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I Módulo 801 Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado 1) Compreender o Eixo Hipotálamo-Hipófise-Gonadal O sistema gonadal feminino é controlado por diversos sistemas de feedback negativo e positivo, as quais podem ser de longo alcance (ovário-hipotálamo), curto alcance (ovário-hipófise) ou ultracurto (ovário-ovário ou hipotálamo-hipófise). O estímulo principal é hipotalâmico. o Feedback negativo: inibição do eixo HHO pelos hormônios esteroides (estradiol e progesterona) e não esteroides (inibina) o Feedback positivo: aumento da liberação de gonadotrofinas, mediada por hormônios ovarianos. É observada no período puberal (estímulo da síntese de LH). Quando o estrógeno está em baixa, há estímulo para a secreção de gonadotrofinas hipofisárias. O GnRH (hormônio liberador de gonadotrofinas) é um hormônio secretado pelo hipotálamo, que apresenta secreção pulsátil. o Age na hipófise, especificadamente nos gonadotrofos hipofisários localizados na hipófise anterior, levando a secreção de LH e FSH na circulação. Uma vez secretados na circulação, o LH e o FSH exercem efeitos nas células da granulosa e teca ovarianas e nas células de Leydig e Sertoli testiculares. o Sob efeito desses hormônios, as gônadas exercem suas funções, como espermatogênese, foliculogênese e ovulação! o Nos folículos ovarianos, estimulam a produção de estrogênio e progesterona, desencadeando a ovulação, provocada pela elevação súbita nos níveis de estrogênio e LH. Os principais hormônios sintetizados pelos ovários são os estrogênios e a progesterona, ambos derivados do colesterol. As células da granulosa e da teca são capazes de produzir esses hormônios a partir de andrógenos! o O estrogênio e a progesterona agem no endométrio, levando a modificações do tecido que apresentam como objetivo final “preparar” a implantação do óvulo caso ocorra fecundação. Quando essa não ocorre, a secreção de estrogênio e progesterona pelo corpo lúteo cai, levando a descamação endometrial e consequente menstruação.

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Page 1: I Módulo 801 Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado 1

I Módulo 801 – Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado

1) Compreender o Eixo Hipotálamo-Hipófise-Gonadal

• O sistema gonadal feminino é controlado por diversos sistemas de feedback negativo e positivo, as

quais podem ser de longo alcance (ovário-hipotálamo), curto alcance (ovário-hipófise) ou ultracurto

(ovário-ovário ou hipotálamo-hipófise). O estímulo principal é hipotalâmico.

o Feedback negativo: inibição do eixo HHO pelos hormônios esteroides (estradiol e progesterona)

e não esteroides (inibina)

o Feedback positivo: aumento da liberação de gonadotrofinas, mediada por hormônios ovarianos. É

observada no período puberal (estímulo da síntese de LH). Quando o estrógeno está em baixa, há

estímulo para a secreção de gonadotrofinas hipofisárias.

• O GnRH (hormônio liberador de gonadotrofinas) é um hormônio secretado pelo hipotálamo, que

apresenta secreção pulsátil.

o Age na hipófise, especificadamente nos gonadotrofos hipofisários localizados na hipófise

anterior, levando a secreção de LH e FSH na circulação.

• Uma vez secretados na circulação, o LH e o FSH exercem efeitos nas células da granulosa e teca

ovarianas e nas células de Leydig e Sertoli testiculares.

o Sob efeito desses hormônios, as gônadas exercem suas funções, como espermatogênese,

foliculogênese e ovulação!

o Nos folículos ovarianos, estimulam a produção de estrogênio e progesterona, desencadeando a

ovulação, provocada pela elevação súbita nos níveis de estrogênio e LH.

• Os principais hormônios sintetizados pelos ovários são os estrogênios e a progesterona, ambos

derivados do colesterol. As células da granulosa e da teca são capazes de produzir esses hormônios a

partir de andrógenos!

o O estrogênio e a progesterona agem no endométrio, levando a modificações do tecido que

apresentam como objetivo final “preparar” a implantação do óvulo caso ocorra fecundação.

Quando essa não ocorre, a secreção de estrogênio e progesterona pelo corpo lúteo cai, levando a

descamação endometrial e consequente menstruação.

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I Módulo 801 – Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado

• Os principais estrogênios são androstenediona, estrona e estriol. Seus efeitos metabólicos são:

o Genitais: alterações cíclicas da menstruação (endométrio, aumenta motilidade das tubas...)

o Mamas: desenvolvimento do sistema de ductos, glândulas e mamilos

o Ossos: estimula atividade osteoblástica, fechamento epifisário e absorção intestinal do cálcio.

o Fígado: aumenta a síntese de LDLr (BE)

o Cardiovascular: inibe a ativação plaquetária e leva a vasodilatação

o Pele: aumenta a síntese de colágeno

o SNC: aumenta a libido e inibe morte neuronal

o Promove, obviamente, a manifestação de características sexuais secundárias femininas (mamas,

útero, distribuição de tecido adiposo...)

• ATENÇÃO! O controle do sistema gonadal ocorre por diversos mecanismos de feedback (já

explicados), entretanto, também pode ser influenciado por estímulos exógenos, endógenos (adrenais,

fígado, tireoide) e alterações psíquicas, que podem intervir na regularidade do ciclo menstrual e causar

oligomenorreia ou amenorreia.

2) Compreender a menopausa/falência gonadal feminina

OBS pros calouros: O primeiro objetivo dessa tutoria era revisar o eixo gonadal feminino! Já fiz essa parte,

mas tá no módulo de GO, então, pra economizar espaço (e tinta, rs), não resumi aqui. Lá tá beeem mais

detalhado!

1) Introdução

• A menstruação é um fenômeno cíclico que requer a integridade do eixo gonadodrófico (SNC,

hipotálamo, hipófise e ovários) para o seu bom funcionamento. O fluxo menstrual requer endométrio

responsivo e aparelho genital permeável (“saída”)

• Em condições fisiológicas, a menstruação ocorre cerca de 14 dias após a ovulação, em consequência

a queda dos níveis circulantes de hormônios esteroides sexuais.

• Define-se amenorreia como ausência ou interrupção da menstruação e pode ser manifestação de várias

doenças, endócrinas ou não endócrinas, sendo classificada como primária e secundária. A falta de

menstruação é um sintoma relativamente comum, podendo atingir até 5% das mulheres.

o Amenorreia primária: ausência de menarca após os 13 anos de idade, em meninas que não

tenham iniciado a telarca, ou aos 15 anos, na presença de características sexuais secundárias

(ausência de menarca) → lembrar da progressão do desenvolvimento sexual feminino (TPM –

telarca, pubarca, e, por último, menarca)

o Amenorreia secundária: interrupção da menstruação por três meses consecutivos em uma mulher

que já tenha menstruado previamente ou ausência de menstruação por seis meses em mulheres

com ciclos irregulares. Quando ainda não atingiu esse limite temporal, define-se o atraso

menstrual.

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I Módulo 801 – Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado

• Pode também ser compreendido em: hipogonadismo hipergonadotófico (gonadotrofinas aumentadas –

problema no ovário), hipogonadotrófico (gonadotrofinas reduzidas – problema no hipotálamo ou na

hipófise) ou eugonadotrófico (hormônios normais, relacionada a obstrução anatômica)

• ATENÇÃO! Inicialmente deve-se descartar situações fisiológicas de amenorreia, como gravidez,

lactação e menopausa.

Nomenclatura do sangramento menstrual diminuído ou ausente

- Hipomenorreia: redução nos dias de duração ou no fluxo

- Oligomenorreia: redução na frequência das menstruações (intervalos maiores que 35 dias)

- Criptomenorreia: o sangramento não se exterioriza por alterações anatômicas do trajeto de saída

- Amenorreia: ausência da menarca ou ausência da menstruação por no mínimo três ciclos menstruais

consecutivos ou seis meses

2) Etiologias

• Podem ser decorrentes de alterações anatômicas do trato reprodutivo, insuficiência ovarina

primária, anovulação crônica com estrogênio presente ou causas centrais.

o As anormalidades anatômicas mais comuns são a agenesia mulleriana, hímen imperfurado e

septo vaginal transverso, alterações congênitas presentes principalmente em adolescentes com

desenvolvimento puberal normal e amenorreia primária, podendo muitas vezes serem observadas

pelo próprio exame físico.

▪ Agenesia mulleriana: útero e vagina parcialmente ou totalmente ausentes, na presença de

características femininas e ovário normal.

▪ Hímen imperfurado: anormalidade obstrutiva do trato genital feminino mais comum,

geralmente se apresentado por abaulamento de hímen (acúmulo de líquido menstrual).

• Inicialmente, a ausência da menstruação está associada a atraso da maturação óssea e baixa estatura,

• Nessa tutoria, iremos focar na falência ovariana primária: hipogonadismo hipergonadotrófico. É

uma das causas de amenorreia primárira, que cursa com retardo puberal! Apresenta, como principais

causas:

o Agenesia gonadal

o Disgenesia gonadal (cariótipo anormal – síndrome de Turner ou normal)

o Defeito enzimático (deficiência da aromatase ou da 17,20-liase)

o Falência ovariana prematura (< 40 anos de idade): idiopática, por injúria, síndrome de Savage

(ovários resistentes), galactosemia e autoimune

3) Alterações anatômicas (criptomenorreia)

• Geralmente cursam com amenorreia primária, contudo, há desenvolvimento de características sexuais

secundárias normais.

• Algumas são: fusão ou aglutinação labial, hímen imperfurado, agenesia vaginal, aplasia ou hipoplasia de

endométrio, septo vaginal transverso...

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I Módulo 801 – Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado

• Em casos de amenorreia por alterações anatômicas, não há sangramento frente ao teste de

administração exógena de estrógeno e progesterona!

• A histeroscopia e USG pélvica/transvaginal são exames de imagem útil para diagnóstico.

• ATENÇÃO! Nem todas alterações são endógenas, podendo ser também ser adquiridas! Nesses casos,

cursam com amenorreia secundária em mulheres com caracteres sexuais normais. As principais são

sinéquias uterinas (“cicatrizes no revestimento interno do útero que conectam as paredes uterinas

opostas) por DIP, infecções, inflação, curetagem, radioterapia ou trauma uterino.

4) Insuficiência Ovariana Primária (hipogonadismo hipergonadotrófico)

• Ocorre pela depleção de oócitos e consequente deficiência estrogênica, levando a uma atrofia

endometrial e ausência de menstruações.

• É marcado por um hipogonadismo hipergonadotrófico, ou seja, um hipoestrogenismo associado a

níveis de FSH elevado!

o O FSH deve ser > 40 mUI/ml em, no mínimo, duas dosagens com intervalo de pelo menos 30

dias entre eles para a confirmação.

o Ao teste com estrogênio associado à progesterona, há presença de sangramento menstrual,

demonstrando a ausência de alteração anatômica, mas sim falta hormonal para possibilitar

proliferação e descamação endometrial. Além disso, a reposição de progesterona não consegue

induzir a menstruação, pois o estrógeno é insuficiente pra levar a proliferação do endométrio.

• Ocorre em situações de dano ao tecido ovariano, processo autoimune ou por disgenesia ou agenesia

gonadal. Entretanto, a forma idiopática (com cariótipo normal) é a mais frequentemente observada.

Essa forma é caracterizada pela interrupção da função ovariana, de forma temporária ou definitiva.

• O quadro clínico característico é: amenorreia e sinais de hipoestrogenismo, em mulheres abaixo de

40 anos.

• A IOP pode cursar com amenorreia primária ou secundária, dependendo da idade em que a insuficiência

ocorre.

• Algumas das causas mais frequentes estão elucidadas abaixo:

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I Módulo 801 – Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado

o Genéticas: são necessários dois cromossomos X intactos para a manutenção dos oócitos; em caso

de perda ou alteração desses, verifica-se perda folicular acelerada. Sua forma mais comum é a

Síndrome de Turner (45,X) (45,X/46,XX), condição em que as meninas nascem com baixo

peso, linfedema, baixa estatura na infância, retardo puberal, implantação baixa do cabelo,

pescoço alado, malformações cardíacas e renais. A amenorreia

primária é quase uma regra nesses pacientes, todavia, a síndrome

pode apresentar-se de forma incompleta, e 5% dos pacientes

evoluem com amenorreia secundária, apesar de apresentarem

ovários disgenéticos.

▪ Outras afecções genéticas são disgenesia gonadal pura

(46, XX – apresentam alguns comemorativos da

síndrome de Turner, como retardo do desenvolvimento

puberal, gônadas em fita...); disgenesia gonadal mista

(46, XY – pode haver genitália ambígua e maior risco de

malignidade).

o Autoimune: diagnóstico de difícil confirmação, exceto quando

ocorre em conjunto com as síndromes poliglandulares

autoimunes. Estima-se que cerca de 20 a 30% dos pacientes com

IOP tenham doença autoimune concomitante (principalmente

tireoideana).

o Iatrogênicas: radioterapia, quimioterapia, torção ou cirurgia

o Síndrome dos Ovários resistentes (Savage): causa rara de

amenorreia hipergonadotrófica, caracterizada por anovulação na

presença de gonadotrofinas elevadas e numerosos folículos

ovarianos primordiais, os quais não respondem a

gonadotrofinas endógenas ou exógenas. É um diagnóstico de exclusão, apresentando etiologia

desconhecida.

5) Anovulação crônica com estrogênio presente

• Suas causas mais comuns são:

o Síndrome dos ovários policísticos – aumento no tamanho dos ovários devido a formação de

cistos, oriunda da alteração dos níveis séricos hormonais (descontrole na esteroidogênese por um

defeito intrínseco nas células da teca ovarianas). Está relacionada ao aumento significativo de

risco para diversas comorbidades, como obesidade, infertilidade, dislipidemia, diabetes (defeito

nas vias de sinalização insulínica), depressão e doenças cardiovasculares.

o Hiperplasia adrenal congênita

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I Módulo 801 – Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado

o Obesidade

o Síndrome de Cushing

o Hipo ou hipertireoidismo

o Tumores adrenais ou ovarianos funcionantes

• Nesses pacientes há anovulação e infertilidade devido a perda de sincronia entre a secreção de

hormônios sexuais e os gonadotrofos (mecanismo de feedback é comprometido/alterado). Como não há

ovulação, não há a formação do corpo lúteo e consequente aumento da produção de progesterona,

que antecede o sangramento menstrual.

• Apresentam risco aumentado de carcinoma de endométrio devido ao excesso de estrogênio não

“equilibrado” pela produção de progesterona! Portanto, o tratamento envolve a reposição hormonal

com anticoncepcionais ou progesterona, visando o equilíbrio do sistema de feedback original.

6) Causas centrais de amenorreia por disfunção hipotalâmica (hipogonadismo hipogonadotrófico)

• Correspondem entre 15 a 30% das amenorreias, sendo a causa mais frequente de amenorreia

secundária! Em sua maioria apresentam origem hipotalâmica (devem-se excluir lesões hipofisárias)

• A supressão do GnRH pode derivar de fatores psíquicos, neurogênicos ou iatrogênicos (uso de

drogas). Dependendo do “grau de inibição”, pode ocorrer amenorreia ou apenas anovulação. Suas

principais causas funcionais são:

o Anorexia nervosa/perda de peso importante – distúrbios alimentares levam a disfunção

hipotalâmica em vários níveis: regulação de temperatura, sono, secreção endócrina e equilíbrio

autonômico.

o Exercício físico extenuante – comum em maratonistas, triatletas e bailarinas, sendo que a

supressão do GnRH apresenta etiologia multifatorial (alteração de neurotransmissores, perda de

peso acentuada – um percentual menor que 22% pode levar a amenorreia, “poupança de energia

do organismo” – devido ao consumo elevado, passa a gastar a energia a qual seria utilizada para

manter ciclos menstruais para outras atividades)

o Estresse emocional ou depressão grave – suspeita-se que nesses estados há uma maior produção

de CRH (hormônio liberador de corticotrofina), opioides endógenos, vasopressina e GABA,

que inibem a secreção de GnRH.

o Doenças sistêmicas crônicas (insuficiência renal e hepática, SIDA, neoplasias...)

o Hiperprolactinemia – a prolactina é um hormônio hipofisário que está relacionado ao feedback

negativo da secreção de GnRH.

o Hipotireoidismo

• Também pode ser causada por alterações anatômicas (neoplasias de SNC, radioterapia, doença

inflamatória) ou genéticas (síndrome de Kallmann, hipogonadismo hipogonadotrófico idiopático,

mutação nos genes de receptores hormonais....)

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o Síndrome de Kallman: neuropatia que cursa com amenorreia hipotalâmica, causada por uma

falha na migração das células neuronais olfatórias e das células produtoras de GnRH do

epitélio nasal até a área pré-óptica e hipotalâmcia durante a embriogênese, levando a tríade

clínica – anosmia, hipogonadismo hipogandotrófico e cegueira para cores. Ao exame físico,

o infantilismo é um achado frequente, e os ovários são pequenos e pouco desenvolvidos (devido

aos baixos níveis de gonadotrofinas). O tratamento de escolha é a reposição exógena de GnRH,

podendo ser realizada reposição com estrógeno e progesterona caso deseje evitar gravidez.

o Síndrome de Sheehan: resulta da necrose hipofisária secundária a isquemia local, que pode

ocorrer em hemorragias com instabilidade hemodinâmica durante o parto (hipóxia devido ao

espasmo das artérias pituitárias durante o choque hipovolêmico). É necessária uma destruição de

no mínimo 98% da glândula para que ocorra hipofunção acentuada. Clinicamente se manifesta

semanas a meses após o parto, na forma de um hipopituitarismo generalizado, podendo

haver destruição de apenas alguns setores da hipófise (o gonadotrófico costuma ser o mais

acometido, levando a amenorreia secundária associada a ausência de lactação).

▪ OBS: a Síndrome de Simmonds é a “mesma coisa”, entretanto, não apresenta relação com

o parto (decorrente de trauma, lesões vasculares ou tumores).

o Tumores: dividem-se em hipotalâmicos e hipofisários

▪ Hipotalâmicos: craniofaringiomas (mais comuns), germinomas. granulomas tuberculares,

cistos dermoides. Também podem cursar com aumento da secreção de gonadotrofinas em

alguns casos.

▪ Hipofisários: geralmente são benignos, entretanto, são a causa mais frequente da

amenorreia de origem hipofisária. Seus sintomas são desencadeados pela alteração de

secreção hormonal (podem também cursar com acromegalia, cushing ou hipertireoidismo

– GH, ACTH e TSH) ou pela compressão de estruturas adjacentes (quiasma óptico, por

exemplo). O adenoma hipofisário é a causa mais frequente de amenorreia dentre os

tumores (prolactinoma, principalmente).

• Quando tratada a causa base, o hipotálamo volta a secretar os pulsos de GnRH normalmente e a mulher

volta a ter os ciclos menstruais de forma regular.

• Sua característica típica é o nível baixo de todos os hormônios (do eixo HHO)! Essas pacientes não

apresentam sangramento frente ao teste da progesterona, pois o nível de estrógeno está baixo, impedindo

a proliferação adequada do endométrio. Entretanto, no teste de estrógeno + progesterona, apresenta

sangramento, o que indica uma deficiência hormonal, excluindo um defeito anatômico.

• ATENÇÃO! Nesses casos é de bom grado solicitar uma ressonância magnética da sela turca para

excluir causas anatômicas de amenorreia hipotalâmica (neoplasias).

7) Diagnóstico

a) Anamnese e Exame Físico

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I Módulo 801 – Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado

• Avaliar se é um caso de amenorreia primária ou secundária

• Investigar a presença de outros caracteres sexuais secundários, sinais de hiperandrogenismo (pilificação,

acne...), dor pélvica cíclica, histórico familiar de puberdade e de menarca, antecedentes obstétricos

(síndrome de Sheehan), histórico dos ciclos menstruais prévios e irregularidade menstrual (DUM,

atividade sexual), sinais de hipoestrogenismo (instabilidade de temperatura, fogachos, ondas de calor e

sintomas vasomotores) e uso de contraceptivos.

• Avaliar peso, altura, curva de crescimento, presença de caracteres sexuais secundários, galactorreia,

hirsutismo, virilização, acne ou sinais de hiperandrogenismo ou hipoestrogenismo, acantose nigricans e

sinais de síndrome de Cushing.

b) Exames laboratoriais

• Nas amenorreias secundárias, a primeira conduta é a exclusão da gravidez. Em sequência, deve-se

solicitar a dosagem de prolactina e do hormônio tireotrófico (TSH) – devido a seu baixo custo e

simplicidade.

o TSH: objetiva a detecção de hipotireoidismo subclínico (TSH elevado com T4 normal),

encontrado em pequena quantidade de pacientes com amenorreia e/ou galactorreia (o TRH

também apresenta estimulação sob a produção de prolactina). Esse exame é justificado pelo

rápido diagnóstico e manejo clínico relativamente simples da doença.

▪ ATENÇÃO! O hipertireoidismo, menos frequentemente, pode levar a amenorreia

secundária, apesar que de forma não tão frequente. Isso se deve ao feedback anormal

hipotalâmico, levando a uma secreção persistentemente elevada de LH (e consequente

amenorreia), pelo aumento da conversão periférica de hormônios andrógenos em

estrógenos.

o Prolactina: hormônio sintetizado pela adeno-hipófise, apresentando como função fisiológica a

indução e manutenção da lactação, inibição da função reprodutiva e do impulso sexual. É um

hormônio que apresenta secreção pulsátil, portanto, níveis elevados devem sempre ser

confirmados. A amostra deve ser preferencialmente coletada no meio da manhã, evitando ser

coletada após punção venosa, ingestão de alimentos, estimulação mamária, exercício físico ou

estresse. A hiperprolactinemia (causas mais comuns são usos de medicamentos e presença de

adenomas produtores de prolactina) promove amenorreia pela inibição da secreção pulsátil do

GnRH (a dopamina é o principal inibidor da prolactina, portanto, agonistas da dopamina podem

ser utilizados para reverter a situação).

▪ ATENÇÃO! Duas situações podem interferir nos níveis séricos dessas substâncias: a

macroprolactinemia e o efeito gancho. A primeira se deve a circulação exacerbada da

prolactina em sua forma polimérica (menos ativa – macroprolactina), levando a uma

elevação falsa nos níveis de prolactina, sem haver sintomas clínicos dessa condição. A

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segunda se deve ao excesso de prolactina que pode levar a resultados falsamente baixos

(principalmente em tumores hipofisários grandes – macroprolactinomas)

• Outros testes também podem ser utilizados, como o teste da progesterona, estrogênio, GnRH e

dosagem de FSH.

o Teste da progesterona: avalia o estado da secreção de estrogênio e a presença de permeabilidade

do trato genital de saída. Realizado apenas após investigação inicial do TSH e da prolactina.

Administra-se acetato de medroxiprogesterona durante cinco a sete dias. Podem ocorrer as

seguintes alterações

▪ Sangarmento de privação: ocorre a menstruação, indicando funcionalidade normal do

estrogênio endógeno e trajeto de saída para o fluxo menstrual permeável. Como a

dosagem de TSH e prolactina são normais, pode-se concluir que houve anovulação (o

estrogêncio endógeno garantiu uma resposta endometrial satisfatória, mas não houve

formação do corpo lúteo e consequente queda nos níveis plasmáticos de progesterona,

que desencadeiam a menstruação) → ausência da fase lútea do ciclo menstrual.

• ATENÇÃO! A ação estrogênica sem oposição natural da progesterona é um fator

de risco importante para o câncer endometrial (logo, é uma condição que requer

tratamento, com reposição de progesterona nos últimos 10 a 12 dias do ciclo ou

administração de anticoncepcionais orais combinados de baixa dose).

▪ Ausência de sangramento: não há menstruação, indicando causas relacionadas a produção

deficiente de estrógeno, resposta endometrial inadequada ou obstrução da saída do trato

genital. Nesses casos, deve-se realizar o teste do estrogênio

o Teste do Estrogênio: administração de estrogênios conjugados ou estradiol por 21 dias, com

associação de progesterona nos cinco últimos dias, visando “imitar um ciclo menstrual”. Esse

teste busca avaliar a resposta endometrial e a patência do trato de saída.

▪ Sangramento: descarta causas anatômicas (uterovaginais). Nesses casos, deve ser

realizada a dosagem do FSH (após cerca de duas semanas, devido a interferência no

mecanismo de feedback causada pela administração de hormônios exógenos).

▪ Ausencia de sangramento: indica anormalidades endócrinas do trato genital. Geralmente

associa-se a causas de amenorreia primária.

o Dosagem de FSH: avalia desordens gonádicas, hipofisárias e hipotalâmicas (o déficit de

estrogênio pode ser causado por anomalia ovariana ou no eixo hipotálamo-hipofisário). É útil

para distinção das causas hipergonadotrópicas (aumento de FSH) das hipogonadotrópicas

(redução do FSH).

▪ Hipergonadotrópicas: indicam que o eixo está íntegro, entretanto, não há produção

adequada de hormônios ovarianos (menopausa, falência ovariana precoce)

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I Módulo 801 – Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado

▪ Hipogonadotrópico: indica que o eixo está comprometido, o que explica a baixa produção

de hormônios ovarianos (disfunção hipotalâmica e hipofisária – podem cursar com níveis

normais de FSH).

• ATENÇÃO! Frente a esse achado, justifica-se a realização de ressonância

magnética ou tomografia computadorizada para rastreio de tumores do SNC.

Essa investigação não deve ser realizada de início, pois podem ser encontrados

incidentalomas hipofisários.

o Teste do GnRH: a administração desse hormônio pode ser utilizada nos casos de hipogonadismo

hipogonadotrófico para determinar a origem da disfunção (hipotalâmica ou hipofisária).

Coletam-se duas amostras de sangue: uma pré e outra pós administração exógena de GnRH e

avalia-se o LH e FSH em ambas.

▪ Teste positivo: elevação de 200% em relação aos níveis pré-GnRH, indicando um defeito

hipotalâmico.

▪ Teste negativo: recomenda-se a repetição do teste após quatro a sete dias, devido a

possibilidade de dessensibilização da glândula por hipotrofia funcional, devido ao longo

período sem estimulação.

• Outros exames podem ser solicitados para investigação posterior, como:

o USG pélvica: avaliação anatômica (em pacientes que não menstruaram ainda, nas que já,

podemos usar transvaginal)

o Cariótipo: análise de síndromes genéticas

o Histeroscopia ou histerossalpingografia: avalia perviedade do trato reprodutivo

o USG ou TC de abdome: avalia glanculas adrenais

o RM selar: caso suspeita de patologia hipotálamo-hipofisária

o Teste olfatório e RM de sulcos e bulbos olfatórios: em caso de hipogonadismo hipogonadotrófico

com suspeita de síndrome de Kallmann.

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I Módulo 801 – Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado

Investigação de Amenorreia Secundária

Investigação de Amenorreia Primária

Dosagem de Beta-HCG Exclusão de gravidez

Dosagem de TSH

Avaliação de Hipotieroidismo ou Hipertireoidismo Subclínico

Dosagem de Prolactina

Avaliação de Hiperprolactinemia

(Cuidado com macroprolactinemia e efeito gancho)

Teste da Progesterona

Avalia estrogênio endógeno e patência do trato genital

Positivo (PRL e TSH normais) Negativo

Teste de Estrogênio + Progesterona

Positivo - Dosagem de FSH (EHHO)

Negativo - alteração no trato de saída

Ausência de caracteres sexuais

secundários

↓FSH e LH

Solicitar GnRH

↓GnRH -Amenorreia Hipofisária

↑GnRH -Amenorreia

Hipotalâmica

↑FSH e LH

Solicitar cariótipo

Presença de caracteres sexuais

secundários

USG ABD

Anormalidade Anatômica

Solicitar Cariótipo

Normalidade anatômica

Teste da progesterona

(Investigação igual a secundária)

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I Módulo 801 – Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado

8) Tratamento

• Causas anatômicas ou canaliculares: cirurgia

• Hipogonadismo sem características sexuais secundárias: reposição hormonal com estrógeno e

progesterona de forma lenta e progressiva

• Hipogonadismo com caracteres sexuais secundários: inicia-se reposição hormonal dose plena

• Hipogonadismo hipotalâmico funcional: corrige-se a doença de base; caso essa não possa ser tratada ou

a amenorreia persista pro mais de 06 meses, considera-se o uso de anticoncepcional oral de baixa

dosagem.

• Hiperprolactinemia: agonista dopaminérgicos, suspendem-se medicações causadores de

hiperprolactinemia

• Hipotireoidismo: tratamento específico

• Síndrome dos ovários policísticos: anticoncepcional com progesterona antiandrogênica, antiandrógenos,

metformina, perda de peso, dieta, mudança do estilo de vida. Caso infértil, utilizar análogo de GnRH

pulsátil.

3) Compreender a insuficiência adrenal: 1ª, 2ª, aguda e crônica

1) Introdução

• A insuficiência adrenal é uma síndrome clínica decorrente da perda parcial ou completa da

capacidade de secreção dos esteroides adrenocorticais pelas adrenais, seja por doença da própria

glândula adrenal, seja por doença hipotálamo-hipofisária, causando diminuição do estímulo do hormônio

adrenocorticotrófico ou corticotrofina (ACTH) sobre as adrenais, ou mais frequentemente pelo uso

crônico de glicocorticoides, levando a supressão do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA)

• Afeta principalmente pacientes do sexo feminino entre a quarta e a sexta década de vida.

• Para o surgimento é necessário da destruição de mais de 90% do córtex adrenal bilateralmente.

• Quanto a classificação, se divide em:

o Primária (40% dos casos): decorre da produção inadequada de cortisol pelas adrenais em

condições basais ou de estresse. É conhecida como doença de Addison, caracterizada por

destruição de mais 90% do córtex dessa glândula, levando a queda de glicocorticoides,

mineralocorticoides e andrógenos adrenais.

▪ Possíveis etiologias são – destruição autoimune da adrenal isolada ou associada à

síndrome poliglandular autoimune (60% dos casos), doenças infecciosas com

acometimento adrenal (tuberculose, HIV, fungos, CMV), neoplasias...

▪ ATENÇÃO! Aqui a deficiência é de glicocorticoides, mineralocorticoides e andrógenos

adrenais.

o Secundária (60% dos casos): gerada por patologias do eixo hipotálamo-hipofisário que levam à

redução na produção de ACTH e/ou de hormônio liberador de corticotrofina (CRH) ou, mais

frequentemente, pelo uso crônico de glicocorticoides, levando a supressão do eixo HHA. O

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I Módulo 801 – Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado

déficit de ACTH gera atrofia da adrenal (exceto a camada glomerulosa – produtora de

aldosterona), que ocorre cerca de 04 semanas após ausência de estímulo trófico pelo ACTH. Sua

principal causa é a interrupção do uso de corticoides exógenos continuados por mais de 03

semanas.

▪ ATENÇÃO! Aqui, a deficiência é apenas de glicocorticoides e andrógenos (visto que a

zona glomerulosa é controlada predominantemente pelo SRAA).

Causas de Insuficiência Adrenal Primária

- Doença de Addison autoimune: é a causa mais comum de insuficiência adrenal primária (70 a 90% dos

casos), podendo ocorrer isoladamente ou associada à síndrome poliglandular autoimune. Leva a atrofia

do córtex, porém, preserva a medula adrenal, devido a presença de autoanticorpos (anti 21-hidroxilase,

anti-17-hidroxilase...)

- Tuberculose Adrenal: é a segunda causa mais comum de insuficiência adrenal primária, podendo ser a

primeira em alguns países em desenvolvimento. O acometimento da adrenal ocorre por disseminação

hematogênica microbacteriana (a proliferação é facilitada devido ao aumento da concentração de cortisol

intradrenal). Inicialmente há formação de granulomas que aumentam a glândula, seguido de fibrose dessa.

- Doenças fúngicas: paracoccideoidomicose, histoplasmose ou criptococose com acometimento adrenal.

- Fármacos: cetoconazol, fluconazol, mitotane...

- Traumática: sepse, choque hipovolêmico, hemorragias suprarrenal...

- Metástases: presentes em 70% dos pacientes com câncer de pulmão ou de mama disseminado.

- Adrenoleucodistrofia: doença genética recessiva ligada ao cromossomo X, causada por mutações do

gene ABCD1. Há um acúmulo de ácidos graxos de cadeia longa, que se acumulam em diversos locais do

corpo (no cérebro ou na adrenal) – é aquela do filme “óleo de lorenzo”.

2) Quadro Clínico

• A insuficiência adrenal se apresenta na maioria dos casos com quadro progressivo e insidioso de sinais e

sintomas inespecíficos, os quais são causados pelo déficit de hormônios produzidos nessa glândula:

o Glicocorticoides: astenia, mal-estar, anorexia, perda de peso, sintomas TGI (náuseas, vômitos,

dor), hipoglicemias, mialgia, artralgia e sintomas psiquiátricos. Devido ao papel dessas

moléculas na manutenção do tônus adrenérgico, pode ocorrer hipotensão devido à vasoplegia e

extravasamento de líquido para o meio extracelular. (lembrar que é o hormônio do stress)

o Deficiência de mineralocorticoides (apenas na 1ª): manifesta-se com taquicardia postural,

hipotensão postural, hipotensão arterial basal, hipovolemia e “fome de sal”.

o Deficiência de andrógenos: cursa com sintomas apenas em mulheres, devido a produção exógena

de testosterona pelos homens (testicular). Cursa com queda de libido e redução da pilificação

axilar e pubiana.

• Nos casos de insuficiência adrenal primária, pode haver hiperpigmentação, principalmente em áreas

expostas ao sol, dobras e de trauma, devido ao aumento da POMC (que origina o ACTH e o hormônio

melanotrófico - MSH, o qual atua nos receptores da pele, estimulando os melanócitos). Como na

insuficiência secundária não há secreção de ACTH, a pele não apresenta modificações.

• Em crianças, a insuficiência adrenal pode causar hipoglicemias, hipotensão, desidratação, náuseas,

vômitos, dor abdominal, dificuldade de mamar, hipotonia muscular, hiperpigmentação, cefaleia... Em

meninas, pode cursar com ambiguidade genital.

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I Módulo 801 – Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado

• Em pacientes com insuficiencia secundária a tumor, os pacientes podem apresentar sintomas de

deficiência referentes a outros hormônios hipofisários, ou sintomas de compressão do nervo ótico

(cefaleia e déficit visual)

• Em pacientes crônicos não diagnosticados, principalmente em situações de estresse agudo (como

trauma, cirurgia, ajuste de dose inadequado), quadros agudos de insuficiência adrenal (“crise

adrenal”) podem acontecer, cursando com os seguintes sintomas:

o Sistema Cardiovascular: hipotensão, choque refratário e desidratação

o Neurológico: confusão mental, coma, fraqueza (pode ter convulsão por hipoglicemia)

o Gastrointestinal: náuseas, vômitos, anorexia, dor abdominal

o Laboratório inespecífico: hiponatremia, hiperpotassemia (útil para diferenciar de sepse),

hipoglicemia, uremia, linfocitose, eosinofilia, hipercalemia

3) Diagnóstico

a) Achados Laboratoriais Inespecíficos

• Anemia normocítica e normocrômica

• Eosinofilia

• Leucopenia com linfocitose

• Hiponatremia (falta de aldosterona na primária e excesso de ADH na secundária)

• Hiperpotassemia (se houver insuficiencia adrenal primária – falta de aldosetrona → leva a redução na

excressão do potássio)

• Aumento de TSH (ausência do feedback negativo do cortisol – ddx com hipotireoidismo)

• Acidose metabólica leve

• Hipomagnesemia

• Hipoglicemia

b) Laboratório específico

• Dosagem basal de cortisol às 8h: o cortisol plasmático apresenta seu pico de concentração plasmática no

início da manhã. A maioria dos casos de insuficiência adrenal cursa com cortisol < 3 ug/dl (ou 15 em

situação de estresse); valores acima de 13 são extremamente raros na insuficiência – o normal costuma

ser de 18 ug/dl. Em casos duvidosos (entre 3 e 13 ug/dl), deve-se utilizar testes adicionais (estímulo de

cortisol) para confirmar o diagnóstico.

• ITT: é o teste padrão-ouro para o diagnóstico de insuficiência adrenal, entretanto, apresenta risco de

hipoglicemia grave, pois consiste na aplicação de insulina e aferição dos níveis de glicemia e cortisol

plasmáticos. Apresenta como objetivo avaliar o pico de cortisol frente a hipoglicemia (< 40 mg/dL).

Caso o cortisol esteja abaixo de 18 mg/dL, na vigência de hipoglicemia, a insuficiencia adrenal é

confirmada. É mais sensível do que o teste de cortrosina (descrito abaixo), pois se altera tanto na

insuficiencia primária quanto na secundária.

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I Módulo 801 – Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado

o ATENÇÃO! Devido ao risco de hipoglicemia, esse teste é contraindicado em crianças < 20 kg,

pacientes > 65 anos, pessoas com histórico de crises convulsivas ou de doença coronariana ou

cerebrovascular.

• Teste da cortrosina: feito com coleta de cortisol seriada após administração de cortrosina (ACTH

sintético). A lógica por trás desse exame se dá pela perda de capacidade de responder ao estímulo agudo

de ACTH devido a privação crônica desse hormônio (aproximadamente 04 semanas). Nesse teste, um

pico de cortisol menor do que 18 ug confirma insuficiência adrenal (caso < 10, insuficiência

completa, caso > 10, insuficiência parcial). Pacientes com insuficiência moderada podem apresentar

pico falsamente normal (nesses casos, realizar o ITT, que é o padrão ouro).

o ATENÇÃO! Em pacientes com insuficiência secundária, esse teste só se tornará positivo após

04 semanas da doença (tempo necessário para hipotrofia de adrenal).

o Todos os glicocorticoides devem ser suspensos antes da dosagem do nível sérico de cortisol

(exceto a dexametasona e a betametasona), pois irão dar “falso positivo”. O teste serve para

avaliar se o eixo HHA já se encontra desbloqueado.

• ACTH plasmático às 8 e 9h: serve para identificar se a etiologia é primária ou secundária! Lembre:

esse horário é justamente aquele em que o cortisol se encontra em sua concentração máxima, portanto, o

ACTH também deveria estar elevado! Valores normais ou baixos indicam insuficiência secundária

(falência do eixo HHA em secretar esse hormônio), enquanto aqueles > 100 indicam insuficiência

primária.

• Dosagem de aldosterona e renina: níveis elevados de aldosterona e baixos de renina indicam

insuficiência adrenal primária, podendo ser utilizado como rastreio para pacientes com síndrome

poliglandular autoimune (doença de Addison geralmente anda em conjunto com síndrome poliglandular

autoimune)

• Dosagem de s-DHEA: encontra-se reduzido tanto na insuficiência primária quanto na secundária (é um

andrógeno produzido na suprarrenal). É mais útil em indivíduos mais novos, pois os valores tendem a

ser mais baixos em indivíduos acima de 45 anos.

• Anticorpos antiadrenais: indicam presença de processo autoimune, todavia, não apresentam ampla

disponibilidade em nosso meio.

• Dosagem de ácidos graxos de cadeia longa: investigação de adrenoleucodistrofia (apenas em homens –

ligado ao X)

c) Exames de Imagem

• Tomografia computadorizada (TC) ou Ressonância Magnética (RM) das adrenais: solicitada para

avaliação de insuficiência adrenal primária (verificar alterações como atrofia, hiperplasia, aumento ou

alteração anatômica das glândulas adrenais)

• RM de hipófise: avaliado em caso de insuficiência secundária.

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I Módulo 801 – Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado

4) Tratamento

a) Tratamento da crise adrenal aguda

• A crise adrenal é uma manifestação grave, de quadro clínico variável e extremamente fatal!

• O tratamento deve ser realizado imediatamente, seguindo os princípios abaixo:

o Hidratação com SF

o Hidrocortisona: 100 mg IV (ataque), seguida de 25 a 50 mg IV 6/6h (manutenção)

o Correção de distúrbios hidroeletrolíticos e hipoglicemia

o Tratamento da causa precipitante

o Redução da dose de hidrocortisona progressivamente (evitar retorno da falência renal aguda)

após 2 a 3 dias, para atingir a dose fisiológica de reposição

o Uso de mineralocorticoides só é necessário na insuficiência primária, e quando a dose de

hidrocortisona for < 50 mg/dia

b) Tratamento da insuficiência adrenal crônica

• Baseia-se na reposição de glicocorticoides, a qual deve sempre tentar mimetizar o ciclo fisiológico da

secreção de cortisol corpóreo (início da secreção pela madrugada, com pico sérico durante o acordar

com supressão gradual, até níveis mínimos as 00:00. O total secretado pelo corpo geralmente equivale a

algo entre 10 e 25 mg de hidrocortisona por dia!

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I Módulo 801 – Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado

o ATENÇÃO! Deve-se instruir o paciente a ingerir o medicamento pela manhã e antes das

refeições (a alimentação retarda a absorção desses fármacos).

• A hidrocortisona é o fármaco mais semelhante ao cortisol endógeno. Outros corticoides podem ser

administrados, desde que respeitada a equivalência de dose! Geralmente, há uma tendência a prescrever

quantidades superiores a necessária para o paciente, por isso, idealmente é necessário calcular a dose

de acordo com a superfície corporal (a média é de 7 mg/m2 de cortisol ao dia). Deve-se sempre prezar

pela menor dose possível, para evitar os efeitos deletérios do corticoide.

• Mesmo quando adequadamente tratados, os pacientes apresentam uma pior qualidade de vida e maior

mortalidade que os indivíduos normais (provavelmente devido ao supertratamento ou subtratamento

desses pacientes, pois a medicação não consegue replicar o cortisol endógeno 100%, tornando o paciente

sujeito a hipercortisolismo noturno e hipocortisolismo matinal).

• Os esquemas mais populares de reposição de glicocorticoide são:

o Prednisona 5 mg, ao acordar, associada ou não a uma dose de 2,5 mg às 16h

o Hidrocortisona 15 a 25 mg/dia, em 2 ou 3 vezes ao dia.

o Acetato de cortisona manipulada 25 a 50 mg/dia, administrado 3x ou 2x ao dia.

o Dexamentasona 0,5 uma vez ao dia

• Para crianças e adolescentes, deve-se usar o cálculo de superfície corporal.

• ATENÇÃO! Pacientes com insuficiência adrenal primária e em reposição de glicocorticoides não

necessitam de reposição associada de mineralocorticoides, pois em situações de elevada quantidade

de glicocorticoide a a enzima 11-beta-HSD tipo 2 se torna saturada (inativadora de cortisol), de modo

que a própria cortisona passa a apresentar ação mineralocorticoide!!

• ATENÇÃO! Durante a reposição de glicocorticoides, é necessário monitorar o paciente, procurando

sempre por:

o Sinais de hipercortisolismo (Cushing)

o Manter ACTH < 80 mg/dl

o Densitometria óssea

o Sintomas de insuficiência adrenal (paciente subtratado)

• ATENÇÃO! Lembrar que é necessário duplicar ou triplicar a dose do glicocorticoide em situações de

estresse, até 01 dia após estabilização do quadro.

• Em alguns casos, pode ser necessária a reposição de mineralocorticoides e andrógenos adrenais!

o Mineralocorticoides: necessária frente a administração de dexametasona e betametasona (não

apresentam atividade mineralocorticoide, mesmo em altas doses). Hipotensão postural, avidez

por sal, hiponatermia e hipercalemia são sinais de que o paciente necessita dessa reposição.

o Andrógenos: pode ser considerada em pacientes com má qualidade de vida, humor deprimido,

pouca libido e pele seca. Ainda há muita controvérsia se existem benefícios acerca de sua

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I Módulo 801 – Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado

reposição. A reposição é feita com DHEA. Seus principais efeitos colaterais são acne,

oleosidade, sudorese, pilifcação axilar e pubiana, ganho de peso (efeitos androgenizantes).

4) Compreender as Síndromes Poliglandulares Autoimunes

1) Introdução

• As síndromes poliglandulares autoimunes (SPA) são caracterizadas por duas ou mais doenças

autoimunes associadas, podendo ser endocrinopatias ou doenças não endocrinológicas, causadas pela

perda da tolerância imunológica a um peptídeo encontrado em determinado órgão

2) Fisiopatologia

• Geralmente as doenças autoimunes apresentam um forte componente genético, associado a um fator

ambiental que leva ao desencadeamento da produção de auto-anticorpos (geralmente relacionado ao

mimetismo molecular). A partir daí, o corpo perde a tolerância imunológica, e passa a atacar o peptídeo

específico encontrado no órgão-alvo, com destruição do tecido acometido, levando a manifestações

clíncias decorrentes do mal funcionamento do tecido imunologicamente atacado.

o Apesar de o genótipo do paciente aumentar o risco de desenvolvimento da doença, os fatores

ambientais são essenciais na determinação da expressão clínica da patologia!

• A presença de auto-anticorpos pode ser presente antes mesmo de a doença se desenvolver, com o

indivíduo evoluindo com um período de doença subclínica até que uma porção substancial do tecido seja

destruída (igualzinho ao que acontece na diabetes!)

3) Classificação

a) Síndrome Poliglandular Autoimune tipo 1

• Responsável por 15% dos casos, é uma doença rara, autossômica recessiva, causada por mutação no

gene AIRE (responsável pela tolerância imunológica do indivíduo, por estar envolvido na transcrição de

uma proteína localizada nas células epiteliais do timo, a qual regula a seleção positiva ou negativa das

células autoimunes produzidas, de forma a eliminar as células que identificam auto-antígenos) – doença

monogenética, ao contrário dos outros tipos de SPA, que são multigenéticas

• Também conhecida como “autoimune polyendocrinopathy, candidiasis and ectodermal distrophy

(APECED)”.

• Costuma ter início na infância, sendo semelhante o acometimento entre homens e mulheres. Caracteriza-

se pela manifestação de endocrinopatias autoimunes em uma sequência peculiar durante a infância.

o Na maioria das crianças, há candidíase mucocutânea antes dos 05 anos de idade, afetando em até

5% da superfície corporal.

o Nos anos conseguintes, o hipoparatireoidismo autoimune é a primeira manifestação endócrina

da doença, seguida de uma insuficiência adrenal primária auto-imune (Addinson),

“completando” o quadro clínico da doença até os 15 anos de idade. Muitos pacientes também são

afetados por algumas doenças auto-imunes não glandulares.

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I Módulo 801 – Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado

• Caracteriza-se geralmente pela presença de dois dos três (geralmente os pacientes desenvolvem os

três comprometimentos da síndrome até os 20 anos):

o Candidíase mucocutânea: apresenta prevalência de aproximadamente 100% nos indivíduos

acometidos por essa síndrome. Pode ser crônica ou recorrente, afetando boca, unhas, pele,

esôfago, língua e mucosas.

o Hipoparatireoidismo: apresenta-se em cerca de 86% dos pacientes. É caracterizada por

hipocalcemia e hiperfosfatemia na vigência de PTH < 30 pg/ml. Pode ou não estar associada a

presença de autoanticorpos

o Doença de Addison: apresenta-se em 76% dos pacientes, caracterizada por sintomas decorrentes

da deficiência de glicocorticoides e mineralocorticoides (insuficiência adrenal primária)

o Oofrite autoimune: presente em 72% dos pacientes, manifesta-se por hipoestrogenismo na

vigência de LH e FSH elevados e menopausa precoce.

o Displasia ectodérmica: alterações ungeais, hipoplasia dentária e queratopatia presentes em 50 a

75% dos pacientes.

o Anemia perniciosa: avaliar hemograma, vitamina B12 e anticorpos para anti-células parietais

gástricas

o Hipogonadismo hipergonadotrófico em homens: avaliar LH, FSH e testosterona

o DM1: avaliar parâmetros diagnósticos

o Sintomas TGI: diarreia, sugestivo de doença celíaca

o Hipotireoidismo: avaliar hormônios

o Hepatite autoimune

o Atrofia esplênica ou asplenia: avalia-se com hemograma e USG abdominal

o Outras manifestações: alopecia, vitiligo, alteração no esmalte dentário, colelitíase,

ceratoconjuntivte (outras doenças relacionadas a ectoderme)

b) Síndrome Poliglandular Autoimune Tipo 2 (Síndrome de Schmidt), 3 e 4 – “forma adulta”

• É a síndrome mais comum, incluindo qualquer sintoma ou acometimento orgânico que não se

encaixe na SPA tipo 1! Ao contrário do tipo 1, é uma doença de herança poligenética.

• A forma adulta não é associada a patologias do tecido conjuntivo, como candidíase, queratinopatia ou

outras distrofias.

• Mais frequente em mulheres, e, geralmente as manifestações clínicas começam na idade adulta.

o ATENÇÃO! A forma adulta dessa síndrome apresenta um elevado grau de heterogenicidade

(genética e de associação de doenças), podendo ser compreendida em até quatro tipos distintos!

▪ Tipo 2: seu componente predominante é a Doença de Addison, sendo a identificação

desses pacientes difícil devido ao longo intervalo entre o aparecimento das doenças

autoimunes e a frequência relativamente elevada de sintomas inespecíficos.

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I Módulo 801 – Problema 07 I Thiago Almeida Hurtado

▪ Tipo 3: é a mais frequente, englobando a combinação de diabetes tipo 1 e doença

tireoideana autoimune. Pode acompanhar também outras manifestações autoimunes que

não acometam glândulas

▪ Tipo 4: é o tipo mais heterogêneo, sendo mal definido e frequentemente descrito como a

forma em que as endocrinopatias que não se encaixam nos demais tipos se encontram.

• Quando qualquer um dos componentes da síndrome está presente, o risco de aparecimento de outras

manifestações é maior. O risco de uma segunda endocrinopatia é de 30 a 50 vezes maior do que na

população geral.

• As principais doenças que podem ser encontradas nessa síndrome são:

o Tireoidopatia autoimune: presente em 69% dos pacientes, podendo ser tanto doença de Graves

como tireoidite de Hashimoto.

o DM1: presente em 52% dos pacientes.

o Doença celíaca: presente em 5 a 10% dos pacientes, devem ser pesquisados anticorpo

antigliadina, antiendomísio e antitransaminase

o Vitiligo: 1 a 9% dos pacientes

o Doença de Addison: presente em 0,5% dos pacientes

o Anemia perniciosa: presente em 0,5 a 5% dos pacientes

o Deficiencia de imunoglobulina A: presente em 0,5% dos pacientes

o Hipogonadismo hipergonadotrófico: presente em 4% dos pacientes

o Outros sintomas: alopecia, ataxia cerebelar, hipofisite, bloqueio cardíaco, miastenia grave,

miocardite e serosites.

4) Diagnóstico

• Presença de dois dos três critérios citados nas doenças.

o SPA1: pode ser firmado o diagnóstico caso apareça um acometimento e ocorra histórico familiar

em parente de primeiro grau de paciente.

o SPA 2: de preferência a doença deve ser confirmada com autoanticorpos, e deve ocorrer

acompanhamento de parentes desses pacientes a cada 3 a 5 anos (dosagem de ACTH, vitamina

B, cortisol, dosagem de autoanticorpos pra doença celíaca)

5) Tratamento

• Deve-se orientar acerca das manifestações clínicas de risco para todos os pacientes com suspeita

dessa condição (por exemplo, hipoglicemia em doença de Addison, hipoglicemias em DM1, diarreia

como risco de doença celíaca...)

• Fluconazol 200 mg, VO, 12/12h para candidíase mucocutânea. Evitar o cetoconazol pelo fato desse

inibir a esteroidogênese, aumentando o risco de insuficiência renal.

• Reposição hormonal e tratamento específico para os demais acometimentos (duh)

• Vacina anitpneumocócica para os casos de asplenia