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iygiene da Variola
DISSERTAÇÃO INAUGURAL
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POETO
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1896
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Escola Medico - CirurMica do Porto D I R E C T O R
C O N S E L H E I R O W E N C E S L A U D E SECRETARIO
RICARDO D'ALMEIDA JORGE
MA
CORPO CATHEDRATICO Lentes cathedraticos
1.* Cadeira—Anatomia descriptiva e geral João Pereira Dias Lebre.
2.» Cadeira—Physiologia . . . . Antonio Placido da Costa. 3." Cadeira—Historia natural dos
medicamentos e materia medica Illidio Ayres Pereira do Valle.
4.* Cadeira — Pathologia externa o therapeutica externa . . Antonio Joaquim de Moraes Caldas.
õ.a Cadeira—Medicina operatória. Eduardo Pereira Pimenta. G.* Cadeira—Partos, doenças das
mulheres de parto e dos recemnascidos Dr. Agostinho Antonio do Souto.
7.* Cadeira—Pathologia interna e therapeutica interna . . . Antonio d'Oliveira Monteiro.
8." Cadeira—Clinica medica. . . Antonio dAzevedo Maia. 9." Cadeira—Clinica cirúrgica . . Cândido Augusto Correia de Pinho. 10." Cadeira—Anatomia patholo
gica Augusto Henrique dA. Brandão. 11.* CadeiraMedicina legal, hy
giene privada e publica e toxicologia Ricardo d'Almeida Jorge.
12." Cadeira—Pothologia geral, semoiologia e historia medica. Maximiano A. O. Lemos Junior.
Pharmacia NunoSalgueiro. Lentes jubilados
„ _ ■ ,. f José d'Andrade Gramaxo. Secção medica < ^ T . „ . T Y I Dr. Jose Carlos Lopes.
„ . . ( Visconde d'Oliveira. Secção cirúrgica i _ . , . Ts. * . : l Pedro Augusto Dias.
Lentes substitutos
„ . „ • ' ; . ( João Ijopes da S. Martins Junioi. Secção medica < , , , . . . .
I Alberto d Aguiar. „ ( Roberto B. do Rozario Frias. Secção cirúrgica j y a g o _
Lente demonstrador Secção cirúrgica Vago.
:
A Escola nílo responda pelas doutrinas expendidas na dissertação e enunciadas nas proposições.
(Regulamento da Escola, de 23 d'Aliril de 1840, art. 155.°)
t I
Importância da hygiene
Depois que a Economia Politica, desthronando a lei de Malthus, demonstrou que a taxa de crescimento d'um povo- era proporcional á sua prosperidade, todas as nações civilisaclas procuram nas estatísticas o movimento da sua população.
Nascimentos e óbitos — eis os factores capitães de toda a demographia dynamica. E, se a França vê aterrorisada diminuir-lhe a natalidade, razão temos egualmente para tristezas attendendo ao exaggero da nossa mortalidade infantil.
Nao se trata entre nós de fraudes conjugaes, nao sâo ainda degenerações de antiga raça a quem devemos culpar do nosso mal: á hygiene caberá vencêl-o, quando o nosso povo puder avaliar a importância toda e todos os benefícios de sciencia tão bemfazeja. Trata a hygiene de estreitar os limites em que as moléstias offendem e destroem
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o organismo ; fim fcao alevantado, que deveria encontrar por toda a parte o apoio de que é digno, tem iuctado desde ha muito com perconceitos arreigados que lhe estorvam o andamento.
O homem antigo tinha apenas a preoccupaçâo da virtude: conhecia o bem e o mal por intermédio da consciepcia. Para que importar-se com a saúde, se ella nao depende da vontade do homem ? E' que para os males physicos não ha consciência, e a sensibilidade era grosseira de mais para an-mmciar a acção deletéria dos micróbios, da humidade, de certos raios da luz, eto. Os conhecimentos humanos têem progredido tanto, que o homem d'hoje tem obrigação de possuir essa consciência especial; nasce d'aqui o direito sanitário: nenhum individuo .pode lezar os outros na sua saúde. Nada dispensa a promulgação de leis repressivas dos attentados á hygiene ; alguns caturras empoeirados nos infolium jurídicos, nao qui-zeram chamar crime a esses attentados por lhes faltar a intenção. Esta condição do acto crime tem perdido muita importância depois dos estudos
•sobre criminologia feitos por Garofalo, Lombroso e outros. Eu chamaria também crime á incúria d'um governo que tEío pouco faz pela hygiene, quando a saúde do povo é dos maiores deveres do estado. Verdade é que síío precisas sommas de dinheiro para combater os inveterados costumes deletérios, vigiar as novas condições sanitárias e proceder aos melhoramentos indispensáveis que exigem muito pessoal, laboratórios especiaes, sanatórios grandes-systemas de canalisaçao, etc.; mas as van-
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tagens que adviriam d'esté emprego dos dinheiros públicos compensariam, ao contrario do que agora acontece, os sacrifícios do contribuinte.
Demais, a hygiene nao está em divorcio com a Economia Politica; não é simplesmente uma causa de despeza para o estado. A doença, por muitos motivos, custa caro ao individuo e portanto á sociedade. A alimentação especial do enfermo, o seu tratamento, assistência e a falta de trabalho representam, na população, uma perda enorme de capital.
Se, por meio de cuidados sanitários, conseguirmos diminuir o numero dos doentes, obtemos um lucro que compensa, até certo ponto, as clespezas feitas pela hygiene. De que isto é verdade, dao provas os cálculos approximados feitos para a população do Porto.
Nos três últimos annos, em que as estatísticas foram feitas com cuidados crescentes, houve no Porto a média de 27 mortos para mil habitantes - M g = 27.
Em geral, a cada óbito correspondem 35 casos de doença para mil habitantes, casos que duram em média 20 dias, ou seja 16:000 dias de tratamento para mil habitantes. A população da cidade é de 144:000 habitantes; calculando em 200 reis (média extremamente baixa) a despeza diária de cada doente, achamos que a população do Porto gasta, no tratamento das doenças, 486:720^000 reis.
Supponbamos agora que, com os rigores da hygiene, fazemos descer a 22 a cifra da mortali-
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dade ; e isto Mo é irrealisavel, visto que a mortalidade de Londres tem baixado até 20. - Repetindo os cálculos, veriflca-se que obtivemos uma economia de 100:400^000 reis, juros d'um capital com que se podia fazer muito a bem da saúde publica.
O calculo pecca ainda por deficiente. Com a morte e a doença mão se perde só dinheiro e trabalho que o representa, perde-se moralmente conforme o valor e as qualidades de trabalho do individuo que adoeceu ou que morreu. A vida d'um grande homem tem um valor elevado, relativamente á vida d'um obscuro trabalhador, d'uma creança que acaba de nascer, d'um idiota ou d'um aleijado. Uma vida que se extingue é capital social que desapparece, a educação dos filhos representa encargos em que se esvae muito dinheiro; quanto mais elevada fôr essa educação, tanto maior é a capitalisaçao d'aquella vida. Suppondo que o homem trabalha dos 20 aos 60 annos, o seu ganho representa uma renda vitalícia : o juro d'um capital garantido pela saúde. De modo que, n'estas condições, se a morte vem ceifar aos 20, 30, 45 annos individuos validos, isto representa, para a família d'elles, uma perda equivalente áquella renda. No Porto morrem por anno 662 homens entre os 20 e 60 annos. Quanto valerá um homem n'essa idade ? Avaliavam-se os escravos pelas suas qualidades: força, destreza, intel-ligencia, habilidades especiaes, etc. ; quer dizer o valor do negro era proporcional ao seu trabalho. Façamos o mesmo agora; um homem no Porto
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ganha em média 300 reis por dia ou seja 100^000 ■reis por armo que é a renda vitalícia de um con
to de reis; admittida esta média extremamente baixa e morrendo 662 homens n'estas condições, vêse que ha uma perda annual de 662 contos. Se, pelas precauções hygienicas, esta mortalidade fosse reduzida a metade, hypothèse muito realisa
vel, teríamos para accrescentar á quantia que já mencionamos 331 contos de reis de economia. Paizes ha que teem comprehendido estes cálculos
A Inglaterra foi o berço da hygiene: os primeiros postos sanitários lá tiveram a sua origem. John Simon desde 1873 em que fundou o seu serviço, notou que a mortalidade geral que era de 29 des
ceu a 25, assim como a mortalidade por doenças infecciosas que era de 3 desceu a 1. Foi a prática e nao as locubrações scientificas o que em Ingla
terra preparou o domínio da hygiene ; notouse que a miséria das classes pobres era a que maior contingente dava para as infecções e desde 1870 foram consumidos rios de dinheiro em obras de saneamento.
■ O capitulo mais importante da hygiene diz respeito ás doenças infecciosas. São essas que cahem mais directamente debaixo da sua alçada e os pujantes trabalhos de Pasteur e seus sueces
sores vem de ha muito avolumando a extraordi
nária importância d'esse capitulo. Deve dizerse, no emtanto, que esta finalidade preventiva não nasceu com as famozas descobertas do sábio finan
cez, vem ella dos tempos em que a hygiene com
batia as doenças assoladoras conhecidas pelo ter
If)
mo geral de moléstias pestilenciaes. A peste e a lepra, consideradas a hydra pathologica das velhas idades, foram batidas com vigor por medidas sanitárias ás vezes d'uma dureza que nós mal concebemos. E' conhecido o isolamento forçado nas gafarias, o descaroavel abandono a que eram obrigados os leprosos de quem todos fugiam, ouvido o som da campainha que traziam pendente do joelho para annunciar a sua approximação. Houve sitios que se despovoaram, emigrações parciaes para determinados pontos onde o flagello ainda não chegara, ou onde as condições especiaes do terreno e a presença de aguas sulfurosas consentiam uma esperança de immunidade. E, d'esté modo, a peste foi exterminada e a lepra quasi desappareceu. Algumas povoações, e entre nós S. Pedro do Sul, devem a sua origem áquelles rigores da hygiene.
Se já então por meios empíricos se obtinham -resultados tâo satisfactorios, hoje, que temos excellentes processos de exploração scientifica, e applicamos a prophilaxia de um modo racional, os resultados devem ser bellos. Não quer isto dizer que a hygiene tudo vença; as doenças são caprichosas e tem a sua existência regulada pelas leis do tempo. Elias, como certos povos e animaes," emigram d'uns paizes distantes, fazem o seu período de estacionamento, esgotam os elementos favoráveis á sua subsistência e fogem ou desap-parecem terminada a sua evolução natural.
Temos hoje moléstias antigas como a lepra e a tuberculose, e temos moléstias .novas como a
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syphilis, o cólera e outras. Outras doenças foram ferocíssimas no momento da sua invasão e talvez porque as populações invadidas creassem por adaptação uma relativa immunidade, perderam grande parte da sua virulência e arrastam hoje uma vida vegetativa.
A experiência ensinara aos antigos que as doenças pestilenciaes eram devidas a agentes contagiosos facilmente vehiculados por um modo directo ou indirecto: directo, quando se dava o contacto do doente com outro individuo, quando este respirava o ar contaminado por um leproso, etc. ; indirecto, quando a vehiculaçâo do contagio se fazia a distancia por intermédio de objectos de que o doente se servia.
Houve uma época em que a medicina, desprezando o que a experiência secular tinha ensinado, negava a existência de doenças inficiosas. As doutrinas de Broussais, que explicava todas as doenças por irritações de tecidos, deram em resultado a abrogaçâo de certas leis administrativas contra as causas de contagio e a expurgação de certos preceitos hygienicos. Consistiu n'isto o maior erro de Broussais, homem eminente cujas idéas revolucionaram as sciencias medicas, fazendo taboa raza de todos os conhecimentos. Ainda ha pouco tempo se duvidava do contagio da lepra e da tuberculose; surgiram, porém, os collaboradores de Pasteur; crearam a bacteriologia e com ella levantaram de novo a doutrina in-ficiosa servindo-se de novos processos de analyse experimental.
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A hygiene nâo é ainda a sciencia d'hoje — é a sciencia do futuro; o povo ha de render culto á sua divindade quando as doutrinas bacteriológicas, as mais geraes e indiscutíveis, tiverem aberto brecha em todos os espíritos. Nâo faltam apóstolos das novas idéas; elles vencerão das trevas.
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II
Variola — Impotência do tratamento curativo
E' hoje um facto positivo e averiguado que existe um agente pathogenico capaz de produzir a variola. Qual seja esse agente ainda o não disse a bacteriologia, apezar de todos os seus progressos. A experiência define variola — uma doença inocula-vel, contagiosa, conferindo a immunidade por um primitivo ataque — em summa uma moléstia infecciosa^ como o demonstra a sua evolução clinica. E' tão inoculavel que a variolisaçâo era antigamente de prática quotidiana na China, Corea e alguns pontos de Algeria; da sua contagiosidade são provas bastantes as epidemias de que podemos recordar-nos.
Apezar do silencio da bacteriologia, possuímos noções exactas acerca dos seus meios de contagio: as vesico-pustulas cutâneas de ha muito são consideradas como vehiculos do gérmen variolico
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e podem transmittil-o em todos os períodos da sua evolução. Quando antigamente se praticava a inoculação preventiva, aproveitava-se para isso o pus ou a sôrosidade das pústulas; nao se sabia ainda que o meio mais seguro da transmissão é fornecido pelas crostas variolosas.
O vanoloso já curado que descama, é, por essa razão, o intermediário usual do contagio ; tinha razão Brouardel quando chamava ás crostas a semente da variola. O vestuário e tudo o mais que tem estado em contacto com o doente é sempre um bom meio de diffusao, se nao tiver havido uma desinfecção rigorosa; O contacto com o virus variolico pode fazer-se directamente com o doente, ou indirectamente quando esse virus é trazido por um terceiro individuo sao — contagio directo e indirecto. O contagio indirecto faz-se quasi sempre' á custa das pessoas que tratam dos variolosos ou mesmo d'aquellas que os vao visitar. Algumas vezes porém nao acontece assim ; é conhecido o facto de uma epidemia de variola n'uma fabrica de papel trazida por um masso de farrapos; uma carta, um trem, uma casa ou uma peça de roupa pôde em certas condições, fazer rebentar uma epidemia- O ar foi considerado também como agente de transmissão do veneno mórbido, e em certos casos n3,o pôde negar-se-lhe esta propriedade: as poeiras levantadas ao fazer a limpeza n'uma salla de variolosos, podem arrastar o mal para uma casa visinha. Nao se sabe ainda a distancia maxima a que o ar arrasta os germens contagiosos,
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Sao várias as vias de penetração do virus no organismo : pelo revestimento cutâneo, e basta uma pequena escoriação ou arranhadura para a entrada do virus, que nos lymphaticos subcutâneos encontra um bom meio de propagação ; pelas vias digestivas a transmissão parece ser rara; não acontece o mesmo pelas vias aerias — partículas de crostas variolicas podem facilmente atravessar o epithelio respiratório, em alguns pontos alterado, e d'ahi invadir facilmente o organismo pelas vias lymphatica ou sanguínea.
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A todo o tempo pôde o homem contrahir a varíola; estatísticas estrangeiras dizem que manifestada uma epidemia, são atacados principalmente os adultos que já perderam a immunidade (entre 20 a 30 annos) ; em Portugal acontece o contrario: as epidemias de variola ceifam muitos adultos, mas fazem as suas principaes razias nas creanças, porque a vaccinaçao é restricta e muitos adultos adquiriram a immunidade por esse primeiro ataque de varíola.
Poderão as condições de raça ou paiz influir sobre a contagiosidade d'esta doença? Não. Partindo do extremo oriente, d'onde é oriunda, lá reina de ha muitos séculos, dizem-n'o a China e o Indostão. Os mouros trouxeram-n'a para a Hes-panha e de cá se estendeu a todo o mundo, sempre terrivelmente aggressiva e indifférente a questões de raça e de clima que de nenhum
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modo lhe influenciam a contagiosidade. No norte da Europa e Asia vae produzindo os mesmos estragos que nas zonas tórridas da America depois que as viagens de Colombo trocaram entre o velho e o novo mundo a syphilis e a variola.
Com a passagem e permanência na Europa a variola tem sofrido grande atténua çfto que a torna bem menos perigosa do que para uma ilha, por ex., onde ella nunca-penetrasse; fez isto a hereditariedade, o habito e a vaccinaçao. A influencia das classes é nitida, a miséria, com todo o seu cortejo de depressões, fez que as classes proletárias forneçam o mais avultado contingente á morbilidade variolica. Deve ser esta uma razão porque aos poderes públicos tem merecido pouca attençao este terrível flagelle.
A immunidade para com a variola pôde ser natural ou congenita e adquirida, pelo habito ou pela vaccinaçao.
A immunidade natural nao é de raça, como já vimos, é simplesmente de individues. Em todos os tempos e paizes apparece quem seja absolutamente refractário á variola. Ai se assim nao fora! a Europa ter-se-hia despovoado no tempo em que a variola a assolava desapiedadamente matando por anno 400:000 pessoas ; segundo Bouley, houve tempo em que a decima parte dos óbitos e a metade das cegueiras eram produzidas pela variola.
A immunidade adquirida pelo habito é a que se obtém lentamente recebendo a pouco e pouco
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os germens da doença e tornando o organismo refractário á sua ecclozao, do mesmo modo que os empregados do theatro anatómico a respeito da infecção dos cadáveres. Depois de um primeiro ataque o organismo fica também immune, ao menos por alguns annos : a prática da variolisaçao exercida antigamente fundava-se n'esta espécie de immunidade, trazida da China para Inglaterra em 1720 por Worthey Montagu, escriptora celebre; por muito tempo foi praticada apezar dos protestos das faculdades de medicina. Da immunidade por vaccinação fallaremos depois, mais demoradamente.
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Quantos progressos se tem feito na etiologia das doenças infecciosas agudas, tornam mais sen-sivel a nossa impotência em cural-as. A' excepção do impaludismo, febre rheumatismal e ultimamente da diphteria. O medico assiste desarmado á evolução de todas estas moléstias apezar da multiplicidade de methodos therapeuticos pre-conisados contra ellas.
E essa mesma multiplicidade demonstra a sua .insufficiencia. Todos os dias se publicam observações comprovativas da efflcacia de tal ou tal medicamento especifico, e todos dto bons resultados como dâo bons resultados limonadas refrigerantes com que temos visto tratar este anno pneumonias e febres typhoides. Não ha pois trata-
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mento especifico contra a maior parte das infecções agudas; o micróbio penetrando n'um organismo, só por elle pôde ser expulso.
Espectador habitual d'essas luctas silenciosas que muitas vezes acabam com a morte dos dous combatentes, o medico, inimigo do invasor, mio assiste inerte a essa refrega: vigia as armas do seu constituinte, explorando-lhe os diversos sys-temas e regula as suas forças, modificando'lhe a temperatura quando sente a. reacção exagerada. A varíola mio tem, pois, tratamento curativo; o clinico tem de limitar-se á medicação symptomatica, regrando os seus cuidados pela gravidade da forma que a moléstia apresenta, porque o prognostico varia desde o mais sombrio e desesperado na variola hemorrhagica até ao mais favorável na varíola discreta.
Em tempos de epidemia, se apoz um calefrio único, intenso, sobrevindo bruscamente, o thermomètre marca uma grande exacerbação febril de 39° ou 40", pôde, com grandes probabilidades, dia-' gnosticar-se a varíola. O doente deve ser desde logo transportado e conservar-se em repouso n'um aposento com luz e ventilação sufficiente e temperatura approximada de 15°. A cama, a mais macia que ser possa, deve ter os lençoes já usados de modo a nao determinar attritos dolorosos sobre a pelle.
Entretanto, apparecem os primeiros symptomas geraes: rachialgia e cephalalgia; a revulsão cutanea que o vulgo emprega como lenitivo de todas as dores está contraindicada na variola, porque a
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erupção cutanea é tanto mais intensa quanto foi mais viva a irritação da pelle.
Por vezes torna-se necessário combater ab initio a exacerbação febril; diversos medicamentos tem sido empregados com esse fim : o sulfato de quinina em doses massiças de 1 Va a 2 grammas nas 24 horas, o acido salicylico e salicylate de soda, a kairina e a acetanilide; está demonstrado porém que se todos estes medicamentos conseguem fazer baixar a temperatura, não tem acção alguma bemfazeja sobre a natureza da affecção. O mesmo
' acontece com as soluções phenicadas, das quaes devemos receiar sempre effeitos tóxicos por susceptibilidades individuaes. Reprovo todas estas medicações no sentido de fazer baixar a temperatura: a maior parte dos medicamentos sáo eliminados pelos rins e muitos d'elles deixam ahi graves vestígios da sua passagem; isto n'uma occasiáo em que esses orgáos são os principaes depuradores do organismo, é sobrecarregal-os de trabalho, arriscar a uma intoxicação. E nao precisamos d'isso: a febre é por todos considerada hoje como meio de defeza do organismo, é necessária portanto e só devemos combatêl-a quando exaggerada. Temos para isso um moio cuja importância vem crescendo com a prática de todos os dias — é a bal-neotherapia, Felizmente, já lá vae o tempo em que estúpidos prejuízos do povo e até da sciencia, mataram á sede muitos variolosos. Lembro-me ainda "de ouvir narrar alguns d'esses supplicios aterradores ; quatro hercules seguravam as pontas de um cobertor, insensíveis ás suplicas dilaceram
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tes do infeliz que, mal podendo respirar, se contorcia ardendo em febre e pedindo agua. E assim morreu muita gente até que corações menos empedernidos deitaram agua n'aquelle fogo e, vendo melhorar os doentes, chamaram milagre o que só era trivial. O indígena berra ainda contra a prática dos banhos frios nas pyrexias, mas é já bem tempo de destruir superstições.
N'este período da invasão da doença, a agua fria provoca uma irritação assas viva e extensa dos tegumentos, que por essa razão podem soffrer erupção mais1 intensa; para obstar a esse inconveniente, alguns aconselham banhos tépidos a 30° ou 32° que, não irritando a pelle, tem effeito bastante sobre a temperatura.
Visto nao haver medicação capaz de fazer abortar a varíola, o mais razoável é fornecer ao organismo os meios de resistir melhor á infecção.
A dieta láctea, ether e acetato de ammoniaco, são bons recursos quando recearmos por aquella resistência.
Manifesta-se portanto a erupção sem que de modo algum a possamos estorvar; a purulencia das pústulas constitue a sua maior gravidade n'este período: é ella devida á infecção secundaria produzida pela penetração de micróbios pyogenics. E' contra a acção d'esses microorganismos e conseguintemente contra a producção de cicatrizes consecutivas á suppuração que a thera-
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peutica tem conjurado. De todas as medicações internas apregoadas n'este propósito, o systema de Duscatel, ou tratamento ethereo-opiado, foi aquelle que melhor soube captar as sympathias dos entendidos.
Injectam-se por dia duas ou três seringas de Pravaz cheias de ether, nas nádegas, em pleno tecido cellular; administra-se ao mesmo tempo 15 a 20 centigrammas d'opio n'uma poção alcoólica, alternando esta administração com o uso de 20 gottas de perchloreto de ferro dadas por différentes vezes no dia. Duscatel afflança ter colhido magníficos resultados, evitando também as cicatrizes profundas.
Tem um inconveniente grave esta medicação: as injecções sub-cutaneas sao frequentemente o ponto de partida de abcessos profundos e extensos e por essa razão se substituiu o emprego das injecções pelo uso do xarope 'de ether. O tratamento ethereo-opiado fornece, com effeito, ao doente meios de resistir energicamente á infecção, mas mal pôde comprehender-se como pôde elle oppôr-se á purulencia e formação de cicatrizes, nâo actuando directamente sobre as vesico-pustulas invadidas e secundariamente infectadas por micróbios pyogenicos.
A medicação externa, dirigida precisamente contra estes germens inficiosos, parece mais racional. As mascaras protectoras da acção do ar foram substituídas por pomadas de toda a casta de substancias antisepticas, e estas, umas vezes dolorosas outras pouco limpas, foram substituídas
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também pelo emprego de pulverisações phenica-das ou de sublimado. E' muito para aconselhar ainda, o uso de banhos geraes tépidos addiciona-dos de 30 grammas de sublimado, de modo a tornar os tegumentos o mais asepticos que ser possa.
Sao excellentes os resultados colhidos e merece ser applicado nos casos de variola de erupção viva e extensa ; na variola discreta bastará o emprego das pomadas antisepticas e entre ellas o glyceroleo de enxofre que nos foi particularmente aconselhado no curso de pathologia interna.
Partindo do principio que os raios chimicos do espectro irritam os tegumentos, activando o dia-pedeze dos glóbulos rubros e favorecendo a sup-puraçao, teve alguém a ideia de subtrahir os va-riolosos a esta causa de irritação.
Põe-se isto em prática forrando as janellas com pannos vermelhos ou empregando vidros da mesma côr; parece comtudo que os magníficos resultados inculcados pelo auctor de tal doutrina, por mais ninguém foram obtidos. No período de dissecação e convalescença, o medico procurará auxiliar a descamaçao e levantar as forças cio doente por meio de banhos e tónicos.
*
Sao bem minguados os nossos recursos thera-peuticos; dao apenas bons resultados nas formas de variola que a experiência diz curarem-se espontaneamente.
Alguma cousa se consegue, quero crer, contra
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as deformações cicatriciaes, mas parece-me isso bem pouco, quando vejo todos os methodos de tratamento incapazes de salvar um caso de variola hemorrhagica, a meu vér a mais legitima, e que seria talvez a mais frequente se o virus não viesse degenerado pela hereditariedade e pela vaccina.
Ill
Tratamento preventivo — Isolamento e desinfecção
E' pois bem certo que a variola manifestada segue fatalmente a sua evolução apezar de todos os medicamentos. Será a hygiene tão impotente como a therapeutica? Evidentemente não; os meios de que dispõe a hygiene dao mais uma vez a razão do " mais vale prevenir que reme-dear„. No Porto, como n'outros centros de população, a variola é endémica, todos os mezes o obituário regista mortes por esta doença ; faz isto d'uma maneira surda, passando vida obscura, ac-cumulando energias para futuro combate emquan-to se vigorisa em terrenos bem adubados. Quando chega o momento em que se tem creado novas receptividades e extinguido a acção da vaccina — a variola larga a mascara da covarde e insidiosa benignidade para ostentar todo o appa-rato d'uma epidemia terrível. E isto é tão ver-
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dade que as epidemias surgem no Porto com verdadeira regularidade; não são grandes os períodos de acalmia, variam entre seis ou sete annos.
Bem conhecedora da topographia dos Jogares, a varíola assenta os seus arraiaes n'aquelles pontos d'onde mais difficil será desalojal-a; e ao tempo que consome ahi todo o material propicio á sua subsistência, vae mandando guardas avançadas preparar novo acampamento. O Porto fornece á variola terreno feracissimo onde ella se tem refestelado á farta. As ilhas do Porto são colmeias de pobres convertidas em focos de miasmas á mingua de instrucçâo e fortuna - tugúrios miseráveis onde milhares de indivíduos em lucta com toda a casta de privações, offerecem á variola vasto campo de proezas. Nada mais triste do que esses antros infectos onde habita a mizeria e o aceio morreu; os micróbios dão-se bem n'es-sas estrumeiras ambulantes e como não é d'esta união que a força nasce, muito ao contrario, á varíola mal pôde suster-se o passo quando ella visita com maus instinctos essa população desgraçada. Que fazer para evitar essas epidemias tão lethaes? Se ao hygienista intelligente e devotado fosse dada liberdade de acção, por certo a variola não levaria a melhor; contra as manhas e ciladas d'essa doença terrível, a hygiene possue hoje os melhores meios de resistência.
Como doença eminentemente contagiosa, é de clara necessidade o isolamento e a desinfecção. O isolamento nas grandes populações não pôde limitar-se ao domicilio, impedem-n'o a abso-
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luta indigência da maior parte dos doentes e a grande agglomeração de povo em casas completamente insalubres. Para esses ha o isolamento hospitalar, sem o carinho das mães é certo, mas sob a vigilância de pessoal mais conhecedor, ainda que menos terno, pois é bem verdade que o espectáculo muitas vezes repetido de grandes desgraças ou de grandes misérias, acaba por nos tornar indifférentes ás dores que vemos soffrer — cousas de psychologia. O isolamento hospitalar pôde fazer-se de quatro modos diversos com vantagens prováveis diversas também.
a) O isolamento em saltas especiaes é deficiente em toda a extensão da palavra; o serviço dos enfermeiros, e até os passeios dos próprios doentes, quando podem illudir a vigilância dos empregados, podem ser causa frequente de contagio por transmissão de germens inflciosos.
N'outras doenças dotadas de menos poder para o contagio, pneumonias, péritonites e septicemias por exemplo, este methodo pôde satisfazer aos mais exigentes; na variola, como em todas as doenças capazes de fazer epidemias, de modo nenhum.
b) Enfermarias isoladas, communicando directamente com o exterior silo, em theoria, excellentes processos de isolamento, mas a prática não corresponde á espectativa; n'um hospital geral não pôde haver tanta vigilância quanta baste para impedir o contagio dentro ou fora do hospital; n'estas condições p isolamento está longe de ser um bem,
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c) Os pavilhões isolados, nem sempre realisa-veis á falta de dependências espaçosas em hos-pitaes de grande lote, não escapam também incólumes d'uma critica judiciosa e esmiuçada; a promiscuidade possivel entre contagionados e enfermeiros ou doentes d'outras sallas, fazem perdei' as esperanças que podiam ter-se em tal instituição.
d) A construcçao de hospitaes privativos é o ponto capital de toda a hygiene em materia epi-demilogica; só um hospital especial onde se reunissem e tratassem todos os variolosos da clien-tella hospitalar, pôde reunir todas as condições de uma sequestraçâo perfeita. De trabalhosa rea-lisação (nós que o dizemos...) estes estabelecimentos devem ser' feitos de modo a não acarretar perigos para os habitantes circumvisinhos, e por isso se deve procurar sitio salubre e affasta-do d'outros prédios urbanos. O fim altamente humanitário d'estes hospitaes justifica bem os rigores que a hygiene pratica. Se por amor da santidade se toleravam os conventos com as suas muralhas e as suas grades, muralhas tão altas e grades tão espessas que o sol a custo penetrava n'aquelles sepulchros de seres vivos, ninguém deve estranhar que hoje por amor da humanidade se façam também conventos; a sciencia, menos exigente que a virtude, não prohibe a entrada do bom sol, que é também desinfectante, e dá aos reclusos a esperança de pouco demorado ca-ptiveiro.
Um hospital de doenças infecciosas deve estar
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completamente sequestrado do meio exterior; as poucas pessoas que tenham de habitar fora, medicos por exemplo, porão blusas desinfectadas para visitar os doentes; á sahida repetirão os cuidados de limpeza e hygiene, e isto é tanto mais importante quanto é bem possível o contagio indirecto por intermédio do facultativo.
E' necessária uma salla especial para doentes cuja erupção sem caracter definido não justifique um diagnostico seguro. N'esta salla de duvidosos duplamente isolados, só depois de cuidados rigorosos poderão entrar os enfermeiros. Varioloso de salla com mum em quem se manifesta ou presume uma infecção secundaria, pôde ser isolado in situ - partindo do principio de que o ar é mau vehiculo de germens, rodeia-se a cama com grades cuja chave é guardada pelo único enfermeiro que se approxima do doente. Carros ou macas, correspondências,, tudo em fim que sae do hospital, só poderá fazel-o depois de completa desinfecção. — E' só assim, que se pôde vencer uma epidemia.
Nós costumamos esperar que ellas suecum-bam. . . de indigestão.
No Porto para doenças contagiosas existem apenas dous pavilhões do hospital da Misericórdia ; não quero chamar-lhes perigosos, porque alguma utilidade terão no tratamento de casos sporadi-cos por via de regra benignos e fracamente contagiosos, mas ficam já tão longe dos conselhos da sciencia, que muitas vezes faz vergonha vêr na salja commum de acceitaçâo variolosos e en-
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sarampados em plena efflorescenoia de exanthema. Com creanças acontece peor : o Hospital de creanças que temos não admitte doenças contagiosas.
Já uma vez estivemos arriscados a possuir um hospital em regulares condições; reinava então o cólera na Hespanha com desuzada intensidade e o indígena tremeu ao 1er nas gazetas as atterradoras noticias : povoações inteiras desimadas, o flagello que não respeita os ricos, compridas valias todos os dias atulhadas de cadáveres. Foi assim que em 1892 tentou fazer-se um hospital para coléricos, no sitio denominado " Guellas-de-Pau„. Desfeito o pânico prematuramente, ficou por acabar, vasio, actualmente sem préstimo, á espera que as intempéries o desabem.
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Não é sufficiente a sequestraçâo hospitalar ; apezar de fertillissima em resultados magníficos, precisa de ser acompanhada do isolamento no próprio domicilio. Faltam no hospital as commo-didades e até o luxo de que não pode prescindir a gente rica a quem não faltam preconceitos e parece vergonhoso o que seria um acto de verdadeiro altruísmo; nas aldeias esta realisação é impossível : as nossas povoações ruraes, vivendo em geral dos minguados proventos da lavoura, precisam de todas as suas economias para pagamento das contribuições. A sequestraçâo domiciliar é, em algumas nações da Europa, regrada
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por leis policiaes; em Athenas, casa onde exista um varioloso é obrigada a declaral-o ao publico d'um modo parecido com aquelle nosso aviso aos larápios: Gautella com as ratoeiras, e acham tao deficiente este annuncio que a casa do doente e rondada a toda a hora por um policia cujo encargo só termina dez dias depois de estar acabada a descamaçao.
Eu desconfio muito dos resultados d'estas medidas coercitivas. Parece-me que nâo haverá leis capazes de as tornar efficazes emquanto o povo, que teima em nao vêr, nao quizer cumpril-as voluntariamente. Mo se imagina um isolamento forçado tao absoluto que não haja meios de enganar auctoridades. O facto da prohibiçao só faz crescer a vontade de infringir a lei; nao foi decerto a belleza da maça que fez que Eva pec-casse.
E nao faltam ao nosso povo exemplos de irrefutável contagiosidade : julgo que nao ha em Portugal aldeia alguma onde a variola nao tenha feito diversas epidemias, descobrindo tanto os seus ataques, que raríssimas vezes ficam ignorados o introductor e propagadores da moléstia.
M s ultimas férias grandes tive occasiao de assistir á ecclosao de uma pequena epidemia va-riolica n'uma povoação onde, a curta distancia do Porto, só produz preversões de costumes que nao illustraçao do povo. Um bando de pedintes foi o portador do contagio. Ninguém desconhece esses entes desgraçados e malandros, muitas vezes doentes simulados, que arrastam uma vida nómada e
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selvagem sem a minima comprehensao de limpeza.
Vêmol-o.3 n'essas romarias dos arredores do Porto patenteando deformações e monstruosidades, lezões immundas de que elles fazem a historia atroando os ares com ns suas lamurias estudadas, n'uni tom irritante e.aggressivo, que mais produz nojo que commiseração. E junto com os aleijados ou doentes uma multidão de vadios especuladores, mulheres dissolutas que se embebedam e deixam mutilai- os filhos ou os abandonam a outros carinhos, homens turbulentos que disputam á facada os proventos da vermelhinha quando dirigem nas tabernas as expedições ou assaltos dos seus subalternos, creanças esfarrapadas e ama-rellentas sem pães e sem sorrisos — homens e mulheres n'uma promiscuidade monstruosa, expel-lindo pela bocca, juntas com baforadas de alcool e picadilho, tosses sêccas de deboche.
Um bando d'estes pedintes atravessava a aldeia negociando com o cadaver d'uma creancinha que a variola victimara. Foi o acontecimento do dia ; mulheres entendidas, levando comsigo creanças de todas as idades, foram vêr que raça de bexigas tinha morto a innocentinha, emquanto os doridos (?) andavam pelas portas espalhando a doença e pedindo para o caixão.
JSTo dia seguinte a defuncta foi para o cemitério levada por creanças da localidade e, passados dez a quinze dias, apparecia o primeiro caso de variola n'uni pequeno que tinha ido ao enterro .
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Différentes causas, fizeram que esta epidemia, que nao se generalisou muito, nao fosse também muito mortífera. Apezar d'isso mostrou bem claramente de que modo se faz o contagio e o poder que tem a vaccinaçâo.
Conhecidas tão bem as causas d'esté desastre, mal se vê a difficuldade que possa haver em ven-ce'1-ás, e chamo-lhe desastre porque, apezar da grande benignidade, foram victimadas durante um mez dez a doze creanças n'uma população de seisce'n-tos habitantes.
Tem muito que desbastar a hygiene emquanto se nao desvanecerem os instinctos perniciosos que herdamos do tempo em que as doenças eram só castigos de Deus e o melhor attestado de santidade. Penhor, seguro de bemaventurança, era trazer o corpo coberto de estercos e de parazitas.
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Eu nEo quero affirmar que entre nós nao haveria ainda desinfecção publica senão fosse o pânico de 92 a que já me referi; é certo que só chicoteado pelo tremendo horror de uma invasão colérica é que acordou o egoísmo do povo.
No estado actual da sciencia nao pôde com-prehender-se hygiene sem desinfecção; os tratadistas de doenças infecciosas já de ha muito citam casos de. contagio pela permanência n'uni aposento anteriormente occupado por um doente, pelo uso das suas roupas, etc. ; estes conhecimentos são muito anteriores á fecunda theoria microbianna
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que produziu a asepsia e antisepsia, cuja prática applicada ao universo se chama desinfecção publica. Entre nós foi estabelecida a desinfecção obrigatória para Lisboa em 12 de abril de 1894 e para o Porto em 4 de maio do mesmo anno, quando a respectiva camará municipal representou ao governo que já possuia um serviço de desinfecção a funccionar desde o anno anterior. Seria mais rasoavel, e sobretudo mais sympathico, que o povo, convencido dos bons resultados que d'acpii lhe advém, acceitasse espontaneamente esta medida; mas eu dou razão a quem diz que todas as estufas fabricadas e muitas ainda por construir, teriam tempo para se enferrujar e estragai- antes que, pelos livros e monographias, se conquistasse para estas práticas o assenso de toda a gente.
Em Inglaterra tem a desinfecção o apoio da opinião publica ; está praticamente organisada. As disposições especiaes sobre a desinfecção zelam a saúde publica de modo que .nada deixam a desejar. Datam de 1875 essas disposições e não podemos deixar de traduzil-as, porque mostram bem com que rigor se trata lá fora da hygiene e como vamos atrazados a tal respeito. Dizem assim :
i - Quando se manifeste um caso de doença infecciosa n'uma casa ou n'uin navio, o respectivo locatário é obrigado a requisitar os serviços da desinfecção publica para aquelles locaes sob pena de dez chelins de multa por cada dia de demora.
n - O individuo portador d'uina affecção trans-missivel que. sem prevenir o conductor, entrar
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n'um" carro de praça ou outro vehiculo publico, pagará cinco libras de multa.
m — Pagará igual multa aquelle que, atacado por uma doença contagiosa, se apresentar voluntariamente e sem precauções na via publica, n'uma loja, n'uma escola, n'uma igreja, n'um theatre ou qualquer outro logar publico.
iv — Terá ainda a multa de cinco libras o individuo que fornecer a outrem objectos contaminados sem prévia desinfecção.
v — Pagará vinte libras de multa quem alugar uma casa ou aposento, onde tenha havido um caso suspeito, sem que casa e objectos contaminados tenham sido desinfectados.
vi — Todo o individuo que alugar, ou deixar vêr para o fim de aluguer, uma casa inteira ou parte d'ella, encobrindo, em contrario da verdade, que alli existisse nas seis semanas anteriores algum caso de doença transmissível, será punido por falsa informação com prisão acompanhada ou nao de trabalhos forçados e multa de vinte libras.
vu — Aquelle que deixar de obedecer voluntariamente a estas leis ou se oppozer á sua execução, pagará de multa até cincoenta libras.
viu — Em caso de infracção das presentes disposições, á parte a pena da lei, o proprietário ou locatário pagará o serviço de desinfecção que a auctoridade local julgar conveniente fazer.
Já ao tempo d'estas disposições era em Inglaterra obrigatória a remoção para os hospitaes de isolamento dos doentes atacados de doenças con-
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tagiosas e que nao tenham domicilio próprio, habitem casas occupadas por mais d'uma família ou estejam embarcados. As auctoridades locaes tem auctorisaçao para, entre outras cousas: 1.° estabelecer e manter uma ou mais carruagens para o transporte de doentes contagiosos; 2." organisar um logar próprio, com todos os apparelhos e assistência necessários, a desinfecção das camas, roupas e outros artigos, tudo isto gratuitamente; 3.° dirigir a destruição de camas, roupas ou outros artigos que tenham sido expostos á infecção de qualquer doença perigosa e 4.° estabelecer mortuárias, para onde possa ser removido, por ordem da justiça e em certas condições, o cadaver de qualquer individo fallecido de doença infecciosa. Mais ninguém possue um serviço tao completo; os inglezes, encarnação do interesse e do commercio, d ao por bem empregadas sommas enormes que gastam com este ramo da hygiene. Mesmo entre nós, que ha tao pouco tempo possuímos a desinfecção, algumas vantagens temos visto dimanar d'ella.
A desinfecção para a variola faz-se nas roupas e nos domicílios ou moveis ; no Porto emprega-se no primeiro caso o vapor d'agua sobreaquecido por excesso de pressão e, para domicílios, as pul-verisações de sublimado corrosivo. Pena é que medidas de tao capital importância e de prática tao comesinha lá fora, entre nós só tenham execução em Lisboa e Porto; nas aldeias, como nas grandes cidades, ha epidemias terríveis de varíola e, se cada município possuisse um serviço de des-
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infecção, séria mais uma arma poderosa para combater o virus infeccioso.
E nao é só a variola que reclama por toda a parte os serviços da desinfecção :,a tuberculose por si só justificaria um posto em cada concelho. E' realmente aterrador o progresso d'esta doença que mata mais que todas as epidemias juntas e, nao contente com isso, lega aos nascituros uma imminencia mórbida, as mais das vezes fatal. Termo final de suecessivas degenerações é o terreno que o bacillo habitualmente escolhe e victíma, mas sem negar a grandíssima e capital importância da predisposição, eu nao posso deixar de crer que a tuberculose é infecciosa e o contagio desempenha um papel importante também no desenvolvimento d'esta doença. Entrando insidiosamente no lar (furna familia, a tuberculose faz a sua sementeira diariamente nas roupas, nas paredes da casa, no pavimento etc. A semente pulverisa-se, a vassoura levanta-a sob a forma de poeira e em casa do tuberculoso a cada momento se ingere e respira a morte.
Arem depois a diphteria, o sarampo, a escarlatina fazendo muito frequentemente epidemias, doenças para quem a prophylaxia é tudo (nao fallo já da diphteria, apezar da fallibilidade do soro) e a desinfecção é recurso valiosíssimo e imprescindível.
E quando digo que cada município devia ter um posto de desinfecção, nao peço um estabelecimento completo a primar em todos os requintes que a hygiene vae aconselhando; isso custaria
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muito caro a terras que não precisam de tanto. Bastaria um pequeno edifício onde podesse
existir um aposento limitado para atmosphera sulfurosa, uma estufa para desinfecção de roupas, dous pulverisadores para domicílios e moveis e um deposito dos desinfectantes mais usados : sublimado corrosivo, sulfato de cobre, enxofre, etc. Nas povoações mais pequenas e mais pobres bastariam estes rudimentos para combater com vantagem epidemias ruraes, comtanto que o povo, comprehendendo todo o alcance dos seus benflcios, requisitasse o seu emprego.
IV
Vaccinação
Os homens de sciencia, no bom intento de conhecer as causas das cousas, tem engendrado numerosíssimas theorias para explicar porque uma doença infecciosa só costuma atacar uma vez o organismo; ainda o microscópio nâo tinha accu-sado a existência de micróbios e já os antigos discorriam muito sabiamente sobre espiritos e humores para se convencerem de conhecimentos relativos á immunidade.
Hoje fazem-nos riso as rhetoricas dos velhos como hao de rir-se de nós os vindouros quando a sciencia de hoje tiver passado de moda.
Eu tenho horror a theorias; parecem-me alicerces pouco seguros para edificar conhecimentos e julgo que ellas só devem seduzir espiritos quentes e enthusiastas capazes de perseguir uma ideia
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até ao sol náo se lembrando que elle pôde der-reter-lhes as azas.
Era todo o tempo, e mais que nunca antigamente, houve d'esses profetas e illuminados que, trazendo a dialéctica para o campo essencialmente prático das sciencias medicas, só conseguiram dar cabeçada tremenda, porque em medicina querem-se sábios e nâo génios.
A historia nâo conserva o nome do que primeiro praticou a variolisaçao preventiva; era um facto de observação geral que os indivíduos, curados d'um primeiro ataque de variola, nâo eram em regra segunda vez atacados; sabia-se além d'isso que as epidemias, tinham diversos graus de gravidade - inoculava-se por isso uma forma benigna que deixava o organismo quite com aquel-la doença.
A variola inoculada é geralmente menos grave que a variola natural, mas já o dizia a observação clinica e hoje demonstrou a experimentação que o virus mais attenuado pode produzir symptomas d'uma infecção generalisada e intensa quando no individuo concorrem circumstancias especiaes e pouco conhecidas que constituem os bons terrenos.
A variolisaçao fazia-se no Oriente antes de nós sabermos o que era variola, mas a prática de três mil annos pouco tem modificado o processo; na China servem-se de crostas variolicas que guardam em caixas apropriadas e, em occa-siao opportuna, introduzem-n'as nas narinas das creanças; na Núbia usam os negros apertar ao
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braço um estofo d'algodao impregnado de pus va-riolico, n'outras regiões usam a inoculação propriamente dita, fazendo uma solução de continuidade e pondo-a em relação com o pus. '
Por maior cuidado que tivessem os inoculadores, escolhendo uma variola discreta e preparando bem os indivíduos para a inoculação, esta era muitas vezes seguida de phenomenos locaes intensos, com pronunciada reacção febril e symp-tomas geraes em todo o organismo.
Acontecia também sobrevir uma erupção ge-neralisada que podia transmittir-se, sendo o ponto de partida d'uma epidemia grave. Calcula-se que de trinta inoculados, - um contrahia uma variola perigosa, de modo que esta prática que para uns era preventiva, era para outros mortal por propagação da doença e hoje ninguém duvida que o exercício da variolisaçâo augmentou muito a lethalida-de da variola.
Jenner praticava a variolisaçâo quando descobriu a vaccina. Que os curadores de vaccas eram muitas vezes refractários á variola, era um facto conhecido já; Jenner disse porquê, coníir-mou-o com experiências suas, e das suas conclusões saiu a descoberta mais proveitosa que o século passado offereceu á humanidade. Os taes refractários accusavam nos seus antecedentes uma erupção de natureza pustulosa sobrevinda ao tempo que análogas lesões se observavam nas tetas das vaccas por elles tratadas. Jenner concluiu que por intermédio de arranhaduras, feridas ou quaes-quer soluções de continuidade se teria feito a
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transmissão da doença e para corroborar esta sup-posição conseguiu inocular n'um homem a doença d'uma vacca.
Outra vez inoculou uma creança, servindo-se de pústulas desenvolvidas n'uma rapariga que accidentalmente contratura a doença; no sitio da inoculação formaram-se pústulas que seguiam uma evolução análoga ás da variola, e, tendo algum tempo depois praticado a variolisação na mesma creança, observou que efectivamente a variola se não desenvolvia.
Estava descoberta a vaccina, mas Jenner precisava de mais observações ; vaccinada directamente uma creança com pus tirado d'uma vacca, sobreveiu uma pustulação regular que serviu para vaccinar uma série de adultos que todos ficaram refractários á variola.
Passou no dia 14 de maio o centenário da obra de Jenner. Se houvesse festas, deveriam ser feitas por todas aquellas mães a (juem elle poupou muitas dores. Ha muito quem faça recuar a descoberta da vaccina a tempos mais remotos que Jenner; não ha porém, quem lhe conteste o grande mérito de a ter demonstrado e vulgari-sado.
Já disse que não trataria aqui de theorias de immunidade, por isso que são theorias; o trabalho orgânico necessário para estabelecer-se o estado refractário, exige um tempo variável segundo a espécie do virus. No homem, a cultura da vaccina gasta dez dias para conferir a immuni-dade absoluta contra a variola ; antes d'esté pra-
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so, e principalmente ate ao sexto dia, a evolução da vaccina não estorva o desenvolvimento de inoculações supranumerárias. Como se vê, não é immediate o effeito da vaccinação, e isto explica o insucesso d'algumas medidas hygienicas cumpridas com assaz rigor: em casos de epidemias graves tem-se estabelecido a vaccinação geral como meio seguro de localisar a doença, cercan-do-a de barreiras julgadas inexpugnáveis; não o são porém pelas razões acima ditas e muitas vezes é por este meio que se faz a progressão do mal.
Para cada doença infecciosa ha espécies de seres vfvos naturalmente refractários; é vitalícia esta immunidade como fazendo parte da propria essência dos indivíduos. Adquirida ou provocada e sempre temporária a immunidade para qualquer doença microbiana, pouco a pouco o organismo readquire as suas propriedades primitivas e o in-rividuo volta ao seu antigo estado de receptividade. A duração do estado refractário é extremamente variável; depende sobre modo e em proporção directa com a intensidade da impregnação que o produziu.
As variações que se observam na immunidade estão relacionadas com a natureza, qualidade e quantidade do agente infecioso, com as modalidades da substancia immunisante introduzida na economia e com differenças várias relativas ao próprio individuo, edade, morbidez, etc. Não comporta este trabalho o necessário desenvolvimento d'egfcas causas; attendendo sempre ao mais im-
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portante, alguma cousa direi acerca das modalidades da substancia immunisante.
O estado de immunidade é funcçao das variadíssimas formas apresentadas pela materia virulenta ao effectuai' a sua passagem atravéz do organismo: esse estado pode ser produzido pela propria bacteria pathogenica, por um producto chimico proveniente da sua cultura, pelo sangue ou soro d'outro organismo; não resulta sempre d'um uniço virus e se -em geral uma infecção curada só defende da bacteria que a causou são conhecidos também exemplos de immunidade conferida por um micróbio contra outro.
De que modo se produz a immunidade por intermédio da vaccinaçao? Prende-se com esta pergunta a questão da identidade da vaccina e da variola, questão de pouca importância prática, mas que traz os pathologistas ás turras desde Bouley e Chaveau que refutaram a unicidade de Jenner.
Havia tudo a esperar da bacteriologia na resolução d'esté problema. Já em 1868 Gluge e Keber faziam o exame microscópico do contheu-do de pústulas no -oitavo dia de evolução ; juntas com os elementos normaes figurados do organismo, viram partículas sólidas que poderam isolar, perdendo então a lympha, vehiculo d'estes corpúsculos, toda a sua actividade virulenta.
Não pôde ainda conseguir-se reconhecer, entre essas partículas, o agente especifico que não é melhor conhecido que o do sarampo. e variola ; é por isso impossível o estudo directo sobre o mi-
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crobio a respeito das suas reacções, morphologia, etc.; as bactérias até hoje encontradas eram conhecidas já e tem-se-lhe attribuido o papel secundário de concomitância. Não serão muitas doenças, que chamamos especificas, produzidas por combinações de micróbios, á similhança dos compostos chimicos que tem propriedades diversas dos elementos ,que os constituem ?
Eu não quero demorar-me n'esta hypothèse tão no ar, mas vejo bem que são assim sólidas as bases de muitas theorias que transtornam completamente capítulos inteiros de pathologia. Levada para o campo das idealisações, aquella doutrina daria muito ; senão vejamos como explicar a immunidade para as taes doenças.
No organismo existem normalmente bactérias, diversas para cada individuo (até aqui faltei verdade); no momento da infecção um composto microbiano ataca os organismos e acha-se em contacto com as bactérias já ahi existentes ; se entre uns e outros micróbios existem affinidades capazes de desfazer aquella combinação, aborta a infecção, o individuo estava immune.
Deixemos porém divagações, que outros assumptos se õfferecem por certo de maior vulto. Dissemos que adquirida ou provocada era temporária a immunidade. A sua duração é variável para cada doença e por isso a vaccinaçâo das creanças deve ser considerada como o principio d'uma série de inoculações impostas a cada individuo. Chama-se recuperatividaáe o estado do organismo que deixa de ser refractário, e assim
m como a receptividade para a variola se anniquila pela vaccinação, outro tanto faz a revaccinaçâo contra a recuperatividade.
Não pôde ser determinado precisamente o tempo de immunidade por primeira vaccinação. E' sabido, porém, que a recuperatividade tem graus e podemos dizer, abstrahindo d'outros factores, que a variola é tanto mais grave quanto sobrevem mais longe da vaccinação infantil ; entre nós acontece vulgarmente que as creanças vacci-nadas são infectadas segunda vez por volta dos dez annos; esta varíola costuma ser benigna e faz as vezes de revaccinaçâo.
A vaccina confere uma immunidade média approximada de dez annos; devia portanto ser praticada todas as décadas e n'aquelles indivíduos que não tiverem ainda recuperado a receptividade, far-se-hiam inoculações todos os annos até que dessem bom resultado.
Acontece o mesmo com a immunidade conferida pela propria variola, ao contrario do que o vulgo imagina ; Jenner já conhecia este facto e só o não sabe quem. não tenha assistido de perto aos estragos d'uma epidemia. E', na verdade, mais duradoura a immunidade assim naturalmente adquirida, mas a pax d'isso ha predisposições in-dividnaes e exacerbações de virus que matam por vezes n'uma segunda investida.
A revaccinaçâo é pois necessária para todos.
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Colhida nas mãos de Sarah Neslem, Jenner empregou a vaccina humanisada. Teve porém a intuição de que terrenos vários lhe imprimiriam caracteres différentes e porisso mandava que, sempre que fosse possivelj se colhesse a vaccina na sua fonte natural. A experiência veio confirmar as ap-prehensões de Jenner : a vaccinaçao animal produz uma pustulaçâo regular ao passo que a humanisada, passando por indivíduos de diversa receptividade, ora se apresenta com uma forma grave e incommoda ora tão degenerada que por pouco tempo poderá conferir a immunidade.
E' pois esta uma questão de terrenos; a semente vaccinal modifica-se com as transplantações e só conserva intactas as suas propriedades quando cultivada na raça bovina.
Além d'estas razões que excluem a prática jenneriana, devem merecer-nos sérias considerações as doenças transmissíveis com a vaccina. O primeiro logar pertence á syphilis: a historia medica relata uma infinidade de casos em que a vaccina levou aquella doença ao meio d'uma família que vale o mesmo que syphilizal-a toda, pois as creanças andam nas mãos de todos e, muitas vezes, um beijo basta ao contagio.
Doença frequentemente no estado latente e porisso tanto mais perigosa, porque é fácil, to-mando-se para vaccinifera uma creança apparen-temente sadia, encobrirem essas apparencias uma
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syphilis occulta que a inoculação vae acordar. Bastariam as desgraças que a este respeito tem causado a vaccinaçâo jenneriana para que ella deva ser abolida, e algum tempo se receou o juizo do povo, pois muitos factos foram abafados para que a vaccinaçâo náo deixasse de fazer-se.
Acostumados a encarar a syphilis como castigo de gosos illicitos, faz-nos dó* vêr esse mal em creancinhas tão infelizes quanto é immerecida a sua pena, immerecida e immortal porque, em muitos casos, nem acaba com a morte propagando-so á descendência.
Acontece o mesmo com outras doenças contagiosas e, muitos casos de accidentes graves que antigamente se attribuiam simplesmente á vac: cina, eram devidos certamente a princípios infec-tuosos.
Tem-se produzido a erysipela, a lepra e d'uni individuo manifestamente scrofuloso inocularam-se septicemias e phleimões dispersos. Em tempos de epidemias, a prática jenneriana pôde augmentai- a diffusâo da doença por meio de variolisaç.ões inconscientes; já dissemos que a vaccina e a variola podem desenvolver-se simultaneamente.
Do que fica dito se vê que ha necessidade de recorrer á vaccinaçâo animal, no fim duplo de evitar a degeneração da vaccina e prevenir a transmissão das doenças do vaccinifero ; de resto, a experimentação tem demonstrado que a vaccina animal é antes mais activa que a humanisada, levando a esta subida vantagem sobretudo nas revaccinacfíes.
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A vaccina animal teve também seus detractores: accusavam-n'a de poder transmittir a tuberculose, attenta a sua grande frequência no gado vaccum. Mo ha porém memoria de dar-se essa transmissão e é mesmo parecer de grandes sum-midades que ella não pôde dar-se porque a tuberculose é extremamente rara nas vitellas de tenra idade, porque, inoculada n'outros animaes a vaccina de vaccas tuberculosas, esses animaes nada soffreram e porque o exame bacteriológico do conteúdo d'essas pústulas nunca pôde evidenciar o bacillo de Koch.
Todas as vantagens estão pois do lado da vaccina animal e muito é para lamentar que entre nós não seja exclusivo o seu emprego ; nao é — algumas vezes por incúria do povo que acha mais expedito aproveitar-se da vaccina do visinho, de muitas excellentissimas camarás que não a fornecem gratis aos pobres e dos governos que esperaram que um particular fundasse no Porto um instituto de vaccinação e não lhe dão subsidio algum.
Sempre que empregada em collectividades a vaccinaçâo deve ser feita directamente da teta ao braço do vaccinado porque, além de poder contaminar-se de substancias estranhas e até sépticas, a vaccina é grandemente alterável. As vaccina-çoes directas podem fazer-se no exercito e nas escolas para onde seja fácil o transporte da vitella vaccinifera e no instituto todas as vezes que ha colheita de vaccina; muitas vezes, porém, é impossível recorrer a este meio e porisso se fazem conservas.
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De très modos se conserva a materia preservadora: lympha, polpa sêcca pulverisada e polpa glycerinosa. O primeiro dos processos deve ser abandonado, pois sabe-se hoje que a duração da immunidade é d'algum modo proporcional a quantidade de agentes virulentos inoculados e a lympha vaccinica é muito pobre em micróbios que só existem em grande numero entranhados nas paredes pustulosas.
A polpa pulverisada, ainda que satisfazendo a esta ultima condição, tem o inconveniente de necessitar da mistura extemporânea com agua glycerinosa, gastando n'isso alguns minutos d'expo, siçâo ao ar o que faz inspirar receios acerca da sua pureza.
A polpa glycerinosa é formada pela trituração em glycerina pura dos productos de raspagem da pústula vaccinica.
Experiências recentes tem mostrado que na, vaccina animal podem existir micróbios pathoge' nicos e principalmente staphylococos, causa fro-quente de erysipelas e phleimões, e que a polpa glycerinosa pôde conservar-se durante mezes, sem que a sua actividade diminua, envelhecendo somente esses micróbios damninhos; d'aqui vem a preferencia de que hoje gosa este processo e alguns práticos dão tanto valor a estas doutrinas que só empregam a vaccina alguns mezes depois da colheita. -
.Différentes circumstancias influem no resultado da vaccinaçao: edade, clima, estação, natureza e qualidade do virus, precaução e methodo
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operatório, etc. Alguma cousa devemos dizer das duas ultimas condições; todos admittem hoje que muitas suppurações rebeldes sâo devidas á falta de asepsia na prática da vaccinaçáo; é mister portanto a maior limpeza da região escolhida e das roupas que devem deixar inteiramente nua essa região; do operador e dos seus instrumentos deve partir o exemplo, nao se furtando aos cuidados mais minuciosos, como se fosse tratar um caso de alta cirurgia.
A região escolhida é ordinariamente o braço; serve também a parte externa e superior da coxa, n'aquellas pessoas cujo modo de vida possa ser lesado pelo aspecto das cicatrizes postas a descoberto pelas exigências da moda.
Tem sido aconselhados tantos instrumentos e processos,. que fariam demasiado longa uma incompleta descripçâo. E' certo, porém, que muitos d'elles não a valem e outros são assaz conhecidos para nos pouparmos a ella.
Deve haver grande cautella com os instrumentos servidos, pois facilmente se infectam n'uma precedente inoculação; o vaccinostylo de Mares-chal está ao abrigo d'esse inconveniente, merecendo para mim a preferencia — é bastante barato para empregar-se individualmente, é também muito simples para fácil esterilisação prévia.
Dos methodos adoptados que são vários, pare-ce-me melhor o das scariflcações, menos doloroso, e o que melhor permitte a impregnação de grande quantidade de vaccina. Não é, certamente, questão de primeira ordem esta da preferencia por certos
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instrumentos e processos; na vaccinaçÊío todos elles dão bons resultados quando manejados por pessoas de consciência que se não mettem a mexer em machinismos humanos sem medir as suas forças com as suas responsabilidades. Feita a inoculação, é mister vigiar bem os vaccinados que devem conservar nua a região escolhida pelo menos du
rante dez minutos, sem tocarlhe com os dedos ou outros objectos. Nos dias seguintes para pou
par essa região á acção nefasta do ar, da luz e do attricto das roupas, o melhor seria cobrila com um pouco de gaze e algodão que bastaria substituir ao sexto dia para vêr o andamento da vaccina; mais simples é porém fixar, por dentro das roupas em contacto com a região inoculada, uma faxa de gaze ou linho macio e aseptico, e isto teria a vantagem de nâo exercer compressão.
A evolução da vaccina normal gasta approxi
madamente quinze dias até á queda das crostas ; modificações e anomalias de erupção raras vezes sobrevem e são devidas á falta de cuidado, na escolha das vitellas e na applicaçâo dos preceitos enunciados nos capítulos antecedentes.
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A ultima epidemia de variola, a que já me re
feri, precisou de dois annos para percorrer toda a área do Porto desde a Foz até Campanha.
Começou em maio de 93, devida provavelmente á exacerbação do virus que nos mezes anteriores
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só tinha dado casos sporadicos em Mathozinhos e Foz. '
Em setembro o obituário de Lordello accusa a propagação epidemica no sentido centrípeto. Em outubro já ha casos em Cedofeita, os focos mais lethiferos são Boavista, Carvalhido e Quinta Ama-rella, que concorreram para fazer dezoito victimas. Em novembro desloca-se um pouco a área epidemica, abandonando Boavista e Carvalhido para se acantonar de preferencia nas ruas de Serpa Pinto e Matadouro ; foi de vinte o obtuario.
Reconhecendo a direcção d'esta marcha invasora, o director da Repartição de Saúde e Hygiene do Porto, dr. Ricardo Jorge, preveniu aauctori-dade para evitar-se a epidemia no alto da Fonti-nha onde a densidade e a miséria da população melhor cultura offerecia ao desenvolvimento do mal. Vaccinaçcies e revaccinações feitas em massa tiveram tâo bom resultado que a variola não deu o numero de victimas que era de recear, quasi sem gasto de medicamentos offerecidos gratuitamente por algumas pharmacias. Em dezembro_ a epidemia habitava o Bornjardim e continuava a sua marcha invadindo Santo Ildefonso e Sé. Em maio de 94 foi Miragaya que mais soffreu e d'aqui se communicou a S. Nicolau pelos bairros de S. Sebastião e Barredo.
Nos dous primeiros mezes de 95 foi a Sé a freguezia mais tributada e em março Campanha ; esta ultima freguezia, á custa de bastantes dam-nos, sustentou a epidemia até julho, já depois do extinctos todos os outros focos. Em resumo :
m a mortalidade pela variola nos últimos très annos foi a seguinte :
Em 1893 82 óbitos Em 1894 218 „ Em 1895 94
Total . . . 384
Quer isto dizer que para mil habitantes houve a mortalidade estupenda de 2,76.
Nada menos de 384 pessoas dizimadas pela varíola nos últimos três annos; isto, n'uma cidade tao pequena como o Porto, é deveras contrista-dor; o sarampo faz também os seus estragos e o mesmo acontece com as outras doenças zymo-ticas, mas, se é verdade que a hygiene grandemente influe n'ellas, não sâo para estranhar tanto exacerbações de mortalidade e ecclosões de epidemias porque nao temos para as combater o remédio soberano e infaílivel da vaccina.
Eu nao sei quando a sciencia ha de ser vencedora da feroz estupidez do povo; d'ella deve dimanar um segundo fiat lux para os espíritos obscurecidos pela ignorância damninha. Para esse tempo mostre-se á humanidade as vantagens da vaccinação e supprimam-se leis vergonhosas atten-torias da liberdade individual ; mas nenhum povo do mundo attingiu ainda essa perfeição e, o que as religiões poderiam ter feito n'outros tempos estabelecendo a vaccinação como prática religiosa, tiveram de fazel-o os governos decretando-a obrigatória.
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Nós esperamos, como a França e poucas mais nações, que a persuasão leve os povos ao caminho do dever. A França, que fez a revolução, hoje respeita preconceitos; não receou sacrificar milhares de vidas, porque a conquista d'uma ideia repousa sempre sobre um montílo de cadáveres e hoje, di-zendo-se inimiga da violência, teme recorrer á força para sacrificar teimosias estúpidas ao bem de todos os cidadãos. Já ella pagou bem caro o seu desleixo, quando em 1870, no meio das agruras d'uma guerra aterradora, viu os seus exércitos devastados pela variola ; calcula-se em 200:000 os soldados que adoeceram, morrendo 24:000; ao mesmo tempo o mesmo flagello pairava sobre o exercito allemâo, que mais numeroso e luctando com privações e mudanças de clima, apenas perdeu 500 homens.
A Allemanha, como os outros paizes de vacci-nação obrigatória, não sabe agora o que são epidemias de variola e nas suas estatísticas mortuárias a casa correspondente áquella doença quasi podia ser supprimida.
Querem mais que isto os pusillanimes que receiam ferir a liberdade pessoal ? Nâo sabem elles que a sociedade é uma somma de sacrifícios? •
A liberdade individual acaba onde começa o interesse de todos.
Espíritos verdadeiramente superiores, arrebatados pelo fogo do génio irrequieto, tem-se insurgido contra as prepotências da sociedade, no dizer d'elles, vexatórias. Spencer, referindo-se ao despotismo exercido sobre o individuo, clama que
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no futuro, por effeito secular da educação, a agremiação dos homens não passará d'uma agremiação de escravos. No nosso caso particular ha ainda os anti-vaccinadores, liga de indivíduos de diversas nações, mas em grande numero inglezes, que fazem toda a casta de propaganda contra a prática da vaccinaçao.
Dizem elles que~ a vaccina, poupando os indivíduos na infância, vem fazer que elles morram já adultos quando, mais válidos e prestáveis á família e á sociedade.
Dizem mais que a vaccina, fazendo desappare-cer a variola, veio augmentai- a mortalidade pelas outras doenças infecciosas da infância e a mortalidade geral, servindo além d'isso de transmissão para certas doenças inoculáveis.
Os primeiros argumentos fazem lembrar as ideias d'aquelles philosophos que aconselhavam o celibato para acabar com a morte; de resto, vê-se bem quão falsas são estas doutrinas: é antes a variola que predispõe para a tuberculose como a demographia tem demonstrado e muitos attribuem lesões valvulares a esta doença infecciosa. Não sei que confiança merece a voz do povo que attribue ás bexigas, quando não matam, um effeito salutar sobre o organismo; não tem para mim explicação estas ideias e antes me. parece que a eliminação dos princípios tóxicos, em abundância proporcional com a gravidade da doença, devem deixar vestígios indeléveis nos emunctorios orgânicos ; não terá a variola grande culpa de tantas nephrites precoces que põem o organismo n'um equi-
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librio instabilissimo, deixando-o succumbir ao menor abalo ?
Deixemos, porém, hypotheses e vejamos os effeitos perniciosos d'aquella liga liberal; já não quero fallar na Inglaterra, onde o obituário da varíola tem crescido progressivamente nos últimos cinco annos, porque o exemplo mais frizante do valor da vaccina obrigatória é-nos dado pelo seguinte facto: Em maio de 1883 o povo de Zurich, intimidado com as profecias atterradoras dos anti-vaccinadores, votou a suspensão da vaccina obrigatória. Três annos depois, as estatísticas mostravam os seguintes resultados de mortes pela varíola em 1:000 óbitos geraes:
1882 o 1883 8 no ultimo trimestre. 1884 12 1885 52 1886 85 só no primeiro trimestre.
Adopte-se pois a vaccinação e revaccinação obrigatórias; um anno que passa é um numero considerável de victimas sacrificadas vergonhosamente á tibieza dos governos, — a varíola conserva ainda considerável gravidade, os seus estragos continuarão a ser grandes, se não forem es-terilisados os terrenos onde ella cahir.
. Falíamos já no isolamento e desinfecção, mas nas grandes epidemias é impossível a sua execução perfeita e, para todos os casos, a prophilaxia única e especifica é a vaccinação que, sem ser
K perigosa era tempos de epidemias é o melhor, meio de lhes estorvar os destroços.
A revaccinaçao é condição também essencial para a extineção do flagello; nas epidemias va-riolicas a mortandade dos revaccinados é de um para 70:000.
Eu nao sei se ha anti-vaccinadores de boa-fé, pois a maior parte d'elles admittem a desinfecção e o isolamento forçados, prática que, apezar de nao garantir resultados completamente seguros, é por certo mais violenta. Onde a liberdade n'este caso?
Peter, baseiando-se na efficacia das-medidas que temos contra a variola, diz que é vergonhoso nao estar livre de tal doença; acerescente-se porisso ás nossas leis um artigo que trate da vaccinaçao obrigatória; organise-se capazmente um serviço vaccinico, constando de différentes institutos, de modo a empregar-se somente a vaccina animal, de teta ao braço nas collectivida-des e no instituto, por meio da polpa glycerinosa em todos os outros casos; faculte-se a vaccinaçao gratuitamente, encarregando d'essa prática unicamente pessoas habilitadas; vigie-se a sua execução em todas as classes e muito principalmente nas miseráveis, que maior pasto dao á variola, e se fizermos tudo isto, a variola ha de acabar entre nós, como acabou na Allemanha e nos outros paizes, a este respeito beneméritos.
PROPOSIÇÕES
Anatomia. - Ha defeitos de oonstrucção na parede abdominal.
Physiologia. - A pão e agua pode viver-se.
Anatomia pathologica. - São immortaes as cellulas germinativas.
Materia medica. - A agua em abundância tem boa applicaçâo nas doenças agudas.
Pathologia geral. - Aos predispostos nunca faltaram bacillos.
Pathologia externa - 0 cancro duro é anterior á infecção do organismo.
Pathologia interna. - A dilatação do estômago é apenas um symptoma.
Operações. - Reprovo o uso do amygdalotomo.
Partos. - Nas rupturas do utero só a hysterectomia pôde ser bem succedida.
Hygiene. - As dores dos callos são protestos do organismo contra a tyrannia das modas.
Pôde Ímprimir-se
W. de Lima* Director.
Visto A, Brandão,
Presidente.