folia de reis: tradiÇÃo e modernidade de... · 2020-05-26 · folia de reis: tradiÇÃo e...
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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
GRADUAÇÃO EM ANTROPOLOGIA
Marcos Vinícius Macedo Varella
FOLIA DE REIS: TRADIÇÃO E MODERNIDADE
Niterói
2018
MARCOS VINÍCIUS MACEDO VARELLA
FOLIA DE REIS: TRADIÇÃO E MODERNIDADE
Monografia apresentada ao Curso de Graduação emAntropologia da Universidade Federal Fluminense,como parte dos requisitos necessários à obtenção dotítulo de Bacharel em Antropologia.
Orientador: Prof.º Dr. Daniel Bitter
Niterói
2018
Ficha catalográfica automática - SDC/BCG
Bibliotecária responsável: Angela Albuquerque de Insfrán CRB7/2318
M141f Macedo Varella, Marcos Vinícius
Folia de Reis: Tradição e Modernidade / Marcos Vinícius Macedo Varella; Daniel Bitter, orientador. Niterói, 2018.
65 f. : il.
Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Antropologia)-Universidade Federal Fluminense, Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Niterói, 2018.
1. Identidade Cultural. 2. Folia de Reis. 3. Antropologia Social. 4. Tradição.5. Produção intelectual. I. TítuloII. Bitter,Daniel, orientador. III. Universidade Federal Fluminense. Instituto deCiências Humanas e Filosofia. Departamento de Antropologia.
CDD -
Marcos Vinícius Macedo Varella
FOLIA DE REIS: TRADIÇÃO E MODERNIDADE
Esta monografia foi julgada adequada para a obtenção do Título de “bacharel” e
aprovada em sua forma final pelo Curso de Graduação em Antropologia da
Universidade Federal Fluminense.
Niterói, 17 de julho de 2018.
Banca Examinadora
_____________________________
Prof. Dr. Daniel Bitter (Orientador)
____________________________
Prof.ª Dr.ª Gisele Fonseca Chagas
Universidade Federal Fluminense
___________________________
Prof.ª Dr.ª Joana Miller
Universidade Federal Fluminense
Dedico este trabalho à todos os foliões que ainda
conseguem manter a cultura de Folias de Reis, na
cidade de São Gonçalo, no Rio de Janeiro. Mesmo
com tantas dificuldades encontradas, ainda resistem
a tudo e a todos.
AGRADECIMENTOS
A minha família, que foi a principal ferramenta para jamais desistir de sonhar.
Ao meu orientador, Daniel Bitter, que é um verdadeiro guerreiro na luta pelo resgate da
cultura de Folias de Reis, no Estado do Rio de Janeiro.
A Prof.ª Dr.ª Gláucia, que foi a responsável por fazer de minha vida um verdadeiro
trabalho de campo, e com isso, produzindo minha própria etnografia.
Ao mestre Waldecy e os foliões do bairro Almerinda, em São Gonçalo, que foram
essenciais para a construção desse discurso etnográfico.
Construir uma etnografia é aprender a viver e a
conhecer os grupos que produzem culturas
múltiplas.
Marcos Vinícius Macedo Varella
RESUMO
Este trabalho é resultado de uma grande caminhada pela cultura do município de São
Gonçalo, uma vez que remonta uma prática que perpassa o tempo. Antes de escolher o
tema de minha pesquisa de campo, estava estudando para escrever meu livro sobre as
Igrejas de São Gonçalo, o qual já foi lançado pelo selo editorial da Secretaria de Cultura
do município de São Gonçalo e aprovado pela Secretaria de Cultura do Estado do Rio
de Janeiro. Foi, através de muitos encontros com os grupos de Folias de Reis, que
resolvi ser mais participativo nas reuniões propostas pelos mesmos. Desta forma,
construindo uma etnografia sobre o grupo, com a preocupação de que seus feitos não
sejam esquecidos. Espero que esta pesquisa, fique para a posteridade, servindo como
base para novos trabalhos de campo, sobre essa tão significativa manifestação da nossa
cultura.
Palavras-Chave: 1. Identidade Cultural. 2. Folia de Reis. 3. Antropologia Social. 4.
Narrativa. 5. Tradição.
ABSTRACT
This work is the result of a long walk by the culture of the municipality of São Gonçalo,
since it dates back a practice that transcends the time. Before choosing the theme of my
field research, I was studying to write my book on the churches of São Gonçalo, which
has already been launched by the editorial Department of culture seal of the
municipality of São Gonçalo and approved by the Ministry of culture of the State in Rio
de Janeiro. But it was through many encounters with groups of Folias de Reis that I
decided to be more participatory in such meetings proposed by the same. In this way,
building a Ethnography on the group in fear that their deeds be forgotten over time,
where this material would be for posterity on new fieldwork.
Keywords: 1. Cultural identity. 2. Folia de Reis. 3. Social Anthropology. 4. Narrative. 5.
Tradition.
ÍNDICE DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 – Festa de Arremate com o Mestre Waldecy, a filha de Dona Almerinda que dá
nome ao Bairro e o Contra Mestre
Figura 2 – A Festa de Arremate e os preparos dos instrumentos
Figura 3 – Preparação para a reza da Bandeira antes do Giro
Figura 4 – A Bandeira da Estrela Nova do Oriente
Figura 5 – Altar com os Santos e a Bandeira
Figura 6 – A roupa do Palhaço
Figura 7 – O palhaço sentado antes de se fantasiar
Figura 8 – Um Símbolo muito respeitado – pós morte
Figura 9 – O Mestre Waldecy se preparando para o Giro
Figura 10 – Uma nova geração na Folia de Reis
Figura 11 – Instrumentos preparados para o Giro
Figura 12 – O Contra Mestre antes do Giro
Figura 13 – O sanfoneiro (centro) e o Contra Mestre (direita)
Figura 14 – Mestre e Contra Mestre prontos para o Giro
Figura 15 – O grupo de foliões preparados para o Giro
Figura 16 – O uniforme para fazer o Giro
Figura 17 – Um encontro de Mestres: Waldecy a esquerda e Fumaça a direita
Figura 18 – O Contra Mestre e a Porta Bandeira
Figura 19 – O tocador de bumbo do Giro
Figura 20 – Uma ilustre visita ao barracão com o Mestre Fumaça
Figura 21 – O tocador de tarol do Giro
ÍNDICE DE SIGLAS
FASG – Fundação de Artes de São Gonçalo
IHGN – Instituto Histórico e Geográfico de Niterói
IHGSG – Instituto Histórico e Geográfico de São Gonçalo
MEMOR – Instituto Gonçalense de Memória e Produções Culturais.
NPN – Núcleo de Pesquisadores Niteroienses
SMTC – Secretaria Municipal de Turismo e Cultura
UERJ – Universidade do Estado do Rio de Janeiro
UFF – Universidade Federal Fluminense
SUMÁRIO
Apresentação
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Capítulo 1 - Origem da Folia de Reis 15
Capítulo 2 - A Festa de Arremate 19
Capítulo 3 - Principais elementos da Folia de Reis 24
3.1-A Bandeira 24
3.2- O Palhaço 28
Capítulo 4 - Modificações culturais na Folia de Reis 34
4.1- O choque de gerações, o encontro da tradição e a modernidade 34
4.2- A relação familiar: fortalecimento ou enfraquecimento? 47
Considerações Finais 53
Bibliografia 55
13
Apresentação
Este trabalho é o resultado de muitas participações e admiração pelos grupos de
Folias de Reis. Antes de escolher o tema, de minha pesquisa, estava estudando e
trabalhando na SMTC, e não sabia ainda, qual o campo gostaria de pesquisar para fazer
meu trabalho de final de curso, ou seja, meu TCC (Trabalho de Conclusão de Curso).
Após ter passado por algumas experiências realizando trabalho de campo, em diferentes
áreas da antropologia, inclusive já com material para realizar outro trabalho, meu
encantamento se voltou para algo que sempre fui apaixonado e que tive sempre um
grande respeito. Depois de participar de muitas festas e analisá-las, através de grande
crivo bibliográfico estudado no curso de antropologia, é que pude pensar em fazer um
trabalho de campo de pesquisa etnográfica, o que foi extremamente gratificante e uma
experiência cada vez mais intensa para a pesquisa, pois me envolvi profundamente a
ponto de ser convidado e ficar “em cima do muro” para fazer o papel do palhaço ou ser
padrinho da folia estudada.
Tudo tornou-se mais consolidado quando entrei em contato com materiais vastos
de bibliografias da área. Sendo assim, o trabalho de campo tornou-se, ainda, mais rico,
principalmente pelas experiências vividas e analisadas junto ao grupo. Muitas pessoas,
não tem ideia da grande importância dessa prática cultural, uma vez que, perpassa o
tempo e cria um diálogo com um modelo social vivido. As pessoas envolvidas fazem
um trabalho fantástico para perpetuarem a Folia de Reis em nossa cultura popular,
mesmo enfrentando uma grande dificuldade para a execução dos trabalhos.
Após quatro anos consecutivos, participando ativamente das atividades da Folia
de Reis, no bairro Almerinda, com o Mestre Waldecy, e ajudando outras folias como: a
do Mutuá, com o Mestre Fumaça e a do Engenho do Roçado, com o Mestre Caetano,
ambos em São Gonçalo, percebi que meu trabalho de campo, foi ganhando estrutura, e
as leituras feitas com as bibliografias voltadas à antropologia, multiplicou e trouxe
novos questionamentos sobre toda a estrutura que abarca e dinamiza os grupos de Folias
de Reis, não somente no município, mas em todos os locais do Brasil que praticam essa
cultura, pois a mesma, se diferencia, e em muito, por local de prática.
Estas questões, certamente não tem uma resposta, mas passaram a me preocupar
como um todo, assim como outros grupos que possuem, também, dificuldades
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múltiplas, pois o resgate de uma cultura jamais poderia deixar de existir, juntamente
com suas práticas. Mas infelizmente, o que podemos dizer é que, a falência de tal
atividade é vista pelo número que deixou de existir, pois eram uma média de quinze
grupos de folia, e hoje, só existem três.
Capítulo 1: Origem da Folia de Reis
15
Devemos em primeiro momento, termos a noção de identidade cultural, junto ao
objeto estudado, a Folia de Reis, o que remonta a um antigo debate no campo dos
estudos desses grupos, que em sua maioria tornam-se esquecidos pelo tempo. A
antropologia, enquanto um campo de conhecimento específico, desenvolveu o método
etnográfico, a partir desse método, nós, pesquisadores, podemos estar em contato,
intensivo e direto, com o nosso objeto de pesquisa em locais únicos. Nesta pesquisa,
pretendo apresentar uma breve etnografia, de um grupo de Folias de Reis presente no
município de São Gonçalo. Este grupo possui diferentes características de outros grupos
que praticam a mesma atividade cultural por todos os estados do Brasil, o que nos
remeterá a algumas peculiaridades que serão abordadas a partir desse pressuposto. Desta
forma, será apresentado materiais coletados através de entrevistas e análises diretas
feitas junto aos praticantes e participantes indiretos.
Na verdade, a Folia de Reis é uma comemoração folclórica de origem
religiosa dos quadros europeus, muito cultuada e respeitada na Espanha. No Brasil,
recebe vários nomes, é conhecida em muitos estados como: a Festa de Reis, reisado ou
mais simplesmente como a Folia de Reis.
Andei estudando tal prática, por algum tempo, e percebi que ela em seus
primórdios era uma forma de celebrar a perseverança das andanças dos 3 reis magos,
em busca do Messias. Eles nem ao menos sabiam se Ele existia, mas acreditavam, pois
Deus tinha destacado para eles em suas mensagens.
O que se sabe na verdade, é muito pouco, nem se tem certeza que eram reis de
verdade, podem ter sido sacerdotes de uma religião alternativa na antiga Pérsia, que
buscavam seus deuses em coisas que não podiam explicar.
Na verdade, nem o número de reis magos é uma certeza, pois sabe-se que eram
muito ricos, poderiam ser grandes comerciantes e estes naquela época tinham grande
patrimônio. Eles eram assim caracterizados, devido à grande quantidade de presentes e
perfumes, que traziam em sua bagagem, e principalmente pelas riquezas de suas
vestimentas, ricamente trabalhadas e chamavam a atenção das demais pessoas naquele
período.
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Essas comemorações começam no dia 25 de dezembro, o que representa o
nascimento de Jesus e vai até dia 06 de janeiro, data provável da partida dos reis, para
volta às suas longínquas terras, segundo a Bíblia no Evangelho de Mateus.
Essa tradição ganhou mais força nas terras brasileiras, principalmente no
século XIX, e mantem-se viva em muitas regiões do Brasil. No Rio de Janeiro, como
tudo nos leva a grandes festas, essa data se estende até o dia 20, com muitas visitações,
pois é data da comemoração de São Sebastião, padroeiro da cidade. As comemorações
são mais fervorosas nos estados do sudeste e do sul, mas não podemos deixar de
destacar que também no nordeste existem muitos grupos. Em estados como Bahia,
Minas Gerais e Rio de Janeiro, onde as religiões de matrizes africanas e o catolicismo
são mais fortes, as comemorações fazem parte do calendário oficial das principais
cidades.
Para essas festas são organizados verdadeiros roteiros, que consistem na
visitação das casas de devotos e simpatizantes, que se incluem numa grande lista pois,
as mesmas serão visitadas. Os alimentos ficam por conta do dono da casa ou
responsável, que faz verdadeiros banquetes para os foliões. O mesmo também fazer
doações, que podem ser de diversas formas como: roupas, alimentos, dinheiro, remédios
e outras coisas, que no final dos festejos, os responsáveis pelo recolhimento devem
repassar para outras folias ou igrejas de sua região.
Em uma conversa, o Pai de Santo, Geleia da Rocinha, narrou que, existiam
vários grupos de folias de reis, em sua comunidade. Eram 5 grupos, cada um com uma
cor diferente: rosa, azul claro, verde, amarelo, vermelho. No momento que se
encontravam em determinadas vielas ou becos, era um verdadeiro duelo de cantigas e
piruetas de seus palhaços mascarados. Mas o importante, é que não haviam nem
vencidos e nem vencedores, pois depois de algum tempo cada grupo seguia o seu
caminho em direções diversas, continuando as visitações às casas. Os grupos, também,
tinham outras características marcantes, pois como falei, a visitação às casas,
aconteciam do dia 25 de dezembro até o dia 20 de janeiro. O Sr. Geleia contou que
nunca compreendia como arrumavam forças para ficarem 24 horas representando as
peregrinações dos reis magos, só se alimentando e descansando nas casas que visitavam.
Lá faziam suas orações de agradecimento e de pedido de graças pelas acolhidas. Os
alimentos e doações que recebiam, e em muita quantidade, eram repassados. Cada
grupo era composto pelos músicos, que englobavam sanfoneiros, tocadores de bumbo,
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de pratos, de violões, de reco-recos, de flautas e rebecas, 3 palhaços vestidos com
roupas bem coloridas, que personificavam os soldados com suas vestimentas suntuosas
e que marcavam a riqueza.
A designação de cada membro do grupo, como: bandeireiro ou alferes de
bandeira, tinha a função de carregar a bandeira do grupo, respeitosamente, como se
fosse a bandeira de um país. Essa pessoa, geralmente, era o componente de melhor
conduta no seio do grupo; o mestre ou embaixador, é o principal personagem da folia. É
ele quem organiza a logística do grupo e responsável por todo o conhecimento passado
para os foliões.
Existe, também, a figura do festeiro, que é como se fosse um presidente
fundador do grupo, e é em sua casa, que os membros do grupo costumam se reunir para
tratar de todos os pormenores das visitações. É de lá, que sai a bandeira, para ser
benzida na igreja, quando começam e terminam os festejos.
As canções, são hinos que muitas vezes só eles conseguem entoar, por serem quase
inaudíveis, em virtude do caos sonoro, provocado pelos instrumentos, e em respeito as
casas onde visitam. Outro motivo, também, é que aos poucos, as cantigas foram sendo
adequadas aos idiomas de matrizes africanas, tornando quase impossíveis seus
reconhecimentos.
Algumas das características marcantes são as cantigas de apresentação e de
despedida dos grupos às casas que visitam, pois essas nunca mudam.
Na verdade, são múltiplas, as atenções para o significado. O que pude perceber,
ao longo do trabalho de campo, foi visões e significados totalmente diferentes,
inclusive, entre os membros do grupo. Um bom exemplo, é a chamada para o Rei Mago
Baltazar, sempre enaltecido e colocado como um negro de destaque para alguns foliões.
O Pai de Santo, Geleia da Rocinha, que apenas é um admirador, mas não participante
dos eventos, não citou, em nenhum momento, tal colocação. Foi neste momento, que
refleti sobre a condição e troca de informações dentro do trabalho, pois a construção de
uma etnografia, tem uma forte presença, para diagnosticar as observações nas
convivências dentro e fora, mas com rigor social sempre presente, onde seus membros
diferenciam, e em muito, nas condições de diversidades de classes sociais.
Perceber claramente o significado transmitido pelos foliões, nos remete a algo de
extrema nostalgia e respeito mútuo, pois a hierarquização presente norteia o diálogo
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entre todos. No momento, em que o mestre está falando algo, jamais alguém o interpela,
e ficam prestando muita atenção na sua sabedoria, pois é considerado o grande guardião
do conhecimento sobre a Folia de Reis.
Capítulo 2 - A Festa de Arremate
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Na verdade, a celebração simboliza o encerramento das saídas da Folia no ano, e
todos os trabalhos que antecedem e que os preparos são rigorosamente cobrados pelos
mestres. A minha pesquisa de campo foi feita no bairro Almerinda, em São Gonçalo,
sobre a Bandeira da Estrela do Oriente, do Mestre Waldecy. Vale destacar que, uma vez
que é consagrado o arremate, os foliões realizam uma festa a fim de agradecer todos os
ganhos ofertados à bandeira, doados pelos devotos que receberam a folia em suas casas.
Nesse sentido, o arremate dos ganhos poderia ser estendido, não apenas em retribuição
aos devotos convidados, mas também a outros grupos de Folias de Reis, de todo o
Estado, pois existe um ritual de ajuda mútua entre eles. Percebi que, quando sobram,
grande parte das doações são distribuídas para a realização de outras festas, pois nem
todas as bandeiras conseguem o suficiente para a execução dos eventos. Inclusive, eu
mesmo apadrinhei muitas festas de folias, como: a do Mestre Waldecy e do Mestre
Caetano, que conseguiram poucas doações.
Figura 1 – Festa de Arremate com Mestre Waldecy, a filha de Dona Almerinda que
dá nome ao Bairro e nosso saudoso contra mestre.
Nessa perspectiva, a Festa do Arremate seria um espaço de sociabilidade que
permite a criação e a manutenção de alianças entre as folias por meio de convites
mútuos. Mestre Waldecy conta que, antes da festa, vai à casa de cada mestre de folia ou
a suas respectivas festas do arremate para convidá-los pessoalmente para a sua. No
20
período em que eu acompanhava a Folia, a festa do Waldecy sempre foi organizada no
mês de julho, próximo à data natalícia do mestre.
A organização das festas do arremate está vinculada aos santos de devoção dos
foliões. Sabendo disso, os integrantes da Bandeira Estrela Nova do Oriente, organizam-
se, anualmente, para comparecer aos encerramentos. Mestre Horizonte, da folia de reis
Irmandade São Cristóvão, de Papucaia, realiza seu arremate no fim de semana próximo
ao final do mês de maio, Dia de Nossa Senhora de Fátima (13 de maio). Mestre
Fumaça, da Bandeira Nova Flor do Oriente, do município de São Gonçalo, faz seu
festejo no primeiro final de semana de dezembro, próximo à data de Santa Bárbara,
santa de devoção da família do mestre, Dia de Santa Maria Madalena, mesma santa de
devoção do mestre João, da Bandeira Estrela Dalva do Oriente, de Jacarepaguá, que
atualmente sai de Vila Isabel, do Morro dos Macacos. No caso destes dois últimos
mestres, eles se preocupam em marcar a data de seus eventos em distintos finais de
semana para não haver conflito de datas e, concomitantemente, enfraquecimento das
festas. Desde o final de 2008 até 2018, período em que tenho acompanhado mestre
Waldecy e sua bandeira, consegui compreender, melhor, como essas três festas são
fundamentais para alicerçar as redes de sociabilidade e solidariedade entre os grupos.
Há também as festas de Mestre Caetano, no Engenho do Roçado, também em São
Gonçalo, Mestre Waldir, da Bandeira Estrela da Guia, de Campo Grande, e a da
Bandeira Três Reis Guiados por São Jorge, do mestre Jorge de Itaboraí, realizadas no
mês de maio (mês de Nossa Senhora), mas esses arremates não integram o corpo de
festas de presença obrigatória.
Podemos perceber, que outra dimensão de sociabilidade presente no arremate, é
a reciprocidade obrigatória (MAUSS, 2003), com o oferecimento e o comparecimento à
festa de uma folia organizadora, pois a prática do convite gera a relação de
comprometimento. Assim, ao ser convidado para uma Festa do Arremate, por um
mestre, criam-se condições para um comprometimento moral e ético de aceitar e
retribuir o convite. Além disso, gera-se a obrigação de se organizar uma festa tão boa
quanto, e se possível melhor, que àquela para a qual o grupo de Folia de Reis foi
convidado. Tais qualidades, mostram o quanto a festa do arremate se torna um circuito,
que relaciona a Folia de Reis organizadora, as folias convidadas, os devotos, as coisas
oferecidas e os santos para quem são oferecidas as coisas, sendo também um campo de
disputa de autoridade, prestígio e reputação. Podemos também perceber, uma grande
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disputa entre as referidas, pois existem diferenças entre: fantasias, bandeiras,
instrumentos e, até mesmo, na forma de transporte. Desta forma, fica evidente, as
diferenças sociais, que são visíveis nas apresentações.
Figura 2 – A Festa de Arremate e os preparos dos instrumentos.
A Festa do Arremate é, portanto, um fato social total (MAUSS, 2003), que
relaciona as mais variadas esferas que compõem o social: dimensões econômicas,
estéticas, morais, religiosas, materiais, espirituais, visíveis, invisíveis, mundanas,
extramundanas se entrelaçam para configurar a festa como um fato social total
(BITTER, 2010, p. 67). A vantagem do uso dessa noção está em evidenciar, por
exemplo, que as dimensões econômicas desse empreendimento não podem ser
compreendidas a partir do modo como o Ocidente moderno concebeu o campo
autônomo da economia. Aqui, trocas de dom e mercado entrelaçam-se, pessoas trocam
com divindades e antepassados, e assim por diante. Mas não podemos esquecer,
também, que questões políticas, também estão presentes, pois na maioria das vezes,
existem relações com o poder público, tanto na esfera executiva como na legislativa,
pois os mestres estão sempre buscando recursos junto a estes.
Esse evento é o encerramento das saídas das bandeiras nos períodos de giros ou
jornadas com os foliões, mas, como podemos ver, existem relações entre esses dois ritos
das folias de reis que reafirmam laços de devoções e aumentam a circulação dos objetos
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e dons entre devotos, foliões e santos. É nesse circuito de objetos e de trocas com os
santos que podemos nos aproximar da questão da quarta obrigação tratada por Maurice
Godelier sobre a obra de Marcel Mauss:
Em todas as sociedades – sejam ou não divididas emcategorias, castas ou classes – vemos humanos oferecendodons a seres que eles consideram seus superiores: potênciasdivinas, os espíritos da natureza ou os espíritos dos mortos. Aeles dirigem preces, oferendas e às vezes até sacrificam bensou mesmo a vida. É a famosa quarta obrigação constitutiva dodom que Mauss mencionou sem desenvolver completamente eque, em geral, foi esquecida por seus comentaristas(GODELIER, 2001, p. 25).
Foi no mês de julho, de 2016, que meu trabalho de campo ganhou corpo, pois,
mesmo sobre forte chuva, estive presente na Festa de Arremate de Mestre Waldecy. E
percebi, que antes da chegada da folia convidada, sobre o comando do Mestre Fumaça,
a preocupação dos foliões estava grande, pois aguardavam ansiosos, a apresentação do
outro grupo. Nesta festa, o número de pessoas presentes, não era grande, pois o tempo
não favorecia em nada, mesmo assim, o encontro e os preparativos foi uma verdadeira
maravilha, onde mesmo com chuva torrencial, os fogos de artifício, não falharam e o
brilho nas apresentações tornaram-se ainda maiores devido as dificuldades e a
superação das mesmas, onde os esforços não eram medidos para que tudo ocorresse em
perfeitas condições. Isto foi visto, claramente, no sorriso dos integrantes que
compareceram e abrilhantaram todo aquele momento.
Jamais poderia esquecer de relatar, a simbologia da presença das Bandeiras na
Festa de Arremate, principalmente por ser um dos momentos mais belos da festa. O
respeito e o tratamento das mesmas, transcendem a tudo, pois se tornam um momento
único, uma vez que cada bandeira tem a sua forma e seus ornamentos. Vale ressaltar,
que relatos com maior significância, serão descritos no próximo capítulo, que dará
destaque às Bandeiras.
Assim sendo, a construção de uma etnografia pautada no estudo desses grupos,
nos remete a uma grande troca de elementos que são resgatados dentro da Folia de Reis
e suas dimensões socioculturais.
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Capítulo 3 – Principais elementos da Folia de Reis
3.1 – A Bandeira
Na verdade, a representação do sagrado frente a Folia de Reis, tem múltiplas
significações, principalmente nos objetos que as singularizam, a exemplo da Bandeira.
Daniel Bitter (2010) já chamou a atenção para a importância da Bandeira, elemento
máximo da Folia de Reis, e a máscara dentro das folias. Ambos os elementos, passam
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por processos rituais para serem produzidos, utilizados, guardados e, até mesmo,
desfeitos. Da mesma forma, os demais objetos rituais, como as fardas, os bonés-capes e
os instrumentos também passam por esses processos no período dos giros e das Festas
do Arremate. A indumentária, por exemplo, é feita unicamente para a utilização da folia
nos períodos de saídas rituais, no momento em que não é mais utilizada, fica no altar
juntamente com outros santos de devoção na sede da Bandeira Estrela Nova do Oriente,
no bairro Almerinda, no município de São Gonçalo.
Figura 3 – Preparação para a reza da Bandeira antes do Giro.
Assim que entramos na sede, em um corredor do lado esquerdo, deparamo-nos
com o altar, local em que repousa a Bandeira Estrela Nova do Oriente, ficando exposta e
com velas acesas referenciando a mesma e os santos presentes. A visitação pode ser
feita sempre com a presença do mestre, que conta vários episódios referentes a
condução da mesma, visto que ela é uma espécie de elemento protetor para todo o
grupo, e vou além, para todos que acreditam na sua força como proteção espiritual,
independente do crivo religioso de quem participa indiretamente.
As cores da farda da Bandeira Estrela Nova do Oriente são verde e branco.
Segundo o mestre, a escolha da cor deu-se:
Waldecy diz que quando menino, trabalhava muito no campo,onde o verde estava sempre muito presente, mas não somente
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foi o sentido da escolha, uma vez que muito cansado, foidescansar debaixo de uma árvore e teve um sonho dizendo queum dia ele sairia daquele local, formaria sua família e teria umamissão à cumprir. E depois disso, jamais deixou de realizarsuas obrigações, com muito afinco e respeito, pois alega quesuas conquistas são graças aos trabalhos junto a Folia de Reis,que jamais deixaram de ser realizados, mesmo passando porgrandes dificuldades, pois são nelas que ganham mais forçaspara fazer os eventos, pois minha Bandeira jamais deixarádesamparado.
A Bandeira do mestre Waldecy, foi entregue ao mesmo por uma mãe de santo
que confeccionou sete bandeiras. Ele tem muito orgulho de ser uma espécie de guardião
para ela, pois como mesmo diz, viu muitas folias se encerrarem e, guarda até hoje as
bandeiras das que deixaram de sair. Se preocupa muito com o que significa a mesma,
para ele e para outras pessoas que compreendem o verdadeiro significado destas.
Na verdade, a Bandeira é algo simbólico que foge a compreensão de muitos,
principalmente para os que não conhecem o ritual. O mestre relatou que:
A responsabilidade de ser guardião de uma bandeira é muitoimportante, pois mesmo com uma folia deixando de existir, suabandeira jamais pode ser deixada de qualquer forma, pois quemtem suas obrigações sobre ela será punido severamente. Nãodevemos brincar com o que não conhecemos, pois traremosproblemas para a nossa vida. Eu mesmo guardo a Bandeira deuma folia que acabou. Mas sei muito bem o que vou ter quefazer para dar fim na mesma, pois ela tem um dono, e este,sabe, certamente, como ela deve ser tratada. Por isso, semprefalo com os meus foliões a importância pela Bandeira, pois elaé a alma da Folia de Reis.
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Figura 4 – A Bandeira da Estrela Nova do Oriente.
A Bandeira é algo que realmente significa muito para o grupo, pois seu
simbolismo possui grande valor espiritual. Ela atua como elemento integrante das
bonanças adquiridas por cada folião que está amparado pelo seu fazer protetor,
fornecendo frutos permanentes que os levam as práticas referenciadas na folia,
abarcando toda a propriedade do simbólica. Além de protegê-la, a Bandeira precisa
compreender os códigos e as formas de distribuição das bênçãos operadas pelos santos,
sem transgredir nenhuma das interdições rituais (RADCLIFFE-BROWN, 1973).
Aproprio-me da categoria de Radcliffe-Brown no que diz respeito às interdições rituais,
pois, ao transgredir qualquer regra do corpo do fundamento, o folião estaria colocando
não apenas ele, mas todos os devotos e mais a Bandeira em uma situação de fragilidade
ritual, tornando todos os envolvidos nas saídas em potenciais alvos de magias.
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Figura 5 – Altar com os Santos e a Bandeira.
Para exemplificar essa questão, cito uma experiência de campo ocorrida com o
mestre, onde em uma saída, por uma rua, juntamente com os foliões, ao passar por um
bar, notou algo de errado, uma vez que apareceu um homem, do nada, negro e alto, e
tentou a todo o custo, impedir a passagem da Bandeira. Naquele momento percebi, que
não era um homem comum, e precisava cruzar a Bandeira frente ao mesmo. O homem
pulava muito, o que dificultava executar a tarefa, foi numa distração, deste homem, que
conseguimos cruzar a Bandeira. Naquele momento, ele parou e deixou o grupo passar
sem problemas e para nossa surpresa, seu sumiço foi de imediato.
A bandeireira é a responsável pelo grupo e tem de conhecer o fundamento da
folia, não permitindo nenhuma transgressão para com esse objeto ritual. O silêncio e a
postura irredutível de total confiança e respeito denotam a questão da seriedade em não
se separar da Bandeira e nem a tratar como simples objeto. O santo tem de ser levado
pela bandeireira até a casa dos devotos e com total apreço nas festas, uma vez que
jamais o mestre deixa a Bandeira entrar em seu recinto sem a reza e nem sair do mesmo
através da mesma prática, como sempre relatou: “A Bandeira está acima do homem e
28
dos seus propósitos, pois ela representa os santos, e sendo assim, cada momento é de
extremo respeito e obrigação”.
3.2 – O Palhaço
A figura que sempre está no centro de discussões severas é a do palhaço, pois
seu significado foge as regras representadas em cada Estado, uma vez que prescreve as
regras. Em alguns lugares, o palhaço não representa um conhecimento profundo
religioso, visto que, crianças fazem este papel sem se preocuparem com a simbologia
existente no Estado. Em meu trabalho de campo, nunca presenciei uma criança na figura
do palhaço, só adultos.
O palhaço da Folia é outro personagem que também precisa dominar os códigos
do fundamento, pois ele é o guardião da Folia. Ele precisa operar com tais
conhecimentos para realizar suas performances corporais e verbais, através de falas
curtas e versos. A apresentação do palhaço dá-se em um período específico em meio às
realizações dos giros da folia. Em geral, após o recebimento da Bandeira pelo devoto
dentro da casa, ocorre a distribuição de comida para os visitantes e, logo em seguida,
depois de todos terem comido, o mestre faz soar seu apito, arrebatando a atenção de
todas as pessoas. É nesse momento, que os palhaços pedem licença para suas chegadas.
Suas apresentações limitam-se à varanda da casa, pois, como o palhaço representa o
perseguidor de Cristo, um soldado de Herodes, e assim, não pode ter contato com a
Bandeira. Eles entoam e rimam os versos, que ora são desenvolvidas por meio do
improviso, ora são baseadas em livretos populares, conhecidos como cordel. Os
palhaços destacam-se entre os demais foliões por ostentar fantasias coloridas e máscaras
que remetem ao grotesco, com seus dentes e chifres animalescos. O fator mais
importante é que o palhaço, necessariamente, tem de dominar os códigos contidos no
fundamento, pois seu lugar liminar (TURNER, 2013) na folia pode colocar tanto ele
quanto os demais foliões em risco (BITTER, 2010; CHAVES, 2009; PEREIRA, 2009).
Quando era menino, em São Gonçalo, tinha medo de quando palhaço passava,
geralmente atrás da bandeira ou no final da folia, pois não compreendia o porquê,
mesmo fora do carnaval, existiam palhaços. Nunca consegui descobrir quem estava por
traz da máscara.
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A farda e a máscara do palhaço destacam-se por não serem guardadas próximas
aos demais objetos da Folia. Enquanto a Bandeira, que é a materialização do santo e
elemento fundador da Folia de Reis, é depositada no altar, a máscara distancia-se dessa
categoria por ser de uso pessoal do devoto que vai se fardar de palhaço. Cáscia Frade
(1997) já destacava o caráter pessoal da indumentária em sua pesquisa. A máscara do
palhaço, geralmente é produzida pelo próprio folião, e sua durabilidade pode variar de
acordo com o material utilizado em sua fabricação. Hoje, a máscara é confeccionada por
encomenda, onde seu custo não é nada barato, podendo ultrapassar até o valor de
quinhentos reais, como relata o mestre Waldecy.
Figura 6 – A roupa do Palhaço.
Os versos da ladainha não são os únicos elementos rituais utilizados para a
proteção dos palhaços. Antes das saídas da Folia da sede, a Bandeira de Reis é passada
pelo corpo dos foliões fardados de brincantes. Neste momento, o único elemento que
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não entra em contato com a bandeira é a máscara. Nas palavras do antropólogo Daniel
Bitter:
Os palhaços são tipos sempre cercados de obrigações, regras erestrições, bem como de prescrições. Quando mascarados, elescostumam ser impedidos de entrar em igrejas ou em outroslugares considerados sagrados, ou de se aproximaremdemasiadamente da bandeira ou de imagens de santos. Elestambém não devem fazer as refeições junto dos foliões.Considera-se, por vezes, perigoso tocar em suas vestes oumáscaras, e o motivo de tanto cuidado e de certo rigor dasregras de poluição se deve aos múltiplos significados a elesatribuídos. Algumas interpretações relacionam o palhaço com oDiabo e com outras imagens negativas. Podem ainda estarrelacionados a Exu e, desse modo, evidencia-se tambémalguma associação com o mundo dos espíritos. Trata-se, afinal,de um pólo simbólico, multivocal, para usar a expressão deTurner (1962). Como propõe o autor, os seres ambíguos sãoindefinidos e posicionados além da estrutura social. Isso ostorna desobrigados a cumprir certas normas sociais, o que oscoloca em estreita relação com os poderes não-sociais ouassociais da vida e da morte (BITTER, 2010, p. 151-152).
As máscaras são objetos ligados ao mundo dos espíritos. Tal caráter mágico faz
com que sejam relacionadas às proibições e restrições, tendo poder de desencadear
indesejadas situações rituais (RADCLIFFE-BROWN, 1973), também interpretadas
como causadoras de perigo (DOUGLAS, 1966). Seus usos fazem com que sejam
concebidas como causadoras de desordem ou de outra ordem (TURNER, 2013),
podendo proporcionar o caos a todos que estão ao seu entorno. Por isso, há a
necessidade de compreender, cumprir e não transgredir as regras contidas no
fundamento.
Dentre os foliões, o palhaço é o primeiro a retirar sua máscara e farda no
momento da entrega da bandeira. Esse evento ocorre ao final da Festa do Arremate, que
simboliza o término das saídas rituais da Bandeira. Quando a última Folia de Reis
visitante retira sua bandeira do altar anfitrião e retorna para suas moradias.
Daniel Bitter identifica tais gestos corporais como pedidos de perdão do
brincante por exercer esse papel ritual: Trata-se, afinal, de um ritual de conversão
religiosa, um batismo simbólico, com efeitos morais. Aí reside precisamente sua
ambivalência simbólica (BITTER, 2010, p. 153).
O palhaço não pode, simplesmente, desrespeitar as proibições rituais por ser
identificado como uma figura transgressora. Se acaso um palhaço comete algum deslize
ritual, por não compreender o corpo de conhecimento contido no fundamento, ele é
31
repreendido por seu mestre ou pelo mestre anfitrião no mesmo momento. O palhaço
defronta-se com um conjunto de obrigações rituais que limitam sua performance e
regulamentam suas práticas, se grotescas ou não. Ele precisa ter o domínio do
fundamento para não colocar em jogo seu prestígio e o de sua folia. Por isso, não é
qualquer pessoa, sem conhecimento, que pode ser palhaço, pois depende, também, de
estudos de rituais e até leituras de livros, e isto relato, pois fui convidado pelo Mestre
Waldecy. O mesmo me mostrou que existem formas perigosas para a realização de tal
trabalho, pois é uma função muito difícil para ser executada de qualquer forma.
Figura 7 – O palhaço sentado antes de se fantasiar.
O mestre, em uma das suas conversas informais, relatou-me que uma vez, na
roça, na estrada, em direção a um sítio, viu o palhaço se afastando diversas vezes do
grupo, e é claro, da Bandeira. Sendo assim, foi chamado a sua atenção inúmeras vezes,
onde o mesmo não se importou. Depois de um tempo, com o grupo se distanciando, os
foliões escutaram muitos gritos e, voltaram devido a notarem a ausência do palhaço. Ao
ser encontrado, o mesmo estava com sua roupa toda rasgada com grande cheiro de
enxofre e, com a presença de uma forte fumaça. Assim o mestre argumentou:
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Não se pode ficar longe da Bandeira em sua função. Assim, ocastigo veio rápido. Brincar com algo tão sério, não se podefazer, pois não conhecemos bem as forças do mal, mas elasexistem. Foi o que aconteceu com você. Espero que isso tenhate colocado na linha e que não se repita, pois se tivesseescutado e não ficasse longe da Bandeira, nada disso teriaacontecido.
A figura do palhaço e suas vestimentas são tão representativas, que até para lavá-
las e tocá-las são feitas rituais e rezas para esta finalidade, por uma experiência passei,
quando estava no barracão, onde a roupa estava na corda e iria tocá-la. Logo fui
advertido pelo mestre que não o fizesse, pois precisaria de conhecimento de causa e ter
as mãos lavadas por aroeira e sal grosso, para afastar os espíritos ruins, e resguardar a
pessoa para que nada acontecesse de mal, onde o obedeci imediatamente.
Figura 8 – Um símbolo muito respeitado – pós morte.
Na substituição do palhaço, uma vez da morte do folião anterior, que tinha esse
papel, percebi algo que foi bastante importante para a construção deste trabalho. Como
observador, notei que no giro de 25 de dezembro de 2017, na preparação do palhaço, o
mesmo não deixou ser fotografado e nem quis falar nada, respeitando tal atitude e
postura do mesmo no evento. Inclusive, este integrante era novo e não o conhecia de
encontros anteriores. Perguntei, então, ao mestre e o mesmo disse que não me
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preocupasse, pois não era nada em relação a minha pessoa, mas a responsabilidade e o
respeito daquele folião em sua função, principalmente, devido ao horário e a caminhada
pelas encruzilhadas.
Capítulo 4 - Modificações culturais na Folia de Reis
4.1 – O choque de gerações, o encontro da tradição e a modernidade
A cultura é dinâmica, como mecanismo adaptativo e cumulativo. A cultura sofre
mudanças. Traços se perdem, outros se adicionam, em velocidades distintas nas
diferentes sociedades. Desta forma, a Folia de Reis vem sofrendo essas modificações,
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principalmente no que tange ao conhecimento sobre tal prática cultural, onde algumas
ainda resistem. Infelizmente, outras deixam de existir e se perdem com o tempo.
Dois mecanismos básicos permitem a mudança cultural: a invenção ou
introdução de novos conceitos, e a difusão de conceitos a partir de outras culturas. Há
também a descoberta, que é um tipo de mudança cultural originado pela revelação de
algo desconhecido pela própria sociedade e que ela decide adaptar.
A mudança acarreta normalmente em resistência. Visto que os aspectos da vida cultural
estão ligados entre si, a alteração mínima de somente um deles pode ocasionar efeitos
em todos os outros. Modificações na maneira de produzir podem, por exemplo,
interferir na construção e transferência de responsabilidades produzidas por um grupo.
O Mestre Waldecy Marcelino mostra claramente, e chama a atenção, para os
componentes de sua folia, a Estrela Nova do Oriente, no bairro Almerinda, em São
Gonçalo, pois a persistência os leva a permanência das atividades do grupo, e sem esta
seria impossível a manutenção de seus trabalhos.
Nos preparativos o mestre sempre está cobrando aos foliões,comprometimento com os seus afazeres, visto que, o númeroreduzido e outras dificuldades, trazem para o grupo prejuízospara a confecção do trabalho final. O mesmo, sempre cobra ohorário e a seriedade. Não permito brincadeiras com algo tãosério. Minha responsabilidade é grande, e não posso perder ofoco, pois sou cobrado e vocês sabem muito bem por quem!
A resistência à mudança representa uma vantagem, no sentido de que somente
modificações realmente proveitosas, e que sejam por isso inevitáveis, serão adotadas
evitando o esforço da sociedade em adaptar, e depois rejeitar um novo conceito. É muito
difícil a aceitação de modificações por um grupo que preserva as tradições. Vejo
claramente, a posição do mestre, pois mesmo com tantos problemas, como a própria luta
contra o alcoolismo, agora curado, continua trabalhando seriamente, cumprindo suas
obrigações com o grupo.
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Figura 9 – O Mestre Waldecy se preparando para o Giro.
O ambiente exerce um papel fundamental sobre as mudanças culturais, embora
não único. Os homens mudam sua maneira de encarar o mundo tanto por contingências
ambientais quanto por transformações da consciência social, principalmente, em relação
a construção de algo que é claramente voltado a manutenção da tradição. Devendo
seguir um modelo que sofre modificações, mas não fogem das práticas voltadas a sua
tradição.
O processo de adaptação de uma cultura às exigências do seu meio ambiente,
existe no momento em que esses são compatíveis ao seu crescimento e não pela sua
extinção. Exige também a interação desse grupo com outros, que lhe são anteriores, mas
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que não fazem com que os mesmos larguem sua base da tradição construída durante
toda a sua história.
A mudança cultural é um fenômeno que se produz intensamente nas atuais
sociedades, de tendência multicultural e cada vez mais acentuada, dada a rapidez do
ritmo em que vive e dos convívios externos a que está sujeita. Ela é o resultado dessa
convivência e a prova do progresso, o qual atesta o carácter não estático das culturas,
que se modificam ao longo do tempo, fazendo a História dos povos. A mudança cultural
começou a fazer-se sentir com mais força, ao mesmo tempo que se geraram numerosos
processos de aculturação, coincidindo com a passagem das estruturas rurais a urbanas e
das estruturas agrárias a industriais. A avultada deslocação de pessoas dos meios menos
tradicionais para os mais tradicionais, que esse fenômeno acarreta, vai alterar o status
quo da sua vida, obrigando-as a desenvolver estratégias de adaptação ao novo meio
social e laboral. Hoje em dia, o fenômeno já é tão corrente que se considera que uma
cultura se torna obsoleta, quando não é capaz de resolver eficazmente os problemas
atuais do seu grupo, caindo na desatualização. Há, por vezes, casos de grupos que, a
partir de certa altura, deixam de ser coesos culturalmente, devido a opções culturais
opostas tomadas pelos seus membros. Uma manifestação cultural nessas condições,
revela-se como algo que não identifica o grupo a que pertence e para resolver essa
situação, só tem uma solução: a conscientização do perigo de desmoronamento que
corre o grupo. Este, terá de procurar alguém que lidere uma mudança cultural capaz de
voltar a torná-lo coeso. Essa mudança terá de passar obrigatoriamente por uma revisão e
uma consciencialização da história do grupo, dando-lhe uma nova orientação das
crenças e dos seus verdadeiros valores. Muito provavelmente, através da criação de
novos rituais ou/e de novas linguagens que reorientem e deem resposta às questões de
identidade do grupo. Se tal não for conseguido, é porque não há uma vontade efetiva de
mantê-lo com essa identidade, não se tendo desenvolvido esforços no sentido de uma
interação grupal geradora de entendimento com vista à renovação cultural, e aí o grupo
deixa de ter os mesmos objetivos, os mesmos valores, sendo o mais certo desfazer-se.
No caso da Folia de Reis, acredito que suas tradições se relacionam diretamente com o
seu dia a dia, sua família, seu emprego, suas conquistas, pois, o modo de obrigação pala
tradição religiosa, supera muitas modificações que são impostas, mas que não perduram
para a ideologia do grupo.
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A mudança cultural é, hoje, um dos campos que mais ocupa a Sociologia e a
antropologia aplicada, porque ela é particularmente evidente em certos meios, tais como
nos processos adaptativos dos imigrantes que partiram de meios rurais e chegaram às
cinturas das grandes cidades. Também acontece nas culturas rurais manifestando um
certo isolamento, mas que vão sofrendo o impacto dos meios de comunicação,
especialmente da televisão. O mesmo se passa na mudança de contexto cultural que vive
o crescente número de estudantes que vai fazer os seus estudos, ou parte deles, para o
estrangeiro. Ocorre ainda nas mudanças que acarretam a adaptação às novas
tecnologias, sobretudo por parte das faixas menos jovens. Sendo assim muitas práticas
são colocadas como não prioritárias nos seus estudos, um com exemplo é a Folia de
Reis, pois existem poucos trabalhos sobre o assunto, e que graças a persistência de
Daniel Bitter, que consegui realizar tal confecção deste, onde suas orientações foram
fundamentais.
O conceito de mudança cultural também se adota em relação ao mundo
tradicional, sempre que alguma cultura esteja a sucumbir por inadaptação às exigências
do mundo atual, tendo de reconverter-se, se quiser salvar-se, para o que terá de utilizar
estratégias de mudança da cultura do grupo, mas sem modificar suas bases culturais.
Vivemos num ritmo crescente das novas tecnologias, entre as transformações
causadas por elas, existem algumas rupturas entre as gerações. As pessoas mais velhas
não entendem as atitudes dos jovens de hoje. Estes, por sua vez, consideram os mais
velhos desconectados com a realidade do mundo atual. Dentro da Folia de Reis essa
realidade se torna um pouco diferente, pois o mestre é uma figura de destaque e é
reconhecido como uma espécie de guardião da memória.
Esse é o dilema de nossa famílias. Estamos numa época em que várias gerações
convivem ao mesmo tempo e no mesmo ambiente. Isso acontece no meio profissional,
nas universidades, nas igrejas e em casa. A maior expectativa de vida faz com que
experientes pelo tempo de vida fiquem ativos por mais tempo. Assim, aumenta o tempo
de convivência com os mais novos que possuem uma menor experiência e quer
aprender. Surge, então, o conflito de gerações.
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Figura 10 – Uma nova geração na Folia de Reis.
É comum cobrar das pessoas que o cercam, o respeito e o carinho com o seu
próximo, assim as atividades da Folia estão permeadas, isso em uma singularidade e
persistência da produção do grupo, que mesmo devida a tantas transformações e
dificuldades, nunca deixa de exercer suas atividades dentro de um contexto
completamente hierarquizado.
Poderíamos citar muitos exemplos para enfatizar que há um novo cenário. As
fórmulas antigas de relacionamento não funcionam mais. Definir os novos integrantes
com idade menos avançada como preguiçosos e alienados é muito simplista e não
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resolve, pois a cultura é diferenciada dependendo do grupo que participa, uma vez que
na folia até percebemos algumas modificações, mas nada tão significativa para mudar
suas bases tradicionais.
Não há como ficar passivo e indiferente diante dessa realidade. Em algum
momento os mais experientes terão de se envolver com as tendências ou serão
envolvidos por elas. Não há mais como viver num mundo sem tecnologia e internet.
Desde sua conta bancária, comprar no supermercado, estacionar o carro, comunicar-se
com alguém por celular, e-mail, redes sociais, até acender um fogão, nosso cotidiano
está envolvido pelo mundo virtual. O adolescente de hoje já nasceu dentro dessa
realidade. É preciso conhecer e viver no mundo em que vive o seu grupo que sofreu
modificações. Mundo em que, aliás, que eles também vivem. Um bom exemplo é o
próprio mestre Waldecy, que possui celular e sabe muito bem fazer muitas coisas novas
de nossos dias.
O fato de as gerações conviverem num mesmo ambiente, pode contribuir para
amenizar a distância entre elas e as dificuldades que cada uma possui, pois é essencial
para a existência do grupo e a manutenção de sua cultura tradicional.
As novas gerações possuem muita informação, mas pouca profundidade.
Precisam adquirir outro tipo de conhecimento, o pensamento crítico-reflexivo, algo em
que a geração anterior pôde contribuir devido a sua vivência. Os jovens, por terem fácil
acesso a todo tipo de informação e domínio da tecnologia, não podem desconsiderar o
conhecimento dos mais experientes, como é o caso do mestre, pois o respeito a sua
pessoa é muito grande pelo cargo que ocupa frente ao grupo.
Os mais experientes, por sua vez, precisam ser humildes e aceitarem a
necessidade de se adaptarem à nova realidade, sendo menos resistentes e mais flexíveis
ao novo e ao diferente. Na maioria das vezes, é muito difícil poder reverter algo não
aceito pelo mestre, que não costuma voltar atrás em algumas práticas existentes.
Os fundadores precisam dos mais jovens, de sua energia, motivação,
criatividade, informalidade, flexibilidade, rapidez, sua capacidade de fazer várias coisas
ao mesmo tempo, sua visão de um mundo sem fronteiras, globalizado e do seu bom
trânsito entre minorias.
40
É fato que os mais jovens precisam dos mais experientes, de sua experiência,
vivência, maturidade, conhecimento, reflexão, bom conselho, exemplo, direção, esforço
e resultados comprovados. Principalmente pela função que o mesmo ocupa como líder
de um grupo que permeia o tempo.
Sabemos que é inevitável o choque de gerações, mas percebi, ao longo do
trabalho, que a simbologia está acima de tal fato, pois dentro desse quadro, a Folia de
Reis torna-se um instrumento de propagação do elemento cultural e tradicional. O
respeito é linear frente aos seus membros, que mantêm um caráter de extrema coerção
diagnosticado pela referência ao líder, ou seja, o mestre, que a todo o momento é a
figura de controle e do sucesso da produção do grupo. Infelizmente, muitos deixaram de
existir devido ao falecimento de seu mestre. Inclusive, na folia de reis do mestre
Waldecy, existem membros que vieram de outras folias, incluindo filhos de mestres.
Podemos notar, nesse momento, que a tradição se torna singular e de caráter crucial
frente a existência do grupo.
Neste momento, a presença da força no elemento organizador de cada folia é
visto como uma espécie de “pessoa a ser seguida”, onde tudo o que acontece está
voltado ao seu controle, desde a organização dos trabalhos até o final dos mesmos, com
as visitações.
As visitações são a realização da prática do ritual que reproduz e insere os
foliões no tempo cosmológico dos Reis Magos. Ao fazê-las, os devotos entoam as
profecias deixadas pelos Santos Reis. Foram esses santos, que incumbiram os devotos
de continuarem o seu trabalho. Infelizmente, estes estão sendo reduzidos devido à falta
de espaço, e, segundo o mestre Waldecy, muitos estão se convertendo ao protestantismo,
o que dificulta as tradicionais visitações.
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Figura 11 – Instrumentos preparados para o Giro.
As casas que serão visitadas, são negociadas entre os anfitriões dos Santos Reis
e os foliões. Geralmente, os devotos vão ao galpão do mestre Waldecy conversar sobre a
possibilidade de recebê-los naquele ano. Desta forma, as visitações estabelecem uma
rede de sociabilidade que abrange foliões, santos, devotos, familiares, amigos e
vizinhos. Segundo Carlos Rodrigues Brandão:
A Folia não gira para cantar louvores ao Menino Jesus, nempara reconstruir, como um auto piedoso igual ao dasPastorinhas que existem no Nordeste e a que eu assisti duasvezes em Pirenópolis (Goiás), a história do Natal de Jesus. Masela tampouco gira para arrecadar, em 13 ou em 7 dias, dinheirodado por alguns para uma festa comunitária de todos. O que aFolia faz é proclamar e responder por um tempo ritual diferentede trânsito entre homens e dádivas (BRANDÃO, 1981, p. 32).
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Figura 12 – O Contra Mestre antes do Giro.
A estrutura narrativa da Folia de Reis, aproxima-se do que Fredrik Barth chama
de corpus de conhecimento:
What is constructed as a corpus of knowledge by these meanscreates a characteristic way of knowing that might be describedin externalist language as poetic – a visual symphony thatrepresents the ancestrally granted mystery of growth assomething that covertly permeates nature and createsmankind‘s daily food (BARTH, 2000b, p. 5).
O que é construído como um corpus de conhecimento por essesmeios cria uma forma característica de saber que pode serdescrita em linguagem externalist como poética – uma sinfoniavisual que representa o mistério ancestralmente concedido decrescimento como algo tão secretamente permeia a natureza ecria alimento diário da humanidade (BARTH, 2000b, p. 5).
Assim como nas tradições de conhecimento de Barth, o fundamento é
perpassado pelas três características: o corpus substantivo, que seria o conteúdo
propriamente dito; os meios comunicativos, que estão ligados à forma de transmissão,
visto que nas folias a tradição é passada de geração a geração. Com o passar dos anos,
vem sofrendo grandes modificações.
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Figura 13 – O Sanfoneiro (centro) e o Contra Mestre (direita).
Essa missão passada de geração, é a responsabilidade que os foliões tem de levar
a Bandeira/Santos Reis à casa dos devotos, anunciando o nascimento do Menino Jesus.
A Bandeira de Reis é o símbolo máximo do grupo; ela é o santo, e seu nome gera
identidade para os devotos. Segundo Bitter:
[…] a Bandeira, assim como outros objetos que assumemcaracterísticas similares, tende a ser percebida como sendocapaz de mediar, de forma orgânica, o plano dos homens notempo presente com o plano supramundano num tempo-espaçode outra qualidade. Nesta perspectiva a bandeira vemrepresentar o irrepresentável, tornar conhecido o desconhecido,acessível o inacessível ou ainda tornar visível o invisível(BITTER, 2010, p. 110).
Em minha pesquisa de campo, pude perceber um grande diferencial, que vem
mudando de ano em ano, não só no número de pessoas, mas nas substituições que são
feitas para a continuidade dos trabalhos. Foi constatado que até na representação dos
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objetos e das festas, os significados vão se transformando e se adaptando a novas
formas.
Figura 14 – Mestre e Contra Mestre prontos para o Giro.
Este elemento foi percebido, no último giro que participei no ano de 2017, pois o
mestre estava muito nervoso com medo da falta de foliões. O tempo passava e nada de
chegar as pessoas os participantes. Foi neste momento, que o sanfoneiro do grupo
chamou a atenção:
A hora está próxima e já são quase meia noite. Temos quecumprir com nossas obrigações, pois poderemos ser castigados.Mesmo com o número que tiver, vamos nos arrumar e sair nohorário certo. Muitos tem problemas de deslocamento e logoestarão presentes. Mas não podemos é ficar parado vendo otempo passar sem preparar as nossas vestimentas einstrumentos, pois iremos subir a Chumbada (São Gonçalo), eos traficantes cobram o horário certo para não subirmos tarde enão corrermos risco de vida, pois o respeito no passado eramaior, isto é, eles nem saíam nas ruas quando o giro era feitonaquele lugar, onde o medo não era nosso, mas sim deles.
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As dificuldades cada vez mais aumentam, principalmente pela falta de
infraestrutura da própria cidade, como transporte, segurança pública, investimento para
a cultura popular, o que faz com que tal prática não seja prioritária para o novo
momento vivido em detrimento de gasto do Poder Público, que não tem como
prioridade o incentivo a continuidade da folia.
Figura 15 – O Grupo de foliões preparados para o Giro.
Infelizmente, é muito triste quando você presente em um trabalho de campo, vê
as dificuldades frente a realidade dos foliões em sua saída, pois o transporte não é o
único problema para o deslocamento dos componentes, mas sim fatores sociais ligados,
muito das vezes, até nos afazeres familiares, pois nem todos em certas datas, estão
disponíveis para realizarem os eventos, principalmente no referente ao Natal.
Sendo assim, a construção de um modelo ideal para atender ao grupo de foliões
ao todo, é algo de impossível de se realizar nos dias atuais. Isso ocorre devido à falta de
recursos, que é a mola mestra para a finalização de todos os trabalhos.
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Foto 16 – O uniforme para fazer o Giro.
Em resumo, pude perceber que a realização dos giros da folia de reis em meio ao
ambiente urbano não depende apenas dos foliões e devotos que receberão a Bandeira
em suas casas. A dificuldade de locomoção na cidade é um fator crucial para a
realização da missão sagrada que impede, muita das vezes, o mestre e seus foliões de
estenderem os laços de sociabilidade para outros atores, tais como os motoristas de
ônibus e vans de aluguel. Além disso, o que pudemos ver é que a maior parte dos
foliões, possuem idade avançada e não podem mais fazer o que faziam, quando eram
jovens. A realização do giro é o que é mais cobrado pelos filhos do Mestre Waldecy,
pois este, é iniciado no dia 24 de dezembro e só termina no dia 06 de janeiro, alguns
indo até dia 20, em comemoração ao martírio de São Sebastião, quando foi fundada a
cidade do Rio de Janeiro. Vale ressaltar que os percursos vão além do município, uma
vez que muitas visitas são feitas em Niterói e em outras localidades.
4.2 - A relação familiar: fortalecimento ou enfraquecimento?
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O mestre de folia Waldecy irá completar 80 anos de idade, em 2018, e em uma
das entrevistas, em meu trabalho de campo, sobre a folia de reis, do bairro Almerinda,
em São Gonçalo, relatou muitas coisas interessantes, o que me ajudou, e em muito, em
minha etnografia sobre o grupo estudado.
O que mais me chamou a atenção nessa pesquisa de campo, foi a construção de
uma etnografia na forma de estruturar um modelo, onde há um embate na própria
pesquisa, o campo e o homem, o qual devemos analisar as informações catalogadas para
a execução do trabalho. E neste, é muito claro, a relação familiar entre os membros do
grupo e o modelo social construído, pois a família é algo de extrema importância,
mesmo não sendo parte direta dos foliões que realizam seus múltiplos trabalhos.
Foto 17 – Um encontro de Mestres: Waldecy a esquerda e Fumaça a direita.
Um bom exemplo merecedor de destaque, é o do senhor Waldecy, que é o
Mestre de Folia do bairro Almerinda, nasceu em São Fidélis, tem seis filhos, sendo uma
mulher e cinco homens. Infelizmente, não tive nem a oportunidade de fazer uma
entrevista com eles, pois os mesmos não participam da Folia e nem seus netos. Então,
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este fato pode ser encarado como uma forma negativa de dar continuidade aos trabalhos
do mestre em relação aos seus familiares diretos.
Para nossa tristeza, um outro exemplo é o do grupo de Folia do Engenho do
Roçado, sobre o comando do Mestre Caetano, que encerrou suas atividades em São
Gonçalo, pois sem sucessão para a execução dos trabalhos, um grupo partiu para
Friburgo, iniciando um novo processo. Podemos perceber, nesse sentido, que ocorre um
declínio, frente a essa expressão da cultura popular, pois existe um grande medo de
grande parte dos integrantes, das Folias, que destacam que somente os símbolos e
imagens irão resistir a esse contínuo processo de desgaste dos grupos de Folias de Reis
que ainda resistem. Até quando isso será possível? Destaca um antigo folião, pois na
própria referência familiar, o enfraquecimento pela continuidade dos trabalhos é visível.
Sendo assim, fica muito difícil os mais idosos e experientes arcarem com todo o
conjunto de feitos para a execução da apresentação que o grupo realiza nas datas
festivas.
Figura 18 – O Contra Mestre e a porta bandeira.
Na verdade, a cultura, que realmente está viva e presente, nestas atividades,
tendem a exaustão e fechamento de seus trabalhos. Eu mesmo, já acompanho esses
trabalhos por mais de vinte anos, e fico muito preocupado com o que vejo, pois um
grande exemplo vivido é o número de pessoas nas Festas de Arremate, momento áureo e
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de muita emoção na troca das bandeiras, um ritual de muito respeito e devoção. A cada
ano que passa, vejo um número muito reduzido de pessoas presentes na ocasião, pois
cheguei a presenciar uma média de três mil pessoas nas festas, e hoje, não vejo mais do
que duzentas, onde muitas famílias, por inúmeros motivos, não participam mais. O pior
de tudo, que não aparecem novas pessoas para substituí-los, trazendo uma grande
deficiência em todos os sentidos no planejamento, execução e finalização do trabalho.
Figura 19 – O tocador de bumbo do Giro.
O respeito entre os foliões é algo majestoso e obtendo informações, com o filho
do mestre, que pediu para não ser identificado, tem uma grande preocupação com seu
pai, pois na sua idade, algumas atividades devem ser cortadas do seu hábito. “Não
consigo fazer com que meu pai diminua o seu ritmo, pois para ele, a folia é parte de sua
vida. E infelizmente, as ajudas cada vez mais estão reduzindo, tanto do público como do
privado, onde muitas das vezes tem saído dinheiro do bolso dos próprios foliões para a
execução dos trabalhos. Assim sendo, o número de foliões, também, estão reduzindo,
pois a maioria não tem condição financeira para contribuírem de forma material. Esse é
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um momento de muita tristeza, pois não quero ver meu pai passando mal como vi em
muitas das vezes, ele não tem idade para isso, se pelo menos tivesse alguém para ficar à
disposição dele para ele não precisar caminhar longos percursos pedindo ajuda seria
uma coisa que me deixaria menos preocupado”.
Figura 20 – Uma ilustre visita ao barracão com Mestre Fumaça.
Desta forma, podemos perceber, claramente, que na participação junto ao grupo,
no trabalho de campo realizado, a convivência com o mesmo norteou alguns elementos
fundamentais, que são de grande significado para o fortalecimento e o enfraquecimento
do grupo. São vários os traços visíveis que as famílias estão totalmente vivenciando
outros caminhos, o que faz com que a continuidade seja colocada muito distante da
construção da vontade dos mestres, em continuar os seus trabalhos com pessoas capazes
de realizarem suas tarefas, de forma que não prejudique a execução de todo o
cronograma planejado, que já vem sendo feito por muito tempo, e na maior parte das
vezes, passada de geração a geração, por membros das famílias realizadoras de todo o
conjunto praticado pelos foliões.
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Figura 21 – O tocador de tarol do Giro.
No campo, verifiquei que estava equivocado no que pensava sobre o trabalho
dos integrantes da Folia de Reis, uma vez que tinha em mente, que era um grande
número de pessoas que trabalhavam em conjunto, para a realização dos grandiosos
eventos que são planejados por um calendário anual, onde seria trabalhado somente na
época das festas. No entanto, estava enganado, pois os trabalhos são realizados o ano
todo. E sem sombra de dúvidas, muitos finais de semana e feriados, são aproveitados
pelos foliões para fazerem seus acertos e treinarem suas cantigas e a utilização de
instrumentos e pessoal para manejá-los. Também foi notado, no campo, que algumas
famílias ainda resistem para que tudo dê certo, e jamais problemas atrapalharão suas
atividades, que a cada ano, mesmo com a falta de ajuda, continuam a trazer muita
alegria para os que ainda acreditam e respeitam a tradição da Folia de Reis.
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Considerações Finais
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Para o leitor que dedicou seu tempo a este trabalho, quero deixar uma última
reflexão: com base nesta monografia de final de curso de graduação em Antropologia, a
Folia de Reis sobreviverá ao embate: tradição e modernidade.
Assim como a realização do Giro, que se inicia com a saída da Bandeira da sede
e se encerra com a entrega da bandeira na festa do arremate, quero encerrar meu
trabalho com o questionamento inicial. As Folias de Reis não se limitam ao rótulo de
práticas religiosas remanescentes do catolicismo colonial, ou manifestações de festejos
devocionais rurais que sobrevivem no meio urbano, mas sim, através do referencial
ligado a uma tradição que rompe toda uma imposição presente nas relações sociais que,
transmigram algo de colocado como sendo construído para tal, mas não construído
como elemento norteador de uma crença pautada no respeito e na necessidade de
sobreviver ao tempo.
Para a construção deste trabalho, o recorte escolhido foi a relação entre a
tradição e a modernidade entre os grupos de Folias de Reis no município de São
Gonçalo, no estado do Rio de Janeiro. Em ambos os momentos, há uma inter-relação de
práticas envolvendo foliões, devotos e santos no ambiente urbano e rural. Como busquei
apresentar, tanto para as organizações dos giros quanto das festas, há o desenvolvimento
de redes de alianças através de laços de sociabilidade com os vizinhos e familiares para
as saídas da Bandeira Estrela Nova do Oriente. Os pedidos de licença para a entrada dos
santos na residência do devoto são permeados por um conjunto de regras de etiqueta
operado pelo mestre, contramestre, outros integrantes do grupo e simpatizantes pela
cultura popular e religiosa. Os palhaços também precisam compreender tais códigos
para não realizarem nenhuma transgressão, ocasionando alguma indesejável situação
ritual para os foliões, pois os mesmos, segundo o Mestre Waldecy, que até me convidou
para o cargo que vagou com a morte do folião que fazia o papel do palhaço, mas
alertou-me que não seria tão simples, pois além de estudar o livro, não poderia entregar
esta responsabilidade, antes de seu tempo previsto, isto é, seu tempo obrigatório no
cargo ocupado.
As festas do arremate igualmente figuram como um terreno fértil para o
desenvolvimento deste trabalho. Nelas, pude observar e participar nas performances
religiosas realizadas pelas folias e palhaços que visam à devoção aos santos, mas
também buscam a conquista de prestígio, verificando que existe uma disputa entre as
folias no que tange as melhores apresentações, ou seja, os melhores destaques. Apontei
que a culminância da celebração revela, ainda, o circuito de dádivas entre os devotos da
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morada e os santos, operado através das doações de comida e donativos que corroboram
para o seu desenvolvimento. Sabemos que nem todos os grupos recebem a mesma
quantidade de donativos, dependendo muito dos locais que visitam, dos padrinhos que
possuem e em sua relação com o Poder Público e Privado, ou seja, na busca por
patrocinadores. No tocante a esta questão, podemos compreender que não se pode
pensar nas realizações do arremate sem a análise dos laços sociais e religiosos
realizados no período dos giros e na logística para a concretização dos festejos.
Na realização dos trabalhos de campo, percebi o quanto estes grupos rituais se
esforçam para construir e manter laços de sociabilidade e solidariedade entre devotos,
vizinhos, familiares, amigos, estruturando uma rede de relações sociais, pois são estes
os responsáveis pela realização de todo o processo, desde o projeto de execução até a
concretização do trabalho final.
Na verdade esses laços são essenciais para a realização da Festa do Arremate e
dos giros da folia em meio à complexidade no município de São Gonçalo, que sofre
com os precários serviços de transporte público, saúde, educação, segurança pública e
outros. E foi através dessa perspectiva, que foi desenvolvido este trabalho etnográfico,
apontando novas possibilidades para a conservação dessa cultura popular, que já não
existe em muitos outros municípios, e que singulariza a possibilidade da continuidade
desses grupos, e a manutenção, dos mesmos, com maior cuidado pelo Poder Público.
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