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Fernando Gaia Filho

As Árias de Amor e de Saudades

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Título: As Árias de Amor e de SaudadesAutor: Fernando Gaia FilhoConcepção: Ex-Ricardo dePinho TeixeiraDesign: Bruno GomesCapa: Bruno Gomes

1ª Edição: Janeiro de 2013ISBN:Depósito Legal:

www.poesiafaclube.com

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PREFÁCIO

Este livro foi feito para ser lido em uma alvorada ou um dia de chuva. Cada verso deve ser lido como se fossem danças diferentes. Alguns se valem de um tango; outros, de uma valsa.

Acrescentando, aqui não existe uma ordem. Você poderá abrir o livro na página que quiser. Mas, se preferir seguir uma ordem, procure lê-lo com cuidado: talvez você encontre alguma história entre as linhas tênues que se unem imaginariamente.

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À musa que inspirou todo amor e toda a saudade que lapidaram meus versos,

dedico este livro: Aline.

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“Ao primeiro encontro, às primeiras noites mal dormidas e a toda história que prosseguiu,

dedico as memórias de meus sentimentos”.

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Alguém me trouxe vinho esta tarde. Embalo a taça devagar, querendo que ela dance em minha mão. Aspiro lentamente o aroma que embriaga meus sentidos. Eis o pôr do sol. Atrás de mim caminha uma voz que me convida para longe, rumo ao horizonte alaranjado. A voz não caminha sozinha. Com ela, uma manceba ensaiada pelo vento a acompanha. Toda a mobília está fora do lugar. Meus cotovelos escorregam vagarosamente sobre o parapeito. Um toque e um sorriso. Nada mais é preciso.

Eu pertenço ao que meus olhos podem tocar. E isso acontece sempre, em qualquer lugar.

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Estamos juntos como a abelha que se prende a uma flor, para colher seu néctar e dedicar sua vida ao que é doce. Foi assim que você me envolveu. Entre os mantos noturnos, nos deleitamos um sobre os sorrisos do outro, e deixamos os relógios em outra estação. Brindamos nossos corpos ao sabor de nossas vidas. E como numa cerimônia, invocamos a garça e o leão, e depois a lebre e o cavalo, e depois a águia e o urso, e as coisas que moram fora de nossa alcova estão desmoronando, pilastra por pilastra. E já não sei se sou pergaminho ou se sou traça.

Tudo o que acontecer agora, permanecerá pela eternidade.

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Nas vastas horas onde o mundo não é mais mundo e o tempo não é mais uma medida, um alarme soa. Não sei se são seis ou se são sete. Os ponteiros sempre voltam em meio ao “até breve” que o coração sente como um “adeus”. Eu seguro você com medo de nunca mais vê-la. Um beijo arde em minha boca. Até breve... Ou adeus.

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Mais um dia. Mais três dias. E as horas que vinham agora estão se esgotando. Mais dois dias, mais meio dia. E somo todas as horas para lembrar-me apenas dos segundos.

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Uma carta chegou até mim. Quando me achei tão próximo, você se foi. Eu nunca desejei o teu adeus, e jamais acreditei que fosse eterno enquanto durasse. Minha vida estava resumida em um dia. Esse dia desmoronou. Como hei de respirar agora? Para onde você foi? Por que não me deu uma chance? Aquilo não era real?

Ergue-se a lua minguante. E prostro-me em meio a um quarto escuro.

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Aproxima-se o desespero. Não sei bem o que sinto, só sei que em nada eu devo tocar. Tudo que eu queria sentir para me afastar de você, me traz a luz de seus olhos enquanto era banhada pelo sol que procurava um bom lugar para morar. Eu não sei ver o futuro. Eu não sei viver de esperanças. Eu quero esquecer que sei amar. Eu quero você de volta. Quero morrer em algum lugar.

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Vinde até mim, ó imperdoável e poderosa morte. Percorri colinas e restingas para encontrar-lhe. Abrace teu filho que treme no peito afável. A luz corroeu minha tez e nenhuma babosa cuidou de minhas feridas. Tento convencer minhas chagas que minha carne já não tem sabor. Perdi o que tanto amava. Não me encontro em lugar nenhum.

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Aqui estão os meus olhos. Enterro-os e me regozijo de tê-los perdido. Leve-os, pois não preciso mais dos traços míopes que neles haviam. Por eles já se passaram extensos rios que tantas e tantas noites naufragaram meus sonhos, como uma nau sem capitão.

Ando tateando no incerto.

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Da hora pequena que cabe entre o cinco e o dez, para outra hora que não existe nessa roda chamada vida. As horas. Passam e não curam. Apenas passam, passam...

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Qual é a distância que separa você de mim, quando tento transformá-la em apenas um sonho? Restar-me-ia seu último adeus, mas não o encontro. Desejaria acreditar que tivesse sido eterno enquanto durou, e ter apenas aquele dia em que o mundo desmoronou diante de sua beleza. Mas ainda estou vivo, e as lembranças daquele dia dentro de nossa alcova não me permitem seguir adiante. Começa agora a minha grande solidão.

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Solidão; a que devo a honra de recebê-la novamente em meus restos mortais? Você é a única que me resta quando as noites se tornam frias e a lua se torna pesada. Em seu silêncio, trabalha com esmero em minhas chagas, mas a dor que sinto é forte. Cuide de mim quando eu perder minhas esperanças novamente. Ó, como é árdua a arte de esperar...

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E dentro daquele lugar que já não era apenas meu, encontrei-a através da parede, embalada na melodia onde tudo acontece em qualquer lugar. Das mil rosas que calculei com meus olhos fugidios e temerosos, achei uma que tranquilizou meus suspiros antes de tocar a maçaneta. Nela, vi você sorrindo, e este foi o único ensejo que gravitou minha mão e puxou meu corpo para dentro do nosso pequeno lar.

Em seus olhos e sua voz, escutei todos os arcanjos cantarem uma ópera ministrada pela luz do sol que lhe tocava e que trazia você em minha direção. O dia que o mundo havia desmoronado havia voltado. Todos os segundos. Todas as horas. O que eu poderia ter feito, senão chorar?

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Lenta é a queda da pétala, que embalada no ar, se move morosamente nos braços invisíveis que a conduzem para o seu repouso na terra, onde tudo nasce e tudo cresce. Seu cair é tão silencioso quanto o soar dos longínquos sinos da igreja que acolhe os fiéis bem aventurados, que se perdem durante a ciranda das crianças. Eu nunca havia percebido que a morte era tão bela.

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Todas as coisas estão mortas. Árvores, prédios, ruas, praças, pessoas... E todos morreram juntos e em cadeia. Não, não basta contemplar. Todas as belas coisas se calaram. E não se pode mais escutá-las se não puder morrer junto com elas.

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Pela cálida noite que me convidou para um café, chega a chuva. Vem serena, mansa, ganhando espaço entre os sons que minha janela intermeia. Gotas que têm vida e aroma. Fácil é para o olfato reconhecer o perfume do chão que é lavado. Chuva que prossegue trépida, afobada, formando uma cascata que banha as eiras próximas ao meu quarto.

Doce é a garota que chega de surpresa e se silencia aos poucos, como se precisasse das saudades dos que a escutam. Vai-se como se vão os atores de uma ópera que esperam o baixar das cortinas. Minha canção de ninar...

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Todas as tardes eram díspares. Nunca o sol era o mesmo. E minha imaginação me colocava dentro de um mundo que era presente e eu amava estar presente para ele. Minha boca se deleitava com o vento forte, que esvoaçavam meus cabelos enquanto a ladeira de minha casa acabava nos rangidos do freio da minha bicicleta. As jabuticabas amadureciam em meus olhos famintos, e o gosto se adocicava ainda mais caso a vontade fosse maior.

O dia e a noite eram um só corpo. Cada um era apenas um ator diferente dentro do espetáculo do universo. Quantas e quantas vezes não sonhei com as noites natalinas, mas logo em seguida ansiava pelo dia seguinte, como quem não dorme; e espera pela chegada da nau que navegará pela manhã.

Meus melhores brinquedos eram tão simples que os tratava como se fossem irmãos. Ah, como era bom ser criança...

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Havia um príncipe e um castelo. Sua alma era boa. Seu castelo; cheio de gente. Um dia o rei morreu. O príncipe recolheu seus vastos olhos para dentro do quarto daquele que um dia governou tudo. Tudo dentro se tornara pequeno demais. Tudo fora se tornara grande demais.

Havia um príncipe e um castelo. Ele tinha uma alma. O castelo estava empoeirado. Todos que lá moravam começavam a deixar o preto dentro dos armários. A vida aos poucos voltava ao seu normal. Mas o castelo havia diminuído. Ninguém sabia o motivo.

Havia um príncipe e um castelo. Existia uma alma. Certo dia, a rainha morreu. O preto retornara aos olhares e às vestes. O príncipe se encolhia dentro de sua armadura frágil. As noites se confundiam com os dias, e tudo ficara sem rumo. O início desposou o fim. Já não era possível mais saber quem era quem. O príncipe tentou permanecer no castelo. Tudo dentro se tornara grande e escuro. Não existia nada do lado de fora.

Havia um príncipe e um castelo. Seu coração virara gelo. Seus olhos se fecharam para tudo e para todos. Ninguém sabia o motivo.

Havia um príncipe. E um castelo. O príncipe resolvera se fingir de porta-estandarte e para a batalha seguiu. Longínquos gritos ressoavam pelas colinas, e um som de trombeta alertava os perigos. O porta-estandarte se viu dentro de uma emboscada. Lanças e espadas dançavam em frente aos olhos, banhadas de uma veste líquida e rubra que incandescia a face que cobria. Mas ele não morreu. Foi seu pior castigo naquele momento.

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Em meio a relva, seus olhos encontraram uma rosa. E o príncipe acolheu todas suas feridas e as deixou doer. Não adiantava pedir. A morte não vinha. Mas existia uma rosa diante de seus olhos. Uma rosa... Uma... Um...

Havia um príncipe e um castelo. Tudo que restara ao príncipe era seu castelo deixado há milhas e milhas distantes. Seu grande e sólido castelo. Era tão sólido que passou a se chamar Solidão.

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Sinto sua falta, minha amada. Sinto falta dos seus beijos e seus sorrisos ao entardecer. Sinto falta de acordar ao seu lado e sentir o cheiro dos seus cabelos que invadiram meu rosto durante a noite. Sinto falta da sua pele morena e do seu jeito tão gracioso quando se maquia. Sinto falta do seu sotaque cantado que faz da sua voz um coral celeste para meus ouvidos. Sinto falta do seu sorriso de menina e seu olhar e mulher.

Sinto sua falta, minha amada. Sinto sua falta. Sinto. Falta minha amada.

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Vontade de voar. Por aí. Descalço e solto. Voar de olhos fechados e cabelos compridos. Voar devagar por entre as ruas e os parques. Talvez eu até encontre um vale ou uma campina.

E quero ver tudo em detalhes. As gotas de chuva que percorrem a vidraça e deixam um pouco de si para trás. Novas gotinhas que se unirão a outras e que também deixarão um pouco de si para trás...

Assim, eu não irei muito longe. Preciso apreciar a distância antes de continuar. Mas estou tão inerte... Aonde foi que eu me perdi?

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Valha-me como a brisa primaverilEstes versos que lhe proclamo.E se um dia sentires que sua alma aperta seu espírito,Imploro para que receba bem minhas palavras.

Compreendi que ferir está em sua natureza,Mas é você quem decide fechar os grilhões.Você é a metade de minha alma;a metade que não cabe dentro de mim.

Se for dádiva esperar por você,Grandes dons desenvolvi por todos esses anos.Se precisasse, esperaria por mais mil anos,E se não fossem suficientes,Paciência teria para mais mil.

Abram os véus de sua alcovaDeixe-me viver junto de seu mundo sem janelas.O ar que nos circunda embala-nos em nosso calor,e dentro de você reside o universo.Basta-me olhar em seus olhos, e verei a reluzente luz da lua pela manhã;as estrelas vespertinase o fulgente sol noturno,pois contigo toda a lógica da vidacabe dentro de um ósculo.

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O branco do seu vestido não é o mesmo branco que vi há tão pouco tempo. O branco que imaginei já não é mais o mesmo branco de agora. O sol que toca os móveis e a cortina não é o mesmo sol que resplandece lá fora.

É incrível como o mundo se transforma dentro de uma sala.

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Fuja. Fuja para algum lugar que eu não o encontre. Vá para algum vale ou para algum país distante. Suas dores lhe tomaram muito tempo. Fuja da vida e de si mesmo. Pelo menos por alguns instantes.

Algum dia, um bem distante, quero ver você de vestes azuis e saber que não será mais ferido. Que o nosso reencontro seja tão doce quanto às letras de sua melodia.

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Posso ficar chateado? Não. Posso ser fraco de vez em quando? Não. Posso ser compreendido? Não. Posso ficar com raiva? Não. Posso sofrer? Não. Tudo bem; restou-me o silêncio.

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Ó deus, o que seria de você sem mim? Não haveria ninguém para contemplar suas maravilhas e nem para uma conversa durante o silêncio de um dia nublado. Quero tanto chegar até seu canto escuro e pequeno, mas tenho medo do que vou sentir.

Olhe comigo todas as coisas ao meu redor. Não sei por onde começar. Ó deus, o que seria de você se eu desistisse de lhe procurar?

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Mesmo fatigado e com sono, como era bom sair de dentro daquele espaço minúsculo e poder me sentir no meio do nada por alguns minutos. Naqueles instantes, esquecia-me das horas e dos pés dormentes. O café que embaçava meus óculos servia apenas para dar algum sabor à boca seca. As comidas pareciam ter outros sabores em lugares distantes.

Naqueles breves momentos, a melhor coisa que acontecia era eu ser tratado apenas como mais um dentre tantos outros que passam e se vão.

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Abriram-se meus olhos pela manhã. E toda aquela densa escuridão agora parecia pequena demais para todas as coisas que estavam ali escondidas. O medo já não era mais medo e houve um silêncio perante a revelação. E pensar que todo aquele pesadelo foi por causa de um dia preguiçoso...

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Gosto forte este que flui da sua pele. Imprime em meus lábios o sabor das noites pelas quais você esteve ausente. Todo o gosto de uma saudade. Todo o gosto de matar a saudade. Tem gosto de silêncio.

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Após o meio-dia, tudo vira uma. Uma hora, você se vai. Uma hora, há de voltar. Sobrando uma tarde para gastar.

Após a meia-noite, tudo vira um. Um olhar que esbarra no seu. Uma lembrança do meio-dia. Um desejo de você. De reencontrar.

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Ao meu redor estavam uma mãe e uma filha. Diante de tanta confusão dos meus dias de viagem, eu havia me esquecido que as crianças admiram seus pais. Os ônibus não são lugares pensados para nenhuma criança. Mesmo assim, existe algo mágico naquele corredor de ferro que atravessa morros e avenidas.

Como devia ser aconchegante aquela mão que impedia a pequena de cair, acalmando o peito trépido que não achava nada familiar a não ser a mão que a segurava.

Vendo-as, percebi o quão importante é uma mãe usar perfume com frequência. São nesses momentos despercebidos que as sensações guardam as melhores memórias de nossa infância. Algo para se admirar.

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Das maravilhas que surgiram daquele mundo desconhecido,Pouco sobrou da luz e o sorriso.Se eu morresse, o que seria da rosa que você virou?Se eu me curvasse diante do desespero, o que sobraria das canções que lhe fiz?De nada me adianta tudo isso;Estar entre a calma e a desesperança,Entre a chuva e o sol,A árvore e a lápide,Minha chegada e a sua despedida.Há uma voz que me diz para não temer,Mas existe outra que me envia para a pressa e para um futuro vazio.A quem devo ouvir, se meus lamentos são por você?

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Você não vê? Não vê as cores que estão ao seu redor, e que voam conforme o vento e o tempo? O que aconteceu com seus olhos, que abertos ou fechados enxergam a mesma coisa? As coisas já não são mais as mesmas, mas você insiste em viver as mesmas coisas.

Dê-me a sua mão. Siga-me. Ao final de Março, tudo vira Abril. Não vamos mais perder o trem e nem o assobio. Ao final de Março, tudo vira Abril. Se não se molhar com a chuva, pelo menos encoste seu rosto no vitral frio. Pois ao final de Março, tudo vira Abril. Tudo vira Abril. Abriu.

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