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etrâWArtes n Domingo, 14-5-1950 ^ÍHollI w m m^^ £ m BEM difícil e penoso se torna, realmente, seguir em Portugal, uma digna carreira literária! Duas. entre as várias razões que para isso concorrem, se me afiguram fundamentais. Sobre elas me permitirá o leitor escrever ho- jc estas linhas- Uma é a falta de tempo. Outra a falta de estimulo. Quanto à falta de tempo: Não sendo rico, (pois em geral o não é, ou do que o é me não importa agora falar) tem o es- critor duas soluções diante de si: ou fazer do seu talento um meio de ganhar a vida, ou ter qualquer outra profissão que lhe permita ganhá-la. Ganhar a vida, entre nós, com a literatura, além de não ser coisa fácil, bem sabemos o que dignifica! Nada menos que . renúncia do escritor à^ignida- de da sua função e à liberdade da sua criação. O nosso públi- co leitor não- para susten- tar um verdadeiro artista lite- rário. De vez em quando nos acena a esperança com o pá- . blico do Brasil ou o das nos- sas colônias. Falada a língua portuguesa em tão vasta área, não parece que à sua literatura . deveria caber um vasto públi- co? Mas o público das nossas Coionias é ainda extremamen- . ie reduzido; Quanto ao do Brasil, não parece muito mais largo! Qüe hoje aparecem, no mercado português, vários - livros brasileiros, tanto origi- nais como traduções, é fato. Que hoje existem, entre nós, muitos intelectuais empenha- ¦ dos em propagandear a litera- tura brasileira, também é fa- to. Dar-se-á o fenômeno reci- proco? Não me parece que o confirme a percentagem dos li- vros portugueses vendidos nes- se grande país que fala e es- creve a nossa língua. Assim, é ainda o pequeno continente português que prin- cipalmente consome as obras literárias portuguesas- Mas es- se pequeno continente é dema- siado pequeno :— e ainda mui- to deficientemente dado à lei- tura. Do tempo de Herculano, Camilo ou Eça, até hoje, pare- ce não se poder verificar gran- de progresso em tal sentido! O escritor português que preten- da, hoje, viver da sua pena, tem de fazer "serviços" de fco- da a casta, e, por todos os meios, explorar a curiosidade o os gostos do público. E pron- to, é um criador liquidado. Nada que mais implacável- mente exija despreocupação e liberdade de espirito do que uma plena criação artística. Falo, está claro, de "liberda- de" e "despreocupação", rela- tivamente a quanto seja es- tranho ou adverso á obra do artista. Eis a primeira solução. Segunda solução: O escritor - português escolhe (ou—antes; aceita) qualquer outra profis- são que lhe permita ganhar a vida, reservando o que lhe res- te de tempo vago para o seu trabalho literário. Talvez não imagine quem me está lendo 'a menos que seja um de tais infelizes!) os trabalhos força- dos a que então se condena, Retrato de Emile Zol a EDOUARD MANET CONDIÇÃO DO ES- CRITOR PORTUGUÊS JOSÉ9 REGI O. &M 4.° N.M64 flflA.-JBk ¦¦¦'. nrr^-:^.'...Aflfl^&^flflfl^fl ¦ss^- ::^:fa«Mfey.... :.... x?;>, 'f^M|^;:.:v¦:¦¦¦ Afl i-41 ÉPIfl BgnitfMMfl£fl^BBBÍtlMff& K&àssy^sí. v*c ¦ flB ¦ -fl H&^fl BB »ii"«|l^^^fliflfl] H P^fll NlPlflflflflflflflflflflflflfl^wvl^V?! ;" ':flflflflflfll^il4';:^^ Wflflflflflflflflflflflflflflfl^Vfl^KJp^^i^P^' »fl.^^^|M^MMUMHÍ|HiÉlflfl Màm |_^HgMgHa_fK vll^-flPflI 'lllflfl ¦•¦ ¦¦¦¦-<** -I ^^^M¦IHl - JlIP-^1 \^JIÉflBHfiÉiilJl Pr $w$ÉflPÍÉHHR' ' JÉPffr , : s^^^^ÉPifiW^ ^^^fl fl^^^w*^H Ir <SíS5ÍS^^™SsSSSS!BWr*^¥sflBsJkV S& mÊÈÈÈÈU' ™"^ FSfff:;l~::-:-<4 ÉflIIIIISp•iÍÉ«iiHfii flKÍBfl:,s' -:fli "ks%i« IP*fl Kf flB/''.^B EÈfi!S*^^^5iiB Éfe. 1 BlLWBI] liiL„ flI ,R^^^BÉflPlií:iMI ¦nIpwIflflB^^flI flP^^H^lflfl ¦ AflflPVflb ,BJBl¥JI %fllllÉíIflklt^fl ¦%nSflflflflK^wS^fl1flfl flflBflsKcSíflK^flfl flfl^Sa^sH +kÜs! 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Depois, é a torturante falta de tempo com as suas, pelo menos, prováveis conse- qüências de excesso de traba- lho, esgotamento nervoso, com repercussões, por cansaço, de esterilidade ou repetição na obra, etc. Se este desgraçado atinge uma relativa popularl- dade, aquilo mesmo que lhe poderia ser (e em certa medi- da é) um incentvo, se lhe vol- ve em tormento: Mandam-lhe livros, publicações, manuscrt- tos, dactilegrafados; pedem-lhe opiniões, conselhos, críticas; 50- licitam-lhe colaborações grá- tis, etc. No, aliás naturalíssí- mo, egoísmo da imensa maioria dos admiradores, quais desses admiradores se limitam à he- róica atitude de simplesmente, manifestarem a sua estima? Quais antecipadamente aceitam o silêncio do seu ídolo? Quais lho perdoam? O que é vulgar. e até natural, é exigirem que os seus pedidos sejam aceites, os seus dactilegrafados e , ma- nuscritos apreciados com ateu- ção, os seus livros lidos, agra- decidos, criticados, retribuídos sem excessiva demora, etc- Co- mo cada um se lembra de si nem se lembra de que pode ter, e tem, muitos cama- radas cm tais exigências. Ora o pobre do escritor português, que não ganha para o luxo és'- trangeiro dum secretário, (nem um secretário resolveria senáo parte da questão) onde irá bus- car tempo para tudo isso? As horas do seu trabalho profis- sional? Será mau funcionário. As das suas leituras? Deixai a de fazer as que mais necessita ou deseja. As da sua criaç.io artística? Deixará de produzir muito do que poderia produzir. As do seu mais necessário o legítimo repouso? Será um d ti- ente. Assim, o que lhe poderia ser um grato incentivo re- ceber testemunhos de que o apreciam se lhe torna, aft- nal, um novo tormento. K quantos, ainda, desses preten- sos admiradores, não passam üe borboletas atraídas pela popu- laridadc dum nome! Voaria quando surgir no horta o 111 o qualquer celebridade mais te- cente ou mais espalhafatosa. . Eis, muito sucin támènt e, quanto à falta de tempo Quanto a falta Ue estimulo; vimos que o da remunera- ção material, importante até para um artista, lhe é inuao escasso. Hoje em dia, até reco- nieçou o vexatório namoro ao editor! Outro estímulo lhe ri-..-'; ta que designarei por este bre.- ve e fascinante nome: a g>u- ria. Mas compare-se, aqui, a posição do escritor português com a do escritor estrangeirou Desde que realmente haja pro- duzido uma obra, (muitas vê- zes não superior à de qualquer grande escritor português) escritor francês, inglês, alemão, russo, espanhol, ou até natu- ral de pequenos países como nosso, tem multas probabilida- dès de saber que a sua obra correrá todo o mundo culto: achará simpatia, compreensão, interesse apaixonado, em seres de muito diversos pontos da terra. Imensa consolação, pre- cioso estímulo com que será melhor nunca sonhar o criador português! Que importa quo algumas vezes, alguma das m- às obras chegue a ser tradu- zlda? Imediatamente recai 11* obscuridade. Por fraqueza da mesma obra? Não o creio. Sim por um concurso de circunstan- 1 cias que será muito curioso analisar para outra vez, ou noutro lugar. Quantas obras correm mundo, em nada supe- I riores a várias nossas que ou nunca passaram fronteiras, ou foi como se nunca as houves- | sem passado! Apenas um pe- quenino exemplo: "A Dama das Camélias" valerá mais que o "Amor de Perdição"? Resta, portanto, ao criadov literário português a aten- ç&o nacional. Quais os modos como se manifesta, ao presen- te, essa atenção? Aceitemos quo há, presentemente, em Portu- gal, meia dúzia de críticos se- rios, inteligentes sensíveis su- licientemente rieos para algo compreenderem das mais di~ versas obras, possuindo uma idéia mais ou menos exata do que seja o fenômeno artístico, e um elevado sentido daquela imparcialidade, embora rela ti- va, que pressupõe a vocação crítica. Sem estes dons que -.a- zem a grandeza e a fecundi- dade da crítica, não críti- ca que preste Haverá, haver» entre nós essa meia dúzia de críticos? Haverá. Mas estudam Camões, Oil Vicente. Bernar- (.Conclui n.\ 0.» página)

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etrâWArtes

n

Domingo, 14-5-1950 ^ÍHollI w m m^^ £ m

BEM

difícil e penoso setorna, realmente, seguirem Portugal, uma digna

carreira literária! Duas. entreas várias razões que para issoconcorrem, se me afiguramfundamentais. Sobre elas mepermitirá o leitor escrever ho-jc estas linhas- — Uma — éa falta de tempo. Outra — afalta de estimulo.

Quanto à falta de tempo:Não sendo rico, (pois em geralo não é, ou do que o é me nãoimporta agora falar) tem o es-critor duas soluções diante desi: ou fazer do seu talento ummeio de ganhar a vida, ou terqualquer outra profissão quelhe permita ganhá-la.

Ganhar a vida, entre nós,com a literatura, além de nãoser coisa fácil, bem sabemos oque dignifica! Nada menos que

. renúncia do escritor à^ignida-de da sua função e à liberdadeda sua criação. O nosso públi-co leitor não- dá para susten-tar um verdadeiro artista lite-rário. De vez em quando nosacena a esperança com o pá-

. blico do Brasil ou o das nos-sas colônias. Falada a línguaportuguesa em tão vasta área,não parece que à sua literatura

. deveria caber um vasto públi-co? Mas o público das nossasCoionias é ainda extremamen-

. ie reduzido; Quanto ao doBrasil, não parece muito maislargo! Qüe já hoje aparecem,no mercado português, vários

- livros brasileiros, tanto origi-nais como traduções, é fato.Que já hoje existem, entre nós,muitos intelectuais empenha-

¦ dos em propagandear a litera-tura brasileira, também é fa-to. Dar-se-á o fenômeno reci-proco? Não me parece que oconfirme a percentagem dos li-vros portugueses vendidos nes-se grande país que fala e es-creve a nossa língua.

Assim, é ainda o pequenocontinente português que prin-cipalmente consome as obrasliterárias portuguesas- Mas es-se pequeno continente é dema-siado pequeno :— e ainda mui-to deficientemente dado à lei-tura. Do tempo de Herculano,Camilo ou Eça, até hoje, pare-ce não se poder verificar gran-de progresso em tal sentido! Oescritor português que preten-da, hoje, viver da sua pena,tem de fazer "serviços" de fco-da a casta, e, por todos osmeios, explorar a curiosidade oos gostos do público. E pron-to, — é um criador liquidado.Nada há que mais implacável-mente exija despreocupação eliberdade de espirito do queuma plena criação artística.Falo, está claro, de "liberda-de" e "despreocupação", rela-tivamente a quanto seja es-tranho ou adverso á obra doartista. Eis a primeira solução.

Segunda solução: O escritor- português escolhe (ou—antes;

aceita) qualquer outra profis-são que lhe permita ganhar avida, reservando o que lhe res-te de tempo vago para o seutrabalho literário. Talvez nãoimagine quem me está lendo'a menos que seja um de taisinfelizes!) os trabalhos força-dos a que então se condena,

Retrato de Emile Zol a — EDOUARD MANET

CONDIÇÃO DO ES-CRITOR PORTUGUÊS

JOSÉ9 REGI O.

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em pretendendo ir além do sim-pies amador e seguir digna-mente uma carreira! Primeiro,é o inferno de continuamentehaver de interromper a suacriação — que exige concen-tração e continuidade de inte-rêsses, de estados de espírito,de" ésfórçõsT" —' com os tiaba-lhos da profissão que o remu-nera. Depois, é a torturantefalta de tempo com as suas,pelo menos, prováveis conse-qüências de excesso de traba-lho, esgotamento nervoso, comrepercussões, por cansaço, deesterilidade ou repetição naobra, etc. Se este desgraçado

atinge uma relativa popularl-dade, aquilo mesmo que lhepoderia ser (e em certa medi-da é) um incentvo, se lhe vol-ve em tormento: Mandam-lhelivros, publicações, manuscrt-tos, dactilegrafados; pedem-lheopiniões, conselhos, críticas; 50-licitam-lhe colaborações grá-tis, etc. No, aliás naturalíssí-mo, egoísmo da imensa maioriados admiradores, quais dessesadmiradores se limitam à he-róica atitude de simplesmente,manifestarem a sua estima?Quais antecipadamente aceitamo silêncio do seu ídolo? Quaislho perdoam? O que é vulgar.

e até natural, é exigirem queos seus pedidos sejam aceites,os seus dactilegrafados e , ma-nuscritos apreciados com ateu-ção, os seus livros lidos, agra-decidos, criticados, retribuídossem excessiva demora, etc- Co-mo cada um só se lembra desi nem se lembra de quepode ter, e tem, muitos cama-radas cm tais exigências. Orao pobre do escritor português,que não ganha para o luxo és'-trangeiro dum secretário, (nemum secretário resolveria senáoparte da questão) onde irá bus-car tempo para tudo isso? Ashoras do seu trabalho profis-

sional? Será mau funcionário.As das suas leituras? Deixai ade fazer as que mais necessitaou deseja. As da sua criaç.ioartística? Deixará de produzirmuito do que poderia produzir.As do seu mais necessário olegítimo repouso? Será um d ti-ente. Assim, o que lhe poderiaser um grato incentivo — re-ceber testemunhos de que oapreciam — se lhe torna, aft-nal, um novo tormento. Kquantos, ainda, desses preten-sos admiradores, não passam üeborboletas atraídas pela popu-laridadc dum nome! Voariaquando surgir no horta o 111 oqualquer celebridade mais te-cente ou mais espalhafatosa. .

Eis, muito sucin támènt e,quanto à falta de tempo

Quanto a falta Ue estimulo;Já vimos que o da remunera-ção material, importante atépara um artista, lhe é inuaoescasso. Hoje em dia, até reco-nieçou o vexatório namoro aoeditor! Outro estímulo lhe ri-..-';ta que designarei por este bre.-ve e fascinante nome: a g>u-ria. Mas compare-se, aqui, aposição do escritor portuguêscom a do escritor estrangeirouDesde que realmente haja pro-duzido uma obra, (muitas vê-zes não superior à de qualquergrande escritor português) -»escritor francês, inglês, alemão,russo, espanhol, ou até natu-ral de pequenos países como •nosso, tem multas probabilida-dès de saber que a sua obracorrerá todo o mundo culto:achará simpatia, compreensão,interesse apaixonado, em seresde muito diversos pontos daterra. Imensa consolação, pre-cioso estímulo com que serámelhor nunca sonhar o criadorportuguês! Que importa quoalgumas vezes, alguma das m-às obras chegue a ser tradu-zlda? Imediatamente recai 11*obscuridade. Por fraqueza damesma obra? Não o creio. Simpor um concurso de circunstan- 1cias que será muito curiosoanalisar para outra vez, ounoutro lugar. Quantas obrascorrem mundo, em nada supe- Iriores a várias nossas que oununca passaram fronteiras, oufoi como se nunca as houves- |sem passado! Apenas um pe-quenino exemplo: "A Damadas Camélias" valerá mais queo "Amor de Perdição"?

Resta, portanto, ao criadovliterário português — a aten-ç&o nacional. Quais os modoscomo se manifesta, ao presen-te, essa atenção? Aceitemos quohá, presentemente, em Portu-gal, meia dúzia de críticos se-rios, inteligentes sensíveis su-licientemente rieos para algocompreenderem das mais di~versas obras, possuindo umaidéia mais ou menos exata do

que seja o fenômeno artístico,e um elevado sentido daquelaimparcialidade, embora rela ti-va, que pressupõe a vocaçãocrítica. Sem estes dons que -.a-zem a grandeza e a fecundi-dade da crítica, não há críti-ca que preste Haverá, haver»entre nós essa meia dúzia decríticos? Haverá. Mas estudamCamões, Oil Vicente. Bernar-

(.Conclui n.\ 0.» página)

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Págiat — 2 LETRA S E rART ES Domingo, 14-5-1950

Estive conversando com Ma-voclito de Orncllas cm sua ca-su, situada — come dizem 08jornais municipais — em Pe-tràpolis. E' èüc o bairro maisnovo da cidade c onde moramquase que todas as pessoas li-gadas com o jornalismo, as ar-1cs c. a literatura do Rio Gran-de. Aqui mora Erico Veríssimo,mima casa do chamado estilocaliforniano. A pintora YolanduTrcbbl — Dyonélio Machado,agora iniciando uma nova tèc-nica numa novela que é a his-tória dum médico — a dese-nhista e decoradora Ana deAthayáe que viajará em segui-da para Paris, onde fará umcurso de história da arte e ce-nografia. Enfim, você encontraem Petrópolis- algumas belascasas {muito poucas, é verdade)e belas gentes também.

A moradia de Manoelito é mo-derna, clara e confortável. Nojardim de entrada um salso-chorão dá uma nota poética acasa que as árvores quase en-cobrem.

A biblioteca, cheia de livros

N o tas gaúchasConversa com Manoelito de Ornellas

ti ELI DUTRA

preciosos, está quase que intel-ramente coberta de originais dosnovos e novíssimos, gentes queilustraram trabalhos de Manoe-llto de Ornellas ou a quem êleauxiliou e estimulou no iniciode carreira. E' o autor de "Tia-rajú" (o quem todos chamam oPoeta) uma criatura envolventec acolhedora. Lírico até no fa-lar, êle se destaca numa terraem que as pessoas insistem emfalar com secura e precisão. E «

é até estranho ouvir Manoelitodizer que nos esperará "ao cairda tarde", enquanto toda gentemarca horário e não suportademoras.

Conversamos a respeito detudo. Manoelito de Ornellastrabalha agora para uma se-gunda edição de "Gaúchos e Be-duinos", re fundindo e enrique-cendo a sua tese. Mostra-me aslâminas recebidas da Espanha eas fotografias da arquitetura, do

vestuário e tipos em que se notaa mais completa influência bér-bere, enviadas por Portugal.Mostra-me os livros, onde à pre-ciosa encadernação, à perfeitaimpressão em papel de arroz, aEspanha, por seus melhores es-tudiosos, faz base à tese deferi-dida e apresentada em "Gaú-chos e Beduinos". Sei então,pelo próprio autor, que do livro,tão bem recebido pela critica e

., o público estudioso, sucedeu o

convite da Espanha para umaviagem de reconhecimento e /c-vantamenlo. Serão três mesesde trabalho continuo, de "»c.nosa tarefa", mas também &legitimo "encantamento"

paraesse homem que faz históriaduma maneira lírica e espontü*nea, assim como os poetas rea.Uzam seus poemas, fascinam!»)o leitor porque éle próprio estánum estado de encantamento.

Soube ainda por amigos quePortugal também enviará con-vite a Manoelito de Ornellas enem poderia ser de outra tor-ma, já que o nosso patrimôniocultural (o que "Gaúchos e Be-duinos" documenta tão bem) £resultante da civilização legadatanto ou mais pelo portuguêsdo que o espanhol. E ninguémmelhor indicado para investigare apresentar as raízes da nossaformação, pois Manoelito deOrnellas é um dos poucos quecompreendem a necessidade deaproximação continua com as"vivas e poderosas fontes danossa riqueza cultural".

SPRANGER,

caracterizando oseu "homem político", afir-ma que "no âmbito da es-

tintura psíquica puramente po-litica se atrofia o órgão daobjetividade e da verdade". Eainr'<t mais: "O efeito caraetc-rísti o desta degencração cons-tituiva do sentido da verdadeé o fato de que o retórico passaa envolver com a sua frondea prsonalidade íntegra." Parafina mente concluir: "No mun-do inteiro, ali onde o desígnioreli ico define a atitude, tantoentra os sofistas gregos da épo-ça clássica, como entre os ro-manos, desde Cícero, entre ospolt':.cos e eclesiásticos protes-tan< *s e jesuítas, entre os di-piev atas dos tempos cortesãose e: \ geral nos povos latinos seanír >õe o ideal de cultura re-tória ao da filosófica."

A politização do homem bra-sileit-o, no século XIX, realizou-se plenamente no sentido assi-nalMo por Spranger. Séculode 7oaquim Nabuco para quema p litica era "nina pura artede construção no vácuo: a basesão as teses e não os fatos, oma'"«liai as idéias e não os ho-m'r;.5, a situação, o mundo onão o país; os habitantes, asgerr^ões futuras e não asatuais''; e que levaria um Gil-ber-o Freyre a descobrir que".a ascensão do bacharel oudoutor afrancesado trouxe paraa v;1a brasileira muita fuga darea'dade através de leis quasefrei-lianas"; bacharéis comopor sua vez assinala GilbertoAmado cheios de uma "fácil einexaurível erudição à margemdos fatos e das coisas."

E~.ta evasão da realidade, ei iem grande parte fruto da edu-eaço ministrada, de sentidoflor'damente jesuítico e ornadoe de que o currículo do ColégioVedo II pode dar idéia. Aí ti-nha mos então duas cadeiras delatim; uma de grego, uma defrancês, inglês ou alemão; umade filosofia racional e moral;uma de retórica e poética; duasde história e geografia; umade matemáticas elementarescompreendendo aritmética e ai-gebrá (até equações de segun-do £rau); duas de ciências na-turais, sendo uma de histórianatural com as primeiras no-ções. de zoologia, botânica, mi-neralogia e geologia e outra deelementos de física e química,cc- ireendendo os princípiosgr .is e mais aplicáveis aosusos da vida. E o ensino ain-da da arte do desenho, da mú-sica* c da... dança. Para asmulheres, já era possível oaprendizado de "croché, filé,tricô, matiz, estufo, flores eobras de missa ngas.'**

O que primeiro chama a

DE LATIM E RETÓRICA'JAMIL ALMANSUR HADDAD

atenção é a hipertrofia do la-tim. Retórica c Poética são, decerto modo, prolongamento dolatim, pois que sempre a teo-ria e a casuística são extraídasde autores latinos. Latim é de-sapêgo da terra, é fuga violen-ta das realidades do chão, é obarco aprestado para a partidaem direção de Shangri-la. La-tim é línrua de Igreja c não

de casa, é idioma para conver-sar com Deus e não com os ho-mens. Corredor estendido embusca do sobrenatural e nãoâncora presa no chão mono-tono e prosaico. E onde o es-tudo lírico do latim se hiper-trofia, temos, como reverso damedalha, o desfalecimento doensino das ciências físicas onaturais que, pelo programa

acima referido, se reduzia a"primeiras noções" e "princi-pios gerais". As ciências, sim,é que correspondem a umapreocupação veraz de adesãoao mundo e aos seus proble-mas. Entre os idiomas, Ortegay Gasset, elege o alemão comolíngua da verdade e a queagora podemos contrapor o la-tim, a língua do sonho. A lin-

FRAGMENTOS EXTRAÍDOS DAOBRA DE G. £. CHESTERTON

O

PERIGO da loucura re-side antes na obsessãoda lógica do que na ca-

pacidade de imaginação. .Apoesia é sã porque flutua fã-cilmente num mar infinito. Opoeta deseja apenas introdu-zir a cabeça no céu. E' o ló-gico que busca introduzir océu na cabeça. E é a sua ca-bèça que estoura.'.—+—

Os materialistas e os loucosnunca têm dúvidas.

O segredo do misticismo re-side nisto: o homem é eapaçde compreender todas as coi-sas com o auxílio de algo quenão compreende. O lógicomórbido procura tornar lúei-das todas as coisas, e o resul»tado é que tudo se torna mis-terioso. O determinista escla-rece a teoria da causalidade elogo em seguida se encontrana situação de não poder di-zer "por favor" à sua criada.

• —*—O . materialista-progressisca

moderno é o homem que vaia um comício político onde. se,queixa de que. os selvagens,se-.jam- -tratados. .como animais rEm seguida, apanha o chapéue o guardarchuva, e se dirigea uma reunião, científica ondeprova que todos os homens sãopraticamente animais,

O ódio de um herói é maisgeneroso do que o amor de umfilan tropo.

A grande lição de "A Belae a Fera" é a de que uma coi-

sa deve ser amada antes de seramável.

Não é surpresa verificar quea verdade seja mais estranhadojme a ficção, desde que cria-

HÉ lk:/>>',^^^v•»'¦'•»*/.'•'¦'¦•'¦•-•''' 'BbIly-Â&ftvíxBi

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----- ¦^PJ/f^BBB^BwBKUBBwUBBBI^BBhBBBBBBBBBBBK

Chestertonmos a ficção segundo as nossasconveniências.

A tradição cristã repousa sô-bre dois ou três paradoxos oumistérios, que podem sar fácil-mente, refutados numa eon.tro-vérsia e facilmente justificadosna vida.

modernos contra a moral é cs-. tensivãmente exibido. Entre-

tanto, hão se trata, a bem di-zer, de um preconceito contraa moral, mas de uni precon.ceito contra a moral dos ou-tros. O esteta moderno, espe-rando convencer-nos de queaprecia mais a beleza do quea conduta, lê Mallarmé e bebeabsinto num café. Mas aí nãose acha apenas o seu gêneiode beleza preferida; tambémestá o seu gênero de condutiapreferida.

—*—

O "temperamento artístico"é uma doença que aflige osamadores, uma doença peculiaraos homens que não possuema força de expressão necessá-ria para formular e eliminar oelemento artístico que neiesexiste. Os artistas vigorosos esadios eliminam a sua arte tãofacilmente como respiram etranspiram. Mas entre os ar-tistas de menor fôlego, essafunção - se torna opressiva ecausa üm sofrimento bem defi-nido que se chama "tempera-mento artístico". Grandes ar-tistas como Shakespeare eBrowning foram pessoas co-muns. Enquanto isso, são nu-merosas as tragédias moüva-das pelo "temperamento.ari;ís-tico": tragédias de vaidade, deviolência ou de medo. Contu-do, a maior tragédia desse"temperamento artístico" con-siste èm que lhe é impossívelproduzir uma' autêntica ' obrade arte. ^

O preconceito dós estetas' .(Tradução e seleção de W.L.)'

«rua amada do filósofo espanhol,posta facultativamente nocurrículo, acabaria, não obs-tante o fenômeno Tobias Bar-reto, facultativa, o que vale di*zer inoperante.

Na luta contra o latim, é ocaso de lembrar a atitude doBarão de Macahubas, que porsua vez reivindicava um lugarmais amplo para as ciências fí-sicas e naturais. Realmente, oBarão proclama: "Na revolu-ção nova que projeto fazer noensino da mocidade brasileira,entre os melhoramentos quepretendo introduzir, há de ca-ber muita parte ao cultivo dasciências naturais, dando-se apossível extensão ao ensino dosfenômenos mais comuns da na-tureza, explicáveis pela físicae pela química." E o reversoinexorável da medalha: "O quedirei do ensino do latim e dosrespectivos exames? Quantotempo gasto em vão, quantosacrifício inútil, para meter umestudante na cabeça todaaquela infinidade, de regras, demedições, de. incrementos,quantidades de sílabas, etc. etc.Ainda aqui pediria eu que meesclarecessem sobre o auxílioque traz ao estudo nos cursossuperiores o conhecimento daarte versi fica tória latina comsua complicada nomenclaturade pés etc."

Mais tarde, todavia, o Barãoia ufanar-se da instituição dos"outeiros", jogos florais emque acabariam se distinguindoestudantes como Ruy e CastroAlves e que tratavam decidida-mente de estimular as naseen-tes tendências retóricas, ou se-jam^ànti-eientíficas, ou na II-nha de Spranger, atrofladovasda verdade, nos seus futura-mente famosos alunos..., Se o curso secundara eraassim virginalmente retórico, aretórica evidentemente iria' che-gar ao esplendor definitivo nn>hora das aulas, da FaeuJ3v.ííede Direito, verdadeira ante-sala do Parüamento, tanto quepor 1854 se reconhecia, con-soante o historiador "a neees-sidade de separar-se as ciênciasjurídicas das ciências sociais,dividindo o curso cm duas se-ções. Os indivíduos que pre-tendem seguir a carreira damagistratura e da advocacianão precisam dos mesmos és-tudos que são necessários aosque abraçam a carreira admi-nisíraíiva ou política." Voníà-de, portanto, de deixar bem ca-racterizada a função da Facuí-dade como fábrica de políticos.E fábrica de sonho êirrealjdá-de por conseguinte.

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' Domingo. 14-5-1950 /? E T R A S E M 7? T E S Página — 3 '

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Em Gu.iraringuerá o escritor Brito BrocaAfim cie convalescer cie grave en-

fermldade que o prendeu no leito maisde mês, seguiu puni Guuratlnguetá, suacidade natal, o escritor Brlio Broca,nosso companheiro cie "Letras e Artes",figura das mais representativas da mo-dorna literatura brasileira.

Grande conhecedor de nossa 11 lera-tura o sempre bem Informado sobre oemais recentes movimentos literário» es-trangelroa, Brito Broca vem prestandoao nosso suplemento, desde o seu pri-

• '.ífS melro número', continuada e preciosa:/¦, colaboração. Ensaísta dos mais brt-

Ipantes, mas de uma modéstia que"im atinge as raias cio anacronismo. Brito''*• Broca. apesar de tudo, 6 um nome co-conhecido e prezado em nossos círculos culturais. "Letraa

<*• Artes" que é uma publicação sua, tantos s&o os serviçosde inestimável valor que lhe deve, fazendo votos pela seucompleto restabelecimento, envia-lhe daqui o fraternalabraço de todos os seus companheiros de lutas, que sáotodos os que, de alguma forma, multam em A MANHA.

Nova edição de "Cascalho"

Está sendo anunciado para. breve o lançamento da •seminua edição de "Cascalho", romance .de Her.berto Sa-les que grande sucesso alcançou quando do seu lança-jm-iito evidenciando os altos méritos literários Ho Jovem,flrelonista baiano. . •

Como a primeira, a segunda edição de Cascalhoserei publicada pela Editora "O Cruzeiro".

Um poeta paraibano.. -1...._-". f

O sr. Nagela Cantallce. poeta paraibano, acaba de pu-Mlcar em opusculo. o poema de sua autoria .."Brasil:',. --..

inspirado na sinfonia de "O Guarani", de Carlos .Gomes.

Jorge Lacerda em Santa CatarinaEm gozo de férias, encontra-se em .Santa Catarina,

onde permanecerá até o fim "do mês. o nosso, compa-, .nheiro Jorge Lacerda, diretor de "Letras e Arte6". Duran-te sua ausência, responde pelo suplemento o escritor Al* unielda Fischer, a quem deve ser endereçada a corn?3pon-4ência respectiva.

Cyro dos Anjos e o problema de criaçãoartística

Cyro dos Anjos vem publicando,' parceladamente, umidlçôes dominicais de A MANHA, penetrante e lúcido eotudo sóbr-' o problema dá criaçào artística.

O tema, sempre atual, é tratadocom a conhecida seriedade do -roman-clsta mineiro, que o analisa sob todosos aspectos, em sua mais profunda slg-nificação. Através dos diversos slste-mas filosóficos e concepções estéticas.o. autor de "Abdias" busca a origem.

o sentido da obra de arte, revelatirdo, a par da revista .em que passa .idéias e livros, inteligente e oompre- ,ensiva visão pessoal do assunto.

Num melo intelectual . em que aficção obedece multas. vezes apenas áintuição criadora, sem o conheclmen-to e a cultura que a disciplinam e lherevelam as verdadeiras possibilidades.

auspicioso o fato dè'um'romancista.lemonstrar tanta consciência do "mé-tier" e erudição tão vasta.

"Letras e Artes" sugere, nestaoportunidade, a publicação de "A Criação Artística" em.plaquete ou em uma «le nossas revistas de cultura.

Apreciados em Paris os conceitos emitidospor Alceu Amoroso Lima

Em entrevista que concedeu a um Jornal desta caol-tal, Madame Gabrielle Mineur, Adida Cultural da Embal-xada Francesa, que acaba de regressar de sua pátria, re-íeriu-se â repercussão da viagem do escritor Alceu AmorosoLima ao seu país, acentuando que os conceitos por eleemitidos foram particularmente votados em Paris, repre-seutativos que são de um aspecto da realidade brasileira.

"Pequenos poemas em prosa de Baudelaire"

Foi lançada, pela Livraria José Olympio a traduçãoque de "Os pequenos poemas em prosa de Baudelaire" teuAurélio Buarque de Hollanda, sem dúvida uma das maisvomplecas e honestas figuras de tradutor que jamais pos-suimos.

Resultado do "Prêmio Fábio Prado de 1949"Por maioria de votos, a comissão julgadora do con-

curso de romance e novela patrocinado pela ABDE de S.Paulo sob a denominação de "Prêmio Fábio Prado" deli-berou conceder a laurea correspondente ao livro inédito"Contra a Mão", de autoria de Antônio Olavo Pereira, ro-tnanclsta paulista que agora vai fazer sua estréia.

A comissão era composta de José Geraldo Vieira, CJ8S'-los Burlamaqui Kopke e Osmar Pimentel .

Nomes ilustres da literatura brasileira íoram distm-guidos com uma menção honrosa, por deliberação dosmesmos julgadores. Assim, obtiveram menção honrosa noaludido concurso os romances "As confissões de meu tioGonzaga", de Luis Jardim, "Recuo do Meridiano", de JoãoPacheco (ainda Inédito) e "O Chamado do Mar", de Ja-mes Amado.

"Mundaú", um livro*» regionalEm edição dos Irmãos Pongettí.

aparecerá nesses dias o livro de coutos"Mundaú", da autoria de Pedro deCarvalho VUella.

O ilustre escritor que também é ban-quelro e político, revive nas páginasde seii3 contos, figuras e ambientesde Alagoas, sua terra natal.

"Mundaú", prefaciado por Joracy Ca-niargo, que o considera um dos maisvivos . e brilhantes narradores, IrêJK,ilustrações de SaPt-ft. Roça. ~~''

0 espírito das épocas

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Acaba de ser posto à venda o último livro do consa-grado escritor Kilmundo Moniz sugestivamente tntitulndo"ü espirito das épocas".

Trata-se de um conjunto de ensaios sobre os crandesvultos literários da Humanidade, obedecendo a uma dl-

retriz filosófica que lhe garante esplêndida harmonia.O professor Edmundo Moniz representa, na verdade,

um pensamento autônomo e, justamente por isso, sabesempre subordinar os seus julgamentos críticos a uma il-nha ideológica que, sem embargo de qualquer dlvergen-cia doutrinária, constitui uma orientação digna de exame.

E 'de esperar-se merecido cxiu», pois; não taIUm aobrilhante autor de "O espirito das épocas" dotes que otornam uma personalidade de Indiscutível valor.

Ac obras completas de «Marques RebeloA Editora 'Cruzeiro

prossegue no lançamento danObras Completas do Marques Rabelo. Já feram publica-das "Oscarlna"'e "Três Caminhòa", num único volume, eos romances "Murafa" e' "A estrela sobe". Esse empreen-dtmento editorial facilita ao grande público apreciar- umadas mais sugestivas figuras de nossas letras, c um escrl-tor que continuou e renovou o romance urbano brasl-

- lelro . "Caminho de Poesia"Inaugurando as atividades editoriais da revista "Oro-

nos", deverá aparecer, dentro de alguns dtus, o volumede estréia do poeta Rui Rodrigo Fernandes, sob o titulode "Caminho de Poesia". Rui Rodrigo Fernandes, que-náo~é um" de3conlÜcldo de nosso público ledor, pots co-labora em várias revistas e jornais desta capital, ílgu-rara por ,certo, com êsse livro, em lugar destacado entre

os nossos' poetas' vánguardclros.

Entrevista com Jean CassouEm seu próximo número, "Letras e Artes" pu-

bllcará interessante entrevista do nosso correspoti-dêrtte na Europa, Loúls Wiznitzer, com o grande os-crltor francês Jean Cassou.

Poemas de Luís MartinsApresentando capa e ilustrações de Tarsila. acaba de

aparecer "Cantigas da rua escura", volume de versos doLuís Martins, conhecido crítico de arte de São Paulo.

Volume de esplêndida feição gráfica, reúne ele cercade 30 poemas que dão bem uma mostra dessa nova facetada sensibilidade e do talento de Luis Martins."Cantigas da rua escura" aparece em edição da Livra-ria Martins Editora, de S&o Paulo.

Próximos lançamentos da Editora A NoiteTendo lançado esta semana dois livros da maior im-

portâncla, como "Lições de COlsas", no plano das ObrasCompletas de Ruy Barbosa, e "Enigmas Populares" de JoséMaria de Melo, a Editora A Noite anuncia: "Guerra deu-tro do beco", romance de Jorge de Lima; "As filhas dofogo", de Gerard de Nerval, em tradução de WUly Lewln;"A cinza do tempo", contos de Gustavo Barroso, "Roman-ceiro do Negrinho", de Sonla Regina.

''Forma", nova revista de arteJosé Slmeão Leal, que dirige "Cultura", a magnittea

revista do Ministério da Educação e Saúde, lançará maisuma publicação — "Forma", revista de artes plásticas, edl-tada também pelo Serviço de Documentação daquele ml-ntstério.44Lições de Coisas", de Ruy Barbosa

As recentes comemorações do centenário do nascimen- ,to de Ruy Barbosa estabeleceram uma viva curiosidadeem torno .da vida e da obra do famoso brasileiro, e o grau-de público vem procurando informar-se das múltiplasatividades desse espirito invulgar no conhecimento de•eus livros mais representativos..., , ¦

A Editora A Noite, que se encarregou da publicaçãoTe "Cartas de Inglaterra" e "A Constituição de 18SH",apresenta agora "Lições de Coisas", precisamente^ o li-vro que de modo mais fecundo pode operar esse contactoentre o leitor comum e o gênio da Águia de Haya.

"Lições de -Coisas" não é, a rigor, um livro de auto-ria de Ruy Barbosa, mas a tradução admirável da popu-lar obra do inglês Calkins, que o grande pensador e pott-tico brasileiro difundiu entre nós, em 1886. E' um livrode ensinamentos pedagógicos, destinado à formação inte-lectual das crianças. A êsse livro, Ruy deu muito de sentalento e de sua glória, mesmo porque não foram poucas»s adaptações por êle realizadas, tendo em vista a inaoiee a psicologia dos escolares brasileiros.

Seleção! de crônicas

m

De Paris, Rubem Braga tem enviado aos jornais bra-sileiros sugestivas crônicas sobre a Cidade Luz, que cone-tituem sem dúvida, flagrantes encantadores da metrópo-le vista através dos mais diversos assuntos. De RubeimBraga anuncia-se o lançamento de "50 crônicas selecto-nadas", onde o público encontrará p que de melhor saiuda pena do autor de "O conde è o passarinho".

Noticias vária» "W ^

Está sendo reeditado o livro "Aparência do Rio de Ja-nelro". obra em dois volumes de Gastão Cruls.

'.'.¦•—* —

Wilson Loüsadà acabou de preparar uma antologia dapoesia amorosa brasileira, do romantismo até os nossosdias. # —

Em tradução de Jamil Almansur Haddad, sairão bre-yeménte as Odes AnacrçonUcas.

* —Só no ano próximo deve sair o volume "Os Loucos",

de Octavlo de Faria, continuação da Tragédia Burguesa.^ -

i "Reaparição de Inácio", de Lúcio Cardoso, foi progra-mado para sair diariamente em folhetim, por um vesper-tino local. i* —.

"Maria Barbara", eis o titulo d.q rOíB.aace qu« RftCu.01de Queicoa est& escrevendo.

Virá ao Brasil Jean CocteauAlém de Jean. Louis Barrault, —

cuja companhia teatral já se oncon-tra a caminho do Brasil, conforme no-tlclamos — de quem ?"Letras e Artes"publicou, cm seu número anterior, Im-portanto entrevista concedida, poucaantes de partir, u bordo do Florida, aLouis Wiznitzer, nosso corrcspondcuUtna Europa, deverá vir ao nosso palabrevemente, segundo estumos Informa-dos, o fumoso Jean Cocteau, um do*mais ultos valores das letras francesasde nossos dias.

Jacqucs Mnrltnln, o grande pensa-dor católico francês, que deveria, Igual-mente, vir ao Brasil este ano. segun-do notícias procedentes de Tarii, adiousua viagem para outra ocasião umavez que vários compromissos c afazer»»o prendem, no momento; na França.

O centenário de BlumenauAo ensejo do centenário da cidade de Blumenau, quo

transcorrerá em outubro próximo, beráò realizados, sob opatrocínio do Departamento de Educação do Governo doSanta Catarina, além de Importantes comemorações cívicas,várlc* concursos literários e artísticos.

Um desses concursos, cujas Inscrições se encontram,abertas, se refere a monografias relativas á colontza<,:u>do Vale do Itajaí, havendo prêmios no valor de Ü5 mtlicruzeiros. Também se encontram abertos as Inscriçõespara o Concurso de Romance e Novela sobre o mesmoassunto, Igualmente com um prêmio de vinte mil cruz''l-ros e outro de cinco mil cruzeiros.

Para melhores Informações referentes aos concursos êias solenldades comemorativas do centenário de Blume-Inau. os Interessados podem dlrlglr-se ao sr. Elpldlo B;»r-bosa. diretor do Departamento de Educaçfto do Estado dsSanta Catarina.

Atividades do SAPS em 1949O major Umberto Peregrino,, diretor geral do SAPS,

apresentou ao Ministro do Trabalho circunstanciado rela-tório das atividades daquele Serviço durante o ano ds1949. Entre essas atividades cumpre-nos destacar as cul-turals ligadas á alimentação, que vieram Impulsionar sestimular os estudos da matéria entre nós. Nesse sentlitowíol criado o "Prêmio SAPS de Literatura Infantil", Já dis-tribuido em 1948 e 1949 e o "Prêmio Nacional de AllmcuMtaçào SAPS", também conferido nos dois anos em apreço*

O referido relatório acaba de ser publicado em vo-lume. i

O numero 3 de "Cultura

Editada pelo Serviço dè Documeu-1 tação do Ministério da Educação, ae*-

ba de aparecer, em seu número 3. arevista "Cultura", que tem a dirigi-Ia o escritor José Slmeão Leal. Comodas vezes anteriores, a grande publl-ricação apresenta valiosos estudos sobrotaspectos significativos das letras e das'artes, a par de um notável aspectoplástico que a tem colocado no nlvatdas melhores realizações no gênero tan-to do Brasil como do estrangeiro. Dosumário deste número, além das notase comentários, merecem destaque es-i

pecial os ensaios de Euríco Nogueira França e Mario Bara-ta sobre problemas da arte; de M. Bonriln e Mira y Lo-pez sobre ciência social; de Munhoz da Rocha e OtávioTarqulnlo abordando temas históricos; e de Josué Mon-telo? Lucla Miguel Pereira e Newton Freitas sobre pro-bleruas de literatura..

"Orfeu" em 195uNo próximo mês, vai ser divulgada, em admirável eo*.

cão enriquecida de fotografias e outros elementos, o Po*iiorama da Nova Poesia Brasileira" organizado por Fer~nando Ferreira de Loanda, e prefaciado por Álvaro Lins.,,Trata-se sem dúvida do maior testenn aho de conjunto d»!obra dos poetas brasileiros da geração de 1945, llgurandtk,nele não apenas as figuras mais conhecidas mas outras'aue vivem na província ou não se manifestaram publica- imente. Além disso, anuncia "Orfeu" vários livros taiscomo "O homem ao vento", de José Paulo Pais; Flor dsPedra", de Bandeira Trlbuzzl; "Do sonho e da esfinge Dde Afonso Felix de Souza; "A vida breve", de Afonso Fe-llx de Souza, "Equlnóclo", de Fernando Ferreira de l-oan-da. etc, além de uma edição nova de "Acontecimento dsSoneto", de Ledo Ivo, que circulou em tiragem restrita de100 exemplares, editada em Barcelona.

Livro de Tomás SeixasO poeta pernambucano Tomás Seixas, que se vem tor-

nando familiar ao movimento literário brasileiro atravésde prosa e poesia' excelentes publicadas em nosso suple-mento, anuncia um livro de poemas, ainda sem titulo ocontendo não só versos novos como poemas ja publicados!em tiragens reduzidas no Recife. Tomás Seixas constitui,sem dúvida uma das figuras mais inquietas e pessoais d.»sua geração.

As edições de "Livros de Portugal"=**»::

nn sW^>'ív'''' ¦ '•' *• '•' '•'• '•'•Hbbbbb

Sob os cuidados gráficos e a orl-entaçáo intelectual de Antônio Pedro."Livros de Portugal" está realizandoatualmente uma atividade editorial tiosugestiva importância para a nossa 11-terá tura. Já foram lançados livros qusse Impuseram entre os maiores aeou-*teclmentos do ano passado, como "Re-

trato Natural", de Cecília Molrel-?'- " o"Livro de Sonetos", de JorgeAgora, anunclam-se obras de .- '-cia Igual, como o volume de crou--. . cieAugusto Frederico Schmidt, beres aPaisagens", e a biografia de Gonc*l-ves Dias, escrita por Manuel Bandeira.

t Correspondência c publicações literárias deyemser endereçadas para Jorge Lacerda* TUH Republicart« Peru, 101, apartamento 90'4

'•

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Página E E T X 'A S B WART E S Domingo, 14-5-1950

ANTIGAMENTE,

exprobu-va-se ao Museu de Be-Ias Artes a incúria da

escolha das mostras de arte queali se faziam no suguáo de en-trada. Muito pior, sem dúvida,e o que cs expõe hoje na sededo Ministério da Educação, semmaior critério, sem se pensarmesmo na função deseducadoraque exercem certas exposiçõescomo, por exemplo, a da sra,ROSA LUBRANC4

V incrível que ainda se con-sídjrò tal espécie de pintura, emais ainda que se exiba noprincipal dos salões de arte daCanital Federal.

>:ão se trata de escola, trata-f: c.a qualidade, que é desastra-tíf.~ier.te da pior. Como situartr! pintura? Nem ao menos temo ranço acadêmico, nem tam-pouco a "guacherie" primltivis-ta que algumas vezes tem cer-to sabor...

Ò que não se compreende éque o Ministério da Educaçãoacolha o que nada significa,sem uma prévia seleção do queconvém endossar em nome danossa cultura artística.

-7A a mostra da sra. KAROLASZILARD GABOR s-? reveste de

S ABE.SE que as vária?maneiras como tsm sidousada a palavra raça le-

varam a confundir com língua;o caso da chamada raoa ária-rr, que não é mais' que povosV ) é, misturas i"\ grupos cau-cínicos e mòrisóis com umtrcàcò l\hguÍ3tieo uno e insti-I" r*..jc3 idênticas, falando lín.f 13 ar:ç.nas. Este. confusão es-v \c!e-.e também ao uso da pa-Ir vz cu.tura cemo sinônimo detü ;a ou ue língua.

Aliás, cultura é termo den. jltipla acepção, varia ndoquer no sentido antropológico

% quer no simplesmente literárioou intelectual. Entre nós, porexemplo, geralmente fala-se em

i cultura como acumulação dej conhecimentos: um homem

culto. O homem culto ou decultura é aquele que reuniu outem reunido conhecimentoávastos e variados.

I Já para os americanos cúltu-, ra entende-se, no seu sentido

antropológico, como complexo, de hábitos e criações do ho-

mem, hábitos c criações porS êle adquiridos do grupo em que

nasceu ou dos grupos com os; quais teve contato. Deste modo,

e em face dessa diversidade decunceituação, nascem as diver.

j sas interpretações. E surgemtambém os relacionamentos en-tre cultura e língua, ou entrelíngua e raça, ou ainda entre

i raça e cultura.Todavia, o papel da língua

I nos quadros humanos é daI maior importância; se se dese-| ia conhecer bem um povo, lera-! bra Kroeber, deve tomar-se em| consideração sua Kngua. É um

ttos elementos característicos deI qualquer agrupamento humanoI ou étnico. E muitas vezes é êle

i o elemento sobrevivente quan-f «to se verificam choques de ra-i ças ou de culturas diferentes.

De maneira que exerce uma, posição de relevo nos estudosi culturais o conhecimento dametodologia da linguagem,

i através da qual se apura o¦ mecanismo lingüístico. Esta im-portância salienta-se quando seestudam, na etnologia, os gru,pos indígenas ou naturais. E,estende-se também aos gruposmais adiantados de cultura. Ocaráter científico que apresentaa metodologia da linguagem, 11-ga-se, pois, ao estudo maisaprofundado da língua, ora emrelação às origens, função e

HEED]ISfli miW^MMí&M^SMostras de Arte no Ministério da Educação

certo Interesse, principalmenteo que se refere à gravura emmadeira. ,

Nem sempre a sua pinturavibra nas modulações da côr.E\ antes, em sua generalidadeuma pintura suja, terrosa, fôs-ca, na qual nenhuma nota can-ta a beleza de um azul, de umamarelo, de um verde.

No entanto, ela se exprimenuma autêntica linguagem piás-tica. Mesmo não me agradandoo seu colorido reconheço umpintor de maiores posstbilida-des que as apresentadas. Umintensivo trabalho de harmoniacolorística faria enorme bene-fício a essa pintora capaz de serealizar amplamente.

Já as suas gravuras em ma-

SANTA ROSA

deira à cores têm outra quall-dade. O gravador conhece adificuldade de se obter o re-sultado por ela demonstrado,em fases sucessivas, como noprocesso tipográfico. Cada côruma chapa, de dimensões exa-tas para se ajustarem à com-posição planejada. Nisso a sra.GABOR triunfa admiràvelmen-te, conseguindo efeitos magní-íicos.

Numa açtista de valor comoa sra. KAROLA SZILARDGABOR o que desejamos é operfeito desenvolvimento defceuespírito artístico, o qual ajuda-do por uma maior observaçãode certas leis da côr, muito po-dera realizar.

Outro artista que se apresen-

ta na trilogia atual do Minis-térdo, é o sr. ION POTCASUOANA.

Que dizer da pintura do sr.OANA, homem culto, de umaInteligência requintada, inteira-mente dentro dos delicados pro-blemas da arte moderna?

Não compreendo porque pe-netrando no espírito intrincadode nossa arte atual, com a pers-picácia com que o sr. OANA ofaz, não chegue a realizar ne-nhum desses problemas!

Do ponto de vista formal oudo ponto de vista colorístico, osr. OAfíA nos deixa perplexos.Penso mesmo que de nada lhevaleu o contato de Bonnard, queconheceu pessoalmente, nem

- il»Hli.

CULTURA, LÍNGUA E FOLCLOREMANUEL DIÉGUES JÚNIOR

desenvolvimento, ora em rela-ção aos problemas de interpre-tação do pensamento ou do en-sino.

Em livro recente o ProfessorJ- Budin estuda alguns dessesaspectos relacionados com oproblema da linguagem, em sua

posição metodológica. Trata-sede "Metodologia da Lingua-gem". Livro didático, é certo,destinado ao uso de escolas

Livros brasileiros em lingua inglesaO

PRIMEIRO livro brasilei-ro editado em inglês, nosEstados Unidos, foi "Ca-

naan" de Graça Aranha, emtradução de Mariano JoaquimLorente, e apareceu em Bostonem 1920.

Em 1921 Isaac Goldberg pu-blicou uma coleção de contos deMachado de Assis, Coelho Ne-to, Medeiros e Albuquerque eCarmen Dolores ("BrazilianTales"), seguido de uma histó-ria de literatura ("Brazilian Li-terature").

Além dos livros traduzidos porSamuel Putnam existem, atual-mente, em inglês: "Amar verbointransitivo" ("Fraulein"), deMário de Andrade, traduzidopor Margarete Richardson; umacondensação de "Mar Morto"("Sea of the âead"); Yeman-

já, mistress of the seas and thesails", de Jorge Amado, por Do-nald Walsh, na coleção "Fies-ta", histórias da América La-tina; "O cortico" ("A BrazilianTenement"), de Aluízio de Aze-vedo, por Harry W. Broion; "AMarqueza de Santos, "Domiti-Ia", de Paulo Setúbal, traduçãoe adaptação de Margaret Ri-chardson; "O Rio de Janeirono tempo dos Vice-Reis" ("Rioin the time of Viceroys") deLuis Edmundo, por DorotheaII. Monsen; "A fogueira" ("Thebonfire"), de Cecilio Carneiro,por Dudley Poore; "Angústia"("Anguish") de Graciliano Ra-mos, por L. C. Kaplan; "Mo-cência", de Taunay, em novatradução de Henriqueta Cham-berlain, autora de "Where thesabiá sings", "Caminhos Cru-zados" (Crossroaãs"), "O resto

é silêncio" ("The rest is silen-ce") e "Olhai os lírios do cam-po" ("Consider the lilies of thefield") de Erico Veríssimo, osdois primeiros traduzidos por L.C. Kaplan e o último, por JeanNeel Karnoff; "Amazônia mis-teriosa" ("The mysterious Ama-zonia") de Gastão Cruls, por J.T. W. Sadler; "Contos" ("Bra-zilian Short stories"), de Mon-teiro Lobato, por Isaac Gold-berg. Ainda inédita, a traduçãode "Memórias de um Sargentode Milícias", feita por írvingLinn.

Escritas diretamente em in-glés: "Brazil, an interpreta-tion", ensaio de Gilberto Frey-re, "White shores of Olinda",novela de Sylvia Leão e "Bra-zilian Literature, an outline",de Erico Veríssimo,

Desenho de YLUW

mesmo o saudável clima artis-tico europeu, tão propício a pul-mões que se querem encher do-fluídos de arte.

A forma do sr. O AN A naoinvoca nenhuma das caracterís-tlcas em que se exprime a artede hoje. Do Surrealismo aoAbstraclonismo não vejo a ga-veta onde arrumá-lo. A suaforma, ainda anedótlca, fica noslimites da caricatura, sem asintenções espirituais da enrica-tura. A sua cor, também, sedesdobrando numa gama detons neutros, não vibra, não co-munlca uma emoção, nem pelomenos um vislumbre de sabe-doria técnica.

As suas invenções se esque-matizam e de tal modo se im-precisam que, terminamos nãosabendo a sua verdadeira di-reção.

Sendo o sr. OAflA um pintorjovem, é possível que atormen-tado por tão grande cruzamen-to de idéias, sinta-se dentro deuma nebulosa de arte, ondeainda não chegaram os raios deum sol esclarecedor.

Porém, com tempo e vonta-de poderá chegar a ouvir a har-monia das esferas...

normais ou institutos de edu-cação, quer dizer ao ensino eà aprendizagem, tem, entretan.to, interesse mais amplo pelosaspectos que focaliza no campoda linguagem e da sua impor-tãncia encarada do ponto devista metodológico.

O Autor examina as diversasteorias da origem da lingua-gem, bem assim sua naturezae função. Defende a opinião deque a linguagem passou dogrito-instintivo ao grito-sinalchegando às palavras. Destaintrodução parte então para oestudo metodológico, no querespeita ao papel da linguagemna criança, através de sua for-mação e desenvolvimento, suasmodalidades e fases. Outros ca-pítulos são dedicados aos fun-damentos metodológicos do en-sino da linguagem, particulari-zando o ensino da leitura e daescrita, da composição e da or-tografia e da gramática.

Um capituio final trata daliteratura infantil. Nele o Pro-fessor J. Budin salienta o papel,neste campo, da contribuiçãofolclórica; ou seja da literaturaoral. Parece-me uma das boassínteses sobre o papel do foi-clore em suas relações com aliteratura infantil. Pois o Au-tor mostra como deve ser apro-veitado o material folclórico esugere idéias sobre a interpre-tação dos contos populares. Oassunto, aliás, comportaria umaampliação no seu exame.

Em primeiro lugar, salientar,se, por exemplo, o valor sócio-lógico dos contos populares noterreno da interpretação; de-pois, a posição psicológica queoferece a análise dos contos po-pulares. Parece-me, aliás, umdos setores ainda não devida-mente desbravados: esse da. in-terpretação sociológica e daanálise psicológica dos contospopulares. Pois os contos popu-lares têm sua significação so-ciológica e refletem tambémaspectos psicológicos que náopodem ser desprezados.

Já é conhecida a tese de queos contos populares exprimem ;sempre uma idéia moral; con- '.sequentemente como essa idéiamoral forma uma categoria so.ciai, e se transmite através deregras morais que são fenôme-nos sociais, claro é que os con- !tos populares têm significaçãosociológica.

II

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Domingo, 14-5-1950 t ETR 'A S B 'A R T E S Págim

1 919 TERMINA sua vidaliterária com a apresen-tação de dois bons ro-mances. O de Luis Jar-

tliin, a que Já me referi, e o dejosé (ieraldo Vieira (A Ladnl-ra da Memória — Saraiva, ed.)que acabo de ler. Ler com cn-levo e emoção, apesar de to-dos os prculoslsmos e erudiçõesde que se cnclicm inúmeraspítginas. E apesar da pletoraverbal, dos parênteses, das di-vü nações, das defazagens vlo-lentos. Em compensação umapoesia verdadeira, autêntica,uma observação que pode sertão açuda e realista quantorica na imagem que a exprime.

Ao tema da afinidade senti-mental e mental, do amor quese mantém platônico para não80 diminuir no dcsnivelamentoda traição, ajuntam-se os dasolidão, da insolubilldade decertos Indivíduos excepcionaisno ambiente em que vivem ma-tcrialmente, o da eterna revi-vescéncia da esperança paraalém da morte dos entes que-ridos e de sua presença do pas-sado. E não se trata própria-mente de uma novela dramáti-ca, embora trechos da narra-cão, como o do desaparecimen-to da heroina, possam comovernté ás lágrimas, mas de umpoema em prosa, realizado comacentos de lirismo transbordan-te c denso a .um tempo.

A extrema riqueza do voca-bulário, a multiplicação geo-métrica das associações deidéias cansarão por vezes oleitor de nossa época, habitua-cio á secura perspicaz dos ro-mancistas que "conhecem psi-cologia a fundo" e reagem con-tra o romantismo dos moder-nistas de 1922. Ou dos escrito-

LADEIRA DA MEMÓRIA

res que descobriram no realis-mo c no assunto social um veiopropício à exploração dcmagti-gica das massas. Ninguém mainde seu momento histórico, cn-trctuuto; que esse José GeraldoVieira, complexo e simples,atento ao intcrnacionalismo dacultura, ao marginalismo dosque sofrem a influência curopéia e amam a terra tropical,ouvem engasgados os sambasde Noel Rosa e as músicas deSatie, entendem de Frcud ecompram figas de Guiné aosfornecedores de macumbeiros.Ninguém mais presente, maispessoal na expressão da sensi-bilidade moderna do que esseescritor desvairado pelo amorás palavras, sutil na descobertada imagem inesperada, pene-trante na análise das almas de-sa Justadas, cheio de angústiase ao mesmo tempo exuberantede entusiasmo revolucionário.Com trechos de um surrealismotípico, como quando comparaos passageiros de seu vagão ahipopotamos, maçanetas, fui-nhas, gargulas, hérnias cívicas,ferros de engomar, cebolas,gansos, vísceras vestidas, bu-chos digerindo, fígados fabri-cando fel, e momentos de umadramaticidade expressa em me-táforas da realidade mais atual,como quando ao saber rcpeiiíi-namente da morte de Renata oprotagonista do drama nos diz:"A biblioteca sumiu. Tudo:pessoas, paredes, livros, cande-

SÉRGIO MILLIET

labro, poltronas. Como umavião desgovernado, em fúria,com os motores em rotaçãomáxima, num ronco estertoran-te, despencando entre labare-das, senti a alma se desluserirde mim numa velocidade quea deformava em fantasma flui-dico". Da mesma forma nodiálogo, a frase, espontânea sealterna com a convencional ea literária, segundo a cena sepasRc em ambiente fotografa-do da realidade (recepção cmcasa de Rcatrix) ou tenha sidoimaginaria para atender ás exi-gências do tema (passeios comRenata, monólogo do tio Ran-gel no trem, ele). As vezes ointelectualismo do autor for-necc-lhe a expressão mais cfl-ciente. Por exemplo: ao ^on-templar a cidadezinha paraonde se exila, diz o herói: "Sejá fosse de madrugada, lem-braria, sob a aurora frígida,um "gachis" de sorvete, lama esangue pintado por Vlaminck".Mas acontece também que esseintelectualismo lhe pregue umapeça e o leve a comparaçõesmenos felizes. Assim é que emdado momento fala de xilogra-vuras e cita os "Caprichos" deGoya, que são litografias. Lap-sos inevitáveis cm quem se im-pregnou dos requintes da em-dição sem ter abdicado do hu-mano profundo, da convivén-cia apaixonada com os homense as coisas.

O que me interessa sobremo-

do neste romance Ce José Ge»ruído Vieira é cntrcCunto a im-portância do "ambiente efe-tivo". O drama de Jorge comoO de Renata, desenrola-se apa-rentomente num eli.nia de so-nho, de fantasia. Na realidadeêle ocorre no ambiente efetivodos personagens, isto é, no am-Incute em que de fato vivem,o único que contém para elesuma substância concreta. Daia intensidade e a verdade in-trínseca dé sua aventura Esta,não é inventada, falsa, arlifi-ciai. Ao contrário, c o artifí-ciai nesses heróis c a sua exis-tenda cotidiana. Como o pin-tor que declarava ser o olhoo maior inimigo da pintura,Jorge e Renata poderiam sus-tentar que na realidade vulgarexterior se encontra o inimigomaior da vida real. O que im-porta afinal para o viajante,não são "os campos dromeda-rios, nem o espanto empluma-do dos coqueiros (Valsa late-jante)", mas o reflexo da paisa-gein na alma de quem a contem-pia. Vida é o que acorda dentrode nós uma emoção. Realidadeé o que sentimos, amamos oucdiamos intensamente e não osfatos que acontecem c não raronos cnleiam e nos impõem de-terminadas atitudes ou nos im-pelem a certas ações. A cons-ciência de que assim são defato a vida, a realidade, o mim-do verdadeiro, c a percepção deque, a nos impedir de alcança-

los, estão o mundo exterior, osarcasmo dos fatos, as iujiiii-ções das datas, parentescos, .-ri-tuação social, etc, é que cau-Mini a angústia, o sentimento)de solidão, de insolubilldade onos induzem a expedir desespe-rados S. O. S. Se há queutcapte a mensagem è se se esta*bclece um diálogo, temos a sen-,saçáo eufórica de nos haver-mos realizado, Mas se riesapa-reco a alma irmã, a das afini-duries eletrizantes, então res-ta apenas subir a "ladeira ria.memória" à procura, imiti!-mente, riu faisea antiga. Mastio Rangel, vivido, lúcido, hu-mano, sabe que a mensagemencontra >cmprc quem a capte.Por isso diz a Jorge estas pa-lavras de reconforto: "Cuidava,você então que neste mundonão havia mais nenhuma cria-tura capaz de captar o seu S.O. S." Jorge, cm todo sofri-mento, cm todas as perplexi-dades solitárias, embora noacuidemos perdidos. sempre,sempre há um instinto reflexode apelo. E há sempre escutascapazes de captar essa ânsia,seja lá em que litoral longin-quo tenhamos queimado a nave >v.para o impossível retorno".

O romance de José GeraldoVieira é portanto na sua glo-riosa melancolia uma mensa-gem de otimismo. Em relaçãoao romance rio realismo da mi-séria, desesperante e obnu-lantc dos recursos que temospara lutar c nos realizarmos,ele se apresenta como umaafirmação do homem, uma su-pçração do espirito, o romanceda realidade interior, o roman-

(Conclui na 15.a pág.). j j

POEMA DE HENRI DE REGNIEREM TRADUÇÃO DE R. MAGALHÃES JÚNIOR

**&tento-v

O» Vinheta de SANTA ROSA

LE BONHEURSI TU VEUX ÈTRE HEUREUX, NE CUEILLE PAS LA ROSEQUI TE FRÔLE AU PASSAGE ET QUI S'OFFRE À TA MAIN, •LA FLEUR EST DÉJÀ MORTE À PEINE EST-ELLE ÉCLOSE,MÉME LORSQUE SA CHAIR RÉVÈLE UN SANG DIVIN...

N'ARRÊTE PAS L'OISEAU QUI TRAVERSE L'ESPACE;NE DIRIGE VERS LUI NI FLÈCHE NI FILETET CONTENTE TES YEUX DE SON OMBRE QUI PASSESANS LES LEVER AU CIEL OÜ SON AlLE VOLAIT;

NtCOUTE PAS LA VOIX QUI TE DIT: "VIENS". N'ÉCOU>'E '"

NI LE CRI DU TORRENT, NI L'APPEL DU RUISSEAU;PREFERE AU DIAMANT LE CAILLOU DE LA ROUTE;HESITE AU CARREFOUR ET CONSULTE L'ÉCHO.

PRENDS GARDE... NE VÊTS PAS CES COULEURS ÉCLATANTESDONT L'ASPECT FAIT GRINCER LES DENTS DES ENVIEUX;LE MARBRE DU PALAIS, MOINS QUE LE LIN DES TENTES,REND LES RÉVEILS LÉGERS ET LES SOMMEILS HEUREUX.

AUSSIBIEN QUE UiSPLEURS LE RIRE FAIT DES RIDES,NE DIS JAMAIS: ENCORE, ET DIS PLÜTÕT: ASSEZ.TT- LE BONHEUR EST UN DIEU QUI MARCHE LES MAINS VIDESET REGARDE LA VIE AVEC DES YEUX BAISSÉS.

(Do livro "VESTIGIÀ FLAMMAE")

IÀ VENTURA }

HENRI l>E RÉGNIER

SE QUERES SER FELIZ NÃO COLHAS NUNCA A ROSAQUE, RUBRA, NO JARDIM, SE TE OFERECE À MÀO,POIS MORREU, AO ABRIR-SE, A FLOR MARAVILHOSA,E AS PÉTALAS DE SANGUE EM BREVE TOMBARÃO...

AQ PÁSSARO LIGEIRO, IMPLUMADO, QUE PASSA,NÃO QUEIRAS COM TEU ARCO E UMA FLEXA ABATER,DEVE BASTAR-TE VER A SOMBRA QUE ÊLE TRAÇANO CHÃO, SEM PARA O CÉU O OLHAR IMPURO ERGUER.

NÃO OUÇAS NUNCA A VOZ QUE TE DISSER: "VEM". NADAESCUTES, — SEJA O ARROIO OU MÚSICA DE NINHOS.PREFERE AO DIAMANTE OS CALHAUS DE UMA ESTRADA

E À TRILHA MAIS SUAVE OS ÁSPEROS CAMINHOS.

CONVÉM QUE NO VESTIR A DISCRIÇÃO APRENDAS,POIS EVITA O RILHAR DE DENTES INVEJOSOS.AO PALÁCIO PREFERE AS ENCARDIDAS TENDAS;'DÉSPERTARÁS

FELIZ DE SONHOS VENTUROSOS. . .

TAL COMO O PRANTO O RISO AJUDA A FAZER RUGAS..,-"NUNCA PEÇAS DEMAIS. LIMITA AS FANTASIAS, -POIS A VENTURA É UM DEUS QUE ANDA EM CONSTANTES FUGAS,DE OLHOS POSTOS NO CHÃO E MÃOS SEMPRE VAZIAS...

k. MAGALHÃES JÚNIOR

•JUÉSÉÉd^ ÇSTSSTIWW*;;"''¦ !••:'¦'-•..' s--'V -1..-V.V.,,.,,—....... „„.„,«,,,,.....

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Página — 6*,-• LETRAS E rA RT E S

Mas nem ei, nem mesmo noconjunto de todos os poemasaté agora citados, ficava ditonido o que tinha Cruz a dizerem torno do sagrado motivo.Sua expressão final e total,nesse terreno, está contidaalhures: nos três sonetos inti-lulados PACTO DE ALMAS,compostos no dia 12 de Outubrode 1897, expjicltamente ofere-cldos a Nestor Victor, "por de-votamcnto r admiração", e nosyuais o poeia fala desta forma:

1

PARA SEMPRE

Ah! para sempre! paru sem-\pre! Agora

Não nos separaremos nem um[dia...

Nunca mais, nunca mais nes-Ita harmonia

Das nossas almas de divina[aurora.

A voz do céu pode vibrar so-Inora

Ou do inferno a sinistra sin-\fonia,

Que num fundo de astral me-* [laneolia

Minha alma com a tua ai-[ma goza e chora.

Para sempre está feito o au-Igusto pactotCegos seremos do celeste tac-

[to,Do Sonho envoltos na estre-

[Ia d a rede,

E perdidos, perdidos no In-[finito

_ • * As nossas almas, no clarão[bendito

Hão-de enfim saciar toda es-[ta sede...

II

LONGE DE TUDO

E' livres, livres, desta vã ma-[teria,

Longe, nos claros astros pe-[regrinos

Que havemos de encontrar os[dons divinos

E a grande paz, a grande paz[sidéria.

Cá nesta humuna e trágica[miséria,

Nestes surdos abismos assas-[sinos

Teremos de colher de atros[destinos

A flor apodrecida e delete-[ria.

O baixo mundo que iroveja e[brama

só nos mostra a caveira e[só a lama,

Ah! Só d lama e movimen-[tos lassos...

Mas as almas irmãs, almas[perfeitas,'

Hão — de trocar, nas Regiões[eleitas,

Largos, profundos, imortais[abraços!

II»

ALMA DAS ALMAS

Alma aas almas, minha ir-[má gloriosa,Divina irradiação do Senti-

[mento,Quando estarás no azul Des-

[lumbramento,Perto de mim, na grande Paz

[radiosa?Tu que és a lua da Mansão

[de rosaDa graça e do supremo En-

[cantamenlo,O cirio astral do Augusto

[PensamentoVelando eternamente a fé

[chorosa;Alma das almas, meu con-

[solo amigo,Seio celeste, sacrossanto abri-

[go.Serena e constelada im.ensi»

[dade;Entre os teus beijos de °te-

[real cariciu,Sorrindo e soluçando de de-

Ilicia,Quando te abraçarei na Éter-

ínidade?"

9

fl tpflBOoOfcfiflfti MOftflft*Vv'^*** *^**ft*fcf .*•* *-**W^ * m^u * * **^'^^r** t**-**^^-"iV'<*A'LAj*ii*_/lLf_^j* ¦¦¦--• ...». -. ¦ .............. _ .

Cruz e Souza e Nestor Vitor

E eis aí o espetáculo deslum-orante: o homem negro e ohomem branco, o primitivo eo requintado, o Poeta em cujopsiquismo trepidavam somenteritmos • bárbaros e antigos e opensador alimentado da maisrecente cultura do mundo, Cruze Souza e Nestor Victor, —constituindo o exemplo de mú-tuo amor espiritual mais ab-negado, mais férvido, mais des-prendido, mais puro talvez queregiste a história universal dainteligência.

TASSO DA SILVEIRA(Conclusão)

Das confissões, dos depoimen-tos desse amor que um e outronos deixaram resulta claramen-te que, como não podia deixarde acontecer, interferiu cadaum na condensação definitivada "alma profunda" do outrode maneira imperiosa.

Nestor de si mesmo diz quedeveu ao convívio de Cruz osenso de gravidade da vida queinforma toda a sua literatura.Cruz e Souza apenas exprimeo absoluto fascínio que sobreêle exercia o Amigo, e a abso-

luta dependência em que vi-via do seu amor. A critica, noentanto, pode respigar na obrade Cruz os sentidos positivosque nela infundiu, por influxodesse amor, o ensaísta do "Elo-gio do amigo".

Apontemos apenas sumária-mente esses sentidos dizendoque Nestor exerceu Junto aCruz, com magnífica eficácia,o papel de condutor — ou deintermediário, como se diz emLiteratura Comparada — dascorrentes de mais denso pen-

CONDIÇÃO DO ES-CRITOR PORTUGUÊS

(Conclusão da l.* pág.)dim, porventura Camilo, por-ventura o Eça, porventura, até,já o Fernando Pessoa, — por-que o Fernando Pessoa tam-bém já morreu. Náo serei euquem os censure por isso! Mas• escritor contemporâneo éque não pode contar com eles.Os críticos que se ocupam dosnossos criadores contemporâ-neos, quem são? Na maioria(digo "na maioria") medíocresmuito senhores de si, ou mui-to pouco dispostos a perdoarqualquer superioridade alheia;às vezes, colegas despeitadosque se vingam; outras vezes,doutrinários políticos, religio-sos, sociólogos, tudo o mais,que só vêem um adversário nocriador que os não serve; e as-sim por diante. TJma insana-

vel cegueira ou uma oportunamiopia —¦ lhes escondem o quemais importa na criação ar-tística: a sua originalidade; asua qualidade; a sua força in-Uma; o seu tom único.

Bem certo, bem certo quetambém nos outros países apa-recém destes exemplares! Ai,porém, são as suas tristes vo-zes apagadas pelas dos verda-deiros críticos; pois aí, há ver-dadeiros críticos para estuda-rem as obras contemporâneas,dando-lhes uma compreensãoque não exclui a justa medidados valores.

Bem certo, ainda, que atéentre nós há uma ou outra ex-ceção no soturno panoramaque ficou esboçado. Honra aessa heróicas exceções, quesão o único verdadeiro' incen-

tivo exterior do desprotegidocriador português! Mas seráúnico? Não o único: Até o es-critor português sente que pai-pita, na sombra, um públicoanônimo que, embora reduzido,o acompanha com o seu inte-rêsse. Desse mundo lhe vem, àsvezes, um estímulo numa notade jornal, numa carta que nãopede nada em troca, numaspalavras comovidas dum des-conhecido que se lhe dirige-..E também, está claro, naque-les testemunhos a que já mereferi, e que só é pena — da-das as torturantes condições detrabalho cm que se esfalfa,matando-se aos poucos, o cria-dor português intransigente -—só é pena, dizia, não tome aheróica resolução de dar sempedir.

¦'•*"¦.' '*;' •>

A ESFINGE DE SAN MICHELEDARCY DAMASCENO

SOBE O MENINO A COLINAVAMOS NÓS PELA MÃO DELE.CAMINHO DE SAN MICHELESUBIMOS NÓS MAIS O GUIA,MENINO GUIA DE CEGOSPOR ORGULHO, BEM SERIA.

POR ENCOSTAS DE ANACAPRIQUE ROTAS LENTAS SE ARRASTAMCAMINHO DE SAN MICHELE»E A VOZ DO, MENINO, SÉRIO- '

— LÃ VIVEVA IL DOTTOR' MUNTHE,LA CANTAVANO GLI UCCEl.LI . ..

PATAMAR DO ABISMO ACESOONDE AFUNDEI MEU ORGULHOE AFOGUEI MINHA IRONIALEVADO, ANDARILHO CEGOPOR CAMINHOS DE ANACAPRIPOR MÃOS DO MENINO GUIA'

PÁSSARO ILHÉU, O MENINO .ABEIRA A ESFINGE IMPASSÍVEL

FAÇA UM PEDIDO, AO TOCÁ-LA:SERÁ OUVIDO ALGUM DIA.SÉRIO, O MENINO ESPERAVA,ALHEIO A MINHA IRONIA.

A PEDRA MIRAVA O MARIMÓVEL SOB O COBALTO -DE UM CÉU ALTO, CEGO, VIL.MAIS GRANDE. QUE TEU DESPREZOÉ O TÉDIO'DE TANTO AZULDOS CAMINHOS POR QUE VIM!

DECIFRA-ME E SEREI TEU » ; 'PENSEI, MORDENDO MEU TRAVOSEI QUE OS OLHOS DO MENINOTAMBÉM PEDIAM POR MIMQUE POR ORGULHO FUI CEGOE POR CEGO ME PERDI.

TOQUEI A ESFINGE, A PRÒPOR-MEMAS HUMILHEI-ME, E PEDI.

Domingo, 14-5-1950

samento que circulavam, no ho.ra, no espírito do mundo Tr>• do o emersonismo, todo o nletascheanismo, todo o càrlylêalnismo, todo o íbsenismo üu».na natureza de Nestor. se lv»!viam fundido em slngulnii^j-ma resultante que náo me cabe analisar aqui, - se escoaramde Nestor para a suHstanelade Cruz, adensando-a, galvani-aando-o, sublimando-n de maneira surpreendente. Pode-sedizer que, em Cruz, o que lvtsobretudo é a seguinte íasci'-ríante conjunctio oposiTORUM, a seguinte fascinan-te conjunção de contrastes- rtdaquela natureza de bárbaroprimitivo de que nos fala Nes-tor mais de uma vez em seiisescritos sobre o Poeta Negrocom as mais agudas, mais re-quintadas. mais altas ânsias dainteligência de seu tempo. És-te decisivo elemento exterio-foi o convívio de Nestor queo facultou a Cruz. Nestor foique lhe deu a beber, não direta-mente, mas através de sua pa-lestra, de suas observações, desua atuação pessoal, ó filtromágico do pensamento nietz-^-cheano — i «elaborado pelo sen-timento cristão da vida do pró-prio Nestor Victor — c da vi-são ibseniana das almas e dodestino, e do transf:?uradoridealismo carlyleano, e da li-losofia emer-soniana do homeminterior, -*- para não falar deNovalis, Whitmam, Rimbaud,Baudelaire, Verlaine. Maeter-linck, e os simbolistns portu-guêses, que o Poeta Negro emgrande parte absorveu atravésdo temperamento do Amigo. Opróprio Antero deve ter pri-meiro aparecido, com a augus-ta gravidade de seu verbo, aosolhos de Cruz e Souza, ?ob asfeições que de há muita neledescobrira Nestor.

Releiam-se agora alguns doscantos mais altos do GrandeNegro, e neles sem dificuldadede monta se discernirão todasas incidências apontadas aci-ma. Há Nietzsche e Emersonno soneto "Sorriso interior", co-mo há Ibsen e Carlyle, e Bau-delaire e Novalis. em várias dasoutras grandes peças de Cruz.Tudo isso, poiém, não como in-fluxo direto, nem mesmo co-mo simples reminiscência Massim, como fruto de profundatransubstanciação. nomo sen-timentos do mundo qu;: já ha-viam sofrido a unifica^ova com-pressão do espírito ... NestorVictor, e que, passánciu destepara a alma convulsa 'Jo PoetaNegro, pelo crmal da afeição ex-trema, se saturaram do impe-to apocalíptico e do magnetismoda poesia que constituíam asubstância mesmo do úlMmc.

Não dispondo de tempo parafazer a prova minuciosa destasúltimas afirmações nesta pági-na, que encerrarei, no eritâh-to, com um soneto de Cruz,expressivo de tudo o que aci-ma ficou dito: Com o sonetoque êle intitulou

INVULNERÁVEL

Quando dos carnavais da ra-[ça humana

Foram caindo as máscaras[grotescas

E as atitudes mais funambu-tlescasSe desfizerem no feroz Nir-

\vana;Quando tudo ruir na febre

linsana,Nas vertigens bizarras pito-

[rescasDe um mundo de emoções

[carnavalescasQue ri da fé profunda e so-

[berano;Vendo passar a lúgubre fu-

[néreaGaleria sinistra da MisériaCom as máscaras do rosto

[descoladas;Tu que és o deus, o deus in-

[vulnerável,Resiste a tudo e fica formi-idável,No silêncio das noites es-

[ir ciadas!".m*

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RT E S Página — 7

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Não está melhor do res-friado? — perguntou-me cie,enquanto embrulhava um mo-lhe de ervas secas para a ou-tra freguesa.

— Náo é disto que se trata— esclareci com certa friezana voz, defendendo-me — jáestou completamente boa.

Êle não se deu por achado-e fixando-me com suas gios-sas lunelas de míope, acresceu^tou:

É que tenho aí erva no-Tá de São Juiião. Se.quiser ex-jperimentar...Obrigada — respondi comirresistível náusea-

Ao mesmo tempo, enquanto•esperava que êle acabasse defazer seu meticuloso embrulho,observei que a outra freguesase colocava de costas paramim, possivelmente a fim deme evitar — e no intimo, comum sorriso onde não punha amenor parcela de ressentimen-to, tão cansada e experimen-tada me achava, pensei naspalavras que ela devia estarpronunciando consigo mesma,

-e que eu já ouvira tantas vê-zes, em ocasiões diferentes:"Uma mulher desta espécie!"

Uma mulher desta espécie.Rapidamente, como quem co-mete um ato pouco recomen-dávei, examinei meu vestidobordado com velhas missangascoloridas, minha pobre "toi-lette" de noite, que tanta in-veja causava às minhas ami-gas. Sim, minhas mãos tre-miam. Toda a minha coragemse fora e eu tinha medo denão conseguir ocultar o nervo-sismo de que me achava pos-suida. Finalmente, depois deremexer uma grande bolsa develudo preto, a mulher pagoue retirou-se. Voltei-me entãopara o caixeiro, disposta a nãopermitir que êle enveredassepelo habitual assunto dos gra-cejos e das propostas que medirigia:

"Seu" Afonso, não sei oque há, mas tenho dormidomal. Queria um remédio...

Êle levantou para mim, seurosto pálido, onde luziam doisca vos olhos de curandeiro:

1 — Um pouco da pomada mi-lagrosa de São Benedito?

Bati no balcão, impaciente:.— Não, "seu" Afonso, um

desses remédios modernos, des-sãs pílulas pára dormir.

Êle balançou a cabeça repro-vàtivamente:

Ah, já sei, uma dessa*drogas estrangeiras-

E inclinando-se de súbito nobalcão e tocando-me com seusdedos finos e peludos, habitua-dos apenas ao manejo caba-Jístico das panacéias:

«r-.. São os nervos, filhinha?Vê-se que está cansada, muitocansada.

Ergui os ombros, numa )m-paciência que já nã,ó se dis-farçava mais. Sem dúvida êlecompreendeu o que se passavacomigo, pois abriu uma gaveta

,<• *• CAPITULO DE ROMANCE

e entregou-me um tubo. Pelaembalagem vi que era exata-mente o que eu procurava:apoderei-me vorazmente do ob-jeto que êle me entregava, in-dagando qual a dose normal,quanto deveria tomar, etc. Comgrande benevolência, num tommacio e melífluo de quem adi-vinhusse para que fim desti-nava eu aquele remédio, expii-cou-me que deveria tomar nomáximo duas por noite, poisa droga era forte c "poderiaacontecer que ficasse dormiu-do muitos dias". Tentei esho-çar um sorriso, tudo de que euera capaz naquela noite:

— E se tomasse todo?As lunetas inquisidoras fui-

guraram de repentina compre-cnsão e aquiescência:

•¦ Ai dormiria para sempre

LÚCIO CARDOSO

— soprou-me quase junto aorosto. Paguei e sai. Na rua,com a bolsa apertada contrao peito, e dentro da bolsaaquele remédio com que viniiasonhando há vários dias (oencontro com o ferido só vie-ra precisar um desejo que len-lamente se avolumava cm meuespirito) caminhei a esmo, sobas gotas finas da chuva quetombava. Em torno a multidãoparecia mais agitada, vultosapressados me roçavam, facesenvoltas cm peles, cabeçasocultas sob véus, enquantoguarda-chuvas se abriam e pc-sados capotes de homem agi-tavam as pontas ao vento for-te da noite. Mais nítidos, osletreirog luminosos colocavamuma nota alarmante dentro danevoa que começava a descer.

E essas figuras que enchiam asruas eram os eternos homenscom embrulhos, as habituaismulheres que vinham de aban-donar os escritórios, toda essahumanidade de destino certo cmarcado, da qual eu me afãs-tara e de que perdera o ritmohá tanto tempo.

E já agota nenhuma da-quelas pequenas dores meafligiam mais: não lamentavaminha vida truncada, nem mi-nha incapacidade de criar uniaforma nova de existência —sabia apenas que estava can-sada e morrer me parecia ocaminho mais rápido e maissensato. A mim mesma, cami-nhando sem descanso, comoacionada por oculta mola, per-guntava onde se achavamaquelas intensas nostalgia* que

O ESPIRITO DE SWIFT:DISCURSO SOBRE A GUERRA

Jonathan Swift é um âos maioies prosadores e. sem dúvidat 0 maior escritor satíricoãa literatura inglesa. Fora ãa Inglaterra esse fato é menos conheciâo porque a obra-prima ão granâe polemista contra a humaniãade, "As viagens ãe Gulliver" só circulaem eâições abreviaãas e cspurgaãas, como livro ãe leitura infantil. O trecho seguinte,sobre a guerra, é ão capitulo V, livro IV ão "Gulliver".

ELE

me perguntou quantoaos motivos mais frequen-tes das guerras. Respondi

que esses motivos são tão nu-merosos que só poderia men-cionar os mais comuns. Asvezes, é a ambição dos princi-pes que não acreditam nuncapossuir bastante terras. Asvezes é o conselho dos minis-tros que precisam de guerrapara sufocar os gritos dos sú-ditos contra a administraçãoinepta e corrupta. Tambémpequenas diferenças de idéiasjá causaram guerras e das maissangrentas. Às vezes deve serdecidido pela guerra entre doisgovernos qual dos dois tem deceder a metade do seu pais,metade à qual nenhum dosdois tem um direito. Outravez, um governo começa a bri-gar com outro governo por me-do que o outro comece a bri-

gar. Já se começaram guerrasporque a inimigo é muito for-te, enquanto outras guerras seiniciaram porque o inimigo émuito fraco. As vezes nossosvizinhos possuem as coisas deque nós precisamos; outra vezeles precisam de coisas quenós possuímos. Motivo dosmais justificados para começaruma guerra é a invasão em ou-tro pois porque a populaçãoestá enfraquecida por dificul-dades econômicas ou por dis-sensões partidárias. Tambémtemos o direito de atacar nosso vizinho quando uma cidadedele nos agrada muito. Quan-do um governo manda suas tro-pas para . um país em que apopulação é pobre, e ignoran-te, tem o direito de eliminar ametade desse povo e escravi-zar a outra para alfabetizá-loe extinguir os resíduos do bar-

barismo. Sobretudo convémproceder dessa maneira com osnossos chamados aliados.

Usam-se para esses fins oscanhões, fuzis, pistolas, espa-das, baionetas,. batalhas, aa-sédios, retiradas, ataques, mi-nas, contra-minas, bombar-deios, escaramuças navais, ....20.000 mortos de cada um doslados, agonias, membros quevoam pelos ares, fumaça, baru-lho, confusão dos corpos, fu-gas, perseguições, campos cheiosde cadáveres entregues aos ca-chorros e lobos, saques, pilha-gens, incêndios e outras des-truições menores.

Mas quando acontece queuma agressão dessas não tem omerecido êxito, então as tropasvoltam para casa, iniciandoaquilo que se chama guerra ei-vil.

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Xilogravura de OSWALDO C0ELDI

antigamente se apossavam domim ao cair da noite, quandovia passar os bondes pe-Jados de gente em demandaaos lares trancados e hostis, oas fachadas dos cabarés e dascasas de diversões acendiamseu olho luminoso e que*Ue,olhando as calçadas onde tran-sitava um triste rebanho à ca-ta de prazeres. Nada mais exis-tia em mim senão um grandeaniquilamento e uma fundaimpressão de que já havia ba-tido em todas as portas, quojá havia tentado todos os re-cursos. k

Mas de que estranhas c ob«-ti nadas forças não se compõenu fundo das almas esse jactoelementar c constante, que ecomo o próprio principio davida? Eu caminhava, as ruasiam ficando para trás, os quar-teirões que me eram tão fami-liares, as esquinas onde tantasvezes me postara à espera dasvitimas incautas... dessas eter-nas vitimas que afinal são osnossos algozes e os duros se-nhores de quem dependemos.Eu caminhava, e ao meu pen-samento subia a lembrança deoutras mulheres que vira emsituação mais ou menos idên-tica, tristes- isoladas, com essasensibilidade doentia e viva dosque rolam a vida inteira ámercê das mais duras contin-Bencias... L e m b rava-me detantos rostos isolados e frios,e a mim mesmo perguntavaonde tinham ido, se haviamtomado o mesmo caminho queeu, se haviam conseguido su-portar o inenarrável vasio des-sa vida sem esperança e semhorizonte de espécie alguma...

Nem eu mesma conseguiasaber como tinha c h egadoàquele estado: caminhandoapenas, à sombra desses altosedifícios que coagulam o cen-tro dos quarteirões mais mo-vimentados, sentia que todasas cidades secretam dessa es-pécie noturna e desgraçada deseres, desses obscuros destroçosque se arruinam pelas esqui-nas, ao longo de uma vida in-teira de febre e de procura.. •

Pois eu procurara, não tinhadisto a menor dúvida. Duran-te anos sufocara nos quartosmais estreitos e nos ambientesmais sórdidos, à espera, em vão,que a luz salvadora surgisse.Não tinha nome, nem face.nem coisa alguma que a iden-tificasse dentro desse caos emque se tinha convertido a mi-nha existência — mas quantomais a penumbra se fechavasobre mim, mais inquieta setornava a minha ânsia, maisdesatinada, como se temesseque a cada minuto uma proba-bilidade nova surgisse, capaz deme arrebatar a única esperan-ça possível... Que direi dessesquartos suspeitos e imundos, emcujas janelas estrangeiras tan-tas vezes me debrucei, sondando aflitaménte a escuridão semremédio, os tetos sujos, comose fosse possível que uma vez,uma só vez alguém chamassemeu nome do outro lado. Quedirei desses quartos e dessascamas quentes e úmidas desuor onde tantas noites 'se-«uidas escondi o meu rostocansado chorando nem sei quelagrimas tão duro se tornarao meu rosto, tão insensíveis osmeus olhos, tão desapiedada apobre alma que velava dentrode mim ..

Sim, decerto eu procurara,mas agora estava farta. Den-tro de mim falecera toda pos-sibilidade de esperança. l)en-tro em pouco, sozinha numcanto escuro como um animalforagido, tomaria todo o tuboque se achava na minha boi-sa, e dormiria de um sono doqual jama^; poderiam me ar-rançar. Dentro em pouco. E eurepetia essas pala vras, rit-mando meus passos, monótona-mente.

¦¦--—Foi assfmT"dê"üm modo qua-se insensível, que cheguei atoo ponto uar, barcas. Lá o mo -vimento era mais intenso, api-tos surdos vinham da solidãonoturna do mar. Não hesitei:ganhei o saguão e comprei Umapassagem. ¦'-—*

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CHAGALL, O MAIOR PINTOR DE NQ SO TEMPO, FALA A "LETRAS E ARTESUM HOMEM SIMPLES

Desenho de ChagallNão hesito enfrentar a crítica

em voga, isto é, os promotores cÜlefensores do abstracion i s m o,

a Orgeval, num retiro InviolávelDepois se transferiu para Ven-ce, no Melo-Dia, onde trabalhoatualmente, em sua vila. E é dese notar a coincidência que fazMatisse, Picasso e Chagall vive-rem e trabalharem quase comovizinhos, numa zona táo próxl-ma, apesar do mundo -ser tãogrande. Mas se passarmos porali, veremos que não é por co-incidência que se reuniram osgigantes... No momento, Cha-gall está em Paris, hospedadoem casa de sua filha Ida, que•firmando que Marc Chagall se Z,vZ vT

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destaca entre os "três grandes". conheço >* muito tempo. Numa

fcara ser o maior entre os pinto-res contemporâneos. Não se tra-ia de descobrir sua pintura, nemlie conquistar novos fiéis. Tra.Ia-se simplesmente de um depoi-toento próprio: para aqueles que,llomo eu, conhecem Picasso, Bra-

pequena e doce praça da ilha —a Praça Dauphine — tranqüila,com suas mesas e cadeiras aosol. Entrei por uma porta infe-rlor, dei mais alguns passos e eisque subitamente me encontreinum pequeno aposento situadono andar térreo, dominando uma,|ue e Chagall, humanamente, a ZnZg*

Wrre* " e¦uperlorldade artística do último SLE^iT ? ^^ ?"_ tão evidente ™m„ o ^ „-, „a Paredes, duas esplendidas telasÉ tão evidente como a do sol so

bre a lua. Eu já conhecia Cha-gall- Havia-o encontrado em No-Va York há alguns anos e guar-Bara dele esta inolvidável im-pressão que fica em todos aque-les que se aproximam do pintor.Agora, um grande acontecimentoee marca em Paris: Chagall ex-(põe na galeria Maegh suas te

de Chagall, entre as mais belas.Chagall entra e um tom diferen-te invade a sala. Parece com umúnico homem: Charles ChaplinNão é alto, tem os cabelos gri-salhos, anelados e levemente caí-dos sobre a fronte, formandouma espécie de aureola. Os olhosrussos, longos e brilhantes, sãoprofundamente humanos. AgiaIas mais recentes, ao lado das £T"7 - ¦? ,-ilustrações recentemente apare- 22KL5 ^

díf?,?do: _7cidas de duas grandes obras: JS?T ' ^^^ (ohrl'

«_. , •¦ ««ma. gado). Num momento compre-Almas Mortas" de Nicolas Go- endo que para entender e sentirgol, e As Mil e Uma Noites", sua arte é suficiente apenas vê.d ultimo um suntuoso álbum de Io e ouvir sua voz melodiosa eSmvf i? am a na. AmérIca- slncera que envolve a gente numWum dos próximos números do misticismo quase tangível. Só-revista "Verve", Chagall publi. bretudo é a extrema simplicida-«ara as ilustrações feitas para de que nos conquista e força ams historias de Boccaccio. nossa simpatia por que Chagallf Letra* a Ar»»." ~ „ • • nunca pareoe um intelectual, nãoTLerras e Arte, , o primeiro fala sobre filosofia ou crítica;\ contato publico em Paris fala simplesmente e o que diz

,-,. _ tem um acento de verdade dekt dSna„°„,dch^ud0S ün,'d0S Um" TOrdade I»**» *?«*pa aois anos, Chagall se recolheu fere.

mÊÇabo de CHAGALL

Para vir ao Brasil, esperaapenas um convite

Tem pensado sempre no Bra-ail e diz com um acento russopronunciado: "Deve ser um paísmaravilhoso. Teem me convidadomuito para uma "tournée" atélá, mas tudo fica em palavras.Porém ainda haverá tempo e eudesejo muito conhecer suas cô-res".

Agora o nosso assunto é a pin-tura abstrata- Chagall diz:

— Não acredito senão em umacoisa. A qualidade. Não é pre.ciso fechar-se numa direção,obedecer incondicionalmente auma teoria. Sartre diz: "o mal";Breton diz: "o automatismo";Degand diz: "o abstrato". Pormim acho que somos instrumen-tos que palpitam independente-mente de uma ordem. Bebemosde um grande rio que é a vida.Há a margem direita e a es-querda das coisas nesse rio. Asarvores, as flores, os autos, asfrutas, as pessoas, os doentes doestômago ou da cabeça, tudo is-so, coisas que flutuam neste rio.Elas nos tocam, nos roçam e nósnão podemos ser-lhes insensí-veis. O estômago digere tudo quelhe enviamos, os bons e os mauspratos- A alma do artista e seutrabalho não diferem muito dis-so. Não devemos nos isolar numcaminho estreito. A questão seresume em deixar-se embalar pe-_Ias águas do grande rio. Eu sem-pre me influencio por todas ascoisas. Por uma mosca que atra-vessa o quarto, pela simpatia queleio nos olhos das pessoas-A pintura do nosso século

Chagall se detém, se compõe eevita ser prolixo: "Eu não seime deter" — diz êle. E continua:

—Admito qualquer pintura,desde que ela seja bela; bastaque ela tenha qualidade, porquea qualidade é a condição doamor. Sob a qualidade há oamor e o amor é a qualidadeIdeal. Não aludo ao amor sexual,mas àquele amor total, autên-tico. Vivemos uma época de de-cadência de religiões e em com-

ipensação criamos uma religiãoprópria, que é o amor.

Os quadros abstratos nãocorrem o perigo de constituíremapenas decoração, tapeçaria, porexemplo? -

Às vezes. Porém há . tam-bem a bela tapeçaria antiga.

; Tapetes que de boa vontade oscolocamos nas paredes... sem-pre a mesma coisa: a qualidade.Há na Bíblia um preceitoexpresso, segundo o qual não sedeve pintar ou reproduzir nenhu-ma de suas passagens (Chagall éjudeu e o sabe). Como o senhorencara esta proibição?

Tudo é uma questão de con-dição, de maneira de ver, porquenada poderá ser taxativamenteinterditado. Tudo deve e pode serexpresso, depende da maneira, domodo pelo qual se comporta di-ante de um tema.

Qual a sua opinião sobre oscontemporâneos? Gostaria tam-bém — pedi-lhe — que o senhorme falasse um pouco acerca dosprimeiros anos em Paris, quandoveio da Rússia, por volta de 1910.

Chagall tenta ordenar os acon.tecimentos:

— Foi logo depois da revoluçãorussa — me diz. — Quando che-Suei em Paris encontrei Guillau-me Apollinaire, Max Jacob, que •foram os meus primeiros, amigos.Foi precisamente na fase final ' "" .do impressionismo e nos primor- r'

.dios do cubismo/que eu insistia

E EM PERMANENTE f^NJATO TOM A VERDADEIRÍ ORIGEM DA CRIAÇÃO ARTÍSTICA - "O PONTO DE CONTATO ENTRE tn mmTRÊS DE TODAS AS ÉPOCAS E A QUALIDADE"l (PARIS - VIA AIR FRANCE - LOUIS WIZNITZER)

C°NTAT° ENTRE 0S MES'/vtt*

em denominar realismo. E era uma psicologia nova Dormi* JJpróprio realismo para mim, em- então se insistia em'ver adinnábora eu n&o estivesse de acordo do lado e atrás sempre uma Dcom multas de suas teorias. Pen. ma coisa. Como se a cabeça Vusava completar esta pintura com se unicamente o que se passai

diante dela. Entretanto, os íenô-menos são simultâneos e estacorrespondência não se dá ape-nas com os objetos, mas com asensibilidade. Eu pretendia um

cubismo Impregnado du uma psi.cologia plástica. Depois veio osurrealismo. Também aquele mo-vimento ficou fechado em llml-tes muito estreitos numa tentati-

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Marc Chagall, quando era enfrentado pelo nosso correspondente, em Paris*IM PAIS More Chagall (Tradução de LIDO IVO

— e WILLY LEWIN)

MEU É APENASO PAÍS QUE EXISTE EM MINHA ALMAENTRO NELE SEM PASSAPORTECOMO SE FOSSE EM MINHA CASAÊLE VÊ MINHA TRISTEZAE MINHA SOLIDÃO.ÊLE ME FAZ DORMIRE ME COBRE COM UMA PEDRA PERFUMADA.

EM MIM FLORESCEM JARDINS,MINHAS FLORES SÃO INVENTADAS,MINHAS RUAS PERTENCEM-ME..MAS NELAS NÃO HÁ CASAS,DESTRUIRAM-NAS DESDE A INFÂNCIA.OS HABITANTES VOGAM NO ARÀ PROCURA DE UM ABRIGOELES MORAM EM MINHA ALMA.

EIS PORQUE SORRIOQUANDO O MEU SOL MAL BRILHA,OU CHORO COMO LEVE CHUVA NOTURNA.HOUVE UM TEMPO EM QUE EU TINHA DUAS CABEÇAS,HOUVE UM TEMPOEM QUE ESTES DOIS ROSTOSSE COBRIAM DE UM ORVALHO AMOROSOE SE DERRETIAM COMO O PERFUME DE UMA ROSA.;

AGORA ME PARECEQUE MESMO QUANDO RECUOAVANÇOPARA UM ALTO PORTALATRÁS DO QUAL SE ESTENDEM MUROSONDE DORMEM TROVÕES EXTINTOSE RELÂMPAGOS PARTIDOS»

MEU É APENASO PAÍS QUE EXISTE EM MINHA ALMA.

mm^^^^^^^^Hmmmmm^^^^Êm^^mmmmmmmWÊm^ ^^^Y^^^í^mm^^^m^mM^^^^^mmmmk wÊ&^WM^ãàm^m BMi fl IlHIEI RÜi Wm1 ^^^^^^^^^^m^^^^m M^^kmWBmW^^m^^^m P^l II lü I

ifall WÈÊÊÊÊÈmmm wm®: -fl Ül _Ü I__nl_i llMKSKKI w__H IsHnl^H^S R^M^v/" 'v:'::;__fl RSSSSSel¦k^ Ti mê« mm mm I¦ ^I^Wi 1 ¦___ - JiiW r ^ Hs___MB_KlM__^i§it^^_^P^^^^^ x-s•-- RIR Rli-fc^^^^fl RR R • ;¦ í* -RRillPlfl ¦

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^Bl ^^^^^^W^^^Sm^&ãm mm MMW^^^^^^^mmmmW^UmmmmmJ>o alto de YitebsKi óieé de MARC CHAGALL

va de automatismo ou numavontade de chocar (que nada ti-nhn de automatismo). Entretan-to eu nao hesito em reconhecero extremo valor de certas telasde Picasso, Mondnan. de Klee oude Miro. Gosto de certas obrasde Picasso mais pelo seu sentido

.do que por uma identidade co-migo. Reputo valor a certos qua-d ros de Klee ou do mais moçoMiro, porque são realmente bo-nltas, mas para a minha aimaeu sinto que elas não bastam.Nem os modernos nem osantigos, mas os grandes

mestresQue pensa dos grandes mes-

três clássicos?Evidentemente eles me con-

fundiram. Eu já disse, amo aqualidade, sobre todas as coisas

Certamente isto seria banalnuma outra boca. Porém não sãoapenas frases quando são ditaspor Chagall. A simplicidade e afé com que são ditas, fazem.nassuar como um poema. Seus olhossublinham o que vai dizendo equase sempre termina suas fia-ses docemente, com um sorrisoesplêndido: "É sempre assim —prossegue — os grandes' se con-finam. Greco, Goya, Tintoretto,tfan Gogh, todos tém um pontocomum: se reúnem não pelosmotivos e tendências, mas pelaqualidade. E Rembrandt não fimais atual porque não há maisa característica de sua qualidadehoje e ninguém pinta como êle.Mas é preciso recuperar isso, épreciso pintar como Rembrandt.Os nomes que eu admiro? Cima-bue, Giotto, Piero de Ia Fran-cesca-.. há pontos de contatoevidentes entre os grandes...

Ê verdade que o senhor sô-mente trabalha sob inspiração?

A esta pergunta, Chagall setorna comovido, cheio de simpll-cidade infantil, de doçura.

Graças a Deus eu recebiuma certa dose de inspiraçãoque jamais me falta (pensa ummomento, a cabeça caida sobreo ombro): recorda acaso essesversos — "Mon coeur est un lutsuspendu: sitot quon le touche11 résònhe?"Chagall e os novos "metiers"

da pinturaA seguir, falo sobre as águas-

fortes e a cerâmica Êle me diz:Comecei a fazer agua-forte

há dois anos. Elas me pareceramtomadas de uma necessidade ab-soluta de luz, não de côr. A luzfecha nela todas as palhetasimaginárias do mesmo modo quea côr autêntica traz nela todasua luz... Novamente senti ne-cessidade de fazer aguas-fortespor ocasião de meu retorno dosEstados Unidos. Porque? Se eusei, se sempre soube o que fiz éporque eu acredito que não fa-rei nada fora daquilo. Tudo oque fazemos é procura de ver-dade. Mas é difícil falar e eume fecho em minha arte comoem uma caverna. Uma caverna,entretanto, que é um templo, on-de pretendo oferecer meu sacri-fício-

Insisto ainda uma vez!— Tenho feito alguma cerâml _,

ca, que considero o resultado dtminha vida no Meio-Dia; lá sen-te-se uma grande significaçãodeste velho "métier". A própriaterra, sobre a qual a gente pisa,é em si luminosa e nos olha co-mo se estendesse um apelo. Etenho, às vezes a impressão de .estar ouvindo a voz de minhacidade natal — Vitebsk.. • Mas

este sennao na terra nao se cap-tn facilmente. Vivemos numtempo de bombas, poderemostalvez morrer, morrer todos, nãose sabe quando, e ás vezes sintoum incontido desejo de me con-fundir com esta bela terra cheiade fogo. E a abstração? Não serátambém isto matéria para abs.tração? Ou se trata de fazer 11-teratura? Verdadeiramente, amatéria é sensível. A qualidade éabstrata, o amor é abstrato.

Falo sobre sua volta à Amé-rica. Haverá possibilidade?Como não. Basta que eu se-ja convidado. Sempre me com-porto como uma criança: é ne-cessávio que me convidem, queme guiem e acredito que todosnós somos mais ou menos assim.Não há verdadeiros Hércules. Nofundo somos todos crianças, comum forte desejo de sermos gula.dos. Há dois anos, quando minhamulher morreu, acreditei quetambém eu ia morrer. Parecia ir-rcmediável- Porém encontrei mi-nha nova mulher, que me rerio-vou a inspiração, meu desejo deviver. Pensei então que minhaantiga mulher queria que eucontinuasse a trabalhar e eis tu-do...

Seus próximos trabalhos?Ilustrei nt; fábulas de La Fon-

talne, faz muito tempo, mas osmanuscritos e ilustrações estão

Desenho de Chagall

tretanto. não fiz nada nesse sen-tido. Vou voltar a Vence.

Conhece os pintores brasi-lei ros?

Tenho grande curiosidade evontade de conhecê-los. Ficomuito satisfeito quando encontroqualidades nos trabalhos dos ou-tios e também me alegro quandoeles julgam meus trabalhos. Mas,se eu conheço pintores brasilei-ros? Sim, conheço um pouco Pormetidos num subterrâneo de Bu- ^L^Tn^™^

umP°UC0 ™"dapest, e aí está o motivo da £#¦?

ClCC,r° PaS' PTm g°S*demora. Aparecerá em breve, *«"» de conhece-los melhorceio, uma edição da Bibfia, eon ££RZ _

*'*minhas ilustrações. í:haga11 padece a simpatia que

le nos meus olhos, e após dedi-Gostaria de dizer aos leitores cür-me seu livro me acompanha,desta entrevista que este será pronunciando novamente —maior livro ilustrado deste sé- «Setipassibò». Antes do últimoculo XX, mas — pergunto aperto de mão oferece a "LE-Chagall — que dramas poder-se- TRÁS E ARTES" um poe-ia escolher na Bíblia? O pintor ma que escreveu na Rússiasorri e me responde: e que nesta página está sen-Há 105 ilustrações... 105. do divulgada pela primeiraE além disso, no que tem vez. Efetivamente não devemoatrabalhado ultimamente? acrescentar considerações aoNa América fiz "décors" poema pois éle é a imagem pre*para ballet. Para o "Pássaro de cisa da pintura de Chagall e doFogo", de Strawinsky. Aqui, en. homem que éle é.

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Desenho de CHAGALL ^

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Página — 10 LETRAS E ARTES Domingo. 14-5-1950

Anais do Congresso deFilosofia

V Vao bom adiantados os tra-balhos de feitura dos anais do

• 1» Congresso Brasileiro de Filo-4 sofia. A parte mais difícil, qual•seja a de taqulgrafar e tradu-, duzir os debates e discursos quo

foram gravados cm discos, jáfoi terminada, restando agora'a impressão tipográfica dosmesmos e das teses. Tudo indi-ca que os anais exccderfio a cs-

i pectativa reinante ao seu redor.(Eles serão a última resposta, diida pelo -Instituto Brasileiro,de Filosofia aos que descriamf,da realização do conclave.i "Roteiro". Mais uma revista surgiu noRio de Janeiro e para ela cha-mo a atenção dos paulistas:'•Roteiro". Embora modesta co-mo tudo quanto 6 produto doidealismo de gente moça que

oião visa o lucro mas apenas o.debate das idéias, "Roteiro"

.inscreve em seu programa "umideal de trabalho e um sentidode disciplina. O traballu - que

. se funda na preocupação. dediscernir, na vida social, os va-Toies propriamente éticos dos'estéticos; a disciplina inspira-da no propósito de atingir umacompreensão atual e ordenada

da verdadeira significação dosproblemas gerais da cultura,

/Particularmente os que se re-j ferem às nossas realidades".

"Roteiro", que tem como di-rètbr responsável o sr. DanielC. da Silva, e secretaria de A.Magalhães Ji\, apresenta'cri-tica literária, ficção, crônicamusicai, pedagógica e histórica,além de sonetos, notícias e co-mentários. Auguramos à novarevista de jovens uma longa vi-da e aos seus. orientadores mui-ta paciência a fim de vencertpdos os obstáculos que certarmente aparecerão à sua frente.Correspondência••Em virtude das muitas recla-

mações que tenho recebido arespeito de correspondência «amim dirigida (houve um dsseo-nhecido que me escreveu na-da menos dfe 7 cartas, um te-Jegrama e me enviou uma peçade teatro sob registro e dissotu .Io... nada me chegou àsmãos!) faço aqui um chamadogeral, à maneira dos rádio-amadores, indagando se osabaixo relacionados receberamas cartas, livros, etc. a eles en-via dos:

Do Rio de Janeiro: Hélio Ja-.guaribe. Saldanha Coelho, Au-gusto Franco, Jorge Lacerda,Gil. Oto Maria Carpeaux. Rai-mundo Souza Dantas. José Pau-Io Moreira da Fonseca. De BeloHorizonte: Artur Versiani Velo-so, Mario Rodrigues Viana, Or-lando M. Carvalho. EduardoFrieiro, Dantas Mota. De Pio-nanópolis: Walmor Cardoso riaSilva. De Fortaleza: Abdias Li-ma, c Fran Martins. De JoãoPessoa: Edson Regis.

Sl?J M HIP I 1 Pf9 Rv^lÍmI iliiíll

MAiSr—mii i earori

Na reportagem publicadaem LETRAS E ARTES sô~bre os ranchos "intelectuais"existentes na Praia Grande,foi esquecido, o de Vicent<>Ferreira da Silva, o existen-cialisla. Embora não conhe-ça ainda nenhum ' dessesranchos/posso garantir que,?io do Vicente Ferreira daSilva,, que fica entre o mare a serra, é costume haverdebates filosóficos, discussões

jp.91 exemplo sobre a éssèn-cia axméqiea....da verdade, 0sobre o absoluto e sôbrèlss.valores. . Entre o mergulhono mar e o almoço há -em-pre, no: rancho de VicenteFerreira da Silva, uma pau-¦sa\ para se debater temascomo estes: a verdade ' avalidade?, O amor é o únicovalor existente? A uniãometafísica se opera na soli-dão? No dia em que lá for.discorrerei a respeito da di-fração dos valores vivos

ALCÂNTARA SILVEIRA

Três perguntas poro Dora Ferreira da SilvaConforme uuunci*Mios no

Itimo número, Dora ferrei-a üa Silva vui puoucar «mittiçuo de iuxo, pata oibliu-mus, c com ilustrações deOswald de Andrade filho, atradução que iez uas "Elegi-as de úuino" de Itilkc. Apro-vei tando o ensejo, ii/.emor, atrauutora três perguntas apropósito do maruvuiioso poe-ta. tus aqui as perguntas cn.s ic&paslas:

Por que traduziu íiilkc?"Em ID-1'S caiu-me as uiáosum pequeno volume, de autorque me era totalmente des-conhecido nessa época: "Uscadernos de írtaitè LauridsBriggc", de Kamer-M áriaRilke, cm tradução castelha-na. A experiência dessa lei-tura foi algo de decisivo pa-ra mim, pois nunca mais pu-de abandonar a convivênciado poeta. Há uma poesia quealtera, como diz Cioran. "ocurso, a espessura e a quaii-dade, do nosso sangue". Tal

. é a poesia de Rilke, criadorade um espaço pióprio, emcuja intimidade ingressamoscom aquele espanto imaturodo noviço da gravura de Do-ré.

Encontrado estímulo tãopoderoso, apliquei-me no es-tudo da língua alemã, que euvinha aprendendo há doisanos, sem grande convicção.E comecei a traduzir, puramor. Finalmente, em 194G-47, disposta a arrostar o cri-me melancólico da imperfei-ção, traduzi as "Elegias deDuino". publicadas em "LE-TRÁS E ARTES" por ini-ciativa de Almeida Sales".

O tema da morte é especi •almente importante na poe-sia de Rilke?"A morte tem sido, atra-vés dos tempos, fonte ime-mortal da grande poesia. Ril-ke, entretanto, incorporou ês-se tema à sua poesia de um

medo inteiramente singular,tornando-o nova matriz deexperiências. Em seu poemade mocidade "Canção deamor c morte do porta-es-tandarte Chrístopli Rilke"sente-se ainda a tônica ro-mântica e tradicional do te-ma: a morte é aí encaradacomo o termo final, como aculminância da existência- No"Livro das Horas", publica-do posteriormenle, já seanunciava" entretanto a con-cepção rilkeana da "morieprópria" — desenvolvida pio--namente nas obras tardias —da morte como fermento,mesmo da vida, que nela en-contra o motivo de seu de-senvolvimento singular. Sóquem sente a presença damorte c capaz de vida ver-dadeira e, reciprocamente, sóquem vive em autenticidademorre sua morte própria.

Senhor, dai a cada um sua[morte própria.

a morte que provem de cadavida.

onde se conhece amor, sen-[tido e aflição".

Nas Elegias e nos Sonetosa Orfeu. Riike chega final-mente a uma visão definiti-va do problema, com a in-tuição do duplo domínio davida c da morte. Numa cartaesclarecedora a Von Hulcwicz.o poeta adverte que nas "Ele-gias, a afirmação da vida eda morte se revelam comoformando uma só". E maisadiante: "A morte é o ladoda vida que não está voltadopara nós e que portanto naopodemos iluminar. "Única-mente mediante uma amplia-ção de nossa consciência, po-deremos viver essa vida ver-dadeira "que se estende atra-vés dos dois domínios..."

Há uma influência direta

de Valcry na poesia de Rilke?"No capitulo das inlluên

cias sobre a sua obra, Rilkedeclarou certa vez, como tes-temunha Katharina Kippcu-berg, "que o mundo inteiro,sem limites, tinha contribui-do pura a sua formação c oseu desenvolvimento". E nacaudal dessas "influencias",ao lado de Jacobsen, Tolstoi,Kodin, Lermontov, Kicrkega-ard, Cl ide e Valcry. punha osacontecimentos s i m p les davida cotidiana e as impret»-sães recêbtdas da natureza cda arte.

Ü possível, entretanto, cs-«quem a t i z a n d o, colocar asobras de Rilke sob diversos

-signos. Assim, "O Livro deHoras" pode ser consideradofruto da experiência de suaviagem ã Rússia, isto ro quediz respeito à sua primeiraparte: O Livro da Vida Mo-nástica. A segunda e a ter-ccira partes, isto é, "O Livroda Peregrinação" e "O Livroda Pobreza e da Morte"acusam também a paisagemnebulosa de Worpswede e apresença poderosa de Paris,que Rilke contava entre suaiexperiências mais difíceis. "OCadernos de Malte LauridsBrigge", sua obra auto-bio-gráfica, acha-se sob o signode uma curiosa síntese de in-fluências: Jacobsen e a pai-sagem nórdica, Rodin e aatmosfera de Paris. A influ-ência de Rodin se prolonga ese acentua nos "Novos Poemas". O livro das "Elegias",fruto laborioso de aridez eplenitude, nasceu em céus di-ferentes, sob a influência in-decifrável de estações cósim-cas e interiores- Enfim, o te-ma sempre recorrente da me-tamorfose, acentuado nos"Sonetos a Orfeu", poderiater sido fecundado pela ex-periéncia rilkeana da poesiade Valery".

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Notícias de teatroDizem que Sérgio Cardoso

e Nidia Llcia estão somente es-pecando a terminação do ar-ranha céu que se constrói emfrente ao teatro em que traba-lham para se casar c mudarpara lá.

-— O Teatro Brasileiro deComédia, no intuito de nãodeixar os seus freqüentadores

sem uma noite de função, criouo "Teatro das Segundas Fel-ras". destinado a ocupar o pai-co obrigatoriamente abandona-do nesse dia. Ziembinsky temdirigido o "Teatros das Segun-das-Feiras" e as peças nele re-presentadas têm conseguidoagradar. Pena é que elas nãopermaneçam em cartaz. Por

que não representar a mesmadurante pelo menos 4 segundas-feiras seguidas?

No pequeno auditório doTeatro da Cultura Artística 03alunos da Escola de Arte Dra-máticá de São Paulo represen-tam "Dias Felizes" de ClaüdeAndré Pouget, em tradução deMaria Jacinta e sob a direçãode Alfredo Mesquita. No audi*tório grande Maria Delia Cos-ta representa "A Família Bar-ret". Murmüra-se que SandroPoloni. .0 diretor da Compa-rima, levará à cena uma peçade Oswald de Andrade!

No Museu de Arte Moder-na continua o curso de teatroministrado por Ruggero Jacoh-bi que em sua ultima aula dis-correu sobre o teatro éxisten-cialista. Ilustraram-na SérgioCardoso e Rui Afonso Machá-do. o poeta de "Rumo Enxuto".O Departamento de Cul-tura da Associação Paulista deMedicina reuniu-se para dis-cutir o "Poço" de Helena 3il-velra, com a presença da au-tora.

Prêmio "Fábio Prado"

A Comissão Julgadora doPrêmio "Fábio Prado" (sstorromance) constituída pelos es-critores José Geraldo Vieira,Osmar Pimentel e Carlos Bur-lamaqui Kopke acaba de apon-tar o vencedor: é o sr. AntônioOlavo Pereira, um desconheci-do no mundo das letras. A obrapremiada, inédita, intitula-se"Contra mão" e sabemos, par-ticularmente, que tendo a mes-ma sido lida por GracilianoRamos, mereceu deste os maio-res elogios. Mais uma opiniãofavorável, portanto, a se juntarà da ilustrada Comissão Julga-dora. Esperemos agora pelo re-sultado da Comissão Julgadorado Prêmio de Teatro.

"A FACE PERDIDA"

S

Ilustração de TAKSILA para "Caiitig as da Rua Escura", de Luiz Martins

Ja estava com esta páginapronta quando me chegouas mãos o último livro depoemas de Cassiano Ricar.r,do: "A Face Perdida". Li-dos alguns poemas, conven-ci-me de que o "velho" Cas-siano Ricardo é um poetade verdade, que devia ser'professor de muito novíssimo-que por ai anda. Incrível emCassiano é o. seu grande po-der de se renovar a cada li-vro que aparece. Ao contra-rio de outros poetas quê es',tacionam, à medida que otempo, passa,, este jpoÀtaica-da dia nos aparece mais no-vo, ainda procurando novassoluções e novos temas. Há,sem dúvida alguma, na suapoesia um fecundo sopro re-novüdor quê a toma, aomesmo tempo, mais grave,mais profunda e mais amar- ¦ga. Tenciono no próximo nú-mero me demorar mais sô-bre esta "Face Perdida" do"oeta Cassiano- Ricardo.

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Domingo, 14-5-1950 LETRAS E "ARTES Página — 11

! T~"\ E um V°nUi de vlhta 8ln'I 1 tético, seria possível aflr-

I JL/ mar que a poesia mo-dorna no Brasil está vivendo osigno de uma concepção má-'gica da arte. Talvez que essa"quailté maitresse" náo sejaapenas peculiar aos poetas no-vos, pertencentes às chamadasgerações de 1945 e 1948. e elajá venha cavando o seu leitodesde o tempo do simbolismo,quando tivemos alguns poetashábeis, encantadores, capazesde invenções momentâneas.Mas é Inegável nos novos dehoje, nos seus representantes,categorizados, bem entendido,que a magia chega a atingiraquilo que todos os artistasambicionam: um modo de co-nhecimento novo.

Com efeito, atfcivés da diver-sidade dos talentos c das pes-quisas que marcam o poeta denossos dias, o denominador co-mum de uma arte mágica pa-rece conduzi-lo aos momentossuperiores de uma existênciaque está para além das pala-vras. atingida quase por ilumi-nações, sem formas intermedia-rias, completada apenas napoesia.

Não se considera mais o poe-ma como instrumento de umaconfidencia, uma espécie de te-Ia de gestos c palavras em quese debate um coração prisio-neiro. O poema se apresentaantes como objeto, como um fi-Iho largado no mundo, empe-nhado em iniciar sua vida in-dependente, em seguir o desti-no de alguém que se tornacentro de efeitos mágicos, que-rendo tomar qualquer forma, ira toda parte, sem renunciar,como diz Armand Robin, ao seupoder essencial de arte con jura-tória que êle até há pouco sóencontrava no rigor de severasinterdições.

E' verdade que a poesia nãopertence propriamente ao poe-ta, pois está sempre ligada auma realidade que o excede eultrapassa. E por isso ela é bemum objeto absolutamente desli-gado do longo trabalho que lhedeu à luz. E para que o mur-múrio dessa nova fonte nos che-gue aos ouvidos em todo o seumistério, em toda a sua magia,se torna preciso que o poeta secale e o esqueçamos.

Essa operação delicada pare-ce que a vem realizando os poe-tas novos do Brasil.

Estamos aqui diante de trêsexemplos: Ledo Ivo, DomingosCarvalho da Silva, José PauloMoreira da Fonseca. Os primei-ros da geração de 1945 c o úl-timo da geração de 1948, dentroda classificação um tanto arbi-traria que se procura justificar.

Ledo Ivo, pela sua riquezaverbal, pela sua exuberância li-rica, pela sua volubilidajU tec-nica, é dos primeiros entre nósa crer que a poesia está na na-tureza, fora mesmo de qual-quer domínio literário, da rigi-da postura formal. O própriopoeta faz questão de acentuarque guarda um sol no peito,não deixando de olhar nos "es-pelhos dos instantes onde a vi-da se reflete em termos de dia-mante".

Há qualquer coisa de autôno-mo nos seus últimos poemasreunidos em "Cântico" ted. Jo-sé Olympio). A despeito de es-tar presente em grande nume-ro de composições, o poeta pa-rece interessado em se apagar,em dar a entender que não pre-cisa de versos para* encontrar apoesia em sua pureza. Esta an-tes se exprime simplesmente nachuva sobre a cidade. Até assarjetas a recebem:•.. Como são belosc nítidos os barcos de papel

POESIA E MAGIA

TEMISTOCLES LINHARES

que navegam buscando os rei-[nos fantásticos, os inacessi-

[veis!

Há lições a colher na «ature-za. Lições que ao poeta cabeaproveitar, libertando-sc do"complexo de pequenez" que otem limitado desde Mallar-mé a um círculo de motivos einspiração muito restrilo, con-cebido sempre como um excr-ciclo espiritual em luta perma-nente contra os seus própriosmeios.

Aquela máquina feita de re-cusas, de piadas, que tem sidomanejada pelos poetas moder-nos, verdadeiros "homens des-truidos", que desesperaram dabeleza que traziam consigo, mo-vidos apenas por deliberadoinstinto de suicídio, está vistoque o nosso poeta jovem nãoquer mais usá-la. O conselhoque êle dá hoje a seu irmãopoeta é antes este:

Meu irmão, deixa que a gotei-[ra molhe tuas últi7nas

m^^^lmmwfítyys -' ^v*—--^^ f tm0g/m\

Ledo Ivo

poesias. Pouco importa que[amanhã te reconcilies

com os graiidcs temas poéticos.O amanhã é inconsumivcl. A

[chuva te ensinaa ser invariável sem se repetir.

O poeta procura alargar osseus horizontes, querendo abolir o supérfluo, para ficar noessencial.

De quanto quis deter, como[quem puxo as rédeas de um

[cavalo,ficaram uma estrela que náo

[vi, um pouco de mar célere,o sonho revel que me pertur-

[bou o repouso.a alheia ínelodia que estorvou

[minha cançãoe a lâmpada que outros accn-[deram por mim cm minha

[sala.

Ainda que convencido de quenada foi perdido, o que mais

seduz agora é a fidelidade ãvida, ao explendor do mundo:

... o vida é um reino — a vi-[da é o nosso reino

não obstante o terror, o éxta-[se e o milagre.

O que Ledo Ivo quer é unvipoesia de olhos abertos, de arlivre, de manhãs claras, de es-

relas, de céu:

O NEGRO EM SANTA CATARINA

QUASE

sempre subestima-mos a contribuição doelemento negro nos Es-

tados do sul. E' um erro deapreciação determinado . pelaperspectiva do presente Es-quecemos o passado e foi jus*tamente no passado, no perío-do áureo do regime servil, queo negro atuou naquelas regiõesmais tarde, coloridas pelo in-fluxo da colonização européia.

O colono escravo, com o abo-licionismo, abandonou a terrafria e veio para regiões maisquentes. Substituiu-o o colonolivre, branco, • europeu, imi-giante, já introduzido, aliás,antes da Abolição.

Entretanto, se voltarmos aspesquisas para a época da es-cravatura, vamos verificar, nosdevidos termos, o influxo doelemento negro-africano.

Agora mesmo, lendo o ensaio"Medicina, médicos e charla-tães do passado'' do historiadorOswaldo R. Cabral, profundoconhecedor da história de San-ta Catarina encontramos curió-sa documentação a respeitodessa influência. .

Os livros e os estudos desseerudito catarinense são sem-pre repositórios interessantes edignos de consulta, pois cons-tituem fontes idôneas, onde adocumentação inédita se alia,à originalidade das pesquisas.

Nessa obra, que acabamos deler, nos dá o autor, através deposturas municipais e de joi-nais do século passado, valiososinformes sobre a feitiçaria ne-

' gra. --- ; • -•.¦•-¦ --¦¦¦¦Por aí ficamos sabendo que

às feitiçarias era dado o nomebangalez não registrado aindapor nenhum afrò-negrista na-cional. É o que registra uma pos-tura da Câmara Municipal doDesterro em 1831:

"Todo o indivíduo branco oupreto forro que em sua. casa

JOAQUIM RIBEIRO

fizer ajuntamento de pretos,que dizem feitiçarias ou ban-galez, etc".

A forma "bangalez" deve servariante de bangulê, que signi-fica "dança de negro, com pai-mas e sapateado" e foi colhidapor Macedo Soares no Rio deJaneiro (Cabo Frio).

Outro informe pitoresco é oque dá o jornal "Regeneração"de 14 de Dszembro de 1879 sobre o material de feitiçaria dedois negros macumbeiros:

"Uma grande boneca depano denominada Vorota-Hcr-vas que no dizer dos íeiticei-ros transmitia-lhes o conheci-mento do que fazia, objeto daconsulta; uma" outra, menor,que tinha o -prenome de Senti-nella; um caramujo com umacabeça de cera; diversos peda-ções de vela, enfeitadas; raizes,fruetas, figas, objetos de metal,dois grandes borlas de pennasque serviam para adivinhar eque chamavam gongá, além deum sem número de outros ob-jetos, que costumavam amon-toar esta casta de pretos noci-vos à sociedade".

Comentando este texto diz

Canção da ausênciaabsurda

SÔNIA REGINA\ - í-~,rJÇ

Se pudeise parti ric >'

poro bem longe—de . mini.,..:

Ausente dos meus sentidos,da inquietude sem fim,com que prozer transporiaessa distância de angástiosdo que sou ao que seria. .

Se pudesse, partiriaporá bem longe de mim. . ,

Oswaldo Cabral: "Nada encon-trei na literatura afro-brasilei-ra, compulsada, que se assème-1 liasse"'.

Gongá, entretanto, é pequenocesto, alcofa, registrado tantopor Jacques Raimundo (o ele-mento áfro-negro na linguaportuguesa) — como por Re-nato Mendonça — ÍA in-fluência africana no por tu-guês do Brasil). Este últimodá, como área geográfica dovocábulo, o Rio de Janeiro. Noséculo passado, pelo menos, eraconhecido no sul.

Pareceu a Oswaldo Cabralindecifrável a denominaçãoVorota-Hervas dada a um ma-nipanso. A um observador dalinguagem popular e da "meia

lingua" dos negros não é diti-cultosá a exegese otimológica.Trata-se da expressão: Brota-Ervas através das transforma-ções: brota — borota — vorota,perfeitamente dentro da índoledo linguajar dos negros (Cf. ha-ranço — branco; cabala — ca-vala).

Refere-se ainda o eruditohistoriador a um curandeiro,um crioulo de Bobos, lugarejoda costa catarinense, que coma fama de seus "milagres"alarmou as autoridades...

. Vê-se que o negro exerceu,na província do sul, o mesmofascínio místico que ainda hojeexerce nas macumbas do Rio,nos candomblés da Bahia enos xangós do Nordeste.

Õ negfõ", ~êm'"respGst-a--à~máX.cuia da escravidão, maculou,com.feitiço, e superstições, a ai-ma do povo .que o explorou.

A mancha da escravaturaapagou-se. Não se apagou, lo-davia, a mancha da süperstl-cão... ..:„¦:

Oh! se o céu não existir, criem-\vo para mim,

que tenho necessidade de inc~[fúvcl e de absoluto,

Tudo é pretexto pura ritmose sonoridade mágicas. Notas in-dividuais e notas genéricas somisturam, umas nascem dasoutras. Tudo surge c se desva-neve ao apelo mágico das pa*lavras combinadas para rece-ber o comentário adequado, vi-vo e humano, sem o apoio doqualquer hipótese de teologiaconsoladora. Sem dúvida que aum poeta, não ha necessidadede ser outra coisa mais alem dopoeta. A imagem poética por sijá representa um mundo Intel-ro, um mundo novo, onde

A vida. liberta dos vocabulários[eventuais, festeja-se

sem memóriano espirito acorrentado a um

[infinito agoraeternamenute presente como o

[o oceano nas praias.A curiosidade do poeta, ain-

da que se estenda através demetáforas inumeráveis por unaamor febril, mas corpórco, se-xual, panteista, está sempreexigindo dele uma referencia dordem objetiva, como que obe-decendo ao princípio clássico daimitação da natureza ou entãoao choque romântico do senti-mento individual contra a fata-«lidade das coisas.

O poeta não se peja d* con,-fessar assim:

Teu argumento, moça, faz com\quc eu abandone os livros, o[corpo a corpo com a sabedo-

[ria, e saia contigo pelo sitioaprendendo a linguagem da[chuva, a passarínhagem irres[ponsável e o travo selvagem

[das frutas

Estou contigo. Nem Homero me[levará mais

para a libertinagem da imorta-[lidade. Aqui os clássicos se

[dissolvrmnos papagaios que as crianças

[soltaram no cé%para lutar com os albatrozes

Já não preciso de versos para[saber que estou vivo.

Estou caminhando entre as árv[vores sem nenhum compro<

[ misso.

A magia que se desprendedestes versos é lôda exterior, sfassim c possível dizer, eiuprcS*»tando às palavras a significa-'ção mais condizente com a sti*prema ambição da poesia. H^como um novo casamento cn.«Ire a eloqüência e a poesia»Mas não se trata de nenhwHma magia que venha a tendei,para qualquer conhecimentomístico ou mesmo para as for-mas extremas da experiêncKeinterior. E' uma magia tôd?extrospectiva, que faz a poesia»existir, tomar formas tangíveissem precisar se apoiar cm cer*te/as místicas ou religiosas pre*estabelecidas. Magia menos 6.serviço das palavras, dos arti**ficios, das próprias invenções,mas que acaba sempre se„ cor-poriíicanrio em imagens, enfflorações verbais de uma rique-za raras vezes obtida em noss»poesia.

Com Ledo Ivo temos o exem-pio do poeta que abandonou ánoção clássica da poesia con-siderada como jogo perfeito.Ele pertence á categoria dos

jjoHasi._que, segundo a defini-ção de Rolland de Kenevme,"reconheceram na poesia um»via de conhecimento aberta ã©homem tanto sobre o sou pró-prio mistério como sobre osabismos do mundo exterior.

Talvez o melhor exemplo dílnessa poesia nova.

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Página 12 L F/T R A S E ARTES Domingo, 14-5-1950

ALLECROGrandes c estranhos ¦>¦«» os teus

olhos. Parece que guardam todosos paradoxos da \ida o nu--; ia tutodas as parábolas da morte. «Vlnaespirito Indomável o iiiimií nu-tintos rebeldes de nômade «.uni-mensal nfto qulzeram acreditar narealidade do encontro com teu*»olhos. Procurei nao dar impor-i.iiHüi ao nosso primeiro ilesi •-hrimeuto, nem i\ intensidade deamor que nasceu, assim, no esp.vço de um rel.lnipaxu. Teus olhosrepresentavam a primeira tu/, de¦uma longa e escura noite, t/.rl-velmentc, sem amor. Estava dinu-te do mundo de Imagens te mu4(ue sonhei tantas vezes mesm iacordado, — o poema perfeito quemintraliiia de poeta solitário em-lial.iva na ânsia rio universalidadehumana. Teus olhos encerramtoda a poesia da vida. Teus loa-gos cilios assemelham-se a longo::nbanos, calmos, lunguidos, sen-suais, e foram ícltos para o meudelírio de esteia apaixonado.Teus olhos r.ãu ¦ geniais, de umabeleza totalmente nova. NaquelaIrier.a de ação de um ídolo orlcn-tal teus olhos são possuídos, ex-Iraordinarlamcnte, do movimenta-do das IntençOcs. Que magnlflcen-te é a eloqüência muda dos teusolhos!

ANDANTEHavia naquela noite do nosso

primeiro movimento visões fan-tástica3 e imagens fugidias dentrodps teus olhos, superficialmente,parados. Aproximei-me por umacuriosidade primaria de meninoencantado diante de um brln-quedo novo c en'rci pelos teusolhos longamente belos. Existiamtroncos de árvores com suas por-tentosas raízes expostas ao ventoe árvores imensas tenebrosamen-te desgalhadas. Eram trechos deuma eterna triseza que vive nosteus olhes de uma gigantescasaudade que nacceu e cresceudent.o «Zeles. Como te amei na-quele Instante! Éramos riccçssà-ries um ao outro. Habitava, tam-bem, em mim uma saudadeamante da tua. Atravessei 3 ti-aniar guiado pela mesma simplescuriosidade de conhecer tonsolhos. Apareceram outras regiõesterríveis, de uma beleza cnvol-ventemente estranha ao meu ser-timento estético, mas -ao mesmotempo fascinante e convidativa.Teus olhos cheios de uma i. mu-ra encantada começaram por ta-lar-me assim — "acaso tens medi»de jornadear pelas minhas tristesregiões?". Respondi negativamen-te E teus olhos disseram — "cn-tfto vem!" — e eu atravessei cor-redores imensos cobertos de teiascoloridas de sentimentos esquis!-tos. Assemelhavam-se a dantescascatacumbas de sonhos impôs-siveis e de pensamentosque não se dizem, só sepensam, só se sentem". "Ésum poeta e só mesmo um sercomo tu terás toda a compreensãoprecisa para sentir as minhas pai-sagens interiores. O poeta nacontemplação é um ser divino .

ADDAGIOSurgiu uma região branca, vir-

gem de todos os sonhos contem-porãncos, • cheia de símbolos es-quecidos da tua intância. Tudocompletamente coberto de neva.Encontrei dois sapatinhos de cri-anca — teus sapatinhos — quetua mãe, num extremismo deemotividade, guardara como es-tranha lembrança de um sonhoque se vai distanciando sem sepoder deter jamais. Sonho quese suplanta, que vai crescendotremendamente, que toma formasabsurdas de distância humana,como uma árvore que ao crescercom suas raízes portentosas es-trangulasse o próprio ventre ma-terno. Sonho admlravelmente beloque ao tomar formas próprias,distancia as mãos que guiaramos longos primeiros passos; quenuma fuga de frieza afetiva naopermite mais a ternura das mãosque velaram os sentidos pristi-*ios. Tu cresces e dirás — 'queculpa tenho eu de estar crês-cendo?" — refletindo teu egoísmohumaníssimo. E vais afastandolentamente num gesto de enfadoa boca que te contou pela pri-meira vez a saga desta vida con-tida numa canção de ninar; asmãos que te embalaram; os olhosque por ti velaram dia e noite.Não importa o porque disto tudo.A ingratidão pode ser impessoalou inconsciente, por isto nuncadeves procurar explicar o que nemtu sabes. Aqueles sapatinhos —

jteus sapatinhos de criança—- vi-'vem nos teus olhos como a es-perança de algum dia voltares aidentificar quem» com deslum-Juramento nas mãos e no coração,os calçava nos teus pés. Nos sa-

i^attnhosi_exJstiaJImo..da._esperaii?Hpa. VI a um canto uma boneca•desmantelada, símbolo perfeito da•criatura ideal, procurada e ja-limais achada. As molas saiam-lherpela barriga como desencanto &ilusão humana. Teu brinquedoifavorlto, já muito estragado —/sim avião — com que muitofcríncaste Jazia coberto de neve

OLHOS, OS TEUS OLHOS...VAN IAPA

sobro o ideal ardente. Teu avião(liara raízes potentemente pro-funda so por mais que imaginesconquistar as alturas lotais, esta-ríis sempre rastejando na terru.Achei doloroso devassar teu mim-do apenas por mera curiosidade.1'cdi — deixa-me voltar. Ulsscble— "nfto, agora vê o resto. Vé aalma de meus olhos, conhece ossegredos que geram toda esta ne-leza possível e olha na planícieaquele logo placldamcntc ador-mccldo. Há na sua frieza melan-eólica um terrível dcsincanto deviver. Existe um caso sentimeu-tal afogado pelas minhas ma-».homicidas. Olha para denro e unsua calmo transparente veras aImensidade da minha desdita. S»assim poderás avaliar o preço qti"pago pela beleza de meus própriosolhos!"

Vi mãos arimlruveis que supll*cavam amor a uma alma proibi-da de amar. Ídolos de todas jh es-perlcs, sonhos de todos os tanu-uhos, flores de uma beleza mu-nita, tudo preso ao fundo do lagopor groisos cipós do uma subs-tftncla misteriosa. A tudo assistisem poder nada fazer para Impe-dlr o sacrllicio de teus sonhos deamor. Mai-j adiante depois do lagodey: um tirei tuna regííio imensa,coberta de coluna] dectpadas •-um cii.".'» em /orma de tabuleirode xadrez com todos os símbolo.?virados s misturados a pétalas ru-liras de pJguna rosa humana,como se fossem gotas cie sanguealguém que morreu de amor..."Poetas, meu poeta amável,não faças dos meus ciltos a teudelírio de esteta. Nao. Por i:<vor!Eu sofrerci mais ainda. E ainda

mais por nao poder retribuir oteu amor puro como cslus e.st.i-tuas de mármore quo vès ali,que mesmo nuas nunca estiveram,tfto vestidas, de tamanha belezatotal".

E a um lado, cm direção aonorte via-se uma série de está-tuas formosíssimas, todas masca-radas, com pequenas máscaras develudo cm diversas cores e as cs-lamas pareciam possuir olhos vi-vos e por detrás daquelas masca-ras rostos humanos. Fui mui?alem do lago e descobri numapraia distante, de areia vermelhaum veleiro branco com as velasazuis esfarrapadas O mastro cen-trai partido. O leme despedaçadopelo tempe. Observe? impressõesdigitais diversaF e também a mar-ca de quato mãos. Mãos qu».*morreram ali, uma nas outras,

CINEMA E ROMANCECOMO A NOVA ARTE REVOLUCIONA A TÉCNICA NOVELESCA

Em seu excelente estudo sô-bre o romance americano, diz aescritora francesa Claude.EU-mond Magny ("L'ágc du ro-man americain", Paris, Editi-ons du Seuil) que um dos po-derosos atrativos da ficção con-temporâneá, vinda da NorteAmerica, está em sua extremomodernidade, em sua capacida-de de refletir, mais direta e fi-elmente, as profundas subver-soes havidas na consciência dohomem de nosso tempo e em.sua maneira de apreender ascoisas.

Essa modernidade da ficçãoamericana não provém apenasdos seus temas: encontra-se es-pecialmcntc no ritmo em queos temas são tratados-"Do# Passo* ou Sinclair Le-wis não nos agradam só por-que pintam uma vida mais mo.deras, mais evoluída do que anossa — diz C. E. Magny —ou porque duplicam, com o en-canto insidioso da utopia, oclássico prestígio do exotismo.Agradam-nos, sobretudo, por-que nos oferecem o espetáculo,único, talvez, no mundo atual,duma literatura em que a téc-nica é verdadeiramente con-substancial à matéria, ao assim-to versado. Bem ao contráriodo que fazem os nossos roman-cistas, que muitas vezes nosdão, da vida moderna, urna

iniaçe?:: tão incongruente,quanto o seria um daguerreo-tipo dum a-ranho-céu".

E continua a escritora."Quase toda." an novidade?

introduzidas pelos americanosna técnica romanesca —: salvoo monólogo interior cuja orl-gem histórica, alcance estéticoe significação metafísica sãodiferentes — foram tomadas deempréstimo ao cinema.

Essa transposição, para a 11-teratura, de processos do cine.ma, que poderá ser usada emescala ainda maior, é plena-mente justificada pelo íntimoparentesco existente entre asduas artes. Seu fim é colocar adisposição do escritor um ar-senal inteiro e novo, de meiosextremamente eficazes — dosquais alguns, por certo, foramempregados, embora tímida-mente e sem método, por Bal-zac, Sthendal ou pelos natura-listas.

Podem-se grupar tais pro-cessos em torno de duas inova-ções principais. Uma delas con-cerne ao modo de narrar, quese torna inteiramente objetivo,e de uma objetividade levadaaté ao behavionismo, por impo-siçáo das próprias convençõesadotadas para apresentação dosacontecimentos — convençõesditadas ao cineasta* pela natu-reza de sua „ arte e que o ro-

mancista moderno em,aii»yoü,por sua livre vontade: Só doexterior se descreverão os fatos,sem fazer comentário algum,nem lhes dar interpretação psi-cológica.

A outra inovação consistirána adoção de certos processosespecificamente técnicos, tor-nados possíveis pela extensão,ao romance, do princípio damudança de planos, cuja dca-coberta transformou o cinema,erigiucio-o em arte.

Como o encenador, o roman-cista se permite, agora, colocara câmera onde bem entende, evariar continuamente a posiçãodela, de modo a mostrar a vi-da de suas personagens sobincidência imprevista, de muitoperto ou de bem longe, bem co-mo de nos fazer ver tal cenaora pelos olhos dum protago.nista, ora pelos de outro — eisto sem que se quebre a con-tinuidade essencial a toda anarrativa, seja impressa ou fil-mada- m

Pode-se relacionar com essainovação capital o emprego, noromance, de processos típica-mente cinematográficos: "fu-soes encadradas", cenas sopre-postas ou "corrings-up", de im-portâncJa secundaria, aliás. Douso desses processos encontra-mos uma infinidade de exemplosna literatura americana".

GÊNIO O PRESIDENTEA. HERCULANO DE CARVALHO. LYD1A DE ALENCASTRO GRAÇAAo Poeta Jorge de Lima y

Muralho a rotinír de ecos distantes.Tela sonora e trêmulo de dedos. ,m ;Que belos são os ecos restoontesPela floresta espessa dos segredos!Repercutem sem fim es voxes de antes,Brados de dor entoam, risos ledos.

Da caverna das sombras sombra inquiot»Ali se cruzam doidas as penumbras;Delas sorvas, cantando, a dor secretaPara que em gesto índómito a resumas.De verbo, em forma e cor, de som, em brumasTeces no axul assombras de poeta.

Onda que treme ao hálito que vemDas entranhas a arfar dos continentes}Encruzilhada das perfis do Além,Ponta final das vias convergentes,A essência humana em ti respira e te»Seu vivo espelho de águas transparente,

E nynca mais te calas... Murmurante,És torrente a ressoar de vale em vale.És rio e és oceano, breve instanteQue devem dia e século imortal.Só te alcanças em Deus. . . E, ressoanr\Vibras eterno, em Deus, como cristal?

)

ESPERAREI EM VÃOO TEU PRESENTE.NUNCA O DARÁSA MIM SOMENTENEM A NINGUÉMPOIS QUEM TERÁESSA DÁDIVA DE POGO?

VAZIA È MINHA MÃOÁ TUA ESPERA.E MEU CORAÇÃOBATE NAS CANTIGASDA VIDA EXISTIDALONGE DE MIM.COMO UM SINO BATEO MEU CORAÇÃOCHORANDO A VIDAQUE NÃO PASSOU PERTONEM MJSMOlPASSOU

EIS O MEU PRESENTEAMBICIONADO jQUERO QUE ME DÊSA VIDA VIVIDA,A VIDA PARTIDAPARA NUNCA MAIS. I

¦e- dois -amantes que por cen,»ombaram abraçados para semnr..e joelhos, «acostados ao Ih....'ara nao perderem o roteiro, n,losvlarem o seu destino de amorJra «raiide rombo 110 casco doi.nva ver a estrutura interna ».uase Inteiramente couer.a iuanimais e vegetais marinhos \„tombadiiho verifiquei marcas dapés de amantes ternos e apauu.nados, salpicados pela ternura V»felicidade de amar e de ser ama-do. Aquele barco, por certo, eu-calhou após uma tempestade depaixões, quando habitado por doisamantes enamorados. As velha*cordas rangiam, de quando <ntquando, como se fossem vozeilongínquas que dizlnm frases ueamor, ininteligíveis pela Imensadistância. Das escotilhas vaziassaiam paralelas para o infinitocomo símbolos de caricias longasde um amor lncomeu6uravelme<i-te Impossive I. Uma brisasuave o m u slc a I traziauni cheiro marinho mlstu-rado às sensações de um anforgrande demais para o mundo do*homem;. Apanhando um binóculono chão, olhei para o lado nonoe divisou-sc-me uma regulo es-cura c brumosa. Fui mais além.Teus olhos eram agora tudo paramim. Tinha descoberto o teusegredo c tu sabias o meu dese-Jo. Talvez fosse aquela a faixamais triste dos teus olhos. Regiãoterrivelmente simbólica. Umaimensa árvore dava máscaras, |im-to a um extenso pântano de pu-tridas lamas roxas, vermelhas, ama-rilas e pretas. Na borda, ao longode toda e eu, tensão deste lugar,floresciam lirios geniiflcxos longa-mente alvos, de uma beleza semnome, lembrando anjos brancos demãos brancas es^endidjis para océu estrelado.' Para se conseguirchegar ao outro lado, era nceesvi-rio atravessar uma extensa pontefeita de moedas de ouro. Cadavez que um desejo humano du*teus olhos transpunha a pontüpara o plano das realizações, oslirio.i iam murchando c tua almachafurdando na lama eterna, tia-via ainda uma ampulheta sub-mer.sa, um relógio sem ponteiroso um mirante que se estendiapara o infinito como um dedoindicador de ação. Tudo aquilorepresentava muitos dos coiiseu-timentos dos teus olhos na bus*ca'de Interesses desclassificados eações indignas da pureza dos teusolho:;. Rocas que beijaste õójnvVasco. lábios que sugaste comrepugnância. Eram marcas inde-leveis de corpos que possulste porsimples Itbldinagem estéril. Em»botaste teus sentidos nos maishorripilantes pecados. Nao tinnasrequinte no prazer. Fechei meusolhos e não pude imaginar urainferno mais terrível. Aqueles fa-tos tinham deixado cicatrizes natua alma.

ALLECRO VIVACEAtravessei uma alameda de cl>

prestes melancolkamente lãngtti •dos e fui dar numa região ondejazia o teu segredo — o teu pro-Mema!

Era a região da subllmação, ondeo casto e o lírico se misturavamtornamente. A legião do ultra-romantismo que recalcaste na tuaadolescência. Foi ai que eu disseaos teus olhos — sempre desço-nheceste a ternura e necessitastanto de ternura. Scntia-se nestelugar música distante, músicainolvidavel. Nos teus olhos haviamúsica de Chopin. Era noite, céuexpressivamente estrelado. Uma,lua sonolenta de beleza flanavaentre guirlanda de nuvens. Quan-ta música divina na cintilação dasestrelas!

O (istáiito dos teus olhos baixoua mim e falou-me mais uma vez— "já que agora sabes tudo, é-inehumano que complete o resto. Abeleza evocativa dos meus olhosvem da dôr de não ser eu tambéoipoeta. Da minha fraqueza inte-rior, da minha ânsia da certeza,da minha angústia do Inatingível,da tortura de não poder dizeipára — não ames meus Olhos poifavor. De hão poder alçar o voueterno contigo. Esta nao é a. veaprimeira que meus olhos inspira-ram ao teu gênio tal paixão hu-mana. Em outras épocas, em ou*trás idades já fomos companhei"ros, irmãos e amantes.

Guarda no âmago de teu cora*ção, ha faixa mais pura dos teussonhos de artista, esta paribolaque esconde todos os sonhos hu*manos de felicidade e de amor".."Sabes de onde nasceram aiestréias?"

Não, respondi, e olhei paraas estrelas, certo de que ninguémsaberia tal coisa, tal origem e de-pois pousei meus alhos tristes noiteus olhos inesquecíveis e espereicomo uma revelação tua resposta.-T- "As estrelas nasceram dossonhos impossíveis". t

Naquele instante havia compre-endido tudo.

E quisera apenas que teus olhosfossem as "lâmpadas piloto" demeu destino, íL-

! \

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¦BSçr^i

Domingo, 14-5-1950 1 ET R"A S E rART ES Página — 13

QEM

nfto conhece nqueittadmirável pintura de Joa-nlnha que o romântico

Garrett, numa frescura colori-da de pastel e nos mais purostraços de desenho, nos oferecepara deleltaçôó dos olhos e doooraçao?

Pois a beleza discreta de Joa-nlnha como que se esvai e secsfuma perante o pormenor dosH!us olhos verdes que Garretttão encantadoramente pintou —••não daquele verde descarado etraidor da raça felina; não da-quele verde mau e distlnguidoque não é senão azul* imperfei-to. não; eram verdes-verdes,puros e brilhantes como esme-ruídas do mais súbito quilate".

Professava Garrett a religiãodos olhos pretos, mas os olhosverdes de Joaninha alucina-ram-no e no movimento da-quèlas suas viagens, ora porterras, ora por recordações, aalucinação dos olhos verdes per-scguia-o e a mesma coisa suce-de ao ledor daquele delicioso eestranho roteiro, catecisrno dasensibilidade portuguesa.

A religião dos olhos verdesvem de longe.

O povo considera-os malicio-sos e mudáveis.

Porém, os olhos verdes deJoaninha são de outra qualida-de, quilate dirá Garrett. Não.são como aqueles olhos de quenos fala Rodrigues Lobo na suatão conhecida redondilha:

Num jeito que dãoZagala, os teus olhos,Picam mais que Jtojos!

O Poeta não nos diz qual eraa cor dos olhos da pastorinhaque o enfeitiçou e esse miuté-rio dá maior encanto à redon-dilha de Rodrigues Lobo.

O povo canta os olhos verdes.'¦ Nunca mais posso esqueceruma quadra que certo dia, navolta da festa de Nossa Senho-ra de Guadalupe, ouvi cantarem Serpa a um rancho improvi-sado, que minuto a minuto iacrescendo com o gentio que selhe ia agregando.

A POESIA DOS OLHOS VERDESCARLOS LOBO DE OLIVEIRA

Num ritmo lento, duma lenti-dão difícil de executar, o grupoarrastava-se e o canto expressl-vo na sonoridade das notas gra-ves ecoava a nossa roda:

Os olhos de MarianitaSão verdes, cor de limão...Ai, sim, Marianita, ai sim!Ai, sim, Marianita, ai não!

Em pleno Alentejo em que areligião dos olhos negros é areligião do comum das gentes,a coral grave e profunda pare-cia acentuar a fascinação da-quela cor, capaz dos mais va-riados cambiantes, à luz e ásemoções.

Janelas abertas para o mun-do que nos rodeia,, espelhos davida interior, em que vem re-fletir-se os mais sutis momen-tos da alma, sempre os olhosforam cantados pelos poetas.

Sua doçura, sua malícia, suapureza, sua luz ou desenho, suagraça ou expressão, encontra-ram nos poetas interpretes doseu mistério profundo.

Mas os olhos verdes — comoé extraordinário o encanto des-ta cor! —ensinavam-se na poe-

sia portuguesa com o estranhobrilho da sua luz.

O clássico Eloy de Sotomaior,que tão bem cantou ao modopastoril, deixou-nos na sua"Ribeira do Mondego", à roda

deste tema:Lindos olhos verdes '.tomai barco e redes,

esta deliciosa e sugestiva poesia:Verdes olhos sãoAlegres na cor,contrários no amorE na condição

Dá-me o coração' Meus olhos se te rendes,Tomai barco e redes.Se eu olhos pescasseVós foreis uns deles,quando achasse nelestudo o que buscasse:Va-se a vida, va-see se mais quiserdes,

. Tomai barco e redes.Por uns olhos taisCem mil vidas dera,Se tantas tivera,inda dera mais:Se alma me roubais,Lindos olhos verdes,Tomai barco e redes.

Noutro passo do seu belo poe.ma bucólico, o poeta de novocanta os olhos verdes, e nessedoce enlelo deixa-se prender:

Quantos vedes, olhos verdes,Matais e ressucitais,que se por verdes matais,também dais vida por

[verdes.Veste-se o camaleão" da cor, a que mais se aplica,mas vós, verdes olhos nao,que na vossa aplicaçãotudo da vossa cor fica.Para em verde o conver-

tterdesVedes por verde cristal,e para vos parecerdesvos parecem de cor talquantos vedes, olhos verdesSe de quanto o Lince vê,Conhece e penetra ,o centro,de vós o mesmo se crêque o coração que vosso é,pelos olhos verdes dentro.Se ao Belisário imitaisSomente em ser matadores,Os seus não são para mais;Mas vós, olhos vencedores,

Matais e ressucitais.Mas quem mais se deixou

prender e enfcitlçar pelos olhosverdes foi Camões, verdura deolhos como tão expressivamentelhes chamava. O Poeta que re-partiu a sua vida pelos camposda batalha, aventura das naus,seduções do longe, o poeta quepartiu o coração em bocadinhos,em generosa dádiva de amor,reservou para os olhos verdes,para a poesia estranha dos olhosverdes, para a verdura dos olhos,o encanto puro ou a malícia vi-

va de alguns formosos versos.Menina dos olhos verdes,Porque me n&o vedes?Eles verdes saoe tem por usançaHa cor esperança,e nos olhos sfto,vossa condição,Não é d'olhos verdes,Porque me nfto vedes.Isenções a molhosque eles dizem terdes,não são de olhos verdes,nem de verdes olhos.Sirvo de giolhos,e vós não me credes,porque me n&o vedes.

Devieis-me crer,Por que possa vê-los,que uns olhos tão belosnão se hão de esconder;mas fazeis-me crerque já não são verdes,porque me não vedes,-Verdes não o sãono que alcanço deles:verdes são aqueles

..que esperança dão.Se na condição ¦./

Está serem verdes,Porque me não vedes?

Noutras redondilhas cheias domovimento e cor, quase desenhode bailado, Camões evoca osolhos verdes e a sua graça, apropósito deste mote:

Verdes são os camposda cor do limão;Assim são os olhos

Do meu coraçãoCampo que te estendesCom verdura belaOvelhas que nela

vosso pasto tendes:De ervas vos mantendes,

que traz o verão,E eu... das lembrançasdo meu coração.Gados que pasceisCom contentamento:vosso monumentoNão no entendeis:Isso que corneis,não são ervas, não;São graças dos olhosdo meu coração,

Diz o Povo:Os olhos da MarianitaSão verdes, cor de limão.

Quantas Marianitas, com séUsolhos cor de limão, enredaramo coração do Poeta. Sabe-se lá.

De Helena sabemos nós quetinha os olhos verdes e quão mi-lagrosa era a verdura deles.

A parte escureceDonde os olhos tira,E para onde os vira,O ar se esclarece;a terra florece,Secam-se os abrolhosNa luz dos seus olhos.

A poesia dos olhos verdes in-sinuou-se na alma e no coraçãodos poetas. Desde o povo quetão bem os sabe cantar, até Ca-mões, intérprete admirável dasua estranha luz, os olhos ver-des jamais podem perder o sor-tilégio, o encantamento da suacor, pelo muito que fizeramamar ou sofrer. Entraram paratodo o sempre na Poesia portu-guesa>

S. PAULO, 16-111-31.Manú,Sua carta fez a inquietação

.>a ter no mocambo aqui, tenhopensado muito em você e nessediabo de doença. Está claro queuma revivescência de doençavelha assim, pode não ser nadac pode ser tudo- Talvez no ca-so dependa mais de você queda doença, ela é filezinha comobem provou, talvez dependaexclusivamente de você fazercom que ela se recolha desim-portanto naquela apenas semi-realidade das coisas virtuais,que pelo menos não estragarácom seu corpo. Deixa as marcasespirituais sempre, eu sei, cvocê tem toda uma literaturaãe Tísico, mas isso não faz malnão, e algumas das páginas,principalmente da sua prosamais recente, provindas quaseque exclusivamente dessa vir-tuaiidade da tuberculose, sãodas asperidades, das... vira-das, das tristezas mais impres-sionantes deste mundo, são ri-quezas que a doença deu paravocê. Deus queira que continuedando só riquezas assim e que arebordosa do sábado não sejanada. Não vai ser nada não sevocê tomar cuidado consigo.Não vale a, pena a gente se ee-cordar de suas próprias culpaspassadas se não for pra tirardelas uma norma nova e porisso lembro que talvez você te-nha estado exagerando um bo-cado as suas forças ultimameh-te e daí tenha vindo essa visi-«nha da amante fielzinha.•-Quando' estive aí aquela histó-

iria de você ter casa e não estarIdormindo em casa, me incomo-{dou como o diabo. Mas tambémrôo posso me culpar das ml-'lhas invencíveis soberbias, quea*o são soberbias mas delicade-

Rh duma alma que me dá rai-Ta só. Talvez no momento ope você carecesse fosse dum

Carta de Mario de Andrade a M. BandeiraRibeiro Couto junto, mais nu-mano, mais espontâneo, falan-do com mais naturalidade cheiode curiosidades justas que per-guntasse o que era aquilo e sefosse mesmo vadiagem com mu-lher te botasse logo a doençapra cima e ridicularizasse o ex-cesso, que você está fazendo. Fa-lhei lamentavelmente, o quetambém me dói enormementoagora, tanto mais que sem ne-nhuma gratuidade, fiquei purae simplesmente preocupadíssi-mo com o fato, naquela curto-sidade impaciente de saber ede remover uma possível culpagrave de você pra consigo mes-mo. Talvez se não fosse todaaquela lufalufa em que vivi ostrês dias de Rio eu tivesse cal-ma pra pensar em mim e re-movesse com facilidade as dis-creções, viesse a falar e quemsabe se remediar a tempo, ca-so tivesse mesmo algum mal nocaso, mas chegava em casa cestava matutando em reformasem cadeiras, em programas edepois aqui e relatórios que adoertça me proibia de continuare mais tamanho diabo de preo-cupações que fUi obrigado aabandonar você. É inda agoraposso dizer que abandonei por-que sua carta merecia respostaimediata e não respondi levan-do pra você pelo menos estalembrança de companheiro. Masf que jucurutú cantou manhã-zinha nas jarinas do meu teju-pá veio mesmo a desgraça quenão há corpo fechado nem porMestre Carlos que possa vencer.Tive uma recaída de gripe queme deixou de novo na cama fei-to morto, só ontem pude viverum bocadinho e já agora, são 8

_d». manhãs wiíueira, coisa aue

faço é escrever pra você. Êsteano pra mim também você veja ,como está- intestinos que náoposso sair dum regime odienlo eseveríssimo, você não imaginacomo tenho sofrido e neste mo-mento mesmo inda sofro. Umesgotamento geral que nuncafoi tamanho e justo quandotambém a trabalheira nunca foitamanha, é inconcebível o quetenho feito e tenho pra fazer.E com o esgotamento veio afraqueza de corpo que a qual-quer cara do clima se debatemaltratado, gripes, defluxos, euma tosse inconcebível. Masnão posso tomar remédios pratosse porque o estômago nãodeixa! êta merda de vida! Masme parece tão mesquinho falardas minhas macacõas num mo-mento em cpie você está commacacôa guassú não creia náo,foi parolagem só pra divertir odoente, tirar da sua cabeça aipossíveis preocupações que vo-cê terá e espero que já estejamminimizadas por uma reflexãobem macha. Ontem o Rodrigo(1) esteve aqui em São Paulo,

mode inaugurar com o Chico deCampos o edifício da Faculda-de de Medicina. Nao vi o Ro-drigo mas conseguimos falar pe-Io telefone com ele. Fiquei meioatrapalhado, queria falar e nãosabia até Onde os outros esta-vam inteirados do que sucederapra você e não sabia também sevocê queria que alguém soubes-se de nada. Afinal perguntei porvocê e o que fora isso de vocêinventar de repente viagem praTeresópolis. Rodrigo me disseque "pois é" e que não tinhagostado nada de você ultima-mente porquê achara que você

instava, além de.abatido fisica-v

mente, com o moral tambémabatido. Isso é que me fez in-da pisar nos calos mais, fiqueiestragado pro resto do dia.Raciocinar as besticès da morteem carta parece sempre litera-tura e é uma pena. Se eu es-tivesse aí então falando a gen-te pode dizer tudo que não pa-rece literatura, falado simples.Você é inteligente demais pranão saber tudo o que eu faJa-va pra você. Pois se fale essasmesmas coisas porque com asnossas poesias, quando se nãoa gente se retemperar no ve-lho pé-de-boi que sousiste vo-Iuptuoso não-ser das nossas fan.tasias, não é só bom, é descar-ga necessária pra a gente selembrar que pé foi feito pra pi-sar, nariz pra respirar, etc.Agora veu te dizer até logo.Não me escreva cartas agora,não escreva pra ninguém. Masapenas as palavras necessáriaspra que a gente possa, daquiviver torcendo pra você isso se-ria impiedade não mandar. "Es-tou bem", "estou mais forte",etc e só. E no mais creio quevocê náo precisa mais que agente repita o que você repre-senta pra nós, pelo menos trêspessoas aqui. Alcântara, Loli-

•to e eu. Sou obrigado a esse de-ver de justiça de te dizer quenem me sinto com o direito deme isolar numa frase vaidosa-mente sozinho, porquê é in-contestável que os meus com-panheiros de enumeração tequerem com um carinho, comuma ardência humana prodi*glosa, são seus amigos puríssi-mos também. Mas é mesmo daenorme elevação de caráter quevocê tem despertar as amlza-

hi.ãaa mais discretas e mais.de*,

votadas. Falei "discreta" por-que quero lembrar a você ossegredos que morrem e quenão poderão jamais ferir ne-nhuma susceptibilidade bem eu-locada. O que quer dizer quese você em momentos como oque está passando agora so-fresse de qualquer omissão naoseria impiedoso pra consigo,seria impiedoso pra conoscoque nada mais aspiramos doque estar sossegados e cômode»em você. E' certo que aí vocêtem amigos tão bons como nóse na companhia desse maravi-lhoso Dodô (2), está perfeitomas se não quiser pesar de-mais pra um em qualquer sen-tido das precisões materiais eespirituais desta vida,, se apoieem todos, por que entre os ca-rinhos da vida mais humanospelo menos eu sempre sintoque dos maiores é esta apoia-ção nos outros que estou recla-mando- de você. Não sei bemainda como vou mandar estacarta pra você, primeiro telefo-nó pra Baby (3) pra Vêr séela tem o endereço daí, se nãotiver mando pro Curvelo mes-mo. Irei hoje ao Diário Na-cional e verei em que estado es-tá sua conta lá e farei com queacabem com Isso direito. Estaclaro que sinto com enormida-de você parar sua colaboraçãomas de fato você tem razãoe no momento deve mesmo «edar todos os sossegos. Você de-seja algum livro? E o caso d>Cícero!'.¦.. A uruca bateu nafamília, companheiro... Lem-branca pro Dodô e abrace ovelho amigp

MARIO

1. Rodrigo M\F. de Andrade.2. Geraldo Barroso do Ama-

ral-3. Baby Guilherme de AI-

meida. (Notas de Manuel Ban-í_deiral^

"¦'¦-:¦ ::ít

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Página — 14 L.E TRA S E A RT E S Jomingo, 14-5-1950

T O DO o Drasil artísticoc cultural cata come-

morando este mes ocentenário de nascimento de Al-

imeida Júnior, o grande pintor! pauliiita que primeiro entre nós' realizou obra de notável valor.plástico, lixando nossas coisas,\ nossos costumes c nossa gente,[enriquecendo e renovando, (umnovas cores e nova luz, a téc-nica pietórtea cm voga na últi-ma metade do século XIX.

Numa época em que os pín-•tores brasileiros, compelidos pe-1o hábito da cópia e da imita-ção. faziam entre nós pinturaestrangeira, colocando homens ecoisas de nossa terra dentro deambientes europeus, fixandopaisagens nossas com luzes ecores que não eram próprias ao"nosso meio —- dando em resul-lado belas paisagens de desço-jihecidos recantos, de inexisten-'7es

cidades.do Velho Mundo, —a contribuição apresentada por'Almeida Júnior representavamuito, era um passo em direçãoà pintura realmente nacional.Suas pesquisas e estudos de cou-ws e tinas brasileiros constt-tuem. ineaàvclmentc, o melhorde sua obra. embora não che-pitemos ao ponto de afirmar.,como o fazem alguns críticos,vun representam a única '-ôu-tribiúcâo séria do pintor itnãno •às art»s plásticas-do vttjs.

José Ferraz de Almeida Júnior'/asceu em Ihí. no Estado de

/São Paulo, a 8 de maio de 1850.uAendó filho de José Ferraz de'Almeida, modesto pintor de pa-/edes. c de d. Cândida do Ama-7dl Souza: Descendia, entre-'tanto,; de ilustre linhagem, reii-dó sexto neto de Francisco Van-âenburg. natural de Antuérpia

>e quinto neto de Felipe de Cam- ¦pós Vandêrburg. natural deLisboa. Descendia também deJoão Ramalho e Tibiricá.

Demonstrando, muito cedo,vocação artística, matriculou-sema Academia Imperial de BelasArtes dó Rio de Janeiro, ondeteve por. mestres Júlio Le Che-vrel e Vítor Meireles. Em jrir-tude de dificuldades finahcei-ras, abandonou os estudos, re-gfessando a São Paulo..D. Pe-lirç II, todavia, reconhecendo nojovem pintor uma grande pro-viessa, enviou-o à Europa, àsmas expensas. Permaneceu Al-mèida Júnior em terras euro-

péias de 1876 a 1882. Na Fran

O CENTENÁRIO DE NASCI-MENTO DE ALMEIDA JÜNIOR

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'Caipiras negaceando", famoso quadro de Almeida Júnior — Museu Nacional de Belas Artes

ça, cursou a Escola de Belas nel. Em 1882, após percorrerAries de Paris, tendo como.um ' a Itália, regressou ao Brasil,de seus mestres o grande Caba- Mostrou-se Almieda Júnior

indiferente ao impressionismoque, naquela época, agitava Pa-ris, em vista de serem seus

mestres, em grande parte, adep.tos do Iradicionulistno plásticoE isso foi um bem, embora nàòo crelam alguns críticos, /jo,à 0pín£or brasileiro pôde, assimadquirir a segura formação pidtôrica que lhe permitiria, muntarde, a se atirar à pesquisa àacor e da luz ao ar livre.

Tanto é verdade que trouxeimportante contribuição à pin-tura brasileira, enriquecendo.ade novo colorido, que os semprimeiros quadros, de coloridotênue e frio, diferem ynuito dosuas telas posteriores, de coresfortes e másculas, próprias donosso ambiente.

Em Paris. Almeida Júmorfreqüentou, além da Escola d?.Belas Artes, um curso noturnode desenho.

De Almeida Júnior se podadizer que, enquanto ainda es-cravizado à cor e à luz euro-péia. preferiu assuntos de inte-rior e foi um pintor estrangeirono Brasil. Porém, libertando-scda influência dos mestres daformação tradicional, dedicou-se ao estudo de nossos tipos ecostumes, enchendo suas telasda luz forte e do colorido vigo-roso de nossa terra. Em "A par-tida da monção". "Caipiras ne-gaceando". "Picando fumo","Nha Chica". etc. Almeida Jú-nior já é um mestre do pincel.

Com 49 anos de idade, admi-rado e festejado em todo o pais,amadurecido e situado no pontomais alto de sua carreira artis-tica. Almeida Júnior desapareceassassinado, na cidade paulistade Piracicaba.

Segundo os documentos cons*tantes do processo-crime contraseu matador, que se encontrano Arquivo do Tribunal do Júride Piracicaba, Almeida Júniorperdeu a vida numa tragédiapassional. O grande pintor, se-gundo se sabe, maniinha liga-ção amorosa com a jovem se-nhora Maria Laura do AmaralSampaio, com quem deixoufilhos.

Descoberta essa ligação, foi oartista apunhalado, pelo .esposode Maria Laura. à porta do Ho-tel Central de .Piracicaba, às15- horas do dia 13 de novembrode 1899. Seu túmulo se encon-tra no cemitério daquela cidade,Onde, todos os anos, artistas eintelectuais bandeirantes vãoprestar ao notável pintor as ho-menagens a que tem direito.

(CONCLUSÃO},

Enquanto ação, não existe "su-blimaçüo", se ela resulta do yro-cesso de elaboração tia escala his-tôriea, o que não a eoiiipatinili-asa com o sentido presente da vid«individual. A criança não sübli-ma, ela realiza. O bárbaro nãosublima, rcali/a. O selvagem nãosublima, realiza. O civilizado, por«ua. vez, não sublima: realiza!Cada qual, porém, realiza na ra-Bãó direta da Histórica éxpérien-cia', e na direção que esta mesmaexperiência lhe ensinou, dando,nos a ilusão da sublimarão.

a "stiblimação" se desloca, pois,para o fator tempo, onde encon-tramos a sua inevitabilidade di-ante da experiência que o homemvem colhendo na luta entre ¦>estado de prazer e o principio dereaJidade. À medida, entretanto,,qtic se acentua o seu desenvolvi-mento, após os primeiros anos, acriança vai-se apoderando de íor-mas reativas especiais, tidas como¦instintivas, intuicionais, depoisInteligentes, manifestações estaselabordas na trajetória da espécie,para se realizarem no intiivíduoatual, como adequado. meio emais eficaz de finnar-se o homemante a realidade do mundo ex-terno, líis o que entendemos por"'süblimação", quando, não passaisto de tendências reelabòrãdas áforma consciente de cada um.i E. ainda, nesta característica èque topamos, outro lapso da psi-canálise, pelo seu sistematizador,6ir Ernest Jones,.em concluir di-retamente as formas religiosassublimadas da retenção sexual ede funções fisiológicas semelhan-tes.

I Em se tratando da atualidade

PSICOLOGIA E RELIGIÃO^^^^^^^^^^^^^^^^m^^mmmmm^m^mmmmmm^tmammmam^^^^mmwm^mm^m^^mtm^mmmm^mKm^mMmmmm^mmÊ

(ENSAIO DE CRITICA)PAULO EMÍLIO RIBEIRO DE VILHENA

-indivíduo", o pensamento de ,lo-nes, e as soluções que atravésdele buscou, se mostram de todoinexequiveis e distantes da reall-dade, "presente" da pçrsonali-dade, não deixando de possuir es?ta teoria, por isso, a sua aplica-bilidade na origem do pensamun-to religioso, como atuação histõri.ca através da sucessão vital dasgerações.

Estudadas, nas suas pretensões,as tentativas, psicanaliticas de dis-.cernimento do fenômeno religioso,podemos concluir, sem susto, que,partindo de um centro irradiadore originário de • pesquisa, aliásaceitável, não logram, todavia,elas explicar satisfatoriamente asconseqüências do fenômeno, porisso que os planos de pesquisa econclusão não se aproximam, até,pelo contrário, pecam por exces-siva divergência.

Do prisma histórico, a "religiãose mostra como a tendência àbs-trato-afetiva das manifestaçõeshumanas, sintetizando e arrastai!?do em fenômenos psíquicos uni-versais, como símbolos, aquelemundo controverso do inconscieiute, . efetuando-o pelos caminhosque lhe abriu a espécie". A com-preensão mística da vida. no seuaspecto histórico, se faz, tão so-

mente, pela apreciação da obra daespécie e das multiformes reaçõesque o meio despertou no indivi-duo, triturando, educando, ree-laborando tendências de persona-lidade para, enfim, condicioná-la.o quanto possível, às exigências asmais diversas e inesperadas.

Em face de si mesmo e do mun-do que o cerca, o homem se tor.nou um solitário, como já o dis-se Gustav Young, e suas energiasnão o têm condicionado senãopelo sentimento do desconhecidoque o envolve. E não nos esque-çamos de que, ante o homem, seantepõem duas 'formas semelhan-,tes do desconhecido: a do mundoe a do próprio homem. Enquantoexistir o processo da elaboraçãoconsciente; enquanto viver o ho-mem sua luta no domínio e pelo*domínio do desconhecido, será ohomem um ser sempre inesperado,e terá o seu dia inundado sem-pre das mais extravagantes sur-presas. Não tem sido outra a lutado homem, que o domínio do des-conhecido. Outras as suas formasde reação, que conhecer para do-minar e dominar para não temer.Estas, as fontes que acirram astendências humanas trabalhadasna marcha da evolução, e só elasjustificam a fenomenoiogia reli-

giosa. O Deus do homem, antesde ser um Deus de realidade, nãoultrapassa a uma forma de des-conhecido — criada e alentadacomo meio absoluto de vencer-seo indivíduo no seu temor, no seuisolamento e na sua expectativa.Aqui, iremos cair nas bases in-dividuais e seu mecanismo da ela-boração do fenômeno religioso.O Prof. Mira y Lopes dirá: "a

nosso ver, -'o presente psíquico"é praticamente inexistente na vidaafetiva dos indivíduos normais,pois esta mostra-se geralmenteorientada para o "futuro" (ten-dência prospectiva determinantede reação prévia), com ligeirasincursões no "passado" "e, maisadiante acrescenta, "todos temosvisto a influência que a atitudeafetiva prévia exerce sobre a vi-vencia da atualidade", e, -ainda,linhas abaixo, "... sentimos a rea-lidade não como é, mas como es-peramos senti-la..." (l)Sabemos, e isto é elementar, queInéxiste o presente, no homem,que não esteja acompanhado detonus afetivo. Seja caracterizadonas formas de inquietação, demedo, de desejo, ou de interèse.seja nas reações impulsivas daafirmação. Ora. na sua caminha-da pelos tempos e no espaço, ji»-.

mais se desprendeu o individu*de seu colorido afetivo, e tudoque criou nesta jornada trouxe,inegavelmente, o profundo marcodo sentimento, da emoção, dapaixão e das tendências embrute-cidas que impulsionam estes sen-timentos. Entre, pois, as criaçõeshumanas que nasceram e se de-sen volveram sob o mesmo coloridoafetivo, a religião ocupa lugarproeminente, senão proeminente,como a mais bela, a mais numa-na e a mais rica de todas as tan-tasias elaboradas pela espécie.

A filosofia da vida reside, ai, naapreciação humana dos valores,no convívio natural das ciências,onde os fatos correm,, por si, asua simplicidade irretorquivel, eno espírito inteligente da crítica,em busca do equilíbrio na afir-mação e conservação do homem,através destas montanhas, quan-do não só existentes na natureza,êle as cria em si mesmo. Nossointuito não é desfazer montanhas,porém, galgá-las e vencê-las, con-,servando-as, todavia, às raizes docoração humano, até que a obrado tempo as elimine, lentamcfa-te, e faça pairar no horizonte odesdobramento tranqüilo de um/mundo real, abrigando a serent-dade consciente dos indivíduos.

Nada mais que isto, o nosso es-tudo. Partindo da concepção hu-mana da religião, até penetrar oseu verdadeiro sentido, qual sejao de uma tentativa a mais da.humanidade de resguardar os des-tlnos humanos, no seu afã deafirmação e de mútua protelo,entre si e o indivíduo.

(1) Emílio Mira y Lopez, "Pro-,?,¦ bleraas atuais de PsjloQiQgig!,^ i

Page 14: etrâWArtes - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/114774/per114774_1950_00164.pdf · com a literatura, além de não ser coisa fácil, bem sabemos o que dignifica! ... não parece muito

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Domingo, 14-5-1950 LET R"A S E rA RT ES Página — 15

UM EPISÓDIO ACADÊMICO

A Academia, ve* por outra, seapaixona por certos temas oucertos casos. Os prêmios acade-micos já agitaram a opinião daAcademia pelo menos duas ve-im Uma delas foi quando con-torrou Cecília Meireles ao Pre-mio de Poesia, com o seu gran-de livro de poemas "Viagem.

Fernando Magalhães, moblll-zando o alto prestígio de suaeloqüência, combateu com ar-dento entusiasmo o parecer deCassiano Ricardo. Mas estesoube defender com brilho, lu-i-idcz e bravura o seu admira-vel parecer, fazendo-o vence-dor. Outro caso de prêmio lite-rário que inquietou e empolgou:i Academia, ocorreu em 1926 efoi desencadeado pela peça delicnjamlm Uma — "O homemem marcha". O volume do"Teatro de Benjamim Lima ,publicado em 1949 (contendo aspeças "O homem era marcha",••ri homem que ri" e "O mar-tiiio de D. Juan") traz nassuas primeiras páginas, comopreíácio, uma interessante re-constituição desse episódio aca-dêmlco. O caso foi em resumo oseguinte: Concorrendo ao prê-mio de teatro de 1ÍW5, junta-mente com doze outras come-dias, a de Benjamim Uma tevea seu /avor parecer unanime darespectiva comissão, de que fa-ziam parte Coelho Neto, Clau-ilio de Souza e A. Austregési-

Como, porem, os senhoresCarJos de Laet e Osório DuqueEstrada impugnassem esse pa-recer, os senhores Rodrigo Otá-vio e Humberto de Campos re-quereram voltasse cia àquelacomissão. m ¦

Pouco depois o senhor Clau-dio de Souza, relator, lia emplenário a réplica da comissão— trabalho longo e minucioso,em que se estudara exaustiva-mente não só a questão da mo-raíídadc em teatro, como o ca-so concreto das acusações à re-ferida peça, e cuja publicarãoocupa nada menos de 19 pági-nas do numero de Junho dé1945 da "Revista da Acade-;nv, . _ .

Mo entender da comissão, èd;«, i.sência moral da sátiraocupar-se da imoralidade, poisse ela tratasse de assuntos mo-raia mal empregaria o gume desuas armas. Sua função é ata-car, escalpelar, ferir, açoitar.Se fizesse isto com as virtudes,com as exaltações da alma,

com a nobreza dos impulsos,com qualquer das tendênciashumanas de elevação, seriaodiosa, iníqua, condenável. Elasó é sátira, e como sátira dignade aplausos, quando ataca te-mas imorais, vícios, aberrações,monstruosidades físicas e pst-quitas, aleljóes de toda a espe-cie. Náo se escreve a sátira sô-bre o liso pergaminho dos lou-vores e das consagrações, c simsobre papel de lixa, mais oumenos grosso, para atritar, pu-lir e igualar as superfícies hú-manas que se avenugam de de-formações.

Tendo o senhor Carlos doLaet, na sessão de 18 de no-vembro de 1926, treplloado ver-balmenie, o senhor Cláudio deSouza procedeu à leitura das se-guintes "conclusões da Comis-são Julgadora":"A Comissão de teatro pensahaver' provado com sua abun-dante réplica:

1» _ Que "O homem quemarcha" é uma sátira, c é daessência da sátira analisar osmaus coslumes, os vícios e asde venerações da moral;

Z° — Que o fato -de a ter oautor classificado como farcanão a exclui do concurso, cujorc£u'.amento não fixa mmhumaforma cênica determinada e atodas aceita, seja qual fôr o te-ma; . j3" __ Que nao se trata de ummarido que pede dinheiro aoamante da mulher para tirarproveito pessoal c sim de ummarido que, por uma concep-ção monstruosa de vingança,orojeta empobrecer o amantede sua mulher para castigá-lo;

40 — Que a peça não aplau-de o procedimento do marido, clonge de incitar o publico a se-

DlOGENtiS LAERCIO

gulr-lhc o exemplo, anntema-tizu-o com as iu.iín duras ex-pressões;

5" — Que cm todos os temposo teatro assim procedeu, ex-pondo os vícios da' espécie, paracondená-los com a sátira, oucom o auatema, e esta lem si-do sempre sua benéfica função;

6o — Que no próprio Vatlca-no, guarda mais alto da moralcristã, que é a mais severa, fize-ram-sc representações de pe-ças. uma dsdas escrita por umcardeal, nas quais nem mesmoa Hrenciosidade de expressãofo5 evitadai S

7° •— Que ainda mesmo que aconclusão da peça fôsse maiscomplacente para com os seusporvMtugens, a Academia julgaapenas do valor literário dasobras, c pelo fato de premiarêste valor não. apoia nem ado-ta suas conclusões.

g* ._. Que o trabalho tem va-lor e merece prêmio, e que osligeiros senões de linguagem quea comissão apontou não lhe ti-ram o mérito literário, pois nãose trata dé erros graves ou desoleeismos imperdoáveis, ¦ masapenas do uso de galicismosmuito comuns na nossa prosa, ede alguns neologisraos, que oparecer definiu nestes termos:"são nugas que revisão maiscuidada arredará do texto".

9» — Que a Academia deFrança, alta c severa institui-ção que nos tem servido de mo-délo, e todas as academias li-terárias do mundo não íiliadasa determinado credo religiososeguem o critério, que tambémesta Academia, em casos ante-rlores, tem adotado, de apenasjulgar do valor literário dasobras que sé apresentam a seusconcursos; .

LADEIRA DA(Conclusão da 5.a pág.)

ce do mais rico e concreto detodos os realismos. s.r;

Esse problema do ambienteefetivo, analisa-o com acerto oromancista nestes comentáriosde tio Rangel durante o traje-

PARIS I

I¦issffli

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NOTÍCIAS DEA Exposição Francis Cruber

PARIS maio (de Louis Wiznitzer) Roualt c Picasso. com

o caSlôr quase' v%lento de sua arte, íffiJggOT-^Sgnela introdução do sofrimei, to na tunalica .Ja í,mvn™

.contemporânea: O surrealismo plantava suas bases W^^jjMJcomento em que Gruber começava a pintar,:. inas g?£!«.«5jg$¦imféticamente isolado de qualquer escola, a maigem de quai-quer movimento, arrebatado por uma espécie de ixisfí;^? °

f:tinada. Sua morbidez comunicava uma espécie da essência m-íhia que os aèòritecüuentos mais tarde confirmaram, a K»os campos de concentração e a própria antevisão de sua mon.

.prematura cm VJ48. r.„..^oi«sr«Atado ao conflito entre o bem e o mal como ^«^JM**Gruber seguiu muito naturalmente o caminho fia ,,oform„çao,

e sua obra não pôde deixar de filtrar alguns dos mellmres a U-flcíòs do süneálismò: Notadamentc "te pnntemifó e Ljuuom-

..".«" acentuam' isto"; Seus temas preferidos são os horrendos pa-noramas dos subúrbios e os nus em decomposição <Job) e aca-cietsiittos esqueléticos e ridículos, etc. Os ângulos de suas com-posições são realçados com uma vivacidade quase frenética, umdesenho nervoso, ligeiro. Há na sua obra a transparente pre-seiica rio romantismo e uma sensação de que alguma coisa nao"! cothnietòu. Qual será o seu julgamento? Ser;i muito, ou poucoprovável que se venha a gostar deste "Coin d'Atelier . onde o?Mor colocou o máximo de sua emoção? Talvez se aprecie maisalgumas de suas paisagens onde o pessimismo não é detalhado eonde os cinzas e os verdes assumem um valor idêntico ao quetinjbám nas telas de CÒürbert. que foi seu mestre. Svias uitvroar,telas, as de 1948, deixam transparecer uma estranha evolução: maissutil, mais delicado, o pintor tenta uma incursão a uma espe-cie de simbolismo muito própria, cheia entretanto de cotidianoiJnpiedoso.Mauriac contra a Academia

Em entrevista recentemente concedida a um jornal de Co-penhague, o romancista François Mauriac fez graves acusações aAcademia Francesa, da qual é membro imortal. Segundo o au»tor de "Therese Desqueiroux" aquela instituição não passa üeum aglomerado de "velhos senis que procuram recupera* as.™-culdades mentais e que se rejubilam por haver passado da ida-de em que se está sujeito ao câncer". "Para que serve esta gen-te? ,— prossegue — Eu nada tenho de. comum com ela". Na mes--ma entrevista,-Mamiau-anunciou—o^Títparedmento- ckv-'^m- novo.romance seu, cujo título será "Feu Swr La Terre". Declara aindaestar decepcionado com o general De Gaulle e finaliza a surpre-Çndente entrevista dizendo que participa deste pensamento deKierkegaard: "Deus não é qualquer um de quem se fala, mas ai-guém a quem se fala".

to de trem em que acompanhaJorge a caminho da fazenda «dos dias de sua felicidade mor-ta: "Certas leitoras vão alémdos personagens e «nredos:atingem o autor, processo aliásmais lógico. Querem o criador,bem mais do que as criaturas.

Elas averiguam que a slmilitu-de de suas almas, problemas,anelos e dramas dos persona-gens dos seus livros, as coloca:primeiro, numa atmosfera iden-tira; segundo, que já que vocêcriou tudo isso e tudo isso en-contra representação real emsuas vidas, tanto os persona-gens, como o autor e e,as ""

certas leitoras —. são dummesmo mundo específico. Dai,a conseqüência: tais leitoras secuidam também personagens ecriaturas suas. Mas, vamosadiante: todos os personagensessenciais dum romancista saode certo modo ele próprio. To-dos os problemas, aneíos e dra-mas são confissões ou sublima-ções. Estabelece-se então umaafinidade global. Digo mais: seessas criaturas até então naoachavam a quem confiar certosestados de alma. consciência,sensibilidade, espirito, no senti-do de compreensão e consulta,iá agora sabem o que dixer, a

quem consultar. E isso comuma confiança estribada cm documentação exata: o livro .

Entretanto, o que tão fácil deexplicar se revela quanto ás lei-toras de romances bem maiscomplexo parece cm relação aoromancista. Mas não o é. Oautor também sente na ídenti-ficação da leitora com suas per-sonagens uma identificação desi próprio com a leitora, atravésda personagem, reflexo de seusdesejos, ambições, ideais, figu-

._..ra concreta, palpável,- em -quepede viver sua realidade inte-rior. Rompe assim o romancede José Geraldo Vieira as fron-teiras da simples narração, daanedota/ e até da pesquisa psi*

10° — Considerando que a pc-ça t-ut discussão mantém lin-guagem sempre asseada c ele-vada. sem nenhuma passagemimoral, chegando a fazer comque se passe fora do palco umaúnica cena de sedução que nelase contém;

11° — Considerando que o sr.Conde de Laet declarou a estaAcademia que não leu a peça. eapenas a julga pelo resumo fel-to pela Comissão, e esta, queleu e releu a peça, indica-a aoprêmio, e não menos zela peladignidade- acadêmica: -

... mantém seu parecer emtodos seus termos.

Rio de Janeiro. 18 de novem-bro de 1926.

a) Cláudio de Souza — Rela-tor: Coelho Neto; Austregesilo."

Prosscguindo a discussão doparecer da Comissão Julgadora,falaram ainda, nessa mesmasessão de 18 de novembro, ossrs. Osório Duque Estradas,Coelho Neto e Carlos de Laet'.

Posto cm votação o parecerda Comissão Julgadora, reque-rcu o sr. Carlos de Laet prefe-rência para o seu substitutivo, oque foi aprovado por 12 votoscontra 7.

Posto em votação o substitu-tivo Carlos de Laét, foi apro-vado por 10 votos contra 9.

E assim terminou esse apai-xonante e singular episódio li-terário da vida acadêmica.PARTIDA DE GUSTAVO

BARROSOPartiu quinta-feira para a

Europa o Presidente da Acade-mia, sr. Gustavo Barroso, queteve embarque muito concorri-do.

O sr. Peregrino Júnior, naqualidade de Secretário Geral,

VtiÍ

eclógica para elevar-se ás es-feras transcendentes da filoso-fia antropológica.

Só isso, ainda que menos rea-lizado, bastaria para emprestara "Ladeira da Memória" umvalor raramente atingido emnossa literatura.

MEMÓRIA

assumiu a Presidência, desig-nando para Secretário ('•(•rui osr. Rodrigo Otávio Filho, paraIo Secrclárlo o sr. Anibal Frei-re e para 2o Secretario o sr. VI-rlato Correia.PENDE NA ACADEMIA

O sr Nicola Pende visitou oPetlt Trianon. Foi saudado pelosr. Alolsio de «.'astro c respon-deu agradecendo.CONFERÊNCIA DE ALCEU

AMOROSO LIMAO sr. Alceu Amoroso Lima

pronunciou uma conferência noCirculo Católico, na semanapassada, abordando o tema darxoansãn í-»fúli"-< no Brasil.A FACE PERDIDA

Deu-nos o sr. Cassiano Ri-cardn mais um livro de noemas:"A face perdida". Trata-se deobra de errande valor literário,que a crítica situa entre as ex-pressões mais altas e miras dapoesia brasileira contempora-nea. Na ultima sessão da Aca-demia vários acadêmicos louva-ram calorosamente o sr. Cas-siano Ricardo, festejando comefnsão o aparecimento de "Fa'

cc Perdida".PALAVRAS DE ROQUETE

PINTOComentando, na Academia, o

aparecimento do livro do sr.Peregrino Júnior sobre "Crês-cimento e Desenvolvimento", osr. Roquete Pinto considerou-ó"notável pela originalidade,pela clareza c pela documenta-cão", tecendo ardentes louvoresà obra e ao autor.MONUMENTO A JOÃO DO

RTO EM LISBOALisboa, que há pouco deu a

uma de suas praças o nome deAfrânio Peixoto, acaba de inau-gurar um monumento à me-mória de João do Rio. PauloBarreto foi um amigo ardentede Portugal — e foi precursorda política de aproximação lu-so-brasileira. Os portuguesespor isso lhe são gratos e dedi-cados, e para significar essagratidão e estima erigiram emLisboa um monumento em suahonra. Lembrança justa e de-licada, que toca profundamen-te à sensibilidade de todosaqueles que se batem pelo idealda unidade espiritual luso-brasi-leira. Falou, na inauguração domonumento a João do Rio,aquele que realmente devia fa-lar: João de Barros — grandeamigo e companheiro de PauloBarreto, e seu colaborador naobra comum de aproximaçãoentre Brasil e Portugal

Letras e AiíesDIREÇÃO

DE

JORGE LACERDACOLABORADORES:

Adonias Filho, Afrânio Coutinho, Alcântara Silveira, Alceu Amo-roso Lima, Almeida Fischer, Almeida Sales, Alphonsus GulmaraensFilho, Álvaro Gonçalves, Anihal Machado, Anor Butler Maciel, An-tonio Rangel Bandeira, Ascendino Leite, Augusto Frederico Schmidt,Augusto Meyer, Batista da Costa, Breho Acioli, Brito Broca, CarlosDrummond de Andrade, Cassiano Ricardo, cecilia Meireles, Chris-tiano Martins, Ciro dos Anjos, Clarisse Lispector, Cláudio T. Barbo-sa, Dalton Xrevisan, Damaso Rocha, Dantas Mota, Dinah S. deQueiroz, Eugênio Gomes, Euryalo Canabrava, Fernando Ferreira deLoanda, Franklin de Oliveira, Geraldo Ferraz, Gabriel Munhoz daftocha, Guerreiro Ramos, Gustavo Barroso, Gilberto Freyre, ilerbenParentes Fortes, lierman Lima, Jayme Adour da Câmara, João con-dé, Joaquim Ribeiro, J. 1*. Moreira da Fonseca, José Lins do Rego,Jorge de Lima, José F. Coelho, José Geraldo Vieira, José SimeaoLeal, José Tavares de Miranda, Josué de Castro, Josué Montello,Leony de Oliveira Machado, Ledo Ivo, Lígia Fagundes Teles, LouisWiznitzer, Lopes de Andrade, Lúcio Cardoso, Luiz Jardim, Manueli-to de Orneias, Manuel Bandeira, Marcos Bonder Reis, Mario da SilvaBrito, Mario Qúiníana. Marques Rebelo, Murilo Mendes, Novelli Ju-nior, Neli Dutra, Newton de Freitas, Octavio fie Faria, Olímpio Mou-rãò FiUio, Oliveira e Silva, Otto Maria Carpeaux, Paulo Mendes Cam-pos, Paulo Ronai, Peregrino Júnior, Péricles da Silva Ramos, Rena-to Almeida, Renzo Massarani, Ribeiro Couto, Rodrigo M. F. de An-orade, Roger Bastide, Rogério Corcâo, Roland Corbisie/, Rosário lus-co, Rubem Biafora, Santa Rosa, Sérgio Milliet, Scrvulo de Melo, bii-vio Elia, Sylvlo da Cunha, Sônia Regina, Tasso tía Siiveira, íemisrio-cies Linhares, Thlers Martins Moreira, Umberto Peregrino; Van Jara,Vicente Ferreira da Silva, Wilson Figueiredo, Willy Lewin, XavierPlacer.

1LUSTRADORES:

Alfredo Ceschiatti. Armando Pacheco, Athos Bulcao, MarceloGrassmànn Marcier, Éavga Ostrovver, Iberê Camargo, Luiz Jiuoini,Noemia, Oswaldo Goél#Í, Paulo O. Flores, Paulo Vincent, RcnmaKatz, Percy Deane, Santa Rosa, Van Rogger e Yllen Kerr.

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Página — 16 LETRAS E 'ARTES Domingo, 14-5-1950

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Ilustração de SANTA ROSA

S O LIDA OE* NESTE DESESPERO ATORMENTADO, E' NESTE ENCONTRO DE ANSIEDADES

[SURPREENDENTES,POR TODO ESTE INFINITO DE DISTÂNCIAS E TORTURAS,POR ESTA SOMBRIA DESOLAÇÃO DE SAUDADES E DE ANGÚSTIAS.NESTE CAMINHO QUE SE ALONGA E NESTA ESCALADA QUE CONTINUA,

QUE EU ME PERCEBO E ME COMPREENDO, INDECISO, ABSORTO, SEM RUMOFRENTE AO QUE SOU, DISTANTE DO QUE DESEJAVA TER SIDO,PARADO EM MEU PRÓPRIO ISOLAMENTO, EMUDECIDO EM MINHA IDÉIATENTANDO SUBIR ESCARPAS INSISTINDO EM ALCANÇAR HORIZONTES.

EM TUDO ESTE MARASMO, ESTA MORDAÇA E ESTE CANSAÇO DE TAPERAESTA PRESENÇA DO IMPALPAVEL E ESTA DÚVIDA DO INVISÍVEL;"EM TUDO ESTE DESTERRO, ESTA FUGA DE ESPERANÇAS E ALEGRIAS,A CADA PASSO O DESENCONTRO, ESTE EXÍLIO E JSSTE INCONTENTAM-iNTO...

CADA POENTE E' UM DESENGANO ACORRENTADO AO FIM DA TARDESOBREVIVENDO NO TORPOR DO OCASO QUE SE LEVANTA;PELOS DIAS E PELAS NOITES CADA IMPRESSÃO QUE RESTARECORDA. LEMBRA O DESERTO DAS MADRUGADAS MORTAS!

JE* NESTA RUÍNA SILENCIOSA DE AGRURAS E DE TfcDIO,NESTE ESFACELAMENTO DE GRANDEZAS, NESTE CAMINHO,POR ESTA SINISTRA DEBANDADA DE DESTINOS PERDIDOSE NESTE ROLDÃO DO TEMPO E NESTE ESFORÇO BALDADO E INÚTIL ;

ClUE EU ME RECOLHO A CLAUSURA E A TREMENDA CONFIDENCIA DE MIMTMESMO

E ESTACO PARA AUSCULTAR, PARA VER E PARA SENTIR PELA VID \O ESPAÇO TREMENDAMENTE ABERTO SOBRE TUDO O QUE IMAGINOE A INCERTEZA RESPLENDENDO SOBRE TUDO O QUE SUPONHO!

PAULA ACHILLES

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