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7 ST kmÊmr etras e Aries ANO 6.° H.c :40 | MJNDADOP. JORGE LACePDA MMmHI &*£&#<? eu 6" Domingo, 4-5-1952 OIKLIÜK: ALMEIDA fISCHER —t: N\yí «uipre se. observk «a. ue o nunieiu c « •ia 4ii viutí o c^tUuu ijiogranco .o* üjUm.»; a proceuer tom na.oi eu- c..-»a a exegese ^;t vtauzuçao a/tibuUÀ'. A^UcU* uúji ;uiCuie ue .ju«*«ie i>cuve, dceiu-uiu uni» Vida o eu mui uurci * muí«i, ucu« 3ejuiUi'<S c JUSla. i*U üíCüjuo, o»- mu^.cíivc, autAgoiiisníu ciure % viua uo uiiwi £ iUrt prouuçau, «Nao c u *uo uco/re cuju ceo- uáruo u* * incii cüjft Diografia volva a uura uiai* cu^upi eeusi. ve*, àCdiÇU u vaior ua ii\.ü/.a«;au « jUbuiio.i a Auíuiruçiio ue aeu* tuiitcuipOiaüCüa wU UlSClpUlOS. 'X&hiuetu «ao e vumuu. «.or-ae, à m .ipuiü de uma rtau^aváú pie» tonta d cuiunuuivao literária * vfyficá ue IíViuü puuiicauos ou in: i.iailUhuruOb Uc.i.tuüa JuulO ucrança piedosa ao» posveti/>. x,om Leonáruu» a auidiM! ia f,in« u.r>iá<,l«u e iaciutaua uu- iu pelo que àaoeaius de sua vi- ua, ue *cu temperamento, de deus êxitos e piouvupaçoeü. co- mo pco yue iiüo ignoramos de suas idéias expo-las uo& manu*. vi nos noje em poder üo> »<iu~ bcüs e inulioieuas ua Franca, da ingiaterrã» ua itaua, da Au.-»- ti ia., manuscritos esses cm sua lotauuúde ja puoücauos. .Nao pretendo voltar aqui á Mia oiograiia, que se consultará ²caso nao se tenha por tui i- ro. na mbmoi *u, em dezenas de vu.uiaes kcessiveijs a qualquer leitor interessado. Mau une pa- íeoe sequer -uecessano citar «m laioá principais de uma «yifc- têiicia inteiramente dedicada a* pesquisas artísticas e cientificas, inteiramèrâte voltada para a me. uitação c u estudo. Apenas de- sejò mostrar mais uma vez ²qüò esse Leonardo da Vinci, preocupado em fins do séeuib r;V » início do século XVI com todas as possibilidades da fisi- «a, da química e da astronomia, curioso de conhecimento» tèc- íik.os, atento às leis da compo- sição, da perspectiva, e da cor, interessado no problema da ex- pressão das emoções, esse Leo. nardo foi, em verdade, o homem típico de seu tempo, o grande precursor, o grande pioneiro, o grande inovador, o grande revo* hiciònario dessa época rica de ternos, numa Itália que. uma vez mais. se postara na' van- guarda da civilização ocidental. Leonardo personifica '«tão os anseios de uma elite, è o pro- tntipo da inteligência critica que revê os valores aceitos e da inteligência criadora que impõe itovas concepções. E' difícil talar de Leonardo sem repetir tudo o que foi dito. sem cair nos clássicos pa- ralelos, como por exemplo en- Ire-Da Vinci-e Miguel Ângelo, fcem enveredar pela senda peri- gosa de «ma crítica psicanali- tici baseada ei» locumeníos duvidosos ou em Interpretações apressadas •. Por isso, e em me cabendo-di- zer do artista tão somente, pro- curei encarar o pintor e o este- tiííista na sua contcmporanel- dade a paragonà-lo, de passa- g<*m, sem descabida insistência, com algum revolucionário de nosso tempo, com alguém que tamb«m procedeu a uma rigoro- revisão dos valores pictórl- ros, que se esforçou sem: cessar Por atingir a verdade na ex- pressão artística após uma luta decidida contra a formula, a couta » decadência acadêmica. Kefiro-me a Paul Cezanne. Uma das primeiras frases com »ne deparo nos manuscritos WÊÈfmSm<Smm^L&L^mr^m^m\W^ ififl Htf^^^H^BRHlrV^VI^l^BBd^HlBÍ9i^^^^^l^^si?^mIMÜI^^B^HnÉft^^^^l "O porto" Xilogravura de EDUARDO VltKNAZZA OS MANUSCRITOS DE LEONARDO Leonardo é a &cgu!nte: "que ninguém me leia se não for ma- temático, pois eu o sou em to. dos os meus princípios". Quem diz matemática diz lógica, dia construção, equilíbrio, geome- tria. Quem diz matemática, tem em vista uma tentativa de es- tabilidade, de edificação sólida em -aposição à sensibilidade. Mas quem se afirma assim tão peremptoriamente adepto do uma rígida dlsçipMtia ialveai busque apenas um corretivo —• produto de severa autocrítica para as imposições de uma" an- sia incontida de expressão. Co- mr quer que seja, essa frase mo lembra outra, agora não me- nos celebre, de Paul Cezanne* "•a natureza é feita de cub^s esferas, cilindros". Espírito geo. métrico, dirão os que freqüenta- rara Pascal, espírito geométrico que leva um ao estudo das pro- porções (embora a composição inteligente do quadro hou- vesse chegado à perfeição com seus auiecessoresj, ao estudo das SÉRGIO MILLIET proporções, digo, no momento em que uma requintada sensi- bilidade ameaça a solidez obra de arte, e outro á redesco- berta da estrutura, no inslau. te em que o impressionismo cs- quece desenho e construção e entra numa fase por assim di- zer delinquescente. ^Nesses mesmos manuscritos de Leonardo, tão cheios de obser- vações importantes, descubro esta opinião ousadíssima de que de toda a produção pictorica existente, a de Giotto e a de Masace'o merecem respeito e amor. Via sem duvida, em ambos, revolucionários dessa expressão que desaparecera da pintura sob o convencionalismo místico em voga durante tanto tempo. Considera Leo- nardo que cm sua época se pro- cessava rapidamente a deca- dencia da arte pictoríca, copl- ando.se os pintores mutuaraeii- te. afastados da verdade huma- na ,da observação da natureza, da fidelidade necc^suria ao real, do espírito de criação. Era pre- ciso portanto recomeçar tudo desde o início, esquecer, as rc- celtas, abolir os preconceitos, reconquistar a inocência e a humildade sem as quais a obra d;5 a te. não se realiza. Não será diferente a linguagem de Cezaime, exigindo do artista cfu-i se cofnca:-se diante do oh- jeto a ser pintado como se nun- ca o tivesse visto, condenando & academia é apontando nos ensinamentos de Poussin, por um lado, e de Delacroix, por outro, os únicos diçnos de con- sideração. Composição solida e forca exnresrlva, sinceridade, Iiorror ao convencional, exata- m^n*'! o que preconiza Da Vinci. O am«r é filho do conheci- mento, diss<' este, acrescentan- do alhures qi».e todos os nossos conhecimentos nos vêm dos sení;'Tos. rorl«-se perceber nes- st», afi ma ção a característica do espírito c5*rt'*fjc.o, o alicerce pri- meiro do método c&perinieuUl, Nada mais lógico e justo. Ma» pode-se ver também um anseio «ie não se arredar da verdade cio modelo, de chegar a ela pem experiência direta da vista e *•• tato. numa exploração consci- enuiosa e aguda que desconfia «l(- qualquer generalização, do qualquer conceito gratuito, de qualquer metafísica. Cezanne faria o mesmo, ma- tando dc cansaço seus mode.os paia alcançar um tom real, vo.- tando cem veres â mesma na.- sageni afim de ncnelrar-lhe « segredo das formas recôndita:,, da estrutura, do ekquelcto ua anatomia. O tratado de pintura de Ler»- nardo está repleto de notáveis reflexo?» sobre a aplicação ua geometria na composição úo quadro e na construção das f>- guias Mas aplicação náo nia parece o termo certo, pois nã« pa te o pintor dc uma teoria preestabelecida. antes tira essa teoria da observação penetran- te da natureza. K' verdade, co- mo dirt Lionello Venturi, quo êle criou unia teoria da pers- pectiya, que, para construir um corpo humano, fundou uma ciência anatômica e para colo» rir uma tela formulou um tra- lado das sombras. Mas a essa sistematização ele chegou pela experiência repetida, controlada e transformada em lei al>ós a verificação da constância dos resultados. "A atmosfera esta cheia de unia infinidade de pi- ramides", escreve em dado mo- mento; as proporções do corpo humano são de tal ordem, o essa ordem preside também às proporções dos demais corpos existentes na natureza, ali iu;i de outra feita. E temos com essas proposições mais uma vea a lembrança de Cezanne qua se inteiraria igualmente dessas leis e as apontaria a^s teoris- tas modernos como de obser- vnneia imprcsriridivèl à realiza» ção da.obra de arte. Entretanto o espirito geomê- tricô, tão desenvolvido em Leonardo como em Cezanne nao excluiria a sensibilidade, não Abafaria o esprito dc finvra. perceptivel em todas as suas roflcvões sobre arte e em par- tScular em lo<las a«? suas prclu- cões conhecidas. Essa doçura de sua<? personagens, essa ele- ganeia de formas ?m que sa compraz e r»tê a discrição de seu colorido, são conseqüências do es-^rito de flniirn. Ninguém melhor r'o que êle aliou uma cola a out-a, finura e geome» tna, ninguém, nem mesmo Goo the, foi mais perfeito na sut» organização mental. Pode parecer a quem o apressadamente que Leonardo se cingiu demasiado à copia ser- vil da natureza, talvez conven- çido de que nesta está o modelo recomendável, porquanto nela se encontra a verdade. Seria um erro pensar assim. O pro- piii» Leonardo em mais de um trecho de seu tratado nos ad- verte contra uma conclusão pre* cipitada. Duas ou três frases se me afiguram edificantes. Ela que nos declara de súbito: "a pintura luta e rivalwa com a natureza". É mesmo a vence o domina, porque "a.natureza é limitada e a fantasia infinita" E ;iinda por ser a pintura "uma coisa mental", um produto por- tanto do espirilo e não o re?ul- ta*o de um virtuosismo ma- nual. Na realidade, se o pintor imita a natureza náo o faz de- tando-]he o direito de criar. Sem dúvida observa essa natu- C*l5íittdo-a «a tela. mas dispu- .{Contl^i na IV uúsia»X

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7ST

kmÊmr etras e AriesANO 6.° — H.c :40 |

MJNDADOP. JORGE LACePDAMMmHI&*£&#<?

eu 6"

Domingo, 4-5-1952OIKLIÜK: ALMEIDA fISCHER

—t:

N\yí

«uipre se. observk «a.ue o nunieiu c « •ia

4ii viutí o c^tUuu ijiogranco .o*üjUm.»; a proceuer tom na.oi eu-c..-»a a exegese ^;t vtauzuçaoa/tibuUÀ'. A^UcU* uúji ;uiCuieue .ju«*«ie i>cuve, dceiu-uiu uni»Vida o eu mui uurci * muí«i, ucu«3ejuiUi'<S c JUSla. i*U üíCüjuo, o»-mu^.cíivc, autAgoiiisníu ciure %viua uo uiiwi £ iUrt prouuçau,«Nao c u *uo uco/re cuju ceo-uáruo u* * incii cüjft Diografiavolva a uura uiai* cu^upi eeusi.ve*, àCdiÇU u vaior ua ii\.ü/.a«;au« jUbuiio.i a Auíuiruçiio ue aeu*tuiitcuipOiaüCüa wU UlSClpUlOS.'X&hiuetu «ao e vumuu. «.or-ae,à m .ipuiü de uma rtau^aváú pie»tonta d cuiunuuivao literária *vfyficá ue IíViuü puuiicauos ouin: i.iailUhuruOb Uc.i.tuüa JuulOucrança piedosa ao» posveti/>.

x,om Leonáruu» a auidiM! iaf,in« u.r>iá<,l«u e iaciutaua uu-iu pelo que àaoeaius de sua vi-ua, ue *cu temperamento, dedeus êxitos e piouvupaçoeü. co-mo pco yue iiüo ignoramos desuas idéias expo-las uo& manu*.vi nos noje em poder üo> »<iu~bcüs e inulioieuas ua Franca, daingiaterrã» ua itaua, da Au.-»-ti ia., manuscritos esses cm sualotauuúde ja puoücauos.

.Nao pretendo voltar aqui áMia oiograiia, que se consultará

caso nao se tenha por tui i-ro. na mbmoi *u, em dezenas devu.uiaes kcessiveijs a qualquerleitor interessado. Mau une pa-íeoe sequer -uecessano citar «mlaioá principais de uma «yifc-têiicia inteiramente dedicada a*pesquisas artísticas e cientificas,inteiramèrâte voltada para a me.uitação c u estudo. Apenas de-sejò mostrar — mais uma vez

qüò esse Leonardo da Vinci,preocupado em fins do séeuibr;V » início do século XVI comtodas as possibilidades da fisi-«a, da química e da astronomia,curioso de conhecimento» tèc-íik.os, atento às leis da compo-sição, da perspectiva, e da cor,interessado no problema da ex-pressão das emoções, esse Leo.nardo foi, em verdade, o homemtípico de seu tempo, o grandeprecursor, o grande pioneiro, ogrande inovador, o grande revo*hiciònario dessa época rica deternos, numa Itália que. umavez mais. se postara na' van-guarda da civilização ocidental.Leonardo personifica '«tão osanseios de uma elite, è o pro-tntipo da inteligência criticaque revê os valores aceitos e dainteligência criadora que impõeitovas concepções.

E' difícil talar de Leonardosem repetir tudo o que já foidito. sem cair nos clássicos pa-ralelos, como por exemplo en-Ire-Da Vinci-e Miguel Ângelo,fcem enveredar pela senda peri-gosa de «ma crítica psicanali-tici baseada ei» locumeníosduvidosos ou em Interpretaçõesapressadas •.

Por isso, e em me cabendo-di-zer do artista tão somente, pro-curei encarar o pintor e o este-tiííista na sua contcmporanel-dade a paragonà-lo, de passa-g<*m, sem descabida insistência,com algum revolucionário denosso tempo, com alguém quetamb«m procedeu a uma rigoro-s» revisão dos valores pictórl-ros, que se esforçou sem: cessarPor atingir a verdade na ex-pressão artística após uma lutadecidida contra a formula, acouta » decadência acadêmica.Kefiro-me a Paul Cezanne.Uma das primeiras frases com»ne deparo nos manuscritos dü

WÊÈfmSm<Smm^L&L^mr^m^m\W^ ififl Htf^^^H^BRHlrV^VI^l^BBd^H lBÍ9i^^^^^l^^si?^m IMÜ I^^B^HnÉft^^^^l

"O porto" — Xilogravura de EDUARDO VltKNAZZA

OS MANUSCRITOSDE LEONARDO

Leonardo é a &cgu!nte: "queninguém me leia se não for ma-temático, pois eu o sou em to.dos os meus princípios". Quemdiz matemática diz lógica, diaconstrução, equilíbrio, geome-tria. Quem diz matemática, temem vista uma tentativa de es-tabilidade, de edificação sólidaem -aposição à sensibilidade.Mas quem se afirma assim tãoperemptoriamente adepto douma rígida dlsçipMtia ialveaibusque apenas um corretivo —•produto de severa autocríticapara as imposições de uma" an-sia incontida de expressão. Co-mr quer que seja, essa frase molembra outra, já agora não me-nos celebre, de Paul Cezanne*"•a natureza é feita de cub^sesferas, cilindros". Espírito geo.métrico, dirão os que freqüenta-rara Pascal, espírito geométricoque leva um ao estudo das pro-porções (embora a composiçãointeligente do quadro já hou-vesse chegado à perfeição comseus auiecessoresj, ao estudo das

SÉRGIO MILLIET

proporções, digo, no momentoem que uma requintada sensi-bilidade ameaça a solidez d»obra de arte, e outro á redesco-berta da estrutura, no inslau.te em que o impressionismo cs-quece desenho e construção eentra numa fase por assim di-zer delinquescente.

^Nesses mesmos manuscritos deLeonardo, tão cheios de obser-vações importantes, descubroesta opinião ousadíssima de quede toda a produção pictoricaexistente, só a de Giotto e ade Masace'o merecem respeitoe amor. Via sem duvida, emambos, revolucionários dessaexpressão que desaparecera dapintura sob o convencionalismomístico em voga durante tantotempo. Considera Leo-nardo que cm sua época se pro-cessava rapidamente a deca-dencia da arte pictoríca, copl-ando.se os pintores mutuaraeii-te. afastados da verdade huma-na ,da observação da natureza,da fidelidade necc^suria ao real,

do espírito de criação. Era pre-ciso portanto recomeçar tudodesde o início, esquecer, as rc-celtas, abolir os preconceitos,reconquistar a inocência e ahumildade sem as quais a obrad;5 a te. não se realiza. Nãoserá diferente a linguagem deCezaime, exigindo do artistacfu-i se cofnca:-se diante do oh-jeto a ser pintado como se nun-ca o tivesse visto, condenando& academia é apontando nosensinamentos de Poussin, porum lado, e de Delacroix, poroutro, os únicos diçnos de con-sideração. Composição solida eforca exnresrlva, sinceridade,Iiorror ao convencional, exata-m^n*'! o que preconiza DaVinci.

O am«r é filho do conheci-mento, diss<' este, acrescentan-do alhures qi».e todos os nossosconhecimentos nos vêm dossení;'Tos. rorl«-se perceber nes-st», afi ma ção a característica doespírito c5*rt'*fjc.o, o alicerce pri-meiro do método c&perinieuUl,

Nada mais lógico e justo. Ma»pode-se ver também um anseio«ie não se arredar da verdadecio modelo, de chegar a ela pemexperiência direta da vista e *••tato. numa exploração consci-enuiosa e aguda que desconfia«l(- qualquer generalização, doqualquer conceito gratuito, dequalquer metafísica.

Cezanne faria o mesmo, ma-tando dc cansaço seus mode.ospaia alcançar um tom real, vo.-tando cem veres â mesma na.-sageni afim de ncnelrar-lhe «segredo das formas recôndita:,,da estrutura, do ekquelcto uaanatomia.

O tratado de pintura de Ler»-nardo está repleto de notáveisreflexo?» sobre a aplicação uageometria na composição úoquadro e na construção das f>-guias Mas aplicação náo niaparece o termo certo, pois nã«pa te o pintor dc uma teoriapreestabelecida. antes tira essa

teoria da observação penetran-te da natureza. K' verdade, co-mo dirt Lionello Venturi, quoêle criou unia teoria da pers-pectiya, que, para construir umcorpo humano, fundou umaciência anatômica e para colo»rir uma tela formulou um tra-lado das sombras. Mas a essasistematização ele chegou pelaexperiência repetida, controladae transformada em lei al>ós averificação da constância dosresultados. "A atmosfera estacheia de unia infinidade de pi-ramides", escreve em dado mo-mento; as proporções do corpohumano são de tal ordem, oessa ordem preside também àsproporções dos demais corposexistentes na natureza, ali iu;ide outra feita. E temos comessas proposições mais uma veaa lembrança de Cezanne quase inteiraria igualmente dessasleis e as apontaria a^s teoris-tas modernos como de obser-vnneia imprcsriridivèl à realiza»ção da.obra de arte.

Entretanto o espirito geomê-tricô, tão desenvolvido emLeonardo como em Cezanne naoexcluiria a sensibilidade, nãoAbafaria o esprito dc finvra.perceptivel em todas as suasroflcvões sobre arte e em par-tScular em lo<las a«? suas prclu-cões conhecidas. Essa doçurade sua<? personagens, essa ele-ganeia de formas ?m que sacompraz e r»tê a discrição de seucolorido, são conseqüências does-^rito de flniirn. Ninguémmelhor r'o que êle aliou umacola a out-a, finura e geome»tna, ninguém, nem mesmo Goothe, foi mais perfeito na sut»organização mental.

Pode parecer a quem o lêapressadamente que Leonardose cingiu demasiado à copia ser-vil da natureza, talvez conven-çido de que nesta está o modelorecomendável, porquanto nelase encontra a verdade. Seriaum erro pensar assim. O pro-piii» Leonardo em mais de umtrecho de seu tratado nos ad-verte contra uma conclusão pre*cipitada. Duas ou três frasesse me afiguram edificantes. Elaque nos declara de súbito: "apintura luta e rivalwa com anatureza". É mesmo a vence odomina, porque "a.natureza élimitada e a fantasia infinita"E ;iinda por ser a pintura "umacoisa mental", um produto por-tanto do espirilo e não o re?ul-ta*o de um virtuosismo ma-nual. Na realidade, se o pintorimita a natureza náo o faz de-tando-]he o direito de criar.Sem dúvida observa essa natu-C*l5íittdo-a «a tela. mas dispu-

.{Contl^i na IV uúsia»X

Página — 2 ZT1TR-AS B 'AKTES Domingo, 4-5-1952

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BURNT NORTONt. s. ELÍOÍÍTrodllfSo livre e notas de José Escobor Faria)!

Tempo presente e tempo passadoPiescuto são ambos talvez no tompo* futuro,K o tempo- futuro, contido no teropo passado.5o lodo o tempo o eternamente presenteTodo o tempo é lrromimtvel.Abstração é o ou» poderia ter sidoPermanecendo a eterna possibilidadeNum mundo de indagação apenas.O que poderia ter aldo e o que foiApontem para um íim sempre preecnt\ íoAa queda» ecoam na lembrançaAtrave» o caminho que nao tomamosPara a porta que jamais abrimosNo, Jardim de. vmw. Minhas palavras ecofinAssim, na tua mente.

Mas- com que fimAglta-se a poeira na taça das folhasEu pio sei iiiüor.

Outros ecosHabitam O Jarclim. Deveremos segui-los? 30Depressa» i íalou o pássaro, encontrem-nos, encon-

[tarem-nos»Ao redor aos meandros. Através do portão primeiro»Dentro do nosso primeiro mundo, seguiremos nosA decepção, do tqrdo? Dentro do nosso primeiro mundo.Invisíveis, dignificados, lá estavam elosMovendo-se em. llberdado sobre as folhas mortas,No calor do outono, por entre o ar vibrante»E o pássaro chaoaou, cm resposta d.Iraudlvel músicu encobsrta nos arbustos,E oo olhares ocultos se cruzaram, eis que as rosas 30Pareciam flores que,, eram olhadas.3Lá. estavam eles, convidados nossos, benvlndos o alegre»Assim, nos nos movemos, e eles, em formai figura,Ao longo do. renque vazio, dentro do círculo de buxoa,Para olhar ao fundo o ressequido tanque.BeQO o tanque, e a cimento, as bordas enegrecidos.E dft água csttvera cheio, da lua do sol tirada.E os loto» levantaram-se, tranqüilamente, tranqüila»•-, Emente»Fora da profunda luz a superfície reluzla,E atrás de nos se achavam eles, no tanque refletidos 4£Uma nuvem então passou, o o tanque se toínou vazio.Vai, disse o pássaro, eis que as folhas se encontravamM ,'x [cheias de crianças,Ocultas excitadamente, contendo o riso.Vai. vai, vai, disse o pássaro: os homensSuportar não podem, tanta realidade.Tempo, passado ©_ tempo futuro.O que^ poderia ter sido e o que foiApontam para um fim sempre presente,.

nAlhos e safiras sob a lama.Coalham o eixo no seu leito ainda.No sangue o fio vibrantaCanta sób. velhas cicatrizesApaziguando longas e olvidadas guerras.A dança ao longa das artériasA circulação, da. linfaNa flutuação dos astros configuram-seA árvore sobem a se aqueceremE acima na árvore que se move nos movemosNa hu? por sobre a folha imaginada«í em cima do abrasado chio ouvimosAbaixo,, o. mastim e o javailProsseguindo como, sempre em seus exemplosPorém, reconciliados, entre os astros.

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No ponto Imóvel do mundo circulante. Nem carne ou[ausência de carne;Nem de, nem para o ide; no ponto imóvel, lá impera

., , [a dança,Mas sem prisão nem movimento. E isto, fixação nãôOnde passado e futuro são unidos. Nenhum movil«, [mento de, nem para.Nenhuma ascensão ou. declínio. Salvo para o ponto,,. ¦ i'-. [o ponto imóvel,'Lá não. haveria a dança, e lá só existe a dança.Apenas di&er eu posso, lá estivemos nós: onde porém•w ,»„~. tnão Bel dizer, 70E dizer nao sei qual fora a duração, pois que seria, ... , j . ± [isto no tempo colocar.A liberdade interior da vontade atuanteO libertar da ação e da dor, o libertar do intimoE da compulsão exterior, rodeados porémPela graça da razão, branca lua imóvel e moventeErhebung ssm mobilidade, concentração

Que não se elimf.iíi, ambas um novo mundoE o antigo desvendado, compreendidoNo auge de seus êxtasc3 parciais,A resolução de seus parciais horrores. goMas o encadèamento. entre passado e futuroNa fraqueza, do mutável corpo reunidos,Da perdição e do céu protege o homem,'Eis que a carne suportar não pode.

Tempo passado e tempo futuroSomente concedem alguma consciência.6er consciente não é estar no tempoMas só, com o tempo o instante no Jardim de rosa*n Í1&I n° cfaman^áo ao fustigar da chuva?O instante, no esboçado tempo que se esfümá 905Sdo?Mv*mHlenlbrados:.env0lvi4os em P^do e futuro.So através do fernpo é o tempo qünauiitàao*

IIIAqui ê o lugar do desamorTempo antes tempo depoisEm «ombria luz: nem o resplendor do diaA revestir sua íorma com límpida calma&«iteS^ SOmbr? no âmago da beIeza transitóriaInsinuando permanência em lentas rotaçõesAfnLas.,tr8va3 a que so purifique a almaAfastando a luxúria com a privação lOIPurificando o amor que provém do mundo.Nem carência ou plenitude. Um adejar apenasbObre as faces crispadas no cavalgar do tempo

£erturba_ò>3 ngr seguidas confusõesDe fantasia tão repletas quão vastos de sentido IKumífta apatia sem concentração .i.- ~A

Homens e pedaços do papel em redemoinho pelo frioIvento

Qu» sopra no tempo, ante* • dopols,Vento adentro e por fora dos pulmões desfeitosTempo antes e tempo depois. 110JSüralaçfio de almas enfermesDentro do ar estéril, o tôrpldoImpelido ao vento que varre as sombrias colinas de

LLondrcs,Rampstoad e ClerkenweU, Csmpden e Putnoy,Hlghgute, Frlmroae e Ludgate. Não aquiNáo aqui as trevas, neste mundo d» pina íútcís • eon.

Musoa,

Desce mala abaixo, desce apenasAdentro de um mundo em perpetua solHudc-,Mundo não mundo, que não- e mundo.

Sombra interior, privação 130E destituição de todos os twns»Dcesecação do mundo dos sentidos»Fuga de um mundo de fantasias.Mundo espiritual inoperante;Este é um caminho, e o outroIgual se apresente, não tm movimentoMas. na abstenção do movimento; enquanto 86 move •

[mundoEm luxúria, sobre os seus petrificados caminhosDo tempo passado e da tempo futuro,

XVO sino e o tempo sepultaram o dia, 130Uma nuvem negra para longe levou o soT,Voltar-ae-á para nós o girassol? a clematitoDesgarrada, para nós se inclinará? suas hastes S gavlnhafEm nós se prenderão? ^^FrioOs ramos do telxo se eneresparfto.Para a terra sobro nós? Depois que a asa do mártir»

[pescadorLuz à luz Já respondeu, o em silêncio se quedou. Imóvelté a luz açoraNo ponto imóvel do mundo oiroulante.

?As palavras movem-se, move-se a música 14aApenas no tempo, mas só o que está vivoPode morre. Depois da fala, plnetrímT& palavrasS&2SS

dn°a,aüêncl0- Apenas peia form£ ptío™emplo,5^t,^Pfavraa.ou a tW* Penetrar W9W°r

$£ i™,*"1^ 3? m0ve ¦» 6Ua Drópria imoblliaadok£ a-fto»obiUdade do violino enquanto o SS»,Nao isto apenas* mas a co-exlstência, P««w»On dizer que o fim antece o princípio,!LíL f t ? ,PrlnciPio lá «>mpre esüverara isoAntes do inicia e depois do fim.B tudo, sempre, no presente está. As palavras se comprt-Pendem-se e por vezes quebrom-se ante o próprio1^Sob a, tensão, desusam, resvalam, arruinam-ae P^'Decaem com a imprecisão, não íe|sSf;Não querem a' Imobilidade. Ululantes ^oiS^íbUandoi<,^Mecer e cen&u?ar- o» meramenteTta^eSrAs agridem sempre. A Palavra nó deserto

mSMGlsx ;Mais atacada é ainda pelas vozes da tentacâ/»A sombra ulvante na dança funerária,P* mQ alto lamento da desconsolada quimera.Do exemplo o detalhe ê o movimento.Oomo na figura dos dez degraus.O desejo por si mesmo

'é movimento•nao por si mesmo desejável*E' o amor imóvel por si mesmo,

loraÍTn q+Ue °rigem e flm d<> movimento,Fora do tempo, e indiferente '£&}Z?^ no aspecto do tempoColhido em forma de limitação vh\Entre o sêr e o não-sêr; XiSúbito nas setas intensas do solAinda quando se move a poeiraLa se levanta o riso ocultoDag, crianças na folhagemVivo agora, aqui, agora sempreEs^ril e triste o ridículo tempoEstendendo-se antes e depois.

NOTAS

de dois temas que se contraoOPm. tt' ~ Esposiçãolírica seguida de outra SloS 'itt ~

?m* Passagemto ou aplicação social dos temas

'l e lAv^T^11-lírico; V — aolicarfin nP«nl V j. ' IV ~" ura brado

f^s como é o poema interpretado- * Gldd,n5-

miJ-^ r-.InterPenetração de passado, presente p mS. (AÍ ° d° qUG f01' P0derla €po é e £tóhrl1~n1°L~' Bu^fc Norton abre com uma meditação

to- sess? e çsv^s. 4 Sfea no°cSo°. -sj««,• . L~~ Perslste na recordação do poeta o auo no-sem ter sido tanto como o que foi, e a imagem

"niciaíl a dos versos assinalados. A lembraAça L re& a u?£írtCOiSa m°rta ° s5Pultada no presente E no landimS,i°J?e e-°S' ° que poderia ter sWo « o ope foi, agoraexistem, sao por um momento. Em determinado ins,íeahdJLBQá5° a íelici£iad* lmmana. transforma-se em

tia—14) — Recordação de Coatwold houae, onde pnssado, presente, o futuro, com suas cargas do mistério"ocorreram à imaginação do poeta. Eliot traz para ae me-ditaçôes poétlco-metaXlsicas a sua praenc* ua munefiasolitária. (A) "

(21, 29, 34 » 36) — Sao momentos do passado qve fr»,Quentam o presente assim como eles o foram ouironcom aparência de alguma realidade; momentos quc juúram, são e serão fora do tempo, eternos. <a>

(25) — Os ecos do coisas e fatos quo ainda vivem nalembrança, além do tempo, além do nosso contato. <h)

(46—50) — O segundo movimento inieia-sa com umapassagem de grande beleza, na qual a unidade da wpc«riência ê transmitida pela justaposição dos contráriosO verso "Alhos e safiraa eob a lama" (49j provém d«ilallarmé (V. "Tornnerre et rubis aux moyeux", do poe-ma "M'introdulre aans ton histolrc", e '^...bavant bouset rubis", do soneto "Le Tombeau de Charles Baudeial»re"). (C)

(49—50) — ET certo, pois, que a Junção das palavrasalhos e safiras não é acidentai. Apresentam-se duasIdéias em opostas direções, e ao mesmo tempo. Alhqvegetal com vida, e safira, pedra preciosa, acham-se n«torra (sob a lama), onde o ferro também se encontra, oquo formará, no futuro, o eixo de um carro. As tíuaiImagens era opciçiio "Coalham o eixo no seu Joito ain»da" (50), o eixo igualmente imóvel, no estado natural,porém potencial em movimento. (B)

(49—50/64) — Quando Eliot diz: "Alhos a saflras s"ha lama / Coalham o eixo no Beu leito ainda" e, logomais, "No ponto Imóvel do mundo circulante", — istoquer significar a existência de um ponto matemHlcamon-te puro, segundo Philip Weelwright. Reporta-se o cri-tico ao velho símbolo da. Roda da Fortuna, de«envoJvici«na iconografia medieval e da Renascença, apiicando-onos versos citados. Diz êle: "Sempre no. centro do mo.vlmento desta roda, condicionando-o, está o eixo". "Mas,se o eixo visível gira, o que é evidente por tratar-se deuma parte material da roda, há ainda um outro ei* o(imaginário) dentro daquele, e que é central, Um pontomatematicamente puro, o quaj permanece imóvel (veja-se o verso "No ponto imóvel do mundo circulante"), oassim reconcilia a contradição do movimento que circula,O eixo perfeito, pois, simboliza o último ponto da aspi-ração humana, o alhos e safiras (o vulgar e a luxúria)as duas usuais condições que impedem àquela realiza-ção". Sste ponto matematicamente puro, que recon-cuia as forças contrárias à paz e à felicidade do gênerahumano, ô o eterno, o infinito, é Deus.

51—63) — A circulação do sangue em nossas veias,como um fluxo permanente, é análoga, para o poeta,ao movimento produzido entre os astros.. Disto (V. 64—69), retira a imagem do ponto imóvel, onde considera arelação entro imobilidade e movimento, entre o instan-te que não se acha no tempo e o próprio viver notempo, (o

(64) —• A unidade ritmica da exletêncla figurada naponto imóvel âo mundo circulante. (A)

(67) — A Imobilidade interior pode ser alcançadano ponto em que passado e futuro são unidos. (A)

(64—63) — Atribui H. Gardner à passagem que bíInicia com o verso No ponto imóvel do mundo cir-culante, algo assim como a descrição da dança mágicodas figuras de Tarot (cartas tíe advlnhação). — V. "ThaGreater Trumps", de Charles Williams. (C)

(72—75) — A liberdade interior da vontade atuantflrefere-se à experiência que a mente vem a sentir re-pentinamente no lar, quando liberta, da ansiedade. Btudo acontece inesperadamente como uma graça, sem apreparação da mente e sem nenhum esforço. Ambas aaexperiências, da desolação e da alegria (esta representa-da no riso das crianças), nos livram da escravidão dotempo passado e do tempo futuro. Cada um destes mo-mentos resolve-se num instante de liberdade, (C)(70) — Erhebung: exultação. A alma, embora spri-slonada ao corpo, exulta em. sua ascensão para unir-soao eterno; a alma é figurada na imobilidade de, suacontemplação mística, mas evoluindo em movimento as-censional por estágios diversos de purificação. (V. "As-cençãc ao Monte Carmelo" e "A sombria noite da Al«ma", de São João vda Cruz). (B)

(88—90) — Em Burnt Norton, o profundamento 'her*jriético, ou seja a apresentação de uma rica símbolo-gia do fluxo da vida, é compreendido como uma unida-de no plano da consciência. Após situar em termos fi-losóficos a relação entre imobilidade e movimento, rela*çao que se liga à idéia de passado, presente e futuro.o poeta nos remete a três momentos concretos, segundo 09versos assinalados, (Ç)(92) — a conquista do tempo só poderá ocorreratravés do tempo. Esta vitória é alcançada pela aprecn-são do ponto imóvel do mundo circulante (V. 64). Oponto matematicamente puro, de Philip Wheelwrlght, 6p mesmo do verso mencionado e assemelha-se, como ura.equivalente poético de Eliot em nossa cosmologia, aoMovente imóvel de Dante. (D)(93—116) — Ha uma abrupta mudança neste movi*mente, o Jardim e as imagens da natureza foram es*quecidos, pene.trando-se agora num mundo de dif*ren*jtes caminhos. A primeira estrofe remete-nos à visão daThe Waste Land, com a multidão a andar apressada-monte por sobre a Ponto de Londres — os escravos dotempo, cada qual aprisionado em sua própria solidllo^Aqui estamos no sombrio mundo do Tubo da Londres*:A imagem dos transeuntes ó central nos. Four Quar«ftets. (C)

(03—116) — para P. O. Matthiesseru Eliot simboli-rza. no movimento III, a descida ao "subway" à pene«trarão na escura noite da alma. (D) (V. obras citadas;tíe São João da Cruz).(107—108) — Em todo o movimento m ha o reccHnnecimento de que dificilmente se poderia realizar aaconquista do tempo num mundo de confusões (V. 92>;|— reminiscências de Gcrontion. (D)'l.17~129) —- A segunda estrofe dêste movimentaiapresenta uma vacilação. A mente, ao invés de ignorarasua miséria e solidão, é solicitada a aceitá-las, para re*uuuhecer sua própria destituição e penetrar o presente^Deve, pois, abandonar o movimento do mundo através daí,!

passado, presente e futuro, a viagem que provém de par^te nenhuma, por entra nenhuma parte ã que se dlrig*a nenhum lugar, a fim de realizar-se numa situaçãfatual. m\ 1

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Domingo, 4-5-1952 T.HT"RrAS n 'ARTESPágina -— 9

IÜSTír

ICA-8E muito bcuta ptiüüuacuo no Brasil deum trabalho como o quePaulo Rónai acaba de

lançar a público: Escola deTradutores. Em Portugal, Justi-ficar-se-ia, uns sete ou oitonnos atrás. De fato, enquanto,lio Itrasil, se continua a traba-jiuir afauQsamente na Incorpo-ração das obras-primas das li-icraturas estrangeiras na lin-gua portuguesa, entre nós, emPortugal, essa tarefa encontra-w boje reduzida ao mínimo In-dispensável. Aliás, uma das ea-«as editoras de Lisboa que man-tem ainda o facho das tradu-çòcs é uma casa que não pre-cisa de tradutores portugueses,visto que as obras que publica,previamente traduzidos c edi-tadas no Brasil, passam ape-nas pela banca de um adapta-dor, que utiliza o texto tradu-zido alcm-Atlãntico, sobre oqual procede às necessárias re-parações de acordo com uma.sintaxe e um vocabulário dia adia mais distantes da sintaxee do vocabulário do portuguêsque se fala e escreve cm terrasde Santa Cruz. Ora, na verda-de, uma "escola dc tradutores"c organização que apenas se' justifica e apenas se torna in-dispensável onde há, evidente-mente, que traduzir. O Brasil,que tudo tem traduzido, o bomc o mau, bem e mal, sejamosjustos, muito se me afiguraprecisar de uma boa escola detradutores.

Paulo Rónai conhece bem oproblema. Pelo que depreendo<la leitura do seu culto e argu-to trabalho, o autor da Escolacie Tradutores não é brasileirode origem. Eis a situação maisrecomendável para um escritorestudar as condições em quepodem vir a compreender-semelhor as dificuldades quaseinsuperáveis com que se defron-ta todo o tradutor consciencioso.

Propõe o autor deste opus-calo quaisquer soluções defini-íivas ao problema que estuda?Não. Reconhecendo que o quese pensa numa língua não podeser vertido integralmente paraoutra, pois que verbo e pensa-2í'.ento se encontram indissolú-vclmeníe fundidos, Paulo Rónai

VALERA' A PENA TRADUZIR?"" ¦ '- ' "¦« '¦jf •W—«—«J-f-m—i m | i »i

JOÃO. GASPAR SIMÕESlimita-se, por assim dizer, aapresentar alguns aspectos dosvários problemas que se levan-tam sempre que se aborda odifícil tema em discussão.

A tradução é, na verdade, ummal necessário. E ninguém me-Ibor do que um escritor billn-gue, como é o caso de PauloRónai, para apreciar as trai-ções de que é alvo obra que,tendo o selo de uma língua,debaldc é arrastada pelos cabe-los para uma outra, onde anão atrai anccstralidadc algu-ma.

Na verdade, para bem nosidentificarmos com a traiçãoque os italianos consideram ine-rente a todo o ato de traduzir— traduttori traditori —, te-mos de falar e escrever, comoaborígenes, pelo menos duaalínguas, e quanto mais diferen-tes melhor.

Não é a um Gil Vicente quepodemos pedir a compreensãodeste fenômeno, o Gil Vicenteque escreveu quer em portu-guês quer em castelhano, mas,sim, por exemplo, a JosephConrad, que usou o inglês co*mo língua literária, embora ti-vesse nascido e vivido na Po-lônia até aos vinte e oito anosde idade.

Paulo Rónai, originàriamen-te de língua germânica, ao quesuponho, porque escreve hoje alíngua portuguesa como se por-tuguês fosse — é brasileiro —,está em condições excepcionaispara apreender p ângulo datraição que representa a maispequena tentativa de trans-plantação de um testo de lin-gua germânica para língua la-tina.

A tradução é um mal neces-sário, disse. E estou pronto arepeti-lo. Posto não haja solu-ção satisfatória para esse mal,nem por isso devemos resignar-nos a conservar fora do círculoda nossa curiosidade as obras

literárias escritas cm línguasque desconhecemos. Bem certoque o ideai estaria em saber-mos profundamente o maiornúmero de línguas, procurando,assim, que as nossas leiturasfossem feitas sobre textos ori-glnsris. Mas isso não é possí-vil. Há, pelo menos, dez oudoze línguas cm que se encon-tram obras-primas dignas deuma leitura aplicada: o fran-cês, o inglês, o alemão, o ita-liano, o espanhol, o russo, osueco, o norueguês, o holandês,o rumeno, o dinamarquês, otcheco, para não sairmos daEuropa, e sem contarmos comas línguas mortas. Inútil con-siderar o esforço que o apren-dizado dc tantas e tão diversaslínguas representaria na curtae trabalhosa existência de umhomem, e, especialmente, depra escritor. Se procurarmos co-nhecer, entre os grandes au-tores contemporâneos, quais, deentre eles, teriam lido Dostol-evski em russo, Shakcspcare,cm inglês, Ibsen, em nome-guês, Strindberg, em sueco,Thomas Mann, em alemão, Ki-erkgaard, em dinamarquês, PioBaroja, em espanhol, ou Ma-chado dc Assis, em português,teríamos a surpresa de verifl-car, por exemplo, que AndréGide, penetrante analista daobra do autor de O Idiota, nãoSabia russo, que Shakcspcarepoucos dramaturgos contempo-ràneos o terão lido na sua lin-gua, e que Ibsen e Strindberg,influenciando, como influencia-ram e influenciam, o teatro in-glês, francês, italiano e espa-nhol, apenas por raros autoresteriam sido lidos nos textosoriginais. Bernard Shaw, paranão irmos mais longe, que foio primeiro a impor em Ingla-terra o teatro do dramaturgodos Espectros, desconhecia porcompleto a língua do seu au-tor favorito. De resto, é sabl-

«Io que grandes escritores —Flaubert ou Zola, por exemplo— pouco mais conheciam, cmmatéria de línguas, que a suaprópria língua.

Que depreender de tudo Isto?Que a tradução, não obstante astraições a que sujeita os tex-tos, é um trabalho necessário.Que se considerarmos a impor-tapeia de uma obra em fun-ção dos seus valores verbais,reputando-a tanto mais intra-duzível quanto mais castiços es-ses valores, concluiremos que,ainda mesmo em relação a es-tas obras, é de ponderar asvantagens da tradução. Não setraduz, é certo, o que há demais genuíno na forma de umFlaubert ou de um Valéry, deum Rilke ou de um T. S. Eliot,mas, graças à aplicação dostradutores, — dos bons tradu-tores — a obra destes escrito-res, uma vez vertida para ou-tra língua, acorda nesta vaio-res e sentidos que nunca scri-am acordados caso sobre eles senão tivesse debruçado a paci-ente atenção e a fina fnteli-gência de um bom tradutor.Não é tanto pelo que era simesmo representa, no virtuosis-mo latente dos seus valoresverbais, que uma obra originalpode vir a exercer influênciasobre um escritor de outra lin-gua ignorante do idioma em quoessa obra foi concebida, é so-bretudo pelo que cia passa arepresentar, uma vez encontra-das por um tradutor ideal ascorrespondências linçuís t i c a 8que lhe cabem na língua paraque é vertida. Quão poucos au-tores conhecerão Kafka no ori-ginal! Quão poucos, em verda-de, terão lido Reiner MariaRilke em alemão! E, no entan-to, a influência de Kafka ede Rilke irradia pelo mundo,representando um dos fatoresmais importantes na evolução

das correntes Uterárfes contem,poiâiicas.

Que pretendo eu com Isto?Onde quero eu conduzir o meubarco? Ao porto cm que d es*t"*ra e^a escuoa ideai qu i «obra literária pura: ou seja,essa consubstanciarão virtualde um trabalho de pura cria-ção do espírito humano. Bemcerto que a língua é qualquercoisa de consubs'?nclal oo tra-balho do espírito. O Dcnsamen-to é palavra em potência, pen*samento e pa!avra s&o insepa-ráveis. Trabalham, porém, cr-radamente os escritores -— cs-sa é, pelo menos, a minha opf-nião — que prj.mram !«^»arnesta o trabalho de ioniu;....i-ção daquele. Através «Ia pala-vra — para o pensamento, ciao lema que proponho, nin lemacontrário ao geralmente aceito:através do pensamento, para apalavra. Escritores dc uma ri-queza verbal incxcedível —Shakesnearc, verbi gratia —prestam-se a quantas traiçõesos sujeitam os tradutores: ve-jainos G.uizot. ou Françols, Vi-ctor Hugo. André Gide ou oRei p. Luiz I, qae todos ciesverteram para francês ou por-tugv.ês a obra do grande dra-maturgo. Pois bem: sejam quaiaforem as traições a que Sha-kespearc tenha sido sujeito no.tseus textos, dele sempre chegaaté nós seja o que for: chega*nos, sempre, pelo menos quantobasta para nos sentirmos pe-rante um gênio. É o que doresto^ acontece com Dostolrvs-ki. Já outro tanto não se veri-fica com qualquer autor menosgenial. Em Shakespeare, o ca-minho é através da palavra]pa*a o pensamento. Rica, ?lr-Wilá, o"ase barroca, a língua-gem do Mestre isahelino vaisempre mais além da palavra,Ainda quando como na ps rã-bola desferida por um projétil,a linguagem de um Hamlcí pa-rece o fartar-se do pensamento aque se dirige — o pensamentoque procura —, a esse alvo dis-ti„nte e'a, em verdade, se diri-ge, esse alvo vira. Daí que otradutor do grande rlramaturgo,mesmo quando falha no seutrabalho de alistamento lin«*

(Conclui na 10.a página)

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JDl N EB U LO SA Vinheta deSANTA ROSA

QUE SEJA COMO NAS ILHAS:ETERNAMENTE DOMINGO:OU COMO OS PÉS DAS MULHERES,SEMPRE QUENTES, SEMPRE FRIOS;OU AS VIAGENS DOS SONHOS;NÃO SABEMQS SE PARTIMOS

tfNCM TÃO POUCO SE CHEGAMOS,»C NO MEIO DA HISTÓRIAGERALMENTE DESPERTAMOS.

SEJA O MURMÚRIO CANDENTEDAS NOIVAS INICIADASOU AS SESTAS COMPLACENTES&m uATOS POR SOBRE OS MUROS,QUE SEJA COMO O CLAMORDO GUERREIRO ATRAIÇOADOOU A TRISTEZA DO PAIQUANDO O FILHO O ABANDONAATRÁS DA GRANDE CIDADE.

QUE SEJA COMO OS ENTERROSE @ EQUÍVOCO 1*0 fRANTO,COMO UMA CANÇÃO DE BERÇOOU UM NAVIO ATRACANDO,COMO OS CEGOS NAS ESQUINARÍ)U A NOITE NO OCEANO.QUE SEJA INARTICULÁVELCOMO A POESIA PURANO MOMENTO EM QUE AMAMOS.

SEJA A HARMONIA ESCORRIDAENTRE OS PEDAIS DO PIANO,À CEGUEIRA DAS ESTÁTUASNO ULTIMO Í>!A DO ANO,E TENHA O CÁLCULO FRIODOS SONÂMBULOS ANDANDO,QUE SEJA ASSIM, COfcfo AS ROSAS,E DEPOIS m ENTRANHE NO CÉUCOMO AS GRANDES NEBULOSAS.

JLÊDO I Y O

Página 'CETR'AS E rARTES Domingo, 4-5-1952

N UM recanto *:•. Provcnça,perto do JVfcuuellia, vive aescritor friujcês Blai.se

Ccndrars. Seu nome aparece,com relativa freqüência, no cai-ta«- Jlteràrlo, na França, masentre nós, numa época, cm quetanto se fala cm Sartre e cmCamus, quase ninguém mais solembra do autor de "L^r".Entretanto, Ccndrars teve umagrande voga no Brasil, há vin-te e cinco anos atrás, na pri-meira fase do modernismo. Foium dos colaboradores da revis-ta "Klaxon" e sua poesia en-tusiasmava os vanguardeiros.que nela viam um exemplo doque devia ser o novo ritmo, anova estética do verso. Essa in-fluência se tornou sensível, so-bretudo, no grupo paulista, ouantes na ala Oswald e Mariode Andrade.

Precisamente nos começos de1924, quando ia acerrado o de-bate — cujo clímax seria, logodepois, o rompimento de GraçaAranha com a Academia —anunciou-se a visita de UlalsoCcndrars, ao Brasil. Em que•condições se dava essa viagem?

i A convite dos modernistas, sub-I vencionada por eles ou por ini-i ciativa do próprio Ccndrars, quenessa época era um terrível"globc-trotter"? só Oswald deAndrade, de certo, poderá di-fcêlo.

O fato é que a chegada doautor de "L'Or" incentivou asconstantes discussões entre pas-sadistas e modernistas. Cen-drars parece ter vindo primei-ramente a São Paulo pois seudesembarque se efetuou cmSantos. Mas logo na chegada

[sobreveio um incidente ridícu-(Jo. As autoridades portuárias,constatando que o poeta, muti-Jado de guerra, não possuía umbraço, e fundadas naturalmen-te em dispositivos legais que nãopermitem a entrada no país deimigrantes aleijados, quiseramimpedi-lo de desembarcar. Aii-Jial, tudo se resolveu, e BlaiseCcndrars pôde encaminhar-sePara São Paulo, onde o aguar-

I davam os modernistas alvoro-çados. Num recorte de. jornal«pie tenho à mão e cuja datanão pude precisar, leio êste pro-lesto, cheio de ironia, de Mario«le Andrade: "Mas o ato poli-ííial me enche de orgulho — es-»ereve êle — Que vem fazer, en-ire nós os mutilados? O BrasilJião precisa de mutilados. Pre-cisa de braços. O Brasil nãoprecisa de recordações penosas,ísenão de certezas joviais. Numa"descida de vapor a policia nãoipodia pesar as riquezas espiri-luals que Cendrars nos trazia".

Infelizmente, não consegui,&té agora, localizar a data exa-üa da chegada do poeta francêsí»o Brasil. Apurei apenas ter si-do em começos de 1924. A 11de junho desse no pronunciouêle, em São Paulo, no salão do(Conservatório uma conferência,acompanhada da exposição dejguadros modernistas.

r Por outro lado, sei de sua fa-pnosa visita às velhas cidades[jolneiras, durante a Semana

BLAISE CENDRARSNO BRASIL, EM 1924

0 MUTILADO DE GUERRA — INCIDE NTÊ NO DESEMBARQUE EM SANTOS —VIAGEM A MINAS BARROCA — "MAI S ELLE A L.AIR TRÊS BIEN, CfcTTE

VILLE" — "FUTURISMO" EM PORTUGUÊS E EM FRANCÊSBRITO D ROCA

Santa, em companhia de umgrupo de vanguarda, visi-ta que marcou um momento Im-portante da campanha moder-nlsta. Na reportagem detalha-da dessa viagem, feita pelo sr.René Thiolller, no número de20 ile Janeiro de 1926 de "TerraRoxa c Outras Terras", não en-contro qualquer alusão ao ano,em que ela se teria realizado.Mas me parece evidente que foiem 1924, pois embora Cendrarstivesse permanecido muito tem-po no Brasil, não julgo prolon-gar-se a estadia até a Sema-na Santa do ano seguinte. As-sim, vou reportar-me, primeiro,à excursão a Minas para depoistratar da conferência do poetana capital paulista.

E quanto a essa aventura ml-nclra, o único documento emque me posso basear é a crôni-ca de René ThioIIier. Está cia-ro que não se trata de nenhumapagina modelar de literatura,embora o autor soubesse acen-tuar, com espirito, alguns as-pectos típicos de Cendrars nodecorrer da viagem. René Thiol-lier, tipo aristocrata e gentil ¦—figura de destaque da socieda-de paulista — cuja literaturanão prejudicava ninguém, tinhasido um dos patrocinadores daSemana de Arte Moderna, e sedeclarara solidário com o mo-vlmento, embora sempre es-crevesse em linguagem bemcomportada, toda cheia de fio-reados parnasianos.

Mas antes de tudo o que me-recc reparo nessa viagem é aatitude paradoxal dos viajantes.São todos modernistas, homensdo futuro. E a um poeta devanguarda que nos visita, es-candalizando os espíritos con-formistas, o que vão eles mos-trar? As velhas cidades de Ml-nas, com suas igrejas do século18, seus casarões coloniais e im-periais, numa paisagem tristo-nha, onde tudo é evocação doPassado e, em última análise,ludo sugere ruínas. Pareceria«m contrassenso essa atitude.Mas seria um contrassenso ape-nas aparente. Havia uma lógi-ca interior no caso. O divórcio,cm que a maior parte dos nos-sos escritores, sempre viveu, darealidade brasileira fazia comque a paisagem de Minas bar-roca surgisse aos olhos dos mo-dernistas, como qualquer coisade novo e original, dentro, por-tanto, do quadro de novidade eoriginalidade que eles procura-vam, E não falaram, desde aprimeira hora, numa volta ásraízes da nacionalidade, na pro-cura do filão que conduzisse a

BLAISE CENDRARSuma arte genuinamente brasl-leira? Pois lã nas ruínas minei-ras, haviam'de encontrar, cer-tamente, as sugestões dessa ar-te.

Já em 1916, Mario de Andra-de tinha andado por aquelas cl-da des, escrevendo uma série doartigos na "Revista do Brasil"sobre as igrejas de Minas, coma assinatura de M. Morais deAndrade. Era assim o genuína-mente brasileiro, e ao mesmotempo, o exótico que atraía oalegre grupo de excursionista,composto de d. Olivia GuedesPenteado, Tarsila do Amaral,Mario de Andrade, Oswald deAndrade, Cendrars e ReneThioIIier. A viagem se fez pelostrens da Central, sem pressa,suportando todos, eles os inco-modos da jornada, com o bomhumor de colegiais em férias,?lliás, a descrição de René Thiol-Her abrange apenas o percursode São Paulo a São João d'ElRei, onde chegaram na quarta-feira de trevas. Dali continua-ram, naturalmente, até OuroPreto, Belo Horizonte, passan-do por Congonhas. ThioIIierpinta-nos um Cendrars muitopreocupado com a comida, sa-tisfeitíssimo, quando percebeque "on va deujener", e anteum hotel, cm São João d'El Rei.querendo saber logo "si l'on ymange bien".

Enquanto Tarsila aproveitasempre as oportunidades paraapanhar algum croquis, o quenão deixa de despertar parti-eular interesse do chefe do trem.Em São João d'EI Rei ao parti-rem de automóvel da estação,Cedrars observa satisfeito: —

"Mais Pile a 1'air trôs bien.cettc villc!"

No hotel, todos ficam mais oumenos acomodados, sem encon-trar motivos para maiores quei-xas, Inclusive dona Olivia, ha-bituada mais do que os com-palheiros, ao conforto c ao lu-xo. A descrição termina aqui,no estilo bem 1850 de RcnóThioIIier. Está ele em seu quar-to de hotel, ultimando a "toi-lette" para o jantar e prome-tendo realizar uma áornada cmtorno do aposento, à guisa deXavier de Malstre. "Nisto umsino plangcu — escreve êle —Dir-se-iani badaladas de ago-nla. Estanquei o olhar. Susti-ve-me a escutá-lo. Dentro demim suspirou funda uma sau-dade: a começo vaga, impreci-sa..." e por aí vai para finali-zar numa alusão à lua, "nossafagueira companheira de via-gem, roçando por tudo o seupepluin de prata".

Mas essa excursão foi fecun-da para o grupo modernista.Tarsila teria encontrado na pin-tura das igrejas e dos velhoscasarões mineiros a inspiraçãode muitos dos seus painéis; Os-wald de Andrade colheu o te-ma de várias poesias "pau bra-sil" e Mário de Andrade veio aescrever, então, seu admirável"Noturno de Belo Horizonte. .

XXXA 11 de junho de 1924, um

artigo de redação na primei-ra página da "Gazeta", de SãoPaulo, focalizava o aconteci-mento do dia: a conferência deBlaise Cendrars no salão doConservatório, considerando oescritor francês como importadopor Oswald de Andrade, "pourépa ter tout le monde et sonpère" "nesta terra de café ede bichos de café.""Blaise Cendrars — dizia oartigo •— fará sua conferênciaem francês, o que felizmente re-presenta um grande consolopara nós e desconsolo para osfuturistas. Se o futurismo nãoé ainda compreendido, se nin-guem chegou até hoje a se con-formar com a fantasia dessaplêiade irriquieta que procura aviva força incutir no ânimo dopúblico não sente; se ninguémcomprende em suma as belezasdo futurismo em português, commaior razão não nas compreen-dera na conferência de BlaiseCendrars que as vai expor emfrancês.n

A palestra do autor de "I/Or"seria ilustrada com a apresen-tação de quadros modernistas.Note-se, de passagem, que emmarço de 1924, Lasar Segall ti-

nha realizado uma exposlclo"futurista" em São Paulo, ca»"saiido o maior escândalo. i;t)1abrü, Mario Guastuu, no "jiir.nal do Comércio", daquela el«dade, do qual era diretor, <.¦„„inentara tais ousadias e udispa»rates" em artigos com os Si..K um tos títulos: Tarulifja òc,ral" e "Aiumlnaçâo Visual"sendo o primeiro revidado porOswald de Andrade.

A 13 de junho, comentanrtna conferência de Cendrars, rtjaGuastlni haver o escritor fiaiscês proporcionado "a um pu,bllco bern reduzido, mas seleto,cerca de duas horas de InflnUto .prazer..." "Porque — »x,pllca êle — Nâo houve, entre <>$presentes, cidadão que nãodesopilasse o fígado ante a exUbicão dos quadros (quadros rn.tre aspas no texto» de meia du-zia de pintores, rtuc para o sr.Ccndrars são o c.vpoente dessacoisa inominável que um punha-do de humoristas deliberou eha«mar arte moderna .."

Ressalva, porém, no eonfe-rencista a qualidade de homemde ação, de mutilado da guerrae concorda em havei o "distin.to poeta" defendido valente..mente o seu ponto de vista,"procurando convencer o públ).co que sorria ironicamente, umaparte, enquanto a outra «Ior-mia." Transige em achar queteria o sr. Cendrars deixado aImpressão de que realmente aarte moderna possui estética, sgnão se tivese lembrado de exl-bir esse- iélebres quadros dopintores contemporâneos. A es-sa exibição — diz Guastini —ninguém resistiu, o gargalharrompeu espontâneo e comunica-tivo ante os quadros do sr. Sc-gall (a quem o cronista cha-ma de "impagável bolchevista")e os do sr Delloney ^Quem scríiêste?) Quanto as telas da dis-tinta e festejada sro. Tarsil;- tioAmaral pareceram-lhe menosgrotescas e bem compreensíveis,já que davam idéia de pinturaque até criança de grupo esco-lar consegue fazer. E termina,declarando peremptòi lamente:"Mas São Paulo, apesar do quodele dizem, ,é terra civilizadaque a tudo sabe dar o justo va-Ior, sem sair da linha aeonse-lhada pela compostura". O fa-turo viria mostrar o contrário:São Paulo faria absolutamentequestão de sair dessa linha"aconselhada pela compostu*ra"...

Por aqui ficaram as nossaspesquisas sobre a visita de Blai-se Cendrars ao Brasil. Estevoêle em outros recantos de nos-sa terra e, principalmente, noAmazonas, localizando em am-bientes brasileiros vários dosseus contos. No belo recanto d»Provença, onde agora vive, osedentário pachorrento da ve-lhice deve recorda1?, constante-mente, o andejo incorrigível damocidade, e lembrar-se, comfreqüência, dos rumores c dasirritações que por aqui susci-tou. Pois não se esquece êle doBrasil, tendo prefaciado, aindahá pouco, um documentário ío-tográfíco sobre o nosso país.

BURNT NORTON(Conclusão da 2.* pagina)

(í3ü—I3S) — o iír»eo movimento IV leva-nos de no»»« no jardim. E' um lirismo de sombra, Be bem queJBombrio de um gênero diverso e totalmente cheio de ex-bpectatlva. A luz desapareceu, uma nuvem afastou o solV- estamos vivendo no tempo; mas aguardamos, no tem-toa, um contato de vida ou de morte, de ternura oumo agouro. (C)[_ (130—139) — Toda esta parte do poema compõe-Me de imagens que situam a emoção da alma num planoífelevado de iluminação; um desejo ardente de transíigu-gftçSo, com a experiência a captar a luz imóvel noJgonto imóvel do mundo circulante. (A)

(140—160) — O V movimento, e último, volta-s?toara as Idéias do primeiro. Ha imagens sobre o mundoHa arte. O processo do tempo mostra-se triste e ridl-limito, a estender-se antes e depois, (C)

(140—160) — Aplicam-se aqui as idéias do poeta re-ivamente à elaboração da poesia. E' o ideal da artonetrar A imobilidade, assim como um imóvel jarroInês / Continuamente se move em sua própria imobi-ide. Afinidade àquilo que é eterno, e nisto Eliot es-ibelece a ligação entro a luta da arto e da reli-*So. (A)(143—140) — V. o poema "Anedocte of the Jar", dofallace Stevens — concepção mais ou menor- ici»tÍ£a,/,..„, (ja conquista do tempo pela arte. (D)

(158—139) — Tentação de Cristo no deserto (V. Sã*Mateus 4:1-11). A Palavra no deserto / Maás «tacada éainda pelas vozes da tentação, A Palavra refere-se aotestemunho de João Batista (V. Evangelho de São João1:14). (C)(76/162—171) — Erhebung: exultação. A alma quoexulta na ascençfio à procura de Deus, Como na figurados de* degraus. Reporta-se às concepções místicas deSão João da Cruz, em que a alma, para atingir a uniãoIntegral ao Eterno, a Deus, paEsa por dez estágios depurificação interior. Burnt Norton é eonduzido a umplano místico-metafísico, situando o problema tempo-eternidade nos dias presentes. (B)(172—178) — No fecho do poema, um instante de fe*llcldade é atingido pela imagem das setas intensas dogol que transfiguram o mundo, bem como pela Imagemdo riso oculto das crianças na folhagem, a traduzir osentido da felicidade humana. (C)Relativamente ao binômio poeeift-íüüsoria em BumfeNorton, diz Edmund Wilson: "A conclusão de Eliot acêr-ea da relação entre filosofia e poesia é que, embora afilosofia tenha o seu lugar na poesia, iBto constituiapenas alguma coisa que nós "vemos" entre outras coi-•sas com as quais o poeta so nos apreBenta — uma sé*i«e de idéias quo penetram o seu próprio mundo, rs*«m como sucedo na Divina Comédia." (É)

os

3i *.C' M* Boi*rft' POT *ua vez. nos oferece uma earacterís-tica essencial à. compreenaao^dji ; pofisjjL q« gllot^ ao- aiir- fc

ma? que isto de tal modo purifica seu trabalho, qv.Qdisto resulta a omissão do pensamento originário à rea-lização, para, ao final, surgir tão só a imaginação, noleitor, daquele pensamento que motivou o poema, osargumentos contidos nos Four Quartéis "... transmi-tem o tom e o clima de certas atividades mentais: «aoconclusões que produzem um gênero especial de efeitoemocional", (F)

(Cumpre advertir ro leitor que„.a pontuação do ori~glnal, com mínimas alterações, foi respeitada para Q"°o poema não perdesse uma de suas características ior*piais de construção). '¦

Notas coligidas segundo as obras de: 'Geoífrey Bullough, The trend of modem poetry, OU*

*er and Boyd, London, 1049. (A) IE. M. Stephenson. T. S. Eliot and the lay readnvVhe Fartune Press, Londor, 1948. (B) .Helen Gardncr, The art of T. S, Eliot, The Cressem©rsss, London, 1949, (O)F. O. Matthiesscn. The achievement of T. S. EliOl*(Oxíord University Press, New York, 1947. (D)«dmund Wilson, Anel's Castel, Charles Scribncr s-Sons, New York, 1950 (E)O. M. Bowra, The creative experiment, Macminan.-jg* Oo. Ltd, London, 1949. (F) íPhilip Wheelwright, Eliofs philosophical themes. i" jrr\ B. Eliot, a study of his writings by ssveral bauaslfiPsftgfo-Popsoa Ltd., London, 1949. (G)

Domingo, 4-5-195Z 7, ET RAS B ARTES P4çma —* 5

1

¦

Â

AVENTURA começou pofum sonho. As vésperas deminha partida do Uio

mergulhei num desses pesade-loa que nos fechara no Inferno,in estava cm Paris, C procura-va polo Editor Julliard, que mehavia escrito c feito comigoum contrato. Kiam-me as pos-soas, bem no nari?:

"Mas esse editor naoexiste!""Não é possível! Eu tenhoum contrato com cie!"

Monsieur Julliard não eraum editor, mas s/m um niisli-fieador. O autor enganado tm-tia em várias portas. E vozesde todos os tons gritavam:"Monsieur Julliard naoestá!"

O autor brasileiro que ali-mentara o ideal de pertenceraos leitores franceses suava to-dos os suores da agonia:

"Imagine como vão ca-coar de mim no Brasil!"

Era terrível. Mas todos ospesadelos têm fim, e eu me viade olhos bem despertos no meuquarto, com uma paisagem demalas abertas, já feitas pelametade.

Todavia, o sonho me possui*ra com tal fúria, que eu aindaestava em clima de pesadelo,quando, na manhã seguinte deminha chegada a Paris, batiaàs portas da Editora na "Rucde I/Univcrsité" No guichê daentrada uma jovem me res'ponde:"MONSIEUR JULLIARDNaO ESTA!"

Sinto um mal-estar indefiní-vei. Esqueço-me que estamos na

A LITERATURA inglesasempre foi o paraíso doesotismo.

Nenhuma outra pode lhe dis-putar, nesse sentido, a hegemo-riia. Portugal e mais a Espa-nha não conseguiram hltrapas-sá-la.

E não há nisso nada de es*pantoso para um povo que, pe-lo3 tentáculos de seu imporia-lismo, por vezes insaciável, seexpandiu pelos sete mares.

O idioma inglês foi tambémobra de navegadores. E da li-te atura que ele criou, deveriambrotar espontaneamente asmais expressivas passagens sô-ore o mar.

I Se na literatura portuguesa•<o maior dos seus gênios noadsu nos Lusíadas impressionan-te retrato da viagem Oceânicacom as suas tormentas e oss^us mistérios — coube ao maior•dos ingleses, .a William Sha-kêspeare criar, Com o seu gênio,ò drama náutico.

I Sendo os ingleses senhoresdo mar, é até certo ponto és-'tranho que es3e aspecto da li-teratura shakespeariana sejavpy dos menos lembrados.

Não faltam, contudo, estudoscsTCciaüzados que fixam a im-põrtánèià da obra de Shakes-peare, sob esse aspecto, deverasinteressante.

TJraa dessas pesquisas foi em-¦preêndida pelo professor HaroldFrancis Watson.

O sou ensaio "The sailor inEôglish fietion and drama",pftla Si?a extensão, melhor sa-lienía o papel de ShákespeareMossa modalidade literária.

O eeu trabalho, tipicamente5ioi'te-americano_peIo que revê-Ja de levantamento bibliográ-fico, rosúítóu de vários anos de"researches" sob a direção doprofessor Ashtey Horaee Thovn-«üke, mestre de erudição sha-feespeareáho, ou melhor, da épo-

. «a clisaheteana.Harold Francis Watson dá-

ttes uma perspectiva bastanteclara, e, através dela, podemos,Bem obscuridade, apreciar acontribuirão do auior de "liam-*3et" na caracterização do dra-Jóia náutico.i Não foram infecundos os cin-Soo anos de pesquisas com Thorn-:«Uke na, Universidade de Co-flümbla.

i Harold Watson, ao analisarfo papel do marinheiro no dra-*ma inglês, coloca "The Tem-3>est" de Shákespeare como um«dos pontos de referência para[J interessante estudo» ^

AS CONFISSÕES DEUM AUTOR EM PARIS

'íOINAH SILVEIRA DE QUEIROZ.

quinta-feira santa, e que umasúbita aflição de partir ganhatoda a gente que possui meiospara descansar nos dias da Se-mana Santa — cozando aschamadas "férias da Páscoa".Mas a mocinha jà me indica oDiretório Literário da Editora.Subo duas escadas e perguntopor êle, em sua ante-sala. E —milagre tolo! — a datilografame reconhece, mal digo meunome:

— "A senhora é a autora dolivro "L'ile aux démons"?"

Respiro. A estúpida angústiase foi. Estou já diante de Pier-re Javet, que também dirigeuma coleção: CAPRICORNE,só de autores estrangeiros. Bprecisamente nela que meu 11-vro foi incluído. Ivete Bessls,que se incumbe do trato com03 escritores, traz os primeirosexemplares de ML'ILE ÀÍIÃDÊMONS". Vejo-os com emo-ção. "Margarida La Rocque-ficou pequenina e discreta naedição francesa. Mas a suaroupa tem um verde alegre. Etraz uma tira amarela, com aexplicação: "UMA MULHERAS V0ITA8 COM AS CRIA-

TURAS DO INFERNO. Nãohouve idéia dc homenagear oBrasil com esse verde e ama-relo, mas eu sinto como uraautor embandeirado nas suascores nacionais, e penso que is-so trará sorte. Plerre Javet tempalavras otimistas a respeitodo livro. Julga-o parcialmente,pois está na coleção de seuscuidados, como um novo MO-BY DICK. Não posso deixarde rir.

Faço uma descoberta. O*exemplares para a crítica saofeitos à parto. Não trazem ne-nhuma recomendação, nem opreço dc quatrocentos c cin-quenta francos, que vem no 11*vro destinado ao público. Oseditores franceses sáo deli-cados. Nada sugerem à cri-tica. Aqui a história é diferrni-te. Não há qualquer frase nolivro que possa levar o critico aum pré-julgameuto. Mas, ni>exemplar do público vem aapresentação que toma melapágina e tem esse trecho cx~plicativo do romance — ...«SEDUZIDA POR UM COM-PANHElRO DE TRAVESSIAELA ENCONTRA EM SEUEXÍLIO, EM COMPANHIA DA

A1A E DE SEU AMANTJB, ~0DESTINO FANTÁSTICO DASCRIATURAS ENFEITIOADAS,DESCRITO A MANEIRA DEJEROME BOSCH. NA ATMOHFERA DUMA ILHA DESEtt-TA, POSSUÍDA PELOS SERESDEMONÍACOS, E QUE MAR-GARCDA LA ROCQUE DKJvCOBRE NA PRESENÇA DEUMA FERA ESTRANHA, UMAEBRIEDADE HUMANA. DES-CE TODOS OS DEGRAUS D\ABJECAO. TENDO FICADOSô, FORA DO TEMPO E DACONSCIÊNCIA HUMANA, EÍ.AlÈ RETOMADA, ENFIM, PELOMUNDO DOS HOMENS.

Leio, abaixo, os nomes Hus-três dos outros escritores tiacoleção. O pesadelo acabou.Agora, a aflição é só de iilegri;*.,

Saio radiante, com os pri-meiros exemplares debaixo dobraço. Um deles serã para Mau-riac, a quem visitei em Parish& três anos. Vou vê-lo em seugabinete no "Figaro". Tuitoagora me parece banhado ua»quela emoção da estréia. Reto-mo minha alma Ingênua, amesma de quando avistei o pri-meiro exemplar das "Floradas

SHÁKESPEARE E ODRAMA NÁUTICO

Procurando um método con-veniente para discutir a tipo-logia do "sea drama", propõeo pesquisador que se tome porbase a contribuição de doisautores clássicos, Shákespearee Ben Jonson.

O primeiro, com "The Tem-péSt'% serve de paradigma paraás peças dramáticas que te-nham cenas no mar, isto é, emnavio. E o segundo, para osque fixam tão somente a psico-logia do marujo nas suas ca-racterísticas Substanciais, forade seu meio ergológico.

No primeiro caso chama, parafacilidade de sistematização,"The Tempest school".

Não há exagero nisso.

JOAQUIM. RIBEIROShákespeare criou, de fato, o

drama náutico.A tempestade no mar, vista

através de um navio que vaiafundar, tevê a sua fórmulaclássica e definida logo no prin-cípio do drama. Tem, hão hádúvida, raízes na literaturagreco-romana. A Verdade, po-rém, é que "Practically ali theelements of the formula storraare present", diz Watson. Ediscrimina, esquemáticamente,esses elementos.

Naturalmente essa disseca-ção impunha-se para a realUzação de um exame compara-tivo com as peças influenciadaspor Shákespeare.

Assim é que aponta o influ-xo de foThe Tempest" na "SeaVoyage" de Fletcher, cm "ThePrisiòners" de Killigretv, etc...,

E' uma viagem amena oerudita através dessas tempes-tades marinhas, ricas de colo-rido shakespeariano.

Essa demonstração confirmao título de fundador do dramanáutico oue, sem favor, cabe aShákespeare.

E* um título que se adaptabem a quem, por ser a maiorfigura da literatura inglesa,deveria, de fato, trazer, em suamensagem artística, um símbo-Io da. própria missão históricada Inglaterra no mundo. Os

VJwWWWwjty?

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na Serra". Há um eplsódficurioso nesse velho taxi que movai levando, pela "Avenida do.1Campos Elíscos". e que, comotantos, já têm seu teto abertuirom uma janela para o céu prl-maveril. O chofer toma tfnosso português pela lingua es-panhola. E, admirador fervo-*roso de Eva Perón, troca a au-tora brasileira pela primeiradama argentina. Seus olhosbrilhara do prazer da "desço-berta" de Evita com saúde, «Viajando escondido. Fala nos"meus" retrates, e diz que nãoprecisarei chamá-lo... porqueantes virá a mim.

Não desmancho o cngraçad!s<simo equívoco. Eis aí um su-cesso de outra natureza, e como qual a romancista absoluta-mente não contava.

Mauriae se mostra desejos»dc Visitar o Brasil. Mas diz quanão pode mais fazer conferên-cias, por motivo de sua rouqut-dão. Contudo, acho sua fala.bem melhor do que há trêaanos. Diz que lera # livro nas?suas férias da Páscoa, mas, eubem imagino a montanheta dolivros que lhe mandaram paraêsse fim.

Vou à primeira livraria, e já!dou com o livro-papagaio-vcr-4de-c-amarelo, bem & mostra,no balcão. Pergunto sobre li-vros do Brasil. Trazem-me "LaChevalier de L'Espoir", daMonsieur Amado...

Enfim, ganho o grande "bou-,levard" Com as flores da Prima-vera de Paris rebentando micoração.

couraçados bélicos e os transa«tlãntieos pacíficos do maiorimpério do mundo não tonar-guirão jamais a tmoriaHdada:de navio naufragado pelos po*deres mágicos de Prospero...

Óleo da ALBER TO MAGNELU

Á França e a produ*ção espiritual

(Conclusão da 7* página)tão poderosos são que resistemaos conflitos econômicos e aacontrações da violência. Con*cordemos no entanto que, por?agora, é a tormenta econôml-cá que nos ameaça. Toda cila-ção do espírito — como limaialma — é obrigada a aceitarum corpo sujeito a um sistemade trocas. Apesar do que dizlaíBaudelaire sobre o "comércio»satânico", um livro é, ai ddmim, um objeto de comércio. Aícriação literária hoje em diaítem imensa dificuldade par»impôr-se, molda-se a uma for-ma na medida da aceitação do;público; ora o público é deso-rientado por uma produção somprecedente, e só pensa em em-pregar o dinheiro em fins dainteresso imediato. O intenue-diário não sabe o que ha dafazer, entalado entre os preçosde custo e raridade do mercado,põe as mãos na cabeça. Quasotodas as revistas literárias de-sapareceram; muitos editoresfecharam as portas; os capa*zes de suportar o baVançô cons-«tituiram-.se em "trusts" ouiipotentes e de processos nem•serrmre anodinos a respeito, dainteligência, Estamos, po-r cem-seqüência, cm face de urn pe-rigo para a liberdade de 'ouefalávamos; se por outro Indoô retribuição intelectual foi-insuficiente, não é de admiraiciue o artista troque a liberta-*de por dinheiro. A incert^a'dos tempos 6 tal que o homemjâ não sabe bem onde c ;h'<,nèm para onde vai; as qi"^>toes absurdas ocupam os err,-ritos dos- que dominam e clo3dominados, fi o momento ciadistinguir entre a lealdade doaprimeiros planos e a beleza dasexperiências profundas. É possi-vei que, como via o poeta: "Omundo vá acabar. A única ra-Kão, pela qual poderia durar, 6que clti existe". O instantâneoe o mecânico talvez vençam o

; misterioso e o duradouro. Pa-\ rece que, neste velho país fran-

l cês, so luta, com qualidade o' «efeitos, a favor do antigos q,verdadeiros valoreô^

ragma m o TETRAS E ARTES Domingo, M-1952

\

jt i *-« ***** * COM SOTERO

Uma fotografia histórica, de 1930, em Paris: sentados, da esquer-da para a direita, Sotero Cosme e Plínio Salgado; em pé, SouzaAranha e Cândido Portinari. Há vinte e dois anos nada os dividia

WtZNITZER,

você não po-de dizer isto no entre**

VÍSH

V *- Que?r- Quo Leonardo, Miguel

Ângelo, Rafael não representam/um grande posso do ponto de

( Visto do orte pura, em relação

o Ucello, Masaccio, Piero de IaFroncesco. -^

—• Mos você acaba de dizerisso! ;f

— Sim. Mas se você disseressas coisas podem certos pinto?res moços achar que Leonardoe Miguel Ângelo já não valem

mais a pena ser estudados.— f, há sempre este perigo..*

,, Sotero Cosme o eu passeamoslentamente pelas ruas antigasdo Florenca, conversando sobremil assuntos. Sotero Cosme, cujonome já nos lembra da famíliados Mediei, è um dos raros pa-trícios adaptados a esta cidadomais civilizada do mundo. Osol está batendo no corpo atlé-

tico do David de Buonnaroti. Osturistas se precipitam pela por*ta da Galeria degli Ufficci. A-travessamos a plazza de IaSignioria, no moio da qual foi

queimado, há séculos, o Sovo-narola que quis reformar o cie-ro e o mundo.i

PINTURA ABSTRATA E PIN-TURA RELIGIOS/

¦— E a pintura abstrata, achaque é cia eterna?

— Absolutamente. A pinturaabstrata é uma moda, em ai-guns casos uma tentativa quese pode comparar sem exagero a"Art nouille" de 900. Naquelaépoca Iodos pensavam que istonão ia acabar mais. Entreran-to... Não. A pintura dependeessencialmente das formas. àpintura não pode fugir do na-tureza. Ou então ela deixa d«ler pintura. Você vê, todo mun-do pode fazer pintura abstrata,ninguém nota a diferença. Maspaisagens, retratos, cenas bi-blícas, gente, bicho, flores, exi-

DO CADERNO DE LEITURA

^ ^ RISTAO de Athayde. diriaI hoje, diante das crônicas

-**- de Rubem Braga, enfei-xadas em volume, o mesmo

cue escreveu em 1930, sobre umlivro de crônicas de conhecidojornalista? —•• "Uma crônicanum livro é como um passari--nho afogado". Ou, mais clara-mente, "o que foi feito paraviver uma hora não deve vi-ver um dia". Concordamos comeste juízo, aplicado à crônica,de modo geral. Mas quando setrata de um escritor como Ru-bem Braga — por que não di-ger de um poeta? — cremosque esta asserção deixa de serverdadeira. Mesmo porque, asfcrônicas que selecionou para o•aparecimento em livro, quaseque perdem este caráter, pe-queninos contos que são, da vidabrasileira, escritos, talvez, pelo

linais humano doS^nosso escri-tores do post-mòdernismo. Oque avultá nestas crônicas, so-brepujando o lirismo do autor,ê o sentimento da fraternidadeIiumana, intenso, mesmo neleque timbra por ser o bicho-do-mato da nossa literatura. EsteSolitário não desdenia o con-l/ívio humano, apenas enxergamais longe do que nós, e porBer a.^im. nem sempre podejKtar alegre.

CARLOS DAVID

"Romance de uma pequenaregião cabocla das divisas deSão Paulo e Minas", assim dizo verso da capa de Água Fun-da, livro onde estreou, há ai-gum tempo, Ruth Guimarães.Crônica supersticiosa da vida deum lugarejo carbonífero e deseus habitantes encafuados en-tre rio e morros, longe do marque muitos nem chegam a co-nhecer — está escrita numalinguagem regional cheia depoesia. A romancista adota otom destes poetas anônimos, ve-Ihos contadores de histórias dedantes, que ainda se encontrapelo interior, como a MariaGenória, de cuja boca SimõesLopes Neto teve a fortuna deouvir e anotar as sextilhas doLunar de Sepé.

Água Funda é a história dealmas simples, duma gente tris-te e meio desconhecida de nós,que sabe se entender com ospássaros, os peixes, as estações,conhecendo mil remédios casei-ros, defendendo-se eficazmenteda picada das cobras, só nãosabendo se curar do mal doamor. Amam perdidamente, atéá loucura, à morte, as perso-nagens de Ruth Guimarães,pintadas em traços fortes e in-eonfundíveis. Se um dia esque-eermos os nomes de siá Caro-lina e de Jóca, conservaremos,quem sabe, a lembrança de

«mas paixões, de seus sofrimen-tos.

Mas não só a trama das bis-tórias interessa-nos em ÁguaFunda, devendo-se notar, sobeste aspecto, o fato da autoralargar uma história e pegar ofio de outra, sem nenhuma 11-gação visível para os olhos doleitor, como no relato da vidade Olhos d'Agua e de siá Ca-rolina, o qual vai fazendo atépular, subitamente, para o ro-mance «dóca-Curlango. Interes-sa-nos ainda a plasticidade deum estilo que tudo reflete, afei-to aos sons, às cores, aos per-fumes de uma paisagem muitoconhecida da romancista. Re-almente, não é pequena a con-tribuicão poética deste livrosombrio, fazendo-nos depararcom uma gente nossa irmã, quees condições geográficas e so-ciais colocaram afastada donosso caminho, confinada numsitio de "carvão e tédio", mascujo destino nos abala e üo-move.

..-X X XPaulo Hecker Filho precip!-

tou-se no túnel que conduz àvida secreta dos internatos,tíando-nos, numa pequena no-vela, a crônica, de uma paixãocolegial. O seu Internalo pie-tende ser, como os demais, o

(Conclui na JO.* página)

gem talento para ser interpreta-dos, reproduiidos,

Acha interessante a pin-tura social?

De maneira nenhuma. Es-

te é outro perigo que a pinturadeve evitar. E, sobretudo, alguns

dos nossos pintores que têm uma

tendência muito forte para odo-

tar hoje uma orientação, ama-nfiã outra. Provar alguma coisa,lançar "messages", pintar ve-Ihos rezando ou operários po-bres, tudo isto não dá certo. Vo-cê vai me dizer que na IdodeMédia sá pintavam cenos da Bi-blia? Mas eles então tinham afé, e aliás estes eram então osúnicos assuntos. O mundo vivia

preocupado apenas com" a reli-

gião. Não se falava de polítl-ca ou de erotismo. Falava-sedos santos, dos milagres, da Vir-

gem Maria. Os pintores italia-nos exploraram o mundo em queeles viviam, o mundo católica*Mas foi sempre de maneira es-

pontânea, nunca foram obriga-dos, nem tentaram de provar ai-guma coisa com seus afrescos,tuas telas.

— Certos pintores modernos,tais como Chagall, Braque, Ma-tlsse. Miro, decoraram ultima-mente igrejas e capelas. Achaque sem a fé é possível criaruma arte religioso?

COMDomingo, 4-5-1952 ZETRAS E 'ARTES Página

E EM FLORENCAA fé c a arte religiosa — Onde cada pedra relida um passado ilustre — O pintor e o cônsul

LOUIS izNITZER

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gênios do Renascença. Dante,Galiteo, Machiavol, Savenarola,Petrarca, Ariosto, passearam porestes "logores". Comentamos apolítica do século 15, as leis de-tnocráticos de Florenca naquelaépoca, o humanismo de Lorcn-xo Magnífico, o furor de Sovo-narola. Olhamos para muitas

cosas cm cuja pedra se grava-ram versos do Dante. A cida-de não é só um museo, é tom-bem um livro.

Oscar Wilde dis«e que avida copio a orte?

Ê, mas não é bem assim.A arte copia a natureza e, às

vezes, as obras de arte, por suavez, influenciam a vida. Masprimeiro vem a natureza.

É importante poro o pin-tor, enquanto trabalho, cogitar

• da parede onde vai ser pregadoseu quadro?

—- É uma fraqueza da maio-ria dos artistas. Não sou contras síntese das artes e acho bemas igrejas, os palácios com fre»cos, telas e esculturas por todaparte, de maneira harmoniosaMas isto não é indispensávelUma tela tem um valor intrin-Seco e não depende do ambien-te. A pintura é uma arte abso-luta. Pode ser relacionada comoutra, mas por acidente.

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* Ketrato de mulher", « qt M mais recente de Sotero Cosme

— Não acho. Eles forom I sua atividade, entretanto. Ovados por motivos estéticos problema não é nosso. '

porque acham que a Igreja A ARTE E A VIDAum edifício que se presta a il Chegamos ao Amo, um rio-coração. Não podemos proibir xinho que inspirou os maiores

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Sotero Cosme, em flagrante tirado em 19*8, en*s famosos pintores Vlaniincfe e Yan Dongci,

íi

Você tem trobolhndo mui-to ultimamente?

Sim, desde que chegueiaqui e que arranjei um oteliercom vista sobre os jardins Bobo-II, com esta luz maravilhosa eesta serena tranquilidodo, eutrabalhei bastante e com alegria.O ambiente aqui é mesmo paracríor.

—- Qual c a importância dePoris na pintura?

'— Paris c o mercado, a boi-«a. Para vender é preciso pos-«ar por lá. Lá estão os criticos eas galerias. Lá nos espera a ce-lebridode. Quanto ao resto vo-cê sabe.

BRASILEIROS NA ITÀLI*

Você não acha que deve-riam criar um centro de /estu-dos para artistas brasileiros aqui

em Florenço?

Estão criando. 25 moços e25 moças, tedos brasileiros, de-vem chegar em junho para es-tildar- aqui. Já têm uma vila

para os hospedar. E uma coisaexcelente. Aqui não encontra-rão existencialismo, mas só gen-

«9 civilizada e fina. Será umaoa escola paro os nossos mo-os.

Dos italianos, qual é suaipinião?

*— í um povo admirável, querossui a arte de viver e de con-

viver. Neles se unem duas cor-rentes, uma etrusco, de finura,

de ironia, de sentido da morto.

O pintor diplomata palestrando .com Lovis Wiznítzer na rhwzade Ia Signioria, em Florenca

e do destino, e uma romana,mais artificial, inclinada às con-quistos, aos discursos e aos cha-

péus de pluma. A síntese é maisde que simpática. Aliás, trata-te de uma gente excepcional-mente trabalhadora e as fomi-

lias que estamos para receberno Brasil constituirão um ele-

'''mento de primeira ordem, como

aliás os que já vivem ali.

— Co cônsul que está fa-lando agora. ..

Sotero Cosme alude agora aoencontro, entre Miguel Ângeloe Maquiavei, em Sabirto. Quoconversa interessante teriam tido

eles ali! E assim, recordando em

cada pedra de Florenca. um pas-sado ilustre, continuamos a nos-

sa palestra.

A FRANÇA E A PRO-DUÇÃO ESPIRITUAL

A França foi esmagada em1940 como em nenhumoutro momento da suahistória. A despeito da

resistência de um punhado deheróis, a despeito da solidarie-dade secreta r'e grande partedo povo, a terrível confusão dasidéias 'pois houve paixões sin-ceras e corajosas nos camposmais opostos, conio houve am-biguidade e astúcias necessâ-rias* o "apodrecimento" hor-roroso que o inimigo acalenta-va no solo nacional,/ todos .esrtes males reunidos provocavamo esgotamento da nação. Quempoderia prever que, no temívelcomplexo., social que sobreveioà guerra, as noções de liberta-ção e vitória fessem suficientespara criar um estado de eufo-ria. E no entanto, como a vidaespiritual não cessou (mesmono momento de perturbação eperversão durante, a ocupsção'total do território, quer clan-destinamehte, quer no eatran-geiro, e forneceu à Resistênciaboas armas), o mundo deve terconstatado, com espanto tal-vez, que a França continuavaa produzir: a realçar uma ^éia,a ¦fnz'~T o cv-2 ç^roir^ í-^ra —sem dúvida, a razão ae sua

PIERRE JEAN JOUVEexistência. Ê interessante exa-minar como se manteve estadiferença entre a condição realda França e o seu espírito.Através dos piores embaraçospo íticos e econômicos mantive-mo-nos os mesmos: uma cons-tante intelectual. Intimada porum partido social autoritário aaiistar-se, a literatura não sealistou. Intimados por certametafísica torpèmente tétrica

. de diminuir cientemente o ní-vel cultural à altura de um ma-terialismo "existencial", a poe-sia e romance só parcialmen-

.te seguiram essa disciplina dainfelicidade. A moda dos"monstros" nas artes plásticasreinou certo tenwo. mas tendea des?vparecer. Compreende-seque as artes, no seu conjunto,sofra da dissolução da socieda-de humana; mas sorrem tal-vez menos aqui que noutro pbn-¦ to qualquer. A cultura francesasempre me pareceu. ol>edecermais a um nível do eme as ar>a-rições de grandeza extrema. Es-te nível, comportando as obrasmn;3 avançadas e as m°is con-vencíQnais, é sempre alto. Osgênios excepcionais são muito

_r."ros, >;?o temos aqui nemSbaJwpeare^neirt Mo^nrt; maso trabalho num'pl*'*ao si-peribr,

tende a continuar, se.ia quaisforem as circunstâncias nacló-nais. O artista francês pode terpor tradição uma paixão poli-tica: a obra mantem-so indo-pendente. Tomemos o èxeinplode Chateaubriand é Güsta\eFlaubert. A famosa "medida"francesa é uma qualidade q\j^contém um defeito; e felizmen-te esta medida, com o seu ladopobre, está longe de traduzir oque há dè forte na arte fran?cesa. Mas a medida de meios,e o alto nível do talento, cor-respondem-se de certo modo.Prefiro no entanto explicar »hcolsn pelo espírito de liberda-de. Falo da" liberdade comoprincinio metafísico, e não co-mo "slogan" de prop;)fíflnda. naliberdade como tendência aí s-tiva espontânea, irreprimível,natural. A Franca tem o há-b;to da liberdade, da ades;"íoespontânea, do movimento deescolha, da intolerância das

¦ disciplinas. Esta liberdade nãopossui sempre a mesma pro-ítmdídade, nem é sempre tãoefetiva como seria para dp.ce-jar; mas não fenece nunca.Tais caracteres não mudam.Nem a guerra, nem a infelicí-dade nacional os destroem a

(Conclui na 5.» página)

À \

Página — 8 TT2TRAS E 'ARTES Domingo, 4-5-1952

OS homens exatos são In*

sensíveis, usam uma mas-cara, não se traem. Acoubcicnoia tem um ante-

paro vulgarmente chamado con-vcmèricia. £ lato que um pen-sador contemporâneo classificoucomo "barreira biológica e fi-sic» da .sensibilidade" para dara existência um aspecto amá-vcl. Mas o artista è impetuoso,as suas emoções não reoonhe-cem empecilho e dai a razãode ser considerado como semdignidade, amoral ou imoral.

Por isto, uma figura comoDo:-:to:evsky, cuja essência nãofoi z Inda penetrada, a frio. pornenhum crítico, causa pasmoaos homens dc bom senso. Dis-cutldíssimo, Tolstoi reputou-oescritor de segunda plana, aopasso que Gide o arvora sole-nemente cm "maior gênio" doromence do século XX. O cer-to e que o escritor russo repre-senta, por si mesmo, um trata-do í.e psiquiatria, bem estuda-«los os "cataclismos emoclo-nais" de um epilético preocupa-do com aquilo que, para o gê-nero humano, não tem sentido:a viâ*. É Pereira da Silva quem<lir: MS.e, de ura lado. Dostol-evsk.v ío! um forte porque sou-bc sp sobrepor à sua própriadcsgR^çá, de outro o vemosaoí-ita? e cometer as fraquezasqu? o tornam, além de doentepropriamente dito, um enfer-nm moral, dés mais impressio-ncuitea que a vida tem regis-tr:ido. S^ria mesmo inútil di-zer «j«ac«e Tião fosse essa qua-lidado de sülilimação, aliás tãocemÉtn n«é artistas, capaz detráaéfara&r as tendências re-baíSsadàs e até aviltantes dap? r .'.onalíd&de em momentos debeleza, cie. Po^toievsky, teriasiiio uju louoe banal, jogado,fclvez, eoífco frra, numa jaulad» hospício".

{ l\y ¦ a .i odía va os homens, dofunda d\> ooratijão e, por nãopo-W evitendê-lcs; dedicou-s»de.sv~;n*;Uavo-;ríe a um cão. Apar i'o culto *xa própria beleza,*ra de uma ferocidade incrível

A FACE TRÁGICA DA ARTEPAVJD ANTUNES,

inquando se irritava, embora nãomerecesse a classificação deperverso. Pelo menos Letorncaunos garante que a bondade ea ferocidade podem coexistir.

Oriundo de uma família doalienados, Chateaubriand viveuperseguido pela hlpocondria epela idéia do suicídio, alem doque sofria os sintomas das mo-lestias que imaginava. Não ten-do encontrado um ideal amo-roso em nenhuma das mulheresque conheceu, a sua imaginaçãodelirante acabou engendrandouma que resumia todas asamantes, talvez com prevalên-cia de Madame Itecamier, tam-bém uma desviada, psíquica-mente. No seu caso, a arte re:presentou a sua parte de equi-Iíbrio para evitar um dos opôs-tos — suicídio ou loucura.

Será que o pensamento mol-da a matéria plástica num serque participa também da vida,independente do seu criador?Quanto a nós, Pirandelo nãofez nenhum paradoxo quandonos advertiu de que os perso-nagens governam o autor. Go-vernam. Muitas vezes tomamrumo diverso daquele que lhesfoi destinado num esquema no-velístico. Não se cogita de ca-botinismo. O homem anormal,ou seja, o artista, é, via de re-gra, sadicamente verdadeiro.

Não raro é que, para libertar-se do medo, crie o artista, cons-eientemente, um medo maior.Tal sucedeu a Hoffmann, quesentia pavor aos fantasmas queêle próprio criava, a ponto deexigir a presença da esposa, aseu lado, quando escrevia, àuoite, as suas histórias extraor-

dlnárias. E o curioso é que eleprecisava desses mesmos espe-ctros, que o haviam de perse-guir até ao fim da vida, parafugir às rcminlscências angus-tiosas da sua primeira infán-cia. Sofria de perturbações sen-sorlais e multas vezes viu oseu duplo. Não foi o álcool queo fez alucinado. Ao contrário,por ser um alucinado é que pro-curou o álcool.

Alucinado também era Shel-ley, freqüentemente perseguidopelo seu outro. Em criança, so-freu a tirania dos educadoresem maus tratos corporais quelhe deformaram a individuali-dade. Tornou-se um pusilânimediante do mundo. Só quandoconseguia isolar-se é que extra-vasava as suas maguas em pro-longados acessos de choro.

Torturado pelo pavor de serenterrado vivo, Poe horrorfca-va-se à idéia de ficar só. Trans-mitiu essa aflição mortal n'"0Komcm das .Multidões" des-vendando o seu drama íntimo— o drama de um enfermo queempreendera a tarefa de fugira si mesmo. E, quando fala doseu pesonagem — "Seguilo ia

m em vão; nunca chegaria % sa-ber coisa alguma, nem delenem das suas ações" — na rea-lidade não faz mais do que au-tobiografia. Para não se lembrarda asfixia em baixo da terra,bebeu até ao delírio. Esse pavormórbido que o levou quas.<; aolimiar da loucura — pois emcertos contos apresentava ossinais premonitórios de pertur-bação mental —- determinou osen grande pendor literário.

Henry Hhodes declara, sob asua responsabilidade de crímt-

nologista, que muitos dos con-tos de Edgaid Poe — "Buraca",v. g. — pertencem ao gênetxdos que um delinqüente poderiaescrever. E acentua que muitopouco faltou ao escritor paiafigurar na galeria do crime. Pa-ia ilustrar a tese, lembra aindaque Poe demonstrou o mm (a-lento de detetive no conto "Omistério de Marte Kogest", ba-seado numa história real de as-sassínio, do qual apresentou asolução exata, levando a palmaaos técnicos da polícia, que sómuito depois chegaram a lrièn-tico resultado.

Ressalta cm qualquer dos ca-sos — no da loucura impenden-te como no do criminoso virtu-ai — que a arte con jurou osdois males, convertendo se emreação à idéia obsessiva, istoé, à tatofobia, embora falhan-do na incoercível tendência dePoe à alcoolatrla, culminado noataque de um deürium tremens,que lhe causou a morte.

O solitário Flaubert, oriundode uma respeitável família quenão admitia, em seu seio, nemvagabundos nem poetas, enla-çados no mesmo desprezo, foiabandonado pelo pai, notávelcirurgião, como um trambolho.Viveu sempre entre o suicídio ea loucura. Era um caso de ara-bivalência: o lírico amador depalavras e o analista frio equase animalesco. 'A palavra,para êle, tinha animação deum ser vivo. Passava duas ho-ras em cima de um adjetivo, nafaina angustiosa de achar aexpressão determinada para ca-da pensamento, o que lhe va-leu o eognome de mártir da li-

teratura. A paixão da palavraexata devia ter causado a estoPrometeu dos letras — da for-ma, melhor se diria, emboraêle não admitisse nenhuma dis-tinção entre forma e fundo, tãoidentificado se sentia com o seumito literário da fusão de am-!>as — devia ter-lhe causado, dl-ziamos, crises agudísslmas, sodermos crédito à declaração douma das suas sobrinhas, segun-do a qual uma das causas damorte do 'escritor teria sidi"Bouvard et Pécuchet", novelaque ficou inacabada.

Maupassant, também de umafamília de alienados, não en*controu a mesma sorte de Flau.bert, seu grande amigo. O equi-Iíbrio não pudera ser mantidaPara afastar recordações dolo«rosas, pensava cm mulheres.As mulheres foram a sua obses-são e o seu narcótico. Dos ex-cessos praticados à autoscopia,desta ao horror à morte, pro-curando sempre a lucidez nasbebidas excitantes e no éter,chegara o inegualavel conteurde "Bouie-de Suif" às teníati-vas de suicídio e, finalmente, àloucura. A arte falhara na suafinalidade — desviar o cursode uma tragédia.

Mas, não falhara em DanttA psicanálise descobriu esse Ti-tá ímpar — um neurótico ob-sessivo. O homem-síntese d«todo o pensamento medieval,vazou nas estrofes da "DivinaComedia" o seu grande confíi-to interior travado entre a ab-negação e a tormenta. Ou te-ria sido o temor da vida futu-ra a causa formal do poema? Acausa eficiente cremos desço-brí-la em Beatriz, o maior aci-dente na vida do Poeta e, poristo, convertida em símbolo dasabedoria revelada. Se ela oamasse, e não o outro comquem casou, talvez Dante se ti-vesse libertado do medo reügJo-so. E daí nada restaria dele,nem sequer uma recordação. Aloucura amorosa do Vate, de-vemos a coluna-mestra da lile-ratura mundial.

N O Barri Vermelho o ba-fciiqííe oki.:;ee para o Cor-tpmç Vc ho, onde a ca-

parito <íõ IpwyV) ptenta entreos pirís do lodo, imobilizara apajreíra, iiv-m "stacato" de se-nen>;ta selvagem- Dontro danoite, a coPrpmp crua tresan-da, enquanto rescende a cascade pnn nos tanques profundos.

E vem subindo o morro paraa Vila escura. Ftopos rui vos etrfímtüos das chsrass das iam-P8.rin*3 varam entre ps pernasc:os MornpanRantes: E as lon-gras sombras a oscilarem; maldefinidas; é?oif;b?m-ke pelakpvir^rn. dá ladeira forno ron-da d<n o"r"",-Jos p^nlwnps.

Fundida em b^o sonovo pe-Ia r-ápfqria( tambor, puita epan^afvi a fioa^p da marchac*á jwtftQ.i^ffvéís bo^o;°s e re<"<ije-bT*o",qf,,: <?.ornns suados ove se-riam. à cH/r^p^in na,,a a com-prp"'"'"/-, ;n„,,~i{víij ^)0 [v<0'!3í,dS•tIlPr> fT^vt-.^njq (iç^fi^ant.gjhos.

*fPou" Hipo ve'*v> à fre^i-f nu-xaiK'n n -ípirn. dos parceiros:

$ ...

çy-f Tstta", quebra..-.: X^v^rq a requebrar,

Corp orarei* vamos dançar!Atesíp?, assüni ...Vencido ò nclive. fi copio ^

ca dum BubtèrrftpeoR^sfo^garp a opressão d« ca-

minhàcla. Depois, em to-"o cioboi se fí^rupapi tolos. "Vaga-Irnce" A cabecoirra amarrada#;i esnue^eto d? ripns. roberto<5e àníaí7epi com ^«"-"•pas pln-'tal^a-das. (sm ni!P?'-.i<o.. r?0jsa ^ev;da, através dos cP^Ps de vi-<3"o. íuzi-n^o aos v^'3X0S cen-tolho dos da cf^4e'a, Poisadolio chão. é copio um animal es-tT.-oho. eui cio-f"va de choco.O cervo. a cobrínhà e o cava-linho renois^.m.; arwJs a primei-ra mostra da noitada. E logoa anr^ppa recomeça, enfiando-ee uo1a rua larga, debruada degrama alta, chanfrada das de-

BUMBA - MEU - BOI/VARIANTE CATAR INENSE — ORLEANS).

pressões, golpeada das valetaspluviais.

A cantoria se altela, comagudos e graves grudando-se àescuridão, picotada de cima pe-lo luciolar d'estrêlas. até de-fronte à venda de "Seu" Ca-narirn. Dentro, 210 reboliço es-pertinhado, apontam clarões re-pentinos, recortando os quadrosdas janelas e, pelas frinchas,mergulhando na rua, em esto-cadas contra a treva.

Num pincho decidido, Soterosuspende a armarão abaúladado boi, pondo-a sobre o dôrso.Nem se lhe vêm mais os pés,que o animal, de cortinas aoredor, como metido em saias,parece tê-lo devorado.

Reinicia-se" a dança. Mas.deslocado o centro de grávida-de,- tornado bípede, o bicharô-co adquire rapidez nas nega-ças, volteia de relâmpago, bal-xa, badala e alça a. cabeça ouo traseiro com agilidade espan-cosa, como pássaro a bicar, eis^cando.

As rabanadas abrem claros,para oue se espalhe melhor,Há gritos de pânico nruAheril,â ameaça dos cornos perfuran-tes, como esgrimindo.

E, então, o vaqueiro se adi-anta, com a vara de comandoe domação:

lê, boi!_0 batuque mais forte vibra-

ção, com o pandeiro em solo:Dança, barroso! Investe,

Vagalume!Paz uma cortesia. Para odono da casa. Para a donatambém .^

TITO CARVALHO

Tem o animal estalos peloarcabolço, glra-glrando comopião, arremetendo contra a as-sistência em correria e garga-lhada, flexando de um extremoa outro do círculo, fazendo opovaréu recuar e avançar no-vãmente, como maretas napfãia. Carrega sôbie ó Vaqueiro,tentando fisgá-lo. Inutilmente,porque tem pela dianteira umcorpo fino t fugidio, que selivra, galhardo e chibante, aospontaços violentos e está emtoda parte, provocador, em pi-notes e gatimonhas, sem sernunca atingido das cornadas.

Por fim, Vagalume é vencidodo cansaço, bufando sob a es-topa malhada.

Pai Mateus salta para o ter-reiro, chapelão de abas recur-vas, espiando pe^s dois furosda máscara — um couro degato-do-mato. a cauda feitabarba comprida.

E como em colapso, o boi sepgacha, tremelicando, aqúietlan,do-se, a seguir. Parece morto,embora os grandes olhos es-pelhem golpeios de luz.

•— Nêguinho de sete fôlegos,o Sotero ...

E manhoso nas mano-bras ...

Capoeira, como o vaquei-ro ...

Já o coro plange a mâgua dosucesso:O meu boi morreu,•Que será de mim?

Vou buscar outro,O' maninho,

Lá no Marolnt ..«lê. boi! -

Tostada e magra, chalé apre-silhado ao queixo, Mãe Cata-rlna se aproxima còm o cane-co vazio, em rogaçãõ de chápara a cura do estuporado.

Seu Canarim põe-lhe dentromoedas de níquel. Mas. Pai Ma-teus, inconformado, reclama li-quidos, para aviamento da mê-zinha curativa. E o mata-bichoescorre aos martelos, sorvidoaté mesmo, em canudo, pelaboca inerte do boi ... .

Depois, Pai Mateus anda-lheà volta, sussurrando. Palpa-lheo lombo, puxa-lhe o rabo, ba-te-lhe nas aspas e conclui queo mal se foi.

Recomeça a batucada. Pifamos morrões das lamparinas. E ocírculo volta a formar-se, ins-tável, em suas linhas geomé-tricas disformes.Agora, no segundo ato, Vagàlu-

me ensaia passos trôpegos. Não-fosse a bebida quebrar a afoi-teza do dançador. Contudo, acoisa é apenas ardil de Sotero,a ver se colhe curiosos confi-antes e desgarrados. E o san-gue escaldado pela pinga, maisveloz se fas nos arranques,mais rápido nas acutiladas,mais vertiginoso nos rodopios,por jeito que cabeça e caudaquase se confundem. Ê o ins-íante culmüiantô-

' Trotando de lado, com pas-fcos à frente e atrás, marcadosao ritmo da bateria, o cavall-nho passeia pelos bordos do.círculo.

Meu cavalinho,Êle vem do mar ...Valente e mansinho,Para o boi laçar ...

lê, boi!lê, boi!

Ora, dança, meu boi!

Corre, depois, paralelo ao Va-"galume. E ambos são cavalhei-ros sim, senhores. Porque socumprimentam, depois de roda-rem sobre si mesmos, ao com-passo da batucada. O ginete fl-ca aot. meio do arcaboiço daminiatura de .parelhèiro —ancas roliças, rabo áspero dacerdas, e empinando, J cabeçamiúda, trabalhada em trapos,dois olhinhos de baga silvestre-Empunha o laço, volteando aoalto, sem desferi-lo. O boi re-fuga a cabeçorra, em precato.E a cena se prolonga, em ten-tátiva e malogro, até que, afi»nal, a laçada corta o ar e co-lhe ó boi pelas duas hastes,num golpe de mestria.

Como dançarinas em fundode palco, a cabrinha e o cervoentram, ao tempo em que Va-galume vai sendo retirado cio-cilmente para recanto mais es-curo. E os dois bichinhos ca-briolam, escaramuçam, rodeiame gingam, até que o batuquevai "smorzando-*', em final de• funçanata. Mas, passa a novotema musical — a_marchinh»da retirada. '"-. . .

Mãe Catarina se faz maisclaudicante, com as sobras doremédio do boi. Toma a dian-teira, depois da despedida aosdonos da casa, ao lado do PaiMateus, seguindo-os os âcsís-tentes de renovada curiosidade,a engrossarem pelo caminho.Por fim, vão os bichos, quamais adiante se acomodam emlocais escuros. A batucada sereaviva, esmagando_a quietadada Vila recolhida. & perdendo-se na treva distante, deixa pe-")los ares os ecos mortiços da,sua peregrinação andeja;

Mãe Catarina.Que vida é essa tua»;Bebendo cachaça,Caindo na rua ,**

ragiaurjEdíV^jsjtttc'- **WÍ«FIW*P»" t)W ,

Pomíngo, 4 5 1952 r » r k a $ E rA R T E .<? Página — 9

I1

LOUIS

- Charles - Adclaidode (hamisso, mais conhe-cldo como Adclbert vou

( hamisso, nasceu em 17K1no castelo de Boncourt, Fran-ça, filho do aristocratas. Em1702, as tormentas da Rcvolu-ção forçaram a família a ast-)ar-se no estrangeiro. Km Ber-lim, onde os Chamisso fixaramresidência em 1796, a rainha«Ia Prússia acolheu como pa]emo jovem Adclbert, então com15 anos, c cuja carreira pare-cia, assim, de ante-mão traça-da: servindo no exercito prus-piano, pagaria desta" maneira adívida de gratidão contraída porsua família para com os sobe-runos, seus protetores.

Em 1801, os Chamisso tor-naram à França, enquantoAóclbert, já então tenente noregimento de Goetz, em Ber-Jim, preferiu ficar. Envergan-do sem entusiasmo o uniformereal, ¦ o futuro poeta lançou-soao estudo com paixão, desço-brindo a Alemanha cosmopoli-ta de Lessing, Hcrder, Fichtc,Schlegel e, «obretudo. Schillerque concitava os contemporãne-ds a renovarem o milagre helê-jbicò.

Chamisso deixou-so envolverpela onda de entusiasmo e dorenovação espiritual que ba-nhava toda a Alemanha. Rous-scau e Schiller passaram a sereeus deuses.

Entretanto, por mais sinceroque fosse seu entusiasmo poraquela Alemanha cosmopolitac idealista, Chamisso não dei-xava, não poderia deixar dosentir o trágico do seu destinoque o fazia oscilar entre duaspátrias. Afinal, nascera naFrança, e embora falasse jáum alemão quase impecável, erao francês a sua lingua mater-na. Duas pátrias, duas línguasdisputariam sempre seu coração.

Cercado de amigos, poetas,escritores c acadêmicos, lendojá os clássicos gregos e latinosno original, e dedicando-se aliteratura, mais de uma vezChamisso solicitou baixa do

ADELBERT VON CHAMISSO-O "HOMEM SEM SOMBRA"

exercito, no que só foi atendi-do ein 1809, no posto de pri-nicho tenente. Respirou aliviadoe foi passar um ano na Frau-ça, onde fez estreita e duradou-ra amizade com Madame doStael. Mas, sentindo-se desar-ralgado no pais de origem, on-de seus pais tinham jncabadode falecer, tornou à capital ale-mS, passando a privar ali comalguns dos melhores escritoresda Alemanha de então: Cie-mens Brentano, Arnim, Wi-Ihclm Grimm, Justinus Kerncrc, mais tarde, E. T A. Hoffman,Uhland, Hcinc e Schopcnhaucr.

Enquanto fazia literatura, eestudava medicina e botânica,ocorreu-lhe, em 1813, a idéiade escrever a "história do ho-mem que vendeu sua própriasombra". Essa história, que lhedaria notoriedade mundial, eleapresentou-a sob a forma deuma confissão dirigida a sipróprio, Chamisso, e remetidapor um certo Peter Schlemihl.O poeta confiou o manuscrito aseus amigos Ilitzig e Fouaué.Este último publicou-o, em 1814,em Nuremberg, sob o título:"Peter Schlemihls WundersamoGeschichte". Tal foi a aceita-ção do conto, que, a seguir, estoera vertido para o francês, in-glês e italiano.

CHAMISSO VISITA O BRASIL

No ano seguinte, por uma no-ticia de jornal, Chamisso veioa saber que uma expedição rus-ea, sob o comando do capitãoOtto von Kotzebue, se dispunhaa explorar as regiões polares.

OTTO SCIINEIDER

Vivamente interessado. Chamls-so apresentou-se para tomarparte c foi aceito na qualidadode cientista. Em agosto de 1815,o brigue de guerra "Rurik",de 180 toneladas, zarpou rumoao Mar de Bering, passandopelas Ilhas Canárias e alcan-çando o litoral brasileiro natarde de 10 de dezembro, quan-do lançou ferros "no canal doSanta Catarina, do lado da ter-rá firme -ç nas proximidadesdo forte de Santa Cruz". Emsua obra, a um tempo cientí-fica e pitoresca, "Viagem emredor do Mundo", em dois to-mos, Chamisso dedicou váriaspáginas ao Brasil, registrandocriteriosamente, e impressiona-do pela "abundância gigantescada natureza orgânica", suas ob-servações colhidas nessa visitade 18 dias à então vila de N.Senhora do Desterro, hoje Fio-rianõpolis, c arredores.

De regresso da expedição, quodurou .três anos, c já ocupandoalto posto no Jardim Botânicode Berlim, Chamisso casou-secom a jovem Antonia Piaste quelhe deu vários filhos. A partirdali, dedicado à família, à bo-tânica e à poesia, cercado doamigos e escritores, festejadocomo poeta e cientista, distln-guido com vários títulos e que-rido por suas qualidades^ de ca-ráter, espírito e coração, suavida decorreu sem nuvens até àmorte em 21 de agosto de 1838."O HOMEM SEM SOMBRA"

Voltemos à "Singular Histó-ria de Peter Schlemihl", cuja

tradução brasileira neverá apa-recer, em breve, pelas EdiçõesMelhoramentos.

Muito se tem escrito sobroeste conto, universalmente fa-moso e traduzido em mais dovinte idiomas. Nele, Chamissorenovou um tema antiquisstmo,tão remoto quanto a própriainfância da humanidade e suavelha luta contra as artes dodemônio. Tcmâticamentc, a his-tória enquadra-se na expressãoliterária mais antiga da huma-nidade — o conto de fadas queteve seus pontos mais altos naluta de Édipo com a esfinge,de Hamlet com o fantasma, doDom Quixote com os moinhosde vento, de Fausto concluln-do um pacto com o demônio,e de Don Juan que é levadopelo diabo.

O motivo que lhe inspirouparece ter sido meramente ca-suai. Distraidíssimo como bompoeta e cientista, Chamisso per-deu certa vez, num passeioquase tudo que levava consigo:chapéu, bengala, lenço e di-nheiro. Seu amigo Fouqué ad-vertiu-o então, gracejando, deque, de tão distraído, um diaacabaria perdendo a própriasombra ...

Em outro passeio, numa tar-de de muito sol, sempre cmcompanhia do inseparável Fou-qué, Chamisso lançou esta per-gunta, em tom de brincadeira:

— E se um de nós perdesse,de repente, a sua sombra? Ouse ambos a perdêssemos?

A idéia de perder a sombraera-lhe, pois, familiar. Nadamais natural que, numa espé-

cia de conto de fadas, exploras*se a idéia c todos as singularesconseqüências dai decorrentes.

A história, uma voz publica*da, agradou imensamente. K,como não podia deixar de acon-tecer, os críticos do mundo in-tclro se apoderaram do assim-to para interpretar, cada qualà sua maneira, o slmbollsníoda sombra, intencionado ou nãopelo autor, mas sem dúvida su-gcslivo. Assim, para uns, a som-bra simboliza a alma-sombrados egípcios e outros povos an-tigos. Para outros, dignifica asaúde, ou u pátria primitivaque Chamisso trocou por outra,ou a paz da consciência, ouainda a fuga da realidade parao mundo da ilusão ...

Todavia, — c esta é a lição— a nessa sombra, tão indivi-dual e inalienável quanto anossa alma, nossa personalida-de ou maneira de ser, nossaconsciência, pátria ou saíulc, ouseja lá o que for, não pode servendida a preço algum, nemdada, trocada ou emprestada,e muito menos pode a sua per-da ser compensada por todo odirhciro deste mundo.

Tudo indica que Chamissonão tenha escrito este tontovisando algum sentido simbó-lico, tanto assim que chegou aaborrecer-sc com as inúmerasperguntas que lhe faziam .sobroa significação da sombra. Elecostumava responder que cadaum interpretasse a sombra co-mo bem entendesse.

Tenha ou não Chamisso pre-tendido o simbolkmo, uma coi-sa está fora de dúvida: a sin-guiar hisíória de Peter Schle-mihl tem fundo evidentementeautobiográfico. Schlemihl — si-nônifno, segundo velhíssimatradição, do indivíduo malfa-dado, ou azarado — é ele, opróprio Chamisso que, na épo-ca cm que escreveu o conto,andava mal de vida, enquantoem todas as figuras centrais dahistória se reconhecem fácil-mente pessoas ligadas de pertoà vida do poeta.

ANTÔNIO Pinto de Medei-

ros acaba do enviar-nos oseu segundo livro de ver-

}sos, intitulado "Rio do Vento"((Edição do Auto-, Natal, Rioj Grande ôo Nirto 1951). E sato "Um poeta atoa", publicado,«m 1949, já enconva >'araos um"novíssrmo" consciente, da suamissão, agora enc-mtrrmos ojovem poeta norv.sta muitoanais amadurecido, ;m\o restan-úc mais nenhuma duvida quan-tto à sua vocação para a poesiade maiores dimensões.

Na verdade, Antônio Pinto deMedeiros parece continuar o ca»sninho por êle traçado anterior-enente no seu livro de estréia,a que acima aludimos. Ainda no-,"tamos em "Rio du Vento" um:\ijgrande humildada ante o "má-kier" e a palavra: ainda nota-anos que o poeta procura encon-i/trar a sua verda It-ira forma& sua verdadeira expressão;

únda presentimos nele o so-fredor, o angustiado, o desajus-lado, o pária; aiaaa ouvimos>s mesmos gritos de amargura,

toe entrega e de tristeza, queplanto caracterizavam o seu-pn-fcneiro livro. "Rio do Vento",fco entanto, já se nos afigurajwm enorme avanço em relaçãojè. estréia deste escritor. Anto.foio Pinto de Medeiros situa-seklentro da própria poesia; sur-tec mais depurado na expressãofoética propriamente dita; per-

filou em comunicação o que £a*«nhou em mistério e sutileza; aífcua poesia tornou-.-e mais den-&a e mais profunda —.essaden-sidade nos parecendo produtodo hermetismo e da síntese aque chegou êste poe ca em plenaevolução. i

O primeiro poema de "Rio doTVento", '-'Enigma número 1", écaudaloso e informe. Possui umcaráter confidencial. Mas, naocaindo na poesia intimista docunho tradicional, so arremessa;è. uma espécie de poesia trans--cendente, onde o poeta procuracaptar o sentimento de todo oWívérst* através do que êlemesmo sente em relação "a. ês*

POESIA E POESIA

REYNALDO BA IRÃO.

se universo que o rodeia. A ex-periência não é nova. E' bas*tante velha, já sabemos. O tra.tamento, porém, que lhe em-prestou o nosso prtta é que ènovo, f,uend"o-o soluçar huma-namente:

"Mas o diálogo h?,ò haverá.[Andarilhos estranhos

Caminharemos dentro das ho-[ras cm estranha

x. aventura.. A luz que me embalsama dar-

[lhe-á infinitos tamanhosE pesará sobre mim a pro-

[funda tortura.

De ser um. Copiará descuida-[da todos os meus gestos.

Imitará minhas formas em[trejeitos de deboche

E não gastará os músculos[mortos e os membros

[infestosDe fantasma irrequieto ou cl-

talco fantoche.

Banharei em suor seu corpo[sem alma

E amargará müma boca. O[sangue e a caridade

Não -v tocarão. E o cansaçode todos os ho-

[mens não virá.

Baquearei ante a morte. In*[diferente e calmei: JJetomara, também, para o

[nada ou a eternidade,' Sftmo en, sem migalhas do

£beia- Mas o diálofo:tnão haverá.**

f 17a reaBítedo, ftsto primeira

joema, un» soneto bem poucoconvencional, é um ato de fã»'

do Vento" encontraremos o poe.ta perseguido pelo que êie pos-sa chamar: A tíUA FRUSTRA-ÇAO. Um negativismo iníreneacompanhará cada verso trísioe inconformado aéste livro ex-celente. A salvação estaria nocansaço de todos cs homens.Mas o poeta sabe', perfeitamen-te, que "o cansaço de todos oshomens não virá" porque "olhosimpunes mundos recriam semhorizontes" e "andarilhos es-tranhes caminharemos dentrodas hovas em estranha aven-tura". Aliás, Antônio Pinto doMedeiros insiste na mesmaimagem em outros poemas de«Rio do Vento". No "Enigmas:úmero 8" êle volU a falar dosmesmos

«Caminhos das aventuras*

i "São os caminhos que vâo*.

Que vão para o.ide? Que vftopara longe, que vão para o in-íjnito, que levam para o into«cável, que levam para os higa-res inatingíveis. Um desejo dofuga, de libertaçac. caracterizatoda esta poesia ir.oça, como solo poeta não precisasse mesmofugir a todo instante, a fim deper possível a realização total«de mundos que se despren-Idem do eu em separação". Dês«*pe sentimento de fuga, de ma»arfmo desprendimento, nasce Vana poesia. Todo um velho c3"an» poético é relundido e ma*jorizado. Começamos a viver erasonho, do sonho dos mortos,'«"sonhos renascentes", ainda quosabendo que todos os sonhos

irados / Nós também vamos re.valorizando "o nada e o espé-lho", vamos dando sentido no-vo ao ".silêncio aconal que 3ederrama sobre a pedra da paz".A lace humana va^-se tornan-co simplesmente vmi "sombramorta e nua". Todos os cande-labros vão-se meiamorfoseandoem "candelabros inúteis", deca-pitados, "janela alerta ao si-lêncio e às cinzas", "presen-ça inquieta sobre a noite imo-vei e va"...

O que mais impressiona hê»te pequeno livzo do versos é aílima de desoVtráo que nos su-:oca a abna e nos entristec»até o desvario. Porque, nesbpequeno livro de versos, o Dajxil principal é desempenhad»pelo desvario das metáforascempre se repetindo incansável-mente, numa contii-uidade quecansa os nervos e a comodidade nossa de leito.'es enfastia-dos. A insistência com que opoeta fala sempre das mesmascoisas do mesmo jeito, talveasoja a sua maior qualidade, noque diz respeito à realização.Neste sentido, os seguintes ver-sos:

«Dos seios fogem aos ventosNegros gritos infinitosQue dançam perdidos, nus, jE se agasalham vencidos /Nas sombras desesperadasDo triste farol da barraOnde não é a noite absoluta."

$$o eneontrâvelstouirã página dõto", versos qae4os ãe maneiraene obedecerttb a

ein traalcjTjee

serão resolvidiversa, maj

om SENTIDOçontçttflftBBJk

tico absolutamente igual; numprolongamento de uma mesmaidéia até o infinito.

Outra co,-sa que achamos In-teressante destacar em "Rio doVento" é a preocupação que opoeta manifesta pela sua in-lancia. Quase sempre a frus-tração que sentimos perambu-l:\ndo ne£ta obra é fruto de umsaudosismo do passado — sau-dosismo que o noss.) posta nãopode reprimir e que. se mani-festa alravts de versos e.ssen-ciàlmrênte líricos o que por su<*vez não é uma de suas gran-des peculiaridades). O "Poemado Desejo Impossível" talveawja o cue melhor exemplifica-ria o que afirma/nos. "D?.se-rho", "A Pedra" "Enigma nu-mero 15" e outros poemas maistambém poderiam per anonta-dos como' resultado da frustra-cão de que falamos, ainda queiiem sempre possamos apontaro lirismo como uma das carac-turísticas destes poemas. Ora,€f-sa frustração nã3 deverá serentendida no significado co*mum que essa palavra possui.Ao contrário. Frustração, aqu!,funciona no mesmo sentido emque a aplicamos parq algunspoemas de Fernando Pessoa, aousar o poeta porcaguês o hete-rônimo de Álvaro de Campos(v. "No tempo em que feste-javiim o dia dos meus anos","Sim, passava aqúí freqüente-mente há vinte anos", etc,*te).

}"Rio do Vento" nos traz deVolta um poeta Gério e pesqui,sador que não podemos de jeitonenhum perder de visla.

. Num momento em que quaso¦todo o mundo deseja pertencer5 "geração de 45", num momen-tto de mistificadorns endeusa-tíos e de poetas suplnamênteartificiais e «valérvanos", An-•tOrio Pinto de Medeiros é dig-põ de maior atenção e de es*todos mais ponderados, aindaltfiie a sua obra sela pequena«a quantidade o es^eja^unaS

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Página — 10 IETRAS E ARTES Domingo, 4r-!M$52¦.wih.iiu y ¦'¦¦üiui- .,Ji'i-"Ji " )'iiUI."i|.. ¦¦

(Conoluaàn da 1.' pág.)reza prenlte de ensinamentosprecioso*. Descobre-lhe os ee-gredog e com ae lioões aprendi-úmb rivaliza na lareiu o»»auo. a.I,„ arüo iria terá o artista náoalgo a ser reproduzido, mas umexemplo natural da pits&iblh-dade de valorização dos tonsI>or justaposição e por contras-ilef. Pelo estudo dessa escalaoromaiio.1 constata que as coresopostas são complcmentarcs —verde e vermelho; mas percebetambém rjue as vizinhas — ver-do e azul — se harmonizam embelos acordes, «l^sde que sabli-mente mat tendas. E o artista

Os manuscriros de Leonardo

Valerá a pena tra-duzir?

(Conclusão da 3* página)guístico à curva verbal da pala-vra do Mestre, sempre alcançao pensamento que ele visa. Per-de-so muito, é certo, da belezaformal de Sha-espcare numatradução, boa ou má, perfeitaou Imperfeita, mas o seu pensa-mento recolhe-se sempre, valoruniversal de troca que c. Eis oque não poderemos dizer doescritor que atravé' do pensa-mento apenas visa a palavra.

Ao do escritor para quem apalavra é o único alvo. Delenão reza a história da traduçãomais que batalhas perdidas.Ci-ande, adentro das fronteirasda sua pátria c da sua língua,o autor cujo pensamento sedesfaz de encontro à penediadas palavras é como uma armade pólvora seca: ouvem o rui-do das detonações os que lheestão próximos, mas os que es-tão distantes não dão por nada.O que vai de idioma para idio-ma não é o som das palavrasde um escritor — mas o cho-q-.e das suas idéias: a bala deque as palavras são apenas ofulminante.

Paulo Eónai cita Edgard Poe.E Eigar Poe é um dos casosmais típicos do escritor de efei-toa distância. Para o inglês deformação substancialmente In-giêsa, a obra do autor tíe TheBaven é a obra de um escritorprovinciano. Este é, pelo menos.

<o ponío de vista de T. S. Eiiotquando escreve, no seu ensaioFrom Poe to Valéry: "Há umcerto travo provinciano na suaobra, se o compararmos, porexemplo, com Whitman, cm queesse travo não existe. O pro-vincianismo de Poe é o provin-ciani:;mo úc uma pessoa quese não sente em sua casa, em-bora não possa estar em qual-quer outra parte que não sejaonde, de fato, está. Poe é umaespécie de europeu deslocado.Poucos autores terão atingido a»eminências que este atingiu tãopouco carreando das suas pró-prias raízes, isolado como sem-pre viveu de tudo que o rodea-va".

Baudelaire parece não terpensado assim. Paul Valérytambém não. JE Fernando Pes-ms,, que e tra<!u*hi; igualmente.Por que? T. :S. Eliot o

"diz: "por-que é possível que os escrito-ires (estrangeiros) tenham vis-to seja o que for em Poe queos leitores de língua inglesa nãoviram'".

Nem mais nem menos: Bau-delairc, traduzindo o autor doÍPoefcic Principie, antes das suaspalavras, viu as suas idéias,por isso mesmo, traduzindo-o,incorporou tia língua francesamão propriamente uma língua-gem poética original, mas uma

/ poesia, um pensamento, umavirtualidade poética, que o seugênio interpretou através dasidéias que o próprio Poe o aja-dou a concretizar. Tentando«ma correspondência ideal emlíngua francesa para aquilo quaanão cera, no fim de contas, emlíngua inglesa, senão um movi-¦ãmsfa.i2i&$sü5£5%5& sm Semana»

ode um pensamento, Baudelaire«encontrou o que o próprio Poeprocurava: -esse seja o que for«que as palavras sujarem e sóio pensamento apreende. O tra-dutor ideal é aquele que «atarepetir ao seu espírito a para-*lioi* traçada nc espírito ão «a-tor traduzido pelas palavras<cam que este procurou ô senpróprio pensamento*

aprende a lei dos contrastes oa lei das passagens, iraportan-tes ua uuiteação temática desua obra.

Leonardo estuda a sombra ea luz nos seus antagonismos eentor.de o porque do relevo.Analisa a distribuição dessasluzes e sombras denlro de umda-o espaço c formula unia leiUn equilíbrio de valores quenáo conduz apenas à obtençãodo relevo mas ainda a criaçãoda atmosfera psicológica, a qualscr.a mais tarde tão exploradapor Rcmbrandt.

oua concepção da pintura cmrelação à natureza aproxima-se do ponto de vista de Ce-zanne, tendo-se evidentementeem conta os respectivos mo-mentos hástorieos. Cezannetambém criava a partir do mo-

deJo» mas p6ra rivalizar com anatureza, para vencê-la arran-cando-ihe os segredos íntimosc não copiando bisonhamente osaspectos csterio.es. Em ambosa pintura se torna de fato umacoisa mental, o que não excluiem absoluto a emoção, anteslhe facilita a comunicação sema qual a arte morre por carcn-cia de auditório, de eco na sen-sibiiidade alheia.

lia mais porém, em Leonar-do. Pois nele há sempre ummais.

Da observação atenta da vi-da vem-lhe a idéia de que emsua fonte tem-se o movimento.E disso que hoje nos parece umsimples truismo, após a orgiabavroca. nascem as ieis do rit-mo e o aproveitamento exí-res-sivo da linha melódica. Toda acomposição da famosa Ceia,obedece a uma linha ondulan-te, que vai de um a outro ex-tremo da mesa, com uma cur-va mais acentuada e por issomesmo menos sensual, maiscalma, na figura de Cristo. Pa-ra a qual convergem aliás to-das as linhas importantes doquadro. E se tivermos em men-te a tela celebre da Leda e ocisne, não poderemos deixar delembrar a volúpia da estiliza-ção linear, nem as combinaçõesrítmicas que decorem da repe-tiflão discreta e sábia de mo-vímentos paralelos na figuraprincipal, no cisne e nos cupl-do?.

Por outro lado, dessa prçs.en*ça permanente, do artista tlian-te da natureza surge x valori-zação da paisagem, a qnal en-tre os contemporâneos de Leo-nardo é sempre desprezada, en-caiada como um elemento sub-sldiario, tão somente, c apenasjustificável na medida m quepõe em maior evidencia a no-brerca das personagens. Leo-nardo será o primeiro a darimportância à paisagem, a ad-miti-la como gênero respeita-vel.

Tão agudo observador e tãointeligente teorista devia fa-talmente ter idéias som* a cri-:tica pictorica. Tinha-as efeti-vãmente, e em dado momentono-las comunica, estabelecendoos critérios para o julgamentoda obra de arte. Resume-seeles em três recomendações.Primeira — A observação dorelevo, isto é, a analise do cia-ro-esenro que -realça <©s objetos,lhes dá volume e peso. Segun-da _ a .observação da compo-sição, isto é» * analise do equl-librio dos valores e da divisãodo quadro em partes harmonlo-eamente entrosadas «umas nasentras. Terceira •-- A observa-ção da expressão, Isto é, a ana-lise das linhas o ritmos que dãovida às figuras. Não seriam dl*«ferentes os critérios .modernosde julgamento, com exceção daparle relativa ao claro-escurodespresíigiauv âk. a ãla malaem virtude do abandono paula-»tino do f iguraüvisnu».

Im convém, a» exegese dapensamento de on gênio, nüo*perder de vist» o condiciona,mmio Imposto pela época. Nin-ewém escapa e seu tempo, potmato ousado que osfa. E Los»nardo, em seu momento .nisto»

O artista em Leonardo naose interessa apenas pela phnu-ra, embora por eia tenha mtc».ra predileção, julgando-a a maiscomp.cta do touab as artes. Foimus.co laruxem e esouuor. Ln-tretanto encarava a musica co-mo uma arte sem eternidade,porque já se líie dissipavam oseleito* cuiiH.vo.» ao provocar *emoção estética, a qual nuncamais pouia repetir-se. Natural,mente não lhe era possível ima-[finar a üO»uvao Ua gravação emdisco, que resolveu o problemaú» reprodução permanente deum mesmo u.oniento excelenteda interpretação. Menosprezan-do a musica era induzido e esta-heleccr uma escala de valorespara os sentidos, colocando avista «o mais alto nivel. Essapreocupação da eternidade daobra de arte. da maior prolon-gação de sua vida, foi igual,mente peculiar a Cezanne, oopal queria pintar para o mu-seu.

Nos «»e.as comentários sobreas artes, Leonardo assim se ex-prime em certa ocasião na de-tesa da pintura: "mie lhe pare-ce mais essencial ao homem,seu nome ou sua imagem? Aforma não muda a não ser coma morte e o nome varia segun-do o país". A pintura será pois,para êle, a linguagem univer-sal, que sobrepujará, em seupoder de expressão a própria li-teratura.

Quanto ã escultura, ela se lheafigura a menos importante dasartes. Trata-a com pouca sim-patia, ainda que alegue ser tãohábil escultor quanto talentosopintor Ha por certo nessa opi-júão alguma influencia intclee-tuaiista, .muito compreensível emquem passou a vida em inces-santes indagações filosóficas ecientíficas. Observemos que Ce-zanne não apreciou tampouco aescultora, ao contrario dos im-pressionistas que, quase todos,se sentiram por ela atraídos.

Melancólica e solene, gentil ecspirüuai, diria Stendhal daobra de Da Vinci, com essa le-víandade que o grande roman-oísta pôs sempre em suas* diva-gações estéticas. Na realidadea obra de Leonardo é a um tem-po proijunda e requintada, massem resquícios de gentileza,sem ademanes femininos, comoquiseram ver alguns psicana-listas. -Sua concepção da bc-Ieza nada tem de anormal, e,se exceíe nas figuras graciosas,não recua tampouco ante a pin-tura cio feio, do pitoresco, domonstruoso. Sua observação,evidenciada nos desenhos e es-boços <pie deixou, é a de um ho.mem completo, atento a todasas manifestações da vida. Massen desejo de criar formas emequilíbrio perfeito, movimentosexpressivos e ritmos harmonio-sos, levou-o a só realizar natela os ,í«*nas suscetíveis de ele-var o gosto e o espírito do pu-Mico. Tor outro lado foi nmprofissional, executando enco-mendas, e sem tempo talvez pa»

v ra dar andamento a assuntos desua preferencia.

Carra de Vau-, numa brochu-Ta pouco conhecida sobre a ar-te de Leonardo, diz que o pintorestava convencido de que certascurvas geométricas possuíamnelas um segredo e um poderde beleza. Hoje, esse segredo daliixha em si já foi amplamente«analisado e seria absurdo in-sistir. .Como amplamente esto-dados foram os demais prinef-pios da composição, da cor, doclaro escuro, da expressividade.Tais segredos se encontram ago.ra em qualquer manual, estãona »oca de todos os críticos, nasaulas dos bons professores. Masninguém negai* a .£»* Vínci •mérito de ter sido o grande re-visor das teorias em voga e --»portanto -- o fandado? do sís-tema <ejoe dominaria a arte oct*dental »&§ o advento do Impres*Sionismo» até o advento conee-jnltante 4te «ma inovn civllisa.Ção. O qvse lhe escapou e o queáegprezíiE, êlo pão fi jwder»

lei ficou»io antes de a nuas» oui-tuia paver acumulado loua umaterte ue uescoucrtas e iuvençocM]que iimm modificar por comple- '

to o tooprio btiitiuo ua vida.Leonardo é, com duzentos anos

de «uncccueucia, um homem uosetuio j-V-U projetando-se sobreo bccuio auzeuove, preparando a»ua.sea inosottoas ua primoragranue revolução uidusuial e aauceuyao ua ou.gucsia. L, umcnucioi.euihiu, com a vantagem,soore vo.iairo, por exemplo, üeuma ieiibiunioaue è-ccpcional.for ifco puna melhor ao queVoitairc vciSiiioa, ombora escre-va co.o menos desenvoltura.

i'aui Vaiery em sua introdu-çao uo aieiouo ue Leonardo Davinci, afirma que "fica de umhomem aquilo fcue nos fazempgtiáai jcu .Ame e as oora> qut*íransl or.naiu esse nome em umsinal tíe aomiraçáo, pdio ou in-diferença". Se entretanto, diz,as facuidaties do indivíduo sãotão consideráveis em todos >sgêneros, sua imagem faz-se ca-da vez mais difícil de se apre-ender. Esse indivíduo tão com-plexo é Leonardo e, para PaulVaiery, o segredo .de sen gemoestá em ter achado M entre ascoisas, relações cuja continni.dade não percebjiamo3',. Tamrelações que p impeliram a pro-jetar pma espécie de súmula dosconhecimentos dos séculos XVe XVI -- pois outra coisa naosão seus manuscritos — êle asdescobriu e aplicou com maiorêxito na pintura. Daí p fato do

(nome do .artista ter superado odo cient-sta ou o do filosofo.Não nos houvesse ele deixado oaquadros que deixou e lhe perpe-tuam a memoriaJ-e'teriam fica-do seus comentários sobre a fi-sica ou a anatomia, o que jábastara para justificar as ho-nunagens que hoje lhe presta,mos como a um dos maiores ge-nios da humanidade.

Goethe, comentando um livroque se publicara em seu temposobre Leonardo Da Vinci tema oportunidade de algumas re-flexões interessantes. Assim emrelação à Ceia, observa o con-vincente movimento das mãoae a sua coordenação com as ex-pressões das personagens, o quoredunda a seu ver em uma har-tnonia perfeita. Não se atardaporém na analise dessa coor.denação nem nos revela que talqualidade provém dos ritmosentrosados na estrutura geraldo quadro, o que tem como con-seqüência a excelência da com-posição.

Goethe é, mais do que umasensibilidade tocada pela pintu-ra, uma inteligência crítica efilosófica. Apesar de superior aStendhal na apreciação das ar-tes plásticas, não vai mais lon-ge do que o gosto da época. Ba*.ta dizer que detesta o góticobárbaro e insiste quase sempreem desenvolver teorias mais ou-tienos convencionais, pois ocaráter "místico" da obra dearte — tão incensado pela cri-tica moderna — lhe escapa to-.talmente. ¦•gnfaijmto GoetheSabe ver as qualidades oue maiso preocupam na criação e naexpressão do pensamento: a or-dera, © equilibrio, a razão. Naoesqueçamos que preferia a or-dem à justiça.

Com seu espírito voltado paraa euritmia, e também* como fpróprio Leonardo, para o, ver-dade natural, teria a respeito dopintor uma frase que me parecedas mais felizes: "da proporçãopura e observada até os mons.tros mais estranhos, formadospelo ajuntamento de imagina-ções contraditórias, tudo deviaser s um tempo natural e ra-vflonal". feio nesse Jnlgamen*¦& nao» Jujuuh;umvci cvmi^^«-«So 4o talento «e -.-eonardo, majulgamento qne encontra senalicerí^e comprobatorio nas pro-prias níwtaçõca do toscano. Mque, aerso |a o assinalei, wsSmcomplexo e completo ê o graoude Leonardo. Como toomplexose completos são os verdadeiros£Kftíoa erfâãoyea m% «wa «s?«

Obra» atingem seiMvc, |ioj ai.guma de suas Qualidades. .,,poiASÓes po&terlpres. Os (,,.,»,inados talcntps menores, naocato pps seduzem mais uo ime.diato, porque exprimem o ma.u coto sensível que vivemos commaioi felicidade, estão malaperto de nos, são-nos mais ..ceu.níveis. Na SU» unilateral;ími.Ic,l/orem, não alcançam os demaismomentos sensíveis, envelheccnie morrem com aquilo que ex-priraium. Os gênios, menos pp.nrtrantes talvez pa expresfião doimediato* porque não se atem aovisível e ao acessível mas en..tram fundo no recôndito, nomcdíRto e no Universal, em to.das as épocas estão presentes anon comovem sempre pe>os a».pectos de sua obra que tornampaulatinamente de atualidade.á'squecemos então o que não nojperturba mais e apreciamos «que do mundo em au_ vivemosé por tais obras refletido, ex-presso.

E para terminar, esta opiniãocuriosa de um historiador dearte norte-americano, suspeitoaté certo ponto porque hostilao talento pictorico de Leonar.do. Observa Sheldon Cheney;'è literário, sentimental, ac^ic*mico... o mais engenhoso dile-tante da historia da arte". .mas (inda bem!) "um soberbodesenhista que renovou a com.posição e descobriu o movimen>to. a vida".

Não faltará quem assim pen«se em nossos dias, estes diasde algjima confusão entre aca-demismo e figurativismo, nestomomento de imperialismo doabstrato, nesta hora de exafe-radp esteticismo em que os va-Iores humanos e da naturezacedem o passo a uma pura me.tafísica das Unhas e das cores.

Nesta época em oue a sim-pies pesouisa, quando não oacaso amigo, se apresenta comorealização transce.dente, a na-ciente observação do artistaLeonardo Da Vinci, sua serie-dade, seu bom orgulho sem va!-dade, sua prudência, seu amor: seu respeito. à obra acabada,espantam os afoitos. Entretan-to, permanecem validos, apon-tando a toãos o caminho ver-dadeiro da criação artística, nãonas suas exterioridades ocasio-nais mas em seu espirito, emsua essência.

EEi TOSA

(Conclusão da 6.a página)centro das nossas impressõesmais decisivas. .Esta reduzidacoletividade, com seus capri-chos, seus pequenos* mistérios,é bem a miniatura da vida quacorre lá fora, com os amoresInelutáveis, os crimes. Aqui, acomentário equívoco dos corre-dores mal iluminados, dos pá*tios de recreio, o escámeo pú-«blico de um bando de meninosejidiabrados, vestindo a toga dajuizes. Deslta vida precoce*amantes furiosos e garotos ban-cando cocotes, Paulo HeckenFilho tirou-nos uma histórlajcurta, clara * provocante, sanão chega a ser deveras o re-lato da desordem sexual, cpimum até nos -infcernatos maiábem policiados, põe-nos, pelamenos, diante de um cas< per-»

4urbador: Jorge^EU, sôbEe cujailigação pesará a aventura.

O jovem escritor poil9ale«grense nao «veio a público de-fender a sua novelinha, t orna©os falara, ao .verificar .que vá^

.tílos íleitoses tomaram-rna PpjlUm depoimento íi&tinip, o i* sw4imor & .conduta &e jeus pei so*jnagejus, como independente dattlda 4o mtot-M, JusMmente a(impessoalidade da hietórj» co n^Jeriu a ^aplo Jleoker ^dhomyimmõ^òfi ideseri^va fi &&?}*gica da qual êle je aproveitoumal * ;aéushçame»te. lnternati%BOb ,ym aepecoo, ekêga # &*}porco e .escaadalQSQ, è w°>,®rmado,ao .tratamento literaridsprejasado, .qj*8 compromete «maioria dos «trabalhos do autoide Ah! Terra e Ka paz da lua,fasdêle um Uvrinho falhado^flue o Mtor prudente, retirar»¦das vistas de «ente. twuco w'i^mm: " -^

Domingo, 4-5-1952 ZKTR'A'S E rARTES Pátfna — 11

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José Lins do Rego mais uma vexna EuropaPartiu, quarta-feira ultima, para

paris, acompanhado de tua esposa, oescritor José Lins do Rego, que vattomar parte ali numa reunião i puraa qual riil convidado como delegadobrasileiro. £ esta a terceira toa cmque o romancista de "Bangüê" vai aKuropa, em menos de dois ano», de-v^ndo regressar dentro de um mes

Jr\ e melo, para partir de novo, em se-' / \ \ temuro, com detsmo a Alemanha, ou-de será lançada a tradução de &uas

f obras completas.Rui, de Sêneca Fleuiy

Aumentando a fina sórlo de Mogroziaa, acabam asEdições Melhoramentos de publicar "Rui Barbosa", doproí Ronato Soneca Fieury, proporcionando a noas»juventude uma visão fiel oo grande genlo da raça.

Nova romance de Permínio AsforaO romancista Perminio Asfora, autor de "Norta

Grande", "Fogo Verde", etc., esta ultimando novo ro-tnance, que aparecera sob o titulo de "A Bandeira", noftual retomara o tema focalizado em "Sapo", seu Uvro de.cetréia publicado em 1940.

A literatura brasileira em PortugalEm bem feita seção dedicada a literatura brasileira,

nie mantém no Jornal lisboeta "O Debate", o escritor/orge Ramos publicou, recentemente, sob o titulo "in-tercambio", artigo em que lamenta, a inexistência de um*Intenso e permanente intercâmbio cultural entre Portu-gal e Brasil, de maneira a tornar conhecidos nos doispaíses os autênticos valores literários de cada um. JorgeRamos tem sido, em Portugal, íncans&yel e prestlmoao.divulgador da literatura brasüeira, mantendo, em váriosjornais de Lisboa e do interior do pais seções exclusiva*atente dedicadas às nossas letras.

Concurso Fotográfico 'isto é o Rio dejaneiro!"

Encerra-se a 31 de maio o prazo de recebimento detrabalhos do Segundo Concurso Fotográfico promovidopelas Edições Melhoramentos. O concurso^ se destina alotograílas que mostrem aspectos de no.-sa capital. Serãodistribuídos prêmios em livros e em dinheiro, de Cr*um.oo,. í.ooo.oo e 700,00.

O centenário de Paul BourgetMais um centenário comemorado este ano: o de

Paul Bourget, o romancista francês, cuja obra depois deobter tanto êxito no começo do século ficou relegada aoeuqueclmento. Agora, no entanto, se vem fazendo na cri-tica francesa um movimento em prol da revalorização d»Bourget, e é possível que neste centenário o autor de•"Le Disciple" entre novamente em focok

A volta de Oswaldo AlvesOswaldo Alves, o vitorioso romancista de "Ura bo«

atoem dentro do mundo", segundo estamos informados,,*Etá elaborando um novo romance, que será a continua-São do primeiro. Em conversa com um amigo,. OswaldoAlves lamentou que, de certo modo, houvesse malbarata-do um assunto excelente no seu romance de estréia,acrescentando: "Que não faria hoje com aquele; mate-liai?" Assim, parece que no próximo ano teremos a voltadesse escritor mineiro.

Euclides da Cunha em LorenaVários cultores da memória de Ku-

clides da Cunha, à frente dos quaisse encontra o dr. Gama Rodrigues,ur*i..;ndem organizar, na cidade deLorena. um Museu Euclideano, à fei-çl» d» que existe cm São José do Riopardo. Como se> sabe, o autor dos•"Sertões" trabalhou multo tempo emLorena, como engenheiro de ObrasPúblicas do Estado de São Paulo, ten-do ali decorrido uma das etapas maisimportantes da sua existência. Trata-se de uma idéia, portanto, digna deapoio e louvor.

VITORiNQ NEMESIO FICARÁ'DOIS MESES NO BRASIL

ITORINO Nemesio, umauma ãas figuras ãe maiorâestaque ãa Missão Cul-

fiural Portuguesa, que há poucomos visitou, não regressou com$eus companheiros pelo "Vera-Cruz"; ficou no Brasil, onãe ãe-vera permanecer cerca ãe ãoismeses, ãanão \m curso sôorepoética portuguesa, na Facul-dade ãe Filosofia e Letras, Cur-)so esse que se realizará toãasIas quartas feiras, às 18 horas,Wambém foi Vitorino Nemesioeonviãaão pelo governador Jo-té Américo para visitar a Pa-paiba e Jazer ali conferências*

m.p Sufi

A Exposição de Artistas BrasileirosRealizou-se no dia 33 de abril a inauguração da Ex-

poalçfto de Artistas Brasileiros, promovida pelo Musvixdo Arte Moderna, do Rio de Janeiro. Foi um grande acon-tecimento artístico que despertou o maior interesse da-das mais diversas tendências de vanguarda ali represen-tadas. O ato inaugural teve a presença do ministro d»Educação, altaa autoridades, figuras do destaque no muu-do das artes e das letras. Ver em outra pagina deste ]or-nal a reportagem de Mário Barata sobre a Exposição.

Ainda sem solução o caso da biblioteca deYan de Almeida Prado

Ainda nao teve solução o caso da biblioteca do sr.Yan. de. Almeida Prado, doada á Preíeitura de 8áo Pau-lo mediante certas cláusulas imposta» pelo doador. £ queo legislativo . municipal impugna algumas deisas cláusu-Aas e assim a questão so vai arrastando Indefinidamente

Uma exposição sobre Alvares de AzevedoInaugurou-se no dia 25 de abril, no sacuão da Bi-

blioteca Nacional, uma exposição comemorativa do cen-tenário de Alvares de Azevedo, organizada pelo diretordaquele estabelecimento, o escritor Eugênio Gomes. Essamostra constitui um documentário precioso cobre a vld%e a obra do poeta, que ai aparece estreitamento vlncu-lada ao romantismo europeu. A disposição metódica dostextos, das gravuras, dos manuscritos e outros elemen-tos permite ao público acompannar nas diversas etapasesia existência que foi tão cheia quanto curta.

'Teoria Geral do Serviço Público"Do escritor Celso Brant, diretor da bem feita revista

cultural mineira "Acalaca", acaba de aparteer, em ediçãode belo aspecto gráfico, o livro "Teoria Geral do ServiçoPúblico", trabalho de grande penetração com base noDireito Administrativo, que oferece esplêndida contribui-ção aos nossos estudiosos de assuntos administra ti voa.

"A miniatura desaparecida"As Edições Melhoramentos revelaram, ao nosso pü-

lllco, Erich Kaestner, através de "Três homens na neve*e "As duas Lolotas". Dele, agora, aparece "A mlnlatu-ra desaparecida", vol. 1 da serie "Novelas de mistério'*daquela editora.

Suplemento literário do "Jornal do Povo"Voltou à circular o excelente Suplemento Literário

do "Jornal do Povo", editado em Ponte Nova, no inte-rior mineiro. A esplêndida publicação, que obedeço à es-clarecida direção dos intelectuais A. Brant Ribeiro, MárioOlímaco, OlegárlQ Lopes e Nelson Alves, divulga no pre-sente número, entre outras, colaborações de Eugênio Go-mes, João Accloii, Edgard de Vasconcelos, A. Brant RI-beiro, Gonçalves da Costa, José Grossi, Afíonso D?Avlía,Mário Clímaco, Lacerda Cortes, Olegario Lopes e Prau-»cisco Cabral.

O último número de "Kriterion"

MereGe especial menção o esforço dos que vêm man-tendo a excelente revista cultural "Knterion", como ór-gão da Faculdade de Filosofia da Universidade de MinasGerais. Ainda agora os números 15 e 16, reunidos numsó volume, com beia apresentação gráfica, denotam o ca-rinho e a inteligência quo presiüe a escolha do material.Estudos sérios e de primeira ordem tornam a leitura dosreferidos números substanciosa* e fecunda. Destacare-mos, por exemplo, entre outros, os trabaliros de ArthurVesiani Veloso, Eduardo Friciro, Aires da Mata MachadoFilho.

Pequenas notíciasDepois de um mês de férias nesta capital, regressou

a Paris o sr. Roberto Assunção, primeiro secretário daEmbaixada Brasileira, na França.

XXXPaulo Ronai trabalha empenhadamente na sua tese

para o concurso de francês em que pretende inscrever-se no Colégio Pedro II.

XXXA "Gazeta", de São Paulo, acaba de lançar a Idéia

da trasladação dos restos mortais de Alvares de Azevedopara a capital paulista, dirigindo-se nesse sentido aoCentro Acadêmico "Onze de Agosto" para que promovaa iniciativa.

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Sartre vai mudar-se de Saint-Germain-des-Prés

A titulo de 1.° de poril íol Uivul-gadu, há pouco, entre nos, n novvcla

.iiau da morte de Jcuu Paul Çártre.ja uma "blague"; o autor dé "Lijlable et le bou Dlcu'' , .*iivu mUíUom de saúde, cm P&sU.- O que <.rdade, no entanto, ô que 6lé cogita

.ie mudar-se do 6ttJnr-Gérmain-aes>.es, ufco sabendo aiucia st* Ira pau¦k^wií>

jr l .ontmartre ou Montparnosse. A no-Vh /¦*,'x' cla não deixa de alarmar <>s <vxIj«

¦—jgj£ I nciuiistas freqüentadores do Calode Flore, que iicarao privados újpresença freqüente do mestre.

"Sentimentos da Fé e do Império"O sr. Arllndo Veiga dos tSantos áútOí de vftrlce Jl^

vroo sõbie asaumos patrianovlstas, publicou réeentemen-te o trabalho "Sentimentos du Fé e do tatpârjp'*; O \\>-lume faz parte da Coleção Pátrla-Nova e íol lançado unImperial cidade de São Paulo de Pjrttifcfciif*,

Dois processos judiciários entre éscrttórèsDois processos literários ocupam atur.tr.u.-t!i;c a »wn-

ç&o da imprensa parisiense: um, o que o- r.QmancíBUi pa-rlslense Sidney Stewart acaba do inovei eóutra o edito»francês do seu romence "Seul demain oonpte", per a;.u-sa de cortes ieltos no livro; outro, contra Renê-JeanCiot, pelo pintor Nelllot, que o acusa de cer dado ò nomeNellloi; a um dos personagens do roi*iíiaca "Poii de Iabete". "Crivello" de março

Já se encontra em nosso país o numero 3, Ano IVcorrespondente s março deste ano, da excelente royistáitaliana de arte e literatura "Crivcüo', que ce edita ém,Nápoles sob a direção de Maria Tertüa Crlstòíano. Opresente número publica, entre outros, colaborações fiáGaiibaldi Alessandi-inl, Ullsse Prota-Giurlib J. PasqulerjMaria Teresa Cristofano, Mino Veccia, Iituiatu Muinarnè,Aurora dei Mônaco, Guldo Cimino, Angela Mar-tial, Ar-mando Castello, etc..

Biografia de Rui iSaibosaO sr. 8Uo Gonçalves acaba de pui;ii<:ur, em lacça-

mento dos Irmãos Pongetti Editcrea. a sffúnda ed««;tiOde seu livro "A Águia do Haia", Intèrsassáaitíjt biograííAde Ruy Barbosa.Homenagem do "Jornal de Letras" a Mâuri^

cio RosemLítwwíDias antes de partir paia Porto AJe^rô, onde vai real-

dit em alto cargo administrativo na LÍvíaria de GiObo,Maurício Rosemblatt foi homenageado com um Jantar,promovido pelo "Jornal de Letras", no Bar Recreio. Nessareunião cordialísslma, que teve o çQrnparccimeatO cie ai-guns dos emlgoa mais intimos de Muujucíg Rosemblatt,teve êle, mais uma vez, a. ocasião de comprovai o çu;~cuio de estima quei deixa no Rio de Janeiro.

Guerreiro Ramos, na "Amsrkan

Sociological Socicíy>aPor proposta do sociólogo austríaco J. L« Moreno, o

sr. Guerreiro Ramos passou a integrar, como "octlyemember", a "American Sociological Suciéty''; ho gêneroa instituição de maior responsabilidade profissional aosEstados Unidos.

loão Conde partiu porá a EuropaJoão CanUé, um dos diretores do

jornal de Letras", partiu para Por-,ugai no tran atiauuco "Vera Cruz''»;Omo cohvidauo da eu:presa uo n-i-vío. De Portugal, Ccnue deverá vi-àt-,ar a França, a Suíça t, outioj pa::,'.'í;.^proveltanüo tssa pennánetíçià naiuropa para trabaiiiar íjeia expsinsáí»Ji do "Jornal de Letvns". que )n con-,& em vários países, e pr:ucinnlmentePortugal, numerosos ieiteres. Nâoperderá também a oportunidade pára•jiiriqutcer os seus arquivos, tendpprometido, ao partir, fazer um "ílasli"do Ralazar

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V'cadernos mmi

'tfVROS B CORRESPONDÊNCIA

' Toda correspondência destinada*b "Letras o Artes" deva ser dlrl-feida a Almeida Flschea, Redação*fe A MANHÃ — Rua SacadujSpamõi s » Slft 0 Janeiro,, -*:

SUPERVIELLE E JEAN-LOÜISBARRAULT

A Juies Supervielle escreveu, a pedido dajean-Louis Barrault, um «'divertissement" emverso tirado de um capítulo de "L'enfant d©Ia haute mer" sob o título "Les suites d'unescourse" e termina um conto filosófico.UMA INTERPRETAÇÃO DE ROUSSEAUA Jean Guehenno corrige as provas do ter-ceiro e último tomo de seu "Jean-Jacques" quoaparecerá nas edições Gallimard. Essa obra %òomb^JNO sabe, uma interpretação complet-amefi*te nova do autor das "Confissões".

"NÃO SOU STALINISTA"*v H propósito das Interpretações oferecidaspeloè e^unJstas de -Lettres Prançaises» das&élas socialistas de Victor Hugo, o "PigaraLitteraire* acaba de publicar um excerto dasSeS^aB-oo autor dos -Miseráveis", sobO título "Je ne suis pas stalinienM.

PEREGRINAÇÃO AO TÚMULO DEMAX JACOB

m. Os "Amigos de Max Jacob", sociedade quetem a seu cargo o culto do escritor, morto numcampo de concentração durante a última guer-ra, realizou, há pouco, sua peregrinação tradi-cional ao túmulo do poeta em SainJ„-Benoit-sur-le-Loire.

CARTAS INÉDITAS DE PROUST9 Mme. Riefsthal acaba de entregar a JulienCain para a Biblioteca Nacional um conjuntode quarenta e uma cartas autografas üi MareeiProust, que lne foram dirigidas entre 1899 e1908. Prima de Reynaldo Hahn, Mme. Riefsthalencontrou, pela primeira vez, Mareei Proust nacasa da mãe do famoso musicista. QuandoProust empreendeu a tarefa de tradurt Reskinrecorreu à colaboração de Mme. Riefsthal.

AIS dois números dos"Cadernos Cultura", queJosé Simeão Leal vem Un-

çando com uma extraordináriapontualidade em edições doServiço de Documentação doMinistério da Educação. Intl-tulam-se eles: "Forma e Ex-pressão do Soneto", sendo esieuma antologia precedida ãe in-trodução por Paulo MendesCampos, e "José de Alencar",conferência pronunciada porGilberto Freire, no ano passa-do, no auditório do Ministérioda. Educação.

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Em terceira tiragem, aprèsen-tam as Edições Melhora meu Losa obra de Hermine Weise Top-ker, "A língua portuguesa paraestrangeiros", com vocabula-rio nosso, alemão, inglês, fran-cês e italiano. O método adotado é dos mais interessantes,po?s trp.mm:'? várias noções re-íerentes ao BrasiL .

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iLetras eArtesDOMINCO, 4 DE MAIO DE 1952

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Ilustrarão de SANTA ROSA

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NO CAIS BATIDO DE VENTOSOS BÊBADOS CAMBALEARAM' -NAS RUAS MORTAS, OS BÊBADOSENTRE SOMBRAS SE PERDERAM

TATEANTES, CANSADOS, TRÔPEGOSDAS ANGÚSTIAS QUE BEBERAMOS BÊBADOS, CAMBALEANDO, 'PELAS ESTRADAS ERRARAM.

DEPOIS, CAÍDOS NAS POÇASNOS VALADOS, NAS SARGETASFUNDAMENTE ADORMECERAM.

0 MUNDO FICOU DISTANTEAS ESTRELAS SE APAGARAM .E ELES NADA MAIS SOFRERAM ... V

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TA S S O D A SILV E I R A

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