estratégias de ensino de língua inglesa e …...satyro, diego. estratégias de ensino de língua...

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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP Diego Satyro Estratégias de ensino de Língua Inglesa e afetividade na EJA: olhares múltiplos Mestrado em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem São Paulo 2018

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Page 1: Estratégias de ensino de Língua Inglesa e …...SATYRO, Diego. Estratégias de ensino de língua inglesa e afetividade na EJA: olhares múltiplos. 2018. 286 f.Dissertação (Mestrado

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

PUC-SP

Diego Satyro

Estratégias de ensino de Língua Inglesa e

afetividade na EJA: olhares múltiplos

Mestrado em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem

São Paulo

2018

Page 2: Estratégias de ensino de Língua Inglesa e …...SATYRO, Diego. Estratégias de ensino de língua inglesa e afetividade na EJA: olhares múltiplos. 2018. 286 f.Dissertação (Mestrado

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

PUC-SP

Diego Satyro

Estratégias de ensino de Língua Inglesa e

afetividade na EJA: olhares múltiplos

Mestrado em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem

São Paulo

2018

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como

exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em

Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem,, sob a

orientação da Profa. Dra. Maria Antonieta Alba Celani.

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Banca Examinadora

__________________________________________________

__________________________________________________

__________________________________________________

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Autorizo a divulgação do texto completo em bases de dados

especializadas e a reprodução total ou parcial, por processos

fotocopiadores, exclusivamente para fins acadêmicos ou científicos,

desde que citada a fonte.

Assinatura: __________________________________________________

Local: São Paulo (SP)

Data: 03/12/2018

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Este trabalho é dedicado aos professores e aos alunos da Educação de Jovens

e Adultos.

Page 6: Estratégias de ensino de Língua Inglesa e …...SATYRO, Diego. Estratégias de ensino de língua inglesa e afetividade na EJA: olhares múltiplos. 2018. 286 f.Dissertação (Mestrado

Agradeço ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e

Tecnológico (CNPq) pela concessão de bolsa para a realização desta pesquisa

de Mestrado.

Page 7: Estratégias de ensino de Língua Inglesa e …...SATYRO, Diego. Estratégias de ensino de língua inglesa e afetividade na EJA: olhares múltiplos. 2018. 286 f.Dissertação (Mestrado

AGRADECIMENTOS

Agradeço à professora Dra. Maria Antonieta Alba Celani pela coragem

em ter me aceitado como seu orientando. De um nome lido na faculdade e já

admirado, ela passou a ser um exemplo de perseverança, de perspicácia e de

paciência com as minhas constantes reconsiderações.

Agradeço às professoras do LAEL (Profas. Dras. Angela Lessa, Beth

Brait, Fernanda Liberali, Mara Zanotto, Maria Cecília Camargo Guimarães e

Sumiko Ikeda) com quem tive o prazer de aprender junto. Certamente, esta

dissertação tem o olhar de cada uma de vocês.

Agradeço às professoras Dras. Maximina Maria Freire e Karin Claudia

Nin Brauer pelas contribuições essenciais a esta pesquisa. Com vocês, meu

olhar tornou-se mais complexo.

Agradeço aos professores do programa de Estudos Pós-Graduados em

Educação: Currículo desta universidade por terem me acolhido em suas aulas.

Os olhares de vocês – professoras doutoras Ana Saul e Marina Feldmann –

estão, também, impressos nas páginas deste texto.

Agradeço à Maria Lúcia, “nossa mãe, no LAEL”, pela escuta e pelo

carinho durante esses dois últimos anos.

Agradeço aos colegas “dos encontros quinzenais às segundas-feiras”.

Ariane, Cida, Mara, Márcio, Maurício, Neiva e Stela: vocês não só partilharam

seus saberes comigo, mas me impulsionaram nesta jornada. Os olhares de

vocês estão aqui.

Agradeço às Profas. Dras. Laurinda Almeida e Regina Prandini pelas

conversas que tivemos. Sem o apoio de vocês, eu teria ficado mais intimidado

em trazer a psicogenética walloniana para esta pesquisa.

Agradeço ao Prof. Dr. Sérgio Leite pelos caminhos sugeridos pela trilha

do monismo nesta pesquisa e em sala de aula.

Agradeço aos Profs. Doutores Telma Garcia e Vilson Leffa pelo incentivo

e pelos livros. A melhor parte de cada presente foi o envelope onde pude ler os

nomes de vocês. Espero, futuramente, retribuir a generosidade que recebi.

Agradeço às professoras, pesquisadoras e defensoras da Educação de

Jovens e Adultos em São Bernardo do Campo: Izaura Martins e Nívia Zanardo.

As palavras de apoio que recebi de vocês foram um importante combustível.

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Agradeço aos professores-participantes desta pesquisa. Sem vocês,

esta dissertação não teria sido escrita.

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O seu olhar

Arnaldo Antunes; Paulo Tatit

“O seu olhar lá fora.

O seu olhar no céu.

O seu olhar demora.

O seu olhar no meu.

O seu olhar, seu olhar melhora,

Melhora o meu.”

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SATYRO, Diego. Estratégias de ensino de língua inglesa e afetividade na EJA: olhares múltiplos. 2018. 286 f. Dissertação (Mestrado em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

RESUMO

Este estudo é sobre as estratégias de ensino de Língua Inglesa (como língua estrangeira) e suas relações com a afetividade em classes da Educação de Jovens e Adultos (EJA). Os objetivos desta investigação são identificar e interpretar as estratégias de ensino usadas pelos participantes e explicar o papel da afetividade nesse processo. A revisão bibliográfica inclui estudos sobre a história da EJA, o perfil dos estudantes, o status da língua inglesa como disciplina em escolas públicas, a condição pós-método, a relação entre afetividade e cognição, o monismo espinosista, a pedagogia freiriana, a psicogenética walloniana e a formação de professores de língua estrangeira para e na EJA. O contexto da pesquisa são duas escolas municipais noturnas localizadas em regiões periféricas de São Bernardo do Campo, São Paulo. A pesquisa envolve três professores-participantes, além do pesquisador. A metodologia de pesquisa é qualitativa e interpretativista, na forma de estudo de caso coletivo. Em 2016, os instrumentos para a geração de dados foram: questionário para conhecer o perfil dos participantes; observações e filmagens de aulas; entrevistas; questionário para conhecer as estratégias de ensino que, em geral, eram usadas; planos de aula; conversas informais; mensagens por aplicativo. Alguns achados da pesquisa são: a escolha de estratégias de ensino depende de fatores como as experiências prévias dos professores, os materiais de ensino, o currículo da escola e a formação inicial e contínua (em serviço). Além disso, os professores que constroem vínculos afetivos positivos com os alunos da EJA têm mais sucesso em engajá-los em tarefas que envolvam a língua inglesa. No entanto, a compreensão da afetividade como parte fundamental da agência docente não é clara a todos os participantes. Palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos. Ensino de língua inglesa. Estratégias de ensino. Afetividade.

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SATYRO, Diego. Strategies for English language teaching, emotions and feelings in the field of Adult and Youth Education: multiple perspectives. 2018. 286 f. Master’s thesis (Master degree in Applied Linguistics and Language Studies) – São Paulo Catholic University.

ABSTRACT This study is about the strategies for English (as a foreign language) teaching and the expressions of emotions and feelings in the field of Adult and Youth Education (equivalent to EJA, in Brazil). The research purposes are to identify and to interpret the strategies for English teaching used by the participants and to explain the role of emotions and feelings in this process. The literature review is organized into studies on the history of Adult and Youth Education in Brazil, on the profile of students who enroll in these courses, on the status of English as a subject in Brazilian public schools, on the post-method condition, on the interdependence between emotion and cognition, on the Spinozistic monism, on the Freirean approach, on the Henri Wallon’s developmental psychology and on teacher education to and in the field of Adult and Youth Education. The setting is two state junior high schools with adult and youth classes in the evening. The schools are near slums of São Bernardo do Campo, São Paulo. This study includes three teachers, besides the researcher. The research method is the qualitative interpretative research, particularly the collective case study. In 2016, to gather the data, I designed pre and post-questionnaires, carried out individual interviews, observed and recorded classes, obtained the teachers’ lesson plans, had informal conversations with them, and communicated through text messages. The data analysis show that the participants’ previous experiences, the language-teaching supplementary materials, the school approach to curriculum design and the pre-service and in-service teacher education play crucial roles in the choice of strategies for teaching English. Furthermore, teachers who create emotional bonds with their students are more successful in engaging them in English language-learning tasks. However, the understanding of emotions and feelings as a substantial part of the teacher’s agency is not clear to every participant. Key-words: Adult and Youth Education. Strategies for English language teaching. Emotions.

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LISTA DE FOTOS

Foto 1 - Objetivo de aprendizagem da turma 8º C, na Escola Anísio Teixeira 156

Foto 2 - Objetivo de aprendizagem da turma 8º A, na Escola Anísio Teixeira 157

Foto 3 - Flash card usado pela professora Eliane ..........................................161

Foto 4 - Flash card usado pela professora Giovanna .....................................175

Foto 5 - Flash cards com imagens de alimentos e de bebidas .......................175

Foto 6 - Mapa do bairro da Escola Darcy Ribeiro, com instalações indicadas em

língua inglesa .................................................................................................188

Foto 7 - Exercício de tradução, na turma 7º B da Escola Anísio Teixeira .......195

Foto 8 - Parte do handout usado pelas turmas 7º A e 7º B da Escola Anísio

Teixeira ..........................................................................................................195

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Levantamento de microestratégias assinaladas por cada professor-

participante da pesquisa ................................................................................210

Gráfico 2 - Levantamento de macroestratégias assinaladas pelos três

professores-participantes da pesquisa ...........................................................211

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Instrumentos de geração de dados em relação a cada professor-

participante da pesquisa ................................................................................135

Quadro 2 - Descrição dos contextos das aulas filmadas ................................140

Quadro 3 - Descrição dos contextos das entrevistas......................................143

Quadro 4 - Relação entre instrumentos de geração de dados e tipo de

informação gerada .........................................................................................145

Quadro 5 - Relação entre os objetivos específicos da pesquisa e as asserções

que orientam a análise dos dados..................................................................147

Quadro 6 - Resumo da metodologia de pesquisa, organizado por etapas e por

aspectos metodológicos .................................................................................152

Quadro 7 - Inventário das microestratégias de ensino observadas em sala de

aula ................................................................................................................208

Quadro 8 - Síntese de dados cruzados dos casos dos professores Eliane,

Giovanna e Valter ..........................................................................................235

Quadro 9 - Relação entre as perguntas, os objetivos e os achados da pesquisa

.......................................................................................................................237

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Quantidade de alunos da EJA e de profissionais da gestão escolar

da Escola Anísio Teixeira ...............................................................................127

Tabela 2 - Quantidade de alunos da EJA e de profissionais da gestão escolar

da Escola Darcy Ribeiro .................................................................................128

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas

ACTFL Conselho Americano de Línguas Estrangeiras

BNCC Base Nacional Curricular Comum

COCA Corpus of Contemporary American English

CONFITEA Conferência Internacional de Educação de Jovens e

Adultos

EJA Educação de Jovens e Adultos

EMEB Escola Municipal de Educação Básica

EMEP Escola Municipal de Ensino Profissionalizante

EPT Educação Para Todos

FUNDEB Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação

Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação

FUNDEF Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do

Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério

HTPC Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais

Anísio Teixeira

LA Linguística Aplicada

LAEL Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem

LDB Lei de Diretrizes e Bases

LE Língua Estrangeira

LEM Língua Estrangeira Moderna

L2 Segunda língua

MEC Ministério da Educação

MOBRAL Movimento Brasileiro de Alfabetização

MOVA Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos

ONU Organização das Nações Unidas

PAC Programa de Alfabetização e Cidadania

PAMJA Programa de Alfabetização Municipal de Jovens e Adultos

PCN Parâmetros Curriculares Nacionais

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PEJA Programa de Educação de Jovens e Adultos

SME Secretaria Municipal de Educação

UFF Universidade Federal Fluminense

UFMG Universidade Federal de Minas Gerais

UMEP Universidade Metodista de São Paulo

ZDP Zona de Desenvolvimento Proximal

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Sumário

INTRODUÇÃO ................................................................................................ 20

1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ................................................................... 31

1.1 Olhares para e sobre a EJA ................................................................ 31

1.1.1 Olhares sobre a história da EJA no Brasil ................................................ 32

1.1.2.1 Olhares sobre a história da EJA em São Bernardo do Campo .............. 42

1.1.1.1 Olhares sobre as Diretrizes Curriculares da EJA da rede

municipal de São Bernardo do Campo ................................................. 44

1.1.3 Olhares para os alunos da EJA ................................................................ 51

1.1.4 Olhares sobre o status da língua inglesa na escola pública ..................... 54

1.1.4.1 Olhares sobre o ensino da língua inglesa no contexto da EJA . 56

1.2 Olhares sobre a condição pós-método no ensino de língua inglesa59

1.2.1 Olhares sobre a condição pós-método no contexto da EJA ..................... 65

1.2.2 Olhares para as macroestratégias de ensino de língua estrangeira ......... 67

1.2.2.1 Macroestratégia 1: Maximizar as oportunidades de aprendizagem

............................................................................................................. 69

1.2.2.2 Macroestratégia 2: Minimizar desencontros perceptuais ......... 70

1.2.2.3 Macroestratégia 3: Facilitar a interação negociada ................... 71

1.2.2.4 Macroestratégia 4: Promover a autonomia do aluno ................. 72

1.2.2.5 Macroestratégia 5: Estimular a conscientização linguística....... 73

1.2.2.6 Macroestratégia 6: Ativar a intuição heurística .......................... 73

1.2.2.7 Macroestratégia 7: Contextualizar input linguístico ................... 74

1.2.2.8 Macroestratégia 8: Integrar as habilidades linguísticas ............. 75

1.2.2.9 Macroestratégia 9: Garantir a relevância social ........................ 76

1.2.2.10 Macroestratégia 10: Aumentar a consciência cultural ............. 78

1.3 Olhares sobre a Afetividade ............................................................... 78

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1.3.1 Alguns olhares da Linguística Aplicada para a afetividade ....................... 79

1.3.2 Olhares de Baruque de Espinosa sobre a afetividade e a concepção

monista de conhecimento e de ser humano ......................................................... 83

1.3.3 Olhares de Paulo Freire sobre a afetividade ............................................ 88

1.3.4 Olhares de Henri Wallon sobre a afetividade ........................................... 92

1.3.5 Olhares afetivos e convergentes ............................................................ 103

1.4 Olhares no sentido da formação de professores de língua inglesa

para e na EJA ............................................................................................105

2 METODOLOGIA DE PESQUISA ................................................................116

2.1 Pesquisa qualitativa e interpretativista .............................................116

2.1.1 O método estudo de caso ...................................................................... 117

2.1.2 O caso ................................................................................................... 121

2.2 Contexto da pesquisa ........................................................................122

2.2.1 As escolas .............................................................................................. 126

2.2.1.1 Escola Anísio Teixeira .............................................................127

2.2.1.2 Escola Darcy Ribeiro ...............................................................127

2.2.1.3 Aspectos estruturais, materiais e equipamentos oferecidos pelas

duas unidades escolares .....................................................................128

2.2.2 Os participantes ..................................................................................... 129

2.2.2.1 Professora Eliane ....................................................................130

2.2.2.2 Professora Giovanna ...............................................................131

2.2.2.3 Professor Valter .......................................................................132

2.2.3 O pesquisador ........................................................................................ 133

2.3 Instrumentos de geração de dados ...................................................135

2.3.1 Questionários ......................................................................................... 136

2.3.2 Observação e filmagem das aulas ......................................................... 139

2.3.3 Entrevistas ............................................................................................. 141

2.3.4 Artefatos culturais .................................................................................. 144

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2.4 Procedimentos de análise dos dados ...............................................146

2.4.1 Foco nas estratégias de ensino .............................................................. 147

2.4.2 Foco na afetividade ................................................................................ 148

2.5 Vantagens e dificuldades desta pesquisa ........................................149

3 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS DADOS ......................................154

3.1 As estratégias de ensino de língua inglesa no chão da sala de aula

...................................................................................................................155

3.1.1 O caso das estratégias de ensino da professora Eliane ......................... 155

3.1.1.1 Microestratégia informar os alunos sobre o objetivo de

aprendizagem da aula .........................................................................156

3.1.1.2 Microestratégia solicitar aos alunos que criem frases a partir de

flash cards com imagens .....................................................................159

3.1.1.3 Microestratégia criar momentos em que um aluno fala “em cima

da fala” de outro aluno .........................................................................168

3.1.2 O caso das estratégias de ensino da professora Giovanna .................... 172

3.1.2.1 Microestratégia construir glossários (inglês-português) com a

ajuda de flash cards ............................................................................172

3.1.2.2 Microestratégia solicitar aos alunos que relacionem palavras em

língua inglesa com imagens, contextos de uso ou palavras traduzidas

para a língua portuguesa .....................................................................178

3.1.2.3 Microestratégia conectar o ensino da língua inglesa à concepção

de educação da escola e da Secretaria de Educação em que alunos e

professores estão inseridos .................................................................182

3.1.3 O caso das estratégias de ensino do professor Valter ........................... 189

3.2 As estratégias de ensino nas vozes dos professores .....................208

3.3 Afetividade na sala de aula ................................................................213

3.3.1 Os pequenos nadas ............................................................................... 213

3.3.2 A relação professor-alunos .................................................................... 217

3.3.3 Incertezas: a afetividade é um conceito em construção ......................... 224

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3.4 Afetividade, estratégias de ensino e aprendizagem na EJA: um

encontro possível .....................................................................................234

INCONCLUSÕES ..........................................................................................240

REFERÊNCIAS .............................................................................................245

APÊNDICE A – Questionário para conhecer o perfil dos professores-

participantes .................................................................................................260

APÊNDICE B – Questionário para o levantamento de estratégias de ensino

usadas pelos professores-participantes ....................................................272

APÊNDICE C – Termo de consentimento livre e esclarecido ...................282

ANEXO A – Handout usado pelo professor Valter .....................................284

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20

INTRODUÇÃO

Mas, na Educação de Jovens e Adultos (EJA), tem a disciplina Língua

Inglesa? O que se ensina de inglês na EJA? Pra que ensinar inglês na EJA, se

os alunos mal falam português? Essas perguntas já nos foram feitas, algumas

vezes, em diferentes contextos. Aliás, em alguns casos, os interlocutores eram,

também, professores dessa modalidade de ensino.

Talvez, em comum a essas questões, haja a ideia implícita de que a

língua inglesa não traga nenhum benefício a jovens e a adultos populares1.

Outro sentido oculto a essas falas é, possivelmente, a ideia de que aprender

uma língua estrangeira seja algo válido, se for para certo estrato social – o que

não inclui as pessoas que frequentam as escolas noturnas (e, normalmente,

periféricas), onde há cursos de EJA.

Dentro desse cenário, delimitamos o tema desta dissertação: o ensino

de língua inglesa, como língua estrangeira, na EJA, em escolas públicas.

Porque se trata de um universo de pesquisa muito amplo, buscamos um

problema que nos ajudasse a olhar para a prática em sala de aula. Assim,

chegamos à teoria das macroestratégias e das microestratégias de ensino

(KUMARAVADIVELU, 1994, 2003).

Além disso, baseados numa concepção monista (ESPINOSA, 2014)

sobre a natureza do conhecimento, acrescentamos ao nosso problema de

pesquisa a relação entre afetividade e cognição; particularmente, como a

afetividade surge nas aulas de língua inglesa da EJA.

Frente a essa problematização, chegamos a três perguntas norteadoras

do estudo, a saber:

1 Com base em Arroyo (2007, 2011, 2018), usaremos, neste trabalho, a expressão jovens e

adultos populares, para referirmo-nos ao público-alvo da EJA. Embora não tenhamos localizado, em nossas leituras, a definição do adjetivo popular(es) – e, frisamos, o educador espanhol escreve, ainda, sobre “juventude e vida adulta populares” (ARROYO, 2007, p. 06, grifos nossos) -, Arroyo (2007) circunscreve o uso dessa expressão, à qual aderimos. Para ele, os jovens e os adultos populares que se matriculam na EJA são pessoas cujos modos de vida são marcados pela desigualdade social. Ao tratar dessas vidas populares, o pesquisador escreve: “de onde esses jovens e adultos que frequentam a EJA estão mais próximos? Seria dos jovens e adultos das camadas médias? Ao contrário, estão cada vez mais distantes. Na pobreza, miséria, subemprego, vulnerabilidade” (ARROYO, 2007, p. 07). A partir de nossa experiência como professores da EJA, concordamos com a imagem construída pelo autor.

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21

1. Que estratégias de ensino são usadas pelos professores de língua inglesa,

no contexto da EJA, em turmas de Ensino Fundamental 2?

2. Que elementos contextuais podem interferir na escolha das estratégias de

ensino usadas pelos professores-participantes?

3. Como a afetividade pode emergir nas aulas de língua inglesa da EJA?

Por meio dessas perguntas, nosso intuito foi cumprir com o seguinte

objetivo geral: conhecer as estratégias de ensino de língua inglesa usadas na

EJA, no segundo segmento, em escolas públicas, e relacioná-las à questão da

afetividade produzida nesse ambiente específico.

Para relacionar as perguntas de pesquisa com o objetivo geral traçado,

guiamo-nos por três objetivos específicos. Neles, fizemos demarcações

temporais e espaciais, já que, de antemão, desejávamos estudar a EJA

oferecida pela rede municipal de São Bernardo do Campo, São Paulo. Dito

isso, nossos objetivos específicos passaram a ser:

1. Identificar as estratégias de ensino usadas por professores de língua inglesa,

no contexto de duas escolas municipais com cursos de EJA, em São Bernardo

do Campo.

2. Interpretar as estratégias escolhidas pelos professores-participantes,

segundo a análise do contexto de ensino-aprendizagem feita por eles.

3. Explicar as formas como a afetividade emerge nas aulas de língua inglesa

da EJA, relacionando-as às ações dos professores-participantes.

Nosso interesse pelo ensino de língua inglesa, em escolas com EJA da

rede municipal de São Bernardo do Campo, mistura-se à justificativa desta

dissertação. O pesquisador tem trabalhado nesse sistema de ensino há mais

de cinco anos. Embora não se trate de uma pesquisa-ação, este estudo é

resultado de reflexões (e principalmente) anseios vividos durante esse período.

Em 2015 e em 2016, essas ruminações foram expandidas: a Secretaria

de Educação do município passou a organizar encontros bimestrais entre os

professores de língua inglesa. A cada dois meses, então, seis a oito

educadores reuniam-se, para discutirem como era – ou como nos parecia ser –

ensinar inglês a jovens e a adultos, naquele sistema de ensino. Nossa

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22

formadora não era uma professora de língua estrangeira, mas uma orientadora

educacional responsável pela EJA. Nesses encontros formativos, fazíamos

rodas de conversa, semelhantemente aos círculos de cultura freirianos,

conforme lemos em Freire, P. (2016).

Nos círculos, entre uma conversa e outra, uma percepção -

supostamente individual -, a nosso ver, tornou-se coletiva: ensinar a língua

inglesa na EJA era um desafio! E, entre os motivos listados, havia a questão da

provável carência de pesquisas sobre esse tema. Além disso, discutíamos

como nos sentíamos isolados em nossas escolas. Normalmente, não tínhamos

outros colegas da mesma disciplina com quem pudéssemos partilhar ideias,

textos, atividades, erros e acertos.

Outra angústia que, aos poucos, deixou de ser individual e passou a ser

coletiva dizia respeito à forma como olhávamos para os alunos da EJA. Ao

trabalhar nessa modalidade2, tornamo-nos ouvintes de narrativas marcadas

pela desumanização. Aparentemente, a história oral dos sujeitos da EJA era,

muitas vezes, atravessada por abandono familiar, por uso de drogas, por

desemprego e por dificuldades de aprendizagem. Em contraste a isso,

falávamos, também, sobre a importância de não os olhar nem nos olhar pelo

prisma do coitadismo.

Assim, esta pesquisa surgiu da própria vida do pesquisador e de seus

colegas de trabalho. Se este estudo possui alguma relevância social,

reputamo-la a seus participantes. Esta dissertação tenta dar vez e voz a

educadores que, noite a noite, medeiam a língua inglesa a jovens e a adultos

cuja escolarização, em algum momento, já não deu certo. A EJA representa-

lhes, quase sempre, uma segunda chance. E, acreditamos, para que essa

chance resulte em algum sucesso, é fundamental haver um profissional em

sintonia com os problemas específicos dessa modalidade.

2 Segundo a LDB 9.496/96 (BRASIL, 1996), no artigo 21, a educação escolar compõe-se de I.

educação básica, formada pela Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio; II. educação superior. A EJA, por sua vez, é assunto dos artigos 37 e 38. Disso, decorrem os seguintes argumentos: em primeiro lugar, a EJA não é uma das etapas da educação básica; em segundo lugar, a EJA ocupa, no âmbito da legislação educacional, o lugar das modalidades de ensino (de que fazem parte, também, a Educação Especial, a Educação Profissional e Tecnológica, a Educação do Campo, a Educação Escolar Indígena, a Educação Escolar Quilombola e a Educação a Distância).

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Deste ponto em diante, vejamos um resumo de outras pesquisas sobre o

ensino de língua inglesa na EJA, com atenção especial às estratégias

didáticas. Para fazer esse estado d’arte, ainda em 2016, pesquisamos artigos,

dissertações e teses em bibliotecas virtuais, por meio das seguintes palavras-

chave: ensino, língua inglesa, estratégias, Educação de Jovens e Adultos.

Com referência às tais bibliotecas, podemos citar o Portal de Periódicos

da Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior (CAPES)3 e os

acervos online da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), da

Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Estadual de Campinas

(UNICAMP). Escolhemos essas universidades, entre outros motivos, em

função do contexto geográfico da nossa pesquisa. Essas instituições estão

localizadas na região conhecida como Grande São Paulo, o que inclui São

Bernardo do Campo.

Seguindo uma linha do tempo, comecemos por Cruz (2003). Baseado na

análise do discurso francesa, o pesquisador estudou a teleaula de língua

inglesa do Telecurso 2000. Ressalvamos que, ainda hoje (2018), as telessalas

são uma forma de organização da EJA. Para o autor, embora a proposta do

material veicule a língua inglesa como um conhecimento necessário “para todo

e qualquer indivíduo que não queira ficar à margem do mundo dito civilizado e

moderno” (CRUZ, 2003, p. 145), na prática, apenas noções básicas eram

oferecidas. Em suma, havia uma distância entre o que era prometido a alunos

trabalhadores e o que era cumprido.

Santiago (2008) estudou a construção e a aplicação de materiais

didáticos para a EJA, no segundo segmento, em língua inglesa, a partir de

documentos curriculares (BRASIL, 1998; 2002b) e de teóricos do

sociointeracionismo.

Bregeiro (2010) investigou, também, a construção e a aplicação de

materiais didáticos para a EJA (no Ensino Médio), em língua inglesa. No

entanto, em comparação ao trabalho citado no último parágrafo, adotou outro

referencial teórico: a abordagem instrumental.

Em artigo, Silva e Cardoso (2014) fizeram um levantamento das

estratégias de aprendizagem mais usadas pelos alunos com o melhor

3 Disponível em: <http://www.periodicos.capes.gov.br/>. Acesso em: 27.jul.2018.

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desempenho em língua inglesa, no contexto específico da EJA. O referencial

teórico, nesse caso, é muito parecido com o de Santiago (2008): documentos

curriculares (BRASIL, 1998, 2002b) e a teoria de aprendizagem

sociointeracionista.

Landim (2015) fez um estudo etnográfico e comparado de duas escolas

com EJA e descreveu, especialmente, as aulas de língua inglesa. O problema

de pesquisa da autora é a distinção entre as práticas de letramentos escolares,

isto é, vividos dentro da escola (em língua estrangeira), e as práticas de

letramentos sociais realizadas pelos estudantes, fora da escola. Para fazer a

análise dos dados, a pesquisadora apoiou-se no estudo dos letramentos

críticos.

Muniz (2015), em artigo, comparou os sentidos de leitura presentes em

dois documentos: um de âmbito federal (BRASIL, 1998) e outro, de foro

municipal (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2012). Neste ponto, chamamos a

atenção para a produção de um conhecimento local. Ao selecionar o corpus de

sua pesquisa, Muniz (2015), que tem sido professora da EJA da rede municipal

de São Bernardo do Campo, partiu de um referencial circunscrito à sua

realidade concreta. O achado de sua pesquisa é o seguinte: o documento

municipal, para ela, privilegia a leitura de mundo, já que é fundamentado nas

ideias de Paulo Freire. O documento federal, por outro lado, favorece a leitura

em língua inglesa como uma habilidade escolar.

A este estado d’arte, acrescentamos dois estudos, publicados como

capítulos de livro. São eles Scheyerl (2009) e Prado, Lange, Schlatter e Garcez

(2014).

O trabalho de Scheyerl (2009) é uma pesquisa teórica sobre os desafios

que o professor de língua inglesa enfrenta, diariamente, na EJA. Em sua

reflexão, a linguista aplicada escreve sobre a falta de compromisso dos alunos

e, como resultado, sobre a desmotivação dos professores. No entanto, para

enfrentar essa situação, a pesquisadora propõe um ensino focado no

humanismo (que, no nosso olhar, aproxima-se da ideia de humanização

(FREIRE, P., 2016)), inspirado no pensamento freiriano e na pedagogia crítica.

Já o texto escrito a oito mãos por Prado, Lange, Schlatter e Garcez

(2014) é um compilado de dados produzidos em duas pesquisas distintas e

anteriores. Aqui, ex-orientadores e ex-orientandos reuniram-se para comparar

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seus achados. Nos dois casos, houve pesquisas-ação em turmas de língua

inglesa, na EJA. O referencial teórico são os letramentos múltiplos.

Partindo do estado d’arte, entendemos que esta dissertação é “um elo

na cadeia da comunicação discursiva” (BAKHTIN, 2016, 35). A seguir,

dialogaremos com parte dos pesquisadores citados. E, ao estabelecermos

esse diálogo, tentaremos apresentar algo novo, já que, segundo Faraco (2009),

intérprete das ideias do Círculo de Bakhtin, todo evento linguístico – como a

escrita e a leitura deste trabalho – é, de certa forma, único e singular.

A propósito da unicidade e da singularidade deste estudo, deste ponto

em diante, lidaremos com conceitos, teorias e dados. Por isso, em

concordância com Fabrício (2006), é preciso deixar claras as regras do jogo,

isto é, os procedimentos teórico-metodológicos que inspiraram esta pesquisa.

A primeira questão, no sentido de matéria que pode suscitar dificuldades

de compreensão, é o porquê do subtítulo deste estudo (isto é, olhares

múltiplos). Para nós, esta pesquisa é fruto de um trabalho em equipe. Embora

o relatório final seja escrito por uma pessoa, não existem, aqui, ideias de um

indivíduo, apenas. Em breve, retomaremos esse ponto de vista de uma

perspectiva linguístico-discursiva. Inicialmente, queremos tornar compreensível

nossa posição axiológica em relação à escrita desta investigação.

Neste trabalho, emprestamos o significado de olhar de Oliveira, L. P.

(2002). Para essa educadora, a hegemonia do olhar

é tão evidente que muitas vezes chega a arrefecer os demais sentidos. É sobretudo pelo olhar que se constrói a cosmovisão; é pelo olhar que o sujeito ergue-se como realizador de sua própria história, como construtor de um novo mundo. E é com esse mesmo olhar que se deve atentar para os educadores [...] (OLIVEIRA, L. P., 2002, p. 217, grifos da autora).

Concordamos com a sugestão dessa pesquisadora. Acreditamos que

nosso olhar para os professores-participantes deste estudo – Eliane, Giovanna

e Valter -, tem uma enorme responsabilidade. Para não os olharmos de forma

enviesada, contamos, ao longo de dois anos (2016-2018), com os olhares de

outros pesquisadores (principalmente, aqueles orientados pela professora Dra.

Maria Antonieta Alba Celani), durante algumas aulas, congressos, seminários

ou, ainda, conversas informais. Com o intuito de imprimir, na língua, uma

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multiplicidade de olhares, elegemos a primeira pessoa do plural para a escrita

deste texto.

A segunda questão é a concepção de língua(gem) em que nos

baseamos. Em conformidade com Volóshinov (2017, p. 224), entendemos a

língua(gem) como um “processo ininterrupto de formação, realizado por meio

da interação sociodiscursiva dos falantes” (grifos do autor). Nesse sentido, a

língua(gem) está sempre presa ao contexto de enunciação e não se separa,

portanto, da história.

Ainda fundamentados em Volóshinov (2017), compreendemos a

língua(gem) como um processo social. Para o filósofo russo, “todo signo é

social por natureza e o signo interior não é menos social do que o exterior”

(VOLÓSHINOV, 2017, p. 128). Disso, decorre nossa posição sobre a

fragilidade da ideia de um olhar (e de uma escrita) individual. Nesse quadro

interpretativo, tudo que avaliamos é atravessado por fatores socioideológicos,

como nossa própria história, nossa cultura, nossos valores familiares, entre

outros aspectos.

Além disso, é importante ressaltar que, assim como Volóshinov (2017),

outros autores basilares desta pesquisa (por exemplo, Henri Wallon e Paulo

Freire) têm a mesma premissa teórica: o materialismo histórico-dialético

marxista4.

Para Galvão (1998) e Leite (2013, 2018), o pensamento de Henri Wallon

é influenciado pelas ideias do materialismo histórico-dialético, principalmente,

no que diz respeito à perspectiva desenvolvimentista desse pesquisador,

fundada na relação dialética entre indivíduo e meio, conforme veremos na

subseção 1.3.4 Olhares de Henri Wallon sobre a afetividade.

Em Freire, P. (2016), a influência dessa corrente filosófica já aparece na

obra Pedagogia do Oprimido. Essa interlocução pode ser localizada,

explicitamente, no momento em que Freire, P. (2016) argumenta que

objetividade e subjetividade não se separam. A esse respeito, escreve:

Em Marx, como em nenhum outro pensador crítico, realista, jamais se encontrará esta dicotomia [objetividade versus subjetividade]. O que

4 Para conhecer os pontos convergentes sobre a concepção de língua(gem) de Paulo Freire e

de Mikhail Bakhtin – membro do Círculo de Bakhtin, de que Valentin Volóshinov fazia parte -, remetemo-nos à obra de Zuin e Reyes (2010).

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Marx criticou, e cientificamente destruiu, não foi a subjetividade, mas o subjetivismo, o psicologismo (FREIRE, P., 2016, p. 51).

Sublinhamos, no entanto, que a influência do materialismo histórico-

dialético marxista no pensamento de Paulo Freire não é exclusiva nem

excludente. De acordo com Torres (1996, p. 118), parte da popularidade da

obra do educador pernambucano é resultado da confluência de diferentes

correntes filosóficas, como “o existencialismo, a fenomenologia, a dialética

hegeliana e o materialismo histórico”5.

Retomando a questão da língua(gem), é preciso fazer outra observação:

o uso de língua estrangeira, no lugar de língua adicional6. No nosso olhar e no

olhar dos professores-participantes, nas classes com EJA, no início de cada

semestre, é comum que alguns estudantes vejam a língua inglesa como algo

estranho, insólito à realidade deles. Do ponto de vista etimológico, de acordo

com Cunha (2010, p. 272), o adjetivo “estrangeiro” vem do latim “extraneus”,

cujo significado é, exatamente, “estranho(a)”. Por conta dessas questões

contextuais e linguísticas, preferimos a forma língua estrangeira (deste ponto

em diante, LE).

A terceira questão teórico-metodológica é por que este trabalho pertence

ao campo da Linguística Aplicada (doravante, LA). Preliminarmente, baseados

em Allwright (2006) e em Moita Lopes (2006), entendemos a LA como uma

ciência interessada em criar inteligibilidades para problemas em que a

linguagem é central. Nesse sentido, o papel do linguista aplicado é produzir

entendimentos, sem, necessariamente, propor soluções. Para os linguistas

aplicados em que nos apoiamos, a busca pela solução pode apagar as marcas

5 Ainda com relação à influência do materialismo histórico-dialético na obra de Paulo Freire,

citamos o trabalho de Caron (2016). Para esse pesquisador, a importância do ideário marxista no pensamento freiriano constitui um “debate inconcluso” (CARON, 2016, p. 254). Em resumo, Caron (2016) defende a ideia de que o método de pesquisa usado por Paulo Freire dá um olhar existencialista/fenomenológico às “estruturas das sociedades de classe apontadas por Marx”. Em contraste a isso, respeitados os contextos históricos de cada pensador, Caron (2016) compreende que há diferenças conceituais entre a pedagogia freiriana e aquela sugerida pelo filósofo alemão. 6 De acordo com Leffa e Irala (2014), a forma língua estrangeira é inadequada ao contexto de

ensino-aprendizagem brasileiro. De acordo com esses linguistas aplicados, até mesmo no ensino básico, é comum haver alunos com histórias de imigração. Para esses estudantes, a língua inglesa, por exemplo, pode já ter sido ensinada/aprendida em seus países de origem. Assim, Leffa e Irala (2014) sugerem a forma língua adicional, que, segundo eles, não aponta para um número ou para uma ordem de aquisição ou de aprendizagem (como sugerem, implicitamente, as expressões segunda língua ou terceira língua) nem para uma particularidade geográfica.

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da complexidade daquilo que, de fato, acontece. Por isso, é importante buscar

compreender por que, supostamente, determinados fenômenos tomam forma e

de que maneira eles são construídos e constroem a linguagem.

Nesta dissertação, embora tratemos de caminhos alternativos, nosso

enfoque é tentar reconhecer “a complexidade essencial e irredutível do

fenômeno do ensino e da aprendizagem” (ALLWRIGHT, 2006, p. 13, tradução

nossa7) da língua inglesa na EJA.

Adicionalmente, este trabalho encontra um lugar dentro dos estudos em

LA, porque é transversal, em termos de referencial interpretativo e

metodológico. Para Pennycook (2006), as pesquisas em LA não justapõem

saberes elaborados em diferentes campos do conhecimento, mas rompem com

as fronteiras desses territórios. Nesta dissertação, baseamo-nos em pesquisas

conduzidas por linguistas aplicados, filósofos, pedagogos, psicólogos da

educação, cientistas sociais e sociolinguistas, por exemplo. Nesse movimento

de rupturas, não estabelecemos uma hierarquia, segundo a qual certos

conhecimentos valem mais do que outros. Ao contrário, todos são igualmente

válidos e necessários para o nosso processo de teorização.

Além disso, julgamos que este estudo vai ao encontro da LA de que

Fabrício (2006) trata. Para essa pesquisadora, os trabalhos nessa área têm

deslocado o foco do centro “para as organizações invisíveis, para as periferias,

para as formas de ser consideradas subalternas ou inferiores” (FABRÍCIO,

2006, p. 51). No nosso olhar, esta dissertação tenta dar visibilidade a pessoas,

a práticas, a contextos e a problemas que podem passar despercebidos. Com

base na nossa experiência e na literatura que apresentaremos, a EJA parece

ocupar o não-lugar em algumas licenciaturas, em documentos curriculares da

União e em reportagens veiculadas pela mídia mainstream8. E, dentro dessa

paisagem, talvez, haja um lugar ainda mais invisível: a sala de aula de língua

inglesa. Por isso, cremos que a LA abrange nossa pesquisa.

A quarta questão é a relação entre este estudo, a área do conhecimento

e a linha de pesquisa (Linguagem e Educação). No programa de Linguística

7 “[We need to move] towards a recognition of the essential and irreducible complexity of the

phenomenon of classroom language learning and teaching” (ALLWRIGHT, 2006, p. 13). 8 A respeito da subalternização do professor e do aluno das classes populares por meio do

discurso midiático, sugerimos a apreciação de Bohn (2013). Quanto aos discursos midiáticos em torno da EJA, recomendamos a leitura dos artigos organizados por Cavalcante e Florêncio (2013).

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Aplicada e Estudos da Linguagem (LAEL), da Pontifícia Universidade Católica

de São Paulo (PUC-SP), a linha Linguagem e Educação9 tem abordado, entre

outros, os seguintes temas: afetividade e cognição, ensino-aprendizagem de

língua estrangeira e interação em sala de aula. No nosso entendimento, tais

assuntos são fundamentais, neste trabalho, o que explica a relação a que

aludimos.

A quinta questão teórico-metodológica é, na realidade, uma ressalva.

Frente ao problema de pesquisa, à concepção de língua(gem) a que nos

afiliamos e à delimitação que fizemos dos estudos em LA, queremos deixar

claro o seguinte: para nós, a língua não serve a “etiquetagens” (FABRÍCIO,

2006, p. 60). Ao olharmos para os professores, pretendemos fugir de rótulos,

como tradicional, sociointeracionista ou pautado na abordagem instrumental.

Por isso, escolhemos, como parte do nosso referencial teórico, a condição pós-

método (PRABHU, 1990; KUMARAVADIVELU, 1994, 2003, 2008, 2012;

CANAGARAJAH, 2009a, 2009b; OLIVEIRA, L. A., 2014; LEFFA, 2016, entre

outros). Além disso, frisamos: nosso olhar não é uma chancela. Por mais que

tenhamos valorizado a pluralidade de perspectivas, o gênero discursivo em

jogo exige escolhas. No entanto, sabemos que essas escolhas não dão conta

da realidade concreta, que é sempre histórica, cultural, situada e complexa.

Por complexa, reportamo-nos ao pensamento complexo. Inspirados em

Morin (2012, 2013, 2015), entendemos que nenhuma investigação científica

pode desconsiderar o autoexame do(s) pesquisador(es). Ademais, deve ser

guiada pelo seguinte princípio: “a consciência de que os seres humanos

objetos de pesquisa não são deficientes culturais, mas dispõem também de um

saber próprio” (MORIN, 2013, p. 190, grifos nossos). Com o pensamento

complexo, aprendemos/desaprendemos/reaprendemos, ainda, a olhar para o

todo, sem negligenciar as partes; a não prever relações de causa-efeito como

se fossem lineares e inequívocas; a não deter-se nas regularidades, mas a

valorizar as irregularidades presentes em cada sistema.

Partindo dessas questões, vejamos, resumidamente, como esta

dissertação é estruturada.

9 Para saber mais sobre os estudos da linha de pesquisa Linguagem e Educação, da PUC-SP,

recomendamos o seguinte website: <http://www.pucsp.br/pos-graduacao/mestrado-e-doutorado/linguistica-aplicada-e-estudos-da-linguagem#areas-de-concentracao-e-linhas-de-pesquisa>. Acesso em: 28.jul.2018.

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Na primeira seção, apresentaremos a fundamentação teórica.

Trataremos da história da EJA, em âmbito federal e municipal; do perfil

contemporâneo dos sujeitos-alunos que se matriculam nessa modalidade de

ensino; da condição pós-método; da afetividade constituinte da relação

professor-alunos e da formação docente para e na EJA.

Na segunda seção, compartilharemos a metodologia desta pesquisa.

Abordaremos não só o percurso metodológico, mas, também, os pressupostos

teóricos ligados à pesquisa qualitativa e interpretativista e ao método estudo de

caso. Faremos, ainda, um panorama das dificuldades e das vantagens que, a

nosso ver, caracterizaram o caminho metodológico que fizemos.

Na terceira sessão, exibiremos e discutiremos os dados produzidos e

coletados em campo. Nosso intuito é que o leitor possa visualizar as aulas de

língua inglesa a que assistimos e as conversas que tivemos com os

professores-participantes. Por isso, mostraremos a interação, dentro e fora da

sala de aula.

Na última sessão deste trabalho, Inconclusões, refletiremos sobre as

perspectivas pedagógicas que identificamos, durante a pesquisa em campo, e

em que medida elas parecem dialogar com os sujeitos-alunos da EJA. Por fim,

abordaremos as mudanças que a pesquisa operou no próprio pesquisador.

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1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Nesta seção, discorreremos sobre o referencial teórico desta pesquisa.

Conforme antecipamos, na Introdução, há quatro subseções, organizadas por

núcleos temáticos, a saber: história da EJA e a presença da língua inglesa,

como componente curricular, nessa modalidade; a condição pós-método e a

teoria das macroestratégias e das microestratégias; a afetividade numa

perspectiva desenvolvimentista e social; a formação de professores de língua

inglesa para e na EJA.

Evidenciamos, ainda, nossa busca por referenciais

inter/transdisciplinares10, isto é, não circunscritos a uma área do conhecimento,

apenas. Daí a metáfora do olhar, explicada no início deste trabalho, e indexada

nos títulos das subseções a seguir. Nesse sentido, concordamos, novamente,

com Oliveira, L. P. (2002). Para tentar entender o real – como o ensino de

língua inglesa em turmas da EJA -, é preciso partir de um olhar

inter/transdisciplinar. Esse olhar, afinal, “consiste numa relação de

cumplicidade, parceria, percebendo a riqueza aflorada na multiplicidade

epistemológica” (OLIVEIRA, L. P., 2002, p. 217).

1.1 Olhares para e sobre a EJA

Nesta subseção, abordaremos a história da EJA no Brasil e em São

Bernardo do Campo (SP). Além de uma visada histórica, analisaremos,

também, um documento importante para a organização dessa modalidade

como política pública municipal: as Diretrizes Curriculares para EJA (SÃO

BERNARDO DO CAMPO, 2012). Veremos, ainda, um retrato dos sujeitos-

alunos que procuram os cursos de EJA, segundo alguns estudiosos dessa

10

Em alguns trechos deste trabalho, usaremos a forma inter/transdisciplinar, porque nossos aportes teóricos fazem referência à interdisciplinaridade (OLIVEIRA, L.P., 2002) e à transdisciplinaridade (CELANI, 1998). Conquanto haja diferenças em relação aos objetos de pesquisa, aos campos de atuação e às bases teóricas dessas pesquisadoras, Celani (1998) e Oliveira, L. P. (2002) entendem que, para investigar realidades complexas, mutáveis e incertas, precisamos romper com as barreiras disciplinares e acolher diferentes pontos de vista. Além disso, mantemos a forma inter/transdisciplinar, inspirados em Moraes (2007). Para essa autora, à luz do pensamento complexo, o professor/sujeito pesquisador deve ser “interdisciplinar e/ou transdisciplinar em suas atitudes, pensamentos e práticas” (MORAES, 2007, p. 19, grifos nossos).

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área. Eventualmente, ocupar-nos-emos com a questão do ensino de língua

inglesa, no contexto específico dessa modalidade de ensino.

1.1.1 Olhares sobre a história da EJA no Brasil

De acordo com Jardilino e Araújo (2014), no Brasil, a história da EJA

como política nacional11 começou com outro nome: Educação de Adultos. Nos

anos 1930, o governo federal ocupou-se com a implantação do sistema público

de ensino. Consequentemente, passou a se preocupar, também, com a

população de jovens e adultos em situação de analfabetismo12

. Essa

preocupação motivou a Campanha de Educação de Adultos, em 1947.

A campanha foi criada pelo Serviço de Educação de Adultos, organizado

durante os anos 1940. De acordo com Baquero (2016), essas ações não

obtiveram muito sucesso. Um indício desse fracasso foi a extinção da

campanha, já na década de 1950. No entanto, essas iniciativas abriram o

território para discussões sobre a educação de adultos e as consequências

sociais, econômicas e psicológicas decorrentes do analfabetismo.

Durante a década de 1960, há duas formas de atendimento educacional

a jovens e a adultos populares. Uma delas são os exames de madureza. A

outra, a educação popular, idealizada por Paulo Freire, e concretizada na

região Nordeste, especialmente, em Angicos, no interior do Rio Grande do

Norte (RN), e em Recife, Pernambuco (PE).

De acordo com a Lei nº 4.024 (BRASIL, 1961), as pessoas que tinham

mais de 16 anos ou mais de 19 anos poderiam obter, respectivamente, o

certificado de conclusão do curso ginasial ou do curso colegial, mediante a

prestação de exames de madureza. Para os autores da Proposta Curricular

para a Educação de Jovens e Adultos, vol. 1, (BRASIL, 2002a), a legislação

vigente, nesse período, não especificava quem eram os responsáveis pela

11

Por conta da extensão da sessão, não trataremos da história da EJA fora do âmbito da política de Estado. No entanto, conforme Haddad e Di Pierro (2015), a prática de alfabetizar jovens e adultos remonta à colonização do Brasil, em decorrência da ação educativa missionária. 12

Nesta dissertação, usaremos o segmento em situação de analfabetismo em vez do adjetivo analfabeto(a)(s). Entendemos que esse adjetivo pode servir como um estigma social. E, preferimos em situação de analfabetismo, porque, com essa escolha lexical, podemos evidenciar a ideia de que o analfabetismo é uma produção sócio-histórica.

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organização desses exames. Consequentemente, escolas privadas foram

autorizadas pelos conselhos e secretarias locais a aplicarem tais provas, “ao

lado dos estabelecimentos oficiais” (BRASIL, 2002a, p. 14).

Paulo Freire, por sua vez, desenvolveu uma pedagogia para alfabetizar

jovens, adultos e idosos. Segundo Baquero (2016), nesse momento, a área

Educação de Adultos ganhou uma proposta metodológica específica.

Mais adiante, aprofundaremos a discussão sobre a afetividade, na

pedagogia de Paulo Freire. Entretanto, para narrarmos a história da EJA no

Brasil, precisamos fazer um pausa e discutir, em linhas gerais, o que a

pedagogia freiriana representou (e apresentou) para os políticos conservadores

do nosso país, no início da década de 1960.

Para o educador pernambucano, a educação deve servir à libertação,

não à opressão (FREIRE, P., 2016). Mas libertação de quem ou de quê?

Segundo Freire, P. (2016), a pessoa em situação de analfabetismo vive em um

estado de opressão. Assim, aprender a ler e a escrever é uma forma de romper

com essa castração da própria dignidade humana e de libertar-se.

Para alfabetizar, Paulo Freire criou um método. Professor e aluno, ou

educador e educando, nas palavras do autor, precisavam, juntos, romper com

a dicotomia que, histórica e culturalmente, os separavam. Em outras palavras,

Paulo Freire já entendia que a sala de aula não poderia ser o lugar onde o

professor exerceria o papel de detentor do conhecimento e o aluno, receptor do

conhecimento transmitido. A essa concepção tradicional de ensino, o autor deu

o nome de educação bancária, como vemos em Freire, P. (2016).

No método criado por Paulo Freire, a alfabetização ocorria por meio de

palavras geradoras ou de temas geradores, investigados e tematizados na

comunidade onde os alunos moravam e trabalhavam.

Além disso, a proposta freiriana era pautada na problematização da

realidade e na busca pela superação de situações-limite (FREIRE, P., 2016).

Por isso, para Paulo Freire, aprender a ler e a escrever não significava,

somente, adquirir competências sociais, mas, também, desvelar, por meio do

diálogo, a própria realidade. Esse desvelamento era acompanhado, em

paralelo e ao mesmo tempo, pelo desenvolvimento da consciência crítica,

conforme afirmam Borges (2016) e Klein (2016), intérpretes do pensamento

freiriano.

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34

O sucesso do trabalho de Paulo Freire em Angicos (RN), em Recife (PE)

e no sertão nordestino repercutiu, nacionalmente. Por esse motivo, o educador

pernambucano foi convidado pelo então presidente do Brasil, João Goulart

(1961-1964), o Jango, a liderar o Programa Nacional de Alfabetização de

Adultos. De acordo com Silva, A. (2012), nesse programa, o educador propôs a

alfabetização de dois milhões de jovens e adultos, em vinte mil círculos de

cultura, ao redor do Brasil. No entanto, o sonho freiriano foi interrompido pelo

Golpe Militar de 1964.

Com a entrada dos militares no poder, o presidente João Goulart foi

deposto. Paulo Freire e sua família foram exilados para o Chile. Nesse Brasil

de chumbo, uma educação emancipatória para jovens e adultos populares

configurava uma ameaça aos ideais políticos dos militares.

Ainda assim, os dirigentes do país não podiam fechar os olhos para a

questão das pessoas em situação de analfabetismo, porque essa conjuntura

era comprometedora em termos de concessão de empréstimos internacionais

ao Brasil. Diante desse cenário, segundo Zanardo (2017, p. 25), o governo

federal criou “o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL) e, depois, a

implantação do Ensino Supletivo no ano de 1971, com a promulgação da Lei

Federal no 5.692”.

De acordo com Silva, A. (2012, p. 36), o MOBRAL foi uma “política de

prerrogativa massificadora”. Enquanto a proposta freiriana de alfabetização de

jovens e adultos olhava para as questões locais (de onde partiam as palavras

geradoras e os temas geradores), a proposta do MOBRAL olhava para sujeitos

desencarnados. Isto é: não se tratava de pensar os modos de organização do

processo de ensino-aprendizagem a partir de uma comunidade específica, de

pessoas com uma historicidade marcada pela desigualdade social, mas, sim,

de homogeneizar as práticas docentes. O ensino supletivo, por sua vez, era um

curso aligeirado, cuja concepção de educação era emprestada do ensino

regular.

A respeito da educação de pessoas jovens e adultas, durante as

décadas de 1960 e de 1970, Di Pierro (2005) discorre sobre o que, para ela, é

o paradigma compensatório. Nessa concepção, MOBRAL e suplência

respondiam a necessidades do modelo econômico concentrador de riquezas. A

partir da Lei no 5.692/71, o 1º e o 2º graus tornaram-se obrigatórios. A

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ampliação da escolaridade imposta pela legislação pressionou as pessoas a

buscarem a certificação mínima exigida por uma parte do mercado de trabalho.

Um reflexo dessa política foi a busca não somente por cursos supletivos

presenciais, mas, também, por cursos não-presenciais - apostilados e/ou com

a mediação da televisão ou do rádio -, e por exames supletivos. No lugar da

educação emancipatória, interessada em combater as desigualdades sociais e

organizada como uma ação educativa coletiva, a suplência, principalmente,

atendeu “ao apelo modernizador da educação a distância e aderiu aos

preceitos tecnicistas da individualização da aprendizagem e instrução

programada” (DI PIERRO, 2005, p. 1117).

Na lógica do paradigma compensatório, de acordo com Di Pierro (2005),

o ensino supletivo tinha a função de suprimento13. Se, em algum momento,

jovens e adultos populares não tiveram acesso à escola ou não vivenciaram

condições igualitárias de permanência nela – e, portanto, não tinham um

certificado de 1º ou de 2º graus -, era um dever do Estado garantir-lhes a

escolarização. Havia, nessa visão, um olhar de falta, por parte dos legisladores.

Faltavam a esses jovens e adultos a experiência do ensino regular, os

conhecimentos escolares dessa fase e o reconhecimento de que estavam

aptos a ocuparem certos postos de trabalho. Nas palavras de Di Pierro (2005,

p. 1118, grifos da autora):

Ao dirigir o olhar para a falta de experiência e conhecimento escolar dos jovens e adultos, a concepção compensatória nutre visões preconceituosas que subestimam os alunos, dificulta que os professores valorizem a cultura popular e reconheçam os conhecimentos adquiridos pelos educandos no convívio social e no trabalho.

A partir da argumentação de Di Pierro (2005), interrogamo-nos sobre a

possível legitimidade do paradigma compensatório, nos cursos para jovens e

adultos populares, passados mais de 50 anos (1960-2018). Para essa autora,

em 2005, “a cultura escolar brasileira ainda encontra-se (sic) impregnada” (DI

13

Embora se trate de uma metáfora, a função de suprimento do ensino supletivo pode ser deduzida a partir do próprio texto legal, conforme lemos, a seguir: “CAPÍTULO IV. Do Ensino Supletivo. Art. 24. O ensino supletivo terá por finalidade: a) suprir a escolarização regular para os adolescentes e adulto que não a tenham seguido ou concluído na idade própria” (BRASIL, 1971, grifos nossos).

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PIERRO, 2005, p. 1118, grifos nossos) dessa concepção. A nosso ver, alguns

vestígios desse paradigma são:

a ideia preconceituosa – e superada, em termos de pesquisas no campo

da Psicologia da Educação14

– de que a aprendizagem escolar tem

“idade própria” (BRASIL, 1971);

o entendimento de que o parâmetro para a EJA deve ser o ensino

regular, em relação à construção de currículos escolares, a

metodologias de ensino, a propostas de avaliação institucional ou da

aprendizagem e à produção de materiais didáticos;

o olhar dos tomadores de decisão (Conselhos de Educação, secretários

e dirigentes municipais, gestores escolares e professores), ao ser

dirigido para os aspectos que, supostamente, faltam aos sujeitos-alunos

da EJA. Com base em Di Pierro (2005), compreendemos que esse olhar

pode ser substituído pelo olhar da presença, isto é, por uma apreciação

daquilo que esses sujeitos já sabem, já podem fazer, já realizam com

sucesso e, a partir daí, propõem-se intervenções pedagógicas.

Com o fim da ditadura militar (1964-1985), passamos a falar sobre a

educação de pessoas cuja escolaridade foi interrompida como um direito15.

Essa perspectiva é resultado de uma “Constituição [1988]16 avançada na

14

A superação da ideia de que a infância e a adolescência sejam as supostas idades apropriadas para a aprendizagem de conteúdos escolares é, também, discutida por Oliveira, M. (1999). Acrescentamos a esse trabalho os estudos que revisamos para a escrita da seção 1.3.3 Olhares de Henri Wallon sobre a afetividade. Para Henri Wallon, que estudou o desenvolvimento humano e é um importante interlocutor das pesquisas em Psicologia da Educação, desenvolvemo-nos ao longo da vida e, por isso, respeitadas as questões biológicas e sociais, somos, sempre, aprendentes. 15

Com referência à legislação educacional, de acordo com a relatora do Parecer CNE/CEB 11/2001 (BRASIL, 2001), a expressão Educação de Jovens e Adultos surgiu com a LDB 9.394/96, na seção V, intitulada Da Educação de Jovens e Adultos, nos artigos nº 37 e 38 e seus parágrafos. 16

A perspectiva da oferta de cursos de EJA como um direito é sugerida nos seguintes trechos da Constituição Brasileira: “- art 3: Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: IV- promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer formas de discriminação - art 206: O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I- igualdade de condições de acesso e permanência na escola. - art. 208: O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: I- ensino fundamental obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria” (BRASIL, 1988, grifos nossos).

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garantia dos direitos sociais” (DI PIERRO; HADDAD, 2015, p. 198). No entanto,

como Di Pierro e Haddad (2015) apontam, o reconhecimento e a garantia

previstos pela lei não foram suficientes para a concretização dessa

prerrogativa. Para esses pesquisadores, essa concretização foi impedida pela

lógica macroeconômica dos anos 1990, isto é, o neoliberalismo.

No final do século XX, outros olhares para a EJA passaram a incidir nas

políticas educacionais brasileiras, mas partiram de contextos internacionais. Na

verdade, nesse período, a temática EJA foi objeto de diferentes acordos

externos, encabeçados pela Organização das Nações Unidas (ONU). Eles são:

Os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODMs), acordo assinado em 2000; as metas de Educação Para Todos (EPT), criadas em 1990 em Jomtien (Tailândia) e renovadas em 2000 em Dakar (Senegal); e a Declaração de Hamburgo (Alemanha) e Agenda para o Futuro subscritas em 1997 na V Conferência Internacional de Educação de Adultos (Confintea) (DI PIERRO; HADDAD, 2015, p. 200).

Com essas referências internacionais e, no pano de fundo geopolítico,

com acordos econômicos bilaterais entre o Brasil e outros países signatários da

ONU, uma agenda para a EJA precisou ser pensada. Entretanto, em âmbito

nacional, os projetos realizados, durante os anos 1990, foram escassos.

Em 2000, as metas de Educação Para Todos (EPT) foram reavaliadas,

na Cúpula Mundial de Educação, em Dakar. A meta de oferecer a todas as

crianças, jovens e adultos uma educação que correspondesse a suas

necessidades foi adiada para 2015. Ela foi, também, desdobrada em seis

objetivos. Dois deles dizem respeito, diretamente, à EJA:

1. Assegurar que as necessidades de aprendizagem de todos os jovens e adultos sejam alcançadas através de acesso equitativo a programas apropriados de aprendizagem e competências para a vida. 2. Alcançar 50% de melhora nos níveis de educação de adultos até 2015, especialmente para as mulheres, e acesso equitativo à educação básica e continuada para adultos (DI PIERRO; HADDAD, 2015, p. 199).

Di Pierro e Haddad (2015) concluem que, até 2015, as políticas públicas

de EJA, no Brasil, não haviam alcançado as metas e os objetivos da EPT.

Retomando a linha do tempo, é preciso destacar, ainda, o papel da

Conferência Internacional de Educação de Adultos V (Confintea V), no âmbito

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da agenda internacional da ONU. Em 1997, esse evento gerou dois

documentos norteadores: a Declaração de Hamburgo e a Agenda para o

Futuro. Ambos difundiram a perspectiva de educação e de aprendizagem ao

longo da vida. Para Di Pierro e Haddad (2015), a partir de 1997, a definição de

EJA tornou-se mais clara para os países participantes da Conferência,

evidenciando a possibilidade (e a necessidade) da criação de políticas

educacionais para todas as pessoas, não somente para crianças e

adolescentes.

Segundo Jardilino e Araújo (2014), em território nacional, durante o

mesmo período, o debate sobre a EJA foi fortalecido com a formação dos

Fóruns Estaduais de EJA e a garantia de oferta da modalidade por meio da

LDB nº 9.394/96. A partir desse marco legal, a identidade dos cursos para

pessoas jovens e adultas mudou. Conceitualmente, abandonou-se a ideia de

suplência. Para Di Pierro (2005), a mudança de MOBRAL-ensino supletivo para

EJA deu lugar ao paradigma da aprendizagem ao longo da vida, em oposição

ao paradigma compensatório.

Essa mudança aponta para o reconhecimento das especificidades do

trabalho pedagógico com jovens e adultos populares. E mais, acena para uma

questão social, ancorada no cenário político, econômico e cultural dos anos

1990, a saber: o mercado de trabalho passou a exigir formação permanente.

Os conteúdos escolares da educação básica, ensinados a crianças e a

adolescentes, não eram mais considerados suficientes, frente às demandas da

modernidade. Além disso, por indução dos documentos internacionais já

mencionados, o papel da escola com cursos de EJA mudou. No paradigma

compensatório, baseado na Lei nº 5.692/71, predominava a função supridora.

No paradigma da aprendizagem ao longo da vida, pautado na LDB 9.394/96,

há a função reparadora. Sobre essa diferença, o relator do Parecer CNE/CEB

11/2000, Carlos Roberto Jamil Cury, escreve:

[...] a função reparadora da EJA, no limite, significa não só a

entrada no circuito dos direitos civis pela restauração de um direito negado: o direito a uma escola de qualidade, mas também o reconhecimento daquela igualdade ontológica de todo e qualquer ser humano. Desta negação, evidente na história brasileira, resulta uma perda: o acesso a um bem real, social e simbolicamente importante. Logo, não se deve confundir a noção de reparação com a de

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suprimento (BRASIL, 2000, p. 07, negritos do relator e itálicos nossos).

Destacamos, aqui, a complementaridade do Parecer CNE/CEB 11/2000

à LDB 9.394/96. Ao fixar as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação

de Jovens e Adultos (BRASIL, 2000), o Estado lança uma base teórica para a

ação educativa no âmbito da EJA. O pensamento de Paulo Freire, negado

pelos legisladores do regime militar, é recuperado. Nesse documento, além da

função reparadora, encontramos outras duas incumbências dessa modalidade

de ensino: a função equalizadora e a função qualificadora.

A função equalizadora pressupõe que garantir a igualdade de acesso de

todas as pessoas jovens e adultas à escola não é suficiente para a

permanência delas. A reentrada no sistema educacional deve prever, também,

“novas inserções no mundo do trabalho, na vida social, nos espaços da

estética e na abertura dos canais de participação” (BRASIL, 2000, p. 09). Por

fim, a função qualificadora atribui à EJA a tarefa de promover atualização

constante a jovens, adultos e idosos por toda a vida. De uma perspectiva

conceitual, a função qualificadora rompe com a ideia de aprendizagem na

idade certa, porque considera que o ser humano pode, sempre, aprender.

Segundo o relator do Parecer CNE/CEB 11/2000, essa função “é o próprio

sentido da EJA” (BRASIL, 2000, p. 11, grifos do relator).

No entanto, segundo diferentes estudiosos da história dessa modalidade

(SILVA, A., 2012; DI PIERRO, HADDAD, 2015; ZANARDO, 2017), a criação de

políticas públicas que concretizassem o direito à educação e à aprendizagem

ao longo da vida ocorreu a partir de 2003, com a eleição do ex-presidente Luiz

Inácio Lula da Silva.

De 2003 a 2006, o governo federal institucionalizou a EJA com o

surgimento da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e

Diversidade (SECAD), abrigada no Ministério da Educação (MEC). Ao dar um

lugar institucional a essa modalidade, o Estado pôde agir em outras frentes,

promovendo “o Programa Brasil Alfabetizado, o Programa Nacional de Livros

Didáticos para a EJA, Programas de Formação Continuada e Produção de

Material Didático” (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2012, p. 28-29).

No mesmo período (2003-2006), de acordo com Di Pierro e Haddad

(2015), outras ações federais fortaleceram a EJA, como, em 2005, o Programa

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Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem Urbano), que tem buscado oferecer

o Ensino Fundamental e qualificação profissional aos jovens de baixa renda.

Em 2006, o MEC lançou o Programa Nacional de Integração da Educação

Básica com a Educação Profissional na Modalidade Educação de Jovens e

Adultos (Proeja). Este tem oferecido elevação da escolaridade (Ensino

Fundamental e Médio) integrada à formação profissional inicial ou técnica, em

escolas da rede federal.

Em 2007, primeiro ano do segundo mandato do ex-presidente Luiz

Inácio Lula da Silva, o governo federal substituiu o Fundo de Manutenção e

Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério

(FUNDEF) pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica

e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB). O FUNDEF servia

como uma espécie de caixa central, com a função de distribuir recursos

federais, estaduais e municipais a escolas do Ensino Fundamental. A partir do

FUNDEB, a EJA foi incluída nessa distribuição. Segundo Zanardo (2017), com

recursos financeiros garantidos pela legislação, mais turmas de alfabetização,

de Ensino Fundamental e de Ensino Médio foram criadas em todo o país.

Seguindo a lógica da linha do tempo, chegamos aos mandatos da

presidenta17 legitimamente eleita: Dilma Rousseff (2011-2016). Em seu

primeiro ano de governo, uma política pública que merece atenção, de acordo

com Di Pierro e Haddad (2015), é o Plano Estratégico de Educação no âmbito

do Sistema Prisional (Peesp). Do ponto de vista político-institucional, a EJA

tornou-se, também, a modalidade de ação educativa que tem chegado a

unidades de reclusão.

Ainda em 2011, o governo federal criou o Programa Nacional de Acesso

ao Ensino Técnico (Pronatec), “a marca distintiva” da presidenta Dilma

Roussef, na temática EJA (DI PIERRO e HADDAD, 2015, p. 211). Para esses

pesquisadores, há, nessa política pública, um aspecto privatizante, porque o

Estado legou a escolas do Sistema S18 e a redes privadas a oferta do ensino

17

O uso do substantivo presidenta já foi assunto de debates entre linguistas, educadores e jornalistas. Usamo-lo, com base no léxico computado pelo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, que dicionarizou essa palavra. Isso pode ser comprovado em: <http://www.academia.org.br/nossa-lingua/busca-no-vocabulario>. Acesso em: 13.out.2018. 18

“A expressão Sistema S designa o conjunto de instituições mantido por contribuições sociais e geridas pelo empresariado para assistir e promover a formação profissional dos

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profissionalizante, sem, com isso, preocupar-se em integrar essa modalidade à

educação básica.

Portanto, embora se trate do mesmo partido político (Partido dos

Trabalhadores, PT), há, aparentemente, diferenças na filosofia educacional dos

dois últimos governos federais legitimamente eleitos. Durante os dois mandatos

do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, as políticas públicas para a EJA

buscaram a integração entre a educação básica e o ensino profissionalizante.

Na gestão da presidenta Dilma Rousseff, houve uma separação entre essas

ofertas.

Quando olhamos, em retrospecto, para a história da EJA, no Brasil,

podemos observar avanços. Se, anteriormente, a Educação de Adultos, nos

anos 1930, tinha contornos não institucionais e, portanto, dependia das

iniciativas isoladas de determinados governos, hoje, a EJA possui status de

direito subjetivado. No entanto, antes de encerrarmos esta subseção,

observaremos alguns dados numéricos.

De acordo com Di Pierro e Haddad (2015), com base no Censo Escolar

2014, o número de matrículas na EJA, somadas as de Ensino Fundamental

com as de Ensino Médio, caíram, em 2007, de 4.985.338 para 3.772.670, em

2013. Isso equivale a uma queda de 24,3%, em apenas seis anos.

E, hoje? Qual é o número mais recente de matrículas na EJA, de acordo

com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

(INEP)? No último Censo Escolar (BRASIL, INEP, 2017), 1.882.601 matrículas

foram contabilizadas na EJA/Ensino Fundamental e 1.046.357, na EJA/Ensino

Médio. Somadas, existem 2.928.958 matrículas. Comparando-as ao número de

matrículas em 2013, apontado por Di Pierro e Haddad (2015), chegamos a uma

diferença de 843.712 inscrições, em menos de quatro anos.

Outro dado alarmante e recente pode ser encontrado na última edição

da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios Contínua (PNAD Contínua)

(IBGE, 2018), cujo ano de referência é 2016 e, de divulgação, 2017. Segundo

essa pesquisa, 11,2% da população de 25 anos ou mais não têm instrução

formal e 30,6% têm o Ensino Fundamental incompleto.

trabalhadores da indústria (Sesi, Senai), do comércio (Sesc, Senac), do transporte (Senat) e das empresas rurais (Senar)” (DI PIERRO; HADDAD, 2015, p. 217, grifos dos autores).

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Cruzando esses dados, chegamos a 2018, na ponta da nossa linha do

tempo. Aparentemente, a garantia do direito à EJA não tem sido suficiente para

transformar a realidade educacional (e sócio-cultural, acreditamos) de milhões

de jovens e adultos. De um lado, as matrículas dessa modalidade têm

diminuído. De outro lado, há um contingente enorme de pessoas que poderiam

frequentar cursos de EJA e concluir o Ensino Fundamental e Médio.

Por fim, devemos afirmar que o horizonte da EJA, no Brasil, é

desesperançoso? De acordo com o escritor Ariano Suassuna, “o otimista é um

tolo. O pessimista, um chato. Bom mesmo é ser um realista esperançoso”19.

Dito isso, encerramos esta subseção como realistas esperançosos. Em março

deste ano (2018), enquanto esta dissertação estava sendo escrita, o Senado

brasileiro incluiu na LDB 9.394/96 a Lei 13.632/2018, que garante o direito à

educação e à aprendizagem ao longo da vida “como um dos princípios

norteadores do ensino brasileiro” (BRASIL, 2018b). E mais, a proposta

75/2017, aprovada pelo Plenário do Senado, estabelece que a EJA é o

instrumento adequado para a concretização desse direito a pessoas que não

conseguiram completar os estudos (BRASIL, 2018b). Quase vinte anos depois,

a perspectiva de ação educativa da Declaração de Hamburgo e da Agenda

para o Futuro (UNESCO, 1999) ganha os contornos da lei no Brasil.

1.1.2.1 Olhares sobre a história da EJA em São Bernardo do Campo

Nesta subseção, discorremos sobre a história da EJA na cidade de São

Bernardo do Campo (SP), onde os dados desta pesquisa foram produzidos.

Concordamos com Méndez (2002, p. 32, grifos nossos), para quem o

conhecimento é, sempre, uma “construção histórica e social dinâmica que

necessita de contexto para poder ser entendido e interpretado”. Assim,

acreditamos que é importante relatar a história da EJA no município onde este

estudo foi desenvolvido.

Em São Bernardo do Campo, os primeiros registros de ações educativas

voltadas à alfabetização de adultos são de 1989 (SÃO BERNARDO DO

19

Aforismo disponível em: <https://www.pensador.com/frase/NTQxOTIy/>. Acesso em: 22.maio.2018.

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43

CAMPO, 2012). Provavelmente, isso ocorreu em decorrência da força legal

exercida pela Constituição Federal de 1988. A princípio, a prefeitura criou o

Programa Municipal de Alfabetização de Jovens e Adultos (PAMJA), cuja meta

era alfabetizar os funcionários da própria rede municipal.

Mais tarde, em 1990, o governo municipal iniciou o Programa de

Alfabetização e Cidadania (PAC). Diferentemente do PAMJA, o PAC foi

oferecido a toda a população. No entanto, esse programa foi estruturado em

parceria com a sociedade civil. A contratação dos educadores e de apoio

técnico escolar ficou a cargo de uma universidade local, a Universidade

Metodista de São Paulo (UMESP). Essa parceria produziu, então, em 1993, o

Programa Municipal de Alfabetização e Cidadania (PROMAC). A EJA foi

oferecida na forma do PROMAC até 2009.

Nesse ano, com a eleição do prefeito Luiz Marinho (Partido dos

Trabalhadores, PT), o poder público assumiu a EJA. Essa atribuição trouxe

mudanças para a oferta da modalidade, de acordo com Zanardo (2017). O

léxico e a semântica da língua ajudam-nos a perceber algumas diferenças

ideológicas: antes, para referirem-se à EJA, os governos municipais falavam

sobre projetos de alfabetização e de cidadania, o que dá indícios de uma

política temporária ou passageira. Depois de 2009, a prefeitura deixou de usar

o item lexical projeto de..., e passou a referir-se à Educação de Jovens e

Adultos.

Durante os dois mandatos de Luiz Marinho (2009-2016), a EJA foi

organizada da seguinte forma:

a) atendimento aos alunos em Escolas Municipais de Ensino Básico (EMEBs),

com oferta do primeiro e do segundo segmentos20 (isto é: da alfabetização ao

equivalente ao 9º ano);

20

Possivelmente, em oposição ao uso de etapa(s) - termo consagrado no que se refere às partes que constituem o ensino regular (por exemplo, a etapa do Ensino Fundamental) – os autores da Proposta Curricular para a educação de jovens e adultos: segundo segmento do Ensino Fundamental: 5ª a 8ª série (BRASIL, 2002a) utilizam – desde o título - o item segmento. Em todo o documento, não localizamos uma definição, mas podemos concluir que se trata de um termo sinônimo à palavra etapa, mas com uso restrito ao plano da EJA. Para ilustrar essa relação de sinonímia, partilhamos o seguinte trecho: “Quanto aos alunos matriculados em cada um dos segmentos ou etapas, verifica-se uma redução significativa do número de alunos ao longo do processo, motivada por repetência e/ou evasão” (BRASIL, 2002a, p. 25, grifos nossos). Como podemos ver, nesta subseção, a rede municipal de EJA de São Bernardo do Campo faz uso desse vocabulário.

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44

b) alfabetização por meio do projeto Movimento pela Alfabetização (MOVA),

que ocorria em núcleos educacionais, fora das escolas;

c) em Escolas Municipais de Ensino Profissionalizante (EMEPs) e EMEBs,

onde os alunos podiam cursar o primeiro e o segundo segmentos, dentro de

um formato metodológico alternativo: a telessala;

d) em EMEPs, com oferta do primeiro e do segundo segmentos, além de

cursos profissionalizantes.

Entendemos que a estruturação da EJA, no terreno da política pública,

valorizou a modalidade e, principalmente, as pessoas que a têm constituído

(alunos, professores e gestores). A partir deste ponto, para prosseguirmos com

nossa pesquisa, precisamos, ainda, olhar para um aspecto central dessa

estruturação político-educacional: o currículo.

1.1.1.1 Olhares sobre as Diretrizes Curriculares da EJA da rede municipal de

São Bernardo do Campo

De acordo com Méndez (2002), há uma integração entre currículo,

educação, conhecimento e avaliação. Naturalmente, neste trabalho, ater-nos-

emos à dimensão do ensino, porque é nele em que observamos as estratégias

didáticas. No entanto, para apresentar um retrato o mais fiel possível da EJA

em São Bernardo do Campo, conferindo-lhe certa identidade, apresentaremos

o marco referencial que a prefeitura propôs aos professores-participantes deste

estudo.

No contexto da prefeitura de São Bernardo do Campo, não tem havido

(de 2009 a 2018) um currículo para a EJA, mas, sim, Diretrizes Curriculares

(SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2012)21. Essa escolha lexical marca diferentes

concepções teórico-metodológicas. De um lado, de acordo com Zanardo

(2017), há a ideia pré-concebida, no senso comum, de que o currículo escolar

deve veicular um rol de conteúdos. De outro lado, existe a ideia de que o

currículo é uma bússola para os professores refletirem sobre suas ações em

21

O título do documento é Diretrizes Curriculares da EJA. Para evitar a repetição do item lexical da EJA, usaremos, apenas, Diretrizes Curriculares. E, como a subseção é dedicada a analisar esse documento, faremos a entrada da referência - (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2012) -, somente quando houver alguma citação.

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sala de aula. A seguir, é possível observar a forma como as Diretrizes

Curriculares são apresentadas:

Por ser uma reflexão coletiva esperamos que [as Diretrizes Curriculares] seja (sic) um material de constante pesquisa para a organização da ação educativa, pois aborda uma concepção progressista de educação de jovens e adultos e apresenta as possibilidades de atendimento que temos para a EJA a partir da recuperação de um histórico dessa modalidade em São Bernardo do Campo (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2012, p. 06).

Do excerto acima, destacamos alguns pontos:

os autores do documento identificam-no como o resultado de um

processo coletivo, como sugere a expressão por ser uma reflexão coletiva.

a concepção de educação ratificada pretende romper com a ideia de

uma escola tradicional para jovens e adultos, conforme lemos em: “aborda uma

concepção progressista de educação” (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2012,

p. 06).

Para os autores das Diretrizes Curriculares, o currículo não é uma mera

colagem objetiva de informações, “pois estas (sic) são sempre frutos de

determinados agrupamentos sociais, que decidem quais conhecimentos serão

construídos nas salas de aula” (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2012, p. 34-

35). Para frisarem essa crítica e, ao mesmo tempo, delimitarem uma teoria

sobre o que é currículo, os autores dessa proposta apresentam, em uma caixa

de texto, o seguinte conceito:

O currículo é lugar, espaço, território. O currículo é relação de poder. O currículo é trajetória, viagem, percurso. O currículo é autobiografia, nossa vida curriculum vitae: no currículo se forja nossa identidade. O currículo é texto, discurso, documento. O currículo é documento de identidade. Tomaz Tadeu/ 2003 [s.p.]

22 (SÃO BERNARDO DO

CAMPO, 2012, p. 34).

Coerentemente, com base no conceito de currículo explicitado, as

Diretrizes Curriculares não listam conteúdos, habilidades ou competências que

22

A obra citada não consta nas Referências do documento (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2012, p. 119-121). No entanto, provavelmente, o excerto publicado seja parte de SILVA, T.T. (2010).

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devem ser ensinados ou aprendidos em cada termo ou ciclo da EJA, em

nenhuma disciplina. Compreendemos que essa ruptura com a lógica do

paradigma tradicional pode ser muito produtiva, já que o professor é solicitado

a olhar para o seu entorno e, principalmente, para os seus alunos.

Acreditamos, também, que a ausência de um rol de conteúdos (de

língua inglesa, por exemplo) permite a abertura de espaço para uma autonomia

docente, ainda que esta não seja parte da agência do professor. Por agência,

com base em Jordão (2017), entendemos a construção, pautada na diferença e

no conflito, de condições favoráveis à aprendizagem, propiciadas por um agir

intencional e crítico do professor. Assim, o professor da EJA, na rede

municipal, tem a possibilidade de selecionar os conteúdos que pretende

trabalhar com seus alunos – o que lhe confere certa autonomia -, mas seu agir

intencional pode não atrelar a teoria induzida pelas Diretrizes Curriculares à

prática em sala de aula.

Adiante, vejamos como as Diretrizes Curriculares abordam a concepção

de educação, a metodologia de ensino, o tratamento para as diferentes

disciplinas ou componentes curriculares, a avaliação e a questão da linguagem.

A respeito da concepção de educação, o documento informa:

[...] essa produção [a publicação das Diretrizes Curriculares] é histórica e por esse motivo é mutável, responde às necessidades do coletivo e pode ser revisitada e reorganizada, sem ferir os princípios de uma educação crítica (SÃO BERNARDO DO

CAMPO, 2012, p. 07, grifos nossos).

Assim, apresenta que, os pressupostos do atendimento da demanda de Educação de Jovens e Adultos e Educação Profissional na rede de SBC fundamentam-se nos princípios da Educação Popular, na perspectiva freireana (SÃO BERNARDO DO CAMPO,

2012, p. 08, grifos nossos). Enfim, que possamos organizar a EJA pautada no direito à educação ao longo da vida, garantindo o acesso, a permanência, a gestão democrática e a qualidade social na formação integral dos sujeitos para sua emancipação (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2012, p. 11,

grifos nossos).

Os excertos evidenciam uma proposta baseada em princípios freirianos.

Os itens lexicais educação crítica, Educação Popular e formação [...] para a

emancipação remetem-nos ao vocabulário usado, por exemplo, em Freire, P.

(2016).

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As Diretrizes Curriculares apresentam as seguintes etapas para o

planejamento do ensino: “a investigação, a tematização e a problematização

crítica da realidade dos/as educandos/as” (SÃO BERNARDO DO CAMPO,

2012, p. 33). Para Mühl (2016), intérprete do pensamento freiriano, a

problematização pode ser sintetizada como uma pedagogia da pergunta. Sobre

isso, a pesquisadora afirma: “Freire defende uma pedagogia da pergunta em

oposição à pedagogia da resposta” (MÜHL, 2016, p. 329). Problematizar,

então, exige fazer indagações que expandam a compreensão dos alunos. Por

meio delas, os educandos desenvolvem a criticidade e criam condições (em

parceria com o professor) de pensar e de intervir na sua realidade. Assim, a

problematização engloba a reflexão e a ação.

As Diretrizes Curriculares propõem e reiteram a metodologia

participativa e o trabalho pedagógico organizado por meio de “projetos de

ensino” – prescrições que podemos identificar, repetidas vezes, ao longo do

documento (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2012, p.p. 34, 36, 39, 41, 69-70,

80).

Na metodologia participativa, como o adjetivo sugere, os alunos devem

participar das decisões em sala de aula. O currículo da turma é produzido por e

com eles. Para Silva, A. (2012, p. 91), essa metodologia é uma forma de

“educação integral”, já que articula “ciência, cultura e trabalho”. A atividade

didática por meio de projetos prevê que professores de diferentes conteúdos

curriculares planejem situações de aprendizagem que partam dos saberes dos

alunos e que problematizem a realidade concreta deles.

Com referência à organização dos objetos de conhecimento,

entendemos que as Diretrizes Curriculares propõem um arranjo transdisciplinar

do trabalho pedagógico. Para sustentar esse argumento, baseamo-nos em

Celani (1998). Para a linguista aplicada, a “trandisciplinaridade envolve mais do

que a justaposição de ramos do saber. Envolve a coexistência, em um estado

de interação dinâmica [...]” (CELANI, 1998, p. 132, grifos da autora). Essa

perspectiva pressupõe, ainda, integração e colaboração entre as disciplinas

tradicionais.

A partir da argumentação de Celani (1998), lemos/relemos as Diretrizes

Curriculares. Nesse documento, há a seguinte citação quanto ao pensamento

(trans)disciplinar:

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[...] a diretriz tenciona um currículo que ultrapasse os limites disciplinares formalistas conteudistas (sic), possibilitando a organização de tempos e espaços para a aquisição e construção de conhecimentos (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2012, p. 34, grifos nossos).

Em teoria, a nosso ver, as Diretrizes Curriculares buscam romper com a

ênfase nas disciplinas e sugerem, no lugar da grade curricular tradicional, um

trabalho pensado a partir de temas da vida dos educandos23. Embora esse

documento não prescreva como as escolas com cursos de EJA devem ser

reorganizadas, há a intenção de, por seu intermédio, promover mudanças.

Nesse sentido, retomamos outro argumento de Celani (1998). Para a

pesquisadora, a transdisciplinaridade é uma atitude que envolve mudanças e

que exige, também,

uma reestruturação de organização: novos parceiros, novas concepções, novas abordagens, novas compreensões e novos sistemas (CELANI, 1998, p. 140-141).

A respeito da avaliação do processo de ensino-aprendizagem, as

Diretrizes Curriculares declaram:

A avaliação é entendida numa perspectiva processual, com necessidade de registros permanentes durante a prática educativa. Esses registros devem constituir a ficha de avaliação semestral que permitirá a avaliação individual dos/as educandos/as conforme objetivos propostos ao trabalho. Essa avaliação é condução do novo planejar que se fará a partir da necessidade e especificidades dos sujeitos educandos/as (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2012, p. 80-81).

Do excerto lido, retiramos a concepção de avaliação processual, já

prescrita pela LDB 9.394/9624 e pela Proposta Curricular para a educação de

jovens e adultos: segundo segmento do Ensino Fundamental: 5ª a 8ª série:

23

É oportuno compartilharmos, aqui, uma experiência do pesquisador. Em 2015, a partir das Diretrizes Curriculares (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2012), a Secretaria de Educação municipal propôs o fim das grades disciplinares às escolas municipais com cursos de EJA: segundo segmento. A intenção desse movimento era fortalecer a pedagogia de projetos e o trabalho colaborativo entre professores de diferentes áreas. Na escola onde o pesquisador atuava como professor de língua inglesa, esse movimento não repercutiu positivamente. Acreditamos que aspectos distintos confluíram para isso, como a descrença dos professores e dos gestores nessa proposta de ação educativa e/ou a falta de oportunidade, por parte desses sujeitos, de aprofundar os estudos sobre a inter/transdisciplinaridade. 24

Para saber mais sobre a avaliação processual, recomendamos a leitura de Luckesi (2011).

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49

língua estrangeira (BRASIL, 2002b). Isto mostra o alinhamento entre os marcos

legais de âmbito federal e municipal.

Ainda sobre a avaliação, ressaltamos que, na rede municipal de São

Bernardo do Campo, não há notas ou classificações. Os registros das

aprendizagens são feitos em uma “ficha de avaliação semestral” (SÃO

BERNARDO DO CAMPO, 2012, p. 80). Nessa ficha, os professores apontam

os objetivos de aprendizagem que trabalharam durante o semestre, o que

equivale, na verdade, a um termo completo25. Para cada aluno, há

apontamentos sobre as aprendizagens construídas (ou não).

A respeito da avaliação, pensamos que a ausência de notas pode

influenciar, positivamente, a relação entre os professores e os alunos e entre

os alunos e a escola. Sem a nota classificatória, talvez, os instrumentos de

coleta de dados da aprendizagem se tornem menos desencorajadores aos

estudantes da EJA.

Relembremos uma informação importante: ao propor uma perspectiva

transdisciplinar, de educação integral, as Diretrizes Curriculares não trazem

especificidades de cada conteúdo curricular, ou disciplina, o que inclui nosso

objeto de estudo, a língua inglesa. Dito isso, chegamos ao último tópico desta

subseção: o problema da linguagem.

Em todo o documento, o registro do item lexical linguagem(ns) aparece

apenas uma vez:

As Linguagens escrita e oral são grandes possibilidades de

comunicação e organização de ideias que os homens, mulheres e crianças possuem (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2012, p. 50, grifos nossos).

A opção por linguagens pode sugerir uma confusão entre linguagem e

língua. O documento especifica apenas duas modalidades: escrita e oralidade.

Não trata, então, de outras semioses ou de formas de promover efeitos de

sentido, como a hipermodalidade, a linguagem visual, a linguagem sonora ou a

multimodalidade. Daí nossa suspeita sobre a provável confusão entre

linguagem e língua.

25

O termo da EJA é equivalente a uma série do Ensino Fundamental 1 ou do Ensino Fundamental 2. No entanto, nessa modalidade, cada termo tem a duração de um semestre letivo.

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50

Adicionalmente, os autores das Diretrizes Curriculares não fazem

nenhuma menção ao papel da língua inglesa como LE. Interpretamos essa

ausência como uma informação importante. Parece-nos um indício de que, ao

estruturarem a oferta de EJA na rede municipal, os autores não se atentaram a

essa especificidade linguística e educacional. Esse indicativo pode ser

validado, se considerarmos que as expressões língua inglesa ou língua

estrangeira não sejam citadas em todo o documento.

Antes de encerrarmos esta subseção, vejamos um resumo dos pontos

tratados nela. Basicamente, as Diretrizes Curriculares da EJA, em São

Bernardo do Campo,

são fundamentadas na pedagogia freiriana;

entendem o processo de ensino-aprendizagem como um desvelamento

da realidade concreta dos alunos;

buscam o desenvolvimento da criticidade e da emancipação social;

sugerem a metodologia participativa e a organização curricular por meio

de projetos didáticos;

prescrevem a avaliação processual e a construção de registros que não

sejam classificatórios, isto é, que não atribuam notas aos alunos;

definem a linguagem como forma de comunicação e de organização do

pensamento;

não fazem nenhuma referência ao papel particular da língua inglesa

como LE no processo de ensino-aprendizagem.

Aproximando-se do fim desta subseção, é preciso retomar o primeiro

parágrafo dela. A nosso ver, o currículo oficial de uma rede de ensino confere-

lhe identidade e atribui-lhe uma base teórica, a partir da qual supervisores,

diretores e coordenadores podem pensar os currículos de cada escola. Nesse

sentido, parece-nos previsível que as escolhas metodológicas dos professores-

participantes desta pesquisa sejam diferentes, múltiplas e complexas. Para

efeito deste trabalho, não olharemos para as práticas em sala de aula com a

finalidade de uma categorização, à luz das Diretrizes Curriculares da EJA (por

exemplo, práticas muito próximas ou muito distantes daquilo que foi prescrito

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51

pelo marco legal). Portanto, nas ações dos professores-participantes,

esperamos identificar traços da pedagogia sugerida pelo documento analisado.

1.1.3 Olhares para os alunos da EJA

Considerando os participantes deste estudo, não faremos um esboço

dos alunos das turmas nas quais os dados foram produzidos. Apresentaremos,

no entanto, estudos qualitativos que podem nos ajudar a entender esses

sujeitos da EJA. Presumimos que, por intermédio dessas pesquisas, nossa

análise pode ser beneficiada, principalmente, no que diz respeito ao papel da

afetividade no processo de ensino-aprendizagem de língua inglesa.

A pergunta que norteia esta subseção é: quem são os jovens e os

adultos que frequentam as classes com cursos de EJA? Para responder a essa

questão, fundamentamo-nos, inicialmente, em Oliveira, M. (1999, p. 50-51):

O adulto, no âmbito da educação de jovens e adultos, não é o estudante universitário, o profissional qualificado que frequenta cursos de formação continuada ou de especialização [...]. Ele é geralmente o migrante que chega às grandes metrópoles proveniente de áreas rurais empobrecidas, filho de trabalhadores rurais não qualificados e com baixo nível de instrução escolar (muito frequentemente analfabetos), ele próprio com uma passagem curta e não sistemática pela escola e trabalhando em ocupações urbanas não qualificadas, após experiência no trabalho rural na infância e na adolescência, que busca a escola tardiamente para alfabetizar-se ou cursar algumas séries do ensino supletivo. E o jovem, incorporado ao território da antiga educação de adultos relativamente há pouco tempo, não é aquele com uma história de escolaridade regular, o vestibulando ou o aluno de cursos extracurriculares em busca de enriquecimento pessoal [...]. Como o adulto anteriormente descrito, ele é também um excluído da escola, porém geralmente incorporado aos cursos supletivos em fases mais adiantadas da escolaridade, com maiores chances, portanto, de concluir o ensino fundamental ou mesmo o ensino médio. É bem mais ligado ao mundo urbano, envolvido em atividades de trabalho e lazer mais relacionadas com a sociedade letrada, escolarizada e urbana.

O estudante da EJA, jovem, adulto ou idoso, não é, portanto, apenas

uma não-criança. Em algum momento da infância ou da adolescência, a

trajetória de vida e a trajetória escolar desse estudante se desencontraram. No

entanto, chamamos a atenção para a data do estudo de Oliveira, M.: 1999. A

autora escreveu-o há quase vinte anos. O que mudou de lá para cá, no perfil

do estudante da EJA?

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52

Hoje (2018), ao pesquisarmos as descrições do sujeito-aluno da EJA,

concluímos que os apontamentos de Oliveira, M. (1999) sobre os adultos que

procuram essa modalidade de ensino são, ainda, atuais. Um estudo que

sustenta esse argumento é o de Jardilino e Araújo (2014). Para eles, os adultos

da EJA são sujeitos com baixa ou, em alguns casos, nenhuma escolaridade.

Pessoas excluídas, não só, do sistema escolar, na infância, mas, também, da

sociedade, na vida adulta. Nos últimos seis anos, na EJA municipal de São

Bernardo do Campo, temos ouvido inúmeros relatos de mulheres e de homens

que procuram escolas noturnas, depois de uma infância marcada pelo trabalho

rural, em estados do Nordeste e do Norte.

No entanto, a descrição dos alunos jovens feita por Oliveira, M. (1999)

exige um olhar diacrônico. Dezenove anos depois, podemos falar sobre

juvenilização, um fenômeno social típico da EJA, de acordo com Jardilino e

Araújo (2014) e Zanardo (2017). A juvenilização é a entrada maciça de jovens

nessa modalidade, pensada, anteriormente, para atender somente a adultos.

Jardilino e Araújo (2014, p. 182) complementam:

A presença cada vez maior destes jovens na EJA tem sido identificada em todas as regiões do Brasil e em muitos países da América Latina, representando um grande desafio, pois implica pensar em novas práticas e novas relações que se estabelecem nas salas de aulas (sic) e no espaço escolar.

A juvenilização não traz apenas um contingente numérico para as

classes da EJA. Ela carrega diferentes significados. Vejamos alguns deles.

Ao estudar a juventude da EJA de Belo Horizonte (MG), Dayrell (2011, p.

63) afirma que as experiências escolares desses estudantes são

caracterizadas “por repetências, evasões esporádicas e retornos, até a

exclusão definitiva”. Quase sempre, os jovens que se matriculam na EJA

frequentaram a escola, quando eram crianças. O acesso ao ensino obrigatório

foi-lhes garantido. No entanto, a permanência escolar desses alunos não lhes

foi assegurada. Algumas causas dessa conjuntura são as dificuldades de

aprendizagem, a falta de apoio da família ou de uma rede de proteção,

situações de risco ou de vulnerabilidade social (como a miséria ou a doença de

um adulto cuidador) e o uso de drogas.

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53

A matéria da evasão nos cursos de EJA foi estudada, também, por

Jardilino e Araújo (2014), em escala nacional. Ao cruzarem dados do Censo

Escolar de 2012, os educadores mineiros concluíram que a maioria dos alunos

matriculados na EJA/Ensino Fundamental 2 migrou do ensino regular para a

escola noturna. Segundo os autores, uma explicação possível para essa

realocação das matrículas é o esgotamento de recursos (humanos e

estruturais) para o trabalho pedagógico com esses sujeitos.

De acordo com reportagem recente d’O Estado de São Paulo

(PALHARES, 2017), de 2014 a 2015, mais alunos do Ensino Fundamental 2

(2,7%) migraram para a EJA do que os do Ensino Médio (1,9%). Ou seja: o

jovem que ingressa na EJA, frequentemente em escolas noturnas e com carga

horária reduzida, tem, em média, menos de 18 anos.

No plano da EJA de São Bernardo do Campo, a juvenilização é um

fenômeno presente em quase todas as salas de aula, como Zanardo (2017)

nos aponta.

Nos cursos de ensino regular, esses alunos comprometem a “taxa de

escolarização líquida” (JARDILINO; ARAÚJO, 2014, p. 184), isto é, engrossam

a fila de estudantes com distorção idade/série. Nesse caso, a EJA parece-lhes

ser a opção mais viável para concluírem os estudos. Entretanto, essa suposta

viabilidade, aqui, é questionável.

Na primeira subseção, apresentamos o número de matrículas da EJA,

de acordo com o último Censo Escolar: 2.928.958 (BRASIL, INEP, 2017).

Contudo, quando examinamos os dados da PNAD (IBGE, 2018), coletados até

2016 e publicados em 2017, 1,7 milhão de pessoas afirmaram estudar na EJA

(JORNAL DO BRASIL, 2017)26. Deduzimos que essa discrepância evidencie

um fenômeno educacional típico da EJA. De fato, no cotidiano das turmas dos

professores-participantes desta pesquisa, havia, em alguns casos, uma

diferença de quase 100% entre o número de matrículas no início de cada termo

(no segundo semestre de 2016) e o número de alunos que, noite a noite,

frequentavam as salas de aula. Essa apuração já foi feita, também, por outros

26

A reportagem 51% da população com 25 anos ou mais possuem apenas ensino fundamental, diz IBGE não apresenta autoria. Seguimos a sugestão de Rodrigues, A. (2008) e fizemos a entrada desse texto, na lista de Referências, com o nome da página da internet/homepage. Para evitar confusões, repetimos, no texto, a mesma entrada. Deste ponto em diante, adotaremos esse procedimento para as referências a hipertextos cujos autores são desconhecidos.

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estudiosos, na área da Educação (ARROYO, 2011) e no campo da LA

(PRADO; LANGE; SCHLATTER, GARCEZ, 2014). Constatamos, assim, a força

do fenômeno evasão escolar na EJA.

Com base no nosso referencial teórico, acreditamos que, por meio do

diálogo, na busca pela compreensão do outro, e pautados na relação teoria-

prática, professores, gestores públicos, funcionários técnico-administrativos,

pesquisadores e, principalmente, alunos podem, em solidariedade, redefinir

papéis e pensar uma oferta de cursos de EJA que seja, efetivamente, inclusiva.

Nas palavras de Arroyo (2011, p. 48), é preciso pensar/propor uma oferta de

EJA genuinamente pública:

A EJA sempre veio para recolher aqueles que não conseguiam fazer seu percurso nessa lógica seletiva e rígida de nosso sistema escolar. Cada jovem e adulto que chegam à EJA (sic) são náufragos ou vítimas do caráter pouco público de nosso sistema escolar. Um espaço será público quando adaptado às condições de vida em que o povo pode exercer seus direitos.

Por fim, concordamos com Arroyo (2011, p. 40), também, sobre a

necessidade de olharmos, de um prisma político, para os alunos da EJA: “Vê-

los como oprimidos será um olhar mais politizado do que vê-los como pobres,

preguiçosos ou violentos, ou como reprovados e defasados”.

1.1.4 Olhares sobre o status da língua inglesa na escola pública

Neste estudo, parte do nosso objeto de pesquisa são as estratégias de

ensino de língua inglesa. Por isso, refletiremos sobre por que e para que a

língua inglesa pode ser ensinada-aprendida, no contexto da EJA.

Entendemos que a língua inglesa é parte dos currículos escolares a

pretexto da globalização. Na realidade, as tendências desse fenômeno têm, em

geral, trazido consequências para as políticas e as práticas educacionais,

conforme Burbules e Torres (2004) afirmam. Nesse sentido, ensinar-aprender a

língua inglesa faz parte de um efeito cascata.

Para Edmundo (2013), na globalização, dominar a língua inglesa

equivale a ter um capital cultural e um capital simbólico. Cultural, porque o

conhecimento da língua inglesa é legitimado, na nossa sociedade, por

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diferentes instituições e grupos sociais. Falar inglês, especialmente, pode

trazer boa reputação ao usuário da língua. Simbólico, porque a aprendizagem

da língua inglesa é uma aspiração, quer dizer, um sonho para muitas pessoas.

Assim sendo, podemos compreender por que a obrigatoriedade de uma LE no

Ensino Fundamental, conforme os Parâmetros Curriculares Nacionais de

Língua Estrangeira Moderna (BRASIL, SEMTEC, 1998) postulam, tenha sido

alterada, recentemente. Na Base Nacional Curricular Comum (BRASIL,

2017b)27, há indicações de eixos, de habilidades e de objetos do conhecimento

para o ensino-aprendizagem exclusivo da língua inglesa. Talvez, na prática, os

currículos escolares mudem pouco a partir dessa determinação legal. No

entanto, ela marca a soberania da língua inglesa na proposição de políticas

públicas educacionais.

Em nosso exame, não qualificamos a globalização como um fenômeno

bom ou ruim. Com base em Canagarajah (2009a), entendemo-la como parte

integrante da pós-modernidade. Nela, entre outros aspectos, emergem

avanços tecnológicos importantes e novas formas de comunicação. Em certos

contextos, esses artefatos e essas linguagens têm sido incorporados ao

processo de ensino-aprendizagem de língua inglesa, como Miccoli (2016) nos

mostra.

No entanto, a mesma globalização produz discursos enviesados. Entre

eles, citamos, por exemplo, os estereótipos de adolescentes e de jovens

aprendizes de língua inglesa. Alguns desses estereótipos são as imagens de

adolescentes sintonizados com a produção midiática norte-americana,

especialmente, o cinema, as séries de televisão ou os videoclipes publicados

na web. Acrescentamos a essa lista os jovens que jogam videogame com

pessoas do mundo inteiro e que, em muitos casos, usam a língua inglesa para

competir e/ou colaborar, virtualmente.

Em suma, entendemos que a globalização produz pressões econômicas

e sociais para os Estados. Nesse cenário, saber a língua inglesa pode ser um

27

A BNCC (BRASIL, 2017b) foi elaborada para nortear 60% dos currículos de escolas com Ensino Fundamental (1 e 2) de todo o país. Em tese, esse documento serve, também, para a EJA. No entanto, criticamos a conduta dos proponentes desse marco legal. Entendemos a EJA como uma realidade específica, diferente daquela do Ensino Fundamental regular. Discordamos da ideia de que o Ensino Fundamental 2 seja, por excelência, um grande guarda-chuva, no qual a EJA deve ser abrigada. Acreditamos que a BNCC deveria fazer menção às especificidades dessa modalidade e, portanto, propor ajustes curriculares.

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56

benefício para o sujeito, em termos de mobilidade social, e para o país, em

termos de agenda política. Contudo, neste trabalho, ressaltamos a importância

de um olhar atento para as consequências discursivas desse fenômeno (cf. a

sessão intitulada Olhares sobre a condição pós-método no ensino de língua

inglesa).

A partir desses argumentos, na próxima subseção, abordaremos as

finalidades possíveis do ensino de língua inglesa, no contexto particular da

EJA.

1.1.4.1 Olhares sobre o ensino da língua inglesa no contexto da EJA

Professor, eu não sei nem falar português; pra que aprender inglês? –

esta é a pergunta que alguns alunos dos três professores-participantes deste

estudo lhes fizeram, ao longo dos anos, conforme ouvimos nas entrevistas.

Nesse caso, o discurso dos sujeitos-alunos indexa uma visão de mundo:

aparentemente, na EJA, a língua inglesa lhes parece desnecessária. Desse

modo, a questão para que aprender a língua inglesa, no contexto da EJA,

surge como uma reflexão necessária a este referencial teórico.

No campo da EJA, o processo de ensino-aprendizagem de língua

inglesa pode servir para a inclusão social. Esse argumento decorre, em

primeiro lugar, de uma visão de direitos à aprendizagem. Ainda que não faça

menção específica à EJA, encontramos esse argumento nos PCN-LEM

(BRASIL, SEMTEC, 1998, p. 19), do Ensino Fundamental 2:

A LE é um direito do aluno previsto na LDB 9.394/96 e na Declaração Universal dos Direitos Linguísticos, publicada pelo Centro Internacional Escarré para Minorias Étnicas e Nações (Ciemen) e pelo PEN-Club Internacional.

Alguns anos depois, o argumento do direito à aprendizagem foi

retomado pelos autores28 da Proposta Curricular para a educação de jovens e

28

Destacamos, aqui, o trabalho da orientadora desta pesquisa, Profa. Dra. Maria Antonieta Alba Celani, que foi coautora dos PCN-LEM (BRASIL, SEMTEC, 1998) e da Proposta Curricular para a educação de jovens e adultos: segundo segmento do ensino fundamental: 5ª a 8ª série: língua estrangeira (BRASIL, 2002b).

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57

adultos: segundo segmento do Ensino Fundamental: 5ª a 8ª série: língua

estrangeira (BRASIL, 2002b, p. 67, grifos nossos):

A aprendizagem de línguas estrangeiras, compreendida como um direito básico de todas as pessoas e uma resposta a

necessidades individuais e sociais do homem contemporâneo – não só como forma de inserção no mundo do trabalho, mas também, principalmente, como forma de promover a participação social –, tem papel fundamental na formação dos jovens e adultos. A língua estrangeira permite o acesso a uma ampla rede de comunicação e à grande quantidade de informações presentes na sociedade atual.

A nosso ver, a noção de direito pressupõe deveres. O aluno da EJA tem

o direito de aprender a língua inglesa, assim como o Estado tem o dever de

criar um contexto apropriado para o processo de ensino-aprendizagem. Para

cumprir com essa demanda, o Estado promove o que entendemos por

integração. Quer dizer: na EJA, a língua inglesa integra o catálogo de

disciplinas escolares. De um lado, isso não implica, obrigatoriamente, a

elaboração de políticas públicas que busquem fortalecer a prática pedagógica.

De outro lado, devemos analisar essa situação em uma perspectiva macro.

Afinal, o Estado pode acabar não garantindo ensino-aprendizagem de

qualidade em nenhuma disciplina, em qualquer modalidade ou etapa da

educação básica. Nas palavras de Leffa (2009, p. 116), “o que interessa, do

ponto de vista político, é afirmar a inserção [da língua inglesa]; não realizá-la”.

Neste trabalho, defendemos a ideia de que, ao aprender a língua

inglesa, mais do que participar de um mundo globalizado, o estudante pode ser

incluído nesse mundo. Com a metonímia da inclusão, damos um sentido

político ao nosso argumento. Apoiados em Freire, P. (2014), entendemos

política na perspectiva das relações de poder. Se o direito dos alunos da EJA à

aprendizagem de língua inglesa for negado, eles serão ainda mais excluídos de

setores da comunidade global de que fazem parte. Inversamente, os mais ricos

continuarão a aprender a língua inglesa e terão a chance de usá-la, caso

queiram, para a opressão social.

Além disso, não reputamos à língua inglesa um papel utilitarista.

Concordamos com a crítica de Prado, Lange, Schlatter e Garcez (2014) à

provável ineficácia de um processo de ensino-aprendizagem de língua inglesa,

na EJA, voltado apenas ao mercado de trabalho. Entendemos a língua inglesa

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como uma peça fundamental na formação de um pensamento plural, que

ultrapasse os muros da escola. Por isso, acolhemos as ideias a seguir,

estabelecidas por documentos oficiais para o ensino de LE/Inglês na EJA:

A LE tem um papel importante na formação interdisciplinar dos alunos

(BRASIL, 2002b).

A LE possibilita o ingresso do aluno “num universo cultural distinto”

(BRASIL, 2002b, p. 70).

A língua inglesa e o letramento digital constituem, juntamente, um

requisito para a participação num mundo global (SÃO PAULO, 2010).

A língua inglesa desenvolve a criticidade e ajuda o aluno a compreender

as diferenças entre os seus valores e os valores do(s) outro(s) (SÃO

PAULO, 2010).

Suportamos, ainda, a ideia de que a inclusão social, produzida,

parcialmente, pelo ensino-aprendizagem de língua inglesa, na EJA, exige um

olhar de alteridade29. Grosso modo, aprender uma LE é uma vivência que nos

coloca fora de si e no lugar do outro, in one’s shoes, como diríamos em inglês

informal. Desse modo, acreditamos que a língua inglesa tem o potencial de

criar situações em que os alunos da EJA exercitem essa conduta.

Por isso, entendemos que a língua inglesa é fundamental para incluir,

social e culturalmente, os jovens e os adultos da EJA na sociedade. E, por

sociedade, referimo-nos à comunidade global (superdiversa e mediada pela

tecnologia) e à comunidade local (a cidade, o bairro, a própria escola e a sala

de aula). Em qualquer uma delas, interpretamos o olhar de alteridade como

uma forma inclusiva de busca pela compreensão do(s) outro(s).

29

Adotamos, aqui, o significado de alteridade previsto nos PCN-LEM: “Por alteridade (sic) entende-se os fatores sociais que caracterizam a vida de outras pessoas em comunidades onde as línguas estrangeiras são usadas como línguas maternas, línguas oficiais e ainda como línguas estrangeiras” (BRASIL, 1998, p. 19).

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59

1.2 Olhares sobre a condição pós-método no ensino de língua inglesa

Neste trabalho, a primeira pergunta de pesquisa é: quais são as

estratégias de ensino de língua inglesa usadas pelos professores-

participantes? A escolha pelo termo estratégias deriva de uma teoria específica

sobre o ensino de LE: o pós-método. Por isso, nesta subseção, discutiremos os

tópicos a seguir: o que é a condição pós-método; por que esse construto da LA

serve ao propósito desta dissertação; o que são e quais são as

macroestratégias e as microestratégias de ensino de LE.

A princípio, é preciso discutir o conceito de método de ensino. Essa

discussão tem estado na agenda de professores da educação básica e de

pesquisadores. Normalmente, o debate gira em torno desta indagação (às

vezes, posta nas entrelinhas): qual é o melhor método de ensino? Como

professores de língua inglesa, podemos reconhecer que essa polêmica tenha

sido pretexto para inúmeras publicações, tanto voltadas ao ensino de LE ou de

segunda língua quanto à pesquisa em LA.

Segundo Correa e Saleh (2007, p. 10), “a palavra método tem sua

origem no grego méthodos e diz respeito a caminho para chegar a um

objetivo”. A etimologia da palavra método leva-nos a pensar, portanto, em

procedimentos que possam conduzir a determinado fim. Segundo as autoras, a

noção de método traz, ainda, sentimentos ambíguos para o ensino. De um

lado, o método é desejável; de outro, ele pode ser inibidor de conflitos e, assim,

não “propiciar a reflexão, a autocrítica e o cotejamento com a vivência pessoal,

caminho para a aquisição de conhecimento e a revisão da prática profissional”

(CORREA; SALEH, 2007, p. 11).

A ambiguidade do sentido de método no ensino de LE tem chamado a

atenção de alguns linguistas aplicados. Ao criticar o ensino pautado na égide

do (melhor) método, parte desses pesquisadores passou a teorizar a condição

pós-método. De acordo com Oliveira, L. A. (2014), Pennycook, em The

Concept of Method, Interested Knowledge, and the Politics of Language

Teaching (1989); Prabhu, em There is no best method - Why (1990); Richards,

em "Beyond Methods" (in: The Language Teaching Matrix) (1990); Allwright,

em The Death of the Method (1991); Kumaravadivelu, em The Postmethod

Condition: (E)merging Strategies for Second/Foreign Language Teaching

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60

(1994), contribuíram para essa crítica e teorização. À lista de Oliveira, L. A.

(2014), acrescentamos, ainda, os estudos de Canagarajah (2009a) sobre outro

construto em LA: o conhecimento local30. Para o linguista aplicado cingalês,

esse construto está diretamente associado a uma “consciência pós-método”

(CANAGARAJAH, 2009a, p. xxvii).

Para Pennycook (1989, p. 589-590 apud KUMARAVADIVELU, 2008, p.

10, tradução nossa), o conceito de método “reflete uma visão particular de

mundo e é articulado em interesses de relações de poder desiguais31” entre o

especialista e o professor. Para nós, mesmo havendo quase três décadas entre

o estudo do linguista aplicado australiano e esta dissertação, a ideia de

relações de poder desiguais continua central em pesquisas que investigam o

ensino de LE, particularmente, a língua inglesa. Grosso modo, os métodos de

ensino têm sido teorizados por acadêmicos e por autores de materiais

didáticos. As ideias sobre como ensinar com mais produtividade partem, então,

de centros de pesquisa ou de editoras, localizadas, quase sempre, nos Estados

Unidos ou no Reino Unido. Inversamente, em sala de aula, no Brasil, por

exemplo, o professor pode ter a função de aplicar determinado método, de

seguir certo caminho e de tentar chegar a um lugar pré-determinado por

outrem. Em suma, os métodos de ensino são, muitas vezes, de cima para

baixo – ou “top-down”, nas palavras de Kumaravadivelu (2008, p. 10).

De acordo com Kumaravadivelu (1994), além de haver uma geografia

injusta no ensino de LE (isto é, no centro, estão os teóricos; na periferia, há os

professores), os métodos de ensino partem de condições idealizadas e de

contextos ideais. O sujeito que ensina e o sujeito que aprende a LE são, assim,

desencarnados. São pessoas que, aparentemente, estão fora de um quadro

político, cultural, institucional e social. Essa constatação desestabiliza a ideia

pré-concebida de que algum método possa garantir a aprendizagem de todos

ou de quase todos os alunos, em qualquer contexto:

30

O termo conhecimento local (tradução nossa para “local knowledge”) é usado por Canagarajah (2009b), para referir-se (a) a crenças e a práticas sociais de uma comunidade; (b) aos saberes que contrastam com o conhecimento oficial; (c) ao conhecimento acadêmico que é produzido fora dos contornos das disciplinas já estabelecidas; (d) ao conhecimento gerado em contextos práticos de trabalho, como a sala de aula de LE. 31

“[...] as Pennycook (1989: 589–90) has pointed out, the concept of method “reflects a particular view of the world and is articulated in the interests of unequal power relationships” between the expert and the teacher” (KUMARAVADIVELU, 2008, p. 10).

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Como a aprendizagem de línguas e as necessidades, vontades e situações de ensino são imprevisivelmente numerosas, não há método idealizado que possa prever todas as variáveis, a fim de

providenciar as sugestões específicas à situação de que os professores necessitam, para lidarem com os desafios com que se confrontam no dia a dia (KUMARAVADIVELU, 2008, p. 10, tradução nossa, grifos nossos)

32.

A questão da imprevisibilidade das variáveis no ensino de LE remete-

nos, diretamente, a diferentes contextos. Como vimos, a condição pós-método

é uma reação à ideia de que as situações didáticas devem ter seus contornos

definidos pelos métodos. Além disso, essa condição é, também, um construto

frutífero para a investigação do processo de ensino-aprendizagem colado ao e

produzido no contexto, em seu sentido amplo.

Para Prabhu (1990), o contexto é constituído por variações relacionadas

à situação social (a política linguística, o ambiente linguístico, as atitudes

culturais e linguísticas, fatores econômicos e ideológicos), à organização

educacional (objetivos, limitações de tempo e de recursos, eficiência

administrativa, quantidade de alunos e ethos da turma), aos fatores

relacionados ao professor (status, formação, crença, autonomia e habilidades)

e aos fatores relacionados ao aluno (idade, aspirações, experiência de

aprendizagem prévia e atitudes em relação à aprendizagem). Diante dessa

complexidade, inseparável de qualquer sala de aula, Prabhu (1990) e

Kumaravadivelu (1994, 2003, 2008, 2012) insistem que não há um método

ideal para o ensino de LE.

Outro subsídio da condição pós-método aos estudos em LA é a busca

pela autonomia do professor, conforme argumentam Kumavaradivelu (1994,

2012) e Leffa (2016). Para esses pesquisadores, o professor conhece o

contexto onde trabalha, sabe quem são os alunos, quais são os objetivos, as

necessidades e os interesses deles. Logo, ele tem a possibilidade de

selecionar os procedimentos mais eficazes para ensinar e aprender em uma

situação específica. A respeito desse aspecto da condição pós-método, Leffa

(2016, p. 40) afirma: “ninguém conhece sua realidade melhor do que ele [o

32

“Since language learning and teaching needs, wants and situations are unpredictably numerous, no idealized method can visualize all the variables in advance in order to provide situation-specific suggestions that practicing teachers need to tackle the challenges they confront in the practice of their everyday teaching” (KUMARAVADIVELU, 2008, p. 10).

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62

professor], principalmente quando vista e analisada por sua própria reflexão e

pesquisa”.

A condição pós-método pode contribuir, ainda, para o trabalho com

projetos pedagógicos (PRABHU, 1990; KUMARAVADIVELU, 2003; LEFFA,

2016). Partindo da premissa de que, nessa lógica, o professor planeja

situações de aprendizagem a partir das vontades e dos problemas dos alunos,

o trabalho com projetos didáticos é uma organização curricular desejável.

A terceira contribuição da condição pós-método para estudos em LA é a

proposta de uma pedagogia crítica (KUMARAVADIVELU, 1994, 2003; MILLER,

2013; LEFFA, 2016). Essa perspectiva crítica considera que a noção de

método é fabricada a partir de alguns mitos. Parte deles, na verdade, já foi

discutida nesta revisão bibliográfica. Assim, apresentá-los-emos de forma

sintética, com base na leitura de Oliveira, L. A. (2014):

Primeiro mito: existe um método ideal.

Segundo mito: “o método se constitui no princípio organizador para o

ensino e para a aprendizagem de línguas” (OLIVEIRA, L.A., 2014, p. 195).

Terceiro mito: “o método tem um valor universal e é a-histórico”

(OLIVEIRA, L.A., 2014, p. 197).

Quarto mito: para alguns teóricos, o conceito de método produz a

dicotomia teoria x prática. Desse modo, o método pode ser reduzido à

teoria.

Quinto mito: o método é neutro e, portanto, não tem motivações

ideológicas.

O quarto subsídio da condição pós-método para a LA é a possibilidade

de pensar o processo de ensino-aprendizagem de forma pragmática, pautada

em princípios. Segundo Kumaravadivelu (1994, p. 30, tradução nossa), o

“pragmatismo por princípios”33 focaliza as ações em sala de aula como

resultado de uma avaliação crítica. Esse tipo de exame é pré-requisito para a

materialização da lógica pós-método e acontece por parte do professor.

33

“Principled pragmatism” (KUMARAVADIVELU, 1999, p. 30, tradução nossa).

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63

A quinta contribuição da condição pós-método é pertinente aos estudos

sobre a formação de professores de línguas. Para Kumaravadivelu (2003), a

formação de professores pode ser analisada de acordo com três paradigmas

coexistentes: o tecnicista passivo, o praticante reflexivo e o intelectual

transformador.

O tecnicista passivo implementa teorias criadas pelos acadêmicos. Sua

concepção de ensino-aprendizagem é behaviorista. Os conteúdos de ensino

são, basicamente, fatos observáveis e regras articuladas.

O praticante reflexivo é fruto dos estudos de Kumaravadivelu (2003)

sobre as obras How we think (1933) e The Reflective Practitioner (1983), dos

norte-americanos John Dewey (1859-1952) e Donald Schön (1930-1997),

respectivamente. Nesse perspectiva, o professor reflete sobre a ação e reflete

na ação. Dessa forma, é um intérprete do contexto e um produtor de teorias.

No entanto, para Kumaravadivelu (2003), a reflexão, nesse enquadre, é um

processo solitário e os professores continuam presos à relação de poder entre

o professor, na sala de aula, e o pesquisador, na universidade.

O intelectual transformador, por sua vez, está pautado na condição pós-

método. Para formular esse construto, Kumaravadivelu (2003) inspirou-se na

pedagogia freiriana. Em classe, o trabalho pedagógico é socialmente

contextualizado e orientado pelo questionamento. Entre outras características,

trata-se de uma visão de educador sensível à pluralidade cultural e à dimensão

afetiva dos estudantes. Além disso, a ideia de reflexão, nesse caso, é

expandida para ação-reflexão-ação.

Deste modo, a visão pós-método tem contribuído, parcialmente, para

uma mudança no trabalho com a formação de professores de línguas, no

campo da LA. Segundo Miller (2013, p. 100), houve

um caminhar da noção de treinamento em direção às noções de educação, formação, trabalho e desenvolvimento profissional [...], da busca pela eficiência a partir da subserviência às abordagens e métodos prescritos em direção à criticidade e à ética na época “pós-método” (Prabhu, 1990; Kumaravadivelu, 2003; Jordão et alii, 2011; Magalhães e Fidalgo, 2011; Celani, 2005; Moita Lopes, 2006, 2009; Silva et alii, 2012, entre outros).

Como esta dissertação está fundamentada no pensamento sócio-

histórico-cultural, é importante analisar outros discursos (ou olhares) sobre a

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condição pós-método. Embora linguistas aplicados de diferentes partes do

mundo, incluindo o Brasil, tenham usado esse construto para repensar a

formação de professores e as pesquisas sobre o processo de ensino-

aprendizagem de línguas, a perspectiva pós-método apresenta, também,

limitações.

Liu (2004) pesquisou, por meio de questionários, a adesão a métodos de

ensino (por exemplo, a abordagem comunicativa, o ensino por meio de tarefas,

o método de gramática-tradução, entre outros) de 448 professores de língua

inglesa como LE ou como segunda língua, em diferentes partes do mundo, e

para turmas de diversos níveis de ensino. A tese desse linguista aplicado é: a

condição pós-método é exclusivamente teórica. Na prática, os professores de

LE afirmam, ainda, aplicar algum método específico, em sala de aula.

Outro contra-argumento de Liu (2004) é o número de novas edições e de

publicações amplamente usadas, em cursos de pós-graduação, com

questionários sobre métodos de ensino, além de artigos em periódicos e de

apresentações em congressos e em conferências sobre determinado método.

Oliveira, L. A. (2014) concorda com a tese de Liu (2004). Para o linguista

aplicado brasileiro, os métodos ainda têm espaço na sala de aula de LE. Já

para Miller (2013), por outro lado, eles têm tido menos prestígio em cursos de

formação de professores de línguas, mas continuam sendo um desejo da

sociedade.

Ao questionar a validade da condição pós-método, consideramos, ainda,

os achados de pesquisas que contrastam o que os professores afirmam fazer e

o que fazem, de fato, em sala de aula. Para Kumaravadivelu (2008, p. 84,

tradução nossa),

pesquisas orientadas para a sala de aula e conduzidas por Kumaravadivelu (1993a), Nunan (1987), Thornbury (1996) e outros mostram, claramente, que, até quando os professores afirmam seguir algum método em particular, eles não aderem a princípios básicos associados a esse método.

34

34

“[…] classroom-oriented research conducted by Kumaravadivelu (1993a), Nunan (1987), Thornbury (1996), and others clearly shows that even teachers who claim to follow a particular method do not actually adhere to the basic principles associated with it” (KUMARAVADIVELU, 2008, p. 84).

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No Brasil, Oliveira, L. A. (2014) faz a mesma constatação, ao comentar

sua experiência como professor-formador de língua inglesa.

Neste trabalho, entendemos a condição pós-método como mais um

construto, em coexistência com diversos métodos de ensino de LE. Não é por

acaso que temos evitado a expressão “era pós-método” (PRAHBU, 1990, p.

162; KUMARAVADIVELU, 1994, p. 161). Não compreendemos esse conceito

como um marco temporal, mas como uma forma possível de olhar para o

processo de ensino-aprendizagem de LE.

Em resumo, para nós, a condição pós-método é um modelo teórico

disponível para explicar o ensino de língua inglesa na EJA. A respeito de

modelos teóricos, não podemos deixar de grifar a dinamicidade deles. Para

Deyes (2009, p. 128, tradução nossa), por exemplo, basta compararmos a

descrição do universo de Ptolomeu com a visão de Copérnico – “uma visão é

válida até que ela seja colocada sob pressão de novas descobertas e de novos

argumentos, os quais abarquem os fatos e os expliquem mais”35.

1.2.1 Olhares sobre a condição pós-método no contexto da EJA

Conforme afirmamos, anteriormente, a condição pós-método é um

construto possível e ético para o propósito desta dissertação. Possível, porque

é um modelo teórico disponível para pensarmos o ensino e a aprendizagem de

língua inglesa como LE. Ético, porque a interpretação do pesquisador inclui a

visão dos outros professores-participantes, em seus próprios contextos, sem a

necessidade de compararmos as ações e as interações, em sala de aula, com

as condutas prescritas por qualquer método de ensino.

Com base em Bohn (2013), entendemos ética numa perspectiva

bakhtiniana. De acordo com o linguista aplicado brasileiro, “a ética bakhtiniana

do dizer do sujeito, a responsabilidade/responsividade sem álibi nasce da

singularidade e define a posição do sujeito em seu contexto sociolinguístico”

(BOHN, 2013, p. 85). Para esse pesquisador, as ações em sala de aula

precisam responder ao contexto sócio-histórico-cultural das pessoas ali

35

“[...] one view is valid until it comes under pressure from new discoveries and new arguments which encompass the facts and explain more” (DEYES, 2009, p. 128).

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envolvidas. Nesse sentido, a condição pós-método valoriza as particularidades

de cada professor, em cada escola, com cada turma. Valoriza, também, as

identidades do professor e dos alunos.

Para Edmundo (2013), apoiada no pensamento de Pennycook (1989),

de Kumaravadivelu (1994, 2003) e de Canagarajah (2009a, 2009b), teóricos da

condição pós-método, pode-se dizer que “o olhar para o ensino da língua está

se movendo na busca por metodologias que valorizem o (re)encontro de

identidades (múltiplas e locais)” (EDMUNDO, 2013, p. 47, grifos nossos). Por

esse ângulo, é importante relembrarmos o contexto desta pesquisa. A EJA é

um tempo-espaço de muitas particularidades na educação básica: as salas de

aula são intergeracionais, há pouco investimento em formação inicial dos

professores, a carga horária de língua inglesa é pequena e as histórias de vida

dos alunos são, quase sempre, atravessadas pela exclusão social. Logo, é

importante pautar-nos em um modelo teórico que privilegie a heterogeneidade

(de objetivos, de práticas, de materiais didáticos e de concepções curriculares).

Entendemos a condição pós-método como um construto que se encaixa nesse

critério.

A respeito dessa heterogeneidade, para escrever o Caderno de

orientações didáticas para EJA: Língua Estrangeira – Inglês (SÃO PAULO,

2010), a pesquisadora Walkyria Monte Mór reuniu-se, durante um ano, com

professores da EJA. Sobre esses encontros, a autora escreve:

Percebeu-se que há falta de clareza dos objetivos e do papel desse ensino [o de LE] na escola e que estes vêm a se confundir com o papel e os objetivos de outras modalidades de ensino, tais como os cursos de idiomas. A falta de clareza resulta na prática de enfocar conteúdos e adotar procedimentos nem sempre adequados a um ensino escolar regular e às necessidades deste; resulta muitas vezes na desmotivação – de professores, alunos, pais de alunos, diretores – e no questionamento da relevância do estudo de línguas estrangeiras nas escolas regulares (SÃO PAULO, 2010, p. 24).

A condição pós-método rompe, teoricamente, com o dogmatismo da

prescrição. Com isso, abre caminhos não só para novas práticas, em sala de

aula, mas, também, para o desenho de novos objetivos de ensino-

aprendizagem de língua inglesa.

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1.2.2 Olhares para as macroestratégias de ensino de língua estrangeira

No tocante à condição pós-método, Kumaravadivelu (1994) propõe

pensar o ensino de LE por meio de macroestratégias e de microestratégias.

Para o linguista aplicado, as estratégias são ações ou atos de ensino. O que

diferencia, então, macroestratégias de microestratégias? As microestratégias

são mais numerosas e podem ser comparadas a atividades, em sala de aula.

São propostas com começo, meio e fim. As macroestratégias, por sua vez, têm

número limitado (dez, no total) e correspondem a procedimentos pensados a

partir de princípios (cf. a noção de pragmatismo por princípios, discutida

anteriormente). Como a própria linguagem aponta, as macroestratégias

conectam teoria (indiciada em princípios) e prática (indiciada em pragmatismo).

Inicialmente, Kumaravadivelu escreveu sobre macroestratégias e

microestratégias de ensino no artigo The Postmethod Condition: (E)merging

Strategies for Second/Foreign Language Teaching (1994). Depois, expandiu

esses conceitos no livro Beyond Methods: microstrategies for language

teaching (2003). Comparando os dois textos, as rubricas para cada

macroestratégia são as mesmas. No entanto, como se pode prever, diante dos

dois gêneros discursivos (artigo e livro de divulgação científica), em 2003, o

linguista aplicado pôde apresentar uma extensa revisão bibliográfica. Em cada

capítulo, o autor explica uma macroestratégia, sugere duas a quatro

microestratégias (passo a passo, para ajudar o professor) e mostra, em média,

dois projetos exploratórios. Normalmente, os projetos não têm um viés inter- ou

transdisciplinar. São projetos que partem de curiosidades ou de situações-

problema para os alunos resolverem.

Partindo dessa apresentação inicial, é oportuno conhecermos alguns

contra-argumentos aos estudos de Kumaravadivelu (1994, 2003), segundo

alguns autores brasileiros.

Para Oliveira, L. A. (2014, p. 201), Kumaravadivelu (1994, 2003) propõe

um “arcabouço macroestratégico” para o ensino de LE ou de segunda língua.

De fato, o pesquisador indiano lista um rol de ações docentes possíveis em

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sala de aula, embasando-as em pesquisas empreendidas por ele ou por outros

linguistas aplicados36. Além disso, Oliveira, L. A. (2014, p. 201) complementa:

É com base nas macroestratégias que, segundo Kumaravadivelu, os professores serão capazes de gerar suas próprias macroestratégias ou microestratégias de acordo com situações e necessidades específicas.

Esse raciocínio é importante para pensarmos as estratégias

socioafetivas, discutidas na sessão metodológica.

Para Leffa e Irala (2014, p. 29-30, grifos nossos), entretanto, as

macroestratégias não são, exatamente, uma novidade:

O uso do termo “pós-método” pode ser visto como uma tirada espirituosa e inteligente de Kumaravadivelu. A verdade, no entanto, é que não existe ensino de língua sem método. O próprio Kumaravadivelu (2006) reconhece isso ao responder as críticas que lhe fizeram: as macroestratégias que propõe não deixam de ser um método, como também é o caso do professor que segue sua intuição pedagógica ao ministrar sua aula. O que realmente

terminou foi a imposição dos métodos universais, infalíveis e a prova da incompetência do professor, dando lugar a soluções situadas, dentro de um contexto específico. [...] Neste ponto, Kumaravadivelu (2006) estava certo, ao defender a necessidade de contextualizar a aprendizagem.

Não concordamos com Leffa e Irala (2014). Para Kumaravadivelu

(2008), o método é produzido por especialistas. Em classe, todo professor

aplica sua metodologia de ensino. O linguista aplicado reputa essa lógica a

Mackey (1965, p. 84)37, que já diferenciava “análise de método” de “análise de

ensino”. Dessa forma, entendemos as macroestratégias de Kumaravadivelu

(1994, 2003, 2008) como ações constituintes da metodologia de cada professor

de LE.

Por fim, é importante frisar a produtividade do conceito de

macroestratégias. De acordo com Kumaravadivelu (1994), elas não são

prescritivas, mas descritivas. O autor sugere que elas sejam vistas como

estratégias interpretativas. Por meio delas, o professor pode pesquisar sua

prática e criar microestratégias a partir do seu contexto, preparando-se para

36

Aliás, considerando os vários episódios de interação em sala de aula transcritos por Kumaravadivelu (2003), é, no mínimo, exagerada a crítica de Liu (2004) sobre a alegada ausência de dados empíricos na pesquisa do linguista aplicado indiano. 37

“Mackey, W. F. (1965). Language teaching analysis. Bloomington: Indiana University Press” (KUMARAVADIVELU, 2008, p. 236).

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desenvolver sua própria teoria da prática de uma pedagogia de línguas. Além

disso, enquadrar as macroestratégias como estratégias interpretativas vai ao

encontro da metodologia de pesquisa adotada nesta dissertação (quer dizer, a

pesquisa qualitativa e interpretativista).

A seguir, apresentaremos a síntese de cada macroestratégia38.

1.2.2.1 Macroestratégia 1: Maximizar as oportunidades de aprendizagem39

Inicialmente, Kumaravadivelu (1994) teoriza sobre a importância de um

planejamento de curso de LE informado pelo feedback constante dos alunos.

Para ele, essa macroestratégia sempre esteve associada, também, às

instruções em sala de aula. De acordo com o linguista aplicado, as orientações

do professor propiciam oportunidades de aprendizagem. Essa ideia será

expandida no livro dedicado às macroestratégias de ensino

(KUMARAVADIVELU, 2003).

Para Kumaravadivelu (2003), as perguntas que o professor faz a seus

alunos e o envolvimento deles nas atividades propostas geram colaboração, o

que contribui para a criação e a utilização de oportunidades de aprendizagem.

Nesse sentido, uma alternativa viável a professores e a alunos de LE é trazer a

comunidade global para a sala de aula, por meio da internet. Para o autor, é

importante que as oportunidades de aprendizagem não sejam limitadas à

escola, mas ultrapassem-na. Por isso, Kumaravadivelu (2003) sugere a

participação de professores e de estudantes em comunidades virtuais, de que

participam, também, outros falantes da língua-alvo. A título de exemplo, o

38

Para a apresentação das macroestratégias, baseamo-nos na ordem dos capítulos de Kumaravadivelu (2003). Lembramos que cada macroestratégia corresponde a um capítulo do livro escrito pelo linguista aplicado. 39

“Maximizing learning opportunities” (KUMARAVADIVELU, 2003, p. 44). Informamos que, daqui em diante, todos os subtítulos desta subseção são traduções de macroestratégias pensadas por Kumaravadivelu (1994, 2003). Responsabilizamo-nos, inteiramente, por todas as traduções.

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70

linguista aplicado recomenda o trabalho pedagógico com chat rooms40, com

grupos de notícias e com web sites de pen pals41.

Destacamos que, nos dois textos-base (KUMARAVADIVELU 1994,

2003), o pesquisador critica professores de LE ou de segunda língua que usam

os currículos e os livros didáticos pré-fixados pelas escolas, sem reconstruí-los

a partir das necessidades, dos desejos e das situações específicas de cada

coletivo de alunos. O autor não se posiciona contrariamente ao uso desses

artefatos, mas entende que ambos devam ser usados como trampolins para a

criação de atividades em sala de aula.

1.2.2.2 Macroestratégia 2: Minimizar desencontros perceptuais42

Para Kumaravadivelu (1994), o sucesso ou o fracasso das ações em

sala de aula dependem, entre outros aspectos, da sensibilidade do educador,

para perceber os encontros e os desencontros engendrados pelo processo de

ensino-aprendizagem.

Segundo o autor (KUMARAVADIVELU, 1994), o impacto das atividades

em sala de aula na aprendizagem dos alunos depende tanto da interpretação

deles quanto da intenção do educador. Por isso, como exemplos, o autor cita a

importância de o professor antecipar eventuais desencontros, como a falta de

repertório linguístico, exigido por alguma atividade em classe; ou o

desconhecimento de alguns objetivos de aprendizagem – de curto ou de longo

prazo -, já estabelecidos com a turma.

Em livro, Kumaravadivelu (2003) afirma ser imperativo que os

professores de LE ou de segunda língua identifiquem os desencontros

perceptuais, em sala de aula. Para o pesquisador, o professor comprometido

com a aprendizagem precisa diminuir a distância entre o que intenciona e o

40

Chat rooms são espaços online em que pessoas podem se comunicar por meio de mensagens escritas, normalmente sobre um assunto específico. Em relação ao trabalho pedagógico com chat rooms, nas aulas de língua inglesa como LE, recomendamos a leitura de Holden (2009). 41

Pen pals são pessoas com quem é possível trocar cartas ou e-mails como um hobby e/ou como uma forma de aprimorar os conhecimentos em LE. Por meio do site My Language Exchange (Disponível em: <https://www.mylanguageexchange.com/penpals.asp>. Acesso em: 15.out.2018), o usuário pode se comunicar com pen pals (também conhecidos como pen friends), em diversos idiomas. 42

“Minimizing perceptual mismatches” (KUMARAVADIVELU, 2003, p. 77).

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que os aprendizes interpretam como o papel deles nos eventos da aula. Para o

autor, embora seja impossível evitar a formação de tais desencontros, é

possível identificá-los e administrá-los. Por esse ângulo, a mediação

pedagógica é uma ferramenta necessária à prática de ensino.

1.2.2.3 Macroestratégia 3: Facilitar a interação negociada43

No artigo publicado em 1994, Kumaravadivelu aborda a interação em

sala de aula em sentido amplo. Afirma que o aluno aprende mais a LE, quando

os tópicos de discussão partem da iniciativa dele (aprendiz). Algumas

microestratégias úteis para facilitar a interação negociada são

atividades em grupo;

discussão de tópicos que partam dos interesses dos alunos;

encorajamento à participação dos alunos em todos os momentos da

aula (por exemplo, ao clarificar o que foi dito, ao confirmar, ao checar a

compreensão, ao solicitar, ao corrigir, ao encenar etc.).

Em livro, Kumaradivelu (2003) enquadra a interação numa perspectiva

vygotskyana. Assim, entende a interação como uma atividade sócio-histórico-

cultural. Para o autor, essa atividade é tripartida em (a) atividade textual, (b)

atividade intertextual e (c) atividade ideacional.

Na atividade textual, a língua(gem) é vista como texto. Em termos de

ensino-aprendizagem, é importante que o aluno de LE receba input44

linguístico, suficientemente, para adquirir a segunda língua. Na atividade

intertextual, a língua(gem) é vista como lócus interacional e, portanto, a

aquisição45 de segunda língua depende das situações interacionais de que o

aprendiz participa. Nesse caso, a hipótese do output linguístico é, também,

43

“Facilitating negotiated interaction” (KUMARAVADIVELU, 2003, p.101). 44

Input é a “língua que o aprendiz ouve ou recebe e com a qual aprende” (LONGMAN DICTIONARY OF APPLIED LINGUISTICS, s.p. apud PAIVA, 2014, p. 180). 45

Preferimos a metonímia da aprendizagem de uma LE ou de uma segunda língua, ao invés da aquisição de uma LE ou de uma segunda língua. No entanto, para sermos coerentes com a linguagem usada pelos autores que sustentam nossa argumentação, mantivemos a escolha original de cada pesquisador, em toda a dissertação. Para saber mais sobre as diferenças entre essas metonímias, sugerimos a leitura de Paiva (2014).

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valorizada. Na atividade ideacional, a língua(gem) é vista como mecanismo de

comunicação e de funcionamento do pensamento. Nesse caso, aprender uma

segunda língua é participar de zpd’s (zonas de desenvolvimento proximal)46.

1.2.2.4 Macroestratégia 4: Promover a autonomia do aluno47

Preliminarmente, Kumaravadivelu (1994) entende que o professor de LE

pode equipar o aluno com habilidades metacognitivas, cognitivas, sociais e

afetivas, para que o estudante possa aprender a aprender. Outra parte

importante desse processo é sistematizar algumas estratégias de

aprendizagem que, às vezes, podem ser individuais, mas podem, também,

beneficiar o coletivo, em sala de aula. A título de exemplo, com base em

Kumaravadivelu (1994), citamos a mudança atitudinal, principalmente de

aprendizes adultos, em relação a suas expectativas dos papeis do professor e

do aluno, em um curso de LE ou de segunda língua. Segundo Kumaravadivelu

(1994), o professor deve ajudar o aprendiz a responsabilizar-se por sua

aprendizagem, combinando “preparação psicológica” com “treinamento

estratégico” (KUMARAVADIVELU, 1994, p. 40, tradução nossa)48. Por meio

dessa combinação, o autor acredita que o aprendiz terá condições de entender

o funcionamento das estratégias de aprendizagem e saberá como usá-las em

tarefas, como monitorar seu desempenho e como avaliar seu processo49.

Contudo, quase uma década depois, o próprio linguista aplicado revê

essa macroestratégia e, ao reconsiderá-la, passa a classificá-la como

“autonomia estreita”50 (KUMARAVADIVELU, 2003, p. 133). Para o autor, a

autonomia estreita refere-se, portanto, ao ensino estratégico de LE. Além dela,

o professor pode desenvolver nos alunos a “autonomia ampla”

46

Kumaravadivelu (2003) entende a zpd como a zona correspondente à distância entre o nível de desenvolvimento linguístico real e o nível de desenvolvimento potencial do aluno. 47

“Promoting learner autonomy” (KUMARAVADIVELU, 2003, p.131). 48

“This psychological preparation should be combined with strategic training that helps learners understand what the learning strategies are, how to use them for accomplishing various problem-posing and problem-solving tasks, how to monitor their performance, and how to assess the outcome of their learning” (KUMARAVADIVELU, 1994, p. 40). 49

As estratégias de aprendizagem são aprofundadas por Kumaravadivelu (2003). Em livro, o autor revisa a taxonomia delas, com base em Rebecca Oxford (1990). Aliás, o linguista aplicado (KUMARAVADIVELU, 2003) apresenta uma figura que esquematiza essa revisão teórica e que pode ser útil a pesquisas sobre esse tema. 50

Autonomia estreita e autonomia ampla são traduções, respectivamente, de “narrow autonomy” (KUMARAVADIVELU, 2003, p. 133) e de “broad autonomy” (KUMARAVADIVELU, 2003, p. 141).

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(KUMARAVADIVELU, 2003, p. 141). Inspirada nos princípios da pedagogia

freiriana, esse tipo de autonomia busca a emancipação das pessoas, a partir

do contexto escolar.

1.2.2.5 Macroestratégia 5: Estimular a conscientização linguística51

Em seu artigo, Kumaravadivelu (1994) conceitua a conscientização

linguística como uma conjunção de tomada de consciência com o aumento do

input linguístico. Em classe, o aluno de LE ou de segunda língua pode

aprender melhor, se interiorizar as regras do idioma por meio do acesso a

diversos textos.

Mais tarde, o linguista aplicado (KUMARAVADIVELU, 2003) expande

esse conceito e propõe uma classificação dos tipos de conscientização

linguística, a saber:

conscientização linguística geral;

conscientização linguística crítica.

No primeiro caso, o autor acrescenta a importância de o professor de LE

ensinar a prosódia da língua-alvo e os efeitos de sentido decorrentes dos

aspectos fonético-fonológicos. No segundo caso, o autor sugere pautar o

processo de ensino-aprendizagem na sociopolítica da linguagem. Em outras

palavras, isso significa ensinar-aprender a língua(gem) na perspectiva das

relações de poder.

1.2.2.6 Macroestratégia 6: Ativar a intuição heurística52

Essa macroestratégia tem relação direta com o ensino de gramática de

LE. Em seu artigo, Kumaravadivelu (1994) destaca o potencial do ensino

indutivo. Para ele, o aluno pode aprender uma LE a partir do contato com

51

“Fostering language awareness” (KUMARAVADIVELU, 2003, p.156). 52

“Activating intuitive heuristics” (KUMARAVADIVELU, 2003, p.176).

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74

dados textuais. Nessa perspectiva, com o tempo, o aprendiz passa a perceber

as regras implícitas ao funcionamento da língua.

Em livro, o linguista aplicado (KUMARAVADIVELU, 2003) problematiza,

novamente, as diferenças teóricas e práticas entre a metodologia dedutiva e a

indutiva. É importante ressaltar que a postura de Kumaravadivelu (2003) é

bastante equilibrada, no que diz respeito a essa ambivalência. O autor

reconhece que, no dia a dia, as duas metodologias têm coexistido. Por isso,

sugere microestratégias que focalizem:

o significado. Para tal, o linguista aplicado propõe a organização de

“tarefas pedagógicas” 53 (KUMARAVADIVELU, 2003, 189, tradução

nossa);

os elementos linguísticos. Com esse intuito, o autor aponta para “tarefas

de descoberta gramatical” 54 (KUMARAVADIVELU, 2003, p. 193,

tradução nossa).

1.2.2.7 Macroestratégia 7: Contextualizar input linguístico55

Inicialmente, Kumaravadivelu (1994) explica essa macroestratégia da

seguinte forma: o input selecionado pelo professor de LE precisa ser explorado

pelos alunos nas várias dimensões de uma língua: a sintática, a semântica, a

pragmática e a discursiva. Isso significa contextualizar toda sentença e todo

texto. Algumas microestratégias que beneficiam essa macroestratégia são

ensinar por meio de tarefas;

simular esquetes teatrais ou atividades como role-play;

53

No original, “grammar tasks” (KUMARAVADIVELU, 2003, p. 189). O autor explica que, por tarefas gramaticais, se refere aos estudos de Ellis e de seus colaboradores (1997). A referência completa é “Ellis, R. (1997). SLA Research and Language Teaching. Oxford: Oxford University Press” (KUMARAVADIVELU, 2003, p. 322). 54

No original, “grammar discovery tasks” ou “pedagogic tasks” (KUMARAVADIVELU, 2003, p. 193), isto é, tarefas pedagógicas. Nesse caso, o linguista aplicado inspira-se nas atividades sugeridas por Long e por seus colaboradores (1998). A referência completa é “Long, M. and P. Robinson (1998). “Focus on form: Theory, research, and practice,” in C. Doughty and J. Williams (eds.). Focus on Form in Classroom Second Language Acquisition. Cambridge: Cambridge University Press, pp. 15–41” (KUMARAVADIVELU, 2003, p. 326). 55

“Contextualizing linguistic input” (KUMARAVADIVELU, 2003, p. 204).

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75

propor a resolução de situações-problema.

Ao expandir esse construto, Kumaravadivelu (2003) propõe uma visão

mais ampla de contexto. Grosso modo, a tese do linguista aplicado é esta: todo

professor de línguas é um etnógrafo. Por isso, o contexto de uso da

língua(gem) pode ser classificado em (a) contexto linguístico; (b) contexto

extralinguístico; (c) contexto situacional e (d) contexto extrassituacional.

O contexto linguístico requer do professor o trabalho com coesão e com

coerência, em sala de aula. Nesse sentido, Kumaravadivelu (2003)

fundamenta-se em Halliday e Hasan (1976)56. O contexto extralinguístico

recruta ensinar-aprender aspectos relacionados à prosódia. O contexto

situacional diz respeito à adequação de um enunciado à situação que o gerou,

considerando, portanto, a semântica da língua(gem). Por fim, o contexto

extrassituacional é o contexto da cultura. Kumaravadivelu (2003) entende que

conferir sentido a um enunciado linguístico demanda conhecer as normas

culturais que o regem. Dessa forma, a decodificação da língua(gem) não ocorre

isolada das normas de interpretação da cultura do falante/ouvinte/aprendiz.

Em suma, Kumaravadivelu (2003) explica a relação entre aspectos

sintáticos, semânticos e culturais, a partir dos quais a comunicação acontece.

Para ele, usar uma língua para a comunicação efetiva exige a integração

desses aspectos, necessários à contextualização do input.

1.2.2.8 Macroestratégia 8: Integrar as habilidades linguísticas57

Nos dois textos-base desta revisão (KUMARAVADIVELU, 1994, 2003), o

autor parte de uma crítica: os livros didáticos de língua inglesa como LE

segregam as quatro habilidades linguísticas, isto é, leitura, escrita, oralidade e

compreensão oral. E, ao fazerem isso, criam situações artificiais, já que, no dia

a dia, usamos as quatro habilidades de forma integrada.

A princípio, Kumaravadivelu (1994) contrasta a forma como os alunos

combinam as quatro habilidades, na sala de aula de LE, com a maneira como

56

A obra citada por Kumaravadivelu (2003) é “Halliday, M. A. K., and R. Hasan (1976). Cohesion in English. London: Longman” (KUMARAVADIVELU, 2003, p. 323). 57

“Integrating language skills” (KUMARAVADIVELU, 2003, p. 225).

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elas são apresentadas – e separadas/sequenciadas – pelo professor e pelo

autor de livro didático. Disso redunda a recomendação do linguista aplicado

pela integração das habilidades, para um ensino efetivo da LE ou da segunda

língua.

Posteriormente, Kumaravadivelu (2003) conclui que o professor pode

planejar atividades cujo desenho pressuponha a integração de duas ou mais

habilidades. Por exemplo: solicitar, na e pela língua-alvo, aos alunos que

tentem entender o que o professor diz (compreensão oral), busquem

clarificações (oralidade) e tomem notas (escrita); ou organizar os alunos em

duplas/grupos para fazerem uma tempestade de ideias

(oralidade/compreensão oral/escrita/leitura) e planejarem a apresentação de

um seminário de algo do interesse deles à turma. Ao sugerir essas ações,

Kumaravadivelu (2003) reforça a importância, para o desenvolvimento das

habilidades linguísticas –em integração -, do uso da biblioteca escolar (nesse

caso, há a premissa de que esse espaço contém materiais na língua-alvo) e do

laboratório de informática.

Retomando a crítica à visão dos autores de livros didáticos quanto à

segregação das habilidades, Kumaravadivelu (2003) apresenta a seguinte

ideia: quando o professor usa, de forma dogmática, o livro didático, tende-se a

separar as habilidades e a diminuir a autonomia docente; ao contrário, quando

o professor complementa o uso do livro didático com recursos midiáticos

(filmes, músicas, revistas em LE, anúncios publicitários publicados na web,

etc.), tende-se a integrar as habilidades e a aumentar a autonomia docente.

1.2.2.9 Macroestratégia 9: Garantir a relevância social58

Previamente, Kumaravadivelu (1994) afirma que o professor de LE ou de

segunda língua precisa ser sensível ao ambiente social, político e educacional

em que ensina. Essa sensibilidade engloba, ainda, a questão do papel da

língua-alvo no lugar onde os alunos estudam e vivem. Para o autor, as metas

de aprendizagem, por exemplo, devem partir da análise desse contexto.

58

“Ensuring social relevance” (KUMARAVADIVELU, 2003, p. 239).

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77

A título de exemplo, Kumaravadivelu (1994) cita a questão do falante

nativo. No olhar desse pesquisador, os programas de ensino de LE não devem

esperar que os alunos atinjam a perfeição de um falante nativo, mas que

reflitam um uso funcional da língua, em situações comunicativas reais.

Adiante, Kumaravadivelu (2003) amplia a noção de ensino socialmente

relevante. Para o linguista aplicado, esse tipo de ensino considera – mais uma

vez, conforme vimos em Kumaravadivelu (1994) – os aspectos políticos,

sociais e educacionais, além das questões étnicas, históricas, burocráticas,

religiosas, familiares e de gênero que incidem na sala de aula, na vida dos

alunos e na vida dos professores. Apoiado nessa visão mais ampla, o autor

sugere que a variante padrão da língua-alvo seja ensinada como uma forma

socialmente mais valorizada, e não linguisticamente melhor do que todas as

outras variantes. Sugere, ainda, que o currículo dos cursos de LE seja

descolonizado, dando lugar a práticas sociais locais (e não prescritas pelas

metrópoles, isto é, pelos centros político-econômicos)59.

Por fim, Kumaravadivelu (2003) enfatiza a importância de o professor

selecionar e produzir materiais didáticos socialmente relevantes. No caso da

língua inglesa, o pesquisador propõe abordar o idioma na perspectiva de uma

língua global (em oposição à ideia de língua nacional). A partir disso, lista três

tipos de informação cultural que podem ajudar os professores de inglês como

LE a elaborarem materiais educativos. Parafraseando Kumaravadivelu (2003),

essas informações são:

textos que foquem a cultura de um país onde a língua inglesa seja

usada como primeira língua;

textos sobre a cultura dos próprios alunos, escritos/falados na língua-

alvo;

59

Kumaravadivelu (2003) relaciona o ensino-aprendizagem de uma norma-padrão ao problema da colonização produzida pela cultura europeia/ocidental. Esse argumento parte do trabalho de Pennycook (1998). Segundo Pennycook (1998 apud Kumaravadivelu, 2003), a expansão da língua inglesa no mundo é um produto da colonização, assim como os modos de pensamento e de comportamento europeus/ocidentais atuais. A cultura europeia/ocidental, portanto, é moldada pela e molda, ao mesmo tempo, a colonização. Diante disso, os dois autores reivindicam esforços conjuntos para a descolonização do ensino de língua inglesa como LE, em busca de representações e de possibilidades alternativas.

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78

textos que foquem diversas culturas, independentemente do uso oficial

da língua inglesa.

1.2.2.10 Macroestratégia 10: Aumentar a consciência cultural60

Para Kumaravadivelu (1994), aumentar a consciência cultural dos

estudantes não significa apenas trazer a perspectiva do nativo na língua-alvo.

Significa, na verdade, trazer a cultura dos educandos para a sala de aula. Toda

sala de aula é um ambiente culturalmente plural. Ao tratar os educandos como

informantes culturais, o educador de LE pode encorajá-los a engajarem-se em

um processo de participação que valoriza o conhecimento deles.

Mais tarde, o linguista aplicado (KUMARAVADIVELU, 2003) incrementa

essas ideias. Segundo o autor, ensinar uma língua é ensinar culturas. Assim, o

linguista aplicado baseia-se na noção de consciência cultural crítica, inspirada

em Freire, P. (2002). Nessa lógica, os alunos e o professor de LE são

informantes culturais.

Na opinião de Kumaravadivelu (2003), o ensino de cultura, na

perspectiva tradicional, concebe a sala de aula como um casulo monocultural.

De outro ângulo, na perspectiva crítica, a sala de aula pode ser um mosaico

multicultural. Nele, cada pessoa constitui uma peça, a partir de sua identidade.

Por identidade, o linguista aplicado entende a combinação de elementos

constituintes de uma pessoa, “como a cor, o gênero, a classe social, a religião

e a orientação sexual” (KUMARAVADIVELU, 2003, p. 266).

1.3 Olhares sobre a Afetividade

Neste trabalho, a afetividade é central na discussão teórica sobre o

processo de ensino-aprendizagem de língua inglesa. Essa centralidade pode

ser resumida em duas asserções:

o desenvolvimento e a aprendizagem ocorrem numa perspectiva

monista, isto é, que não separa a cognição da afetividade;

60

“Raising cultural consciousness” (KUMARAVADIVELU, 2003, p. 267).

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79

a dimensão afetiva parece ser ainda mais relevante, em termos de

ensino e de aprendizagem, quando pensamos no contexto particular da

EJA.

A partir dos argumentos apresentados, nosso objetivo é, inicialmente,

discutir como a afetividade tem sido apresentada em alguns estudos na área

de LA. Com isso, pretendemos traçar um panorama e, a partir dele, atar alguns

nós. A seguir, explicaremos nosso entendimento sobre a afetividade numa

lógica monista. Para nós, o monismo é a visão filosófica que mais bem se

encaixa na ideia de afetividade freiriana e na concepção de pessoa, construto

formulado pelo psicológico Henri Wallon. Para cada um desses autores,

dedicaremos uma subseção específica. Assim, o arranjo desta seção é

norteado pelos seguintes pontos:

(a) a presença da afetividade em pesquisas no campo da Linguística

Aplicada (LA);

(b) a afetividade numa perspectiva monista;

(c) a afetividade no pensamento de Paulo Freire;

(d) a afetividade e a concepção de pessoa, numa base

desenvolvimentista, segundo Henri Wallon.

1.3.1 Alguns olhares da Linguística Aplicada para a afetividade

Buscar indícios do tema da afetividade em pesquisas na área de LA,

especificamente com referência ao ensino e à aprendizagem de línguas, exige

um olhar atento não a uma palavra em particular, mas a um campo semântico.

Esse campo é constituído por itens lexicais como afeto(s), emoção(ões),

sentimento(s) e dimensão afetiva. Nessa busca, nossa argumentação partirá

de um estudo que não aborda a questão dos afetos na aula de LE, mas que

poderá nos ajudar a entender a posição secundária que esse tópico tem,

historicamente, ocupado, na LA.

De um ponto de vista diacrônico, Canagarajah (2018) discute o conceito

de competência comunicativa em língua inglesa como segunda língua ou LE,

em turmas de STEM (acrônimo para Science, Technology, Engineering, and

Mathematics), formadas por estudantes de diferentes partes do mundo. Para

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80

isso, o autor recupera a imagem de “metáfora arbórea da aquisição e da

competência linguística61” (CANAGARAJAH, 2018, p. 02, tradução nossa).

Pautada em explicações estruturalistas, essa metáfora sugere que a aquisição

de uma segunda língua ou de uma LE ocorre de forma semelhante ao

crescimento de uma árvore. A figura a seguir ilustra esse modelo:

Fonte: CANAGARAJAH, 2018, p. 03

No modelo revisado por Canagarajah (2018), a gramática da língua é a

estrutura profunda, de onde parte o tronco, constituído por elementos

fonológicos e morfossintáticos. Em tese, o trabalho da raiz com o tronco

propicia o desempenho (ou performance), que pode ser visível nos diferentes

usos discursivos e pragmáticos da língua(gem), na produção de gêneros

textuais distintos e na escolha adequada do registro linguístico. Os afetos e as

emoções (affect/emotion) aparecem como pano de fundo para o crescimento

da árvore (ou seja, para a aquisição de uma segunda língua ou LE). Ocupam,

portanto, um lugar acessório.

61

“[…] the arboreal metaphor of language acquisition and competence” (CANAGARAJAH, 2018, p. 02).

Figura 1 – Modelo arbóreo de aquisição de segunda língua

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81

Para o linguista aplicado cingalês, o modelo arbóreo prevaleceu nas

pesquisas sobre ensino-aprendizagem de LE, durante os anos 1970 e 1980.

Nesse período, portanto, “recursos como o corpo, as emoções, a situação ou

os objetos são considerados como partes de contextos externos ou

secundários à competência”62 (CANAGARAJAH, 2018, p. 03, tradução nossa).

Essa crítica aproxima-se de estudos de outros linguistas aplicados ou de

pesquisadores do ensino de línguas estrangeiras/adicionais, conforme veremos

a seguir.

Citamos, por exemplo, a hipótese do input para a aquisição de segunda

língua ou de LE, formulada por Krashen (1985). Para esse linguista aplicado,

há cinco hipóteses explicativas e complementares para a aquisição de uma LE.

Para efeito deste estudo, parece-nos pertinente citar a hipótese do filtro afetivo.

Por filtro afetivo, Krashen (1985) entende o bloqueio mental causado por

fatores afetivos (alta ansiedade, autoestima e motivação baixas) que impede o

input de atingir o dispositivo de aquisição de linguagem63. Segundo Paiva

(2014), o modelo de aquisição de segunda língua ou de LE proposto por

Krashen (1985) recebeu inúmeras críticas, porque diminuía a relevância do

ensino formal do idioma.

Já nos anos 2000, no prefácio da obra de Mastrella-de-Andrade et al.

(2011), Afetividade e emoções no ensino/aprendizagem de línguas: múltiplos

olhares, Böhn (2011, p. 07, grifos do autor) afirma:

Este termo [afetividade] vem expresso por palavras como motivação e identidade; palavras sobre crenças e emoções; sobre autoestima; sobre ansiedade; sobre falar, fazer, sentir e vir a ser; sobre o corpo e a voz. É uma tentativa significativa para explicar e compreender o ser humano aprendendo a falar diferentes idiomas; é mais um exercício para apreender, conforme propõe Carlos A. Faraco, os significados do ser da linguagem e do ser impregnado de linguagem.

Como o pesquisador brasileiro resume, no plano da LA, estudar a

afetividade implica conhecer aspectos relacionados à motivação, à construção

62

“Resources such as body, emotions, setting, or objects are considered part of environmental contexts that are extraneous or secondary to competence” (CANAGARAJAH, 2018, p. 03). 63

Nas palavras de Krashen (1985, p. 81), “the ‘affective filter’ is a mental block that prevents acquirers from fully utilizing the comprehensible input they receive for language acquisition. […] This occurs when the acquirer is unmotivated, lacking in self-confidence, or anxious, when he is ‘on the defensive’ (Stevick 1976), when he considers the language class to be a place where his weakness will be revealed”.

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82

de identidades, a crenças, à autoestima e à ansiedade, nas aulas de LE. Na

mesma obra, Mastrella-de-Andrade (2011, p. 12) afirma que as investigações

sobre a afetividade, nas aulas de língua inglesa como LE, não olham para esse

objeto como “meras questões individuais”, mas como “fatores imbricados e

[que] atuam de forma diferente em diferentes sujeitos, grupos e contextos”.

Aprendemos com Mastrella-de-Andrade et al. (2011) que pesquisar a

afetividade, nas aulas de LE, pode ocorrer numa moldura social e não

intrapsíquica.

Nessa mesma linha teórica, podemos incluir os estudos de Miller (2013)

e Silva, W. M. e Paiva (2016). Nos dois casos, as pesquisadoras brasileiras

enfatizam o papel da dimensão afetiva para a formação de professores de LE.

Para Miller (2013), baseada na pedagogia crítica, é imprescindível

pesquisar as emoções dos professores e a construção de suas identidades,

especialmente em projetos educacionais de justiça social. Silva, W. M. e Paiva

(2016), por sua vez, fundamentadas na teoria da complexidade, tratam de um

“lado afetivo” (SILVA, W.M.; PAIVA, 2016, p. 61) necessário à aprendizagem e

à formação específica do conselheiro linguageiro64.

Os trabalhos de Miller (2013) e de Silva, W. M. e Paiva (2016) criam

outros nós. No primeiro caso, a pesquisadora aponta para uma necessidade.

Miller (2013) sugere que as pesquisas em LA invistam na dimensão afetiva e

em suas implicações em sala de aula. No segundo caso, Silva, W. M. e Paiva

(2016) analisam uma experiência concretizada em uma universidade

brasileira65, um contexto bastante distinto daquele em que empreendemos esta

pesquisa.

Quanto à relação entre afetividade e prática pedagógica, Oliveira, L.

(2014) escreve sobre o papel do professor de língua inglesa como um

facilitador da aprendizagem. E, nesse sentido, facilitar a aprendizagem significa

“contribuir para a criação de uma atmosfera afetiva (emocional e psicológica)

positiva na sala de aula” (OLIVEIRA, L., 2014, p. 25).

64

“O conselheiro linguageiro atua tanto junto aos alunos (orienta, apoia, monitora e dá retorno, conscientiza, conversa) quanto junto à instituição (leva a prover recursos e oportunidades adequados). Esta dupla função só pode ser exercida por alguém que saiba a língua e que tenha conhecimento do que são línguas adicionais e de como as pessoas aprendem” (SILVA; PAIVA, 2016, p. 53). 65

UFPA (Universidade Federal do Pará), onde Silva, W. M. (2016) atua como pesquisadora e docente.

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83

Certamente, esse panorama pode ser expandido e, assim, acolher

novos e, talvez, contraditórios olhares. A afetividade, em LA, é um solo fértil à

colheita de muitos e variados frutos. Para nós, as pesquisas de Mastrella-de-

Andrade et al. (2011), de Miller (2013), de Oliveira L. (2014), de Silva e Paiva

(2016) e de Canagarajah (2018) são sulcos num terreno vasto. De modo geral,

esses estudos abordam a afetividade numa perspectiva identitária. Abordam-

na, ainda, como um construto englobante, que abarca problemas relacionados

à autoestima e à motivação dos alunos para aprender a língua inglesa. Para

esta investigação, no entanto, interessa-nos, sobretudo, uma abordagem

menos voltada aos estudos identitários e mais direcionada à relação professor-

aluno. Por isso, propomos outra base teórica para compreender o contexto

específico deste estudo. Seguindo a tendência transdisciplinar da LA,

buscamos em diferentes áreas do conhecimento subsídios para nossa reflexão,

a saber:

na filosofia monista de inspiração espinosista;

na sociologia da educação freiriana;

na psicologia da educação, especialmente, na teoria de

desenvolvimento humano walloniana.

1.3.2 Olhares de Baruque de Espinosa sobre a afetividade e a concepção

monista de conhecimento e de ser humano

Nesta dissertação, a afetividade ou a dimensão afetiva está pautada

numa concepção monista e espinosista66 do ser humano e do conhecimento.

Baruque de Espinosa67 (1632-1677) é um importante filósofo holandês do

século XVII. Sua filosofia vai de encontro ao racionalismo cartesiano, inspirado

pelas ideias de René Descartes (1596-1650).

66

Embora Merçon (2009, p. 39) utilize o adjetivo “spinozano” para qualificar os estudos inspirados em Baruque de Espinosa, o Vocabulário ortográfico da língua portuguesa (ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2009, p. 342) admite, apenas, a forma “espinosista”, na categoria gramatical adjetivo. 67

Optamos pela forma Baruque de Espinosa por tratar-se da grafia da referência bibliográfica (ESPINOSA, 2014) mais recente a que tivemos acesso.

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A lógica cartesiana é marcada por uma concepção dualista, em que

razão e mente devem ser sobrepostas às emoções e ao corpo. Para Brown e

Stenner (2001, p. 83, tradução nossa),

o problema da interação mente-corpo, como foi formulado por Descartes, envolve a separação estrita de dois elementos do ser, um movimento que faz de Descartes alguém essencialmente moderno

68.

Na concepção dualista, sintetizada pela máxima cartesiana penso, logo

existo, a razão é a condição da existência humana. Partindo do pressuposto de

que o pensamento ocidental, no século XVII, era intensamente marcado pelo

domínio político-ideológico da Igreja, o racionalismo surgiu como um paradigma

necessário aos filósofos e aos cientistas daquele momento. Da mesma forma,

no século XVIII, os iluministas continuaram a defender a importância do

pensamento racional, em prol da liberdade e da emancipação. Segundo Soligo

(2018 apud LEITE, 2018, p. 10), o raciocínio da época era: “a razão traria a luz,

contra as trevas das crenças religiosas e dos atos movidos pelos afetos”.

O predomínio do racionalismo e, portanto, da concepção dualista,

chegou à produção científica do século XX. Na LA, podemos ilustrar esse

argumento com o estudo diacrônico de Canagarajah (2018), mencionado há

pouco. De acordo com Leite (2018), a busca por novos paradigmas, que

rompessem com a lógica dual, partiu da Psicologia.

Não obstante a procura por uma concepção teórica alternativa, ainda

hoje, o racionalismo tem encontrado eco em diferentes campos do

conhecimento. Sua aceitação pode ser detectada, por exemplo, no âmbito

educacional. Uma amostra disso é, possivelmente, a formação do professor de

línguas. De modo geral, é comum ouvirmos relatos sobre a prevalência dos

conteúdos escolares tradicionais em detrimento das relações afetivas no

Ensino Fundamental ou Médio, em contextos de formação docente inicial.

Segundo Leite (2013), no Brasil, as pesquisas sobre afetividade, em

Psicologia e em Educação, começaram apenas nos anos 1990. Para esse

pesquisador, havia, aqui, portanto, uma “carência” (LEITE, 2013, p. 47) nos

estudos dessa temática. Em conformidade com os argumentos que

68

“The problem of mind-body interaction, as formulated by Descartes, involves the strict separation of the two elements of being, a move that makes Descartes essentially modern” (BROWN; STENNER, 2001, 83).

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apresentamos anteriormente, Leite (2013) reputa essa lacuna ao “secular

predomínio da chamada concepção dualista” (LEITE, 2013, p. 47).

Em contraste ao racionalismo, a concepção monista revela-se uma

teoria útil para compreendermos o papel dos afetos na construção do

conhecimento. O monismo, proposto por Espinosa (2005), postula que corpo e

mente são diferentes, mas atributos da mesma Substância, isto é, da mesma

Natureza. Adicionalmente, essa Substância constitui tanto o homem quanto

Deus. Disso, decorre o seguinte raciocínio: todos os seres humanos emanam

dessa Substância. Em síntese, a concepção monista rompe com dualismos

fundantes do pensamento racionalista cartesiano, como corpo/mente,

homem/Deus e pensamento/afetos.

Dito isso, refletiremos sobre o sentido dos afetos ou das emoções, na

concepção monista. Para tal, partiremos dos modos de conceber do homem,

segundo Espinosa (2014):

Chamamos opinião ao primeiro [modo de conceber do homem] porque está sujeito a erro e porque jamais tem lugar com respeito a algo de que estamos certos, mas só quando se fala de conjeturar e supor. Chamamos crença ao segundo [modo de conceber do homem]

porque as coisas que apreendemos unicamente pela razão, nós não as vemos, mas somente as conhecemos pelo convencimento, no intelecto, de que devem ser assim, e não de outra maneira. Porém denominamos conhecimento claro àquele [modo de conceber do homem] que não é por convencimento da razão, mas sim por um sentir e um gozar a própria coisa; esse conhecimento vai muito além dos demais (ESPINOSA, 2014, p. 50, grifos do autor).

Ao tratar dos modos distintos de conceber a inteligência, Espinosa

propõe, então, uma classificação. Para ele, as formas de conceber (quer dizer:

conceituar, de maneira imbricada, o mundo exterior e o mundo interior) são

tripartidas: opinião, crença e conhecimento claro. Na opinião, ficamos no

mundo das hipóteses e somos guiados pelo ouvir dizer. Na crença, queremos

apreender a realidade unicamente pelo intelecto. No conhecimento claro,

buscamos apreendê-la por meio da relação entre o nosso intelecto e as nossas

emoções. Segundo Espinosa, esse conhecimento vai muito além dos demais,

isto é, o autor declara ser esse modo de conceber a inteligência do homem a

forma mais plena e adequada. Nesse caso, nossa compreensão do mundo

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seria, idealmente, mais global, se olhássemos a realidade usando mente e

corpo, intelecção e sentimentos.

De acordo com Merçon (2009), para Espinosa, o sentido de afeto é

inseparável, portanto, da cognição, assim como a mente não pode ser

separada do corpo, nem Deus do homem. O afeto é a base do pensamento.

Posto de outra forma, “pensamos porque somos afetados” (MERÇON, 2016

apud RABERNOT, 2016, p. 18).

Se assumirmos a afetividade como algo indivisível em cada pessoa, à

luz do pensamento de Espinosa (2005, 2014), podemos inferir que

toda aprendizagem é marcada pelos afetos. Não existe atividade, em

sala de aula, que não cause alguma afecção69 no aluno e no professor;

a afecção pode causar um impacto afetivo positivo ou negativo;

o impacto (positivo ou negativo) incide, sempre, no aluno e no professor.

Logo, os afetos e a cognição do educador são tão importantes quanto os

afetos e a cognição dos educandos.

É necessário compreender, também, que a teoria dos afetos de

Espinosa (2005) não sugere roteiros pré-estabelecidos. As afecções que

acontecem, em sala de aula, por exemplo, não devem ser interpretadas como

unilineares, já que cada corpo é afetado de múltiplas formas. O que nos toca, o

que nos incomoda ou o que nos emociona não tem, sempre, a mesma causa.

Em uma sala de aula, as possibilidades de afecção são inúmeras. Em um

mesmo espaço, há corpos-mentes diferentes, que, ao longo de um curso,

passarão por mudanças, serão transformados, uma vez que as afecções não

são, evidentemente, exclusivas do espaço escolar. Com referência ao

potencial de mudança que as afecções/os afetos promovem, Merçon (2016

apud RABERNOT, 2016, p. 18) afirma:

69

Neste trabalho, usamos os segmentos lexicais afeto(s), afetividade e afecção. Para evitar uma escrita ambígua, compartilhamos, a seguir, o verbete do Dicionário etimológico da língua portuguesa: “afecção sf. ‘alteração, moral ou física, que se origina de diversas causas’ XVIII;

‘estado mórbido, distúrbio patológico’ XVII. [...] afetiv.IDADE sf. ‘inclinação para amar’ XIX

[...] afeto sm. ‘sentimento de amizade’ XVI” (CUNHA, 2010, p. 16, grifos do autor). Assim sendo, entendemos que a afeçção é algo que não envolve apenas aspectos emocionais. Os afetos estão mais próximos à ideia de emoções ou de sentimentos e, portanto, estão intrinsecamente ligados aos aspectos emocionais. A afetividade, por sua vez, é uma dimensão ou um domínio do conjunto de afetos.

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A imensa variabilidade de canais afetivos que nos constitui, seja quando comparamos nossas vidas umas às outras, seja quando consideramos uma mesma vida em seus distintos momentos, sugere não haver fórmulas para o ensino ou para o aprendizado das potências do pensamento.

A teoria dos afetos de Espinosa (2005) está diretamente ligada a outro

conceito: conatus. Para o filósofo holandês, conatus é nossa potência de agir.

Segundo Leme (2013), intérprete de Espinosa, podemos intuir a variação da

nossa potência de agir “antes e depois de uma afecção” (LEME, 2013, p. 111).

Isso significa que, dependendo da forma como o outro age sobre nós e do

modo como agimos sobre o outro, nossa potência pode aumentar ou diminuir.

Na filosofia espinosista, não existem pessoas potentes em oposição a pessoas

(supostamente) não potentes. Somos, todos, equipados com nosso conatus. A

questão que nos diferencia é como essa potência de agir nos conduz à ação ou

à estagnação, como, diante dos enfrentamentos da vida, nos mobilizamos ou

permanecemos imóveis.

A partir do conceito de conatus e do pressuposto monista de que os

afetos são a base - inseparável - do pensamento, interpretamos que, em sala

de aula, é ideal que as afecções gerem impactos afetivos positivos, de forma a

aumentar a potência de agir de todos os participantes do processo de ensino-

aprendizagem. Neste sentido, inferimos que o papel do professor ganha ainda

mais relevância, já que se espera dele a criação de afecções positivas, mesmo

quando ele se sente objeto de afecções negativas. Afinal, ser potente, em

termos espinosistas, é saber afetar e ser afetado (HOEGSBRO; NISSEN,

2014). Do mesmo modo, com base nesse argumento, podemos tentar

compreender por que, aparentemente, as afecções que partem do professor,

em sala de aula, na direção dos alunos, não levam ao aumento da potência,

quer dizer, não geram, a nosso ver, curiosidade em aprender mais, busca por

novos conhecimentos ou empenho por uma vida mais alegre.

Diante dessa discussão teórica, voltamos, então, ao contexto específico

desta pesquisa. Ao revisar a literatura sobre o processo de ensino-

aprendizagem na EJA, lemos sobre sujeitos atravessados pela exclusão social

e escolar. São pessoas cujas trajetórias de vida têm desencontros com a

trajetória escolar convencional. Consequentemente, não nos parece exagero

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concluir que, para muitas delas, as afecções promovidas pelo ambiente escolar

podem ter criado, no passado, impactos afetivos negativos. Daí a evasão

escolar, na infância, e a entrada em cursos de EJA, durante a adolescência

e/ou a vida adulta.

De forma geral, a escola tradicional, pautada no paradigma da

racionalidade técnica, tem separado a cognição dos afetos. No Brasil, essa

mesma escola tem propiciado a exclusão de milhares de crianças e de jovens,

ao longo dos anos. Logo, se o aluno da EJA se matricula em uma escola onde

predomina o dualismo, parece-nos coerente que o abatimento, a frustração e a

vontade de desistir possam atingi-lo (novamente). Defendemos a ideia,

portanto, de que a sala de aula da EJA oportunize impactos afetivos positivos

no estudante. Assim, aprender-ensinar a língua inglesa poderá se constituir

num processo de desenvolvimento integral do estudante e do professor.

1.3.3 Olhares de Paulo Freire sobre a afetividade

De acordo com Dalla Vechia (2016), as palavras afetividade, afetos e

amorosidade aparecem, no total, 11 vezes na extensa obra de Paulo Freire

(1921-1997). Mais uma vez, destacamos que esta subseção parte de sentidos

e de significados simbolizados por um campo semântico e não por uma

palavra-chave. Posto isso, discorremos sobre como a afetividade pode emergir

na sala de aula, usando a pedagogia freiriana como suporte de análise.

Da leitura de Freire, P. (2002, 2016, 2017), julgamos que a dimensão

afetiva

é alicerçada no monismo;

é uma escolha intencional e corajosa do professor;

está nos pequenos nadas;

é inseparável do diálogo;

é concretizada por meio do diálogo;

é produzida sócio-historicamente;

é o reconhecimento de que os alunos são oprimidos;

está presente na relação professor-aluno como um todo.

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O monismo em Freire, P. (2002, p. 52) pode ser fixado na subseção

Ensinar exige querer bem aos educandos, em Pedagogia da autonomia. Nessa

obra, o autor afirma:

E o que dizer, mas sobretudo que esperar de mim, se, como professor, não me acho tomado por este outro saber, o de que preciso estar aberto ao gosto de querer bem, às vezes, à coragem de querer bem aos educandos e à própria prática educativa de que participo. Esta abertura ao querer bem não significa, na verdade, que, porque professor (sic) me obrigo a querer bem a todos os alunos de maneira igual. Significa, de fato, que a afetividade não me assusta, que não tenho medo de expressá-la. Significa esta abertura ao querer bem a maneira que tenho de autenticamente selar o meu compromisso com os educandos, numa prática específica do ser humano. Na verdade preciso descartar como falsa a separação radical entre seriedade docente e afetividade. Não é certo, sobretudo do ponto de vista democrático, que serei tão melhor professor quanto mais severo, mais frio, mais distante e "cinzento” me ponha nas minhas relações com os alunos, no trato dos objetos cognoscíveis que devo ensinar. A afetividade não se acha excluída da cognoscibilidade. O que não posso obviamente permitir é que minha afetividade interfira no cumprimento ético de meu dever de professor no exercício de minha autoridade. Não posso condicionar a avaliação do trabalho escolar de um aluno ao maior ou menor bem querer que tenha por ele (itálicos do autor, negritos nossos).

Para Freire, P. (2002), a dimensão cognitiva é inseparável da dimensão

afetiva. Consequentemente, ensinar, numa perspectiva progressista, exige

reconhecer essa asserção. Um efeito disso é a importância da relação positiva

entre professor e alunos. Sem ela, o processo de ensino-aprendizagem

incorrerá em provável insucesso.

Vale ressalvar, também, a questão do querer bem aos educandos. A

respeito disso, Freire, P. (2002, p. 52) usa o deôntico – “deve-se”. Isso sugere

que o querer bem não é algo fácil ou simples. Desse argumento, resulta a

coragem sobre que o educador escreve. Interpretamos, aí, que, na pedagogia

freiriana, a afetividade é parte da agência do professor. Não se trata de algo

incidental, que surge a partir de um acaso entre duas pessoas ou,

acidentalmente, entre o professor e uma classe em particular. Trata-se, pois,

de um agir intencional, em direção a uma prática educativa pautada no diálogo.

A afetividade, ou a dimensão afetiva, de base freiriana está presente, até

mesmo, nos gestos. Para tratar disso, o educador descreve um meneio de seu

antigo professor de língua portuguesa, que lhe acenou com a cabeça,

mostrando respeito pela redação do estudante. Esse relato serve de material

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para o autor criticar a conformação das relações dentro da escola. Segundo

ele, há um “caráter socializante” e “informal” (FREIRE, P., 2002, p. 19) que é,

de forma geral, negligenciado no processo de formação de professores e no

cotidiano escolar. O educador conclui:

Pormenores assim da cotidianidade do professor, portanto igualmente do aluno, a que quase sempre pouca ou nenhuma atenção se dá, têm na verdade um peso significativo na avaliação da experiência docente. O que importa, na formação docente, não é a repetição mecânica do gesto, este ou aquele, mas a compreensão do valor dos sentimentos, das emoções, do desejo, da insegurança a ser superada pela segurança, do medo que, ao ser “educado”, vai gerando a coragem (FREIRE, P., 2002, p. 20, grifos nossos).

Neste trabalho, chamaremos os “gestos” e os “pormenores” a que Freire,

P. (2002, p. 20) se refere de pequenos nadas. Os pequenos nadas são atitudes

simples, como um aceno de cabeça em sinal de apreciação, um sorriso durante

a aula, a recepção dos alunos à porta da sala, um elogio sobre o avanço na

apropriação de determinada habilidade linguística ou estratégia de estudo,

como encontrar alguma palavra desconhecida no dicionário bilíngue. Na

pedagogia freiriana, a dimensão afetiva abarca essas atitudes no dia a dia

escolar. E, nesta dissertação, elas são tratadas como estratégias socioafetivas.

A afetividade existe no e por meio do diálogo. Nesse quadro referencial,

por diálogo, entendemos a interação entre dois mundos. Naturalmente, diante

das diferenças entre as pessoas, a concretização do diálogo depende de

disponibilidade.

Como professores, nossas condições sociais podem nos afastar da

realidade dos alunos, o que pode nos impedir de, verdadeiramente, dialogar

com eles. Por isso, o educador fala sobre a necessidade de nos tornarmos

“menos estranho[s] e distante[s]” (FREIRE, P., 2002, p. 51) da realidade em

que nossos estudantes vivem. Quer dizer: devemos ser mais disponíveis à

escuta do outro. A afetividade está, então, na forma como esse juízo do mundo

dos nossos alunos é feito.

Na pedagogia freiriana, não se conhece os alunos a partir de uma lógica

simplesmente objetiva (por exemplo, perguntando-lhes quanto ganham por

mês, se trabalham ou quantos chuveiros há em sua casa). É preciso tentar

conhecê-los como sujeitos, em sentido integral. Neste ponto, podemos citar o

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trabalho de Zanardo (2017). Ao pesquisar turmas intergeracionais e a

juvenilização na EJA, em São Bernardo do Campo, a pesquisadora

depreendeu que o diálogo é essencial no combate à evasão e ao absenteísmo

e na motivação à permanência escolar dos educandos.

Parece-nos que, para Paulo Freire, a afetividade não é dada, mas é

produzida sócio-historicamente. Concluímos isso por analogia. O edifício do

pensamento freiriano foi erguido a partir do materialismo dialético. Nessa visão,

não nos parece coerente admitir que algo mediado pelas pessoas e pela

cultura (como são os afetos) possa ser entendido como um ente intrínseco ao

processo de ensino-aprendizagem e, portanto, oferecido. Para haver

afetividade em sala de aula, os sujeitos precisam engajar-se na produção dela.

Além disso, a afetividade de base freiriana exige o reconhecimento de

que os estudantes são oprimidos. Essa asserção ganha ainda mais força,

quando discutimos esse tema no contexto da EJA. Segundo Freire, P. (2016),

os oprimidos têm sua dignidade roubada. Esse roubo é concretizado com o

desfalque da identidade, da autoestima e do afeto, como Arroyo (2018) pontua.

Por meio dessa linha interpretativa, Freire, P. (2016) não escreve sobre uma

prática assistencialista ou sobre coitadismo70. A ideia de opressão é, aqui,

radicalmente política. E, nas palavras do educador pernambucano, constitui um

problema a ser superado. O sujeito da EJA conhece a opressão na pele.

Para Freire, P. (2016), portanto, é preciso que a escola reconheça essa

opressão. Sem isso, as práticas educacionais hegemônicas continuarão a

desumanizar os sujeitos. Assim, a afetividade de que Freire, P. (2002, 2016,

2017) trata desempenha o papel de mola propulsora à humanização. Para o

educador pernambucano, somente a partir desse processo, podemos pensar

70

Em 1967, quando escreveu Pedagogia do Oprimido, Paulo Freire antecipou as críticas que receberia de alguns leitores. Ao defender o amor como elemento constituinte do diálogo, na educação emancipadora, o autor escreveu: “Sendo fundamento do diálogo, o amor é, também, diálogo. Daí que seja essencialmente tarefa de sujeitos e que não possa verificar-se na relação de dominação. Nesta, o que há é patologia de amor: sadismo em quem domina; masoquismo nos dominados. Amor, não. Porque é um ato de coragem, nunca de medo, o amor é compromisso com os homens. Onde quer que estejam estes, oprimidos, o ato de amor está em comprometer-se com a causa. A causa de sua libertação. Mas, este compromisso, porque é amoroso, é dialógico. Como ato de valentia, não pode ser piegas; como ato de liberdade, não pode ser pretexto para a manipulação, senão gerador de outros atos de liberdade. A não ser assim, não é amor” (FREIRE, P., 2016, p. 111, grifos nossos). Decidimos ressalvar essa antecipação às

críticas feita por Freire, P. (2016), porque, efetivamente, no contexto escolar, ouvimos de alguns professores que a pedagogia freiriana serve para passar a mão na cabeça dos alunos. Aqui, marcamos nossa discordância desse ponto de vista.

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em um paradigma educacional comprometido com a mudança pedagógica,

social, ética e política.

Dito isso, coligimos todos os pontos teóricos abordados para chegarmos

à questão crucial da relação professor-aluno. Para a afetividade ser articulada

à cognição e à humanização, constituir e ser constituída pelo diálogo, ela

precisa ser, primeiramente, produzida na relação entre os sujeitos. Sobre isto,

Freire, P. (2017, p. 140) escreve:

Creio que a questão fundamental diante de que devemos estar, educadoras e educadores, bastante lúcidos e cada vez mais competentes é que nossas relações com os educandos são um dos caminhos de que dispomos para exercer nossa intervenção na realidade a curto e a longo prazo.

Em resumo, Freire, P. (2017) vê na relação professor-aluno

(afetivamente positiva) uma forma de intervir na realidade e, portanto, cumprir

com a proposta de seu pensamento pedagógico. Desse modo,

compreendemos que sua teoria é, acima de tudo, uma teoria de respeito pelo

outro.

Por fim, concluímos que a dimensão afetiva, pautada em Freire, P.

(2002, 2016, 2017), ajuda-nos a olhar para o sujeito da EJA, à luz de um

paradigma crítico de educação. Auxilia-nos, também, a analisar a relação

professor-aluno, em sala de aula, buscando indícios de diálogo, de

humanização e de respeito pelo outro, sem, com isso, separar a afetividade da

cognição.

1.3.4 Olhares de Henri Wallon sobre a afetividade

Deste ponto em diante, discutiremos as contribuições da psicogenética

de Wallon (1995)71 e as apropriações dessa teoria do desenvolvimento humano

71

Não defendemos a teoria walloniana como o único referencial teórico, dentro da psicologia educacional, adequado a esta pesquisa. De outro lado, para estabelecer um diálogo entre os olhares de Espinosa (2014) e de Freire (2002, 2016, 2017), consideramos o pensamento de Henri Wallon um dinamizador de toda nossa discussão sobre a afetividade. Sobre isso, vale a pena compartilhar a experiência de Almeida, L. (2012a). De acordo com a pesquisadora, ao participar de uma mesa-redonda sobre as contribuições da Psicologia da Educação para o processo de ensino-aprendizagem na EJA, ela ouviu relatos de pesquisas produzidas com os aportes da teoria sócio-histórico-cultural de linha vygotskyana, da psicogenética walloniana e

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por pesquisadores da psicologia educacional. Para isso, não nos apoiaremos,

somente, nos textos escritos pelo médico, psicólogo e educador francês, mas,

especialmente, nas pesquisas desenvolvidas por diferentes psicólogos-

pedagogos brasileiros, cuja base teórica é o pensamento walloniano (GALVÃO,

1998, 2003; ALMEIDA, L., 2012a, 2012b; LEITE, 2013, 2018; MAHONEY,

2012, 2016; PRANDINI, 2016, entre outros).

Antes de prosseguir com a discussão teórica sobre os significados da

afetividade, é importante explicitar (i) por que e (ii) para que estudar esse tema,

a partir da psicogenética walloniana. O pensamento de Henri Wallon contribui

para uma visão da afetividade e da inteligência, à luz das teorias do

desenvolvimento. Consequentemente, ao estudá-lo, tornamo-nos mais seguros

sobre o quê e como observar a integração afetividade-inteligência, em sala de

aula. Acrescemos a isso a questão metodológica, que será central na próxima

sessão. No livro organizado por Almeida, L. (2012a), encontramos indicações

para a construção de uma pesquisa, em âmbito escolar, pautada na teoria

walloniana.

Henri Wallon (1879-1962) nasceu e viveu na França. Inicialmente,

estudou medicina e, mais tarde, psicologia. Seu principal interesse de pesquisa

foi a gênese do psiquismo humano. Para isso, dedicou-se a estudar a infância.

Com respeito a seu objeto de estudo, fazemos uma ressalva: a nosso ver, a

teoria walloniana não é útil, apenas, para analisar o desenvolvimento infantil.

De fato, a leitura de A evolução psicológica da criança ([1941]1995)

pode acenar para outro raciocínio, a começar pelo título. Ao revisar esse texto,

encontramos, inúmeras vezes, a expressão a criança. Analogamente, no Brasil,

Galvão (1998) - importante interlocutora do psicólogo francês – publicou Henri

Wallon: uma concepção dialética do desenvolvimento infantil. Embora

reconheçamos esses indícios, mantemos nosso posicionamento.

Para isso, apoiamo-nos em dois argumentos: em primeiro lugar, Wallon

(1995) explicita seu projeto de pesquisa e não deixa dúvidas quanto ao seu

interesse em estudar o desenvolvimento do psiquismo, isto é, da personalidade

(e, por conseguinte, da inteligência) humana. Essa questão é discutida por um

dos discípulos do pesquisador, Zazzo (1995), que afirma: “Wallon definiu-se,

do behaviorismo radical. Quer dizer: o mesmo objeto pôde ser observado a partir de diferentes (e complementares) ângulos.

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pois, a si mesmo, como um psicólogo no sentido mais completo do termo”

(ZAZZO, 1995 apud WALLON, 1995, p. 16).

Em segundo lugar, numa perspectiva desenvolvimentista, a infância

pode ser privilegiada, mas não, necessariamente, reduzida a uma espécie de

fase única do desenvolvimento. Esse argumento ganha força, à medida que o

ilustramos com os estudos de Almeida, L. e Mahoney et al. (2007), Almeida, L.

et al. (2012a), Leite (2013) e Leite et al. (2018), que usam a teoria walloniana

como aporte teórico para pesquisas em diversos contextos, com sujeitos de

todas as idades (o que inclui jovens, adultos e idosos da EJA, tanto professores

quanto alunos).

Para Wallon (1995), as emoções não devem ser separadas da

inteligência, nem devem ser tratadas “como uma dimensão sombria e perigosa

para o ser humano” (LEITE, 2013, p. 47). Daí a crítica do psicólogo francês ao

dualismo herdado da filosofia positivista. A respeito dessa posição, é

interessante constatar que Wallon foi um dos pensadores mais influentes do

movimento escolas novas, na Europa, na primeira metade do século XX. Esse

movimento buscou uma renovação educacional, opondo-se à escola e à

pedagogia tradicionais. Segundo Cambi (1999), do ponto de vista filosófico,

essa oposição marcou um desacordo com as ideias positivistas, prevalecentes

na prática escolar cotidiana da época.

Apoiado no materialismo histórico-dialético, Wallon (1995) postula que o

sujeito é constituído por suas interações com o meio. Por isso, o autor propõe

um estudo sempre contextualizado do indivíduo. Para ele, entender o sujeito é

entendê-lo em uma atividade, agindo no meio. Disso, resulta o potencial

profícuo do espaço escolar para a investigação das condutas, dos

pensamentos e dos sentimentos das pessoas.

Segundo Mahoney (2016, p. 14), a teoria walloniana é “uma perspectiva

psicogenética num enfoque interacionista”. Em outras palavras, o

desenvolvimento surge da interação entre programações genéticas da espécie

com variáveis do meio. Por meio, o autor refere-se à interação entre os

recursos motores, cognitivos e afetivos com que o indivíduo é equipado (por

herança filogenética) e as características do ambiente. Adicionalmente, Wallon

(1995) classifica o meio em espacial e em social. O meio espacial diz respeito à

paisagem geográfica, como os meios rurais e urbanos, e as vizinhanças por

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onde o indivíduo transita. O meio social concerne aos grupos de que o

indivíduo faz parte, como a família, o ambiente de trabalho e a escola.

Na visão de Wallon (1995), o desenvolvimento percorre etapas ou

estágios. A cada estágio de maturação72, mais funções psíquicas ficam

disponíveis ao indivíduo. Com base em Galvão (1998), entendemos as funções

psíquicas como aquelas responsáveis pelas novas possibilidades e

capacidades de pensamento e de ação. Essas funções surgem

progressivamente e seguem a seguinte lógica: as funções mais recentes

integram-se às funções anteriores, sobrepondo-as, sem, dessa forma,

pressupor a eliminação das funções mais antigas.

Adicionalmente, as funções psíquicas tornam-se mais complexas, à

proporção que o social passa a ocupar o lugar que, anteriormente, era

exclusivo do biológico. Citamos, como exemplo, as emoções dos bebês. Para

um recém-nascido, a fome é uma situação indutora de choro. À medida que a

criança amadurece, ela passa a entender que, por meio da linguagem, é

possível comunicar seu desejo por comida de outra maneira. Quer dizer: o

social (i.e., a linguagem, a interação humana e a cultura) se liga ao biológico,

retirando-lhe sua primazia anterior, durante o estágio impulsivo emocional (de 0

a 1 ano).

Ao mesmo tempo, o ambiente coloca, também, novas demandas. O

“meio não é, portanto, uma entidade estática e homogênea, mas transforma-

se”, juntamente com a pessoa (GALVÃO, 1998, p. 38-39). Podemos afirmar

que, na psicogenética walloniana, organismo e meio formam uma unidade.

A partir dessa unidade, a teoria walloniana compreende o

desenvolvimento como algo não linear. Por não linearidade, aqui, queremos

dizer que o caminho de desenvolvimento trilhado pelo indivíduo não prevê a

superação total de aspectos dos estágios anteriores. Segundo Wallon (1995), o

desenvolvimento humano é regulado por duas leis. A primeira delas é a lei de

alternância funcional. Para o psicólogo francês, ao longo da vida, nossa

maturação alterna movimentos de dentro para fora e de fora para dentro. Em

outras palavras, estamos ora em busca do conhecimento de si (com destaque

72

Na psicogenética walloniana, os estágios de desenvolvimento são: (1) impulsivo-emocional (durante o primeiro ano vida); (2) sensório-motor e projetivo (dos dois aos três anos); (3) personalismo (dos três aos seis anos); (4) categorial (dos seis anos à adolescência); (5) adolescência (WALLON, 1995).

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para os estágios impulsivo emocional, personalismo, puberdade e

adolescência), ora em busca do conhecimento de objetos externos

(normalmente, nos estágios sensório-motor e projetivo, categorial).

A segunda lei reguladora do desenvolvimento humano é a

predominância de conjuntos funcionais a cada estágio. Adiante, nos deteremos

no conjunto da afetividade. Neste momento, é importante explicar que, para

Wallon (1995), ao longo da vida, em cada etapa, um conjunto ou domínio tende

a predominar. Por exemplo: é esperado que a dimensão dos afetos seja

acentuada durante a adolescência, quando as pessoas começam a se opor

aos adultos, a se apaixonar e a descobrir seus objetos de desejo. Entretanto,

nenhum conjunto funcional deixará de atuar no desenvolvimento ou será,

conforme explicamos, superado, linearmente. A nós, parece que a perspectiva

de desenvolvimento walloniana é mais próxima à figura de um espiral do que à

imagem de uma reta.

Nessa teoria psicogenética, desenvolver-se não significa mesclar

funções psíquicas, mas tem o sentido de “um processo constituído por

oposições, oscilações, avanços e retrocessos” (PRANDINI, 2016, p. 34). Quer

dizer: o desenvolvimento pressupõe transformações constantes e contínuas.

Dito isso, é importante compreender que “continuidade não significa ausência

de mudanças, mas transformações coerentes com a história evolutiva anterior”

(MAHONEY, 2016, p 15). Quanto a esse processo de ir-e-vir, que marca o

desenvolvimento humano, vale a pena lermos o que o próprio Wallon afirma

sobre a transformação da criança em adulto:

a infância e a multiplicidade de suas possibilidades atingem o seu máximo no homem, o ponto em que seu desenvolvimento é a aptidão para modificar suas reações, não apenas seguindo a excitação bruta ou associações já realizadas, mas em função de suas representações relativas às circunstâncias presentes e futuras (WALLON, 1984, p. 05

73 apud MAHONEY, 2016, p. 19).

Na busca por uma teoria não reducionista e fragmentadora do psiquismo

humano, Wallon (1995) propõe um estudo integrado do desenvolvimento

humano; disso resulta sua concepção de pessoa. Para ele, nossas funções

psíquicas são distribuídas em diferentes conjuntos ou domínios (o ato motor, a

73

WALLON, Henri. L’enfant turbulent. Paris: Presses Universitaires de France, [1925] 1984.

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afetividade e o conhecimento74). Cada conjunto se integra75 a todos os outros.

Logo, esses domínios devem ser vistos como uma unidade, um todo

entrelaçado. Para Wallon, esse todo constitui um quarto conjunto funcional: a

pessoa. A respeito disso, Leite (2013, p. 48) afirma:

Para Wallon (1968, 1978, 1995), o processo de desenvolvimento humano é determinado pela contínua relação que se estabelece entre três grandes núcleos funcionais – a afetividade, a cognição e o movimento – que vão produzir o quarto núcleo que ele chamou de pessoa. As relações entre esses núcleos são explicadas pela relação dialética que existe entre os processos biológicos/orgânicos e o ambiente social, o que significa assumir que as dimensões biológica e social são indissociáveis, estando dialeticamente relacionadas.

Baseados em Mahoney (2016), podemos afirmar que, considerando a

integração dos conjuntos funcionais, em cada etapa da vida (bebê, criança,

adolescente, adulto, idoso), tem-se, sempre, uma pessoa completa e um

sujeito em transformação. Assim sendo, o psiquismo é o resultado das

unidades organismo-meio e movimento-afetividade-inteligência-pessoa.

Antes de prosseguirmos com essa discussão teórica, é necessário

diferenciar pessoa, indivíduo e sujeito. De acordo com Prandini (2016, p. 30),

para Wallon, “pessoa é um conceito abstrato, genérico, que se refere ao que há

de comum entre os homens, opondo-se ao conceito de indivíduo, como homem

particular, concreto”. Ou seja: pessoa é um construto teórico; indivíduo é o ser

humano encarnado, atuando dentro de uma atividade, interagindo com o outro

e com o meio. Sujeito, por sua vez, é um termo também usado por outros

interlocutores de Wallon em que nos apoiamos: Galvão (2003) e Leite (2013,

2018). Ao pensar as contribuições do psicólogo francês para o pensamento

educacional contemporâneo, Galvão (2003, p. 82), por exemplo, afirma: “[a

teoria de Wallon] confirma a intuição de tantos professores que se recusam a

se dirigir a seus alunos como se fossem intelectos abstratos ou sujeitos sem

história” (grifo nosso). Portanto, sujeito é um termo que amplia a ideia de meio,

74

Os intérpretes de Wallon em que sustentamos esta pesquisa não compartilham das mesmas escolhas lexicais para nomear os domínios ou os conjuntos funcionais. Galvão (1998, 2003) usa ato motor e inteligência. Leite (2013) prefere movimento e cognição. Mahoney (2016), por sua vez, escreve motor e cognição. 75

Quanto ao significado do verbo integrar, além de nos apoiar nos psicólogos-pedagogos citados neste texto, firmamo-nos, também, no sentido etimológico dessa palavra. De acordo com Cunha (2010, p. 361), integrar tem o sentido de “completar”.

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um conceito fundamental para essa teoria, porque engendra a noção de

contexto histórico, social e cultural.

É preciso, ainda, fixar outro ponto da teoria walloniana, antes de

aprofundarmos a argumentação sobre a afetividade: a seleção de um domínio

psíquico. Se Wallon (1995) entende o ser humano numa perspectiva integral,

pode parecer incoerente, do ponto de vista teórico e metodológico, usar esse

pensamento como suporte para entender um conjunto funcional em particular.

Para desfazer essa lógica, apoiamo-nos em Prandini (2016). De acordo com a

autora,

a divisão das funções pelos domínios ato motor, afetividade e conhecimento satisfaz a uma necessidade de analisar, fragmentar, para compreender (PRANDINI, 2016, p. 30).

Isto é: o olhar fracionado nos ajuda a mergulhar em um aspecto da

teoria walloniana, a olhar - com foco - em um ponto específico, mas isso não

significa desconsiderar outros elementos desse referencial.

Com a psicogenética walloniana em nosso horizonte, chegamos à

questão específica da afetividade. Segundo Almeida, L. (2012a), para Wallon, o

conjunto afetivo é a capacidade orgânica que temos de afetar e de sermos

afetados. Como Mahoney (2016) afirma, esse domínio oferece-nos funções

responsáveis pelas emoções, pelos sentimentos e pelas paixões76. Ao interagir

com o meio, essas funções produzem os recursos de que precisamos para nos

comunicar, para nos expressarmos para e com o outro e, assim, agirmos no

mundo.

Como essa teoria pode contribuir para o processo de ensino-

aprendizagem? Em primeiro lugar, reiteramos a perspectiva monista. Como

professores, quando aceitamos a psicogenética walloniana, concordamos com

76

A teoria walloniana pressupõe uma classificação dos afetos em emoções, sentimentos e paixões. Sobre essa classificação, Almeida, L. (2012a, p. 14) afirma: “Emoções, sentimentos e paixão diferem em níveis de duração, visibilidade, intensidade e controle: emoções, com predominância do orgânico, têm curta duração, maior intensidade e visibilidade, e o controle da razão sobre elas é menor; os sentimentos, com predominância da representação, são mais duradouros, menos intensos e mais controlados; já a paixão é encoberta com completo autocontrole sobre o comportamento, para atingir um objetivo; é mais duradoura e mais intensa do que o sentimento”. Neste trabalho, já que elegemos uma proposta teórica inter/transdisciplinar, e, portanto, não focada em apenas uma teoria sobre a afetividade, não faremos uma distinção entre os tipos de afeto. Entendemos que, assim, o trabalho pode ficar um pouco mais conciso e didático.

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a ideia de que, em sala de aula, não trabalhamos apenas com a inteligência

dos alunos (conjunto cognitivo). O tempo todo e ao mesmo tempo,

trabalhamos, também, com a motricidade e a afetividade de cada indivíduo e

do grupo. Assentimos, então, com a premissa de que a temperatura afetiva

pode interferir, diretamente, na aprendizagem e no ensino.

Apoiados na afetividade walloniana, podemos romper com alguns

discursos escolares já cristalizados. Por exemplo: alguns alunos não aprendem

determinado conteúdo, porque seu estado afetivo não é saudável. No caso da

educação básica pública, com frequência, esse estado afetivo parece estar

relacionado a problemas familiares. No caso da EJA, as possibilidades são

ainda mais numerosas. Os distúrbios afetivos podem ser decorrentes de

pobreza, desemprego ou separação amorosa. Como professores, nossa

prática informa-nos que, muitas vezes, há relação entre perturbações afetivas e

cognição. Entretanto, com base em estudos wallonianos, como o de Galvão

(1998), aprendemos que o contrário pode ser, também, verdadeiro. Aprender

algum conteúdo escolar pode causar um impacto positivo na afetividade. Um

aluno desmotivado tem a possibilidade, ao construir conhecimento na escola,

de aumentar sua autoestima e melhorar seu autoconceito.

Outro ensinamento das pesquisas sobre a psicogenética walloniana é o

valor da interação. De acordo com Galvão (2003, p. 82, grifo da autora),

a ideia de que o ser humano se constrói na interação social, no confronto com o outro, traz importantes consequências para a compreensão, na escola, dos sujeitos em formação e de seus processos.

Provavelmente, no cotidiano escolar da EJA, haja tempos-espaços

propícios à interação. Um deles, por exemplo, é o cenário eleito para esta

pesquisa: a aula de língua inglesa como LE. No entanto, com Wallon (1995),

passamos do reconhecimento desse fato para a possibilidade de qualificação

dessa dinâmica. Dizendo de outra forma, a qualidade da interação prepara as

aprendizagens.

De acordo com Mahoney (2016), para Wallon, aprender significa

transformar-se na relação com o outro. Na teoria psicogenética, isso pode ser

comprovado por meio da atração que a criança sente pelo adulto. “Essa

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atração é movida por uma das necessidades mais profundas do ser humano:

estar com o outro para se humanizar” (MAHONEY, 2016, p. 19). Assim,

marcamos mais um encontro entre o pensamento do psicólogo francês e o

pensamento freiriano. Para o educador pernambucano, a educação popular

deveria servir para a humanização e para a libertação dos oprimidos (FREIRE,

P., 2016). Nossas experiências, em turmas de EJA, sugerem que há alunos

que já vivenciaram ou ainda vivenciam processos de desumanização, como a

privação de liberdade, a fome e a violência sexual. Quase todos eles foram

vítimas, em algum momento, da exclusão escolar, seja por meio da falta de

acesso ao ensino obrigatório ou pelas dificuldades em permanecer na escola.

Portanto, a compreensão de Mahoney (2016), amparada pela psicogenética

walloniana, sobre o significado de aprender reforça o papel que a escola pode

exercer na vida dos estudantes.

A partir de Wallon (1995), atribuímos, então, outros sentidos à relação

professor-aluno. Neste ponto, com base em Almeida, L. (2012a, p. 14),

reiteramos: na psicogenética walloniana, o professor não deve ser “bonzinho

ou ceder ao capricho dos alunos”. Segundo nosso aporte teórico, ser professor

é considerar o aluno como uma pessoa global e organizar o ensino numa

perspectiva de educação integral. Ser professor é cuidar das relações em sala

de aula, porque entendemos que elas podem moldar a possibilidade de os

alunos aprenderem (ou não). Reforçamos esse argumento com o trabalho de

Galvão (2003). De acordo com a pesquisadora walloniana, há estudos que

mostram como o destravamento da inteligência depende de uma ação

intencional do professor, no sentido de promover o “saneamento da atmosfera

emocional” (GALVÃO, 2003, p. 84). Neste trabalho, compreendemos que esse

saneamento pode fazer parte, então, da agência do professor.

Na EJA, nossas vivências, como professores, mostram que as salas de

aula são, muitas vezes, apenas portos de passagem. Cansados do trabalho ou

desanimados com um histórico de fracasso escolar, muitos estudantes dessa

modalidade de ensino parecem passar pela escola, mas sem ancorarem e

sentirem-se seguros. Os índices de evasão, já discutidos nesta pesquisa,

traduzem em números esse argumento. Daí a relação entre afetividade,

aprendizagem e EJA, que estabelecemos neste estudo. Sobre esse nexo,

compartilhamos as ideias de Almeida, L. (2012a, p. 17):

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No caso de professores e alunos da EJA, [...] situações de imperícia são frequentes: nos professores, porque não foram preparados para atuar nessa modalidade de ensino; e nos alunos, porque retornam aos bancos escolares sem pré-requisitos para um processo de escolarização satisfatório. Por outro lado, e lembrando que o que nos afeta se expressa em sensações de bem-estar ou mal-estar, agrado ou desagrado, professores e alunos experienciam sentimentos prazerosos quando ensinam e quando aprendem.

Para essa pesquisadora, em sala de aula, as afecções produzidas por

professores e alunos percorrem diferentes orientações. Por esse ângulo, a

teoria walloniana ajuda-nos a interpretar o que, de fato, acontece. Ela é uma

lente para apreender o concreto. Assim, interessa-nos, também, a plasticidade

das interações a que Wallon (1995), Galvão (2003), Prandini (2016) e Leite

(2018) se referem. Segundo esses pesquisadores, podemos observar na

postura, no rosto, no olhar, no sorriso (conjunto motor) e na comunicação

(conjunto cognitivo ou inteligência), por exemplo, as emoções e os sentimentos

presentes na interação (conjunto afetivo). Na psicogenética walloniana, os

afetos podem ser detectados no tônus dos indivíduos.

Voltando ao elo entre afetividade, aprendizagem e EJA, é válido

conhecermos parte do trabalho de Gazoli (2013). Ao pesquisar práticas de

alfabetização e de letramento na EJA, apoiada na teoria walloniana, a

pesquisadora descreve, assim, o contexto de seu estudo:

[os alunos] afirmavam-se, muitas vezes, incapazes de aprender. Acreditavam que tinham mais dificuldades que as demais pessoas, que eram inferiores intelectualmente. Mas, ao mesmo tempo, creditavam à professora a crença de que poderiam superar tais dificuldades com a ajuda dela. A construção do vínculo afetivo saltava aos olhos (GAZOLI, 2013, p. 65, grifos nossos).

Concordamos com Gazoli (2013). Conforme veremos na terceira sessão,

muitas vezes, nas aulas de língua inglesa, na EJA, a construção dos vínculos

afetivos salta aos nossos olhos. A teoria walloniana pode nos ajudar a

interpretar essas percepções.

Por intermédio desse quadro teórico, aprendemos, ainda, que o

professor é, também, uma pessoa. Além de ser um mediador cultural, conforme

Leite (2013) e Piletti e Rossato (2017) destacam, o professor é, ainda, “uma

pessoa completa, com cognição, afeto, e em constante transformação”

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(PILETTI; ROSSATO, 2017, p. 110). Isto é: o professor é o principal agente

mediador entre os objetos de conhecimento/conteúdos escolares e o aluno,

assim como é um sujeito com desejos, sonhos, possibilidades e limitações.

Deste modo, a pesquisa baseada no pensamento de Wallon deve considerar

que, para conhecer o professor, é preciso “colocar-se em seus lugares, voltar-

se para seus anseios, dificuldades” (PILETTI; ROSSATO, 2017, p. 109).

Em resumo, entendemos que, para definir o papel da afetividade no

processo de ensino-aprendizagem, precisamos elucidar, antes, parte

importante dos papéis do professor e da escola. Para nós, em ambos os casos,

parece tratar-se da produção de vínculos. Por vínculo, apoiados na etimologia

dessa palavra, compreendemos “tudo o que ata, liga ou aperta” (CUNHA, 2010,

p. 361). Acreditamos que cabe ao professor, na sala de aula, e à escola, de

modo geral, a tentativa de construir vínculos, ligações, entre os objetos do

conhecimento/conteúdos escolares e os sujeitos do espaço escolar; entre as

emoções, o movimento e a cognição; entre o indivíduo e a sociedade.

Baseados em Wallon (1995) e em seus intérpretes, entendemos que a

afetividade é inseparável da inteligência e, por isso, ela oferece funções

psíquicas essenciais para o desenvolvimento e a aprendizagem acontecerem.

Por meio de uma atmosfera afetiva positiva, objetos de

conhecimento/conteúdos escolares complexos para os alunos, como aqueles

ligados à língua inglesa em cursos de EJA, podem ser facilitados pelo

professor.

Por fim, julgamos necessário reconhecer a dimensão política do

pensamento walloniano. Ao discutirem o Projeto Langevin-Wallon, uma

proposta de educação integral por ciclos, da pré-escola à universidade,

formulada pelo psicólogo francês e por seu amigo, Paul Langevin (1872-1946),

para o ensino público na França, nos anos 1940, Piletti e Rossato (2017, p.

114) afirmam:

Para ele [Wallon] não basta discutir as questões de cunho pedagógico-metodológico do ensino, é preciso que sejam refletidas e consideradas as dimensões sociais, políticas envolvidas no papel da escola. Com isso, numa crítica ao sistema de ensino francês, propõe mudanças profundas, as quais possam levar ao rompimento com a perversa seletividade existente [...] (grifos nossos).

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103

Com a pesquisa de base teórica walloniana, aprendemos a pensar por

uma lógica unitária, não fragmentada nem reducionista. Disso, resultam,

reiteramos, as unidades organismo-meio e ato motor-afetividade-inteligência-

pessoa. A partir do trecho de Piletti e Rossato (2017), e dos escritos de Galvão

(1998) e de Cambi (1999), concluímos que a biografia desse pensador, assim

como a de Paulo Freire, é um atestado - em vida - de outra unidade: escola-

sociedade. Para nós, a afetividade e a cognição, o ensino e a aprendizagem de

língua inglesa na EJA estão encaixados nessa perspectiva.

1.3.5 Olhares afetivos e convergentes

A nosso ver, no que diz respeito à afetividade, os olhares de Espinosa

(2005, 2014), de Freire, P. (2002, 2016, 2017) e de Wallon (1995) convergem

para os seguintes aspectos:

a articulação entre afetos e conhecimento;

a concepção de ser humano;

a visão (esperada) do ser professor.

Para os autores da nossa fundamentação teórica, contrariamente ao

racionalismo técnico, as emoções e os sentimentos são privilegiados. Dessa

forma, podemos usar suas teorias como lentes de aumento para observar a

relação – indissociável – entre afetos e conhecimento. Afinal, esses

pensadores não teorizam, exclusivamente, sobre a afetividade. Para eles, a

dimensão afetiva é o alicerce do pensamento (ESPINOSA, 2005, 2014), da

ação educativa (FREIRE, P., 2002, 2016, 2017) e do desenvolvimento

(WALLON, 1995).

Acreditamos que os estudos revisados contribuem para uma

ressignificação do papel da afetividade na aprendizagem humana. A propósito,

reforçamos a relevância do pensamento espinosista. Ainda que, na sessão de

apresentação e discussão dos dados, não façamos referências explícitas a

conceitos cunhados por Espinosa (2005, 2014), como conhecimento claro,

Substância ou conatus, julgamos que a concepção monista está,

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implicitamente, ligada às ideias de Freire, P. (2002, 2016, 2017) e de Wallon

(1995).

Outra característica partilhada pelos autores citados é a concepção de

ser humano como um ser social. No pensamento de Espinosa (2005), nossos

afetos aumentam/diminuem nossa potência de agir, o conatus, bem como

aumentamos/diminuímos a potência de agir do outro. Ou seja: no isolamento,

não existe expansão ou fortalecimento da nossa condição de perseverar em

nós mesmos e de resistir às dificuldades impostas à nossa existência. O

pensamento freiriano, por sua vez, não busca a libertação individual, mas a

emancipação de todas as pessoas cuja humanidade foi roubada. Assim sendo,

nessa teoria, não lutamos por uma suposta auto-humanização, mas pela

humanização daqueles que são atravessados pela opressão e, como resultado,

nos humanizamos. Na psicogenética walloniana, nossas disposições orgânicas

precisam interagir com o meio, para que o desenvolvimento aconteça. Isso

significa que não existe crescimento, transformação e aprendizagem no vácuo,

sem a interação com objetos e, principalmente, com as pessoas.

Além disso, no olhar dos autores que, aqui, discutimos, o ser humano é

indivisível. Por esse motivo, entendemos que, em sala de aula, o educador

precisa mediar os objetos do conhecimento, cuidando, sempre, nesse

processo, do clima afetivo.

A terceira característica partilhada pelos autores é a visão –

esperada/inferida – do ser professor. Registramos esperada/inferida, em

virtude da seguinte constatação: tanto Espinosa (2005, 2014) quanto Wallon

(1995)77 não escreveram, especificamente, para professores. Ainda assim,

sentimo-nos amparados pela literatura revisada, para deduzir algumas

características que, a nosso ver, constituem o ser professor, segundo esses

teóricos. São elas: a) alguém que reconheça o papel da afetividade em seu

ofício e não o trate como secundário; b) alguém que, a partir desse

reconhecimento, valorize os afetos, em sala de aula, e busque entender as

relações afetividade-cognição e professor-aluno; c) alguém que preze por suas

77

De acordo com Almeida, L. (2012b, p. 71), Wallon escreveu “análises da Educação Nova que tratam da Educação em geral; Projeto Langevin-Wallon”, o que a autora chama de pedagogia explícita. No entanto, nesta dissertação, baseamo-nos em uma referência (WALLON, 1995) da “pedagogia implícita” (ALMEIDA, L., 2012b, 71) desse pesquisador, já que se trata de uma obra do campo da Psicologia.

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próprias emoções e sentimentos, já que o professor é, também, uma pessoa,

no sentido walloniano, e sua intervenção no espaço escolar depende da

disponibilidade para afetar e ser afetado.

Diante desses argumentos, é preciso discutir a formação docente. Afinal,

que tipo de formação se alinha às ideias que, aqui, apresentamos? Para

abordar esse conteúdo, de saída, sabemos que o paradigma cartesiano não vai

ao encontro de um processo formativo interessado na relação entre afetos e

conhecimentos. Consequentemente, entendemos que uma visão alternativa ao

racionalismo deve se opor a um pensamento fragmentador. Na esteira desse

raciocínio, devemos, por fim, tencionar uma configuração possível de formação

docente, que rompa com a cronologia subtendida em formação inicial ou

formação contínua, já que, no nosso olhar, o vínculo entre ensino,

aprendizagem e afetividade perpassa toda a vida dos professores, em qualquer

momento, independentemente de um diploma ou de um certificado. Em razão

dessas ideias, encaminhamo-nos à próxima subsessão.

1.4 Olhares no sentido da formação de professores de língua inglesa para

e na EJA

Nas outras sessões desta fundamentação teórica, o tema formação de

professores tem estado presente. Podemos retomar, por exemplo, o conceito

de professor intelectual transformador, cunhado por Kumaravadivelu (2003), e

a importância da afetividade na agência docente. A esses tópicos,

acrescentaremos outros pontos de vista, com o olhar voltado para as

particularidades do ensino de língua inglesa no contexto da EJA.

Para esta revisão bibliográfica, julgamos necessária, novamente, a

busca por estudos em LA e em Educação, porque, de acordo com as leituras

que fizemos, não há, ainda, pesquisas sobre a formação específica de

professores de língua inglesa para a EJA. E mais, consideramos pertinente a

reflexão sobre essa suposta especificidade. Afinal, é preciso haver uma

formação particularizada a professores de língua inglesa, para atuarem na

EJA? Salientamos, ainda, que esta discussão inclui duas práticas coexistentes

e, acreditamos, complementares: a real, isto é, o que já acontece, tem

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acontecido ou aconteceu, em termos de formação (específica) para

professores da EJA, e a ideal, quer dizer, o que pesquisadores desse campo78,

no Brasil, têm teorizado sobre esse assunto.

Antes de prosseguirmos com essa discussão, delimitaremos o

significado de formação de professores, usado até este momento. Ao longo

deste trabalho, fizemos referência à formação inicial. Com isso, mencionamos,

portanto, a visão do senso comum sobre esse tema, segundo a qual a

formação docente pode ser classificada como inicial ou contínua. Nesses dois

casos, está em jogo o critério cronológico. Em outras palavras, a formação

inicial equivale à graduação em uma licenciatura. A formação contínua, aos

outros contextos formativos pós-licenciatura, como a formação em serviço ou

os cursos de pós-graduação. Adiante, retomaremos esse conceito, a partir de

outro prisma.

No que diz respeito à formação inicial, Périco (2009) e Soares, L. (2011)

afirmam que a EJA é um conteúdo pouco explorado nos cursos de licenciatura.

Os parâmetros dos dois autores são, respectivamente, a inserção de uma

disciplina específica sobre essa temática no currículo de Pedagogia e de

licenciaturas e a habilitação em EJA. Com referência a isso, para Périco (2009,

p. 75-76), “são poucos os cursos com formação de educadores de jovens e

adultos; dos 1500 cursos de Pedagogia existentes no país, menos de 2% têm

esse compromisso”. Possivelmente, o dado quantitativo apresentado por essa

pesquisadora seja, hoje (2018), incorreto. No entanto, ele serve-nos como um

retrato da presença pouco expressiva, ou ausência, da EJA em cursos de

formação inicial de professores79.

De acordo com Soares, L. (2011), esse cenário já não parecia promissor

nos anos 1980, mesmo diante da forte necessidade de oferta de tempos-

78

Com base em Giovanetti (2011) e em Soares, L. (2011), afirmamos que os estudos sobre a EJA, no Brasil, tem constituído um campo de pesquisa autônomo. Um argumento que sustenta essa afirmação é a criação do GT de EJA, isto é, Grupo de Trabalho de Educação de Jovens e Adultos, pela Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação (ANPEd), em 1998. Informações adicionais sobre esse GT podem ser encontradas em <http://www.anped.org.br/grupos-de-trabalho/gt18-educa%C3%A7%C3%A3o-de-pessoas-jovens-e-adultas>. Acesso em: 09.jun.2018. 79

Périco (2009) coletou dados por meio de questionários, enviados a 14 professores de língua portuguesa da EJA de escolas públicas do Guarujá (SP). Assim como os participantes deste estudo, (1) todos eram licenciados em Letras e (2) nenhum deles estudou aspectos específicos da EJA durante a graduação. Cruzados, esses dados sugerem que, em âmbito micro, local (como a região ABCDRM ou a Baixada Paulista), a conclusão a que Périco (2009) chegou continua em voga (tomando, como referência, o ano em que produzimos nossos dados - 2016).

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espaços para a escolarização de jovens e adultos. Por isso, em 1986, a

Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) iniciou o curso de Pedagogia

com Habilitação para a EJA. Dezessete anos depois, o educador mineiro

investigou em que medida os ex-alunos desse curso passaram a atuar, de fato,

nessa modalidade. Para a surpresa de Soares, L. (2011), apenas 140

estudantes escolheram esse curso, de 1986 a 200380. Dessa população, 22 ex-

alunos trabalhavam, efetivamente, com jovens e adultos.

Entendemos que um caso isolado não deve servir a generalizações, mas

os dados levantados por Soares, L. (2011) sugerem que a especificidade dos

estudos em EJA não garante o interesse de professores em formação inicial

por essa área de atuação.

Em relação à formação contínua e em serviço, consideramos pertinente

a esta revisão bibliográfica o trabalho de Mileto (2009). Recém-ingresso na EJA

da rede municipal do Rio de Janeiro (RJ), esse professor-pesquisador fez parte

de um programa de formação contínua criado por uma parceria entre a

Universidade Federal Fluminense (UFF) e essa prefeitura. Ao relatar parte

dessa experiência, o autor afirma:

Verificava-se nas reuniões das sextas-feiras um conjunto [de] deficiências estruturais e pessoais para que essa importante característica da proposta do PEJA

81 [isto é, os centros de estudos

deveriam funcionar como tempos-espaços para a reflexão pedagógica sobre a EJA] pudesse contemplar os objetivos planejados. Em razão dos limites da ética profissional produzidos pela simultaneidade da posição de professor e pesquisador, ocorrem constrangimentos para fazer uma descrição detalhada dos comportamentos manifestados nas reuniões das sextas feiras, mas de forma objetiva e sucinta, limito-me em afirmar que “centro de estudos” era uma denominação pouco apropriada (MILETO, 2009, p. 34).

Reiteramos nossa convicção de que o exemplo acima é uma experiência

única e, portanto, não se presta a uma teoria sobre a formação contínua de

professores da EJA. No entanto, consideramo-lo como um indício de que não

há, exatamente, um modelo de formação de professores para ou na EJA.

80

Soares, L. (2011) não explicita qual foi seu parâmetro numérico para avaliar a (pequena) adesão dos alunos de pedagogia da UFMG à Habilitação em EJA. Ainda assim, o autor escreve: “Durante 17 anos da existência da habilitação, somente 140 estudantes constavam

como formandos nessa área” (SOARES, L., 2011, p. 286, grifos do autor). 81

PEJA é Programa de Educação de Jovens e Adultos, criado pela Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro.

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Diante desses estudos, entendemos que a formação de professores

para e na EJA pode partir da própria escola. Sustentamos esse argumento nas

pesquisas de García (1995) e de Jardilino e Araújo (2014). Para esses autores,

a formação docente precisa estar baseada na ideia de desenvolvimento

profissional, quer dizer, provir “de saberes adquiridos na prática, na vivência e

no cotidiano escolar” (JARDILINO; ARAÚJO, 2014, p. 158).

A perspectiva do desenvolvimento profissional repercute, também, na

LA. Ao escrever sobre a atuação do professor de língua inglesa na escola

pública, Miccoli (2016, p. 36) afirma: “um bom professor se faz na prática, pois

formação alguma o prepara para a imprevisibilidade da sala de aula. Melhorar

não significa, apenas, fazer cursos”. Concordamos, parcialmente, com a

posição dessa pesquisadora. Entendemos que, preferencialmente, a EJA deve

ser incluída nos currículos dos cursos de licenciatura, como Letras:

Português/Inglês, e não somente em Pedagogia. O contrário dessa inclusão

nos parece uma forma de negligência. Não tratar da EJA, nesses espaços,

pode significar não preparar o professor para atuar em um contexto repleto de

particularidades, como as salas intergeracionais ou as dificuldades de

aprendizagem resultantes, entre outros motivos, dos longos períodos de

evasão escolar. Contudo, a realidade de qualquer sala de aula é, sempre,

instável e mutável. Disso, redunda nossa crença de que a preparação de um

professor de língua inglesa para a EJA não pode ser atribuída, exclusivamente,

a um curso de formação inicial ou de formação contínua.

Reconhecemos, aqui, que a ideia de formação de professores para e na

EJA baseada em desenvolvimento profissional estabelece, ainda, outra linha

interpretativa. Conforme assinalamos, anteriormente, estudos em Educação e

em LA propõem que a formação docente parta da sala de aula. Essa sugestão

implica a seguinte pergunta: quais são os modos de fazer esse tipo de

formação? À medida que a escola pública se responsabiliza pela formação

docente permanente, existe a tendência de que tal processo se aproxime ou se

distancie do polo da integração ou do polo da diferenciação. Para explicar esse

argumento, recorremos à imagem do pêndulo. De um lado, pode haver práticas

de formação docente em serviço que tratem a EJA como o Ensino

Fundamental ou Médio no período noturno, isto é, a EJA difere de outras

modalidades educativas, exclusivamente, no que diz respeito ao horário de

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funcionamento. No outro lado do pêndulo, pode haver práticas de formação

docente em serviço que abordem a EJA a partir de suas diferenças do Ensino

Fundamental ou Médio regular.

Conjeturamos essa situação com base em Sacristán (2008). Para esse

pesquisador, o discurso educacional usa a diversificação como um slogan. No

dia a dia escolar, entretanto, as diferenças podem ser percebidas e tratadas

como perturbações e não como algo inerente à educação. Por isso,

posicionamo-nos a favor de processos formativos de professores de EJA que

considerem as especificidades dessa ação educativa.

Por especificidades, referimo-nos, principalmente, às características

políticas, sociais e culturais da população de alunos. Os estudos de Giovanetti

(2011) e de Soares, L. (2011) mostram que a formação de professores para e

na EJA pode ser qualificada, quando contempla o estudo das pessoas que se

matriculam nas escolas com essa modalidade. Para sustentarem esse

argumento, os dois pesquisadores baseiam-se em suas experiências como

professores e estudiosos dessa área, como a Escola Plural, proposta pela

prefeitura de Belo Horizonte, e a Escola Candanga, em Brasília (GIOVANETTI,

2011); ou, ainda, a estruturação da EJA em Ibirité, em Minas Gerais (SOARES,

L., 2011).

Quanto ao que seria ideal para uma formação de professores específica

à EJA, Giovanetti (2011) aponta três características adicionais: a concepção de

educação popular, a interlocução da educação com a filosofia e a interlocução

da educação com as ciências sociais. Para delimitar o significado de educação

popular, a pesquisadora apoia-se nas formas de organização dos movimentos

sociais. A respeito da filosofia, sugere o estudo da concepção de homem

inconcluso, em constante transformação. E, por intermédio da sociologia,

aconselha os professores a estudarem os processos de criação e de

manutenção da desigualdade social no Brasil.

Frente aos desafios postos pela EJA, concordamos, ainda, com Pinto

(2010). Embora tenha escrito, em 1966, Sete lições sobre Educação de

Adultos, as ideias desse educador ainda nos parecem atuais. Ao responder à

pergunta “quem educa o educador de adultos?”, Pinto (2010, p. 110-111)

escreve:

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110

A resposta correta é a que mostra o papel da sociedade como

educadora do educador. Em última análise, é sempre a sociedade que dita a concepção que cada educador tem do seu papel, do modo de executá-lo, das finalidades de sua ação, tudo isso de acordo com a posição que o próprio educador ocupa na sociedade. A noção de posição está tomada aqui no sentido histórico-dialético amplo e indica por isso não só os fundamentos materiais da realidade social do educador, mas igualmente o conjunto de suas ideias em todos os terrenos, e muito particularmente no da própria educação (grifos do autor).

A formação do professor de língua inglesa da EJA depende,

diretamente, do que a sociedade espera e tem feito com essa modalidade. E,

nessa lógica, depende, ainda, da posição que o professor da EJA ocupa na

sociedade brasileira. Logo, educar o professor de língua inglesa que atua na

EJA pressupõe refletir, constantemente, sobre o impacto que essa modalidade

de ensino tem causado (ou não) na vida das pessoas que dela precisam e na

comunidade onde a escola está situada. Adicionalmente, essa interpretação é

um alerta ao professor de língua inglesa que, nesse contexto particular, precisa

estar sempre atento ao lugar que a EJA ocupa dentro da unidade escolar e da

rede de ensino de que faz parte.

Em resumo, o professor de língua inglesa que atua na EJA precisa

dispor não somente de conhecimentos linguísticos e relacionais (como aqueles

ligados à afetividade e aos vínculos com os alunos), mas, também, de

ferramentas para interpretar a realidade concreta dos alunos com quem

trabalha, atrelando os objetos de conhecimento na língua-alvo com a “vida-

vivida” (BRITTO, 2002, p. 77) de jovens, adultos e idosos populares.

Diante dessas demandas, reforçamos que o paradigma de formação

docente pautado no critério cronológico, isto é, formação inicial ou formação

contínua, não é adequado. Nossa referência para balizar a adequação (ou não)

desse paradigma são, mais uma vez, as especificidades da EJA e nossa

convicção na integração entre afetos e inteligência. Daí nosso interesse pelo

pensamento complexo.

De forma sucinta, com base em Morin (2012, 2013, 2015), entendemos

que o pensamento complexo82 nos ajuda a olhar o real de forma não redutora

82

Do item lexical latino complexus, a palavra complexidade significa o que é tecido junto, “o que abrange muitos elementos ou várias partes” (PETRAGLIA, 2011, p. 59). Para pesquisar a complexidade da vida, desde 1960, Morin (2012, 2013, 2015) tem proposto o estudo e o desenvolvimento do “pensamento complexo” (MORIN, 2015, p. 07). Segundo o filósofo francês,

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nem linear. Assim, os efeitos de um fenômeno não podem ser totalmente

calculados, já que o imprevisível, o irregular e o particular estão, sempre,

presentes (na vida e na sala de aula). Para Morin (2013), o pensamento

complexo é, ainda, uma resposta à cegueira dos saberes separados. Isso

significa que conhecer, complexamente, não equivale a separar ou a justapor,

mas, sim, a ligar e a religar os saberes (e, aqui, saberes inclui os afetos, quer

dizer, o que sabemos sobre o que sentimos). Pelo ângulo da complexidade, o

saber disciplinar é fragmentador e mutilante.

Pensar a formação docente, segundo o pensamento complexo, exige-

nos uma postura contrária à busca por modelos - supostamente infalíveis - de

processos formativos. Para Moraes (2007, p. 20), “modelos não passam de

esquemas reveladores de certa parcialidade” (grifos nossos). À medida que o

todo é reduzido às partes, no paradigma tradicional, surgem os dualismos,

como, por exemplo, certo/errado, teoria/prática, método/abordagem,

ensino/aprendizagem, conteúdos/afetos e inteligência/afetividade. O

pensamento complexo, no entanto, ajuda-nos a romper com essa lógica dual,

já que busca a integração dos saberes. Comparativamente, podemos afirmar

que, em oposição à racionalidade cartesiana, o pensamento complexo é

monista.

Além disso, no lugar da homogeneização e da pressuposição de que

todos os professores têm, em uma mesma escola, necessidades formativas

semelhantes, a complexidade privilegia a diferenciação. De acordo com

Moraes (2007), os processos de organização tendem, naturalmente, a se

diferenciar. Com esse aporte teórico, a formação de professores de língua

inglesa para e na EJA pode valorizar, justamente, o que distingue essa

modalidade de ensino de outras formas de atendimento educacional. Pode

valorizar, também, as diferenças entre os professores de um mesmo coletivo,

isto é, suas particularidades, dificuldades e potencialidades. Pode valorizar,

enfim, a diferenciação em cada educador, quer dizer, as mudanças

vivenciadas, por cada pessoa, no contexto da EJA.

A formação de professores de línguas pelo prisma da complexidade tem

sido um tema explorado por alguns linguistas aplicados. Ao revisarmos essa

“o pensamento complexo não é o que evita ou suprime o desafio [da complexidade], mas o que ajuda a revelá-lo, e às vezes mesmo a superá-lo” (MORIN, 2015, p. 08).

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112

literatura83, consideramos pertinente a este estudo o conceito de auto-

heteroecoformação84, segundo Freire, M. e Leffa (2013).

Em primeiro lugar, conforme sugere a escolha lexical feita pelos autores,

a palavra auto-heteroecoformação rompe com o critério cronológico indexado

em formação inicial e/ou formação contínua. Em síntese, para Freire, M. e Leffa

(2013), a formação docente não deve ser classificada com base em um critério

temporal. Esse olhar complexo, não-linear, nem reduzido a um parâmetro

único, pode ser comprovado pelo trabalho de Aguilar (2016), que pesquisou a

formação de estudantes-professores de Letras: Português/Espanhol. Além

disso, para Vian Jr. (2018), a auto-heteroecoformação é um conceito

sintonizado com a hipermodernidade, com os avanços tecnológicos e seus

impactos no ensino de línguas e com a ideia de que a aprendizagem docente

acontece ao longo da vida.

Em segundo lugar, a auto-heteroecoformação é um conceito englobante

e integrador. Para não haver dúvidas sobre os aspectos tecidos juntos e

enredados por esse conceito-chave, é importante descrever sua gênese. De

acordo com Freire, M. e Leffa (2013), autoformação, heteroformação e

ecoformação são elementos da teoria tripolar de formação docente, de Pineau

(1988). Para o educador franco-canadense, cada elemento constitui um

movimento ou um polo, a saber: personalização, socialização e ecologização.

Sobre isso, os pesquisadores brasileiros escrevem:

83

Com referência à revisão da literatura sobre a formação de professores à luz da complexidade, frisamos, aqui, nosso interesse pelo trabalho de Silva, F.C. (2016). Em sua tese de Doutorado em Educação, o pesquisador propõe um processo formativo a professores da EJA, com base em pressupostos do pensamento complexo. As participantes de sua pesquisa – chamadas, pelo autor, de praticantepensantes – são professoras alfabetizadoras e de língua portuguesa dessa modalidade, em Açu, município do Rio Grande do Norte (RN). Embora use a noção de formação continuada, Silva, F.C. (2016) destaca a importância de a formação docente tecer, em conjunto, as histórias pessoais e profissionais de seus educadores. 84

Freire, M. e Leffa (2013) expandem a ideia de auto-heteroecoformação, acrescentando a esse conceito o adjetivo tecnológica, como vemos no título de seu trabalho. A esse respeito, os linguistas aplicados escrevem: “partindo de uma perspectiva auto-heteroecoformadora e, portanto, sistêmico-complexa, dirigimos nosso olhar à formação tecnológica do professor, entendendo-a como uma vertente da formação docente” (FREIRE, M.; LEFFA, 2013, p. 74, grifos nossos). Nesta dissertação, não exploramos a vertente tecnológica dos professores-participantes, mas, ainda assim, consideramos a ideia de auto-heteroecoformação produtiva, já que ela sugere uma configuração aos processos de formação docente, à luz do pensamento complexo.

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113

autoformação, caracterizada pela ação do eu como sujeito individual e social, pela responsabilidade do indivíduo pela sua própria formação, tornando-se sujeito e objeto da mesma (sic);

heteroformação, marcada pela ação dos indivíduos uns sobre os outros, indicando a dimensão social do processo formativo e caracterizando a coformação; e

ecoformação, indicando a ação do meio ambiente sobre os indivíduos, revelando a dimensão ambiental e ecológica do processo formativo (FREIRE, M.; LEFFA, 2013, p. 69, grifo dos autores).

A partir desses movimentos, podemos compreender, então, que a

formação de professores perpassa por escolhas pessoais, o que redunda na

autoformação. Nesse polo, o professor não é considerado culpado por seus

erros ou por suas dificuldades, mas é corresponsabilizado pelos avanços e

pelas limitações em sua prática, posto que se enxerga parte de um sistema

aberto85 (a escola, a comunidade escolar e a rede de ensino). A formação de

professores é, também, um processo social. Na heteroformação, professores

podem ser formadores de seus colegas de trabalho. Acrescentamos a essa

dinâmica os próprios alunos da EJA, que, no nosso entendimento, podem atuar

como coformadores docentes. Finalmente, na ecoformação, os aspectos

ambientais são realçados. Nesse sentido, a escola e a comunidade escolar são

loci formativos.

Partindo, em especial, da argumentação de Pineau (1988), Freire, M.

(2009) e Freire, M. e Leffa (2013) propõem a articulação desses polos a quatro

dimensões complementares umas às outras: ação, sujeito, objeto e relações.

A dimensão da ação implica a seguinte ideia: a formação docente, pela

lente do pensamento complexo, não é unidirecional, mas, sim, recursiva. Em

outras palavras, a lógica ação individual gera ação social, que produz ação

ecológica dá lugar a uma visão circular, segundo a qual não há hierarquias, já

que uma ação incide na outra, sem, necessariamente, respeitar um critério de

gradação.

A dimensão do sujeito não se separa da dimensão anterior, uma vez que

toda ação depende de um ator para acontecer. Para Freire, M. e Leffa (2013), o

sujeito do processo formativo é, sempre e ao mesmo tempo, individual (na

85

Para definir sistemas abertos, segundo o pensamento complexo, Moraes (2003, p. 65) escreve: “Os sistemas vivos, como complexos organizacionais abertos, refletem sua interação com o meio ambiente, com o qual as estruturas dissipativas estão trocando, constantemente, energia, mantendo assim um fluxo dinâmico e infindável. Por exemplo, uma semente, um óvulo, o ser humano e as sociedades são sistemas abertos”.

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autoformação), social (na heteroformação) e ecológico (na ecologização).

Trazendo essa dimensão à formação de professores de língua inglesa

para e na EJA, podemos identificar a relevância do trabalho colaborativo. Parte

dos dados desta pesquisa evidencia a repercussão positiva do trabalho em

equipe na prática de uma das professoras-participantes86. Adicionalmente, a

partir de nossa experiência como professores da EJA, julgamos necessária a

criação de uma rede de formação permanente. Se considerarmos que há

poucos espaços acadêmicos e institucionais dedicados, exclusivamente, à

formação de professores dessa modalidade, a aprendizagem em rede, na

própria escola e/ou na rede de ensino, ganha ainda mais relevo.

A terceira dimensão, objeto, articula as duas dimensões anteriores.

Subjaz a essa articulação esta ideia: todo sujeito age em direção a um objeto,

mesmo que se trate de algo localizado no próprio indivíduo (como, por

exemplo, a busca pelo autoconhecimento, por aquilo que lhe emociona ou que

lhe causa indiferença, na relação cotidiana com os alunos da EJA).

Por fim, a quarta dimensão, a das relações, “focaliza as interações que

interligam o sujeito e sua ação [,] quando direcionado ao objeto de formação”

(FREIRE, M.; LEFFA, 2013, p. 72, grifos dos autores). Por meio dessa

dimensão específica, todas as dimensões anteriores e os polos formativos,

pensados, inicialmente, por Pineau (1988), são interconectados. Isso significa

que, pelo ângulo da auto-heteroecoformação, a formação docente não deve ser

estruturada em elementos estanques e fragmentados (como as metodologias

alegadamente mais eficazes a jovens, adultos e idosos populares; ou a prática

pedagógica fundamentada em uma teoria única). Segundo o paradigma de

formação docente tradicional, podem coocorrer, entendemos, tempos-espaços

(in)formativos, mas a formação a que temos nos referido, nesta seção,

pressupõe processos dinâmicos, mutáveis e que não desconsideram, em

nenhuma circunstância, as pessoas envolvidas nesse movimento.

Acrescentamos à argumentação anterior outro aspecto da auto-

heteroecoformação que, acreditamos, é pertinente a este estudo: o diálogo

entre esse conceito e o pensamento freiriano. Inicialmente, a referência à

86

Confira, na seção de Apresentação e discussão dos dados, a subseção 3.1.2.3 Microestratégia conectar o ensino da língua inglesa à concepção de educação da escola e da Secretaria de Educação em que alunos e professores estão inseridos.

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115

pedagogia de Paulo Freire aparece, de forma explícita, no trabalho de Freire,

M. e Leffa (2013, p. 75-76):

a auto-heteroecoformação [...] contempla o desenvolvimento de um professor que, além do saber instrumental, revela uma postura problematizadora ([Paulo] Freire, 1970), mostrando-se investigador e crítico, para que, assim, possa distanciar-se das práticas transmissivo-repetitivas [...].

Em nosso entendimento, a auto-heteroecoformação complementa a

ideia de formação permanente, citada, repetidas vezes, pelo educador

pernambucano, em Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática

educativa (FREIRE, P., 2002). Afinal, pelo olhar da complexidade, como

mostram os trabalhos de Silva, F.C. (2016) e de Vian Jr. (2018), a

aprendizagem de professores acontece ao longo da vida.

Além disso, tanto para Freire, P. (2002, 2016) quanto para Freire, M. e

Leffa (2013), a formação docente deve ter um compromisso com a mudança

(da sala de aula, da escola e da sociedade). Mesmo que esses autores estejam

apoiados, parcialmente, em diferentes bases teóricas, ambos partilham dessa

preocupação. Nesse sentido, porque acreditamos que o mundo é complexo e

dinâmico, consideramos que a aula de língua inglesa – objeto possível da ação

ecológica, em um processo auto-heteroecoformativo – pode romper com a

lógica cópia-repetição-acerto/erro; pode ajudar a romper, portanto, com a

educação bancária, problematizada por Freire, P. (2016).

Embora este trabalho não analise a formação dos professores-

participantes, à vista dos argumentos apresentados, sugerimos, enfim, o

pensamento complexo e o conceito de auto-heteroecoformação como

subsídios importantes à (futura e/ou possível) formação de professores de

língua inglesa para e na EJA. Defendemos essa ideia, porque, nessa visão,

reduções e fragmentações são evitadas. O processo formativo, nesse caso,

integra as partes (i.e., concepção de língua(gem), estratégias didáticas, afetos,

entre outros elementos) em um todo, que será, simultaneamente, maior e

menor do que a soma das partes.

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116

2 METODOLOGIA DE PESQUISA

Nesta seção, apresentaremos a metodologia de pesquisa. A princípio,

abordaremos o paradigma de investigação a que nos afiliamos e o método

utilizado (o estudo de caso). Adiante, discorreremos sobre o contexto de

pesquisa, o que inclui um olhar para as escolas onde produzimos os dados e

um retrato do perfil dos professores-participantes e do pesquisador. Após,

traçaremos o caminho metodológico da pesquisa, discutindo, entre outros

aspectos, os instrumentos de geração de dados. Por fim, comentaremos as

estratégias e as técnicas de análise dos dados.

2.1 Pesquisa qualitativa e interpretativista

Esta dissertação é uma pesquisa qualitativa e interpretativista.

Primeiramente, é um estudo qualitativo, porque procura entender e interpretar

um fenômeno social (o ensino de língua inglesa na EJA) num contexto

particular (duas escolas municipais de São Bernardo do Campo). Em segundo

lugar, é um estudo interpretativista, porque está interessado em descobrir

padrões de organização social e cultural e as relações entre eles e as ações

sociais de pessoas específicas.

A escolha pela metodologia qualitativa e interpretativista decorre do

tema e da natureza deste trabalho. Para Bortoni-Ricardo (2008, p. 41)87, nesse

tipo de investigação, os pesquisadores começam seu trabalho procurando

responder a três perguntas:

1. O que está acontecendo aqui? 2. O que essas ações significam para as pessoas envolvidas nelas? Ou seja, quais são as perspectivas interpretativas dos agentes envolvidos nessas ações? 3. Como essas ações que têm lugar em um microcosmo como a sala de aula se relacionam com as dimensões de natureza macrossocial

87

A fonte primária de Bortoni-Ricardo (2008) é Erickson (1990). Embora o educador norte-americano tenha desenvolvido uma metodologia etnográfica para as pesquisas em âmbito escolar, a linguista aplicada brasileira deixa claro que o paradigma sobre o qual ela discorre é o interpretativismo (BORTONI-RICARDO, 2008). Assim, neste trabalho, usamos a lógica interpretativista para um estudo de caso coletivo e não para uma pesquisa etnográfica. Adiante, explicaremos algumas diferenças entre esses métodos.

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em diversos níveis: o sistema local em que a escola está inserida, a cidade e a comunidade nacional?

Como um dos objetos de estudo desta investigação tem sido as

estratégias de ensino de língua inglesa, o enquadre da pesquisa qualitativa e

interpretativista auxilia-nos na interpretação daquilo que acontece,

efetivamente, em sala de aula. Além disso, propicia um processo

argumentativo que dá voz ao pesquisador e aos outros participantes do estudo

(três professores de língua inglesa da EJA da rede municipal de São Bernardo

do Campo).

A pesquisa qualitativa e interpretativista tem servido a linguistas

aplicados e a educadores interessados em estudar a ecologia da sala de aula

(BORTONI-RICARDO, 2008; MILLER, 2013). Essa metodologia, então, ampara

estudos dedicados a explicar, de forma detalhada e mais completa possível, o

que acontece dentro da escola, considerando, principalmente, a interação entre

os atores escolares.

Para nós, essa característica vai ao encontro de outro objeto de estudo

deste trabalho: a afetividade. Conforme explicamos anteriormente, entendemos

que a afetividade se expressa, em classe, por meio dos vínculos afetivos.

Esses, por sua vez, dependem das relações entre professores e alunos,

estabelecidas por meio da e na linguagem.

Segundo Bortoni-Ricardo (2008) e Yin (2015), a pesquisa qualitativa e

interpretativista abarca um conjunto de métodos e de práticas (por exemplo, a

pesquisa etnográfica, a observação participante, a pesquisa fenomenológica,

entre outros). Conscientes disso, decidimos organizar esta investigação na

forma de um estudo de caso coletivo.

2.1.1 O método estudo de caso

Para a definição de estudo de caso, fundamentamo-nos em André

(2008), em Leffa (2006) e em Yin (2015, 2016). Para definir esse método de

pesquisa, partiremos de três pontos principais:

a definição pelo escopo da pesquisa;

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a definição pelas características do método;

a comparação com outros métodos de pesquisa qualitativa e

interpretativista.

Após a definição, prosseguiremos com outro problema teórico-

metodológico: o tipo de estudo de caso.

De acordo com Yin (2015, p. 17), o estudo de caso é “uma investigação

empírica”, que estuda um fenômeno contemporâneo em profundidade, em

especial, quando os contornos entre o fenômeno e o contexto são fluidos. Essa

definição marca um encontro com a elucidação de Leffa (2006). Para ele, o

estudo de caso “é a investigação profunda e exaustiva de um participante ou

pequeno grupo” (LEFFA, 2006, p. 14).

Yin (2015) complementa sua definição com algumas características

específicas desse método: (i) contar com múltiplas fontes de evidência e (ii)

aproveitar as proposições teóricas para guiar a geração de dados88. Assim

sendo, entendemos que o escopo e as particularidades desta pesquisa

convergem para o método em questão.

Para nós, desde a etapa de protocolo de pesquisa89, estudar as

estratégias de ensino (ligadas, também, à afetividade, em sala de aula) de

língua inglesa na EJA não equivale a examinar o mesmo objeto em outro

contexto educacional, ainda que haja semelhanças estruturais. Conforme

discutimos na seção intitulada Olhares para e sobre a EJA, essa modalidade

de ensino apresenta sujeitos cuja historicidade não deve ser equiparada à de

outros jovens, adultos ou idosos. Dito de outra forma, interpretar as estratégias

didáticas, aqui, não significa dar sentido ao que acontece em quaisquer salas

de aula de língua inglesa, em escolas públicas ou de Ensino Fundamental 2.

Portanto, retomando a posição de Yin (2015), os limites entre o fenômeno

investigado e o contexto não são, sempre, evidentes.

88

Yin (2015, 2016) escreve, o tempo todo, sobre coleta de dados. Preferimos outras metáforas, como produção ou geração de dados. Entendemos que as informações observadas, durante a pesquisa em campo, exigem um trabalho ativo de reflexão, de combinação e de recombinação. Portanto, tais informações não estão prontas para serem coletadas, mas à espera de uma construção. Daí nossa preferência por escolhas lexicais diferentes daquelas do cientista social norte-americano. 89

Protocolo de pesquisa é a forma usada por Yin (2015, 2016), para referir-se ao projeto de pesquisa, geralmente exigido, como requisito de ingresso, pelos Programas de Estudos Pós-graduados.

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119

No entanto, o escopo de um estudo de caso é suficiente para diferenciá-

lo de uma pesquisa etnográfica ou de observação participante? Possivelmente,

a resposta seja não. Disso resulta a importância das características específicas

do estudo de caso. O fato de usarmos diferentes fontes de produção dos dados

distingue esse método de outros da pesquisa qualitativa e interpretativista. De

acordo com Yin (2015, p. 22), “a etnografia geralmente exige longos períodos

de tempo no ‘campo’ e enfatiza evidências observacionais e de entrevista

detalhadas”. Em nosso estudo, durante a etapa de pesquisa em campo,

sabíamos que o tempo disponível para filmar as aulas de língua inglesa e para

entrevistar os professores-participantes era curto. Por isso, triangular os dados

com base em outros instrumentos (por exemplo, questionários, conversas

informais por aplicativo e análise de planos de aula) serviria ao nosso propósito

de organizar a investigação na forma de um estudo de caso.

Definir esse método por comparação implícita a outros métodos

qualitativos é a estratégia retórica usada, também, por André (2008). Para ela,

o estudo de caso não deve ser visto, apenas, como um modelo pré-

experimental de pesquisa, com o objetivo de exploração inicial de uma

temática, já que se trata de buscar a “exploração dos dados em termos de suas

relações com o contexto em que foram produzidos e dos significados a eles

atribuídos pelos sujeitos envolvidos” (ANDRÉ, 2008, p. 36). Neste trabalho,

então, os objetivos (geral e específicos) estão diretamente atrelados a estas

duas características centrais para o método de pesquisa escolhido:

interpretar as estratégias de ensino e a afetividade a partir de e no

contexto particular da EJA;

explorar os significados atribuídos às estratégias de ensino pelos

professores-participantes e pelo pesquisador.

Mais à frente, retomaremos os objetivos da pesquisa. Por ora, fixemos

outro aspecto metodológico fundamental: o tipo de estudo de caso.

Os autores que embasam esta discussão apresentam diferentes

tipologias. Durante as etapas de protocolo de pesquisa e de elaboração deste

texto, constatamos que os critérios explicativos para cada tipo de estudo de

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caso diferem, de acordo com cada pesquisador. Por isso, neste trabalho,

consideramos dois critérios essenciais:

o tipo de estudo de caso em relação à análise dos dados e

o tipo de estudo de caso quanto ao número de participantes.

Para Leffa (2006), os estudos de caso podem ser exploratórios,

descritivos e explanatórios. Considerando os objetivos desta pesquisa,

classificamo-la como um estudo de caso explanatório, porque não buscamos,

apenas, descrever uma realidade (o que sugere um estudo de caso descritivo)

ou testar hipóteses (o que aponta para um estudo de caso exploratório), mas o

nosso intuito é descrever realidades e interpretá-las. Desse modo, a tipologia

do estudo de caso depende de fatores como a intencionalidade da investigação

e o tipo de análise ou de interpretação dos dados.

No que diz respeito ao número de participantes ou de casos, as

classificações, também, variam.

Yin (2015) considera que a definição do caso (cf., à frente, a subseção O

caso) pode incluir informações de diferentes indivíduos, o que propicia um

“estudo de casos múltiplos” (YIN, 2015, p. 33, grifos nossos).

André (2008), cuja fonte primária é Stake (1994), apresenta o estudo de

caso coletivo, “quando o pesquisador não se concentra num só caso, mas em

vários, como por exemplo, em várias escolas ou vários professores, com

finalidade intrínseca ou instrumental” (ANDRÉ, 2008, p. 20). A finalidade

instrumental a que a pesquisadora se refere é um conceito de Stake (1994).

Resumidamente, trata-se do interesse do pesquisador não por um caso

particular (isto é, um professor, uma escola ou uma rede de ensino específica),

mas por aquilo que um caso – ou casos – pode ajudar a elucidar.

Neste trabalho, preferimos a tipologia sugerida por Stake (1994) e por

André (2006). Desde a etapa de protocolo de pesquisa, nosso interesse tem

sido a interpretação das estratégias de ensino de língua inglesa na EJA e a

relação entre elas e a afetividade. Portanto, não optamos por uma unidade de

análise que pudesse ser classificada como um caso de sucesso (por exemplo,

um professor de língua inglesa que, segundo funcionários da Secretaria de

Educação ou da direção de alguma escola, fosse considerado competente ou

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que mantivesse vínculos afetivos com a maior parte dos alunos) ou como um

caso de imperícia profissional (como uma escola com EJA que tivesse a

reputação de não ser acolhedora aos estudantes).

Em suma, este estudo de caso pode ser classificado como

explanatório, uma vez que busca descrever realidades e interpretá-las;

coletivo, com finalidade instrumental, posto que abarca três casos e, por

intermédio deles, procura compartilhar insights, reflexões sobre o objeto

de estudo.

2.1.2 O caso

Preliminarmente, é preciso deixar claro que o caso é uma expressão

englobante. Na verdade, o caso deste estudo é constituído por três casos. No

entanto, para sermos coerentes com a tipologia sugerida por Stake (1994) e

por André (2006), usaremos a flexão do substantivo no singular.

Para Yin (2015), apresentar o caso em um relatório de pesquisa (ou

dissertação, neste contexto) é uma tarefa dividida em duas etapas:

definição do caso;

delimitação do caso.

Nesta subseção, adotaremos a indicação do cientista social norte-

americano. Segundo ele, “em cada situação (sic) uma pessoa única é o caso

sendo estudado e o indivíduo é a unidade primária de análise” (YIN, 2015, p.

33). Assim, seguindo a tradição dos estudos de caso convencionais, na análise

dos dados, apresentaremos, inicialmente, três casos – um para cada professor-

participante. Daí as rubricas caso da professora Eliane, caso da professora

Giovanna e caso do professor Valter90. Entretanto, essa definição com base no

indivíduo não é suficiente para explicarmos “o caso” da pesquisa.

90

Todos os nomes são fictícios. Durante a pesquisa em campo, ao aplicarmos um questionário inicial, solicitamos aos professores-participantes que se dessem um nome, para a escrita da dissertação. Uma professora disse-nos que não via necessidade de usar um nome inventado, mesmo após nossa explicação sobre as questões éticas ligadas a essa escolha. Outro

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Yin (2015) reforça a necessidade de delimitação do caso em termos

espaciais e temporais. Nesta pesquisa, o limite espacial é a sala de aula.

Embora a atuação do professor de língua inglesa se estenda a outros locais,

como a sala dos professores em momentos de planejamento, o foco deste

estudo é interpretar as estratégias de ensino in loco, por meio da e na interação

com os alunos da EJA. O limite temporal é o período de setembro a dezembro

de 2016, um momento de virada política na prefeitura de São Bernardo do

Campo, conforme veremos a seguir (cf. a subseção 2.2 Contexto da pesquisa).

Por fim, a definição do caso depende, ainda, de um aspecto central no

método escolhido: a concretude do fenômeno. Para Yin (2015, p. 36),

o caso desejado deve ser algum fenômeno da vida real que tenha alguma manifestação concreta. O caso não pode ser simplesmente uma abstração, como uma reivindicação, um argumento ou mesmo uma hipótese.

Assim, nesta pesquisa, sintetizamos o caso como as estratégias de

ensino de língua inglesa usadas pelos professores-participantes e suas

relações com a afetividade. Ressalvamos que a teoria sobre a afetividade

discutida neste estudo não pode ser reduzida a uma abstração, já que

considera a inseparabilidade entre inteligência, afetos e movimento e emerge

na relação e na interação do professor com os alunos (e vice-versa).

2.2 Contexto da pesquisa

O contexto é o fator essencial para o trabalho com o método estudo de

caso, conforme André (2008) e Yin (2015) nos ensinam. Como se trata de um

aspecto amplo, delimitaremos nossa compreensão sobre o que é o contexto

desta pesquisa a partir dos pontos a seguir:

o contexto macrossocial, isto é, a cidade de São Bernardo do Campo e a

rede municipal de EJA;

professor escolheu, por acaso, o nome de um professor de língua inglesa da mesma rede de ensino. Para não causar confusões, decidimos renomear – com nomes fictícios – esses dois participantes.

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o contexto microssocial, quer dizer, as particularidades do componente

curricular Língua Inglesa, na sala de aula.

São Bernardo do Campo é um município com população estimada em

827.437 pessoas (IBGE, 2017). Trata-se da quarta cidade mais populosa do

estado de São Paulo.

Historicamente, São Bernardo do Campo é uma cidade conhecida pela

influência da cultura italiana e pelas lutas sindicais. De um lado, os nomes dos

bairros, por exemplo, costumam fazer referência a famílias italianas

tradicionais. De outro lado, São Bernardo do Campo costuma aparecer na

mídia mainstream, quando a pauta são as questões ligadas ao Partido dos

Trabalhadores (PT) e às greves dos funcionários de empresas

automobilísticas, cujas plantas estão na cidade há mais de 30 anos. Por fim,

concordamos com Zanardo (2017, p. 64), para quem

São Bernardo é um município urbano, com traços de cidade do interior, pois são comuns festas tradicionais como a Procissão dos Carreteiros, em homenagem à Santa Padroeira da cidade.

Nesse panorama sócio-histórico-cultural, justamente por conta da

industrialização, o município apresenta uma grande presença de migrantes de

outras regiões brasileiras, com destaque para o Norte e o Nordeste. Seguindo

uma espécie de lógica da urbanização no nosso país, parte desse contingente

populacional passou a organizar as favelas91 da cidade. Uma das escolas

participantes desta pesquisa, por exemplo, atende a alunos de uma favela com,

em média, 30 mil moradores, segundo o levantamento de um jornal regional

(TAMASAUSKAS, 2003).

A taxa de escolarização da cidade é alta: 97,6% das pessoas de 10 a 14

anos estudam no Ensino Fundamental (IBGE, [2010] 2017). No entanto, em

termos de educação básica, conforme elucidamos na subseção 1.1.2 Olhares

91

Usamos o segmento lexical favela, com base em Meirelles e Athayde (2014). Concordamos com os pesquisadores sobre os significados possíveis dessa palavra, que não é usada, aqui, como um estigma. Segundo eles, com base na pesquisa Radiografia das Favelas Brasileiras, realizada pelo Instituto Data Favela, a baliza de conhecimento para falarmos sobre as favelas brasileiras não deve ser o “estereótipo midiático, em que os moradores de comunidades, de modo invariável, figuram como miseráveis incultos, indolentes e bárbaros” (MEIRELLES, ATHAYDE, 2014, p. 29). A baliza de conhecimento, para esses pesquisadores, são os próprios moradores dessas regiões e o que eles falam sobre o local onde vivem ( idem).

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sobre a história da EJA em São Bernardo do Campo, a história da EJA, como

política pública, é bastante recente, já que começou em 2009. Em linhas

gerais, a rede municipal tem sido totalmente responsável pela oferta de Ensino

Fundamental 1 e 2, na modalidade EJA. A rede estadual tem oferecido cursos

de EJA/Ensino Médio.

Até 2016, a oferta de Ensino Fundamental 2 acontecia92 em 12 escolas

da prefeitura. Os perfis dessas escolas eram bastante diversos, porque

algumas delas ofereciam a EJA em diferentes configurações, como a

articulação com o ensino profissionalizante. Em menor número, havia escolas

com salas multisseriadas, isto é, alunos de termos diferentes (por exemplo, 5º

e 6º termos, equivalentes ao 6º e ao 7º anos do Ensino Fundamental)

estudavam em uma mesma classe, ao mesmo tempo, com um único professor.

Nesta pesquisa, as duas escolas-participantes partilhavam das

seguintes características:

o atendimento a alunos da EJA acontecia apenas à noite (das 19h30min

às 22h30min), porque, pela manhã e à tarde, havia turmas de Ensino

Fundamental 1, regular;

não havia oferta de ensino profissionalizante;

não existiam salas multisseriadas para o segundo segmento, ou 3º e 4º

ciclos (o equivalente ao Ensino Fundamental 2);

do ponto de vista histórico, a oferta de cursos de EJA, como política

pública, já havia começado em 2009. Portanto, quando fizemos a

pesquisa em campo, no segundo semestre de 2016, o trabalho com

jovens e adultos, nos dois contextos, acontecia há sete anos.

Antes de prosseguirmos com o estudo do contexto microssocial,

fazemos uma ressalva: em 2016, ao planejarmos a etapa de geração dos

dados, consideramos a necessidade de não adiar a aplicação de nenhum

instrumento (por exemplo, a filmagem das aulas ou as entrevistas com os

professores-participantes) para o ano seguinte (2017), em função da iminente

92

Neste parágrafo, mudamos o tempo verbal (do presente para o pretérito imperfeito do modo indicativo), porque não sabemos, exatamente, como a EJA, em São Bernardo do Campo, tem sido estruturada, desde 2017, quando um novo governo (prefeito Orlando Morando (PSDB)) foi eleito.

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virada política. Com a entrada de um novo partido político no poder - como, de

fato, aconteceu -, prevíamos que a mediação da Secretaria de Educação com

as escolas-participantes pudesse ser dificultada, já que ela dependia de

contatos feitos entre o pesquisador e alguns funcionários dessa pasta.

Para tratar do contexto microssocial, focaremos os seguintes pontos:

o regime de trabalho dos professores-participantes;

a carga horária do componente curricular Língua Inglesa.

O regime de trabalho dos professores de EJA da rede municipal prevê

que a lotação do educador dependa do número de aulas que ele possui em

uma determinada escola. Cada turma do segundo segmento da EJA tem uma

aula de Língua Inglesa por semana. Consequentemente, em escolas com

poucas turmas, o professor precisa fazer uma espécie de “rodízio”. Em

diferentes noites da semana, ele atende a escolas distintas. Nesta pesquisa,

conforme veremos em Os participantes, apenas uma professora trabalhava em

uma única unidade escolar, somente. A maioria dos professores, portanto,

atuava em mais de uma escola.

Nas duas escolas pesquisadas, em todas as turmas e termos, como

anunciamos acima, os professores-participantes dispõem de uma hora/aula por

semana. Isso significa um contato semanal de, em média, 50 minutos com

cada grupo de estudantes. Normalmente, nas salas de aula a partir das quais

os dados foram gerados, em cada encontro, houve um período inicial de dez

minutos durante os quais os estudantes foram ao banheiro ou saíram para

fumar, no pátio.

É importante ressaltar, ainda, o período de curso de um termo, no

contexto da EJA de São Bernardo do Campo. Cada termo é concluído em um

semestre. Na verdade, o curso tem, efetivamente, quatro meses, descontados

os períodos de recesso e de férias. Matematicamente, portanto, cada

termo/série contém, em média, 16 encontros, o que equivale a menos de 14

horas/aula.

Se um aluno ingressa no 5º termo e conclui, na EJA, todo o Ensino

Fundamental 2, ele perfará um curso de 56 horas/aula, no que diz respeito à

língua inglesa. Frisamos, contudo, que essa carga horária é um cenário

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idealizado. Todos os professores-participantes apontam o absenteísmo dos

estudantes da EJA como um complicador para o processo de ensino-

aprendizagem. Em outras palavras, o total de 56 horas/aula, num período de

dois anos – ou quatro termos, ou, ainda, todo o Ensino Fundamental 2 – é

vivenciado por um pequeno grupo de estudantes.

Em resumo, o tempo alocado para o processo de ensino-aprendizagem

de língua inglesa na EJA é muito curto. A respeito desse tema, sugerimos a

leitura de Miccoli (2016), que analisa a relação entre a carga horária e os

currículos de língua inglesa, em escolas públicas. Para ela, o tempo destinado

a essa disciplina é um entrave93 à aprendizagem significativa, autônoma e com

vistas à fluência dos estudantes. A nosso ver, essa situação é agravada,

quando se trata dos cursos de EJA.

2.2.1 As escolas

Para descrever as duas escolas, partiremos das características gerais,

assinaladas acima, e de apontamentos específicos a cada realidade. Por isso,

dividiremos esta subseção em três partes:

descrição geral da Escola Anísio Teixeira;

descrição geral da Escola Darcy Ribeiro e

aspectos estruturais, materiais e equipamentos oferecidos pelas duas

unidades escolares.

Como antecipamos, por questões éticas, omitimos os nomes das duas

escolas, chamando-as, então, de Escola Anísio Teixeira e de Escola Darcy

Ribeiro.

93

“De acordo com o Conselho Americano de Línguas Estrangeiras (ACTFL), são necessárias cerca de 240 horas de língua estrangeira para chegar a um nível de desempenho intermediário, baixo ou médio, de acordo com as diferenças individuais dos alunos” (MICCOLI, 2016, p. 18, grifos nossos). Ou seja: a realidade do microcosmo aula de língua inglesa na EJA municipal de São Bernardo do Campo, no mínimo, contrasta, enormemente, com o padrão recomendado pelo ACTFL.

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127

2.2.1.1 Escola Anísio Teixeira

A Escola Anísio Teixeira foi fundada em 1988 (SP ESCOLAS, 2018). Ela

está localizada no Jardim Palermo. Todo o território do bairro era praticamente

desabitado até a década de 1970, segundo dados da prefeitura (PREFEITURA

DE SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2016). Essa escola está justamente em

uma avenida que liga o Jardim Palermo à Vila São Pedro (a maior favela da

cidade) e a outros bairros periféricos. Vale ressaltar que a Escola Anísio

Teixeira está próxima ao centro comercial do município.

A tabela abaixo traz alguns dados numéricos, com base no recorte

temporal da pesquisa em campo (segundo semestre de 2016):

Tabela 1 – Quantidade de alunos da EJA e de profissionais da gestão escolar da Escola Anísio Teixeira

Características Nº

Alunos atendidos pela escola (nos três períodos) 1.000

Estimativa de alunos que frequentam, ao longo do semestre, as

aulas da EJA

Entre 150 e 180

Profissionais que compõem a gestão escolar 06

Profissionais da gestão escolar que acompanham, diariamente, os

professores e os alunos da EJA

02

Fonte: Elaborado pelo autor, dezembro de 2016.

Durante a investigação, os professores-participantes informaram-me

que, naquele período, as formações docentes em serviço, planejadas pela

professora coordenadora da unidade escolar, eram sobre estratégias de leitura,

por conta das dificuldades de compreensão textual dos alunos da EJA.

2.2.1.2 Escola Darcy Ribeiro

A Escola Darcy Ribeiro foi fundada, também, em 1988 (SP ESCOLAS,

2018). Ela está localizada no Jardim Batistini. Esse território é às margens da

Estrada Galvão Bueno e bastante longe do centro comercial de São Bernardo

Campo (nesse quesito, é uma realidade oposta à da Escola Anísio Teixeira).

Historicamente, o Jardim Batistini tem abrigado restaurantes consagrados do

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128

município. Segundo a professora Giovanna, que trabalha na Escola Darcy

Ribeiro, alguns estudantes da EJA são funcionários desses estabelecimentos.

A tabela a seguir apresenta dados quantitativos sobre o atendimento e o

funcionamento dessa escola:

Tabela 2 - Quantidade de alunos da EJA e de profissionais da gestão escolar da Escola

Darcy Ribeiro

Características Nº

Alunos atendidos pela escola (nos três períodos) 812

Estimativa de alunos que frequentam, ao longo do semestre, as aulas

da EJA

85

Profissionais que compõem a gestão escolar 04

Profissionais da gestão escolar que acompanham, diariamente, os

professores e os alunos da EJA

02

Fonte: Elaborado pelo autor, dezembro de 2016.

Na Escola Darcy Ribeiro, o trabalho com o currículo crítico-libertador,

induzido pela proposta curricular da prefeitura para a EJA, parece ser profícuo.

Para afirmarmos isso, baseamo-nos nas entrevistas e nas conversas informais

com a professora-participante (Giovanna) e no blog da própria escola94. Nele,

podemos ver os trabalhos realizados pelos estudantes da EJA a partir de

temas geradores, uma categoria metodológica freiriana (FREIRE, P., 2016). Os

posts do blog contêm relatos de experiências, textos escritos pelos

professores, fotos e vídeos.

No que diz respeito às formações em serviço, de acordo, ainda, com a

professora-participante, o foco era, justamente, o trabalho com projetos

pedagógicos inter/transdisciplinares, cujas tematizações eram feitas com os

alunos, no início de cada semestre.

2.2.1.3 Aspectos estruturais, materiais e equipamentos oferecidos pelas duas

unidades escolares

As Escolas Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro têm infraestruturas

semelhantes. Ambas dispõem de quadra esportiva, de espaço para a

socialização dos alunos, de mobiliário adequado para os estudantes jovens e

94

Por questões éticas, não podemos compartilhar o endereço eletrônico do blog.

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129

adultos, de bebedouros, de refeitórios, de bibliotecas e, em cada uma delas, há

um laboratório de informática com vinte computadores.

Quanto a materiais e a equipamentos, as Escolas Anísio Teixeira e

Darcy Ribeiro têm dois televisores, dois projetores e aparelhos de som, mas

não oferecem Internet com conexão Wi-Fi a alunos nem a funcionários.

Ressaltamos que o material escolar (caneta, lápis, borracha e caderno) e o

livro didático95 são dados pela prefeitura a cada aluno da EJA, no início do

semestre.

Por fim, segundo as professoras Eliane (Escola Anísio Teixeira) e

Giovanna (Escola Darcy Ribeiro), um complicador estrutural para o ensino de

língua lnglesa é a falta de materiais impressos específicos a esse componente

curricular. A professora Eliane reclama, pontualmente, da ausência de

dicionários bilíngues. Para a professora Giovanna, a escola poderia oferecer,

além de dicionários bilíngues, livros, readers96 e histórias em quadrinhos em

LE.

2.2.2 Os participantes

Para escolher os participantes desta pesquisa, inicialmente, fizemos

uma proposta aos sete professores de língua inglesa da EJA da rede

municipal97

, porque não sabíamos se haveria interesse por parte desse grupo

em cooperar com esta pesquisa. Assim, em agosto de 2016, em um encontro

formativo na Secretaria de Educação, explicamos-lhes quais eram os objetivos

deste trabalho e que instrumentos de geração de dados, preliminarmente,

poderiam ser usados. Todos os professores mostraram disponibilidade em

cooperar.

95

Desde 2016, os livros didáticos entregues aos alunos da EJA pertencem à Coleção Viver, aprender, escrita, em coautoria, por Aguiar et al. (a primeira edição é de 2013). Os livros são organizados por série/termo e apresentam conteúdos de todas as disciplinas. 96

Readers são adaptações literárias de clássicos da literatura inglesa e norte-americana. Eles costumam ser calibrados por nível de complexidade linguística. Para saber mais sobre o uso deles, em sala de aula de LE, sugerimos a leitura de Lima Jr. (2016). 97

Em 2016, oito educadores, concursados para o cargo Professor de Língua Inglesa, trabalhavam na rede municipal de São Bernardo do Campo. Como o município responsabiliza-se pela oferta de Ensino Fundamental 2 apenas no formato da EJA, os oito professores (grupo de que tenho feito parte desde 2013) têm atuado, ainda hoje (2018), especificamente, nessa modalidade de ensino.

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130

Após essa etapa inicial, decidimos, então, mapear em que unidades

escolares cada professor trabalhava. Disso, resultou um dado: em duas das

maiores escolas (de um grupo formado por 12 unidades), em termos de

número de turmas da EJA, havia dois professores de língua inglesa em cada

uma delas, em diferentes dias da semana. Em setembro, procuramos contatar,

então, os quatro professores que lecionavam nessas duas escolas.

Acreditávamos, naquele momento, que esse contexto de pesquisa poderia

propiciar uma síntese de dados cruzados interessante. Entretanto, houve

dificuldades para conseguirmos a autorização de filmagem das aulas em uma

dessas escolas. Por isso, reformulamos, parcialmente, nosso plano original.

Dele, mantivemos a cooperação com os professores Eliane e Valter, que

trabalhavam na Escola Anísio Teixeira. E, passamos a contar, em novembro de

2016, com a participação da professora Giovanna, da Escola Darcy Ribeiro.

A seguir, apresentamos um perfil de cada um dos professores-

participantes. A referência temporal para as informações veiculadas é o ano de

2016, quando os dados foram produzidos.

2.2.2.1 Professora Eliane

A professora Eliane tinha 30 anos. Fez a graduação em Letras –

Licenciatura em Português/Inglês, na modalidade presencial, em uma

faculdade particular, em São Bernardo do Campo. Durante a pesquisa em

campo, Eliane estava fazendo dois cursos de pós-graduação lato sensu, na

modalidade a distância: um deles era sobre Ensino de Língua Inglesa; o outro,

Educação Especial.

Eliane era professora há pouco mais de seis anos; durante cinco deles,

trabalhava somente na prefeitura de São Bernardo do Campo, como professora

de Língua Inglesa. Ela complementava a jornada de trabalho como educadora

de apoio à aprendizagem, no Ensino Fundamental 1, no período vespertino.

Ainda no que concerne à vida profissional, antes de tornar-se professora

em escolas públicas, o que começou com a entrada na EJA, Eliane trabalhou

em centros de idiomas.

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131

Sobre a escolha pelo magistério, ela afirmou gostar de ser professora de

língua inglesa, porque se identificava com o idioma. No que diz respeito à EJA,

particularmente, ela apontou o seguinte desafio profissional: “mostrar aos

alunos, principalmente, os mais velhos, que a Língua Inglesa é importante para

o seu crescimento profissional e pessoal, também” (Questionário de pesquisa

1). Para ela, “um ambiente de trabalho mais calmo” (Questionário de pesquisa

1) foi o motivo que a levou a candidatar-se a um cargo como professora efetiva

dessa modalidade.

Eliane participava das formações em serviço promovidas pela Secretaria

de Educação. Ela declarou que a EJA não foi tema nem objeto de estudo em

outros contextos formativos de que fez parte (como a formação inicial em

Letras), antes do ingresso na prefeitura de São Bernardo do Campo.

2.2.2.2 Professora Giovanna

A professora Giovanna tinha 40 anos. Fez a graduação em Letras –

Licenciatura em Português/Inglês na modalidade semipresencial, em uma

faculdade particular, em São Bernardo do Campo. Ela ainda não havia feito

pós-graduação, embora tivesse interesse.

Anteriormente, estudou inglês em diferentes centros de idiomas.

Giovanna sempre gostou dessa LE e estudou-a para tornar-se comissária de

voo, profissão que desempenhou por 15 anos, antes de licenciar-se. Ela era

professora de Língua Inglesa há um período de seis a dez anos. Na rede

municipal de São Bernardo do Campo, trabalhava há cinco anos, exatamente.

A respeito da rotina de trabalho, Giovanna trabalhava à noite, como

docente na EJA e, durante o dia, em um centro de idiomas. Nele, além de ser

professora, auxiliava, ainda, a coordenação pedagógica. Na prefeitura,

trabalhava 20 horas semanais98. Sua jornada de trabalho total durava, em

média, dez horas por dia, de segunda-feira a sábado.

Sobre a carreira docente, Giovanna afirmou gostar de ser professora de

língua inglesa, mas complementou: “não gosto do salário, e nem das condições

98

A jornada de trabalho dos professores da EJA – 2º segmento é de 24 horas semanais, distribuídas da seguinte forma: 20 horas na unidade escolar; duas horas de planejamento livre, isto é, fora da escola, e duas horas de Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC).

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132

de trabalho em Centro de Idiomas” (Questionário de pesquisa 1). Entre os

desafios da profissão, Giovanna declarou ter de preparar muitas aulas

diferentes e, com isso, haver pouco tempo para o descanso.

Quanto à vivência profissional na EJA, Giovanna disse que, antes de

ingressar na prefeitura de São Bernardo do Campo, não havia trabalhado com

essa modalidade. No entanto, isso era um desejo, porque a experiência prévia,

em centros de idiomas, lhe serviu para que ela percebesse que preferia ensinar

adultos a crianças. Para ela, então, o motivo que a levou a escolher a EJA

como local de atuação foi o interesse em “trabalhar com adultos e ter essa

troca de experiências com os educandos” (Questionário de pesquisa 1).

Giovanna participava, sempre, das formações em serviço oferecidas

pela Secretaria de Educação. Ela afirmou que, em sua formação inicial ou em

outros contextos formativos, fora do âmbito da prefeitura de São Bernardo do

Campo, não teve a oportunidade de estudar quaisquer aspectos da EJA.

2.2.2.3 Professor Valter

O professor Valter tinha 54 anos. Ele era formado em Letras –

Licenciatura em Português/Inglês na modalidade semipresencial, em uma

faculdade particular, em São Bernardo do Campo – a mesma instituição em

que a professora Giovanna se graduou. Em 2016, durante o primeiro semestre,

Valter concluiu um curso de pós-graduação lato sensu em Tecnologias da

Informação, na modalidade a distância.

Assim como as professoras Eliane e Giovanna, Valter trabalhava, como

professor de língua inglesa, há um período de seis a dez anos, dos quais cinco

deles foram, apenas, na prefeitura de São Bernardo do Campo. Diferentemente

das outras professoras-participantes deste estudo, Valter não tinha experiência

como aluno ou como professor em centros de idiomas.

Sobre o magistério, Valter afirmou gostar de ser professor de língua

inglesa, porque a “aquisição de outro idioma é muito importante na construção

do indivíduo” (Questionário de pesquisa 1). Para ele, o maior desafio, ao

ensinar inglês como LE, era “fazer as pessoas falarem o idioma. Se não

falarem, o processo de aquisição fica incompleto” (Questionário de pesquisa 1).

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133

Para Valter, a vivência profissional na EJA começou com o ingresso na

prefeitura de São Bernardo do Campo. Sobre o porquê de ter escolhido a EJA

como contexto de trabalho, Valter escreveu: “Fiz o concurso sem saber o que

era EJA” (Questionário de pesquisa 1).

Valter participava das formações em serviço promovidas pela Secretaria

de Educação. Confirmando uma de suas falas no parágrafo anterior, ele

declarou que a EJA não havia sido tema de nenhum componente curricular da

formação inicial ou de cursos de formação contínua, antes do ingresso na

prefeitura de São Bernardo do Campo.

2.2.3 O pesquisador99

À época da pesquisa em campo, tinha 27 anos. Formei-me em Letras –

Licenciatura em Português/Inglês, pelo Centro Universitário Fundação Santo

André, em 2010. Naquele mesmo ano, fui aprovado em dois concursos

públicos para os cargos de professor efetivo de Língua Portuguesa e de Língua

Inglesa da rede estadual de São Paulo. Consegui, então, ingressar no

magistério público logo após a formatura, em 2011. Durante os quatro anos em

que cursei a licenciatura, trabalhei em centros de idiomas e em um curso

preparatório para vestibulares, como corretor de redação. Fiz, ainda, estágio de

docência em uma escola particular de Ensino Fundamental 2 e Médio.

De 2012 a 2015, trabalhei como professor efetivo de Língua Inglesa em

outras duas redes de ensino (além da rede estadual): a prefeitura de São Paulo

e a prefeitura de São Bernardo do Campo, cidade onde moro.

Em 2015, voltei a trabalhar em escolas particulares de Ensino

Fundamental 2 e Médio, mas como professor de língua portuguesa.

No que diz respeito à formação acadêmica, em 2011, comecei a pós-

graduação lato sensu em Ensino de Língua Inglesa na Universidade Estadual

de São Paulo “Júlio de Mesquita” (UNESP). Concluí esse curso no início de

2013. Entre 2013 e 2014, cursei uma segunda graduação: Pedagogia plena

para licenciados, na Universidade Nove de Julho (UNINOVE). Em 2016,

99

Como se trata de uma descrição do pesquisador, optamos por registrar as formas verbais na primeira pessoa do discurso.

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134

ingressei no mestrado em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem, na

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Com referência ao meu interesse em trabalhar com EJA, lembro-me de

que essa modalidade chamava minha atenção, desde a primeira graduação

(Letras). No primeiro semestre desse curso, durante algumas aulas da

disciplina Políticas Públicas Educacionais, ouvi da professora da turma relatos

sobre a experiência dela com a organização da EJA, como um direito, em

Mauá, na região ABCDMRR100. Desde então, pensava no desafio que seria,

para o professor formado em Letras, trabalhar com adultos e idosos populares,

que não tinham frequentado a escola quando eram crianças. Como se vê, a

representação101 que eu fazia, àquela época, sobre essa modalidade de ensino

era estereotipada, uma vez que desconsiderava o contingente jovem que já

frequentava as aulas da EJA, em 2007.

No entanto, não avalio a presença da EJA como parte fundamental da

minha formação inicial em Letras ou em Pedagogia. Nos dois casos, o que era

ouvido ou lido sobre essa modalidade de ensino era, sempre, bastante

superficial, porque não tratava das particularidades culturais dessa temática.

Em síntese, a diferença reforçada, nesses cenários de aprendizagem, era,

basicamente, a faixa etária dos estudantes.

Quanto à formação contínua em serviço, sempre participei dos

encontros formativos organizados pela Secretaria de Educação de São

Bernardo do Campo. E, antes de ingressar no mestrado, já havia participado de

alguns fóruns regionais sobre a EJA.

100

A região ABCDMRR é formada pelos seguintes municípios paulistas: Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano, Diadema, Ribeiros Pires, Mauá e Rio Grande da Serra. 101

Neste trabalho, usamos o termo representação de acordo com os significados do dicionário (ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2008) e não como um construto ligado a alguma teoria específica. Segundo o Dicionário Escolar da Língua Portuguesa (ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2008, p. 1108), representação pode ser “1. Ato ou efeito de representar(-se). 2. Ideia ou imagem que reproduz, imita ou simboliza (pessoa, coisa, fato) [...]. 3. Encenação de uma peça [...]. 4. Interpretação, por parte de um artista, de um determinado papel; atuação [...]. 5. Conjunto de membros que integram uma delegação ou comissão”.

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135

2.3 Instrumentos de geração de dados

Considerando a flexibilidade do método estudo de caso, utilizamos

diversos instrumentos de geração de dados. O quadro a seguir apresenta a

relação entre o uso de cada instrumento e os professores-participantes.

Quadro 1 - Instrumentos de geração de dados em relação a cada professor-participante da pesquisa

Instrumento de geração de dados Professora

Eliane

Professora

Giovanna

Professor

Valter

Questionário online102

Sim Sim Sim

Observação participante e filmagem

das aulas

Sim Sim Sim

Conversas informais em campo, com

autorização dos professores-

participantes para compor os dados da

pesquisa

Sim Sim Sim

Fotocópia do material didático usado

em sala de aula, quando o pesquisador

estava presente

Não Sim Sim

Notas em campo do pesquisador Sim Sim Sim

Questionário de estratégias de ensino,

com base em Kumaravadivelu (1994,

2003), acompanhado de comentários

dos professores-participantes

(gravados em áudio)

Sim Sim Sim

Planos de aula, com a seção

Estratégias de ensino descrita

Sim Sim Não

Conversas por WhatssApp, para

esclarecimentos de dúvidas do

pesquisador

Sim Sim Sim

Fonte: Elaborado pelo autor, junho de 2017.

Nota: Sim e Não indicam se o participante contribuiu (ou não) com a produção de dados a

partir de determinado instrumento.

102

O questionário pode ser acessado em: <https://docs.google.com/forms/d/145UWr9jZD6IGMIYZhofH3NHcj9snkP-xf7x4EIJsBM4/edit>. Acesso em: 28.mai.2018.

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136

Adiante, detalharemos como os instrumentos foram elaborados e

aplicados.

2.3.1 Questionários

Para Dörnyei (2011), nas pesquisas em LA, questionários podem

apresentar três tipos de informação dos respondentes: aspectos factuais,

comportamentais ou atitudinais. Com nossos dois questionários, cobrimos,

parcialmente, os três aspectos a que o linguista aplicado se refere.

Por intermédio do primeiro questionário, buscamos conhecer a

escolaridade, a história do professor como aprendiz de língua inglesa e sua

relação com o ambiente em que trabalhava (aspectos factuais). E, fizemos

questões relacionadas a opiniões e a interesses dos participantes (aspectos

atitudinais). Frisamos que a aplicação desse instrumento foi por meio do

Google Formulários.

No segundo questionário, focamos a prática em sala de aula. Nosso

interesse foi promover uma conversa entre o professor, o pesquisador e a

teoria das macroestratégias e das microestratégias de Kumaravadivelu (1994,

2003). Considerando que as estratégias de ensino são ações empiricamente

observáveis, a partir de Dörnyei (2011), avaliamos esse instrumento como um

questionário para cobrir aspectos comportamentais dos professores-

participantes.

Para a elaboração desse instrumento, enumeramos as macroestratégias

e etiquetamos as microestratégias. O código da etiqueta informa, por meio da

letra M, a macroestratégia a que a microestratégia está ligada. Ao lado,

acrescentamos a letra A (de ação) e um número, em ordem crescente. Dessa

forma, o código M1A1, por exemplo, indica que se trata da primeira

microestratégia atrelada à macroestratégia 1, isto é, maximizar oportunidades

de aprendizagem.

Ao lado de cada código, escrevemos uma microestratégia. Em quase

todos os casos, partimos da revisão bibliográfica do artigo e do livro escritos

por Kumaravadivelu (1994, 2003). Com o objetivo de dinamizar a conversa,

acrescentamos algumas microestratégias não previstas pelo linguista aplicado

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137

indiano. Para ilustrar essa explicação, apresentamos uma seção desse

questionário:

Macroestratégia 2: Facilitar a interação negociada.

M2A1. S ( ) N ( ) Organizar os alunos em duplas.

M2A2. S ( ) N ( ) Organizar os alunos em grupos.

M2A3. S ( ) N ( ) Criar momentos em que o aluno clarifique o que outro colega ou o próprio

professor disse (sobre conteúdos da língua inglesa).

M2A4. S ( ) N ( ) Criar momentos em que o aluno confirme a compreensão de outro colega

ou do próprio professor (sobre conteúdos da língua inglesa).

M2A5. S ( ) N ( ) Criar momentos em que o aluno faça solicitações a outros colegas ou ao

próprio professor, para compreender com mais profundidade conteúdos da língua inglesa.

M2A6. S ( ) N ( ) Encorajar o aluno a falar “em cima” da fala de outro aluno, com foco nos

conteúdos da aula de língua inglesa.

M2A7. S ( ) N ( ) Encorajar o aluno a trocar turnos com outros colegas, em língua inglesa.

M2A8. S ( ) N ( ) Encorajar o aluno a iniciar a conversa, em língua inglesa.

M2A9. S ( ) N ( ) Criar momentos de discussão em grupo em língua inglesa.

M2A10. S ( ) N ( ) Fazer questões, em língua inglesa, que exijam respostas abertas (por

exemplo, What’s your opinion on...?”; “What do you think about ....?” etc.).

M2A11. S ( ) N ( ) Fazer questões, em língua inglesa, que exijam respostas fechadas (“Do

you like...?”; “Do you eat...?” etc.).

M2A12. S ( ) N ( ) Criar momentos em que o controle do tópico conversacional (por

exemplo, meios de transporte na cidade, alimentos etc.) seja feito pelo aluno.

Quase todas as microestratégias acima são sugeridas e discutidas por

Kumaravadivelu (1994, 2003), exceto a estratégia sublinhada: Fazer questões,

em língua inglesa, que exijam respostas fechadas (“Do you like...?”; “Do you

eat...?” etc.). Na verdade, para esse pesquisador, o processo de facilitar a

interação, na aula de LE, depende, em grande parte, do tipo de pergunta que o

professor faz aos alunos. Disso, resulta que Kumaravadivelu (2003) não

recomenda o uso de perguntas que demandem respostas fechadas. No

entanto, conforme apresentamos na fundamentação teórica, o autor não é

dogmático em suas colocações nem prescreve como o professor de língua

inglesa deva agir. Por esse motivo, decidimos incluir no questionário algumas

microestratégias de nossa autoria, vinculando-as a uma das dez

macroestratégias teorizadas por Kumaravadivelu (1994, 2003).

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138

Os participantes foram orientados a responder, para cada

microestratégia, Sim ou Não (abreviados pelas formas S e N). Com isso,

excluímos a ideia de frequência de uso de determinada estratégia de ensino.

Nossa suspeita é de que, se houvesse a possibilidade de registrar essa

frequência, considerando o número total de microestratégias (116),

os dados poderiam ficar intratáveis para uma análise cruzada;

a teoria de Kumaravadivelu (1994, 2003) poderia ser mal interpretada e

incoerentemente aplicada. Para esse pesquisador, as estratégias de

ensino precisam ser selecionadas a partir do contexto específico em que

o professor está inserido. Por isso, interessa-nos menos a questão da

frequência ou da tipicidade, porque nosso objetivo maior é interpretar,

principalmente, por que certas estratégias são (ou não) usadas.

Para conhecer os porquês relacionados às macroestratégias, solicitamos

aos professores que respondessem ao questionário a lápis e que, ao mesmo

tempo, comentassem, em voz alta, suas respostas. Dessa forma, eles puderam

ajustá-las, tirar dúvidas, elogiar e criticar o instrumento. Essas conversas - ou

Entrevistas 02, como veremos - foram gravadas por meio do celular (modelo

iPhone 4) do pesquisador e, depois, transcritas.

Ressaltamos, aqui, a criação da macroestratégia 11, refletir sobre a

afetividade. Elaboramos essa macroestratégia e as microestratégias

associadas a ela, em razão do nosso interesse em estudar a afetividade nas

aulas de língua inglesa. Para os professores-participantes, apresentamos as

microestratégias como estratégias socioafetivas. Embora seja um neologismo,

escolhemos esse adjetivo, socioafetivo, porque ele sugere que a afetividade é

interpsíquica (não intrapsíquica), em conformidade com nossa fundamentação

teórica.

Finalmente, é importante deixar claro que fizemos testes pilotos dos

questionários, como Dörnyei (2011) aconselha. Em ambos os casos, pedimos a

professores da EJA de diferentes disciplinas (Língua Portuguesa, Ciências e

História) para lerem os dois questionários e darem feedback sobre o número de

itens e a clareza dos enunciados. A respeito disso, reforçamos, aqui, a

importância da cooperação desses colegas, que nos ajudaram a pensar como

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139

a afetividade pode se expressar por meio de ações intencionais (ou não) do

professor em sala de aula.

2.3.2 Observação e filmagem das aulas

O interesse em observar as aulas de Língua Inglesa e filmá-las surgiu

em decorrência da seguinte suposição: provavelmente, o uso exclusivo de

questionários e de entrevistas poderia limitar a nossa interpretação sobre as

estratégias de ensino de Língua Inglesa, porque, nesse caso, teríamos apenas

a voz dos participantes fora da sala de aula. Entendemos que, para saber o

que acontece nesse cenário, a observação participante e a filmagem de

algumas aulas podem ser instrumentos de pesquisa adequados a um estudo

de caso.

Adicionalmente, esse procedimento de produção de dados é sugerido

por Wallon ([1941] 1995) e por Kumaravadivelu (1994). Para o médico francês,

o registro cinematográfico é uma tentativa de retratar o indivíduo dentro de uma

atividade, sem perder detalhes que, talvez, fossem negligenciados pela

observação, apenas. Por isso, as pesquisas de Almeida, L. et al. (2012a) e de

Leite et al. (2018) sobre a afetividade em sala de aula, numa perspectiva

walloniana, utilizam a videogravação como um instrumento de geração de

dados. Já para o linguista aplicado, filmar a ação do educador, em classe, é um

caminho para que o professor de LE produza mais teoria sobre a prática,

catalogando e interpretando novas macroestratégias e microestratégias.

Para as filmagens, usamos uma filmadora semiprofissional, da marca

Panasonic, modelo HC-V100, com imagem Full HD e microfone. Como ela

pertencia ao pesquisador, testes de uso não foram necessários. Para evitar

problemas técnicos relacionados à captação de áudio, o gravador do celular do

pesquisador foi, também, utilizado. Ao longo das filmagens, esse aparelho (o

celular) ficou na frente da sala, próximo aos professores-participantes.

Em relação à operação da filmadora, não usamos tripé. Motivo: durante

a etapa de escrita do protocolo de pesquisa, fomos informados por uma

encarregada da EJA da Secretaria de Educação de São Bernardo do Campo

sobre as prováveis dificuldades em conseguirmos autorização de filmagem dos

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140

alunos. De fato, não tínhamos essa intenção, porque já considerávamos outros

entraves. Por exemplo, não sabíamos em que turmas as filmagens

aconteceriam, para, antecipadamente, encaminharmos qualquer termo de

autorização aos estudantes. E mais, na EJA, é preciso contar com o ingresso

de novos alunos ao longo de todo o semestre. Assim, combinamos com os

professores e com os gestores de cada escola que manipularíamos a filmadora

o tempo todo, focando a atenção no educador.

Quando o professor-participante parecia se fixar na frente da classe,

tomávamos notas de campo, em um caderno.

O quadro abaixo apresenta uma descrição geral de quantas aulas foram

filmadas e em quais escolas fizemos esse registro.

Quadro 2 - Descrição dos contextos das aulas filmadas

Participante Número de aulas

filmadas

Data da filmagem

(em 2016)

Turmas Escola

Eliane 1 27 de outubro 8º A Anísio Teixeira

1 10 de novembro 8º C

Giovanna 2 08 de novembro 5º A e 8º A Darcy Ribeiro

1 24 de novembro 7º A

Valter 1 26 de outubro 7º A Anísio Teixeira

2 09 de novembro 7º A e 7º B

Total de aulas filmadas: 08

Fonte: Elaborado pelo autor, maio de 2018.

Como não fizemos ambientações com o uso da filmadora desligada, em

sala de aula, para que os alunos e os professores se acostumassem com

aquela situação inusitada (isto é, haver uma videogravação da aula de Língua

Inglesa), solicitamos aos três participantes que explicassem, antecipadamente,

às turmas o motivo da nossa presença. Além disso, ao final de cada filmagem,

perguntamos-lhes (professores) se eles acharam que, com a presença do

pesquisador, os alunos se comportaram diferentemente. A respeito disso,

ouvimos uma resposta positiva apenas da professora Giovanna, após

filmarmos a aula do 5º termo A, no dia 08 de novembro. Para ela, numa

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141

conversa informal, na Escola Darcy Ribeiro, os estudantes ficaram “um pouco

mais tímidos”.

Após as filmagens, fizemos as descrições das aulas, com atenção aos

“protocolos interacionais”, isto é, à transcrição dos turnos de fala, conforme

Bortoni-Ricardo (200, p. 94) sugere, e à descrição das estratégias de ensino

observadas.

2.3.3 Entrevistas

Com base em Yin (2016), decidimos fazer entrevistas qualitativas, em

contraste às entrevistas estruturadas. As entrevistas qualitativas apresentam as

seguintes características principais:

“a relação entre o pesquisador e o participante não segue um roteiro

rígido” (YIN, 2016, p. 119), quer dizer, não usamos questionários únicos

para pautar a conversa. Baseamos nossas perguntas, principalmente,

nas estratégias de ensino usadas nas aulas a que assistimos e que

filmamos;

“um pesquisador qualitativo não tenta adotar um comportamento ou

conduta uniforme para todas as entrevistas” (YIN, 2016, p. 119), ou seja,

nosso comportamento não foi o mesmo com todos os participantes,

porque consideramos o perfil de cada um deles;

“as perguntas mais importantes em uma entrevista qualitativa serão

abertas mais do que fechadas” (YIN, 2016, p. 120, grifos do autor).

Assim, não limitamos as respostas dos professores a palavras-chave

específicas, mas tentamos criar contextos em que eles se sentissem

confortáveis para refletirem sobre suas ações em sala de aula.

Para ilustrar o que afirmamos acima, exibimos uma questão feita à

participante Giovanna, no dia 24 de novembro de 2016. Acreditamos que essa

pergunta pode exemplificar o tipo de entrevista que conduzimos com todos os

professores deste estudo:

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142

Pesquisador: Quando você chegou à sala de aula das duas turmas que eu acompanhei, os

alunos estavam sentados separadamente, cada um em uma carteira/cadeira. Você costuma

intervir no layout da sala de aula? (Fonte: Entrevista 01 com a participante Giovanna, em 24 de

novembro de 2016)103

Interessava-nos, portanto, buscar insights dos participantes sobre o que

havia acontecido em sala de aula e, por esse motivo, não nos pareceu

adequado pautar essas conversas em um questionário único.

Fizemos duas entrevistas com cada participante. Na primeira delas,

todas as perguntas foram exclusivamente sobre as estratégias de ensino

observadas. Na segunda, trouxemos o questionário sobre macroestratégias e

microestratégias. Nesse caso, reforçamos a ideia de que as entrevistas foram,

de fato, qualitativas (em oposição a estruturadas), porque o questionário nos

serviu como um ponto de partida. Com base nele, os professores-participantes

puderam opinar sobre o que já tinham feito (ou não) em alguma aula de Língua

Inglesa da EJA e por que fizeram tais escolhas, mas sem a preocupação de

responder, rigorosamente, a cada item.

Fazemos, aqui, outra ressalva sobre a condução da segunda entrevista.

Como a experiência em campo havia nos alertado para a importância da

afetividade na interação e na relação entre professores e alunos, preparamo-

nos para conversar com cada participante a respeito desse tema. Planejamos,

então, perguntas sobre qual parecia ser o papel dos afetos no contexto do

ensino de Língua Inglesa na EJA.

Para registrar as entrevistas, foi utilizado o gravador do celular do

pesquisador. Após as gravações, elas foram transcritas, sem o apoio de

nenhum software específico a essa função.

A seguir, apresentamos um quadro descritivo do contexto das

entrevistas produzidas neste estudo:

103

Os protocolos interacionais estão apresentados em fonte menor em relação ao corpo do texto e com bordas em todos os lados. Com isso, objetivamos distinguir esses protocolos das citações diretas. Todos eles estão apresentados literalmente. Eventuais inadequações gramaticais ou ortográficas foram preservadas, para garantir fidelidade às expressões dos participantes e do pesquisador.

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143

Quadro 3 - Descrição dos contextos das entrevistas

Participante Número de

entrevistas

gravadas

Data da

entrevista (em

2016)

Local Duração (em

minutos)

Eliane 1 10 de novembro Escola Anísio

Teixeira

23:30

1 16 de dezembro 40:50

Giovanna 1 24 de novembro Escola Darcy

Ribeiro

25:45

1 15 de dezembro 37:50

Valter 1 26 de outubro Escola Anísio

Teixeira

18:20

1 16 de dezembro 23:30

Total de entrevistas conduzidas: 06

Fonte: Elaborado pelo autor, maio de 2018.

Julgamos importante destacar, ainda, um conceito de Yin (2016) sobre

as entrevistas qualitativas. Para esse pesquisador, elas podem funcionar “como

um relacionamento social” (YIN, 2016, p. 120). No nosso caso, a relação entre

pesquisador e participantes era de conhecidos, não de amigos. Durante nossas

conversas, produzimos situações amistosas, mas não nos parece que isso

tenha moldado as respostas dos participantes.

A título de exemplo dessas situações, citamos a segunda e última

entrevista com a professora Eliane. Ao ouvir, pelo pesquisador, a descrição de

um episódio de sala de aula, a participante ficou emocionada e chorou. De

acordo com ela, foi importante conhecer - e, acrescentaríamos: ser

reconhecida – um relato do sucesso de seu trabalho com os alunos da EJA.

Uma situação análoga ocorreu com a professora Giovanna. Na segunda

entrevista, ela disse ao pesquisador que já repensava o papel da afetividade no

ensino e na aprendizagem da língua inglesa e que reputava esse repensar à

experiência de fazer parte desta pesquisa.

Em retrospecto, constatamos, portanto, a natureza formativa das

entrevistas qualitativas para o entrevistador e os entrevistados. A respeito

disso, concordamos com Almeida, L. e Szymanski (2010 apud ALMEIDA, L.,

2012, p. 19), para quem

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144

[...] é importante lembrar que na situação de entrevista, que é um momento de encontro entre duas pessoas [...], afetar e ser afetado vale tanto para o entrevistado como para o entrevistador. Têm

eles diferentes históricos em seu percurso de vida e chegam à situação de entrevista com diferentes expectativas. É natural, pois, que no transcorrer da entrevista circulem emoções e sentimentos (grifos nossos).

2.3.4 Artefatos culturais

Para Yin (2016, p. 131), artefatos culturais são “objetos (documentos,

artefatos e registros arquivais) relacionados ao tema de pesquisa”. Neste

estudo, já apresentamos, na fundamentação teórica, um importante artefato: as

Diretrizes Curriculares da EJA (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2012). Além

desse documento histórico, coletamos, também, reportagens de jornais locais e

textos dos blogs das duas escolas-participantes. Neste ponto, registramos

“coletar” (e não produzir ou gerar), em concordância com Yin (2016, p. 131).

Para esse pesquisador, os artefatos culturais são objetos coletados, porque

são “acumulados” (idem).

Nesta subseção, destacamos os seguintes artefatos: os planos de aula

das professoras Eliane e Giovanna e o material didático104 usado, em classe,

pelo professor Valter. Nós os escolhemos como amostras do trabalho realizado

pelos participantes. Para isso, delimitamos o tempo e o espaço. Esse material

foi coletado, exclusivamente, com base nas aulas filmadas. Não solicitamos

aos participantes nenhum artefato que não cumprisse com esse critério.

Adicionalmente, consideramos os objetos coletados apropriados para

reduzir a reflexividade105. Tanto os planos de aula quanto o material didático

usado em classe não foram criados para os fins desta investigação e, por isso,

não são, acreditamos, influenciados por ela.

Ressaltamos, no entanto, que os artefatos culturais não são centrais

para nossa pesquisa. Eles ocupam, aqui, função complementar.

104

Por inexperiência do pesquisador, não coletamos fotocópias do material didático utilizado pela professora Giovanna. Assim como o professor Valter, ela também tinha o hábito de levar atividades impressas aos alunos. No caso dela, entretanto, havia a adesão a um livro em particular. Embora não haja partes desse material anexas ao nosso estudo, ele foi tópico de uma conversa informal com a professora-participante. Essa conversa será retomada na próxima sessão. 105

Com base em Bortoni-Ricardo (2008), entendemos a reflexividade como um pressuposto do paradigma interpretativista. De acordo com essa premissa, “o pesquisador é parte do mundo que ele pesquisa” (BORTONI-RICARDO, 2008, p. 58).

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145

No que diz respeito aos planos de aulas, nós os solicitamos em

decorrência da organização desse documento. Nas duas escolas em que

realizamos a investigação, os planos de aula apresentavam os seguintes

subtítulos: conteúdos e estratégias. Portanto, em ambos os casos, esse

artefato poderia nos ajudar a compreender a relação entre os objetos do

conhecimento (conteúdos escolares) e as estratégias de ensino de Língua

Inglesa, além de dar pistas da compreensão de cada participante sobre o que

eles entendiam por tais estratégias.

O material didático usado pelo professor Valter, por sua vez, é composto

por cinco exercícios. Eles giram em torno de um texto não autêntico106 sobre

uma festa de casamento nos Estados Unidos. A partir dele, os alunos são

solicitados a completarem algumas lacunas com chunks e colocações. Por fim,

precisam verter algumas sentenças da língua portuguesa para a língua inglesa.

Essa atividade pode ser localizada em um site107 para aprendizes de língua

inglesa como LE108.

Por fim, no quadro a seguir, apresentamos um panorama da relação

entre cada instrumento de pesquisa e o tipo de informação gerada:

Quadro 4 - Relação entre instrumentos de geração de dados e tipo de informação gerada

Instrumento de geração de dados Tipo de informação gerada

Questionário online Perfil (i.e., idade, experiências profissionais prévias,

escolarização, apreciação pela língua inglesa, entre

outros aspectos) de cada professor-participante.

Observação participante e filmagem das

aulas

Padrões de interação com os alunos;

macroestratégias e microestratégias de ensino de

LE mais usadas; indícios da relação professor-

alunos.

Conversas informais em campo, com

autorização dos professores-

participantes para compor os dados da

pesquisa

Perspectiva pessoal de cada professor-participante

sobre o cotidiano na EJA.

106

Textos autênticos são aqueles não adaptados a fins específicos de ensino de LE. 107

Disponível em: <https://www.inglesnapontadalingua.com.br/2010/09/texto-em-ingles-para-iniciantes-2.html>. Acesso em: 01.jun.2018. 108

Pedimos autorização ao professor Valter para compormos os dados da pesquisa com essa informação.

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146

Quadro 4 - Relação entre instrumentos de geração de dados e tipo de informação gerada

continuação

Fotocópia do material didático usado em

sala de aula, quando o professor-

pesquisador estava presente

Concepção de língua(gem) e de como ocorre a

aprendizagem de LE latente às atividades

propostas aos alunos.

Notas em campo do pesquisador Perspectiva pessoal do pesquisador sobre a

relação professor-alunos, em classe, e sobre as

condutas de alguns estudantes, especificamente.

Questionário de estratégias de ensino,

com base em Kumaravadivelu (1994,

2003), acompanhado de comentários

dos professores-participantes (gravados

em áudio)

Interpretação dos professores-participantes sobre

as macroestratégias e as microestratégias de

ensino mais e menos usadas em sala de aula;

visão dos professores sobre o papel da afetividade

no processo de ensino-aprendizagem de LE.

Planos de aula, com a seção Estratégias

de ensino descrita

Interpretação dos professores-participantes sobre o

que são, no olhar deles, estratégias de ensino e

visão de currículo subjacente às práticas em sala

de aula.

Conversas por WhatssApp, para

esclarecimentos de dúvidas do

professor-pesquisador

Classificação dos textos (autênticos, adaptados ou

retirados de livros didáticos) usados em sala de

aula e as experiências prévias, quanto à formação,

com a temática EJA.

Fonte: Elaborado pelo autor, outubro de 2018.

2.4 Procedimentos de análise dos dados

Para Leffa (2006, p. 21), em um estudo de caso, há três maneiras de

interpretar os dados: “(1) análise holística, (2) análise detalhada e (3) análise

de padrões recorrentes”. Neste trabalho, entendemos que a análise holística é

a mais adequada, porque buscamos olhar para as informações em sua

totalidade, fazendo inferências e associações entre o que conversamos,

observamos, ouvimos, lemos e sentimos, em campo, com as teorias que

embasam esta pesquisa. No entanto, considerando a natureza dos objetos

(i.e., as estratatégias de ensino de língua inglesa como LE e a afetividade na

relação professor-alunos), além de uma visão holística, é oportuno usar

diferentes estratégias e técnicas de análise. Com essa separação, não

pretendemos fragmentar nossos temas de interesse, mas, sim, tornar a leitura

mais acessível.

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147

2.4.1 Foco nas estratégias de ensino

Baseados em Yin (2015), usaremos duas estratégias analíticas:

seguir as proposições teóricas ou asserções que levaram ao

caso;

responder às perguntas de pesquisa.

Assim, para cada pergunta de pesquisa, apresentaremos evidências

produzidas a partir de diferentes instrumentos. E, contaremos com

“proposições teóricas” (YIN, 2015, p. 140) ou, nas palavras de Bortoni-Ricardo

(2008), com asserções. De acordo com essa pesquisadora, a “asserção é um

enunciado afirmativo no qual o pesquisador antecipa os desvelamentos que a

pesquisa poderá trazer” (BORTONI-RICARDO, 2008, p. 53). Dito isso,

atrelamos os objetivos específicos deste estudo a três asserções, conforme o

quadro abaixo:

Quadro 5 - Relação entre os objetivos específicos da pesquisa e as asserções que

orientam a análise dos dados

Objetivo específico da pesquisa Asserção

1. Identificar as estratégias de ensino usadas

por professores de Língua Inglesa, no

contexto de duas escolas municipais com

EJA, em São Bernardo do Campo.

1. Os professores-participantes afirmam usar

diferentes estratégias de ensino.

2. Interpretar as estratégias escolhidas pelos

professores-participantes, segundo a análise

do contexto de ensino-aprendizagem feita por

eles.

2. As estratégias de ensino podem ser

selecionadas (ou não) a partir da análise do

contexto de ensino-aprendizagem feita pelos

professores-participantes.

3. Explicar a forma como a afetividade emerge

nas aulas de língua inglesa da EJA,

relacionando-a às ações dos professores-

participantes.

3. A dimensão afetiva pode interferir (ou não)

na escolha e no uso de variadas estratégias

de ensino de língua inglesa, no contexto da

EJA.

Fonte: Elaborado pelo autor, junho de 2017.

Na próxima sessão, essas asserções serão recuperadas e, então,

compartilharemos os achados deste estudo.

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148

Para elegermos as técnicas de análise, nossos suportes teóricos são,

mais uma vez, Leffa (2006) e Yin (2015). Para o linguista aplicado brasileiro,

quando o estudo de caso objetiva construir possíveis explicações para o

funcionamento de um fenômeno, a técnica analítica mais eficaz é “explanation-

building” (LEFFA, 2006, p. 21). Por intermédio dela, podemos olhar para os

nossos dados sem a necessidade de “casá-los” (idem) com outras pesquisas

semelhantes na mesma área.

Yin (2015, p. 168), por sua vez, sugere a técnica “síntese cruzada dos

dados”, na ocasião de casos múltiplos, ou como preferimos, de um caso

coletivo. Essa técnica é usada para conduzir pesquisas em que os casos

estudados repliquem ou contrastem uns em relação aos outros. Daí nosso

interesse por esse percurso metodológico. Para conduzir esse tipo de análise,

Yin (2015, p. 171) reforça a ideia de que, mais do que “tabelas de palavras”, é

preciso haver interpretação argumentativa para o uso eficiente dessa técnica,

algo que converge com a proposta analítica de Leffa (2006), citada no

parágrafo anterior.

2.4.2 Foco na afetividade

O tratamento das informações relacionadas à afetividade partirá de

categorias. Assim, entendemos que a apresentação dos dados pode ser mais

global, já que não será restrita à atuação de cada professor-participante,

isoladamente.

Esse procedimento de análise é sugerido por André (2008), por Almeida,

L. et al. (2012) e por Leite et al. (2013, 2018). Apoiados nesses pesquisadores,

preliminarmente, fizemos a transcrição dos protocolos interacionais. O passo

seguinte foi ler e reler todo o material, “para identificar os pontos relevantes e

iniciar o processo de construção das categorias descritivas” (ANDRÉ, 2008, p.

55). O terceiro passo foi a codificação. À medida que percebíamos fios

condutores ou, nas palavras de Almeida, L. (2012, p. 24), “unidades de

significado”, com a ajuda de um software de edição de textos, destacávamos,

com cores diferentes, trechos dos protocolos interacionais. Em seguida, para

agrupar os excertos destacados, imprimimos os protocolos em folhas coloridas,

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149

seguindo este critério: cada cor (amarelo, verde e rosa) apontava para uma

possível combinação de unidades de significado.

A respeito da suposta divisão de um tema em partes, concordamos com

Almeida, L. (2012a, p. 24). Para essa pesquisadora, “as unidades de

significado relacionam-se umas com as outras – o pressuposto é que essas

unidades podem acessar o todo, e não fragmentá-lo”. Dito isso, deixamos claro

que, a nosso ver, as categorias escolhidas nos ajudam a entender a afetividade

em sala de aula, mas não esgotam, reduzem ou fracionam essa dimensão das

relações humanas. Além disso, a análise por meio de categorias permite-nos

apreender a realidade como algo mutante e dinâmico, pois “uma explicação

que se apoia no real aceita as contradições que ele apresenta” (ALMEIDA, L.,

2012a, p. 25). Daí nossa escolha por rubricas que não sejam,

necessariamente, objetivas ou que excluam quaisquer traços de ambivalência.

Finalmente, as categorias a que chegamos são: os pequenos nadas, a

relação professor-alunos e as incertezas.

2.5 Vantagens e dificuldades desta pesquisa

Entendemos que uma sessão metodológica, em uma dissertação ou

tese, não serve, apenas, para descrever a pesquisa conduzida, mas, também,

para contribuir com o fazer pesquisa de uma comunidade mais ampla, a

comunidade científica. Nesse sentido, encerraremos esta parte do nosso

estudo com algumas reflexões sobre as vantagens do método escolhido e as

dificuldades encontradas em campo.

Sobre as vantagens, destacamos a flexibilidade do estudo de caso. Por

meio desse método, pudemos triangular os dados da pesquisa a partir de

diferentes instrumentos e perspectivas. De certa forma, o estudo de caso é

uma espécie de método guarda-chuva, porque pode acolher outros métodos

qualitativos, sem perder, com isso, sua vocação, isto é, promover uma

investigação profunda sobre alguma realidade concreta, considerando as vozes

de todos os participantes. Neste trabalho, por exemplo, o estudo de caso

coletivo foi configurado, entre outros procedimentos, com base em um

levantamento de estratégias de ensino de Língua Inglesa e de uma pesquisa

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150

histórica sobre a oferta de EJA em São Bernardo do Campo. Certamente, o

escopo desses métodos complementares é pequeno, mas, em um estudo de

caso, eles podem ser articulados.

Outra vantagem do método escolhido diz respeito a seu caráter

generalizante. Para Leffa (2006, p. 15), o

estudo de caso é um tipo de pesquisa qualitativa, com ênfase maior na exploração e descrição detalhada de um determinado evento ou situação, sem a preocupação de descobrir uma verdade universal e generalizável.

Concordamos com o linguista aplicado sobre a ênfase do estudo de

caso. No entanto, achamos pertinente rediscutir a possibilidade (ou não) de

generalização produzida por esse método. A respeito disso, Yin (2015, p. 22)

afirma: os estudos de caso “são generalizáveis às proposições teóricas e não

às populações ou aos universos”. Diante das colocações desses dois

pesquisadores, compreendemos que este estudo de caso coletivo tem grandes

chances de não ser generalizável, em termos de universo de pesquisa. Um

argumento que sustenta essa afirmação é o fato de que se trata de uma

investigação com três professores específicos, situados histórica e

geograficamente. Por outro lado, acreditamos que aspectos das realidades

concretas vividas por esses participantes podem servir, por exemplo, a

generalizações sobre a relação entre afetividade e agência docente e sobre a

formação de professores de Língua Inglesa para e na EJA.

Em oposição e em complementaridade a essas vantagens,

consideramos acertada a sugestão de Bortoni-Ricardo (2008) quanto à

descrição das dificuldades encontradas durante a pesquisa. Conhecendo-as,

futuros leitores e pesquisadores terão a oportunidade de vislumbrar caminhos

alternativos ao que trilhamos, caso decidam conduzir investigações, em alguma

medida, semelhantes a este estudo. Assim, listamos, a seguir, os principais

entraves desta pesquisa:

1. Demora na negociação com o órgão público responsável: Conforme o

cronograma do protocolo de pesquisa, em agosto de 2016, solicitamos à

Secretaria de Educação de São Bernardo do Campo a autorização para

conduzirmos o estudo em duas unidades escolares. No entanto, recebemos o

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151

aval para as filmagens em outubro. Dessa forma, não tivemos o tempo

desejado (quatro meses, a priori) para gerir a pesquisa em campo.

2. Substituição de uma das escolas participantes da pesquisa, devido a um

desajuste entre o pesquisador e os gestores de uma unidade escolar. Embora

já tivéssemos a autorização da Secretaria de Educação de São Bernardo do

Campo, não conseguimos combinar as datas das filmagens das aulas com as

gestoras da unidade, responsáveis, especificamente, pela EJA. Em conversa

com orientadoras de ensino da Secretaria de Educação, decidimos substituir a

tal escola por outra, de perfil semelhante. Com isso, atrasamos, em três

semanas, a pesquisa em campo, já que tivemos de recomeçar a negociação

burocrática com uma nova escola.

3. Redução do número de professores participantes: Na fase de protocolo,

pensávamos, inicialmente, em organizar o estudo de caso com quatro

professores-participantes. No entanto, por conta da dificuldade descrita no item

anterior (2), tivemos de reajustar esse número: de quatro para três

participantes.

4. Falta de tempo agravada: Combinar os dias de filmagem e entrevistas com

os professores não foi uma tarefa fácil, porque, durante o mês de novembro,

algumas atividades eram centrais nas escolas, como as aulas para as

avaliações finais, os trabalhos de compensação de faltas, as assembleias de

encerramento do semestre e o Haja EJA, um evento semelhante a uma mostra

cultural e previsto no calendário escolar da cidade.

5. Número de aulas filmadas: Em nosso protocolo de pesquisa, planejávamos

filmar doze aulas – três de cada professor-participante. Mesmo com o tempo

reduzido e com três professores envolvidos no estudo (em vez de quatro),

tentamos nos ater a essa estimativa. Filmamos, no entanto, um total de oito

aulas. Na Escola Anísio Teixeira, primeiramente, houve corte de energia (aliás,

um problema já citado pela professora Eliane, no Questionário 1). Por

conseguinte, todos, alunos e professores, foram dispensados. Nessa mesma

escola, em outro dia agendado com a direção e com a professora-participante,

enquanto caminhávamos para uma sala de aula, fomos informados por um

professor de que “não haveria a última aula”. Essa decisão foi tomada pela

direção e não fomos notificados sobre o motivo dela.

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152

Por fim, para encerrarmos esta sessão, compartilharemos um quadro-

resumo com os principais aspectos metodológicos, distribuídos em cada etapa

da pesquisa. Com o auxílio dele, esperamos facilitar a compreensão sobre a

metodologia deste estudo e prepará-lo para a sessão com a apresentação e a

discussão dos dados.

Quadro 6 - Resumo da metodologia de pesquisa, organizado por etapas e por aspectos

metodológicos

Etapa 1: Protocolo de pesquisa

Aspecto metodológico Organização desta pesquisa Referencial teórico

Tipo de metodologia Qualitativa ANDRÉ, 2008;

BORTONI-RICARDO,

2008;

YIN, 2015, 2016.

Método de pesquisa Estudo de caso LEFFA, 2006;

YIN, 2015.

Orientação epistemológica Paradigma interpretativista BORTONI-RICARDO,

2008;

YIN, 2015.

Tipo de estudo de caso em

relação ao número de

participantes

Estudo de casos múltiplos ou

estudo de caso coletivo

ANDRÉ, 2008;

YIN, 2015.

Tipo de estudo de caso em

relação à análise dos

dados

Explanatório LEFFA, 2006.

Etapa 2: Pesquisa em campo

Instrumentos de produção

dos dados

Questionários DÖRNYEI, 2011.

Entrevistas ALMEIDA, 2012;

YIN, 2016.

Aulas filmadas e observações do

pesquisador

KUMARAVADIVELU, 1994;

YIN, 2015.

Artefatos (proposta curricular,

planos de aula e materiais

usados em classe)

YIN, 2016.

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153

Quadro 06 – Resumo da metodologia de pesquisa, organizado por etapas e por aspectos

metodológicos.

continuação

Etapa 3: Análise dos dados

Modo de interpretação dos

dados

Análise holística LEFFA, 2006.

Estratégias de análise Foco nas estratégias de ensino

de LE: contar com proposições

teóricas

YIN, 2015.

Foco na afetividade em sala de

aula: categorias

ANDRÉ, 2008;

ALMEIDA, L., 2012a.

Técnicas de análise Explanation-building LEFFA, 2006.

Síntese de dados cruzados YIN, 2015.

Fonte: Elaborado pelo autor, maio de 2018.

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154

3 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS DADOS

Nesta sessão, apresentaremos parte do que vimos, ouvimos e sentimos,

durante a pesquisa em campo. Pretendemos, com isso, colocar um holofote

sobre o professor de língua inglesa, mostrando suas ações, seus anseios e

suas conquistas. Para tal, trilharemos um percurso de leitura-escrita-releitura,

conduzido pelas perguntas norteadores deste estudo.

Esse percurso consiste, ainda, de dois gestos: identificação e

interpretação. Nessa ordem, então, identificaremos e interpretaremos: i) as

microestratégias de ensino observadas em sala de aula; ii) as microestratégias

de ensino que, embora não tenhamos constatado, os participantes afirmam

serem usadas por eles, no contexto específico da EJA; iii) as formas com que a

afetividade é produzida na relação professor-alunos. Com esse trajeto

percorrido, poderemos responder às três perguntas de pesquisa. Em síntese,

nosso intuito é partir do chão da sala de aula, para, adiante, refletirmos sobre

os porquês de cada ação.

Em decorrência da quantidade de informações textuais e da diversidade

de instrumentos de pesquisa utilizados, pautados em Bortoni-Ricardo (2008, p.

94), exporemos os dados na forma de “protocolos interacionais”. Como o

próprio termo sugere, esses protocolos são registros das diferentes interações

a que assistimos, em classes da EJA, ou que tivemos com os professores-

participantes.

A esse respeito, retomamos o conceito de interação: segundo

Kumaravadivelu (2003, p. 113), a interação é uma “atividade ideacional”. Trata-

se de uma consciência cognitiva e de uma sensibilidade cultural, numa relação

complexa entre o indivíduo e o meio. A título de aprofundamento teórico,

remetemo-nos à subseção 1.2.2.3, Facilitar a interação negociada. Além disso,

é importante reforçar que, para Wallon (1995) e seus intérpretes, o ser humano

torna-se sujeito por meio da interação. São as interações que nos preparam

para as aprendizagens.

Dessa forma, concluímos que os protocolos interacionais podem servir

ao nosso propósito de investigar como ocorre o uso de estratégias de ensino

de língua inglesa e como a afetividade é produzida em sala de aula.

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155

Em termos organizacionais, todos os protocolos interacionais estão

enumerados, sem diferenciação entre os casos. Dizendo de outra forma, a

contagem de cada protocolo prescinde a lógica caso a caso. No entanto, os

protocolos têm classificações, de acordo com o instrumento de geração dos

dados. As classificações são: episódios, entrevistas (01 ou 02) e questionários

(01 e 02). Em relação a estes dois últimos, os números 01 e 02 indicam,

respectivamente, a cronologia da condução da entrevista ou da aplicação do

questionário109.

Episódio, por sua vez, é o termo empregado por Kumaravadivelu (2003),

ao longo de sua obra. O linguista aplicado usa-o para apresentar os dados que

coletou em salas de aula de língua inglesa como língua estrangeira ou como

segunda língua e, dessa forma, exemplificar o uso de diversas

microestratégias. Aqui, simulamos, portanto, a forma como esse pesquisador

apresentou os dados de seu trabalho.

3.1 As estratégias de ensino de língua inglesa no chão da sala de aula

Conforme antecipamos, anteriormente, discorremos sobre as estratégias

de ensino que vimos/filmamos e sobre as quais conversamos nas entrevistas.

A apresentação de cada caso segue o critério de ordem alfabética da letra

inicial do nome do professor-participante.

3.1.1 O caso das estratégias de ensino da professora Eliane

Convém reforçar que a professora Eliane trabalhava apenas na Escola

Anísio Teixeira, com todos os alunos do segundo segmento, isto é, do quinto

ao oitavo termo. Em contraste aos outros professores-participantes desta

investigação, Eliane era a única que perfazia toda jornada de trabalho em uma

mesma escola.

A partir da observação de duas aulas, em dias diferentes, para o 8º

termo, nas turmas 8º A e 8º C, pudemos registrar o uso repetido de três

microestratégias de ensino:

109

Frisamos que todos os participantes foram entrevistados duas vezes e responderam a dois questionários.

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156

informar os alunos sobre o objetivo de aprendizagem da aula;

solicitar aos alunos que criem frases a partir de flash cards com

imagens;

criar momentos em que um aluno fala em cima da fala de outro aluno.

No que se segue, discutiremos cada uma dessas microestratégias.

3.1.1.1 Microestratégia informar os alunos sobre o objetivo de aprendizagem da

aula

Ao entrar nas salas de aula, em ambas as turmas, a professora Eliane

escreveu um objetivo de aprendizagem, na lousa. Por meio dele, pudemos

notar quais eram os conteúdos e as habilidades que a professora-participante

esperava ensinar e, consequentemente, que seus alunos aprendessem. Para

ilustrar isso, compartilhamos, a seguir, duas fotos. Cada uma delas foi tirada

em um dia diferente, em uma turma distinta. Nos dois casos, editamo-las, para

que nem a professora nem qualquer aluno pudessem ser vistos. Nessa edição,

colocamos, ainda, uma tarja preta no lugar do nome real da professora-

participante.

Foto 1 - Objetivo de aprendizagem da turma 8º C, na Escola Anísio Teixeira110

110

A professora Eliane confundiu-se com o ano. Naquele momento, estávamos, ainda, em 2016. Mais tarde, durante a aula, os alunos alertaram a educadora sobre essa confusão.

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157

Foto 2 - Objetivo de aprendizagem da turma 8º A, na Escola Anísio Teixeira111

A propósito do uso dessa microestratégia e sua frequência nas aulas de

língua inglesa, a professora explicou:

Protocolo interacional nº 01112

A microestratégia informar os alunos sobre o objetivo de aprendizagem da aula

(Entrevista nº 01 realizada com a professora Eliane, no dia 10 de novembro de 2016, na Escola

Anísio Teixeira)

01. Pesquisador: Mas você usa essa estratégia com frequência? Faz parte da sua didática

entrar na sala e escrever na lousa qual é o objetivo daquela aula ou foi algo que você fez

pontualmente, porque era uma nova matéria?

02. Professora Eliane: Não, não. Eu normalmente [+], eu escrevo qual é o objetivo da aula,

pra que eles [alunos] saibam, eu acho interessante. Foi até um curso de [+] ééé, como que eu

posso dizer [+++]? Não me lembro, agora; se chama...

03. Pesquisador: Classroom management?

04. Professora Eliane: Não, não. Éééé Sequências Pedagógicas ou algo nesse ramo, [em]

que falaram que era interessante escrever o objetivo e, desde então, eu normalmente escrevo

o objetivo da aula, o que que eles vão aprender e o que eu quero que eles consigam fazer no

final da aula, DAQUELA aula.

111

A sigla PC, usada pela professora, refere-se ao tempo verbal present continuous, em língua inglesa. 112

Embasados em Bortoni-Ricardo (2008), para transcrever as entrevistas desta dissertação, adotamos a seguinte legenda: os colchetes são usados para preencherem o enunciado com palavras que, na fala, foram suprimidas, mas que podem contribuir para a compreensão; LETRAS MAIÚSCULAS indicam aumento na entonação do falante, o que sugere ênfase; [+] mostra uma pausa curta na fala; [+++] assinala uma pausa longa, o que pode significar um momento de reflexão ou de reformulação do discurso por parte do falante. Além disso, apresentamos os protocolos interacionais de forma literal. Eventuais inadequações gramaticais ou ortográficas foram preservadas, para garantir fidelidade às expressões dos participantes.

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158

05. Pesquisador: Entendi. E, aí, você, às vezes, pensa sobre a hipótese de voltar pro objetivo

no final da aula e perguntar pros alunos se eles acham que aquilo foi por eles alcançado ou

você prefere usar aquilo como um disparador pra começar a aula?

06. Professora Eliane: Mais como um disparador pra começar a aula. E, eu retomo muito isso

NA PRÓXIMA AULA. Ao final da aula, né, como o tempo é, normalmente, corrido, eu não

consigo resumir ali, então, eu passo alguns exercícios, eu corrijo [+], TENTO corrigir

individualmente e, aí, depois, NA PRÓXIMA AULA, SIM, aí eu retomo, pergunto o que que eles

lembram, o que eles não lembram e se o objetivo... Aí, ASSIM, com as minhas perguntas, com

as perguntas estratégicas, então, eu já vou saber se meu objetivo foi atingido ou não.

Com o referencial teórico pautado em Kumaravadivelu (1994, 2003),

entendemos que a microestratégia usada pela professora Eliane faz parte da

macroestratégia minimizar perceptuais desencontros. Ao deixar claro para os

alunos qual era o objetivo de aprendizagem da aula, a professora estava

diminuindo a distância entre o que havia planejado ensinar e o que o aluno

deveria aprender. Além disso, essa ação nos mostra parte da intencionalidade

da educadora. De acordo com ela, o objetivo de aprendizagem era sempre

retomado na aula seguinte. Ao fazer essa retomada, conforme vimos em sala

de aula, ela tinha condições de interpretar o que os alunos se lembravam da

semana anterior, o que pareciam já ter assimilado e o que, talvez, não tivessem

aprendido. A ideia de retomada, de recuperação, pode ser deduzida,

textualmente, do objetivo de aprendizagem escrito na lousa da turma 8º A (cf. a

Foto 02). Nele, lemos: “retomar o conteúdo da aula passada e abordar as

exceções do PS”113 (grifos nossos).

Notamos, ainda, a relevância da formação docente. De acordo com a

professora Eliane, a microestratégia sob holofote foi explorada em um curso de

formação contínua. Parece-nos que a lição tirada desse curso foi bastante

valiosa à educadora que, desde então, a tem usado como uma rotina. Dito isso,

do ponto de vista teórico, refletimos, também, sobre a natureza das estratégias

de ensino. Talvez, com a prática profissional, parte delas – e, entendemos que

se trate, aqui, de um caso como este – seja rotinizada de tal forma que o

professor não a use como algo específico a determinado termo ou grupo de

113

Embora as aspas duplas sejam usadas, a rigor, para marcar citações diretas, nesta seção, nós as usaremos para delimitar trechos de fala ou de escrita dos professores-participantes e do pesquisador.

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159

alunos, mas, sim, como uma característica do seu modo de agir (em sentido

amplo), em sala de aula.

3.1.1.2 Microestratégia solicitar aos alunos que criem frases a partir de flash

cards com imagens

Com as turmas 8º A e 8º C, o foco do trabalho da professora Eliane era

o ensino de gramática. Aliás, ela nos disse, em entrevista, que isso decorria de

um pedido dos próprios alunos, no início de cada semestre. Para eles, segundo

ela, o ensino de gramática da língua inglesa era cobrado em vestibulares, algo

com que a educadora concordava.

Nesse contexto, para ensinar gramática, vimos a participante usar flash

cards de duas formas diferentes, mas complementares: 1. ensinar vocabulário

relacionado a verbos de ação; 2. solicitar aos alunos que escrevessem, em

seus cadernos, frases formadas por sujeito pronominal e verbo de ação (por

exemplo, he shaves ou she cooks; ele se barbeia ou ela cozinha, em

português). Entendemos que essas ações de ensino podem ser interpretadas

como duas microestratégias, no lugar de apenas uma. Entretanto, porque

observamos a complementaridade no uso delas e porque nos baseamos em

Kumaravadivelu (1994, 2003), para quem uma microestratégia tem uma

estrutura de tempo mais pontual (começo, meio e fim, durante uma aula, por

exemplo) do que, comparativamente, uma macroestratégia, decidimos tratar

dessa unidade de análise de forma global. Ambas nos parecem integradas pelo

“material suplementar” (UR, 2012, p. 212), isto é, os flash cards114.

Como veremos, a seguir, a forma como a professora Eliane usou esse

material vai ao encontro do que Ur (2012) afirma. Eles foram tanto manuseados

quanto pendurados na lousa. O manuseio deles foi totalmente feito pela

educadora. Ressaltamos, ainda, que, em uma conversa informal, quando

questionada sobre a procedência desses materiais suplementares, a

professora afirmou-nos que os comprou sem nenhuma ajuda de custo da

escola.

114

De acordo com Ur (2012), flash cards costumam exibir imagens. Ao contrário de uma lousa digital, contudo, eles trazem a vantagem de serem manuseados, trocados de lugar ou substituídos, ao invés de ficarem só pendurados na frente da sala.

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160

Abaixo, compartilhamos um episódio de aula e a foto de um flash card

usado pela participante:

Protocolo interacional nº 2115

Episódio 01 – A aprendizagem de vocabulário (verbos de ação) e o uso de flash cards

(Aula na turma 8º C, no dia 27 de outubro de 2016. Há oito alunos na classe. Todos eles são

jovens.)

01. Professora Eliane: Agora, eu quero ver, daqueles DOZE VERBOS, que nós trabalhamos,

o que é que vocês lembram. São muitos, né? (a professora retira seu conjunto de flash cards

de um saco plástico e começa a aproximar-se das duas fileiras onde estão os oito alunos da

turma). Deixa eu ver. (Mostrando o primeiro flash card) O que que vocês lembram desse

daqui?

02. Marcos: Escola.

03. Professora Eliane: Não, [respondam] in English.

04. Márcia: Study.

05. Professora Eliane: Study! Very good! (Mostrando o segundo flash card à turma) E, this?

06. Márcia: Não lembro, não.

07. Professora Eliane: Não?! É super easy.

08. Marcos: Video game...

(A professora circula entre as carteiras, mostrando o flash card.)

09. Professora Eliane: PLAY video game.

(A professora mostra o terceiro flash card à turma.)

10. Professora Eliane: E, esse? And this?

11. Márcia: Tomando banho?

12. Vitor (buscando anotações no caderno): Shower?

13. Professora Eliane (balançando a cabeça e mostrando concordância com a resposta de

Vitor): Shower! (Mostrando o quarto flash card à turma) And this? Super easy!

14. Vitor (virando as páginas do caderno): Deixa eu ver.

15. Márcia: Piano?

16. Marcos: Play...

17. Professora Eliane: Play WHAT?

(Os alunos riem.)

18. Professora Eliane: Gente, play the piano.

115

Em primeiro lugar, todos os participantes receberam nomes fictícios e seus turnos de fala são enumerados, para facilitar a análise. Em segundo lugar, para a legenda da transcrição desses turnos, recorremos aos itens já descritos na nota de rodapé do protocolo interacional nº 01. Acrescentamos-lhes os parênteses e as palavras em itálico. Entre parênteses, descrevemos elementos contextuais e ações dos participantes que possam contribuir para a compreensão. Em itálico, grifamos os estrangeirismos e os itens lexicais que servem como respostas dos alunos a perguntas da professora-participante.

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161

Foto 3 - Flash card usado pela professora Eliane

Como vemos, a professora Eliane usou os flash cards para ensinar e

retomar vocabulário. No episódio acima, percebemos uma espécie de jogo de

perguntas-e-respostas. Em outras palavras, a professora mostrava uma

imagem e perguntava: “o que é isso?” ou “what is this?”. Os alunos deviam

responder com um verbo de ação em inglês, ensinado previamente. Em termos

de participação da turma, os estudantes pareceram interessados em acertar a

resposta correta (ou seja, dizer o verbo de ação que a professora esperava

ouvir).

Ainda no que tange ao envolvimento dos alunos, a microestratégia sob

enfoque pareceu-nos viável. Alguns indícios que sustentam nossa análise são

a vontade dos estudantes em participar e as risadas que deram, ao tentarem

pronunciar algumas palavras em inglês. Reconhecemos que temos uma

amostragem pequena de aulas filmadas da professora Eliane, mas, estudando-

as, entendemos que esse episódio é um exemplo do engajamento a que nos

referimos. Examinando-o, podemos encontrar a participação de Márcia (turno

04), de Marcos (turno 08) e de Vitor (turno 12), que interagiram com a

professora por meio de algumas palavras na língua-alvo.

Após a retomada ou a consolidação de vocabulário (verbos de ação), a

professora Eliane solicitou aos alunos que escrevessem frases no presente

simples. Para isso, ela mostrou a diferença no paradigma verbal, no que diz

respeito às desinências e –s, no final dos verbos (por exemplo, I cook

versus he cooks; eu cozinho e ele cozinha, respectivamente, em português).

Nessa etapa da aula, os flash cards foram usados apenas para relembrar os

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162

alunos de que verbos tinham de usar. A seguir, veremos como isso foi

encaminhado, em sala de aula, nas duas turmas que acompanhamos:

Protocolo interacional nº 03

Episódio 02 - Ensino de gramática, tradução e flash cards

(Aula na turma 8º C, no dia 27 de outubro de 2016. Há oito alunos na classe. Todos eles são

jovens. A professora Eliane está reforçando o uso da desinência verbal –s, no presente

simples, para a terceira pessoa do singular.)

01. Márcia: E, como que fica em português?

02. Professora Eliane (apontando para “He cooks”): Como se traduz116

?

03. Márcia: É.

04. Professora Eliane: Ele... (a professora para de traduzir quando chega ao verbo “cook” e

olha para a turma, como se a convidasse a continuar a tradução, em voz alta.)

05. Márcia:... cozinha?

06. Professora Eliane: É. A tradução vai variar de acordo com a pessoa.

07. Márcia: E, o [pronome] nós?

08. Professora Eliane (apontando para “We cook”, na lousa): Nós...

09. Rodolfo: ... cozinhamos?

10. Professora Eliane: ... cozinhamos.

(A professora fica em silêncio por alguns segundos, esperando questionamentos.)

11. Professora Eliane: Any question? Vocês sabem que eu não trabalho com tradução, só

com as figuras. Na tradução, nós vamos conjugar o verbo de acordo com a nossa gramática.

Mas, in English, lembra daquele texto [de] que a gente falou? Tem que esquecer um pouquinho

[d]esse negócio meio mecânico de ficar uma tradução certinha, porque, uma hora, não vai

bater. (Apontando para dois flash cards no topo da lousa) Então, aqui, vocês vão conjugar os

verbos read e eat, em todas as pessoas.

Protocolo interacional nº 04

Episódio 03 – Ensino de gramática e flash cards

(Aula na turma 8º A, no dia 10 de novembro de 2016. Há 15 alunos na classe. Trata-se de um

grupo intergeracional. Em termos numéricos, predominam os jovens em relação aos adultos.)

01. Professora Eliane: Bom, agora, assim que vocês terminarem de copiar, a teacher vai

colocar, lá, na lousa, os flash cards que A GENTE JÁ VIU, né, a gente viu TREZE

VERBOS, lembra? [É] pra gente utilizar durante o semestre; depois, a gente vê mais alguns.

Vocês vão montar, igualmente [à forma] da semana passada, como eu escrevi aqui (ela aponta

116

Todos os grifos nesta seção são de nossa autoria e têm como objetivo dar ênfase à informação em questão.

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163

para a última seção da lousa e começa a ler o que está escrito) “considerando o que nós

aprendemos na aula anterior e HOJE, conjugue os verbos, a seguir, de acordo com os

sujeitos”, de acordo com as PESSOAS. Então, se eu falo que EU faço isso daqui (ela levanta

um flash card, em que se vê uma pessoa sentada, em frente a uma mesa sobre a qual há uma

xícara), vocês têm que lembrar qual é o verbo em English, SE vai ter –s ou não, SE

termina com (apontando para o conteúdo da segunda seção da lousa) “-o, -x, -ch, -sh ou –z”,

SE termina com –y... Então, é (pausadamente) BAS-TAN-TE coisa que vocês têm que

lembrar. Já tá dando um nó na cabeça de vocês? ADORO! Então, vamos lá! É assim que

funciona. Depois, vocês desatam esses nós, conforme vocês vão fazendo, vão errando, vão

acertando, vão corrigindo. Esse negócio é meio complicado, mesmo, tá bom? Vou apagar, aqui

(a educadora começa a apagar a primeira seção da lousa).

(Os alunos continuam copiando a explicação gramatical do quadro.)

A partir da nossa observação em sala de aula, como evidenciam os

exemplos acima, concluímos que os flash cards foram usados, nesse caso,

apenas como um recurso mnemônico, como uma pista de que verbos,

exatamente, deveriam ser conjugados. Nesse momento, o foco não é mais a

aprendizagem de vocabulário, mas, sim, a gramática da língua inglesa.

Antes de concluirmos esta seção, retomamos a justificativa que a

professora Eliane deu aos alunos sobre o uso de flash cards, no protocolo

interacional nº 03. No turno 11, ela afirma que não trabalha “com tradução, só

com figuras”. De fato, não vimos a professora Eliane, em nenhum momento,

escrever qualquer palavra em língua materna na lousa. No entanto,

entendemos que a tradução é parte de sua prática em sala de aula. Grosso

modo, por tradução, neste trabalho, compreendemos o ato de transpor

qualquer unidade de sentido em língua estrangeira para a língua materna (ou

vice-versa). Aliás, a tradução aparece, de forma explícita, nos turnos de 02 a

10 do mesmo protocolo interacional. Aparece, é verdade, como objeto de

dúvida de uma aluna (Márcia), que acabou funcionando como um gatilho para

um conflito positivo, envolvendo, ainda, outro estudante (Marcos).

Talvez, para a professora Eliane, negar a tradução, como estratégia

didática, esteja relacionado a experiências prévias, como discutiremos a seguir.

Outra possibilidade de interpretação é: para ela, o ato de traduzir está ligado a

exercícios ou a tarefas que exijam dos alunos o contraste, na escrita, de

enunciados nas duas línguas-alvo (inglês e português). Em nossa amostragem,

vimos esses contrastes serem feitos, mas, sempre, mediados pela fala.

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164

Para evitar confusões, é preciso deixar claro o seguinte: neste estudo,

estamos interessados em abordar a estratégia de ensino como nossa unidade

de análise. Como não fizemos experimentos sobre as aprendizagens

construídas pelos alunos da EJA nem os entrevistamos para conhecer suas

representações sobre o processo de ensino-aprendizagem de língua inglesa,

não pretendemos avaliar a eficácia de determinada estratégia didática. No que

diz respeito à aprendizagem dos alunos, com base no referencial interpretativo

em que apoiamos esta discussão, estamos interessados em observar o

engajamento dos estudantes, o interesse deles em participar das aulas, a

vontade de expandir sentidos, ao fazer perguntas, ao falar em cima da fala de

um colega ou ao clarificar o que professor e alunos já disseram. Neste estudo

de caso, conforme apresentamos na fundamentação teórica, aprender é, em

grande medida, transformar-se com o outro. Portanto, trata-se de uma

experiência eminentemente relacional. É nesse sentido que encaminhamos

esta análise.

Com o objetivo de entender mais e melhor a relação entre as estratégias

de ensino da professora Eliane e o uso de flash cards, no contexto da EJA, é

oportuno saber o que a participante nos disse sobre isso:

Protocolo interacional nº 05

O uso de flash cards em experiências prévias

(Entrevista nº 01 realizada com a professora Eliane, no dia 10 de novembro de 2016, na Escola

Anísio Teixeira)

01. Pesquisador: A forma como você PEDE ATENÇÃO é de um jeito carinhoso, porque o

aluno não entende [esse pedido ou essa correção] que é bronca.

(A professora Eliane ri com o comentário do pesquisador.)

02. Pesquisador: Então, assim, na sua opinião, [a ação de pedir a atenção dos alunos de

forma afetuosa], também, entra nessa leitura de algo NÃO REFLETIDO?

03. Professora Eliane: Eu acho que a gente, sempre, vai aprendendo. Eu acho que, assim, a

gente, ééé, [+] o nosso educando é um educando [que é], assim, MUITO CARENTE. Então,

você acaba meio que trabalhando com isso. E, quando eu trabalhei lá, na XXX117

, lá nós

tínhamos alunos bem [carentes], também...com o nível social bem mais baixo. ENTÃO, assim,

117

Onde lemos “XXX”, na realidade, a professora Eliane citou o nome de uma escola de idiomas ligada a uma Organização Não Governamental (ONG) de São Bernardo do Campo. Ela trabalhou nesse centro de idiomas, antes de atuar na EJA. Por motivos éticos, preferimos omitir o nome dessa ONG.

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165

vem com aquela... NÃO VEM POR QUERER! Vem, porque o pai quer. O outro pode estar aqui

[na escola com EJA], porque precisa de arrumar um emprego, precisa melhorar no emprego.

Então, talvez, eu pense mais por esse lado: de que ele [o educando da EJA] PRECISA de estar

aqui, [mesmo que] às vezes, não esteja num dia muito bom. Então, eu tento fazer isso de uma

forma que SEJA LEVE, né? Até porque a gente sabe que a língua inglesa ainda tem muita

resistência por parte deles. A primeira coisa que eu ouço é “eu não sei nem português, por que

que eu vou falar inglês?”. Então, assim, eu sempre falo pra eles: “então, você não precisava ter

falado nenhuma, porque você nasceu sabendo nenhuma”, né? E, outra coisa: “você não vai

precisar de português pra aprender inglês, não”. Aí, foi onde eu adotei os flash cards, que eu

já usava. Eu [os] adotei no curso de idiomas, mas não tinha sido efetivo. Lá, no curso de

idiomas, é diferente, porque o material já vem PRONTO pra você. Isso, também, me fez

MUITA FALTA [no contexto das escolas com EJA da prefeitura]! MUITA, MUITA, MUITA!

Eu fiquei, assim, BASTANTE perdida...

Protocolo interacional nº 06

O uso de flash cards para trabalhar a oralidade

(Entrevista nº 02 realizada com a professora Eliane, no dia 16 de dezembro de 2016, na Escola

Anísio Teixeira)

01. Pesquisador: E, por exemplo, a ação de número 8118

, que diz respeito aos role-play, em

sala de aula. Aqui, a gente tem, basicamente, em jogo, a questão do speaking, né? Como é

que você acha que acontece a oralidade na aula de língua inglesa, pensando na sua

realidade?

02. Professora Eliane: Oral drills?

03. Pesquisador: O oral drills é o que você acha possível?

04. Professora Eliane: Sim.

05. Pesquisador: Então, a gente pode dizer que, assim, decorre da sua prática que uma

estratégia é o uso de oral drills pra promover a oralidade? Eu posso escrever isso sobre o seu

trabalho?

06. Professora Eliane: Pode. E, é isso, mesmo. Só isso.

07. Pesquisador: Que tipo de atividade com oral drills ou que estrutura que eles completam

para poder falar inglês? Que nível de estrutura você usa?

08. Professora Eliane: Normalmente, são as palavras, o vocabulário, né? Normalmente, por

meio dos flash cards que eu sempre... quando eu os uso, eu trago sempre por meio da

prática oral, mesmo. Eu não traduzo, não traduzo em português para eles. Eles olham,

eles repetem, eles desenham no caderno o que, no caso, se for trabalhar frutas.

118

Neste momento, pesquisador e professora-participante discutiam o questionário de estratégias de ensino, baseado em Kumaravadivelu (1994, 2003), em particular, a microestratégia criar atividades em que os alunos façam role-play (desempenhem papéis, como numa esquete teatral), enumerada como a oitava ação da macroestratégia contextualizar o input linguístico.

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166

Os exemplos acima nos mostram que, embora não tenhamos

perguntado à professora Eliane, exatamente, sobre o uso de flash cards, nas

duas entrevistas que conduzimos, ela relacionou parte de suas ações em sala

de aula ao uso desse material. No primeiro caso, retomando uma possibilidade

interpretativa levantada, a professora-participante explicou a utilização dos

flash cards como um caminho viável para ensinar inglês especificamente na

EJA, com base em experiências prévias. E, ao contrário do que poderíamos

supor, essa avaliação não decorreu de uma experiência (profissional) bem-

sucedida. Na verdade, a partir da fala da professora Eliane (protocolo

interacional nº 05, turno 03), presumimos que o trabalho com flash cards, em

centro de idiomas, não lhe pareceu adequado, mas pareceu funcionar na EJA.

É possível relacionar, ainda, a experiência prévia em centros de idiomas

ao trabalho com oral drills, que, segundo a professora Eliane, são facilitados

pelos tais flash cards. Tradicionalmente, os oral drills “consistem em

repetições” (ALMEIDA, C., 2014, p. 114). Durante os anos 1960 e 1970, esses

exercícios estiveram ligados à ideia de treinamento. No entanto, para Boa

Sorte (2014), muitos cursos livres de idiomas adotam, até hoje, essa

perspectiva. Embasados em nossa própria experiência profissional,

concordamos com o linguista aplicado sobre isso. Entendemos que, em alguma

medida, a bagagem profissional trazida de centros de idiomas pela professora

Eliane pode se refletir no trabalho que ela geria na EJA, em 2016.

Dessa análise, resultam, ainda, duas considerações: em primeiro lugar,

podemos constatar a angústia da professora que se viu perdida diante de um

novo contexto de ensino: a EJA. Lembramos que, como todos os outros

participantes deste estudo, essa modalidade educacional não foi apontada

como um componente curricular da formação inicial. Talvez, conjeturamos,

esse sentimento tivesse outros contornos (mais positivos), se a EJA não

significasse um território inexplorado no curso de licenciatura dessa educadora

– algo que pudemos confirmar na pesquisa em campo, por meio de uma

conversa por aplicativo de telefone.

Em segundo lugar, em linhas gerais, podemos refletir sobre o desenho

de uma estratégia de ensino. Afinal, o que um professor de língua inglesa

escolhe, primeiramente: a estratégia de ensino ou o material didático? Em

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167

outras palavras, o que fazer, em sala de aula, é uma questão precedente a

com que material ensinar? Ou ainda: uma estratégia de ensino pode ser, no

chão da sala de aula, subordinada ao material didático? Neste trabalho, não

pretendemos responder, de forma definitiva, a essas perguntas, mas, quando

ponderamos sobre elas, percebemos como as estratégias de ensino,

principalmente, as microestratégias, à luz da teoria de Kumaravadivelu (1993,

2004), podem ter seus limites confundidos com as possibilidades de uso de

determinados materiais suplementares – como os flash cards, para a

professora Eliane.

A propósito, no que tange aos limites (ou não) entre estratégia de ensino

e material didático, apresentamos um exemplo do que a professora-participante

nos disse sobre isso:

Protocolo interacional nº 07

Questionário 1 – Formulário para conhecer o perfil dos professores-participantes

Questão 27. Que estratégias de ensino você mais usa em sala de aula? Cite e comente duas

delas. (Por exemplo: organizar os alunos em grupos e trabalhar com textos autênticos).

Professora Eliane: Flash cards, textos e músicas.

Aparentemente, para a professora Eliane, as estratégias de ensino

misturam-se com os artefatos, nas palavras de Kumaravadivelu (1994, 2003),

ou com os materiais didáticos. Essa mistura, explícita no exemplo acima, nos

leva ao seguinte dado de pesquisa: muitas vezes, tanto para o professor de

língua inglesa quanto para o pesquisador, selecionar ou analisar certas

estratégias de ensino pode equivaler a estudar o uso de materiais didáticos por

parte do educador. Em outras palavras, parece-nos que, muitas vezes, o foco

em uma estratégia de ensino pode residir em observar os papéis dos atores em

sala de aula frente a um texto, a uma imagem ou a algum exercício gramatical,

por exemplo, intencionalmente escolhidos pelo professor.

Falamos em dado de pesquisa, porque essa consideração pode ser

feita, também, com algumas diferenciações, sobre os casos subsequentes (da

professora Giovanna e do professor Valter). Entretanto, fazemos uma ressalva:

essa conduta analítica não deve ser dogmática. A seguir, por exemplo,

veremos como o estudo de microestratégias pode ter centralidade na interação

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168

(sem, necessariamente, depender do uso de qualquer material didático em

particular).

3.1.1.3 Microestratégia criar momentos em que um aluno fala “em cima da fala”

de outro aluno

Para analisar a microestratégia a seguir, é preciso garantir o conceito de

interação a que temos feito referência. Para isso, remetemo-nos ao início desta

sessão, em Apresentação e discussão dos dados.

A partir dessa retomada, deixamos claro o seguinte: neste estudo de

caso, estamos interessados em observar a interação entre professores e

alunos em sentido amplo e em sentido estreito. Este diz respeito à interação

sob a forma de conversa. Para isso, os turnos de fala podem dar conta de

informar-nos sobre essa “atividade ideacional” (KUMARAVADIVELU, 2003, p.

113). No entanto, por interação em sentido amplo, entendemos tudo que

professores e alunos dizem e fazem, em sala de aula. Sorrisos, risadas, tom de

voz alterado, pausas e olhares direcionados servem-nos como elementos da

interação.

Adicionalmente, ao concordar com a premissa teórica de que a interação

leva à construção de conhecimentos, não estamos julgando a qualidade ou a

natureza desse conhecimento. Estamos, com efeito, reconhecendo como a

interação gerenciada pela professora Eliane propiciou oportunidades de

ampliação de saberes, que, aqui, são sumamente gramaticais (mas que

poderiam ser, em outro contexto, diferentes, em termos de usos linguísticos,

discursivos e sociais).

Assim, antecipamos que os protocolos interacionais, a seguir,

exemplificam o que entendemos por interação em sentido amplo. Em seguida,

parte desses episódios será retomada, quando tratarmos da produção da

afetividade. Neste momento, entretanto, estamos empenhados em discutir as

formas como a professora Eliane conseguiu engajar os alunos da EJA em uma

conversa. O assunto é a conjugação de alguns verbos da língua inglesa no

presente simples:

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169

Protocolo interacional nº 08

Episódio 04 - Falando em cima da fala do outro, para fazer ajustes e construir

conhecimentos

(Aula na turma 8º A, no dia 10 de novembro de 2016. Há 15 alunos na classe. Trata-se de um

grupo intergeracional. Numericamente, predominam os jovens em relação aos adultos. Nesse

momento, a professora está retomando a regra geral de conjugação de verbos no presente

simples. Ela percebe o interesse dos educandos em copiar a lição da lousa.)

01. Professora Eliane: Então, foca, aqui, um pouquinho. Depois, vocês copiam. Vai dar

tempo! Então, a gente aprendeu, na última aula, sobre rotinas ou fatos, não foi? E, o que

acontece nesse tempo verbal que era diferente? O que aconteceu lá [aula anterior]?

(Os alunos ficam em silêncio.)

02. Professora Eliane: (provavelmente, replanejando seu discurso, para obter uma resposta

da turma): A gente falava... usava o verbo da mesma forma PRA TODAS as pessoas?

03. Alunos (em coro): Não!

04. Professora Eliane: Pra quem eu mudo [o verbo]? Por que eu mudo [o verbo]?

05. Daniel: Quando for no plural, você vai ter que mudar. De VOCÊ pra VOCÊS.

06. Professora Eliane: Certeza? Tá certo disso? (com cara de dúvida). Quem pode

contribuir mais? O que mudava [na conjugação verbal]? Que vocês fizeram as colunas...

07. Elisangela e Francisco (em uníssono): O –s?!

08. Professora Eliane: Yes! E, isso tem relação com o plural?

09. Amanda: Não! (enfaticamente).

10. Professora Eliane: Não! Muito bem, A-DO-REI esse NÃOOO...

(A professora sorri.)

Protocolo interacional nº 09

Episódio 05 – Falando “em cima da fala” do outro, para confirmar hipóteses e construir

conhecimentos

(Aula na turma 8º A, no dia 10 de novembro de 2016. Há 15 alunos na classe. Trata-se de um

grupo intergeracional. Numericamente, predominam os jovens em relação aos adultos. Nesse

momento da aula, a professora está explicando a ortografia de verbos terminados em –y e

conjugados no presente simples.)

01. Professora Eliane: Vou voltar! Aqui, ó! Quando o VER-BO (pausadamente) terminar com –

y e, antes deste –y, tiver uma CONSOANTE, vocês vão cortar (fazendo um gesto de corte com

a mão) o –y, vão TIRAR o –y, e vão acrescentar...

02. Daniel: -IES!

03. Professora Eliane: -IES! (Apontando para o verbo play, escrito na lousa) Ele termina com -

y?

04. Alunos (em coro): Sim!

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05. Professora Eliane: O sujeito é ELE ou ELA?

06. Alguns alunos (em coro): Não.

07. Vera: SIM!

08. Professora Eliane (balançando a cabeça, em sentido afirmativo): SIM!

(Neste momento, a professora faz uma cara de frustrada e desapontada, em tom de

brincadeira. Alguns alunos riem.)

09. Professora Eliane: E, antes desse –y, tem o quê? Uma consoante ou uma vogal?

10. Alguns alunos (em coro): Tem um –a! É vogal!

11. Professora Eliane: Vai alterar [o verbo]? Eu vou colocar –s ou –ies?

12. Vera: -s.

13. Daniel: -IES!

14. Professora Eliane (olhando especificamente para Daniel): Por que –IES?

15. Vera (suspirando): Ah, Jesus!

16. Bruno: Eu acho que é só colocar o –s.

17. Professora Eliane (sorrindo para o aluno Bruno): Por quê? (Alguns segundos depois,

aproximando-se um pouco mais do centro da sala) E, se eu te ajudar, dizendo que você está

certo, mas tem que entender o porquê. Por quê? Quem pode ajudar [o colega]?

18. Bruno: Ah, eu chutei!

19. Professora Eliane: Alguma coisa, ele entendeu. Porque ele está certo. Gabi? (A educanda

balança a cabeça) Não quer colaborar, hoje, Gabi? (A aluna repete o mesmo gesto e abaixa a

cabeça) Então, tá bom! Gê? Josi? Ana? Ana, você não faça isso comigo. Você pintou o cabelo,

[mas] você era inteligente, quando você era morena, então, fala, Ana. It’s your turn, Ana. Sua

vez de brilhar.

20. Ana (rindo): Ah, meu Deus. Eu gostei disso.

(A professora Eliane ri, também, com a postura de Ana.)

21. Professora Eliane: João? Sheila? Juliano? Por que que vai ser somente o –s?

(Os alunos começam a levantar hipóteses, falando um em cima da fala do outro. Não

conseguimos distinguir o que eles dizem.)

22. Professora Eliane: Não tô ouvindo ninguém desse jeito.

(Alguns alunos riem.)

Os exemplos acima nos indicam, mais uma vez, que, para a professora

Eliane, a participação do aluno era essencial. Para dar forma a essa

intencionalidade, ela criou um contexto favorável à fala em cima da fala. Em

outras palavras, o que um aluno dizia servia como uma brecha para a fala de

algum colega, tanto no sentido de uma correção (protocolo nº 08) quanto de

uma clarificação (protocolo nº 09). Quando lemos esses dados a partir de

Kumaravadivelu (1994, 2003), identificamos ações que podem ser ligadas à

macroestratégia facilitar a interação negociada e que, aliás, compõem nosso

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formulário de estratégias (cf. o Apêndice B, particularmente, as

microestratégias M2A3 e M2A4). Em suma, o que vimos a professora Eliane

fazer o tempo todo – e, aqui, ressaltamos que os dois protocolos são exemplos

de ações repetidas e frequentes, durante as aulas a que assistimos – foi,

exatamente, promover um ambiente mediador, em que os estudantes

pudessem interagir o máximo possível, ainda que essa interação acontecesse

em língua materna.

Por fim, é oportuno discutir a concepção de língua da professora-

participante. Como podemos observar a partir dos dados apresentados,

parece-nos que o estruturalismo é latente às escolhas metodológicas

observadas119. A língua inglesa que apareceu nas aulas a que assistimos pode

ser reduzida ao nível da estrutura sintática (sujeito pronominal + verbo no

presente simples) ou ao nível do grafema (“quando o verbo terminar com a

letra –y...”). Nesse sentido, concluímos que as estratégias de ensino

usadas/analisadas, em certa medida, confluíram para o processo de ensino

planejado.

Com isso, não estamos concordando com a perspectiva teórica da

professora-participante, em relação ao que é uma língua ou a como ensinar

uma língua (estrangeira). Estamos, na verdade, mostrando a correlação entre a

concepção de língua(gem), os objetivos de aprendizagem – a propósito,

compartilhados com os alunos - e as estratégias de ensino. A esse respeito,

além do mais, reforçamos que houve nexo entre as estratégias de ensino que

vimos a professora Eliane usar e a antecipação delas em seus planos de aula.

119

Para apoiar nosso argumento, baseamo-nos na explicação de Costa (2011) sobre a concepção estruturalista de linguagem. Segundo o linguista, nessa visão - inspirada, principalmente, nos estudos de Ferdinand de Saussure (1857 – 1913) -, a língua é forma (estrutura) e não substância (a matéria a partir da qual ela se manifestou). Consequentemente, um dos princípios do estruturalismo é: “o de que a língua deve ser estudada em si mesma e por si mesma. É o que chamamos de estudo imanente da língua, o que significa dizer que toda preocupação extralinguística precisa ser abandonada, uma vez que a estrutura da língua deve ser descrita apenas a partir de suas relações internas. Nessa perspectiva, ficam excluídas as relações entre língua e sociedade, língua e cultura, língua e distribuição geográfica, língua e literatura ou qualquer outra relação que não seja absolutamente relacionada com a organização interna dos elementos que constituem o sistema linguístico” (COSTA, 2011, p. 115, grifos do autor).

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172

3.1.2 O caso das estratégias de ensino da professora Giovanna

Em primeiro lugar, importa-nos recuperar o contexto de trabalho da

professora Giovanna. Em 2016, na rede municipal de EJA, em São Bernardo

do Campo, a educadora atuava em duas escolas noturnas. Para efeito deste

estudo, todos os dados gerados dizem respeito ao trabalho dela,

especificamente, na Escola Darcy Ribeiro, onde a participante trabalhava com

cada uma das quatro turmas – 5º A, 6º A, 7ºA e 8º A, durante três dias da

semana.

A partir da nossa amostragem de três aulas observadas (e filmadas),

pudemos identificar algumas microestratégias usadas repetidamente, como

escrever o cabeçalho do dia, em língua inglesa, com a ajuda dos alunos, ou

como lhes perguntar se estavam bem (por exemplo, “Are you fine or so so?”),

usando a língua-alvo. No entanto, para esta análise, privilegiaremos outras

microestratégias, cujo uso pode nos dar indícios da seleção de conteúdos e

das manifestações dos alunos frente às ações da educadora. Com essa lógica

em mente, especificaremos as seguintes microestratégias:

construir glossários (inglês-português) com a ajuda de flash cards;

solicitar aos alunos que relacionem palavras em língua inglesa com

imagens, contextos de uso ou palavras traduzidas para a língua

portuguesa;

conectar o ensino da língua inglesa à concepção de educação da escola

e da Secretaria de Educação em que alunos e professores estavam

inseridos.

3.1.2.1 Microestratégia construir glossários (inglês-português) com a ajuda de

flash cards

Partindo das ações em sala de aula, em dias da semana diferentes e em

datas distintas, pudemos observar o uso da mesma microestratégia: apresentar

aos alunos flash cards com imagens organizadas por um mesmo assunto (no

5º A, lugares em uma cidade; no 7º A, alimentos e bebidas) e, depois, construir

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173

um glossário com o vocabulário ensinado. A seguir, apresentamos episódios

que ilustram essa microestratégia:

Protocolo interacional nº 10

Episódio 01 – O uso de flash cards para a aprendizagem de vocabulário (lugares em uma

cidade)

(Aula na turma 5º A, no dia 11 de novembro de 2016. Há quatro alunos na classe – dois

homens e duas mulheres. Todos são adultos.)

01. Professora Giovanna (tirando os flash cards de um saco plástico): A gente tem alguns

lugares pra mostrar pra vocês, pra ver se vocês sabem. Lembra que a gente tem as

estratégias que a gente sabe, [como] palavras que são CONHECIDAS, palavras que são

parecidas com o inglês, palavras do português, né? Ou coisas que a gente já conhece,

[por]que [o idioma] inglês, hoje em dia, todo o mundo já meio que sabe. (A professora mostra

um flash card, onde lemos: “FIRE STATION”) Esse lugar, aqui, ó, (pronunciando,

pausadamente) fire station. Vamos repetir: fire...

02. Alguns alunos (em coro): fire...

03. Professora Giovanna: ... station.

04. Alunos (em coro): station.

05. Professora Giovanna: Que palavra que parece com Portuguese, que parece com o

português?

06. Sandra: Estação?

07. Professora Giovanna: Estação, muito bem! E, fire?

(Professora Giovanna espera, durante alguns segundos, por uma resposta dos alunos.)

08. Professora Giovanna: Tem um monte de música que fala de fire. (Cantando) “Baby, you’re

a fire work...” Lembra de fire? Já ouviu falar, né, André? (A professora sorri para André. Ele

balança a cabeça, em resposta à pergunta dela). Então, [fire station] é ESTAÇÃO onde

apagam o fogo. É estação (apontando para “STATION”) e fogo (apontando para “FIRE”), se a

gente traduzisse, [mas] aqui, no Brasil, é corpo de bombeiros, né, que tem o nome. Yes?

Vamos falar mais uma vez: fire...

09. Alguns alunos (em coro): Fire...

10. Professora Giovanna: ... station.

11. Alguns alunos (em coro): Station.

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174

Protocolo interacional nº 11

Episódio 02 - O uso de flash cards para a aprendizagem e a retomada de vocabulário

(alimentos e bebidas)

(Aula na turma 7º A, no dia 24 de novembro. Há três alunos jovens na classe. A professora

mostra, em um flash card, a imagem de um bolo.)

01. Professora Giovanna: E, esse aqui? A gente aprende... como que chama aquele bolo

no copinho? Ou bolo pequenininho?

02. Aline: Doce, não é?

03. Professora Giovanna: In English, tem um nome. Que vende que nem um bolinho

pequenininho...

04. Aline: Cupcake?

05. Professora Giovanna: Cupcake! Porque é no copo ou na xícara, né? E, aqui [na imagem

do flash card], é só cake – que é bolo.

06. Rogério: Eu tava tentando lembrar o nome daquele cara, lá, que faz o bolo lá...

07. Professora Giovanna: Cake Boss120

?

08. Rogério: É.

09. Professora Giovanna: Ele é o chefe do bolo, né? Aquele que faz aqueles bolos bonitos.

Não é esse?

10. Rogério: E, esse nome é o quê?

11. Professora Giovanna: Cake – bolo. Boss é chefe.

Em resumo, a professora Giovanna mostrou os flash cards – comprados

por ela mesma -, treinou a pronúncia dos alunos, por meio de repetição, e

propôs-lhes uma brincadeira: munidos de flash cards apenas com palavras, os

estudantes tinham de levantar-se, ir à lousa e formar pares de flash cards,

associando imagens a palavras em língua inglesa. As fotos abaixo revelam

etapas dessa microestratégia. Em ambas, fizemos edições, em função da ética

exigida pela pesquisa. Nelas, visualizamos parte do material didático usado na

aula do 5º termo A e na aula do 7º termo A, respectivamente.

120

Cake Boss é uma série de televisão norte-americana no formato reality show. Em 2016, ela era exibida, no Brasil, pela emissora Bandeirantes. Mais informações podem ser encontradas nesta página da web: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Cake_Boss>. Acesso em: 14.jul.2018.

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175

Foto 4 - Flash card usado pela professora Giovanna

Foto 5 - Flash cards com imagens de alimentos e de bebidas

Quando lemos, atentamente, o protocolo interacional nº 10, notamos

algo pertinente à discussão sobre o funcionamento de estratégias de ensino: a

articulação de uma microestratégia a outra microestratégia. No primeiro turno,

é possível detectar que a professora Giovanna não partiu, diretamente, da

proposta de associação de imagens a palavras em língua inglesa, mas

recuperou, com os alunos, a habilidade de reconhecimento de palavras

cognatas121. Possivelmente, atenta às dificuldades que a linguagem escolar

121

Palavras cognatas são aquelas “provavelmente idênticas ou aproximadamente similares [a palavras] na própria língua do aluno” (UR, 2012, p. 141, tradução nossa). Para essa linguista aplicada, as palavras cognatas são, com frequência, usadas em tarefas de leitura, porque oferecem uma ampla cadeia de vocabulário para a prática dessa habilidade (a leitura).

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176

pudesse causar aos alunos da EJA, como Oliveira, M. (1999) pontua, a

professora Giovanna não utilizou o jargão linguístico (por exemplo, palavra

cognata). Ao invés disso, convidou a turma a observar “palavras que são

parecidas com o inglês, palavras do português, né?” (turno 05). Adiante, ela

ainda pediu à aluna Sandra que dissesse em que local ela (Sandra) já havia

ouvido a palavra station. A estudante comentou que já a tinha escutado no

metrô, em São Paulo. Interpretamos a pergunta da professora como uma forma

de buscar os conhecimentos prévios dos alunos – mais uma vez,

microestratégias foram combinadas.

Aliás, essa articulação entre microestratégias, com a finalidade de

ensinar vocabulário, aparece de forma explícita nos turnos 01 e 07 do protocolo

interacional nº 11. Nos dois casos, a professora Giovanna buscou formas de

consolidar a aprendizagem de vocabulário da turma.

A propósito do uso de flash cards como algo pontual ou regular (no

sentido de comum ou de rotineiro), chegamos ao seguinte dado: a professora

Giovanna usava esse material didático com frequência e, provavelmente, para

a mesma microestratégia sob enfoque. Para sustentar esse argumento,

apresentamos parte de uma entrevista que conduzimos com a participante:

Protocolo interacional nº 12

O uso de flash cards para a aprendizagem de vocabulário

(Entrevista nº 01 realizada com a professora Giovanna, no dia 24 de novembro de 2016, na

Escola Darcy Ribeiro)

01. Pesquisador: E, ainda em relação aos flash cards: Você usou, também, alguns deles com

imagens de lugares na cidade. Esses flash cards foram feitos por você?

02. Professora Giovanna: Não, eles não foram feitos por mim. Foram comprados de uma

coleção de um livro, que tinha essa coleção de flash cards, assim, separada. E, eu comprei e

eu uso bastante, porque eu acho que a gente tem que ASSOCIAR todas as habilidades: o

aluno que é visual, o aluno que é auditivo, e o aluno que é sinestésico. Então, eu mostro

os flash cards pro visual, e faço todo o mundo relacionar, levando o nome do lugar,

assim, da fruta, ou, sei lá, do animal, até a FOTO do animal, pra quem é sinestésico

também se sentir contemplado na aula. E, o auditivo, quando a gente lê, todo o mundo

junto, a pronúncia. Então, eu TENTO, sempre, me ater nessas, nesses três tipos de

aprendizes, aí.

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03. Pesquisador: E, aí, assim, dá pra concluir, então, que o uso de imagens é um recurso

habitual nas suas práticas na EJA?

04. Professora Giovanna: Isso, muito habitual. Eu acho que [+], como a GRANDE MAIORIA

das pessoas é visual, né, a gente tem grandes estudos que [afirmam] que a maioria das

pessoas SÃO VISUAIS, eu trago bastante [imagens à sala de aula], pra, também, fazer essa

coisa DIVERTIDA, de se mexer na classe, de todo o mundo interagir, de um ajudar o outro, né,

quando sente dificuldade com a imagem, o outro vai lá e ajuda. Eu faço, sempre, isso.

Com os comentários da professora Giovanna, entendemos que, de um

lado, o uso de flash cards lhe parece ancorado em uma teoria das inteligências

múltiplas122. Essa sugestão é indiciada em segmentos lexicais como “aluno que

é visual”, “aluno que é auditivo” e “aluno que é sinestésico”. De outro lado,

quando analisamos o mesmo discurso na perspectiva das teorias linguísticas,

interpretamos que a microestratégia em âmbito pode trazer, de forma oculta,

uma concepção estruturalista da língua, já que a língua inglesa, nesse caso

específico, fica limitada ao ensino de algumas palavras isoladas (embora elas

sejam conectadas por um assunto ou, em termos linguísticos, por um campo

semântico, como lugares em uma cidade ou alimentos e bebidas).

Quanto à viabilidade do uso dessa estratégia, em termos de

engajamento dos alunos, observamos que, nos dois casos, a participação dos

estudantes foi positiva. Nosso parâmetro para essa avaliação são

manifestações como: nenhum aluno se recusou a participar de alguma etapa

da atividade; os educandos pareceram se divertir com a possibilidade de

formar pares de flash cards e, durante esse momento, conversaram sobre suas

escolhas e pediram ajuda a colegas e à professora; o ritmo das duas aulas foi

acessível aos dois grupos – nenhum aluno ficou para trás, sem saber o que

fazer ou como agir.

Neste momento, é possível traçar um paralelo entre a microestratégia

em perspectiva e outra, discutida na subseção anterior: solicitar aos alunos que

criassem frases a partir de flash cards com imagens. O que parece conectar as

ações das professoras Eliane e Giovanna? Em primeiro lugar, ambas recorriam

ao uso sistemático de flash cards. Em segundo lugar, as duas participantes

122

Remetemo-nos à revisão bibliográfica de Bregeiro (2010), em sua dissertação. Ao propor atividades para alunos do 1º ano do Ensino Médio da EJA, em uma escola pública, a pesquisadora estabelece alguns pontos de convergência entre “enquetes sobre inteligências múltiplas” (BREGEIRO, 2010, p. 24) e análises de necessidades.

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178

tinham experiência prévia em centros de idiomas (à época da produção dos

dados, a professora Giovanna ainda trabalhava em uma escola desse setor).

Conjeturamos que a escolha da professora Giovanna pela

microestratégia construir glossários (inglês-português) com a ajuda de flash

cards decorra, entre outros fatores, da bagagem de vivências profissionais que

ela construiu em centros de idiomas, antes do ingresso na EJA. Se

contrastarmos esse dado hipotético com dados coletados sobre as estratégias

de ensino da professora Eliane – e, aqui, nos remetemos, em particular, ao

protocolo interacional nº 05 da subseção anterior (3.1.1) -, chegamos à

seguinte ideia: as estratégias de ensino são potencialmente transferíveis de um

contexto profissional a outro, embora nem sempre sejam recontextualizadas.

Em outras palavras, com base nos dados sobre os casos das professoras

Eliane e Giovanna, entendemos que um professor pode ter seu inventário

pessoal de estratégias de ensino, cujo uso pode ser descontextualizado ou

recontextualizado, no chão da sala de aula.

No que se segue, vejamos outra microestratégia usada pela professora

Giovanna.

3.1.2.2 Microestratégia solicitar aos alunos que relacionem palavras em língua

inglesa com imagens, contextos de uso ou palavras traduzidas para a língua

portuguesa

Como o próprio subtítulo aponta, estamos diante de uma microestratégia

com diferentes desdobramentos, mas com o mesmo ponto de partida. Em

nossa amostragem de três aulas observadas (e filmadas), em 100% das vezes,

a professora Giovanna organizou alguma atividade em que os alunos tivessem

de estabelecer relações. O que nos pareceu subjacente a essas três

incidências? De imediato, reconhecemos o foco na aprendizagem de

vocabulário. Para pôr a microestratégia em ação, a professora-participante

usou handouts123, previamente fotocopiados para cada aluno. O episódio a

seguir ilustra nossa unidade de análise:

123

Handout é um termo frequentemente usado em textos sobre o ensino de língua inglesa como língua estrangeira ou como segunda língua. Aqui, o usamos como sinônimo de material didático. Segundo o Dicionário Macmillan Online, handout é “uma folha com informações que é

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Protocolo interacional nº 13

Episódio 03 – Handout com exercício para a aprendizagem de vocabulário sobre bebidas

em língua inglesa

(Aula na turma 7º A, no dia 24 de novembro. Há três alunos, jovens, na classe. A professora

acabou de revisar todos os pares de flash cards.)

01. Professora Giovanna: Agora, a gente vai pra segunda parte (ela pega alguns handouts).

Coloquem o nome de vocês aqui embaixo, [por]que eu vou recolher.

(A professora entrega aos três alunos um exemplar fotocopiado do handout.)

02. Professora Giovanna: Olha lá, na segunda página. Na segunda parte. Dá uma viradinha.

Depois, a gente volta na primeira [página]. A gente tem, aqui, mais outras coisas, que, talvez,

não estava[m] na lousa. O que que eu quero que vocês tentem fazer? Tentem colocar, de lápis,

o que que é em português, em algum lugar.

03. Adilson: É fácil.

04. Professora Giovanna: Facinho, né? Tem o orange juice, tem o milk, que a gente já

conhece. E, tem outros que são bem parecidos. Olhando a foto, a gente já consegue

decifrar. É que, talvez, a foto não tá muito boa.

05. Rogério: Na segunda foto, né?

06. Professora Giovanna: Isso.

07. Adilson: É só pra grifar o que tá em português?

08. Professora Giovanna: Não. Se você não sabe a palavra ou acha que vai esquecer,

escreve em português...

09. Adilson: ...não, eu já sei.

10. Professora Giovanna: .... porque é só pra te lembrar.

11. Adilson: A primeira [imagem, no handout] é água mineral.

12. Professora Giovanna: Então, vamos lá. A primeira é “mineral water”– água mineral.

Vamos repetir: mineral water.

13. Adilson e Rogério (em coro): Mineral water.

Como vemos no exemplo acima, os alunos da turma 7º A tiveram de

relacionar imagens de bebidas a seus respectivos nomes em língua inglesa. Na

turma 5º A, a proposta foi relacionar placas com os locais em uma cidade onde

elas poderiam aparecer com mais regularidade. Na turma 8º A, a professora

Giovanna solicitou aos alunos que relacionassem as informações em um texto

modelar (um identification card (ID), de uma adolescente norte-americana) a

dada a alguém, em algum grupo, especialmente em uma sala de aula” (tradução livre). Disponível em: <https://www.macmillandictionary.com/dictionary/british/handout>. Acesso em: 30.jun.2018.

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informações pessoais, com a ajuda de um glossário. Nesse caso, no final da

aula, os alunos preencheram seus próprios ID’s.

A partir dessa descrição, é possível fazer duas considerações:

primeiramente, repetimos a ressalva de que uma microestratégia costuma ser

acompanhada por outra microestratégia. Para solicitar aos estudantes que

estabelecessem relações, a professora Giovanna organizava-os em duplas.

Temos, portanto, uma ação no sentido da facilitação da interação negociada,

uma das macroestratégias assinaladas por Kumaravadivelu (1994, 2003). Em

segundo lugar, outra constante da nossa análise aflora com os exemplos que

vimos nas aulas dessa participante: os contornos de uma microestratégia

fundem-se com os contornos do material didático.

Ainda em campo, percebendo essa fusão ou, talvez, a dificuldade em

separar, didaticamente, os limites entre estratégias e materiais de ensino,

conversamos com a professora Giovanna sobre a escolha do material

pedagógico. Antes de apresentar esse dado, para evitar confusões, é preciso

delimitar o seguinte: este estudo de caso não busca analisar, em profundidade,

os materiais usados em sala de aula. Entretanto, compusemos parte dos dados

com esses artefatos (cf. a subseção 2.3.4), porque não nos pareceu adequado,

em uma análise holística, apartar, completamente, esses elementos do quadro

de estratégias de ensino.

Com essa delimitação feita, exibimos, a seguir, um excerto de

questionário e um trecho de entrevista. Esses protocolos interacionais apoiarão

nossa análise:

Protocolo interacional nº 14

Questionário 1 – Formulário para conhecer o perfil dos professores-participantes

Questão 27. Que estratégias de ensino você mais usa em sala de aula? Cite e comente

duas delas. (Por exemplo: organizar os alunos em grupos e trabalhar com textos autênticos).

Professora Giovanna: Levo folhas impressas e peço para eles em grupos com dicionários

tentar relacionar as colunas.

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Protocolo interacional nº 15

O material fotocopiado e o livro didático específico para a EJA

(Entrevista nº 01 realizada com a professora Giovanna, no dia 24 de novembro de 2016, na

Escola Darcy Ribeiro)

01. Pesquisador: E, aí, você trabalhou, nas duas turmas, com material didático fotocopiado.

Você pode comentar de onde você tira essas atividades? Qual é o seu material de origem?124

02. Professora Giovanna: Eu tiro de livros. Eu tiro de um livro de escola de idiomas, [em]

que eu trabalho, também. [O livro] é específico de curso básico que a gente dá pra

taxistas, pra pessoas que vão trabalhar em um hotel e precisam ter conhecimentos

básicos de inglês, né, pra atender um cliente. [É um livro] voltado pro mundo do

trabalho. E, também, pego [atividades] de outros livros. Pego de internet. Mas, ééé, a gente

tem que tomar muito cuidado, porque tudo da internet vem MUITO INFANTILIZADO, né? [O

material] vem com muito DESENHINHO, assim...Que NÃO É a cara do nosso aluno DA EJA.

Então, tem que tomar MUITO CUIDADO, quando você for pegar uma atividade [+]. EU costumo

pegar, imprimir, recortar, colar e MONTAR de outro jeito. E, depois, fotocopiar daquela

montagem/colagem, que eu fiz. Pra tentar tirar esses desenhinhos, essas coisas, assim, que

deixa o material muito infantil, né?

Embasados nesses protocolos, podemos concluir que a microestratégia

identificada (isto é, solicitar aos alunos que relacionassem palavras em língua

inglesa com imagens, contextos de uso ou palavras traduzidas para a língua

portuguesa) era, provavelmente, usada, com regularidade, pela professora

Giovanna. Isso pode ser deduzido da resposta da participante, no protocolo nº

14. Adicionalmente, ainda que houvesse uma curadoria (a professora afirmou

selecionar, organizar e apresentar, de modo apropriado aos alunos da EJA,

materiais didáticos específicos para o ensino de língua inglesa) – o que

julgamos uma competência profissional bastante relevante para o trabalho

docente -, havia, em paralelo, uma suposta preferência por um determinado

material. Qual era a procedência desse material? Um centro de idiomas.

Acreditamos que, latente a esses dados, há, novamente, a presença da

124

Durante a preparação da filmagem das aulas no 5º A e no 8º A, folheamos o livro a que a professora Giovanna se referiu, durante a entrevista. Esse material era vendido somente na rede de centros de idiomas onde ela, em 2016, trabalhava. O material não é seriado, como, normalmente, são organizados os livros ou as apostilas desse tipo. É um volume único. Nele, percebemos que os enunciados dos exercícios são escritos em língua portuguesa. De modo geral, eles vêm acompanhados de muitas imagens e apresentam foco na aprendizagem de vocabulário contextualizado em situações-título para cada unidade, como At the airport ou In the restaurant.

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experiência prévia como uma espécie de bússola na escolha das estratégias (e

dos materiais) de ensino.

Finalmente, no que diz respeito à participação dos alunos, a

microestratégia solicitar-lhes que relacionassem palavras em língua inglesa

com imagens, contextos de uso ou palavras traduzidas para a língua

portuguesa pareceu-nos bem-sucedida. Mais uma vez, houve adesão de todos

os alunos das três turmas em que acompanhamos nossa participante. Em

todos os casos, entendemos que as condutas dos estudantes foram ao

encontro da intencionalidade da professora Giovanna. Eles fizeram-lhe

perguntas, tiraram dúvidas, tomaram notas e estabeleceram as relações de

vocabulário propostas. Para consolidar esse dado, reforçamos que houve

coerência entre o que a professora Giovanna fez, em sala de aula, e o que

lemos sobre seu planejamento nos planos de aula.

3.1.2.3 Microestratégia conectar o ensino da língua inglesa à concepção de

educação da escola e da Secretaria de Educação em que alunos e professores

estão inseridos

Durante as entrevistas e as conversas informais com a professora

Giovanna, percebemos indícios de que ela planejava suas aulas com base em

aspectos das Diretrizes Curriculares da EJA (SÃO BERNARDO DO CAMPO,

2012) (para saber mais, cf. a subseção 1.1.1.1). Por planejamento, nesse caso,

não queremos dizer que as estratégias de ensino usadas, em classe, eram

decorrentes apenas da proposta curricular do município. Planejamento, aqui,

tem o sentido de escolha dos conteúdos curriculares e do seu modo de

organização (interdisciplinar, como veremos).

O primeiro indício que pudemos verificar, em sala de aula, de que a

professora Giovanna ligava os conteúdos curriculares de língua inglesa a um

currículo da escola (e, portanto, não somente de língua estrangeira) pode ser

observado no seguinte protocolo:

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183

Protocolo interacional nº 16

Episódio 04 – Cultura: tema da aula de língua inglesa e de um projeto interdisciplinar da

escola

(Aula na turma 8º A, no dia 08 de novembro de 2016. Há 09 alunos na classe. Trata-se de um

grupo intergeracional, com predomínio de jovens e de mulheres. Neste momento da aula, a

professora Giovanna tinha acabado de entregar handouts aos estudantes.)

01. Professora Giovanna: People, vamos primeiro, aqui, no quadradinho (apontando um

exercício no topo do handout). (Lendo) “Open your mind”. Você pode ler pra gente?

(Andreia, aluna sentada à frente da professora, balança a cabeça, indicando que não quer ler.)

06. Professora Giovanna: [O enunciado] Tá em Portuguese.

07. Andreia (lendo): “Você tem algum documento de identificação? Qual? Por que precisamos

de documentos de identificação? Quais documentos de identificação você conhece?”.

08. Professora Giovanna: Yes. O nosso trabalho é de CULTURA. [É] o nosso trabalho de

seminário – cultura. Cada cultura tem, né, um documento de identidade, uma coisa SUA,

né? A gente se identifica, CULTURALMENTE, com o nosso país. Aqui, no Brasil, quais

[são] os documentos que a gente usa?

É importante deixar claro que, nesta investigação, não analisaremos o

currículo de língua inglesa da Escola Darcy Ribeiro, mas, em campo, ficamos

motivados a conhecer um pouco mais da correlação entre as estratégias de

ensino da professora Giovanna e seu contexto particular de trabalho. Afinal, em

sala de aula, ela apresentou o tema cultura aos alunos como algo da escola e

não apenas da aula de língua inglesa. Por quê? O que ela quis dizer por “nosso

trabalho de seminário” (turno 08)? Por inexperiência do pesquisador, essas

perguntas não foram diretamente feitas à nossa participante. Entretanto,

podemos apresentar outros dados que sustentem a seguinte interpretação:

para a professora Giovanna, a escolha dos conteúdos curriculares partia de

sua bagagem de conhecimentos prévios sobre o ensino da língua inglesa em

centros de idiomas e, aparentemente, de uma organização interdisciplinar (para

as turmas da EJA) da Escola Darcy Ribeiro. O trecho de entrevista abaixo nos

permite argumentar isso. Chamamos a atenção para a escolha lexical da

participante. Foi ela, afinal, quem trouxe à tona a ideia de um projeto

interdisciplinar:

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Protocolo interacional nº 17

O trabalho em equipe e de natureza interdisciplinar

(Entrevista nº 02 realizada com a professora Giovanna, no dia 15 de dezembro de 2016, na

Escola Darcy Ribeiro)

01. Professora Giovanna: A gente esqueceu da M7A6 [Criar momentos de culminância de

uma pesquisa, em L2, que engajem toda a turma em uma discussão (integração entre reading,

writing, speaking e listening)], que tá do outro lado, da culminância na escola...

02. Pesquisador: É verdade, é verdade. Você tem toda razão, [por]que isso aqui é importante.

Como que se dá essa culminância, que você deixou bem claro, numa conversa nossa, que não

é uma culminância SÓ da aula de inglês, é uma culminância da escola, né?

03. Professora Giovanna: Da escola, porque, a partir das falas significativas, da situação-

limite levantada, nós, professores, fazemos um projeto em cima dessa fala, né, e da

superação da fala. E, nós temos, no final do semestre, a culminância através de um seminário

que é apresentado pra todos os alunos da escola e familiares que são convidados, tem

convite... É UM EVENTO aqui, nós já temos isso há quatro anos, três anos, eu acho. Então, a

gente tá ficando bem, assim, profissional (risos) nisso de seminário. E, os alunos que entram

aqui, até os do Alfa, Pós-Alfa125

, eles já sabem que têm esse seminário, que vale como,

realmente, pra eles passarem ou não de ano, pra eles verem se aprenderam ou não. E, é bem,

bem legal.

04. Pesquisador: Se você me permite, eu vou perguntar na entrevista, porque quem ouve não

sabe que você fala isso contente, né? Você entende esse seminário como uma prática de

sucesso da escola, né?

05. Professora Giovanna: Sim, é uma prática de sucesso.

06. Pesquisador: E, a quem você atribui esse sucesso? Esse sucesso é resultado do trabalho

de quem, na escola?

07. Professora Giovanna: Eu acho que de todos, né? Da equipe gestora, que apoia

bastante a gente, dos professores, [por]que nós somos um quadro pequeno E UNIDOS, e

nós queremos que isso dê certo. E, a motivação que a gente mostra pros alunos, que vai

conquistando eles, né. E aí depois disso eles... a gente consegue fazer com que eles

ABRACEM o projeto, né, porque eles... a gente mostra que tem gravações, né, para os

alunos que estão entrando, que é tipo uma [+], uma INTRODUÇÃO à escola: “a nossa escola

funciona assim”. Aí a gente mostra como que é para os alunos novos, eles assistem

separadamente aqui, na biblioteca, junto com a coordenadora, e a gente continua dando aula.

E, os alunos novos já sobem assim: “Nossa, nós temos que fazer um seminário, que legal!”, né,

mostra os parentes assistindo, os familiares, tudo. Então, é uma culminância bem legal, assim,

É UM EVENTO da escola.

125

Alfa e Pós-alfa são referências às turmas de Alfabetização e de Pós-Alfabetização, equivalentes aos cinco anos do Ensino Fundamental 1 ou ao 1º e ao 2º ciclos, respectivamente, da Proposta Curricular para a educação de jovens e adultos (BRASIL, 2002a). Em 2016, a Escola Darcy Ribeiro contava com uma turma Alfa e outra, Pós-Alfa.

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08. Pesquisador: E aí você consegue ver nessa culminância a presença do seu trabalho,

como professora de inglês, e da língua inglesa, também?

09. Professora Giovanna: Também. Porque ELES [alunos] percebem que todas as

matérias estão conectadas, assim, que tem essa interdisciplinaridade.

A nosso ver, curiosamente, a discussão sobre o trabalho em equipe e de

natureza interdisciplinar da escola surgiu a partir dos comentários da

professora-participante sobre outra microestratégia (isto é, criar momentos de

culminância de uma pesquisa, em L2, que engajem toda a turma em uma

discussão (integração entre reading, writing, speaking e listening)). Como se

pode deduzir, a tal culminância era um “evento” – palavra usada, repetidas

vezes, pela educadora -, em que todos os alunos da EJA da Escola Darcy

Ribeiro apresentavam à comunidade escolar o que haviam aprendido, durante

um semestre, em todas as disciplinas. Para concretizar esse evento, alguns

temas, distribuídos por termos, eram elencados. Essa tematização partia de

“falas significativas, da situação-limite” dos alunos e buscava uma “superação”

(turno 03). O que esses segmentos lexicais têm em comum? Todos eles

podem ser localizados em Freire, P. (2016) – referência teórica que escora, em

grande parte, as Diretrizes Curriculares da EJA (SÃO BERNARDO DO

CAMPO, 2012). Em outras palavras, a escolha de conteúdos curriculares de

língua inglesa partia de uma perspectiva inter/transdisciplinar (cf. a subseção

1.1.1.1), possibilitada pelos temas geradores126.

No nosso entendimento, a elaboração de um currículo por temas

geradores (FREIRE, P., 2016) altera, parcialmente, a relação conteúdo

escolar/disciplina, porque o tema gerador atravessa diferentes componentes

curriculares. Eis o motivo pelo qual, acreditamos, a professora Giovanna

afirmou: os alunos “percebem que todas as matérias estão conectadas” (turno

07). Em teoria, ao romper com a lógica tradicional, segundo a qual

126

Tema gerador e palavra geradora são conceitos de Freire, P. (2016). Para o autor, a grade de conteúdos, que, aqui, temos chamado de currículo, numa perspectiva de educação emancipadora, não deve ser imposta aos alunos nem refletir a visão da elite. Em oposição a essa prática, típica da educação tradicional, Freire, P. (2016) propõe que os professores investiguem, problematizem e tematizem a realidade dos alunos. A partir da tematização, os educadores podem eleger, em parceria com os estudantes, a palavra geradora (no âmbito da alfabetização) ou o tema gerador (no contexto de grupos em que os alunos já são alfabetizados). Do tema gerador, surgem os conteúdos curriculares. De acordo com Freire, P. (2016), a seleção de conteúdos deve privilegiar as necessidades dos alunos e não a lógica disciplinar em que professores são, tradicionalmente, formados.

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186

determinados temas devem ser desenvolvidos em disciplinas específicas, a

proposta da Escola Darcy Ribeiro aos alunos da EJA apontava, ainda, para

outra mudança: o trabalho pedagógico com “projetos” (turnos 03 e 07).

Notamos, também, o papel do trabalho em equipe, apontado pela

participante. Para ela, a relação entre os professores da Escola Darcy Ribeiro

contagiava os alunos, de tal forma que eles (estudantes) pudessem, do mesmo

modo, trabalhar na perspectiva educacional proposta. Daí, provavelmente, a

escolha por estes segmentos lexicais: “prática de sucesso”, “somos um grupo

unido” e “motivação” (turno 07). Acrescentamos a essa leitura dos dados outra

informação importante, obtida durante conversas informais: segundo a

professora Giovanna, os horários de trabalho pedagógico coletivo (HTPC’s)

eram usados pela equipe escolar, professores e gestão, para o planejamento

dos projetos baseados em temas geradores.

Como esses momentos formativos não compõem o escopo da nossa

pesquisa, não podemos asseverar isto, mas suspeitamos, com base na

percepção da professora Giovanna, que esses tempos-espaços eram bastante

importantes em termos de formação docente. Intuimos isso, porque, a nosso

ver, o trabalho pedagógico com projetos inter/transdisciplinares exige

reestruturação organizacional. São necessárias parcerias entre os professores,

modificações nos horários e, provavelmente, estudos sobre temas, até então,

pouco conhecidos ou nem sequer explorados nos cursos de formação inicial ou

de formação contínua. A partir das nossas conversas com a professora

Giovanna, parece-nos que esses desafios eram confrontados pelos

educadores da Escola Darcy Ribeiro.

Teoricamente, à luz do pensamento de Paulo Freire, construir um

currículo pautado em falas significativas, situações-limite e temas geradores127

é uma forma de aproximar os objetos do conhecimento – ou os conteúdos

curriculares – de sujeitos encarnados, quer dizer, de pessoas com sonhos,

problemas, dificuldades e limitações. E, porque não se trata de uma tarefa

127

Remetemo-nos, neste ponto, ao trabalho de Zanardo (2017), que investiga a efetivação da proposta curricular da rede municipal de São Bernardo do Campo, em uma escola com cursos de EJA. Para tal, a autora pesquisa a relação entre falas significativas, situações-limite e temas geradores.

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187

simples, conjeturamos, é importante haver formação docente entre pares e

alicerçada nas características da própria comunidade escolar.

Quando olhamos para os mesmos dados, mas embasados em

Kumaravadivelu (1994, 2003), encontramos correspondência, também, entre a

prática e a teoria. Para o linguista aplicado indiano, examinar a realidade do

uso da língua inglesa no contexto da comunidade escolar e conectar o ensino

da língua inglesa à concepção de educação da escola e da Secretaria de

Educação em que alunos e professores estão inseridos são duas

microestratégias ligadas à macroestratégia encorajar o desenvolvimento da

consciência linguística em língua estrangeira (cf. o Apêndice B). Para o

subtítulo desta seção, escolhemos a segunda microestratégia listada, porque

ela dá conta de abarcar três contextos diferentes, mas interligados: a sala de

aula de língua inglesa da professora Giovanna, a Escola Darcy Ribeiro e a

Secretaria de Educação de São Bernardo do Campo. De acordo com

Kumaravadivelu (2003), a coerência entre o que as diferentes esferas

educacionais propõem aos alunos pode ressignificar, para a comunidade

escolar, o sentido da língua estrangeira dentro da escola e na sociedade.

A título de exemplo, a professora Giovanna disse-nos que, para

convencer os alunos do 8º termo de que a língua inglesa estava presente no

dia a dia deles, ela levou-os a um mercado ao lado da escola. Lá, lhes pediu

que registrassem todas as palavras em língua inglesa localizadas em rótulos

de produtos alimentícios. Como podemos prever, os estudantes foram

persuadidos a mudarem de ideia. De acordo com o relato feito pela professora,

por intermédio dessa microestratégia, eles puderam perceber que palavras

cotidianas (por exemplo, close-up, whitening, dove e vanish) constituíam, na

verdade, o léxico da língua estrangeira ensinada na escola.

Outro exemplo de trabalho inter/transdisciplinar ocorreu em 2016,

durante a produção dos dados. Com o tema O meu bairro, os alunos do 5º

termo estavam aprendendo a nomear as instalações do bairro e da cidade

onde moravam. Depois, equipados com esse conhecimento, eles teriam de

construir um mapa, com indicações - em língua inglesa - do entorno da Escola

Darcy Ribeiro. Esse mapa integraria a culminância do projeto

inter/transdisciplinar desse grupo. Essa microestratégia contava com a

facilitação de conhecimentos da professora Giovanna e dos professores de

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188

Geografia e de Artes. A imagem abaixo nos mostra o trabalho que a primeira

turma de 5º termo daquele ano fez128:

Foto 6 - Mapa do bairro da Escola Darcy Ribeiro, com instalações indicadas em língua inglesa

Não temos dados que atestem (ou não) a aprendizagem dos alunos da

Escola Darcy Ribeiro em língua inglesa, em termos de superação das

situações-limite. Buscar manifestações da emancipação desses sujeitos ou do

aumento da consciência crítica deles, como propôs Freire, P. (2016), exigiria

outra investigação. No entanto, entendemos que a microestratégia conectar o

ensino da língua inglesa à concepção de educação da escola e da Secretaria

de Educação em que alunos e professores estão inseridos tinha o potencial de

beneficiar os alunos em relação à construção global de conhecimentos, já que,

por indução da perspectiva curricular da rede municipal, a Escola Darcy Ribeiro

trabalhava com a organização inter/transdisciplinar.

Por fim, o estudo dessa microestratégia nos trouxe outro aprendizado: o

desenho de uma estratégia de ensino pode ser traçado dentro de um território

escolar e não meramente disciplinar.

128

Trata-se de alunos que estudaram de fevereiro a junho (2018), na Escola Darcy Ribeiro, antes, portanto, de nossa pesquisa em campo acontecer.

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3.1.3 O caso das estratégias de ensino do professor Valter

Antes de lermos os protocolos interacionais de que participam o

professor Valter e seus alunos, é importante retomarmos o contexto de trabalho

particular desse educador. À época da produção dos dados, Valter trabalhava

em três escolas municipais. À Escola Anísio Teixeira, ia uma vez por semana.

Lá, atuava com os alunos do sétimo termo (turmas: 7º A e 7º B). As outras

turmas da mesma unidade escolar tinham aula com a professora Eliane.

Sucintamente, a partir da observação das quatro aulas desse

participante a que assistimos, identificamos a predominância do uso de uma

mesma microestratégia: traduzir um texto não autêntico, com auxílio de

glossário. No entanto, ressaltamos que isso pode ser interpretado como algo

incidental, porque acompanhamos o professor-participante em duas aulas

seguidas, em ambas as turmas. Em outras palavras, nos dois grupos (7º a e 7º

B), o que ele propôs aos estudantes, na primeira aula observada, se estendeu

à aula da semana seguinte.

O protocolo interacional nº 18 descreve, parcialmente, o uso dessa

microestratégia. Participam dele o professor Valter e duas alunas: Raquel e

Dora.

Protocolo interacional nº 18

Episódio nº 01: A microestratégia traduzir um texto não autêntico, com auxílio de

glossário.

(Aula no 7º B na Escola Anísio Teixeira, no dia 26 de outubro de 2016. A aula começa as

19h30min e, pontualmente, o professor chega à sala. Alguns minutos depois, a aluna Raquel

entra na sala. Raquel tem, provavelmente, 40 anos. Ela comenta que poucos alunos têm

frequentado, ainda, a turma, em outubro. A maior parte deles desistiu de estudar. O professor

Valter informa-lhe que esperará mais alguns minutos, antes de, efetivamente, começar a aula,

porque aguarda a chegada de outros alunos. As 19h42min, aproximadamente, mais uma

estudante aparece: Dora. Ela aparenta ter poucos mais de 18 anos. A jovem senta ao lado de

Raquel. Dessa posição, as alunas começam a receber instruções do professor Valter. Ele está

sentado, na frente das duas alunas, na cadeira do professor)

1. Professor Valter: Então, a gente vai fazer a interpretação de texto, que é o foco da

escola. É interpretação de texto em inglês. Então, do que a foto trata?

2. Dora: Ah, é de um casamento!

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190

3. Professor Valter: Então, escreve aí, do lado, casamento. (Professor e alunas escrevem em

seus próprios handouts129

, provavelmente, ao lado da foto. Notamos que, durante esse

processo de dar instrução e de tomar nota no material, o educador permanece sentado). O que

quer dizer casamento em inglês? Aqui, na folha, se você ver, aqui embaixo, aqui no exercício

quatro, tá escrito “Vocabulário”. Vocabulário é a tradução de vários termos e palavras do texto.

Então, uma frase que tem no texto, por exemplo, é very traditional wedding (nesse momento,

Raquel está perdida. Dora aponta, no handout da colega de turma, onde está a tal expressão)

Que quer dizer very traditional wedding?

4. Raquel (lendo o handout): Casamento bem tradicional.

5. Professor Valter: Isso! E, qual é a palavra que corresponde a casamento? Qual que vocês

acham?

6. Dora: Wedding?

7. Professor Valter: Wedding. Exatamente! (Aparentemente, Dora grifa no handout de Raquel

as palavras casamento e wedding). Então, aqui [no “Vocabulário”], tem uma lista de palavras

em português e em inglês que, depois, vai ajudar no entendimento do texto. Por exemplo, esse

tipo de evento [o casamento] é barato ou caro? Que vocês acham?

8. Raquel: O casamento é caro, professor!

9. Professor Valter: É caro, justamente. Vamos colocar aqui embaixo (o educador começa a

escrever no próprio handout, sentado, ainda, à mesa do professor): casamento caro.

10. Raquel: Caro, né? (nesse momento, Dora ajuda a colega, apontando onde Raquel deve

fazer sua anotação. No entanto, Dora parece irritada com a dificuldade da colega, porque

suspira, em voz alta, ao cooperar com Raquel).

11. Raquel: Vamos procurar aqui, no Vocabulário, onde tá escrito [caro], onde tem a tradução

da palavra caro...

12. Dora: Então, a gente vai responder isso aqui em cima (apontando para o topo do handout,

onde estão as perguntas problematizadoras)?

13. Professor Valter: Isso.

14. Raquel: Então, pera aí, porque a gente vai ter que arrumar. A gente anotou aqui no meio,

mas tem que anotar em cima, né? Pera aí, um minutinho...Senão, não vai dar certo, né?

15. Professor Valter (enquanto as alunas Raquel e Dora fazem anotações): É assim que se

faz, tá vendo? A gente tem um tema, um texto, né, e, pra estudar o texto, [vocês] têm que

ir lendo e anotando aquilo que a gente acha importante. A gente tá REescrevendo o

texto, INTERPRETANDO o texto. (Aparentemente, porque soltaram os lápis e voltaram a

olhar para o professor, Dora e Raquel terminaram suas anotações) Se você ver aqui embaixo,

depois de very traditional wedding, tem extremely expensive. Qual das palavras aqui

representa caro?

16. Dora: Aqui? (perdida)

17. Professor Valter: Hum? Em extremely expensive.

18. Raquel: Nas duas frases ou em uma só...

129

Cf. o Anexo A.

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191

19. Professor Valter: Qual dessas duas palavras é caro?

20. Raquel: ...*tremely130

?

21. Dora: A última?

22. Professor Valter: Exatamente, a última – expensive. Então, vamos copiar: caro é igual a

expensive.

(Nesse momento, quando metade da aula já tinha passado, por volta das 20h, um jovem aluno

entra na classe. O professor Valter, pacientemente, cumprimenta-o)

23. Professor Valter: Opa!

(O educando aproxima-se da mesa do professor, sem cumprimentá-lo. Sentado, o professor

Valter entrega-lhe o material usado naquela aula e complementa:)

24. Professor Valter: Nós estamos fazendo interpretação de texto. Estamos aqui, no

segundo item.

(Sem dizer nada, o aluno pega o material e senta no fundo da sala.)

A partir do episódio acima, podemos refletir sobre o papel da

microestratégia traduzir um texto não autêntico, com auxílio de glossário e a

justificativa do professor-participante para seu uso. Em primeiro lugar, então,

entendemos que os contornos dessa microestratégia apontam para uma

centralização do processo de ensino-aprendizagem no professor. O episódio nº

18 mostra-nos que 50% dos turnos interacionais são do educador, isto é, 12

turnos de um total de 24.

Em segundo lugar, do ponto de vista do professor Valter, a tradução

equivale à interpretação de texto. Adiante, discutiremos as diferenças entre o

ato de traduzir e o ato de interpretar um texto em língua estrangeira. Antes

disso, retomamos a definição de interpretação textual apresentada por esse

participante da pesquisa:

15. Professor Valter (enquanto as alunas Raquel e Dora fazem anotações): É assim que se

faz, tá vendo? A gente tem um tema, um texto, né, e, pra estudar o texto, [vocês] têm que ir

lendo e anotando aquilo que a gente acha importante. A gente tá REescrevendo o texto,

INTERPRETANDO o texto.

Para o professor Valter, interpretar é, pois, uma forma de reescrever. No

entanto, essa suposta reescrita não dá espaço à autoria dos alunos, porque

130

O * indica tratar-se de um segmento lexical agramatical.

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192

parece tratar a língua inglesa como um código de significados131 únicos.

Apoiamos esse argumento em dados como o turno 22 e o próprio handout que

serve como material didático para essa microestratégia acontecer. Nele, há

“chunks of language” (cf. o Anexo A), isto é, trechos de um texto ou

collocations132 da língua inglesa, traduzidos para a língua portuguesa. Para ler

(ou traduzir o texto-base), uma narração com o tema casamento, os alunos do

professor Valter pareciam depender, exclusivamente, do glossário exibido no

material didático. Dizendo de outra forma, a tradução correta (no sentido de

esperada ou legitimada pelo professor) era aquela informada pelo handout.

A correlação entre o ato de traduzir e o ato de interpretar emergiu,

também, em outras aulas e em dias diferentes. O protocolo 19 ajuda-nos a

refletir sobre essa questão. Nele, interagem o professor Valter e o único aluno

presente na classe, no início da aula: Danilo.

Protocolo interacional nº 19

Episódio nº 02: A microestratégia traduzir um texto não autêntico, com auxílio de

glossário

(Aula no 7º B, no dia 09 de novembro de 2016. O professor Valter entrega o handout133

a um

aluno jovem, aproximadamente, com 18 anos, sentado a duas carteiras do professor.)

1. Professor Valter (o educador olha a frente e o verso do material): Você não tinha feito [a

atividade, na aula anterior, no dia 26 de outubro] A gente vai começar por aqui (o professor faz

um movimento com a mão, na direção do topo da folha até a margem final. Em seguida,

retorna à sua cadeira e senta). Bom, nessa primeira [questão], aqui, tá vendo que tem uma

imagem? Essa imagem é sobre o quê?

(Danilo balança a cabeça, afirmativamente, mas não diz nada.)

02. Professor Valter: Sobre o que é essa imagem, aqui?

03. Danilo: Um casamento?

04. Professor Valter: Isso. Vamos escrever, então: casamento.

(Danilo coloca um fone de ouvido na orelha direita e começa a arrumar o material. Até então,

sua mochila estava fechada.)

131

Com base em Zuin e Reyes (2010), entendemos o significado como algo mais estável do que o sentido e igual a todas as pessoas. O sentido, por sua vez, é mais dinâmico, pessoal, varia de sujeito a sujeito e é preso ao contexto. 132

Collocations “referem-se ao modo com que palavras tendem a coocorrer com outras palavras ou expressões” (UR, 2012, p. 61, tradução livre). 133

Cf. o Anexo A.

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05. Professor Valter (levantando o handout e apontando para o primeiro exercício, com uma

caneta, enquanto conversa com Danilo): Então, você vai escrever, aqui, casamento. Escreve:

casamento.

06. Danilo: Aonde?

07. Professor Valter (apontando, mais uma vez, para o exercício em que há a imagem): Do

lado da foto. Então, vamos continuar. Questão número 2. (Lendo) “Que palavras ou expressões

em inglês você sabe sobre esse tema? Esse tipo de evento é barato ou caro?” (Olhando para

Danilo) O que você acha?

08. Danilo: Barato.

09. Professor Valter (sorrindo e acolhendo, gentilmente, a resposta do aluno): Barato?

10. Danilo: Pra mim, é.

11. Professor Valter (surpreso): Casamento é barato?

12. Danilo: NÃO! Mas assim [como da foto] é.

13. Professor Valter: Casamento é bem caro. Vamos colocar, aqui, onde tem o ponto de

interrogação: caro. Depois, (lendo) “quem paga geralmente por todo esse evento?”.

14. Danilo: Sei lá. O homem e a mulher.

15. Professor Valter: Isso. Geralmente, o casal. E? (Pausa, esperando por um complemento

de Danilo) A família, né? Geralmente, os pais.

(Enquanto essa interação acontece, Danilo faz anotações em seu handout.)

16. Professor Valter (lendo): “Onde ele [o casamento] geralmente acontece?”.

17. Danilo: Numa igreja.

18. Professor Valter: Então, escreve: igreja.

19. Professor Valter (lendo): “Que tipo de roupas as personagens de um evento assim

usam?”.

20. Danilo: Terno.

21. Professor Valter (escrevendo em seu material): Terno E vestido de noiva, né? Os

personagens principais são o noivo e a noiva.

22. Danilo: Eu coloco o quê? Noivo e noiva?

23. Professor Valter: Coloca, hum, terno e vestido de noiva – que são os tipos de roupa que

eles usam. O que acontece mais nesse tipo de evento?

24. Danilo: Ah, casamento, festa depois.

25. Professor Valter (tomando nota, em seu material): Fes-ta. Eles cortam a gravata.

26. Danilo: Hã?

27. Professor Valter: Aí, eles jogam o buquê de flores.

(Danilo registra, possivelmente, as palavras do professor. Frequentemente, notamos que ele

olha para a porta, que está aberta)

28. Professor Valter: O que a gente acabou de fazer aqui? A gente acabou de fazer uma lista

de palavras que retratam a foto. Não é isso? Então, se a foto retrata o casamento, a gente fez

um monte de perguntas que retratam o que é o casamento. Então, você, aí, montou uma

IMAGEM do que é o casamento. Ou seja: você montou meio que uma EXPLICAÇÃO do

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194

que é o casamento. Isso aí é a mesma coisa de quando você vai INTERPRETAR um

texto. (Repetindo) Você vai interpretar um texto. O texto... Você vai fazer uma análise do

texto, então, você levanta os principais ASPECTOS do texto, tá certo? (Danilo faz um

meneio com a cabeça, concordando com o professor) É o que você acabou de fazer aí. Aí,

exercício três. (Lendo) “Só depois de pensar um pouco nas perguntas acima, leia o texto

abaixo. Procure identificar as palavras e as expressões que você conhece. Tente interpretar o

texto em conjunto e não palavra por palavra”. (Olhando para Danilo) Então, sempre, um texto

é constituído de ORAÇÕES, tá certo? Dificilmente, você fala só palavras. Você fala,

geralmente, FRASES. Então, aí, a gente tem um texto em inglês. Tá vendo? A gente vai

traduzir o texto. Eu vou fazer o seguinte: eu vou colocar na lousa e a gente vai

traduzindo juntos, tá?

(Danilo faz apenas um gesto afirmativo com a cabeça.)

Os dados do episódio nº 02 expandem o significado de interpretação, do

ponto de vista do professor Valter. Conforme ele disse ao aluno Danilo, no

turno 28, o ato de interpretar está associado a duas ações: “explicar” e

“analisar um texto”. Adicionalmente, é importante observar que o segmento

lexical interpretar aparece no próprio handout, onde lemos: “Tente interpretar o

texto em conjunto e não palavra por palavra” (cf. o Anexo A). Acreditamos que

professor e aluno analisaram, de fato, um texto visual, já que comentaram

alguns detalhes da foto impressa no handout, como mostram os turnos de 02 a

27. No entanto, quando se trata do texto verbal, parece-nos que houve,

apenas, a tradução, não a análise textual-discursiva ou a explicação

metalinguística.

Para compor os dados desta unidade de análise, compartilhamos, a

seguir, uma foto da lousa, na turma 7º B, e uma imagem, a partir da qual

podemos examinar uma parte do handout trabalhado pelo professor-

participante e pelos alunos, durante as aulas filmadas. No caso da foto,

sublinhamos que fizemos um corte, com editor de texto, para não mostrarmos o

professor Valter ou os educandos, por motivos éticos.

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Foto 7 - Exercício de tradução, na turma 7º B da Escola Anísio Teixeira

Foto 8 - Parte do handout usado pelas turmas 7º A e 7º B da Escola Anísio Teixeira

Ao cotejar as fotos 7 e 8, podemos perceber os desdobramentos da

microestratégia traduzir um texto não autêntico, com auxílio de glossário e o

vínculo entre a ação do professor, a ação do aluno e o material didático usado.

Entendemos que a microestratégia em âmbito exigiu dos alunos atenção,

principalmente, às frases e às collocations já traduzidas, debaixo da rubrica

“Vocabulário” (que, nesta análise, temos chamado de glossário). Do professor,

essa mesma microestratégia exigiu o controle desse processo, uma vez que

ele traduziu, efetivamente, o texto-base. Para mediar esses papéis, havia o

handout, sem o qual, provavelmente, o ato de traduzir não teria acontecido da

mesma forma.

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196

Em seu estudo sobre macroestratégias e microestratégias,

Kumaravadivelu (2003) não aprofunda a discussão sobre a leitura, em termos

de linhas teóricas. No entanto, o linguista aplicado apresenta, ao longo de todo

o livro, diversas microestratégias – aliás, associadas a distintas

macroestratégias - cujo ponto de partida é a leitura de algum texto autêntico,

escrito em língua inglesa. Para o pesquisador indiano, o trabalho com a

língua(gem), em sala de aula, deve servir para a construção de significados

(em inglês, meaning-making). Com esse objetivo em mente, o professor de

língua estrangeira, a partir de um texto, em qualquer modalidade (oral, escrita,

verbovisual ou multissemiótica), pode articular os contextos linguístico e

extralinguístico, o que significa ir além do sistema linguístico e considerar o

evento comunicativo como um todo.

Além disso, embasados em Kumaravadivelu (2003), acreditamos que,

para haver interpretação textual (ou construção de sentidos, como prefere o

pesquisador), dentro e fora da escola, o sujeito deve ter um papel ativo no

processo de leitura. E, ativo, aqui, não significa alguém que tome notas ou que

escreva o tempo todo, mas uma pessoa com o pensamento ativo, isto é, que

faz relações entre o lido e o vivido, que compara argumentos, que refuta ideias

ou que concorda – mesmo que parcialmente - com o autor.

Ressaltamos, ainda, que, embora Kumaravadivelu (2003) não utilize a

expressão letramento crítico em seu livro, as ideias desse pesquisador

apontam para esse conceito. Sustentamos esse argumento com base em

Takaki (2012) e em Edmundo (2013). Para essas autoras, o letramento crítico

consiste, justamente, em atribuir sentidos aos textos, fazendo do

questionamento “um estímulo ao processo de interpretação e,

consequentemente, à produção do conhecimento” (EDMUNDO, 2013, p. 70). A

partir dessa expansão de saberes, a prática da crítica pode ser desenvolvida.

Para tal, é preciso ser capaz de construir significados e sentidos,

permanentemente, “a partir da relação de seu contexto com o contexto do autor

e com toda a multi-hiper-modalidade, que é inerente à linguagem” (TAKAKI,

2012, p. 980). Para Kumaravadivelu (2003), a leitura é, também, uma forma de

agir no mundo, e não, somente, uma habilidade escolar.

Essa perspectiva teórica aparece, principalmente, na macroestratégia

encorajar o desenvolvimento da consciência linguística em língua estrangeira.

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Com o objetivo de ampliar a consciência linguística dos alunos, com atenção

ao caráter ideológico e social da língua(gem), o linguista aplicado sugere

microestratégias como encorajar os alunos a reconhecer uma variedade de

pontos de vista sobre temas e tópicos de língua inglesa; pedir-lhes para discutir

como alguns tópicos podem ser vistos de outra forma, considerando a

perspectiva cultural e linguística deles (alunos); e motivá-los a registrar, por

escrito (como numa espécie de diário de bordo), os exemplos de uso linguístico

ou de práticas sociais que, particularmente, os provocam, isto é, que causam

algum tipo de indignação ou de reflexão. Portanto, reafirmamos nossa

perspectiva interpretativa de que a microestratégia estabelecida pelo professor

Valter não estava ligada à interpretação textual (tomando, por base, o nosso

referencial teórico), mas, sim, à tradução.

Com referência à natureza do texto (autêntico ou não autêntico) usado,

em sala de aula, pelo participante, é importante apresentar alguns dados. Para

isso, apresentamos, a seguir, o protocolo interacional nº 20:

Protocolo interacional nº 20

Questionário 1 – Formulário para conhecer o perfil dos professores-participantes

Questão 28. Que estratégias de ensino você reconhece como eficientes, mas usa pouco em

sala de aula? Cite e comente duas delas. (Por exemplo: organizar os alunos em grupos e

trabalhar com textos autênticos).

Professor Valter: Acho que devemos abolir os textos padronizados, mas ainda não achei

uma forma de fazer isso. Os alunos deveriam aprender o idioma colaborando, e não

competindo.

Entendemos que, primeiramente, o professor Valter não respondeu, de

fato, à questão 28, uma vez que sua resposta não foi sobre as estratégias de

ensino que reconhecia como eficientes. No entanto, sua resposta pode nos

levar a concluir que, para ele, o trabalho com “textos padronizados” não lhe

parecia ideal, ou desejável, ainda que fosse o caminho trilhado, à época da

produção dos dados. Para não incorrer em uma interpretação equivocada, em

uma conversa por aplicativo, perguntamos-lhe se ele, realmente, usava, nas

aulas da EJA, apenas textos produzidos para fins didáticos (ou não autênticos),

como tínhamos entendido. Naquele momento, sua resposta foi afirmativa.

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Daqui em diante, analisaremos as manifestações dos alunos frente à

microestratégia traduzir um texto não autêntico, com auxílio de glossário. A

esse respeito, em primeiro lugar, apresentaremos dois protocolos interacionais

em que essa microestratégia serviu para a ampliação de conhecimentos

gramaticais dos alunos:

Protocolo interacional nº 21

Episódio nº 03 – A comparação entre a grafia de palavras da língua inglesa com palavras

da língua portuguesa

(Aula no 7º B, no dia 09 de novembro de 2016. Há três estudantes na classe. Todos estavam

presentes na aula anterior, no dia 26 de outubro.134

)

01. Professor Valter: Vamos lá, na parte de trás [do handout], no item 5, é pra completar, aqui,

o texto.

02. Danilo: Atrás?

03. Professor Valter: Isso, na parte de trás (ele aponta para Dora, que está sentada à sua

frente, onde o quinto exercício está localizado). Então, COMO você vai completar? É só seguir

o texto. Então, onde tá escrito lá: “we had a very traditional”... tá faltando a palavra “traditional”

(com giz colorido, o professor começa a circular a palavra “traditional”, na lousa). Aí, em

seguida, no texto: “and it was extremely expensive” (passa a circular “extremely”, na lousa).

“Extremely” é bem parecido com o português, ó! Tradicional... “traditional” é bem

parecido com o nosso tradicional.

(Durante esse turno de fala do professor Valter, Danilo e Dora continuaram a responder o

exercício, em seus handouts.)

Protocolo interacional nº 22

Episódio nº 04 – Dúvida sobre a forma do futuro simples

(Aula no 7º A, no dia 26 de outubro. Há 14 alunos presentes na sala de aula. Na lousa, o

professor Valter já escreveu, com cores diferentes e em linhas sobrepostas: “BUT IT WAS

WORTH” / MAS VALEU A PENA.).

01. André: Professor, e se fosse para colocar: “Mas VAI valer a pena”? Como ficaria?

02. Professor Valter: Mas o quê?

03. André: “Mas VAI valer a pena”. Como é que ficaria?

04. Jaqueline: VAI...Ele [André] quer saber o VAI...

05. André: É, no caso, VAI valer...Aí [na lousa], tá “mas VALEU...”

134

Entre os dias 26 de outubro e 09 de novembro, houve um feriado: Dia de Finados (em 02 de novembro). Considerando que o professor Valter ia à Escola Anísio Teixeira apenas uma vez por semana, pudemos acompanhá-lo durante duas aulas seguidas em cada turma.

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199

06. Professor Valter (refletindo): Aí teria que colocar no [tempo verbal] futuro.

07. André: É. Aí como é que ficaria, aí, no caso...

08. Professor Valter: É, aí, você colocaria no futuro (apontando para a frase escrita em

inglês): But it WILL worth. Aí assim: VAI valer a pena.

09. André: Escreve aí.

(O professor Valter escreve na lousa: *IT WILL WORTH. André toma nota, em seu caderno.

Enquanto o aluno faz o registro, o professor lê o que acabou de escrever, em voz alta.).

10. Professor Valter: Bom, então, vamos lá.

No protocolo interacional nº 21, podemos constatar que o professor

Valter usou a tradução de traditional e de extremely (tradicional e

extremamente, em português), para mostrar as semelhanças ortográficas entre

as duas línguas, a estrangeira e a materna (turno 03). Apesar de não falar em

palavras cognatas, acreditamos que essa ação tenha sido decorrente da

microestratégia escolhida para aquelas aulas (isto é, traduzir um texto não

autêntico, com auxílio de glossário).

Em contraste a isso, no protocolo interacional nº 22, a participação do

aluno André contribuiu, de certa forma, para a atividade de toda a turma. Ao

perguntar sobre a tradução da frase “vai valer a pena” (turno 03) para a língua

inglesa, André instalou um conflito (positivo) e, a partir disso, o professor Valter

pôde apresentar aos alunos o verbo modal will. Infelizmente, talvez, porque

tenha sido surpreendido pela questão do aluno, o educador, em sua resposta,

acabou se esquecendo do verbo to be (turno 08), já que a tradução correta

seria it will be worth135. Ainda assim, entendemos que esse episódio nos

permite entrever interesse pela língua inglesa por parte de alguns estudantes

da EJA.

No entanto, quando tratamos do uso da microestratégia traduzir um texto

não autêntico, com auxílio de glossário, em linhas gerais, embasados em toda

nossa amostragem, percebemos que a maior parte das dúvidas dos alunos diz

respeito à organização dos registros no handout. Para ilustrarmos esse ponto

de vista, retomamos, aqui, excertos dos protocolos de interação nº 18 e nº 19,

respectivamente:

135

Em Corpus of Contemporary American English (COCA), há 83 linhas de concordância ou registros para o segmento lexical “it will be worth”, o que atesta o uso frequente dessa expressão em língua inglesa, na variante Inglês Americano. Disponível em: <https://corpus.byu.edu/coca/>. Acesso em: 02.jul.2018.

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200

12. Dora: Então, a gente vai responder isso aqui em cima (apontando para o topo do handout,

onde estão as perguntas problematizadoras)?

13. Professor Valter: Isso.

14. Raquel: Então, pera aí, porque a gente vai ter que arrumar. A gente anotou aqui no

meio, mas tem que anotar em cima, né? Pera aí, um minutinho...Senão, não vai dar certo,

né?

19. Professor Valter (lendo): “Que tipo de roupas as personagens de um evento assim usam”?

20. Danilo: Terno.

21. Professor Valter (escrevendo em seu material): Terno E vestido de noiva, né? Os

personagens principais são o noivo e a noiva.

22. Danilo: Eu coloco o quê? Noivo e noiva?

23. Professor Valter: Coloca, hum, terno e vestido de noiva – que são os tipos de roupa que

eles usam.

Os dois excertos anteriores evidenciam as dúvidas dos estudantes Dora,

Raquel e Danilo sobre em que lugar, no material didático, deviam escrever

suas anotações e que palavras, exatamente, tinham de usar. Paralelamente, à

medida que o professor Valter escrevia a tradução do texto-base na lousa, a

ansiedade dos alunos parecia diminuir. Nossos parâmetros para essa análise

são a diminuição do fluxo interacional entre o professor e os estudantes e o

cumprimento, aparentemente simples, da tarefa. Este comportamento, em

particular, foi observado na primeira aula da turma 7º B. Nesse dia, enquanto o

professor Valter e as alunas Dora e Raquel comentavam a imagem impressa

no handout, quatro jovens, com, aparentemente, 18 a 20 anos, conversavam e

ouviam música, no fundo da sala. No momento em que o educador foi à lousa

e começou a traduzir o texto-base, esse grupo de estudantes passou a copiar o

registro do quadro em seus cadernos, deixando de conversar e de ouvir

música.

Parece-nos que, conforme os contornos da microestratégia se

aproximavam de uma aula convencional (isto é, a ação do professor era

centralizadora, na frente da turma, escrevendo na lousa, enquanto os alunos

copiavam a lição, passivamente), a ansiedade dos estudantes diminuía. Como

interpretar essas reações? De saída, não pretendemos responder a essa

pergunta de forma linear, amparados em um argumento supostamente infalível.

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201

A nosso ver, a relação microestratégia-efeito nos alunos, nesse caso

específico, apresentou um tipo de correspondência que, à luz do pensamento

freiriano (que, sabemos, inspirou grande parte das ideias de Kumaravadivelu

(2003, 2008, 2012)), não produz autonomia nem senso crítico. Entretanto,

como veremos em breve, isso não era algo despercebido pelo professor Valter.

Após a descrição do uso da microestratégia ligada à tradução e das

manifestações dos alunos frente a ela, é necessário tentar explicar os possíveis

porquês da prevalência dessa ação, em sala de aula. E, por prevalência,

frisamos que nosso parâmetro são as aulas a que assistimos. Nesse sentido,

identificamos três causas:

1. o legado da tradução no ensino de línguas estrangeiras;

2. a concepção de língua do professor-participante;

3. a compreensão do professor-participante sobre os encaminhamentos

pedagógicos do corpo docente da Escola Anísio Teixeira.

Sobre o legado da tradução, Leffa e Irala (2014) afirmam que a literatura

especializada tem apresentado o Método da Gramática e da Tradução como

algo datado, com raízes na Antiguidade e na Idade Média, mas

são recorrentes os trabalhos que apontam a atualidade de práticas pedagógicas que ainda se valem dessa perspectiva, especialmente no ensino formal e regular (LEFFA; IRALA, 2014, p. 23).

A partir desse argumento, não queremos dizer que o professor Valter

seguisse os ditames do Método Gramática e Tradução. Por outro lado,

entendemos que solicitar aos alunos que traduzam frases – como o nosso

participante propunha – é parte de uma prática escolar enraizada na lógica do

ensino informal.

Aliás, no que diz respeito a métodos de ensino, para não sobrepor nossa

intepretação às palavras do próprio participante, é relevante observar o que ele

escreveu sobre ser adepto (ou não) a algum método específico:

Page 204: Estratégias de ensino de Língua Inglesa e …...SATYRO, Diego. Estratégias de ensino de língua inglesa e afetividade na EJA: olhares múltiplos. 2018. 286 f.Dissertação (Mestrado

202

Protocolo interacional nº 23

Questionário 1 – Formulário para conhecer o perfil dos professores-participantes

Questão 29. Você é adepto de algum método para o ensino de língua inglesa? Comente sua

resposta.

Professor Valter: Não acredito que exista um método correto para estudar uma língua ou

qualquer tipo de conhecimento.

Do ponto de vista do professor Valter, não existe um método de ensino

eleito, conscientemente, para seu trabalho no contexto da EJA. No nosso olhar,

isso pode reforçar a leitura de que o legado da tradução como metodologia de

ensino136 de línguas estrangeiras é latente – e presente, neste caso - a

algumas práticas docentes. Além do mais, essa latência coincide com outra

característica oculta à microestratégia de ensino que temos focalizado: a

concepção de língua do educador.

Acreditamos que a concepção de língua do professor Valter acena para

o estruturalismo. Nessa visão, a língua é um “conjunto de estruturas sintáticas

e vocabulário” (PAIVA, 2012, p. 34). Para nós, a forma como a língua inglesa

foi apresentada aos alunos das turmas 7º A e 7º B poderia ser reduzida,

justamente, a estruturas sintáticas e a palavras isoladas, como vemos em “a

very tradicional wedding” (um sintagma nominal) ou “it was worth” (um

sintagma verbal). Sustentamos essa análise com os dados do protocolo

interacional nº 24:

Protocolo interacional nº 24

A concepção de língua e as expectativas dos alunos da EJA

(Entrevista nº 01 realizada com o professor Valter no dia 26 de outubro de 2016, na Escola

Anísio Teixeira)

01. Pesquisador: E você considera essa evasão um dos grandes desafios pra quem trabalha

com Educação de Jovens e Adultos? Assim, é difícil, como educador...

02. Professor Valter: É, porque a gente não sabe, né, por que ou o que é isso. A verdade é

aquela coisa assim: nós não sabemos a realidade social dessas pessoas. Não vivenciamos,

esse é o negócio [+++]. A gente não imagina o que esses caras passam. Então, é aí que eu

acho que está toda a problemática. Como a gente não sabe [a realidade do aluno], a gente não

136

Para Kumaravadivelu (2008), o método de ensino é sempre uma teoria; a metodologia de ensino, aquilo que é, efetivamente, posto em prática, no chão da sala de aula.

Page 205: Estratégias de ensino de Língua Inglesa e …...SATYRO, Diego. Estratégias de ensino de língua inglesa e afetividade na EJA: olhares múltiplos. 2018. 286 f.Dissertação (Mestrado

203

sabe como agir. Nas minhas aulas, eu tento [+] assim: fazer o máximo possível de diálogo, né,

tentar dialogar. [+] Obviamente, que isso é muito difícil, né? Mas eu tento ser o mais aberto, o

mais próximo possível pra dialogar. E, AO MESMO TEMPO, eu tento preencher as

expectativas deles de ter uma aula tradicional. Principalmente os mais velhos. Eles querem

uma aula tradicional. OS MAIS NOVOS também têm, mais ou menos, esse mesmo sentimento.

Eles [+], eles criticam a escola, porque ela fica dialogando muito. E, na verdade, eles não

querem isso. Eles querem uma aula mais tradicional. Por isso que eu faço esses

impressos. Tento fazer de uma forma mais formal possível, de forma que seja uma aula

meio que... BANCÁRIA, mesmo, digamos assim. Tipo bancária... Só que, como eles

querem ISSO, né, como eles querem muito isso, aí eu faço todo esse processo, mas eu tento

[+] fazer uma aula dialogada, de forma que, né, [o aluno] vai tentando [+++] ter uma ideia mais

geral sobre o idioma, de forma que eles tenham [+], comecem a ter um interesse mais

estrutural sobre [+++], sobre a matéria, né, sobre o inglês. É, mais ou menos, nesse

sentido que eu sempre tento ir, né. Que é [um trabalho] muito difícil. Eu acho que tem a ver,

também, com a [+++] situação NOSSA, mesmo, de professor, né? Não é fácil, né? Ou seja, a

gente tem [+++] uma situação difícil, tem uma PRESSÃO muito grande. Na verdade, é assim: a

escola toda, né, toda a questão do ENSINO, ela fica nas costas do professor e [+++] é difícil de

[+] negar isso, porque, na verdade, é assim: a gente aceita, também, a responsabilidade. Nós

estamos aqui pra isso. A gente aceita a responsabilidade de dar aula, né? Mas a verdade é

que precisa ter uma estrutura muito grande. Por exemplo: aqui, essa escola, eu acho até

bacana, porque tem aquela TV ali137

, aí você espeta o pen-drive ali e passo o vídeo que eu

quiser, entendeu? Então, eu sou aquele professor que vem toda hora aqui, no laboratório, pra

passar vídeo, pra comentar, pra dialogar sobre o texto, pra comentar sobre o assunto [+]. Eu

acho isso daí importantíssimo, mas, ao mesmo tempo, também, eu tento dar o máximo

possível de atividades escritas pra eles, porque eu acho importante, porque eles querem

atividade escrita, mas também querem é [+++], querem, mesmo, atividade escrita [+] ou seja,

eu sinto que eles querem dialogar também, mas NÃO MUITO! Se, por exemplo, você começa a

falar muito, FALAR, FALAR, eles não...138

Na fala do professor Valter, podemos detectar as marcas de uma

concepção estruturalista da língua. O educador reputa-a ao que ele entende

pelos interesses dos alunos da EJA. Esse dado pode ser comprovado por meio

dos excertos em negrito. Adicionalmente, é importante observar que, para o

professor-participante, o trabalho com as estruturas da língua – o que pode

justificar, em partes, a microestratégia analisada – é um desejo dos alunos. No

entanto, o educador reconhece, também, que “a gente não imagina o que

137

Neste momento, o professor apontou para uma tevê, dentro da biblioteca. 138

O professor fez um gesto com os ombros no sentido de descaso, como se os alunos ficassem entediados ou não valorizassem momentos de discussão mais demorados.

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204

esses caras [os alunos] passam”. Temos, nesse caso, um aparente paradoxo.

De um lado, ensinar as estruturas da língua inglesa é uma resposta às

vontades dos alunos; de outro lado, conhecer a realidade deles parece ser um

impedimento a escolhas mais refletidas sobre o quê e como ensinar a língua

estrangeira na EJA. De mais a mais, esse paradoxo pode ser reforçado por

meio de qualificadores como aula “tradicional” e “bancária” versus aula

“dialogada”.

Com o uso de “bancária”, o professor Valter mostra, ainda,

conhecimento sobre o jargão do pensamento freiriano, que serve de base às

Diretrizes Curriculares da EJA (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2012).

Entretanto, aqui, ele usa a ideia de aula bancária como algo, grosso modo,

necessário, na EJA, e não como um formato a ser evitado.

Talvez, uma explicação aceitável para o paradoxo citado há pouco (isto

é, o que os alunos da EJA parecem desejar versus o desconhecimento da

realidade concreta desses sujeitos) seja certo imediatismo na caracterização

desse grupo por parte do educador. Ele, por exemplo, parece ponderar sobre

algumas particularidades culturais do grupo de alunos com que trabalha.

Parece, também, interessado em ouvir os jovens e os adultos da EJA. No

entanto, entendemos que essa escuta, se não for atenta e discutida com os

próprios alunos (e, preferencialmente, com os outros professores), pode levar a

conclusões precipitadas, como acreditar que a “aula bancária” é um desejo real

dos estudantes e não a forma com que a maior parte deles foi familiarizada,

durante o processo de escolarização.

A propósito da compreensão do professor Valter sobre os desejos e as

vontades dos alunos da EJA, é possível observarmos a mesma perspectiva

interpretativa em outro protocolo interacional:

Protocolo interacional nº 25

Questionário 1 – Formulário da pesquisa Estratégias de ensino de língua inglesa no

Contexto da EJA

Questão 27. Que estratégias de ensino você mais usa em sala de aula? Cite e comente duas

delas. (Por exemplo: organizar os alunos em grupos e trabalhar com textos autênticos).

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205

Professor Valter: Na EJA, gosto de trabalhar com interpretação de textos. Os mais

avançados gostam e fazem com facilidade. Os menos avançados também gostam. É

possível trabalhar vocabulário de forma bem rudimentar.

Segundo o professor Valter, a interpretação textual, que, aqui, temos

entendido como tradução de texto não autêntico, é, assim como o estudo das

estruturas da língua estrangeira, uma suposta preferência dos alunos.

Chamamos, ainda, a atenção para a questão 27 do protocolo interacional nº

25. Por intermédio da relação pergunta-resposta, podemos cruzar os dados

produzidos, a partir da observação das aulas, com a autoavaliação do próprio

participante. Para ele, conforme lemos, o trabalho com interpretação/tradução é

uma microestratégia de ensino bastante usada em sua prática.

Em síntese, parece-nos que há uma correlação entre a microestratégia,

o legado de uma metodologia de ensino (a tradução), a concepção

estruturalista de língua e uma percepção sobre os interesses dos alunos da

EJA.

Finalmente, a terceira provável causa para o estabelecimento da

microestratégia traduzir um texto não autêntico, com auxílio de glossário é a

compreensão do professor-participante sobre os encaminhamentos

pedagógicos do corpo docente da Escola Anísio Teixeira. O protocolo

interacional nº 26 traz dados importantes para essa discussão:

Protocolo interacional nº 26

O trabalho com a leitura na perspectiva de metas da Escola Anísio Teixeira

(Entrevista nº 01 realizada com o professor Valter no dia 26 de outubro de 2016, na Escola

Anísio Teixeira)

01. Pesquisador: Você fez um comentário, também, durante a aula, sobre como trabalhar com

o texto, sendo um projeto da escola, né, como trabalhar com a interpretação de texto [+].

Então, existe, dentro do projeto político-pedagógico da escola, uma espécie de ênfase na

leitura, que parte da gestão e que todos os professores fazem parte desse projeto, ou é uma

ideia sua, [na disciplina] em língua inglesa?

02. Professor Valter: Não, isso foi uma discussão no último Conselho de Classe. E, o

Conselho decidiu, definiu, né, que [o aprendizado] estava muito FRACO, né, que eles [alunos]

não conseguiam escrever textos, eles não conseguiam obedecer comandos de interpretação

de texto, de [+++] leitura. ENTÃO, pra eles, é muito difícil, por exemplo, numa notícia de jornal,

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206

[+] não conseguir identificar uma notícia de jornal, o que estava escrito [+], no próprio texto, não

conseguir achar informação de texto. Então, aí, eu falei: bom [+], eu já VINHA fazendo isso,

desde o começo, né, no outro semestre, mas eu achei que é fundamental fazer esse tipo de

atividade. Eu falei: bom, vou continuar fazendo. Foi isso que é eu defendi na reunião do

Conselho, [a defesa] de que seria muito importante que se fizesse uma intervenção pra que

eles [+]. Porque, na verdade, é assim: o Conselho [+]. O que o Conselho estava discutindo?

Ele estava discutindo que eles [alunos] não sabiam é [+++] a questão da ORTOGRAFIA,

né, a questão-chave foi a ortografia. Então, eu falei: bom, então, melhor não é a questão de

treinar a ortografia em si, é treinar, né, [+] os gêneros textuais, e A PARTIR DOS gêneros,

aí você desenvolve a ortografia, desenvolve algumas palavras. Na hora que você gostar do

que você tá lendo, né, na hora que ele [aluno] entender o que tá lendo, aí ele vai começar a

desvendar a questão da ortografia.

Para o professor Valter, o trabalho com leitura integrava as metas da

Escola Anísio Teixeira, em 2016. Essas metas, aparentemente, buscavam

melhorar a escrita e a leitura dos alunos em língua materna. É importante

destacar que, para o professor-participante, sua prática já correspondia aos

propósitos do corpo docente (aqui, sintetizado na forma do “Conselho de

Classe”). Ainda que este estudo não seja sobre a formação em serviço de

professores dessa unidade escolar, percebemos que, na visão do educador,

seu trabalho estava, de fato, contribuindo para uma demanda da escola, e não

apenas das aulas de língua inglesa. Assim, podemos refletir sobre a relação

entre a parte (a aula de língua inglesa nas turmas 7º A e 7º B) e o todo (o

processo de ensino-aprendizagem da EJA, na Escola Anísio Teixeira).

Talvez, em alguma medida, o professor Valter tenha privilegiado a

microestratégia traduzir um texto não autêntico, com auxílio de glossário em

virtude da presença do texto em sala de aula. Em tese, o trabalho docente (em

equipe) dedicado a desenvolver habilidades leitoras e escritoras ajudaria os

alunos da EJA. No entanto, na fala do professor Valter (protocolo interacional

nº 26, turno 02), parece haver certa confusão entre os objetivos da ação

educativa. Afinal, qual era o foco desse trabalho coletivo: a ortografia, a

compreensão de enunciados em provas, o letramento ou o gosto pela leitura?

Com essa reflexão, não estamos afirmando que tais metas não eram

complementares ou que não nos pareçam importantes. Queremos dizer, no

entanto, que – apesar de sua boa vontade - a escolha microestratégica do

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207

professor Valter pode não ter sido totalmente refletida, em termos de

concepção de língua(gem) e de teorias sobre a didática da leitura e da escrita.

Diante dessa discussão, retomamos a seguinte fala desse participante

(presente no protocolo interacional nº 20):

Professor Valter: Acho que devemos abolir os textos padronizados, mas ainda não achei

uma forma de fazer isso. Os alunos deveriam aprender o idioma colaborando, e não

competindo.

Ao usar o verbo “abolir”, o professor Valter fez uma avaliação. Para ele,

os “textos padronizados” deveriam ser substituídos. Subjaz a essa informação

a ideia de que, para o participante, há a crença – ou o conhecimento, de fato –

de que outros materiais didáticos possam ser mais relevantes aos alunos (por

exemplo, os textos autênticos). No entanto, porque a crença ou o

conhecimento não levaram à mudança? Isto é: se o professor Valter avaliava

que, em sua prática docente, existiam elementos fora de sintonia com aquilo

que, em tese, poderia contribuir mais para a aprendizagem dos alunos (o que

reaparece em “os alunos deveriam aprender o idioma [,] colaborando”), por que

ele não agia diferentemente? Para tentar responder a essa questão,

retomamos um argumento de Celani (1998). Segundo a linguista aplicada,

a mudança não é um objeto material ou um processo fora de nós, esperando para ser descoberto. A mudança é como nós a entendemos [...] (CELANI, 1998, p. 140, grifos nossos).

Conjeturamos que, para o professor Valter, a mudança era algo distante,

àquele momento. Além dos riscos inerentes a qualquer transformação, havia,

para ele, outro dificultador: a própria barreira pessoal. Mudar não exige apenas

um desejo, mas, também – e, talvez, acima de tudo – a busca por novas rotas,

por novos planos (de estudo, de trabalho e, até mesmo, de autoconhecimento),

por diferentes formas de ensinar-aprender.

Por fim, em retrospecto, ao ler todos os dados referentes a este caso,

consideramos que, para o professor Valter, a ênfase na tradução não lhe

parecia ideal ou preferível. Entretanto, naquele momento, era o caminho que

ele havia encontrado para ensinar inglês a alunos jovens e adultos. Ao

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208

contrapor o feito e o desejado, esse participante nos levou ao seguinte dado: o

uso de uma microestratégia – mesmo que se trate de uma ação frequente –

não revela, por si só, o que um professor julga ser mais adequado. Pode

revelar, na verdade, aquilo que o professor sabe fazer, em um contexto

específico.

3.2 As estratégias de ensino nas vozes dos professores

Neste trabalho, conforme explicamos no sessão metodológica, há um

levantamento neste estudo de caso coletivo. Baseados em Yin (2015),

entendemos que o uso de métodos múltiplos pode nos ajudar a compreender

os fenômenos que têm motivado esta investigação; em especial, pode nos

auxiliar a responder à primeira pergunta de pesquisa: que estratégias de ensino

são usadas pelos professores de língua inglesa, no contexto da EJA, em

turmas de Ensino Fundamental 2, na rede municipal de São Bernardo do

Campo?

Parte desse questionamento foi respondida nas subseções anteriores.

Entretanto, a nosso ver, as estratégias de ensino apresentadas e discutidas,

anteriormente, podem corresponder a uma fração muito pequena do inventário

de estratégias didáticas já usadas pelos professores-participantes, na EJA. A

esse respeito, vejamos um quadro-resumo das estratégias que observamos no

chão da sala de aula, em outubro, novembro e dezembro de 2016:

Quadro 7 - Inventário das microestratégias de ensino observadas em sala de aula

Microestratégia Termo em que a

microestratégia foi

usada

Professor-

participante

Informar os alunos sobre o objetivo de

aprendizagem da aula

8º Eliane

Solicitar aos alunos que criem frases a partir

de flash cards com imagens

8º Eliane

Criar momentos em que um aluno fale “em

cima da fala” de outro aluno

8º Eliane

Construir glossários (inglês-português) com

a ajuda de flash cards

5º e 7º Giovanna

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209

Quadro 7 - Inventário das microestratégias de ensino observadas em sala de aula

continuação

Solicitar aos alunos que relacionem palavras

em língua inglesa com imagens, contextos

de uso ou palavras traduzidas para a língua

portuguesa

5º, 7º e 8º Giovanna

Conectar o ensino da língua inglesa à

concepção de educação da escola e da

Secretaria de Educação em que alunos e

professores estão inseridos

5º e 8º Giovanna

Traduzir um texto não autêntico, com auxílio

de glossário

7º Valter

Fonte: Elaborado pelo autor, julho de 2018.

Para conhecer outras estratégias didáticas que, em campo, não

pudemos observar, aplicamos aos três participantes um questionário com 116

microestratégias listadas. Lembramos que esse catálogo de possíveis ações do

professor de língua inglesa foi planejado, majoritariamente, a partir do nosso

referencial teórico (KUMARAVADIVELU, 1994, 2003) e complementado, ao

final, por 24 microestratégias ligadas à macroestratégia 11, refletir sobre a

afetividade (cf. o Apêndice B). Estas foram pensadas (e testadas), com base no

cotidiano do pesquisador, que também é professor na EJA.

As informações produzidas a partir desse questionário (que, aliás, serviu

como mediador para uma entrevista gravada com cada um dos participantes)

serão apresentadas em gráficos organizados por dois eixos: o eixo das

microestratégias e o eixo das macroestratégias.

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210

Gráfico 1 - Levantamento de microestratégias assinaladas por cada professor-participante da pesquisa

Fonte: Elaborado pelo autor, maio de 2017.

Como se pode verificar, de modo geral, os três participantes apontaram

que já tinham usado a maior parte das microestratégias catalogadas. A média

de respostas afirmativas é de 81,6%. Nenhum deles apresentou uma conduta

anômala. Chamam nossa atenção as informações geradas a partir das

respostas do professor Valter. Durante a aplicação do questionário, ele se

mostrou adepto ao uso de 92% das microestratégias disponíveis no

instrumento de pesquisa.

O que podemos deduzir desse cenário? Com base nos apontamentos

dos professores – confirmados por meio de entrevistas -, depreendemos

dessas respostas o seguinte dado: segundo os próprios educadores, as

estratégias didáticas usadas, no contexto da EJA, eram diversificadas.

Antes de prosseguirmos, para evitar confusões, é necessário deixar isto

claro, mais uma vez: o questionário usado para produzir essas informações

limitou as respostas dos professores a duas alternativas: sim e não.

Consequentemente, as afirmações que, aqui, estamos fazendo não dizem

respeito à tipicidade ou à atipicidade do uso das 116 microestratégias, mas,

sim, a um uso já feito, no território da EJA.

Daqui em diante, é necessário observar como essa mencionada

diversidade no uso de estratégias de ensino se manifesta em termos de

macroestratégias:

81% 72%

92%

19% 28%

8%

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

100%

Sim Não

Professora Eliane Professora Giovanna Professor Valter

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211

Gráfico 2 - Levantamento de macroestratégias assinaladas pelos três professores-participantes da pesquisa

Fonte: Elaborado pelo autor, maio de 2017.

Em linhas gerais, coerentemente com as informações apresentadas no

primeiro gráfico, os professores-participantes indicaram já ter feito uso de todas

as macroestratégias. Olhando para o gráfico 02, no entanto, dois pontos

chamam nossa atenção: a maior adesão dos educadores ficou concentrada na

macroestratégia 11, refletir sobre a afetividade; e a única distorção – quer dizer,

houve mais respostas negativas do que afirmativas – ocorreu com a

macroestratégia 04, ativar a intuição heurística.

Com essa dimensão quantitativa à frente, especulamos por que houve

diferenciação nas marcações, justamente, dessas duas macroestratégias. Em

primeiro lugar, o índice de 92% de respostas afirmativas para a

macroestratégia 11 acena para a importância da afetividade nos modos de agir

dos professores da EJA – algo que suspeitávamos ser muito importante para

67%

81% 83%

42%

80%

70% 72%

82% 83% 88%

92%

33%

19% 17%

58%

20%

30% 28%

18% 17% 13%

8%

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

100%

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11

Sim Não

Legenda:

Macroestratégia 1: Maximizar as oportunidades de aprendizagem Macroestratégia 2: Facilitar a interação negociada Macroestratégia 3: Minimizar desencontros perceptuais Macroestratégia 4: Ativar a intuição heurística Macroestratégia 5: Estimular a conscientização linguística Macroestratégia 6: Contextualizar input linguístico

Legenda (cont.): Macroestratégia 7: Integrar habilidades linguísticas Macroestratégia 8: Promover a autonomia do aluno Macroestratégia 9: Aumentar a consciência cultural Macroestratégia 10: Garantir a relevância social Macroestratégia 11: Refletir sobre a afetividade

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212

este estudo, mas que não sabíamos se seria pertinente aos participantes. De

certa forma, essa informação parece garantir a pertinência desse tema.

Quanto à macroestratégia 04, ativar a intuição heurística, parece-nos

menos linear a relação entre o que já havia sido feito – em algum momento,

ressaltamos - e a importância dada a isso. Afinal, ao tratar dessa

macroestratégia, Kumaravadivelu (2003) apresenta ações que potencializam o

ensino de gramática de língua inglesa. Para interpretar essa informação, é

preciso recuperar isto: no questionário, há algumas microestratégias criadas

por nós, pesquisadores. À época da produção dos dados, fizemos algumas

intervenções, porque buscávamos saber se o contraponto à teoria de

Kumavaradivelu (1994, 2003) encontraria alcance na prática de um dos nossos

participantes. Aparentemente, temos um caso como esse. Tanto a professora

Eliane quanto a professora Giovanna marcaram sim na seguinte

microestratégia: “explicitar, em detalhes, regras gramaticais da língua inglesa

(por exemplo: quando o sujeito da frase for a terceira pessoa do singular, no

simple present, usa-se does, não do, como verbo auxiliar)”.

A premissa de Kumaravadivelu (2003) é a de que o professor pode criar

um ambiente linguístico rico e, assim, ativar a heurística dos alunos. Como

resultado, de forma natural, os estudantes poderão deduzir as regras

gramaticais que governam o funcionamento sintático da língua-alvo. Esta lógica

é exatamente o oposto ao que as duas professoras assinalaram. Aliás, vimos

essa microestratégia ser posta em ação durante as aulas da professora Eliane,

na Escola Anísio Teixeira. Dito isso, parece-nos coerente que os participantes

não tenham relacionado suas ações em sala de aula às opções do formulário,

com a mesma regularidade, na ocasião da macroestratégia nº 04.

Por fim, talvez, julgamos necessário fazer um exercício de comparação

entre parte dos dados qualitativos já apresentados e os dados quantitativos

deste estudo. Acreditamos que essa comparação pode levar à seguinte

interpretação: há uma distância entre o dito e o feito, em sala de aula. Em

outras palavras, o que pudemos observar – e que, parcialmente, já

compartilhamos – pode não denotar diversidade, em termos de estratégias de

ensino, o que contraria a lógica apresentada pelos participantes por meio de

suas respostas ao Questionário 02.

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213

A respeito dessa linha interpretativa, primeiramente, sabemos que ela

encontra lugar em nosso referencial teórico. Na LA, Kumaravadivelu (2008) e

Oliveira, L. A. (2014) já trataram desse problema em diferentes cenários de

aprendizagem (aulas de língua inglesa em universidades norte-americanas e

em centros de idiomas brasileiros, respectivamente). Freire, P. (2017) tocou,

também, nesse tema, mas na perspectiva das práticas escolares de modo

geral. Dito isso, consideramos essa leitura legítima. No entanto, não nos

fixamos nela.

A nosso ver, é injusto garantir que há distância entre o feito (durante

duas ou três aulas) e o dito. Em jogo, há um parâmetro de tempo desigual (isto

é, o tempo da pesquisa em campo não pode ser comparado ao tempo de

vivência dos participantes na EJA). Por isso, consideramos que todos os dados

importam e, nem por isso, aprisionam a realidade ou conduzem a uma verdade

definitiva.

3.3 Afetividade na sala de aula

O levantamento de macroestratégias e de microestratégias que fizemos

com os professores-participantes confirmou uma de nossas asserções, desde a

etapa de protocolo de pesquisa: para trabalhar com jovens, adultos e idosos da

EJA, é preciso refletir sobre o papel da afetividade. A partir deste ponto, esse

será o tema central da nossa discussão.

Para apresentar os dados, retomamos os procedimentos de análise

apontados na subseção 2.4.2. Isso significa que nosso trabalho de análise

partirá de categorias, cuja ordem de apresentação seguirá o seguinte critério:

primeiramente, o que observamos em sala de aula; depois, o que ouvimos dos

participantes sobre a afetividade nas aulas de língua inglesa da EJA.

3.3.1 Os pequenos nadas

Conforme já expusemos na fundamentação teórica, para Freire, P.

(2002), a afetividade pode surgir, em sala de aula, de formas singelas, como

um gesto ou um sorriso. A esse tipo de manifestação da afetividade, damos o

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nome de pequenos nadas. Com essa expressão figurada, queremos realçar a

importância de algumas ações despretensiosas, mas cujo efeito – na relação

professor-aluno - pode ser bastante positivo. No nosso olhar, os pequenos

nadas contribuem para o equilíbrio da temperatura afetiva, um conceito da

psicogenética walloniana. Isso significa que um sorriso, por exemplo, pode ser

uma afecção capaz de mudar o estado emocional das pessoas em uma

realidade concreta, durante uma atividade (como ensinar e aprender inglês, na

EJA).

Aliás, o sorriso e o riso já foram indicados em algumas cenas descritas

neste trabalho. A título de exemplo, citamos os protocolos interacionais nº 05 e

nº 08 (caso da professora Eliane), nº 10 (caso da professora Giovanna) e nº 19

(caso do professor Valter). Em todos esses episódios, vemos como a reação

dos participantes (sob a forma de um sorriso) à fala de algum aluno facilitou a

interação – e, não nos esqueçamos de que interagir, aqui, é estar em um

caminho de aprendizagem.

Além do sorriso, destacamos, a seguir, outras manifestações de

pequenos nadas que podem ilustrar nosso ponto de vista:

Protocolo interacional nº 27

Episódio 01 – O olhar micro da professora e o pequeno nada sob a forma de

reconhecimento

(Aula na turma 8º A, na Escola Anísio Teixeira, no dia 10 de novembro de 2016. Há 15 alunos

na classe. Trata-se de um grupo intergeracional. Numericamente, predominam os jovens em

relação aos adultos. Neste momento, a professora Eliane acabou de escrever, na lousa, seu

objetivo de aprendizagem para aquela aula.)

01. Professora Eliane: Dá um tempinho! Just a little. Please! Presta atenção só um pouquinho,

aqui. (A professora olha para uma aluna sentada na primeira carteira, em frente da lousa. A

aluna é jovem, com, aproximadamente, 20 anos). Oi, Gabi, há quanto tempo, né? Você

voltou a estudar de novo? E, agora tá tudo bem? (A educanda balança a cabeça,

afirmativamente.) Isso que é importante!

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Protocolo interacional nº 28

Episódio 02 – O pequeno nada sob a forma de elogio

(Aula na turma 5º A, na Escola Darcy Ribeiro, no dia 08 de novembro de 2016. Há quatro

alunos na classe.)

01. Professora Giovanna: Vamos escrever na lousa, pra praticar a escrita do português,

também. Vamos? Então, vem, Rosália, você que tem uma letra bonita.

02. Rosália: Eu?

03. Professora Giovanna: É. Vem (sorrindo). Vem, aqui, escrever a tradução. Escolhe uns

dois ou três [substantivos]. Vem.

(Rosália parece estar bastante tímida.)

04. Professora Giovanna: Vem. Tem todas as fotinhos, aqui.

(Rosália vai à lousa, ao lado da professora.)

05. Rosália (falando diretamente com a professora): Escreve o quê?

06. Professora Giovanna (sorrindo): Store – é o quê?

07. Rosália: Loja.

08. Professora Giovanna: Isso. E, video?

09. Rosália: Vídeo.

10. Professora Giovanna: Então, você pode falar loja de vídeos ou LO-CA...(esperando que

Rosália complete a palavra não terminada)... LO-CA-DO-RA.

Em nosso entendimento, os pequenos nadas surgiram nas cenas

descritas acima. No protocolo interacional nº 27, existe um pequeno nada no

reconhecimento da presença de uma aluna, “Gabi”. Embora estivesse ausente

por muitas aulas durante o semestre, ao retornar à escola, a professora

Giovanna percebeu-a e mostrou se importar com a estudante. A esse respeito,

lembramos que o absenteísmo e a evasão escolar são sintomáticos na EJA.

Podemos comprovar esse dado na realidade concreta da nossa investigação.

Assistimos a oito aulas, em sete turmas diferentes, em duas escolas. Em todas

elas, o número de alunos matriculados variava de 20 a 30 estudantes por

classe. No entanto, o número máximo de educandos presentes que pudemos

constatar foi 15 (turma 8º A, na Escola Anísio Teixeira), o que representa, em

média, 50% de assiduidade139.

139

Esse dado encontra correspondência na pesquisa feita pelos linguistas aplicados Prado, Lange, Schlatter e Garcez (2014). Ao pesquisarem o ensino de língua inglesa na EJA, em uma escola da rede estadual do Rio Grande do Sul (RS), os pesquisadores afirmam: “[...] Essa turma [“T6A, uma das duas turmas de EJA na última etapa do Ensino Fundamental] representava todo o universo complexo e diverso que é uma turma de EJA: bastante heterogênea e com grande número de alunos evadidos ao longo do semestre. No caderno de

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Acreditamos que, se a aluna “Gabi” – e, aqui, chamamos a atenção para

o uso do apelido, no lugar do nome próprio, feito pela professora Eliane –

estivesse desmotivada e, por isso, ausente em muitas aulas, a atitude da

educadora pode ter causado uma afecção positiva na estudante.

No protocolo nº 28, o pequeno nada emergiu sob a forma de um elogio.

Neste ponto, é necessário deixar claro o seguinte: o elogio feito pelo professor

a um aluno não é um achado desta pesquisa, ainda que o apresentemos em

um quadro teórico específico. A nosso ver, trata-se de algo, provavelmente,

comum à sala de aula, em diversos níveis e contextos educacionais. Dito isso,

por que, então, partilhar esse episódio? Entendemos que o elogio da

professora Giovanna à caligrafia de Rosália (turno 01) tenha sido o mecanismo

encontrado pela educadora para engajar a estudante em uma tarefa.

Reparamos que Rosália, uma mulher com aproximadamente 40 anos, em uma

sala de 5º termo – um indício de que ela esteve afastada dos bancos escolares

por muito tempo –, se surpreendeu com o elogio (turno 02). Como resultado, a

aluna ganhou coragem e foi à lousa, conforme a professora havia lhe pedido.

À identificação de pequenos nadas, somamos outro dado: em termos

comparativos, os participantes deste estudo que sabiam os nomes (e, até

mesmo, alguns apelidos) dos estudantes tinham mais facilidade em engajá-los

em uma tarefa. Lendo todos os episódios de sala de aula, percebemos que

Eliane e Giovanna sempre se referiram a seus alunos por meio dos nomes

próprios deles. Já em relação ao professor Valter, em nossa amostragem, não

encontramos nenhum turno de fala em que ele tenha se dirigido a qualquer

estudante por meio de nome próprio.

Para Freire, P. (2017), chamar um aluno pelo nome dele é parte do agir

intencional do professor. Em nossa cultura, o nome próprio compõe a

identidade das pessoas e, por isso, em termos de relação humana e de ação

educativa, não é bom que isso seja tratado como um mero detalhe. Em outras

palavras, não queremos dizer que o professor deixou de interagir com seus

alunos, já que não lhes chamou pelos seus nomes. No entanto, talvez, eles se

chamada constavam os nomes de 45 alunos matriculados. No entanto, apenas 20 foram frequentes durante a realização do projeto (19 dos alunos da lista nunca compareceram a nenhuma das aulas, e os outros seis compareceram a uma ou duas aulas)” (PRADO; LANGE; SCHLATTER; GARCEZ, 2014, p. 145, grifos nossos).

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sentiriam mais reconhecidos pelo educador, se esse pequeno nada estivesse

presente na interação.

3.3.2 A relação professor-alunos

Conquanto o foco deste estudo sejam as ações dos professores-

participantes no chão da sala de aula, durante a investigação, à medida que

aprofundávamos a revisão bibliográfica, fomos percebendo a importância da

relação professor-alunos. Para nós, apoiados em Wallon (1995), a afetividade é

um fenômeno interpsíquico. Na psicogenética walloniana, as emoções, os

sentimentos e as paixões não são produzidos pela mente, sem a participação

do meio, isto é, sem a interação com o outro e com a cultura.

Consequentemente, o domínio ou o conjunto da afetividade, responsável por

parte das nossas funções psíquicas, não dispensa, em momento algum, as

relações que construímos.

Por isso, é relevante olhar para a questão dos vínculos afetivos entre as

professoras Eliane e Giovanna e seus alunos, em dois episódios de sala de

aula:

Protocolo interacional nº 29

Episódio 03 – O bom humor na relação professor-aluno

(Aula na turma 8º A, na Escola Anísio Teixeira, no dia 10 de novembro de 2016. Há 15 alunos

na sala. Neste momento, a professora Eliane começa a andar pela sala de aula, confirmando

se os educandos estão copiando o conteúdo da lousa. De imediato, ela vai diretamente para o

fundo da classe, onde João está rindo. Ele parece antever que a professora vai checar o

caderno dele.)

01. Professora Eliane: Pode copiar, viu, moço.

(João dá risada, mais uma vez.)

02. Professora Eliane (falando especificamente com João): Você me fez andar até aqui [o

fundo da sala], só pra [eu] mostrar meu “modelito” pras câmeras? (A professora balança a

cabeça em negação, como parte da brincadeira) Eu vim ver se você estava copiando.

03. João (sorrindo): Vixi, sou tão importante?

04. Professora Eliane (vistando outros cadernos, mas, ainda, interagindo com João): Lógico,

sua participação, sua presença, tudo [é importante]!

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Protocolo interacional nº 30

Episódio 04 – A alegria na relação professor-aluno

(Aula na turma 8º A, na Escola Darcy Ribeiro, no dia 08 de novembro. Há 11 alunos na sala.

Enquanto eles fazem exercícios, Rodrigo, que é bastante jovem, pede ajuda à professora.)

01. Rodrigo: Professora, vem aqui.

02. Professora Giovanna (sorrindo): Teacher, come here, please.

03. Rodrigo (rindo): É o quê?

(Alguns alunos começam a rir, ao ver esta interação entre a professora e o colega de sala.)

04. Professora Giovanna (repetindo): Teacher, come here.

05. Rodrigo: Teacher, come here.

(Alguns alunos comemoram a repetição bem-sucedida de Rodrigo, aplaudindo-o.

Professora e aluno cumprimentam-se com um toque de mãos.)

Em nosso entendimento, uma característica partilhada pelas professoras

Eliane e Giovanna é a capacidade de criar, na classe, um ambiente com

temperatura afetiva equilibrada. No protocolo interacional nº 29, por exemplo,

a professora Eliane estava interessada em acompanhar o trabalho de João, um

jovem que, durante a observação da aula, nos chamou a atenção devido à sua

conduta. João andava pela sala pedindo lápis e caneta emprestados a outros

alunos, enquanto a professora Eliane tentava explicar a conjugação de verbos

no presente simples. Por isso, quando a vimos se aproximando desse aluno

em particular, prevíamos que ela tivesse de dar uma bronca nele. O que vimos,

entretanto, foi, sim, uma verificação, mas embalada por bom-humor (turno 02).

Além de fazer uma brincadeira, a professora motivou João a fazer o exercício

proposto por ela. Daquele ponto em diante, sua conduta mudou. João deixou

de perambular pela sala e ficou mais concentrado na tarefa de língua inglesa

do que em conversas paralelas.

No protocolo interacional nº 30, vemos, em outro contexto, como a

afetividade sob a forma de uma brincadeira entre professora e alunos

contribuiu para a temperatura afetiva da turma. Nesse caso, cabe, aqui, uma

nota: Rodrigo chegou atrasado à sala. Ele estava dentro da escola, no pátio,

enrolando para começar a aula de língua inglesa. Sabemos disso, porque,

assim que entramos na classe da turma 8º A, na Escola Darcy Ribeiro,

algumas alunas fizeram esse comentário à professora Giovanna. Como

resultado do atraso, Rodrigo pareceu não entender o que tinha de fazer.

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219

Apesar da demora do estudante em chegar à sala (algo que voltaremos a

abordar, adiante), a professora quebrou o gelo e fez uma brincadeira, ao pedir

a ele que falasse com ela em inglês (turno 02). O efeito dessa brincadeira

contagiou o grupo, como vemos no comentário entre parênteses, no final do

episódio.

Contágio emocional é outro conceito importante na psicogenética

walloniana. Para Wallon (1995), determinadas emoções tendem a ser

transmitidas de pessoa a pessoa. Essa transmissão ocorre, porque somos,

como membros da espécie humana, afetados uns pelos outros – quer

desejemos isso ou não. Além disso, as emoções, os sentimentos e as paixões,

segundo a psicogenética walloniana, têm plastificidade, isto é, são

identificáveis no nosso tônus corporal. Por isso, em uma sala de aula, o bom

humor e a brincadeira entre um professor e um aluno podem contagiar,

positivamente (nesse caso), outros alunos da mesma turma. Esse construto

teórico nos parece exemplificado pelo protocolo interacional nº 30.

No contexto específico da EJA, as relações professor-alunos são

fundamentais para que os jovens, os adultos e os idosos dessa modalidade

possam acreditar no papel transformador da escola e da educação. Como

Arroyo (2011) nos questiona: diante da dureza da vida desses sujeitos, é justo

oferecer-lhes dureza, também, no convívio escolar? Muitas vezes, parte dessas

pessoas, na infância, não teve acesso a uma escola alegre, colorida e

calorosa. Quando chegam à EJA, porque estão mais velhas, não encontrarão

alegria ou certo colorido nem mesmo nas relações que podem construir com

seus professores?

Dada a importância dessa relação, é preciso explicar por que não

evidenciamos este dado, especificamente, com episódios das aulas do

professor Valter. Em nossa amostragem, não localizamos cenas que pudessem

exemplificar uma temperatura afetiva equilibrada nas aulas desse educador.

Com isso, não queremos dizer que há registros (sonegados, nesta pesquisa)

de desarmonia entre o participante e seus alunos. No entanto, não vimos ações

– e, por conseguinte, reações dos alunos – que pudessem mostrar como uma

brincadeira ou o bom-humor do professor tivessem engajado algum estudante

a participar da tarefa proposta. Não vimos, também, cenas de contágio

emocional de sentimentos como alegria ou entusiasmo.

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Julgamos que há distintas linhas interpretativas para explicar por que

vimos diferenças entre a afetividade produzida pelo professor Valter e por seus

alunos e a afetividade criada140 nos contextos das professoras Eliane e

Giovanna. No nosso olhar, algumas possíveis interpretações são nossa

subjetividade, a questão organizacional da jornada de trabalho do participante

e, como veremos adiante, a formação docente – tópico que será abordado

apenas no fim desta seção.

Porque este estudo é sumamente qualitativo, a reflexividade é latente.

Não podemos separar, com total perícia, o objeto de pesquisa dos sujeitos da

pesquisa. Em outras palavras, o que entendemos por afetividade interfere na

forma como olhamos (e avaliamos) esse fenômeno. Assim, intuímos, de forma

geral, que não havia vínculos entre o professor Valter e seus alunos, nas

turmas 7º A e 7º B. Os sinais dessa ausência de vínculos aparecem nos

estudantes. Comparativamente, em retrospecto, nos protocolos interacionais nº

29 e nº 30, podemos perceber como o bom-humor e a alegria aconteciam

numa espécie de via de mão dupla. Esses afetos foram interpretados pelos

alunos, que reagiram, positivamente, às afecções das professoras. Esse

retorno afetivo não emergiu nos nossos dados, no que diz respeito ao caso do

professor Valter.

No entanto, em contrapartida a essa suposta ausência de vínculos

afetivos, fazemos uma observação: em 2016, o professor Valter,

diferentemente das professoras Eliane e Giovanna, trabalhava em três escolas

da rede municipal. Ele ia, repetimos, à Escola Anísio Teixeira apenas uma vez

por semana. Das reuniões pedagógicas, participava somente dos Conselhos

de Classe. O que isso pode impactar no contexto específico da sala de aula?

Interpretamos que a ausência de vínculos entre o educador e seus alunos pode

140

Talvez, seja importante questionar o uso que, aqui, fazemos da metáfora da produção ou da criação da afetividade. Conforme já explicitamos, essa imagem é resultado da nossa leitura de Freire, P. (2002). No entanto, lembramos que, para Wallon (2002), o conjunto da afetividade é, de certa forma, herdado biologicamente. Em outras palavras, já nascemos capazes de produzir e de receber afecções, que, inicialmente, tomam a forma das emoções (como sentir fome ou frio). Disso, resulta a questão: os entendimentos desses autores sobre a origem da afetividade não se contradizem? A nosso ver, para Wallon (1995), numa perspectiva de desenvolvimento humano, a afetividade ganha novos contornos e sentidos, ao longo da vida. Esses traçados sucedem a diferentes interações entre organismo e meio. E, nesse ponto, há convergência total entre o que Freire, P. (2002) e Wallon (1995) postulam. Para ambos, os afetos são produzidos a partir de situações concretas, inseridas na cultura – como a sala de aula de língua inglesa.

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221

repercutir a falta de ligação afetiva entre ele e a escola onde produzimos os

dados. Essa lógica interpretativa incide, portanto, na relação parte-todo. Se não

há na macroestrutura (escola-professor ou professor-escola) um vínculo

afetivo, pode ser pouco provável que ele exista na microestrutura (professor-

alunos ou alunos-professor). Lembramos que a professora Eliane atuava,

também, na Escola Anísio Teixeira; porém, em todos os dias da semana, sem

precisar, então, se dividir entre uma escola e outra.

Com base em Oliveira, L. (2012a), em uma pesquisa sobre afetividade,

na perspectiva da psicogenética walloniana, é necessário colocar-nos no lugar

dos participantes. Quando nos imaginamos na posição do professor Valter, isto

é, trabalhando em diferentes escolas; participando, de forma fragmentada, de

reuniões de trabalho coletivo; lidando com identidades escolares diferentes em

uma mesma rede de ensino, parece-nos provável que ele tivesse dificuldades

em estabelecer e/ou fortalecer os vínculos afetivos nessas três instituições.

No que se segue, antes de ouvirmos/lermos o que os professores nos

disseram sobre o papel da afetividade nas aulas de língua inglesa da EJA, é

preciso deixar claro o seguinte: as relações entre os participantes e seus

alunos não eram facilmente estabelecidas. Por mais que essa afirmação

pareça óbvia, queremos, com ela, reforçar que o contexto de trabalho desses

três educadores era desfavorável, em certos aspectos, à construção de

vínculos com os estudantes.

Entendemos que, para haver um elo entre professor e alunos, há duas

condições básicas: disposição (para ensinar e para aprender) e frequência

escolar. A respeito do absenteísmo permanente dos alunos da EJA, já fizemos

alguns comentários de natureza quantitativa. O protocolo a seguir ilustra como

esse problema pode instalar certo mal-estar, ou seja, um clima afetivo negativo:

Protocolo interacional nº 31

Episódio 05 – Os conteúdos escolares e o absenteísmo dos alunos

(Aula na turma 8º C, na Escola Anísio Teixeira, no dia 27 de outubro de 2016. Há seis alunos

na sala. Neste momento, início da aula, a professora Eliane acabou de escrever, na lousa, o

objetivo de aprendizagem.)

1. Professora Eliane: Good evening, again, de novo, pra vocês. Eu fico muito triste, porque

vocês... a gente vai NA SEQUÊNCIA. A gente já viu textos no present continuous, no future,

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e, agora, a gente vai falar, um pouquinho, sobre o present simple. Só que essa BASE, eu

preciso que, depois, vocês peguem com os colegas de vocês, [e] COPIEM, okay? E, TRAGAM.

Mas, hoje, a gente vai falar de um assunto novo, então, dá pra vocês pegarem. Eu tô SEM

atividade de vocês. NENHUMA [atividade]. E, olha, essa é a sala [em] que eu entrei MENOS.

Só temos DUAS atividades. Uma avaliação e uma atividade que a gente fez das Olimpíadas.

Então, eu preciso muito que vocês não faltem!

2. Márcia: Então, dá uma avaliação pra gente!

3. Professora Eliane: Mas eu preciso que vocês tenham, NO MÍNIMO, o conteúdo no

caderno. Porque como vocês sabem, a minha avaliação é sempre com consulta, MAS não dá

pra olhar no celular. Tem que ser [conteúdo] escrito no caderno.

4. Márcia (aparentemente irritada): Mas não tem como, professora! Ninguém tem o

caderno [completo]!

5. Professora Eliane: Tem. O Marcos tem [o caderno completo].

6. Márcia: Qual Marcos?

7. Professora Eliane: O Marcos que senta próximo da Anália. (Repetindo) O Marcos tem. O

Tiago, que senta aqui (aponta para a primeira carteira, à frente dela), tem. Tá bom? Então, vai

juntando, aí, os pedaços, pra que vocês possam ter o conteúdo, all right?

O episódio acima ilustra uma situação que nos parece bastante

frequente, no contexto da EJA. Nosso parâmetro avaliativo é a experiência do

pesquisador, como professor dessa modalidade, e algumas aulas deste estudo

a que assistimos. Em síntese, a professora Eliane fez um pedido aos alunos

(turno 01): atualizar os cadernos. Sem isso, ela não teria condições de,

formalmente, avaliá-los. Entendemos que Márcia, uma aluna jovem, se irritou

com o pedido da professora (turno 04), apesar de ele nos parecer ético – afinal,

nos parece justo que a professora pudesse verificar os registros que os alunos

tinham feito nas aulas de língua inglesa. A irritação de Márcia foi causada pelo

seu provável absenteísmo. Com o excesso de faltas, a aluna percebeu o

seguinte problema: sua aprendizagem estava fragmentada e,

consequentemente, sua promoção para o ensino médio, em risco.

Reparamos, ainda, nos encaminhamentos que partem dos dois lados: a

professora (no final de outubro, provavelmente, às vésperas do Conselho de

Classe) solicitou aos alunos faltosos que copiassem “as anotações dos outros

colegas”; Márcia, por sua vez, pediu à educadora que aplicasse uma prova,

indicando que, para ela (Márcia), conjeturamos, o importante era produzir um

instrumento de avaliação e não aprender os conteúdos escolares.

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223

Notamos que, não obstante a animosidade de Márcia, a professora

Eliane conseguiu, durante a aula, equilibrar a temperatura afetiva. E,

conseguiu, também, envolver essa aluna na microestratégia que havia

planejado usar. Para comprovar isso, remetemo-nos ao protocolo interacional

nº 02, nesta seção.

Além do absenteísmo, há outro problema relacionado ao tempo, em sala

de aula, para que professor e alunos convivam – e construam vínculos afetivos:

os atrasos dos estudantes. Esse dado surgiu em cinco das sete turmas141, nas

duas escolas, em que conduzimos este estudo. Em números, isso representa

um índice de 72% das aulas analisadas. Qual é, possivelmente, a implicação

dos atrasos (que variaram de dez a 40 minutos – o que equivale a mais de dois

terços da aula)? Quando esses alunos chegam à classe, sentem-se perdidos.

Intuímos que esse sentimento possa afetar o autoconceito desses

jovens e adultos como aprendizes de uma língua estrangeira. Em outras

palavras, ao sentirem-se perdidos, eles podem se aperceber menos aptos a

aprender a língua inglesa, o que sabemos não ser verdadeiro. No entanto, com

foco na afetividade, entendemos que esse comportamento – e seus

desdobramentos no cotidiano da EJA – pode atingir as relações professor-

alunos e, em consequência, o processo de ensino-aprendizagem.

A título de fundamentação teórica, fazemos, aqui, um reforço às palavras

de Scheyerl (2009), que escreveu sobre o ensino de língua inglesa na EJA, em

escolas públicas e noturnas. De acordo com essa pesquisadora, os atrasos

constantes dos alunos dessa modalidade podem prejudicar o processo de

ensino-aprendizagem.

Diante desse cenário, marcado por uma carga horária reduzida, por

absenteísmo e por atrasos constantes, voltamos à base teórica que guia o

nosso olhar sobre as questões da afetividade em sala de aula. Se nos

alinhamos à ideia de que a afetividade, a inteligência e o movimento não se

separam e se acreditamos que as relações entre professores e alunos

produzem a afetividade – que nunca é dada, mas é sempre criada -, então,

141

Não houve atraso de nenhum aluno nas turmas 5º A e 7º A da Escola Darcy Ribeiro. Contudo, frisamos o seguinte: em ambas, o número de estudantes presentes era pequeno. Na turma 5º A, havia apenas quatro alunos; na turma 7º A, três. Portanto, concluímos que, nessa circunstância, as chances de atrasos eram menores.

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devemos defender o poder transformador das relações afetivas positivas como

um meio para a aprendizagem acontecer.

Em seguida, veremos como essa lógica depende de dois fatores que

incidem na sala de aula, mas que podem permear todas as escolhas do

professor, desde o seu planejamento (por exemplo, que microestratégias usar,

que materiais didáticos selecionar, que tipo de currículo construir etc.): o

entendimento sobre quem são os sujeitos da EJA e o sentido que cada

participante dá à afetividade. Para tratar desse entendimento, usaremos a

categoria incertezas.

3.3.3 Incertezas: a afetividade é um conceito em construção

Até este momento, temos tratado da afetividade em sala de aula como

algo traduzido em ações. Vimos, também, que, para os nossos participantes,

refletir sobre esse tema é, conceituamos, uma macroestratégia usada com

frequência no cotidiano da EJA. No que se segue, veremos os sentidos que os

professores Eliane, Giovanna e Valter deram a essa palavra-problema.

Veremos, então, que conceituar a afetividade e seu papel no processo de

ensino-aprendizagem de língua inglesa, na EJA, é um exercício marcado por

incertezas, contradições e ambivalências.

Para evitar equívocos, é importar sublinhar o seguinte: a nosso ver, era

esperado que os participantes afirmassem que, para eles, a afetividade era

algo relevante ao ensino e à aprendizagem. Acreditamos que o próprio

contexto de uma entrevista qualitativa – cuja interação era, aliás, gravada –

pode ter interferido nas respostas dos professores. No entanto, interessava-

nos, especialmente, buscar os sentidos latentes às falas de cada um deles.

Sabendo disso, vejamos, então, o que eles nos disseram:

Protocolo interacional nº 32

Afetividade e diálogo, na perspectiva da professora Eliane

(Entrevista nº 02 realizada com a professora Eliane, no dia 16 de dezembro de 2016, na Escola

Anísio Teixeira)

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225

01. Pesquisador: Você acha importante a afetividade para você poder promover

aprendizagem do inglês?

02. Professora Eliane: Sim.

03. Pesquisador: Por que que você acha importante?

04. Professora Eliane: Primeiro, porque a gente tem que chamar esses alunos, de alguma

forma, para o nosso lado. Então, se você... a matéria já é uma coisa, assim, pra eles, eles

não veem TANTO significado. Após muitas conversas, a observação do contexto externo

deles, eles começam a pensar: “Ah!, puxa vida, a gente já usa [a língua inglesa]”. Mas até

chegar nesse ponto, se você [professor] não tem uma relação afetiva ali com eles, eu

creio que vai ficar muito difícil alcançar esse aluno, como que eu posso dizer? Em SUA

APRENDIZAGEM, mesmo.

05. Pesquisador: E, você sente que você tem mais ganhos porque eles gostam de você? Ou

você acha que não tem essa correlação?

06. Professora Eliane: Difícil responder isso (risos).

07. Pesquisador: Porque, por exemplo, eu vejo que eles [alunos] gostam muito de você. Mas

você interpreta isso como sendo uma coisa pontual [em relação às aulas assistidas] ou porque,

realmente, o aluno em questão gosta de você? E, por isso, ele não vai ficar só quietinho para te

respeitar, na sala, mas ele vai aprender inglês, ele vai aprender MAIS, porque, entre outras

coisas, o ambiente é apropriado, em termos de afeto?

08. Professora-Eliane: Eu acho que isso é em qualquer lugar, até mesmo no trabalho.

Quando você tem uma relação afetiva com as pessoas, tudo rende melhor. Tudo... tudo

dá MAIS CERTO, vamos dizer assim.

09. Pesquisador: E, quem que são essas pessoas que estão na sala de aula da EJA? Na sua

visão, assim, se você fosse explicar o que é EJA para alguém que nunca pisou numa sala de

ensino noturno que atenda alunos de periferia na EJA: quem que são essas pessoas que estão

na EJA?

10. Professora Eliane: Essas pessoas, elas, na maioria das vezes, estão cumprindo, não sei

se chama pena socioeducativa... e, então, essas pessoas, assim, tiveram... É, uma coisa que

muito a Secretaria [de Educação de São Bernardo do Campo] fala com a gente e você

acaba, no começo, você fica meio “Hum, será?”. Mas você acaba vendo que são

pessoas que são carentes de oportunidades, financeiramente falando...nem todos! Têm

pessoas que não têm esse perfil, mas, na grande maioria, SIM. Eles precisam trabalhar para se

manter, embora jovens, ainda, né, numa idade ainda, assim, não na maioridade. Os idosos, na

maioria das vezes, as pessoas mais velhas, eles vêm para uma INTERAÇÃO COM O OUTRO,

ali, muitas vezes parece que ele não vem... [Ele vem] aprender a ler, para ele, ali, vai ser lucro,

[por]que a vida dele ali já está formada. O que atrapalha um pouquinho é que essa

afetividade que a gente tem, na EJA, eu digo tanto da gestão, também, porque aqui, na

EJA, a gente costuma brincar que nós somos mais mães. E, quando eles chegam lá, no

Ensino Médio, no Ensino Médio são os pais. Porque as mães, elas têm esse sentimento

de acolher, de passar a mão na cabeça. E, nesse contexto, aqui, na EJA, atrapalha um

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226

pouco, porque, assim... e, também, tem o contexto do trabalho, mas, assim, na maioria

das vezes, eles não chegam no horário [+]. Então, isso atrapalha muito a aula. E, por

serem adultos, eles têm livre acesso de chegar a hora que eles puderem, então, muitos dizem

que estão trabalhando, só que esse fluxo entra um, entra o outro atrapalha muito nossas aulas.

Então, esse aluno, dificilmente, ele é um aluno regular, porque, já por ser adulto, voltando,

novamente, sendo repetitiva até, mas ele tem a questão da família. Às vezes, não é aluno de 5º

ano, que a mãe vem trazer, é aluno que é essa mãe vai deixar o filho, às vezes, doente, ou não

vai [para a escola]. Então, esse aluno tem um contexto aí, ele não veio naquele dia, você tem

que dar uma: “Ah!, vamos lá, não desmotiva!”. São alunos que precisam de bastante

motivação, bastante incentivo pra terminar.

11. Pesquisador: E, você acha que, nesse sentido, é meio coerente dizer que a afetividade

acaba sendo mais importante, ainda?

12. Professora Eliane: COM CERTEZA.

13. Pesquisador: Porque, assim, você já falou: em qualquer contexto ela é importante. Mas,

na EJA, ela ganha traços de mais relevância?

14. Professora Eliane: Sim.

15. Pesquisador: Por conta desse público?

16. Professora Eliane: Com certeza. Eles [alunos] já não encontraram isso na vida lá fora.

Eles vêm para um ambiente que é totalmente hostil, grosseiro... aí, não vai dar certo.

A professora Eliane inter-relacionou a afetividade e a aprendizagem. Ao

explicar essa conexão, ela afirmou: “a gente tem que chamar esses alunos, de

alguma forma, para o nosso lado” (turno 04). Por meio dessa fala, entendemos

que, para ela, um dos sentidos possíveis conferidos ao papel da afetividade é a

ideia de parceria. Segundo ela, essa parceria é ainda mais importante no

contexto específico da aula de língua inglesa, já que os alunos da EJA,

inicialmente, parecem não valorizar esse componente curricular.

Ao explicar por que a afetividade importa ao processo de ensino-

aprendizagem, a professora Eliane respondeu: “Quando você tem uma relação

afetiva com as pessoas, tudo rende melhor” (turno 08). Nesse caso, parece-nos

haver certo senso comum na resposta da participante. Para ela, os benefícios

dos vínculos afetivos, em termos de aprendizagem, podem ser percebidos “em

qualquer lugar” – o que pode significar que, na sala de aula, tais efeitos sejam,

talvez, naturais, no sentido de naturalizados (e não produzidos, como

acreditamos). De outro lado, é verdade que, segundo Mahoney (2016),

baseada na psicogenética walloniana, as relações afetivas positivas facilitam a

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227

interação em quaisquer contextos, o que inclui as relações profissionais dentro

da escola.

A propósito do pensamento de Wallon (1995), destacamos a provocação

do pesquisador, ao perguntar à professora Eliane se ela correlacionava o

interesse dos alunos pela língua inglesa ao carinho que tinham por ela

(professora). De acordo com Galvão (2003), essa correlação pode ser legítima,

em termos de aprendizagem. Afinal, o professor medeia os conhecimentos aos

alunos de forma relacional. Em consequência, se os alunos gostam do

professor, é provável que tenham algum apreço pelo objeto de conhecimento

com que ele trabalha. A essa pergunta, a professora Eliane pareceu-nos

tímida, como se não quisesse se comprometer com um “sim”.

Para a professora Eliane, a afetividade aparece imbuída, ainda, de

contradições. A primeira contradição foi, aparentemente, superada. Esta

aparece indexada no turno 10, quando a professora-participante citou a

influência das formações contínuas da Secretaria de Educação de São

Bernardo do Campo. Nesse momento, o tópico da conversa é a identidade do

sujeito-aluno da EJA. Segundo a professora Eliane, antes dos encontros

formativos organizados pela rede de ensino, ela parecia não concordar com a

ideia de que os estudantes dessa modalidade fossem pessoas “cumprindo

penas socioeducativas” ou “carentes de oportunidades”. Após esses encontros,

ela passou a admitir que esses sujeitos são – com base no nosso referencial

teórico - oprimidos (FREIRE, P., 2016).

A respeito dessa mudança no olhar da professora, acrescentamos, aqui,

um dado produzido durante uma conversa informal com a participante: para

ela, ao ingressar na EJA, conhecer a historicidade dos alunos era um

obstáculo. Ela acreditava que esse conhecimento poderia influenciar,

negativamente, sua avaliação, em sala de aula. Em tese, entrar em contato

com as histórias de vida dos jovens e dos adultos populares era uma forma de

deixar-se impactar por situações de extrema dureza e sofrimento. No entanto, a

formação em serviço e, principalmente – de acordo com o relato que ouvimos -,

as relações construídas com os alunos lhe afetaram. Em algum momento,

conjeturamos, a professora Eliane percebeu que já não era mais possível

separar a pessoa – em termos wallonianos – do aluno nas classes da EJA.

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228

A segunda contradição abrigada pela ideia da função da afetividade na

escola aparece, também, no turno 10. Dessa vez, a educadora tratou de uma

situação cotidiana que lhe incomodava: a alegada permissividade institucional.

Coerentemente, a professora Eliane não negou, com esse argumento, o papel

da afetividade no processo de ensino-aprendizagem, mas apresentou um dado

que já discutimos neste trabalho: parte dos alunos da EJA, na Escola Anísio

Teixeira, não conseguia se comprometer com a estrutura de ensino oferecida

pela instituição (e, por conseguinte, pela rede de ensino), em termos de

frequência e de assiduidade.

Segundo a professora Eliane, o comportamento permissivo foi

apresentado pela própria escola, ainda que esta se preocupasse em zelar

pelas relações afetivas (positivas) com os alunos. E, aqui, falamos em escola,

porque a participante problematizou essa questão, a partir do prisma da

professora, em sala de aula, e da “gestão”. Daí a metáfora “a EJA é uma mãe”,

isto é, a EJA da Escola Anísio Teixeira dialoga, acolhe e flexibiliza (apesar das

condutas inadequadas de alguns alunos, no olhar da participante).

Por fim, a professora Eliane estabeleceu a relação entre afetividade e

motivação (turno 10). Mais uma vez, o sentido dessa associação surge da sua

leitura sobre quem é o sujeito-aluno da EJA. A participante reconhece que,

para o educando, em termos gerais, desistir é, sempre, uma bifurcação

possível. Para romper com essa lógica – que, conforme vimos, é habitual nas

escolas com essa modalidade -, a professora Eliane acredita na força do

professor como um motivador permanente.

A seguir, ilustramos o posicionamento da professora Giovanna, em

entrevista, quanto ao papel da afetividade em sua prática docente:

Protocolo interacional nº 33

Afetividade e o sujeito-aluno da EJA, na perspectiva da professora Giovanna

(Entrevista nº 02 realizada com a professora Giovanna, no dia 15 de dezembro de 2016, na

Escola Darcy Ribeiro)

01. Pesquisador: Quantas ações você assinalou aí [“Macroestratégia 11 – Refletir sobre a

afetividade”]?

02. Professora Giovanna: Todas.

03. Pesquisador: Todas?

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04. Professora Giovanna: Todas. Eu tenho isso, mesmo, de afetividade. Eu repensei no

que você havia conversado comigo e, realmente, isso propicia um ambiente agradável

e o aprendizado deles é maior, mesmo. Eu acho que, quando tem essa afetividade,

quando tem esse carinho, assim, que você conhece eles [alunos] como individual, como

indivíduo, é importante, sim.

05. Pesquisador: Você acha que você teria o mesmo sucesso, em termos de aprendizagem

da língua [inglesa], se você fosse uma professora menos afetuosa?

06. Professora Giovanna: Ah, não sei, talvez, sim. Não sei se num contexto aqui de EJA,

assim, [por]que eles são alunos adultos, que já passaram por coisas que... problemas

da vida, que eles pararam de estudar, e se você não tem essa abertura para deixar eles

contarem a história deles e, querendo ou não, ele dá um pedacinho dele e leva um

pedacinho seu, né, é... isso é da educação, assim. Quando você escuta a história de vida

deles e você conta a sua história, também, isso aproxima muito eles, e quebra essa barreira

de que “Ai, professora de inglês”, né, professor é um ser de outro planeta, [um ser] especial.

07. Pesquisador: Assim, em resumo, quando você tá me falando isso, eu tô aqui pensando

algumas coisas, né. Por exemplo, como é que você explicaria, pra quem nunca trabalhou

com EJA, pode ser até mesmo educador, mas nunca pisou numa sala de aula de EJA -

segmento 2: Quem é essa pessoa que vem pra aula dessa escola, à noite, para ter aula de

EJA com você? Quem são essas pessoas?

08. Professora Giovanna: São pessoas que perderam o time da oportunidade de estudar,

tiveram alguns percalços, problemas, ou precisaram trabalhar para sustentar irmãos, ou

vieram do Nordeste, do Norte, de outro lugar, pequenos ainda, pra tentar a vida, ou jovens

para tentar a vida em São Paulo e casaram, tiveram filhos. São meninas que saíram da

escola, porque estavam grávidas, e voltaram, depois de algum tempo. Meninos que foram

excluídos do sistema educacional estadual, que repetiram, repetiram, repetiram, até que o

Estado expulsou eles e falaram: “Ó, vocês já têm idade pra EJA”. São pessoas assim,

pessoas que já tiveram uma história de vida mais sofrida. E, [ao] trabalhar na EJA, você

tem que ter esse lado humano, assim, para entender isso porque, pelo menos para

mim, a EJA me fez um ser humano melhor.

Em primeiro lugar, é preciso contextualizar as mudanças no olhar da

professora Giovanna sobre o papel da afetividade no processo de ensino-

aprendizagem. Inicialmente, em campo, por meio de conversas informais,

sondamos com a educadora como ela entendia o trabalho com e pela

afetividade, em sala de aula. Naquele momento, não sabíamos, ainda, que

referencial teórico seria, de fato, adotado para tratar desse tema. Questionada

sobre isso, a professora Giovanna disse-nos “ah, é o meu jeito!”.

A partir dessa fala, intuímos, então, que, talvez, em linhas gerais, a

afetividade, no sentido da produção de vínculos afetivos, possa fazer parte da

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atuação do professor, mas não da agência142 desse profissional. Para constituir

a agência docente, entendemos, é necessário haver consciência do papel

desse domínio ou conjunto psíquico (WALLON, 1995) no desenvolvimento da

inteligência e da pessoa como um todo.

À medida que a produção dos dados avançava, estreitávamos os laços

com a professora Giovanna. Conversamos bastante sobre as aulas observadas

e, durante esse processo, o olhar dela para o papel da afetividade,

provavelmente, mudou. Um indício dessa mudança é a resposta que ela nos

deu no turno 04. Nele, ela afirma: “Eu repensei no que você [pesquisador]

havia conversado comigo e, realmente, isso [a afetividade] propicia um

ambiente agradável e o aprendizado deles é maior, mesmo”. No entanto,

embora acreditemos que tenha havido uma transformação no olhar da

participante, ela não deixou de refletir a ideia de que a dimensão afetiva seja,

quiçá, uma parte intrínseca à sua própria personalidade, quando nos disse “eu

tenho isso, mesmo”.

Com essas informações contextuais e textuais no nosso horizonte,

cremos que as duas linhas interpretativas se complementam: de um lado, a

afetividade pode ser parte da agência docente e, portanto, o trabalho com ela e

por meio dela é consciente; de outro lado, usar a afetividade em prol dos

processos educativos é um saber personalizado, uma vez que a pessoa do

professor – em termos wallonianos - interfere na construção desse

conhecimento.

O turno 04 traz, ainda, o seguinte sentido de afetividade: diálogo. Por

diálogo, não fazemos referência à conversa face a face, mas ao diálogo

freiriano, isto é, às relações dialógicas entre o mundo do professor e os dos

alunos. A relevância do diálogo, para justificar o papel da afetividade em sala

de aula, é indiciada em “conhecer os alunos como indivíduos é importante”.

Depois, essa ideia foi expandida em outros turnos, como nos mostram

os segmentos: “ele [aluno] dá um pedacinho dele e leva um pedacinho seu, né,

é... isso é da educação” (turno 06), “Quando você escuta a história de vida

deles [alunos] e você conta a sua história, também, isso aproxima muito eles”

142

Para conferir nossa discussão teórica sobre o sentido de agência, remetemo-nos às subseções 1.1.1.1 Olhares sobre as Diretrizes Curriculares da EJA da rede municipal de São Bernardo do Campo, 1.3.3 Olhares de Paulo Freire sobre a afetividade e 1.3.4 Olhares de Henri Wallon sobre a afetividade.

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(turno 06), e “você tem que ter esse lado humano, assim, para entender isso

porque, pelo menos, para mim, a EJA me fez um ser humano melhor” (turno

08).

A nosso ver, em todos esses trechos, há a ideia de que a historicidade

da educadora e as historicidades dos alunos se encontram na sala de aula. Por

meio do diálogo, há afecções dos dois lados, o que, entendemos, funciona

como o motor da afetividade.

A respeito do diálogo, ainda, podemos aproximar o ponto de vista da

professora Giovanna à perspectiva da professora Eliane. Para ambas, o

reconhecimento de que os alunos da EJA são sujeitos atravessados pela

opressão, em sentido freiriano, leva a uma valorização das relações humanas

na sala de aula. Dizendo de outra forma, cuidar dos vínculos afetivos, na EJA,

é importante, entre outros aspectos, em virtude de quem são os alunos dessa

modalidade.

Para exemplificar a opressão a que aludimos, remetemo-nos ao turno

08. Nele, segundo a professora Giovanna, alguns grupos que frequentavam

suas aulas eram formados por adolescentes convidados a saírem das escolas

estaduais, porque, nelas, eram repetentes – e, consequentemente, estavam

fora do eixo idade/série – ou porque haviam engravidado. Além deles, havia os

migrantes, que vieram a São Bernardo do Campo em busca do sonho de uma

vida melhor. Em resumo, o retrato feito pela participante confirma os dados

apresentados no nosso referencial teórico143, particularmente, os estudos de

Arroyo (2011), de Dayrell (2011) e de Jardilino e Araújo (2014).

Os protocolos a seguir explicitam as perspectivas pessoais do professor

Valter sobre o papel da afetividade no processo de ensino-aprendizagem, na

EJA:

Protocolo interacional nº 34

143

A propósito do perfil dos alunos da EJA, remetemo-nos à subseção 1.1.3 Olhares para os alunos da EJA.

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Afetividade e o professor como modelo, na perspectiva do professor Valter

(Entrevista nº 02 realizada com o professor Valter no dia 16 de dezembro de 2016, na Escola

Anísio Teixeira.)

01. Pesquisador: E, essa Macroestratégia 11, que é (lendo) “refletir sobre afetividade”, você

marcou quase tudo, também, ou tudo, que é a última página?

02. Professor Valter: Tudo.

03. Pesquisador: Tudo?

04. Professor Valter: TUDO. Eu acho, eu acho esse negócio é essencial.

05. Pesquisador: E, por que que você acha que a afetividade é tão importante para

aprendizagem de inglês, na EJA?

06. Professor Valter: É porque ele [aluno] vai se basear na gente pra se construir, né?

Uma vez eu vi um psicólogo falar sobre [+] a CONSTRUÇÃO DO SER, né? Então, por

exemplo, como é que o cara, como é que o [+++] aí ele leu, como é que chama? A biografia do

John Lennon! Aí, na biografia, o cara fala assim: “Como que o John Lennon se construiu

enquanto ser, né, como ele construiu aquela personalidade?”. Ele, na juventude, quando tinha

17, 18 anos, ele andava que nem, ele copiava tudo do Elvis Presley. Copiava o jeito de andar,

o jeito de pentear o cabelo, o jeito de falar, TUDO. E, o que aconteceu? Quando ele ficou

adulto, o que aconteceu? Ele se transformou no John Lennon, que é uma personalidade mil,

MILHARES DE VEZES mais rica, muito mais interessante do que o Elvis Presley. Então, É

ASSIM que a gente se constrói, é no outro, é se baseando no outro. Então, essa afetividade é

importante. É importante você... ter essa relação de afetividade com os alunos pra que

eles se baseiem no que você é. E, você só vai conseguir influenciar os alunos se você,

primeiro, tiver orgulho de si mesmo, gostar de si mesmo, né, e se você der essa chance

de interação aonde eles vão ter você como modelo. Claro, eles vão CONSTRUIR UM

OUTRO MODELO, mas eles vão ter em quem se basear.

Para o professor Valter, a afetividade tem o sentido de construção de

modelos. E, o parâmetro para essa construção, na opinião dele, é, em linhas

gerais, o professor. Ou seja: por meio de uma “relação de afetividade” (turno

06), os alunos da EJA podem se tornar outras pessoas.

O posicionamento do professor Valter dá margem a uma interpretação

ambivalente. Ao usar a metáfora o professor é a base do aluno, indiciada nos

segmentos “é importante [...] que eles [alunos] se baseiem no que você

[professor] é” e “eles vão construir um outro modelo, mas eles vão ter em quem

se basear”, Valter sugere que, na relação professor-alunos, provém do

educador o interesse em conhecer o outro, isto é, o jovem, o adulto ou o idoso

popular que se matricula em um curso de EJA. Essa linha interpretativa pode

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ser reforçada por este excerto: “você [professor] só vai conseguir influenciar os

alunos [...], se você der uma chance de interação”.

A nosso ver, considerando o papel social do professor, parece-nos

legítimo que, repetimos, a produção da afetividade seja vista como algo

intencional e, que, portanto, tenha origem no educador. A partir dos

argumentos de Freire, P. (2002), de Leite (2013), de Gazoli (2013) e de

Mahoney (2016), podemos afirmar que, em virtude da importância do meio na

modelagem das relações afetivas em sala de aula, o professor precisa zelar

por esse ambiente e pelas trocas que, nele, acontecem.

Entretanto, consideramos que, latente à fala do professor-participante,

pode haver outro sentido: talvez, para ele, a afetividade seja uma via para que

os alunos da EJA alcancem modelos melhores, não na direção exclusiva da

relação professor-aluno, mas, principalmente, quanto às suas formas de

agir/ser. Dizendo de outra maneira, para o professor Valter, faltam (bons)

modelos aos jovens e aos adultos dessa modalidade. Chegamos a esse

raciocínio por meio da interlocução entre o protocolo interacional nº 34 e o

protocolo a seguir:

Protocolo interacional nº 35

Cultura na perspectiva do professor Valter

(Entrevista nº 02 realizada com o professor Valter no dia 16 de dezembro de 2016, na Escola

Anísio Teixeira.)

01. Pesquisador: Agora, Macroestratégia 9. A 9ª e a 10ª [macroestratégias], você assinalou,

também, praticamente tudo, (lendo): “consciência social e relevância social”, né? E aí você já

deu um exemplo de como o inglês é relevante quando fez a atividade em que os alunos foram

buscar as palavras no jornal. Existe algum exemplo que você possa dar sobre essa questão

DA CULTURA? Como é que você traz a cultura pra sala de aula?

02. Professor Valter: A questão da cultura é essencial, né? Eles [alunos] têm uma cultura, por

exemplo: A CULTURA DE NÃO LER! Eles têm a cultura de não ler! A cultura de não ouvir

música em língua inglesa. A cultura de ouvir funk. Funk não fala nada, né?! Então, eles têm

que mudar a cultura que eles têm.

No turno 02 do protocolo interacional nº 35, o professor Valter sugeriu

que a cultura dos alunos da EJA não lhes é apropriada. Como resultado,

interpretamos, para ele, é preciso que os estudantes recebam outra cultura,

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234

que tenham acesso a outro modelo cultural – o que nos leva de volta ao

protocolo interacional nº 34. Por meio de uma leitura comparada dos dados

apresentados, entendemos que, para o participante, a afetividade é necessária

a um processo de aculturação, em que o aluno da EJA recebe uma espécie de

cultura escolar.

Aliás, parece-nos que há certa incoerência na fala do professor Valter.

Embora ele valorize a afetividade – e lembramos que ele afirmou usar todas as

microestratégias ligadas à macroestratégia 11, refletir sobre a afetividade -

suas respostas não nos dão indícios de que essa reflexão considera o diálogo

com os alunos da EJA. Segundo o pensamento freiriano, não existem culturas

melhores ou piores. O professor, nessa visão, não é um modelo cultural, no

sentido de detentor ou de embaixador de alguma cultura específica. Para

Freire, P. (2014), um dos problemas da educação não libertadora é,

justamente, desconsiderar a cultura do aluno. Não nos parece possível,

portanto, haver diálogo, no sentido freiriano, se ele vier acompanhado de pré-

julgamentos. Consequentemente, nesse cenário, a construção de vínculos

afetivos entre professor e alunos pode se tornar mais difícil.

Adicionalmente, notamos que, no protocolo interacional nº 34, o

professor Valter não inter-relacionou afetividade e aprendizagem. Sua resposta

foi totalmente fundamentada na suposta construção de uma nova pessoa do

aluno, baseada no professor. Por fim, apesar de haver uma aparente confusão

na fala do participante (ou de haver dificuldade da nossa parte em interpretá-

la), o professor Valter é bastante assertivo sobre a importância da afetividade

na relação educador-educandos.

3.4 Afetividade, estratégias de ensino e aprendizagem na EJA: um

encontro possível

Após apresentarmos tantos dados, é preciso, ainda, tentar sintetizá-los

numa perspectiva contrastiva. Do contrário, podem parecer dados de casos

isolados e não de uma mesma pesquisa. Para isso, conforme anunciamos na

sessão anterior, embasados em Yin (2015), exibiremos um quadro com um

apanhado daquilo que descobrimos ao longo da investigação. A respeito dele,

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235

fazemos esta ressalva: por pontos convergentes, entendemos os aspectos

deste estudo que foram comuns aos três professores-participantes; já os

pontos divergentes são aqueles traços partilhados por dois educadores ou

exibidos por um deles.

Quadro 8 - Síntese de dados cruzados dos casos dos professores Eliane, Giovanna e Valter

Pontos convergentes

01 Os participantes não estudaram a EJA ou, particularmente, o ensino de línguas no

contexto da EJA, durante a formação inicial.

02 Os participantes alegam diversificar as estratégias de ensino usadas no contexto

específico da EJA.

03 A seleção de materiais didáticos (por exemplo, flash cards ou handouts com textos para

tradução) parece guiar a escolha das estratégias de ensino por todos os participantes.

04 A própria definição de estratégia de ensino confunde-se com o rol de materiais didáticos

usados em sala de aula.

05 As estratégias de ensino identificadas e comentadas pelos participantes acenam para

uma concepção de língua(gem) estruturalista.

06 Os participantes parecem não trabalhar com situações de aprendizagem em que a língua

inglesa seja o idioma em uso. Daí, por exemplo, a preferência por textos não autênticos

ou a provável ausência de propostas de leitura voltadas à construção de sentidos.

07 Os participantes afirmam valorizar o papel da afetividade no processo de ensino-

aprendizagem.

08 Não parece haver clareza total, para os participantes, sobre como a afetividade contribui

para o processo de ensino-aprendizagem, isto é, de que forma ela constitui a agência

docente.

Pontos divergentes

09 Apenas a professora Giovanna reputa parte de sua formação contínua e em serviço ao

trabalho em equipe (professores e gestão). Segundo ela, sua prática em sala de aula é

um reflexo das discussões do grupo de que faz parte.

10 A escolha das estratégias de ensino das professoras Eliane e Giovanna decorre,

parcialmente, de experiências prévias em centros de idiomas.

11 A interação com os alunos sobre os objetos de conhecimento facilita o engajamento

deles nas tarefas propostas pelas professoras Eliane e Giovanna.

12 O enfoque linguístico de cada professor é bastante particular: a professora Eliane foca o

ensino de gramática; a professora Giovanna, a aprendizagem de vocabulário; o professor

Valter, a tradução de textos não autênticos.

13 As professoras Eliane e Giovanna têm vínculos afetivos com os alunos.

14 Embora seja respeitoso e educado com os estudantes, o professor Valter parece não ter

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236

vínculos afetivos com eles.

15 A temperatura afetiva nas aulas das professoras Eliane e Giovanna é equilibrada. Nesses

cenários de aprendizagem, vemos bom-humor, alegria e entusiasmo por parte das

educadoras e da maior parte dos educandos.

16 As professoras Eliane e Giovanna valorizam os pequenos nadas nas relações com os

alunos.

17 As professoras Eliane e Giovanna dão importância ao diálogo com a realidade concreta

dos alunos da EJA.

18 Latente às falas do professor Valter, há a ideia de que os alunos da EJA precisam

receber outra cultura, quando retornam à escola.

19 As relações entre os participantes e seus alunos dependem de uma questão estrutural: a

ligação afetiva entre os professores e as escolas onde eles atuam. Nesse sentido,

destaca-se a jornada de trabalho do professor Valter, que, em contraste às professoras

Eliane e Giovanna, atuava em três escolas com EJA, em 2016.

Fonte: Elaborado pelo autor, julho de 2018.

Diante dessa síntese, percebemos o potencial de análise das

macroestratégias e das microestratégias. Por meio do estudo delas, é possível

deduzir concepções de língua(gem), marcas de experiências prévias e saberes

docentes situados e personalizados. No entanto, compreendemos, também,

que esse estudo pode ser fragmentado, sobretudo no contexto da EJA, se não

vier acompanhado de um olhar sobre as questões ligadas à afetividade em sala

de aula.

Dizemos sobretudo no contexto da EJA, porque, embora tenhamos

focado nossa atenção nos sujeitos-professores, ao cruzar os dados,

constatamos o papel da afetividade na atuação e/ou na agência do professor

de língua inglesa como um diferencial. Para exemplificar nosso ponto de vista,

atentamo-nos aos itens 13 a 18 do quadro acima. Todos eles apontam para

uma mesma direção: a nosso ver, os alunos da EJA envolvem-se mais em

tarefas pedagógicas, quando há vínculos afetivos entre eles e o professor.

Fazemos essa constatação com base, também, no que sabemos sobre quem

são esses sujeitos-alunos, segundo o que ouvimos dos participantes e o que

revisamos, na fundamentação teórica.

Finalmente, para sistematizar os dados apresentados e discutidos,

apresentamos, a seguir, um quadro-resumo, com as perguntas de pesquisa, os

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237

objetivos específicos e os achados que fizemos, durante este percurso

analítico:

Quadro 9 - Relação entre as perguntas, os objetivos e os achados da pesquisa

Perguntas de

pesquisa

Objetivos específicos Achados

1. Que estratégias de

ensino são usadas

pelos professores de

língua inglesa, no

contexto da EJA, em

turmas de Ensino

Fundamental 2, na

rede municipal de São

Bernardo do Campo?

1. Identificar as

estratégias de ensino

usadas por

professores de língua

inglesa, no contexto de

duas escolas

municipais com EJA,

em São Bernardo do

Campo.

Confira o quadro 07 – Inventário

das microestratégias de ensino

observadas em sala de aula.

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238

Quadro 9 – Relação entre as perguntas, os objetivos e os achados da pesquisa

continuação

2. Que elementos

contextuais podem

interferir na escolha das

estratégias de ensino

usadas pelos

professores-

participantes?

2. Interpretar as

estratégias escolhidas

pelos professores-

participantes, segundo

a análise do contexto de

ensino-aprendizagem

feita por eles.

A escolha de estratégias de ensino

depende de experiências

profissionais prévias, ainda que o

contexto de trabalho anterior seja

bastante diferente daquele que a EJA

apresenta.

A escolha de estratégias é, com

frequência, subordinada (e, talvez,

posterior) à escolha de materiais

didáticos.

A escolha de estratégias didáticas

depende, ainda, do entendimento

que os professores têm sobre os

interesses dos alunos, mesmo que os

educandos não participem da

construção do currículo.

A triagem de estratégias didáticas

depende de uma visão de currículo

da própria escola, que pode (ou não)

criar oportunidades para a

construção de práticas de ensino-

aprendizagem interdisciplinares e

mais voltadas a problemas

levantados pela própria comunidade.

Em suma, o trabalho em equipe afeta

a seleção de estratégias de ensino

usadas em sala de aula. O caso da

professora Giovanna exemplifica

esse achado de pesquisa.

A eleição de certas estratégias

depende da formação permanente do

professor de língua inglesa. Isso ficou

bastante claro no caso do professor

Valter, com referência à

compreensão dele sobre o que é

texto, o que é interpretação de texto

e para que a tradução serve.

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239

Quadro 9 – Relação entre as perguntas, os objetivos e os achados da pesquisa

continuação

3. Como a afetividade

pode emergir nas

aulas de língua

inglesa da EJA?

3. Explicar a forma

como a afetividade

emerge nas aulas de

língua inglesa da EJA,

relacionando-a às

ações dos professores-

participantes.

A afetividade emerge sob as formas

de pequenos nadas, como sorrisos,

risadas e elogios prosaicos.

Para produzir afetividade, em

classe, o bom-humor parece ser

necessário.

A afetividade é alicerçada no

diálogo, em sentido freiriano. As

participantes (Eliane e Giovanna)

deste estudo que consideravam a

historicidade dos alunos da EJA

mantinham, com eles, vínculos

afetivos. Em oposição a isso, o

participante (Valter) cuja

perspectiva pessoal pressupunha a

valorização de uma suposta cultura

escolar aparentava ter mais

dificuldades em criar esses laços.

A afetividade como agência é um

conceito difuso. Parte dessa difusão

pode ser reputada à autoimagem

que o participante faz de si mesmo.

Dizendo de outra forma, trabalhar

com e por meio da afetividade

depende da pessoa - em sentido

walloniano – do professor.

Relações entre professores e

alunos afetivamente positivas

impulsionam o ensino e, como

resultado, a aprendizagem. O

contrário também é verdadeiro:

relações com afecções apáticas

parecem travar o processo de

ensino-aprendizagem.

Fonte: Elaborado pelo autor, julho de 2018.

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240

INCONCLUSÕES

Para Freire, P. (2002), somos seres inconclusos. Estamos, sempre, em

constante transformação. Por isso, neste espaço, prefiro discutir inconclusões.

Ainda que se trate de reflexões, não as considero finais, no sentido de

terminadas ou bem acabadas. Penso que essas ideias continuarão ativas na

minha experiência como professor de língua inglesa e como sujeito-

pesquisador. Adicionalmente, aqui, emprego a primeira pessoa do singular,

porque entendo que este trabalho trouxe mudanças na minha vida pessoal.

Aliás, com base em Moraes (2007), antecipo que tais mudanças têm uma

natureza ontológica, epistemológica e metodológica. Adiante, voltarei a esse

argumento.

Com referência à apresentação e à discussão dos dados, acredito que

correspondi, em grande parte, aos objetivos traçados para este estudo. Admito

que, devido à exigência de lidar com dois objetos de pesquisa distintos (i.e.,

estratégias didáticas de ensino de LE e afetividade em sala de aula), a questão

da formação de professores de língua inglesa para e na EJA tenha sido pouco

explorada. Eis, aí, uma investigação em estado de semente, que, no futuro,

pode propor caminhos interessantes a pesquisadores e a formadores de

professores.

No que diz respeito à experiência em campo, julgo que aprendi muito

com os professores-participantes. Em nosso convívio, observei pessoas

empenhadas em ensinar a língua inglesa, apesar das nossas - e, neste

momento, friso o uso desse pronome – angústias, inseguranças e incertezas.

Afinal, o sujeito-pesquisador conhece a sala de aula da EJA, na rede municipal

de São Bernardo do Campo (SP), primeiramente, como professor.

No entanto, a experiência em campo mostrou-me indícios de que a

efetivação de uma política pública de EJA não parece ter entrado – ao menos,

plenamente - na sala de aula. Explico: embora já houvesse, em 2016, diretrizes

de âmbito federal (BRASIL, 2002a, 2002b) e municipal (SÃO BERNARDO DO

CAMPO, 2012) que tencionassem uma pedagogia com a cara da EJA, isto é,

pensada para os sujeitos dessa modalidade, em classe, observei estratégias

didáticas ligadas, a meu ver, a outros contextos de ação educativa, como o

centro de idiomas ou a escola com Ensino Fundamental regular.

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241

Estou convicto de que a EJA necessita de uma pedagogia dos sujeitos e

para os sujeitos. Nessa lógica, incluo a didática, ou didáticas, de ensino de LE.

Sustento esse argumento em algo apontado pela literatura revisada (ARROYO,

2011; DAYRELL, 2011; JARDILINO; ARAÚJO, 2014, ZANARDO, 2017, entre

outros) e pelos três professores-participantes: os estudantes dessa modalidade

viveram/vivem histórias de desumanização. Infelizmente, em um país tão

desigual como o nosso, sei que o roubo da dignidade humana pode começar

na infância. No entanto, na EJA, há o seguinte agravante: o sentimento de

menos valia e as condições sociais já levaram os alunos a abandonar a escola,

em outro momento. O retorno a essa instituição é, no mínimo, uma segunda

chance, uma nova tentativa de resgatar o direito humano à educação. Assim

sendo, ser professor em cursos de EJA parece-me exigir saberes e

competências específicas.

No que concerne a novos estudos, no campo da LA, acredito no

potencial de pesquisas-ação fundamentadas no(s) letramento(s). Sugiro, como

ponto de partida, dois trabalhos: a) o de Prado, Lange, Schlatter e Garcez

(2014), que traz propostas de como letrar, na EJA, por meio da língua inglesa e

com a ajuda de textos em língua materna. Para esses pesquisadores, uma

forma de aproximar os jovens e os adultos de textos autênticos (e polêmicos)

em língua adicional é partir de um corpus com os mesmos temas, mas em

língua portuguesa; b) o de Landim (2015), que, apoiada nos conceitos de

letramentos críticos, letramentos escolares e letramentos sociais, chegou a

achados de pesquisa, em certa medida, semelhantes àqueles que apresentei

na seção anterior. Segundo o estudo etnográfico dessa pesquisadora, é

frequente, nas aulas de língua inglesa da EJA, o trabalho com questões

lexicais e gramaticais descontextualizadas, em detrimento de aspectos

discursivos.

Nessa mesma direção, considero pertinentes os argumentos de

Kumaravadivelu (2004) e de Canagarajah (2009b) sobre a elaboração de

materiais didáticos socialmente relevantes. Como isso pode se concretizar, no

âmbito da EJA? Que gêneros discursivos para a compreensão e para a

produção podem ser privilegiados? Que eventos comunicativos são, em tese,

mais interessantes aos alunos? Que temas podem aproximar os estudantes da

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EJA da ideia de línguas inglesas, isto é, de uma língua global? Essas questões

contribuem para novos estudos.

Futuras pesquisas podem se debruçar, também, sobre os discursos de

desumanização realizados por alunos e por professores da EJA. No campo da

LA, tais corpora podem ser analisados de forma transdisciplinar, na interface

entre áreas como Análise do Discurso, Linguística Sistêmico-Funcional e

Psicologia Social. A meu ver, não se trata de olhar para aquilo que é negativo,

simplesmente. Penso que novos estudos sobre esse tema podem nos ajudar a

entender como nossa vocação ontológica – ou seja: a humanização e o ser-

mais, segundo Freire, P. (2016), ou o aumento da nossa potência de agir, de

acordo com Espinosa (2005) – pode ser destruída.

A propósito dessa interlocução entre áreas diferentes, acredito que

novos estudos inter/transdisciplinares podem ressignificar a questão da

afetividade no processo de ensino-aprendizagem de línguas. Destaco, aqui, o

conceito de afetividade como agência docente. Penso que, neste trabalho, eu

tenha iniciado a discussão sobre esse tema. É preciso, ainda, refinar esse

construto. Talvez, futuros pesquisadores tentem responder à seguinte

pergunta: para falarmos sobre afetividade como agência docente, é

imprescindível que o professor tenha clareza pedagógica sobre sua ação em

sala de aula? Ou: a afetividade como agência docente prescinde à explicitação

de conceitos?

A partir dos achados deste estudo, passo, também, a contestar algumas

generalizações. Uma delas diz respeito à suposta tranquilidade que as turmas

de EJA trazem a seus professores e alunos. Muitas vezes, ouvi, em diferentes

contextos (como a própria universidade), frases estereotipadas, como “ah, na

EJA, só tem velhinho! Deve ser um sossego trabalhar com esse público”. Os

dados desta pesquisa reforçam que a juvenilização não é uma abstração, mas,

sim, um fenômeno social contemporâneo. E, infelizmente, a alegada

tranquilidade desse cenário parece estar associada a um problema crônico: o

absenteísmo e a evasão dos alunos.

A segunda generalização, presente, aliás, nas Diretrizes Curriculares da

EJA (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2012), é a seguinte: a concepção de EJA

suplantou, legal e teoricamente, a mentalidade de Ensino Supletivo. Para mim,

não há dúvidas de que o conceito de EJA é superior à ideia de Ensino

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Supletivo. A EJA não repõe o que falta, apenas, mas busca qualificar as

pessoas, oferecendo-lhes mais do que escolarização. No entanto, à vista dos

dados deste estudo, acho acertada e atual a reflexão de Di Pierro (2005) sobre

a coexistência do paradigma compensatório e do paradigma da aprendizagem

ao longo da vida. Não me posiciono a favor dessa ambivalência, somente em

razão das estratégias didáticas ou das relações professor-aluno observadas

em campo. Meu posicionamento parte, sobretudo, de uma visão macro. Não

sei se é possível superar, totalmente, a ideia de Ensino Supletivo,

considerando a carga horária reduzida, as dificuldades de aprendizagem de

alguns alunos e seu excesso de faltas. Disso, concluo que o conceito de EJA é

um avanço, mas as políticas públicas precisam se engajar na construção de

um paradigma sólido de aprendizagem ao longo da vida.

Quanto a possíveis universalizações teóricas, reitero o argumento de

que o paradigma cartesiano é inadequado à Educação, em termos de ensino,

de aprendizagem e de sociedade. Ao concordar com a ideia de que a escola

forma uma unidade com coletivos maiores, como entendem Freire, P. (2002,

2014, 2016, 2017) e Wallon (1995), não posso aceitar que essa instituição –

muitas vezes, representada, no senso comum, pela figura do professor –

fragmente a natureza humana, isto é, separe afetos de conhecimentos. Dito

isso, discorro sobre outra universalização: a formação de professores de

línguas precisa reconhecer e valorizar a articulação entre afetividade e

cognição. Aqui, volto a sugerir o pensamento complexo (MORAES, 2003,

2007, 2008; MORIN, 2012, 2013a, 2013b, 2015; PETRAGLIA, 2011, 2012) e a

auto-heteroecoformação (FREIRE, M.; LEFFA, 2013) como lentes úteis a essa

empreitada.

A partir da revisão da literatura, acredito que a complexidade é uma

resposta alternativa ao pensamento disjuntor da racionalidade técnica, que,

neste trabalho, tenho, repetidamente, criticado. Na esteira disso, avalio a auto-

heteroecoformação como uma proposta de processos formativos dinâmicos –

como é a sala de aula da EJA -, que integra as diversas dimensões do sujeito e

que considera o professor uma pessoa aprendente, ao longo da vida.

Conforme expus no início desta seção, inspirado em Moraes (2007),

entendo que esta pesquisa me trouxe mudanças de natureza ontológica,

epistemológica e metodológica. A mudança metodológica, talvez, tenha sido a

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menos poderosa. Não alego isso, porque se trate de uma alteração pouco

significativa. No entanto, em retrospecto, quando analiso o sujeito-professor

(que, de alguma forma, nunca se descolou, totalmente, do sujeito-pesquisador),

reconheço, há alguns anos, atitudes inter/transdisciplinares, no meu dia a dia

profissional.

Nesta dissertação, entretanto, o agir inter/transdisciplinar ganhou força e

um novo sentido, já que mudei, também, epistemologicamente. Reputo isso

aos conhecimentos construídos, durante o Mestrado. Sem dúvida, eles me

ajudaram a confiar nesta intuição: muitas vezes, o saber que importa está nas

fronteiras. Além disso, contrapor (mas não negligenciar) perspectivas de

integração e de acolhida à diferença e à diferenciação (como, a meu ver, são o

monismo, a psicogenética walloniana, a pedagogia freiriana e a complexidade)

à racionalidade técnica é mais do que se apropriar de um novo conjunto de

ideias; é, com efeito, uma experiência dos afetos e do pensamento.

Desse modo, penso que houve mudanças ontológicas. O sujeito-

pesquisador alterou o sujeito-professor. Modificaram-se, portanto, aspectos da

minha identidade. O meu olhar para as questões relacionadas à afetividade e

às relações no espaço escolar se tornou mais agudo. Meu trabalho como

professor de língua inglesa foi qualificado, porque penso que me tornei mais

competente.

Por fim, espero, com otimismo, que a leitura deste estudo – mesmo que

seja por pouco tempo, como sugere, positivamente, Allwright (2006) – dê

visibilidade aos professores de língua inglesa da EJA, cumprindo, portanto,

com a finalidade deste trabalho. Talvez, menos invisíveis, eles possam estar na

agenda das políticas públicas de formação e de incentivo ao magistério, por

parte de gestores públicos de escolas e de Secretarias de Educação.

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260

APÊNDICE A – Questionário para conhecer o perfil dos professores-

participantes

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

Estudos Pós-graduados em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem

(LAEL)

Mestrado em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem

Este questionário é confidencial. Suas respostas serão usadas,

exclusivamente, para uma pesquisa de Mestrado em Linguística Aplicada e

Estudos da Linguagem. O objetivo desta pesquisa é mapear quais são as

estratégias de ensino que emergem nas aulas de língua inglesa na Educação

de Jovens e Adultos, no município de São Bernardo do Campo (SP). A sua

participação é essencial na constituição dos dados. Por favor, não deixe

nenhuma resposta em branco.

Parte I – Dados pessoais

Nome completo: __________________________________________________

Idade: ________________________ Gênero: __________________________

Naturalidade: ____________________________________________________

Estado civil: ____________________________________________________

Parte II – Informações sobre a formação acadêmica e a atuação

profissional.

01. Graduação

Curso: _________________________________________________________

Instituição: ______________________________________________________

Conclusão (mês / ano): ____________________________________________

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02. Qual a modalidade do seu curso de graduação?

( ) presencial

( ) semipresencial

( ) a distância.

03. Que modalidades de cursos de pós-graduação você fez?

( ) Aperfeiçoamento

Curso: _________________________________________________________

Instituição: ______________________________________________________

Conclusão (mês/ano): _____________________________________________

( ) Especialização (mínimo de 360 horas)

Curso: _________________________________________________________

Instituição: ______________________________________________________

Conclusão (mês/ano): _____________________________________________

( ) Mestrado.

Curso: ________________________________________________________

Instituição: ______________________________________________________

Tema de pesquisa: _______________________________________________

Conclusão (mês/ano): _____________________________________________

( ) Doutorado

Curso: _________________________________________________________

Instituição: ______________________________________________________

Tema de pesquisa: _______________________________________________

Conclusão (mês/ano): _____________________________________________

( ) Ainda não fiz nenhum curso de pós-graduação.

04. Durante seus estudos de graduação e / ou de pós-graduação, você cursou

alguma disciplina relacionada especificamente à Educação de Jovens e

Adultos?

( ) Sim

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262

( ) Não

05. Na graduação e/ou na pós-graduação, a Educação de Jovens e Adultos foi

tema de alguma disciplina? Comente isso.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

06. Você estudou ou tem estudado a língua inglesa em algum centro de

idiomas? Em caso afirmativo, determine a duração dos seus estudos e onde

estudou. Você pode mencionar mais de um centro de idiomas.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

______________________________________________________________

07. Como surgiu o seu interesse pela língua inglesa? Comente sua resposta.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

08. Há quanto tempo você é professor de língua inglesa?

( ) menos de 1 ano.

( ) de 1 a 5 anos.

( ) de 6 a 10 anos.

( ) 11 a 15 anos.

( ) há mais de 15 anos.

09. Você gosta de ser professor de língua inglesa? Comente sua resposta.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

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263

10. Quais são os desafios que você enfrenta como professor de língua inglesa?

Comente sua resposta.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

Parte III – Informações sobre a atuação profissional no contexto

específico da Educação de Jovens e Adultos

11. Onde você é professor? (Em caso de acúmulo, escreva o nome da(s)

escola(s) onde atua. Se essa(s) escola(s) for(em) em outro município, escreva,

também, o nome da rede de que é funcionário(a)).

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

12. Há quanto tempo você é professor de língua inglesa da Secretaria de

Educação de São Bernardo do Campo?

( ) menos de 1 ano.

( ) de 1 a 5 anos.

( ) de 6 a 10 anos.

13. Você participa dos momentos formativos para professores da Secretaria de

Educação de São Bernardo do Campo?

( ) Sim.

( ) Não.

14. Para quais termos, na Educação de Jovens e Adultos, você leciona a língua

inglesa?

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

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15. Qual é a sua jornada de trabalho na Educação de Jovens e Adultos?

Comente, em sua resposta, a sua carga horária dentro e fora da escola, e o

período do dia em que atua.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

16. Você já havia trabalhado como professor da Educação de Jovens e

Adultos, antes do ingresso na Secretaria de Educação de São Bernardo do

Campo? Se esse for o seu caso, comente sua(s) experiência(s) anterior(es)

nessa modalidade.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

17. Que motivos o/a levaram a escolher a Educação de Jovens e Adultos,

como contexto de trabalho? Comente-os.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

Parte IV – Informações sobre o contexto escolar em que o professor atua,

na Educação de Jovens e Adultos

18. Como são os seus alunos na Educação de Jovens e Adultos? Escreva

sobre eles. Considere as faixas etárias, as condições socioeconômicas e os

enfrentamentos mais comuns entre os alunos.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

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265

19. Como é a relação entre a escola e a comunidade? Comente-a.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

20. Informe alguns dados sobre a escola-sede em que você trabalha:

a) Nome da escola: ______________________________________________

b) Bairro da escola: ______________________________________________

c) Outra(s) modalidade(s) de ensino, além da EJA, oferecida(s) na escola:

( ) Creche

( ) Ensino infantil (EMEI)

( ) Ensino Fundamental I

( ) Ensino Profissionalizante

d) Número de alunos atendidos pela escola: ____________________________

e) Quantos alunos, em média, são matriculados nas turmas da Educação de

Jovens e Adultos? ________________________________________________

f) Quantos alunos frequentam, ao longo do semestre, as aulas da Educação de

Jovens e Adultos?_________________________________________________

g) Número de profissionais que compõem a gestão escolar:

_______________________________________________________________

h) Número de profissionais da gestão escolar que acompanham, diariamente,

os professores e os alunos da Educação de Jovens e Adultos:

______________________________________________________________

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266

21. Aspectos estruturais

Em relação aos aspectos

estruturais:

Sim Não Parcialmente

a) a pintura da escola é satisfatória?

b) há bebedouros em número

suficiente, para atender à

comunidade escolar?

c) há ventiladores nas salas de aula?

d) há banheiros em número

suficiente, para atender à

comunidade escolar?

e) a escola tem acessibilidade?

(elevadores, rampas, piso

antiderrapante etc.)

f) o mobiliário da escola é adequado

para os jovens e os adultos?

g) a escola possui biblioteca?

h) o acervo da biblioteca contém

obras apropriadas para os alunos

jovens e adultos?

i) a escola tem anfiteatro ou

auditório?

j) a escola possui quadra?

l) a escola tem laboratório de

informática?

m) existe algum espaço para a

socialização entre os alunos da

Educação de Jovens e Adultos?

n) a escola possui refeitório para os

alunos?

o) há algum problema no

fornecimento de água e / ou de luz na

escola?

Page 269: Estratégias de ensino de Língua Inglesa e …...SATYRO, Diego. Estratégias de ensino de língua inglesa e afetividade na EJA: olhares múltiplos. 2018. 286 f.Dissertação (Mestrado

267

22. Materiais e equipamentos

A unidade escola oferece Sim Não Parcialmente

a) televisão?

b) projetor (Data Show)?

c) aparelho de som?

d) internet Wi-Fi para os

funcionários?

e) internet Wi-Fi para os alunos?

f) equipamentos de som (caixas,

amplificadores, microfones etc.)?

g) impressora?

h) tablets?

i) máquina fotográfica?

j) computadores para os

funcionários?

l) computadores para os alunos?

m) livros didáticos para os alunos da

Educação de Jovens e Adultos?

n) material escolar (lápis, caderno,

tesoura, caneta etc.) para os alunos?

23. Que problemas relacionados à arquitetura escolar ou a equipamentos

eletrônicos você percebe como os maiores complicadores para o ensino e a

aprendizagem de língua inglesa? Comente isso.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

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268

Parte V - Informações sobre o contexto de ensino do professor, na

Educação de Jovens e Adultos

24. Que fatores contextuais você considera importantes ao planejar suas

aulas? Cite alguns deles e comente-os.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

25. Que estratégias de ensino você mais usa em sala de aula? Cite e

comente duas delas. (Por exemplo: organizar os alunos em grupos e trabalhar

com textos autênticos). 144

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

26. Que estratégias de ensino você reconhece como eficientes, mas usa

pouco em sala de aula? Cite e comente duas delas. (Por exemplo: organizar os

alunos em grupos e trabalhar com textos autênticos).

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

144

Há diferenças na numeração das questões deste questionário, se as versões online e impressa dele foram comparadas. À época da produção dos dados, adaptamos este instrumento de pesquisa ao formato Google forms. Ao fazermos isso, alguns ajustes foram necessários. Resultado: embora as questões sejam exatamente as mesmas, os números delas variam um pouco (por exemplo, a questão 25, acima, aparece, na seção Apresentação e discussão dos dados, como questão 27).

Page 271: Estratégias de ensino de Língua Inglesa e …...SATYRO, Diego. Estratégias de ensino de língua inglesa e afetividade na EJA: olhares múltiplos. 2018. 286 f.Dissertação (Mestrado

269

27. Você é adepto de algum método para o ensino de língua inglesa? Comente

sua resposta.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

28. O que você entende por método de ensino de língua inglesa? Comente

sua definição e dê exemplos.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

29. O que você entende por abordagem de ensino de língua inglesa?

Comente sua definição e dê exemplos.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

30. O que você entende por estratégias de ensino? Define-as e dê exemplos.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

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31. O que você entende por estratégias de aprendizagem ou estratégias do

aprendiz (learner’s strategies)? Define-as e dê exemplos.

_______________________________________________________________

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270

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

Parte VI - Informações sobre o Currículo Crítico-Libertador, na Educação

de Jovens e Adultos

32. O que você entende pelo Currículo Crítico-Libertador, proposto pela

Secretaria de Educação de São Bernardo do Campo?

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

33. O que você entende por falas significativas, na perspectiva do Currículo

Crítico-Libertador? Dê dois exemplos.

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_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

34. Você planeja o Currículo de língua inglesa a partir das falas significativas

dos educandos? Comente isso e dê um exemplo.

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35. Qual é a metodologia de ensino do Currículo Crítico-Libertador? Descreva-

a.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

36. Você considera que o Currículo Crítico-Libertador contribui para o ensino-

aprendizagem de língua inglesa na Educação de Jovens e Adultos? Comente

sua resposta.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

37. Em outro contexto de trabalho, fora do âmbito da Educação de Jovens e

Adultos, você usa ou usaria a metodologia do Currículo Crítico-Libertador, para

ensinar a língua inglesa? Comente sua resposta.

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272

APÊNDICE B – Questionário para o levantamento de estratégias de ensino

usadas pelos professores-participantes

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

Estudos Pós-graduados em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem

(LAEL)

Mestrado em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem

Este formulário é confidencial. Suas respostas serão usadas, exclusivamente,

para uma pesquisa de Mestrado em Linguística Aplicada e Estudos da

Linguagem. O objetivo desta pesquisa é mapear quais são as estratégias de

ensino que emergem nas aulas de língua inglesa na Educação de Jovens e

Adultos, no município de São Bernardo do Campo (SP). A sua participação é

essencial na constituição dos dados. Por favor, não deixe nenhuma resposta

em branco.

Nome fictício: __________________________________________________

Leia as estratégias abaixo. Elas são uma confluência de dois textos escritos

por B. Kumaravadivelu: “The Postmethod Condition: (E)merging Strategies for

Second / Foreign Language Teaching” (1994) e “Beyond methods:

macrostrategies for language teaching” (2003). Marque (X) em S ( ), isto é,

SIM, as estratégias que, com frequência, você entende usar, em sala de aula,

no contexto da Educação de Jovens e Adultos.

Page 275: Estratégias de ensino de Língua Inglesa e …...SATYRO, Diego. Estratégias de ensino de língua inglesa e afetividade na EJA: olhares múltiplos. 2018. 286 f.Dissertação (Mestrado

273

Macroestratégia 1: Maximizar oportunidades de aprendizagem

M1A1. S ( ) N ( ) Modificar, continuamente, o plano de ensino a partir do

feedback do aluno.

M1A2. S ( ) N ( ) Planejar o curso e as aulas de língua inglesa a partir dos

desejos, das vontades e dos objetivos expressos pelos alunos.

M1A3. S ( ) N ( ) Trazer o erro particular de um aluno para a atenção da

turma.

Macroestratégia 2: Facilitar a interação negociada.

M2A1. S ( ) N ( ) Organizar os alunos em duplas.

M2A2. S ( ) N ( ) Organizar os alunos em grupos.

M2A3. S ( ) N ( ) Criar momentos em que o aluno clarifique o que outro

colega ou o próprio professor disse (sobre conteúdos da língua inglesa).

M2A4. S ( ) N ( ) Criar momentos em que o aluno confirme a compreensão

de outro colega ou do próprio professor (sobre conteúdos da língua inglesa).

M2A5. S ( ) N ( ) Criar momentos em que o aluno faça solicitações a outros

colegas ou ao próprio professor, para compreender com mais profundidade

conteúdos da língua inglesa.

M2A6. S ( ) N ( ) Encorajar o aluno a falar “em cima” da fala de outro aluno,

com foco nos conteúdos da aula de língua inglesa.

M2A7. S ( ) N ( ) Encorajar o aluno a trocar turnos com outros colegas, em

língua inglesa.

M2A8. S ( ) N ( ) Encorajar o aluno a iniciar a conversa, em língua inglesa.

M2A9. S ( ) N ( ) Criar momentos de discussão em grupo em língua inglesa.

M2A10. S ( ) N ( ) Fazer questões, em língua inglesa, que exijam respostas

abertas (por exemplo: What’s your opinion on...?”; “What do you think about

....?” etc.).

M2A11. S ( ) N ( ) Fazer questões, em língua inglesa, que exijam respostas

fechadas (“Do you like...?”; “Do you eat...?” etc.).

M2A12. S ( ) N ( ) Criar momentos em que o controle do tópico

conversacional (meios de transporte na cidade, alimentos etc.) seja feito pelo

aluno.

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274

Macroestratégia 3: Minimizar desencontros perceptuais

M3A1. S ( ) N ( ) Retomar, em sala de aula, os objetivos pedagógicos a

curto e /ou a longo prazo.

M3A2. S ( ) N ( ) Interpretar o repertório linguístico (sintático, semântico e

pragmático, na língua inglesa) dos alunos, para planejar as atividades, em sala

de aula.

M3A3. S ( ) N ( ) Interpretar as estratégias de aprendizagem do aluno (como

registrar o vocabulário no caderno ou repetir palavras em língua inglesa, após o

professor), isto é, operações, rotinas, passos, planos, para obter, memorizar e

usar a língua estrangeira.

M3A4. S ( ) N ( ) Interpretar o conhecimento prévio dos alunos sobre

normas culturais para aprender a língua inglesa, no contexto da sala de aula.

M3A5. S ( ) N ( ) Interpretar os modos de autoavaliação dos alunos para

medir a própria aprendizagem deles.

M3A6. S ( ) N ( ) Interpretar os percursos dos alunos para resolver

situações-problema específicas, na língua inglesa, como selecionar

informações ou deduzir o significado de determinado item lexical.

M3A7. S ( ) N ( ) Interpretar os conhecimentos prévios dos alunos sobre as

instruções dadas pelo professor ou pelo autor do livro didático, para resolver

exercícios.

M3A8. S ( ) N ( ) Interpretar as atitudes dos alunos sobre o ensino e a

aprendizagem da língua inglesa.

Macroestratégia 4: Ativar a intuição heurística

M4A1. S ( ) N ( ) Explicitar, em detalhes, regras gramaticais da língua

inglesa (por exemplo: quando o sujeito da frase for a terceira pessoa do

singular, no simple present, usa-se does, não do, como verbo auxiliar).

M4A2. S ( ) N ( ) Analisar corpus linguístico, com o objetivo de ajudar os

alunos a aprenderem gramática, em língua inglesa.

M4A3. S ( ) N ( ) Oferecer uma vasta gama de textos, de modo que os

alunos infiram algumas regras gramaticais.

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275

M4A4. S ( ) N ( ) Encorajar os alunos a encontrarem a regra gramatical que

“governa” certas estruturas.

Macroestratégia 5: Estimular a conscientização linguística

M5A1. S ( ) N ( ) Ensinar estruturas gramaticais da língua inglesa com foco

no professor, de modo linear e hierárquico.

M5A2. S ( ) N ( ) Ensinar princípios gerais de uso da língua inglesa (por

exemplo: enunciados interrogativos em L2 apresentam o verbo auxiliar no

começo da frase).

M5A3. S ( ) N ( ) Ensinar estratégias de memorização de regras gramaticais.

M5A4. S ( ) N ( ) Criar momentos de reflexão, em sala de aula, sobre o

papel da língua inglesa na sociedade em que os alunos estão inseridos.

M5A5. S ( ) N ( ) Examinar a realidade do uso da língua inglesa no contexto

em que você, professor/a, está inserido/a.

M5A6. S ( ) N ( ) Conectar o ensino da língua inglesa à concepção de

educação da escola e da Secretaria de Educação em que alunos e professor

estão inseridos.

M5A7. S ( ) N ( ) Planejar exercícios que não exijam uma resposta correta,

mas que permitam múltiplas interpretações, desde que elas sejam plausíveis.

M5A8. S ( ) N ( ) Encorajar os alunos a reconhecerem uma variedade de

pontos de vista sobre temas e tópicos de língua inglesa.

M5A9. S ( ) N ( ) Pedir aos alunos para discutirem como alguns tópicos

podem ser vistos de outra forma, considerando a perspectiva cultural e

linguística deles.

M5A10. S ( ) N ( ) Encorajar os alunos a registrarem, por escrito (como

numa espécie de “diário de bordo”), os exemplos de uso linguístico ou de

práticas sociais que particularmente os “provocam”.

Macroestratégia 6: Contextualizar input linguístico

M6A1. S ( ) N ( ) Contextualizar os diferentes textos (orais e escritos), para

facilitar a compreensão do aluno.

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276

M6A2. S ( ) N ( ) Explorar, com os alunos, os fatores linguísticos de um texto

combinados aos fatores extralinguísticos, situacionais e extrasituacionais (isto

é: fatores ligados à semântica, à pragmática e ao discurso).

M6A3. S ( ) N ( ) Ensinar tópicos linguísticos por meio de frases curtas e

isoladas.

M6A4. S ( ) N ( ) Focar, em alguns momentos, fatores relacionados à

coesão e à coerência do texto.

M6A5. S ( ) N ( ) Mostrar para os alunos como uma mesma palavra /

sentença pode ser interpretada de diferentes maneiras, de acordo com o

contexto de uso (spring ou sheet).

M6A6. S ( ) N ( ) Mostrar para os alunos como o quadro cultural interfere na

seleção linguística do locutor.

M6A7. S ( ) N ( ) Mostrar para os alunos como a mudança na sílaba tônica

de certas palavras pode interferir na comunicação (can do versus can’t do / shit

versus sheet).

M6A8. S ( ) N ( ) Criar atividades em que os alunos façam role-play

(desempenhem “papéis”, como numa esquete teatral).

M6A9. S ( ) N ( ) Criar atividades em que os alunos executem tarefas dentro

de uma situação pré-estabelecida (pedir informações sobre bagagem

extraviada, no balcão de um aeroporto).

M6A10. S ( ) N ( ) Aplicar atividades do tipo cloze procedure, isto é, retirar

palavras de um texto e pedir aos alunos que o completem a partir do repertório

linguístico deles.

Macroestratégia 7: Integrar habilidades linguísticas

M7A1. S ( ) N ( ) Criar atividades que envolvam a integração de diferentes

habilidades (reading com speaking ou listening com writing).

M7A2. S ( ) N ( ) Criar atividades que segreguem as diferentes habilidades

(atividade com foco em reading; atividade com foco em speaking; atividade

com foco em writing etc.).

M7A3. S ( ) N ( ) Encorajar os alunos a tomarem notas (por escrito) a partir

do que o professor diz em L2 (integração entre listening e writing).

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277

M7A4. S ( ) N ( ) Encorajar os alunos a fazerem tempestades de ideias, em

L2, em duplas ou em grupos, ou a consultarem a internet e a biblioteca escolar,

para fazerem alguma atividade (integração entre reading, speaking, listening e

writing).

M7A5. S ( ) N ( ) Encorajar os alunos a planejarem uma apresentação, para

a turma, em L2, sobre os dados coletados em uma pesquisa (integração entre

reading, speaking, listening e writing).

M7A6. S ( ) N ( ) Criar momentos de culminância de uma pesquisa, em L2,

que engajem toda a turma em uma discussão (integração entre reading,

writing, speaking e listening).

Macroestratégia 8: Promover a autonomia do aluno

M8A1. S ( ) N ( ) Considerar o grau de autonomia dos alunos em termos de

objetivos, de realização de tarefas e de avaliação.

M8A2. S ( ) N ( ) Ajudar os alunos a desenvolverem o pensamento crítico.

M8A3. S ( ) N ( ) Ajudar os alunos a desenvolverem a tomada de decisões e

ação independentemente, no contexto da aprendizagem de L2.

M8A4. S ( ) N ( ) Ajudar os alunos a descobrirem o potencial de

aprendizagem deles.

M8A5. S ( ) N ( ) Ajudar os alunos a terem responsabilidade pela própria

aprendizagem.

M8A6. S ( ) N ( ) Ajudar os alunos a lidarem com demandas psicológicas

que exijam deles confrontar suas fraquezas e pontos fracos.

M8A7. S ( ) N ( ) Ajudar os alunos a se autocontrolarem.

M8A8. S ( ) N ( ) Ajudar os alunos a desenvolverem autodisciplina.

M8A9. S ( ) N ( ) Ajudar os alunos a desistirem da total dependência do

professor.

M8A10. S ( ) N ( ) Ajudar os alunos a compreenderem que a autonomia será

desenvolvida por meio da interação (do aluno com outro aluno, do aluno com o

professor, do aluno com a tarefa, do aluno com o ambiente de aprendizagem).

M8A11. S ( ) N ( ) Conhecer a personalidade dos alunos, para, por meio

disso, relacionar o desenvolvimento da autonomia com o contexto da sala de

aula.

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M8A12. S ( ) N ( ) Negociar com os alunos os objetivos da aula de língua

inglesa.

M8A13. S ( ) N ( ) Negociar com os alunos a metodologia de trabalho na

aula de língua inglesa.

M8A14. S ( ) N ( ) Encorajar uma discussão, em sala de aula, sobre o que é

uma língua e a aprendizagem de uma língua estrangeira.

M8A15. S ( ) N ( ) Ajudar os alunos a se tornarem conscientes das possíveis

estratégias de aprendizagem de L2 disponíveis a eles.

M8A16. S ( ) N ( ) Criar um ambiente em que os alunos sintam que possam

experimentar a L2.

M8A17. S ( ) N ( ) Permitir aos alunos que formem seus próprios pontos de

vista sobre a aprendizagem de L2 e que respeitem os pontos de vista de outros

colegas.

M8A18. S ( ) N ( ) Aconselhar alguns alunos, individualmente, sobre seus

percursos de aprendizagem.

M8A19. S ( ) N ( ) Desenvolver uma atividade do tipo “Perfil do Aprendiz”,

em que os alunos identificam seus objetivos, suas estratégias e seus estilos de

aprendizagem.

Macroestratégia 9: Aumentar a consciência cultural

M9A1. S ( ) N ( ) Explorar a diversidade (idade, gênero, cor etc.) da sala de

aula como propósito de ensino e de aprendizagem.

M9A2. S ( ) N ( ) Trazer, para a sala de aula, o conhecimento cultural dos

alunos.

M9A3. S ( ) N ( ) Criar momentos em que os alunos compartilhem seus

conhecimentos culturais com o / a professor/a e com os outros colegas de

turma cujas perspectivas de vida sejam diferentes.

M9A4. S ( ) N ( ) Conscientizar os alunos sobre a conexão complexa entre o

uso da língua e a identidade cultural.

M9A5. S ( ) N ( ) Sensibilizar os alunos à riqueza cultural que está em torno

da escola.

M9A6. S ( ) N ( ) Reconhecer e contemplar a bagagem cultural dos alunos e

suas identidades individuais.

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M9A7. S ( ) N ( ) Desenvolver atividades que “desmontem” estereótipos

constituintes de má comunicação e de desentendimentos.

M9A8. S ( ) N ( ) Ajudar os alunos a “lerem” eventos culturais e atividades

que dialogam com a experiência deles (por exemplo: saraus de poesia na

comunidade, show de talentos etc.).

M9A9. S ( ) N ( ) Aplicar um Perfil Cultural aos alunos, com o objetivo de

saber as atividades culturais nas quais eles se engajam.

M9A10. S ( ) N ( ) Problematizar com os alunos o que é cultura.

M9A11. S ( ) N ( ) Discutir, com a turma, a compreensão de cultura que os

alunos têm.

M9A12. S ( ) N ( ) Explorar, em sala de aula, a cultura (feriados, datas

comemorativas, festas nacionais, esportes etc.) dos países nativos de língua

inglesa.

Macroestratégia 10: Garantir a relevância social

M10A1. S ( ) N ( ) Usar a língua portuguesa logo após perguntas feitas em

L2, para criar uma “atmosfera de abertura” para os alunos.

M10A2. S ( ) N ( ) Dar direções claras em língua portuguesa, para evitar

problemas de comunicação na sala de aula.

M10A3. S ( ) N ( ) Dar explicações simples em língua portuguesa, para que

os alunos entendam certos conceitos facilmente.

M10A4. S ( ) N ( ) Focalizar e preparar atividades sobre palavras

transparentes ou cognatas e sobre falsos cognatos (false friends).

M10A5. S ( ) N ( ) Focalizar e preparar atividades sobre empréstimos

linguísticos de L2 para L1 (e vice-versa).

M10A6. S ( ) N ( ) Preparar / selecionar materiais que foquem a cultura de

um país onde L2 seja a língua oficial.

M10A7. S ( ) N ( ) Preparar / selecionar materiais que foquem a cultura

brasileira (isto é, a cultura dos alunos), mas sejam escritos em L2.

M10A8. S ( ) N ( ) Preparar / selecionar materiais que foquem uma

variedade de países, sejam eles falantes da língua inglesa ou não.

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Macroestratégia 11: Refletir sobre a afetividade

M11A1. S ( ) N ( ) Caminhar pela sala de aula, para tirar as dúvidas dos

alunos.

M11A2. S ( ) N ( ) Cumprimentar os alunos, quando eles chegam à sala de

aula.

M11A3. S ( ) N ( ) Elogiar a participação individual de alguns alunos, em um

momento pontual da aula (por exemplo: quando o / a aluno /a acerta a resposta

de algum exercício ou quando lembra a tradução de alguma palavra já

ensinada).

M11A4. S ( ) N ( ) Elogiar a participação da turma, em um momento pontual

da aula (por exemplo: quando os alunos repetem, com entusiasmo, as palavras

ditas pelo/a professor/a ou quando participam ativamente de alguma atividade,

em pequenos grupos).

M11A5. S ( ) N ( ) Corrigir o erro de algum aluno/a, assinalando a

importância da participação dele/a.

M11A6. S ( ) N ( ) Receber os alunos, à porta da sala de aula,

cumprimentando-os, individualmente.

M11A7. S ( ) N ( ) Solicitar, individualmente, aos alunos que façam a

atividade da aula, quando há aparente desinteresse.

M11A8. S ( ) N ( ) Solicitar aos alunos que façam a atividade da aula,

quando há aparente desinteresse, na frente da turma.

M11A9. S ( ) N ( ) Perguntar aos alunos faltantes o motivo pelo qual eles

têm faltado à aula com frequência.

M11A10. S ( ) N ( ) Enfatizar a força de vontade dos alunos da Educação de

Jovens e Adultos por terem decidido voltar à escola, para toda a turma.

M11A11. S ( ) N ( ) Falar sobre as suas próprias dificuldades para os

alunos, narrando momentos da sua vida (como professor/a, como estudante,

como filho/a, como marido/ esposa, como cidadão / ã etc.).

M11A12. S ( ) N ( ) Organizar jogos, na sala de aula, para “quebrar o gelo”,

isto é, para estabelecer um clima agradável e divertido, na sala de aula.

M11A13. S ( ) N ( ) Encorajar os alunos a reconhecerem o esforço dos

colegas de turma.

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M11A14. S ( ) N ( ) Encorajar os alunos a se preocuparem com a falta à

aula do colega de turma.

M11A15. S ( ) N ( ) Encorajar os alunos a não desistirem de terminar o

curso na Educação de Jovens e Adultos, finalizando a educação básica.

M11A16. S ( ) N ( ) Encorajar a colaboração em sala de aula, de modo que

os alunos com mais dificuldade em aprender a L2 não se sintam sozinhos ou

solitários.

M11A17. S ( ) N ( ) Apaziguar os alunos que se sentem “inaptos” a aprender

a língua inglesa, reagindo aos comentários deles (por exemplo: “Eu não vou

aprender inglês!”), com palavras de confiança.

M11A18. S ( ) N ( ) Valorizar as relações de afeto que são construídas entre

alunos e professor/a, em todos os espaços escolares (não se limitando à sala

de aula, como, por exemplo, o pátio, o refeitório, a sala dos professores etc.).

M11A19. S ( ) N ( ) Tratar o erro particular de um/a aluno/a (por exemplo: a

forma de pronunciar alguma palavra) de forma descontraída.

M11A20. S ( ) N ( ) Chamar os alunos, na sala de aula, sempre pelo nome

próprio deles.

M11A21. S ( ) N ( ) Aproximar-se do lugar onde está o/a aluno/a ansioso/a

por não conseguir fazer alguma atividade ou por se sentir “inapto” a aprender

L2, acalmando-o/a.

M11A22. S ( ) N ( ) Ouvir, de forma não preconceituosa, os relatos dos

alunos sobre a perspectiva e o modo de vida deles.

M11A23. S ( ) N ( ) Refletir sobre os laços construídos, na sala de aula,

entre os próprios alunos.

M11A24. S ( ) N ( ) Parabenizar o/a aluno/a que relata situações de sucesso

na vida escolar e na pessoal dele/a (por exemplo: um relato sobre a formatura

de um filho na faculdade ou sobre o êxito em uma avaliação de matemática).

Que outras estratégias (ações), fora dessa lista, você ativa, em sala de aula?

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

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APÊNDICE C – Termo de consentimento livre e esclarecido

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

Estudos Pós-graduados em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem

(LAEL)

Mestrado em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem

Eu, ____________________________________________________________,

portador(a) do RG nº _______________________________, declaro que fui

apropriadamente informado(a) sobre a pesquisa de Mestrado “Estratégias de

ensino de língua inglesa na Educação de Jovens e Adultos”, desenvolvida pelo

pesquisador Diego Satyro, sob a orientação da Profa. Dra. Maria Antonieta

Alba Celani, do Programa de Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem

(LAEL), da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

O pesquisador esclareceu quais são seus objetivos de pesquisa, a saber:

coletar dados sobre estratégias de ensino usadas por professores de língua

inglesa, no contexto da Educação de Jovens e Adultos, por meio de

questionário, filmagem da performance do educador em sala de aula e

entrevista. Além do mais, autorizo o uso da minha imagem. Fui prevenido(a),

ainda, de que poderei interromper a minha colaboração nesta pesquisa, em

qualquer etapa do seu desenvolvimento. O pesquisador manterá sigilo total

sobre minha identidade e sobre os meus dados. Por fim, também fui avisado de

que os dados constituídos serão parte de uma dissertação de mestrado para

uma banca examinadora formada por professores doutores. A versão final

desse texto será disponibilizada em meio físico e em meio eletrônico, para

posterior consulta.

Desse modo, concordo em participar desta pesquisa.

São Bernardo do Campo, _______ de ___________, 2016.

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283

Nome do professor-participante: ____________________________________

Assinatura: _____________________________________________________

CPF: ____________________________ RG: _________________________

Endereço: ______________________________________________________

E-mail: ________________________________________________________

Telefone para contato: ____________________________________________

Nome da primeira testemunha: _____________________________________

Assinatura: _____________________________________________________

CPF: ____________________________ RG: _________________________

Nome da segunda testemunha: _____________________________________

Assinatura: _____________________________________________________

CPF: ____________________________ RG: _________________________

Pesquisador: Diego Satyro

CPF: 37056200885 RG: 34491089-1

Assinatura do pesquisador: ________________________________________

Page 286: Estratégias de ensino de Língua Inglesa e …...SATYRO, Diego. Estratégias de ensino de língua inglesa e afetividade na EJA: olhares múltiplos. 2018. 286 f.Dissertação (Mestrado

284

ANEXO A – Handout usado pelo professor Valter

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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

PUC-SP

Diego Satyro

Estratégias de ensino de Língua Inglesa e

afetividade na EJA: olhares múltiplos

Mestrado em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem

São Paulo

2018