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VII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Lisboa, Portugal, 8-11 Oct. 2002 Estado, sociedade e democracia em contextos de mudanças tecnológicas : uma perspectiva política das novas relações entre estado e sociedade Ana Benvinda Teixeira Lage Secretária de Administração do Estado da Bahia 1. INTRODUÇÃO: AS QUESTÕES E OS SEUS PROBLEMAS. Nas décadas recentes as relações entre Estado e sociedade nas democracias ocidentais têm passado por profundas transformações estruturais. Não se trata apenas de mudanças nas formas institucionais dos canais clássicos de representação política, dimensão onde o aprofundamento conceitual da idéia de cidadania e a ampliação do escopo social da democracia têm induzido a novos modelos institucionais de participação e de acesso às arenas estatais. Trata-se também de mudanças nos padrões das demandas sociais e nas formas organizacionais adotadas pelo Estado para responder a uma sociedade que vem apresentando um grau crescente de complexidade tecnológica e cultural. De fato, o processo de modernização tecnológica e cultural das últimas décadas, que vem ocorrendo principalmente nas regiões mais urbanizadas do mundo, desencadeou novos padrões de sociabilidade e formas interativas entre grupos antes dispersos territorialmente ou separados pelas barreiras da estratificação social. Na América Latina, a essas transformações estruturais deve-se acrescentar a crise de financiamento dos Estados latino-americanos e a conseqüente necessidade de captar recursos em um mercado globalizado, de alta competitividade, e operando sobre uma base tecnológica que requer grandes investimentos em infra-estrutura tecnológica e agentes públicos socializados nos códigos e padrões operacionais das novas redes de comunicação. Essas transformações obrigaram os Governos do continente nos anos 80 a responderem a requisitos sócio-culturais, infra-estruturais e tecnológicos que eles não estavam plenamente preparados para enfrentar. Dois fatores históricos de longo curso estão na base dessa inadequação. Primeiro, historicamente os Estados do continente se estruturaram sobre sistemas político-representativos orientados para a exclusão de grande parte dos atores sociais dos centros decisórios, apresentado uma baixíssima competitividade política. Regra geral, as orientações dominantes assumidas pelos sistemas oligárquicos do continente (Dahl,1997; Santos,1993;1988; North,1990) não consideravam as reais demandas da sociedade e nem dispunham de instrumentos político-institucionais para capturar as demandas sociais e transformá-las em políticas públicas adequadas. Na ausência de sistemas representativos inclusivos, estruturados sobre princípios liberais que pudessem operar a transitividade entre política, sociedade e mercado, esses sistemas se esclerosaram, limitados que estavam pela própria dinâmica auto-referida de sua estruturação. Dessa forma, os inputs políticos, organizacionais e tecnológicos oriundos das transformações sócio-econômicas mundiais e das próprias sociedades nacionais passavam ao largo da agenda dos governos. Mas não se esclerosaram sozinhos, pois erodiram não apenas a legitimidade do próprio modelo representativo, mas também as bases organizacionais e operacionais de seus Estados, tornando-as inadequadas para coordenar eficientemente os agentes sociais em torno de projetos nacionais dinâmicos politicamente e abertos a processos de inovação tecnológica. A queda dos regimes populistas expressa justamente essa inadequação dos modelos políticos vigentes até os anos 60 ao processo de modernização urbano-industrial do continente (Weffort,1978; Ianni,1986). Um segundo fator foi o forte caráter patrimonialista das sociedades latino- americanas, que conduziu ao elitismo e a rigidez dos suportes institucionais e administrativos dessas sociedades, como foi o exemplo do Brasil (Faoro,1958). Cartorialismo e patrimonialismo foram os princípios norteadores de Estados diretamente envolvidos na produção econômica a partir dos anos 30, subsidiando os grupos corporativos que tinham acesso privilegiado às suas arenas setoriais. Também

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VII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Lisboa, Portugal, 8-11 Oct. 2002

Estado, sociedade e democracia em contextos de mudanças tecnológicas : uma perspectiva política das novas relações entre estado e sociedade

Ana Benvinda Teixeira Lage

Secretária de Administração do Estado da Bahia 1. INTRODUÇÃO: AS QUESTÕES E OS SEUS PROBLEMAS. Nas décadas recentes as relações entre Estado e sociedade nas democracias ocidentais têm passado por profundas transformações estruturais. Não se trata apenas de mudanças nas formas institucionais dos canais clássicos de representação política, dimensão onde o aprofundamento conceitual da idéia de cidadania e a ampliação do escopo social da democracia têm induzido a novos modelos institucionais de participação e de acesso às arenas estatais. Trata-se também de mudanças nos padrões das demandas sociais e nas formas organizacionais adotadas pelo Estado para responder a uma sociedade que vem apresentando um grau crescente de complexidade tecnológica e cultural.

De fato, o processo de modernização tecnológica e cultural das últimas décadas, que vem ocorrendo principalmente nas regiões mais urbanizadas do mundo, desencadeou novos padrões de sociabilidade e formas interativas entre grupos antes dispersos territorialmente ou separados pelas barreiras da estratificação social. Na América Latina, a essas transformações estruturais deve-se acrescentar a crise de financiamento dos Estados latino-americanos e a conseqüente necessidade de captar recursos em um mercado globalizado, de alta competitividade, e operando sobre uma base tecnológica que requer grandes investimentos em infra-estrutura tecnológica e agentes públicos socializados nos códigos e padrões operacionais das novas redes de comunicação. Essas transformações obrigaram os Governos do continente nos anos 80 a responderem a requisitos sócio-culturais, infra-estruturais e tecnológicos que eles não estavam plenamente preparados para enfrentar. Dois fatores históricos de longo curso estão na base dessa inadequação. Primeiro, historicamente os Estados do continente se estruturaram sobre sistemas político-representativos orientados para a exclusão de grande parte dos atores sociais dos centros decisórios, apresentado uma baixíssima competitividade política. Regra geral, as orientações dominantes assumidas pelos sistemas oligárquicos do continente (Dahl,1997; Santos,1993;1988; North,1990) não consideravam as reais demandas da sociedade e nem dispunham de instrumentos político-institucionais para capturar as demandas sociais e transformá-las em políticas públicas adequadas. Na ausência de sistemas representativos inclusivos, estruturados sobre princípios liberais que pudessem operar a transitividade entre política, sociedade e mercado, esses sistemas se esclerosaram, limitados que estavam pela própria dinâmica auto-referida de sua estruturação. Dessa forma, os inputs políticos, organizacionais e tecnológicos oriundos das transformações sócio-econômicas mundiais e das próprias sociedades nacionais passavam ao largo da agenda dos governos. Mas não se esclerosaram sozinhos, pois erodiram não apenas a legitimidade do próprio modelo representativo, mas também as bases organizacionais e operacionais de seus Estados, tornando-as inadequadas para coordenar eficientemente os agentes sociais em torno de projetos nacionais dinâmicos politicamente e abertos a processos de inovação tecnológica. A queda dos regimes populistas expressa justamente essa inadequação dos modelos políticos vigentes até os anos 60 ao processo de modernização urbano-industrial do continente (Weffort,1978; Ianni,1986). Um segundo fator foi o forte caráter patrimonialista das sociedades latino-americanas, que conduziu ao elitismo e a rigidez dos suportes institucionais e administrativos dessas sociedades, como foi o exemplo do Brasil (Faoro,1958). Cartorialismo e patrimonialismo foram os princípios norteadores de Estados diretamente envolvidos na produção econômica a partir dos anos 30, subsidiando os grupos corporativos que tinham acesso privilegiado às suas arenas setoriais. Também

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nesse caso o Brasil foi um exemplo clássico (Boschi,1991;Nunes,1997;Draibe,1985). Esses dois processos, convergentes na produção de sistemas político-institucionais fechados aos impulsos do processo de inovação social e tecnológica, estruturaram Estados organizacionalmente inadequados ao processo de modernização que posteriormente o mundo iria experimentar.

O problema da adoção de padrões tecnológicos e institucionais inadequados não é patrimônio da América Latina. Mas o quadro econômico que se configurou a partir dos anos 80 mostrou que tanto a fase desenvolvimentista quanto o período posterior do autoritarismo político constituíram-se em elos de continuidade de modelos políticos e econômicos inadequados aos novos padrões de competitividade e de disponibilidade financeira da economia internacional (Faucher,1993; Sallum e Kulgemas,1993; Malloy,1983). As pressões advindas da nova configuração do sistema internacional de Estados, caracterizadas pelos impulsos em favor da democratização e da abertura econômica (Whitead,1993;Hurrel,1993) puseram em xeque as deficiências dessas formas de estruturação sócio-institucional. O debate em torno das reformas do Estado deflagrado a partir dos anos 80 nos países do continente, veio justamente responder a esses desafios. Para a maior parte dos participantes do debate, tratava-se de reorientar as formas de organização institucional e administrativa dos Governos do continente em favor de modelos abertos à competitividade econômica e a novos padrões de interação com a sociedade civil. Nesse contexto, os modelos de reformas se disseminaram pelo continente (Spink,1998) através das agências multilaterais e das organizações especializadas, e os governos passaram a concentrar seus esforços na reorganização de suas bases organizacionais, administrativas e tecnológicas. Os modelos reformistas predominantes se concentraram nos mecanismos administrativos e técnicos das reformas. Em que pese a importância desses aspectos, a nossa perspectiva é a de que o debate necessita incorporar as dimensões político-institucionais mais amplas que referenciam as relações entre o Estado e a sociedade. Essa é a mediação social fundamental em contextos de intensa modernização econômica e sócio-cultural, e em regimes democráticos são essas relações que em última instância determinam os limites e as possibilidades políticas das reformas, assim como as formas administrativas e os conteúdos tecnológicos assumidos por elas.

O objetivo desse texto é justamente ressaltar alguns desses aspectos que consideramos essenciais na definição do quadro geral descrito acima. A nossa perspectiva é a de que a trajetória histórica das relações entre o Estado e a sociedade sempre foi mediada por três variáveis fundamentais. Em primeiro lugar, pelos i) modelos político-institucionais que referenciam o funcionamento das instituições políticas e a atuação das organizações sociais de cada país. Eles delimitam as interações possíveis entre os atores sociais e entre estes e o Estado, e condicionam as possibilidades de inovação social, visto que fornecem os parâmetros políticos para a ação social e delimitam as possibilidades administrativas das instituições estatais em períodos de mudanças. Em segundo, pelo ii) padrão tecnológico disponível em cada momento histórico. Esse padrão condiciona os limites da ação estatal no processo de coordenação social, visto que ele resolve os problemas relativos aos limites postos por uma sociedade diversificada socialmente e dispersa pelo território, tornando possível a coordenação política e a gestão econômica do território. Em terceiro lugar, pelos iii) modelos organizacionais e administrativos assumidos pelo Estado na alocação de serviços e infra-estrutura para a sociedade. Esses modelos condicionam as possibilidades de alocação eficiente e adequada dos serviços no território e a capacidade do Estado de flexibilizar seus padrões de respostas administrativas em momentos de mudanças intensas. Essas três variáveis condicionam os processos políticos substantivos das três dimensões fundamentais para a definição da qualidade e o perfil das relações entre Estado e sociedade civil: a) a capacidade de coordenação política e administrativa do Estado sobre a sociedade, definida pelos modelos político-institucionais e administrativos utilizados e pelo perfil da base técnica e operacional disponível para ele; as b) possibilidades de que indivíduos e grupos sociais organizados possam

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resolver os seus problemas da ação coletiva a partir de modelos políticos favoráveis e da disponibilidade de uma base técnica que favoreça as interações entre grupos sociais; e finalmente, c) a configuração e a qualidade do espaço público resultante dos tipos de interação que referenciam essas relações. Nos próximos tópicos tentaremos percorrer alguns momentos fundamentais da trajetória entre o Estado e a Sociedade, salientando os marcos político-institucionais e administrativos que serviram de parâmetro e de mediação política para essas relações e de que forma os padrões tecnológicos de cada período favoreceram determinadas tendências nesse processo. 2. MUDANÇAS POLÍTICAS E TRANSFORMAÇÕES NAS RESPONSABILIDADES SOCIAIS DO ESTADO NO

PROCESSO DE DEMOCRATIZAÇÃO.

Democratização, Direitos Sociais e Mudanças no Modelo Institucional do Estado A principal característica do processo de expansão do Estado moderno entre os séculos XVI e meados do século XIX foi que ele ocorreu principalmente através do estímulo ao desmonte das formas de organização social anteriormente vigentes. Polany (2000) demonstra magistralmente como os mecanismos de mercado deflagrados sob o estímulo e amparo do Estado liberal destruíram os antigos direitos dos pobres e trabalhadores secularmente incrustados nos Estatutos Elizabethanos. Esse era um processo que gerava uma forte tensão social e cabia ao poder político tentar conter esse potencial de conflito político. Ao final do século XVIII as transformações sócio-econômicas, políticas e culturais já eram intensas: mudanças nos padrões comportamentais dos indivíduos, início do processo de urbanização, decadência das barreiras estamentais herdadas do feudalismo, crescente pressão social pela igualdade política e o acelerado desenvolvimento tecnológico na produção eram os traços marcantes do período (Hobsbawn,1989). Tudo isso colocava para os doutrinadores políticos a questão de pensar modelos de Estado e estruturas governamentais adequadas à resolução das questões sociais e econômicas num período de intensa mobilização política. Tanto a Revolução Gloriosa de 1688, que pôs um fim definitivo no absolutismo inglês e foi influenciada decisivamente pelos doutrinadores liberais, quanto a Revolução Francesa de 1789, deflagrada em nome de Rousseau, são expressões históricas de um período onde se colocava dramaticamente a questão da institucionalização de um novo padrão de relações entre o Estado e sociedade civil. A partir desse período as pressões sociais por melhores condições de vida iriam se intensificar. Isso posicionava no centro das questões políticas o problema da modelagem organizacional e da estruturação institucional de um sistema representativo que carreasse para o interior do Estado, de forma controlada, as demandas da população. A resolução desse problema era um imperativo político de primeira grandeza, visto que a evolução da Revolução Industrial vinha fazendo terra arrasada das bases comunais do tecido social das sociedades européias, desbaratando as redes sociais das comunidades camponesas e expropriando milhões de pessoas que dependiam das suas múltiplas formas de enraizamento local (Polany,2000). A esse quadro, socialistas e liberais a partir do final do século XIX passaram a responder de formas distintas. Mas ambos contribuíram para que o processo de organização institucional e administrativa do Estado fosse reorientado para o provimento da infra-estrutura produtiva e os bens e serviços sociais requeridos pelo processo geral de modernização. Os primeiros com as pressões sociais por melhores condições de vida das massas trabalhadoras e fornecendo os conteúdos políticos igualitários para um Estado orientado para a produção do bem-estar social. Os segundos, fornecendo os modelos político-institucionais que serviriam de base para a resolução dos problemas da representação política. Coube aos Federalistas (1987) americanos a responsabilidade de formular o desenho de um

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sistema representativo adequado aos novos tempos, propondo um modelo de organização federativa que compatibilizasse as fortes demandas dos Estados e comunidades locais por maior autonomia política e decisória com um modelo que oferecesse um mínimo de eficiência operacional e equilíbrio político na escala nacional de governo. Sob o pragmatismo político dos federalistas, o modelo de pesos e contrapesos institucionais que caracteriza o modelo político-institucional americano foi capaz de propiciar estabilidade política e eficiência operacional e administrativa ao sistema político, sem deixar de respeitar a tradição de autonomia local das comunidades e as demandas dos Estados da Federação. Esse foi um modelo de engenharia institucional bem sucedido, que retém as suas principais características institucionais até os dias de hoje, tais como forte atribuição de poderes ao Legislativo e ao Judiciário, limitação constitucional do Poder Executivo, instituição de uma Casa de representação territorial- o Senado- para solucionar os problemas advindos dos pesos políticos diferenciados entre os Estados e elevado grau de autonomia política para Estados e Municípios. O funcionamento político desse sistema, orientado para o equilíbrio político entre os poderes republicanos e amparado na forte tradição associativa da sociedade americana, foi capaz de compatibilizar as demandas democráticas por igualdade social com o funcionamento eficiente do Governo num período onde o Estado passou a assumir crescentes responsabilidades sociais. A disponibilidade dessas alternativas político-institucionais para a viabilização de um sistema representativo veio ao encontro do processo de ampliação do escopo da cidadania, que impôs ao Estado moderno forte mudanças no seu modelo de organização institucional e administrativa. Nesse contexto, o surgimento do governo responsável perante a sociedade iria mudar completamente as relações entre os Estados liberais e as suas respectivas sociedades. Doravante o Estado iria se organizar administrativa e institucionalmente para fornecer respostas às pressões sociais por políticas de proteção social e pela alocação de infra-estrutura adequada à escala demográfica das cidades industrializadas. O clássico trabalho de Marshall (1967) demonstra como esse processo de afirmação da cidadania foi lento mas inexorável, na realidade um período que durou mais de seis séculos e envolveu a equalização das múltiplas dimensões dos direitos. Marschall entendeu a cidadania como a institucionalização de um status universal e uniforme de direitos dos membros da comunidade nacional, que substitui o status estamental baseado na hierarquia social. Trata-se de um fenômeno político representado pela troca da legitimidade dinástica do poder pela legitimidade do povo, abarcando a interdependência dos três tipos de direitos: civis, políticos e sociais. Mas os direitos civis são vinculados a denominada liberdade negativa, direitos que buscam uma esfera de liberdade em relação ao caráter coercitivo do Estado e não direitos positivos, de afirmação de novas conquistas. Já os direitos políticos são direitos individuais exercidos coletivamente, inseridos na denominada liberdade positiva. Eles foram delimitados institucionalmente pelo progressivo processo de racionalização jurídico-político do Estado através do sistema representativo e da consolidação da democracia no Estado de direito. Finalmente, os direitos sociais, corolário do processo de afirmação da cidadania, deflagrados ao final do século XIX e consolidados com a experiência do Welfare, impuseram aos Estados modernos novos papéis e obrigações perante as suas comunidades nacionais. Esse foi o processo final de transformação do Estado Protetor em Estado Provedor (Rosanvallon,1997).

A Estruturação Institucional do Welfare State e Sua Crise

Num contexto político crescentemente democrático, a disponibilidade de modelos político-institucionais de representação capazes de referenciar politicamente a ação administrativa dos governos, exerceu influência decisiva nas formas de estruturação organizacional e no perfil da ação administrativa do Estado social a partir do pós-guerra. A afirmação dos direitos sociais impôs aos Estados ocidentais industrializados novos tipos de compromisso em relação à sociedade civil. A partir do pós-guerra a agenda política desses Estados foi reorientada para o provimento de bens e serviços sociais universalizados, integrando a agenda

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administrativa do denominado Estado Provedor. Essa ampliação no escopo das obrigações estatais impôs uma particular forma de organização institucional e administrativa aos Estados. Eles foram reorganizados em direção à estruturação nacional dos sistemas previdenciários e na alocação de equipamentos e serviços infra-estruturais nas cidades. Na interpretação dos adeptos da convergência entre gastos sociais e desenvolvimento econômico, como Harold Wilenski, o Welfare seria um amplo fenômeno de institucionalização dos direitos sociais através da garantia estatal de padrões mínimos de renda, alimentação, saúde, habitação e educação, postos como direitos políticos e sociais inalienáveis. Para os teóricos da convergência, o incremento dos gastos sociais é o resultado do papel do Estado como substituto da família, das organizações filantrópicas e das comunidades locais, em resposta a um contexto onde a influência das mudanças políticas, tecnológicas e econômicas sobre a estrutura ocupacional, obriga o Estado a assumir crescentes funções sociais. Nessa perspectiva, esse modelo só foi possível porque a ação redistributiva do Estado foi compatível com o crescimento econômico e tecnológico do capitalismo contemporâneo; assim políticas sociais são percebidas como uma consequência do desenvolvimento tecnológico e econômico das modernas economias industriais (Faria,1998). Nessa vertente teórica, as políticas sociais se situam como variáveis dependentes de fatores demográficos e econômicos, e como em Marshall, a modernidade pode ser concebida como uma trajetória caracterizada pela inclusão social crescente através da ampliação dos direitos civis, políticos e sociais. Mas para operar todos os benefícios incrustados nesse sistema social, o Estado de Bem-Estar organizou as suas relações internas e com a sociedade de forma centralizada e automatizada. Não apenas os sistemas previdenciários eram geridos pelos governos nacionais, mas também todo o processo de alocação de serviços e equipamentos urbanos, num sistema onde governos locais exerciam o papel de gerentes operacionais dos equipamentos e serviços definidos pelos sistemas de administração centralizada dos governos nacionais. Mas a gestão nacional centralizada do enorme sistema administrativo encarregado de prover um escopo amplo de serviços e bens sociais, pressupunha uma grande disponibilidade de recursos, plenamente disponíveis apenas nos momentos de expansão econômica, quando o problema da subprodutividade dos capitais não se posicionava como um fator limitante para a manutenção do modelo. Mas passado a fase de expansão do imediato pós-guerra, erodiram as condições fiscais e estruturais que mantinham a legitimidade política do sistema de bem-estar como uma expressão do modelo social concertacional estruturado entre sindicatos, Estado e empresários(Offe,1989;1984). A crise fiscal que assolou os Estados nos anos 70 e 80 veio por em xeque as possibilidades de manutenção do modelo do Estado Provedor. Essa crise passou a ameaçar os suportes político e institucionais internos que estruturavam os sistemas de Welfare mais bem sucedidos: a capacidade administrativa e a coesão institucional. Por outro lado, a instabilidade social mostrou o lado regressivo da crise: a busca por segurança passou a preponderar sobre a afirmação da solidariedade social, gerando uma forte rejeição cultural ao Welfare(Rosanvallon,1987) As várias dimensões da crise do modelo de Welfare State foram conectadas e potencializadas pelas formas institucionais e administrativas desse sistema social: Estados baseados em forte burocratização fornecendo serviços altamente padronizados, organização administrativa centralizada, e um padrão de coordenação política orientado para a antecipação, o controle e o enquadramento social das demandas. Em certo sentido, trata-se de um modelo onde convergiam os traços organizacionais fundamentais do Estado racional-legal com os conteúdos sociais e políticos da matriz rousseauneana. Mas com a ressalva de que o processo de racionalização administrativa e a base tecnológica disponível para o Estado num contexto de democratização passiva inverteram a equação dessa matriz: a vontade social passou a ser definida no bojo do próprio Estado, tendo como referência uma burocracia que se reforçava e se expandia através da sua própria forma de existir.

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3. O DEBATE SOBRE A REFORMA DO ESTADO E SUAS ALTERNATIVAS POLÍTICAS E ADMINISTRATIVAS

Para além das razões institucionais internas da crise do Welfare, a crise dos anos 80 contribuiu decisivamente para a reformulação das formas organizacionais e administrativas que serviam de suporte para as operações dos Estados orientados para o bem-estar social. Nesse contexto, os governos conservadores de Tatcher e Regan foram os baluartes dos modelos neoliberais das reformas nos anos 80. Mas as opções desses governos se defrontaram com os modelos político-institucionais vigentes em seus respectivos países. Se nos Estados unitários o padrão centralizado de coordenação político-administrativa possibilitava a implementação de estratégias de reorganização administrativa e de transferência de certas atividades para o mercado, em países de desenho institucional federativo os entraves eram mais difíceis de serem removidos. Como demonstra a literatura neo-institucionalista, os desenhos institucionais mais amplos de um país condicionam não apenas os processos decisórios no âmbito do Estado, mas também as possibilidades e limites da ação coletiva dos atores sociais. Os estudos coordenados por Thelen, Longstrech e Steinmo (1992) sobre as reformas nos EUA e Europa, mostram como o desenho institucional centralizado da Inglaterra se situou como fator favorável ao Governo Tatcher na sua estratégia de reformar o Estado em direção a um modelo administrativo mais referenciado nas regras do mercado. Processo distinto ocorreu nos EUA. Aqui, um Estado estruturado sobre um desenho institucional federativo e baseado no princípio republicano da separação de poderes, limitou a capacidade do Governo Regan de remover os numerosos pontos de veto representados pelos Estados e governos locais. Como consequência, as reformas foram limitadas pelo desenho federativo, e o Governo federal acabou delegando a cada Estado a responsabilidade pela implementação das reformas que se dispusessem a assumir. Frente a esses limites institucionais, o debate sobre as reformas do Estado nos anos 80 e 90 tomou duas direções básicas. Nos países da OCDE e EUA predominaram as preocupações instrumentais de caráter administrativista, visto que as propostas não podiam por em xeque a tradição institucional e o desenho constitucional desses países, dimensões de difícil enfrentamento político em nações de forte tradição democrática. Nesses, o debate foi tomado pelas discussões em torno do gerencialismo como princípio administrativo capaz de incrementar a eficiência das administrações públicas e o controle governamental sobre elas. Nos países da América Latina, a essa agenda administrativista foram agregadas as questões relativas às reformas dos modelos organizacionais do Estado e dos desenhos federativos e constitucionais existentes; não é coincidência que nos anos 90 foi aprovado o instituto da reeleição presidencial em inúmeros países latinoamericanos. Com a continuidade, esperava-se propiciar as condições políticas necessárias às reformas. Esse foi o exemplo da direção tomada pelo debate no Brasil. Fortemente influenciado pelas agências multilaterais que atuam no país, o debate procurou reforçar a necessidade de dotar o Governo federal de fortes poderes constitucionais e de reduzir a liberdade fiscal dos Estados membros da Federação como estratégia de limitação dos pontos de veto às reformas. Mas quais as características políticas dessas duas tendências reformistas? O Perfil do Debate Sobre as Reformas na Inglaterra e EUA O debate sobre os rumos das reformas nos países da tradição anglo-saxã assumiu um forte perfil instrumental. Tratava-se fundamentalmente de reformar os instrumentos administrativos e os padrões organizacionais para a melhoria dos serviços públicos ofertados aos cidadãos. O foco primordial da reforma dos governos conservadores conduzia as ações reformistas para questões como as mudanças nos organogramas governamentais, a modernização administrativa, a redução do contingente de funcionários públicos e a alocação de infra-estrutura tecnológica nos serviços públicos.

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O movimento político e conceitual que orientou as alternativas das reformas foi o managerialism, conjunto de princípios gerenciais e administrativos adequado às novas formas de gestão e aos requisitos técnicos da economia flexível da era pós-fordista. Mas o foco no gerencialismo foi reforçado pelas opções políticas dos governos conservadores nos EUA e Inglaterra, envolvidos que estavam com processos de transferência de responsabilidades administrativas e de custos para os governos locais e regionais. Nesse contexto, qualidades como inovação e iniciativa empreendedora passaram a ser valorizadas, e o clássico desse período, o trabalho de Osborne e Gaeble, “Reinventando o Governo”, localizava nos governos locais justamente o ambiente favorável à manifestação dessas qualidades requisitadas pela nova economia. Em certa medida, nesse período também reeditava-se o sonho americano das pequenas comunidades como espaços ético-políticos onde os ideais de liberdade e igualdade de oportunidade eram possíveis de serem atualizados. Várias foram os aportes teóricos implicitamente requisitados pelos estrategistas das reformas, o que situava em primeiro plano alguns problemas de fundo que orientariam implicitamente a eleição dos problemas a serem enfrentados pelo gerencialismo. O primeiro problema era a questão da distribuição de custos desiguais na produção dos bens públicos, o que conduzia o debate diretamente para o enfrentamento do problema do “free rider”(Olson,1999) Num contexto onde a agenda administrativa se defrontava com o problema da escassez, essa questão assumiu uma importância inusitada. De acordo com a melhor tradição dos governos liberais conservadores, a suposição intelectual de fundo era a de que sem fortes incentivos econômicos ou mecanismos de coerção que limitassem a ação de indivíduos racionais aquisidores, a estabilidade das democracias sempre favorece os mecanismos que possibilitam o processo de apropriação dos fundos públicos pelos grupos organizados (Olson,1982). Pois em condições de estabilidade, as estratégias de grupos de atores organizados em redes possibilitam a criação de canais privilegiados de interlocução e acesso às agências públicas. Para Olson (1982), quanto mais consolidados no tempo mais os regimes democráticos propiciam condições políticas para que as agências públicas sejam capturadas pelos grupos mais organizados. A assimetria organizacional vigente na sociedade, o acesso dos grupos organizados às informações privilegiadas, e as condições de contínua interação propiciadas por regimes democráticos estáveis, seriam as principais causas desse processo de apropriação. Reduzir o tamanho do Estado é o corolário natural dessas premissas, visto que quanto menos agências públicas disponíveis para serem apropriadas mais preservados estariam os fundos públicos. Um Estado ampliado só seria admissível em condições de total simetria organizacional, configuração social impossível de se estabelecer. Uma segunda questão de fundo orientava o debate para os problemas derivados do processo de delegação no âmbito das organizações públicas. Originalmente a questão da delegação foi amplamente abordada pelos críticos do distributivismo no sistema político americano ( Mayhew,1974;Fiorina,1977; Niskanen,1971). Para eles, o problema principal era o de como a ação autonomizada da burocracia pública-os agentes-, em interação com políticos interessados em distribuir sob condições vantajosas as verbas públicas disponíveis para o Legislativo, incrementava os custos de manutenção do Estado e distorcia a configuração das políticas públicas, burlando as orientações dos dois principais interessados no processo de implementação das políticas: o próprio Governo federal e os eleitores. O problema tenderia a se reproduzir porque os agentes sempre dispunham de informações privilegiadas e de interlocutores estratégicos não acessíveis aos principais. Assim, em Estados dotados de numerosas funções administrativas e abrigando um grande contingente de burocratas, os riscos morais - “moral hazard”- incrustados nas relações agente-principal tenderiam a se ampliar. O resultado seria uma alocação sub-ótima do orçamento e uma distorção setorial e territorial no processo de distribuição dos recursos públicos, visto que o processo de interação entre políticos distributivistas e burocratas tenderia a nacionalizar conflitos distributivos regionais. Por fim, uma questão típica do debate neo-institucionalista, o peso atribuído ao desenho das instituições políticas do país, foi a terceira influência incorporada ao debate. Alguns autores dessa vertente sustentam que o desenho das instituições contribui decisivamente para a redução dos custos de

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transação e da incerteza informacional, instituições adequadas às transações econômicas, que estimulem a adoção de novas tecnologias e reduzam a incerteza informacional favorecem a iniciativa social e incrementam as possibilidades de desenvolvimento (North,1990). Para essa vertente, os modelos político-institucionais mais gerais que orientam o funcionamento das instituições políticas também seriam fundamentais para a implementação da agenda governamental em contextos de reformas. Determinados desenhos institucionais podem estimular ou não a instauração de pontos de veto no interior do Estado, emperrando o processo decisório e dificultando a implementação de políticas que contrariem coalizões que circulam em torno do Estado. Esse seria o exemplo dos países nórdicos, onde as coalizões que instituíram o Welfare criaram anéis burocráticos e político-institucionais, condicionando o processo decisório nas arenas políticas (Immergut,1996; Thelen e Steinmo,1992; Pierson,1995). Os insumos teóricos fornecidos por essas teorias impulsionaram as proposições reformistas principalmente para a adoção de instrumentos de controle dos agentes burocráticos e para o desmonte ou reforma das estruturas estatais que pudessem incrementar custos ou representar pontos de veto às reformas. Nesse sentido, reorganização institucional e instrumentos gerenciais foram as duas faces da mesma moeda reformista. Nesse contexto, as redes de instituições de gestão espalhadas pelo mundo e conectadas por visões comuns acerca das mazelas estatais foram um dos principais suportes do movimento reformista no mundo. Como consenso na agenda, dotar as administrações de estruturas ágeis e flexíveis, incrementar a eficácia dos serviços públicos, reduzir custos e ampliar a transparência da máquina pública eram as proposições mais comuns da onda reformista. Mas regra geral essas idéias foram traduzidas de forma simplista como uma questão de redução do tamanho do Estado. Na perspectiva de Kettl(1998), esse consenso em torno da necessidade de reduzir o tamanho do Estado, seja ele qual fosse, revelou pela primeira vez na história os efeitos da era da informação sobre a formação de um acordo global entre agentes públicos reformadores do Estado e agentes privados formadores de opinião em torno de uma meta política global. Para ele, esse consenso em torno da redução do tamanho do Estado traduzia uma percepção baseada em uma premissa e uma imposição: a premissa era a de que custos menores necessariamente conduzem a serviços melhores; e a imposição derivava da visão imediatista dos governos, preocupados em satisfazer uma opinião pública cansada de Estados grandes, onerosos e que ofereciam serviços de qualidade duvidosa. Consequentemente, a agenda internacional da reforma, orientada pelo managerialism e o seu foco centrado nos resultados e na eficiência do processo administrativo, se concentrou predominantemente na extinção e privatização das agências públicas e na transferência dos serviços públicos para governos regionais e locais. Nos EUA, país federativo, o princípio administrativo que orientou essas tendências foi o de “deixar o administrador administrar”; e na Inglaterra e Nova Zelândia a lógica foi a de “faça o administrador administrar”, através de mecanismos administrativos de controle baseados estritamente na lógica econômica da eficiência. Mas como ressalta o autor, implementar uma agenda negativa não resolve o problema, e onde as reformas foram mais longe, como na Nova Zelândia, os próprios gestores passaram a questionar o padrão estabelecido do tamanho do Estado e as resultantes relações entre o público e o privado. Na sua perspectiva, é necessário reverter a dimensão negativa das reformas, orientando as proposições para questões como: o que o Governo pode e deve fazer da melhor maneira possível (Kettl, 1998). De fato, no Reino Unido o tema da reforma do Estado se encaminhou para um recorte administrativista que passou a priorizar o aperfeiçoamento gerencial e a redução do número de funcionários, em detrimento da dimensão política e institucional do Estado. Sob um governo profundamente desconfiado em relação ao serviço púbico, entre 1979 e 1984 o contingente de funcionários foi reduzido de 700 mil para 600 mil, e hoje cerca de três quartos do funcionalismo trabalham em agências executivas controladas por contratos de gestão (Jenkins, 1998). Essas agências funcionam hoje sob controles de instrumentos contratuais orientados para a eficiência do processo

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administrativo. Mas está ausente uma concepção do cidadão como ele foi originalmente concebido pelo liberalismo de Stuart Mill e Toqueville. Na Nova Zelândia a reforma do modelo funcional-administrativo do Estado foi ainda mais profunda. Além de uma profunda liberalização nos mercados e uma redução no tamanho do Estado, o modelo de operação administrativa do Governo foi orientado para o controle dos gestores por contratos baseados no desempenho e na produtividade, e o controle hierárquico passou a ser feito por uma Comissão central de governo que avalia o desempenho dos executivos-chefes contratados. Os princípios que nortearam as reformas naquele país foram: forma de controle estratégico sobre a máquina pública, descentralização, accountability frente aos cidadãos e no âmbito das hierarquias internas envolvidas na gestão dos serviços, competição entre as agências públicas, e transferência de serviços para o setor privado onde este apresenta melhores condições de executá-los. A própria distribuição do orçamento entre os departamentos passou a ser definida por critérios de eficiência alocativa (Richardson,1998).

Para Pollit (1990; apud Abrucio,1998), os princípios que orientam o modelo gerencialista inglês são centrados preponderantemente na busca da produtividade e na incorporação dos modelos de gestão da iniciativa privada para o setor público, caracterizando a preponderância de uma visão funcional-administrativista nas reformas do governo britânico. Essa seria a expressão de uma profunda despolitização da administração pública, esvaziando a sua característica de dimensão vinculada às formas do espaço público existente em cada país; e revela que as vertentes mais puras do managerialism apresentam, de acordo com a tradição liberal mais conservadora, uma visão individualista da cidadania, valorizando o lugar do indivíduo como consumidor e agente de mercado.

A crítica de Abrucio (1998) segue a mesma linha de Pollit, em quem ele referencia parte de sua análise. Para ele a separação entre política e administração alija os princípios de equidade e justiça que deveriam nortear a avaliação da ação estatal, prevalecendo a preocupação com a manutenção dos custos econômicos da máquina pública. Na sua perspectiva, nos modelos gerencialistas predominantes na Inglaterra e EUA, o foco predominante foi na eficiência econômica do processo administrativo, deixando de lado a dimensão da efetividade como dimensão política da Administração. As proposições assumidas por Przewoski (1998) se situam como um ponto de equilíbrio no debate entre os críticos do modelo e os gerencialistas. Abordando um dos pontos centrais assumidos pelo debate, as relações entre agentes e principais, a sua posição é a de que a resolução dos problemas de delegação que existem entre governo e agentes econômicos, entre políticos e burocratas, e entre cidadãos e governos, aponta para a importância do desenho institucional como mecanismo de mediação entre esses atores, fazendo convergir as soluções institucionalistas com os problemas de delegação de funções reconhecidos pelos teóricos da escolha racional. Para ele, um Governo amparado em boas instituições teria melhores condições de incrementar a economia que um Estado não interventor, visto que o processo de controle sobre a execução das políticas teria condições de ser mais efetivo. Nesse sentido, apenas os incentivos gerenciais para a melhoria das condições de envolvimento e de desempenho dos funcionários são insatisfatórios. Assim, a reforma do Estado requisitaria amplas reformas institucionais na estrutura do Estado e no sistema político, que favoreçam o processo de fiscalização dos principais sobre os agentes e o controle democrático sobre o funcionamento do aparelho do Estado. De fato, a preponderância do gerencialismo sobre os modelos de reforma tende a reduzir o conteúdo político do conceito de accountability, que estava na base da mobilização política para as reformas, a um conjunto de técnicas de prestação de contas e a instrumentos formais de controle burocrático. Nesse sentido, a recente reação cristalizada na corrente da Public Service Orientation procura valorizar os conteúdos ético-políticos do conceito de cidadania e a dimensão participativa da esfera pública (Pollit,1990;apud Abrucio,1998), esta concebida como lócus social das decisões políticas e como dimensão política que possibilita e estimula padrões republicanos de interação social. Nessa perspectiva, essa corrente aponta para a substituição do modelo de competição entre agências, como

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implantado na Inglaterra e Nova Zelândia, por um modelo institucional orientado para formas de cooperação entre agências públicas e entre estas e os setores privados, resgatando a dimensão ético-política da res publica como dimensão fundamental nas relações entre Estado e sociedade civil. Como sugere Catalã (1998), uma governabilidade mais participativa e democrática, enraizada na tradição do país, pode incrementar a capacidade de uma sociedade para enfrentar os desafios do processo de modernização.

O Debate na América Latina.

Na América Latina o debate sobre a reforma do Estado também incorporou as premissas do

gerencialismo, embora também tenha agregado as questões relativas ao reordenamento dos poderes constitucionais do Executivo e a questão federativa à agenda das reformas. As instituições multilaterais de fomento foram os grandes elos da cadeia de instituições comprometidas em disseminar as idéias fundamentais das reformas.Segundo Spink (1998), entre os anos de 1990 e 1995 o BID aprovou cerca de 100 programas que contemplavam componentes orientados para o fortalecimento e a reforma do Estado. Mas a onda de reformas dos anos 80 também era um desdobramento de uma discussão já antecipada no continente na década de 50, período em que uma rede de instituições nacionais já vinha debatendo a questão da reforma em seus respectivos países. O que havia de novo era a roupagem padronizada das proposições, referenciada nos modelos gerencialistas predominantes, e as recomendações das agências de desenvolvimento quanto à necessidade de redução do tamanho do Estado. Spink observou duas características do debate em torno das reformas na América Latina: a ausência de referências claras às teorias políticas que implicitamente orientavam as proposições reformistas; e a construção de modelos técnico-voluntaristas que priorizaram os aspectos instrumentais das reformas. Assim, em que pese a heterogeneidade das variáveis que incidem sobre o tema, essas tendências estreitaram o escopo das proposições sobre as reformas. Na sua perspectiva, trata-se de uma narrativa que ainda necessita vincular a administração pública às experiências culturais e sociais do cotidiano, visto que os modelos tratam a Administração como desvinculada das características de sua base social de referência (Spink,1998).

De fato, a forte predominância dos requisitos econômicos do ajuste estrutural na definição do perfil programático das reformas foi ressaltado por investigadores que apontavam para as convergências históricas e políticas entre o processo de reestruturação econômica e as reformas do Estado no continente (Filgueiras,1999; Glade,1998), embora admita-se que há uma total assimetria entre o processo de reestruturação econômica e as reformas do Estado, visto que estas se defrontam com entraves políticos mais poderosos, principalmente por parte da burocracia estatal (Glade,1998).

No Brasil, o papel histórico da burocracia já foi abordado por estudos que investigaram a peculiaridade da gênese política dos atores políticos. Para estes, dado que o Estado antecedeu a estruturação política da sociedade, a burocracia civil e militar se antecipou aos partidos políticos como atores estratégicos da cena política. Conseqüentemente, o liberalismo sempre foi mais formal que real e as arenas estatais foram transformadas em lócus de representação política, substituindo o sistema representativo como canal de mediação entre o Estado e a sociedade na definição das políticas sociais (Souza,1990;Santos,1988;Bochi,1991) Talvez por isso a reforma do Estado no Brasil tenha se encaminhado para priorizar a reforma administrativa e as mudanças no estatuto dos funcionários públicos, visto que na percepção dos agentes reformadores (Pereira,1998; Cardoso,1998), a burocracia não apenas representava um ponto de veto às reformas mas também era inadequada para os requisitos de agilidade e flexibilidade de um Estado que se pretende ágil e moderno.

Mas além da reforma administrativa e de suas questões gerenciais, o debate brasileiro foi permeado pelas questões vinculadas aos problemas do federalismo e da municipalização no pós-1988. Muitos passaram a considerar que o federalismo brasileiro no pós-1988 impulsionou uma excessiva desconcentração de poder, incrementando as dificuldades do Poder Executivo federal em exercer as

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suas funções de coordenação político-administrativa no âmbito nacional. Como os Governadores exerceram um papel central no processo de redemocratização, eles mantiveram uma forte capacidade de impor seus interesses sobre a agenda política nacional em detrimento da capacidade de coordenação do Executivo Federal (Abrucio,1998; Abrucio e Samuelson, 1997; Almeida,1995). A visão dominante entre os estudiosos do federalismo passou a ser a de que a resolução dos problemas de fragmentação e de ausência de coordenação política derivados do pacto federativo instaurado em 1988 era fundamental para a governabilidade e a exequibilidade das reformas.

Quanto à municipalização, de fato há o reconhecimento de que o desenho federativo foi reorientado para o fortalecimento das esferas subnacionais de governo, desencadeando uma forte tendência em direção à municipalização das políticas públicas (Arretche,1996;Castro,1990,1991). Os Estados e os Municípios se fortaleceram e estes últimos passaram a abrigar importantes experiências de democracia participativa. Mas além da crítica desses autores ao caráter parcial da descentralização e da municipalização, os estudiosos consideram que a dispersão e a fragmentação dos atores políticos pelos diversos níveis de governo têm gerado processos de competição predatória entre Estados e municípios (Melo:1993,1995), configurando um federalismo altamente competitivo(Fiori, 1995), em que o processo de descentralização de poder passa de fato a depender da constelação de atores que circula em torno de cada política(Almeida,1995; Silva,1995). A inclusão dessas questões revela que, em certo sentido, o debate sobre os rumos das reformas no Brasil, ao incorporar os problemas relativos aos modelos institucionais mais amplos que referenciam o escopo de atuação estatal e os padrões de relações entre Estado e sociedade civil, demonstrou um avanço qualitativo em relação ao escopo discursivo dos países centrados apenas nas questões do gerencialismo. Contudo, ambas as orientações deram pouca importância a uma questão fundamental para a reforma do Estado e a instauração de novos padrões de relações entre o Estado e a sociedade na atualidade: os novos modelos tecnológicos apropriados pelo Estado no seu escopo de atuação. Esses modelos viabilizam padrões de interação entre governo e sociedade impossíveis de serem estabelecidos em etapas históricas anteriores. Eles podem também viabilizar transformações nas dimensões fundamentais que definem os padrões de relações entre Estado e sociedade, tais como, a consolidação de uma accountability democrática, a melhoria da qualidade dos serviços públicos, a resolução dos problemas relativos a capacidade do Estado exercer uma coordenação político-administrativa satisfatória, e as próprias possibilidades que se abrem para que os grupos sociais resolvam seus problemas de ação coletiva. Assim, as modernas tecnologias se posicionam como uma mediação importante na atual configuração das reformas, visto que os modelos organizacionais e administrativos propostos terão parte de sua eficácia condicionada pelos novos instrumentos de informação. 4. DEMOCRACIA, NOVAS TECNOLOGIAS, E ACCOUNTABILITY: AS PERSPECTIVAS

DAS RELAÇÕES ENTRE ESTADO E SOCIEDADE NA ERA DA INFORMAÇÃO A disseminação das novas tecnologias de comunicação pela sociedade e sua incorporação pelas atividades estatais tem gerado profundas modificações tanto nas formas operacionais dos Estados modernos quanto nos padrões informacionais e associativos vigentes nas sociedades contemporâneas. A Internet abriu possibilidades inéditas para a interação de grupos sociais dispersos social e territorialmente, colocando novos desafios políticos e administrativos para os Estados. Como instrumento passível de ser apropriado e remodelado de acordo com os desígnios de seus usuários, ela possibilita aos cidadãos e atores políticos uma nova inserção na cena política.

Os impactos dessa revolução não podem ser menosprezados. Nas últimas eleições brasileiras mais de 100 milhões de eleitores participaram de um processo eleitoral altamente informatizado e milhões de contribuintes brasileiros realizam suas declarações de renda pela Internet. Processos como os concursos públicos, as experiências de educação à distância, passando pelas licitações públicas e

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pelas milhares de transações financeiras e mercantis, revelam que já estamos vivendo nos umbrais da denominada Sociedade da Informação.

Todas essas possibilidades já integravam o rol de expectativas contidas na utopia informacional. Apesar da noção de uma sociedade da informação ter sido deflagrada a partir da disseminação das idéias de Daniel Belll e Alvin Tofler nas décadas de 60 e 70, só recentemente as bases dessa utopia tecnológica -como a existência do computador e dos sistemas de comunicação em rede- forneceram os elementos para que a opinião pública e a mídia passassem a considerá-la como uma configuração social possível. Assim, a informação como meio tecnológico e como ideologia norteadora do comportamento dos agentes econômicos e sociais, tornou-se ela própria o principal mecanismo indutor das projeções futuras dos agentes públicos e privados.

De fato, não parece haver dúvidas sobre o imenso potencial da Internet para gerar empregos, aprimorar os serviços sociais, expandir os negócios, etc. A economia da informação global tem testemunhado um enorme incremento nas transações entre empresas e entre essas e os consumidores. Existem também numerosos benefícios sociais resultantes de políticas que fomentam a participação na nova economia da informação global. A área da saúde pode dispor de grandes benefícios através de conexões institucionais entre países, fornecendo aos médicos e pacientes de centros médicos menores acesso aos recursos da medicina. A tecnologia da informação também pode contribuir para a preservação de heranças culturais através de museus e bibliotecas virtuais. Por fim, pode contribuir para fomentar a expansão da democracia e o respeito aos direitos humanos, fornecendo o fluxo de idéias e informações acerca da esfera política. Mas como observa Alan Larson, a “divisão digital” entre países industrializados e em desenvolvimento é crescente. Mais da metade dos 300 milhões de pessoas que tinham acesso à Internet no ano de 2000 encontravam-se na América do Norte. No Oriente Médio pouco mais de um milhão de pessoas possuem acesso à rede, e na África o número é de cerca de dois milhões. Existe maior número de internautas em Nova Iorque que em todo o continente africano (Larson,2001).

Esses são dados que apontam para os limites políticos e sociais do processo de disseminação da rede, e são questões que necessitam ser enfrentadas.

Estado, Sociedade e Tecnologia: algumas questões do debate

Acredita-se que a utilização da Internet e de Web Sites governamentais destinados à prestação

de serviços públicos on-line e a disponibilização das variadas informações acerca das atividades públicas representa um caminho para melhorar a eficácia dos serviços e a qualidade do processo democrático. Por meio desses instrumentos espera-se poder atender demandas mais específicas da população, e que esta possa ter uma participação mais efetiva na gestão pública, tanto definindo prioridades quanto fiscalizando e controlando as ações do governo. Da perspectiva do fortalecimento da democracia e das redefinições das relações entre Estado e sociedade, três dimensões são diretamente influenciadas por essas mudanças e podem passar por transformações profundas em suas configurações: a configuração da esfera pública; a lógica da ação coletiva dos grupos sociais, e as formas de coordenação político-administrativa do Estado. Dada a complexidades das sociedades modernas, a esfera pública ficou restrita a algumas “sedes” específicas: os espaços e organizações do sistema político representativo; as organizações sociais e públicas que gravitam em torno das funções administrativas do Estado, e os lugares e fluxos informacionais sob controle da mídia. A internet de fato pode esgarçar essas circunscrições sistêmicas do atual espaço público e incrementar a accountability das organizações estatais, redefinindo um espaço público não circunscrito apenas pelo mundo sistêmico, e reforçando os conteúdos de um republicanismo participativo, no sentido de Habermas (1997).

No que se refere à resolução dos problemas relativos à lógica da ação coletiva, os grupos organizados podem potencialmente se beneficiar das transformações tecnológicas em direção à

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remoção dos entraves políticos derivados da estratificação social e da dispersão territorial, que dificultam a mobilização de grupos dispersos.

Da perspectiva do modelo de coordenação político-administrativa a ser assumido pelo Estado em decorrência da generalização das novas tecnologias, ele se coloca como uma variável dependente de três intervenientes fundamentais: o grau de adesão sócio-cultural aos conteúdos tecnológicos e à linguagem da denominada Sociedade da Informação; a amplitude da acessibilidade social às novas tecnologias da informação; e a capacidade do Estado de legitimar e garantir a adesão dos cidadãos às experiências de gestão baseadas no uso das tecnologias da informação. Essas configurações possíveis da ordem social e de suas expressões político-institucionais, podem transformar profundamente os padrões da política e os requisitos operacionais e administrativos a serem seguidos pelo Estado. Nesse contexto, questões como as novas formas de participação social nas decisões estatais, a revalorização do peso político dos indivíduos nas arenas estatais, as novas formas de organização dos lobbies e grupos organizados, as possibilidades abertas pela ampliação das experiências da democracia eletrônica e as mudanças no papel do Estado, se colocam como questões que podem reconfigurar completamente as relações entre Estado e sociedade. Mas as visões acerca das possibilidades políticas da Internet e de seus impactos sobre a ação coletiva variam bastante. Para os estudiosos do fenômeno da comunicação na pós-modernidade, existem duas correntes básicas de pensamento: os utópicos, que dispõem de uma leitura positiva acerca das possibilidades políticas e sociais das redes, e os antiutópicos, que focalizam principalmente as possibilidades abertas pelas novas formas de comunicação para o controle social pelo Estado e para a subordinação das pequenas empresas às grandes redes corporativas (Kumar,1997, apud Aktsu,2001). Mas essa linha de investigação não incorpora questões de fundo que são cruciais para a definição das configurações da política e das relações entre o Estado e a sociedade. Na perspectiva política priorizada nesse texto, podemos simplificadamente afirmar que existem duas perspectivas básicas: a dos que associam a Internet ao processo de revitalização da accountability governamental, da democracia e da esfera pública através de uma cidadania renovada; e os que consideram que ela pode reforçar a erosão do capital social das comunidades, instaurar um padrão hobesiano de sociedade política, esvaziar a esfera política representativa, incrementar o controle estatal sobre os movimentos sociais e reforçar o que O’Donnel (1991) denomina de democracia delegativa, onde o cidadão se ausenta do sistema político após depositar seu voto. Para os primeiros, que associam a Internet a um novo processo social de revitalização do espaço público e das democracias, ela abre possibilidades enormes. Dentre as suas características positivas, eles ressaltam a facilidade que ela apresenta de ser remodelada pelos usuários, a capacidade de replicabilidade da informação, o baixo custo de sua utilização por camadas sociais antes alijadas do processo de comunicação a distância, a abertura a uma ativa intervenção do usuário na cena pública, e as possibilidades de ser apropriada para a mobilização de grupos latentes, como os grupos de ecologistas e os movimentos de afirmação das identidades culturais de nacionalidades politicamente minoritárias. Essas características fariam desse meio de comunicação uma ferramenta única na história, associando disponibilidade de informação com mobilização da opinião pública, estando na base de inúmeras mobilizações sociais em torno de ações convergentes, tais como os movimentos ecológicos e pacifistas, e na origem do reforço da accountability governamental perante a sociedade. Para alguns pesquisadores, a Internet reduziria os custos da interação social entre membros de movimentos por afirmação dos direitos civis e políticos, reforçando os movimentos libertários (Ayres, 2001, apud Borges,2001) Nessa leitura positiva, podemos deduzir e considerar que os impactos benéficos seriam muitos. Em primeiro lugar, o problema olsoniano da mobilização de grupos latentes ou grupos grandes (Olson,1999) estaria resolvido; os grupos latentes ou sem canais de representação teriam possibilidades de interagirem e se expressarem na cena política, visto que a Internet reduziria os custos de cooperação coletiva. Em segundo, a Internet reduziria os custos das transações econômicas, visto que poria em

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contato produtores e consumidores, sem intermediários onerosos. Em terceiro, a Internet possibilitaria uma revitalização da esfera pública através da ativa participação dos indivíduos nas discussões públicas; nesse caso, tanto seria possível realizar os ideais de um republicanismo cívico constituído pelo envolvimento dos cidadãos nos moldes das propostas de Habermas (1997), quanto os ideais do liberalismo de Stuart Mill e Toqueville, orientado para a manutenção da liberdade individual e à cooperação solidária entre os indivíduos num contexto livre de coerção estatal. Numa leitura negativa, os argumentos também podem ser muitos. Mas o mais central é o que visualiza que num contexto de forte individualismo, a Internet poderia contribuir para isolar os indivíduos integrantes de movimentos de mobilização social, visto que ela dispensa interações coletivas, com impactos negativos sobre o capital social e cultural das coletividades (Harwodd,2001, apud,Borges,2001). Nesse contexto, podemos deduzir que os vícios da democracia delegativa seriam incrementados e a accountability vertical tenderia a ser erodida, visto que mesmo nas sociedades desenvolvidas o processo de modernização sócio-econômica não estimula a participação do eleitor. De uma forma ou de outra, a internet modifica os padrões de interação entre os indivíduos e as agências do Estado e cria alternativas de pressão sobre elas, e essa é uma das novidades introduzidas no cenário histórico.

Mudanças Tecnológicas e Transformações nas Formas de Atuação Governamental Apesar da intensidade política e cultural desse debate, e sem desconhecer a singularidade tecnológica e política da Internet, é importante ressaltar que as possibilidades abertas pelas mudanças tecnológicas sobre a configuração da política e das relações entre Estado e Sociedade não são questões tão novas assim. Ao longo da história as transformações tecnológicas sempre se fizeram acompanhar de mudanças nas formas de interação entre Governo e sociedade. Essa lembrança evita que se transforme automaticamente instrumentos como a Internet -que facilita a mediação entre Governo e Sociedade mas que expressa tendências sociais mais profundas- em um demiurgo da política na Era da Informação. Nesse sentido, a questão fundamental hoje é discutir o que há de específico na atual revolução tecnológica. O primeiro marco fundamental, talvez o mais importante da história, foi a gênese da imprensa, que revolucionou o relacionamento entre o público e o privado. Antes, o rei era forçado a manter permanente contato com os governados, pessoalmente ou através de seus funcionários, como forma de atualizar a simbologia do poder e o pacto político com os súditos. Na ausência da imprensa, a palavra do governante ou os documentos assinados por ele serviam de normas de conduta para os súditos. Como não podiam ser reproduzidos, detinham valor inestimável, transferindo seus atributos de nobreza e poder aos seus portadores, o que reforçava o caráter do poder político como símbolo transcendente à sociedade(Kantorowicz,1958). Mas esse era um modelo de poder baseado na simbologia da nobreza, visto que essa forma de atualização física do mando apresentava visíveis limites espaciais. A imprensa revoluciona as formas de atualização do poder, ampliando o raio de ação do governante, mas também facilitando a socialização entre governados. Inicia-se aí a luta secular pelo controle da informação. Com a Revolução Industrial, a multiplicação dos meios de transporte a vapor propicia as condições de mobilidade espacial para governantes e governados, e numa sociedade já dotada de grande complexidade, a burocracia administrativa passa a servir de principal veículo político de mediação entre o Estado e a sociedade, tendência essa que iria se apresentar como a principal característica do processo de constituição do Estado racional-legal(Hobsbawm,1989; Weber,1999). As bases tecnológicas dessa mediação eram os decretos e normas impressos, que tornavam onipresentes a todos as resoluções dos governantes através da burocracia. Mas na sociedade também proliferavam os veículos de informação, e as elites políticas letradas podiam dispor de idéias próprias acerca do melhor governo e do que deveria ser uma boa sociedade; emerge uma esfera pública burguesa não estatal que iria influenciar os rumos da política, graças também às possibilidades abertas pela imprensa e a

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indústria editorial na formação do que viria se chamar de opinião pública (Habermas,1984;.Arendt,1995). Assim, o desenvolvimento da imprensa escapou ao controle estatal, passando a fazer parte dos empreendimentos privados e do cotidiano dos cidadãos, e nesse sentido foi uma tecnologia que exerceu um papel fundamental na democratização das informações e nos movimentos liberais do século XIX. Um segundo marco foi a invenção do telégrafo e posteriormente a do telefone. Com o telégrafo, os Governos alcançam uma eficiência política e administrativa sem precedentes. Como era uma tecnologia de base operacional centralizada, inicialmente o Estado operava o telégrafo de acordo com as suas estratégias. Mas os capitais privados rapidamente passaram a utilizá-lo nas suas transações financeiras, que deu um salto fenomenal na sua velocidade e amplitude; se não foi democraticamente apropriado pela sociedade em geral, passou a fazer parte do mundo dos negócios. Utilizado inicialmente para comunicações locais, o telefone gerou impactos diretos na estrutura organizacional de governos e empresas privadas, para depois alterar os padrões de sociabilidade da população. Com o rádio e a televisão, os governos assumem definitivamente o controle das comunicações como uma política pública, organizada e estruturada para o controle das informações e, indiretamente, das formas de mobilização política e de interação social. É bastante conhecido que os governos autoritários europeus dos anos 20 e 30 utilizaram-se largamente do rádio como veículo de propaganda de massa. Essa apropriação política iria incidir diretamente sobre as formas posteriores de regulamentação da televisão, baseada no absoluto controle do Estado sobre o meio; assim, ela só passaria a ser difundida a partir dos anos 50(Winston,1998) . Essa evolução das tecnologias da comunicação demonstra que a luta pelo controle da informação se intensificou à medida que a base tecnológica evoluía. Quando a operação da tecnologia necessitava de um grande suporte infra-estrutural, operado de forma centralizada, como o telégrafo, o Estado definia o escopo de usuários possíveis e as suas formas de utilização. Mas em meios mais pulverizados, como a imprensa e posteriormente o telefone, a sociedade se apropriava dos benefícios derivados da democratização do meio . Nesse processo, a partir do século XIX o liberalismo exerceu um papel fundamental, visto que a sua ideologia orientada para a liberdade política e o empreendedorismo, favoreceu a captura dos meios de informação pelos capitais privados e pelos movimentos políticos; direção distinta tomada posteriormente pelos regimes fascistas e socialistas, em que o Estado detinha o controle absoluto dos veículos de comunicação de massa. Contudo, as pressões políticas pela ampliação da democracia e dos benefícios sociais nos regimes democráticos, e a necessidade de prover bens e serviços para a massa da população nos regimes socialistas, conduziram ambos os tipos de regime político a partir do início do século XX a organizarem seus serviços incorporando as inovações tecnológicas na administração pública. Essas questões indicam que as tecnologias devem ser consideradas como variáveis dependentes em relação às opções políticas e administrativas dos Estado e das alternativas sociais assumidas pelas sociedades. Como variáveis independentes, os modelos políticos dos Estados modernos -a organização político-institucional e administrativa do Estado e as metas do sistema político- e os padrões sócio-culturais e políticos da ordem social condicionam as formas e os usos das tecnologias. Nesse sentido, as tecnologias se inserem no contexto da trajetória histórica do processo de comunicação entre o Estado e a sociedade. Sendo assim, cabe novamente a questão sobre o que há de singular nessa nova fase do desenvolvimento das tecnologias da informação. Nos parece que algumas características das redes de comunicação baseadas no uso da Internet demonstram que a revolução tecnológica atual, se não modifica os termos dessa equação, aprofunda bastante, para o bem ou para o mal, o grau de interatividade entre os grupos sociais e entre estes e o Estado, assim como a capacidade do Estado em responder aos inputs sociais. A primeira característica é técnico-econômica: a velocidade do meio, seu baixo custo, e a facilidade de manuseio do instrumento, potencializam a disseminação de seu uso para diversos fins: econômicos, sócio-culturais ou políticos. A segunda é técnico-política: a capacidade dos usuários interagirem com o meio e

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moldarem os conteúdos e as formas do próprio veículo de interação amplia profundamente a liberdade e o raio de ação dos usuários, sejam eles indivíduos, grupos sociais ou o próprio Estado. Obviamente que ambas as características não podem ser desvinculadas das variáveis relacionadas às assimetrias sociais e à distribuição desigual do poder político e econômico; pois a utilização de todas as potencialidades da Internet pelo usuário depende do seu lugar social e do capital cultural, econômico e político que ele detém. Assim, de uma forma ou de outra, o Estado é o agente social que detém as maiores possibilidades de se apropriar das potencialidades da Internet e intervir no meio, mesmo porque dispõe de alguma capacidade política e jurídica de regulação técnica sobre ela. Contudo, uma estrutura técnica auto-modelada pelos provedores e pelos milhões de usuários, assim como o formato descentralizado que atravessa as fronteiras nacionais, fazem das modernas redes de comunicação baseadas na Internet o modelo tecnológico com maior potencialidade de democratização da História. Resta saber de que forma as experiências de governo eletrônico em curso apontam de fato para o reforço da democracia, da accountability e da melhoria na qualidade dos serviços públicos. Vejamos algumas características básicas de algumas experiências.

As Experiências de E-Government e Seus Possíveis Impactos Sobre a Democracia. As experiências governamentais e não-governamentais que se utilizam da estrutura da Internet têm se disseminado rapidamente pelo mundo. Nos EUA destacam-se algumas experiências de e-democracy, bem de acordo com a forte tradição liberal e de descentralização política daquele país. Mas a grande preocupação do Governo americano, incluindo funcionários do Executivo e membros das comissões do Congresso, é com as regras e segurança do comércio eletrônico. Segundo estimativas da GIIC, o comércio eletrônico privado em 2004 representará 7% do total de transações realizadas entre empresas no mundo. Por isso, a Comissão de Infra-Estrutura da Informação Global(GIIC), instituição não governamental independente, lançada pela cúpula do G-7 em Bruxelas, em 1995, vem trabalhando na estruturação de códigos comerciais universais para a segurança contratual do comércio global, incluindo aí a revolução nas normas, novas definições dos direitos individuais no ciberespaço, e a institucionalização de estruturas legais de amparo jurídico ao comércio eletrônico(Charles,2001). A vulnerabilidade jurídica e comercial da Internet vem tomando grande espaço entre as preocupações do Governo e dos institutos técnicos americanos, visto que ataques de hackers tem gerado estragos formidáveis no grau de confiança no comércio eletrônico. Assim, a luta contra a fraude eletrônica se apresenta como a principal preocupação da Comissão Federal do Comércio do Governo americano(Bernestein,2001). Isso tem mobilizado institutos eletrônicos, como o Instituto de Engenharia de Softwares(SEI), um centro de desenvolvimento de pesquisas que funciona com fundos federais financiados pelo Departamento de Defesa, que vem propondo uma série de inovações tecnológicas para a preservação dos sites envolvidos no comércio eletrônico.(Cross,2001). Asiim, as propostas atuais do Governo americano estão orientadas para a formulação de uma estrutura legal e comercial uniforme para as transações eletrônicas globais, regra geral por iniciativa das Comissões Federais ou do Departamento de Comércio do Governo Federal(Pincus,2001). Essa preocupação comercial se expressa no tipo de portais disponibilizados pelos três níveis de governo, onde tendem a prevalecer os usos econômicos. No nível federal de governo, o portal Buyers.gov (http://www.buyers.gov/)é o local onde as agências federais podem realizar compras do setor de bens de tecnologia da informação por meio de leilões. A agência responsável pelo portal, a Federal Technology Service Office of Information Technology Solutions (FTS), mantém contratos com empresas, as enablers, que são acessíveis através do portal, onde as agências e departamentos governamentais podem selecionar produtos e fornecedores e negociar preços e a especificação dos produtos. Nos Estados americanos, uma iniciativa de articulação horizontal em rede ocorreu através da união de vários Estados, em 1998, na estruturação do portal de compras, Multi-State E-mall Online Procurement System. A iniciativa, liderada pelo Estado de Massachussetts, era integrada pelos Estados

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de Idaho, New York, Texas e Utah. Posteriormente cada um deles optou por implementar seus próprios portais. O Texas desenvolveu o Texas Marketplace (http://www.marketplace.state.tx.us/), com o objetivo de criar as condições favoráveis ao comércio eletrônico em geral, incluindo tanto as compras governamentais quanto um espaço para transações do setor privado Para o governo americano o problema é o de incrementar o comércio: apesar da disseminação de iniciativas desse tipo, as compras governamentais on-line nos EUA representam menos de 1% dos cerca de US$ 1 trilhão do total de compras governamentais do país. Segundo estimativas oficiais, “os três níveis de governo poderiam economizar mais de U$ 50 bilhões se pelo menos metade destas compras fosse realizada por meio do uso de portais eletrônicos e mecanismos de leilões”(Fernandes,2002). Por isso, Alan Larson, Subsecretário de Estado para Assuntos Econômicos, Comerciais e Agrícolas do Governo americano, reconhece que ainda são necessários muitos investimentos em infra-estrutura e em políticas de telecomunicações para que os países emergentes atinjam um mínimo de desenvolvimento no setor de tecnologia da informação. Assim, interessado em desenvolver ações estratégicas globais que incrementem o comércio eletrônico global e estimulem intercâmbios técnicos com países emergentes, o Governo americano, através da USAID, vem implementado uma série de programas de assistência tecnológica em países como Africa do Sul, Uganda, Guatemala, Jamaica, India, Bulgária, Gana Marrocos, Guiné, Egito e outros(Larson,2001). Trata-se de uma política estratégica para os EUA, que detêm a maior parcela do comércio mundial e se beneficiariam significativamente com o incremento das transações eletrônicas. Em alguns países asiáticos emergentes, como a China, as experiências de governos eletrônicos também estão localizadas no e-commerce. Um dos exemplos mais marcantes é a experiência da Cidade de Shenzehen, que de uma pequena cidade há algumas décadas, teve o seu comércio eletrônico brutalmente incrementado, transformando-se numa das quatro principais cidades econômicas do país(Ping,2002). Com uma população de mais de um bilhão de habitantes, a adesão dos consumidores a esse tipo de veículo implicará numa redução brutal dos custos de transação das empresas chinesas. O perfil das experiências européias aponta para uma maior participação das experiências cívicas. Na Holanda, o e-government tem sido utilizado para o aperfeiçoamento dos serviços oferecidos aos cidadãos e para reduzir o hiato entre os eleitos e eleitores, reforçando a cidadania e as bases institucionais da democracia. Os municípios têm um papel fundamental no desenvolvimento dessa modalidade de prestação de serviços, visto que foi implementada na maioria das cidades holandesas com mais de 50.000 habitantes, onde os governos dispõem de web sites e exercem importante papel na manutenção dos serviços locais. Uma pesquisa recente demonstrou que cerca de 94% das Municipalidades estão trabalhando com algum tipo de serviço eletrônico voltado para a melhoria da qualidade dos serviços prestados aos cidadãos, e a adoção dessas tecnologias têm causado impactos nas formas de estruturação organizacional e administrativa dos governos locais(Van Antwerpen,2002). Na Alemanha as tendências também são semelhantes e apontam para o reforço da accountability por parte do Governo Federal frente à sociedade e governos locais. O Governo alemão, através do Ministério da Economia e Tecnologia, colocou como meta disponibilizar para cidadãos e municipalidades todos os serviços sob responsabilidade do Governo Federal até 2005(Drueke,2001.). O caso da Suiça é bastante divulgado por jornais e revistas, e expressa o perfil cívico predominante das experiências européias. A Suíça foi o primeiro país do mundo a realizar eleições pela Internet. A experiência de e-democracy teve início no primeiro semestre de 2002, e o objetivo é incrementar a participação da população em eleições -que atualmente se situa em quase 50%. Os suíços já participam de diversas decisões do governo. Há plebiscitos para se definir mudanças na Constituição ou quando o país debate a entrada em uma organização internacional. As eleições via Internet fazem parte de um projeto nacional que transformará profundamente a administração tradicional, fornecendo via Internet desde a emissão de documentos a pagamentos de tributos. Nesse país, mais de 50% dos habitantes possuem computadores em casa e 44% deles navegam pela Internet quase todos os dias. Mas essa tendência de utilização da rede para reforçar a participação do cidadão, a cultura

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cívica e a accountability através de consultas públicas e referendos não se restringe a Suiça. A Prefeitura de Bolonha também desenvolveu um projeto bastante conhecido, o Rete Civica. Como o próprio nome indica, trata-se de uma iniciativa orientada para o fornecimento de informações públicas via internet, contando também com terminais públicos para a população acessar a rede. A Prefeitura instalou um provedor público e garantiu acesso gratuito para os residentes da cidade. Em dois anos cerca de cinco mil residentes e duzentas organizações civis tornaram-se assinantes do provedor público. Também em Atenas, o projeto Péricles, desenvolvido pela Universidade Técnica Nacional de Atenas, tem como objetivo criar instrumentos formais de deliberação e participação dos cidadãos nos projetos legislativos da cidade, no que talvez significará a primeira experiência efetiva de democracia eletrônica no âmbito das deliberações legislativas. Na escala continental, o Eletronic Democracy European Network-EDEN, de iniciativa dos governos da União Européia, se destina a viabilizar, via internet, a participação ativa dos cidadãos nos processos decisórios tradicionais do sistema representativo. Nos próprios Estados Unidos, o projeto Vothere.net, desenvolvido por empresas como Compaq, Cisco e Entrust, é um sistema de votação sigiloso que já está sendo utilizado em algumas eleições primárias no país. Também no Estado da Minnesota, por exemplo, grupos civis objetivando estimular a participação política e a revitalização da cultura cívica, montaram o projeto E-Democracy em 1994, que objetiva fornecer informações sobre as iniciativas legislativas aos cidadãos, com grande impacto sobre o processo deliberativo dos legisladores (Borges,2002). Nos países da Comunidade Britânica os governos também vêm assumindo iniciativas que estimulam a participação dos cidadãos nos projetos públicos, estimulando a cultura cívica e a accountability dos órgãos governamentais. Na Nova Zelândia foi montado um sistema de informações via on-line onde se disponibiliza a lista de projetos do Poder Executivo que estão submetidos à consulta pública. Na Inglaterra o Governo vem estimulando os órgãos públicos a disponibilizarem versões eletrônicas dos seus respectivos projetos para o conhecimento da opinião pública, e no Canadá é bastante comum que documentos públicos sejam publicados com link’s dos e-mail’s dos órgãos responsáveis(Ferreira e Araújo,2000). Mas ainda existem enormes divergências acerca dos reais impactos dessas experiências sobre o aprofundamento do contrato democrático estabelecido entre governos e cidadãos na Europa. De acordo com um trabalho de avaliação da OCDE realizado em 1998 sobre as experiências em desenvolvimento, o “Impact of the Emerging Information on the Policy Development Process and Democratic Quality”, apesar da ampliação do número de governos democráticos do continente europeu que têm se utilizado das novas tecnologias, os recursos tecnológicos da rede ainda eram utilizados preponderantemente para a divulgação de decisões assumidas previamente pelos governos. Assim, a utilização das novas tecnologias era fundamentalmente utilizada para a disseminação das informações. A prática da consulta popular e da participação dos cidadãos no processo decisório ainda estava muito restrita a iniciativas isoladas de governos locais ou de departamentos específicos dos governos nacionais, sem se constituir num princípio geral de orientação para todos os governos da OCDE. Em parte porque as novas tecnologias foram apropriadas em paralelo às formas de comunicação tradicionais preexistentes, tais como ofícios, telefone e fax(Ferreira e Araújo,2000). A organização reforçou as suas conclusões em pesquisa focalizada em cinco países-Suécia, França, Finlândia, Austrália e Reino Unido-, onde concluiu que, embora houvesse pontos em comum, as experiências eram muito condicionadas e dependentes das opções políticas dos governos nacionais (Castor e Age,2000). Essas conclusões reforçam o que muitos analistas já reconheceram. Fundamentalmente que existem inúmeras restrições políticas e institucionais à consolidação e disseminação do e-government, sendo as principais, as dificuldades de universalização do acesso; a ausência de uma infra-estrutura de feedback governamental que garanta a recepção das solicitações dos cidadãos; a dificuldade em simplificar e padronizar os modelos de sites e as informações contidas nos portais governamentais, e por fim, as dificuldades de se obter plena transparência por parte dos governos. Essas conclusões apontam para os condicionantes políticos que intervêm na definição do perfil

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das experiências de e-democracy. O aprofundamento nos modelos de participação política através dessas experiências requisita mudanças políticas profundas, tanto nas formas de estruturação estatal e nos modelos operacionais dos governos quanto no desenho dos sistemas políticos representativos. Mesmo nos países da OCDE e nos EUA, essas são questões que demandarão um longo processo de redefinição do papel do Estado e de mudanças nas regras do sistema político-representativo. Por outro lado, em contextos de profundas desigualdades sociais como nos países da América Latina, aprofundar os mecanismos da democracia eletrônica, incorporando-os no limite de definirem o processo decisório governamental, significa incrementar a força política relativa dos setores já privilegiados em outras dimensões da vida social. Frente a esses limites estruturais, as experiências orientadas para a melhoria da qualidade dos serviços públicos ofertados, para a disseminação de informações de interesse público e para o aprofundamento da transparência dos governos, se posicionam também como alternativas adequadas às condições estruturais dos países do continente. Sem deixar de almejar uma crescente ampliação da participação política dos cidadãos via Internet, essas alternativas contribuem efetivamente para melhorar a qualidade e a agilidades dos serviços ofertados, incrementar a eficiência dos governos, reduzir os custos das transações econômicas, incrementar o grau de interação entre Governo e sociedade e reforçar a accountability. Ao fim, essas são questões que também integram as condições definidoras da qualidade de uma democracia, e em certa medida os governos do continente já vêm se dedicando a esta tarefa. Nessa direção, vários são os exemplos em curso. Os governos do México, Argentina, Costa Rica, Honduras, Chile e Brasil já vêm disponibilizando portais eletrônicos para diversos fins públicos. No México, o Governo federal criou o portal Compranet (www.compranet.gb.mx) em 1997-que serviu de modelo para o similar brasileiro, o Comprasnet(www.comprasnet.gov.br)- onde se realiza a maior parte das compras governamentais. Nele são realizados leilões eletrônicos de bens, serviços e obras públicas de três mil órgãos do governo, englobando transações no valor de mais de U$ 20 bilhões anuais. O modelo bem sucedido do México desencadeou convênios de cooperação e assessoria com a Argentina, Equador, Costa Rica e Honduras, e o Banco Mundial vem testando o sistema para avaliar as possibilidades de sua replicabilidade para outros países. Mas apesar de ser bem sucedido, o modelo mexicano não é o único em desenvolvimento. No Chile o portal de compras governamentais, o ChileCompra(www.g2b.ch) é operado pelo setor privado e a certificação também é realizada por terceiros(Fernandes,2002) No Brasil, a preocupação do Governo Federal tem sido a de propiciar segurança jurídica e padronização metodológica às operações dos órgãos governamentais. A Medida Provisória 2200-2 de 24/08/2001 instituiu a ICP-Brasil, um conjunto de técnicas e procedimentos a serem seguidos pelos órgãos governamentais e organizações privadas, com o objetivo de definir os parâmetros técnicos e metodológicos de um sistema de certificação sob chave pública. Esse sistema oferecerá as garantias de que as transações comerciais e financeiras terão idêntica validade e serão isonômicas juridicamente às transações que têm como base os documentos impressos(Fernandes,2002). Mas é através do Programa Sociedade da Informação, lançado pelo decreto n°3.294 de 199, sob responsabilidade do Ministério da Ciência e Tecnologia, que o Governo Federal tenta definir as principais diretrizes para o setor. No “Livro Verde” do Programa, o Governo Federal reconhece a amplitude e profundidade das mudanças estruturais provocadas pelos novos paradigmas das tecnologias da informação e explicita a sua preocupação com a manutenção das desigualdades digitais, visto que a maior parte da população não dispõe sequer de serviços de telefonia. Assim, são explicitados os objetivos da política governamental de informação eletrônica, orientados para a preservação da identidade cultural do povo brasileiro, para a redução das desigualdades regionais e sociais e para o estímulo à participação social da população nos fóruns governamentais. Isso seria possível através de uma administração pública mais transparente e participativa, possibilidade que poderia ser viabilizada pelas tecnologias de informação e comunicação(MCT,2000). Nesse sentido, a perspectiva da política do Governo Federal é a de reforçar a accountability e a participação dos cidadãos nos fóruns públicos e no acompanhamento de projetos públicos.

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Contudo, apesar da intenção governamental de disponibilizar de forma on-line todos os serviços governamentais até o final de 2002, ainda não existem iniciativas consolidadas e generalizadas entre os órgãos governamentais federais para que se possa afirmar que o Governo brasileiro sofreu mudanças profundas na área da accountability eletrônica. Existem experiências de licitações públicas, compras eletrônicas através do Comprasnet, leilões de títulos públicos1, até mesmo a disponibilização de orçamentos públicos, programas e projetos governamentais, mas nada semelhante às iniciativas de consultas públicas como se observa em alguns países da OCDE. As experiências dos governos estaduais ainda são recentes e estão se disseminando pelo país. Regra geral existe uma forte associação entre modelos organizacionais inovadores e a utilização de tecnologias da informação na oferta de bens e serviços públicos, em websites governamentais ou em locais que concentram um grande números de serviços públicos e que também permitem acesso via Internet. Essa convergência entre modelos organizacionais modernos e tecnologia de ponta vem sendo utilizada através de três tendências.Uma, de caráter estritamente administrativo, refere-se à estrututuração dos sistemas de administração financeira dos Estados e Municípios, os SIAFEM’s. Programa de modernização que recebeu forte apoio do BID, que disponibilizou grandes recursos para a informatização das Secretarias Estaduais de Fazenda e está apoiando também a modernização dos Municípios, seu uso tende a se consolidar e se disseminar entre os gestores públicos. Um segundo modelo é aquele cristalizado nos portais eletrônicos destinados a compras governamentais, licitações públicas e leilões, geralmente disponíveis através de link’s dos websites governametais. Trata-se de serviços de disseminação de informações de interesse público e que objetivam agilizar processos de tomada de preços, licitações e leilões públicos. Salvo raras exceções, na maior parte dos Estado brasileiros portais informativos já estão em funcionamento. Essa opção vem se enraizando até no Poder Judiciário. Um exemplo foi o leilão realizado pela secção do Estado do Espírito Santo, do Tribunal Regional Federal(www.jfes.trf2.gov.br), onde os bens eram visualizados e os lances podiam ser feitos via Internet(Fernandes,2002). Um terceiro modelo, com forte potencialidade para impactar o grau de envolvimento cívico dos cidadãos e as relações entre o Estado e a sociedade civil, é aquele representado por iniciativas tipo one-stop-shopping, onde existe uma forte associação entre modelos organizacionais inovadores baseados em princípios gerencialistas e a utilização de tecnologias da informação. Essas iniciativas vêm se disseminando nos Estados da Bahia, São Paulo, Pernambuco, Goiás, Rio de Janeiro, Paraná, Rio Grande do Norte e Amapá. Através dessas iniciativas esses Estados vêm demonstrando que é possível facilitar a vida dos cidadãos, garantir maior agilidade nos serviços públicos, disseminar informações sobre serviços básicos e contribuir para reduzir os custos de transação de empresas e contribuintes individuais, incrementando as condições gerais da produtividade de suas economias e o grau de transparência dos serviços públicos. No Estado da Bahia, o Serviço de Atendimento ao Cidadão-SAC, uma experiência do tipo one-stop-shopping, implantado em 1995, vem introduzindo grandes inovações nos padrões tradicionais de atendimento do serviço público no Estado. Estruturado sob um modelo organizacional matricial, que envolve as diversas unidades prestadoras de serviços públicos e um núcleo gerencial que coordena a integração funcional das unidades e estabelece os padrões de qualidade no atendimento dos serviços, o SAC é dotado de recursos tecnológicos para o provimento de informação on-line aos cidadãos e vem ampliando as suas unidades de atendimento, orientadas para a oferta de serviços de licenciamento público e de documentação, pagamento de taxas públicas, serviços de defesa do consumidor e informações turísticas. O que singulariza a experiência é o seu enraizamento social como referência de serviço público para a população e a sua articulação institucional com demais órgãos públicos do Governo Estadual. A crescente consolidação de ambas as formas de enraizamento, a social e a

1A Secretaria do Tesouro Nacional desenvolveu um portal -Tesouro Direito- para vendas de títulos públicos a pessoas físicas, objetivando democratizar o acesso a esse bem(ver: htttp://www.stn.fazenda.gov.br)

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institucional, revelam que o SAC é dotado da necessária flexibilidade operacional para se consolidar no entorno institucional onde atua e coordenar os demais agentes institucionais no provimento dos serviços demandados pela população. A associação entre um modelo organizacional inovador, um padrão de gerenciamento flexível e o uso de tecnologias da informação, está contribuindo para transformar a imagem do serviço estatal junto à coletividade, estreitar os vínculos entre os cidadãos e empresas e o governo, e incrementar a capacidade de coordenação político-administrativa do Governo Estadual sobre os agentes governamentais. Trata-se de uma iniciativa de sucesso que vem disseminando o seu modelo para os demais Estados brasileiros. Em São Paulo o Programa Poupatempo utiliza-se dos mesmos princípios organizacionais e da mesma base tecnológica da experiência bahiana. Também uma experiência do tipo one-stop-shopping, que conta com várias unidades de atendimento na Região Metropolitana de São Paulo, os principais objetivos do Poupatempo são: democratizar o acesso aos serviços públicos, melhorar a qualidade dos serviços e do atendimento, restaurar o caráter público dos serviços através de um atendimento isonômico a todos, socializar as informações de interesse público e favorecer a inclusão social. Como na Bahia, Governos municipais, dirigentes de centros comerciais e de demais órgãos públicos vêm solicitando parcerias com o Programa, que já se tornou uma referência extremamente positiva para a população. Desde o início de seu funcionamento, em 1997, o Poupatempo já atendeu mais de 39,7 milhões de pessoas(Annenberg,2002) Experiências desse tipo apresentam um grande potencial para mudar o perfil do Estado brasileiro, seja afirmando o seu caráter de dimensão pública, seja incrementando a accountability governamental, ou ainda reforçando a confiança e os laços entre os cidadãos e os seus governos. Mas elas não impactam apenas a dimensão cívica da ordem social brasileira. Ao concentrar serviços públicos antes dispersos num mesmo local e que pode ser acessado via Internet, elas reconfiguram o espaço físico através da concentração de seus marcos administrativos num só lugar, mas também superpondo a essa dimensão física um espaço virtual que pode ser acessado à distância. A sua utilização nos espaços urbano-metropolitanos contribui decisivamente para incrementar uma das vantagens básicas das tecnologias da informação: reduzir os custos de transação entre os agentes econômicos e incrementar a produtividade geral da economia. Nesse sentido, se experiências desse tipo não transformam automaticamente a cultura cívica e o grau de participação política, visto que isso depende de outras dimensões culturais e políticas da sociedade brasileira, podem contribuir para reforçar o caráter público do Estado e estreitar os laços entre Administração Pública e cidadãos. 5. CONCLUSÕES: LIMITES E POSSIBILIDADES POLÍTICAS DAS CONEXÕES ENTRE

NOVAS TECNOLOGIAS E DEMOCRACIA. As novas tecnologias da informação estão de fato contribuindo para modificar as relações entre o Estado e a sociedade civil. Elas propiciam agilidade, acessibilidade e qualidade aos serviços e bens sob responsabilidade dos governos. Mas essas condições se realizam sob o arcabouço de determinados modelos político-institucionais e suas expressões organizacionais e administrativas. Esses modelos podem ampliar ou limitar, através dos seus suportes organizacionais, as possibilidades cívicas abertas pelas novas tecnologias da informação. Mas é evidente que esses modelos políticos- institucionais expressam as opções políticas de cada ordem social, e nesse sentido eles dependem do caráter do contrato social básico de cada sociedade e do lugar definido por ele para cidadãos e governo. Nas democracias modernas, principalmente a partir da gênese do Estado de Bem-Estar Social na Europa, esse contrato produziu um sistema híbrido, onde houve a convergência entre um sistema representativo liberal com metas sociais orientadas para uma igualdade mínima entre os cidadãos, dando origem ao modelo concertacional da social-democracia européia. Em certo sentido, trata-se de um contrato que vincula as regras formais do liberalismo ético de Stuart Mill com as metas sociais do contratualismo rousseauneano. A gênese do neoliberalismo e os debates em torno da reforma do Estado

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nos anos 80 não modificaram radicalmente esse contrato, visto que os direitos sociais básicos passaram a ser considerados como conquistas civilizatórias pelos povos europeus. Apenas reforçou o elemento lockeano do contrato: o mercado posto também como agente de regulação social. Mas na América Latina o caráter do contrato foi, em grande parte da história do continente, um acordo hobesiano: na ausência de um consenso social mínimo em torno das regras que deveriam reger o funcionamento do sistema representativo e a rotatividade do poder político, e diante das fortes assimetrias sociais instaladas desde os primórdios do processo colonizador, o dissenso sócio-político abriu espaço para que o Estado se antecipasse às estratégias dos diversos atores sociais e passasse a agir como agente autoritário de coordenação político-administrativa da sociedade. Essa situação só iniciou um processo de reversão a partir das experiências de democratização e da crise fiscal dos anos 80, que obrigaram os Governos do continente a negociar com os atores sociais e agentes econômicos uma agenda mínima de governo. Lentamente, o caráter do pacto social vem se modificando em direção a um paradigma mais democrático e igualitário. Nesse contexto, as novas tecnologias podem contribuir para melhorar a qualidade do padrão de relações históricas estabelecidas entre Estado e sociedade civil no continente. De fato, as experiências em curso na Europa demonstram que, apesar do conceito de e-democracy ainda estar vinculado às funções do Legislativo, o Poder Executivo de alguns países já incorporou os recursos eletrônicos que podem aproximar a administração pública dos seus cidadãos. Mas essas experiências também indicam que os usos da Internet tendem a se subordinar às opções do modelo político de cada país. Se nos países da Europa vêm prevalecendo os usos da rede para iniciativas cívicas, reforçando a accountability e as formas de participação direta, nos EUA têm preponderado as preocupações econômicas, apesar da tradição cívica desse país. Na América Latina os desafios são muitos. Mas transformar a estrutura do Estado e as formas operacionais dos governos para a plena incorporação das potencialidades das tecnologias da informação, exige profundas mudanças no conceito de democracia representativa e nas distinções clássicas entre Estado e sociedade civil. Mas essas são mudanças incrementais e representam um processo histórico profundo e de longo curso, talvez secular; mesmo nos países de forte tradicão democrática, como na Europa e América do Norte, provavelmente não serão factíveis no curto prazo. Por outro lado, incrementar radicalmente a porosidade do Estado e vincular a atuação dos governos à cotidiana atualização da opinião pública via Internet implica, em primeiro lugar, remover as fronteiras institucionais que justificam a existência do próprio Estado como fenômeno social e dimensão institucional específica; segundo, que o Governo como instância social de coordenação política e administrativa deixa de ser necessário às sociedades; terceiro, que as assimetrias sociais teriam que ser removidas. Mas sabemos que a gênese histórica do Estado como o conhecemos, e muito antes a dos governos, veio responder a requisitos estruturais das sociedades por agentes de coordenação política e administrativa. Assim, o esgotamento histórico das formas sociais Estado e Governo está longe de se concretizar, visto que isso requisitaria a resolução dos problemas da ação coletiva como questão fundamental das sociedades humanas organizadas. Nesse sentido, se as novas tecnologias da informação apresentam potencialidades para aprofundar o sentido da democracia, esse processo não pode deslegitimar os princípios básicos do sistema político-representativo, baseado que é na melhor equação política possível: um cidadão, um voto. No contexto de sociedades assimétricas, e desconhecemos alguma que não seja, essa equação é a mais justa possível, pois pelo menos viabiliza a igualdade entre os indivíduos no plano político. Assim, a defesa do aprofundamento das experiências de e-democracy, não pode conduzir a uma alternativa que estabeleça como parâmetro fundamental da ação administrativa e da legitimidade política dos governos a exclusiva participação dos cidadãos eletrônicos. Isso implicaria em reforçar as próprias desigualdades resultantes do processo de estratificação, que em última instância determinam as possibilidades de cada um dispor de uma conexão eletrônica. Nesse sentido, os usos das novas tecnologias devem ser intensificados naquilo que contribuem

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para melhorar a qualidade de vida dos cidadãos e o caráter público do Estado, mas preservando os princípios fundamentais do sistema democrático representativo. Apesar de suas limitações, esse é o sistema que crescentemente vem assegurando direitos mínimos universais aos cidadãos dos países que optaram por esse modelo político. O mesmo sistema que também tem induzido os Governos a incorporarem inovações tecnológicas em favor da melhoria da qualidade de vida dos cidadãos.

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Lourdes(org.): Estado, Mercado e Democracia. Rio de Janeiro, Paz e Terra. RESENHA BIOGRÁFICA ANA BENVINDA TEIXEIRA LAGE, economista, atual Secretária da Administração do Estado da Bahia. À frente da Saeb, ela está conduzindo um amplo processo de transformação por que vem passando o Estado, envolvendo ações como o governo eletrônico; o aprofundamento da tecnologia do SAC (Serviço de Atendimento ao Cidadão); novas tecnologias de gestão, desenvolvimento da Fundação Luís Eduardo Magalhães; o Qualiop, maior programa brasileiro de qualidade nas obras públicas; a revisão e a criação de carreiras, com destaque para a de Gestor Governamental; e a Desburocratização do setor público.

Ana Benvinda assumiu o cargo de secretária da Administração em maio de 2000. Antes, ocupou, de fevereiro de 1999 a maio de 2000, a Superintendência de Administração Financeira da Secretaria da Fazenda. Ela ingressou na Secretaria da Fazenda em 1978, como analista financeira, e sempre trabalhou nesta área, tendo ocupado durante três anos (de fevereiro de 1996 a fevereiro de 1999) a Diretoria do Departamento do Tesouro.

Graduada em Ciências Econômicas pela Universidade Federal da Bahia, em 1975, possui diversos cursos de especialização em Finanças Públicas, Dívida Pública, Administração Financeira, Controle de Gastos Públicos e Mercados de Capitais, além dos inúmeros seminários e workshops de que já participou ao longo de sua vida profissional.

No exercício da gestão e administração de recursos humanos, aprimorou seus conhecimentos através de treinamentos para o exercício da liderança e desenvolvimento de equipe. ENDEREÇO Secretaria da Administração do Estado da Bahia 2ª Avenida, 200 – 1º andar, sala 106 – Centro Administrativo da Bahia - CEP 41.750-300 Salvador, Bahia, BRASIL E-mail: [email protected] www.saeb.ba.gov.br Tel.: (71) 370-3343/3342 Fax: (71) 370-3345