(esse aqui) psicomotricidade e desenho

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Universidade Estadual de Maringá 24 a26 de setembro de 2008 1 DESENHO E CONSTRUÇÃO DE ASPECTOS TOPÓLOGICOS NA EDUCAÇÃO INFANTIL PEREIRA, Lilian Alves CALSA, Geiva Carolina INTRODUÇÃO Observando o cenário atual da Educação Infantil, percebemos certa incoerência no que diz respeito à seleção dos conteúdos que serão trabalhados no ano letivo. Na maioria das vezes, prioriza-se a alfabetização com atividades de memorização e repetição. As necessidades lúdicas, quando atendidas, são realizadas sem maiores justificativas senão a do brincar pelo brincar. De acordo com Fonseca (2008), com as atividades corporais frequentemente ocorre na escola o inverso do que deveria acontecer. Isso é observado nos espaços cada vez mais limitados para atividades deste tipo, enquanto aumentam os recursos para as salas de aula e atividades intelectuais. A preocupação excessiva com a alfabetização vem limitando o corpo das crianças, e levando os educadores a esquecer que a base para a aprendizagem infantil situa-se no próprio corpo. Para o autor, antes de aprender os conteúdos ministrados pela escola, o corpo deve estar com todos os elementos psicomotores estruturados (esquema corporal, lateralidade, organização espacial, organização temporal, coordenação e equilíbrio), pois sem essa organização a criança não está apta a sentar-se em uma cadeira e segurar um lápis para expressar no papel o que formulou em pensamento. Parece faltar nas escolas a percepção de que a psicomotricidade é uma atividade essencial para o desenvolvimento infantil. Diante desse contexto, muitos pesquisadores têm buscado atividades que possam ser usadas na escola e que tenham resultados satisfatórios tanto para a formação motora como para a alfabetização da criança. Fonseca (2008) considera o corpo como o primeiro dicionário infantil, repleto de experiências psicomotoras, às quais a criança pode recorrer ao longo de seu processo de alfabetização formal.

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Universidade Estadual de Maringá 24 a26 de setembro de 2008

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DESENHO E CONSTRUÇÃO DE ASPECTOS TOPÓLOGICOS NA

EDUCAÇÃO INFANTIL

PEREIRA, Lilian Alves CALSA, Geiva Carolina

INTRODUÇÃO

Observando o cenário atual da Educação Infantil, percebemos certa incoerência no que

diz respeito à seleção dos conteúdos que serão trabalhados no ano letivo. Na maioria das

vezes, prioriza-se a alfabetização com atividades de memorização e repetição. As

necessidades lúdicas, quando atendidas, são realizadas sem maiores justificativas senão

a do brincar pelo brincar.

De acordo com Fonseca (2008), com as atividades corporais frequentemente ocorre na

escola o inverso do que deveria acontecer. Isso é observado nos espaços cada vez mais

limitados para atividades deste tipo, enquanto aumentam os recursos para as salas de

aula e atividades intelectuais. A preocupação excessiva com a alfabetização vem

limitando o corpo das crianças, e levando os educadores a esquecer que a base para a

aprendizagem infantil situa-se no próprio corpo. Para o autor, antes de aprender os

conteúdos ministrados pela escola, o corpo deve estar com todos os elementos

psicomotores estruturados (esquema corporal, lateralidade, organização espacial,

organização temporal, coordenação e equilíbrio), pois sem essa organização a criança

não está apta a sentar-se em uma cadeira e segurar um lápis para expressar no papel o

que formulou em pensamento.

Parece faltar nas escolas a percepção de que a psicomotricidade é uma atividade

essencial para o desenvolvimento infantil. Diante desse contexto, muitos pesquisadores

têm buscado atividades que possam ser usadas na escola e que tenham resultados

satisfatórios tanto para a formação motora como para a alfabetização da criança.

Fonseca (2008) considera o corpo como o primeiro dicionário infantil, repleto de

experiências psicomotoras, às quais a criança pode recorrer ao longo de seu processo de

alfabetização formal.

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A psicomotricidade contribui para a formação global do indivíduo por meio de

atividades que vão além do simples divertir-se e também promovem o criar, o

interpretar e o dialogar com o mundo em que vivem (LIMA e BARBOSA, 2007). Por

conta disso, é cada vez maior o número de estudos científicos que recomendam a

presença destacada das atividades psicomotoras no programa escolar, principalmente

nas séries iniciais. A formação que a psicomotricidade oferece é capaz de prevenir

dificuldades de aprendizagem, freqüentes no cotidiano escolar.

Levando em conta tais aspectos, o presente trabalho teve por objetivo elaborar e aplicar

uma intervenção psicopedagógica envolvendo jogos corporais com ênfase na área

psicomotora (esquema corporal, orientação espacial e temporal), mental (tomada de

consciência da ação) com o intuito de verificar a influência dessa intervenção de caráter

construtivista sobre a ampliação de conceitos topológicos de alunos da educação

infantil. Para tanto, fizeram parte da pesquisa 60 crianças com faixa etária entre quatro e

cinco de anos um Centro de Educação Infantil. Verificou-se que as crianças

investigadas, em especial, as que apresentaram dificuldades na bateria de testes sobre

noções topológicas reproduziram esse resultado na organização espacial, temporal e

esquema corporal. Neste artigo, serão apresentados apenas os dados referentes ao teste

do espaço gráfico (desenho da figura humana) obtidos na fase anterior ao processo de

intervenção psicopedagógica em andamento.

INFÂNCIA E CORPO

Para Sirota (2001), a infância é definida como um período de crescimento no qual o

indivíduo, tanto do ponto de vista físico como moral, não existe ainda. Além disso, ela

representa o período normal da educação e da instrução. A infância se apresenta ao

educador como um ser não formado, uma obra não realizada e um produto não acabado,

mas um devir, um começo de ser, uma pessoa em vias de formação. Para a autora, a

sociologia em geral e, particularmente, a sociologia da educação durante longo tempo

permaneceu circunscrita a esta definição. Em contraposição a essa concepção que

considera a criança como um objeto passivo e submisso ao processo de socialização,

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regido pelas instituições sociais, surgem “os primeiros elementos de uma sociologia da

infância” (SIROTA, 2001, p.9).

As definições funcionalistas e a conseqüente releitura do conceito de socialização das

crianças levam a reconsiderar a criança como ator de sua própria vida sem

desconsiderar, porém, o caráter estruturador das instâncias sociais. Para Sirota (2001),

nas últimas décadas, a redescoberta da sociologia interacionista e as abordagens

construtivistas fornecem os paradigmas teóricos dessa nova construção do objeto

“infância”. Uma nova visão da infância, considerada uma construção social, dependente

ao mesmo tempo do contexto e das prescrições do discurso hegemônico da sociedade,

foi iniciada pelo trabalho dos pesquisadores da área da História. A partir de então, um

grande número de trabalhos vem discutindo esse conceito.

Entre esses estudos pode ser citado o de Postman (1999), segundo o qual os gregos não

pensavam nas crianças como uma categoria humana especial, foram, sim, os romanos

que começaram a estabelecer uma preocupação maior com as características e

condições da infância. No período clássico, a criança era concebida como um ser pouco

desenvolvido tanto fisicamente como intelectualmente. Para Platão, a educação das

crianças deveria ser direcionada tendo em vista o potencial de formação de cada um,

conforme os padrões esperados de um adulto.

Durante a Idade Média não existia um conceito específico de criança, o indivíduo era

considerado criança pelo menos até os sete anos, idade a partir da qual poderia entender

e fazer o mesmo que os adultos. Não era concebida a existência de um estado

intermediário entre infância e idade adulta. Segundo o autor, a criança era considerada

quase invisível ou um “mini-adulto”.

Segundo Postman (1999), esse quadro só mudaria em meados do século XVIII, quando,

na Alemanha, inventou-se a tipografia. Neste período, as crianças foram expulsas do

mundo adulto, e passam a habitar um novo mundo: o mundo da infância. Após

aproximadamente cinqüenta anos da invenção da tipografia, estabeleceu-se uma

distinção mais clara entre a criança e o adulto, momento em que para a sociedade

burguesa torna-se necessário um homem letrado. A criança passa a se constituir o

indivíduo cujo papel é o de aprender a ler e a escrever. Para se tornar adulto a criança

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deve aprender esses conteúdos escolares: ser criança torna-se “o vir a ser adulto” por

meio do processo de escolarização.

A partir daí, final do século XIX e início do século XX, a infância torna-se uma

categoria científica, descrita e acompanhada em suas diferentes etapas. Estágios de

desenvolvimento baseados na idade cronológica são descritos pela ciência da Psicologia

e da Pedagogia, ambas em ascensão. Esses conhecimentos, de caráter científico,

propiciam a organização das classes escolares e o estabelecimento de um currículo

adequado para cada etapa do desenvolvimento infantil.

Fazendo parte desse amplo movimento de reconstrução do conceito de infância,

segundo Ghiraldelli Jr. (2002, p. 20), com a Revolução Industrial e os “desdobramentos

do capitalismo oitocentista, as crianças [...] são colocadas no mundo do trabalho, assim

quando se inicia o século XX, a escola é considerada o lugar da infância, mas não o seu

lugar de fato”. A noção de infância é, definitivamente, desligada do sentimento amoroso

e ligada à ciência e ao trabalho, este último considerado um elemento inerente à vida

infantil.

Ao agregar a idéia do trabalho ao conceito de infância, a Pedagogia passou a entender a

criança como um ser ativo, autor de suas idéias e de suas ações. Essa concepção

fundamenta várias tendências pedagógicas, em particular, as Pedagogias Novas e as

Construtivistas. De acordo com o autor, a concepção de infância sofre uma alteração

importante na segunda metade do século XX com o advento das políticas econômicas e

sociais neoliberalistas. Esse movimento no conjunto da sociedade promove a quase

inexistência da infância nos moldes tradicionais. A criança torna-se consumidora cuja

subjetividade deixa de ser centrada na “consciência” e passa a centrar-se no “consumo

do corpo”. Ghiraldelli Jr. (2002) explica o movimento da criança nesse processo da

seguinte maneira

[...] um duplo movimento: o sujeito se reduz ao corpo e a consumidor, e o próprio corpo se transforma em objeto de consumo, de modo que, no limite, o sujeito se torna objeto. O sujeito é, então este estranho elemento: corpo-que-consome-corpo (GHIRALDELLI JR, 2002, p. 37).

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O indivíduo acredita ser um sujeito racional e livre que escolhe e controla o seu próprio

corpo. No entanto, ser criança constitui-se ter um corpo que consome coisas de criança.

Deixa de ser definido pela ciência e passa a ser definido pela mídia e pelo mercado.

Com a modificação que vem ocorrendo na concepção de infância, a criança tende a não

ser mais concebida como indivíduo que age, descobre, inventa e interage com a

realidade. Em contrapartida, torna-se um sujeito que entra em contato com a hiper-

realidade e com o mundo virtual. Essa modificação implica a redução dos movimentos

do corpo: seu uso quando existe é sempre organizado e sistematizado e não espontâneo

e lúdico. Segundo Ghiraldelli (2002, p.32), a nova concepção de infância traz

conseqüências negativas para o desenvolvimento infantil na medida em que ser criança

e ser adulto se misturam a tal ponto que “[...] a criança torna-se um adulto infantilóide”

As experiências infantis quase reduzidas ao consumo não favorecem os confrontos e as

resistências necessárias à “conformação de sua personalidade individual”.

O autor conclui que a sociedade ocidental apresenta uma forma superficial e limitada de

caracterizar o corpo e a infância. Além dos conflitos interiores e das mudanças

corporais, a criança se defronta com a contradição entre velhos e novos valores, crenças

e conceitos que vão se delineando a partir das necessidades do contexto sócio-histórico.

E, apesar de vários estudos mostrarem a necessidade orgânica e psicológica contrária, o

desenvolvimento psicomotor não vem conseguindo ser retomado e ocupar o espaço

devido na formação dos indivíduos, em particular as crianças.

TOMADA DE CONSCIÊNCIA E CORPO

Vários estudos sobre o desenvolvimento motor infantil como os de Fávero (2004) e

Oliveira (1992) mostram o quanto o corpo vem sendo cada vez mais usado como

consumo, e não como fator de sua formação integral. Segundo as autoras, isso tem

gerado o não desenvolvimento das habilidades corporais dos indivíduos. Assim, como o

indivíduo não conhece seu corpo não toma consciência do mesmo. Para que esses

conhecimentos possam ser construídos, é necessário o desenvolvimento da ação prática

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do sujeito sobre o mundo, assim como sua interiorização e reorganização em nível

simbólico. Isso possibilitaria ao sujeito construir um conhecimento gradativamente mais

complexo de si, do outro e dos objetos da realidade física e social na qual está inserido.

Segundo Piaget (1977), faz parte do processo de aprendizagem de um conceito ou

procedimento o processo de tomada de consciência. Para chegar a esse tipo de

aprendizagem em que o sujeito é capaz de fazer e compreender o que faz, ou seja,

explicar e justificar seu pensamento, suas operações e ações, é importante a ocorrência

de intervenções do meio externo. A tomada de consciência é facilitada pela intervenção

do meio social – do outro. Essa intervenção pode favorecer o movimento dos indivíduos

à tomada de consciência de um conhecimento – um saber – que já existia como um

saber fazer. Piaget (1977, p. 13) parte da hipótese de “que a tomada de consciência

depende de regulações ativas que comportam escolhas mais ou menos intencionais e

não de regulações sensorimotrizes mais ou menos automáticas”.

Para o autor, as regulações automatizadas responsáveis por ações não intencionais são

insuficientes para a tomada de consciência. São necessárias regulações ativas que

implicam decisões voluntárias e intencionais do indivíduo sobre suas ações ou sobre seu

pensar. O processo de tomada de consciência depende dessas decisões, pois permitem a

compreensão por parte dos sujeitos das estratégias utilizadas para a resolução de uma

determinada situação-problema. Assim, para que o indivíduo atinja o nível de

conceituação sobre um objeto de conhecimento faz-se necessária a passagem da

assimilação prática desse objeto a uma assimilação conceituada.

DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA

O teste, cujos dados serão relatados neste artigo, refere-se ao espaço gráfico (desenho da

figura humana) que teve a função de investigar as características do desenho infantil e

as relações topológicas primitivas presentes nesta atividade. O levantamento de dados

teve início com o pedido para que os alunos desenhassem a figura humana: “Você

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poderia desenhar uma pessoa?”. A prova foi realizada durante uma entrevista

individual.

O presente teste foi adaptado de Piaget (1993) que, por sua vez, baseou-se nos estudos

de G. H. Luquet (1979) sobre as etapas de desenvolvimento do desenho infantil. Os

desenhos foram classificados em quatro fases: desenho involuntário ou garatuja (2 – 3

anos); incapacidade sintética (3 – 4 anos); realismo intelectual (a partir de 4 anos) e

realismo visual (8 – 9 anos). Essas fases foram as utilizadas como critério de análise dos

dados obtidos junto aos alunos de educação infantil entrevistados – 60 alunos – na

investigação.

Na primeira fase denominada “desenho involuntário” ou garatuja a criança atribui

significados próprios ao rabisco, uma espécie de analogia fortuita entre o traçado e o

que se pretende fazer.

A segunda fase, “incapacidade sintética” apresenta vários elementos sobrepostos, na

qual ocorre busca pela reprodução de formas sem coordenação precisa. Esta fase é

subdividida em duas subfases: a do girino e a dos badamecos. A subfase do girino

caracteriza-se pela representação da figura humana com uma grande cabeça de onde

saem os braços e pernas; enquanto na subfase dos badamecos os desenhos da figura

humana avançam por mostrarem o tronco, que pode ser composto por um traço reto de

onde saem pernas e braço ou podem possuir formas circulares.

Na terceira fase, “realismo intelectual”, os desenhos apresentam parcialmente os

atributos do modelo desenhado, pois sem ater-se ao real, a criança desenha aquilo que

ela sabe sobre o objeto e não tudo aquilo que ela vê. Por último, na quarta fase

denominada “realismo visual” os desenhos mostram rudimentos de perspectiva e

proporções. A criança desenha mais fielmente o que é visto ou pensado, pois os

desenhos estão mais voltados para o real do que para o imaginário.

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APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Em relação à primeira fase do “desenho involuntário” ou de garatuja, de acordo com os

dados coletados nenhuma criança, entre as entrevistadas, apresentou desenho

correspondente a esta etapa. Os dados mostram que 15% (nove crianças) delas

apresentaram um desempenho compatível com a fase identificada por Luquet (1979)

como incapacidade sintética na subfase girinos. Todas as crianças classificadas neste

estágio podem ser consideradas atrasadas se levada em conta sua idade cronológica.

Analisados em conjunto com os dados obtidos nos testes sobre noções topológicas

verifica-se uma relação possível entre ambos. O atraso no desenho pode estar

relacionado a dificuldades no desenvolvimento de relações topológicas, como

vizinhança, separação, continuidade e descontinuidade. Os desenhos de EMA 5,00 e

PED 4;09 (Figura 1) exemplificam as características deste tipo de desenho: não

conseguiram sintetizar a figura humana como um todo, e a relações topológicas de

vizinhança, nas quais as separações (olhos, bocas, pernas e braços aparecem distintos

uns dos outros) e o envolvimento (bocas e olhos dentro do rosto) são bem marcados. A

relação de continuidade nestes desenhos apresenta-se de forma mais complexa,

confirmando os dados e resultados encontrados em Piaget (1993), pois nesta fase a

criança não consegue manter a continuidade das partes do corpo quando está

desenhando.

Figura 1: Exemplo de incapacidade sintética – Girino EMA 5;00 e Girino com braços PED 4;09

respectivamente.

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Segundo a análise dos desenhos coletados, 41,7% (25 crianças) foram classificados na

fase da incapacidade sintética – subfase badamecos, dessas 12 (20%) podem ser

consideradas atrasadas para sua idade cronológica, apesar de os desenhos apresentarem

avanço no sentido de já mostrarem um tronco humano delimitado. Os dedos são

representados, porém a relação de descontinuidade ainda não desta completamente

estabelecida, pois a criança não consegue desenhar os a quantidade de dedos correta, ou

seja, não estabelece o delineamento de início e término desses membros (Figura 2).

Figura 2: Exemplo de incapacidade sintética – Badamecos HEL 4;08.

Em relação ao “realismo intelectual”, 43% (26 crianças) foram classificadas nesta fase,

na qual as relações topológicas são utilizadas em todos os desenhos. Para a criança

considerar as partes em relação ao todo utiliza a representação topológica do espaço e

esta se estende a todos os objetos desenhados, como exemplifica a figura abaixo (Figura

3).

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Figura 3: Exemplo de “realismo intelectual” MAR 4;11.

No grupo de crianças entrevistadas (60 crianças) não foram encontradas representações

gráficas que atendessem os critérios estabelecidos por Luquet (1979) nesta fase.

Acredita-se que isto tenha ocorrido pelo fato dessas crianças não atenderem a idade

cronológica estabelecida para a fase (8 – 9 anos).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O atraso nos testes do espaço gráfico (desenho da figura humana) encontradas por

Kobayashi (2001) em crianças de 5-7 anos, também foram encontradas nas crianças de

educação infantil, neste caso, crianças de 4-5 anos, o que sugere que essas dificuldades

no desenvolvimento das noções topológicas podem estar se manifestando desde a

primeira infância. Essa hipótese confirma as conclusões de Fávero (2004) e Tomazinho

(2002) sobre as lacunas no desenvolvimento espacial que vem sendo promovida pelas

famílias e pela escola, uma vez que os resultados de seus estudos têm identificado o

processo inverso desse conteúdo ministrado pela escola. Ou seja, a escola vem

trabalhando a ciência geométrica – a construção espacial pelas relações projetivas e

euclidianas, antes das noções topológicas. Esse tipo de trabalho não tem sido visto como

uma forma eficaz para o processo de construção do conhecimento espacial, uma vez que

Piaget (1993) assinala que este tipo de aprendizagem deve ser iniciada pela construção

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topológica e na seqüência as projetivas e euclidianas. Além disso, os alunos

investigados nesses estudos evidenciaram atrasos importantes.

Os resultados obtidos neste trabalho foram ao encontro dos resultados apresentados

anteriormente pela literatura especializada (PAVANELLO, 1995; KOBAYASHI,

2001). Nessas investigações, fundamentadas no construtivismo piagetiano, as autoras

mostram o quanto a escola precisa modificar a forma de abordar o início das

construções espaciais, sugerindo a importância de uma intervenção psicopedagógica

preventiva que priorize a psicomotricidade – espaço, tempo e esquema corporal – e no

processo de tomada de consciência, já que acredita-se que o mesmo é capaz de alterar as

estruturas cognitivas dos sujeitos, condições consideradas fundamentais para o

desenvolvimento do autoconhecimento, da autonomia e da intencionalidade das ações.

Finalizando, pode-se dizer que a modificação progressiva do desempenho dos alunos ao

longo do processo de intervenção psicopedagógica, faz acreditarmos na influência

positiva de sua organização baseada no processo de tomada de consciência. Os

resultados preliminares mostram que uma intervenção baseada nos pressupostos do

processo de tomada de consciência sobre os movimentos do corpo mostrou-se ser capaz

de favorecer o movimento cognitivo dos alunos no sentido da reorganização de seus

conhecimentos prévios sobre esse tema.

REFERÊNCIAS

FÁVERO, M. T. M. Desenvolvimento psicomotor e aprendizagem da escrita. Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual de Maringá. Maringá, 2004.

FONSECA, V. da. Desenvolvimento psicomotor e aprendizagem. Porto Alegre: Artmed, 2008.

GHIRALDELLI Jr., P. (Org.) et al. Infância, educação e neoliberalismo. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2002.

KOBAYASHI, M. do C. M.. A construção da geometria pela criança. Bauru: EDUSC, 2001.

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LIMA, A.S. BARBOSA, S.B. A psicomotricidade na infância, desenvolvendo capacidades. Revista Norte Científico, v.1, n.1, 2007.

LUQUET, G. H. O desenho infantil. Porto: Livraria Civilização, 1979.

OLIVEIRA, G. C. de. Avaliação psicomotora a Luz da Psicologia e Psicopedagogia. São Paulo: Vozes, 2008.

____. Psicomotricidade: Um estudo em escolares com dificuldades em leitura e escrita. 277 f. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1992.

PAVANELLO, R. M.. Formação de possibilidades cognitivas em noções geométricas. 166 f. Tese (Doutorado) – Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1995.

PIAGET, J. A tomada de consciência. São Paulo: Edições Melhoramentos, 1977.

PIAGET, J.; INHELDER, B. A representação do espaço na criança. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.

POSTMAN, N. O Desaparecimento da Infância. Rio de Janeiro: Graphia, 1999.

SIROTA, R. Emergência de uma sociologia da infância: evolução do objeto e do olhar. Cadernos de Pesquisa, nº 112, p. 7-31, março/ 2001.

TOMAZINHO, R. C. Z. As atividades e brincadeiras corporais na pré-escola: um olhar reflexivo. Dissertação (Mestrado) – Universidade Presbiteriana Mackenzie. São Paulo, 2002.