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1 EFEITO DA NÃO CUMULATIVIDADE DA CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS/PASEP E DA COFINS EM RELAÇÃO ÀS EMPRESAS PRESTADORAS DE SERVIÇOS Fabio Rodrigues de Oliveira Mestrando em Ciências Contábeis pela Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado Vínculo institucional: Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado Endereço: Av. Liberdade, 532, Liberdade, São Paulo, SP - Brasil - CEP 01502- 001 Telefone: 11 96501240 E-mail: [email protected] Mauro Fernando Gallo (principal contato) Doutor em Controladoria e Contabilidade pela Universidade de São Paulo Vínculo institucional: Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado Endereço: Av. Liberdade, 532, Liberdade, São Paulo, SP - Brasil - CEP 01502- 001 Telefone: 11 32722339 E-mail: [email protected]

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EFEITO DA NÃO CUMULATIVIDADE DA CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS/PASEP E DA COFINS EM RELAÇÃO ÀS EMPRESAS PRESTADORAS DE SERVIÇOS

Fabio Rodrigues de Oliveira Mestrando em Ciências Contábeis pela Fundação Escola de Comércio Álvares

Penteado Vínculo institucional: Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado

Endereço: Av. Liberdade, 532, Liberdade, São Paulo, SP - Brasil - CEP 01502-001

Telefone: 11 96501240 E-mail: [email protected]

Mauro Fernando Gallo (principal contato) Doutor em Controladoria e Contabilidade pela Universidade de São Paulo

Vínculo institucional: Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado Endereço: Av. Liberdade, 532, Liberdade, São Paulo, SP - Brasil - CEP 01502-

001 Telefone: 11 32722339

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EFEITO DA NÃO CUMULATIVIDADE DA CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS/PASEP E DA COFINS EM RELAÇÃO ÀS EMPRESAS PRESTADORAS DE SERVIÇOS

Fabio Rodrigues de Oliveira - Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (Brasil)

Mauro Fernando Gallo - Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (Brasil)

Resumo

Os tributos cumulativos trazem graves inconvenientes à economia, como o efeito “em cascata”, a verticalização de empresas e a injusta distribuição da carga tributária sobre o consumo. Por esses motivos, tem sido comum a substituição dessa sistemática de incidência pela não cumulatividade, que busca compensar, em cada fase de tributação, o que foi pago na anterior. É o que ocorreu no Brasil com a Contribuição para o PIS/PASEP e com a Contribuição para Financiamento da Seguridade Social – COFINS. Ao contrário, todavia, do que ocorre com outros tributos, em relação às citadas espécies tributárias a aplicação da não cumulatividade não foi plena, trazendo efeitos nocivos para diversos setores, principalmente às empresas prestadoras de serviços. É o que busca demonstrar este trabalho, por meio de uma pesquisa bibliográfica e documental. Em face da elevada carga tributária aplicada no país, este trabalho se mostrar muito importante, pois, além de evidenciar os efeitos negativos da sistemática não cumulativa, será útil como ferramenta de planejamento tributário e redução de custos.

Palavra-chave

Tributos. Não cumulatividade. . Custos. Planejamento tributário.

1. INTRODUÇÃO

A premissa sempre adotada em relação à incidência não cumulativa de um tributo é que ela é mais eficiente, trazendo menos danos à economia, estando mais próximo à teoria da tributação ótima, que pressupõe o menor impacto possível da imposição tributária em relação aos comportamentos dos agentes (SIQUEIRA; NOGUEIRA; BARBOSA, 2004, p. 173).

A técnica que foi empregada no Brasil para dar efetividade à não cumulatividade das contribuições, no entanto, acabou limitando a sua aplicação, trazendo efeitos negativos à economia e a diversos setores, haja vista o sensível aumento da carga tributária.

É o que buscará evidenciar este trabalho, por meio de uma pesquisa bibliográfica e documental, que analisará os efeitos da não cumulatividade da Contribuição para o PIS/PASEP e da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social – COFINS, em relação às empresas prestadoras de serviços.

Este estudo se justifica, pois procura demonstrar que simplesmente rotular determinadas incidências como não cumulativas nem sempre trazem os efeitos esperados pelos contribuintes com um tributo desta categoria.

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Sua importância também é revelada, uma vez que ao comparar o regime cumulativo e não cumulativo, será útil como ferramenta de planejamento tributário e controle de custos.

2. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 Não cumulatividade

A história dos tributos sobre valor acrescido, mais conhecidos no Brasil por não cumulativos, é bem recente e ingressou pela primeira vez no direito positivo na França que, em 1954, transformou o seu velho imposto sobre o volume de negócios em um tributo sobre o valor acrescido (TORRES, 2004).

Logo após seu nascimento, este tipo de tributo se irradiou pela Europa, estando atualmente presente em toda a União Européia, sob o título de Imposto sobre Valor Agregado – IVA. Os tributos não cumulativos também estão presentes na América Latina, inclusive no Brasil, onde apareceram pela primeira vez em 1958, com o Imposto Sobre Produtos Industrializados – IPI, que a época se denominava Imposto de Consumo.

2.1.1 Significado da expressão e finalidade

Para Hugo de Brito Machado (2004, p. 70):

Entende-se por não cumulatividade a qualidade do imposto e o princípio segundo o qual em cada operação o contribuinte deduz do valor do imposto correspondente à saída dos produtos o valor que incidiu na operação anterior, de sorte que reste tributado somente o valor acrescido.

Observa-se que a sistemática não cumulativa contrapõe-se ao regime cumulativo. Neste, o tributo (SIQUEIRA; RAMOS, 2004, p. 170):

é cobrado em diversas etapas do processo produtivo, de forma que haja a cobrança sobre uma base que contém o tributo cobrado em etapas anteriores, ou seja, a cobrança de tais tributos, quando não é acompanhada de mecanismos de compensação dos montantes cobrados nas etapas anteriores das cadeias de produção, produz um quadro de incidência em cascata.

Não é demasiado destacar que a não cumulatividade comporta duas espécies (HARADA, 2004):

a) incidência do tributo sobre o valor acrescido em cada etapa de movimentação da mercadoria, conhecido como IVA (Imposto sobre Valor Agregado), que figura no âmbito latino-americano em geral e na União Européia;

b) incidência do imposto sobre valor total de mercadoria, seguido de dedução daquele cobrado nas etapas anteriores, sistema este adotado no Brasil.

Independente da forma adotada para realização da não cumulatividade, o que importa é o resultado final, ou seja, o tributo, em cada operação, deve onerar somente o valor acrescido.

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2.1.2 Não cumulatividade na Constituição Federal de 1988

Ao contrário do que acontece em outras ordens jurídicas, nas quais o princípio da não cumulatividade não merece nem mesmo consagração constitucional, no Brasil, o Texto Magno não se conforma em apenas ditar o princípio. A Constituição Federal o trata o em minúcia, lhe ditando as regras mais importantes, qual seja, que o tributo devido em cada operação deverá ser compensado com o montante cobrado nas anteriores (MACHADO, 2004).

A Constituição Federal de 1988 impõe a não cumulatividade para o Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, para o Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Prestações de Serviços de Transporte Interestadual, Intermunicipal e de Comunicação – ICMS e para os impostos residuais.

Por meio da Emenda Constitucional n.º 42, de 19 de dezembro de 2003, a não cumulatividade também passou a ser prevista para as contribuições incidentes sobre o faturamento ou lucro e sobre a importação de bens ou serviços do exterior.

2.1.3 Sistemas de realização do princípio da não cumulatividade

É importante destacar que para a realização da não cumulatividade é possível a adoção de dois sistemas diferentes:

a) a concessão de crédito financeiro dedutível, que abrange o imposto pago relativo a qualquer bem entrado no estabelecimento, essencial e imprescindível à atividade;

b) a concessão de crédito físico, o qual restringe o direito à compensação ao imposto pago na aquisição de bens que fisicamente se incorporam ao produto final ou que se consomem no curso do processo de produção, dele se excluindo as máquinas, ferramentas e outros integrantes do ativo fixo. (BRITO, 2004, p. 114).

Conforme Machado (2004), não há dúvida que nossa a Constituição Federal não adota a posição restritiva, porque nenhuma limitação impõe ao princípio da não cumulatividade.

2.2 Contribuições Sociais

As contribuições sociais estão previstas na Constituição Federal do Brasil de 1988, e o produto de sua arrecadação destina-se ao financiamento da seguridade social, que compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência, e à assistência social.

Os pressupostos materiais de incidência das contribuições constam do art. 195 da Constituição Federal de 1988, a qual prevê as seguintes modalidades de apuração:

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I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:

a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício;

b) a receita ou o faturamento;

c) o lucro;

II - do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201;

III - sobre a receita de concursos de prognósticos.

IV - do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar.

Este trabalho limita-se à análise das contribuições incidentes sobre a receita ou faturamento.

2.2.1 Cumulatividade das contribuições sociais

Até 2002, quando foi inaugurada a incidência não cumulativa da Contribuição para o PIS/PASEP, as contribuições incidiam somente na modalidade cumulativa.

Nesta sistemática, em cada uma das fases de produção ou circulação dos bens e serviços, as contribuições são calculadas mediante aplicação, sobre o faturamento auferido pela empresa, das alíquotas de 0,65%, em relação à Contribuição para o PIS/PASEP, e 3%, em relação à COFINS.

2.3 Técnica da não cumulatividade

Conforme Brito (2004), a não cumulatividade pode ser encarada como princípio e também como técnica. É um princípio, quando enunciada de forma genérica, como está na Constituição, e é técnica, quando detalha a forma em que realiza o princípio.

Em relação à Contribuição para o PIS/PASEP e à COFINS, a técnica empregada para dar efetividade à não cumulatividade consta das Leis n.ºs 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e 10.833, de 29 de dezembro de 2003, respectivamente.

2.3.1 Pessoas jurídicas sujeitas à sistemática

Antes de entrar nos detalhes da não cumulatividade, cabe observar que o novo regime não aboliu a incidência cumulativa das contribuições. Com a instituição da incidência não cumulativa, passamos a conviver com dois regimes de apuração das contribuições.

Conforme Afonso e Araujo (2004), o governo federal, em uma economia moderna, com fortes e crescentes inter-relacionamentos setoriais, inova ao tentar

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criar o conceito da semicumulatividade, mantendo em convivência o regime cumulativo e não cumulativo.

2.3.2 Aspecto quantitativo de incidência

As contribuições têm como fato gerador o faturamento, assim entendido o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil.

A grande novidade em relação ao novo sistema ficou por conta das alíquotas maiores aplicáveis à base de cálculo. Essa medida foi necessária ara preservar a arrecadação, uma vez que neste regime é permitida a dedução de créditos após o cálculo do montante devido.

Diante disso, as alíquotas das contribuições foram majoradas em mais de 150%, passando de 0,65% para 1,65%, em relação à Contribuição para o PIS/PASEP, e de 3% para 7,6%, em relação à COFINS.

Para determinação do valor da Contribuição para PIS/PASEP e da COFINS serão aplicadas as citadas alíquotas sobre a base de cálculo, ou seja, sobre o faturamento mensal, que compreende o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica.

2.3.3 Créditos da sistemática não cumulativa

Embora o título desta modalidade de tributação sugira a implantação da não cumulatividade, este instituto não foi adotado em sua plenitude, pois as Leis n.º 10.637, de 2002, e n.º 10.833, de 2003 preferiram a técnica de listar as operações que geram e as que não geram direito a crédito.

Conforme assevera Antonio Airton Ferreira (2003), para que fosse garantida a operacionalidade da regra constitucional da não cumulatividade em relação às contrições sociais, deveria haver o confronto entre o débito tributário e o crédito do contribuinte. Afirma, ainda, Ferreira (2003), que se essa metodologia estivesse expressamente contida no texto legal, a aplicação da regra da não cumulatividade não suscitaria tantas dúvidas, uma vez que estaria resguardada a pertinência entre os elementos que compõem o campo da materialidade de incidência das contribuições e os elementos que devem integrar o quadro dos créditos conferidos ao contribuinte.

Todavia, não foi essa a técnica adotada. De acordo com o art. 3º das Leis n.ºs 10.637, de 2002, e 10.833, de 2003, e alterações posteriores, do valor apurado das contrições a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados mediante aplicação das alíquotas de 1,65%, em relação à Contribuição para o PIS/PASEP, e 7,6%, em relação à COFINS, sobre o valor:

a) dos bens adquiridos no mês para revenda;

b) dos bens e serviços adquiridos no mês, para serem utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes;

c) dos encargos incorridos no mês com energia elétrica e energia térmica, inclusive sob a forma de vapor, consumidas nos estabelecimentos da pessoa jurídica;

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d) dos encargos com aluguéis de prédios, máquinas e equipamentos, pagos a pessoa jurídica, utilizados nas atividades da empresa;

e) das contraprestações de operações de arrendamento mercantil de pessoa jurídica;

f) dos encargos de depreciação de máquinas, equipamentos e outros bens incorporados ao ativo imobilizado, adquiridos ou fabricados para locação a terceiros, ou para utilização na produção de bens destinados à venda ou na prestação de serviços;

g) dos encargos de depreciação ou amortização de edificações e benfeitorias em imóveis próprios ou de terceiros, utilizados nas atividades da empresa;

h) dos bens recebidos em devolução no mês, cuja receita de venda tenha integrado faturamento do mês ou de mês anterior, e tributada na forma não cumulativa;

i) dos encargos com armazenagem de mercadoria e frete na operação de venda, quando o ônus for suportado pelo vendedor.

Além destes créditos, há, ainda, a existência de créditos específicos ou presumidos para determinadas atividades, tais como a subcontratação de transporte de cargas por empresa de serviço de transporte rodoviário de cargas.

É importante ainda observar que a técnica adotada para as contribuições é muito peculiar no sentido que não toma como base necessariamente aquilo que foi pago na operação anterior, permitindo a apuração de créditos, incluive, em operações que foram beneficiadas por isenção. Neste sistema, não temos a transferência de créditos como ocorre com o ICMS e o IPI. A apuração é feita internamente (OLIVEIRA; ONO. 2009).

2.3.4 Restrições à apropriação de créditos

Destaca-se que dessa relação taxativa de créditos, ainda há algumas restrições. Assim, na aquisição de bens para revenda, não é possível o desconto de créditos em relação aos produtos sujeitos à incidência monofásica ou inseridos na substituição tributária das contribuições.

A mão-de-obra paga a pessoa física também não dará direito a crédito, ou seja, sobre a folha de salário mensal, por exemplo, não será possível o desconto de créditos.

2.4 Custos

Conforme Lopes e Carvalho (2000), os dados obtidos da apuração dos custos têm sido utilizados para diferentes finalidades, como o estudo da rentabilidade, a redução dos custos controláveis, o planejamento e o controle das operações do sistema de produção, a identificação e a determinação da rentabilidade e a identificação do ponto de equilíbrio da atividade.

Com o advento da não-cumulatividade das contribuições sociais, a apuração dos custos passou a ter mais uma finalidade. Como foi demonstrada ao longo deste trabalho, a técnica adotada para a não-cumulatividade das contribuições sociais não teve como premissa permitir que qualquer custo garanta a apuração de créditos, mas tão somente aqueles taxativamente descritos pelo legislador.

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Por outro lado, tendo em vista o princípio da não-cumulatividade, todos os custos ligados a uma determinada atividade deveriam permitir a apuração de créditos. Por isso a importância de se conhecer os custos de uma atividade. Somente assim poderá ser possível verificar se o legislador impôs limites onde não deveria.

3. METODOLOGIA DA PESQUISA

Uma pesquisa, muito mais do que procurar a verdade, busca encontrar respostas a questões propostas, utilizando métodos científicos (MARCONI; LAKATOS, 2008).

Tendo em vista esse pressuposto, para permitir a consecução desta pesquisa, foi realizado um levantamento bibliográfico sobre os temas que referenciam este trabalho, quais sejam, (a) não cumulatividade, (b) contribuições sociais.

Também foi realizada uma pesquisa documental, abrangendo os atos legais relativos aos referidos referencias, bem como aqueles que tratam especificamente da não cumulatividade das contribuições sociais, objeto principal desta pesquisa.

Por fim, para demonstrar os efeitos da não cumulatividade, foi realizado um exemplo hipotético, o qual permite a evidenciar seus efeitos nocivos em relação às empresas prestadoras de serviços.

4. EXEMPLO HIPOTÉTICO

Para evidenciar o efeito da não cumulatividade em relação às empresas prestadoras de serviços, optou-se por analisar, por meio de um exemplo hipotético, as empresas de transporte rodoviário de cargas.

A escolha deste setor se deve ao fato de que a própria legislação excepcionou algumas atividades de transporte da não cumulatividade, motivada, certamente, pela provável majoração da carga tributária.

Posto isso, cabe observar que na determinação dos créditos, o primeiro passo é evidenciar os custos, as despesas e os demais encargos incorridos no período. Neste estudo hipotético, para analisar os custos, as despesas e os encargos incorridos, será utilizada, com algumas adaptações, a relação de custos elaborada por Carmo, Lopes e Carvalho (2006).

Os cursos na atividade de transportes podem ser divididos da seguinte forma:

Despesas com mão-de-obra Alimentação, transporte e uniformes

Benefícios (transporte, alimentação, diária, etc)

Encargos sociais

Gastos com rescisão contratual

Gastos com treinamento de Mão-de-obra

Mão-de-obra eventual

Salários funcionários

Tributos fixos e multas IPVA

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Taxa de licenciamento

Seguro obrigatório

Multas

Despesas e custos diversos Combustível

Rastreamento

Energia elétrica

Arrendamento mercantil

Manutenção / consertos

Lubrificantes / óleo

Seguro do veículo

Pneus / câmaras / estepes

Recauchutagem

Depreciação

Retífica

Serviços de elétrica

Limpeza do veículo

Pedágio

Troca de pneu/consertos

Multa

Subcontratação de serviços de transporte

Amortização

Partes e peças

QUADRO 1 – Custos no transporte rodoviário de cargas

Fonte: Do autor.

De posse a relação dos encargos incorridos no período, o próximo passo é relacionar aqueles que permitem o desconto de créditos. Esta é uma das fases mais complexas, haja vista as várias restrições à apuração de créditos.

A seguir, são analisados os referidos créditos, por grupo.

4.1 Despesas com mão-de-obra

Da relação de encargos expostos, por exemplo, não será possível a apuração de créditos em relação aos valores relativos a mão-de-obra paga a pessoa física, mesmo que estes valores se constituam como insumos para a atividade, uma vez a regra que impede o desconto de créditos em relação a pagamentos a pessoa física.

Exceção a essa restrição teríamos, todavia, no caso de mão-de-obra terceirizada contratada junto a outra pessoa jurídica. Essa medida, todavia, encontra restrições em face da legislação trabalhista brasileira, que impede a terceirização de atividade-fim.

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4.2 Tributos fixos

A legislação das contribuições optou por relacionar taxativamente os valores que permitem a apuração de créditos. Assim, é possível inferir que em relação aos encargos tributários suportados pelo contribuinte não é possível o desconto de créditos, pois não se inserem na restrita relação dos créditos.

4.3 Despesas e custos diversos

As Leis n.ºs 10.637, de 2002, e 10.833, de 2003, em seus exatos termos, prevêem que poderão ser descontados créditos em relação a “bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços [...], inclusive combustíveis e lubrificantes [...]”.

Como se verifica, os bens e serviços utilizados como insumo na prestação de serviços geram créditos das contribuições. A legislação das contribuições, entretanto, não traz essa definição.

A Secretaria da Receita Federal do Brasil define como insumos utilizados na prestação de serviços:

a) os bens aplicados ou consumidos na prestação de serviços, desde que não estejam incluídos no ativo imobilizado; e

b) os serviços aplicados ou consumidos na prestação do serviço.

Para a Receita Federal, o termo insumo na prestação de serviços não corresponde a todo e qualquer bem ou serviço que gera despesa necessária para a atividade da empresa, mas tão somente como aqueles bens e serviços que efetivamente sejam aplicados ou consumidos na prestação do serviço e, em se tratando de aquisição de bens, não sejam passíveis de inclusão no ativo imobilizado.

Tendo em vista essas afirmações, na análise destes créditos, portanto, é necessário verificar se os encargos incorridos inserem-se nesta definição.

Da relação de encargos relacionadas com o setor de transporte de cargas, podemos incluir, portanto, os seguintes custos:

Combustível Pneus, câmaras e estepes Limpeza de veículo Manutenção e consertos Recauchutagem Retífica Lubrificantes e óleo Partes e peças Serviços de elétrica

É importante destacar que é possível o desconto de créditos em relação às despesas efetuadas com a aquisição de partes e peças de reposição e com serviços de manutenção em veículos, máquinas e equipamentos empregados diretamente na prestação de serviços, desde que essas partes e peças não estejam incluídas no ativo imobilizado. Caso estejam incluídas, o crédito será descontado com base na depreciação mensal.

Os seguintes valores, que podem ser classificados como insumos, já possuem, todavia, subgrupos próprios, como já foi analisado:

a) energia elétrica;

b) arrendamento mercantil;

c) depreciação;

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d) amortização

e) subcontratação de serviços de transporte

4.4 Confrontação entre o regime cumulativo e não cumulativo

As principais diferenças entre o regime cumulativo e não cumulativo referem-se ao desconto de créditos e às alíquotas aplicáveis. No regime não cumulativo as alíquotas são superiores ao regime cumulativo, justamente para compensar o desconto de créditos. O aumento das alíquotas corresponde a 153,33%.

Assim, o ponto de equilíbrio entre o regime cumulativo e não cumulativo ocorre quando os créditos admitidos neste último correspondem a 60,53% do montante apurado do débito. Sempre que o valor for superior, o regime não cumulativo será mais vantajoso. Todavia, se o montante dos créditos for inferior a esse montante, o novo regime é prejudicial.

Para que este percentual seja alcançado, as empresas precisam trabalhar com uma margem de lucro muito reduzida, pois as despesas e custos deverão corresponder a mais de 60,53% das receitas, sem contar que vários encargos não geram créditos das contribuições.

Para ilustrar essa afirmação, podemos considerar uma empresa de transporte de cargas, cuja receita bruta no período foi de R$ 100.000,00 e que apurou os seguintes custos:

a) salários: R$ 20.000,00

b) encargos sociais e benefícios: R$ 7.000,00

c) combustíveis: R$ 30.000,00

d) depreciação: R$ 15.000,00

e) manutenção e conserto: R$ 3.000,00

Em face desses dados, o primeiro passo será apurar o montante dos débitos, que neste caso correspondem a:

a) PIS/PASEP: R$ 100.000,00 x 1,65% = R$ 1.650,00

b) COFINS: R$ 100.000,00 x 7,6% = R$ 7.600,00

O próximo passo é verificar, em relação aos custos incorridos, quais geram créditos. Neste exemplo, são:

1. Combustíveis

a) PIS/PASEP: R$ 30.000,00 x 1,65% = R$ 495,00

b) COFINS: R$ 30.000,00 x 7,6% = R$ 2.280,00

2. Depreciação

a) PIS/PASEP: R$ 15.000,00 x 1,65% = R$ 247,50

b) COFINS: R$ 15.000,00 x 7,6% = R$ 1.140,00

3. Manutenção e conserto

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a) PIS/PASEP: R$ 3.000,00 x 1,65% = R$ 49,50

b) COFINS: R$ 3.000,00 x 7,6% = R$ 228,00

Diante disso, basta descontar do montante de cada débito o corresponde valor de créditos:

a) PIS/PASEP: R$ 1.650,00 – R$ 495,00 – R$ 247,50 – R$ 49,50 = R$ 858,00

b) COFINS: R$ 7.600,00 – R$ 2.280,00 – R$ 1.140,00 – R$ 228,00 = R$ 3.952,00

Neste exemplo, os gastos que permitem a apuração de créditos correspondem a 48% da receita bruta auferida no período. Dessa forma, em vista da afirmativa mencionada anteriormente, que o ponto de equilíbrio corresponde a 60,53%, é possível inferior que neste exemplo o regime não cumulativo é prejudicial ao contribuinte.

Podemos confirmar essa afirmativa, aplicando à receita bruta as alíquotas incidentes no regime cumulativo:

a) PIS/PASEP: R$ 100.000,00 x 0,65% = R$ 650,00

b) COFINS: R$ 100.000,00 x 3% = R$ 3.000,00

Tributo Regime não

cumulativo (R$) Regime cumulativo

(R$) Aumento (R$)

PIS/PASEP 858,00 650,00 208,00 COFINS 3.952,00 3.000,00 952,00

Neste exemplo, a carga tributária no sistema não cumulativo superou em 30% o regime cumulativo. Como se constata, o regime não cumulativo, neste caso, é prejudicial ao contribuinte. Mesmo com seu “efeito em cascata”, o regime cumulativo ainda é preferível em relação ao regime não cumulativo.

Todavia, se ao contrário de restringir os créditos, a técnica empregada seguisse orientação constitucional, implementando o sistema sugerido por Ferreira (2003), teríamos os seguintes valores, considerando todos os custos incorridos na atividade:

Tributo Regime não

cumulativo (R$) Regime cumulativo

(R$) Redução (R$)

PIS/PASEP 412,50 650,00 237,50 COFINS 1.900,00 3.000,00 1.100,00

Sem a restrição aos créditos, a carga tributária, no regime não cumulativo, é reduzida em mais de 35% em comparação ao regime cumulativo. Em comparação com regime não cumulativo restritivo, a redução no regime não cumulativo pleno foi superior a 50%.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A opinião pública e os meios de comunicação acreditam que o tributo não cumulativo é menos oneroso. Entretanto, tem se verificado que isso nem sempre ocorre, em face dos sistemas não cumulativos que são implementados.

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Como foi demonstrado no exemplo hipotético deste estudo, a não cumulatividade majorou a carga tributária das empresas de transporte rodoviário de cargas, haja vista as diversas limitações aos créditos.

Mantida a sistemática atual, para essas empresas o regime cumulativo se mostra mais adequado, uma vez que a carga tributária é consideravelmente menor. Assim, em relação a estas empresas, poderia ser adotada a mesma medida que já é adotada em relação a outras atividades, qual seja, de excepcioná-las do regime não cumulativo.

Para efeito de planejamento tributário e controle de custos, portanto, o regime cumulativo das contribuições se mostra o mais adequado para as empresas de prestação de serviços, face às restrições existentes.

Todavia, melhor que excepcionar essas atividades do regime não cumulativo, seria implantar um verdadeiro regime não cumulativo, sem as restrições criadas.

6. REFERÊNCIAS

AFONSO, José Roberto Rodrigues; ARAUJO, Érica Amorim. Contribuições sociais, mas antieconômicas. In ARVATE, Paulo e BIDERMAN Ciro (Org.). Economia do Setor Público no Brasil. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. cap. 15, p. 270-289.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm>. Acesso em: 31 mai 2009.

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