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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE ARTES,CIÊNCIAS E HUMANIDADES EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM MUSEUS DE CIÊNCIA: DIÁLOGOS, PRÁTICAS E CONCEPÇÕES Gustavo da Costa Meyer Orientador: Profº Dr. Marcos Bernardino de Carvalho Relatório final de Iniciação Científica, financiado pela categoria institucional (RUSP). São Paulo, agosto de 2012.

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Page 1: EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM MUSEUS DE CIÊNCIA: … · principalmente, de referenciais teóricos que tratam dessa questão à luz da “ecologia de saberes” e da necessidade do diálogo

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

ESCOLA DE ARTES, CIÊNCIAS E HUMANIDADES

EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM MUSEUS DE CIÊNCIA: DIÁLOGOS, PRÁTICAS E

CONCEPÇÕES

Gustavo da Costa Meyer

Orientador: Profº Dr. Marcos Bernardino de Carvalho

Relatório final de Iniciação Científica, financiado pela categoria institucional (RUSP).

São Paulo, agosto de 2012.

Page 2: EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM MUSEUS DE CIÊNCIA: … · principalmente, de referenciais teóricos que tratam dessa questão à luz da “ecologia de saberes” e da necessidade do diálogo

2AGRADECIMENTOS

Estes não são agradecimentos somente por este trabalho, mas sim, por um ciclo

que se encerra juntamente com este.

Aos meus pais, Nelson e Sebastiana, e irmãos, Guilherme e Gabriel, por todo

suporte e apoio que me deram no decorrer da graduação e no desenvolvimento deste

trabalho, sempre com palavras de carinho e incentivo, mesmo quando eu não as

merecia.

A todos os meus amigos queridos, aqueles que ainda vejo com frequência e aos

que, apesar do distanciamento, sempre se encontram presentes de algum modo, não

citando-os pelo risco e pela injustiça de me esquecer de algum deles. Em especial, aos

amigos Marcel, Sâmia, Juliana, Melissa, Mariana, Bruna e Fernando, que me

aguentaram durante toda a graduação e também no decorrer deste trabalho, escutando

minhas reflexões e, principalmente, contribuindo com as mesmas.

A todos os integrantes do grupo de pesquisa Movimentos Sociais:

Sustentabilidade e Dimensão Socioambiental, que muito contribuíram com os (des)

caminhos tomados por este trabalho, seja diretamente, com críticas e discussões, ou

indiretamente, através de reflexões geradas pela leitura e debate dos trabalhos

desenvolvidos por cada membro do grupo. Posso afirmar, com total convicção, que

minha experiência no desenvolvimento desta iniciação científica não teria sido tão rica e

profunda caso não tivesse participado de tal grupo de pesquisa. Para além das

discussões acadêmicas (ou mesmo filosóficas), também ficam as amizades com as

pessoas do grupo.

Ao meu orientador Professor Marcos Bernardino de Carvalho, pelo incentivo

(por aceitar conduzir esta pesquisa comigo), assistência e paciência ao longo do

desenvolvimento do presente estudo, sempre solícito para o esclarecimento de dúvidas e

oferecendo sugestões que enriqueceram este trabalho. Além disso, não poderia deixar de

ressaltar seu lado humano, sempre me tratando com educação, com respeito e,

principalmente, de forma dialógica e horizontal.

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3

A minha raiva, minha justa ira, se funda na

minha revolta em face da negação do direito de

“ser mais” inscrito na natureza do seres

humanos. Não posso, por isso, cruzar os braços

fatalistamente diante da miséria, esvaziando,

desta maneira, minha responsabilidade no

discurso cínico e “morno”, que fala da

impossibilidade de mudar porque a realidade é

mesmo assim. O discurso da acomodação ou de

sua defesa, o discurso da exaltação do silêncio

imposto de que resulta a imobilidade dos

silenciados, o discurso do elogio da adaptação

tornada como fado ou sina é um discurso

negador da humanização de cuja

responsabilidade não podemos nos eximir.

(Paulo Freire, pedagogia da

autonomia)

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4RESUMO

O principal objetivo deste trabalho foi a problematização de quais aspectos possui a

educação ambiental concebida e praticada em museus de ciência, tendo-se em vista a

heterogeneidade de visões que cercam a questão ambiental, com as devidas posições

político-ideológicas que sustentam tal entendimento. Para tal análise, utilizou-se,

principalmente, de referenciais teóricos que tratam dessa questão à luz da “ecologia de

saberes” e da necessidade do diálogo de saberes, da consideração do caráter cognitivo

da crise ambiental e da concepção de educação ambiental crítica. Avaliou-se que a

forma de educação ambiental que prevalece em alguns museus de ciência é

fragmentada, reducionista e a-histórica, com abordagens pedagógicas ligadas,

preponderantemente, a aspectos das ciências naturais. Assim, atualmente, os museus de

ciência encontram-se despotencializados como espaços de discussão, não

proporcionando uma comunicação dialógica, transmitindo apenas informações ao invés

de proporcionar reflexões a respeito destas. O foco museológico encontra-se muito mais

nos objetos e na organização das exposições (o que não deixa de ser importante), do que

no potencial do espaço museal em si, envolvendo outros elementos da comunicação

educacional dos museus, como os educadores, por exemplo. No entanto, apesar de

prevalecer nos museus de ciência uma educação ambiental de caráter reducionista,

percebeu-se também, por parte de algumas dessas instituições, práxis interessantes, que

buscam abordar, pedagogicamente, alguns fundamentos característicos de uma

educação ambiental de vias críticas, como, por exemplo, o questionamento da ciência

como prática neutra e despolitizada; dessa maneira, pode-se dizer que tais experiências

indicam possíveis caminhos a serem trilhados pelos museus de ciência.

Palavras-chave: museus, educação ambiental, educação científica.

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5SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO: EDUCAÇÃO AMBIENTAL E MUSEUS DE CIÊNCIA,

QUAL A RELAÇÃO? ................................................................................................ 6

1. EDUCAÇÃO AMBIENTAL E MUSEUS DE CIÊNCIA: PRIMEIROS

ASPECTOS ................................................................................................................. 7

2. MUSEUS DE CIÊNCIA: ESPAÇOS PRIVILEGIADOS PARA A PRÁTICA E

DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL ..................................... 10

3. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS ..................................... 11

4. MUSEUS DE CIÊNCIA: ORIGENS E CONCEITOS........................................ 11

5. MUSEUS: PAPÉIS E MODELOS DE COMUNICAÇÃO................................. 14

5.1 Papéis dos Museus de Ciência......................................................................... 14

5.2 Modelos de Comunicação e Educação Científica ........................................... 16

6. CRISE AMBIENTAL, EDUCAÇÃO AMBIENTAL E MUSEUS DE CIÊNCIA

................................................................................................................................... 20

6.1 Reflexões quanto a crise ambiental................................................................. 20

6.2 Reflexões quanto a crise ambiental: conceitos de desenvolvimento .............. 26

6.3 Educação ambiental: contexto geral e vertentes ............................................ 31

6.4 Educação Ambiental e Museus de Ciência ..................................................... 36

7. CONSIDERAÇÕES PARCIAIS .......................................................................... 60

8. REFERÊNCIAS .................................................................................................... 63

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6APRESENTAÇÃO: EDUCAÇÃO AMBIENTAL E MUSEUS DE CIÊNCIA,

QUAL A RELAÇÃO?

Levando-se em consideração a diversidade de museus existentes que podem ser

caracterizados como científicos, torna-se difícil a conceituação destes e a análise de suas

práticas. Contudo, de maneira geral, os museus de ciência são espaços pedagógicos que

possuem características peculiares, como o aspecto lúdico e inter, multi e

transdisciplinar de seus objetos, exposições e estruturas (física e humana); estando

imersos no interior de uma rede de instituições de conhecimento e ensino que se inter-

relacionam. O objetivo principal de um museu de ciência é, claramente, o da educação

científica, todavia, existem muitas outras questões que se relacionam à ciência, quando

esta não é vista como um instrumento neutro, como a sociedade (p.e, em seus aspectos

históricos, políticos, econômicos e culturais), a natureza e a tecnologia.

Das relações entre essas dimensões na realidade, surgem inúmeras questões

complexas, com fatores e processos de difícil compreensão e clareza. Algumas espécies

de museus de ciência, com atributos específicos, buscam abordar pedagogicamente tais

questões, incorporando-as à seus objetivos. Assim, acredita-se que os museus de ciência

são importantes espaços públicos de discussão, possuindo papel fundamental, dentro de

uma cadeia educacional, ao poderem proporcionar reflexões e atitudes críticas em

relação a temas importantes, que envolvem, além de conhecimentos científicos, outros

tipos de saberes, como é o caso dos temas socioambientais. A discussão das origens e

consequências da crise ambiental (ou socioambiental como se prefira dizer) insere-se na

concepção ou perspectiva de educação ambiental prevalecente no museu de ciência.

Nesse contexto, o intuito deste trabalho foi o de problematizar quais aspectos

possui a educação ambiental concebida e praticada em museus de ciência, tendo-se em

vista a heterogeneidade de visões que cercam a questão ambiental, com as devidas

posições político-ideológicas que sustentam tal entendimento. Para tal análise, utilizou-

se, principalmente, de referenciais teóricos que tratam: da comunicação e divulgação

científica em museus, da ecologia de saberes, da crise cognitiva e da necessidade do

diálogo de saberes, e da concepção de educação ambiental crítica; documentos que

tratam de projetos de educação ambiental em museus de ciência também foram

analisados.

Como será melhor desenvolvido e especificado no decorrer do trabalho,

possivelmente, a forma de educação ambiental que prevalece em alguns museus de

ciência é fragmentada, reducionista e a-histórica, com abordagens pedagógicas muito

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7mais ligadas a aspectos das ciências naturais. Dessa forma, atualmente, os museus de

ciência encontram-se despotencializados como espaços de discussão, não

proporcionando uma comunicação dialógica, transmitindo informações ao invés de

proporcionar reflexões a respeito destas; o foco museológico encontra-se muito mais

nos objetos e na organização das exposições (o que não deixa de ser importante), do que

no potencial do espaço museal em si, envolvendo outros elementos da comunicação

educacional dos museus, como os educadores, por exemplo.

Existem, evidentemente, por parte de alguns museus de ciência, propostas

interessantes, que buscam, além de uma abordagem de educação ambiental de caráter

mais crítico, o trabalho com todos os elementos que caracterizam o potencial educador

do espaço museal. Tais propostas também foram apresentadas e analisadas nesta

pesquisa.

1. EDUCAÇÃO AMBIENTAL E MUSEUS DE CIÊNCIA: PRIMEIROS ASPECTOS

Apesar dos inúmeros benefícios que os avanços científicos e tecnológicos

acarretaram para as sociedades humanas até os dias atuais, existem muitos aspectos

inerentes à ciência e ao método científico com implicações consideradas problemáticas

para o meio ambiente e para a sociedade, se é que tais dimensões podem ser separadas.

Historicamente, considera-se que o grande êxito da ciência européia moderna foi a

simplificação da complexidade, fragmentando a ciência em disciplinas e separando os

objetos de estudo do sujeito que os estudava. Tal método entra em desacordo com uma

realidade complexa em diferentes níveis. Além disso, outras formas de conhecimento,

de saberes, foram marginalizados.

Sousa Santos, ao tratar das tensões entre ciência, filosofia e teologia, coloca que

a “visibilidade [dessas tensões] assenta na invisibilidade de formas de conhecimento

[populares, leigos, plebeus, camponeses ou indígenas] que não se encaixam em

nenhuma dessas modalidades” (2007, p.72). Esses conhecimentos estão para além do

universo do verdadeiro e do falso científico, e de sua objetividade e racionalidade

instrumental.

Acredita-se que, para fazer frente às novas questões socioambientais

emergentes, ou à “crise do conhecimento” nas palavras de Leff (2003), a ciência

fragmentada em disciplinas deveria converter-se em ciência inter e transdisciplinar,

mas, além disso, a ciência moderna deve ser encarada como promotora de um diálogo

entre os saberes ou “ecologia de saberes” segundo Sousa Santos (2007), reconhecendo-

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8se a pluralidade de conhecimentos diversos e as interações entre eles, sem

comprometer suas autonomias.

A crise ambiental é, portanto, uma crise do pensamento ocidental, da objetivação

e da homogeneização do mundo, da cisão entre sujeito e objeto, separando-se a

racionalidade formal da racionalidade substantiva:

A complexidade ambiental abre uma nova reflexão sobre a natureza do ser, do saber e do conhecer; sobre a hibridação do conhecimento na interdisciplinaridade e na transdisciplinaridade; sobre o diálogo de saberes e a inserção da subjetividade dos valores e dos interesses na tomada de decisões e nas estratégias de apropriação da natureza. (LEFF, 2003, p.22)

O objetivo de apresentar aos indivíduos instrumentos que possibilitem uma

análise crítica dos aspectos inerentes a ciência em sua relação com o meio ambiente e a

sociedade (tais como sua fragmentação, sua relação com outros saberes, seus limites,

suas possibilidades) demanda um grande esforço educacional, necessitando-se de uma

divulgação científica interligada com a Educação Ambiental (EA) em sua vertente

crítica, colocada por Layrargues como “um processo educativo eminentemente político,

que visa ao desenvolvimento nos educandos de uma consciência crítica acerca das

instituições, atores e fatores sociais geradores de riscos e respectivos conflitos

socioambientais” (2002, p.189).

Os espaços educacionais que podem comportar práticas pedagógicas voltadas

para a relação entre ciência e questões socioambientais são os mais variados, como

espaços formais, por exemplo. Ao lado de instituições sociais de educação formal,

existem outros núcleos de aprendizagem, as chamadas comunidades aprendentes, onde,

segundo Brandão, as “pessoas aprendem ensinando e ensinam aprendendo, (…) [com]

as pessoas (…) intertrocando saberes entre elas” (2005, p.87-88). Exemplos de espaços

que abrigam uma educação dessa espécie são os museus, cuja conceituação será tratada

posteriormente.

Segundo Margareth Lopes, os museus brasileiros são “verdadeiras escolas

abertas” (2001, p.883), visto que “estabeleceram-se como poderosas instituições de

controle de políticas, de concepções científicas e de troca de conhecimentos (...)” (2010,

p.1). Portanto, esses locais funcionam (ou funcionavam) tanto como institutos de

pesquisa, como também centros de divulgação do conhecimento de maneira

diferenciada, seja este conhecimento considerado científico ou não. No caso específico

do chamado museu de ciência, foco deste trabalho, sua importância se dá

principalmente no âmbito da ampliação e refinamento da chamada alfabetização

científica, buscando-se contribuir para a formação de cidadãos críticos, capazes de

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9apreciar a ciência como parte da cultura e estarem aptos a dialogar com outros saberes

e questionar o conhecimento em voga. Esta alfabetização científica adquire uma

importância ainda maior ao ser inserida no contexto dos problemas socioambientais

atuais, visto que para discutir e se engajar como cidadão no enfrentamento de tal

realidade, a população necessita estar cientificamente letrada (em um sentido de

formação, e não de capacitação) e sociopoliticamente consciente.

Os museus, de maneira geral, possuem aspectos educativos e comunicacionais

característicos, complexos e abstratos, sendo de fundamental importância o trato dos

métodos de comunicação empregados nesses espaços, assim como as concepções

existentes, direta ou indiretamente, nesses métodos. Este trabalho tratará posteriormente

de tais métodos comunicacionais, assim como a influência destes na forma de EA

praticada, suas potencialidades e/ou limitações.

Sendo assim, dentro deste contexto de relacionamento entre museus de ciência e

EA, pergunta-se: De que maneira a problemática socioambiental vêm sendo

relacionada com a ciência em museus voltados para a divulgação científica?

Com vistas a tornar mais clara a idéia que orienta este trabalho e, tendo em vista

a problemática exposta até este momento, parte-se da hipótese que, os atuais museus de

ciência, em suas exposições que tratam de temáticas socioambientais, buscam explicitar

ao público visitante o caráter conceitual do tema tratado, ou seja, busca-se expor o fato

de forma científica, não abordando-se fatores políticos, sociais ou éticos que existem no

contexto do tema. Tal forma de comunicação e divulgação científica, apesar de

importante, por fornecer bases científicas mínimas para que os indivíduos possam

opinar sobre determinado assunto, pode vir a prejudicar uma formação cidadã mais

ampla, capacitada a intervir em políticas públicas ou privadas e, principalmente, não

fornece subsídios para se pensar em outros modelos de desenvolvimento, mais justos e

equitativos. Deve-se pensar e discutir, portanto, como os temas ambientais ou

socioambientais, em museus de ciência, podem ser geradores de discussões políticas

mais amplas e, além disso, como tais temas podem servir como articuladores entre as

áreas científicas em si com outras formas de saberes.

Antes, contudo, de entrar-se em aspectos especificamente relacionados ao

espaço museológico, com a concepção e prática de EA que o caracteriza, retoma-se nos

próximos capítulos (2 e 3) as idéias bases desta pesquisa, buscando-se a clara

visualização dos objetivos e da importância da temática, brevemente tratada nesta

introdução.

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102. MUSEUS DE CIÊNCIA: ESPAÇOS PRIVILEGIADOS PARA A PRÁTICA E DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Um museu possui particularidades importantes na realização de práticas

educativas quando comparado com outros espaços educacionais. Os museus propiciam

uma maior liberdade na seleção e organização de conteúdos e metodologias, ampliando

possibilidades de multi, inter e transdisciplinaridade e contextualização, permitindo a

livre circulação do público entre suas temáticas; mas mais importante que esses fatores,

os museus possibilitam a realização daquele “diálogo de saberes” apregoado por Leff

(2003), onde tanto exposições fixas como itinerantes podem apresentar conteúdos que

envolvam outras formas de conhecimento e suas estratégias de apropriação da natureza

(que podem ser antagônicas) dentro de um espaço que abriga o conhecimento científico.

Assim, tais espaços possuem um grande potencial na promoção da motivação intrínseca

para o estudo de ciências e seus vínculos com as questões ambientais e outros saberes,

principalmente no que tange as implicações socioambientais do desenvolvimento

científico.

A motivação pela realização de uma pesquisa, vinculando a EA e espaços como

museus de ciência, advém do reconhecimento da complexidade ambiental e a

necessidade de uma revolução no pensamento, “uma transformação do conhecimento e

das práticas educativas para construir um novo saber e uma nova racionalidade que

orientem a construção de um mundo de sustentabilidade, de equidade, de democracia”

(LEFF, 2003, p.22). Nesse sentido, o museu de ciência, dentro de suas potencialidades e

limitações, pode vir a contribuir com um olhar mais sistêmico da problemática

socioambiental, não podendo se perder de vista, obviamente, o fato de que os museus de

ciência fazem parte de uma cadeia de espaços educacionais mais ampla (escolas,

parques, entre outras), cada qual com suas possibilidades de contribuição, respeitando-

se suas características.

Destacados os atributos principais dos museus de ciência, que os qualificam

como espaços educacionais privilegiados, os objetivos desta pesquisa são, portanto, a

identificação e análise crítica das práticas, discursos e concepções educacionais de

cunho socioambiental realizadas em museus de ciência, assim como a proposição de

outras formas de ações educativas com tal caráter, que poderiam ser empregadas nestes

espaços.

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113. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS

Tendo como referenciais teóricos a comunicação e divulgação científica em

museus, a ecologia de saberes, a crise cognitiva e a necessidade do diálogo de saberes, e

a concepção da EA crítica, em um primeiro momento desta pesquisa buscou-se os

métodos de comunicação e educação científica praticados nos museus de ciência

atualmente, buscando-se um diálogo entre tais métodos empregados com os papéis dos

museus científicos diante das demandas sociais contemporâneas, discutindo-se a EA

praticada nos museus de ciência, dentro do contexto dos métodos comunicacionais e

educacionais empregados.

Portanto, foi analisada a influência dos métodos comunicacionais e

educacionais, historicamente empregados pelos museus de ciência para o fim da

divulgação científica, na EA praticada por tais museus como uma de suas atividades,

buscando-se potencialidades e limitações dessas práticas e novos horizontes de ações.

Com esse intuito, teóricos da comunicação e educação em museus e teóricos da EA

foram utilizados.

Posteriormente, foram avaliadas as práticas de cunho socioambiental praticadas

na Estação Ciência, museu de ciência existente no município de São Paulo. Tal museu

foi utilizado como estudo de caso, na análise crítica e na tentativa de proposição de

novas ações educativas, de acordo com as concepções de EA existentes atualmente

nesse espaço.

Por fim, com o intuito de discutir possibilidades de práxis de EA de vias críticas

para os museus de ciência, foram analisadas as concepções e práticas de EA do Museu

de Astronomia e Ciências Afins (MAST) e do museu de ciências da UNICAMP.

4. MUSEUS DE CIÊNCIA: ORIGENS E CONCEITOS

Destacadas as idéias que deram origem a esta pesquisa, e exposta a pertinência

da mesma, pode-se adentrar efetivamente nos aspectos teóricos e práticos que compõem

os museus em suas interligações com a EA.

Primeiramente, é necessário conceituar de forma mais clara o objeto de estudo

deste trabalho, os museus de ciência, tendo em vista que estes possuem ramificações

com características peculiares, tratando de temas distintos entre si e, portanto, não

incorporando, em muitos casos, temáticas socioambientais neste contexto de atuação.

Existem atualmente, no mundo, aproximadamente 35.000 museus dos mais variados

tipos (KNOBEL, 2008); já no Brasil, existem hoje cerca de 140 centros e/ou museus de

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12ciência, com mais de 80 deles localizados na região Sul- Sudeste do país, sendo que

apenas o Rio de Janeiro, Recife, Porto Alegre e São Paulo possuem grandes centros de

ciência, com uma oferta permanente e um número considerável de visitantes. Apesar de

existirem grandes controvérsias sobre as instituições que podem ser caracterizadas como

museus de ciência, Marandino (2008) considera zoológicos, jardins botânicos, hortos e

centros de cultura como museus de ciência, por possuírem alguns elementos (objeto,

espaço e tempo) e pelo objetivo comum de divulgação científica, atrelada a outros

objetivos.

De maneira geral, portanto, existem inúmeros espaços que podem ser incluídos

no conjunto dos museus de ciência, por possuírem características em comum; no

entanto, tais espaços também possuem algumas particularidades, construídas

historicamente, que os definem em subconjuntos específicos.

Assim, historicamente, o papel e a organização dos museus foi se alterando, de

acordo com o contexto sociopolítico da época e, também, de acordo com as linhas

pedagógicas que foram sendo pensadas e debatidas. Dessa forma, os museus foram

transformando algumas de suas características primordiais, recebendo novas

denominações dentro desse conjunto.

Segundo Gaspar (1993), o papel dos museus alterou-se muito ao longo do

tempo, passando dos tradicionais espaços destinados a preservação de coleções e

monumentos históricos, sem qualquer organização ou catalogação dos objetos, para os

centros de ciência contemporâneos, construídos e planejados segundo o conceito da

interatividade, partindo do pensamento de que o aprendizado depende da manipulação

dos objetos.

No entanto, antes de se tratar dos extremos da constituição histórica dos museus,

é necessário tratar do surgimento do interesse pela divulgação e comunicação científica

utilizando-se museus que trabalhassem de modo particular a ciência. Tal interesse,

segundo Gaspar (1993), começou a surgir entre os séculos XVII e XVIII; o ápice

ocorreu devido a revolução industrial e através do impacto provocado pela Teoria da

Evolução de Darwin, quando formalmente surgiram os museus de ciência e tecnologia e

os museus de história natural. Tais museus de ciência eram, no início, basicamente

centros de pesquisa, mais do que de educação; todavia, com o surgimento das

Universidades, muitos destes museus foram atrelados administrativamente às mesmas,

alterando seu principal objetivo para a área educacional, principalmente para a educação

científica.

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13Posteriormente, pós segunda Guerra Mundial, surgiram os chamados centros

de ciência, que, apesar de objetivarem também a educação científica, se diferenciavam

dos modelos de museus de ciência concebidos até então, já que possuíam um caráter

menos “histórico”, ou seja, não possuíam interesses profundos na conservação e

preservação de objetos e, sim, na construção de suas próprias exposições, de acordo

com suas áreas de interesse, possuindo artefatos de maior interatividade. Assim, de

forma a construir uma linha cronológica do surgimento e papel dos museus de ciência,

pode-se dizer que eles se dividem basicamente em dois grupos: a categoria tradicional,

com preocupações voltadas para a preservação do passado, ou como centros de ciência,

com vistas ao presente e ao futuro. Cury et al. (2000) procuraram tornar mais evidente a

divisão entre museus de ciência tradicionais e os centros de ciência, como exposto na

figura 1 abaixo:

Museus de ciência tradicionais Centros de CiênciaFunção social e educacional Função social e educacional

Política de atuação Política de atuaçãoComprometimento com a

socialização do conhecimentoComprometimento com a socialização do

conhecimentoPreserva e comunica Comunica

Método de trabalho centrado no processo curatorial

Método de trabalho centrado no processo de comunicação

Aquisição de acervo/formação de coleções

Fabricação de “acervo” de modelos

Conservação preventiva e restauração

Renovação, manutenção e reposição

Comunicação do temas pertinentes ao acervo por meio de exposição,

monitoria e outras estratégias

Comunicação de temas científicos ligados à política científica do centro por meio de exposição, monitoria e outras estratégias

As atividades são orientadas pelo acervo e a exposição é a principal

forma de comunicação

As atividades são orientadas pela divulgação científica e nem sempre há uma ênfase sobre

um meio específicoFigura 1: Comparação das características de museus tradicionais e centros de ciências e tecnologia (adaptado de CURY et. al., 2000).

Assim, segundo os próprios autores, na comparação entre as colunas, percebe-se

que o principal diferencial entre as duas instituições está na forma da constituição dos

acervos e no uso das coleções no desenvolvimento das ações públicas; as principais

semelhanças correspondem ao compromisso social que ambas possuem ao divulgar

conhecimento científico e tecnológico.

Contudo, para este trabalho, o mais importante é que os centros de ciência

possuem, além das características já destacadas, uma ligação maior com a realidade

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14cotidiana e com a interface meio ambiente/sociedade, o que possibilita uma

avaliação, por parte desta pesquisa, da EA tratada nestes espaços, suas limitações atuais

e potencialidades futuras.

Assim, com vistas a uma padronização, quando tratar-se neste trabalho a respeito

da relação entre EA e museus de ciência, deve-se levar em conta, como referencial de

características e atuação, os centros de ciência contemporâneos, como já destacado.

5. MUSEUS: PAPÉIS E MODELOS DE COMUNICAÇÃO

5.1 Papéis dos Museus de Ciência

Como já dito anteriormente, o papel exercido pelos museus de ciência alterou-se

muito ao longo do tempo, provocando, inclusive, distinções em seu interior.

Atualmente, o papel que os museus de ciência, tanto os tradicionais como os centros de

ciência, devem exercer na sociedade, é ainda extremamente discutido e debatido por

pesquisadores do tema.

Em reportagem publicada na Revista Com Ciência em 2003, as diversas

opiniões a respeito do papel dos museus de ciência foram colocadas em destaque. A

professora Margareth Lopes, por exemplo, representando a opinião de um grupo de

pesquisadores, defende que a divulgação científica deve relativizar a própria ciência,

apresentando também suas controvérsias e situando-a em um contexto social mais

amplo:

A cultura científica é apenas uma das formas de cultura. A ciência não tem um status epistemológico superior a outras manifestações culturais. É uma atividade mundana, social, praticada por pessoas que vivem em um determinado contexto sócio-econômico, em períodos históricos determinados1

Deve-se, portanto, desmistificar a ciência (sua universalidade e objetividade),

colocando-a como apenas uma das formas de cultura.

Para Gilson Antunes da Silva, pesquisador da Universidade Federal do Rio de

Janeiro (UFRJ), os museus devem acrescentar outros tipos de saberes, não classificados

como científicos, ao seu projeto educacional:

A experiência dos museus de síntese, como o Museu Nacional do México, procura investigar a medicina tradicional dos índios, resgatando seu valor simbólico e terapêutico. Há um reconhecimento dos saberes tradicionais, que aquela ciência positivista do século XIX não admitia. A ausência de diálogo

1 Entrevista dada à Revista Com Ciência por Margareth Lopes em 2003, disponível em: <http://www.comciencia.br/comciencia/handler.php?section=8&edicao=37&id=44>. Acesso em: agosto de 2011.

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15entre aquilo que é classificado como pré-científico e científico hoje é muito relativizada2

Além disso, Gilson defende que os museus deveriam discutir aspectos éticos e

sociais da ciência, visto que tal conhecimento sobre a ciência, a chamada alfabetização

científica, funcionaria como um mecanismo de defesa para a sociedade.

Já o professor Marcelo Firer é crítico em relação ao questionamento da ciência

como saber instituído:

Relativizar a ciência ou contestar a ciência por motivos ideológicos é algo como negá-la. Hoje o cidadão vive imerso na Ciência e Tecnologia e não há saída fora dela3

Firer também destaca “a interatividade proporcionada pelos experimentos

expostos (...) como fundamental para o centro de ciência levar a uma reflexão do que

está sendo mostrado”.³

Assim, percebe-se que existe uma ampla diversidade de opiniões a respeito do

papel dos museus de ciência, ou pelo menos em relação a forma como os museus devem

tratar a própria ciência. Entretanto, em sua pesquisa, Delicado (2004) procurou

sistematizar as principais funções dos museus de ciência em Portugal, deixando claro

que os resultados são aplicáveis a outros museus de ciência espalhados pelo mundo.

A autora utiliza-se do International Council of Museums (ICOM) com o intuito

de definir o museu e suas funções: “Instituições [que] destinam-se à aquisição,

conservação, investigação e comunicação, com a finalidade de estudo, educação e

divertimento, de testemunhos materiais dos povos e do seu ambiente” (DELICADO,

2004, p.3). De acordo com a autora, os museus científicos, dessa forma, abarcariam

algumas destas funções e introduziriam outras novas, desenvolvendo suas atividades e

conteúdos de acordo com demandas do contexto envoltório.

Assim, a autora procura elencar, através de análises documentais e de

entrevistas, aquelas que seriam as principais funções dos museus de ciência: a promoção

da cultura científica, a investigação, o apoio ao ensino, os serviços à comunidade, a

preservação do patrimônio, a educação ambiental e o reforço da Identidade (local ou

2 Entrevista dada à Revista Com Ciência por Gilson Antunes da Silva em 2003, disponível em: <http://www.comciencia.br/comciencia/handler.php?section=8&edicao=37&id=44>. Acesso em: agosto de 2011.

3 Entrevista dada à Revista Com Ciência por Marcelo Firer em 2003, disponível em: <http://www.comciencia.br/comciencia/handler.php?section=8&edicao=37&id=44>. Acesso em: agosto de 2011.

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16institucional). Nota-se o destaque especial dado ao fato da EA, tema deste trabalho,

ser um dos papéis atuais dos museus de ciência, principalmente dos centros de ciência.

O trabalho de Delicado, porém, não busca classificar a escala de importância que

os museus atribuem, direta ou indiretamente, a estes papéis; assim, aparentemente,

poderia se imaginar que tais papéis possuem níveis de importância homogêneos.

Naturalmente, todavia, sabe-se que o principal objetivo dos museus de ciência,

deixado claro em sua denominação, é a promoção da cultura científica, a qual Delicado,

define como sendo “a comunicação (unívoca ou bidirecional) entre o campo de

produção da ciência e a esfera pública, podendo os conteúdos (conhecimentos,

resultados, processos, controvérsias, descobertas, riscos, impactos sociais) e objetivos

(econômicos, políticos, sociais, culturais, cívicos) dessa comunicação serem muito

diversificados” (2004, p.4). No Brasil, em estudo sobre a percepção dos centros e

museus de ciência tradicionais, quanto aos seus objetivos institucionais e atributos

organizacionais e administrativos, Cury et al. (2000) deixam claro que a tarefa da

divulgação científica e tecnológica é intrínseca a natureza dos museus de ciência.

Portanto, o que se verifica desta discussão a respeito dos papéis dos museus de

ciência, é que a promoção da cultura científica, ou mais especificamente a comunicação

pública e educação científica, é o principal papel dos museus de ciência; sendo assim,

todos os demais papéis, incluindo a EA, encontram-se subordinados ou colocados

dentro do contexto e metodologias empregadas para se alcançar o objetivo institucional

principal.

Nessa lógica de raciocínio, pode-se dizer que, discussões mais profundas quanto

às concepções e práticas de EA exercidas no espaço museal, suas limitações, críticas e

potencialidades, dependem primordialmente do entendimento histórico dos métodos

comunicacionais e educacionais desenvolvidos e utilizados pelos museus de ciência,

com o objetivo principal da comunicação e educação científica, tendo em vista que tais

métodos empregados influenciarão diretamente os outros papéis dos museus de ciência,

subsidiando as práticas de EA empregadas. Dessa maneira, o tópico posterior pretende o

esclarecimento dos principais modelos de comunicação e educação científica que

subsidiam as práticas nos museus de ciência, buscando-se o destaque de seus atributos.

5.2 Modelos de Comunicação e Educação Científica

Primeiramente, é necessário esclarecer que existem inúmeras formas e espaços

na sociedade que permitem a comunicação pública de Ciência e Tecnologia (C & T),

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17utilizando-se de métodos parecidos para cumprir tal fim, sendo que os museus de

ciência surgem como mais um espaço com esse objetivo. No entanto, os museus de

ciência apresentam potenciais únicos para facilitar a aprendizagem e promover a

participação cidadã nos debates societários contemporâneos; o foco deste trabalho,

portanto, não perpassa tão somente por características específicas dos museus de

ciência, como suas exposições e objetos, mas sim pelo potencial do espaço em si, como

possuidor de características intrínsecas para promoção da ligação entre ciência,

sociedade e meio ambiente, sendo uma espécie de chamariz, um espaço público e,

portanto, aberto para discussões entre os diversos atores sociais.

Sabe-se, no entanto, que apesar desse potencial, nem sempre os métodos de

comunicação pública de C & T utilizados pelos museus de ciência são considerados

democráticos e dialógicos. Existem outros modelos, que surgiram em contextos

históricos específicos, que possuem outras concepções a respeito do que seja a

comunicação e divulgação científica.

Segundo Navas (2008), existem quatro modelos de comunicação pública de C &

T, considerados os principais: o modelo antigo ou de déficit, o modelo contextual, o

modelo da experiência leiga e o modelo dialógico (modelo de participação pública).

O modelo de déficit é o mais antigo dentre os quatro modelos, partindo de uma

visão onde a ciência encontra-se desvinculada da sociedade no mundo moderno,

existindo, portanto, um espaço a se preencher, já que o conhecimento científico não

chega ao conhecimento do público. A chave nesse modelo é a disseminação do

conhecimento, onde os cientistas assumem o papel ativo da transmissão de informações,

em uma única via, dos cientistas (emissores) para o público, considerados receptores

passivos, caracterizando-se o público negativamente.

Neste modelo, portanto, assume-se uma visão simplista da ciência, tida como um

corpo neutro de conhecimentos, onde os cientistas são autoridades no assunto e, aquilo

que produzem, é tido como verdade absoluta, longe de sofrer interferências do contexto

sociopolítico existente. O público é passivo em relação àquilo que recebe ou, em

palavras freireanas, é tratado segundo uma concepção “bancária” de educação. Assim, a

transmissão de conhecimentos implica que a informação seja simplificada e reduzida

para o público “sem conhecimentos”.

Além disso, o modelo de déficit muitas vezes assume a percepção de uma

ciência a- histórica, desumanizando-a, tornando-a um corpo separado da sociedade onde

está incluída. Dessa forma, busca-se a transmissão do fenômeno ou conceito científico

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18em si, já que parte-se da idéia de que a falta de conhecimento científico dos

indivíduos existe e precisa ser suprida.

O modelo contextual, segundo Navas (2008), surge das críticas ao modelo de

déficit, podendo mesmo representar uma evolução em relação a esse modelo. No

modelo contextual, os indivíduos não são considerados recipientes vazios, possuindo

experiências prévias e redes de informações advindas de seus contextos culturais; assim,

novas informações recebidas seriam processadas de acordo com o conhecimento pré-

existente.

No entanto, a crítica que surge em relação a esse modelo é que, apesar de ele

considerar a existência de um contexto sociocultural prévio, ignora a resposta dos

indivíduos em relação à informação; ou seja, a transmissão de informações continua

sendo de uma única via, sendo tal modelo apenas uma versão mais aprimorada do

modelo de déficit.

Os dois modelos destacados anteriormente, portanto, são considerados modelos

anti-democráticos e não participativos, assumindo uma única via de transmissão da

informação, sem a existência de diálogos ou discussões.

Já o modelo da experiência leiga “surge no contexto das mudanças estruturais

da sociedade democrática no século XX” (NAVAS, 2008, p. 25); assim, “as questões

manifestadas na sociedade, que abrigam os movimentos sociais que reivindicavam

direitos políticos, econômicos, sociais, culturais e a construção da cidadania pela

educação, também alteram o papel da instituição que tem como função comunicar e

socializar o conhecimento” (VALENTE, 2005, p. 54). Dessa forma, a comunicação

pública da ciência deve ter maiores compromissos com a inclusão social e a

participação cidadã.

O modelo da experiência leiga visa desmistificar e relativizar a ciência como

única forma de conhecimento verdadeiro e absoluto, valorizando outras formas de

saberes (experiências de vida de comunidades reais, práticas tradicionalmente

desenvolvidas, conhecimentos intergeracionais) como sendo aplicáveis também na

resolução de problemas. Segundo Navas (2008), as críticas a este modelo estão

relacionadas a relevância dada a valores e crenças, e partem da própria comunidade

científica.

O modelo dialógico surge nesta mesma tendência, de incorporar a ciência em

uma dimensão cultural mais ampla, em diálogo com outras formas de saberes; assim, “a

ênfase não está mais dada no traduzir e difundir o conhecimento [científico], mas sim,

na forma em que o indivíduo consegue se apropriar do conhecimento, integrá-lo a

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19outros saberes e usá-lo no processo de tomada de decisão” (NAVAS, 2008, p.25). A

condição necessária para tal tipo de empreendimento seria a valorização do diálogo

entre os diversos atores sociais (incluindo cientistas), e a existência de espaços que

propiciem o desenvolvimento desses diálogos. Uma síntese de todos os modelos

comunicacionais de C & T encontra-se em destaque na figura 2.

Modelo Contextual

- Dirigido a audiências particulares;

-Atende a necessidades e situações que podem ser tempo, localização, linguagem;

-Destaca as habilidades das audiências por compreender com facilidade e rapidez tópicos relevantes.

Modelo da Experiência Leiga

-Considera as limitações da informação científica;

-Considera a potencialidade dos conhecimentos de audiências particulares;

- Ressalta a natureza interativa do processo científico;

-Aceita a experiência como independente da comunidade científica.

Modelo de Déficit

-Transmissão linear da informação dos expertos ao público;

-Acredita que a boa transmissão da informação leva a uma redução do “déficit” de conhecimento;

-Acredita que reduzindo o déficit é possível tomar melhores decisões e apoiar a ciência de uma melhor maneira.

Modelo de Participação Pública

-Focaliza em assuntos políticos que envolvem conhecimentos científicos e tecnológicos;

-Apóia-se nos ideais democráticos de ampla participação popular em processos políticos;

-Constrói mecanismos para estimular a participação cidadã em processos ativos de formulação de políticas;

-Autoridade real do público sobre políticas e recursos.

Figura 2: Síntese - modelos conceituais de comunicação pública da ciência (fonte: Lewenstein e Brossard, 2006 apud FARES et. al., 2007).

Atualmente, segundo Navas (2008), estes modelos apresentados convivem

muitas vezes no mesmo espaço, em um museu de ciência, por exemplo, existindo,

todavia, um modelo que se mostra preponderante ou dominante em relação aos demais,

que é o caso do modelo de déficit. Para corroborar tal perspectiva dominante, cabe

utilizar as palavras de Amorim (1998) apud VALENTE (2005):

Na atualidade, a educação científica, tanto escolar quanto não escolar, tem sido bastante questionada, particularmente no que diz respeito às reais possibilidades que conferem à participação consciente e crítica dos cidadãos na nossa sociedade, altamente tecnológica e cientificizada. A educação

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20científica, tal como se apresenta, prioriza o conteúdo científico, ou seja, o produto de uma construção humana e histórica, geralmente apresentado de uma forma neutra e a-histórica. Além disso, esse produto vem sendo cada vez mais sintetizado sob a forma dos conceitos científicos aos quais, na maioria dos casos, a população tem acesso sob forma de uma linguagem extremamente técnica, se não incompreensível, ou a partir de simplificações reducionistas e errôneas. (p. 58)

Valente assinala que “enquanto os museus de ciência (...) tradicionais (...)

mostram dificuldade em comunicar uma perspectiva compreensiva do conhecimento

científico atual, os centros de ciência apresentam a ciência sem antecedentes, fora do

contexto cultural e fragmentada” (2005, p. 55), privilegiando a apresentação de

fenômenos naturais.

Dessa forma, tal discussão apresentada até aqui vem a corroborar uma parte da

hipótese levantada neste trabalho, quanto ao fato dos centros de ciência atuais

privilegiarem a apresentação do conteúdo científico em si, sem maiores discussões. No

entanto, isto não é o cerne da questão deste trabalho, sendo necessário verificar como o

uso preponderante do modelo de déficit pode limitar a EA praticada pelos centros de

ciência e, mais do que isso, de que forma a EA pode potencializar o uso do espaço de

um museu científico, propiciando a interligação entre temas, e sendo geradora de

discussões sociopolíticas mais amplas; assim, o principio central é como potencializar

os espaços dos museus de ciência, através da EA.

Para tal discussão, faz-se necessária a inserção de teóricos da EA, no cruzamento

com o modelo de déficit praticado, visando-se verificar as limitações da EA praticada

no interior dos centros de ciência e, como a EA poderia potencializar estes espaços a

partir de suas linhas teóricas mais críticas.

6. CRISE AMBIENTAL, EDUCAÇÃO AMBIENTAL E MUSEUS DE CIÊNCIA

6.1 Reflexões quanto a crise ambiental

Antes de tratarmos de maneira mais específica das vertentes da EA existentes, e

a relação destas com o modelo de déficit praticado nos museus de ciência, é necessária a

análise do contexto histórico acerca das origens da crise ambiental, tratando-se das

relações existentes entre sociedade, natureza e tecnologia. Tal contexto subsidia

teoricamente o modelo geral de educação, dito não-ambiental, em contraposição à

necessidade do surgimento de uma educação adjetivada como “ambiental”, em resposta

aos problemas socioambientais.

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21A questão ambiental emerge de maneira mais significativa e ampla a partir

dos anos 70, expressando a contradição entre o modelo de desenvolvimento dominante

e a realidade socioambiental. No entanto, naquele período, predominava na sociedade a

idéia de que a chamada “crise ambiental” se devia, sobretudo, a exaustão de recursos

naturais, poluição, degradação de ecossistemas, entre outros. Outros aspectos (políticos,

sociais, econômicos, éticos), de cunho causal, ficavam em segundo plano, ou mesmo

eram omitidos propositadamente. No debate ecológico dos anos 70, observa-se uma

disputa de forças em busca da afirmação de uma determinada interpretação da crise

ambiental, onde o discurso ecológico oficial, produzido por órgãos governamentais

nacionais ou internacionais, constitui-se como um esforço para instituir uma

interpretação sobre a crise ecológica que se torne consensual.

Nestes documentos, tidos como os discursos oficiais, pretende-se conciliar a

preservação ambiental com o desenvolvimento industrial (com bases técnico-

científicas), dentro de um modo de produção capitalista; sendo assim, existe o

predomínio de uma visão técnica e naturalizante, em detrimento dos aspectos éticos e

políticos da questão ambiental. Tal visão instrumental e hegemônica impregna,

portanto, a educação de forma geral, vista como a serviço do modo de produção

capitalista e, portanto, opressora.

Antes de adentrar-se, entretanto, na educação em si, é necessário que se vá mais

à fundo nas origens da crise ambiental. Segundo Leff (2003), as raízes da crise

ambiental são muito mais profundas, entendo-a como crise de civilização, crise do

pensamento ocidental. Há, portanto, uma clara crítica à ciência e também à tecnologia

associada a esta. No entanto, apesar de hoje a tecnologia ser vista como uma aplicação

do conhecimento científico, Brugger esclarece que na realidade a tecnologia abarca a

ciência, sendo assim mais ampla que a mesma; dessa maneira, a tecnologia seria o

estudo das técnicas, entendidas como “uma sistematização de conhecimentos práticos,

artefatos ou instrumentos destinados a otimizar o trabalho humano e buscar maior

produtividade” (2004, p. 80).

Desse modo, compreende-se que a técnica é anterior à ciência e pode ser

independente dela, aproximando-se mais de um saber popular. A tecnologia é,

atualmente, prontamente associada à ciência por inúmeros fatores históricos, culturais e

ideológicos.

A partir da Revolução Industrial nasceu um tipo de cultura ocidental pautada em

uma cultura tecnológica de dominância científica, inserindo-se a tecnologia

paulatinamente em um universo ideológico que molda um determinado tipo de

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22pensamento e de modo de vida. Portanto, atualmente existe uma visão de predomínio

da razão tecnológica ou instrumental sobre a razão política e social, caracterizando certo

reducionismo, vinculando-se a questão ambiental da seguinte maneira:

Esse tecnicismo que, além de simplificador é deformador, reduz a complexa multidimensionalidade da temática ambiental à unidimensionalidade técnica (...) a questão ambiental é produto de um modelo de organização geral da sociedade, que comporta decisões e escolhas político-econômicas e culturais entre várias opções possíveis (...) decidir e desenhar um modelo de organização social envolve múltiplos interesses e implica num jogo de forças que disputam a possibilidade de afirmar uma dada interpretação de sociedade e, uma dominação sobre os demais grupos que aspiram ao poder (...) não se pode negar que a questão ambiental tem, entre outras, uma dimensão técnica, mas, esta é precedida e, condicionada, por razões políticas e sociais e não o contrário, como pretende a redução tecnicista (...) essa explicação redutora da questão ambiental obedece a um desvio tecnocrático, que substitui a razão política pela razão técnica e, trata a técnica como um saber “neutro”, acessível apenas aos especialistas. (LIMA, 1999, p. 9)

O paradigma científico materializa-se nas relações econômicas, alicerçando de

maneira teórica e prática um modo de produção que modificou profundamente a relação

dos seres humanos entre si e destes com a natureza: o modo de produção que nasceu

com a Revolução Industrial, explorando o meio de modo cada vez mais intenso, de

acordo com o advento e o aprimoramento das técnicas. É importante salientar que, neste

contexto, “meio” deve ser entendido a partir da visão de Josué de Castro (2002), o qual

já em 1972 caracterizava o “meio” de modo multidimensional, sem reducionismos,

incluindo não somente o meio físico ou biológico, mas também o meio econômico e

cultural. Também destaca-se que não existe propriamente uma linha histórica contínua e

desumanizada, como talvez possa ser apreendido das linhas gerais do texto, sendo que

tal contexto societário foi marcado por descontinuidades e por linhas de pensamento

diferenciadas que, atualmente, podem ser sistematizadas da forma apresentada até o

momento, sintetizadas no trecho a seguir:

A partir de então surgiu o capitalismo, as relações mercantis cresceram e as antigas comunidades com suas culturas tradicionais foram se esfacelando e sendo absorvidas [ou sendo colocadas na invisibilidade] pela “cultura tecnológica”. O êxodo dos campos em direção às cidades instituiu o viver individual em detrimento do viver em comunidade. As cidades e o estilo de vida industrial paulatinamente tornaram-se sinônimos de cultura e civilização, opostos ao viver no campo (...) problemas que antes eram resolvidos coletivamente tornaram-se os problemas de cada um. Começa assim, historicamente, um traço marcante da sociedade industrial: o individualismo. O desenvolvimento da indústria aprofundou a divisão do trabalho fortalecendo e fundindo fenômenos que tinham uma evolução paralela: a visão de mundo cartesiana, a nova ordem econômica e o

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23individualismo. O individualismo, como “nova forma de viver”, deu um vigoroso impulso à oposição sociedade-natureza. (BRUGGER, 2004, p. 58)

Ainda na perspectiva do individualismo, destacado no trecho anterior como

característica marcante da sociedade industrial, pode-se tratar, por consequência, do

conceito de indivíduo bem-sucedido predominante em nossa sociedade, onde o

parâmetro é quase sempre material, “é demonstração de força de poder aquisitivo e de

um determinado status socioeconômico, consoante com a ordem econômica neoliberal e

com o padrão de civilização do hemisfério Norte” (BRUGGER, 2004, p. 63). Assim, o

sistema paga melhor a quem ajuda a sua perpetuação, sendo a questão da escolha

profissional também “ambiental”, onde, muitas vezes, ações pautadas pela falta de ética

profissional, deliberada ou não, com prevalência da eficiência técnica sobre questões

políticas e éticas, também podem gerar impactos ambientais.

Percebe-se, portanto, pelo que foi exposto até o momento, que é um erro atribuir

as responsabilidades pelos problemas ambientais ao homem enquanto espécie genérica,

devendo-se deslocar o foco para a dinâmica sociedade x natureza e não ser humano x

natureza, apesar das incoerências que caracterizam todas essas oposições, como será

explicitado posteriormente. Nessa mesma linha, também se constitui um equívoco

responsabilizar a todos pela destruição ambiental, dentro de uma sociedade marcada

pela disparidade nas relações de poderes, onde a grande maioria dos indivíduos está

imersa “na ação ingênua, mecânica e controlada ideológica e politicamente pelos

‘opressores’” (PITANO E NOAL, 2009, p. 293).

Cabe relembrar e aprofundar, no entanto, que apesar de muitos problemas

ambientais terem se materializado através do modo de produção dominante, foi a

ciência e o método científico que subsidiaram teórica e filosoficamente tal modelo,

como já dito, sendo assim, o cerne da questão ambiental encontra-se na forma de

pensamento ocidental, em suas características e maneiras de enxergar a realidade

complexa:

Ao pensar o ser como ente [o pensamento ocidental] abriu a via da racionalidade científica e instrumental que produziu a modernidade como uma ordem coisificada e fragmentada, como formas de domínio e controle sobre o mundo. Por isso, a crise ambiental é sobretudo um problema de conhecimento (...) Esta racionalidade dominante descobre a complexidade em seus limites, em sua negatividade, na alienação e na incerteza do mundo economizado, arrastado por um processo incontrolável e insustentável de produção. (LEFF, 2003, destaque nosso)

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24Dentro desse contexto do pensamento ocidental, surge uma distinção

importante para a maneira de como a sociedade se relaciona com a natureza, a distinção

entre o mundo da natureza e o mundo da cultura. Segundo Carvalho, é na filosofia dos

antigos gregos em que desenvolvem-se os argumentos teóricos que caracterizam tal

distinção, resultando na definição hegemônica de natureza como oposta a de homem, de

cultura e de história, e, portanto, vista como objeto de estudo:

Com Tales [de Mileto] funda-se aquela que é considerada a primeira Escola filosófica – a Escola de Mileto – e a natureza enquanto corpo distinto da sociedade humana, passa a ser um dos principais temas da reflexão filosófica. Com Aristóteles [de Estagira], o último dos grandes filósofos da Antiguidade grega, a physis (natureza em grego) adquire alguma de suas definições mais usuais. (2005, p.339)

No entanto, em um sentido estrito, tais oposições homem-natureza, sociedade-

natureza ou cultura-natureza, já destacadas neste trabalho, não fazem sentido, visto que

o homem também faz parte da natureza, é produto desta. Mesmo que seja considerada a

idéia de uma primeira natureza, sem a interferência dos seres humanos, e de uma

segunda natureza, artificial, com a influência do ser humano por meio de técnicas

específicas, ainda haverá uma contradição intrínseca, o homem originou-se da natureza,

pertence e é pequeno em relação a grandiosidade desta, e não o contrário.

Assim, a concepção hegemônica da natureza de oposição à sociedade ocidental,

de diferença, se “transforma em hierarquia através do evolucionismo linear, o ecocídio e

etnocídio caminham juntos” (BRUGGER, 2004, p. 59). Evidentemente, toda sociedade,

toda cultura, possui uma determinada idéia do que seja a natureza, no entanto, a

definição simplista destacada anteriormente é a que tem prevalecido.

A partir de tal hierarquia colocada entre sociedade e natureza, esta foi

considerada objeto a ser dominado por meio da ciência e da razão tecnológica. É bem

verdade também, que existe uma visão contra-hegemônica de natureza na sociedade

ocidental, uma visão dita romântica, onde o homem, de maneira genérica e abstrata,

seria o responsável por destruir a natureza.

Assim, a dicotomia sociedade-natureza continua, sendo que em dado momento a

natureza deve ser suprimida pela cultura, e em um segundo momento é a cultura e o

homem que devem ser suprimidos pela natureza. Ignora-se o ponto central da questão,

que diz respeito a rediscussão de nossa relação com a natureza, sem oposições ou

extremos, mas com diálogos entre os diferentes saberes.

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25Essas dicotomias são exemplos de uma das características marcantes do

pensamento ocidental, a fragmentação histórica do saber com vistas à compreensão da

realidade complexa. Nesse contexto de fragmentação, a questão ambiental é abarcada e

tratada de diferentes maneiras pelas Ciências Humanas ou pelas Ciências Naturais e

Exatas, sem que exista a real inter e transdisciplinaridade que a problemática ambiental

exige.

Desse modo, destaca-se duas abordagens mais gerais da questão ambiental no

âmbito científico. Em uma dessas visões, geralmente oferecida pelas Ciências Humanas,

é dada ênfase aos fatores histórico-sociais, em detrimento dos aspectos técnicos e

naturais da questão ambiental; a outra visão, que não pode ser relacionada a uma área do

conhecimento em específico, enfatiza as dimensões naturais e técnicas da questão

ambiental, destacando-se os temas ecológicos. Dentre as duas abordagens, a visão

técnica e naturalizante é aquela que tem prevalecido.

De maneira geral, portanto, o conceito de meio ambiente, multidimensional,

incluindo os aspectos naturais e os resultantes das atividades humanas (resultado da

interação de fatores biológicos, físicos, sociais, econômicos e culturais), é comumente

confinado às suas dimensões naturais ou técnicas. Desse contexto, emergem certas

expressões ou termos relacionados ao meio ambiente, como a “aplicação de soluções

eficazes; a proteção; a administração e o treinamento de recursos (naturais e humanos

respectivamente), o saneamento, a manutenção de um nível ótimo de produtividade,

[entre outros]” (BRUGGER, 2004, p. 54).

O conceito de meio ambiente acaba, assim, sendo confundido com o de natureza,

chegando-se a colocá-los mesmo como sinônimos:

Prevalecem as necessidades de preservação do potencial produtivo dos ecossistemas, dos recursos naturais e o estudo de seus distúrbios, como a poluição ou a extinção massiva de espécies, e não um conceito total, que inclui o ser humano e sua dimensão histórico-social. Embora a dimensão técnico-natural seja legítima, ela não pode ser tomada como a questão ambiental no seu todo, ou tampouco favorecida às expensas de outras. (BRUGGER, 2004, p. 55)

Portanto, a questão ambiental diz respeito ao modo como a sociedade se

relaciona com a natureza –qualquer sociedade ou natureza – incluindo as relações dos

seres humanos entre si; como destaca Moraes, baseado originalmente no marxismo, “a

estruturação da sociedade define a relação dos indivíduos com a maior parte dos

recursos naturais, ao normatizar as suas relações entre si” (2005, p. 75). Nesse

contexto, expressões como “proteger, preservar ou sanear o meio ambiente”, por

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26exemplo, apresentam certa incoerência, já que o que deve ser protegido, saneado ou

preservado são os recursos naturais, ou um dado ecossistema ou bioma, e não todas ou

quaisquer relações com a natureza.

Buscando-se um fechamento do que foi tratado até o momento neste capítulo,

poderíamos usar o que afirmou Leff, ao articular questões referentes ao pensamento

ocidental, ao modo de produção predominante, e a visão de natureza hegemônica:

A problemática ambiental, mais que uma crise ecológica, é um questionamento do pensamento e do entendimento, da ontologia e da epistemologia com as quais a civilização ocidental compreendeu o ser, os entes e as coisas; da ciência e da razão tecnológica com as quais a natureza foi dominada e o mundo moderno economizado. (2003, p. 19)

6.2 Reflexões quanto a crise ambiental: conceitos de desenvolvimento

Dentro do contexto de termos relacionados à questão ambiental, também a

expressão “desenvolvimento sustentável”, tido como o ideal a se alcançar em termos

societários num contexto de crise ambiental, é marcado pela ambiguidade, abrangendo

dois significados: um que inclui a dimensão política e ética e o outro que se refere

unicamente ao gerenciamento adequado (ou sustentável) dos recursos naturais, sendo

que, em ambos os casos, aposta-se no desenvolvimento do patamar tecnológico,

necessário à superação da crise do capital.

O Relatório Brundtland, desenvolvido pela Comissão Mundial sobre Meio

Ambiente e Desenvolvimento (criada pela ONU em 1983), foi aquele que cunhou e

elaborou o conceito de desenvolvimento sustentável:

Desenvolvimento sustentável é um processo de transformação no qual a exploração dos recursos, a direção dos investimentos, a orientação do desenvolvimento tecnológico e a mudança institucional se harmonizam e reforça o potencial presente e futuro, a fim de atender 'as necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem as suas próprias necessidades. (Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, 1991, p.49)

De acordo com LIMA (2011), baseando-se no fato de que os modelos de

desenvolvimento praticados desde o pós-guerra falharam em seus objetivos, a Comissão

Brundtland procurou avaliar as relações críticas entre o meio ambiente e o

desenvolvimento, entendendo que os problemas ambientais não decorrem apenas da

dinâmica de desenvolvimento adotada, eles também condicionam o tipo de

desenvolvimento possível numa dada conjuntura; entende-se, portanto, que o fator

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27ambiental é inerente ao desenvolvimento, não sendo “apenas” mais uma questão a ser

considerada. O mesmo autor também destaca que a principal realização do discurso do

desenvolvimento sustentável foi combinar integrada e sistematicamente questões que

eram frequentemente abordadas isoladamente, ou como concorrentes: preservação

ambiental, crescimento econômico, desigualdade e participação social, dívida externa,

relações norte-sul, tecnologia, energia e população, globalização e cooperação

internacional; porém, por não avançar o suficiente para demonstrar a viabilidade dessa

visão, o discurso da sustentabilidade tornou-se ambíguo e contraditório, instaurando-se

uma disputa sobre o significado legítimo da sustentabilidade proposta e sobre os

melhores meios de atingi-la.

Neste ponto, tendo em vista uma reflexão mais profunda quanto ao termo, deve-

se analisar as palavras “desenvolvimento” e “sustentável” separadamente.

O termo desenvolvimento pode ser entendido de três maneiras distintas, mas que

muitas vezes se confundem. A primeira visão, mais freqüente, é a de tratá-lo como

sinônimo de crescimento econômico. Segundo Veiga (2005), até o início dos anos 60,

essa forma de ver o desenvolvimento era a mais comum, visto que as nações

consideradas mais desenvolvidas eram aquelas que possuíam um melhor desempenho

econômico, enquanto que os países de pior desempenho econômico permaneciam em

um estágio de “subdesenvolvimento”. A segunda visão de desenvolvimento é a de que

ele é apenas uma ilusão, manipulação ideológica, quimera, estabelecendo uma simples

equivalência entre desenvolvimento e riqueza. De certa forma, esta segunda visão

também remete ao crescimento econômico. A terceira visão pode ser resumida em uma

frase de Celso Furtado:

(...) o desenvolvimento se caracteriza pelo seu projeto social subjacente. Dispor de recursos para investir está longe de ser condição suficiente para preparar um melhor futuro para a massa da população. Mas quando o projeto social prioriza a efetiva melhoria das condições de vida dessa população, o crescimento se metamorfoseia em desenvolvimento. (2004, p. 484)

Castro (2000), de maneira precursora, já tratava da falsidade existente na

avaliação do desenvolvimento tomando-se como base somente a expansão da riqueza

material, propugnando a necessidade de mudanças sociais sucessivas e profundas. Dessa

forma, para o autor, o mundo todo continua relativamente subdesenvolvido, visto que

nenhum país atingiu um patamar equilibrado de desenvolvimento, em termos que não

sejam meramente quantitativos.

Assim, a palavra “desenvolvimento” pode tanto ser associada a idéias positivas,

no sentido qualitativo ou de incremento, como pode ser confundida com questões

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28quantitativas de crescimento econômico; todavia, o grande cerne da questão da

palavra “desenvolvimento” encontra-se no fato de qual tem sido, historicamente, o

significado de “desenvolver”, já que, muitas intervenções antrópicas que degradam

recursos naturais e desrespeitam comunidades tradicionais, tem sido feitas em nome do

“progresso” e do “desenvolvimento”. Para Brugger, o sentido de desenvolvimento

hegemônico tem sido o de converter todos os padrões culturais em apenas um:

Como “civilizado” e “desenvolvido” assim o são em função da adequação a um determinado parâmetro, é lícito questionar se desenvolver não teria sido, na maioria dos exemplos históricos, (des)envolver, isto é, romper o elo de envolvimento de determinados povos com a sua cultura no sentido mais amplo –fragilizar e “pasteurizar” tanto a diversidade biológica quanto cultural, até que todos os padrões se convertam em apenas um. (Des) envolver, nesse sentido que tem sido hegemônico, encontra assim uma convergência filosófica surpreendente com a tese (...) do pensamento unidimensional. Sem exagero algum, essa foi a História da colonização da maior parte dos povos primitivos (...) do hemisfério Sul, que graças aos povos civilizados do hemisfério Norte foram aculturados e puderam decolar então para níveis superiores de existência (...). Por trás dessa “aculturação”, contudo, sempre houve motivos nada altruísticos. (2004, p.73)

Está associada à palavra “desenvolvimento”, portanto, um caráter evolucionista,

distinguindo-se, na sociedade, fases infantis ou primitivas, fases de desenvolvimento e

fases maduras. Assim, o falacioso objetivo de um futuro melhor sempre está em vista.

Nesse sentido, Castro, por exemplo, destaca que o subdesenvolvimento é uma forma de

poluição humana, conseqüência do crescimento econômico de regiões mais ricas, não

sendo, portanto, uma fase ou caminho para o desenvolvimento (em um sentido

associado ao crescimento econômico), e sim um subproduto deste:

Para que não se reste a menor dúvida de que o subdesenvolvimento é, na civilização de consumo, um produto do desenvolvimento, basta verificar que antes da explosão capitalista e industrial de nosso século não existia estadivisão entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos, separados uns dos outros por um largo fosso econômico. Foi depois da revolução industrial que se exteriorizaram as disparidades extremas dos ritmos de crescimento e dos níveis econômicos de ambos os grupos de países. (2002, p. 96)

Já em relação à palavra “sustentável”, está origina-se da Ecologia (ciência

natural), sendo relacionada, geralmente, à natureza homeostática dos ecossistemas

naturais, englobando, ainda, conceitos como o de “capacidade de suporte”, por exemplo.

O termo sustentabilidade também pode ser visto de três modos distintos. A

primeira visão é a de que não existe dilema entre conservação ambiental e crescimento

econômico. Essa hipótese é mais conhecida como “curva ambiental de Kuznets”, que

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29mostra que, apesar do crescimento econômico prejudicar o meio ambiente (em um

sentido puramente físico ou biológico) até que um certo nível de riqueza seja alcançado,

após atingir-se esse patamar, a tendência se inverteria, ou seja, o crescimento

econômico auxiliaria na conservação ambiental (VEIGA, 2005).

Em contrapartida a esse pensamento, está a relação entre economia e

termodinâmica, tese de Nicholas Georgescu-Roegen. Baseado na segunda lei da

termodinâmica (entropia), as atividades econômicas são energias convertidas em formas

de calor difusas, tornando-as inutilizáveis. Assim, em algum momento, segundo

Georgescu, a humanidade deverá retrair o consumo dos produtos para que o

desenvolvimento possa continuar a ocorrer. Dentro dessa vertente, encontra-se também

Herman E. Daly, que possui uma visão ainda mais cética, em que só a “condição

estacionária” pode evitar a decadência ecológica, ou seja, que a economia só melhoraria

em termos qualitativos quando se substituísse uma atividade econômica por outra de

melhor tecnologia e menor impacto na natureza (e.g. Energia fóssil por energia limpa).

Por fim, a terceira visão de sustentabilidade tenta avançar pelo “caminho do

meio”, entre as duas hipóteses tão opostas. No entanto, ainda é apenas uma tentativa.

O adjetivo “sustentável” associado ao termo “desenvolvimento”, assim como a

questão ambiental em si, tem uma forte dimensão técnica naturalista, insuficiente para

dar conta da complexidade inerente às relações entre sociedade e natureza. Neste padrão

de soluções técnicas, a preservação de potenciais produtivos aparece como o principal

critério de sustentabilidade do pensamento hegemônico, o que, apesar de ser uma

condição necessária, não é o suficiente, agradando muito mais a grupos de poder em

específico, do que a sociedade de maneira geral, como destaca Castro:

A tecnologia não é boa nem má. É a sua utilização que lhe dá sentido ético. Se nos países do Terceiro Mundo a tecnologia age contra os povos subdesenvolvidos é porque foi utilizada unicamente para produzir o máximo de vantagens e lucros para os grupos da economia dominante. (2002, p. 97)

Questões sociais, éticas e ecológicas acabam, dessa forma, sendo relegadas a

segundo plano, ou seja, esse padrão alternativo de desenvolvimento chamado

sustentável acaba se tornando uma roupagem nova do padrão de desenvolvimento

tradicional, utilizando-se de recursos técnicos no gerenciamento de recursos naturais

tido como importantes para certos grupos hegemônicos. A conversão de padrões

culturais, portanto, permanece, travestido de uma nova roupagem verde ou de uma dita

responsabilidade ambiental.

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30Cabe destacar que, anteriormente ao surgimento do conceito de

desenvolvimento sustentável e de sua difusão, o economista Ignacy Sachs apropriou-se

do termo “ecodesenvolvimento”, lançado por Maurice Strong em 1973, desenvolvendo-

o conceitualmente e criando estratégias para alcançá-lo. O ecodesenvolvimento seria um

estilo de desenvolvimento onde cada ecoregião procuraria soluções específicas para

seus problemas particulares, levando em conta os dados ecológicos e os culturais, as

necessidades imediatas e as de longo prazo. Assim, na operacionalização do termo, seria

necessário um amplo conhecimento do ambiente e cultura locais, bem como o

envolvimento dos indivíduos na elaboração do planejamento das estratégias.

O conceito de desenvolvimento sustentável é muitas vezes considerado uma

versão evoluída e melhor lapidada em relação ao conceito de ecodesenvolvimento;

todavia, Layrargues (1997) destaca que, apesar das semelhanças nas idéias contidas nos

termos, existem diferenças importantes.

De forma geral, o desenvolvimento sustentável e o ecodesenvolvimento

possuem um fim em comum, atingir o patamar de sociedades sustentáveis; para este

fim, no entanto, possuem estratégias diferenciadas. O desenvolvimento sustentável,

como já dito, mantém a ideologia dominante, acreditando amplamente no

desenvolvimento tecnológico e na busca da eliminação da pobreza nos países

subdesenvolvidos (na busca da elevação do teto de consumo destes, e não na redução do

consumo dos países ditos desenvolvidos) como estratégias para a “preservação

ambiental”. Já o ecodesenvolvimento, apesar de também reforçar a importância da

tecnologia, prega o desenvolvimento tecnológico endógeno, respeitando necessidades

socioculturais, e não a simples transferência de tecnologia exógena.

Nesse sentido, muitos autores sugerem a substituição do conceito de

desenvolvimento sustentável pelo de sociedade sustentável, tendo em vista que o

conceito de sociedade sustentável, em ideais convergentes com o pregado pelo

ecodesenvolvimento, “permite a cada sociedade definir seus modelos de produção,

consumo e bem-estar a partir de sua cultura, de sua história e de seu ambiente natural,

abandonando a transposição imitativa de soluções padronizadas para contextos e

realidades bastante diferenciadas” (LIMA, 1999, p.5). Contudo, talvez isso seja uma

questão menor, no sentido que a manutenção do conceito de desenvolvimento

sustentável depende muito mais do seu conteúdo e uso real, do que da forma em si.

Mesmo Ignacy Sachs (2004), por exemplo, considera que, entre a Conferência

das Nações Unidas sobre Meio Ambiente (de 1972, em Estocolmo) e a Cúpula sobre

Desenvolvimento Sustentável (de 2002, em Joanesburgo), o conceito de

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31desenvolvimento sustentável foi refinado, com importantes avanços epistemológicos,

sendo a sustentabilidade social um componente essencial. Sabe-se que a

sustentabilidade não é uma ciência e não possui, portanto, conceitos e metodologias

definidas. No entanto, atualmente existe quase um consenso no que tange ao fato de que

a sustentabilidade abarca dimensões variadas, não somente a dimensão técnica, mas

também a ambiental, a social, a econômica, a cultural, a institucional, entre outras.

Finalizando, cabe destacar que a importância deste capítulo, na discussão de

teorias e ideologias que perpassam os diferentes modelos de desenvolvimento, deve-se a

ausência da possibilidade deste tipo de debate no interior dos museus de ciência, dado o

modo de EA preferencialmente praticado, como será apresentado posteriormente.

6.3 Educação ambiental: contexto geral e vertentes

Dentro desse contexto complexo relacionado à crise ambiental, surge a partir da

década de 70 a articulação entre educação e meio ambiente como uma das ações de

enfrentamento de tal crise, visto que a educação é considerada um instrumento

privilegiado de humanização, socialização e direcionamento social, com grandes

possibilidades de promover a liberdade ou a opressão, de conservar ou transformar a

ordem socialmente estabelecida.

Historicamente, a EA surge, primeiramente, em 1972, na Conferência das

Nações Unidas para o Ambiente Humano, realizada em Estocolmo na Suécia. No

documento intitulado Declaração de Estocolmo, indicava-se a necessidade de realizar

uma EA como instrumento estratégico pela melhoria da qualidade de vida. Outras

conferências seguiram-se com o passar dos anos, apresentando documentos que tratam

dos objetivos, princípios, estratégias e recomendações para a EA, como a Conferência

Intergovernamental sobre Educação Ambiental, realizada em Tbilisi na Geórgia, em

1977.

No Brasil, em meados da década de 70, a EA é incorporada institucionalmente

através de secretarias e órgãos governamentais ambientais, sendo também apropriada

pelas escassas, na época, organizações conservacionistas (LOUREIRO, 2004).

Na conferência Sub-regional de Educação Ambiental para a Educação

Secundária realizada no Peru, a definição dada para a EA é a tônica seguida por outros

documentos de mesma temática:

A educação ambiental é a ação educativa permanente pela qual a comunidade educativa têm a tomada de consciência de sua realidade global,

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32do tipo de relações que os homens estabelecem entre si e com a natureza, dos problemas derivados de ditas relações e suas causas profundas. Ela desenvolve, mediante uma prática que vincula o educando com a comunidade, valores e atitudes que promovem um comportamento dirigido a transformação superadora dessa realidade, tanto em seus aspectos naturais como sociais, desenvolvendo no educando as habilidades e atitudes necessárias para dita transformação. (MMA, 2007 apud DIÓGENES E SILVA, 2008)

A partir do que foi exposto no trecho destacado, nota-se que existe uma

convergência de idéias sobre o que seria a EA e o que deveria ser a Educação no seu

contexto amplo. Dessa forma, surge a primeira contradição da Educação com a

adjetivação “ambiental”, visto que ela nasce como sendo uma ramificação da Educação

em si, voltada para a resolução dos problemas da sociedade referentes à degradação do

ambiente. A EA nasce, portanto, dentro da lógica do pensamento ocidental, com a sua

característica tecnicista de fragmentação dos saberes, concebida no interior do

pensamento que está na raiz da crise ambiental.

Seguindo-se a linha teórica de Leff, por exemplo, existe uma forte incoerência

na construção dos princípios norteadores da EA pela via do pensamento hegemônico,

visto que a crise ambiental “não poderia encontrar uma solução pela via da

racionalidade teórica e instrumental que constrói e destrói o mundo, [pois] apreender a

complexidade ambiental implica um processo de desconstrução e reconstrução do

pensamento” (2003, p. 16).

Dessa forma, o grande problema, no que tange uma EA desvinculada de uma

Educação em sentido mais amplo, é que a EA acaba, na prática, promovendo a

perpetuação do sistema vigente, sendo opressora, ou adestradora nas palavras de

Brugger (2004), apesar da construção teórica da EA apontar para outras tendências. No

entanto, cabe destacar que o grande problema está na base epistemológica e ética da

educação em si, sendo esta uma educação ambiental ou não; além disso, Carvalho

argumenta que o destaque da dimensão “ambiental” na educação de forma geral é

importante no sentido de enfatizar uma qualidade que “embora possa ser pertinente aos

princípios gerais da educação, permanecia subsumida, diluída, inviabilizada, ou mesmo

negada por outras narrativas ou versões predominantes” (2004, p. 16).

Mesmo que as vertentes da EA (não existe uma única corrente de EA) estejam

inseridas dentro do paradigma cientificista atual, isso não impede que sejam

aproveitadas as brechas do sistema vigente, como forma de luta contra-hegemônica:

Embora o sistema de reprodução social seja real, ele não é monolítico e isento de contradições e, sempre será possível exercer práticas que trabalhem

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33a crítica e a resistência à reprodução e dominação ideológicas. (LIMA, 1999, p. 12)

Portanto, ainda imerso no contexto colocado pelo trecho acima, Brugger (2004),

enfatiza que talvez o mais coerente para o resgate dos aspectos epistemológicos e éticos

da questão ambiental seja a revisão e o resgate dessas dimensões dentro do próprio

conhecimento que construímos. Assim, as correntes de EA existentes possuem

diferentes visões acerca da problemática ambiental, buscando alternativas de ação de

acordo com suas concepções. Existem vertentes com objetivos biológicos ou

conservacionistas (corrente conservacionista), com objetivos culturais/espirituais (grupo

da educação ao ar livre), com objetivos políticos, visando a democracia, a participação

social e a cidadania (categoria da gestão ambiental) e, por último, existem vertentes com

objetivos econômicos (corrente da economia ecológica).

No entanto, de maneira geral e resumida, devido à forma de organização do

conhecimento na sociedade (fragmentação da ciência), distinguem-se as duas tendências

gerais já apresentadas neste trabalho: as propostas educacionais oferecidas pelas

ciências humanas, com destaque para fatores históricos e sociais (EA crítica,

emancipatória e transformadora da realidade existente), e a tendência geral e

predominante, que concentra sua abordagem quase que exclusivamente sob aspectos

naturais e técnicos dos problemas ambientais (EA convencional).

Loureiro destaca que não existe uma linearidade histórica entre as diferentes

vertentes de EA, ou seja, não houve qualquer tipo de evolucionismo; dessa maneira, não

ocorreu um desdobramento de modalidades educativas consideradas convencionais para

uma educação que pensa o ambiente de forma integral. Para o autor, o que havia, e

ainda permanece, são visões hegemônicas que, influenciadas pela tradição

conservacionista e pelas teorias produzidas nos limites das ciências naturais, “assumem

um ‘caráter’ convencional entre a educação e o ambientalismo enquanto movimento

histórico, diverso no modo de entender a unidade sociedade/natureza e no definir o que

seriam novos patamares societários, bem como os caminhos para concretizá-los” (2004,

p. 75).

Segundo Lima (2004), a chamada EA convencional tende a converter a

complexidade da questão ambiental à singularidade de alguma de suas dimensões,

agindo de forma reducionista, portanto. Nessa lógica, o autor destaca abordagens

ecologicistas, abordagens tecnicistas, abordagens que destacam os efeitos mais

aparentes dos problemas ambientais e ignoram seus aspectos causais e abordagens

individualistas e comportamentalistas.

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34A problemática ambiental, complexa e multidimensional, acaba reduzida,

assim, a questões de gerenciamento de recursos naturais (e humanos) escassos, a

poluição, a destruição da camada de ozônio, entre outros temas, sendo associada a

disciplinas do conhecimento já constituídas, incorporando conceitos e visões de mundo

oriundas destas (como o conceito hegemônico de natureza), sem considerar a visão

sistêmica da realidade necessária para o trato da crise ambiental.

O surgimento de uma educação ambiental pressupõe o reconhecimento de que a educação tradicional não tem sido ambiental. Consequentemente, o “ambiental” deveria ser parte intrínseca da educação como um todo e não modalidade ou uma de suas dimensões (...). A compartimentalização do “ambiental”, ou a inserção de uma “dimensão ambiental”, inevitavelmente confinam o conceito de meio ambiente a uma perspectiva instrumental e o elenco de “problemas ambientais” se reduz à poluição, escassez de recursos naturais, diminuição da biodiversidade, etc. A educação ambiental vista dessa forma não ultrapassa as fronteiras da velha educação conservacionista e não faz jus portanto ao adjetivo a que se propõe. (BRUGGER, 2004, p. 83)

A esse tipo de EA predominante, mesmo que disfarçadamente, em projetos,

documentos oficiais, trabalhos e em espaços educacionais como um todo, pode-se

qualificar como sendo uma espécie de adestramento ambiental, que Brugger define

como sendo “uma instrução de caráter essencialmente técnico, fruto de uma visão de

mundo cientificista e unidimensional” (2004, p. 12). Tal forma de educação ou

instrução, também predominante nos museus de ciência, como será aprofundado

posteriormente, é uma forma de adequação dos indivíduos ao sistema social vigente,

uma forma de opressão, perpetuando uma estrutura social injusta. Normalmente, a

fachada de um saber técnico oculta ou serve como argumento para uma decisão

puramente política.

Essa linha redutora de educação acaba por esvaziar a questão ambiental de suas

características mais significativas, como a potencialidade de unir realidades e de

articular e relacionar dimensões complementares que constituem uma complexidade

maior, interpretando-se, assim, a realidade socioambiental através de perspectivas

unidimensionais do conhecimento científico, sem diálogos intra e inter-saberes,

perdendo-se, principalmente, a visão sistêmica da realidade. Além disso, tal visão

parcial e reducionista, segundo Lima (2004), favorece uma compreensão despolitizada e

alienada dos problemas ambientais, ocultando seus motivos políticos e confundindo a

prioridade entre variáveis dependentes (causas) e independentes (efeitos).

Lima afirma também que a despolitização pode, inclusive, ser observada na

banalização do uso das noções de cidadania e participação social nos discursos oficiais

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35de EA, usando-se tais conceitos no contexto do capitalismo, “ora como meios de

ocultar as desigualdades sociais e de legitimar sua manutenção, ora como conquistas

associadas ao consumo” (2004, p. 90).

Partindo de uma visão técnica, naturalizante e, portanto, reducionista, da questão

ambiental, as ações propostas por esse tipo de educação adestradora tem seu conteúdo

esvaziado, diagnosticando o problema socioambiental como um problema de

comportamentos individuais, vendo a solução de forma paliativa e pontual, na mudança

de comportamento dos indivíduos em sua relação com o ambiente. Não questiona-se,

assim, as causas profundas da crise ambiental, as resoluções dos problemas parecem

simples, pautadas em conhecimentos científicos neutros capazes de solucionar os

problemas dentro da mesma lógica vigente.

Da mesma maneira, as soluções com base na correção de comportamentos

individuais parecem querer responsabilizar a todos, de maneira igualitária, pelos

problemas socioambientais, não se levando em consideração o desequilíbrio de poderes

existente na sociedade, e a heterogeneidade que a compõe.

As campanhas que de alguma forma contemplam os temas ambientais, como separação de lixo ou economia de energia, geralmente vêm acompanhadas de frases que convidam a população a colaborar, como por exemplo:-Responsabilidade ambiental: Passe adiante. Usa-se como estratégia essa divulgação do adestramento por intermédio dos próprios adestrados, que são treinados por instituições educacionais ou não para a preservação dos elementos naturais. São indicações cabais de intimidação da sociedade para “fazer a sua parte” fazendo-a entender que é ela (toda ela) a responsável por danos ambientais. (DIÓGENES E SILVA, 2008).

Com base no que foi dito até o momento, pode-se considerar, portanto, que

acima de tudo, a principal conseqüência do adestramento ambiental refere-se a

despolitização da sociedade, a opressão e manutenção do estado vigente, deixando-se a

tomada de decisões para grupos de poder minoritários, que se articulam de acordo com

seus interesses, buscando a minimização de conflitos com base em ações de EA

possuidoras de todas as características superficiais já citadas: pontuais, de cunho técnico

e naturalizante, com foco em mudanças de comportamento individuais, sem atitudes na

real causa dos problemas socioambientais, já que, em muitos casos, os próprios

proponentes das ações de EA, ou aqueles que os financiam, fazem parte da raiz do

problema.

A problematização da realidade não é, desse modo, o foco de ação da EA de

características adestradoras, onde a existência de conflitos pode levar a reflexões e

apreensões da realidade que venham a convergir em ações libertadoras e

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36transformadoras, com a clara visualização das relações de poderes existentes; isso,

evidentemente, passa longe dos interesses daqueles que lucram com a perpetuação do

sistema vigente.

6.4 Educação Ambiental e Museus de Ciência

Dentro do contexto apresentado até o momento neste trabalho, a questão que

permanece, portanto, diz respeito à quais características apresenta a EA que é tratada

dentro dos museus de ciência. Para o trato desta problemática, é importante o resgate do

modelo de comunicação pública da ciência que é predominante nos museus científicos,

assim como suas características principais.

O modelo de comunicação pública da ciência que prevalece nos museus de

ciência é o modelo de déficit que, de maneira resumida, coloca a ciência como um

corpo neutro de conhecimentos, a-histórica, sem quaisquer relações com a sociedade,

não podendo ser influenciada, portanto, por questões sociais, políticas ou culturais. A

partir dessas características, a prática da educação científica se constitui na transmissão

de conhecimentos para os indivíduos “sem conhecimentos”, buscando-se sua

“capacitação” para lidar com os fenômenos científicos mais relevantes.

Percebe-se claramente, dessa maneira, nos atributos do modelo de déficit

predominante, fortes relações com as características que marcam o chamado

adestramento ambiental já destacado. Assim, a EA que é praticada nos museus de

ciência possui características naturalizantes (ou conservacionistas) e técnicas, buscando

mudanças comportamentais individuais, sem discussões éticas, políticas, culturais e

históricas mais relevantes.

Um exemplo de viés conservacionista no trato da questão ambiental é fornecido

pelo trabalho de Delicado, ao tratar dos museus de ciência em Portugal, onde a EA é

vista da seguinte forma por um funcionário entrevistado do Museu Botânico da

Universidade de Coimbra:

Motivá-los um bocado para a importância das plantas, para a proteção da natureza, porque sem isso as pessoas nunca estarão motivadas para a preservação da natureza nem para a importância nem para a biodiversidade. São chavões que toda a gente usa, toda a gente diz, mas no fundo as pessoas não sabem porque é que é importante a preservação (2004, p. 11).

Além disso, a temática ambiental tende a ser compartimentada no interior dos

museus científicos, seguindo a lógica geral que ramifica a educação em educação

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37ambiental, associando-se o “ambiental” a disciplinas ou corpos científicos que

tendem a ser considerados como aqueles que inerentemente são os mais adequados para

abarcar os problemas socioambientais. Portanto, nos museus científicos a ciência tende

a ser fragmentada em corpos científicos separados (física, biologia, Ciências da Terra,

entre outros), e o trato da temática ambiental tende a ser associada a alguma dessas

disciplinas, sem que haja uma maior transversalidade ou interdisciplinaridade,

colocando-se os problemas socioambientais de forma desvinculada de outras dimensões

importantes da realidade, reduzido ao trato de fenômenos científicos ou à soluções

simplistas de caráter gerencial, sem que se aborde as causas reais dos problemas.

Sabe-se que esta tendência no trato da questão ambiental também existe em

outros espaços educacionais, entretanto, as conseqüências da prática de um

adestramento ambiental são ainda mais agravadas quando imersas em espaços como os

museus de ciência, já que a ciência tende a ser relacionada como a única capaz de

solucionar os problemas socioambientais, reduzidos em disciplinas específicas e que,

portanto, podem amplamente ser tratados dentro do arcabouço de conhecimentos dessas

disciplinas, sem a necessidade de maiores diálogos com outras formas de saberes, ou

mesmo, sem necessidade de maiores participações da sociedade, tranqüilizada pelas

soluções técnicas existentes. Dessa maneira, não há a necessidade da abordagem de

soluções de maior complexidade e que possuam cunho estrutural.

A fala de Antunes et. al., acerca da importância das exposições de divulgação da

ciência ilustra tal fé no caminho único da ciência e tecnologia para o trato dos

problemas socioambientais:

Hoje, existe o reconhecimento de que é inviável qualquer via de retrocesso ou de escape do desenvolvimento das tecnociências. Pelo contrário, o que existe é a constatação do crescente nível de dependência do homem em relação a esses avanços. As dimensões cotidiana, cívica e cultural dos indivíduos estão cada vez mais impregnadas e determinadas por esse processo de crescimento. Tal dependência indica que a própria defesa da sociedade e dos cidadãos em face dos referidos riscos somente é viável com a utilização de meios tecnocientíficos, inclusive no que se refere à reversão dos danos já causados. (2002, p. 156, destaque nosso)

Todavia, o interessante é que os mesmos autores tratam da ambigüidade entre as

possibilidades de benefícios e de danos das tecnociências, e da necessidade de se

“compreender que as questões científicas e tecnológicas são, em nível crescente,

questões de natureza política que dizem respeito a toda a sociedade” (p. 156). Antunes

et. al. (2002) também evocam a necessidade de se “capacitar” o cidadão para que este se

posicione de maneira consciente e crítica com relação aos rumos da ciência e

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38tecnologia; ou seja, os mesmos autores possuem um pensamento ambíguo com

relação ao papel da ciência e tecnologia na sociedade, o qual pode ser consequência das

diferentes noções de cidadania e participação existentes.

Como já dito anteriormente neste trabalho, Lima (2004) critica a noção de

cidadania e participação atrelada ao contexto do capitalismo, defendendo que a

igualdade jurídica formal deve vir acompanhada de outras conquistas econômicas,

sociais e políticas. Tal noção de cidadania e participação vem ao encontro dos interesses

deste trabalho, na crítica a EA de cunho técnico e naturalizante existente nos museus de

ciência.

De modo a se colocar um exemplo de EA de caráter técnico e naturalizante

dentro dos espaços museais, é pertinente a análise do projeto intitulado “O Planeta Terra

e a Preservação Ambiental” (TEIXEIRA, 2007), desenvolvido para a Estação Ciência,

museu científico localizado em São Paulo e inaugurado em 1987 pelo Conselho

Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico- CNPq; atualmente, a Estação

Ciência é administrada pela Universidade de São Paulo (USP).

O problema principal deste projeto deve-se a associação da temática ambiental

somente a área da Geologia, compartimentando-a em certa disciplina, como destacado

pelo fato de que “o projeto visou ampliar a área de Geologia e Meio Ambiente da

Estação Ciência” (TEIXEIRA, 2007). Tal forma errônea de abordar a problemática

ambiental acaba desencadeando em aspectos relacionados à um tipo de adestramento

ambiental, mais do que uma educação ambiental.

As características “adestrantes” do projeto se fazem presentes por todo o seu

conteúdo, a começar pela sua proposta principal, que é a “de que todos tenham

racionalidade no uso dos recursos naturais não renováveis e adotem posturas

responsáveis em relação ao meio ambiente, em benefício das futuras gerações”

(TEIXEIRA, 2007). Observa-se explicitamente no trecho destacado uma visão

reducionista da questão ambiental, associada ao simples gerenciamento técnico dos

recursos naturais, assim como, percebe-se que mudanças de posturas comportamentais

são incentivadas como a solução dos problemas socioambientais.

Essa característica de incentivo a mudanças comportamentais como solução de

problemas socioambientais mais profundos, se faz presente, inclusive, em objetos da

exposição, como “[em] uma maquete e painéis que mostram a importância do Aqüífero

Guarani e uma experiência interativa [que] mostra a quantidade de água utilizada em

alguns equipamentos domésticos” (TEIXEIRA, 2007).

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39O projeto também apresenta vias naturalizantes, associando o conceito de

meio ambiente com os ciclos biogeoquímicos (ciclos da água, do carbono, do Oxigênio

e do Nitrogênio), desencadeando em implicações simplistas que relacionam os

elementos naturais, suas utilizações e os problemas ambientais causados pela

interferência do homem.

Assim, de forma geral, aspectos técnicos e naturalizantes seguem permeando

todo o projeto, tratando-se temas relacionados às fontes de energia, aos ciclos das

rochas, aos minerais, entre outros, de forma reducionista, sem abordar questões de

caráter mais estrutural da sociedade.

Todavia, talvez os objetivos do projeto explicitem mais claramente seu viés

adestrador, com destaque para a difusão de posturas responsáveis para o uso racional

dos recursos naturais, e a capacitação de professores do Ensino Fundamental e Médio,

no conhecimento geológico e ambiental. A palavra “capacitação”, mais do que uma

reflexão acerca dos temas socioambientais tratados no projeto, indica uma postura de

“treinamento ambiental”, com vias técnicas explicitas, sem condições de abordar a crise

ambiental em seus fatores causais.

Por fim, no tocante ao aspecto de patrocínio do projeto, este é financiado pela

Petrobrás, ou seja, existe a busca de uma relação, mesmo que indireta, entre o conteúdo

da exposição, voltada ao “Planeta Terra e a Preservação Ambiental”, com o nome da

empresa em questão, o que é no mínimo imprudente ou inadequado. O seguinte trecho

do projeto explicita uma intencionalidade de relação: “os objetivos [do projeto] atendem

à missão institucional, em sintonia com as ações sociais e culturais da Petrobrás”

(TEIXEIRA, 2007).

Logicamente, não se quer dizer neste trabalho que tais abordagens técnicas e

naturalizantes, no trato da questão ambiental, não são importantes, todavia, reduzir-se a

questão somente a este ponto, sem maiores problematizações, é uma forma de alienação

e mesmo de opressão. Tais temas socioambientais poderiam ser geradores de discussões

mais amplas, o que não está colocado como propósito do projeto destacado, por

exemplo.

Também não se quer dizer neste trabalho que a ciência não possui papel de

extrema relevância no trato das problemáticas socioambientais, todavia, faz-se

necessário que a ciência seja incluída em um contexto social, cultural e político mais

amplo, assim como, deve-se se colocar a ciência em diálogo com outras formas de

saberes. Se não for dessa maneira, um espaço público, como o museu científico, acaba

sendo despotencializado, servindo apenas como um interlocutor entre a ciência e a

Page 40: EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM MUSEUS DE CIÊNCIA: … · principalmente, de referenciais teóricos que tratam dessa questão à luz da “ecologia de saberes” e da necessidade do diálogo

40sociedade, na busca por diminuir o desconhecimento acerca dos fenômenos

científicos, perdendo-se o potencial do museu de ciência como gerador de debates mais

amplos e estruturais acerca do modelo de desenvolvimento hegemônico. A EA neste

espaço é compartimentada, simplificando a crise ambiental, que tem causas profundas e

complexas.

É bem provável que a forma de educação deficitária abordada pelo museu de

ciência, buscando a transmissão de informações para a sociedade, esteja relacionada ao

fato do museu científico ser considerado um espaço de educação pontual, restringindo

seus meios de educação aos objetos ou às exposições. Nesse contexto, o museu

científico tende a visualizar seu potencial educativo de forma reduzida, o que acarreta

em uma abordagem também simplificada da realidade complexa, e dos problemas

socioambientais.

Tal visão reduzida, educacionalmente focada apenas na organização dos objetos

e das exposições dentro dos espaços dos museus, acaba fazendo com que se perca o

foco do espaço museal em si, em uma visão mais abrangente ou holística (sem ser

genérica) do museu de ciência. Assim, o museu de ciência não deve ser reduzido

somente aos seus objetos e exposições, articulando-se tais meios educacionais a outros

espaços dos museus, como auditórios e anfiteatros. No entanto, além disso, devem-se

buscar outras formas de educação, que possibilitem uma maior inter e

transdisciplinaridade dentro do espaço museal, não devendo se restringir a EA a espaços

específicos, associada a disciplinas específicas, visto que as características da crise

ambiental e mesmo da temática ambiental abrem possibilidades educacionais enormes

em uma abordagem mais integrada e profunda da realidade.

É claro também, como já colocado anteriormente neste trabalho, que o modelo

de déficit não é universal para todos os museus de ciência, existindo inúmeras

experiências que se contrapõe a esse tipo de modelo predominante, buscando atividades

educacionais inovadoras, as quais serão tratadas posteriormente; aliás, mesmo dentro de

um museu de ciência em específico podem coexistir atividades de cunho reducionista ou

integradoras. Cabe adiantar, no entanto, que um exemplo de museu científico com um

olhar mais complexo da realidade é o MAST, unidade de pesquisa integrante da

estrutura do Ministério da Ciência e Tecnologia, localizado no Rio de Janeiro.

Assim, outras vertentes da EA, de características libertadoras e não opressoras,

podem possibilitar a potencialização do espaço museal, de forma a integrar suas

diferentes áreas através da temática ambiental, que, por si só, já possui características

multi, inter e transdisciplinares, buscando-se a aproximação com o modelo de

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41comunicação da C & T que prioriza a participação pública. Evidentemente, no

entanto, as características intrínsecas dos museus de ciência devem ser respeitadas e

trabalhadas.

Faz-se necessário, portanto, o trato das características e potencialidades das

outras vertentes da EA, contextualizadas dentro dos espaços dos museus de ciência, com

suas características específicas, relacionadas aos objetos, exposições e mediadores.

7. MUSEU DE CIÊNCIA: ESTRUTURA E ESPAÇO PEDAGÓGICO

Antes de tratarmos das outras vertentes de EA e suas características, faz-se

necessário, primeiramente, uma retomada e sintetização das questões abordadas nos

capítulos anteriores, que dizem respeito ou convergem para as noções relacionadas ao

termo “desenvolvimento sustentável”. Através dessa retomada, irá se compreender

melhor a importância do museu de ciência como uma estrutura ou espaço pedagógico de

possibilidades multi, inter, e transdisclipinares, sem ater-se exclusivamente aos seus

objetos, capaz de possibilitar discussões sobre os modelos de desenvolvimento

societários.

Lima (2011) destaca que a questão ambiental tem motivado inúmeras

explicações e soluções, que ora enfatizam um único fator causal, ora um conjunto de

fatores explicativos para o processo de degradação ambiental. Dentro dessa perspectiva,

o mesmo autor utiliza a concepção de campo social desenvolvida por Bourdieu, na

tentativa de compreender as características complexas constitutivas da questão

ambiental:

(...) o campo social é o universo onde as pessoas, os grupos e as instituições que dele participam se definem pelas relações de competição e poder que estabelecem, visando à hegemonia simbólica e material sobre esse universo de atividade e saber. Compreende um conjunto de relações de forças, interesses e conflitos, em que se estabelecem alianças e estratégias para conquistar o objeto em disputa no campo, no caso, o capital simbólico legitimado, fundado em atos de conhecimento e de reconhecimento pelos pares concorrentes no interior do campo social. (...) Por ser um espaço concorrencial, o campo pressupõe relações internas assimétricas, derivadas da desigual distribuição de poder entre grupos dominantes e dominados. (p. 41)

Dessa forma, como já colocado anteriormente neste trabalho, a noção de

“desenvolvimento sustentável”, como novo modelo societário que surge em resposta a

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42problemática socioambiental constatada, evoca inúmeros conflitos e debates, sendo

que os diversos atores sociais existentes na sociedade aproveitam-se do vazio conceitual

do termo em busca da legitimação de suas condutas e práticas.

Nesse contexto complexo e multifacetado, Sachs (2009) fala da necessidade de

uma “cultura do desenvolvimento”:

Por esse termo entendo um conjunto de noções que facilitam a compreensão da história e preparam a reflexão sobre o futuro de nossas sociedades inscritas tanto na ecologia cultural como na ecologia natural. Celso Furtado tinha razão ao dizer que o desenvolvimento é um conceito cultural, na medida em que implica a invenção do futuro. (p. 352)

Assim, o autor enxerga na questão do desenvolvimento a necessidade e/ou

possibilidade de seu tratamento em termos pedagógicos, tida como um elemento do

ensino, desde o colégio. Todavia, não seria uma prática pedagógica reducionista,

possuiria um viés politizante, tendo em vista que o autor, assim como Lima (2011),

também observa a disputa pela legitimação de interesses entre os diversos atores sociais,

e o papel cada vez maior da política nesse cenário. Além disso, da mesma forma que

Paulo Freire (1996), Sachs (2009) não enxerga a história como inexorável, e sim, como

algo em permanente desconstrução e reconstrução, dependente das forças sociais

predominantes e da abordagem educacional consequente, de via reacionária ou

progressista.

Creio que a política pesará cada vez mais nas nossas sociedades. Num mundo complexo de opções múltiplas, em que se enfrentam forças contraditórias, há pouco lugar para decisões ideais tomadas em bases “objetivas”, cientificamente estabelecidas, a menos que seja pela via de procedimentos intelectualmente duvidosos, que consistem em reduzir a multiplicidade de objetivos irredutíveis entre si num objetivo único, mediante um jogo de ponderações arbitrárias. (...) A análise comparativa dastrajetórias do desenvolvimento-mau desenvolvimento dos diferentes países é chamada a se transformar em um poderoso instrumento de pedagogia política, balizando o campo dos debates sobre os projetos nacionais. (SACHS, 2009, p. 353)

Dessa forma, observa-se, através do que foi exposto, a importância da dimensão

educacional, quando buscamos a leitura crítica do modelo societário hegemônico e dos

caminhos que se contrapõem a ele. Todavia, como já foi destacado, a educação de

caráter reducionista e transmissora de informações é a que predomina, sendo que, nos

museus de ciência, tal tipo de educação, ao tratar da complexidade dos problemas

socioambientais, os reduz, legitimando a realidade posta ou, então, dinamiza tal

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43realidade para que esta perdure sem grandes conflitos; dessa forma, os museus de

ciência não problematizam suas temáticas de maneira a proporcionar debates ou

discussões quanto aos modelos de desenvolvimento societários, não estando muitas

vezes, também, em consonância com a realidade do país, com um modelo pedagógico e

estrutural museal pautado no histórico de construção e desenvolvimento dos museus do

exterior. Assim, temáticas como as tecnologias sociais, a justiça ambiental (as quais

trataremos conceitualmente posteriormente) ou saberes que não os das ciências

naturais4, não entram na pauta pedagógica dos museus de ciência.

Possivelmente, um dos grandes problemas da pedagogia dos museus de ciência

está no fato da educação posta estar voltada somente para a forma pela qual devem ser

trabalhados os objetos ou as exposições, concentrando-se todas as atenções na forma

como o arcabouço científico será transposto para as exposições museais. Não que isso

seja errado ou inadequado, tendo em vista que as exposições são partes fundamentais da

identidade de qualquer espécie de museu, seja ele científico ou não. O grande problema

é que, dessa forma, perde-se o potencial do museu como espaço pedagógico

privilegiado, em contato aberto com as comunidades locais em seu entorno, tendo em

vista que o olhar fica reduzido aos objetos e exposições, sem uma proposta que

enxergue o museu em todos os seus espaços interiores, em diálogo com o exterior.

Murriello et al. (2006), ao analisar a experiência do museu de ciências da

UNICAMP, também tece críticas quanto ao foco pedagógico dos museus estar reduzido

aos objetos ou as exposições:

Uma das conseqüências da aplicação do modelo de transmissão é considerar as exposições como o único espaço de comunicação do museu. O enfoque “comunicacional holístico” (...) abrange todos os aspectos do funcionamento da instituição que constituem a sua imagem. O prédio, a ambientação, os monitores, os folders, tudo faz parte da imagem do museu e, portanto, da experiência museal dos visitantes.(...) É a experiência como um todo que precisa ser avaliada e considerada ao pensar os museus. (p.3)

Dessa forma, o olhar mais amplo para a estrutura ou o espaço do museu de

ciência poderia potencializar sua prática educativa, suscitando maiores debates e

diálogos quanto às temáticas expostas, possibilitando que se exerça na prática a inter,

multi e transversalidade que existe potencialmente no espaço museal. Matarezi (2005)

entende que “os termos ‘estruturas’ e ‘espaços educadores’ são recentes e surgem para

4 Não se quer dizer com tal afirmação que as ciências humanas estão totalmente ausentes da pauta pedagógica dos museus, visto que existem muitas exposições de temáticas nesse sentido; todavia, acredita-se que as ciências naturais predominam nos espaços museais. Dessa forma, talvez pudesse existir um maior diálogo entre tais ciências,

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44abarcar algumas das dimensões pertinentes à Educação Ambiental crítica, popular,

transformadora e emancipatória” (p.163). Poderia se questionar que o museu de ciência,

em si, já é um espaço educador, todavia, crê-se que o museu de ciência, com seu modelo

de comunicação dominante sendo o modelo de déficit, apresenta somente

“características educacionais”, não sendo um espaço e/ou estrutura educadora,

prejudicando a prática de uma educação ambiental politizada, que propicie elementos,

tanto para a crítica do modelo societário hegemônico, como para a discussão sobre

outros modelos possíveis.

Matarezi (2005) trata a respeito da importância dos espaços e/ou estruturas

educadoras para a prática de EA de vias críticas:

(...) fica evidente que os esforços para inserção da Educação Ambiental, em todos os níveis e esferas da sociedade, devem ocorrer também na perspectiva de que os espaços e/ou estruturas, com as quais convivemos e interagimos cotidianamente, sejam dotados de características educadoras e emancipatórias, que contenham em si o potencial de provocar descobertas e reflexões, individuais e coletivas simultaneamente. (p. 163)

Assim, tendo em vista a possibilidade de propiciar a chamada “cultura do

desenvolvimento”, tornando as questões objetivas e subjetivas do desenvolvimento

(suas falácias e possibilidades) elementos pedagógicos, deve-se pensar o museu de

ciência como estrutura/espaço educador, que, como espaço público, esteja aberto a

discussões e debates, tanto sobre problemáticas socioambientais locais (dialogando

sempre com a comunidade em seu entorno), como sobre as questões de outras esferas

espaciais.

Luisa Massarani5, chefe do Museu da Vida, instituição existente no Rio de

Janeiro e administrada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), também afirma a

importância dos museus de ciência nas discussões sobre modelos de desenvolvimento,

visto que tais espécies de museus “têm cada vez mais um papel fundamental como

fórum de debate de discussões sobre temas de grande relevância para a ciência e a

sociedade; (...) [visando] estimular a reflexão sobre a necessidade e os desafios de

buscarmos um desenvolvimento sustentável”. Logicamente, por tudo que já foi

colocado neste trabalho, o termo “desenvolvimento sustentável” posto na declaração

não poder estar imerso no vazio conceitual e prático.

buscando-se aproximar daquilo que é apregoado pela chamada ciência pós-normal, que busca considerar, também, outras formas de saberes. 5 Entrevista concedida por Luisa Massarani à Agência FAPESP, disponível em: <http://agencia.fapesp.br/15603> Acesso em: maio de 2012.

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45Tendo em vista essa concepção inicial do museu de ciência como

estrutura/espaço educador, deve-se tratar sobre a concepção de EA que deve prevalecer

em seu interior, cujas características trataremos a partir de agora.

8. EM MUSEUS DE CIÊNCIA, HÁ ESPAÇO PARA UMA EDUCAÇÃO

AMBIENTAL “CRÍTICA, EMANCIPATÓRIA E TRANSFORMADORA”?

Antes de tratarmos acerca da EA crítica propriamente, bem como de suas

características, é importante nos atermos inicialmente à teoria que embasa tal educação

libertária, a chamada teoria crítica, que busca se contrapor a teoria convencional6.

As características da teoria convencional já foram minimamente citadas neste

trabalho, porém, convém sistematizá-las, para que as características da teoria crítica

tornem-se mais evidentes e claras. Sendo assim, pode-se dizer que a teoria convencional

é aquela que se produz como válida pela ciência dominante (positivista), tendo por

atributos: a abstração conceitual sem vinculação com a realidade concreta, ao partir de

modelos que pressupõem a sociedade como algo dado, sem historicidade, naturalizada,

podendo ser reduzida ou fragmentada; e a neutralidade e a objetividade do

conhecimento na explicação do funcionamento da sociedade, tornando-a objeto, de

forma mecanicista. Loureiro (2005) considera que “tais características ignoram o

movimento da história, os sujeitos e a ciência como prática social inserida em um

conjunto complexo de relações sociais e suas implicações econômicas, políticas,

ideológicas e de poder” (p. 326).

A teoria crítica, expressão vinculada às reflexões e formulações produzidas pela

Escola de Frankfurt, busca romper com as características conservadoras da teoria

convencional, visando a geração e apropriação societária de conhecimentos que

propiciem a transformação e emancipação da sociedade. Loureiro (2005) destaca as

principais características da teoria crítica:

(1) a análise dos processos de legitimação do Estado na sociedade de consumo; (2) a crítica ao uso ideológico da ciência e da tecnologia na reprodução da sociedade; (3) a negação da neutralidade do conhecimento científico; (4) o exame minucioso da “indústria cultural” que, no capitalismo, fabrica necessidades materiais e simbólicas favoráveis ao individualismo, à competitividade desigual e ao consumismo; (5) a argumentação em favor da racionalidade emancipatória e da liberdade; (6) a crítica à racionalidade instrumental, por favorecer processos inerentes à

6 Nesse contexto, o emprego do vocábulo “convencional” refere-se ao modo de pensar ocidental hegemônico, à ciência e ao método científico moderno, não possuindo relação com os saberes tradicionais, importantes e que devem ser considerados, na concepção deste trabalho, na pedagogia museal.

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46acumulação capitalista (eficiência produtiva, quantificação da realidade e dicotomia sociedade-natureza). (p.326)

Ainda segundo o mesmo autor, estritamente no campo da educação, foram

influenciados pela teoria crítica e pela escola frankfurtiana figuras reconhecidas como

Henri Giroux, um dos fundadores da pedagogia crítica, Peter McLaren e Paulo Freire,

educadores de extrema influência nos estudos e práticas pedagógicas no Brasil, Europa

e Estados Unidos. No Brasil, os ideais democráticos e emancipatórios do pensamento

crítico, aplicados à educação, foram constitutivos da educação popular, rompendo com a

educação de caráter tecnicista, transmissora de conhecimentos, convocando-se a

educação para o papel de mediação na construção social de conhecimentos que façam

sentido na vida dos sujeitos, buscando-se a autonomia dos mesmos.

Loureiro (2005, p. 327) busca, dessa forma, a associação entre a teoria crítica e a

EA, enfatizando as premissas de tal teoria que são utilizadas no campo da EA:

- A crítica (à sociedade, à ciência e à argumentação) e a autocrítica (pessoal)

são princípios metodológicos;

-A verdade científica está em sua comprovação prática na história, no

conhecimento poder ser aplicado para ajudar a humanidade a superar as

relações de dominação, alienação e expropriação. No mais, a pura abstração

conceitual só possui veracidade em termos formais, muitas das vezes

servindo como fator de reprodução social;

-Teoria e prática não estão descoladas. Conhecer e agir são dimensões

próprias que ganham condição para transformar a realidade à medida que se

relacionam e se constituem mutuamente. O conhecimento “do que é” (teoria)

e a ação em busca do “que queremos que seja” estão unidas e é através dessa

indissociação que tomamos consciência de nós mesmos e do outro no

mundo;

-Ciência e valores culturais estão ligados e não há como separá-los na

pesquisa. Devemos admitir que sempre analisamos os fenômenos a partir de

uma determinada interpretação, de um código de valores e de certas

concepções teóricas que “iluminam” nosso olhar da realidade. A

objetividade científica está na explicitação de nossa posição teórica e na

análise honesta da realidade à luz de tal teoria, permitindo a compreensão e o

questionamento formulado por outro;

-A ciência crítica é revolucionária, visa superar a dicotomia sujeito-objeto e

a mercantilização da vida. Estas são entendidas como características

inerentes ao metabolismo da sociedade capitalista, conduzindo o ser humano

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47a um estado de alienação diante de si mesmo, da espécie e a uma condição

de “ruptura” entre sociedade-natureza;

-A ciência crítica se faz partindo do princípio de que nada, nenhum fato ou

fenômeno é compreensível em si mesmo, mas somente em relações,

formando uma totalidade complexa. Aqui não há um todo absoluto, mas

totalidades em movimento de mútua constituição entre partes e todos, que

são compreendidos racionalmente pela práxis (vinculação teoria-prática).

Assim, a EA de vias críticas busca, resumidamente, o entendimento e a

problematização da crise ambiental em suas raízes mais profundas, colocando em

questionamento o modelo societário vigente (suas bases materiais e político-

ideológicas) e também o modo de pensamento ocidental, em sua racionalidade

instrumental e dicotomização da relação sociedade-natureza. Além disso, a EA crítica

busca, não somente a compreensão, mas também a intervenção nos problemas e

conflitos ambientais, utilizando como metodologia a dialética, que em termos

educacionais se expressa através dos métodos de cunho participativo, como a utilização

da Pesquisa Participante (vinculada à Educação Popular) e da Pesquisa-Ação

Participante.

Segundo Carvalho (2004), o projeto político-pedagógico de uma EA crítica seria

o de contribuir para uma mudança de valores e atitudes, contribuindo para a formação

de um sujeito ecológico. Tal sujeito está vinculado a aspectos sociais, históricos e

políticos que o condicionam, mas que não o determinam, sendo a emancipação algo

sempre possível.

Para uma educação ambiental crítica, a prática educativa é a formação do sujeito humano enquanto ser individual e social, historicamente situado. Segundo esta orientação, a educação não se reduz a uma intervenção centrada exclusivamente no indivíduo (...) nem tampouco se dirige apenas a coletivos abstratos. Desta forma, recusa tanto a crença individualista de que a mudança social se dá pela soma das mudanças individuais, (...) quando cada um fizer a sua parte, [quanto] a contrapartida desta dicotomia, que subsume a subjetividade num sistema social genérico e despersonalizado que deve mudar primeiro para depois dar lugar as transformações no mundo da vida dos grupos e pessoas, aqui vistos como sucedâneos da mudança macro social. Na perspectiva de uma educação ambiental crítica, a formação incide sobre as relações indivíduo-sociedade e, neste sentido, indivíduo e coletividade só fazem sentido se pensados em relação. As pessoas se constituem em relação com o mundo em que vivem com os outros e pelo qual são responsáveis juntamente com os outros. (p.20)

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48Um conceito importante que integra a EA crítica é a noção de justiça

ambiental7, visto que tal conceito faz a fundamental interligação entre as problemáticas

sociais e ambientais, de grande relevância principalmente para os países do “Sul”,

tirando o caráter elitista que muitos grupos tentam atribuir a questão ambiental. A noção

de justiça ambiental torna claro o fato de que a distribuição de poderes (econômicos,

políticos, ideológicos, entre outras formas de poder) entre os diferentes atores sociais

não é equitativa, sendo que aqueles que possuem maiores poderes impõem seus

interesses (predominantemente econômicos) sobre os interesses dos demais, gerando,

como conseqüência, o espólio dos recursos naturais dos grupos de menor poder, ou

mesmo a distribuição desigual dos custos socioambientais; assim, fica claro que as

responsabilidades pelas problemáticas ambientais não são puramente individuais,

estando elas divididas entre os atores sociais de acordo, é claro, com a dinâmica de

poder assimétrica existente na sociedade.

A noção de “justiça ambiental” exprime um movimento de ressignificação da questão ambiental. Ela resulta de uma apropriação singular da temática do meio ambiente por dinâmicas sociopolíticas tradicionalmente envolvidas com a construção da justiça social. (...). A estratégia ancorada na noção de justiça ambiental (...) identifica a desigual exposição ao risco como resultado de uma lógica que faz que a acumulação de riqueza se realize tendo por base a penalização ambiental dos mais despossuídos. A operação dessa lógica estaria associada ao funcionamento do mercado de terras, cuja “ação de coordenação” faz que práticas danosas se situem em áreas desvalorizadas, assim como à ausência de políticas que limitem a ação desse mercado. Tal segmentação socioterritorial tem se aprofundado com a globalização dos mercados e a abertura comercial – a saber, com a maior liberdade de movimento e deslocalização dos capitais, queda do custo de relocalização e incremento do poder de exercício da chantagem locacional pelos capitais, que podem usar a carência de empregos e de receitas públicas como condição de força para impor práticas poluentes e regressão dos direitos sociais. (ACSELRAD, 2010, p. 110)

A idéia expressa no termo justiça ambiental deixa também claro que, o “diálogo”

que deve existir entre os atores sociais existentes em determinado tempo e espaço deve

ser um diálogo marcado pelo conflito, visto que este é condição inerente à uma

sociedade marcada pela desigualdade. Mascarar a dimensão do conflito, através de

diálogos pacificadores, pode até mesmo ser uma estratégia para manter as condições

dominantes; assim, o conflito deve ser encarado como algo positivo, pedagógico,

inerente à realidade complexa, marcada por interesses diferenciados.

7 A noção de Justiça Ambiental está imersa em um debate mais amplo, inserida no interior da Ecologia Política.

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49Além da noção de justiça ambiental, inúmeros outros conceitos e práticas

possuem princípios e valores que se assemelham àqueles contidos na EA crítica,

podendo estar, dessa forma, associados a esta vertente de EA, como a economia

solidária, as tecnologias sociais, entre outras.

A economia solidária é uma prática de produção e consumo que privilegia o

trabalho coletivo, a autogestão, a justiça social e o desenvolvimento local, sustentável e

solidário, buscando, a partir desses princípios e práticas, a construção de novas ações

econômicas e sociais fundadas na cooperação, “inspiradas por valores culturais que

colocam o ser humano como sujeito e finalidade da atividade econômica, em vez da

acumulação privada de riqueza em geral e de capital em particular” (TYGEL, 2007, p.

1).

A idéia contida na economia solidária é importante no sentido dela ser vista por

muitos pesquisadores como uma estratégia real de desenvolvimento, em contraposição e

crítica ao modelo de desenvolvimento hegemônico posto atualmente. Tygel (2007)

sustenta que a Economia Solidária também possui algumas armadilhas, como o fato de

poder ser apropriada por alguns atores, como um apêndice da economia formal e como

estratégia no planejamento de ações de responsabilidade socioambiental por parte das

empresas; a visão do empreendedorismo social, como estratégia individual e não

coletiva, também é uma armadilha para a Economia Solidária. Assim, segundo Tigel

(2007), só é possível a escapatória de tais armadilhas quando:

afirmamos a ES [Economia Solidária] como uma estratégia de desenvolvimento, ou seja, quando questionamos o próprio modelo de desenvolvimento em que nossa sociedade está sustentada. Desta feita, conseguimos manter sempre no horizonte das práticas e reflexões da ES a perspectiva de transformação social: a transformação da nossa organização produtiva, econômica, das relações de produção, comercialização e consumo, e do próprio conceito de mercado. (p. 4)

Ainda segundo o mesmo autor, a ligação entre economia solidária e EA crítica

está no fato de que ambas, entre outras coisas, buscam a crítica do processo histórico

existente por trás da mercantilização das riquezas naturais e da vida em sentido mais

amplo, sendo que, os produtos e serviços comercializados “no mercado” contêm, em si,

direta ou indiretamente, a superexploração do meio social, físico e biológico, ou seja, do

ambiente, deslegitimando ou banalizando as práticas culturais, como forma de defesa

contra tal espoliação.

Com relação às tecnologias sociais, pode-se dizer, de maneira resumida, visto

que existe uma ampla discussão acadêmica com relação a esta temática, que sua

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50principal característica está relacionada a crítica que faz ao entendimento da

construção do conhecimento científico, através do método científico, como uma prática

neutra por parte do pesquisador, como se não existissem interesses políticos e

econômicos em tais ações.

Segundo Rodrigues e Barbieri (2008), a tecnologia social pode ser

conceitualmente compreendida como “produtos, técnicas ou metodologias replicáveis,

desenvolvidas na interação com a comunidade e que representem efetivas soluções de

transformação social” (p. 1070). Dessa forma, a tecnologia social é encarada

primordialmente como um processo, e não somente como uma técnica ou instrumento

específico, não podendo, também, ser relacionada ao uso de tecnologias ultrapassadas

por grupos sociais de menor renda, visto que a tecnologia social também é intensiva em

termos de conhecimentos gerados, podendo, inclusive, ser mais efetiva e eficiente em

termos produtivos do que as tecnologias convencionais. Além disso, se consideramos a

visão das tecnologias sociais pelo prisma do uso de tecnologias defasadas, para os

países centrais, pelos países chamados subdesenvolvidos, caíremos no erro do

subdesenvolvimento como estágio para o desenvolvimento, e não como consequência

deste, sem a necessidade de gerarmos conhecimento endógeno para nos (des)-

envolvermos.

Outras características importantes da tecnologia social dizem respeito à

emancipação dos atores envolvidos, através da participação, e à apropriação destes dos

conhecimentos necessários ao seu uso e replicação. Desta forma, elimina-se a

possibilidade de apropriação privada dos conhecimentos por meio de direitos de

propriedade industrial e/ou individual, com a novidade que a inovação vier a trazer

passando a ser conhecida e de domínio público.

Assim, postas tais características, pode-se dizer que a tecnologia social também

é vista como um elemento a ser pensado na construção de novos modelos societários:

A tecnologia social tem como elemento central a emancipação dos atores envolvidos, o que torna o seu processo de produção e utilização parte da construção [da denominada] cidadania deliberativa, aquela na qual a ‘pessoa toma consciência da sua função como sujeito social, e não adjunto, e como tal passa a ter uma presença ativa e solidária nos destinos da sua comunidade’. Desse modo, a tecnologia social é um instrumento do desenvolvimento sustentável de modo autêntico, pois além da erradicação da pobreza e cuidado com o meio ambiente, ela promove a cidadania deliberativa, aspecto central da dimensão política desse novo modo de conceber o desenvolvimento. (RODRIGUES E BARBIERI, 2008, p. 1083)

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51Cabem, é claro, como já dito, cuidados com relação ao entendimento dos

termos “desenvolvimento sustentável”, “meio ambiente”, e “participação”, elementos

que a tecnologia social incorpora ou busca como fim.

Na relação entre a EA crítica, a economia solidária e a tecnologia social, pode-se

dizer, segundo Dagnino (2010), que os espaços econômicos solidários representam

espaços produtivos, de geração de renda, para o desenvolvimento da tecnologia social,

buscando-se novos valores culturais (ou a reafirmação daqueles já existentes), em

oposição aos valores individualistas das sociedades contemporâneas, e a geração de

conhecimentos endógenos, condizentes com as características do meio físico, cultural e

biológico de cada região.

Logicamente, todas as noções tratadas até o momento, envolvendo a EA crítica,

a justiça ambiental, a economia solidária e a tecnologia social, estão imersas em campos

de pesquisa amplos. Nesta pesquisa ressaltamos somente suas conceituações e

características básicas, bem como deixamos de tratar de outras noções que também

possuem caráter contra-hegemônico.

Colocadas as características da EA crítica, e sua profunda relação com as noções

de justiça ambiental, economia solidária e tecnologia social, fica claro que, no espaço

museal, se considerados somente os objetos e exposições por si só, torna-se

extremamente dificultoso trabalhar tais elementos críticos na busca de reflexões e

debates quanto aos modelos de desenvolvimento. Por isso devemos considerar o museu

científico como um espaço e/ou estrutura educadora, dando-se especial atenção aos

educadores (ou mediadores) que trabalham em tais espaços, buscando-se não somente o

treinamento técnico e instrumental de tais indivíduos, e sim, uma formação de caráter

sociopolítico, descolonizando pensamentos, para que, a partir dos temas que os objetos,

exposições, e outros espaços do museu propiciam, se possa gerar debates quanto as

problemáticas socioambientais e os modelos societários consequentes.

8.1 Educação Ambiental crítica e Museus de Ciência: exemplos práticos

Apesar das críticas feitas nesta pesquisa, quanto à predominância, nos museus de

ciência, de uma forma de EA de caráter técnico, naturalizante e a-histórica, existem

exemplos de projetos interessantes desenvolvidos em alguns museus de ciência, os

quais possuem como concepção e prática a EA de caráter crítico. Um exemplo de

projeto inserido neste contexto encontra-se no Museu de Astronomia e Ciências Afins

(MAST).

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52Guimarães e Vasconcellos (2006) procuram descrever a concepção de EA

existente no MAST, bem como as práticas derivadas desta concepção; apesar de caber,

a partir da análise dessa descrição, algumas críticas, existem características positivas a

serem destacadas. Primeiramente, os autores deixam claro que é a concepção da EA

crítica que norteia as práticas do museu:

O contexto social atual exige o empenho de todas as áreas do conhecimento nas discussões sobre a problemática socioambiental. A Educação em Ciências em interlocução com os pressupostos da Educação Ambiental Crítica pode oferecer uma grande contribuição. Pois, para discutir e se engajar como cidadão no enfrentamento dos problemas socioambientais, a população precisa estar cientificamente letrada e politicamente consciente. (p. 166, destaque nosso)

Com relação ao trecho acima, cabem algumas críticas quanto a intenção de

tornar a população “cientificamente letrada” e “politicamente consciente” para o trato

da crise ambiental, visto que o conhecimento científico por si só, sem o diálogo com

outros saberes, não é capaz de abordar toda a complexidade da realidade; além disso, a

forma como os termos foram colocados pode passar a impressão de um vazio de

conhecimentos por parte de alguns indivíduos da sociedade, sendo necessário preencher

mecanicamente tais vazios; desse modo, a educação adquire um caráter de simples

transmissão de conteúdos. Todavia, essa é uma crítica que tem como base somente os

termos utilizados, sendo positivo o fato de deixar-se clara a concepção de EA adotada.

Como destacamos anteriormente neste trabalho, a EA crítica possui inúmeras

premissas, oriundas da Teoria Crítica, e também está relacionada a outras noções

contestatórias do modelo de sociedade preponderante. Guimarães e Vasconcellos (2006)

destacam os elementos incorporados a idéia de EA crítica que concebem para a prática

educativa do MAST, incluindo a necessidade do aumento do empoderamento da

população, a leitura crítica da realidade para a ação, e a necessidade de cooperação entre

as diversas instituições educativas, formais e não-formais.

Acreditamos que seja na complementaridade dos diferentes espaços educacionais (formal e não formal) que possamos potencializar uma “abordagem relacional” (...), que propicie uma adequada contextualização da perspectiva científica à dimensão ambiental no processo educativo. Deste modo, fica mais fácil a sociedade compreender o passado e o presente, ajudando-a na construção de um futuro melhor. (...) O Museu deve aliar informação, ensino-aprendizagem e entretenimento em prol da promoção da ampliação da cultura e construção de valores. Valores que reflitam o aumento do empoderamento da população, a partir da ampliação do exercício da sua cidadania. Para isso ele deve também trabalhar para desmitificar a Ciência e motivar o pensamento problematizador-crítico e investigador na compreensão-ação dos problemas socioambientais. (p.168)

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53

A questão da noção de empoderamento também merece certo cuidado, tendo em

vista o fato de que o termo pode ser apropriado por qualquer ator social, e que a

intenção de empoderar certo grupo é de certo modo egocêntrica, já que isso é algo que

deve surgir autonomamente. No que diz respeito a idéia da complementaridade

pedagógica entre as instituições de ensino formal e não formal, esta é de fundamental

importância, desde que não se percam as características particulares de cada instituição.

Assim, apresentada a concepção de EA existente no MAST, a principal prática

educativa que deriva de tal concepção, segundo Guimarães e Vasconcellos (2006), é a

ação denominada de “trilha ambiental”; segundo os autores:

A proposta da “Trilha Ambiental” contempla um roteiro de visita guiada por diferentes exposições, que é oferecido pelo MAST às escolas. Nela, as discussões sobre a problemática socioambiental são trabalhadas a partir de conhecimentos científicos, explorando-se nas exposições atividades como o “Ano Cósmico” (uma linha do tempo marcando eventos naturais e históricos) e o “Sistema Solar” (representado em escala pelo campus do Museu); a “Astronomia: uma história” (focando na mudança paradigmática do conhecimento da idade média para o conhecimento da Ciência Moderna); os “Ciclos Astronômicos e a Vida na Terra” (trabalhando cadeias de relações na biosfera, em particular os ciclos da matéria e energia); e finalizando a visita com uma apresentação dialogada audiovisual no auditório. (p.169)

Assim, “a partir dos ambientes educativos provocados pelos conteúdos das

diferentes exposições e seus mediadores” (Guimarães e Vasconcellos, 2006, p.170),

pretende-se estimular, no público visitante, reflexões sobre os referenciais

paradigmáticos da sociedade contemporânea e a visão de mundo prevalecente.

Creio que a proposta desenvolvida pelo MAST é interessante, principalmente

por considerar alguns fatores importantes a serem pensados em uma proposta museal

que busque proporcionar diálogos, reflexões e debates quanto ao modelo de

desenvolvimento hegemônico. Entre esses fatores a serem destacados está a busca pela

inter-relação dos espaços do museu de ciência, abarcando não somente as exposições e

objetos, visando-se também a valorização dos educadores museais, por exemplo. Além

disso, a busca pela abordagem da problemática ambiental de forma sistêmica, histórica,

não linear, e com características não- naturalizantes, também é algo positivo a se

destacar.

Procura-se construir uma mudança/ampliação do olhar, em que se trabalha uma identidade de pertencimento a um coletivo; de sermos e estarmos em uma parte enredada em um todo maior; que participamos de um movimento

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54evolutivo, não exclusivamente linear, mas também cíclico e complexo. Procuramos provocar uma mudança de foco que contemple uma compreensão complexa da realidade socioambiental e que motive professores e estudantes a se engajarem em discussões e ações sobre a problemática socioambiental. Ao final da visita, estimula-se o surgimento de questionamentos, para serem trabalhados posteriormente na Escola, a respeito da crise socioambiental da atualidade. [Além disso] pretendemos pensar na formação do educador para além do profissional que atua no espaço formal (professor) e não formal (profissional de museus e centros), ou na Educação em Ciências e Educação Ambiental, sem mais uma vez deixar de reconhecer as especificidades de cada espaço e função, com suas habilidades e competências particulares. [A proposta da trilha ambiental em]nível interno, vem propiciando uma maior integração das diferentes exposições, atividades e setores do Museu e, no nível externo, uma maior abertura e aproximação do Museu com a sociedade. (p. 170)

Entretanto, apesar dos pontos interessantes destacados, creio que apenas não

ficou muito clara a relação da proposta do MAST com outras noções interligadas à EA

crítica, algumas destacadas neste trabalho, que também buscam a abordagem das raízes

profundas da crise ambiental e possibilidades contra-hegemônicas tangíveis,

desnaturalizando a questão ambiental e tornando clara sua perspectiva

multidimensional. A noção de justiça ambiental, por exemplo, retira da questão

ambiental o caráter puramente técnico para a resolução de problemas, buscando as

dimensões estruturais e políticas da problemática ambiental, tanto em nível local como

em nível global.

Tais considerações, todavia, não retiram o caráter positivo da proposta do

MAST, que busca uma maior integração externa e interna para o museu de ciência,

através da temática ambiental. A proposta de utilizar temas ambientais como temas

geradores de discussões mais amplas é um caminho interessante a ser desenvolvido

pelos museus de ciência.

A proposta dos temas geradores é originária do Método Paulo Freire, entendido

não como uma metodologia, mas sim como o próprio pensamento de Paulo Freire, o

conjunto de fundamentos ou princípios filosófico-políticos presentes em suas reflexões

e ações, caracterizando uma educação de caráter progressista, libertadora e popular.

De maneira resumida, a educação libertadora é uma atividade em que sujeitos,

educadores e educandos, mediatizados pelo mundo (pelas suas realidades históricas

concretas), educam-se em comunhão, buscando aprofundarem-se no conhecimento da

realidade em que vivem, na identificação das causas reais e profundas dos problemas

que emergem, com possibilidades de intervenção em tais problemáticas. Na pedagogia

freireana, as “palavras geradoras”, oriundas da prática de vida dos educandos e

possuindo conteúdos sociais e políticos significativos para os sujeitos, são o eixo

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55metodológico principal, proporcionando a leitura de mundo necessária para o

processo de reflexão-ação; assim, as “palavras geradoras” possuem o papel de “temas

geradores”, sendo que tais temas “servem ao processo de codificação- decodificação e

problematização da situação” (Tozoni-Reis, 2006, p. 104).

Dessa forma, percebe-se que a pedagogia freireana proporciona fundamentos

importantes para a prática da EA de vias críticas, como destaca Lima (2004):

A pedagogia freireana, ao propor uma educação libertadora, traz uma rica contribuição teórica e metodológica para a prática da educação ambiental emancipatória [ou de vias críticas] quando procura despertar a consciência do educando através da problematização dos temas geradores pertencentes ao seu universo vivido. Trabalha, nesse sentido, sua percepção de indivíduo no mundo em relação com outros indivíduos visando sua inserção crítica nessa realidade. Nesse processo os educandos reconhecem sua situação como problema e se deparam com a possibilidade de assumirem sua história, superando os obstáculos que impedem seu crescimento e humanização. (p. 99)

Destaca-se, entretanto, que os temas geradores não devem ser abordados como

atividades-fim em si mesmos, visto que, ao serem colocados dessa forma, na busca pela

resolução de problemas locais de maneira pontual, pode fomentar-se uma “percepção

equivocada de que o problema ambiental não está inserido numa cadeia sistêmica de

causa-efeito, e que sua solução encontra-se na órbita da esfera técnica (...) [reduzindo-

se] a causa pela consequência” (Layrargues, 1999, p. 7).

A abordagem do tema gerador deve enfatizar, portanto, uma visão

multidimensional do problema, integrando a crítica e o foco sobre as causas, de maneira

a estimular uma compreensão mais politizada dos problemas ambientais, sem

reducionismos. Lima (2004) levanta, por exemplo, alguns temas geradores que

poderiam ser explorados nas práticas da EA crítica: as razões dos conflitos pelo acesso e

pelo uso dos recursos naturais que antagonizam interesses privados e públicos; a

responsabilidade diferenciada dos diversos agentes sociais na produção da degradação

ambiental; o direito à qualidade de vida como um direito de cidadania; o modo

diferenciado como os impactos e riscos tecnológicos e ambientais atingem pobres e

ricos; as possibilidades de construir ações sociais diante de tais questões; entre outros.

O desenvolvimento dos temas geradores pode, nesse sentido, estabelecer os vínculos entre os impactos socioambientais, seus processos de formação e agentes causais; o direito a uma ambiente saudável, os direitos e deveres de cidadania e as possíveis respostas individuais e coletivas visando a superação do problema analisado. (LIMA, 2004, p. 101)

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56Evidentemente, tais temas geradores devem ser, na realidade, definidos

coletiva e participativamente, dependendo dos contextos locais. Em um museu de

ciência isso torna-se extremamente dificultoso se considerarmos somente suas

exposições e objetos, tendo em vista que as temáticas destes são estáticas e foram

definidas previamente. Dessa forma, torna-se ainda mais importante o papel do

educador nesse processo, que deve, a partir dos elementos museais e da percepção dos

educandos, buscar definir temas-geradores e problematizá-los a partir de sua formação

sociopolítica.

Resumidamente, pode-se considerar que a característica positiva na proposta

pedagógica do MAST advém da explicitação de seu vínculo com a EA crítica, com

alguns fundamentos desta concepção desdobrando-se na prática do projeto da Trilha

Ambiental adotado pelo MAST, como, por exemplo, através da busca pelo trato da

problemática ambiental de forma sistêmica, histórica, não linear, e com características

não- naturalizantes, utilizando-se, de maneira integrada, outros elementos

comunicacionais do espaço museal, que não somente seus objetos e exposições. Além

disso, a proposta da Trilha Ambiental agrega a metodologia ou ideia dos temas

geradores, a serem levantados e abordados através dos elementos de comunicação do

museu de ciência.

Contudo, alguns fundamentos importantes da EA crítica não estão explicitados

na proposta da Trilha Ambiental, como as questões relacionadas a noção de justiça

ambiental e, principalmente, o questionamento da responsabilidade científica nas

origens da problemática socioambiental, além da possibilidade de diálogos entre a

ciência e outras formas de saberes. Assim, elementos importantes para a discussão das

causas da crise ambiental acabam sendo marginalizados.

Neste ponto, pode-se tratar a respeito do museu de ciências da UNICAMP,

espaço museal localizado em Campinas, desenvolvido a partir de 2003, onde percebe-se

a explicitação de outros fundamentos da EA crítica, alguns existentes também no espaço

do MAST, e vice-versa.

Murriello et. al. (2006), ao tratarem das justificativas para a criação do museu de

ciências da UNICAMP, destacam a importância dos museus como espaços

comunitários, visando-se a discussão de temáticas que envolvam o desenvolvimento

local. Além disso, os autores, assim como neste trabalho, também criticam a

predominância do modelo comunicacional de déficit nos museus de ciência, mostrando-

se apenas os resultados das pesquisas científicas, de forma a-histórica, neutra, e sem

maiores contextualizações políticas e sociais.

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57Dessa forma, os autores defendem um modelo de comunicação da ciência que

propicie maiores diálogos entre os espaços museais e o público, de forma que sejam

considerados todos os elementos de comunicação do museu de ciência; além disso,

defendem uma abordagem histórica, política e cultural da ciência.

Consideramos que esse processo dialógico de comunicação em um museu de ciência e tecnologia deve envolver, entre outros, uma aproximação às formas em que estas práticas são desenvolvidas. Apresentar a lógica de estruturação do conhecimento científico, seus métodos, sua epistemologia e a sua prática como atividade social pode permitir a um público diverso se aproximar da ciência como atividade cultural complexa. A simples divulgação dos resultados científicos, prática mais freqüente nos museus de ciências, (...) mostrando apenas os seus resultados – normalmente carregados de uma visão otimista – (...) [reforça] a mistificação da ciência e da tecnologia afastando o público dos processos e debates que a compõem. (...) A comunicação da ciência faz parte do processo de criação científica e não é apenas seu resultado. (...) As últimas experiências museológicas aplicada às ciências têm procurado desmistificar os princípios científicos democratizando o saber acadêmico, polemizar sobre os resultados das pesquisas, explicitar os processos de construção do conhecimento e demonstrar as funções sociais e políticas da ciência, abordando interdisciplinarmente temas polêmicos da realidade contemporânea. Acreditamos que esse é um caminho ainda a transitar, buscando novos modelos museológicos apropriados à nossa realidade local. (p.3)

Percebe-se, portanto, a preocupação do museu de ciências da UNICAMP em

questionar a ciência e a tecnologia, colocando-as em um contexto histórico, buscando

discutir, inclusive, as responsabilidades da ciência em algumas problemáticas

societárias, incluindo a questão ambiental. As propostas do museu da UNICAMP

“devem abranger temas da ciência e da tecnologia com abordagem inter e multi-

disciplinar, fomentando a discussão do impacto tecnológico, social, ambiental e ético do

desenvolvimento científico” (MURRIELLO et. al., 2006, p. 8).

A missão do museu de ciência da UNICAMP, apresentada em seu projeto

conceitual, bem como suas práticas preliminares, demonstram, assim, as duas

preocupações centrais para sua criação, especificadas anteriormente: a desmistificação

da ciência como prática neutra e descontextualizada; e os desdobramentos da aplicação

do método científico para o cotidiano, seus impactos (positivos ou negativos) e sua

utilização para a legitimação de práticas políticas, econômicas e sociais.

[A missão do museu de ciências da UNICAMP é a de] promover a difusão da cultura científica, sendo um espaço que valorize a convivência, o lazer e a inclusão social, onde são mostrados os processos pelos quais a ciência e a tecnologia são constituídos, seu impacto no cotidiano e seus desdobramentos sócio-ambientais, tomando como referência contextos locais. [Na perspectiva dessa missão, uma das atividades do museu será a promoção de

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58debates] com o objetivo de aprofundar a base de argumentação de questões de relevância social-econômica-ambiental-ética, que envolvam questões científicas e tecnológicas. (MURRIELLO et. al., 2006, p. 8)

Com relação as práticas do museu de ciência da UNICAMP, existem alguns

projetos de especial relevância, como a “Oficina Desafio”, onde levam-se desafios

tecnológicos até as escolas, propondo-se aos estudantes o desenvolvimento de soluções

tecnológicas para alguns dos problemas reais apresentados nas atividades. A figura 3

explicita alguns dos desafios propostos pelo projeto

Figura 3: Alguns dos desafios propostos pelo projeto “Oficina Desafio”, elaborado pelo museu de ciências da UNICAMP (fonte: Murriello et. al., 2006).

Percebe-se, através dos desafios propostos, que, apesar do projeto ser

interessante, faz-se necessário que os desafios sejam bem trabalhados, abordando-os em

um contexto mais amplo, que considere outros elementos além de, somente, o elemento

técnico. Assim, se tais desafios propiciarem discussões ampliadas e reflexões críticas

sobre a ciência, a sociedade e a tecnologia, como propõe a missão e os objetivos do

museu de ciências da UNICAMP, tornam-se atividades de grande potencial, que,

inclusive, podem abarcar a temática da tecnologia social.

Foram apresentados e analisados, de maneira resumida, os aspectos conceituais

relacionados ao museu de ciências da UNICAMP, sendo também apresentada uma de

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59suas práticas, a título de exemplo. Pode-se dizer que, apesar de suas concepções não

destacarem explicitamente o conceito e fundamentos da EA crítica, o museu da

UNICAMP possui fundamentos relacionados a esta vertente de EA, principalmente o

questionamento crítico à ciência e a problematização de seus impactos na sociedade.

Dessa forma, nota-se, através dos exemplos de concepções e práticas de EA

constituintes do MAST e do museu de ciências da UNICAMP, que a práxis de uma EA

de caráter crítico, em toda a sua complexidade pedagógica (que condiz com a

complexidade da crise ambiental), é de grande dificuldade, tendo-se em vista que nem

todos os fundamentos desta vertente de EA encontram-se presentes nos museus de

ciência exemplificados. Todavia, percebe-se que os museus analisados possuem

concepções e práticas interessantes que podem complementar-se.

Outros exemplos, que se complementariam as práxis do MAST e do museu da

UNICAMP, poderiam ser citados, como as atividades desenvolvidas pelo Catavento

Cultural, museu de ciência localizado em São Paulo, que aborda pedagogicamente

alguns instrumentos da política ambiental brasileira (como a criação de áreas de

proteção natural), suas bases científicas, seus contextos históricos de criação e os

debates políticos em torno destas.

Assim, dada a complexidade da crise ambiental, pedagogicamente torna-se

difícil para os museus de ciência uma práxis de EA crítica, em todos os seus

fundamentos, não sendo possível o apontamento de respostas fáceis, mesmo porque,

estas não existem. No entanto, existem caminhos que podem e devem ser considerados

pelos museus de ciência.

Primeiramente, com relação a aspectos internos, o museu de ciência deve possuir

uma abordagem educacional que considere todos os seus elementos pedagógicos; deve-

se dar destaque especial, é claro, para seus objetos e exposições, contudo, outros

aspectos e espaços do museu devem ser considerados, principalmente, a formação

sociopolítica (e não somente técnica) de seus educadores. Além disso, os museus de

ciência devem procurar refletir e dialogar (entre si e com o público) sobre suas bases

conceituais e práticas, procurando a incorporação de elementos que propiciem uma

comunicação que vá além da mera transmissão de informações, com características

semelhantes ao modelo de participação pública na ciência.

Todavia, no que tange uma educação ambiental verdadeiramente crítica, que

discuta e questione o modelo de desenvolvimento hegemônico, somente essas

considerações não são suficientes, sendo necessária, além de uma maior articulação

entre os museus de ciência e outras instituições de educação (formais e não-formais),

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60sobretudo, uma maior relação dos museus de ciência entre si, para que estes possam

dialogar e refletir sobre suas práxis de âmbito socioambiental.

Os exemplos do MAST (com sua concepção de EA crítica e seu trato sistêmico,

não linear, histórico e não naturalizante da problemática ambiental, além da utilização

metodológica dos temas geradores), e do museu de ciências da UNICAMP (com sua

crítica a ciência como prática neutra e a-histórica, e seu questionamento das

responsabilidades da ciência no desdobramento de problemáticas socioambientais)

apontam: a aparente complementaridade dos esforços dos museus de ciência na busca

de uma abordagem crítica da crise ambiental; e a necessidade de diálogo entre os

museus de ciência para que tais esforços sejam potencializados.

Por fim, acrescenta-se às considerações tecidas anteriormente, a possibilidade, e

talvez necessidade, que os museus de ciência tragam aspectos que envolvam

pedagogicamente outras formas de saberes, além do científico. Sabe-se que esse não é

um dos objetivos dos museus de ciência, visto que tal tarefa parece estar

compartimentada a museus antropológicos ou de outras características. Todavia, não

existe necessidade de tal fragmentação dos conhecimentos, sendo que a abordagem de

outros saberes (indígenas, de populações tradicionais, entre outros) potencializaria o

caráter crítico e questionador do museu de ciência.

9. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho, ao destacar os elementos político-ideológicos que embasam as

diferentes vertentes de educação ambiental, bem como suas relações com as origens da

crise ambiental, teve como principal objetivo, em linhas gerais, o questionamento das

concepções e práticas de educação ambiental que predominam em museus de ciência,

colocando, sem qualquer pretensão de resolução, a possibilidade destes espaços

incluírem, em suas abordagens pedagógicas, aspectos mais críticos no trato das

problemáticas socioambientais.

Assim, o principal objetivo desta pesquisa, mais do que apontar fórmulas ou

caminhos metodológicos em específico, era o de tornar evidente e problematizar as

características da educação ambiental desenvolvida pelos museus de ciência, tendo-se

em vista o fato de que a educação ambiental não é homogênea, apresentando vertentes

com atributos e fundamentos diferenciados.

Procurou-se, inicialmente, o esclarecimento de pontos importantes, referentes às

características de museu de ciência que correspondem aos interesses do trabalho,

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61levando-se em consideração que os museus de ciência podem pertencer a grupos

específicos. Colocando-se como referência os atributos existentes em um centro de

ciência (interatividade, e ligação maior com a realidade cotidiana e com a interface meio

ambiente/sociedade), estabeleceram-se teoricamente as atividades ou interesses que

prevalecem neste tipo de espaço educacional, sendo a voltada para a comunicação e

divulgação científica aquela que se destaca.

Todavia, o interesse pela educação ambiental e, consequentemente, pela crise

ambiental, também está presente no espaço museal, sendo que sua práxis encontra-se

hierarquicamente influenciada pelo modelo de comunicação pública de C & T mais

utilizado, o chamado modelo de déficit.

A partir do modelo de déficit, predominantemente presente nos museus de

ciência, de características a-históricas e de transmissão de conhecimentos, revela-se

também nestes espaços educacionais uma educação ambiental de atributos tecnicistas,

naturalizantes e reducionistas, pautada pela ação nas consequências e não nas causas da

questão ambiental, com foco em mudanças de comportamento individuais, e,

principalmente, despolitizando o debate acerca da problemática ambiental em sua

complexidade e multidimensionalidade, não propiciando maiores diálogos com outras

formas de saberes.

Desta forma, o potencial do museu de ciência não é aproveitado, visto que não

possibilita um real diálogo e participação pública, mesmo sendo um espaço propício

para a discussão de temas que integram múltiplas dimensões (políticas, sociais, éticas,

técnicas, culturais, econômicas, entre outras).

Na análise da Estação Ciência, por exemplo, em seu projeto intitulado “O

Planeta Terra e a Preservação Ambiental”, observou-se a prática da educação ambiental

com todas as características descritas anteriormente, além do fato de que a temática

ambiental está compartimentada na área da Geologia, reduzida a um debate estritamente

técnico, apresentando, hegemonicamente, características das ciências naturais.

Existem várias explicações para a forma de educação deficitária utilizada pelos

museus de ciência, as quais foram discutidas no decorrer do trabalho, incluindo o fato

do museu científico ser considerado um espaço de educação pontual, restringindo seus

meios de educação aos objetos ou às exposições; todavia, um fator que ainda não havia

sido problematizado é a questão de alguns museus de ciência serem órgãos de extensão

de universidades. Esse, evidentemente, não é o problema em si; o problema se encontra

no conceito de extensão que prevalece na prática das universidades, buscando suprir

deficiências de interação com a sociedade, sem, contudo, proporcionar oportunidades

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62reais de diálogo, que sejam bidirecionais, e que respeitem conhecimentos de outro

tipo que não o acadêmico.

Assim, explicitadas e analisadas criticamente as características da educação

ambiental prevalecentes nos museus de ciência, com suas consequentes dificuldades de

abordar as problemáticas socioambientais em suas causas reais e profundas,

aprofundou-se a discussão com relação a educação ambiental de caráter crítico,

apresentando-se, suas características e relações com outras noções contra-hegemônicas,

e também suas possibilidades de subsídio teórico e prático para os museus de ciência.

Percebeu-se, através do estudo dos fundamentos que compõem a educação

ambiental crítica, bem como das noções atreladas à tal vertente (de justiça ambiental,

economia solidária e tecnologia social), que dificilmente os museus de ciência, vistos

individualmente, conseguiriam abarcar o trato de toda a complexidade multicausal que

envolve a crise ambiental, articulando questões que envolvem o pensamento ocidental,

o modo de produção predominante, e a visão de natureza hegemônica.

Contudo, através da análise dos projetos desenvolvidos pelo Museu de

Astronomia e Ciências Afins (MAST) e pelo museu de ciências da UNICAMP, avaliou-

se a existência de esforços teóricos e práticos na busca de abordagens pedagógicas mais

críticas no trato das problemáticas socioambientais, mesmo que, individualmente, tais

museus de ciência não consigam acolher todos os fundamentos de uma educação

ambiental de vias críticas.

Tais esforços dizem respeito ao olhar: sistêmico, não linear, histórico, e não

naturalizante da problemática ambiental, além da crítica à ciência como prática neutra e

a-histórica, questionando-se suas responsabilidades quando ocorrem, como

desdobramento de seu processo de criação, impactos socioambientais (positivos e

negativos). Além disso, acrescenta-se o intento do MAST e do museu de ciências da

UNICAMP, de abarcar, em suas concepções e práticas educativas, todos os elementos

que envolvem a comunicação dos museus de ciência, e não somente seus objetos e

exposições.

A partir do que foi exposto, considera-se, portanto, que apesar das claras

dificuldades existentes para a práxis de uma educação ambiental crítica nos museus de

ciência, faz-se necessário que os fundamentos e elementos que compõem essa vertente

da educação ambiental sejam continuamente almejados pelos museus de ciência, os

quais devem estar em permanente diálogo, já que possuem concepções e práticas que se

complementam na busca de uma análise crítica da questão ambiental. Além disso, os

museus de ciência devem ter em vista, como possibilidade pedagógica, a abordagem de

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63atributos relacionados a outras formas de saberes, com vistas a potencialização de seu

caráter educador, no trato mais profundo da crise ambiental, incluindo a crise do

pensamento ocidental e a busca de outros tipos de “pensamentos” ou conhecimentos, os

quais não devem ficar segregados somente em museus específicos para tal fim.

10. REFERÊNCIAS

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