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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
DANO MORAL: ATIVIDADE VANTAJOSA PARA AS EMPRESAS
Por: Carlos Josué de Araujo Lima
Orientador
Prof. William Rocha
Rio de Janeiro
2014
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
DANO MORAL: ATIVIDADE VANTAJOSA PARA AS EMPRESAS
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Direito do Consumidor e
Responsabilidade Civil.
Por: . Carlos Josué de Araujo Lima.
3
AGRADECIMENTOS
A cada vitória o reconhecimento devido ao meu Deus, pois só ele é
digno de toda honra, glória e louvor Senhor, obrigado pelo fim de mais uma
etapa.
Agradeço à minha família, aos meus colegas e professores, que
colaboraram de alguma maneira para a materialização deste trabalho.
A todos, que de alguma forma contribuíram para a concretização deste
trabalho, registro meu sincero agradecimento.
4
DEDICATÓRIA
Dedico esta vitória aos verdadeiros
responsáveis por ela que, além de
serem os meus insentivadores são a
minha inspiração. Sei da tua
importância e dedico este momento
também a ti, meu Deus, fonte das
minhas realizações. Sei que nada na
vida teria sentido sem vocês, minhas
meninas Laryssa e Sara e sem você
Cláudia a minha vida faltaria, meu
grande amor. É bom ter vocês para
repartir esta vitória, meus pais que
fazem parte de todas as minha
conquistas.
5
RESUMO
O desenvolvimento histórico do dano moral foi conturbado, passando por
significativas alterações ao longo da história. Verifica-se que a noção de dano
está sempre presente a noção de prejuízo. Nem sempre a transgressão de
uma norma ocasiona dano. Somente ocorrerá possibilidade de indenização,
como regra, se o ato ilícito ocasionar dano. o legislador constituinte do Código
Civil Brasileiro de 1916 recepcionou somente a figura do dano material, sendo,
que à época, todos os processos por dano moral eram indeferidos de plano por
ausência de previsão legal. Foi em 1988, indubitavelmente recepcionado com
a Constituição Federal (CF) promulgada em 5 de outubro de 1988, que o dano
moral foi trazido ao nosso ordenamento de forma clara e precisa, enquadrado
entre os Direitos e Garantias fundamentais e, posteriormente, mais
precisamente em seu art. 186, inserido no Código Civil Brasileiro de 2002,
trazendo à tona a figura do dano moral e o dever de repará-lo, de forma a
reforçar a CF/88. Trata-se esta monografia da análise ao dano moral como
atividade vantajosa as grandes empresas, haja vista as ocorrências de um
desestímulo inverso aplicado por nossos tribunais. Abordar-se-á a origem do
dano moral, o caráter do dano moral e sua instrumentalidade eficaz para
inibir práticas ilícitas, além da teoria do valor do desestímulo que, deveria ser
utilizada para inibir as empresas que lesionam reiteradamente o consumidor e,
no entanto, está sendo aplicada inversamente.
6
METODOLOGIA
Os métodos adotados para a elaboração desta monografia se deram
basicamente, por pesquisas nas mais conceituadas doutrinas jurídicas pátria e
o direito positivo brasileiro, além da vasta jurisprudência dos nossos Tribunais
e também consulta a internet.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - Dano 09
1.1 Conceito de dano 09
1.2 Dano patrimonial e extrapatrimonial 10
1.3 Dano moral 13
CAPÍTULO II - A origem do dano moral 21
2.1 A evolução historica do dano moral no Brasil 25
2.2 O dano moral na Constituição Federal 30
2.3 O dano moral no Código Civil de 2002 31
CAPÍTULO III – O Caráter do dano moral 35
CAPÍTULO IV - DANO MORAL: instrumento
eficaz para inibir práticas ilícitas
ao consumidor 38
CAPÍTULO V - O Dano Moral e sua Reparação 46
5.1 Direito Comparado 46
5.2. Reflexos da Notoriedade do Dano Moral 48
CAPÍTULO VI - A teoria do valor do desestímulo 55
6.1 Origem 55
6.2 Conceito 56
6.3 Norma geral do ressarcimento 57
CONCLUSÃO 61
BIBLIOGRAFIA 62
8
INTRODUÇÃO
O caráter indenizatório do dano moral é pura e simplesmente subjetivo,
verifica-se nas decisões dos nossos tribunais uma inversão para se estabelecer
um critério justo, que seja capaz de minimizar o sofrimento causado à vítima.
Destarte, que tem sido o consumidor vitimado não só pelos prejuízos, muitas
das vezes, causados pelas empresas, mas também, pelas indenizações que
não têm o efeito coercitivo inibidor, nem a compesação real pelo sofrimento
causado à vítima. Infelizmente os nossos magistrados preoculpam-se mais
com a hipótese do enriquecimento ilícito do consumidor do que aplicar a
punição pedagógica nas empresas que insistem em agir dolosamente em seus
atos ilícitos.
Versa esta monografia sobre a figura do dano moral como atividade
vantajosa para as empresas no aspecto indenizatório. No contexto geral,
procurar-se-á absorver o conceito de dano, enfatizando o dano moral e sua
evolução. Para tanto, procurar-se-á citar as condições necessárias à
configuração do dano moral e apresentar a ineficácia do dano moral punitivo
junto da grandes empresas.
Consta, no desenvolver desta monografia, breve análise das principais
questões relacionadas ao dano moral , com foco na tarefa dos magistrados em
aplicar o dano moral como instrumento eficaz para inibir os atos ilícitos. Como
suporte aos argumentos desenvolvidos, consideraram-se, basicamente, as
doutrinas pátria e o direito positivo brasileiro, além de alguns julgados dos
nossos Tribunais.
9
I – DANO
1.1 CONCEITO DE DANO
Dano consiste no prejuizo sofrido pelo agente. Pode ser individual ou
coletivo, econômico e não econômico. A noção de dano está sempre presente
a noção de prejuízo. Nem sempre a transgressão de uma norma ocasiona
dano. Somente ocorrerá possibilidade de indenização, como regra, se o ato
ilícito ocasionar dano.
O vocábulo dano serve para descrever o mal ou o prejuízo que sofre
uma pessoa ou um objeto1. O dano ocorre quando um bem juridicamente
protegido é diminuido, deteriorado ou inutilizado, por ato nocivo e prejudicial,
produzido pelo delito civil ou penal2.
Dano é uma perda, um prejuízo, mal fazendo referência a diversos tipos
de lesões que prejudica diretamente a aparência, o valor, a utilidade, a
validade, etc. Dano também se define como uma queda de um estado original,
como resultado dos danos, a depreciação, o rompimento ou a quebra.
Menoscabo ou mal causado com ou sem intenção que prejudica ou
elimina uma pessoa ou um objeto. O dano pode transformar uma coisa ou um
ser de um estado de perfeito funcionamento a um estado de total disfunção. Os
prejuízos causados pelos danos podem ser ressarcidos dependendo do tipo de
dano causado.
Se nos aprofundamos um pouco mais na definição de danos, falaremos
de danos hedônicos. Os danos hedônicos se referem à indenização por
compensação pela perda do desfrute ou o valor da vida. Às vezes se faz
referência como o valor da vida perdida imaterial. Os que advogam pelo
1 http://queconceito.com.br/dano 2 http://pt.wikipedia.org/wiki/Dano
10
hedonismo acreditam que a vida é intrinsecamente mais valiosa que a
quantidade de dinheiro que uma pessoa pode ganhar.
Por tanto, as indenizações por um salário perdido e pela dor e
sofrimento são suficiente para fazer toda a parte demandante.
O valor da vida humana não é sujeito a uma medição precisa na economia, por
tanto esse tipo de valores são subjetivos. 3
1.2 DANO PATRIMONIAL E EXTRAPATRIMONIAL
Segundo entendimento generalizado na doutrina é possível distinguir, no
âmbito dos danos, a categoria dos danos patrimoniais, de um lado, dos danos
extrapatrimoniais, ou morais, de outro; respectivamente, o verdadeiro e próprio
prejuízo econômico, o sofrimento psíquico ou moral, as dores, as angustias e
as frustrações infligidas ao ofendido.4
O dano, portanto, se subdivide em dano patrimonial e extrapatrimonial,
sendo essa a divisão doutrinária clássica. Afirmam ainda que o dano
patrimonial é aquele causado de forma direta aos bens e direitos que têm
valores economicamente apreciáveis do seu possuidor. Exemplificadamente,
ocorre quando sofremos algum dano em um veículo ou bem em um bem
imóvel.
Dano patrimonial, portanto, é aquele suscetível de avalição pecuniária,
podendo ser reparado por reposição em dinheiro, denominador comum da
indenização.
A caracterização do dano extrapatrimonial tem sido deduzida na doutrina
sob forma negativa, na sua contraposição ao dano patrimonial; ou como refere
Aguiar Dias, “quando ao dano não correspondem as caracteristicas de dano
3 http://queconceito.com.br/dano 4 Dano moral/Yussef Said Cahali. – 4. Ed rev., pag. 18.
11
patrimonial, estamos em presença de dano moral”;5 pretendendo, Ponte de
Miranda, que “dano patrimonial é o dano que atinge o patrimonio do ofendido;
dano não patrimonial é o que é, só o atingindo com ser humano, não lhe atinge
o patrimônio.”6
Seguindo o mesmo critério, Orlando Gomes procura precisar o instituito,
distinguindo a lesão ao direito personalíssimo que repercute no patrimônio da
que não repercute: “A expressão dano moral deve ser reservada
exclusivamente para designar o agravo que nao produz qualquer efeito
patrimonial. Se há consequências de ordem patrimonial, ainda que mediante
repercussão, o dano deixa de ser extrapatrionial.”7
Se, porém, abstrairmos o caráter estritamente econômico do patrimônio,
para (segundo as concepções mais modernas) dilargar o seu conteúdo de
modo a compreender valores imateriais, inclusive de natureza ética, veremos
que o critério distintivo à base da exclusão revela-se insatisfatório.
Parece mais razoável, assim, caracterizar o dano moral pelos seus
próprios elementos; portanto, “como a privação ao diminuição daqueles bens
que têm um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a tranquilidade
de espírito, a liberdade individual, a integridade individual, a integridade física,
a honra e os demais sagrados afetos”; classificando-se, desse modo, em dano
que afeta a “parte social do patrimônio moral” (honra, reputação etc.) e dano
que molesta a “parte afetiva do patrimônio moral” (dor, tristeza, saudade etc.);
dano moral que provoca direta ou indiretamente dano patrimonial (cicatriz
deformante etc.) e dano moral puro (dor, tristeza etc.).8
Gagliano e Pamplona Filho (2010, p. 82) aclaram, que, segundo
tendência atual, a qual preceitua sobre a despatrimonialização do direito civil,
5 Da responsabilidade civil, II, n. 226,p.771. 6 Tratado de direito privado, XXVI, §3.108,P.30. 7 Obrigações, n. 195,p.332. 8 Dalmartello, danni morali contrattuali, Riv. Dir. Civ.,1933,p.55 et seq.
12
afirmam que outros bens, do mesmo modo, podem sofrer danos, como bens
personalíssimos. Assim, restará configurado o dever de indenizar segundo a
responsabilidade civil do infrator.
Os doutrinadores asseguram ainda que os danos patrimoniais ou
materiais devam ser analisados por dois aspectos: O Dano emergente que
nada mais é que o dano sofrido direto no patrimônio da vítima, ou seja, é o
prejuízo propriamente dito, o que se perdeu, e o segundo aspecto denominado
de Lucros cessantes que, correspondem a uma espécie de dano consequente,
o qual ocorre quando a vítima deixa de lucrar, por decorrência de um dano
sofrido, ou seja, ela deixa de lucrar por culpa do dano sofrido.
Os pleitos indenizatórios de lucros cessantes e dano emergente deverão
estar devidamente constituídos nos autos, ou seja, deve haver prova concreta
da ocorrência dos referidos danos, evitando-se, assim, as aventuras jurídicas,
para obter enriquecimento ilícito, com intento de obter lucro abusivo.
A doutrina mais recente menciona também a questão do dano reflexo ou
dano ricochete. Trata-se da situação de dano reflexo que sofre uma pessoa por
um dano causado a outra.
Acompanhando esse raciocínio, a 15ª Câmara civel do TJ/RJ, em sede
de Apelação Cível:
DÉCIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL DO TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO APELAÇÃO
CÍVEL Nº 0151558-94.2012.8.19.0001 INDENIZATÓRIA. Dano
moral em ricochete decorrente de acidente de trabalho sofrido
por parente próximo dos autores. Agravo retido. A competência
para o julgamento da presente lide envolve questão que gerou,
por longo tempo, bastante polemica em nossos tribunais. É
que, a partir da vigência da Emenda Constitucional 45/2004,
ficou estabelecida a competência da justiça do trabalho para as
causas indenizatórias por danos morais e patrimoniais
13
decorrentes de acidente de trabalho. A questão foi, contudo,
pacificada após a edição da Súmula Vinculante nº 22 do STF,
permanecendo dúvida apenas quanto à hipótese dos autos. A
quarta turma do E. Superior Tribunal de Justiça, em julgamento
recente sob a relatoria do ilustre Ministro Luis Felipe Salomão,
consolidou entendimento bastante pertinente na espécie,
dando maior abrangência ao inciso VI do artigo 114 da CF,
remetendo à Justiça do Trabalho demanda onde herdeiros do
obreiro pleiteavam danos morais decorrentes do acidente de
trabalho que o vitimou. Instransponível, assim, a preliminar de
incompetência do juízo, arguido tempestivamente pela ré.
Ressalte-se que em um primeiro momento o próprio juiz
declinou de sua competência, tendo reconsiderado a decisão a
pedido da parte autora antes mesmo da citação. Impõe-se,
assim, a anulação de todos os atos do processo, declinando-se
da competência para uma das varas da Justiça do Trabalho.
Quanto à possibilidade de conexão factual a recomendar
julgamento simultâneo das lides, deve igualmente essa matéria
ser apreciada naquele tribunal. PROVIMENTO DO AGRAVO
RETIDO, FICANDO PREJUDICADOS OS RECURSOS DE
APELAÇÃO.
Em determinadas situações especiais, o direito reconhece que terceiros –
geralmente parentes, mas não necessariamente parentes – venham a ser
afetados moralmente, de maneira indireta pelo dano moral infligido à vítima do
ato ilícito; ainda que se trate de uma responsabilidade que se vincula à mesma
causa geradora da obrigação, esse direito preserva certa autonomia quanto à
sua titularidade e respectivo exercício, a latere da indenização o dano sofrido
pelo ofendido diretamente.9
1.3 – DANO MORAL
A reparação de danos morais, embora admitida pela doutrina
majoritária anteriormente à Cosntituição de 1988 ( art. 5º, X), ganhou enorme
9 Dano moral/Yussef Said Cahali. – 4. Ed rev., pag. 53.
14
dimensão entre nós somente após o preceito constitucional. Com a Lei Maior
expressa, superou–se a renitência empredernida de grande massa da
jurisprudência, que rejeitava a reparação de danos exclusivamente morais. O
fato é que em nosso ordenamento de 1916, o art. 159, astro-rei de nossa
responsabilidade civil, nunca restringiu a indenização aos danos
exclusivamente materiais.10
Segundo Venosa (2012, p.46, vol. IV), dano moral é o prejuizo que afeta
o ânimo psíquico, moral e intelectual da vítima. Sua atuação é dentro dos
direitos da personalidade. Nesse campo, o prejuízo transita pelo imponderável,
daí porque aumentam as dificuldades de se estabelecer a justa recompensa
pelo dano. Em muitas situações, cuida-se de indenizar o inefável.
O dano moral abrange principalmente os direitos da personalidade em
geral, direito à imagem, ao nome, à privacidade, ao próprio corpo etc. Por
essas premissas, não há que se identificar o dano moral exclusivamente com a
dor física ou psíquica. Será moral o dano que ocasiona um disturbio anormal
na vida do individuo; uma inconveniência de comportamento ou, como
definimos, um desconforto comportamental a ser examinado em cada caso. Ao
se analisar o dano moral, o juiz se volta para a sintomatologia do sofrimento, a
qual se não pode ser valorado por terceiro, deve , no caso, ser quantificada
economicamente.
Neste sentido Jurisprudência a seguir:
0069801-83.2009.8.19.0001 - APELAÇÃO 1ª Ementa - DES.
SIDNEY HARTUNG - Julgamento: 09/05/2011 - QUARTA
CAMARA CIVEL APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REPARAÇÃO
POR DANOS MORAIS - PROCEDÊNCIA 1 - Trata-se de
ofensa, verbais e escritas, perpetradas à pessoa do síndico em
presença de funcionários do condomínio. 2 Sentença de
procedência, condenando a parte ré a indenizar o autor, a título
de danos morais, no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais). 3 -
10 Venosa - 2012, p.46, vol. IV.
15
Apela a parte ré requerendo procedência do pedido com a
reforma da sentença, a fim de julgar procedente o pedido
contraposto feito na contestação, bem como seja reduzido o
valor da condenação. 4 Configurada a conduta culposa da Ré,
ensejando o dever de indenizar os prejuízos daí advindos, na
forma dos artigos 186 e 927 do Código Civil. Presentes os
pressupostos da responsabilidade civil. Pedido contraposto
improcedente por ausência de provas. 5 - Verba indenizatória
elevada, merecendo, à luz dos princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade, considerando-se, ainda, o postulado da
vedação ao enriquecimento sem causa, ser reduzida para R$
5.000,00 (cinco mil reais). Precedentes Jurisprudenciais. -
Honorários advocatícios acertadamente arbitrados, na forma do
art. 20, § 3º, do CPC, em 10% sobre o montante condenatório
Aplicabilidade do disposto no art. 557, § 1º-A, do CPC.
PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DA RÉ, para reduzir o
valor de indenização por danos morais para R$ 5.000,00 (cinco
mil reais), mantendo quanto ao mais a r. sentença, por seus
próprios fundamentos.
Acrescente-se que o dano psíquico é modalidade inserida na categoria
de danos morais, para efeitos de indenização. O dano psicológico pressupõe
modificação de personalidade, com sintomas palpáveis, inibições, depressões,
sindromes, bloqueios etc. Evidente que esses danos podem decorrer de
conduta praticada por terceiro, por dolo ou culpa. O dano moral, em sentido
lato, abrange não somente os danos psicologicos; não se traduz unicamente
por uma variação psíquica, mas também pela dor ou padecimento moral, que
não aflora perceptivelmente em outro sintoma. A dor moral insere-se no amplo
campo da teoria dos valores. Desse modo, o dano moral é indenizavel, ainda
que não resulte em alterações psíquicas.11
Neste sentido sentença a seguir:
Vistos. ANTONIO RIBEIRO ajuizou a presente ação
declaratória de inexistência de débito cumulada com
11 Venosa , direito civil,responsabilidade civil, 12º ed., p. 49.
16
indenização por danos morais e com pedido de antecipação da
tutela jurisdicional em face de BANCO ABN AMRO REAL S/A.
aduzindo, em síntese, que não celebrou contrato algum com o
réu. Contudo, foi surpreendido com apontamento em órgão de
proteção ao crédito em relação ao contrato de financiamento
no valor R$ 17.836,76 (dezessete mil, oitocentos e trinta e seis
reais e setenta e seis centavos), inexistente, porquanto o autor
não deve obrigação alguma ao réu. Relata que buscou solução
administrativa, sem sucesso. Pede antecipação da tutela
jurisdicional para exclusão de seu nome de órgão de proteção
ao crédito, declaração de inexistência da obrigação e
condenação do réu ao pagamento de indenização por danos
morais. Com a petição inicial vieram documentos. A
antecipação da tutela jurisdicional foi deferida (fls. 38/39).
Citado, o réu contestou e faz referência à eventual contratação
fraudulenta por terceiro, mediante uso de documento do autor,
e que adotou todas as providências e cautela cabíveis quando
da realização da contratação, de modo que não havia meio de
evitar a fraude e o resultado. Termina ao afirmar que
inexistente nexo de causalidade entre sua conduta e o
resultado, e não tem o dever de indenizar. Com a contestação
vieram documentos. É o relatório. Presentes os pressupostos
processuais e as condições da ação, entendida como direito
abstrato, o feito comporta julgamento de mérito, no estado em
que se encontra; desnecessária a colheita de outras provas,
pois a matéria é eminentemente de direito e os fatos
controversos vieram bem comprovados por documentos, de
maneira que recomendável o julgamento antecipado, em
conformidade com a regra do artigo 330, inciso I, do Código de
Processo Civil. Trata-se, aparentemente, de mais um caso de
contratação de financiamento com documentos falsos ou
documentos utilizados por falsário. A matéria é por demais
conhecida, estando pacificada a jurisprudência a respeito da
responsabilidade da instituição financeira, para casos como o
descrito nos autos, justamente por se aplicar à teoria do risco
do negócio. A atividade bancária ou similar impõe a exposição
a risco de sofrer golpes por estelionatários, como o caso
descrito nos autos, e isto, de forma alguma, afasta o dever de
indenizar e, assim sendo, a ação só pode ser julgada
17
procedente. Não socorre ao réu as teses sustentadas de
ausência de culpa ou de culpa exclusiva de terceiro. Nessa
direção: Responsabilidade Civil - Danos Morais -
Financiamento concedido a fraudadores com os documentos
da autora - Inclusão indevida de seu nome em cadastros de
inadimplentes - Falha na prestação de serviços, além da
responsabilidade objetiva pelos danos causados - Não se
justificando a redução ou a majoração do montante
indenizatório, pois alinhando aos critérios com um ente
adotados por esta Câmara no julgamento de casos
semelhantes - Recursos desprovidos Sentença mantida.
(Apelação n° 7.327.299-4, 21ª Câmara de Direito Privado do
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Rel. Des. Ademir
Benedito) O dano moral é indiscutível, haja vista que o autor
teve seu nome inscrito no rol de inadimplentes sem nunca ter
contratado com o Réu, de sorte que, não há como afastar a
responsabilidade da instituição financeira, diante do prejuízo
moral sofrido pelo autor, que segundo a jurisprudência do
Colendo Superior Tribunal de Justiça decorre do próprio ato
lesivo da anotação restritiva (Cf. REsps n°s 110.091/MG;
323.356/SC; 165.727/DF e REsp 873062, Ministro Fernando
Gonçalves, 05/03/2008). Os documentos que estão nos autos
evidenciam o descaso e a pouca importância do réu para com
o autor, sem providência alguma antes de enviar o nome dele
para órgão de proteção ao crédito, ou mesmo alguma outra
depois que ele dirigiu reclamação formal, comprovada nos
autos (fls. 14/15), e disso emerge, inexoravelmente, o dever de
indenizar por danos morais. Registro, também, que o direito à
tranquilidade e bom nome do autor foram fortemente
agredidos, e por período de tempo significativo, o que é
suficiente para ser compensado através de indenização. Vale
lembrar os ensinamentos de Rui Stocco: "Em sua obra Danni
Morali Contrattuali, Dalmartello enuncia os elementos
caracterizadores do dano moral, segundo sua visão, como a
privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor
precípuo na vida do homem e que são a paz, a tranqüilidade de
espírito, a liberdade individual, a integridade física, a honra e os
demais sagrados afetos...(Tratado de Responsabilidade Civil,
Ed. Revista dos Tribunais, 7ª Edição, pág. 1683). Também, a
18
definição de dano moral por Yussef Cahali: "a privação ou
diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida
do homem e que são a paz, a tranqüilidade de espírito, a
liberdade individual, a integridade física, a honra e os demais
sagrados afetos" (Dano Moral, Yussef Said Cahali, 2ª Edição,
Ed. Revista dos Tribunais, pág. 20). Para Savatier, dano moral
"é qualquer sofrimento humano que não é causado por uma
perda pecuniária, e abrange todo atentado à reputação da
vítima, à sua autoridade legitima, ao seu pudor, à sua
segurança e tranqüilidade, ao seu amor próprio estético, à
integridade de sua inteligência, a suas afeições, etc". (Traité de
La Responsabilité Civile, vol.II, n° 525, in Caio Mario da Silva
Pereira, Responsabilidade Civil, Editora Forense, RJ, 1989). E
ainda, a Jurisprudência: "DANO MORAL. Caracterização. Dor e
tristeza que se impõe a terceiro, sem repercussão patrimonial.
Bens espirituais do homem que lhe são preciosos e queridos,
tanto ou mais do que os bens materiais. Ementa oficial: O dano
moral pode ser considerado a dor, a tristeza, que se impõe a
terceiro, de forma que não tenha repercussão alguma no
patrimônio. Não pode, por isso, duvidar-se que o homem
possui bens espirituais ou morais, que lhe são preciosos e
queridos, tanto ou mais do que os bens materiais. Esses bens
são, sem dúvida, complemento daqueles; pois fornecem meios,
não somente para se obter duração, saúde e bem-estar físicos
ou do corpo, mas também para se alcançar a saúde e o bem-
estar morais ou do espírito, mediante alegrias, prazeres,
doçuras afetivas, distrações, confortos, leituras, espetáculos
naturais e artificiais, viagens encantos da vida". (2º TACivil 10ª
Câm.; Ap. n° 649.274-00/3-SP; Rel. Juiz Irineu Pedrotti; j .
26/6/2003; v.u.) RT814/259) Por fim, sabe-se que o valor da
reparação do dano moral é uma questão controvertida,
complexa, e, pela sua própria essência, abstrata. Em concreto,
isso deve atender o escopo de sua dupla função: reparar o
prejuízo, buscando minimizar a dor da vítima e, punir o ofensor,
para que não volte a reincidir. Por outro lato, é necessário
assegurar uma justa compensação, sem, entretanto, incorrer
em enriquecimento ilícito por parte de quem a recebe, e,
paralelamente, terminar em ruína daquele responsável pelo
seu pagamento. Logo, objetivando remunerar apenas o que
19
decorreu deste episódio, e, diante das peculiaridades sócio-
econômicas das partes, o adequado é fixar a indenização em
R$ 10.000,00 (dez mil reais), quantia que deve sofrer juros
legais e correção monetária conforme a prática do Tribunal a
partir da data desta sentença. Ante o exposto, julgo procedente
o pedido deduzido por ANTONIO RIBEIRO em face de BANCO
ABN AMRO REAL S/A, confirmo a antecipação da tutela
jurisdicional deferida à fls. 38/39, declaro inexistente a
obrigação mencionada na petição inicial e condeno o réu a
indenizar o autor, por danos morais, no valor de R$ 10.000,00
(dez mil reais), com juros legais e
correção monetária conforme a Tabela Prática do Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo a contar desta sentença. Julgo
extinto o processo, com apreciação do mérito, com fundamento
no art. 269, inciso I, do Código de Processo Civil. Verificada a
sucumbência, condeno o réu ao pagamento de custas e
despesas processuais, e honorários ao patrono da autora, que
arbitro em 10% do valor da condenação, nos termos do art. 20,
§ 3º, do mesmo Código. P.R.I.C. São Paulo, 27 de setembro de
2010. Cláudio Emanuel Graziotto Juiz de Direito.
Na realidade, tudo aquilo que molesta gravemente a alma humana,
ferindo-lhe gravemente os valores fundamentais inerentes à sua personalidade
ou reconhecidos pela sociedade em que está integrado, qualifica-se, em linha
de princípio, como dano moral; não há como enumerá-los exastivamente,
evidenciando-se na dor, na angústia , no sofrimento, na tristeza pela ausência
de um ente querido falecido; no desprestígio, na desconsideração social, no
descrédito à reputação, na humilhação pública, no devassamento da
privacidade; no desequilibrio da normalidade psíquica, nos traumatismos
emocionais, na depressão ou no desgaste psicológico, nas situações de
constrangimento moral.
Coloca-se, neste ponto, a questão pertinente à melhor expressão
nominal do instituto, questão, aliás, sem maior interesse prático, merecendo a
opção, desde logo, pela nomenclatura dano moral, denominação que se impôs,
20
pela força de sua expressividade, à tradição do nosso direito, ainda que não
incólume de crítica devido à polissemia da palavra moral.12
12 Ponte de Miranda: “ A expressão dano moral tem concorrido para graves confusões, bem como a expressão alemã schmerzengeld (dinheiro de dor). Às vezes, os escritores e juízes empregam a expressão dano moral em sentido amplíssimo(dano à normalidade da vida de relação, dano moral estrito, que é o dano à reputação, dano que não é qualquer dos anteriores mas também não ofende o patrimônio, como o de dor sofrida, o de destruição de bem sem qualquer valor patrimonial ou de valor patrimonial ìnfimo). Aí, dano moral seria dano não patrimonial. Outros têm como dano moral o dano à normalidade da vida de relação, o dano que faz baixar o moral da pessoa, e o dano à reputação. Finalmente, há o senso estrito de dano moral: o dano à reputação”. (tratado de direito..., cit., XXVI,§ 3. 107, p. 30-31).
21
II – A ORIGEM DO DANO MORAL
Para descobrir a essência do dano moral e a manifestação no direito
atual, exsurge a necessidade de apresentar, sucintamente, a sua origem e
evolução ao longo do tempo.
A preocupação com a moral e os bons costumes reporta à antiguidade.
A questão não é recente, posto que o reconhecimento e a conseqüente
reparação do dano de ordem moral já vinha sendo sugerido por inúmeros
séculos antes de Cristo.13
Nos primórdios da civilização humana prevalecia a justiça pelas próprias
mãos, sob a égide da Lei de Talião (olho por olho e dente por dente), o que
colocava sempre os mais fracos fisicamente em desvantagens, haja vista a
vulnerabilidade frente aos mais fortes.
Historicamente, antes mesmo do direito romano, as mais antigas
codificações já previam a noção de reparação de dano. Portanto, é de longa
data que a moral vem preocupando juristas, tanto que já constante das
primeiras legislações codificadas.
Conforme Pamplona Filho, citando Valentim14, “O Código de Hamurabi
foi o primeiro na história em que predominam idéias claras sobre direito e
econômia”. Para Pamplona15, que “[...] trata-se de um sistema codificado de
leis, surgido na Mesopotâmia, através do rei da Babilônia, Hamurabi, também
conhecido por Kamo-Rábi, que reviu, adaptou e ampliou diversas leis sumérias
e acadianas”. E conclui: 13 RAMANAUSKAS, Flavio Augusto. Dano moral no direito do trabalho. Disponível em: <http://www.advogado.adv.br/artigos/2001/edsonramanauskas/danomoraltraballho.htm>. 2000, p. 2. Acesso em: 18.Dez.2013. 14 VALENTIM, Veit. História universal. 6. ed., Tomo I. São Paulo: Livraria Martins Editora, 1964. p. 81. Apud PAMPLONA FILHO, Rodolfo. O dano moral na relação de emprego. 3. ed. São Paulo: LTr, 2002, p. 54. 15 PAMPLONA FILHO, 2002, p. 54.
22
Sendo assim, o Código de Hamurabi buscava,
indubitavelmente, a reparação das lesões ocorridas, materiais
ou morais, condenando o agente lesante a sofrer ofensas
idênticas (aplicação da 'Lei de Talião') ou pagar importâncias
em prata (moeda vigente à época).16
O Código de Ur Nammu o primitivo fundador da terceira dinastia de Ur,
do país primitivo dos sumerianos, em meados de 2140 e 2040 a.C., é
considerado uma das mais antigas codificações da civilização humana, no
referido Código, já era possível encontrar previsão para a reparação do Dano
Moral. O Código de Ur Nammu assemelha-se com a velha Lei das XII Tábuas,
e é anterior ao Código de Hamurabi. Nele, apesar dos textos incompletos, já se
verificava a preocupação do monarca da época em reprimir a violência e o
instinto de vingança, inato no ser humano. Neste período da história, o dano
moral referia-se puramente aos danos físicos sofridos por alguém, os quais
eram reparados através do pagamento de multa.17
Desta forma é possível constatar que o Código de Ur-Mammu,
apresentava um caráter pecuniário para a reparação do Dano, contrariando o
preceito vingativo do “dente por dente e olho por olho”, usual na maioria dos
povos antigos.
Outra codificação que tratava da reparabilidade do Dano era a LEI DAS
XII TABUAS, a qual teve fundamental importância para a origem do Direito
Romano. Apesar de o texto original ter sido perdido em um grande incêndio em
Roma, em 390 a.C., foi possível extrair dos fragmentos que foram
recuperados,a existência do instituto da reparação. Por exemplo, conforme
Valois (2005. p.) frisa alguns dos itens presentes na Tábua VIII (De delictis -
Dos delitos): 16 Ibidem, p. 56. 17 KRAMERSamuel Noah. The Sumerians. The U. of Chicago Press, Chicago,1963. Apud GALVÃO,Daniela Ramos. 2004. p. 4.
23
[...] VII- Cabe ação de dano contra aquele que faz pastar o seu
rebanho no campo de outrem. [...] X- Aquele que causa
incêndio num edifício, ou num moinho de trigo próximo de uma
casa, se o faz conscientemente, seja amarrado, flagelado e
morto pelo fogo; se o faz por negligência, será condenado a
reparar o dano; se for muito pobre, fará a indenização
parceladamente.
A Lei das XII Tábuas estabeleceu uma indenização com duplo caráter
para a reparação do dano, ou seja, para determinada situação a pena recairia
sobre a integridade física do autor, ou então, o autor sofreria perda pecuniária,
pagando determinada quantia em valor para a vítima do dano. Neste contexto,
caracteriza a existência da reparação do dano, desta forma o Código Romano
não fugiu da característica das codificações antigas, que aplicavam pena ao
causador do dano, afetando sua integridade física, mas também trouxe o
caráter pecuniário para a indenização.
Neste sentido:
O direito romano, com a Lei das XII Tábuas (Lex
Duodecimarum Tabularum - 452 a.C), a Lex Aquilia (286 a.C),
as Institutas, o Codex Justinianus e o Digesto (528–534 a.C)
também trataram do assunto. Salutar destacar que já entre os
romanos, o dano moral englobava tanto o Ser quanto o Ter.
SINTENIS e IHERING comungavam de idêntico
posicionamento quanto à existência do dano moral no direito
romano, e pontificavam: ‘o homem tanto pode ser lesado no
que é, como no que tem’.18
Na Grécia antiga já encontramos o instituto da reparabilidade do Dano
Moral, o qual apresentava um caráter pecuniário, para tanto. SILVA (2009.
p.71) cita o poema Odisséia, comentando uma decisão, proveniente de uma
reunião entre deuses que condenou Ares, deus da guerra, a pagar ao traído
18 PAULA, Alexandre Sturion de. Dano moral: um prisma de sua admissão e da aferição de seu quantum sob a ótica da conotação sancionatória. Disponível em:<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5026>. 2004. p. 3. Acesso em: 19.dez.2013.
24
Hefesto uma determinada quantia em dinheiro devido, ao adultério de sua
esposa Afrodite com o referido condenado.
Apesar de Homero relatar este fato em um poema, temos que valorar tal
narração, tendo em vista, que através deste fato podemos concluir que o povo
Grego já tinha a noção da reparação do dano moral.
O dano moral também se apresentava no Direito Romano, o que
conseqüentemente influenciaria o reconhecimento do dano extra-patrinomial no
ordenamento jurídico de todo o mundo, tendo em vista a importância do direito
romano para os legisladores. Conforme foi visto acima, a Lei das Doze Tábuas
foi uma codificação romana, vigente em meados de em 390 a.C, que
contemplava a reparação ao dano.
A Bíblia é o livro mais lido do mundo, e para muitos seus ensinamentos
são considerados leis, ou seja, cada ensinamento exposto vira uma lei moral,
ou seja, os cristãos transformam aqueles ensinamentos em costumes, que
devem respeitados e cumpridos. O dano moral também se apresenta na Bíblia
sagrada, no Antigo Testamento, no livro de Deuteronômio, 22:13-19, senão
vejamos:
Se um homem tomar uma mulher por esposa e, tendo
coabitado com ela, vier a desprezá-la, e lhe imputar falsamente
coisas escandalosas e contra ela divulgar má fama, dizendo:
“Tomei esta mulher e, quando me cheguei a ela, não achei nela
os sinais da virgindade”, então o pai e a mãe da jovem tomarão
os sinais da virgindade da moça, e os levarão aos anciãos da
cidade, à porta; e o pai da jovem dirá aos anciãos: “Eu dei
minha filha para esposa a este homem, e agora ele a despreza,
e eis que lhe atribui coisas escandalosas, dizendo: - Não achei
na tua filha os sinais da virgindade; porém eis aqui os sinais da
virgindade de minha filha”. E eles estenderão a roupa diante
dos anciãos da cidade. Então, os anciãos daquela cidade,
tomando o homem, o castigarão, e, multando-o em cem ciclos
25
de prata, os darão ao pai da moça, porquanto divulgou má
fama sobre sua virgem de Israel. Ela ficará sendo sua mulher,
e ele por todos os seus dias não poderá repudiá-la.
Pode-se dizer que a presença da reparação do Dano em um livro tão
respeitado no mundo inteiro, teve enorme influencia para o seu reconhecimento
e aplicação, pois conforme já exposto, a Bíblia apresenta “leis morais” para os
cristãos, que sem sombra de dúvidas as aplicariam, obrigando desta forma os
causadores de danos extra-patrimoniais a repará-los.
2.1 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DANO MORAL NO BRASIL
Reconheça-se que já de longa data a doutrina nacional orientava-se no
sentido de admitir a tese positiva da reparação do dano moral. A única
divergência que ainda se mantinha estava em que alguns autores, embora
aceitando a reparabilidade do dano moral como tese, negavam tivesse sido
acolhida então pelo nosso legislador como princípio geral, ressalvando certas
disposições excepcionais especificas; enquanto outros se desenvolviam mais
amplamente no sentido de que o principio da reparação do dano moral já
estava de fato integrado na nossa legislação anterior.
Assim, Orlando Gomes, reconhecendo que já então prevalecia a
doutrina da reparabilidade do dano moral, mas como o Código Civil de 1916
não inseria qualquer preceito alusivo a ele, constestava os que se
manifestavam no sentido de que, perante o nosso direito, o dano moral poderia
se reparado.19
Na realidade, a doutrina nacional, antes e depois do Código Civil
anterior, já vinha se definindo, de maneira expressiva, pela reparação do dano
moral no direito brasileiro. Assim, se é certo que o antigo código Civil se omitira
quanto a nserir uma regra geral de reparação do dano moral, não era menos
certo que se referia a divesas hipoteses em que o dano moral seria reparável 19 Ob. Cit. N.195,p 334.
26
(art. 1.537,1.538,1.543,1.547,1.548,1.549 e 1.550, todos do CC/1916); tais
hipóteses assim referidas estavam longe de constituir simples exceção à regra
de que só os danos patrimoniais deveriam ser ressarcidos, antes , pelo
contrário, visando apenas disciplinar a ”forma de liquidação do dano”,
prestavam-se para confirmar que estava ínsita na lei civil a ideia da
reparabilidade do dano moral.
Acrescente-se, ainda, o fundamento extraído do art. 76 daquele CC,
segundo o qual, “para propor, ou contestar uma ação, é necessario ter
interesse econômico, ou moral.”
O Dano Moral, em nosso ordenamento jurídico, teve seu
desenvolvimento ao longo de diversas leis, que paulatinamente, foram
reconhecendo a figura da reparação ao dano imaterial.
Como já vimos o dano moral, tem suas raízes nas mais remotas
civilizações, o que conseqüentemente, influenciou o nosso legislador para
implantar o instituto da reparabilidade ao dano imaterial em nosso ordenamento
jurídico.
Na época em que o Brasil era colônia de Portugal, eram as Ordenações
do Reino que apresentavam normas para regularizar as relações sociais, ou
seja, tais ordenações eram um conjunto de normas que regulavam o direito
comercial, civil, processual e etc, que deveria ser aplicado na coroa portuguesa
e em suas colônias.
Tais ordenações já previam a possibilidade da reparação ao dano extra-
patrimonial, como bem assevera Claudia Regina Bento de Freitas (2009):
Talvez uma das mais antigas referências à indenização por
dano moral, encontrada historicamente no direito brasileiro,
está no Título XXIII do Livro V das Ordenações do Reino
(1603), que previa a condenação do homem que dormisse com
27
uma mulher virgem e com ela não se casasse, devendo pagar
um determinado valor, a título de indenização, como um
“dote” para o casamento daquela mulher, a ser arbitrado pelo
julgador em função das posses do homem ou de seu pai.
As Ordenações do Reino sendo uma das mais antigas leis da história
legislativa brasileira, muito influenciou nas legislações posteriores. Neste
sentido temos o Código Penal brasileiro de 1890, que trouxe consigo a
possibilidade do ressarcimento ao prejuízo moral.
O Código Penal de 1890, o qual foi decretado por Manoel Deodoro da
Fonseca, em seu Titulo XI, trouxe previsão para os crimes que atentem contra
a honra e a boa fama dos indivíduos, podemos citar o artigo 316 do código ora
em questão, apresentando a seguinte redação:
Art. 316. Si a calumnia for commettida por meio de publicação
de pamphleto, impresso ou lithographado, distribuido por mais
de 15 pessoas, ou affixado em logar frequentado, contra
corporação que exerça autoridade publica, ou contra agente ou
depositario desta e em razão de seu officio: Penas – de prisão
cellular por seis mezes a dousannos e multa de 500$ a
1:00000$.
Vimos que o artigo supra, visa punir aquele individuo que deprecie a
honra de outrem, desta forma fica clara a preocupação do Código Penal de
1890 com o bem imaterial do individuo, ou seja, a honra, aplicando ao autor do
dano pena de prisão e multa.
Porém em relação à gênese do Dano Moral no ordenamento jurídico
brasileiro, Brandão (2009. p.), ver o Código Civil de 1916, como percussor da
origem do instituto da reparabilidade em nossa legislação pátria. O Código Civil
de 1916 apresentava a possibilidade da reparação ao dano moral, o que
conseqüentemente daria força para as demais leis brasileiras trazerem em seu
28
texto a reparação exclusiva ao dano moral, pois o dano moral naquele
momento estava ligado ao dano material.
Ao longo do tempo, as leis brasileiras passaram a ver o dano moral de
forma autônoma, separando-o da ofensa material, desta forma o dano imaterial
passou a ser previsto nas mais variadas legislações, tais como a Constituição
Federal de 1998, o Código de Defesa do Consumidor editado em 1990 o
Código Civil de 2002, entre outras, garantindo desta forma, a presença do
instituto da reparação ao dano mora.
O Código Civil Brasileiro de 1916, elaborado pelo ilustre jurista Clóvis
Beviláqua, compilou normas para regular as relações privadas entre os
indivíduos, e dentre este normas, o referido Código apresentou a possibilidade
para a reparação ao dano imaterial.
O artigo 1547 do código de 1916, trouxe em sua redação a idéia da
reparação ao dano extra-patrimonial, dispondo que: “A indenização por injúria
ou calúnia consistirá na reparação do dano que delas resulte ao ofendido.”. O
dano supracitado, orbitava a esfera psicológica, pois calúnia ou injuria, é algo
que abala de regra o bem estar do ofendido, em virtude de ter sua honra
atingida. Contudo não podemos nos ater apenas a idéia da reparação moral,
desta forma podemos fazer uma interpretação mais extensiva.
Se imaginarmos um indivíduo que exerça atividade comercial, e em
decorrência de injurias ou calunias, tenha sua fama abalada, e
conseqüentemente sofra perda de seus clientes, deixará de ganhar seu
sustento, assim tem-se um dano material.
Entretanto se fizermos uma interpretação restrita do artigo ora em
questão, teremos a possibilidade de uma reparação ao dano imaterial, que
neste caso o bem atingido seria a honra da vítima. O artigo 76 e seu parágrafo
29
único, do Código de 1916, trouxeram como dos pressupostos para a
legitimidade da ação, o interesse moral do postulante, senão vejamos:
Art. 76. Para propor, ou contestar uma ação, é necessário ter
legítimo interesse econômico, ou moral.
Parágrafo único. O interesse moral só autoriza a ação quando
toque diretamente ao autor, ou à sua família.
Fica possível entender que o artigo supra, permitia ao individuo, postular
em juízo uma ação movido apenas pelo o interesse moral, sendo possível
compreender que se o dano é imaterial, o diploma de 1916, permite sua
reparação, basta para tanto, o individuo sofrer dano afete a sua moral.
Em suma, pelo o exposto acima, compreende-se que indiscutivelmente
que o código de 1916, trouxe a possibilidade da reparação ao dano moral, o
que certamente direcionaria os legisladores brasileiros a ver este instituto de
forma diferente, e obviamente fortalecê-lo em outros diplomas legais.
Podemos destacar de acordo com o estudo de Brandão (2009, p.), que
posterior ao código de 1916, mais precisamente em 1945 com o surgimento da
lei de falências, o dano moral ganhava mais uma lei que previa sua aplicação,
no ano de 1962, mesmo sentido, o Código Brasileiro de Telecomunicações
também já apresentava o instituto da reparação, em seguida Código Eleitoral
também apresentou o Dano Moral. Já em 1967 a lei 5.250, trouxe em seus
artigos 51 e 52, punição para aqueles que afetassem a honra e à reputação de
outrem, através de informações de caráter falacioso.
Não resta duvidas que o dano moral não fosse demorar a ver visto como
um instituto autônomo, assim ganhando uma previsão legal clara, que não
restasse dúvidas, conseqüentemente encerrando qualquer discussão
doutrinaria, acerca da reparação do dano moral.
30
2.2 O DANO MORAL NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
A Constituição Federal do Brasil, promulgada em 1988, também
chamada de Constituição Cidadã, em virtude de sua proteção aos direitos
fundamentais dos indivíduos, trouxe em seu texto, previsão legal para garantir
os direitos individuais dos cidadãos brasileiros, desta forma o artigo 5º, incisos
V e X, trás a seguinte disposição acerca da reparabilidade da lesão a moral,
senão vejamos:
V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo,
além da indenização por dano material, moral ou à imagem;
[...]
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a
imagem das pessoas, assegurando o direito a indenização pelo
dano material ou moral decorrente da sua violação;
Para o professor Caio Mario da Silva Pereira (2001, p.58), a Constituição
brasileira de 1988, encerrou definitivamente as discussões acerca da
possibilidade da reparação do dano exclusivamente imaterial, atribuindo ao
magistrado brasileiro, a aplicação de uma indenização visando a reparação do
dano imaterial, senão vejamos:
Constituição Federal de 1988 veio pôr uma pá de cal na resistência à
reparação do dano moral. [...] E assim, a reparação do dano moral integra-se
definitivamente em nosso direito positivo. [...] Com as duas disposições
contidas na Constituição de 1988 o princípio da reparação do dano moral
encontrou o batismo que a inseriu em a canonicidade de nosso direito positivo.
Agora, pela palavra mais firme e mais alta da norma constitucional, tornou-se
princípio de natureza cogente o que estabelece a reparação por dano moral em
nosso direito.
A parti de seu reconhecimento constitucional, o Dano Moral passa a ser
valorizado pelos aplicadores do direito, pois a promulgação da carta magna de
1988 abriu caminhos para se pleitear indenização ao Dano que fosse de
31
caráter moral. Vimos que a reparação ao dano moral apareceu de forma
taxativa na Constituição Federal de 1988, tal previsão, traz a forma de
reparação da lesão ao dano unicamente extra patrimonial. Com o amparo
constitucional o Dano Moral enraizou-se de forma definitiva em nosso
ordenamento jurídico.
2.3 O DANO MORAL NO CÓDIGO CIVIL DE 2002
O novo Código Civil, que entrou em vigor no ano de 2002, assim como a
carta magna de 1988, trouxe em sua redação, a possibilidade da reparação ao
dano moral, ganhando ainda mais força em nosso ordenamento jurídico. A
grande novidade que trouxe o Código de 2002 foi à expressão “exclusivamente
moral”, pois sacramentou de forma bem clara, que se alguém sofresse um
dano exclusivamente moral, teria o direito de receber indenização.
O artigo 186 do referido código civil, deixa explicita a obrigação da
reparação ao dano imaterial, apresentando a seguinte redação:
Art. 186 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária,
negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a
outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Assim não restam dúvidas que quando o legislador de 2002 utilizou a
expressão “ainda que exclusivamente moral”, somente ratificou a existência da
reparação do dano moral, que já estava presente no artigo 5º da constituição
pátria, que trata sobre os direitos e garantias fundamentais.
Diante do exposto fica claro que o ordenamento jurídico brasileiro,
admite a reparação ao dano exclusivamente moral, e grande contribuição deu a
Constituição brasileira de 1988, pois, em virtude da previsão da reparação ao
dano moral, o instituto ganhou o devido reconhecimento. Assim as vítimas de
danos morais, ganharam mais elementos para fundamentar o pedido de
reparação.
32
No Código Civil de 2002, há previsão da responsabilização do dano
moral, quando admite no parágrafo único do seu artigo 952 que no caso do
esbulhador ou usurpador não poder restituir o objeto, deverá reembolsar o
lesado no valor da coisa, sendo este calculado com base no seu preço de
mercado ou no de afeição que tinha; como também quando ordena no seu
artigo 953, caput e parágrafo único que nas hipóteses de calúnia, difamação ou
injúria, se o ofendido não puder comprovar os danos de ordem patrimonial,
poderá o magistrado se valer de critério equitativo e arbitrar o montante
indenizatório. Porém, a inovação maior trazida pela lei n.º 10.406/2002, em
relação à ordenação até então vigente, fora a previsão expressa de
indenização do dano moral em seu artigo 186, conforme mencionado
anteriormente.
A regra é que se indenizarão os prejuízos que afetem diretamente o
lesado. Porém, em casos excepcionais, poderá haver a necessidade de se
reparar os danos indiretos, ou seja, aqueles resultantes de repercussão em um
segundo momento na esfera de interesses da vítima. O dano na modalidade
indireta se verifica quando se é atingido um bem extrapatrimonial do ofendido
(a vida, o nome, a imagem, a honra, etc.).
O Código Civil de 2002 estabelece alguns critérios de tarifação
indenizatória em determinadas hipóteses, como por exemplo, quando a lesão
provocada for decorrente de demanda de dívida inexigível (artigos 939 a 941
da lei nacional n.º 10.406/02) ou quando o dano for provocado por injúria,
difamação ou calúnia (artigo 953 do Novo Estatuto Civilista).
No entanto, a regra básica do Direito Civil para a mensuração do quanto
devido está expressa no artigo 944, caput e parágrafo único do Código Civil de
2002, que assim dispôem: "A indenização mede-se pela extensão do dano.
Parágrafo único: Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa
e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização". Essa, sem
dúvida, foi uma das grandes inovações trazidas pela lei nacional n.º 10.406/02,
33
pois até então, o magistrado deveria, no caso concreto, julgando procedente o
pedido de indenização, condenar o réu a reparar o mal de forma integral, não
podendo decidir por equidade, concedendo pela metade ou em outra
proporção, a ser apurada no caso em concreto, a quantia devida. O parágrafo,
ora em comento, somente poderá ser aplicado quando se estiver diante da
responsabilidade subjetiva, já que na modalidade objetiva não se questiona o
elemento subjetivo "culpa", somente tornando-se necessária a conduta e o
nexo de causalidade com o dano, sendo esse também o entendimento de Rui
Stoco (apud BRITTO, 2004) que ao tecer comentários sobre esse dispositivo,
assim o resumiu: "Também o parágrafo único desse artigo, segundo nos
parece, rompe com a teoria da restitutio in integrum ao facultar ao juiz reduzir,
equitativamente, a indenização se houver ''''excessiva desproporção entre a
gravidade da culpa e o dano''. Ao adotar e fazer retornar os critérios de graus
da culpa obrou mal, pois o dano material não pode sofrer influência dessa
gradação se comprovado que o agente agiu culposamente ou que há nexo de
causa e efeito entre a conduta e o resultado danoso, nos casos de
responsabilidade objetiva ou sem culpa. Aliás, como conciliar a contradição
entre indenizar por inteiro quando se tratar de responsabilidade objetiva e
impor indenização reduzida ou parcial porque o agente atuou com culpa leve,
se na primeira hipótese sequer se exige culpa?"20
Quando a expressão do dano é exclusivamente moral, a
discricionariedade do juiz, cresce ainda mais. A reparação do dano moral não
consiste em uma indenização propriamente dita (tendo em vista que se está
diante de bens que não possuem um valor econômico), mas sim em uma
compensação pelo mal sofrido, tentando-se diminuir o sofrimento provocado na
vítima pela conduta danosa perpetrada pelo agente, e servindo de desestímulo
a esse e todos aqueles que possam vir a cometer um ato ilícito. A
jurisprudência tem ficado, portanto, encarregada de estabelecer os parâmetros
para indenização, uma vez que é impossível ao legislador regular todas as
20http://uj.novaprolink.com.br/doutrina/6122/a_responsabilidade_civil_no_codigo_civil_de_2002_e_a_previsao_da_indenizacao_pelo_dano
34
hipóteses, o que não vem alcançando a devida finalidade no aspecto de
desistímulo, tendo em vista que o quantum indenizatório punitivo pedagógico
são arbitrados pelos magistrados com valores irrisórios.
Portanto, a importância do quantum indenizatório do dano moral, na
seara consumerista, deve ser compatível com o vulto dos interesses em
conflito, refletindo-se, de modo expressivo, no patrimônio do lesante, a fim de
que sinta, efetivamente, a resposta da ordem jurídica aos efeitos do resultado
lesivo produzido. Deve, pois, ser quantia economicamente significativa, em
razão das potencialidades do patrimônio do lesante.
35
III .O CARÁTER DO DANO MORAL
O ordenamento jurídico brasileiro reconhece a reparação ao Dano Moral,
chegando ao ponto de se obter o reconhecimento constitucional. A CF/88 em
seu artigo 5º prevê o direito de reparação, conforme dicção do inciso V, do
aludido artigo:
[...] é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo,
além da indenização por dano material, moral ou à imagem.
Em decorrência de seu caráter subjetivo, a indenização pode ser
comprometida, ou seja, estar nas mãos do magistrado arbitrar o valor da
indenização, pois não existe uma tarifação para se obter o valor indenizatório,
cabendo ao juiz arbitrar a indenização.
Neste contexto, chega-se à seguinte indagação: qual será a natureza
jurídica da indenização do Dano Moral? Podemos encontrar três correntes
doutrinarias, a primeira defende uma indenização com caráter meramente
compensatório, assim o autor do dano estaria obrigado a pagar uma mera
indenização; a segunda corrente defende um caráter punitivo da indenização,
ou seja, uma indenização revestida de um caráter punitivo, assim o valor da
indenização deveria ter um caráter punitivo, desta forma o autor do dano
deveria ser punido, para não mais praticar atos que ofendam a moral de outrem
e por fim a terceira corrente que defende uma indenização de duplo caráter,
uma indenização de natureza compensatório-punitiva, ou seja, a vítima do
Dano terá em sua indenização a soma de dois valores, um direcionado a
compensação do Dano, e outra direcionada a punir o ofensor, objetivando a
não reincidência na prática de danos morais.21
21 DANTAS, L. C. S.; A indústria do dano moral: Atividade lucrativa para as grandes empresas. Conteudo Juridico. Brasilia, 2010. Disponivel em: . Acesso em: 05 de fevereiro de 2014.
36
No entendimento de Caio Mario Pereira da Silva (2000, p 55), a qual
acredita no caráter punitivo da reparação como forma de condenação ao
ofensor, e um caráter compensatório que interessa a vitima, pois receberá uma
indenização que proporcionará um conforto ao sofrimento do ofendido, em
suas palavras:
Quando se cuida do dano moral, o fulcro do conceito
ressarcitório acha-se deslocado para a convergência de duas
forças: “caráter punitivo" para que o causador do dano, pelo
fato da condenação, se veja castigado pela ofensa que
praticou; e o “caráter compensatório" para a vítima, que
receberá uma soma que lhe proporcione prazeres como
contrapartida do mal sofrido.
Objetiva, assim, repreender a prática abusiva no caso concreto e
desestimular a prática reiterada de tais atos. A doutrina clássica rechaçava a
sua aplicação, ao longo do tempo, a visão do Direito foi se modificando até
que o dano moral veio a ser acolhido pelo ordenamento jurídico do Brasil.
Debates ainda surgem, no entanto, com relação aos critérios para sua
fixação: enquanto parte da doutrina agarra-se a um cunho estritamente
reparatório, vozes mais modernas apontam o caráter punitivo pedagógico do
instituto, especialmente no bojo das relações de consumo.
A Constituição Federal de 1988 representou um avanço bastante
significativo no que tange à tutela dos direitos da personalidade, conjunto
extrapatrimonial de direitos a integrar a totalidade dos bens do indivíduo. Trata-
se aqui da proteção do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, tão caro ao
nosso ordenamento.
Assim, a reparação pelos danos ocasionados a tais direitos vem prevista
em seu artigo 5°, X, sendo inegável sua admissão no Direito Brasileiro, bem
37
como a proteção aos direitos do consumidor efetivada pelo Código de Defesa
do Consumidor (CDC).
O dano moral - em especial os critérios para sua verificação e fixação –
ainda é tema que demanda estudos mais aprofundados.
O que se vê na jurisprudência é um zelo extremado no que tange ao
enriquecimento ilícito da parte ofendida, visando a inibir a chamada indústria do
dano moral, cuidado este que age, muitas vezes, em favor do poder econômico
da parte ofensora, ocasionando a que as grandes empresas em nada se
sintam estimuladas a melhorar seus serviços e que enxurrada de ações contra
elas assoberbe o poder judiciário.22
A indissociabilidade do caráter pedagógico da reparação dos danos
morais, vem sendo defendida para através dele empresas que detenham
grande potencial econômico possam ser desestimuladas a reiterar práticas
abusivas.
22 http://portal.estacio.br.
38
IV. DANO MORAL: instrumento eficaz para inibir práticas
ilícitas ao consumidor.
O instituto do dano moral, expressamente previsto na Constituição
Federal (CF), em seu Artigo 5º, V e X, deve ser visto como instrumento eficaz
no sentido de assegurar o direito à dignidade humana (CF, Art. 1º, III), pois
esta, “não tem preço”, e como fato que inibe práticas ilícitas ao consumidor.
(MELO, 2006).
Em se tratando de danos causados com culpa grave ou naquelas em
que se constatasse a existência de um padrão de negligência por parte do
fornecedor, a imposição de uma indenização com função verdadeiramente
punitiva, ou preventiva, ou pedagógica, romperia com essa perversa equação,
atuando como forma de tornar economicamente desinteressante a manutenção
de serviços defeituosos e, assim, os direitos humanos e a dignidade das
pessoas sofreriam menos agressões, na exata medida em que o peso da
condenação seria sentido no bolso do infrator como forte desestímulo e,
finalmente, a necessidade de demonstrar à sociedade que aquele
comportamento lesivo é condenável e que o Estado juiz não admite e nem
permite que sejam reiterados tais ilícitos, sem que o ofensor sofra a devida
reprimenda.
Ademais, a indenização por dano moral deverá ter como objetivo, além
do caráter pedagógico, a finalidade de combater as impunidades, já que servirá
para demonstrar ao infrator e à sociedade que aquele que desrespeitou as
regras básicas da convivência humana, poderá sofrer uma punição exemplar.
Desta forma, a teoria que melhor se coaduna com os anseios da
sociedade moderna, no tocante à reparação por danos morais, é aquela que
tem caráter tríplice, qual seja: punitivo, compensatório e exemplar.
39
Araken de Assis (2003, [S.I]) destaca a importância da indenização com
caráter de punição, para prevenir o cometimento de novos ilícitos. “A prudência
consistirá em punir moderadamente o ofensor, para que o ilícito não se torne a
repetir, a este título.”
Devem ser observadas as muitas práticas abusivas que estão a lesionar
o universo dos consumidores que mantém com as empresas uma relação de
consumo, atraídos pelas ofertas dos produtos e seviços que vem a
companhados de armadilhas que estão a retirar dos bolsos dos consumidores,
de forma indevida, pequenos valores que na receita das empresas formam um
montante adquirido indevidamente.
É relevante que, diante das práticas ilicitas as empresas suportem o
quantum indenizatório a título de dano moral punitivo como real forma de
coibição, para que os atos ilicitos adotados pelas empresas não lhes deem as
vantagens que fomentam todas as iniquidades que resultam apenas em uma
punição irrisória diante dos lucros adquiridos, sorrateirairamente de cada
indivíduo que forma o universo dos consumidores.
A indenização por danos morais tem o condão de reparar a dor, o
sofrimento ou a exposição indevida sofrida pela vítima em razão da situação
constrangedora, além de servir para desestimular o ofensor a praticar
novamente a conduta que deu origem ao dano.
A indenização por dano moral é arbitrável, para que a quantia satisfaça a
dor da vítima. Mas não se trata de um valor que se submete ao livre talante do
julgador, sem quaisquer critérios. Até porque deve o juiz na sua sentença,
conforme o Artigo 458 do CPC, fundamentar sua decisão.
As decisões proferidas que visam não gerar enriquecimento ilícito ao
indivíduo consumidor que sofreu o abuso não faz justiça, apenas “passa a mão
na cabeça” de quem erra, sabe que está no erro, e continuará no erro porque
40
sabe que não será devidamente reprimido, ou punido. Tais decisões deveriam
ter como foco, frear as práticas ilicítas, desfavorecendo quem vem angariando
fortunas indevidamente à mercê da punidade insignificante defendidas pela
maioria dos doutrinadores e dos nossos tribunais.
Deverá o juiz obedecer à lei, ainda que dela discorde, ainda que lhe
pareça injusta. Seria o império da desordem, se cada qual pudesse, a seu
arbítrio, suspender a execução votada pelos representantes da nação. Pois, se
todo poder emana do povo, e este concedeu aos membros da Assembléia a
tarefa de formular as regras jurídicas que o hão de governar; e não a juízes.
Desse modo, os juízes não têm como negar, quando o reflexo
patrimonial é evidente. Assim, é primordial proteger o consumidor nesse novo
século, em todas as relações humanas que passam por situações de consumo
e, tendo em vista a teoria do desestímulo, cada ofensor deve ser condenado a
pagar indenização que represente medida eficaz para que não volte a praticar
ato ilícito, observando-se, para tanto, sua capacidade econômica e a
conseqüente razoabilidade do valor que deve ser arbitrado, sem que lhe abale
demasiadamente, mas que torne necessária a imediata correção da prática de
posturas reprováveis como a que ensejou a condenação.
Em vários campos, os processos por dano moral têm ajudado as
pessoas a recuperar direitos. O Princípio da Proporcionalidade, utilizado para
se apurar dano moral, não liberta o juiz dos limites e possibilidades oferecidos
pelo ordenamento e por sua própria formação, tampouco da realidade apurada
e sopesado caso a caso. Em verdade, oferece uma alternativa de atuação
construtiva do judiciário para a produção do melhor resultado, ainda quando
não seja o único possível ou mesmo aquele que mais obviamente resultaria da
aplicação mais justa da lei. (LIMA, 2005).
Como o Código de Defesa do Consumidor, o brasileiro começou a ficar
mais exigente e passou a ter mais conhecimento sobre seus direitos, proteção
41
nessa relação de hipossuficiência, diante de uma sociedade mediática, que
impõe cada vez mais suas regras.
O CDC veio na hora certa para proteger os danos morais provenientes
destas relações que envolvem o ser humano, e os defendem de tais atos
arbitrários. A luta contra a devastação do ser humano, enquanto sujeito de
direitos, e a regra de seus privilégios de usufruir desses direitos é captada pelo
CDC, fazendo com que o consumidor brasileiro,consiga manter um certo
padrão de respeitabilidade humana, diante de todas as suas relações em
constante desenvolvimento, próprias do consumo desenfreado e frenético,
pois, nos dias de hoje, o homem vive em constante relação de consumo.
Vergonha, dor, humilhação, constrangimento e sofrimento, resultantes
de negligência, irresponsabilidade ou má-fé, não são mais resolvidos com
esquecimento, conversas duras ou ameaças. Vão parar nos tribunais.
Sabendo-se que dano é todo detrimento, todo prejuízo que afeta os bens
dos seres humanos, tudo que a pessoa tem e tudo que a pessoa é, é imperioso
notar que o dano moral depende da prova de nexo de causalidade entre o fato
gerador do dano e suas conseqüências nocivas à moral do ofendido, uma vez
ocorrendo tais provas, quem se sente humilhado, agora, também encontra
amparo na lei.
O Código de Defesa do Consumidor (Lei nº FD. 8.078, de 11-09-90),
estabeleceu no Art. 6º de tal dispositivo que: “São direitos básicos do
consumidor...VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e
morais”; VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vista à
prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais.
Está hoje assegurada a constitucionalidade da indenização do dano
moral à pessoa (Art. 5º, X, da CF). O mesmo dano, de que pode ser vítima
também a pessoa jurídica, é reparável através de ação de indenização.
42
A pessoa jurídica, embora não seja titular de honra subjetiva, que se
caracteriza pela dignidade, decoro e auto-estima, exclusiva do ser humano, é
detentora de honra objetiva, fazendo jus à indenização por dano moral sempre
que o seu bom nome, reputação ou imagem forem atingidos no meio comercial
por algum ato ilícito.
Após a Constituição de 1998, a noção do dano moral não mais de
restringe ao pretium doloris, abrangendo também qualquer ataque ao nome ou
imagem da pessoa, física ou jurídica, com vistas a resguardar a sua
credibilidade e respeitabilidade.
Assim, uma vez ocorrendo o dano moral, caberá indenização à vítima
ofendida, sendo que a indenização não deve ter a finalidade de vender a honra,
mas, sim, penalizar o ofensor, fazendo, ainda, com que a honra alheia não seja
violada de forma indevida, respeitando-a.
Com a reparação pecuniária, o ofensor sentirá em seu próprio
patrimônio um desfalque para indenizar aquele que fora agredido de forma
indevida em sua honra, outorgando-lhe assim uma satisfação em dinheiro, cujo
valor será fixado pelo juiz, levandose em conta as conseqüências do ato e a
potencialidade das partes, sempre se lembrando que a indenização não deve
ser irrisória, sob pena de essa não alcançar sua devida e verdadeira
finalidade.23
Neste sentido Jurisprudência a seguir:
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO II
JUIZADO ESPECIAL CÍVEL REGIONAL DO ALCANTÂRA
COMARCA DE SÃO GONÇALO Processo no :0016603-
23 Estação Científica OnlineJuiz de Fora, n. 05, Jan. 2008: Plínio Lacerda Martins- Mestre em Direito pela Universidade Gama Filho (UGF). Especialista em Direito pela Universidade Federa Fluminense (UFF).Promotor de Justiça. Professor convidado da Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ). Professor da Faculdade Estácio de Sá de Juiz de Fora e Ana Márcia Barquette Pires - Graduanda do 8º Período do Curso de Direito da Faculdade Estácio de Sá de Juiz de Fora/MG.
43
28.2013.8.19.0087 Autor: NATÁLIA SILVA KMIEC
Réu:MERIDIANO- FUNDO DE INVESTIMENTOS EM
DIREITOS CREDITÓRIOS MULTISEGMENTOS. PROJETO
DE SENTENÇA Dispensado o relatório na forma do art.38 da
Lei 9099/95. Trata-se de ação oriunda de cessão de crédito
sendo seu nome negativado em razão da cessão Rejeito a
preliminar de ilegitimidade passiva suscitada pela ré,pois a
autora lhe imputa condutas danosas devendo ser analisado
junto ao mérito sua responsabilidade. No mérito, a relação
entre as partes é de consumo, nos termos da Lei 8.078/90,
sendo, portanto, a responsabilidade da(s) parte(s) ré(s)
objetiva, respondendo pelo(s) dano(s) causado(s) (art. 6º, VI e
14 da Lei 8.078/90). Verossímil a alegação autoral, cabível,
portanto, a inversão do ônus da prova (art.6º, VIII da Lei
8.078/90). Enunciado nº 9.1.2 - A inversão do ônus da prova
nas relações de consumo é direito do consumidor (art. 6º,
caput, CDC), não sendo necessário que o Juiz advirta o
fornecedor de tal inversão, devendo este comparecer à
audiência, munido desde logo, de todas as provas com que
pretenda (aviso TJERJ nº 23/2008 de 02/07/08). A ré não
trouxe provas ou argumentos capazes de desconstituir a
presunção de veracidade da narrativa da parte autora.
Ressalta-se no presente caso que a cessão de crédito ocorreu
sem a ciência da parte autora. Dispõe o Artigo 290 do Código
Civil: ´A cessão do crédito não tem eficácia em relação ao
devedor, senão quando a este notificada; mas por notificado se
tem o devedor que, em escrito público ou particular, se
declarou ciente da cessão feita.´ Por certo, as ré não
comprovou a ciência prévia da autora. Assim, caracterizada a
falha na cessão de crédito sem a prévia notificação do devedor
. Ressalta-se ainda que a parte autora junta documentos
comprovando negativação de seu nome pela ré às fls. 17.
Desta forma, flagrante a falha da ré, sendo procedente o
pedido de exclusão do nome do autor dos cadastros restritivos
do crédito em razão dos fatos narrados na presente demanda,
bem como o pedido de declaração de inexistência do débito
que originou a restrição objeto desta demanda . Procedente o
pedido de indenização por danos morais, diante da falha na
prestação do serviço e na inclusão indevida do nome da parte
44
autora nos cadastros de proteção ao crédito. Cumpre ressaltar
que o dano moral em uma sociedade de consumo em massa,
deve ser considerado sob o aspecto ressarcitório e também
sob o preventivo-pedagógico, para que os fatos lesionadores
não ocorram novamente. Entendo com respaldo no conteúdo
probatório presente nos autos que o valor de R$10.000,00 (
dez mil reais)é adequado para reparar o autor pelos danos
morais sofridos . Isto posto JULGO PROCEDENTE O PEDIDO
para tornar definitiva a tutela deferida às fls.32, devendo à ré,
no prazo de 10 dias, cancelar o débito que originou a restrição
objetos desta demanda, sob pena de multa de
R$200,00(duzentos reais) por cada cobrança indevida, bem
como, para condenar, o réu, a paga a parte autora a quantia de
R$ 10.000,00( dez mil reais), a título de compensação por dano
moral, corrigidos monetariamente pelo índice do TJ/RJ a contar
desta data e com juros de 1% a.m. a contar da citação. Sem
custas e honorários. A parte ré fica ciente de que deverá
depositar a quantia acima fixada, referente a condenação em
pagar quantia certa, no prazo de 15 dias após o trânsito em
julgado, sob pena da multa de 10% prevista no artigo 475-J do
CPC, nos termos do Enunciado Jurídico 13.9.1 do Aviso
39/2007. Remeto a apreciação da MM. Juiz Togado, na forma
do art. 40 da Lei 9099/95. SÃO GONÇALO, 01 de novembro de
2013.
O douto Desembargador Sergio Cavalieri Filho, que concatena
acerca do Dano Moral em perspectiva a ordem constitucional, assim aduzindo:
Temos hoje o que pode ser chamado de direito subjetivo constitucional à
diginidade. Ao assim fazer, a Constituição deu ao dano moral uma nova feição
e maior dimensão, porque a dignidade humano nada mais é do que a base de
todos os valores morais, a essência de todos os direitos personalíssimos. O
direito à honra, a imagem, ao nome, à intimidade, a vida privacidade ou a
qualquer outro direito da personalidade – todos estão englobados no direito à
dignidade, verdadeiro fundamento e essência de cada preceito constitucional
relativo aos direitos da pessoa humana.
45
Dano moral, à luz da Constituição vigente, nada mais é do que a
violação do direito à dignidade. E foi justamente por considerar a inviolabilidade
da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem corolário do direito à
dignidade que a Constituição inseriu em seu art. 5º, V e X, a plena reparação
do dano moral.24
24 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 5.ed. São Paulo: Malheiros, 2004. 559 p
46
V - O Dano Moral e sua Reparação
5.1. Direito Comparado
O Código de Defesa do Consumidor brasileiro inscreve, no Art, 62, como
direito básico deste: "a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e
morais, individuais, coletivos e difusos".
Comparadamente, no Direito Lusitano (Portugal), poucas são as
referências sobre a instituição do dano moral, porém nas Ordenações
Manuelinas, Livro III, Título 71, parágrafo 31 e, Filipinas, Livro III, Título 86,
parágrafo 16, assim encontra-se sua existência:
... E se o vencedor quiser haver, não somente a verdadeira
estimação da cousa, mas segundo a affeição que ella havia,
em tal caso jurará elle sobre a dita afeição; e depois do dito
juramento pode o juiz taxá-lo, e segundo a dita taxação, assim
condenará o réu, e fará execução em seus bens, sem outra
citação da parte... (sic)
No Direito Canônico (disciplina eclesiástica da Itália), sob o prisma
do revogado Código de Direito Canônico de 1918, nas arras esponsalícios,
consagrava-se a reparação dos danos e prejuízos pela ruptura da promessa de
casamento, aduzido no Cân. 1.017, § 3º (“Cân.” é o mesmo que Art., na
legislação brasileira).
Recentemente, em 1983 com a adoção do Novo Código Canônico,
promulgado pelo então Papa, D. João Paulo II, caracterizada ficou a
indenização por danos morais, como se vê:
"Cân. 220 - a ninguém é lícito lesar ilegitimamente a boa fama
de que alguém goza, nem violar o direito de cada pessoa de
defender a própria intimidade."
47
O direito brasileiro, influenciado pela Igreja, e principalmente pela
legislação de Portugal, também adotou esse princípio, na Lei de 6 de outubro
de 1784 – posto que as Ordenações Filipinas e demais diplomas lusitanos
vigoraram no Brasil, a partir da determinação de lei imperial datada de 20 de
outubro de 1823, até que fosse promulgado o próprio Código Civil brasileiro. O
que veio a se concretizar com sua consolidação e aprovação pelo então
Imperador D. Pedro II, em 24 de dezembro de 1858.25
Nosso Código Civil vigente, artigo 186, prevê: “Aquele que, por ação ou
omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a
outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. E o artigo 927
complementa: “Aquele que, por ato ilícito (artigos 186 e 187), causar dano a
outrem, fica obrigado a repará-lo.
Na Declaração Universal dos Direitos dos Homens proclamada em
10 de dezembro de 1948 pela Organização das Nações Unidas, a questão da
honra vinha tutelada, como se vê: "Art. 12 - Ninguém será objeto de
intromissões arbitrárias em sua vida particular, em sua família, em seu
domicílio, ou em sua correspondência, nem padecerá, seja quem for, atentados
à sua honra e à sua reputação".
Com isso, é de se verificar que desde que o Direito passou a ser
codificado, a ressarcibilidade por danos morais sempre esteve presente, ainda
que indiretamente, e de outra forma não poderia ser, acabou por ser positivado
no direito brasileiro, ainda que tardiamente.
Cabe lembrar, que no Brasil, mesmo antes da Constituição Federal
de 1988, o Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei nº 4.117/62), a Lei de
Imprensa (Lei nº 5.250/67) e a Lei dos Direitos Autorais (Lei nº. 9.610/98), já
consagravam a reparabilidade por danos morais.
25 AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado de. Prefácio. In: FREITAS, Augusto Teixeira de. Consolidação das Leis Civis. Brasília: Senado Federal, 2003, v. 1, p. 17.
48
Talvez até por essa delonga, e pela conseqüente demanda
reprimida, é que hoje o instituto do dano moral enfrenta dois grandes
questionamentos: o da caracterização do dano moral; e o quantum
indenizatório.
Notório conhecimento de que, até mesmo dos indivíduos menos
estudados, nos Estados Unidos, a questão de buscar a Tutela Jurisdicional
quanto à pretensão de indenização por danos morais é amplamente pacificada.
Inclusive, não há limites para condenações, que chegam até a milhões de
dólares.
No Direito norte-americano, de essência principiológica, há
numerosos casos, para corroborar que não há necessidade de lei escrita para
se pesar o justo. Pois com o Bom Senso aplicado a princípios direcionadores,
já é suficiente para sacramentar a incidência de dano moral, não sendo
delimitado por qualquer limite legal. A exemplo, podem ser referidos os casos:
Leonard Ross x New York Times, que rendeu US$705 milhões em indenização;
Richard Sprague x Philadelphia Inquirer, que rendeu US$34 milhões; Houston
Money Management x Wall Street Journal, rendendo US$232 milhões de
indenização. E nunca, nenhuma instância, nem ninguém chegou a dizer que a
legislação americana seria uma violência contra a democracia.26
5.2. Reflexos da Notoriedade do Dano Moral
A Responsabilidade Civil vem ganhando destaque no meio social,
principalmente quando tocante ao dano moral.
Atribuiu-se este movimento a partir da Constituição de 1988, onde a
existência do dano ganhou referência expressa. A Constituição foi um grande
estímulo, inclusive na indenização por dano moral. O Código do Consumidor,
26 OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA. Página eletrônica de website. Disponível em: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos/plq050320031.htm>.
49
que entrou em vigor em 1991 também impulsionou a responsabilização do
ofensor.
Aponta-se a influência norte-americana na procura pela indenização
por danos morais. A partir da década de 90, muito por influência americana, o
brasileiro começou a dar mais importância para o tema, a procurar pelos seus
direitos. A expansão responsabilidade civil, principalmente na última década, é
decorrente do amadurecimento da sociedade brasileira no sentido de buscar o
cumprimento dos direitos que lhe assiste.
A postura verificada na busca pela reparação e garantia do
cumprimento dos deveres é fruto da facilitação do acesso ao Poder Judiciário,
com a criação dos Juizados Especiais e a especialização da legislação.
O novo Código Civil veio corroborar a possibilidade de as pessoas
naturais e jurídicas pleitearem indenização por danos físicos, patrimoniais e
materiais. A expansão do conceito de responsabilidade civil e a procura pelo
reparo do dano moral, tem um fundo cultural.
Realmente tem aumentado a conscientização de que um dano pode
e deve ser cobrado. Porém, ressalta-se a dificuldade da Justiça brasileira em
fixar os danos. Nos EUA há júri popular para decidir as indenizações, que
costumam ser bilionárias.
Houve o crescimento das ações contra o Poder Público e contra
todo aquele que causa dano a outrem, dentro do conceito de responsabilidade
civil. Um dos motivos a serem buscadas as pretensões, seria a demora da
Justiça na definição de casos, para tanto sendo o próprio Estado, acionado.
A ocorrência do dano moral, o pressuposto necessário é a violação
do direito à serenidade de espírito, ou seja, todo ser humano tem o direito de
não ser afetado em seu equilíbrio psicológico, não podendo sofrer qualquer ato
50
de terceiro que cause dissonância em sua paz interior, que faça vibrar o
“diapasão” da temperança do indivíduo. O que se compreende estarem ligados,
principalmente, todos os direitos da personalidade humana, como já
explanados no transcorrer deste trabalho. Assim, se tal ofensa a um direito da
personalidade ocorrer, deve o incitado ser indenizado.
A indissociabilidade do caráter pedagógico da reparação dos danos
morais se faz necessária para que, através dele empresas que detenham
grande potencial econômico possam ser desestimuladas a reiterar práticas
abusivas.
De origem americana, baseada no punitive damages, a Teoria do
Desestímulo, defendida no Brasil com maestria pelo mestre Carlos Alberto
Bittar, traduz exatamente esse anseio. Temos julgado emblemático no STJ,
que demonstra com clareza a função pedagógica da reparação por dano moral:
DANO MORAL. REPARAÇÃO. CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO
DO VALOR. CONDENAÇÃO ANTERIOR, EM QUANTIA
MENOR. Na fixação do valor da condenação por dano moral,
deve o julgador atender a certos critérios, tais como nível
cultural do causador do dano; condição sócio-econômica do
ofensor e do ofendido; intensidade do dolo ou grau da culpa (se
for o caso) do autor da ofensa; efeitos do dano no psiquismo do
ofendido e as repercussões do fato na comunidade em que
vive a vítima. Ademais, a reparação deve ter fim também
pedagógico, de modo a desestimular a prática de outros ilícitos
similares, sem que sirva, entretanto, a condenação de
contributo a enriquecimentos injustificáveis. Verificada
condenação anterior, de outro órgão de imprensa, em quantia
bem inferior, por fatos análogos, é lícito ao STJ conhecer do
recurso pela alínea “c” do permissivo constitucional e reduzir o
valor arbitrado a título de reparação. Recurso conhecido e, por
maioria, provido. (Superior Tribunal de Justiça, REsp
355.392/RJ, Rel. Ministra Nancy Andrihi, Rel. p/ Acórdão
Ministro Castro Filho, Terceira Turma.
51
Claro que a aplicação desse caráter pedagógico não pode levar a
empresa à ruína, mas deve ser capaz de coibir futuras condutas atentatórias, e
para isso o magistrado deve se valer de um juízo de ponderação, baseado no
princípio da proporcionalidade, no momento de fixação do quantum
indenizatório.
Neste sentido :
007. 0004847-77.2012.8.17.0001 Apelação (0313837-8)
Comarca : Recife Vara : 32ª Vara Cível
Apelante : BANCO SANTANDER (BRASIL) S/A
Apelado : Ricardo Marinho Cortez
Órgão Julgador : 2ª Câmara Cível
Relator : Des. Cândido José da Fonte Saraiva de Moraes
Relator Convocado : Des. Francisco Manoel Tenorio dos
Santos
Despacho : Decisão Terminativa Última Devolução :
29/08/2013 16:27 Local: Diretoria Cível D E C I S Ã O T E R M I
N A T I V A Trata-se de apelação interposta contra sentença
(fls. 91/95), julgando procedente a ação indenizatória manejada
pelo ora Apelado, condenando "o réu ao pagamento de
indenização por danos morais que arbitro em R$ 3.000,00 (três
mil reais) em virtude da cobrança de dívida inexistente. Tal
valor deverá ser corrigido monetariamente a partir da
publicação pelo índice ENCOGE. Juros de 1% (um por cento)
a.m. desde a citação". Indeferiu o pedido de repetição do
indébito em dobro por inexistir pagamento indevido, mas
ajuizamento de execução de dívida objeto de novação e, em
razão da sucumbência recíproca, determinou a compensação
das verbas honorárias advocatícias. Em suas razões recursais
(fls. 99/110), a Apelante sustenta que "a simples cobrança não
enseja dano moral". Aduz excessividade no valor de R$
3.000,00 contido na sentença, e pugna pelo provimento do
recurso para excluir ou reduzir montante indenizatório
estipulado, pleiteando, ainda, o deslocamento do termo inicial
dos juros e correção monetária para a data do arbitramento.
Preparo às fls. 132/134. Em contrarrazões (fls. 144/146), o
Apelado requer a manutenção da sentença. Brevemente
relatado, decido. Entendo que o ajuizamento indevido de
execução de dívida notoriamente inexigível contra consumidor
52
constitui ato ilícito e pode ocasionar danos extrapatrimoniais. É
desnecessária, portanto, a prova do prejuízo, que é presumido
e decorre da experiência comum. Neste sentido, os seguintes
julgados: (g.n.) ......... ADMINISTRATIVO - INDENIZAÇÃO
POR DANOS MORAIS - AJUIZAMENTO INDEVIDO DE AÇÃO
DE EXECUÇÃO FISCAL - DÉBITO PAGO
ANTECEDENTEMENTE.
1. A Súmula 83/STJ é aplicável também às hipóteses em que o
apelo se fulcra na alínea "a" do permissivo constitucional.
2. O ajuizamento indevido de execução fiscal de dívida já
quitada poderá justificar o pedido de reparação por danos
morais quando ficar provado ter havido abalo moral. 3. Agravo
regimental não provido. (AgRg no Ag 1163571/RJ, Rel. Ministra
ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em
20/04/2010, DJe 03/05/2010) .........APELAÇÃO CÍVEL.
RESPONSABILIDADE CIVIL. AJUIZAMENTO INDEVIDO DE
EXECUÇÃO JUDICIAL. DÍVIDA INEXISTENTE. DANO
MORAL. DEVER DE INDENIZAR. VALOR DA INDENIZAÇÃO.
SUCUMBÊNCIA. 1. O ajuizamento indevido de execução
judicial por dívida inexistente obriga o ofensor a compensar os
danos morais experimentados pela parte lesada. Precedentes.
2. Valor da indenização fixado de acordo com as circunstâncias
do caso e os precedentes. 3. Sucumbência revista, na forma do
artigo 20 do Código de Processo Civil. APELO PROVIDO.
DECISÃO MONOCRÁTICA. (Apelação Cível Nº 70051848265,
Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Iris
Helena Medeiros Nogueira, Julgado em 23/11/2012)
Edição nº 161/2013 Recife - PE, segunda-feira, 2 de setembro
de 2013 595 ......... Ultrapassado tal aspecto, resta analisar o
pedido de redução do quantum indenizatório. Afirmo, desde já,
que cabe ao juiz arbitrar uma quantia compatível com a
reprovabilidade da conduta ilícita, a gravidade do dano e a
repercussão da ofensa, devendo esse valor ser moderado e
eqüitativo, para não se converter o sofrimento em indevido
instrumento de captação de lucro. Nesse sentido, colaciono do
corpo do acórdão de lavra do eminente Des. Sérgio Cavalieri
Filho, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, o seguinte
trecho no sentido de que o dano moral não pode e não deve
ser causa de enriquecimento ilícito do ofendido:
53
......... (...) No que diz respeito ao valor da indenização, estou
convencido de que o arbitramento judicial continua sendo o
meio mais eficiente para fixar o dano moral e que nessa tarefa
o princípio da razoabilidade, inserto no art. 1.059 do CC para a
fixação do lucro cessante deve ser adotado pelo Juiz. Razoável
é aquilo que é sensato, comedido, moderado, que guarda uma
certa proporcionalidade. Importa dizer que o juiz, ao valorar o
dano moral, deve arbitrar uma quantia que, de acordo com seu
prudente arbítrio seja compatível com a reprovabilidade da
conduta ilícita e
a gravidade do dano por ela produzido. Deve-lhe também servir
de norte aquele outro princípio que veda que o dano se
transforme em fonte de lucro. Se a reparação deve ser a mais
ampla possível, a indenização não se destina a enriquecer a
vítima. Entre esses dois limites deve se situar o bom senso do
Julgador. Qualquer quantia a mais do que a necessária à
reparação do dano importará em enriquecimento sem causa,
ensejando novo dano. Na lição do insigne Caio Mário, dois
motivos ou duas causas estão conjugados na reparação por
dano moral: 1) punição ao infrator pelo fato de haver ofendido
um bem jurídico da vítima, posto que imaterial; 2) pôr nas mãos
do ofendido uma soma que não é o pretium doluris, porém o
meio de lhe oferecer oportunidade de conseguir uma satisfação
de qualquer espécie, seja de ordem intelectual ou moral, seja
mesmo de cunho material, o que pode ser obtido no fato de
saber que esta soma em dinheiro pode amenizar a amargura
da ofensa. Recomenda, todavia, o mestre fazendo referência
ao seu anteprojeto de obrigações, que esse arbitramento deve
ser moderado e eqüitativo para que não se converta o
sofrimento em móvel de captação de lucro (o lucro capiendo)
(responsabilidade Civil Forense, p. 315-316). Em suma, o bom
senso deve nortear o Juiz no exame do caso concreto
concedendo e guardando a indenização pelo dano moral de
acordo com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e
duração do sofrimento experimentado pela vítima, a
capacidade econômica do causador do dano, as condições
pessoais do ofendido, etc. (Ap. 5.658/97 - 2ª Cam. TJRJ - j.
14.10.1997 - Rel. Des. Sérgio Cavalieri Filho - DORJ 11.12.97
in RT 753/345). ......... Da mesma forma, a orientação do
54
Superior Tribunal de Justiça sobre o tema, verbis:
.........RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO. PESSOA
JURÍDICA. PROTESTO INDEVIDO DE TÍTULOS. DANOS
MORAIS. CABIMENTO. RESPONSABILIDADE CIVIL.
SÚMULA 7/STJ. VALOR EXCESSIVO. REDUÇÃO.
POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. I - O enunciado 227 da
Súmula desta Corte encerrou a controvérsia a fim de
reconhecer a possibilidade de a pessoa jurídica sofrer dano
moral. II - Rever os fundamentos do acórdão quanto à
responsabilidade dos réus e à existência de danos morais
encontra óbice nesta instância especial, à luz do enunciado 7
da Súmula deste Tribunal Superior. III - É entendimento
uníssono nesta Corte que "o valor do dano moral (...) deve ser
fixado com moderação, considerando a realidade de cada
caso, cabível a intervenção da Corte quando exagerado,
absurdo, causador de enriquecimento ilícito" (Resp nº
255.056/RJ, DJ de 30/10/2000). IV- No caso em apreço,
mostrando-se excessivo o valor fixado nas instâncias
ordinárias, a redução se faz necessária. Recurso especial
provido. (REsp 886.284/SP, Rel. Min. Castro Filho, 3ª Turma,
DJ 18/12/2006 p. 399) ......... Destarte, a quantia de R$3.000,00
afigura-se adequada e observa o princípio da razoabilidade,
contemplando o caráter compensatório e pedagógico, sem
importar em enriquecimento sem causa. Considerando que a
correção monetária se iniciou com a publicação da sentença,
resta-nos avaliar o pedido de deslocamento do termo a quo dos
juros de mora para a data do arbitramento. Tratando-se de
responsabilidade contratual, deve ser mantido o
reconhecimento de sua incidência a partir da citação, conforme
farta jurisprudência do STJ (vide AgRg no AREsp 300.337/ES,
Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ª T., DJe 20/06/2013; AgRg no AREsp
72.494/PR, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado
em 16/05/2013, DJe 28/05/2013, entre outros). Ante o exposto,
NEGO SEGUIMENTO AO RECURSO, nos termos do art. 557,
caput, do CPC. P.R.I. Recife, Des. Tenório dos Santos Relator
substituto DECISÃO INTERLOCUTÓTRIA- 2ªCC Emitida em
30/08/2013.
55
VI - A teoria do valor do desestímulo
6.1- Origem
A teoria do valor do desestímulo tem origem nos Estados Unidos da
América, onde visa a aplicação ademais da pretensão do autor, a aplicação de
uma punição para que o agressor não venha a cometer outra vez aquele
mesmo ato que outrora havia realizado, servindo de exemplo tal punição à toda
sociedade, o que se convencionou chamar de punitive damages ou exemplary
damages.
A responsabilidade civil é um sistema de caráter complexo em que
conflitam uma série de finalidades sociais, as que não se esgotam em uma
mera função compensatória, necessitando assim uma aplicação punitiva, como
também aquela que efetivamente é tão exacerbada que transformam
significativamente uma sociedade, pois podemos citar uma hipótese de um
dano causado por uma indústria que emprega grande parte de uma município,
onde por ventura tal indústria venha a ocasionar um dano a um cidadão e
venha a ser aplicada uma indenização de tão significativo valor que venha a
comprometer ademais de toda a indústria, a vida de centenas de pessoas.
Muitas críticas são elaboradas em desfavor de tal teoria, sem embargo
sabe-se que nos Estados Unidos o que ocorre é verdadeiramente a chamada
Indústria da Indenização, fato este que deve ser combatido com veemência em
nosso país, pois a teoria possui bons aspectos, mas como todas as coisas
boas, estas caso estejam nas mãos, ou seja, sejam julgadas por magistrados
sem uma boa e devida formação não tão somente jurídica, senão filosófica e
sociológica, podem dar ensejo a indenizações extremamente vultosas.
No nosso país um dos grandes defensores foi BITTAR, que assim dizia
acerca dos danos punitivos:
56
“Adotada a reparação pecuniária – que, aliás é a regra na
prática, diante dos antecedentes expostos -, vem-se
cristalizando orientação na jurisprudência nacional que, já de
longo tempo, domina o cenário indenizatório nos direitos norte-
americanos e inglês. É a da fixação de valor que serve como
desestímulo a novas agressões, coerente com o espírito dos
referidos punitive ou exemplary damages da jurisprudência
daqueles países.
Em consonância com essa diretriz, a indenização por danos
morais deve traduzir-se em montante que represente
advertência ao lesante e à sociedade de que não se aceita o
comportamento assumido, ou o evento lesivo advindo.
Consubstancia-se, portanto, em importância compatível com o
vulto dos interesses em conflito, refletindo-se de modo
expressivo, no patrimônio do lesante, a fim de que sinta,
efetivamente, a resposta da ordem jurídica aos efeitos do
resultado lesivo produzido. Deve, pois, ser quantia
economicamente significativa, em razão das potencialidades do
patrimônio do lesante.”27
6.2 Conceito
De maneira abrangente, podemos definir que a Teoria do Valor do
Desestímulo é um instituto, onde devido ao cometimento de uma conduta
lesiva, seja ela no âmbito do direito moral ou material, o lesante venha a ser
ademais de responsável pelo ressarcimento ou compensação de sua conduta,
terá de pagar ainda uma soma a ser arbitrada pelo magistrado a título de
punição, para que esta sua conduta não venha a ser tornar repetitiva, servindo
assim de exemplo a toda sociedade, para que a mesma também não venha a
dar ensejo a mesma ou similar conduta.
27 De acordo com o Carlos Alberto Bittar, um dos grandes defensores da Teoria do Valor do Desestímulo, deve ser aplicada a referida teoria, como foi dito por ele, visando uma punição ao lesante fazendo com que o mesmo não incida novamente em erro, ou seja, na conduta ensejadora de responsabilização, demonstrando à sociedade que aquele erro cometido não venha jamais a ser repetido, não tão somente pelo lesante como ademais de toda a sociedade que veio a ter ciência daquele fato ou ato.
57
Com a adequação dessa teoria, não se vislumbra a aplicação de
indenizações milionárias, como ocorre nos EUA, o que se objetiva com tal
teoria é transformar as indenizações mais justas, pois o que ocorre nos EUA é
o oposto da realidade brasileira, visto que enquanto naquele país as somas são
milionárias gerando grande desconforto para todos, aqui no Brasil as
indenizações são pequenas, quando não irrisórias, fazendo com que os
lesantes tornem-se mais estimulados a realizar diversas vezes a mesma
conduta, como é o exemplo das instituições bancárias e financeiras, que
através dos cadastros de inadimplentes, como o SPC e SERASA, atuam
comumente como Tribunais de Exceção, inserindo indevidamente o nome de
pessoas de boa índole, totalmente adimplentes com suas obrigações
contraídas, fazendo com que ocorra situações extremamente vexatórias que na
maioria das vezes são inolvidáveis por quem passou por tais constrangimentos.
6.3 - Norma geral do ressarcimento
Segundo LÔBO28, o fundamento principal da responsabilidade civil, reside
no neminem laedere, que significa não lesar ou ofender a pessoa ou o
patrimônio do outro, apontando a necessidade de que na realidade não se
deve deixar qualquer ofensa ou dano sem ressarcimento.
O que significa dizer que aquele que transgrediu a esfera do bem
jurídico alheio, tem a obrigação de indenizar.
No mesmo sentido, expressou MELLO29:
“ Todo ordenamento jurídico, com maior ou menor intensidade,
contém, como básico, o princípio da incolumidade das esferas
jurídicas individuais, consideradas estas, em sentido lato, o
conjunto de direitos e deveres mensuráveis, ou não,
28 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Direito das Obrigações. 1ª ed., Brasília: Ed. Brasília Jurídica, 1999. pág. 29 MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do Fato Jurídico (Plano da Existência). 9ª ed., São Paulo: Saraiva, 1999. pág. 195.
58
economicamente, relacionados a alguém. Em conseqüência
desse princípio, concretizado na fórmula latina do neminem
laedere, a ninguém é dado interferir, legitimamente, na esfera
jurídica alheia, sem o consentimento de seu titular ou
autorização de seu titular ou autorização do ordenamento
jurídico, donde haver um dever genérico, absoluto, no sentido
de que cabe a todos, de não causar danos aos outros”.
Existem determinadas condutas antijurídicas que além de transgredir a
esfera jurídica alheia, jamais se tornam olvidadas por aquele que sofreu a
ofensa, como é o caso do dano moral provindo de injúria, calúnia ou
difamação. Nesses casos, a indenização, por mais rigorosa que vem a ser
jamais conduz a situação do ofendido ao status quo ante, servindo apenas
como lenitivo pela situação amargada.
A teoria da responsabilidade civil, cujas raízes estão fixadas no princípio
fundamental do neminem laedere, encontra sua justificação na liberdade de
atuação do homem, enquanto ser social, e na sua racionalidade. Busca a
satisfação dos interesses do lesado, com vistas a restaurar o seu patrimônio ou
compensar o seu sofrimento, conforme o caso. Distingue-se entre a fundada na
lei e a que se origina nas relações contratuais, recebendo a chancela do Direito
Civil brasileiro sob o fundamento genérico da culpa (lato sensu), não obstante
as concessões feitas à responsabilidade objetiva. E, no seu processo
evolutivo, centra-se, hoje, cada vez mais acentuadamente, na reparação de
dano à vítima.
No Direito brasileiro, o princípio geral de reparabilidade da lesão moral
teve como origem a exegese literal do art. 186 do Código Civil, do qual não
decorre qualquer distinção a respeito do tipo de dano capaz de ensejar o dever
de indenizar (ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus).
Vale enfatizar, a propósito, que o próprio mecanismo protetor da norma
geral que impõe a reparação – neminem laedere – caracteriza-se por sua
natureza mista, pois, se, de um lado, compõe danos, de outro lado, impõe a
59
sanção do ato ilícito. E, via de conseqüência, ao comandar a punição do
infrator, orienta condutas.
Assim prudência e razoabilidade devem ser tomadas como palavras-de-
ordem em todo o processo de apuração do dano moral e da indenização
devida em função deste.
Assim, surge nesse diapasão a Teoria do Valor do Desestímulo, com o
escopo de aplicar uma punição ao lesante/ofensor, ademais de ressarcir os
danos oriundos do seu ato ilícito em face do lesado/ofendido.
Sem embargo, no seu sentido extremamente puro, a referida teoria nos
EUA vem acompanhada de uma numerosa série de indenizações exacerbadas,
chegando até a desmoralizar o próprio instituto da Responsabilidade Civil,
todavia no Direito pátrio isso jamais ocorreria, mesmo com o próprio advento
do § 2º do art. 944, contido no Projeto de Lei n.º 6.960/2002, visto que
atualmente no Novo Código Civil, o próprio art. 944 em seu parágrafo único
prevê a redução eqüitativa do valor indenizatório, caso haja efetiva
desproporção entre a gravidade da culpa e o dano.
Portanto, a teoria do valor do desestímulo, deve ser preconizada como
critério informador, revelando-se benéfica, sem embargo com a conjugação de
diversos critérios, como a própria eqüidade, buscando-se assim que a
indenização esteja informada de princípios que permitam o estabelecimento
perfeito de um equilíbrio que realize o encontro de um justo valor que venha a
servir de desestímulo ao lesante e de compensação ao lesado, onde não seja
ínfima para quem indeniza, como também não seja excessiva para quem
recebe, não levando o primeiro a ruína, nem enriquecendo ilicitamente o
segundo.
Nessa análise, em que deve preponderar, como orientação central, a
idéia de sancionamento do ofensor, que impõe seja o quantum reparatório
razoavelmente expressivo, como forma de obstar a reiteração de casos futuros,
60
deve, ainda, o julgador atentar, embora com menor rigor, para a possibilidade
do enriquecimento do ofendido, que somente se admite em situações
excepcionais, desde que, obviamente, não se identifiquem especulações
desonestas.
61
CONCLUSÃO
Portanto, somente considerados todos esses aspectos pelo Judiciário
estaria assegurada a quantificação da indenização devida por dano moral de
forma a punir de fato o ofensor e a compensar o ofendido, embora em
pecúnia, observado o poder por estar alcançado no terreno das satisfações
humanas, ao mesmo tempo em que se impede seja o quantum expressão de
puro arbítrio, alcançando-se, assim, o ideal de justiça.
Devem ser observadas as muitas práticas abusivas que estão a lesionar
o universo dos consumidores que mantém com as empresas uma relação de
consumo, atraídos pelas ofertas dos produtos e seviços que vem a
companhados de armadilhas que estão a retirar dos bolsos dos consumidores,
de forma indevida, pequenos valores que na receita das empresas formam um
montante adquirido indevidamente.
É relevante que, diante das práticas ilicitas as empresas suportem o
quantum indenizatório a título de dano moral punitivo como real forma de
coibição, para que os atos ilicitos adotados pelas empresas não lhes deem as
vantagens que fomentam todas as iniquidades que resultam apenas em uma
punição irrisória diante dos lucros adquiridos, sorrateirairamente de cada
indivíduo que forma o universo dos consumidores.
62
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