arboaventura.files.wordpress.com viewa cultura. alberto. r. boaventura (1) esqueceu-se que o homem...

24
1 A cultura Alberto R Boaventura (1) Esqueceu-se que o homem culto é aquele que tem a capacidade de cultivar seu próprio espírito e para tanto que está em constante observação de si mesmo – é refinado nesse sentido. Culto, cultivado é alguém que trata de si mesmo com arte, faz de seu próprio ser objeto de estudo, ou, que não é rude para tratar com sua existência, mas erudito (que etimologicamente significa: não rude) Os elementos que mais distinguiram o homem dos demais seres são: a grande capacidade de organização social, a expressão artística e intelectual, a capacidade de controle de seu meio, os mais diversos hábitos coletivos (formas de habitação, regime alimentar, crenças etc.). Entre muito outros elementos mais específicos, estes são integrantes do conceito que é entendido por cultura. Vários aspectos iniciais concorreram para a origem da aculturação dos povos: a fabricação de instrumentos, que por vezes determinava a posição de poder de um grupo em relação a outro; os regimes alimentares, as vestimentas e o modo de moradia ou abrigo eram determinados de acordo com a região de cada grupo etc. A partir da dispersão da espécie humana para as mais variadas regiões, os indivíduos tendiam à adaptação em relação ao meio em que se instalava. Tal fato resultou nas grandes variações culturais entre povos de diferentes regiões. O homem fundou sua hegemonia em relação aos outros animais através de sua capacidade de controle do meio em que vivia. Para efeito de estudo, vagas evidências do desenvolvimento das técnicas de controle do meio permaneceram ao longo dos tempos. Sítios arqueológicos de todas as partes do mundo contêm indícios das migrações sazonais e da exploração de uma vasta variedade de modos de subsistência, tanto através do cultivo de vegetais quanto de animais. Em Nice, na França, alguns resquícios de abrigos de madeira foram encontrados. Tais resquícios tem idade estipulada em 400.000 anos. Ainda alguns fragmentos de ferramentas encontrados nos sítios de

Upload: lytuyen

Post on 07-Feb-2018

216 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: arboaventura.files.wordpress.com viewA cultura. Alberto. R. Boaventura (1) Esqueceu-se que o homem culto é aquele que tem a capacidade de cultivar seu próprio espírito e para tanto

1

A culturaAlberto R Boaventura (1)

Esqueceu-se que o homem culto é aquele que tem a capacidade de cultivar seu próprio espírito e para tanto que está em constante observação de si mesmo – é refinado nesse sentido.

Culto, cultivado é alguém que trata de si mesmo com arte, faz de seu próprio ser objeto de estudo, ou, que não é rude para tratar com sua existência, mas erudito (que etimologicamente significa: não rude)

Os elementos que mais distinguiram o homem dos demais seres são: a grande capacidade de organização social, a expressão artística e intelectual, a capacidade de controle de seu meio, os mais diversos hábitos coletivos (formas de habitação, regime alimentar, crenças etc.). Entre muito outros elementos mais específicos, estes são integrantes do conceito que é entendido por cultura.

Vários aspectos iniciais concorreram para a origem da aculturação dos povos: a fabricação de instrumentos, que por vezes determinava a posição de poder de um grupo em relação a outro; os regimes alimentares, as vestimentas e o modo de moradia ou abrigo eram determinados de acordo com a região de cada grupo etc. A partir da dispersão da espécie humana para as mais variadas regiões, os indivíduos tendiam à adaptação em relação ao meio em que se instalava. Tal fato resultou nas grandes variações culturais entre povos de diferentes regiões.

O homem fundou sua hegemonia em relação aos outros animais através de sua capacidade de controle do meio em que vivia. Para efeito de estudo, vagas evidências do desenvolvimento das técnicas de controle do meio permaneceram ao longo dos tempos. Sítios arqueológicos de todas as partes do mundo contêm indícios das migrações sazonais e da exploração de uma vasta variedade de modos de subsistência, tanto através do cultivo de vegetais quanto de animais. Em Nice, na França, alguns resquícios de abrigos de madeira foram encontrados. Tais resquícios tem idade estipulada em 400.000 anos. Ainda alguns fragmentos de ferramentas encontrados nos sítios de Neandertal são indícios do tratamento de peles para uso de vestuário (200.000 a 30.000 anos antes de Cristo, na África setentrional, na Europa, na Ásia Central e no Oriente Médio)

Cultura (do latim colere, que significa cultivar) é um conceito de várias acepções, sendo a mais corrente a definição genérica formulada por Edward B. Tylor, segundo a qual cultura é “aquele todo complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros hábitos e aptidões adquiridos pelo homem como membro da sociedade”. Em Roma, na língua latina, seu antepassado etimológico tinha o sentido de “agricultura” (significado que a palavra mantém ainda hoje em determinados contextos), como empregado

Page 2: arboaventura.files.wordpress.com viewA cultura. Alberto. R. Boaventura (1) Esqueceu-se que o homem culto é aquele que tem a capacidade de cultivar seu próprio espírito e para tanto

2

por Varrão, por exemplo. Cultura é também associada, comumente, a altas formas de manifestação artística e/ou técnica da humanidade, como a música erudita europeia (o termo alemão “Kultur” – cultura – se aproxima mais desta definição). Definições de cultura foram realizadas por Ralph Linton, Leslie White, Clifford Geertz, Franz Boas, Malinowski e outros cientistas sociais. Em um estudo aprofundado, Alfred Kroeber e Clyde Kluckhohn encontraram pelo menos 167 definições diferentes para o termo cultura.

Por ter sido fortemente associada ao conceito de civilização no século XVIII, a cultura muitas vezes se confunde com noções de: desenvolvimento, educação, bons costumes, etiqueta e comportamentos de elite. Essa confusão entre cultura e civilização foi comum, sobretudo, na França e na Inglaterra dos séculos XVIII e XIX, onde cultura se referia a um ideal de elite. Ela possibilitou o surgimento da dicotomia (e, eventualmente, hierarquização) entre “cultura erudita” e “cultura popular”, melhor representada nos textos de Matthew Arnold, ainda fortemente presente no imaginário das sociedades ocidentais.

A CULTURA é fundamental para a compreensão de diversos valores morais e éticos que guiam nosso comportamento social.  Entender como estes valores se internalizaram em nós e como eles conduzem nossas emoções e a avaliação do outro, é um grande desafio.

CULTURA - É o conjunto de atividades e modos de agir, costumes e instruções de um povo. É o meio pelo qual o homem se adapta às condições de existência transformando a realidade.

Cultura é um processo em permanente evolução, diverso e rico. É o desenvolvimento de um grupo social, uma nação, uma comunidade; fruto do esforço coletivo pelo aprimoramento de valores espirituais e materiais.  É o conjunto de fenômenos materiais e ideológicos que caracterizam um grupo étnico ou uma nação (língua, costumes, rituais, culinária, vestuário, religião, etc.), estando em permanente processo de mudança. O texto trata do conhecimento que rege a conduta da vida cotidiana; para esclarecer esse conhecimento, o método usado é a análise fenomenológica. Essa realidade social da vida cotidiana é dividida entre um indivíduo e outro, num sistema de relação face a face (este é ‘’o’’ exemplo de interação social). Essa situação é a única que consegue reproduzir os sintomas e as situações que ocorrem no momento da interação entre os indivíduos. Como o outro é plenamente real, não se pode esconder as interpretações, os gestos e as “caretas”, principalmente no momento da conversa. Para essa interação é preciso de um sistema de sinais, na vida cotidiana o sistema de sinal mais importante é a linguagem, e sua compreensão é essencial para entender a realidade. A linguagem simbólica é capaz de transcender a realidade, por isso é um de seus componentes essenciais. O universo simbólico é um nível de legitimação, esses processos simbólicos mostram realidades diferentes das que compõe a experiência da vida cotidiana, eles são produtos sociais e tem uma história.       Tudo que é feito pelo homem está sujeito a tornar-se hábito, este fornece a direção e a especialização da atividade humana. Esse processo de formação do hábito precede a institucionalização; esta ocorre sempre que existe uma tipificação recíproca de ações habituais entre tipos de atores (uma tipificação é uma instituição). A instituição, sendo um fato social, é coercitiva, coletiva e

Page 3: arboaventura.files.wordpress.com viewA cultura. Alberto. R. Boaventura (1) Esqueceu-se que o homem culto é aquele que tem a capacidade de cultivar seu próprio espírito e para tanto

3

exterior ao homem. Então quando se desvia da ordem da instituição, afasta-se da realidade.

CULTURA POPULARARANTES, Antônio Augusto. O que é Cultura Popular. 14 ª Edição. São Paulo. Editora Brasiliense, 1998.

Cultura Popular recobre um complexo de padrões de comportamento e crenças de um povo. No entanto, para Antônio Augusto Arantes cultura popular é um aglomerado de fragmentos que apresenta significados bastante heterogêneos e variáveis.

Muito se tem falado e escrito sobre cultura popular, mas ainda não é suficiente porque a pesar de todo estudo ainda se deturpa muito o sentido dessa palavra, já é hora de pararmos e refletirmos sobre a profundidade que essa expressão abrange.

Sabemos perfeitamente que Aurélio Buarque de Holanda, define com autoridade, em seu bem conceituado dicionário de língua portuguesa, cultura em seu uso corrente como significando “saber, estudo, elegância, esmero, conhecimento, informação”, ela evoca os domínios da filosofia, das ciências e das belas artes.

“Porém quando acrescentamos o termo “popular” entramos num paradoxo entre “cultura” e” povo”, como se tudo que vem do “povo” fosse desprovido de saber. Basta olharmos em nossa volta para percebermos que são bastante diversificados os valores e conceitos vigentes na nossa complexa sociedade.

A massa homogênea, que é o povo brasileiro, é formada de várias raças e origens diferentes e cada um com sua cultura, costumes e religião. Embora nos eduque o tempo todo a termos um modo de vida civilizado – culto, não podemos prescindir dos objetos e práticas que qualificamos como “populares”, pois o nosso cotidiano é mesclado com esses costumes: samba, seresta, bumba-meu-boi, reisado, carnaval.

A escola, a igreja e a família são instituições formadoras do ser e juntamente com os meios de comunicação de massa têm a função de produzir e divulgar ideias como se fossem ou devessem ser ou se tornar os modos ideais de agir e de pensar de todos.

Repudiamos tudo aquilo que está relacionado com o “povo” qualificando como ingênuo, de mau gosto, indigesto, errado, pitoresco, ineficaz, mas quando traçamos nossas teorias temos a tendência de inserir essas coisas contraditórias em relação à cultura popular em nossos planos individuais. Por que essa ambivalência em relação ao que é “diferente”, e especialmente, ao que é identificado como “povo”?

Pela mesma razão por que reagimos no aspecto cultural do etnocentrismo, o qual tende a julgar o “outro” em relação às normas e comportamentos do grupo social

Page 4: arboaventura.files.wordpress.com viewA cultura. Alberto. R. Boaventura (1) Esqueceu-se que o homem culto é aquele que tem a capacidade de cultivar seu próprio espírito e para tanto

4

a que se pertence. Corresponde a uma percepção da vida e da sociedade do observador onde o seu próprio grupo é tomado como centro de tudo e todos os outros são pensados e sentidos através de valores, modelos e definições do que é a existência.

Esse termo “popular” representa um obstáculo pelo qual as outras sociedades são observadas em função da nossa, em geral, portador de preconceitos que são manifestações de uma visão unilateral e deturpada da realidade social.

Assim, pressupomos que a “cultura popular” surge como outra cultura contrária ao saber culto dominante. Podemos observar dois modelos de relação a partir da identidade entre grupos de “membros” com culturas diferentes: em uma a identidade é vista exclusivamente pelo sistema de normas de sua própria cultura, onde o “diferente” é desvalorizado como incivilizado, incultos ou errado e a outra onde a cultura “diferente” atua como grupo de comparação crítica com relação às deficiências práticas do grupo central.

Atentamos especialmente para confronto das diferenças entre a “elite/culta” e “povo/popular” sobre a perspectiva antropológica. O grupo da “elite” julgando-se detentor do saber sempre se exclui do grupo destacado como “povo”. Mas quem é a “elite” e quem é o “povo” do qual se refere o autor, deste livro? A forma sutil como agimos frente a outros grupos, tentando rotulá-los, discriminá-los, demonstramos diariamente exemplos etnocêntricos.

Etnograficamente o grupo do “eu”, em contraposição ao grupo do “outro” – diferente – é aquele que é visto como o primitivo, o não civilizado e que se opõe ao desenvolvimento da civilização; por sua vez, o “povo”, em contraposição à elite – saber – é a massa homogeneizada composta por várias camadas, o não saber. É necessário que haja um ponto de equilíbrio para unir esses dois extremos. Precisamos aprender com as diferenças do “outro”, assim, a antropologia tem como objetivo pensar sobre as diferenças culturais entre os povos, não a radicalizando e sim, relativizando-a.

Sobre essa diferença gira a problemática desta obra: Como unir os opostos, “elite’ e o “povo”“? Acredito que este problema só poderá ser solucionado se pensarmos a cultura no plural e no presente e que se parta de uma concepção não normativa e dinâmica. Devemos transformar a diferença em uma relação capaz enriquecer a cultura do “eu” com aquilo que o “outro” tem de diferente, melhor dizendo, é conhecer a diferença, experimentando a própria “cultura popular” como diferente, em vez de ignorá-la devemos absorvê-la ou aprender com ela. Pois assim podemos manter uma relação harmoniosa de contribuição mútua com começo, meio e fim.

Concluímos, então, que no diz respeita à cultura popular a antropologia surge para intermediar a questão da “diferença” através do processo harmonioso de reciprocidade como forma de entendimento, de diálogo entre os povos, assim como a cultura popular busca dialogar com a cultura erudita. O ponto de partida usual do trabalho do antropólogo é a observação direta de indivíduos se comportando em face de outros indivíduos e em relação à natureza.

Page 5: arboaventura.files.wordpress.com viewA cultura. Alberto. R. Boaventura (1) Esqueceu-se que o homem culto é aquele que tem a capacidade de cultivar seu próprio espírito e para tanto

5

Acredito na união dos opostos, porque aprendemos com as diferenças, pois se somos todos iguais e se temos o mesmo pensamento, que conhecimento o “outro” pode nos acrescentar?.

O fato de sermos diferentes é que o ponto de partida para a civilização e o progresso do indivíduo, só podemos deixar de ser um povo heterogêneo para sermos homogêneos.

A Filosofia espera contribuir para uma reflexão mais profunda sobre as questões relativas ao tema e a partir desta, contribuir para a superação de valores de herança colonial que entravam o desenvolvimento da sociedade.

AFRICANIDADES é um tema que está em pauta para reflexão, em todas as esferas da sociedade: educação, política, religião, economia (nas leis sancionadas no governo Lula, conquista dos movimentos negros nas políticas de Ação Afirmativa, no processo de mudança social onde cada vez mais se torna visível a questão da discriminação em contradição com a visibilidade das potencialidades étnico-raciais e sociais em todos os níveis (idade, cor, religião, gênero, manifestação cultural, classe social, etc.).

Cada vez mais se exige o conhecimento da cultura africana sem o véu do folclore que minimiza sua  importância junto ás matrizes indígenas e principalmente europeias.

O Brasil é considerado o mais africano entre os países americanos, pois foi o principal receptor de escravos originários de África e, atualmente, 45 por cento dos seus 180 milhões de habitantes são negros ou mulatos.  

"O Brasil não só é um país da diáspora africana, mas também um país africano, a segunda maior nação negra do mundo"

Se entendermos que cada grupo étnico possui sua forma de se expressar no mundo, ampliamos nossa compreensão de que há uma diversidade cultural que deve ser respeitada, senão compreendida.  E o respeito compreende a liberdade de expressão.

A história ocidental nos deixou de herança o olhar etnocêntrico. Este olhar foi um dos fatores desencadeadores do fenômeno social da atitude preconceituosa e da discriminação.

No séc. XXI, uma parcela da população em um processo que é natural de mudança de mentalidade, se debruça sobre estes aspectos herdados com o objetivo de superá-los.  Nesta parcela estão artistas, livres pensadores, educadores, governo e grupos sociais, editores de jornais, livros e revistas, etc.  Em todos os setores e através de todos os meios de comunicação, o tema diversidade cultural está sendo tratado de forma profunda, pois entendem que só assim, se poderá avançar.

“Em geral, o senso comum emprega as expressões ‘ter cultura’ e ‘não ter cultura’ como sinônimos de culto e inculto, o que gera uma série de distorções e preconceitos”.No sentido Antropológico, não falamos em Cultura, no singular, mas em culturas, no plural, pois a lei, os valores, as crenças, as práticas e instituições

Page 6: arboaventura.files.wordpress.com viewA cultura. Alberto. R. Boaventura (1) Esqueceu-se que o homem culto é aquele que tem a capacidade de cultivar seu próprio espírito e para tanto

6

variam de formação social para formação social. Além disso, uma mesma sociedade, por ser temporal e histórica, passa por transformações culturais amplas e, sob esse aspecto, Antropologia e História se completam, ainda que os ritmos temporais das várias sociedades não sejam os mesmos, algumas mudando mais lentamente e outras mais rapidamente.

Se reunirmos o sentido amplo e o sentido restrito, compreenderemos que a Cultura é a maneira pela qual os humanos se humanizam por meio de práticas que criam a existência social, econômica, política, religiosa, intelectual e artística.

A religião, a culinária, o vestuário, o mobiliário, as formas de habitação, os hábitos à mesa, as cerimônias, o modo de relacionar-se com os mais velhos e os mais jovens, com os animais e com a terra, os utensílios, as técnicas, as instituições sociais (como a família) e políticas (como o Estado), os costumes diante da morte, a guerra, o trabalho, as ciências, a Filosofia, as artes, os jogos, as festas, os tribunais, as relações amorosas, as diferenças sexuais e étnicas, tudo isso constitui a Cultura como invenção da relação com o Outro.O Outro, antes de tudo, é a Natureza. A naturalidade é o Outro da humanidade. A seguir, os deuses, maiores do que os humanos, superiores e poderosos. Depois, os outros humanos, os diferentes de nós mesmos: os estrangeiros, os antepassados e os descendentes, os inimigos e os amigos, os homens para as mulheres, as mulheres para os homens, os mais velhos para os jovens, os mais jovens para os velhos, etc.

Em sociedades como a nossa, divididas em classes sociais, o Outro é também a outra classe social, diferente da nossa, de modo que a divisão social coloca o Outro no interior da mesma sociedade e definem relações de conflito, exploração, opressão, luta. Entre os inúmeros resultados da existência da alteridade (o ser, outro) no interior da mesma sociedade, encontramos a divisão entre cultura de elite e cultura popular, cultura erudita e cultura de massa.

DEFINIÇÕES A PARTIR DO ENTENDIMENTO DO QUE É CULTURA

DISCRIMINAÇÃO - Discriminar significa "fazer uma distinção". O significado mais comum tem a ver com a discriminação sociológica: a discriminação social, racial, religiosa, sexual, étnica ou especista.

DIVERSIDADE - Movimento que vai à contracorrente da monocultura ou cultura única.

‘A diversidade é percebida, com frequência, como uma disparidade, uma variação, uma pluralidade, quer dizer, o contrário da uniformidade e da homogeneidade. Em seu sentido primeiro e literal, a diversidade cultural referia-se apenas e simplesmente, em consequência, à multiplicidade de culturas ou de identidades culturais. Mas,atualmente, esta visão está ultrapassada, pois, para inúmeros especialistas, a «diversidade» não se define tanto por oposição à «homogeneidade» quanto pela oposição à «disparidade». Ela é sinônima de diálogo e de valores compartilhados. ’ Alain Kiyindou 

“A sociedade brasileira reflete, por sua própria formação histórica, o pluralismo. Somos nacionalmente, hoje, uma síntese intercultural, não apenas um mosaico

Page 7: arboaventura.files.wordpress.com viewA cultura. Alberto. R. Boaventura (1) Esqueceu-se que o homem culto é aquele que tem a capacidade de cultivar seu próprio espírito e para tanto

7

de culturas. Nossa singularidade consiste em aceitar – um pouco mais do que outros - a diversidade e transformá-la em algo mais universal. Este é o verdadeiro perfil brasileiro… Sabemos, portanto, por experiência própria, que o diálogo entre culturas supera – no final – o relativismo cultural crasso e enriquece valores universais”.

Principais conceitos

Diversos sentidos da palavra variam consoante a aplicação em determinado ramo do conhecimento humano.

Agricultura  – acepção original do termo cultura, que se refere ao cultivo da terra para produção de espécies vegetais úteis ao consumo do homem.

Ciências sociais  - Do ponto de vista das ciências sociais (isto é, da sociologia e da antropologia), sobretudo conforme a formulação de Tylor, a cultura é um conjunto de ideias, comportamentos, símbolos e práticas sociais artificiais (isto é, não naturais ou biológicos) aprendidos de geração em geração por meio da vida em sociedade. Essa definição geral pode sofrer mudanças de acordo com a perspectiva teórica do sociólogo ou antropólogo em questão. De acordo com Ralph Linton, “como termo geral, cultura significa a herança social e total da Humanidade; como termo específico, uma cultura significa determinada variante da herança social. Assim, cultura, como um todo, compõe-se de grande número de culturas, cada uma das quais é característica de certo grupo de indivíduos”  Enquanto a definição de Tylor é muito genérica, podendo causar confusão quando se propõe uma reflexão mais aprofundada do que é cultura, outras definições são mais restritivas. Os autores debatem se o termo se refere mais corretamente a ideias (Boas, Malinowski, Linton), comportamentos (Kroeber) ou simbolização de comportamento, incluindo a cultura material (L. White). Vale lembrar que, em algumas concepções de cultura, o comportamento é apenas biológico, sendo a cultura a forma como esse conjunto de fatores biológicos se apresentam nas sociedades humanas. Em outras concepções (como onde cultura é entendida como conjunto de ideias), cultura exclui os registros materiais dos homens como tais da classificação (ex. um sofá ou uma mesa não seriam “cultura”) – posição fortemente criticada por White.

Filosofia  - cultura é o conjunto de manifestações humanas que contrastam com a natureza ou comportamento natural. Por seu turno, em biologia uma cultura é normalmente uma criação especial de organismos (em geral microscópicos) para fins determinados (por exemplo: estudo de modos de vida bacterianos, estudos microecológicos, etc.). No dia-a-dia das sociedades civilizadas (especialmente a sociedade ocidental) e no vulgo costuma ser associada à aquisição de conhecimentos e práticas de vida reconhecidas como melhores, superiores, ou seja, erudição; este sentido normalmente se associa ao que é também descrito como "alta cultura", e é empregado apenas no singular (não existem culturas, apenas uma cultura ideal, à qual os homens indistintamente devem se enquadrar).

Page 8: arboaventura.files.wordpress.com viewA cultura. Alberto. R. Boaventura (1) Esqueceu-se que o homem culto é aquele que tem a capacidade de cultivar seu próprio espírito e para tanto

8

Dentro do contexto da filosofia, a cultura é um conjunto de respostas para melhor satisfazer as necessidades e os desejos humanos. Cultura é informação, isto é, um conjunto de conhecimentos teóricos e práticos que se aprende e transmite aos contemporâneos e aos vindouros. A cultura é o resultado dos modos como os diversos grupos humanos foram resolvendo os seus problemas ao longo da história. Cultura é criação. O homem não só recebe a cultura dos seus antepassados como também cria elementos que a renovam. A cultura é um fator de humanização. O homem só se torna homem porque vive no seio de um grupo cultural. A cultura é um sistema de símbolos compartilhados com que se interpreta a realidade e que conferem sentido à vida dos seres humanos.

Antropologia  - esta ciência entende a cultura como a totalidade de padrões aprendidos e desenvolvidos pelo ser humano. Segundo a definição pioneira de Edward Burnett Tylor, sob a etnologia (ciência relativa especificamente do estudo da cultura) a cultura seria "o complexo que inclui conhecimento, crenças, arte, morais, leis, costumes e outras aptidões e hábitos adquiridos pelo homem como membro da sociedade". Portanto corresponde, neste último sentido, às formas de organização de um povo, seus costumes e tradições transmitidas de geração para geração que, a partir de uma vivência e tradição comum, se apresentam como a identidade desse  povo.

O uso de abstração é uma característica do que é cultura: os elementos culturais só existem na mente das pessoas, em seus símbolos tais como padrões artísticos e mitos. Entretanto fala-se também em cultura material (por analogia a cultura simbólica) quando do estudo de produtos culturais concretos (obras de arte, escritos, ferramentas, etc.). Essa forma de cultura (material) é preservada no tempo com mais facilidade, uma vez que a cultura simbólica é extremamente frágil.

A principal característica da cultura é o chamado mecanismo adaptativo: a capacidade de responder ao meio de acordo com mudança de hábitos, mais rápida do que uma possível evolução biológica. O homem não precisou, por exemplo, desenvolver longa pelagem e grossas camadas de gordura sob a pele para viver em ambientes mais frios – ele simplesmente adaptou-se com o uso de roupas, do fogo e de habitações. A evolução cultural é mais rápida do que a biológica. No entanto, ao rejeitar a evolução biológica, o homem torna-se dependente da cultura, pois esta age em substituição a elementos que constituiriam o ser humano; a falta de um destes elementos (por exemplo, a supressão de um aspecto da cultura) causaria o mesmo efeito de uma amputação ou defeito físico, talvez ainda pior.

Além disso, a cultura é também um mecanismo cumulativo. As modificações trazidas por uma geração passam à geração seguinte, de modo que a cultura transforma-se perdendo e incorporando aspectos mais adequados à sobrevivência, reduzindo o esforço das novas gerações.

Um exemplo de vantagem obtida através da cultura é o desenvolvimento do cultivo do solo, a agricultura. Com ela o homem pôde ter maior controle sobre o fornecimento de alimentos, minimizando os efeitos de escassez de caça ou

Page 9: arboaventura.files.wordpress.com viewA cultura. Alberto. R. Boaventura (1) Esqueceu-se que o homem culto é aquele que tem a capacidade de cultivar seu próprio espírito e para tanto

9

coleta. Também pôde abandonar o nomadismo; daí a fixação em aldeamentos, cidades e estados.

A agricultura também permitiu o crescimento populacional de maneira acentuada, que gerou novo problema: produzir alimento para uma população maior. Desenvolvimentos técnicos – facilitados pelo maior número de mentes pensantes– permitem que essa dificuldade seja superada, mas por sua vez induzem a um novo aumento da população; o aumento populacional é assim causa e consequência do avanço cultural.

Edward Burnett Tylor (Londres, 2 de outubro de 1832 — Wellington, 2 de janeiro de 1917) foi um antropólogo britânico. Era irmão do geólogo Alfred Tylor. Tylor filia-se à escola antropológica do evolucionismo social. Considerado o pai do conceito moderno de cultura, Tylor vê, porém, a cultura humana como única, pois defende que os diferentes povos sofreriam convergência de suas práticas culturais ao longo de seu desenvolvimento, ideia que não é consenso hoje em dia. Sua principal obra é Primitive Culture(1871).

Tylor é considerado um representante do evolucionismo social. Em seus trabalhos Cultura primitiva e Antropologia, ele definiu o contexto do estudo científico da antropologia, baseado nas teorias uniformitárias de Charles Lyell. Ao contrário do que comumente se pensa a obra de Charles Darwin não desempenhou grande influência no pensamento de Tylor, embora ele de fato tenha lido Darwin. Ele acreditava que existia uma base funcional para o desenvolvimento da sociedade e religião, que ele determinou ser universal.

Ele introduziu o termo animismo (a fé na alma individual ou anima de todas as coisas e manifestações naturais) no senso comum. Ele considerou animismo como o primeiro estágio de desenvolvimento de todas as religiões

Mudança Cultural

A cultura é dinâmica. Como mecanismo adaptativo e cumulativo, a cultura sofre mudanças. Traços se perdem, outros se adicionam, em velocidades distintas nas diferentes sociedades.

Dois mecanismos básicos permitem a mudança cultural: a invenção ou introdução de novos conceitos, e a difusão de conceitos a partir de outras culturas. Há também a descoberta, que é um tipo de mudança cultural originado pela revelação de algo desconhecido pela própria sociedade e que ela decide adotar.

A mudança acarreta normalmente em resistência. Visto que os aspectos da vida cultural estão ligados entre si, a alteração mínima de somente um deles pode ocasionar efeitos em todos os outros. Modificações na maneira de produzir podem, por exemplo, interferir na escolha de membros para o governo ou na aplicação de leis. A resistência à mudança representa uma vantagem, no sentido

Page 10: arboaventura.files.wordpress.com viewA cultura. Alberto. R. Boaventura (1) Esqueceu-se que o homem culto é aquele que tem a capacidade de cultivar seu próprio espírito e para tanto

10

de que somente modificações realmente proveitosas, e que sejam por isso inevitável, serão adotadas evitando o esforço da sociedade em adotar, e depois rejeitar um novo conceito.

O 'ambiente' exerce um papel fundamental sobre as mudanças culturais, embora não único: os homens mudam sua maneira de encarar o mundo tanto por contingências ambientais quanto por transformações da consciência social.

ETNOCENTRISMO é uma atitude na qual a visão ou avaliação de um grupo sempre estaria sendo baseado nos valores adotados pelo seu grupo, como referência, como padrão de valor. Trata-se de uma atitude discriminatória e preconceituosa. Basicamente, encontramos em tal posicionamento um grupo étnico sendo considerado como superior a outro.

Não existem grupos superiores ou inferiores, mas grupos diferentes. Um grupo pode ter menor ou maior desenvolvimento tecnológico se comparado um ao outro, possivelmente, é mais adaptável a determinados ambientes, além de não possuir diversos problemas que esse grupo "superior" possui.

FOLCLORE - Gênero de cultura de origem popular, constituído pelos costumes, lendas, tradições e festas populares transmitidos por imitação e via oral de geração em geração. "Folclore é tradição! Passado e presente! É cultura embasada nos usos e costumes de uma Nação! Todos os povos possuem suas tradições, crendios e superstições, que transmitem através de lendas, contos, provérbios e canções”.

PRECONCEITO - É uma atitude discriminatória que baseia conhecimentos surgidos em determinado momento como se revelassem verdades sobre pessoas ou lugares determinados. Costuma indicar desconhecimento pejorativo de alguém, ao que lhe é diferente. As formas mais comuns de preconceito são o social, racial e sexual.

RELATIVISMO CULTURAL -  é uma ideologia político-social que defende a validade e a riqueza de qualquer sistema cultural e nega qualquer valorização moral e ética dos mesmos.

O relativismo cultural defende que o bem e o mal são relativos a cada cultura. O "bem" coincide com o que é "socialmente aprovado" numa dada cultura. Os princípios morais descrevem convenções sociais e devem ser baseados nas normas da nossa sociedade.  Harry Gensler

 

Ex: Na cultura europeia-ocidental, o ato de comer é feito com garfo, faca e colher.  Excetuando-se os cerimoniais, não há ordem estabelecida para sentar-se à mesa. Na China o costume é comer sentado.  No interior do nordeste é costume comer utilizando-se os dedos.  Se junta um punhado de comida, em geral com farinha e com os dedos leva-a à boca.  Hábitos diferentes que naturais em seus contextos, podem ser mal interpretados fora deles. Assim, comer com a mão pode ser uma falta de educação, comer com colher pode ser coisa de pobre ou comer com garfo e faca ou palitos pode parecer estranho a quem não tem este hábito.

Page 11: arboaventura.files.wordpress.com viewA cultura. Alberto. R. Boaventura (1) Esqueceu-se que o homem culto é aquele que tem a capacidade de cultivar seu próprio espírito e para tanto

11

A aculturação refere-se ao encontro de duas culturas diferentes e, segundo afirmações mais tradicionais, a sobreposição de uma cultura sobre a outra. Historicamente, a aculturação moderna tornou-se evidente a partir da colonização nas Américas, África e Oceania.

Antes do período das grandes navegações mercantilistas e da colonização dessas regiões por nações europeias, a própria Europa sofreu aculturação, por exemplo, no período em que parte de seu continente esteve nas mãos dos povos árabes.

No conceito geral, define-se a aculturação como um processo de imposição cultural que, no Brasil colonial, ocorreu pela catequização dos índios, negros escravos e por meio de  referências “civilizatórias” trazidas por portugueses, franceses e ingleses.

Nos tempos atuais, a aculturação é percebida como resultado de um processo de intercâmbio cultura em que duas culturas absorvem mutuamente suas características e costumes gerando uma nova referência. Essa nova referência ou nova cultura apresenta traços da cultura inicial e da cultura absorvida.

A cultura brasileira é formada por traços portugueses, africanos e indígenas; formação ocorrida no decorrer de nossa história pela colonização e pelo processo de imigração. A globalização e a interatividade das mídias permitem  um processo de aculturação e nivelamento das culturas pela proximidade das sociedades, das trocas e da rapidez dos veículos de comunicação que distribuem diversas referências, comportamentos e signos culturais em diferentes países.

Acredita-se que a aculturação, sendo um processo moderno de expansão, não consegue destruir por completo a identidade social e local de um povo. Hoje, a aculturação é considerada proveniente de um processo não violento, mas proveniente de uma necessidade de informação e busca de aspectos culturais por parte de vários povos.

Trata-se de um processo de aquisição que ocorre por meio de vários grupos de culturas diversas, permitindo que indivíduos de uma cultura aprendam o comportamento o as tradições de indivíduos de outra cultura.

É errado pensar que uma cultura desapareça por completo após sofrer influências de outra cultura, a cultura morre junto com o seu povo e, muitas vezes, se fortalece quando mescla sua cultura com a de outros povos.

Devemos considerar que, mesmo nos tempos feudais e mercantis, nenhum povo conseguia viver constantemente isolado e que a cultura é um processo dinâmico em constante formação e expansão.

A cultura não é estática ou mórbida, seja por fatores históricos, humanos e até mesmo bélico, ela é capaz de perder, reaver ou absorver novas referências durante o processo de consolidação ou reorganização de uma sociedade. A aculturação não significa a morte dos signos e comportamentos culturais de um

Page 12: arboaventura.files.wordpress.com viewA cultura. Alberto. R. Boaventura (1) Esqueceu-se que o homem culto é aquele que tem a capacidade de cultivar seu próprio espírito e para tanto

12

povo, mas um processo proveniente de causas impostas ou antropologicamente naturais.

A sociologia  é uma ciência que estuda a forma de relacionamento entre os grupos, assim como as consequências dessa relação. Seu principal objetivo é o estudo da sociedade, focalizando na educação como uma forma importante de relacionamento entre as pessoas. Essa ciência é significativa para a conscientização social e a formação do espírito crítico. É também uma forma de aperfeiçoar o conhecimento social, auxiliando os interessados a compreenderem melhor o comportamento dos grupos sociais.

Um dos principais sociólogos que se preocupou com essa questão foi Durkheim. Ele acredita que a educação está ligada diretamente a toda vida social, já  que os homens foram responsáveis pela criação da escola. Ele foi o primeiro sociólogo a afirmar que a escola é uma instituição fundamental para formação do indivíduo, pois ela e a sociedade interagem e se completam. Segundo Poyer (2007) a escola é compreendida como uma das partes que compõe o processo social.

A escola é  uma instituição que atendem as condições sócias e está sujeita a mudanças sempre que preciso, por isso é tida como um espaço de socialização. Durkheim entende a sociedade como um organismo funcionando em que partes, essas que se completam.  Desta forma, cabe à escola formar o individuo e inserir as regras sociais através da reprodução dos hábitos e valores. Existem aspectos diferentes entre educação escolar e educação fora da escola, por isso é preciso estabelecer uma relação entre elas, já que ambas englobam o processo de socialização e cultura que buscam formar membros da sociedade.

A educação aparece exerce um papel fundamental nas relações sociais, servindo para evitar as contradições que existem entre os interesses sociais e pessoais. Ela é vista como um fator que contribui para a transformação social. Todavia, ela sozinha não tem o poder de transformar, pois surge das mais diversas experiências de vida e das mais diferentes condições de trabalho.

Segundo a sociologia da educação o processo educacional não pode ser separado do espaço da aprendizagem, ou seja, do ambiente em que acontecem as ações do cotidiano e de suas implicações. A escola deve abrir espaço para os alunos refletirem e analisarem sobre os acontecimentos do mundo e suas implicações e se posicionarem de forma politica. Dessa forma, haverá o desenvolvimento do educando através da sociologia.

A anomia, considerada fora de qualquer contexto social particular, refere-se aos problemas de controle social em um determinado sistema social. Os valores estão ausentes ou se surgem, estão em conflito e os indivíduos não estão adequadamente socializados às diretrizes culturais, portanto, a coerção cultural se mostra ineficaz.

Qualquer que seja seu significado particular, a anomia é um estado social de ausência de normas, uma anarquia, considerando a relação entre os indivíduos e

Page 13: arboaventura.files.wordpress.com viewA cultura. Alberto. R. Boaventura (1) Esqueceu-se que o homem culto é aquele que tem a capacidade de cultivar seu próprio espírito e para tanto

13

as forças do controle social.  Emile Durkheim (sociólogo francês) utilizava as taxas de desvio do comportamento e o estado da lei e punição como índices da anomia. Mesmo evitando conceitos psicológicos, acreditava que o egoísmo, a competição insaciável e a ausência de sentido e de objetivos poderiam ser apontadas como as reações prováveis dos indivíduos que vivem em uma sociedade anômica, na qual os obstáculos estão no funcionamento ordenado da sociedade.

Já  a alienação representa um problema de legitimidade do controle social, é um problema de poder, expresso no ato da dominação, dimensão ausente na perspectiva da anomia. A alienação volta-se para a hierarquia do controle dentro do próprio contexto social, onde as condições sociais tornam o indivíduo separado da sociedade, sendo esta uma extensão do próprio indivíduo, personificada na atividade pessoal de cada ator social.

Para Karl Marx  (filósofo e sociólogo alemão) alienar-se da sociedade é, em princípio, alienar-se de si mesmo. A alienação refere-se aos obstáculos existentes no crescimento produtivo dos indivíduos e, consequentemente, às barreiras que impedem a transformação adaptada do sistema social.

Uma condição não alienada refere-se à harmonia social como resultado espontâneo de indivíduos livres para realizar suas potencialidades, autônomos e autodeterminantes, sem o controle de forças externas. Os indivíduos, quando alienados, se tornam impotentes e estranhos às criações de sua própria atividade social.

Para Marx e Durkheim, alienação e anomia não são definições simples, seja no nível psicológico, seja no nível sociológico. Como conceitos, são teorias sociais completas, que explicam o comportamento diante de certas condições sociais. Como criticas, implicam no julgamento de uma sociedade a partir de um ideal.

Não é tão simples definir a palavra ‘violência’, segundo sociólogos e pesquisadores deste tema. As conotações deste conceito variam conforme suas fontes. Por exemplo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), este termo significa impor um grau intenso de dor e sofrimento que não se pode evitar. Para os militantes dos direitos humanos, a ‘violência’ é entendida como a violação dos direitos civis. Mas os estudiosos creem que seu significado é muito mais profundo.

A violência tem várias faces. Na verdade, a violência urbana é apenas uma delas, entre guerras, miséria, discriminações, e tantas mais. O ângulo aqui abordado é um dos mais discutidos e controvertido de nossos tempos. Os atos transgressores ocorridos no âmago das grandes cidades, de caráter estritamente agressivo, frutos da vida em sociedade na esfera urbana, caracterizam, em parte, este fenômeno social que se convencionou chamar de violência urbana.

Ela se expressa através dos níveis cada vez mais elevados de criminalidade, da sujeição frequente ao domínio dos instintos selvagens e bárbaros, do crime organizado, principalmente em torno do tráfico de drogas, dos atos despidos de

Page 14: arboaventura.files.wordpress.com viewA cultura. Alberto. R. Boaventura (1) Esqueceu-se que o homem culto é aquele que tem a capacidade de cultivar seu próprio espírito e para tanto

14

qualquer civilidade – aqui se compreendem também a constituição de gangues, as pichações, a espoliação dos bens públicos, o caos do trânsito, os pontos abandonados da cidade, sem nenhuma preservação ou manutenção, entre outros.

Infelizmente, a cultura de massa e um setor da mídia, irresponsável e sensacionalista, alimentam essas tendências explosivas das metrópoles, incentivando a violência por meio de filmes, músicas, novelas, um jornalismo policial preocupado apenas com uma audiência crescente, entre outros.

Violência nas Grandes Cidades

A violência está enraizada no próprio processo histórico brasileiro, desde os primórdios da colonização. Milhares de índios foram exterminados, culturas dizimadas, outros aborígenes escravizados, ao lado dos negros trazidos da África. Esse contexto foi, ao longo do tempo, agravando-se ainda mais. Depois da libertação dos escravos, da importação de mão-de-obra de outros países, os imigrantes, o número de excluídos e marginalizados da nossa sociedade foi crescendo significativamente.

À medida que as cidades passaram a inchar de forma caótica, desordenada, sem nenhum planejamento, absorvendo também os trabalhadores do campo, principalmente após a mecanização rural, sua população foi dividindo os territórios – um centro ocupado pela elite, alguns círculos habitados pela classe média, e uma periferia crescente que cada vez mais se expande por todos os espaços desocupados que restam nas metrópoles urbanas.

Tudo isso, somado a um sistema econômico que mais exclui do que inclui as pessoas, mecanismo cruel que, por um lado, explora os trabalhadores, aliena-os do produto de seu trabalho, e por outro estimula ao máximo o consumo, através dos canais disponibilizados pela mídia e pela cultura de massa. Assim, a maior parte dos jovens, excitados pelo apelo ao consumismo, sem perspectivas materiais e sociais, abandonados pelo Poder Público, que não investe o suficiente em políticas educacionais e culturais, vê abrir-se diante de seus olhos o universo do crime organizado, que eles acreditam lhes proporcionar tudo o que mais desejam. Este mundo, a princípio fascinante, ocupa o vácuo deixado pelo Estado, mas depois trai cada um de seus seguidores, oferecendo-lhes nada mais que uma vida perdida, sem dignidade, mergulhada nos vícios e em uma violência sem freios, que acaba ceifando suas próprias existências.

Assim, em sociedades nas quais as instituições revelam-se fracas e corrompidas, na qual a autoridade social encontra-se desacreditada, os valores morais atravessam uma fase de decadência e descrença, na qual até mesmo a família tem deixado de cumprir seu papel fundamental na esfera da educação e da concessão de limites, vemos a violência urbana ultrapassar inclusive as barreiras sociais, aliciando adeptos em todas as classes sociais, em qualquer faixa étnica, independente até mesmo de sexo, idade ou religião.

A própria vida perdeu seu sentido, daí presenciarmos linchamentos, justiça realizada pelas próprias mãos, crimes passionais, assassinatos resultantes de

Page 15: arboaventura.files.wordpress.com viewA cultura. Alberto. R. Boaventura (1) Esqueceu-se que o homem culto é aquele que tem a capacidade de cultivar seu próprio espírito e para tanto

15

brigas no trânsito, em casas noturnas, shows, bares, entre pessoas aparentemente honestas e até aquele momento completamente obedientes às normas sociais e legais.

Hoje, em nosso país, a violência se dissemina também pelas cidades do interior, pois os grupos criminosos vão procurando novos territórios. Além disso, também essas pequenas cidades absorvem atualmente os problemas antes típicos das grandes metrópoles, principalmente a degradação moral. Torna-se urgente uma profunda reforma político-social, aliada a um resgate intenso dos valores esquecidos, perdidos pelo caminho. Esta ação depende do Estado, mas também de toda a sociedade organizada.

Cidadania e Educação

SOBRE O CONCEITO DE CIDADANIA E SEUS REFLEXOS NA ESCOLA

Sobre cidadania o dicionário de língua portuguesa Larousse afirma ser “qualidade de cidadão”, “qualidade de uma pessoa que possui, em uma determinada comunidade, política, o conjunto de direitos civis e políticos”. No entanto, na realidade em que vivemos atualmente, se indagarmos a respeito do tema, certamente encontraremos uma diversidade de opiniões e nenhuma definição que possa contemplar de forma plena o conceito de cidadania. Podemos afirmar que ser cidadão é ter direitos e deveres. Mas de que maneira poderemos definir quais direitos e quais deveres? Portanto, é na determinação destes direitos e deveres que se encontra o “nó” relacionado a esta questão complexa que é a cidadania.

Ouve-se falar de “educação para a cidadania”, de “projetos educativos” voltados para a cidadania, enfim, de sociedades que tenham no cidadão o foco de suas preocupações. Mas apesar da discussão que é bastante amplo o que se pode perceber é que a literatura produzida não nos esclarece este aspecto importante para as sociedades ditas democráticas. Importante na medida em que, para que seja democrática, uma sociedade tem na participação dos seus indivíduos uma característica básica.

De todo modo, alguns autores, conscientes da “confusão” que se estabelece sobre o que seria e como exercer cidadania, tenta dar a este respeito algum esclarecimento. Entre estes autores, Gentili e Alencar afirmam que “a cidadania deve ser pensada como um conjunto de valores e práticas  cujo exercício não somente se fundamenta no reconhecimento formal dos direitos e deveres que a constituem na vida cotidiana dos indivíduos”. (Gentili e Alencar, 2001, p. 87). Ou seja, não basta que se defina um conceito formalmente. Mais importante que isso é a prática dessa definição. Cidadania significa, além do reconhecimento dos direitos e deveres dos cidadãos, o cumprimento dos mesmos por parte da sociedade. Por outro lado, tanto o reconhecimento quanto o cumprimento destes direitos e deveres, não devem – como é de senso comum – se restringir à esfera política, isto é, ao direito e ao dever de votar e ser votado. Outro aspecto

Page 16: arboaventura.files.wordpress.com viewA cultura. Alberto. R. Boaventura (1) Esqueceu-se que o homem culto é aquele que tem a capacidade de cultivar seu próprio espírito e para tanto

16

importante é que a cidadania tem na igualdade uma condição de existência. Igualdade de direitos, de deveres, de oportunidades. Igualdade, enfim, de participação social e política.

Em meio a essa indefinição os “cidadãos” enfrentam justas dificuldades relativas ao exercício destes direitos e deveres que na realidade muitas vezes desconhecem por completo. Se o indivíduo não tem uma definição do que seja a cidadania, obviamente não poderá exercê-la de forma plena. Ao mesmo tempo, na medida em que se percebe esta indefinição no que se refere ao conceito de cidadania, a democracia tampouco poderá acontecer uma vez que ela se faz na participação dos cidadãos. Ou seja, a cidadania deve ser pensada como condição fundamental para a existência de uma sociedade democrática. Obviamente não se trata da cidadania “do papel”, isto é da teoria, mas da cidadania em termos práticos, a que deve acontecer com a participação de cada membro, cada cidadão consciente de seus direitos, deveres e valor.

A complexidade do mundo globalizado, a amplitude das comunicações, provoca essa indefinição relativamente à cidadania. Se ser cidadão significa, conforme a origem grega, em termos bastante genéricos, ser o habitante da cidade, isso implica no pertencimento a determinado espaço geográfico. Mas o que se pode perceber é que para a globalização não existem barreiras. Ao extrapolar estes limites faz desaparecer as peculiaridades de cada espaço e também dos indivíduos implicados. Serão todos “cidadãos do mundo”, sujeitos indefinidos socialmente. A rapidez das transformações sociais provoca igualmente transformações individuais. Isso exige readaptação, reeducação. São neste ponto que a escola precisa também ser repensada, principalmente os professores, responsáveis diretos por promover essa readaptação exigida pelas transformações tecnológicas. Dessa forma, é necessário que valores e a forma de disseminá-los sejam repensados, inclusive no que se refere à cidadania.

Referências BibliográficasARANHA, Maria Lúcia de Arruda, MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: introdução à

filosofia. 2 ed. São Paulo: Moderna, 1993. ARAÚJO, Silvana Miceli de. Artifício e autenticidade: o turismo como experiência antropológica. In: BANDUCCI JÚNIOR, Álvaro, BARRETTO, Margarita (orgs.). Turismo e identidade local – uma visão antropológica. 2 ed. Campinas: Papirus, 2002 (Coleção Turismo). BANDUCCI JÚNIOR, Álvaro. Turismo e antropologia no Brasil: estudo preliminar. In: BANDUCCI JÚNIOR, Álvaro, BARRETTO, Margarita (orgs.). Turismo e identidade local – uma visão antropológica. 2 ed. Campinas: Papirus, 2002 (Coleção Turismo). BARRETTO, Margarita. Manual de iniciação ao estudo do turismo. 10 ed. Campinas: Papirus, 2001 (Coleção Turismo). BUENO, Francisco da Silveira. Minidicionário da língua portuguesa. SãoPaulo: FTD,1996. BURNS, Peter M. Turismo e antropologia. São Paulo: Chronos, 2002. CAMARGO, Haroldo Leitão. Patrimônio histórico e cultural. São Paulo: Aleph, 2002 (Coleção ABC do Turismo). CUCHE, Denys. A noção de cultura nas ciências sociais. Bauru: EDUSC, 1999. DAMATTA, Roberto. O ofício do etnólogo, ou como ter “Anthropological Blues”. In: NUNES, Edson de Oliveira (org.). A aventura sociológica – objetividade, paixão

Page 17: arboaventura.files.wordpress.com viewA cultura. Alberto. R. Boaventura (1) Esqueceu-se que o homem culto é aquele que tem a capacidade de cultivar seu próprio espírito e para tanto

17

improviso e método na pesquisa social. Rio de Janeiro: Zahar, 1978. ------. Torre de Babel. Rio de Janeiro: Rocco, 1996. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Mini-aurélio século XXI: o minidicionário da língua portuguesa. 4 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000. GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Zahar, 1978. APA PETRÓPOLIS – Zoneamento da área de proteção ambiental. Petró polis: Autores & Agentes & Associados, 2003. LAPLANTINE, François, TRINDADE, Liana. O que é imaginário. São Paulo: Brasiliense, 1997.LARAIA, Roque de Barros. Cultura – um conceito antropológico. 8 ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,1993. LÓPES, Tânia. Rotas nacionais: fragmentando os roteiros turísticos sobre Ouro Preto. In: BANDUCCI JÚNIOR, Álvaro, BARRETTO, Margarita (orgs.). Turismo e identidade local – uma visão antropológica. 2 ed. Campinas: Papirus, 2002 (Coleção Turismo). MAUSS, Marcel. Sociologia e antropologia. São Paulo: EDUSP, 1974. MOESCH, Marutschka Martini. A produção do saber turístico. São Paulo: Contexto, 2000. ORTIZ, Renato. Cultura brasileira e identidade nacional. 5 ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. REIS, Rita de Cássia Guedes dos. Turismo: a busca de sua essência. Juiz de Fora: 2004. Monografia (Graduação em Turismo) – UFJF. ROCHA, Everardo. Totemismo e mercado: notas para uma antropologia do consumo. Logos. Rio de Janeiro:UERJ/FCS, ano 3, n.5, p.55-7, 2 semest re/1996. _____. “Tempo de casa” ou “carteira manjada”: notas para um estudo de construção da identidade. Comum. Rio de Janeiro: FACHA, v.2, n.8, p.44-64, 1981. VELHO, Gilberto. Observando o familiar. In: NUNES, Edson de Oliveira (org.). A aventura sociológica – objetividade, paixão, improvisa e método na pesquisa social. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.