direito penal - parte geral - paulo queiroz.pdf

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    E d i t o r e sJo o d e A lm eid a

    J o o Luiz d a S ilv a A lm eid a

    Conselho Editorial Conselho ConsultivoAlexandre Freitas Cmara lvaro Mayrink da CostaAmilton Bueno de Carvalho Antonio Carlos Martins SoaresArtur de Brito Gueiros Souza Augusto ZimmermannCezar Roberto Bitencourt Aurlio Wander BastosCesar Flores Elida SguinCristiano Chaves de Farias Flvia Lages de CastroCarlos Eduardo Adriano Japiass Flvio Alves MartinsElpdio Donizetti Gisele CittadinoEmerson Garcia Humberto Dalla Bernardina de PinhoFauzi Hassan Choukr Joo Theotonio Mendes de Almeida Jr.Firly Nascimento Filho Jos Femando de Castro FariasFrancisco de Assis M. Tavares Jos Ribas VieiraGeraldo L. M. Prado Luiz Ferlizardo BarrosoGuilherme Pena de Moraes Luiz Paulo Vieira de CarvalhoGustavo Snchal de GofFredo Marcello CiotolaJ. M. Leoni Lopes de Oliveira Omar Gama Ben KaussJoo Carlos Souto Rafael BarrettoJos dos Santos Carvalho Filho Sergio Demoro HamiltonLcio Antnio Chamon JuniorManoel Messias PeixinhoMarcellus Polastri LimaMarco Aurlio Bezerra de MeloMarcos Juruena Villela SoutoNelson RosenvaldPaulo de Bessa AntunesPaulo RangelRicardo Mximo Gomes FerrazSaio de CarvalhoSrgio Andr RochaSidney GuerraTrsis Nametala Sarlo JorgeVictor Gameiro Drummond

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  • P a u lo Q u eir o z

    D ir eito P en a l

    P a r t e G er a l4a edio

    Completamente revista e ampliada

    E d i t o r a Lum en Ju r is

    Rio de Janeiro 2008

  • Sumrio

    Sumrio

    Nota do Autor............................................................................................... ............................ . x ix

    Primeira Parte FUNDAMENTOS DO DIREITO PENAL

    Captulo I - Introduo............................................................................................................ 31. Conceito de direito penai................................................................................................ 3

    1.1. Relao entre Direito Penal e Direito Processual Penal.............................. 51.2. Mas o que de fato o Direito?................................. ........................................... 71.3. Ainda o conceito de Direito: o Direito no existe............. ........................... 91.4. Leis so necessrias?...................................... ................................................ .......... 161.5. Direito e arte..................................................................................................... ......... 18

    2. Direito penal, critniiologia. e poltica crim inal................... ............................ 192.1. Direito penal e poltica criminal; h distino realmente?........................... 20

    3. Direito penal e controle social.................................................. ..................................... 244. Direito penal e moral..................... ................................................................................. .26

    4.1. Deus e o Direito......................................................................................................... 275. Carter subsidirio do direito penal..................................................................... ...... 306 . Carter fragmentrio do direito penal..................................................... ................... 337 . Ilcito penal e ilcito no penal.................. ............................... ....... ........................... 338 . Legislao especial................................... ...................................................... .................. 349. Contagem dos prazos penais e processuais penais..... .................. ........................... 34

    Captulo II - Direito Penal e Constituio.......................................... ........................... 371. Direito penal e Constituio............................................................................... ......... 372. Direito penal e Estado............................. ........ ............. ....................... ........................ 383. Princpio da liberdade................................................................ ..................................... 394. Princpios fundamentais................................................ ........................ ........................ 39

    4.1. Introduo.................................................................................................................. 39. 4.2. Princpio da legalidade e irretroatividade da norma penal mais severa.

    "Nilum crimen, milla poena sine praevm leg e...................... ...................... 404.2.1. Princpio da taxatividade (certeza ou determinao)................ ....... 424.2.2. Princpios da anterioridade e da irretroatividade da lei penal....... 424.2.3. Leis penais em branco e princpio da reserva legal............................ 43

    4.3. Princpio da proporcionalidade (em sentido amplo),................ .............. . 464.3.1. Princpio da necessidade (nuhim crimen, nuJla poena sine ne~

    cesshate)..................................................... ...... ...... ............ ............. ...... .... 474.3.2. Princpio da adequao (ou exigibilidade ou idoneidade)............... 484.3.3. Princpio da proporcionalidade das penas (proporcionalidade em

    sentido estrito)......................................................................... ................... 48

  • Sumrio

    Sumrio

    Nota do Autor..................................................................................................................... xix

    Primeira Parte FUNDAMENTOS DO DIREITO PENAL

    Captulo I - Introduo.................................................................................................... 31. Conceito de direito penal........................................................................................ 3

    1.1. Relao entre Direito Penal e Direito Processual Penal............................ 51.2. Mas o que de fato o Direito?........................................................................ 71.3. Ainda o conceito de Direito: o Direito no existe........................................ 91.4. Leis so necessrias?.......................................................................................... 161.5. Direito e arte....................................................................................................... 18

    2. Direito penal, criminologia e poltica criminal................................................... 192.1. Direito penal e poltica criminal: h distino realmente?......................... 20

    3. Direito penal e controle social................................................................................. 244. Direito penal e moral............................................................................................... 26

    4.1. Deus e o Direito.................................................................................................. 275. Carter subsidirio do direito penal...................................................................... 306. Carter fragmentrio do direito penal.................................................................. 337. Ilcito penal e ilcito no penal............................................................................... 338. Legislao especial.................................................................................................... 349. Contagem dos prazos penais e processuais penais............................................... 34

    Captulo II - Direito Penal e Constituio.................................................................. 371. Direito penal e Constituio................................................................................... 372. Direito penal e Estado.............................................................................................. 383. Princpio da liberdade.............................................................................................. 394. Princpios fundamentais........................................................................................... 39

    4.1. Introduo........................................................................................................... 39 4.2. Princpio da legalidade e irretroatividade da norma penal mais severa.

    "Nullum crimen, nulla poena sine praevia lege".......................................... 404.2.1. Princpio da taxatividade (certeza ou determinao)...................... 42

    4.2:2. Princpios da anterioridade e da irretroatividade da lei penal...... 424.2.3. Leis penais em branco e princpio da reserva legal.......................... 43

    4.3. Princpio da proporcionalidade (em sentido amplo)................. :................ 464.3.1. Princpio da necessidade (nullum crimen, nulla poena sine ne-

    cessitate).................................................................................................. 474.3.2. Princpio da adequao (ou exigibilidade ou idoneidade).............. 484.3.3. Princpio da proporcionalidade das penas (proporcionalidade em

    sentido estrito)....................................................................................... 48

  • Paulo Queiroz

    4.3.4. O princpio ne bis in idem.................................................................. 494.3.5. Princpio da insignificncia................................................................ 51

    4.4. Princpio da humanidade............................................................................... 534.5. Princpio da responsabilidade pessoal ou de culpabilidade...................... 574.6. Princpio da lesividade (ou ofensividade)................................................... 58

    5. Direito e Interpretao........................................................................................... 595.1. Introduo......................................................................................................... 595.2. Interpretar compreender e argumentar...................................................... 615.3. O chamado crculo hermenutico................................................................. 625.4. Limites da interpretao................................................................................. 685.5. Interpretao e garantismo............................................................................ 695.6. Interpretao conforme a Constituio......................................................... - 705.7. Direito e analogia............................................................................................ 72

    5.7.1. Analogia e interpretao analgica?.................................................. 746. Conflito aparente de normas penais..................................................................... 76

    6.1. Introduo......................................................................................................... 766.2. Princpio da especialidade............................................................................. 786.3. Princpio da subsidiariedade......................................................................... 796.4. Princpio da consuno ou absoro........................................................... 79

    6.4.1. crime complexo ou composto............................................................ 816.4.2. crime progressivo e progresso criminosa em sentido estrito...... 816.5. Primazia do princpio da especialidade.............................................. 82

    Captulo III - Funes do Direito Penal (teorias da pena)....................................... 83Introduo....................................................................................................................... 831. Teorias legitimadoras.............................................................................................. 85

    1. Teorias absolutas.............................................................................................. 851.1. Crtica......................................................................................................... 87

    2. Teorias relativas (preveno geral e preveno especial) ou prevencio-nistas.................................................................................................................. 872.1. Introduo................................................................................................. 872.2. Preveno geral negativa........................................................................ 87

    2.2.1. Crtica.............................................................................................. 882.3. Preveno geral positiva.......................................................................... 88

    2.3.1. Crtica.............................................................................................. 902.4. Preveno especial ou individual.......................................................... 92

    2.4.1. Crtica.............................................................................................. 933. Teorias eclticas (ou unitrias ou mistas)..................................................... 94

    3.1. Introduo................................................................................................. 943.2. A teoria dialtica unificadora de Claus Roxin...................................... 953.3. O garantismo de Luigi Ferrajoli.............................................................. 95

    I. Teorias deslegitimadoras: abolicionismo e minimalismo radical..................... 961. Introduo........................................................................................................ 96

    1.1.0 crime no existe: carter definitorial do delito............................... 971.2. Inidoneidade preventiva ou motivadora............................................. 98

  • D ire ito Penal - P arte G eral

    1.3. Excepcionalidade da interveno penal - as cifras ocultas da criminalidade ................................................................................................................. 98

    1.4. Igualdade formal versus desigualdade material: seletividade arbitrria do sistema penal........................................................................................... 99

    1.5. Carter conseqencial (sintomatolgico), e no causai (etiolgico),da interveno penal........................................................................................ 100

    1.6. Carter crimingeno do sistema penal....................................................... 1001.7. Reificao do conflito (do delito): neutralizao da vtima pelo siste

    ma penal............................................................................................................... 1011.8. O sistema penal intervm sobre pessoas, e no sobre situaes........... 102

    2. Concluso.................................................................................................................... 102

    Captulo IV - A Lei Penal no Tempo........................................................................... 1051. Princpio da legalidade e consectrios lgicos: anterioridade e irretroativi

    dade da lei penal mais severa......................................................................................... 1051.1. Introduo................................................................................................................... 105

    2. Hipteses de irretroatividade......................................................................................... 1062.1. Neocriminalizao (novatio legis incriminadora).......................................... 1062.2. Lei nova mais severa (novatio legis in peju s) .................................................. 1062.3. Irretroatividade da jurisprudncia?..................................................................... 107

    3. Hipteses de retroatividade............................................................................................ 1083.1. Descriminalizao (abolitio crim inis)................................................................ 1083.2. Lei penal mais branda (novatio legis in mellius)............................................. 108

    4. Combinao de leis penais (lex tertia)?...................................................................... 1095. Sucesso de leis penais: a lei intermediria............................................................... 1106. Ultratividade da lei penal: leis temporrias e excepcionais.................................. 1117. Irretroatividade da lei processual................................................................................. 1128. Irretroatividade da Lei de Execuo Penal................................................................ 1149. Normas penais em branco.............................................................................................. 11410. Aplicao da lei e vacatio leg is ........................................................................ 11511. Tempo do crime................................................................................................................ 116

    Captulo V - A Lei Penal no Espao............................................................................. 1191. Introduo........................................................................................................................... 1192. Conceito de territrio....................................................................................................... 1203. Lugar do crime................................................................................................................... 1204. Extraterritorialidade......................................................................................................... 1205. Pena cumprida no estrangeiro....................................................................................... 1216. Eficcia da sentena penal estrangeira........................................................................ 122

    Segunda Parte TEORIA DO DELITO

    Captulo I - Introduo Geral....................................................................................... 1251. Conceito e instrumentalidade da teoria do delito..................................................... 125

    1.1. Crtica da razo tcnico-jurdica ......................................................................... 127

  • Paulo Q ueiroz

    2. Funcionalismo (sistema racional-final, teleolgico ou funcional).................. 1313. Evoluo da teoria do delito: causalismo, nalismo e funcionalismo............. 133

    3.1. Introduo........................................................................................................ 1333.2. A teoria causai da ao (causalismo).............................................................. 1343.3. A teoria final da ao (finalismo).................................................................. 1353.4. Funcionalismo.................................................................................................. 136

    4. Responsabilidade penal da pessoa jurdica....................................................... 137

    Captulo II - Conceito de Crime.................................................................................. 1431. Infraes penais: crimes e contravenes........................................................... 1432. Conceito de crime.................................................................................................. 1443. Conceito definitorial de delito - segundo a teoria do labeling approach (ou

    teoria do etiquetamento)........................................................................................ 1454. Conceito analtico de crime.................................................................................. 145

    4.1. Tipicidade......................................................................................................... 1474.2. Antijuridicidade............................................................................................... 1474.3. Culpabilidade................................................................................................... 1484.4. Relao entre os conceitos definitorial e analtico de crime..................... 148

    Captulo III - Evoluo do Conceito de Tipo............................................................. 1511. Sistema tripartido: o tipo como indcio de antijuridicidade............................. 1512. Sistema bipartido: a teoria dos elementos negativos do tipo............................. 1523. Posio aqui adotada: teoria dos elementos negativos do tipo (sistema bipar

    tido) .......................................................................................................................... 1534. Teoria da tipicidade conglobante........................................................................ 1555. Para uma configurao monista-funcional da teoria do delito.......................... 156

    5.1. Culpabilidade como exigibilidade, tendo em vista os fins de prevenogeral e especial................................................................................................. 157

    Captulo IV - Classificao dos Crimes....................................................................... 163Estrutura do tipo: classe de tipos................................................................................. 1631. Crimes dolosos, culposos e preterdolosos........................................................... 1632. Crimes materiais, formais e de mera conduta.................................................... 1633. Crimes comissivos, omissivos prprios e omissivos imprprios........................ 1644. Crimes comuns e especiais..................................................................................... 1655. Crimes principais e acessrios.............................................................................. 1655. Crimes instantneos e permanentes..................................................................... 1657. Crimes simples e compostos................................................................................. 166i. Crimes de dano e de perigo................................................................................... 166

    Crimes unissubjetivos e plurissubjetivos.............................................................. 16710. Crimes de ao nica e de ao mltipla............................................................ 16711- Crimes habituais..................................................................................................... 168

    -aptulo V - Relao de Causalidade.......................................................................... 1691. Introduo................................................................................................................ 169

    Teoria da equivalncia dos antecedentes causais ou da conditio sine qua non.......................................................................................................................... 169

  • D ireito Penal - P arte G eral

    2.1. Alcance.................................................................................................................. 1702.2. Interrupo do processo causai......................................................................... 171

    2.2.1. Causas absoluta e relativamente independentes............................... 1712.2.2. Causas absoluta e relativamente independentes: irrelevncia da

    distino................................................................................................... 1722.2.3. Causa superveniente relativamente independente........................... 173

    3. Crtica teoria da equivalncia dos antecedentes causais................................. 1744. Relao causai nos crimes omissivos...................................................................... 175

    4.1. Crimes omissivos prprios e omissivos imprprios: distino................... 1764.2. Causalidade nos crimes omissivos imprprios: requisitos........................... 1774.3. Inconstitucionalidade dos crimes omissivos imprprios?........................... 178

    5. A moderna teoria da imputao objetiva.............................................................. 1815.1. Significado e posio sistemtica..................................................................... 1815.2. Conceito de risco permitido............................................................................ 1825.3. Crtica teoria da imputao objetiva............................................................ 1835.4. Concluso............................................................................................................ 185

    Captulo VI - Teoria do Dolo......................................................................................... 1871. Introduo: ausncia de conduta........................................................................... 1872. Dolo e conscincia da ilicitude............................................................................... 188

    2.1. Questo preliminar: dolo normativo versus dolo natural........................... 1882.2. Dolo numa perspectiva monista-funcional.................................................... 189

    3. Conceito e atualidade dolo...................................................................................... 1914. Elementos do dolo: representao e vontade....................................................... 1925. Espcies de dolo: dolo direto e dolo eventual....................................................... 1936. Dolo eventual e culpa consciente: distino.......................................................... 194

    6.1. Dolo eventual e culpa consciente: teorias..................................................... 1967. Elementos subjetivos do tipo?................................................................................. 1988. Crime qualificado pelo resultado: preterdolo ou preterintencionalidade....... 199

    8.1. Inconstitucionalidade dos crimes qualificados pelo resultado?................. 2009. Ausncia de dolo: erro de tipo................................................................................ 201

    9.1. Espcies de erro de tipo: erro inevitvel e evitvel..................................... 20210. Ausncia do conhecimento do injusto: erro de proibio................................. 203

    10.1. Conceito............................................................................................................ 20310.2. Objeto da conscincia do injusto.................................................................. 20310.3. Divisibilidade do erro...................................................................................... 20410.4. Espcies de erro: inevitvel e evitvel........................................................ 20410.5. Posio sistemtica.......................................................................................... 20510.6. Desconhecimento da lei e desconhecimento da ilicitude do fato: dis

    tino ................................................................................................................. 20511. Erro sobre causas de justificao - erro de tipo permissivo............................... 207

    11.1. Conceito........................................................................................................... 20711.2. Espcies: erro inevitvel e evitvel.............................................................. 20711.3. Posio sistemtica......................................................................................... 208

  • Paulo Queiroz

    12. Erro de tipo, erro de proibio e erro sobre causas de justificao: uma distino a ser superada.............................................................................................. 209

    13. Erro provocado por terceiro................................................................................. 21114. Erro sobre a pessoa: aberratio ictus..................................................................... 212

    14.1. Crtica disciplina legal da aberratio ictus................................................ 21315. Resultado diverso do pretendido (aberrado delicti)............................................ 215

    Captulo VII - Teoria do Crime Culposo.................................................................... 2171. Introduo................................................................................................................ 2172. Excepcionalidade do crime culposo.................................................................... 2183. Conceito de culpa: requisitos................................................................................ 2184. Princpio da confiana........................................................................................... 2205. Estrutura do crime culposo................................................................................... 221

    5.1. Estrutura do crime culposo: causas de justificao e de excluso de culpabilidade .......................................................................................................... 222

    5. Culpa consciente e culpa inconsciente............................................................... 2237. Imprudncia, negligncia, impercia................................................................... 224}. Autocolocao em perigo...................................................................................... 225

    Zaptulo VIII - Consumao e Tentativa................................................................... 227l. Introduo................................................................................................................ 227!. Crime consumado: significado.............................................................................. 227

    2.1. Consumao nos crimes materiais, formais, de mera conduta e outros ... 229I. Consumao e exaurimento.................................................................................. 229L Tentativa: conceito e requisitos............................................................................ 229

    4.1. Tentativa e dolo eventual: incompatibilidade?............................................ 2314.2. Preparao e tentativa: distino................................................................... 2314.3. Crimes que no admitem tentativa............................................................... 2334.4. Punio da tentativa: fundamento poltico-criminal.................................. 2334.5. Tentativa e princpios da ofensividade e proporcionalidade..................... 234

    . Desistncia voluntria (da tentativa).................................................................... 236

    . Arrependimento eficaz (da tentativa).................................................................. 2376.1. Posio sistemtica.......................................................................................... 237Tentativa inidnea ou crime impossvel.............................................................. 237Crime impossvel em razo de preparao de flagrante - a Smula 145 do STF.. 2388.1. Preparao do flagrante.................................................................................. 2398.2. Impossibilidade de consumao.................................................................... 2408.3. Flagrante retardado......................................................................................... 240Arrependimento posterior..................................................................................... 240

    aptulo IX - Concurso de Pessoas: autoria e participao...................................... 243Introduo................................................................................................................ 243Conceito e momento.............................................................................................. 243Requisito: adeso subjetiva ou nexo psicolgico................................................ 2443.1. Desistncia voluntria e arrependimento eficaz......................................... 245Autoria e participao: distino.......................................................................... 2464.1. Teoria unitria................................................................................................. 247

  • D ireito P en al - P arte G eral

    4.2. Teoria objetivo-formal....................................................................................... 2484.3. Teoria subjetiva................................................................................................... 2494.4. A teoria do domnio do fato............................................................................ 249

    5. Formas de autoria....................................................................................................... 2505.1. Co-autoria............................................................................................................. 251

    5.1.1. Co-autoria em crimes culposos............................................................. 2515.2. Autoria mediata (ou indireta)........................................................................... 253

    6. Participao (em sentido estrito): acessoriedade................................................. 2546.1. Adoo da teoria da acessoriedade extremada da participao................. 255

    7. Formas de participao: instigao e cumplicidade............................................ 2578. Co-autoria e participao nos crimes omissivos.................................................. 2589. Participao de menor importncia....................................................................... 25910. Participao dolosamente diversa (ou desvio subjetivo de conduta).............. 25911. (In)comunicabilidade das circunstncias de carter pessoal............................. 260

    Captulo X - Teoria da Ilicitude Causas de Justificao............................................. 2631. Introduo................................................................................................................... 2632. Requisito subjetivo nas causas de justificao..................................................... 2643. Excesso nas causas de justificao........................................................................... 2654. Efeitos.......................................................................................................................... 2665. Erro sobre causas de justificao............................................................................ 2666. Causas de justificao em espcie........................................................................... 267

    6.1. Legtima defesa................................................................................................... 2676.1.1. Requisitos................................................................................................. 268

    A) Agresso injusta - atual ou iminente............................................ 268B) Atualidade ou iminncia da agresso............................................ 270C) Defesa de direito prprio ou de terceiro...................................... 270D) Uso moderado dos meios necessrios........................................... 272

    6.2. Estado de necessidade....................................................................................... 2736.2.1. Significado e posio sistemtica........................................................ 273

    6.2.1.1. Estado de necessidade, como excludente do crime............ 2746.2.2. Requisitos................................................................................................ 275

    A) Existncia de perigo atual e inevitvel........................................ 275B) Perigo no provocado pelo agente................................................ 276C) Inexistncia de dever legal de enfrentar o perigo...................... 276D) Inexigibilidade do sacrifcio do bem ameaado.......................... 277E) Ameaa a direito prprio ou alheio............................................... 277

    6.3. Estrito cumprimento do dever legal............................................................... 2786.4. Exerccio regular de direito (em sentido estrito)......................................... 2796.5. Consentimento do ofendido........................................................................... 279

    Captulo XI Teoria da Culpabilidade: Causas de Excluso de culpabilidade........ 283I. Introduo................................................................................................................. 283

    Evoluo do conceito de culpabilidade................................................................. 2851. Culpabilidade segundo a doutrina causalista: concepo psicolgica da

    culpabilidade..................................................................................................... 285

  • Paulo Q ueiroz

    2. Concepo normativa da culpabilidade......................................................... 2873. Culpabilidade segundo a doutrina finalista: concepo normativa pura .. 2874. Culpabilidade segundo o funcionalismo: culpabilidade como limite

    preveno.......................................................................................................... 2885. Causas de excluso de culpabilidade em espcie......................................... 291

    5.1. Inimputabilidade decorrente de alienao mental............................... 2925.1.1. Significado e pressupostos............................................................ 2925.1.2. Efeito................................................................................................ 2945.1.3. Reduo de pena no caso de imputabilidade diminuda.......... 295

    5.2. Menoridade penal..................................................................................... 2955.3. Coao moral irresistvel (CP, art. 22)................................................... 2965.4. Obedincia hierrquica (CP, art. 22)...................................................... - 2975.5. Embriaguez............................................................................................... 298

    5.5.1. Embriaguez involuntria.............................................................. 2995.5.2. Embriaguez voluntria.................................................................. 299

    5.6. Emoo e paixo....................................................................................... 300

    Captulo XII - Concurso de Crimes............................................................................ 3031. Concurso material (ou real): pluralidade de aes e crimes............................. 3032. Concurso formal (ou ideal): unidade de ao e pluralidade de crimes........... 3033. Crime continuado: pluralidade de aes e unidade de crime........................... 304. 3.1. Requisitos......................................................................................................... 305

    3.2. Pena................................................................................................................... 3063.3. Crime continuado especfico......................................................................... 306

    3.3.1. Pena.................................................................................................. 307

    Terceira Parte CONSEQNCIAS JURDICO-PENAIS DO CRIME

    Da Pena............................................................................................................. 3111. Conceito, fins e limites............................................................................ 311

    I. Pena de Priso.................................................................................................. 3121. Falncia da pena de priso?..................................................................... 3122. Limites do discurso reformista-liberal................................................ 313

    II. Individualizao Judicial da Pena (sano penal)........................................ 3171. Significado e importncia........................................................................ 317

    1.1. Individualizao da pena e pessoa jurdica.................................... 3182. Individualizao e garantismo................................................................. 318

    2.1. Concurso de agentes e concurso de crimes.................................... 3202.2. Emendatio e mutatio libelli.............................................................. 3212.3. Sistema acusatrio e emendatio libelli........................................... 321

    3. Pode o juiz fixar pena abaixo do mnimo legal?................................... 3244. Erros freqentes na aplicao da pena................................................... 325

    y* Mtodo de fixao da pena............................................................................. 3271. Primeira fase: fixao da pena-base....................................................... 328

  • D ireito Penal - Parte G eral

    2. Segunda fase: fixao da pena provisria............................................... 3282.1. Concurso de agravantes e atenuantes.............................................. 3282.2. Qualificadoras e agravantes............................................................... 329

    3. Terceira fase: fixao da pena definitiva................................................ 3303.1. Causas de aumento de pena e qualificadoras: distino............... 3303.2. Limites mximos e mnimos decorrentes das causas de aumento

    e diminuio......................................................................................... 3303.3. Concurso de causas de aumento e diminuio de pena: possibi

    lidades.................................................................................................... 331V. De como se procede ao clculo da pena.......................................................... 332VI. Mtodo para incidncia das causas de aumento e diminuio................... 333VII. Circunstncias judiciais em espcie................................................................. 334

    Introduo........................................................................................................... 3341. Culpabilidade.............................................................................................. 3342. Antecedentes do ru................................................................................... 3363. Conduta social............................................................................................. 3374. Personalidade do ru................................................................................. 3385. Motivos do crime........................................................................................ 3386. Circunstncias e conseqncias do crim e.............................................. 3397. Comportamento da vtima........................................................................ 339

    VIII. Segunda fase: fixao da pena provisria........................................................ 340IX. Circunstncias agravantes em espcie............................................................. 340

    Introduo........................................................................................................... 3401. Reincidncia................................................................................................ 3402. Motivo ftil ou torpe.................................................................................. 3443. Para facilitar ou assegurar a execuo, a ocultao, a impunidade ou

    a vantagem de outro crime........................................................................ 3454. Traio, emboscada, dissimulao ou qualquer recurso que dificulte

    ou tome impossvel a defesa do ofendido.............................................. 3465. Emprego de veneno, explosivo etc............................................................ 3466. Embriaguez preordenada............................................................................ 3477. Ascendente, descendente, irmo ou cnjuge......................................... 3478. Contra criana, maior de sessenta anos, enfermo e mulher grvida.. 3489. Abuso de poder ou violao inerente a cargo, ofcio, ministrio ou

    profisso........................................................................................................ 34910. Ofendido sob proteo de autoridade...................................................... 34911. Ocasio de incndio, naufrgio, inundao u qualquer calamidade

    pblica, ou de desgraa particular do ofendido..................................... 34912. Abuso de autoridade ou prevalecimento de relaes domsticas, de

    coabitao ou de hospitalidade, ou com violncia contra a mulher na forma da lei especfica............................................................................... 350

    13. Agravantes em concurso de pessoas........................................................ 35013.1. Agente que promove, organiza a cooperao ou dirige a ativi

    dade dos demais agentes.................................................................. 350

  • Paulo Q ueiroz

    13.2. Agente que coage ou induz outrem execuo material docrime................................................................................................. 351

    13.3. Agente que instiga ou determina a cometer o crime algum sujeito sua autoridade ou no punvel em virtude de condioou qualidade pessoal....................................................................... 351

    13.4. Paga ou promessa de recompensa.................................................. 352X. Circunstncias atenuantes em espcie........................................................... 353

    Introduo......................................................................................................... 3531. Idade do agente........................................................................................ 3532. Desconhecimento da le i.......................................................................... 3533. Motivo de relevante valor social ou moral........................................... 3544. Evitao das conseqncias ou reparao do dano............................... - 3545. Coao resistvel, cumprimento de ordem hierrquica etc................ 3546. Confisso espontnea............................................................................... 3557. Influncia de multido em tumulto, se no o provocou.................... 356

    XI. Regimes prisionais............................................................................................ 3561. Progresso e regresso de regime........................................................... 356

    1.1. Regime disciplinar diferenciado..................................................... 3582. Progresso nos crimes hediondos.......................................................... 359

    2.1. Constitucionalidade da proibio de progresso dos crimes hediondos ............................................................................................... 360

    3. Execuo provisria da sentena............................................................ 362XII. Detrao............................................................................................................. 365

    1. Conceito e cabimento.............................................................................. 3652. Conexo processual.................................................................................. 366

    XIII. Direitos e deveres do condenado.................................................................... 367XIV. Remio.............................................................................................................. 369XV. Limite mximo da pena de priso................................................................... 370

    1. Significado e justificao......................................................................... 3702. Alcance...................................................................................................... 3713. Supervenincia de nova condenao..................................................... 373

    XVI. Penas Restritivas de Direitos........................................................................... 3741. Introduo................................................................................................. 3742. Requisitos para a substituio................................................................ 375

    2.1. Vedao de pena restritiva de direito na nova lei de droga........ 3783. Converso em pena privativa da liberdade........................................... 3804. Penas restritivas de direito em espcie.................................................. 381

    4.1. Prestao de servios comunidade ou a entidades pblicas..... 3814.2. Interdio temporria de direitos................................................... 3824.3. Limitao de final de semana.......................................................... 3844.4. Perda de bens e valores.................................................................... 3854.5. Prestao pecuniria......................................................................... 386

    4.5.1. Substituio por prestao de outra natureza.................... 3864.6. Multa substitutiva............................................................................. 387

  • D ire ito P en al - P arte G eral

    XVII. Pena de Multa...................................................................................................... 3871. Significado e crtica...................................................................................... 3872. Individualizao da pena: limites mximo e mnimo......................... 3883. Pagamento e execuo da multa............................................................. 389

    XVIII. Medidas de Segurana....................................................................................... 3891. Conceito e pressupostos................................................................................ 389

    1.1. A Lei de Reforma Psiquitrica ou Lei Antimanicomial................ 3932. Finalidade...................................................................................................... 3943. Prazos mximo e mnimo......................................................................... 3954. Penas e medidas de segurana se distinguem realmente?.................. 397

    4.1. Natureza jurdica da sentena........................................................... 3995. Espcies........................................................................................................... 400

    5.1. Converso regressiva e progressiva.................................................. 4016. Extino......................................................................................................... 401

    XIX. Suspenso condicional da execuo da pena - sursis................................... 402XX. Livramento condicional..................................................................................... 404

    1. Conceito e requisitos........................................................ ........................ 4041.1. Pena igual ou superior a dois anos................................................... 4051.2. Cumprimento de parte da pena........................................................ 4051.3. Reincidncia especfica em crime hediondo.................................. 4061.4. Reparao do dano.............................................................................. 4071.5. Presuno de no-reincidncia......................................................... 4071.6. Comportamento satisfatrio etc........................................................ 408

    2. Revogao do livramento......................................................................... 4082.1. Revogao obrigatria........................................................................ 4082.2. Revogao facultativa......................................................................... 4092.3. Efeitos da revogao........................................................................... 409

    3. Extino da pena......................................................................................... 410XXL Da Ao Penal...................................................................................................... 410

    1. Conceito e legitimidade de agir............................................................... 4102. Ao penal pblica..................................................................................... 411

    2.1. Princpios que a regem....................................................................... 4112.2. Irretratabilidade da representao................................................... 412

    3. Ao penal privada..................................................................................... 4133.1. Renncia do ofendido......................................................................... 4133.2. Perdo do ofendido............................................................................. 413

    4. Ao penal privada subsidiria................................................................. 4145. Decadncia do direito de queixa e de representao............................ 414

    XXII. Causas de extino de punibilidade.................................................................. 4151. Introduo.................................................................................................... 4152. Causas de extino em espcie.................................................................. 416

    2.1. Morte do agente.................................................................................. 4162.2. Anistia, graa e indulto...................................................................... 4172.3. Perempo............................................................................................ 4182.4. Retratao............................................................................................. 419

  • Sum rio

    2.5. Perdo judicial................................................................................... 4192.6. A bolido criminis e outras................................................................. 4202.7. Prescrio........................................................................................... 420

    2.7.1. Conceito e fundamento......................................................... 4202.7.2. Espcies de prescrio............................................................ 4212.7.3. Prazos....................................................................................... 4232.7.3.1. Prescrio da Medida de Segurana................................ 4242.7.4. Causas de aumento e de diminuio de pena...................... 4242.7.5. Reincidncia........................................................................... 4252.7.6. Concurso de crimes................................................................ 4252.7.7. Prescrio (ordinria) da pretenso punitiva..................... 4262.7.8. Prescrio (extraordinria) retroativa e superveniente...... 4262.7.9. Prescrio retroativa antecipada.......................................... 4272.7.10. Termo inicial da prescrio................................................ 4292.7.11. Termo inicial da prescrio da pretenso punitiva.......... 4292.7.12. Termo inicial da prescrio da pretenso executria..... 4292.7.13. Causas impeditivas ou suspensivas da prescrio............. 4302.7.14. Causas interruptivas da prescrio..................................... 431

    XXIII. Dos efeitos da condenao............................................................................. 4341. Significado.................................................................................................. 4342. Efeitos genricos........................................................................................ 435

    2.1. Dever de indenizar........................................................................... 4352.2. Confisco em favor da Unio dos instrumentos e produtos do

    crime.................................................................................................... 4363. Efeitos especficos...................................................................................... 437

    3.1. Perda de cargo, funo pblica ou mandato eletivo...................... 4373.2. Incapacidade para o exerccio do poder familiar, tutela ou cura-

    tela....................................................................................................... 4383.3. Inabilitao para dirigir veculo...................................................... 438

    XXIV. Reabilitao....................................................................................................... 438

    Referncias Bibliogrficas............................................................................................. 441

  • Nota do A utor

    xix

    Nota do Autor

    O texto que o leitor tem em mos, dirigido basicamente, mas no exclusivamente, a alunos do curso da graduao em direito, pretende tratar o direito penal a partir de uma perspectiva crtica e comprometida com o sistema de valores e princpios da Constituio Federal, alfa e mega do ordenamento jurdico e, pois, comeo e fim da juridicidade. De acordo com essa perspectiva, todos aqueles que lidam com o direito (juizes, membros do Ministrio Pblico, advogados, autoridades administrativas, alunos, professores etc.) ho de deixar de ser meros espectadores da lei, para exercerem ativamente, como seus intrpretes e aplicadores vivos, um papel bem mais dinmico, complexo, crtico e criativo do direito, tendo como referncia a legalidade constitucional. E esse novo e desafiador papel mais cresce de importncia e mais exige de seus operadores quando se editam e se multiplicam leis penais simblicas, demaggicas e que, por conseguinte, s desacreditam mais ainda o j desacreditado sistema penal, pois servem para s criar uma impresso - e uma falsa impresso - de segurana jurdica.

    Alm disso, com a constitucionalizao dos direitos e garantias fundamentais do homem (CF, art. 5Q), a questo dos fins do direito penal deixou de ser pura especulao terica para tomar-se uma questo de direito positivo de fundamental importncia para juizes e legisladores, visto que a Constituio Federal, fundamento de validade da ordem jurdica, deve orientar tanto a elaborao das leis quanto a sua concreo, vale dizer, deve ser o ponto de partida e o ponto de chegada de toda construo e elaborao doutrinria e jurisprudencial.

    Naturalmente que um direito penal assim concebido - um direito penal da Constituio ou conforme a Constituio - h de ser necessariamente mnimo, garantista, instrumental e subsidirio da poltica social geral e, em particular, da poltica de preveno e controle da desviao, que deve ter como prioridade mxima a integrao social do homem e a realizao de suas necessidades bsicas (emprego, escola, sade, lazer), em cujo contexto o direito penal, como parte de uma poltica de proteo integral dos direitos humanos, h de ocupar e desempenhar um papel bastante modesto.

    Direito penal m nim o, porque a vocao libertria do constituinte de 1988 manifesta, conforme demonstra seu amplssimo rol de direitos e garantias individuais (art. 5q), de sorte que, sendo a liberdade a regra, a no-liberdade, a exceo, medidas constritivas da liberdade, sobretudo as de carter penal, devem constituir a exceo das excees, dizer, devem ser o ltimo recurso de defesa da juridicidade. Garantista, porque, por maior que seja o interesse do Estado em reprimir

  • determinadas condutas, tal s ser legtimo quando respeitadas, formal e materialmente, as garantias penais e processuais constitucionalmente consagradas. Instrum ental, porque, no constituindo o direito penal um fim em si mesmo, mas um meio de proteo de bens jurdicos, sua interveno s se justifica quando e se necessria para a consecuo dos fins que se lhe assinalem. Por fim , subsidirio, porque sua atuao h de pressupor o fracasso de outras instncias menos lesivas de controle social, com as quais dever concorrer utilmente.

    A questo fundamental reside assim em dar efetividade ao projeto democrtico, maximizando a proteo do cidado e minimizando a violncia, projeto para o qual pouco pode contribuir a interveno penal, inevitavelmente traumtica, cirrgica e negativa, i Afinal, um Estado que se define Democrtico de Direito (CF, art. 1Q), que declara, como seus fundamentos, a dignidade da pessoa humana, a cidadania, os valores sociais do trabalho, e proclama, como seus objetivos fundamentais, constituir uma sociedade livre, justa e solidria, que promete erradicar a pobreza e a marginalizao, reduzir as desigualdades sociais e regionais, promover0 bem de todos, sem preconceitos de origem, raa, sexo, cor, idade (art. 3Q), no pode nem deve pretender lanar sobre seus jurisdicionados, prematuramente, esse sistema de violncia seletiva e discriminatria, que o sistema penal, mxime quando esse mesmo Estado, por ao e/ou omisso, em grande parte co-responsvel pelas gravssimas disfunes sociais que vicejam e pelos dramticos conflitos que da derivam.

    Antes, e para no os trair com a mera retrica constitucional, h de assumir ! no uma postura passiva-negativa (garantismo negativo), mas uma postura ativa-i positiva (garantismo positivo), em face de seus jurisdicionados, dizer, h de ali-I ment-los, h de dar-lhes teto, h de prestigiar-lhes a sade, o trabalho, h de rea-| lizar a funo social da propriedade, h de possibilitar-lhes efetivamente o exerc

    cio da cidadania, proporcionando-lhes as condies mnimas de desenvolvimento de suas potencialidades, e assim reduzir os nveis de desigualdade social (realizao dos direitos sociais), sob pena de esse Estado carecer de toda legitimidade para exigir de tais pessoas qualquer prestao, j que, como ressalta Ferrajoli, a declarao constitucional dos direitos dos cidados eqivale declarao constitucional dos deveres do Estado.2 Urge assim trabalhar com o mnimo de direito penal e com o mximo de direitos sociais.

    Por fim, por no ser o direito penal uma cincia de professores, mas uma cincia de casos,3 toda e qualquer construo doutrinria deve ter como prioridade absoluta a resoluo de conflitos reais, evitando-se abstraes excessivas e inteis, de interesse puramente acadmico, de modo que decisivo aparelhar as agncias judiciais dos instrumentos necessrios soluo justa (ou minimamente

    1 A expresso de Antnio Garca-Pablos.2 D erecho y razn. Teoria de Garantismo Penal. Ed. Trotta. Madrid, 1995, p. 862.3 A expresso de Santiago Mir Puig.

  • Nota do A utor

    injusta) dos conflitos jurdico-penais. Os conceitos e institutos jurdico-penais devem enfim constituir uma ferramenta - til - de trabalho, de um trabalho que se pretende justo.

    Alis, ingnuo pensar que a tcnica jurdica seja bastante para se decidir justamente. Sim, porque a formao tcnico-jurdica s pode oferecer, na mehor das hipteses, isso: uma deciso tcnica. Mas uma deciso tcnica no uma deciso justa ou ao menos no o necessariamente: em particular aqueles que acompanham mais de perto as decises do Tribunal do Jri sabem muito bem que os jurados, embora leigos em direito, nro raro decidem mais justamente do que os juizes togados. que, se, para o juiz tcnico, importa primeiramente a tcnica, para o juiz leigo, importa primordialmente a justeza das decises, por vezes, valendo-se inclusive de argumentos insustentveis do ponto de vista estritamente dogmtico. Parece, inclusive, que no fundo os grandes juizes de Direito, Promotores de Justia e advogados talentosos, diferentemente dos meros burocratas, semelhana dos poetas e msicos virtuosos, no se tomam; nascem; e a tcnica para tais pessoas constitui apenas um instrumento de aperfeioamento de habilidades/qualidades inatas, preexistentes formao tcnica, a qual no constitui em si mesmo garantia de justia. que uma boa interpretao, na arte, como no direito, mais do que tcnica e razo, requer talento e sensibilidade.

    Ademais, semelhante perspectiva (garantista), infensa a toda sorte de dogmas, verdades preconcebidas ou argumentos de autoridade (argumentos potestativos), convida dvida, estimula o esprito crtico e a incerteza permanente sobre a vali- dez das leis e de sua aplicao, assim como a conscincia do carter em grande parte ideal - e, pois, irrealizado e carente de realizao - de seus prprios fundamentos e fontes de legitimao jurdica.4

    O leitor logo perceber que, conseqente com semelhante projeto, ousou o autor em mais de um lugar defender posies divergentes da doutrina e do direito codificado, por entender que o saber penal no a mera contemplao do direito como , mas a projeo do direito que deve ser (Filangieri). Afinal, a histria do direito penal a histria do Estado, um largo caminho de democratizao que s estamos iniciando e que, por isso, requer uma constante reviso crtica e implica ao mesmo tempo remover, permanentemente, mitos, fices e alienaes que impeam essa reviso.5

    4 Ferrajoli, cit., p. 853.5 Juan Bustos Ramrez. Bases Crticas de un nuevo derecho p en a i Bogot: Temis, 1982, p. 150.

  • Primeira Parte

    FUNDAMENTOS DO DIREITO PENAL

  • D ireito Penal - P arte G eral

    Captulo I Introduo

    1. Conceito de direito penal

    Simplificadamente,1 o direito penal ou direito criminal a parte do ordenamento jurdico que define as infraes penais (crimes e contravenes) e comina as respectivas sanes (penas e medidas de segurana).2

    Eis algumas das definies mais conhecidas: Franz von Liszt o define como o conjunto das prescries emanadas do Estado que ligam ao crime, como fato, a pena, como conseqncia;3 Mezger, como o exerccio do poder punitivo do Estado, que conecta ao delito, como pressuposto, a pena, como conseqncia jurdica;4 Welzel, como a parte do ordenamento jurdico que determina as caractersticas da ao delituosa e lhe impe penas ou medidas de segurana .5

    Wessels d uma definio mais completa: por Direito Penal designa-se a parte do ordenamento jurdico que determina os pressupostos da punibilidade, bem como os caracteres especficos da conduta punvel, cominando determinadas penas e prevendo, a par de outras conseqncias jurdicas, especialmente medidas de segurana.6 Entre ns, Frederico Marques assinala que para se ter uma noo exata imprescindvel que nela se compreendam todas as relaes jurdicas que as normas penais disciplinam, inclusive as que derivam dessa sistematizao ordenadora do delito e da pena, apresentando o seguinte conceito: o direito penal o conjunto de normas que ligam ao crime, como fato, a pena, como conseqncia, e disci

    1 Por conceito, entende-se todo o processo que tom e possvel a descrio, a classificao e a previso dos objetos cognoscveis. Assim entendido, esse termo tem significado generalssimo e pode incluir qualquer espcie de sinal ou procedimento semntico, seja qual for o objeto a que se refere, abstrato ou concreto, prximo ou distante, universal ou individual. Nicola Abbagnano. Dicionrio de Filosofia. S. Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 164.

    2 De acordo com Juarez Cirino, o direito penal o setor do ordenamento jurdico que define crim es, comina penas e prev medidas de segurana aplicveis aos autores das condutas incriminadas. Direito Penal. Parte Geral. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 3. Eis ainda o conceito de Luis Jim nez de Asa: conjunto de normas e disposies jurdicas que regulam o exerccio do poder sancionador e preventivo do Estado, estabelecendo o conceito do delito como pressuposto da ao estatal, assim como a responsabilidade do sujeito ativo, e associando infrao da norma um pena finalista ou uma medida de segurana. La ley e el delito: curso de dogmatica penal. Caracas: editorial Anrs Bello, 1945, p. 17.

    3 Tratado de direito penal alemo, trad. Jos Hygino Duarte Pereira. Rio de Janeiro: Briguiet, 1899, v. 1, p. 1.4 Tratado de derecho penal, 2. ed. Madrid: 1946, v. 1, p. 27-28.5 D erecho penal alemn, trad. Bustos e Prez. Santiago: Ed. Jurdica de Chile, 1993, p. 1.6 Pireito penal, trad. Juarez Tavares, 5. ed.. Porto Alegre: Srgio A. Fabris, Editor, 1976, p. 5.

  • Paulo Q ueiroz

    plina, tambm, outras relaes jurdicas da derivadas, para estabelecer a aplicabilidade de medidas de segurana e a tutela do direito de liberdade em face do poder de punir do Estado.7

    Mas tais definies no so de todo exatas, estando o objeto do direito penal alm delas. Basta referir algumas normas: no h crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prvia cominao legal; ningum pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime; considera-se praticado o crime no momento da ao ou omisso, ainda que outro seja o momento do resultado (CP, arts. fo a 40). a pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime (art. 8e); o resultado, de que depende a existncia do crime, somente imputvel a quem lhe deu causa (art. 13); entende-se em legtima defesa quem... (art. 25); isento de pena... (art. 181); considera-se funcionrio pblico... (art. 327).

    V-se assim que as normas jurdico-penais no se limitam definio de comportamentos delituosos, cominando-lhes as respectivas sanes. A prevalecer to restrito conceito, s teremos como normas penais aquelas previstas na chamada Parte Especial dos cdigos e leis penais extravagantes que prevem as condutas delituosas. A Parte Geral, e no raro tambm a Parte Especial, em vez de declarar quais so os comportamentos criminosos ou contravencionais, trata sobretudo de delimitar o mbito de atuao das normas penais e de estabelecer os critrios de interpretao/aplicao do direito penal.

    Mas no apenas isso. A Constituio Federal (principalmente) e o Cdigo Penal definem ainda as bases e os princpios que informam o direito penal, traando-lhe o perfil, limites e contornos. Numa palavra, do-lhe a conformao polti- co-jurdica.

    Assim, por exemplo, quando adota o princpio da legalidade, o princpio da no-perpetuao das penas, o princpio da proporcionalidade etc.. Enfim, as normas tipicamente penais - previstas ou no num diploma penal - , ao tempo em que fundam e estruturam o poder punitivo do Estado, fixam os princpios e regras fundamentais que vo governar a interveno jurdico-penal, criando, paralelamente, um sistema de garantias em face do exerccio deste poder.

    Ademais, tais definies, ao ressaltarem a relao Estado/infrator, marginalizam a vtima, desconsiderando o papel fundamental que esta vem de assumir no direito penal e processual penal.8

    Tratado de direito penal. Campinas: Bookseller, 1997, p. 24.Fala-se inclusive de vtimo-dogmtica, parte da vitimologia que se ocuparia da influncia do comportamento da vtima na dogmtica penal; havendo quem entenda (Schnemann, que desenvolve o princpio vitimolgico) que onde seja possvel e exigvel uma autoproteo fcil e eficaz por parte da prpria vtima no ocorre, propriamente, uma leso socialmente perigosa e digna de represso jurdico-penal, motivo pelo qual o ofendido no , em tal caso, merecedor da proteo outorgada pelo direito penal, dado o carter de ultima ratio. Sobre o assunto, Roxin, D erecho penal: parte general. Madrid: Ed. Civitas, 1997, p. 562-567.

  • D ireito Penai - P arte G eral

    Cabe conceituar assim, e preliminarmente, o direito penal como o conjunto das normas jurdicas que, materializando o poder punitivo do Estado, define as infraes penais (crimes e contravenes) e comina as sanes correspondentes (penas, medidas de segurana ou outra conseqncia legal9), estabelecendo ainda os princpios e garantias em face do o exerccio deste poder, ao tempo em que cria os pressupostos de punibilidade.

    Pode-se ainda conceitu-lo, como faz Garca-Pablos, sob o enfoque dinmico e sociolgico, como sendo um dos instrumentos do controle social formal por meio do qual o Estado, mediante determinado sistema normativo (as leis penais), castiga com sanes negativas de particular gravidade (penas e outras conseqncias afins) as condutas desviadas mais nocivas para a convivncia, assegurando desse modo a necessria disciplina social e a correta socializao dos membros do grupo.10

    certo tambm que, por meio da expresso Direito Penal, designada a cincia do direito penal. Nesse sentido, o saber ou a cincia penal tem por objeto o conhecimento, a interpretao, a sistematizao e a crtica do direito positivo.11

    Finalmente, convm advertir que todos esses conceitos so tambm passveis de crtica por confundirem, mais ou menos claramente, direito penal com legislao penal, isto , confundem lei e direito, conforme se esclarecer mais adiante.

    1.1. Relao entre Direito Penal e Direito Processual Penal

    O Direito Processual Penal o ramo do ordenamento jurdico cujas normas instituem e organizam os rgos pblicos que cumprem a funo jurisdicional do Estado e disciplinam os atos que integram o procedimento necessrio para a aplicao de uma pena ou medida de segurana.12 Incumbe ao processo penal, portanto, definir competncias, fixar procedimentos e estabelecer as medidas processuais necessrias realizao do direito penal, razo pela qual o processo penal nada mais do que um continuum do direito penal, ou seja, o direito penal em movimento, e, pois, formam uma unidade.

    Por conseguinte, no pode haver crime sem processo, porque por meio do processo penal que o Estado, que detm com exclusividade o direito de punir,13 di

    9 Ao me referir a outra conseqncia legal, quero aludir a medidas despenalizadoras, como a suspenso condicional do processo e a transao (Lei nQ 9.099/95), e efeitos no penais da sentena penal condenatria (obrigao de reparar o dano etc.), bem como admitir a possibilidade de redefinio e flexibilizao da resposta penal, segundo o princpio da adequao. No particular, entendo que o direito penal deve ampliar, sensivelmente, os modos de responder ao conflito, conforme as particularidades de cada caso concreto, buscando, semelhana do direito no penal (civil, administrativo), uma soluo para o caso, soluo que no precisa ter necessariamente carter de pena.

    10 Derecho penai: introduccin, Madrid: Universidad Complutense de Madrid, 1995, p. 1-2.11 Garca-Pablos, cit., p. 298.12 Maier, Julio B. J. Derecho Procesal Penal.Tomo I: Fundamentos. 3. ed. Buenos Aires: Editores dei Puerto,

    2004, p. 75.13 Conforme assinala Aury Lopes Jnior, o processo, como instituio estatal, a nica estrutura que se reco

    nhece como legtima para a imposio da pena, visto que o direito penal desprovido de coao direta e, di

  • r, por exemplo, se h ou no crime, se o crime est ou no provado, se a prova obtida ou no lcita, se o autor agiu ou no em legtima defesa, se ele ou no cul- pvel, se houve ou no prescrio. Por isso que entre o direito penal e o processo penal h uma relao de mtua referncia e complementaridade,14 visto que o direito penal impensvel sem um processo penal (e vice-versa). Da dizer Calmon de Passos que a relao entre o direito material (penal, civil) e o processo no uma relao apenas de meio e fim, isto , instrumental, mas uma relao integrativa, orgnica, substancial, uma vez que o direito socialmente construdo, historicamente formulado, atende ao contingente e conjuntural do tempo e do espao, e, por isso, somente o depois de produzido.15

    Exatamente por isso, os princpios e garantias inerentes ao direito penal (legalidade, irretroatividade da lei mais severa etc.) devem ser aplicados, por "igual, ao processo penal, unitariamente, no cabendo fazer distino no particular. Tambm por isso, os constrangimentos gerados pelo processo penal jamais podero exceder queles que poderiam resultar da prpria condenao, sob pena de converso do processo em pena antecipada, alm de violao ao princpio da proporcionalidade. Assim, no legtima a priso provisria sempre que infrao penal cometida for cominada pena no privativa da liberdade ou for cabvel a sua substituio por pena restritiva de direito ou semelhante.16

    Apesar disso, direito penal e processo penal no se confundem, porque, por exemplo, a priso provisria (priso em flagrante, priso preventiva) no a prpria pena cominada ao crime, nem sua antecipao, a qual pressupe um processo, sob pena de se confundir o processo de conhecimento com o processo de execuo (a prpria execuo da pena); e, neste caso, o processo, que deveria assegurar ao ru as garantias que lhe so inerentes, com vistas realizao de um julgamento justo ou ao menos conforme a Constituio seria um simples pretexto para se impor um castigo antecipado a algum e legitimar decises arbitrrias, como se de fato processo algum existisse.

    O mesmo deve ser dito quanto execuo penal, ltima etapa de realizao do direito penal, a qual deve ser regida pelos princpios constitucionais do direito e processo penal, afinal, o direito, apesar de compartimentado em ramos, pretende ser um s. Assim, modificaes legislativas criadas em desfavor do condenado no podem atingir as condenaes por crimes cometidos anteriormente sua entrada em vigor, sob pena de violao ao princpio da irretroatividade da lei mais severa

    ferentemente do direito privado, no tem atuao nem realidade concreta fora do processo correspondente, in Introduo crtica ao Processo Penal. 4* edio. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 3.

    14 Figueiredo Dias, Jorge. Direito Processual Penal. 1. ed 1974 (reimpresso). Coimbra: Coimbra Editora, 2004, p. 28.

    15 J. J.Calmon de Passos. Direito, poder, justia e processo. Forense: Rio de Janeiro, 1999, p. 52 e 68.16 Sobre isso, conferir Antnio Vieira. O Princpio da Proporcionalidade e Priso Provisria, in Leituras

    Complementares de Processo Penal. Salvador: JUSPODIVM, 2008.

  • D ire ito Penal - Parte G eral

    (v.g., uma lei que abolisse o livramento condicional deveria ser aplicada somente aos crimes cometidos posteriormente sua vigncia).

    Em concluso, e contrariamente doutrina e jurisprudncia ainda hoje majoritria, temos que tudo que se disser sobre o direito penal h de igualmente valer para o direito processual penal e execuo penal, necessariamente, a fim de confe- rir-lhes tratamento unitrio e conforme a Constituio.17

    1.2. Mas o que de fato o Direito?

    Em primeiro lugar, o direito um conceito, tal qual justia, moral, tica ou esttica. E como conceito, remete necessariamente a outros conceitos: lei, ordem, segurana, liberdade, bem jurdico etc., que tambm reenviam a outros tantos, motivo pelo qual s se pode obter um conceito de direito por meio de remisses, associaes.

    Em segundo lugar, o mais elaborado ou prestigiado conceito de direito apenas um entre vrios conceitos possveis, de sorte que traduz em ltima anlise o ponto de vista de seu autor ou de quem o adota, afinal outros tantos conceitos, mais ou menos exatos, mais ou menos amplos, so igualmente possveis. Tambm por isso, um conceito constitui uma apreenso sempre parcial do mundo, dentro de um universo de representaes possveis; um conceito uma simplificao, uma reduo.

    Em terceiro lugar, todo conceito, como representao formal do pensamento, pouco ou nada diz sobre o seu contedo, isto , pouco ou nada diz sobre as mltiplas formas que ele pode histrica e concretamente assumir, at porque, embora pretenda valer para o futuro, pensado a partir de uma experincia passada, a revelar que definir algo de certo modo legislar sobre o desconhecido. Tambm por isso, um conceito, como expresso da linguagem, estruturalmente aberto, e, pois, pode compreender objetos histricos os mais dspares (v.g., o conceito de legtima defesa depende do que se entenda, em dado contexto, por injusta agresso, atual ou iminente, uso moderado dos meios necessrios, direito prprio ou alheio etc.).

    Em quarto lugar, um conceito, que assim socialmente construdo, s compreensvel num espao e tempo determinados, motivo pelo qual, com ou sem alte

    17 De modo diverso, Elmir Duclerc (Curso Bsico de Direito Processual Penal, v. 1. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 4) sustenta que no correto vincular a existncia do direito processual ao direito penal, mesmo porque o processo penal nem sempre ser decidido com amparo em normas de direito material (pense-se, por exemplo, nos processos por crime de furto, em que pode ser necessrio discutir se a coisa subtrada era ou no alheia luz do Direito Civil). No estamos de acordo com isso, evidentemente. Desde logo, porque o direito um s, apesar de compartimentado em ramos, que no so compartimentos estanques; segundo, porque o recurso ao conceito jurdico-penal de infrao penal (no caso, crime de furto) absolutamente indispensvel; terceiro, porque no se pode justificar um conceito a partir de uma exceo; finalmente, porque o s fato de um processo penal poder ser anulado por meio de habeas eorpus por violar normas processuais no desmente a vinculao essencial entre direito penal e processo penal. Alm disso, o direito processo penal, ames de ser processo, direito, e no qualquer processo (civil, administrativo etc.), mas processo p en a l isto , relativo ao direito penal. Enfim, os argumentos invocados em favor da independncia do direito processual penal dizem respeito a aspectos acidentais, no essenciais, da relao poltico-jurdica em questo.

  • Paulo Queiroz

    8rao de seus termos, est em permanente mutao, afinal um conceito encerra uma conveno (sempre provisria), e est condicionado por pr-conceitos ou pr- juzos. Por isso que o legal ou ilegal, o lcito ou ilcito variam no tempo e no espao, independentemente (inclusive) da alterao dos termos da lei, at porque o direito existe com ou sem leis (v.g., comunidades ou pases que seguem um direito costumeiro). Todo conceito, assim como todo texto, pressupe um determinado contexto.

    Exatamente por isso, o que justo hoje ou o foi ontem no ser necessariamente amanh. Pode ocorrer inclusive de se ter por justo e legal num determinado momento algo que se tornar injusto e ilegal - e eventualmente criminoso - em momento posterior (v.g., a discriminao de homossexuais ou de filhos havidos fora do casamento, danos ao meio ambiente), podendo-se imaginar que no faturo, tal como j ocorre nalguns pases, muito do que atualmente ilegal se tornar legal (e vice-versa), como a eutansia, o casamento entre pessoas do mesmo sexo, a adoo por tais casais, a mudana de sexo etc. Alis, historicamente, nem todas as pessoas foram consideradas como sujeitos de direito (v.g., estrangeiros, prisioneiros de guerra, mulheres, escravos).18

    Em quinto lugar, o conceito de direito, tal qual o conceito de justia, liberdade, igualdade, e diferentemente do conceito de cavalo, automvel etc., que dizem respeito a algo concreto, no remetem a uma coisa, a um objeto, propriamente, mas a relaes e conflitos que da resultam (v.g., pais/filhos, empresa/empregados, autores/vtimas, Estado/criminosos etc.). Exatamente por isso, o direito no um conjunto de artigos de lei, mas um conjunto de relaes humanas.19

    Finalmente, todo conceito construdo pela equiparao de coisas desiguais e, por isso, constitui uma universalizao do no-universal, do singular; um conceito nasce, portanto, da postulao de identidade do no idntico.20 O conceito de crime, por exemplo, refere-se a um sem-nmero de condutas que a rigor nada tm em comum, exceo da circunstncia de estarem formalmente tipificadas: matar algum, subtrair coisa alheia mvel, emitir cheque sem proviso de fundos, portar droga para consumo pessoal, abater espcime de fauna silvestre etc. (espcime que pode variar de uma borboleta a uma ona pintada), conceitos, que, por sua vez, unificam coisas dspares. Com efeito, no existe um homicdio absolutamente igual a outro homicdio, nem um furto absolutamente igual a outro furto, nem um crime ambiental absolutamente igual a outro, pois as mltiplas variveis que sempre envolvem tais atos tornam cada ao humana singular, nica, irrepetvel. Enfim, um conceito formado pela eliminao do que h de particular em cada ato; e

    18 Tambm por isso, no correto criticar a justia ou injustia de um ato ou instituio (v. g., a escravido) desconsiderando o contexto em que surgiram. No de admirar, por isso, que no futuro, tal como j ocorre nalguns pases, se for abolida a represso ao trfico ilcito, drogas passem a ser vendidas livremente em drogarias e a histria da sua represso seja vista como selvageria ou algo similar.

    19 Arthur Kaufmann. Filosofia do Direito. Lisboa: Fundao Calouste Gulbenkian, 2004.20 Nietzsche, Friedrich. Sobre verdad y mentira en sentido extramoral. Madrid: Tecnos, 1996.

  • D ireito Penal - Parte Geral

    quanto mais exato, mais abstrato e mais vazio de contedo se toma.21 Os fatos so mais ou menos semelhantes, nunca idnticos.

    Alis, a analogia, que tradicionalmente tem merecido um tratamento secundrio, no constitui (conforme se ver mais tarde) um elemento acidental, mas essencial ao conhecimento/interpretao, pois o belo e o feio, o justo e o injusto, o legal e o ilegal so construdos em verdade a partir de comparaes (analogias), isto , recorrendo-se, conscientemente ou no, a experincias (sempre novas) de beleza, de justia e de legalidade.

    De tudo isso resulta que o direito no est previamente dado, pois parte da construo social da realidade; e, portanto, o direito no preexiste interpretao, mas dela resultado, razo pela qual a interpretao no um modo de desvelar um suposto direito preexistente, mas a forma mesma de produo do direito. Enfim, no mais a interpretao que depende do direito (ou da lei), mas o direito (ou a lei) que depende da interpretao.

    O que ento o direito? Sob essa perspectiva, uma multido mvel de metforas e metonmias.22

    1.3. Ainda o conceito de Direito: o Direito no existe23

    preciso insistir ainda que o direito no uma coisa, isto , no tem uma essncia, uma substncia; no existe ontologicamente, independentemente da representao que fazemos a seu respeito, porque constitui uma criao humana, que nasce e morre com o homem, ou seja, o direito no slido, nem lquido, nem gasoso, nem animal, nem vegetal.24

    Com efeito, aquilo que uma teoria do direito objetiva como direito, so palavras de Franois Ewald, como natureza do direito, como essncia do direito, no tem existncia real. O Direito - demos-lhe maisculas - no existe. Ou antes, no existe a no ser como um nome que reenvia a um objeto, mas serve para designar uma multiplicidade de objetos histricos possveis - que, como realidades, no tm

    21 Nietzsche, Friedrich. Sobre verdad y mentira en sentido extramoral. Madrid: Tecnos: 1996.22 Nietzsche, Friedrich. Sobre verdad y mentira en sentido extramoral. Madrid:Tecnos: 1996. Naturalmente

    que com esse conceito generalssimo, aplicvel a outros saberes, fica por esclarecer o que h (se h) de peculiar no fenmeno" jurdico.

    23 Conforme se infere de alguns conceitos: o direito , pois, o conjunto de condies sob