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Editor Jônatas Junqueira de MelloAssistente editorial Sirlene Miranda de SalesProdutora editorial Clarissa Boraschi Maria

Preparação de originais Ana Cristina Garcia / MariaIzabel Barreiros Bitencourt Bressan / Liana Ganiko Brito

CatenacciArte e diagramação Cristina Aparecida Agudo de

Freitas / Claudirene de Moura Santos SilvaRevisão de provas Rita de Cássia Queiroz Gorgati

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Acabamento Prol Editora Gráfica

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Data de fechamento da edição:7-11-2011

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art. - artigoBoletim da AASP - Boletim da Associação dosAdvogados de São PauloCC - Código Civilcf. - conferir ou confronteCF - Constituição FederalCP - Código PenalCPC - Código de Processo CivilDec. - DecretoDec.-Lei - Decreto-LeiDJU - Diário da Justiça da Uniãoed. - ediçãoENTA - Encontro Nacional de Tribunais de Alçadaj. - julgadoJTACSP - Julgados do Tribunal de Alçada Civil deSão PauloLF - Lei de FalênciasLRP - Lei dos Registros PúblicosMin. - Ministron. - númerop. - página

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p. ex. - por exemploRel. - RelatorREsp - Recurso EspecialRF - Revista ForenseRJTJRS - Revista de Jurisprudência do Tribunal deJustiça do Rio Grande do SulRJTJSP - Revista de Jurisprudência do Tribunal deJustiça de São PauloRSTJ - Revista do Superior Tribunal de JustiçaRT - Revista dos TribunaisRTJ - Revista Trimestral de Jurisprudências. - seguinte(s)STF - Supremo Tribunal FederalSTJ - Superior Tribunal de JustiçaT. - TurmaTFR - Tribunal Federal de RecursosTJSP - Tribunal de Justiça de São Paulov. - vide

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ÍNDICE

Abreviaturas

Título I — DA POSSE E DAS AÇÕESPOSSESSÓRIAS

Capítulo I — Generalidades sobre a Posse

1. Direito das coisas2. Direito real e direito pessoal3. Introdução ao estudo da posse4. Teorias sobre a posse5. Conceito de posse6. Posse e detenção7. Quase posse e composse8. O objeto da posse e a posse dos direitos pessoais9. Natureza jurídica da posse

Capítulo II — Espécies de Posse

10. Posse direta e posse indireta11. Posse justa e posse injusta12. Posse de boa-fé e posse de má-fé

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13. Posse nova e posse velha14. Posse natural e posse civil ou jurídica15. Posse ad interdicta e posse ad usucapionem16. Posse pro diviso e posse pro indiviso

Capítulo III — Aquisição e Perda da Posse

17. Introdução18. Modos de aquisição19. Quem pode adquirir a posse20. Perda da posse21. Recuperação de coisas móveis e títulos aoportador22. Perda da posse para o ausente

Capítulo IV — Efeitos da Posse

23. Tutela da posse23.1. Introdução23.2. A proteção possessória24. Ações possessórias em sentido estrito24.1. Legitimação ativa e passiva24.2. Conversão de ação possessória em ação deindenização25. Ações possessórias na técnica do Código deProcesso Civil25.1. A fungibilidade dos interditos

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25.2. Cumulação de pedidos25.3. Caráter dúplice das ações possessórias25.4. Distinção entre juízo possessório e juízopetitório. A exceção de domínio25.5. Procedimento: ação de força nova e ação deforça velha. Ação possessória relativa a coisa móvel25.6. A exigência de prestação de caução26. Da manutenção e da reintegração de posse26.1. Características e requisitos26.1.1. Introdução26.1.2. Posse26.1.3. Turbação26.1.4. Esbulho26.1.5. Data da turbação ou do esbulho26.1.6. Continuação ou perda da posse26.2. O procedimento26.2.1. A petição inicial26.2.2. Da liminar26.2.2.1. Concessão de liminar contra pessoa jurídicade direito público26.2.2.2. Recurso cabível26.2.2.3. Execução da decisão concessiva de liminar26.2.3. Contestação e procedimento ordinário26.3. Execução da sentença26.4. Embargos do executado e de retenção porbenfeitorias26.5. Embargos de terceiro

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27. Do interdito proibitório27.1. Características e requisitos27.2. Cominação de pena pecuniária28. Ações afins aos interditos possessórios28.1. Ação de imissão na posse28.1.1. Características e natureza jurídica28.1.2. Imissão na posse e reivindicatória28.2. Ação de nunciação de obra nova28.2.1. Conteúdo e pressupostos28.2.2. Legitimidade para a ação28.2.3. Procedimento28.2.4. Embargo extrajudicial28.3. Embargos de terceiro28.3.1. Introdução28.3.2. Pressupostos28.3.3. Parte equiparada a terceiro28.3.4. Legitimidade ativa e passiva. A legitimidadeativa do cônjuge28.3.5. Casos especiais: embargos para a defesa daposse nas ações de divisão e de demarcação eembargos do credor com garantia real28.3.6. Fraude contra credores e embargos28.3.7. Procedimento29. A percepção dos frutos29.1. Introdução29.2. Noção e espécies de frutos29.3. Regras da restituição (CC, arts. 1.214 a 1.216)

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30. A responsabilidade pela perda ou deterioração dacoisa31. A indenização das benfeitorias e o direito deretenção31.1. O possuidor e os melhoramentos que realizouna coisa31.2. Regras da indenização das benfeitorias (CC,arts. 1.219 a 1.222)31.3. Direito de retenção: conceito, fundamento,natureza jurídica e modo de exercício

Título II — DOS DIREITOS REAIS

Capítulo Único — Disposições Gerais

32. Conceito33. Espécies34. Aquisição dos direitos reais

Título III — DA PROPRIEDADE

Capítulo I — Da Propriedade em Geral

35. Conceito e elementos constitutivos dapropriedade36. Ação reivindicatória. Pressupostos e naturezajurídica

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36.1. Legitimidade ativa e passiva36.2. Outros meios de defesa da propriedade: açãonegatória e ação de dano infecto37. Caracteres da propriedade38. Evolução do direito de propriedade. Funçãosocial da propriedade39. Fundamento jurídico da propriedade40. Da descoberta

Capítulo II — Da Aquisição da PropriedadeImóvel

41. Modos de aquisição41.1. Da usucapião41.1.1. Conceito41.1.2. Espécies41.1.3. Pressupostos41.1.4. Ação de usucapião41.2. Do registro do título41.2.1. Princípios que regem o registro de imóveis41.2.2. Matrícula, registro e averbação41.2.3. Livros obrigatórios41.2.4. Retificação do registro41.3. Da acessão41.3.1. Acessões físicas ou naturais41.3.2. Acessões industriais

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Capítulo III — Da Aquisição da PropriedadeMóvel

42. Da usucapião43. Da ocupação44. Do achado do tesouro45. Da tradição46. Da especificação47. Da confusão, da comistão e da adjunção

Capítulo IV — Da Perda da Propriedade

48. Introdução49. Modos

Capítulo V — Dos Direitos de Vizinhança

50. Introdução51. Do uso anormal da propriedade51.1. Espécies de atos nocivos51.2. Soluções para a composição dos conflitos52. Das árvores limítrofes53. Da passagem forçada54. Da passagem de cabos e tubulações55. Das águas56. Dos limites entre prédios e do direito de tapagem57. Do direito de construir

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57.1. Limitações e responsabilidades57.2. Devassamento da propriedade vizinha57.3. Águas e beirais57.4. Paredes divisórias57.5. Uso do prédio vizinho

Capítulo VI — Do Condomínio Geral

58. Do condomínio voluntário58.1. Conceito e espécies58.2. Direitos e deveres dos condôminos58.3. Extinção do condomínio58.4. Da administração do condomínio59. Do condomínio necessário

Capítulo VII — Do Condomínio Edilício

60. Considerações iniciais. Natureza jurídica61. Instituição e constituição do condomínio62. Estrutura interna do condomínio63. Da administração do condomínio em edificações

Capítulo VIII — Da Propriedade Resolúvel

64. Conceito65. Causas de resolução da propriedade

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Capítulo IX — Da Propriedade Fiduciária

66. Conceito67. Regulamentação

Título IV — DA SUPERFÍCIE

68. Conceito69. Regulamentação70. Da enfiteuse70.1. Conceito. Objeto70.2. Características70.3. Extinção da enfiteuse

Título V — DAS SERVIDÕES

71. Conceito72. Características73. Classificação74. Modos de constituição74.1. Servidão constituída por ato humano74.2. Servidão constituída por fato humano75. Ações que protegem as servidões76. Da extinção das servidões

Título VI — DO USUFRUTO

77. Conceito e características

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78. Constituição e objeto79. Usufruto e fideicomisso80. Espécies81. Extinção do usufruto

Título VII — DO USO

Título VIII — DA HABITAÇÃO

Título IX — DO DIREITO DO PROMITENTECOMPRADOR

Título X — DIREITOS REAIS DE GARANTIA.DO PENHOR, DA HIPOTECA E DAANTICRESE

Capítulo I — Disposições Gerais

82. Conceito e características83. Efeitos: preferência, sequela, excussão eindivisibilidade84. Requisitos para eficácia da garantia real85. Cláusula comissória86. Vencimento antecipado da dívida. Saldo

Capítulo II — Do Penhor

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87. Conceito, características e objeto88. Espécies89. Extinção do penhor90. Do penhor rural91. Do penhor industrial e mercantil92. Do penhor de direitos e de títulos de crédito93. Do penhor de veículos94. Do penhor legal

Capítulo III — Da Hipoteca

95. Conceito e características96. Objeto97. Espécies98. Pluralidade de hipotecas99. Direito de remição100. Perempção101. Extinção da hipoteca

Capítulo IV — Da Anticrese

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TÍTULO IDA POSSE E DAS AÇÕES POSSESSÓRIAS

CAPÍTULO IGENERALIDADES SOBRE A POSSE

1 DIREITO DAS COISAS

O direito das coisas é o complexo das normasreguladoras das relações jurídicas concernentes aosbens corpóreos suscetíveis de apropriação pelohomem. Bem, em sentido filosófico, é tudo o quesatisfaz uma necessidade humana. Juridicamentefalando, o conceito de coisas corresponde ao debens, mas nem sempre há perfeita sincronizaçãoentre as duas expressões. Às vezes, coisas são ogênero e bens, a espécie; outras vezes, estes são ogênero e aquelas, a espécie; outras, finalmente, sãoos dois termos usados como sinônimos, havendoentão entre eles coincidência de significação (Scuto,Istituzioni di diritto privato; Parte Generale, v. 1, p.291).

José Carlos Moreira Alves, responsável pelaParte Geral do novo Código, considera, com apoio na

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lição de Trabucchi (Istituzioni di diritto civile, 13.ed., n. 158, p. 366), o conceito de coisa mais amplo doque o de bem. O direito das coisas (CC, Livro III)trata do direito real pleno, isto é, da propriedade,tendo por objeto coisa móvel ou imóvel corpórea, dopróprio titular; e dos direitos reais limitados,incidentes sobre coisa alheia.

O Código Civil brasileiro divide a matéria emduas partes, a saber: posse e direitos reais,dedicando, nesta última, títulos específicos àpropriedade e a cada um de seus desmembramentos,denominados direitos reais sobre coisas alheias.

2 DIREITO REAL E DIREITO PESSOAL

O direito real pode ser definido como o poderjurídico, direto e imediato, do titular sobre a coisa,com exclusividade e contra todos. No polo passivoincluem-se os membros da coletividade, pois todosdevem abster-se de qualquer atitude que possaturbar o direito do titular. No instante em que alguémviola esse dever, o sujeito passivo, que eraindeterminado, torna-se determinado. O direitopessoal, por sua vez, consiste numa relação jurídicapela qual o sujeito ativo pode exigir do sujeitopassivo determinada prestação. Constitui umarelação de pessoa a pessoa e tem, como elementos, o

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sujeito ativo, o sujeito passivo e a prestação. Osdireitos reais têm, por outro lado, como elementosessenciais: o sujeito ativo, a coisa e a relação oupoder do sujeito ativo sobre a coisa, chamadodomínio.

A teoria unitária realista procura unificar osdireitos reais e obrigacionais a partir do critério dopatrimônio, considerando que o direito das coisas eo direito das obrigações fazem parte de uma realidademais ampla, que seria o direito patrimonial.Entretanto, a diversidade de princípios que osorientam dificulta a sua unificação num só sistema.Mostra-se, portanto, a doutrina denominada dualistaou clássica mais adequada à realidade. Partindo daconcepção dualista, pode-se dizer que o direito realapresenta características próprias, que o distinguemdos direitos pessoais ou obrigacionais. Suadisciplina segue, dentre outros, os seguintesprincípios:a) Princípio da aderência, especialização ou

inerência — estabelece um vínculo ou relaçãoentre o sujeito e a coisa, não dependendo dacolaboração de nenhum sujeito passivo paraexistir. Nos direitos pessoais, o vínculoobrigacional existente entre credor e devedorconfere ao primeiro o direito de exigir a prestaçãoprometida.

b) Princípio do absolutismo — os direitos reais

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exercem-se erga omnes, ou seja, contra todos, quedevem abster-se de molestar o titular. Surge, daí, odireito de sequela ou jus persequendi, isto é, deperseguir a coisa e de reivindicá-la em poder dequem quer que esteja (ação real), bem como o juspraeferendi ou direito de preferência (cf. n. 83). Osobrigacionais, por não estabelecerem vínculodessa natureza, resolvem-se em perdas e danos enão se exercem contra todos mas em face de umou alguns sujeitos determinados. Dispõem deação pessoal.

c) Princípio da publicidade ou da visibilidade — osdireitos reais sobre imóveis só se adquirem depoisdo registro, no Cartório de Registro de Imóveis, dorespectivo título (CC, art. 1.227); sobre móveis, sódepois da tradição (CC, arts. 1.226 e 1.267). Sendooponíveis erga omnes, faz-se necessário quetodos possam conhecer os seus titulares, para nãomolestá-los. O registro e a tradição atuam comomeios de publicidade da titularidade dos direitosreais. Os pessoais ou obrigacionais seguem oprincípio do consensualismo: aperfeiçoam-se como acordo de vontades.

d) Princípio da taxatividade — o número dosdireitos reais é limitado, taxativo. Direitos reais sãosomente os enumerados na lei (numerus clausus).O art. 1.225 do Código Civil limita o número dosdireitos reais, indicando, além da propriedade,

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mais onze (superfície, servidões, usufruto etc.). Oart. 1.227 exige o registro do título como condiçãopara a aquisição do direito real sobre imóveis,“salvo os casos expressos neste Código”. Umdeles, segundo Arnoldo Medeiros da Fonseca, é odireito de retenção, por poder ser invocado pelopossuidor de boa-fé até em face da reivindicatóriado legítimo dono, nos termos do art. 516 (do CCde 1916, correspondente ao art. 1.219 dodiploma de 2002) (Direito de retenção, 2. ed.,Forense, p. 255-6, n. 142). Arnoldo Wald, por suavez, sustenta que o próprio Código Civil criou, noart. 1.142 (do CC de 1916, correspondente ao art.505 do novo Código), um outro direito real que éo pacto de retrovenda (Direito das coisas, 4. ed.,Revista dos Tribunais, p. 23, n. 11). O referido rol,em comparação com o constante do art. 674 doestatuto de 1916, sofreu as seguintes alterações:a) a enfiteuse foi substituída pela superfície; e b)as rendas expressamente constituídas sobreimóveis, pelo direito do promitente comprador doimóvel. A alienação fiduciária é disciplinada comoespécie de propriedade (Da propriedadefiduciária), nos arts. 1.361 e s., aplicando-se-lhe,no que couber, o disposto nos arts. 1.421, 1.425,1.426, 1.427 e 1.436, que dizem respeito à hipotecae ao penhor (direitos reais de garantia). No direitodas obrigações não há essa limitação. Existe certo

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número de contratos nominados, previstos notexto legal, podendo as partes criar os chamadosinominados. Basta que sejam capazes e lícito oobjeto. Assim, contrapõe-se à técnica do numerusclausus a do numerus apertus, para a consecuçãoprática do princípio da autonomia da vontade.

e) Princípio da tipificação ou tipicidade — osdireitos reais existem de acordo com os tiposlegais. São definidos e enumerados determinadostipos pela norma, e só a estes correspondem osdireitos reais, sendo pois seus modelos. Nosobrigacionais, ao contrário, admitem--se, ao ladodos contratos típicos, os atípicos, em númeroilimitado.

f) Princípio da perpetuidade — a propriedade é umdireito perpétuo, pois não se o perde pelo nãouso, mas somente pelos meios e formas legais:desapropriação, usucapião, renúncia, abandonoetc. Já os direitos obrigacionais, pela sua natureza,são eminentemente transitórios: cumprida aobrigação, extinguem-se. Não exigido o seucumprimento dentro de certo lapso de tempo,prescrevem.

g) Princípio da exclusividade — não pode haverdois direitos reais, de igual conteúdo, sobre amesma coisa. No caso do usufruto, por exemplo, ousufrutuário tem direito aos frutos, enquanto onu--proprietário conserva o direito à substância da

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coisa. No condomínio, cada consorte tem direito aporções ideais, distintas e exclusivas.

h) Princípio do desmembramento ou da elasticidade— conquanto os direitos reais sobre coisasalheias tenham normalmente mais estabilidade doque os obrigacionais, são também transitórios.Desmembram-se do direito-matriz, que é apropriedade, constituindo os direitos reais sobrecoisas alheias. Quando estes se extinguem, comono caso de morte do usufrutuário, por exemplo, opoder que residia em mãos de seus titularesretorna às mãos do proprietário (princípio daconsolidação). Este, embora seja o inversodaquele, o complementa e com ele convive.

3 INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA POSSE

O nosso direito protege não só a possecorrespondente ao direito de propriedade e a outrosdireitos reais como também a posse como figuraautônoma e independente da existência de um título.Embora possa um proprietário violentamentedesapossado de um imóvel valer-se da açãoreivindicatória para reavê-lo, preferível mostra-se, noentanto, a possessória, cuja principal vantagem épossibilitar a reintegração do autor na posse do bemlogo no início da lide. E a posse, como situação de

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fato, não é difícil de ser provada.A posse é protegida para evitar a violência e

assegurar a paz social, bem como porque a situaçãode fato aparenta ser uma situação de direito. É,assim, uma situação de fato protegida pelolegislador. Se alguém se instala em um imóvel e nelese mantém, mansa e pacificamente, por mais de ano edia, cria uma situação possessória, que lheproporciona direito a proteção. Tal direito é chamadode jus possessionis, derivado de uma posseautônoma, independente de qualquer título. É tãosomente o direito fundado no fato da posse(possideo quod possideo) que é protegido contraterceiros e até mesmo contra o proprietário. Opossuidor só perderá o imóvel para este,futuramente, nas vias ordinárias. Enquanto isso,aquela situação de fato será mantida. E será sempremantida contra terceiros que não possuam nenhumtítulo nem melhor posse.

Já o direito à posse, conferido ao portador detítulo devidamente transcrito, bem como ao titular deoutros direitos reais, é denominado jus possidendiou posse causal. Nesses exemplos, a posse não temqualquer autonomia, constituindo-se em conteúdodo direito real. Tanto no caso do jus possidendi(posse causal, titulada), como no do jus possessionis(posse autônoma, sem título), é assegurado o direitoà proteção dessa situação contra atos de violência,

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para garantia da paz social. Como se pode verificar, aposse distingue-se da propriedade, mas o possuidorencontra-se em uma situação de fato, aparentandoser o proprietário.

4 TEORIAS SOBRE A POSSE

O estudo da posse é repleto de teorias queprocuram explicar o seu conceito. Podem, entretanto,ser reduzidas a dois grupos: o das teorias subjetivase o das objetivas. Para Savigny, cuja teoria integra ogrupo das subjetivas, a posse caracteriza-se pelaconjugação de dois elementos: o corpus, elementoobjetivo que consiste na detenção física da coisa, eo animus, elemento subjetivo, que se encontra naintenção de exercer sobre a coisa um poder nointeresse próprio (animus rem sibi habendi). Tanto oconceito do corpus como o do animus sofrerammutações na própria teoria subjetiva. O primeiro,inicialmente considerado simples contato físico coma coisa (é a situação daquele que mora na casa ouconduz o seu automóvel), posteriormente passou acons is tir na mera possibilidade de exercer essecontato, tendo sempre a coisa à sua disposição.Assim, não o perde o dono do veículo que entrou nocinema e deixou-o no estacionamento.

Denominada teoria objetiva, a de Ihering não

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empresta à intenção, ao animus, a importância quelhe confere a teoria subjetiva. Considera-o como jáincluído no corpus e dá ênfase, na posse, ao seucaráter de exteriorização da propriedade. Para que aposse exista, basta o elemento objetivo, pois ela serevela na maneira como o proprietário age em face dacoisa. Para Ihering, portanto, basta o corpus para acaracterização da posse. Tal expressão, porém, nãosignifica contato físico com a coisa, mas simconduta de dono. Tem posse quem se comportacomo este, e nesse comportamento já está incluído oanimus. A conduta de dono pode ser analisadaobjetivamente, sem a necessidade de pesquisar-se aintenção do agente. A posse, então, é aexteriorização da propriedade, a visibilidade dodomínio, o uso econômico da coisa. Ela é protegida,em resumo, porque representa a forma como odomínio se manifesta.

O Código Civil brasileiro adotou a teoria deIhering, como se depreende da definição depossuidor constante do art. 1.196, que assimconsidera aquele que se comporta como proprietário,exercendo algum dos poderes que lhe são inerentes.

A alteração das estruturas sociais tem trazidoaos estudos possessórios, a partir do início doséculo passado, a contribuição de juristassociólogos como Perozzi, Saleilles e Hernandez Gil,que deram novos rumos à posse, fazendo-a adquirir a

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sua autonomia em face da propriedade. Essas novasteorias, que dão ênfase ao caráter econômico e àfunção social da posse, aliadas à nova concepção dodireito de propriedade, que também deve exercer umafunção social, como prescreve a Constituição daRepública, constituem instrumento jurídico defortalecimento da posse, permitindo que, em algunscasos e diante de certas circunstâncias, venha apreponderar sobre o direito de propriedade.

5 CONCEITO DE POSSE

Para Ihering, cuja teoria o nosso direito positivoacolheu, posse é conduta de dono. Sempre que hajao exercício dos poderes de fato, inerentes àpropriedade, existe a posse, a não ser que algumanorma diga que esse exercício configura a detenção enão a posse. O conceito desta, no direito positivobrasileiro, indiretamente nos é dado pelo art. 1.196 doCódigo Civil, ao considerar possuidor “todo aqueleque tem de fato o exercício, pleno ou não, de algumdos poderes inerentes à propriedade”.

Como o legislador deve dizer em que casos esseexercício configura detenção e não posse, o art. 1.198proclama: “Considera-se detentor aquele que,achando-se em relação de dependência para comoutro, conserva a posse em nome deste e em

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cumprimento de ordens ou instruções suas”. E, noparágrafo único, estabelece presunção juris tantumde detenção: “Aquele que começou a comportar-sedo modo como prescreve este artigo, em relação aobem e à outra pessoa, presume-se detentor, até queprove o contrário”. Complementa o quadro o art.1.208, prescrevendo: “Não induzem posse os atos demera permissão ou tolerância assim como nãoautorizam a sua aquisição os atos violentos, ouclandestinos, senão depois de cessar a violência oua clandestinidade”. Portanto, o conceito de posseresulta da conjugação dos três dispositivos legaismencionados.

6 POSSE E DETENÇÃO

Há situações em que uma pessoa não éconsiderada possuidora, mesmo exercendo poderesde fato sobre uma coisa. Isso acontece quando a leidesqualifica a relação para mera detenção, como fazno art. 1.198 supratranscrito. Embora, portanto, aposse possa ser considerada uma forma de condutaque se assemelha à de dono, não é possuidor oservo na posse, aquele que a conserva em nome deoutrem ou em cumprimento de ordens ou instruçõesdaquele em cuja dependência se encontre. Opossuidor exerce o poder de fato em razão de um

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interesse próprio; o detentor, no interesse de outrem.É o caso típico dos caseiros e de todos aqueles quezelam por propriedades em nome do dono. Podem sermencionadas, ainda, como exemplos de detenção, asituação do soldado em relação às armas no quartel ea do preso em relação às ferramentas com quetrabalha. Tais servidores não têm posse e não lhesassiste o direito de invocar, em nome próprio, aproteção possessória. São chamados de “fâmulos daposse”. Embora não tenham o direito de invocar, emseu nome, a proteção possessória, não se lhesrecusa, contudo, o direito de exercer a autoproteçãodo possuidor, quanto às coisas confiadas a seucuidado, consequência natural de seu dever devigilância.

Mister lembrar, ainda, que não induzem posse,também, os atos de mera permissão ou tolerância(CC, art. 1.208). Outros exemplos de detenção pordisposição expressa da lei encontram-se no art. 1.224(“Só se considera perdida a posse para quem nãopresenciou o esbulho, quando, tendo notícia dele, seabstém de retomar a coisa, ou, tentando recuperá-la,é violentamente repelido”) e na segunda parte docitado art. 1.208 (“... assim como não autorizam a suaaquisição os atos violentos, ou clandestinos, senãodepois de cessar a violência, ou a clandestinidade”).Pode-se, ainda, dizer que também não há posse debens públicos, principalmente depois que a

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Constituição Federal de 1988 proibiu a usucapiãoespecial de tais bens (arts. 183 e 191). Se hátolerância do Poder Público, o uso do bem peloparticular não passa de mera detenção consentida.

Desse modo nem todo estado de fato,relativamente à coisa ou à sua utilização, éjuridicamente posse. Às vezes é. Outras, não passade mera detenção, que muito se assemelha à posse,mas que dela difere na essência como nos efeitos.Somente a posse gera efeitos jurídicos: esta a grandedistinção. Para Ihering, a detenção acha-se em últimolugar na escala das relações jurídicas entre a pessoae coisa. Em primeiro lugar, figuram a propriedade eseus desmembramentos; em segundo plano, a possede boa-fé; em terceiro, a posse; e, por fim, adetenção.

7 QUASE POSSE E COMPOSSE

Para os romanos só se considerava posse aemanada do direito de propriedade. A exercida nostermos de qualquer direito real menor (iura in realiena ou direitos reais sobre coisas alheias)desmembrado do direito de propriedade, como aservidão e o usufruto, por exemplo, era chamada dequase posse, por ser aplicada aos direitos ou coisasincorpóreas. Assim também o poder de fato ou posse

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emanada de um direito obrigacional ou pessoal,como na locação, no comodato etc. Tal distinção nãopassa, entretanto, de uma reminiscência histórica,pois não se coaduna com o sistema do Código Civilbrasileiro, que não a prevê. Com efeito, as situaçõesque os romanos chamavam de quase posse são, hoje,tratadas como posse propriamente dita. O art. 1.196do aludido diploma, ao mencionar o termo“propriedade”, nele incluiu os direitos reais menores.E o art. 1.197, ao desdobrar a posse em direta eindireta, permite o exercício da primeira por força deum direito obrigacional.

Composse é a situação pela qual duas ou maispessoas exercem, simultaneamente, poderespossessórios sobre a mesma coisa. “Se duas ou maispessoas possuírem coisa indivisa, poderá cada umaexercer sobre ela atos possessórios, contanto quenão excluam os dos outros compossuidores” (CC,art. 1.199). É o que ocorre com adquirentes de coisacomum, com marido e mulher em regime decomunhão de bens ou com coerdeiros antes dapartilha. Como a posse é a exteriorização do domínio,admite-se a composse em todos os casos em queocorre o condomínio, pois ela está para a posseassim como este para o domínio.

Qualquer dos compossuidores pode valer-se dointerdito possessório ou da legítima defesa paraimpedir que outro compossuidor exerça uma posse

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exclusiva sobre qualquer fração da comunhão.Podem, também, estabelecer uma divisão de fato paraa utilização pacífica do direito de cada um, surgindo,assim, a composse pro diviso. Permanecerá proindiviso se todos exercerem, ao mesmo tempo esobre a totalidade da coisa, os poderes de fato(utilização ou exploração comum do bem). Nacomposse pro diviso, exercendo os compossuidorespoderes apenas sobre uma parte definida da coisa, eestando tal situação consolidada no tempo (há maisde ano e dia), poderá cada qual recorrer aosinterditos contra aquele que atentar contra talexercício.

Em relação a terceiros, como se fossem um únicosujeito, qualquer deles poderá usar os remédiospossessórios que se fizerem necessários, tal comoacontece no condomínio (CC, art. 1.314). Aduza-seque não se deve confundir composse comconcorrência ou sobreposição de posses. Nacomposse, há vários possuidores exercendo o poderde fato, concomitantemente, sobre o mesmo bem. Naconcorrência de posses, com o desdobramentodestas em direta e indireta, dá-se o fenômeno daexistência de posses de natureza diversa sobre amesma coisa, tendo cada possuidor o exercíciolimitado ao âmbito específico da sua.

8 O OBJETO DA POSSE E A POSSE DOS

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DIREITOS PESSOAIS

O direito das coisas compreende tão só bensmateriais: a propriedade e seus desmembramentos.Tem por objeto, pois, bens corpóreos, que hão de sertangíveis pelo homem. Tradicionalmente, a possetem sido entendida como reportada a coisa material,corpórea. No Brasil, por influência de Ruy Barbosa,os interditos possessórios chegaram a ser utilizadospara a defesa de direitos pessoais, incorpóreos,como o direito a determinado cargo, mas por curtoperíodo histórico, que terminou com a instituição domandado de segurança, a partir de 1934. Hoje, noentanto, para esse fim são utilizadas as cautelaresinominadas, baseadas no poder cautelar geral do juiz.

9 NATUREZA JURÍDICA DA POSSE

A posse é um fato ou um direito? Para Ihering, éum direito, isto é, um interesse legalmente protegido.Segundo Clóvis Beviláqua, não é direito, mas simplesfato, que é protegido em atenção à propriedade, daqual ela é a manifestação exterior. Para Savigny, temnatureza dupla: é fato e direito. Em princípio,considerada em si mesmo, é um fato, mas, pelas suasconsequências legais, pelos efeitos que gera, entrana esfera do direito. Considera-a, portanto, um misto

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de fato e de direito, como a maioria dos civilistas.Profunda, no entanto, é a divergência no tocante

à classificação desse direito: real, pessoal ouespecial. A resposta a essa dúvida tem importânciaprática, pois as ações reais, por exemplo, exigem apresença do cônjuge na relação processualconcernente a bem imóvel (CPC, art. 10). A pretensãode classificar a posse como direito pessoal esbarrana própria definição deste: relação jurídica pela qualo sujeito ativo pode exigir do sujeito passivodeterminada prestação. O Código Civil brasileiro(tanto o de 1916 quanto o de 2002), que adotou oprincípio do numerus clausus, também não a incluiuno rol taxativo dos direitos reais (art. 674 do CC/1916;art. 1.225 do CC/2002). Talvez por essa dificuldade,Beviláqua tenha relutado em reconhecer a naturezareal da posse, preferindo aceitá-la como “um direitode natureza especial, a manifestação de um direitoreal”. Para Ihering, a posse, sendo um direito, sópode pertencer à categoria dos direitos reais.

Não nos parece, porém, que as açõespossessórias envolvam o ius in re, pois visam tãosomente preservar ou restaurar um estado de fatoameaçado ou inovado arbitrariamente. Na sistemáticado Código Civil brasileiro, a posse não pode serconsiderada direito real, pois não figurava, como jámencionado, no rol exaustivo do art. 674 do Códigode 1916 (art. 1.225 do novo CC), fiel ao princípio da

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taxatividade dos direitos reais (numerus clausus).Ademais, estes exigem um título que possa sertranscrito (CC/1916, art. 676; CC/2002, art. 1.227). Aposse, no entanto, é regulada na lei como umasituação de fato: pode ser perdida, no caso deimóveis, sem a intervenção da mulher, se o marido osabandona. Melhor, desse modo, ficar com a opiniãode Clóvis Beviláqua: não é direito real, mas sim umdireito especial. A questão acabou sendoregulamentada pelo legislador, com a inclusão, pelaLei n. 8.952, de 13 de dezembro de 1994, do § 2º aoart. 10 do CPC, do seguinte teor: “Nas açõespossessórias, a participação do cônjuge do autor oudo réu somente é indispensável nos casos decomposse ou de ato por ambos praticado”.

Quadro sinótico – Generalidades sobre a posse

Conceito

Direito das coisas éo complexo dasnormasreguladoras dasrelações jurídicas

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1.Direitodascoisas

Conceito relações jurídicasconcernentes aosbens corpóreossuscetíveis deapropriação pelohomem.

Conteúdo

O CC divide amatéria em duaspartes: posse edireitos reais,dedicando, nestaúltima, títulosespecíficos àpropriedade e acada um de seusdesmembramentos,denominados

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denominadosdireitos reais sobrecoisas alheias.

2.Direitoreal edireitopessoal

Conceito

a) direito realpoder jurídico,direto e imediato,do titular sobre acoisa, comexclusividade econtra todos;b) o direito pessoalconsiste numarelação jurídicapela qual o sujeitoativo pode exigir dosujeito passivodeterminada

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determinadaprestação.

Teorias

a) a teoria unitáriarealista procuraunificar os direitosreais eobrigacionais apartir do critério dopatrimônio,considerando que odireito das coisas eo direito dasobrigações fazemparte de umarealidade maisampla, que seria o

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direito patrimonial;b) segundo a teoriadualista ouclássica, maisadequada àrealidade, o direitoreal apresentacaracterísticaspróprias, que odistinguem dosdireitos pessoais.

a) aderênciaespecializaçãoinerência:estabelece umvínculo entre o

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2.Direitoreal edireito

vínculo entre osujeito e a coisa;b) absolutismodireitos reaisexe r c em- s e omnes (contratodos), que devemabster-se demolestar o titular.Surge daí o direitode sequela ou persequendi e ojus praeferendic) publicidadevisibilidade: oregistro e atradição atuamcomo meios de

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pessoal

Princípiosqueregem osdireitosreais

como meios depublicidade datitularidade dosdireitos reais;d) taxatividadenúmero dos direitosreais é limitado,taxativo. Direitosreais são somenteos enumerados nalei (numerusclausus);e) tipificaçãotipicidade: osdireitos reaisexistem de acordocom os tipos

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com os tiposlegais;f) perpetuidadepropriedade é umdireito perpétuo,pois não é perdidopelo não uso. Já osdireitosobrigacionais sãotransitórios:cumprida aobrigação,extinguem-se;g) exclusividadenão pode haverdois direitos reais,de igual conteúdo,sobre a mesma

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sobre a mesmacoisa;h)desmembramentodesmembram-sedo direito-matriz,que é apropriedade,constituindo osdireitos reais sobrecoisas

2.Direitoreal edireito

Princípiosqueregem osdireitos

alheias. Quandoestes seextinguem, atitularidade plenaretorna às mãos doproprietário

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direitopessoal

direitosreais

proprietário(princípio daconsolidação

Introdução

Se alguém semantém,pacificamente, emum imóvel, pormais de ano e dia,cria uma situaçãopossessória, quelhe proporcionadireito a proteção,chamado de possessionis(posse autônoma).A posse titulada é

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d e n o m i n a d a possidendi ouposse causalambos os casos, éassegurado odireito à proteçãodessa situaçãocontra atos deviolência, paragarantia da pazsocial.

a) subjetiva (deSavigny): a possecaracteriza-se pelaconjugação docorpus (elemento

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3.Posse

Teorias

corpus (elementoobjetivo queconsiste nadetenção física dacoisa) e do animus(elementosubjetivo, que seencontra naintenção de exercersobre a coisa umpoder no interessepróprio — animusrem sibi habendib) objetiva (deIhering): considerao animus jáincluído no corpusque significa

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que significaconduta de donoEsta pode seranalisadaobjetivamente, sema necessidade depesquisar-se aintenção do agente.A posse, então, é aexteriorização dodomínio. O CCbrasileiro adotou talteoria (art. 1.196).

Para Ihering, cujateoria o nossodireito positivo

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Conceito

acolheu, posse éconduta de dono.Sempre que haja oexercício dospoderes de fato,inerentes àpropriedade, existeposse, a não serque alguma norma(como os arts.1.198 e 1.208, p.ex.) diga que esseexercício configuraa detenção e não aposse.

Há situações em

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Posse edetenção

Há situações emque uma pessoanão é consideradapossuidora, mesmoexercendo poderesde fato sobre umacoisa. Issoacontece quando alei desqualifica arelação para meradetenção, como ofaz nos arts. 1.198,1.208 e 1.224, p.ex. Somente aposse gera efeitosjurídicos.

Os romanos só

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Quaseposse

Os romanos sóconsideravamposse a emanadado direito depropriedade. Aexercida nostermos de qualquerdireito real menor(servidão eusufruto, p. ex.) erachamada de quaseposse, por seraplicada aosdireitos ou coisasincorpóreas. Taissituações são hojetratadas comoposse

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3.Posse

possepropriamente dita.

É a situação pelaqual duas ou maispessoas exercem,simultaneamente,poderespossessórios sobrea mesma coisa(CC, art. 1.199).Será pro divisose estabelecer umadivisão de fato paraa utilização pacíficado direito de cadaum. Permanecerá

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Composse

um. Permanecerápro indivisotodos exercerem,ao mesmo tempo esobre a totalidadeda coisa, ospoderes de fato.Qualquer doscompossuidorespode valer-se dointerditopossessório paraimpedir que outrocompossuidorexerça uma posseexclusiva sobrequalquer fração dacomunhão.

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comunhão.

Posse dosdireitospessoais

O direito dascoisas compreendetão só bensmateriais: apropriedade e seusdesmembramentos.Tem por objeto,pois, benscorpóreos. Para adefesa dos direitospessoais,incorpóreos, sãohoje utilizadas ascautelaresinominadas.

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Naturezajurídica

A posse temnatureza dupla: éfato e direito.Considerada em simesma, é um fato,mas, pelos efeitosque gera, entra naesfera do direito.Segundo Beviláqua,a posse não édireito real, nempessoal, mas umdireito especial.

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CAPÍTULO IIESPÉCIES DE POSSE

10 POSSE DIRETA E POSSE INDIRETA

É possível distinguir, dentre as espécies deposse, a direta ou imediata da indireta ou mediata(art. 1.197). Nessa classificação, não se propõe oproblema da qualificação da posse, porque ambassão jurídicas e têm o mesmo valor (jus possidendi ouposses causais). A questão da qualificação aparecena distinção entre posse justa e injusta (art. 1.200) ede boa e má-fé (art. 1.201).

A divisão da posse em direta e indireta encontra-se assim definida: “A posse direta, de pessoa quetem a coisa em seu poder, temporariamente, emvirtude de direito pessoal, ou real, não anula aindireta, de quem aquela foi havida, podendo opossuidor direto defender a sua posse contra oindireto” (CC, art. 1.197). A relação possessória, nocaso, desdobra-se. O proprietário exerce a posseindireta, como consequência de seu domínio. Olocatário, por exemplo, exerce a posse direta porconcessão do locador. Uma não anula a outra.Ambas coexistem no tempo e no espaço e sãoposses jurídicas (jus possidendi), não autônomas,

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pois implicam o exercício de efetivo direito sobre acoisa.

A vantagem dessa divisão é que o possuidordireto e o indireto podem invocar a proteçãopossessória contra terceiro, mas só este podeadquirir a propriedade em virtude da usucapião. Opossuidor direto jamais poderá adquiri-la por essemeio, por faltar-lhe o ânimo de dono, a não ser que,excepcionalmente, ocorra mudança da causapossessionis, com inversão do referido ânimo,passando a possuí-la como dono (cf. n. 11, infra). Ajurisprudência já vinha admitindo que cada qualrecorresse aos interditos possessórios contra ooutro, para defender a sua posse, quando seencontrasse por ele ameaçado (cf. RT, 654:145,668:125). Tal possibilidade encontra-se, agora,expressamente prevista no mencionado art. 1.197 donovo Código. O desmembramento da posse em diretae indireta pode ocorrer em várias espécies decontrato, como no de compra e venda com reserva dedomínio, no de alienação fiduciária, no compromissode compra e venda etc.

11 POSSE JUSTA E POSSE INJUSTA

Posse justa é a não violenta, clandestina ouprecária (CC, art. 1.200), ou, segundo a técnica

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romana, a adquirida legitimamente, sem vício jurídicoexterno (nec vim, nec clam, nec precario). Éclandestina, por exemplo, a do que furta um objetoou ocupa imóvel de outro às escondidas. É violentaa do que toma um objeto de alguém, despojando-o àforça, ou expulsa de um imóvel, por meios violentos,o anterior possuidor. E é precária quando o agentenega-se a devolver a coisa, findo o contrato. Posseinjusta, portanto, é a adquirida viciosamente (vim,clam aut precario). Esses três vícios correspondemàs figuras definidas no Código Penal como roubo(violência), furto (clandestinidade) e apropriaçãoindébita (precariedade). O mencionado artigo nãoesgota, porém, as hipóteses em que a posse éviciosa. Aquele que, pacificamente, ingressa emterreno alheio, sem procurar ocultar a invasão,também pratica esbulho, malgrado a sua conduta nãose identifique com nenhum dos três víciosapontados.

Ainda que viciada, a posse injusta não deixa deser posse, visto que a sua qualificação é feita em facede determinada pessoa, sendo, portanto, relativa.Será injusta em face do legítimo possuidor. Mesmoviciada, porém, será justa, suscetível de proteção emrelação às demais pessoas estranhas ao fato. Assim,a posse obtida clandestinamente, até por furto, éinjusta em relação ao legítimo possuidor, mas poderáser justa em relação a um terceiro que não tenha

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posse alguma. Para a proteção da posse não importaseja justa ou injusta, em sentido absoluto. Basta queseja justa em relação ao adversário.

A precariedade difere dos vícios da violência eda clandestinidade quanto ao momento de seusurgimento. Enquanto os fatos que caracterizamestas ocorrem no momento da aquisição da posse,aquela somente se origina de atos posteriores, ouseja, a partir do instante em que o possuidor diretose recusa a obedecer à ordem de restituição do bemao possuidor indireto. A concessão da posseprecária é perfeitamente lícita. Enquanto nãochegado o momento de devolver a coisa, opossuidor (o comodatário, p. ex.) tem posse justa. Ovício manifesta-se quando fica caracterizado o abusode confiança. No instante em que se recusa arestituí-la, sua posse torna-se viciada e injusta,passando à condição de esbulhador.

A violência e a clandestinidade podem, porém,cessar. Nesse caso, dá-se o convalescimento dosvícios. Enquanto não findam, existe apenasdetenção. Cessados, surge a posse, porém injusta.Com efeito, dispõe o art. 1.208 do Código Civil quenão induzem posse os atos violentos ouclandestinos, “senão depois de cessar a violência oua clandestinidade”. Segundo vários autores, dentreeles Silvio Rodrigues (Direito civil, 23. ed., Saraiva,v. 5, p. 29), tal dispositivo arredou a possibilidade de

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ocorrer o convalescimento do vício da precariedade,seja porque representa um abuso de confiança, sejaporque a obrigação de devolver a coisa recebida emconfiança nunca cessa. Conforme, porém, anotaLenine Nequete (Da prescrição aquisitiva —usucapião, 3. ed., Porto Alegre, 1981, p. 123), nadaimpede que “o caráter originário da posse semodifique quando, acompanhando a mudança davontade, sobrevém igualmente uma nova causapossessionis”. Assim, o locatário, por exemplo,“desde que adquira a propriedade a um nondominus, ou que tenha repelido o proprietário,deixando de pagar-lhe os aluguéis e fazendo-lhesentir inequivocamente a sua pretensão dominial, éfora de dúvida que passou a possuir como dono”.Tal posse, em virtude da nova causa possessionis,tornar-se-ia capaz de conduzir à usucapião,iniciando-se a contagem do prazo a partir dessainversão.

Com relação à violência, no entanto, a situaçãode fato consolida--se se o esbulhado deixar de reagir,e a mera detenção do invasor, existente antes decessada a violência, passa à condição de posse,embora qualificada como injusta. A lei nãoestabelece prazo para a aquisição dessa posse. Paraque este último vício cesse, basta que o possuidorpasse a usar a coisa publicamente, comconhecimento do proprietário, sem que este reaja.

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Cessadas a violência e a clandestinidade, a meradetenção, que então estava caracterizada,transforma-se em posse injusta em relação aoesbulhado, que permite ao novo possuidor sermantido provisoriamente, contra os que não tiveremmelhor posse. Na posse de mais de ano e dia, opossuidor será mantido provisoriamente, inclusivecontra o proprietário, até ser convencido pelos meiosordinários (CC, arts. 1.210 e 1.211; CPC, art. 924).Cessadas a violência e a clandestinidade, a possepassa a ser “útil”, surtindo todos os seus efeitos,nomeadamente para a usucapião e para a utilizaçãodos interditos.

Procura-se conciliar o art. 1.208 do Código Civil,que admite a cessação dos vícios da posse, com aregra do art. 1.203, que presume manter esta o mesmocaráter com que foi adquirida, afirmando-se que esteúltimo dispositivo contém uma presunção juristantum, no sentido de que a posse guarda o caráterde sua aquisição. Assim, admite prova em contrário.

12 POSSE DE BOA-FÉ E POSSE DE MÁ-FÉ

É de boa-fé a posse se o possuidor ignora ovício, ou o obstáculo que impede a aquisição dacoisa (CC, art. 1.201). O seu conceito, portanto,funda-se em dados psicológicos, em critério

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subjetivo. É de suma importância, para caracterizá-la,a crença do possuidor de encontrar-se em umasituação legítima. Se ignora a existência de vício naaquisição da posse, ela é de boa-fé; se o vício é deseu conhecimento, a posse é de má-fé. Para verificarse uma posse é justa ou injusta, o critério, entretanto,é objetivo: examina-se a existência ou não dos víciosapontados.

A boa-fé não é essencial para o uso das açõespossessórias. Basta que a posse seja justa. Aindaque de má-fé, o possuidor não perde o direito deajuizar a ação possessória competente para proteger-se de um ataque à sua posse. A boa-fé somenteganha relevância, com relação à posse, em setratando de usucapião, de disputa sobre os frutos ebenfeitorias da coisa possuída ou da definição daresponsabilidade pela sua perda ou deterioração. Umtestamento, pelo qual alguém recebe um imóvel, porexemplo, ignorando que o ato é nulo, é hábil, nãoobstante o vício, para transmitir-lhe a crença de queo adquiriu legitimamente (ou de que a aquisição élegítima). Essa crença, embora calcada em títulodefeituoso, mas aparentemente legal, produz efeitoigual ao de um título perfeito e autoriza reputar-se deboa-fé quem se encontrar em tal situação. Título, emsentido lato, é o elemento representativo da causa oufundamento jurídico de um direito.

O Código Civil estabelece presunção de boa-fé

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em favor de quem tem justo título, salvo prova emcontrário, ou quando a lei expressamente não admiteessa presunção (art. 1.201, parágrafo único). Justotítulo é o que seria hábil para transmitir o domínio e aposse se não contivesse nenhum vício impeditivodessa transmissão. Por exemplo, uma escritura decompra e venda, devidamente registrada, é um títulohábil para a transmissão de imóvel. No entanto, se ovendedor não era o verdadeiro dono (aquisição anon domino) ou se era um menor não assistido porseu representante legal, a aquisição não seperfecciona e pode ser anulada. Porém a posse doadquirente presume-se ser de boa-fé, porqueestribada em justo título. Essa presunção, noentanto, é juris tantum e, como tal, admite prova emcontrário. De qualquer forma, ela ampara o possuidorde boa-fé, pois transfere o ônus da prova à partecontrária, a quem incumbirá demonstrar que, adespeito do justo título, estava o possuidor cientede não ser justa a posse. Desnecessário dizer que aposse de boa-fé pode existir sem o justo título.

Dentre as várias teorias existentes a respeito daconfiguração da má-fé, destacam-se a ética, que ligaa má-fé à ideia de culpa, e a psicológica, que sóindaga da ciência por parte do possuidor daexistência do impedimento para a aquisição da posse.Tem sido salientada a necessidade da ignorânciaderivar de um erro escusável. Assim, se o possuidor

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adquiriu a coisa de menor impúbere com aparênciainfantil, não pode alegar ignorância da nulidade quepesa sobre o seu título, como também não podeignorá-la se comprou o imóvel sem examinar a provade domínio do alienante. Nos dois casos, suaignorância deflui de culpa imperdoável, que por issomesmo não pode ser alegada, conforme a concepçãoética.

O art. 1.202 do Código Civil dispõe a respeito datransformação da posse de boa-fé em posse de má-fé. Divergem os romanos e os canonistas quanto àadmissibilidade ou não da mudança jurídica do seucaráter. Para o sistema do direito romano, aprecia-sea existência da boa-fé em um momento único: o daaquisição da posse. A adquirida de boa-fé conservaessa qualificação, ainda que o possuidor, em dadomomento, tenha conhecimento de que adquiriu coisaalheia. A má-fé superveniente não prejudica (malafides superveniens non nocet). O direito canônicoinspira-se em uma moral severa e exige que a boa-féexista durante todo o tempo em que a coisa seencontre em poder do possuidor. O Código Civilbrasileiro acolheu, no art. 1.202, a última regra. Asolução desloca a questão para o objetivismo, poisn ã o se pode apanhar na mente do possuidor omomento exato em que soube que possuíaindevidamente. Somente as circunstâncias objetivaspoderão apontá-lo. A jurisprudência tem entendido

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que a citação para a ação é uma dessascircunstâncias que demonstram a transformação daposse de boa-fé em posse de má-fé, pois em razãodela, recebendo a cópia da inicial, o possuidor tomaciência dos vícios de sua posse (RTJ, 99:804;RJTJRS, 68:393). Os efeitos da sentença retroagirãoao momento da citação, a partir do qual o possuidorserá tratado como possuidor de má-fé, com todas asconsequências especificadas nos arts. 1.216 a 1.220do Código Civil. Nada impede, entretanto, que ointeressado prove que a parte contrária, mesmo antesda citação, já sabia que possuía indevidamente acoisa.

13 POSSE NOVA E POSSE VELHA

Posse nova é a de menos de ano e dia. Possevelha é a de ano e dia ou mais. Dispõe o art. 1.211 doCódigo Civil: “Quando mais de uma pessoa se disserpossuidora, manter-se-á provisoriamente a que tivera coisa, se não estiver manifesto que a obteve dealguma das outras por modo vicioso”. O referidodiploma, assim, não distingue, como o fazia o de1916, para a manutenção provisória do que detém acoisa, entre a posse velha e a posse nova.

Não se deve confundir posse nova com ação deforça nova, nem posse velha com ação de força

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velha. Classifica-se a posse em nova ou velhaquanto à sua idade. Todavia, para saber se a ação éde força nova ou velha, leva-se em conta o tempodecorrido desde a ocorrência da turbação ou doesbulho. Se o turbado ou esbulhado reagiu logo,intentando a ação dentro do prazo de ano e dia,contado da data da turbação ou do esbulho, poderápleitear a concessão da liminar (CPC, art. 924), por setratar de ação de força nova. Passado esse prazo, noentanto, o procedimento será ordinário, sem direito aliminar, sendo a ação de força velha. É possível,assim, alguém que tenha posse velha ajuizar ação deforça nova, ou de força velha, dependendo do tempoque levar para intentá-la, contado o prazo daturbação ou do esbulho, assim como também alguémque tenha posse nova ajuizar ação de força nova oude força velha.

14 POSSE NATURAL E POSSE CIVIL OUJURÍDICA

Posse natural é a que se constitui pelo exercíciode poderes de fato sobre a coisa. Posse civil oujurídica é a que assim se considera por força de lei,sem necessidade de atos físicos ou materiais.Exemplifica-se com o constituto possessório: Avende sua casa a B, mas continua no imóvel como

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inquilino; não obstante, B fica sendo possuidor dacoisa (posse indireta), mesmo sem jamais tê-laocupado fisicamente. Posse civil ou jurídica é,portanto, a que se transmite ou se adquire pelotítulo. Adquire-se a posse por qualquer dos modosde aquisição em geral, desde o momento em que setorna possível o exercício, em nome próprio, dequalquer dos poderes inerentes à propriedade (CC,art. 1.204). A jurisprudência tem considerado válida atransmissão da posse por escritura (JTACSP, 78:99;STJ, 3ª T., REsp 21.125-0-MS, Rel. Min. DiasTrindade, j. 11-5-1992, DJU, 15 jun. 1992, n. 113, p.9267).

15 POSSE “AD INTERDICTA” E POSSE “ADUSUCAPIONEM”

Posse ad interdicta é a que pode ser defendidapelos interditos ou ações possessórias, quandomolestada, mas não conduz à usucapião. Opossuidor, como o locatário, por exemplo, vítima deameaça ou de efetiva turbação ou esbulho, tem afaculdade de defendê-la ou de recuperá-la pela açãopossessória adequada até mesmo contra oproprietário.

Posse ad usucapionem é a que se prolonga pordeterminado lapso de tempo estabelecido na lei,

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deferindo a seu titular a aquisição do domínio. Aofim de um período de dez anos, aliado a outrosrequisitos, como o ânimo de dono, o exercíciocontínuo e de forma mansa e pacífica, além do justotítulo e boa-fé, dá origem à usucapião ordinária (CC,art. 1.242). Quando a posse, com essascaracterísticas, prolonga-se por quinze anos, a leidefere a aquisição do domínio pela usucapiãoextraordinária, independentemente de título e boa-fé(CC, art. 1.238).

16 POSSE “PRO DIVISO” E POSSE “PROINDIVISO”

A distinção já foi apontada no n. 7, retro, quetrata da composse, ao qual nos reportamos.

Quadro sinótico – Espécies de posse

a) posse direta ouimediata: é a daqueleque tem a coisa emseu poder,

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seu poder,temporariamente, emvirtude de contrato (aposse do locatário, p.ex., que a exerce porconcessão do locador— CC, art. 1.197);b) posse indireta oumediata: é a daqueleque cede o uso dobem (a do locador, p.ex.). Dá-se odesdobramento daposse. Uma não anulaa outra. Nessaclassificação não sepropõe o problema daqualificação da posse,

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qualificação da posse,porque ambas sãoposses jurídicas (juspossidendi) e têm omesmo valor.

a) posse justa: é anão violenta,clandestina ouprecária (CC, art.1.200). É a adquiridalegitimamente, semvício jurídico externo;b) posse injusta: é aadquiridaviciosamente (vim,clam aut precario).

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Espéciesdeposse

Ainda que viciada, nãodeixa de ser posse,visto que a suaqualificação é feita emface de determinadapessoa. Será injustaem face do legítimopossuidor; será,porém, justa esuscetível deproteção em relaçãoàs demais pessoasestranhas ao fato.

a) posse de boa-fé:configura-se quando opossuidor ignora o

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possuidor ignora ovício, ou o obstáculoque impede aaquisição da coisa(art. 1.201). É desuma importância acrença do possuidorde encontrar-se emuma situação legítima.O CC estabelecepresunção de boa-féem favor de quem temjusto título (art. 1.201,parágrafo único);b) posse de má-fé: éaquela em que opossuidor temconhecimento dos

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conhecimento dosvícios na aquisição daposse e, portanto, dailegitimidade de seudireito. A posse deboa-fé se transformaem posse de má-fédesde o momento emque as circunstânciasdemonstrem que opossuidor não maisignora que possuiindevidamente (CC,art. 1.202).

a) posse nova: é a demenos de ano e dia.

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Não se confunde comação de força nova,que leva em conta nãoa duração temporalda posse, mas otempo decorridodesde a ocorrência daturbação ou doesbulho;b) posse velha: é ade ano e dia ou mais.Não se confunde comação de força velha,intentada depois deano e dia da turbaçãoou esbulho.

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Espéciesdeposse

a) posse natural: é aque se constitui peloexercício de poderesde fato sobre a coisa;b) posse civil oujurídica: é a queassim se considerapor força da lei, semnecessidade de atosfísicos ou materiais. Éa que se transmite ouse adquire pelo título(escritura pública, p.ex.).

a) posse “adinterdicta”: é a que

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posse interdicta”: é a quepode ser defendidapelos interditos ouações possessórias,quando molestada,mas não conduz àusucapião (a dolocatário, p. ex.);b) posse “adusucapionem”: é aque se prolonga pordeterminado lapso detempo estabelecidona lei, deferindo a seutitular a aquisição dodomínio.

a) posse “pro diviso”:

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a) posse “pro diviso”:é a exercidasimultaneamente(composse),estabelecendo-se,porém, uma divisãode fato entre oscompossuidores;b) posse “proindiviso”: é aquela emque se exercem, aomesmo tempo e sobrea totalidade da coisa,os poderes deutilização ouexploração comum dobem.

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bem.

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CAPÍTULO IIIAQUISIÇÃO E PERDA DA POSSE

17 INTRODUÇÃO

Justifica-se a fixação da data da aquisição daposse por assinalar o início do prazo da prescriçãoaquisitiva e do lapso de ano e dia, que distingue aposse nova da posse velha. Para melhorsistematização do estudo, serão tratadas em um sócapítulo sua aquisição e perda. Convém ressaltar,desde logo, a reduzida utilidade de se regular, comoo fez o Código Civil de 1916, os casos e modos deaquisição da posse. Acolhida a teoria de Ihering,pela qual a posse é o estado de fato correspondenteao exercício da propriedade, ou de seusdesmembramentos, basta a lei prescrever que haveráposse sempre que essa situação se definir nasrelações jurídicas.

18 MODOS DE AQUISIÇÃO

Dispunha o art. 493 do Código Civil de 1916 quese adquiria a posse: “I — pela apreensão da coisa,ou pelo exercício do direito; II — pelo fato de se

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dispor da coisa, ou do direito; III — por qualquerdos modos de aquisição em geral”. O legislador,esquecendo-se do fato de haver adotado a teoria deIhering, admitiu a aquisição da posse pela apreensãoda coisa, bem como a sua perda pelo abandono epela tradição, modos estes que melhor se enquadramna teoria de Savigny, baseada na coexistência docorpus e do animus. A mera circunstância de olegislador, no inciso III desse artigo, declarar que seadquire a posse por qualquer dos modos deaquisição em geral torna inútil a enumeração feitanos incisos I e II.

O novo Código Civil, coerente com a teoriaobjetiva de Ihering, adotada no art. 1.196, não fezenumeração dos modos de aquisição da posse,limitando-se a proclamar, no art. 1.204: “Adquire-se aposse desde o momento em que se torna possível oexercício, em nome próprio, de qualquer dos poderesinerentes à propriedade”. A sua aquisição podeconcretizar-se, portanto, por qualquer dos modos deaquisição em geral, como, exemplificativamente, aapreensão, o constituto possessório e qualqueroutro ato ou negócio jurídico, a título gratuito ouoneroso, inter vivos ou causa mortis.

A apreensão consiste na apropriação unilateralde coisa “sem dono”. A coisa diz-se “sem dono”quando tiver sido abandonada (res derelicta) ouquando não for de ninguém (res nullius). Dá-se,

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ainda, a apreensão numa outra situação: quando acoisa é retirada de outrem sem a sua permissão.Configura-se, também nesse caso, a aquisição daposse, embora tenha ocorrido violência ouclandestinidade, porque, se o primitivo possuidoromitir-se, não reagindo incontinenti em defesa desua posse ou não a defendendo por meio dosinterditos (CC, art. 1.210, caput, e § 1º; CPC, art. 926),os vícios que comprometiam o ato detentivo doturbador ou esbulhador desaparecem, e terá eleobtido a posse, que, embora injusta perante oesbulhado, é merecedora de proteção em face deterceiros que não têm melhor posse (arts. 1.210 e1.211). Adquire-se-a também pelo exercício dodireito. Exemplo clássico é o da servidão. Seconstituída pela passagem de um aqueduto porterreno alheio, por exemplo, adquire o agente a suaposse se o dono do prédio serviente permaneceinerte. O art. 1.379 do Código Civil proclama que oexercício incontestado e contínuo de uma servidãopode, preenchidos os demais requisitos legais,conduzir à usucapião. O fato de se dispor da coisacaracteriza conduta normal de titular da posse oudomínio.

Podendo a posse ser adquirida por qualquer atojurídico, adquire-se-a, portanto, também pelatradição, que pressupõe um acordo de vontades, umnegócio jurídico de alienação, quer a título gratuito,

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como na doação, quer a título oneroso, como nacompra e venda. A tradição pode ser real, simbólicae ficta. Real, quando envolve a entrega efetiva ematerial da coisa; simbólica, quando representadapor ato que traduz a alienação, como a entrega daschaves do apartamento vendido; e ficta, no caso doconstituto possessório (cláusula constituti). Ocorre,por exemplo, quando o vendedor, transferindo aoutrem o domínio da coisa, conserva-a todavia emseu poder, mas agora na qualidade de locatário. Areferida cláusula tem a finalidade de evitarcomplicações decorrentes de duas convenções, comduas entregas sucessivas. A cláusula constituti nãose presume. Deve constar expressamente do ato ouresultar de estipulação que a pressuponha(Washington de Barros Monteiro, Curso de direitocivil, 14. ed., Saraiva, v. 3, p. 37). Pode ocorrer,também, na traditio brevi manu, que se configuraquando o possuidor de uma coisa em nome alheiopassa a possuí-la como própria. Assim acontecequando alguém, possuindo um bem, na qualidade,por exemplo, de arrendatário, o adquire, tornando-seseu proprietário.

Quanto à origem, distinguem-se os modos deaquisição da posse em originários e derivados. Noprimeiro caso, não há relação de causalidade entre aposse atual e a anterior. É o que acontece quando háesbulho, e o vício, posteriormente, convalesce. Por

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outro lado, diz-se que a posse é derivada quando háanuência do anterior possuidor, como na tradição. Seo modo de aquisição é originário, a posse apresenta-se escoimada dos vícios que anteriormente acontaminavam. Já o mesmo não acontece com aadquirida por meios derivados. De acordo com o art.1.203 do Código Civil, essa posse conservará omesmo caráter de antes. A adquirida por herdeirosou legatários, por exemplo, mantém os mesmosvícios anteriores (CC, art. 1.206). Quando o modo éoriginário, surge uma nova situação de fato, quepode ter outros defeitos, mas não os víciosanteriores. O art. 1.207, 2ª parte, traz uma exceção àregra de que a posse mantém o caráter com que foiadquirida, ao facultar ao sucessor singular unir a suaposse à de seu antecessor, para os efeitos legais.Assim, pode deixar de fazê-lo, se o quiser. No casoda usucapião, por exemplo, pode desconsiderar certoperíodo se a posse adquirida era viciosa. Unindo asua posse à de seu antecessor, terá direito àsmesmas ações que a este competia.

19 QUEM PODE ADQUIRIR A POSSE

A posse pode ser adquirida pela própria pessoaque a pretende, desde que capaz. Se não tivercapacidade legal, poderá adquiri-la se estiver

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representada ou assistida por seu representante (art.1.205, I). O novo Código não se refere à aquisiçãopor “procurador”, como o fazia o de 1916,considerando que a expressão “representante”abrange tanto o representante legal do agente comoo representante convencional ou procurador (cf. arts.115 e s.). Admite-se, ainda, que terceiro, mesmo semmandato, adquira posse em nome de outrem,dependendo de ratificação (art. 1.205, II). Trata-se dafigura do gestor de negócios, prevista nos arts. 861 es. Limongi França (A posse no Código Civil,Bushatsky, 1964, p. 33) apresenta o exemplo dealguém que cerca uma área e coloca lá umprocurador, mas este não só cultiva, em nome domandante, a área cercada, senão uma outracircunvizinha. O capataz, nesse caso, não émandatário para o cultivo da segunda área, “mas aaquisição da posse desta pelo titular daquela podeefetivar-se pela ratificação, expressa ou tácita”.

A posse do imóvel faz presumir, até provacontrária, a das coisas móveis que nele estiverem(CC, art. 1.209). Trata-se de mais uma aplicação doprincípio segundo o qual o acessório segue oprincipal. A presunção é juris tantum e estabelece ainversão do ônus da prova: o possuidor do imóvelnão necessita provar a posse dos objetos neleencontrados, mas o terceiro terá de provar os direitosque alegar ter sobre eles.

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20 PERDA DA POSSE

Supérflua, também, a enumeração feita pelo art.520 do Código Civil de 1916 dos meios pelos quais seperde a posse. Se esta é a exteriorização do domínioe se é possuidor aquele que se comporta em relaçãoà coisa como dono, desde o momento em que não secomporte mais dessa maneira, ou se veja impedido deexercer os poderes inerentes ao domínio, a posseestará perdida. O novo Código Civil, por essa razão,simplesmente proclama: “Perde-se a posse quandocessa, embora contra a vontade do possuidor, opoder sobre o bem, ao qual se refere o art. 1.196” (art.1.223).

Não há, com efeito, em diploma que acolhe ateoria de Ihering, a necessidade de especificar,casuisticamente, os casos e modos de perda daposse. Exemplificativamente, pode-se mencionar oabandono, que se dá quando o possuidor renuncia àposse, manifestando, voluntariamente, a intenção delargar o que lhe pertence, como quando atira à ruaum objeto seu, e a tradição, que só acarreta a perdada posse quando envolve a intenção definitiva detransferi-la a outrem, como acontece na venda doobjeto, com transmissão da posse plena aoadquirente. Perde-se, ainda, a posse, por exemplo,pela destruição da coisa; por sua colocação fora docomércio, porque se tornou inaproveitável ou

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inalienável; e pela posse de outrem, ainda que a novaposse se tenha firmado contra a vontade do primitivopossuidor, se este não foi mantido ou reintegrado emtempo oportuno. O desapossamento violento por atode terceiro dá origem à detenção, viciada pelaviolência exercida. Com o convalescimento dessevício, surge a posse, embora injusta, que se firmarápelo decurso do prazo de ano e dia, até serconvencido pelos meios ordinários (CPC, art. 924).Estes não são os atinentes ao petitório, mas à própriaação possessória em que se deu a manutençãoprovisória. A perda da posse pelo primitivopossuidor não é, pois, definitiva. Ela somenteocorrerá se permanecer inerte durante todo o tempode prescrição da ação possessória. O constitutopossessório, já comentado, também pode acarretar aperda da posse. O proprietário que, por exemplo,aliena o imóvel mas permanece nele residindo porforça de contrato de locação celebrado com oadquirente, perde a posse de dono, mas adquire, pelacláusula “constituti”, a de locatário.

21 RECUPERAÇÃO DE COISAS MÓVEIS ETÍTULOS AO PORTADOR

O art. 521 do Código Civil de 1916 permitia areivindicação de coisa móvel furtada, ou título ao

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portador, ainda que o terceiro demonstrasse seradquirente de boa-fé. Aquele que achava coisapertencente a outrem, ou a furtava, ficava obrigado arestituí-la ao legítimo possuidor. A mesma obrigaçãoexistia para aquele a quem a coisa tivesse sidotransferida. Se contra este a ação fosse movida,competir--lhe-ia direito regressivo contra a pessoaque lhe transferiu a coisa, para cobrança do seuvalor, e ainda das perdas e danos, se agiu de má--fé.Veja-se a jurisprudência: “A lei civil permite à vítimado furto reivindicar a coisa furtada, mesmo daqueleque a adquiriu e possui de boa-fé” (RT, 365:200,381:274).

O novo Código Civil não contém dispositivosemelhante ao mencionado art. 521 do Código de1916. Desse modo, o furto de título ao portador rege-se, hoje, exclusivamente pelo disposto no art. 907 doCódigo de Processo Civil, que dispõe: “Aquele quetiver perdido título ao portador ou dele houver sidoinjustamente desapossado poderá: I — reivindicá-loda pessoa que o detiver; II — requerer-lhe aanulação e substituição por outro”. Em relação àcoisa móvel ou semovente, prevalecerá a regra geral,aplicável também aos imóveis, de que o proprietárioinjustamente privado da coisa que lhe pertence podereivindicá-la de quem quer que a detenha (CC, art.1.228).

A situação do terceiro que vem a adquirir um

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objeto que foi extraviado ou roubado é traçada peloart. 1.268 do Código Civil, com relação à tradição:feita por quem não seja proprietário, “a tradição nãoaliena a propriedade, exceto se a coisa, oferecida aopúblico, em leilão ou estabelecimento comercial, fortransferida em circunstâncias tais que, ao adquirentede boa-fé, como a qualquer pessoa, o alienante seafigurar dono”, ou se “o alienante adquirir depois apropriedade” (§ 1º). Também não transfere apropriedade a tradição quando tiver por título umnegócio jurídico nulo (§ 2º). Nos casos de furto,roubo e perda, a coisa sai da esfera de vigilância dopossuidor contra a sua vontade. O mesmo nãoacontece quando este é vítima de estelionato ou deapropriação indébita, pois nesses casos a própriavítima se despoja, voluntariamente, da coisa, emboraàs vezes ilaqueada em sua boa-fé. Por isso, adoutrina e a jurisprudência têm entendido que oproprietário não pode reivindicar a coisa que estejaem poder de terceiro de boa-fé, nas hipóteses deestelionato ou apropriação indébita. Se a vítimapretender, nesses casos, reivindicar a coisa em poderde terceiro de boa-fé, não obterá êxito em suapretensão. A vítima poderá voltar-se contra o autordo ato ilícito, para exercer os seus eventuais direitos.Ressalte-se, por oportuno, que a reivindicação deimóveis segue outra disciplina.

Mesmo feita por quem não seja dono, se a coisa

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foi oferecida ao público em leilão, ou estabelecimentocomercial, tudo levando a crer que o alienante éproprietário, esse negócio transfere a propriedade.Dá-se proeminência à boa-fé em detrimento do realproprietário, que deverá responsabilizar o alienantede má-fé, persistindo, porém, a tradição e a alienaçãofeita ao adquirente de boa-fé.

22 PERDA DA POSSE PARA O AUSENTE

Dispunha o art. 522 do Código Civil de 1916 quesó se considerava perdida a posse para o ausentequando, tendo notícia da ocupação, se abstinha deretomar a coisa, ou, tentando recuperá-la, eraviolentamente repelido. A palavra “ausente” eraempregada no sentido comum, indicando aquele quenão se achava presente, e não no sentido jurídicoconcebido no art. 463 do referido diploma,correspondente ao art. 22 do novo estatuto civil.

A interpretação literal do aludido artigoinsinuava que a posse estava perdida para oausente quando, ciente do esbulho, permaneciainativo, ou tentando reaver a coisa, eraviolentamente repelido. Melchíades Picanço, citadopor Guido Arzua, em crítica ao postulado, assim seexpressou: “O Código, falando de posse perdida,como que dá a entender que o indivíduo esbulhado

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por ocasião de sua ausência, ausência que pode seraté de dias, não tem mais direito ao possessório, senão consegue retomar logo a posse, mas isso estáem desarmonia com a lei. Se o desapossado érepelido violentamente, nada o impede de recorrer àsações possessórias” (Posse: direito e o processo,Revista dos Tribunais, 1978, p. 131, n. 3).

Não obstante, o novo Código Civil manteve aorientação, dispondo: “Só se considera perdida aposse para quem não presenciou o esbulho, quando,tendo notícia dele, se abstém de retomar a coisa, ou,tentando recuperá-la, é violentamente repelido” (art.1.224). Naturalmente, essa perda é provisória, pois,como dito acima, nada o impede de recorrer às açõespossessórias.

Quadro sinótico – Aquisição e perda da posse

Adquire-se a possedesde o momento emque se torna possívelo exercício, em nomepróprio, de qualquer

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1. Modosdeaquisição

próprio, de qualquerdos poderesinerentes àpropriedade (CC, art.1.196). A suaaquisição podeconcretizar-se,portanto, porqualquer dos modosde aquisição emgeral, como, p. ex., aapreensão, oconstitutopossessório equalquer outro ato ounegócio jurídico,especialmente atradição, que pode

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tradição, que podeser real, simbólica eficta.

2.Aquisiçãooriginária

Configura-se noscasos em que não hárelação decausalidade entre aposse atual e aanterior. É o queacontece quando háesbulho, e o vício,posteriormente,cessa.

Diz-se que a posse éderivada quando háanuência do anterior

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3.Aquisiçãoderivada

anuência do anteriorpossuidor, como natradição. De acordocom o art. 1.203 doCC, essa posseconservará o mesmocaráter de

3.Aquisiçãoderivada

antes. Quando omodo é originário,surge uma novasituação de fato, quepode ter outrosdefeitos, mas não osvícios anteriores.

— a própria pessoaque a pretende, desde

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4.Quempodeadquirira posse

que a pretende, desdeque capaz;— o seu representante,legal ou convencional;— terceiro semmandato (gestor denegócios), dependendode ratificação (CC, art.1.205).

5.

Perde-se a possequando cessa, emboracontra a vontade dopossuidor, o podersobre o bem, ao qualse refere o art. 1.196(CC, art. 1.223).

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5.Perdadaposse

Exemplificativamente,perde-se-a peloabandono, pelatradição, peladestruição da coisa,por sua colocação forado comércio, pelaposse de outrem, peloconstituto possessório,pela traditio brevimanu etc.

6.Perda

Só se consideraperdida a posse paraquem não presenciou oesbulho, quando, tendonotícia dele, se abstém

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Perdadapossepara oausente

notícia dele, se abstémde retomar a coisa, ou,tentando recuperá-la, éviolentamente repelido(CC, art. 1.224). Essaperda é provisória, poisnada o impede derecorrer às açõespossessórias.

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CAPÍTULO IVEFEITOS DA POSSE

23 TUTELA DA POSSE

23.1. INTRODUÇÃO

São precisamente os efeitos da posse que lheimprimem cunho jurídico e a distinguem da meradetenção. Cinco são os mais evidentes: a) a proteçãopossessória, abrangendo a autodefesa e a invocaçãodos interditos; b) a percepção dos frutos; c) aresponsabilidade pela perda ou deterioração dacoisa; d) a indenização pelas benfeitorias e o direitode retenção; e) a usucapião.

23.2. A PROTEÇÃO POSSESSÓRIA

A proteção conferida ao possuidor é o principalefeito da posse. Dá-se de dois modos: pela legítimadefesa e pelo desforço imediato (autotutela,autodefesa ou defesa direta), em que o possuidorpode manter ou restabelecer a situação de fato pelosseus próprios recursos; e pelas ações possessórias,criadas especificamente para a defesa da posse(heterotutela). Quando o possuidor se acha presente

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e é turbado no exercício de sua posse, pode reagir,fazendo uso da defesa direta, agindo, então, emlegítima defesa. A situação se assemelha à daexcludente prevista no Código Penal. Se, entretanto,a hipótese for de esbulho, tendo ocorrido a perda daposse, poderá fazer uso do desforço imediato. É oque preceitua o art. 1.210, § 1º, do Código Civil: “Opossuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-seou restituir-se por sua própria força, contanto que ofaça logo; os atos de defesa, ou de desforço, nãopodem ir além do indispensável à manutenção, ourestituição da posse”. A expressão “por sua própriaforça”, constante do texto legal, quer dizer: semapelar para a autoridade, para a polícia ou para ajustiça.

A legítima defesa não se confunde com odesforço imediato. Este ocorre quando o possuidor,já tendo perdido a posse (esbulho), consegue reagir,em seguida, e retomar a coisa. A primeira somentetem lugar enquanto a turbação perdurar, estando opossuidor na posse da coisa. O desforço imediato épraticado diante do atentado já consumado, masainda no calor dos acontecimentos. O possuidor temde agir com suas próprias forças, embora possa serauxiliado por amigos e empregados, permitindo-se-lhe ainda, se necessário, o emprego de armas. Pode oguardião da coisa exercer a autodefesa, a benefíciodo possuidor ou representado. Embora não tenha o

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direito de invocar, em seu nome, a proteçãopossessória, não se lhe recusa, contudo, o direito deexercer a autoproteção do possuidor, consequêncianatural de seu dever de vigilância.

Os atos de defesa, ou de desforço, não podem iralém do indispensável à manutenção, ou restituiçãoda posse (art. 1.210, § 1º, 2ª parte). Há necessidade,portanto, de observar determinados requisitos, paraque a defesa direta possa ser considerada legítima.Em primeiro lugar, é preciso que a reação se façalogo, imediatamente após a agressão. CarvalhoSantos explica que esse advérbio significa que, se opossuidor não puder exercer o desforçoimediatamente, poderá fazê-lo logo que lhe sejapossível agir. E exemplifica: alguém se encontra como ladrão de sua capa dias depois do furto. Em talhipótese, apesar do lapso de tempo decorrido,assiste-lhe o direito de fazer justiça por suas própriasmãos, se presente não estiver a polícia (Código Civilbrasileiro interpretado, Freitas Bastos, v. 7, p. 137).Assim, não pode ser interpretado de forma tão literalque venha a excluir qualquer intervalo. Havendodúvida, é aconselhável o ajuizamento da açãopossessória pertinente, pois haverá o risco de seconfigurar o crime de “exercício arbitrário daspróprias razões”, previsto no art. 345 do CódigoPenal.

Em segundo lugar, a reação deve-se limitar ao

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indispensável à retomada da posse. Os meiosempregados devem ser proporcionais à agressão.Essa forma excepcional de defesa só favorece quemusa moderadamente dos meios necessários pararepelir injusta agressão. O excesso na defesa daposse pode acarretar a indenização de danoscausados.

24 AÇÕES POSSESSÓRIAS EM SENTIDOESTRITO

24.1. LEGITIMAÇÃO ATIVA E PASSIVA

Exige-se a condição de possuidor para apropositura dos interditos (CPC, art. 926), mesmo quenão tenha título (possideo quod possideo). Odetentor, por não ser possuidor, não tem essafaculdade. Não basta ser proprietário ou titular deoutro direito real. Se somente tem o direito, mas não aposse correspondente, terá de valer-se da viapetitória, não da possessória, a não ser que se tratede sucessor de quem detinha a posse e foimolestado. O herdeiro ou sucessor causa mortisencontra-se, em matéria possessória, em situaçãoprivilegiada, pois presume a lei que “continua dedireito a posse do seu antecessor” (CC, art. 1.207).Assim, não necessita provar a sua posse anterior,

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mas apenas a do de cujus. Ao sucessor a títulosingular é facultado unir a sua posse à doantecessor, para os efeitos legais. Desse modo, seeste tinha posse e havia sido esbulhado, àquele seráfacultado assumir sua posição, para o fim de ajuizar acompetente ação possessória contra o terceiro.

Embora Pontes de Miranda (Comentários aoCódigo de Processo Civil, Rio de Janeiro, Forense,1976, t. 12, p. 381) defenda a tese de que o nascituropode ser possuidor (“a posse vai para o nascituro,como se já tivesse nascido, ou a quem, se o feto nãonasce com vida, é herdeiro”), parece-nos mais corretaa posição de José Carlos Moreira Alves, no sentidode que o nascituro, enquanto tal, não é possuidor,visto “que não há, nunca houve, direito donascituro, mas, simples, puramente, expectativas dedireito, que se lhe protegem, se lhe garantem, numefeito preliminar, provisório, numa Vorwirkung,porque essa garantia, essa proteção é inerente e éessencial à expectativa do direito”. Assim, aduz, se“o nascituro não é titular de direitos subjetivos, nãoserá também, ainda que por ficção, possuidor”(Posse, Rio de Janeiro, Forense, 1985, v. II, p. 142).

Possuidores diretos e indiretos têm açãopossessória contra terceiros, e também um contra ooutro (v. n. 10, retro). Havendo posse escalonada ouem níveis (locador, locatário, sublocatário), em quehá um possuidor direto e mais de um possuidor

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indireto, é preciso verificar qual das posses foiofendida na ação movida entre eles. Entretanto,contra terceiros, há legitimação concorrente dospossuidores de diferentes níveis, podendo instaurar-se litisconsórcio não obrigatório.

A legitimidade passiva nas ações possessórias édo autor da ameaça, turbação ou esbulho (CPC, arts.927, II, e 932), assim como do terceiro que recebeu acoisa esbulhada, sabendo que o era, isto é, de má-fé(CC, art. 1.212). Contra o terceiro que recebeu a coisade boa-fé não cabe ação de reintegração de posse,pela interpretação a contrario sensu do referido art.1.212. Nesse caso, caberá ao esbulhado a açãopetitória contra o terceiro de boa-fé (Tito Fulgêncio,Da posse e das ações possessórias, 5. ed., Rio deJaneiro, Forense, 1980, v. 1, p. 135, n. 172; RT,182:679).

Se a turbação e o esbulho forem causados porpessoa privada de discernimento ou menor incapazde entender o valor ético da sua ação, o legitimadopassivo será o encarregado de sua vigilância(curador, pai ou tutor), a quem competirá responderpor autoria moral, se, tendo conhecimento do ato,não tiver recolocado as coisas no status quo ante,voluntariamente, ou por culpa in vigilando (JoãoBatista Monteiro, Ação de reintegração de posse,Revista dos Tribunais, 1987, p. 154, n. 43.1).

A ação pode ser proposta tanto contra o autor

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do ato molestador como contra quem ordenou a suaprática, ou contra ambos. Mesmo que o turbadorproceda como representante legal ou convencionalde outrem, e dentro dos limites do mandato, opossuidor molestado não tem obrigação de saberque se trata de representação. A lei não desampara orepresentante, porque sempre lhe fica aberto orecurso de nomeação à autoria da pessoa em cujonome praticou a turbação. Com maior razão terálegitimidade passiva se agiu por conta própria, fora ealém dos limites do seu mandato.

O herdeiro a título universal ou mortis causatambém é legitimado passivo, porque continua dedireito a posse de seu antecessor (CC, art. 1.207),com as mesmas características. Já o sucessor a títulosingular somente estará legitimado para responder àação de reintegração de posse se, nos termos do art.1.212 do Código Civil, “recebeu a coisa esbulhadasabendo que o era”.

Legitimada passivamente para a ação é a pessoajurídica de direito privado autora do atomolestador, não o seu gerente, administrador oudiretor, se estes não ag iram em nome próprio.Também são legitimadas as pessoas jurídicas dedireito público, contra as quais pode até ser deferidamedida liminar, desde que sejam previamenteouvidos os seus representantes legais (CPC, art. 928,parágrafo único). Quando o Poder Público

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desapossa alguém sem o processo expropriatórioregular, não há dúvida de que pratica esbulho. Ajurisprudência, porém, ao fundamento de que a obrapública não pode ser demolida e de que aoproprietário nada mais resta, vem convertendo osinterditos possessórios em ação de indenização,denominada desapropriação indireta. Essaconversão, todavia, deve ocorrer somente se houvepedido alternativo de indenização e se oapossamento está consumado, sendo o imóvelempregado realmente em obra pública. Caso nãotenha sido formulado o pedido alternativo, é de seproclamar a carência de ação movida contra o PoderPúblico, ante a intangibilidade da obra pública,máxime quando já ultimada, por pertinente, adesapropriação indireta (RT, 668:103; JTACSP (Lex),84:120).

No entanto, é perfeitamente cabível açãopossessória contra o Poder Público quando estecomete atentado à posse dos particulares, agindomore privatorum, isto é, como qualquer particular, enão para realizar obra pública. Tem-se entendido,contudo, que o particular, nestes últimos casos, devereagir prontamente, pois não mais poderá pretenderinterditar a obra se já estiver construída ou emconstrução, nada mais lhe restando então quepleitear a respectiva indenização.

Muitas vezes o turbado ou esbulhado propõe

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ação contra simples prepostos, que praticam osreferidos atos a mando de terceiros, pordesconhecimento da situação fática. Para corrigiresse endereçamento errôneo da demanda há umexpediente técnico processual: a nomeação àautoria. Se o demandado é simples detentor (CC, art.1.198), nomeia à autoria (CPC, art. 62); se é possuidordireto apenas (CC, art. 1.197), denuncia da lide aopossuidor indireto (CPC, art. 70, II).

24.2. CONVERSÃO DE AÇÃO POSSESSÓRIAEM AÇÃO DE INDENIZAÇÃO

Permite-se que o possuidor possa demandar aproteção possessória e, cumulativamente, pleitear acondenação do réu nas perdas e danos (CPC, art.921). Se, no entanto, ocorreu o perecimento ou adeterioração considerável da coisa, só resta aopossuidor o caminho da indenização. Se tal ocorreu,porém, depois de ajuizada a ação de reintegração deposse, embora já não possa ser apreciado o pedidode proteção possessória, nada impede que apretensão indenizatória seja deferida, mas somentese formulada na inicial, cumulativamente com opedido de proteção possessória.

Quadro sinótico – Efeitos da posse

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1.Tutelada

Efeitosmaisevidentes

a) a proteção possessória,abrangendo a autodefesa ea invocação dos interditos;b) a percepção dos frutos;c) a responsabilidade pelaperda ou deterioração dacoisa;d) a indenização pelasbenfeitorias e o direito deretenção;e) a usucapião.

a) legítima

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daposse

A proteçãopossessória

a) legítimadefesa edesforçoimediato

b) açõespossessórias(heterotutela)

a) exige-se acondição de

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2. Ações

Legitimaçãoativa

condição depossuidormesmo quenão tenhatítulo. Odetentor nãotem essafaculdade,nem onascituro, aquem seatribui meraexpectativa dedireito;b) dospossuidoresdiretos

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2. Açõespossessóriasem sentidoestrito

diretosindiretosaçãopossessóriacontraterceiros etambém umcontra o outro.

Legitimaçãopassiva

a) do autor daameaça,turbação ouesbulho (CPC,arts. 927, II, e932);b) do curador,pai ou tutor, sea turbação e o

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a turbação e oesbulho foremcausados poramental oumenor;

c) da pessoaque ordenou aprática do atomolestador;d) do herdeiroa títulouniversal oumortis causaporquecontinua dedireito a possede seu

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2. Açõespossessóriasem sentidoestrito

Legitimaçãopassiva

de seuantecessor;e) a pessoajurídica dedireito privadoautora do atomolestador,bem como apessoajurídica dedireito público,contra a qualpode até serdeferidamedida liminar,desde quesejam

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sejampreviamenteouvidos osseusrepresentanteslegais (CPC,art. 928,parágrafoúnico).

Conversãoem ação deindenização

Se ocorrer operecimentoou adeterioraçãoconsiderávelda coisa, sóresta aopossuidor o

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possuidor ocaminho daindenização.

25 AÇÕES POSSESSÓRIAS NA TÉCNICA DOCÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

25.1. A FUNGIBILIDADE DOS INTERDITOS

O princípio da fungibilidade das açõespossessórias está assim regulamentado: “Apropositura de uma ação possessória em vez deoutra não obstará a que o juiz conheça do pedido eoutorgue a proteção legal correspondente àquela,cujos requisitos estejam provados” (CPC, art. 920).Desse modo, se a ação cabível for a de manutençãode posse e o autor ingressar com ação dereintegração, ou vice-versa, o juiz conhecerá dopedido da mesma forma e determinará a expedição domandado adequado aos requisitos provados. É umaaplicação do princípio da mihi factum dabo tibi jus,segundo o qual a parte expõe o fato e o juiz aplica odireito.

Impõe-se tal princípio somente às três açõespossessórias em sentido estrito. Sendo uma exceçãoao princípio que proíbe o julgamento extra petita

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(CPC, art. 460), deve ter aplicação estrita.Inadmissível o seu emprego entre uma açãopossessória e a ação de imissão na posse oureivindicatória, ou entre uma possessória e uma açãode despejo. Se tal ocorrer, o autor será declaradocarecedor, por falta de interesse processualadequado, não podendo uma ação ser aceita poroutra (RT, 333:484, 469:66, 612:106; JTACSP,102:91). O referido princípio autoriza a conversão dointerdito proibitório em interdito de manutenção oureintegração de posse se, depois de ajuizado, vier aocorrer a turbação, ou o esbulho, que se temia.Entretanto, ajuizada a ação de manutenção de posse,não há mais lugar para ser intentado o interditoproibitório, por falta de interesse de agir.

25.2. CUMULAÇÃO DE PEDIDOS

O art. 921 do Código de Processo Civil permiteque o autor, na inicial da ação possessória, cumule opedido possessório com o de condenação em perdase danos, cominação de pena para o caso de novaturbação ou esbulho e desfazimento de construçãoou plantação feita em detrimento de sua posse. Acumulação é facultativa e pode ocorrer sem prejuízodo rito especial, embora os agregados aopossessório não tenham tal conteúdo. Se não foiformulado pelo autor ou pelo réu o pedido de

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condenação em perdas e danos, julgará ultra petitao juiz que a decretar de ofício, pois não se pode tê-locomo implícito. Não se pode relegar à fase daliquidação a prova da existência do dano. Esta tem deser produzida no processo de conhecimento, paraque a sentença possa reconhecê-lo.

O pedido de cominação de pena é cominatóriotípico e equivale a um interdito proibitório incidentala uma ação de turbação ou esbulho. É tambémfacultativo, e nada obsta que seja requerido para ahipótese de o réu infringir o mandado de manutençãoou reintegração liminar. Desde que o autor dispenseo rito especial, pode formular outros pedidoscumulados ao possessório, como, por exemplo, o derescisão do compromisso de compra e venda e odemarcatório (CPC, art. 951).

25.3. CARÁTER DÚPLICE DAS AÇÕESPOSSESSÓRIAS

“É lícito ao réu, na contestação, alegando quefoi o ofendido em sua posse, demandar a proteçãopossessória e a indenização devida pelos prejuízosresultantes da turbação ou do esbulho cometido peloautor” (CPC, art. 922). As ações possessórias têm,pois, natureza dúplice. Não se faz necessário pedidoreconvencional. Se se julgar ofendido em sua posse,o réu pode formular, na própria contestação, os

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pedidos que tiver contra o autor. Estabelecida exlege a duplicidade da ação, facultam-se ao réu asmesmas cumulações permitidas ao autor pelo art. 921do estatuto processual.

Como o réu pode formular tais pedidos nacontestação, não se admite reconvenção em açãopossessória (RT, 618:128; JTACSP, 105:249). Nempor isso deve-se concluir pela absoluta e geralinadmissibilidade dessa forma de resposta do réu emação possessória, adverte Adroaldo FurtadoFabrício. Ela “cabe para veicular outras pretensões,que não as contempladas no artigo. Nem mesmo é deexcluir-se reconvenção, com a forma e oprocedimento que lhe são próprios, para formularpedidos de conteúdo possessório, se referentes, porexemplo, a outro bem, ou a outra parte do mesmobem” (Comentários ao Código de Processo Civil,Forense, 1988, v. 8, t. 3, p. 405, n. 335). A açãopossessória somente é dúplice se o réu tambémdemandar, na contestação, proteção possessória(RT, 615:187).

25.4. DISTINÇÃO ENTRE JUÍZOPOSSESSÓRIO E JUÍZO PETITÓRIO. AEXCEÇÃO DE DOMÍNIO

No juízo possessório não adianta alegar odomínio, porque só se discute posse. Por outro lado,

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no juízo petitório a discussão versa sobre o domínio,sendo secundária a questão daquela. Só por exceçãoé que a questão do domínio podia ser trazida ao juízopossessório, segundo o art. 505 do Código Civil de1916, assim redigido: “Não obsta à manutenção, oureintegração na posse, a alegação de domínio, ou deoutro direito sobre a coisa. Não se deve, entretanto,julgar a posse em favor daquele a quemevidentemente não pertencer o domínio”.

Tratava-se de um dispositivo controvertido,porque a primeira parte parecia contradizer asegunda. Na primeira, estava representada a própriadistinção entre o juízo possessório e o petitório: aalegação de domínio não impede a manutenção ou areintegração na posse. Assim, se a ação erapossessória, vencia quem tinha melhor posse, denada adiantando alegar domínio. Entretanto, nasegunda parte estava dito que não se devia julgar aposse em favor daquele a quem evidentemente nãopertencesse o domínio! A aparente contradição foiconciliada pela jurisprudência da seguinte forma: emregra, nas ações possessórias não era permitida adefesa com fundamento no domínio;excepcionalmente, porém, ela era admitida nosseguintes casos: a) quando duvidosa a posse deambos os litigantes; b) quando as partes disputavama posse a título de proprietárias.

A maioria dos acórdãos admitia a exceção de

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domínio (exceptio dominii, exceptio proprietatis ouquerella proprietatis) nas duas hipóteses, ou seja,quando duvidosa a posse de ambos os litigantes equando a disputavam a título de proprietários.Alguns, entretanto, só a aceitavam em um ou outrocaso. O Supremo Tribunal Federal, na Súmula 487,assentou: “Será deferida a posse a quemevidentemente tiver o domínio, se com base neste fordisputada”.

O art. 923 do Código de Processo Civil tem aseguinte redação: “Na pendência do processopossessório é defeso, assim ao autor como ao réu,intentar a ação de reconhecimento do domínio”. ALei n. 6.820, de 16 de setembro de 1980, suprimiu asegunda parte do aludido dispositivo (que tinharedação assemelhada à do art. 505 do Código Civil de1916). Vários doutrinadores passaram, então, aentender que a segunda parte deste últimodispositivo, justamente a que possibilitava aarguição da exceptio proprietatis naquelas duashipóteses mencionadas, fora revogada pelo art. 923do Código de Processo Civil, permanecendo emvigor somente a primeira, que estabelecia a distinçãoentre juízo possessório e juízo petitório. Para essacorrente, além da segunda parte do aludido art. 505do diploma civil de 1916, revogada estaria também aSúmula 487 do Supremo Tribunal Federal e, emconsequência, extinta a exceção de domínio em

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nosso sistema.Com o advento do novo Código Civil ficou

evidenciada, de modo irrefragável, a referidaextinção, pois esse diploma não contempla apossibilidade de se arguir a exceptio proprietatis,limitando-se a proclamar, no art. 1.210, § 2º: “Nãoobsta à manutenção ou reintegração na posse aalegação de propriedade, ou de outro direito sobre acoisa”.

Resta analisar a redação atual do aludido art. 923do Código de Processo Civil: “Na pendência doprocesso possessório, é defeso, assim ao autor comoao réu, intentar a ação de reconhecimento dodomínio”. Portanto, enquanto estiver tramitando aação possessória, nem o réu nem o autor podemajuizar, paralelamente, a ação petitória para obter adeclaração do seu direito à posse. A consequênciaprática da proibição é que poderá o possuidor nãoproprietário, desde que ajuíze ação possessória,impedir a recuperação da coisa pelo seu legítimodono, pois este ficará impedido de recorrer àreivindicatória até que a possessória sejadefinitivamente julgada. Pensando em evitar abusos,a doutrina e a jurisprudência têm restringido a suaaplicação aos casos em que, na possessória, a posseé disputada com base nos títulos de domínio (cf. RT,482:273, 605:55, 650:67), não, portanto, àqueles emque as partes alegam apenas posse de fato baseada

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em atos concretos.

25.5. PROCEDIMENTO: AÇÃO DE FORÇANOVA E AÇÃO DE FORÇA VELHA. AÇÃOPOSSESSÓRIA RELATIVA A COISA MÓVEL

Dispõe o art. 924 do Código de Processo Civil:“Regem o procedimento de manutenção e dereintegração de posse as normas da seção seguinte,quando intentado dentro de ano e dia da turbação oudo esbulho; passado esse prazo, será ordinário, nãoperdendo, contudo, o caráter possessório”. Asreferidas normas estabelecem um procedimentoespecial, cuja principal diferença e vantagem é aprevisão da medida liminar. Esta, porém, só seráconcedida quando a ação for intentada dentro deano e dia da turbação ou do esbulho; caso contrário,o rito será ordinário, não perdendo a ação, contudo,o caráter possessório. Isso significa que somentehaverá o rito especial, constituído de duas fases (aprimeira para a concessão de liminar), se a ação forajuizada no prazo de ano e dia da turbação ou doesbulho, caso em que a possessória seráconsiderada ação de “força nova”. Passado esseprazo, o rito será o ordinário e a ação, “de forçavelha”, seguindo-se, então, o prazo para acontestação, a instrução e o julgamento.

A diferença, pois, entre o procedimento especial

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das ações possessórias e o ordinário está napossibilidade, prevista no primeiro, de concessão deliminar, inaudita altera parte ou após a realização deuma audiência de justificação prévia da posse. Nãohá vantagem alguma para o proprietário em promoveração possessória se o esbulho sofrido data de maisde ano e dia, pois ela seguirá o rito ordinário, semliminar. Melhor será ajuizar desde logo areivindicatória. Se, no entanto, nenhum dos litigantesfor proprietário e estiverem disputando o imóvel atítulo de possuidores, com base no jus possessionis,a única via judicial de que se podem valer é apossessória. Nesse caso, se for intentada no prazode ano e dia, seguirá o rito especial, compossibilidade de obtenção da liminar. Se já houverpassado o prazo de ano e dia, ao possuidor sórestará o ajuizamento da possessória, que seguiráporém o rito ordinário, sem liminar.

A Lei n. 9.245, de 26 de dezembro de 1995,excluiu do procedimento sumário as ações queversem sobre posse e domínio de coisas móveis.Assim, o procedimento das ações possessórias, querversem sobre bens móveis, quer sobre bens imóveis,sendo ação de força velha, será sempre o ordinário.Se for ação de força nova, seguirá o especial dosarts. 926 e s. do Código de Processo Civil, quepreveem a possibilidade de se conceder liminar.

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25.6. A EXIGÊNCIA DE PRESTAÇÃO DECAUÇÃO

Estabelece o art. 925 do estatuto processualcivil: “Se o réu provar, em qualquer tempo, que oautor provisoriamente mantido ou reintegrado naposse carece de idoneidade financeira para, no casode decair da ação, responder por perdas e danos, ojuiz assinar-lhe-á o prazo de 5 (cinco) dias pararequerer caução sob pena de ser depositada a coisalitigiosa”. Muitas vezes, a concessão de uma liminarparalisa a realização de obras vultosas e podeacontecer que, a final, não seja confirmada. Orequerido, então, fará jus à indenização dos prejuízossofridos. Para garantir-se, poderá o réu, após aconcessão da liminar, exigir que o autor prestecaução, na conformidade dos arts. 826 a 838 doCódigo de Processo Civil, provando a falta deidoneidade financeira deste para arcar com as perdase danos. Não prestando a caução, a coisa litigiosaserá depositada judicialmente. A caução poderá serreal (consistente em imóvel, joias, dinheiro) oufidejussória (carta de fiança).

Alegam alguns que tal dispositivo édiscriminatório, podendo deixar desprovidos datutela os que não tenham condições de prestarcaução suficiente. Argumentam outros, no entanto,em favor do dispositivo, com a malícia do litigante

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que, obtida a liminar, passa a protelar ao máximo oandamento do processo, vindo a decair da demanda,a final, sem ter condições de indenizar os prejuízosque a protelação causou ao réu. Aduza-se, ainda,que o juiz não está adstrito a deferir, sempre, opedido de caução. Trata-se de um poderdiscricionário atribuído a ele.

Quadro sinótico – Ações possessórias natécnica do CPC

A propositura deuma ação emvez de outra nãoimpedirá que ojuiz conheça dopedido eoutorgue aproteção legalcorrespondente

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1. Afungibilidadedos interditos

correspondenteàquela, cujosrequisitosestejamprovados (CPC,art. 920). Assim,se cabível for ade manutençãode posse e oautor ingressarcom ação dereintegração, ouvice-versa, o juizdeterminará aexpedição domandadoadequado aosrequisitos

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requisitosprovados.

2. Cumulaçãode pedidos

O art. 921 doCPC permite queo autor, nainicial, cumule opedidopossessório como de condenaçãoem perdas edanos,cominação depena para ocaso de novaturbação ouesbulho e

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desfazimento deconstrução ouplantação feitaem detrimentode sua posse.

3. Caráter

As açõespossessóriastêm naturezadúplice. Não sefaz necessáriopedidoreconvencional.É lícito ao réu,com efeito, nacontestação,alegando que foi

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3. Caráterdúplice dasaçõespossessórias

alegando que foiofendido em suaposse,demandar aproteçãopossessória e aindenizaçãodevida pelosprejuízosresultantes daturbação ou doesbulhocometido peloautor (CPC, art.922).

No juízopossessório não

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4. Juízopetitórioe juízopossessório

possessório nãoadianta alegar odomínio, porquesó se discuteposse. Por outrolado, no juízopetitório adiscussão versasobre o domínio,sendosecundária aquestão daquela.O CC/2002 nãoadmite apossibilidade dese arguir aexceptio

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proprietatis (art.1.210, § 2o).

5.

Somente haveráo rito especial,constituído deduas fases (aprimeira para aconcessão deliminar), se aação for ajuizadano prazo de anoe dia daturbação ou doesbulho, casoem que apossessória será

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Procedimento possessória seráconsideradaação de “forçanova”. Passadoesse prazo, orito será oordinário e aação, de “forçavelha”, seguindo-se, então, oprazo para acontestação, ainstrução e ojulgamento.

Se o réu provarque o autorprovisoriamente

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6. Exigênciadeprestação decaução

provisoriamentemantido oureintegrado naposse carece deidoneidadefinanceira para,no caso dedecair da ação,responder porperdas e danos,o juiz assinar-lhe-á o prazo decinco dias pararequerer cauçãosob pena de serdepositada acoisa litigiosa

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coisa litigiosa(CPC, art. 925).

26 DA MANUTENÇÃO E DA REINTEGRAÇÃODE POSSE

26.1. CARACTERÍSTICAS E REQUISITOS

26.1.1. INTRODUÇÃO

A manutenção e a reintegração de posse sãotratadas em uma única seção, visto que apresentamcaracterísticas e requisitos semelhantes. A diferençaestá apenas em que “o possuidor tem direito a sermantido na posse em caso de turbação ereintegrado no de esbulho” (CPC, art. 926). Aturbação distingue-se do esbulho porque, com este,o possuidor vem a ser privado da posse, ao passoque naquela, embora molestado, continua na possedos bens. A ação de manutenção de posse, pois, écabível na hipótese em que o possuidor sofreturbação em seu exercício. Em caso de esbulho,adequada é a de reintegração de posse.

26.1.2. POSSE

O primeiro requisito para a propositura das

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referidas ações (CPC, art. 927) é a prova da posse.Quem nunca a teve não pode valer--se dosinterditos. Assim, a pessoa que adquire um imóvel eobtém a escritura definitiva, mas não a posse, porqueo vendedor a retém, não pode socorrer-se da açãopossessória, porque nunca teve posse. A açãoapropriada, nesse caso, será a de imissão na posse.Na possessória o autor terá de produzir prova de quetem posse legítima da coisa e que a manteve, apesarda turbação, ou que tinha posse e a perdeu emvirtude do esbulho praticado pelo réu.

A posse pode ser transmitida por ato inter vivosou causa mortis. Logo, se alguém recebeu, naescritura, a posse de outrem que a tinha, não está nasituação de quem nunca exerceu a posse, porque arecebeu de seu antecessor, podendo mover açãopossessória contra qualquer intruso. É caso,também, de reintegração se o vendedor transmite aposse na escritura e não a entrega de fato. Nessemomento passa a ser esbulhador. A jurisprudênciatem admitido a transmissão da posse por escriturapública (posse civil ou jurídica), de modo a legitimaro uso dos interditos pelo novo titular do domínio atémesmo em face do alienante, que continua a deter oimóvel, mas em nome de quem o adquiriu (v. n. 14,retro). Diferente, porém, a situação se o vendedornão entrega juridicamente a posse, por cláusulacontratual, prometendo entregá-la depois e não o faz.

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Nesse caso a ação será de imissão na posse, porquenem juridicamente nem de fato o proprietário aobteve. A falta de prova da posse acarreta aimprocedência da ação, não cabendo a extinção doprocesso sem julgamento do mérito (RT, 572:136).

26.1.3. TURBAÇÃO

O segundo requisito é a prova da turbação oudo esbulho praticado pelo réu. O autor terá dedescrever quais os fatos que o estão molestando,cerceando o exercício da posse. Por exemplo, deveráprovar que o réu vem penetrando em seu terrenopara extrair lenha ou colocar animais no pasto ouvem se utilizando de determinado caminho sem suapermissão. Turbação é todo ato que embaraça o livreexercício da posse.

Alguns autores admitem não só a turbação defato (agressão material contra a posse), comotambém a de direito. Consiste esta na contestaçãojudicial da posse do autor pelo réu. O Tribunal deJustiça de São Paulo já proclamou que a descrição deum imóvel em inventário como bem do espólioconfiguraria turbação de direito, por constituir“ameaça de turbação de posse do atual possuidor”(RT, 260:382). Parece-nos, no entanto, que turbaçãosó pode ser de fato, e não de direito, como já sedecidiu (RT, 491:140), pois contra atos judiciais não

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cabe a manutenção, mas embargos e outros meiospróprios de defesa. A turbação “Há de ser real, istoé, concreta, efetiva, consistente em fatos” (OrlandoGomes, Direitos reais, 6. ed., Forense, 1978, p. 91, n.63), mesmo porque ameaça não é o mesmo queturbação; pode dar ensejo à propositura do interditoproibitório, mas não à da ação de manutenção.Turbação é efetivo embaraço ao exercício da posse.

A turbação pode ser, ainda, direta e indireta,positiva e negativa. Direta é a comum, a que seexerce imediatamente sobre o bem; indireta é apraticada externamente, mas que repercute sobre acoisa possuída, como, por exemplo, se, em virtude demanobras do turbador, o possuidor não consegueinquilino para o prédio. Positiva é a turbação queresulta da prática de atos materiais sobre a coisa(passagem pela propriedade alheia ou ingresso pararetirar água); negativa é a que apenas dificulta ouembaraça o livre exercício da posse, pelo possuidor.

26.1.4. ESBULHO

O esbulho acarreta a perda da posse contra avontade do possuidor. Quer a perda resulte deviolência, quer de qualquer outro vício, como aclandestinidade ou a precariedade, cabe a ação dereintegração de posse. O esbulho resultante do vícioda precariedade é denominado esbulho pacífico. No

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tocante à clandestinidade, o prazo de ano e dia teminício a partir do momento em que o possuidor tomaconhecimento da prática do ato. Nessa hipótese nãohá oportunidade para o desforço imediato, que deveser exercido logo após o desapossamento, isto é,ainda no calor dos acontecimentos.

Em várias situações pode ocorrer o chamadoesbulho pacífico, resultante do vício daprecariedade. Quando o compromissário compradordeixa de pagar as prestações avençadas, pode-seajuizar ação de rescisão contratual, cumulada comação de reintegração de posse. Na mesma sentença,o juiz declara rescindido o contrato e manda restituiro imóvel ao autor. Nesse caso, porém, não pode acausa seguir o procedimento especial daspossessórias, mas o ordinário, em que não cabe aexpedição do mandado liminar de reintegração. Só aadoção do procedimento comum torna possível acumulação desses pedidos (JTACSP, 116:114). Jádecidiu o Supremo Tribunal Federal serdesnecessária a prévia ou concomitante ação derescisão de compromisso para a procedência dapossessória, havendo cláusula resolutória expressa(RT, 472:238, 483:215; RTJ, 83:401), pois no pedidode reintegração está contida a pretensão doreconhecimento da rescisão contratual, a fim de secaracterizar o esbulho. De acordo com a Súmula 76do Superior Tribunal de Justiça, “A falta de registro

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do compromisso de compra e venda de imóvel nãodispensa a prévia interpelação para constituir emmora o devedor”. Há decisões no sentido de que,mesmo em se tratando de comodato por prazoindeterminado, torna-se desnecessária préviainterpelação, porque a citação válida para o processoé a mais eficaz interpelação (RT, 420:215, 422:141,616:134), mas não poderá ser concedida a liminar deplano.

26.1.5. DATA DA TURBAÇÃO OU DOESBULHO

Exige a lei, em terceiro lugar, a prova da data daturbação ou do esbulho. Dela depende oprocedimento a ser adotado. O especial, com pedidode liminar, exige prova de turbação ou esbulhopraticados há menos de ano e dia da data doajuizamento. Passado esse prazo, será adotado o ritoordinário, não perdendo, contudo, o caráterpossessório (CPC, art. 924). O prazo de ano e dia é dedecadência; portanto, fatal e peremptório. Quandoreiterados os atos de turbação, a cada um deles podecorresponder uma ação, fluindo o prazo de ano e diada data em que se verifica o respectivo ato. A provada data da turbação ou do esbulho é importantetambém para a verificação de eventual prescrição daação.

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26.1.6. CONTINUAÇÃO OU PERDA DA POSSE

Em quarto lugar, necessita o autor provar, naação de manutenção de posse, a sua posse atual, ouseja, que, apesar de ter sido molestado, ainda amantém, não a tendo perdido para o réu. Se não maisconserva a posse, por haver sido esbulhado, terá deajuizar ação de reintegração de posse.

26.2. O PROCEDIMENTO

26.2.1. A PETIÇÃO INICIAL

A petição inicial deve atender ao que dispõe oart. 927 do estatuto processual civil (procedimentoespecial), além de conter todos os requisitosenumerados no art. 282, próprios do procedimentocomum, para que a prestação jurisdicional postuladapossa ser prestada. Não se pode ajuizar açãopossessória sem que o objeto da ação sejaperfeitamente individualizado e delimitado. Docontrário, a sentença que eventualmente acolher opedido não poderá ser executada. A posse que seprotege na ação possessória é a certa e localizada(RT, 515:247).

As partes devem ser identificadas com precisão(CPC, art. 282, II). Entretanto já se decidiu queenganos sem consequências devem ser tolerados,

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encarando-se a exigência “dentro de certarelatividade, porque pode acontecer que o nomecerto do réu seja ignorado ou inacessível ao autor”(RT, 486:79). Fato comum é a invasão de grandesáreas por um número indeterminado de famílias,cujos membros são desconhecidos do proprietário.Tem-se admitido a propositura da ação contra osocupantes do imóvel, que serão citados eidentificados pelo oficial de justiça, fazendo-se aindicação, na inicial, de somente alguns nomes,geralmente dos que lideram o grupo.

A toda causa será atribuído um valor certo,ainda que não tenha conteúdo econômico imediato(CPC, art. 258). O art. 259 não especifica qual o valora ser atribuído às ações possessórias, mas declaraque o valor da reivindicatória será o da “estimativaoficial para lançamento do imposto” (CPC, art. 259,VII). Tendo em vista que ambas visam à posse dobem, inexiste razão para se diferenciar a orientação.Por essa razão, a fixação em montantecorrespondente ao venal, conferido pelo PoderPúblico para o lançamento tributário, vempredominando na jurisprudência, por analogia, paraas ações possessórias (RT, 566:152 e 666:108;JTACSP, 116:155).

26.2.2. DA LIMINAR

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Se provada a posse anterior do autor e aturbação ou o esbulho ocorridos há menos de ano edia, o juiz determinará a expedição de mandado demanutenção ou de reintegração de posse initio litis,antecipando a proteção possessória pleiteada, queserá confirmada ou não na sentença final. A liminarinaudita altera parte, isto é, sem ouvir o réu, serádeferida se a petição inicial estiver devidamenteinstruída com prova idônea dos fatos mencionadosno art. 927 do Código de Processo Civil: posse, datada turbação ou do esbulho etc. (CPC, art. 928). Nãose justifica, porém, a concessão da liminar com baseapenas em documentos que só provam o domínio(RT, 490:99). A apreciação da prova fica ao prudentearbítrio do juiz (RT, 490:111), que deverá, no entanto,fundamentar a sua decisão, ainda que de formaconcisa (CPC, art. 165), sob pena de ser anulada, emeventual recurso (RT, 603:128). A não comprovaçãodos referidos requisitos não importará, desde logo,na extinção do processo, mas tão só na denegaçãodo mandado liminar. Já se decidiu que, para aconcessão da liminar, “exige-se apenas um começode prova do requerente” (RF, 60:20).

Tem-se entendido que, apesar do caráter dúplicedas ações possessórias, é impossível o deferimentode liminar ao réu (VI ENTA, tese 8), bem como que éincabível a reintegração liminar quando o pedido écumulado com o de rescisão do compromisso, em

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razão da necessidade de ser seguido o rito ordinário.Também descabe medida cautelar em contraposiçãoa liminar concedida na possessória (JTACSP,94:159), bem como a tutela antecipada genérica (CPC,art. 273) nas ações de força nova, admitida somentenas de força velha, em que o rito é ordinário, semliminar.

Se a petição inicial não estiver devidamenteinstruída, o juiz determinará que o autor justifiquepreviamente o alegado, citando-se o réu paracomparecer à audiência que for designada (CPC, art.928). Os termos imperativos do aludido dispositivolegal (“o juiz determinará”) conduziram à formaçãode uma corrente jurisprudencial no sentido de que omagistrado não pode indeferir a liminar antes de feitaa justificação prévia (RT, 505:51; JTACSP, 110:304).Parece-nos, no entanto, que não se pode admitir queele, ex officio, determine a justificação quando nãotenha sido requerida sequer nessa forma alternativa.Se o autor só postulou a liminar com base nadocumentação da inicial, ao juiz não é lícitodeterminar justificação.

A finalidade da justificação é unicamentepossibilitar ao autor oportunidade para comprovar aexistência dos requisitos legais para a obtenção daliminar. É realizada, pois, no exclusivo interesse doautor. As testemunhas a serem ouvidas são,portanto, as por ele arroladas. O réu deve,

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obrigatoriamente, ser citado para comparecer àaudiência. Poderá fazer-se representar por advogadoe dela participar, reinquirindo as testemunhasarroladas pelo autor ou contraditando-as. Tem sidotolerada a juntada de documentos destinados ainfirmar as declarações e a credibilidade dastestemunhas (RT, 419:116). Nessa fase, o réu nãopoderá apresentar contestação nem qualquer tipo dedefesa, assim como, também, arrolar testemunhas. Jáse decidiu, porém, ser facultado ao juiz, “que não seconsidere devidamente esclarecido para conceder ounão medida liminar, determinar audição detestemunhas eventualmente indicadas também pelorequerido; mas este não tem direito de exigir audiçãoque tal” (RT, 499:105). Serão ouvidas, portanto,como “testemunhas do juízo”.

26.2.2.1. Concessão de liminar contra pessoajurídica de direito público

Contra pessoa jurídica de direito público o juiznão pode conceder a liminar sem antes ouvir orespectivo representante judicial, ainda quedevidamente provados os requisitos do art. 927(CPC, art. 928, parágrafo único). Incluem-se “noprivilégio as pessoas de Direito Público externo (v.g., Estados soberanos estrangeiros) e os entesautárquicos. Não se incluem, contudo, as chamadas

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empresas públicas, e menos ainda as de capitalmisto, que são pessoas de Direito Privado, assimcomo as concessionárias e permissionárias deserviços ao público” (Adroaldo Furtado Fabrício,Comentários ao Código de Processo Civil, cit., p.450, n. 375). O prazo para a manifestação dorepresentante da ré será fixado pelo juiz. Se este nãoo fizer, deve-se entender que se aplica o de cincodias do art. 185 do Código de Processo Civil. Se ficarcomprovado o desapossamento de modo definitivodo bem e o seu emprego em obra pública, o autorserá julgado carecedor da ação (RT, 668:103),devendo então propor a ação de desapropriaçãoindireta (cf. n. 24.1, retro). Somente emcircunstâncias especialíssimas essa audiência dorepresentante legal da pessoa jurídica de direitopúblico pode ser dispensada (RJTJSP, 59:220;JTACSP, 105:72).

26.2.2.2. Recurso cabível

A decisão que concede ou denega medidaliminar é interlocutória, uma vez que não põe fim aoprocesso. É, portanto, atacável por agravo deinstrumento (CPC, art. 522). Com a promulgação daLei n. 9.139, de 30 de novembro de 1995, não há maisnecessidade de impetração do mandado desegurança para a obtenção de efeito suspensivo ao

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aludido recurso, que será interposto diretamente notribunal, podendo o relator, sendo relevante ofundamento jurídico e havendo risco na demora,atribuir-lhe efeito suspensivo.

É lícito ao juiz, no juízo de retratação,reconsiderar a decisão liminarmente proferida. Naausência do agravo, a matéria somente poderá serreapreciada na sentença final. Tem a jurisprudênciaadmitido, no entanto, a cassação de liminar no cursoda lide, ante a prova de fato novo, mas, se este nãoocorrer, nem se der provimento ao agravo, suarevogação não se justifica, juridicamente (JTACSP,90:71; RT, 572:136).

26.2.2.3. Execução da decisão concessiva deliminar

A execução da decisão liminar positiva se fazmediante expedição de mandado a ser cumprido poroficial de justiça. Não há citação do réu, no caso dareintegração, para entregar a coisa em determinadoprazo. A execução se faz de plano, imediatamente,pois não há propriamente instância executória (RT,487:204). Pode ser promovida não só contra o réu,como contra terceiro que se encontre no imóvellitigioso (CPC, art. 42), ainda que adquirente oucessionário. O terceiro que adquiriu o bem depois demovida a ação, ou que recebeu do executado a

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simples detenção ou posse do imóvel, poderá serexpulso dele na execução do mandado expedidocontra o executado. Em outras palavras, o mandadovalerá contra qualquer pessoa encontrada no lugar,ressalvado apenas aquele que apresentar título deaquisição ou posse proveniente de pessoa estranhaao processo. Para este efeito poderá oferecerembargos de terceiro (RT, 473:186).

Se, depois de cumprido o mandado, o réu voltara turbar ou esbulhar a posse do autor, poderá estevaler-se da medida cautelar de atentado, alegando terhavido “inovação ilegal no estado da lide”, ousimplesmente requerer o revigoramento do mandadoinicial de posse. Pelo princípio da economiaprocessual, basta uma simples petição dirigida aojuiz, requerendo a constatação, por oficial de justiça,da nova turbação ou do esbulho e o revigoramentodo mandado inicialmente cumprido (RT, 474:99).

26.2.3. CONTESTAÇÃO E PROCEDIMENTOORDINÁRIO

Após a primeira fase, em que o juiz decide sobrea concessão ou não da liminar, a ação possessóriaassume feição contenciosa. Se não houvejustificação prévia, deverá o autor promover, noscinco dias subsequentes, a citação do réu, para queofereça contestação (CPC, art. 930). Se não o fizer, a

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liminar perderá eficácia, pois não se pode admitir queo autor deixe de praticar os atos necessários àefetivação da citação, depois de obter a liminar,beneficiando-se indefinidamente dessa situação.Deve, portanto, não só requerer como tambémfornecer todos os meios necessários à efetivação doato, como o depósito das custas e das despesas dooficial de justiça. O prazo para a defesa começará acorrer da juntada aos autos do mandado de citaçãodevidamente cumprido.

Se for realizada a justificação prévia, com citaçãodo réu, o prazo para contestar contar-se-á daintimação do despacho que deferir ou não a liminar(CPC, art. 930, parágrafo único), que poderá ser feitana pessoa do advogado constituído, dispensada aintimação pessoal do réu. Esta será necessária se eleainda não tiver advogado. Se, porém, expedir-semandado de reintegração, intimando-sepessoalmente o réu a cumprir a determinação judicial,dispensada a do seu advogado por esse motivo, afluência do prazo para a defesa terá início a partir dajuntada do mandado aos autos (RT, 351:486) e seráde quinze dias, pois o art. 931 do Código de ProcessoCivil determina que a ação tenha o procedimentoordinário.

26.3. EXECUÇÃO DA SENTENÇA

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A execução se faz mediante a expedição, deplano, de mandado. O réu não é citado para entregara coisa no prazo de dez dias, como acontece naexecução para entrega de coisa certa fundada emtítulo executivo extrajudicial (CPC, art. 621). O juizemite uma ordem para que o oficial de justiça expulseimediatamente o esbulhador e reintegre na posse oesbulhado (v. n. 26.2.2.3, retro), pois a possessóriatem força executiva, tal como a ação de despejo, nãoexistindo instância executória.

Na realidade, há uma fase de execução suigeneris, que não se subsume a nenhuma dasespécies de execução reguladas no Livro II doCódigo, podendo ser de natureza complexa, quandose cumulam pedidos de perdas e danos, decominação de pena e de condenação aodesfazimento de obras ou plantações, caso em quenão haverá apenas uma, mas várias execuções, nahipótese de acolhimento de todos os pedidos (JoãoBatista Monteiro, Ação de reintegração de posse,cit., p. 208-14). A condenação ao pagamento deperdas e danos dá lugar à execução por quantia certacontra devedor solvente; a cominação de pena(astreintes) para o caso de nova turbação ouesbulho impõe ao vencido uma obrigação de nãofazer, dando ensejo à aplicação dos arts. 644 e 645 doCódigo de Processo Civil; a procedência do pedidode desfazimento de construção ou plantação dá

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origem à execução de obrigação de fazer (CPC, arts.632 e s.).

26.4. EMBARGOS DO EXECUTADO E DERETENÇÃO POR BENFEITORIAS

É predominante, na doutrina, o entendimento deque não cabem embargos do executado em açãopossessória, porque a sentença tem força executiva(Vicente Greco Filho, Direito processual civilbrasileiro, Saraiva, v. 3, p. 225, n. 57.2). Esseentendimento é também o dominante najurisprudência (JTACSP, 121:97; STJ, 4ª T., REsp739-RJ, j. 21-8-1990, v. u., DJU, 10 set. 1990, p. 9129,em.). Ademais, a Lei n. 11.232, de 22 de dezembro de2005, limita a oposição de embargos de devedor àsexecuções por título extrajudicial.

O art. 1.219 do Código Civil assegura aopossuidor de boa-fé o direito de retenção porbenfeitorias necessárias e úteis. Esse direito éexercido na contestação ou em reconvenção. Podiaser invocado também por meio dos embargos deretenção por benfeitorias, uma vez que, em suaredação primitiva, o caput do art. 744 do Código deProcesso Civil se referia à “execução de sentençaproferida em ação fundada em direito real ou emdireito pessoal”.

Atualmente, no entanto, não se pode opor

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embargos de retenção por benfeitorias em açãopossessória. A redação que a Lei n. 10.444, de 7 demaio de 2002, deu ao aludido art. 744 do estatutoprocessual restringe os embargos de retenção à“execução para a entrega de coisa” e invoca o art.621, relativo à execução para entrega de coisa, portítulo extrajudicial: “Na execução para entrega decoisa (art. 621) é lícito ao devedor deduzir embargosde retenção por benfeitorias”. A mesma lei transferiuo aludido artigo do Capítulo II, referente aos“embargos à execução fundada em sentença”, para oCapítulo III, concernente aos “embargos à execuçãofundada em título extrajudicial”. Em virtude dessasalterações, a partir da vigência da mencionada leisomente na execução para a entrega de coisa portítulo extrajudicial serão cabíveis embargos deretenção.

O mencionado art. 744 foi posteriormenterevogado pela Lei n. 11.382, de 6 de dezembro de2006, que deslocou, para o art. 745, IV, §§ 1º e 2º, aregulação dos embargos de retenção por benfeitoriasem sede de execução para entrega de coisa.

Quanto à ação que tenha por objeto a entrega decoisa (art. 461-A), como a ação possessória, o direitode retenção deverá ser alegado na contestação ereconhecido na sentença; nesta hipótese, caberá aoautor, como condição para a expedição do mandado(art. 461-A, § 2º, c/c o art. 572), indenizar o réu pelas

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benfeitorias, as quais deverão ser objeto de prévialiquidação, como determina o art. 628, na execuçãopor título extrajudicial.

Seja como for, na contestação, na reconvenção,ou nos embargos de retenção, o vencido deveespecificar as benfeitorias, sob pena de se considerarincabível a retenção (RT, 521:199, 576:227).Abrangem tanto as benfeitorias como as acessões(STF, RTJ, 60:179; STJ, 4ª T., REsp 739-RJ, Rel. Min.Athos Carneiro, j. 21-8-1990, DJU, 10 set. 1990, p.9129). Há, no entanto, algumas decisões em sentidocontrário (RT, 616:144; JTACSP, 116:199).

Não arguindo o direito de retenção nacontestação ou em reconvenção — e não podendo,agora, fazê-lo em embargos de retenção —, competiráao réu cobrar o valor das benfeitorias e acessões, porele feitas, por intermédio de ação de indenização,porque, do contrário, se permitiria o locupletamentoilícito do vencedor, em detrimento do vencido.

26.5. EMBARGOS DE TERCEIRO

O Supremo Tribunal Federal já admitiu aoposição de embargos de terceiro em açõespossessórias (RTJ, 72:296; RT, 539:126), mesmodepois do trânsito em julgado da sentença noprocesso de conhecimento (RT, 496:150). Oquinquídio para a oposição conta-se do ato que

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exaure a execução (RT, 539:126). Tais decisõesafiguram-se-nos corretas, pois quem não foi parte noprocesso, mas veio a sofrer turbação ou esbulho naposse da coisa, por apreensão judicial, estálegitimado a opor tais embargos para fazer cessar aperturbação (CPC, art. 1.046). Quem adquire coisalitigiosa, ou seja, quem sucede na posse após acitação, entretanto, não é terceiro legitimado a oporembargos. Malgrado esse entendimento, a questãocontinua controvertida, havendo decisões nosentido de que, transitando em julgado a sentença, jánão cabem embargos de terceiro (RT, 512:126,591:152; RJTJSP, 50:229).

Quadro sinótico – Da manutenção e dareintegração de posse

Embora apresentemcaracterísticassemelhantes, a açãode manutenção deposse é cabível nahipótese em que o

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1.Características

hipótese em que opossuidor sofreturbação em seuexercício, mascontinua na possedos bens. Em casode esbulho, em que opossuidor vem a serprivado da posse,adequada é a dereintegração deposse (CPC, art.926).

a) posse: a prova daposse é o primeirorequisito para a

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propositura dasreferidas ações.Quem nunca a tevenão pode valer-sedos interditos;b) turbação: é todoato que embaraça olivre exercício daposse. Deve tambémser provada peloautor. Só pode ser defato, e não de direito,pois contra atosjudiciais cabemembargos e outrosmeios próprios dedefesa. A turbação

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2. Requisitos

defesa. A turbaçãopode ser, ainda,direta e indireta,positiva e negativa;c) esbulho: acarretaa perda da possecontra a vontade dopossuidor. Resulta deviolência,clandestinidade ouprecariedade. Oesbulho resultante daprecariedade édenominado esbulhopacífico;d) data da turbaçãoou do esbulho

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prova da data daturbação ou doesbulho determina oprocedimento a seradotado. Sepraticado há menosde ano e dia doajuizamento, será oespecial, com pedidode liminar. Passadoesse prazo, seráadotado o ritoordinário, nãoperdendo, contudo, ocaráter possessório(CPC, art. 924);e) continuação ou

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e) continuação ouperda da posseação de manutençãode posse o autordeve provar que,apesar de ter sidomolestado, ainda amantém. Se não maisconserva a posse,por ter sidoesbulhado, terá deajuizar ação dereintegração deposse.

— deveatender aoque dispõe

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3.Procedimento

PetiçãoInicial

que dispõeo art. 927do CPC econtertodos osrequisitosenumeradosno art. 282do mesmodiploma;

— o objeto daação há de serperfeitamenteindividualizado;— as partesdevem seridentificadas

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PetiçãoInicial

identificadascom precisão(CPC, art. 282,II);— deve serdado valor àcausa (CPC,art. 258),correspondenteao venal

a) altera parte:será concedidase a inicialestiverdevidamente

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devidamenteinstruídaprova dos fatosmencionadosno art. 927 doCPC: posse,turbação ouesbulhoocorridos hámenos de anoe dia etc.;b) apósjustificaçãopréviainicial nãoestiverdevidamenteinstruída;

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3.Procedimento

Da liminar

instruída;c) contrapessoa jurídicade direitopúblicosomentedepois deouvido o seurepresentantejudicial (CPC,art. 928,parágrafoúnico), aindaquedevidamenteprovados osrequisitos do

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Procedimento art. 927;d) cabíveldecisão queconcede oudenega medidaliminar, denaturezainterlocutória, éo instrumento(CPC, art.522);e) a execuçãoda decisãoliminar positivase faz de

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se faz deplano,mediantemandado a sercumprido poroficial dejustiça, semnecessidadede citação paraentregar acoisa emdeterminadoprazo.

Concedida ounão a liminar,deverá o autorpromover, nos

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Contestaçãoe ritoordinário

promover, noscinco diassubsequentes,a citação doréu, para queofereçacontestação(CPC, art.930). Se forrealizada ajustificaçãoprévia, comcitação do réu,o prazo paracontestarcontar-se-á daintimação do

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intimação dodespacho quedeferir ou nãoa liminar(parágrafoúnico).

4. Execuçãoda sentença

A execução se faz mediante aexpedição, de plano, demandado. O juiz emite umaordem para que o oficial dejustiça reintegre na posse oesbulhado, pois a possessóriatem força executiva, tal comoa ação de despejo.

Predomina o entendimento deque não cabem embargos do

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5. Embargosdo executado

que não cabem embargos doexecutado em açãopossessória, porque asentença tem força executiva.Ademais, a Lei n.11.232/2005 limita a oposiçãodos embargos à execução portítulo extrajudicial.

6. Embargosde retençãoporbenfeitorias

Atualmente não se pode oporembargos de retenção porbenfeitorias em açãopossessória. O art. 744 doestatuto processual restringesua oposição à “execuçãopara a entrega de coisa” einvoca o art. 621, relativo àexecução para entrega de

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execução para entrega decoisa, por título extrajudicial.O direito de retenção deveser alegado em contestação.

7. Embargosde terceiro

O STF já admitiu a oposiçãode embargos de terceiro emações possessórias, mesmodepois do trânsito em julgadoda sentença no processo deconhecimento. O quinquídiopara a oposição conta-se doato que exaure a execução.

27 DO INTERDITO PROIBITÓRIO

27.1. CARACTERÍSTICAS E REQUISITOS

É a terceira ação tipicamente possessória. Tem

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caráter preventivo, pois visa a impedir que seconcretize uma ameaça à posse. Há uma gradaçãonos atos perturbadores da posse. Para cada etapaprevê-se uma ação específica. Assim, se o possuidorestá apenas sofrendo uma ameaça mas se sente naiminência de uma turbação ou de um esbulho, poderáevitar, por meio da referida ação, que venham aconsumar-se. Pressupõe esta os seguintesrequisitos: a) posse atual do autor; b) a ameaça deturbação ou esbulho por parte do réu; c) justo receiode ser efetivada a ameaça. Dispõe, com efeito, o art.932 do Código de Processo Civil: “O possuidordireto ou indireto, que tenha justo receio de sermolestado na posse, poderá impetrar ao juiz que osegure da turbação ou esbulho iminente, mediantemandado proibitório, em que se comine ao réudeterminada pena pecuniária, caso transgrida opreceito”.

O primeiro requisito é a posse atual do autor. Oart. 932 do estatuto processual afirma que a posse aser protegida pode ser a direta ou a indireta. É certoque a posse a ser provada é a atual, pois se já aperdeu, por consumada a ameaça, o remédioapropriado será, então, a ação de reintegração deposse. O segundo requisito — ameaça de turbaçãoou de esbulho por parte do réu — entrelaça-se com oterceiro, que é o justo receio de que seja efetivada.Não é qualquer ameaça que enseja a propositura

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dessa ação. É necessário que tenha havido um atoque indique certeza de estar a posse na iminência deser violada. Para vencer a demanda, o autor devedemonstrar que o seu receio é justo, fundado emfatos ou atitudes que indicavam a iminência demoléstia à posse. Justo receio, assim, não significamero temor subjetivo, mas receio provocado porfatos concretos e objetivos.

Como observa Washington de Barros Monteiro(Curso de direito civil, cit., p. 50), “assim como nãoconstitui coação a ameaça de exercício normal de umdireito (CC/2002, art. 153), também a afirmativa de quese invocará oportunamente a ação da justiça nãoconfigura ameaça, apta a infundir receio ao autor,bem como seu recurso ao interdito”. Tem-sedecidido, por isso, que não se justifica o interditoproibitório com a finalidade de impedir que o réulance mão de medidas judiciais que entenda cabíveis(Boletim da AASP, 1.421:63).

27.2. COMINAÇÃO DE PENA PECUNIÁRIA

O interdito proibitório assemelha-se à açãocominatória, pois prevê, como forma de evitar aconcretização da ameaça, a cominação ao réu depena pecuniária, caso transgrida o preceito. Deve serpedida pelo autor e fixada pelo juiz, em montanterazoável, que sirva para desestimular o réu de

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transgredir o veto, mas não ultrapasse,excessivamente, o valor do dano que a transgressãoacarretaria ao autor.

Consoante a lição de Pontes de Miranda(Comentários ao Código de Processo Civil, cit., t. 6,p. 157), “Se foi pedida a proibição de turbação e o réuesbulhou, além de se lhe aplicar a pena cominada,por infração do preceito, expede-se contra ele omandado de reintegração, liquidando-se na execuçãoas perdas e danos em que for então condenado,ainda que acima da pena cominada, masindependente dela (art. 374)”. Se a ameaça vier a seconcretizar no curso do processo, o interditoproibitório será transformado em ação demanutenção ou de reintegração de posse,concedendo-se a medida liminar apropriada eprosseguindo-se no rito ordinário (RT, 490:75).Entretanto o contrário não é verdadeiro, isto é,ajuizada a ação de manutenção, não há mais lugarpara ser intentado o interdito proibitório, por falta deinteresse de agir.

Ao determinar a aplicação ao interditoproibitório do disposto na seção anterior, o estatutoprocessual (art. 933) permitiu, também, que seconcedesse liminar em interdito proibitório, o quenão era admitido na vigência do Código anterior (RT,494:152). Hoje não paira mais dúvida sobre apossibilidade de se impetrar tal ação contra ato da

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Administração Pública, visto que o art. 928 dispõeque a medida não será concedida in limine litiscontra as pessoas jurídicas de direito público, semprévia audiência dos respectivos representantesjudiciais. A única restrição é que devem ser ouvidosos seus representantes legais antes da concessão daliminar (v. n. 24.1, retro).

Quadro sinótico – Do interdito proibitório

1.Características

É a terceiraaçãotipicamentepossessória.Tem caráterpreventivo, poisvisa a impedirque seconcretize umaameaça à

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ameaça àposse.

2. Requisitos

a) posse atualdo autor;b) ameaça deturbação ouesbulho porparte do réu;c) justo receiode serefetivada aameaça (CPC,art. 932).

O interditoproibitórioassemelha-se à

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3. Cominaçãodepenapecuniária

assemelha-se àaçãocominatória,pois prevê,como forma deevitar aconcretizaçãoda ameaça, acominação aoréu de penapecuniária,caso transgridao preceito. Sea ameaça viera concretizar-se no curso doprocesso, o

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processo, ointerditoproibitório serátransformadoem ação demanutenção oude reintegraçãode posse,concedendo-sea liminarapropriada eprosseguindo-se no ritoordinário.

28 AÇÕES AFINS AOS INTERDITOSPOSSESSÓRIOS

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28.1. AÇÃO DE IMISSÃO NA POSSE

28.1.1. CARACTERÍSTICAS E NATUREZAJURÍDICA

A ação de imissão na posse era regulada peloCódigo de Processo Civil de 1939 no art. 381, quedispunha competir a referida ação: a) aos adquirentesde bens, para haverem a respectiva posse, contra osalienantes ou terceiros que os detivessem; b) aosadministradores e demais representantes daspessoas jurídicas, para haverem dos seusantecessores a entrega dos bens pertencentes àpessoa representada; c) aos mandatários, parareceberem dos antecessores a posse dos bens domandante.

A hipótese mais frequente é a primeira, em que oautor da ação é proprietário da coisa, mas nãopossuidor, por haver recebido do alienante só odomínio (jus possidendi), pela escritura, mas não aposse. Como nunca teve posse (CPC, art. 927, I), nãopode valer-se dos interditos possessórios. Porém,quando ocorre a transmissão da posse jurídica aoadquirente não acompanhada da entrega efetiva doimóvel, o alienante torna-se esbulhador, ficando oprimeiro autorizado a propor contra ele ação dereintegração de posse. A imissão tem sido utilizada,também, por arrematantes de imóveis, com suporte

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na carta de arrematação, para haverem a posse dosbens arrematados em poder dos devedores.

O Código atual não tratou da ação de imissão naposse. Nem por isso ela deixou de existir, pois poderáser ajuizada sempre que houver uma pretensão àimissão na posse de algum bem. A cada pretensãodeve existir uma ação que a garanta (CC, art. 189).Suprimido foi apenas o procedimento especialprevisto no Código de 1939, mas não o direitosubjetivo. A ação obedecerá ao rito ordinário ousumário, conforme o valor da causa.

A referida ação não se confunde com as açõespossessórias típicas, embora se revista de caráterpossessório. Não se aplica, pois, entre elas oprincípio da fungibilidade. Tendo por fundamento odomínio, é ação dominial. O estatuto revogado,embora a situasse entre as possessórias, acabavapor considerá-la ação dominial ao exigir que a inicialfosse instruída com o título de propriedade. É,portanto, ação de natureza petitória, pois o autorinvoca o jus possidendi, pedindo uma posse aindanão entregue. Tem-se admitido, porém, que possa serajuizada pelo compromissário comprador, comcompromisso irretratável, devidamente registrado eintegralmente quitado. Assim já decidiu o SupremoTribunal Federal (STF, RTJ, 65:718).

Preceitua a Súmula 4 do Tribunal de Justiça deSão Paulo: “É cabível liminar em ação de imissão de

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posse, mesmo em se tratando de imóvel objeto dearrematação com base no Decreto-Lei n. 70/66”.

28.1.2. IMISSÃO NA POSSE EREIVINDICATÓRIA

Alguns afirmam que a reivindicatória atendeperfeitamente à finalidade da ação de imissão naposse, tendo esta, portanto, sido absorvida poraquela. São, no entanto, ações distintas, que têmaplicação em situações diferentes, pois a ação dereivindicação “cuida de domínio e posse que seperderam por ato injusto de outrem. Na imissão, asituação é diversa. O proprietário quer a posse quenunca teve. Não perdeu o domínio, nem a posse.Tem o domínio e quer ter a posse também, na qualnunca entrou” (Gildo dos Santos, Posse epropriedade, coord.Yussef Cahali, Saraiva, p. 447).Assim, o objetivo da imissão é consolidar apropriedade, em sentido amplo, enquanto areivindicação tem por fim reaver a propriedade. Nasequência, aduz o mencionado autor: “Enquanto aimissão é proposta contra o alienante, areivindicatória deve ser proposta contra o atualdetentor da coisa reivindicanda. Será nula, portanto,a que se propuser contra quem já alienou o objeto”.

A ação de imissão na posse, na formadisciplinada no art. 381, I, do Código de ProcessoCivil de 1939, não podia ser proposta contra terceiro

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que detivesse a coisa em nome próprio, como ocomodatário. Legitimidade para ser demandado sótinha o alienante ou o terceiro que detivesse a coisaem nome deste. Todavia, não mais se tratando deprocedimento especial, inespecíficos também setornaram os seus requisitos. Na realidade, a restriçãono sentido de que o terceiro se encontrasse na possedo imóvel em nome do alienante não constavaexpressamente do texto legal, constituindoconstrução jurisprudencial. Sendo considerada agoraação de rito comum, desvinculada dos requisitos dodireito anterior, é de se admitir que ela poderia serintentada contra o alienante e contra terceiro,detenha este ou não a posse em nome daquele.

Se o alienante, antes da alienação, tinha açãopossessória contra terceiro esbulhador que detém aposse em nome próprio, o adquirente também poderámovê-la, pois o art. 1.207 do Código Civil faculta aosucessor singular “unir sua posse à do antecessor,para os efeitos legais”. Na imissão, a matéria dedefesa é limitada à nulidade da aquisição, ou àalegação de justa causa para retenção da coisa, poiso autor não pretende discutir a propriedade, que temcomo certa, mas apenas consolidar, em concreto, ojus possidendi que adquiriu. Na reivindicatória, noentanto, o autor pede domínio e posse, podendo oréu opor-lhe toda e qualquer defesa sobre um eoutra. Pode, inclusive, pleitear seja reconhecido

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como dono.

28.2. AÇÃO DE NUNCIAÇÃO DE OBRA NOVA

28.2.1. CONTEÚDO E PRESSUPOSTOS

A ação de nunciação de obra nova, tambémchamada de embargo de obra nova, reveste-se decaráter possessório pelo fato de poder ser utilizadatambém pelo possuidor. Seu objetivo é impedir acontinuação de obra que prejudique prédio vizinhoou esteja em desacordo com os regulamentosadministrativos. O seu fundamento encontra-se napreservação ao direito dos vizinhos (CC, art. 1.299),bem como nas disposições dos arts. 1.300, 1.301 e1.302, que impõem ao proprietário o dever deconstruir de maneira que o seu prédio não despejeáguas, diretamente, sobre o prédio vizinho,proibindo-o, ainda, de abrir janelas, ou fazer eirado,terraço ou varanda, a menos de metro e meio doterreno vizinho.

A pretensão ao embargo é assegurada “aoproprietário ou possuidor, a fim de impedir que aedificação de obra nova em imóvel vizinho lheprejudique o prédio, suas servidões ou fins a que édestinado” (CPC, art. 934, I). A expressão “obra” temum sentido amplo, abrangendo todo e qualquer atomaterial lesivo ao direito de propriedade ou à posse.

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Nela se incluem “demolição, colheita, corte demadeiras, extração de minérios e obras semelhantes”(art. 936, parágrafo único). Abrange toda e qualquerconstrução que possa prejudicar os vizinhos, como adestinada a represar águas de córrego que serve osprédios inferiores.

É pressuposto essencial da ação que a obra seja“nova”, isto é, não se encontre em fase final. Se jáestá terminada, ou em vias de conclusão, faltandosomente os arremates finais, julga-se o autorcarecedor. Se já estiver em fase de conclusão, ovizinho poderá propor ação de reparação de danosou demolitória, mas não mais embargá-la (RJTJSP,113:343). Cumulada a ação de nunciação com a dereparação de danos, e sendo incabível a primeira, porjá estar finda a construção, impõe-se oprosseguimento do feito para a apreciação do pedidocumulado (RT, 518:114). Do mesmo modo, secumulada com a cominação de multa (CPC, art. 936) ea demolição da obra, prejudicado o embargo, restariao exame do pedido de demolição (RT, 576:62).

Outro pressuposto é de que os prédios sejamvizinhos, contíguos. A contiguidade, entretanto, nãodeve ter caráter absoluto, podendo abranger não sóos prédios confinantes, como os mais afastados,desde que sujeitos às consequências do uso nocivodas propriedades que os rodeiam (RT, 509:64).Quando a obra nova invade o terreno vizinho, o meio

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processual adequado para embargá-la é a açãopossessória, não a nunciação, segundo uma correnteque se lastreia no fato de o estatuto processual civiladmitir a última para impedir construção de obranova em imóvel vizinho. Outra corrente, à qualfiliava-se Pontes de Miranda, entendia cabível anunciação, autorizada pelo art. 573 do Código Civilde 1916, que previa o embargo, pelo proprietário, deconstrução de prédio que “invadisse a área do seu”.O novo Código Civil, contudo, no art. 1.301,correspondente ao mencionado art. 573, nãoreproduziu a referida autorização, prestigiando,assim, a primeira corrente citada.

Quando ocorre invasão mínima do terrenovizinho, mostrando-se desaconselhável a paralisaçãoou a demolição de obra de certo vulto, tem-seconvertido, pretorianamente, a nunciação ou ademolitória em ação de indenização da área invadida,sem caracterizar decisão extra petita (STF, RTJ,58:484; RT, 606:97). Em alguns casos essa tem sidotambém a solução quando se trata de obra pública,não estando o Poder Público agindo moreprivatorum, configurando-se verdadeiradesapropriação indireta. Preleciona Washington deBarros Monteiro (Curso de direito civil, cit., p. 55)ser “inadmissível a ação se a obra nova vem a serexecutada não no prédio do nunciado, mas na rua ounum logradouro público. Em tal hipótese, ao

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prejudicado cabe reclamar administrativamentecontra o responsável, desde que seja um particular,sabido que a nunciação destinada a proteger direitopúblico subjetivo não encontra guarida em nossodireito”.

Em geral, não se tem admitido a propositura, porparticular, da ação de nunciação de obra nova, comfundamento simplesmente na contravenção àsposturas administrativas, principalmente se aprovadaa planta da construção pela Prefeitura. Falta-lhedireito subjetivo na hipótese para poder embasar asua pretensão em juízo. Entretanto, se emconsequência da obra erigida em infração àsposturas municipais verificar-se dano à suapropriedade, o particular poderá embargá-la, comfulcro no art. 572 do Código Civil — de 1916,correspondente ao art. 1.299 do novo diploma(STF, RT, 459:233), ainda que escorada em alvará delicença para construção fornecido pelamunicipalidade (RT, 478:93 e 510:106). Se o autor édeclarado carecedor da ação, ou se esta é julgadaimprocedente, reconhece-se o direito do nunciado àreparação de eventual prejuízo que haja sofrido.

28.2.2. LEGITIMIDADE PARA A AÇÃO

Compete a ação ao proprietário ou possuidor, aocondômino e ao Município (CPC, art. 934, I a III). O

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inciso I legitima para a ação não só o proprietáriocomo o possuidor (com ou sem título), o síndico dafalência e outros administradores judiciais. Oproprietário sem posse também pode exercer anunciação de obra nova (RT, 578:188). O locatário etodos aqueles que têm posse direta emanada decontrato celebrado com o proprietário tambémpossuem legitimidade para o seu exercício (JTACSP,59:353).

A hipótese prevista no inciso II do art. 934 doCódigo de Processo Civil presta-se especialmentepara impedir que o condômino realize obras em áreasde uso comum, em prejuízo dos demais condôminos(RT, 605:190). No tocante ao inciso III, registre-se acrítica ao fato de mencionar somente o Municípiocomo legitimado ativo para a ação, destinada a“impedir que o particular construa em contravençãoda lei, do regulamento ou de postura”. Predomina nadoutrina o entendimento de que ali se compreendemtodos os órgãos da Administração Pública, federais eestaduais, bem como as entidades estatais,autárquicas e paraestatais.

Legitimado para figurar como réu na ação é odono da obra, aquele por conta de quem éexecutada, podendo ser o dono do terreno, opossuidor direto ou indireto, desde que seja erigidapor conta deles (RT, 345:426). A ação nunciativa éde natureza pessoal, de modo a dispensar tanto a

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outorga uxória como a citação da mulher do réu (RT,510:106, 594:105).

28.2.3. PROCEDIMENTO

Na petição inicial o nunciante requererá oembargo “para que fique suspensa a obra”, bemcomo a “cominação de pena para o caso deinobservância do preceito” e a “condenação emperdas e danos” (CPC, art. 936), podendo o juizconceder o embargo liminarmente ou apósjustificação prévia (art. 937). Concedido liminarmente,comete atentado (CPC, art. 879, II) a parte que nocurso do processo “prossegue em obra embargada”.O oficial de justiça intimará o construtor e osoperários a que não continuem os trabalhos, sobpena de desobediência, citando o proprietário paracontestar a ação em cinco dias, aplicando-se, aseguir, o disposto no art. 803 do mesmo diploma.

Desde que preste caução e demonstre prejuízoresultante da suspensão da obra, o nunciado poderárequerer o seu prosseguimento, mas em nenhumahipótese este terá lugar tratando-se de obra novalevantada contra determinação de regulamentosadministrativos (CPC, art. 940, § 2º). Não é possívelliberar-se o nunciado da obrigação de prestar cauçãose pretende o prosseguimento da obra, pois aqueladecorre de imposição expressa de lei (RT, 569:79). O

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juiz não está obrigado a deferir a caução e asuspender os embargos se não estiverinequivocamente demonstrada a ocorrência de sériosprejuízos com a paralisação da obra.

28.2.4. EMBARGO EXTRAJUDICIAL

É lícito ao prejudicado, “se o caso for urgente,fazer o embargo extrajudicial, notificandoverbalmente, perante duas testemunhas, oproprietário ou, em sua falta, o construtor, para nãocontinuar a obra” (CPC, art. 935). Em três dias,requererá “o nunciante a ratificação em juízo, sobpena de cessar o efeito do embargo”. Justifica-se oseu emprego nos casos de obras que rapidamente seconcluem, constituindo uma verdadeira antecipaçãoda providência jurisdicional.

A ratificação posterior faz retroagir a validade e aeficácia do embargo à data de sua efetivação. Se,entretanto, for denegada, voltam as coisas ao estadoanterior e o nunciado “pode haver do nunciante asperdas e danos que haja sofrido em razão daparalisação da obra, mesmo que a ação de nunciaçãovenha a ser julgada favoravelmente ao autor. Tinhaeste direito ao embargo mas não a embargoextrajudicial”. Se há homologação, “os atospraticados pelo nunciado em contrário ao embargo,mesmo antes da ratificação, configuram atentado,

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porque a eficácia daquele é ex tunc” (AdroaldoFurtado Fabrício, Comentários ao Código deProcesso Civil, cit., p. 492, n. 412).

28.3. EMBARGOS DE TERCEIRO

28.3.1. INTRODUÇÃO

Também os embargos de terceiro, senhor epossuidor, podem ser utilizados para a defesa daposse. Senhor, porque podem ser opostos pelodominus, pelo proprietário, e possuidor, porquepodem ser empregados por quem seja apenaspossuidor (CPC, art. 1.046). Com efeito, dispõe o § 1ºdo art. 1.046 que “os embargos podem ser de terceirosenhor e possuidor, ou apenas possuidor”.

É intuitivo que podem ser opostos também porquem é apenas senhor. Nesse sentido, decidiu oSupremo Tribunal Federal: “É razoável, quandomenos, o entendimento de que o titularinquestionável do domínio, embora não tendo aposse, pode utilizar embargos de terceiro” (RT,542:259). Podem estes ser opostos com caráterpreventivo, em face de lesão ainda não ocorrida, masiminente. Não é preciso que a apreensão já tenhasido executada. Basta a simples determinaçãojudicial, a possibilidade futura e iminente daapreensão. Assim a jurisprudência: STF, RF, 119:106

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e RTJ, 77:915; TJSP, RT, 593:120, 605:53.A ação de embargos de terceiro difere das

possessórias porque nestas a apreensão do bem éfeita por um particular, enquanto naquela é efetuadapor oficial de justiça, em cumprimento de ordemjudicial. Mesmo sendo um ato lícito, prejudica aposse do terceiro que não é parte no processo,legitimando-o à propositura dos embargos. Ademais,só quem tem ou teve posse pode ajuizar açãopossessória. Nos embargos de terceiro tal requisitonem sempre se verifica. Nos casos do § 2º do art.1.046 e do inciso II do art. 1.047 do Código deProcesso Civil, pode opor os embargos quem nemestá na posse da coisa, fazendo-o com base no seutítulo de aquisição ou por ser credor com garantiareal. Outra diferença verifica-se no tocante aocumprimento da liminar, exigindo o art. 1.051 que oembargante preste caução para receber de volta osbens.

28.3.2. PRESSUPOSTOS

São pressupostos da ação de embargos deterceiro: a) um ato de apreensão judicial; b) acondição de proprietário ou possuidor do bem; c) aqualidade de terceiro (CPC, art. 1.046); d) aobservância do prazo do art. 1.048. A existência deum ato de apreensão judicial constitui o fator que

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os distingue das ações possessórias, destinadas asanar os inconvenientes de ameaça, turbação ouesbulho, mas praticados por particulares. Por outrolado, quem não for senhor nem possuidor (letra b)não tem interesse processual. Neste caso, o juiz osrejeitará in limine.

A qualidade de terceiro é estabelecida porexclusão: quem não é parte no feito, ainda que possavir a ser. É também terceiro quem dele participa emqualidade diferente, defendendo um bem que nãopode ser atingido pela apreensão judicial, porquenão foi objeto da ação. Não é terceiro, porém, aqueleque, embora parte ilegítima, é citado para a ação.Neste caso, é parte e deve alegar, em contestação(CPC, art. 301, X), em impugnação (art. 475-L, IV) ouem embargos do devedor (art. 745, IV, § 1º), essailegitimidade. Quem adquire coisa litigiosa não éterceiro e não pode opor os embargos, assim comoquem sucede na posse após a citação (CPC, art. 42,III); estão sujeitos ao julgado, e contra este não têmembargos de terceiro a opor, ainda que nãoregistrada a ação no Registro de Imóveis.

Contrariando a Súmula 621 do Supremo TribunalFederal, prescreve a de n. 84 do Superior Tribunal deJustiça: “É admissível a oposição de embargos deterceiro fundados em alegação de posse advinda docompromisso de compra e venda de imóvel, aindaque desprovido do registro”. Esse Tribunal também

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proclamou caber embargos de terceiro à mulher “queintenta defender os bens que lhe couberem empartilha devidamente homologada, ainda que nãoregistrado o formal” (3ª T., REsp 5.185-RJ, Rel. Min.Eduardo Ribeiro, j. 11-12-1990, DJU, 18 fev. 1991, p.1036).

28.3.3. PARTE EQUIPARADA A TERCEIRO

Dispõe o § 2º do art. 1.046 do Código deProcesso Civil: “Equipara-se a terceiro a parte que,posto figure no processo, defende bens que, pelotítulo de sua aquisição ou pela qualidade em que ospossuir, não podem ser atingidos pela apreensãojudicial”. E o § 3º acrescenta: “Considera-se tambémterceiro o cônjuge quando defende a posse dos bensdotais, próprios, reservados ou de sua meação”. Amesma pessoa, física ou jurídica, pode ser parte eterceiro no mesmo processo, se são diferentes ostítulos jurídicos que justificam esse duplo papel. Apalavra “terceiro” significa não só a pessoa que nãotenha participado do feito, como também a que deleparticipou, mas que, nos embargos, é titular de umdireito diferente.

Assim, o executado, que teve penhorado umbem doado com cláusula de impenhorabilidade, podeopor embargos de terceiro somente para alegar essacircunstância. O condômino, mesmo sendo parte na

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ação de divisão, pode embargar, como terceiro, se alinha do perímetro invadir o prédio contíguo, que éde sua propriedade. Também a pessoa que foi partena possessória poderá valer-se desses embargosquando a execução atingir um bem que, malgrado lhepertença, não foi objeto da ação. Embora se trate damesma pessoa, está agindo com outros títulos,ingressando em juízo em outra qualidade e litigandosobre outros bens.

28.3.4. LEGITIMIDADE ATIVA E PASSIVA. ALEGITIMIDADE ATIVA DO CÔNJUGE

A legitimidade ativa ad causam é de quempretende ter direito sobre o bem que sofreu aconstrição. A passiva é do exequente, ou dopromovente do processo em que ocorreu o ato deapreensão judicial. Figurará como réu aquele que deucausa à apreensão judicial, mediante pedido ao PoderJudiciário, ainda que não haja, de sua parte,indicação direta do bem, e a penhora tenha resultadode atuação de ofício do oficial de justiça.

A mulher casada pode defender a sua meaçãopor meio de embargos de terceiro, com base no § 3ºdo art. 1.046 do Código de Processo Civil, mesmointimada da penhora e não tendo ingressado, noprazo legal, com os embargos de devedor. Se apenhora recaiu sobre bem de sua meação, próprio,

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reservado (desde que adquirido antes da atual CF)ou dotal, poderá apresentar embargos de terceiro, noprazo do art. 1.048 (RTJ, 93:878; STF, RT, 514:268),sendo irrelevante que haja sido intimada da penhora(RJTJSP, 98:350). Nos embargos, poderá pleitear queos bens sejam excluídos da penhora, mas nãodiscutir o débito, porque isso é matéria a serdeduzida em embargos do devedor (RTJ, 101:800).Desse modo, conforme o caso, a mulher poderáintervir no processo, ao mesmo tempo, como parte ecomo terceiro, com base em títulos diversos (RTJ,105:274).

Pelo Estatuto da Mulher Casada (Lei n. 4.121/62,art. 3º, reforçado pela norma do art. 226, § 5º, da CF),a meação da mulher não responde pelos títulos dedívida de qualquer natureza firmados apenas pelomarido, salvo se resultou em benefício da família. Emregra, presume-se que os negócios feitos pelocônjuge sejam em benefício da família (STF, RT,500:247), daí por que compete à mulher elidir talpresunção. Esta deixará de existir, entretanto, quandoa dívida do marido provier de aval, dado de favor,desde que não à firma da qual é sócio. A meação damulher deve ser considerada em cada bem do casal enão na totalidade do patrimônio (RSTJ, 8:385). OSuperior Tribunal de Justiça também proclamou sermais adequada a orientação segundo a qual “o bem,se for indivisível, será levado por inteiro à hasta

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pública, cabendo à esposa metade do preçoalcançado” (STJ, 4ª T., REsp 16.950-0-MG, Rel. Min.Barros Monteiro, j. 3-3-1993).

28.3.5. CASOS ESPECIAIS: EMBARGOSPARA A DEFESA DA POSSE NASAÇÕES DE DIVISÃO E DEDEMARCAÇÃO E EMBARGOS DOCREDOR COM GARANTIA REAL

É admissível, ainda, a oposição de embargos deterceiro “para a defesa da posse, quando, nas açõesde divisão ou de demarcação, for o imóvel sujeito aatos materiais, preparatórios ou definitivos, dapartilha ou da fixação de rumos” (CPC, art. 1.047, I), oembargante não for parte na divisória oudemarcatória e, ainda, “para o credor com garantiareal obstar alienação judicial do objeto da hipoteca,penhor ou anticrese” (art. 1.047, II).

O inciso II do citado art. 1.047 só faculta osembargos de terceiro ao credor hipotecário quandonão tenha sido intimado da execução. Tendo direitode preferência sobre o bem dado em hipoteca, deveser intimado da praça, para que possa exercer areferida preferência (CPC, art. 698) sobre o produtoda arrematação. Estando garantido, não temlegitimidade nem interesse na oposição de embargosde terceiro. Quando legitimado a opor os aludidos

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embargos, por não ter sido intimado da execução,não pode o credor hipotecário deduzir seus direitosmediante simples petição, no processo em que sepenhorou o imóvel hipotecado: há de fazê-lo pormeio de embargos de terceiro.

Se, na ação de divisão, a linha do perímetroinvadir área de outrem, o confrontante, que éterceiro, pois não é parte na ação, estará legitimado aopor os embargos. Se for também condômino doprédio dividendo, e o perímetro invadir-lhe apropriedade, ou a posse, embora parte no processodivisório, é também terceiro, como proprietário doimóvel lindeiro, e, nesta última qualidade, terátambém legitimidade para oferecer os embargos deterceiro.

Contra os embargos do credor com garantia real,o embargado só pode alegar, em contestação, alémdas matérias preliminares processuais, que: a) “odevedor comum é insolvente”, e, destarte, deve serinstaurado o processo de insolvência, em que oscréditos devem ser habilitados, com a suspensão detodas as execuções, inclusive a do embargado; b) “otítulo é nulo ou não obriga a terceiro”; c) “outra é acoisa dada em garantia” (CPC, art. 1.054). Osembargos do credor com garantia real, quandofundados na falta da intimação da praça, têm o efeitoapenas de obstar a sua realização, já designada.Efetivada, entretanto, a intimação, o credor

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hipotecário não poderá impedir que se faça aarrematação, salvo se tiver alegado nos embargos ecomprovado que o devedor possui outros benssobre os quais poderá incidir a penhora (STF, RTJ,110:912 e RT, 593:277).

O bem hipotecado não é impenhorável, mas aocredor hipotecário está assegurado o direito deimpedir a alienação judicial, por meio de embargos deterceiro, desde que demonstrada a solvência dodevedor (RT, 589:115). Se aquele comprova aexistência de outros bens do devedor sobre os quaispoderá incidir a penhora, acolhem-se os embargospor ele oferecidos, mesmo que tenha sidoregularmente intimado da praça (RT, 597:95). Se foinotificado dos termos da execução e deixou oprocesso correr, sem manifestar o seu interesse,opera-se a extinção da hipoteca (RTJ, 97:817).

28.3.6. FRAUDE CONTRA CREDORES EEMBARGOS

Durante longo tempo perdurou o entendimentode que o reconhecimento da fraude contra credoressó podia ser feito na ação pauliana, especialmenteporque o art. 109 do Código Civil de 1916 exigia aparticipação não só do devedor alienante comotambém do adquirente e de eventuais terceiros aquem a coisa, fraudulentamente, tinha sido

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transferida. O devedor não participa dos embargosde terceiro, mas só o credor exequente, comoembargado, e o adquirente, como embargante.

Entretanto, o Supremo Tribunal Federal acabouadmitindo o reconhecimento de fraude contracredores em embargos de terceiro quando notória ainsolvência do devedor (RTJ, 100:716, 117:164). Emoutras decisões, exigiu-se que todos os interessadostenham sido convocados ao processo. Entendemos,na ocasião, ser possível tal apreciação em embargosde terceiro, mesmo sem a participação do devedoralienante, relembrando que, segundo a modernadoutrina, o reconhecimento da alienação em fraudecontra os credores não anula propriamente o atofraudulento, mas apenas o considera ineficaz, “desorte que os bens ou os valores transferidos pelodevedor, em prejuízo dos credores, não retornam aoseu patrimônio, mas permanecem no patrimônio doadquirente ou do novo titular dos respectivosdireitos” (Alvino Lima, A fraude no direito civil,Saraiva, p. 185). Considerando-se a ação paulianacomo ação de ineficácia e não de anulabilidade, nãose há de exigir que o devedor alienante e oadquirente nela figurem como litisconsortesnecessários. O Superior Tribunal de Justiça,entretanto, adotou posição contrária, editando aSúmula 195: “Em embargos de terceiro não se anulaato jurídico, por fraude contra credores”.

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O novo Código Civil manteve o sistema dodiploma de 1916, segundo o qual a fraude contracredores acarreta a anulabilidade do negóciojurídico. Não adotou, assim, a tese da ineficáciarelativa acima exposta, defendida por grande parte dadoutrina.

28.3.7. PROCEDIMENTO

Os embargos podem ser opostos a qualquertempo no processo de conhecimento enquanto nãotransitada em julgado a sentença (CPC, art. 1.048).Portanto, ainda que o processo esteja no tribunal,para apreciação do recurso. Isso quando o ato deapreensão emana de processo de conhecimento. Noprocesso de execução, podem ser opostos até cincodias depois da arrematação, adjudicação ou remição,mas sempre antes da assinatura da respectiva carta.Em se tratanto de apreensão judicial determinada emprocesso cautelar, o prazo prolonga-se até asentença do processo de conhecimento transitar emjulgado.

Se o referido prazo for perdido, não mais haveráoportunidade para a propositura de embargos deterceiro, mas ainda restará a possibilidade de sepostular a anulação do ato judicial. Com efeito, aação anulatória é a adequada, depois de passadas asoportunidades para a oposição de embargos de

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terceiro ou à arrematação (RT, 609:24). Se, noentanto, são opostos contra imissão na possesubsequente à arrematação, o prazo de cinco diasnão se conta desta, mas da ordem judicial ou daconsumação da imissão, porque o embargante não seinsurge contra a arrematação, que não o prejudica, esim contra a imissão na posse (RT, 488:123, 560:131).Os embargos de terceiro serão distribuídos pordependência e correrão em autos distintos perante omesmo juiz que ordenou a apreensão (CPC, art.1.049).

No caso de apreensão por carta precatória,competente para julgar os embargos de terceiro é ojuízo deprecante, se o bem apreendido foi por eleindicado (STJ, RT, 653:213). Se, no entanto, este nãoindica expressamente qual o bem a ser penhorado, acompetência é do juízo deprecado (RSTJ, 5:98;Súmula 33 do extinto TFR). O valor da causa, emembargos de terceiro, deve corresponder aobenefício patrimonial pretendido, isto é, ao dos benspenhorados (RT, 549:126, 578:155; JTACSP, 95:110,97:109).

A petição inicial da ação de embargos deterceiro deve atender aos requisitos do art. 282 doestatuto processual. O embargante deve fazer provasumária de sua posse e da qualidade de terceiro,oferecendo documentos e rol de testemunhas (CPC,art. 1.050). O juiz poderá, liminarmente ou depois de

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justificada suficientemente a posse em audiênciapreliminar, ordenar a expedição de mandado demanutenção ou de restituição em favor doembargante, que só receberá os bens depois deprestar caução de os devolver com seusrendimentos, caso sejam a final declaradosimprocedentes (CPC, art. 1.051). Essa caução temsido dispensada quando a sua prestação torneinviável a manutenção do bem nas mãos dopossuidor, não havendo outras razões quejustifiquem o perigo de deterioração. Se os embargosversarem sobre todos os bens, o juiz determinará asuspensão do curso do processo principal. Opreceito, embora cogente (RT, 609:95), não se aplicano caso de fraude de execução (JTACSP, 61:169). Seversarem sobre alguns deles, prosseguirá o processoprincipal somente quanto aos não embargados (CPC,art. 1.052).

Consta de alguns julgados que não é precisocitar pessoalmente o embargado, pois ele é oexequente do processo principal. Basta que se abravista dos autos ao seu advogado (RTJ, 94:631; RT,578:142; JTACSP, 98:15). A orientação mais recente,no entanto, é a que exige a citação pessoal doembargado, ao fundamento de que se aplicam aosprocedimentos especiais de jurisdição contenciosaas regras do procedimento ordinário. Sem essacitação, não se poderá decretar a revelia do

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embargado, em caso de não apresentação decontestação (STJ, 4ª T., REsp 2.892-RO, Rel. Min.Athos Carneiro, j. 21-8-1990, DJU, 17 set. 1990, p.9514).

Os embargos devem ser contestados no prazo dedez dias. O embargado pode alegar, para defender amanutenção da apreensão, toda a matéria relevanteem direito, inclusive a alienação do bem em fraude àexecução (JTACSP, 103:323) — não, porém, emfraude aos credores (v. n. 28.3.6, retro) —, bem comoapresentar exceção. Findo aquele prazo, oprocedimento segue o rito do art. 803, que éconcentrado, utilizado no processo cautelar. Se oembargado não contestar, presumir-se-ão aceitos porele, como verdadeiros, os fatos arguidos peloembargante. Neste caso, decidirá o juiz em cincodias, sem necessidade de audiência.

Quadro sinótico – Ações afins aos interditospossessórios

Era reguladapeloCPC/1939, no

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1. Açãodeimissãonaposse

Características

CPC/1939, noart. 381. Ahipótese maisfrequente éaquela em queo autor daação éproprietário dacoisa mas nãopossuidor, porhaver recebidodo alienantesó o domínio,pela escritura,mas não aposse. Comonunca teveposse, não

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posse, nãopode valer-sedos interditos.O Código atualnão tratou da

Características

imissão naposse. Nempor isso eladeixou deexistir, poispoderá serajuizadasempre quehouver umapretensão àimissão naposse de

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1. Açãodeimissãona

posse dealgum bem.

Naturezajurídica

A referidaação tem porfundamento odomínio. É,portanto, açãodominial, denaturezapetitóriao autor invocao possidendipedindo umaposse aindanão entregue.

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naposse

Imissão naposse ereivindicatória

São açõesdistintas. Areivindicatóriacuida dedomínio eposse que seperderam porato injusto deoutrem. Naimissão, asituação édiversa. Oproprietárioquer a posseque nuncateve. Não

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teve. Nãoperdeu odomínio, nema posse. Temo domínio equer ter apossetambém, naqual nuncaentrou.

Reveste-se decaráterpossessóriopelo fato depoder serutilizadatambém pelo

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Conteúdo

também pelopossuidor. Seuobjetivo éimpedir acontinuação deobra queprejudiqueprédio vizinhoou esteja emdesacordocom osregulamentosadministrativos(CPC, art.934, I).

a) que a obraseja “nova”,

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2. Açãodenunciaçãodeobra nova

Pressupostos

seja “nova”,isto é, não seencontre emfase final;b) que osprédios sejamvizinhos,contíguos. Acontiguidadenão deve tercaráterabsoluto,podendoabranger nãosó os prédiosconfinantes,como os mais

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como os maisafastados,desde quesujeitos àsconsequênciasdo uso nocivodaspropriedadesque osrodeiam.

Legitimidadeativa

Compete aa ç ã o : proprietário; ao condômino;e Município(CPC, art.

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(CPC, art.934, I a III).

Procedimento

Na inicial onuncianterequererá oembargo “paraque fiquesuspensa aobra”, bemcomo a“cominação depena pa-

ra o caso deinobservânciado preceito” ea “condenação

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Procedimento

a “condenaçãoem perdas edanos” (CPC,art. 936),podendo o juizconceder oembargoliminarmenteou apósjustificaçãoprévia. Ooficial dejustiça intimaráo construtor eos operários aque nãocontinuem ostrabalhos, sob

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2. Açãodenunciaçãodeobra nova

trabalhos, sobpena dedesobediência,citando oproprietáriopara contestara ação emcinco dias,aplicando-se,a seguir, odisposto noart. 803 domesmodiploma.

É lícito aoprejudicado,

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Embargoextrajudicial

prejudicado,“se o caso forurgente, fazero embargoextrajudicial,notificandoverbalmente,perante duastestemunhas,o proprietárioou, em suafalta, oconstrutor,para nãocontinuar aobra” (CPC,art. 935). Emtrês dias,

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três dias,requererá “onunciante aratificação emjuízo, sobpena decessar o efeitodo embargo”.

Também osembargos deterceiro, senhore possuidor,podem serutilizados paraa defesa daposse. Diferemdas

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Introdução

daspossessóriasporque nestasa apreensão dobem é feita porum particular,enquantonaquela éefetuada poroficial dejustiça, emcumprimentode ordemjudicial. Mesmosendo um atolícito, prejudicaa posse do

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3.Embargosdeterceiro

a posse doterceiro quenão é parte noprocesso,legitimando-o àpropositura dosembargos(CPC, art.1.046).

Pressupostos

a) ato deapreensãojudicial;b) condição deproprietário oupossui dor dobem;c) qualidade de

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c) qualidade deterceiro;d) observânciado prazo doart. 1.048 doCPC.

Parteequiparadaa terceiro

Equipara-se aterceiro a parteque, postofigure noprocesso,defende bensque, pelo títulode suaaquisição oupela qualidadeem que os

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em que ospossuir, nãopodem seratingidos pelaapreensãojudicial.

Parteequiparadaa terceiro

Considera-setambémterceiro ocônjuge quandodefende aposse dosbens dotais,próprios,reservados oude sua meação

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(CPC, art.1.046, §§ 23º).

Legitimidade

A legitimidadeativa causamquem pretendeter direitosobre o bemque sofreu aconstrição. Apassiva é doexequente, oudo promoventedo processoem que ocorreu

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Legitimidadeativa epassiva

em que ocorreuo ato deapreensãojudicial. Amulher casadapode defendera sua meação,mesmointimada dapenhora e nãotendoingressado, noprazo legal,com osembargos dedevedor.

É admissível,

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Casosespeciais

É admissível,ainda, aoposição deembargos det e r c e i r o : “para a defesada posse,quando, nasações dedivisão ou dedemarcação,for o imóvelsujeito a atosmateriais,preparatóriosou definitivos,da partilha ouda fixação de

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3.Embargosdeterceiro

especiais da fixação derumos” e oembargantenão for partena ação; “para o credorcom garantiareal obstaralienaçãojudicial doobjeto dahipoteca,penhor ouanticrese”(CPC, art.1.047, I e II).

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Fraudecontracredores

Proclama aSúmula 195 doSTJ: “Emembargos deterceiro não seanula atojurídico, porfraude contracredores”. Oreconhecimentoda fraude,portanto, sópode ser feitona açãopauliana.

Os embargos

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Os embargospodem seropostos aqualquertempo processo deconhecimentoenquanto nãotransitada emjulgado asentença(CPC, art.1.048). Noprocesso deexecuçãopodem seropostoscinco dias

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Procedimento cinco diasdepois daarrematação,adjudicação ouremição, massempre antesda assinaturada respectivacarta. Osembargosdevem sercontestadosprazo de dezdias. Findoesse prazo, oprocedimentosegue o rito

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segue o ritoconcentrado doart. 803.

29 A PERCEPÇÃO DOS FRUTOS

29.1. INTRODUÇÃO

Os frutos devem pertencer ao proprietário, comoacessórios da coisa (CC, art. 92). Essa regra,contudo, não prevalece quando o possuidor estápossuindo de boa-fé, isto é, com a convicção de queé seu o bem possuído. A condição fundamental,pois, para que o possuidor ganhe os frutos é suaboa-fé, ou seja, o pensamento de que é proprietário,expressamente exigido pelo art. 1.214. O Código Civilbrasileiro requer a existência de um justo título para aaquisição dos frutos, porque deve dar direito a eles aposse que se assemelha à propriedade, ou tem suaaparência. Todos os atos translativos, mesmo osnulos, ou putativos, dão direito aos frutos, desdeque convençam o adquirente da legitimidade do seudireito. Só não tem direito aos frutos o possuidor quetem apenas a posse, sem título que a valorize.

29.2. NOÇÃO E ESPÉCIES DE FRUTOS

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Os frutos são bens acessórios, pois dependemda coisa principal. Na grande classe das coisasacessórias compreendem-se duas espécies: frutos eprodutos (CC, art. 95). Produtos são as utilidadesque se retiram da coisa, diminuindo-lhes aquantidade, porque não se reproduzemperiodicamente, como as pedras e os metais, que seextraem das pedreiras e das minas. Distinguem-sedos frutos porque a colheita destes não diminui ovalor nem a substância da fonte, e a daqueles, sim.

Frutos são as utilidades que uma coisaperiodicamente produz. Nascem e renascem da coisa,sem acarretar-lhe a destruição, como as frutas dasárvores, o leite, as crias dos animais etc. Dividem-se,quanto à origem, em naturais, industriais e civis.Naturais são os que se desenvolvem e se renovamperiodicamente, em virtude da força orgânica daprópria natureza, como as frutas das árvores, as criasdos animais etc. Industriais são os que aparecempela mão do homem, isto é, os que surgem em razãoda atuação do homem sobre a natureza, como aprodução de uma fábrica. Civis são as rendasproduzidas pela coisa, em virtude de sua utilizaçãopor outrem que não o proprietário, como os juros eos aluguéis.

Quanto ao seu estado, dividem-se em pendentes,enquanto unidos à coisa que os produziu;percebidos, ou colhidos, depois de separados;

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estantes, os separados e armazenados ouacondicionados para venda; percipiendos, os quedeviam ser, mas não foram colhidos ou percebidos; econsumidos, os que não existem mais porque foramutilizados. A boa-fé só expropria o valor relativo aosfrutos, permanecendo o possuidor obrigado aindenizar ao proprietário os produtos que tenhaobtido da coisa.

29.3. REGRAS DA RESTITUIÇÃO (CC, ARTS.1.214 A 1.216)

O “possuidor de boa-fé tem direito, enquanto eladurar, aos frutos percebidos” (CC, art. 1.214). A leiprotege aquele que deu destinação econômica àterra, na persuasão de que lhe pertencia. Considera-se cessada a boa-fé com a citação para a causa. Opossuidor de boa-fé, embora tenha direito aos frutospercebidos, não faz jus ao frutos pendentes, nem aoscolhidos antecipadamente, que devem serrestituídos, deduzidas as despesas da produção ecusteio. É o que expressamente dispõe o parágrafoúnico do art. 1.214 do mesmo diploma. Caso nãohouvesse a dedução dessas despesas, o vencedorexperimentaria um enriquecimento sem causa, algoinadmissível. Esse direito, porém, só é garantido aopossuidor de boa-fé até o momento em que estivernessa condição.

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Os “frutos naturais e industriais reputam-secolhidos e percebidos, logo que são separados; oscivis reputam-se percebidos dia por dia” (CC, art.1.215). Assim, o possuidor de boa-fé faz seus osfrutos naturais desde o instante da separação,tenha-os consumido ou estejam ainda em celeiros ouarmazéns. A disciplina dos frutos industriais, queresultam do trabalho do homem, é a mesma dosfrutos naturais. A percepção dos frutos civis ourendimentos, como os juros e aluguéis, não seefetiva por ato material, mas por presunção da lei,que os considera percebidos dia a dia (de die indiem). Também devem ser restituídos se recebidoscom antecipação.

O legislador procura desencorajar o surgimentode posses ilegítimas. Desse modo, o art. 1.216prescreve que “o possuidor de má-fé responde portodos os frutos colhidos e percebidos, bem comopelos que, por culpa sua, deixou de perceber, desdeo momento em que se constituiu de má-fé; tem direitoàs despesas da produção e custeio”. A posse de má-fé não é totalmente desprovida de eficácia jurídica,porque o possuidor nessa condição faz jus àsdespesas de produção e custeio, em atenção aoprincípio geral de repúdio ao enriquecimento semcausa.

30 A RESPONSABILIDADE PELA PERDA OU

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DETERIORAÇÃO DA COISA

“O possuidor de boa-fé não responde pela perdaou deterioração da coisa, a que não der causa” (CC,art. 1.217). A expressão “a que não der causa”,contida na parte final, equivale a dizer que aresponsabilidade do possuidor não se caracteriza, amenos que tenha agido com dolo ou culpa. Não seencontrava essa restrição no projeto de ClóvisBeviláqua que se transformou no Código Civil de1916, porque o possuidor, que detém a coisa comosua, animo domini, não deve responder pelasdeteriorações: sui quasi suam neglexit nulliquerellae subjectus est. A modificação, incluída pelaComissão Revisora e que destoava da orientaçãoseguida pela maioria das legislações, tem sua fonteno direito português e foi mantida no transcrito art.1.217 do novo Código.

Por outro lado, prescreve o art. 1.218: “Opossuidor de má-fé responde pela perda, oudeterioração da coisa, ainda que acidentais, salvo seprovar que de igual modo se teriam dado, estando elana posse do reivindicante”. Ao possuidor de má-fécompete o ônus de provar a exceção, isto é, que domesmo modo se teriam dado as perdas, estando acoisa na posse do reivindicante. Não basta a provada ausência de culpa nem da força maior. A únicaprova exoneradora é a da ocorrência do mesmo

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prejuízo, se não tivesse havido interferência algumado possuidor. Há, no caso, uma presunção juristantum de culpa do possuidor de má-fé, invertendo-se o ônus da prova.

31 A INDENIZAÇÃO DAS BENFEITORIAS E ODIREITO DE RETENÇÃO

31.1. O POSSUIDOR E OS MELHORAMENTOSQUE REALIZOU NA COISA

O possuidor de boa-fé tem o direito de serindenizado pelos melhoramentos que introduziu nobem. Desde o direito romano classificam-se em trêsgrupos as despesas ou os melhoramentos quepodem ser realizados nas coisas: a) despesas oubenfeitorias necessárias (impensae necesariae); b)despesas ou benfeitorias úteis (impensae utiles); c)despesas ou benfeitorias de luxo (impensaevoluptuariae). O Código Civil brasileiro consideranecessárias as benfeitorias que têm por fimconservar o bem ou evitar que se deteriore; úteis, asque aumentam ou facilitam o uso do bem; evoluptuárias, as de mero deleite ou recreio, que nãoaumentam o uso habitual do bem, ainda que o tornemmais agradável ou sejam de elevado valor (art. 96).

Sob duplo ponto de vista pode-se qualificar de

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necessária uma benfeitoria: a) quando se destina àconservação da coisa; b) quando visa a permitir suanormal exploração. Quanto à letra “a”, o possuidorpode realizar despesas de conservação da coisa, sejapara impedir que pereça ou se deteriore, seja paraconservá-la juridicamente. Impedem o perecimentodespesas para dar suficiente solidez a umaresidência, para cura das enfermidades dos animaisetc. Destinam-se a conservar a coisa juridicamenteas efetuadas para o cancelamento de uma hipoteca,liberação de qualquer outro ônus real, pagamento deforos e impostos, promoção de defesa judicial etc.No tocante à letra “b”, são também melhoramentosou benfeitorias necessárias as realizadas parapermitir a normal exploração econômica da coisa,como, por exemplo, a adubação, o esgotamento depântanos, as culturas de toda espécie, as máquinas einstalações etc.

O conceito de benfeitorias úteis é negativo: asque não se enquadram na categoria de necessárias,mas aumentam objetivamente o valor do bem. Para oCódigo Civil brasileiro são úteis as benfeitorias queaumentam ou facilitam o uso do bem. Assim, porexemplo, o acrescentamento de um banheiro ou deuma garagem à casa. Voluptuárias são as que sóconsistem em objetos de luxo e recreio, como jardins,mirantes, fontes, cascatas artificiais, bem comoaquelas que não aumentam o valor venal da coisa, no

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mercado em geral, ou só o aumentam em proporçãoinsignificante, como preceitua o § 2º do art. 967 doCódigo Civil colombiano. O Código Civil brasileiroconceitua as benfeitorias voluptuárias como as demero deleite ou recreio, que não aumentem o usohabitual do bem, ainda que o tornem mais agradávelou sejam de elevado valor.

Não se confundem benfeitorias e acessõesindustriais, malgrado a tendência cada vez maisgeneralizada de igualar os seus efeitos. As acessõesestão previstas nos arts. 1.253 a 1.259 do CódigoCivil e constituem construções ou plantações.Benfeitorias são obras ou despesas efetuadas numacoisa para conservá-la, melhorá-la ou apenasembelezá-la. São melhoramentos efetuados em coisajá existente. As acessões industriais, por sua vez,são obras que criam coisas novas, como a edificaçãode uma casa. A pintura ou os reparos feitos em casajá existente constituem benfeitorias. Apesar deacarretarem consequências diversas, a jurisprudênciavem reconhecendo o direito de retenção aopossuidor também nos casos de acessõesindustriais, malgrado a legislação o tenha previstosomente para a hipótese de ter sido feita algumabenfeitoria necessária ou útil (CC, art. 1.219). Nessesentido já se pronunciaram o Supremo TribunalFederal (RTJ, 60:179) e o Superior Tribunal de Justiça(RSTJ, 17:293).

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31.2. REGRAS DA INDENIZAÇÃO DASBENFEITORIAS (CC, ARTS. 1.219 A 1.222)

“O possuidor de boa-fé tem direito à indenizaçãodas benfeitorias necessárias e úteis, bem como,quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, alevantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa,e poderá exercer o direito de retenção pelo valor dasbenfeitorias necessárias e úteis” (CC, art. 1.219).Somente diante do caso concreto poder-se-á, muitasvezes, distinguir a espécie de benfeitoria. Construiruma piscina numa casa residencial, por exemplo,poderá ser uma benfeitoria voluptuária, mas numcolégio apresentar-se-á como benfeitoria útil e numclube de natação poderá ser uma benfeitorianecessária. Quanto às voluptuárias, poderá opossuidor de boa-fé levantá-las (jus tollendi), se issonão acarretar estrago à coisa e se o reivindicante nãopreferir ficar com elas, indenizando o seu valor. Oobjetivo é evitar o locupletamento sem causa doproprietário pelas benfeitorias então realizadas.

Dispõe o art. 1.220 que “ao possuidor de má-féserão ressarcidas somente as benfeitoriasnecessárias; não lhe assiste o direito de retençãopela importância destas, nem o de levantar asvoluptuárias”, porque obrou com a consciência deque praticava um ato ilícito. Faz jus à indenizaçãodas necessárias porque, caso contrário, o

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reivindicante experimentaria um enriquecimentoindevido. Alguns países, ao contrário do Brasil,admitem a indenização ao possuidor de má-fétambém das benfeitorias úteis. Prescreve o art. 1.221que “as benfeitorias compensam-se com os danos, esó obrigam ao ressarcimento se ao tempo da evicçãoainda existirem”. A compensação pressupõe aexistência de duas obrigações recíprocas a seremsopesadas.

O Código impõe, ainda, outra limitação ao direitodo possuidor que tenha agido de má-fé ao dispor, noart. 1.222: “O reivindicante, obrigado a indenizar asbenfeitorias ao possuidor de má-fé, tem o direito deoptar entre o seu valor atual e o seu custo; aopossuidor de boa-fé indenizará pelo valor atual”. Ajustificativa assenta-se na máxima da equidade quenão permite que se enriqueça alguém à custa alheia.Só faria sentido, porém, se os níveis de custo fossemestáveis, dado que o valor atual e o do custogeralmente se equivaleriam, mas não em períodos deinflação elevada e crônica pelos quais passou o País.Daí ter o Supremo Tribunal Federal, na vigência doCódigo Civil de 1916, mandado aplicar a correçãomonetária ao preço de custo das benfeitorias,reconhecendo, no caso, a existência de uma dívidade valor.

31.3. DIREITO DE RETENÇÃO: CONCEITO,

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FUNDAMENTO, NATUREZA JURÍDICA EMODO DE EXERCÍCIO

Consiste o ius retentionis num meio de defesaoutorgado ao credor, a quem é reconhecida afaculdade de continuar a deter a coisa alheia,mantendo-a em seu poder até ser indenizado pelocrédito, que se origina, via de regra, das benfeitoriasou de acessões por ele feitas. Além dos casosprevistos expressamente na legislação civil ecomercial, os mais comuns, admitidos pelajurisprudência, são os seguintes: a) em favor doempreiteiro-construtor (RT, 282:278); b) em favor dolocatário contra o senhorio (RT, 322:511); c) em favordo artífice, fabricante e daquele que faz consertos nacoisa (RT, 492:201). Malgrado algumas opiniões emcontrário, a ideia de retenção está menos ligada àideia de enriquecimento sem causa (porque nãoimpede a cobrança da indenização) do que à de meiocoercitivo, em função do qual fica o devedorcompelido a pagar para poder, só então, haver acoisa. Trata-se, na realidade, de um meio coercitivode pagamento, uma modalidade do art. 476 doCódigo Civil (exceptio non adimpleti contractus),transportada para o momento da execução,privilegiando o retentor porque esteve de boa-fé.

A respeito da natureza do direito de retenção,pretendem alguns tratar-se apenas de um direito

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pessoal. Outros objetam que se cuida de direito real,oponível erga omnes, havendo, ainda, os que optampor soluções intermédias. Arnoldo Medeiros daFonseca sustenta tratar-se de direito real. O seuprincipal argumento é o de que o art. 676 do CódigoCivil de 1916 (correspondente ao art. 1.227 do novodiploma), estabelecendo que os direitos reais sobreimóveis, resultantes de atos entre vivos, só seadquirem depois da transcrição ou da inscrição dosrespectivos títulos no registro público, ressalvatextualmente “salvo os casos expressos nesteCódigo”. Menciona, ainda, o fato de o possuidor deboa-fé poder invocar o direito de retenção até emface da reivindicatória do legítimo dono — art. 516(art. 1.219 do novo CC), aduzindo que essa mesmaregra é mandada aplicar a outras situações (arts. 873,772, 1.279 e 1.315 do Código Civil — de 1916,correspondentes, respectivamente, aos arts. 242,1.433, II, 644 e 681 do novo diploma), constituindoesse vínculo a relação característica de um direitoreal (Arnoldo Medeiros da Fonseca, Direito deretenção, cit., p. 255-6, n. 142). O direito de retençãoé reconhecido pela jurisprudência como o poderjurídico direto e imediato de uma pessoa sobre umacoisa, com todas as características de um direito real.Tem sido proclamado, por exemplo, o direito deretenção em favor de oficina mecânica que consertouo veículo até o pagamento do serviço e do material

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empregado na reparação (RT, 494:103, 511:137,519:213; RTJ, 40:358).

Via de regra, o direito de retenção deve seralegado em contestação para ser reconhecido nasentença. Pode o devedor, ainda, na execução paraentrega de coisa certa constante de título executivoextrajudicial (CPC, art. 621) deduzir embargos deretenção por benfeitorias. Consistem eles numinstrumento do possuidor de boa-fé, que, citado paraentregar a coisa, opõe-se a ela até que o exequentepague as benfeitorias feitas no imóvel (art. 745, IV,§§ 1º e 2º). Não podem, porém, ser opostos naexecução por título executivo judicial, em face danova redação dada aos arts. 621 e 744 do Código deProcesso Civil pela Lei n. 10.444, de 7-5-2002 (esteúltimo revogado pela Lei n. 11.328, de 6-12-2006,que deslocou a regulação da matéria para o art.745, V, §§ 1 º e 2º), devendo ser deduzidos emcontestação. A respeito do cabimento ou não deembargos de retenção por benfeitorias em açõespossessórias e ações de despejo, que têm forçaexecutiva, vide n. 26.4, retro.

Quadro sinótico – A percepção dos frutos

Os frutos devem

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1. Introdução

Os frutos devempertencer aoproprietário, comoacessórios da coisa.Essa regra, contudo,não prevalece quandoo possuidor estápossuindo de boa-fé,isto é, com aconvicção de que éseu o bem possuído(CC, art. 1.214).

Os frutos sãoacessórios, poisdependem da coisaprincipal. Distinguem-se dos produtos, que

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2. Noção defrutos

se dos produtos, quetambém são coisasacessórias, porquenão exaurem a fonte,quando colhidos.Reproduzem-seperiodicamente, aocontrário dosprodutos. Frutos sãoas utilidades que umacoisa periodicamenteproduz.

Quantoàorigem

a) naturais;b) industriais;c) civis.

a)

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3. EspéciesQuantoao seuestado

a)pendentes;b)percebidos,ou colhidos;c) estantes;d)percipiendos;e)consumidos.

a) o possuidor de boa-fé tem direito,enquanto ela durar,aos frutos percebidos(CC, art. 1.214);b) os frutos naturais e

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4. Regras darestituição

industriais reputam-secolhidos e percebidos,logo que sãoseparados; os civisreputam-sepercebidos dia por dia(art. 1.215);c) o possuidor de má-fé responde por todosos frutos colhidos epercebidos, bem comopelos que, por culpasua, deixou deperceber, desde omomento em que seconstituiu de má-fé;tem direito às

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tem direito àsdespesas da produçãoe custeio.

5.Responsabilidadepela perda oudeterioração dacoisa

O possuidor de boa-fénão responde pelaperda ou deterioraçãoda coisa, a que nãoder causa, ou seja, senão agir com dolo ouculpa (CC, art. 1.217).Por outro lado, opossuidor de má-féresponde pela perda,ou deterioração dacoisa, ainda queacidentais, salvo seprovar que de igual

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provar que de igualmodo se teriam dado,estando ela na possedo reivindicante (art.1.218).

6.Indenizaçãodas

O possuidor tem o direitode ser indenizado pelosmelhoramentos queintroduziu no bem. Asbenfeitorias podem ser:a) necessárias — quetêm por fim conservar ob e m ; b) úteis — queaumentam ou facilitam ouso do bem; voluptuárias — de mero

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benfeitorias deleite ou recreio.Benfeitorias sãomelhoramentos feitos emcoisa já existente.Distinguem-se dasacessões industriaisconstituem coisas novas,como a edificação deuma casa.

a) “o possuidor de boa-fétem direito à indenizaçãodas benfeitoriasnecessárias e úteis, bemcomo, quanto àsvoluptuárias, se não lheforem pagas, a levantá-

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7. Regrasdaindenização

forem pagas, a levantá-las, quando o puder semdetrimento da coisa, epoderá exercer o direitode retenção pelo valordas benfeitoriasnecessárias e úteis” (CC,art. 1.219);b) “ao possuidor de má-féserão ressarcidassomente as benfeitoriasnecessárias; não lheassiste o direito deretenção pela importânciadestas, nem o de levantaras voluptuárias” (art.1.220);c) “as benfeitorias

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c) “as benfeitoriascompensam-se com osdanos, e só obrigam aoressarcimento se aotempo da evicção aindaexistirem” (art. 1.221);d) “o reivindicante,obrigado a indenizar asbenfeitorias ao possuidorde má-fé, tem o direito deoptar entre o seu valoratual e o seu custo; aopossuidor de boa-féindenizará pelo valoratual” (art. 1.222).

Consiste o retentionis

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8. Direitoderetenção

Conceito

retentionisnum meio dedefesaoutorgado aocredor, aquem éreconhecida afaculdade decontinuar adeter a coisaalheia,mantendo-aem seu poderaté serindenizadopelo crédito,que se origina,

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que se origina,via de regra,das

Conceito

benfeitorias oude acessõespor ele feitas.Ajurisprudênciaprevê outrashipóteses emque pode serexercido.

O direito deretenção éreconhecidopela

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8. Direitoderetenção

Naturezajurídica

pelajurisprudênciacomo o poderjurídico diretoe imediato deuma pessoasobre umacoisa, comtodas ascaracterísticasde um direitoreal.

Via de regra,o direito deretenção deveser alegadoem

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Modo deexercício

emcontestaçãopara serreconhecidona sentença.Pode odevedor,ainda, naexecução paraentrega decoisa certaconstante detítulo executivoextrajudicial(CPC, art.621), deduzirembargos de

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embargos deretenção benfeitorias.

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TÍTULO IIDOS DIREITOS REAIS

CAPÍTULO ÚNICO

DISPOSIÇÕES GERAIS

32 CONCEITO

O direito real consiste no poder jurídico, direto eimediato, do titular sobre a coisa, com exclusividadee contra todos. Tem, como elementos essenciais, osujeito ativo, a coisa e a relação ou poder do sujeitoativo sobre a coisa, chamado domínio.

A propriedade é o direito real mais completo.Confere ao seu titular os poderes de usar, gozar edispor da coisa, assim como de reavê-la do poder dequem quer que injustamente a possua ou detenha(CC, art. 1.228). Quando todas essas prerrogativasacham-se reunidas em uma só pessoa, diz-se que éela titular da propriedade plena. Entretanto, apropriedade poderá ser limitada quando algum oualguns dos poderes inerentes ao domínio sedestacarem e se incorporarem ao patrimônio de outrapessoa. No usufruto, por exemplo, o direito de usar e

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gozar fica com o usufrutuário, permanecendo com onu-proprietário somente o de dispor e reivindicar acoisa. O usufrutuário, em razão dessedesmembramento, passa a ter um direito real sobrecoisa alheia, sendo oponível erga omnes.

33 ESPÉCIES

Os direitos reais são enumerados no art. 1.225 doCódigo Civil: propriedade, superfície, servidões,usufruto, uso, habitação, direito do promitentecomprador do imóvel, penhor, hipoteca, anticrese,concessão de uso especial para fins de moradia econcessão de direito real de uso. A propriedade édireito real completo. Os demais resultam de seudesmembramento e são denominados direitos reaismenores ou direitos reais sobre coisas alheias. Openhor, a hipoteca e a anticrese são chamados dedireitos reais de garantia, e os demais, de direitosreais de gozo ou fruição.

A concessão de uso especial para fins demoradia e a concessão de direito real de uso foramincluídas no rol dos direitos reais do citado art. 1.225do Código Civil pelo art. 10 da Lei n. 11.481, de 31 demaio de 2007, que prevê medidas voltadas àorganização fundiária de interesse social em imóveisda União. A primeira está assegurada pelo art. 183, §

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1º, da Constituição Federal. A referida Lei n.11.481/2007, por conseguinte, previu como direitoreal a concessão de uso especial, com a finalidade deoperacionalizar o direito social de moradia e o deconcessão de uso especial para fins de moradia.Trata-se de instituto que constitui decorrência dapolítica urbana prevista na Carta Magna. Aconcessão de direito real de uso dá-se por atoadministrativo vinculado ao poder público, sobreimóvel de propriedade da União Federal, ato quedeverá ser levado ao registro imobiliário para que odireito real se constitua plenamente. Aplicam-se-lheas regras do uso e do usufruto dos arts. 1.412 e 1.423do Código Civil, naquilo que for compatível.

34 AQUISIÇÃO DOS DIREITOS REAIS

No direito brasileiro o contrato, por si só, nãobasta para a transferência do domínio. Por ele criam-se apenas obrigações e direitos (CC, art. 481). Odomínio, porém, só se adquire pela tradição, se forcoisa móvel (art. 1.226), e pelo registro do título, sefor imóvel (art. 1.227). Desse modo, enquanto ocontrato que institui uma hipoteca ou uma servidãonão estiver registrado no Cartório de Registro deImóveis, existirá entre as partes apenas um vínculoobrigacional. O direito real, com todas as suas

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características, somente surgirá após aquele registro.Os direitos reais continuarão incidindo sobre os

imóveis, ainda que estes sejam alienados, enquantonão se extinguirem por alguma causa legal. Osadquirentes serão donos de coisa sobre a qual recaium direito real pertencente a outrem.

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TÍTULO IIIDA PROPRIEDADE

CAPÍTULO IDA PROPRIEDADE EM GERAL

35 CONCEITO E ELEMENTOSCONSTITUTIVOS DA PROPRIEDADE

O art. 1.228 do Código Civil não oferece umadefinição de propriedade, apenas enunciando ospoderes do proprietário: “O proprietário tem afaculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direitode reavê-la do poder de quem quer que injustamentea possua ou detenha”. Trata-se do mais completodos direitos subjetivos, a matriz dos direitos reais e onúcleo do direito das coisas.

O primeiro elemento constitutivo dapropriedade é o direito de usar (jus utendi), queconsiste na faculdade de o dono servir-se da coisa ede utilizá-la da maneira que entender maisconveniente, podendo excluir terceiros de igual uso.O segundo é o direito de gozar ou usufruir (jusfruendi), que compreende o poder de perceber os

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frutos naturais e civis da coisa e de aproveitareconomicamente os seus produtos. O terceiro é odireito de dispor da coisa (jus abutendi), de transferi-la, de aliená-la a outrem a qualquer título. Envolve afaculdade de consumir o bem, de dividi-lo ou degravá-lo. Não significa, porém, prerrogativa deabusar da coisa, destruindo-a gratuitamente, pois aprópria Constituição Federal prescreve que o uso dapropriedade deve ser condicionado ao bem-estarsocial. O último (quarto) elemento é o direito dereaver a coisa (rei vindicatio), de reivindicá-la dasmãos de quem injustamente a possua ou detenha.Envolve a proteção específica da propriedade, quese perfaz pela ação reivindicatória.

Preceitua o art. 1.232 do Código Civil que “osfrutos e mais produtos da coisa pertencem, aindaquando separados, ao seu proprietário, salvo se, porpreceito jurídico especial, couberem a outrem”.Trata-se de uma consequência do princípio de que acoisa acessória segue a principal, salvo disposiçãoespecial em contrário. Preceitos jurídicos especiaispodem ser o art. 1.284 do Código Civil, que trata dosfrutos caídos de árvores limítrofes em terrenovizinho, e também o 1.214, que assegura aopossuidor de boa-fé o direito aos frutos percebidos.

36 AÇÃO REIVINDICATÓRIA.PRESSUPOSTOS E NATUREZA JURÍDICA

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A ação reivindicatória tem caráteressencialmente dominial e por isso só pode serutilizada pelo proprietário, por quem tenha jus in re.Nessa ação o autor deve provar o seu domínio,oferecendo prova inconcussa da propriedade, com orespectivo registro, e descrevendo o imóvel comsuas confrontações, bem como demonstrar que acoisa reivindicada se encontra na posse do réu. Três,portanto, os pressupostos de admissibilidade de talação: a titularidade do domínio, pelo autor, da áreareivindicanda; a individuação da coisa; a posseinjusta do réu.

O registro imobiliário comprova a titularidadedo domínio, “sem necessidade de sercomplementada essa prova com filiação dos títulosde domínio anteriores. Somente quando há títulos dedomínio em favor de ambas as partes é que seaprecia a filiação anterior para se saber qual atranscrição que deve prevalecer” (RT, 354:206).Pressuposto essencial à propositura da ação é adescrição atualizada do bem, com os corretoslimites e confrontações, de modo a possibilitar a suaexata localização. Na reivindicatória o proprietário vairetomar a coisa não de qualquer possuidor oudetentor, porém daquele que a conserva sem causajurídica, ou a possui injustamente. É ação doproprietário que tem título, mas não tem posse,contra quem tem posse, mas não tem título.

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É ação real que compete ao senhor da coisa.Essa, pois, a sua natureza jurídica. Carece da ação otitular do domínio se a posse do terceiro for justa,como, por exemplo, a fundada em contrato nãorescindido. Encontra fundamento, pois, no art. 1.228do Código Civil, que assegura ao proprietário odireito de sequela, atributo dos direitos reais quepossibilita a este perseguir a coisa onde quer queesteja, de acordo com a máxima romana resubicumque sit, pro domino suo clamat (onde querque se encontre a coisa, ela clama pelo seu dono). Oreferido dispositivo fala em posse injusta. Talexpressão é referida em termos genéricos,significando sem título, isto é, sem causa jurídica.Não se tem, pois, a acepção restrita de posse injustado art. 1.200. Na reivindicatória, detém injustamente aposse quem não tem título que a justifique, mesmoque não seja violenta, clandestina ou precária, eainda que seja de boa-fé. Não fosse assim, o domínioestaria praticamente extinto ante o fato da posse.

A ação reivindicatória é imprescritível, emborase trate de ação real. Versa sobre o domínio, que éperpétuo e somente se extingue nos casos expressosem lei (usucapião, desapropriação etc.), não seextinguindo pelo não uso. Se, no entanto, a coisa foiusucapida pelo possuidor, não mais pode serproposta a reivindicatória pelo antigo proprietário.Mesmo imprescritível, esbarra na usucapião, que

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pode ser alegada pelo possuidor, em defesa, contra oantigo proprietário para elidir o pedido (Súmula 237do STF). Acolhida tal defesa na reivindicatória, asentença de improcedência da ação ilidirá apretensão do reivindicante, mas não produziráefeitos erga omnes, não dispensando, assim, apropositura da ação de usucapião, com citação detodos os interessados. Se se admitisse a prescriçãoda reivindicatória no prazo das ações reais (10 anos,segundo o art. 205), estar-se-ia admitindo apossibilidade de eventualmente existir um direito semsujeito. Por exemplo, se já tivessem decorrido dozeanos do dia em que poderia propor a ação, o autornão mais teria o direito de reivindicar. E o réu nãopoderia usucapir, por não ter quinze anos de possemansa e pacífica (CC, art. 1.238, caput).

36.1. LEGITIMIDADE ATIVA E PASSIVA

Compete a reivindicatória ao senhor da coisa, aotitular do domínio. Em se tratando de ação realimobiliária, é indispensável a outorga uxória para oseu ajuizamento bem como a citação de ambos oscônjuges, se o réu for casado (CPC, art. 10). Não seexige que a propriedade seja plena. Mesmo alimitada, como ocorre nos direitos reais sobre coisasalheias e na resolúvel, autoriza a sua propositura. Damesma forma, cada condômino pode,

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individualmente, reivindicar de terceiro a totalidadedo imóvel (CC, art. 1.314), não podendo este opor--lhe, em exceção, o caráter parcial do seu direito (CC,art. 1.827). Como o direito hereditário é modo deaquisição da propriedade imóvel (CC, art. 1.784), e odomínio e a posse da herança transmitem-se aosherdeiros desde a abertura da sucessão, podem estesreivindicar os bens que a integram mesmo sem aexistência de formal de partilha, esteja este registradoou não. Indispensável, no entanto, que o imóvelesteja registrado em nome do de cujus. Igual direitocabe ao cessionário dos direitos hereditários. Emboradurante algum tempo tivesse sido negada ao titularde compromisso de compra e venda, por não ter odomínio da coisa, legitimidade para a propositura daação, a jurisprudência, ao tempo do Código Civil de1916, vinha se orientando no sentido de admitir queo promitente comprador ajuizasse a açãoreivindicatória, pois o titular de compromisso decompra e venda irretratável e irrevogável que pagoutodas as prestações possui todos os direitoselementares do proprietário, podendo usar, gozar edispor da coisa. Dispõe, assim, de título paraembasar ação reivindicatória contra terceiro que seencontra injustamente na posse do bem. O art. 1.417do aludido diploma, todavia, enuncia que opromitente comprador adquire direito real à aquisiçãodo imóvel mediante promessa de compra e venda

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“registrada no Cartório de Registro de Imóveis”. Nãobasta que o compromisso de compra e venda sejairretratável e irrevogável. Há de estar registrado noCartório de Registro de Imóveis. A propósito,proclama o Enunciado 253, aprovado na III Jornadade Direito Civil, realizada pelo Conselho da JustiçaFederal: “O promitente comprador, titular de direitoreal (art. 1.417), tem a faculdade de reivindicar deterceiro o imóvel prometido à venda”. Tal enunciadogarante ao compromissário comprador o direito desequela, ou seja, de reaver a coisa de queminjustamente a detenha, desde que seja titular dedireito real nos termos do citado art. 1.417 que,como vimos, exige para tanto que o compromisso decompra e venda esteja registrado no Cartório deRegistro de Imóveis.

Quanto à legitimidade passiva, a ação deve serendereçada contra quem está na posse ou detém acoisa, sem título ou suporte jurídico. A boa-fé nãoimpede a caracterização da injustiça da posse, parafins de reivindicatória. Ao possuidor direto, citadopara a ação, incumbe a denunciação da lide aopossuidor indireto (CPC, art. 70, III). A reivindicatóriapode, assim, ser movida contra o possuidor semtítulo e o detentor, qualquer que seja a causa pelaqual possuam ou detenham a coisa. Pode serendereçada também contra aquele que deixou depossuí-la com dolo, isto é, transferindo-a para outro

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com a intenção de dificultar ao autor sua vindicação.

36.2. OUTROS MEIOS DE DEFESA DAPROPRIEDADE: AÇÃO NEGATÓRIA E AÇÃODE DANO INFECTO

A negatória é cabível quando o domínio doautor, por um ato injusto, esteja sofrendo algumarestrição por alguém que se julgue com um direito deservidão sobre o imóvel. Já a ação de dano infectotem caráter preventivo e cominatório, como ointerdito proibitório, e pode ser oposta quando hajafundado receio de perigo iminente, em razão de ruínado prédio vizinho ou vício na sua construção (CC,art. 1.280). Precavendo-se, o autor obtém que asentença comine ao réu a prestação de caução que oassegure contra o dano futuro (cautio damniinfecti). Pode ser proposta também nos casos de mauuso da propriedade vizinha, que prejudique osossego, a segurança e a saúde do proprietário ouinquilino de um prédio.

37 CARACTERES DA PROPRIEDADE

Preceitua o art. 1.231 do Código Civil que “apropriedade presume-se plena e exclusiva, até provaem contrário”. Costuma-se, efetivamente, afirmar que

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o direito de propriedade é exclusivo, no sentido depoder o seu titular afastar da coisa quem quer quedela queira utilizar-se (tal noção não se choca com ade condomínio, pois cada condômino é proprietário,com exclusividade, de sua parte ideal) e ilimitado(pleno) ou absoluto, no sentido de encontrar-se apropriedade liberta dos encargos que a constrangiamdesde os tempos feudais, quando o que lavrava osolo tinha o dever de pagar foro ao fidalgo. Hoje, oproprietário tem amplo poder sobre o que lhepertence. Também se diz que a propriedade éirrevogável ou perpétua, porque não se extinguepelo não uso. Não estará perdida enquanto oproprietário não a alienar ou enquanto não ocorrernenhum dos modos de perda previstos em lei, comoa desapropriação, o perecimento, a usucapião etc.

38 EVOLUÇÃO DO DIREITO DEPROPRIEDADE. FUNÇÃO SOCIAL DAPROPRIEDADE

No direito romano, a propriedade tinha caráterindividualista. Na Idade Média passou por uma fasepeculiar, com dualidade de sujeitos (o dono e o queexplorava economicamente o imóvel, pagando aoprimeiro pelo seu uso). Após a Revolução Francesa,assumiu feição marcadamente individualista. No

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século passado, no entanto, foi acentuado o seucaráter social, contribuindo para essa situação asencíclicas papais. A atual Constituição Federaldispõe que a propriedade atenderá a sua funçãosocial (art. 5º, XXIII). Também determina que aordem econômica observará a função dapropriedade, impondo freios à atividade empresarial(art. 170, III).

Nessa ordem, o novo Código Civil proclama que“o direito de propriedade deve ser exercido emconsonância com as suas finalidades econômicas esociais e de modo que sejam preservados, deconformidade com o estabelecido em lei especial, aflora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrioecológico e o patrimônio histórico e artístico, bemcomo evitada a poluição do ar e das águas” (art.1.228, § 1º); e que “são defesos os atos que nãotrazem ao proprietário qualquer comodidade, ouutilidade, e sejam animados pela intenção deprejudicar outrem” (§ 2º). O referido diploma criouuma nova espécie de desapropriação, determinadapelo Poder Judiciário na hipótese de “o imóvelreivindicado consistir em extensa área, na posseininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, deconsiderável número de pessoas, e estas nelahouverem realizado, em conjunto ou separadamente,obras e serviços considerados pelo juiz de interessesocial e econômico relevante” (§ 4º). Nesse caso “o

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juiz fixará a justa indenização devida ao proprietário”(§ 5º). Trata-se de inovação de elevado alcance,inspirada no sentido social do direito de propriedadee também no novo conceito de posse, qualificada porMiguel Reale como posse-trabalho.

Inúmeras leis impõem restrições ao direito depropriedade (Código de Mineração, Código Florestal,Lei de Proteção do Meio Ambiente etc.), além daslimitações decorrentes do direito de vizinhança e decláusulas impostas nas liberalidades. Todo esseconjunto, no entanto, acaba traçando o perfil atualdo direito de propriedade no direito brasileiro, quedeixou de apresentar as características de direitoabsoluto e ilimitado, para se transformar em umdireito de finalidade social.

O art. 1.231 do Código Civil considera plena (ouilimitada) e exclusiva a propriedade, até prova emcontrário. É limitada quando pesa sobre ela ônusreal, como no caso do usufruto e de outros direitosreais sobre coisas alheias, em virtude dodesmembramento dos direitos elementares doproprietário (usar, gozar etc.), ou quando é resolúvel(sujeita a resolução). É plena quando o proprietárioconcentra em suas mãos todos os direitoselementares mencionados no art. 1.228. O art. 1.229limita a extensão da propriedade pelo critério dautilidade: até onde lhe for útil. Não pode oproprietário opor-se a trabalhos realizados por

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terceiros a uma altura ou profundidade tais, que nãotenha ele interesse algum em impedi-los. A restriçãoé de cunho social. Acrescenta o art. 1.230 que “apropriedade do solo não abrange as jazidas, minas edemais recursos minerais, os potenciais de energiahidráulica, os monumentos arqueológicos e outrosbens referidos por leis especiais” que constituempropriedade distinta do solo para efeito deexploração ou aproveitamento (CF, art. 176; Cód. deMineração, art. 84).

39 FUNDAMENTO JURÍDICO DAPROPRIEDADE

Dentre as teorias que procuram um fundamentojurídico para o direito de propriedade a da ocupaçãoé a mais antiga. Vislumbra-o na ocupação das coisas,quando não pertenciam a ninguém (res nullius). Ébastante combatida, por entender-se que a ocupaçãoé apenas modo de aquisição da propriedade, mas nãotem substância para justificar o direito depropriedade e, portanto, para servir-lhe defundamento jurídico. A da especificação apoia-se notrabalho. Somente o trabalho humano, transformandoa natureza e a matéria bruta, justifica o direito depropriedade. Essa teoria, embora tenha inspirado osregimes socialistas no início do século passado, não

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pode ser aceita, porque não responde à dúvida sobrese deve existir a propriedade, procurando apenasresolver quem deve ser o proprietário.

A teoria da lei, sustentada por Montesquieu emseu De l’esprit des lois, assenta-se na concepção deque a propriedade é instituição do direito positivo:existe porque a lei a criou e a garante. Essa teoria nãoestá, porém, imune a críticas, pois não pode apropriedade fundar-se somente na vontade humana,porque o legislador poderia ser levado a suprimi-la,quando deveria ter apenas o poder de regular-lhe oexercício. Contrapõe-se, especialmente, que apropriedade sempre existiu, mesmo antes de serregulamentada pela lei. A teoria da natureza humanaé a que conta com o maior número de adeptos. Paraestes, a propriedade é inerente à natureza humana,sendo uma dádiva de Deus aos homens. É,naturalmente, a teoria acolhida pela Igreja Católica,consoante se depreende das encíclicas papais. Apropriedade não deriva do Estado e de suas leis, masantecede-lhes, como direito natural.

40 DA DESCOBERTA

A Seção II do Capítulo do novo Código Civilque trata da propriedade em geral, sob o título “Dadescoberta”, figurava, no Código Civil de 1916, como

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modo de aquisição e perda da propriedade móvel,com o nome de “invenção”.

Descoberta é o achado de coisa perdida por seudono. Descobridor é a pessoa que a encontra. Quemquer que ache coisa alheia perdida há de restituí-laao dono ou legítimo possuidor (CC, art. 1.233). Não oconhecendo, o descobridor fará por encontrá-lo, e,se não o encontrar, entregará a coisa achada àautoridade competente (parágrafo único). O CódigoPenal considera infração punível a apropriação decoisa achada e a não entrega à autoridadecompetente ou ao seu dono, no prazo de quinze dias.Aquele que restituir a coisa achada terá direito a umarecompensa não inferior a 5% do seu valor, e àindenização pelas despesas que houver feito com aconservação e o transporte da coisa, se o dono nãopreferir abandoná-la (art. 1.234). Se o dono da coisapreferir abandoná-la, o inventor passa a ser o titular,mesmo que já a tenha entregue à autoridadecompetente, ficando afastada a aplicação do art.1.237.

Quadro sinótico – Da propriedade em geral

Trata-se do mais completo dosdireitos subjetivos, a matriz dos

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1. Conceito

direitos subjetivos, a matriz dosdireitos reais e o núcleo dodireito das coisas. O art. 1.228do CC não oferece umadefinição de propriedade,apenas enunciando os poderesdo proprietário.

2. Elementosconstitutivos

a) direito de usar (b) direito de gozar ou usufruir(jus fruendi);c) direito de dispor da coisa(jus abutendi);d) direito de reaver a coisa (vindicatio).

a) a titularidadedo domínio,

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Pressupostos

do domínio,pelo autor, daáreareivindicanda;b) aindividuação dacoisa;c) a posseinjusta do réu(desprovida detítulo).

Tem caráteressencialmentedominial e porisso só podeser utilizada

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Naturezajurídica

peloproprietário,por quem tenhajus in reportanto, realcompete aosenhor dacoisa.

— compete areivindicatóriaao senhor dacoisa, ao titulardo domínio;— não se exigeque a

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3. Açãoreivindicatória

Legitimidadeativa

que apropriedadeseja plena.Mesmo alimitada, comoocorre nosdireitos reaissobre coisasalheias e naresolúvel,autoriza a suapropositura;— cadacondôminopode,individualmente,reivindicar deterceiro a

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terceiro atotalidade doimóvel (CC, art.1.314);— ocompromissáriocomprador, quepagou todas asprestações,possui todos osdireitoselementares doproprietário edispõe, assim,de título paraembasar açãoreivindicatória.

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reivindicatória.

Legitimidadepassiva

— a ação deveser endereçadacontra quemestá na posseou detém acoisa, semtítulo ousuportejurídico;

— a boa-fé nãoimpede acaracterizaçãoda injustiça daposse, parafins de

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3. Açãoreivindicatória

Legitimidadepassiva

fins dereivindicatória;— ao possuidordireto, citadopara a ação,incumbe anomeação àautoria doproprietário(CPC, art. 62).

É cabívelquando odomínio doautor, porum atoinjusto,esteja

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4. Outrosmeios dedefesa

Açãonegatória

estejasofrendoalgumarestriçãopor alguémque sejulgue comum direitode servidãosobre oimóvel.

Temcaráterpreventivo ecominatório,como ointerdito

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defesadapropriedade

Ação dedanoinfecto

interditoproibitório,e pode seropostaquando hajafundadoreceio deperigoiminenteem razãode ruína doprédiovizinho ouvício na suaconstrução(CC, art.1.280).

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1.280).Cabetambémnos casosde mau usodapropriedadevizinha.

5.Caracteresdo direitodepropriedade

a) é exclusivo (nocondomínio, recaisobre a parte ideal);b) é ilimitado (pleno)ou absoluto;c) é irrevogável ouperpétuo: não seextingue pelo não uso.

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6. Evoluçãodo

a) no direito romano:tinha caráterindividualista;b) na Idade Média:passou por uma fasepeculiar, com dualidadede sujeitos (o dono e oque exploravaeconomicamente oimóvel, pagando aoprimeiro pelo seu uso);c) após a RevoluçãoFrancesa: assumiufeição marcadamenteindividualista;d) na atualidade,desempenha uma

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direito depropriedade

desempenha umafunção social: deve serexercido emconsonância com assuas finalidadeseconômicas e sociais ede modo que sejampreservados a flora, afauna, as belezasnaturais, o equilíbrioecológico e opatrimônio histórico eartístico, bem comoevitada a poluição doar e das águas (CC,art. 1.228; CF, art. 5º,XXIII).

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7.Fundamentojurídico

a) teoria da ocupaçãoé a mais antiga.Vislumbra o direito depropriedade naocupação das coisas,quando não pertenciama ninguém (res nulliusb) teoria daespecificação: apoia-se no trabalho. Inspirouos regimes socialistas;

c) teoria da lei (deMontesquieu): sustentaque a propriedade éinstituição do direito

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7.Fundamentojurídico

positivo, ou seja, existeporque a lei a criou e agarante;d) teoria da naturezahumana: prega que apropriedade é inerenteà natureza humana.Não deriva do Estado ede suas leis, masantecede-lhes, comodireito natural. É a queconta com o maiornúmero de adeptos,especialmente a IgrejaCatólica.

Descoberta é o achado

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8. Dadescoberta

Descoberta é o achadode coisa perdida porseu dono. Descobridoré a pessoa que aencontra. “Quem querque ache coisa alheiaperdida há de restituí-laao dono ou legítimopossuidor” (CC, art.1.233). “Não oconhecendo, odescobridor fará porencontrá-lo, e, se não oencontrar, entregará acoisa achada àautoridade competente”(parágrafo único).

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CAPÍTULO IIDA AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE IMÓVEL

41 MODOS DE AQUISIÇÃO

O Código Civil de 1916 enumerava,taxativamente, no art. 530, os modos de aquisição dapropriedade imóvel: a) registro do título detransferência no Registro do Imóvel; b) acessão; c)usucapião; e d) direito hereditário. O novo diplomanão os especificou, limitando-se a disciplinar, nocapítulo intitulado “Da aquisição da propriedadeimóvel”, a usucapião, o registro do título e aacessão (arts. 1.238 a 1.259). O direito hereditário é,também, modo de aquisição da propriedade imóvelporque, aberta a sucessão, a herança transmite-se,desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários(CC, art. 1.784). O inventário será feito em função doprincípio da continuidade do registro de imóveis,para que o herdeiro ali figure como titular do direito

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de propriedade. Todavia a aquisição desse direitodá-se simplesmente em razão do falecimento do decujus, quando então se considera aberta a sucessão(saisine). O mesmo ocorre com a usucapião, como severá mais adiante. Presentes os demais pressupostoslegais, considera-se adquirido o domínio pelosimples decurso do lapso de tempo previsto na lei. Asentença que reconhecer a usucapião terá naturezameramente declaratória.

Quanto à procedência ou causa de aquisição,esta pode ser: originária, quando não hátransmissão de um sujeito para outro, como ocorrena acessão natural e na usucapião; e derivada,quando resulta de uma relação negocial entre oanterior proprietário e o adquirente, havendo, pois,uma transmissão do domínio em razão damanifestação de vontade. Se o modo é originário, apropriedade passa ao patrimônio do adquirenteescoimada de quaisquer limitações ou vícios queporventura a maculavam. Se é derivado, atransmissão é feita com os mesmos atributos eeventuais limitações que anteriormente recaíamsobre a propriedade, porque ninguém pode transferirmais direitos do que tem. A aquisição derivada exige,também, comprovação da legitimidade do direito doantecessor.

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Quadro sinótico – Aquisição da propriedadeimóvel

Hipóteseslegais (CC,arts. 1.239/1.259 e1.784)

a)usucapião;b) registrodo título detransferênciano Registrodo Imóvel;c) acessão;d) direitohereditário.

a) originárianão hátransmissãode um

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Modosdeaquisição

Quanto àprocedência

de umsujeito paraoutro, comoocorre naacessãonatural e nausucapião;b) derivadaa aquisiçãoresulta deuma relaçãonegocialentre oanteriorproprietárioe oadquirente.

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adquirente.

41.1. DA USUCAPIÃO

41.1.1. CONCEITO

A usucapião é também chamada de prescriçãoaquisitiva, em confronto ou comparação com aprescrição extintiva, que é disciplinada nos arts. 205e 206 do Código Civil. Em ambas, aparece o elementotempo influindo na aquisição e na extinção dedireitos. A primeira, regulada no direito das coisas, émodo originário de aquisição da propriedade e deoutros direitos reais suscetíveis de exercíciocontinuado (entre eles, as servidões e o usufruto)pela posse prolongada no tempo, acompanhada decertos requisitos exigidos pela lei; a segunda, tratadana Parte Geral do Código, é a perda da pretensão e,por conseguinte, da ação atribuída a um direito, e detoda a sua capacidade defensiva, em consequênciado não uso dela durante determinado espaço detempo.

O art. 1.244 do Código Civil, entretanto,demonstra que se trata de institutos símiles, aoprescrever: “Estende-se ao possuidor o dispostoquanto ao devedor acerca das causas que obstam,

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suspendem ou interrompem a prescrição, as quaistambém se aplicam à usucapião”.Consequentemente, dentre outras proibições, não severifica usucapião entre cônjuges, na constância docasamento, entre ascendentes e descendentes,durante o poder familiar etc. Não corre, ainda, aprescrição (art. 198) contra os absolutamenteincapazes de que trata o art. 3º. Já se decidiu que sesuspende o prazo da prescrição aquisitiva a partir dadata do óbito do pai da herdeira necessária, menor dedezesseis anos, até que complete essa idade,beneficiando os demais condôminos (RJTJSP,39:143).

41.1.2. ESPÉCIES

Podem ser objeto de usucapião bens móveis eimóveis. O direito brasileiro distingue três espéciesde usucapião de bens imóveis: a extraordinária, aordinária e a especial (ou constitucional), dividindo-se a última em rural (pro labore) e urbana (pró-moradia ou pro misero).

A usucapião extraordinária é disciplinada noart. 1.238 do Código Civil e seus requisitos são:posse de quinze anos (que pode reduzir-se a 10 anosse o possuidor houver estabelecido no imóvel a suamoradia habitual ou nele realizado obras ou serviçosde caráter produtivo), exercida com ânimo de dono,

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de forma contínua, mansa e pacificamente.Dispensam-se os requisitos do justo título e da boa-fé. Tem, como antecedentes históricos, apraescriptio longi temporis, a longissimi temporis(que chegou a ser de 40 anos) e a prescriçãoimemorial (posse de cujo começo não houvessememória entre os vivos). A ordinária é prevista noart. 1.242 e apresenta os seguintes requisitos: possede dez anos, exercida com ânimo de dono, de formacontínua, mansa e pacificamente, além de justo títuloe boa-fé. O prazo será de cinco anos “se o imóvelhouver sido adquirido, onerosamente, com base noregistro constante do respectivo cartório, canceladaposteriormente, desde que os possuidores neletiverem estabelecido a sua moradia, ou realizadoinvestimentos de interesse social e econômico” (art.1.242, parágrafo único).

Preceitua o art. 2.029 das “DisposiçõesTransitórias” que, “até dois anos após a entrada emvigor deste Código, os prazos estabelecidos noparágrafo único do art. 1.238 e no parágrafo único doart. 1.242 serão acrescidos de dois anos, qualquerque seja o tempo transcorrido na vigência doanterior, Lei n. 3.071, de 1º de janeiro de 1916”. Osparágrafos mencionados dizem respeito às hipótesesem que o prazo é reduzido porque o possuidorestabeleceu no imóvel a sua moradia habitual, ounele realizou obras ou serviços de caráter produtivo.

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Acrescenta o art. 2.030 que “o acréscimo, de quetrata o artigo antecedente, será feito nos casos a quese refere o § 4º do art. 1.228”.

A usucapião especial rural (pro labore) surgiu,no direito brasileiro, na Constituição de 1934, sendoconservada na Carta outorgada de 1937 e naConstituição de 1946. A Constituição de 1967 e aEmenda Constitucional de 1969 não repetiram o textodas anteriores, mas a última consignou os seusrequisitos básicos, remetendo a sua disciplina à leiordinária. Enquanto não regulamentada, aplicou-se aLei n. 4.504, de 30 de novembro de 1964 (Estatuto daTerra), até o advento da Lei n. 6.969, de 10 dedezembro de 1981, elaborada especialmente pararegulamentar a aquisição, por usucapião especial, deimóveis rurais. Preceitua o seu art. 1º: “Todo aqueleque, não sendo proprietário rural nem urbano,possuir como sua, por 5 (cinco) anos ininterruptos,sem oposição, área rural contínua, não excedente de25 (vinte e cinco) hectares, e a houver tornadoprodutiva com seu trabalho e nela tiver sua morada,adquirir-lhe-á o domínio, independentemente dejusto título e boa-fé, podendo requerer ao juiz queassim o declare por sentença, a qual servirá de títulopara transcrição no Registro de Imóveis”.Excepcionalmente, o seu art. 2º incluiu as terrasdevolutas (espécies de bens públicos) entre os bensusucapíveis. Entretanto, o art. 191 da atual

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Constituição aumentou a dimensão da área ruralsuscetível dessa espécie de usucapião paracinquenta hectares, tendo o parágrafo único proibidoexpressamente a aquisição de imóveis públicos porusucapião. O usucapiente não pode ser proprietáriode qualquer outro imóvel, seja rural ou urbano. Noart. 1.239, o novo Código Civil limitou-se areproduzir, ipsis litteris, o mencionado art. 191 daConstituição Federal.

A usucapião especial urbana constituiinovação trazida pela Constituição de 1988, estandoregulamentada em seu art. 183: “Aquele que possuircomo sua área urbana de até duzentos e cinquentametros quadrados, por cinco anos, ininterruptamentee sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou desua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que nãoseja proprietário de outro imóvel urbano ou rural”.Não se aplica à posse de terreno urbano semconstrução, pois é requisito a sua utilização paramoradia do possuidor ou de sua família.Acrescentam os §§ 2º e 3º que esse “direito não seráreconhecido ao novo possuidor mais de uma vez” eque os “imóveis públicos não serão adquiridos porusucapião”. O título de domínio e a concessão deuso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou aambos, independente do estado civil (§ 1º). Essaespécie de usucapião não reclama justo título nemboa-fé, como também ocorre com a usucapião

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especial rural. Como se trata de inovação trazida pelaCarta de 1988, não se incluem no preceitoconstitucional as posses anteriores. O prazo de cincoanos só começou a contar, para os interessados, apartir da vigência da atual Constituição. O novodireito não poderia retroagir, surpreendendo oproprietário com uma situação jurídica anteriormentenão prevista. Assim, os primeiros pedidos somentepuderam ser formulados a partir de 5 de outubro de1993. No art. 1.240, o novo Código Civil reproduziu,integralmente, o art. 183, §§ 1º e 2º, da ConstituiçãoFederal.

A Lei n. 12.424, de 16 de junho de 2011, criouuma nova modalidade de usucapião especial urbana,chamada de usucapião familiar, inserindo noCódigo Civil o art. 1.240-A e seu § 1º, do seguinteteor: “Aquele que exercer, por 2 (dois) anosininterruptamente e sem oposição, posse direta, comexclusividade, sobre imóvel urbano de até 250 m2(duzentos e cinquenta metros quadrados) cujapropriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o parasua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á odomínio integral, desde que não seja proprietário deoutro imóvel urbano ou rural. § 1º O direito previstono caput não será reconhecido ao mesmo possuidormais de uma vez”. Trata-se, como mencionado, denova modalidade de usucapião especial urbana,

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instituída em favor de pessoas de baixa renda quenão têm imóvel próprio, seja urbano ou rural. A lei emapreço disciplina o novo instituto nos moldes do art.183 da Constituição Federal. Assim como nausucapião especial urbana, é necessário que ousucapiente não seja proprietário de outro imóvelurbano ou rural e exerça posse mansa, pacífica eininterrupta sobre imóvel urbano de até 250 metrosquadrados, para fins de sua moradia ou de suafamília, não sendo permitida a concessão da medidamais de uma vez em favor da mesma pessoa. Podemser apontadas, no entanto, as seguintes diferenças:a) na usucapião familiar, ao contrário do que sucedena usucapião especial urbana, exige-se, além dosrequisitos mencionados, que o usucapiente sejacoproprietário do imóvel, em comunhão oucondomínio com seu ex-cônjuge ou ex-companheiro;b) exige-se, também, que estes tenham abandonado olar de forma voluntária e injustificada; c) o temponecessário para usucapir é flagrantemente inferior aodas demais espécies de usucapião, consumando-se aprescrição aquisitiva no prazo de dois anos.

O art. 10 do Estatuto da Cidade (Lei n. 10.257, de10-7-2001) prevê também a usucapião coletiva, deinegável alcance social, de áreas urbanas com maisde 250 metros quadrados, ocupadas por populaçãode baixa renda para sua moradia por cinco anos,onde não for possível identificar os terrenos

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ocupados individualmente.

41.1.3. PRESSUPOSTOS

Os pressupostos da usucapião são: coisa hábilou suscetível de usucapião, posse, decurso dotempo, justo título e boa-fé. Os três primeiros sãoindispensáveis e exigidos em todas as espécies deusucapião. O justo título e a boa-fé somente sãoreclamados na usucapião ordinária.Preambularmente, é necessário verificar se o bem quese pretende usucapir é suscetível de prescriçãoaquisitiva, pois nem todos se sujeitam a ela, como osbens fora do comércio e os bens públicos.

Decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo que ofato de o imóvel rural possuir área inferior ao móduloregional não constitui empeço à sua aquisição pelausucapião extraordinária, havendo prevalência dasregras do Código Civil, em matéria de usucapião,sobre o art. 65 da Lei n. 4.504/64, denominadaEstatuto da Terra. Há, no caso, possibilidade jurídicado pedido e interesse processual (JTJ, Lex, 247:75).

Consideram-se fora do comércio os bensnaturalmente indisponíveis (insuscetíveis deapropriação pelo homem, como o ar atmosférico, aágua do mar), os legalmente indisponíveis (bens deuso comum, de uso especial e de incapazes, osdireitos da personalidade e os órgãos do corpo

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humano) e os indisponíveis pela vontade humana(deixados em testamento ou doados, com cláusula deinalienabilidade). São, assim, insuscetíveis deapropriação pelo homem os bens que se acham emabundância no universo e escapam de seu poderfísico, como a luz, o ar atmosférico, o mar alto etc.Bens legalmente inalienáveis são os que, por lei, nãopodem ser transferidos a outrem, não se incluindonesse conceito os que se tornaram inalienáveis pelavontade do testador ou do doador. Ainalienabilidade decorrente de ato jurídico não temforça de subtrair o bem gravado da prescriçãoaquisitiva, não o colocando fora do comércio.Decidiu, com efeito, o Superior Tribunal de Justiçaque, “com o usucapião simplesmente extingue-se odomínio do proprietário anterior, bem como osdireitos reais que tiver ele constituído e sem embargode quaisquer limitações a seu dispor” (STJ, 4ª T.,REsp 207.167-RJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo).

Os bens públicos também não podem ser objetode usucapião. Dispõe o art. 2º do Decreto n.22.785/33 que “os bens públicos, seja qual for suanatureza, não são sujeitos a prescrição”. Com relaçãoaos imóveis, essa orientação foi reiterada no art. 200do Decreto-Lei n. 9.760, de 5 de setembro de 1946,que disciplina os bens imóveis da União, ao estatuirque, “seja qual for a sua natureza, não são sujeitos ausucapião”. A jurisprudência consolidou-se nesse

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sentido, conforme se verifica pela Súmula 340 doSupremo Tribunal Federal, verbis: “Desde a vigênciado Código Civil (de 1916), os bens dominicais, comoos demais bens públicos, não podem ser adquiridospor usucapião”. E o novo Código Civil, nessa linha,proclama: “Os bens públicos não estão sujeitos ausucapião” (art. 102). Assim, somente podem serobjeto de usucapião bens do domínio particular, nãopodendo sê--lo os terrenos de marinha e as terrasdevolutas. Estas não mais podem ser objeto deusucapião pro labore, em face da expressa proibiçãoconstante do parágrafo único do art. 191 daConstituição de 1988.

A posse é fundamental para a configuração daprescrição aquisitiva. Não é qualquer espécie deposse, entretanto, que pode conduzir à usucapião.Exige a lei que se revista de certas características. Aposse ad interdicta, justa, dá direito à proteçãopossessória, mas não gera a usucapião. Posse adusucapionem é a que contém os requisitos exigidospelos arts. 1.238 a 1.242 do Código Civil, sendo oprimeiro deles o ânimo de dono (animus domini ouanimus rem sibi habendi). Exigem os aludidosdispositivos, com efeito, que o usucapiente possua oimóvel “como seu”. Não tem ânimo de dono olocatário, o comodatário e todos aqueles que exercemposse direta sobre a coisa, sabendo que não lhepertence e com reconhecimento do direito dominial

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de outrem, obrigando-se a devolvê-la. Ressalve-seque é possível ocorrer a modificação do caráter daposse, quando, acompanhando a mudança davontade, sobrevém uma nova causa possessionis (cf.n. 11, retro).

O segundo requisito da posse ad usucapionemé que seja mansa e pacífica, isto é, exercida semoposição. Se o possuidor não é molestado, durantetodo o tempo estabelecido na lei, por quem tenhalegítimo interesse, ou seja, pelo proprietário, diz-seque a sua posse é mansa e pacífica. Todavia, se estetomou alguma providência na área judicial, visando aquebrar a continuidade da posse, descaracterizadafica a ad usucapionem. Providências extrajudiciaisnão significam, verdadeiramente, oposição. Se opossuidor defendeu a sua posse em juízo contrainvectivas de terceiros e evidenciou o seu ânimo dedono, não se pode falar em oposição capaz de retirarda posse a sua característica de mansa e pacífica.

Como terceiro requisito, deve a posse sercontínua, isto é, sem interrupção. O possuidor nãopode possuir a coisa a intervalos. É necessário que atenha conservado durante todo o tempo e até oajuizamento da ação de usucapião. O fato de mudar-se para outro local não significa, necessariamente,abandono da posse, se continuou comportando-secomo dono em relação à coisa. Para evitar ainterrupção da posse, em caso de esbulho, deve o

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usucapiente procurar recuperá-la imediatamente pelaforça, se ainda for possível (CC, art. 1.210, § 1º), ouingressar em juízo com a ação de reintegração deposse. O Código Civil brasileiro não prevê prazo paraque a posse seja interrompida pelo esbulho praticadopor terceiro, mas o Tribunal de Justiça de São Paulojá decidiu que, se “o esbulhado interpõe, dentro deano e dia, interdito possessório, e vence, conta-seem seu favor o tempo em que esteve privado daposse” (RF, 123:469). Se o interdito for julgado emfavor da outra parte, reconhecendo-se-lhe melhorposse, a do usucapiente será consideradadescontínua.

Embora exija a continuidade da posse, admite oCódigo Civil, no art. 1.243, que o possuidoracrescente à sua posse a dos seus antecessores,para o fim de contar o tempo exigido para ausucapião (accessio possessionis), contanto quetodas sejam contínuas, pacíficas e, nos casos do art.1.242, com justo título e de boa-fé. O possuidorpode, portanto, demonstrar que mantém posse adusucapionem por si e por seus antecessores.Ultrapassada a jurisprudência que exigia provaescrita da transmissão negocial da posse, sendoadmitida também a oral. A junção das posses podedecorrer, ainda, da successio possessionis (aquisiçãoa título universal), quando o herdeiro se reputa nacontinuação da posse do falecido (CC, art. 1.207).

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No tocante ao decurso do tempo, contam-se osanos por dias (de die ad diem), e não por horas. Oprazo começa a fluir no dia seguinte ao da posse.Não se conta o primeiro dia (dies a quo), porque énecessariamente incompleto, mas conta-se o último(dies ad quem). Para a usucapião extraordinária, éexigido o prazo de quinze anos (art. 1.238), que sereduzirá a dez anos (parágrafo único) se o possuidorhouver estabelecido no imóvel a sua moradiahabitual, ou nele realizado obras ou serviços decaráter produtivo (posse-trabalho). Para a ordinária,em que o possuidor deve ter justo título e boa-fé,basta o prazo de dez anos (art. 1.242). Será de cincoanos se o imóvel houver sido adquirido,onerosamente, com base em transcrição constantedo registro próprio, cancelada posteriormente, desdeque os possuidores nele tiverem estabelecido a suamoradia, ou realizado investimentos de interessesocial e econômico (parágrafo único).

Para a consumação da usucapião extraordinárianão se exige que o possuidor tenha justo título, nemboa-fé (CC, art. 1.238). Tal exigência também não éfeita na usucapião especial. O justo título é,entretanto, requisito indispensável para a aquisiçãoda propriedade pela usucapião ordinária (CC, art.1.242). O seu conceito encontra-se no n. 12 destaobra. O título normalmente hábil a transferir odomínio, e que se apresenta formalmente perfeito,

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provoca no adquirente a crença (opinio domini) deque se tornou dono. Não se confunde tal crença,indispensável à caracterização da usucapiãoordinária, com o animus domini, que é a vontade depossuir como dono, de ser dono, necessário para aconfiguração da usucapião extraordinária. Tem-seentendido que o justo título, para originar a crençade que se é dono, deve estar registrado no cartóriode registro imobiliário e revestido das formalidadesexternas. O compromisso de compra irretratável eirrevogável, por conferir direito real aocompromissário comprador e possibilitar aadjudicação compulsória, mesmo não registrado, éconsiderado justo título, por alguns, para os efeitosde usucapião ordinária. O Supremo Tribunal Federaljá decidiu em sentido contrário (RTJ, 97:796).Contudo, o Superior Tribunal de Justiça,posteriormente, proclamou: “Segundo ajurisprudência do STJ, não são necessários oregistro e o instrumento público, seja para o fim daSúmula 84, seja para que se requeira a adjudicação.Podendo dispor de tal eficácia, a promessa decompra e venda, gerando direito à adjudicação, geradireito à aquisição por usucapião ordinário” (RT,732:181).

O decurso do tempo, a posse de dez anos e aconcorrência dos demais requisitos mencionadosvêm sanar as eventuais irregularidades e defeitos

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desses títulos. O vício, contudo, não deve ser deforma, nem constituir nulidade absoluta. Se o título énulo, não enseja a usucapião ordinária. Sendo nulo,não é justo. Somente o título anulável não impede ausucapião ordinária, visto que é título eficaz eproduz efeitos, enquanto não se lhe decreta aanulação. Se a escritura, por exemplo, é nula por faltade assinatura do outorgante vendedor, não constituijusto título hábil à aquisição do bem pela usucapião.É óbvio que o possuidor, tendo título devidamenteregistrado, não necessitará ajuizar a ação deusucapião, após o decurso do referido prazo. Já tema sua situação jurídica definida no título. Poderásimplesmente, se algum dia vier a ser molestado porterceiro, arguir a aquisição per usucapionem, emdefesa, como o permite a Súmula 237 do SupremoTribunal Federal. Nada impede, no entanto, que tomea iniciativa de obter a declaração judicial do domínio,mediante ação de usucapião (CC, art. 1.241).

Diz-se de boa-fé a posse se o possuidor ignora ovício ou o obstáculo que lhe impede a aquisição dacoisa. Costuma ser atrelada ao justo título, embora setrate de realidade jurídica autônoma. O art. 1.201,parágrafo único, do Código Civil estabelecepresunção juris tantum de boa-fé em favor de quemtem justo título. Deve ela existir no começo da possee permanecer durante todo o decurso do prazo. Se opossuidor vem a saber da existência do vício, deixa

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de existir a boa-fé, não ficando sanada a mácula.

41.1.4. AÇÃO DE USUCAPIÃO

O possuidor com posse ad usucapionem podeajuizar ação declaratória (CC, art. 1.241), reguladapelos arts. 941 a 945 do Código de Processo Civil,sob o título de “ação de usucapião de terrasparticulares”, no foro da situação do imóvel, que seráclara e precisamente individuado na inicial. Deve oautor, além de expor o fundamento do pedido, juntarplanta da área usucapienda (CPC, art. 942). Asentença que julgá-la procedente será registrada,mediante mandado, no registro de imóveis,satisfeitas as obrigações fiscais (art. 945). Interviráobrigatoriamente em todos os atos do processo oMinistério Público.

A propositura da ação de usucapião, segundoalguns, somente é permitida a quem tem posse atualdo imóvel. Se o usucapiente, depois de consumada ausucapião, sofre esbulho e perde a posse, terá derecuperá-la pela ação publiciana, uma espécie dereivindicatória sem título, para poder, assim, ajuizar aação de usucapião e obter uma sentença favorável,que lhe servirá de título, malgrado já se tenhatornado dono desde o momento do exaurimento dolapso prescricional (CC, art. 1.238), sendo a sentençade natureza meramente declaratória.

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Predomina hoje o entendimento de que a perdaposterior da posse é irrelevante e não tem o condãode desfazer o domínio já adquirido. Admissível,neste caso, a ação de usucapião, citando-se opossuidor atual.

Quadro sinótico – Usucapião

Conceito

Usucapião é modo de aquisição dapropriedade e de outros direitos reaispela posse prolongada da coisa coma observância dos requisitos legais. Étambém chamada deaquisitiva.

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Usucapião

Espécies a)Extraordinária

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b) Ordinária

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Usucapião Espécies

c) Especial

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c)Especial

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Usucapião

Espécies

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d)Coletiva

Pressupostos

a) coisa hábil ou suscetível deusucapião;b) posse;

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Pressupostos b) posse;c) decurso do tempo;d) justo título;e) boa-fé.

Ação deusucapião

Tem natureza declaratória (CC,art. 1.241) e é regulada pelosarts. 941/945 do CPC. Deve serajuizada no foro da situação doimóvel, que será clara eprecisamente individuado nainicial. Deve o autor juntar plantada área usucapienda. Asentença que julgá-la seráregistrada, mediante mandado,no registro de imóveis.

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41.2. DO REGISTRO DO TÍTULO

No direito brasileiro não basta o contrato para atransferência ou aquisição do domínio. Por ele,criam-se apenas obrigações e direitos, segundoestatui o art. 481 do Código Civil. O domínio, porém,só se transfere pela tradição, se for coisa móvel (art.1.267) e pelo registro do título translativo, se forimóvel (art. 1.245). A relação dos atos sujeitos aregistro encontra-se na Lei dos Registros Públicos(Lei n. 6.015, de 31-12-1973, art. 167). A lei anteriorsujeitava alguns atos, como os transmissivos dapropriedade, à transcrição, e outros, como ahipoteca, à inscrição. A atual, e o novo Código Civil,usam apenas a expressão “registro”, que engloba osantigos atos de transcrição e de inscrição.

41.2.1. PRINCÍPIOS QUE REGEM OREGISTRO DE IMÓVEIS

Para proporcionar maior segurança aos negóciosimobiliários, criou o legislador um sistema deregistros públicos, informado por diversosprincípios, que garantem a sua eficácia.

O primeiro desses princípios é o da publicidade.O registro confere publicidade às transaçõesimobiliárias, valendo contra terceiros. Qualquerpessoa poderá requerer certidão de registro sem

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informar ao oficial ou ao funcionário o motivo ouinteresse do pedido (LRP, art. 17).

O segundo princípio é o da força probante (fépública) ou presunção. Os registros têm forçaprobante, pois gozam da presunção de veracidade.Presume-se pertencer o direito real à pessoa em cujonome encontra-se registrado. Trata-se de presunçãojuris tantum, sendo o adquirente tido como titular dodireito registrado, até que o contrário se demonstre,como estatui o art. 1.247 do Código Civil: “Se o teordo registro não exprimir a verdade, poderá ointeressado reclamar que se retifique ou anule”.Aduz o art. 1.245, § 2º: “Enquanto não se promover,por meio de ação própria, a decretação de invalidadedo registro, e o respectivo cancelamento, oadquirente continua a ser havido como dono doimóvel”. Adotou o Código Civil brasileiro, nesseparticular, solução intermediária, não considerandoabsoluta tal presunção (juris et de jure), como o fez odireito alemão (na Alemanha, a propriedade imóvelestá toda cadastrada), nem afastando a relevância doregistro, como o fez o direito francês, para o qual odomínio adquire-se pelo contrato, servindo oregistro apenas como meio de publicidade. Podemosdizer que a Alemanha adotou simultaneamente osprincípios da presunção e da fé pública e que oBrasil encampou somente o princípio da presunção,que prevalece até prova em contrário. No Brasil,

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apenas o registro pelo sistema Torrens (LRP, art. 277)acarreta presunção absoluta sobre a titularidade dodomínio, mas só se aplica a imóveis rurais. Assumecaráter contencioso, com citação de todos osinteressados, sendo o pedido julgado por sentença.

O princípio da legalidade pode ser mencionadoem terceiro lugar. Incumbe ao oficial do cartório, pordever de ofício, examinar a legalidade e a validadedos títulos que lhe são apresentados para registro,nos seus aspectos intrínsecos e extrínsecos. Não lhecabe, entretanto, arguir vícios do consentimento,devendo limitar-se à verificação de sua natureza, seregistrável ou não. Expressiva corrente tem, noentanto, sustentado que o oficial pode levantar todae qualquer dúvida que provenha diretamente dotítulo. Tão logo o título seja protocolizado, faz--se aprenotação, devendo o oficial examiná-lo. Se estiverem ordem, será registrado. Havendo exigência a sersatisfeita, indicá-la-á por escrito, tendo o interessadotrinta dias para a regularização. Não se conformandoo apresentante com a exigência do oficial, será otítulo, a seu requerimento e com a declaração dedúvida, remetido ao juízo competente para dirimi-la(LRP, art. 198). Neste caso, o prazo de trinta diaspermanecerá suspenso, até a solução a ser dada pelojuiz.

Suscitada a dúvida pelo oficial (suscitante), apedido do interessado, cujo procedimento é de

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jurisdição voluntária (em que o juiz administrainteresses privados), será o apresentante do título(suscitado) cientificado dos seus termos, paraimpugná-la. O Ministério Público será ouvido, e adúvida julgada, por sentença. Se procedente,poderão interpor recurso de apelação o interessado,o Ministério Público e o terceiro prejudicado. Seimprocedente, não poderá o oficial apelar, por faltade legítimo interesse, tendo-a suscitado apenas pordever de ofício. Todavia, poderão fazê-lo orepresentante do Ministério Público e o terceiroprejudicado. O recurso será endereçado ao ConselhoSuperior da Magistratura, que em São Paulo éconstituído por sete desembargadores, a saber: oPresidente do Tribunal de Justiça, o Vice-Presidente,o Corregedor-Geral da Justiça, o Presidente da SeçãoCriminal, o Presidente da Seção de Direito Privado, oPresidente da Seção de Direito Público e o Decano.Mantida a sentença de improcedência, o interessadoapresentará de novo os documentos, para que seproceda ao registro (LRP, art. 203). Quando é opróprio interessado que peticiona diretamente aojuiz, requerendo a instauração do procedimento dedúvida (passando, então, a suscitante, e o oficial asuscitado), o expediente denomina-se dúvidainversa, não prevista na Lei dos Registros Públicos,mas em geral admitida pelos juízes, por uma questãode economia processual.

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Em quarto lugar aparece o princípio daterritorialidade. É o que exige o registro nacircunscrição imobiliária da situação do imóvel. Aescritura pode ser lavrada no Cartório de Notas dequalquer localidade, mas o registro só pode serefetuado no Registro de Imóveis da situação doimóvel, o que, sem dúvida, facilita a pesquisa emtorno dos imóveis (LRP, art. 169).

Em quinto lugar figura o princípio dacontinuidade, pelo qual somente se admite o registrode um título se a pessoa que nele aparece comoalienante é a mesma que figura no registro como oseu proprietário. Assim, se “A” consta como oproprietário no registro e aliena o seu imóvel a “B”,que por sua vez o transfere a “C”, a escrituraoutorgada por “B” a “C” somente poderá serregistrada depois que “B” figurar como dono noregistro de imóveis, ou seja, apenas depois deregistrada a escritura outorgada por “A” a “B”. Esseprincípio está consagrado no art. 195 da Lei dosRegistros Públicos.

O sexto princípio é o da prioridade, que protegequem primeiro registra o seu título. A prenotaçãoassegura a prioridade do registro. Se mais de umtítulo for apresentado a registro no mesmo dia, seráregistrado aquele prenotado em primeiro lugar noprotocolo (LRP, arts. 191 e 192). Caso a parteinteressada, em trinta dias, não atenda às exigências

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formuladas pelo oficial, cessam os efeitos daprenotação, podendo ser examinado e registrado, seestiver em ordem, o título apresentado em segundolugar. Se o primeiro apresentante não se conformarcom as exigências indicadas e requerer a suscitaçãode dúvida, o prazo fica prorrogado até o julgamentodo referido procedimento.

Em sétimo lugar aponta-se o princípio daespecialidade, previsto no art. 225 da Lei dosRegistros Públicos, que exige a minuciosaindividualização, no título, do bem a ser registrado. Éo que trata dos dados geográficos do imóvel,especialmente os relativos às suas metragens econfrontações. Objetiva proteger o registro de errosque possam confundir as propriedades e causarprejuízos aos seus titulares.

Por último, pode ser mencionado o princípio dainstância, que não permite que o oficial proceda aregistros de ofício, mas somente a requerimento dointeressado, ainda que verbal (LRP, art. 13). Atémesmo a instauração de procedimento de dúvidaserá feita a requerimento do interessado (LRP, art.198).

41.2.2. MATRÍCULA, REGISTRO EAVERBAÇÃO

A atual Lei dos Registros Públicos, pretendendo

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melhor individualizar os imóveis, instituiu amatrícula, exigindo a sua realização antes doregistro, quando o imóvel sofrer a primeira alteraçãona titularidade após a sua vigência (arts. 176, § 1º, e228). Os imóveis, antes da referida lei, recebiam umnovo número de transcrição a cada alienação. Depoisda sua entrada em vigor, só conservam o antigonúmero de transcrição os imóveis que não sofreramnenhuma alteração em sua titularidade. Os que foramvendidos, doados, permutados ou transferidos porsucessão hereditária receberam um número dematrícula, por ocasião do registro do títulotranslativo (escritura pública, formal de partilha),número este que sempre os acompanhará. Asalienações posteriores serão registradas na mesmamatrícula. Esta é feita somente por ocasião doprimeiro registro, após a vigência da atual Lei dosRegistros Públicos, e o antecede. Não é a matrículaque produz a transferência da propriedade, mas sim oregistro. Se parte de um imóvel for alienada(desmembramento), constituirá ela um novo imóvel,que deverá, então, ser matriculado, recebendonúmero próprio. Pode ser requerida a fusão de doisou mais imóveis contíguos, pertencentes ao mesmoproprietário, em uma só matrícula, de novo número,encerrando-se as primitivas (art. 234).

O registro sucede à matrícula e é o ato queefetivamente acarreta a transferência da propriedade.

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O número inicial da matrícula é mantido, mas ossubsequentes registros receberão numeraçõesdiferentes, em ordem cronológica, vinculados aonúmero da matrícula-base. A averbação é qualqueranotação feita à margem de um registro, para indicaras alterações ocorridas no imóvel, seja quanto à suasituação física (edificação de uma casa, mudança denome de rua), seja quanto à situação jurídica do seuproprietário (mudança de solteiro para casado, p. ex.).Averbam-se fatos posteriores à matrícula e aoregistro, que não alteram a essência desses atos,modificando apenas as características do imóvel oudo sujeito.

41.2.3. LIVROS OBRIGATÓRIOS

São em número de cinco (LRP, art. 173). O Livron. 1 — Protocolo — serve para anotação de todosos títulos apresentados diariamente. É chamado de“a chave do registro de imóveis” ou a porta deentrada, pela qual devem passar todos os títulosregistráveis. A data do registro, para os efeitoslegais, é a da prenotação do título no protocolo,ainda que efetuado posteriormente (CC, art. 1.246). OLivro n. 2 — Registro Geral — é destinado àmatrícula e ao registro dos títulos, além de outrosatos. É nesse livro que se pratica o ato que transfereo domínio dos imóveis (registro, anteriormentechamado de transcrição). O Livro n. 3 — Registro

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Auxiliar — destina-se ao registro de atos quedevem, por lei, ser registrados, embora não sedestinem à transferência do domínio, como asconvenções antenupciais, as convenções decondomínio, as cédulas de crédito rural etc. (art. 178).Os Livros n. 4 e n. 5 funcionam como uma espécie deíndices. O n. 4 — Indicador Real — é o repositóriode todos os imóveis que figurarem nos demais livros,podendo ser localizados por seus dados ecaracterísticas. O Livro n. 5 — Indicador Pessoal —contém o nome de todas as pessoas que figuram noregistro como proprietárias, em ordem alfabética,facilitando a expedição de certidões.

41.2.4. RETIFICAÇÃO DO REGISTRO

É admissível a retificação do registro quando háinexatidão nos lançamentos, isto é, “se o teor doregistro de imóveis não exprimir a verdade” (CC, art.1.247; LRP, art. 212).

A retificabilidade, disciplinada nos arts. 212 e213 da Lei dos Registros Públicos, é um doselementos distintivos dos sistemas brasileiro ealemão. Em sua redação original, os citadosdispositivos permitiam o processamento daretificação somente perante o juiz corregedor doregistro imobiliário. Todavia, a Lei n. 10.931, de 2 deagosto de 2004, deu-lhes nova redação, permitindo

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que o pedido de retificação seja feito ao próprioOficial do Registro de Imóveis competente, nahipótese de o registro ou a averbação serem omissos,imprecisos ou não exprimirem a verdade, masfacultando ao interessado “requerer a retificação pormeio de procedimento judicial”. Enquanto omencionado art. 212 refere-se apenas a“requerimento do interessado”, o art. 213 prevêtambém ato de ofício, nas hipóteses descritas nasletras a a g do inciso I.

Foi adotado, assim, um sistema misto, ou seja,administrativo, com alguma forma decontenciosidade: na retificação de área, paraaumentá-la ou diminuí-la, ou na alteração de divisas,alienantes e confrontantes são citados e, da decisãoproferida, cabe apelação.

Quadro sinótico – Aquisição pelo registro dotítulo

Não basta ocontrato para atransferência ouaquisição do

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Introdução

aquisição dodomínio (CC, art.481). Este só setransfere pelatradição, se forcoisa móvel (art.1.267) e peloregistro do títulotranslativo, se forimóvel (art.1.245). A relaçãodos atos sujeitosa registroencontra-se naLRP (Lei n.6.015/73, art.167).

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Aquisiçãopeloregistrodo título

Princípiosqueregem oregistro deimóveis

a) dapublicidadeb) da probantepública);c) da legalidaded) daterritorialidadee) dacontinuidadef) da prioridadeg) daespecialidadeh) da instância

a) matrícula

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Atos doregistro

feita somente porocasião doprimeiro registrodo título, após avigência da atualLRP. Destina-sea individualizar osimóveis. Onúmero dematrícula sempreos acompanhará.As alienaçõesposteriores serãoregistradas namesmamatrícula;

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Atos doregistro

b) sucede àmatrícula. É oato queefetivamenteacarreta atransferência dapropriedade. Onúmero inicial damatrícula émantido, mas ossubsequentesregistrosreceberãonumeraçõesdiferentes, emordem

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Aquisiçãopeloregistrodo título

ordemcronológica,vinculados aonúmero damatrícula-base;c) averbaçãoqualqueranotação feita àmargem de umregistro, paraindicar asalteraçõesocorridas noimóvel.

a) Protocolo(Livro n. 1);

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do título

Livrosobrigatórios

b) Registro geral(Livro n. 2);c) Registroauxiliar (Livro n.3);d) Indicador real(Livro n. 4);e) Indicadorpessoal (Livro n.5).

É admissível aretificação doregistro quandohá inexatidão noslançamentos, istoé, “se o teor do

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Retificaçãodo registro

é, “se o teor doregistro deimóveis nãoexprimir averdade” (CC,art. 1.247; LRP,art. 212). Aretificação podeser feitaextrajudicialmentequando não afetedireito deterceiros.

41.3. DA ACESSÃO

É modo originário de aquisição da propriedade,criado por lei, em virtude do qual tudo o que se

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incorpora a um bem fica pertencendo ao seuproprietário. Na acessão predomina o princípiosegundo o qual a coisa acessória segue a principal.Entretanto, com relação a suas consequências,aplica-se também o princípio que veda oenriquecimento sem causa. O legislador entendeumais conveniente atribuir o domínio da coisaacessória também ao dono da principal, para evitar oestabelecimento de um condomínio forçado eindesejado, porém, ao mesmo tempo, procurou evitaro locupletamento indevido, possibilitando aoproprietário desfalcado o percebimento de umaindenização.

Pode dar-se pela formação de ilhas, aluvião,avulsão, abandono de álveo e plantações ouconstruções (CC, art. 1.248). A última é denominadaacessão industrial, por decorrer do trabalho ouindústria do homem, sendo acessão de móvel aimóvel. As demais são acessões físicas ou naturais,por decorrerem de fenômenos naturais, sendoacessões de imóvel a imóvel. A acessão de móvel amóvel será estudada adiante, no capítulo que tratada aquisição de propriedade móvel.

41.3.1. ACESSÕES FÍSICAS OU NATURAIS

A aquisição da propriedade das ilhas formadaspor força natural (acúmulo de areia e materiais

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levados pela correnteza) ocorre de acordo com suasituação ou posição no leito dos rios. As que seformam no meio do rio distribuem-se na proporçãodas testadas dos terrenos até a linha que dividir oálveo ou leito do rio em duas partes iguais; as que seformam entre essa linha e uma das margensconsideram-se acréscimos aos terrenos ribeirinhosfronteiros desse mesmo lado (CC, art. 1.249; Códigode Águas, art. 23). Interessam ao direito civil somenteas ilhas e ilhotas surgidas nos rios não navegáveis,por pertencerem ao domínio particular.

Aluvião, segundo a doutrina, é o aumentoinsensível que o rio anexa às terras, tãovagarosamente que seria impossível, em dadomomento, apreciar a quantidade acrescida. Essesacréscimos pertencem aos donos dos terrenosmarginais, segundo a regra de que o acessório segueo principal (CC, art. 1.250). O favorecido não estáobrigado a pagar indenização ao prejudicado.Nenhum particular, entretanto, pode realizar obra outrabalho para determinar o aparecimento de terrenoaluvial em seu benefício. As partes descobertas pelaretração das águas dormentes, como lagos etanques, são chamadas de aluvião impróprio, nãoconstituindo acessão.

Verifica-se a avulsão quando a força súbita dacorrente arranca uma parte considerável de umprédio, arrojando-a sobre outro (Código de Águas,

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art. 19). Porém, segundo se depreende da leitura doart. 1.251 do Código Civil, a avulsão dá-se não sópela força de corrente como ainda por qualquer forçanatural e violenta. Desse modo, pode ocorrer tambémpor superposição. Entretanto, quando a avulsão é decoisa não suscetível de aderência natural, aplica-se odisposto quanto às coisas perdidas (CC, art. 1.233;Código de Águas, art. 21), que devem ser devolvidasao dono. Na avulsão, o acréscimo passa a pertencerao dono da coisa principal. Se o proprietário doprédio desfalcado reclamar, dentro do prazodecadencial de um ano, o dono do prédio acrescido,se não quiser devolver, pagará indenização àquele.Cabe ao dono do prédio acrescido a opção:aquiescer a que se remova a parte acrescida ouindenizar o reclamante (CC, art. 1.251 e parágrafoúnico; Código de Águas, art. 20).

O Código de Águas define o álveo como “asuperfície que as águas cobrem sem transbordar parao solo natural e ordinariamente enxuto” (art. 9º). É,em suma, o leito do rio. O álveo abandonado de riopúblico ou particular pertence aos proprietáriosribeirinhos das duas margens, na proporção dastestadas, até a linha mediana daquele (CC, art. 1.252;Código de Águas, art. 10 e parágrafos). Os limitesdos imóveis confinantes não sofrem modificação seo curso d’água que serve de divisa vem a seralterado.

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41.3.2. ACESSÕES INDUSTRIAIS

As construções e plantações são chamadas deacessões industriais ou artificiais, porque derivamde um comportamento ativo do homem. A regrabásica está consubstanciada na presunção de quetoda construção ou plantação existente em umterreno foi feita pelo proprietário e à sua custa. Trata-se, entretanto, de presunção vencível, admitindoprova contrária (CC, art. 1.253). A presunção se ilidenas hipóteses mencionadas nos arts. 1.254 e s.

Se o proprietário semeia, planta ou edifica em seupróprio terreno, mas com sementes, plantas oumateriais alheios, adquire a propriedade destes, vistoque o acessório segue o principal. O que adere aosolo a este se incorpora. Entretanto, para evitar oenriquecimento sem causa, estabelece o art. 1.254 doCódigo Civil que terá de reembolsar o valor do queutilizar, respondendo ainda por perdas e danos setiver procedido de má-fé. Por outro lado, quemplanta, semeia ou edifica em terreno alheio perde, emproveito do proprietário, as sementes, plantas econstruções, mas, estando de boa-fé, tem direito àindenização (CC, art. 1.255). Se, no entanto, estiverde má-fé, o proprietário terá a opção de obrigá-lo arepor as coisas no estado anterior, retirando a p lantaou demolindo a edificação, e a pagar os prejuízos, oudeixar que permaneça, a seu benefício e sem

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indenização. Não seria justo, com efeito, que oplantador ou construtor que procedesse de má-féfosse encontrar para esta uma proteção da ordemjurídica e receber indenização pelo seu ato ilícito, emcondição melhor do que o possuidor de má-fé, quetambém nenhuma indenização recebe. “Se aconstrução ou plantação exceder consideravelmenteo valor do terreno, aquele que, de boa-fé, plantou ouedificou, adquirirá a propriedade do solo, mediantepagamento da indenização fixada judicialmente, senão houver acordo” (art. 1.255, parágrafo único).Esta última regra constitui inovação introduzida pelonovo Código Civil, caracterizando uma espécie dedesapropriação no interesse privado. Configura-se adenominada “acessão inversa”, lastreada noprincípio da função social da propriedade.

O aludido art. 1.255 somente se aplica àsconstruções e plantações, que são acessõesindustriais, e não às benfeitorias, que não são coisasnovas, mas apenas acréscimos ou melhoramentos emobras já feitas. Nas acessões, o proprietário paga ojusto valor, isto é, o valor efetivo dos materiais e damão de obra. Nas benfeitorias, estando o possuidorde má-fé, pode o proprietário optar entre o valor atuale o seu custo (CC, art. 1.222), devendo este, noentanto, ser corrigido monetariamente (STF, RTJ,70:785).

Se de ambas as partes houver má-fé, o

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proprietário adquire as sementes, plantas econstruções, mas é obrigado a ressarcir o valor dasacessões (CC, art. 1.256). À falta de elementospositivos, presume a lei, ainda, no parágrafo únicodo 1.256, a má-fé do proprietário quando o trabalhode construção ou lavoura foi realizado em suapresença e sem impugnação sua. O mesmo se aplicaquando terceiro, que não é dono das sementes,plantas ou materiais, emprega-os de boa-fé em soloalheio. Assim mesmo o proprietário os adquire, e odono das plantas ou dos materiais poderá cobrar aindenização do dono do solo quando não puderhavê-la do plantador ou construtor (art. 1.257 eparágrafo único).

Quando o valor do terreno era inferior ao daconstrução ou plantação levantada de boa-fé,entendiam alguns injusta a regra do Código Civil de1916 que determinava a sua perda em favor do donodo solo. Na jurisprudência vinha sendo acolhido oentendimento de que, se a construção invadiaterreno alheio em parte mínima e não lhe prejudicavaa utilização, o invasor não devia ser condenado ademoli-la, mas apenas a indenizar a área invadida,segundo seu justo valor (RT, 493:107 e 517:201). Onovo Código Civil, suprindo a omissão do diplomade 1916, disciplina a questão no art. 1.258, verbis: “Sea construção, feita parcialmente em solo próprio,invade solo alheio em proporção não superior à

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vigésima parte deste, adquire o construtor de boa-féa propriedade da parte do solo invadido, se o valorda construção exceder o dessa parte, e responde porindenização que represente, também, o valor da áreaperdida e a desvalorização da área remanescente”.Aduz o parágrafo único: “Pagando em décuplo asperdas e danos previstos neste artigo, o construtorde má-fé adquire a propriedade da parte do solo queinvadiu, se em proporção à vigésima parte deste e ovalor da construção exceder consideravelmente odessa parte e não se puder demolir a porção invasorasem grave prejuízo para a construção”.

A invasão pela construção de área alheiaconsiderável é disciplinada no art. 1.259 do CódigoCivil: “Se o construtor estiver de boa--fé, e a invasãodo solo alheio exceder a vigésima parte deste,adquire a propriedade da parte do solo invadido, eresponde por perdas e danos que abranjam o valorque a invasão acrescer à construção, mais o da áreaperdida e o da desvalorização da área remanescente;se de má--fé, é obrigado a demolir o que neleconstruiu, pagando as perdas e danos apurados, queserão devidos em dobro”.

Quadro sinótico – Aquisição pela acessão

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1.Conceitodeacessão

É modo originário deaquisição da propriedade,criado por lei, em virtude doqual tudo o que se incorporaa um bem fica pertencendoao seu proprietário.

2.

a)acessõesfísicas ounaturais:

— formação deilhas peloacúmulo naturalde areia emateriaislevados pelacorrenteza eocorre deacordo com suasituação ou

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2.Espécies(CC, art.1.248)

naturais:constituemfenômenosnaturais eacessõesde imóvela imóvel

situação ouposição no leitodos rios (CC,art. 1.249);— aluviãoaumentoinsensível que orio anexa àsterras, tãovagarosamenteque seriaimpossível, emdado momen-

to, apreciar aquantidadeacrescida.Esses

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a)acessões

Essesacréscimospertencem aosdonos dosterrenosmarginais,segundo a regrade que oacessório segueo principal (CC,art. 1.250);— avulsãoquando a forçasúbita dacorrente arrancauma parteconsiderável deum prédio,

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acessõesfísicas ounaturais:constituemfenômenosna-turais eacessõesde imóvela imóvel

um prédio,arrojando-asobre outro (art.1.251);— abandono deálveo, que é asuperfície queas águascobrem semtransbordarpara o solonatural eordinariamenteenxuto. O abandonadorio público ouparticular

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2.Espécies(CC, art.1.248)

particularpertence aosproprietáriosribeirinhos dasduas margens,na proporçãodas testadas,até a linhamedianadaquele (art.1.252).

As construçõese plantaçõessão chamadasde acessõesindustriais ouartificiais,

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b)acessõesindustriais

artificiais,porque derivamde umcomportamentoativo do homem.A regra básicaestáconsubstanciadana presunção deque todaconstrução ouplantaçãoexistente em umterreno foi feitapelo proprietárioe à sua custa.Trata-se, no

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entanto, depresunçãovencível,admitindo provacontrária (CC,art. 1.253). Apresunção seilide nashipótesesmencionadasnos arts. 1.245e s.

CAPÍTULO III

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DA AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE MÓVEL

42 DA USUCAPIÃO

A usucapião de coisas móveis não apresenta amesma importância da de imóveis. Prevê o CódigoCivil prazos mais reduzidos para a primeira. Adquiriráa propriedade da coisa móvel quem a possuir comosua, contínua e incontestadamente durante trêsanos, com justo título e boa-fé (CC, art. 1.260). É umaespécie de usucapião ordinária. A extraordinária (art.1.261) exige apenas posse por cinco anos,independentemente de título ou boa-fé. Aplica-se àusucapião das coisas móveis o disposto nos arts.1.243 e 1.244 (CC, art. 1.262).

43 DA OCUPAÇÃO

Ocupação é modo originário de aquisição debem móvel que consiste na tomada de posse decoisa sem dono, com a intenção de se tornar seuproprietário. Coisas sem dono são as coisas deninguém (res nullius) ou as abandonadas (resderelicta). “Quem se assenhorear de coisa sem donopara logo lhe adquire a propriedade, não sendo essa

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ocupação defesa por lei” (CC, art. 1.263). O CódigoCivil de 1916 tratava da caça, da pesca, da invenção(descoberta) e do tesoiro como modalidades deocupação.

44 DO ACHADO DO TESOURO

O Código Civil, no art. 1.264, chama de tesouro odepósito antigo de coisas preciosas, oculto e de cujodono não haja memória. Se alguém o encontrar emprédio alheio, dividir-se-á por igual entre oproprietário deste e o que o achar casualmente. Otesouro pertencerá por inteiro ao proprietário doprédio, se for achado por ele, ou em pesquisa queordenou, ou por terceiro não autorizado (art. 1.265).Praticará crime quem se apropriar da quota a que temdireito o proprietário do prédio (Código Penal, art.169).

45 DA TRADIÇÃO

Pelo sistema do Código Civil brasileiro, ocontrato, por si só, não transfere a propriedade,gerando apenas obrigações. A aquisição do domíniode bem móvel só ocorrerá se lhe seguir a tradição.Dispõe o art. 1.267 do Código Civil que “apropriedade das coisas não se transfere pelos

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negócios jurídicos antes da tradição”. Mas esta sesubentende “quando o transmitente continua apossuir pelo constituto possessório; quando cedeao adquirente o direito à restituição da coisa, que seencontra em poder de terceiro; ou quando oadquirente já está na posse da coisa, por ocasião donegócio jurídico” (parágrafo único).

A tradição pode ser real, simbólica ou ficta,como já demonstrado no n. 18 desta obra. Feita porquem não é proprietário, não alheia a propriedade,exceto se a coisa, oferecida ao público, em leilão ouestabelecimento comercial, for transferida emcircunstâncias tais que, ao adquirente de boa-fé,como a qualquer pessoa, o alienante se afigurardono. “Se o adquirente estiver de boa-fé e oalienante adquirir depois a propriedade, considera-serealizada a transferência desde o momento em queocorreu a tradição. Não transfere a propriedade atradição, quando tiver por título um negócio jurídiconulo” (CC, art. 1.268, §§ 1º e 2º).

46 DA ESPECIFICAÇÃO

Dá-se a especificação quando uma pessoa,trabalhando em matéria-prima, obtém espécie nova.De acordo com o art. 1.269 do Código Civil, a espécienova será do especificador, se a matéria era sua,

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ainda que só em parte, e não se puder restituir àforma anterior. Se não lhe pertencer e a restituição àforma anterior for impossível (como no caso deesculturas), a solução dependerá da boa ou má-fé doespecificador. Em casos de confecção de obras dearte, em que o preço da mão de obra excedaconsideravelmente o valor da matéria--prima, existe ointeresse social em preservá-la e em prestigiar otrabalho artístico. Ainda que realizada de má-fé,concede a lei a propriedade da obra de arte aoespecificador, mas, neste caso, sujeita-o a indenizar ovalor da matéria-prima e a pagar eventuais perdas edanos.

47 DA CONFUSÃO, DA COMISTÃO E DAADJUNÇÃO

Confusão é a mistura de coisas líquidas;comistão, a mistura de coisas sólidas ou secas; eadjunção, a justaposição de uma coisa a outra. Se ascoisas pertencem a donos diversos e forammisturadas sem o consentimento deles, continuam apertencer-lhes, sendo possível separar a matéria-prima sem deterioração. Não o sendo, ou exigindo aseparação dispêndio excessivo, subsiste indiviso otodo. A espécie nova pertencerá aos donos damatéria-prima, cada qual com o seu quinhão

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proporcional ao valor do seu material. Entretanto, seuma das coisas puder ser considerada principal emrelação às outras, a propriedade da espécie nova seráatribuída ao dono da coisa principal, tendo este,contudo, a obrigação de indenizar os outros.

Quadro sinótico – Aquisição da propriedademóvel

1. Usucapião

1) ordináriapropriedade da coisamóvel quem a possuircomo sua, contínua eincontestadamentedurante três anos, comjusto título e boa-fé(CC, art. 1.260).2) extraordináriaapenas posse por cinco

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Modosdeaquisição

apenas posse por cincoanos,independentemente detítulo ou boa-fé. Aplica-se à usucapião dascoisas móveis odisposto nos arts.1.243 e 1.244 (CC, art.1.262).

2. Ocupação

Ocupaçãooriginário de aquisiçãode bem móvel queconsiste na tomada deposse de coisa semdono, com a intençãode se tornar seuproprietário. Dispõe o

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2. Ocupação proprietário. Dispõe oart. 1.263 do CC:“Quem se assenhorearde coisa sem dono paralogo lhe adquire apropriedade, não sendoessa ocupação defesapor lei”.

3. Achado detesouro

Tesouroantigo de coisaspreciosas, oculto e decujo dono não hajamemória. Se alguém oencontrar em prédioalheio, dividir-se-á porigual entre oproprietário deste e o

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proprietário deste e oque o acharcasualmente (CC, art.1.264).

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Modosdeaquisição

4. Tradição

Noção

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Espécies

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5.Especificação

Dá-se a quando uma pessoa,trabalhando emmatéria-prima, obtémespécie nova. Aespécie nova será doespecificador, se amatéria era sua, aindaque só em parte, e nãose puder restituir àforma anterior (CC, art.1.269).

6. Confusão,

— confusãode coisas líquidas;— comistãode coisas sólidas ou

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comistão eadjunção

de coisas sólidas ousecas;— adjunçãojustaposição de umacoisa a outra.

CAPÍTULO IVDA PERDA DA PROPRIEDADE

48 INTRODUÇÃO

O direito de propriedade, sendo perpétuo, sópoderá ser perdido pela vontade do dono (alienação,renúncia, abandono) ou por alguma outra causalegal, como o perecimento, a usucapião, adesapropriação etc. O simples não uso, sem ascaracterísticas de abandono, não determina a suaperda, se não foi usucapido por outrem, ainda que se

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passem mais de quinze anos. O art. 1.275 do CódigoCivil enumera alguns casos de perda da propriedade:a alienação, a renúncia, o abandono, o perecimento ea desapropriação. Os três primeiros são modosvoluntários, sendo o perecimento e a desapropriaçãomodos involuntários de perda da propriedade. Aenumeração do art. 1.275 é meramenteexemplificativa, referindo-se à existência, no Código,de outras causas de extinção, como a usucapião e aacessão.

49 MODOS

Dá-se a alienação por meio de contrato(negócio jurídico bilateral), pelo qual o titulartransfere a propriedade a outra pessoa. Pode ser atítulo oneroso, como na compra e venda, ou a títulogratuito, como na doação. Em qualquer caso, osefeitos da perda da propriedade imóvel serãosubordinados ao registro do título transmissivo (art.1.275, parágrafo único).

A renúncia é ato unilateral, pelo qual o titularabre mão de seus direitos sobre a coisa, de formaexpressa. O ato renunciativo de imóvel deve tambémser registrado no Registro de Imóveis competente(art. 1.275, parágrafo único). Exige-se a escriturapública para a “renúncia de direitos reais sobre

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imóveis de valor superior a trinta vezes o maiorsalário mínimo vigente no País” (CC, art. 108).Também a renúncia à sucessão aberta deve constarexpressamente de instrumento público ou ser tomadapor termo nos autos, conforme dispõe o art. 1.806 domesmo diploma.

O abandono também é ato unilateral, pelo qual otitular abre mão de seus direitos sobre a coisa. Nessecaso, não há manifestação expressa. Pode ocorrer,por exemplo, quando o proprietário não tem meios depagar os impostos que oneram o imóvel. A condutado proprietário caracteriza-se, no abandono, pelaintenção (animus) de não mais ter a coisa para si.Abandonado o imóvel, qualquer pessoa pode deleapossar-se. Todavia, se for arrecadado como coisavaga pelo Município ou pelo Distrito Federal, por seachar nas respectivas circunscrições, permanecerácomo coisa de ninguém durante três anos contadosda arrecadação, se estiver em zona urbana. “O imóvelsituado na zona rural, abandonado nas mesmascircunstâncias, poderá ser arrecadado, como bemvago, e passar, três anos depois, à propriedade daUnião, onde quer que ele se localize.” Há, portanto, apossibilidade de o proprietário arrepender-se nodecurso do referido prazo. Presumir-se-á de modoabsoluto a intenção de não mais conservar o imóvelem seu patrimônio quando, cessados os atos deposse, deixar o proprietário de satisfazer os ônus

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fiscais (art. 1.276, caput, e §§ 1º e 2º).A perda pelo perecimento da coisa decorre da

perda do objeto. Perde-se a propriedade imóvelmediante desapropriação nos casos expressos naConstituição Federal. Trata-se de modo involuntáriode perda do domínio.

Quadro sinótico – Perda da propriedade

Perda dapropriedade

1.Modos

Voluntários

Involuntários

2. Enumeração

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2. Enumeraçãomera-menteexemplificativa (CC,art. 1.275)

2. Enumeração

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Perda dapropriedade

2. Enumeraçãomeramenteexemplificativa (CC,art. 1.275)

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CAPÍTULO VDOS DIREITOS DE VIZINHANÇA

50 INTRODUÇÃO

As regras que constituem o direito de vizinhançadestinam-se a evitar e a compor eventuais conflitosde interesses entre proprietários de prédioscontíguos. Em geral, as limitações são impostascomo obrigação de permitir a prática de certos atospelo vizinho e de se abster da prática de outros. Osdireitos de vizinhança emanam da lei. Suas normasconstituem direitos e deveres recíprocos. São, ainda,obrigações propter rem, que acompanham a coisa,vinculando quem quer que se encontre na posiçãode vizinho, transmitindo-se ao seu sucessor a títuloparticular.

51 DO USO ANORMAL DA PROPRIEDADE

51.1. ESPÉCIES DE ATOS NOCIVOS

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O art. 1.277 do Código Civil estabeleceu umpreceito genérico sobre o mau uso da propriedade,em termos claros e apropriados. As interferências ouatos prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúdecapazes de causar conflitos de vizinhança podem serclassificados em três espécies: ilegais, abusivos elesivos.

Ilegais são os atos ilícitos, que obrigam àcomposição do dano, nos termos do art. 186 doCódigo Civil, como, por exemplo, atear fogo noprédio vizinho. Ainda que não existisse o art. 1.277, oprejudicado estaria protegido pela norma do art. 186,que lhe garante o direito à indenização. Abusivos sãoos que, embora o causador do incômodo semantenha nos limites de sua propriedade, mesmoassim vem a prejudicar o vizinho, muitas vezes sob aforma de barulho excessivo. A teoria do abuso dedireito é, hoje, acolhida em nosso direito, como seinfere do art. 187 do Código Civil, que permiteconsiderar ilícitos os atos praticados no exercícioirregular de um direito. São lesivos os que causamdano ao vizinho, embora o agente não esteja fazendouso anormal de sua propriedade e a atividade tenhasido até autorizada por alvará expedido pelo PoderPúblico. É o caso, por exemplo, de uma indústria cujafuligem esteja prejudicando ou poluindo o ambiente,embora normal a atividade.

Os atos ilegais e abusivos estão abrangidos pela

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norma do art. 1.277, pois neles há o uso anormal dapropriedade. O aludido dispositivo confere não só aoproprietário como também ao possuidor o direito defazer cessar as interferências ilegais ou abusivasprovocadas pela utilização da propriedade vizinha,em detrimento de sua segurança, de seu sossego ede sua saúde. Uso anormal é tanto o ilícito como oabusivo, em desacordo com sua finalidadeeconômica ou social, a boa-fé ou os bons costumes.Para se aferir a normalidade ou a anormalidade dautilização de um imóvel procura-se: a) verificar aextensão do dano ou do incômodo causado. Se, nascircunstâncias, este se contém no limite do tolerável,não há razão para reprimi-lo. Com efeito, a vida emsociedade impõe às pessoas a obrigação de suportarcertos incômodos, desde que não ultrapassem oslimites do razoável e do tolerável; b) examinar a zonaonde ocorre o conflito, bem como os usos ecostumes locais. Não se pode apreciar com osmesmos padrões a normalidade do uso dapropriedade em um bairro residencial e em umindustrial, em uma cidade tranquila do interior e emuma capital. O parágrafo único do art. 1.277determina que se considere “a natureza da utilização,a localização do prédio, atendidas as normas quedistribuem as edificações em zonas, e os limitesordinários de tolerância dos moradores davizinhança”; c) considerar a anterioridade da posse,

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pois em princípio não teria razão para reclamar quemconstruísse nas proximidades de estabelecimentosbarulhentos ou perigosos. É o que sustenta a teoriada pré-ocupação. Por ela, aquele que primeiramentese instala em determinado local acaba, de certomodo, estabelecendo a sua destinação. Tal teorianão pode, entretanto, ser aceita em todos os casos esem reservas. Se o barulho é demasiado ou se a leiproíbe o incômodo, o proprietário não pode valer-seda anterioridade de seu estabelecimento paracontinuar molestando o próximo.

Os bens tutelados pelo art. 1.277 são asegurança, o sossego e a saúde. Assim, constituiráofensa à segurança pessoal, ou dos bens, aexploração de indústrias de explosivos e inflamáveis,a provocação de fortes trepidações etc.; ao sossego,os ruídos exagerados em geral; e, à saúde,emanações de gases tóxicos, depósito de lixo etc. Odecoro não está abrangido por esse artigo. Dessemodo, o proprietário ou o possuidor de um prédionão têm como impedir que prostitutas se instalemnos apartamentos, desde que não perturbem osossego dos demais moradores.

51.2. SOLUÇÕES PARA A COMPOSIÇÃO DOSCONFLITOS

Na doutrina e na jurisprudência são alvitradas

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soluções para a composição dos conflitos devizinhança. Em resumo: a) se o incômodo é normal,tolerável, não deve ser reprimido. A reclamação davítima será aferida segundo o critério do homomedius. Só serão atendidas reclamações relativas adanos considerados insuportáveis ao homemnormal; b) se o dano for intolerável, deve o juiz,primeiramente, determinar que seja reduzido aproporções normais, fixando horários defuncionamento (somente durante o dia, p. ex.),exigindo a colocação de aparelhos de controle dapoluição, levantando barreiras de proteção etc.Preceitua, com efeito, o art. 1.279 do Código Civil:“Ainda que por decisão judicial devam ser toleradasas interferências, poderá o vizinho exigir a suaredução, ou eliminação, quando estas se tornarempos s íveis ”; c) se não for possível reduzir oincômodo a níveis suportáveis, por meio de medidasadequadas, então determinará o juiz a cessação daatividade, fechando a indústria ou o estabelecimentoou até demolindo a obra, se forem de interesseparticular; d) se, no entanto, a causadora doincômodo for indústria ou qualquer atividade deinteresse social, não se determinará o seufechamento ou a cessação da atividade. Se oincômodo não puder ser reduzido aos graus detolerabilidade mediante medidas adequadas, seráimposto ao causador do dano a obrigação de

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indenizar o vizinho (CC, art. 1.278).A ação apropriada para a tutela dos direitos

mencionados é a cominatória, na qual se imporá aoréu a obrigação de se abster da prática dos atosprejudiciais ao vizinho, ou a de tomar as medidasadequadas para a redução do incômodo, sob pena depagamento de multa diária, com base nos arts. 287,461, § 4º, e 644 do Código de Processo Civil. Pode aação ser ajuizada pelo proprietário, pelocompromissário comprador titular de direito real oupelo possuidor. Se há dano consumado, cabível aação de ressarcimento de danos.

Prescreve, ainda, o art. 1.280 do Código Civil que“o proprietário ou o possuidor tem direito a exigir dodono do prédio vizinho a demolição, ou a reparaçãodeste, quando ameace ruína, bem como que lhepreste caução pelo dano iminente”. Cuida-se, ainda,de uso anormal da propriedade, pois a ameaça dedesabamento de prédio em ruína constituinegligência do proprietário. O vizinho ameaçadopode, simplesmente, forçar a reparação, exigindo quea outra parte preste, em juízo, caução pelo danoiminente (CPC, arts. 826/838). Essa caução pelo danoiminente é chamada de “caução de dano infecto” (cf.n. 36.2, retro), mas pode o prejudicado preferir moveração cominatória contra o proprietário negligente, emforma de ação demolitória, ou para exigir a reparaçãodo prédio em ruínas. O proprietário ou o possuidor

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de um prédio, em que alguém tenha direito de fazerobras, pode, no caso de dano iminente, exigir doautor delas as necessárias garantias contra oprejuízo eventual (CC, art. 1.281).

52 DAS ÁRVORES LIMÍTROFES

“A árvore, cujo tronco estiver na linhadivisória, presume-se pertencer em comum aosdonos dos prédios confinantes” (CC, art. 1.282).Institui-se, assim, a presunção de condomínio, queadmite, no entanto, prova em contrário. A árvore quenão tem seu tronco na linha divisória pertence aodono do prédio em que ele estiver.

Sendo comum a árvore, os frutos e o troncopertencem a ambos os proprietários. Não pode umdos confrontantes arrancá-la sem o consentimentodo outro. Se a sua presença estiver causandoprejuízo e não obtiver o consentimento do vizinho,deverá recorrer ao Judiciário. Com relação aos frutosque caírem naturalmente, aplica-se a regra do art.1.284 do Código Civil: pertencem ao dono do soloonde tombarem, se este for de propriedade particular.Tal regra constitui exceção ao princípio de que oacessório segue o principal, adotado no art. 1.232 domesmo diploma. Todavia, se caírem em umapropriedade pública, o proprietário continuará sendo

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o seu dono, cometendo furto quem deles seapoderar.

53 DA PASSAGEM FORÇADA

O art. 1.285 do Código Civil assegura aoproprietário de prédio que se achar encravado, semacesso a via pública, nascente ou porto, o direito de,mediante pagamento de indenização, constranger ovizinho a lhe dar passagem, cujo rumo serájudicialmente fixado, se necessário. O imóvelencravado não pode ser explorado economicamentee deixará de ser aproveitado, por falta decomunicação com a via pública. O instituto dapassagem forçada atende, pois, ao interesse social. Odireito é exercitável contra o proprietário contíguo e,se necessário, contra o vizinho não imediato.

O direito de exigir do vizinho que lhe deixepassagem só existe quando o encravamento énatural e absoluto. Não pode ser provocado peloproprietário. Não pode este vender a parte do terrenoque lhe dava acesso à via pública e, depois,pretender que outro vizinho lhe dê passagem. Nessecaso, e porque nenhum imóvel deve permanecerencravado, poderá voltar-se somente contra oadquirente do terreno em que existia a passagem (RT,499:74). Da mesma forma, o adquirente da parte que

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ficou encravada pelo desmembramento voluntário sópode exigir passagem do alienante (RT, 363:224). Apropósito, preceitua o Código Civil: “Se ocorreralienação parcial do prédio, de modo que uma daspartes perca o acesso a via pública, nascente ouporto, o proprietário da outra deve tolerar apassagem”. Aplica-se tal regra “ainda quando, antesda alienação, existia passagem através de imóvelvizinho, não estando o proprietário desteconstrangido, depois, a dar uma outra” (art. 1.285, §§2º e 3º).

Não se considera encravado o imóvel que tenhaoutra saída, ainda que difícil e penosa. Razões decomodidade não são atendidas, para obrigar ovizinho a suportar a passagem por seu imóvel. Taldireito equivale a uma desapropriação no interesseparticular, pois o proprietário do prédio onerado coma passagem tem direito a indenização cabal,expressamente prevista no art. 1.285 do Código Civil.E, se o proprietário do prédio encravado perder, porculpa sua (não uso), o direito de trânsito pelosprédios contíguos, terá de novamente pleiteá-lo,sujeitando-se a arbitramento novo e atual daretribuição pecuniária. Não havendo acordo entre osinteressados, a fixação da passagem, em qualquercaso, será feita judicialmente (art. 1.285). Deverá ojuiz, então, impor o menor ônus possível ao prédioserviente. Havendo vários imóveis, escolherá aquele

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que menor dano sofrerá com a imposição do encargo(RT, 491:177). Dispõe, com efeito, o art. 1.285, § 1º,do Código Civil: “Sofrerá o constrangimento ovizinho cujo imóvel mais natural e facilmente seprestar à passagem”. Extingue-se a passagemforçada e desaparece o encravamento em casos, porexemplo, de abertura de estrada pública queatravessa ou passa ao lado de suas divisas, ouquando é anexado a outro, que tem acesso para a viapública (RT, 376:218).

Servidão de passagem ou de trânsito constituidireito real sobre coisa alheia e não se confunde compassagem forçada, ora estudada e pertencente aodireito de vizinhança. Esta decorre da lei, tendo afinalidade de evitar que um prédio fique semdestinação ou utilização econômica. Ocorrendo ahipótese, o dono do prédio encravado pode exigir apassagem, mediante o pagamento da indenizaçãoque for judicialmente arbitrada. A servidão, noentanto, constitui direito real sobre coisa alheia egeralmente nasce de um contrato, nãocorrespondendo necessariamente a um imperativodeterminado pela situação dos imóveis, mas àsimples conveniência e comodidade do dono de umprédio não encravado que pretende umacomunicação mais fácil e próxima.

54 DA PASSAGEM DE CABOS E

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TUBULAÇÕES

O proprietário é, igualmente, obrigado a tolerar,mediante recebimento de indenização que atendatambém à desvalorização da área remanescente, apassagem, através de seu imóvel, de cabos,tubulações e outros condutos subterrâneos deserviços de utilidade pública (luz, água, esgoto, p.ex.), em proveito de proprietários vizinhos, quandode outro modo for impossível ou excessivamenteonerosa. “O proprietário prejudicado pode exigir quea instalação seja feita de modo menos gravoso aoprédio onerado, bem como, depois, seja removida, àsua custa, para outro local do imóvel” (CC, art. 1.286e parágrafo único).

“Se as instalações oferecerem grave risco, seráfacultado ao proprietário do prédio onerado exigir arealização de obras de segurança” (art. 1.287).

55 DAS ÁGUAS

O Código Civil disciplina a utilização deaqueduto ou canalização das águas no art. 1.293,permitindo a todos canalizar pelo prédio de outrem aságuas a que tenham direito, mediante préviaindenização a seu proprietário, não só para asprimeiras necessidades da vida como também para os

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serviços da agricultura ou da indústria, escoamentode águas supérfluas ou acumuladas, ou a drenagemde terrenos.

O art. 1.290 do aludido diploma prevê o direito àssobras das águas nascentes e das águas pluviais.Trata-se da servidão das águas supérfluas, pela qualo prédio inferior pode adquirir sobre as sobras umaservidão destinada a usos domésticos, bebedouro degado e a outras finalidades, especialmente asagrícolas. Os prédios inferiores são obrigados areceber as águas que correm naturalmente dossuperiores. Se o dono do prédio superior fizer obrasde arte para facilitar o escoamento, procederá demodo que não piore a condição natural e anterior dooutro (art. 1.288). “Quando as águas, artificialmentelevadas ao prédio superior, ou aí colhidas, correremdele para o inferior, poderá o dono deste reclamarque se desviem, ou se lhe indenize o prejuízo quesofrer. Da indenização será deduzido o valor dobenefício obtido” (art. 1.289 e parágrafo único).

“O possuidor do imóvel superior não poderápoluir as águas indispensáveis às primeirasnecessidades da vida dos possuidores dos imóveisinferiores; as demais, que poluir, deverá recuperar,ressarcindo os danos que estes sofrerem, se não forpossível a recuperação ou o desvio do cursoartificial das águas” (art. 1.291). “O proprietário temdireito de construir barragens, açudes, ou outras

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obras para represamento de água em seu prédio; seas águas represadas invadirem prédio alheio, será oseu proprietário indenizado pelo dano sofrido,deduzido o valor do benefício obtido” (art. 1.292).

O Código de Águas (Dec. n. 24.643, de 10-7-1934), mais amplo, aplica-se às questões decorrentesda utilização das águas no que não contrariar asnormas do Código Civil.

56 DOS LIMITES ENTRE PRÉDIOS E DODIREITO DE TAPAGEM

Estabelece o Código Civil regras parademarcação dos limites entre prédios, dispondo queo proprietário “pode constranger o seu confinante aproceder com ele à demarcação entre os dois prédios,a aviventar rumos apagados e a renovar marcosdestruídos ou arruinados, repartindo-seproporcionalmente entre os interessados asrespectivas despesas” (art. 1.297, caput, 2ª parte).

A ação apropriada é a demarcatória (CPC, arts.946/966). O que caracteriza a demarcação comodireito de vizinhança é o fato de repartirem-seproporcionalmente entre os interessados asrespectivas despesas. Somente se admite a açãodemarcatória quando há confusão de limites na linhadivisória. Se existem limites há longo tempo

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respeitados, ainda que não correspondam aos títulosdominiais, ou muro divisório construído fora dalinha, não cabe a referida ação, que não se confundecom a reivindicatória nem com as açõespossessórias. Se o autor pretende também obterrestituição de áreas invadidas ou usurpadas, devecumulá-la com a possessória ou a reivindicatória (RT,453:83). Sendo confusos, os limites, em falta deoutro meio, determinar-se-ão de conformidade com aposse justa; e, não se achando ela provada, dividir-se-á o terreno contestado por partes iguais entre osprédios, ou, não sendo possível a divisão cômoda,adjudicar-se-á a um deles, mediante indenização aooutro (CC, art. 1.298).

A lei concede ao proprietário o direito de cercar,murar, valar ou tapar de qualquer modo o seu prédio,quer seja urbano, quer rural (CC, art. 1.297, caput, 1ªparte). Na expressão “tapume” incluem-se os muros,cercas, sebes vivas, gradis ou quaisquer outrosmeios de separação dos terrenos. Presume-se, atéprova em contrário, “pertencer a ambos osproprietários confinantes, sendo estes obrigados, deconformidade com os costumes da localidade, aconcorrer, em partes iguais, para as despesas de suaconstrução e conservação” (art. 1.297, § 1º). Essapresunção, contudo, é relativa e admite prova emcontrário.

Tem-se entendido que a divisão das despesas

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deve ser previamente convencionada. À falta deacordo, o proprietário interessado na construção daobra deve obter o reconhecimento judicial daobrigação do confinante de contribuir para aconstrução do tapume, se a construção decorrer deexigência administrativa constante de lei ouregulamento. O proprietário que já tenha fechado oseu terreno por outra forma (cerca de arame ou debambus, p. ex.) não está obrigado a levantar tapumeespecial, a não ser que o exijam as posturasmunicipais (RT, 499:193). Somente existe a obrigaçãodo vizinho de participar das despesas quando secogita de tapume destinado a evitar a passagem deanimais de grande porte, como o gado vacum,cavalar e muar. Quanto aos tapumes especiais,destinados à vedação de animais de pequeno porte(aves domésticas, cabritos, porcos e carneiros), ou aadorno da propriedade ou sua preservação, entende-se que a sua construção, conservação e utilizaçãocabem unicamente ao interessado, que provocou anecessidade deles (art. 1.297, § 3º), ou seja, ao donodesses animais, que poderá ser responsabilizado senão os construir e os animais causarem danos.

57 DO DIREITO DE CONSTRUIR

57.1. LIMITAÇÕES E RESPONSABILIDADES

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Pode o proprietário levantar em seu terreno asconstruções que lhe aprouver, salvo o direito dosvizinhos e os regulamentos administrativos (CC, art.1.299). As limitações de ordem pública são impostaspelos regulamentos administrativos e geralmenteintegram os códigos de posturas municipais. Já aslimitações de direito privado constituem as restriçõesde vizinhança, consignadas em normas civis ouresultantes de convenções particulares. Assim, todoproprietário é obrigado a ressarcir o dano que aconstrução causar ao seu vizinho. Não só pela regrageral do art. 186, como pela específica do art. 1.299,ambos do Código Civil. Este dispositivo protege osvizinhos contra quaisquer danos decorrentes deconstrução.

A ação mais comum entre vizinhos é a deindenização. Para a obtenção do ressarcimento bastaa prova do dano e da relação de causalidade entre odano e a construção vizinha, sendo desnecessária ademonstração de culpa do agente. Aresponsabilidade pelos danos causados a vizinhosem virtude de construção é objetiva,independentemente de culpa de quem quer que seja,decorrendo exclusivamente da lesividade ou danocividade do fato da construção. Os prejuízos hãode ser ressarcidos por quem os causa e por quemaufere os proveitos da construção, sendo solidária aobrigação do dono da obra e do engenheiro que a

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executa (RT, 400:161; RJTJSP, 48:61). Desde que aconstrução civil passou a ser uma atividadelegalmente regulamentada, e se tornou privativa deprofissionais habilitados e de empresas autorizadas aexecutar trabalhos de engenharia e arquitetura,tornaram-se os construtores, os arquitetos ou asociedade autorizada a construir responsáveistécnica e economicamente pelos danos daconstrução perante vizinhos, em solidariedade com oproprietário que encomenda a obra. Se, entretanto, oproprietário pagar sozinho a indenização, poderámover ação regressiva contra o construtor, se osdanos decorreram de imperícia ou de negligência desua parte. Podem, ainda, ser utilizadas, parasolucionar conflitos de vizinhança decorrentes deconstrução, ação demolitória (CC, arts. 1.280 e 1.312),cominatória, de nunciação de obra nova, de cauçãode dano infecto (v. n. 36.2, retro), possessória etc.

57.2. DEVASSAMENTO DA PROPRIEDADEVIZINHA

Prescreve o art. 1.301 do Código Civil que édefeso “abrir janelas, ou fazer eirado, terraço ouvaranda, a menos de metro e meio do terrenovizinho”. Nesse caso, o proprietário lesado podeembargar a construção, mediante o embargo de obranova (CPC, art. 934, I). A finalidade dessa servidão

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negativa é preservar a intimidade das famílias,resguardando-as da indiscrição dos vizinhos. Conta-se a distância de metro e meio da linha divisória enão do edifício vizinho. O § 2º do art. 1.301,entretanto, exclui da proibição as aberturas para luzou ventilação, não maiores de dez centímetros delargura sobre vinte de comprimento e construídas amais de dois metros de altura de cada piso, pois taisvãos dificultam, pelas pequenas dimensões e pelaaltura, a observação do que se passa no vizinho.

A jurisprudência tem interpretadorestritivamente o art. 573 do Código Civil de 1916,correspondente ao art. 1.301 do novo diploma.Assim, tem-se admitido a abertura de janelas a menosde metro e meio, quando entre os prédios existe muroalto (RT, 495:51). Tem-se entendido que portaspodem ser abertas a menos de metro e meio, uma vezque o mencionado dispositivo só se refere a janela,eirado, terraço ou varanda, não aludindo a portas(RT, 491:72). Igualmente se tem admitido aconstrução de janelas a menos de metro e meio se seapresentam tapadas com caixilhos não basculantes,mas fixos com vidros opacos e que não permitam odevassamento, com base na Súmula 120 do STF. Já aSúmula 414 desse Sodalício estabelece: “Não sedistingue a visão direta da oblíqua, na proibição deabrir janela, ou de fazer eirado, ou varanda, a menosde metro e meio do prédio de outrem”. Contudo,

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preceitua o § 1º do art. 1.301 do Código Civil: “Asjanelas cuja visão não incida sobre a linha divisória,bem como as perpendiculares, não poderão serabertas a menos de setenta e cinco centímetros”.

Se as aberturas para luz tiverem dimensãosuperior a dez centímetros de largura sobre vinte decomprimento, serão consideradas janelas e caberá aoproprietário prejudicado impugná-las dentro do prazode ano e dia. Dispõe o art. 1.302 do Código Civil queo proprietário “pode, no lapso de ano e dia após aconclusão da obra, exigir que se desfaça janela,sacada, terraço ou goteira sobre o seu prédio;escoado o prazo, não poderá, por sua vez, edificarsem atender ao disposto no artigo antecedente, nemimpedir, ou dificultar, o escoamento das águas dagoteira, com prejuízo para o prédio vizinho”.Acrescenta o parágrafo único: “Em se tratando devãos, ou aberturas para luz, seja qual for aquantidade, altura e disposição, o vizinho poderá, atodo tempo, levantar a sua edificação, oucontramuro, ainda que lhes vede a claridade”. Nestecaso não nasce, pois, para o infrator servidão de luzpor usucapião a prazo reduzido, pois o proprietáriodo prédio poderá construir junto à divisa, ainda quea construção vede a claridade (TJSP, RT, 506:71). Nazona rural, não se pode edificar a menos de trêsmetros do terreno vizinho (art. 1.303). Frise-se, porfim, que a jurisprudência tem admitido também as

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claraboias e janelas bem altas, colocadas a uma alturatal que torne impossível observar a propriedadevizinha.

57.3. ÁGUAS E BEIRAIS

O proprietário edificará de maneira que seuprédio não despeje águas, diretamente, sobre oprédio vizinho (CC, art. 1.300), deixando entre este eo beiral, quando por outro modo não o possa evitar,um intervalo de dez centímetros, quando menos, demodo que as águas se escoem (Código de Águas,art. 105). Não pode, portanto, construir de modo queo beiral de seu telhado despeje sobre o vizinho. Aságuas pluviais devem ser despejadas no solo dopróprio dono do prédio, e não no do vizinho. Emboraesteja este obrigado a receber as águas que corremnaturalmente para o seu prédio, não pode sercompelido a suportar as que ali fluam artificialmente,por meio de calhas ou beirais. Depreende-se, da partefinal do dispositivo supratranscrito, que se oproprietário colocar calhas que recolham as goteiras,impedindo que caiam na propriedade vizinha, poderáencostar o telhado na linha divisória.

57.4. PAREDES DIVISÓRIAS

O Código Civil trata das questões referentes aparedes divisórias (parede-meia), hoje de reduzida

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importância, nos arts. 1.304 a 1.307. Paredesdivisórias são as que integram a estrutura doedifício, na linha de divisa. Distinguem-se dos murosdivisórios, que são regidos pelas disposiçõesreferentes aos tapumes. Muro é elemento devedação, enquanto parede é elemento desustentação e vedação.

No tocante ao assentamento da parede divisória,o art. 1.305 do Código Civil abre ao proprietário queprimeiro edificar a seguinte alternativa: assentar aparede somente no seu terreno, ou assentá-la, atémeia espessura, no terreno vizinho. Na primeirahipótese, a parede pertencer-lhe-á, inteiramente; nasegunda, será de ambos. Nas duas hipóteses, osvizinhos podem usá-la livremente. O dono do terrenoinvadido tem o direito de travejá-la. Se o fizer, aqueleque a construiu pode cobrar metade de seu valor.Enquanto não a travejar, pode, se o desejar, e nostermos do art. 1.328, adquirir meação nela. Porém,após havê-la travejado, não tem mais opção, poisquem a construiu pode exigir o pagamento dameação.

57.5. USO DO PRÉDIO VIZINHO

Dispõe o art. 1.313 do Código Civil que oproprietário ou ocupante do imóvel é obrigado atolerar que o vizinho entre no prédio, mediante aviso-

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prévio, para “dele temporariamente usar, quandoindispensável à reparação, construção, reconstruçãoou limpeza de sua casa ou do muro divisório”, e“apoderar-se de coisas suas, inclusive animais que aíse encontrem casualmente”. Uma vez entregues ascoisas buscadas pelo vizinho, poderá ser impedida asua entrada no imóvel (§ 2º). Aplica-se o disposto noreferido dispositivo aos casos de limpeza oureparação de esgotos, goteiras, aparelhos higiênicos,poços e nascentes e ao aparo de cerca viva (§ 1º). Sedo exercício do mencionado direito provier dano, teráo prejudicado direito a ressarcimento (§ 3º).

Muitas vezes, o proprietário tem necessidade depenetrar no imóvel vizinho, para proceder aosserviços mencionados no art. 1.313. Tem direito defazê-lo, desde que avise previamente o vizinho. Este,quando muito, poderá fazer restrições quanto ahorários, disciplinando-os. Todavia, o que tiver depenetrar no imóvel confinante fica obrigado, por lei, areparar o dano que porventura causar.

Quadro sinótico – Dos direitos de vizinhança

As regras que constituem odireito de vizinhança

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1.Introdução

direito de vizinhançadestinam--se a evitar e acompor eventuais conflitosde interesses entreproprietários de prédioscontíguos. São obrigaçõespropter rem, queacompanham a coisa,vinculando quem quer que seencontre na posição devizinho, transmitindo- -se aoseu sucessor a títulosingular.

Espéciesde atosnocivos

a) ilegais;b) abusivos;c) lesivos.

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2. Usoanormal dapropriedade

Critériospara seaferir anormalidade

a) verificar seo incômodocausado secontém ou nãono limite dotolerávelb) examinar azona ondeocorre conflito,bem como osusos ecostumeslocais;c) consideraraanterioridadeda posse (

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da posse (ocupação

Soluçõespara acomposiçãodosconflitos

— se oincômodo étoleráveldeve serreprimido;

— se o danofor intoleráveldeve o juiz,primeiramente,determinarque sejareduzido aproporções

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2. Usoanormal dapropriedade

Soluçõespara acomposiçãodosconflitos

proporçõesnormais (CC,art. 1.279);— se não forpossível aredução,entãodeterminará ojuiz acessação daatividadefor interesseparticular— se aatividadedanosa for deinteresse

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interessesocialdeterminará asua cessação,mas se imporáao seuresponsável aobrigação deindenizarvizinho (CC,art. 1.278).

3. Dasárvores

A árvore, cujo tronco estiverna linha divisória, presume-se pertencer em comum aosdonos dos prédiosconfinantes (CC, art. 1.282).

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limítrofes Institui-se, assim, apresunção de condomínio,que admite, no entanto,prova em contrário.

O CC assegura aoproprietário deprédio que se acharencravado, deforma natural eabsoluta, semacesso a viapública, nascenteou porto, o direitode, mediantepagamento deindenização,

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4. Dapassagemforçada

indenização,constranger ovizinho a lhe darpassagem, cujorumo serájudicialmente fixado,se necessário (art.1.285). Não seconsideraencravado o imóvelque tenha outrasaída, ainda quedifícil e penosa. Apassagem forçadaé instituto do direitode vizinhança e nãose confunde comservidão de

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servidão depassagem, queconstitui direito realsobre coisa alheia.

5. Dapassagemde cabos etubulações

O proprietário éainda obrigado atolerar, medianteindenização, apassagem, pelo seuimóvel, de cabos,tubulações e outroscondutossubterrâneos deserviços de utilidadepública (luz, água,esgoto, p. ex.), emproveito de

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proveito deproprietáriosvizinhos, quando deoutro modo forimpossível ouexcessivamenteonerosa (CC, art.1.286).

O CC disciplina autilização deaqueduto oucanalização daságuas no art. 1.293,permitindo a todoscanalizar peloprédio de outrem as

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6. Daságuas

prédio de outrem aságuas a que tenhadireito, medianteprévia indenizaçãoao proprietário, nãosó para asprimeirasnecessidades davida como tambémpara os serviços daagricultura ou daindústria,escoamento deáguas supérfluas ouacumuladas, ou adrenagem deterrenos.

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7. Doslimitesentreprédios

Estabelece o CCregras parademarcação doslimites entreprédios, dispondoque o proprietário“pode constranger oseu confinante aproceder com ele àdemarcação entreos dois prédios, aaviventar rumosapagados e arenovar marcosdestruídos ouarruinados,repartindo-se

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repartindo-seproporcionalmenteentre osinteressados asrespectivasdespesas” (art.1.297). A açãoapropriada é ademarcatória (CPC,arts. 946/966).

A lei concede aoproprietário o direitode cercar, murar,valar ou tapar dequalquer modo oseu prédio, quer

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8. Dodireito detapagem

seja urbano, querrural (CC, art.1.297). Tem-seentendido que adivisão dasdespesas deve serpreviamenteconvencionada.Quanto aostapumes especiais,destinados àvedação de animaisde pequeno porte,ou a adorno dapropriedade ou suapreservação,entende-se que a

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entende-se que asua construção econservação cabemunicamente aointeressado, queprovocou anecessidade deles.

Pode oproprietáriolevantar em seuterreno asconstruções quelhe aprouver,salvo o direitodos vizinhos e osregulamentosadministrativos

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9. Do

Limitações eresponsabilidades

administrativos(CC, art. 1.299).A ação maiscomum entrevizinhos é a deindenização. Aresponsabilidadepelos danoscausados avizinhos emvirtude deconstrução éobjetivaainda serutilizadas: açãodemolitória (CC,arts. 1.280 e

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9. Dodireitodeconstruir

arts. 1.280 e1.312),cominatória, denunciação deobra nova, decaução de danoinfecto,possessória etc.

É defeso “abrirjanelas, ou fazereirado, terraçoou varanda, amenos de metroe meio doterreno vizinho”.Nesse caso, olesado pode

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Devassamento dapropriedadevizinha

lesado podeembargar aconstrução,mediante oembargo deobra nova (CPC,art. 934, I).Conta-se adistância demetro e meio dalinha divisória enão do edifíciovizinho.

Não pode oproprietárioconstruir demodo que o

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Águas e beirais

modo que obeiral de seutelhado despejesobre o vizinho.As águaspluviais devemser despejadasno solo dopróprio dono doprédio, e não nodo vizinho. Se,porém, oproprietáriocolocar calhasque recolham asgoteiras,impedindo que

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impedindo quecaiam napropriedadevizinha, poderáencostar otelhado na linhadivisória (CC,art. 1.300).

Paredesdivisórias(parede-meia)são as queintegram aestrutura doedifício, na linhade divisa. O art.1.305 do CC

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9. Dodireitodeconstruir

Paredesdivisórias

1.305 do CCabre aoproprietário queprimeiro edificara alternativa:assentar aparede somenteno seu terreno,ou assentá-la,até meiaespessura, noterreno vizinho.Na primeirahipótese, aparedepertencer-lhe-áinteiramente; nasegunda, será

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segunda, seráde ambos. Nasduas hipóteses,os vizinhospodem usá-lalivremente.

O proprietárioou ocupante doimóvel éobrigado atolerar que ovizinho entre noprédio, medianteaviso-prévio,para “deletemporariamente

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Uso do prédiovizinho

usar, quandoindispensável àreparação,construção oulimpeza de suacasa ou do murodivisório”, e“apoderar-se decoisas suas,inclusive animaisque aí seencontremcasualmente”(CC, art. 1.313).

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CAPÍTULO VIDO CONDOMÍNIO GERAL

58 DO CONDOMÍNIO VOLUNTÁRIO

58.1. CONCEITO E ESPÉCIES

Quando os direitos elementares do proprietário(CC, art. 1.228) pertencerem a mais de um titular,existirá o condomínio ou domínio comum de um bem.Não há conflito com o princípio da exclusividade,pois entende-se que o direito de propriedade é um sóe incide sobre as partes ideais de cada condômino.Perante terceiros, cada comunheiro atua comoproprietário exclusivo do todo. O Código Civildisciplina o condomínio geral (tradicional oucomum), que pode ser voluntário (arts. 1.314 e s.) enecessário ou legal (arts. 1.327 e s.), e o condomínioedilício ou em edificações (arts. 1.331 e s.).

Quanto à origem, o condomínio pode serconvencional, eventual ou legal. Convencional ouvoluntário é o que se origina da vontade doscondôminos, ou seja, quando duas ou mais pessoas

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adquirem o mesmo bem. Eventual é o que resulta davontade de terceiros, ou seja, do doador ou dotestador, ao efetuarem uma liberalidade a váriaspessoas. Legal ou necessário é o imposto pela lei,como no caso de paredes, cercas, muros e valas (art.1.327).

Quanto à forma, o condomínio pode ser prodiviso ou pro indiviso, transitório ou permanente.No condomínio pro diviso, apesar da comunhão dedireito, há mera aparência de condomínio, porquecada condômino encontra-se localizado em partecerta e determinada da coisa, agindo como donoexclusivo da porção ocupada. No pro indiviso, nãohavendo a localização em partes certas edeterminadas, a comunhão é de direito e de fato.Condomínio transitório é o convencional ou oeventual, que podem ser extintos a todo tempo pelavontade de qualquer condômino. Permanente é olegal, que perdura enquanto persistir a situação queo determinou (paredes divisórias, p. ex.).

Quanto ao objeto, o condomínio pode seruniversal, quando abrange todos os bens, inclusivefrutos e rendimentos, como na comunhão hereditária,e singular, incidente sobre coisa determinada (murodivisório, p. ex.).

58.2. DIREITOS E DEVERES DOSCONDÔMINOS

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Com relação aos direitos, dispõe o art. 1.314 doCódigo Civil que cada condômino pode: a) usar dacoisa conforme sua destinação, e sobre ela exercertodos os direitos compatíveis com a indivisão; b)reivindicá-la de terceiro; c) defender a sua posse; d)alhear a respectiva parte indivisa ou gravá-la.

Quanto ao primeiro item (a), pode o condôminoexercer sobre a coisa todos os direitos compatíveiscom a indivisão, não podendo impedir que os demaisconsortes se utilizem também de seus direitos, naproporção da cota de cada um e de acordo com adestinação do bem. Tratando-se de imóvel, pode neleinstalar-se, desde que não afaste os demaisconsortes. O direito de usar da coisa, no entanto,não permite ao condômino alterar a destinação dacoisa, “sem o consenso dos outros” (art. 1.314,parágrafo único). Não pode alterar a substância dacoisa nem o modo como é tradicionalmente usada.

Cada condômino responde aos outros pelosfrutos que percebeu da coisa comum e pelo dano quelhe causou (art. 1.319). Assim, se o imóvel é urbano eestiver ocupado por um dos condôminos, podem osdemais exigir-lhe pagamento de quantia mensalcorrespondente ao valor locativo. Se estiver locado aterceiro, tem o condômino direito de pedi-lo para usopróprio. Também nenhum condômino pode, semprévio consenso dos outros, dar posse, uso ou gozoda propriedade a estranhos (art. 1.314, parágrafo

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único), pois o uso autorizado pela lei é o pessoal.Embora o Código prescreva que o condômino podeusar da coisa, tem ele de sujeitar-se à deliberação damaioria, que é quem decide se ela deve seradministrada, vendida ou alugada, se não forpossível o uso e gozo em comum (art. 1.323).

Dispõe, ainda, o art. 1.314 do Código Civil quepode cada condômino reivindicar a coisa que estejaem poder de terceiro (b). Aplica--se à hipótese o art.1.827, que autoriza o herdeiro a “demandar os bensda herança, mesmo em poder de terceiros”, bemcomo o parágrafo único do art. 1.791, verbis: “Até apartilha, o direito dos coerdeiros, quanto àpropriedade e posse da herança, será indivisível, eregular-se-á pelas normas relativas ao condomínio”.Qualquer dos coerdeiros pode reclamar auniversalidade da herança ao terceiro, queindevidamente a possua. Não pode, assim, o terceiroopor-lhe, em exceção, o caráter parcial do seu direitonos bens da herança. Como o direito de reivindicar édeferido ao proprietário, o condômino só podepropor ação reivindicatória contra terceiro, e nãocontra outro condômino, porque este também éproprietário e oporia ao reivindicante direito igual.Contra outro condômino só pode caber apossessória.

O condômino, como qualquer outro possuidor,poderá (c) defender a sua posse contra outrem (art.

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1.314).Pode cada consorte, ainda, alhear a respectiva

parte indivisa ou gravá-la (d). O primeiro direitosofre a restrição contida no art. 504, que prevê odireito de preempção ou preferência em favor dosdemais condôminos. O preterido poderá,depositando o valor correspondente ao preço,“haver para si a parte vendida a estranhos, se orequerer no prazo de cento e oitenta dias, sob penade decadência”. Conta-se esse prazo da data em queteve ciência inequívoca da venda (STF-RTJ, 57:322,59:591). Preceitua o art. 1.793, § 2º, do Código Civilque “é ineficaz a cessão, pelo coerdeiro, de seudireito hereditário sobre qualquer bem da herançaconsiderado singularmente”. Tem-se entendido que,se a cota ideal é alienada, com localização doquinhão, descrição das divisas e confrontações, talvenda será condicional e só prevalecerá se, nadivisão futura, coincidir o quinhão atribuído aovendedor com o que havia alienado ao adquirente.Do contrário, ficará desfeita.

O art. 1.314 do Código Civil menciona ainda queo condômino pode gravar sua parte indivisa. Pode,portanto, dá-la em hipoteca. Nesse mesmo sentidoproclama o art. 1.420, § 2º: “A coisa comum a dois oumais proprietários não pode ser dada em garantiareal, na sua totalidade, sem o consentimento detodos; mas cada um pode individualmente dar em

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garantia real a parte que tiver”. O dever de concorrerpara as despesas de conservação ou divisão dacoisa, na proporção de sua parte, bem como aresponsabilidade pelas dívidas contraídas emproveito da comunhão, são impostos ao condôminonos arts. 1.316 a 1.318.

58.3. EXTINÇÃO DO CONDOMÍNIO

O Código Civil procura facilitar a extinção docondomínio, que é tido por todos como fonte deatritos e desavenças. Assim, a “todo tempo serálícito ao condômino exigir a divisão da coisa comum”(art. 1.320). Se os condôminos fizerem um pacto denão dividi-la, a avença valerá apenas por cinco anos,suscetível de prorrogação ulterior (§ 1º). E, se aindivisão for condição estabelecida “pelo doador, outestador”, entende-se que o foi somente por cincoanos (§ 2º). A requerimento de qualquer interessadoe se graves razões o aconselharem, “pode o juizdeterminar a divisão da coisa comum antes do prazo”(§ 3º).

A divisão é o meio adequado para se extinguir ocondomínio em coisa divisível. Pode ser amigável oujudicial. Só se admite a primeira forma, por escriturapública, se todos os condôminos forem maiores ecapazes. Se um deles for menor, ou se não houveracordo, será necessária a divisão judicial. Isso

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porque o art. 1.321 do Código Civil determina que seapliquem à divisão do condomínio, no que couber,as regras de partilha da herança (arts. 2.013 a 2.022).O art. 2.016, por sua vez, estabelece: “Será semprejudicial a partilha, se os herdeiros divergirem, assimcomo se algum deles for incapaz”. Pela divisão, cadacondômino terá o seu quinhão devidamenteindividualizado.

A ação de divisão (CPC, art. 967) éimprescritível, podendo ser ajuizada a qualquertempo. A divisão entre condôminos é simplesmentedeclaratória e não atributiva da propriedade (CPC,art. 980). Esta poderá, entretanto, ser julgadapreliminarmente no mesmo processo. Os condôminosjá eram proprietários; a divisão apenas declara elocaliza a parte de cada um. A sentença retroage,pois, à data do início da comunhão, produzindoefeitos ex tunc.

Se a coisa é indivisível, o condomínio só poderáextinguir-se pela venda da coisa comum. Estatui oart. 1.322 do Código Civil que, “quando a coisa forindivisível, e os consortes não quiserem adjudicá-laa um só, indenizando os outros, será vendida erepartido o apurado, preferindo-se, na venda, emcondições iguais de oferta, o condômino aoestranho, e entre os condôminos aquele que tiver nacoisa benfeitorias mais valiosas, e, não as havendo,o de quinhão maior”. Aduz o parágrafo único: “Se

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nenhum dos condôminos tem benfeitorias na coisacomum e participam todos do condomínio em partesiguais, realizar-se-á licitação entre estranhos e, antesde adjudicada a coisa àquele que ofereceu maiorlanço, proceder-se-á à licitação entre os condôminos,a fim de que a coisa seja adjudicada a quem afinaloferecer melhor lanço, preferindo, em condiçõesiguais, o condômino ao estranho”. Se todosquiserem vender, a venda será feita amigavelmente.Se houver divergência e um ou mais condôminosquiserem vender, observar-se-á o rito estabelecidonos arts. 1.104 e 1.113 e s. do Código de ProcessoCivil. A alienação, depois de avaliado o bem, seráfeita em hasta pública, durante a qual o condôminopoderá manifestar o seu direito de preferência.

58.4. DA ADMINISTRAÇÃO DO CONDOMÍNIO

Se os condôminos resolverem que a coisa deveser administrada, por maioria escolherão também oadministrador, que poderá ser estranho aocondomínio (CC, art. 1.323). Deliberarão também, se odesejarem, a respeito do regime de administração,remuneração do administrador, prestação de contasetc. “O condômino que administrar sem oposiçãodos outros presume-se representante comum” (art.1.324). Por não ter ânimo de dono, não podeusucapir, salvo em situações excepcionais, em que o

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referido ânimo restar demonstrado em razão decircunstâncias especiais. Os poderes que lhe sãoconferidos são os de simples administração. Nãopode praticar atos que exijam poderes especiais, taiscomo alienar a coisa, receber citações etc. Poderá,entretanto, alienar coisas que ordinariamente sedestinam à venda, como frutos ou produtos depropriedade agrícola.

Os condôminos podem usar a coisa comumpessoalmente. Se não o desejarem ou por desacordotal não for possível, então resolverão se a coisa deveser administrada, vendida ou alugada. Para queocorra a venda, basta a vontade de um sócondômino. Só não será vendida se todosconcordarem que se não venda (CC, arts. 1.320 e1.322). Neste caso, a maioria deliberará sobre aadministração ou locação da coisa comum. A maioriaserá calculada não pelo número, senão pelo valordos quinhões, e as deliberações só terão validadequando tomadas por maioria absoluta (art. 1.325, §1º), isto é, por votos que representem mais de metadedo valor total. Não sendo possível alcançar maioriaabsoluta, decidirá o juiz, a requerimento de qualquercondômino, ouvidos os outros (art. 1.325, § 2º).Havendo dúvida quanto ao valor do quinhão, seráeste avaliado judicialmente (art. 1.325, § 3º).

59 DO CONDOMÍNIO NECESSÁRIO

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Condomínio necessário ou legal é o impostopela lei, como no caso de paredes, cercas, muros evalas, que se regula pelo disposto nos arts. 1.297 e1.298, e 1.304 a 1.307 do Código Civil, como preceituao art. 1.327 do referido diploma. Reportamo-nos,assim, aos n. 56 e 57.4 desta obra, que tratam,respectivamente, “dos limites entre prédios e dodireito de tapagem” e das “paredes divisórias”.

Nas referidas hipóteses, o “proprietário que tiverdireito a estremar um imóvel com paredes, cercas,muros, valas ou valados, tê-lo-á igualmente a adquirirmeação na parede, muro, valado ou cerca do vizinho,embolsando-lhe metade do que atualmente valer aobra e o terreno por ela ocupado” (CC, art. 1.328; v.também art. 1.297). Não convindo os dois no preçoda obra, será ele arbitrado por peritos, a expensas deambos os confinantes (art. 1.329). “Qualquer que sejao valor da meação, enquanto aquele que pretender adivisão não o pagar ou depositar, nenhum usopoderá fazer na parede, muro, vala, cerca ou qualqueroutra obra divisória” (art. 1.330).

Quadro sinótico – Do condomínio geral

Quando os direitos elementares doproprietário pertencerem a mais de um

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1. Docondomíniovoluntário

Conceito proprietário pertencerem a mais de umtitular, existirá o condomínio ou domíniocomum de um bem.

EspéciesDisciplinadasnoCC

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Quanto àorigem

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1. Docondomíniovoluntário

EspéciesQuanto àforma

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Quanto aoobjeto

Direitos dos

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Direitos doscondôminos

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Direitos dos condôminos

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1. Docondomíniovoluntário

Deveres dos condôminos

Bem

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Extinção docondomínio

Bemdivisível

Bemindivisível

Os condôminos podem usar acoisa comum pessoalmente. Senão o desejarem ou pordesacordo tal não for possível,

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Administraçãodocondomínio

então resolverão se ela deve seradministrada, vendida oualugada. Para que ocorra avenda, basta a vontade de umsó condômino. Só não serávendida se todos concordaremque se não venda (CC, arts.1.320 e 1.322). Neste caso, amaioria deliberará sobre aadministração ou locação dacoisa comum. Se resolveremque deve ser administrada, pormaioria escolherão oadministrador (art. 1.323).

Condomínio necessáriopela lei, como no caso de paredes, cercas,

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2. Docondomínionecessário

pela lei, como no caso de paredes, cercas,muros e valas, que se regula pelo disposto nosarts. 1.297 e 1.298, e 1.304 a 1.307 do CC. Nasreferidas hipóteses, o “proprietário que tiverdireito a estremar um imóvel com paredes,cercas, muros, valas ou valados, tê-lo-áigualmente a adquirir meação na parede, muro,valado ou cerca do vizinho, embolsando-lhemetade do que atualmente valer a obra e oterreno por ela ocupado” (art. 1.328).

CAPÍTULO VIIDO CONDOMÍNIO EDILÍCIO

60 CONSIDERAÇÕES INICIAIS. NATUREZA

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JURÍDICA

O primeiro diploma a tratar do condomínioedilício ou em edificações, também chamado dehorizontal, foi o Decreto-Lei n. 5.481, de 1928.Posteriormente passou a ser regido pela Lei n. 4.591,de 16 de dezembro de 1964, com as alterações da Lein. 4.864, de 29 de novembro de 1965. As principaisinovações trazidas pela referida legislação foram: a)compõe-se a lei de dois títulos, cuidando o primeirodo condomínio e o segundo das incorporações; b)permitiu o condomínio em prédios de um pavimento;c) ao determinar, no parágrafo único do art. 4º, que oadquirente responde pelos débitos do alienante,atribuiu o caráter de propter rem a essas obrigações;d) estabeleceu a obrigatoriedade da existência deuma convenção de condomínio e de umregulamento; e) determinou que a representação docondomínio fosse feita pelo síndico; f) cuidou dasincorporações na segunda parte, visando impedirque o incorporador cause prejuízo aos condôminos,especialmente proibindo reajuste de preços, se nãoconvencionados expressamente.

O novo Código Civil, apesar de expressaremissão à lei especial, que continua em vigor,contém dispositivos regrando os direitos e deveresdos condôminos, bem como a competência dasassembleias e dos síndicos. Nesses assuntos, a

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referida Lei n. 4.591, de 1964, aplica-se apenassubsidiariamente.

Caracteriza-se o condomínio edilício pelaapresentação de uma propriedade comum ao lado deuma propriedade privativa. Cada condômino é titular,com exclusividade, da unidade autônoma(apartamento, escritório, sala, loja, sobreloja,garagem) e titular de partes ideais das áreas comuns(terreno, estrutura do prédio, telhado, rede geral dedistribuição de água, esgoto, gás e eletricidade,calefação e refrigeração central, corredores de acessoàs unidades autônomas e ao logradouro público etc.)(CC, art. 1.331).

Quanto à natureza jurídica, prevalece oentendimento de que o condomínio não tempersonalidade jurídica. Entretanto está legitimado aatuar em juízo, ativa e passivamente, representadopelo síndico (CPC, art. 12, IX), em situação similar àdo espólio e da massa falida.

61 INSTITUIÇÃO E CONSTITUIÇÃO DOCONDOMÍNIO

Todo condomínio em edificações deve ter,obrigatoriamente, o ato de instituição, a Convençãode Condomínio e o Regulamento (RegimentoInterno).

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O novo Código Civil distingue, de maneiraobjetiva, os atos de instituição e os de constituiçãodo condomínio. O ato de instituição é previsto noart. 1.332 do referido diploma e pode resultar de atoentre vivos ou testamento, com inscrição obrigatóriano Registro de Imóveis, devendo conter, além dodisposto em lei especial, a individualização de cadaunidade, a determinação da fração ideal atribuída acada uma relativamente ao terreno e partes comuns, eo fim a que se destinam.

A Convenção de Condomínio, apontada no art.1.333 do Código Civil como ato de constituição docondomínio edilício, é um documento escrito no qualse estipulam os direitos e deveres de cadacondômino, e deve ser subscrita pelos titulares de,no mínimo, dois terços das frações ideais. Autilização do prédio é por ela regulada. Difere doscontratos em geral porque estes obrigam somente aspartes contratantes, enquanto a Convenção sujeitatodos os titulares de direitos sobre as unidades, ouquantos sobre elas tenham posse ou detenção,atuais ou futuros. Pode conter outras normasaprovadas pelos interessados, além das obrigatórias,desde que não contrariem a lei. Objetiva, pois,estabelecer regramento para o bom aproveitamentodo edifício por todos e para que haja tranquilidadeinterna. Poderá ser feita por escritura pública ou porinstrumento particular (CC, art. 1.334, § 1º). São

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equiparados aos proprietários, “salvo disposição emcontrário”, os promitentes compradores e oscessionários de direitos relativos às unidadesautônomas (art. 1.334, § 2º). Qualquer alteraçãoposterior da Convenção reclama o quorum de doisterços das frações ideais, também deliberada emassembleia. A modificação da destinação origináriadas unidades autônomas, bem como mudanças nafachada do prédio, nas frações ideais, nas áreas deuso comum e outras exigem a unanimidade de votos(CC, art. 1.351; Lei n. 4.591/64, art. 10, § 2º).

O Regulamento, ou Regimento Interno,complementa a Convenção. Geralmente, contémregras minuciosas sobre o uso das coisas comuns eé colocado em quadros, no andar térreo, próximo aoselevadores ou à portaria, fixados na parede.

62 ESTRUTURA INTERNA DO CONDOMÍNIO

O condomínio é composto de unidadesautônomas e áreas comuns. A unidade autônomapode consistir em apartamentos, escritórios, salas,lojas, sobrelojas, abrigos para veículos ou casas emvilas particulares, não se reclamando número mínimode peças nem metragem mínima. Nenhuma unidadeautônoma pode ser privada de saída para a viapública (CC, art. 1.331, § 4º). Exige a Lei n. 4.591/64

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que cada uma tenha designação especial, numéricaou alfabética (arts. 1º, § 1º, e 2º).

Pode o proprietário de cada unidade alugá-la,cedê-la, gravá-la, sem que necessite de autorizaçãodos outros condôminos (art. 4º). E estes não têmpreferência na aquisição, ao contrário do queacontece no condomínio comum e como é previstono art. 504 do Código Civil. Se, no entanto, umamesma unidade pertencer a dois ou maisproprietários, aplicam-se-lhes as regras docondomínio comum, tais como as referentes àadministração, venda da coisa comum e pagamentode despesas e dívidas (art. 6º). O art. 1.339, § 2º, doCódigo Civil permite ao condômino “alienar parteacessória de sua unidade imobiliária a outrocondômino, só podendo fazê-lo a terceiro se essafaculdade constar do ato constitutivo docondomínio, e se a ela não se opuser a respectivaassembleia geral”. Se o condômino resolver “alugarárea no abrigo para veículos, preferir-se-á, emcondições iguais, qualquer dos condôminos aestranhos, e, entre todos, os possuidores” (CC, art.1.338). Para efeitos tributários, cada unidadeautônoma será tratada como prédio isolado (art. 11).

Os arts. 1.331, § 2º, do Código Civil e 3º da Lei n.4.591/64 enumeram as áreas comuns do condomínio.São elas insuscetíveis de divisão e de alienação,separadas da respectiva unidade. Quanto à sua

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utilização, dispõe o art. 19 da referida lei que cadaconsorte poderá “usar as partes e coisas comuns, demaneira a não causar dano ou incômodo aos demaiscondôminos ou moradores, nem obstáculo ouembaraço ao bom uso das mesmas partes por todos”.Para usá-las com exclusividade, só com anuência daunanimidade dos condôminos. A fachada do edifícioé propriedade de todos. Assim, o condômino nãopode alterá-la, a menos que obtenha anuência detodos os consortes (Lei n. 4.591, art. 10, § 2º).

A utilização do condomínio sofre limitaçõesimpostas pela lei e restrições previstas naConvenção. Além da norma genérica do art. 1.277 doCódigo Civil, proibindo o uso anormal dapropriedade, o art. 1.336, IV, do mesmo diplomaconsidera dever do condômino não utilizar as suaspartes de maneira prejudicial ao sossego, salubridadee segurança dos possuidores, ou aos bonscostumes. O art. 10, III, da Lei n. 4.591/64 traz idênticalimitação, também prescrevendo que o condôminonão pode destinar sua unidade à utilização diversada finalidade do prédio. Assim, se é residencial, nãopodem existir escritórios, gabinetes dentários etc.

Com relação à manutenção de animais no prédio,deve haver disposição pertinente na Convenção. Seomissa, não poderá, em princípio, ser censurada. Se aConvenção vedar somente a presença de animaisque causam incômodo aos vizinhos ou ameaçam sua

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segurança, as questões que surgirem serão dirimidasem função da prova dessas duas situações de fato.Se a proibição for genérica, atingindo animais dequalquer espécie, poderá mostrar-se exagerada nahipótese de um condômino possuir um animal depequeno porte e inofensivo. Por essa razão têm ostribunais exigido a demonstração de que o animal, dealguma forma, prejudica a segurança, o sossego ou asaúde dos condôminos. As cláusulas restritivas eproibitivas da Convenção devem ser, assim,interpretadas em consonância com as normas legaisreferentes aos condomínios, especialmente os arts.10 e 19 da Lei n. 4.591 e 1.277 e 1.336, IV, do CódigoCivil.

Inovou o estatuto civil de 2002 ao prever apossibilidade de se aplicar multa ao condômino oupossuidor que, por seu reiterado comportamentoantissocial, gerar incompatibilidade de convivênciacom os demais condôminos ou possuidores (art.1.337, parágrafo único).

Tem a jurisprudência proclamado, no tocante àsdespesas de condomínio, que, para as prestaçõesdevidas antes da entrada em vigor do novo CódigoCivil, aplica-se sobre o débito a multa de 20%, comoprevisto na legislação de regência da época.Todavia, para as prestações vencidasposteriormente, aplica-se a multa de 2% prevista noart. 1.336 do novo diploma.

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O Tribunal de Justiça de São Paulo temconsiderado indevida a cumulação, nos contratos,do abono de pontualidade com cláusula penalmoratória, por importar previsão de dupla multa ealteração da real data de pagamento da prestação.Entende, todavia, perfeitamente legal a estipulaçãodo referido abono quando inexiste previsão decumulação com multa moratória (31ª Câm., Ap.992.09.037291-2, j. 23-2-2010).

63 DA ADMINISTRAÇÃO DO CONDOMÍNIOEM EDIFICAÇÕES

A administração é exercida por um síndico, cujomandato não pode exceder de dois anos, permitida areeleição. Compete-lhe, dentre outras atribuições,representar ativa e passivamente o condomínio, emjuízo ou fora dele. Pode ser condômino ou pessoafísica ou jurídica estranha ao condomínio.Geralmente, são empresas especializadas. O síndico éassessorado por um Conselho Consultivo,constituído de três condôminos, com mandatos quenão podem exceder a dois anos, permitida a reeleição.É órgão de assessoramento e fiscalização (Lei n.4.591, art. 23). “Poderá haver no condomínio umconselho fiscal, composto de três membros, eleitospela assembleia, por prazo não superior a dois anos,

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ao qual compete dar parecer sobre as contas dosíndico” (CC, art. 1.356).

Deve haver, anualmente, uma assembleia geralordinária, convocada pelo síndico na forma previstana Convenção, à qual compete, além das demaismatérias inscritas na ordem do dia, aprovar, pormaioria dos presentes, o orçamento das despesas, ascontribuições dos condôminos e a prestação decontas (CC, art. 1.350). As decisões da assembleia,tomadas, em cada caso, pelo quorum que aConvenção fixar, obrigam todos os condôminos,mesmo os vencidos e os que não compareceram. Asassembleias gerais extraordinárias podem serconvocadas pelo síndico ou por condôminos querepresentem um quarto, no mínimo, do condomínio,sempre que o exijam os interesses gerais (CC, art.1.355). A Convenção de Condomínio e o RegimentoInterno só podem ser modificados em assembleiageral extraordinária, pela aprovação de dois terçosdos votos dos condôminos. A assembleia é o órgãomáximo do condomínio, tendo poderes, inclusive,para modificar a própria Convenção; sujeita-sesomente à lei e às disposições estabelecidas nesta,podendo ser controlada pelo Judiciário.

Quadro sinótico – Do condomínio edilício

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1. Introdução

O CC/2002,apesar deexpressaremissão à leiespecial, quecontinua em vigor(Lei n. 4.591/64),contémdispositivosregrando osdireitos edeveres doscondôminos,bem como acompetência dasassembleias e

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dos síndicos.Nessesassuntos, a Lein. 4.591/64aplica-se apenassubsidiariamente.

2.Característica

Caracteriza-se ocondomínioedilício pelaapresentação deuma propriedadecomum ao ladode umapropriedadeprivativa. Cadacondômino é

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Característica condômino étitular, comexclusividade, daunidadeautônoma etitular de partesideais das áreascomuns (CC, art.1.331).

Prevalece oentendimento deque ocondomínio nãotempersonalidadejurídica.Entretanto, está

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3. Naturezajurídica

Entretanto, estálegitimado aatuar em juízo,ativa epassivamente,representadopelo síndico(CPC, art. 12,IX), em situaçãosimilar à doespólio e damassa falida.

Institui-se ocondomínioedilício por atoentre vivos outestamento,

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4. Instituiçãodocondomínio

testamento,registrado noCartório deRegistro deImóveis, devendoconter, além dodisposto em leiespecial, aindividualizaçãode cada unidade,a determinaçãoda fração idealatribuída a cadaumarelativamente aoterreno e partescomuns, e o fim

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comuns, e o fima que sedestinam (CC,art. 1.332).

5.

A Convenção deCondomínio é oato deconstituição docondomínioedilício (CC, art.1.333). É umdocumentoescrito (escriturapública ouinstrumentoparticular) noqual se estipulam

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5.Constituiçãodocondomínio

qual se estipulamos direitos edeveres de cadacondômino. Deveser subscritapelos titularesde, no mínimo,dois terços dasfrações ideais. Autilização doprédio é por elaregulada. Sujeitatodos os titularesde direitos sobreas unidades,atuais ou futuros.

Também

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6.Regulamento

Tambémdenominado“RegimentoInterno”,complementa aConvenção.Geralmente,contém regrasminuciosas sobreo uso das coisascomuns.

a) unidadeautônoma: podeconsistir emapartamentos,escritórios,salas, lojas,

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salas, lojas,abrigos paraveículos oucasas em vilasparticulares.Não pode serprivada de saídapara a viapública. Pode oproprietárioalugá-la, cedê-la, gravá-la, semque necessitede autorizaçãodos outroscondôminos, quenão têm

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7. Estruturainterna docondomínio

não têmpreferência naaquisição;b) áreascomuns: sãoinsuscetíveis dedivisão e dealienação,separadas darespectivaunidade. Cadaconsorte podeusá-las “demaneira a nãocausarincômodo aosdemaiscondôminos ou

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condôminos oumoradores, nemobstáculo ouembaraço aobom uso dasmesmas partespor todos” (CC,art. 1.331, § 2º;Lei n. 4.591/64,art. 19).

É exercida porum síndico, cujomandato nãopode exceder dedois anos,permitida a

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8.Administração

reeleição.Compete-lhe,dentre outrasatribuições,representarativa epassivamente ocondomínio, emjuízo ou foradele. Pode sercondômino oupessoa física oujurídica estranhaao condomínio.O síndico éassessorado porum Conselho

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Administraçãodocondomínio

um ConselhoConsultivo,constituído detrêscondôminos,com mandatosque não podemexceder a doisanos, permitidaa reeleição.Deve haver,anualmente,uma assembleiageral ordinária,convocada pelosíndico. Aassembleia é oórgão máximo

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órgão máximodo condomínio,tendo poderes,inclusive, paramodificar aprópriaConvenção.

CAPÍTULO VIIIDA PROPRIEDADE RESOLÚVEL

64 CONCEITO

Diz-se que a propriedade é resolúvel quando otítulo de aquisição está subordinado a uma condiçãoresolutiva ou ao advento do termo. Nesse caso, deixa

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de ser plena, assim como quando pesa sobre elaônus reais, passando a ser limitada.

65 CAUSAS DE RESOLUÇÃO DAPROPRIEDADE

O Código Civil trata dos casos de resolução dapropriedade em dois artigos, que estabelecemexceções ao princípio de que o direito depropriedade é perpétuo e irrevogável: pelo adventode uma condição ou termo e pelo surgimento de umacausa superveniente. No art. 1.359, a causa daresolução se encontra inserta no título; no art. 1.360,o elemento que resolve a relação jurídica ésuperveniente.

Dispõe o art. 1.359 que, “resolvida a propriedadepelo implemento da condição ou pelo advento dotermo, entendem-se também resolvidos os direitosreais concedidos na sua pendência, e o proprietário,em cujo favor se opera a resolução, pode reivindicara coisa do poder de quem a possua ou detenha”. Acondição ou termo referidos constam do títuloconstitutivo da propriedade, de tal forma que oterceiro que a adquiriu não poderá alegar surpresa.Se alguém, por exemplo, adquirir imóvel em cujaescritura existia um pacto de retrovenda, não poderáreclamar se o primeiro alienante exercer o seu direito

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de retrato antes do prazo de três anos (CC, art. 505).Nesse caso, resolve-se o domínio do terceiro e oprimeiro alienante poderá reivindicar o imóvel.

O art. 1.360 do Código Civil cuida de outrahipótese. Dispõe, com efeito, que se, porém, “apropriedade se resolver por outra causasuperveniente, o possuidor, que a tiver adquirido portítulo anterior à sua resolução, será consideradoproprietário perfeito, restando à pessoa, em cujobenefício houve a resolução, ação contra aquele cujapropriedade se resolveu para haver a própria coisaou o seu valor”. Se alguém, por exemplo, receber umimóvel em doação e depois o alienar, o adquirenteserá considerado proprietário perfeito se,posteriormente, o doador resolver revogar a doaçãopor ingratidão do donatário (art. 557). Embora permitaa revogação, não pode ela prejudicar direitosadquiridos por terceiros. Como se trata de causasuperveniente, o adquirente não podia prevê-la. Odoador, nesse caso, só poderá cobrar do donatário ovalor da coisa, porque esta continuará pertencendoao adquirente de boa-fé.

Quadro sinótico – Da propriedade resolúvel

A propriedade é

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1.Conceito

A propriedade éresolúvel quando otítulo de aquisiçãoestá subordinado auma condiçãoresolutiva ou aoadvento do termo.Nesse caso, deixa deser plena, assim comoquando pesam sobreela ônus reais,passando a serlimitada.

a) ex tunc: se a causada resolução dapropriedade constardo próprio título

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2.Efeitos

do próprio títuloconstitutivo (CC, art.1.359);b) ex nunc: se aresolução se der porcausa superveniente(art. 1.360). Sealguém, p. ex.,receber um imóvel emdoação e depois oalienar, o adquirenteserá consideradoproprietário perfeitose, posteriormente, odoador revogar adoação por ingratidãodo donatário (art.

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557).

CAPÍTULO IXDA PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA

66 CONCEITO

“Considera-se fiduciária a propriedade resolúvelde coisa móvel infungível que o devedor, comescopo de garantia, transfere ao credor” (CC, art.1.361).

O instituto foi introduzido no direito brasileiropela Lei de Mercado de Capitais (Lei n. 4.728/65, art.66). O contrato de venda a crédito com reserva dedomínio representava uma garantia somente para ocomerciante de bens móveis duráveis. Com aparticipação cada vez maior das financeiras nessarelação jurídica, surgiu a necessidade de se dar maiorgarantia a essas intermediárias. O art. 66 da referidalei foi modificado pelo Decreto-Lei n. 911/69 (cujo

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art. 3º foi alterado pela Lei n. 10.931, de 2-8-2004),que passou a regular o referido instituto. O novoCódigo Civil disciplinou-o, em linhas gerais, sob otítulo “Da propriedade fiduciária” (arts. 1.361 a1.368), ficando revogada a referida legislaçãoespecial naquilo que respeita ao direito material.Permanece em vigor somente, no que couber, para asquestões de ordem processual específica.

Na alienação fiduciária em garantia dá-se atransferência do domínio do bem móvel ao credor,denominado fiduciário (em geral, uma financeira, queforneceu o numerário para a aquisição), em garantiado pagamento, permanecendo o devedor (fiduciante)com a posse direta da coisa. A Súmula 6 do extinto 1ºTribunal de Alçada Civil de São Paulo admite alegitimidade dos consórcios para efetuarfinanciamentos mediante alienação fiduciária. Odomínio e a posse indireta passam ao credor, emgarantia. Não se dá tradição real, mas sim ficta(constituto possessório). O domínio do credor éresolúvel, pois resolve-se automaticamente em favordo devedor alienante, sem necessidade de outro ato,uma vez paga a última parcela da dívida. Somentebens móveis infungíveis e alienáveis podem serobjeto de alienação fiduciária.

67 REGULAMENTAÇÃO

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O contrato deve ter a forma escrita, podendo oinstrumento ser público ou particular, e conter: ototal da dívida, ou sua estimativa; o prazo, ou aépoca do pagamento; a taxa de juros, se houver; adescrição da coisa objeto da transferência, com oselementos indispensáveis à sua identificação (CC,art. 1.362). A aquisição do domínio exige a tradição,que é ficta, na hipótese. O registro no Cartório deTítulos e Documentos confere existência legal àpropriedade fiduciária, gerando oponibilidade aterceiros. Deve ser efetivado no “domicílio dodevedor, ou, em se tratando de veículos, narepartição competente para o licenciamento, fazendo-se a anotação no certificado de registro” (CC, art.1.361, § 1º; Código de Trânsito Brasileiro, art. 121).Dispõe, com efeito, a Súmula 92 do STJ: “A terceirode boa-fé não é oponível a alienação fiduciária nãoanotada no Certificado de Registro do veículoautomotor”. O credor pode exigir outras garantias,como a fiança e o aval. Se o débito é saldado porterceiro, em geral o avalista ou fiador, dá-se a sub-rogação no crédito e na propriedade fiduciária (CC,art. 1.368; Dec.-Lei n. 911/69, art. 6º).

Os direitos e obrigações do fiducianteconsistem em: a) ficar com a posse direta da coisa e odireito eventual de reaver a propriedade plena, com opagamento da dívida; b) purgar a mora, em caso delhe ser movida ação de busca e apreensão; c) receber

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o saldo apurado na venda do bem efetuada pelofiduciário para satisfação de seu crédito; d)responder pelo remanescente da dívida, se a garantianão se mostrar suficiente; e) não dispor do bemalienado, que pertence ao fiduciário (nada impedeque ceda o direito eventual de que é titular,consistente na expectativa de vir a ser titular,independentemente da anuência do credor, levandoa cessão a registro); f) entregar o bem, em caso deinadimplemento de sua obrigação, sujeitando-se àpena de prisão imposta ao depositário infiel. Arecuperação da propriedade plena opera-se pelaaverbação da quitação do credor no cartório em queregistrado o contrato, que pode ser obtida, em casode recusa, por meio da ação de consignação empagamento.

A obrigação principal do credor fiduciárioconsiste em proporcionar ao alienante ofinanciamento a que se obrigou, bem como emrespeitar o direito ao uso regular da coisa por partedeste. Se o devedor é inadimplente, fica o credorobrigado a vender o bem, aplicando o preço nopagamento de seu crédito, acréscimos legais,contratuais e despesas, e a entregar o saldo, sehouver, ao devedor (CC, art. 1.364). Para esse fim,pode ajuizar ação de busca e apreensão contra odevedor, a qual poderá ser convertida em ação dedepósito, caso o bem não seja encontrado.

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O art. 1.365 do Código Civil proíbe a inserção, nocontrato, de cláusula que permita ao credor ficar coma coisa alienada em garantia, em caso deinadimplemento contratual (pacto comissório). Se odevedor é inadimplente, cumpre-lhe promover asmedidas judiciais mencionadas. Mas o parágrafoúnico do aludido dispositivo preceitua que “odevedor pode, com a anuência do credor, dar seudireito eventual à coisa em pagamento da dívida,após o vencimento desta”. A mora decorrerá dosimples vencimento do prazo para pagamento, masdeverá ser comprovada mediante o protesto do títuloou por carta registrada, expedida por intermédio doCartório de Títulos e Documentos, a critério docredor (art. 2º, § 2º, do Dec.-Lei n. 911/69).Comprovada a mora do devedor, pode o credorconsiderar vencidas todas as obrigações contratuaise ajuizar ação de busca e apreensão, obtendo aliminar. Cinco dias após executada a liminar,consolidar-se-ão a propriedade e a posse plena eexclusiva do bem no patrimônio do credor fiduciário.No aludido prazo, o devedor fiduciante poderá pagara integralidade da dívida pendente, segundo osvalores apresentados pelo credor fiduciário na inicial,hipótese na qual o bem lhe será restituído livre deônus. O devedor fiduciante apresentará resposta noprazo de quinze dias da execução da liminar.

A sentença, de que cabe apelação apenas no

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efeito devolutivo, em caso de procedência da ação(na hipótese de improcedência, deve ser recebida emambos os efeitos, cf. JTACSP, 125:258), não impediráa venda extrajudicial do bem. A venda pode serextrajudicial ou judicial (CC, art. 1.364). Preferida esta,aplica-se o disposto nos arts. 1.113 a 1.119 doCódigo de Processo Civil. Se o bem não forencontrado ou não se achar na posse do devedor, ocredor poderá requerer a conversão do pedido debusca e apreensão, nos mesmos autos, em ação dedepósito, na forma prevista nos arts. 901 a 906 doCódigo de Processo Civil (art. 4º). A prisão dodepositário contratual só seria decretada após asentença e depois de vencido o prazo de vinte equatro horas para entrega da coisa, ou o seuequivalente em dinheiro. A sanção atuava como meiode coerção e não propriamente como pena, pois a leinão estabeleceu um prazo mínimo para sua duração,estando ela na própria vontade do depositário, quepodia dela liberar-se desde o momento em quecumpria a obrigação de restituir. A prisão dodepositário judicial, todavia, podia ser decretada nopróprio processo em que se constituiu o encargo(Súmula 619 do STF). Entretanto, no dia 3 dedezembro de 2008, o Supremo Tribunal Federal, emdecisão histórica, pôs fim à prisão civil dodepositário infiel, tanto nas hipóteses de contratos,como os de depósito, de alienação fiduciária, de

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arrendamento mercantil ou leasing, v. g., como nocaso do depositário judicial. Em consequência, areferida Corte revogou a mencionada Súmula 619. Atese majoritária atribuiu status supralegal, acima dalegislação ordinária mas abaixo da Constituição, aostratados sobre Direitos Humanos, dentre eles oPacto de São José da Costa Rica, que proíbe a prisãocivil por dívida, excetuando apenas o devedorvoluntário de pensão alimentícia. De acordo com aSúmula 20 do extinto 1º Tribunal de Alçada Civil, ovalor da coisa, para efeito da mais adequadaestimação do equivalente em dinheiro, “é ocorrespondente ao do débito contratual, isto é, ao dosaldo devedor em aberto”.

Se ocorrer a falência do devedor e a busca nãotiver ainda sido efetivada, o credor fiduciário poderásimplesmente formular pedido de restituição no juízofalimentar, não estando sujeito a habilitação (art. 7ºda LF). Se, ao ser decretada a falência, a liminar debusca e apreensão já havia sido cumprida, a açãoprosseguirá até final, no juízo em que foi proposta,passando o síndico a representar o falido (RTJ,81:620).

Quadro sinótico – Da propriedade fiduciária

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1. Conceito ecaracteres

Considera-sefiduciária apropriedaderesolúvel decoisa móvelinfungível que odevedor, comescopo degarantia,transfere aocredor (CC,art. 1.361). Naalienaçãofiduciária emgarantia dá-sea transferênciado domínio do

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do domínio dobem móvel aocredor(fiduciário), emgarantia dopagamento,permanecendoo devedor(fiduciante)com a possedireta da coisa.

— o contratodeve ter aforma escrita,podendo oinstrumento serpúblico ou

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2.Regulamentação

público ouparticular, econter: o totalda dívida; oprazo ou aépoca dopagamento; ataxa de juros,se houver; adescrição dacoisa objeto datransferência(CC, art.1.362);— a aquisiçãodo domínioexige a

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exige atradição, que éficta, nahipótese;— o registrono Cartório deTítulos eDocumentosconfereexistência legalà propriedadefiduciária,gerandooponibilidade aterceiros.

a) ficar com aposse direta

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posse diretada coisa e odireito eventualde reaver apropriedadeplena, com opagamento dadívida;b) purgar amora, em casode lhe sermovida açãode busca eapreensão;c) receber osaldo apuradona venda dobem efetuada

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3. Direitos eobrigações dofiduciante

bem efetuadapelo fiduciáriopara satisfaçãode seu crédito;d) responderpeloremanescenteda dívida, se agarantia não semostrarsuficiente;e) não dispordo bemalienado, quepertence aofiduciário,embora possa

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embora possaceder o direitoeventual deque é titular;f) entregar obem, em casodeinadimplementode suaobrigação,sujeitando-se àpena de prisãoimposta aodepositárioinfiel.

a) a obrigaçãoprincipal consiste

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4.Obrigaçõesdo credorfiduciário

principal consisteem proporcionarao alienante ofinanciamento aque se obrigou,bem como emrespeitar odireito ao usoregular da coisapor parte deste;b) se o devedoré inadimplente,fica o credorobrigado avender o bem,aplicando opreço no

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pagamento deseu crédito eacréscimos, e aentregar o saldo,se houver, aodevedor (CC,art. 1.364).

— pode o credormover ação debusca eapreensãocontra o devedorinadimplente, aqual poderá serconvertida emação de

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5.Procedimento

ação dedepósito, caso obem não sejaencontrado;— a sentença,de que cabeapelação apenasn o efeitodevolutivo, emcaso deprocedência daação, nãoimpedirá a vendaextrajudicial dobem econsolidará apropriedade e aposse plena e

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posse plena eexclusiva nasmãos doproprietáriofiduciário;

— a venda podeser extrajudicialou judicial (CC,art. 1.364).Preferida esta,aplica-se odisposto nosarts. 1.113 a1.119 do CPC;— se o bem nãofor encontrado, ocredor poderá

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5.Procedimento

credor poderárequerer aconversão dopedido de buscae apreensão,nos mesmosautos, em açãode depósito, naforma previstanos arts. 901 a906 do CPC;— a prisão sóserá decretadaapós a sentençae depois devencido o prazode 24 horas para

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de 24 horas paraentrega dacoisa, ou o seuequivalente emdinheiro.

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TÍTULO IVDA SUPERFÍCIE

68 CONCEITO

A Lei n. 10.257/2001 introduziu, no direitobrasileiro, o direito de superfície, limitado porém aimóvel urbano, enquanto o novo Código Civil cuidado urbano e também do rural. Aboliu este aenfiteuse, substituindo-a pelo direito de superfíciegratuito ou oneroso. Considera-se vantajosa asubstituição porque o novo instituto permite melhorutilização da coisa. Trata-se de direito real de fruiçãoou gozo sobre coisa alheia, de origem romana. Surgiuda necessidade prática de se permitir edificaçãosobre bens públicos, permanecendo o solo em poderdo Estado. Pode ser temporário ou perpétuo. OCódigo Civil brasileiro, contudo, só admite a suaconstituição por tempo determinado.

Dispõe o art. 1.369 do Código Civil que o“proprietário pode conceder a outrem o direito deconstruir ou de plantar em seu terreno, por tempodeterminado, mediante escritura pública devidamenteregistrada no Cartório de Registro de Imóveis”. Odireito de superfície “não autoriza obra no subsolo,salvo se for inerente ao objeto da concessão”

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(parágrafo único). Pelo novo instituto, uma pessoa,cujo terreno não seja apropriado para a construçãoque pretende erigir, pode, por exemplo, permutar ouso do solo, temporariamente, mantendo apropriedade deste, com outra pessoa que possuaterreno que atenda às suas necessidades, cedendo,por outro lado, a esta, que nele tem interesse, odireito de superfície de seu imóvel. Assim, oproprietário de um terreno localizado na zona central,próprio para a edificação de um prédio de escritórios,mas que deseja investir na construção e montagemde uma fábrica, pode permutar o uso do solo de seuimóvel com o de um terreno localizado na periferia dacidade, cujo proprietário tem interesse em construirum prédio de escritórios.

69 REGULAMENTAÇÃO

O superficiário, que tem o direito de construir ouplantar, responderá pelos encargos e tributos queincidirem sobre o imóvel (CC, art. 1.371). Oproprietário, denominado concedente ou fundieiro,tem a expectativa de receber a coisa com a obra ouplantação. Dispõe, com efeito, o art. 1.375 do CódigoCivil: “Extinta a concessão, o proprietário passará ater a propriedade plena sobre o terreno, construçãoou plantação, independentemente de indenização, se

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as partes não houverem estipulado o contrário”. “Odireito de superfície pode transferir-se a terceiros e,por morte do superficiário, aos seus herdeiros. Nãopoderá ser estipulado pelo concedente, a nenhumtítulo, qualquer pagamento pela transferência” (CC,art. 1.372 e parágrafo único).

Em caso de alienação do imóvel ou do direito desuperfície, o superficiário ou o proprietário, emigualdade de condições, tem direito de preferência(art. 1.373). Se o imóvel for desapropriado, “aindenização cabe ao proprietário e ao superficiário,no valor correspondente ao direito real de cada um”(art. 1.376). O direito de superfície, constituído porpessoa jurídica de direito público interno, rege-sepelo Código Civil, no que não for diversamentedisciplinado em lei especial (art. 1.377).

Quadro sinótico – Da superfície

Trata-se dedireito real defruição ougozo sobrecoisa alheia,

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1. Conceito

coisa alheia,de origemromana, peloqual oproprietárioconcede aoutrem odireito deconstruir oude plantar emseu terreno,por tempodeterminado,medianteescriturapúblicadevidamente

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devidamenteregistrada noCartório deRegistro deImóveis (CC,art. 1.369). OCC/2002aboliu aenfiteuse,substituindo-apelo direito desuperfíciegratuito ouoneroso.

— osuperficiário,que tem o

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2.Regulamentação

que tem odireito deconstruir ouplantar,responderápelosencargos etributos queincidiremsobre oimóvel (CC,art. 1.371);

— oproprietário(fundieiro)tem aexpectativa

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2.Regulamentação

expectativade receber acoisa com aobra ouplantação(art. 1.375);— o direito desuperfíciepodetransferir-se aterceiros e,por morte dosuperficiário,aos seusherdeiros;— não poderáser estipulado

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ser estipuladopeloconcedente, anenhum título,qualquerpagamentopelatransferência(art. 1.372,parágrafoúnico).

70 DA ENFITEUSE

70.1. CONCEITO. OBJETO

O art. 2.038 do Livro Complementar — “DasDisposições Finais e Transitórias” — do novo

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Código Civil proíbe a constituição de enfiteuses esubenfiteuses e subordina as existentes, até suaextinção, às disposições do Código Civil anterior eleis posteriores, ficando defeso, neste caso, “cobrarlaudêmio ou prestação análoga nas transmissões dobem aforado, sobre o valor das construções ouplantações”, bem como “constituir subenfiteuse” (§1º, I e II). A enfiteuse dos terrenos de marinha eacrescidos continua regida por lei especial (§ 2º). Areferida regra de transição justifica a manutenção,nesta obra, dos comentários a respeito do institutoda enfiteuse.

Dá-se a enfiteuse, aforamento ou emprazamento“quando por ato entre vivos, ou de última vontade, oproprietário atribui a outrem o domínio útil do imóvel,pagando a pessoa, que o adquire, e assim seconstitui enfiteuta, ao senhorio direto uma pensão,ou foro anual, certo e invariável” (CC/1916, art. 678).O proprietário é chamado de senhorio direto. Otitular do direito real sobre coisa alheia é denominadoenfiteuta e tem um poder muito amplo sobre a coisa.Pode usá-la e desfrutá-la do modo mais completo,bem como aliená-la e transmiti-la por herança. Porisso se diz que a enfiteuse é o mais amplo dosdireitos reais sobre coisas alheias. O proprietáriopraticamente conserva apenas o nome de dono ealguns poucos direitos, que se manifestam emocasiões restritas.

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O contrato de aforamento só pode ter por objetoterras não cultivadas e terrenos que se destinem àedificação. A enfiteuse pode ser constituída,também, sobre terrenos de marinha, que margeiam omar, rios e lagoas onde exista influência das marés epertencem ao domínio direto da União. Estáregulamentada no Decreto-Lei n. 9.760/46, tendosemelhanças com a do Código Civil, especialmenteno tocante à cessão de uso, pois também ali seestabelece o pagamento de foro. No entanto, nãoestá sujeita a resgate, sendo a sua regulamentação,constante de legislação eminentemente de direitopúblico, diferente em vários pontos da estabelecidano Código, possuindo, assim, natureza especial.

70.2. CARACTERÍSTICAS

O contrato de enfiteuse é perpétuo. A enfiteusepor tempo limitado considera-se arrendamento, ecomo tal se rege (CC/1916, art. 679). Dessacaracterística decorre o direito do enfiteuta detransmitir os seus direitos, por ato inter vivos oucausa mortis. Os bens enfitêuticos transmitem-se porherança na mesma ordem estabelecida a respeito dosalodiais, isto é, dos bens livres e desembaraçados,mas não podem ser divididos em glebas semconsentimento do senhorio. O aforamento, portanto,é indivisível se não houver o consentimento do

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senhorio, que pode ser tácito. Os sucessorespromoverão a eleição de cabecel que os representeperante o senhorio, tendo legitimação ativa e passivapara todas as questões (art. 690). Se, porém, osenhorio direto convier na divisão do prazo, cadauma das glebas em que for dividido constituirá prazodistinto (art. 690, § 2º).

O enfiteuta tem a obrigação de pagar aosenhorio uma pensão anual, também chamada cânonou foro. A falta de pagamento do foro por três anosconsecutivos acarreta o comisso, que é uma forma deextinção da enfiteuse (CC/1916, art. 692, II). Osenhorio, por sua vez, tem direito de preferência, ouprelação, quando o enfiteuta pretende transferir aoutrem o domínio útil em caso de venda judicial (art.689). Se não exercesse o direito de preferência, osenhorio teria direito ao laudêmio, isto é, umaporcentagem sobre o valor da transação, que podiaser convencionada livremente. Entretanto, seria de2,5% sobre o preço da alienação, se outra nãohouvesse sido fixada no título de aforamento (art.686). O mencionado art. 2.038, § 1º, I, das“Disposições Transitórias” do novo Código Civilproíbe, no entanto, nas enfiteuses existentes,“cobrar laudêmio ou prestação análoga nastransmissões de bem aforado, sobre o valor dasconstruções ou plantações”. O direito de preferênciatambém é assegurado ao foreiro, no caso de querer o

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senhorio vender o domínio direto, devendo, pois, sertambém interpelado a exercê-lo (arts. 684 e 685). Oenfiteuta está legitimado a gravar o bem emprazadocom hipoteca, servidão e usufruto, condicionado oônus a extinguir-se com a cessão do aforamento.

70.3. EXTINÇÃO DA ENFITEUSE

O art. 692 do Código Civil de 1916 prevê trêsmodos de extinção da enfiteuse: a) pela “naturaldeterioração do prédio aforado, quando chegue anão valer o capital correspondente ao foro e mais umquinto deste”; b) pelo “comisso, deixando o foreirode pagar as pensões devidas por três anosconsecutivos, caso em que o senhorio o indenizarádas benfeitorias necessárias” (inciso II). Aimpontualidade e a rescisão contratual têm de serpronunciadas pela autoridade judiciária competente.Podem as partes estabelecer no contrato que a faltade pagamento das pensões não acarreta o comisso.Dispõe a Súmula 122 do Supremo Tribunal Federalque “o enfiteuta pode purgar a mora enquanto nãodecretado o comisso por sentença”; e c) pelofalecimento do enfiteuta, sem herdeiros, salvo odireito dos credores (inciso III). Estes, pois, podemcontinuar com o aforamento até a liquidação dosdébitos do falecido. Altera-se, desse modo, oprincípio de que a herança vai ter ao Município, em

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falta de herdeiros, pois nesse caso o imóvel édevolvido ao senhorio. Trata-se, portanto, dehipótese de sucessão anômala ou irregular.

Além desses modos de extinção, peculiares àenfiteuse, outros existem, como: a) o perecimento doobjeto; b) a desapropriação — neste caso não cabeo laudêmio, pois não se trata de uma venda feita peloforeiro, malgrado algumas opiniões em contrário; c) ausucapião do imóvel aforado, em caso de inércia doforeiro e do titular do domínio direto; d) a renúnciafeita pelo enfiteuta, que deve ser expressa (CC/1916,art. 687); e) a consolidação, quando o enfiteutaexerce o direito de opção no caso de venda da nuapropriedade, passando a ter a propriedade plena, ouquando o senhorio direto exerce a opção, em caso devenda do domínio útil; f) a confusão, quando namesma pessoa se reúnem as qualidades de enfiteutae de senhorio direto, por ato inter vivos ou sucessãocausa mortis (se um deles se torna herdeiro do outroou ocorre a abertura da sucessão); g) o resgate.

Quanto a este, dispõe o art. 693 do Código Civilde 1916 que “todos os aforamentos, inclusive osconstituídos anteriormente a este Código, salvoacordo entre as partes, são resgatáveis dez anosdepois de constituídos, mediante pagamento de umlaudêmio, que será de 2,5% (dois e meio por cento)sobre o valor atual da propriedade plena, e de 10(dez) pensões anuais pelo foreiro, que não poderá no

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seu contrato renunciar ao direito de resgate, nemcontrariar as disposições imperativas desteCapítulo”. O resgate, portanto, tem a finalidade deconsolidar o domínio nas mãos do enfiteuta, que nãopode renunciar a tal direito, sendo nula eventualcláusula nesse sentido. Mas pode, querendo,continuar pagando o foro e não exercer o direito deresgate, mesmo tendo decorrido o prazo de dez anos.A expressão “salvo acordo entre as partes” somentese refere à possibilidade de diminuição, por avença,do prazo do resgate e do valor da indenização.

Quadro sinótico – Da enfiteuse

Dá-se a enfiteuse,aforamento ouemprazamento “quando porato entre vivos, ou de últimavontade, o proprietárioatribui a outrem o domínioútil do imóvel, pagando a

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1. Conceito

pessoa, que o adquire, eassim se constitui enfiteuta,ao senhorio direto umapensão, ou foro anual, certoe invariável” (CC/1916, art.678). O art. 2.038 dasDisposições Transitórias doCC/2002 proíbe aconstituição de enfiteuses esubenfiteuses e subordinaas existentes, até suaextinção, às disposições doCC anterior e leisposteriores.

O contrato de aforamentosó pode ter por objeto

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2. Objeto

só pode ter por objetoterras não cultivadas eterrenos que se destinem àedificação. A enfiteuse podeser constituída tambémsobre terrenos de marinha(Dec.-Lei n. 9.760/46).

— o contrato de enfiteuse éperpétuo. A enfiteuse portempo limitado considera-searrendamento e como tal serege (CC/1916, art. 679);— o enfiteuta tem aobrigação de pagar aosenhorio uma pensão anual,também chamadaforo;

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3.Características

foro;— o senhorio, por sua vez,tem direito de preferênciaquando o enfiteuta pretendetransferir a outrem odomínio útil em caso devenda judicial. Se nãoexercesse o direito depreferência, o senhorio teriadireito ao laudêmiouma porcentagem sobre ovalor da transação, quepodia ser convencionadalivremente.

a) pela naturaldeterioração doprédio aforado,

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Modospeculiares

prédio aforado,quando cheguea não valer ocapitalcorrespondenteao foro e maisum quintodeste;b) pelocomisso,deixando oforeiro de pagaras pensõesdevidas por trêsanosconsecutivos,caso em que o

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4. Extinção

caso em que osenhorio oindenizará dasbenfeitoriasnecessárias;c) pelofalecimento doenfiteuta, semherdeiros, salvoo direito doscredores(CC/1916, art.692).

Outros

a) perecimento;b)desapropriação;c) usucapião;

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Outrosmodos

c) usucapião;d) renúncia;e)consolidação;f) confusão;g) resgate.

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TÍTULO VDAS SERVIDÕES

71 CONCEITO

O Código Civil trata, no presente Título, dasservidões conhecidas como prediais, que sedistinguem das pessoais, como eram chamadas, nodireito romano, as vantagens proporcionadas aalguém, como o usufruto, o uso e a habitação.

Para que o proprietário de um prédio possa deleutilizar-se amplamente, torna-se necessário, muitasvezes, valer-se dos prédios vizinhos. As servidõesconstituem, assim, direitos, por efeito dos quais unsprédios servem a outros. Daí a origem dessaexpressão, que é definida como a restrição imposta aum prédio, para uso e utilidade de outro pertencentea dono diverso. Constituem direito real instituído emfavor de um prédio (dominante) sobre outro(serviente) pertencente a dono diverso (CC, art.1.378). A servidão predial nasce da vontade dosproprietários, não se confundindo com as servidõeslegais, que são direitos de vizinhança impostoscoativamente. A voluntariedade é, pois, da essênciada servidão.

As servidões podem tomar as mais variadas

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formas. A mais conhecida é a servidão de trânsito oude passagem, mas existem outras, como a deaqueduto (canalização), iluminação, pastagem,ventilação, não construir a certa altura etc. Não énecessário que os prédios sejam contíguos.

72 CARACTERÍSTICAS

a) A servidão é uma relação entre dois prédiosdistintos. De um lado, temos o prédio serviente,que sofre as restrições em benefício do outro,chamado dominante. Estabelece-se um ônus, quese consubstancia num dever, para o proprietário,de abstenção ou de permitir a utilização do imóvelpara certo fim. A vantagem ou desvantagem adereao imóvel e transmite-se com ele, tendo existênciaindependente da pessoa do proprietário. Gera umaobrigação propter rem: vincula o dono do prédioserviente, seja ele quem for.

b) Os prédios devem pertencer a donos diversos,pois, se forem do mesmo proprietário, estesimplesmente usará o que é seu, sem que seestabeleça uma servidão.

c) Nas servidões, serve a coisa e não o dono. Estenada tem a fazer. Sua obrigação não consiste emum facere, mas apenas em uma abstenção ou nodever de suportar o exercício da servidão, pois em

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razão dela perde ele alguns dos seus direitosdominicais.

d) A servidão não se presume, pois constitui-semediante declaração expressa dos proprietários,ou por testamento, e subsequente registro noCartório de Registro de Imóveis (CC, art. 1.378).Deve ser cumpridamente provada por quem alegasua existência. Na dúvida, decide-se contra ela.Sua interpretação é sempre restrita, por implicarlimitação ao direito de propriedade.

e) A servidão é direito real, acessório, de duraçãoindefinida e indivisível. Real, porque incidediretamente sobre bens imóveis, embora alheios,está munida de sequela e ação real e é oponívelerga omnes. Acessório, porque dependente dodireito de propriedade. Acompanha os prédiosquando alienados. De duração indefinida, porqueperde sua característica de servidão quandoestabelecida por tempo limitado. Duraindefinidamente, enquanto não extinta por algumacausa legal, ainda que os prédios passem a outrosdonos. Por isso, costuma-se dizer que a servidão éperpétua. Indivisível, porque não se desdobra emcaso de divisão do prédio dominante ou do prédioserviente. Só pode ser reclamada como um todo,ainda que o prédio dominante venha a pertencer adiversas pessoas (CC, art. 1.386).

f) A servidão é inalienável. Por decorrer de uma

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necessidade do prédio dominante, não se concebesua transferência a outro prédio, pois implicariaextinção da antiga servidão e constituição deoutra.

73 CLASSIFICAÇÃO

A classificação mais importante das servidões éa que as distingue pelo exercício. Sob esse prismapodem ser contínuas e descontínuas, aparentes enão aparentes. Uma servidão é contínua quandoexercida independentemente de uma ação humana e,em geral, ininterruptamente. Exemplo típico é a deaqueduto, em que as águas correm de um prédio aoutro, sem necessidade da atuação das pessoas.Podem ser mencionadas, ainda, as de passagem decabos e tubulações condutores de energia elétrica ede outros serviços públicos e as de iluminação eventilação. Uma vez estabelecidas, subsistem eexercem-se independentemente de ato humano, aindaque na realidade possam deixar de ser praticadasininterruptamente. Servidão descontínua é a que temo seu exercício condicionado a algum ato humanoatual, como na de trânsito e na de retirada d’água.Aparente é a que se manifesta por obras exteriores,visíveis e permanentes, como a de passagem e a deaqueduto, em que o caminho e os condutos podem

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ser vistos. Não aparente é a servidão que não serevela por obras exteriores, como a de não edificaralém de certa altura ou de não construir emdeterminado local.

Essas espécies podem combinar-se, dandoorigem, então, às servidões contínuas e aparentes,como as de aqueduto; às contínuas e não aparentes,como as de não construir além de certa altura(servidão altius non tollendi); às descontínuas eaparentes, como as de passagem por caminhodemarcado; às descontínuas e não aparentes, comoas de retirar água, sem caminho visível.

74 MODOS DE CONSTITUIÇÃO

Alguns modos de constituição das servidõesestão previstos na lei, enquanto outros são criaçãoda doutrina e da jurisprudência. As servidões podemnascer de ato ou fato humano. O ato humano geradorde uma servidão pode ser: a) negócio jurídico; b)s e n t e n ç a ; c) usucapião; d) destinação doproprietário. O fato humano é gerador somente daservidão de trânsito. Os modos de constituição dasservidões por destinação do proprietário e por fatohumano não constam da lei e são criações dadoutrina e da jurisprudência.

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74.1. SERVIDÃO CONSTITUÍDA POR ATOHUMANO

O ato humano gerador da servidão pode ser:a) Negócio jurídico “causa mortis” (testamento) ou

inter vivos. O modo mais frequente, no entanto, deconstituição das servidões é por ato inter vivos,isto é, pelo contrato, em regra a título oneroso.Necessária a escritura pública, bem como oregistro imobiliário (CC, arts. 108 e 1.378).

b) A sentença proferida em ação de divisão. Napartilha, “instituir-se-ão as servidões, que foremindispensáveis, em favor de uns quinhões sobreos outros, incluindo o respectivo valor noorçamento para que, não se tratando de servidõesnaturais, seja compensado o condôminoaquinhoado com o prédio serviente” (CPC, art.979, II).

c) A usucapião, consoante prevê o art. 1.379 doCódigo Civil: “O exercício incontestado econtínuo de uma servidão aparente, por dez anos,nos termos do art. 1.242, autoriza o interessado aregistrá-la em seu nome no Registro de Imóveis,valendo-lhe como título a sentença que julgarconsumada a usucapião”. Acrescenta o parágrafoúnico: “Se o possuidor não tiver título, o prazo dausucapião será de vinte anos”. Apenas asservidões aparentes e contínuas podem ser objeto

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de posse. Entretanto, a jurisprudência passou aadmitir, somente com relação à servidão detrânsito (descontínua) que se revele por sinaisexternos, a proteção possessória (v. n. 74.2, infra).

d) A destinação do proprietário, quando esteestabelece uma serventia em favor de um prédiosobre outro, sendo ambos de sua propriedade, eum deles é alienado. Passando os prédios apertencer a donos diversos, a serventiatransforma-se em servidão. É óbvio que no títulode alienação nada constou, porque senão teria elasurgido do contrato. Mesmo assim, considera-setransformada a serventia em servidão porque oadquirente contava com ela, já que foraestabelecida pelo proprietário, que dela se valia.Por isso, é necessário que a serventia seja visívelou que exista obra que revele a destinação, bemcomo a falta de declaração contrária aoestabelecimento da servidão. Pode surgir tambéma servidão por destinação do proprietário quandoa serventia foi estabelecida entre partes de umamesma gleba e o proprietário aliena uma delas, ouentão aliena as duas a pessoas diferentes. Aservidão só surgirá quando os prédios, dominantee serviente, passarem a pertencer a pessoasdiversas.

74.2. SERVIDÃO CONSTITUÍDA POR FATO

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HUMANO

A jurisprudência revelou uma modalidade deconstituição de servidão, aplicável exclusivamente àde trânsito, decorrente de fato humano. Tem-seentendido que, se o dono do prédio dominantecostuma servir-se de determinado caminho aberto noprédio serviente, e se este se exterioriza por sinaisvisíveis, como aterros, mata-burros, bueiros,pontilhões etc., nasce o direito real sobre coisaalheia, digno de proteção possessória. Talentendimento encontra-se cristalizado na Súmula 415do Supremo Tribunal Federal, do seguinte teor:“Servidão de trânsito não titulada, mas tornadapermanente, sobretudo pela natureza das obrasrealizadas, considera-se aparente, conferindo direitoà proteção possessória”. Se o caminho não édemarcado e visível, será encarada como meratolerância do dono do prédio serviente.

75 AÇÕES QUE PROTEGEM AS SERVIDÕES

São as seguintes: a) confessória, que visa àobtenção do reconhecimento judicial da existência deservidão negada ou contestada. Trata-se de açãoreal, sendo indispensável a outorga uxória e a citaçãoda mulher do réu; b) negatória, destinada a

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possibilitar ao dono do prédio serviente a obtençãode sentença que declare a inexistência de servidãoou de direito à sua ampliação; c) de manutenção oureintegração de posse, em favor do dono do prédiodominante, que é molestado ou esbulhado peloproprietário do prédio serviente. Também pode serutilizada quando este não permite a realização deobras de conservação da servidão; d) de usucapião,conforme expresso no art. 1.379 do Código Civil.

76 DA EXTINÇÃO DAS SERVIDÕES

“Salvo nas desapropriações, a servidão, uma vezregistrada, só se extingue, com respeito a terceiros,quando cancelada” (CC, art. 1.387). É natural queisso ocorra, tendo em vista que sua constituiçãodepende de tal registro, especialmente em setratando de não aparentes. O art. 1.388 do CódigoCivil indica os casos em que o cancelamento podeser deferido judicialmente, a pedido do dono doprédio serviente: a) pela renúncia, que deve serexpressa, mas admite-se que possa ser tácita quando,por exemplo, o dono do prédio dominante permiteque o dono do prédio serviente faça nele obraincompatível com o exercício da servidão; b) pelacessação, para o prédio dominante, da utilidade quedeterminou a constituição da servidão; c) pelo

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resgate, que só poderá ocorrer quandoconvencionado. Difere, pois, da enfiteuse, queautoriza sempre o resgate (CC/1916, art. 683).

Extinguem-se, ainda, as servidões prediais, nostermos do art. 1.389 do Código Civil: a) pela reuniãodos dois prédios no domínio da mesma pessoa —nesse caso, opera-se a confusão; b) pela supressãodas respectivas obras, por efeito de contrato ou deoutro título expresso — trata-se de modo de extinçãoque se aplica às servidões aparentes; c) pelo nãouso, durante dez anos contínuos.

Quadro sinótico – Das servidões

1. Conceito deservidão

Constitui restriçãoimposta a um imóvel,para uso e utilidadede outro pertencentea dono diverso. Trata-se de direito realinstituído em favor de

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predial um prédio(dominante) sobreoutro (serviente)pertencente a donodiverso (CC, art.1.378).

2.Características

a) a servidão é umarelação entre doisprédios distintos;b) os prédios devempertencer a donosdiversos;c) nas servidões,serve a coisa e não odono;d) a servidão não se

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d) a servidão não sepresume;e) a servidão é direitoreal, acessório, deduração indefinida eindivisível;f) a servidão éinalienável.

Quanto ao modo deexercício, podem ser:contínuas edescontínuas; equanto àexteriorização:aparentes e aparentes. Essasespécies podem

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3.Classificação

espécies podemcombinar-se, dandoorigem às servidões:a) contínuas eaparentes; contínuas e aparentes; descontínuas eaparentes; descontínuas e aparentes.

4. Modos deconstituição

Atohumano

a) negóciojurídico;b)sentença;

c)

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4. Modos deconstituição

Atohumano

c)usucapião;d)destinaçãodoproprietário.

Fatohumano

servidão detrânsito

5. Ações queprotegem asservidões

a) confessória;b) negatória;c) de manutenção ede reintegração deposse;d) de usucapião.

a) pela renúncia;

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6. Extinção(arts. 1.388 e1.389)

a) pela renúncia;b) pela cessação,para o prédiodominante, dautilidade quedeterminou aconstituição daservidão;c) pelo resgate;d) pela confusão;e) pela supressãodas respectivasobras;f) pelo não uso,durante dez anoscontínuos.

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TÍTULO VIDO USUFRUTO

77 CONCEITO E CARACTERÍSTICAS

O Código Civil de 1916 definia o usufruto, no art.713, como “o direito real de fruir as utilidades e frutosde uma coisa, enquanto temporariamente destacadoda propriedade”. Alguns dos poderes inerentes aodomínio são transferidos ao usufrutuário, que passaa ter, assim, direito de uso e gozo sobre coisa alheia.Como é temporário, ocorrendo sua extinção, passaráo nu-proprietário a ter o domínio pleno da coisa.

Diz-se que o usufruto é temporário porqueextingue-se com a morte do usufrutuário (CC, art.1.410, I) ou no prazo de trinta anos, se constituídoem favor de pessoa jurídica, e esta não se extinguirantes (art. 1.410, III). É, também, direito real,gozando o seu titular das prerrogativas deste:sequela, oposição erga omnes, ação real etc. É,ainda, inalienável, permitindo-se, porém, a cessão deseu exercício por título gratuito ou oneroso (CC, art.1.393). Se isso acontecer, o usufrutuário poderátambém arrendar o imóvel, não estando obrigado aexplorá-lo pessoalmente.

A inalienabilidade ocasiona a

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impenhorabilidade do usufruto. O direito em si nãopode ser penhorado, em execução movida por dívidado usufrutuário, porque a penhora destina-se apromover a venda forçada do bem em hasta pública.Mas como o seu exercício pode ser cedido, épassível, em consequência, de ser penhorado. Nessecaso, o usufrutuário fica provisoriamente privado dodireito de retirar da coisa os frutos que ela produz. Ojuiz que deferir a penhora nomeará um administradordo imóvel. Os frutos produzidos e colhidos servirãopara pagar o credor até que se extinga totalmente adívida. Nesse caso, a penhora será levantada,readquirindo o usufrutuário o direito de uso e gozoda coisa (CPC, art. 717). Observa-se que ousufrutuário não perde o direito de usufruto, o queocorreria se este pudesse ser penhorado earrematado por terceiro. Perde apenas,temporariamente, o exercício desse direito, em razãoda penhora.

No entanto, se a dívida for do nu-proprietário, apenhora pode recair sobre os seus direitos. O nu-proprietário tem o direito de dispor da coisa. Oimóvel pode ser penhorado, portanto, e alienado emhasta pública, mas a todo tempo, inclusive depois daarrematação, incidirá sobre ele o direito real deusufruto, pertencente ao usufrutuário, até que venhaa extinguir-se, nas hipóteses previstas no art. 1.410.

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78 CONSTITUIÇÃO E OBJETO

O usufruto pode constituir-se por determinaçãolegal, ato de vontade e usucapião. Por determinaçãolegal é o estabelecido pela lei em favor de certaspessoas, como o usufruto dos pais sobre os bens dofilho menor (CC, art. 1.689, I). Por ato de vontade é oque resulta de contrato ou testamento. Admite-se,ainda, a sua constituição pela usucapião, ordináriaou extraordinária, desde que concorram os requisitoslegais.

Podem ser objeto de usufruto um ou mais bens,móveis ou imóveis, um patrimônio inteiro ou partedeste (CC, art. 1.390). “O usufruto de imóveis,quando não resulte de usucapião, constituir-se-ámediante registro no Cartório de Registro deImóveis” (art. 1.391). O usufruto de bens móveisconsumíveis (art. 1.392, § 1º) é denominado quaseusufruto ou usufruto impróprio, assemelhando-se aomútuo, porque o usufrutuário torna-se verdadeiroproprietário, ficando obrigado a restituir coisaequivalente. Em regra, o usufrutuário é obrigado aconservar a substância da coisa para o nu-proprietário. “Se o usufruto recai sobreuniversalidade ou quota-parte de bens, ousufrutuário tem direito à parte do tesouro achadopor outrem, e ao preço pago pelo vizinho do prédiousufruído, para obter meação em parede, cerca, muro,

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vala ou valado” (art. 1.392, § 3º).

79 USUFRUTO E FIDEICOMISSO

Malgrado a semelhança entre usufruto efideicomisso, decorrente do fato de existirem, emambos, dois beneficiários ou titulares, nítida é adiferença entre os dois institutos: a) o primeiro édireito real sobre coisa alheia, enquanto ofideicomisso constitui espécie de substituiçãotestamentária; b) naquele, o domínio se desmembra,cabendo a cada titular certos direitos (aousufrutuário, os de usar e gozar; ao nu-proprietário,os de dispor e de reaver), ao passo que nofideicomisso cada titular tem a propriedade plena; c)o usufrutuário e o nu-proprietário exercemsimultaneamente os seus direitos; já o fiduciário e ofideicomissário exercem-nos sucessivamente; d) nousufruto, são contempladas pessoas já existentes,enquanto o fideicomisso somente se permite emfavor dos não concebidos ao tempo da morte dotestador, ou seja, em favor da prole eventual (CC, art.1.952).

80 ESPÉCIES

Quanto à origem ou modo de constituição, o

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usufruto pode ser legal e convencional (voluntário).Legal é o instituído por lei em benefício dedeterminadas pessoas. Convencional é o que resultado contrato (ato inter vivos, em geral sob a forma dedoação) ou do testamento (ato causa mortis).

Quanto à sua duração, pode ser temporário ouvitalício. Usufruto temporário é o estabelecido comprazo certo de vigência. Extingue-se com o adventodo termo. Vitalício é o que perdura até a morte dousufrutuário ou enquanto não sobrevier causa legalextintiva (CC, arts. 1.410 e 1.411).

Quanto ao seu objeto, o usufruto divide-se empróprio ou impróprio. Próprio é o que tem por objetocoisas inconsumíveis e infungíveis, cujassubstâncias são conservadas e restituídas ao nu-proprietário. Impróprio é o que incide sobre bensconsumíveis ou fungíveis, sendo denominado quaseusufruto (CC, art. 1.392, § 1º).

Quanto aos titulares, pode ser simultâneo esucessivo. Simultâneo é o constituído em favor deduas ou mais pessoas, ao mesmo tempo,extinguindo-se gradativamente em relação a cadauma das que falecerem, salvo se expressamenteestipulado o direito de acrescer. Neste caso, oquinhão do usufrutuário falecido acresce ao dosobrevivente, que passa a desfrutar do bem comexclusividade (art. 1.411). Esse direito, nos usufrutosinstituídos por testamento, rege-se pelo disposto no

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art. 1.946 do Código Civil. Usufruto sucessivo é oinstituído em favor de uma pessoa, para que depoisde sua morte transmita-se a terceiro. Essa modalidadenão é admitida pelo nosso ordenamento, que prevê aextinção do usufruto pela morte do usufrutuário.

Se o doador, ao reservar para si o usufruto(usufruto deducto) do bem doado, estabelecer a suainalienabilidade, esse gravame só poderá sercancelado após sua morte, se estiver bemevidenciada a sua intenção de não permitir aalienação do bem somente enquanto permanecercomo usufrutuário. Falecendo este, cancelam-se ousufruto e a cláusula de inalienabilidade de carátertemporário.

81 EXTINÇÃO DO USUFRUTO

Segundo o art. 1.410 do Código Civil, extingue-se o usufruto: a) pela renúncia (inciso I) oudesistência manifestada pelo usufrutuário, exigindo-se apenas que o faça por escritura pública, se odireito se refere a bens imóveis de valor superior aoestabelecido no art. 108 do Código Civil (trinta vezeso maior salário mínimo vigente no País); b) pelamorte do usufrutuário (inciso I). O direito deacrescer, quando estipulado, constitui uma exceção àregra de que o usufruto se extingue com a morte do

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usufrutuário. Entretanto, quando estabelecido nasdoações de pais a filhos, não pode atingir a legítimados herdeiros necessários, operando-se somente notocante à metade disponível; c) pelo advento dotermo de sua duração, estabelecido no seu atoconstitutivo (inciso II), salvo se o usufrutuáriofalecer antes; d) pela extinção da pessoa jurídica, emfavor de quem foi constituído, ou, se ela perdurar,pelo decurso de trinta anos da data em que secomeçou a exercer (inciso III); e) pela cessação domotivo de que se origina (inciso IV), que pode serpio, moral, científico etc., bem como no caso dousufruto dos pais sobre os bens dos filhos menores,que cessa quando estes atingem a maioridade; f) peladestruição da coisa, não sendo fungível (inciso V).Se, no entanto, a coisa foi desapropriada ou seencontrava no seguro, o direito do usufrutuário sesub-roga na indenização recebida (arts. 1.407, 1.408,§ 2º, e 1.409). Acontece o mesmo quando adestruição da coisa ocorreu por culpa de terceirocondenado a reparar o dano; g) pela consolidação,quando na mesma pessoa se reúnem as qualidadesde usufrutuário e nu-proprietário (inciso VI). Pode talsituação ocorrer, por exemplo, quando o usufrutuárioadquire o domínio do bem, por ato inter vivos oucausa mortis; h) por culpa do usufrutuário, quandofalta ao seu dever de cuidar bem da coisa (inciso VII).A extinção depende do reconhecimento da culpa por

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sentença; i) pelo não uso, ou não fruição (incisoVIII), da coisa em que o usufruto recai (arts. 1.390 e1.399).

Além desses modos de extinção expressamenteprevistos, pode o usufruto extinguir-se, ainda, peloimplemento de condição resolutiva estabelecidapelo instituidor.

Quadro sinótico – Do usufruto

1. Conceito

Usufruto édireito real defruir as utilidadese frutos de umacoisa, enquantotemporariamentedestacado dapropriedade.Alguns dospoderes

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1. Conceito poderesinerentes aodomínio sãotransferidos aousufrutuário, quepassa a ter,assim, direito deuso e gozosobre coisaalheia.

2.Características

a) é temporário;b) é direito realsobre coisaalheia;c) é inalienável,permitindo-se,

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Características porém, a cessãode seu exercício(CC, art. 1.393);d) éimpenhorável.

3. Constituição

a) pordeterminaçãolegal;b) por ato devontade;c) pelausucapião.

Podem serobjeto deusufruto um ou

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4. Objeto

mais bens,móveis ouimóveis, umpatrimôniointeiro ou partedeste (CC, art.1.390).

a) o primeiro édireito real sobrecoisa alheia,enquanto ofideicomissoconstitui espéciede substituiçãotestamentária;b) naquele, o

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5. Usufruto efideicomisso(distinção)

b) naquele, odomínio sedesmembra,cabendo a cadatitular certosdireitos, aopasso que nofideicomissocada titular tema propriedadeplena;c) o usufrutuárioe o nu-proprietárioexercemsimultaneamenteos seus direitos;já o fiduciário e

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já o fiduciário eo fideicomissárioexercem-nossucessivamente;

5. Usufruto efideicomisso(distinção)

d) no usufruto,sãocontempladaspessoas jáexistentes,enquanto ofideicomissosomente sepermite em favordos nãoconcebidos aotempo da mortedo testador, ou

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do testador, ouseja, em favorda proleeventual (CC,art. 1.952).

6.Espécies

Quantoàorigem

a) legal;b)convencional.

Quantoàduração

a)temporário;b) vitalício.

Quantoao seuobjeto

a) próprio;b) impróprio.

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objeto

Quantoaostitulares

a)simultâneo;b) sucessivo.

7.

a) pela renúncia oudesistência;b) pela morte dousufrutuário;c) pelo advento dotermo de sua duração;d) pela extinção dapessoa jurídica;e) pela cessação domotivo de que seorigina;f) pela destruição da

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7.Extinção(CC, art.1.410)

f) pela destruição dacoisa, não sendofungível;g) pela consolidação;h) por culpa dousufrutuário, quandofalta ao seu dever decuidar bem da coisa;i) pelo não uso dacoisa em que ousufruto recai;j) pelo implemento decondição resolutivaestabelecida peloinstituidor.

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TÍTULO VIIDO USO

Trata-se de instituto que se destina a assegurarao beneficiário a utilização imediata de coisa alheiae que praticamente não tem significação em nossoPaís. É considerado um usufruto restrito, porqueostenta as mesmas características de direito real,temporário e resultante do desmembramento dapropriedade, distinguindo-se entretanto pelo fato deo usufrutuário auferir o uso e a fruição da coisa,enquanto ao usuário não é concedida senão autilização restrita aos limites das necessidades suase de sua família (CC, art. 1.412). O objeto do usopode consistir em coisa móvel ou imóvel. Aponta-se,como aplicação do direito de uso, o jazigo perpétuo,a faculdade de nele sepultar os mortos da família.“São aplicáveis ao uso, no que não for contrário àsua natureza, as disposições relativas ao usufruto”(art. 1.413).

Quadro sinótico – Do uso

Trata-se de direito

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1.Conceito

Trata-se de direitoreal que autorizauma pessoa aretirar,temporariamente, decoisa alheia, todasas utilidades paraatender às suasprópriasnecessidades e àsde sua família.

Embora sejaconsiderado umusufruto restrito, ouso distingue-sedeste instituto pelofato de o

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2. Uso eusufruto(distinção)

fato de ousufrutuário auferir ouso e a fruição dacoisa, enquanto aousuário não éconcedida senão autilização restritaaos limites dasnecessidades suase de sua família(CC, art. 1.412).

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TÍTULO VIIIDA HABITAÇÃO

O direito real de habitação é ainda mais restritodo que o uso, pois consiste na faculdade de residirnum prédio alheio, com a família. Devido ao seucaráter personalíssimo, não pode ser cedido. Assim,o titular deve residir, ele próprio, com sua família, noprédio. Não pode alugá-lo, nem emprestá-lo. Seconferido a mais de uma pessoa, qualquer delas queocupar a habitação estará no exercício de direitopróprio, nada devendo às demais a título de aluguel.A nenhuma será lícito impedir o exercício da outra oudas outras. É direito real temporário, extinguindo-sepelos mesmos modos de extinção do usufruto (CC,art. 1.416).

Pode constituir-se, assim como o usufruto, porlei (CC, art. 1.831; Lei n. 9.278/96, que regulamentou aunião estável) e por ato de vontade (contrato etestamento), devendo ser registrado (LRP, art. 167, I,n. 7).

Quadro sinótico – Da habitação

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1. Conceito

É direito realtemporário deocupargratuitamentecasa alheia, paramorada do titulare de sua família(CC, art. 1.414).É ainda maisrestrito do que ouso.

2.Característica

É direito realtemporário,extinguindo-sepelos mesmosmodos de

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Característica modos deextinção dousufruto (CC,art. 1.416).

3.Constituição

a) por lei (CC,art. 1.831);b) por ato devontade(contrato etestamento),devendo serregistrado (LRP,art. 167, I, n. 7).

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TÍTULO IXDO DIREITO DO PROMITENTE COMPRADOR

O Decreto-Lei n. 58, de 10 de dezembro de 1937,ampliou o rol dos direitos reais contemplados noCódigo Civil de 1916, com a criação da promessairretratável de venda de um bem de raiz. Talpromessa, ou compromisso de compra e venda, é umcontrato (pactum de contrahendo), pelo qual aspartes se comprometem a levar a efeito um contratodefinitivo de venda e compra. O consentimento já foidado, na promessa, convencionando os contratantesreiterá-lo na escritura definitiva. O promitentecomprador não recebe o domínio da coisa, mas passaa ter direitos sobre ela. Estes são, por isso, direitosreais sobre coisa alheia e consistem em desfrutardesta, em impedir sua válida alienação a outrem e nopoder de ajuizar ação de adjudicação compulsória.

O sistema do Código Civil de 1916 permitia quemuitos loteadores, com base no seu art. 1.088,deixassem de outorgar a escritura definitiva eoptassem por pagar perdas e danos aocompromissário comprador, estipuladas geralmentesob a forma de devolução do preço em dobro, com aintenção de revender o lote, muitas vezessupervalorizado, com lucro, porque o aludido

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dispositivo admitia o arrependimento. Com oadvento do Decreto-Lei n. 58/37, o compromissotornava-se irretratável e conferia direito real aocomprador, desde que levado ao registro imobiliário.A Lei n. 649, de 11 de março de 1949, deu novaredação ao art. 22 daquele decreto-lei(posteriormente modificado pela Lei n. 6.014, de 27-12-1973), estendendo tal proteção aos imóveis nãoloteados.

A Lei n. 6.766, de 19 de dezembro de 1979,denominada Lei do Parcelamento do Solo Urbano,veio derrogar o Decreto-Lei n. 58/37, que hoje seaplica somente aos loteamentos rurais. O art. 25 dareferida lei declara irretratáveis e irrevogáveis oscompromissos de compra e venda de imóveisloteados. Qualquer cláusula de arrependimento,nesses contratos, ter-se-á, pois, por não escrita. Emse tratando de imóvel não loteado, lícito afigura-seconvencionar o arrependimento, afastando-se, comisso, a constituição do direito real. Inexistindocláusula nesse sentido, prevalece a irretratabilidade.

O novo Código Civil disciplina o direito dopromitente comprador nos arts. 1.417 e 1.418. Dispõeo primeiro: “Mediante promessa de compra e venda,em que se não pactuou arrependimento, celebradapor instrumento público ou particular, e registrada noCartório de Registro de Imóveis, adquire opromitente comprador direito real à aquisição do

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imóvel”. Prescreve o art. 1.418: “O promitentecomprador, titular de direito real, pode exigir dopromitente vendedor, ou de terceiros, a quem osdireitos deste forem cedidos, a outorga da escrituradefinitiva de compra e venda, conforme o dispostono instrumento preliminar; e, se houver recusa,requerer ao juiz a adjudicação do imóvel”.

O Superior Tribunal de Justiça tem admitido apropositura de ação de adjudicação compulsóriamesmo não estando registrado o compromisso decompra e venda irretratável e irrevogável. Proclama,com efeito, a Súmula 239 desse Sodalício: “O direitoà adjudicação compulsória não se condiciona aoregistro do compromisso de compra e venda nocartório de imóveis”. A autorização do cônjuge éindispensável, por consistir em alienação de bemimóvel sujeita à adjudicação compulsória.

Se o compromissário comprador deixar decumprir a sua obrigação, atrasando o pagamento dasprestações, poderá o vendedor pleitear a rescisãocontratual, cumulada com pedido de reintegração deposse. Antes, porém, terá de constituir em mora odevedor, notificando-o (judicialmente ou peloCartório de Registro de Imóveis) para pagar asprestações em atraso no prazo de trinta dias, se setratar de imóvel loteado (Lei n. 6.766/79, art. 32), oude quinze dias, se for imóvel não loteado (Dec.-Lei n.745/69), ainda que no contrato conste cláusula

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resolutiva expressa. Neste último caso, a notificaçãoprévia ou premonitória pode ser feita judicialmenteou pelo Cartório de Títulos e Documentos. Embora acitação para a ação constitua em mora o devedor(CPC, art. 219), nos casos mencionados deve serprévia. Dispõe a Súmula 76 do Superior Tribunal deJustiça que “a falta de registro do compromisso decompra e venda de imóvel não dispensa a préviainterpelação para constituir em mora o devedor”.

Proclamam as Súmulas 1 e 2 do Tribunal deJustiça de São Paulo: “1. O compromissáriocomprador de imóvel, mesmo inadimplente, podepedir a rescisão do contrato e reaver as quantiaspagas, admitida a compensação com gastos própriosde administração e propaganda feitos pelocompromissário vendedor, assim como com o valorque se arbitrar pelo tempo de ocupação do bem”; “2.A devolução das quantias pagas em contrato decompromisso de compra e venda de imóvel deve serfeita de uma só vez, não se sujeitando à forma deparcelamento prevista para a aquisição”.

Quadro sinótico – Do direito do promitentecomprador

Trata-se de um

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1.Compromissode compra evenda

Trata-se de umcontrato peloqual as partes secomprometem alevar a efeito umcontratodefinitivo devenda e compra.O consentimentojá foi dado, napromessa,convencionandoos contratantesreiterá-lo naescrituradefinitiva.

O CC/2002

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2. Disciplinalegal

O CC/2002disciplina odireito dopromitentecomprador nosarts. 1.417 e1.418. Dispõe oprimeiro:“Mediantepromessa decompra e venda,em que não sepactuouarrependimento,celebrada porinstrumentopúblico ou

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público ouparticular, eregistrada noCartório deRegistro deImóveis, adquireo promitentecompradordireito real àaquisição doimóvel”.

O STJ temadmitido apropositura deação deadjudicaçãocompulsória

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3.Adjudicaçãocompulsória(CC, art.1.418)

compulsóriamesmo nãoestandoregistrado ocompromisso decompra e vendairretratável(Súmula 239). Aautorização docônjuge éindispensável,por consistir emalienação debem imóvelsujeita àadjudicaçãocompulsória.

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Se ocompromissáriocompradordeixar de cumprira sua obrigação,atrasando opagamento dasprestações,poderá ovendedor pleiteara rescisãocontratual,cumulada compedido dereintegração deposse. Antes,

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4. Rescisãocontratual

porém, terá deconstituir emmora o devedor,notificando-opara pagar asprestações ematraso no prazode 30 dias, se setratar de imóvelloteado (Lei n.6.766/79, art.32), ou de 15dias, se forimóvel nãoloteado (Dec.-Lein. 745/69), aindaque no contrato

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que no contratoconste cláusularesolutivaexpressa.

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TÍTULO XDIREITOS REAIS DE GARANTIA. DO

PENHOR, DA HIPOTECA E DA ANTICRESE

CAPÍTULO IDISPOSIÇÕES GERAIS

82 CONCEITO E CARACTERÍSTICAS

O Código Civil brasileiro contempla as seguintesmodalidades de garantia: penhor, hipoteca eanticrese (art. 1.419). A Lei n. 4.728, de 14 de julho de1965, modificada pelo Decreto-Lei n. 911, de 1º deoutubro de 1969, criou uma nova modalidade: aalienação fiduciária, disciplinada no novo CódigoCivil como propriedade fiduciária (arts. 1.361 a 1.368).Além dos privilégios a certos créditos criados pelalei, podem as partes convencionar uma segurançaespecial de recebimento do crédito, a que se dá onome de garantia, porque muitas vezes os débitosdo devedor podem exceder o valor de seupatrimônio. Pode, então, o credor exigir maioresgarantias, fidejussórias ou reais, não se contentandocom a garantia geral representada pelo patrimônio do

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devedor. A fidejussória ou pessoal é aquela em queterceiro se responsabiliza pela solução da dívida,caso o devedor deixe de cumprir a obrigação.Decorre do contrato de fiança (CC, art. 818). É umagarantia relativa, porque pode acontecer que o fiadorse torne insolvente por ocasião do vencimento dadívida.

A garantia real é mais eficaz, visto que vinculadeterminado bem do devedor ao pagamento dadívida. No caso do penhor (bens móveis) e dahipoteca (bens imóveis), o bem dado em garantia épenhorado, havendo impontualidade do devedor, elevado à hasta pública. O produto da arremataçãodestinar-se-á preferencialmente ao pagamento docredor pignoratício ou hipotecário. Os quirografáriossó terão direito às sobras, que lhes serão rateadas.Na anticrese, a coisa dada em garantia passa àsmãos do credor, que procura pagar-se com as rendaspor ela produzidas. Trata-se de direitos reais (CC, art.1.419), pois munidos das prerrogativas próprias detais direitos, mas acessórios, uma vez que visamgarantir uma dívida, que é o principal.

Os direitos reais de garantia não se confundemcom os de gozo ou de fruição. Estes têm porconteúdo o uso e fruição das utilidades da coisa, daqual o seu titular tem posse direta, implicandorestrições ao jus utendi e fruendi do proprietário.Nos direitos reais de garantia há vinculação de um

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bem, pertencente ao devedor, ao pagamento de umadívida, sem que o credor possa dele usar e gozar,mesmo quando o tem em seu poder, como no penhor,sendo que qualquer rendimento desse bem édestinado exclusivamente à liquidação do débito,como na anticrese. Os direitos reais de gozo sãoautônomos, enquanto os de garantia são acessórios.Não se confundem, também, com os privilégios.Estes asseguram preferência sobre todo o patrimôniodo devedor e decorrem da lei, não assegurandopoder imediato sobre os bens. Aqueles decorrem deconvenção entre as partes e envolvem bensdeterminados, que ficam vinculados ao cumprimentoda obrigação.

83 EFEITOS: PREFERÊNCIA, SEQUELA,EXCUSSÃO E INDIVISIBILIDADE

O principal efeito das garantias reais consiste nofato de o bem, que era segurança comum a todos oscredores e que foi separado do patrimônio dodevedor, ficar afetado ao pagamento prioritário dedeterminada obrigação. Disso decorrem, ainda, osseguintes efeitos:a) Direito de preferência — o credor hipotecário e o

pignoratício preferem, no pagamento, a outroscredores (CC, art. 1.422). O produto da

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arrematação do bem dado em garantia serádestinado, primeiramente, ao pagamento do credortitular do direito real. As sobras, se houver, serãorateadas entre os demais credores. Em caso deinsolvência do devedor, receberápreferencialmente o credor com garantia real, como produto da venda do bem clausurado, gozandoassim da faculdade de receber sem se sujeitar aorateio. Quando o produto obtido na hasta públicanão for suficiente para o pagamento da dívida, ocredor continuará a sê-lo do saldo, porém nacondição de quirografário, porque o bem dadoem garantia já foi arrematado. O direito depreferência subsume-se no seguinte princípio:prior tempore potior iure, de aplicação geral emmatéria de direitos reais (primeiro no tempo,melhor no direito).

b) Direito de sequela — é o direito de perseguir ereclamar a coisa dada em garantia, em poder dequem quer que se encontre, para sobre ela exercero seu direito de excussão, pois o valor do bemestá afeto à satisfação do crédito. Assim, quemadquire imóvel hipotecado, por exemplo, estásujeito a vê-lo levado à hasta pública, parapagamento da dívida que está a garantir.

c) Direito de excussão — os credores hipotecário epignoratício têm o direito de excutir a coisahipotecada ou empenhada (CC, art. 1.422), isto é,

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promover a sua venda em hasta pública, por meiodo processo de execução judicial. É requisito,porém, que a obrigação esteja vencida. Havendomais de uma hipoteca sobre o mesmo bem,observar-se-á a prioridade no registro.

d) Indivisibilidade — “o pagamento de uma ou maisprestações da dívida não importa exoneraçãocorrespondente da garantia, ainda que estacompreenda vários bens, salvo disposiçãoexpressa no título ou na quitação” (CC, art. 1.421).O pagamento parcial de uma dívida não acarreta aliberação da garantia na proporção do pagamentoefetuado, salvo se o contrário for convencionado.O art. 1.429 é consequência desse princípio eestabelece: “Os sucessores do devedor nãopodem remir parcialmente o penhor ou a hipotecana proporção dos seus quinhões; qualquer deles,porém, pode fazê-lo no todo”. O sucessor dodevedor não pode liberar o seu quinhão, pagandoapenas a sua cota-parte na dívida. Terá, paratanto, de pagar a totalidade do débito, sub-rogando-se nos direitos do credor pelas cotas doscoerdeiros.

84 REQUISITOS PARA EFICÁCIA DAGARANTIA REAL

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Para a validade da garantia real exige a lei, alémd a capacidade geral para os atos da vida civil, aespecial para alienar. Apenas as coisas suscetíveisde alienação podem ser dadas em garantia, e sóaquele que pode alienar pode hipotecar, dar emanticrese ou empenhar. Somente as coisas quepodem ser alienadas podem ser dadas em penhor,anticrese, ou hipoteca (CC, art. 1.420). Justifica-se aexigência porque o bem dado em garantia pode servendido em hasta pública.

Além de proprietário, o devedor deve ter ainda alivre disposição da coisa dada em garantia. Secasado, deve exibir outorga uxória. Os menores sob opoder familiar ou tutela, bem como os curatelados,dependem de representação ou assistência e deautorização judicial para que possam gravar os seusbens com ônus reais. O ascendente pode hipotecarbens a descendente, sem consentimento dos outros,não se lhe aplicando a limitação referente à venda,imposta no art. 497 do Código Civil, que deve serinterpretado restritivamente por cercear o direito depropriedade. O falido, por não ter a administração deseus bens, não pode onerá-los (LF, art. 103). Osdevedores em recuperação judicial ou extrajudicial,porém, com autorização judicial, podem fazê-lo.

O art. 1.420, § 2º, trata do imóvel em condomínio,dispondo que não pode ser dado em garantia real, nasua totalidade, sem o consentimento de todos; mas

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cada um pode individualmente dar em garantia real aparte que tiver (v. n. 58.2, retro).

Quanto aos bens, não podem ser objeto degarantia, sob pena de nulidade, coisas fora docomércio (CC, art. 1.420), ou seja, bens inalienáveis, eimóveis financiados pelos Institutos e Caixas deAposentadorias e Pensões (Dec.-Lei n. 8.618, de 10-1-1946). Com relação a coisas alheias, dispõe o § 1ºdo art. 1.420 que “a propriedade superveniente tornaeficaz, desde o registro, as garantias reaisestabelecidas por quem não era dono”.

Para que os contratos de penhor, hipoteca eanticrese tenham eficácia exige-se a especialização ea publicidade. A especialização é a descriçãopormenorizada, no contrato, do bem dado emgarantia, do valor do crédito, do prazo fixado parapagamento e da taxa de juros, se houver (art. 1.424).A publicidade é dada pelo registro do títuloconstitutivo no Registro de Imóveis (hipoteca,anticrese e penhor rural, cf. arts. 1.438 e 1.492 do CCe 167 da LRP) ou no Registro de Títulos eDocumentos (penhor convencional, cf. arts. 221 doCC e 127 da LRP). A tradição, no penhor, é também,secundariamente, forma de publicidade. É com oregistro que se constitui o direito real, oponível ergaomnes. A publicidade permite, ainda, que seestabeleça a prioridade entre os vários credores comgarantia.

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85 CLÁUSULA COMISSÓRIA

É a estipulação que autoriza o credor a ficar coma coisa dada em garantia, caso a dívida não sejapaga. Não se confunde com o pacto comissórioinserido nos contratos de compra e venda. O nossodireito proíbe a cláusula comissória nas garantiasreais. Dispõe o art. 1.428 do Código Civil: “É nula acláusula que autoriza o credor pignoratício,anticrético ou hipotecário a ficar com o objeto dagarantia, se a dívida não for paga no vencimento”. Afinalidade da proibição é evitar a usura. O credorsomente pode excutir o bem, pagando-se com oproduto da arrematação. O que sobejar serádevolvido ao devedor.

86 VENCIMENTO ANTECIPADO DA DÍVIDA.SALDO

Para maior garantia do credor, a lei antecipa ovencimento das dívidas com garantia real,independentemente de estipulação, nas hipótesesmencionadas no art. 1.425 do Código Civil. O art. 333prevê o vencimento antecipado das obrigações emgeral em algumas dessas hipóteses.

Quando, excutido o penhor ou executada ahipoteca, o produto não bastar para o pagamento da

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dívida e das despesas judiciais, continuará odevedor obrigado pessoalmente pelo restante (CC,art. 1.430). A garantia real não exclui a pessoal.Extinta ou esgotada a primeira, a segunda continua asubsistir. Pelo saldo, o credor será quirografário.

Quadro sinótico – Direito real de garantia

1.Conceito

Direito real de garantiaque confere ao seu titularo poder de obter opagamento de uma dívidacom o valor ou a renda deum bem aplicadoexclusivamente à suasatisfação. Não seconfunde com o de ou de fruição.

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2. Efeitos

a) direito de preferência(CC, art. 1.422);b) direito de sequela;c) direito de excussão (art.1.422);d) indivisibilidade (art.1.421).

Subjetivos

— capacidadegenérica paraos atos davida civil;— capacidadeespecial paraalienar.

— somente as

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3.Requisitos Objetivos

— somente ascoisas quepodem seralienadaspodem serdadas emgarantia (CC,art. 1.420);— podemrecair sobrebem móvel(penhor) eimóvel(hipoteca);— não podemser objeto degarantiacoisas fora do

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coisas fora docomércio (art.1.420).

Formais

—especialização(CC, art.1.424);— publicidade(arts. 1.438 e1.492).

4.Cláusulacomissória

É a estipulação queautoriza o credor a ficarcom a coisa dada emgarantia, caso a dívidanão seja paga. O art.1.428 do CC proíbe

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comissória 1.428 do CC proíbeexpressamente cláusuladessa natureza.

5.Vencimen-toantecipa-do dadívida

Para maior garantia docredor, a lei antecipa ovencimento das dívidascom garantia real,independentemente deestipulação, nas hipótesesmencionadas no art. 1.425do CC. O art. 333 prevê ovencimento antecipadodas obrigações em geralem algumas dessashipóteses.

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CAPÍTULO IIDO PENHOR

87 CONCEITO, CARACTERÍSTICAS E OBJETO

“Constitui-se o penhor pela transferência efetivada posse que, em garantia do débito ao credor ou aquem o represente, faz o devedor, ou alguém por ele,de uma coisa móvel, suscetível de alienação” (CC,art. 1.431). Trata-se de direito real que vincula umacoisa móvel ao pagamento de uma dívida. Distingue-se da hipoteca não só pela transferência do objeto aocredor, o que não ocorre naquela, como também peloobjeto, já que esta tem por garantia bens imóveis,embora possa recair, também, sobre aeronaves enavios.

Apresenta as seguintes características: a) édireito real, conforme prescreve o art. 1.419 doCódigo Civil; b) é direito acessório, e, como tal,segue o destino da coisa principal. Uma vez extinta adívida, extingue-se o penhor. Assim, não pode o

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credor, paga a dívida, recusar a entrega da coisa aquem a empenhou (art. 1.435, IV), mas pode exercer odireito de retenção até que o indenizem dasdespesas, devidamente justificadas, que tiver feito,não sendo ocasionadas por culpa sua (art. 1.433, II);c) só se perfecciona pela tradição do objeto aocredor. A lei, porém, criou penhores especiais,dispensando a tradição (art. 1.431, parágrafo único)por efeito da cláusula constituti (penhor rural,industrial, mercantil e de veículos). O credor éconsiderado depositário do objeto empenhado e temsuas obrigações especificadas no art. 1.435. Pode, seo devedor não pagar a dívida, promover a excussãodo penhor. O seu direito consiste em ser pagopreferencialmente na venda da coisa apenhada.

Quanto ao objeto, o penhor recai sobre bensmóveis, corpóreos ou incorpóreos (direitos) ealienáveis, isto é, que não estejam fora do comércio.Entretanto, no penhor agrícola e no industrial,admite-se que recaia sobre imóveis por acessãofísica ou intelectual (tratores, máquinas e outrosobjetos incorporados ao solo). Em princípio, não seadmite um segundo penhor sobre a coisa, em face datransmissão da posse. Contudo, quando a possecontinua com o devedor, nada impede que tal ocorra.Dá-se o subpenhor (que pode ser proibido, nocontrato) quando, instituído o penhor em favor deum credor, que recebe a posse, este, por sua vez,

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institui o penhor em favor de terceiro.O penhor é contrato solene, pois a lei exige que

seja constituído por instrumento público ouparticular (CC, arts. 1.432 e 1.438), com a devidaespecificação. É necessário, para valer contraterceiros, que seja levado ao Registro de Títulos eDocumentos (LRP, art. 127) ou, no caso do penhorrural, ao Registro de Imóveis (LRP, art. 167), salvo sese tratar de penhor legal.

88 ESPÉCIES

O penhor pode ser convencional e legal. Oprimeiro resulta de um acordo de vontades e osegundo promana da lei (objetiva protegerdeterminados credores). Pode-se, ainda, distinguir openhor comum dos especiais. Penhor comum é omencionado no art. 1.431 do Código Civil e decorreda vontade das partes. Os especiais refogem aopadrão tradicional, estando sujeitos a regrasespecíficas, como ocorre com os penhores legal,rural, industrial, de títulos de crédito e de veículos.

89 EXTINÇÃO DO PENHOR

Extingue-se o penhor nas seguintes hipóteses(CC, art. 1.436): a) extinguindo-se a obrigação.

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Sendo direito acessório, extingue-se com a extinçãodo principal; b) perecendo a coisa. Se parcial aperda, a garantia real permanece quanto à fração nãoatingida. A extinção do penhor, que é o acessório,não implica a extinção da dívida. Esta continua aexistir como crédito quirografário; c) renunciando ocredor, expressa ou tacitamente (§ 1º); d)confundindo-se na mesma pessoa as qualidades decredor e de dono da coisa; e) dando-se aadjudicação judicial, a remição (CPC, arts. 714 e787), ou a venda do penhor (quando permitida nocontrato).

90 DO PENHOR RURAL

O Código Civil de 1916 tratava do penhor rural(tanto agrícola como pecuário) nos arts. 781 a 788. Oassunto foi, entretanto, reformulado pela Lei n. 492,de 30 de agosto de 1937 e, mais tarde,complementado pela Lei n. 3.253, de 28 de julho de1957, que inclusive criou as cédulas de crédito rural.Esta última foi modificada pelo Decreto-Lei n. 167, de14 de fevereiro de 1967. Nessa espécie de penhor nãoocorre a tradição da coisa. Ao credor é deferida aposse indireta, enquanto o devedor conserva adireta, como depositário. Preceitua o art. 1.438 donovo Código Civil: “Constitui-se o penhor rural

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mediante instrumento público ou particular,registrado no Cartório de Registro de Imóveis dacircunscrição em que estiverem situadas as coisasempenhadas”. Prometendo pagar em dinheiro adívida, que garante com penhor rural, “o devedorpoderá emitir, em favor do credor, cédula ruralpignoratícia, na forma determinada em lei especial”(parágrafo único).

O penhor rural tem por objeto bens móveis eimóveis por acessão física e intelectual, sendo nessesentido semelhante à hipoteca. Podem ser objeto depenhor pecuário “os animais que integram aatividade pastoril, agrícola ou de laticínios” (CC, art.1.444). O agrícola possibilita a concessão degarantia sobre coisas futuras, ou seja, sobrecolheitas de lavouras em formação (art. 1.442, II). Énegócio solene, porque a lei exige que seja feito porinstrumento público ou particular, devidamenteespecializado. Deve ser registrado no Registro deImóveis da circunscrição em que estiverem situadosos bens ou animais empenhados, para ter eficáciacontra terceiros. O penhor abrange a safraimediatamente seguinte, no caso de frustrar-se oumostrar-se insuficiente a que se deu em garantia. Seo credor não financiar a nova safra, poderá o rurícolaconstituir novo penhor, em quantia máximaequivalente à do primeiro (art. 1.443 e parágrafoúnico).

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O penhor pecuário recai sobre os animais que secriam pascendo, para a indústria pastoril, agrícola oude laticínios, em qualquer de suas modalidades. A leinão permite a venda dos animais empenhados sem oconsentimento prévio e por escrito do credor (art.1.445). Realizada a excussão do penhor, o devedor éintimado para depositar o seu objeto. Se não o fizer,corre o risco de ter a sua prisão decretada. No casode morte dos animais, devem ser substituídos poroutros da mesma espécie, que ficam sub-rogados nopenhor (art. 1.446).

91 DO PENHOR INDUSTRIAL E MERCANTIL

“Constitui-se o penhor industrial, ou o mercantil,mediante instrumento público ou particular,registrado no Cartório de Registro de Imóveis dacircunscrição onde estiverem situadas as coisasempenhadas” (CC, art. 1.448). O devedor poderáemitir cédula do respectivo crédito, na formaregulada em lei especial (parágrafo único).

Essa modalidade de penhor pode ter por objeto“máquinas, aparelhos, materiais, instrumentos,instalados e em funcionamento, com os acessóriosou sem eles; animais, utilizados na indústria; sal ebens destinados à exploração das salinas; produtosde suinocultura, animais destinados à

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industrialização de carnes e derivados; matérias-primas e produtos industrializados” (art. 1.447). Odevedor não pode alienar as coisas empenhadas,nem alterá-las ou mudar-lhes a situação, sem oconsentimento escrito do credor. Se este anuir naalienação, o devedor deverá efetuar a reposição comoutros bens da mesma natureza, que ficarão sub-rogados no penhor (art. 1.449).

92 DO PENHOR DE DIREITOS E DE TÍTULOSDE CRÉDITO

O Código Civil admite penhor de direitos,suscetíveis de cessão, sobre coisas móveis, que seconstitui mediante instrumento público ou particular,registrado no Registro de Títulos e Documentos. Otitular do direito entregará ao credor pignoratício osdocumentos comprobatórios, salvo se tiver interesselegítimo em conservá-los (CC, art. 1.452).

Efetivada a caução, o direito ao recebimento docrédito é transferido ao credor, cujas prerrogativassão enumeradas no art. 1.455 do Código Civil. Passaa ser verdadeiro mandatário do devedor e assume acondição de depositário, pelas importâncias quereceber além do que lhe é devido (CC, art. 1.455,parágrafo único). Ao receber os documentoscomprobatórios do crédito, deve dar ciência ao

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devedor do título, que não mais poderá pagar aodevedor, sob pena de pagar mal (art. 1.453). “O titulardo crédito empenhado só pode receber o pagamentocom a anuência, por escrito, do credor pignoratício,caso em que o penhor se extinguirá” (art. 1.457).“Estando vencido o crédito pignoratício, tem ocredor direito a reter, da quantia recebida, o que lhe édevido, restituindo o restante ao devedor; ou aexcutir a coisa a ele entregue” (art. 1.455, parágrafoúnico).

“O penhor, que recai sobre título de crédito,constitui-se mediante instrumento público ouparticular ou endosso pignoratício, com a tradiçãodo título ao credor” (CC, art. 1.458). O devedor dotítulo empenhado, que receber a intimação para nãopagar ao seu credor ou se der por ciente do penhor,não poderá pagar a este e, se o fizer, responderásolidariamente por perdas e danos, perante o credorpignoratício (art. 1.460).

93 DO PENHOR DE VEÍCULOS

O legislador inovou, disciplinando em seçãoautônoma o penhor de veículos empregados emqualquer espécie de transporte ou condução.Constitui-se “mediante instrumento público ouparticular, registrado no Cartório de Títulos e

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Documentos do domicílio do devedor, e anotado nocertificado de propriedade” (CC, art. 1.462),admitindo-se a emissão de cédula de crédito por este.Só pode ser convencionado pelo prazo máximo dedois anos, prorrogável até o limite de igual tempo,averbada a prorrogação à margem do registrorespectivo (art. 1.466).

O credor tem o direito de verificar o estado doveículo empenhado, que deve estar previamentesegurado contra furto, avaria, perecimento e danoscausados a terceiros. A alienação, ou a mudança, doveículo empenhado sem prévia comunicação aocredor importa no vencimento antecipado do créditopignoratício.

94 DO PENHOR LEGAL

O legislador estabeleceu o penhor legal visandoproteger certas pessoas, em determinadas situações,garantindo-lhes o resgate de seus créditos. Sãocredores pignoratícios, independentemente deconvenção: a) os hospedeiros, ou fornecedores depousada ou alimento, sobre as bagagens, móveis,joias ou dinheiro que os seus consumidores oufregueses tiverem consigo nos respectivosestabelecimentos, pelas despesas ou consumo queaí tiverem feito; b) o dono do prédio rústico ou

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urbano, sobre os bens móveis que o rendeiro ouinquilino tiver guarnecendo o mesmo prédio, pelosaluguéis ou rendas (CC, art. 1.467).

Inocorrendo o pagamento, o credor podeapossar-se dos bens (só os que guarnecem o prédiolocado ou estejam no hotel), para estabelecer sobreeles o seu direito real, antes mesmo de recorrer àautoridade judiciária, sempre que haja perigo nademora (CC, art. 1.470). É meio direto de defesa,constituindo direito mais amplo que o simples direitode retenção e de maior eficácia que o privilégiopessoal. Além dos casos mencionados no art. 1.467,há também o penhor instituído em favor dos artistase auxiliares cênicos sobre o material da empresateatral utilizado nas apresentações, pela importânciade seus salários e despesas de transporte (Dec. n.18.257, de 10-12-1928), e o estabelecido sobre asmáquinas e aparelhos utilizados na indústria que seencontrem no prédio dado em locação (Dec.-Lei n.4.191, de 18-3-1942). Somente com a homologação(CC, art. 1.471; CPC, art. 874) completa-se o penhorlegal. A apreensão, enquanto não homologada, nãoconstitui propriamente penhor, mas mera pretensãode constituir penhor.

Quadro sinótico – Do penhor

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1. Conceito

Trata-se de direitoreal que vincula umacoisa móvel aopagamento de umadívida. Constitui-sepela transferênciaefetiva da posse que,em garantia do débitoao credor ou a quemo represente, faz odevedor, ou alguémpor ele, de uma coisamóvel, suscetível dealienação (CC, art.1.431).

a) é direito real (CC,

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2.Características

a) é direito real (CC,art. 1.419);b) é direito acessório;c) só se perfeccionapela tradição doobjeto ao credor.

3. Objeto

O penhor recai sobrebens móveis,corpóreos ouincorpóreos.Entretanto, no penhoragrícola e noindustrial, admite-seque recaia sobreimóveis por acessãofísica ou intelectual

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(tratores, máquinas eoutros objetosincorporados aosolo).

4. Espécies

a) convencional;b) legal;c) comum;

d)especial

— penhorlegal;— penhorrural;— penhorindustrial;— penhorde títulos

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de títulosde crédito;— penhordeveículos.

5. Extinção dopenhor (CC,art. 1.436)

a) tendo caráteracessório,extinguindo-se aobrigação;b) perecendo a coisa;c) renunciando ocredor, expressa outacitamente;d) confundindo-se namesma pessoa asqualidades de credore de dono da coisa;

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e de dono da coisa;e) dando-se aadjudicação judicial, aremição, ou a vendado penhor, quandopermitida no contrato.

Espécies

a)agrícola;b)pecuário.

a) podemser objetod e penhorpecuário“osanimais

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6. Penhor rural

Objeto

animaisqueintegram aatividadepastoril,agrícolaou delaticínios”(CC, art.1.444);b) openhoragrícolapossibilitaaconcessãodegarantia

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garantiasobrecoisasfuturas, ouseja,sobrecolheitasdelavourasemformação(art.1.442, II).

Essa modalidade depenhor pode ter porobjeto “máquinas,

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7.Penhorindustrialemercantil

objeto “máquinas,aparelhos, materiais,instrumentos,instalados e emfuncionamento, comos acessórios ou semeles; animais,utilizados na indústria;sal e bens destinadosà exploração dassalinas; produtos desuinocultura, animaisdestinados àindustrialização decarnes e derivados;matérias-primas eprodutosindustrializados (CC,

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industrializados (CC,art. 1.447).

8.Penhordedireitos

O CC admite penhorde direitos,suscetíveis decessão, sobre coisasmóveis, que seconstitui medianteinstrumento públicoou particular,registrado noRegistro de Títulos eDocumentos. O titulardo direito entregaráao credor pignoratícioos documentoscomprobatórios, salvo

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comprobatórios, salvose tiver interesselegítimo em conservá-los (CC, art. 1.452).

9.Penhordetítulosde

Constitui-se medianteinstrumento públicoou particular ouendosso pignoratício,com a tradição dotítulo ao credor (CC,art. 1.458). Odevedor do títuloempenhado, quereceber a intimaçãopara não pagar aoseu credor ou se der

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decrédito

por ciente do penhor,não poderá pagar aeste e, se o fizer,responderásolidariamente porperdas e danos,perante o credorpignoratício (art.1.460).

Só pode serconvencionado peloprazo máximo de doisanos, prorrogável atéo limite de igualtempo, averbada aprorrogação à

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10.Penhordeveículos

prorrogação àmargem do registrorespectivo (CC, art.1.466). Constitui-semediante instrumentopúblico ou particular,registrado no Cartóriode Títulos eDocumentos dodomicílio do devedor,e anotado nocertificado depropriedade (art.1.462).

São credorespignoratícios,independentemente

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11.Penhorlegal

independentementede convenção: a) oshospedeiros, oufornecedores depousada ou alimento,sobre as bagagens,móveis, joias oudinheiro que os seusconsumidores oufregueses tiveremconsigo nosrespectivosestabelecimentos,pelas despesas ouconsumo que aítiverem feito; b) odono do prédio

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rústico ou urbano,sobre os bens móveisque o rendeiro ouinquilino tiverguarnecendo omesmo prédio, pelosaluguéis ou rendas(CC, art. 1.467).Constitui meio diretode defesa (art.1.470). Completa-sesomente com ahomologação (art.1.471).

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CAPÍTULO IIIDA HIPOTECA

95 CONCEITO E CARACTERÍSTICAS

É o direito real de garantia que tem por objetobens imóveis, navio ou avião pertencentes aodevedor ou a terceiro e que, embora não entreguesao credor, asseguram-lhe, preferencialmente, orecebimento de seu crédito.

As suas principais características são asseguintes, além das já citadas: a) o objeto gravadodeve ser de propriedade do devedor ou de terceiro;b) o devedor continua na posse do imóvelhipotecado; c) é indivisível, pois a hipoteca grava obem na sua totalidade (CC, art. 1.421), nãoacarretando exoneração correspondente da garantiao pagamento parcial da dívida; d) tem caráteracessório; e) na modalidade convencional, é negóciosolene (art. 108); f) confere ao seu titular os direitosde preferência e de sequela. Se o bem for alienado,será transferido ao adquirente com o ônus dahipoteca que o grava, desde que tenha havido o

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prévio registro. Caso contrário, o adquirente não lhesofre os efeitos; g) assenta-se em dois princípios: oda especialização e o da publicidade, já abordadosno n. 84, retro.

96 OBJETO

A hipoteca tem por objeto: a) os imóveis; b) osacessórios dos imóveis conjuntamente com eles; c) odomínio direto; d) o domínio útil; e) as estradas deferro; f) os recursos naturais a que se refere o art.1.230 do Código Civil, independentemente do soloonde se acham; g) os navios; h) as aeronaves (CC,art. 1.473). A hipoteca dos navios e das aeronavesrege-se pelo disposto em lei especial. Embora sejammóveis, é admitida a hipoteca, por conveniênciaeconômica e porque são suscetíveis de identificaçãoe individuação, tendo registro peculiar,possibilitando a especialização e a publicidade,princípios que norteiam o direito real de garantia.

Só são passíveis de hipoteca imóveis que seachem no comércio e sejam alienáveis. Não podemser hipotecados os onerados com cláusula deinalienabilidade ou os que se encontrem extracommercium (art. 1.420). Por abstratos, simplesdireitos hereditários não são suscetíveis de hipoteca,mesmo porque torna-se impossível o seu registro. A

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hipoteca abrange todas as acessões, melhoramentosou construções do imóvel, dado o seu caráteracessório. Subsistem os ônus reais constituídos eregistrados, anteriormente à hipoteca, sobre o mesmoimóvel (CC, art. 1.474). Em execução hipotecária sãopenhoráveis os aluguéis do prédio hipotecado, emface da indivisibilidade da garantia e da abrangênciados acessórios do imóvel, neles se incluindo osrendimentos, se insuficiente o valor do bem oneradocom a hipoteca. São também suscetíveis de hipotecaos apartamentos em edifícios em condomínio,independentemente do consentimento doscondôminos (Lei n. 4.591/64, art. 4º; CC, art. 1.331, §1º).

97 ESPÉCIES

Segundo a origem, a hipoteca pode serconvencional, legal ou judicial. É convencionalquando se origina do contrato, da livre manifestaçãodos interessados; é legal quando emana da lei paragarantir determinadas obrigações (CC, art. 1.489) — oprocesso de especialização consta do Código deProcesso Civil, arts. 1.205 e s.; é judicial quandodecorre de sentença judicial, assegurando a suaexecução.

Quanto ao objeto em que recai, pode ser comum,

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quando incide sobre bem imóvel, e especial,submetida a regime legal específico, como a que tempor objeto aviões, navios ou vias férreas.

A hipoteca judicial resulta de sentençacondenatória e exige especialização e registro noCartório de Registro de Imóveis para que seja opostaa terceiros (CPC, art. 466). Presentes todos ospressupostos legais (CPC, art. 466; LRP, art. 167, I, n.2), prevalece contra o adquirente do imóvel de modoabsoluto.

98 PLURALIDADE DE HIPOTECAS

Admite-se a efetivação de novas hipotecassobre o imóvel anteriormente hipotecado, desde quecom novo título constitutivo, em favor do mesmo oude outro credor (CC, art. 1.476). É possível, assim,seja o imóvel gravado de várias hipotecas, a menosque o título constitutivo anterior vede issoexpressamente. Mesmo havendo pluralidade dehipotecas, o credor primitivo não fica prejudicado,porque goza do direito de preferência. É deconsignar que o devedor deve revelar, ao constituirnova hipoteca, a existência da anterior, sob pena de,silenciando, cometer crime de estelionato (CP, art.171, § 2º, II).

A segunda hipoteca sobre o mesmo imóvel

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recebe o nome de sub-hipoteca. Pode ser efetivadaainda que o valor do imóvel não a comporte. Emrazão da preferência entre os credores hipotecários,fixada pela ordem de registro dos títulos no Registrode Imóveis (prioridade), o sub-hipotecário não passade um credor quirografário em relação aos anteriores,que não serão prejudicados. Todavia, a lei assegura-lhe a prerrogativa de remir a hipoteca anterior, a fimde evitar execução devastadora, que não deixe sobrapara o pagamento de seu crédito.

Se constar de escritura levada a registro aexistência de hipoteca anterior, não registrada, ooficial do Registro de Imóveis deve fazer aprenotação e sobrestar-lhe por trinta dias o registro.Esgotado este prazo sem que o credor da primeirahipoteca a registre, a segunda será registrada e terápreferência sobre a primeira (LRP, art. 189). “Salvo ocaso de insolvência do devedor, o credor dasegunda hipoteca, embora vencida, não poderáexecutar o imóvel antes de vencida a primeira” (CC,art. 1.477). Não se considera insolvente o devedorpor faltar ao pagamento das obrigações garantidaspor hipotecas posteriores à primeira (art. 1.477,parágrafo único). Vencida a primeira hipoteca eomitindo-se o primeiro credor, pode o segundopromover a execução. Mas aquele será pago compreferência, cabendo a este o que restar.

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99 DIREITO DE REMIÇÃO

O art. 1.478 do Código Civil faculta a remição dahipoteca anterior por parte do credor da segundaquando o devedor não se ofereça, no vencimento, apagar a obrigação avençada. Efetuando opagamento, o referido credor se sub-rogará nosdireitos da hipoteca anterior, sem prejuízo dos quelhe competirem contra o devedor comum. “Se oprimeiro credor estiver promovendo a execução dahipoteca, o credor da segunda depositará aimportância do débito e as despesas judiciais” (art.1.478, parágrafo único). Prevê o art. 1.481 apossibilidade de remição por parte do adquirente doimóvel hipotecado, consignando, nos §§ 1º e 2º, asprovidências que devem ser tomadas para a suaconsecução.

100 PEREMPÇÃO

A hipoteca convencional tem validade por trintaanos (CC, art. 1.485, com redação determinada pelaLei n. 10.931, de 2-8-2004). Embora possam as partesestipular o prazo que lhes convier, e prorrogá-lomediante simples averbação, este não ultrapassará oreferido limite. Quando atingido, dá-se a perempção.Somente mediante novo instrumento, submetido a

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outro registro, pode-se preservar o mesmo númerode ordem, na preferência da execução hipotecária,mantendo-se a garantia (CC, art. 1.485). A perempçãoatinge somente a hipoteca convencional. A legalprolonga-se, enquanto perdurar a situação jurídicaque ela visa resguardar, mas a especialização, emcompletando vinte anos, deve ser renovada (art.1.498).

101 EXTINÇÃO DA HIPOTECA

A hipoteca extingue-se (CC, art. 1.499): a) tendocaráter acessório, pela extinção da obrigaçãoprincipal; b) pelo perecimento da coisa; c) pelaresolução da propriedade; d) pela renúncia do credor,que deve ser expressa; e) pela remição, efetuada pelocredor da segunda hipoteca, pelo adquirente doimóvel hipotecado, pelo executado, seu cônjuge,descendente ou ascendente; f) pela arrematação ouadjudicação, no mesmo processo ou em outro, desdeque o credor hipotecário, notificado judicialmente davenda (segundo os arts. 1.501 do CC e 619 do CPC, éineficaz a venda sem a intimação do credor), nãocompareça para defender o seu direito.

“Extingue-se ainda a hipoteca com a averbação,no Registro de Imóveis, do cancelamento do registro,à vista da respectiva prova” (CC, art. 1.500).

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Quadro sinótico – Da hipoteca

1. Conceito

Hipoteca é o direito realque tem por objeto bensimóveis, navio ou aviãopertencentes aodevedor ou a terceiro eque, embora nãoentregues ao credor,asseguram-lhe,preferencialmente, orecebimento de seucrédito.

a) o objeto gravadodeve ser depropriedade do devedor

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2.Características

propriedade do devedorou de terceiro;b) o devedor continuana posse do imóvelhipotecado;c) é indivisível, poisgrava o bem na suatotalidade (CC, art.1.421);d) tem caráteracessório;e) na modalidadeconvencional, é negóciosolene (art. 108);f) confere ao seu titularos direitos depreferência e desequela;

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sequela;g) assenta-se em doisprincípios: o daespecialização e o dapublicidade.

3. Objeto

a) os imóveis;b) os acessórios dosimóveis conjuntamentecom eles;c) o domínio direto;d) o domínio útil;e) as estradas de ferro;f) os recursos naturais aque se refere o art.1.230 do CC,independentemente do

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solo onde se acham;g) os navios;h) as aeronaves (art.1.473).

4. Espécies

Segundoa origem

a)convencional;b) legal;c) judicial.

Quantoaoobjeto

a) comum;b) especial.

Admite-se seja oimóvel gravado devárias hipotecas, a

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5.Pluralidadedehipotecas

menos que o títuloconstitutivo anteriorvede issoexpressamente.Mesmo havendopluralidade dehipotecas, o credorprimitivo não ficaprejudicado, porquegoza do direito depreferência (CC,art. 1.476). Asegunda hipotecasobre o mesmoimóvel recebe onome de sub-hipoteca.

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hipoteca.

6. Direitode remição

O art. 1.478 do CCfaculta a remiçãoda hipoteca anteriorpor parte do credorda segunda quandoo devedor não seofereça, novencimento, apagar a obrigaçãoavençada.Efetuando opagamento, oreferido credor sesub-rogará nosdireitos da hipotecaanterior, sem

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anterior, semprejuízo dos que lhecompetirem contrao devedor comum.

A hipotecaconvencional temvalidade por 30anos. Emborapossam as partesestipular o prazoque lhes convier, eprorrogá-lomediante simplesaverbação, estenão ultrapassará oreferido limite.Quando atingido,

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7.Perempção

Quando atingido,dá-se aperempção.Somente mediantenovo instrumento,submetido a outroregistro, pode-sepreservar o mesmonúmero de ordem,na preferência daexecuçãohipotecária,mantendo-se agarantia (CC, art.1.485).

a) tendo caráter

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8. Extinção(CC, art.1.499)

a) tendo caráteracessório, pelaextinção daobrigação principal;b) pelo perecimentoda coisa;c) pela resoluçãoda propriedade;d) pela renúncia docredor, que deveser expressa;e) pela remição,efetuada pelocredor da segundahipoteca, peloadquirente doimóvel hipotecado,pelo executado, seu

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1.499) pelo executado, seucônjuge,descendente ouascendente;f) pela arremataçãoou adjudicação, nomesmo processoou em outro, desdeque o credorhipotecário,notificadojudicialmente davenda, nãocompareça paradefender o seudireito.

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CAPÍTULO IVDA ANTICRESE

É direito real sobre coisa alheia, em que o credorrecebe a posse de coisa frugífera, ficando autorizadoa perceber-lhe os frutos e imputá-los no pagamentoda dívida. Trata-se de instituto pouco utilizado,recaindo a preferência, hoje, sobre a hipoteca.Apresenta o inconveniente de retirar do devedor aposse e gozo do imóvel, transferindo-os para ocredor. Este é obrigado, por sua conta, a colher osfrutos e pagar-se com as próprias mãos. Embora oart. 1.506, § 2º, do Código Civil permita ao devedoranticrético hipotecar o imóvel dado em anticrese,dificilmente encontrará quem aceite tal situação.

Findo o prazo do contrato, ou liquidado odébito, cabe ao credor anticrético restituir o imóvelao devedor. Extinta a dívida, extingue-se a anticrese,que é direito acessório. A extinção da dívida podedar-se pela sua amortização com os frutos da coisa,ou pelo pagamento antecipado. Extingue-se a

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anticrese pela caducidade, decorridos quinze anosda data de sua constituição (CC, art. 1.423). Nessecaso, o credor passa a quirografário.

O credor anticrético pode, salvo pacto emsentido contrário, arrendar os bens dados emanticrese a terceiro, se não preferir administrá-los efruir seus frutos e utilidades. Deverá apresentaranualmente balanço exato e fiel de sua administração,que poderá ser impugnado pelo devedor. Se osdados contidos no balanço forem inexatos, ouruinosa a administração, poderá este, se o quiser,requerer a transformação do contrato emarrendamento, fixando o juiz o valor mensal doaluguel, o qual poderá ser corrigido anualmente (CC,art. 1.507 e §§ 1º e 2º).

A anticrese distingue-se do penhor comumporque tem por objeto bem imóvel, e o credor tem odireito aos frutos, até o pagamento da dívida.Também não se confunde com o penhor rural, emque a posse continua com o devedor. Afasta-se dahipoteca porque o credor hipotecário pode promovera excussão e venda judicial do bem hipotecado, semter a sua posse, o que não ocorre com o anticrético.Admite-se a cumulação da anticrese com a hipoteca(CC, art. 1.506, § 2º).

Quadro sinótico – Da anticrese

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1. Conceito

Anticrese édireito realsobre coisaalheia, em queo credorrecebe a possede coisafrugífera,ficandoautorizado aperceber-lhe osfrutos e imputá-los nopagamento dadívida (CC, art.1.506).

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2.Características

— é direito realde garantia;— requercapacidade daspartes;— não conferepreferência aoanticresista nopagamento docrédito com aimportânciaobtida naexcussão dobem onerado,pois só lhe éconferido o

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conferido odireito deretenção;— requer, parasuaconstituição,escriturapública eregistro noregistroimobiliário.

a) pelopagamento dadívida;b) pelo términodo prazo legalou caducidade

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3. Extinção

ou caducidade(CC, art.1.423);c) peloperecimento dobem anticrético(art. 1.509, §2º);d) peladesapropriação(art. 1.509, §2º);e) pelarenúncia doanticresista;f) pelaexcussão de

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outros credoresquando oanticrético nãoopuser seudireito deretenção (art.1.509, § 1º);g) pelo resgatefeito peloadquirente doimóvel gravado(art. 1.510).

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TÍTULOS JÁLANÇADOS

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Volume 11 — Processo Civil — Teoria geral doprocesso de conhecimento

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