da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

31
Revista do Direito Privado da UEL Volume 2 Número 3 www.uel.br/revistas/direitoprivado DA INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR AO ATO COOPERATIVO Têmis Chenso da Silva Rabelo * Vanderley Doin Pacheco ** RESUMO O presente trabalho faz um breve estudo, separadamente, de três tipos de atos que podem ser praticados pelas cooperativas: atos cooperativos; atos não cooperativos intrínsecos e atos não cooperativos extrínsecos à atividade cooperativa e se nestes incidem ou não o Código de Defesa do Consumidor. Para tanto, analisa os pontos decorrentes da relação de consumo, destacados pelo Código de Defesa do Consumidor e seus sujeitos, assim definidos como fornecedor e consumidor, este último como sendo aquele que adquire ou utiliza produtos ou serviços como destinatário final. Ainda, analisa de maneira lacônica as sociedades empresárias, suas classificações e a distinção entre as sociedades simples e empresárias, de pessoas e de capital, contratual e institucional e define em qual espécie societária está inserida a cooperativa. Busca-se na doutrina e na jurisprudência predominante diferenciar a relação de consumo do ato cooperativo, este regido pela Lei Federal n. º 5.764/1971, na qual se deu tratamento destacado em seu artigo 79. Orienta-se através dos elementos de peculiaridade, verificando quanto à possibilidade ou não da aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao ato cooperativo e conclui pautando-se no entendimento predominante sobre o tema em destaque. Palavras-chave: Consumidor. Fornecedor. Relação de consumo. Sociedade cooperativa. Ato cooperativo. ABSTRACT The present work makes a briefing study, separately, of three types of acts that can be practised by the cooperatives: cooperative acts; intrinsic non cooperative acts and extrinsic non cooperative acts to the cooperative activity and if in these happen or not the Code of Defense of the Consumer. For in such a way, it analyzes the decurrent points of the consumption relation, detached for the Code of Defense of the Consumer and its citizens, thus defined as supplying and consuming, this last one as being that acquire or use products or services as final addressee. Still, it analyzes in summarized way the societies entrepreneurs, its classifications and the distinction between the simple societies and entrepreneurs, of people and capital, contractual and institutional and defines in which species of society is inserted the cooperative. One searches in the doctrine and the predominant jurisprudence to differentiate the relation of consumption of the cooperative act, this conducted by Federal Law N. º 5,764/1971, in which it gave treatment detached in its article 79. It is oriented through the peculiarity elements, verifying the possibility not the application of the Code of Defense of the Consumer to the cooperative act concludes guiding itself through the predominant agreement on the subject in prominence. Keywords: Consumer. Supplier. Relation of consumption. Cooperative society. Cooperative act. _____________ * Mestre em Direito Negocial, Especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil, Advogada e Professora Universitária UEL e UNOPAR, ambas em Londrina Paraná Brasil. Contato pelo e-mail [email protected] ** Graduado em Direito pela Universidade Norte do Paraná UNOPAR em Londrina Paraná - Brasil. Contato pelo e-mail [email protected].

Upload: truongminh

Post on 10-Jan-2017

216 views

Category:

Documents


4 download

TRANSCRIPT

Page 1: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

DA INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO

CONSUMIDOR AO ATO COOPERATIVO

Têmis Chenso da Silva Rabelo*

Vanderley Doin Pacheco**

RESUMO

O presente trabalho faz um breve estudo, separadamente, de três tipos de atos que podem ser

praticados pelas cooperativas: atos cooperativos; atos não cooperativos intrínsecos e atos não

cooperativos extrínsecos à atividade cooperativa e se nestes incidem ou não o Código de Defesa do

Consumidor. Para tanto, analisa os pontos decorrentes da relação de consumo, destacados pelo Código

de Defesa do Consumidor e seus sujeitos, assim definidos como fornecedor e consumidor, este último

como sendo aquele que adquire ou utiliza produtos ou serviços como destinatário final. Ainda, analisa

de maneira lacônica as sociedades empresárias, suas classificações e a distinção entre as sociedades

simples e empresárias, de pessoas e de capital, contratual e institucional e define em qual espécie

societária está inserida a cooperativa. Busca-se na doutrina e na jurisprudência predominante

diferenciar a relação de consumo do ato cooperativo, este regido pela Lei Federal n. º 5.764/1971, na

qual se deu tratamento destacado em seu artigo 79. Orienta-se através dos elementos de peculiaridade,

verificando quanto à possibilidade ou não da aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao ato

cooperativo e conclui pautando-se no entendimento predominante sobre o tema em destaque.

Palavras-chave: Consumidor. Fornecedor. Relação de consumo. Sociedade cooperativa. Ato

cooperativo.

ABSTRACT

The present work makes a briefing study, separately, of three types of acts that can be practised by the

cooperatives: cooperative acts; intrinsic non cooperative acts and extrinsic non cooperative acts to the

cooperative activity and if in these happen or not the Code of Defense of the Consumer. For in such a

way, it analyzes the decurrent points of the consumption relation, detached for the Code of Defense of

the Consumer and its citizens, thus defined as supplying and consuming, this last one as being that

acquire or use products or services as final addressee. Still, it analyzes in summarized way the

societies entrepreneurs, its classifications and the distinction between the simple societies and

entrepreneurs, of people and capital, contractual and institutional and defines in which species of

society is inserted the cooperative. One searches in the doctrine and the predominant jurisprudence to

differentiate the relation of consumption of the cooperative act, this conducted by Federal Law N. º

5,764/1971, in which it gave treatment detached in its article 79. It is oriented through the peculiarity

elements, verifying the possibility not the application of the Code of Defense of the Consumer to the

cooperative act concludes guiding itself through the predominant agreement on the subject in

prominence.

Keywords: Consumer. Supplier. Relation of consumption. Cooperative society. Cooperative act.

_____________ * Mestre em Direito Negocial, Especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil, Advogada e Professora

Universitária UEL e UNOPAR, ambas em Londrina – Paraná – Brasil. Contato pelo e-mail [email protected] ** Graduado em Direito pela Universidade Norte do Paraná – UNOPAR em Londrina – Paraná - Brasil. Contato

pelo e-mail [email protected].

Page 2: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

2

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

1 INTRODUÇÃO

Diante da disseminação dos direitos inerentes ao consumidor, parte frágil da

considerada relação de consumo e que necessita de intervenção estatal e especializada para a

garantia de seus interesses, houve mundo jurídico manifestações no sentido da aplicação da

legislação consumerista aos chamados atos cooperativos, que possui tratamento diferenciado

amparado por legislação especial.

O CDC, de uma maneira mais ampla, define e conceitua o consumidor, como sendo

toda a pessoa física ou jurídica que individual ou coletivamente adquire ou utiliza produto ou

serviço como destinatário final, ou ainda que apenas esteja exposta às práticas abusivas

praticadas pelos fornecedores.

Ainda, como elemento subjetivo da relação de consumo, estabelece como fornecedor

um conceito amplo do termo, tratando todo aquele que atua no lado oposto ao do consumidor

e que de alguma maneira atende as necessidades destes, atuando no desempenho de atividades

de oferta de bens ou serviços no mercado.

Logo, a relação de consumo está diretamente relacionada no que tange aos atos

praticados entre consumidor e fornecedor, e visa estabelecer o equilíbrio necessário a

qualquer harmonia econômica no relacionamento entre eles.

Os atos cooperativos, disciplinados pela Lei n. 5.764/71, em seu artigo 79, são

definidos como os praticados entre as cooperativas e cooperados e pelas cooperativas entre si

quando associadas, para a consecução dos objetivos sociais. Com isso, tem-se que os

elementos subjetivos do ato cooperativo é o cooperado e a cooperativa, diferentemente da

relação de consumo.

O ato cooperativo tem objetivos sociais na sociedade cooperativa, fundada e

solidificada no princípio da solidariedade, e não visa lucro, ao contrário da relação de

consumo que tem por fim uma necessidade do consumidor e uma aquisição pecuniária por

parte do fornecedor.

Sabe-se que ao tratar de cooperativismo, instituto que possui tratamento diferenciado

por legislação especial, nem todos os atos praticados por estas incidem o CDC.

O presente estudo não visa esclarecer todos estes atos, que serão chamados - Atos

não Cooperativos Intrínsecos e Atos não Cooperativos Extrínsecos à Atividade Cooperativa.

Todavia, faz uma breve abordagem a estes atos que devem ser analisados mediante

interpretação às peculiaridades de cada caso concreto.

Page 3: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

3

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

Necessário se faz, pois, distinguir detalhadamente as relações jurídicas e negociais

envolvendo o ente cooperativo e os seus cooperados, daquelas perpetradas entre cooperativa

para com terceiros, chamados clientes não cooperados, para chegar-se ao objetivo final da

relação que envolve o ato cooperativo propriamente dito.

Analisa sucintamente em qual classificação está inserida a sociedade cooperativa,

tornando-a um tipo de sociedade sui generis, totalmente diferenciada dos demais tipos

societários.

Tem, portanto, o presente estudo o objetivo de analisar os pontos decorrentes da

relação de consumo e diferenciá-los dos atos cooperativos, buscando na doutrina e na

jurisprudência predominante o conteúdo para a diferenciação dos elementos de peculiaridade,

verificando quanto à possibilidade ou não da incidência do CDC ao ato cooperativo.

2 CONSIDERAÇÕES AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Como acontece em todo ramo do Direito, as transformações sociais e econômicas

influenciam suas mudanças, a fim de não permitirem injustiças às partes menos

desfavorecidas.

A relação entre consumidor e fornecedor vem desde os tempos mais remotos, e

sempre decorreu da necessidade de adquirir algo para a satisfação pessoal ou coletiva das

partes envolvidas.

Todavia, o que antes era considerado uma situação de equilíbrio, nos dias atuais o

fornecedor, em seu conceito mais amplo, assumiu uma posição de força em relação àquele

que consome o produto final, ficando este último à mercê daquilo que lhe é oferecido, sem

qualquer condição de negociação.

Estas condições surgiram com as mudanças no modo de produção, que deram origem

à indústria moderna e ao processo de concentração econômica, durante o século XX, sob a

influência do liberalismo econômico e propagação da livre concorrência. Isto se deu devido

ao fenômeno chamado de sociedade de consumo, que trouxe como característica marcante o

número crescente de produtos e serviços no mercado.

Com isso, houve um aumento desenfreado da produção e através de mecanismos

utilizados pelos fabricantes para a entrada desses produtos no mercado, estimularam o

consumo exagerado. Indubitavelmente, os menos desfavorecidos ficaram à mercê das

alternativas criadas para facilitar o consumo, multiplicando na sociedade o número de

Page 4: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

4

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

contratos de adesão e assim, atingindo os direitos do consumidor.

O CDC foi instituído para amenizar a vulnerabilidade do consumidor, que possuía

inclusive dificuldades de acesso à justiça, frente ao fornecedor de produtos ou serviços, que

por sua vez possuía o domínio do crédito e do marketing (GRINOVER, 2007, p. 6).

Tendo em vista que o mercado não possui mecanismos próprios e eficientes para

superar tal vulnerabilidade do consumidor, fez-se necessária a intervenção do Estado nas suas

três esferas (Legislativo, Executivo e Judiciário) a fim de que se formulem normas jurídicas

de consumo (GRINOVER, 2007, p. 7).

A Constituição Federal de 1988 tratou sobre o assunto, inserindo-o entre os direitos

individuais, no artigo 5º, XXXII, “O Estado promoverá na forma da lei a defesa do

consumidor”. Ainda, com determinação expressa no artigo 48 dos Atos das Disposições

Constitucionais Transitórias, que “o congresso Nacional, dentro de 120 dias da promulgação

da Constituição, elaborará o Código de Defesa do Consumidor.”

O reconhecimento de que o consumidor estava desprotegido em termos educacionais,

informativo, material e legislativo, determinou uma maior atenção para o problema e o

aparecimento da legislação protetiva em vários países (MARAN, 2004, p. 54).

Com isso, em 1990, foi promulgada a lei 8.078, que é tratada como Código, a qual

instituiu as relações de consumo e seus sujeitos, mudando de forma peculiar os atos praticados

entre estes, visando proteger a considerada parte fraca da relação de consumo aos chamados

dominadores de mercado (monopólios e oligopólios), impondo a estes uma melhor qualidade

nos produtos e serviços prestados e até uma melhora no atendimento das empresas

fornecedoras em geral.

Grinover (2007, p. 9) enfatiza o modelo intervencionista estatal adotado pelo Brasil,

como fez ênfase os autores do anteprojeto:

De um lado, há o exemplo, ainda majoritário, daqueles países que regram o mercado

de consumo mediante leis esparsas, específicas para cada uma das atividades

econômicas diretamente relacionadas com o consumidor (publicidade, crédito,

responsabilidade civil pelos acidentes de consumo, garantias etc). De outra parte,

existem aqueles ordenamentos que preferem tutelar o consumidor de modo

sistemático, optando por um „código‟, como conjunto de normas gerais, em

detrimento de leis esparsas. Esse modelo, pregado pelos maiores juristas da matéria

e em vias de se tornar realidade na França, Bélgica e Holanda, foi adotado no Brasil,

que surge como o pioneiro da codificação do Direito do Consumidor em todo o

mundo.

Tem-se a importância da codificação devido à coerência e à homogeneidade a um

Page 5: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

5

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

determinado ramo do Direito, possibilitando sua autonomia, o que por sua vez, simplifica e

clarifica o regramento legal da matéria, favorecendo, de uma maneira geral, os destinatários e

os aplicadores da norma.

Desta forma, com a entrada em vigência do CDC, as empresas fornecedoras de

produtos e serviços foram obrigadas a se adaptarem aos mecanismos da lei, e quando não

observam as determinações instituídas, ficam vulneráveis ao Poder Jurisdicional do Estado.

No entanto, tal caráter estará sempre relacionado ao que diz respeito à

vulnerabilidade do consumidor frente às relações de consumo, e acentua-se que “a pedra de

toque é a condição de destinatário final de produtos e serviços, ou desde que não visem a uso

profissional” (FILOMENO, 2007, p. 20).

Diante do exposto, o CDC equilibrou as partes envolvidas na relação de consumo,

impondo aos fornecedores de bens ou serviços a criarem mecanismos de melhoria em todos

os seguimentos do mercado econômico.

2.1 Relação de Consumo e seus Elementos

Diante do artigo 1º do CDC, revela-se que a parte anteriormente vulnerável à relação

de consumo, agora ganha considerada proteção do Estado.

A defesa e proteção inserida no dispositivo mencionado estão diretamente ligadas à

relação de consumo, ou seja, é imprescindível que estejam presentes os elementos:

consumidor e fornecedor.

Pereira (2003, p. 80), com maestria, trata o assunto dizendo que “consumo é o

processo pelo qual se derivam utilidades de um bem, ou de um serviço. De uma forma mais

generalizada, também se pode descrever o consumo como a atividade de adquirir bens ou

serviços com o intuito de auferir satisfações”.

Assim, a relação está ligada através da ação do sujeito elementar consumidor ao

outro sujeito elementar fornecedor, o qual fornece os bens para a satisfação final da relação,

ou seja, para o próprio consumo.

Neste contexto, Lisboa (2000, p. 296) afirma que:

A relação jurídica de consumo é espécie de relação jurídica com características

próprias, de vez que somente se estará diante de liame jurídico, sobre o qual incide o

CDC, se preenchidos os requisitos subjetivos e objetivos relativos ao vínculo em

tela. Como liame jurídico, envolve a existência de sujeitos do direito em pólos

opostos, que interagem para a transmissão de bens (objeto do direito) e a consecução

Page 6: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

6

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

dos fins que deram origem à formação da relação.

Seguindo o raciocínio, Tupinambá Miguel (apud BATISTI, 2001, p. 205) assevera:

[...] interpretra-se que há relação de consumo quando um consumidor adquire bem

para sua utilização final, embora nem sempre esteja clara a condição de fornecedor

daquele que vende, especialmente face à análise de profissionalidade, regularidade e

habitualidade.

Filomeno (2007, p. 32), ao expor sobre a relação de consumo, esclarece que:

Pode-se dessarte inferir que toda relação de consumo: a) envolve basicamente duas

partes bem definidas: de um lado, o adquirente de um produto ou serviço

(„consumidor‟), e, de outro, o fornecedor ou vendedor de um produto ou serviço

(„produtor/fornecedor‟); b) tal relação destina-se à satisfação de uma necessidade

privada do consumidor; c) o consumidor, não dispondo, por si só, de controle sobre

a produção de bens de consumo ou prestação de serviços que lhe são destinados,

arrisca-se a submeter-se ao poder e condições dos produtores daqueles mesmos bens

e serviços.

Neste contexto, assevera-se que não haverá relação de consumo quando inexistir em

um dos pólos o sujeito de direito, ou seja, o consumidor ou o fornecedor, e ainda, que estejam

ligados pelo produto ou serviço destinado ao consumo final, através da necessidade e

satisfação daquele que se considera a parte vulnerável da relação.

Lisboa (2000, p. 296-297) conclui o raciocínio alertando que ”ausente algum desses

requisitos, a relação jurídica em questão não será de consumo, porém de outra espécie”.

Portanto, a relação de consumo caracteriza-se através da aquisição de um

determinado produto ou serviço, colocado no mercado de consumo por um fornecedor, e

destinado ao seu fim e a satisfação daquele que necessita do objeto resultante dos esforços de

quem o produziu ou inseriu no mercado de consumo.

2.2 Consumidor

Assegura-se que o consumidor é a parte vulnerável da relação de consumo como dito

alhures.

Neste contexto, Filomeno (2007, p. 28) assegura que o legislador procurou afastar de

tal conceituação componente de natureza sociológica, psicológica, de ordem literária e

filosófica, entendendo desta maneira por consumidor “qualquer pessoa física ou jurídica que,

Page 7: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

7

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

isolada ou coletivamente, contrate para consumo final, em benefício próprio ou de outrem, a

aquisição ou a locação de bens, bem como a prestação de um serviço”.

Para Alvin (1991, p. 15), o conceito geral de consumidor, estabelecido no artigo 2º,

refere-se explicitamente à aquisição ou utilização em caráter final, in verbis, consumidor é

aquele:

Que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final, não contemplando

como consumidores, genericamente, aqueles que adquirem o produto ou o serviço

em fase intermediária, como os revendedores, ou seja, aqueles que adquirem e

revendem o mesmo produto, ou apenas adquirem o produto para transformá-lo ou

mesmo implementá-lo em outro.

Sob a análise econômico-jurídica do termo, Othon Sidou (apud FILOMENO, 2007,

p. 29) acentua que consumidor é “qualquer pessoa, natural ou jurídica, que contrata, para

utilização, a aquisição de mercadoria ou a prestação de serviço, independentemente do modo

de manifestação da vontade, isto é, sem forma especial, salvo quando a lei expressamente a

exigir”.

No parágrafo único do mencionado artigo, o legislador equiparou ao consumidor a

coletividade de pessoas, ainda que de maneira indeterminável, que haja intervindo nas

relações de consumo.

Segundo o professor Waldírio Bulgarelli (apud FILOMENO, 2007, p. 42), o

consumidor pode ser considerado como:

Aquele que se encontra numa situação de usar ou consumir, estabelecendo-se, por

isso, uma relação atual ou potencial, fática sem dúvida, porém a que se deve dar uma

valoração jurídica, a fim de protegê-lo, quer evitando, quer reparando os danos

sofridos.

Desta forma, o legislador inseriu no conceito de consumidor a pessoa física

individual e também de maneira equiparada a coletividade, porém, desde que esteja

relacionada ao produto ou serviço contratado e seja seu destinatário final.

Sobre esse entendimento, Alvin (1991, p. 14) leciona:

[...] o industrial que adquire o produto para aplicá-lo como insumo em outro produto

de sua fabricação, como por exemplo: uma indústria de confecções que adquire certa

metragem de elásticos que serão utilizados na produção de peças de roupa, para este

caso específico, não realiza a compra na qualidade de consumidor, ou seja, como

destinatário final do objeto da relação de consumo, pois não atingiu aí, o produto, o

seu ciclo final, vez que passa a ser sucessivamente transformado ou implementado

Page 8: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

8

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

em outro produto, embora diferente daquele que já foi objeto não finalístico de

consumo.

Neste caso, conclui o autor dizendo que se socorre ao Código Cível e o Código

Comercial, no caso de vício do produto, tendo em vista a falta do elemento consumidor

caracterizado assim pelo destinatário final do produto adquirido e não pode se valer do CDC,

além do que existe ainda a falta da vulnerabilidade das partes contratantes, objeto de defesa e

proteção da lei 8.078/1990.

Vale ressaltar que, além da determinação contida no artigo 2º do CDC e seu

parágrafo único, o artigo 29 do mesmo codex estabelece que “para os fins deste capítulo e do

seguinte, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às

práticas nele previstas” (BENJAMIM, 2007, p. 263).

O legislador não limitou o consumidor como individual ou coletivo, que adquire

produtos ou serviços para o consumo final, mas equiparou-o àquelas pessoas que estão

expostas às práticas previstas no código.

Como no artigo 2º, aqui também podem ser caracterizadas de maneira individual ou

coletiva, tendo como único requisito a exposição à prática contida na legislação pertinente.

Sobre este entendimento, Alvin (1991, p. 16) ensina que:

[...] a exceção do artigo 29 esta relacionada com oferta, informação, publicidade

enganosa ou abusiva [...]; práticas comerciais e contratuais abusivas; cobrança de

dívidas e contratos de adesão, ou seja, valores que, à vista do sistema protetivo deste

código, merecem tratamento mais cuidadoso, no sentido de aumentar o âmbito da

proteção legislativa, em virtude de sua maior valoração e relevância em termos

sociais.

Diante disto, toda e qualquer pessoa legalmente constituída que adquire determinado

produto ou serviço, para si ou para outrem, individual ou coletivamente, ou ainda, que estejam

expostas às práticas abusivas, estará caracterizado o elemento consumidor nos termos do

CDC.

2.3 Fornecedor

Assim como a figura do consumidor foi intitulada como a parte vulnerável da relação

de consumo, é imprescindível a existência da figura do fornecedor, que é a parte mais forte da

referida relação, para que haja a verdadeira integração entre as partes contratantes.

Page 9: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

9

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

Para Plácido e Silva (apud FILOMENO, 2007, p. 47), “fornecedor, derivado do

francês „fournir, fornisseur‟, é todo comerciante ou estabelecimento que abastece, ou fornece,

habitualmente uma casa ou um outro estabelecimento dos gêneros e mercadorias necessários a

seu consumo”.

A respeito do artigo 3º, caput, do CDC, Lisboa (2000, p. 297) leciona que:

[...] não se limita à noção de fornecedor ao fabricante, ao produtor ou ao

comerciante. Fornecedor é o gênero, do qual são espécies, entre outros: o fabricante,

o produtor, o montador, o criador, construtor, o transformador, o importador, o

exportador, o distribuidor, o comerciante, enfim, todo aquele que, de qualquer

forma, mantém atividade de transmissão de produtos ou serviços no mercado de

consumo.

Ainda, segundo Alvin (1991, p. 17):

Neste artigo 3º, tenciona-se estabelecer a maior abrangência possível para o conceito

de „fornecedor‟, ou seja, o sujeito de direitos que atua no pólo oposto ao do

consumidor, ou, que integra o conjunto de pessoas que compõem ou podem compor

este pólo oposto.

Com o mesmo entendimento, para Filomeno (2007, p. 47), são considerados

fornecedores todos quantos propiciem a oferta de produtos e serviços no mercado de

consumo, de maneira a atender às necessidades dos consumidores, sendo “despiciendo

indargar-se a que título, sendo relevante, isto sim, a distinção que se deve fazer entre as várias

espécies de fornecedor nos casos de responsabilização por danos causados aos

consumidores.”

E conclui dizendo que a condição de fornecedor está intimamente ligada à atividade

de cada um e desde que coloquem aqueles produtos e serviços efetivamente no mercado,

nascendo daí, ipso facto, eventual responsabilidade por danos causados aos destinatários, ou

seja, pelo fato do produto.

Fala-se ainda que com referência ao fornecedor, enquadra-se como tal aquela pessoa

física ou jurídica que desenvolve atividades de produção, montagem, criação, construção,

transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou

serviços. Isto é, que de alguma forma coloca à disposição de outras, determinados bens ou

serviços mediante uma contrapartida que, como regra geral, é representada pela remuneração.

Em resumo, pode-se dizer que fornecedor é qualquer pessoa física, ou seja, qualquer

um que, a título singular, mediante desempenho de atividade mercantil ou civil e de forma

Page 10: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

10

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

habitual, ofereça no mercado produtos ou serviços, e a jurídica, da mesma forma, mas em

associações mercantil ou civil e de forma habitual.

Estabelece o parágrafo 1º do artigo 3º do CDC, que produto é qualquer bem móvel

ou imóvel, material ou imaterial. Tem-se, que qualquer pode ser o produto, desde que seja o

objeto da relação de consumo.

Já o parágrafo 2º do mesmo artigo, estabelece que serviço é qualquer atividade

fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária,

financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

Assim, conclui-se que qualquer que seja o produto ou serviço, objeto da relação de

consumo, inserido no mercado por pessoa física ou jurídica, que atua de forma habitual,

oferecendo-os ao consumidor, destinatário final destes, está diretamente sujeito às normas do

CDC.

2.4 A Vulnerabilidade do Consumidor

Como é cediço, o consumidor é a parte mais fraca e vulnerável da relação de

consumo, e, muito embora a Constituição Federal vise o livre mercado e a livre concorrência,

no próprio artigo 170, a defesa do consumidor foi indiscutivelmente relacionada como um dos

principais objetivos do Estado Brasileiro.

Coelho (2008, p. 206) alerta que:

[...] nas relações de consumo, o consumidor encontra-se em situação de

vulnerabilidade, e esclarece que a lei presume que o consumidor é vulnerável

perante o fornecedor não só em termos socioeconômicos, mas também sob o ponto

de vista do acesso e controle das informações (vulnerabilidade técnica) e negocial

(vulnerabilidade jurídica).

Seguindo este raciocínio, o entendimento destacado por Almeida (2002, p. 22)

admite que:

[...] a vulnerabilidade do consumidor está diretamente relacionada à desinformação,

ao excesso de propaganda com orientação desqualificada, falta de garantia e

seriedade por parte do fornecedor, entre outros diversos motivos que colocam o

consumidor em uma posição inferior aquele que, em suma, dita as regras de

consumo.

Tal preocupação estatal visa a estabelecer o equilíbrio necessário a qualquer

Page 11: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

11

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

harmonia econômica no relacionamento consumidor-fornecedor.

Dentro das perspectivas da Política Nacional de Relação de Consumo, coube ao

Estado o desenvolvimento de mecanismos para concretizar o objetivo esposado na

Constituição Federal, mais especificamente a determinação contida no artigo 5º, XXXII. Tais

mecanismos foram instituídos a fim de que os produtos e serviços colocados no mercado

atendessem às expectativas do consumidor. Com isso, nasce a lei n.º 8.078/1990 que

estabelece normas de proteção e defesa ao consumidor e a igualdade de negociação entre as

partes contratantes.

3 AS SOCIEDADES

Nasce uma sociedade quando duas ou mais pessoas, que têm como objetivo auferir

renda, ou seja, ganhar dinheiro com isso, unem-se com o propósito econômico.

O artigo 981 do CC/02 (Brasil, 2008) estabelece que:

Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a

contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a

partilha, entre si, dos resultados. § único. A atividade pode restringir-se à realização

de um ou mais negócios determinados.

No tocante à constituição das sociedades, Gagliano e Pamplona Filho (2007, p. 212)

mencionam que “a sociedade é espécie de corporação, dotada de personalidade jurídica

própria, e instituída por meio de um contrato social, com o precípuo escopo de exercer

atividade econômica e partilhar lucro”.

Com muita propriedade, Gladston Mamede (2007, p. 6) sustenta que:

A contratação de sociedade implica a definição de obrigações recíprocas, ou seja, a

assunção por cada uma das partes do dever de contribuir para os esforços comuns de

concretização das metas econômicas visadas. O contrato de sociedade mostra-se

aqui distinto do contrato de associação, embora em ambos os casos se tenha o

ajustamento, livre e consciente, como exigido pelo artigo 5º, XX, da Constituição da

República, de um grupo juridicamente regulamentado. Com efeito, como previsto no

artigo 53, parágrafo único, do Código Civil, „não há, entre os associados, direitos e

obrigações recíprocos‟.

O contrato de sociedade encontra-se conceituado conforme descrito no artigo acima,

e está composto, segundo Gladston Mamede (2007, p. 6) pelos seguintes elementos: “(1)

ajuste de vontade; (2) pluralidade de pessoas; (3) definição de obrigações recíprocas; (4)

Page 12: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

12

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

finalidade econômica; e (5) partilha dos resultados.”

Observa-se que sem a vontade livre e consciente da pessoa, não há constituição

válida das obrigações assumidas, embora possam ser considerados outros tipos de obrigações.

Com relação à finalidade econômica e a partilha dos resultados, tem-se que

necessariamente toda união de pessoas, que visa à atividade como lucrativa, não importando a

ordem auferida para que se atribua uma elevação à importância inicial integralizada (lucros

sobre o capital investido), dividindo o resultado final entre as partes contratantes como

satisfação dos fins realizados.

Portanto, celebram contrato de sociedade duas ou mais pessoas, com fins lucrativos,

que se obrigam reciprocamente, com bens ou serviços, ao exercício de certa finalidade e a

partilha dos resultados.

Duas são as espécies de sociedade no direito brasileiro, a simples e a empresária.

3.1 Sociedades Simples e Empresárias

Respeitados os elementos que compõem uma sociedade, como mencionado acima,

importante ressaltar os dois subtipos, como sendo a sociedade simples e a empresária, o que

caracteriza seu objeto social.

Diante dos ensinamentos de Arnoldo Wald (2005, p. 80), tem-se que:

Com a unificação do direito obrigacional pelo novo Código Civil, mudou-se o

enfoque do comerciante para o empresário. Em relação às sociedades, por

conseqüência, abandonou-se a classificação das sociedades em civil e comercial,

passando-se a diferenciá-las de acordo com a atividade desenvolvida, denominando-

as sociedades empresárias e sociedade não-empresárias ou simples, adotando a

solução do direito italiano. Neste sentido o artigo aqui analisado estabelece que

empresária é a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria do

empresário, nos termos do artigo 966. Já as sociedades simples são assim

classificadas de maneira negativa, isto é, são aquelas que não se caracterizam como

empresárias.

Esta classificação diz respeito à essencial diferença de que apenas a sociedade

empresária pratica atos de comércio com fins lucrativos, enquanto a sociedade simples,

embora almeje lucros, não pratica atos de comércio, e sim atua na qualidade de profissionais,

ou seja, é através de seus conhecimentos técnicos e específicos que objetiva os fins

econômicos.

Maria Helena Diniz (2007, p. 258), ao escrever sobre esta classificação, diz que:

Page 13: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

13

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

A sociedade simples, por sua vez, é a que visa fim econômico ou lucrativo, que deve

ser repartido entre os sócios, sendo alcançado pelo exercício de certas profissões ou

pela prestação de serviços técnicos. [...] Mesmo que uma sociedade simples venha a

praticar, eventualmente, atos peculiares ao exercício de uma empresa, tal fato não a

desnatura, pois o que importa para identificação da natureza da sociedade é a

atividade principal por ela exercida (RT, 462:81). [...] visam lucro, mediante

exercício de atividade mercantil (RT 468:207), assumindo as formas de: sociedade

em nome coletivo; sociedade em comandita simples; sociedade em comandita por

ações; sociedade limitada; sociedade anônima ou por ações (CC/02, arts. 1.039 a

1.092, Lei N.º 11.101/2005, art. 96, § 1º).

Portanto, para se saber se uma sociedade é simples ou empresarial, basta verificar a

natureza a que ela se destina, ou seja, é simples quando a atividade está voltada aos sócios,

depende fundamentalmente dos atributos individuais destes, e, empresarial quando os hábitos

da sociedade são plenamente mercantis, independentemente das características subjetivas dos

mesmos.

Seguindo o raciocínio, Miguel Reale (2008) preleciona:

Tanto a sociedade simples como a empresária podem se constituir para prestação de

serviço, mas, a meu ver, na primeira, a palavra “serviço” corresponde à profissão

exercida pelo sócio. Na sociedade empresária, ao contrário, os serviços são

organizados tendo em vista a sua produção ou circulação, dependendo da finalidade

visada. É o que se dá quando uma empresa é organizada para prestação de serviços,

como, por exemplo, os de transmissão ou distribuição de energia elétrica, ou de

transporte.

Já Gladston Mamede (2007, p. 9), com grande senso prático, assevera:

[...] Nesse sentido, o artigo 982 do Código Civil esclarece que as sociedades podem

ser (1) empresárias ou (2) simples; as empresárias são aquelas que têm por objeto o

exercício de atividade própria de empresário sujeito ao registro, conforme a previsão

anotada nos artigos 966 e 967 do Código Civil; as demais são consideradas

sociedades simples.

E conclui dizendo que esta divisão, tendo por referência a estrutura empresarial ou

não da atividade, encontra uma exceção no parágrafo único daquele artigo 982, tomada pelo

tipo societário, ou seja, as sociedades por ações são consideradas empresárias e a sociedade

cooperativa é considerada simples.

Neste contexto, importante dizer que as sociedades visam fim econômico ou

lucrativo e têm autonomia patrimonial, uma vez que atuam em nome próprio e suas

existências são totalmente distintas das dos sócios.

Page 14: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

14

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

3.2 Sociedades de Pessoas e de Capital

O primeiro critério de classificação das sociedades empresárias é o que leva em conta

o grau de dependência da sociedade em relação às qualidades subjetivas dos sócios.

Segundo este critério, as sociedades podem ser de pessoas ou de capital.

Notadamente, não existe sociedade sem que haja o elemento dos sujeitos (sócios),

em um mínimo de dois, ou seja, toda sociedade será de pessoas, todavia, esta distinção diz

respeito aos deveres e obrigações para com a sociedade.

Coelho (2008, p. 25) assim ensina a respeito desta classificação:

As sociedades de pessoas são aquelas em que a realização do objeto social depende

mais dos atributos individuais dos sócios que da contribuição material que eles dão.

As de capital são as sociedades em que essa contribuição material é mais importante

que as características subjetivas dos sócios. A natureza da sociedade importa

diferenças no tocante à alienação da participação societária (quotas ou ações), à sua

penhorabilidade por dívida particular do sócio e à questão da sucessão por morte.

Para Gladston Mamede (2007, p. 65), a distinção destes dois grandes grupos diz

respeito ao animus que orienta as pessoas que se unem, e assim pondera:

[...] de um lado, verificam-se grupos que são formados em função das pessoas, ou

seja, sociedades cuja identidade do membro é um elemento vital. [...] De outro lado,

verificam-se grupos que dão menos importância para a identidade do sócio, estando

mais preocupados com o aporte de capital a bem da sociedade; justamente por isso,

não fazem distinção de quem será o sócio, desde que o capital seja integralizado e as

cláusulas do contrato social sejam respeitadas. No primeiro caso, fala-se em

sociedade de pessoas ou sociedade „intuito personae‟ (em função das pessoas); no

segundo caso, sociedade de capital („intuito pecuniae‟).

Isto posto, entendidas as classificações que norteiam as sociedades empresárias, ou

seja, quanto ao objeto social são sociedades simples ou empresárias; sejam quanto aos deveres

e obrigações para com a sociedade são classificadas como as de pessoas ou de capital, passa-

se a analisar as sociedades contratuais e institucionais.

3.3 Sociedades Contratuais e Institucionais

O segundo critério de classificação das sociedades empresárias é o que diz respeito

ao regime de constituição e dissolução do vínculo societário.

Nas palavras de Coelho (2008, p. 26):

Page 15: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

15

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

As sociedades contratuais são constituídas por um contrato entre os sócios. Isto é,

nelas, o vínculo estabelecido entre os membros da pessoa jurídica tem natureza

contratual, e, em decorrência, os princípios do direito dos contratos explicam parte

das relações entre os sócios. As institucionais também se constituem por um ato de

manifestação de vontade dos sócios, mas não é este revestido de natureza contratual.

Em decorrência, os postulados da teoria dos contratos não contribuem para a

compreensão dos direitos e deveres dos membros da sociedade.

Gladston Mamede (2007, p. 64), ao lecionar sobre as sociedades contratuais,

esclarece que “estabelece-se um contrato de sociedade, ou seja, um contrato social entre os

sócios, nele sendo preenchidos consoante dispostos nos artigos 46 e 997 do CC/02, bem como

estipulando-se outras cláusulas que as partes livremente pactuarem e que regularão a

existência da sociedade”.

E, no que diz respeito às sociedades institucionais, crava a seguinte idéia:

Em contraste, há as chamadas sociedades estatutárias ou sociedades institucionais.

Seus elementos de identificação e as regras específicas por meio das quais existem e

são administradas estão definidas em estatutos e não em contratos. O estatuto,

embora reflita o conjunto das normas que orientam a existência e o funcionamento

da pessoa jurídica, não se apresenta como um contrato, não registrando obrigações

que tenham sido assumidas entre as partes nomeadas e qualificadas no instrumento.

[...] Os instituidores são aqueles que acolheram ao chamado para instituição da

pessoa jurídica, sendo aceitos para tanto, e que deliberam as regras que orientarão a

existência e o funcionamento da pessoa jurídica; o resultado dessa assembléia será

convertido em estatuto, sendo devidamente registrado.

E conclui que “embora devam estar ali nomeados e qualificados os fundadores, não

se faz necessário listar todos os associados (nas associações), cooperados (nas cooperativas)

ou acionistas (nas sociedades por ações)”.

Portanto, fica nítido entre as sociedades contratuais e as institucionais: naquelas as

partes estão reciprocamente obrigadas entre si, através de um contrato de sociedade estipulado

entre elas pela vontade livre e consciente; ao passo que nestas, não há contrato, e sim, um

estatuto social e as partes não estão interligadas reciprocamente, mais sim perante a sociedade

empresária.

4 SOCIEDADE COOPERATIVA

Instituída a partir do século XIX, na Inglaterra, onde trabalhadores que migraram

para as cidades viram a necessidade de unir-se para adquirirem alimentos mais baratos.

Cansados dos fartos trabalhos e má remuneração, agravados através dos efeitos causados pela

Page 16: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

16

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

revolução industrial, o cooperativismo ganhou notável importância entre os homens.

Para Waldírio Bulgarelli (1961, p. 55):

O cooperativismo surge como a realização de um movimento de revolta do mais

fraco econômica e socialmente contra o seu opressor; o consumidor cansado de ser

explorado pelo comerciante, resolveu, em uma revolta pacífica, substituir-se ao seu

algoz, e extinguir o lucro da operação.

Com essa finalidade, entende-se que cooperativismo é a união entre pessoas que

possuem os mesmos objetivos, e que almejam a satisfação de necessidades comuns.

Conforme Walmor Franke (1973, p. 11), no conceito de cooperativa, deve-se sempre

levar em “consideração a defesa e a melhoria da situação econômica dos cooperados, através

da obtenção dos mais baixos custos nos produtos ou serviços de que necessitam.”

Neste entendimento, Ademar Schardong (2003, p. 81) faz o seguinte comentário:

Diante do incontestável objetivo geral das sociedades cooperativas, o legislador

constitucional brasileiro, quando da elaboração da Constituição Federal de 1988,

assegurou, em diversos dispositivos (art. 5º, XVII, XVIII, XX, XXI; art. 174, § 2º -

CF/88) o direito à sociedade de se organizar em sociedades cooperativas, cabendo ao

Estado apoiá-las e incentivá-las.

A sociedade cooperativa tem como base o princípio da solidariedade, e firma-se

através da união de pessoas, com finalidade econômica, porém sem almejarem lucro. Neste

entendimento, Gladston Mamede (2007, p. 605) ensina que “nas sociedades cooperativas, em

fato, há uma finalidade econômica; mas, não há finalidade de lucro.”

Tendo sua posição ideológica fundada na solidariedade, desde os tempos mais

remotos, o professor Hanz-Jürgen Seraphim (apud FRANKE, 1973, p. 7), com maestria

ensina que:

O mais alto princípio ao qual se subordina, inalteravelmente, a ação cooperativa [...]

é o de que a cooperativa não existe para explorar serviços no seu próprio interesse,

mas para prestá-los desinteressadamente aos seus membros, os cooperados. Essa

atitude básica pressupõe um ideário socioeconômico, a que se tem chamado, com

muito acerto, de solidarismo, entendido como expressão de um comportamento

comum em que o interesse da cooperativa se identifique com o do cooperado. É

exatamente esse ideário que distingue as cooperativas, por forma inequívoca, de

outras orientações econômicas, tais como o individualismo lucrativista e o

coletivismo comunista, e, bem assim, do altruísmo econômico.

Solidificada neste princípio básico, entende-se como sociedade cooperativa a união

de pessoas que se obrigam entre elas, com o objetivo econômico, porém sem fins lucrativos.

Page 17: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

17

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

Muito embora o artigo 3º da Lei Cooperativista mencione que celebram contrato de

sociedade cooperativa as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou

serviços para o exercício de uma atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de

lucro, assevera-se que as cooperativas não são contratuais, e sim institucionais, pois, por força

do artigo 14 e seguintes do mesmo dispositivo legal, devem ser constituídas por deliberação

da Assembléia Geral dos fundadores, constantes da respectiva ata ou por instrumento público.

Com isso, tem-se que as cooperativas são sociedades de pessoas, com forma própria,

de natureza civil, não sujeitas à falência, constituídas para prestar serviços aos associados,

distinguindo-se das demais sociedades, nos termos do artigo 4ª da Lei n.º 5.764/1971 e pelas

seguintes características: adesão voluntária; variabilidade de capital, representado por quotas-

partes; limitação do número de quotas-partes do capital para cada associado; inacessibilidade

de quotas-partes do capital a terceiros, estranhos à sociedade; singularidade de voto; quorum

para o funcionamento e deliberação de assembléia geral baseado no número de associados e

não do capital; retorno das sobras do exercício proporcionalmente às operações realizadas

pelo associado; indivisibilidade do fundo de reserva e de assistência técnica educacional e

social; neutralidade política e indiscriminação religiosa, racial e social; prestação de

assistência aos associados; área de admissão de associados limitada às possibilidades de

reunião, controle, operações e prestação de serviços.

Do citado dispositivo legal instituem-se as características diferenciadoras das demais

sociedades mercantis.

Vergílio Frederico Périus (apud MEINEN, 2002) ensina que:

O associado é dono da cooperativa, não seu cliente, daí ser fácil entender que lhe

cabe cobrir os custos operacionais da cooperativa [...]. A cooperativa, portanto, é um

braço alongado do associado, de tal forma que sócios são a cooperativa e esta só tem

razão de existência se eles a querem manter.

As cooperativas são sociedades simples, independentemente de seu objeto, por força

do artigo 982, § único do CC/02, e justamente por isso não estão sujeitas a falência. Observa-

se a isso que as cooperativas são definidas por lei especial (lei n.º 5.764/1971) e

subsidiariamente aplicam-se os artigos 1.093 a 1.096 do CC/02, no qual admitem-se ainda, no

que a lei for omissa, as disposições referentes à sociedades simples (v.g. arts. 997 a 1.038 do

CC/02), respeitadas as características estabelecidas no art. 1094 do mesmo diploma legal.

Efetivamente, revestiu-se da maior importância a norma do artigo 5º, inciso XVIII da

Constituição Federal de 1988 que garantiu a independência do direito cooperativo.

Page 18: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

18

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

Arnoldo Wald (2005, p. 603) assim leciona:

A cooperativa é, no Brasil, sociedade simples com características próprias, em que

assume especial realce o espírito da mutualidade, equivalente à reciprocidade das

prestações entre a cooperativa e o cooperado, em contraprestação ao cunho

eminentemente capitalista das demais sociedades comerciais.

Tem-se que a cooperativa é considerada sociedade simples, por força de lei, e trata-se

de pessoas que, diante dos fins comuns, unem-se para promover a defesa de suas economias.

Dá-se a sociedade cooperativa o seu caráter de sociedade de pessoas, devido à

contribuição pessoal máxima dos seus associados (cooperados), a qual é muito maior do que o

das demais sociedades.

Neste diapasão, Walmor Franke (1973, p. 13) assevera:

A cooperativa, porém, se distingue conceitualmente das demais organizações por um

traço altamente característico: enquanto nas empresas não-cooperativas a pessoa se

associa para participar dos lucros sociais na proporção do capital investido, já na

cooperativa a razão que conduz à filiação do associado não é a obtenção de um

dividendo de capital, mas a possibilidade de utilizar-se dos „serviços‟ da sociedade

para melhorar o seu próprio „status‟ econômico.

E conclui dizendo que para isso “impõe-se que o sócio da cooperativa seja, ao

mesmo tempo, o seu usuário ou cliente.”

Para Waldírio Bulgarelli (1961, p. 58):

O cooperativismo atua na ordem econômica, trazendo um sentido altamente social.

A alguns tratadistas mais atilados não passou despercebido esse aspecto tão

importante da atividade cooperativista, e na análise da sua natureza intrínseca,

ressaltaram-no, para indicar, principalmente, a predominância do fator social sobre o

econômico, fato esse que distancia o cooperativismo do capitalismo.

Diante de todo o exposto, apresentam-se as cooperativas como uma específica

categoria de sociedade, que enseja novos tipos de relações jurídicas com seus cooperados,

principalmente sua atuação e operacionalidade distinta das demais sociedades, com objetivos

e características próprias.

4.1 Ato Cooperativo

A cooperativa é uma sociedade de natureza simples, criada por Lei Federal n.º

Page 19: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

19

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

5.764/1971, que define a política nacional do cooperativismo e institui o regime jurídico das

sociedades cooperativas, e possuem características próprias, distinta das demais sociedades.

Visto isto, destaca-se que o ato cooperativo está muito bem descrito no artigo 79 da

Lei 5.764/71, in verbis:

Art. 79. Denominam-se atos cooperativos os praticados entre as cooperativas e seus

associados, entre estes e aquelas e pelas cooperativas entre si quando associadas,

para a consecução dos objetivos sociais. Parágrafo único. O ato cooperativo não

implica operação de mercado, nem contrato de compra e venda de produto ou

mercadoria.

Seguindo o raciocínio Gladston Mamede (2007, p. 613) assim define o ato

cooperativo:

[...] aquele praticado (1) entre a cooperativa e seu cooperado, (2) entre os

cooperados e a cooperativa e (3) entre as cooperativas entre si, quando associadas,

para a consecução dos objetivos sociais – não implica operação de mercado, nem

contrato de compra e venda de produto ou mercadoria. É o ato jurídico no âmbito

das empresas e, mesmo, das sociedades simples.

Tem-se que se trata de negócios específicos, vinculados e subordinados aos objetivos

sociais, praticados pelos sócios com as suas sociedades e que não constituem operação de

mercado nem compra e venda.

A respeito dos elementos essenciais do ato cooperativo, Bellini Júnior (1998, p. 5)

ressalta:

Primeiramente, cumpre ressaltar que, por ocasião do I Congresso Continental de

Direito Cooperativo (Venezuela, 1969), os participantes consolidaram, através da

Carta de Mérida, os elementos essenciais do ato cooperativo, que permitem sejam

estes distinguidos de outros atos jurídicos: a) sujeitos: associado e cooperativa,

constituída e funcionante de acordo com os princípios cooperativos universalmente

aceitos; b) objeto: de acordo com os fins de uma cooperativa; c) serviço: sem

intenção de lucro.

E conclui:

Assim, sob a influência desse Congresso, em 16 de Dezembro de 1971 foi

promulgada a Lei n.º 5.764/71, dispondo em seu art. 79 que os atos cooperativos são

unicamente os realizados entre a cooperativa e os associados ou entre as próprias

cooperativas, quando associadas. Assenta também a norma que o ato cooperativo

deve ser realizado na consecução dos objetivos sociais e não implica operação de

mercado, nem contrato de compra e venda de produtos e mercadoria.

Page 20: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

20

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

Permite-se dizer que o ato cooperativo é aquele praticado entre os sujeitos

instituidores da sociedade cooperativa, com objetivos comuns e praticados sem a qualquer

estimativa de lucros.

Neste aspecto, Rose (2008, p. 49) assevera que:

O conjunto de ações que uma Cooperativa realiza, com seus associados, prestando a

eles o serviço que eles, associados, procuraram na Cooperativa quando se

associaram, serviço que não os diferencia da qualidade de associados, por serem

clientes, este serviço é o que a lei chama de ato cooperativo. Ato que não é lucrativo

e cuja realização não implica, por expressa disposição legal, operação de mercado

ou contrato de compra e venda do produto, serviço ou mercadoria.

Portanto, todo o ato praticado entre os mencionados sujeitos, sem intenção de lucros,

estará caracterizado o ato cooperativo nos termos da legislação em comento.

No entanto, alguns aspectos devem ser analisados, tendo em vista que existem atos

em que não aparecerá o sujeito cooperado, e sim aqueles chamados não-cooperados, distintos

da relação cooperativista.

4.1.1 Atos não cooperativos intrínsecos

Sabe-se que o ato cooperativo é aquele praticado entre os sujeitos incorporados na

relação – cooperado/cooperativa - e cooperativas entre si quando associadas. No entanto, a de

se ressaltarem os dois subtipos de atos para uma melhor compreensão sobre o tema.

Ao se referir aos atos não cooperativos intrínsecos, diz-se daqueles relacionados a

negócios em que são inerentes aos objetivos da sociedade, ou seja, fins comuns entre os

associados (cooperativa/cooperado).

Bellini Júnior (1998, p. 8) preleciona que são os atos que a cooperativa perfaz com

terceiros no “atendimento de seu objetivo social, sendo meio ou instrumento por intermédio

do qual a cooperativa se coloca na posição de poder realizar aquelas operações internas que

dizem respeito à prestação de serviços aos sócios”.

Os atos não cooperativos intrínsecos, como aqueles de contratar ou demitir

empregados e compra de equipamentos, são em busca de atender os fins sociais da sociedade

cooperativa e por sua vez não visam lucros, e, sim, beneficiar os seus associados

(cooperados).

4.1.2 Atos não cooperativos extrínsecos

Page 21: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

21

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

Os demais atos praticados pela sociedade cooperativa geram lucros, todavia não

podem ser distribuídos aos seus associados, pois estaria ferindo a própria finalidade atribuída

a ela.

Assim, têm-se na legislação especial cooperativista, nos seus artigos 85 a 88, as

operações com não associados.

Estes artigos estabelecem o seguinte – in verbis:

Art. 85. As cooperativas agropecuárias e de pesca poderão adquirir produtos de não

associados, agricultores, pecuaristas ou pescadores, para completar lotes destinados

ao cumprimento de contratos ou suprir capacidade ociosa de instalações industriais

das cooperativas que as possuem.

Art. 86. As cooperativas poderão fornecer bens e serviços a não associados, desde

que tal faculdade atenda aos objetivos sociais e estejam de conformidade com a

presente lei. Parágrafo único. No caso das cooperativas de crédito e das seções de

crédito das cooperativas agrícolas mistas, o disposto neste artigo só se aplicará com

base em regras a serem estabelecidas pelo órgão normativo.

Art. 87. Os resultados das operações das cooperativas com não associados,

mencionados nos artigos 85 e 86, serão levados à conta do "Fundo de Assistência

Técnica, Educacional e Social" e serão contabilizados em separado, de molde a

permitir cálculo para incidência de tributos.

Art. 88. Poderão as cooperativas participar de sociedades não cooperativas para

melhor atendimento dos próprios objetivos e de outros de caráter acessório ou

complementar.

Nota-se que os atos mencionados nos artigos acima citados, tratam-se daqueles

praticados a não associados, mas sempre em atendimento dos próprios objetivos sociais.

Deste modo, como assevera Waldírio Bulgarelli (1961, p. 11) “considerar algumas

das categorias de cooperativas existentes, ou todas, simplesmente como sociedades

comerciais (mercantis), é negar a própria instituição cooperativa”.

Para a instituição da cooperativa, calcada no princípio da solidariedade e objetivos

comuns entre os associados, sem a finalidade lucrativa, não há que se falar em atos praticados

que fujam destes conceitos.

A relação cooperativa com o mercado em geral está relacionada indiretamente ao que

estabelece a legislação, ou seja, os atos não cooperativos extrínsecos estão indiretamente

correlacionados com seus objetivos sociais.

Há uma diferenciação entre os objetivos sociais mencionados com a causa final da

relação, o que neste último está afastada qualquer menção. A causa final dos atos sempre será

analisada para o fim a que se destina, porém no caso em específico – atos cooperativos à luz

do artigo 79 da Lei Federal n.º 5.764/71 – não se argumenta para que serve o ato, e sim qual é

Page 22: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

22

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

o objetivo alcançado por ele.

Nas palavras de Walmor Franke (apud BELINI, 1998, p. 9):

O fim da cooperativa é a prestação de serviços aos associados, para a melhoria do

seu status econômico [...]. Objeto do empreendimento cooperativo é o ramo de sua

atividade empresarial; é o meio pelo qual, no caso singular, a cooperativa procura

alcançar o seu fim, ou seja, a defesa e melhoria da situação econômica do

cooperado. A tais atos, sob a óptica das sociedades cooperativas, denominamos atos

não-cooperativos extrínsecos. Porém, nada mais são do que atos comerciais ou civis,

dependendo, para seu enquadramento, de suas particularidades. (sic)

O referido autor, com muita clareza, ao mencionar sobre a natureza dúplice da

cooperativa; os atos cooperativos e as diversas espécies de negócios realizados pela

sociedade, preleciona:

Já se acentuou que o fim da cooperativa não se confunde com o seu objeto. O fim é a

promoção da defesa ou fomento da economia dos cooperados, mediante a prestação

dos serviços a que se referem os estatutos. O objeto é a atividade empresarial

desenvolvida pela cooperativa para a satisfação daquele fim, ou seja, a melhoria do

„status‟ econômico dos sócios.

E complementa alertando que o interesse do cooperado e o da cooperativa obedecem

à mesma causa final, ou seja, a cooperativa visa servir o associado (cooperado) e isso é

recíproco, sempre em busca de seus objetivos.

Diante disto repete-se a idéia de Pontes de Miranda (apud FRANKE, 1973) que, com

maestria diz “que nesse caso, o interesse em ser comum o fim, faz ser comum o interesse”.

Observa-se que mesmo os atos cooperativos praticados entre cooperados e

cooperativa necessitam de negócios relacionados com terceiros, por exemplo: um cooperado

produtor de soja que entrega sua produção para ser vendida pela cooperativa, necessita de

negócios com terceiros no mercado para a definitiva execução do ato (chamado atos não

cooperativos extrínsecos).

Muito embora estes atos dizem respeito a operações de mercado (mercantil), o lucro

almejado nestes negócios serão aplicados em benefício dos cooperados e da própria sociedade

cooperativa.

Portanto, os atos não cooperativos extrínsecos também têm por finalidade os

objetivos sociais da sociedade, e, embora haja a obtenção de algum lucro, devem ser aplicados

nas melhorias da própria sociedade e em benefício dos seus associados, dentro do que

estabelece a função social da empresa.

Page 23: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

23

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

5 DA INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR AO ATO

COOPERATIVO

Como já visto, entende-se que consumidor é “qualquer pessoa física ou jurídica que,

isolada ou coletivamente, contrate para consumo final, em benefício próprio ou de outrem, a

aquisição ou a locação de bens, bem como a prestação de um serviço”, e ainda “as pessoas

expostas a informações ou publicidades enganosas, sujeitas às cláusulas em formulários-

padrão de contratos de adesão, bem como as que já os firmaram” (FILOMENO, 2007, p. 32 e

46).

No tocante ao elemento fornecedor, diz-se que qualquer que seja o produto ou

serviço, objeto da relação de consumo, inserido no mercado por pessoa física ou jurídica, que

atua de forma habitual, oferecendo-os ao consumidor, destinatário final destes, está

diretamente sujeito às normas do CDC.

Para que esteja caracterizada a relação de consumo, é imprescindível a ligação

através da ação do sujeito elementar consumidor ao outro sujeito elementar fornecedor, o qual

fornece os bens para a satisfação final da relação, ou seja, o consumo.

Observa-se a tudo isto que a cooperativa não tem natureza mercantil, tão pouco é

fornecedora de produtos ou serviços aos seus associados (cooperados), conforme disciplina o

CDC.

Não obstante, o cooperado também não é consumidor nos termos do diploma legal, o

que de per si já afasta a aplicação do CDC ao ato cooperativo, pois não se trata de relação de

consumo.

No tocante à hipossuficiência das partes, vale ressaltar que o cooperado não está

fragilizado ou vulnerável aos atos praticados pela sociedade cooperativa, devido ao fato deste

ser o sócio e cliente ao mesmo tempo, amparado pelo estatuto social pelo qual aderiu.

Ademar Schardong, ao lecionar sobre Cooperativa de Crédito – Instrumento de

Organização Econômica da Sociedade, ressalta com veemência que “os atos cooperativos

decorrem da condição de proprietário e usuário que ostenta o cooperado”. E conclui da

seguinte forma: “Se o ato cooperativo é praticado pelo sócio, através da cooperativa,

utilizando-a como instrumento da sua atividade principal, é razão suficientemente forte para

afastar a incidência do CDC” (SCHARDONG, 2003, p. 95).

Assim entendem sobre o tema os doutrinadores Enio Meinen, Jefferson Nercolini

Domingues e Jane Aparecida Stefanes Domingues (2002, p. 90-91), nos seguintes termos:

Page 24: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

24

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

Portanto, a cooperativa não se confunde com as demais sociedades financeiras de

natureza mercantil. As sociedades são constituídas para „prestarem serviços aos

próprios associados‟, veiculando o aspecto da dupla qualidade pela qual o associado

exerce ao mesmo tempo o papel de dono e usuário das cooperativas, circunstância

exposta com clareza pelo Prof. Walmor Franke, In „Dicionário das Sociedades

Cooperativas‟, Editora Saraiva, 1973, p. 13 e 14, in verbis; „A cooperativa, porém,

se distingue conceitualmente das demais organizações por um traço altamente

característico: enquanto nas empresas não cooperativas a pessoa se associa para

participar dos lucros sociais na proporção do capital investido, já na cooperativa a

razão que conduz à filiação do associado não é a obtenção de um dividendo de

capital, mas a possibilidade de utilizar-se dos „serviços‟ da sociedade para melhorar

o seu próprio „status econômico‟‟ (pág. 13). Portanto, inexiste a possibilidade

jurídica para utilizar-se da aplicação do CDC na relação associado X cooperativa,

porque a cooperativa por ser de pessoas representa o interesse destes associados. Em

se tratando de cooperativismo, regido pela Lei 5.764/71, todos os cooperados são,

em verdade, os proprietários, os donos da cooperativa. É cediço que, o objetivo geral

do cooperativismo é o bem comum de todos os associados, que nesta sociedade não

há lucro, mas sim o rateio das sobras e prejuízos por todos. Tais aspectos, peculiares

ao cooperativismo, demonstram cabalmente que não se trata de relação de consumo

e sim mutualidade. A relação cooperativista é distinta das relações de consumo que

são provenientes dos atos de comércio, da intermediação do lucro.

Em complemento esclarecem que:

Deste modo, conclui-se que a principal característica da sociedade cooperativa é a

inexistência de um interesse próprio, distinto dos seus membros, o interesse é

coletivo, que vai ao encontro do próprio objetivo do Código de Defesa do

Consumidor, pois sua natureza societária visa a salvaguardar o interesse coletivo.

Não é por outra razão que a posição de sócio vem definida como uma posição

dúplice, de sócio e proprietário a um só tempo.

Sobre o referido tema, o entendimento esposado pela Relatora Desembargadora

Anny Mary Kuss (2000), do Tribunal de Alçada do Paraná, que mantém o posicionamento até

os dias de hoje, consolidou o não acolhimento do CDC ao ato cooperativo:

[...] Especialmente no que se refere ao § 1º do artigo 52, não há aplicabilidade ao

caso presente, uma vez que, por ser uma das partes cooperativa, a relação jurídica

daí decorrente refere-se à concessão de fomento à atividade agrícola do recorrente,

atividade esta que se encontra inserida em fase intermediária da cadeia de produção,

ou seja, não se trata de relação jurídica envolvendo em um de seus pólos o

consumidor final, não podendo ser considerado o apelante como consumidor, nos

termos do artigo 2º do CDC.

No que diz respeito aos atos não cooperativos extrínsecos, parece oportuno o

entendimento de que os objetivos sociais da cooperativa estão além das simples operações de

mercado, e tendo em vista a finalidade mútua do cooperativismo para com seus associados,

mesmo na relação cooperativa/terceiros, somente em alguns tipos de atos não cooperativos

que poderiam incidir o CDC, devido às peculiaridades deste tipo societário.

Page 25: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

25

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

Walmor Franke (1973, p. 24), ao mencionar sobre os negócios praticados pela

cooperativa em busca dos objetivos comuns, assevera:

[...] nas cooperativas de produtores, o negócio interno, isto é, a entrega dos produtos

pelo cooperado para serem vendidos pela cooperativa („in natura‟ ou transformados)

necessita, para a sua total execução, de outro negócio, o negócio-meio, consiste na

venda do produto pela cooperativa no mercado, com reversão do respectivo preço,

„minus‟ despesas, ao sócio.

Chega-se ao entendimento de que qualquer que seja o ato – ato cooperativo

propriamente dito, intrínseco ou extrínseco – e desde que praticado entre cooperados e

cooperativas entre si, na busca da finalidade mútua dos associados e da própria sociedade,

para que haja a aplicabilidade do CDC, será necessária a análise de cada caso concreto.

Na lição de Walmor Franke (1973, p. 26), depreende-se que os negócios internos

entre cooperados e cooperativa, com a finalidade comum, não participam da natureza

lucrativista das operações de mercado, já que são eles regidos pelo princípio de identidade ou

da unidade do fim e porque não existe mercado entre a cooperativa e o associado no que diz

respeito àqueles negócios.

Para a existência da relação de consumo em atos praticados pela sociedade, não

haverá entre um dos pólos da relação a cooperativa ou o cooperado (associado), e sim um

terceiro totalmente estranho à sociedade que adquire produtos ou serviços para o consumo

final. Ademais, necessário se faz a análise de cada caso concreto e suas peculiaridades.

Nas palavras de Walmor Franke (1973, p. 28):

Ainda que a prática de negócios com terceiros a cooperativa atingir, melhormente, o

seu fim, qual seja o de incrementar o „status‟ econômico dos sócios e se estes, por

outro lado, não se beneficiam dos lucros auferidos (ou porque os mesmos revertem

sob a forma de „bônus‟ aos terceiros contratantes ou porque se destinem a atividades

de interesse coletivo), apaga-se, inegavelmente, o caráter comercial daquelas

operações, que passam a conviver, sem contradição, dentro dos fins do

empreendimento cooperativo, com os princípios aludidos.

E complementa:

A distribuição, entre associados, do lucro auferido em operações especificamente

cooperativas (negócios internos ou negócios-fim) com estranhos, implicaria a

descaracterização da cooperativa, atribuindo-lhe finalidades capitalistas. Se esse

lucro, porém, não for partilhado entre os sócios, mas levado a fundo indivisível

destinado ao fomento da educação ou a fins de assistência social etc., isto é, a um

fundo cuja aplicação envolve interesses de utilidade coletiva, não há negar que a

cooperativa não só se despoja da missão fundamental que lhe cabe auxiliar as

Page 26: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

26

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

economias associadas, mas ainda se investe do exercício de funções que

normalmente incumbem ao poder público.

Ademais, a cooperativa, quando da relação jurídica com seus associados, não faz o

papel de fornecedora de produtos e serviços, e sim distribuidora de tais bens e sempre em

busca de melhorias econômicas e sociais comuns.

Guimarães e Cunha (apud DAL COL, 2008, p. 11) assim destaca o ato cooperativo:

Nas operações internas existe, apenas, a prestação de serviços, em suas inúmeras

modalidades, que a lei houve por bem denominar de „atos cooperativos‟. Muito

embora, na prática, seja comum ouvir-se que o associado „vendeu‟ sua produção à

cooperativa, ou dela „comprou‟ determinado bem, efetivamente ela não realizou

essas operações de compra e venda, mas, simplesmente, alguns „atos cooperativos‟,

de vez que, havendo apenas o propósito de prestação de serviços, inexistiu o fato

mercantil da transação.

Com isso, entende-se que não há aplicação da norma consumerista aos atos

cooperativos, tendo em vista que não se trata de contrato de compra e venda e nem operação

de mercado, por força de lei especial, e ainda estão afastados os elementos consumidor e

fornecedor da relação.

Ademais, nos ensinamentos de Enio Meinen, Jefferson Nercolini Domingues e Jane

Aparecida Stefanes Domingues (2002, p. 89):

[...] tais sociedade possuem disciplina própria e específica, inexistindo relação de

consumo, mas sim, uma sociedade com características diferenciadas das demais.

Deve-se obedecer ao disposto no Estatuto, onde estão catalogados todos os direitos e

obrigações do associado; vale dizer, o associado pode demitir-se da cooperativa

livremente, até porque „ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a

permanecer associado‟ (Constituição Federal, art. 5º, XX), mas, a sua retirada se dá

nos termos previamente estabelecidos.

O Desembargador Relator Fernando Vidal de Oliveira (2002), ao fundamentar sua

decisão, assim conclui o tema:

O CDC somente se aplica, como é evidente, aos contratos de consumo, em que haja

a caracterização tanto da figura do fornecedor quanto da do consumidor. No caso

dos autos, está diante de típico contrato empresarial, em que inexiste a relação de

consumo, não se podendo presumir a hipossuficiência de qualquer das partes. Neste

contexto, a força vinculante dos contratos deve ser atendida, como mecanismo de

manutenção de segurança nas relações negociais. [...] o dinheiro obtido com a

operação discutida nos Embargos à Execução foi destinado à atividade agrícola, de

forma que não está caracterizada uma relação de consumo por ausência de

consumidor.

Page 27: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

27

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

Diante disto, para que haja relação de consumo nos atos praticados entre cooperados

e cooperativas e entre estas em si, é necessária a figura dos elementos constitutivos da relação

(fornecedor e consumidor), além de uma premissa maior, qual seja, a existência de uma

efetiva relação de consumo.

Ademais, via de regra, os cooperados não podem ser equiparados aos consumidores

perante a sua própria cooperativa, uma vez que atuam como sócios e clientes ao mesmo

tempo, nem esta última como fornecedora, pois é mero instrumento para chegar-se aos fins

comuns da própria sociedade, afastados das tipificações do CDC.

6 CONCLUSÃO

Houve, no mundo jurídico, muita discussão sobre a incidência ou não do CDC aos

atos praticados pelas sociedades cooperativas e seus cooperados (associados), chamados de

ato cooperativo.

Nota-se com o presente estudo que a norma consumerista pode ser aplicada quando

há efetivamente a existência de uma relação final (consumo) entre os sujeitos elementares

destacados no CDC, em seu amplo conceito e ainda, todos aqueles que estão de alguma forma

vulneráveis aos atos praticados pelos fornecedores de bens ou serviços estão sujeitos às suas

determinações.

A hipossuficiência na relação de consumo é entendida devido à vulnerabilidade do

consumidor e está diretamente relacionada à desinformação, ao excesso de propaganda com

orientação desqualificada, falta de garantia e seriedade por parte do fornecedor, entre outros

diversos motivos que colocam o consumidor em uma posição inferior aquele que dita às

regras de consumo, e através da incidência da norma consumerista as partes se tornam

equilibradas.

Por conta disso, verifica-se que o cooperado não está fragilizado ou vulnerável aos

atos praticados pela sociedade cooperativa, devido ao fato deste ser sócio e cliente ao mesmo

tempo, amparado pelo estatuto social pelo qual aderiu.

Ao estudar a sociedade cooperativa, observa-se a existência de particularidades que a

destaca dos demais tipos societários, tornando-a um tipo societário sui generis e que merece

atendimento sob uma visão da ordem especial.

Dá-se a sociedade cooperativa o seu caráter de sociedade de pessoas, devido à

contribuição pessoal máxima dos seus associados (cooperados), a qual é muito maior do que o

Page 28: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

28

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

das demais sociedades mercantis.

Além do disposto no § único do artigo 982 do CC/02, a atividade da sociedade

cooperativa é considerada sociedade simples, pois está voltada para os sócios, sendo

fundamentais a dedicação e os conhecimentos técnicos de cada um para o desenvolvimento da

atividade.

As sociedades cooperativas são constituídas por deliberação da Assembléia Geral

dos fundadores, constantes da respectiva ata ou por instrumento público e considerada de

natureza institucional e não contratual, conforme disciplina o artigo 3º da Lei 5.764/71. Os

cooperados estão interligados através do Estatuto Social, onde estão relacionados todos os

direitos e obrigações do associado (cooperado).

Além do mais, diante do princípio norteador cooperativo, ou seja, o da solidariedade,

todos os associados estão obrigados uns com os outros, sempre em busca da finalidade social,

cultural e em defesa de suas economias e não diretamente a sociedade cooperativa, pois esta

atua em benefício e interesse coletivo.

No tocante ao ato cooperativo e a incidência ou não do CDC, deve-se levar em

consideração cada caso concreto e suas peculiaridades.

Logo, os atos não cooperativos intrínsecos são os atos praticados pela cooperativa

com terceiros em atendimento aos seus objetivos sociais. Estes tipos de atos não geram

qualquer tipo de lucro para a sociedade, caso contrário, não estariam atendendo as finalidades

sociais da cooperativa, como por exemplo, a contratação de funcionários e colaboradores.

Os atos não cooperativos extrínsecos, como é certo, têm natureza comercial ou civil,

e possui, em essência, finalidade econômica de lucro. Todavia, tais lucros surgidos destes

tipos de atos não podem ser distribuídos aos cooperados, nem direta ou indiretamente, por

determinação expressa do artigo 24, § 3º e artigos 85, 86 e 88, todos da Lei 5.764/1971.

Sendo assim, os resultados oriundos da prática destes atos não cooperativos

pertencem à cooperativa e não ao cooperado, assim, apenas a estes tipos de atos não

cooperativos é que poderiam incidir o CDC.

Ressalte-se que o cooperado não é consumidor, a cooperativa não é fornecedora de

bens ou serviços, tão pouco são hipossuficientes uns aos outros, pois, como visto, o cooperado

faz o papel de sócio e cliente ao mesmo tempo, e a cooperativa é distribuidora dos bens e

serviços em busca da finalidade comum da sociedade, qual seja, a melhoria sócio-econômica

de seus associados.

Portanto, tem-se que não há que se falar em aplicabilidade do CDC ao ato

Page 29: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

29

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

cooperativo stricto sensu, pois, além de socorrer-se a finalidades recíprocas da sociedade, não

está caracterizada a relação final de consumidor, mas sim o vínculo societário entre cooperado

e cooperativa, ao passo que neste caso aplica-se a legislação especial cooperativista.

Page 30: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

30

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, João Batista de. A proteção jurídica do consumidor. 3. ed. rev. atual. e ampl. São

Paulo: Saraiva, 2002.

ALVIM, Arruda. Código do consumidor comentado e legislação correlata. São Paulo:

Revista dos tribunais, 1991.

BATISTI, Leonir. Direito do consumidor para o Mercosul. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2001.

BELLINI JR., João. Sociedades cooperativas: regime jurídico e aspectos tributários. Revista

de Estudos Tributários, São Paulo, n. 4, p. 5, nov./dez. 1998.

BULGARELLI, Waldírio. Natureza jurídica da sociedade cooperativa. São Paulo: Editora

Clássico Cientifica, 1961.

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial: direito de empresa. 11. ed. rev. e atual.

São Paulo: Saraiva, 2008, v. 2-3.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria geral do direito civil. 24. ed.

rev. e atual. de acordo com a reforma do CPC. São Paulo: Saraiva, 2007, v. 1.

FRANKE, Walmor. Direito das sociedades cooperativas: direito cooperativo. São Paulo:

Saraiva: Ed. da Universidade de São Paulo, 1973.

GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil: parte geral. Pablo Stolze Gagliano,

Rodolfo Pamplona Filho. 9. ed. ver., atual e ampl. São Paulo; Saraiva, 2007, v. 1.

GRINOVER, Ada Pelegrini et al. Código de defesa do consumidor: comentado pelos autos do

anteprojeto. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007.

DAL COL, Helder Martinez. A cláusula mandato, o ato cooperativo e a Súmula 60 do STJ .

Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 48, dez. 2000. Disponível em:

<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1195>. Acesso em: 18 ago 2008.

LISBOA, Roberto Senise. Contratos difusos e coletivos. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista

dos Tribunais, 2000.

MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedade simples e

empresárias. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2007, v. 2.

MARAN, Mara Suely Oliveira e Silva. Publicidade e proteção do consumidor no âmbito do

Mercosul. Curitiba: Juruá, 2004.

MEINEN, Ênio. Cooperativas de crédito no direito brasileiro. Porto Alegre: Sagra Luzzatto,

2002.

PEREIRA, Agostinho Oli Koppe. Responsabilidade civil por danos ao consumidor causados

Page 31: da inaplicabilidade do código de defesa do consumidor ao ato

31

Revista do Direito Privado da UEL – Volume 2 – Número 3 – www.uel.br/revistas/direitoprivado

por defeitos dos produtos: A teoria da ação social e o direito do consumidor. Porto Alegre:

Livraria do Advogado, 2003.

REALE, Miguel. A Sociedade Simples e a empresária no código civil. Disponível em:

<http://www.miguelreale.com.br/artigos/socse.htm>. Acesso em: 11 set 2008.

ROSE, Marco Túlio de. O ato cooperativo e a incidência tributária nas cooperativas. Porto

Alegre: 2001. Disponível em: <www.ree.com.br/artigo2.doc.>. Acesso em: 01 nov. 2008.

SCHARDONG, Ademar. Cooperativa de crédito: instrumento de organização econômica da

sociedade. Porto Alegre: Rigel, 2003.

VALLIN, Cláudio Roberto. O Consumidor e o fornecedor no código de defesa do

consumidor. Disponível em: <http://www.sebraesp.com.br/principal/abrindo%20seu%20

neg%C3%B3cio/produtos%20sebrae/artigos/listadeartigos/codigo_defesa_consumidor.aspx>.

Acesso em: 11 set 2008.

VIANA, Guilherme Borba. Cooperativa não é empresa e não está sujeita a falência.

societário, cooperativas, regime diferenciado. Disponível em:

<http://www.conjur.com.br/static/text/48660,1>. Acesso em: 04 out 2008.

WALD, Arnoldo. Comentários ao novo código civil. Do direito de empresa. Coord. Sálvio de

Figueiredo Teixeira. Rio de Janeiro: Forense, 2005. v. XIV.