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CÉSAR OLIVEIRA RIBEIRO INAPLICABILIDADE DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE ÀS PESSOAS JURÍDICAS Salvador/BA - 2011 -

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CÉSAR OLIVEIRA RIBEIRO

INAPLICABILIDADE DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE ÀS

PESSOAS JURÍDICAS

Salvador/BA

- 2011 -

Rua Humberto de Campos, 282, Ed. Graça Empresarial, Sala 203 – Graça

CEP: 40.150-130. Salvador – BA. Tel. Fax. (71) 3012-0667

RESUMO

O presente trabalho visa perquirir se cabe a extensão dos direitos da personalidade às pessoas

jurídicas, como este vem sendo aplicado rotineiramente nos tribunais brasileiros e pela

interpretação que vem sendo dada ao artigo 52 do código civil. Para tanto veremos as bases

que fundamentam a teoria das pessoas jurídicas, bem como dos direitos da personalidade,

com vistas a percebemos que a diferença de valores que permeiam estes institutos

impossibilita qualquer interpretação no sentido de fazer a aplicação dos direitos da

personalidade às pessoas jurídicas. Isto porque os direitos da personalidade fundamentam-se

na dignidade da pessoa humana, enquanto que as pessoas jurídicas têm por desiderato a

separação patrimonial e fomento à atividade econômica. Assim, o que tem se feito na doutrina

e jurisprudência é atentatório ao fundamento dos direitos da personalidade. Entretanto, tal

interpretação tem sido feita para resolver os casos de difícil comprovação ou liquidação de

danos, para os quais entendemos que a técnica de liquidação dos danos aos direitos da

personalidade pode ser estendida às pessoas jurídicas.

Palavras-chave: direitos da personalidade; pessoas jurídicas.

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ABSTRACT

This paper aims to question about the possibility to extend the personal rights to the

legal entities, as it is been done in the courts and by the interpretation of the civil law.

To accomplish this goal, we will study the base of the theory behind the corporations

and the personal rights, in order to understand the diference of values that exist in each

concept that makes impossible the extension of the individual rights to the legal entities.

This impossibility is due to the personal rights are based on the principle of human

dignity, while the corporations have the finality of segregate the patrimony and increase

the economy. What has been made in the studies and in the legal practice is offensive to

the foundation of the individual rights. However, this interpretation has been accepted

in order to solve the cases of hard proof or evidence of the amount of the damage, in

which we understand that the technique of liquidation of damage to the personal rights

can be extended to the corporations.

Keywords: personal rights; corporations.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO................................................................................................................. 5

2. A PERSONALIDADE...................................................................................................... 8

2.1. O RECONHECIMENTO DA PERSONALIDADE NA HISTÓRIA............................. 8

2.2. PERSONALIDADE JURÍDICA E PESSOA JURÍDICA............................................... 10

2.3. AS ESPÉCIES DE PESSOAS JURÍDICAS E SUA VINCULAÇÃO À

PATRIMONIALIDADE.........................................................................................................

15

2.3.1. As Sociedades.............................................................................................................. 16

2.3.2. As Fundações............................................................................................................... 18

2.3.3. As Associações............................................................................................................. 20

2.3.4. Os Partidos Políticos e as Organizações Religiosas................................................. 24

3. OS DIREITOS DA PERSONALIDADE........................................................................ 28

3.1. NOVAS PERSPECTIVAS DO DIREITO CIVIL........................................................... 28

3.2. ASPECTOS HISTÓRICOS............................................................................................. 32

3.3. NOÇÕES CONCEITUAIS.............................................................................................. 36

3.4. PRINCIPAIS CARACTERÍSITCAS.............................................................................. 39

3.5. PRINCIPAIS CLASSIFICAÇÕES E SUAS ESPECIFICIDADES................................ 42

3.5.1. Imagem......................................................................................................................... 45

3.5.2. Honra........................................................................................................................... 48

3.5.3. Privacidade.................................................................................................................. 51

3.5.4. Nome............................................................................................................................. 53

4. INAPLICABILIDADE DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE ÀS PESSOAS

JURÍDICAS...........................................................................................................................

57

4.1. DISPOSITIVOS LEGAIS E ENTENDIMENTOS JURISPRUDENCIAIS................... 57

4.2. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A INAPLICABILIDADE ÀS PESSOAS

JURÍDICAS............................................................................................................................

59

4.3. PROTEÇÃO LEGAL AOS SUPOSTOS “DIREITOS DA PERSONALIDADE”

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DOS ENTES FICTÍCIOS....................................................................................................... 62

4.4. MÉTODOS DE APURAÇÃO DOS DANOS MATERIAIS DE DIFÍCIL

LIQUIDAÇÃO E/OU COMPROVAÇÃO SOFRIDOS PELAS PESSOAS JURÍDICAS....

65

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................... 68

REFERÊNCIAS.................................................................................................................... 71

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1. INTRODUÇÃO

Com o advento da sociedade capitalista e a economia de escala, especialmente após a

Revolução Industrial, iniciou-se uma época de exploração do homem pelo próprio homem

diferente da escravidão que marcou a Antiguidade e a Idade Média.

Foram criados mecanismos de legitimação para que pudessem ser oprimidos os mais

fracos ou mais pobres em favor dos capitães de indústrias.

A partir daí começaram a surgir os movimentos humanistas, que pediam liberdade,

igualdade e fraternidade, numa tentativa de impor um respeito mínimo ao homem, enquanto

ser vivo diferenciado dos animais, dotado de inteligência e logo de compaixão e respeito ao

próximo.

Após as atrocidades vivenciadas na Segunda Guerra Mundial esse movimento ganha

ainda mais força e consolida os chamados direitos da personalidade.

O nosso objetivo com a presente pesquisa é perquirir se estes direitos da

personalidade, conquistados com muito sofrimento para a valorização dos seres humanos,

podem ser estendidos às pessoas jurídicas.

É importante salientar que o instituto da personalidade jurídica nasceu exatamente

para expandir as potencialidades humanas e permitir que o homem viesse a conseguir,

coletivamente, o que lhe é impossível individualmente. Além disso, as pessoas jurídicas foram

determinantes para a consolidação do modo de produção capitalista.

Por isso, o sistema jurídica dá personalidade e capacidade a estes entes, alçando-os a

um patamar de privilégios bastante semelhante ao das pessoas naturais.

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O tema da possibilidade de aplicação dos direitos da personalidade às pessoas

jurídicas é polêmico e sempre despertou querelas nos doutrinadores, posto que a divisão

entre os que apóiam e os que rechaçam a extensão sempre foi abissal.

Atualmente, aqueles que negam os direitos da personalidade aos entes fictícios têm

perdido espaço e adeptos, pois o Superior Tribunal de Justiça e o Código Civil parecem ter

encampado o posicionamento reverso. Desta forma, a quase totalidade dos manuais de direito

civil já verberam pela aplicabilidade dos direitos personalíssimos às pessoas jurídicas.

Ainda assim, doutrinadores como Pietro Perlingieri, Gustavo Tepedino, Renan Lotufo,

César Fiuza e Roxana Borges mantêm a resistência, fundamentando-se quase que

exclusivamente na tese de que os direitos da personalidade baseiam-se na dignidade da

pessoa humana, princípio fundamental do Estado Democrático de Direito Brasileiro, e logo não

poderiam ser aplicados aos entes coletivos.

A fundamentação trazida parece-nos bastante acertada, mas queremos ir além e

demonstrar que as pessoas jurídicas são entes vinculados aos seus patrimônios e

desenvolvimento de suas atividades, não podendo ter, desta maneira, vinculação com direitos

ligados a bens indisponíveis, inalienáveis e sem expressão econômica.

Por isso, entendemos que o nosso posicionamento tem originalidade, apesar de

fundamentar-se na doutrina dos citados juristas, tentando galgar um vôo um pouco mais

ousado.

Ao traçarmos estas idéias temos também que nos debruçar sobre a questão dos danos

de difícil comprovação e/ou liquidação sofridos pelos entes coletivos, posto que nestes casos é

que a jurisprudência tem se valido da doutrina dos direitos da personalidade, para liquidar tais

danos como morais e arbitrar um valor indenizatório. Veremos assim, qual a melhor forma de

resolver a questão sem sacrificar os direitos personalíssimos.

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Para chegar a tanto, utilizaremos a pesquisa bibliográfica como fonte principal, através

de livros, revistas especializadas, legislação, textos da rede mundial de computadores e

jurisprudência nacional.

Tentaremos, sempre que possível, utilizar uma abordagem relacionada à legislação

vigente, de forma a demonstrar que as idéias esposadas têm cabimento do direito positivo.

No segundo capítulo abordaremos as nuances das pessoas jurídicas, fazendo uma

abordagem histórica, conceitual e legal deste instituto, de forma a evidenciar que o mesmo se

fundamenta na patrimonialidade e na atividade econômica, sendo assim avesso aos princípios

da dignidade da pessoa humana. Explicitaremos as particularidades de cada tipo de pessoa

jurídica, limitando-nos ao campo do direito privado, para fundamentar o nosso

posicionamento.

No terceiro capítulo estudaremos os direitos da personalidade, revisando sua evolução

histórica para descobrirmos os pilares sobre os quais se erigiram estes direitos, bem como as

noções conceituais, características e classificações atuais que têm sido adotadas, explicitando

a incompatibilidade destas com os entes fictícios. Além disso, faremos uma breve

pormenorização das principais espécies de direitos da personalidade que são aplicados às

pessoas jurídicas.

Para finalizar, trataremos de como a jurisprudência e a legislação têm tratado o tema,

expondo suas fragilidades e construindo o nosso posicionamento, com base nas teorias de

diversos doutrinadores, e sugerindo uma resolução para a questão dos supostos direitos da

personalidade das pessoas jurídicas, de forma a não desampará-las, bem como para os danos

de difícil comprovação e/ou liquidação.

Para orientar o leitor, utilizaremos os termos pessoa jurídica, ente coletivo, ente moral

e ente fictício como indistintamente sinônimos, assim como os termos direitos da

personalidade e direitos personalíssimos. Também, o termo empresário será sempre

empregado no sentido de pessoa jurídica que explora atividade empresarial.

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As traduções existentes no texto foram livremente feitas por nós, assim como os grifos

das citações correspondem aos originais, salvo os casos em que expressamente avisaremos.

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2. A PERSONALIDADE

Este capítulo será dedicado ao estudo do surgimento da personalidade jurídica, tanto

para pessoas naturais quanto jurídicas, suas características e formas e também ao

entendimento dos conceitos e fundamentos das pessoas jurídicas, para entendermos a

possibilidade de aplicação dos direitos da personalidade as estes entes.

2.1. O RECONHECIMENTO DA PERSONALIDADE NA HISTÓRIA

Atualmente no Brasil, qualquer pessoa que nasce com vida tem personalidade jurídica

(como pessoa natural) sendo titular de direitos e podendo contrair obrigações, conforme

artigo 2º do Código Civil1. Também, a Lei Civil determina que determinadas agremiações de

pessoas ou patrimônios sejam dotadas de personalidade jurídica, com a mesma capacidade de

direitos e obrigações.

Entretanto, nem sempre foi assim.

Os registros históricos nos mostram que mesmo as pessoas naturais tinham restrições

para alcançar a personalidade plena.

Como registra Renan Lotufo, nos primórdios do direito romano, as pessoas poderiam ter

até três status, quais sejam status civitatis, status libertatis e status familiae. Apenas com a

cumulação das três condições o indivíduo poderia exercer plenamente seus direitos civis e

1 Art. 2º A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a

concepção, os direitos do nascituro. BRASIL. Código Civil. Lei nº 10.406, de 10/01/2002. Disponível em

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>, acesso em 27/07/2011.

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políticos, sendo que no caso de perda do status libertatis, ou seja redução à condição de

escravo, o indivíduo perdia a personalidade jurídica.2

Pela lógica, concluímos que nesta época, aqueles que nasciam escravos, também

estavam desprovidos de possuírem direitos e obrigações, posto que eram tratados pelo direito

como res (coisa), como nos informa César Fiuza:

De qualquer forma, a personalidade é invenção do Direito. Por isso,

dizemos que personalidade é atributo ou valor jurídico. A

personalidade não é natural, tanto não é natural, que antigamente

havia seres humanos aos quais o Direito não atribuía personalidade.

Eram os escravos, considerados coisas perante o ordenamento

jurídico.3

Também em Roma, como informa Washington de Barros Monteiro, iniciou-se a

instituição de pessoas jurídicas, sendo que inicialmente, na primeira fase do Império Romano,

conheciam-se apenas certas associações de interesse público, como universitates, sodalitates,

corpora e collegia. Já no direito Justiniano, enriqueceu-se a pessoa jurídica com o acréscimo

das fundações.4

Vemos, assim, que os romanos subtraiam a algumas pessoas naturais o reconhecimento

da personalidade jurídica, enquanto que a atribuíam a entes fictícios. Desta forma, a

personalidade, nesta e outras épocas como veremos, era um direito subjetivo atribuído apenas

a certas pessoas naturais ou fictícias de acordo com a opção legislativa.

Durante a Idade Média, permaneceu a característica eletiva da atribuição da

personalidade pela lei, sendo que a Igreja Católica contribuiu para o desenvolvimento das

pessoas jurídicas, como veremos no próximo subitem.

Na modernidade, com o advento da economia capitalista e a necessidade da expansão

de mercados e de capacidade produtiva, passou-se a atribuir personalidade a todas as pessoas

2 LOTUFO, Renan. Curso Avançado de Direito Civil. Coordenação: Everaldo Augusto Cambler. Vol.

1: Parte Geral. 2ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. P. 90. 3 FIUZA, César. Direito Civil: Curso Completo. 7 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 109.

4 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 100.

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naturais e as pessoas jurídicas receberam regulamentação específica, com vistas ao

recrudescimento de suas atividades.

Mesmo com essa nova perspectiva, ainda prevalecia a ótica legalista da atribuição da

personalidade, sendo inclusive, que à época a teoria vigente das pessoas jurídicas era a da

ficção (como detalharemos adiante).

Por isso, após as duas guerras mundiais, com todas as atrocidades do holocausto, os

juristas voltaram a repensar os conceitos de personalidade para alterar o centro do universo

jurídico, deslocando o foco da lei para o ser humano. A partir desta mudança, até mesmo o

conceito das pessoas jurídicas foi alterado, para que estas passassem a ser reconhecidas como

meio de realização das necessidades humanas.

Quanto à esta mudança de foco, escrevem Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald:

Em quadro conclusivo, é lícito verberar que o reconhecimento da

fundamentalidade da dignidade da pessoa humana produz como

consectário lógico a reapreciação (em outras palavras, uma revisita)

dos velhos institutos (e dogmas) civilísticos, dentre os quais a

personalidade jurídica, a autonomia da vontade, o patrimônio, o

contrato, a propriedade e a família.5

Pelo exposto, esta brevíssima perspectiva histórica serve para relembrar que houve uma

mudança no paradigma da personalidade jurídica e, hoje, o epicentro e a justificativa é o ser

humano e sua realização plena, devendo este aspecto ser considerado em toda especulação

do ordenamento jurídico, abrangendo, especialmente os direitos da personalidade.

5 FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direito Civil – Teoria Geral. 7 ed. Rio de

Janeiro: Lúmen Júris, 2008. p. 101. (com grifos no original)

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Para Pietro Perligieri: “A personalidade é, portanto, não um direito, mas um valor ( o

valor fundamental do ordenamento) e está na base de uma série de situações existenciais, nas

quais se traduz a sua incessantemente mutável exigência de tutela”6.

Sendo assim, atualmente, temos um conceito de pessoa, inscrito na legislação civil

brasileira, que abarca todas as pessoas naturais (assim considerados todos os seres humanos

que nascem vivos) e também alguns tipos de associações de pessoas ou patrimônios, aos quais

se denominam pessoas jurídicas.

Resume desta forma Maria Helena Diniz,

pessoa é o ente físico ou coletivo suscetível de direitos e obrigações,

sendo sinônimo de sujeito de direito. Sujeito de direito é aquele que é

sujeito de um dever jurídico, de uma pretensão ou titularidade jurídica,

que é o poder de fazer valer, através de uma ação, o não-cumprimento

do dever jurídico, ou melhor, o poder de intervir na produção da

decisão judicial.7

Em apertada síntese poderíamos formular que pessoa é todo aquele ao qual o

ordenamento reconhece o direito de titularizar direitos, podendo exigi-los judicialmente.

Uma vez definido o conceito atual de personalidade, bem como os seus fundamentos

axiológicos e legais, passaremos, então, ao estudo mais detalhado das pessoas jurídicas que

constituem o objeto específico deste estudo.

6 PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil: Introdução ao Direito Civil Constitucional, tradução

Maria Cristina de Cicco. 3 ed. Riode Janeiro: Renovar, 2007. p. 155-156. 7 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 22 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 117-118.

v. 1.

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2.2. PERSONALIDADE JURÍDICA E PESSOA JURÍDICA

É da natureza do ser humano se reunir em grupamentos para a completude de sua

vivência ou para praticar certas atividades ou mesmo para alcançar determinados fins, para os

quais sua força e vontade individuais não são suficientes. Em certas ocasiões, esses

grupamentos se tornam tão sólidos e necessários, que passam a adquirir autonomia em

relação àqueles que o formam (conjunto de indivíduos), até mesmo sobrevivendo-lhes. Para

Caio Mário da Silva Pereira,

o sentimento gregário do homem permite afirmar que a associação é

inerente à natureza, corrigindo-lhe as fraquezas e suprindo com a sua

continuidade a brevidade da vida. O espírito criador engendra então

entidades coletivas, resultantes de um agregado de pessoas ou de um

acervo de bens, por via dos quais logra a obtenção de resultados mais

positivos e mais amplos do que consegue o esforço individual

isolado.8

A estes aglomerados coube à lei reconhecer a personalidade jurídica, como forma de

dar-lhes plenitude para o atingimento de seu objetivo maior, que é a realização dos seres

humanos que a eles se agregam.

Naturalmente, que este reconhecimento não foi de imediato e, na verdade, foi bastante

lenta a evolução histórica da pessoa jurídica, iniciando-se na Idade Média e ainda tendo

conflitos conceituais hodiernamente.

No direito romano, apesar da existência das societas e das universitates, não havia a

personalidade separada desses entes, apenas se reconhecendo a personalidade e capacidade

jurídica ao Estado.

Conforme ensina Ulhoa,

8 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 20 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p.

297. vol. 1.

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Os alicerces da teoria da pessoa jurídica encontram-se na Idade

Média, em noções destinadas a atender às necessidades de

organização da Igreja Católica e preservação de seu patrimônio.

Naquele tempo, o direito canônico separava a Igreja, como

corporação, de seus membros (os clérigos), afirmando que aquela tem

existência permanente, que transcende a vida transitória dos padres e

bispos. Também por ser a Igreja uma corporação independente de seus

integrantes, nem todos podem falar legitimamente por ela, mas,

dependendo do assunto, apenas os membros de determinada

hierarquia, consultando previamente, por vezes, alguns de seus pares.

Outra importante implicação do reconhecimento da Igreja como uma

corporação inconfundível com os seus integrantes era pertinente aos

bens. A afirmação da vida da Igreja em separado leva à distinção

entre o patrimônio dela e o de cada membro do clero.9

Sendo assim, curiosamente, foi a Igreja responsável pela fundação do instituto que, mais

tarde, serviria como um dos alicerces para o desenvolvimento do capitalismo.

Com a Revolução Comercial, o reconhecimento das pessoas jurídicas e sua legislação se

expande, surgindo as sociedades comerciais, nas quais o instituto ganha força e demonstra sua

verdadeira razão de ser. Principalmente no que tange à separação patrimonial e titularidade

obrigacional, revelou-se a relevância da pessoa jurídica.

Atualmente, podemos definir a pessoa jurídica como entidade formada por um conjunto

de pessoas ou de bens, que visam a determinado fim e à qual se reconhece a personalidade.

Nota-se que o mais importante da conceituação é formação de um único ente, que detenha

capacidade jurídica própria, ou seja, a personalização não é uma conseqüência aleatória da

formação do conjunto de pessoas ou bens com destinação específica, mas um de seus intuitos

primeiros.

Desta forma, cabe-nos reformular o conceito apresentado, adotando a lição de Fábio

Ulhoa, “a pessoa jurídica é uma técnica de separação patrimonial em que se atribui

9 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil. 1 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 1. p. 230. (sem

grifos no original)

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personalidade própria ao patrimônio segregado” 10 . Este conceito inspira-se,

fundamentalmente, no desiderato da personificação.

Veja-se aqui, no conceito esposado pelo autor que o fundamento da pessoa jurídica e

sua dinâmica estão essencialmente ligados ao patrimônio sobre o qual esta se erige.

Por outro lado, Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald, ao tratarem da fundamentação do

reconhecimento das pessoas jurídicas relembram que toda a nova ordem jurídica (e logo a

civil) deverá estar voltada para a realização da dignidade da pessoa humana, desta forma a

pessoa jurídica, independentemente de sua atividade (ou finalidade) deverá desempenhar

uma função social. Por isso, para os citados autores, a atribuição de personalidade para os

entes fictícios só tem razão de ser na medida em que estes contribuem para a plena realização

humana11.

Logo, são elementos da pessoa jurídica: uma vontade humana que lhe origina, que pode

ser coletiva ou singular, esta no caso da fundação, como veremos adiante; a conjugação de

pessoas ou dotação de um patrimônio para a afetação a determinado fim; licitude de sua

atividade; e capacidade jurídica reconhecida legalmente.

Existem diversas teorias para explicar a natureza jurídica da pessoa jurídica, assunto que

foi e é alvo de intrincadas discussões e teses, permanecendo, ainda hoje, como não resolvido

qual a teoria mais adequada, vez que as mais recentes ainda estão se amoldando. Apesar

disso, Orlando Gomes, com sua habitual precisão observava que a discussão sobre o tema

“carece de maior interesse, uma vez que, seja qual for a explicação, nenhuma influência

decisiva exerce na construção técnica hoje incorporada às legislações”12. Inobstante a

argumentação prática do citado doutrinador, abordaremos o tema de forma a melhor

solidificar o entendimento das pessoas jurídicas.

10

COELHO, Fábio Ulhoa. op. cit. p. 232. 11

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direito Civil – Teoria Geral. 7 ed. Rio de

Janeiro: Lúmen Júris, 2008. p. 260-261. 12

GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 186.

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As teorias mais importantes são a da ficção, a realidade técnica e a realidade das

instituições jurídicas. A teoria da ficção, cujo maior expoente é Savigny, adota a idéia que só o

homem pode titularizar relações, sendo que a pessoa jurídica é uma criação artificial da lei

(ficção), logo inexistente no plano real. Esta teoria é criticada por não reconhecer a

necessidade e existência real da pessoa jurídica, estando em franco desuso. Já a teoria da

realidade técnica, “a pessoa jurídica é uma realidade (abstrata) reconhecida pelo direito. O

direito não a cria apenas a reconhece. Ela nasce da iniciativa de pessoas humanas e é deferida

pelo Estado”13.

A última teoria, da realidade das instituições jurídicas, cuja referência doutrinária está

em Hauriou, entende a pessoa jurídica como idéia derivada da lei, sendo concedida a certos

grupamentos de pessoas ou destinações patrimoniais, para a consecução de determinados fins

específicos. Logo, a pessoa jurídica seria uma realidade aliada a uma vontade humana, as quais

têm o reconhecimento legal.

Vê-se assim, que qualquer que seja a teoria adotada o principal fundamento é o

reconhecimento legal e a vontade humana.

A partir de sua constituição, que no direito brasileiro se dá no registro no órgão

competente, a pessoa jurídica adquire sua personalidade distinta, como bem ressalta Cristiano

Chaves de Farias,

A pessoa jurídica, regularmente constituída e personificada, conta com

os seguintes caracteres: a) personalidade distinta dos seus

instituidores; b) patrimônio também distinto dos seus membros; c)

existência jurídica diversa de seus integrantes; d) não podem exercer

atos que sejam privativos de pessoas naturais, em razão de sua

estrutura biopsicológica; e) podem ser sujeito ativo ou passivo em atos

civis e criminais14

.

13

BRUSCATO, Wilges Ariana. Empresário Individual de Responsabilidade Limitada. São Paulo:

Quartier Latin, 2005. p. 148. 14

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direito Civil – Teoria Geral. 7 ed. Rio de

Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 265.

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Desenham-se, aqui, mais uma vez, como características mais importantes da pessoa

jurídica sua separação patrimonial e sua capacidade jurídica.

A pessoa jurídica é pólo de relações autônomo, podendo titularizar direitos e cumprir

obrigações, como as próprias pessoas naturais. É reconhecida a capacidade jurídica geral a

esses entes, para que possam atuar no mundo real e desenvolver seus fins precípuos, sempre

o fazendo em nome próprio. Assim, também, quando uma sociedade pratica ato ilícito, ela

mesma deverá responder e arcar com este, pois uma ação contra os sócios recairia na

ilegitimidade passiva, posto que o sócio não praticou ato e sim a sociedade. Isto porque, para

atuar no mundo real, as pessoas jurídicas precisam se fazer representar por pessoas naturais,

de forma que se externe sua vontade.

Outro ponto fundamental da pessoa jurídica é a autonomia patrimonial, concernente na

segregação entre seu patrimônio e o de seus instituidores. Este é o ponto que mais interessa

ao Direito Empresarial e Civil, pois serve de fundamento à responsabilidade limitada. Assim,

por exemplo, ao instituir uma sociedade, cada sócio contribui com uma fração do capital

social, porém, constituída a sociedade, aquele capital passa a pertencer a ela, não mais

podendo utilizá-lo o sócio, o qual passa a ter uma participação societária. “A partir do instante

em que o sócio separa determinado bem ou quantia monetária de seu patrimônio pessoal e o

outorga à sociedade empresária, extinguem-se quaisquer vínculos entre a pessoa do sócio e o

bem”15, sendo assim, “não existe comunhão ou condomínio dos sócios relativamente aos bens

sociais; sobre estes os componentes da sociedade empresária não exercem nenhum direito, de

propriedade ou de outra natureza. (...) No patrimônio dos sócios encontra-se apenas a

participação societária”16.

Esta autonomia importa na conclusão de que, como titular de capacidade jurídica e de

patrimônio próprio por si administrada, a pessoa jurídica deve responder com os seus bens

pelas obrigações a elas imputadas. Só há de se falar em responsabilidade de sócios ou

15

BRUSCATO, Wilges Ariana. op. cit. p. 156. 16

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial, p. 15, v. 2.

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administradores em casos de fraude, como veremos adiante, ou de responsabilidade

subsidiária se a lei assim estipular. Logo, no caso de sociedades empresárias, respondem pelas

obrigações sociais apenas os bens sociais, apenas cogitando-se da busca ao patrimônio dos

sócios, nos casos de responsabilidade ilimitada, após o exaurimento do patrimônio da

sociedade.

Esta autonomia, entretanto, é mitigada, em alguns pontos, pela lei e também pela

jurisprudência. Sendo assim, tem-se tido a responsabilidade solidária dos sócios ou

administradores de pessoa jurídica nos casos de dívida fiscal, trabalhista, previdenciária,

consumerista, danos ao meio ambiente e atos prejudiciais ao livre mercado (livre

concorrência). Como bem resume o Fábio Ulhoa,

O princípio da autonomia patrimonial tem sua aplicação limitada,

atualmente, às obrigações entre empresários. Se o credor é empregado,

consumidor ou o estado, o princípio não tem sido prestigiado pela lei

ou pelo juiz17

.

Estas exceções têm sua razão de ser em virtude das diversas fraudes perpetradas pelas

sociedades fictícias, às quais têm levado a uma perda para os empresários de boa conduta e da

sociedade como um todo.

Isto porque, o princípio da autonomia patrimonial é alicerce do direito societário, tendo

especial função de incentivar a aplicação de recursos em atividades produtivas, tirando-os da

exclusiva especulação.

Novamente, citamos Fábio Ulhoa:

Se não existisse o princípio da separação patrimonial, os insucessos na

exploração da empresa poderiam significar a perda de todos os bens

particulares dos sócios, amealhados ao longo do trabalho de uma vida

ou mesmo de gerações, e, nesse quadro, menos pessoas se sentiriam

estimuladas a desenvolver novas atividades empresariais. No final, o

potencial econômico do País não estaria eficientemente otimizado e as

17

Idem, ibidem, p. 20.

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pessoas em geral ficariam prejudicadas, tendo menos acessos a bens e

serviços.18

A personalidade jurídica distinta, então, deu vida à separação patrimonial, que por sua

vez permitiu que as pessoas jurídicas desenvolvessem e expandissem suas atividades de forma

impressionante.

Entretanto, como bem ressaltamos neste tópico e insistiremos no decorrer deste

estudo, o fundamento e todo o desenvolvimento das atividades das pessoas jurídicas tem seu

derredor no patrimônio social, ainda que permeado pelas vontades de seus integrantes.

Este patrimônio, uma vez destacado das pessoas naturais que o cederam, deixam de

instituir esfera humana, em seu sentido estrito, passando a compor empresa ou passará a ter

destinação não lucrativa, mas ainda voltada ao desenvolvimento da atividade de uma pessoa

jurídica.

Por isso, como passaremos a desenvolver, parece-nos que todas as pessoas jurídicas

estão intrinsecamente ligadas aos seus respectivos patrimônios e ampliação destes,

destoando, desta forma dos princípios que regem os direitos da personalidade,

especificamente da dignidade da pessoa humana.

2.3. AS ESPÉCIES DE PESSOAS JURÍDICAS E SUA VINCULAÇÃO À PATRIMONIALIDADE

O Código Civil vigente divide as pessoas jurídicas em de direito público (interno e

externo) e direito privado. Nesta análise, limitaremo-nos ao estudo das de direito privado,

posto que são as regidas pelo Direito Civil e mais especificamente sobre as quais tem girado a

controvérsia concernente aos direitos da personalidade.

18

Idem, ibidem, p. 16.

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A própria lei civil enumera, em lista fechada, quais são os tipos de pessoa jurídicas, a

saber:

Art. 44. São pessoas jurídicas de direito privado:

I - as associações;

II - as sociedades;

III - as fundações.

IV - as organizações religiosas;

V - os partidos políticos.19

Apesar de, a primeira vista, parecer que alguns tipos não serão vinculados à idéia de

patrimonialidade, ensejando um possível reconhecimento de direitos extrapatrimoniais a

estes, tal idéia deverá ser plenamente rechaçada, como demonstraremos.

Começaremos pelas sociedades, para as quais a defesa do nosso pensamento é de mais

fácil aceitação.

2.3.1. As Sociedades

Conceituando as sociedades, Cristiano Chaves e Nelson Rosenval apresentam a seguinte

síntese: “As sociedades são pessoas jurídicas que visam, almejam, o lucro, com o objetivo de

reparti-lo entre os sócios”20. Parece-nos que o conceito apresentado pelos autores já sintetiza

sem qualquer dúvida o que queremos explicar neste item, mas iremos além, após conceituá-

las.

O artigo 981 do Código Civil traz disposição de clareza solar sobre o conceito das

sociedades:

19

BRASIL. Código Civil – Lei nº 10.406, de 10/01/2002. Disponível em

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406.htm>, acesso em 27/07/2011. 20

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson, op. cit., p. 269.

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Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que

reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o

exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos

resultados.21

Vemos assim que objetivo da sociedade é exercer atividade para partilhar o resultado

entre seus sócios. Dependendo da forma de organização e da atividade a ser explorada, as

sociedades poderão ser empresárias ou simples, conforme artigos 966 e 982 do Código Civil.

Vale citar que a inclusão das disposições legais referentes às sociedades empresárias no

Código Civil foi de grande revolução no Direito Privado, caminhando no sentido da unificação

pretendida por muitos e rechaçada por outros.

O ato que dá surgimento às sociedades é o contrato social, como informam Pablo Stolze

e Rodolfo Pamplona, sendo este contrato, depois de devidamente registrado, o constitutivo da

personalidade jurídica da sociedade.

Em sua conceituação, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona registram que as sociedades são

pessoas jurídicas coletivas (corporações) que têm como finalidade precípua a exploração de

atividade econômica para partilhar os lucros desta auferidos.22

Importante salientar que as definições supracitadas referem-se a todos os tipos de

sociedades, não somente as empresariais, nas quais o intuito lucrativo é mais acentuado.

Sendo assim, temos que a sociedade é uma reunião de pessoas, em torno de um

patrimônio, para deste extrair o máximo retorno econômico, com a posterior divisão da renda

entre os componentes.

Inobstante todos os tipos societários existentes (limitada, anônima, em comandita ou

em nome coletivo) todas estarão intrinsecamente voltadas para o exercício de uma atividade

(prestação de serviço ou comércio), pela qual tentam auferir retorno financeiro para divisão

entre os sócios, conforme informa Flávio Tartuce:

21

BRASIL, Código Civil, op. cit. 22

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. 5 ed. São

Paulo: Saraiva, 2004. p. 220.

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a) Sociedades empresárias – são as que visam a uma finalidade

lucrativa, mediante exercício de atividade empresária.

(...)

b) Sociedades simples – são as que visam, também, a um fim

econômico (lucro), mediante exercício de atividade não empresária.23

É importante salientar ainda que as sociedades podem ser constituídas por pessoas

jurídicas, ou seja, os sócios podem ser pessoas jurídicas, inexistindo, desta forma, pessoas

naturais como sócias.

É o caso de sociedades controladas, conforme permissão do artigo 1.098 do Código Civil.

A Lei das Sociedades por Ações (Lei nº 6.404/76) também permite que a pessoa jurídica seja

acionista e, no caso das subsidiárias integrais, que uma única pessoa jurídica titularize todas as

ações de outra, na forma dos artigos 116 e 251 da referida lei, in verbis:

Art. 116. Entende-se por acionista controlador a pessoa, natural ou

jurídica, ou o grupo de pessoas vinculadas por acordo de voto, ou sob

controle comum, que:

a) é titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo

permanente, a maioria dos votos nas deliberações da assembléia-geral

e o poder de eleger a maioria dos administradores da companhia; e

b) usa efetivamente seu poder para dirigir as atividades sociais e

orientar o funcionamento dos órgãos da companhia.

Art. 251. A companhia pode ser constituída, mediante escritura

pública, tendo como único acionista sociedade brasileira.24

Vê-se, desta forma, que o elemento humano, nas sociedades, apesar de importante

para a sua gênese e funcionamento, não estará no centro de suas atividades e mesmo de seus

interesses, posto que a finalidade precípua do lucro fatalmente sobrepujará qualquer outra,

uma vez que vivemos em regime capitalista.

23

TARTUCE, Flávio. Direito Civil, 1: lei de introdução e parte geral. 4 ed. São Paulo: Método, 2008. p.

227. 24

BRASIL. Lei nº 6.404, de 15/12/1976. Dispõe sobre as Sociedades por Ações Disponível em

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6404consol.htm>, acesso em 25/07/2011.

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Por isso, não há como se olvidar que nas sociedades o fim é o lucro, sendo certo que

todas as conseqüências de danos praticados a elas também serão patrimoniais, concernentes

na diminuição do patrimônio social ou mesmo na redução do lucro ou sua expectativa.

2.3.2. As Fundações

As fundações, curiosamente, são pessoas jurídicas que se organizam em torno de um

patrimônio, conforme nos informam Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona:

Diferentemente das associações e das sociedades, as fundações

resultam não da união de indivíduos, mas da afetação de um

patrimônio, por testamento ou escritura pública, que faz o seu

instituidor, especificando o fim para o qual se destina.25

Vê-se, assim, que o epicentro sobre o qual se erige a fundação é um patrimônio, na

verdade, um patrimônio afetado a um fim.

Segundo Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald, as fundações resultam da congregação

de três elementos: patrimônio, finalidade e afetação do patrimônio a uma finalidade

específica.26

Continuando a lição sobre fundações, os citados juristas referem que o ato de instituição

da fundação tem forma prescrita em lei, devendo ser feita através da reserva de determinados

bens pelo instituidor, sendo que esta reserva será feita por escritura pública (se o instituidor

25

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo, op. cit., p. 225. 26

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson, op. cit., p. 272.

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ainda estiver vivo – ato inter vivos) ou por testamento (caso o instituidor queira a destinação

para além de sua vivência – causa mortis).27

A grande questão que faz os juristas não perceberem a vinculação da fundação à

patrimonialidade é a sua finalidade altruística, conforme requisito do parágrafo único do artigo

62 do Código Civil28 e como bem define Maria Helena Diniz:

A fundação deve almejar a consecução de fins nobres, para

proporcionar adaptação à vida social, a obtenção da cultura, do

desenvolvimento intelectual e o respeito de valores espirituais,

artísticos, materiais ou científicos. Não pode haver abuso,

desvirtuando-se os fins fundacionais para atender a interesses

particulares do instituidor, por exemplo.29

Face a essas definições e requisitos, pode-se enganosamente concluir que a fundação

não estaria vinculada à patrimonialidade, contudo sua própria gênese assim está.

Veja-se que sem um patrimônio inicial, não se constitui uma fundação. Além disso, no

exercício de suas atividades, a fundação precisa gerir e extrair de seu patrimônio o máximo de

retorno possível, de forma a concretizar suas finalidades, posto que sem recursos econômicos,

estará condenada á ruína.

Devemos ressaltar que a atividade a ser exercida pela fundação, apesar de

possivelmente gerar retorno econômico, não pode ter esta conotação intrínseca. Assim, é

lícito à fundação que realiza pesquisas médicas patentear e explorar esta patente de uma

descoberta, devendo, muito embora, reverter os recursos aferidos para novas pesquisas e sua

manutenção administrativa.

27

Idem, ibidem, p. 273. 28

A fundação somente poderá constituir-se para fins religiosos, morais, culturais ou de assistência.

BRASIL. Código Civil – Lei nº 10.406, parágrafo único do artigo 62, de 10/01/2002. Disponível em

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406.htm>, acesso em 25/07/2011. 29

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: parte geral. V. 1. 22 ed. São Paulo: Saraiva,

2005. p. 211.

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É preciso entender que uma fundação, por ter um patrimônio limitado (no ato de sua

instituição), só sobreviverá por longa data se sua atividade tiver algum retorno econômico ou

se aqueles que dela participarem ou dela usufruírem fizerem doações.

O próprio Código Civil prevê, em seus artigos 63 e 69, que os bens destinados á

fundação podem ser ou virem a ser insuficientes ao seu funcionamento, hipótese em que a

pessoa jurídica será liquidada e seus bens direcionados a outra fundação de finalidade similar.

Sendo assim, a própria legislação prevê que os bens destinados à constituição do ente

fundacional devem ser suficientes e capazes de lhe conferir funcionalidade e autonomia

financeira e administrativa, pois do contrário inviabiliza-se a atividade.

Apesar de vinculada ao seu patrimônio e à rentabilidade deste ou graciosidade de seus

seguidores, a lei proíbe expressamente que aqueles que compõem sua diretoria ou conselho

diretivo venham a auferir remuneração em razão da rentabilidade deste patrimônio ou por

qualquer outra razão, posto que aí sim estar-se-ia dando finalidade lucrativa à fundação.

Neste sentido, é a lição de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona:

Cumpre-nos observar que o legislador cuidou de inserir parágrafo

único no referido art. 62 do CC-02 [Código Civil de 2002],

consagrando o elemento finalístico da fundação, que somente poderá

constituir-se ‘para fins religiosos, morais, culturais ou de assistência’.

Escapa, pois, do permissivo legal a entidade supostamente fundacional

que empreenda atividade econômica com escopo lucrativo.

Não se admite, por outro lado, sobretudo por sua precípua finalidade

social, que a diretoria ou conselho deliberativo da fundação,

desvirtuando inclusive a vontade do instituidor, aliene

injustificadamente bens componentes de seu acervo patrimonial.

Sustentamos que toda alienação demanda alvará judicial, devendo ser

devidamente motivada, em procedimento de jurisdição graciosa, com

a indispensável intervenção do Ministério Público.30

30

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo, op. cit., p. 226.

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Vemos, claramente que se proíbe o escopo lucrativo, mas a extração de resultados do

patrimônio é imperiosa para a sobrevivência da fundação, caso esta não seja sustentada pela

doação de seus asseclas.

Neste diapasão, a fiscalização do Ministério Público prevista na lei civil deve exatamente

impedir que sejam utilizadas as fundações como meio transverso de enriquecimento sem

causa ou evasão fiscal.

2.3.3. As Associações

A maior parte dos doutrinadores, ao realizar estudo sobre os tipos de pessoas jurídicas,

engloba as sociedades e associações num só gênero, denominado corporações. As

corporações, pela definição, são grupos de pessoas que se unem a partir de um sentimento

comum (affectio societatis), para alcançarem, conjuntamente determinado fim.31

Vemos assim que há uma similaridade entre as associações e sociedades, concernentes

no elemento que as fazem surgirem, qual seja a aglomeração de pessoas com o mesmo

objetivo e com o intuito de somarem esforços para alcançá-lo.

“As associações são entidades de direito privado, formadas pela união de indivíduos

com o propósito de realizarem fins não-econômicos”, conforme ensinam Pablo Stolze e

Rodolfo Pamplona e continuam informando que:

O traço peculiar às associações civis, portanto, é jsutamente a sua

finalidade não-econômica – podendo ser educacional, lúdica, religiosa

etc. Resulta, conforme se anotou, da união de pessoas, geralmente em

grande número (associados), e na forma estabelecida em seu ato

constitutivo denominado estatuto.32

31

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson, op. cit., p. 268-269. 32

GAGLIANO, Pablo Stolze; Rodolfo Pamplona. op.cit., p. 215.

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Temos assim que as associações resultam da conjunção de vontades de pessoas, para a

consecução de fins não-lucrativos.

As associações são constituídas pelo registro do seu estatuto nos Cartórios de Registros

de Títulos e Documentos.

O Código Civil, em seu artigo 54 já determina os requisitos de conteúdo dos estatutos,

que são: denominação, fins e sede; requisitos para admissão, demissão e exclusão dos

associados; direitos e deveres dos associados; as fontes de recursos para a sua manutenção;

constituição e funcionamento dos órgãos deliberativos; condições para alterações do estatuto

e dissolução; e forma de gestão administrativa e de aprovação das respectivas contas,

conforme redação alterada pela Lei nº 11.127, de 28 de junho de 2005.

É importante frisar que o direito de associação é constitucionalmente protegido,

devendo o Estado manter a mínima intervenção nas associações, consagrando-se a autonomia

administrativa.

Também, é oportuno mencionar, conforme discriminação acima, que a legislação cuidou

de obrigar aos associados a descreverem, desde a constituição de seu ente associativo, como

será o sustento deste, ou seja, de onde a associação extrairá recursos para a sua manutenção e

funcionamento, de forma a alcançar os fins almejados (artigo 54, inciso IV, do Código Civil).

O ponto nevrálgico da diferenciação entre as corporações está em sua finalidade.

Enquanto, como vimos, as sociedades perseguirão intrinsecamente o lucro, as associações, na

forma do artigo 53 do Código Civil, deverão ter fins não econômicos. Entendemos que estes

fins não econômicos das associações descritos na legislação equiparam-se à finalidade não

lucrativa supra mencionada no estudo das fundações.

Neste mesmo sentido manifestam-se Maria Nazaré Lins Barbosa e Carolina Felippe de

Oliveira, ao mencionarem que a expressão contida no referido artigo 53 da codificação civil,

“fins não econômicos”, deve ser entendida como “fins não lucrativos”. Assim, nada obstaria

que as associações, no exercício de suas atividades auferissem receitas financeiras, desde que

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estas receitas fossem reinvestidas para o atingimento de sua finalidade, proibida, em qualquer

hipótese, a distribuição de lucros ou quaisquer valores entre os associados.33

No mesmo passo é a lição de Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald, ao afirmar que nada

impede que as associações tenham renda financeira, desde que não distribuam lucros e

tenham fins não econômicos:

Já as associações não têm em mira finalidade lucrativa, como estampa

o art. 53 da Lei Civil. É preciso, entrementes, uma interpretação cum

grano salis [com ponderação, com parcimônia] da referida norma.

Veja-se que as associações podem (e, por que não dizer, devem) ter

ganho financeiro. No entanto, o eventual lucro obtido será reaplicado

na própria entidade, vedando-se a partilha entre os sócios. Logo, a lei

não veda o lucro nas associações, mas a sua divisão entre os

associados.

Assim, a associação se consubstancia na união de pessoas naturais,

organizada para atender a fins não econômicos, que podem ser

literários, pios, esportivos, acadêmicos, etc., encontrando limites no

disposto no artigo 5º, XVII, da Constituição Federal que afirma ser

plena a liberdade associativa para fins lícitos, vedada a de caráter

paramiilitar.34

No mesmo sentido:

Note-se que pelo fato de não perseguir escopo lucrativo, a associação

não está impedida de gerar renda que sirva para a mantença de suas

atividades e pagamento do seu quadro funcional. Pelo contrário, o que

se deve observar é que, em uma associação, os seus membros não

pretendem partilhar lucros (pro labore) ou dividendos, como ocorre

entre os sócios nas sociedades civis e mercantis. A receita gerada deve

ser revertida em benefício da própria associação, visando à melhoria

de sua atividade.35

Vemos, pelas citações trazidas, que os juristas chegam a entender salutar para a

associação que a mesma venha a ter lucros, posto que assim terá sua subsistência garantida e

por conseguinte independência para almejar seus fins precípuos.

33

BARBOSA, Maria Nazaré Lins; OLIVEIRA, Carolina Felippe de. Manual de ONGS: Guia prático

de orientação jurídica. 5 ed. Rio de Janeiro: FGV, 2004. 34

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson, op. cit., p. 270. 35

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA, Rofolfo. op. cit., p. 215-216.

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Notamos também, que muitas associações que não desempenham atividades que

geram retornos econômicos instituem uma taxa a ser paga pelos associados, de forma a

manterem-se em atividade, como é o caso de associações de moradores e clubes esportivos.

Vemos assim que o intuito das associações não é intrinsecamente patrimonial, posto

que seu objetivo usualmente seja literário, pio, esportivo, acadêmico, científico, religioso, etc.

Ainda assim, para a pessoa jurídica, em si mesma considerada, a única coisa que interessa é a

sua sobrevivência para atingimento de suas finalidades.

Por isso, a associação necessita ter recursos financeiros suficientes para sua manutenção

e desenvolvimento pleno de suas atividades, uma vez que a míngua de sua renda levará à

inexorável diminuição de atuação e, por fim, liquidação.

Sendo assim, para as associações que exercem atividade econômica lucrativa, os danos a

si perpetrados atingirão diretamente à sua perspectiva de renda, ainda que ligados

exclusivamente ao tipo de imagem que a pessoa jurídica quer passar.

Podemos exemplificar com o caso de uma associação de pesquisas científicas acusada

de fraudar seus resultados. Neste caso, a conseqüência da imputação do ato de falsificação

estará ligado à imagem que o ente associativo passa de ser uma instituição não lucrativa que

contribui graciosamente para o desenvolvimento da humanidade e a repercussão será a

diminuição na procura de outras pessoas (jurídicas e físicas) que queira colaborar com esta

(com trabalho ou dinheiro) ou mesmo que queiram contratá-la.

No aspecto das associações que não exercem atividades econômicas, estas dependem

de seu conjunto de associados, de forma que os ataques à sua reputação, afastarão os atuais e

futuros contribuintes.

Outro ponto que merece destaque é a atribuição, por parte do Judiciário e dos juristas,

de um devido processo legal e contraditório quando da eventual exclusão de um associado.

Sendo assim, este indivíduo a ser excluído tem direito à defesa e a conhecer as acusações que

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lhe são imputadas. Em verdade, tal aplicação decorre da eficácia horizontal dos direitos

fundamentais, já consagrada na doutrina constitucional.

Em face desta eficácia, não se pode impedir o associado de exercer qualquer direito ou

função que lhe tenha sido legitimamente conferido. Sobre este aspecto manifesta-se Flávio

Tartuce:

Percebe-se a intenção do legislador em valorizar os direitos inerentes à

dignidade da pessoa humana, sendo o comando visualizado como uma

manifestação do princípio constitucional pelo qual ninguém pode ser

compelido a agir senão em virtude de lei (princípio da legalidade, art.

5º, II, da CF/1988 [Constituição Federal de 1988]).36

Apesar de em sua passagem o jurista fazer referência ao princípio basilar da dignidade

da pessoa humana, não vemos aqui nenhuma incongruência com o quanto defendido neste

estudo, posto que o referido autor apenas está se referindo à defesa do associado contra ato

ilegal da pessoa jurídica. Desta forma, certo continua a atribuição da dignidade da pessoa

humana como princípio capaz de proteger o ser humano contra ofensas e injustiças

perpetradas pelas próprias associações que integram.

É importante frisar que não queremos, em nenhum momento, mercantilizar ou tornar

as associações vilãs, contudo entendemos que o fim altruístico para o qual esta é criada só

poderá ser realizado se a mesma tiver condições de arcar com os custos da “empreitada”.

Mesmo assim, a necessidade do dinheiro não diminuirá a grandeza dos resultados que

poderão ser alcançados pelas associações.

Conforme pontua Renan Lotufo, as associações são as únicas pessoas jurídicas de direito

civil que podem vir a serem agraciadas com o título de utilidade pública (municipal, estadual

ou federal), passando, assim, a serem titulares de benefícios fiscais e administrativos ou

36

TARTUCE, Flávio. op. cit., p. 225.

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mesmo recebendo repasses governamentais, tudo isto em reconhecimento aos fins altruísticos

e benéficos que as mesmas hodiernamente promovem à sociedade como um todo.37

2.3.4. Os Partidos Políticos e As Organizações Religiosas

Conforme alteração introduzida pela Lei nº 10.825, de 22 de dezembro de 2003, o rol

dos tipos de pessoas jurídicas de direito privado ganhou mais duas figuras: os partidos políticos

e as organizações religiosas.

Para Flávio Tartuce, a alteração tem conotação política, no intuito de afastar os

requisitos legais da associação, como vimos supra, podendo-se criar regras mais brandas para

estes novos entes.38

De fato, muito antes das alterações trazidas pela lei, que é de 2003, já existiam diversos

partidos políticos, os quais eram constituídos em forma de associação.

Por isso mesmo, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona criticam a criação “forçada” destas

novas espécies de pessoas jurídicas, entendendo que ambas já estavam muito bem

agasalhadas sobre o manto das associações.

Pela legislação, tanto os partidos quanto as organizações religiosas não poderão sofrer

empecilhos em sua constituição e funcionamento, na forma dos parágrafos §1º e §3º do artigo

44 do Código Civil. Entretanto, tal previsão já estava inserida na garantia constitucional de

37

LOTUFO, Renan. Curso Avançado de Direito Civil: parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2002. v. 1. p. 115. 38

TARTUCE, Flávio. op. cit., p. 228-229.

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associação (inserta no artigo 5º, XVII, da Constituição Federal), bem como na liberdade

religiosa (artigos 5º, VI e 19, I, também da Carta Magna).39

Apesar de todo o esforço do legislador em afastar da regulamentação os partidos e as

organizações religiosas, a lei nº 9.096/1995 regulamenta a constituição e funcionamento dos

partidos, enquanto que, conforme nos informa Anderson Casé, a terceira Jornada de Direito

Civil realizada pelo Superior Tribunal de Justiça aprovou o enunciado nº 143, segundo o qual as

organizações religiosas poderão sofrer controle de legalidade e legitimidade de seu registro,

bem como poderão ser reexaminados, pelo Poder Judiciário, a compatibilidade dos seus atos

com a lei e com os seus estatutos.40

Apesar de todas as definições legais, segundo Maria Helena Diniz, os partidos políticos

são:

Entidades integradas por pessoas com idéia comuns, tendo por

finalidade conquistar o poder para a consecução de um programa. São

associações civis, que visam assegurar, no interesse do regime

democrático, a autenticidade do sistema representativo e defender os

direitos fundamentais definidos na Constituição Federal.41

Sendo assim, parece-nos que tanto os partidos políticos quanto as organizações

religiosas nada mais são do que associações de finalidades específicas, de forma que, no que

tange à vinculação patrimonial destes entes, poderemos tecer os mesmos comentários feitos

no subitem anterior.

39

Artigo 5º, inciso XVII: “a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de

autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento”; Artigo 5º, inciso VI: “é

inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos

e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”; artigo 19: “É vedado à

União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas,

subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de

dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público”. BRASIL,

Constituição Federal de 1988. Disponível em

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>, acesso em 26/07/2011. 40

CASÉ, Anderson George de Lima. Impossibilidade de dano moral às pessoas jurídicas. 2010.

Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Direito, 2010. 41

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 22 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. v. 1. p.

222-223.

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Além disso, vale acrescentar que, no que tange às instituições religiosas, devemos

lembrar, conforme já abordado, que a Igreja Católica foi uma das responsáveis pelo

desenvolvimento da pessoa jurídica, quando iniciou a segregação do seu patrimônio do de

seus clérigos, conforme informa-nos Arnold Wald:

No Direito Medieval coube aos canonistas desenvolver e hipertrofiar o

conceito de pessoa jurídica, a fim de atender à necessidade de

organização interna da igreja. A pessoa jurídica é, então, definida

como persona ficta [pessoa ficta] ou corpus mysticum [corpo místico],

pelos canonistas, que nela percebem uma realidade distinta e superior

à soma dos seus membros.42

Por isso, apesar de todo o ideário altruísta e não lucrativo que permeia as instituições

religiosas e os partidos políticos (estes um pouco menos no nosso país), na análise estrita das

pessoas jurídicas, vemos que existe a mesma lógica das associações.

No caso dos partidos e instituições religiosas, estes entes dependerão prioritariamente

das contribuições de seus afiliados e seguidores, que muitas vezes são obrigatórias, sob pena

de segregação do não contribuinte.

Mais uma vez reiteramos que todas as pessoas jurídicas de direito privado estão ligadas

ao seu patrimônio e a exploração deste, de onde provém a possibilidade de alcançarem os

objetivos para os quais foram instituídas.

Uma vez concluído o estudo das pessoas jurídicas, deixando claro que desde a gênese

deste instituto o mais fundamental foi a separação patrimonial e autonomia jurídica do ente

fictício, vimos que todas as espécies de pessoas jurídicas abrangidas pela lei civil estão

umbilicalmente ligadas ao seu patrimônio e à exploração deste, de forma direta ou indireta,

dependendo disto para a consecução de suas atividades.

42

WALD, Arnold. Direito Civil: Introdução e Parte Geral. 11 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 147.

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Importante lembrar da lição de Fábio Ulhoa que conceitua: “a pessoa jurídica é uma

técnica de separação patrimonial em que se atribui personalidade própria ao patrimônio

segregado”43.

Ora, assim, só podemos entender que realmente o que importa para a personalização

dos entes fictícios é a autonomia patrimonial, com vistas a facilitar suas transações com os

outros entes da vida social e o desenvolvimento de suas atividades.

Podemos assim concluir que a pessoa jurídica, quando esvaziada de seu patrimônio e de

qualquer possibilidade de auferição de renda, não encontra fim em si mesma, tornando-se

impossível a sua manutenção e obrigatório o seu desfecho.

43

COELHO, Fábio Ulhoa. op. cit. p. 232.

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3. OS DIREITOS DA PERSONALIDADE

Estabelecidas definições, formas e finalidades das pessoa jurídicas cabe-nos agora

passar ao estudo mais específico dos direitos da personalidade para entender se a axiologia e

objeto de proteção destes pode ou não estenderem-se aos entes fictícios.

Entretanto, antes de adentrar o campo dos direitos personalíssimos, devemos

entender as novas perspectivas do direito civil, notadamente o direito civil-constitucional,

descentralização do direito civil e os novos princípios que permeiam a nova codificação

(Código Civil de 2002).

3.1. NOVAS PERSPECTIVAS DO DIREITO CIVIL

Após a Revolução Francesa, com o advento do Código Civil Napoleônico, muitos

juristas passaram a crer que todas as soluções para os problemas jurídicos da esfera civil

estariam insertos na codificação.

Norberto Bobbio chega a insinuar a pretensa completude dos códigos: “a miragem da

codificação é a completude: uma regra para cada caso. O Código é para o juiz um prontuário,

que lhe deve servir infalivelmente, e do qual não pode se afastar”.44

Neste sentido, chegou-se a crer que as disposições constitucionais deveriam ser

interpretadas à luz da lei civil, gerando uma total inversão valorativa, o que ocorreu no

ordenamento brasileiro por muito tempo, até a promulgação da Constituição de 1988.

44

BOBBIO, Norberto, apud Gustavo Tepedino. O Código Civil, Os chamados Microssistemas e a

Constituição: Premissas para uma Reforma Legislativa, in Problemas de Direito Civil Constitucional.

Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 2.

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Neste sentido nos informa Luíz Roberto Barroso:

A verdade, no entanto, é que a preocupação com o cumprimento da

Constituição, com a realização prática dos comandos nela contidos,

enfim, com a sua efetividade, incorporou-se, de modo natural à prática

brasileira pós-1988. Passou a fazer parte da pré-compreensão do tema,

como se houvéssemos descoberto o óbvio após longa procura. A

capacidade – ou não – de operar com as categorias, conceitos e

princípios de direito constitucional passou a ser um traço distintivo

dos profissionais das diferentes carreiras jurídicas. A Constituição,

liberta da tutela indevida do regime militar, adquiriu força normativa e

foi alçada, ainda que tardiamente, ao centro do sistema jurídico,

fundamento e filtro de toda a legislação infraconstitucional. Sua

supremacia, antes apenas formal, entrou na vida do país e das

instituilções.45

Uma vez que houve essa mudança do centro do sistema jurídico como um todo,

deslocando a base e suporte de toda a legislação para o texto constitucional, não mais cabia a

utilização do Código Civil de 1916, posto que este, conforme nos informam Cristiano Chaves e

Nelson Rosenvald, estava inspirado nas concepções individualista e voluntarista oitocentistas,

sob a influência do Código Civil francês de 1804 e do BGB alemão. Pela necessidade de romper

com a lógica feudal e da nobreza, estas codificações afirmavam valores individualistas e

queriam garantir o acesso a bens de consumo (patrimonialista).46

Além disso, para garantir a segurança das relações jurídicas em face do poder político,

estes códigos civis criavam “um mundo de segurança”, para garantir a estabilidade das

atividades privadas. Também, os textos almejavam abarcar a plenitude das situações jurídicas,

entrando numa casuística de disposições normativas e descritivas de cada sanção ou solução a

ser aplicada.47

É óbvio, então, que a Codificação de 1916 não poderia caminhar ao lado da Constituição

Cidadã de 1988, posto que aquele era individualista, patrimonialista, machista e centralizados;

45

BARROSO, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas: limites e

possibilidades da Constituição Brasileira. 6 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. X, nota prévia. 46

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson, op. cit., p. 22. 47

Idem, ibidem, p. 22.

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enquanto que o texto constitucional traz como fundamentos a igualdade material, dignidade

da pessoa humana e proporcionalidade.

Desta forma, é impossível conceber-se atualmente a aplicação de qualquer dispositivo

legal sem a sua devida conformidade com o texto constitucional e este fenômeno, certamente

ocorre no direito civil, especialmente com o Código Civil de 2002, neste sentido manifesta-se

Paulo Luiz Netto Lôbo:

Na atualidade, não se cuida de buscar a demarcação dos espaços

distintos e até contrapostos. Antes havia uma disjunção, hoje há

unidade hermenêutica, tendo a Constituição como ápice conformador

da elaboração e aplicação da legislação civil. A mudança de atitude é

substancial: deve o jurista interpretar o Código Civil segundo a

Constituição e não a Constituição segundo o Código Civil, como

ocorria com freqüência (e ainda ocorre). A mudança de atitude

também envolve certa dose de humildade epistemológica.”48

Desta forma, hoje temos o que os doutrinadores chamam de direito civil constitucional,

que na forma da lição de Flávio Tartuce, apoiado em José Afonso da Silva, não é um novo ramo

do Direito, mas uma nova visão hermenêutica do antigo Direito Civil criado em Roma, que hoje

teve ter seus institutos e previsões legais permeados pelo conteúdo axiológico da Lei Maior.49

Por isso que o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana consegue fluir do

texto constitucional e impregnar o direito civil, trazendo a função social de toda atividade civil

e criando os direitos da personalidade, com previsão legislativa específica.

Além da desta nova postura de subordinar todo o Direito Civil aos fundamentos

constitucionais, também temos um novo fenômeno da descentralização no âmbito civil.

O fenômeno da descentralização não é exclusivo do Direito Civil, mas ocorre em todo o

ordenamento, posto que, uma vez que todos os fundamentos axiológicos estão presentes na

Constituição, não existe mais um imperativo de codificação completa, ou seja, os códigos não

precisam mais descrever todas as situações da vida, devendo apenas preocupar-se com os

48

LÔBO, Paulo Luiz Netto. Teoria Geral das Obrigações. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 2. 49

TARTUCE, Flávio, op. cit., p. 110-111.

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principais pontos de cada matéria, tecendo cláusulas abertas que serão complementadas por

legislações especiais ou mesmo pela interpretação da Carta Magna.

Sendo assim, a descentralização é a regulação de certas matérias de direito civil por

legislações especiais.

Aliás, esta descentralização só pode subsistir em conjunto com a constitucionalização do

direito civil, posto que, do contrário, teríamos uma série de legislações desconexas e isoladas

regulando cada aspecto do direito civil.

Em verdade, a descentralização iniciou-se na vigência do Código de 1916, posto que a

partir de certo momento, o código já estava defasado e era preciso legislar as novas situações

e anseios da vida. Como não se conseguia alterar o código, a solução foi criar microssistemas

civis de legislação, como informam Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona:

Por tudo isso, a dificuldade em proceder a uma reforma generalizada

de nosso Código desencadeou, pois, o (inverso) fenômeno da

descentralização ou descodificação do Direito Civil, marcado pela

proliferação assustadora, à velocidade da luz, de estatutos e leis

especiais que disciplinariam não somente as novas exigências da

sociedade industrializada, mas também velhas figuras que se alteraram

com o decorrer dos anos, sob o influxo de novas idéias solidaristas e

humanitárias, e que não poderiam ser plena e eficazmente reguladas

por um código ultrapassado e conservador.50

Conforme noticia Flávio Tartuce, em face da descentralização já consolidada, ao

elaborar a nova codificação civil, Miguel Reale (coordenador do anteprojeto) definiu como

uma das diretrizes básicas a de

somente inserir no Código Civil matéria já consolidada ou com

relevante grau de experiência crítica, transferindo-se para legislação

especial questões ainda em processo de estudo, ou que, por sua

natureza complexa, envolvem problemas e soluções que extrapolam a

50

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA, Rodolfo, op. cit., p. 51.

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codificação privada, caso da bioética, do biodireito e do direito

eletrônico ou digital.51

Vê-se que, pelo exposto, que pretendeu-se dar à codificação civil apenas o conteúdo

que já estivesse consolidado na doutrina e jurisprudência, deixando as questões controversas

para complementações legislativas. Ao nosso ver, tal opção foi mais que acertada, posto que a

experiência que teve-se com o Código de 1916 mostrou que alterar um texto codificado é

trabalho hercúleo para a estrutura legislativa brasileira.

Além disso, o código civil baseou-se no sistema de textura aberta ou janelas abertas

que, conforme Judith Martins-Costa, que permite, em função de sua estrutura lingüística, a

constante incorporação e solução de novos problemas, seja pela jurisprudência, seja por uma

atividade de complementação legislativa. Segundo a referida jurista:

Nas cláusulas gerais a formulação da hipótese legal é procedida

mediante o emprego de conceitos cujos termos têm significado

intencionalmente vago e aberto, os chamados ‘conceitos jurídicos

indeterminados’. Por vezes – e aí encontraremos as cláusulas gerais

propriamente ditas -, o seu enunciado, ao invés de traçar

punctualmente a hipótese e as conseqüências, é desenhado uma vaga

moldura, permitindo, pela vagueza semântica que caracteriza os seus

termos, a incorporação de princípios e máximas de conduta

originalmente estrangeiros ao corpus codificado, do que resulta,

mediante a atividade de concreção destes princípios, diretrizes e

máximas de conduta, a constante formulação de novas normas.52

Além de tudo o quanto já explicitado, temos que trazer a lume, pela importância na

interpretação da codificação civil os princípios da eticidade, sociabilidade e operabilidade.

Segundo Flávio Tartuce,

o próprio Miguel Reale não se cansava em apontar os princípios ou

regramentos básicos que sustentam a atual codificação privada:

eticidade, socialidade e operabilidade. O estudo de tais princípios é

51

TARTUCE, Flávio, op. cit., p. 90-91. 52

MARTINS-COSTA, Judith. O Novo Código Civil brasileiro: em busca da “ética da situação”. In

BRANCO, Gerson Luiz Carlos e MARTINS-COSTA, Judith. Diretrizes Teóricas do novo Código Civil

brasileiro. São Paulo: saraiva, 2002. p.118.

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fundamental para que se possa entender os novos institutos que

surgiram com a nossa nova lei privada.53

O princípio da eticidade, parece-nos, estar umbilicalmente ligado á boa-fé, sendo uma

expectativa de que todos os indivíduos se comportem, frente ao demais, de forma proba,

como no antigo brocado do bonus pater familiae (bom pai de família).

Neste sentido apoiamo-nos no ex-Ministro do Superior Tribunal de Justiça, José

Delgado:

O típico de ética buscado pelo novo Código Civil é o defendido pela

corrente kantiana: é o comportamento que confia no homeme como

um ser composto de valores que o elevam ao patamar de respeito pelo

semelhante e de reflexo de um estado de confiança nas relações

desenvolvidas, quer negociais, quer não negociais. É, na expressão

kantiana, a certeza do dever cumprido, a tranqüilidade da boa

consciência.54

Já o princípio da socialidade, conforme informa Flávio Tartuce, procura superar o caráter

individualista da antiga codificação, deslocando o centro do universo jurídico do “eu” para

“nós”. Ao invés de primar pela liberdade individual, ter-se-á que priorizar o coletivo, a função

social, a humanidade.55

Sendo assim, os dispositivos do código devem ser interpretados com vistas à boa

convivência entre os indivíduos, harmonização dos interesses e valorização da coletividade.

Quanto ao último princípio, o da operabilidade, este visa dar ao Código Civil a máxima

efetividade, especialmente no que tange ao preenchimento das cláusulas abertas e soluções

dos conflitos.

Por isso, os juristas ao utilizarem o texto codificado devem preencher as lacunas

deixados pelo mesmo e concretizarem os princípios norteadores.

53

TARTUCE, Flávio, op. cit., p. 94. 54

DELGADO, José. A Ética e a Boa-fé no Novo Código Civil. In: DELGADO, Mário Luiz; ALVES,

Jonse Figueirêdo. Questões controvertidas do novo Código Civil. São Paulo: Método, 2003. p. 177. 55

TARTUCE, Flávio, op. cit., p. 96-97.

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Vistas as novas tendências e princípios que regem o Direito Civil, passaremos ao estudo

dos direitos da personalidade, os quais estão intrinsecamente ligados a esta nova

principiologia.

3.2. ASPECTOS HISTÓRICOS

A ampla proteção hoje conferida aos direitos da personalidade constitui fato recente na

história jurídica, cabendo-nos investigar a origem destes direitos para entendermos sua carga

axiológica.

Conforme noticiam Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald, no Direito Romano não

existiam direitos da personalidade da forma como conceituamos atualmente, apenas existia,

para a proteção do indivíduo a actio injuriarum, uma espécie de ação contra injúria, que

estaria mais voltada a uma ação penal privada, do que a uma proteção civil. Ressaltam ainda

os autores que esta ação foi elastecida para abranger qualquer atentado contra a pessoa,

aproximando-se à forma atual de proteção, mas ainda muito embrionária.56

Durante a Idade Média, com a expansão do cristianismo, iniciou-se o pensamento de

fraternidade e temos então o embrião da dignidade da pessoa humana, posto que reconhecia-

se um vínculo entre Deus e o ser humano.

Logo após, tivemos também o Iluminismo, que desflorou no antropocentrismo, levando

à valorização do homem e proteção ás suas liberdades. Além disso tivemos a Escola de Direito

Natural, com a teoria do Jusnaturalismo, ainda hoje utilizada por doutrinadores como

fundamento dos direitos da personalidade.

56

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 106.

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Como bem pontuam Carlos Bittar e Carlos Bittar Filho, na verdade, todos estes fatores

históricos foram se aglomerando para culminar no surgimento dos direitos da personalidade:

A construção da teoria dos direitos da personalidade humana deve-se,

principalmente: a) cristianismo, em que em que se assentou a idéia de

dignidade do homem; b) à Escola de Direito, que firmou a noção de

direitos naturais ou inatos ao homem, correspondente à natureza

humana, a ela unidos indissoluvelmente e preexistentes ao

reconhecimento do Estado; e, c) aos filósofos e pensadores do

iluminismo, em que se passou a valorizar o ser, indivíduo, frente ao

Estado.57

Entretanto, conforme noticia Roxana Borges, houve rejeição inicial a construir-se os

direitos da personalidade, liderada por Savigny, posto que não se poderia admitir que ao

mesmo tempo a pessoa fosse sujeito e objeto do direito, uma vez que tal assertiva legitimaria

o suicídio.58

Ainda assim, a proteção da pessoa continuou a avançar, notadamente no campo do

Direito Público, onde as liberdades e garantias fundamentais foram consolidando-se após as

revoluções burguesas (Revolução Francesa e Independência dos Estados Unidos). Todavia, aqui

o viés das garantias eram a proteção do indivíduo contra a opressão de um estado totalitário e

tirano.

Neste sentido registram Carlos Bittar e Carlos Bittar Filho:

Assim é que foi, primeiramente, no âmbito público, que os direitos da

personalidade ganharam a sagração legislativa, a começar pela

Declaração norte-americana, que refletia a tradição puritana das

antigas colônias, de liberdade de consciência frente ao Estado – pois

formadas, como se sabe por cidadãos ingleses.59

57

BITTAR, Carlos Alberto; BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Tutela dos direitos da personalidade e

dos Direitos Autorais nas Atividades Empresariais. Sâo Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 18. 58

BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Disponibilidade dos direitos da personalidade e a autonomia

privada. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 20. 59

BITTAR, Carlos Alberto; BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Tutela dos direitos da personalidade e dos

Direitos Autorais nas Atividades Empresariais. Sâo Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 19.

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Apesar de toda esta evolução, os direitos da personalidade só foram efetivados na

esfera civil após a II Guerra Mundial. Isto porque, durante a guerra as atrocidades do

holocausto e a degradação do ser humano vivenciados nos campos de concentração levaram a

uma necessidade de proteger-se o ser humano contra o seu igual, provendo-lhe de

instrumentos jurídicos de subsistência.

Conforme verberam Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald, somente após a II Guerra

Mundial é que os códigos civis incorporaram a tutela dos direitos da personalidade. “Era

preciso assegurar uma tutela fundamental, elementar, em favor da personalidade humana,

salvaguardando a própria raça”.60

Sobre esta transição e consolidação dos direitos da personalidade, bem resume César

Fiuza:

Com a evolução do capitalismo industrial, a concentração, a

massificação, os horrores da segunda Guerra Mundial, com o

desenvolvimento da tecnologia, principalmente da biotecnologia etc.,

a perspectiva muda. O paradigma do Estado Liberal é substituído pelo

do Estado Social intervencionista, protetor do mais fraco. Os direitos

da personalidade passam a integrar a esfera privada, protegendo o

indivíduo, sua dignidade, contra a ganância e o poderio dos mais

fortes. Ao lado desse prisma privatístico, continua a subsistir o

público, em socorro do indivíduo contra o Estado. Tendo em vista

essas duas esferas, privada e pública, os direitos da personalidade

pertencem a ambas. Na esfera privada, fala-se em direitos da

personalidade, terminologia cunhada por Otto Gierke. Na esfera

pública, em direitos humanos ou direitos fundamentais.61

Sendo assim, temos que os direitos da personalidade resultam de uma progressão

histórica em que se expandiu a proteção do homem, inicialmente contra o Estado e hoje

também frente aos seus semelhantes e às corporações. Neste prisma, vemos que a pedra

angular dos direitos da personalidade é a dignidade da pessoa humana, princípio inafastável

do Estado Democrático de Direito, que foi assegurado historicamente após diversas afrontas

ao mesmo. 60

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 107. 61

FIUZA, César. Direito Civil: Curso Completo. 7 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 134.

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Em face desta conquista histórica, derivada de muitos percalços, deve-se proteger a

dignidade da pessoa humana enquanto valor e não mero atributo jurídico ou norma do

ordenamento, sob pena de retrocedermos à primeira alteração legislativa, conforme bem

defende Roxana Borges:

Considerar a historicidade da dignidade da pessoa humana é, segundo

a análise aqui desenvolvida, valorizar essa conquista do homem e, por

isso mesmo, protegê-la da melhor forma possível, já que não foi uma

outorga, mas algo conquistado, cuja conservação, proteção e

promoção, por sua vez, também requerem trabalho.62

E continua a jurista:

O fato de o princípio da dignidade da pessoa humana representar uma

conquista do homem torna-a ainda mais preciosa e mais merecedora

de proteção do que se tivesse sido outorgada por uma razão divina ou

natural. Exatamente por derivar de um momento histórico, de

conjunturas jurídicas, políticas, filosóficas, culturais, econômicas e

sociais localizadas e reais, é que o princípio da dignidade da pessoa

humana ganha enorme valor para nossa análise.63

No ordenamento jurídico brasileiro, os direitos da personalidade começaram a ser

inseridos pela jurisprudência, posto que à época que os mesmos estavam sendo desenvolvidos

em outras partes do mundo, estávamos sob regime militar que cerceava as liberdades e

garantias fundamentais (pós Segunda Guerra Mundial).

Entretanto, como bem aduz Anderson Casé, os direitos da personalidade passaram a ter

previsão expressa com a Constituição Federal de 1988, podendo-se citar os incisos V, X e XLI do

artigo 5º como exemplos. Além disso, a Lei de Imprensa (lei nº 5.250/67), Estatuto da Criança e

do Adolescente (lei nº 8.069/90) e a Lei do Transplante de Órgãos (lei nº 9.434/97) fazem

menção expressa aos direitos da personalidade, protegendo-os nos seus âmbitos64

62

BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. op. cit., p. 19. 63

Idem, ibidem, p. 19. 64

CASÉ, Anderson George de Lima. op. cit., p. 32.

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Embora a legislação supracitada já resguardassem os direitos da personalidade,

especialmente com a proteção constitucional, foi no Código Civil de 2002 que esta proteção se

consolidou, especialmente com as novas perspectivas e princípios trazidos pela codificação,

como vimos no subitem anterior.

Sobre este aspecto, manifesta-se Anderson Casé:

Portanto, a sistemática constitucional atual valoriza e privilegia a

tutela da dignidade da pessoa humana e das relações existenciais em

detrimento das relações patrimoniais. A constituição alçou o ser

humano ao patamar máximo do ordenamento jurídico brasileiro, pelo

simples fato de ser pessoa, pouco importando se detentora de

patrimônio ou não.

O código civil em respeito à importância da matéria, dedicou aos

direitos da personalidade especial atenção ao que prevê capítulo

próprio para tratá-la, nos artigos 11 a 21, não esgotando, contudo, a

matéria. Ressalte-se que, o código civil de 2002 é marcado pela

repersonalização e despatrimonialização do direito, ao contrário do

CC [Código Civil] de 1916, marcantemente patrimonialista e

individualista, elaborado numa sociedade majoritariamente agrícola,

tendo a maioria da sua população vivendo na zona rural, ocorrendo a

subversão dos seres humanos ao patrimônio65

.

Por esta breve perspectiva histórica, percebemos que a lógica dos direitos da

personalidade é a exaltação e proteção do “humano”, logo não podemos concordar que este

princípio, conquistado a “ferro e fogo”, seja utilizado para a proteção das relações

instrinsecamente patrimoniais das pessoas jurídicas, o que levaria à fragilização axiológica do

instituto e sua conseqüente restrição gradativa.

65

Idem, ibidem, p. 33.

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3.3. NOÇÕES CONCEITUAIS

A noção conceitual atualmente mais aceita sobre os direitos da personalidade é a de

que os mesmos têm por objeto a proteção das projeções físicas e psíquicas das pessoas, suas

características mais importantes, visando garantir o pleno desenvolvimento das capacidades

do ser humano e sua existência, bem como resguardar a dignidade da pessoa humana.

É com base neste conceito que foram afastadas as objeções das teorias negativistas

(defendidas por Savigny, Jellineck e outros), pela qual não seria possível existirem direitos da

personalidade, posto que o objeto e o sujeito coincidiriam. Pela nova definição, os direitos da

personalidade estariam ligados à projeções do ser, seus atributos e qualidades, não

confundindo-se com o mesmo.

Neste sentido manifesta-se Roxana Borges:

Considera-se, atualmente, que o objeto dos direitos da personalidade

são projeções físicas ou psíquicas da pessoa, ou as suas características

mais importantes. As projeções da personalidade, suas expressões,

qualidades ou atributos são bens jurídicos e se apóiam no direito

positivo. Os direitos da personalidade são uma categoria especial de

direito, diferente dos direitos obrigacionais e dos direitos reais. Por

meio dos direitos da personalidade se protegem a essência da pessoa e

suas principais características. Os objetos dos direitos da

personalidade são os bens e valores considerados essenciais para o ser

humano.

Portanto, não há confusão, nos direitos de personalidade, entre sujeito

e objeto de direito. Embora o sujeito de direito possa ser, em última

instância, a personalidade mesma, são as várias qualidades ou

expressões desta, particularizadas, que são consideradas bens

jurídicos. Não é a personalidade o objeto dos direitos da

personalidade, mas alguma qualidades, expressões ou projeções

dela.66

66

BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. op. cit., p. 20.

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Vemos na explanação trazida que a referida autora ainda traz a distinção de que os

direitos da personalidade não se enquadram dentro das obrigações ou dos direitos reais,

sendo espécie nova de direito civil.

Neste mesmo sentido é a manifestação de Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald:

Ao lado destes direitos patrimoniais, com vocação econômica,

reconhecidos para satisfazer as necessidades variadas decorrentes da

vida em sociedade ( e materializados no campo dos direitos reais e

obrigacionais), existem os chamados direitos da personalidade,

domiciliados na esfera mais íntima da pessoa em não mensuráveis

economicamente.67

Pelas exposições, os direitos da personalidade estão conceitualmente afastados da

esfera patrimonial e na mesma medida ligados ao ser humano, pois, conforme pontua Orlando

Gomes, os direitos da personalidade são direitos essenciais à pessoa humana, a fim de

resguardar sua própria dignidade68

Carlos Bittar também traz em sua definição uma ligação dos direitos da personalidade à

pessoa humana:

Consideram-se como da personalidade os direitos reconhecidos à

pessoa humana tomada em si mesma e em suas projeções na

sociedade, previstos no ordenamento jurídico exatamente para a

defesa de valores inatos no homem, como a vida, higidez física, a

intimidade, a honra, a intelectualidade e outros tantos69

.

Em texto clássico da doutrina dos direitos da personalidade, Adriano de Cupis vincula

estes direitos á realização mínima do ser, sem os quais a personalidade em si perderia seu

valor concreto. Para o autor, todos os direitos destinados a dar conteúdo à personalidade

67

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 108. 68

GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995. p. 153. 69

BITTAR, Carlos Alberto. Os Direitos da Personalidade. 7 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária,

2008. p. 1.

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serão direitos da personalidade, sendo esta nomenclatura restrita ao que é imprescindível à

personalidade, no que o jurista chama de “direitos essenciais”.70

Neste sentido, merece nossa citação a lição de Miguel Serpa Lopes:

Consideramos os direitos da personalidade como os atinentes à

utilização e disponibilidade de certos atributos inatos ao indivíduo,

como projeções biopsíquicas integrativas da pessoa humana,

constituindo-se em objetos (bens jurídicos), assegurados e

disciplinados pela ordem jurídica imperante71

.

Apesar da extensa lista de doutrinadores trazidos que sustentam o conceito de direitos

da personalidade na pessoa humana, alguns assim não o fazem, como é o caso de Flávio

Tartuce, o qual apenas altera as palavras, suprimindo o “humana” e fazendo referência apenas

a “pessoa”. Assim, para o autor os direitos da personalidade têm por objeto os modos de ser,

físicos ou morais da pessoa, de forma que protegem-se os atributos específicos da

personalidade, sendo a personalidade a qualidade do ente considerado pessoa. Mesmo assim,

parece-nos que o jurista revolve ao fundamento da humanidade, quando informa que a

“proteção envolve aspectos psíquicos do indivíduo, além de sua integridade físical, moral e

intelectual, desde a sua concepção até a sua morte”72.

Sendo assim, por mais tente-se fundamentar ou elocubrar uma de conceituar os direitos

da personalidade sem o elemento humano, fatalmente seremos traídos pela ligação umbilical

deste elemento, ficando a possível conceituação sem supedâneo axiológico suficiente para

respaldar sua previsão constitucional.

Por isso, parece-nos que a noção conceitual apresentada por Cristiano Chaves e Nelson

Rosenvald define com maestria o que discutimos:

Nessa ordem de idéias é possível asseverar serem os direitos da

personalidade aqueles direitos subjetivos reconhecidos à pessoa,

70

CUPIS, Adriano de. Os Direitos da Personalidade. 2ed. São Paulo: Quorum, 2008. p. 23-24. 71

SERPA LOPES, Miguel Maria de. Curso de direito civil. 9 ed. rev. e atual. por José Serpa Santa

Maria. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2000. v. 1. p. 241. 72

TARTUCE, Flávio. op. cit., p. 153.

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tomada em si mesma e em suas necessárias projeções sociais. Isto é,

são os direitos essenciais ao desenvolvimento da pessoa humana, em

que se convertem as projeções físicas, psíquicas e intelectuais do seu

titular, individualizando-o de modo a lhe emprestar segura e avançada

tutela jurídica.

Os direitos da personalidade, portanto, possibilitam a atuação na

defesa da própria pessoa, considerada em seus múltiplos aspectos

(físico, psíquico, intelectual...).

Compõem, em verdade, um conjunto de faculdades jurídicas

reconhecidas á pessoa humana, cujo objeto são os bens jurídicos

caracterizados pelos diferentes aspectos da pessoa tomada em si

mesma e em suas projeções e prolongamentos73

.

Vemos assim, que mesmo a conceituação dos direitos da personalidade está ligada à

essência da pessoa humana.

Antes de passarmos ao estudo das características destes direitos personalíssimos,

faremos breve digressão acerca da fonte dos direitos da personalidade, posto que é tema de

imbricada discussão.

A questão reside em saber se os direitos da personalidade são direitos naturais ou

decorrem da história (e da lei). Em verdade, a discussão é de corrente doutrinária, sendo que

os jusnaturalistas afirmarão que trata-se de direito do homem que cabe ao estado apenas

reconhecer; enquanto que os positivistas rebaterão que são direitos criados pela lei.

Renan Lotufo está entre os que entendem que a natureza dos direitos da personalidade

é de direito positivo74. Já Carlos Bittar defende que os direitos da personalidade são inatos,

cabendo ao estado reconhecê-los e sancioná-los75.

Nosso entendimento, com embasamento na doutrina de Pontes de Miranda, é de que

os direitos da personalidade decorrem, não de uma imposição sobrenatural, mas de uma

73

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 108-109. 74

LOTUFO, Renan. Código Civil comentado: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 54. 75

BITTAR, Carlos Alberto. op. cit., p. 7.

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evolução histórica que pressionou os legisladores a consagrarem estes direitos como positivos,

incluindo-os, assim, no ordenamento jurídico76.

3.4. PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS

Apesar de não haver uma unanimidade em torno das características dos direitos da

personalidade, podemos afirmar que existe um “quase” consenso em dizer que estes são

absolutos, extrapatrimoniais, inalienáveis, impenhoráveis, imprescritíveis, irrenunciáveis e

relativamente disponíveis, como veremos.

Gustavo Tepedino ainda adiciona a esta lista de características a generaidade, que para

o mesmo significa que os direitos da personalidade são concedidos a todos, pelo simpes fato

de estarem vivos, ou só pelo fato de ser. Conforme incita o mesmo autor, alguns

doutrinadores referem-se a esta característica como sendo os direitos da personalidade

“inatos”, entretanto considera tal terminologia ambígua, posto que pode sugerir a

anterioridade dos direitos à lei numa perspectiva jusnaturalista, que é rechaçada pelo referido

jurista, assim como fizemos alhures77.

Já Sílvio de Salvo Venosa, aponta que os direitos da personalidade seriam direitos

privados fundamentais, merecedores de respeito por representarem conteúdo mínimo que

permite a convivência harmoniosa da sociedade. Aponta ainda o autor as seguintes

características: inatos ou originários, porque se adquirem ao nascer (com a venia de nossa

discordância, conforme supra); vitalícios ou perpétuos, porque perduram por toda a existência

do ser humano; imprescritíveis, porque sempre se pode opor resistência às violações, não se

convalidando estas; inalienáveis ou relativamente disponíveis, posto que a princípio estão fora

76

PONTES DE MIRANDA. Tratado de direito privado. atual. por Vilson Rodrigues Alves. Campinas:

Bookseller, 1999. v. 1. p. 7. 77

TEPEDINO, Gustavo. Temas de direito civil. 3 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p.33.

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do comércio e não detêm valor econômico; absolutos, tendo em vista serem oponíveis erga

omnes.78

Os direitos da personalidade são absolutos, porque são oponíveis erga omnes (contra

todos), ou seja, toda a sociedade tem o dever de respeitar os direitos personalíssimos de um

determinado indivíduo, podendo este opor-se a qualquer violação contra o seu direito.

A extrapatrimonialidade refere-se à impossibilidade de aferição econômica estrita

destes direitos, ou como bem pontua Renan Lotufo, “porque não se reduzem a

dimensionamentode interesses, nem a avaliações econômicas” 79.

A imprescritibilidade dos direitos da personalidade deriva de estarem instrinsecamente

ligados ao mínimo existencial da pessoa humana, bem como, pela sua origem, por estarem

conexos à ordem pública, sendo neste sentido o entendimento de Maria Helena Diniz80.

Apesar da crítica de Fávio Tartuce ao termo imprescritíveis, assim materemos, por razões

didáticas, como ressalta o referido autor:

Melhor seria considerar que tais direitos não estão sujeitos à

prescrição do que usar a expressão imprescritíveis. Isso porque,

conforme veremos, não é o direito que prescreve, mas a pretensão (art.

189 do CC [Código Civil]). De qualquer forma continuaremos a usar

tal expressão, corriqueira que é na doutrina e jurisprudência. Em

suma, a utilização atende a fins didáticos.81

Uma das mais controvertidas características é a da disponibilidade relativa dos direitos

da personalidade. Alguns autores afirmam que os direitos da personalidade são

indisponíveis82. Contudo, a maior parte dos doutrinadores entendem que eles são, em

verdade, relativamente disponíveis, podendo o titular deles dispor de forma limitada e

78

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Parte Geral. São Paulo: Atlas, 2009. p. 170-171. 79

LOTUFO, Renan. Curso Avançado de Direito Civil. Coordenação: Everaldo Augusto Cambler. Vol. 1:

Parte Geral. 2ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 78. 80

DINIZ, Maria Helena.op. cit., p. 252. 81

TARTUCE. Flávio. op. cit., p. 167. 82

Neste sentido LOTUFO, Renan. op. cit. e TEPEDINO, Gustavo. op. cit.

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temporalmente restrita, desde que tal disposição não comprometa a própria dignidade do

titular, conforme pontuam Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald:

Vale notar que em casos específicos (não todos!), limitados pela

afirmação da própria dignidade humana e pela impossibilidade de

disposição em caráter total ou permanente, é permitido ao titular ceder

o exercício (e não a titularidade) de alguns direitos da personalidade.83

Nesta discussão, é importante lembrar a lição de Roxana Borges, no sentido de que os

direitos da personalidade não são disponíveis em sentido estrito, mas são transmissíveis as

expressões do uso destes direitos, ou seja existem aspectos patrimoniais dos direitos da

personalidade que podem, de forma temporária e de acordo com a dignidade da pessoa

humana, ser transmitidos.84

Pela sua disponibilidade relativa, não podem os titulares renunciarem ou alienarem os

direitos da personalidade, bem como são os mesmos impenhoráveis.

Quanto à impenhorabilidade, é importante lembrar que além de os direitos da

personalidade serem penhoráveis em si, estes constroem ao seu derredor uma barreira maior,

consistente na realização do mínimo existencial, que é hoje o fundamento das

impenhorabilidades constantes em toda a legislação brasileira.

Há também autores que sinalizam para a vitaliciedade dos direitos da personalidade, o

que para nós configura redundância com a imprescritibilidade, apesar de muitos

argumentarem pela impossibilidade de se aceitar que os direitos existiriam apenas enquanto

vivo o titular, posto que seus parentes poderão proteger estes direitos. Neste sentido,

Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald argumentam que esta proteção é dada aos vivos:

Não se esqueça, de qualquer forma, que se reconhece, como direito da

personalidade da pessoa viva, a proteção dos direitos da personalidade

de alguém que já morreu, como assinala o Parágrafo Único do art. 12

do Estatuto Substantivo. São os chamados lesados indiretos, 1que

estão legitimados para reclamar proteção aos direitos da personalidade

83

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALDO, Nelson. op. cit., p. 112. 84

BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. op. cit., p.

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do cônjuge faecido, bem como de seus parentes (mortos) em inha reta

ou colateral até o quarto grau.85

Além destas características, é importante pontuar, também, como ressalta Maria Heleza

Diniz, que os direitos da personalidade são ilimitados, posto é impossível entender um número

fechado de direitos da personalidade, sendo os mesmos uma categoria elástica, que deve ser

vislumbrada ampla e irrestritamente para a proteção do homem. Sendo assim, as previsões

legislativas de espécies de direitos personalíssimo, servem apenas à proteção mais eficaz de

direitos mais consagrados, que contudo não têm hierarquia com os demais86

Por fim, Gustavo Tepedino ainda acrescenta a essencialidade e a preeminência dos

direitos da personalidade, colocando-os em patamar superior e prioritário em relação aos

demais direitos subjetivos, dada a peculiar função e valor do seu objeto maior (dignidade da

pessoa humana).87

Vemos, desta forma e mais uma vez, que as características dos direitos personalíssimos

estão ligados ao desenvolvimento da personalidade enquanto valor contido no ordenamento

jurídico, em consonância com o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana.

Nesse espeque, é impossível conceber que direitos ínsitos a realizar plenamente os

seres humanos, provendo-lhe o mínimo existencial e a plenitude de sua personalidade possam

ser estendidos às pessoas jurídicas, entes ligados à patrimonialidade e persecução de renda,

seja por extensão ou mesmo analogia.

85

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 114. 86

DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 121. 87

TEPEDINO, Gustavo. op. cit., p. 35.

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3.5. PRINCIPAIS CLASSIFICAÇÕES E SUAS ESPECIFICIDADES

Como vimos anteriormente, uma das características dos direitos da personalidade é a

sua ilimitação, desta forma, impossível fazer-se uma classificação exata da quantidade e

espécies destes direitos, posto que outros surgirão, com novas especificidades, de acordo com

as necessidades de proteção da personalidade.

Ainda assim, existem alguns principais tipos de direitos personalíssimos já catalogados

ou mesmo positivados, quais sejam: direito à vida, integridade física, integridade psíquica,

honra, imagem e nome.

Novamente ressaltamos que qualquer lista de direitos da personalidade jamais será

exaustiva e mesmo a disposição legal não é numerus clausus, posto que, conforme já

ressaltamos, a dignidade da pessoa humana é princípio vivo e que demanda para a sua

proteção e efetividade a adaptação jurídica à realidade social.

Assim, as listas de direitos da personalidade contida no Código Civil e na Constituição

Federal não são exaustivas, pois conforme ressalta o próprio artigo 5º, § 2º:

§ 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não

excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela

adotados, ou dos tratados internacionais em que a República

Federativa do Brasil seja parte.

É importante ressaltar a discussão existente entre os monistas e pluralistas quanto à

proteção dos direitos da personalidade, questionando, de um lado, se existe um direito geral

da pessoa humana (com várias facetas) ou, pela outra corrente, se existe uma lista de direitos

autônomos entre si.

Para os pluralistas, existem diversos direitos da personalidade que servem à tutela da

dignidade da pessoa humana.

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Carlos Alberto Bittar, que filia-se ao pluralismo, descreve que, apesar de não exaustivo,

existe um rol direitos da personalidade, não um direito, posto que os bens jurídicos protegidos

por cada espécie seria diferente e desta forma teria peculiaridades singulares88.

Um dos defensores da teoria pluralista é San Tiago Dantas, que faz uma analogia entre

os direitos da personalidade e os direitos reais. Segundo o autor, o direito real sobre o

patrimônio é unitário (propriedade), contudo o mesmo se manifesta em diversas espécies

jurídicas. Da mesma forma, existiria uma cláusula geral de tutela da personalidade, a qual teria

várias facetas de proteção, identificadas nas espécies conhecidas, mas existindo entre estas

uma teia unificadora, determinando o tratamento unitário entre as mesmas89.

Neste mesmo sentido manifesta-se Pietro Perlingieri, pelo monismo:

A tutela da pessoa não pode ser fracionada em isoladas fattispecie

concretas, em autônomas hipóteses não comunicáveis entre si, mas

deve ser apresentada como problema unitário, dado o seu fundamento

representado pela unidade do valor da pessoa. Este não pode ser

dividido em tantos interesses, em tantos bens, em isoladas ocasiões,

como nas teorias atomísticas [pluralistas].90

Também apoiando a idéia da cláusula geral temos Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald,

para os quais esta concepção assegura proteção plena e eficaz à pessoa humana, pois permite

que novos e eventuais valores incorporados à personalidade não estejam carentes de tutela

jurídica. Ressaltam ainda que face as constantes mudanças do mundo moderno, que ocorrem

em ritmo aceleradíssimo, a cláusula geral de proteção permite salvaguardar a dignidade em

situações jurídicas inéditas que poderão ocorrer.91

Resolvendo a discussão de forma, Roxana Borges afirma não haver efeitos práticos entre

a adoção de uma ou outra corrente, posto que ambas fundamentam-se na dignidade da

88

BITTAR, Carlos Alberto. op. cit., 61. 89

SANTIAGO DANTAS, Francisco Clementino, apud BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. op. cit., p.

27. 90

PERLINGIERI, Pietro. op. cit., p. 154. 91

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 115.

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pessoa humana e nenhuma restringe a proteção aos direitos personalíssimos, acrescenta ainda

que:

No ordenamento jurídica brasileiro, as idéias de “séria aberta de

direitos”e direito geral de personalidade” não se excluem e ambas têm

a mesma relevância prática: a de ampliar a proteção da pessoa, nos

mais diversos aspectos de sua dignidade, mesmo que nem todas as

situações de risco à sua dignidade estajam previstas expressamente no

ordenamento legislado, ou seja, independentemente de tipicidade.92

Neste sentido, adotamos o posicionamento ora citado, posto que independentemente

da forma de expressão destes direitos da personalidade, o importante é que a proteção aos

mesmos seja irrestrita e para além dos limites legais.

Retornando às listas de direitos da personalidade, Renan Lotufo, leciona que estes

dividem-se em direitos à integridade física e à integridade moral. Seriam, assim, os direitos à

integridade física o direito sobre o próprio corpo, à vida e ao cadáver. Já os da integridade

moral seriam a honra, liberdade, privacidade, intimidade, imagem e nome93.

Gustavo Tepedino também divide os direitos da personalidade em integridade física e

moral:

De toda sorte, costuma-se distingui-los em dois grupos: os direitos à

integridade física e os direitos à integridade moral. No primeiro grupo

situam-se o direito à vida, o direito ao próprio corpo e o direito ao

cadáver. No segundo, encontram-se o direito à honra, o direito à

liberdade, o direito ao recato, o direito à imagem, o direito ao nome e

o direito moral do autor.94

Divisão parecida fazem Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona, quando enumeram três

aspectos dos direitos personalíssimos: físico, psíquico e moral. No aspecto físico estaria o

92

BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. op. cit., p. 29. 93

LOTUFO, Renan. op. cit., 50. 94

TEPEDINO, Gustavo. op. cit., 35.

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direito à vida e ao corpo. Na seara psíquica compreende-se a liberdade, privacidade, saúde e

segredo. No aspecto moral ter-se-ia os valores da honra, imagem e nome.95

Com a mesma espécie de divisão, Limongi França segrega os direitos da personalidade

em: direito à integridade física, direito à integridade intelectual e direito à integridade moral.

Reconhece, muito embora, o autor que tais categorias não são compartimentalizadas e um

mesmo direito pode ao mesmo tempo manifestar-se na esfera física e na moral, como o

direito à imagem. Desta forma, o referido jurista enumera os direitos a partir das categorias

elencadas, ressaltando a forma não definitiva. O direito à integridade física, abrangeria: o

direito à vida e alimentos; o direito sobre o próprio corpo, vivo; o direito sobre o próprio

corpo, morto; o direito sobre o corpo alheio, vivo; direito sobre o corpo alheio, morto; o

direito sobre partes separadas do corpo, vivo; o direito sobre partes separadas do corpo,

morta. Já os direitos à integridade intelectual abarcariam as seguintes espécies: o direito à

liberdade de pensamento; o direito pessoa de autor científico; o direito pessoa de autor

artístico; o direito pessoal de inventor. Por fim, a integridade moral seria dividida da seguinte

forma: o direito à liberdade civil, política e religiosa; o direito à honra; o direito à

honorificência; o direito ao recato; o direito ao segredo pessoal, doméstico e profissional; o

direito à imagem e o direito à identidade pessoa, familiar e social96.

Parece-nos que esta lista trazida pelo supracitado autor é das mais completas,

abarcando as diversas facetas dos direitos da personalidade, inclusive os direitos de autor.

Conforme informa-nos Anderson Casé:

O Código Civil traz de forma exemplificada os direitos da

personalidade nos artigos 11 e 12, expondo as suas características. Já

os artigos 13 a 15 tratam da integridade psicofísica e nos artigos 16 a

19, do nome e sobrenome. Por fim, o artigo 20 traz o direito à imagem

e o artigo 21 à privacidade. Válido se faz ressaltar, que o legislador

ordinário não desejou regulamentar toda a matéria neste capítulo,

95

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA, Rodolfo. op, cit., p. 150. 96

LIMONGI FRANÇA, Rubens. Manual de direito civil. 4 ed. São Paulo: revista dos Tribunais, 1980.

v. 1. p.412.

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tendo em vista as infindáveis situações jurídicas em que se pode

deparar o ser humano.97

Como bem informam Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald:

Nessa linha de idéias, a despeito da proteção específica dispensada ao

nome (arts. 16 a 19, CC [Código Civil]), à imagem (art. 20, CC

[Código Civil]), à privacidade (art. 21, CC [Código Civil]), dentre

outros direitos, há uma cláusula geral de proteção da personalidade,

com o propósito de ampliar significativamente a tutela, impedindo o

exaurimento das espécies de direitos da personalidade, que não podem

ser esgotados, nem limitados.98

Desta forma, cremos que inobstante as variações nas listas de cada autor e mesmo face

à ilimitação das espécies de direitos personalíssimos, o que interessa-nos é analisar as espécies

que normalmente são utilizadas de forma “elástica” para as pessoas jurídicas e se esta

extensão se mostra cabível na lógica jurídica.

Sendo assim, passaremos a tratar mais minuciosamente das espécies que a doutrina e

jurisprudência comumente associam aos entes fictícios, quais sejam: honra, imagem,

privacidade e nome.

3.5.1. Imagem

Em nossa sociedade midiática e permanentemente vigiada, o direito à imagem constitui-

se em direito da personalidade de grande relevância, assumindo, papel importantíssimo na

97

CASÉ, Anderson George de Lima. op. cit., p. 49. 98

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 115.

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identificação e mesmo valorização do ser humano. Tal aspecto é ainda mais evidente, face a

profusão de equipamentos eletrônicos de captação de imagem.99

O direito à imagem, então, pela sua relevância e amplitude na sociedade moderna

assume dois aspectos. O primeiro aspecto é o chamado imagem retrato, consistente nos

aspectos físicos da pessoa. O segundo é a imagem atributo, referente à forma como o

indivíduo é percebido na sociedade.

Assim explicam Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald:

Essa elasticidade conceitual, decorrente da proteção constitucional da

imagem (CF [Constituição federal], art. 5º, incisos V e X), faz

compreender, no conceito de imagem, diferentes aspectos: a imagem-

retrato (referindo-se às características fisionômicas do titular, à

representação de uma pessoa pelo seu aspecto visual, enfim, é ao seu

pôster, à sua fotografia, encarada tanto no aspecto estático – uma

pintura quanto dinâmico – um filme – art. 5º, X, CF [Constituição

Federal]; a imagem-atributo (que é o consectário natural da vida em

sociedade, consistindo no conjunto de características peculiares da

apresentação e identificação social de uma pessoa, referindo aos seus

qualificativos sociais, aos seus comportamentos reiterados. Não se

confunde com a imagem exterior, cuidando, na verdade, de seu retrato

moral) e a imagem-voz (caracterizada pelo timbre sonoro, que

também serve para a identificação de uma pessoa, até mesmo porque

não poderia imaginar que a personalidade não se evidencia menos na

voz que nas características fisionômicas).100

Vale ressaltar a nossa discordância com os doutrinadores citados quanto à identificação

de uma imagem-voz, posto que esta estaria abarcada pela imagem-retrato, no aspecto

exclusivo do timbre sonoro, e pela imagem-atributo, na faceta de forma de falar, impostação,

vocabulário e formas de expressão, não constituindo, a priori, categoria autônoma

(inobstante, alguns autores classificam um direito à voz, separado da imagem101).

99

Atualmente, qualquer fato mais proeminente está sempre sendo filmado por algum celular ou câmera

digital e, em poucos instantes, está disponível para todas as pessoas do globo através da rede mundial de

computadores. 100

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 140-141. 101

Neste sentido, GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA, Rodolfo. op. cit., p. 172.

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Nesta diferenciação é importante frisar a objeção de Luiz Alberto David Araújo, para

quem tal segregação parece desnecessária, pois o direito é o mesmo, sendo apenas

desdobrado em dois aspectos da imagem na sociedade. Desta forma, apesar da duplicidade de

formas, o direito protegido seria o mesmo: a imagem.102

Roxana Borges informa que o direito à imagem, em sua concepção negativa, não

permite a terceiros a utilização não autorizada, vedando-se mesmo, além da divulgação e da

reprodução, o registro. Conforma a autora, apenas admite-se o uso não consentido em casos

de interesse social, administração da justiça e manutenção da ordem pública, tais como a

imagem de políticos, fotos de fugitivos, imagens de locais públicos sem destaque para

determinada pessoa, dentre outros.

Conforme registra Anderson Casé, a violação do direito à imagem, além de ensejar

pleito de danos morais e materiais, permite ao ofendido requerer a cessação da exposição de

sua imagem, bem como a destruição dos suportes de registro da imagem, na forma do artigo

20 do Código Civil.103

Desta forma, para a utilização da imagem de determinada pessoa é imprescindível seu

consentimento, podendo-se este ser mesmo não-escrito ou tácito, como no caso de pessoa

que se deixa entrevistar por repórter (por óbvio que o entrevistado reconhece que o

depoimento será exibido pelo meio de comunicação e anue com tal condição).

Entretanto, como bem assinala Roxana Borges, este consentimento há de ser bastante

específico e, no caso de escrito, certamente deverá ser detalhado, limitado e especificar os

objetivos e condições de utilização da imagem cedida. Alerta ainda a jurista que a revogação

do consentimento jamais poderá ser objeto de execução forçada, ensejando apenas perdas e

danos, respeitando-se a boa-fé e coibindo-se o abuso de direito.104

102

ARAUJO, Luiz Alberto David. A Proteção Constitucional da Própria Imagem: pessoa física,

pessoa jurídica e produto. Belo Horizonte: Del Rey, 1996. p. 30. 103

CASÉ, Anderson George de Lima. op. cit., p. 51. 104

BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro, op. cit., p. 159-160.

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Neste sentido decidiu o Superior Tribunal de Justiça Brasileiro ao analisar caso em que a

imagem de uma pessoa foi utilizada em publicação diversa da que se tinha autorizado,

reconhecendo a violação ao direito e impondo a indenização:

Recurso Especial. Direito Processual Civil e Direito Civil. Publicação

não autorizada de foto integrante de ensaio fotográfico contratado com

revista especializada. Dano moral. Configuração.

- É possível a concretização do dano moral independentemente da

conotação média de moral, posto que a honra subjetiva tem

termômetro próprio inerente a cada indivíduo. É o decoro, é o

sentimento de auto-estima, de avaliação própria que possuem

valoração individual, não se podendo negar esta dor de acordo com

sentimentos alheios.

- Tem o condão de violar o decoro, a exibição de imagem nua em

publicação diversa daquela com quem se contratou, acarretando

alcance também diverso, quando a vontade da pessoa que teve sua

imagem exposta era a de exibí-la em ensaio fotográfico publicado em

revista especializada, destinada a público seleto.

- A publicação desautorizada de imagem exclusivamente destinada a

certa revista, em veículo diverso do pretendido, atinge a

honorabilidade da pessoa exposta, na medida em que experimenta o

vexame de descumprir contrato em que se obrigou à exclusividade das

fotos.

- A publicação de imagem sem a exclusividade necessária ou em

produto jornalístico que não é próprio para o contexto, acarreta a

depreciação da imagem e, em razão de tal depreciação, a proprietária

da imagem experimenta dor e sofrimento.105

Vê-se, assim, que a tutela do direito da imagem visa resguardar mais a própria

compreensão que o titular tem de si e a forma como este a quer exteriorizá-la, do que a

percepção que os outros têm da imagem do indivíduo, ou seja, busca-se mais proteger o

âmago da consciência da pessoa do que aquilo que a sociedade percebe dele, numa tutela

totalmente condizente com a dignidade da pessoa humana.

105

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 270730/RJ. Relator: Carlos Alberto

Menezes Direito, Brasília, D.J. 07/05/2001, disponível em

<https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200000783994&dt_publicacao=07/05/2001>,

acesso em 27/07/2011.

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Para Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald, a pessoa jurídica também titularizaria o

direito à imagem, apenas na modalidade imagem-atributo, através do conjunto de

caracteríticas que a particularizam socialmente.106

Devemos discordar frontalmente do pensamento dos citados autores, posto que,

conforme ponderamos supra e parece demonstrado nos conceitos e situações trazidas, o

direito à imagem, mesmo na categoria imagem-atributo, visa tutelar mais a concepção que o

indivíduo tem de si mesmo, concepção esta que o mesmo pretende ver reconhecida pelos

demais componentes da sociedade, sendo certo de que o contrário seria violação ao seu

direito.

Nestes termos, não podemos crer que o ente fictício tenha, em seu âmago, consciência

da imagem que tem e quer projetar no seio social, crença pela qual afastamos integralmente a

tese anteriormente referida.

3.5.2. Honra

A honra é direito da personalidade bastante vulnerável na sociedade midiática em que

vivemos, posto que a qualquer momento pode-se publicar uma manchete ou “postar-se” em

um blog, acusações ou imputações de fatos a outrem, ofendendo-lhe a honra.

Em síntese acurada, Adriano de Cupis conceitua a honra como:

A honra significa tanto o valor moral íntimo do homem, como a

estima dos outros ou a consideração social, o bom nome ou a boa

fama, como, enfim, o sentimento, ou consciência, da própria

dignidade pessoal.107

106

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 142. 107

CUPIS, Adriano de. Os Direitos da Personalidade. 2ed. São Paulo: Quorum, 2008. p.

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Pelo citado autor, a honra perfaz-se tanto do valor social ou renome de que seu titular

desfruta na sociedade, quanto daquilo que ele mesmo pensa sobre si.

Desta forma, como acrescentam Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald, a honra constitui

a boa fama social da pessoa, devendo ser protegida contra falsas imputações e ataques que

possam maculá-la. Além disso, a honra também é a auto-estima, o juízo valorativo que cada

um faz de si próprio.108

Vê-se que a honra toca a cada indivíduo independente de sua conduta moral, frente aos

valores da sociedade, apesar deste fato ser ponderado quando da proteção de seu direito,

como bem ensina Paulo Luiz Netto Lôbo:

Também denominado direito à integridade moral ou à reputação, o

direito à honra tutela o respeito, a consideração, a boa fama e a estima

que a pessoa desfruta nas relações sociais. Toda pessoa, por mais que

se conduza de modo não ético, desfruta desse direito, em grau maior

ou menor, a depender de seu comportamento moral e da comunidade

em que vive ou atua. A honra, que se constrói no ambiente social, é o

mais frágil dos direitos da personalidade, porque pode ser destruída

em virtude de informação maliciosa ou dolosa. A honra há de ser

aferida pelo juiz considerando os valores do lesado em harmonia com

os valores cultuados na comunidade em que vive ou atua

profissionalmente. Costuma-se confundir o direito à honra com o

direito a imagem, mas este diz respeito apenas à retratação externa da

pessoa. A reputação relaciona-se à honra e não à imagem.109

Vê-se que no pensamento do citado jurista estão inscritas as noções de subjetividade da

honra, enquanto auto-valor de seu titular, bem como da reputação que este desfruta;

entretanto, como bem ressaltado, o valor subjetivo merece guarida ainda que a conduta do

indivíduo na sociedade seja reprovável. É o caso de crimonosos, mesmo os piores tipos, que

merecem a defesa de sua honra, por mais cruel que tenha sido o seu crime, não podendo ser

expostos e ridicularizados.

108

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 148-149. 109

LÔBO, Paulo Luiz Netto. Danos morais e direitos da personalidade. Disponível em:

<http://jus.uol.com.br/revista/texto/4445/danos-morais-e-direitos-da-personalidade>, acesso em

27/07/2011.

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Muitos autores, em virtude desta dupla faceta do direito à honra, entendem subdividi-lo

em honra subjetiva e honra objetiva, conforme lecionam Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona:

Poderá manifestar-se de duas formas:

a) objetiva: corresponde à reputação da pessoa, compreendendo o

seu bom nome e a fama de que desfruta no seio da sociade;

b) subjetiva: corresponde ao sentimento pessoal de estima ou à

consciência da própria dignidade.110

Parece-nos, em verdade, que ambas nuances do direito à honra estão interligadas de

uma forma que não podem ser distinguidas como direitos autônomos, mas sim extensão de

uma mesa tutela.

Isto porque, se determinada conduta afeta aquilo que o indivíduo entende como sua

auto-estima, muito provavelmente afetará sua reputação e se alguma ofensa agride a sua

reputação, certamente repercutirá em sua auto-valoração. Desta forma, entendemos que, em

verdade, a forma com que se ofende a honra é que pode ser dividida em objetiva e subjetiva,

apenas e exclusivamente para caráter de valoração do dano, sendo certo que a ofensa sempre

atingirá ambos aspectos (objetivo e subjetivo).

Neste sentido Paulo Luiz Netto Lôbo, também tem entendido que a honra objetiva é

uma extensão do direito à honra exclusiva para abarcar as pessoas jurídicas:

A honra pode ser entendida como subjetiva, quando toca à pessoa

física, porque somente ela pode sofrer constrangimentos, humilhações,

vexames. Tem-se admitido a honra objetiva, no caso das pessoas

jurídicas, que também dependem de consideração, apreço e estimas

sociais.111

Também Renan Lotufo ressaltar que a tentativa de caracterizar a existência de uma

“honra objetiva” é uma analogia simplista que deve ser rechaçada, face complexidade e

caráter fundamental dos direitos humanos (dentre os quais está a honra). Para o citado autor,

110

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA, Rodolfo. op. cit., p. 182. Concordam com este

posicionamento FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 150; BITTAR, Carlos

Alberto. op. cit., p. 133. 111

LÔBO, Paulo Luiz Netto. op. cit.

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a reputação de uma pessoa jurídica constitui bem de seu patrimônio imaterial, logo ligado à

propriedade, a qual tem fundamento diametralmente oposto aos direitos da personalidade. 112

Ainda leciona que:

Não é qualquer empresa privada que consegue ter direito à fama, à

respeitabilidade e ao crédito quando nasce. São coisas diversas, são

coisas distintas. A fama, a boa fama, a honra objetiva da empresa é

algo que a empresa conquista no desenvolvimento de suas atividades.

É algo que ela faz integrar no seu patrimônio, é um bem imaterial que

ela desenvolve e faz com que seja meritória de proteção. Isso não

significa que tenha a mesma denominação, o mesmo conteúdo, a

chamada “dignidade humana”.113

Como bem informa-nos Anderson Casé, nossa opinião não é a majoritária na doutrina e

jurisprudência, contudo merece nota relembrar que não se aplica às pessoas jurídicas a honra

subjetiva, conclusão lógica em face da inexistência, por estes entes de uma consciência

própria. 114

Segundo os que defendem a aplicação da honra aos entes fictícios, estes sofreriam

abalos à sua reputação perante fornecedores, consumidores e toda a sociedade dos ataques

ao seu renome, prejudicando o seu crédito e receita.

Novamente discordamos desta orientação, aderindo ao explanado na citação de Renan

Lotufo, conquanto a reputação da pessoa jurídica integra o seu patrimônio, sendo certo que

merece proteção, contudo as ofensas mencionadas não atingem sua honra e sim seu

patrimônio, devendo ser assim entendidas.

112

LOTUFO, Renan. Dano Moral da pessoa jurídica. Revista Brasileira de Direito Comparado. n. 25.

Rio de Janeiro: Instituto de Direito Comparado Luso-Brasileiro, 2003. p. 298-301. 113

Idem, ibidem, p.299. (com grifos no original) 114

CASÉ, Anderson George de Lima. op. cit., p. 55.

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3.5.3. Privacidade

Este direito está literalmente insculpido no texto constitucional, inciso X do artigo 5º,

bem como no artigo 21 do Código Civil, sendo entendido como o direito ao segredo e o direito

de estar só.

Como bem ressalta Roxana Borges, este direito também compreende duas ascepções, a

primeira ligada à intimidade, à necessidade de proteger-se a esfera privada da pessoa contra a

publicidade, concedendo o direito do indivíduo de recato.115

Como bem explicam Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona:

O elemento fundamental do direito à intimidade, manifestação

primordial do direito à vida privada, é a exigibilidade de respeito ao

isolamento de cada ser humano, que não pretende que certos aspectos

de sua vida cheguem ao conhecimento de terceiros. Em outras

palavras é o direito de estar só.116

Já no tocante ao direito de segredo, temos a definição de Paulo José da Costa Júnior

para quem este direito é o “círculo concêntrico de menor raio em que se desdobra a

intimidade: é o que reclama proteção mais veemente contra a indiscrição”.117

Temos assim, então, que o indivíduo tem proteção para exercer suas atividades

afastadas do conhecimento público e, além disso, de manter em sigilo seus dados, gostos,

comunicações, sentimentos e mesmo atos da vida comum.

É importante observar que o direito à privacidade é protegido independetemente de

ofensa à honra ou imagem, sendo assim se alguma conduta invade esta esfera de proteção

115

BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. op. cit., p. 167. 116

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA, Rodolfo. op. cit., p. 180. 117

COSTA JÚNIOR, Paulo José da. O Direito de Estar Só: tutela penal da intimidade. São Paulo: RT,

1970. p. 73.

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legal, é cabida indenização ainda que não se macule aqueles outros direitos, ou seja ainda que

não haja exposição.

Também ressalta-nos Maria Helena Diniz que mesmo as pessoas notórias têm direito à

privacidade, devendo ser respeitados os aspectos íntimos de sua vida.118

Além de todos os aspectos já mencionados, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona nos trazem

ainda o direito ao sigilo profissional, sendo que este direito não visa resguardar a atividade de

algum profissional, mas sim o direito da pessoa que teve de revelar algum segredo seu a

terceiro, por circunstância da atividade profissional deste, como no caso de médicos, padres e

advogados. Vemos que neste caso, está sendo resguardado o direito do indivíduo a manter sua

privacidade, mesmo frente à necessidade pontual de precisar expô-la a um profissional. Este

profissional passa a ter o dever de manter o segredo, sendo a violação crime conforme artigos

153 e 154 do Código Penal.119

Segundo pontua Anderson Casé, a doutrina e jurisprudência brasileiras têm entendido

existir uma espécie de direito à privacidade e intimidade das pessoas jurídicas que estaria

ligada ao segredo industrial, dando ensejo à percepção de danos morais quando de sua

violação.120

Neste sentido manifesta-se Carlos Bittar:

Desse direito desfruta também a pessoa jurídica, que, a par do

segredo, faz jus à preservação da sua vida interna, vedando-se, pois, a

divulgação de informações de âmbito restrito. Há, inclusive, normas

legais que proíbem a difusão de dados de cunho confidencial na

empresa (assim, no âmbito societário; no plano da publicidade; das

comunicações). Mas, de outro lado,por exigências do mercado, ficam

certas empresas obrigadas a divulgar informações (as companhias

abertas), integrando-se, aliás, em mecanismos regulamentadores

próprios de fluxo de dados, sob controle estatal.121

118

DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 129. 119

GAGLIANO, Pablo Stolze;PAMPLONA, Rodolfo. op. cit., 182. 120

CASÉ, Anderson George de Lima. op. cit., p. 58. 121

BITTAR, Carlos Alberto. op. cit., p. 114.

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Data venia, não podemos concordar com o pensamento esposado pelo supra

mencionado autor.

Parece-nos, em verdade, que as pessoas jurídicas são regidas pela publicidade, posto

que seus atos constitutivos são registrados e podem ser acessados por qualquer cidadão

(artigo 45 do Código Civil) e, mais atualmente, as entidades mais respeitadas são aquelas que

aderem ao Novo Mercado122 e mantêm divulgação constante da destinação de suas receitas e

bem como dos projetos em que investem.

Aliás, como bem ressalta o citado autor, as companhias abertas têm a obrigação de

divulgar os seus demonstrativos contábeis, conforme artigo 176 da Lei 6.404/76:

Art. 176. Ao fim de cada exercício social, a diretoria fará elaborar,

com base na escrituração mercantil da companhia, as seguintes

demonstrações financeiras, que deverão exprimir com clareza a

situação do patrimônio da companhia e as mutações ocorridas no

exercício:

I - balanço patrimonial;

II - demonstração dos lucros ou prejuízos acumulados;

III - demonstração do resultado do exercício; e

IV - demonstração das origens e aplicações de recursos.

IV – demonstração dos fluxos de caixa; e

V – se companhia aberta, demonstração do valor adicionado.

§ 1º As demonstrações de cada exercício serão publicadas com a

indicação dos valores correspondentes das demonstrações do exercício

anterior.123

Vemos assim, que tal determinação legal contrasta diretamente com o direito à

privacidade que tem a pessoa humana, especialmente porque esta tem direito ao seu sigilo

fiscal e bancário, que deve ser protegido de forma ampla e irrestrita.

122

Segundo Ivan Procoli Calvo, o Novo Mercado é um segmento de listagem de empresas que adotam

práticas mais claras de governança corporativa e de relacionamento com os seus acionistas. Assim, para

ingressar neste seleto grupo, uma companhia deve adotar regras mais rígidas que as legais quanto à

divulgação de informações contábeis e administrativas, gerando um “disclosure”, bem como ampliar os

direitos dos acionistas. CALVO, Ivan Procoli. O “Novo Mercado”, a Governança Corporativa e a

Arquitetura Financeira: aspectos comparativos e sua influência sobre o controle organizacional.

Disponível em <http://www.economiabr.net/colunas/calvo/novomercado.html>, acesso em 27/07/2011. 123

BRASIL. Lei nº 6.404, de 15/12/1976. Dispõe sobre as Sociedades por Ações Disponível em

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6404consol.htm>, acesso em 25/07/2011.

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Sendo assim, a mera existência de um direito ao segredo industrial, que conforme

veremos é direito patrimonial das pessoas jurídicas para o resguardo seu sucesso econômico,

não pode de qualquer modo ser confundido com o direito personalíssimo da privacidade, com

o qual não guarda qualquer semelhança.

3.5.4. Nome

O nome é um dos direitos da personalidade que também tem sido estendido aos entes

morais, para efetivar uma suposta proteção aos direitos daquelas personalidades, contudo

antes de perquirir esta questão específica, veremos o conceito de nome como direito da

personalidade.

O nome é a identificação da pessoa perante a sociedade, assim como sua imagem é a

sua conformidade exterior que lhe identifica, o nome é a designação civil que individualiza

cada ser.

Alguns autores referem-se a este direito como identidade.

Conforme ensinam Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald:

É certa e incontroversa a importância de cada pessoa ser identificada

socialmente, individualizando-se em relação às demais. Aliás data de

priscas eras a importância conferida ao nome, percebendo-se até

mesmo na Bíblia Sagrada que, entre os hebreus, emprestava-se nome

individual aos recém-nascidos logo aos oito dias de vida, momento em

que se dava a circuncisão, somente vindo a ser admitida a homonímia

tempo depois, fruto do crescimento populacional.124

124

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., p. 170.

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Vemos assim, que o nome é elemento que distingue o ser humano e o dá

individualidade perante seus semelhantes, sendo, desta forma, indubitável componente da

personalidade.

O nome da pessoa física é composto de prenome e sobrenome (este relativo à sua

família, conotando assim a sucessão familiar). Além disso, o nome da pessoa natural é regido

pela imutabilidade relativa, só podendo ser alterado em casos excepcionais previstos na lei:

Art. 57. A alteração posterior de nome, somente por exceção e

motivadamente, após audiência do Ministério Público, será permitida

por sentença do juiz a que estiver sujeito o registro, arquivando-se o

mandado e publicando-se a alteração pela imprensa, ressalvada a

hipótese do art. 110 desta Lei.125

Por outro lado, o nome da pessoa jurídica pode ser alterado a qualquer momento e por

qualquer motivo, desde que haja consenso (ou maioria, dependendo dos casos) entre aqueles

que a compõem.

Segundo Carlos Alberto Bittar, o nome comercial (ou empresarial) também merece

proteção enquanto direito de personalidade, posto que serve à identificação do negócio e

individualização da empresa.

O nome comercial, em verdade, pode constituir-se de duas maneiras, uma delas é a

firma social, em que se utiliza elementos dos nomes dos sócios acrescidos ou não de menção

ao ramo da atividade a ser desenvolvida; a outra forma é a denominação é composta de um

“elemento fantasia” (expressão lingüística qualquer, não coincidente com o nome civil dos

sócios) acompanhado, obrigatoriamente, da designação do ramo de atividade.126

Vemos assim que o nome empresarial nem sempre guarda conotação de realidade com

os elementos identificadores dos sócios, pois pode ser constituído de elemento fantasia.

125

BRASIL. Lei nº 6.015 de 31 de dezembro de 1973. Dispõe sobre os registros públicos e dá outras

providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6015.htm>, acesso em

28/07/2011. 126

COELHO, Fábio Ulhoa. op. cit., p.177-178.

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Ainda assim, leciona Carlos Alberto Bittar:

Por sua vez, o nome comercial, submete-se a regime próprio, previsto

na legislação mercantil. Desdobrando-se em nome, firma ou razão

social (em que figuram nomes de pessoas) e em denominação (com

expressões de fantasia), sujeita-se, para os mesmos fins e efeitos do

nome civil, a registro próprio (disciplinado pela Lei nº 8.934/94).

Admite-se a defesa contra usos não consentidos, ou além dos limites

consentidos, em face da economicidade e da negociabilidade do

direito em causa, que, ao reverso do civil, goza de expressão

pecuniária e possibilita a expansão de negócios além fronteiras (como

no licenciamento de griffes), extinguindo-se com a baixa no

registro.127

Para nós, o pensamento do citado autor, por si só, demonstra a total incompatibilidade

do nome comercial com a tutela dos direitos da personalidade, posto que como vimos, estes

direitos não têm expressão econômica e são inalienáveis.

Já o nome comercial “goza de expressão pecuniária” e tem como característica a

“negociabilidade”. Não há, todavia, como se negar tais características ao nome comercial, uma

vez que o mesmo pode ser negociado, bem como pode o empresário ceder ou alienar sua

marca ou mesmo extingui-la, diferentemente do nome civil, o qual sempre será designativo

daquele ser e gozará da proteção respectiva.

Outro ponto importante é que o nome da pessoa jurídica empresária, uma vez

registrado e arquivado na Junta Comercial, tem proteção apenas no âmbito estadual, ou seja,

outro empresário poderá utilizar o mesmo nome em outra unidade da federação sem infringir

nenhuma lei. Neste sentido informa Fábio Ulhoa:

Tais arquivamentos, contudo, não impedem que, em outro Estado da

Federação (Rio de Janeiro, suponha-se), seja arquivado ato

constitutivo com nome empresarial colidente.

(...)

127

BITTAR, Carlos Alberto. op. cit., p. 131.

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Como o registro do nome empresarial tem abrangência estadual, e não

nacional, os seus efeitos estão restritos aos Estados em que o

empresário tem sede ou filial.128

Interessante notar a questão da marca, posto que esta, regulada pela Lei de Propriedade

Industrial (Lei nº 9.279/96), é definida como sinal distintivo que identifica produtos e serviços

de um determinado empresário e, por conseqüência, acaba por identificá-lo.129

Podemos assim, dizer que a marca, em última instância, é a identificação do empresário

frente aos seus consumidores. Pois bem, como a legislação brasileira adota o regime atributivo

do registro de marca, é possível que determinada pessoa explore uma marca durante anos e

depois venha a perdê-la para outrem que a registre primeiramente (ressalvado o direito de

precedência insculpido no artigo 129, § 1º da Lei 9.279/96).130

Desta forma, resta inconteste que o nome da pessoa natural não tem qualquer

similaridade com o nome da pessoa jurídica, o qual estará submetido à atividade econômica,

podendo ser alienado ou cedido.

Por isso, não se pode tentar conceder a ambos o mesmo tratamento jurídico, posto que

diferentes são seus fundamentos, devendo ser diferentes os seus tratamentos legais.

128

COELHO, Fábio Ulhoa. op. cit., p. 181-182 129

Idem, ibidem, p.139. 130

“O registro de natureza atributiva ocorre quando a propriedade sobre a marca vier a se constituir com a

concessão do registro da marca à primeira pessoa que protocolizar a solicitação do mesmo perante um

órgão público”. BARBOSA, Denis Borges. Direito de Precedência ao Registro de Marcas. Disponível

em <jus2.uol.com.br/revista/texto/4985/direitodeprecedencia.html>, acesso em 05/04/2011.

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4. INAPLICABILIDADE DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE ÀS PESSOAS JURÍDICAS

Após as anteriores explanações sobre personalidade e direitos personalíssimos,

podemos, enfim entender sobre o descabimento dos direitos da personalidade às pessoas

jurídicas, face a diferença principiológica que rege cada um destes institutos.

Entretanto, antes de debruçarmos sobre o assunto, convém uma revisão sobre o que diz

expressamente a legislação e a jurisprudência sobre o tema em análise.

4.1. DISPOSITIVOS LEGAIS E ENTENDIMENTOS JURISPRUDENCIAIS

O Código Civil de 1916 não trazia qualquer dispositivo acerca dos direitos da

personalidade, como vimos anteriormente, mesmo porque estes somente vieram a ser

plenamente desenvolvidos no pós guerra.

Contudo, como os direitos da personalidade foram desenvolvendo-se na doutrina antes

da legislação, chegou-se à questão de se estes caberiam aos entes fictícios.

Inicialmente, houve uma tendência a negar-se a extensão destes direitos aos ente

fictícios, como informa-nos Renan Lotufo, especialmente nos Tribunais de Justiça do Rio de

Janeiro e Rio Grande do Sul.

Tal pensamento também foi esposado pelo então ministro do Superior Tribunal de

Justiça, Carlos Alberto Menezes Direito, em voto no Recurso Especial nº 147702 / MA:

O conceito de honra objetiva, opondo-se ao conceito de honra

subjetiva, com todo o respeito, é, apenas, um artifício para o fim

colimado. Em nenhuma hipótese, e é um fato insuscetível de

contestação, a pessoa jurídica pode sofrer dano moral.

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Tudo o que se passa na esfera da atividade empresarial, ou não,

desenvolvida por sociedades organizadas de acordo com a lei, deve,

necessariamente, repercutir no patrimônio. Se, por exemplo, contra

uma instituição financeira é assacada informação mentirosa sobre sua

capacidade de cumprir os compromissos com seus clientes, é evidente

que não há falar em dano moral, mas, sim, em dano à credibilidade da

empresa com repercussão patrimonial, assim a fuga de clientes ou o

encerramento das contas. O que não pode existir é a empresa se sentir

ofendida em sua dignidade, na sua honra. Se fosse diferente, estar-se-

ia no reino do absurdo. 131

Apesar da contundente opinião do citado ministro, a jurisprudência majoritária que se

firmou no Superior Tribunal de Justiça foi no sentido de conceder-se a aplicação dos direitos

personalíssimos às pessoas jurídicas.

Neste sentido:

CIVIL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - RESPONSABILIDADE

CIVIL – PESSOA JURIDICA - DANO MORAL.

I - A HONRA OBJETIVA DA PESSOA JURÍDICA PODE SER

OFENDIDA PELO PROTESTO INDEVIDO DE TÍTULO

CAMBIAL.

II - CABÍVEL A AÇÃO DE INDENIZAÇÃO, POR PESSOA

JURÍDICA; VISTO QUE A PROTEÇÃO DOS ATRIBUTOS

MORAIS DA PERSONALIDADE NÃO ESTÁ RESERVADA

SOMENTE ÀS PESSOAS FÍSICAS (RESP N. 60.033-2-MG - DJ DE

27.11.95).

III - RECURSO CONHECIDO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.132

Duplicatas fraudulentas. Protesto. Banco endossatário. Ciência do

vício. Dano moral. Pessoa jurídica.

1. Tendo ciência inequívoca o banco endossatário de que as duplicatas

eram fraudulentas, sem lastro algum, deve o mesmo responder pelos

danos morais decorrentes do protesto.

131

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 147702/MA. Relator: Carlos Alberto

Menezes Direito, Brasília, D.J. 05/04/1999, disponível em

<https://ww2.stj.jus.br/processo/jsp/ita/abreDocumento.jsp?num_registro=199700638286&dt_publicacao

=05-04-1999&cod_tipo_documento=>, acesso em 27/07/2011. 132

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 58660/MG. Relator: Waldemar Zveiter,

Brasília, D.J. 22/09/1997, disponível em

<https://ww2.stj.jus.br/processo/ita/listarAcordaos?classe=&num_processo=&num_registro=1995000047

63&dt_publicacao=22/09/1997>, acesso em 27/07/2011.

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2. Incidência, na espécie, da vedação da Súmula n° 07/STJ quanto à

verificação da boa-fé do endossatário, afastada no Acórdão recorrido.

3. Ressalvada a posição deste Relator, tem direito a pessoa jurídica de

postular indenização por danos morais ocasionados por ofensa à sua

honra. Precedentes da Corte.

4. Dissídio jurisprudencial que não sustenta a passagem do recurso

especial, a teor da Súmula n° 83/STJ.

5. Recurso especial não conhecido.133

Tal entendimento foi embasado pelo pensamento de doutrinadores que já sustentavam,

à época, o cabimento de tal extensão dos direitos da personalidade, como é o caso de Carlos

Alberto Bittar, para quem as pessoas jurídicas, assim como as naturais, atuam na sociedade

para a realização dos princípios jurídicos e por isso seriam detentoras de personalidade e dos

direitos a ela inerentes.134

Para o autor, apesar de certas peculiaridades não permitirem que todos os direitos

personalíssimos sejam aplicados aos entes morais, estes são detentores de direito ao nome,

marca, honra e segredo.135

Desta forma, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e, consequentemente, os

demais tribunais estaduais passaram a entender que estendiam-se às pessoas jurídicas os

direitos da personalidade.

É de notar-se que esta aplicação, conforme vimos nos acórdãos acima citados, deu-se

principalmente no que cabe à indenização por danos morais e mais especificamente nos casos

de protesto indevido ou inclusão em órgãos de restrição de crédito.

Parece-nos que assim ocorreu, porque nestas situações específicas é muito difícil

mensurar o dano sofrido, se tomarmos a visão estritamente patrimonial, tornando-se

complicada a indenização.

133

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 161913/MG. Relator: Carlos Alberto

Menezes Direito, Brasília, D.J. 18/12/1998, disponível em

<https://ww2.stj.jus.br/processo/ita/listarAcordaos?classe=&num_processo=&num_registro=1998000069

90&dt_publicacao=18/12/1998>, acesso em 27/07/2011. 134

BITTAR, Carlos Alberto. op. cit., p. 28. 135

Idem, ibidem, p. 45.

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Em face da reiterada jurisprudência, editou-se, ainda na vigência do Código Civil de

1916, a súmula 227 do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe: “a pessoa jurídica pode sofrer

dano moral”. 136

Assim, consagrou-se o entendimento de que as pessoa jurídicas eram titulares dos

direitos da personalidade, podendo pleitear sua proteção.

Conforme informa-nos Anderson Casé, o Código Civil de 2002 fez a discussão pender

ainda mais no sentido da aplicabilidade:

O código civil de 2002 trouxe o artigo 52 afirmando que seria

aplicado no que coubesse, às pessoas jurídicas, a proteção dos direitos

da personalidade, previstos naquele capítulo. Este artigo vem sendo

interpretado pela doutrina e jurisprudência pátria de forma que as

pessoa jurídicas são detentoras de determinados aspectos dos direitos

da personalidade e, portanto, podem figurar no pólo passivo de uma

demanda que objetiva a reparação por danos morais.

Realmente, após a vigência do novo código, o tema que ora discutimos foi pacificado

nos tribunais, sendo inúmeros os exemplos de aplicação dos direitos da personalidade às

pessoas jurídicas.

Mesmo diante de tais obstáculos bastante alicerçados, entendemos que tal extensão é

descabida e desvirtua os direitos personalíssimos, conforme passaremos a discorrer.

4.2. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A INAPLICABILIDADE ÀS PESSOAS JURÍDICAS

Não obstante o artigo existente no Código Civil e a súmula editada pela jurisprudência

reiterada do Superior Tribunal de Justiça, temos que discordar no sentido de que não são

aplicáveis às pessoas jurídicas os direitos da personalidade, conforme explicitaremos.

136

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula 227. Brasília, D.J. 08/10/1999, disponível em <

http://www.stj.jus.br/SCON/>, acesso em 27/07/2011.

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Inicialmente cabe citar a lição de Pietro Perlingieri, que é claro e contundente em

afirmar que é incabível a tutela dos direitos da personalidade às pessoas jurídicas, utilizando

como fundamento a diversidade das razões de tutela:

Os chamados direitos da personalidade e as pessoas jurídicas. É

possível remover o equívoco sobre a extensão dos direitos da pessoa

humana às pessoas jurídicas. Se a tutela da pessoa humana afunda as

suas raízes na cláusula geral presente no art. 2º da Constituição e

qualquer aspecto ou interesse concernente à pessoa é tutelado na

medida em que sejam essenciais ao seu pleno e livre desenvolvimento,

é também verdade que qualquer interesse referidos às pessoas

jurídicas, não somente assume significados diferentes, mas recebe

também uma tutela que encontra um distinto fundamento. Para as

pessoas jurídicas o recurso à cláusula geral de tutela dos “direitos

invioláveis” do homem constituiria uma referência totalmente

injustificada, expressão de uma mistificante interpretação extensiva

fundada em um silogismo: a pessoa física é sujeito que tem tutela; a

pessoa jurídica é sujeito; ergo, à pessoa jurídica deve-se aplicar a

mesma tutela. Daqui uma concepção dogmática e unitária da

subjetividade como fato neutro. O valor do sujeito pessoa física é,

todavia, diverso daquele do sujeito pessoa jurídica.137

Conforme informa o citado autor, os direitos da personalidade fundamentam-se na

dignidade da pessoa humana, consoante princípio insculpido no artigo 1º, inciso III da

Constituição Federal (referido no texto como artigo 2º, em referência à Constituição Italiana)

e, conforme posiciona Renan Lotufo, este valor (da dignidade) transcende a qualquer outro,

tanto que decorreu de uma conquista histórica milenar, decorrente de incansáveis lutas e,

mais recentemente, de duas guerras mundiais, alcançando o patamar de Declaração

Universal.138

No mesmo sentido é a doutrina de Roxana Borges, entendendo que apesar das pessoas

jurídicas serem detentoras de personalidade e capacidade, não podem ser titulares de direitos

137

PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil: Introdução ao Direito Civil Constitucional, tradução

Maria Cristina de Cicco. 3 ed. Riode Janeiro: Renovar, 2007. p 39. 138

LOTUFO, Renan. op. cit., p. 298.

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da personalidade, pois estes são exclusivos dos seres humanos. Para a autora, incorre em erro

a jurisprudência quando adota o posicionamento reverso.139

Para Pablo Malheiros da Cunha Frota, só a pessoa humana pode titularizar direitos

personalíssimo, pois estes derivam exclusivamente da dignidade da pessoa humana e

realização do mínimo existencial, o que não pode ser aplicado às pessoas jurídicas. Além disso,

ressalta o autor, os direitos da personalidade estão ligados às situações existenciais, as quais

estão afastadas do cotidiano das pessoas jurídicas.140

As pessoas jurídicas, fundamentam-se na idéia de patrimônio e desenvolvimento da

atividade econômica, mesmo quando têm finalidade não-lucrativa. Estes entes estão

intrinsecamente ligados aos seus patrimônios e suas atividades, importando-lhes apenas como

manter seu sustento. Estes entes fictícios não têm a suscetibilidade e a beleza humana, não se

emocionam nem se deprimem; por conseguinte, não podem desfrutar daquilo que visa

resguardar o mínimo existencial humano, sob pena de perdermos esta proteção tão eficaz que

tem sido dispensada pelo Direito.

Como bem pontua Orlando Gomes: “tanto as pessoas físicas como as jurídicas são

sujeitos de direito, mas a naturalidade de umas e a artificialidade das outras obriga a

discipliná-las diversamente”. 141

Também no sentido de diferenciar as tutelas entre as pessoas:

Levando-se em conta a interpretação do direito civil constitucional, as

pessoas jurídicas são detentoras de valores diversos daqueles que

fundam a pessoa humana, pois os entes fictícios são meros

instrumentos para a promoção da pessoa humana, e não há como se

sobrepor o instrumento à substância. Desta forma, chega-se ao

entendimento de que a pessoa jurídica foi criada para desenvolver as

potencialidades e os projetos de vida dos seres humanos. Assim, a

139

BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. op. cit., p. 20. 140

FROTA, Pablo Malheiros da Cunha. Danos Morais e a Pessoa Jurídica. São Paulo: Método, 2008. p.

262 141

GOMES, Orlando. Introdução ao direito civil. 10 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993. p. 146.

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pessoa humana é um fim em si mesmo, enquanto as pessoas jurídicas

são o meio.142

Sendo assim, a dignidade da pessoa humana, enquanto corolário que fundamenta e dá

valor aos direitos da personalidade, jamais poderá ser estendido às pessoas jurídicas, posto

que estas atuam na esfera econômica e ali desenvolvem suas atividades, requerendo, desta

maneira, proteção econômica de seus bens.

Por isso, também seria incabível para os entes fictícios a indenização por danos morais,

posto que esta visa resguardar ofensas aos direitos da personalidade.

Neste sentido é clara e contundente a lição de Gustavo Tepedino:

Com base em tais premissas metodológicas, percebe-se o equívoco de

se imaginar os direitos da personalidade e o ressarcimento por danos

morais como categorias neutras, adotadas artificialmente pela pessoa

jurídica para a sua tutela (a maximização de seu desempenho

econômico e de seus lucros). Ao revés, o intérprete deve estar atento

para a diversidade de princípios e de valores que inspiram a pessoa

física e a pessoa jurídica, e para que esta, como comunidade

intermediária constitucionalmente privilegiada, seja merecedora de

tutela jurídica apenas e tão-somente como um instrumento

(privilegiado) para a realização das pessoas que, em seu âmbito de

ação, é capaz de congregar.143

Salienta ainda o autor que a previsão contida no artigo 52 do Código Civil em nada

contradiz a impossibilidade de extensão dos direitos da personalidade às pessoas jurídicas.

Pelo contrário, o próprio artigo expressamente diz que se aplicará a proteção dos direitos da

personalidade. Desta forma, o texto legislativo não quis expandir a incidência dos direitos da

personalidade, apenas a forma de proteção ou a técnica de proteção.144

Também assim se manifesta Anderson Casé, informando:

Ressalte-se que a indenização por danos morais em relação aos seres

humanos, não repara prejuízos, tendo em vista serem irreparáveis os

142

CASÉ. Anderson George de Lima. op. cit., p. 113. 143

TEPEDINO, Gustavo. op. cit., p. 57-58. 144

Idem, ibidem, p. 55-56.

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referidos danos, mas sim compensam o ofendido. No caso do ente

coletivo, o mesmo entendimento não pode ser aplicado, porque não

sofre dor, não pode determinar indenização com fundamento

exclusivo na punição do ofensor, mas sim geram abalo de

credibilidade ou crédito ao ente coletivo.145

Neste sentido, parece-nos que a extensão sugerida pelo artigo 52 do Código Civil é para

que, nos casos de danos de difícil comprovação ou liquidação, seja-se aplicado aos entes

coletivos a indenização por arbitramento, como é feito nas indenizações decorrentes de

violações a direitos personalíssimos, podendo o juiz arbitrar o valor de acordo com critérios

similares.

Nos próximos subitens detalharemos as formas de proteção dos direitos das pessoas

jurídicas, especialmente nestes casos de difícil liquidação ou comprovação.

Pelo exposto, mais uma vez concluímos que os direitos da personalidade não podem ser

aplicados às pessoas jurídicas em face da diferença axiológica dos institutos em questão,

especialmente pelos fundamentos dos direitos personalíssimos. Além disso, a conformação e

os objetos de proteção dos direitos da personalidade são incongruentes com a tutela da

pessoa jurídica, especialmente no que tange ao desenvolvimento de suas atividades

econômicas e a persecução dos lucros.

4.3. PROTEÇÃO LEGAL AOS SUPOSTOS “DIREITOS DA PERSONALIDADE” DOS ENTES FICTÍCIOS

Apesar de nossa fundamentada posição pelo afastamento dos direitos da personalidade

para as pessoas jurídicas, entendemos que os direitos de tais entes não ficarão sem o devido

resguardo legal, posto que já são objeto de dispositivos de lei vigentes no ordenamento.

145

CASÉ, Anderson George de Lima. op. cit., p. 121.

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Conforme normalmente vemos na doutrina e jurisprudência, normalmente são

aplicados às pessoas jurídicas o direito ao nome, direito à imagem, direito à honra objetiva e

direito ao segredo.

No que tange ao nome, as pessoas jurídicas têm a proteção deste resguardada no

Código Civil, especialmente no artigo 1.166, que garante a exclusividade estadual do nome e,

no caso do seu parágrafo, nacional em se tratando de registro especial. A lei 8.934/94 também

traz dispositivos concernentes ao registro do nome empresarial e sua proteção, conforme

artigo 35 da mesma lei.

Em outro giro, temos a marca, que nos tempos atuais tem sido elemento principal de

caracterização das pessoas jurídicas (o que abrangeria uma proteção ao nome e à imagem).

Este instituto está conceituado e descrito na Lei 9.279/96, que dispõe sobre a propriedade

industrial, em seus artigos 122 a 182.

Segundo a citada lei, a marca é sinal distintivo utilizado para identificar um produto ou

serviço dos demais (artigos 122 e 123). Desta forma, a marca é o elemento caracterizador da

atividade de determinada pessoa jurídica.

Segundo o artigo 130 da Lei de Propriedade Industrial, um dos direitos conferidos ao

titular da marca é o de zelar pela integridade material e pela reputação da mesma. Sendo

assim, confere-se expressamente o direito ao empresário de resguardar a sua desígnia de

ofensas e má utilização, proteção esta que deverá ser efetivada pelo manejo de ações de

repressão e de indenização. Parece-nos que neste espeque, está-se protegendo também a

chama “honra objetiva”, posto que resguarda-se a reputação da marca registrada.

Outrossim, vemos também que a multicitada lei permite a cessão e licenciamento do

uso da marca pelo seu titular, seja a título oneroso ou gratuito (artigos 134 e 139).

Além de todas estas proteções, os artigos 189, 190 e 191 ainda tipificam como crimes a

utilização indevida da marca, nome comercial e título de estabelecimento:

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Art. 189. Comete crime contra registro de marca quem:

I - reproduz, sem autorização do titular, no todo ou em parte, marca

registrada, ou imita-a de modo que possa induzir confusão; ou

II - altera marca registrada de outrem já aposta em produto colocado

no mercado.

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa.

Art. 190. Comete crime contra registro de marca quem importa,

exporta, vende, oferece ou expõe à venda, oculta ou tem em estoque:

I - produto assinalado com marca ilicitamente reproduzida ou imitada,

de outrem, no todo ou em parte; ou

II - produto de sua indústria ou comércio, contido em vasilhame,

recipiente ou embalagem que contenha marca legítima de outrem.

Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) meses, ou multa.

Art. 191. Reproduzir ou imitar, de modo que possa induzir em erro ou

confusão, armas, brasões ou distintivos oficiais nacionais, estrangeiros

ou internacionais, sem a necessária autorização, no todo ou em parte,

em marca, título de estabelecimento, nome comercial, insígnia ou

sinal de propaganda, ou usar essas reproduções ou imitações com fins

econômicos.

Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) meses, ou multa.

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem vende ou expõe ou

oferece à venda produtos assinalados com essas marcas.146

Apesar de toda esta proteção, como vige no direito de propriedade industrial brasileiro

o regime aquisitivo sobre a marca, conforme já vimos aquele que não a registra sobre ela não

detém qualquer direito.

Inclusive, se outra pessoa registrar a marca, esta que será a titular e poderá opor

pretensão face ao que não registrou, ressalvado o direito de “utilização anterior”. Ainda que

apoiado nesta prerrogativa legal queira-se defender-se a prescindibilidade do registro da

marca, a doutrina é unânime em asseverar que este direito é limitado, podendo o seu titular

perdê-lo pela inércia (como já abordamos no capítulo anterior), enquanto que os direitos da

personalidade, como vimos, são irrenunciáveis e imprescritíveis.

Além do que abordamos, entendemos que a proteção da comumente chama honra

objetiva das pessoas jurídicas, está eminentemente ligada ao abalo de credibilidade e mesmo

à retração de suas atividades econômicas causadas por ofensas à sua reputação.

146

BRASIL. op. cit.

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Neste sentido, concordamos com o Renan Lotufo, para quem a reputação da pessoa

jurídica (honra objetiva) é bem que integra seu patrimônio imaterial, merecendo guarida do

ordenamento jurídico.147

A questão que se configura é como dimensionar e comprovar estes danos causados à

reputação ou renome do ente coletivo, uma vez que este abalo de credibilidade produz efeitos

a longo prazo?

Responderemos a esta questão no próximo subitem, tecendo considerações acerca das

formas de apuração e indenização destas violações.

Por fim, temos que abordar o direito ao segredo que muitos doutrinadores imputam às

pessoas jurídicas. Para nós este direito em verdade não existe, posto que os entes coletivos

são regidos pela publicidade de seus atos, especialmente os constitutivos, sem o quê estes são

inválidos.

Na verdade, o que existe é um segredo industrial ou segredo de empresa, que resguarda

àqueles que estão na atividade econômica exclusividade no uso de métodos novos. Este

direito é concretizado quando do registro de patente, a partir do qual o inventor passa a ter o

direito de exclusividade de exploração.

Entretanto, ao registrar a patente o inventor dá publicidade ao seu invento e o método

que utilizou. Muitos empresários, por isso, exploram suas invenções sem registro, para manter

a novidade de seus inventos.

Ainda assim, informa-nos Fábio Ulhoa:

O segredo de empresa não está totalmente desamparado no direito

brasileiro. Pelo contrário, a lei tipifica como crime de concorrência

desleal a exploração, sem autorização, de “conhecimentos,

informações ou dados confidenciais, utilizáveis na indústria, comércio

ou prestação de serviços, excluídos aqueles que sejam de

conhecimento público ou que sejam evidentes para um técnico no

147

LOTUFO, Renan. op. cit., p. 300.

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assunto”, se o acesso ao segredo foi fraudulento ou derivou de relação

contratual empregatícia.148

Sendo assim, o que existe é uma proteção à atividade econômica, reprimindo-se a

concorrência desleal e não privilegiando-se um suposto direito à privacidade das pessoas

jurídicas

4.4. MÉTODOS DE COMPROVAÇÃO E/OU APURAÇÃO DOS DANOS MATERIAIS DE DIFÍCIL

LIQUIDAÇÃO SOFRIDOS PELAS PESSOAS JURÍDICAS

Parece-nos que a grande questão que levou tanto os juízes quanto o legislador a

apoiar a aplicabilidade dos direitos da personalidade às pessoas jurídicas está ligada à

dificuldade de apurar-se os danos patrimoniais sofridos em casos de abalo de crédito, ofensa

ao nome empresarial, utilização indevida da marca, entre outros.

Neste aspecto, poderemos “salvar” o artigo 52 do Código Civil de sua flagrante

inconstitucionalidade, atribuindo a este uma interpretação conforme, ressaltando-se o

vocábulo “proteção” como significado de que possam ser aplicados aos casos de danos

materiais de difícil liquidação e/ou comprovação sofridos pelas pessoas jurídicas o método de

arbitramento de valores indenizatórios, assim como os tribunais têm feito com os casos de

danos morais.

Desta forma, estar-se-á não somente resguardando-se a integridade dos direitos da

personalidade, bem como permitindo-se a plena indenização dos casos difíceis dos entes

fictícios.

Alguns doutrinadores tomam rumo diverso, manifestando que tais danos seriam os

chamados danos institucionais, que são aqueles que geram abalo na atividade econômica mas

148

COELHO, Fábio Ulhoa. op. cit., p. 140.

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não são propriamente materiais, conforme referem Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald.Para

estes autores os danos institucionais também poderiam ser arbitrados pela autoridade

judiciária a partir da análise da ofensa e seus potenciais prejuízos, ainda que não comprovados

estes.149

Para nós, novamente com base na tese de Renan Lotufo, estes danos à reputação ou

credibilidade das pessoas jurídicas são danos intrinsecamente patrimoniais150. Contudo, estes

atingem o patrimônio imaterial destes entes, tornando difícil a mensuração da perda

econômica ocasionada ou mesmo a comprovação dela.

Pensemos no exemplo de publicação de matéria jornalística atribuindo a determinada

associação científica falsidade nos seus estudos. Tal matéria certamente repercutirá no

conceito que esta associação desfruta no seio da sociedade, gerando um dano à atividade

daquela. Este dano terá como conseqüência a diminuição dos aportes de contribuições, perda

de patrocínios, redução de contratos e patentes que a associação detém, entre outros. Prima

facie a associação não tem como sequer comprovar este dano e ainda que assim o possa, o juiz

não terá como decidir com embasamento probatório a extensão deste.

Nestes casos, sustentamos que deve ser aplicado o disposto no artigo 52 do Código

Civil, atraindo para a resolução destas querelas a forma de liquidação dos danos aos direitos da

personalidade.

Importante frisar, estamos atraindo somente a técnica de resolução da quantificação

dos danos que tem se usado na experiência da defesa dos direitos da personalidade para

aplicação às pessoas jurídicas, o que pode ser feito sem qualquer sacrifício axiológico ou

mesmo ofensa ao enriquecimento ilícito.

Tal aplicação deverá, ainda assim, pautar-se na ilicitude da conduta, potencialidade do

dano, reputação do ofendido e situação econômica do ofensor, para que esta indenização não

149

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. op. cit., 282-283 150

LOTUFO, Renan. op. cit., p. 300.

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venha a ser irrisória, deixando de resguardar os bens jurídicos tutelados, ou exacerbada,

levando ao enriquecimento ilícito e à insolvência do ofensor.

Em verdade, teremos, de um lado, a plena indenização dos danos causados e

penalização do infrator dos direitos do ente coletivo e, de outro lado, a compatibilização do

artigo 52 do Código Civil com a Constituição e a principiologia que cerca os direitos da

personalidade.

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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

É difícil argumentar contra um dispositivo de lei expresso, sendo que inclusive, a

legislação processual caracteriza tal atitude de litigância de má-fé; contudo no caso específico

do artigo 52 do Código Civil, somos forçados a crer que tal dispositivo dissona do princípio

constitucional sobre o qual se erigem os direitos da personalidade ou, numa tentativa de

mantê-lo no ordenamento, devemos utilizá-lo como alternativa legal para o arbitramento de

indenizações nos casos de difícil liquidação.

Vimos que os direitos da personalidade foram brandidos a ferro e fogo para a proteção

daquilo que o ser humano tem de mais essencial à sua existência e mesmo para garantir a sua

subsistência numa sociedade pautada pela economia.

Por isso, os direitos da personalidade representam uma categoria jurídica altamente

carregada de valor histórico e que por isso foi alçada ao patamar de direito fundamental e

recebeu as características de absolutos, extrapatrimoniais, inalienáveis, impenhoráveis,

imprescritíveis, irrenunciáveis e relativamente disponíveis.

Os direitos da personalidade devem assim permanecer como categoria segregada de

direitos que não podem ser vilipendiados, reduzidos ou relativizados, o que fatalmente

ocorrerá se a expansão que lhes tem sido feita perdurar.

Isto porque se tais possibilidades começarem a serem aceitas, poderemos ter,

futuramente, u movimento de redução dos direitos da personalidade, assim como ocorreu

com os direitos patrimoniais, que foram relativizados em face da função social.

Desta forma, uma vez que os direitos da personalidade forma concebidos e estão sendo

desenvolvidos para a proteção e exaltação dos seres humanos, não podemos entender como

se poderia aceitar a sua aplicação às pessoas jurídicas. Mesmo porque a própria Constituição

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Federal é expressa em dizer que um dos princípios fundamentais da República Brasileira é a

dignidade da pessoa humana.

As pessoas jurídicas baseiam-se no fundamento de separação patrimonial e autonomia

obrigacional, sendo importante para este instituto a possibilidade de negociação, no mercado,

de seus direitos e manutenção de sua atividade.

Conforme evidenciamos, toda a teoria da personalidade jurídica dos entes coletivos foi

acompanhada pela expansão do capitalismo e a necessidade de circulação da riqueza, que é

inerente a este.

Com a evolução das relações sociais surgiram entes fictícios que não estavam

direcionados ao lucro, mas que mesmo assim derivavam da mesma necessidade de separação

patrimonial e autonomia da vontade. Por isso, entendemos que mesmo as associações,

fundações, partidos políticos e organizações religiosas têm em seu cerne uma ligação muito

forte com os seus patrimônios e o desenvolvimento de suas atividade, pois todos precisam de

recursos para sobreviver.

Sendo assim, a aplicação dos direitos da personalidade às pessoas jurídicas iniciará um

processo de mitigação destes direitos, enfraquecendo as supracitadas características que os

protegem.

Pela diferença axiológica entre os institutos, concluímos que não se aplicam às pessoas

jurídicas os direitos da personalidade.

Ainda assim, o texto do Código Civil, no intuito de resolver questões ligadas à liquidação

de danos referentes ao abalo de crédito ou credibilidade, inseriu um artigo prevendo que

podem ser utilizados, nestes casos, os métodos de liquidação dos direitos da personalidade

para a proteção dos direitos das pessoas jurídicas.

Vemos assim, que não há qualquer confusão entre o dispositivo do código e os

fundamentos constitucionais dos direitos em tela, uma vez que o mesmo primou pela

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ampliação da reparabilidade dos direitos patrimoniais das pessoas jurídicas, emprestando-lhes

uma técnica de liquidação dos direitos personalíssimos.

Este empréstimo, em nada pode ser utilizado para concluir, da forma que vem

concluindo a jurisprudência brasileira, de que se estendem os direitos da personalidade às

pessoas jurídicas.

Ainda assim, os supostos direitos que a doutrina vem tentando resguardar com a

imprópria extensão dos direitos personalíssimos, já estão resguardados por outros institutos

do direito civil e empresarial.

Neste sentido, demonstramos que a marca protege o suposto direito de imagem das

pessoas jurídicas, inclusive possibilitando que estas negociem com este direito, o que é

interessante do ponto de vista da economia.

Também, o nome empresarial tem sua proteção na forma da legislação vigente, desde

que submetido ao registro regular, sendo que uma parte desta tutela se confundirá com o

direito de marca.

O segredo de indústria ou de empresa também tem sua proteção contra a apropriação

ilícita, seja na esfera cível como na criminal.

Por último o suposto direito à “honra objetiva” será resguardado pela tutela da

reputação ou renome, como bem imaterial pertencente ao patrimônio da pessoa jurídica,

desde que esta faça por merecer tal proteção.

Vemos assim, que os defensores da extensão dos direitos da personalidade não têm

razão ao dizer que estão tutelando direitos não resguardados às pessoas jurídicas, pois o

ordenamento já tratou de protegê-los. Obviamente o resguardo conedido para estes entes foi

mais limitado que o das pessoas humanas, pois assim ordena a própria tábua axiológica

esculpida na constituição cidadã.

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Pela nova principiologia do Direito Civil, a personalidade do ser humano não é mais um

atributo jurídico e sim um valor que deve fundamentar e permear todo o ordenamento,

servindo de guia para a resolução dos conflitos.

Isto porque o ser humano centraliza o foco de atenções do direito, sendo os seus

sentimentos, experiências e sua dignidade valores revestidos de proteção jurídica.

Apesar de algumas pessoas jurídicas desenvolverem atividades ligadas à filantropia,

mesmo estes entes ainda guardam a relação estreita com o seu patrimônio e atividade, não

tendo as projeções psíquicas e físicas que conceituam os direitos da personalidade.

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