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A INAPLICABILIDADE DAS SANÇÕES PENAIS DO
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
AUTOR: DELEMAR FERREIRA CAMARGO
ORIENTADORA: PROFª. DRª. FABIANA TEIXEIRA ALBUQUERQUE
Direito
PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
DELEMAR FERREIRA CAMARGO
A INAPLICABILIDADE DAS SANÇÕES PENAIS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
Monografia apresentada ao curso de graduação em Direito da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do Título de Bacharel em Direito. Orientadora: Profª. Drª. Fabiana Teixeira Albuquerque
Brasília 2009
Trabalho de autoria de Camargo, Delemar Ferreira, intitulado “A Inaplicabilidade das Sanções Penais do Código de Defesa do Consumidor”, requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito, defendido e aprovado, em ____ de _______________ de 2009, pela Banca Examinadora constituída por:
___________________________________________________ Presidente: Prof.
Universidade Católica de Brasília
___________________________________________________ Integrante: Prof.
Universidade Católica de Brasília
___________________________________________________ Integrante: Prof.
Universidade Católica de Brasília
Brasília 2009
Dedico o presente trabalho à minha esposa Carmen e às minhas filhas, Danielle, Carolina e Gabriela pelo constante amor, apoio e tolerância no decorrer da minha caminhada, rumo à formação a que tanto almejava.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus, por ter me concedido a oportunidade de estar entre as
pessoas agraciadas com tamanha satisfação de estar aqui hoje, confeccionando um
trabalho final de um curso superior de qualidade e de grande expressão e respeito,
que, diante do disputadíssimo mercado de trabalho, onde pessoas com grandes
qualidades estão à espera de uma oportunidade profissional, me colocando em
condições de igualdade a essas pessoas e que jamais eu poderia deixar passar.
Ao Banco Central do Brasil, que, através de seu programa de incentivo à
primeira graduação de seus servidores, me proporcionou a oportunidade ímpar de
me tornar um Bacharel em Direito subsidiando a minha formação em oitenta por
cento de seu valor, que sem ele, seria quase impossível.
À minha família, que, durante essa caminhada rumo à formação, não mediu
esforços para me apoiar e me incentivar, abrindo mão de passeios, férias e outras
oportunidades de laser que surgiram durante esses cinco anos e não puderam
participar em razão de estarem comprometidas com meus horários e compromissos
da faculdade.
Aos professores, aos colegas e amigos, que, me acompanharam durante
essa caminhada e tiveram em alguns momentos que exercitarem sua paciência para
comigo, que, em razão da falta de entendimento do conteúdo de algumas
disciplinas, tive que recorrer a eles, os quais me atenderam prontamente.
A todos aqueles que, de alguma forma acreditaram que apesar da idade a
qual me encontro, não desanimaram em nenhum momento de me dedicar apoio e
compreensão e também àqueles que não acreditaram, pois, talvez, devo grande
parte de minha vitória a esses que me dispus a contrariá-los.
À minha mãe e ao meu pai “in memoriam”, pelo respeito e dignidade com os
quais me criaram e que, mesmo sem nenhuma formação acadêmica, souberam
transformar aquele filho, na pessoa que hoje sou, lutadora e obstinada em atingir os
objetivos almejados.
Todos os homens têm igual direito à satisfação das suas necessidades e ao usufruto de todos os bens da natureza, e a sociedade deve consolidar esta igualdade. (Babeuf)
RESUMO
Camargo, Delemar Ferreira, intitulado “A Inaplicabilidade das Sanções Penais do
Código de Defesa do Consumidor”, ____ Trabalho de Conclusão de Curso
(Bacharelado em Direito)–Faculdade de Direito, Universidade Católica de Brasília.
Brasília, DF, 2009.
Com o presente Trabalho de Conclusão de Curso, o autor faz alguns
questionamentos sobre a inaplicabilidade das sanções penais impostas pelo Código
de Defesa do Consumidor, relacionando-as e comparando-as, às leis extravagantes
e ao Código Penal, com sanções penais bem mais severas que as disposta no
diploma legal em análise.
Por outro lado, temos a ineficácia dos agentes fiscalizadores e a falta de
sintonia entre as agências reguladoras de defesa do consumidor e as autoridades
competentes, tais como o Ministério Público, donde poderia advir a propositura das
ações penais cabíveis.
No primeiro capítulo,são feitos breves comentários sobre a origem da relação
de consumo entre fornecedor e consumidor, serão tratados também, a escalada da
aquisição dos direitos do cidadão brasileiro nas relações de consumo frente ao
poder econômico das grandes empresas de fornecimento de produtos ou serviços
em grandes escalas, a proteção do consumidor nas constituições, a vulnerabilidade
do consumidor frente ao fornecedor, o motivo da inserção de sanções penais no
CDC, sobre quem recairá a pena e sobre a responsabilidade civil nas relações de
consumo.
No segundo capítulo, é feita uma comparação com alguns países vizinhos
sobre os instrumentos legais de amparo ao consumidor quanto, aos meios de
defesa, aos órgãos responsáveis pela efetividade dessa defesa, às políticas de
educação para o consumo, à competência para aplicação da lei, à responsabilidade
dos fornecedores perante o consumidor.
No terceiro capítulo, algumas considerações sobre a incompatibilidade e
contradições das sanções penais insertas no CDC, da responsabilidade civil do
fornecedor com relação ao fato do produto ou do serviço e da responsabilidade
subsidiária do comerciante, passando também sobre a questão da responsabilidade
por vício do produto ou do serviço.
No quarto capítulo, a disposição sobre os aspectos penais do Código de
Defesa do Consumidor, mostrando suas disparidades frente as demais legislações
penais e uma demonstração de que, sua aplicabilidade se torna totalmente
impraticável frente a fragilidade das penas ali impostas.
Palavra chave: Código; Defesa; Consumidor; Inaplicabilidade, Artigos, Penais;
Punição; Pena, Dolo, Culpa.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 1
CAPÍTULO 1 ............................................................................................................... 4
HISTÓRICO DA PROTEÇÃO NAS RELAÇÕES DE CONSUMO .............................. 4
1.1 Origem das relações de consumo ......................................................................... 4
1.2 - Da Proteção das pessoas nas Constituições Brasileiras .................................... 4
1.3 - O Código de Defesa do Consumidor: ................................................................. 6
1.4 - Da Vulnerabilidade do Consumidor ..................................................................... 7
1.5 - O porquê da inserção de Cláusulas penais no CDC. ........................................ 10
1.6 - A quem aplicar a pena. ..................................................................................... 11
1.7 - Da Responsabilidade pela Reparação do Dano. .............................................. 12
CAPÍTULO 2 ............................................................................................................. 14
INCOMPATIBILIDADE E CONTRADIÇÕES DAS SANÇÕES PENAIS DO CDC ... 14
2.1 O Código de Defesa do Consumidor e outras Normas ....................................... 14
2.2 Da Responsabilidade do Fornecedor pelo fato do produto ................................. 15
2.3 Da subsidiariedade da responsabilidade ............................................................. 18
2.4 Da responsabilidade do fornecedor pelo fato do serviço ..................................... 20
2.5 Da responsabilidade por vício do produto ou do serviço ..................................... 22
CAPÍTULO 3 ............................................................................................................. 25
DAS SANÇÕES PENAIS IMPOSTAS PELO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ......................................................................................................... 25
3.1 Da inserção das penas no Código de Defesa do Consumidor ............................ 25
3.2 Da tipificação aos crimes do Código de Defesa do Consumidor ......................... 26
3.3 Dos crimes por omissão ...................................................................................... 27
3.4 Do crime de desobediência de determinação de autoridade............................... 30
3.5 Das infrações penais por abuso na publicidade .................................................. 31
3.6 Do crime de emprego de peças usadas no conserto de produtos ...................... 33
3.7 Da Cobrança de dívidas e dos bancos de dados ................................................ 34
3.8 Do certificado de garantia e seu conteúdo .......................................................... 38
3.9 Da forma de aplicação, circunstâncias e tipos de pena ...................................... 39
CAPÍTULO 4 ............................................................................................................. 41
O DIREITO DO CONSUMIDOR COMPARADO A ALGUNS DOS PAÍSES VIZINHOS ................................................................................................................. 41
4.1 As sanções penais como instrumento de defesa do consumidor ........................ 41
4.2 Comparação quanto a legitimidade para propositura da ação ............................ 42
4.3 Comparação quanto ao sistema de defesa do consumidor ................................. 44
4.4 Comparação quanto às políticas de educação para o consumo ......................... 46
4.5 Comparação quanto a competência para aplicação da lei .................................. 48
4.6 Comparação quanto a responsabilidade dos fornecedores ................................ 50
CONCLUSÃO ........................................................................................................... 53
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 55
1
INTRODUÇÃO
A escolha do tema “A Inaplicabilidade das Sanções Penais do Código de
Defesa do Consumidor”, não foi por acaso. Desde o início do Curso de Direito, o
autor estabeleceu uma relação muito estreita com a matéria, a qual pretende
aprofundar conhecimentos para atuação em sua vida profissional.
No decorrer de sua formação, o autor passou a perceber que a Lei 8.078/90,
ou seja, o Código de Defesa do Consumidor é um dos dispositivos legais mais
completos e abrangentes dentro do nosso ordenamento jurídico, pois, visa à
proteção, não só das pessoas envolvidas na relação contratual, mas, também a
própria relação, para que não haja nenhum abuso ou prejuízo por nenhuma das
partes envolvidas e também a punição com sanções penais à parte infringente
daquela relação.
No entendimento do autor, a lei 8.078/90, denominada como Código de
Defesa do Consumidor, não deveria receber tal denominação, vez que, ficou
parecendo que a lei, veio com o propósito primeiro de defender o consumidor em
uma relação de consumo em que o fornecedor, de uma forma geral, seria aquele
que, ao se aproximar de seu cliente para o estabelecimento de tal relação, estaria
com o propósito de causar algum dano, o que não é verdade, ela veio para igualar
as pessoas dentro de uma relação de consumo a qual, dentro do mundo capitalista
que vivemos é de suma importância para qualquer economia, inclusive a economia
brasileira e porque não, mundial.
O crescimento de uma Nação não se faz apenas com trabalho e dedicação
por parte de sua população, mas, o grande esteio para este crescimento, é a
movimentação de produtos e serviços produzidos por integrantes daquela Nação,
sendo que, esta movimentação só se estabelece através da relação de consumo, ou
seja, criando-se a figura do fornecedor e do consumidor, onde, necessariamente
haverá de se estabelecer regras para não haver sobreposição de um ao outro.
È um tema muito complexo, pois, a grande maioria da doutrina, não versa
sobre as infrações na relação de consumo no sentido de ilícito penal e sim de
responsabilidade civil com reparação de danos, materiais ou morais, até porque, a
2
reparação dos danos causados dentro da relação de consumo, são na maioria das
vezes, quando o autor do dano é o fornecedor, reparados pecuniariamente ou com a
substituição do produto ou serviço defeituoso e nunca com sanções penais.
Sérgio Cavalieri Filho, em sua maravilhosa obra sobre responsabilidade civil
(Cavalieri Filho, Sérgio, 2009, p. 474), define que, “o Código de Defesa do
Consumidor engendrou um novo sistema de responsabilidade civil para as relações
de consumo, com fundamentos e princípios novos, porquanto a responsabilidade
civil tradicional revelara-se insuficiente para proteger o consumidor”, para que não
tenhamos dúvidas sobre a incidência da responsabilidade civil nas relações de
consumo, o mesmo autor relata como exemplo o caso de uma senhora, julgado pela
9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (Ap. cível 10.771/98),
onde:
Ao abrir, no recesso do seu lar, um litro de um determinado
refrigerante, para servi-lo aos seus dois filhinhos, a tampa explodiu, bateu
com tal violência em um dos seus olhos que a deixou cega daquela vista. À
luz da responsabilidade tradicional, quem seria o causador do dano? A
quem aquela senhora poderia responsabilizar? A garrafa que não seria,
porque a coisa não responde por coisa alguma. Poderia responsabilizar o
vendedor do refrigerante, o supermercado, digamos? De acordo com a
responsabilidade tradicional este haveria de se defender com a máxima
facilidade, alegando que não teve culpa, pois, limitou-se a vender o
refrigerante tal como o recebeu do fabricante – fechado, embalado, lacrado
– sem qualquer participação no processo de fabricação. Poderia a vítima
responsabilizar o fabricante? Também este, de acordo com o Direito
tradicional, haveria de afastar qualquer responsabilidade de sua parte
dizendo que nada vendeu para a vítima, que não havia nenhuma relação
contratual entre eles e que só responde pelo fato da coisa enquanto ela
estiver sob a sua guarda, comando ou direção, jamais depois que saiu de
sua fábrica. Essa é a própria da teoria da guarda. Como se vê, aquela
senhora pelo sistema tradicional de responsabilidade, estaria ao
desamparo, não obstante agredida violentamente no recesso do seu lar.1
Ao fazermos uma leitura do inciso VI do artigo 4º do Código de Defesa do
Consumidor, temos total clareza de que nossos legisladores não tinham nenhuma
intenção de responsabilizar penalmente qualquer que seja o dano causado pelo
fornecedor ao seu consumidor e sim, aplicar-lhes as sanções administrativas
1 Cavalieri Filho, Sérgio. (2009). Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas.
3
cabíveis ao caso, ou seja, definindo quais são os objetivos do Código de Defesa do
Consumidor, já que temos o Código Penal e leis específicas que abrangem também
a relação de consumo, restando, portanto, à vítima, buscar junto ao judiciário a
reparação do dano, sempre argüindo a responsabilidade civil.2
2 Cavalieri Filho, Sérgio. (2009). Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas.
4
Capítulo 1
HISTÓRICO DA PROTEÇÃO NAS RELAÇÕES DE CONSUMO
1.1 ORIGEM DAS RELAÇÕES DE CONSUMO
A idéia de se estabelecer uma relação fornecedor/consumidor surgiu com a
necessidade de expansão do capitalismo em meados do século XVI, onde as
pessoas que viviam em sociedade começaram a sentir a necessidade de se
comunicar materialmente, mas, só por volta do século XVIII, nas sociedades
burguesas, o indivíduo passou a ser o centro das atenções para a expansão e da
realização mais completa do capitalismo.
A produção agrícola e industrial surgiu em face da necessidade de consumo
apresentada pela sociedade que, com o surgimento da vontade de satisfação
pessoal em razão de produtos para seu desfrute, o indivíduo tornou-se, ao mesmo
tempo, fornecedor e consumidor, ou seja, o indivíduo produzia algo em escala maior
que sua necessidade e colocava à venda o excedente para pessoas que dispunham
de outros produtos, mas que também procuravam produtos dos quais, não
conseguiam produzir, surgindo então o comércio entre pessoas produtoras,
alavancando o capitalismo e reforçando a existência da relação de consumo.
1.2 - Da Proteção Das Pessoas Nas Constituições Brasileiras
No Brasil, a nossa primeira Constituição, que foi a do Império datada de 25 de
março de 1824, trouxe em seu artigo 179, que versava sobre os Direitos Individuais,
a garantia a liberdade, a segurança individual e a propriedade, não mencionou
nenhum outro Direito. Já no Brasil República, a Constituição de 1891 trouxe em seu
artigo 78, além da manutenção da garantia da liberdade, da segurança individual e
5
da propriedade, mencionou também outros direitos advindos da forma de governo
estabelecida.
A Constituição Federal de 1934, em seu artigo 113, acrescentou aos Direitos
já enumerados, o Direito à subsistência, ou seja, dando aí o primeiro passo para que
se estabelecesse dentro da sociedade uma relação de trabalho e comércio, o qual
foi retirado pela Constituição Federal de 1937 em seu artigo 122, ou seja, voltando a
estaca zero com relação ao amparo do Estado à subsistência dos indivíduos.
Com o advento da Consolidação das Leis do Trabalho em 1943, fez-se
necessário que, a Constituição Federal de 1946, trouxesse de volta para o indivíduo
em seu artigo 141, aquela garantia retirada, enumerando aos Direitos Individuais, o
Direito à vida, ou seja, restabelecendo aí a garantia do Estado à subsistência e
consequentemente o retorno da relação de trabalho e comércio dentro da
sociedade, situação que foi mantida pela Constituição Federal de 1967 em seu
artigo 150.
Em 16 de abril de 1985, a Assembléia Geral da Organização das Nações
Unidas, editou a resolução nº 39/248, fixando regras gerais a serem adotadas e
observadas por todos os países membros, na qual, reconheceu que os
consumidores eram sujeitos vulneráveis na relação de consumo em termos
econômicos quanto ao seu poder de negociação e que necessitariam de tratamento
especial por parte do Estado.3
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º acrescenta aos Direitos e
Garantias Fundamentais, o direito à igualdade, sendo que, no inciso XXXII diz que, o
Estado, promoverá, na forma da lei a defesa do consumidor, e em seu artigo 170
que dispõe sobre os princípios da ordem econômica, em seu inciso V está
enumerado como um dos princípios da ordem econômica, a defesa do consumidor.
3 Manual de Direito do Consumidor.–Brasília: Escola Nacional de Defesa do Consumidor, 2009, p. 16.
6
1.3 - O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR:
Editada no dia 11 de setembro de 1990, vindo a vigorar a partir do dia 11 de
março de 1991, a Lei 8.078, denominada como Código de Defesa do Consumidor, é
tida pela maioria de nossos doutrinadores como sendo, uma lei tão completa e
abrangente que, ao invés de dispor pura e simplesmente de comandos legais
voltados à proibição de certas condutas, determinou que a atividade de proteção e
defesa do consumidor seja exercida de modo coordenado, uniforme e sistematizado
para garantir maior segurança e eficiência de resultados aos cidadãos, ou seja, uma
verdadeira revolução nas relações de consumo, a qual só não é perfeita em razão
de seu título II, onde trata das infrações penais, tipificando como crimes, algumas
condutas na relação de consumo e impondo sanções das quais jamais teremos
noticias em razão da fragilidade do consumidor, ainda estampada frente ao
fornecedor, disposições estas que é o foco da proposta deste trabalho acadêmico.
Como bem defende José Geraldo Brito Filomeno, em (Filomeno, 2007), diz
que, apesar de conviver harmonicamente com os demais dispositivos legais, entre
eles o Código Penal Brasileiro, há aparentemente total desnecessidade de
disposição de sanções penais no Código de Defesa do Consumidor, pois, o Código
Penal e a legislação específica, tutelam penalmente qualquer abuso frente ao
consumidor, tais como: os crimes de apropriação indébita, o estelionato, a fraude no
comércio, a defraudação na entrega de coisa e etc.4
A relação de consumo entre fornecedor e consumidor é bastante ampla em
razão de suas diversas possibilidades de negociações, sejam elas, no consumo de
serviços ou de produtos o fornecedor tem sua parcela de responsabilidade sobre o
que se está oferecendo, mas, o consumidor também tem a sua responsabilidade de
analisar dentro do mercado fornecedor o que melhor se adéque à sua necessidade
naquele momento. Enquanto tal relação está dentro da normalidade, não há muito
com o que se preocupar, mas, quando passa a existir conflito, a parte
hipossuficiente da relação, ou seja, o consumidor tende a obter desvantagens.
4 Curso Fundamental de Direito do Consumidor/José Geraldo Brito Filomeno. – São Paulo: Atlas, 2007.
7
Apesar de estarem tipificados no título II do Código de Defesa do
Consumidor, não se tem noticia de casos em que houve aplicação de tais
dispositivos, até porque, existe uma certa dificuldade para identificar os verdadeiros
autores do crime, considerando que a empresa apesar de ter na figura de seus
sócios a co-responsabilidade pelos atos ilícitos praticados por seus subordinados.
Quando o Código de Defesa do Consumidor define em seu artigo 61 que
“Constituem crimes contra as relações de consumo previstas neste Código, sem
prejuízo do disposto no Código Penal e leis especiais, as condutas tipificadas nos
artigos seguintes” está deixando bem claro que sua meta não é punir ninguém e sim,
regular as relações de consumo e apontar soluções em caso de litígio, já que temos
o Código Penal e leis especiais, tais como, a Lei nº 1.521/51, conhecida como a “lei
de crimes contra a economia popular”, que, desde 1951 combate com sanções
penais as pessoas físicas ou jurídicas que pratique qualquer crime ou contravenção
contra a economia popular. Temos também a Lei 8.137/90, conhecida como a “lei de
crimes contra a ordem tributária, econômica e relações de consumo”, editada após o
Código de Defesa do Consumidor que também traz em seu bojo, sanções penais de
crimes nas relações de consumo.
1.4 - DA VULNERABILIDADE DO CONSUMIDOR
O relacionamento entre pessoas livres, mas também muito desiguais, no
plano fático, econômico, técnico e jurídico, acabou por revelar que o mais forte
sempre atuava com o intuito de fazer prevalecer o seu interesse em detrimento da
parte mais fraca, ou seja, o fornecedor sempre prevalecia sobre o consumidor,
considerado a parte mais fraca da relação. Com a promulgação da Constituição
Federal em outubro de 1988, foi contemplada com o direito fundamental à proteção
do Estado, através de seus Poderes, que deve atuar de forma positiva na defesa
dos interesses e direitos da parte mais fraca da relação jurídica de consumo,
enunciando o artigo 5º, inciso XXXII entre os direitos e garantias fundamentais
determinando a criação de lei específica de proteção ao consumidor.
8
Considerando que o consumidor é o sujeito imprescindível na relação de
consumo e no intuito de dar proteção a essa relação é que, o Código de Defesa do
Consumidor focou toda a sua atenção e atuação protetiva e equilibradora dispostas
em seu artigo 4º, inciso I, onde leciona que:
Art. 4º - A Política Nacional das Relações de Consumo tem por
objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à
sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses
econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a
transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes
princípios:
Inciso I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no
mercado de consumo;
Este mesmo pensamento é seguido por Ada Pellegrini Grinover e Antônio
Herman de Vasconcelos e Benjamin, quando em comentários à legislação
consumerista codificada afirmam:
“A proteção ao consumidor é um desafio de nossa era e representa,
em todo o mundo, um dos temas mais atuais do Direito [...]. Se antes
fornecedor e consumidor encontravam-se em uma situação de relativo
equilíbrio de poder de barganha (até porque se conheciam), agora é o
fornecedor (fabricante, produtor, construtor, importador ou comerciante)
que, inegavelmente, assume a posição de força na relação de consumo e
que, por isso mesmo, “dita as regras”. E o direito não pode ficar alheio a tal
fenômeno. [...]. É com os olhos postos nesta vulnerabilidade do consumidor
que se funda a nova disciplina jurídica. Que enorme tarefa quando se sabe
que esta fragilidade é multifária, decorrendo ora da atuação dos monopólios
e oligopólios, ora da carência de informação sobre qualidade, preço, crédito
e outras características dos produtos e serviços. Não bastasse tal, o
consumidor ainda é cercado por uma publicidade crescente, não estando,
ademais, tão organizado quanto os fornecedores. Toda e qualquer
legislação de proteção ao consumidor tem, portanto, a mesma ratio, vale
dizer, reequilibrar a relação de consumo, seja reforçando, quando possível,
a posição do consumidor, seja proibindo ou limitando certas práticas de
mercado”5
5 BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcelos e GRINOVER, Ada Pelegrini ET. AL. Código..., cit., p. 7
9
Nessa mesma esteira, leciona JOSÉ AUGUSTO GARCIA DE SOUZA (28 p.
7) que, “O Código existe porque o consumidor é vulnerável, especialmente sob o
aspecto técnico a vulnerabilidade econômica geralmente acompanha a
vulnerabilidade técnica, mas não é essencial.
A vulnerabilidade do consumidor, segundo José Geraldo Brito Filomeno, em
(Filomeno, 2007, p. 147), está também entendida de que, enquanto o fornecedor de
um produto conhece todas as fases de sua fabricação, o consumidor as desconhece
e apenas espera que o produto que viu anunciado, seja do jeito que o viu e vai
desempenhar as atividades anunciadas, não causando nenhum dano à sua saúde, à
sua segurança e também econômico.6
Quando da elaboração do Código de Defesa do Consumidor, tem-se a
impressão de que, nossos legisladores levaram em consideração a falta de
informação da sociedade brasileira quanto a seus direitos e obrigações. Não porque
não querem se informar, mas sim, pela falta de programas governamentais voltados
à informação e até mesmo formação da sociedade no que tange aos seus direitos e
obrigações. Daí a necessidade de se agrupar em uma única lei, os direitos, as
obrigações e as sanções advindas da relação de consumo.
Quando se trata da relação de consumo entre fornecedor e consumidor e
essas relações são feitas dentro de uma mesma sociedade de fornecimento e
consumo, não há que se falar em vulnerabilidade, porque, a relação é feita entre
pessoas que estão em um mesmo patamar, ou seja, o fornecedor e o consumidor
são ao mesmo tempo, um e outro.
Quando se trata de relação de consumo, entre consumidor pessoa física ou
jurídica e grandes empresas, principalmente no seguimento da prestação de
serviços, tais como, as empresas de telefonia e as instituições financeiras, é que se
vê a falta de poder de negociação do consumidor frente ao poder econômico, pois,
as empresas visam pura e simplesmente a obtenção de vantagens pecuniárias
frente aos contratos de adesão que, na maioria das vezes vêm eivados de cláusulas
abusivas, deixando o consumidor em situação de total desvantagem quanto aos
seus direitos de questionamento sobre tais cláusulas, vez que, quando da
celebração de tais contratos, o consumidor se encontra em situação de necessidade
6 Curso Fundamental de Direito do Consumidor/José Geraldo Brito Filomeno. – São Paulo: Atlas, 2007.
10
momentânea e às vezes, premente para solução de determinado problema que lhe
aflige.
Vemos em uma transação bancária, onde, o cliente, pessoa física ou jurídica,
necessita contrair empréstimo de determinado valor para satisfação de necessidade
imediata para aquisição de um bem ou até mesmo para satisfação de uma
obrigação já estabelecida, é exigido do cliente todas as garantias possíveis e até
mesmo algumas que estão além de suas possibilidades para que tal contrato seja
concluído, enquanto que, o cliente, não tem nenhuma opção de exigir ou de
demonstrar que está naquele momento, sendo coagido a prestar garantia sob pena
de não se estabelecer a relação de consumo, explicitando aí, a vunerabilidade do
consumidor.
1.5 - O PORQUÊ DA INSERÇÃO DE CLÁUSULAS PENAIS NO CDC.
O Código de Defesa do Consumidor veio para amparar o consumidor e
procurar amenizar a vulnerabilidade existente na relação de consumo, inserindo em
seu texto sanções penais impostas às pessoas prestadoras de serviços e aos
administradores de empresas que causarem algum tipo de dano ao consumidor,
dando-se a impressão de que o intuito não é propriamente a punição e sim a
segurança jurídica da qual, até então não existia em nosso ordenamento jurídico
direcionado especificamente para as relações de consumo, pois, as sanções de que
falamos seriam aplicadas na violação de qualquer direito descrito em seu artigo 6º
onde, descreve com rara perfeição inserida em uma lei, os direitos básicos do
consumidor.
Com a leitura do artigo 61 do Código de Defesa do Consumidor, podemos
concluir que as sanções penais dispostas no Código de Defesa do Consumidor só
serão aplicadas quando não houver previsão.
O artigo 63 do Código de Defesa do Consumidor fica totalmente inaplicável na
medida em que descreve que a omissão de dizeres ou sinais ostensivos sobre a
nocividade ou periculosidade de produtos, embalagens, invólucros, recipientes ou
publicidade, impõe uma pena que varia de seis meses a dois anos e multa, definindo
11
que, basta a omissão para que haja o crime e a punição, mas, se o perigo é omitido,
o consumidor fatalmente só saberá do perigo ao qual está exposto, quando do
acontecimento do dano material ou moral em razão da falta, dos dizeres ali exigidos,
ou seja, a falta das informações servirão apenas como prova da irregularidade, vez
que, o Código Penal em seu Título VIII, que versa sobre os Crimes Contra a
Incolumidade Pública, determinando penas mais severas àqueles que praticarem
tais crimes, a preferência pela vítima na busca de punição ao autor do fato, ou seja,
o fabricante, o vendedor, ou mesmo o prestador do serviço defeituoso, será sempre
o Código Penal, por ter a possibilidade de uma punição mais severa, deixando
portanto de aplicar o artigo 63 da Lei 8.078/90, definida como Código de Defesa do
Consumidor.
1.6 - A QUEM APLICAR A PENA.
Quando falamos em crime contra o consumidor nas relações de consumo,
fica caracterizado mais como responsabilidade civil, pois, os prejuízos causados à
vítima, é quase sempre material ou moral, e o infrator fica sempre com a
responsabilidade de reparar o dano causado, em valores financeiros e nunca com o
cumprimento de pena restritiva de direito ou de liberdade.
Atribui-se à responsabilidade civil uma função essencialmente reparadora,
admite para o instituto também uma função secundária, que seria justamente a
punitiva. Esta função estaria presente na perda de patrimônio que é imposta ao
lesante em favor do lesado. Ao perder patrimônio para satisfazer a reparação do
dano injustamente causado ao lesado evidente que o causador da lesão se
empobrece. Este empobrecimento parece-me constituir-se claramente numa
sanção, uma pena mesmo. (Khouri, 3ª ed. – 2006, p. 150).
O artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor preceitua que:
“Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou
estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de
produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação,
distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”.
12
Na definição de fornecedor dada pelo artigo 3º do Código de Defesa do
Consumidor, entende-se que todos aqueles que de certa forma contribui para a
colocação do produto ou serviço no mercado de consumo, acaba sendo definido
como fornecedor, ou seja, o fornecedor de matéria prima para confecção de
determinado produto, o fornecedor de mão de obra para obtenção do produto final, o
intermediário que leva este produto até o ponto de consumo e finalmente o
responsável pelo repasse de tal produto ao consumidor final. Ensina Sérgio Cavalieri
Filho em sua obra sobre Programa de Responsabilidade Civil, que:
“O comerciante pode ser responsabilizado em via secundária
quando, o fabricante, o construtor, o produtor ou importador não puderem
ser identificados; o produto for fornecido sem identificação clara do seu
fabricante, produtor, construtor ou importador ou – hipótese mais comum –
quando o comerciante não conservar adequadamente os produtos
perecíveis”.7
1.7 - DA RESPONSABILIDADE PELA REPARAÇÃO DO DANO.
Ensina Flávia Viveiros de Castro em sua obra sobre Danos à Pessoa nas
Relações de Consumo (Castro, Flávia Viveiros, 2006, p. 91) que,
O Código de Defesa do Consumidor, como estatuto das relações de mercado construído sob a ótica protetora do hipossuficiente, traduz um programa de atuação para o Estado e para os agentes econômicos em que a axiologia constitucional tem papel fundamental, sendo certo que toda aplicação deste direito será efetivada a partir da determinação protetora da Lei Maior, inclusive no que diz respeito à responsabilidade civil, o que não permite uma leitura restritiva deste instituto.8
7 Cavalieri Filho, Sérgio. (2009). Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas.
8Castro, F.V. (2006), Danos à pessoa nas Relações de Consumo, Rio de Janeiro: Lumen Juris.
13
Há o entendimento de que a pena a ser aplicada, cabe ao infrator, ao
causador do dano, àquele que efetivamente contribuiu para que houvesse o crime,
mas, quando a ação parte de um empregado de determinada empresa, esse
empregado naquele momento, é a empresa, portanto a responsabilidade de
reparação do dano é da empresa, ou seja, dos administradores ou sócios que
efetivamente na esfera jurídica, respondem pela empresa.
O gerente de uma determinada empresa que assina um contrato em nome da
empresa a qual é subordinado, em caso de descumprimento deste contrato, o
gerente será meramente mencionado como o representante da empresa que firmou
tal contrato e nunca o responsável pelo efetivo cumprimento, ficando a cargo da
empresa dar prosseguimento à responsabilidade assumida, mesmo que aquele
gerente, não faça mais parte do rol de empregados daquela empresa.
Se, ao proceder a empresa, na infringência de qualquer cláusula contratual,
ou até mesmo, deixar de dar prosseguimento a uma prestação já iniciada e vier a
causar dano ao consumidor, a empresa responderá independentemente de quem é
a culpa, se é do empregado que presta serviços em nome da empresa ou de outra
pessoa designada pela empresa numa possível terceirização.
O dano material ou moral, causado ao consumidor na relação de consumo,
obrigatoriamente terá que ser reparado pelo causador do dano, mas, perante a
justiça, a pessoa que sofreu o dano terá que provar que aquele dano realmente
adveio daquela relação, ou seja, a prova do dano material fica mais fácil para se
provar, já o dano moral, a doutrina ainda não conseguiu chegar a um raciocínio de
pacificação em face do que seria o dano moral e a sua extensão para a justa
reparação.9
9 Castro, Flávia Viveiros, (2006), Danos à pessoa nas relações de consumo, Lumen Juris, Rio de Janeiro.
14
Capítulo 2
INCOMPATIBILIDADE E CONTRADIÇÕES DAS SANÇÕES PENAIS DO CDC
2.1 O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E OUTRAS NORMAS
Encontram-se, as normas processuais infraconstitucionais o fundamento
necessário na Constituição Federal de 1988 e passam a integrar o extenso rol de
garantias à cidadania e à pessoa, tornando-se protegidas de tentativas de
modificação de acordo com conveniências políticas de caráter autoritário ou
eventual. Também a Constituição rígida consagra normas que disciplinam uma face
relativamente recente de antiga função estatal, ou seja, a jurisdição constitucional.
Seguindo esse entendimento de que as pessoas necessitam de amparo e
proteção diante de suas ações em seu cotidiano, nossos legisladores há muito vêm
se preocupando em dar proteção e consequentemente punição àqueles que de certa
forma venham a prejudicar seus semelhantes em qualquer tipo de relação, seja ela,
cível, criminal, trabalhista, tributária, econômica e agora mais recente a relação de
consumo.
Quando falamos em incompatibilidades de aplicação de alguns artigos
inseridos em uma determinada norma, não estamos de forma alguma pretendendo
deixar a impressão de que toda a norma é incompatível com a realidade, vez que,
ao inserir as sanções penais no Código de Defesa do Consumidor, temos a
impressão de que nossos legisladores quiseram dar complementação à norma de
forma que, não pairasse nenhuma dúvida quanto à responsabilidade do fornecedor
na relação de consumo estabelecida entre ele e aquele e denominando como
crimes, algumas condutas do fornecedor em relação ao consumidor, seja por
produtos ou serviços defeituosos.
Como bem ensina José Geraldo, (Filomeno, José Geraldo Brito, 2007, cap. 6,
p. 76), o autor trata da tutela penal do consumidor, fazendo uma análise comparativa
das sanções penais do Código de Defesa do Consumidor com outras legislações
codificadas e especiais, onde o define como um microsistema jurídico interdisciplinar
15
e que estabelece uma convivência pacífica com as outras legislações, ou seja, as
cláusulas penais do Código de Defesa do Consumidor são de mera formalidade,
deixando que os crimes, diretos ou indiretos nas relações de consumo sejam
tratados pelas legislações especiais e o Código Penal.10
Em artigo publicado em sitio da internet, Marcela Blumatti Matos, (Matos,
2006), fala com muita propriedade sobre a inaplicabilidade das sanções penais
insertas no Código de Defesa do Consumidor que, entendido como sendo um
microssistema jurídico que tem como prisma fundamental a vulnerabilidade do
consumidor, o CDC é orientado por princípios rigorosíssimos na defesa do
hipossuficiente econômico, princípios estes, que acabam por vetorizar o conteúdo
das normas penais insertas no mesmo.
Ainda nessa mesma esteira, Marcela Blumatti, vai ainda mais longe quando
coloca em seu magnífico artigo, que os nossos legisladores não tiveram a
preocupação de pormenorizar a equidade entre suas sanções penais com outras
legislações penais já inseridas em nosso ordenamento jurídico, onde diz que:
O CDC não é um remédio pretensamente eficaz para todos os males que afligem as relações de consumo. Ocorre que, na ânsia por proteger o consumidor frente às práticas abusivas e criminosas dos fornecedores, bem como, na tentativa de, a todo custo, reequilibrar as relações permeadas pelo consumo, a expansão das normas penais nesse microssistema ocorreu de maneira desordenada. Fato é que a expansão das normas penais no CDC não observou a unicidade do Sistema Jurídico, pois o que houve foi uma crescente criminalização de condutas sem a preocupação com a compatibilidade dos tipos penais aos princípios penais, e, é mister que se diga que essa falta de sistematização dos dispositivos penais no microssistema em comento, viola princípios e garantias penais fundamentais do Direito Penal Clássico, originando problemas como conflito de normas e princípios, superposição de tipos, desproporcionalidades, dificuldades interpretativas e até mesmo de aplicação dessas normas. 11
2.2 DA RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR PELO FATO DO PRODUTO
No entendimento de Sérgio Cavalieri Filho, a sistemática do Código de
Defesa do Consumidor divide a responsabilidade do fornecedor em responsabilidade
10 Curso Fundamental de Direito do Consumidor/José Geraldo Brito Filomeno. – São Paulo: Atlas, 2007.
11 Matos, M. B. (05 de setembro de 2006). WWW.direitonet.com.br/artigos. Acesso em 07 de outubro de 2009,
disponível em WWW.direitonet.com.br
16
pelo fato do produto e do serviço e responsabilidade por vício do produto e do
serviço. Da primeira tratam os artigos 12 a 14; e da segunda, os artigos 18 a 20,
(Cavalieri Filho, Sérgio, 2009, p. 476). Para que entendamos o que o autor quer
dizer, vamos à análise dos referidos artigos.12
O artigo 12 do CDC dispõe que: O fabricante, o produtor, o construtor,
nacional ou estrangeiro, e o importador, respondem independentemente da
existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por
defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas,
manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por
informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
§ 1° O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele
legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes,
entre as quais:
I - sua apresentação;
II - o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam;
III - a época em que foi colocado em circulação.
§ 2º O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor
qualidade ter sido colocado no mercado.
§ 3° O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será
responsabilizado quando provar:
I - que não colocou o produto no mercado;
II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;
III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
Nossos legisladores deixaram bem claro neste artigo, a existência de um
leque de opções para que o consumidor busque junto à cadeia de fornecimento a
reparação do dano sofrido provocado por um produto adquirido, mas, deixou fora
deste contexto aquele ao qual o consumidor contrata, ou seja, o varejista, que, é
aquele que realmente oferece o produto e estabelece diretamente com o consumidor
a relação de consumo, também, por outro lado, dá margem para defesa àquele que
participou da cadeia para a colocação do produto no mercado, mas, não concorreu
para a ocorrência do dano, ou seja, fixando a responsabilidade naquele que
realmente concorreu para a existência do dano.
12
Cavalieri Filho, Sérgio. (2009). Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas.
17
Na interpretação de Antônio Herman Vasconcellos e Benjamin em,
(Vasconcelllos, 1991, p. 55), deveriam ser responsabilizados todos aqueles agentes
econômicos envolvidos com a produção e comercialização de um determinado
produto pela sua garantia de segurança.13
A tutela penal do consumidor não visa somente ampará-lo dos riscos aos
quais está exposto em razão de defeitos de produtos, visa também ampará-lo no
tocante à responsabilização do fornecedor na reparação do dano causado,
independente de culpa, ou seja, a busca pela reparação do dano engloba toda a
cadeia de fornecimento, quando diz, o fabricante, o produtor, o construtor, nacional
ou estrangeiro, e o importador, deixando como já dito anteriormente, excluído o
vendedor.
A busca do consumidor pela reparação do dano causado, não é tão fácil
assim, é preciso que fique bem claro que o dano causado é realmente proveniente
do defeito do produto ou serviço e não porque foi colocado no mercado outro
produto com tecnologia mais avançada, como ensina muito bem João Marcello de
Araújo Júnior, (Júnior, João Marcello de Araújo, 1992), em Comentários ao Código
do Consumidor:
Para ensejar a responsabilidade é preciso que o produto seja considerado defeituoso, isto é, quando não ofereça a segurança que dele se espera, seja com relação ao uso previsto, quanto àqueles previsíveis. Para tanto serão levadas em consideração: aparência do produto; os usos e riscos razoavelmente esperados, quais sejam, aqueles decorrentes de sua natureza e fruição; a época em que foi colocado no mercado. Cumpre destacar, que o aparecimento de novo produto que incorpore melhor tecnologia, ou simplesmente, seja de melhor qualidade, não importará em reconhecer-se como defeituoso, o produto anteriormente lançado no mercado de consumo.14
13
Vasconcellos, A.H. (1991) Comentários ao Código de Proteção ao Consumidor. São Paulo: Saraiva. 14
Júnior, João Marcello de Araújo, (1992), Comentários ao Código do Consumidor. Rio de Janeiro: Forense
18
2.3 DA SUBSIDIARIEDADE DA RESPONSABILIDADE
Disposta no artigo 13 do Código de Defesa do Consumidor a
responsabilidade subsidiária do comerciante na relação de consumo, foi bastante
providencial, ao sabermos que, o consumidor na busca de alguma reparação de
danos causados por algum tipo de produto ou serviço, terá maior acessibilidade
àquele com quem contrata, deixando em seu parágrafo único o direito de regresso
daquele que realmente é o responsável pelo dano.
O artigo 13 do Código de Defesa do Consumidor leciona que “O comerciante
é igualmente responsável, nos termos do artigo anterior quando: I – o fabricante, o
construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados; II – o produto
for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou
importador; III – não conservar adequadamente os produtos perecíveis; e em seu
parágrafo único, dá a oportunidade ao que repara o dano o direito de regresso
dispondo que: Aquele que efetivar o pagamento ao prejudicado poderá exercer o
direito de regresso contra os demais responsáveis, segundo sua participação na
causação do evento danoso.
Na leitura e interpretação do artigo 13, chega-se à conclusão que, o motivo da
não inserção do comerciante na cadeia de responsabilidade pelo fato de defeito do
produto ou do serviço, disposta no artigo anterior, é porque os responsáveis pelo
fato do defeito do produto ou do serviço, são aqueles que, fabricam, produzem,
constroem ou importam, ou seja, aqueles que conhecem a cadeia de produção ou
importação de tal produto ou serviço.
Ao deixar o comerciante fora da cadeia de responsáveis disposta no artigo 12,
fez-se necessária a disposição em um artigo separado versando sobre a
responsabilidade subsidiária do comerciante, vez que, mesmo não conhecendo a
cadeia de produção ou importação de tal produto ou serviço, o comerciante é aquele
que escolhe os produtos a serem comercializados em seu estabelecimento
comercial e também aquele que efetivamente coloca o produto ou serviço no
mercado, estabelecendo diretamente a relação entre fornecedor e consumidor.
19
Como bem ressalta Sérgio Cavalieri em (Cavalieri Filho, Sérgio, 2009, p. 483),
a inclusão do comerciante como responsável subsidiário foi para favorecer e reforçar
a posição do consumidor, não para enfraquecê-la, posição esta que deixa bem claro
que a inclusão do comerciante não exclui o fornecedor, ou seja, só vem a aumentar
a cadeia de fornecimento e portanto de responsáveis pelo fato do produto ou
serviço.15
Em entendimento contrário à responsabilização subsidiária do comerciante ou
distribuidor, João Marcello de Araújo Júnior, em (Júnior, João Marcello de Araújo,
1992, p. 67), entende que o comerciante só poderá ser responsabilizado nos casos
em que o fabricante, produtor, construtor ou importador não for identificado ou essa
identificação não for clara, ou, ainda, quando o defeito for consequente de culpa do
comerciante por má conservação do produto, no caso de produto perecível.
Já no entendimento de Hermen de Vasconcellos e Benjamin, em
(Vasconcelllos, 1991, p. 71), defende que, na percepção do consumidor, o
responsável pelo dano que sofreu é o comerciante, o sujeito com qual o contratou, e
vai mais longe quando elogia com bastante veemência a observação de Antônio
Nicácio, emérito diretor da Divisão de Estudos Juridicos da Federação do Comércio
de São Paulo no sentido de que, “na verdade, quem entra mesmo em contato direto
com o consumidor é o comerciante e, evidentemente, a primeira visão que o
consumidor tem é que alguém, se o lesou, foi aquele que lhe vendeu diretamente o
produto”.
Seguindo o mesmo entendimento de que o comerciante é responsável
subsidiário por ser ele o responsável pelo produto que coloca à venda em seu
estabelecimento, Paulo R. Roque A. Khouri, em (Khouri, Paulo Roberto Roque
Antônio, 2006, p. 168), define que, tal dispositivo obriga que o comerciante seja
cauteloso na comercialização de seus produtos, evitando expor o consumidor a risco
demasiado de produtos, que nem sequer têm identificação do fabricante, ou que, por
serem produtos perecíveis, não são conservados adequadamente.
15
Cavalieri Filho, Sérgio. (2009). Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas.
20
2.4 DA RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR PELO FATO DO SERVIÇO
Por ser o fornecimento de serviços um tanto diferenciado do fornecimento de
produtos, vez que, no fornecimento de produtos temos a entrega de coisa, a qual,
com uma simples inspeção poderá ser detectado determinados defeitos e se for o
caso a devolução da mesma ao fornecedor, já no fornecimento de serviços não há
essa mesma facilidade, em razão de os serviços serem prestados de forma, às
vezes, continuada e o defeito de sua prestação só ser detectado após algum tem de
sua efetiva realização, motivo este, que levou nossos legisladores a dedicarem o
artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor exclusivamente para regular tal
relação.
O artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor leciona que: “O fornecedor
de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação
dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos
serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua
fruição”, § 1º O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o
consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias
relevantes, entre as quais: I – o modo de seu fornecimento; II – o resultado e os
riscos que razoavelmente dele se esperam; III – a época em que foi fornecido. § 2º
O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas. § 3º O
fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I – que, tendo
prestado o serviço, o defeito inexiste; II – a culpa exclusiva do consumidor ou de
terceiro. § 4º A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada
mediante a verificação de culpa.
Na leitura do caput do artigo 14, fica batante evidenciado que o legislador
mencionou o fornecedor e não especificando os fornecedores, como no artigo 12, ou
seja, entende-se que no fornecimento de serviços, todas as pessoas envolvidas na
prestação daquele serviço equiparam-se apenas a um fornecedor, deixando a
entender que a responsabilidade pela má prestação do serviço, independe de culpa
21
de um ou de outro profissional envolvidos na prestação de tal serviço, todos
respondem solidariamente.
Este entendimento é seguido pela maioria dos doutrinadores, até porque, na
relação de consumo de serviços, quando não são prestados por grandes
conglomerados empresariais, as partes contratantes, tratam pessoalmente, como
bem acentua Sérgio Cavalieri Filho, em (Cavalieri Filho, Sérgio, 2009, p. 484) que, a
principal diferença entre o artigo 12 e o artigo 14 do Código de Defesa do
Consumidor está na designação dos agentes responsáveis, o artigo 12 versa sobre
o fato do produto, enquanto que, o artigo 14 fala apenas em fornecedor.16
Também, versando sobre a responsabilidade solidária na relação entre
consumidor e fornecedor na relação de consumo, Hermen de Vasconcellos e
Benjamin, em (Vasconcelllos, 1991, p. 78), seguem no mesmo entendimento
dizendo que:
Ao contrário do que sucede no art. 12, o Código, no art. 14, não fragmenta a responsabilidade, colocando de um lado o comerciante (distribuidor ou varejista), e do outro o fabricante, o produtor, o construtor e o importador. Fala-se apenas em “fornecedor”, gênero que inclui todos os partícipes da cadeia de produção e distribuição. Tal ocorreu porque, via de regra, o fornecedor do serviço é o próprio prestador, aquele, pessoa física ou jurídica, que entrega a prestação. É certo que os serviços podem ser prestados através da contratação de terceiros. Nestecaso todos são responsáveis objetivamente pelso acidentes de consumo causados pelo serviço prestado.17
E para encerrarmos a argumentação sobre a responsabilidade solidária dos
prestadores de serviços envolvidos em eventual dano causado pelo serviço
prestado, destacamos os comentários de João Marcello de Araújo Júnior, em
(Júnior, João Marcello de Araújo, 1992, p. 69), onde afirma que o Código de Defesa
do Consumidor rompeu com a tradição civilística fazendo recair a responsabilidade
sobre pessoas diversas daquelas envolvidas no contrato. Para estabelecer
congruência, o âmbito do extremo oposto, também, foi ampliado.18
16
Cavalieri Filho, Sérgio. (2009). Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas. 17
Vasconcellos, A.H. (1991) Comentários ao Código de Proteção ao Consumidor. São Paulo: Saraiva. 18
Júnior, João Marcello de Araújo, (1992), Comentários ao Código do Consumidor. Rio de Janeiro: Forense
22
2.5 DA RESPONSABILIDADE POR VÍCIO DO PRODUTO OU DO SERVIÇO
Como já definido que o defeito do produto ou do serviço é constatado quando,
ao utilizá-lo, o consumidor descobre que o mesmo não oferece a segurança que
dele se espera e que a presença do defeito poderá a vir causar danos, materiais ou
morais ao consumidor que o utiliza, no entendimento de Sérgio Cavalieri Filho, em
(Cavalieri Filho, Sérgio, 2009, p. 497), o vício é defeito menos grave, circunscrito ao
produto ou serviço, que apenas causa o seu mau funcionamento, como a televisão
que não funciona ou que não produz boa imagem ou a geladeira que não gela e
etc.19
Apesar de ser matéria já codificada no artigo 441 do novo Código Civil que
versa sobre os vícios redibitórios nas relações contratuais, definindo que: A coisa
recebida em virtude de contrato comutativo pode ser enjeitada por vícios ou defeitos
ocultos, que a tornem imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam o valor,
não mencionando sobre serviços, o Código de Defesa do Consumidor foi mais
abrangente ao trazer em sua seção III a responsabilidade do fornecedor por vício
aparente e não só oculto do produto ou do serviço.
No entendimento de Paulo R. Roque A. Khouri, em (Khouri, Paulo Roberto
Roque Antônio, 2006, p. 186), quando a própria seção III e o texto do artigo 18 fala
apenas em responsabilidade, entende-se que o legislador não está se referindo
neste caso à responsabilidade civil propriamente dita, porque nesta, envolve sempre
a idéia de violação de um direito e consequentemente a reparação de todo o
prejuízo experimentado, enquanto que naquela, o fornecedor tem apenas a
obrigação da garantia.20
E, para que, seja efetivada esta garantia e o fornecedor possa ser
responsabilizado pelo vício do produto, temos no artigo 18 do Código de Defesa do
Consumidor que: Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não
duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os
tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam
o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações
19
Cavalieri Filho, Sérgio. (2009). Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas. 20
Khouri, Paulo Roberto Roque Antônio (2006). Direito do Consumidor: contratos, responsabilidade civil e
defesa do consumidor em juízo – 3ª Ed. São Paulo: Atlas.
23
constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária,
respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir
a substituição das partes viciadas. § 1º não sendo o vício sanado no prazo máximo
de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: I – a
substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;
II – a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo
de eventuais perdas e danos; III – o abatimento proporcional do preço. § 2º Poderão
as partes convencionar a redução ou ampliação do prazo previsto no parágrafo
anterior, não podendo ser inferior a sete nem superior a cento e oitenta dias. Nos
contratos de adesão, a cláusula de prazo deverá ser convencionada em separado,
por meio de manifestação expressa do consumidor. § 3º O consumidor poderá fazer
uso imediato das alternativas do § 1º deste artigo sempre que, em razão da
extensão do vício, a substituição das partes viciadas puder comprometer a qualidade
ou características do produto, diminuir-lhe o valor ou se tratar de produto essencial.
§ 4º tendo o consumidor optado pela alternativa do inciso I do § 1º deste artigo, e
não sendo possível a substituição do bem, poderá haver substituição por outro de
espécie, marca ou modelo diversos, mediante complementação ou restituição de
eventual diferença de preço, sem prejuízo do disposto nos incisos II e III do § 1º
deste artigo. § 5º No caso de fornecimento de produtos in natura, será responsável
perante o consumidor o fornecedor imediato, exceto quando identificado claramente
seu produtor. § 6º São impróprios ao uso e consumo: I – os produtos cujos prazos
de validade estejam vencidos; II – os produtos deteriorados, alterados, adulterados,
avariados, falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde,
perigosos ou, ainda, aqueles em desacordo com as normas regulamentares de
fabricação, distribuição ou apresentação; III – os produtos que, por qualquer motivo
se revelem inadequados ao fim a que se destinam.
Ainda, no entendimento de que o vício do produto ou do serviço não causa
danos materiais ou morais ao consumidor, vez que, a responsabilidade do
fornecedor é apenas no sentido de dar garantia de funcionamento do produto ou do
serviço, não existe a obrigação de indenização, e sim de reparação do produto ou do
serviço, com a substituição ou a devolução dos valores pagos apenas corrigidos
monetariamente, ainda, sobre responsabilidade, Paulo R. Roque A Khouri, em sua
obra sobre responsabilidade civil no Código de Defesa do Consumidor, (Khouri,
Paulo Roberto Roque Antônio, 2006, p. 186), leciona que: Embora o vício redibitório
24
propriamente dito seja apenas o defeito oculto e o CDC proteja o consumidor tanto
contra o vício oculto como contra o visível, o aparente, não há dúvida de que o
Código Civil e Código de Defesa do Consumidor tratam de institutos semelhantes.
Para finalização deste capítulo, na certeza de que não há previsão de crimes
no Código de Defesa do Consumidor, e sim de responsabilidade, objetiva ou não, o
autor, buscou na obra de um dos mais respeitados doutrinadores no seguimento do
Direito Civil, o festejado autor Sílvio de Salvo Venosa em (Venosa, 2006, p. 472), a
definição mais completa de responsabilidade, que é:
O marco inicial do exame da responsabilidade é, portanto, a apreciação de um dever violado. Entendemos por dever o ato ou a abstenção que devem ser observados pelo homem diligente, vigilante e prudente. Como mesmo os homens diligentes incidem com frequência em transgressão a deveres legais, morais e contratuais, surge a necessidade de conceituação e exame do dever de indenizar. Exclui-se, em princípio, do Direito, a transgressão a um dever exclusivamente moral.21
21
Venosa, Sílvio de Salvo (2006). Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos, São Paulo: Atlas
25
Capítulo 3
DAS SANÇÕES PENAIS IMPOSTAS PELO CÓDIGO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR
3.1 DA INSERÇÃO DAS PENAS NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
Na ânsia de dar proteção total aos consumidores no tocante a seus direitos
nas relações de consumo, nossos legisladores acabaram por cometer alguns
excessos no que diz respeito aos crimes nas relações de consumo, ou seja, as
condutas definidas pelo Código de Defesa do Consumidor.
Foram inseridas no Código de Defesa do Consumidor, pelos artigos 61 a 80,
sanções penais ao fornecedor que vier a causar algum tipo de dano ao consumidor
nas relações de consumo, dos quais, não condiz com as disposições vistas no
capítulo anterior, onde, todas as infrações mencionadas pelo Código de Defesa do
Consumidor, são mencionadas como, responsabilidade objetiva ou subjetiva sem
mencionar crime, ou seja, as sanções penais, as quais, passemos a estudá-las e
interpretá-las de forma bastante sucinta e lógica, perdem a razão de ser, vez que,
não há, no entendimento do autor, crime nas relações de consumo e sim
responsabilidade daquele que causa o dano, o qual pode ser reparado com a
substituição do produto ou do serviço ou pecuniariamente.
Sobre a inaplicabilidade das sanções penais dispostas no Código de Defesa
do Consumidor, José Augusto Peres Filho, em (Filho, 2009, p. 347), está em que,
muitos dos crimes cometidos contra o consumidor são crimes de mera conduta, ou
seja, não exigem um resultado danoso resultante de sua prática, indo ainda mais
longe quando diz que, há uma grande necessidade de capacitação das pessoas e
dos profissionais que lidam com tais crimes, sendo que neste seguimento estão, os
Magistrados, o Ministério Público, delegados e agentes de polícia, os quais não
recebem informações adequadas para compreensão e combate desses crimes.22
22
Filho, J. A (2009). Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, São Paulo: Verbatim
26
Seguindo o mesmo sentido de entendimento, José Geraldo Brito Filomeno,
um dos colaboradores na elaboração do Código de Defesa do Consumidor, em
(Filomeno, 2007, p. 143), revela que, a grande falta de incidência de crimes contra o
consumidor, nas estatísiticas, se dá em razão da falta de sincronia entre o trabalho
das promotorias de Justiça Cíveis do Consumidor e as Promotorias Criminais.
3.2 DA TIPIFICAÇÃO AOS CRIMES DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
O artigo 61 do Código de Defesa do Consumidor, abrindo o título II, que versa
sobre as infrações penais cometidas pelo fornecedor a seu consumidor nas relações
de consumo, dispõe que: “Constituem crimes contra as relações de consumo
previstas neste Código, sem prejuízo do disposto no Código Penal e leis especiais,
as condutas tipificadas nos artigos seguintes”.
Apesar de tal dispositivo dizer que, a aplicação das penas previstas neste
Código não cause nenhum prejuízo ao disposto no Código Penal e leis especiais,
aplica-se o princípio da especialidade, ou seja, prevalecerá sempre o disposto neste
Código, o que acaba não acontecendo em razão da falta de conhecimento da
maioria dos consumidores, no que se configura crime ou apenas dano, o que os leva
a buscar a reparação civil em sede de Juizados Especiais Cíveis.
Na obra de James Eduardo Oliveira, (Oliveira, 2009, p. 628), o autor, fazendo
citação à autora Eliana Passarelli, em sua obra (Dos crimes contra as relações de
consumo, Saraiva, 2002, p. 45), onde a autora leciona que “A inclusão do dispositivo
supratranscrito é absolutamente desnecessária”, afirmação feita em razão do
disposto no artigo 12 do Código Penal, que trata do princípio da especialidade no
âmbito repressivo, acena com a possibilidade de aplicação das normas constantes
de sua Parte Geral aos fatos incriminados por lei especial, desde que esta não
disponha de modo diverso, entende que, bastaria o legislador silenciar acerca da
matéria para atingir a meta pretendida.
Diante do enunciado no artigo 61 de que a aplicação das sanções penais do
Código de Defesa do Consumidor não exclui as tipificadas no Código Penal e leis
especiais, José Geraldo Brito Filomeno, em (Filomeno, 2007, p. 142), conclui que:
27
A tutela do consumidor não se resume aos delitos tratados no Código de Defesa do Consumidor, até pelo enunciado de seu art. 61, ao estatuir, claramente, que os tipos penais criados pelo legislador, no caso, não excluem outros já existentes, quer na legislação penal ordinária, quer na legislação penal especial.23
Concluímos então que, em razão da dificuldade imposta pelo costume da
sociedade, para entender como crime, uma conduta de violação ao Código de
Defesa do Consumidor por parte de determinado fornecedor, o consumidor aceita de
forma passiva e até de concordância, a explicação do fornecedor, de que houve um
erro e não um crime, ao ser encontrado em determinado produto com valor diferente
do que foi cobrado, o que é muito comum isto acontecer no interior de um
supermercado. Como bem ensina José Augusto Peres Filho, em (Filho, 2009, p.
345), onde resume que, existe um certo descompasso entre os ditames da lei e os
hábitos social e culturalmente enraizados, o que implica em uma imperfeita
aplicação da lei penal em defesa dos consumidores.
3.3 DOS CRIMES POR OMISSÃO
O artigo 63 da Lei 8.078/90 dispõe que: Omitir dizeres ou sinais ostensivos
sobre a nocividade ou periculosidade de produtos, nas embalagens, nos invólucros,
recipientes ou publicidade: Pena – detenção de seis meses a dois anos.
§ 1º Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de alertar, mediante
recomendações escritas ostensivas, sobre a periculosidade do serviço a ser
prestado.
§ 2º Se o crime é culposo: Pena – Detenção de um a seis meses.
Ao inserir penalidades aos fornecedores por omissão de informação sobre a
periculosidade e nocividade nos rótulos dos produtos e serviços no Código de
Defesa do Consumidor, fica a impressão de que nossos legisladores quiseram
apenas fazer com que os fornecedores cumprissem o que dispõem os artigos
obrigacionais com referência à qualidade e segurança dos produtos e serviços, pois,
23
Filomeno, J. G. (2007). Curso Fundamental de Direito do Consumidor, São Paulo: Atlas.
28
o artigo 63 da lei em discussão, ficou mais parecido como sendo uma lei penal em
branco, a qual necessita de outra para complementá-la.
Em sentido contrário ao entendimento do autor de que o artigo 63 é tido como
norma penal em branco, James Eduardo Oliveira, em (Oliveira, 2009, p. 631),
citando Wilson Lavorenti, entende que, não há que se falar em normapenal em
branco, vez que:
Ao contrário do que sustenta parte da doutrina, não se trata de norma penal em branco, no sentido da exigência de ato administrativo para definir produtos perigosos, nível de periculosidade ou qualquer outra circunstância. Cabe ao Juiz, que pode até recorrer a alguns parâmetros adminsitrativos, definir se o produto oferece ou não riscos aos consumidores.24
Na análise jurídica do dispositivo em questão, Paulo José da Costa JR, em
(JR., 1991, p. 221) ensina que, embora o tipo penal não diga expressamente qual o
bem a ser lesado ou posto em perigo em razão da nocividade ou periculosidade do
produto, depreende-se ser a vida ou a saúde, entendimento este, seguido por René
Ariel Dotti, em (Dotti, 1992, p. 235), onde que a objetividade jurídica deflui dos textos
consitucionais e legais que asseguram a proteção e a defesa do consumidor,
tutelando especificamente a vida e a saúde.
E, se entendermos de que o bem a ser tutelado é a vida ou a saúde, está
disposto no título VIII, capítulo III do nosso Código Penal que versa sobre os crimes
contra a saúde pública, em seu artigo 272, onde diz que: corromper, adulterar,
falsificar ou alterar substância ou produto alimentício destinado a consumo,
tornando-o nocivo à saúde ou reduzindo-lhe o valor nutritivo: Pena – Reclusão de
quatro a oito anos.
Também o artigo 278 do Código Penal dispõe que: Fabricar, vender, expor à
venda, ter em depósito para vender ou, de qualquer forma, entregar a consumo
coisa ou substância nociva à saúde, ainda que não destinada à alimentação ou a fim
medicinal: Pena – detenção, de um a três anos.
Como exposto acima, o Código Penal, reprime com muito mais rigor, as
pessoas que venham a infringir o disposto no artigo 63 do CDC, ou seja, enquanto a
pena para o crime tipificado no artigo 63, quando cometido na modalidade culposa, a
pena, que é de detenção, poderá chegar no máximo a seis meses, aplicando-se o
disposto no artigo 278 do Código Penal, a pena de detenção poderá chegar a até
um ano, o que leva o consumidor vitimado por tal crime, procurar na esfera judicial
24
Oliveira, J. E. (2009), Código de Defesa do Consumidor, anotado e comentado. São Paulo: Atlas
29
penal a aplicação do dispositivo do Código Penal e nunca o do Código de Defesa do
Consumidor.
O artigo 7º da Lei 8.137/90, denominada lei de crimes contra a ordem
tributária, econômica e relações de consumo, em seu parágrafo único, enquadra na
modalidade culposa, os crimes considerados pelo artigo 63 do Código de Defesa do
Consumidor, aos quais dá tratamento especial, reduzindo a pena a um terço e a
multa a um quinto, ou seja, tornando-se o artigo 63, totalmente inaplicável.
O disposto no artigo 64 do Código de Defesa do Consumidor tem o objetivo
de definir como crime, o agente que, após a colocação no mercado consumidor de
determinado produto, veio a descobrir que aquele produto poderia causar algum tipo
de dano às pessoas, omitindo a informação à autoridade competente e também
deixando de retirá-lo de circulação por determinação da autoridade, onde diz que:
Deixar de comunicar à autoridade competente e aos consumidores a nocividade ou
periculosidade de produtos cujo conhecimento seja posterior à sua colocação no
mercado: Pena – Detenção de seis meses a dois anos e multa.
Parágrafo único. Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de retirar do
mercado, imediatamente quando determinado pela autoridade competente, os
produtos nocivos ou perigosos, na forma deste artigo.
A inaplicabilidade do artigo 64, defendida pelo autor, é seguida por James
Eduardo Oliveira citando Rizzato Nunes, em sua obra denominada Comentários ao
Código de Defesa do Consumidor, (Oliveira, 2009, p. 633), onde:
Não havendo previsão da modalidade culposa, tem-se o tipo apenas como doloso, o que, por certo, outra vez dificultará sua aplicação. Ter-se-á que identificar a intenção do fornecedor de deixar de comunicar à autoridade competente e aos consumidores a nocividade ou periculosidade do produto, cujo conhecimento ele obteve posteiormente. Ora, se o fornecedor fizer a comunicação – qualquer que seja ela – de forma inadequada, isso, de fato, já elide em larga medida o dolo, pois a falha da comunicação será tida como culposa. Ele – fornecedor – não teve intenção de não comunicar, o que fez foi comunicar mal, e aí fica inaplicável o tipo.25
Outro fator que dificulta a punibilidade penal do fornecedor com relação a não
comunicação à autoridade competente, é com relação a produtos dos quais apenas
o fabricante tem conhecimento do grau de nocividade e de periculosidade do
produto e omite tal informação, e até mesmo, deixando que fiquem expostos nas
prateleiras dos estabelecimentos comerciais, até que o consumidor, as conheça
através de sua utilização ou consumo.
25
Oliveira, J. E. (2009), Código de Defesa do Consumidor, anotado e comentado. São Paulo: Atlas
30
3.4 DO CRIME DE DESOBEDIÊNCIA DE DETERMINAÇÃO DE AUTORIDADE
O artigo 65 versa sobre a execução de serviços, por pessoa física ou jurídica,
os quais possam vir a causar algum tipo de dano sem definir a quem, só
mencionando se é em desobediência a determinação de autoridade já existente, ou
seja, para que se configure crime, há que existir determinação para a não execução
daquele serviço.
Art. 65 – Executar serviço de alto grau de periculosidade, contrariando
determinação de autoridade competente: Pena – Detenção de seis meses a dois
anos.
Parágrafo único. As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das
correspondentes à lesão corporal e à morte.
A inaplicabilidade das sanções penais impostas pelo artigo 65 está na
identificação do que venha a ser serviço de alto grau de periculosidade e se está
contrariando determinação de autoridade competente, ou seja, depende de dois
fatores para que se consuma o crime, que, por sua tipificação ser dolosa, a
aplicação da pena dificilmente será operada, até por que, com bem demonstra René
Ariel Dotti, em (Dotti, 1992, p. 248), o grau maior ou menor da periculosidade do
serviço deverá ser aferido pelo prudente arbítrio do juiz, recorrendo aos critérios e às
normas da legislação trabalhista e sanitária, além das conclusões da prova pericial
ou testemunhal, conforme o caso.26
Como o referido artigo é uma norma penal em branco, porque depende de
complementaridade de determinações das autoridades competentes, entendemos
que, ao caso, na hipótese de haver dano à pessoa, a conduta do fornecedor poderia
vir a ser tipificada como culposa e não como dolosa, levando-se em consideração
também o entendimento de José Geraldo Brito Filomeno, em (Filomeno, 2007, p.
104), onde diz que, embora seja crime formal ou de mera conduta e exatamente por
isso mesmo, vez que estabelece um comportamento decorrente da própria atividade
empresarial, dentro da sistemática da responsabilidade pelo fato do produto ou do
serviço.27
26
Dotti, R. A. (1992). Comentários ao Código do Consumidor. Rio de Janeiro: Forense. 27
Filomeno, J. G. (2007). Curso Fundamental de Direito do Consumidor, São Paulo: Atlas.
31
3.5 DAS INFRAÇÕES PENAIS POR ABUSO NA PUBLICIDADE
Versando sobre os abusos cometidos pelos fornecedores em publicidades
enganosas ou abusivas, temos os artigos, de 66 a 69 do Código de Defesa do
Consumidor, tipificando tais condutas como crime de publicidade, os quais
passamos a analisar suas características e suas aplicabilidades e inaplicabilidades
na esfera penal.
O artigo 66 salienta que: Fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir
informação relevante sobre a natureza, caracterísica, qualidade, quantidade,
segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços:
Pena – Detenção de três meses a um ano e multa.
§ 1º Incorrerá nas mesmas penas quem patrocinar a oferta.
§ 2º Se o crime é culposo: Pena – Detenção de um a seis meses ou multa.
Na leitura do caput do artigo 66, temos que, a culpa pela afirmação falsa ou
enganosa, feita em publicidade de anúncios de determinado produto ou serviço, é
exclusiva do meio de comunicação ao qual se está vinculada, ou seja, da televisão,
do rádio do jornal e etc. Quando da leitura do parágrafo primeiro, entendemos que o
patrocinador do anúncio, o verdadeiro detentor das especificações do produto ou do
serviço, será punido apenas solidariamente, disposição esta que vai ao encontro
com o disposto no artigo 38 do mesmo diploma legal onde diz que: O ônus da prova
da veracidade e correção da informação ou comunicação publicitária cabe a quem
as patrocina. Daí surge, a dificuldade de aplicação da sanção penal imposta pelo
artigo em comento.
No entendimento de Walter Ceneviva, citado na obra de James Eduardo
Oliveira, (Oliveira, 2009, p. 636). O patrocinador incorre em coautoria, como se lê do
§ 1º, pelo fato de patrocinar a oferta, afirmando ainda que, patrocinador é a pessoa
jurídica que responde pelos custos de apresentação do programa de rádio ou de
televisão [...]. O patrocínio não se confunde com a veiculação de anúncios, quando
estes não se vinculam a programas.28 Temos então que, só responderia pelo fato do
artigo 66 o patrocinador e não o veículo de comunicação ao qual se deu sua
veiculação.
28
Oliveira, J. E. (2009), Código de Defesa do Consumidor, anotado e comentado. São Paulo: Atlas
32
Com relação aos crimes contra o consumidor, o artigo 7º da lei 8.137/90
caput, dispõe que: Constitui crime contra as relações de consumo. E em seu inciso
VII define que – induzir o consumidor ou usuário a erro, por via de indicação ou
afirmação falsa ou enganosa sobre a natureza, qualidade de bem ou serviço,
utilizando-se de qualquer meio, inclusive a veiculação ou divulgação publicitária.
Temos então que, o artigo 66 do Código de Defesa do Consumidor foi
totalmente revogado pelo inciso VII do artigo 7º da lei 8.137/90, ao inserir na parte
inicial de seu texto a expressão “induzir o consumidor ou usuário a erro, por via de
indicação ou afirmação falsa ou enganosa sobre a natureza, qualidade de bem ou
serviço”. Até mesmo em razão da pena aplicada ao réu, variando entre dois e cinco
anos ou multa deixando bem claro que o artigo 66 do CDC ficou totalmente
inaplicável.
Quando introduzido no inciso VII do artigo 7º da lei 8.137/90, a expressão
“utilizando-se de qualquer meio, inclusive a veiculação ou divulgação publicitária”,
não deixa nenhuma dúvida de que ficam também revogados os artigos, 67, 68 e 69
do Código de Defesa do Consumidor, por serem de tipificação meramente simbólica.
Seguindo o entendimento de que são totalmente inaplicáveis tais artigos do
Código de Defesa do Consumidor, José Augusto Peres Filho, em (Filho, 2009, p.
361), também menciona como inaplicáveis os artigos 66, 67 e 68 por indicar penas
mais brandas que as do artigo 7º da lei 8.137/90, dizendo:
Ao tratarmos dos crimes dos arts. 66, 67 e 68 do CDC, vimos que são crimes que não precisam de um resultado danoso para o consumidor, posto que só a afirmação falsa ou a publicidade enganosa, por exemplo, são suficientes para a configuração dos delitos. Ocorre, porém, que se a indicação falsa ou enganosa tiver o condão de fazer com que o consumidor incorra em erro, adquirindo o produto ou contratando o serviço, que não tenha a mesma natureza ou qualidade anunciada ou indicada, já não teremos um daqueles crimes que prevêem penas mais brandas, e sim o crime do art. 7º, inciso VII da Lei 8.137/90, cuja pena mínima é a detenção de dois anos e multa.29
29
Filho, J. A (2009). Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, São Paulo: Verbatim
33
3.6 DO CRIME DE EMPREGO DE PEÇAS USADAS NO CONSERTO DE PRODUTOS
O artigo 70 do Código de Defesa do Consumidor, nada mais é do que o crime
de estelionato, tipificado pelo art. 171 do Códgio Penal. O art. 70 do CDC dispõe
que: Empregar, na reparação de produtos, peças ou componentes de reposição
usados, sem autorização do consumidor: Pena – Detenção de três meses a um ano
e multa, o que em razão da pena, o torna totalmente inaplicável frente ao art. 171 do
Código Penal, onde diz que: Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em
prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou
qualquer outro meio fraudulento: Pena – Reclusão de um a cinco anos e multa.
Na leitura e interpretação dos dois artigos, tem-se a convicção de que, os dois
falam a mesma coisa, sendo que, o artigo 70 do CDC tem o condão de tipificar a
conduta do agente. Fazendo parte desta mesma corrente, Paulo José da Costa JR,
em (JR., 1991, p. 243), entende que se o agente, ao proceder à reparação do
produto, afirmar que substituiu a peça por outra nova, conservando porém aquela
velha, a conduta irá subsumir-se no art. 171, caput, do Código Penal.30
Em entendimento diverso do aqui, exposto, José Geraldo Brito Filomeno, em
(Filomeno, 2007, p. 118), expõe que trata-se de delito que vem a complementar a
figura do art. 175 do Código Penal, o qual define a fraude no comércio quando
dispõe que: Enganar, no exercício de atividade comercial, o adquirente ou
consumidor: II – entregando uma mercadoria uma mercadoria por outra. – Pena –
Detenção de seis meses a dois anos.
Já, no entendimento de José Augusto Peres Filho, em (Filho, 2009, p. 363),
estamos diante do crime do art. 7º, VII, da Lei 8.137/90, vez que, o consumidor é
induzido a erro através de informação falsa sobre a natureza do produto que, na sua
confecção, teve empregados peças ou componentes que já tiveram uso.31
Pelo entendimento dos renomados doutrinadores acima citados, não nos
resta nenhuma dúvida de que o artigo 70 do Código de Defesa do Consumidor, está
totalmente inaplicável ao caso em tela.
30 JR., P. J (1991). Comentários ao Código de Proteção ao Consumidor, São Paulo: Saraiva.
31 Filho, J. A (2009). Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, São Paulo: Verbatim
34
3.7 DA COBRANÇA DE DÍVIDAS E DOS BANCOS DE DADOS
Disposto no artigo 71 do Código de Defesa do Consumidor, tipificando como
crime a cobrança de dívidas, que é, nada mais nada menos que o desdobramento
penal do disposto no art. 42 do mesmo diploma, onde está definido que: Na
cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a didículo, nem
será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.
O parágrafo único do artigo 42, vem reforçar ainda mais o entendimento de
que, na cobrança indevida, também opera a responsabilidade civil do fornecedor ao
dispor que: art. 42 – Parágrafo único – O consumidor cobrado em quantia indevida
tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em
excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano
justificável.
O artigo 71, ao dispor que, o fornecedor que: Utilizar, na cobrança de dívidas,
de ameaça, coação, constrangimento físico ou moral, afirmações falsas, incorretas
ou enganosas ou de qualquer outro procedimento que exponha o consumidor,
injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu trabalho, descanso ou lazer: Estará
sujeito à pena de: – Detenção de três meses a um ano e multa. Não resguardou em
nenhum momento o direito do fornecedor em buscar aquilo que lhe é devido, a não
ser pela palavra injustificadamente.
De regra, o consumidor inadimplente, estará no decorrer das vinte e quatro
horas do dia, em seu trabalho, ou descansando, ou passeando, o que podemos
definir como lazer. Sendo assim, se não fosse a palavra injustificadamente,
integrante do texto do artigo 71 do CDC, o fornecedor jamais poderia impelir ao seu
devedor extrajudicialmente a paga-lhe o que é devido.
Temos que, com a inserção da expressão “injustificadamente” na redação do
artigo em comento, desde que, justificando a inadimplência do devedor, abre a
possibilidade de o fornecedor credor, agir contrariamente ao disposto no artigo 42 do
CDC, tornando totalmente inaplicável o disposto no artigo 71 do mesmo diploma
legal.
No entendimento de René Ariel Dotti, em (Dotti, 1992, p. 286), a utilização do
advérbio de modo (injustificadamente) na composição do tipo é mais uma
demonstração da redação defeituosa da norma.
35
Quanto à leitura e interpretação do artigo 72 do Código de Defesa do
Consumidor, o qual dispõe que: Impedir ou dificultar o acesso do consumidor às
informações que sobre ele constem em cadastros, banco de dados, fichas e
registros: Pena – Detenção de seis meses a um ano e multa.
Temos que, o legislador quis simplesmente dar ênfase ao disposto no artigo
43 do mesmo diploma, onde dispõe em seu caput que: O consumidor, sem prejuízo
do disposto no art. 86 (vetado), terá acesso às informações existentes em cadastros,
fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como
sobre as suas respectivas fontes.
Toda a doutrina pesquisada caminha na mesma direção de que tal dispositivo
refere-se aos bancos de dados de caráter público, quais sejam, SERASA, SPC, CCF
do Banco Central e outros, e nunca referindo aos bancos de dados internos das
empresas de um modo geral.
É sabido por toda a sociedade consumidora que, ao inadimplir com uma
instituição financeira, mesmo que venha a saldar o seu débito, constará em seus
registros internos, restrições quanto àquele consumidor, o qual, terá bastante
dificuldade em contratar com tal instituição. É o caso por exemplo, de um
consumidor que adquire um veículo através de financiamento de determinada
financeira e não consegue cumprir com tal contrato, vindo a devolver o bem à
instituição, aquele consumidor, jamais terá novo empréstimo junto àquela financeira.
No entendimento do autor, quando o Código dispõe no texto do art. 72 das
palavras fichas e arquivos, está se referindo, não só aos bancos de dados de caráter
público, como também, aos bancos de dados de caráter interno dos fornecedores,
até porque, o agente público que administra os bancos de dados de caráter público,
não tem nenhuma razão para impedir ou dificultar o acesso do consumidor às
informações referentes à sua pessoa, registradas ali, sendo que, aquela é a sua
função.
Nas palavras transcritas a seguir, de José Augusto Peres Filho, em (Filho,
2009, p. 363), sobre o disposto no art. 72 do CDC, apesar de estarem um pouco
confusas, temos a impressão de que aquele que poderá impedir ou dificultar o
acesso do consumidor aos registros pessoais em banco de dados é o fornecedor, ou
seja, aquele com o qual, o consumidor mantém relação de consumo, porém, não
menciona se são cadastros internos ou públicos, senão vejamos:
36
O referido artigo prevê ações múltiplas e alternativas. O tipo penal incide não apenas caso o fornecedor impeça o acesso do consumidor às informções que sobre ele constem no banco de dados – ou seja, não dá qualquer acesso aos dados, mas incidirá ainda se esse acesso for dificultado, por exemplo, com afirmações de “volte amanhã” ou “só com o gerente ou com o proprietário”, que jamais estão disponíveis para o consumidor.32
Partindo do princípio de que o fornecedor, no intuito de não querer produzir
provas contra si mesmo, é que poderia impedir ou dificultar o acesso do consumidor
aos registros em fichas e cadastros, os quais só poderiam fazê-lo em cadastros
internos, e não nos de caráter público. Segundo Paulo José da Costa JR., em (JR.,
1991, p. 248), comentando sobre o disposto no artigo 72 diz que, a norma agasalhou
repetição de certo modo inútil. Seria bastante que houvesse feito menção, tão
somente, aos bancos de dados e cadastros de consumidores.33
Diante de tais comentários e indagações, temos a nítida compreensão de que
a sanção penal disposta no artigo 72 do Código de Defesa do Consumidor, fica
totalmente inaplicável.
Dispõe o art. 73 que: Deixar de corrigir imediaamente informação sobre
consumidor constante de cadastro, banco de dados, fichas ou registros que sabe ou
deveria saber ser inexata: Pena – Detenção de um a seis meses ou multa.
No entendimento do autor, a disposição do art. 73 do Código de Defesa do
Consumidor, é dirigida ao fornecedor que insere ou mantém, indevidamente
informação negativa do consumidor nos bancos de dados de caráter público, tais
como, negativação do nome do consumidor por débito já quitado e não baixado junto
ao fornecedor, inseridas quando o débito encontrava-se em atraso e, quando do
pagamento pelo consumidor, o fornecedor deixou de proceder a informação ao
banco de dados, mantendo a negativação e etc.
Quanto aos administradores dos bancos de dados de caráter público, estes
só procedem a inserção de dados negativos de determinado consumidor, quando
informado pelo fornecedor, o débito em atraso e o valor do referido débito e a
retirada é feita quando da informação pelo fornecedor da quitação do débito.
O § 3º do art. 43 do CDC dispõe que: O consumidor, sempre que encontrar
inexatidão nos seus dados e cadastros, poderá exigir sua imediata correção,
32
Filho, J. A (2009). Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, São Paulo: Verbatim 33
JR., P. J (1991). Comentários ao Código de Proteção ao Consumidor, São Paulo: Saraiva.
37
devendo o arquivista, no prazo de cinco dias úteis, comunicar a alteração aos
eventuais destinatários das informações incorretas.
Entendo que, a exigência a que se refere o parágrafo terceiro do art. 43,
deverá ser feita ao fornecedor que solicitou ao arquivista do banco de dados, a
inserção indevida ou errônea dos dados do consumidor, que, por questões óbvias, o
arquivista não tem nenhum instrumento para verificação da veracidade das
informações passadas por seus associados para arquivo, sua função é meramente
operacional, o qual tem o prazo de cinco dias para correção dos dados contados a
partir da informação correta do fornecedor associado.
Presos à determinação do artigo 73 onde diz que, “deixar de corrigir
imediatamente”, grande parte da doutrina entende que, o dispositivo, obriga única e
exclusivamente os responsáveis pelos arquivos dos bancos de dados pelas
correções das informações constantes de consumidores em tais arquivos, o que, no
entendimento do autor, a função de corrigir, não deixa de ser dos responsáveis
pelos arquivos, mas, por determinação imediata do fornecedor das informações, ou
seja, os dados corretos ou não, são fornecidos pela empresa associada, a qual
estabeleceu a relação de consumo com o consumidor.
Ao vetar o art. 86 que dispunha, “Aplica-se o habeas data à tutela dos direitos
e interesses dos consumidores”, o legislador deixou bem claro a intenção de que o
consumidor, só terá acesso aos bancos de dados de caráter público para
informações sobre registros em seu nome, mas, para modificação de tais registros, é
necessária a intervenção de quem determinou a inserção de tais dados, ou seja, o
fornecedor com o qual o consumidor estabeleceu relação de consumo.
Em pesquisa a boa parte da doutrina sobre o entendimento do autor, de que o
arquivista dos bancos de dados têm função meramente operacional, não foi
encontrado nenhum doutrinador que concorde com tal pensamento, mas, do
entendimento de que o responsável a ser incriminado é o arquivista, temos vários
autores, dos quais, temos o renomado James Eduardo Oliveira, em (Oliveira, 2009,
p. 647), citando Marcos Alberto Sant’ana Bitelli, se contradiz em fazer alusão à
responsabilidade pelo disposto no art. 73, lecionando que:
A norma do art. 73 do CDC prevê um crime próprio, que somente pode ser cometido pelo adminisrador do banco de dados ou pelo arquivista. De maneira que não é aplicável a outros que não os seus destinatários definidos em lei. Não obstante tratar-se de norma destinada exclusivamente ao administrador do banco de dados ou ao arquivista, mesmo que numa hipótese meramente argumentativa se aceita sua aplicação ao fornecedor, o
38
que em matéria criminal é um verdadeiro absurdo, em virtude de sua natureza estritamente criminal, não tem o condão de criar nenhuma obrigação civil, servindo apenas para descrever uma conduta antijurídica, que, uma vez praticada, encontra a respectiva consequência no próprio texto do art. 73, “pena – detenção de um a seis meses ou multa”.34
E para finalizar o quanto ao entendimento da inaplicabilidade da sanção penal
disposta no art. 73 do Código de Defesa do Consumidor, em pesquisa à
jurisprudência, todas as ações que versam sobre a inserção ou a manutenção
indevida de dados de consumidores em cadastros negativos de bancos de dados de
caráter público, tais como, SERASA, SPC e outros, são de natureza civil, ou seja,
responsabilizando civilmente os fornecedores e nunca os responsáveis pelos
arquivos, e, quando condenados, a sentença é sempre direcionada à reparação por
danos morais, até por que, os pedidos nas ações sobre a irregularidade acima, são
sempre de danos morais.
3.8 DO CERTIFICADO DE GARANTIA E SEU CONTEÚDO
Disposto no artigo 74 do Código de Defesa do Consumidor que: Deixar de
entregar ao consumidor o termo de garantia adequadamente preenchido e com
especificação clara de seu conteúdo: Pena – Detenção de um a seis meses. Temos
que, a inserção deste artigo foi totalmente desnecessária, por ser documento de
emissão obrigatória disposta no parágrafo único do artigo 50 do mesmo diploma.
Quanto à pena imposta por falta de preenchimento do documento, esta se
torna extremamente inócua, vez que, a garantia do produto poderá ser requerida
mediante a apresentação do documento fiscal emitido pelo fornecedor no ato da
aquisição do produto, podendo também, ser preenchido pelo próprio consumidor, já
que as especificações são impressas pelo fabricante do produto.
Fazendo alusão sobre o excesso da dicção disposta no artigo 74 do CDC,
Paulo José da Costa JR., fez o seguinte comentário:
A dicção foi além. Exigiu que o fornecedor, além de preencher adequadamente o termo de garantia, o fizesse com especificação clara de seu conteúdo. Entendemos supérflua a exigência da clareza, uma vez que,
34
Oliveira, J. E. (2009), Código de Defesa do Consumidor, anotado e comentado. São Paulo: Atlas
39
preenchendo-se adequadamente o termo de garantia, implicitamente seu conteúdo haverá de ser especificado com clareza. Caso contrário, não haveria um preenchimento adequado, ou seja, um preenchimento conforme, apropriado, bem ajustado às circunstâncias. Uma vez mais, o legislador, quiçá por amor à clareza excessiva, inseriu na locução normativa vocábulos despiciendos.35
Seguindo este mesmo entendimento de que o disposto no artigo em comento,
René Ariel Dotti, em (Dotti, 1992, p. 294), comenta que a norma penal em análise
seria perfeitamente dispensável do elenco dos delitos previstos pelo Código de
Defesa do Consumidor. Bastavam as medidas de caráter civil e administrativo para
responder à situação de perigo de dano ao patrimônio do consumidor. Donde,
podemos concluir que a sanção penal imposta pelo artigo 74 do Código de Defesa
do Consumidor, é também, totalmente inaplicável.
3.9 DA FORMA DE APLICAÇÃO, CIRCUNSTÂNCIAS E TIPOS DE PENA
O artigo 75 do Código de Defesa do Consumidor, transcreve fielmente o
disposto no art. 29 do Código Penal, acrescentando desnecessariamente, as
pessoas físicas responsáveis pela aprovação da colocação do produto ou serviço
defeituoso no mercado para consumo, sendo que, a parte final do art. 29 do Código
Penal já define que a incidência da pena, é na medida de sua culpabilidade.
Dispõe o art. 75 que: Quem, de qualquer forma, concorrer para os crimes
referidos neste Código incide nas penas a esses cominadas na medida de sua
culpabilidade, bem como o diretor, administrador ou gerente da pessoa jurídica que
promover, permitir ou por qualquer modo aprovar o fornecimento, oferta, exposição à
venda ou manutenção em depósito de produtos ou a oferta e prestação de serviços
nas condições por ele proibidas.
A inaplicabilidade do art. 75 do Código de Defesa do Consumidor, fica ainda mais
evidente quando da aprovação pelo Congresso Nacional da Lei 8.137/90,
sancionada e promulgada no dia 27 de dezembro de 1990, denominada “lei de
crimes contra a ordem triubutária, econômica e relações de consumo”, em seu
capítulo IV, que versa sobre as disposições gerais, define em seu artigo 11 que:
35 JR., P. J (1991). Comentários ao Código de Proteção ao Consumidor, São Paulo: Saraiva.
40
Quem, de qualquer modo, inclusive por meio de pessoa jurídica, concorre para os
crimes definidos nesta lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida de sua
culpabilidade. Parágrafo único. Quando a venda ao consumidor for efetuada por
sistema de entrega ao consumo ou por intermédio de outro em que o preço ao
consumidor é estabelecido ou sugerido pelo fabricante ou concedente, o ato por este
praticado não alcança o distribuidor ou revendedor.
No entendimento do autor, levando-se em conta o disposto no art. 11 da lei
8.137/90, fica bastante evidente que, o art. 75 do Código de Defesa do Consumidor,
foi revogado, ainda no período da vacatio legis da lei 8.078/90, a qual só veio a
vigorar a partir do dia 11 de março de 1991, ou seja, ficando o art. 75 do CDC,
totalmente inaplicável em razão de sua derrogação pelo art. 11 da referida lei.
41
Capítulo 4
O DIREITO DO CONSUMIDOR COMPARADO A ALGUNS DOS PAÍSES VIZINHOS
4.1 AS SANÇÕES PENAIS COMO INSTRUMENTO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
O Código de Defesa do Consumidor Brasileiro prevê, independentemente das
sanções administrativas e civis, também sanções penais e sem prejuízo das
sanções previstas no Código Penal e leis especiais, circunstâncias agravantes e
também dispõe sobre fiança.
Em outros países componentes do MERCOSUL, tais como, Argentina,
Paraguai e Peru, as leis que regulamentam a relação de consumo não prescrevem
sanções penais específicas, em razão de tais sanções já estarem dispostas em seus
respectivos Códigos Penais, sendo que, o Código Penal peruano prevê uma sanção
penal em caso de divergência entre a qualidade ou a quantidade dos produtos e a
informação dos rótulos de etiquetas do produto.
É importante ressaltar que o Código de Defesa do Consumidor Brasileiro
trouxe em seu bojo diversas inovações processuais, tais como a inversão do ônus
da prova, a possibilidade de litisconsórcio entre órgãos estaduais e federais, regras
sobre a coisa julgada erga omnes. nas ações coletivas, execução coletiva na
hipótese de ausência de habilitação de interessados, várias novidades no tocante à
legitimidade para ações coletivas, inclusive de órgãos sem personalidade jurídica e
até mesmo para ações penais privadas subsidiárias das ações públicas, alterou
dispositivos importantes da lei 7.347/85, denominada como sendo a lei da ação civil
pública.
No Brasil, as ações coletivas com base no Código de Defesa do Consumidor
estão dispensadas do adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e
quaisquer outras despesas, além das associações autoras não serem condenadas
em honorários de advogados, custas e despesas processuais, salvo comprovada
má-fé, na Argentina, também há o benefício da justiça gratuita às atuações judiciais
42
que se iniciem em conformidade com a lei argentina de proteção ao consumidor,
enquanto que nos demais países, não há tal previsão.
4.2 COMPARAÇÃO QUANTO A LEGITIMIDADE PARA PROPOSITURA DA AÇÃO
O Código de Defesa do Consumidor brasileiro determina em seus artigos 81 e
82 que a defesa do consumidor em juízo, pode se dar individualmente ou a título
coletivo, onde são legitimados para ajuizar ações coletivas, concorrentemente o
Ministério Público, a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal, as
entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, ainda que sem
personalidade jurídica, as associações legalmente constituídas há pelo menos um
ano e que incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos ali
dispostas, além de autorizar para a defesa dos direitos e interesses dos
consumidores, todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e
efetiva tutela.
- Brasil – Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Art. 81 – A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente ou a título coletivo. Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de: I – interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato; II – interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base; III – interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum. Art. 82 – Para os fins do art. 81, parágrafo único, são legitimados concorrentemente: I – o Ministério Público; II – a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal; III – as entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, ainda que sem personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e direitos protegidos por este Código; IV – as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e que incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos protegidos por este Código, dispensada a autorização assemblear. § 1º O requisito da pré-constituição pode ser dispensado pelo juiz, nas ações previstas nos arts. 91 e seguintes, quando haja manifesto interesse
43
social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido.36
Na Argentina, são legitimados para propor ações judiciais os consumidores ou
usuários, as associações de consumidores constituídas como pessoas jurídicas, a
autoridade de aplicação nacional ou local e o Ministério Público, sendo que, as
associações de consumidores estão habilitadas como litigantes de quaisquer das
partes.
- Argentina - Ley de Defensa Del Consumidor Artículo 52: ACCIONES JUDICIALES: Sin perjuicio de lo expuesto, el consumidor y usuário podrán inicias acciones judiciales cuando sus intereses resulten afectados o amenazados. La acción corresponderá al consumidor o usuário, a las asociaciones de consumidores constituídas como personas jurídicas, a la autoridad de aplicación nacional o local y al ministério público. El ministério público cuando no intervenga em el proceso como parte, actuará obligatoriamente como fiscal de ley. En caso de desistimiento o abandono de la acción de las referidas asociaciones legitimadas, la titularidad activa será asumida por el ministério público.37
No Paraguai, os legitimados são o consumidor ou usuário, as associações de
consumidores que cumpram os requisitos legais, a autoridade competente nacional
ou local e a “Fiscalía General de la República”. Vale ressaltar que, a legislação
paraguaia autoriza que a defesa em juízo dos direitos dos consumidores seja
exercida a título individual e coletivo.
- Paraguai - Ley de Defensa Del Consumidor y Del Usuario Artículo 43º - La defensa em juicio de los derechos que esta ley precautela podrá ser ejercida a título individual como a título colectivo. Será ejercida colectivamente cuando se encuentren involucrados intereses o derechos difusos o colectivos. Tendrán acción el consumidor o usuário, las asociaciones de consumidores que cumplan com los requisitos de los Arts. 45, 46, y 47, la autoridad competente nacional o local y la Fiscalía Gerneral de la República. Las acciones tendientes al resarcimiento por daños y perjuicios solo podrán promoverse por los consumidores o usuários afectados.38
A lei de proteção do consumidor do Peru prevê o INDECOPI como legitimado
para a propositura de ações judiciais relacionadas aos temas de sua competência.
Por meio de delegação do INDECOPI.
36
Código de proteção e defesa do consumidor e legislação correlata (2003). Senado Federal. Subsecretaria de
Edições Técnicas, Brasília-DF. 37
Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça. Publicação sobre A defesa do consumidor na
Argentina, no Brasil, no Paraguai e no Peru. Brasília/Brasil. Artcor Gráfica e Editora Ltda.: 2007. 38
Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça. Publicação sobre A defesa do consumidor na
Argentina, no Brasil, no Paraguai e no Peru. Brasília/Brasil. Artcor Gráfica e Editora Ltda.: 2007.
44
O INDECOPI, que é uma espécie de Ministério Público peruano, representará
todos os consumidores afetados pelos fatos nos quais se fundamenta a petição,
desde que esses não manifestem a vontade de fazê-lo individualmente ou não fazê-
lo em 30 dias.
Outras entidades públicas ou privadas com capacidade pra representar os
interesses dos consumidores adquirem a faculdade para propor ações, sendo que, o
juiz só aceitará a legitimidade dessas entidades se elas apresentarem um
documento que comprove tal delegação.
Peru – Ley de Protección AL Consumidor. Artículo 40º - El procedimento administrativo para hacer cumplir las disposiciones de la presente Ley se iniciará de oficio, a pedido Del consumidor afectado, o Del que potencialmente pudiera verse afectado, o por uma Asociación de Consuidores, y se regirá por lo dispuesto em el Título Quinto Del Decreto Legislativo n º 807. Em el caso de productos adquiridos o servicioscontratados por uma sociedad conyugal u otros patrimônios autônomos, y cuando se solicite la imposición de uma medida correctiva de devolución o reposición, la legitimidad par obrar corresponderá al patrimônio autônomo, mientras que la representación procesal será de cada uno de sus integrantes, de conformidad com lo dispuesto por el Artículo 65º Del Codigo Procesal Civil. La interposición de denuncias por parte de las Asociaciones de Consumidores por infracción a las normas adiministrativas de protección al consumidor queda sujeta a la reglamentación que apruebe el Instituto Nacional de Defensa de la Competencia y Protección de la Propiedad Intelectual.39
4.3 COMPARAÇÃO QUANTO AO SISTEMA DE DEFESA DO CONSUMIDOR
No Brasil através do Decreto nº 2.181, de 20 de março de 1997, da
Presidência da República, foi criado o SNDC - Sistema Nacional de Defesa do
Consumidor, estabelecendo as normas gerais de aplicação das sanções
administrativas previstas no Código de Defesa do Consumidor.
O inciso I do art. 3º do Decreto Presidencial nº 2.181/97, atribui entre tantas
outras, como sendo de competência do Departamento de Proteção e Defesa do
Consumidor – DPDC, órgão integrante do SNDC, planejar, elaborar, propor,
coordenar e executar a política nacional de defesa do consumidor.
39 Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça. Publicação sobre A defesa do consumidor na
Argentina, no Brasil, no Paraguai e no Peru. Brasília/Brasil. Artcor Gráfica e Editora Ltda.: 2007.
45
Para a fiscalização de competência administrativa, aos fornecedores nas
práticas de infração contra o consumidor, o art. 9º, leciona que este Decreto e as
demais normas de defesa do consumidor será exercida em todo território nacional
pela Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, por meio do DPCDC,
pelos órgãos federais integrantes do SNDC, pelos órgãos conveniados com a
Secretaria e pelos órgãos de proteção de defesa do consumidor, os chamados
PROCONS, criados pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, em suas
respectivas áreas de atuação e competência.
- Brasil – Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Art. 105. Integram o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor – SNDC, os órgãos federais, estaduais, do Distrito Federal e municipais e as entidades privadas de defesa do consumidor. Decreto nº 2.181/1997: Art. 1º Fica organizado o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor – SNDC e estabelecidas as normas gerais de aplicação das sanções administrativas, nos termos da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990.40
No Paraguai, o Decreto 20.572/03 criou e regulamentou o Sistema Nacional
Integrado de Proteção ao Consumidor, ou seja, somente após seis anos da
regulamentação brasileira é que o Paraguai regulamentou as relações de consumo
naquele País. Já, na Argentina não existe Lei específica que disciplina as relações
de consumo.
- Paraguai – Decreto 20.572/2003 Art. 1º Créase el Sistema Nacional Integrado de Protección al Consumidor para brindar a nível nacional los serviços de información, orientación, conciliación, mediación, arbitraje, investigación, fiscalización y solución de controvérsias de consumo, derivadas de la aplicación de la Ley nº 1.334/1998, a través de mecanismos de cooperación y coordinación de funciones, que aseguren el cumplimiento de los lineamientos establecidos em la política de calidad Del SNIPC y contribuyan al desarrollo Del país mediante la formación de consumidores exigentes y empresas competitivas que respondan a esas exigências com creatividad y leal compentencia.41
No Peru, apesar de não ter sido contemplado com o Sistema Nacional de
Defesa do Consumidor na lei de consumo, está prevista a delegação de funções,
mas, está sendo desenvolvido um trabalho de formulação de uma lei de Sistema
Nacional Descentralizado de Proteção ao Consumidor e uma nova lei de Proteção
ao Consumidor.
40
Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça. Publicação sobre A defesa do consumidor na
Argentina, no Brasil, no Paraguai e no Peru. Brasília/Brasil. Artcor Gráfica e Editora Ltda.: 2007. 41
Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça. Publicação sobre A defesa do consumidor na
Argentina, no Brasil, no Paraguai e no Peru. Brasília/Brasil. Artcor Gráfica e Editora Ltda.: 2007.
46
Peru – Ley de Protección AL Consumidor. Artículo 46º - La Comisión de Protección al Consumidor, prévio acuerdo Del Directorio Del INDECOPI, podrá delegar sus facultades o las de su Secretaría Técnicz a otras instituciones públicas o privadas, para conocer acerca de las presuntas infracciones cometidas em determinados sectores de consumo o dentro de um âmbito geográfico específico.42
Das legislações dos países analisadas, somente a do Brasil prescreve de
forma expressa a existência de uma política nacional de relações de consumo, bem
como os objetivos e princípios que a regem e os instrumentos que a compõem.
4.4 COMPARAÇÃO QUANTO ÀS POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO PARA O CONSUMO
No Brasil, constitui princípio da Política Nacional de Relações de Consumo a
educação e informação de fornecedores e consumidores, quanto aos seus direitos e
deveres, com a finalidade de melhoria do mercado de consumo.
O Código de Defesa do Consumidor em seu art. 4º, inciso II “b”, dispõe sobre
o incentivo por parte do Estado à criação de associações civis de consumidores, as
quais são consideradas parte do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, o que,
diferentemente da Argentina e Paraguai, está prevista no texto constitucional, em
seu art. 5º, incisos, XVII e XVIII, a liberdade para criação de associação para fins
lícitos e que a criação não depende de autorização do Estado.
- Brasil – Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Art. 4º A política Nacional de Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito a sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: [...] IV – educação e informação de fornecedores e consumidores, quanto aos seus direitos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de consumo;43
As legislações de proteção ao consumidor da Argentina e do Paraguai
determinam que, incumbe ao Estado formular planos gerais de educação para o
42
Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça. Publicação sobre A defesa do consumidor na
Argentina, no Brasil, no Paraguai e no Peru. Brasília/Brasil. Artcor Gráfica e Editora Ltda.: 2007. 43
Código de proteção e defesa do consumidor e legislação correlata (2003). Senado Federal. Subsecretaria de
Edições Técnicas, Brasília-DF.
47
consumo, difundindo-os publicamente e fomentando a criação e o funcionamento
das associações de consumidores e participação da comunidade, sendo que, na
Argentina, a legislação determina que o Estado deve estabelecer nos planos oficiais
do ensino primário e médio a obrigação de ensinar os preceitos e alcances da lei de
proteção do consumidor.
- Argentina - Ley de Defensa Del Consumidor Artículo 60: PLANES EDUCATIVOS: Incumbe al Estado nacional, las províncias y municipalidades, la formulación de planes generales de educación para el consumo y su difusión pública, fomentando la creación y el funcionamiento de las associaciones de consumidores y la partipación de la comunidad em ellas, debiendo propender a que dentro de los planes oficiales de educación primaria y media se enseñen los preceptos y alcances de esta ley.44 - Paraguai - Ley de Defensa Del Consumidor y Del Usuario Artículo 4º - A los efectos de la presente ley, se entenderán por: g) CONSUMO SUSTENTABLE: ES todo acto de consumo, destinado a satisfacer necesidades humanas, realizado sin socavar, dañar o afectar significativamente la calidadd Del médio ambiente y su capacidad para dar satisfacción a las necesidades de las generaciones presentes y futuras;45
A legislação peruana determina que a Comissão de Proteção do Consumidor,
pode reunir informações referentes a características e condições dos produtos ou
serviços inseridos no mercado com a finalidade de informar o consumidor e permitir-
lhe tomar uma decisão de consumo adequada.
Peru – Ley de Protección AL Consumidor. Artículo 50º - El Secretario Técnico y la Comisión de Protección al Consumidor están facultados para reunir información relativa a las características y condiciones de los productos o servicios que se expenden em el mercado, com el objeto de informar AL consumidor para permitile tomar una adecuada decisión de consumo. La información que se ofrezca tendrá el carácter de una opinión y generará responsabilidad en caso de que la misma haya sido emitida de manera maliciosa. Los procedimientos seguidos ante la Comisión de Protección al Consumidor tienen carácter público. Em esa medida, el Secretario Técnico y la Comisión de Protección al Consumidor se encuentran facultados para disponer la difusión de información vinculada a los mismos, siempre que lo consideren pertinente em atención a los intereses de los consumidores afectados y no constituya violación de secretos comerciales o industriales.46
Das legislações dos países analisadas, somente a do Brasil prescreve de
forma expressa a existência de uma política nacional de relações de consumo, bem
44
Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça. Publicação sobre A defesa do consumidor na
Argentina, no Brasil, no Paraguai e no Peru. Brasília/Brasil. Artcor Gráfica e Editora Ltda.: 2007. 45
Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça. Publicação sobre A defesa do consumidor na
Argentina, no Brasil, no Paraguai e no Peru. Brasília/Brasil. Artcor Gráfica e Editora Ltda.: 2007. 46
Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça. Publicação sobre A defesa do consumidor na
Argentina, no Brasil, no Paraguai e no Peru. Brasília/Brasil. Artcor Gráfica e Editora Ltda.: 2007.
48
como os objetivos e princípios que a regem e os instrumentos que a compõem,
sendo que, tais disposições são consideradas como norma objetiva na aplicação das
demais regras específicas do Código de Defesa do Consumidor.
4.5 COMPARAÇÃO QUANTO A COMPETÊNCIA PARA APLICAÇÃO DA LEI
No Brasil, a coordenação política do Sistema Nacional de Defesa do
Consumidor cabe ao Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor, o qual é
órgão do Ministério da Justiça, que tem como principal competência o planejamento,
a elaboração, a proposição, a coordenação e execução da política nacional de
relações de consumo.
Código de Proteção de Defesa do Consumidor Art. 106 – O Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor, da Secretaria de Direito Econômico (MJ), ou órgão federal que venha substituí-lo, é organismo de coordenação da política do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, cabendo-lhe: I – planejar, elaborar, propor, coordenar e executar a política nacional de proteção ao consumidor; II – receber, analisar, avaliar e encaminhar consultas, denúncias ou sugestões apresentadas por entidades representativas ou pessoas jurídicas de direito público ou privado; III – prestar aos consumidores orientação permanente sobre seus direitos e garantias; IV – informar, conscientizar e motivar o consumidor através dos diferentes meios de comunicação; V – solicitar à polícia judiciária a instauração de inquérito policial para a apreciação de delito contra os consumidores, nos termos da legislação vigente; VI – representar ao Ministério Público competente para fins de adoção de medidas processuais no âmbito de suas atribuições; VII – levar ao conhecimento dos órgãos competentes as infrações de ordem administrativa que violarem os interesses difusos, coletivos, ou individuais dos consumidores; VIII – solicitar o concurso de órgãos e entidades da União, Estados, do Distrito Federal e Municípios, bem como auxiliar a fiscalização de preços, abastecimento, quantidade e segurança de bens e serviços; IX- incentivar, inclusive com recursos financeiros e outros programas especiais, a formação de entidades de defesa do consumidor pela população e pelos órgãos públicos estaduais e municipais; X, XI, e XII – Vetados. XIII – desenvolver outras atividades compatíveis com suas finalidades.
49
Parágrafo único. Para a consecução de seus objetivos, o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor poderá solicita o concurso de órgãos e entidades de notória especialização técnico-científica.47
Na Argentina, a autoridade nacional de aplicação da lei de proteção ao
consumidor é a Secretaria de Indústria e Comércio e as autoridades locais de
aplicação dessa lei são os governos provinciais e do município de Buenos Aires,
sendo que, essas autoridades exercem o controle sobre o cumprimento das normas
de forma concorrente.
Também na Argentina, compete à Secretaria de Indústria e Comércio, entre
outras, as funções de, elaborar políticas para a proteção das relações de consumo,
manter um registro nacional de associações de consumidores, receber e dar
prosseguimento a denúncias dos consumidores, demandar a realização de perícias
consideradas necessárias e solicitar relatórios e opiniões de entidades públicas e
privadas, sendo que, a lei autoriza que tais autoridades deleguem as suas funções a
outros órgãos.
- Argentina - Ley de Defensa Del Consumidor Artículo 41 – APLICARIÓN NACIONAL Y LOCAL: La Secretaria de Industria y Comercio será La autoridad nacional de aplicación de La presente ley. Los gobiernos provinciales y La Municipalidad de La Ciudad de Buenos Aires actuarán como autoidades locales de aplicación ejerciendo El control y vigilância sobre El cumplimiento de La presente ley y sus normas reglamentarias respecto a los hechos sometidos a su jurisdicción. Las províncias, em ejercicio de sus atribuiciones, podrán delegar sus funciones em organismos de su dependência o em los gobiernos municipales.48
No Paraguai, a legislação de proteção do consumidor atribui ao Ministério da
Indústria e Comércio, a autoridade de aplicação dessa lei em âmbito nacional e aos
municípios a autoridade da aplicação da lei em âmbito local. As funções do
Ministério da Indústria e Comércio do Paraguai são semelhantes às funções da
Secretaria de Indústria e Comércio da Argentina.
- Paraguai - Ley de Defensa Del Consumidor y Del Usuário Artículo 40º - En el ámbito nacional será autoridad de aplicación de La presente ley el Ministerio de Industria y Comercio, y em el ámbito local, lãs municipalidades; pudiendo ambos actuar em forma concurrente.49
47
Código de proteção e defesa do consumidor e legislação correlata (2003). Senado Federal. Subsecretaria de
Edições Técnicas, Brasília-DF. 48
Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça. Publicação sobre A defesa do consumidor na
Argentina, no Brasil, no Paraguai e no Peru. Brasília/Brasil. Artcor Gráfica e Editora Ltda.: 2007. 49
Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça. Publicação sobre A defesa do consumidor na
Argentina, no Brasil, no Paraguai e no Peru. Brasília/Brasil. Artcor Gráfica e Editora Ltda.: 2007.
50
No Peru, o órgão competente para conhecer das infrações à lei de
consumidor e para aplicar tal lei é a Comissão de Proteção ao Consumidor, órgão
vinculado ao INDECOPI, vez que, tal comissão é competente para exigir de pessoas
físicas ou jurídicas todo tipo de documento, para citar e interrogar, por meio de
funcionários designados para isso, desde que, tais pessoas estejam relacionadas à
matéria objeto de investigação, bem como para realizar inspeções nos
estabelecimentos de pessoas jurídicas, mesmo sem prévia notificação.
- Peru - Ley de Protección al Consumidor Artículo 39º - La comisión de Protección AL Consumidor ES el único órgano administrativo competente par conocer de lãs presuntas infracciones a lal disposiciones contenidas em La presente Ley, así como para impner lãs sanciones administrativas y medidas correctivas estabelecidas em el presente Título. La competencia de Comision de Protección AL Consumidor solo podrá ser negada por norma expresa com rango de ley.50
Na análise sobre a competência para aplicação da lei, foi verificado que, em
todos os países, existe a autorização legal para que os seus órgãos máximos de
aplicação da lei de proteção do consumidor possam solicitar o auxílio de outros
órgãos governamentais para a realização de suas funções.
4.6 COMPARAÇÃO QUANTO A RESPONSABILIDADE DOS FORNECEDORES
Somente no Brasil, Peru e Paraguai, existe a previsão de um direito do
consumidor à efetiva reparação dos danos causados por fornecedores nas relações
de consumo.
Está previsto no art. 6º da Lei Paraguaia que: -Ley de Defensa Del Consumidor y Del Usuario Artículo 6º - Constituyen derechos básicos Del consumiror: f) La efectiva prevención y reparación de los daños patrimoniales y Morales o de los intereses difusos ocasionados a los consumidores, ya Sean individuales o coletivos;51
50
Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça. Publicação sobre A defesa do consumidor na
Argentina, no Brasil, no Paraguai e no Peru. Brasília/Brasil. Artcor Gráfica e Editora Ltda.: 2007. 51
Código de proteção e defesa do consumidor e legislação correlata (2003). Senado Federal. Subsecretaria de
Edições Técnicas, Brasília-DF.
51
No Brasil, o comerciante só poderá ser demandado basicamente em duas
hipóteses, sendo a primeira disposta no inciso I e II do art. 13 do Código de Defesa
do Consumidor, onde, se o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não
puderem ser identificados e a segunda está disposta no inciso III, onde, se o
comerciante não conservar adequadamente os produtos perecíveis, ou seja, em
ocorrendo uma dessas duas hipóteses, o comerciante passará a integrar a cadeia
de responsabilidade já composta pelos demais fornecedores.
Código de Proteção e Defesa do Consumidor Brasileiro Art. São direitos básicos do consumidor: [...] VI – a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos; VII – o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção jurídica, administrativa e técnica aos necessitados; Art. 7º - [...] Parágrafo único. Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo. Art. 12 O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos52
Igualmente na Argentina, como no Brasil, a responsabilidade por danos do
fornecedor é objetiva e solidária, com a possibilidade de se ajuizar ação regressiva
para a verificação do agente causador do dano, sendo que no Brasil, apenas a
responsabilidade por danos dos profissionais liberais deve ser verificada mediante
culpa.
Argentina, Ley de Defensa Del Consumidor: Artículo 40: RESPONSABILIDAD: Si El daño AL consumidor resulta Del vicio o riesgo de La cosa o de La prestación Del servicio, responderán El productor, El fabricante, El importador, El distribuidor, El vendedor y quien haya puesto su marca em La cosa o servicio. El transportista responderá por los daños ocasionados a La cosa com motivo o em ocasión Del servicio. La responsabilidad ES solidaria, sin perjuicio de lãs acciones de repetición que correspondan. Sólo se liberará total o parcialmente quien demuestre que La causa Del daño Le há sido ajena.53
No Peru, a responsabilidade é solidária em caso de danos causados por
defeitos dos produtos à integridade física dos consumidores ou a seus bens, sendo
52
Código de proteção e defesa do consumidor e legislação correlata (2003). Senado Federal. Subsecretaria de
Edições Técnicas, Brasília-DF. 53
Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça. Publicação sobre A defesa do consumidor na
Argentina, no Brasil, no Paraguai e no Peru. Brasília/Brasil. Artcor Gráfica e Editora Ltda.: 2007.
52
possível que o fornecedor interponha ação de regresso contra o causador do dano
ou contra quem originou o defeito.
Peru – Ley de Protección AL Consumidor. Artículo 5 – Em los términos establecidos por El presente Decreto Legislativo, los consumidores tienen los siguientes derechos: e. Derecho a La reparación por daños y perjuicios, consecuencia de La adquisición de los bienes o servicios que se ofrecen en El mercado o de su uso o consumo; Artículo 32º - El proveedor ES responsable de los daños causados a La integridad física de los consumidores o a SUS bienes por los defectos de sus productos.54
A lei peruana também determina que a responsabilidade do fornecedor é
objetiva, sendo os aspectos subjetivos considerados somente na aplicação da pena,
desde que, a análise da participação no fato infrator seja realizada de forma
individual, mas sempre considerando a existência de uma cadeia de fornecedores.
54
Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça. Publicação sobre A defesa do consumidor na
Argentina, no Brasil, no Paraguai e no Peru. Brasília/Brasil. Artcor Gráfica e Editora Ltda.: 2007.
53
CONCLUSÃO
O presente trabalho acadêmico, não tem aqui, a pretensão de que seu
entendimento não possa ser questionado e que sua linha de pensamento perpetue
ao longo de sua carreira profissional, até porque, um trabalho de conclusão de
curso, é apenas o começo para que o formando possa, durante sua jornada
profissional, continuar pesquisando, atualizando e acumulando conhecimentos para
poder desempenhar seu papel junto à sociedade de forma correta e brilhante, ou
seja, este trabalho não está concluído, pelo contrário, está apenas iniciado para que,
de uma forma ou de outra, possamos conhecer o quão é importante a reflexão sobre
determinado seguimento do direito.
A elaboração e a promulgação, da lei 8.078/90, denominada Código de
Defesa do Consumidor, veio, não só para atender a uma determinação imposta pelo
art. 5º, inciso XXXII da Constituição Federal de 1988, como também, atender ao
clamor de uma sociedade que na maioria das vezes, quando vitimada por
fornecedores inescrupulosos nas relações de consumo, não tinham o amparo
adequado quando do sofrimento de algum tipo de dano, moral ou material.
O Código de Defesa do Consumidor é hoje, dentro do nosso ordenamento
jurídico, a ferramenta básica para que a vítima da lesão causada dentro de uma
relação de consumo, qualquer que seja ela, de produtos ou de serviços, busque
junto ao judiciário a reparação, civil ou penal de tal dano, sendo que, a reparação
por qualquer tipo de lesão, moral ou material, é buscada pela vítima, sempre no
sentido da reparação pecuniária e a obrigação de fazer ou não fazer, argüindo
sempre a responsabilidade civil e nunca a imposição de sanções penais.
Ficou evidenciado que a preocupação do legislador quanto à
responsabilidade do fornecedor é de caráter civil e não penal, se apóia na
incoerência das sanções penais que, pelas penas ali impostas, não chegam a ser
nem de caráter meramente inibitório, sendo que o dever de indenizar por
fornecimento de produtos ou serviços inadequados ou defeituosos ao mercado de
consumo fica bastante evidente, levando-se em consideração a teoria do risco do
empreendimento, o qual, a presença da responsabilidade civil está muito mais
54
latente do que o ilícito penal, daí, o entendimento da inaplicabilidade das sanções
penais ali impostas.
Com o advento da lei 9.099 em 26 de setembro de 1995 criando os juizados
especiais cíveis e criminais, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor,
apesar de estar em vigor desde março de 1991, passou a ser de grande relevância
junto à sociedade a qual se destina que é aquela considerada totalmente
hipossuficiente frente ao fornecedor, dando-lhe a oportunidade do acesso à justiça
gratuita.
Outro entendimento de que as sanções penais do Código de defesa do
consumidor ficam totalmente inaplicáveis, se baseia no procedimento das
autoridades responsáveis pela defesa do consumidor, tais como, Procons, Inmetro,
Ipem, Vigilância Sanitária e outros, não remeterem ao Ministério Público ou às
delegacias especializadas, cópias das autuações em que haja indícios de crime para
que sejam propostas as ações penais cabíveis.
Para que haja efetivamente a aplicabilidade das sanções penais impostas
pelo Código de Defesa do Consumidor na punição daqueles que o infringe, teríamos
que ter entre os órgãos responsáveis, uma harmonização de procedimentos dos
quais, fariam com que o fornecedor infrator refletisse ao máximo antes de provocar
qualquer lesão ao consumidor pela venda de produtos ou serviços defeituosos ou
viciados, o que, enquanto isso não acontece, o caminho mais viável ao consumidor
lesado, é aquele que remete à reparação dos danos por responsabilidade civil.
E, quando começar a ocorrer a sintonia e ação dos órgãos fiscalizadores com
relação à denúncia daqueles que cometem crimes na relação de consumo e o
Código de Defesa do Consumidor puder punir com independência em relação ao
Código Penal, talvez possamos ver a aplicabilidade das cláusulas penais ali
impostas. Nesse sentido, leciona José Augusto Peres Filho, em (Filho, 2009, p.
366),. Quando isso passar a ocorrer com naturalidade e na medida em que se dêem
as infrações e autuações, estamos certos de que [...], avançaremos na
implementação efetiva do Código de Defesa do Consumidor, instrumento para a
efetivação da dignidade e da cidadania do povo brasileiro.
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REFERÊNCIAS
Cavalieri Filho, Sérgio. (2009). Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas. Manual de Direito do Consumidor.–Brasília: Escola Nacional de Defesa do Consumidor, 2009, p. 16. BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcelos e GRINOVER, Ada Pelegrini ET. AL. Código..., cit., p. 7 Castro, Flávia Viveiros, (2006), Danos à pessoa nas relações de consumo, Lumen Juris, Rio de Janeiro. Matos, M. B. (05 de setembro de 2006). WWW.direitonet.com.br/artigos. Acesso em 07 de outubro de 2009, disponível em WWW.direitonet.com.br Vasconcellos, A.H. (1991) Comentários ao Código de Proteção ao Consumidor. São Paulo: Saraiva. Júnior, João Marcello de Araújo, (1992), Comentários ao Código do Consumidor. Rio de Janeiro: Forense Khouri, Paulo Roberto Roque Antônio (2006). Direito do Consumidor: contratos, responsabilidade civil e defesa do consumidor em juízo – 3ª Ed. São Paulo: Atlas. Venosa, Sílvio de Salvo (2006). Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos, São Paulo: Atlas Filho, J. A (2009). Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, São Paulo: Verbatim Filomeno, J. G. (2007). Curso Fundamental de Direito do Consumidor, São Paulo: Atlas. Oliveira, J. E. (2009), Código de Defesa do Consumidor, anotado e comentado. São Paulo: Atlas Dotti, R. A. (1992). Comentários ao Código do Consumidor. Rio de Janeiro: Forense. JR., P. J (1991). Comentários ao Código de Proteção ao Consumidor, São Paulo: Saraiva. Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça. Publicação sobre A defesa do consumidor na Argentina, no Brasil, no Paraguai e no Peru. Brasília/Brasil. Artcor Gráfica e Editora Ltda.: 2007. Código de proteção e defesa do consumidor e legislação correlata (2003). Senado Federal. Subsecretaria de Edições Técnicas, Brasília-DF.