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Conversas de Psicologia e do

Envelhecimento Ativo

Atas do Congresso

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Título: Conversas de Psicologia e do Envelhecimento Activo - Atas do Congresso

Autores: Vários

Prefácio: Professor Doutor Carlos Amaral Dias

Texto de Abertura: Comendador Ruy de Carvalho

Coordenadores: Ricardo Pocinho, Vitor Nuno Anjos e Pedro Belo

Editor: Associação Portuguesa Conversas de Psicologia

2016, APCDP

[email protected]

http://conversasdepsicologia.com

ISBN: 978-989-20-6359-1

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ÍNDICE

_____________________________________________________________________________________

PREFÁCIO

Professor Doutor Carlos Amaral Dias __________________________________________________ 7

TEXTO DE ABERTURA

Comendador Ruy de Carvalho _______________________________________________________ 12

1.PRESCRIÇÃO DE EXERCICIO E PREVENÇÃO DE QUEDAS EM IDOSOS UMA REVISÃO

DA LITERATURA

Liliana Santos Ferreira, Anabela Correia Martins & Ricardo Pocinho ________________________ 18

2.ESCALA DE INTENÇÃO E IDEAÇÃO SUICIDÁRIA

Carlos Amaral Dias, Margarida Pocinho, Marisa Loureiro & Vitor Nuno Anjos ________________ 36

3.INTERAÇÃO DOS FATORES SOCIOCULTURAIS E DE DEPRESSÃO NA IDEAÇÃO E

INTENÇÃO SUICIDÁRIA DOS IDOSOS

Margarida Pocinho ________________________________________________________________ 42

4.ESTADOS DE HUMOR E JULGAMENTOS (EMOÇÕES E SATISFAÇÃO COM A VIDA)

Vítor Nuno Anjos, Margarida Pocinho, Alexandra Grasina, João Silva, Luis Loureiro, Margarida Miranda

& Magda Raquel Maia _____________________________________________________________ 48

5.VELHICES, TERRITÓRIOS E CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA: PERCURSOS,

ENCRUZILHADAS E DESVIOS

Marcia Regina Medeiros Veiga, Sónia Cristina Mairos Ferreira, António Manuel Rochette Cordeiro &

Monalisa Dias de Siqueira __________________________________________________________ 55

6.O PROCESSO DE ENVELHECIMENTO HUMANO SOB O OLHAR DO IDOSO.

A REALIDADE DO CONCELHO DA COVILHÃ

Fátima Quelhas Figueiredo __________________________________________________________ 62

7.“EMOÇÕES QUE AS PALAVRAS NÃO TRADUZEM”: ESTUDO DA ALEXITIMIA NUMA

AMOSTRA DE MULHERES COM CANCRO DE MAMA

Helena Sousa, Marina Guerra & Leonor Lencastre _______________________________________ 75

8.primerCOG – UMA FERRAMENTA DE TREINO COGNITIVO, FUNCIONALMENTE

VALIDADA PARA SENIORES COGNITIVAMENTE SAUDÁVEIS

José Carlos Teixeira, Vanessa Costa, Patrícia Alecrim, Sandra Freitas & Isabel Santana __________ 88

9.EFEITOS DO PRECONCEITO E BULLYING NO PROCESSO DE INCLUSÃO ESCOLAR

Morgana Christmann & Sílvia Maria de Oliveira Pavão ___________________________________ 102

10.FAMÍLIA E TRATAMENTO PARA A PESSOA COM TRANSTORNO MENTAL – UM

CASO BRASILEIRO

Lucimar Aparecida Garcia Coneglian & José Augusto Leandro _____________________________ 114

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11.COMPORTAMENTO ANTISSOCIAL E AUTOCONCEITO NA ADOLESCÊNCIA

Alice Murteira Morgado & Maria da Luz Vale Dias ______________________________________ 121

12.O MODELO DE DIAGNOSTICO PSICOSSOCIAL - A PREPÓSITO DE UM CASO

(UTENTE COM ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL, EM FASE DE RECUPERAÇÃO)

Fátima Quelhas & João Figueiredo ___________________________________________________ 183

13.INTERVENÇÃO GRUPAL EM CRIANÇAS COM PARALISIA CEREBRAL

Nuno Cravo Barata ________________________________________________________________ 147

14.MEDIDAS DE PREVENÇÃO E ALERGIAS ALIMENTARES

Cátia Lopes & Nuno Rodrigues ______________________________________________________ 154

15.EXPERIÊNCIAS DURANTE O PERÍODO DE ESTÁGIO NA ASSOCIAÇÃO DE PAIS E

AMIGOS DOS EXCEPCIONAIS (APAE) EM CAMPINA GRANDE/ PARAÍBA/ BRASIL

Clara Lohana Cardoso Guimarães, Clarissa Maria Cardoso Guimarães & João Rogério Dias de Tolêdo

Farias __________________________________________________________________________ 164

16.EXPERIÊNCIAS DURANTE O PERÍODO DE ESTÁGIO NO CENTRO DE ATENÇÃO

PSICOSSOCIAL ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS – CAPS AD - EM CAMPINA GRANDE/

PARAÍBA/ BRASIL

Clara Lohana Cardoso Guimarães, Clarissa Maria Cardoso Guimarães, João Rogério Dias de Tolêdo

Farias & Isabella Lemos Arteiro _____________________________________________________ 175

17.ENVELHECIMENTO E PROJETO DE VIDA: EMOÇÃO E CONSCIÊNCIA DO VIVIDO

Maria de Fátima Fernandes Martins Catão, Kátia Karolina Rodrigues Rocha & Gicelly Pedrosa Cirne

________________________________________________________________________________ 190

18.APRESENTAÇÃO E DIVULGAÇÃO DA PRIMEIRA PLATAFORMA DIGITAL PARA

CUIDADORES INFORMAIS EM PORTUGAL

José Bruno Alves & Ana Ribas Teixeira _______________________________________________ 199

19.ENVELHECIMENTO NA DEFICIÊNCIA OU INCAPACIDADE: ESTUDO COM

LESIONADOS VERTEBROMEDULARES E SEUS CUIDADORES INFORMAIS

Ana Ribas Teixeira & José Bruno Alves _______________________________________________ 204

20.EL CUIDADOR FAMILIAR: RELACIÓN ENTRE LA INSATISFACCIÓN CON EL

CUIDADO Y LA CARGA

Andrea Vázquez-Martínez, Esperanza Navarro-Pardo, Noélia Flores Robaina & Pedro Fernández de

Córdoba Castellá _________________________________________________________________ 225

21.AVALIAÇÃO DA ANSIEDADE AOS TESTES ATRAVÉS DE QUESTIONÁRIOS DE

AUTORRESPOSTA: QUESTIONÁRIO DE COMPORTAMENTOS FACE A SITUAÇÕES DE

TESTE

Tânia Reis & Maria do Céu Salvador __________________________________________________ 236

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22.AVALIAÇÃO DA ANSIEDADE AOS TESTES ATRAVÉS DE QUESTIONÁRIOS DE

AUTORRESPOSTA: QUESTIONÁRIO DE PENSAMENTOS AUTOMÁTICOS FACE A

SITUAÇÕES DE TESTE

Tânia Reis & Maria do Céu Salvador __________________________________________________ 243

23.MANUAIS DE TREINO COGNITIVO COMPENSATÓRIO, PORTUGUÊS: O COGSMART

Ana Paula Couceiro Figueira & Rui Paixão _____________________________________________ 250

24.PROGRAMA DE INTERVENÇÃO NEUROPSICOLÓGICA, PORTUGUÊS: O REHACOG

Ana Paula Couceiro Figueira & Rui Paixão _____________________________________________ 258

25.O QUE PENSAM OS JOVENS-ADULTOS EM IDADE REPRODUTIVA ACERCA DA

DOAÇÃO DE GÂMETAS E DA GESTAÇÃO DE SUBSTITUIÇÃO?

Naír Carolino & Ana Galhardo ______________________________________________________ 269

26.SAÚDE MENTAL E O (RE) ENTENDIMENTO DE UMA REALIDADE VIVIDA

Eliana Nubia Moreira ______________________________________________________________ 277

27.ALTERAÇÕES DO SONO E PROCESSOS DE REGULAÇÃO EMOCIONAL EM ADULTOS

Ana Cristina Neves & Ana Galhardo __________________________________________________ 292

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Prefácio

Professor Doutor Carlos Amaral Dias

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Foi-me pedido um texto sobre o cruzamento entre a psicologia e a sociedade

contemporânea. Poderia ter como ponto de partida alguns dos meus trabalhos,

nomeadamente sobre o terrorismo, a genética ou a modificação do olhar que lançamos

sobre a sexualidade durante o final do Séc. XX e o princípio do Séc. XXI. Seria, no

entanto, demasiado fácil, coisa que, como sabem não gosto.

Irei pois servir-me de um dos mais importantes psicólogos do Séc. XX, Paul Ekman

para poder refletir sobre a extensão da psicologia em áreas tão importantes como a

deteção de mentir, nomeadamente por polícias ou oficiais de Embaixadas e, portanto,

um importante contributo para percebermos quem se move em espaços públicos ou

quem pode ser um potencial terrorista.

Paul Ekman, que começou por ser reconhecido nos meios académicos pelas suas

investigações sobre a mentira, rapidamente estendeu o seu estudo às emoções em geral,

tendo dedicado as suas mais recentes obras ao estudo global daquelas.

Antes de nos pronunciarmos sobre as questões mais recentes levantadas pelas suas

investigações, convém lembrar que os seus estudos sobre a mentira tiveram

repercussões que foram muito além daquelas enunciadas, por exemplo, na famosa obra

de 1989 “Why Kids Lie”. Senão vejamos. O seu método Facial Action Coding System

(Sistema Codificador de Acão facial) teve incidências em áreas diversas. Ao que parece,

mesmo os melhores mentirosos nem sempre conseguem não deixar escapar micro

expressões faciais, que duram menos de metade de um segundo, e que são

incongruentes com o que está a ser dito por estes ou com o seu estado emocional.

Ekman diz “Não quer dizer necessariamente que [o sujeito] esteja a mentir. É aquilo a

que eu chamo um ‘ponto quente’, um ponto de descontinuidade que merece ser

investigado”.

Paul Ekman ensinou, como aliás já afirmei, polícias e oficiais de embaixadas, entre

muitos outros, a detetar uma mentira através da leitura deste micro expressões faciais. O

treino consiste essencialmente em mostrar fotografias de rostos em poses aparentemente

neutras. Em cada rosto, um micro expressão aparece durante 40 milissegundos e o

aprendiz tem de as identificar imediatamente. As expressões podem ser de medo, raiva,

surpresa, etc. O método de treino fornece resultados rápidos, pois ao fim de umas

sessões obteve resultados altos e melhorias substanciais na identificação da mentira.

Para além do micro expressões, Ekman enuncia outros aspetos que podem também

indicar se uma pessoa está a mentir, como a voz, movimentos das mãos, postura,

padrões de discurso, etc. Quando estes variam da forma habitual do indivíduo de falar e

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gesticular, ou não se encaixam na situação, então estamos perante outro ‘ponto quente’

que deve ser investigado. Por exemplo, quando um indivíduo está a mentir é frequente

usar uma linguagem distante, substituindo pronomes da primeira pessoa por outros na

terceira, criando assim o que Ekman apelida de verbal hedges (cercas ou barreiras

verbais), que permitem adiar um pergunta ou resposta dando tempo ao ‘mentiroso’ para

pensar numa estratégia.

O episódio de Bill Clinton e Mónica Lewinsky é um famoso exemplo de como se pode

facilmente detetar uma mentira aplicando estas técnicas. Diz Ekman: “Toda a gente que

eu treinei de todo o país telefonou-me e disse: ‘Viu o presidente? Ele está a mentir”. O

que denunciou Bill Clinton foi precisamente o uso de uma linguagem distante, pois

referiu-se a Mónica Lewinsky como ‘aquela mulher’ (‘that woman’) enquanto ao

mesmo tempo a sua voz se atenuava no fim da frase.

Como se deve calcular, a repercussão de tais estudos e declarações tiveram um enorme

impacto nos Estados Unidos e não só.

É evidente que Paul Ekman foi influenciado por Darwin, veja-se o livro A expressão de

Emoções no Homem e Animais; aí, Darwin procurou defender que as emoções não são

do domínio exclusivo dos humanos, mas que podem também ser encontradas em outras

espécies, e que muitas das ocasiões que geram emoção nos seres humanos fazem-no

também nos animais. Darwin procurou a razão pela qual uma determinada expressão se

usa ou adequa a uma determinada emoção. A resposta é parte fundamental da

demonstração da sua teoria da continuação da espécie e foi crucial para a teoria da

evolução.

Para responder ao porquê de uma relação entre a situação e a emoção solicitada, que

transcende a espécie humana e se apresenta universal, Darwin propôs três princípios.

- Serviceable habits (hábitos úteis) - ou seja, ações que originalmente tinham uma

função e que foram preservadas como sinais. Por exemplo, o retrair do lábio superior de

um cão para expor os caninos. Inicialmente era visto como uma preparação para o

ataque, hoje é “lido” como um aviso ao mostrar ‘a arma’ que poderá ser utilizada.

- Antithesis (antítese) - Darwin utiliza este princípio para descrever porque um cão se

abaixa e se chega ao chão quando adota uma postura submissa; fá-lo porque é o direto

oposto da pose que tomaria para o ataque.

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Darwin mostrou como estes dois princípios explicam a postura de um homem agressivo

(serviceable habits) e a postura de um homem indefeso (antithesis).

- Direct action of the nervous system (Ação direta do sistema nervoso). Para expressões

que não podiam ser explicadas por nenhum dos princípios anteriores, Darwin invocou

este princípio.

Os múltiplos trabalhos científicos de Paul Ekman que, como vimos, se baseiam em

Darwin, não esgotam, no entanto, tudo o que a espécie humana é capaz de produzir

como respostas emocionais. Ou seja, as investigações permitem explicar até um certo

ponto. Aí o sorriso de Mona Lisa interroga-nos. De onde nasce a ambiguidade da

expressão de Gioconda? Quais as partes da face que exprimem sentimentos de alegria

ou tristeza?

O historiador de arte Ernst Gombrich acreditava ser impossível ter certeza do estado de

ânimo com que nos olha.

Mas qual segredo torna tão mutável a expressão da Gioconda? Esta pergunta gerou rios

de discussões. Em geral, as respostas basearam-se no pressuposto de que a ambiguidade

se deve à técnica do sfumato ("esvaecido" ou, literalmente, "esfumado", em italiano),

que desfoca os cantos dos olhos e da boca dando ao quadro um ar de mistério. Mas

Margaret Livingstone, neurobióloga da Faculdade de Medicina de Harvard, propõe-nos

outras formas de avaliar a misteriosa obra de Leonardo. Uma nova explicação,

publicada na revista Science e baseada nas diferenças da perceção da chamada

"frequência espacial" no interior do nosso olho. Trata-se de uma verdadeira medida de

quanto é detalhada uma imagem: se para cada centímetro quadrado da tela de um

computador há mais pixels (isto é, pontinhos que emitem luz), então a representação do

objeto é mais detalhada. Ou, noutros termos, a frequência espacial é mais elevada.

Quando utilizamos a visão central (mirando diretamente o objeto), apreciamos

sobretudo as imagens nítidas (frequências elevadas), antes das mal definidas, enquanto a

nossa visão periférica é mais apta a perceber os contornos esfumados.

Segundo Livingstone, quando não olhamos diretamente a boca de Mona Lisa,

percebemos a parte "alegre" escondida nas baixas frequências, isto é, no sfumato dos

lábios. Mas, se direcionamos o olhar para os lábios, perdemos uma parte do seu sorriso

e temos a impressão de que a expressão muda.

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Muitos, porém, não consideram definitiva essa explicação, pelo menos até que sejam

mais bem esclarecidos quais os traços do rosto humano que exprimem os sentimentos.

Por exemplo, são os olhos que transmitem tristeza ou alegria? Ou é exclusivamente a

forma assumida pelos lábios que veicula essas emoções?

Para Maria Teresa Cattaneo, psicóloga da Universidade de Milão, que estudou por

muito tempo as expressões faciais, os trabalhos de Kontsevich e Tyler, que tentaram

separar a expressão labial do olhar, apresentaram aspetos sujeitos a crítica: “Outras

experimentações indicam que os observadores olham sempre o todo e jamais um só

elemento particular. O cérebro percorre o esquema da face, não uma parte”.

São estes e outros desafios que a obra de Paul Ekman nos lega e legará, apesar e

também por isso, de balbuciarmos tão só um mundo infinitamente probabilístico e em

que os enigmas, tal como Gioconda, nos continuam a desafiar.

Professor Doutor Carlos Amaral Dias

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Texto de Abertura

Comendador Ruy de Carvalho

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Texto do Actor Ruy de Carvalho escrita opara o 2.º Congresso Nacional Conversas de

Psicologia | 1.ª Conferencia Internacional de Envelhecimento Ativo 1

Como disse Sartre, “só há duas maneiras de acabar a vida, ou livre... ou não!”

Já não é tabu falar-se de velhice, assim como se perdeu o tino e a vergonha de se falar

de tudo, como se, de repente, a opinião tivesse tomado o poder, e o poder da opinião

passasse a ser uma declaração de guerra ao esquecimento e ao medo.

Mas infelizmente, o poder da opinião passou a ser o poder do adormecimento. Não há

nenhum mecanismo da sociedade moderna que nos defenda deste alvoroço antigo, desta

inquietação - inquietação, de que o instinto nos fala de mansinho sobre esta cerimónia

silenciosa do passar dos dias.

Passámos dos dias da mordaça para os tempos de uma democracia, onde todos

participam... menos os mais velhos! Ou porque já trabalharam muito, ou porque

merecem descansar, ou porque não servem para nada... ou ainda porque devem ser

deixados morrer em paz.

No entanto, é neles que se reflecte tudo aquilo que verdadeiramente conquistámos. É

nesta paisagem, em que falamos deles, dos mais velhos, como eu, como se fossem uma

raça em extinção, que damos as mãos numa cerimónia silenciosa, na qual

sistematicamente somos novos e cinicamente perplexos, a sugerir soluções inúteis,

perante o engenhoso e piedoso invento, de que temos todos direito a uma morte digna.

Tenho uma estranha e subtil esperança de que, um dia, não tenhamos que sofrer o que

fizemos aos nossos velhos. É curioso como a sociedade votou parte da sua vitalidade e

paixão, a pintar esta maravilhosa aventura a que chamamos vida, com cores doces e

conciliadoras, criando apetecíveis planos de reforma, sistemas infalíveis de segurança

social e mecanismos de harmonia geriátrica, como quem se sente culpado, e

remotamente põe a questão do eterno retorno. Deus não existe, dirão os cépticos, mas...

e se estivermos enganados?

Meus amigos, todos os sistemas são falaciosos e falíveis, se não existir o amor entre os

homens.

E isto não é uma utopia, é uma verdade que todos nós conhecemos, mas que raramente

pomos em prática. Estamos tão ocupados a servir de motor a esta sociedade, que quando

1 O Actor não esteve presente no evento mas a comissão organizadora decidiu, devido o elevado valor do texto e do seu autor, solicitar ao mesmo autorização para o publicar.

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nos retirarmos para a nossa ilha predilecta, que na maior parte dos casos, não passa de

um corpo demasiado maduro e exausto, já não temos forças para advertir os jovens.

A morte acaba por premiar uns, eternizando-os, e condenar os restantes outros... (a

esmagadora maioria), matando-os!

É nesse sentido que a maior parte de nós é condenada ao esquecimento sem nenhuma

razão.

Por que será que escolhemos carregar a vida com descuido e com ódio, em vez de o

fazermos com amor e com carinho?

No tema que hoje aqui nos traz, a coisa é muito mais complexa. Ensinaram-nos que nos

deitaremos, um dia, na cama que fizermos ao longo da vida…e nós aceitámos isso como

um dogma da vida.

Mas a verdade é que… no final, o amor que plantámos em vida será igual àquele que

iremos colher na morte.

Aprendemos que o investimento mais seguro é aquele que se faz na família. Isso não é

linear, porque nem sempre os nossos filhos comungam das dores da nossa velhice.

Então, o que é que está mal?

Será o trabalhar uma vida inteira à espera do descanso merecido?

Será o amar e sofrer por um causa, seja ela a família, um país, ou um ideal?

Será o sermos essa tal sociedade anónima que rege a apologia da esperança como um

fantasma inquieto e febril, mostrando sempre o mesmo horizonte visual, o mesmo céu,

onde apenas as nuvens variam, mas onde só elas vivem... inatingíveis?

Afeiçoámo-nos de tal forma ao ridículo da riqueza e da posse dos bens materiais, que

remetemos a nossa velhice para uma boa reforma, um lar de terceira idade capaz, e um

funeral de estadão, se possível com bandas militares e imagens na televisão, e

permitimo-nos a que a nossa família conte os nossos tostões à espera dos sapatos do

morto.

Entre o dia em que nos assumem como velhos, e o dia da partida, fica uma imensa

solidão. Um empurra - empurra do avô para as diferentes casas dos filhos, umas visitas

cada vez mais esporádicas aos lares, uns jogos de cartas no jardim do Príncipe Real, e

um ténue olhar de amor, cada vez mais difuso daquele velho que nada mais tem para dar

do que a sabedoria inerente ao seu estatuto de pessoa vivida e sábia, de quem não se

quer ouvir a opinião, porque é quase sempre crua, dura, mordaz, verdadeira, simples e

definitiva.

É por isso, que não se gosta dos velhos!

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Para um velho nunca há dúvidas sobre quem vai tombar neste ou naquele confronto! Às

vezes com um sorriso desmonta discursos inteiros, naquele minuto em que, ao seu lado,

irrequieto e distante, está o jovem neto, que remotamente se apercebe de quanta

sabedoria trazem aqueles cabelos brancos.

E no entanto... são inseparáveis! Porquê?

Porque o velho tem a serenidade que só o amor contém, e a criança transborda de vida,

daquela vida que ele tão bem conhece e que só deseja viver para proteger quem ama.

Não há avô que não conheça a saudade, que é a memória mais serena do amor.

O amor que une o avô e o neto é um rochedo cravado na terra, imune á acção

destruidora da sociedade atormentada e do tempo. Não é preciso falarem. O silêncio dá-

lhes força, uma força... que se chama respeito mútuo. No olhar de um, o bom senso, nos

olhos do outro, o amigo de cabelo brancos que ele gostava tanto de ter na escola. É aqui

que tudo começa, ou melhor, é aqui que tudo devia começar, porque é ali que as duas

ingenuidades se tocam. O fim de uma vida traz o conhecimento dos caminhos. A

coragem e a amizade, formam um grande laço e um exemplo para todos os outros

poderem viver a paz que nunca conheceram.

A Verdade não se demonstra: afirma-se!

Porque razão temos tanto medo de ser velhos?

Conhecer é um acto supremo.... É importante que se torne visível o respeito que

devemos ter por aqueles que percorreram os caminhos que ainda temos pela frente. O

amor pela vida que um simples velho contém, é uma fonte de esperança renovada, que

pode fazer a diferença entre este mundo dito moderno, e o mundo que poderíamos ter

tido, e não temos, porque não quisemos, ou não conseguimos ter

Se me permitem um último pensamento, queria deixar-vos como tema de meditação a

ideia de que olhar a velhice como um desterro, é tão absurdo como imaginar uma

paisagem sem cor. É por isso que a ciência não satisfaz o homem. A sua área é restrita.

Respeite-se o seu imenso desejo de pesquisa, mas ensine-se-lhe que o sonho a

ultrapassa facilmente, na sua avidez de infinito, de sentimento, de maturidade, de

preenchimento interior.

Magoa ver a velhice como o descanso do guerreiro, ou como a antecâmara da morte. Eu

não o vejo assim...Eu não deixo que isso me aconteça, porque não desisto de viver...de

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trabalhar, enquanto puder...de viver com os mais jovens....gente do meu tempo....com

um pouco menos de idade.

Todos nós, mais dia, menos dia, teremos de atravessar essa ponte pênsil e pouco segura,

com um andar lento... e doloroso, com o olhar velado pela pouca vontade de sorrir e de

dizer coisas bonitas.

Porquê fazê-lo com amargura, se à dor física não podemos fugir?

Porquê fazê-lo com tristeza, apenas porque a falta de força física nos torna pesados.

Porquê fazê-lo sós, se temos tanta gente que nos pode ajudar a caminhar com dignidade

para o outro lado, para a outra margem...

O branco das nossas cabeças, é uma espécie de elegia ao nosso reencontro com a Mãe-

natureza. De que serve baixar os olhos, se tudo à nossa volta não se cala?

A velhice é um mistério. Mas é dela que se alimentam os poetas... e as mais belas

canções. Um simples cabelo branco contém o maior dos enigmas da criação.

Como fugir a ela, se a sua mão nos persegue, dentro e fora de nós, antes e depois de

tudo? O que fizermos pelos velhos, estaremos a fazê-lo por todos nós.

O que fomos em novos, sê-lo-emos em velhos, e mesmo agora, o que deixarmos de

fazer… e de dizer, faltará, por certo, no futuro.

Muito obrigado

Ruy de Carvalho

(com a prestimosa ajuda da minha filha Paula)

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PRESCRIÇÃO DE EXERCICIO E PREVENÇÃO DE QUEDAS EM IDOSOS

UMA REVISÃO DA LITERATURA

Liliana Santos Ferreira 1,2 Anabela Correia Martins 1 & Ricardo Pocinho3

1 Instituto Politécnico de Coimbra – ESTeSC Coimbra Health School, Department of

Physiotherapy

2 União das Misericórdias Portuguesas, Centro de Apoio a Deficientes – João Paulo II

3INTERTECH – Universidade de Valencia

Abstract

Background: Approximately 28-35% of people aged 65 and over fall each year.

Falls lead to 20-30% of mild to severe injuries and are the underlying cause of 10-15%

of all emergency department visits.

Objective: To identify and analyze the effects of physical exercise programs on the

reduction of the risk of falls in adults, living in the community, over the age of 60.

Methods: Studies published in journals indexed in international databases were

included. After consulting two Systematic Reviews Cochrane (2012) and Nice (2013),

10 articles published between 2012 and 2015 were analyzed, not included in these

Systematic Reviews.

Results: In this review the following studies were included: one on strength training,

one on the training of balance and eight on the multicomponent exercise programs. The

multicomponent exercise intervention, composed by strength, endurance and balance

training, seems to be the best strategy to decrease the rate of falls in older adults.

Conclusion: The different exercise programs are effective in preventing falls among the

elderly. The multidisciplinary support is based on the preventive practices of falls and

therefore needs an attitude of shared information between health professionals.

However, more studies are necessary to enable the reproduction and the comparison of

their results.

Keywords: Elderly; Fall; Exercise; Community.

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Resumo

Introdução: Anualmente, a percentagem de idosos com mais de 65 anos de idade que

sofrem quedas, situa-se entre os 28% e os 35%. As quedas correspondem de 20%-30%

dos ferimentos leves e são a causa subjacente de 10% a 15% de todas as consultas nos

serviços de urgência.

Objetivo: Identificar e analisar os efeitos dos programas de exercício na diminuição do

risco de quedas nos idosos, inseridos na comunidade, com mais de 60 anos de idade.

Métodos: Foram utilizados artigos publicados em revistas indexadas em bases de dados

internacionais. Após consulta de duas revisões sistemáticas Cochrane (2012) e Nice

(2013), foram analisados 10 artigos publicados entre 2012 e 2015, não incluídos nestas

revisões sistemáticas.

Resultados: Nesta revisão foram incluídos os seguintes estudos: um relativo ao treino

de força, um relativo ao treino de equilíbrio e oito relativos a programas de treino

multicomponente. A intervenção do treino multicomponente composto por exercícios

de força, de resistência e de equilíbrio, parece ser a melhor estratégia para diminuir a

percentagem de quedas nos idosos.

Conclusão: Os diferentes programas de exercício foram efetivos na prevenção de

quedas nos idosos. O apoio multidisciplinar, baseado na prevenção de quedas requer

partilha de informação entre os profissionais de saúde. Contudo, são necessários mais

estudos que permitam a reprodução e a comparação dos resultados.

Palavras-chave: Idosos; Queda; Exercícios; Comunidade.

Introdução

As quedas são a segunda causa de morte em todo o mundo (OMS, 2012), sendo

responsáveis por 40%, de todas as mortes relacionadas com ferimentos (WHO, 2007).

Anualmente, a percentagem de idosos com mais de 65 anos de idade que sofrem quedas,

situa-se entre os 28% e os 35%, já nos idosos com mais de 70 anos, esta proporção

aumenta para entre os 32% e os 42% (WHO, 2007).

As quedas correspondem a 20-30% dos ferimentos leves e são a causa subjacente de

10% a 15% de todas as consultas nos serviços de urgência. Mais de 50% das

hospitalizações por ferimentos ocorrem entre pessoas com mais de 65 anos de idade

(WHO, 2007).

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20

20

Adicionalmente, as quedas nos idosos podem também resultar em síndrome pós-queda,

que inclui dependência, perda de autonomia e imobilização que levarão a restrições nas

atividades e na participação social. Destes idosos, muitos acabam por ser

institucionalizados.

De notar que a ocorrência de quedas tem uma origem multifactorial (Veríssimo, 2014).

A WHO (2007) divide esses fatores em quatro dimensões:

Fatores biológicos, como por exemplo, a idade, o género, a raça, entre outros.

Fatores comportamentais, que estão relacionados com comportamentos e ações dos

indivíduos, como por exemplo, a polimedicação, o alcoolismo, o sedentarismo, entre

outros.

Fatores de risco ambientais, que resultam da interação das condições físicas dos

indivíduos com o ambiente, como por exemplo, as barreiras arquitetónicas.

Fatores socioeconómicos, que estão relacionados com os níveis de escolaridade e com a

acessibilidade no domicílio.

Prescrição de exercício e prevenção de quedas

A atividade física e o exercício são componentes importantes na prevenção e no

tratamento de várias doenças e problemas que surgem ao longo do processo de

envelhecimento (Hellénius & Sundberg, 2011). A evidência científica publicada

internacionalmente, nomeadamente guidelines gerais e específicas (Global Advocacy

for Physical Activity, 2010), e a promoção da atividade física como uma

responsabilidade da sociedade em geral e dos profissionais de saúde, em particular, são

algunas das medidas para ese efeito. É, por isso, necessário clarificar quem prescreve,

com base em que critérios, que tipo de atividade/exercício e em que contexto deve

acontecer.

A decisão sobre o tipo de programa de atividade física/exercício (individual vs em

grupo) mais ajustado a uma pessoa depende de vários factores, como preferências

pessoais, extensão dos problemas, disponibilidade dos serviços, entre outros. Embora na

perspectiva das agências, dos serviços e dos profissionais, os programas em grupo

sejam continuamente mais eficientes, a evidência sugere que os que incorporam uma

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21

avaliação e um acompanhamento individualizado, progressivo e seguro conduzem,

ainda, a melhores resultados e benefícios percepcionados pelos indivíduos.

A prescrição, cuidadosa e suportada pela evidência, de um programa para auto

administração também é hoje apontada como uma estratégia capaz de maximizar os

recursos humanos (Australian Commission on Safety and Quality in Health Care, 2008).

Particularmente na prevenção de quedas nas pessoas mais velhas, e de acordo com

Latham, Anderson, Bennett e Stretton (2004) e Wu (2002), os programas menos

efetivos estão frequentemente relacionados com as intervenções em grupo. Este facto

pode ser devido à dificuldade em realizar um programa simultaneamente, motivador e

seguro, em que os exercícios possam ser orientados e modificados para minimizar as

dificuldades e maximizar as capacidades de todos os participantes. Paralelamente, a

auto eficácia no idoso começou a ser vista como um recurso interno capaz de minimizar

os efeitos das incapacidades funcionais que podem afetar o bem-estar e a qualidade de

vida no envelhecimento. No caso do exercício, é completamente seguro que a

autoeficácia seja um determinante consistente na adoção do exercício e na sua

manutenção a longo prazo (Brassington et al., 2002).

Alguns estudos revelam que a literacia em saúde é mais baixa entre a população mais

velha (Baker, Gazmararian, Sudano & Patterson, 2000; Gausman Benson & Forman,

2002), o que pode dificultar a consciencialização para os problemas e a participação nos

programas de atividade física e exercício (Scott, Gazmararian, Williams & Baker,

2002). Segundo os mesmos autores, a literacia em saúde é um preditor mais forte do uso

de medidas preventivas do que o nível de educação ou instrução.

Estas evidências são fundamentais para a conceção e design da intervenção baseada em

prescrição de atividade física ou exercício. Se as pessoas com baixa literacia em saúde

apresentam mais resistência aos programas de exercício, então, material educacional

adequado a essa baixa literacia, como um panfleto intuitivo e pouco dispendioso, com

recomendações simples, ou mais complexas, de atividade física ou exercício,

desenvolvidas e escritas por um especialista deverá apresentar-se como estratégia

coadjuvante do aconselhamento e ensino presencial (Smith et al. 2000; Swinburn et al.

1998; Swedish National Institute of Public Health, 2010).

Nas últimas décadas, a prescrição escrita de conselhos para que doentes e população em

geral se mantenham fisicamente ativos através de atividades ou de programas de

exercício específicos tem sido difundida como uma forma de dar recursos aos cidadãos,

capacitando-os para gerir a sua própria saúde. Green prescription, exercise by

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22

prescription, proactive healthcare by referral, prescriptions of physical activity e

Physical Activity on Prescription, FaR® são algumas das designações apresentadas na

literatura e apontadas em várias investigações como medidas economicamente

acessíveis de aumentar a atividade e de melhorar a qualidade de vida de determinados

doentes em 12 meses, sem evidência de efeitos adversos (Elley, Kerse & Robinson,

2003; Elley, Arroll, Swinburn, Ashon & Robinson, 2004; Williams, 2009; Umpierre et

al., 2011).

Recomendações para prevenir as quedas e as suas consequências sugerem a

implementação de estratégias standard e estratégias individualizadas adequadas aos

recursos disponíveis, revistas regularmente e monitorizadas, envolvendo a pessoa e o

seu coletivo, formal e informal, cuja finalidade é a sustentabilidade das mesmas

(Australian Commission on Safety and Quality in Health Care, 2012; National Center

for Injury Prevention and Control, 2008).

Particularmente na prevenção de quedas nas pessoas mais velhas, e de acordo com

Gillespie et al. (2012), Latham, Anderson, Bennett e Stretton (2004) e Wu (2002), os

programas menos efetivos estão frequentemente relacionados com as intervenções em

grupo e realizadas em ambientes alheios ao quotidiano. Este facto pode ser devido à

dificuldade em realizar um programa, simultaneamente, motivador e seguro, em que os

exercícios possam ser orientados e modificados para minimizar as dificuldades e

maximizar as capacidades de todos os participantes.

A prescrição de exercício é prioritária, não apenas para a prevenção de quedas, mas das

suas consequências; particularmente, se promover mudanças positivas no equilíbrio e na

mobilidade após a realização de um programa adequado e individualizado, desenhado e

implementado por fisioterapeutas e, sustentado na articulação com outros profissionais e

cuidadores informais (Australian Commission on Safety and Quality in Health Care,

2012; Sherrington et al, 2008; Shubert, 2011).

O presente estudo pretende dar um contributo na avaliação dos efeitos de diferentes

programas de exercício na diminuição do risco de quedas (RQ) em idosos, inseridos na

comunidade, com idades acima dos 60 anos.

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23

Materiais e Métodos

Foi realizada uma pesquisa, de revisão da literatura, com a finalidade de encontrar

estudos nos quais foi realizada a prescrição de exercício físico para a prevenção do RQ

em idosos.

Foram revistos artigos publicados em revistas indexadas em bases de dados

internacionais. Após consulta de duas revisões sistemáticas: Cochrane Database of

Systematic Reviews (2012) e Nice (2013), foram analisados ainda 10 artigos publicados

entre 2012 e 2015, não incluídos nestas revisões sistemáticas.

A pesquisa foi realizada em fontes eletrónicas da MEDLINE (PubMed), Cochrane e

ELSEVIER. Os termos utilizados na pesquisa foram: Idosos (Elderly), Quedas (Fall),

exercício (Exercise), comunidade (Community). Foram incluídos os artigos publicados

em Inglês, em Castelhano e em Português.

Na Figura 1, podemos visualizar os critérios de Inclusão e de Exclusão da nossa

pesquisa.

Figura 1 – Critérios de Inclusão e de Exclusão

A Figura 2 apresenta o método de pesquisa utilizado na realização deste estudo de

revisão da literatura.

Risco de Quedas nos Idosos

Critérios de Inclusão

- Estudos de avaliação dos

efeitos de programas de

exercício, na diminuição do

Risco de quedas.

Critérios de Exclusão

- Idosos institucionalizados.

- Estudos realizados em grupos

com Condições Específicas de

Saúde.

- Idosos inseridos na

Comunidade

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24

Figura 2 – Método de Pesquisa

Posteriormente foram escolhidos os artigos relacionados com a avaliação dos efeitos do

exercício físico na diminuição do RQ. Destes artigos, foram selecionados os que faziam

parte dos critérios de inclusão.

Resultados

Neste seguimento, foram selecionados 10 estudos que avaliaram os efeitos de

programas de exercício no risco de quedas dos idosos, por corresponderem aos critérios

de inclusão desta revisão da literatura.

Na Tabela 1, podemos visualizar a caracterização dos diferentes protocolos de

intervenção através do exercício físico em adultos idosos com risco de quedas.

Datas dos estudos incluídos: 01/ 01/ 2012 até 31/ 04/ 2015

Número de Artigos Identificados na base de dados Pubmed

(N = 176), Cochrane (N = 1) e Elsevier.es (N = 12)

N Total = 189 Artigos

Artigos Excluídos após aplicação dos

critérios de Exclusão N = 179 Artigos

Artigos Incluídos na Síntese Qualitativa

N =10 Artigos

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25

Tabela 1 - Caracterização dos Estudos Incluídos

Autores

N

Idade Média

Protocolo de Intervenção

Período/ Follow-up

Resultados/ Quedas

Carlson et al.

(2013)

N = 15

78,1

Programa Flo-Dynamics

Movement

PMC: TFx+ TF + TE

(3x/ semana, 30 Minutos)

8 Semanas ↓ Número de Quedas

↑ Isocinético da flexão/ extensão do joelho

↑ Equilíbrio e Flexibilidade

Llamosas et al.

(2014)

N = 24

70,5

PMC: GE → TFx+ TF + TR + TE

(2x/ semana, 1h)

GC

8 Semanas

Follow-up 24 meses

↓ Número de Quedas

↑Mobilidade, Equilíbrio e SF-36

Matida et al.

(2012)

N = 34 M

66,2

Programa Tai Chi Chuan = TE

GE = (2x/ 24 semanas, 50

minutos); GC

24 Semanas ↓ Risco de Quedas

↑ Isocinético na extensão do joelho

McLean et al.

(2015)

N = 1090

70

PMC: GE → TFx+ TF + TE

(1x/ semana, 1h)

GC

15 Semanas

Follow-up 18 meses

↓Percentagem de Quedas

↑O programa aplicado em mulheres possui

boa relação custo-efetividade.

Nogueras et al.

(2013)

N= 137M

71,7

PMC: TF + TFx + TR + CT + TE

(9 meses/ ano, 3x/ semana, +/- 1h)

5 Anos ↓ Número de Quedas

Palvanen et al.

(2014)

N = 1314

77,6

Programa Multifatorial

MCEP: GE→ TFx + TF + TE +

1 Ano ↓ Número de Quedas

↓ Fatores de Risco

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26

Av. Médica + Nutricionista +

Modificação em Casa; GC

Pata et al.

(2014)

N = 35

74,4

Programa Pilates

MCEP: TF+ TR + TE

(2x/ semana, 1h)

8 Semanas ↓ Número de Quedas

↑Equilíbrio, Mobilidade e Controlo

Postural

Pérez-Ros et al.

(2014)

N = 249

74,5

PMC: +/- 1h

GE1: Educação Mensal sobre

prevenção de Quedas + PMC

GE2: Educação Trimestral + PMC

CG: Educação Inicial sem reforço

posterior

12 Meses ↓ Número de Quedas

Scarpim et al.

(2013)

N= 20

64,5

TF

GE = 3 série, 10-15 repetições,

Iniciar com 50% progredindo para

60-75% da 1RM

(3x/ semana, 1h); GC

24 Semanas ↓ Risco de Quedas (Timed Up and Go)

↑ Fortalecimento Muscular

Yoo et al.

(2013)

N = 21M

74,27

Programa Otago

PMC = TF + TE (3x/ semana, 1h)

GE1: Reality-based Otago;

GE2: Otago.

12 Semanas ↓Falls Efficacy Scale

↑Equilíbrio

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27

N Total = 2939

PMC Programa Multicomponente; TF Treino de Força; TE Treino de Equilíbrio; TFx Treino de Flexibilidade; TR Treino de Resistência; TC

Treino de Coordenação; GC Grupo Controlo; GI Grupo Experimental; M Mulheres; ↑Aumento; ↓Diminuição.

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28

Discussão dos Resultados

Em Portugal, à semelhança de outros países, as taxas de envelhecimento demográfico

têm vindo a aumentar. Neste sentido, a participação regular em programas de exercício

físico é fundamental para diminuir o risco de quedas (RQ).

A prescrição do exercício deverá ser individualizada e progressiva, e com base nas

recomendações para a prescrição do exercício nos idosos (Nelson et al. 2007). A

Swedish National Institute of Public Health (2010) considera os seguintes níveis de

prescrição do exercício:

No nível 1, são enquadrados os indivíduos com condição específica de saúde já

desenvolvida ou com risco de a desenvolver.

O nível 2 diz respeito a programas individuais ou em grupo, mas ainda orientados por

profissionais de saúde.

Nos níveis 3 (em grupo) e 4 (individual) são enquadrados todos os indivíduos com

capacidade para participar em programa regulares de exercício físico, que podem ser

monitorizados por agentes desportivos, sociais, ou outros. A prescrição no nível 4 é

auto-administrada.

Nesta revisão de literatura foram incluídos os seguintes estudos: um relativo ao treino

de força, um relativo ao treino de equilíbrio e oito relativos a programas de treino

multicomponente.

Treino de Equilíbrio

A maior parte dos estudos sobre a efetividade dos exercícios de equilíbrio nos idosos

tem-se focado no RQ.

Matida el al. (2012), após aplicação de um programa de Tai Chi Chuan uma modalidade

de destaque nos programas e exercícios para a terceira idade, obteve melhorias nos

níveis de força muscular avaliada através do dinamómetro isocinético, do equilíbrio e na

diminuição do RQ.

Salientamos que o treino de equilíbrio foi incluído em todos os estudos com programas

de exercício multicomponentes analisados.

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Treino de Força

O treino de força tem merecido, nos últimos anos, uma especial atenção, uma vez que

permite a minimização da perda da massa muscular, da força e da função motora nos

idosos (Huber et al. 2009). Scarpim et al. (2013) mostrou que o treino de força é eficaz

no aumento dos níveis de força muscular e na diminuição do RQ avaliado através do

teste Timed Up and Go.

Na revisão sistemática de Ceccato et al. (2013), refere-se que a maior parte dos estudos

com idosos verificaram um aumento dos níveis de força muscular, independentemente

da velocidade de movimento treinada. Contudo, em relação à potência, alguns autores

afirmam que velocidades de movimento rápidas e lentas são eficientes, enquanto outros

afirmam que velocidade rápida é melhor.

De salientar que o treino de força foi incluído em todos os estudos com programas de

exercício multicomponentes analisados.

Programas Multicomponente

Os programas que envolvem várias componentes, nomeadamente exercícios de força,

resistência, flexibilidade, equilíbrio, entre outros, têm-se mostrado efetivos na melhoria

da condição física dos idosos e, consequentemente na diminuição do RQ.

Herrero et al. (2015), e Cadore et al. (2013), afirmam que as melhorias da capacidade

funcional são mais evidentes quando o programa envolve mais de uma componente,

nomeadamente os exercícios de força, de resistência e de equilíbrio. Isto, quando

comparados com a aplicação de programas de exercício em que é exercitado apenas

uma componente.

Nos estudos com programa de exercícios com multicomponentes foram encontrados

alguns programas específicos, tais como:

O programa Flo-Dynamics Movement, que foi concebido especificamente para idosos,

consistindo na realização de uma série de movimentos lentos e contínuos destinados a

aumentar a força, a flexibilidade e o equilíbrio (Carlson et al., 2013).

O programa Pilates, também concebido especificamente para idosos, é constituído por

exercícios de fortalecimento, de resistência e de equilíbrio (Pata et al., 2014).

O programa Otago, utilizado em idosos é composto por exercícios de fortalecimento,

equilíbrio e caminhada, com recurso a equipamento de projeção (Yoo et al., 2013).

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Palvanen et al. (2014) constataram que a utilização de um programa de exercício com

multicomponentes, em conjunto com uma abordagem multidisciplinar envolvendo o

médico, o nutricionista, o fisioterapeuta e a modificação dos fatores de risco em casa,

são eficazes na diminuição do número de quedas.

Llamosas et al. (2014), McLean et al. (2015), Nogueras et al. (2013), e Pérez-Ross et

al. (2014), também utilizaram nos seus estudos programas de exercício com

multicomponentes.

Segundo Guillespie et al. (2012), NICE (2013), Carlson et al. (2013), Pata et al. (2014),

Yoo et al. (2013), Llamosas et al. (2014), McLean et al. (2015), Nogueras et al. (2013),

Palvanen et al. (2014) e Pérez-Ross et al. (2014) os programas de exercício com

multicomponentes são eficazes na diminuição do RQ.

Segundo Guillespie et al. (2012) os programas para prevenir o risco de quedas parecem

também prevenir a ocorrência de fraturas.

Em suma, todos os programas analisados se mostraram efetivos na diminuição do RQ.

O número total de indivíduos incluídos nos estudos analisados foi de 2939.

O Plano Nacional de Saúde 2012 – 2016 (2012) contempla um objetivo relacionado

com a promoção de contextos favoráveis à saúde ao longo do ciclo da vida. Neste

sentido, a implementação de exercício físico será fundamental para diminuir o RQ nos

idosos.

Conclusões

A prevenção e a melhoria do estado de saúde dos idosos inseridos na comunidade

garantem uma política de envelhecimento ativo.

Todos os estudos analisados foram eficazes na prevenção de quedas nos idosos (Carlson

et al, 2013, Llamosas et al, 2014, Matida et al, 2012, McLean et al, 2015, Nogueras et

al, 2013, Palvanen et al, 2014, Pata et al, 2014, Pérez-Ros et al, 2014, Scarpim et al,

2013 e Yoo et al, 2013).

Os programas de exercício com multicomponentes reduzem significativamente o RQ

(Guillespie et al, 2012, NICE, Carlson et al, 2013, Llamosas et al, 2014, McLean et al,

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2015, Nogueras et al, 2013, Palvanen et al, 2014, Pata et al, 2014, Pérez-Ross et al,

2014 e Yoo et al, 2013).

A avaliação multifactorial, que inclui a avaliação dos fatores de risco, é fundamental na

diminuição das quedas da população idosa (Palvanen et al, 2014). O apoio

multidisciplinar, baseado na prevenção de quedas requer partilha de informação entre os

profissionais de saúde.

Contudo, são necessários mais estudos que possibilitem a reprodução e a comparação

dos resultados.

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36

ESCALA DE INTENÇÃO E IDEAÇÃO SUICIDÁRIA

Margarida Pocinho1,2 Carlos Amaral Dias2 Marisa Loureiro3 &Vitor Nuno Anjos2,

4

1Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Coimbra

2Instituto Superior Miguel Torga | Coimbra

3Laboratório de Bioestatística e Informática Médica, IBILI – Faculdade de Medicina da

Universidade de Coimbra

4Associação Portuguesa Conversas de Psicologia.

INTRODUÇÃO

A maioria dos diagnósticos baseiam-se na avaliação subjetiva da presença de sintomas e

síndromes clínicas. Há maior grau de concordância entre diferentes investigadores,

quando a atribuição do diagnóstico é orientada por critérios operacionais e entrevistas

psiquiátricas padronizadas, possibilitando a comunicação internacional e a comparação

de resultados obtidos em diferentes contextos.

De facto, os instrumentos diagnósticos, os exames subsidiários e as escalas de avaliação

podem transformar-se em medidas extremamente prejudiciais para a clínica e para a

pesquisa, quando submetidas à má utilização por profissionais não treinados, que

desconhecem os conceitos subjacentes ou que ultrapassam, inadvertidamente, seus

limites (Pocinho, 2007)

Para estes últimos, as avaliações padronizadas são simplistas, pois, transformam uma

dimensão clínica num número ou categoria, relegando a segundo plano o julgamento

clínico subjectivo. No entanto parece-nos uma falsa questão, já que qualquer sistema

classificatório, escala de avaliação ou entrevista diagnóstica nada mais é do que uma

teoria (um conceito) e uma tecnologia (um instrumento operacional). De facto, o clínico

que faz sua avaliação de forma não padronizada, baseando-se na sua experiência

profissional e impressão pessoal, utiliza o mesmo referencial teórico que gerou as

entrevistas estruturadas ou semi-estruturadas. A verdade é que as escalas baseadas nos

avanços psicométricos e em critérios de diagnóstico podem oferecer, com um perfil de

efeitos colaterais baixos, uma indicação terapêutica adequada. É o que se pretende com

a criação da Escala Torga de Intenção e/ou Ideação suicidária (ETIIS).

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Escala Torga de Intenção e/ou Ideação suicidária (ETIIS)

A ETIIS foi criada originalmente por Pocinho e Dias em 2005, contudo não foi sujeita a

nenhuma publicação com informação completa acerca da escala para além da tese de

doutoramento de um dos autores, onde foi apresentada. A ETIIS tem sido várias vezes

solicitada para estudos, tendo por isso a autora convidado os dois outros autores deste

artigo para confirmarem os seus dados e proceder a esta primeira publicação, com vista

a uma análise confirmatória com modelos de equações estruturais à posteriori. A ETIIS

é uma escala de heteroadministração, constituída por 11 itens, com duas alternativas de

resposta cotando com um ponto as respostas que revelam intenção e/ou ideação

suicidária e com zero pontos as que não revelam (apêndice).

Para a construção da ETIIS foi, inicialmente, utilizada uma lista de 20 afirmações

gerada por entrevistas realizadas aliadas a outros itens retirados de outras fontes que

resultou num questionário com 35 itens, abrangendo as dimensões: intenção e/ou

ideação suicidária. Entrevistamos, então, 24 indivíduos. Num primeiro momento,

pedimos que apontassem espontaneamente as afirmações que definiam intenção e

ideação suicidária. Não foram sugeridos nenhuns itens pelos entrevistados.

Os itens foram ordenados de acordo com o seu score de impacto. Para reduzir o número

de itens, a fim de compor o instrumento final, foram selecionados os primeiros itens de

score mais alto. Passámos de seguida à análise psicométrica para seleção e redução dos

itens – Análise fatorial (ACP). Administrámos a ETIIS a 600 adultos e fizemos a ACP

dos 15 itens restantes forçando a 2 fatores (intenção e ideação suicida) pelo método

varimax.

Verificámos que 4 dos 15 itens não saturavam com nenhum fator acima de 0,25 e

decidimos retirá-los já que existiam outros itens refletiam o mesmo constructo.

Renumerámos os itens e procedemos a nova ACP. Este último ACP revelou um padrão

de itens distribuídos por dois fatores, apesar dos itens 3 e 5 saturarem em ambos os

fatores. Seguindo as indicações de Bryman e Cramer (1992) optámos pela decisão de os

manter onde mais saturavam, isto é no fator 1, ficando a escala e respetivas subescalas

compostas pelos seguintes itens.

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Tabela 1: ETIIS e respetivas subescalas

Dimensões Itens

Ideação e/ ou Intenção

suicidária (ETIIS) {1,2,3,4,5,6,7,8,9,10,11}

Ideação Suicidária (IDS) [1-6]

Intenção Suicidária (INS) [7-11]

Para avaliar a consistência interna, recorremos ao coeficiente de Kuder-Richardson, face

ao pressuposto estatístico de que é o coeficiente indicado para avaliar escalas com

níveis de mensuração dicotómica, em especial quando a cotação envolve zero e um

como escala de medida (Pocinho, 2012). Os resultados podem ser observados no quadro

que se segue.

Quadro 1 - Análise da fidedignidade das subescalas do ETIIS – KR20

Dimensões Itens Kuder-Richardson

ETIIS {1,2,3,4,5,6,7,8,9,10,11} 0,846

Ideação Suicidária (IDS) [1-6] 0,819

Intenção Suicidária (INS) [7-11] 0,729

Como se pode observar a ETIIS tem elevada consistência interna, embora quando

partilhada pelas duas subescalas perca alguma consistência na subescala intenção

suicidária.

Valores Normativos

Para obtenção de valores normativos passámos a escala a 658 adultos residentes acima

da Cova da Beira, onde o suicídio era residual. Aqui a população apresentou em média

apenas um dos onze sintomas característicos da intenção e/ou ideação suicidária sendo

que mais de metade da população observada não apresenta qualquer sintoma, 25%

apresentam pelo menos um sintoma de ideação enquanto apenas 5% apresentam pelo

menos um sintoma de intenção suicidária.

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Começámos por estabelecer pontos de corte em função do número de sintomas referidos

pela população idosa em geral, considerando que valores superiores a 2 sintomas

discriminavam entre ausência de a presença de intensão e/ou ideação suicida. Contudo a

análise discriminante da função remeteu-nos para o ponto de corte preditivo de 3

sintomas para a ausência de intenção e/ou ideação suicida e superior a 3 sintomas para a

presença daqueles sintomas. Aceitámos o ponto de corte preditivo. Executámos os

mesmos procedimentos para as subescalas intenção suicidária (INS) e ideação suicidária

(IDS) e os resultados foram 2 sintomas para a intenção suicida e 2 sintomas para a

ideação. Assim existe motivo para preocupação se assinalarem 3 sintomas dos 11

disponíveis ou 2 em 6 itens da ideação ou em cinco itens da intensão suicidária.

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técnicas utilizando o SPSS (Celta). Oeiras.

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ESCALA TORGA DE INTENÇÃO E IDEAÇÃO SUICIDÁRIA

Margarida Pocinho & Carlos Amaral Dias (2005)

Vou dizer-lhe algumas frases, quero que responda se elas são verdadeiras ou falsas

V F

1 – Apetece-me desaparecer daqui para fora 1 0

2 – Se pudesse estava sempre a dormir, que era para não pensar em nada. 1 0

3. Vale a pena viver 0 1

4. Estou cansado (a) da Vida 1 0

5. Às vezes tenho ideias de suicídio 1 0

6. Mais valia estar morto (a) 1 0

7. O suicídio parece-me uma solução possível para acabar com o

sofrimento

1 0

8- Logo que surja a ocasião, vou comunicar a minha intenção de cometer

um suicídio

1 0

9- Converso frequentemente sobre suicídio 1 0

10- Tenho planos para a minha Morte 1 0

11. Tenho planos claros de suicídio, estou só á espera que surja a ocasião 1 0

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INTERAÇÃO DOS FATORES SOCIOCULTURAIS E DE DEPRESSÃO NA

IDEAÇÃO E INTENÇÃO SUICIDÁRIA DOS IDOSOS

Margarida Pocinho 1

1Doutora em Saúde Mental e Docente na Escola Superior de Tecnologia da Saúde de

Coimbra e no Instituto Superior Miguel Torga

Introdução

Para as chamadas sociedades primitivas Africanas, nomeadamente na Nigéria, Uganda e

Quénia, o suicida, mesmo depois de morto, era considerado perigoso, na medida em que

consideravam que o contacto físico com o seu corpo ou mesmo apenas a proximidade,

tinha consequências nefastas entre os membros da família.

As culturas ocidentais sempre viram o suicídio como preocupação e de vários níveis de

aceitação ou sanções. Na Grécia Antiga o suicídio era considerado como uma ofensa

pública ao Estado, por isso era segredo e escondido nas suas comunidades locais e o

corpo muitas vezes mutilado (Minois, 1999; Tondo & Baldessarini, 2000).

Na Roma Imperial, o suicídio era frequente, considerado, muitas das vezes, honroso nos

líderes civis e intelectuais. Cícero (106-43 AC.) condenava o suicídio de uma forma

geral mas aceitava-o como acto de heroísmo, auto sacrifício ou defesa da honra. Muitas

das culturas dominadas pelo Império Romano recorriam ao suicídio para fugir à

humilhação e abusos com esperança de uma reencarnação favorável (Tondo &

Baldessarini, 2000)

Na Europa, na Idade Média, visões mistas sobre o suicídio eram frequentes. Este era

respeitado quando cometido como um ato heróico mas a visão dominante era como um

ato egoísta e criminoso e por isso os cadáveres de suicidas eram sujeitos a desonrosa

mutilação, negados em cemitério públicos ou abandonados nas estradas (Minois, 1999).

O Renascimento trouxe uma reavaliação do suicídio. Dante (1265-1321) apresentou um

duplo padrão: «noble souls», almas nobres (que incluíam poetas, filósofos e alguns

políticos quando cometiam suicídio) iam para o limbo, mas os políticos impopulares

eram McDonald & Murphy, condenados às profundezas do inferno, o que levou a que

muitos suicídios famosos fossem reinterpretados como expressão de convicções

filosóficas. Continuavam a existir condenação mas os intelectuais podiam discutir dois

assuntos mais livremente. Erasmus (1466-1536) considerou o suicídio como forma de

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fugir às preocupações da vida, ainda assim considerava-o como um ato insano (Tondo,

Hennen, & Baldessarini, 2001).

Nos séculos XVII e XIX, em Inglaterra o suicídio era mais frequente entre o povo que

nos aristocratas. Muitos filósofos do séc. XVII e XVIII condenavam o suicídio, mas

alguns descritores reconhecem já a correlação entre o suicídio e a melancolia ou outro

distúrbio mental severo.

Ao longo do séc. XVIII as causas, descritas, da maior parte dos suicídios foram as

doenças mentais. A pressão social para a descriminalização do suicídio, seguida pela

revolução francesa de 1789 permitiu uma nova atitude face ao suicídio (Juanatey-

Dourado, 1994), mas foi só no séc. XIX que o estudo do suicídio que passou a ser visto

como um problema. Na Inglaterra a punição foi abolida em 1870 mas na Irlanda apenas

em 1993.

Saraiva (1999) refere que depois do sexo, talvez o último tabu do final do século XX

seja a morte. Segundo este autor o questionar sobre a morte é um imperativo do homem

desperto, pelo que se compreende que este questionar tenha levado ao aparecimento e

imposição definitiva das novas correntes: as teorias sociais, as teorias comunicacionais,

as teorias psicodinâmicas as teorias cognitivas, as teorias biológicas por fim os modelos

integrais que conjugam as premissas das teorias anteriores para explicar os

comportamentos que levam ao suicídio (Saraiva, 1999).

A OMS definiu suicídio como ato deliberado realizado por um indivíduo que sabe, ou

espera, que este lhe seja fatal (Eurotrials, 2004). No âmbito da Saúde Mental, os atos

suicidários não são raros, já que conta com 10% das causas de mortes dos pacientes

psiquiátricos. A maioria é o resultado de doença psiquiátrica, particularmente distúrbios

do humor, psicotismos ou alcoolismo. Só uma pequena parte são causas de eventos de

vida stressantes.

A visão religiosa do suicídio difere consoante o tipo de religião e tem influenciado a

forma como as sociedades o entendem.

Areal (1999) refere que a solidão é um dos fatores mais importantes para o suicídio, já

que parece ser aquele que focará o indivíduo para uma decisão final e determinante do

ato suicidário. Numa situação de solidão o indivíduo já não tem ninguém com quem

compartilhar as suas angústias e tristezas ficando indefeso à mercê das suas ruminações

sobre o desejo de viver e de morrer.

Um outro conceito de relevante importância no suicídio é o da depressão. São muito

frequentes as insónias nos deprimidos e a privação do sono agrava ainda mais o

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problema. Nos últimos 50 anos, as taxas de suicídio reportadas cresceram 60% em todo

o mundo. Há maior prevalência entre idosos e jovens, sobretudo na Europa e nos

Estados Unidos, mas os países em desenvolvimento também tendem a acompanhar os

índices do primeiro mundo (Pocinho, 2007)

Algumas listas de sinais de aviso de suicídio têm sido criadas num esforço de identificar

e aumentar o encaminhamento de pessoas de risco. No entanto, os sinais de aviso não

são necessariamente factores de risco para suicídio e podem incluir comportamentos

comuns entre pessoas aflitas, comportamentos que não sejam específicos de suicídio. Se

tais listas forem aplicadas de maneira ampla, no ambiente geral de uma classe, por

exemplo, podem ser contraproducentes. Com efeito, esforços indiscriminados de

consciencialização sobre o suicídio e listas de triagem excessivamente inclusivas podem

promover o suicídio como possível solução para o sofrimento comum ou sugerir que

pensamentos e comportamentos suicidas sejam respostas normais ao stress. Devem ser

feitos esforços para evitar normalizar, glorificar ou dramatizar o comportamento

suicida, relatar métodos de como fazê-lo ou descrever o suicídio como solução

compreensível a um evento traumático ou stressante. Abordagens inadequadas

poderiam aumentar potencialmente o risco de comportamento suicida em indivíduos

vulneráveis . (Pocinho, 2007)

O suicídio e as tentativas de suicídio são mais frequentes na idade avançada do que em

qualquer outra fase do ciclo vital. O principal fator de risco é a presença de um

transtorno depressivo que muitas vezes passa despercebido ou é insuficientemente

tratado. Vários são os fatores que podem estar associados ao suicídio: história familiar

de comportamentos suicidários; solidão e isolamento social; dependências (drogas

“ilícitas”, fármacos e alcoolismo); doença terminal ou dor crónica; problemas sociais

(desemprego, profissões de risco ou de elevado desgaste psicológico, etc.).

O objetivo principal deste estudo foi a avaliação do impacto que a interação de fatores

socioculturais e da depressão pode exercer sobre a ideação e intenção suicidária numa

população de idosos.

Metodologia

O protocolo de investigação incluiu os seguintes instrumentos psicométricos:

questionário de Avaliação Sociocultural (QASC); Escala de Depressão Geriátrica

(GDS), Escala Torga de Intenção e Ideação Suicidária (ETIIS); Escala de Solidão

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(UCLA); Questionário de Suporte Social (SSQ); Escala de Avaliação de Qualidade de

Vida (ETAQV). Os dados recolhidos foram inseridos e tratados através do programa

informático SPSS. A amostra em estudo repartiu-se por dois grupos: um grupo de

controlo constituído por 660 idosos, maioritariamente do sexo feminino e com idades

compreendidas entre os 64 e os 74 anos, casados ou viúvos, e cuja escolaridade era, em

média, igual ou inferior ao atual 1.º ciclo do ensino básico; um grupo clínico que era

constituído por 372 idosos alentejanos, maioritariamente do sexo masculino proveniente

do meio rural e sem escolaridade.

Resultados

A solidão e a depressão são as situações problema com maior relevância na população

idosa em geral, com uma prevalência de 39% e 36%, respetivamente. Metade dos idosos

inquiridos (50%) considera que tem uma má qualidade de vida sendo o estado de saúde

e a satisfação com a vida os aspetos que menos lhes agradam. Encontrámos também

uma associação estatisticamente relevante entre depressão, risco sociodemográfico,

intenção e/ ou ideação suicidárias, solidão e qualidade de vida. O relacionamento/ apoio

familiar, a polimedicação, a idade, a tipologia familiar e a escolaridade constituem

variáveis preditoras da variação da depressão, contudo, as variáveis que estão mais

associadas à depressão, na população idosa em geral, são a qualidade de vida (ETAQV)

e a solidão (UCLA), já que este teste diagnóstico regista um aumento mais significativo,

do que no caso anterior, quando estas condições estão presentes. A variável intenção/

ideação suicidária mostrou-se dependente da situação económica percebida, do estado

de saúde e da satisfação com a vida (mais precisamente que, ter uma péssima situação

económica, um mau estado de saúde e ausência de satisfação com a vida associam-se

com a presença de intenção suicidária). O estudo revelou que os idosos alentejanos

diferem, claramente, dos controlos em quase todas as dimensões analisadas, sendo que é

na depressão, na solidão e na qualidade de vida, que talvez esteja a explicação para a

diferença de valores nas taxas de suicídio. Verificámos, também que a intenção e

ideação suicidária se associa a fatores socioculturais, como a religiosidade, a forma

como o idoso vê o suicídio, o relacionamento/ apoio familiar, os antecedentes familiares

de suicídio, os comportamentos suicidários de amigos/ comunidade, as tentativas de

suicídio prévias, a tipologia familiar, o estado civil, a idade, comportamentos suicidários

na comunidade e a escolaridade. A Intenção e/ ou Ideação suicidária (ETIIS) tem uma

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relação linear positiva forte com a depressão (0,694) e moderada com a solidão (0,558),

sendo que estas foram as dimensões que considerámos intrínsecas ao hospedeiro no

nosso modelo explicativo do suicídio.

A intenção e ideação suicidária associam-se aos fatores socioculturais destacando-se a

representação do suicídio e a religiosidade uma vez que a intenção/ideação suicidária

está muito associada à definição do suicídio como resolução nobre para um problema

pessoal e à inexistência de fé ou convicção religiosa). Assim, podemos referir que, em

termos gerais, o suicídio entrecruza aspetos do hospedeiro, ambientais e do agente, e

que, como dimensões intrínsecas ao hospedeiro, podemos identificar a depressão e a

solidão, que têm uma relação linear positiva entre si. As dimensões ambientais são a

satisfação com o suporte social e a qualidade de vida, que também se relacionam

positivamente. Quanto às dimensões que compõem o agente suicidário (o risco

sociocultural e a intenção e ideação suicidária) estas confirmaram-se entre os controlos,

mas diferiram no grupo de idosos alentejanos.

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ESTADOS DE HUMOR E JULGAMENTOS

(Emoções e satisfação com a vida)

Vitor Nuno Anjos, Margarida Pocinho; Alexandra Grasina; João Silva; Luis

Loureiro; Margarida Miranda & Magda Raquel Maia

Introdução

A satisfação com a vida é um fator subjetivo do bem-estar, que por sua vez é uma área

da psicologia que tem crescido muito ultimamente, cobrindo estudos que têm utilizado

as mais diversas nomeações, tais como: felicidade, satisfação, estado de espírito e afeto

positivo (Giacomoni, 2004).

As emoções podem ser induzidas, através do visionamento de um filme alegre ou triste,

ou recordando um evento feliz ou triste do nosso passado, ou recebendo feedback

positivo ou negativo em alguma tarefa, exatamente o tipo de experiências que produz

emoções boas ou más na vida real (J. P. Forgas & Moylan, 1987; J. Forgas, 2009).

A satisfação com a vida pode ser dirigida a uma área específica da vida do sujeito (e.g.

trabalho, família) ou de forma global. Existem três faculdades humanas mentais básicas

da psicologia: cognição (como processamento de informação), motivação e emoção.

Apesar do poder indubitável das emoções, estas foram, durante muitos anos,

negligenciadas como tema de investigação científica. Contudo, através da psicologia,

sabemos que pela alteração da perceção (processo cognitivo) podemos manipular as

nossas emoções. E, ao invés de este ser um poder perigoso, a evidência sugere que a

emoção é uma ferramenta útil e essencial que faz parte da nossa capacidade de resposta

a diferentes situações sociais (J. Forgas, 2009).

Frequentemente, confrontamo-nos, em situações do dia-a-dia, com a necessidade de

fazer julgamentos sociais num curto espaço de tempo, pela nossa perceção acerca de

eventos passados, presentes ou futuros. Emoções positivas estão associadas com

julgamentos optimistas e emoções negativas com julgamentos pessimistas (Joseph P.

Forgas & East, 2008).

Regra geral, as emoções positivas como a alegria, a satisfação e o amor, têm uma

implicação direta com a saúde. Permitem o desenvolvimento cognitivo e

comportamental e a construção de recursos psicológicos e emocionais. As emoções

negativas como o medo e a raiva induzem comportamentos de evitação ou de enfrentar

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ameaça. Sendo o pensar uma fonte de stress psicológico, rever conceitos de forma mais

ampla e encarar os eventos como desafios e não como ameaças, possibilitam respostas

criativas, integradas e oferece uma variedade grande de opções comportamentais, com

criticidade, mas sem preconceitos, medos, fuga ou ambivalências. As emoções positivas

também minimizam a duração e os efeitos tóxicos da excitação emocional negativa

(Fredrickson, 2001; Freitas, 2011).

Sinteticamente, as emoções positivas ampliam o repertório pensamento-ação exercendo

uma função adaptativa em situações percebidas como ameaçadoras e favorecendo o

bem-estar em contraposição às emoções negativas que limitam momentaneamente o

repertório de pensamentos/ações restringindo as opções comportamentais (Fredrickson,

2001).

A satisfação com a vida promove originalidade, colaboração, versatilidade, sucesso,

motivação pessoal e social. Em sentido contrário, a psicologia experimental tem

enfatizado a necessidade de limitar, controlar e evitar estados negativos afetivos (J. P.

Forgas & Moylan, 1987; J. Forgas, 2009).

Nesta investigação pretendemos verificar se os estados de humor desencadeados pelo

visionamento de três vídeos diferentes (um de comédia, outro de drama e outro de

violência) influenciam os níveis de satisfação com a vida dos sujeitos.

Metodologia

Após uma seleção aleatória foram apresentados 3 sketches a 81 indivíduos de ambos

os sexos com conteúdos humorísticos diferentes: drama, violência e comédia. Após a

sua visualização pretendeu-se avaliar se a manipulação de humor das pessoas que os

viram influenciaria a avaliação da sua satisfação com a vida.

O sketch sobre drama, com a duração de 2:59 minutos, consistia na história de um pai

surdo mudo e da sua filha que o rejeitava. Durante uma tentativa de suicídio a filha auto

mutila-se, necessitando de uma transfusão sanguínea. O pai salva-lhe a vida ao ser o seu

dador. No sketch sobre violência, com a duração de 52 segundos, durante uma briga de

rua, um indivíduo agride violentamente outra pessoa na cabeça, deixando-o inanimado

na via pública. Durante o sketch de comédia com a duração de 4:39 minutos, são

visualizadas várias situações engraçadas que surpreendem as pessoas.

No fim do visionamento do filme todos os sujeitos (portanto, de todas as condições)

preencheram a Escala da Satisfação com a Vida – SWLS. Estes tiveram um tempo de

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preenchimento de cerca de 90 segundos. Para avaliar a satisfação com a vida foi

utilizada a Escala de Satisfação com a Vida – SWLS (Diener et al., 1985) validada para

a população português a por Simões (1992). O sketch de drama foi visto por 32 sujeitos,

o de comédia por 24 e o de violência por 25. Em termos de perceção de classe social, 4

sujeitos classificam-se como baixa, 17 média baixa, 54 média e 4 média alta. A idade

média dos indivíduos era de 24,59 e desvio padrão de 9,174 compreendida entre 18 e os

57 anos.

Resultados:

As. Comparações estatísticas realizadas através do teste Anova (F=2,875, p=0,062)

sugeriram que os três grupos eram equivalentes quanto à satisfação com a vida.

Tabela 1 - Estatísticas resumo e resultados da Anova em função do sketch

Sketch: n.º �̅� dp f p PO

Drama

Comédia

Violência

32

24

25

17,31

19,96

17,44

3,95

3,96

5,39

2,875

0,062

0,55

Após a transformação de 3 para 2 grupos, testámos as diferenças com recurso a Anova

Os resultados mostram que a satisfação com a vida é influenciada pelo tipo de

sentimentos que pontualmente se experienciam (f=5,811; p=0,018).

Tabela 2 - Estatísticas resumo e resultados da Anova em função do sketch

Sketch: n.º �̅� Dp f p PO

Negativos

Positivos

57

24

17,37

19,96

4,59

3,96 5,811 0,018 0,66

No estudo desta relação, verificámos também, através de testes entre (análises

bivariadas e univariadas) e intra grupos (regressão múltipla) se o sexo, a idade e a classe

social influenciavam a satisfação com a vida, contudo os resultados obrigaram-nos a

não rejeitar a hipótese nula (p>0,05), permitindo-nos concluir que a influência dos

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sentimentos provocados pela visualização dos filmes e a satisfação com a vida se deve a

esta relação e não à interferência das variáveis supramencionadas.

Discussão

Sabendo que as emoções podem ser induzidas, segundo (Forgas & Moylan, 1987;

Forgas, 2009) através do visionamento de um filme alegre ou triste, ou recordando um

evento feliz ou triste do nosso passado, ou recebendo feedback positivo ou negativo em

alguma tarefa (Forgas, 2009), exactamente o tipo de experiências que produz emoções

boas ou más na vida real, o presente estudo compreendeu uma tentativa de mapear os

efeitos associados à manipulação das emoções na satisfação com a vida. Os dados

apresentados sugerem que a exposição a sentimentos negativos leva a uma menor

satisfação com a vida.

Os resultados obtidos estão em consonância com alguns achados disponíveis na

literatura, sugerindo o aumento marginalmente significativo para a satisfação com a

vida em relação ao envolvimento (Forgas, 2009). No entanto, estávamos expectantes

que as influências teriam uma maior significância nos resultados enquanto os três

grupos da amostra estavam separados, o que não sucedeu. Tal só surgiu aquando se

passou a ter apenas dois grupos e ai os resultados vão de encontro ao que “Forgas e

Moylan (1987)” experienciaram e que nos serviu de base para esta pesquisa.

É de salientar que em psicologia, uma parte substancial dos estudos de satisfação com a

vida surge associada aos estudos teóricos do sentido da vida e inclusivé do bem-estar

subjetivo. Estas teorias têm subjacente o pressuposto de que o sentido da vida pode de

facto ter influência, positiva ou negativa, na saúde mental dos indivíduos e são

indissociáveis da satisfação com a vida. Sabemos, no entanto, que pela alteração da

perceção, podemos manipular as nossas emoções. E, ao invés de este ser um poder

perigoso, a evidência sugere que a emoção é uma ferramenta útil e essencial que faz

parte da nossa capacidade de resposta a diferentes situações sociais (J. Forgas, 2009).

A título de exemplo relativamente à satisfação com a vida, é habitual afirmar que a

pessoa experimenta em situações de dificuldade e vulnerabilidade três tipos de

determinantes ou “pesar” relacionados diretamente com a satisfação com a vida. Pesar

em relação ao passado (perceção de não ter realizado as suas aspirações), e mais pesar

em relação ao futuro (a pessoa percebe a sua impotência para realizar os objetivos

futuros). A terceira determinante refere-se ao significado atribuído à finitude.

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As determinantes estão relacionadas com a extensão com que um indivíduo pondera ou

contempla as dificuldades no quotidiano, tornando-o assim saliente.

a) Ativando diretamente sentimentos de pesar e pensamentos relativos ao

significado da vida;

b) Afetando as determinantes, nomeadamente modificando as crenças da pessoa

em relação a si e ao próprio mundo;

c) Ativando um vasto conjunto de mecanismos de coping, incluindo os

processos de revisão de vida, planeamento de vida, identificação com a cultura e

processos de auto transcendência.

Neste caso pode observar-se que os filmes, consoante a tipologia, conseguem despertar

nos indivíduos diferentes emoções que são fundamentais na manutenção do equilíbrio e

saúde mental dos indivíduos. Emoções positivas estão associadas com julgamentos

optimistas e emoções negativas com julgamentos pessimistas (Joseph P. Forgas & East,

2008). Ainda que a experiência esteja confinada ao âmbito laboratorial, pode observar-

se, por exemplo, a importância que as atividades de entretenimento e lazer têm na

experimentação de emoções positivas.

Será que a amostra deveria ter sido, anteriormente ao visionamento dos, exposta de

igual forma a um estímulo neutro? Será que o facto de ter sido feito em salas diferentes,

por cada grupo, teve influência nos resultados obtidos? Será que pelo facto de serem

alunos da mesma escola condicionou o estudo? Será que deveriam os durar mais tempo

e provocar uma maior influencia nos estados de humor? Todas estas são questões que

gostaríamos de comprovar em futuras pesquisas. Futuros estudos devem centrar-se no

controlo de muitas variáveis relevantes, nomeadamente constituir-se um verdadeiro

grupo experimental, incluindo grupo de controlo e observação pré e pós teste. É de

salientar que deve-se incluir grupos mistos de intervenções de modo a controlar o efeito

das determinantes individuais sobre o tratamento.

Referências

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http://www.control.com.au/bi2009/bi310.php

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VELHICES, TERRITÓRIOS E CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA: PERCURSOS,

ENCRUZILHADAS E DESVIOS

Marcia Regina Medeiros Veiga, CEIS20/iii/UC, CAPES/Brasil; Sónia Cristina

Mairos Ferreira, FPCEUC, CEIS20/iii/UC; António Manuel Rochette Cordeiro,

DPGEO/FLUC, CEIS20,iii,UC & Monalisa Dias de Siqueira,

PPGGeronto/UFSM/Brasil

Resumo

Buscamos, com esta comunicação, refletir sobre a importância dos territórios como

referenciais para a construção identitária dos sujeitos na velhice. Nossa base reflexiva

foi construída a partir de observações/descrições do território conhecido como “Alta”,

no casco histórico de Coimbra, Portugal, e entrevistas e conversas informais com 12 de

seus residentes com idades entre os 69 e os 92 anos.

Palavras-chave: Velhices, Territórios, Identidades.

Abstract

We seek, with this communication, reflect on the importance of the territories as

references for the identity construction of subjects in old age. Our reflective base was

built from observations/descriptions of the territory known as "High", in the historical

center of Coimbra, Portugal, and interviews and informal conversations with 12 of its

residents aged between 69 and 92 years.

Keywords: Old Ages, Territories, Identities.

Introdução

Esta comunicação tem por objetivo refletir sobre a importância dos territórios para a

construção identitária dos sujeitos – homens e mulheres – na(s) velhice(s).

Para algumas pessoas, esta fase da vida caracteriza-se pela perda de referenciais

importantes, o que reflete diretamente na construção de suas identidades e na imagem

que projetam de si próprias. As possíveis restrições na mobilidade de certas pessoas

idosas, quer por limitações individuais, quer por problemas encontrados em muitos

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territórios, acabam por transformar os territórios onde residem – a casa, a rua, o bairro –

em principais referenciais de sua construção identitária e de seu posicionamento

enquanto ser social, indivíduos singulares, inseridos em uma coletividade.

As reflexões aqui propostas têm como fio condutor as observações e descrições

realizadas no território da “Alta” do centro histórico de Coimbra, cidade centro-

litorânea de Portugal, e as entrevistas e conversas informais realizadas com 12 pessoas

(11 mulheres e 1 homem), residentes no território em questão, com idades

compreendidas entre os 69 e os 92 anos2. Também buscamos uma sustentação teórico-

conceitual a partir da definição das categorias-chave para esta discussão,

nomeadamente: velhices, territórios, identidades e memórias.

Conceptualização

Com o intuito de pautar e referenciar as discussões aqui levantadas, iniciamos com uma

necessária conceptualização das categorias que elegemos como basilares para este

diálogo.

A primeira destas categorias é(são) a(s) velhice(s). Embora só recentemente a(s)

velhice(s) tenha(m) ganho estatuto de categoria social (Debert, 1999), atualmente é

consensual, tanto no meio académico quanto no senso comum, sua definição como um

construto multidimensional, ou seja, é(são) vivida(s), sentida(s), significada(s) e

ressignificada(s) a partir de dimensões biológicas, psicológicas, sociais e culturais

(Veiga et al., 2014). Além disso, é ainda uma categoria relacional, que não prescinde de

outras categorias, como sexo/género; etnia; idade/geração; classe social; nível de

escolaridade, por exemplo (Debert, 1999).

O conceito de territórios, por sua vez, é compreendido, aqui, a partir de uma abordagem

crítica, política e transformadora da geografia, que entende os territórios como cenários

e atores dos movimentos (de ideias, mercados, capitais, pessoas) e das relações

quotidianas (as territorialidades) (Saquet, 2011), dos quais são, concomitantemente,

produtos e produtores. Possuem, ao mesmo tempo, uma dimensão cultural e simbólica

(enquanto lugares) e uma dimensão política (Souza, 2001).

2 Este exercício reflexivo está ancorado em uma investigação mais ampla, em desenvolvimento, de

caráter interdisciplinar, que objetiva identificar e analisar as interdependências das relações

velhices/territórios, a partir dos eixos de mobilidade, acessibilidade e sociabilidade, em quatro tipologias

territoriais do concelho de Coimbra. A “Alta” é um destes territórios (Veiga et al., 2014; Veiga et al.

2014a).

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Relativamente às identidades, estas podem ser associadas a dimensões individuais, a

partir das quais surgem os conceitos e as imagens que construímos de nós próprios

(Jacques, 1998), e a dimensões sociais, que dizem respeito à pertença a determinadas

coletividades sociais (Bauman, 2005). Ambas, entretanto, são relacionais, construídas

em processos permanentes de experiências e trocas com os outros (Brandão, 1990),

sendo constituídas a partir da dialética diferenças-igualdades (Jacques, 1998).

A construção identitária, em sua dimensão relacional, pode ser comparada a um jogo de

espelhos em que a imagem refletida pelo sujeito é absorvida e (re)interpretada pelo(s)

outro(s), que a devolve(m) ao sujeito original, que dela se reapropria, ressignificando-a.

(Viegas e Gomes, 2007: 11-12)

As memórias são elementos fundamentais no processo de construção identitária. Para

Bosi (2004), as “memórias-lembrança” – em oposição às “memórias-hábitos” – são,

para as pessoas idosas, as mais significativas. Recuperando o raciocínio de Halbwachs,

Bosi (2004: 60) argumenta que as lembranças, para os sujeitos velhos, representam as

substâncias de suas próprias vidas, no presente. Diferentemente, para os adultos jovens,

as lembranças representam um momento de “fuga, arte, lazer, contemplação”, um certo

distanciamento proposital – e até necessário, enquanto válvula de escape – das

atividades quotidianas do presente.

Contextualização

Como anteriormente mencionado, o contexto territorial destas reflexões é a “Alta”3 do

centro histórico de Coimbra, tendo como sujeitos, os idosos e idosas – pessoas com 65

ou mais anos – que lá residem.

Tendo originado a cidade de Coimbra, a “Alta” – em sua versão moçárabe, “Almedina”

– é, ainda hoje, marcada por esta origem, quer pelos traçados sinuosos de suas ruas

estreitas, quer pelas suas construções, grande parte construída bem antes do início do

século XX4, quer, ainda, pela hierarquização, hoje não mais associada à realeza e à

nobreza, mas sim à sua Universidade5.

3 A “Alta” foi escolhida como um dos territórios de investigação – assim como os três demais: zonas da

Solum, Casal do Lobo e Botão – por suas especificidades, tanto territoriais, quanto populacionais. A zona

da Solum constitui-se em uma nova centralidade, com acentuado desenvolvimento a partir das décadas

finais do século XX e iniciais deste século; as demais regiões – Botão e Casal do Lobo –, destacam-se por

suas características próximas ao rural (Veiga et al.. 2014, Veiga et al, 2014a; Veiga et al., 2015). 4 Segundo dados da Base Geográfica de Referenciação de Informação – BGRI – relativa aos Censos 2011

do Instituto Nacional de Estatística português – INE –, 45,12% dos prédios da “Alta” foram construídos

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Em termos populacionais, é um território bastante envelhecido: cerca de 32% de

seus/suas moradores/as têm idade igual ou superior aos 65 anos. Destes, mais da metade

– 68,04% - são mulheres. A escolaridade da população idosa da “Alta” pode ser

considerada baixa: apenas 8,61% desta população tem formação superior. Em

contrapartida, 68,84% possui apenas o 1° ciclo (BGRI/INE, 2011). Muitos vivem sós,

necessitando de auxílio de instituições governamentais, como a Câmara Municipal,

Instituições Particulares de Solidariedade Social – IPSS, ou apoio voluntário. A grande

maioria vive na “Alta”, em média, há 50 anos (Veiga et al., 2015), sendo que grande

parte tem sua mobilidade e locomoção reduzidas, quer por limitações funcionais,

próprias de algumas pessoas em idade avançada; quer por algum tipo de patologia; ou,

ainda pelas dificuldades de mobilidade encontradas no território, como grandes

declives, muitas escadarias no entorno, calçamento precário, em desnível e

escorregadio. Tais limitações acabam por transformar o território – especialmente a

casa, mas também a rua e a vizinhança – num importante – talvez principal – referencial

da construção identitária destes/as idosos e idosas.

Constatações, Reflexões e Considerações Finais

Das 12 pessoas que participaram da pesquisa – 11 mulheres e 1 homem –, residentes no

território da “Alta”, apenas uma, casualmente o único homem participante, lá reside há

menos de 40 anos – neste caso, há apenas quatro anos. Destas mesmas 12 pessoas,

apenas três vivem acompanhadas, sendo que as demais vivem sós.

Embora o território da “Alta” apresente-se muitas vezes hostil, em termos de

acessibilidade e mobilidade, sendo frequentes os relatos de quedas, e que a grande

maioria das habitações esteja em condições precárias e sem os padrões de acessibilidade

e habitabilidade adequados, a grande maioria das pessoas participantes manifesta um

grande apego às suas casas e ao território da “Alta”. Este apego, entretanto, é

comumente justificado por relatos de um passado remoto, quando a casa era co-habitada

pelos filhos/as, maridos e até mesmo netos/as, mesmo que esta co-habitação nem

sempre fosse pacífica. Tuan (1980: 107) denomina este fenómeno – o apego ao

antes de 1919. A BGRI é uma base geográfica de grande escala, tendo o quarteirão como nível máximo

de desgregação (Geirinhas, 2011). 5 A Universidade de Coimbra é uma das mais antigas universidades do mundo – a mais antiga do país –,

tendo, este ano, completado 725 anos. Em junho de 2013, a Universidade foi reconhecida, pela

Organização das Nações Unidas para a educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO –, como Património

da Humanidade.

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território – de topofilia, associando-o aos “sentimentos que temos para com um lugar,

por ser o lar, o locus de reminiscências e o meio de se ganhar a vida”.

Os relatos também convocam para uma época em que a “Alta” possuia uma rede de

comércios e serviços bastante funcional, atualmente evadidos para novas centralidades

da cidade, dando espaço à atual configuração da Universidade. As modificações do

espaço e da vizinhança, ora muito marcada por estudantes residentes em moradias

coletivas e pela grande afluência de turistas, representam um conflito identitário, um

estranhamento em relação ao que reconhecem como “seu” território, fragilizando, de

certa forma, seu sentimento de pertença.

A atual degradação e o envelhecimento da “Alta” também é um fator de

constrangimentos aos seus/suas moradores/as idosos/as, que se sentem, algumas vezes,

segregados e abandonados – principalmente pelo poder público, o que se reflete na

imagem que criam e projetam de si mesmos/as.

As identidades estão calcadas, invariavelmente, no passado, de onde são evocados os

papéis sociais outrora desempenhados no mundo do trabalho, no mundo social e na

esfera familiar, sendo os territórios elementos fundamentais nesta evocação,

representando um referencial importante nas suas autorrepresentações.

Também é possível observar que, apesar de a sociabilidade estar muitas vezes

comprometida ou fragilizada pela distância – ou mesmo perda – dos familiares e dos

amigos mais próximos, estes permanecem como sendo os principais referenciais

relacionais identitários.

A construção identitária na(s) velhice(s), assim, pode ser compreendida como um

processo complexo. A(s) velhice(s) não é(são) uma categorização que os/as defina

enquanto pessoas. Suas identidades são frequentemente construídas a partir das

memórias de um passado distante, muito associado ao território onde vivenciaram e

compartilharam os momentos mais significativos e marcantes de suas vidas.

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O PROCESSO DE ENVELHECIMENTO HUMANO SOB O OLHAR DO

IDOSO. A REALIDADE DO CONCELHO DA COVILHÃ.

Fátima Quelhas Figueiredo

Enfermeira, Mestre em Gerontologia Social | Centro Hospitalar Cova da Beira -

Hospital Pêro da Covilhã

Resumo

Esta investigação tem como questão central o processo de envelhecimento na perspetiva

do idoso do concelho da Covilhã. Realizou-se um estudo que se situa-se numa

abordagem de triangulação dos modelos quantitativos e qualitativos. Concluiu-se que o

idoso tem um conhecimento sumário e encara as suas transformações com preocupação

e alguma resignação.

Palavras - chave: Idoso; Processo de Envelhecimento Humano; Qualidade de Vida

Abstract

This research has as a central issue the aging process at perspective of the elderly of the

county of Covilhã. We conducted a study that is located in a triangulation approach to

quantitative and qualitative models. It was concluded that the elderly have a summary

knowledge and faces its transformations with concern and some resignation.

Keywords: Elderly; Aging Process Human; Quality of Life.

Introdução

O envelhecimento foi, desde sempre, motivo de reflexão do ser humano. Porém, ao

longo do tempo, o conceito de envelhecimento e as atitudes perante o idoso têm vindo a

mudar refletindo, por um lado, o nível de conhecimentos sobre fisiologia e anatomia

humana, por outro, a cultura e as relações sociais de cada época. Tornou-se um

fenómeno muito mais relevante nas sociedades desenvolvidas, devido à sua implicação

na esfera socioeconómica, para além das modificações que refletem a nível individual, e

em novos estilos de vida.

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63

O envelhecimento tem sido analisado sob duas grandes perspetivas: a individual e a

demográfica. A nível individual, o envelhecimento assenta na longevidade dos

indivíduos, ou seja, no aumento da esperança média de vida. Subjacente a este conceito

está o envelhecimento biológico, que na comunidade médica geralmente se define

como, a alteração progressiva das capacidades de adaptação do corpo conduzindo,

consequentemente, a um aumento gradual de determinadas patologias crónico-

degenerativas, que podem precipitar a incapacidade ou o fim da vida. Ainda neste

contexto, podem verificar-se alterações a nível psicológico, dado que os idosos estão

também sujeitos a problemas externos, podendo estes desencadear perturbações mentais

ou comportamentais.

O envelhecimento demográfico, por seu turno, define-se pelo aumento da proporção das

pessoas idosas na população total. De acordo com o Instituto Nacional de Estatística

(INE), as projeções das Nações Unidas (NU) para a população mundial referem que a

proporção de jovens continua a diminuir, alcançando os 21% do total da população em

2050. Contrariamente, a proporção da população com 65 anos ou mais tende a crescer,

aumentando para 15,6% no mesmo ano. Este aumento resulta da transição demográfica,

definida como passagem de um modelo demográfico de fecundidade e de mortalidade

elevadas, para um modelo em que ambos os fenómenos atingem níveis baixos,

originando o estreitamento da base da pirâmide de idades, com redução dos efetivos

populacionais jovens, e do alargamento do topo, com o aumento de efetivos

populacionais idosos.

“O crescimento populacional dos idosos é decorrente das conquistas

tecnológicas e da medicina moderna, que produziram ao longos dos últimos

anos, meios que tornaram possível prevenir, diagnosticar e curar muitas

patologias fatais no passado, aumentando assim a esperança de vida, e

consequentemente, reduzir a taxa de mortalidade verificada na maioria dos

países, principalmente daqueles considerados subdesenvolvidos. Aliado a este

fator temos a redução das taxas de natalidade e a queda da mortalidade infantil,

conduzindo a um aumento da proporção de adultos” (Imaginário, 2008,p10).

O crescimento do número de idosos “sobretudo nos países desenvolvidos pôs em

evidência a problemática relacionada com a velhice, tanto do ponto de vista médico,

quanto socioeconómico”. A questão ganhou assim, nova relevância entre as

preocupações dos poderes políticos, da sociedade e dos meios científicos, aparecendo

como um dos desafios mais importante do século XXI. Atendendo a esta pertinência,

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este tema tem vindo, nos últimos anos, a tornar-se um grande problema social, em

grande medida, devido à evolução sociodemográfica, a que se assiste no mundo

ocidental. Pareceu-nos importante estudar o auto conhecimento do processo de

envelhecimento e a sua influência na qualidade de vida (QDV), contribuindo para uma

avaliação das políticas sociais e da atuação junto dos idosos, no campo da gerontologia

social em ordem a um envelhecimento bem-sucedido.

O envelhecimento faz assim parte da lei universal da vida, na qual se insere o ciclo

biológico do nascimento, crescimento/desenvolvimento e morte. Podemos defini-lo

como um processo de diminuição orgânica e funcional, não resultante de acidente ou

doença e que acontece inevitavelmente com o passar do tempo. Significa isto que, o

envelhecimento não é em si uma doença, embora possa ser agravado ou acelerado por

ela. O envelhecimento não deve ser observado como algo estático ou compartimentado,

mas encarado como o resultado de um jogo de forças em que o Homem, unidade

mente/corpo, segue uma evolução com importantes implicações biológicas, psicológicas

e sociais.

A escolha deste tema não é de todo acidental, mas sim fruto de uma prática profissional,

de 24 anos de trabalho, enquanto enfermeira, na área dos cuidados diferenciados, onde

os utentes são maioritariamente idosos.

A reflexão sobre esta realidade permite-nos formular duas questões de partida para a

orientação deste estudo:

– Qual a opinião dos idosos do Concelho, acerca do seu processo de envelhecimento?

– Será que o conhecimento acerca desse processo faz parte de uma aprendizagem para

um envelhecimento bem-sucedido?

Destas questões decorre a necessidade de definir o objetivo geral que pretendemos

alcançar - conhecer a opinião do idoso do Concelho da Covilhã, acerca do seu processo

de envelhecimento, e a influência desse conhecimento na sua qualidade de vida.

Tendo como fio condutor as questões de partida, bem com o objetivo geral, traçamos os

seguintes objetivos específicos, que norteiam a investigação:

I. Saber se a qualidade de vida do idoso está dependente do seu conhecimento

acerca do processo de envelhecimento;

II. Conhecer os principais medos do idoso acerca do processo de envelhecimento;

III. Identificar algumas estratégias e alguns meios para um envelhecimento bem-

sucedido.

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A orientação metodológica deste estudo situa-se numa abordagem de triangulação dos

modelos quantitativos e qualitativos.

Utilizou-se como instrumento de colheita de dados um questionário sócio demográfico

(em duas versões, de acordo com o contexto onde o idoso reside) sobre o processo de

envelhecimento e a QDV do idoso no Concelho da Covilhã, tendo os questionários sido

preenchidos por nós.

Tendo em conta os objetivos do estudo e as questões orientadoras enveredamos por um

desenho de investigação descritivo – exploratório.

Este estudo foi realizado na região Centro de Portugal, no distrito de Castelo Branco,

Concelho da Covilhã, em dois contextos diferentes: o institucionalizado (urbano) e o

não institucionalizado (urbano ou rural). Para a concretização deste trabalho foi

selecionado o último lar da cidade a abrir portas e 10 freguesias, das 31 do Concelho.

As urbanas, Conceição e Santa Maria, e a nível rural foram selecionadas oito. Assim

sendo, a escolha recaiu sobre as freguesias: Aldeia de São Francisco de Assis, Aldeia de

Souto, Cortes do Meio, Erada, Ferro, São Jorge da Beira, Tortosendo e Verdelhos.

A população do estudo tem idades compreendidas entre 65 e 95 anos, sendo 28 do

género masculino e 63 do feminino. Neste caso concreto tratou-se de uma amostra não

probabilística, uma vez que foi utilizada uma amostra de conveniência. Foram excluídos

os idosos com idade inferior a 65 anos, e os que apresentavam evidentes estados de

demências, ou que não conseguiram responder com autonomia à totalidade das

questões. Os idosos solicitados a participar nesta investigação foram informados dos

objetivos da mesma, assim como do total sigilo dos dados recolhidos.

Gostaríamos, com este estudo, de contribuir para que o autoconhecimento do idoso do

Concelho da Covilhã acerca do seu processo de envelhecimento, conduza a uma

“promoção da saúde (…) assentando nos interesses e necessidades dos gerontes

enquanto sujeitos ativos” (Moura, 2006,p.75) e que as políticas sociais conduzam à

promoção de um envelhecimento ativo e saudável ao longo de toda a vida, com a

criação de respostas onde se verifique “uma mudança fundamental em relação à

“filosofia do sujeito” própria do pensamento tradicional” (Coutinho, 2002,p.331).

Este trabalho foi conduzido com a determinação de contribuir para que o idoso do

Concelho da Covilhã apreenda a conhecer o valor do seu envelhecimento e a relação

desse conhecimento com a QDV, para que encare esta etapa da vida como “um tempo

diferente em que a felicidade continua a ser a razão de viver” (Grün,2010,p.7).

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Esta investigação não encerra aqui. Ela vai estar sempre presente no nosso dia-a-dia,

com apoio direto aos idosos que recorrem ao nosso serviço diariamente, não só com a

finalidade de prolongar e facilitar a vida do idoso através de cuidados médicos, mas

transmitindo-lhes todo o nosso saber. Desta forma pretendemos contribuir para que eles

redescubram o valor e o significado da velhice, para que a possam aceitar e estar de

acordo com tudo o que ela acarreta.

Só assim os idosos “serão uma bênção para a nossa sociedade” (Grün, 2010,p.23).

Metodologia

A presente investigação tem como questão central o processo de envelhecimento na

perspetival do próprio idoso. Pretendemos saber de que modo o idoso encara o

envelhecimento e em que medida a QDV influencia esse processo.

Temos consciência de que a problemática do envelhecimento deve ser refletida e

equacionada de forma integral e sistémica, e de que atualmente os idosos se confrontam

com um leque de transformações sociais, por vezes complexas, que criam obstáculos à

sua QDV, devendo estar para isso preparados.

A orientação metodológica deste estudo situa-se numa abordagem de triangulação dos

modelos quantitativos e qualitativos de natureza descritiva e exploratória, privilegiando

o estudo, a compreensão e explicação da situação atual do objeto de investigação.

A pesquisa quantitativa tem por objetivo a recolha de dados para testar hipóteses ou

responder a questões que lhe dizem respeito. Nestes estudos “pode trabalhar-se com a

população total ou com uma amostra retirada da população com a ajuda de técnicas de

amostragem” (Fortin, 1999,p.162).

Esta investigação consiste num relato essencialmente descritivo, da realidade

encontrada no lar da Santa Casa de Misericórdia e nas freguesias do Concelho da

Covilhã. Podendo ser enriquecido numa perspetiva comparativa e analítica, ao extrair as

variáveis que explicam os diferentes conhecimentos e atitudes da população

investigada. A partir do momento em que a investigação se reporta a pessoas e as inclui

no estudo, levanta questões de ordem moral e ética, que estão presentes desde o início

até à sua conclusão. Segundo Fortin “ (…) a investigação aplicada a seres humanos,

pode por vezes causar danos aos direitos e liberdades da pessoa. Por conseguinte, é

importante tomar todas as disposições necessárias para proteger os direitos e liberdades

das pessoas que participam nas investigações” (Fortin, 1999,p.116).

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Depois de efetivado o esclarecimento da finalidade e dos objetivos do estudo,

informamos todos os participantes do destino que iria ter toda a informação obtida,

nomeadamente da sua utilização para a presente investigação. Foi garantida a não

identificação e a confidencialidade da informação recolhida, demonstrando

disponibilidade para qualquer esclarecimento adicional e para comunicação dos

resultados obtidos.

Dado o grande número de pessoas com baixo grau de escolaridade, optámos por ler nós

próprios o questionário, explicando previamente a cada idoso que seria o investigador a

registar por escrito as respostas dadas.

No que respeita as etapas metodológicas, importa referir que foram, desde o seu início

esquematizadas:

a) Em contexto institucionalizado (urbano)

Nesta primeira fase, foi apresentado, junto da Direção do Lar da Santa Casa da

Misericórdia-Covilhã, o estudo e os seus objetivos. Decorrida uma semana, realizou-se

uma reunião com a diretora técnica do lar, e foi apresentado um exemplar do

instrumento de colheita de dados, aos profissionais do lar e seus utentes, para um

melhor conhecimento acerca da população e definição da técnica de amostragem. Neste

momento também se proporcionou um espaço para esclarecimento de dúvidas em

relação ao mesmo. Posteriormente, procedeu-se à seleção aleatória dos utentes a

participar no estudo, através dos ficheiros existentes.

Seguindo esta forma de procedimento, numa primeira abordagem foi efetuado um pré-

teste a 7 idosos com idade superior a 65, no sentido de se averiguar a aplicabilidade e

compreensibilidade do instrumento. Este pré-teste evidenciou algumas dificuldades de

compreensão ao nível do questionário, que determinaram a sua reformulação. Após a o

pré teste do instrumento, passou-se à fase de aplicação. Os sujeitos foram contactados

nesta fase no Lar e no local havendo o cuidado de proporcionar uma certa privacidade e

abertura por parte dos sujeitos inquiridos.

b) Em contexto não institucionalizado (urbano e rural)

Nesta segunda fase e no sentido de se garantir que a escolha dos participantes fosse o

mais homogénea e aleatória possível no que diz respeito às variáveis em estudo,

procedeu-se à seleção das freguesias do Concelho de forma aleatória. Das 31 freguesias

do Concelho, foram seccionadas 10. Foram contactados os presidentes das respetivas

juntas de freguesias e foram-lhes apresentados os objetivos e instrumento de colheitas

de dados do estudo.

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Depois do acolhimento ao pedido e de acordo com a nossa disponibilidade achámos por

conveniente proceder-se a técnicas de amostragem por conveniência e procedemos à

recolha nas diversas freguesia/aldeias do Concelho, quando os sujeitos se encontravam

calmamente sentados à soleira das suas portas, costume muito apreciado nas aldeias da

nossa região ou ainda quando deambulavam pela aldeia. Este pareceu-nos ser o contexto

privilegiado, quer do ponto de vista da recetividade à interação, quer no que se refere à

possibilidade da aplicação decorrer em privacidade.

Os contactos com os sujeitos em causa tiveram uma duração aproximada de 30 a 40

minutos, não se tendo verificado nenhum caso em que o sujeito, sendo abordado, se

tenha recusado a participar. Muito pelo contrário, superada uma certa dificuldade

inicial, todos os sujeitos apresentaram grande disponibilidade e afabilidade, uma vez

que foram sempre informados logo no primeiro contacto, sobre o objetivo do estudo,

sobre a confidencialidade das suas respostas, assim como, o facto de estarem a

participar num ato voluntário.

Os campos empíricos desta investigação são o Lar da Santa Casa da Misericórdia da

Covilhã e as 10 freguesias selecionadas do Concelho da Covilhã. Concelho que cumpre

os critérios básicos de definição, de espaço urbano e rural, apresentando-se como um

local pertinente, para este estudo. Esta investigação decorreu em dois momentos e

contextos específicos:

a. Em contexto institucionalizado (urbano) - durante o mês de Maio de 2009.

b. Em contexto não institucionalizado (urbano e rural) - de Agosto a Outubro de 2010,

nomeadamente aos fins-de-semana.

Neste estudo a amostra terá dois momentos de apresentação: um primeiro, que a seguir

se expõe, e diz respeito a variáveis consideradas “demográficas gerais” e o de

apresentação propriamente dita, aquando da apresentação dos resultados.

Nesta investigação, a população ou universo são os idosos do Concelho da Covilhã,

sobre os quais se pretendem tirar conclusões. Participaram neste estudo 91 idosos, dos

dois sexos, com idades compreendidas entre os 65 e os 95 anos, inclusive. Para a sua

seleção tivemos em atenção:

- Idade superior aos 65 anos;

- Ambos os sexos;

- Residência no Concelho da Covilhã;

- Idosos que não apresentassem evidentes estados de demências;

- Idosos que conseguissem responder com autonomia à totalidade das questões.

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Para que os participantes selecionados respeitassem estes critérios seguiu-se o método

da amostragem aleatória dos idosos em contexto institucionalizado (urbano) (Lar Santa

Casa da Misericórdia – Covilhã) e o método da amostragem acidental por

conveniência, em contexto não institucionalizado (urbano e rural) (nas 10 freguesias

do Concelho.)

Na interpretação da informação recolhida foi tido em conta o enquadramento teórico de

referência, o tipo de respostas mais frequentes e a sua relação com outras variáveis

consideradas pertinentes. Para facilitar os cálculos estatísticos na análise de dados,

recorremos ao programa informático de estatística – SPSS, versão 17. Assim, tentamos

estabelecer agrupamentos de respostas, através da sua análise. Depois de verificar a

frequência das respostas obtidas e das suas tendências mais significativas, pode surgiu o

interesse em analisar a associação ou interdependência das variáveis.

O resultado do estudo traduz de forma fidedigna as respostas obtidas, que após a sua

análise e interpretação contribuíram para dar resposta as questões de partida, bem com,

para a verificação das hipótese previamente formuladas. Uma vez terminada a analise

dos dados, procedemos à apresentação e análise de resultados, “uma etapa difícil que

exige um pensamento crítico da parte do investigador” (Fortin, 1999,p.329).

Resultados obtidos

A amostra, maioritariamente feminina, é constituída por 91 indivíduos, sendo 28 género

masculino e 63 do feminino.

Pode-se constatar que se trata de uma população muito idosa, em que a maioria dos

indivíduos se encontra acima dos 80 anos de idade. As idades variam entre os 65 e os 95

anos, sendo que a média de idades é de 79,05 anos.

No que se refere ao estado civil, esta amostra é composta, maioritariamente, por idosos

viúvos (53,8%), seguindo-se os casados (36,3%).

Já no que concerne as necessidades de apoio, estas referem-se a situações em que este é

prestado por parte de cuidadores formais. No caso particular do idoso institucionalizado,

o apoio refere-se ao facto de estarem presentes razões de saúde; somente 2,9% não

necessitava de qualquer apoio, uma vez que o seu internamento em lar se deveu à

doença do conjugue (esposa).

Quando o idoso se mantém no seu meio, o apoio é de 23,2%, grande parte relacionado

com motivos de saúde.

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As razões do apoio estão de acordo com o motivo do pedido do mesmo, sendo que nos

idosos institucionalizados prende-se com o facto de estarem sozinhos (45,7%) e por

motivos de saúde (42,8%). Se o idoso se encontra em contexto residencial urbano e

rural, esse motivo está diretamente relacionado com os motivos de saúde (21,4%).

Neste momento são analisados os possíveis dados que nos conduzem a avaliação do

processo de Envelhecimento.

Através da primeira pergunta, pretendemos avaliar a forma como o idoso se sentiu e

como lhe correram as coisas nas quatro últimas semanas que antecederam a recolha de

dados. Pode-se concluir que, a maioria sentiram-se úteis (91,2%), mas nervosos

(82,1%), e, por vezes, deprimidos (68,1%) mas com muita energia (76,9%), e o mais

importante de todos (57,1%) referiu sentir-se feliz nesta fase da vida.

Verificamos que 83,5% dos idosos refere não adoecer mais facilmente que as outras

pessoas da mesma idade e que 56% consideram-se tão saudáveis como qualquer outra

pessoa. Grande parte dos indivíduos em estudos têm a noção de que com idade vai

piorando ao longo dos anos (83,9%). E 75,8% refere que a saúde neta fase da vida não

é excelente.

Podemos também verificar que dos 91 idosos, 49 (53,8%) referem que é possível ser

feliz na velhice e, somente, 15 (16,5%) discordam totalmente da afirmação. Quando

pedimos aos idosos que nos referissem se eles devem permanecer ativos e participativos

na sociedade atual, 91,2 % referiram que “para é morrer”, e 51,6% relatam que na

velhice é possível encontrar companheirismo, dependendo da capacidade de

relacionamento social de cada um.

Quando questionamos os idosos sobre a problemática da morte, falam dela como algo

natural. Em relação a questão, O envelhecimento prenuncia dependência, morte e

solidão, 49,5 % concorda totalmente e 56,0% refere que não ficaram preocupados

quando se aperceberam que estavam a envelhecer. Somente 36 idosos (39,6 %) sentiram

medo ao pensarem na debilidade que o envelhecimento pode ter associado. Cerca de

41,8% dos idosos referem ser difícil enfrentar a ideia de morte e 33% referem que não

lhes e difícil aceitar esta ideia. Mas quando são questionados, É melhor morrer cedo do

que sentir a Angústia e a Solidão da Velhice na nossa sociedade, 38 idosos (41,8%)

referem que quanto mais tarde morrerem melhor.

A maioria dos idosos (62) espera continuar a sentir-se bem, independentemente da

idade.

Em relação à pergunta aberta, O que é para si envelhecer?

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Quase todos referem que:

“É perder faculdades”

“É perder amigos”

“ É perder forças”

“É um processo normal”

“Feliz daquele que chega a esta idade”

“É o inverno da vida”

“É querer e não poder”

“É necessitar de apoio e carinho”

“É não conseguir fazer algo tão rápido, necessitamos de mais tempo”

Após a análise de toda a informação podemos referir que, todos os idosos têm uma ideia

bem definida do que é envelhecer e das limitações causadas pelo mesmo.

Conclusões

1. Esta investigação pôs mais uma vez em evidência que o envelhecimento humano,

para além, de ser individual e social, hoje é muito pertinente. Não é um “problema dos

velhos”, mas da nossa sociedade, para com os seus cidadãos de mais idade. “O (…)

envelhecimento é apontado como (…) um dos aspetos a ter em conta na definição de

políticas sociais de médio e longo prazo.” (Bruto da Costa, 1998,p.86).

2. Com esta investigação pudemos constatar que, os idosos do Concelho da Covilhã têm

um conhecimento sumário do seu processo de envelhecimento, e encaram as suas

transformações e limitações com preocupação e alguma resignação. Afinal a velhice não

é uma doença, é um fenómeno que (n)os afeta exteriormente, mas que tem um

significado, que é necessário reconhecer. “ Envelhecer é os preços que pagamos por

viver mais tempo” (Ermida, 1999,p.43). É nesta etapa da vida que o homem mais sente

as alterações decorrentes do processo de envelhecimento, e que este lhe vai criando

algumas incapacidades, necessitando, por vezes, de ajudas de outrem. É fundamental ter

em conta que o idoso é um ser humano que necessita de cuidados e atenção e tem como

meta final a QDV.

3. Verificamos que as relações familiares e de proximidade contribuem,

prioritariamente, para prevenir o isolamento e a solidão.

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4. A maioria dos idosos do concelho da Covilhã, ainda vivem com o cônjuge e consegue

uma QDV que é resultando do apoio prestado por familiares, vizinhos e/ou apoio social

de que beneficiam.

5. Não obstante, também se constatou que apesar da maioria dos idosos

institucionalizados do Concelho da Covilhã viverem sozinhos, antes de entrarem no lar

manifestaram ainda alguma ânsia pelo seu domicílio, havendo que realçar, um facto

muito importante, que nos despertou alguma da nossa atenção, já que a maioria dos

idosos deste grupo referiu que mantinha ainda a sua casa, com o intuito e esperança de

voltar para lá um dia.

6. Esta investigação pôs em evidência que os idosos do concelho da Covilhã apesar de

se encontrarem em situação de reforma, mantém ainda alguma atividade, mesmo que

limitada.

7. E que a coabitação de idosos com outros idosos doentes (observada em contexto

institucional), por vezes, totalmente dependentes, interfere na sua QDV. O facto de os

idosos estarem em contacto com outros mais doentes, por vezes até com distúrbios

mentais, influencia negativamente as suas atitudes e, consequentemente, a sua

autoestima, começando a visualizar o futuro deles no presente dos outros.

Esta investigação trouxe mais um desafio para os profissionais de saúde/profissionais de

gerontologia social, que trabalhamos em meio hospitalar, ao verificar que podemos por

em prática alguns conhecimentos adquiridos e até mesmo partilhá-los com os outros

profissionais de saúde.

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“EMOÇÕES QUE AS PALAVRAS NÃO TRADUZEM”: ESTUDO DA

ALEXITIMIA NUMA AMOSTRA DE MULHERES COM CANCRO DE MAMA.

Helena Sousa, Marina Guerra & Leonor Lencastre

Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto

Resumo

Numa amostra de 85 mulheres com cancro de mama, a alexitimia parece prejudicar

significativamente várias dimensões da qualidade de vida do Quality of Life

Questionnaire (QLQC-30) e do Breast Cancer Module (QLQC-BR23), instrumentos da

European Organization for Research and Treatment of Cancer (EORTC), utilizados

para este estudo.

Palavras-chave: cancro de mama; alexitimia; qualidade de vida;

Abstract

In a sample of 85 women with breast cancer, alexithymia seems to significantly

prejudice several dimensions of quality of life from the Quality of Life Questionnaire

(QLQC-30) and the Breast Cancer Module (QLQC-BR23), instruments from the

European Organization for Research and Treatment of Cancer (EORTC), used in this

study.

Key-words: breast cancer, alexithymia, quality of life.

Introdução

O cancro de mama é a doença maligna que mais afeta o sexo feminino, estimando-se

que, ao longo da vida, uma em cada nove mulheres venha a desenvolver esta patologia

(Fernandez-Delgado et al., 2008). Com o avanço tecnológico ao nível das ciências

médicas, assiste-se a um crescente otimismo no tratamento da doença e a um aumento

da taxa de sobrevida. Apesar disto, o cancro de mama continua a ser um acontecimento

de vida adverso e potencialmente traumático, com um tratamento prolongado e incerto,

acompanhado por elevadas exigências biopsicossociais e espirituais, com um impacto

profundo e duradouro na qualidade de vida (Montarezi, 2007).

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Com vista a uma melhor identificação dos fatores que poderão interferir com o risco de

disfunção psicossocial nesta população, é fundamental conhecer as variáveis que

poderão colocar em risco e/ou proteger a qualidade de vida destas mulheres (Silva,

Bettencourt, Moreira, & Canavarro, 2011).

A importância da expressão emocional e as suas consequências ao nível físico e

psicológico têm vindo a ser cada vez mais estudadas pela psicologia da saúde, devido ao

seu papel crítico na doença (Fonte, 1993), incluindo no cancro (Graves et al., 2005). É

neste contexto que surge o estudo da alexitimia ou “sem palavras para os sentimentos”

(Fernandes & Tomé, 2002, p.97), enquanto mecanismo de coping mal adaptativo

(Iwamitsu et al., 2003) e que tem vindo a demonstrar correlações negativas com

dimensões da qualidade de vida relacionadas com a saúde (Gritti et al., 2010; Shibata et

al., 2014).

Objetivos

Este estudo pretende (1) caraterizar a alexitimia numa amostra de mulheres com cancro

de mama e (2) analisar a relação da alexitimia com as dimensões da qualidade de vida

do Quality of Life Questionnaire (QLQC-30) e do Breast Cancer Module (QLQC-

BR23), instrumentos da European Organisation for Research and Treatment of Cancer

(EORTC) utilizados para este estudo (cf. Instrumentos).

Enquadramento teórico

Alexitimia

A alexitimia é definida como a dificuldade em reconhecer e em expressar as emoções

mais profundas (Manna et al., 2007). Teoricamente, os alexitimicos são descritos como

demonstrando dificuldades emocionais, uma vez que (1) não conseguem descrever as

suas emoções e sentimentos, (2) apresentam dificuldades em dissociar as emoções das

sensações corporais, (3) dificuldade em perceber estados emocionais e desejos de outras

pessoas, (4) comportamento, inexpressivo, introvertido e (5) fraca capacidade para a

empatia (Fonte, 1993). Segundo Lieberman e Goldstein (2006), a alexitimia é um forte

indício de um mecanismo de coping repressivo e, por isso, mal adaptativo (Iwamitsu et

al., 2003). Por outro lado, uma boa expressão de emoções parece estar associada a um

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maior bem-estar psicossocial, a uma maior autoconfiança e assertividade, a um espírito

mais lutador e a uma melhor qualidade de vida (Mantani et al., 2007).

Existem poucos estudos que relacionam a alexitimia com o cancro de mama. A nível

internacional, Manna e colaboradores (2007) compararam um grupo de mulheres com

cancro de mama com um grupo de controlo (mulheres sem doença), concluindo que as

mulheres com cancro de mama são significativamente mais alexitímicas. A nível

nacional, encontramos apenas um estudo realizado por Guerra, Pinto e Mariano (2007)

que indica uma prevalência da alexitimia em mulheres com cancro de mama duas vezes

superior à da população normativa. A presença deste traço parece ser negativa para a

mulher com cancro de mama, uma vez que as alexitimicas apresentam também uma

perceção mais negativa do seu suporte sociofamiliar, o que prejudica a sua saúde mental

e aumenta o distress associado à doença (Mantani et al., 2007).

Qualidade de vida

A presença de um cancro de mama apresenta diferentes desafios para as mulheres

(Holland & Holahan, 2003). Enquanto doença crónica, altera múltiplos domínios da

qualidade de vida com sequelas que se prolongam durante anos (Pinto & Ribeiro, 2006).

Devido ao interesse crescente pela qualidade de vida no âmbito da doença, surge o

termo a “qualidade de vida relacionada com a saúde” (Pimentel, 2006, p.25). Este

conceito representa as respostas individuais aos efeitos da doença (Costa et al, 2013),

compreendendo uma perspetiva multidimensional que engloba a dimensão física,

psicológica, social e espiritual, bem como a avaliação da eficácia dos serviços de saúde

(Pimentel, 2006; Pinto & Ribeiro, 2006).

Em oncologia, os estudos de avaliação da qualidade de vida apresentam diferentes

conclusões. Há autores que defendem a importância da avaliação desta variável no

cancro de mama, uma vez que esta patologia se destaca pela incidência no sexo

feminino e está associada a uma série de consequências biopsicossociais que têm vindo

a prejudicar a mulher, nomeadamente a nível laboral (chemobrain) sociofamiliar

(Holland & Holahan, 2003) e pessoal (na autoimagem, na vida sexual, na fertilidade)

(Safarinejad, Shafi, & Safarinejad, 2013). Outros estudos relatam que a qualidade de

vida das mulheres com cancro da mama é melhor do que seria de esperar (Lopes,

Ribeiro, & Leal, 1999). Estudos nacionais relativamente recentes demonstram que as

mulheres com cancro de mama têm uma perceção moderadamente positiva da sua

qualidade de vida global (Rebelo, Rolim, Carqueja, & Ferreira, 2007; Sousa, Guerra, &

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Lencastre, 2015). Tal parece sugerir que a doença oncológica pode afetar menos a

qualidade de vida da mulher do que aquilo que geralmente se pensa e que apesar do

cancro de mama ser um acontecimento de vida potencialmente traumático, as doentes

tendem a revelar padrões de funcionamento normais, o que pode ser um importante

indicador da sua capacidade de resiliência (Knobf, 2007).

Método

Participantes

A amostra é constituída por 85 mulheres com cancro de mama utentes de um hospital

do Grande Porto. A idade média é de 47 anos (M=46.99, DP=7.39) e a média de

escolaridade é de 10 anos e meio (M=10.45, DP=5.47). Maioritariamente são casadas

(76.5%) e têm filhos (71.8%). Em termos clínicos, 44.7% da amostra encontra-se entre

o 2º e o 6º mês após o diagnóstico de cancro de mama, 63.5% realizou mastectomia

total e 89.4% encontra-se a realizar ou já realizou quimioterapia.

Instrumentos

Para a recolha de dados, foram utilizados 4 instrumentos de autopreenchimento. O

Questionário Sociodemográfico e Clinico inclui duas secções, a primeira relativa aos

dados sociodemográficos e a segunda, destinada às caraterísticas clinicas da amostra. A

Escala de Alexitimia de Toronto de 20 itens – TAS 20 é escala mais utilizada

mundialmente na avaliação da alexitimia. Trata-se de uma escala de tipo Likert de 5

pontos, composta por 20 itens. Os resultados obtém-se através do somatório e podem

variar de 20 a 80. São considerados alexitímicos os indivíduos com resultados

superiores ou iguais a 61 e não alexitímicos os sujeitos com resultados inferiores ou

iguais a 51. Os resultados compreendidos entre 52 e 60, inclusive, correspondem a uma

zona fronteira. Os estudos das qualidades psicométricas revelam boa validade e

fidelidade com um alpha de Cronbach de .79 (Prazeres et al., 2000).

O The European Organization for Research and Treatment of Cancer Quality of Life

Questionnaire – EORTC QLQC-30 (v. 3.0) é um instrumento com 30 itens utilizado

internacionalmente para avaliar a qualidade de vida relacionada com a saúde em pessoas

com cancro (Aaronsonet al., 1993). Trata-se de uma medida geral e, por isso, existem

vários módulos específicos consoante a neoplasia. É composto por uma medida da

qualidade de vida global, por 4 escalas funcionais, por 3 escalas de sintomas e por 6

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itens de sintomas. Os resultados são transformados em valores de 0 a 100, obtidos

através de algoritmos próprios. Em Portugal, as suas propriedades psicométricas foram

estudadas por Ribeiro, Pinto e Santos (2008), sendo os valores de fidelidade

apropriados, variando de .57 a .88.

O Breast Cancer Module – QLQ-BR23 é uma extensão do QLQ-C30 específica para o

cancro de mama (Aaronson et al, 1993). É constituído por 23 questões que são divididas

por 4 escalas/itens funcionais e por 4 escalas/itens de sintomas. Este módulo pode ser

utilizado em doentes que se encontrem em diferentes fases da doença, abrangendo as

diferentes modalidades de tratamento (cirurgia, quimioterapia, radioterapia e

hormonoterapia).

Procedimento

O projeto foi apresentado à Comissão de Ética de um Hospital do Grande Porto, a fim

de ser autorizado pelo Diretor da Administração. Após a aprovação do estudo, os

instrumentos foram aplicados num gabinete da Clínica de Mama, desde início do mês

de Fevereiro até Maio de 2012. Participaram todas as mulheres que, após a explicação

dos objetivos do estudo, do seu caráter voluntário e confidencial, se predispuseram a

participar. Os critérios de exclusão foram a apresentação de défices cognitivos e/ou

motores que dificultassem o preenchimento dos questionários. O tratamento dos dados

foi efetuado com o programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão

19.0.

Resultados e Discussão

Em relação ao primeiro objetivo deste estudo de (1) caraterizar a alexitimia numa

amostra de mulheres com cancro de mama, os resultados revelam que a prevalência

desta variável na nossa amostra é de 47.1%, sendo que 31.8% das mulheres não são

alexitimicas e as restantes 21.1% estão situadas na “zona fronteira”. Tratam-se de

resultados semelhantes aos encontrados por Guerra, Pinto e Mariano (2007) e Manna e

colaboradores (2007) em mulheres com cancro de mama, onde se verificou uma

prevalência da alexitimia de 40 e 36%, respetivamente. As participantes apresentam

também um valor médio de 58.7 o que, tendo em conta os valores encontrados no

estudo de Prazeres, Parker e Taylor (2000) na adaptação da TAS-20 à população

portuguesa (M = 36.7) e depois de realizado o teste t de student para uma amostra,

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revela níveis de alexitimia significativamente superiores à população normativa (t (84)

= 14.04, p <.01). Tal resultado poderá sugerir que uma grande percentagem das nossas

participantes tem dificuldades no coping com as tarefas emocionais exigidas ao longo

do processo de adaptação à doença oncológica.

Conclui-se, assim, que as mulheres com cancro de mama da nossa amostra são

significativamente mais alexitimicas do que as mulheres da população normativa,

resultados que estão em concordância com a literatura pré-existente e que confirmam

que a prevalência da alexitimia nesta população parece ser mais do que o dobro da

existente na população normativa (Guerra, Pinto e Mariano, 2007) que se situará entre

os 10 e os 20% (Fernandes & Tomé, 2001).

O segundo objetivo deste estudo diz respeito à (2) análise da correlação da alexitimia

com as dimensões da qualidade de vida do Quality of Life Questionnaire (QLQC-30)

e do Breast Cancer Module (QLQC-BR23), instrumentos da European Organisation for

Research and Treatment of Cancer (EORTC) utilizados neste estudo.

A tabela 1 apresenta os valores r de Pearson da variável alexitimia com as escalas

funcionais e os itens de sintomas do QLQC-30.

Tabela 1.Valores R De Pearson Da Variável Alexitimia Com As Escalas Funcionais E

Os Itens De Sintomas Do QLQC-30 (N = 85).

Alexitimia

Qualidade de Vida Global -.529**

Escalas Funcionais

Funcionamento físico -.431**

Funcionamento de papéis -.544**

Funcionamento emocional -.600**

Funcionamento cognitivo -.254*

Funcionamento social -.580**

Itens de Sintomas

Fadiga 583**

Náuseas e vómitos .398**

Dor .501**

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Dispneia .178

Insónias .440**

Perda de apetite .396**

Obstipação .211

Diarreia .227*

Dificuldades financeiras .770**

Nota: *p<.05; **p<.01.

A análise dos valores da tabela 1 revela que a alexitimia apresenta uma correlação

negativa estatisticamente significativa com a qualidade de vida global das mulheres com

cancro de mama da nossa amostra (r =-.529, p <.01). Tal indica que as participantes

mais alexitimicas são as que apresentam perceções mais baixas sobre a sua qualidade de

vida global. Este resultado reforça o efeito negativo da alexitimia na perceção de

qualidade de vida das nossas participantes e poderá indiciar que esta variável poderá ser

um fator de risco na predição sobre a adaptação ao cancro de mama (Sousa, Guerra &

Lencastre, 2015). Por outro lado, uma boa expressão de emoções estará associada a uma

maior autoconfiança e a uma melhor qualidade de vida.

Adicionalmente, a alexitimia apresenta correlações negativas significativas com todas as

escalas funcionais do QLQC-30, indicando que as mulheres mais alexitimicas têm uma

perceção mais negativa do seu funcionamento ao nível emocional (r = -.600, p <.01),

social (r = -.580, p <.01), de papéis (r = -.544, p <.01), físico (r = -.431, p <.01) e

cognitivo (r = -254, p <.05) ao longo do processo de doença. Em termos de sintomas

clínicos, os resultados principais parecem indicar que quanto mais alexitimicas são as

participantes, maior é a perceção de: fadiga (r =.583, p <.01), dor (r = 501, p <.01),

insónias (r =.440, p <.01), náuseas e vómitos (r =.398, p <.01), perda de apetite (r

=.396, p <.01) e diarreia (r=.227, p <.05).

A tabela que se segue apresenta os valores r de Pearson da variável alexitimia com as

escalas funcionais e itens de sintomas do módulo específico de avaliação da qualidade

de vida em mulheres com cancro de mama – o QLQC-BR23.

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Tabela - Valores R De Pearson E Sua Significância Da Variável Alexitimia Com As

Escalas Funcionais E Os Itens De Sintomas Do QLQC-BR23.

Alexitimia

Escalas Funcionais

Imagem corporal -.499**

Função sexual -.071

Prazer sexual -.228

Perspetivas futuras -.464**

Itens de Sintomas

Efeitos dos tratamentos .637**

Sintomas da mama .319**

Sintomas do braço .219*

Preocupação com a queda do cabelo .451**

Nota: *p<.05, **p<.01.

Em relação à correlação da alexitimia com as escalas funcionais e com os itens de

sintomas do módulo QLQC-BR23, os resultados demonstram a existência de correlações

negativas estatisticamente significativas com algumas escalas e com alguns sintomas

importantes específicos do cancro de mama e dos seus tratamentos cirúrgicos e

adjuvantes. A análise dos resultados indica que, quanto mais alexitimicas são as

mulheres, pior é a avaliação que fazem da sua autoimagem corporal (r =-.499, p <.01) e

piores são as suas perspetivas em relação ao futuro (r = -.464, p <.01).

Não foram encontrados resultados estatisticamente significativos em relação ao

funcionamento sexual. De referir que o tamanho da nossa amostra é menor quando

consideramos os itens relativos ao funcionamento e prazer sexual, uma vez que apenas

uma parte da amostra concordou em responder às questões relacionadas com a sua

sexualidade (N = 57).

Em relação aos itens de sintomas, a alexitimia apresenta correlações estatisticamente

significativas e positivas com todos os itens de sintomas do QLQC-BR23. Tal indica

que, quanto mais alexitimicas maior é a perceção sobre a existência de efeitos

secundários decorrentes dos tratamentos (r =.637, p <.01), maior é a preocupação com a

alopécia (r =.451, p <.01), maior é a perceção sobre a presença de sintomas na mama (r

=.319, p <.01) e de sintomas no braço afetado (r =.219, p <.05).

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De um modo geral, ao analisar a relação das alexitimia com diferentes aspetos da

qualidade de vida, os resultados parecem indicar que a presença de alexitimia nas

mulheres com cancro de mama poderá prejudicar a adaptação à doença, uma vez que

está associada a perceções mais negativas sobre as escalas de funcionamento e a uma

maior perceção sobre a presença de sintomas físicos e efeitos colaterais associados aos

tratamentos antineoplásicos, quer cirúrgicos, quer adjuvantes. Na nossa amostra, uma

má expressão de emoções e de sentimentos parece aumentar a perceção sobre o

sofrimento físico associado ao cancro de mama. Poderemos levantar a hipótese de que

ao reprimirem as suas emoções, ao terem dificuldade em expressá-las corretamente e ao

terem dificuldade em dissociar sensações físicas de emocionais, as mulheres mais

alexitímicas têm tendência para se concentrarem nas sensações corporais e somáticas, e

para as aumentarem. Tal situação poderá, em alguns casos, provocar más interpretações

sobre os sinais da doença (Taylor, Parker, Bagby, & Acklin, 1992) que, ao invés de uma

origem fisiológica, teriam uma natureza psicossomática.

Conclusão

Este estudo parece salientar o impacto negativo da alexitimia na qualidade de vida das

mulheres com cancro de mama, podendo constituir um fator de risco para a adaptação à

doença. Enquanto um mecanismo de coping repressivo, de evitamento e mal adaptativo,

a alexitimia parece prejudicar significativamente várias dimensões da qualidade de vida

das nossas participantes.

Os resultados encontrados reforçam a importância de uma maior e melhor

expressividade de emoções e de sentimentos durante a experiência desta doença. O

“silêncio das emoções” sobre o funcionamento físico e sobre a perceção do sofrimento

físico parece prejudicar significativamente a avaliação que as mulheres com cancro de

mama da nossa amostra fazem sobre os seus sintomas físicos e sobre os efeitos

colaterais da doença e dos tratamentos.

Com base nos resultados encontrados retiram-se algumas conclusões integrativas que se

traduzem em implicações para intervenção e para o apoio aos doentes oncológicos.

Assim poderemos sugerir que a intervenção psicológica deverá desmistificar as reações

emocionais negativas, que são normativas, no decorrer de um processo de doença

oncológica, com o objetivo de diminuir os estilos de coping de evitamento e de

repressão emocional. Tal inclui a necessidade de desconstruir crenças que reforçam o

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estigma social que envolve o cancro e que estão presentes, tanto na população em geral

como nos profissionais de saúde, e que dizem respeito à tendência para evitar a

expressão de emoções negativas.

No contexto clínico, e considerando o exemplo da Terapia Focada nas Emoções (EFT),

o paciente deverá ser encorajado a refletir e a verbalizar as suas emoções negativas,

ultrapassando o seu evitamento e a repressão. O psicólogo deverá guiá-lo no sentido de

aumentar a sua consciência sobre as sensações sentidas no corpo, de forma a conseguir

experienciá-las e atribuir palavras à experiência (focagem) (Greenberg & Safran, 1987).

Sugerem-se, ainda, intervenções focadas na regulação emocional, na tolerância ao

distress, na aceitação, reconhecimento e validação das próprias emoções, procurando

aumentar o acesso a emoções positivas e reduzir a vulnerabilidade a emoções negativas,

através da utilização de estratégias de coping, como é o caso do relaxamento e da escrita

terapêutica.

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primerCOG – UMA FERRAMENTA DE TREINO COGNITIVO,

FUNCIONALMENTE VALIDADA PARA SENIORES COGNITIVAMENTE

SAUDÁVEIS

José Carlos Teixeira1 Vanessa Costa2 Patrícia Alecrim2 Sandra Freitas3 & Isabel

Santana3

1 MediaPrimer, Universidade de Coimbra, IT- Instituto de Telecomunicações, Portugal

2 MediaPrimer - Tecnologias e Sistemas Multimédia, Lda., Portugal

3 Centro de Neurociências e Biologia Celular (Universidade de Coimbra, Portugal)

Resumo

O envelhecimento demográfico da população e a relação da idade com o desenvolvimento de

demência e de Défice Cognitivo Ligeiro exigem soluções que contribuam para minorar as

consequências inerentes ao envelhecimento. primerCOG é uma ferramenta de treino cognitivo,

funcionalmente validada para seniores cognitivamente saudáveis.

Palavras-chave: Treino Cognitivo, Envelhecimento Ativo, Défice Cognitivo, Demências.

Abstract

The population aging and its relationship with dementia and Mild Cognitive Impairment,

require solutions that help minimize the consequences of an aging population. primerCOG is a

cognitive training tool, functionally validated for cognitively healthy seniors.

Keywords: Cognitive Training, Active Aging, Mild Cognitive Impairment, Dementia.

INTRODUÇÃO

A idade é considerada, por muitos, um dos principais fatores de risco para o desenvolvimento,

não só de demência (Barranco-Quintana, Allam, Castillo, & Navajas, 2005; Chen, Lin, & Chen,

2009; Herrera-Rivero, Hernández-Aguilar, Manzo, & Aranda-Abreu, 2010; Seshadri et al.,

1997), como também de Défice Cognitivo Ligeiro (DCL) (Luck, Luppa, Briel, & Riedel-Heller,

2010).

As projeções do envelhecimento demográfico da população alertam para uma realidade que

necessita de rápidas mudanças económicas e sociais e um maior investimento na promoção do

envelhecimento ativo. Prevê-se que, em 2050, em Portugal, existam 398 adultos idosos por cada

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100 jovens e que, mundialmente, 20% da população total seja constituída por adultos idosos, ou

seja, cerca de 2,5 biliões de pessoas.

As projeções relativas à demência, também se revelam bastante preocupantes. Calcula-se que o

número de pacientes com demência duplique a cada 20 anos, aproximando-se dos 42 milhões

em 2020 e dos 81 milhões em 2040, na ausência de estratégias preventivas ou tratamentos

eficazes (Ferri et al., 2005). Estima-se que, em 2012, em Portugal, houvesse 182526 indivíduos

com demência (1,71% da população total) (Alzheimer Europe, 2013).

Perante estes dados, somos confrontados com uma necessidade evidente de criação de soluções

que contribuam efetivamente para minorar as consequências inerentes ao envelhecimento da

população.

O trabalho que aqui se apresenta está relacionado com a validação funcional da plataforma de

treino cognitivo primerCOG. A análise e avaliação da experiência de utilização do primerCOG

teve por base uma amostra de 30 adultos idosos cognitivamente saudáveis.

Envelhecimento ativo - A importância da estimulação cognitiva

Pessoas que permanecem mental e fisicamente ativas podem deparar-se com um processo

natural de envelhecimento mais lento (Clark, 2002), sendo sugerido em vários estudos que as

funções básicas que são afetadas pelo envelhecimento podem ser melhoradas através de treino

(Hosseini, Kramer, Kesler, 2014).

Assim, assegurar uma atividade cognitiva frequente, antes da demência diagnosticada, pode

proteger e retardar o declínio cognitivo normal da idade, pois estimula diferentes partes do

cérebro envolvidas na memória e no processamento da informação, tornando-as mais eficientes

e resistentes. Bem como, em casos de demência, manter atividade física e mental contínua tem

um impacto positivo e incremental muito significativo no bem-estar e qualidade de vida do

paciente.

A plataforma primerCOG

primerCOG é uma plataforma de treino cognitivo, de natureza tecnológica e com uma forte base

científica que pretende não só contribuir para um envelhecimento saudável de seniores, como

também responder a necessidades de estimulação, manutenção e reabilitação de várias

patologias do foro neurodegenerativo.

Com atividades que permitem o treino cognitivo da memória, atenção, funções executivas,

linguagem e capacidade visuoespacial, primerCOG apresenta-se como uma ferramenta de

extrema utilidade para os vários especialistas que acompanham indivíduos com diferentes níveis

de deterioração cognitiva, desde o envelhecimento normal a pacientes do espectro da demência,

auxiliando a comunidade científica no diagnóstico precoce, prognóstico, manutenção e

monitorização dos pacientes ao longo dos diversos estágios da demência.

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Esta plataforma permitirá que, remotamente, os especialistas definam e personalizem planos de

treino cognitivo ajustados ao tipo e estágio da doença dos seus pacientes, às suas características

e consequentes limitações. Possibilitará também a monitorização remota da performance e da

evolução clínica de cada um dos pacientes.

Figura 1 - primerCOG: Plataforma para estimulação e treino cognitivo

Desenvolvimento centrado no utilizador

Sendo o primerCOG direcionado não só a seniores saudáveis mas também a utilizadores com

um perfil clínico, no âmbito das limitações cognitivas, optou-se por recorrer a uma metodologia

de desenvolvimento centrada no utilizador explorando o conceito “user experience”.

Em todo o processo de desenvolvimento consideraram-se alterações decorrentes do processo

natural de envelhecimento e capacidades mais afetadas - mobilidade, coordenação mão-olho e

motora, sentidos como a audição e a visão ou domínios cognitivos como a memória a curto-

prazo (AgeLight, 2001) - e as principais dificuldades de indivíduos com uma deficiência

cognitiva.

O estudo das principais características e condicionantes dos vários tipos de utilizadores a quem

o primerCOG se dirige foi fulcral na criação de todo o sistema, pois estas acabaram por

condicionar a definição das diretrizes de usabilidade a respeitar, interferindo de forma muito

evidente em campos como os da interação, navegação, tipo de informação, modelo funcional,

interface gráfica e criação de conteúdos.

Grande parte da literatura relacionada com utilizadores seniores e a Web acaba por apresentar

diretrizes que se refletem numa boa prática na criação de sistemas para qualquer faixa etária e

qualquer tipo de utilizador, desde a consistência da navegação, à forma clara como se deve

escrever ou tratar toda a interface gráfica (Redish & Cisnell, 2004).

Globalmente a abordagem seguida, que concilia ao máximo os requisitos que os diferentes

públicos-alvo do sistema a desenvolver apresentavam, recaiu sobre a adoção dos princípios do

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design universal. primerCOG tem um entendimento claro dos utilizadores a quem se destina,

comunica de forma clara e imediata o seu âmbito e os seus objetivos sendo fácil de usar e

apelativo.

METODOLOGIA

A equipa que tem colaborado na investigação necessária e nas diversas fases de

desenvolvimento do primerCOG, é composta por um vasto grupo de profissionais das áreas das

Neurociências e especialistas em design, interfaces, experiências de utilização, informática,

análise comportamental, análise de experiência de utilização de sistemas informáticos,

usabilidade e acessibilidade.

O Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) que, dentro do leque de competências

científicas que tem, se destaca particularmente pelo estudo dos mecanismos fundamentais de

envelhecimento e doenças neurológicas, contribuiu com todo o suporte científico,

absolutamente necessário para a qualidade científica do resultado final. Tendo tido uma

participação direta em tarefas de análise, especificação e testes das atividades e da plataforma de

treino cognitivo.

Para além do CNC, colaboraram no desenvolvimento do primerCOG entidades diretamente

ligadas à população alvo que, com o seu conhecimento, prestaram um contributo relevante na

análise do problema, especificação, estruturação e ensaio da solução desenvolvida.

A realização do estudo piloto de validação funcional da plataforma contou com a participação

de instituições e associações que consideraram pertinente o envolvimento neste projeto, tendo

colaborado: no teste das atividades de treino cognitivo com os utilizadores alvo, na avaliação do

grau de aceitação, na identificação das dificuldades e melhorias ao nível da usabilidade e na

avaliação da experiência e interação.

O estudo piloto teve início na Santa Casa da Misericórdia da Lousã (SCML), tendo depois sido

desenvolvido no Centro Comunitário de Desenvolvimento e Solidariedade Social de Coimbra

(CCDSSC), e, por fim, na Cáritas Diocesana de Coimbra (CDC). Apesar de todas as instituições

pertencerem ao distrito de Coimbra os participantes inserem-se, sobretudo, em dois meios: meio

moderadamente urbano e meio urbano.

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Tabela 1 - Participantes recrutados junto das instituições

INSTITUIÇÃO

NÚMERO DE

PARTICIPANTES

QUE REALIZARAM

AVALIAÇÃO

PSICOLÓGICA

NÚMERO DE

PARTICIPANTES

INCLUÍDOS NO ESTUDO

PILOTO

SCML 11 8

CCDSSC 15 13

CDC 13 9

Caracterização da amostra

Os participantes que constituem a amostra (N = 30) apresentam M = 9.53 ± 5 (A: 1 – 16) anos

de escolaridade; M = 73.73 ± 9.86 (A: 60 – 94) anos de idade e 93.3% dos participantes são do

género feminino.

Instrumentos utilizados para avaliação psicológica

A avaliação psicológica dos participantes foi realizada por psicóloga clínica e englobou

os aspetos cognitivos, a autoperceção mnésica e o estado emocional e consistiu na

aplicação do conjunto dos seguintes instrumentos de avaliação: os testes de rastreio de

défices cognitivos Mini-Mental State Examination (MMSE; Folstein, Folstein, &

McHugh, 1975; Freitas, Simões, Alves, Santana, 2014) e Montreal Cognitive

Assessment (MoCA; Nasreddine, Phillips, Bédirian, Charbonneau, Whitehead, Collin,

& Chertkow, 2005; Freitas, Simões, Santana, Martins, & Nasreddine, 2013); a Escala

Subjetiva de Queixas de Memória (SMC; Schmand, Jonker, Hooijer, & Lindeboom,

1996; Ginó, Mendes, Ribeiro, Mendonça, Guerreiro, & Garcia, 2008) para a

quantificação objetiva das queixas cognitivas; e a Escala de Depressão Geriátrica (GDS-

30; Yasavage, Brink, Rose, Lum, Huang, Adey, & Leirer, 1983; Barreto, Leuschner,

Santos, & Sobral, 2008), para avaliação de alterações afetivas e exclusão de casos de

Depressão grave. Todos estes instrumentos estão adaptados e validados para a

população portuguesa, sendo possível a interpretação dos resultados e, portanto, garantir

a correta seleção dos participantes cognitivamente saudáveis. A ordem de aplicação dos

instrumentos seguiu a enumeração aqui apresentada e assenta no princípio de evitar

qualquer influência na avaliação cognitiva.

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Instrumentos utilizados para análise de dados

Como suportes de apoio à recolha de dados do estudo piloto para posterior análise

foram criados diversos instrumentos, nomeadamente: (i) para técnicos observadores:

Protocolo de observação das sessões de teste; Formulários de registo dos dados da

observação da experiência global de cada utilizador durante as sessões de teste;

Formulário de registo da experiência de cada utilizador durante a execução de cada uma

das atividades; e (ii) para testers: Questionário para recolha de dados pessoais;

Formulário de avaliação individual de cada uma das 11 atividades; e Formulário de

avaliação pessoal da componente de SO.

Procedimentos para recolha de dados

Inicialmente foi estabelecido contacto com as instituições parceiras de modo a

sensibilizar as pessoas para a importância do treino cognitivo no contexto do

envelhecimento saudável. Identificados os utentes das instituições recetivos a participar

no projeto, o primeiro passo foi a obtenção do consentimento informado escrito. Os

utentes com desempenho cognitivo considerado normal para a escolaridade e idade, e

com ausência de sintomatologia em grau severo, testaram todas as onze atividades de

treino cognitivo até ao nível máximo conseguido (NMC). Em todos os momentos de

colaboração no estudo foi proporcionado aos participantes um ambiente com ausência

de ruído e com condições de luminosidade e temperaturas adequadas.

As sessões de teste das atividades tiveram uma duração média de uma hora e o número

médio de sessões foi igual a seis (M = 6.3; A: 4 -10). A condução das sessões teve em

consideração o respeito pela autonomia dos participantes, não existindo um tempo

rígido para a realização dos exercícios, existindo um ajuste a cada indivíduo e às suas

características e limitações (por exemplo, pessoas com dificuldades visuais preferem

várias sessões num intervalo de tempo mais reduzido do que pessoas sem qualquer tipo

de dificuldade visual).

Procedimentos para análise de dados

Para a análise de dados foi utilizado o programa estatístico Statistical Package for

Social Sciences (IBM, SPSS Version 20). Foram utilizadas análises estatísticas

descritivas para a caracterização da amostra e das sessões. As correlações de Pearson

permitiram a análise da relação entre os instrumentos e o nível máximo conseguido

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(NMC) nas atividades de treino cognitivo. Recorreu-se ao modelo de regressão linear

(RLM) para o estudo da influência da idade, da escolaridade, e da pontuação obtida na

GDS – 30 no NMC. A análise da evolução dos parâmetros avaliados pela psicóloga que

acompanhou as sessões foi realizada recorrendo ao teste t-Student para amostras

emparelhadas.

RESULTADOS

Análise da relação entre os resultados obtidos na avaliação psicológica e o nível máximo

conseguido (NMC) nas atividades de treino cognitivo

Nos testes de rastreio cognitivo obteve-se no MMSE: M = 28.53 ± 1.2 e no MoCA: M =

21.60 ± 4.92; na SMC: M = 3,93 ± 2,67; e GDS – 30: 5,90 ± 4,65.

Verificaram-se correlações positivas e estatisticamente significativas entre a pontuação

total no MoCA e o NMC em todas as atividades (p < .01), ou seja, melhor desempenho

no MoCA correspondia a maiores NMC nas atividades. Foi ainda possível observar

correlações positivas e estatisticamente significativas entre a pontuação total no MMSE

e o NMC em 7 das 11 atividades. Os valores das correlações positivas entre o NMC e os

testes de rastreio cognitivo foi sistematicamente maior no MoCA do que no MMSE.

A pontuação total no MoCA exerceu influência no NMC em todas as atividades, e

chega a explicar o NMC nas atividades desde 26% até 62%. Já a pontuação total no

MMSE exerceu influência em 7 atividades. A maior percentagem explicada pela

pontuação total do MMSE ocorreu sobretudo em tarefas que envolviam memória.

Não se verificaram correlações estatisticamente significativas entre o NMC e a GDS – 30.

Influência da escolaridade e da idade no NMC

Verificaram-se correlações positivas e estatisticamente significativas entre o NMC e a

escolaridade para todas as atividades. Assim, quanto maior é a escolaridade maior é o

NMC. A escolaridade influenciou de forma estatisticamente significativa o NMC em

quase todas as atividades, à exceção da atividade Torres (funções executivas).

Em relação à idade observaram-se correlações negativas entre o NMC e a idade, ou seja,

quanto maior foi a idade, menor foi o NMC em todas as atividades. As correlações

negativas e estatisticamente significativas entre o NMC e a idade foram encontradas

para quase todas as atividades, à exceção das atividades Labirintos (funções executivas

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e capacidade visuoespacial) e Torres (funções executivas). A idade influenciou de forma

estatisticamente significativa o NMC em quase todas as atividades, à exceção das

atividades Labirintos e Torres.

As correlações entre NMC e escolaridade são maiores do que as correlações entre o

NMC e a idade. Os resultados obtidos na correlação e na regressão vão ao encontro

daquilo que já se conhece na literatura, sendo o desempenho cognitivo altamente

influenciado pela escolaridade e não tanto pela idade.

Identificação e reconhecimento de dificuldades, limitações ou incapacidades que condicionem a

utilização de dispositivos ou sistemas tecnológicos

No Questionário de Caracterização dos Participantes, 36,7% da amostra considera ter

dificuldades visuais; 13,3% dificuldades auditivas; 16,7% dificuldades motoras; e 3,3%

da amostra considera ter dificuldades cognitivas.

Após conclusão do estudo, e preenchimento do Questionário de Avaliação Pessoal da

Componente de Saúde Ocupacional, 96,7% afirma “raramente” ter tido dificuldade em

ler o conteúdo; 86,7% “muita facilidade” em distinguir as cores e 13,3% “alguma

facilidade”. Em relação aos aspetos de compreensão 80% dos participantes considerou

ter compreendido e interpretado “com muita facilidade” a informação que lhes foi

apresentada e 20% “com alguma facilidade”. Todos os participantes consideraram

“quase sempre” a linguagem usada clara, simples e adequada ao conteúdo. Estes

resultados sugerem a adequação da plataforma ao público-alvo.

Avaliação da eficácia, eficiência, capacidade de memorização e frequência e da severidade dos

erros que ocorreram ao longo das sessões de aplicação do primerCOG

Para a análise destes quatro parâmetros considerámos a média do conjunto dos itens que

compõem cada um dos parâmetros avaliados. A comparação do registo efetuado pela

neuropsicóloga que acompanhou as sessões é estabelecida atendendo ao número médio

de sessões (M = 6.3), efetuando-se a comparação entre a primeira e a sexta avaliação (n

= 19), e ao número mínimo de sessões realizadas por todos os participantes (4 sessões).

Os resultados da avaliação da análise comportamental evidenciaram uma melhoria

significativa entre a 1ª e a 6ª sessão em todos os parâmetros avaliados através da

observação comportamental (cf. Tabela 2). Entre a 1ª e a 4ª sessão os resultados foram

semelhantes, à exceção da frequência e severidade dos erros que até à 4ª sessão não

apresentava ainda uma melhoria significativa.

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Tabela 2 - Valores do teste t-Student para os parâmetros avaliados durante

a primeira, quarta e sexta sessões

EFICÁCIA EFICIÊNCIA CAPACIDADE

DE MEMORIZAÇÃO

FREQUÊNCIA

E SEVERIDADE

DOS ERROS

1ª – 4ª sessão

(N = 30) 3.10 (p = .004) 3.08 (p = .004) 2.85 (p = .008) 1.99 (p = 0.56)

1ª – 6ª sessão

(n = 19) 2.70 (p = .015) 3.28 (p = .004) 2.85 (p = .031) 2.66 (p = .016)

Avaliação comportamental resultante da observação dos vários participantes ao longo de todas

as sessões de teste que existiram durante o estudo piloto

À semelhança do que aconteceu para os participantes também a neuropsicóloga que

acompanhou todas as sessões de treino cognitivo realizou a avaliação da análise da

experiência de utilização da plataforma. Vários itens foram analisados, tendo-se optado

por agrupá-los de modo a apresentar os dados por áreas de análise com a designação da

escolha da resposta correspondente ao valor médio.

Tabela 3. Avaliação da execução das atividades e da interação com o sistema,

efetuada pelo profissional em análise comportamental

Cálculos Classificar

Cartões

Colecionar

Botões

Descobrir

as

Diferenças

Encontrar

os Gémeos

Labirintos Lista de

Palavras

Na Mesma

Ordem

Slot

Machine

Torres Vi ou Li

Antes

COMPREENSÃO

Da informação apresentada; Do funcionamento da atividade

(1 - Muita dificuldade; 2 - Alguma dificuldade; 3 - Alguma facilidade; 4 - Muita facilidade)

4 3 4 3 4 3 4 3 4 3 3

DIFICULDADES DEMONSTRADAS AO NÍVEL FUNCIONAL

Uso do rato para interagir com o sistema; Em usar o teclado para interagir com o sistema

(1 - Muita dificuldade; 2 - Alguma facilidade; 3 - Muita facilidade)

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3 2 2 3 3 2 3 3 3 3 3

DIFICULDADES DEMONSTRADAS AO NÍVEL DA INTERFACE E USABILIDADE

Compreensão da linguagem; Leitura de conteúdos; Distinção das cores; Compreensão e retenção dos elementos gráficos;

Compreensão das instruções auxiliares; Compreensão dos feedbacks recebidos

(1 - Muita dificuldade; 2 - Alguma facilidade; 3 - Muita facilidade)

3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3

CAPACIDADE DE RESOLUÇÃO DE "PROBLEMA" | SUPERAR DIFICULDADES

(1 - Desistiu de imediato e necessitou de auxílio; 2 - Desistiu com muita facilidade e necessitou de auxílio; 3 - Desistiu com

alguma facilidade e necessitou de auxílio; 4 - Muito persistente mas acabou por necessitar de auxílio; 5 - Muito persistente sem

necessidade de auxílio)

4 4 5 5 5 4 4 4 4 4 4

EXECUÇÃO (EXPERIÊNCIA)

Capacidade de: Orientação | Interação | Interpretação | Resposta a estímulos | Desempenho global

(1 - Muito fraca; 2 - Fraca; 3 - Razoável; 4 - Positiva; 5 - Muito positiva)

4 4 4 5 4 4 4 4 4 4 4

ATITUDE

Grau de aceitação e interesse demonstrado

(1 - Nenhum; 2 - Pouco; 3 - Algum; 4 - Elevado; 5 - Muito elevado)

4 4 4 4 4 4 4 4 4 4 4

CONCLUSÕES

O treino cognitivo on-line foi considerado "necessário" por 56,7% e "muito necessário" por

33,3% dos participantes no estudo. Contudo, 93,3% nunca tinham utilizado plataformas para

este fim, por desconhecerem a sua existência (92,9%). Todos os participantes usam telemóvel,

mas apenas 48,3% usam computador. Foram encontradas correlações positivas e significativas

entre o nível máximo conseguido (NMC) em cada atividade e as pontuações totais no MoCA; e

ausência de correlações significativas entre o NMC em cada atividade e a GDS-30. A pontuação

obtida na GDS-30 não influenciou significativamente o NMC em cada uma das atividades.

Verificaram-se melhorias significativas entre a primeira e a última sessão de utilização da

componente de SO quanto à eficácia, eficiência, capacidade de memorização e frequência de

erros cometidos aquando da utilização da plataforma. Após conclusão do estudo, 66,7% dos

participantes afirmaram estar ”muito satisfeitos” e 26,7% “satisfeitos” com a plataforma testada.

A existência de utilização prévia do computador não exerceu influência no grau de satisfação da

utilização do sistema.

Como conclusão podemos afirmar que a recetividade à utilização do primerCOG foi muito

positiva.

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Os participantes apresentaram comportamentos que indicam motivação nas tarefas, tais como:

Escuta atenta e estabelecimento de contacto visual com a técnica de análise comportamental e

cognitiva aquando da explicação das tarefas;

Leitura atenta das informações/indicações presentes nas atividades;

Seleção e clique com o rato do computador nas tarefas sugeridas;

Interesse em analisar o seu próprio desempenho;

Sentido crítico das tarefas realizadas, que se tornou notório através das sugestões apresentadas

sobre melhorias que poderiam ser efetuadas;

Avaliação positiva das atividades cujo nível máximo de desempenho foi atingido.

No futuro pretende-se realizar a validação clínica e científica da plataforma, através da

implementação de um novo estudo piloto longitudinal com 2 grupos (controlo/clínico),

o que permitirá determinar a eficácia do primerCOG, explorando e avaliando: a

capacidade de melhoria dos utilizadores do primerCOG; a capacidade preventiva dos

utilizadores do primerCOG; e se as atividades de treino cognitivo avaliam realmente os

domínios cognitivos pretendidos em cada uma delas e se estão adequadas aos perfis de

utilizadores.

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100

100

Seshadri, S., Wolf, P. A., Beiser, A., Au, R., McNulty, K., White, R., & D'Agostino,

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EFEITOS DO PRECONCEITO E BULLYING NO PROCESSO DE INCLUSÃO

ESCOLAR

Morgana Christmann & Sílvia Maria de Oliveira Pavão

Universidade Federal de Santa Maria, Brasil.

Resumo

O bullying é um problema social que tem efeitos deletérios sobre o desenvolvimento

daquele que sofre e as vítimas geralmente são sujeitos que apresentam alguma diferença

dos demais, como as pessoas com deficiência. Assim, a escola precisa ser um local de

desconstrução de preconceitos e de respeito aos direitos humanos, com igualdade de

oportunidades.

Palavras-chave: Inclusão; Bullying; Preconceito.

Abstract

Bullying is a social problem that has deleterious effects on the development those who

suffer and the victims are usually those with a difference of others, such as people with

disabilities. Thus, the school must be a place of deconstruction of prejudices and respect

for human rights and equal opportunities.

Keywords: Inclusion; Bullying; Prejudices.

Introdução

O direito à educação de pessoas com deficiência no Brasil, deflagrou nos últimos anos a

necessidade de rever paradigmas educacionais. A Constituição de 1988 (Brasil, 1988) e

a Lei nº 8069/90, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (Brasil,

1990), afirmam que é direito de todo ser humano crescer e desenvolver-se. Ainda com o

direito garantido por lei é comum que as pessoas com deficiências se deparem com

preconceito, barreiras que impedem seu trânsito, seu convívio social e seu crescimento

físico, mental e social.

Refletir acerca dos processos que envolvem a inclusão é um desafio para profissionais

das diversas áreas do conhecimento, pois envolve uma complexidade de elementos

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sócio-históricos, culturais, socioeconômicos e humanos, os quais exigem um olhar

amplo sobre os fatores que envolvem a inclusão em suas diferentes faces. Contudo, esta

reflexão requer que a história de segregação e preconceito sofrido pelas pessoas com

deficiência ao longo dos anos seja considerada, para desta maneira compreender a

situação atual da inclusão, já que diversos são os seus desafios (Jannuzzi, 2004).

Dentre os processos que envolvem a inclusão escolar, está a presença do preconceito e a

“estranheza” causada pela diferença, enquanto elementos históricos que influenciam na

atualidade as questões que envolvem incluir. Entretanto na escola, outro conceito que

tem resultado em diversas pesquisas na área da educação e psicologia especialmente, é o

bullying. O bullying como problema social, tem preocupado a comunidade escolar pelos

efeitos deletérios ao desenvolvimento psicossocial da criança, não apenas aquela sem

deficiência, mas especialmente as que apresentam algum característica que as

“diferencie” dos demais, como as diversas deficiências (Fante; Pedra, 2008).

Tendo como base o cenário da inclusão de pessoas com deficiência na escola regular,

esta pesquisa teve como objetivo dissertar sobre a presença do preconceito e bullying na

escola inclusiva, sob a perspectiva de alunos, pais e professores, com vistas a refletir

sobre os processos psicossociais que envolvem a inclusão.

Metodologia

No decorrer de uma pesquisa, além de elaborarmos respostas organizadas e pertinentes

às perguntas realizadas, construímos sempre novos conhecimentos sobre determinados

temas, tendo em vista as constantes transformações sociais (Gamboa, 2012). A

pesquisa qualitativa, do tipo exploratória, teve como lócus de estudo a rede municipal

de ensino de um município do Rio Grande do Sul-Brasil, sendo aprovada pelo Comitê

de Ética de uma universidade federal no mesmo estado.

A abordagem qualitativa elegida como tipo de pesquisa, busca desvendar os

significados dos fenômenos e dos processos vivenciados pelos sujeitos. Como afirma

Minayo (2004, p. 22), o estudo qualitativo possibilita aprofundar-se no mundo dos

significados e relações humanas que são impossíveis serem medidas ou até mesmo

percebidas por outros métodos de pesquisa.

Nesse estudo, a amostra foi constituída por alunos matriculados do 5° ao 9° ano na rede

municipal de ensino, seus pais e professores. Como critérios para participar do estudo

foram elencados os alunos que apresentassem deficiência física motora (DFM) e

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ausência de deficiência cognitiva. Para localizar tais alunos, foram utilizados os dados

do Educacenso6 e contato telefônico prévio com as educadoras especiais ou

coordenadoras pedagógicas das escolas, que apresentavam registro de alunos com

deficiência física no Educacenso. Assim a amostra foi constituída por 10 professores

(P1...P10), 10 alunos (A1...A10) e sete pais (M1...M7). Foram sete pais, pois duas

alunas eram irmãs e possuíam a mesma DFM, sendo que uma prima também com

deficiência frequentava a escola e pelas quais (3 alunas) apenas uma mãe respondeu e

ainda um aluno era maior de idade.

A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas semi-estruturadas, tendo como

guia três roteiros. Os pais, alunos e professores foram entrevistados individualmente e

suas respostas foram gravadas e posteriormente transcritas pela pesquisadora. Importa

referir que, todos os participantes deram seu consentimento por meio da assinatura do

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e Termo de Assentimento (menores de 18

anos), respeitando os princípios éticos da pesquisa com seres humanos, assegurados

pela Resolução 196/96 (Brasil, 2012).

A análise dos dados foi realizada pelo método de Análise de Conteúdo proposta por

Bardin (2011). A análise de conteúdo é entendida como uma técnica de compreensão,

interpretação e explicação das formas de comunicação, cujos objetivos centrais são: a)

ultrapassar as evidências imediatas; b) aprofundar a percepção da realidade e c)

verificar a pertinência e desvelar a estrutura das mensagens (Bardin, 2011). A partir

desta análise foi possível criar uma categoria metodológica que possibilitou dissertar

acerca do objetivo proposto.

Resultados e Discussão

A pesquisa encontrou um total de 10 alunos (5 meninos e 5 meninas) que se encaixavam

nos critérios de inclusão. Assim, a amostra foi constituída por alunos com média de

idade 14,7 anos, sendo que dois alunos pertenciam ao 5º ano, um ao 6º ano, dois ao 7º

ano, dois ao 8º ano e três ao 9º ano do ensino fundamental.

Quanto as deficiências, dois alunos eram usuários de cadeira de rodas, por sequelas de

paralisia cerebral (PC) e mielomeningocele, A1 e A2 respectivamente. Uma aluna

apresentava baixa estatura causada pelo nanismo (A5) e os demais sete alunos

6 Trata-se de uma pesquisa anual obrigatória para as escolas públicas e privadas da educação básica

brasileira.

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apresentavam sequelas de PC nas diversas formas (A3, A4, A6, A7, A8, A9 e A10),

sendo que apenas um deles (A8) possuía tetraparesia, o caso de maior

comprometimento motor, que no entanto não impedia a mobilidade. Nesse sentido é

importante elucidar que, estes sete alunos possuíam marcha sem apoio com pequenas

dificuldades de locomoção.

Preconceito e bullying.

O preconceito é um tema que vem sendo discutido há anos, em especial, nas ciências

sociais. No entanto, nos últimos tempos, com o advento da “educação para todos”

(Declaração de Jomtien, 1990), os pesquisadores da área da educação têm verificado a

necessidade de pesquisar a temática, tendo em vista a presença da “diferença” na escola

em suas diversas formas.

A deficiência remete a presença da diferença. A diferenciação é pautada por um lugar

social segundo Silva (2006), presentes em todas culturas. Para a mesma autora o

preconceito nada mais é do que um mecanismo de negação social, já que “o ser

diferente” é compreendido como carência, falta ou impossibilidade, que apesar de ser

um comportamento pessoal, é desencadeado por uma ação social (Silva, 2006).

As atribuições de impossibilidade, carência e falta estão também relacionadas à

possibilidade de participação ativa na sociedade, na forma de trabalho. Historicamente,

pessoas com deficiência eram consideradas “inválidas”, “monstros”, que despertavam

medo e pavor. Logo, eram dignas de atitudes de proteção e rejeição, que caracterizam o

preconceito até os dias atuais (Silva, 2006).

A prática do bullying, por sua vez, é caracterizada por agressões verbais repetitivas em

relação a alguma fragilidade ou diferença da vítima (Fante; Pedra, 2008). No caso dos

alunos aqui pesquisados, percebe-se que, em sua maioria, a presença do preconceito, em

relação à deficiência, resulta no bullying.

Deste modo, importa referir que, no contexto desta pesquisa, o preconceito e bullying

são discutidos em conjunto. Porém, são entendidos como dois conceitos distintos, mas

que, no argumento do preconceito quanto aos sujeitos desta pesquisa, o bullying está

intimamente relacionado ao ato de discriminar. Desse modo, o bullying é entendido

como resultado de um processo de discriminação e de preconceito.

A escola enquanto um dos primeiros ambientes sociais da criança, onde ela se encontra

afastada de seus pais e se caracterizando e constituindo como sujeito pertencente aquele

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espaço é um local onde as primeiras manifestações preconceituosas podem ocorrer.

Contudo, igualmente, é o local em que a presença da diferença deve ser assegurada

como forma de construir uma sociedade mais igualitária, sem preconceito e

discriminação.

Nessa pesquisa pode-se verificar, que o preconceito está presente nos relatos da maior

parte dos participantes, mesmo velado, em diversas situações. Quando os alunos foram

questionados quanto ao sentimento de exclusão por possuírem uma deficiência, as

respostas foram variadas. Cinco deles responderam não se sentirem excluídos, como

relatado por uma aluna: “Não. Só me considero mais baixinha. Eles zoam comigo como

zoam com todo mundo.” (A5). É possível perceber, nessa fala, que o fato de “zoar7” é

prática frequente entre os adolescentes. Esta prática pode ser caracterizar como bullying,

no entanto parece que os adolescentes têm enfrentado a situação como cotidiana,

natural. Não seria este um problema que favoreceria a perpetuação da prática do

bullying ou noutros casos de preconceito?

Já o aluno A1, com certa maturidade que a idade lhe confere, afirma que uma pessoa

com deficiência sempre será observada. Nestas situações, por vezes, isso pode gerar

preconceito e, em outras situações, pode ser empregado como forma de piedade,

cuidado ou solidariedade:

O que eu percebo é que tudo o que você faz vai ser notado, seja uma risada, uma

coisa que você falar, ou algum movimento teu vai ser notado pelas outras

pessoas [...] cuidado exagerado, às vezes, porque, se alguma coisa cair no chão,

eles pensam que a gente não pode juntar, e a gente pode... (A1).

Entretanto, esse aluno tem, bem claro, que isso não pode interferir no cotidiano:

“Chama atenção de qualquer maneira! O que não pode atrapalhar, por que as pessoas

vão estar sempre te notando, sempre te olhando, tu não pode dar atenção para aquilo,

por que se você der atenção aquilo vai incomodar”.

As falas de A5 e A1 refletem a compreensão que possuir uma deficiência não é

sinônimo de incapacidade. Em geral, neste estudo, as crianças mais velhas parecem

relacionar-se melhor com sua condição física. Isso não ocorre do mesmo modo no caso

dos mais novos, principalmente em relação ao bullying.

O estudo sobre os dados da PENSE8 de Malta et al. (2014) revelou que os meninos mais

velhos sofrem menos bullying dos que os mais novos. Nessa pesquisa, entre os alunos

7 Zoar: Fazer bagunça, atrapalhar, incomodar o outro pelas suas características e atitudes. 8 Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar.

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que relataram sofrer mais bullying (oito alunos), a maior parte foi de meninos e, apesar

de não poder fazer correlação com a idade, já que a faixa etária dos alunos aqui

pesquisados difere daquela aplicada na PENSE (alunos do 9° ano), os relatos revelaram

que, na atualidade, os alunos sofrem menos bullying que quando eram mais novos.

Todavia, a prática persiste.

O preconceito é uma manifestação que se dá de diversas formas. As atitudes, por

exemplo, podem revelar preconceitos velados. Uma aluna afirmou que é tratada

diferente por alguns professores: “Tratar melhor do que os outros! Alguns me tratam

normal e outros me tratam diferente” (A2). Este relato faz refletir sobre a formação do

professor para atuar com os alunos com deficiência. A falta de preparo é relatada pela

literatura brasileira, como um dos grandes problemas do processo de inclusão, já que

exige uma mudança paradigmática (Freitas; Pavão, 2012).

Sobre a relação com colegas, dois alunos explicitaram que estes não os convidam para

realizar as atividades e, às vezes, lançam ofensas verbais, referindo-se à deficiência com

o termo “aleijado”. O bullying praticado por crianças e adolescentes, em relação às

pessoas com deficiência, pode ser uma manifestação preconceituosa e discriminatória,

que vem sendo perpetuada, como consequência de uma história recente de segregação.

Os alunos foram questionados se já haviam sofrido bullying na escola, em decorrência

da deficiência, e apenas dois deixaram claro não terem passado por essa situação. Os

demais alunos referiram que, em algum momento da vida, foram chamados de

“aleijados”, “pé torto”, “mão torta”, “doente mental” e tantos outros adjetivos que

causam desconforto: “Me sinto triste quando as pessoas olham pra gente com a cara

torta, ou chamam a gente de aleijada...” (A3).

Uma situação relatada, em que o bullying incide sobre a deficiência, refere-se ao caso de

um aluno com PC que, em virtude da lesão cerebral, manteve o reflexo de moro e, por

isso, todo barulho agudo e estridente lhe causa um “susto”. Esse evento foi observado

pelos colegas de turma, que provocam a reação diversas vezes, batendo com a mão

sobre a carteira escolar. Tal situação foi relatada pela mãe e pelo próprio aluno:“...como

me assusto por qualquer coisa eles ficam provocando isso” (A8). Com medo de

represálias dos próprios colegas fora da escola, nada foi feito, no intuito de reduzir a

prática, por opção da família.

É importante destacar que um dos fatores que impedem as atitudes, tanto da escola

quanto da família, frente a essas situações, é o medo, já que a violência está muito

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presente nos bairros do município pesquisado. Por outro lado, essa não é uma

justificativa que sustente o fato de o aluno continuar a passar por essa situação.

Nesse sentido, praticar bullying, durante a adolescência, é uma característica que pode

indicar um maior risco de adoção de comportamentos agressivos na idade adulta. Já

quem sofre o bullying, tem risco maior de desenvolver sintomas de estresse, depressão,

baixa estima ansiedade e baixo rendimento escolar (Malta et al., 2014).

As mães dos alunos pesquisados também foram questionadas quanto ao fato de seus

filhos sofrerem bullying na escola. Apenas uma respondeu que não, as demais mães

referiram ouvir relatos de seus filhos terem sofrido bullying, em relação às suas

características físicas, em algum momento na escola. Nessas situações, a função dos

pais é dar apoio à criança ou ao adolescente:

[...] eu sempre digo pra ela que ela não é diferente de ninguém porque está numa

cadeira de rodas, que o mundo é o mesmo e que existe preconceito, […] apesar

de ter agora a inclusão, tem preconceito sim, sempre vai ter, não é? Então, eu

digo pra ela: tu não é diferente de ninguém, não é inferior nem superior a

ninguém, tu é igual a todos (M2).

A tarefa de prevenir o bullying e de combatê-lo é, também, da família. Essa,

inicialmente, deve oferecer apoio psicológico à criança ou ao adolescente e, em seguida,

tomar atitudes em relação aos agressores. Entretanto, a família precisa ser assistida,

nesse processo, e ter suporte para criar estratégias conjuntas com a escola, sobretudo,

em se tratando de situações de grande complexidade, que envolvam alta frequência e

permanência da violência (Pereira et al., 2011).

Nas falas dos professores, do mesmo modo, é possível identificar que a escola tem

procurado combater todas as formas de preconceito:

Não, eu acho que não é preconceito, não sei se seria preconceito, mas é ele que

não procura, ele que fica na dele, quietinho. Os colegas vão até ele, mas se ele

quer ir ao banheiro, é diferente, tem que pedir por favor, pode ir lá com o A8,

sempre tem um pronto, entendeu? Mas ele não procura os colegas, fica lá [...]

(P8).

O papel do professor é fundamental nesse processo. Para que esse possa intervir e

auxiliar no desenvolvimento de estratégias para a prevenção e combate ao bullying, ele

necessita conhecer bem esse fenômeno social (Pereira et al., 2011). É possível perceber,

nas falas dos alunos, a importância da intervenção do professor: “[...] só que a

professora mandou ele parar e agora ele não faz mais isso...(A4). “Eu achava que tinha

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mais quando a professora Maria não estava aqui. Aí não era nada comigo, mas era com

o João, ficavam chamando ele de cadeirante voador. Antes, quando ela não vinha cuidar

dele, agora que ela vem, parou (A9)”.

Noutros casos o bullying pode ocasionar problemas de ordem física para a vítima. A

entrevistada M8 relata que o filho sofre com constantes problemas gastrointestinais que

não apresentam uma causa aparente e que já foi motivo de investigação médica. Esses

problemas de causa psicossomática existiriam pelo fato de sofrer bullying

cotidianamente? Fante e Pedra (2008) indicam que uma das principais consequências,

para a saúde das pessoas que sofrem bullying, é o estresse.

O estado de estresse causa baixa imunidade e, assim, sintomas diversos são

desencadeados, principalmente próximos ao horário de ir à escola. Tais sintomas

incluem dor de estômago, diarreia, dor de cabeça, dores musculares, tensão, ansiedade,

distúrbios do sono, que podem resultar em doenças como as gastrites, anorexia, herpes,

alergias, entre outras (Fante; Pedra, 2008).

Segundo o mesmo autor, crianças e adolescentes que sofrem bullying na infância

desenvolvem diferentes capacidades na vida adulta. Essas, muitas vezes, estão

relacionadas aos fatores estressores da infância e podem ocasionar problemas de

interação social na vida adulta (Fante; Pedra, 2008).

Contudo, contrapondo as informações até agora apresentadas, uma professora relata

verificar a capacidade de resiliência que o aluno com deficiência pode desenvolver, para

enfrentar as dificuldades advindas da deficiência. Segundo a professora, seu aluno sofre

bullying constantemente na escola e fora dela, e pontuou que: “É outra coisa que eu

percebo que parte dele também, o querer aprender. Talvez essa limitação física faça

com que ele se motive mais e se esforce mais para aprender e não faltar aula” (P10).

A resiliência é uma capacidade que envolve situações de superação de dificuldades,

auto realização e compreensão do homem. Para isso o incentivo e apoio da família e da

escola são fundamentais para que a criança/adolescente possa se desenvolver e adquirir

autonomia e independência (Garcia, 2008).

No tocante às situações que geram bullying entre os alunos pesquisados, apresentar uma

deficiência que dificulte a aprendizagem, no contexto da escola, e que necessite de um

apoio educacional, como a sala de Atendimento Educacional Especializado (AEE),

também foi elemento gerador de bullying e preconceito:

Uma vez, lá no Figueira, quando eu fazia com uma professora que ensinava a

gente fazer as coisas [...]. Era uma sala tipo essa, aí ela ensinava a gente fazer as

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coisas. Aí, cada vez que eu ia nestas aulas, tinha um guri que ficava toda hora me

chamando de perneta e coisa (A9).

Com esta descrição é possível perceber que, ao mesmo tempo em que o objetivo do

AEE é garantir melhores recursos para a aprendizagem dos alunos com deficiência,

também se tornou uma forma de diferenciar os alunos que apresentam alguma

necessidade de auxílio à sua aprendizagem, favorecendo as situações de preconceito e

bullying. Outro ponto a ser observado, referente a essa amostra, é o questionamento de

quais são os alunos que realmente necessitam de atendimento pelo AEE. Ser

considerado um aluno com deficiência não pressupõe carecer de apoio, pois a condição

de deficiência nem sempre determinam as condições de aprendizagem.

Quanto ao fato dos alunos com deficiência perceberem que estão sofrendo preconceito,

foi verificado que esta compreensão varia e, às vezes, as pessoas não reconhecem a

situação que estão vivendo por estarem acostumadas a sofrerem discriminação. Isso foi

relatado por um aluno: “Aqui na escola, como já tinha passado por um processo de

preconceito bem forte em 2006, eu já não dava bola, porque eu passei por isso a vida

inteira, eu só não percebia. Está aí uma baita diferença: você passa por isso, só que você

não percebe [...]” (A1).

O preconceito é um mal social e, logo, presente em diversos locais, das mais diversas

formas. A estranheza causada pela deficiência faz remeter o pensamento à possibilidade

de se igualar, haja vista as fragilidades do corpo humano, o que causa medo e aversão

(Silva, 2006). A mãe de uma aluna diz perceber tal estranheza ao frequentar locais

públicos:

[...] pelo lado de acharem engraçado de rirem sabe, porque, quando eu estou

junto, ela nem percebe, só com o olhar a pessoa vê que eu notei, de tirarem foto

dela disfarçados [...]. Então, eu vejo muito isso, não vejo assim do lado mal de

discriminação sabe, mas incomoda não é? Porque tu estás indo na rua, as pessoas

se cutucam, mostram, como já aconteceu de virem pedir pra tirar foto com ela.

Ai eu digo: se ela quiser, por mim, tudo bem (M6).

Quando analisadas as histórias de vida relatadas pelos alunos e por seus pais, o que se

observa é que o processo que envolve o preconceito com as pessoas com deficiência

física está relacionado, também, ao desconhecido. Na maior parte dos casos, os alunos

sofreram discriminação quando ingressaram na escola, mas, assim que os colegas

passaram a conhecê-los, a compreender suas deficiências e aceitá-las como diferenças

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naturais, o preconceito foi minimizado. Já, entre os adultos, o preconceito parece ser

maior e estar velado em diversas situações.

Tendo por base essas observações, minimizar o bullying ou o preconceito, representa

uma tarefa para a escola em parceria com a família e a comunidade. Novas estratégias

devem ser criadas, pelas escolas, para reduzir o preconceito e a discriminação. Uma

delas é justamente expor os alunos à diferença, seja ela causada pela deficiência, pela

raça, pela cor, pelo gênero, pela opção sexual ou pela religião.

Conclusão

O processo de inclusão escolar ainda caminha por ruas sinuosas, na medida em que

diferentes obstáculos são impostos a cada dia. Por este fato, a escola necessita se

reinventar cotidianamente, dando respostas as dificuldades dos seus alunos e cumprindo

com sua função social.

Contudo, é reconhecido que ainda na atualidade, possuir uma deficiência é sinônimo de

estranheza, fato que entre os alunos em processo de formação, pode gerar o bullying e o

preconceito. Dessa maneira, a escola deve estar sensível para estas ocorrências e

possibilitar um ambiente livre dessas atitudes. Trata-se de um desafio para a escola, que

exige a colaboração de pais e da sociedade em geral.

Para superar estes obstáculos e garantir o aprendizado, que pode estar comprometido

pelas consequências de tais atos, parcerias com diferentes profissionais podem auxiliar

na formulação de estratégias para o enfrentamento do bullying e preconceito. Isto se faz

necessário, na medida que em processo de formação, o aluno necessita reconhecer

limites e aprender a respeitar os demais para viver em sociedade, ajudando a construí-la

sob uma perspectiva de direitos e liberdade.

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ESTADOS DE HUMOR E JULGAMENTOS

(Emoções e satisfação com a vida)

Vitor Nunos Anjos; Margarida Pocinho; Alexandra Grasina; João Silva; Luis Loureiro;

Margarida Miranda & Magda Raquel Maia

Introdução

A satisfação com a vida é um fator subjetivo do bem-estar, que por sua vez é uma área

da psicologia que tem crescido muito ultimamente, cobrindo estudos que têm utilizado

as mais diversas nomeações, tais como: felicidade, satisfação, estado de espírito e afeto

positivo (Giacomoni, 2004).

As emoções podem ser induzidas, através do visionamento de um filme alegre ou triste,

ou recordando um evento feliz ou triste do nosso passado, ou recebendo feedback

positivo ou negativo em alguma tarefa, exatamente o tipo de experiências que produz

emoções boas ou más na vida real (J. P. Forgas & Moylan, 1987; J. Forgas, 2009).

A satisfação com a vida pode ser dirigida a uma área específica da vida do sujeito (e.g.

trabalho, família) ou de forma global. Existem três faculdades humanas mentais básicas

da psicologia: cognição (como processamento de informação), motivação e emoção.

Apesar do poder indubitável das emoções, estas foram, durante muitos anos,

negligenciadas como tema de investigação científica. Contudo, através da psicologia,

sabemos que pela alteração da perceção (processo cognitivo) podemos manipular as

nossas emoções. E, ao invés de este ser um poder perigoso, a evidência sugere que a

emoção é uma ferramenta útil e essencial que faz parte da nossa capacidade de resposta

a diferentes situações sociais (J. Forgas, 2009).

Frequentemente, confrontamo-nos, em situações do dia-a-dia, com a necessidade de

fazer julgamentos sociais num curto espaço de tempo, pela nossa perceção acerca de

eventos passados, presentes ou futuros. Emoções positivas estão associadas com

julgamentos optimistas e emoções negativas com julgamentos pessimistas (Joseph P.

Forgas & East, 2008).

Regra geral, as emoções positivas como a alegria, a satisfação e o amor, têm uma

implicação direta com a saúde. Permitem o desenvolvimento cognitivo e

comportamental e a construção de recursos psicológicos e emocionais. As emoções

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negativas como o medo e a raiva induzem comportamentos de evitação ou de enfrentar

ameaça. Sendo o pensar uma fonte de stress psicológico, rever conceitos de forma mais

ampla e encarar os eventos como desafios e não como ameaças, possibilitam respostas

criativas, integradas e oferece uma variedade grande de opções comportamentais, com

criticidade, mas sem preconceitos, medos, fuga ou ambivalências. As emoções positivas

também minimizam a duração e os efeitos tóxicos da excitação emocional negativa

(Fredrickson, 2001; Freitas, 2011).

Sinteticamente, as emoções positivas ampliam o repertório pensamento-ação exercendo

uma função adaptativa em situações percebidas como ameaçadoras e favorecendo o

bem-estar em contraposição às emoções negativas que limitam momentaneamente o

repertório de pensamentos/ações restringindo as opções comportamentais (Fredrickson,

2001).

A satisfação com a vida promove originalidade, colaboração, versatilidade, sucesso,

motivação pessoal e social. Em sentido contrário, a psicologia experimental tem

enfatizado a necessidade de limitar, controlar e evitar estados negativos afetivos (J. P.

Forgas & Moylan, 1987; J. Forgas, 2009).

Nesta investigação pretendemos verificar se os estados de humor desencadeados pelo

visionamento de três vídeos diferentes (um de comédia, outro de drama e outro de

violência) influenciam os níveis de satisfação com a vida dos sujeitos.

Metodologia

Após uma seleção aleatória foram apresentados 3 sketches a 81 indivíduos de ambos os

sexos com conteúdos humorísticos diferentes: drama, violência e comédia. Após a sua

visualização pretendeu-se avaliar se a manipulação de humor das pessoas que os viram

influenciaria a avaliação da sua satisfação com a vida.

O sketch sobre drama, com a duração de 2:59 minutos, consistia na história de um pai

surdo mudo e da sua filha que o rejeitava. Durante uma tentativa de suicídio a filha auto

mutila-se, necessitando de uma transfusão sanguínea. O pai salva-lhe a vida ao ser o seu

dador. No sketch sobre violência, com a duração de 52 segundos, durante uma briga de

rua, um indivíduo agride violentamente outra pessoa na cabeça, deixando-o inanimado

na via pública. Durante o sketch de comédia com a duração de 4:39 minutos, são

visualizadas várias situações engraçadas que surpreendem as pessoas.

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No fim do visionamento do filme todos os sujeitos (portanto, de todas as condições)

preencheram a Escala da Satisfação com a Vida – SWLS. Estes tiveram um tempo de

preenchimento de cerca de 90 segundos. Para avaliar a satisfação com a vida foi

utilizada a Escala de Satisfação com a Vida – SWLS (Diener et al., 1985) validada para

a população português a por Simões (1992). O sketch de drama foi visto por 32 sujeitos,

o de comédia por 24 e o de violência por 25. Em termos de perceção de classe social, 4

sujeitos classificam-se como baixa, 17 média baixa, 54 média e 4 média alta. A idade

média dos indivíduos era de 24,59 e desvio padrão de 9,174 compreendida entre 18 e os

57 anos.

Resultados:

As. Comparações estatísticas realizadas através do teste Anova (F=2,875, p=0,062)

sugeriram que os três grupos eram equivalentes quanto à satisfação com a vida.

Tabela 1 - Estatísticas resumo e resultados da Anova em função do sketch

Sketch: n.º x̅ dp f p PO

Drama

Comédia

Violência

32

24

25

17,31

19,96

17,44

3,95

3,96

5,39

2,875

0,062

0,55

Após a transformação de 3 para 2 grupos, testámos as diferenças com recurso a Anova

Os resultados mostram que a satisfação com a vida é influenciada pelo tipo de

sentimentos que pontualmente se experienciam (f=5,811; p=0,018).

Tabela 2 - Estatísticas resumo e resultados da Anova em função do sketch

Sketch: n.º x̅ Dp f p PO

Negativos

Positivos

57

24

17,37

19,96

4,59

3,96 5,811 0,018 0,66

No estudo desta relação, verificámos também, através de testes entre (análises

bivariadas e univariadas) e intra grupos (regressão múltipla) se o sexo, a idade e a classe

social influenciavam a satisfação com a vida, contudo os resultados obrigaram-nos a

não rejeitar a hipótese nula (p>0,05), permitindo-nos concluir que a influência dos

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sentimentos provocados pela visualização dos filmes e a satisfação com a vida se deve a

esta relação e não à interferência das variáveis supramencionadas.

Discussão

Sabendo que as emoções podem ser induzidas, segundo “(J. P. Forgas & Moylan, 1987;

J. Forgas, 2009)através do visionamento de um filme alegre ou triste, ou recordando um

evento feliz ou triste do nosso passado, ou recebendo feedback positivo ou negativo em

alguma tarefa (Forgas, 2009), exactamente o tipo de experiências que produz emoções

boas ou más na vida real, o presente estudo compreendeu uma tentativa de mapear os

efeitos associados à manipulação das emoções na satisfação com a vida. Os dados

apresentados sugerem que a exposição a sentimentos negativos leva a uma menor

satisfação com a vida.

Os resultados obtidos estão em consonância com alguns achados disponíveis na

literatura, sugerindo o aumento marginalmente significativo para a satisfação com a

vida em relação ao envolvimento (J. Forgas, 2009). No entanto, estávamos expectantes

que as influências teriam uma maior significância nos resultados enquanto os três

grupos da amostra estavam separados, o que não sucedeu. Tal só surgiu aquando se

passou a ter apenas dois grupos e ai os resultados vão de encontro ao que “Forgas e

Moylan (1987)” experienciaram e que nos serviu de base para esta pesquisa.

É de salientar que em psicologia, uma parte substancial dos estudos de satisfação com a

vida surge associada aos estudos teóricos do sentido da vida e inclusivé do bem-estar

subjetivo. Estas teorias têm subjacente o pressuposto de que o sentido da vida pode de

facto ter influência, positiva ou negativa, na saúde mental dos indivíduos e são

indissociáveis da satisfação com a vida. Sabemos, no entanto, que pela alteração da

perceção, podemos manipular as nossas emoções. E, ao invés de este ser um poder

perigoso, a evidência sugere que a emoção é uma ferramenta útil e essencial que faz

parte da nossa capacidade de resposta a diferentes situações sociais (J. Forgas, 2009).

A título de exemplo relativamente à satisfação com a vida, é habitual afirmar que a

pessoa experimenta em situações de dificuldade e vulnerabilidade três tipos de

determinantes ou “pesar” relacionados diretamente com a satisfação com a vida. Pesar

em relação ao passado (perceção de não ter realizado as suas aspirações), e mais pesar

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em relação ao futuro (a pessoa percebe a sua impotência para realizar os objetivos

futuros). A terceira determinante refere-se ao significado atribuído à finitude.

As determinantes estão relacionadas com a extensão com que um indivíduo pondera ou

contempla as dificuldades no quotidiano, tornando-o assim saliente.

a) Ativando diretamente sentimentos de pesar e pensamentos relativos ao significado da

vida;

b) Afetando as determinantes, nomeadamente modificando as crenças da pessoa em

relação a si e ao próprio mundo;

c) Ativando um vasto conjunto de mecanismos de coping, incluindo os processos de

revisão de vida, planeamento de vida, identificação com a cultura e processos de auto

transcendência.

Neste caso pode observar-se que os filmes, consoante a tipologia, conseguem despertar

nos indivíduos diferentes emoções que são fundamentais na manutenção do equilíbrio e

saúde mental dos indivíduos. Emoções positivas estão associadas com julgamentos

optimistas e emoções negativas com julgamentos pessimistas (Joseph P. Forgas & East,

2008). Ainda que a experiência esteja confinada ao âmbito laboratorial, pode observar-

se, por exemplo, a importância que as atividades de entretenimento e lazer têm na

experimentação de emoções positivas.

Será que a amostra deveria ter sido, anteriormente ao visionamento dos, exposta de

igual forma a um estímulo neutro? Será que o facto de ter sido feito em salas diferentes,

por cada grupo, teve influência nos resultados obtidos? Será que pelo facto de serem

alunos da mesma escola condicionou o estudo? Será que deveriam os durar mais tempo

e provocar uma maior influencia nos estados de humor? Todas estas são questões que

gostaríamos de comprovar em futuras pesquisas. Futuros estudos devem centrar-se no

controlo de muitas variáveis relevantes, nomeadamente constituir-se um verdadeiro

grupo experimental, incluindo grupo de controlo e observação pré e pós teste. É de

salientar que deve-se incluir grupos mistos de intervenções de modo a controlar o efeito

das determinantes individuais sobre o tratamento.

Referências

Forgas, J. (2009). Think Negative! Can a bad mood make us think more clearly?

Australian Science, 30(10), 14–17. Obtido de

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http://www.control.com.au/bi2009/bi310.php

Forgas, J. P., & East, R. (2008). How Real is that Smile? Mood Effects on Accepting or

Rejecting the Veracity of Emotional Facial Expressions. Journal of Nonverbal

Behavior, 32(3), 157–170. http://doi.org/10.1007/s10919-008-0050-1

Forgas, J. P., & Moylan, S. (1987). After the Movies: Transient Mood and Social

Judgments. Personality and Social Psychology Bulletin, 13(4), 467–477.

http://doi.org/10.1177/0146167287134004

Fredrickson, B. L. (2001). The role of positive emotions in positive psychology. The

broaden-and-build theory of positive emotions. The American psychologist, 56(3), 218–

26. Obtido de

http://www.pubmedcentral.nih.gov/articlerender.fcgi?artid=3122271&tool=pmcentrez&

rendertype=abstract

Freitas, T. C. C. C. de. (2011). Meditação Mindfulness para Promoção de Coping e

Saúde Mental : Aplicação clínica e em presídio. Pontifícia Universidade Católica de

Goiás.

Giacomoni, C. H. (2004). Bem-estar subjetivo: em busca da qualidade de vida, 12(1),

43–50.

Simões, A. (1992). Ulterior validação de uma escala de satisfação com a vida (SWLS).

Revista Portuguesa de Pedagogia, (3), 503–515.

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FAMÍLIA E TRATAMENTO PARA A PESSOA COM TRANSTORNO

MENTAL – UM CASO BRASILEIRO9

Lucimar Aparecida Garcia Coneglian10&José Augusto Leandro11

Resumo

O presente trabalho é parte de uma pesquisa cujo objetivo foi o de identificar interfaces

na relação família - casos ‘exitosos’ no tratamento para as pessoas com transtorno

mental que freqüentam os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). A pesquisa foi

realizada em sete serviços de CAPS pertencentes a região dos Campos Gerais, no estado

do Paraná – Brasil. Esse estudo também apontou que na relação família – CAPS os

familiares consideram a instituição como um local de alento, um espaço para

compartilhar dificuldades e dúvidas. O CAPS, um serviço aberto e que atua na lógica da

reinserção psicossocial, foi visto pela maioria destas famílias como um local de

acolhimento da angústia por elas vivida. E, por vezes, foi visto como um local de

'julgamento', onde se sentiram criticadas e culpabilizadas pela doença do seu familiar.

Esse movimento, aparentemente contraditório, retrata um momento histórico de

construção de um novo paradigma de cuidado em saúde mental.

Palavras-chave: Reforma Psiquiátrica brasileira; CAPS; Familiar cuidador; Transtorno

mental.

Abstract

This work is part of a research whose objective was to identify interfaces on the

relationship between family and mental disorders – cases ‘successful’ treatment for

9Este artigo é o condensado do terceiro capítulo da dissertação ALÉM DA REMISSÃO DOS

SINTOMAS: REFORMA PSIQUIÁTRICA E CAPS NA REGIÃO DOS CAMPOS GERAIS –

PARANÁ, orientada pelo Professor Doutor José Augusto Leandro e defendida em 2011 no Programa de

Pós- Graduação de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Estadual de Ponta Grossa, Paraná, Brasil. 10Bolsista Capes - Processo nº 99999.003372/2015-04. Doutoramento em Ciências Sociais Aplicadas pela

Universidade Estadual de Ponta Grossa. Doutoranda visitante do Centro de Estudos Sociais da

Universidade de Coimbra. 11Professor associado do Departamento de História e do Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais

Aplicadas da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). Doutorado em História Cultural pela

Universidade Federal de Santa Catarina.

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people with mental disorders who attend the Centers for Psychosocial Care (CAPS).

The survey was conducted in seven CAPS services belonging to the Campos Gerais

region in the state of Paraná – Brazil. In turn this study also pointed out that the family

relationship – CAPS, family members consider the institution as a place of breath, a

place to share difficulties and doubts. CAPS, an open service and that operates in a

psychosocial reintegration logic, was seen by most of these families, as a host site for

the distress they lived. And sometimes it was seen as a 'judgment' place where they felt

criticized and blamed for the illness of their family member. This movement, apparently

contradictory, portrays a historical moment of construction of a new paradigm of care in

mental health.

Keywords: ; Brasilian Psychiatric Reform; CAPS; Family Caregiver; Mental disorder

Vários foram os tratamentos oferecidos às pessoas em sofrimento psíquico, mas,

principalmente a partir do século XVIII (o século da grande internação, segundo

Foucault, 1978), o tratamento médico se ateve às internações em instituições de

exclusão como manicômios e hospitais psiquiátricos. Ao longo de 250 anos a instituição

asilar foi sinônimo de tratamento e a única opção para pessoas com transtorno mental.

No caso do Brasil, não apenas hospitais públicos, mas principalmente hospitais do setor

privado absorviam a grande maioria destes leitos.

A exclusão resultante do internamento hospitalar prolongado tornou, muitas vezes, a

pessoa com transtorno mental um ser ‘invisível’ para a sua própria família e para a

sociedade. E é no contraponto da invisibilidade e desqualificação desses sujeitos que a

Reforma Psiquiátrica constitui seus princípios, resgatando-os como pessoas/cidadãos

em sofrimento psíquico. Conforme lembra Cavalcante (2003), com a Reforma

Psiquiátrica, o enfoque não é mais a cura, a reparação, mas a produção de vida.

Desinstitucionalização significa tratar o sujeito em sua existência e em relação com suas

condições concretas de vida. Isto significa não administrar-lhe apenas fármacos ou

psicoterapias, mas construir possibilidades. O tratamento deixa de ser a exclusão em

espaços de violência e mortificação para tornar-se criação de possibilidades concretas

de sociabilidade a subjetividade. O doente, antes excluído do mundo dos direitos e da

cidadania, deve tornar-se um sujeito, e não um objeto do saber psiquiátrico. A

desinstitucionalização é este processo, não apenas técnico, administrativo, jurídico,

legislativo ou político; é, acima de tudo, um processo ético, de reconhecimento de uma

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prática que introduz novos sujeitos de direito e novos direitos para os sujeitos.

(AMARANTE, 1995, p. 494).

A desinstitucionalização é entendida como uma progressiva ‘devolução à comunidade’

da responsabilidade com relação às pessoas em sofrimento psíquico, em um movimento

de olhar a pessoa com transtorno mental em sua humanidade e como sujeito de desejos

e necessidades. Também indica crença na inclusão e na capacidade da família no

cuidado de seu ente em sofrimento psíquico.

No Brasil foram criados os Centros de Atenção Psicossocial – CAPS, dispositivos

abertos de atenção em saúde mental que são normatizados pelo Ministério da Saúde e

caracterizam-se como “um lugar de referência e tratamento para pessoas que sofrem

com transtornos mentais, psicoses, neuroses graves e demais quadros, cuja severidade

e/ou persistência justifiquem sua permanência num dispositivo de cuidado intensivo,

comunitário, personalizado e promotor de vida.” (BRASIL, 2004, p.13).

Nestas unidades de atendimento esta pesquisa procurou entender como estão sendo

articuladas a relação família - pessoa em sofrimento psíquico - serviço.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para a coleta de dados12 foram selecionados sete serviços de CAPS situados na região

do estado do Paraná denominada de Campos Gerais13. Dos vinte e quatro municípios

integrantes da região dos Campos Gerais, sete possuíam CAPS transtorno mental em

funcionamento: Arapoti, Campo Largo, Castro, Lapa, Ponta Grossa, Rio Negro e

Telêmaco Borba.

A pesquisa empírica envolveu diferentes procedimentos de obtenção de informações,

como a coleta de dados nos prontuários dos usuários, questionários com coordenadores

dos CAPS e com profissionais atuantes nos serviços e, por fim, entrevistas com

familiares.

Vários foram os objetivos do questionário com os profissionais, entre eles identificar

possíveis histórias de êxitos no tratamento dos sujeitos que frequentavam os serviços. A

12Todos os passos dessa pesquisa foram aprovados pelo COEP – Comitê de Ética em Pesquisa da

Universidade Estadual de Ponta Grossa. 13 A noção da região adotada por esta pesquisa não se apegou apenas aos critérios físicos, nos aspectos

fitogeográficos e geomorfológicos. Importou os aspectos referentes a identidade histórica e cultural que

remonta ao século XVIII, em que foi rota de “tropas de muares e gado de abate provenientes do Rio

Grande do Sul com destino aos mercados de São Paulo e Minas Gerais.” (DICIONÁRIO HISTÓRICO E

GEOGRÁFICO DOS CAMPOS GERAIS, sem ano, sem página).

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partir dos questionários respondidos pelos profissionais chegou-se a um número de

aproximadamente 40 sujeitos que fazem, ou fizeram tratamento nesses serviços e que

foram identificadas como casos exitosos. A partir destas histórias de ‘êxitos’ foi

realizada discussão com as equipes, ocasião em que foram acrescentados outros três

critérios para refinar a seleção para entrevista:

1. Familiar/cuidador de pessoa com transtorno mental severo, de longa duração,

com histórico de várias internações psiquiátricas anteriores

2. Familiar/cuidador que acompanha a pessoa com transtorno mental há pelo

menos dois anos.

3. Familiar/cuidador de ‘usuário’ em tratamento no CAPS há mais de dois anos.

A adoção destes critérios está pautada pela identificação de sujeitos com importante

grau de dificuldade de estabilização pregressa do quadro e que estejam em tratamento

no CAPS por um período significativo de tempo, indicando adesão ao tratamento. Dessa

forma foi feita a escolha de 14 casos exitosos - dois para cada um dos CAPS

pesquisados.

Para este artigo será apresentada, de forma condensada, a análise destas catorze

entrevistas realizadas com os familiares/cuidadores de pessoas com transtorno mental e

que foram considerados casos exitosos no tratamento.

FAMÍLIA DA PESSOA COM TRANSTORNO MENTAL – ALGUMAS

CONSIDERAÇÕES

Para este trabalho concebe-se família como socialmente construída e que traz por tarefas

a articulação das relações entre seus membros e a localização dos sujeitos no conjunto

social. Para a demógrafa Elza Berquó (1998, p. 414): “a família é, acima de tudo, a

instituição a que é atribuída a responsabilidade por tentar superar os problemas da

passagem do tempo tanto para o indivíduo como para a população.” Da psicanálise,

acrescenta-se a importância da família em dar continência aos seus membros na medida

da elaboração de seus traumas, permitindo a aceitação do filho através da revisão das

suas expectativas e desejos.

Vale o cuidado de não reduzir uma questão tão complexa como a do transtorno mental a

uma problemática intra-familiar. Trata-se de uma questão que abarca aspectos

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históricos, sociais, culturais, psíquicos e biológicos. Não se pode reduzir o sofrimento

psíquico ao indivíduo, à família ou ao biológico.

Em pesquisa que se debruçou sobre famílias pobres, Sarti (2009, p. 52-53) refere que:

"A família não é apenas o elo afetivo mais forte dos pobres, o núcleo da sua

sobrevivência material e espiritual, o instrumento através do qual viabilizam seu modo

de vida, mas é o próprio substrato de sua identidade social. Em poucas palavras, a

família é uma questão ontológica para os pobres. Sua importância não é funcional, seu

valor não é meramente instrumental, mas se refere à sua identidade de ser social e

constitui a referência simbólica que estrutura sua explicação do mundo".

Assim como em Sarti (2009), as famílias aqui pesquisadas também podem ser

consideradas pertencentes aos segmentos mais empobrecidos da sociedade brasileira.

Ao concordar com a autora, que concebe família como substrato da “identidade social”,

esta adquire um status significativo no tratamento das pessoas em sofrimento mental.

O tratamento asilar não se interessou pela família da pessoa com transtorno mental ou à

instrumentalização desta para que estivesse mais preparada para o cotidiano de

existência e de cuidado de seu ente. Para a família do período asilar apresentou-se várias

dificuldades, tais como: o pouco entendimento do que é o sofrimento psíquico, a

culpabilização pelo transtorno mental do seu ente, o abandono social, a dificuldade de

acesso a serviços eficientes, as dificuldades econômicas, entre tantas outras.

É importante fazer uma reflexão sobre cuidado e a figura do cuidador da pessoa com

transtorno mental que, geralmente, está situado no círculo familiar. Para Rosa (2008, p.

277): “Prestar cuidados às pessoas enfermas traduz uma das obrigações do código de

direitos e deveres entre os integrantes da família consangüínea. Mesmo que redunde, em

algum ganho ou prejuízo econômico, prover cuidado, figura como uma das atividades

inerentes a tarefas familiares ou domésticas que, da perspectiva do grupo familiar,

foram ‘naturalizadas' como próprias da família.”

É possível destacar dois extremos quando a temática é a de cuidado da pessoa em

vulnerabilidade: o excesso de cuidado, denotando proteção exacerbada, ou a falta de

cuidado, denotando abandono.

Ayres et al. (2003) refere a preocupação com o processo de vitimização e de tutela que a

vulnerabilidade pode suscitar. “Um dos problemas mais apontados nesse sentido é

continuar promovendo uma discriminação negativa dos grupos mais afetados, agora não

mais pelo estigma, mas pela sua vitimização e correlativa tutela, preocupação

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totalmente fundada” (AYRES et al., 2003, p. 131). Assim, não apenas o abandono é

prejudicial, o excesso de cuidados pode acarretar prejuízos na construção da autonomia

pelo sujeito.

Outro aspecto é o de que existe no imaginário um entendimento da ‘obrigatoriedade’ da

presença de um cuidador, indicando superproteção/infantilização da pessoa em

sofrimento psíquico. “O processo de superproteção frequentemente é perpassado por um

de desqualificação, cuja exacerbação tende a culminar num processo de invalidação em

que o ritmo e o tempo próprio do portador de transtorno mental não é considerado, e

nem sua singularidade. O portador de transtorno mental tende, nessas circunstâncias, a

ser percebido como diferente, mas é rotulado de forma negativa.” (ROSA, 2003, p.

253).

AS FAMÍLIAS PESQUISADAS

Foi constatada uma supremacia de mulheres cuidadoras: com exceção de um único

CAPS, de Rio Negro, onde os cuidadores estavam equilibrados entre os dois sexos,

todas as demais unidades pesquisadas apresentaram quase que o dobro de cuidadores

femininos se comparados aos masculinos.

A concepção de cuidado é historicamente construída e confunde-se com a concepção de

maternagem, uma vez que o papel cultural da mulher está atrelado a sua condição

biológica, “engravidar e amamentar é imbricado com a tarefa de maternar como se

fossem atividades correlatas, extensivas” (ROSA, 2003, p. 275). À parte as mudanças

na configuração na constituição da família contemporânea, com a mulher assumindo

papéis fora do ambiente familiar, numa sociedade ainda fortemente marcada pelos

valores do patriarcalismo, na prática ela ainda continua sendo a grande cuidadora.

Classificadas nos grupos ‘família original’14 e a ‘família conjugal’15, encontrou-se mais

de 80% dos cuidadores. Poucos usuários dos CAPS dos Campos Gerais são cuidados

por pessoas sem vínculo familiar (2,4%). Kantorski et al. (2009), pesquisando os CAPS

da Região Sul do Brasil registrou que 39,3% dos usuários vivem com

cônjuge/companheiro (a) e 46,2% vivem com familiar, especialmente mãe ou pai, e

apenas 10,8% vivem sozinhos. Números estes bem próximos aos encontrados na região

dos Campos Gerais. Andreoli (2004), pesquisando o CAPS da cidade de Santos

14Família Original: entendida como pai/mãe e irmão/irmã. 15Família Conjugal: inclui marido/esposa e filho/filha.

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encontrou 78% dos usuários morando com a família. É possível inferir que a família

está bastante presente, pelo menos no aspecto formal do cuidado.

Das mil duzentas e doze pessoas que fazem tratamento nos CAPS dos Campos Gerais,

setenta e sete delas (6,4%) não tem cuidador. Os CAPS pesquisados referem que

aqueles ‘usuários’ que não apresentam cuidador podem ser em virtude de não o

necessitarem ou ainda por estarem ‘abandonados’ por familiares. Neste sentido, dos 77

‘usuários’ dos CAPS dos Campos Gerais que não apresentam a figura do cuidador,

parte deles encontra-se em situação de abandono.

TRIANGULAÇÃO FAMÍLIA/’USUÁRIO’/CAPS

Uma vez que o hospital psiquiátrico saiu de cena como guardião da pessoa com

transtorno mental entra em cena a família. Ela passou a ter papel relevante neste

tratamento, afinal, os CAPS são serviços diurnos e abertos, e de frequência de acordo

com o projeto terapêutico definido caso a caso. Assim, a família mantém o status de

cuidador contrariando o existente no período asilar, em que o familiar estava

temporariamente excluído do cuidado.

Ainda que nos casos pesquisados fosse constatada a existência de proximidade entre

família e serviço, isso não significou que a participação da família foi espontânea e

imediata. Muitas vezes, a sua aproximação aos serviços se deu de maneira um pouco

forçada, com idas e vindas.

Os argumentos utilizados pelas famílias para não participar do tratamento dizem

respeito a um sentimento de estranhamento da doença. O caso do FAMILIAR-

CUIDADOR 5, marido de uma usuária do CAPS, pode ilustrar esta questão. Como

motivo para não participar do tratamento de sua esposa ele dizia que:

Ah eu sempre falava pra ela que eu não vinha. Porque o doente não era eu. Que eu não

tinha problema, que ela que tinha que vir... E ela cansou de falar “Vá, o médico quer

fala com você”. E eu sempre deixava pra traz “Não eu não... Não sou eu que to doente,

quem precisa é você... O que eu vou dizer para o médico, se teus problemas não são por

causa de mim”. Até que chegou um dia que eu peguei, eu mesmo decidi vir, e daí vi que

a... participação minha foi muito importante pro tratamento dela... A participação pro

casal é muito importante pro tratamento. (FAMILIAR-CUIDADOR 5)

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O modelo biomédico, cuja lógica do tratamento está restrita às consultas médicas e à

prescrição medicamentosa, ainda está presente na concepção de muitos familiares, que

resistem em participar de um tratamento cujo pressuposto vai além deste modelo.

Outro aspecto observado durante as entrevistas é que alguns familiares-cuidadores

comparam o CAPS com uma família.

... o CAPS foi a minha mãe, sabe? (FAMILIAR-CUIDADOR 2)

É uma família, né. Que quer muito bem ela e nós queremos bem eles. (FAMILIAR-

CUIDADOR 7)

Conceber o CAPS como família e como mãe pode acarretar uma série de implicações.

De um lado vale lembrar que a loucura é gestada socioculturalmente e, sendo assim, sua

maternidade não pode se circunscrever a determinado serviço. Existe também o perigo

dos CAPS assumirem o “papel de família”, distanciando-se de seu objeto inicial que é o

tratamento. Tratamento este não no sentido tradicional do termo, abarcando apenas

consultas e medicamentos, mas concebido a partir dos constructos da Reforma

Psiquiátrica, dentre eles, a inserção social para além da estrutura da instituição.

Em outra perspectiva, é possível visualizar que quando os entrevistados se referem ao

CAPS como uma família, podem estar considerando também o próprio histórico de

orfandade que vivenciaram. Como já anteriormente relatado, na história do tratamento

para as pessoas com transtorno mental, lugar de louco era o hospício e o lugar da

família era o do isolamento social, na vergonha e na culpa. Durante a realização das

entrevistas, pode-se observar um ‘alento’ dessas famílias com a existência dos CAPS,

que relataram histórico pregresso de seus familiares com inúmeras internações,

diagnósticos diferentes em cada serviço consultado, falta de orientações sobre a

problemática de seu familiar, etc. A orfandade em que os tratamentos pregressos aos

CAPS impuseram a estas famílias parece que as leva, agora, a enxergar a instituição

como uma ‘mãe’.

Como resultado da construção histórica do conceito de loucura existe dificuldades de

caracterizar o comportamento da pessoa em sofrimento psíquico como sintomas de

‘doença’. Usualmente são vistos por prismas morais, julgando-os como “preguiçosos”,

“manipuladores”, “desobedientes”, “violentos” entre tantos outros juízos de valor. Esta

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concepção, além de dificultar o tratamento, também dá posse ao sujeito do comando de

seu comportamento e revela um olhar que caracteriza a pessoa com transtorno mental

como responsável por seus atos. “A própria invisibilidade da ‘doença mental’ ativa os

fantasmas familiares. Como está habituada com a leitura lesional da doença, em geral

buscam, como a psiquiatria, uma causa orgânica para explicar o transtorno mental até

como forma de aplacar o sentimento de culpa.” (ROSA, 2003, p. 247).

Olhar o evento a partir da noção de doença/anormalidade ou ainda na perspectiva de um

sujeito em sofrimento pode resultar em diferenças na expectativa do tratamento.

Considerar o tratamento exitoso no primeiro caso remete a concepção de cura e, no

segundo, perpassa pelo entendimento de “um sujeito [...] com sua singularidade”

(YASUI, 2010, p. 148), onde a crise é parte constitutiva do processo, não sendo

indicativa de fracasso no tratamento. Perpassa também por aceitar o sujeito em sua

diferença, rompendo com a lógica do ajustamento e da normalidade.

Ele é assim mesmo. De vez em quando fica de mau humor, não quer falar com

ninguém... xinga.... Eu já aprendi.... É só deixar ele sozinho que passa. (FAMILIAR-

CUIDADOR 11)

Ao que parece, essa cuidadora está ressignificando o sujeito em sofrimento psíquico e

dando um espaço para sua existência-sofrimento. Um espaço que supera o da

classificação e o da normatização. Neste sentido, possivelmente a crise tem seu lugar, é

esperada e em alguma medida, está sendo entendido como um momento de ‘grande mau

humor’. Esse olhar diferenciado sobre o comportamento do familiar suaviza o

relacionamento e as cobranças, gerando uma convivência menos angustiante.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pelo conteúdo das entrevistas com as famílias foi possível perceber que estas ainda

interpretam a pessoa em sofrimento psíquico pelo prisma da moralidade. Também

existe, por parte delas, o entendimento do CAPS como um ‘normatizador’, numa

expectativa de que o serviço atue de forma pedagógica sobre o comportamento da

pessoa em sofrimento psíquico.

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Seguindo a coerência da contradição presente neste estudo, para além da moralidade e

da normatização, também ficou evidente na fala destas famílias uma maior compreensão

acerca do sofrimento de seu ente, que, por vezes, estão sendo vistos por seus cuidadores

como sujeitos de desejos e de direitos. Sujeitos possíveis de existência na diferença.

De uma forma geral, o alento de poder compartilhar dificuldades e dúvidas foi um

sentimento freqüente nas famílias pesquisadas. O CAPS, um serviço aberto e que atua

numa lógica de reinserção psicossocial, foi visto, por parte destas famílias, como um

local de acolhimento da angústia vivida por elas. Mas também, por vezes, foi visto

como um local de julgamento, onde estas famílias sentiram-se criticadas e

culpabilizadas. O processo de desqualificação/exclusão experimentado pelas pessoas em

sofrimento psíquico também foram vivenciados por suas famílias.

No decorrer dessa pesquisa foi possível perceber que a aproximação família/pessoa em

sofrimento psíquico/CAPS não é simples e está permeada de referências teóricas

defendidas pelas ciências psi em diferentes períodos históricos. Aspectos como a de

culpabilização da família pela ‘crise’ de seu ente, o conceito de família desestruturada, a

crença na inabilidade da família no cotidiano do cuidado ainda permeiam o olhar

lançado pelos profissionais sobre os familiares cuidadores, e em alguma medida,

também, são constructos que podem ter sido assimilados como verdadeiros pelos

próprios familiares.

A realidade se apresenta contraditória em movimentos de avanços e recuos, onde o novo

tem existência simultânea com o velho, ou seja, os constructos que permeiam a Reforma

Psiquiátrica coexistem e se contrapõem aos constructos da psiquiatria biomédica, que

ainda assombram o cotidiano de cuidados.

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COMPORTAMENTO ANTISSOCIAL E AUTOCONCEITO NA

ADOLESCÊNCIA

Alice Murteira Morgado & Maria da Luz Vale Dias

Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra

Resumo

Tendo em consideração as especificidades da adolescência enquanto estádio de

desenvolvimento durante o qual os indivíduos enfrentam o desafio de construir a sua

identidade ao mesmo tempos que se adaptam e aprendem com um meio envolvente cada

vez maior e mais complexo, o autoconceito destaca-se como fator relevante no estudo

dos comportamentos antissociais em adolescentes.

Apresentamos, pois, uma investigação que visou compreender a relação entre

comportamento antissocial na adolescência, autoconceito e as suas trajetórias

desenvolvimentais. Para tal, foram testadas quatro hipóteses: (1) adolescentes com

maior tendência antissocial revelam um autoconceito mais negativo; (2) à medida que as

crianças entram na adolescência os comportamentos antissociais tornam-se mais

evidentes e o autoconceito tende a piorar; (3) a idade e o autoconceito explicam parte do

comportamento antissocial em adolescentes.

De um modo geral todas as hipóteses foram confirmadas, revelando uma tríade

composta por autoconceito, comportamento antissocial e idade. Os resultados obtidos

abrem caminho para uma compreensão mais completa da relação entre o autoconceito e

os comportamentos antissociais na adolescência assim como do seu desenvolvimento.

Fica, por fim, destacada a importância – na investigação e na prática – de uma

abordagem multidimensional do autoconceito na sua relação com o fenómeno

antissocial na adolescência dentro de uma abordagem desenvolvimentista.

Palavras-chave: autoconceito, desenvolvimento, comportamento, antissocial,

adolescência

Abstract

Having in mind the specificities of adolescence as a peculiar developmental stage, when

adolescents struggle to build their identity while adapting and learning from the

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increasingly bigger surrounding social environment, self-concept appears as an

important factor to take into account when studying antisocial behaviours.

This paper presents a research that aimed at understanding the relationship between

adolescent antisocial behaviour, self-concept and their developmental trajectories. For

that purpose, four hypothesis were tested: (1) adolescents with higher antisocial

tendencies have a more negative self-concept; (2) as children develop into adolescence,

antisocial behaviours become more evident and self-concept becomes less positive; (3)

age and self-concept predict antisocial behaviours in adolescents.

Overall, all our hypothesis were confirmed, revealing a triad consisting on self-concept,

antisocial behaviour and age. Our results pave the way for a more complete

understanding of the relation between self-concept and antisocial behaviours in

adolescence and of its development.

In conclusion we stress the importance – on research and practice –of a multi-

dimensional approach of self-concept on antisocial behaviours within a developmental

framework.

Keywords: self-concept, development, antisocial, behaviour, adolescence

Introdução

O autoconceito refere-se à perceção que o sujeito possui das suas próprias

características, competências e personalidade que descrevem quem é e que

características o definem. Constitui, pois, um conjunto de perceções “formadas através

da experiência do self e das interpretações que faz do seu ambiente, sendo

especialmente influenciadas pelos reforços e avaliações de outros significativos e pelas

atribuições que o próprio faz do seu comportamento” (Shavelson, Hubner & Stanton,

1976 in Shavelson & Bolus, 1982, p.3). Tais perceções desempenham um papel

fundamental na organização e motivação do comportamento, gerando um grupo de

atitudes e emoções autoavaliadas relativamente estáveis e conscientes.

Durante a adolescência, o desenvolvimento do autoconceito é particularmente rápido e

significativo, já que “os jovens procuram encontrar respostas para questões de

identidade e para que tipos de comportamentos sociais são adequados em diferentes

contextos” (Ybrandt, 2008, p. 2). Assim, durante este estádio de desenvolvimento, as

autoavaliações tornam-se progressivamente mais abrangentes, complexas, abstratas e

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organizadas na sequência da emergência de novas capacidades cognitivas e da crescente

consciência da perspetiva do outro, que dão aos sujeitos informação adicional a partir da

qual constroem o seu autoconceito (Sebastian, Burnett & Blakemore, 2008). Um aspeto

importante na definição do autoconceito é a sua natureza multifacetada. De facto,

diversos estudos têm vindo a reconhecer a existência de múltiplas dimensões que

formam o autoconceito em geral (Green, Nelson, Martin & Marsh, 2006; Leung & Lau,

1989; O’Mara, Marsh, Craven & Debus, 2006; Shavelson & Bolus, 1982; Vermeiren,

Bogaerts, Ruchkin, Deboutte & Schwab-Stone, 2004; Young & Mroczek, 2003). A este

respeito, Shavelson e Bolus (1982) defendem uma estrutura multifacetada e hierárquica

do autoconceito, no topo da qual se encontra o autoconceito global. Abaixo deste, os

autores identificaram autoconceitos mais específicos que, embora distintos, se

correlacionam, tais como o autoconceito académico, social e físico, todos eles

compostos por outros autoconceitos mais específicos como, por exemplo, relativos a

matemática, ciência, grupo de pares, estados emocionais, aptidão física e aparência

física. No mesmo sentido, a escala de autoconceito para crianças de Piers-Harris reflete

uma estrutura multidimensional, na qual o autoconceito global é resultado de seis

fatores específicos, nomeadamente, aspeto comportamental, estatuto intelectual e

escolar, aparência e atributos físicos, ansiedade, popularidade e satisfação e felicidade

(Veiga, 2006).

As mudanças que ocorrem na adolescência não se refletem apenas no modo como os

adolescentes se percecionam, mas influenciam também os seus comportamentos sociais

no sentido em que “a relação entre o autoconceito e o ajustamento psicológico nos

adolescentes é complexa e uma forte influência na determinação do comportamento”

(Levy, 1997, p. 673). Assim, os comportamentos sociais e o autoconceito não só são

fundamentais para um desenvolvimento pessoal, social e académico adaptativo

(Torregrosa, Ingles & Garcia-Fernandez, 2011), mas também se influenciam

mutuamente, ou seja, os comportamentos sociais poderão contribuir para definir as

perceções dos sujeitos sobre eles próprios, enquanto o autoconceito também parece

desempenhar um papel fundamental no desenvolvimento da agressividade (Edens,

1999).

Assim, quando estudado no âmbito com comportamento social, o autoconceito

desempenha o papel de fator protetor e fator de risco: um autoconceito positivo têm sido

associado a uma boa saúde mental, bons resultados académicos, um desenvolvimento

adaptativo na adolescência do ponto de vista psicológico e social (O’Mara et al., 2006)

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que protegem os jovens de se envolverem em problemas de comportamento, ao mesmo

tempo que, surgem, na literatura, associações entre autoconceito negativo e agressão e

delinquência. De facto, diversos estudos têm revelado uma relação entre um baixo

autoconceito e o envolvimento em diversas formas de comportamentos desviantes como

comportamento agressivo, desobediência e delinquência (Adams, Robertson, Gray-Ray

& Ray, 2003; Edens, 1999; Levy, 1997, 2001; Räty, Larsson, Söderfeldt & Larsson,

2005; Torregrosa et al., 2011; Ybrandt, 2008). Curiosamente, estudos nesta área têm

também revelado uma tendência de jovens agressivos a revelar autoconceitos muito

polarizados, isto é, ou demasiado positivos (Edens, 1999; Salmivalli, 2001; Ybrandt,

2008) ou demasiado negativos (Ybrandt & Armelius, 2004). Assim, se por um lado,

jovens com perceções muito negativas de si poderão usar a agressividade como

estratégia de autopreservação, por outro lado, os comportamentos desviantes poderão

também servir como reforço para a manutenção de uma imagem considerada positiva,

particularmente nos domínios físico (já que o envolvimento em muitos atos desviantes

requer boa condição física) e social (pelo reforço dos pares) (Leung & Lau, 1989;

Torregrosa et al., 2011).

Assim, apesar de ainda um pouco indefinida quanto à sua natureza, a existência de uma

associação entre autoconceito e comportamentos antissociais tem sido amplamente

evidenciada (Edens, 1999; Leung & Lau, 1989; Salmivalli, 2001; Torregrosa et al.,

2011; Ybrandt & Armelius, 2004; Ybrandt, 2008). Assim, apesar das incertezas a este

respeito, autoconceito é parte fundamental do desenvolvimento na adolescência e

desempenha um papel importante no desenvolvimento de comportamentos sociais e,

consequentemente, no desenvolvimento de condutas antissociais na adolescência.

Tendo em consideração o estado da arte referente ao autoconceito na adolescência e ao

seu papel nos comportamentos antissociais, o presente estudo procurou compreender a

relação entre comportamentos antissociais e autoconceito na adolescência assim como

as suas trajetórias de desenvolvimento, tomando a idade como indicador de

desenvolvimento. Embora esta opção envolva algumas limitações (já que as trajetórias

de desenvolvimento não ilustrem apenas pela idade cronológica, mas por um conjunto

complexo de outros indicadores), o tempo e os recursos disponíveis não permitiram a

avaliação de outros indicadores. Assim, foram testadas três hipóteses:

H1: Adolescentes com maior tendência antissocial apresentam um autoconceito mais

negativo, quer globalmente, quer nas suas dimensões específicas;

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H2: À medida que os jovens se desenvolvem, os comportamentos sociais são mais

evidentes e o autoconceito deteriora-se;

H3: A idade e o autoconceito contribuem para a explicação dos comportamentos

antissociais na adolescência.

Metodologia

Instrumentos

O protocolo de avaliação incluiu um questionário sociodemográfico construído

especificamente para esta investigação composto por questões relativas ao género,

idade, ano de escolaridade e nível socioeconómico e dois instrumentos de autorrelato. A

escolha das medidas foi pautada pela robustez das suas características psicométricas, a

sua acessibilidade a jovens com nível básico de leitura, a possibilidade de recolha de

dados de forma coletiva e anónima e o seu potencial de replicação em contextos

culturais distintos.

A avaliação do comportamento social foi realizada através da versão portuguesa do

Youth Self Report (YSR, Fonseca & Monteiro, 1999), tendo sido analisado, em

particular, o fator “antissocial” (= .779 ), composto por itens relativos a crueldade,

desobediência, lutas, ameaças, etc.. O autoconceito foi medido através da versão

portuguesa da Escala de Autoconceito de Piers Harris para Crianças – 2 (Veiga, 2006).

Esta versão reduzida, possui 60 itens de resposta dicotómica (sim/não) que permitem a

obtenção de um resultado global de autoconceito (= .904 ), o qual resulta da soma dos

scores de seis fatores: “aspeto comportamental” (= .799 ), “estatuto intelectual e

escolar” (= .717 ), “aparência e atributos físicos” (= .667 ), “ansiedade” (= .743 ),

“popularidade” (= .684 ), e “satisfação e felicidade” (= .716). Como em todas as

outras dimensões, no fator “ansiedade” um resultado mais elevado indica um resultado

positivo, neste caso, menor ansiedade.

Amostra

Antes da aplicação dos instrumentos, foram solicitadas as devidas autorizações à

Direção Geral para a Inovação e Desenvolvimento Curricular (DGIDC) do Ministério

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da Educação e Ciência e à Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD), após as

quais foram dirigidos pedidos de autorização aceites por três escolas do distrito de

Coimbra. Foram incluídos na amostra todos os adolescentes e respetivos encarregados

de educação, que deram o consentimento informado para a participação no estudo.

Assim, dos 1217 pedidos efetuados, 40.18% obtiveram resposta positiva, sendo a

amostra de natureza ocasional, composta por 489 sujeitos com as características

sociodemográficas apresentadas na tabela 1.

Tabela 1.

Descrição da amostra

Características sociodemográficas Frequência %

Género

Masculino 193 39.5%

Feminino 295 60.5%

TOTAL 489 100%

Idade

9 13 2.7%

10 81 16.6%

11 87 17.8%

12 66 13.5%

13 82 16.8%

14 68 13.9%

15 25 5.1%

16 40 8.2%

17 27 5.5%

TOTAL 489 100%

Ano de Escolaridade

5 83 17.0%

6 94 19.2%

7 74 15.1%

8 75 15.3%

9 79 16.2%

10 23 4.7%

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11 43 8.8%

12 18 3.7%

TOTAL 489 100%

Nível Socioeconómico

Baixo 63 12.9%

Médio 243 49.6%

Elevado 183 37.5%

TOTAL 489 100%

Após a recolha de dados, a amostra foi divida em dois grupos segundo os resultados

obtidos no fator “antissocial” do YSR: um grupo composto pelos sujeitos com

resultados médios e abaixo da média da amostra e outro grupo composto pelos sujeitos

que apresentaram resultados um desvio-padrão acima da média da amostra. A tabela 2.

revela a distribuição da amostra pelos dois grupos.

Tabela 2.

Distribuição de grupos segundo a medida comportamental

Média Desvio

Padrão

Ponto de

corte

N acima do

p.corte

% acima do

p.corte

Antissocial 2.39 2.746 5.136 56 11.45%

Resultados

A primeira hipótese foi testada com um teste T de student (tabela 3.), que confirmou a

existência de diferenças estatisticamente significativas na direção esperada em todos os

fatores exceto no fator “aparência e atributos físicos”.

Tabela 3.

Teste T de student (Autoconceito de acordo com tendência antissocial)

Grupo Autoconceito Média T P

> Antissocial Autoconceito Global

36.21 -7.319 .000

< Antissocial 45.67

> Antissocial Aspeto Comportamental 7.86 -9.931 .000

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< Antissocial 11.16

> Antissocial Estatuto Intelectual e Escolar

7.25 -6.151 .000

< Antissocial 9.75

> Antissocial Aparência e Atributos Físicos

4.64 -1.353 .177

< Antissocial 5.03

> Antissocial Ansiedade

3.53 -4.318 .000

< Antissocial 4.85

> Antissocial Popularidade

6.72 -3.005 .003

< Antissocial 7.65

> Antissocial Satisfação e Felicidade

6.18 -5.240 .000

< Antissocial 7.20

A segunda hipótese foi igualmente confirmada. Não só os valores de comportamento

antissocial aumentaram com a idade, mas também, com a exceção do “aspeto

comportamental”, todas as dimensões de autoconceito revelaram correlações negativas

significativas com a idade, como se verifica na tabela 4.

Tabela 4.Correlações de Pearson entre idade, tendência antisocial e

autoconceito

Idade

Antissocial .151 **

Autoconceito Global -.224 **

Aspeto Comportamental -.082

Estatuto Intelectual e Escolar -.187 **

Aparência e Atributos Físicos -.138 **

Ansiedade -.183 **

Popularidade -.206 **

Satisfação e Felicidade -.213 **

**p< .001

Para o teste da terceira hipótese, foi analisado o papel do autoconceito através de uma

abordagem apenas multidimensional de forma a verificar que componentes específicos

do autoconceito desempenham um papel no comportamento antissocial. A hipótese foi

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confirmada já que a idade e quatro dimensões do autoconceito revelaram um papel

significativo na explicação da variável dependente.

Tabela 6.

Modelo de Regressão Linear Múltipla (Stepwise)

Variável

Dependente Variável Independente R

R2

Ajust. F P

Beta

Std. P

Antissocial

Aspeto comportamental

.548 .292 39.688 .000

-.441 .000

Estatuto Intelectual e Escolar -.234 .000

Popularidade .133 .007

Idade .122 .003

Aparência e Atributos Físicos .104 .030

Conclusões

De um modo geral, as hipóteses foram confirmadas, abrindo caminho para uma

compreensão mais completa da relação entre o autoconceito e os comportamentos

antissociais na adolescência e do seu desenvolvimento. Na amostra em estudo, os

adolescentes com maior tendência antissocial apresentaram um autoconceito mais

negativo quando comparados com os seus pares com menor tendência antissocial exceto

no que diz respeito à aparência e atributos físicos. Houve, com a idade, um decréscimo

no autoconceito acompanhado por um aumento nos resultados relativos ao

comportamento antissocial.

No teste da terceira hipótese, revelou-se o papel preditivo negativo do aspeto

comportamental, do estatuto intelectual e escolar no comportamento antissocial e o

papel positivo da idade, da aparência e atributos físicos e da popularidade.

A ausência de diferenças estatisticamente significativas entre adolescentes com maior e

menor tendência antissocial no autoconceito físico, assim como o papel positivo deste e

da popularidade no comportamento antissocial poderá explicar-se pela evidência

encontrada por muitas investigações que se focam no autoconceito de forma

multidimensional relativa à instrumentalidade do comportamento desviante como

potenciador do autoconceito físico e à sua aprovação pelos pares (Leung & Lau, 1989;

Salmivalli, 2001; Torregrosa et al., 2011). Tal resultado remete para a importância do

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estudo do autoconceito enquanto construto multidimensional no sentido de compreender

com maior precisão a sua relação com o comportamento antissocial.

Destaca-se, ainda, a relevância das trajetórias de desenvolvimento do autoconceito e do

comportamento antissocial na adolescência. Com efeito, o comportamento antissocial

revelou-se significativamente mais elevado e ou autoconceito mais baixo nos

adolescentes mais velhos. Além disso, a idade e o autoconceito revelaram um papel

significativo no comportamento antissocial, formando uma tríade de relações que

merece maior exploração na investigação e na prática.

Com base nos resultados obtidos, fica clara a importância do autoconceito em

intervenções que visem prevenir comportamentos antissociais na adolescência,

envolvendo os sujeitos em atividades que potenciem perceções mais positivas do seu

próprio comportamento e das suas competências académicas. No caso das dimensões

que, quando mais elevadas poderão constituir fatores de risco para comportamentos

antissociais (autoconceito físico e popularidade), não se sugere, evidentemente, a

deterioração das perceções próprias, mas antes, uma contextualização adequada das

mesmas e uma reflexão em torno dos efeitos sociais do comportamento. Por exemplo,

trabalhar com os pares e a comunidade em geral poderá ajudar os adolescentes com

maiores tendências antissociais a direcionar os seus comportamentos para opções mais

saudáveis e ajustadas, mediante a receção de reforços dirigidos para comportamentos

mais prosociais.

O presente estudo apresenta algumas limitações devidas a restrições de tempo e

recursos. Assim, a sua natureza transversal dificulta o estabelecimento de causalidades,

tal como está patente uma inevitável subjetividade decorrente do recurso exclusivo ao

autorrelato para a avaliação da tendência antissocial. Acresce que a amostra não é

aleatória dado que dependemos do consentimento dos adolescentes e dos seus

encarregados de educação para a participação no estudo. Não obstante, a dimensão

assinalável da amostra oferece alguma confiança nas conclusões retiradas dos resultados

obtidos.

Em suma, e apesar das reconhecidas limitações, acreditamos que o presente trabalho

contribui para sublinhar a importância do autoconceito no comportamento antissocial na

adolescência. Esta é, de facto, uma etapa do desenvolvimento durante a qual os sujeitos

se procuram adaptar a ambientes sociais crescentemente complexos e diversificados, ao

mesmo tempo que enfrentam a importante tarefa desenvolvimental de construir a sua

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identidade pessoal, tornando fundamental a consideração do papel do autoconceito nas

escolhas comportamentais.

Destacamos, por isso, a importância de uma abordagem multidimensional do

autoconceito dentro de uma perspetiva desenvolvimentista, capaz de verificar o papel de

dimensões específicas do autoconceito no comportamento antissocial sem menosprezar

o estádio de desenvolvimento em que os sujeitos se encontram e as tarefas que este

coloca para um desenvolvimento adaptativo. Sugerimos, por fim, a prossecução de

estudos futuros que testem o efeito de intervenções em dimensões específicas do

autoconceito (em particular a física, intelectual e social) nas condutas sociais dos

adolescentes. De igual modo, seria interessante a realização de estudos com outros

grupos etários de forma a verificar se, aquando da entrada na idade adulta, o

comportamento antissocial tende a diminuir (como sugere a curva da idade do crime, cf.

Blonigen, 2010) e verificar, nesse caso, o que ocorre com o autoconceito.

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O MODELO DE DIAGNOSTICO PSICOSSOCIAL - A PREPÓSITO DE UM

CASO.

(UTENTE COM ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL, EM FASE DE

RECUPERAÇÃO)

Fátima Quelhas 1& João Figueiredo 2

1Enfermeira Centro Hospitalar Cova da Beira, Mestre em Gerontologia Social,

2Aluno 3º ano de Bioquímica da UBI

Resumo

A longevidade tem implicações importantes para a qualidade de vida, podendo trazer

problemas, com consequências sérias nas diferentes dimensões da vida humana, física,

psíquica e social. O avançar da idade aumenta a possibilidade de ocorrências de doenças

com sequelas, declínio funcional, aumento de dependência, perda de autonomia e até

isolamento social.

As necessidades sociais são um conceito que necessitam de uma abordagem

polissémica. É um termo interdisciplinar, que deve ser trabalhado tendo por base duas

linhas teóricas que pretendem analisar e explicar o que se entende por necessidade.

Tendo por base estas linhas teóricas a utente do caso em estudo, por motivo de doença

não se consegue auto cuidar, na satisfação das atividades da vida diária. Os familiares

de acordo com a esta, e após contacto com a Assistente Social do Hospital, solicitaram o

Serviço de Apoio Domiciliário. Este destina-se a ajudar, no domicílio, qualquer pessoa

que, por deficiência, envelhecimento, ou outro impedimento, não pode satisfazer as suas

necessidades, permitindo à utente, manter-se no seu meio ambiente e evitar o

internamento no lar do centro.

Palavras – chave: Longevidade, Necessidades, Dependência

Abstract

Longevity has important implications for the quality of life and can bring problems,

with serious consequences in the different dimensions of human life, physical, mental

and social. The advancing age increases the possibility of disease occurrences with

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sequels, functional decline, increased dependence, loss of autonomy and even social

isolation.

Social needs are a concept which require a polysemic approach. It is an interdisciplinary

term, which must be worked based on two theoretical lines that aim to analyze and

explain what is meant by necessity.

Based on these theoretical lines the user in the case study, due to illness is unable to

care of himself, in meeting their activities of daily living.

The family according to this, and after contact with the Hospital Social Worker,

solicited the Home Support Service. This is intended to help at home, any person who,

by disability, aging, or other impediment, cannot satisfy their needs, allowing the user to

remain in their environment and avoid the internment at the nursing home care.

Keywords: Longevity, needs, Dependence

Introdução

Na era do envelhecimento global, a Organização Mundial de Saúde, manifesta

reiteradamente, a sua preocupação com o aumento da esperança de vida, considerando

principalmente o espectro assustador da incapacidade e da dependência, as maiores

adversidades no âmbito da saúde associadas ao processo de envelhecimento.

A reflexão sobre esta realidade permite-nos formular a questão central para a elaboração

deste trabalho – De que modo a aplicação dos modelos específicos de intervenção

podem contribuir para uma melhor qualidade de vida nesta fase da vida?

Para o desenvolvimento deste trabalho traçamos o seguinte objetivo:

- Analisar os modelos aplicando-os a um caso, de forma personalizada a uma utente que

necessitou dos nossos serviços.

Tendo por base o objetivo do trabalho e a questão orientadora, enveredámos, por aplicar

o modelo Psicossocial e as suas técnicas de intervenção.

O apoio no seu domicilio é essencial, o idoso quer continuar nele até ao fim dos seus

dias, e é esse o aconselhado, mas nem todos têm essa sorte! Outros há que tem de

recorrer a instituições por vontade própria ou por imposição.

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APRESENTAÇÃO DA UTENTE

Nome: M. J.F.

Data Nascimento: 29 de janeiro de 1930 – Idade: 85 anos

Sexo: Feminino

Raça: Caucasiana

Estado Civil: Casada

Habilitações Literárias: 3ª classe

Nacionalidade: Portuguesa

RESUMO DA SITUAÇÃO QUE NECESSITA DE INTERVENÇÃO

No dia 8 de setembro de 2015, a utente pela manhã apresentava, falta de força do lado

direito do corpo, mas também dificuldade na articulação das palavras, dificuldade em

perceber o que se lhe dizia, sensação de encortiçamento ou formigueiro do mesmo lado

do corpo, dificuldade em engolir, e em ver. Perante tal situação o marido contactou o

112 e a utente deu entrada no serviço de urgências do C. H. C.B., 1 hora após o início

dos sintomas. Após observação clínica, a utente apresentava um défice neurológico, que

com a realização de exames auxiliares de diagnóstico veio confirmar-se AVC Isqémico.

Sendo então transferida para a Unidade de AVCs do mesmo hospital, onde permaneceu

até ao dia 23 de setembro do mesmo ano (com alta clínica desde o dia 21).Devido a

rápida intervenção inicial, a evolução foi favorável, contudo durante o internamento

apresentava:

- Desvio da comissura labial, à direita;

- Hemiplegia à direita;

- Esteve algaliada com foley nº16, durante 7 dias;

- Esfíncter anal não controlado;

- Alteração dos valores de glicemia capilar.

Logo que se estabilizo a situação clínica iniciou-se a reabilitação, que consistiu em

diferentes técnicas que ajudaram a utente, a recuperar o mais possível a função anterior,

nomeadamente a reabilitação motora para as paralisias, e a terapia da fala para as

alterações da linguagem.

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À data da alta apresentava: ligeira gaguez e hemiplegia à direita, pelo que devido a

esta última, necessitava nesta fase de uma cadeira de rodas e um andarilho, para

deambular.

Situação clínica descrita na carta da alta:

“Utente Dependente nas Atividades da Vida Diária”

A INTERVENÇÃO

A atuação da equipa interdisciplinar incluirá saberes, atitudes e valores do ser humano,

constituindo-se numa relação de compromisso com adversidade da utente assistida.

Com uma visão sistémica e integral da utente e marido, será possível trabalhar com suas

reais necessidades, adotando uma prática tecnicamente competente e humanizada,

considerando as ações de promoção, proteção e recuperação da saúde.

Foram explicados os objetivos do Serviço de Apoio Domiciliário (SAD) à utente e

família, ainda durante o internamento hospitalar. Este serviço tem por fundamento

prestar apoio à utente idosa e marido, nas atividades que ela não consegue realizar e

necessita de apoio.

TÉCNICAS DE AÇÃO DIRETA

Traduzem-se nos apoios diretos do Hospital e Junta de Freguesia, devido à dependência

causada pelo AVC, a utente necessitou de ajudas técnicas, que a assistente social do

hospital onde esteve internada providenciou, à data da alta, nomeadamente a cadeira de

rodas e o andarilho. A Junta de Freguesia associou--se e ofereceu o banco de banho,

para promover uma maior autonomia da utente nos cuidados de higiene.

TÉCNICAS DE ACÇÃO INDIRETA

Utilizámos também técnicas de ação indireta, onde a função de mediador foi tida em

conta. Após visita ao domicílio (avaliação das reais necessidades), pela Diretora

Técnica, a habitação tinha as condições exigidas para uma boa recuperação, com o

apoio da SAD, do marido e vizinha (Cuidadora Informal). Foram efetuadas parcerias

com a Câmara Municipal da Covilhã e Junta de Freguesia da área de residência, foi

solicitado o Programa Conforto Habitacional para Pessoas Idosas; com os Bombeiros

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Voluntários da Covilhã para o transporte (Fisioterapia e Terapia da fala). Para a

adaptação às necessidades da utente, o Projeto de Intervenção Solidária – Brico

Solidário Serrano (pequenas reparações), contribuindo assim para uma melhor

autonomia da utente. Para um serviço Social completo - adesão ao Serviço de

Telealarme.

Discussão

A partir do momento em que se reconhece que o utente utiliza as suas forças para se

cuidar, o poder do cuidador torna-se, num poder de acompanhamento e de suporte.

O cuidar gerontológico não pode existir sem a parceria de todas as pessoas (Diretor

Gerais, Diretoras Técnicas, prestadores de cuidados formais, familiares, cuidadores

informais) e entidades (Câmaras Municipais, Juntas de Freguesia) suscetíveis de ajudar

aqueles de quem cuidamos. Ajudá-lo a melhorar ou a manter a saúde, isto é, o seu bem-

estar e a sua qualidade de vida. Porque como refere, Gineste, Pellissier (2008,p.284) o “

cuidar é um artesanato rico de inúmeros conhecimentos e regra de arte, exigindo uma

verdadeira e longa aprendizagem”.

Conclusão

Cuidar é mais que um ato; é uma atitude, abrangendo mais que um momento de atenção

e de zelo, uma atividade de ocupação, preocupação, responsabilização e envolvimento.

O plano de ajuda é um instrumento de trabalho muito útil ao cuidador e ao utente, uma

vez que através dele podemos avaliar a evolução favorável ou não do utente em causa.

Todas as entidades devem trabalhar em harmonia e cooperação estreita para que o idoso

seja assistido no seio da sua família, no seu domicilio proporcionando-lhe o melhor

estado de saúde possível e motivando-o para uma vida ativa, desfrutando assim do

convívio da sua família, dos seus amigos e das pessoas que o rodeiam, deixando a

solidão, vivendo uma vida normal e readquirindo uma ocupação sempre que possível.

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INTERVENÇÃO GRUPAL EM CRIANÇAS COM PARALISIA CEREBRAL

Nuno Cravo Barata

CIDES – Faculdade de Medicina da Universidade do Porto

Resumo

O presente estudo procura avaliar a importância da reunião semanal do «Grupo de

Crianças» com Paralisia Cerebral - intervenção grupal - e o seu impacto em termos de

depressão. A reunião semanal do «Grupo de Crianças» tem como finalidade fornecer

estratégias de coping no sentido de promover a autonomia e a interação social. O estudo

realizou-se com 24 participantes com Paralisia Cerebral, avaliados em dois momentos

temporais distintos – t1 e t2 - espaçados por dois meses e meio quanto aos sintomas

depressivos. Metade dos participantes foram submetidos a intervenção grupal durante

10 sessões semanais com a duração aproximada de 1 hora e 30 minutos (Grupo

Experimental - GE) e a outra não foi submetida a qualquer intervenção (Grupo Controlo

- GC).

A análise dos dados permitiu verificar a existência de uma redução significativa dos

sintomas depressivos apenas no grupo de participantes que foram alvo de intervenção

grupal (GE). Ao invés, nos participantes que não foram sujeitos a intervenção grupal

(GC) não houve qualquer modificação significativa dos sintomas depressivos.

Palavras-chave: Grupo de Crianças; Paralisia Cerebral; Intervenção Grupal; Depressão.

Abstract

The aim of this study is to assess the importance of the weekly meeting for the “Group of

Children” who has cerebral palsy and the impact of this meeting in terms of depression. The aim

of this meeting is to find out strategies of coping in order to promote the autonomy and the

social integration. 24 people with this syndrome were studied and observed in two different

periods – t1 and t2 - half of the participants were under a group treatment during 10 weekly

sessions, lasting 1 hour and 30 minutes each (Trial Group – TG) and the other half of the

participants were not under any treatment (Control Group – CG).

After analysing the data, we could conclude that the trial group who was under a specific

treatment suffered less from a depressive syndrome. On the other hand, any change could be

observed in the other group.

Key words: Group of Childrens; Cerebral Palsy; Group Treatment; Depression.

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INTRODUÇÃO

A primeira descrição de Paralisia Cerebral (PC) surge em 1843, efetuada pelo médico Dr. Little,

considerando-se hoje não ser o termo «Paralisia Cerebral» o mais adequado, pois parece traduzir

uma total ausência da função motora e psicológica o que não corresponde à verdade, além de ser

um termo rejeitado pelos próprios e pelas famílias (Ferreira, Ponte & Azevedo, 2000).

É uma deficiência crónica, surgida precocemente, não sendo o resultado de uma doença

progressiva reconhecida (Ellenberg & Nelson, 1981, cit in Schleichkorn, 1983). A lesão é

estática e não progressiva. Não é uma entidade clínica bem definida, mas uma síndrome

complexa, com formas diferentes de apresentação clínica e, em muitos casos, de etiologia

múltipla. A PC pode também ser referida como uma alteração do desenvolvimento, uma

disfunção neuromotora ou uma alteração motora desenvolvimental.

Considerada, por vezes, de difícil conceptualização considerou-se neste estudo uma criança

depressiva aquela que apresentava as expressões ou sintomas : «Ninguém gosta de mim» é um

tipo de queixa comum entre crianças em idade escolar, que tendem a ter consciência das

questões de popularidade; mas um sentimento prolongado de falta de amizade pode ser um sinal

de depressão infantil – uma perturbação afectiva, ou perturbação do humor, que vai para além

de uma tristeza normal, temporária. Outros sintomas podem incluir dificuldades em se divertir

ou concentrar-se, fadiga, extrema actividade ou apatia, choro, problemas de sono, sentimentos

de que nada vale a pena, alterações do peso, queixas físicas e ideias frequentes sobre a morte ou

o suicídio. Cinco destes sintomas, durante pelo menos duas semanas, podem indicar depressão.

Se os sintomas persistirem, deve ser dado apoio psicológico à criança. O tratamento é

importante, não apenas para o alívio imediato dos sintomas, mas também porque a depressão

infantil pode resultar em tentativa de suicídio e, muitas vezes, é sinal do início de um problema

que pode persistir na idade adulta.

METODOLOGIA

Justificação do Estudo

O presente estudo pretende mostrar o efeito que o encontro semanal do «Grupo de Crianças»

pode ter junto dos sujeitos portadores de Paralisia Cerebral, ao nível dos sintomas depressivos,

verificando se a mesma terá implicações diretas na diminuição ou não dos sintomas depressivos.

Questão científica: Até que ponto a reunião semanal do «Grupo de Crianças» - intervenção

grupal – poderá reduzir os sintomas depressivos?

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Hipótese: A intervenção grupal promove a redução de sintomas depressivos junto de um grupo

de crianças com Paralisia Cerebral.

Adotou-se um desenho quase experimental, pois atuou-se sobre a variável independente

(intervenção grupal) para identificar se esse tipo de intervenção produz alterações na variável

dependente (depressão). Definiram-se dois grupos (experimental – com intervenção grupal – e

de controlo – sem intervenção grupal), em que os sujeitos de investigação são distribuídos de

modo aleatório por cada grupo, intervindo-se sobre um (grupo experimental) e não sobre o outro

(grupo de controlo) e depois compararam-se as alterações que se verificaram após a intervenção.

Caraterização da Amostra

A amostra é não probabilística, sendo do tipo de amostragem por seleção racional e é

constituída por 24 participantes portadores de Paralisia Cerebral.

Foram criados dois grupos distintos: (1) grupo experimental (GE) – com intervenção grupal –

constituído por 12 elementos (7 do sexo masculino e 5 do sexo feminino); (2) grupo de controlo

(GC) – não foi alvo de intervenção grupal – constituído por 12 elementos (7 do sexo masculino

e 5 do sexo feminino).

Quadro 1. Distribuição por Frequências dos Participantes quanto à Variável Sexo

Particip.

GE GC Tot.

Sexo

Freq. % Freq. % Freq. %

Masculino 7 29,2 7 29,2 14 58,3

Feminino 5 20,8 5 20,8 10 41,7

Total 12 50 12 50 24 100

Particip. = Participantes; Freq. = Frequências; % = Percentagens; GE = Grupo Experimental;

GC= Grupo Controlo; Tot. = Total

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Quadro 2. Distribuição por Frequências dos Participantes quanto à Variável Idade

Particip.

GE GC Tot.

Idade

Freq. % Freq. % Freq. %

[6-8] 7 58,4 6 50,0 13 54,2

[9-11] 4 33,3 5 41,7 9 37,5

› 11 1 8,3 1 8,3 2 8,3

Total 12 100 12 100 24 100

Particip. = Participantes; Freq. = Frequências; % = Percentagens; GE = Grupo Experimental;

GC= Grupo Controlo; Tot. = Total

Quadro 3. Média e Desvio Padrão da Idade dos Participantes nos Dois Grupos Considerados

Participantes N Média Desvio

Padrão

Mínimo Máximo

GE 12 8,50 1,98 6 12

GC 12 8,83 1,53 7 12

Tot. 24 8,67 1,76 6,5 12

N = amostra; GE = Grupo Experimental; GC = Grupo Controlo; Tot. = Total

Procedimento

Como o objetivo do estudo é avaliar a importância da intervenção grupal num grupo de

participantes com Paralisia Cerebral, nomeadamente o efeito desta intervenção sobre os

sintomas depressivos, optou-se por comparar os participantes dos dois grupos [Grupo

experimental (G.E.): com intervenção grupal; Grupo controlo: sem intervenção grupal (G.C.)]

relativamente à pontuação obtida no Inventário Depressivo para Crianças, isto em dois

momentos temporais (t1 – antes da intervenção grupal; t2 – depois da intervenção grupal),

espaçados entre si por um período de dois meses e meio (10 sessões) (Quadro 4).

Quadro 4. Esquema da Intervenção Psicológica

Tempo

Grupo

t1 ↔

(10 sessões)

t2

GE CDI Com Intervenção Grupal CDI

GC CDI Sem Intervenção Grupal CDI

GE = Grupo Experimental; GC = Grupo Controlo; t1 = Primeiro momento de avaliação; t2 =

Segundo momento de avaliação

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A seleção dos participantes (tanto dos sujeitos que integraram o grupo experimental como dos

sujeitos que integraram o grupo de controlo) foi feita procedendo primeiro à observação e

consulta individual com posterior análise da sintomatologia, sendo selecionados os que

apresentassem menores dificuldades comunicacionais e sem atraso mental ou atraso mental

leve.

Antes de se proceder à aplicação do instrumento, foi dito aos participantes (com a presença dos

seus pais) que todos os dados recolhidos seriam confidenciais. Deu-se a conhecer o objetivo do

estudo e obteve-se o consentimento livre, escrito e esclarecido dos pais.

O inventário foi lido por todos os sujeitos e foi-lhes pedido que interpretassem cada afirmação

salvaguardando, desta forma, uma possível má interpretação dos sujeitos. Para não haver

diferenças no preenchimento do inventário, este foi preenchido pelo investigador, pois muitos

dos participantes apresentavam dificuldades ao nível da motricidade fina.

Concluída esta fase de administração e preenchimento dos inventários, procedeu-se ao seu

tratamento estatístico.

Instrumento

A avaliação da existência de sintomas depressivos fez-se a partir do Inventário de Depressão

para Crianças (CDI) – na adaptação de Helena (1994) do original Children’s Depression

Inventory (Kovacs & Beck, 1977; Kovacs, 1985). Cada um dos 27 itens deste inventário é

composto por quatro frases descrevendo quatro possibilidades, ordenadas por gravidade de

expressão sintomática, cotadas de 0 a 3. A criança deve escolher em cada item, a alternativa que

melhor descreva o seu comportamento nas últimas duas semanas. Metade dos itens inicia as

escolhas com a frase correspondente à gravidade máxima e a outra metade inicia com as

correspondentes à gravidade mínima. O resultado final obtém-se através do somatório da

pontuação nos 27 itens, podendo variar entre 0 e 54 pontos. Considerou-se como ponto de corte

o valor 17.

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RESULTADOS

Quadro 5. Análise Comparada dos Sintomas Depressivos entre os Dois Grupos (Grupo

Experimental e Grupo de Controlo) nos Dois Momentos Temporais (t1 e t2)

Depressão

Grupos

Média

t1 t2

Desvio Padrão

t1 t2

T

t1 t2

gl

t1 t2

p

t1 t2

GE 19.00 10.75 3.16 2.05

.

11.645 -3.633 23 23 .000** .004

GC 23.25 24.25 5.71 6.21

*p ≤ .05; **p ≤ .01

Pela análise do Quadro 5, observamos que os participantes do grupo experimental apresentam

em t1 um valor médio no CDI de 19 (DP = 3.16), enquanto que nos participantes do grupo

controlo, o valor médio no CDI é de 23.25 (DP = 5.71).

Após a intervenção, num segundo momento de avaliação (t2), constatamos que os participantes

que integraram o grupo alvo de intervenção grupal registam uma redução nos valores médios de

depressão, apresentando um valor de 10.75 (DP = 2.05). Os participantes que não foram alvo de

qualquer tipo de intervenção apresentaram um agravamento nos valores médios do CDI,

registando em t2 um valor médio de 24.25 (DP = 6.21).

Constatamos, igualmente, que os participantes de ambos os grupos (GE e GC) se distinguem à

partida (t1) quanto aos sintomas depressivos [t(23) = 11.645; p = .000]. O mesmo se passa

depois de se implementar a intervenção. De facto, verificamos que os participantes que foram

alvo da intervenção grupal (GE) apresentam, em t2, valores médios de depressão

significativamente inferiores aos apresentados pelos participantes que não foram submetidos a

intervenção (GC) [t(23) = -3.623; p = .004]

Quadro 6. Análise Comparada dos Sintomas Depressivos entre os Dois Momentos Temporais

(t1 e t2) nos Dois Grupos (Grupo Experimental e Grupo de Controlo)

Depressão

Mom.

de Aval.

Média

GE GC

DP

GE GC

t

GE GC

Gl

GE GC

P

GE GC

t1

19.00 23.25

3.16 5.71

.

-2.257 -7.141 22 22 .034 .000**

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t2

10.75 24.25

2.05 6.18

*p ≤ .05; **p ≤ .01

Quando procedemos à análise comparada daquilo que se passa em cada um dos grupos (GE e

GC) ao longo do tempo (de t1 para t2) (Quadro 6), observamos que existe uma redução

significativa dos sintomas depressivos junto daqueles que foram submetidos à intervenção

grupal [t(22) = -2.257; p = .034], o que não se verifica de forma tão acentuada nem no mesmo

sentido, junto dos participantes que não foram alvo de intervenção (t(22) = -7.141; p = .000]. De

facto, assiste-se no GC a um aumento, ainda significativo, da sintomatologia depressiva.

Discussão dos Resultados

Perante estes resultados, e com base nos objetivos específicos propostos neste estudo empírico,

confirma-se que existem diferenças significativas entre os participantes sujeitos a terapia de

grupo e participantes não sujeitos a este tipo de terapia, o que vai de encontro com outros

estudos efetuados (Barata, 2014; 2013; Shipley & Fazio, 1973; Shaw, 1977; Dobson, 1989).

Numa avaliação intragrupal verifica-se que no grupo alvo de intervenção grupal (GE) há

diferenças significativas, entre os momentos temporais (t1 e t2), assistindo-se a uma redução

significativa da sintomatologia depressiva apresentada pelos participantes (19 e 10.75,

respetivamente). Estes resultados vão de encontro a um estudo efetuado por Rush e Watkins

(1978, citados por Beck, Rush, Shaw & Emery, 1997), que também verificaram valores pós-

tratamento significativamente mais baixos em medições da síndrome depressiva do que haviam

evidenciado no pré-tratamento (Barata, 2014: 2013).

No grupo de controlo (GC) e numa perspetiva intragrupal, verifica-se que há diferenças

estatisticamente significativas nos dois momentos avaliativos (t1 e t2), verificando-se um

aumento, significativo, da sintomatologia depressiva apresentada pelos participantes (23.25 e

24.25, respetivamente).

Perante estes valores, pode-se demonstrar que o tratamento cognitivo-comportamental, de que

foi alvo o grupo experimental, apresenta resultados mais satisfatórios (diminuição)

relativamente à sintomatologia depressiva, o que corrobora os estudos efetuados por Barata

(2014; 2013), Shipley e Fazio (1973) e Dobson (1989).

De acordo com os resultados já citados, confirma-se a pertinência de uma intervenção grupal em

sujeitos com deficiência, sendo que, neste estudo, registou-se uma melhoria na sintomatologia

depressiva, o que vem no sentido do encontrado por Barata (2014; 2013), Gallimore e Zetlin

(1980) e Goldstein (1972, cit in Marinho, 2000).

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Verifica-se que a correção das cognições é o traço distintivo da terapia cognitivo-

comportamental e a chave para resultados terapêuticos duradoiros. Além disso, no seu formato

grupal, a terapia cognitivo-comportamental pode ser ampliada para tratar problemas

interpessoais e para incentivar a exploração e a perceção de si mesmo, bem como, à

identificação e consequente modificação dos processos e padrões cognitivos disfuncionais. Este

tipo de terapia permitiu focar não só nos aspetos cognitivos, mas também nas relações

recíprocas entre o afeto, o comportamento e a cognição, produzindo uma mudança nestas três

áreas.

Nas primeiras etapas do tratamento da depressão, procurou-se usar algumas técnicas que se

centram, em grande parte, na mudança comportamental e enfatizam menos a mudança

cognitiva. A programação de atividades que proporcionam satisfação ao paciente, permitiu que

os participantes se tornassem mais ativos e se envolvessem mais no seu ambiente. Ao mesmo

tempo, deve-se observar que a mudança comportamental não começa sozinha. Inclusive na

programação de acontecimentos, o terapeuta conhece as atitudes que o indivíduo mantém, de

modo que pode escolher atividades que se unam a estas atitudes, a fim de criar maior efeito

antidepressivo.

A introdução do elemento psicodramático no grupo revelou-se de extrema valia, pois permitiu

trabalhar em situações nas quais a comunicação verbal se tornou difícil ou na presença de

«impasses» na evolução do grupo.

O uso de técnicas psicodramáticas no grupo permitiu uma melhor compreensão aos

participantes de distorções cognitivas e de ações pouco compreensíveis dos participantes em

várias situações, por eles, experienciadas.

O número de participantes no grupo poderá ter sido uma das condições para o bom

desenvolvimento deste (Ruiz, 2003, cit in Rodríguez et al, 2003).

Pensamos que a reestruturação cognitiva ajudou os participantes a identificarem os seus

próprios pensamentos automáticos negativos. Com a reestruturação cognitiva conseguiu-se que

os participantes identificassem e modificassem estes pensamentos conduzindo a alterações

posteriores no seu estado de ânimo, na sua fisiologia e no seu comportamento, o que vai de

encontro aos estudos de Beck e Emery (1985).

Referências

Barata, N. C. (2014). Paralisia Cerebral: Eficácia de um Programa de Intervenção Grupal.

Covilhã: Éditos Prometaicos.

Barata, N. C. (2013). Intervention group in individuals with cerebral palsy. Iberian Journal of

Clinical & Forensic Neuroscience, 1 (3), 445-462.

Beck, A. T. & Emery, G. (1985). Anxiety disorders, depression and phobias: A cognitive

perspective. New York: Basic Books.

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Beck, A. T., Rush, A. J., Shaw, B. F. & Emery, G. (1997). Terapia cognitiva da depressão.

Porto Alegre: Artes Médicas.

Dobson, K. S. (1989). A Meta-Analysis of the efficacy of cognitive therapy for depression.

Journal of Consulting and Clinical Psychology, 57, 414-419.

Ferreira, M., Ponte, M. & Azevedo, L. (2000). Inovação curricular na implementação demeios

alternativos de comunicação em crianças com deficiência neuromotora

grave (2º ed.). Lisboa: Secretariado Nacional para a Reabilitação e Integração das Pessoas

com Deficiência.

Gallimore, R. & Zetlin, A. (1980). A cognitive skills training program for moderately retarded

learners. In Education and Training of the Mentally Retarded, vol. II.

Kovacs, M. A. (1983). Developmental perspective on methods and measures in the assessment

of depressive disorders: the clinical interview. In M. Rutter, C. Izard, P. Read (eds.): Depression

in young people: developmental and clinical perspectives. New York: Guilford Press.

Marinho, S. M. (2000). Psicopatologia e Deficiência Mental – Fragmentos no cristal.

Braga: Edições APPACDM.

Shaw, B. F. (1977). Comparison of cognitive therapy and behavior therapy in the treatment of

depression. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 45,

543-551.

Shipley, C. R. & Fazio, A. F. (1973). Pilot study of a treatment for psychological depression.

Journal of Abnormal Psychology, 82, 372-376.

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MEDIDAS DE PREVENÇÃO E ALERGIAS ALIMENTARES

Lopes, C. & Rodrigues, N.

Resumo

Encarada como uma doença crónica a alergia alimentar acarreta, como outras patologias

assim classificadas, desafios pessoais, sociais, psicológicos e familiares. O aumento da

prevalência das alergias alimentares justifica a necessidade da existência de estratégias

preventivas para a combater (Ferreira, Coelho & Trindade, 2006). Para além disso,

encontrar formas de prevenir o desenvolvimento desta doença irá reduzir

significativamente a morbilidade e os custos associados à mesma (Silva et al., 2014).

O objetivo deste poster é demonstrar a importância dos vários níveis de prevenção no

âmbito das alergias alimentares, considerando uma Unidade Multidisciplinar de

Alergias Alimentares. A prevenção pode ir desde a atuação prévia à doença (prevenção

primária), à doença latente (prevenção secundária) e por fim na própria doença

sintomática (prevenção terciária).

Palavras-chave: Alergia alimentar, Doença Crónica, Prevenção, Multidisciplinar.

Abstract

Seen as a chronic disease the food allergy, like other diseases as well classified, causes

personal, social, psychological and familiar challenges. The increasing prevalence of

food allergies justifies the need for preventive strategies to fight it (Ferreira, Coelho &

Trindade, 2006). On the other side, finding ways to prevent the development of this

disease will significantly reduce morbidity and the costs associated with it (Silva et al.,

2014).

The purpose of this poster is to demonstrate the importance of the various levels of

prevention in the context of food allergies, considering a Multidisciplinary Unit of Food

Allergies. The prevention may vary from the previous action to the disease (primary

prevention), latent disease (secondary prevention) and finally the symptomatic disease

(tertiary prevention).

Key words: Food Allergy, Chronic Disease, Prevention, Multidisciplinary.

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Introdução

A alergia alimentar “consiste na manifestação clínica de reações imunologicamente

mediadas a substâncias estranhas, habitualmente proteínas” (Ferreira, Coelho, &

Trindade, 2007, p. 216). Esta é frequente nos primeiros anos de vida e tem implicações

claras a nível psicossocial, pelo que a análise do que fazer para prevenir estas alergias é

de extrema importância nos dias de hoje.

Por vezes, a dificuldade em definir as estratégias preventivas começa logo na definiçãp

da aplicação, ou não, de estratégias em toda a população em geral, ou se nos vamos

cingir a crianças consideradas de alto risco (Carrapatoso & Sarinho, 2007). É neste

sentido que podemos definir estratégias diferentes, para níveis de prevenção diferentes.

Sabe-se que normalmente nos primeiros anos de vida os principais alimentos que

provocam alergias alimentares são o leite, ovo, trigo e a soja, sendo que há alergias

alimentares que persistem na idade adulta, tais como a alergia aos frutos secos, peixe ou

marisco (Carrapatoso & Sarinho, 2007).

A prevenção começou a ser utilizada na medicina desde o século XVIII com a

vacinação jenneriana (Almeida, 2005), no entanto, a prevenção não deve ser olhada

apenas numa vertente médica, nem jurídica, mas também numa vertente psicossocial

(Luz & Peres, 1997). Em termos gerais, prevenção significa ação ou efeito de prevenir e

relaciona-se inevitavelmente com dois conceitos: avisar/informar e atuar.

Avisar/informar ao identificar um indivíduo prevenido como uma pessoa alerta que

conhece antecipadamente o curso dos acontecimentos; atuar ao levar a cabo uma série

de ações que impeçam o dano, alterando assim comportamento pré-existentes

(Santacreu, Márquez, & Rubio, 1997).

No desenvolvimento de estratégias de prevenção nas alergias alimentares, deverão ser

considerados, segundo Teixeira (2010) alguns aspetos de forma a maximizar a eficácia

das mesmas: a definição de indivíduo de risco, a efetividade da intervenção, quais são as

intervenções aceitáveis para cada caso, qual a redução efetiva dos efeitos adversos e a

avaliação do curso-efetividade.

Ferreira e Seidman (2007) defendem que, no caso das alergias alimentares, o controlo

dos alergénios pode ser implementado em qualquer um dos estádios de prevenção

(primário, secundário e terciário).

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Prevenção Primária

Entende-se como prevenção primária toda a atividade que tende a informar (avisar)

sobre o estado da situação, com o objetivo de informar o mais antecipadamente possível

de forma a minimizar o risco de dano. Citamos como exemplo para este tipo de

prevenção os estudos epidemiológicos, consultas regulares de estomatologia, entre

outras (Santacreu, Márquez, & Rubio, 1997).

A prevenção primária pretende assim prevenir a doença ou o dano em indivíduos

saudáveis, sem pormenorizar/personalizar o procedimento de intervenção, através de

investigações direcionadas para a deteção de doença ou identificação de fatores de risco.

Ou seja, a prevenção primária tem como objetivo “evitar ou remover a exposição de um

indivíduo ou de uma população a um fator de risco ou causal antes que se desenvolva

um mecanismo patológico” (Almeida, 2005, p. 92). Assim, este tipo de prevenção tem

uma “função educadora e de cidadania para a construção coletiva de um conceito e uma

cultura de saúde mental” (Luz & Peres, 1997, p. 179-180), querendo reduzir a

incidência da doença ou ainda, reduzir o risco médio da população (Almeida, 2005).

Os estudos sobre a prevenção primária são muitas vezes complexos, no entanto, há

vários estudos que já demonstraram a importância da prevenção primária na alergia

alimentar (Carrapatoso & Sarinho, 2007).

Uma vez que a prevenção primária tem como objetivo evitar a sensibilização aos

alimentos alergénios, evidenciamos aqui algumas estratégias dirigidas às crianças com o

“objetivo de prevenir o desenvolvimento da doença alérgica” (Carrapatoso & Sarinho,

2007, p. 293), e como tal, consideramos que devem ser adotadas:

- Aleitamento materno exclusivo nos primeiros meses de vida (Carrapatoso & Sarinho,

2007; Pinheiro, Gomes, Paiva & Gaspar, 2009);

- Quando não é possível o aleitamento materno exclusivo incluir fórmulas

hipoalergénicas que reduzem a ocorrência de alergias às proteínas do leite de vaca e de

eczema atópico, principalmente as fórmulas extensamente hidrolisadas de caseína

(Carrapatoso & Sarinho, 2007; Pinheiro, Gomes, Paiva & Gaspar, 2009);

- Introdução de alimentos sólidos deve ser feita de forma gradual e em pequenas

quantidades (Carrapatoso & Sarinho, 2007; Pinheiro, Gomes, Paiva & Gaspar, 2009);

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- Utilização de suplementos dietéticos com bactérias probióticas no tratamento do eczema

atópico em lactentes (Carrapatoso & Sarinho, 2007; Pinheiro, Gomes, Paiva & Gaspar,

2009);

- Imunização, visando aumentar a resistência a um determinado micro-organismo

(Almeida, 2005);

- Trabalhar questões de promoção da saúde, incutindo assim comportamentos de saúde

(Luz & Peres, 1997);

- Bloqueio da sensibilização imunológica ao alimento (Ferreira & Seidman, 2007).

No caso da idade para introdução dos alimentos a prevenção é ainda muito controversa,

sendo que a maioria dos estudos indica como idade adequada para a introdução do ovo

entre os 9 e os 12 meses e para a introdução do peixe e frutos secos a partir dos 12

meses (Pinheiro, Gomes, Paiva & Gaspar, 2009). No entanto, a Academia Americana de

Alergia, Asma e Imunologia indica como idades para introduzir todos os lacticínios os

12 meses, para introduzir o ovo recomenda a partir dos 2 anos de idade e, no caso dos

frutos secos e peixe, apenas recomenda a inserção destes alimentos após os 3 anos de

idade (Pinheiro, Gomes, Paiva & Gaspar, 2009).

Se pensarmos no caso concreto das alergias alimentares, consideramos que seria

interessante a implementação de ações de sensibilização em todas as escolas, incluindo

crianças e famílias, sobre esta temática.

Um das grandes limitações da prevenção primária é a falta de apoios e recursos para

implementação deste tipo de estratégias, uma vez que normalmente os resultados da

prevenção primária só se visualizam a médio/longo prazo (Luz & Peres, 1997).

Prevenção Secundária

A prevenção secundaria é utilizada nos casos em que já existe sensibilização e

pretendemos “evitar ou atrasar a ocorrência de sintomas”, ou seja, neste caso dirigimos

as estratégias de prevenção àquelas crianças que têm sintomas ligeiros de atopia, mas

que ainda não são consideradas como doentes crónicos (Carrapatoso & Sarinho, 2007,

p. 293). Assim, a prevenção secundária é a atividade que visa remediar ou amenizar o

dano causado e do qual possuímos informação. São exemplos deste tipo de prevenção a

lavagem dos dentes após as refeições, a prática de exercício físico regular ou descanso

adequado, para citar apenas alguns (Santacreu, Márquez, & Rubio, 1997). Este tipo de

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prevenção centra-se nas atuações que visam a prevenção da doença, em grupos

identificados como grupos de risco.

Quando falamos deste tipo de prevenção no âmbito das alergias alimentares, uma das

principais estratégias prende-se com as dietas de evicção naquelas crianças já

identificadas como de risco. A recomendação da evicção durante os primeiros meses de

vida do alimento alergénio, assim como a introdução tardia de alimentos identificados

com tendo um maior potencial alergénio, aparenta ser consensual (Ferreira, Coelho, &

Trindade, 2006). Para que tal aconteça é necessário um envolvimento por parte da

família (que tem de alterar os seus hábitos alimentares e a forma de confecionar os

alimentos em casa) e também um envolvimento da escola, onde muitas vezes a criança

passa muito tempo e consome refeições (Pinheiro, Gomes, Paiva & Gaspar, 2009),

sendo então necessário a elaboração de planos alimentares específicos.

Outra das estratégias neste tipo de prevenção prende-se com a noção de saber utilizar os

dispositivos de adrenalina que podem ser necessários em situações de crise para uma

atuação rápida, pelo que é fundamental darmos uma correta informação tanto aos

cuidadores, como aos técnicos da escola que estão com a criança (Pinheiro, Gomes,

Paiva & Gaspar, 2009).

A este nível de prevenção enquadram-se os rastreios ao nível mais comunitário e os

achados de caso ao nível dos cuidados médicos do indivíduo (Almeida, 2005). O

rastreio aplica-se no caso de doenças crónicas, como é o caso das alergias alimentares,

que podem progredir para estados mais graves caso não sejam intervencionadas. O

objetivo de um rastreio é sempre o de “reduzir a mortalidade ou a morbilidade por uma

determinada doença no grupo rastreado” (Morrison, 1998, cit in Almeida, 2005, p. 93).

No que concerne ao achado de caso, aqui já é “uma deteção oportunista da doença ou

seus fatores de risco em indivíduos que consultam o seu médico por outros problemas”

(Fowler & Gray, cit in Almeida, 2005, p. 93).

Prevenção Terciária

A prevenção terciária é aquele tipo de prevenção que tem como objetivo “reduzir a

frequência e/ou gravidade dos sintomas e a progressão da doença alérgica crónica”

(Carrapatoso & Sarinho, 2007, p. 293). Com este tipo de prevenção conseguimos

“reduzir os custos sociais e económicos dos estados de doença na população, através de

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reabilitação e reintegração precoces e da potenciação da capacidade funcional

remanescente dos indivíduos” (Almeida, 2005, p. 93).

A prevenção terciária centrar-se-á no tipo de atuação levada a cabo quando a patologia

está já diagnosticada e a demonstrar os primeiros sintomas, sendo que este tipo de

prevenção procurará prevenir estados mais avançados dessas mesma patologia, ou seja,

há uma “gestão” do estado da doença (Santacreu, Márquez, & Rubio, 1997; Almeida,

2005). É exemplo deste tipo de prevenção a criação de formas de controlo alimentar.

A prevenção terciária visa limitar os sintomas assim como problemas adicionais em

indivíduos que já sofrem de alergias alimentares, evitando a recorrência de sintomas

(Ferreira & Seidman, 2007). Assim, segundo Teixeira (2010), esta prevenção deverá

abranger o esclarecimento de dúvidas à criança, à família e à escola sobre a doença e os

riscos, para um auxílio efetivo na adesão ao tratamento, através da orientação aos

intervenientes quanto ao plano de tratamento a seguir em caso de emergência e a

exclusão do alimento desencadeante de alergia na alimentação da criança. No caso dos

pacientes com história de anafilaxia, a orientação quanto ao uso da adrenalina deverá ser

privilegiado, sendo que esta constitui a primeira escolha no tratamento da anafilaxia.

Adicionalmente, não existe contraindicação do uso de adrenalina no tratamento de

reações alérgicas graves ou anafilaxia.

O conhecimento dos termos sinónimos ao alimento excluído e a orientação sobre a

leitura de rótulos de produtos industrializados são também importantes aliados na

realização de refeições fora de casa, devendo os pacientes e familiares ser orientados

quanto à importância de questionar os responsáveis pela preparação dos alimentos os

ingredientes utilizados, e forma de preparação/confeção (Teixeira, 2010).

O crescimento e desenvolvimento adequado da criança considerando o conteúdo

nutricional fornecido pelo alimento excluído, não poderá ser descurado de forma a

minimizar risco nutricional por falta de substituições do mesmo valor nutricional

(Teixeira, 2010).

Quando falamos de prevenção a nível psicológico, é aqui que pode fazer sentido utilizar

estratégias como a dessensibilização cognitiva, de forma a diminuir estados

ansiogénicos que se possam detetar. Indivíduos com problemas médicos diagnosticados

procuram constantemente o equilíbrio entre manter o controlo sobre as suas ações do

dia-a-dia e o ter que abdicar involuntariamente desse mesmo controlo (Pereira &

Penido, 2010) em situações em que se veem confrontados com a possibilidade de

contacto com o alimento que provoca a reação alérgica. A maneira como os indivíduos

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reagem aos sintomas é bastante influenciada pelas suas perceções de saúde e doença,

afetando a sua própria saúde de várias maneiras: quer seja através da influência nos

comportamentos preventivos, quer na maneira como reagem ao aparecimento dos

sintomas (Straub, 2005, cit in Pereira & Penido, 2010). A interpretação da forma como

o paciente percebe sua doença, sintomas, tratamento e prognóstico irá influenciar seus

sentimentos e, consequentemente, a sua reação e essas mesmas interpretações poderão

facilitar ou dificultar a adesão ao tratamento (Pereira & Penido, 2010), daí a importância

desta estratégia aplicada às alergias alimentares, no sentido de aumentar o controlo,

aumentar a autoeficácia na gestão dos sintomas e diminuir assim a ansiedade perante

potenciais situações de risco.

Adicionalmente, poderiam ainda ser criados grupos de apoio para troca de experiências,

dúvidas e anseios. Estes grupos tendem a melhorar os recursos sociais e o nível de

conhecimento sobre as questões discutidas em conjunto. Concomitantemente, os

indivíduos que integram grupos de apoio geralmente demonstram maior capacidade de

enfrentamento das situações de vida, uma melhoria na autoconfiança, assim como uma

diminuição do medo e da ambiguidade ou alívio emocional (Morretti & Zucchi, 2010).

A integração neste tipo de grupo contribui para a promoção da qualidade de vida

capacitando os seus membros de melhores estratégias de coping e de resolução de

problemas (Morretti & Zucchi, 2010).

Outros tipos de Prevenção

Considera-se que existem as prevenções chamadas clássicas (prevenção primária,

secundária e terciária), a prevenção primordial e, mais recentemente, surgiu a definição

da prevenção quaternária.

A prevenção primordial é normalmente associada a doenças crónico-degenerativas e

tem como objetivo o “evitar a emergência e o estabelecimento de estilos de vida que se

sabem contribuir para um risco acrescido de doença” (Almeida, 2005, p. 92). Este tipo

de prevenção é muito falado em programas de abstinência tabágica, nutrição adequada e

prática de exercício físico (Alwan, 1997, cit in Almeida, 2005), daí não terem destacado

este tipo de prevenção para as alergias alimentares.

A prevenção quaternária surgiu em 1995, com Jamoulle e Roland, e foi aceite pelo

Comité Internacional de Classificação da WONCA em 1999. Este tipo de prevenção

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realiza-se quando o sujeito padece ou já padeceu de certa doença, de forma a atuar de

forma paliativa nos efeitos nocivos da mesma, muitas vezes é chamada de “prevenção

do sofrimento” (Almeida, 2005). Este tipo de prevenção aplica-se em patologias cuja

possibilidade de recaída é bastante provável, como é o caso do cancro, e pretende

melhorar a qualidade de vida destes doentes e da sua família (Almeida, 2005).

Esta prevenção surge com um propósito claro de diminuir o excesso de

intervencionismo médico associado a atos médicos desnecessários ou injustificados, e

pretende ainda conceder informação relevante para que o paciente tomar decisões

autónomas e conscientes, sem falsas expectativas e conhecendo claramente as vantagens

e desvantagens de cada método diagnóstico e terapêutico proposto (Almeida, 2005).

Não se pretende nunca substituir a abordagem definida clinicamente, mas pretende ser

uma abordagem complementar a esta, através de dois princípios fundamentais que são a

proporcionalidade e a precaução (Almeida, 2005). As estratégias utilizadas neste tipo de

prevenção centram-se na prevenção e tratamento da dor, mas também de outros

sintomas (exemplos: estados confusionais e desnutrição) ou mesmo do sofrimento

psicossocial e espiritual (OSM, 2002, cit in Almeida, 2005).

Optámos por também não incidir muito neste tipo de prevenção dado que ela é

frequentemente utilizada em doenças terminais como o cancro e, mais profundamente,

no grupo etário dos idosos (Almeida, 2005).

Importância da Equipa Multidisciplinar nas Alergias Alimentares

A prevenção deixou de ser apenas uma questão médica, para ter também a vertente

sociocultural e psicológica, pelo que uma abordagem multidisciplinar tem todo o

sentido e só assim conseguimos abranger a promoção da saúde e não apenas a cura (Luz

& Peres, 1997).

Aqui todos podem ter um papel importante:

- O Médico (Imunoalergologista e Endocrinologista) irá proceder a uma análise

minuciosa da história clínica, associada a dados do exame físico, podendo estes ser

complementados por testes alérgicos (o Teste Cutâneo de Hipersensibilidade Imediata

ou Prick Test e os de provocação oral, por exemplo) (Solé, Amancio, Jacob, Cocco,

Sarni & Suano, 2012).

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- O Psicólogo como “educador preocupado com a prevenção, por ser um profissional que

possui um saber teórico e um domínio de técnicas que dizem respeito às relações

humanas, de trabalho, escolares e sociais em geral” (Luz & Peres, 1997, p. 188).

- O Nutricionista cujo acompanhamento e controlo evolutivo da reação da

hipersensibilidade alimentar irá permitir determinar qual o momento ideal para

reintrodução do alimento excluído, caso essa seja uma possibilidade perante o caso

clínico, assim como a aplicação de medidas de prevenção, em qualquer um dos seus

estádios (Teixeira, 2010).

Consideramos ainda que para além destes médicos que constituem a Unidade

Multidisciplinar é importante um apoio permanente ao nível dos Clínicos de Medicina

Geral e Familiar, uma vez que são estes que estão em contato direto com muitos dos

pacientes.

Conclusão

A prevalência das alergias alimentares tem aumentado expressivamente nos últimos

anos, sendo difícil determinar com rigor a sua taxa de incidência (Pinto, 2013). Na

alergia alimentar, a prevenção das situações agudas que possam causar reação

anafilática, passa pela eliminação do contacto/ingestão do alergénio e o tratamento pela

administração atempada da terapêutica adequada a cada caso. No entanto, há várias

formas de prevenção que podem ser implementadas antes da situação aguda de forma a

diminuir o risco existente, e aumentar assim a qualidade de vida dos indivíduos

diagnosticados (Pinto, 2013).

A evicção dos alergénios alimentares pode parecer simples mas traduz-se numa

vigilância constante e atenta uma vez que a sua presença nem sempre é evidente.

Considerando que o desenvolvimento das alergias alimentares varia ao longo do tempo,

havendo por vezes o surgimento de novas alergias alimentares, é fundamental haver

uma monitorização da sensibilização ou tolerâncias desenvolvidas (Pinto, 2013).

Pacientes, cuidadores e população em geral devem dispor de informação culturalmente

apropriada e adaptada, sobre como evitar o alergénio e como atuar em caso de

emergência (Burks et al, 2011).

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EXPERIÊNCIAS DURANTE O PERÍODO DE ESTÁGIO NA ASSOCIAÇÃO DE

PAIS E AMIGOS DOS EXCEPCIONAIS (APAE) EM CAMPINA GRANDE/

PARAÍBA/ BRASIL

Clara Lohana Cardoso Guimarães1 Clarissa Maria Cardoso Guimarães2 & João

Rogério Dias de Tolêdo Farias3

1 - Aluna de Psicologia da Universidade Federal de Campina Grande e Aluna de

Mobilidade na Universidade de Coimbra

2 - Aluna de Enfermagem da Universidade Federal de João Pessoa

3 - Advogado brasileiro e Aluno de Mobilidade no Curso de Língua Francesa I da

Universidade de Coimbra

Resumo

Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais da cidade de Campina Grande, Paraíba,

Brasil. É uma instituição que se configura como uma rede construída por pais, amigos e

pessoas com deficiência, além de voluntários, profissionais e instituições parceiras,

públicas e privadas. Tem por missão promover e articular ações de defesa dos direitos,

prevenção, orientação e apoio às famílias no sentido da melhoria na qualidade de vida

da pessoa com deficiência, promovendo assim a construção de uma sociedade mais

justa e solidária. Diante desta experiência tem-se o objetivo de apresentar as

observações, as dificuldades, as sensações, as marcas e as lições que ficaram pelo

contato direto com crianças, adolescentes e adultos que, fisicamente/cognitivamente

apresentam algum tipo de limitação. Dessa forma, tem um caráter social e o objetivo de

promover atenção integral à pessoa com deficiência, promovendo também a defesa dos

seus direitos de cidadania numa perspectiva de inclusão social de seus usuários. Trata-se

de uma reestruturação da cultura, da prática e das políticas vivenciadas nas escolas de

modo que estas respondam à diversidade de alunos. Assim, atentando à diversidade, a

educação nesta associação busca perceber e atender às necessidades educativas

especiais de todos os sujeitos-alunos, de forma a promover a aprendizagem e o

desenvolvimento pessoal de todos.

Palavras-chave: APAE; Educação; Psicologia.

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Abstract

Association of Parents and Friends of Exceptional Children in the city of Campina

Grande, Paraiba, Brazil. It is an institution that is configured as a network built by

parents, friends and people with disabilities, as well as volunteers, professionals and

partners, public and private institutions. Its mission is to promote and articulate rights

advocacy, prevention, guidance and support to families in order to improve the quality

of life of disabled people, thus promoting the construction of a more just and united

society. Given this experience has the objective of presenting the observations, the

difficulties, the feelings, the marks and the lessons were by direct contact with children,

adolescents and adults, physically / cognitively present some kind of limitation. Thus, it

has a social character and the aim of promoting comprehensive care to people with

disabilities, and to promote the defense of their citizenship rights in the interests of

social inclusion of its members. It is a restructuring of the culture, practice and policies

experienced in schools so that they respond to the diversity of students. Thus, paying

attention to diversity, education in this association seeks to understand and cater to the

special educational needs of all subjects students in order to promote learning and

personal development of all.

Keywords: APAE; Education; Psychology.

INTRODUÇÃO

Baseando-se na desafiadora experiência de estagiar na Associação de Pais e Amigos dos

Excepcionais (APAE) durante um mês, o presente relatório tem por finalidade apresentar

as observações, as dificuldades, as sensações, as marcas e as lições que ficaram pelo contato

direto com crianças, adolescentes e adultos que, fisicamente/cognitivamente apresentam

algum tipo de limitação, que tem muito o que ensinar.

A APAE configura-se como uma rede construída por pais, amigos e pessoas com

deficiência, além de voluntários, profissionais e instituições parceiras, públicas e

privadas. Tem por missão promover e articular ações de defesa dos direitos, prevenção,

orientação e apoio as famílias de forma que esse apoio seja direcionado a melhoria na

qualidade de vida da pessoa com deficiência, promovendo assim a construção de uma

sociedade mais justa e solidária. Dessa forma, tem um caráter social e o objetivo de

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promover atenção integral à pessoa com deficiência, promovendo também a defesa dos

seus direitos de cidadania numa perspectiva de inclusão social de seus usuários.

Trata-se de uma reestruturação da cultura, da prática e das políticas vivenciadas nas

escolas de modo que estas respondam à diversidade de alunos. Assim, atentando à

diversidade, a educação na APAE busca perceber e atender as necessidades educativas

especiais de todos os sujeitos-alunos, de forma a promover a aprendizagem e o

desenvolvimento pessoal de todos.

Durante das supervisões, percebeu-se a confluência da questão de ensino e

aprendizagem na qual a Psicologia estaria intimamente relacionada à aprendizagem e ao

desenvolvimento humano de forma que a relação entre Psicologia e Pedagogia tornou-

se fundamental para o avançar dos nossos trabalhos. A este respeito, Serpa e Santos

(2001) afirmam que a Psicologia deve atuar como construtora de estratégias preventivas

frente aos problemas, na qual o psicólogo deve trabalhar aliado ao educador, integrando

aprendizado e ensino aos conhecimentos pedagógicos e de desenvolvimento,

valorizando as diferenças culturais. E para que isso aconteça, é necessário que o

psicólogo em sua atuação leve em consideração o aspecto biopsicossocial trazido pelos

sujeitos envolvidos, sua relação com as respectivas famílias, com os amigos mais

próximos e consigo mesmo. Sendo assim, pensar para atuar nesta perspectiva é a

premissa básica para a formulação de novas estratégias de intervenção.

INSTITUIÇÃO DE ESTÁGIO – APAE

A Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais – APAE, localiza-se na cidade de

Campina Grande – PB, e atualmente é a maior rede de atendimento integral às pessoas

com deficiências. A instituição faz atendimento a usuários com síndrome de Down e

deficiências mentais, o acolhimento é feito para todas as idades, em um total de 385

alunos matriculados.

A instituição filantrópica conta com funcionários que atuam desde a equoterapia,

fisioterapia, artesanato, escolaridade, educação física, limpeza, cozinha, atendimento

psicológico e médico, com uma ampla rede de funcionários. Por se configurar como um

serviço clínico e escolar, dispõe de ampla variedade de serviços que são ofertados em

prol da pessoa com deficiência, prezando acima de tudo por uma melhoria na qualidade

de vida daqueles que lá frequentam.

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Os serviços ofertados dentro da clínica são o de Psicologia, Fisioterapia,

Fonoaudiologia e médico neurologista. O serviço de Psicologia está em todos os setores

da instituição desde a parte escolar até o setor de equoterapia. Na parte clínica, dentro

da psicologia são trabalhados os mais diversos temas que surgem de acordo com as

demandas do usuário e de seus familiares. Quando criança, uma faixa etária que vai dos

4 aos 12 anos, os pacientes são atendidos na brinquedoteca pela psicóloga que, através

do brincar, estimula suas percepções e promove um melhor desenvolvimento cognitivo.

Pacientes com mais de 12 anos o atendimento é individual, buscando sempre uma

reafirmação da autonomia da pessoa com deficiência em atividades cotidianas. A

psicologia, junto a outros profissionais como o fonoaudiólogo e o fisioterapeuta,

trabalha ainda a estimulação precoce em crianças de 0 a 1 ano de vida por meio de um

trabalho transdisciplinar.

Em relação à família, a Psicologia faz um trabalho de orientação, principalmente em

relação à postura dos pais frente a seus filhos. A superproteção muitas vezes dificulta o

trabalho da APAE. Assim sendo, essa orientação surge a fim de proporcionar um maior

investimento da família na pessoa com deficiência, permitindo a ela uma maior

autonomia e independência no seio família; também é oferecido aos alunos oficinas de

horta, culinária e artesanato, além de aulas de informática, e acesso à biblioteca e à

brinquedoteca onde são desenvolvidas atividades lúdicas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Chegar a um campo de estágio desconhecido é sempre motivo de curiosidade e

angústia. A APAE, principalmente, me deixou um pouco temerosa pelo que eu ouvia

falar das pessoas com Síndrome de Down e com retardos mentais. Fui com um pouco

de medo, mas consegui superá-lo e ia, cada quarta e quinta, aberta à experiência e fiquei

simplesmente apaixonada.

O vínculo que se cria é impressionante, o carinho recebido é impagável, e a confiança

estabelecida é revigorada a cada dia. Tudo passa a ser pensado da forma mais carinhosa

possível, e o retorno sempre é gratificante. Os funcionários foram bastante receptivos e

nos ajudaram muito, facilitando nossa chegada, apresentação e atuação.

Sendo assim, o que fica é carinho e saudade do mês que passou tão rápido! Foi muito

gratificante esse período de estágio em que aprendi mais do que ensinei, em que pude

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desmistificar muitas coisas, e realmente conhecer o quanto são inteligentes, carinhosos e

espertos essas pessoas que tem muito a contribuir, cada uma em suas limitações.

Nosso grupo teve experiências maravilhosas nesse estágio, desenvolvendo atividades

coerentes e continuadas, construindo uma relação de amizade com toda a instituição,

recebendo o carinho e a confiança de todos. Pensamos em casa detalhe com muito

carinho!

O interessante é chegar e perceber que muitos, apesar dos seus diagnósticos, são

totalmente diferentes do esperado, e isso nos deixava surpresas, contribuindo para que

pensássemos aquelas pessoas além das suas possíveis limitações.

Dessa forma, o estágio na APAE foi de suma importância para nosso crescimento

profissional e, principalmente, pessoal, pois tenho certeza que aprendemos muito com

eles, e fizemos o máximo para ofertar ideias bacanas e deixar alguma contribuição para

eles que nos acolheram tão bem!

A APAE é realmente “Apaexonante”! Saio cheia de saudade e com uma vontade imensa

de voltar e contribuir de alguma forma para a educação e o desenvolvimento dos que

fazem parte dessa instituição tão útil e necessária.

REFERÊNCIAS

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EXPERIÊNCIAS DURANTE O PERÍODO DE ESTÁGIO NO CENTRO DE

ATENÇÃO PSICOSSOCIAL ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS – CAPS AD - EM

CAMPINA GRANDE/ PARAÍBA/ BRASIL

Clara Lohana Cardoso Guimarães1 Clarissa Maria Cardoso Guimarães2 João

Rogério Dias de Tolêdo Farias3 & Isabella Lemos Arteiro4

1- Aluna de Psicologia da Universidade Federal de Campina Grande e Aluna de

Mobilidade na Universidade de Coimbra

2- Aluna de Enfermagem da Universidade Federal de João Pessoa

3- Advogado brasileiro e Aluno de Mobilidade no Curso de Língua Francesa I da

Universidade de Coimbra

4- Professora Mestre da Universidade Federal de Campina Grande

Resumo

Centro de Atenção Psicossocial Álcool e outras drogas da cidade de Campina Grande,

Paraíba, Brasil. É um serviço municipal, aberto, comunitário, que oferece atendimento

diário às pessoas com dependência química, realiza o acompanhamento clínico e a

reinserção social destas pessoas através do acesso ao trabalho, lazer, exercício dos

direitos civis e fortalecimento dos laços familiares e comunitários. Com esta experiência

tem-se o objetivo de apresentar as atividades realizadas na instituição, como: tenda do

conto com as mães, oficinas de mosaico, tapeçaria, fuxico e horta com os usuários,

fundamentadas no pressuposto de que o cuidado a usuários de drogas exige condições

que respeitem o indivíduo enquanto pessoa, possibilitando sua (re)inclusão social,

profissional e familiar, ampliando as ações em saúde mental na sua intensidade e

diversidade. Assembleias gerais e passeios, lanches coletivos, festas de aniversário,

jogos, atividades no Parque da Criança e vivências com as famílias dão lugar a oficinas

(atividades que convocam o sujeito a ser um sujeito de ação) que produzem efeitos que

vão da clínica à construção singular de trajetórias e saídas para uma vida mais completa.

O adicto deve ser considerado um sujeito biopsicossocial, e não um objeto heterônimo.

Palavras-chave: CAPS AD; Estágio; Psicologia.

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Abstract

Psychosocial Care Center Alcohol and other drugs in the city of Campina Grande,

Paraiba, Brazil. It is a municipal service, open community offering daily service to

people with chemical dependency, conducts clinical follow-up and social reintegration

of these people through access to work, leisure, exercise of civil rights and

strengthening family and community ties. In direct contact with the difficulties,

strategies and limitations of the institution, closely watching the role played by the only

psychologist from the center combined with a team committed to serve and take care of

various allowed users and their families, it was evidenced the importance of all

professionals to service users that are excluded from social life. General meetings and

tours, collective snacks, birthday parties, games, activities in the Children's Park and

experiences with families give rise to workshops (activities that summon the guy to be a

subject of action) that produce effects ranging from clinic to construction singular paths

and outputs for a fuller life. The addict should be considered a biopsychosocial subject,

not an object heteronym.

Keywords: CAPS AD; Internship; Psychology.

Introdução

O presente diário de campo tem como objetivo apresentar as experiências durante o

período de um mês de estágio no Centro de Atenção Psicossocial – Álcool e outras

drogas da cidade de Campina Grande (CAPS AD). É uma apresentação das observações

e intervenções feitas ao longo desse tempo, contando dia por dia o que aconteceu e o

que foi feito, concluindo com as impressões pessoais de tal campo de estágio.

Foi uma experiência de grande importância, pois convivemos com as dificuldades,

estratégias e limitações da instituição, acompanhando de perto o papel assumido pela

única psicóloga do CAPS (já que recentemente houve um considerado desfalque na

equipe por questões de nova gestão municipal) aliada a uma equipe empenhada em

escutar e cuidar dos diversos usuários que chegam, cada qual com sua demanda, sem

esquecer do apoio à família. Além disso, foi importante por ter mostrado quanta

diferença faz a presença dos profissionais (psicólogo, psicopedagogo, enfermeiro,

médico, cozinheiro, pedagogo, porteiro) para os que são considerados “fora da norma”,

que se encontram excluídos da vida social como um todo sem poder desfrutar, muitas

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vezes, dos direitos de cidadão, perdendo a confiança dos familiares e de todos que os

estigmatizam de alguma forma.

Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) é um dos dispositivos de atenção à saúde

mental que têm valor estratégico para a Reforma Psiquiátrica Brasileira, espalhados pelo

país vêm modificando fortemente a estrutura da assistência à saúde mental, diferenciam-

se pelo porte, capacidade de atendimento, clientela atendida e se organizam no país de

acordo com o perfil populacional dos municípios brasileiros. Assim, estes serviços

diferenciam-se como CAPS I, CAPS II, CAPS III, CAPSi e CAPSad. A partir dessa

inovação o CAPS AD é construído fundamentando-se na idéia de que o tratamento das

pessoas com transtornos decorrentes o uso de substâncias psicoativas e também de seus

familiares exige condições terapêuticas que inexistem nos demais serviços ofertados

para essa realidade dos adictos.

São serviços de saúde municipais, abertos, comunitários, que oferecem atendimento

diário às pessoas com dependência química, realizando o acompanhamento clínico e a

reinserção social destas pessoas através do acesso ao trabalho, lazer, exercício dos

direitos civis e fortalecimento dos laços familiares e comunitários.

Os CAPSad, especializados no atendimento de pessoas que fazem uso prejudicial de

álcool e outras drogas, são equipamentos previstos para cidades com mais de 200.000

habitantes, ou cidades que, por sua localização geográfica (municípios de fronteira, ou

parte de rota de tráfico de drogas) ou cenários epidemiológicos importantes, necessitem

deste serviço para dar resposta efetiva às demandas de saúde mental. Funcionam

durante os cinco dias úteis da semana, e têm capacidade para realizar o

acompanhamento de cerca de 240 pessoas por mês. A equipe mínima prevista paraos

CAPSad é composta por 13 profissionais de nível médio e superior. (DOCUMENTO

APRESENTADO À CONFERÊNCIA REGIONAL DE REFORMA DOS SERVIÇOS DE

SAÚDE MENTAL : 15 ANOS DEPOIS DE CARACAS, 2005, p.30)

O serviço

O Centro de Atenção Psicossocial CAPS AD localizado na Rua Arnaldo de

Albuquerque 80, no bairro Alto Branco da cidade de Campina Grande – Paraíba é uma

instituição voltada à assistência em saúde a pessoas com transtornos decorrentes o uso

de substâncias psicoativas. O ambiente que constitui a estrutura física se detalha em

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uma casa grande adaptada ao serviço, têm um andar, com janelas, varandas e portas.

Tem uma recepção com armários com fichas, uma sala que acontece o atendimento

médico, uma sala onde funciona um escritório, uma sala onde acontecem oficinas com

artesanato, uma sala para atendimento individual, a cozinha, refeitório, lavanderia e

banheiros. Tem ainda uma sala onde acontece reunião com familiares de usuários e uma

sala vazia que funciona como sala de vídeo.

A estrutura dinâmica, ou seja, de funcionamento do CAPS AD condiz com o que o

Ministério da Saúde articula para essa nova rede substitutiva, tem capacidade para 50

usuários por dia, funciona todos os dias menos fim de semana e feriados, oferece

consultas com psiquiatra, psicólogos, tem oficina com usuários e familiares, atendem a

pacientes do bairro e das áreas vizinhas. A equipe que trabalha no serviço é composta

por psiquiatra, psicólogos, assistentes sociais, enfermeiros, técnicos em enfermagem,

pedagogos, profissionais de serviço geral e cozinha.

Ao longo de sua história pode se reconhecer um percurso que vai concretizando em ato

aquilo que pensa e deseja. O CAPS é estruturado por meio das oficinas, circundadas

pelas demais atividades, pertinentes a uma prática inventiva e articulada a tempo e ao

desejo das pessoas. Das assembléias gerais aos passeios, aos lanches coletivos, às festas

de aniversário, aos jogos, data comemorativa, as atividades no Parque da Criança até o

diálogo com as organizações de usuários, forma-se o espectro do que pode acontecer.

As oficinas, espaços livres e abertos à experimentação, produzem efeitos que vão da

clínica à construção singular de trajetórias e saídas para uma vida mais completa.

O adicto, antes excluído do mundo dos direitos e da cidadania, deve tornar-se um

sujeito, e não um objeto jogado na sociedade. É necessário escutar, fazer atendimento

individual, elaborar e realizar atividades com objetivos de abrigar a subjetividade.

Diário de campo - CAPS AD

DIA 1: Participamos do encontro com as mães com a psicóloga Luana na quinta feira

das 08:30 às 10:30h. Logo depois, nos reunimos com a equipe para debater alguns casos

e acompanharmos as evoluções dos prontuários e da ata da reunião. Durante a reunião e

no debate com a equipe, percebemos o quão as mães assumem as responsabilidades de

seus filhos sem dar oportunidade a autonomia dos mesmos, além de apresentarem uma

forte demanda de serem ouvidas nas suas mais dolorosas experiências.

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Fomos muito bem recebidas, tanto pela equipe quanto pelas mães dos usuários, e já

saímos pensando em uma possível atividade a ser realizada na próxima quinta.

DIA 2: Conhecemos a oficina de mosaico e achamos interessante não realizar atividades

complementares, já que os participantes de tal oficina são concentrados nos detalhes

para a confecção dos quadros, além de terem que cumprir uma meta de produção de

quadros que foram encomendados e requererem prazo de entrega. Durante a chegada na

oficina, compartilhamos de experiências diversas (trabalho, família, amigos, tratamento,

amor, etc.) com os usuários e começamos a intervir em questões importantes e

influentes em suas condições de usuários do CAPS AD, fazendo perguntas e dando

algumas contribuições para as mesmas.

DIA 3: Participação na comemoração do dia dos pais. Poucos pais fizeram-se presentes,

e a maioria dos participantes eram os próprios usuários. Alguns palestrantes deram seu

testemunho de vida, alguns usuários fizeram questão de falar alguma coisa relacionada

ao papel do pai, houve bingo e sorteios de cestas básicas.

DIA 4: Mais uma quinta-feira, e participamos do grupo operativo com a família (três

mães estavam presentes), discutindo alguns casos ocorridos na semana com seus filhos

(usuários e ex-usuários da instituição) e dando nossas contribuições de acordo com as

queixas que elas traziam. Depois, discutimos com a equipe a situação de algumas mães

e seus filhos.

DIA 5: Mais uma vez, participamos da oficina de mosaico por meio de uma conversa

fluida e interessante, na qual os dois usuários (únicos participantes de tal oficina) trazem

suas experiências de vida, explicam o funcionamento da construção de uma tela e

reafirmam a importância do CAPS, chegando um a dizer que “entrar no CAPS é dar

abertura ao desenvolvimento das habilidades artísticas. ” Além disso, trouxeram

também as dificuldades e tentações vivenciadas fora da instituição, fazendo-os recair;

dizem que há a recaída mas a esperança retorna ao lembrarem da presença do CAPS.

DIA 6: Foi a primeira quarta em que conhecemos a oficina da horta, da tapeçaria e do

fuxico. Os usuários sentem-se importantes e sujeitos de atuação, sendo muito

importante para o processo de recuperação. Na horta, eles construíram um espaço de

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plantações diversas, cuja colheita é direcionada ao consumo da própria instituição, tal

como: cebola, repolho, alface, erva-doce, alecrim, coentro, etc. Fomos acompanhadas

pelos frequentadores da oficina que nos deixaram a par de como plantar, colher e usar as

diferentes plantas presentes na horta; eles tem muito cuidado com a terra e com a

manutenção da mesma, aguando e limpando sempre para manter tudo limpo. Depois de

passarmos um tempo nesta, fomos conhecer a oficina da tapeçaria e do fuxico, nas quais

muitos usuários participam e fabricam tapetes, objetos para decoração e utilidade na

cozinha; trabalham ao mesmo tempo em que conversam e compartilham suas vivências.

Participei da oficina do fuxico e produzi algumas peças junto com eles. Foi uma

experiência maravilhosa!

DIA 7: Foi o último dia com o grupo de família. Realizamos a metodologia participativa

da “Tenda do Conto” onde as quatro mães que estavam presentes falaram sobre

determinado objeto de representação significativa em suas vidas (a Bíblia foi unânime)

no processo de enfrentamento dos problemas com seus filhos. Postamos alguns objetos

na mesa (colcha de retalho, candeeiro, jarro de flor, chapéu e bolsa de palha, canecas)

que fizeram algumas relembrar de seus tempos de infância no sertão, cuja lembrança as

fez refletir sobre como aqueles tempos eram difíceis, porém saudáveis e de mais

companheirismo nas famílias. Além disso, falaram também do amor incondicional pelos

netos, sendo estes os responsáveis pela amenização das dores e preocupações diárias.

Um momento marcante para mim neste dia foi quando uma das mães olhou para a

colcha de retalhos e lembrou que sua avó fazia muitas colchas para enfeitar a casa que

não tinha energia elétrica, e eu olhei para a colcha. Aqui, percebi e refleti sobre como

nossas relações e nosso dia a dia é tecido por diversos momentos, cada qual com sua

peculiaridade (um dia ruim com um dia bom; um triste com um alegre; um de falta de

esperança e outro com a fé renovada). Conversamos muito e nos despedimos,

infelizmente. Por fim, fizemos as evoluções dos prontuários das mães presentes e foi

outra experiência importante para nosso crescimento profissional.

Considerações Finais

Tendo em vista os aspectos observados no decorrer da visita e mediante pesquisas

teóricas é imprescindível ressaltar a importância da Reforma Psiquiátrica dentro do

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contexto dos Centros de Atenção Psicossocial - CAPS. Ela desencadeou uma nova

ordenação dos espaços terapêuticos com a perda da hegemonia da internação,

modificando as práticas de reabilitação que funcionam a partir de ações que visam fazer

melhorar e proteger os portadores de sofrimento psíquico, pois todo paciente necessita

de um projeto terapêutico individualizado baseado em sua história de vida e

necessidades pessoais, valorizando suas particularidades e limitações, resgatando,

assim, a subjetividade da pessoa. Assim, é CAPS, os Centros de Atenção Psicossocial,

os serviços de saúde mental de base territorial, um dos principais representantes deste

percurso de mudanças.

E, principalmente, o CAPS AD fundamentado no pressuposto de que o cuidado a

usuários de drogas exige condições que respeitem o indivíduo enquanto pessoa,

possibilitando sua (re)inclusão social, profissional e familiar, ampliando as ações em

saúde mental na sua intensidade e diversidade.

O presente relatório demonstrou a eficácia do contato pessoal nas relações de

conhecimento com a dimensão dessa nova estratégia de trabalho, foi grande relevância

para refletir sobre a formação acadêmica no curso de Psicologia, na forma de construir

conhecimentos e orientar para a prática profissional. Enfim, essa visita, a nosso ver, foi

bastante interessante não só do ponto de vista acadêmico, mas principalmente foi uma

lição do ponto de vista pessoal. Além de conhecer e entender o serviço pudemos

perceber o que estava além da dependência: a subjetividade do sujeito.

Referências

Azevedo, D. M., & Miranda, F. A. N. (2010). Práticas profissionais e tratamento

ofertado nos CAPS AD do município de Natal-RN: com a palavra a família. Revista

Enfermagem; 14 (1): 56-63.

Brasil. (2002). Ministério da Saúde. Relatório Final da III Conferência Nacional de

Saúde Mental. Brasília: Conselho Nacional de Saúde.Brasil. (2005). Ministério da

Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. DAPE. Coordenação Geral de Saúde Mental.

Reforma psiquiátrica e política de saúde mental no Brasil. Documento apresentado à

Conferência Regional de Reforma dos Serviços de Saúde Mental: 15 anos depois de

Caracas. OPAS. Brasília.

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Vargas, D., Bittencourt, M. N., Rocha, F. M., & Oliveira, M. A. F. (2013).

Representação social de psicólogos de Centros de Atenção Psicossocial em álcool e

drogas (CAPS AD) sobre o dependente químico. Departamento de Psicobiologia da

Universidade Federal de São Paulo, 11(02):188-192.

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ENVELHECIMENTO E PROJETO DE VIDA: EMOÇÃO E CONSCIÊNCIA DO

VIVIDO

Maria de Fátima Fernandes Martins Catão, Kátia Karolina Rodrigues Rocha &

Gicelly Pedrosa Cirne

UFPB – Universidade Federal da Paraíba/Brasil

Resumo

Tem-se por objetivo refletir sobre envelhecimento e projeto de vida com foco no estudo

da emoção e consciência. Foram realizadas 31 escutas psicossociais com participantes

dos Serviços de Fortalecimento de Vínculos para idosos no Nordeste do Brasil. O

estudo propicia uma reflexão crítica dos idosos sobre ter ou não ter um projeto de vida.

Palavras-chave: envelhecimento, projeto de vida, visão de si, trabalho, exclusão social

Abstract

The aim of this research is to reflect on ageing and life’s project, focused in the study of

emotion and consciousness. It were accomplished 31 psychosocial hearings with

participants of the Strengthening of Linkage Service for Elderly in Brazil. The research

provides a critical reflection of the elderly on having or not a project of life.

Key words: elderly, project of life, vision of themselves, work, social exclusion.

Introdução

O aumento da longevidade nas últimas décadas e a questão do padecimento psicossocial

vivenciados pela pessoa idosa têm provocado a urgência de estudos sobre o fenômeno

do envelhecimento populacional e impulsionado a ciência a se debruçar sobre ele. Neste

direcionamento, esta pesquisa tem por objetivo refletir sobre envelhecimento e projeto

de vida, com foco do estudo da emoção e consciência do vivido, sob a ótica dos idosos

em atendimento em Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos para Idosos -

SCFVI referenciados pelo Centro de Referência e Assistência Social - CRAS no

Nordeste do Brasil. O estudo é de caráter descritivo analítico, com procedimento de

pesquisa/intervenção. Utiliza-se a metodologia SEOP- Serviço de Escuta e de

Orientação Psicossocial: projeto de vida e trabalho, desenvolvida pelo NEIDH- Núcleo

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de Estudos Psicossociais da Exclusão/Inclusão e Direitos Humanos da Universidade

Federal da Paraíba. Esta pesquisa conta com o apoio do CNPq-Conselho Nacional de

Desenvolvimento Científico e Tecnológico, projeto PIBIC.

Envelhecimento e projeto de vida

Analisar o ser humano como um ser em constante transformação, um ser inacabado e

em contínuo processo de desenvolvimento da criança ao idoso (Vigotski,1999, 2000,

2004; Catão, 2001, 2007,2011) possibilita novas formas de rever e refazer as próprias

escolhas. Neste sentido, destaca-se o quão relevante deve ser a utilização desta ideia no

trabalho com sujeitos idosos, que por vezes acham que não há mais o que se fazer da

vida a não ser esperar a morte chegar. Provocar esta reflexão pode possibilitar um

melhoramento na construção do vivido, o que terá consequências diretas na qualidade

de vida do sujeito.

O projeto de vida é um conceito que está intimamente relacionado com a construção do

ser humano, pois este como um ser histórico e social, internaliza as ferramentas

produzidas pela humanidade por meio dos sistemas simbólicos, e está em constante

movimento em todas as suas fases e mudanças. Esse processo de desenvolvimento do

ser humano ocorre em função de como o seu projeto de vida é construído, como chega a

existir, qual sua finalidade e como é finalizado, ao mesmo tempo em que está associado

aos modos culturalmente construídos de ordenar o real (Catão, 2007).

Falar sobre envelhecimento pode não ser tarefa tão simples quanto possa parecer. O ser

humano vivencia ao longo da vida, contínuos movimentos de desenvolvimento e

transformações, de si e do mundo. Este acúmulo de experiências dá-se através do

trabalho e de convivência social e são configuradoras no processo de envelhecimento,

no que se refere a possibilidades de ressignificação da vida (Félix & Catão, 2013).

Considerando a construção do projeto de vida e trabalho um fenômeno psicossócio-

histórico, pode-se supor, tomando por base trabalhos empíricos realizados (Catão 2001,

2007; Felix&Catão, 2013; Catão & Grisi, 2014), que este se configura como uma

organização multidimensional, que emerge em dimensões articuladas entre si: dimensão

sóciocognitiva, dimensão sócioafetiva e dimensão espaço-temporal, num movimento

entre passado, presente e futuro, em que o horizonte é o futuro na sua relação com o

passado na intenção de transformação do presente.

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A construção do Projeto de Vida e trabalho não se limita apenas às condições objetivas

de vida, mas é caracterizada na dialética entre a subjetividade e a objetividade, pois é

através da reflexão crítica de suas vivências que os indivíduos veem

possibilidade/impossibilidades de superação de uma determinada realidade no futuro. A

construção do projeto de vida é uma configuração humana do ser cidadão, sujeito de sua

história individual/social, uma criação analítica, crítica e articulada (Catão, 2007). São

diversas as significações do trabalho como configuração do projeto de vida: enquanto

atividade prazerosa de configuração de si e do cotidiano vivido, o indivíduo se realiza

como sujeito e ser social; humaniza-se, motiva-se, empenha-se. O trabalho faz o ser

humano idealizar e desejar que o resultado de sua atividade manifeste-se como

conhecimento concreto e em cooperação social, pois o ser humano se vê interagindo

com o meio e com o outro (Clot, 2006).

Emoção e Consciência

O ser humano sente, pensa, emociona-se a partir de conceitos, de significados - o que

caracteriza a base semântica da emoção e consciência, entretanto, o significado, não é só

uma questão semântica ou cultural, mas uma condição humana que implica os modos de

pensar e agir do ser humano. Une-se a ele as funções emoção e consciência de forma a

se proceder a análise da vida real do sujeito, resgatando-lhe a humanidade nas condições

de existência e construindo-se esse sujeito de significados, na relação com da realidade,

análise do vivido e perspetivas de projetos futuros.(Vygotsky, 2001, 2004)

Explica Vygotsky (2001), que tudo o que se sabe sobre o desenvolvimento psíquico

indica que aquilo que é verdadeiramente real está nas mudanças que ocorrem na

estrutura interfuncional da consciência. Já refletia o autor, nas décadas de 1920 e 1930,

sobre o problema que existia na interpretação da relação entre a consciência e a vida

real, quando escrevia: depois da consciência surge a vida, e indagava - como abrir

passagem para essa vida ou atividade prática! (Vygotsky, 2001). Fica evidente que, para

se analisar a estrutura da consciência não se deve começar pelo estudo de suas funções

isoladas, mas pelo estudo dos sistemas psicológicos. No livro Pensamento e Linguagem,

Vygotsky reflete que o pensamento não nasce de outro pensamento, mas da esfera

motivadora de nossa consciência - Por trás do pensamento, encontra-se a tendência

afetiva e volitiva. (2001).

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É neste movimento e na capacidade de ser afetado, que o ser humano se produz se faz e

se potencializa, na relação com outros seres humanos e com o mundo (Espinosa, 2005).

Nessa conceção, os afetos deixam de ser estáticos com sentido único e tornam-se

processos que se configuram continuamente, segundo os nexos sustentadores do sistema

psíquico e deste com a situação social e histórica, que são, por sua vez, mediadas pelos

nexos do sistema psicológico, são, pois, reveladores do implícito, do latente, do oculto,

do subtexto. (Sawaia, 2000, 2006, 2010).

É importante sinalizar o papel ativo do Ser Humano e da cultura: o Ser Humano

constitui cultura, ao mesmo tempo em que é por ela constituído, formando um todo

complexo com sustentação nos processos biológico. O biológico e o cultural

constituem-se mutuamente no desenvolvimento humano. Vale enfatizar que Vygotsky

afirmou a unidade dialética entre o desenvolvimento biológico e cultural, apresentam

particularidades na composição do seu entrelaçamento. (Vygotsky, 2004)

A consciência está unida à realidade material e influi sobre os órgãos dos sentidos que

transmitem as mensagens aceitas pelos canais nervosos ao córtex dos grandes

hemisférios cerebrais (Leontiev,1978; Luria,1990). O cérebro, por si só não pensa. A

atividade e a linguagem estão intimamente ligadas ao desenvolvimento desta

propriedade do cérebro humano, a consciência de refletir a realidade objetiva.

Hoje o ultimo limite a ser transposto pela ciência da vida é desvendar a mente e um dos

propósitos neste direcionamento, é estudar a conciliação entre emoção e consciência e o

papel central da emoção nas tomadas de decisão do ser humano e na racionalidade,

(Damásio, 2000, 2004, 2012, 2013). Observa o autor em epígrafe, que as emoções fundam

a maior das novidades, que estão na base da luta pelo avanço da ciência e que o seu estudo,

pelos tabus científicos, têm-se tornado virtualmente impossível até a atualidade. Verifica o

autor, a necessidade de se proceder um conjunto de ruturas epistemológicas, num

direcionamento do desenho dos limites da explicação biológica nos limites das ciências

sociais.

Neste direcionamento, estudar a emoção e consciência do vivido em contextos de exclusão,

se faz necessário indagar sobre sua genética biológica e social e o seu referencial axiológico

– o ser humano, a sua dignidade e os seus direitos básicos e inalienáveis com parte

integrante da biodiversidade e da sociedade plural. (Nunes, 2012, 2013). Estudar a emoção

e consciência do vivido urge estudar, o sujeito da emoção e da consciência e as condições

de constituição deste ser na sua humanidade.

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Método

Trata-se de uma pesquisa-intervenção que utiliza a metodologia SEOP (Serviço de

Escuta e Orientação Psicossocial). O referido estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética

em Pesquisa do Hospital Universitário Lauro Wanderley, parecer número 724 513/

2014. Participaram do estudo 31 idosos do sexo feminino, com idades entre 56 e 89

anos, em atendimento no Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos para

Pessoa Idosa.

Procedimentos de coleta de material

Foram realizadas escutas psicossociais com aplicação de entrevistas semiestruturadas e

questionários semiabertos para caracterização sociodemográfica, durante os plantões

semanais de escuta e de orientação psicossocial.

Procedimentos de análise do material- análise de conteúdo manual

Optou-se pela análise de conteúdo temática (Bardin, 1978; Catão, 2001) orientada pela

abordagem da Psicologia Sócio-Histórica, que enfoca a subjetividade como

intersubjetividade, entendida como sistema complexo de configuração permanente das

relações do todo e das partes, a fim de que a partir das narrativas dos sujeitos pudessem

ser construídas novas maneiras de pensar sobre o que foi dito, e consequentemente,

novas maneiras de ser e estar no mundo. O material foi organizado em corpus e

analisado de modo a separar-se em eixos temáticos, que vislumbraram os temas da

presente pesquisa. Foram consideradas as comunicações explícitas e implícitas dos

sujeitos nas entrevistas, a fim de fazer uma ampla interpretação dos conteúdos.

Resultados e Discussão

Os significados do envelhecimento e projeto de vida foram capturados, nas narrativas de

idosos em Serviços de Convivência, em cinco eixos temáticos: envelhecimento e visão

negativa de si; envelhecimento e visão positiva/negativa de si; dificuldade em elaborar

projeto de vida; trabalho e constituição do sujeito; concepção de envelhecimento e

aposentadoria , como podem ser observados na tabela 1.

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Tabela 1 – Distribuição dos eixos temáticos sobre o Envelhecimento e Projeto de

Vida por idosos em Serviços de Convivência

Eixos temáticos (f) %

Envelhecimento e visão negativa de si 91 26,3

Envelhecimento e visão positiva/negativa de si 63 18,2

Dificuldade em elaborar projeto de vida 87 25,1

Trabalho e constituição do sujeito 52 15,1

Concepção de envelhecimento e aposentadoria 53 15,3

Total 346 100

Envelhecimento e a configuração de si e do Projeto de Vida

É possível observar que as construções são feitas em torno do próprio processo de

envelhecimento e suas relações com a visão de si, projeto de vida e trabalho. Pode-se

inferir que os significados elaborados, configuram-se, por vezes, como uma barreira no

que se refere a expansão do sujeito, colocando-se como uma concepção incapacitante

do que a idade provoca no indivíduo, objetivando-se em situações de exclusão e/ou

dependência: “... tem muita barreira né? para o idoso, porque a gente já não faz mais

quase nada sozinho, aí tá sempre dependendo dos outros” (76 anos); “quando a gente

vai ficando velho, são três coisas que a gente vai notando: a visão vai ficando com

dificuldade, depois vem a audição e depois as pernas” (74 anos).

Aposentar-se, segundo o Dicionário de Aurélio Buarque de Holanda, significa estar fora

do sistema produtivo. Na concepção de cada um, pode significar algo bem mais amplo,

como estar fora da vida, já que a sociedade atual preza tanto pela produtividade (Bruns e

Abreu, 1997). Neste sentido, torna-se cada vez mais difícil ser idoso e ser lembrado, o

que gera este sentimento de angústia, solidão paralelo a menor valoração do presente em

comparação ao passado, sendo este último sempre visto como mais vantajoso.

Neste eixo, verifica-se a dificuldade dos participantes, capturada nas narrativas, em ter

um projeto de vida como configuração de si , assim como a dificuldade de ter tal

propósito: “não vou mais planejar nada, eu só planejei até os 50, depois disso, a Deus

pertence! eu vou tá correndo atrás de que mais?” (56 anos); “não, não, não, mais não.

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ficar, ficar só esperando Deus chamar” (65 anos); “eu só penso em ter saúde pra poder

viver mais” (76 anos); “Meu Deus, porque eu tinha que vir ao mundo e num fazer nada

do que eu gostaria de fazer e de ser?” (69 anos); “ah, e eu tô tão velhinha pra pensar

num projeto, acho que já cumpri minha missão, tenho projeto mais não” (78 anos).

Observa-se uma dificuldade em perceber-se como um ser ativo na construção do vivido.

Captura-se uma desarticulação do projeto de vida e a construção do ser humano, como

se o projeto tivesse que obrigatoriamente parar de acompanhar o sujeito em determinada

fase da vida, ficar no passado, como uma lembrança de algo que foi ou não

conquistado. Sobre isto, já disse Catão (2001) que a construção do projeto de vida

direciona-se em função do sistema do viver criativo ou do viver submisso, o que está

diretamente relacionado à configuração da exclusão/inclusão social. A forma como se

relaciona com o ambiente externo e a forma que este ambiente se coloca para ele, em

nível de condições oferecidas. No caso dos idosos participantes do estudo, verifica-se

que estes sujeitos adotam uma referência de submissão em função do envelhecimento.

Na narrativa “atualmente mesmo eu não tenho projeto de vida, uma vez já tive pra botar

um negócio, pra trabalhar de novo... minha irmã queria arrumar um trabalho pra mim

numa creche, mas minha filha não quer que eu trabalhe mais, porque ela disse que eu já

sofri demais” (69 anos). A entrevistada aparentemente demonstra não ter mais

motivação para trabalhar, no entanto não fica claro até onde essa falta de motivação seja

alimentada pela expressão da filha de que sua mãe não trabalhe mais, ou parte dela

mesma.

As questões relacionadas às mudanças físicas e orgânicas também são trazidas pelas

participantes. Nota-se, em suas falas, um sentimento de limitação e de perdas contínuas.

Essas formas de pensar e sentir o envelhecimento limita os sujeitos no seu dia-a-dia, nas

suas relações familiares, no trabalho e principalmente no que se refere à saúde, já que se

sentem limitados e indispostos, levando-os a uma potência de padecimento.

Por outro lado alguns sujeitos, diante desse sentimento buscam formas de reorganização

de si e da vida, através da reflexão e indagação sobre o vivido, desenvolvem maneiras

de se reverem diante desses sentimentos: “Gostaria de ser mais magra, mas como na

idade a gente fica um pouco assim, porque a gente quando era mais jovem o nosso

físico era um e agora depois da idade tudo muda”. (72 anos). “Eu vou melhorar porque

eu faço atividade física e a tendência de quem faz atividade é melhorar” (72 anos); “

tenho melhorado bastante, com os medicamentos que tomo e com o acompanhamento

psicológico, se não fosse isso, eu não sei se estaria aqui”. (68 anos).

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Desta forma ao se fazer emergir no ser humano a capacidade de refletir sobre o

cotidiano, de forma a expressar os afetos e significados que constrói acerca de si e da

vida, pode capturar-se o sujeito e seu sistema psicológico pela sua ação no mundo,

pelas potências de padecimento / ação vivenciadas na relação consigo, com o mundo e

com os problemas sociais para a sua transformação. É neste movimento e na capacidade

de ser afetado, que o ser humano se produz, se faz e se potencializa, na relação com

outros seres humanos e com o mundo. Nessa concepção, os afetos deixam de ser

estáticos com sentido único e tornam-se processos que se configuram continuamente,

segundo os nexos sustentadores do sistema psíquico e deste com a situação social e

histórica, que são por sua vez mediadas pelos nexos do sistema psicológico, são pois,

reveladores do implícito, do latente, do oculto, do subtexto (Sawaia, 2000).

Verifica-se que os idosos, não se percebem como sujeitos ativos, na construção do

protagonismo de sua história de vida. Observa-se ainda, possibilidades/

impossibilidades de reflexões norteadoras de projetos de vida que respaldem a

concepção de envelhecimento ativo em cada sujeito. O sentir e o pensar neste

direcionamento, configuram-se como provocadores do exercício do sentido ativo do

corpo e da mente.

Foi possivel pelas narrativas e reflexões dos idosos, conhecer suas histórias, capturar os

significados do vivido, analisar sua genese, bem como identificar seus padecimentos e

felicidade. O referido estudo, propiciou também, conhecer o trabalho dos Serviços de

Convivência e Fortalecimento de Vínculos, fundamentado como política pública para o

desenvolvimento físico, mental e social do idoso, com o objetivo de criar condições

para um maior empoderamento dos sujeitos em processo de envelheciment, na

construção de suas vidas.

Referências

Bardin, L. (1978). Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70.

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200

200

APRESENTAÇÃO E DIVULGAÇÃO DA PRIMEIRA PLATAFORMA

DIGITAL PARA CUIDADORES INFORMAIS EM PORTUGAL

José Bruno Alves &Ana Ribas Teixeira,

Doutorandos em Medicina Preventiva e de Saúde Pública, Universidade de Santiago de

Compostela. Espanha

Resumo

A presente comunicação tem como intuito apresentar a primeira plataforma digital para os

cuidadores informais em Portugal e a primeira plataforma plurilinguística da Europa,

desenvolvida no âmbito de um projecto europeu com 27 países. Pretende-se que através do

acesso à informação, a partilha de experiências e boas práticas se promova o sentido de controlo

e de auto eficácia dos cuidadores informais a diversos domínios e minimizar os efeitos

secundários da sobrecarga associada ao cuidar. A promoção da qualidade de vida dos

cuidadores informais resultam em benefícios para o Estado e sistemas sociais e de saúde, mas

sobretudo evitam a institucionalização dos sujeitos beneficiários dos cuidados. Esta plataforma

plurilinguística reúne exemplos de boas práticas em toda a Europa e fomenta no futuro uma

maior proximidade com os profissionais de saúde e os cuidadores, bem como a partilha de

experiências e apoio entre pares. Novas metodologias de intervenção biopsicossocial e de

âmbito da inovação social são prementes para a promoção de um envelhecimento ativo.

Palavras-chave: Plataforma plurilinguística, cuidadores, inovação social, Europa

Abstract

This Communication has the intention to present the first digital platform for informal carers in

Portugal and the first plurilinguistic platform in Europe, developed under a European project

with 27 countries. It is intended that through access to information, sharing of experiences and

good practices promote a sense of control and self efficacy of informal caregivers to several

areas and minimize the side effects of the burden associated with caregiving. Promoting quality

of life of informal caregivers result in benefits to the state and social and health systems, but

above all avoid institutionalization of individuals beneficiaries of care. This plurilinguistic

platform brings together examples of good practice across Europe and fosters the future a closer

relationship with health professionals and caregivers, as well as the sharing of experiences and

peer support. New methods of biopsychosocial intervention and scope of social innovation are

pressing for the promotion of an active aging.

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Texto da comunicação

As mudanças demográficas da Europa nos últimos anos, conduzem a uma incidência crescente

de doenças relacionadas com a idade, uma crescente procura por cuidados, constituindo um

verdadeiro desafio para a sustentabilidade dos sistemas sociais e de saúde. Cerca de 80% dos

cuidados na Europa são prestados por familiares e amigos, existindo mais de 100 milhões de

prestadores de cuidados na Europa. Estima-se em 142 biliões anuais o valor do seu trabalho no

Reino Unido.

O contributo desses cuidadores informais constitui claramente um grande recurso para a

sociedade, mesmo que o seu papel nem sempre seja reconhecido. Cumprindo uma vasta gama

de serviços de apoio, tais como cuidados pessoais, tarefas domésticas, transporte, cuidados e

gestão financeira, bem como o apoio emocional; os cuidadores, muitas vezes oferecem a opção

mais abrangente e desejável para as pessoas que necessitam de cuidados.

A plataforma digital InformCare, promovida em articulação com a Cuidadores Portugal e a rede

europeia de cuidadores, fornece aos cuidadores informais de 27 Estados-membros da EU, as

principais informações sobre os seus direitos, bem como conselhos sobre a melhor forma de

prestar e lidar com suas atividades de cuidado. Cuidadores profissionais e empregadores podem

também aceder a informações sobre a melhor forma de prestar cuidados e atender às suas

necessidades. A plataforma igualmente oferece uma variedade de ferramentas de comunicação

interactivas a desenvolver no futuro (tais como uma rede social, um fórum e um chat) para

permitir que os prestadores de cuidados possam interagir, compartilhar conselhos, procurar

ideias e sugestões, pedir ajuda, apoiar os outros ou apenas ter alguém com quem conversar e que

realmente entende o que é ser um cuidador significa!

Mais informações sobre o projeto Innovage:

O projeto Innovage visa desenvolver e pesquisar inovações sociais com potencial impacto na

qualidade de vida das pessoas idosas.

O projeto tem quatro objetivos específicos:

1. Desenvolver, implementar e avaliar inovações sociais focados na: inovação social,

bemestar e qualidade de vida, e vida saudável.

2. Criar uma nova marca da inovação social através de uma plataforma digital baseada na

web, em que se consideraram as principais inovações de diversos países e avaliadas de acordo

com o seu potencial real para contribuir para prolongar a expectativa de vida saudável.

3. Avaliar possíveis barreiras à implementação de inovações sociais neste domínio, com

base na pesquisa e experiência no âmbito da inovação social e na exploração de tecnologias

recentes para abordar necessidades de uma forma otimizada dos potenciais usuários.

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4. Enfatizar o intercâmbio de conhecimento, para a implementação de soluções

tecnológicas especialmente a nível dos novos Estados-Membros, especialmente os da Europa

Central e Oriental.

Pretende-se com esta apresentação dar a conhecer as potencialidades desta plataforma e os

diferentes domínios de informação acessível aos utilizadores, fazendo uma visita virtual às

páginas da plataforma em www.cuidadoresportugal.pt e, dar a possibilidade dos presentes

conhecer melhor este site, com a presente comunicação.

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ENVELHECIMENTO NA DEFICIÊNCIA OU INCAPACIDADE: ESTUDO

COM LESIONADOS VERTEBROMEDULARES E SEUS CUIDADORES

INFORMAIS

Ana Ribas Teixeira & José Bruno Alves,

Doutorandos em Medicina Preventiva e de Saúde Pública, Universidade de Santiago de

Compostela. Espanha

Resumo

O presente estudo pretende contribuir para uma melhor compreensão do processo de

envelhecimento dos sujeitos com lesão vertebro-medular traumática e dos seus cuidadores

informais (CI) em Portugal.

Este estudo decorreu em colaboração com instituições, centros de reabilitação e associações de

solidariedade social. Participaram 168 sujeitos com LVM e 160 CI. Reconhecendo o coping

como um dos mediadores do processo de ajustamento e, a sobrecarga, a sintomatologia ansiosa

e depressiva e a qualidade de vida (QV) enquanto indicadores de eficácia desse processo, optou-

se pelo estudo destas variáveis.

Os instrumentos utilizados foram o brief COPE (Coping Orientations to Problems Experienced

Scale), o QASCI (Questionário de Avaliação de Sobrecarga do Cuidador Informal), o HADS

(Hospital Anxiety and depression Scale), e o WHOQOL (World Health Organization Quality of

Life).

Os resultados deste estudo identificam os sujeitos com LVM e os seus CI com 60 ou mais anos

de idade como os que recorrem mais à estratégia negação. Os dados, de igual modo, sugerem

que sobrecarga do CI aumenta com a sua idade.

A nível da morbilidade psicológica verifica-se a dependência da ansiedade em relação à idade

dos sujeitos com LVM. Apresentando os CI, com 60 ou mais anos de idade, um índice de

distress emocional para a sintomatologia ansiosa de 11,57 e de 10,12 para a sintomatologia

depressiva. Verificando-se também que a QV diminui com a idade quer nos sujeitos com LVM

como dos seus CI.

No contexto psicoterapêutico e no âmbito da reabilitação salienta-se a importância do papel dos

profissionais de saúde investirem em programas de psicoeducação, e suporte promotores de um

envelhecimento ativo, que favoreçam a adaptação psicológica à LVM, a conciliação e

continuidade dos cuidados informais prestados a este sujeitos.

Palavras-chave: Lesão medular traumática, cuidadores, ajustamento psicológico e

envelhecimento

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Abstract

This study aims to contribute to a better understanding of the aging process of patients

with traumatic spinal cord injury and their informal caregivers (IC) in Portugal.

This study took place in collaboration with institutions, rehabilitation centres and

charitable associations, having participated 168 patients with SCI and 160 and IC.

Recognizing the coping as one of the mediators of the adjustment process, and the

overload, anxiety and depression symptoms and quality of life (QOL) as indicators of

effectiveness of this process, we opted for the study of these variables.

The instruments used were the brief COPE (Coping Orientations to Problems

Experienced

Scale), the QASCI (Informal Caregiver Overload Assessment Questionnaire), the

HADS (Hospital Anxiety and Depression Scale) and the WHOQOL (World Health

Organization Quality of Life).

The results of this study identify patients with SCI and its IC´s having over 60 years of

age as those who rely more on denial strategy. The data likewise suggest that IC´s

overload increases with the age.

At the level of psychological morbidity there is the dependence of anxiety about the age

of the patients with SCI. The IC with 60 or more years old, present an emotional

distress index for anxiety symptoms of 11.57 and 10.12 for depressive symptoms. The

QOL also declines with age, both in patients with SCI as their IC.

In the psychotherapeutic context and in the context of rehabilitation, we highlight the

important role of health professionals when investing in psychoeducation programs, and

support promoters of active aging, facilitating the psychological adaptation to SCI,

conciliation and continuity of informal care provided to these people.

Keywords: spinal cord injury, caregivers, psychological adjustment and aging

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Texto da comunicação

Introdução

A LVM é uma das condições mais graves e devastadoras, que podem afetar a vida de

um indivíduo (Agrawal & Britz, 2015; Helda & Lane, 2014; van Leeuwen, Kraaijeveld,

Lindeman, & Post, 2012), com inúmeras repercussões físicas, psicológicas e sociais

(Schilero et al., 2014).

A nível mundial, estima-se que a lesão vertebro-medular traumática (LVM) afete, todos

os anos, entre 250 000 a 500 000 pessoas (WHO,2013).

As necessidades de tratamento ao longo da vida, os custos associados ao cuidado, a

perda ou diminuição do rendimento e a dificuldade de ingresso e retorno à vida

profissional ativa conduzem a problemas psicológicos e sociais que afetam as

economias dos países, apresentando desafios, quer para os sujeitos com LVM, quer para

as suas famílias (Yilmaz, Turan, & Keles, 2014).

Se, por um lado, a LVM é incurável (Scholtes, Brook, & Martin, 2012) e o seu

tratamento é limitado à minimização das complicações secundárias e à maximização da

função residual pela reabilitação (Ramer, Ramer, & Bradbuy, 2014), os avanços da

investigação científica incutem esperança na cura futura da LVM.

Não obstante, à melhoria do prognóstico dos sujeitos com LVM, resultante dos avanços

médicos e tecnológicos, a LVM continua a lançar desafios a nível dos cuidados de

saúde e sociais (Iremashvili, Brackett, & Lynne, 2012), sendo de salientar o seu

contributo na redução dos significativos níveis de morbilidade e mortalidade (Yilmaz et

al., 2014).

Por outro lado, e apesar da LVM apresentar uma reduzida incidência, os custos

associados ao cuidado do sujeito com LVM permanecem muito elevados (WHO, 2013).

Nos EUA, representam em termos de encargos financeiros, para o estado, cerca de 4

biliões de dólares todos os anos (Iremashvili et al., 2012). De acordo com os dados do

National Spinal Cord Injury Statistical Center (2015), a média das despesas no primeiro

ano após a lesão de um paciente com tetraplegia (c1-c4) chega a atingir 1,064,716

dólares no primeiro ano e 184,891 dólares nos anos subsequentes. Para um paciente

com paraplegia são gastos, no primeiro ano, 518,904 dólares e cerca de 68,739 dólares

nos anos seguintes, sendo que o custo estimado até ao fim de vida de um sujeito com

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LVM possa variar em função da sua idade aquando do momento da lesão em cerca de

1,516,052 e 4,724,181 dólares e de acordo com a severidade da lesão (NSCISC, 2015).

Os custos pessoais são incalculáveis (Suarez, Levi, & Bullington, 2013).

Acresce referir que os custos com LVM são mais elevados relativamente a sujeitos com

quadros de demência, de paralisia cerebral e com esclerose (WHO, 2013).

Por outro lado, as limitações de atividade e a restrição da participação nas atividades

instrumentais e de vida diárias, as dificuldades de emprego, a manutenção dos cuidados

de saúde e de reabilitação dos sujeitos com LVM mobilizam a participação dos CI.

A disponibilidade de apoio emocional e de apoio para a resolução de problemas são

importantes factores na satisfação dos sujeitos com LVM (Whiteneck et al., 2004) e

estão associados ao tipo e magnitude de apoio dado pelos seus CI, família e amigos

(Pearcey, Yoshida, & Renwick, 2007).

Os CI têm também um papel activo na promoção da saúde, gestão, prevenção de

complicações secundárias, que tanto podem comprometer a qualidade de vida do sujeito

com LVM como do seu CI (Sezer et al., 2015). Algumas decisões terapêuticas são feitas

com os CI, como por exemplo, a disponibilidade em realizar cateterismo vesical

intermitente, ao sujeito com LVM tetraplégico; pela sua capacidade em prevenir e gerir

as complicações secundárias, evitando a institucionalização destes sujeitos.

Cuidar de uma pessoa com algum nível de dependência exige lidar com uma

diversidade de esforços, tensões e tarefas que com frequência superam as reais

possibilidades do cuidador, com reflexos não só individuais, como também aos mais

diversos níveis da sua vida. Se, numa fase inicial, o esforço que irá ser exigido não é

plenamente percebido, a continuidade do desempenho do seu papel poderá conduzi-lo à

exaustão (Fernandes, Pereira, Ferreira, Machado & Martins, 2002) e esse papel recai,

maioritariamente, sobre uma única pessoa (Mateo et al., 2000). Toda a situação de

doença é sempre uma situação de crise, um evento stressor com efeitos no doente e na

família (Martins, Pais-Ribeiro & Garrett, 2003).

Os cuidadores tendem, frequentemente, a subestimar a duração e a magnitude do seu

trabalho (Davis, Gilliss, Deshefy-Longhi, Chestnutt, & Molloy, 2011), podendo resultar

dessa entrega custos pessoais (Navaie-Waliser et al., 2002) a nível físico, psicológico,

social e económico. Estes factores podem impossibilitar o cuidador de cumprir com o

seu papel e podem afectar a continuidade da prestação do cuidado, bem como a

qualidade de vida da pessoa que recebe os seus cuidados.

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O acréscimo de responsabilidades e exigências inerentes ao cuidar e a ausência de

recursos; a deslocação das suas necessidades e desejos para segundo plano (Kalra,

Kamath, Trivedi, & Janca, 2008) contribuem para uma situação de sobrecarga do

cuidador.

O coping tem sido descrito como um factor que facilita o ajustamento individual e a

adaptação, tornando-se num foco de interesse crescente, nos estudos acerca da

adaptação dos seres humanos a situações geradoras de stress (Holahan & Moos, 1987).

Lazarus e Folkman (1984) definem coping como os esforços cognitivos e

comportamentais, em constante mudança, orientados para responder a exigências

específicas, externas e/ou internas, que são avaliadas como excedendo os recursos

pessoais. De acordo com estes autores, numa situação avaliada pelo indivíduo – agente

ativo – como sendo geradora de stress, faz com que este adopte estratégias para

diminuir o efeito do stressor.

Considera-se o coping, uma variável intermédia entre um acontecimento e os resultados,

ou consequências desses acontecimentos, pelo que importa ser estudada, pois

desempenha um papel fundamental para o ajustamento e adaptação (Pais-Ribeiro &

Rodrigues, 2004).

Objectivos e enquadramento do estudo no estado da arte

A relação entre a espinal medula e o seu controlo sobre outros sistemas de órgãos

tornam a gestão da LVM complexa (Lo, Esquenazi, Han, & Lee, 2013). A lesão LVM é

das condições mais graves e devastadoras, que podem afectar a vida de uma pessoa

(Agrawal & Britz, 2015; Helda & Lane, 2014; van Leeuwen et al., 2012), com inúmeras

repercussões físicas, psicológicas e sociais (Schilero et al., 2014) e com particularidades

próprias que as tornam única e distintas das outras condições.

A sua reduzida incidência, a ausência de sistemas de informação plenamente funcionais

ou operacionais, a falta de estudos e dados estatísticos actualizados de saúde sobre os

sujeitos com LVM em Portugal torna difícil o conhecimento desta realidade e, o acesso

mais dificultado aos seus CI; podendo mesmo, estes factores contribuir para um maior

investimento do estudo do impacto do cuidar noutras condições.

Numa perspectiva biopsicossocial a incapacidade é resultado da interacção da condição

de saúde e do meio ambiente, no qual, particularmente, os cuidadores demonstram ter

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um papel crucial no nível de funcionalidade destes sujeitos e no processo complexo da

reabilitação. Neste contexto torna-se de especial importância estudar as implicações

inerentes não só decorrentes da deficiência mas também do próprio envelhecimento dos

sujeitos com LVM e seus CI (Leonardi et al., 2012; Leonardi et al., 2006).

Constituem objectivos deste trabalho avaliar que estratégias de coping são mais

utilizadas; a incidência do distress emocional, a sobrecarga e qualidade de vida geral em

ambas as amostras: sujeitos com LVM e CI.

Metodologia

O presente estudo foi realizado a nível nacional entre 2012 e 2013. No sentido de se

obter uma amostra o mais heterogénea e representativa possível da população em

estudo, contactaram-se os principais centros de reabilitação em Portugal à data da

colheita da amostra, em particular, o Centro de Medicina de Reabilitação do Sul; o

Centro de Medicina de Reabilitação da Região Centro - Rovisco Pais e o Centro de

Medicina da Reabilitação de

Alcoitão (Fontes & Martins, 2015). Contactou-se também o Centro Hospitalar do Porto

– Hospital Geral de Santo António, E.P.E e ao Hospital da Prelada, pois o âmbito destas

entidades integra igualmente a especialidade de fisiatria.

Seguindo todas as disposições éticas da declaração de Helsínquia, todos os sujeitos que

acederam participar foram informados quanto aos objectivos, à finalidade do estudo, às

entidades e instituições envolvidas, à participação voluntária, à possibilidade de

desistência a qualquer momento sem qualquer consequência.

Participaram neste estudo indivíduos, voluntários, que cumpriam os seguintes critérios

de inclusão:

Ser um sujeito com LVM traumática com um ano ou mais tempo de lesão (período em

que se considera existir uma certa estabilidade adaptativa e reintegrativa) (Cardoso,

2006);

Definiram-se como critérios de exclusão:

Não possuir um nível de literacia que lhe permita compreender correctamente os

instrumentos de colheita utilizados;

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Idade inferior a 18 anos;

Os sujeitos com LVM apresentam limitações físicas ou mentais decorrentes de outras

condições de saúde graves.

Relativamente aos CI dos sujeitos com LVM definiram-se como critérios de

inclusão:

Ser CI de um sujeito com LVM traumática com um ano ou mais tempo de lesão

Ser o principal responsável pela prestação de cuidados a um sujeito com LVM

traumática, familiar ou amigo;

Os instrumentos utilizados foram os seguintes:

Brief COPE(Carver, 1997; Pais-Ribeiro & Rodrigues, 2004)

O Brief COPE (cf. Anexo VII) foi desenvolvido visto as medidas existentes, em

particular o COPE, colocarem uma grande sobrecarga nos participantes, nomeadamente,

no que se refere ao tempo necessário para responder. Esta versão contém 28 itens em 14

escalas, com dois itens por escala e serve o propósito do presente estudo de avaliar as

estratégias de coping utilizadas pelos CI. As opções de resposta seguem uma escala

ordinal com quatro alternativas de resposta (de 0 a 3), entre “nunca faço isto” até “faço

sempre isto”. A cotação é feita pela soma de 2 itens cada subescala, havendo assim uma

diferenciação das estratégias de coping de acordo com a sua utilização. O valor de cada

estratégia varia de 0 a 6, onde um valor mais elevado indica uma maior utilização

(Carver, 1997; Pais-Ribeiro & Rodrigues, 2004; PaisRibeiro, 2007b).

- QASCI – Questionário de Avaliação da Sobrecarga do CI (Martins et al., 2003).

O objectivo do QASCI consiste em avaliar a sobrecarga física, emocional e social dos

CI, ou seja, a perturbação resultante de lidar com a dependência física e a incapacidade

mental do indivíduo foco da atenção dos cuidados. Este instrumento inclui 32 itens

avaliados por uma escala ordinal de frequência que varia de 1 a 5 e integra 7 dimensões

que Martins et al. (2003) definem: - Implicações na vida pessoal do cuidador (11 itens),

- Satisfação com o papel e com o familiar (5 itens); - Reações às exigências (5 itens); -

Sobrecarga emocional relativa ao familiar (4 itens); - Suporte Familiar (2 itens); -

Sobrecarga Financeira (2 itens); - Percepção dos mecanismos de eficácia e de controlo

(3 itens).

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- HADS – Hospital Anxiety and Depression Scale(Pais-Ribeiro, 2007b; Zigmond &

Snaith, 1983).

O HADS foi desenvolvida por Zigmond e Snaith (1983), com o objetivo de avaliar de

uma forma válida, fiel e prática sintomas de ansiedade e depressão. É uma escala de

auto administração que demora cerca de 10m a ser preenchida; constituída por 14 itens

que se dividem em duas sub-escalas: ansiedade (7 itens) e depressão (7 itens). A forma

de resposta dos 14 itens da escala varia entre zero (0-baixo) a três (3-elevado), numa

escala de Likert de 4 pontos. As duas escalas são classificadas separadamente. A

cotação do HADS é feita do seguinte modo: valores entre 0 e 7 – “normal”; 8 e 10 –

“leve”; 11 e 14 – “moderada”; 15 e 21 – “grave”. (Zigmond & Snaith, 1983, Pais-

Ribeiro et al., 2007).

WHOQOL -100 - Instrumento de Avaliação da Qualidade de Vida da Organização

Mundial de Saúde (Canavarro et al., 2010).

O WHOQOL -100 Esta medida subjectiva e multidimensional destinada à avaliação da

QdV está actualmente disponível em 40 idiomas. Foi validada para Português de

Portugal seguindo todas a etapas estabelecidas pela OMS, no protocolo internacional de

validação do instrumento (Canavarro et al., 2006; Canavarro et al., 2009). A versão em

Português do WHOQOL-100 apresenta uma consistência interna que varia entre 0,84-

0,94 e confiabilidade teste-reteste em todos os domínios (0,67-0,86). A validade

discriminante foi significativa para todos os domínios, excepto na espiritualidade. O

WHOQOL apresentou boas características psicométricas, sugerindo que a versão em

Português do WHOQOL é válida e confiável para a avaliação da QdV em Portugal

(Canavarro et al., 2006; Canavarro et al., 2009). É caracterizado por uma forte solidez

psicométrica em diferentes culturas, sendo actualmente dos instrumentos mais

utilizados para avaliar QdV em estudos de investigação (Canavarro, Pereira, Moreira, &

Paredes, 2010).

-WHOQOL-Bref – Instrumento de Avaliação da Qualidade de Vida da

Organização Mundial de Saúde – versão reduzida (Canavarro et al., 2010).

O WHOQOL-Bref constitui a versão abreviada do instrumento de avaliação da QV da

Organização Mundial de Saúde (WHOQOL Group, 1998), tendo a necessidade de se

dispor de um instrumento de avaliação de QV, que fosse mais fácil de se aplicar e cujo

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preenchimento ocupasse portanto menos tempo, os motivos que impulsionaram a

construção deste instrumento.

Os estudos psicométricos deste instrumento de avaliação da QV da OMS (WHOQOL-

Bref) para Português de Portugal conduzidos por Vaz-Serra et al. (2006), revelam que

este instrumento apresenta boas características psicométricas de fiabilidade temporal,

validade de constructo e validade discriminante, pelo que o tornam num bom

instrumento para avaliar a QV da presente amostra. Dadas as características

transculturais deste instrumento, é possível ainda de ser utilizado em estudos

comparativos de populações entre diferentes países.

Este instrumento é constituído por 26 perguntas, sendo duas mais gerais, referentes à

percepção geral de QV e à percepção geral de saúde, e as restantes 24 representam cada

uma das 24 facetas específicas que constituem o instrumento original. Desta forma,

enquanto na versão longa WHOQOL-100 da OMS cada uma das facetas é avaliada por

4 perguntas, no WHOQOL-Bref cada uma das 24 facetas é avaliada por apenas uma

pergunta, pelo que, neste sentido conserva as 24 facetas do WHOQOL-100, mantendo a

essência multidimensional e subjectiva inerente ao conceito de QV. Estas facetas

organizam-se no WOQOL-Bref em 4 domínios: físico, psicológico, relações sociais e

meio ambiente.

Neste instrumento os valores de cada domínio são calculados e podem variar entre 0 e o

máximo de 100. Os valores são ponderados numa escala positiva, ou seja, quanto mais

alto o valor, melhor a QV nesse domínio (Canavarro et al., 2010).

Resultados e Discussão

Cento e sessenta e oito sujeitos vítimas de LVM traumática constituem esta amostra não

probabilística de conveniência, onde 75,60% dos participantes são do sexo masculino e

24,40% do sexo feminino. O predomínio de homens é uma constante em todos os

estudos empíricos, nacionais e internacionais, o que vai de encontro aos dados

epidemiológicos da população (Cardoso, 2006; Bickenbach, et al., 2013; NSICSC,

2015; Rodríguez, 2014; Singh, et al., 2014).

A média de idade aquando do momento da lesão (30,10 anos) demonstra que estamos

perante uma população que é vítima de LVM traumática, numa idade muito jovem, em

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consonância com o que acontece em outros estudos nacionais e internacionais (Cardoso

2006; Ruiz & Aguado-Díaz, 2003, Singh et al., 2014).

Actualmente, na maioria das regiões e países do mundo, os 30 anos de idade aparecem

associados ao pico de incidência de sujeitos vítimas de um traumatismo desta natureza.

No entanto, é importante considerar novas tendências, devido ao crescente

envelhecimento da população, o traumatismo secundário às quedas podem tornar-se um

crescente problema de saúde pública, e a incidência entre os idosos pode aumentar com

o aumento da esperança de vida (Singh et al., 2014).

Os CI apresentam uma idade média de 50 anos, são na sua maioria do sexo feminino e

apenas 16,88% são do sexo masculino, indo de encontro à ideia do papel da mulher na

nossa sociedade se associa ao de cuidadora e à realidade retratada noutros estudos (Ma,

Lu, Xiong, Yao & Yang, 2014). Estes sujeitos são na sua maioria casados e com baixas

habilitações académicas, com mais de 70% dos CI a não concluir o nível de estudos do

ensino secundário e só 13% com o ensino superior.

O abandono temporário ou definitivo do emprego pode ter implicações para o CI.

Gómez, Ferrer, Rigla e López (2006) salientam que as dificuldades financeiras têm

impacto não só na economia familiar, como na diminuição da auto-estima e realização

pessoal.

A natureza da relação do CI ao sujeito com LVM é na sua maioria de natureza conjugal,

seguindo-se os filhos, os progenitores, irmãos, amigos e outros familiares; o papel de

cuidador principal recaí sobretudo sobre um elemento da família mais próximo e

podendo de facto ser assumido com menor frequência por CI sem laços de sangue,

designadamente por amigos (Braithwaite, 2000), indo de encontro com a meta análise

de López e Martinez (2007) que sugerem existir expectativas culturais e sociais sobre

quem assume o papel de cuidador.

No que se refere ao número de horas que dedicam no cuidar, pouco mais de um terço

presta menos de quinze horas e com a maioria dos CI a prestar mais de trinta horas

semanais, o que revela a singularidade da LVM, que pode resultar em níveis distintos de

dependência ou incapacidade (WHO, 2013).

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Estratégias de Coping

No sentido de perceber quais as respostas cognitivas e comportamentais que fazem

parte do processo de adaptação à LVM traumática. Procuramos conhecer quais as

estratégias de coping mais utilizadas pelos sujeitos com LVM traumática e seus CI. A

análise realizada às

diferentes escalas do brief COPE permite aferir que as estratégias mais utilizadas pelos

sujeitos vítimas LVM traumática são o coping activo (M=4,59; DP= 1,29), a aceitação

(M=4,57; DP= 1,28) e o planear (M=4,48; DP=1,32) por outro lado, as menos utilizadas

são o uso de substância (M=0,32; DP=0,98) e desinvestimento comportamental

(M=1,11; DP=1,44). Por outro lado, CI recorrem com mais frequência à estratégia

aceitação (M=4,46;

DP=1,18) e com menos frequência ao uso de substâncias (M=0,83; DP=1,20)

Para o sujeito com LVM, com o aumento da idade, aumenta também o recurso à

estratégia negação e diminui o recurso as estratégias reinterpretação positiva, aceitação,

autodistracção e o humor. Os CI dos sujeitos com LVM, com 60 ou mais anos de idade,

são os que mais utilizam a estratégia da negação.

A pessoa com uma média de 70 anos tem aproximadamente 50% de sua capacidade

remanescente em cada sistema de órgãos, o que não significa necessariamente um

impacto negativo sobre a saúde ou o funcionamento. Quando a capacidade de reserva

diminui abaixo de 40% do funcionamento original, há uma maior probabilidade de ser

vítima de uma acidente, e/ou estar mais susceptíveis à infecção ou doença (Adkins,

2004). Com a ocorrência de um LVM, as alterações fisiológicas e funcionais aceleraram

potencialmente a diminuição dessa capacidade para um período de tempo, após o qual o

efeito de envelhecimento é pensado para prosseguir a uma velocidade normal (Adkins,

2004). No entanto, o envelhecimento prematuro parece ocorrer em alguns sistemas após

LMV (Kemp & Thompson 2001, Adkins, 2004).

Estudos longitudinais adicionais são necessários para confirmar estes factos,

acreditamos no entanto que as incapacidades que podem advir com o processo de

envelhecimento podem acrescentar dificuldades e originar mais situações de stress,

levando os sujeitos a ter mais dificuldades em gerir a sua condição e a recorrer a

estratégias menos activas e consequentemente menos eficazes no processo de

adaptação.

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As incapacidades que podem advir de um processo normal de envelhecimento, podem,

simultaneamente, acrescentar mais dificuldades aos lesionados medulares e aos seus CI,

nomeadamente, diminuição dos recursos físicos, e originar mais situações potenciadoras

de stress. Tal requer ainda maior esforço de adaptação, levando os sujeitos a sentir mais

dificuldades em gerir a sua condição e, consequentemente, a recorrer a estratégias mais

passivas e disfuncionais como a negação.

Sobrecarga do CI

Os CI dos sujeitos com LVM apresentam níveis moderados de sobrecarga (M=30,32)

com maior expressividade a nível da sobrecarga financeira (M=48,05; DP=35,09),

implicações na vida pessoal (M=39,25; DP=25,35) e sobrecarga emocional

(M=28,87; DP=25,18).

A comparação dos níveis de sobrecarga com outros estudos no contexto da LVM torna-

se uma tarefa particularmente difícil, devido a questões metodológicas; sobretudo

relacionadas com a diversidade de instrumentos utilizados para avaliar a sobrecarga, o

tamanho da amostra e os fatores culturais, étnicos e sociais distintos.

Estes resultados apoiam a conceção do cuidar enquanto fenómeno contributivo de

sobrecarga e, com expressividade multifatorial em particular, nos domínios financeiros

(associado às dificuldades económicas e à incerteza relativamente ao futuro), na vida

pessoal (associado às repercussões negativas, como a diminuição do tempo disponível,

restrições na vida social e alterações na saúde) e a nível emocional (capaz de

desencadear conflitos internos e sentimentos de fuga, cansaço e esgotamento) (Martins

et al., 2003).

Os dados também sugerem que as limitações físicas inerentes à idade e o processo de

envelhecimento associado contribuem para a redução dos mecanismos de eficácia e de

controlo da situação, e aumentem a percepção das implicações do cuidar na vida pessoal

dos CI com mais idade, traduzindo-se numa maior sobrecarga.

Sintomatologia Ansiosa e Depressiva

A prevalência de sujeitos com sintomatologia clínica significativa será de 73.81% para a

ansiedade e 71,44% para a depressão, considerando os sujeitos com LVM que

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apresentam uma pontuação do HADS igual ou superior a 8, valor considerado como

ponto de corte para a categoria de “sintomatologia leve”. Para os CI essa percentagem

atinge para a ansiedade os 81,88% e para a depressão 69,38%.

As pessoas com LVM têm um risco aumentado para morbilidade psicológica Craig,

Tran e Middleton (2009). As sequelas físicas, emocionais e sociais que afectam os

sujeitos portadores de incapacidades físicas, podem naturalmente associar-se a sintomas

depressivos e elevados níveis de ansiedade (Accacio & Ramos, 2004). Estudos revelam

que aproximadamente, um terço dos indivíduos desenvolvem níveis significativamente

elevados de ansiedade e depressão (Woolrich et al., 2006). A OMS (2015) estima que

20-30% das pessoas com lesão medular mostrar sinais clinicamente significativos de

depressão, o que terá por sua vez, um impacto negativo na melhoria do seu

funcionamento e saúde em geral. As pessoas com LVM têm também riscos mais

elevados de transtorno de ansiedade, níveis elevados de sintomatologia ansiosa (Craig et

al. 2009).

Os resultados da presente investigação revelam que o aumento da idade está associado a

um aumento dos níveis de ansiedade (HADS-A). A associação já descrita entre o

aumento da idade, o aumento do recurso à estratégia negação e diminuição do recurso a

estratégias tais como: como a reinterpretação positiva, a aceitação ou o humor, sugeriam

já padrões mais pobres de ajustamento, afirmados, também agora, pela presença

significativa de mais sintomatologia ansiosa.

Os CI com 60 ou mais anos de idade um índice de distress emocional para a

sintomatologia ansiosa de 11,57 e de 10,12 para a sintomatologia depressiva. A

exposição prolongada de eventos desencadeadores de stress no cuidar pode afetar a

saúde mental do cuidador (Awad &

Voruganti, 2008). A este propósito Davis et al. (2011) refere a nível físico e

psicológico, os CI experienciam mais stress, depressão, ansiedade e, problemas de

saúde físicos quando comparados com os não cuidadores da mesma idade. Para Arango-

Lasprillaa et al. (2010) existe uma relação direta das necessidades físicas, como por

exemplo o sono e, emocionais com a depressão.

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Percepção de QV

A percepção da QV global para os sujeitos com LVM traumática é de 57,22 sendo de

72,02 para os indivíduos “saudáveis”, pertencentes à população geral do estudo de

validação do WHOQOL-100 realizado por Canavarro et al. (2006). A percepção da QV

dos CI dos sujeitos com LVM é de 56,25.

Na presente amostra, ao considerar os diferentes grupos etários, verificam-se diferenças,

estatisticamente, significativas nos domínios: físico, psicológico, independência,

relações sociais,

ambiente e da QV geral, em função da idade. Sendo que à medida que esta aumenta,

diminui a QV em todos os domínios referenciados. As pessoas com incapacidades

físicas, à medida que vão envelhecendo, são confrontadas com outras situações

pertinentes, por um lado, intrínsecas ao próprio envelhecimento, como por exemplo a

perda de saúde e outras capacidades físicas, por outro, a perda dos seus entes queridos e,

consequentemente, a diminuição do apoio social, o que levará, na nossa opinião e de

autores como Aguado-Díaz, Fontanil, Árias e Verdugo (2003), a que exista a tendência

para uma menor percepção da QV, com o aumento da idade, acreditamos que

consequente há uma perda de recursos físicos, psicológicos e sociais.

Para os CI, em relação à idade verificam-se diferenças, estatisticamente, significativas

nos domínios: físico, relações sociais, ambiente e QV geral. Assim, à medida que

aumenta a idade diminui a QV dos CI. Os resultados deste estudo vão de encontro com

outros estudos, associando o cuidar a uma menor percepção de QV (Giovannetti,

Covelli, Sattin, & Leonardi, 2015; Blanes, Carmagnani, & Ferreira, 2007).

Conclusões

A implementação de intervenções psicossociais em sujeitos com LVM e seus CI

revelam-se necessárias e particularmente pertinentes para sujeitos mais vulneráveis que

incorrem num maior risco de inadaptação. Podemos referenciar como grupo de risco

aqueles que recorrem com mais frequência a estratégias de coping disfuncionais e que

apresentam mais idade. Com o aumento da idade aumentam também os índices distress

emocional e diminui significativa na QV.

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Os resultados deste estudo sugerem ainda que os CI de sujeitos com LVM apresentam

níveis moderados de sobrecarga, particularmente expressiva nos CI com mais idade.

Salientamos a importância de se investir em programas psicoterapêuticos que

promovam nos sujeitos com 60 ou mais idade a adoção de estratégias de coping

tendencionalmente mais adaptativas, e assim, promover a QV e um envelhecimento

saudável. A intervenção psicoeducacional e as redes de apoio podem de facto, ter um

papel relevante e positivo na promoção da adaptação à LVM e prevenção dos efeitos

adversos associados ao cuidar nos CI (Alves, Teixeira, Azevedo, Duarte, & Paúl, 2015;

Molazem, Falahati, Jahanbin, Jafari, & Ghadakpour, 2014).

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EL CUIDADOR FAMILIAR: RELACIÓN ENTRE LA INSATISFACCIÓN CON EL

CUIDADO Y LA CARGA

Andrea Vázquez-Martínez1,2,Esperanza Navarro-Pardo1,2,Noelia Flores Robaina3 &

Pedro Fernández de Córdoba Castellá1,4

1- InterTech. Interdisciplinary Modeling Group. Universidade Valencia / Universidad

Politécnica de Valencia

2- Departamento de Psicología Evolutiva y de la Educación. Facultad de Psicología.

Universidad de Valencia

3- Departamento de Personalidad, Evaluación y Tratamiento Psicológicos. Facultad de

Psicología. Universidad de Salamanca

4- Departamento de Matemática Aplicada. E.T.S.I. Industriales. Universidad Politécnica

de Valencia

Resumen

El trabajo que se presenta es de corte cuantitativo y tiene como objetivo evaluar el nivel

de carga experimentado por el cuidador familiar de personas dependientes, identificar el

nivel de satisfacción del cuidador con las tareas del cuidado y analizar la satisfacción

que el cuidador siente con el cuidado en relación con la carga que experimenta. Se han

evaluado a 309 cuidadores familiares de la Comunidad de Castilla y León y de la

Comunidad Valenciana. Los resultados obtenidos evidencian la presencia de unos

niveles de carga elevados en el cuidador familiar y se confirma la existencia de una

mayor insatisfacción en aquellas personas que se sienten más sobrecargadas con la labor

de cuidar.

Palabras clave: personas dependientes, cuidador familiar, carga, insatisfacción

Introducción

El fenómeno de la dependencia es uno de los temas de mayor importancia para ser

abordado en el siglo XXI (Czaja, Eisdorfer y Schulz, 2000). El conocido

“envejecimiento del envejecimiento” de la población hace que cada vez sea mayor el

número de personas que alcanzan edades más avanzadas y, con ello, se incrementen las

posibilidades de encontrarse en una situación de vulnerabilidad hacia la dependencia, y,

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por ende, de precisar cuidados de larga duración. En este contexto, la importancia del

cuidador familiar es de suma relevancia, considerándose a la familia como un recurso

para la mejora de la salud de la persona enferma que precisa de unos cuidados (Vaquiro

y Stiepovich, 2010).

Actualmente, el cuidador familiar sigue siendo el tipo de apoyo más utilizado a la hora

de proveer cuidados a las personas que lo necesitan (Álvarez-Rilo y CuadradoCastro,

2011; Martínez et al., 2012). Fernández de Larrinoa et al. (2011) se refieren al cuidador

principal como aquella persona que asume las tareas del cuidado, no es remunerada

económicamente por ello y es percibida por el resto de los miembros de la familia como

única responsable de la persona dependiente, es decir, de su familiar.

Sin embargo, el tiempo y la energía que supone atender al familiar dependiente y la

implicación emocional que supone en la labor diaria del cuidador, pueden conllevar que

emerja la carga, esto es, el grado en que se percibe que el cuidado ha influido sobre

diferentes aspectos de la salud, la vida social y personal y la situación económica (Zarit,

Reever y Bach-Peterson, 1980).

En este sentido, existe un consenso generalizado entre los investigadores respecto a que

la situación de cuidar a una persona dependiente constituye una situación de sobrecarga

y de riesgo para la salud (Álvarez-Rilo y Cuadrado-Castro, 2011; Sequeira, 2013)

puesto que puede tener repercusiones en variables psicológicas y ocasionar alteraciones

emocionales y conductuales en el cuidador.

En este contexto, los objetivos del presente trabajo son (1) evaluar el nivel de carga

experimentado por el cuidador familiar; (2) identificar el nivel de satisfacción del

cuidador con las tareas del cuidado; y (3) analizar la satisfacción que el cuidador siente

con el cuidado en relación con la carga que experimenta.

Método

Participantes

Los participantes corresponden a una muestra de conveniencia formada por 309

cuidadores familiares de personas en situación de dependencia que, en el momento de la

evaluación, se encontraban como cuidador principal de una o más personas en situación

de dependencia. Dichos cuidadores pertenecen a la Comunidad de Castilla y León y a la

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Comunidad Valenciana. Respecto al género de los participantes, 254 son mujeres (82,

2%) frente a 55 hombres (17,8%). La edad promedio de los cuidadores es de 55,76 años

(DT=11,85). La mayoría indican estar casados o conviviendo en pareja (63,4%;

N=196), apreciándose en menor proporción los cuidadores que están viudos (8,4%;

N=26) o divorciados/as (8,4%; N=26). Así mismo, 61 cuidadores indican estar

solteros/as. Respecto al nivel de estudios de los cuidadores, la mayoría se caracterizan

por tener estudios primarios/sin graduado escolar (31,4%; N=97) o secundarios, como

estudios de bachillerato/BUP/FP (27,8%; N=86), y estudios universitarios (16,5%;

N=51). Por tanto, resultan minoritarios aquellos cuidadores que carecen de unos

estudios básicos o iniciales (3,9%; N=12).

En relación al tiempo que llevan los participantes desempeñando la función de cuidador

principal encontramos diferentes grupos, destacando el grupo de cuidadores que llevan

realizando los cuidados entre 3-5 años (28,5%) y más de 11 años (23,3%), siendo

minoritarios quienes realizan dicha función durante menos de un año (5,5%). Además,

los cuidadores manifiestan dedicar una media de 6,5 días a la semana (DT=1,30) a la

atención de su familiar dependiente, con un tiempo de dedicación diaria de 16,05 horas

al día (DT=8,72).

Respecto a las características de la persona en situación de dependencia, se observa una

mayor presencia de mujeres (62,1%; N=192) frente a hombres (37,9%; N=117), con una

edad media de 71,11 años (DT=22,45). Finalmente, en relación al grado de parentesco

que el cuidador tiene con la persona dependiente, mayoritariamente son los hijos/as

(63,4%; N=196) y los esposos/as o compañero/as (20,7%; N=64) quienes asumen el rol

de cuidador principal. En mucha menor proporción, se sitúan como cuidador principal el

yerno/nuera, sobrino/a o el hermano de la persona dependiente.

Procedimiento

La petición de colaboración se llevó a cabo mediante contacto telefónico y entrevistas

presenciales con los responsables de diversas asociaciones de ayuda mutua, centros de

día y otros servicios de atención a familiares de personas en situación de dependencia

ubicadas en la Comunidad de Castilla y León y en la Comunidad Valenciana. En ese

contacto, se les explicaba a los responsables de los centros los objetivos del estudio y la

finalidad de la evaluación. Se les enseñaba también el protocolo de evaluación que

aplicaríamos a los cuidadores familiares. Una vez hecho esto, se acordaba el mejor

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procedimiento para la distribución de los cuestionarios y/o realización de entrevistas

individuales a los participantes. En todos los casos se mantuvieron como criterios de

inclusión que el cuidador/a fuese mayor de 18 años, que fuese familiar y que en el

momento de la evaluación se encontrase atendiendo a una persona en situación de

dependencia, y que llevase desempeñando dicha función durante al menos 6 meses. En

la mayoría de los casos se optó por aplicar los instrumentos de evaluación en formato de

entrevista, garantizando en todo momento el anonimato y la confidencialidad de los

participantes.

Instrumentos

En primer lugar, se administró el cuestionario diseñado por Jenaro et al. (2008) para

evaluar aquellos aspectos sociodemográficos y contextuales relacionados con el cuidado

de personas en situación de dependencia.

En la evaluación de la carga subjetiva de los cuidadores familiares se empleó la versión

española (Martín et al., 1996) de la Escala de Carga del Cuidador (CBI) (Zarit Burden

Inventory; Zarit, Reever y Bach-Peterson, 1980). La escala consta de 22 ítems

planteados en forma de frases que reflejan cómo se sienten algunas personas cuando

cuidan a otra y las repercusiones negativas que implica el cuidado sobre la vida de quien

ejerce esta tarea. Se aplica a la persona que ejerce el rol de cuidador principal, midiendo

el grado en que éste percibe que sus actividades de cuidado o responsabilidades en la

atención de la persona dependiente perturban su propia salud física, emocional y social,

así como su situación económica y bienestar emocional.

Los ítems se puntúan en un gradiente de frecuencia que va desde 1 (nunca) hasta 5 (casi

siempre). La puntuación total se obtiene sumando las puntuaciones de cada uno de los

ítems y oscila entre 22 y 110 puntos. En la medida que la persona obtenga puntuaciones

más elevadas, indica mayores niveles de sobrecarga experimentada por el cuidador.

Puntuaciones comprendidas entre 22 y 46 son indicativas de ausencia de sobrecarga y

puntuaciones comprendidas entre 47 y 55 son indicativas de sobrecarga leve.

Finalmente, los cuidadores que obtienen puntuaciones entre 56 y 110 puntos presentan

una sobrecarga intensa. Se trata de cuidadores que se ven superados por lo que les

sucede, se sienten agobiados por las tareas que han de desempeñar puesto que éstas y el

contexto propio del cuidado les sobrepasa. La fiabilidad del instrumento fue contrastada

mediante el alfa de Cronbach y los resultados (alfa=0,90) apoyaron su fiabilidad.

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Finalmente, para evaluar la satisfacción que el cuidador experimenta con la tarea de

ayudar a la persona receptora de cuidados, se ha empleado la Escala de Satisfacción con

el cuidado (Lawton et al., 1989), en la versión traducida y adaptada al castellano de

López y Crespo (2007). Se trata de una escala que recoge los aspectos satisfactorios de

la labor del cuidador. Se compone de 5 ítems (sentimiento de cercanía, sentimiento de

placer, disfrutar al estar con la persona cuidada, sentirse apreciado e incremento de la

autoestima) a los que se responde en una escala de tipo Likert de 5 puntos que se

plasman en un gradiente de frecuencia o acuerdo sobre los aspectos anteriormente

expuestos relacionados con la satisfacción con el cuidado. Las categorías de respuesta

oscilan entre: “nunca” (5), “rara vez” (4), “alguna vez” (3), “con bastante frecuencia”

(2) y “casi siempre” (1). La puntuación total se obtiene sumando las puntuaciones en

cada uno de los ítems y oscila entre 5 y 25. Las puntuaciones más altas indican una

menor satisfacción con el cuidado. En el presente estudio, el índice de fiabilidad

obtenido ha sido de 0,86, lo que indica unas adecuadas propiedades psicométricas

Resultados

En la tabla 1 se describen los resultados relativos al nivel de carga experimentado por el

cuidador principal como consecuencia de la tarea de cuidar. Como puede apreciarse, los

cuidadores muestran un grado de carga subjetiva elevado. El 82,2% de los cuidadores

evaluados muestra la presencia de carga, cuyo dato es superior en el nivel de sobrecarga

intensa (61,8%) frente a un grupo minoritario de cuidadores en el cual no se aprecia la

presencia de carga (17,2%). De esta manera, de los 309 cuidadores evaluados,

observamos que la carga está ausente en 53 cuidadores.

Tabla 1. Niveles de carga percibidos por los cuidadores familiares

Carga percibida N P Mínimo Máximo Media D.T.

Ausencia de carga 53 17,20 22 45 37,71 5,80

Sobrecarga Leve 65 21,00 46 55 50,64 2,60

Sobrecarga

Intensa

191 61,80 56 98 70,74 10,40

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A continuación, presentamos los resultados tras analizar la satisfacción que experimenta

el cuidador con el hecho de cuidar de su familiar en situación de dependencia (tabla 2).

Así y teniendo en cuenta a los participantes considerados globalmente, se observa que

obtienen puntuaciones que denotan una satisfacción media con las tareas de cuidado

(Media=11,03; DT=4,48). Recordemos que la puntuación máxima es 25 puntos y que a

mayor puntuación obtenida, menor satisfacción tendrá el cuidador.

Tabla 2. Nivel de satisfacción del cuidador familiar

N Mínimo Máximo Media D.T.

Satisfacción 309 1 25 11,03 4,48

Expuesto este resultado, nos centraremos en las puntuaciones que denotan una menor

satisfacción con el cuidado, refiriéndonos a ésta como la insatisfacción del cuidador con

el cuidado. En primer lugar, se analiza la posible relación entre la carga total percibida

en función de la insatisfacción experimentada por el cuidador. Posteriormente, se

identificarán las posibles diferencias entre los niveles de carga respecto a esta misma

variable. Como se aprecia en la figura 1, se ha encontrado una asociación positiva y

significativa entre la variable insatisfacción con el cuidado y la carga total percibida por

el cuidador (r=0,48; p<0,001). Este resultado nos indica, por tanto que, a mayor carga

percibida, los niveles de insatisfacción el cuidador tienden a aumentar.

Figura 1. Diagrama de dispersión entre la insatisfacción y la carga total percibida

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Por su parte, una vez identificada la asociación de la insatisfacción en función de la

carga experimentada, en la tabla 3 se ofrecen las puntuaciones promedio y el análisis de

las diferencias (ANOVA) de la variable insatisfacción en función de los niveles de

carga percibidos por el cuidador (ausencia de carga, sobrecarga leve y sobrecarga

intensa). Los resultados obtenidos evidencian diferencias estadísticamente significativas

en la variable insatisfacción respecto a los diferentes grados de carga (F(2,306) = 29,43;

MCE=499,58; p<0,001), lo que nos indica que la mayor insatisfacción con el cuidado se

encuentra en aquellos cuidadores que experimentan una sobrecarga intensa (obtienen

mayores puntuaciones) respecto al grupo de cuidadores con una sobrecarga leve.

Tabla 3. Estadísticos descriptivos y significación de las diferencias (ANOVA) entre la

insatisfacción con el cuidado y el nivel de carga percibido por el cuidador

Niveles de Carga N M D.T. F Sig.

Insatisfacción

Ausencia Carga Sobrecarga

Leve

53

65

8,64

8,83

3,83

3,38 29,430 0,000

Sobrecarga Intensa 191 12,45 4,41

Por tanto, a medida que aumenta la percepción de carga en el cuidador, se incrementa la

insatisfacción hacia el cuidado. Y, además, se confirma la existencia de una mayor

insatisfacción en aquellas personas que se sienten más sobrecargadas con la labor de

cuidar.

Discusión

Cuidar a una persona dependiente puede suponer una situación estresante para el

cuidador. Así, los resultados obtenidos apoyan los hallazgos recogidos en la literatura

especializada (Grandón, Jenaro y Lemos, 2008; López, Orueta, Gómez-Caro, Sánchez,

Carmona y Alonso, 2009; Reinhard y Horwitz, 1995; Vázquez-Martínez et al., 2013),

en los que se evidencia que el cuidador principal tiene niveles moderadamente altos de

carga derivados de su rol. Los datos obtenidos se traducen en que los cuidadores

perciben que sus actividades y responsabilidades del cuidado perturban de forma

considerable su salud física, emocional y social y que, además, tienen repercusiones en

su situación económica y bienestar emocional. Por otro lado, los cuidadores suelen estar

satisfechos con la situación de cuidado hacia su familiar. Estos datos están en

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concordancia con los encontrados en otras investigaciones, que afirman que en los

cuidadores pueden coexistir elementos positivos y negativos asociados al cuidado y que

éstos son independientes (Kramer, 1997; Skaff y Pearlin, 1992). De manera que, a pesar

de la difícil tarea de prestar cuidados y de todas las consecuencias negativas que puede

existir en la salud del cuidador, también es posible experimentar momentos placenteros

por la acción de cuidar, incluso aportando un mayor sentido a sus vidas.

De forma similar a lo encontrado en otros estudios (Del Pino-Casado et al., 2012),

nuestros resultados también ponen de manifiesto que, a medida que se incrementa la

percepción de carga en el cuidador, la insatisfacción con el cuidado tiende a aumentar.

Además, se encuentran diferencias estadísticamente significativas en función de los

niveles de carga. Esto es, los cuidadores con una sobrecarga intensa obtienen mayores

puntuaciones en la insatisfacción con el cuidado en comparación con los cuidadores con

una sobrecarga leve. Por ello, podemos afirmar la existencia de una mayor

insatisfacción en aquellos cuidadores que se sienten más sobrecargados por la labor de

cuidar. En esta misma línea de resultados se encuentran los hallados en el meta-análisis

de Pinquart y Sörensen (2003), encontrando asociación entre unos menores niveles de

carga y la satisfacción del cuidador. Por lo tanto, esta variable podría resultar relevante a

la hora de amortiguar los efectos nocivos del cuidado y, además, de no poner en un

compromiso la calidad de los cuidados.

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AVALIAÇÃO DA ANSIEDADE AOS TESTES ATRAVÉS DE

QUESTIONÁRIOS DE AUTORRESPOSTA: QUESTIONÁRIO DE

COMPORTAMENTOS FACE A SITUAÇÕES DE TESTE

Tânia Reis, Maria do Céu Salvador

Universidade de Coimbra, Portugal

Resumo:

Tendo presente a utilidade de uma avaliação precisa e rigorosa da Ansiedade aos Testes,

elaborámos um questionário para avaliar comportamentos que poderão ocorrer antes,

durante e após a situação de teste – Questionário de Comportamentos face a Situações

de Teste (QCST). Este estudo envolveu uma amostra de 338 adolescentes, entre os 14 e

os 18 anos, entre os 9º e 12º anos de escolaridade.

Relativamente à estrutura fatorial do QCST optámos por manter apenas as subescalas

Antes e Durante, uma vez que a subescala Depois não apresentou valores aceitáveis de

consistência interna. As duas subescalas do QCST apresentaram uma estrutura

unidimensional, com valores razoáveis para a consistência interna e bons para a

estabilidade temporal. Recomendam-se mais estudos para avaliar as validades

convergente e discriminante.

Palavras-chave: ansiedade aos testes; avaliação; questionários; adolescência.

Ansiedade aos Testes: Definição, Impacto e Avaliação

Segundo Sarason & Sarason (1990), o conceito de ansiedade aos testes (AT) remete

para a expressão de um traço de personalidade numa situação específica, na qual estão

envolvidas a preocupação (i.e., componente cognitiva da ansiedade) e a ativação

emocional (i.e., reações e sensações corporais que coocorrem com a preocupação).

A AT pode, então, prejudicar o desempenho nos testes, interferindo em vários

momentos da sua realização – antes, durante e depois (Carver & Scheier, 1994;

Cassady, 2004; Covington & Omelich, 1988; Folkman & Lazarus, 1985).

Embora existam diversos instrumentos para medir o grau de AT, a nosso ver, não

permitem medir os aspetos comportamentais desse tipo de ansiedade ao longo das

várias fases do ciclo de realização de um teste escolar. Por esse motivo e considerando a

importância de existirem instrumentos para avaliar os comportamentos de AT dos

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alunos facilitando, assim, os processos de avaliação e intervenção, propusemo-nos a

construir um questionário destinado a avaliar os comportamentos de AT antes, durante e

depois da situação de teste – o Questionário de

Comportamentos face a Situações de Teste (QCST). Constituíram também objetivos

desta investigação, a avaliação da qualidade psicométrica do questionário em estudo e a

elaboração de dados normativos para a população de adolescentes portugueses.

O desenvolvimento deste questionário ocorreu paralelamente ao desenvolvimento de

um outro questionário - Questionário de Pensamentos Automáticos face a situações de

teste (QPAST) - recorrendo à mesma amostra e aos mesmos procedimentos.

Metodologia

Amostra

A amostra consistiu em 338 adolescentes (124 rapazes e 214 raparigas), entre os 14 e os

18 anos, entre o 9º e o 12º ano, maioritariamente dos níveis socioeconómico baixo e

médio. Não se verificaram diferenças estatisticamente significativas entre os géneros em

nenhuma das variáveis demográficas.

Instrumentos

O protocolo de investigação incluiu os seguintes instrumentos: Questionário de

Pensamentos Automáticos face a Situações de Teste - QPAST, Questionário de

Comportamentos face a Situações de Teste - QCST, Reações aos Testes – RT (Sarason,

1984), Escala de Incapacitação de Sheehan – SDS (Sheehan, 1983) e Escala

Multidimensional de Ansiedade para Crianças – MASC (March, Parker, Sullivan,

Stallings, & Conners, 1997).

Procedimentos

Os itens foram selecionados com base na literatura e na experiência clínica dos autores.

A fim de testar a compreensão dos itens, após o que se procedeu à sua administração a

31 adolescentes para avaliação da validade facial.

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O protocolo foi administrado em sala de aula, após obtidos os consentimentos das

respetivas entidades que regulam este procedimento (Comissão de Ética da Faculdade

de Psicologia e de Ciências da Educação, da Universidade de Coimbra, da Comissão

Nacional de Proteção de Dados e da Direção Geral da Inovação e Desenvolvimento

Curricular), das Direções das escolas, dos pais dos adolescentes e dos próprios

adolescentes. O QPAST foi novamente administrado a 192 dos participantes (113

raparigas e 79 rapazes), 4 a 5 semanas depois do primeiro preenchimento para avaliar a

estabilidade temporal.

Estratégia Analítica

Depois de confirmados os pressuposto da normalidade procedeu-se a uma seleção

inicial dos itens das várias subescalas (i.e., antes, durante e depois), excluindo itens que

apresentassem valores de correlação item-item superiores a .65 e de correlação item-

total da subescala inferiores a .40. Para além disso, procedeu-se a uma análise da

consistência interna para cada subescala e à exclusão de alguns itens, com o intuito de a

aumentar e de ser no mínimo de consistência para cada subescala ser .70.

Resultados

Desenvolvimento do QCST

Utilizados os critérios referidos para a seleção de itens, o QCST ficou constituído por 10

itens na subescala Antes e 9 itens na subescala Durante. Foram excluídos todos os itens

da subescala Depois por esta ter apresentado um valor de consistência interna

inadmissível (α = . 15).

Estrutura Fatorial

Foram efetuadas Análises Fatoriais Exploratórias, por meio de Análises de

Componentes Principais com rotações oblimin. Depois de consideradas várias opções

fatoriais, o QCST ficou constituído por duas subescalas unidimensionais: a subescala

Antes (com 10 itens) e a subescala Durante (com 9 itens).

Estudo dos Itens

Os resultados demostraram correlações item-subescala significativas, de moderadas a

elevadas na subescala Antes (.43 < r < .70) e moderadas na subescala Durante do QCST

(.41 < r <

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239

239

.65).

No que concerne à consistência interna, foi possível constatar que não aumentaria com a

remoção de qualquer item.

Por último, a análise das correlações teste-reteste revelou que todos os itens se

correlacionam significativamente entre si, tendo os da subescala Antes apresentado

correlações moderadas (.42 < r < .68) e os da subescala Durante demostrado correlações

que variaram de moderadas a elevadas (.47 < r < .74).

Fidelidade: Consistência Interna e Estabilidade Temporal

O valor de consistência interna obtido foi razoável na subescala Antes (α = .75) e

situou-se no limite da razoabilidade na subescala Durante (α = .70).

Os coeficientes de correlação de Pearson relativos ao teste-reteste do QCST revelaram

valores significativos de magnitude elevada, para cada uma das suas subescalas (r = .72

na subescala Antes e r = .77 na subescala Durante). Validade: Validades Convergente e

Divergente

A avaliação da validade convergente das subescalas do QCST foi efetuada por meio da

análise da sua correlação com o total do RT (medida de ansiedade aos testes), o fator

Estudos da SDS para adolescentes (medida do grau de interferência da AT nos estudos)

e os fatores Sintomas

Físicos e Ansiedade Social da MASC (medida de ansiedade). A correlação entre a

subescala Durante do QCST e o total do RT revelou-se significativa e moderada (r =

.54). Todas as outras correlações foram significativas e baixas (.23< r < .35).

A análise da validade discriminante do QCST realizou-se por meio das correlações entre

as suas subescalas/fatores com os fatores Ansiedade de Separação e Evitamento do

Perigo da MASC.

Todas as correlações obtidas foram significativas, à exceção da obtida entre o fator

evitamento do perigo da MASC e a subescala Durante (r = .11). Todas as correlações se

revelaram significativas, embora baixas (.22 < r < .23), exceto a obtida entre a subescala

Antes e o fator Evitamento do Perigo da MASC, que foi moderada (r = .41).

Dados Normativos

Os resultados obtidos através da ANOVA revelaram um efeito estatisticamente

significativo do género (com as raparigas a apresentarem valores mais elevados) no total

da subescala Antes.

Discussão

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240

240

O QCST assume-se como uma medida adequada para avaliar comportamentos

associados à AT, em momentos temporais distintos, contribuindo para um

enriquecimento na área da avaliação deste constructo. Por ser mais específico, este tipo

de avaliação poderá auxiliar o clínico no planeamento de intervenções mais adequadas a

cada caso.

No entanto, a interpretação dos resultados deve ser feita com algumas reservas

atendendo: a) à ausência de uma análise fatorial confirmatória; b) a alguma eventual

imprecisão pelo fato de alguns adolescentes não se encontrarem em época de teste

aquando do preenchimento do questionário; c) à não representatividade da população,

pelo fato de a amostra se limitar à região centro, e não ser equitativa em termos de anos

de escolaridade e nível socioeconómico.

Não obstante a consideração das referidas limitações em investigações posteriores,

recomendamos que sejam feitos mais estudos para avaliar as validades convergente e

discriminante.

Referências

Carver, C. S., & Scheier, M. F. (1994). Situational coping and coping dispositions in a

stressful transaction. Journal of Personality and Social Psychology, 66 (1), 184–195.

Cassady, J. C. (2004). The influence of cognitive test anxiety across the learning–testing

cycle. Learning and Instruction, 14(6), 569-592.

Covington, M. V., & Omelich, C. L. (1988). Achievement dynamics: The interaction of

motives, cognitions, and emotions over time. Anxiety Research, 1(3), 165–183.

Folkman, S., & Lazarus, R. S. (1985). If it changes it must be a process: Study of

emotion and coping during three stages of a college examination. Journal of Personality

and Social Psychology, 48(1), 150–170.

March, J. S. Parker, J. D., Sullivan, K., Stallings, P., & Conners, C. K. (1997). The

Multidimensional Anxiety Scale for Children (MASC): Fator structure, reliability, and

validity. Journal of the American Academy of Child and Adolescent Psychiatry, 36,

554- 565.

Sarason, I. G. (1984). Stress, anxiety, and cognitive interference: Reactions to tests.

Journal of Personality and Social Psychology, 46(4), 929-938.

Saranson, I. G., & Saranson, B. R. (1990). Test Anxiety. In H. Leitenberg (Ed.),

Handbook of Social and Evaluative Anxiety. New York: Plenum Press.

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241

241

Sheehan, D. V. (1983). The anxiety disease. New York: Scribner.

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243

AVALIAÇÃO DA ANSIEDADE AOS TESTES ATRAVÉS DE

QUESTIONÁRIOS DE AUTORRESPOSTA: QUESTIONÁRIO DE

PENSAMENTOS AUTOMÁTICOS FACE A SITUAÇÕES DE TESTE

Tânia Reis, Maria do Céu Salvador

Universidade de Coimbra, Portugal

Resumo

Dada a utilidade de uma avaliação rigorosa da Ansiedade aos Testes (AT), elaborámos

um questionário para avaliar cognições antes, durante e após a situação de teste –

Questionário de Pensamentos Automáticos face a Situações de Teste (QPAST). Este

estudo envolveu uma amostra de 338 adolescentes, entre os 14 e os 18 anos, entre os 9º

e 12º anos de escolaridade.

A estrutura fatorial do QPAST revelou a existência de 2 fatores em cada uma das

subescalas: Antecipação do Fracasso e Medo da Avaliação Negativa, na subescala

Antes; Avaliação Negativa do Desempenho e Medo da Avaliação Negativa, na

subescala Durante; Autópsia e Medo da Avaliação Negativa, na subescala Depois. Os

valores de consistência interna variaram de razoáveis a bons. O questionário evidenciou

ainda boa estabilidade temporal e boa validade convergente e discriminante.

Palavras-chave: ansiedade aos testes; avaliação; questionários; adolescência.

Ansiedade aos Testes: Definição, Impacto e Avaliação

Apesar da pertinência do tema da AT, constata-se alguma ambiguidade em torno do

termo AT (Zeidner, 1998). De entre as numerosas definições presentes na literatura,

destacamos a de Sarason & Sarason (1990), segundo a qual esse tipo de ansiedade é

concetualizado como a expressão de um traço de personalidade numa situação

específica, em que estão envolvidos dois componentes: a preocupação (i.e., componente

cognitiva da ansiedade) e a ativação emocional (i.e., reações e sensações corporais que

acompanham a preocupação). Segundo vários autores, a preocupação encontra-se

bastante generalizada em estudantes com AT, sendo que os estudantes mais ansiosos

tendem a percecionar as situações de teste como ameaçadoras e, consequentemente, a

desviar a atenção de informação relevante, para informação irrelevante para a tarefa, o

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244

244

que poderá prejudicar consideravelmente o seu desempenho (Beck, Emery &

Greenberg, 1985, pp. 161; Eysenk, 1992; Sarason, 1984).

Assim, a AT poderá interferir em vários momentos, desde a preparação para o teste e a

sua realização até à fase de reflexão que tem lugar após o teste, devendo ser entendido

como um constructo complexo e dinâmico, que se desenvolve ao longo do tempo, em

fases temporais distintas. De facto, a investigação atual têm salientado a necessidade de

considerar pelo menos três fases: antes, durante e depois do teste (Carver & Scheier,

1994; Cassady, 2004; Covington & Omelich, 1988; Folkman & Lazarus, 1985).

Apesar da existência de vários instrumentos para avaliar a AT, de acordo com a

pesquisa efetuada, estes parecem não permitir avaliar: a) o conteúdo específico das

cognições relacionadas com a situação de teste, tal como estas se apresentam na mente

do sujeito; b) a forma como estes aspetos cognitivos estão presentes e se organizam ao

longo das várias etapas do ciclo de realização de um teste escolar (antes, durante e

depois do teste).

Perante isto, e dada a importância de existirem instrumentos para aceder ao conteúdo

cognitivo dos alunos face aos testes facilitando, dessa forma, os processos de avaliação

e intervenção, propusemo-nos a construir um questionário destinado a avaliar as

cognições de AT antes, durante e depois da situação de teste – o Questionário de

Pensamentos Automáticos face a Situações de Teste (QPAST). A avaliação da

qualidade psicométrica deste questionário e a elaboração de dados normativos para a

população de adolescentes portugueses assumiram-se igualmente como objetivos desta

investigação.

Metodologia

Amostra

A amostra ficou constituída por 338 adolescentes (124 rapazes e 214 raparigas), entre os

14 e os 18 anos, entre o 9º e o 12º ano, maioritariamente dos níveis socioeconómico

baixo e médio. Não se verificaram diferenças estatisticamente significativas entre os

géneros em nenhuma das variáveis demográficas.

Instrumentos

O protocolo de investigação incluiu os seguintes instrumentos: Questionário de

Pensamentos Automáticos face a Situações de Teste - QPAST, Questionário de

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245

Comportamentos face a Situações de Teste - QCST, Reações aos Testes – RT (Sarason,

1984), Escala de Incapacitação de Sheehan – SDS (Sheehan, 1983) e Escala

Multidimensional de Ansiedade para Crianças – MASC (March, Parker, Sullivan,

Stallings, & Conners, 1997).

Procedimentos

Os itens foram selecionados com base na literatura e na experiência clínica dos autores.

A fim de testar a compreensão dos itens, procedeu-se à sua administração a 31

adolescentes.

Após obtidas as aprovações da Comissão de Ética da Faculdade de Psicologia e de

Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, da Comissão Nacional de Proteção

de Dados (CNPD) e da Direção Geral da Inovação e Desenvolvimento Curricular

(DGIDC), e das Direções de várias escolas contactadas, foram também obtidas as

autorizações dos encarregados de educação e os consentimentos informados dos alunos

participantes. O protocolo foi administrado em sala de aula.

Quatro a cinco semanas depois do primeiro preenchimento, com o intuito de avaliar a

estabilidade temporal, foi efetuada uma segunda passagem do QPAST a 192 dos

participantes (113 raparigas e 79 rapazes).

Estratégia Analítica

Confirmados os pressupostos de normalidade, procedeu-se a uma seleção inicial dos

itens das várias subescalas (i.e., antes, durante e depois), excluindo itens que

apresentassem valores de correlação item-item superiores a .65 e de correlação item-

total da subescala inferiores a .40. Para além disso, procedeu-se a uma análise da

consistência interna para cada subescala e à exclusão de alguns itens, com o intuito de a

aumentar e de ser no mínimo de consistência para cada subescala ser .70.

Resultados

Desenvolvimento do QPAST

Após recorrer aos critérios anteriormente referidos na estratégia analítica para a seleção

de itens, o QPAST ficou com 12 itens na subescala Antes, 13 itens na subescala Durante

e 12 itens na subescala Depois do Teste.

Estrutura Fatorial

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246

Foram efetuadas Análises Fatoriais Exploratórias, por meio de Análises de

Componentes Principais com rotações oblimin. As saturações fatoriais das soluções que

adotámos foram superiores a .30. Depois de consideradas várias opções fatoriais nas

várias subescalas, cada uma ficou constituída por dois fatores: Antecipação do Fracasso

(F1; 9 itens) e Medo da Avaliação Negativa (F2; 3 itens), na subescala Antes; Avaliação

Negativa do Desempenho (F1; 9 itens) e Medo da Avaliação Negativa (F2; 4 itens), na

subescala Durante; Autópsia (F1; 8 itens) e Medo da Avaliação Negativa (F2; 4 itens),

na subescala Depois do QPST.

Estudo dos Itens

As correlações item-fator e item-subescala variaram entre moderadas a elevadas (.83 < r

< .88).

Não se revelou pertinente remover qualquer item, uma vez que tal não aumentaria a

consistência interna de nenhuma subescala do questionário.

A análise das correlações teste-reteste revelou correlações significativas, entre

moderadas e elevadas, entre todos os pares de itens (.50 < α < .77).

Fidelidade: Consistência Interna e Estabilidade Temporal

Relativamente à consistência interna, esta apresentou-se boa para os fatores (.82 < α <

.89) e para a subescala Depois (α = .90) e muito boa para as subescalas Antes e Durante

(α = .91).

Os coeficientes de correlação de Pearson calculados para analisar a estabilidade

temporal revelaram correlações significativas e elevadas em todas as subescalas (.82 < r

< .84) e fatores (.74 < r < .80), à exceção do fator 2 da subescala Depois, que revelou

estabilidade temporal moderada (r = .64).

Validade: Validades Convergente e Discriminante

A validade convergente das subescalas/fatores do QPAST foi analisada por meio da sua

correlação com o total RT (medida de ansiedade aos testes), com o fator Estudos da

SDS para adolescentes (medida do grau de interferência da AT nos estudos) e com os

fatores Sintomas Físicos e Ansiedade Social da MASC (medida de ansiedade). Foram

obtidas correlações significativas, que variaram de moderadas a elevadas com o total do

RT (.57 < r < .77) e foram moderadas com os fatores Sintomas Físicos e Ansiedade

Social da MASC (.40 < r < .55). Por outro lado, verificaram-se correlações baixas a

moderadas com o fator Estudos da SDS para adolescentes (.39 < r < .56).

A validade discriminante do QPAST foi analisada por meio das correlações das suas

subescalas e fatores com os fatores Ansiedade de Separação e Evitamento do Perigo da

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MASC (medida de ansiedade). A análise da magnitude dessas correlações revelou

associações baixas quer entre as subescalas e fatores do QPAST e o fator Ansiedade de

Separação da MASC, quer entre aquelas subescalas e fatores e o fator Evitamento do

Perigo da MASC.

Dados Normativos

Os resultados obtidos através da ANOVA revelaram um efeito estatisticamente

significativo do género em todos os fatores e em todas as subescalas do questionário em

estudo, com as raparigas a obterem sempre resultados mais elevados do que os rapazes.

Discussão

O QPAST revelou-se uma medida fidedigna e válida para avaliar o conteúdo específico

das cognições relacionadas com a AT, tal como poderão surgir na mente do aluno, nos

vários momentos temporais em que esse tipo de ansiedade se poderá manifestar. Dessa

forma, a construção do QPAST parece contribuir para um enriquecimento na área da

avaliação da AT, uma vez que possibilitará uma avaliação mais específica, que poderá

auxiliar o clínico a delinear planos de intervenção mais adequados a cada caso.

Todavia, a interpretação dos resultados obtidos deve ter em consideração as seguintes

limitações: a) inexistência de uma análise fatorial confirmatória; b) alguma possível

imprecisão por alguns adolescentes não se encontrarem em época de teste aquando do

preenchimento do questionário; c) a não representatividade da população, pelo fato de a

amostra se limitar à região centro, e não ser equitativa em termos de anos de

escolaridade e nível socioeconómico.

Para além da consideração destas limitações em investigações posteriores, seria

interessante analisar a validade convergente do QPAST com o PEPQ-E, dada a sua

maior especificidade na avaliação do processamentos pós-situacional em situações de

exame (Salvador, 2015), e incluir no QPAST itens para avaliar a forma como os alunos

se autoavaliam em função do seu desempenho nos testes, por forma a avaliar a vergonha

interna daí resultante.

Referências

Beck, A. T., Emery, G., & Greenberg, R. L., (1985). Anxiety Disorders and Phobias, A

Cognitive Perspective. USA: Basic Books.

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Carver, C. S., & Scheier, M. F. (1994). Situational coping and coping dispositions in a

stressful transaction. Journal of Personality and Social Psychology, 66 (1), 184–195.

Cassady, J. C. (2004). The influence of cognitive test anxiety across the learning–testing

cycle. Learning and Instruction, 14(6), 569-592.

Covington, M. V., & Omelich, C. L. (1988). Achievement dynamics: The interaction of

motives, cognitions, and emotions over time. Anxiety Research, 1(3), 165–183.

Eysenck, M. W. (1992). Anxiety: The cognitive perspective. Hove, UK: Erlbaum.

Folkman, S., & Lazarus, R. S. (1985). If it changes it must be a process: Study of

emotion and coping during three stages of a college examination. Journal of Personality

and Social Psychology, 48(1), 150–170.

March, J. S. Parker, J. D., Sullivan, K., Stallings, P., & Conners, C. K. (1997). The

Multidimensional Anxiety Scale for Children (MASC): Fator structure, reliability, and

validity. Journal of the American Academy of Child and Adolescent Psychiatry, 36,

554- 565.

Sarason, I. G. (1984). Stress, anxiety, and cognitive interference: Reactions to tests.

Journal of Personality and Social Psychology, 46(4), 929-938.

Saranson, I. G., & Saranson, B. R. (1990). Test Anxiety. In H. Leitenberg (Ed.),

Handbook of Social and Evaluative Anxiety. New York: Plenum Press.

Sheehan, D. V. (1983). The anxiety disease. New York: Scribner.

Zeidner, M (1998). Test Anxiety: The State of the Art. New York, Boston, Dordrecht,

London, Moscow: Kluwer Academic Publishers.

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MANUAIS DE TREINO COGNITIVO COMPENSATÓRIO, PORTUGUÊS: O

COGSMART (TCC, FIGUEIRA & PAIXÃO, 2015)

Ana Paula Couceiro Figueira & Rui Paixão

Faculdade de PSicologia e Ciencias da Educação da Universidade de Coimbra

Resumo

Apresentamos o programa CogSMART, vocacionado, originalmente, para estimulação

cognitiva compensatória, para clientes com doenças psiquiátricas, mas hoje com outras

aplicações, os seus Manuais e Recursos, para os sujeitos e terapeuta, uma adaptação de

Ana Paula Couceiro Figueira e Rui Paixão, da versão americana de Dr. Twamley, da

Universidade Estatal do Arizona, USA.

As áreas cognitivas a trabalhar são: a memória prospetiva, a atenção e as funções

executivas (planificação, resolução de problemas, organização e flexibilidade

cognitiva). Todo o treino é orientado para a adequação à vida diária, ao quotidiano da

vida real. O programa é composto por dois manuais, para o cliente e para o

administrador. Trata-se de um programa de intervenção individual ou grupal.

Palavras-chave: intervenção; neuropsicológica; compensatória; manuais; recursos;

Abstract

We present the CogSMART program, originally for cognitive compensatory stimulation

for clients with psychiatric illnesses, but today with other applications, the their manuals

and resources for the subject and therapist, an adaptation by Ana Paula Couceiro

Figueira and Rui Paixão, from the American version of the Dr. Twamley, Arizona State

University, USA. The cognitive areas to work are: prospective memory, attention and

executive functions (planning, problem solving, organization and cognitive flexibility).

All training is oriented to adapt to daily life, the everyday real life. The program

consists of two manuals for the client and for the administrator. And the intervention

can be individual.

Keywords: intervention; neuropsychological; compensatory; manuals; resource;

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lntrodução

A Neuropsicologia é uma área da psicologia que procura a compreensão do

funcionamento cerebral e das suas respetivas alterações. Estuda a relação entre a

atividade nervosa superior e o comportamento, a cognição, as emoções, a motivação e a

vida em relação.

Neste sentido, uma intervenção neuropsicológica consiste em avaliar e estimular as

funções cognitivas como a memória, a atenção, a linguagem oral e escrita, o cálculo, as

capacidades visuo-espaciais, o planeamento e a ação, a destreza manual, o raciocínio,

não descurando os domínios emocionais e sociais, desde o reconhecimento e expressão

das emoções às competências sociais (Figueira & Paixão, sd).

Quer numa perspetiva remediativa, quer numa perspetiva preventiva, a intervenção

neuropsicológica possibilita a potenciação das funções cognitivas, emocionais, sociais e

comportamentais, de forma a promover o bem-estar do(s) indivíduo(s).

Numa lógica remediativa, a Reabilitação/Estimulação Cognitiva ou intervenção

neuropsicológica permite programar e realizar um plano adequado ao indivíduo e às

suas necessidades específicas, perspetivando a recuperação dos défices ou a

estabilização de um processo de deterioração, pretendendo tornar os sujeitos mais

autónomos (Figueira & Paixão, sd).

O plano de intervenção deve consistir num conjunto de procedimentos, técnicas e

tarefas de fácil aprendizagem e utilização, de forma estruturada, sistemática, integrada e

sistémica. Ainda, a intervenção deve ser especificamente orientada para as necessidades

de cada indivíduo, adequando-se a todo o tipo de populações.

A intervenção neuropsicológica (quer a avaliação quer a reabilitação/estimulação) tem

revelado evidências, fundamentalmente, em Demências (Alzheimer, Parkinson,

Demência Vascular, etc.), em situações de Défice Cognitivo Ligeiro, em Acidentes

Vasculares Cerebrais, em Traumatismos Cranianos, em Perturbações do Sono, em

Dislexia, em situações de Hiperatividade com Défice de Atenção, em pacientes

neurocirúrgicos, em Epilepsia, em Sequelas Cognitivas e Psicológicas de Doença

Cerebral ou Neurológica (Ojeda et al., 2012).

Ainda, a intervenção neuropsicológica é indicada no acompanhamento do

envelhecimento cerebral normal, como forma de manutenção das capacidades, de

prevenção e despiste de problemas e dificuldades futuras, ou ainda de promoção dessas

mesmas capacidades.

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Numa perspetiva preventiva, a intervenção neuropsicológica é facilitadora e

potenciadora dos processos referidos, em várias idades e em diferentes situações.

Em Portugal, são já utilizados, em vários contextos, alguns programas estruturados,

todavia, os recursos de intervenção nesta área podem ser considerados ainda escassos e

ainda a carecer de estudos de validade.

Neste sentido, apresentamos o Cogsmart (Figueira & Paixão, sd). O Cogsmart é um

programa de reabilitação cognitiva, um recurso para auxiliar as pessoas a melhorar a sua

memória prospetiva (lembrando-se de fazer as coisas), a atenção, a função executiva

(resolução de problemas, planeamento, organização e flexibilidade cognitiva). O seu

modelo teórico é de intervenção compensatória.

Considera-se que melhorar os processos enunciados irá ajudar as pessoas nas suas

atividades quotidianas, realizando e alcançando os seus objetivos relativos à escola,

trabalho, funcionamento social e vida independente. Tenta-se motivar os clientes para

que mantenham esses objetivos em mente e que aprendam a aplicar as suas novas

competências.

O CogSMART preconiza uma compensação cognitiva, pela prática. Ensina-se as

pessoas a melhorar as suas habilidades cognitivas por meio de estratégias, como o

praticar e aplicar as aprendizagens a atividades da vida diária.

O objetivo é auxiliar a tornar estas estratégias hábitos, para que eles possam ser

utilizados automaticamente quando necessários no mundo real, na vida do quotidiano.

A Estrutura do programa, o formato das sessões podem ser de dois tipos: As sessões de

grupo, normalmente, têm a duração de 2 horas (incluindo uma pausa de 5-10 minutos),

e as individuais de 1 hora.

A sua estrutura tem em conta 11 parâmetros, a saber:

1. Rever as tarefas para casa, da sessão anterior, em que se:

Solicita aos participantes a descrição dos exercícios realizados em casa; debater a

generalização dos exercícios;

Elogia todos os esforços por pequenos que sejam (incluindo assistir à sessão);

2. Apresentar uma competência e fornecer uma explicitação/explicação sobre a mesma:

Apresentar argumentos para os participantes aprenderem esta competência;

Reforçar todos os contributos dados pelos participantes;

Proporcionar algumas explicações adicionais, consideradas pertinentes, e não referidas

pelos participantes;

3. Debater e refletir sobre a competência:

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253

• Verificar se os participantes entendem a competência;

4. Modelar a competência:

Explicar a demonstração da competência;

Realizar demonstrações breves e centradas nos aspetos relevantes da competência;

5. Rever a demonstração com os participantes:

• Discutir e refletir sobre como se treinou a competência;

6. Envolver e motivar os participantes na prática da competência:

Em grupo, iniciar com o participante que seja mais hábil ou mais colaborador;

Solicitar ao participante que manifeste a competência, realizando um role-playing com o

orientador/profissional;

Em grupo, solicitar aos restantes participantes que observem o colega que realiza a

competência;

Incentivar o grupo a praticar a competência.

7. Proporcionar feedback positivo:

Preferencialmente, primeiro, obter feedback positivo dos outros participantes;

Incentivar um feedback específico;

Evitar ou impedir feedback negativo ou crítica destrutiva;

Elogiar todos os esforços.

8. Proporcionar feedback corretivo:

Promover a reflexão (ideias e sugestões) sobre como pode o participante melhorar a

competência apresentada e treinada;

Limitar o feedback a uma ou duas sugestões;

Deve comunicar-se as sugestões de forma positiva e otimista.

9. Envolver/motivar os participantes na prática de competências adicionais:

Se for necessário, solicitar ao participante que modifique o seu comportamento durante

a prática/treino/role-playing;

Verificar se os participantes entendem as sugestões;

Centrar-se nos comportamentos que são relevantes e modificáveis.

10. Proporcionar feedback adicional:

Centrar-se primeiro no comportamento que estiver a ser modificado;

Considerar a utilização de outras estratégias de formação/modificação do

comportamento para melhorar as competências do(s) participante(s), como o coaching,

“dar pistas”, e modelar complementarmente;

Ser generoso mas conciso quando se proporciona feedback.

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11. Fornecer ou proporcionar exercícios para casa:

Proporcionar uma tarefa para praticar a competência – utilizar as fichas das tarefas para

casa;

Solicitar aos participantes que identifiquem situações em que podem atualizar a

competência;

Quando possível, adaptar a tarefa ao nível das competências do participante.

Quanto ao número de Sessões, são aventadas 13 sessões, em que se trabalha os

objetivos e os conteúdos:

Na Sessão 1 – Introdução e apresentação da agenda (recurso de registo, de grande

maisvalia),

Na Sessão 2 – Memória prospetiva (Agendas, Listas, Tarefas de Associação),

Na Sessão 3 – Memória prospetiva a curto-prazo, atenção conversacional,

N Sessão 4 – Atenção conversacional, atenção durante a tarefa,

Na Sessão 5 – Atenção durante a tarefa,

Na Sessão 6 – Aprendizagem verbal e memória,

Na Sessão 7 – Aprendizagem verbal e memória,

Na Sessão 8 – Aprendizagem verbal e memória,

Na Sessão 9 – Flexibilidade cognitiva e resolução de problemas,

Na Sessão 10 – Flexibilidade cognitiva e resolução de problemas,

Na Sessão 11 – Flexibilidade cognitiva, resolução de problemas e planificação,

Na Sessão 12 – Integração de competências, revisão e passos seguintes e, finalmente,

Sessão de Revisão e síntese dos conceitos-chave apresentados no curso de treino

cognitivo.

Quanto aos Materiais e Recursos, o programa completo é composto por dois manuais,

um para o terapeuta e outro para o paciente/sujeito(s). Os conteúdos das pastas/manuais

são muito semelhantes e estão organizados e muito completos para que nada falte no

processo de intervenção.

Os manuais foram desenhados com o objetivo de proporcionar as competências,

estratégias e ferramentas necessárias para melhorar a atenção do cliente, a sua

concentração, a aprendizagem, a memória, a organização e a resolução de problemas.

Ainda sem aplicações em território nacional, a intervenção CogSMART tem sido

utilizada quer de forma individual quer em grupo ou classes.

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Os recursos estão disponíveis online, de forma gratuita. Neste momento, ainda e apenas,

disponível no site dos colegas americanos. Brevemente estarão disponíveis em

www.fpce.uc.pt.recursos.

Quanto às Atividades propostas, as recomendações para os orientadores passam por:

Preparar o espaço, antes da chegada dos participantes; reduzir os distratores e preparar

os materiais, para evitar atrasos.

Simplificar as tarefas, ao nível adequado das capacidades dos participantes (claramente,

ao nível de dificuldade adequado).

Solicitar aos participantes que leiam em voz alta as tarefas (o manual de materiais). Por

exemplo, as definições, as etapas ou passos da competência. Incentivar os participantes

a colaborar na explicitação da sessão.

Utilizar questões ou perguntas dirigidas, para assegurar que os participantes consigam

responder adequadamente, e de forma rápida, ao invés de se fomentar um raciocínio

errado.

Certificar-se de que os participantes iniciam cada tarefa a um ritmo razoável.

Assegurar-se de que os participantes utilizam as estratégias mais adequadas para

compensar as limitações ou fragilidades.

Reduzir a quantidade de informação apresentada aos participantes, ou encurtar as

tarefas, caso seja necessário.

Proporcionar pausas adequadas para assegurar a concentração dos participantes e

mantê-los, assim, envolvidos e motivados nas tarefas.

Os participantes podem realizar as tarefas mesmo de pé, caso se sintam ou manifestem

alguma fadiga.

Proporcionar ajudas, mesmo durante a execução das tarefas, caso se considere

necessário. Não se deve permitir que os participantes se sintam constrangidos ou em

dificuldades.

Elogiar e reforçar todos os esforços dos participantes, sendo convincente (podem ser

reforços verbais ou gestuais dos próprios orientadores, ou um auxiliar externo, tipo

smile, ou outro formato, para reforçar a atenção ou a estratégia utilizada). Incentivar o

esforço.

Na formação dos grupos, ou trabalhos/tarefas de pares, tentar emparelhar participantes

com graus diferentes de capacidades.

Tentar emparelhar os participantes com algum grau de familiaridade ou empatia entre

eles.

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O ritmo da sessão pode variar, em função de vários fatores; utilizar um tempo extra no

final da sessão para praticar as competências apresentadas e treinadas.

Breves notas de fechamento

Nos EUA e em países outros, esta abordagem ao treino cognitiva (TCC) tem sido bem

sucedida para as pessoas com sintomas psiquiátricos, lesões cerebrais, e outras

condições relacionadas com o cérebro, resultando em desafios cognitivos. Não é o caso

de Portugal, porque é um novo recurso, não havendo ainda aplicações ou evidências

empíricas, mas acreditamos que, pelos seus fundamentos e estrutura, pode funcionar

como um recurso de intervenção adequado.

Referências

Twamley, E.(sd). The cogsmart, http://www.cogsmart.com ;

Figueira, A. P. C. & Paixão, R. (sd). Portuguese Compensatory Cognitive Training

Manual Client Version, http://www.cogsmart.com/resources

Figueira, A. P. C. & Paixão, R. (sd). Portuguese Compensatory Cognitive Training

Manual Therapist Version, http://www.cogsmart.com/resources

Figueira, A. P. C. F. & Paixão, R. (in press). Rehacog: programa de intervenção

neuropsicológica. Manual do Cliente. Faculdade de Psicologia e de Ciências da

Educação da Universidade de Coimbra (Ed.), Coimbra.

Figueira, A. P. C. F. & Paixão, R. (in press). Rehacog: programa de intervenção

neuropsicológica. Manual do Profissional. Faculdade de Psicologia e de Ciências da

Educação da Universidade de Coimbra (Ed.), Coimbra.

Ojeda N., Peña J., Bengoetxea E, García A., Sánchez P., Segarra R. C, Ezcurra J.,

Gutiérrez Fraile M., Eguíluz J.I. C. (2012). REHACOP: Programa de

Rehabilitación Cognitiva en Psicosis. Revista de Neurología, 54(6), 337-342.

Ojeda N., Peña J., Bengoetxea E., García A, Sánchez P, Segarra R, Ezcurra J. Gutiérrez

Fraile M, Eguíluz JI. (2012). Evidencias de eficacia de la Rehabilitación Cognitiva en

Psicosis y esquizofrenia con el programa Rehacop. Revista de Neurología, 54(10), 577-

586.

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PROGRAMA DE INTERVENÇÃO NEUROPSICOLÓGICA, PORTUGUÊS: O

REHACOG

Ana Paula Couceiro Figueira & Rui Paixão

Faculdade de Psicologia e Ciencias da Educação da Universidade de Coimbra

Resumo

Apresentamos um programa de intervenção neuropsicológica português, adaptado do

programa espanhol, REHACOP.

Inicialmente pensado para ser trabalhado com populações específicas (psicoses,

esquizofrenias), atualmente, em curso, intervenções com outro tipo de amostras

(crianças, adolescentes, idosos), com e sem dificuldades, numa lógica remediativa e/ou

preventiva, em diversos contextos, incluindo o educativo.

É um programa integral e estruturado, constituído por 8 módulos: atenção (sustentada,

seletiva, dividida, intermitente) e concentração, linguagem (sintaxe, gramática,

vocabulário, compreensão verbal, fluência verbal, linguagem figurativa), memória

(aprendizagem e memória), funções executivas (planificação, raciocínio), atividades da

vida diária (básicas, instrumentais, complexas), competências sociais (competências

básicas, assertividade, comunicação, estabelecimento de relações, viver em

comunidade, gestão de conflitos, viver com saúde), cognição social (reconhecimento de

emoções, raciocínio social, teoria da mente, dilemas morais) e psicoeducação.

É composto por 2 manuais, num total de 300 exercícios.

Palavras-chave: Intervenção; neuropsicológica; ativo; programa;

Abstract

We present a Portuguese neuropsychological intervention program, adapted from the

program REHACOP spanish.

Initially thought to be working with specific populations (psychosis, schizophrenic),

currently in progress, interventions with other samples (children, adolescents, senior

people), with and without difficulties, in a remediative and/or preventive logic, in

several contexts, including education.

It is a comprehensive and structured program with 8 intervention modules: attention

(sustained, selective, divided, flashing) and concentration, language (syntax, grammar,

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vocabulary, verbal fluency, figurative language), memory (learning and memory),

executive functions (planning, reasoning), activities of daily living (basic, instrumental,

complex), social skills (basic skills, assertiveness, communication, conflict

management), social cognition (emotion recognition, social reasoning, theory of mind,

moral dilemmas) and psicoeducation. It consists of two guides, a total of 300 exercises.

Keywords: intervention; neuropsychological, active, program;

Introdução

Ter saúde, para além de ser uma questão individual, é, reconhecidamente, uma questão,

igualmente, familiar, comunitária, sistémica, pública. No mesmo sentido, não só a saúde

física, mas, também, a saúde mental.

Atualmente, é inquestionável, independentemente da ideologia, a necessidade, para que

exista uma efetiva e visível saúde pública, de intervenções a vários níveis, ou seja, do

preventivo ao remediativo, do individual, ao sistémico e ambiental, e, tanto quanto

possível, de forma concomitante, não mutuamente exclusiva. Processos que implicam

meios e recursos estruturados, eficazes, multidisciplinares.

Em termos de saúde mental, mundialmente e em contexto nacional, sabemos que a

prevalência de situações crónica e agudas é elevada. São muitas as estatísticas que

avançam com números gordos e as respostas não têm dado mostras do seu

emagrecimento. Contudo, sabemos que esforços têm sido avançados e aventados.

Contudo, e por razões de ordem vária, desde a falta de recursos estruturados, adesão à

intervenção, etc, ainda existe muito por fazer, sendo, à partida, parece-nos, uma aposta

ganha, quer em temos de intervenção propriamente dita, quer ao nível de investigação,

investir na área da saúde mental, do bem-estar humano.

Genericamente, podemos dizer que os processos neuropsicológicos afiguram-se como

imprescindíveis para a vida em sociedade, para um maior grau de autonomia e

funcionalidade, tendo o seu frágil domínio fortes implicações a nível académico,

pessoal, profissional e social. Indubitalmente, a intervenção neste domínio, em qualquer

idade, em qualquer situação ou contexto, assume particular relevância.

A Neuropsicologia é uma área da psicologia que procura a compreensão do

funcionamento cerebral e das suas respetivas alterações. Estuda a relação entre a

atividade nervosa superior e o comportamento, a cognição, as emoções, a motivação e a

vida em relação.

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Neste sentido, uma intervenção neuropsicológica consiste em avaliar e estimular as

funções cognitivas como a memória, a atenção, a linguagem oral e escrita, o cálculo, as

capacidades visuoespaciais, o planeamento e a ação, a destreza manual, o raciocínio,

não descurando os domínios emocionais e sociais, desde o reconhecimento e expressão

das emoções às competências sociais (Figueira & Paixão, sd).

Quer numa perspetiva remediativa, quer numa perspetiva preventiva, a intervenção

neuropsicológica possibilita a potenciação das funções cognitivas, emocionais, sociais e

comportamentais, de forma a promover o bem-estar do(s) indivíduo(s).

Numa lógica remediativa, a Reabilitação/Estimulação Cognitiva ou intervenção

neuropsicológica permite programar e realizar um plano adequado ao indivíduo e às

suas necessidades específicas, perspetivando a recuperação dos défices ou a

estabilização de um processo de deterioração, pretendendo tornar os sujeitos mais

autónomos (Figueira & Paixão, sd).

O plano de intervenção deve consistir num conjunto de procedimentos, técnicas e

tarefas de fácil aprendizagem e utilização, de forma estruturada, sistemática, integrada e

sistémica. Ainda, a intervenção deve ser especificamente orientada para as necessidades

de cada indivíduo, adequandose a todo o tipo de populações. A intervenção

neuropsicológica (quer a avaliação quer a reabilitação/estimulação) tem revelado

evidências, fundamentalmente, em Demências (Alzheimer, Parkinson, Demência

Vascular, etc.), em situações de Défice Cognitivo Ligeiro, em Acidentes Vasculares

Cerebrais, em Traumatismos Cranianos, em Perturbações do Sono, em Dislexia, em

situações de Hiperatividade com Défice de Atenção, em pacientes neurocirúrgicos, em

Epilepsia, em Sequelas Cognitivas e Psicológicas de Doença Cerebral ou Neurológica

(Ojeda et al., 2012). Ainda, a intervenção neuropsicológica é indicada no

acompanhamento do envelhecimento cerebral normal, como forma de manutenção das

capacidades, de prevenção e despiste de problemas e

dificuldades futuras, ou ainda de promoção dessas mesmas capacidades.

Numa perspetiva preventiva, a intervenção neuropsicológica é facilitadora e

potenciadora dos processos referidos, em várias idades e em diferentes situações.

Em Portugal, são já utilizados, em vários contextos, alguns programas estruturados,

todavia, os recursos de intervenção nesta área podem ser considerados ainda escassos e

ainda a carecer de estudos de validade.

Por ser um programa com base teórica sólida, com evidências comprovadas, bastante

divulgado e premiado, procedemos à adaptação do REHACOP (Ojeda et al., 2012).

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Contudo, dado que a pretensão (dos autores portugueses e dos autores originais) é

alargar o espectro de intervenção, a versão em português terá o acrónimo REHACOG,

significando reabilitação cognitiva.

O REHACOP (2012), originalmente, assume-se como um programa de reabilitação

neuropsicológica de psicoses e esquizofrenia. Resulta de um longo trabalho, de vários

anos, de vários especialistas em neuropsicologia, com mais de 18 anos de experiência

na área, e várias vezes premiado. Todavia, neste momento, os autores da versão

original, espanhola, têm projetos de utilização com outras populações, desde idosos,

adolescentes, jovens e mesmo crianças, com e sem dificuldades, em lógicas preventivas

e/ou remediativas, com as adequações consideradas necessárias.

O REHACOP tem uma orientação funcional, procurando a melhoria da qualidade de

vida e a autonomia funcional dos clientes. Neste sentido, todos os módulos incluem

exercícios funcionais (Figueira & Paixão, sd).

As atividades ou tarefas estão estruturadas por subdomínios e por níveis de dificuldade.

De referir que as tarefas propostas, dos diferentes módulos, estão organizados por 3

níveis de grau de dificuldade médio, médio-alto e alto. Inclui recomendações e

orientações sobre como avaliar as alterações ocorridas ou ganhos adquiridos.

Os materiais são acessíveis e coloridos e incluem as instruções para os clientes e as

soluções para o administrador. Pode ser utilizado com sessões individuais ou em grupo.

O programa completo é composto por 2 manuais, um para o cliente e outro para o

administrador (Figueira & Paixão, sd).

Apresentação do programa

Trata-se de um programa integral e estruturado, constituído por 8 módulos de

intervenção: atenção (total de 61 exercícios sobre atenção sustentada, seletiva, dividida

e alternada), linguagem (remete para questões de sintaxe, gramática, vocabulário,

compreensão verbal, fluidez verbal e linguagem abstrata, a partir de 40 tarefas),

aprendizagem e memória (para além dos 24 exercícios ou atividades específicos, este

módulo inclui intervenção em técnicas compensatórias e psicoeducação sobre como

melhorar os hábitos de vida relacionados com o rendimento mnésico), funções

executivas (atividades orientadas para a melhoria das capacidades de iniciação,

manutenção e finalização, resolução de problemas novos e flexibilidade cognitiva),

atividades da vida diária (o REHACOP tem uma orientação funcional, procurando a

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melhoria da qualidade de vida e a autonomia funcional do cliente. Neste sentido, todos

os módulos incluem exercícios funcionais. Neste módulo, reveemse alguns deles, ao

longo de 41 atividades básicas, instrumentais e avançadas), competências sociais

(composto por 55 exercícios estruturados, com uma metodologia de 10 passos de treino,

que perpassa todas as atividades de interação essenciais para a melhoria da comunicação

entre clientes e os elementos dos seus contextos de relação), cognição social (contempla

os subdomínios reconhecimento de emoções, raciocínio social, dilemas morais e teoria

da mente, num total de 54 atividades estruturadas. para famílias, recursos sociais,

relaxamento) e psicoeducação (este módulo inclui um CD com os materiais necessários

na formação em psicoeducação com clientes e/ou familiares em temas como questões

gerais e sintomas, a medicação e outras terapias, consumo de tóxicos, informação

específica para famílias, recursos sociais, relaxamento. Este módulo será adaptado às

situações de intervenção).

O programa é composto por um total de 300 exercícios de intervenção, acessíveis de

administração, com instruções e soluções e orientações para avaliação das mudanças,

fichas de seguimento e sugestões de seguimento, de tarefas para realizar em contexto

familiar. As atividades ou tarefas estão estruturadas por subdomínios e por níveis de

dificuldade. Os materiais são acessíveis e

coloridos e incluem as instruções para os clientes e as soluções para o interventor. Pode

ser utilizado em sessões individuais ou em grupo. O programa completo é composto por

2 manuais, um para o administrador/profissional e outro para o cliente (Ojeda et al,

2012).

Quanto aos módulos, o módulo Atenção e concentração: Considera-se que a atenção e a

concentração medeiam outros processos cognitivos e que, quando frágeis, podem ter

múltiplas consequências negativas na vida dos indivíduos. Inclusivamente, mesmo os

défices de atenção ligeiros, quando persistentes, podem contribuir para uma disfunção a

longo prazo, sugerindo um mau prognóstico.

Assim, quer numa perspetiva preventiva quer numa perspetiva remediativa, são

propostas tarefas que remetem para quatro componentes da atenção: atenção sustentada

(vigília e memória do trabalho), atenção seletiva (livre de distrações), atenção dividida

(capacidade para responder a duas tarefas simultaneamente) e atenção alternada

(capacidade para a flexibilidade mental).

O módulo Aprendizagem e memória: A memória é considerada um dos aspetos mais

importantes da e para a vida diária, já que reflete as nossas experiências passadas e

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permite adaptarmo-nos a situações presentes. Podem-se diferenciar várias fases na

memória: a retenção ou registo, a receção da informação, a fase de armazenamento ou

conservação da informação e a fase de recuperação da informação.

Sugerem-se tarefas que remetem para três tipos de memória, em função do tempo: a

memória sensorial, que supõe o reconhecimento momentâneo e dura milissegundos; a

memória a curto prazo, relacionada com a memória de trabalho; e a memória a longo

prazo, que retém informação durante mais tempo.

Foram selecionadas tarefas que permitem o treino de competências de memória, dos

vários tipos, incluindo as técnicas de recuperação, tendo em conta exemplos da vida

diária, que se prendem com as adaptações ambientais.

No módulo Linguagem, assume-se que para o indivíduo, enquanto ser social, a

linguagem é um processo fundamental de comunicação, de interação. Mas o domínio da

linguagem é complexo. Não é suficiente reconhecer as letras e as palavras, mas também

compreender o que se ouve ou o que se lê, argumentar, verbalizar, produzir, conhecer o

mundo, etc. Dada a sua pertinência, são propostas tarefas que implicam treino de

sintaxe, gramática, vocabulário, compreensão verbal, fluência verbal e compreensão e

utilização de linguagem figurativa.

No módulo Funções executivas, considera-se, genericamente, que as funções executivas

referem-se às capacidades implícitas no estabelecimento de metas, planificação e

execução ou realização do comportamento, de forma eficaz. Dito de outro modo, são as

capacidades necessárias para estabelecer metas, planificar etapas e formular as

estratégias para atingir os objetivos, as habilidades implicadas na execução e as atitudes

para conseguir realizar as atividades. Fragilidade ou ausência destas funções

comprometem a capacidade do indivíduo manter uma vida independente e produtiva,

pelo que devem ser objeto de um programa de intervenção. A intervenção sobre as

funções executivas implica a melhoria da capacidade organizativa de sequências do

comportamento até à realização dos objetivos desejados. Deve incidir sobre três áreas:

Seleção e execução de planos cognitivos. Refere-se ao comportamento necessário para

selecionar e completar uma atividade dirigida a um objetivo. Implica o conhecimento

dos passos, início da atividade, a organização dos objetivos, revisão do plano e

velocidade de execução, estabelecendo-se diferentes níveis de dificuldade;

Controlo do tempo. Implica calcular, aproximadamente, o tempo necessário para levar a

cabo o plano, criar horários, executar o plano e rever continuamente o tempo

despendido.

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Autorregulação do comportamento. As suas componentes são o conhecimento de si e do

próprio comportamento e o dos outros e a capacidade de controlo dos comportamentos.

O controlo e a regulação aumentam a capacidade reflexiva, a probabilidade de omissão

de comportamentos inapropriados e a emissão de comportamentos adequados.

Quanto ao módulo Cognição social, a cognição social é o conjunto dos processos

cognitivos implicados na forma de pensar das pessoas sobre si mesmas, sobre os outros,

sobre as situações e as interações sociais. Inclui os processos e funções que permitem

que o indivíduo compreenda, atue e beneficie do mundo interpessoal. Nos processos

que constituem a cognição social incluímos o processamento emocional ou

reconhecimento de emoções, o raciocínio social (perceção e

conhecimento social), a teoria da mente e os dilemas morais (estilo de atribuição). O

processamento emocional relaciona-se com a capacidade de perceber e utilizar as

emoções dos outros. A teoria da mente é a capacidade de fazer inferências sobre os

estados mentais dos outros (as suas intenções, disposições, crenças, etc.). A perceção

social refere-se à capacidade de valorizar as regras, os papéis sociais e o contexto social.

O conhecimento social engloba toda a informação necessária sobre os fatores que

influenciam as situações sociais. Oferece aos indivíduos referências para saber como

atuar em cada momento. Por último, o estilo de atribuição (dilemas morais) permite

refletir sobre as consequências de determinados comportamentos, sobre regras de

funcionamento social.

As competências sociais são o conjunto de comportamentos e atitudes que o ser humano

utiliza ou deve realizar na relação com os outros. Estes comportamentos baseiam-se

fundamentalmente no domínio das capacidades de comunicação e requerem

autocontrolo emocional por parte de cada indivíduo. Competências aprendidas desde a

infância e de maneira natural auxiliam a gestão das situações sociais, por forma a obter

objetivos e a preservar a autoestima. Dos vários aspetos das competências sociais, neste

módulo, destacamos a empatia, a assertividade, a escuta ativa, a comunicação verbal,

etc.

No módulo Atividades de vida diária, as atividades de vida diária podem ser

perspetivadas enquanto atividades básicas e atividades mais elaboradas ou complexas.

As atividades básicas de vida diária são o conjunto de atividades primárias, visando o

autocuidado e a mobilidade, que confere autonomia e independência ao indivíduo e que

lhe permite viver sem precisar de ajuda continuada de outros. As atividades englobadas

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nesta categoria são comer, controlar os esfíncteres, usar a casa de banho, vestir-se,

tomar banho, mudar-se (cama, sofá), passear, subir e descer escadas, etc.

As atividades de apoio ou complementares à vida diária são o conjunto de atividades

que permitem a adaptação do indivíduo ao seu meio ambiente, mantendo-se

independente na comunidade. São inseridas nesta categoria a capacidade em fazer

compras, usar o telefone, preparar a comida, cuidar da casa, lavar a roupa, usar

transportes, regular a medicação, utilizar o dinheiro, etc.

Mais complexas, as atividades avançadas da vida diária são o conjunto de

comportamentos elaborados de gestão e regulação do meio físico e do ambiente social,

que permitem ao indivíduo desenvolver um papel social, manter uma boa saúde mental

e disfrutar de uma excelente qualidade de vida. Tais atividades podem ser viajar,

participar em ações sociais, trabalhar, jardinagem e bricolagem, desporto, etc.

Finalmente, o módulo Psicoeducação consiste num módulo mais de cariz informativo,

em que se apresenta e discute, com o(s) indivíduo(s), a família ou rede de suporte, os

aspetos relacionados com a situação em causa e o seu tratamento, no caso de

intervenção remediativa, ou sobre as competências a treinar, numa perspetiva

preventiva.

Assim, no decurso das várias sessões, informa-se o indivíduo e a família sobre a

problemática em causa e a sua sintomatologia, os recursos sociais, os métodos de

relação, etc.

O conhecimento dos comportamentos, dos seus antecedentes e consequentes e formas

de controlo e regulação são uma boa estratégia de gestão da vida diária.

É um módulo em constante construção, de largo espectro, que deverá ser adequado à

problemática a trabalhar.

Para cada módulo, as diferentes tarefas propostas, em diferentes sessões, são

apresentadas com um grau de dificuldade crescente, de baixa a alta dificuldade.

Igualmente, cada competência é treinada a partir de vários exercícios, repartidos por

várias sessões.

Breves notas finais

É no sentido de colmatar alguma lacunas que nos propomos validar um programa que,

embora pensado, e testado, originalmente, para uma situação muito específica, as

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psicoses, nos parece passível ser utilizado em muitas outras situações, quer clínicas,

quer educacionais, quer numa perspetiva remediativa, quer preventiva, e mesmo com

sujeitos em percursos diferentes do seu desenvolvimento. À priori, a mais valia do

programa alvo do nosso ensaio situa-se não só na sua fundamentação, mas, igualmente,

na sua complexidade e variedade de processos a trabalhar, no seu grau de estruturação e

organização e evidências de eficácia.

É, pois, sob esta égide que nos propomos trabalhar com um programa de intervenção

altamente estruturado e cientificamente fundamentado que visa, num primeiro

momento, a capacitação, ou empowerment, nas palavras dos autores, a reabilitação, dos

indivíduos e suas famílias. Embora, à data, mais avaliado em temos clínicos,

remediativos, com populações crónicas específicas (psicoses), consideramos que, com

alguns ajustes, dado tratar-se de material maioritariamente visual, pode ser ensaiado em

outras populações, mesmo a consideradas normais, até de idades diversas e até em outra

perspetiva, incluindo a preventiva.

Embora um programa bastante recente, a sua eficácia tem sido testada em várias

populações, comprovada com várias publicações científicas nacionais (Espanha) e

internacionais, em revistas de alto impacto científico. Resulta de um longo trabalho, de

vários anos, de vários especialistas em neuropsicologia, com mais de 18 anos de

experiência na área (Ojeda et al., 2012).

Embora se trate de um programa de promoção cognitiva, neuropsicológico, pensado e

testado, na origem, para intervenção com uma população específica, com fragilidades

mentais, em situação de evolução prolongada, com limitações cognitivas, parece-nos

um recurso passível de ser utilizado em muitas outras situações, quer em termos

remediativos e /ou de manutenção, quer em termos preventivos, de promoção, com

adultos e mesmo, com alguns ajustes, com crianças e adolescentes.

Referências

Bengoetxea,E., Ojeda N., Segarra R., Sánchez P.M., García J., Peña J., García A.,

Eguíluz J.I & Elizagárate, E. Evidencias de eficacia de la rehabilitación cognitiva en

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O QUE PENSAM OS JOVENS-ADULTOS EM IDADE REPRODUTIVA

ACERCA DA DOAÇÃO DE GÂMETAS E DA GESTAÇÃO DE

SUBSTITUIÇÃO?

Naír Carolino1

Ana Galhardo1, 2

1Instituto Superior Miguel Torga 2 CINEICC - Faculdade de Psicologia e de

Ciências da Educação da Universidade de Coimbra

Resumo

A probabilidade de atingir uma gravidez espontânea, assim como as taxas de sucesso da

Fertilização In Vitro (FIV), tendem a ser sobrestimadas pelos jovens-adultos. A

aceitação social e legal das técnicas de reprodução medicamente assistidas diferem entre

países. Em Portugal, a doação de gâmetas é permitida porém a gestação de substituição

não é legal. Metodologia: Um questionário online foi realizado por 551 sujeitos sem

filhos, com idades entre os 18 e os 40 anos. Resultados: Dos sujeitos, 61,2% referiu

considerar doar gâmetas e 60% concordou que se necessitasse de recorrer a gâmetas de

dador se sentiria feliz. Um total de 42,1% da amostra considerou recorrer à gestação de

substituição. Discussão: Em relação à receção de gâmetas, a maioria dos participantes

considerou sentir-se feliz por realizar o desejo de parentalidade e de cuidar de uma

criança desde o seu nascimento. Apesar da globalidade dos sujeitos não colocar a

hipótese de recorrer à gestação de substituição, a maioria da amostra é a favor da sua

legalização. Conclusão: Os sujeitos revelam uma atitude positiva e de abertura para com

a doação/receção de gâmetas e a gestação de substituição.

Palavras-chave: fertilidade; doação de gâmetas; gestação de substituição.

Introdução

A parentalidade é um dos desejos mais universais da população adulta. Contudo, o

adiamento da maternidade é uma realidade cada vez mais presente e o avançar da idade

associa-se a diversos problemas de fertilidade (Bretherick, Fairbrother, Avila, Harbord

& Robinson, 2010; Lampic, Svanberg, Karlstrom & Tydén, 2006; Daniluk, Koert &

Cheung, 2012). Diversos estudos confirmam que homens e mulheres desvalorizam o

risco de virem a ter problemas de fertilidade e revelam poucos conhecimentos sobre esta

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e os fatores que lhe são inerentes (Daniluk et al., 2012; Maheshwari, Porter, Shetty &

Bhattacharay, 2008; Bretherick et al., 2010; Daniluk & Koert, 2013; Hampton, Mazza

& Newton, 2012; Lampic, et al., 2006).

Na tentativa de solucionar possíveis problemas relacionados com uma conceção de

forma natural e espontânea, muitos casais ponderam o recurso a técnicas de procriação

medicamente assistida (PMA) sendo que estas têm possibilitado, principalmente às

mulheres, ter uma maior perceção de controlo da fertilidade, contribuindo para a crença

de que, com segurança, podem adiar o nascimento do primeiro filho, até se sentirem

realmente preparadas para a maternidade (Daniluk et al., 2012). Contudo, na realidade,

apenas 50% dos casos onde se verifica declínio da fertilidade em mulheres entre os 30 e

os 35 anos e 33% dos casos em mulheres entre os 35 e os 40 anos, podem ser superados

através da PMA, permitindo uma gravidez viável (Maheshwari et al., 2008). De

salientar que esta taxa tem uma eficácia ainda mais reduzida em mulheres com idade

superior a 45 anos (10%) e os tratamentos, para além dos que envolvem a receção de

ovócitos, tornam-se pouco eficazes. No entanto, e como vários estudos corroboraram,

jovens universitários revelam ter expectativas irrealistas quando à efetividade de

sucesso das técnicas de PMA, nomeadamente da fertilização in vitro (FIV), e

considerariam, em caso de problemas de fertilidade, recorrer a esta técnica (Lampic et

al., 2006; Peterson, Pirritano, Tucker & Lampic, 2012).

A aceitação social e legal das técnicas de PMA difere entre países. Em Portugal, e

segundo o Decreto-Lei nº 32/2006, artigo 10º, a doação/receção de gâmetas é autorizada

podendo recorrer a esta doação casais que não conseguem obter uma gravidez através

de técnicas que utilizem os seus gâmetas e desde que as condições permitam manter a

qualidade dos gâmetas dos dadores.

Outro recurso utilizado em vários países como, por exemplo, em alguns estados dos

Estados Unidos da América ou em Inglaterra, por casais que pretendam ser pais é a

Maternidade de Substituição, também chamada por Gestação de Substituição.

Maternidade de Substituição é definida como uma prática pela qual uma mulher

(chamada mãe de substituição) fica grávida e dá à luz um bebé, com o fim de o ceder a

alguém que não pode levar a cabo uma gravidez. De notar que, na atualidade, esta

prática não é permitida pela legislação portuguesa, sendo nulos os negócios jurídicos,

gratuitos ou onerosos dado que para a Constituição Portuguesa, a filiação de mãe resulta

do facto do nascimento, ou seja, é mãe quem tem o parto (artigo 1796º, Código Civil).

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Em Portugal, estudos que abordem as atitudes e o posicionamento dos jovens-adultos

face à doação de gâmetas e à gestação de substituição são escassos. Este estudo

pretendeu explorar o que pensam jovens-adultos em idade reprodutiva e sem filhos

acerca da doação de gâmetas e da gestação de substituição.

Materiais e Métodos

Participantes

Os participantes desta investigação são adultos (com idades compreendidas entre os 18

e os 40 anos, inclusive), de ambos os sexos, em idade reprodutiva sem filhos. A amostra

é constituída por 551 sujeitos, sendo 119 (21,6%) do sexo masculino e 432 (78,4%) do

sexo feminino sendo a média de idades dos participantes de 27,56 anos (DP = 5,05).

Quanto ao estado civil, 75% (n = 413) da amostra é solteiro(a). A maioria dos sujeitos

da amostra encontra-se empregado (n = 329; 59,7%). De salientar ainda que 75% (n =

395) dos sujeitos encontram-se numa relação íntima.

Procedimentos

Com vista à obtenção dos dados pretendidos para o estudo recorreu-se à elaboração de

um protocolo a ser administrado via online, no início do ano de 2015, entre os meses de

fevereiro e abril. A amostra foi recolhida, primeiramente, através de um procedimento

de amostragem por conveniência, sendo que os investigadores selecionaram membros

da população mais acessíveis e, posteriormente, através do método de amostragem Bola

de Neve.

Instrumentos

Os dados sociodemográficos foram obtidos através de um breve questionário realizado

para a presente investigação. Este englobou perguntas relativas ao sexo, à idade, às

habilitações literárias, à situação profissional, entre outras.

Para avaliar as atitudes face à doação de gâmetas e à gestação de substituição,

elaborouse um questionário que englobou questões sobre a aceitação destas técnicas e o

posicionamento dos participantes sobre as mesmas. Consoante a natureza das questões

colocadas, o formato de resposta poderia ser dicotómico (Sim/Não), escala (1 =

discordo totalmente; 5 = Concordo Totalmente) e de escolha múltipla.

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Análise Estatística

As análises estatísticas realizaram-se com recurso ao programa informático Statistical

Package for the Social Sciences (SPSS), versão 20.

Para a análise das atitudes perante a doação de gâmetas e das atitudes perante a

maternidade de substituição procedeu-se à obtenção das frequências e percentagens de

cada categoria. A existência de eventuais diferenças entre os sexos foi analisada por

recurso ao teste do Qui-quadrado.

Em todas as análises realizadas utilizou-se um intervalo de confiança de 95%.

Resultados

Seguidamente, proceder-se-á à apresentação dos principais resultados.

Atitudes perante a Doação de Gâmetas

A maioria dos participantes (70,9%) (n = 370) do estudo não é dador quer de órgãos

quer de tecidos. Os participantes da nossa amostra não revelaram diferenças entre os

sexos no que respeita a esta variável de ser ou não dador (p > 0,05).

Quanto às atitudes perante a doação de gâmetas, 52% (n = 271) dos sujeitos apoiariam

totalmente se um/a amigo/a quisesse doar gâmetas a outro casal, 53% (n = 276) apoiaria

totalmente se um/a amigo/a quisesse ser recetor de gâmetas e 48% (n = 250) concorda

totalmente que a doação de gâmetas é uma boa forma de ajudar casais que não podem

ter filhos.

Relativamente à possibilidade de doar gâmetas, 63,3% (n = 202) da amostra sentir-seia

motivada por ajudar um casal que não pode ter filhos e 27,3% (n = 87) sentir-se-ia como

se a contribuir para o seu semelhante. Dos participantes, 41,7% (n = 133) não revela

receio em vir a ser contactado mais tarde e 49,5% (n = 158) não se sentiriam

incomodados por ter uma pessoa com a sua informação genética.

No que respeita à possibilidade de ter que recorrer a gâmetas de dadores, 31,9% (n =

166) dos sujeitos concorda totalmente que se sentiriam felizes por concretizarem o

sonho de virem a ser mãe/pai e 28,3% (n = 147) referem que não se sentiriam nada

receosos por virem a sentir que o filho não é realmente seu.

Quanto aos fatores que aumentariam a probabilidade de doar gâmetas, 28,8% (n = 150)

dos sujeitos concorda parcialmente que ter aconselhamento aumentaria esta

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probabilidade assim como 25,8% (n = 134) concorda parcialmente que poder falar com

outras pessoas dadoras também aumentaria a probabilidade de doar gâmetas.

Atitudes face à Maternidade de Substituição

No que se refere à legalização da maternidade de substituição, 78% (n = 405) dos

sujeitos da amostra estão a favor. Tanto no sexo masculino como no feminino, a maioria

dos sujeitos são a favor da legalização da maternidade de substituição. Não foi

encontrada uma associação entre a atitude perante a legalização da Maternidade de

Substituição e o sexo (p > 0,05).

Relativamente a recorrer à maternidade de substituição, 57,9% (n = 300) dos sujeitos

não colocariam a hipótese de recorrer à mesma. Novamente, não foram encontradas

diferenças entre homens e mulheres relativamente à possibilidade de recorrer à gestação

de substituição (p > 0,05).

Dos participantes, 59,6% (n = 224) indica que se um/a amigo/a recorresse à gestação de

substituição apoiaria a sua decisão e 51,2% (n = 189) apoiaria uma amiga se esta fosse

gestante de substituição.

Dos participantes que colocariam a hipótese de recorrer à gestação de substituição,

49,1% (n = 107) concorda totalmente que se sentiria feliz por concretizar o sonho de ser

mãe/pai, 52,3% (n = 114) concorda totalmente que se sentiria contente por cuidar de

uma criança desde o seu nascimento e 38,1% (n = 83) discorda totalmente que se

sentiria receoso por poder vir a sentir que o filho não é realmente seu.

Discussão/ Conclusão

A presente investigação teve por objetivo explorar as atitudes dos participantes

relativamente à doação de gâmetas e as atitudes perante a maternidade de substituição.

Dada a escassez de estudos neste âmbito em Portugal, não é possível comprar os

resultados obtidos com estudos anteriores. Porém, e relativamente às atitudes face à

doação de gâmetas, foi possível verificar que a maioria dos participantes revelam uma

atitude positiva perante a doação/receção de gâmetas. Ajudar um casal que não pode ter

filhos e sentir-se a contribuir para o seu semelhante são as principais motivações dos

participantes. Posto isto, e visto que apenas uma percentagem muito baixa dos

participantes deste estudo são dadores de gâmetas, disponibilizar informações e realizar

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ações de promoção da doação de gâmetas seria uma mais-valia para ajudar casais que,

por problemas de fertilidade, não conseguem conceber.

No que respeita à receção de gâmetas, a maioria dos participantes consideraram que se

sentiriam felizes por concretizarem o sonho da parentalidade e de cuidarem de uma

criança desde o seu nascimento. Com estes resultados, podemos supor que a doação e a

receção de gâmetas é uma alternativa aceite pela população do estudo.

Relativamente às atitudes acerca da gestação de substituição, apesar da maioria dos

participantes não colocar a hipótese de recorrer à maternidade de substituição, a minoria

que no caso de impossibilidade de conceber um filho biológico recorreria a esta

alternativa considerou que se sentiria feliz por concretizar o seu sonho de se tornar

mãe/pai e que não se sentiria receoso de vir a sentir que o filho não era realmente seu.

A presente investigação apresenta algumas limitações metodológicas que devem ser

ponderadas para estudos posteriores como, por exemplo, a elevada escolarização da

amostra e o elevado número de participantes do sexo feminino não viabilizando uma

generalização dos resultados obtidos para a população geral. Apesar destas limitações, o

nosso estudo apresenta contributos importantes para a área. Reconhecendo que em

Portugal ainda são escassos os estudos sobre doação de gâmetas e gestação de

substituição, este estudo revela-se inovador por abordar as atitudes de jovens-adultos

sem filhos e em idade reprodutiva perante estes temas.

Dadas as limitações consideradas nesta investigação, seria interessante que, em

próximas investigações, a distribuição dos participantes por sexo fosse mais igualitária

assim como a participação de sujeitos com níveis de escolarização mais baixa, de forma

a tornar-se possível generalizar os resultados para a população geral.

Em conclusão, e no tocante ao posicionamento no que respeita à doação/receção de

gâmetas e à gestação de substituição, os participantes neste estudo parecem demonstrar

abertura e uma atitude positiva.

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SAÚDE MENTAL E O (RE) ENTENDIMENTO DE UMA REALIDADE

VIVIDA.

Eliana Nubia Moreira

Centro Universitário Unirg – Gurupi/ TO - Brasil

Resumo

Este estudo visou apreender a vivência emocional de clientes egressos de primeira

internação psiquiátrica, atendidos no serviço de Plantão Psicológico de um Ambulatório

de Saúde Mental, decorrente da experiência de terem estado sob custódia médica com

perda de sua autonomia pessoal. A intervenção psicológica oferecida a estes clientes

pela plantonistapesquisadora caracterizou-se como emergencial, orientada pelos

pressupostos da Abordagem Centrada na Pessoa.

Palavras Chave: plantão psicológico, prática clínica institucional, intervenção

psicológica.

Abstract

This study aimed at understanding the emotional experience of patients who have

egressed from their first psychiatric intemment and were attended in a psychological

walk-in service of a Public Mental Health Clinic. The focus was their emotional

experience derived from the fact of having been under medical custody and the

consequent lack of personal autonomy.The psychological intervention offered bay the

researcher-clinician pointed out as na emergency oriented by theoretical pressupposed

from the Person Centered Approach.

Keywords: psychological emergence attendance, institutional clinical practice,

psychological intervention.

Introdução

Este artigo surgiu da oportunidade em poder dialogar com pesquisadores de outros

contextos institucionais, sobre a experiência adquirida através de uma pesquisa

desenvolvida no Ambulatório de Saúde Mental, na cidade de Franca SP – Brasil, à

partir de um estudo motivado pelos questionamentos levantados pela pesquisadora em

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sua própria atuação enquanto Coordenadora do Departamento de Psicologia do Hospital

Psiquiátrico local, originando na produção da dissertação no Mestrado em Psicologia

Clinica, e por ora servindo de contributo científico ao 2º Congresso Nacional de

Conversas de Psicologia, pela pertinência da temática “Psicologia e Saúde Mental”, e

pela qualidade e relevância dos resultados obtidos na referida pesquisa, formalmente

ainda não divulgados.Apesar dos movimentos efetivos de mudanças no campo da saúde

mental, o debate aqui apresentado ainda se torna relevante, pois é um desafio para o

profissional de psicologia se aprimorar, contribuindo com melhoria de qualidade de

vida para todos, através da criatividade, competência e com capacidade de criar

respostas, elaborando novas possibilidades de intervenção, que contribuam para que a

Saúde Pública se transforme em produção de vida. É um tema atual ainda pertinente,

por ser perceptível o fato que entre o passado perdido e o tempo vivido no hospital

psiquiátrico, existe para os pacientes o momento traumático da internação, e assim

tentar compreender a patologia psíquica como um espaço onde existe um conflito de

mundos separados entre vencedores e vencidos, o mundo dos adequados, adaptados,

produtivos e o mundo de uma criatura meio dispersa, que não consegue inserir sua

produção num contexto dominante, gerando estigmas que produzem, provavelmente os

comportamentos agressivos (auto-agressivos e hetero-agressivos), num espaço de

tempo que revela a persistencia da alienação de uma sociedade estigmatizante, continua

sendo instigante. O ambiente em que as pessoas internadas vivem, ou o tratamento

sómente de fármacos pouco favorece seus desenvolvimentos individuais, já que as

mantem alienadas da vida: ora excitadas, ora paralisadas (algumas com o corpo

amarrado) e sempre controladas pelos funcionários da instituição, através de drogas

medicamentosas. E assim, angustiada com a alienação dessas pessoas, através da

atuação prática e como pesquisadora, que esta comunicação intenciona reativar a

reflexão sobre as diferentes expressões de pensamentos e dos diversos modos de ser.

Assim, a enfase está no percurso da pesquisa que se interessou em conhecer quais os

elementos estavam presentes na vivência emocional dos pacientes egressos de

internação psiquiátrica, e que obrigatoriamente passavam pelo Ambulatório de Saúde

Mental. Quais conflitos internos os impediam de se desenvolverem com autonomia?

Do ponto de vista institucional, o objetivo da implantação de um serviço de Plantão

Psicológico, num Ambulatório de Sáude Mental, consistiu em prestar um tipo de

atenção psicológica de carater emergencial , com a intenção de contribuir com um

espaço onde as pessoas que passaram por uma única internação psiquiátrica, pudessem

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rever e refletir suas questões pessoais, através de um tipo de interlocução que facilitasse

a escuta de si, identificando e reconhecendo seus próprios sentimentos e possibilidades

de autodireção no momento em que enfrentavam as dificuldades na retomada de

autonomia pessoal.

O objetivo da pesquisa, especificamente, foi o de descrever os elementos que estavam

presentes na vivência emocional de indivíduos que passaram por um rompimento em

relação a sua autoomia pessoal, em decorrencia de terem estado sob custódia

psiquiátrica, pela primeira vez, em uma institição hospitalar, de forma a interpretar o

signficado desta experiência para o cliente. Também interessou compreender, a partir da

estrutura do vivido que emergiu desta pesquisa, a demanda psicológica em relação ao

Ambulatório de Saúde Mental e ao Sistema de Saúde como tal.

Conhecer a demanda emocional deste individuo que esteve sob custódia, foi procurar a

compreensão do significado da vivência que o levou a um rompimento com sua

autonomia pessoal, e conhecer aspectos subjetivos do funcionamento humano, quando

este está comprometido em sua relação com a realidade.

Estado da Arte

Perspectivas de uma Saúde Mental Humanizada

A existência do ser humano se constitui de variáveis biológicas, sociais, culturais e até

espirituais entrelaçadas entre si, e a compreensão do fenômeno da doença mental requer

que os serviços de saúde mental mudem as atitudes em relação ao predominio da visão

psiquiátrica e das concepçõs de saúde e doença em termos de médias excludentes. Está

estabelecido um padrão que normatiza, de acordo com um manual que contém

características de personalidades ou sintomas aparentes, que padronizam um jeito de

ser, excluindo as pessoas que estão de fora dos padrões, determinando a normalidade

e/ou a anormalidade. As equipes responsáveis por intervenções em Saúde Mental tem

mantido um olhar atencioso às questões referentes às divergencias existentes entre o

discurso interdisciplinar e sua prática, pois tem se percebido que não existe parceria na

realização dos atendimentos, bem como ainda se mantém a hieraquia entre os saberes,

destacando-se a Psiquiatria.

Sundfeld(2000) em seu estudo, escolheu como objeto de pesquisa uma equipe

multiprofissional em saúde mental, sendo o seu objetivo discutir os modos como o

homem tem lidado com a loucura ao longo das épocas, para compreender através do

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pensar coletivo, como atualmente esta relação tem se configurado. No Brasil , o

interesse residiu em conhecer a articulação do movimento existente entre saberes

diversos e a redimensão paradigmática, na tentativa de se construir uma nova base de

compreensão da relação entre saúde e doença. A proposta era de transitar entre os

dominios de conhecimentos distintos, em que os profissionais de abordagens diferentes

se abrem a um tipo de relacionamento com o saber, que pressupõe acolher as diferenças.

Desta forma, os profissionais de saúde mental passam a repensar o modelo de atuação

dentro da própria instituição.

Nas reflexões que esta autora faz em relação às diferentes expressões de pensamentos e

dos diversos modos de ser, concluiu que o pensamento complexo ganha vida através da

relação entre eu e o outro, se abrindo a conhecimentos que possam “promover a

transposição de posturas valorativas que empobrecem nossas relações e contribuem para

a marginalização das diferença” (p93). Neste processo de construção, propõe “recriar

uma ética em que a compreensão, a tolerância e a solidariedade encontrem um lugar no

cotidiano das pessoas” promovendo uma “participação democrática e igualitária” (…)

“com-vivência extra muros entre ditos loucos e sociedade”(p94).

Campos(1994), que analisou o discurso das obras de georges Cnaguilhem, nas décadas

de 40 e 60, pouca atenção foi dada à descoberta de que a doença era percebida a partir

de normas socialmente construidas em supostos valores anormais, válidos e escritos por

algum cientista.

Baseando-se neste academicismo crítico, este autor propõe:”uma reconstrução do

conceito de CURA: curar alguém seria sempre lutar para a ampliação do

COEFICIENTE DE AUTONOMIA desta própria pessoa” (p50).

De acordo com o Plano de Ação de Saúde Mental 2001/2002, é necessário garantir a

melhoria na qualidade de vida das pessoas, famílias e grupos, de acordo com os

recursos existentes, através do desenvolvimento e fortalecimento de uma comunicação

interpessoal e social positiva, reconhecida e expressa em sentimentos e emoções,

definida pela resolução de conflitos estabelecidos e mantidos nos vinculos afetivos.

Enfatizando esses aspectos psíquicos que incluem o desenvolvimento sócio-cultural-

esportivo ,em ações promotoras e preventivas de um estilo de vida favorecedor de uma

boa saúde mental.

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281

O adoecer na visão da teoria humanista proposta por Carl Rogers

Permitir a si mesmo compreender profundamente outra pessoa, implica numa abertura à

mudança e isto é duplamente enriquecedor, pois mesmo com o cliente mais

comprometido, a tentativa de compreensão da estranheza de seu mundo psicótico, seus

pensamentos estranhos e seus desânimos, como também seus movimentos afetivos, é

algo importante, pois legitima a experiência de aceitação incondicional, tornando a

relação interpessoal autêntica.

Mas exercitar esta capacidade requer um contexto de relações humanas positivas que

permitam à pessoa defender-se de situações ameaçadoras ao seu self, pois percebendo-

se impossibilitada de expressar a angústia, conflitos estruturais se instalam e o estado

mental da pessoa passa a ser pouco receptivo às condições naturais de empenhar-se em

uma comunicação interpessoal saudável. Assim, o grau de compreensão da pessoa para

lidar com o processo de adaptação e integração da existência humana, passa a ser

insuficiente.

Diante desta insuficiência quanto a capacidade de solução de problemas existenciais, o

processo de crescimento para a maturidade psicologica da pessoa, passa a ser

insatisfatório no conjunto, e assim, sejam quais forem as contingências do meio, o

desenvolvimento integral do individuo fica abalado. Estando a pessoa incongruente,

devido à existencia de fatores pertubadores, a expressão do seu comportamento se

efetuará de maneira irracional, subjetivamente insatisfatória e objetivamente ineficáz,

pois a percepção que o individuo tem de seu self é negativa.

E assim, o individuo adoece, pois a sua saúde e seu bem estar físico tem uma relação

íntima com sua experiência psiquica, ou seja:” pesquisa, tanto médica quanto

psicológica, revela cada vez mais a interpenetração e a inseparabilidade dos aspectos

físicos e psíquicos do organismo” (Rogers, 1959; p.42).

Plantão Psicológico: uma perspectiva de intervenção psicológica

O Plantão Psicológico como modalidade de atendimento clínico tem como objetivo

estabelecer uma relação que favoreça e promova o crescimento e a maturidade pessoal,

através da utilização dos recursos internos latentes, por confiar no desenvolvimento das

potencialidades inerentes à pessoa. Segundo Cury (1999), esta modalidade de

atendimento clínico-psicológico efetivou-se em decorrencia da “significativa e crônica

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demanda que congestiona e dá origem às filas de espera da instituição”, sendo um

serviço que privilegia a demanda emocional imediata do cliente, constatando em seus

estudos que é uma modalidade de assistencia em saúde mental que possibilita a

ampliação da intervenção clínica no contexto da saúde pública.

O Plantão Psicológico é uma forma de atenção psicológica, na qual o tipo de ajuda

oferecida decorre da demanda, no momento em que emerge sua necessidade. A escuta

se faz na hora imediata do seu pedido de ajuda, ou o mais imediato possível, e de

maneira ampliada. Assim um processo de transformação se inicia e, quem sabe,

trazendo uma possibilidade de identificação dos determinantes de um processo saúde-

doença, bem como promovendo uma compreensão de como se dá a institucionalização

dos doentes mentais pela inexistencia de uma escuta qualificada nos primeiros

momentos das queixas e confusão dos sentimentos.

Metodologia

Sujeitos

Foram participantes desta pesquisa usuários adultos, egressos de internação psiquiatrica

encaminhados do Hospital Psiquiátrico para o Ambulatório Saúde mental, para consulta

de atendimento psiquiátrico e/ou psicológico, sem considerar-se outras variáveis como

sexo ou diagnóstico psiquiátrico.

Tipo de Pesquisa

Pesquisa fenomenológica, que é qualitativa e de natureza, pois o interesse está em saber

“ o que é determinada coisa” numa tentativa de construir uma compreensão do que

acontece com o fenômeno indagado (Amatuzzi,2001), onde procura basear-se numa

análise sistemática de registro de experiências, relatados e coletados numa relação

pessoal, no qual o pesquisador facilita ao colaborador o acesso a sua experiência vivida.

Este estudo representa mais uma maneira de ter uma visão fenomenológica do

psiquismo, e assim fazer a escolha do caminho possível para realizar a compreensão da

vivência, numa pesquisa que interroga a realidade subjetiva via relação interpessoal.

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283

Método

O método fenomenológico proposto por Forghieri(1997) compreendeu três momentos:

a) Envolvimento existencial: a plantonista-pesquisadora teve acesso às vivências

emocionais de cada cliente durante o atendimento no Plantão Psicológico, via atitudes

de empatia e aceitação positiva incondicional; b) Distanciamento Reflexivo:

desenvolvido a partir de uma compreensão psicológica dos registros das sessões do

plantão, juntamente com as impressões da plantonista, escritas imediatamente após

encerramento de cada sessão; c) Sintese Específica de cada cliente quanto aos elementos

presentes na sua vivência em relação ao tema, elaborada com base nos registros

realizados e levando a uma interpretação fenomenológica do vivido individual.Ao final

elaborou-se uma Síntese Geral contendo os elementos reveladores da essência do

fenômeno estudado em relação a todos participantes . Também foi elaborado um Diário

de Campo da pesquisadora, contendo suas observações e impressões relativas ao

cotidiano do Ambulatório de Saúde Mental, permitindo lhe uma visão mais globalizada

da instituição que abrigou a intervenção psicológica, e conferindo a pesquisa um caráter

etnográfico.

Análise dos Dados

Havia duas fontes de dados da mesma natureza: a) anotações no Diário de Campo das

impressões da pesquisadora sobre a vivência cotidiana na instituição,incluindo as

percepções quanto às formas de acolhimento dos pacientes pela instituição e dos

mesmos nos seus momentos iniciais de reconhecimento do contexto em que são

atendidos, b) as impressões imediatas da plantonista-pesquisadora sobre o atendimento

no Plantão Psicológico através de registros efetivos após o término das sessões, e estas

ajudaram na compreensão e interpretação do material clínico gravado bem como a

descrição e análise dos significados da própria vivência durante o envolvimento

terapêutico, sendo que o conjunto destes registros possibilitou uma análise das possíveis

influências no contexto institucional sobre o vivido dos sujeitos da pesquisa.Esta

pesquisa teve uma dimensão clínica, ao propor uma ação de intervenção psicológica

facilitadora da mobilização dos recursos psicológicos internos do sujeito, favorecendo-

lhe uma progressiva aproximação com sua experiência.

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Síntese Compreensiva Geral dos Atendimentos

Todos os clientes atendidos revelaram sentimentos de solidão e de tristeza, como se a

vida tivesse se tornado um fardo duro; também evidenciaram fragilidade frente à

realidade e ás circunstâncias a serem enfrentadas no cotidiano. Havia em todos uma

queixa quanto a ausência de relacionamentos gratificantes, como se estivessem jogados

à própria sorte. Também experimentam medos e temem pelas reações alheias. Estes

clientes demonstraram vontade de sair da ociosidade e retomarem a vida produtiva em

seus trabalhos. Os clientes que alcançaram a dimensão da própria dor idealizaram um

desejo de mudança de vida, reconhecendo insatisfação diante do desconhecimento de sí

mesmo e das próprias potencialidades. Apreendeu-se nos relatos que estes clientes não

estão informados sobre o próprio diagnóstico, sendo incompreensível para eles os

sintomas apresentados. Com as dúvidas geradas sobre as possibilidades de mudança, o

sentimento de impotência se instala e a incompreensão de quem são e de como estão os

impedem uma auto-referência realista. Evidenciou-se que a maioria deles busca a fé em

Deus, quando se percebem incapacitados, ou ameaçados com a possibilidade de se

desintegrarem. Todos deram um significado próprio ao tipo de ajuda recebida no

Plantão Psicológico; foram capazes de responder positivamente à relação estabelecida

em um único encontro terapêutico com a plantonista, não demosntrando resistência e

nem se sentindo ameaçados. Também expressaram sentimentos positivos em relação às

atitudes da plantonista. Ficou eviente que estes clientes se beneficiarm de um

atendimento psicológico, além do tratamento medicamentoso, pois puderam comunicar

um pedido de ajuda à plantonista.

Síntese do Diário de Campo

A equipe de profissionais do Ambulatório de Sáude Mental, composta por

psicólogos,psiquiátras, fonoaudiólogos e assistência social é uma equipe com formação

tradicional voltada ao psicodiagnóstico ,e a psicoterapia de médio e longo prazo,

mantendo-se a visão ortodoxa de um processo de anamnese e avaliação do paciente em

até três encontros, sendo este o procedimento técnico inicial de acolhimento do usuário,

no qual o profissional mantém uma postura de coleta de dados, e não de intervenção

clínica imediata. A clientela do ambulatório nem sempre se adequa aos processos

psicoterápicos tradicionais, pois as queixas principais dos pacientes incluem, em sua

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maioria, a necessidade de encontrar ajuda profissional que esteja disponível a dar-lhes

apoio e diminuir o desconforto no momento imediato em que a dor psíquica se

apresenta. Ao serem inicialmente atendidos nas Unidades Básicas de Saúde por um

médico especialista, e avaliados de necessidade de assistência psiquiátrica, eram

encaminhados ao Ambulatório de Saúde Mental, sem serem informados de que o

encaminhamento não implicaria em serem atendidos imediatamente, o que provocava o

descontentamento e alteração de humor, ao serem informados de que teriam que

aguardar na fila de espera para consultas psiquiátricas ou psicológicas; sendo que a

atenção e assistência ao seu sofrimento psíquico teria que ser adiada. Em contrapartida,

se o usuário esteve impedido de comparecer no dia e horário marcado, devido a algum

mal estar físico ou psíquico, ou devido dependencia estabelecida que o impedia de ir

sózinho pois as consultas psiquiátricas exigia-se a presença de um membro da familia

para relatar o estado clínico geral do paciente, e a pesquisadora questionou com os

profissionais se realmente o cliente estaria incapacitado para falar de suas próprias

vivências, ou se o sistema o fazia sentir-se incapacitado delegando o poder à familia,

rompendo assim as suas possibilidades de autonomia. Remarcar a consulta perdida, só

era permitida para mês seguinte, e como estes retornos eram para reavaliação

medicamentosa, a recepção propunha que deixassem a receita médica anterior para

serem entregues aos médicos responsáveis, os quais após dois dias devolveriam à

familia autorizando a compra dos medicamentos. A pesquisadora se inquietava com esta

atitudes de medicar sem nenhum contato com o usuário, embora parecesse tranquilizar

os familiares que, automatizados com este funcionamento, sentiam –se agradecidos por

terem sido favorecidos com a medicação prescrita. O bem estar do paciente estava

totalmente condicionado a esta relação medicamentosa e não ao vínculo que poderia

propiciar uma consciência crítica no seu dinamismo interno. A recepção fica

constantemente sufocada, por ser na porta de entrada do sistema que explodem as

insatisfações, dando a plantonista a autonomia de atender ou não qualquer pessoa,

inclusive recepcionistas, mesmo não sendo participantes da pesquisa, quando estas

pareciam não mais suportar o conflito emocional que as estava deixando angustiadas. O

retorno dado por estes profissionais de que o plantão os havia ajudado a compreender

aspectos de sua vivência geradora de angustia, assim como que sentiam-se agradecidas

pela disponibilidade, acolhimento, compreensão e afeto da plantonista, foi um dado

analisado na discussão das possíveis manifestações do potencial latente, quando a

pessoa encontra um ambiente facilitador que otimiza seus recursos positivos de auto

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crescimento.Em relação ao usuário, ao ser informado sobre a presença da psicóloga de

plantao, aceitava o atendimento prontamente, e no momento em que a porta de entrada

tinha se fechado para o atendimento de sua demanda imediata, o plantão psicológico

passava a ser a possibilidade de manifestação da esperança de resolução ou

compreensão da vivência geradora de angústia. Assim se estabelecia um contato

psicológico favorável entre usuário e terapeuta, pois aquele sentia que o seu pedido de

escuta havia sido acolhido. A terapeuta também se fortalecia, pois pressentia que existia

aceitação da relação, e isto a motivava a fazer uma escuta qualificada e exercitar

atitudes de aceitação positiva incondicional para com o cliente.

Discussão dos Resultados

Esta pesquisa constatou que a implantação de um novo projeto de intervenção é possivel

desde que a comunicação entre os diversos setores se estabeleça viabilizando a

qualificação da assistencia, através de um processo de reflexão sobre o funcionamento

do sistema de saúde. A necessidade de um modelo de atendimento que reorganize a

demanda deste tipo de contexto público torna-se significativa, podendo concretizar-se

pela criação de um espaço no qual seja privilegiada uma escuta qualificada, em

detrimento das rotinas já cristalizadas.

A proposta de Sundfeld (2000) de discutir com a equipe multiprofissional os modos

como se tem lidado com a loucura é pertinente à realidade constada no Ambulatório,

pois neste estudo, se propõe uma reconfiguração do modelo atual existente

redimensionando a prática clínica para uma atuação em que a equipe priorize a

discussão do significado da dor psíquica somatizada ao corpo físico, reorganizando as

possibilidades de conciliar ao tratamento as alternativas de lazer, educação, trabalho e

cultura, como meios de promoção de saúde e devolução de autonomia. A prática de

alguns profissionais de medicina, observada no contexto ambulatorial estudado ainda

prioriza um cotidiano no qual tenta-se normalizar ou curar o paciente, em atividades que

atendem um maior numero possível de usuários, num mínimo espaço de tempo,

exercendo-se o papel burocrático de assinar receitas. São estes mesmo profissionais que

encontram maior dificuldade em participar de atividades propostas para discutir o

trabalho realizado, com implicações sérias para a relação que poderia ser estabelecida

entre profissional e usuário, num diálogo propício a fala e a escuta, que possivelmente

desencadearia no paciente um movimento de compreensão de sua história e de seus

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sintomas, desapropriando a doença do saber médico, e permitindo-lhe confrontar com

suas próprias experiências subjetivas.

Pesquisas realizadas por Pessoti(1996) confirmou que o tratamento no século XIX era

apenas medicamentoso, excluindo a participação do cliente. Analisando os dados desta

pesquisa contasta-se que no século XXI todos os sujeitos da pesquisa ainda estão em

tratamento em uma só ação terapeutica na qual prioriza-se só o fármaco em detrimento

de alternativas que possibilitariam uma relação dos pacientes com seus estados afetivos.

A pesquisadora questiona se isto ainda ocorre porque o conhecimento da psiquiatria se

mantêm institucionalizado, ou, se a psicologia ainda não se apropriou do conhecimento

que tem sobre os fenômenos psíquicos, sendo as contribuições favoráveis à expansão

da intervenções clínicas, no âmbito institucional, com atitudes humanizadas. Não seriam

estes os profissionais mais capacitados para iniciar ações terapêuticas propostas por

Campos(1994), onde se valoriza o vinculo entre usuário, familiares,equipe técnica; o

acolhimento do ususário pela equipe técnica numa dimensão afetiva; a efetivação do

contrato especificando direitos e deveres das pessoas envolvidas no tratamento e a

devolução da autonomia ao usuário para que o mesmo exercite o auto-cuidado? Este é

um desafio no qual se propõe uma clínica ampliada focalizando ao atendimento os

recursos existentes no cliente.

O Plantão Psicológico no Ambulatório de Saúde Mental cumpriu a proposta de prestar

um tipo de atenção psicológica de caráter emergencial a pacientes egresso de internação

psiquiátrica. Possibilitou uma flexibilização, ainda que temporária dos serviços de

atendimento comunitario, sendo possível sistematizar esta aprendizagem tão

significativa da inserção de uma prática de orientação humanista, especificamente da

Abordagem Centrada na Pessoa, num contexto de instituição pública. Sendo assim, esta

pesquisa corroborou os resultados obtidos por Mahfoud(1999): o fato de poderem

recorrer a uma plantonista para realizar os atendimentos emergenciais fez com que se

sentissem aliviados da demanda, confirmando que o Plantão Psicológico é uma

modalidade de assistência à saúde mental que acolhe a pessoa no exato momento em

que ela busca solução para suas dificuldades emocionais.

Na tentativa da plantonista em compreender a estranheza sentida pelos usuários da

própria vida e do diagnóstico psiquiátrico, pode-se constatar que ao ser legitimida a

experiência subjetiva, via aceitação incondicional, sem um julgamento de valor,ou de

conceitos já préconcebidos, possibilitou-se a cada cliente atendido compreender a

própria conduta diante de seu sofrimento e perturbação psíquica, podendo expressar

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com liberdade interior as angústias e os conflitos estruturais instalados.Estes resultados

vão ao encontro do estudo de Messias (2001) ao afirmar a disponibilidade da plantonista

aliada a uma relação de respeito e confiança favorece a manisfestação da tendencia

atualizante.

Os resultados demonstraram que existem limitações quanto a capacidade do sistema de

saúde para solucionar os problemas existenciais vividos, e que os recursos do meio em

que os pacientes vivem estão sendo insatisfatórios, pois os pacientes mantêm durante o

tratamento uma percepção negativa do seu self. Assim, permanecendo a incongruência

entre o que o individuo vivenciou no momento do adoecimento e como ele se percebe

ao longo do tratamento, reforça-se a negação do que realmente experimenta, negando-se

o direito ao seu próprio sentir e a sua potencialidade enquanto pessoa e isto faz com que

a tendencia atualizante que determina suas condutas e auto-estima permaneça

fragilizada.Os resultados também evidenciaram que com a desadaptação psicológica os

aspectos físicos do organismo consequentemente adoeceram, confirmando-se a

inseparabilidade destes aspectos do organismo como um todo, confome pesquisa

realizada por Rogers (1977). Exemplos destes aspectos estão nos relatos dos clientes

que apresentam distúrbios de sono, inapetência, confusão mental e também depressão.

Os resultados da pesquisa também evidenciaram a falta de projetos preventivos que

atendam a população em geral em situações de crise psicológica, anteriores a instalação

da doença propriamente dita e de sua cronificação. Ainda prevalece o padrão de uma

visão psiquiátrica que normatiza as concepções de saúde e doença, onde as ações

objetivas mantêm o discurso organicista, levando a registros meramente

comportamentais para efeito de diagnóstico, e do histórico da vida do usuário, de forma

a privilegiar a categorização dos Manuais Internacionais de Classificações, tais como o

CID V.

Os psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais que na sua prática

institucional poderiam estar contribuindo com a compreensão subjetiva dos casos

discutidos e descrevendo as variáveis psicológicas, sociais e relacionais que contribuem

com a manutenção dos sintomas, não fazem anotações no prontuário dos pacientes,

impossibilitando a compreensão de qual conduta terapêutica está sendo adotada para

evolução do quadro sintomatológico. Não se encontra o projeto que está sendo realizado

para ressocialização do paciente, sendo desconhecidas ao leitor as atividades que estão

propiciando maior autonomia ao individuo, ou seja, a saúde pública local ainda não se

transformou em um local de produção de vida autônoma. Também são excluidas das

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anotações os sentimentos dos usuários em relação à própria vivência, bem como a

compreensão da familia sobre o diagnóstico e sobre suas reais possibilidades de ajuda,

constatando a inexistência de atividades terapêuticas comunitárias que enfoque a

integração social, com um programa terapêutico voltado a sua demanda pessoal,

confirmando que nas internações não se integrou ações de caráter psicossocial ao uso de

psicofármacos.

Conclusão

Concluiu-se que todos os clientes atendidos revelaram sentimentos de solidão,

inutilidade, tristeza, carência de relacionamentos afetivos gratificantes, evidenciando

fragilidade frente às circunstãncias da vida e insatisfação diante do desconhecimento de

si e de suas potencialidades. Os elementos presentes na demanda emocional são

relativos a problemas existenciais, portanto merecedores de uma atenção psicológica

que possibilite uma compreensão de como experimentam e vivenciam os próprios

sentimentos. Ao serem tratados por um tipo de terapêutica apenas medicamentosa,

excluiu-se a possibilidade de manterem contato com os próprios recursos internos, e

assim se reintegrarem a uma condição de vida satisfatória. Ao delegar-se o poder da

cura ao médico, ao remédio ou a familia anula-se a capacidade de compreensão que

poderiam ter em relação à própria vida, impedindo o resgate da autonomia e saúde. O

atendimento no Plantão Psicológico evidenciou que o cliente ao aceitar-se dentro das

próprias limitações cria condições para que uma mudança ocorra, concluindo-se que o

acesso à experiência interior pode ser facilitado por um profissional da área de saúde

mental, mas de uma maneira que não impeça a própria pessoa de manter sua autonomia

de decisão, e assim poder refletir sobre a responsabilidade e consequencia de suas

escolhas.O estudo demonstrou que ao encontrarem um ambiente acolhedor, permeado

de atitudes afetivas, conseguiam resgatar a esperança e expressarem um desejo de

mudança, projetando perspectivas positivas para o futuro, mesmo que tênues. Também

evidenciou-se que ao se delegar o poder de ser feliz, cuidado e amado a outra pessoa, o

potencial inerente ao crescimento humano se despotencializou e os clientes tornaram-se

fragilizados, descrentes das próprias capacidades. No conflito entre o que gostariam de

ser e o que lhes era permitido estar sendo, se desestruturaram emocionalmente e se

entregaram à tristeza. Distanciaram-se do sentir real, e vivenciaram a incongruência de

não se reconhecerem no mundo objetivo, instituido socialmente.

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ALTERAÇÕES DO SONO E PROCESSOS DE REGULAÇÃO EMOCIONAL

EM ADULTOS

Ana Cristina Neves1 & Ana Galhardo12

1Instituto Superior Miguel Torga; 2CINEICC-Faculdade de Psicologia e de

Ciências da Educação da Universidade de Coimbra

Introdução

O sono é um processo fisiológico vital com um papel restaurador importante. Um sono

normal dá ao indivíduo uma sensação de bem-estar e descanso físico/mental, com

recuperação de energias, possibilitando-lhe executar em boas condições as atividades do

dia seguinte. Por outro lado, a reduzida qualidade do sono pode afetar

significativamente a qualidade de vida das pessoas, por exemplo, aumentando a fadiga e

estados de humor negativos, lapsos de atenção e dificuldades de concentração,

irritabilidade, diminuição do desempenho psicomotor, diminuição da memória e tempos

de reação prolongados (Rente & Pimentel, 2004). A autocompaixão é uma estratégia de

regulação emocional importante que, acordo com Neff (2003), implica ser

compreensivo e caloroso para consigo mesmo em caso de dor ou fracasso, em vez

autocrítico ou punitivo. A autora refere que a autocompaixão se associa

significativamente a resultados positivos para a saúde mental, designadamente menos

tendência para desenvolver depressão e ansiedade e, por oposição, maior satisfação com

a vida.

Ao contrário da autocompaixão, o autocriticismo remete para a forma como as pessoas

se relacionam consigo mesmas perante situações de falha e desapontamento pessoal,

adotando uma postura crítica, intolerante, punitiva e de autoavaliação negativa para com

a sua própria condição. Trata-se, portanto, de um modo de relação eu-eu (Castilho &

Pinto Gouveia, 2011; Gilbert, 2000, 2007; Gilbert, Clarke, Hempel, Miles & Irons,

2004) em que uma parte do eu descobre falhas e defeitos e a outra parte se submete, o

que sugere que existe uma interação entre os diferentes aspetos do eu. Esta ocorrência

interna de ataque-submissão fortifica o sentimento de inferioridade e submissão

(Castilho & Pinto Gouveia, 2011).

Assim sendo, é importante em contexto clínico haver uma intervenção direta sobre

indivíduos autocríticos. Esta intervenção deverá incidir no desenvolvimento da

capacidade dos indivíduos se autotranquilizarem, em situações que à partida ativam o

autocriticismo (Amaral, Castilho & Pinto Gouveia, 2010).

O presente estudo tem como principal objetivo analisar a relação entre a qualidade do

sono em adultos e processos de autorregulação emocional como a autocompaixão, o

autojulgamento, o autocriticismo e a autotranquilização.

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Material e Métodos

Participantes

A amostra desta investigação, recolhida na empresa Aquinos, em Tábua, é constituída

por 210 participantes, 163 mulheres e 47 homens, com idades compreendidas entre os

19 anos e os 59 anos (M = 35,82; DP = 9,81).

Instrumentos

Questionário Sociodemográfico: Para o estudo foi elaborado um breve questionário

sociodemográfico, contendo as seguintes questões: sexo, idade, estado civil,

escolaridade, profissão e tempo de trabalho.

Questionário de Pittsburgh sobre a Qualidade do Sono (PSQI): Para analisar a qualidade

do sono utilizou-se o PSQI – versão portuguesa para Portugal (Buysse et al., 1989). Este

é um questionário de autorresposta que visa avaliar as características dos padrões de

sono e quantificar a qualidade do sono do indivíduo durante o ultimo mês, abrangendo a

qualidade subjetiva do sono e a ocorrência de perturbações do mesmo. Trata-se de um

instrumento que engloba os seguintes sete componentes: 1) qualidade subjetiva do sono;

2) latência do sono; 3) duração do sono; 4) eficiência habitual do sono; 5) perturbações

do sono; 6) uso de medicamentos; e 7) disfunção diurna. A forma como os itens se

distribuem pelos diferentes componentes não possibilita uma análise de consistência

interna.

Escala da Autocompaixão (SCS): A SCS foi desenvolvida por Neff (2003a) com o

objetivo de medir a atitude compassiva em relação ao próprio, segundo a filosofia

budista adaptada à psicologia ocidental (Castilho, 2011). No presente estudo foram

utilizados os índices compósitos de autocompaixão (que corresponde ao somatório das

subescalas de calor/compreensão, mindfulness e humanidade comum) e de

autojulgamento (que traduz o somatório das subescalas de autocriticismo, isolamento e

sobreidentificação).

Escala das Formas do Autocriticismo e Autotranquilização (FSCRS): A FSCRS foi

desenvolvida com o objetivo de avaliar como as pessoas se relacionam consigo próprias

– autocriticam ou autotranquilizam - face a situações de fracasso, falhas e ineficácia

pessoal (Gilbert et al., 2004; Castilho & Pinto Gouveia, 2011a). No presente estudo os

valores de alfa de Cronbach encontrados para as diferentes subescalas foram os

seguintes: 0,87 na subescala eu inadequado, 0,74 na subescala eu detestado e 0,87 na

subescala eu tranquilizador.

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Resultados

Os principais resultados, ao nível da análise descritiva, revelaram que a perturbação do

sono é o componente mais sentido pelos participantes. No entanto, é frequente

manifestarem mais autocompaixão, demonstrando igualmente uma atitude positiva

através da forma eu tranquilizador.

Verifica-se igualmente que são as mulheres que têm uma pior qualidade subjetiva do

sono, maior latência do sono e maior perturbação do sono. Relativamente ao uso de

medicamentos, são os participantes mais velhos (46-51 anos) que mais recorrerem aos

fármacos para dormir. Já os participantes mais novos (19-32 anos) apresentam uma

atitude mais positiva, através da forma eu tranquilizador. Os participantes casados/união

de facto têm melhor perceção sobre a qualidade subjetiva do sono, latência do sono,

duração do sono e perturbação do sono, manifestando mais a forma eu inadequado.

A análise correlacional efetuada procura responder ao principal objetivo definido para

este estudo, verificando-se que os participantes mais autocríticos apresentam mais

problemas ao nível da qualidade do sono, nomeadamente nos componentes perturbação

do sono, uso de medicação e disfunção diurna. Já no componente duração do sono são

mais compassivos, demonstrando mais satisfação e compreensão relativamente ao

número de horas de sono. Ainda se encontra uma ambivalência nos resultados, ou seja,

nos componentes qualidade subjetiva do sono, latência do sono e PSQI global, os

sujeitos ora apresentam uma atitude autocrítica ou de autocompaixão (Tabela 1).

Tabela 1- Correlações entre as dimensões dos instrumentos PSQI, SCS e FSCRS

SCS_Auto-

Comp

SCS_Auto-

Julg

Eu

inadequado

Eu

detestado

Eu

tranquilizador

Qual subj do

sono

0,06 0,25** 0,21**

0,20**

-0,12

Latência do

sono 0,34 0,25**

0,23**

0,11

-0,06

Duração do

sono 0,88 0,07

-0,02

0,05

-0,04

Efic hab do

sono 0,07 -0,72

-0,06

-0,14

0,06

Perturb do sono 0,41 0,32** 0,25**

0,24**

-0,09

Uso de

medicam 0,12 0,23**

0,20**

0,26**

-0,20**

Disfunção

diurna 0,66 0,19**

0,17*

0,18*

-0,08

PSQI – Global 1,22 0,35** 0,30*

0,17

-0,19

r = coeficiente de correlação de r de Pearson; p (valor de significância) (*p < 0,05; **p

< 0,01)

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Discussão e Conclusão

As principais conclusões deste estudo indicam que são as mulheres, os indivíduos mais

velhos e os casados/união de facto que apresentam uma qualidade do sono mais pobre.

No mesmo sentido, verifica-se que os indivíduos mais autocríticos também manifestam

mais problemas de sono, tendo um sentimento de inadequação e de defeito do eu, de

merecimento de críticas e repugnância pelo eu.

Algumas limitações podem ser apontadas a este estudo. Um das quais prende-se com a

carência de trabalhos empíricos acerca da relação entre os construtos do nosso estudo, ,

o que dificulta a comparação dos resultados. Outra limitação está relacionada com o

formato de autorresposta dos instrumentos usados na presente investigação, podendo ser

realizada uma avaliação mais detalhada destes aspetos através de outro tipo de

instrumentos, como por exemplo a entrevista clínica. De mencionar também que o

desenho deste estudo e o tipo de análises realizadas não possibilitam o estabelecimento

de relações causais pelo que futuramente estudos de caráter longitudinal poderão

clarificar a ligação entre os processos de regulação emocional e os diversos elementos

relacionados com o sono. Além disso, na nossa amostra estão incluídos participantes

que são trabalhadores por turnos, o que pode afetar os resultados ao nível do sono (e.g.

Costa, 2009), ainda que se trate de turnos fixos e não rotativos.

Para futuros estudos seria pertinente a replicação noutras populações, quer na população

geral com diferentes idades, quer na população clínica, com diferentes tipos de doentes

com perturbações do sono. A replicação destes resultados em amostras clínicas

representativas poderá contribuir para um melhor conhecimento sobre o autocriticismo e

a forma como este poderá influenciar a qualidade do sono. Além disso, o uso de uma

entrevista estruturada para a avaliação do autocriticismo e da autocompaixão também

permitirá uma avaliação mais detalhada do modo como estes processos de regulação

emocional se associam com o sono dos indivíduos.

Apesar das limitações, este estudo procurou explorar as associações entre os construtos

de qualidade do sono, autocompaixão, autojulgamento e autocriticismo, oferecendo

dados relevantes sobre o possível impacto dos processos de regulação emocional em

adultos na qualidade do sono. Compreendeu-se igualmente a necessidade de existir em

contexto clínico, público ou privado, uma intervenção direta focada no tratamento de

indivíduos autocríticos, baseando-se no desenvolvimento da capacidade dos indivíduos

se autotranquilizarem, em situações que à partida possam ser ativadoras de

autocriticismo, focando-se em sentimentos de calor e compreensão pelo eu.

Referências

Amaral, V., Castilho, P. & Pinto Gouveia, J. (2010). A contribuição do auto-criticismo e

da ruminação para o afecto negativo. Psychologica, 52, 271-292.

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American Psychiatric Association. (2013). Manual de Diagnóstico e Estatística das

Perturbações Mentais (5th ed., Texto Revisto). Lisboa: Climepsi Editores.

Castilho, P. (2011). Modelos de relação interna: Autocriticismo e Autocompaixão. Uma

abordagem evolucionária compreensiva da sua natureza função e relação com a

psicopatologia. Dissertação de Doutoramento em Psicologia, na área de especialização

em Psicologia Clínica apresentada à Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação

da Universidade de Coimbra.

Castilho, P. & Pinto Gouveia, J. (2011). Auto-Criticismo: Estudo de validação da versão

portuguesa da Escala das Formas do Auto-Criticismo e Auto-Tranquilização (FSCRS) e

da Escala das Funções do Auto-Criticismo e Auto-Ataque (FSCS). Psychologica,

Avaliação Psicológica em Contexto Clínico, 54, 63-86.

Costa, I. M. A. R. (2009). Trabalho por Turnos, Saúde e Capacidade para o Trabalho

dos Enfermeiros. Dissertação de Mestrado não publicada, Faculdade de Medicina da

Universidade de Coimbra.

Gilbert, P. & Irons, C. (2004). A pilot exploration of the use of compassionate in a

group of self-critical people. Memory, 12(4), 507-516.

Gilbert, P., Clarke, M., Hempel, S., Miles, J. N. V. & Irons, C. (2004). Criticizing and

reassuring oneself: An exploration of forms, styles and reasons in female students.

British Journal of Clinical Psychology, 43, 31-50.

Neff, K. D. (2003). The Development and Validation of a Scale to Measure Self-

Compassion. Self and Identity, 2, 223-250.

Rente, P. & Pimentel, T. (2004). A Patologia do Sono. Lisboa: Lidel – Edições

Técnicas, Lda.

Quinhones, M. S. & Gomes, M. M. (2011). Sono no envelhecimento normal e

patológico: aspectos clínicos e fisiopatológicos. Revista Brasileira de Neurologia, 47(1),

3142.

Thorburn, P. T. & Riha, R. L. (2010). Skin disorders and sleep in adults: Where is the

evidence? Sleep Medicine Reviews, 14, 351-358.

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