configuraÇÃo espacial da rede de atenÇÃo a saÚde em cidades medias do brasil e a efetivaÇÃo...

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ALEXANDRE ANDRÉ DOS SANTOS CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE Estudo de caso de Joinville – 1988 a 2004 Brasília (DF) 2007

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Page 1: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

ALEXANDRE ANDRÉ DOS SANTOS

CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES

MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A

SAÚDE

Estudo de caso de Joinville – 1988 a 2004

Brasília (DF)

2007

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ALEXANDRE ANDRÉ DOS SANTOS

CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES

MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A

SAÚDE

Estudo de caso de Joinville – 1988 a 2004

Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação em

geografia, do Departamento de Pós-Graduação em

Geografia da Universidade de Brasília (UnB), como

requisito parcial à obtenção de grau de mestre.

Orientadora: Profa. Dra. Marília Luiza Peluso

Área de concentração: Gestão Ambiental e Territorial.

Brasília (DF)

Novembro de 2007

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3

SANTOS, ALEXANDRE ANDRÉ DOS. Configuração Espacial da Rede de Atenção a Saúde em Cidades Médias do Brasil e a Efetivação da Universalidade do Acesso a Saúde. Estudo de caso de Joinville – 1988 a 2004/Brasília: Universidade de Brasília/Instituto de Ciências Humanas/ Departamento de Geografia/Alexandre André dos Santos, 110 p., 297 mm, (UnB-IH, Mestre, Gestão Ambiental e Territorial, 2007). Dissertação de Mestrado – Universidade de Brasília. Instituto de Ciências Humanas. 1.Geografia da Saúde; 2. Sistema Único de Saúde (SUS); 3. Joinville (SC) I. UnB-IH II. Título (série) É concedida à Universidade de Brasília permissão para reproduzir cópias desta dissertação e emprestar ou vender tais cópias somente para

propósitos acadêmicos e científicos. O autor reserva outros direitos de publicação e nenhuma parte desta dissertação de mestrado pode ser

reproduzida sem a autorização por escrito do autor.

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Alexandre André dos Santos

CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES

MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A

SAÚDE

Estudo de caso de Joinville – 1988 a 2004

Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação em

geografia, do Departamento de Pós-Graduação em

Geografia da Universidade de Brasília (UnB), como

requisito parcial à obtenção de grau de mestre.

Orientadora: Profa. Dra. Marília Luiza Peluso

Área de concentração: Gestão Ambiental e Territorial.

Profa. Dra. Marília Luiza Peluso

Profa. Orientadora

Prof. Dr. José Ivo dos Santos Pedrosa

Membro da Banca (externo)

Profa. Dra. Claudia Andreoli Galvão

Membro da Banca (interno)

Prof. Dr. Neio Lúcio de Oliveira Campos

Membro Suplente

Brasília (DF), 20 de novembro de 2007

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5

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a minha família.

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6

AGRADECIMENTOS

Agradeço o apoio recebido dos colegas da sala, dos amigos

do trabalho, dos professores, da professora orientadora e da

família, que contribuíram diretamente para que este trabalho

pudesse se transformar em realidade.

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7

RESUMO

As relações estabelecidas entre os diferentes modelos de fazer a gestão da saúde e o espaço municipal, em sua capacidade de gerar espaços promotores de saúde foram analisadas nesta dissertação. A compreensão histórica do sistema de saúde, a partir do estudo de caso de Joinville (Santa Catarina) resgatou as nuances que conformaram a dificuldade em universalizar o acesso à saúde como direito social e dever do Estado. A inovação trazida pela incorporação da saúde como direito na Constituição Federal de 1988, desencadeou vetores em prol da reorganização do sistema de saúde, em busca da garantia da saúde como direito social. A partir desse cenário, destacou-se a importância do espaço local como fator condicionante na formulação das políticas de saúde. O processo de reorganização do sistema municipal de saúde, nesse contexto, foi permeado pelos interesses dos diversos atores, e se refletiu em diferentes apropriações conceituais de espaço, enquanto categoria de análise para o planejamento das ações de saúde na esfera municipal. Sob este viés, foi possível verificar a existência de disputas entre os dois principais modelos de gestão da saúde, o flexneriano e o comunitário, condicionando a gestão da saúde na conformação espacial do acesso à rede de serviços. O modelo flexneriano, sem observar a importância do espaço, e voltado para a ampliação do mercado consumidor de procedimentos médicos, abusou de metodologias concentradoras de ações de recuperação da doença no espaço do hospital. O Modelo comunitário/social/coletivo, incorporando a análise espacial na busca de determinantes sociais, desenvolveu tecnologias espaço-centradas para o campo da gestão da saúde, em busca da integralidade das ações de prevenção e recuperação de doenças, e promoção da saúde. A disputa verificada entre os diversos atores condicionou e foi também condicionada pelo espaço local. O estudo também demonstrou a importância de se planejar a acessibilidade espacial da atenção a saúde para garantir o direito a saúde a todos, conforme expresso na Constituição Federal. Os dados revelaram um gargalo no sistema público de saúde pública de Joinville: cerca de 41% da população de Joinville não possuía um acesso adequado a rede de serviços do SUS, pela falta de uma política adequada que garanta o acesso. Em dezembro de 2004 Joinville contava com aproximadamente 23% da população com acesso ao SUS através do Programa de Saúde da Família, e outros 36% da população tinham seu direito a saúde garantido através de planos privados de saúde. Para os outros 41% da população, localizados em bairros com renda per capita entre 1 e 2 salários mínimos, não se identificou uma porta de entrada adequada ao sistema público de saúde. Este fato ajuda a explicar a dificuldade dos gestores em resolver os problemas existentes com a sobrecarga da rede pública hospitalar. Também foi possível identificar com vários exemplos como a estratégia de saúde da família ofertou respostas adequadas à questão da universalização do acesso a saúde, centradas na definição da comunidade como espaço de atuação da equipe de saúde.

Palavras chave: Geografia da Saúde; Sistema Único de Saúde; Joinville (SC)

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RESUMEN

Las relaciones establecidas entre los diferentes modelos de hacer la gestión de la salud y el espacio municipal, en su capacidad de generar espacios promotores de salud fueron diseccionadas en esa disertación. La comprensión histórica del sistema de salud, a partir del estudio del caso de la ciudad de Joinville (Santa Catarina) rescató las nuances que conformaron la imposibilidad de universalizar el acceso a la salud como derecho social y deber del Estado. La innovación traída por la incorporación de la salud como derecho en la Constitución Federal de 1988, desencadenó la reorganización del sistema de salud, en los gobiernos federal, provincial y municipal, de forma a suplantar la visión existente hasta entonces, de salud pública como caridad a los pobres. A partir de ese escenario, se destacó la importancia del espacio local como factor condicionante en la formulación de las políticas de salud. El proceso de reorganización del sistema municipal de salud, en ese contexto, fue permeado por los intereses de los diversos actores, y se reflejó en diferentes aprovechamientos conceptuales del espacio, mientras categoría de análisis, para la planificación de las acciones de salud en la esfera municipal. Bajo ese viés, fue posible inferir la existencia de disputas entre los dos principales modelos de gestión de la salud condicionando la gestión de la salud en varios aspectos, y que esta disputa además de ofrecer condicionantes espaciales, fue también por el espacio local condicionado. Los datos revelaron un gargalo en el sistema público de salud pública de Joinville: cerca de 41% de la población de Joinville no poseía un acceso adecuado la red de servicios del sistema de salud, por la falta de una política adecuada que garantice el acceso. En diciembre de 2004 Joinville contaba con aproximadamente un 23% de la población con acceso al sistema de salud através del Programa de Salud de la Familia, y otros un 36% de la población tenían su derecho la salud garantizado a través de planes privados de salud. Para los otros un 41% de la población, localizados en barrios con renta per cápita entre 1 y 2 salarios mínimos, no se identificó una puerta de entrada adecuada al sistema público de salud. El estudio también colocó la cuestión de la accesibilidad espacial de la atención la salud en el centro de la agenda decisiva, pues la salud se hube viabilizado mientras derecho social y era preciso aproximar el sistema de salud de las personas, y en especial de las clases excluidas. Como resultado fue posible identificar con varios ejemplos como la estrategia de salud de la familia ofertó respuestas adecuadas a la cuestión de la universalización del acceso a la salud, centradas en la definición de la comunidad como espacio de actuación del equipo de salud.

Palabras llave: Geografía de la Salud; Sistema Único de Salud; Joinville (SC)

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LISTAS DE MAPAS

Mapa Assunto Pagina

Mapa 1

Bairros de Joinville, 2004................................................................ 41

Mapa 2 Bairros onde foram realizadas entrevistas estruturadas com a população ........................................................................................

43

Mapa 3 Identificação da área cedida a Sociedade Hamburguesa de Colonização, 1849............................................................................

49

Mapa 4 Regionalização da saúde de Joinville, 2004..................................... 57

Mapa 5 Distribuição espacial das Unidades de Saúde, Hospitais e sedes de regionais de saúde no município de Joinville, 2004........................

69

Mapa 6 Renda per capita por bairro de Joinville, 2004 ............................... 72

Mapa 7

Bairros com equipes de saúde da família implantados em Joinville, 2004..................................................................................

86

Mapa 8 A cobertura Espacial do PSF e dos planos privados de saúde em Joinville, 2004..................................................................................

89

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LISTA DE FIGURAS

Figura Assunto Página

Figura 1

Modelo da Teoria do Lugar Central.................................................. 33

Figura 2

Joinville no contexto nacional e estadual.......................................... 46

Figura 3 Modelo de cobertura da saúde no espaço municipal......................... 78

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LISTA DE QUADROS

Quadro Assunto P.

Quadro 1

Sistematização da pergunta geral, objetivo geral e hipótese geral.......... 17

Quadro 2

Sistematização das perguntas específicas, objetivos específicos e hipóteses especificas...............................................................................

17

Quadro 3 Diferenças entre o modelo da medicina científica e a saúde coletiva,

social e comunitária................................................................................

28

Quadro 4 Caracterização das entrevistas com os informante-chave....................... 38

Quadro 5 Relação entre as questões, objetivos, hipóteses e as perguntas

formuladas nas entrevistas estruturadas e semi-estruturadas..................

39

Quadro 6 Caracterização das entrevistas com a população dos entrevistados nos bairros(letras)..........................................................................................

42

Quadro 7 Número de consultas médicas realizadas na rede pública de saúde de

Joinville, 1998-2004...............................................................................

63

Quadro 8 Número de ACS e de ESF implantados em Joinville, 1998-2004.........................................................................................................

64

Quadro 9 População de Joinville, 1998-2004......................................................... 65

Quadro 10 Número de consultas per capita em Joinville, 1998-2004...................... 65

Quadro 11 Indicadores de cobertura da Atenção Básica (PSF) em Joinville, 1998-

2004.........................................................................................................

66

Quadro 12 Número de pessoas cobertas por Assistência Médica Privada por ano de Competência em Joinville, 2000 - 2004.............................................

67

Quadro 13 Renda per capita e população dos bairros de Joinville, 2004.................. 71

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12

SUMÁRIO

Item

Assunto Pagina

INTRODUÇÃO....................................................................................

13

1

SISTEMAS DE SAÚDE E ESPAÇO – CONCEITOS, HISTÓRIA, RELAÇÕES.........................................................................................

19 1.1 Modelos de organização do sistema de saúde...................................... 19 1.1.1 A medicina científica/flexneriana e a saúde

comunitária/social/coletiva...................................................................

20 1.1.2 Princípios do SUS e conceitos da geografia......................................... 27 2

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS.........................................

35

3

O ESPAÇO E SAÚDE EM JOINVILLE ............................................

45

3.1 Espaço Natural..................................................................................... 45 3.2 A Economia e a Infra-estrutura............................................................ 46 3.3 História e saúde nos Primórdios da Ocupação de Joinville.................. 47 3.4 O Início do Século XX......................................................................... 50 3.5 O Pós-Guerra........................................................................................ 52 3.6 A promulgação da Constituição Cidadã e o SUS................................. 55 3.7 O SUS na atualidade............................................................................. 62 4

OS LIMITES ATUAIS DA GARANTIA DO ACESSO A SAÚDE................................................................................................

74 4.1 Limites da Reforma Sanitária.............................................................. 74 4.2 Sobrecarga da rede hospitalar publica municipal em Joinvile............. 79 4.3 Resistências e o não-lugar da atenção a saúde de Joinville.................. 85 4.4 O PSF e a capacidade de configuração de espaços produtores de

saúde.....................................................................................................

91 5

CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................

95

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................

99

ANEXO 1 – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para realização das entrevistas.....................................................................

106

ANEXO 2 – Roteiro das entrevistas ....................................................

108

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INTRODUÇÃO

A saúde e a doença das pessoas, desde os primórdios da humanidade, são

condicionadas por várias causas. As causas variam no tempo e no espaço, e a capacidade

explicativa possui uma complexidade intrínseca e é historicamente construída.

Assim, desde a Antiguidade até os dias atuais, a saúde foi explicada de maneira

diferente por uma configuração de aspectos míticos, espaciais, biológicos, sociais e

econômicos.

Tais aspectos, a partir do processo de organização do sistema capitalista, acabam

realçando o papel e a importância do espaço como agente condicionante da condição de vida

das pessoas, assim como em sua capacidade de recuperar e manter sua saúde.

Carlos (1994) vinculou a dinâmica da acumulação capitalista ao processo de produção

e reprodução do espaço, apontando relações com o tipo de trabalho e o modo de vida à

formas e funções da cidade, e com a criação de carências e desigualdades no espaço urbano

(como água, luz, esgoto, transporte, educação), várias delas oferecedoras de determinações

sanitárias.

Coura-Filho (1997, p. 416), por sua vez, afirmou que a má qualidade de vida foi

sistematicamente produzida no tempo e lugar que interessou ao capital. Os novos processos

de produção de doenças estariam diretamente relacionados a este novo modo de produção,

garantindo a sobrevivência e crescimento do referido sistema econômico. Também Hissa

(1992, p. 75) afirmou que a dinâmica da organização capitalista, do ponto de vista sócio-

espacial favoreceu a concentração da morbi-mortalidade em áreas periféricas e

marginalizadas.

Tais abordagens trouxeram aportes reflexivos sobre as maneiras como o modo de

produção capitalista ofereceu determinações à saúde da população, elucidando articulações do

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processo pelo qual as pessoas adoecem com o espaço produzido e reproduzido pelo

capitalismo.

As articulações advindas entre o modo de produção capitalista e o espaço produzido

pela sociedade no processo saúde-doenca se constitui em importante fator explicativo, que

vincula diretamente a necessidade de estudos entre a geografia e a saúde. Trata-se de campo

de estudo já consolidado na literatura cientifica nacional e internacional, fundamental para a

gestão de saúde pública, tão importante que cerca de 80% das necessidades de informação dos

gestores locais de saúde estão relacionadas com a dimensão geográfica (OPAS, 2002, p. 14).

A partir do reconhecimento deste contexto, que justifica um estudo que relacione

espaço e doença, buscou-se um recorte do objeto de analise, que pudesse conferir coerência

metodológica e precisão cientifica. Trilhou-se um caminho que possibilitasse exercitar a

capacidade da geografia de se constituir em ferramenta analisadora do entendimento do

processo de configuração de um sistema municipal de saúde, que elucidasse aspectos da

garantia do princípio constitucional de universalidade do acesso a saúde, a partir da

espacialização da sua rede de serviços.

Tal recorte levou ao estudo dos modelos de gestão de saúde, seus conceitos e cargas

ideológicas intrínsecas. No primeiro plano, dois grandes modelos, o flexneriano, de um lado,

e o comunitário, de outro, do qual derivou o Programa de Saúde da Família (PSF), disputando

no plano ideológico e gerencial dos sistemas de saúde, o cenário de conformação das políticas

de saúde neste pais.

Por outro lado, o recorte espacial, considerando a responsabilidade constitucional da

esfera administrativa municipal no Brasil, adquirida com a Constituição de 1988, indicou

necessidade de estudo nesta escala e a opção recaiu sobre Joinville, município de médio porte,

com cerca de 500 mil habitantes, pólo econômico da região sul do Brasil.

O desafio proposto reforçou a necessidade de trabalhar com conceitos capazes de

aproximar a gestão pública da resolução de problemas da saúde em uma perspectiva espacial.

Pelo lado da saúde, foi preciso aprofundar os estudos sobre a conformação da saúde enquanto

política pública e as diversas respostas buscadas ao longo do século XX para dar conta do

desafio.

As contribuições teóricas da geografia foram buscadas nas diferentes abordagens da

geografia da saúde, que na literatura internacional conformaram genericamente duas grandes

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15

ênfases, uma focando nos processos de espacialização das doenças, e outro na geografia dos

sistemas de saúde (HOWE, 1983; JOSEPH, 1984; KEARNS, 1993).

Todavia, o desafio proposto acabou por tornar tênue as duas ênfases, por que exigiu

um prisma multidisciplinar, qualitativo, ajustado conceitualmente à necessidade de

identificação de problemas e à busca de soluções que pudessem dar conta de uma realidade

complexa, atual, dinâmica.

As considerações de Harvey e Morin sobre abordagens complexas reforçaram a opção

encontrada no presente trabalho. A necessidade metodológica de buscar novos desenhos e

modelagens para questões novas e complexas, foi tratada por Harvey (1980, p. 13) quando

afirmou que “se nossos conceitos são inadequados ou inconsistentes, não podemos esperar

identificar problemas e formular soluções políticas apropriadas”. Já Morin (2003, p. 36),

apontou a inadequação dos saberes desunidos e fragmentados frente à realidade complexa do

mundo atual.

Tal recorte indicou a necessidade do entendimento da conformação da rede de atenção

à saúde existente no município de Joinville, a partir de uma analise espacial, e sua capacidade

de garantir o acesso aos cidadãos de Joinville à saúde publica.

Para tanto, foi preciso aprofundar o estudo sobre os modelos de atenção a saúde que

buscam responder as demandas por organização do sistema de saúde no país. Depreendeu-se

deste levantamento a importância que o modelo flexneriano e aqueles oriundos da reforma

sanitária brasileira jogaram neste debate, na conformação espacial do acesso a rede de

serviços, e como iniciativas governamentais (PSF, por exemplo) de garantia do acesso à saúde

ganharam características próprias fruto desse embate.

O modelo da medicina flexneriana, em geral propôs a organização de serviços de

saúde sob a lógica do mercado do trabalho médico, centrando a especialização dos

procedimentos médicos e delimitando o espaço do hospital como espaço privilegiado de

atuação médica.

O modelo flexneriano possibilitou aprimorar a utilização do espaço como ferramenta

do mercado para desenvolver metodologias concentradoras de ações de recuperação da

doença no espaço do hospital.

As propostas oriundas da reforma sanitária, de forma ampliada, entenderam a saúde

como direito de cidadania, o que no bojo do processo de redemocratização brasileiro, levou a

consolidar este princípio na Constituição Brasileira de 1988.

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16

Foi uma proposta que incorporou a análise espacial na busca de determinantes sociais,

e desenvolveu tecnologias espaço-centradas para o campo da gestão da saúde, em busca da

integralidade das ações de prevenção e recuperação de doenças, e promoção da saúde.

A partir do recorte apresentado o estudo procurou trabalhar com a seguinte questão

central:

como a configuração espacial da rede de atenção à saúde em cidades médias como Joinville

influenciou na efetivação da universalidade do acesso a saúde?

Especificamente, a partir do trabalho de campo e da pesquisa bibliográfica realizada, o

estudo pode aprofundar as seguintes questões: a) Quais os problemas advindos da não

implantação do PSF em todo o território do município de Joinville? b) Qual a capacidade do

PSF em configurar espaços produtores de saúde?

Cada questão originou um objetivo e uma hipótese. O objetivo geral foi definido da

seguinte maneira:

explicitar como a configuração espacial da rede de atenção a saúde influenciou na efetivação

da universalidade do acesso a saúde em cidades medias como Joinville.

Já os objetivos específicos, explicitados a partir do objetivo geral, foram: a) Explicitar

as dificuldades de expansão da implantação do Programa de Saúde da Família em Joinville;

e b) Verificar a capacidade do PSF de criar estratégias com capacidade de promover

espaços saudáveis, centradas na valorização do espaço local e do conhecimento prático.

A hipótese geral que norteou a presente pesquisa foi:

a configuração espacial da rede do Programa de Saúde da Família em cidades similares a

Joinville conformou os limites do processo de reforma sanitária, freando a capacidade dos

municípios em efetivar a universalidade do acesso a saúde.

As hipóteses específicas, derivadas da hipótese geral, foram: a) Existe um grande

vazio de acesso real à rede de atenção básica de saúde em Joinville, que sobrecarrega a rede

hospitalar publica municipal, conformado principalmente por regiões de classe media e

pobres não cobertas pelo PSF; e b) Os modos de fazer a gestão de saúde condicionam a

capacidade da gestão municipal de saúde em efetivar a garantia do acesso à saúde;

O Quadro 1, abaixo, explicita a relação entre o questionamento de pesquisa, o objetivo

e a hipótese gerais da dissertação.

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17

Quadro 1 – Sistematização da pergunta geral, objetivo geral e hipótese geral

Pergunta Geral Objetivo Geral Hipótese Geral

Como a configuração espacial da

rede de atenção a saúde em cidades

similares a Joinville influenciou na

efetivação da universalidade do

acesso a saúde?

Explicitar como a configuração

espacial da rede de atenção a saúde

influenciou na efetivação da

universalidade do acesso a saúde

em cidades médias similares a

Joinville.

A configuração espacial da rede do

Programa de Saúde da Família em

cidades como Joinville conformou

os limites do processo de reforma

sanitária, freando a capacidade dos

municípios em efetivar a

universalidade do acesso a saúde.

Fonte: Santos, A.A.

O Quadro 2, explicita a relação entre os questionamentos de pesquisa, os objetivos e as

hipótese especificas da dissertação.

Quadro 2 – Sistematização das perguntas específicas, objetivos específicos e hipóteses

específicas

Perguntas Específicas Objetivos Específicos Hipóteses Específicas

Quais os problemas advindos da

não implantação do PSF em todo o

território do município de

Joinville?

Explicitar as dificuldades de

expansão da implantação do

Programa de Saúde da Família em

Joinville

Existe um grande vazio de acesso

real a rede de atenção básica de

saúde em Joinville, que

sobrecarrega a rede hospitalar

publica municipal, conformado

principalmente por regiões de

classe media e pobres não cobertas

pelo PSF

Qual a capacidade do PSF em

configurar espaços produtores de

saúde?

Verificar a capacidade do PSF de

criar estratégias com capacidade de

promover espaços saudáveis,

centradas na valorização do espaço

local e do conhecimento prático

Os modos de fazer a gestão de

saúde condicionam a capacidade

da gestão municipal de saúde em

efetivar a garantia do acesso a

saúde;

Fonte: Santos, A.A.

Page 18: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

18

O presente estudo foi organizado em cinco capítulos. No primeiro capítulo, se

explicitou os referenciais teóricos que orientaram o estudo. Foi dada ênfase na capacidade dos

modelos assistenciais flexneriano e comunitário de configurar a rede de atenção a saúde nos

espaços municipais. Também foram abordados os principais conceitos necessários ao

desdobramento teórico, assim como os princípios norteadores do Sistema Único de Saúde.

Os procedimentos metodológicos utilizados no processo de trabalho de campo e coleta

de dados serão apresentados no segundo capitulo, explicitando as opções pela realização de

entrevistas semi-estruturadas com informantes-chaves e estruturadas com a população, na

tentativa de revelar a materialização do processo de configuração da rede de serviços de

Joinville no período de implantação do SUS, assim como a diferente percepção e opinião dos

atores envolvidos no processo de construção do sistema de saúde de Joinville.

A evolução histórica da saúde pública do município de Joinville no período

compreendido entre a implantação do Sistema Único de Saúde (SUS) no país, e o ano de 2004,

quando se encerra um mandato de gestão municipal, foi trabalhada no capítulo terceiro, de

maneira articulada com a contextualização espacial em que se deu o estudo e as características

que individualizaram o objeto do estudo do ponto de vista de sua formação sócio-espacial,

etapa fundamental para contextualizar o recorte espacial.

A luz dos referenciais teóricos, dos procedimentos metodológicos e da

contextualização sócio-espacial foi apresentada, no quarto capítulo, a análise dos dados, com

a identificação de um modelo de análise espacial dos limites atuais da garantia do acesso

universal a saúde para parcela da população para as chamadas cidades médias.

As conclusões e considerações finais foram tratadas no capítulo quinto, com reflexões

oportunas e que são necessárias a radicalização do processo de implantação do SUS, a luz de

um entendimento espacial.

Page 19: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

19

1 SISTEMAS DE SAÚDE E ESPAÇO – CONCEITOS, HISTÓRIA, RELAÇÕES

A revisão bibliográfica concentrou-se no resgate de conceitos fundamentais ao

entendimento da relação entre saúde e espaço, através da discussão dos principais modelos de

organização do sistema de saúde: o flexneriano e o comunitário. Os principais conceitos,

princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde em sua articulação com espaço e sua

validade para a gestão do sistema de saúde também foram objeto de pesquisa bibliográfica.

1.1 Modelos de organização do sistema de saúde

Os modelos de organização do sistema de saúde, ou desenhos tecnoassistenciais,

dizem respeito, sobretudo, à maneira como “se combinariam as diversas ações públicas e

privadas relacionadas com o processo de adoecer, recuperar e promover a saúde, nos espaços

de gestão e atenção da política de saúde” (BRASIL, 2005a, p. 79).

Paim (2002, p. 370), por exemplo, registrou que os modelos de atenção a saúde ou

modelos assistenciais seriam definidos genericamente como combinações de tecnologias

utilizadas nas intervenções sobre problemas e necessidades de saúde. Na mesma linha,

Mendes afirmou que os sistemas de saúde deveriam responder de maneira clara a três

objetivos: “proporcionar um ótimo nível de saúde, um grau adequado de proteção em relação

aos riscos de adoecer e satisfazer as expectativas do cidadão” (MENDES, 2001, p. 18).

As soluções apresentadas pelos modelos assistenciais poderiam ser exclusivamente de

natureza médico-curativa ou incorporar ações de promoção e prevenção. Também poderiam

organizar-se para atender a demanda de modo passivo, apenas aguardando casos que cheguem

ou buscar ativamente os usuários, independente de demanda (CECILIO, 2005, p. 145).

A necessidade de discutir articuladamente os saberes e a política na determinação da

forma de organizar a assistência foi enfatizada por autores como Malta, que afirma:

Page 20: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

20

Modelo técnico-assistencial constitui-se na organização da produção de serviços a

partir de um determinado arranjo de saberes da área, bem como de projetos de ações

sociais específicos, como estratégias políticas de determinado agrupamento social

(MALTA, 2004, p. 438)

Os modelos assistenciais incorporam, principalmente no mundo ocidental capitalista,

uma dimensão articulada de saberes e tecnologias de grupos sociais que, apoiados na

dimensão política, disputam entre si como organizar a assistência ao público.

No Brasil, a história da conformação de modelos assistenciais registrou em sua

historia recente um grande embate na disputa pelo poder de organizar a assistência ao público.

A arena de disputa pelo poder de organizar o sistema de saúde consolidou dois grandes grupos

com diferentes respostas organizacionais: de um lado, o campo da chamada medicina

científica ou Flexneriana, e de outro a medicina comunitária, social e coletiva.

A medicina flexneriana propôs a organização de serviços de saúde sob a lógica do

mercado do trabalho médico, centrando a especialização dos procedimentos médicos e

delimitando o espaço do hospital como espaço privilegiado de atuação médica.

A medicina comunitária, social e coletiva, de forma ampliada, surgiu com o intuito de

buscar respostas às necessidades de saúde da população, entendendo-a como direito de

cidadania, o que no bojo do processo de redemocratização brasileiro, levou a consolidar na

Constituição Brasileira um importante conceito para este trabalho, a universalização do direito

ao acesso a saúde pelo cidadão (BRASIL, 2003, p. 108).

A seguir, apresentam-se os conceitos, princípios e características básicas que norteiam

os modelos flexneriano e comunitário.

1.1.1 A medicina científica/flexneriana e a saúde comunitária/social/coletiva

O modelo medicalizador, ou flexneriano centrou sua prática profissional no hospital e

na utilização intensiva de tecnologia de diagnóstico e terapêutica. Foi uma opção articulada

aos interesses econômicos hegemônicos, do complexo industrial hospitalar/farmacêutico

(BRASIL, 2005a, p. 84).

As raízes do modelo flexneriano remontam ao chamado “Relatório Flexner”,

apresentado em 1910, com o objetivo adequar a formação médica às inovações provindas das

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21

descobertas dos microorganismos. O modelo flexneriano estimulou fortemente a

especialização e a pesquisa visando o conhecimento das doenças no corpo para sua reparação.

(BRASIL, 2005b, p. 54).

A medicina científica, de acordo com Mendes (1985, p. 37) apresentou as seguintes

características: a) mecanicismo (o corpo humano visto como uma máquina); b) biologicismo

(natureza biológica das doenças e de suas causas e conseqüências); c) individualismo

(indivíduo como objeto de ação e responsável pela sua própria doença); d) especialização

(acumulação do capital que exigiu a fragmentação do processo médico enquanto meio de

produção); e) exclusão de práticas alternativas (supremacia da medicina científica sobre

outras práticas médicas alternativas, populares ou acadêmicas); f) tecnificação do ato médico

(desenvolvimento de tecnologia médica, centradas na busca de novas e caras tecnologias); g)

ênfase na medicina curativa (setor da medicina mais suscetível a incorporação de tecnologia);

h) concentração de recursos (necessidade dos mercados em concentrar para obter ganhos de

escala).

A prática médica baseada no Relatório Flexner fortaleceu o poder dos médicos em

detrimento de outras práticas curadoras tradicionais, como a homeopatia, a medicina oriental,

o saber popular, entre outros, ao caracterizá-los como não científicos e ineficazes (LUZ,

1991).

As práticas médicas flexnerianas se ajustaram ao interesse do complexo industrial

hospitalar/farmacêutico. Foi a prática flexneriana que viabilizou a transformação da

recuperação da doença em um mercado muito lucrativo. Viabilizou em todo o mundo

capitalista ocidental um modelo de assistência centrado em consultas médicas, procedimentos,

equipamentos e medicamentos, com oferta hospitalar e atenção especializada como principal

meio de atenção à saúde. (BRASIL, 2005b, p. 54).

Porém, a aplicação do modelo da medicina científica mostrou-se inadequado para a

resolução dos problemas de saúde da grande maioria da população no decorrer da segunda

metade do século XX. Estudos de âmbito internacional identificaram problemas crescentes

relativos à ineficácia, ineficiência e desigualdade, gerada pela medicina científica.

Entre os problemas se destacam:

a) A ineficiência da medicina científica causada pela inflação médica, ou seja, pela

desproporção ou inexistência de correlação entre os investimentos em saúde e os níveis de

saúde, e a chamativa desproporção custo-eficácia da mesma (DOSSEY, 2006, p. 9);

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b) a ineficácia da medicina científica, demonstrada por estudos e pesquisas que

evidenciam que os níveis de saúde atuais decorrem muito mais de mudanças no ambiente do

que de novas descobertas científicas da medicina (MENDES, 1985, p. 37-40);

c) incapacidade de responder às necessidades de saúde, ao risco de adoecer, morrer e à

acessibilidade dos serviços de saúde (MENDES, 1985, p. 37-40);

d) incapacidade de oferecer igualmente acesso aos serviços de saúde, contatada na

chamada Lei de Hart – “a disponibilidade de boa atenção médica tende a variar na razão

inversa das necessidades da população” (MENDES, 1985, p. 37-40).

Apesar da preponderância do enfoque flexneriano em detrimento de outros enfoques,

observou-se ao longo da segunda metade do século XX uma ampliação da tensão entre essa

abordagem e outras abordagens. A partir de meados de 1950, períodos em que predominaram

aspectos centrados em características biológicas, individuais e tecnológicas, foram

intercalados com outros em que se destacaram fatores comunitários e sociais.

A própria definição de saúde como um estado de completo bem-estar físico, mental e

social, e não meramente a ausência de doença ou enfermidade, inserida na Constituição da

Organização Mundial de Saúde (OMS) em 1948, foi uma expressão da concepção ampliada

de saúde.

A Conferência de Alma-Ata, no final dos anos 1970, recolocou o predomínio do

enfoque coletivo e sobre os determinantes sociais que se afirma com a criação da Comissão

sobre Determinantes Sociais da Saúde da OMS, em 2005.

A medicina científica, pelo complexo industrial que gerou e mantém, garantiu seu

espaço nas sociedade industrial, o que determinou a concentração dos recursos de saúde. O

Hospital, que representou para a medicina científica o lócus privilegiado de atenção médica,

foi o equipamento de saúde mais sujeito a espacialização orientada pela lógica do mercado.

(MENDES, 1985, p. 35).

A localização ótima dos hospitais organizou no espaço a desigualdade do acesso à

saúde. A desigualmente espacial se configurou devido a lógica mercadológica que a orientou:

Os médicos e hospitais foram para o espaço daqueles que poderiam comprar os

procedimentos médicos, o espaço urbano, o espaço hegemônico do capital monopolista

(MENDES, 1985, p. 35).

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O modelo flexneriano auxiliou no processo de (des)organização espacial na lógica do

mercado, aumentando a capacidade de atração populacional dos grandes centros urbanos. A

ampliação dos fluxos centro-periferia esgarçou o tecido urbano em direção às periferias,

criando novos movimentos de consumo de espaços periféricos.

O modelo flexneriano deslocou o problema de saúde da escala da coletiva,

comunitária, espacial, para o nível individual, biológico, e com isso menosprezou a

capacidade de intervenção do gestor público articulada a uma visão espaço-centrada,

intersetorial, que tivesse capacidade de promover saúde nas comunidades.

O espaço foi tratado como inerte, absoluto, simples repositório para utilização dos

homens em seu processo de desenvolvimento, papel em branco para escrita da história do

capitalismo na humanidade (DOSSEY, 2006, p. 11).

A medicina científica, ao partir da utilização de um conceito espacial inerte,

configurou a organização do sistema de saúde com características específicas, em que

questões vinculadas a garantia da sustentabilidade da medicina enquanto categoria econômica

prevaleceram sob aspectos da saúde como direito social.

Em especial, a capacidade de universalizar o acesso aos serviços de saúde para o

conjunto da população foi desprezada, uma vez que a lógica orientadora do acesso estava

vinculada a capacidade de consumir os procedimentos médicos, e também pelo fato dos

procedimentos médicos se apresentarem com valor agregado cada vez maior, devido a

tecnologia embutida nos mesmo (inflação médica).

Num período de 50 anos (do início do século XX, quando foi apresentado o relatório

Flexner, até meados dos anos 1950, com o final da segunda guerra mundial) a medicina

científica alcançou maturidade, consolidou-se como base de um poderoso complexo industrial

e gerou uma crise derivada da sua aplicação no mundo ocidental. A crise foi gerada pela

incapacidade da medicina científica em oferecer respostas efetivas de recuperação da saúde

para o conjunto da população mundial.

Os custos altos e crescentes restringiram o acesso aos procedimentos médicos para a

grande maioria da população pobre, no Brasil e no mundo. O fato do modelo se organizar a

partir de uma visão economicista, levando a aglomeração de hospitais nos grandes centros

urbanos, reforçou aspectos de concentração urbana, inviabilizando qualquer proposta de

universalização do acesso a saúde.

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Para responder à crise gerada pela medicina flexneriana, em busca de aliviar as tensões

sociais, a comunidade cientifica internacional se movimentou, a partir da segunda metade do

século XX, na busca de alternativas. Era preciso organizar uma estratégia/modelo com

capacidade de desatar os nós críticos e atuar de maneira complementar ao modelo da

medicina científica. O principal modelo apresentado como resposta moderada foi denominado

“medicina comunitária”. Suas características foram apresentadas por outro relatório,

elaborado em 1970, denominado “Relatório Carnegie”, que diagnosticou a crise da medicina

científica e propôs a sua desflexenarização. As principais recomendações do Relatório

Carnegie, de acordo com Mendes (1985, p. 48) foram:

a) integração docente assistencial;

b) expansão e aceleração da formação de pessoal auxiliar e técnico;

c) integração de matérias básicas e profissionalizantes,

d) incremento das matriculas de estudantes pobres nos cursos de saúde.

e) estruturação de programa sanitário nacional.

A medicina comunitária teve suas origens nas experiências dos sistemas de saúde

ocorridas em países subdesenvolvidos, principalmente na África Colonial inglesa durante a

primeira metade do século XX. Articulou uma dimensão ideológica de integração social dos

marginalizados, trazida pelos norte-americanos, como parte das políticas sociais de combate à

pobreza, implantadas no início da década de 1960 nos Estados Unidos, e foi difundida em

projetos pilotos em outros países subdesenvolvidos da África, Ásia e América Latina, a partir

da mesma década (BRASIL, 2005a, p. 59).

Foi a alternativa viável ante reformas mais radicais e abrangentes, organizando de

maneira complementar à medicina científica para aqueles que não possuíam condições de

pagar pelos procedimentos médicos. Ficou caracterizada como uma medicina dos

marginalizados, urbanos e rurais (MENDES, 1985, p. 46; MERHY, 2004, p. 74).

No Brasil, a partir dos anos 70, a crise da saúde se agravou, devido ao conjunto de

problemas trazidos pela implementação do modelo flexneriano. Serviços de saúde

historicamente divididos entre públicos, privados e filantrópicos, insuficientes, mal

distribuídos e descoordenados, incapazes de resolver os problemas de saúde da maioria da

população brasileira, associados aos interesses econômicos das indústrias de medicamentos,

de equipamentos e das empresas médicas, impediam a organização de um sistema de saúde

eficiente e capaz de dar conta dos problemas de saúde da população brasileira (PAIM, 2002,

p. 61).

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Integrando um movimento em defesa da democracia, dos direitos sociais e de um novo

sistema de saúde, o processo de crítica à medicina científica avançou, conformando um

movimento por reformas denominado “Reforma Sanitária”.

O debate sobre a Reforma Sanitária deu origem a vários modelos ou desenhos

assistenciais alternativos ao hegemônico, que incorporaram outras opções ideológicas,

tecnológicas e organizacionais na construção do sistema de saúde nacional. (BRASIL, 2005a,

p. 84).

A síntese realizada por Merhy, que apresentou duas correntes no bojo da Reforma

Sanitária, um burocrático-sanitário e outro transformador (MERHY, 2006, p. 198), foi

importante por apresentar algumas diferenças na concepção que se traduziram em diferentes

aportes para a rede de serviços de saúde.

Merhy defende que no conjunto das propostas burocrático-sanitárias, estavam a

manutenção da dicotomia entre a assistência médica e saúde pública e a vinculação da rede

básica como “porta de entrada” do conjunto dos serviços de saúde (MERHY, 2006, p. 218).

Via a questão da extensão da cobertura dos serviços pela ótica do custo das ações, e

organizava seu modelo sob uma ótica gerencial/administrativa, onde caberia atenção básica

fazer a triagem do sistema, apenas.

A posição transformadora partiu de um debate mais estrutural do momento,

defendendo um outro paradigma de política social, que se traduzia numa modificação mais

radical da relação sociedade/Estado e que tinha a democratização do poder político e

socialização dos benefícios como metas (MERHY, 2006, p. 223). Foi chamada

transformadora porque propunha uma mudança jurídico-política da natureza da saúde, que

passaria a ser um bem público com o controle da política pelo Estado e a participação dos

grupos sociais da sociedade civil junto ao Estado, na gestão dos serviços (MERHY, 2006, p.

223).

Todo o debate das correntes da Reforma Sanitária desaguou no processo de

redemocratização e Constituinte. Os direitos inscritos na Carta Magna traduziram esse embate

interno e com o modelo hegemônico médico-privatista-flexneriano. Com a Constituição de

1988 a sociedade conquistou o reconhecimento da saúde como direito de todos os cidadãos e

dever do Estado, e incorporou a universalidade, a integralidade, a equidade, a

descentralização, a regionalização e a participação da comunidade como princípios e

diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS).

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Além disso, firmou a Constituição um conceito ampliado de saúde, entendido como

resultado das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho,

transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e acesso a serviços de saúde

(BRASIL, 2003, p. 23). O principio da saúde como direito social trazido pela Constituição

reconheceu o ser humano como um todo, integral, e a saúde como qualidade de vida.

Os conceitos, princípios e diretrizes inscritos na Constituição inovaram ao incorporar a

dinamicidade do espaço e flexibilizar a configuração do sistema de saúde a real necessidade

dos usuários, demandando do poder público a superação do modelo assistencial flexneriano

como resposta governamental. A sociedade demandou através da Carta Magna um sistema de

saúde universal capaz de se estender ao conjunto da população.

Foi a necessidade de romper com o modelo flexneriano, centrado no médico,

fragmentado, voltado a doença, curativista e assistencialista, que trouxe consigo a

necessidade de buscar novos entendimentos do espaço que fossem mais radicais e

incorporassem a crítica ao espaço entendido e pensado como inerte.

Este novo Modelo em sua teoria contou com variados graus de incorporação de

elementos da medicina comunitária e alguns eixos orientadores comuns, conforme

sistematizam materiais do Ministério da Saúde (BRASIL, 2005a, p. 84-85):

a) a utilização do território no processo de planejamento das ações de saúde;

b) definição ampliada dos problemas de saúde com o estabelecimento de estratégias

para percepção das desigualdades regionais e microrregionais, visando a equidade;

c) reorganização das práticas em saúde com uma abordagem interdisciplinar e de

integralidade em saúde;

d) revisão dos conceitos clássicos de hierarquização de serviços, com reconhecimento

da complexidade da atenção básica ou primaria;

e) articulação do setor saúde com os demais setores do governo na formulação de

políticas saudáveis;

f) gestão democratizada.

Também se orientou pelo princípio da saúde como direito social, o que representou

uma profunda diferença de concepção em relação ao modelo flexneriano, que via a questão da

saúde como subordinada os interesses do mercado. A prática coletiva de saúde foi priorizada

no Modelo da Saúde Coletiva, o que resgatou a importância do espaço para o debate das

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políticas de saúde, principalmente o espaço local, da comunidade, espaço onde se estabelecem

vínculos e objeto de intervenção da política de saúde (MENDES, 1985, p. 53).

Um quadro sintético (quadro 3) apresentando as diferenças entre a medicina

flexneriana e a comunitária foi sistematizado por Reis (BRASIL, 2003, p. 109), o que

possibilitou realçá-las em várias dimensões (política/ideológica, constituição do saber, e

formato organizativo da assistência à saúde).

1.1.2 Princípios do SUS e conceitos da geografia

Além do aporte trazido pelo debate entre os modelos assistenciais, fundamental para

entender a origem dos diferentes conflitos existentes no processo de consolidação do SUS em

Joinville, outros conceitos foram fundamentais para o desenvolvimento da linha de raciocínio

que permeou a pesquisa: Universalização, equidade e acessibilidade.

Universalização, segundo Mendes (2001, p. 67) foi definido como “princípio ético

básico, que busca garantir a todos os cidadãos – independentemente de gênero, etnia, nível de

renda, vinculação de trabalho ou nível de risco – os direitos sociais fundamentais, em

quantidade e qualidade compatível com o grau de desenvolvimento de uma determinada

sociedade”.

O conceito de equidade foi o resgatado por Silva (2006, p. 25) como “um instrumento

de justiça para resolver as contradições entre as diversas formulas da justiça social formal ou

abstrata”. Em termos concretos, equidade foi entendida como direito de se tratar os desiguais

de forma desigual, priorizando a ação sanitária para os grupos populacionais com maior

demanda por saúde.

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Quadro 3 - Diferenças entre a medicina científica e a saúde coletiva, social e comunitária

Dimensões Medicina científica Comunitária, coletiva e social Liberal privatista ou neoliberal Democratização ampla, estado e sociedade Política/

ideológica Saúde (doença) enquanto mercadoria Saúde enquanto direito de cidadania Ciência positivista ou neopositivista Materialismo histórico, planejamento

estratégico, planejamento urbano, psicanálise, além da epidemiologia e da clínica.

Saber

Concepção saúde/doença em bases biológica, mecanicista, individualista e reducionista. Prestigio da fisiopatologia, na qual a doença é tratada como uma alteração morfológica e/ou funcional do corpo humano. Predomínio da clínica biologicista com concessão a uma epidemiologia unicausal ou multicausal.

Concepção saúde/doença da epidemiologia social latino-americana que enfatiza o vínculo entre saúde e condições de vida. Correlacionando as dimensões biológicas, ecológicas, culturais, da consciência e conduta e dos processos econômicos, com base no conceito de reprodução social.

Comando pelo mercado da doença (seguros, serviços, fábricas e comércio);

Comando único em cada esfera de governo, atravessado pela participação da sociedade civil e organizada;

Concentração de serviços nas cidades mais desenvolvidas e nos centros comerciais destas

Descentralização e regionalização de ações e serviços

Acesso mediado pelo poder aquisitivo do consumidor

Universalidade do acesso

Preponderância do hospital como lócus das ações

Constituição de rede hierarquizada segundo necessidades e níveis tecnológicos exigidos

Ênfase na medicina curativa; exclusão das práticas alternativas; especialização e tecnificação crescentes dos atos médicos;

Integralidade nas ações abrangendo o indivíduo e o coletivo nos aspectos de promoção, prevenção e cura em todos os níveis;

Eficácia medida pelo grau de restauração ou manutenção da força de trabalho

Eficácia dada pelo impacto na melhoria das condições de vida e da existência humana

Organizativa/ Assistencial

Desconsidera a intersetorialidade Valorização das ações intersetoriais.

Fonte: Reis, AT. (Apontamentos para uma apreciação de modelos tecnoassistenciais em saúde.

Mimeo. Belo Horizonte/MG, 2000 apud Brasil, 2003, p. 109)

O conceito de acessibilidade foi o apresentado nos estudos de Fekete (1997, p. 117).

Segundo Fekete, o conceito de acesso a serviços de saúde é complexo, e as necessidades dos

usuários e a oferta desse tipo de serviço conformam seus limites. O acesso em termos

geográficos é apenas um dos componentes da acessibilidade, uma vez que relaciona a

localização dos demandantes e da oferta de serviços de saúde. A acessibilidade se apresenta

como uma combinação de fatores de distintas dimensões:

a) Acessibilidade geográfica, identificada pela distância média entre o indivíduo e o

serviço de saúde. Levam em conta as condições para que esta distância média seja

percorrida. Importante destacar que a acessibilidade geográfica não garante o acesso,

uma vez que outros aspectos, como credibilidade dos serviços prestados ou horário de

funcionamento, podem obrigar deslocamentos que garantam o acesso em localidades

geograficamente mais distantes. As barreiras representadas pelas distâncias têm

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impacto diferenciado conforme o nível de complexidade dos serviços demandados:

quanto mais especializados, mais longos serão os trajetos a serem percorridos, em

geral, dada a estrutura de distribuição dos estabelecimentos hospitalares de alta

complexidade.

b) Acessibilidade organizacional: indica o grau de acesso proporcionado pelo modo de

organização dos recursos de assistência à saúde. Os obstáculos podem estar no contato

inicial com a unidade de saúde ou dentro da unidade de saúde. No contato inicial,

destacam-se o tempo de espera para marcação de consulta e os horários de

atendimento. Nos obstáculos dentro da unidade, salientam-se o tempo de espera pelo

atendimento médico, bem como a facilidade em se fazer exames laboratoriais e

clínicos.

c) Acessibilidade sociocultural: refere-se à saúde percebida e à confiança nos serviços de

saúde. É preciso entender que a noção de estado de saúde difere entre pessoas de

grupos sociais diferentes. O diferente nível de formação da equipe de saúde e da

população usuária pode influenciar a capacidade para entender a informação

disponível, o diagnóstico e o tratamento, e este aspecto deve ser levado em conta para

que o processo se estabeleça de forma adequada.

d) Acessibilidade econômica: O pressuposto da gratuidade e universalidade deveria

eliminar esse tipo de barreira ao acesso. Mas os custos de transporte, consumo de

tempo, faltas ao trabalho também correspondem a gastos com assistência à saúde,

mesmo que indiretamente.

Os conceitos de regionalização e hierarquização dos serviços também foram

necessários por serem estruturantes da proposta do novo modelo de saúde construído no

Brasil após a Constituição, e trabalhou-se com aqueles majoritários no processo de definição

das políticas de saúde à época, o que levou finalmente ao estudo da teoria do Lugar Central.

O Modelo da Saúde Coletiva trabalhou com dois conceitos de espaço para

operacionalizar as ações de saúde, com rebatimentos diferentes no planejamento em saúde, do

ponto de vista espacial. Na matriz original da medicina comunitária, houve a incorporação do

modelo da desconcentração de recursos, fundado em três conceitos básicos: territorialização,

regionalização e hierarquização dos serviços. (MENDES, 1985, p. 54).

Sobre o conceito de territorialização, Mendes (1993, p. 166) criticou a forma como os

serviços de saúde comumente organizam o trabalho no território, dividindo-o em espaços

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simétricos, pressupondo uma “distribuição homogênea dos problemas de saúde no espaço”, o

que segundo o autor não aconteceria na prática.

A ordenação do território de acordo com as necessidades e possibilidades das práticas

de intervenção, indicando uma subdivisão composta por: Território-Distrito, Território-Área,

Território-Microárea e Território-Moradia.

Cada uma delas está contida na de maior escala, de maneira que o Território-Moradia

é uma subdivisão do Território-Microárea, que é uma subdivisão do Território-Área, que se

encaixa no Território-Distrito.

Assim, seguem as definições de Mendes (1993) para:

a) Território-Distrito: corresponde à área de abrangência de um distrito sanitário,

podendo coincidir com o espaço do município, se for de pequeno porte, ou das

subprefeituras ou regiões administrativas, em caso de municípios maiores. Nesse caso,

há uma lógica político-administrativa, com certo grau de autonomia decisória, que

facilita o trabalho intersetorial, pela possibilidade de uma integração da autoridade

sanitária com responsáveis por diferentes setores;

b) Território-Área: corresponde à área de abrangência de cada unidade ambulatorial de

saúde, considerando os recursos existentes para a população adstrita àquele território;

c) Território Microárea: é definido pelo autor como o espaço privilegiado para o

enfrentamento dos problemas de saúde que são distribuídos de forma não homogênea

no espaço. Desta forma, os recursos e serviços disponíveis no Território-Área são

investidos no Território-Microárea com vistas à resolução dos problemas de saúde

identificados;

d) Território-Moradia: institui-se no espaço de vida de uma micro-unidade social (família

nuclear ou extensiva). Para Mendes, esse território tem grande valor operacional, pois

várias ações de saúde serão realizadas na moradia.

Por fim, apresenta o conceito de território-processo

Assim, um território-processo, base do distrito sanitário, deverá ser esquadrinhado

de modo a configurar uma determinada realidade de saúde, sempre em movimento.

Isto é, uma situação de saúde determinada pela dinâmica das relações sociais,

econômicas e políticas que se reproduzem historicamente, entre indivíduos e grupos

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populacionais existentes no território, reprodução esta condicionada pela sua

inserção no conjunto da sociedade (MENDES, 1993, p.167).

Regionalização foi entendida como uma forma de organização dos sistemas de saúde,

com base territorial, uma diretriz que orienta o processo de descentralização das ações e

serviços de saúde (BRASIL, 2006, p.15). Incorporou o processo de territorialização com o um

dos seus pressupostos e que consiste, de acordo com o documento do Ministério da Saúde

(BRASIL, 2006, p. 15)

no reconhecimento e apropriação dos espaços locais e das relações da população

com a gestão e atenção a saúde, os equipamentos sociais existentes, pelas dinâmicas

das redes de transporte e de comunicação, pelos fluxos assistenciais seguidos pela

população, pelos discursos das lideranças locais e por outros dados que se mostrem

relevantes para a intervenção no processo saúde/doença – como o próprio contexto

histórico e cultural da região.

O processo de regionalização trazido pelo Ministério da Saúde, a partir da segunda

metade da década de 1990, deveria levar a identificação de regiões de saúde, como recortes

territoriais inseridos em espaços contínuos, organizados com o objetivo de atender às

demandas das populações a elas vinculadas, garantindo o acesso, a equidade e a integralidade

do cuidado com a saúde local. As regiões identificadas a partir deste processo poderiam

assumir diferentes desenhos, desde que adequado a diversidade local, mesmo que não

acompanhando as divisões administrações administrativas, viabilizando uma regionalização

viva (BRASIL, 2006, p. 23).

A Hierarquização dos serviços foi entendida a partir dos pressupostos de Cecílio (1997,

p. 47) que a caracterizou como tendo uma forma piramidal. Cecílio (1997, p. 47), indicou que

um modelo hierarquizado

teria na base, um conjunto de unidades de saúde, responsáveis pela atenção

primária a grupos populacionais situados em suas áreas de cobertura. Para esta

extensa rede de unidades, distribuídas de forma a cobrir grupos populacionais bem

definidos (populações adscritas) seria estabelecida, de uma forma geral, a seguinte

missão: oferecer atenção integral à saúde das pessoas, dentro das atribuições

estabelecidas para o nível de atenção primária, na perspectiva da construção de uma

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verdadeira “porta de entrada” para os níveis superiores de maior complexidade

tecnológica do sistema de saúde. Na parte intermediária da pirâmide estariam

localizados os serviços ditos de atenção secundária, basicamente os serviços

ambulatoriais com suas especialidades clínicas e cirúrgicas, o conjunto de serviços

de apoio diagnóstico e terapêutico, alguns serviços de atendimento de urgência e

emergência e os hospitais gerais, normalmente pensados como sendo hospitais

distritais. O topo da pirâmide, finalmente, estaria ocupado pelos serviços

hospitalares de maior complexidade, tendo no seu vértice os hospitais terciários ou

quaternários, de caráter regional, estadual ou, até mesmo, nacional.

A rede hierarquizada representaria a possibilidade de uma racionalização do

atendimento, de forma que haveria um fluxo ordenado de pacientes tanto de baixo para cima

como de cima para baixo, realizado através dos mecanismos de referência e contra-referência,

de forma que as necessidades de assistência das pessoas fossem trabalhadas nos espaços

tecnológicos adequados.

Os conceitos de regionalização e hierarquização dos serviços trabalharam na

perspectiva da Teoria do Lugar Central de Christaller, que se apoiou no princípio da

centralidade, com organização a partir e em torno de um núcleo urbano principal. O núcleo

urbano estabeleceria uma relação de co-dependência com o entorno e a cidade conformaria

um mosaico de regiões complementares, formando hexágonos contíguos, num sistema

multicentrado e hierarquizado de núcleos e periferias em inter-relação (NAJAR, 2003, p.

709). Destaque-se que uma das principais limitações da Teoria do Lugar Central é a

necessidade de utilização de uma planície isotópica como base orientar o seu funcionamento

pleno.

A Teoria do Lugar Central auxiliou as equipes de planejamento em saúde a pensar no

processo de planejamento espacial para a localização dos equipamentos de saúde, visando

garantir o acesso espacial ao sistema de saúde de maneira complementar e hierárquica. As

unidades mais simples, com capacidade de resolver até 85% dos problemas de saúde da

população, deveriam estar o mais próximo possível das pessoas. As unidades mais complexas

e com capacidade instalada maior e equipamentos tecnológicos mais desenvolvidos

localizam-se na região complementar de várias unidades básicas, conformando uma cobertura

espacial decrescente, a partir de uma lógica de distribuição que pudesse aperfeiçoar sua

produtividade. (VASCONCELLOS, 1998, p. 79).

Page 33: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

33

Figura 1 - Modelo da Teoria do Lugar Central

Fonte: Najar (2003, p. 709), adaptado pelo autor

Um último conceito foi importante para o delineamento da pesquisa, por tratar-se

Joinville de uma cidade com essas características. A bibliografia brasileira recente, em

especial a de Amorim Filho e Serra (2001), foi tomada como orientadora do conceito de

cidade média, o que levou a considerar como cidades médias o conjunto de municípios com

população urbana entre 100 mil e 500 mil habitantes, que não sejam metropolitanos ou

capitais estaduais.

Conforme a força dos atores que defendiam os diferentes modelos nos lugares, foi

diferente a configuração da rede de serviços de saúde (MENDES, 2001, p. 88), assim como a

garantia do acesso a saúde foi diferentemente construída nos lugares. O jogo de forças para a

implantação dos diferentes modelos escreveu a história do SUS, no Brasil de uma maneira

geral, e em Joinville em especial (área de estudo), configurando a espacialização das relações

entre a saúde e o espaço local.

Como o processo de implantação do SUS foi atravessado pelo interesse de vários

atores sociais (partidos políticos, universidade, governantes, gestores de saúde, prestadores de

serviços, corporação médica, trabalhadores e usuários, entre outros) na formulação e

implementação, em constantes disputas, a efetivação dos princípios e diretrizes do SUS nos

diferentes municípios brasileiros foi cristalizada de maneira diferenciada (BRASIL, 2005b, p.

Cidade grande Cidade média Cidade pequena

Page 34: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

34

63). Em Joinville o processo foi configurado a partir da ação dos diferentes atores presentes

na arena política.

O custo de se propor a “Reforma Sanitária” em um contexto desfavorável à mesma,

em que o mundo passava por um processo de afirmação do neoliberalismo, foi o de se afastar

da proposta original. O produto da reforma, neste caso, representou aquilo que foi possível

fazer dentro daquele contexto, e não o que foi efetivamente pensado, levando a uma diferença

entre o pensado e o executado, acarretando em desgaste político para os defensores da tese da

reforma.

Page 35: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

35

2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A busca de elementos que pudessem comprovar a hipótese de que a configuração

espacial da rede do Programa de Saúde da Família em cidades com características similares a

Joinville, conformou os limites do processo de reforma sanitária, freando a capacidade dos

municípios em efetivar a universalidade do acesso a saúde, levou a utilização de opções

metodológicas que compreendessem a complexidade do desafio.

Para explicitar como a configuração espacial da rede de atenção a saúde influenciou na

efetivação da universalidade do acesso a saúde em cidades médias similares a Joinville,

optou-se pelo estudo de caso.

O estudo de caso caracteriza-se como um estudo exaustivo de um ou de poucos

objetos, de maneira a permitir seu conhecimento aprofundado (GIL, 1999, p. 25). O caso

estudado foi a gestão municipal de saúde de Joinville, no período compreendido entre a

implantação do SUS no país, em 1988, até o final da ultima gestão municipal eleita quando da

realização da pesquisa, em 2004.

A opção pelo estudo de uma gestão municipal se tornou pertinente pela sua

proximidade com o cidadão. As possibilidades concretas para a diversidade e para a

operacionalização por parte do gestor público de saúde, de desenhos alternativos para a

resolução dos problemas de saúde das pessoas. A reivindicação popular por melhorias, na

escala municipal, se fariam sentir com maior intensidade.

As características de Joinville, importante município da Região Sul do Brasil, onde a

complexidade da gestão pública municipal de saúde comporta inúmeras análises das relações

entre espaço e saúde, justificou a escolha. A ênfase no período de implantação do SUS se

justificou pela inscrição, na Constituição Federal de 1988, de vários direitos sociais e no

campo da saúde, como a integralidade, a regionalização, a participação popular na formulação

de políticas, e para a questão da garantia do acesso universal, o que conferiu ao período um

conjunto de características favorecedoras da produção de inovação e conflitos.

Page 36: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

36

De acordo com os objetivos traçados no projeto de pesquisa, buscaram-se elementos

que pudessem comprovar as hipóteses traçadas, ou seja, oferecer capacidade explicativa para

possível replicação em realidades similares, de maneira mais geral e abrangente.

A dificuldade dos estudos de casos em geral consiste em encontrar elementos que

possam fornecer subsídios para generalizações. Como não se constituiu em objetivo do

presente estudo proporcionar o conhecimento preciso de determinadas características a partir

de procedimentos estatísticos, mas lançar proposições generalizáveis em situações similares

foi cabível tal metodologia (GIL, 1999, p. 27).

Com a definição do recorte espaço-temporal do estudo de caso (a gestão da saúde

pública de Joinville no período da implantação do SUS até 2004), foi realizado um primeiro

movimento de aproximação com a questão principal “Como a configuração espacial da rede

de atenção a saúde em cidades medias do Brasil influenciou na efetivação da universalidade

do acesso a saúde?”, materializado com a revisão da bibliografia que trata do tema, nos eixos

do espaço, e da gestão de saúde. A revisão da bibliografia foi importante para a sustentação e

a construção dos instrumentos de pesquisa e do trabalho de campo. A revisão da bibliografia

também buscou a contextualização histórica necessária para entender processos de formação

sócio-espacial da região de Joinville.

As entrevistas foram escolhidas como trabalho de campo devido a sua capacidade de

captar elementos que não estão presentes nos documentos oficiais. Importante registrar como,

para atingir os objetivos propostos, as entrevistas ratificaram e validaram informações

incorporadas ao trabalho empiricamente.

O trabalho de campo foi desdobrado em dois momentos: a) momento das entrevistas

semi-estruturadas; b) momento das entrevistas estruturadas.

As entrevistas semi-estruturadas foram aplicadas a atores estratégicos no processo de

implantação do Sistema Único de Saúde (SUS) em Joinville. O que caracterizou uma pessoa

como informante-chave foi a sua vinculação, poder de decisão e participação ativa no

processo de implantação do SUS no município. Somente pessoas com alto poder de decisão,

do 1º e 2º escalão da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Joinville, ou Diretores dos

Hospitais Públicos com sede no município de Joinvile foram listados para participar da

entrevista semi-estruturada.

A realização de entrevistas semi-estruturadas com informante-chave teve o objetivo de

explicitar inter-relações existentes entre os modelos de atenção em saúde e a configuração

Page 37: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

37

espacial, identificando no processo de implantação do SUS em Joinville, momentos e espaços

em que houve conflito, assim como dificuldades e resistências na garantia do acesso a saúde.

Também possibilitou identificar, na visão dos informante-chave, as maneiras como os

modelos de gestão se organizaram em Joinville.

A opção por entrevistas semi-estruturadas como método para a coleta de dados junto

aos informante-chave se justificou pela necessidade de aprofundar aspectos qualitativos,

vinculados a percepção, atitudes e motivações. Esta é uma metodologia útil para

pesquisadores que “querem descobrir quais são as questões básicas, como as pessoas

conceituam os tópicos, que terminologia é utilizada pelos informantes, e qual é o seu nível de

compreensão”. (SELTIZ, WRIGHTSMAN E COOK, 1987, p. 40). Suas qualidades consistem

em enumerar de forma mais abrangente as questões que o pesquisador busca abordar no

campo (MINAYO, 2004, p. 121).

Sobre isso, Bertussi (2002, p. 37-38) observou que a diferença entre as pesquisas

qualitativas e quantitativas seria a capacidade das primeiras em incorporar a questão da

intencionalidade, explicitando o mundo dos significados das ações humanas, um lado não

perceptível e não captável em equações, médias e estatísticas. Consiste em método que

dispensa a significância matemática para apreender aquilo que de comum existe nos

indivíduos. Poucas entrevistas poderiam garantir a diversidade de posições acerca de um tema.

Peluso (1988, p. 68) enfatizou o fato de que “o pequeno número de entrevistados provém de

argumentação que diz respeito à própria condição do homem como ser social. Os conteúdos

da consciência, já foi dito, não são individuais, mas produtos das práticas coletivas e das

relações sociais e históricas que se materializam na fala.”

Os informante-chave identificaram territórios e momentos da gestão pública da saúde

de Joinville que pela sua explicação causal, aportavam aspectos relevantes para o

estabelecimento das relações entre o acesso, o espaço e a gestão pública de saúde. Também

aportaram com explicações e fatos importantes para o entendimento do cenário técnico e

político que compunha o contexto das decisões.

A utilização das entrevistas semi-estruturadas proporcionou a busca de várias

dimensões de uma mesma questão, potencializando uma compreensão holística e integral.

Foram realizadas seis solicitações de entrevistas com informante-chave e uma não

pode ser concretizada devido à impossibilidade de tempo do informante.

Page 38: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

38

As entrevistas puderam explorar diferentes dimensões e escalas de abordagem do

objeto de estudo. As entrevistas semi-estruturadas foram identificadas pelos números de “um”

a “cinco” quando são tratadas nos capítulos que tratam dos resultados.

Quadro 4 - Caracterização das entrevistas com os informante-chave

Identificação Sexo Formação Local de atuação

Entrevista 1 F Enfermagem Secretaria Municipal de Saúde (SMS) Joinville

Entrevista 2 F Enfermagem SMS de Joinville

Entrevista 3 M Medicina Hospital Regional Hans Dieter Schmidt

Entrevista 4 M Medicina Maternidade Darcy Vargas

Entrevista 5 F Pedagogia SMS de Joinville

Fonte: Santos, A.A.

A entrevista 1 recuperou o histórico do processo de formação do SUS no município de

Joinville e elementos de caracterização dos rebatimentos espaciais das opções da organização

do Sistema de saúde pública de Joinville, com situações de conflito em localidade na região

oeste do município, e questões relativas a localização de três equipamentos de saúde das

regiões sul e leste do município. Apresentou exemplos de como os fluxos foram utilizados no

processo de planejamento de implantação do PSF de Joinville e registrou como as limitadas

funções de alguns postos de saúde prejudicaram o processo de reorientação da rede de

serviços, e identificou alguns territórios de conflito oriundo da implantação do PSF no

município.

A entrevista 2 trouxe um panorama da evolução do processo de implantação do SUS

na região Oeste do município de Joinville, no período compreendido entre 1991 e 2003, e

outro ponto de vista da gestão da organização do sistema de saúde. Apresentou elementos

importantes para entender a dificuldade de implantação de equipes de saúde da família em

bairros com população de classe média.

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Quadro 5 - Relação entre as questões, objetivos, hipóteses e as perguntas formuladas nas

entrevistas estruturadas e semi-estruturadas

Questão Objetivo Hipótese Entrevista semi-estruturada

(informante-chave)

Entrevista estruturada (população)

Quais os problemas advindos da não implantação do PSF em todo o território do município de Joinville?

Explicitar as dificuldades de expansão da implantação do Programa de Saúde da Família em Joinville.

Existe um grande vazio de acesso real a rede de atenção básica de saúde em Joinville, que sobrecarrega a rede hospitalar publica municipal, conformado principalmente por regiões de classe media e pobres não cobertas pelo PSF.

1. Relate situações de conflito no processo de implantação do SUS. 2. Identifique critérios espaciais para planejamento da rede de atenção em saúde. 3. Caracterize os principais atores que disputam o poder na saúde de Joinville, e seus interesses. 4. Apresente o histórico de implantação do SUS.

1. O que é um problema de saúde pública?Cite alguns exemplos. 4. Relacione as situações em que procurou o SUS nos últimos 6 meses. 5. É correta a divisão das áreas do PSF em seu bairro? Porque? 7. Qual sua avaliação sobre a qualidade da saúde pública?

Qual a capacidade do PSF em configurar espaços produtores de saúde?

Verificar a capacidade do PSF de criar estratégias com capacidade de promover espaços saudáveis, centradas na valorização do espaço local e do conhecimento prático.

Os modos de fazer a gestão de saúde condicionam a capacidade da gestão municipal de saúde em efetivar a garantia do acesso a saúde.

5. Apresente como a variável espacial foi trabalhada no planejamento das ações de saúde. 6. Como foi o processo de participação popular na definição das políticas e ações de saúde. Cite exemplos. 7. Avalie a participação dos usuários no processo de gestão das políticas de saúde.

2. Como poderiam ser resolvidos os problemas de saúde da população? 3. Mapeie a delimitação do PSF no seu bairro. 6. Já participou de movimento pela melhoria da saúde?

Fonte: Santos, A.A.

A entrevista 3 explorou a história de formação do SUS e de alguns equipamentos

públicos de saúde do município, localizados na região leste do município. Também relatou

sobre o processo de hegemonia de determinados setores da classe médica no município.

A entrevista 4 aprofundou o histórico de um importante hospital público estadual –

Maternidade Darci Vargas, localizado no centro de Joinville.

A entrevista 5 centrou sua fala no relato de situações de conflito intrínsecas ao

processo de implantação do Programa de Saúde da Família (PSF) em Joinville. Identificou

situações de conflito nas regiões leste e norte do município, e defendeu aspectos do processo

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de planejamento e implantação de equipes de saúde da família no município, e as resistências

de alguns setores da classe médica.

As entrevistas semi-estruturadas com os informante-chave instruíram a identificação

dos bairros onde seriam realizadas as entrevistas estruturadas. As entrevistas estruturadas

foram aplicadas em moradores dos bairros identificados pelos informante-chave.

A resistência e dificuldade para implantação do SUS, também serviu para explicitar

questões trabalhadas nas entrevistas. As entrevistas estruturadas também objetivaram explorar

questões que ainda ficaram em aberto, em busca das origens dos conflitos, e captar a

percepção das pessoas sobre o acesso efetivo a saúde.

As entrevistas estruturadas estavam organizadas em dois eixos: um eixo de

qualificação do entrevistado por idade, sexo, endereço, escolaridade, e outro eixo de

aprofundamento da temática de saúde e espaço.

As perguntas, cujo modelo encontra-se no Anexo 02, buscaram obter informações

sobre o que seria um problema de saúde pública na avaliação do entrevistado; como se

resolveriam os problemas de saúde da população; a indicação da delimitação do PSF no bairro

do entrevistado; as situações em que procurou o SUS nos últimos 6 meses; a avaliação sobre

a divisão das áreas do PSF em seu bairro; a participação do entrevistado em movimentos pela

melhoria da saúde e a avaliação do entrevistado sobre a qualidade da saúde pública no

município.

O número de entrevistas foi considerado suficiente quando as respostas começaram a

ser repetir – critério de exaustão-saturação. O critério de exaustão-saturação é utilizado neste

tipo de pesquisa quando nas entrevistas realizadas começam a ser reconhecidas a repetição

dos conteúdos dos depoimentos (BERTUSSI, 2002, p. 44).

Para identificar a capacidade de desenhos assistenciais trabalharem na perspectiva de

promover espaços saudáveis, buscou-se em trabalhos apresentados por equipes do PSF de

Joinville, exemplos de atuação intersetorial e de desenvolvimento de capacidades inovadora.

Além disso, trabalhou-se com fontes primárias e secundárias, como relatórios de

gestão, e com a realização de ampla revisão bibliográfica de fontes locais do SUS, com o

objetivo de confrontar as informações apresentadas nas entrevistas com dados de fontes

secundárias.

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Outra fonte importante de dados foram os bancos de dados oriundos dos Sistemas de

Informação do Ministério da Saúde e da Agência Nacional de Saúde Suplementar, que

puderam qualificar e quantificar a cobertura do Programa de Saúde da Família e dos planos

privados de saúde no Brasil e em Joinville.

Mapa 1 - Bairros de Joinville, 2004.

Fonte: Joinville, 2006 (adaptado pelo autor).

Considerando a necessidade de se identificar diferenças e desigualdades em escala

intramunicipal, optou-se por trabalhar com dados agregados no âmbito dos bairros de

Joinville, que de acordo com dados de 2004, possuíam a seguinte configuração espacial (mapa

1).

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Os mapas apresentados foram elaborados no software Terraview, do Instituto Nacional

de Pesquisas Espaciais (INPE), a partir dos dados coletados.

Quadro 6 - Entrevistas estruturadas realizadas com a população nos bairros (letras)

Identificação Sex Escolaridade Idade Bairro Síntese Entrevista a M Ensino médio 43 São Marcos Médico para os pobres; SUS é péssimo. Entrevista b F Fundamental

(4 anos)

46 Aventureiro Vala negra divide áreas e a questão da adscrição de clientela (PSF); “Só atendem se a pessoa estiver morrendo.”

Entrevista c F Fundamental

(4 anos)

43 Aventureiro Mais médicos. Não nota diferença entre os Postos próximos (Rio do Ferro e Parque Joinville). Remédio é a bicicleta.

Entrevista d F Médio 20 Aventureiro O pessoal da invasão não sabe em qual posto vai. Acha que o SUS é bom. O povo é que é preguiçoso.

Entrevista e F Médio 27 Aventureiro Os ACS visitam, mas não dão consulta, então não adianta.

Entrevista f F Fundamental (8 anos)

49 Anita Garibaldi Falta hospital e médicos.

Entrevista g M Fundamental (8 anos)

53 Morro do Meio Falta hospital

Entrevista h M n.i. 39 Morro do Meio Esgoto a céu aberto é problema de saúde Entrevista i M Superior 30 São Marcos O SUS é péssimo. Entrevista j M Fundamental

(8 anos)

35 São Marcos O ACS não pode dar remédio. E a territorialização é incorreta pois tem que ir no Posto mais longe de casa.

Entrevista k F Fundamental (8 anos)

34 Nova Brasília Hospitais são muito longe de casa.

Entrevista l F Fundamental (4 anos)

n.i. Boehmerwald Custo da passagem de ônibus é muito cara e dificulta ir ao hospital.

Entrevista m M Fundamental (8 anos)

53 Parque Guarani As consultas nos especialistas são difíceis de conseguir.

Entrevista n M Superior 25 Ademar Garcia Falta médico que resolva no posto de saúde

Entrevista o F Superior 37 Costa e Silva O SUS é péssimo. Falta médico e o hospital do centro está sempre cheio.

Entrevista p M Médio 39 Boehmerwald Investir na educação também, pois ajuda na saúde.

Fonte: Santos, A.A.

As entrevistas estruturadas realizadas com a população foram identificadas com letras

minúsculas (entrevista a, b, c, d, e, ...).

Os quadros 4, 5 e 6 sistematizam e resumem informações básicas sobre as entrevistas

realizadas com os informantes chaves e com a população. O Mapa 1 identifica os locais onde

foram realizadas as entrevistas com a população.

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43

Mapa 2 – Bairros onde foram realizadas entrevistas estruturadas com a população

Fonte: Santos, A.A.

Sobre o perfil dos entrevistados, registra-se que metade das entrevistas foi realizada

com pessoas do sexo masculino.

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A maioria das pessoas entrevistadas tinha entre 30 e 50 anos, e uma formação escolar

variando entre 5 e 11 anos de escolaridade. Os bairros onde foram realizadas entrevistas são

representativos do conjunto das diversas faixas de renda per capita do município, conforme

apresentado no quadro 6.

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3 O ESPAÇO E A SAÚDE EM JOINVILLE

A análise da configuração espacial demanda um aprofundamento nos aspectos

naturais, históricos, econômicos e sociais, em busca de evidências e articulações que

permitam estudar a configuração espacial da rede de atenção a Saúde em Joinville. O

levantamento sócio-espacial da escala municipal joga luz em importantes condicionantes do

processo de configuração do sistema de saúde do município.

3.1 Espaço Natural

O município de Joinville se localiza no litoral norte do Estado de Santa Catarina

(figura 2), região sul do Brasil, e ocupa uma área de 1.120 km2 (Joinville, 1998, p. 13).

O relevo desenvolveu-se sobre terrenos cristalinos da Serra do Mar e uma área de

sedimentação costeira. A parte oeste do município situa-se no planalto ocidental, com altitude

média de 800 metros e estende-se até os contrafortes da Serra do Mar. Na parte leste está uma

região de planícies deposicionais, resultado de processos sedimentares aluvionais nas partes

mais interioranas e marinhas na linha de costa, onde se encontram manguezais. (JOINVILLE,

1998, p. 13). O clima predominante na região, segundo a classificação de Koppen é do tipo

mesotérmico, sem estação seca (JOINVILLE, 1998, p. 14).

O município de Joinville possui mais de 640 km2 cobertos pela Floresta Atlântica, e 40

km2 cobertos por manguezais. (JOINVILLE, 1998, p. 14). A hidrografia local é fortemente

influenciada por aspectos estruturais e geomorfológicos. A rede de drenagem natural da região

apresenta formato dendrítico, com leitos encachoeirados e encaixados em vales profundos,

com vertentes curtas nos cursos médio e superior. Nas planícies de inundação, apresentam

baixa declividade e grande sinuosidade natural. (JOINVILLE, 1998, p. 15). Nas proximidades

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da foz dos principais rios, a sedimentação de partículas de argila e a ação das marés criam

condições específicas para o surgimento dos manguezais. (JOINVILLE, 1998, p. 15).

Figura 2 – Joinville no Contexto Nacional e Estadual

Fonte: Santos, A.A. (adaptado)

3.2 A Economia e a Infra-estrutura

Joinville é o município mais populoso e industrializado de Santa Catarina. O parque

fabril do município, com mais de 1.500 indústrias, emprega 58 mil funcionários e cresce em

média 5,67% ano. Responsável por cerca de 20% das exportações catarinenses. Terceiro pólo

industrial da Região Sul, Joinville figura entre os quinze maiores arrecadadores de tributos e

taxas municipais, estaduais e federais. A cidade concentra grande parte da atividade

econômica na indústria - que gera um faturamento industrial de US$ 14,8 bilhões por ano -

com destaque para os setores metal mecânico, têxtil, plástico, metalúrgico, químico e

farmacêutico. O Produto Interno Bruto per capita de Joinville também é um dos maiores do

país, em torno de US$ 8.456/ano (JOINVILLE, 1998, p. 10).

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O município possui transporte ferroviário que tem como finalidade o transporte de

cargas como farelo de soja, trigo, sucata, cerâmica, bentonita, óleo degomado, sorgo, aveia,

milho, fertilizantes, minério de ferro, bombonas de aço, ferro gusa e refrigeradores.

O município tem uma malha viária de 1.705,2 km, sendo 208,8 km de estradas vicinais

e 1.496,4 km de viárias urbanas. Do total de vias urbanas, 682,5 km são pavimentadas

(JOINVILLE, 1998, p. 18).

A energia elétrica do município é gerada e distribuída pela CELESC - Centrais

Elétricas de Santa Catarina S.A. Existem 07 subestações responsáveis que são: Subestações I,

II, III, IV, V, Pirabeiraba e Santa Catarina. No município, 181.013 consumidores dispõem de

energia elétrica (JOINVILLE, 1998, p. 20).

Atualmente, o sistema de abastecimento de água de Joinville é atendido pela empresa

pública “Águas de Joinville”, através de duas unidades de tratamento: Piraí e Cubatão, com

capacidade nominal de tratamento de 550 l/s e 1.300 l/s, respectivamente, totalizando 1.850

l/s (JOINVILLE, 1998, p. 30).

O sistema de distribuição de água é formado por sub-adutoras, reservatórios e redes de

distribuição. Ao todo, são 11 centros de reserva dispostos na área urbana de Joinville, com

capacidade de reserva da ordem de 37 milhões de litros. A rede de água é formada por uma

malha de distribuição com extensão aproximada de 1.850 km. O município tem 11

reservatórios com capacidade de 37.090.000 litros. A rede de distribuição tem uma extensão

de 1.830,331 km, com uma vazão de 1.830 litros por segundo. São atendidos 140.404

consumidores, com um consumo médio de 4.300.000 m3 por mês (JOINVILLE, 1998, p. 31).

O município conta com rede de esgoto sanitário, que recebe tratamento através de

lagoas de estabilização (duas unidades) do tipo australiano (lagoas anaeróbicas e lagoas

facultativas em série), e como polimento lagoas de maturação com vazo atual de operação de

180 litros por segundo, o que permite atender 15.220 ligações residenciais, 4.691 ligações

comerciais, 156 ligações industriais e 176 ligações públicas (JOINVILLE, 1998, p. 32).

3.3 História e saúde nos Primórdios da Ocupação de Joinville

Os vestígios mais antigos, os sambaquis, indicam que desde 5.000 a.C existe ocupação

na região de Joinville (CUNHA, 2003, p. 109). Por volta do final do século XVIII, famílias

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luso-brasileiras ocuparam a região, como comprovam as concessões de sesmarias,

principalmente em localidades das regiões leste, centro e sul do município (CUNHA, 2003, p.

109).

Um casamento real deu novo rumo à história da região. O príncipe de Joinville,

François d´Órleans, filho do rei Louis Philipe de França, casou-se com a princesa brasileira

Dona Francisca, irmã do imperador do Brasil D. Pedro II, a 1º de maio de 1843, no Rio de

Janeiro. Recebeu como parte do dote nupcial, grandes extensões de terras devolutas na então

província de Santa Catarina. As terras foram escolhidas em 1844, pelo procurador do príncipe,

o vice-cônsul da França no Brasil, Léonce Aubé. Nos anos de 1845-1846 procedeu-se à

medição e demarcação de 25 léguas quadradas, que foram anexadas à Comarca de São

Francisco do Sul (FICKER, 1973, p. 14)

As dificuldades financeiras da família real indicaram a necessidade de levantar

recursos com o dote. Em 1849 foi assinado um contrato entre a Sociedade Hamburguesa de

Colonização e o príncipe e a princesa de Joinville (ele, filho do rei da França e ela, irmã do

imperador D. Pedro II). Tal contrato estabelecia a cessão de 8 léguas quadradas (do dote

recebido do Império brasileiro pelo casamento) à dita Sociedade, conforme indicado no mapa

3, para que fossem colonizadas por 1500 colonos em 5 anos, marca o início do mais

determinante processo de ocupação da região (CABRAL, 1987, p. 228).

A saúde dos moradores de Joinville, no final do século XIX e início do século XX foi

muito influenciada pelo meio. O elemento condicionante natural, a falta de condições

sanitárias e um conjunto de práticas e hábitos arraigados, desprovidos de preocupação

sanitária, reforçou a proliferação de doenças, fato agravado pela proximidade de nichos ou

focos naturais de doenças, áreas endêmicas, como a malária.

O Brasil da época era considerado por vários autores como “um imenso hospital”

(HOCHMAN, 1998, p. 64). Guedes (1996, p. 31), afirmou que “o Brasil oitocentista era um

país doente: varíola, malária, febre amarela, cólera e tifo, dentre outras, atacavam, sem

piedade, de norte a sul”. Santa Catarina ocupava papel marginal na economia do país, e a

situação de atraso e também se fazia presente no Estado.

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49

Mapa 3 - Identificação da área cedida a Sociedade Hamburguesa de Colonização, 1849

Fonte: Ficker, 1965 (adaptado pelo autor)

Em 1852 a Colônia Dona Francisca possuía 679 habitantes, e 125 pessoas já haviam

falecido, o que apontava para uma taxa de mortalidade de cerca de 155 por mil.

(RODOWICZ, 1992, pg, 35). Apenas para comparar, em 1864, os números indicavam que a

taxa de mortalidade no Rio de Janeiro eram de 25 por mil habitantes, Em Marselle, na França,

a taxa de mortalidade chegava a 30 por mil e Florianópolis a 45 por mil.

O período compreendido entre o final do século XIX e o início do século XX, apesar

das baixas condições sanitárias, foi determinante para a delimitação territorial do sitio urbano.

As dificuldades encontradas para manter atividade agrícola em escala econômica aliada ao

desenvolvimento de outras atividades econômicas na região (erva-mate), proporcionou

condições para o desenvolvimento de atividades de suporte a atividade econômica

preponderante àquele momento.

As condições para transformação de uma colônia agrícola para um espaço urbano

estavam dadas.

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50

3.4 O Início do Século XX

O início do século XX marcou grandes transformações na estrutura econômica e social

do País, que beneficiaram segmentos sociais específicos da população urbana em processo de

aceleração de crescimento, em vista da intensificação dos movimentos migratórios de origem

rural. Além disso, os frutos do acelerado desenvolvimento econômico, que se verificou em

diversos momentos, não foram distribuídos com equidade, resultando em uma sociedade onde

se ampliaram, ao longo do tempo, um conjunto de desigualdades sociais, tais como as

regionais, étnicas e culturais.

A vinda dos colonizadores proporcionou, à medida que Joinville se transformava em

rota de escoamento da produção de erva-mate do planalto norte-catarinense, um milieu1 capaz

de desenvolver a instalação de pequenas oficinas mecânicas e de conserto dos carroções que

viabilizavam o transporte da erva-mate.

A estrada Dona Francisca influiu decisivamente na expansão da indústria ervateira,

pois cristalizou um fluxo de escoamento da produção de mate, propiciando condições de

sustentação da uma economia de suporte de pequenas oficinas que trabalhavam com reparos

nos carroções que faziam o trecho. Este aspecto reforçou a posição de Joinville como ligação

e entreposto entre o planalto e o Porto de São Francisco do Sul, no abastecimento de

suprimentos para a região (FICKER, 1965, p. 407).

Com a expansão da indústria ervateira, surgiu a necessidade de ligação ferroviária da

região com a linha férrea que ligava São Paulo ao Rio Grande do Sul. Esse ramal deveria

ligar-se ao Porto de São Francisco do Sul e suas obras foram inauguradas em 1906. Destaca-

se que o projeto do ramal ferroviário foi alterado para que passasse pelo centro de Joinville,

pois no projeto original o ramal passava a 25 km ao sul da cidade (FICKER, 1965, p. 389)

O processo advindo das atividades da erva-mate, principalmente no período

compreendido entre 1880 e 1910, foi decisivo para a urbanização de Joinville. A condição

proporcionada pelo modelo de organização da colônia (rural de pequenas propriedades), e 1 Processo descrito por Benko (1996, p. 76), ao estudar determinadas regiões da Europa. O milieu se forma a partir de um conjunto de características socio-espaciais, com “o ambiente local sendo levado a inventar e a utilizar novas estruturas econômicas e estruturais”. Benko caracteriza o milieu como um processo que ultrapassa a lógica da explotação e que cria, no hinterland de determinadas regiões, uma economia que se integra ao sistema de divisão de trabalho e de externalidade positiva.

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pelo perfil de formação dos colonos, facilitou a instalação/ocupação mista residencial e fabril,

para suporte de tais atividades, fato comprovado pelas grandes fábricas na área central da

cidade existentes até os dias de hoje.

A construção da ferrovia em 1906 materializou a inclusão de Joinville em novo estágio

da economia regional catarinense, ressaltando o papel cada vez mais destacado de condutor

do desenvolvimento regional, pelas características proporcionadas pela ocupação advinda da

colonização.

No nível local, a ferrovia cristalizou a criação de um fluxo de circulação na região

oeste do município, de sentido mais transversal (leste-oeste), em oposição ao primeiro eixo de

circulação (norte-sul) criado pelos colonizadores germânicos na localidade.

Tais transformações tanto no plano federal, quanto no plano regional, refletiram-se nos

índices de mortalidade, em especial os da mortalidade infantil, gerando um quadro

denominado de transição epidemiológica e que colocou num mesmo espaço, um conjunto de

problemas sanitários decorrentes da ocupação do espaço rural com os problemas advindos do

processo de urbanização.

Fortalece-se neste período o lento e consistente declínio de mortalidade, iniciado desde

o princípio do século XX como reflexo da implantação de novas políticas sanitárias, mais

coercitivas, implantadas como reflexo da Gripe Espanhola de 1918, conforme descreve

Guimarães (2005, p. 19):

A gripe espanhola, que tomou conta do país em 1918, teve impacto significativo

sobre a percepção coletiva das relações entre doença e sociedade e sobre o papel da

autoridade pública.(...) A epidemia produziu um consenso mínimo a respeito da

necessidade urgente de mudanças na área da saúde pública ao atingir também as

elites. Sob o impacto da gripe espanhola, o poder público avançou na sua

capacidade de agir coercivamente sobre a sociedade, durante os anos 20.

Em 1928, Joinville contava com 35 mil habitantes e a mortalidade era muito inferior

as taxas nacionais da época. O total de 385 óbitos registrados no município no ano de 1928,

por exemplo, indicou uma taxa de mortalidade de 11 por mil, enquanto a taxa nacional de

mortalidade rondava os 25 por mil (YUNES, 1974, p. 15).

A conseqüência do aumento do processo de urbanização em Joinville levou ao

aumento do valor dos lotes urbanos, tornando-o uma mercadoria inacessível para grande parte

da população migrante.

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A urbanização, mais veloz que a industrialização, reorganizou o espaço, onde aos mais

pobres restavam apenas os lugares mais distantes da cidade, lugares estes sem infra-estrutura

adequada para moradia, sem serviços públicos, mas, infelizmente, a única opção que o

mercado informal podia oferecer-lhe para fins do exercício do direito à moradia.

O processo de urbanização que proporcionou a reorganização do espaço joinvilense,

pressionou a transição do espaço rural formado por pequenas propriedades para um espaço

urbano, industrial. O quadro de transição do rural para o urbano conformou o pior dos mundos

sob o ponto de vista da saúde dos moradores de Joinville. O quadro de morbidade típico de

áreas rurais foi mantido e um novo se instalou, típico de regiões em processo de

industrialização com urbanização descontrolada, o que potencializou a morbidade e a

mortalidade a partir dos efeitos negativos do processo de industrialização.

A aglomeração, a falta de salubridade e saneamento, conjugados à migração e às

doenças típicas do espaço rural, concentrou as fragilidades, doenças e mortes no espaço

urbano. A transição epidemiológica nos país do terceiro mundo foi em geral a sobreposição

dos problemas de saúde das áreas rurais com os das áreas urbanas, marcando esses espaços

em que houve transição do rural para o industrial.

Outro ponto importante, para o caso de Joinville, foi a necessidade sentida pelas

empresas de contratar médicos nas indústrias e sindicatos, conforme afirmou Valentim (1997,

p. 81). As indústrias já percebiam que era preciso criar condições para a recuperação do

desgaste da força de trabalho, necessidade que foi sentida porque a falta de salubridade dos

trabalhadores prejudicava o rendimento da produção industrial.

Como a saúde era entendida como a capacidade de recuperação da força de trabalho, e

não um direito a ser garantido a todos, tornando-se assim um problema individual, as

empresas assumiram o papel de protagonista na criação de mecanismos que pudessem

garantir a capacidade de recuperação da força de trabalho.

3.5 O Pós-Guerra

A partir do final da 2ª Guerra Mundial, um período de prosperidade e desenvolvimento

econômico se instalou, com reflexo, ainda que desigual, nos índices de mortalidade. Verifica-

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se que a tendência de queda da mortalidade é mantida, embora menos acentuada. Em 1965, a

mortalidade infantil no Brasil caiu para 116 por mil.

A mortalidade infantil caiu mais vagarosamente no período compreendido entre 1960 e

1970 devido a crise social e econômica vivenciada pelo País.

A ditadura no Brasil, nos anos 60, provocou a centralização e a concentração do poder

institucional, fortalecendo a visão da medicina científica no país (LUZ, 1991). Articulada com

os problemas do êxodo rural e da pressão demográfica sobre os grandes centros urbanos, que

foram muito acentuados, a concentração provocada pela medicina flexneriana e representou

uma pressão adicional sobre os serviços de infra-estrutura e de atendimento público.

O sistema de assistência médica organizado no tempo da ditadura, flexneriano, foi

incapaz de responder a crescente pressão da massa assalariada urbana pela ampliação e

melhoria do sistema de saúde.

A complexidade do quadro foi acentuada devido a inflação médica, isto é, o aumento

desproporcional dos custos dos procedimentos médicos, que provocou a elevação dos custos

da assistência médica, devido às transformações científicas da medicina, centrada no hospital,

nos medicamentos e equipamentos médicos. A conjugação levou a uma crise sem tamanho

(BRASIL, 2005b, p. 46).

A crise do setor saúde e a reação a ditadura gerou um caldo de produção intelectual

orgânica pela mudança com inovação. Um grupo de intelectuais vinculados ao Partido

Comunista Brasileiro (PCB) ainda na ilegalidade, e várias lideranças políticas do campo da

oposição à ditadura, começavam a discutir os problemas da saúde brasileira. O grupo entendia

que saúde se constituía em direito do cidadão e buscava um modelo de sociedade alternativo

ao que estava posto, oferecendo os contornos básicos da chamada “Reforma Sanitária”.

Em Joinville, as oportunidades geradas pela crise do sistema capitalista dos anos 30 do

século XX, e as 1ª e 2ª grandes guerras mundiais, todas estimuladoras de políticas de

substituição de importações, intensificaram o processo de parcelamento do solo no centro da

cidade e nas proximidades da região sul de Joinville.

A partir da década de 50, o processo de industrialização de Joinville deu nova

dinâmica à urbanização da região, ampliando a extensão do tecido urbano para as regiões

norte, oeste e sul de Joinville, agudizando problemas relativos a transformação do uso do

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espaço, com a expansão do “tecido urbano” 2 . Os estudos de Santana (2000, p. 67)

demonstram que

um segundo momento se revela a partir do processo de industrialização da cidade de

Joinville – a partir dos anos 50, que resultou em um crescimento vertiginoso da

população, demandando grande mobilidade social de outras áreas da região sul do

país, que viria a se expressar na reorganização da cidade, pois essa nova população

precisava ser assentada em algum lugar.

Os vetores da expansão do tecido urbano de Joinville apontavam, no período de

1967/1976, em direção ao norte, seguidos pelas zonas oeste e Sul. Santana (2000, p. 75)

relata que a tendência de ocupação dessas áreas se explica pelo fato de se constituírem nas

periferias em expansão, menos equipadas em termos de infra-estrutura urbana e comunitária,

e que por isso mesmo tinham no baixo preço da terra o mecanismo de viabilização dos

loteamentos populares.

A fragilidade da função agrícola que sustentava o uso das regiões norte, oeste e sul de

Joinville, tornou-as anti-econômicas frente à necessidade de espaço para alojar as massas de

migrantes que vinham de várias regiões de Santa Catarina e de outros estados em busca de

uma oportunidade de trabalho, no pujante complexo industrial metal-mecânico que se

expandia.

Joinville viveu neste período a consolidação do modelo da medicina científica. O

Hospital São José, maior hospital público da região nordeste de Santa Catarina, criado no

início do século XX com a finalidade de atender aos pobres e desvalidos da região, tornou-se

ao longo de meados dos anos 50 no mais importante hospital público da região.

A crise no modelo de saúde brasileiro representou momentos difíceis para o Hospital

São José. Entre os anos 1960 a 1980, as crises se sucederam, originadas pelo modelo médico

privatista implantado no país e adotado no São José, e que lavaram à permanente defasagem

nos valores pagos por procedimento médico pelo INAMPS – Instituto Nacional de Assistência

Médica da Previdência Social, os freqüentes atrasos e a grande inflação da época

(VALENTIM, 1997, p. 302).

O modelo dual e separado, com a assistência curativa separada da dimensão preventiva

e de promoção, e com as ações de âmbito municipal desvinculadas das ações executadas pelo

2 Tecido urbano é um Termo trabalhado por Lefebvre (1969, p. 16) ao explicar como é o processo de expansão do modo de viver urbano, da emergente sociedade urbana,

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governo estadual e federal, foi o modelo para a saúde de Joinville até a aprovação da nova

Constituição Federal, em 1988.

A prova da fragilidade do sistema foi representada pela convivência do modelo

público, com um aparato médico-privado cooperativado, que ofertava cobertura a parcela

significativa da população, através de convênios firmados entre as indústrias sediadas no

município. Em meados dos anos 1980, a União dos Médicos (UNIMED) chegou a ter 1/3 da

população de Joinville como cliente (VALENTIM, 1997, p. 146).

O fato da Secretaria Municipal de Saúde ter sido criada somente em 11 de novembro

de 1987, através da lei municipal 2188 (SANTOS, H, 2005, p. 25), indica a distância que

havia entre a gestão municipal e a responsabilidade com uma política de saúde pública.

3.6 A promulgação da Constituição Cidadã e o SUS

Com promulgação da Constituição Federal, que consolidou um processo de radical

transformação do sistema de saúde brasileiro, Joinville acelerou o processo de reorganização

do modelo de gestão da saúde.

Desde 1990, a transferência de responsabilidades de saúde para os municípios foi

materializada em Normas Operacionais, editadas pelo Ministério da Saúde. Nesse sentido,

foram editadas a Norma Operacional Básica (NOB) SUS 01/91 e a NOB/SUS 01/92,

enfatizando a necessidade da descentralização das ações e serviços de saúde.

A partir de 1990, houve um processo de municipalização de unidades de saúde geridas

pelos governos estaduais e federal.

O desafio da implantação do SUS em todo o país, e em Joinville isso não foi diferente,

consistiu em articular as ações, antes dispersas nos governos federal, estadual e municipal, no

âmbito curativo, da prevenção de doenças e de promoção da saúde.

Outro desafio foi criar condições políticas para a implantação da proposta da

universalização do acesso à saúde. O principal ator na definição da política municipal de

saúde, a classe médica, defendia a manutenção do modelo hegemônico, apontando a

necessidade de um sistema de serviço de saúde pública voltado somente aos pobres. Exemplo

dessa defesa foi a aprovação da Carta de Joinville, em 1996, em evento nacional organizado

pela classe médica de Joinville e que expressa claramente sua opção por “estimular, ao

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máximo, programas de medicina comunitária e outros que atinjam as populações mais

carentes (VALENTIM, 1997, p. 149).

Neste quadro, em que a inadequação do modelo de gestão pré-SUS se materializava,

frente aos novos desafios, foi preciso oferecer respostas, readequando a estrutura

organizacional da Secretaria Municipal de Saúde aos desafios propostos pela Reforma

Sanitária.

A implantação de regiões de saúde, seguindo a lógica dos distritos de saúde, foi um dos

primeiros atos da Secretaria Municipal de saúde, em busca da integração da rede assistencial.

As regionais de saúde de Joinville foram identificadas a partir do conceito de distrito

trabalhado pelo Ministério da Saúde. De acordo com o Ministério da Saúde, o distrito seria a

unidade mínima operacional e administrativa do SUS, implicando numa delimitação

geográfica concreta, norteada pelos princípios do SUS, e que correspondesse a uma parte de

um município, permitindo a divisão dos serviços de saúde no âmbito municipal (BRASIL,

1990, p. 12)

O município, de acordo com a Entrevista 01, foi dividido em 07 distritos ou regionais

de saúde (Centro, Floresta, Boa Vista, Costa e Silva, Vila Nova, Aventureiro e Pirabeiraba).

Atualmente, são 9 as regionais de saúde, conforme apresentado no mapa 4.

Através da entrevista 1, realizada com integrante da equipe dirigente da Secretaria

Municipal de saúde à época, soube-se também que o arranjo institucional criado para dar

sustentação as mudanças foi precário. Não houve uma lei municipal que redefinisse os cargos

e responsabilidades, e tudo foi realizado no limite da capacidade do gestor de programar as

mudanças naquele momento (entrevista 1). Esta informação auxilia a entender a dificuldade

dos municípios em se adequar ao novo momento em que assumia responsabilidade pela

garantia da oferta a saúde.

Um processo novo, conduzido por uma instituição nova (a Secretaria Municipal de

Saúde tinha menos de três anos à época), tentava romper com estruturas instituídas há muito

tempo. Romper com o antigo modelo, que operava dentro de uma lógica fragmentada,

baseada no pagamento de procedimentos médicos, e separava a prevenção da assistência

médica, implicava em ousar e romper com antigas práticas, centradas no médico e no hospital.

A materialização dos princípios do SUS no município significava a fragilização de

importantes grupos políticos, ligados a planos privados de saúde.

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Mapa 4 - Regionalização da saúde de Joinville, 2004

Fonte: Santos, A.A.

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O princípio da participação popular na definição da política de saúde, através dos

Conselhos de Saúde, com representantes eleitos, foi uma conquista do processo constituinte

que precisou ser conquistado na prática. Estes espaços formais deveriam atuar como

possibilidade concreta de fiscalização e de formulação de política públicas de saúde.

Entretanto, este espaço político de luta nem sempre é ‘dado de graça’, mas

conquistado pelas forças e organizações democrático-populares. No Brasil, em

muitos municípios e mesmo estados onde a tradição de participação da sociedade

civil é fraca, os conselhos são inexistentes na prática, ou muitas vezes apenas

formais e manipulados pelas forças políticas dominantes. Em outras palavras, sua

efetivação real constitui um processo de luta e conquista, através de uma aliança

entre gestores comprometidos, organizações profissionais, organizações populares e

de usuários/familiares, sindicatos, etc. (VASCONCELLOS, 2001, p. 33)

No caso de Joinville, o processo de conquista da efetivação do princípio constitucional

demandou por parte dos movimentos sociais e populares uma grande mobilização. A demanda

dos movimentos sociais do município pela implantação do Conselho foi intensa e marcada por

disputa judicial. Após muita luta um projeto de lei foi apresentado pelo poder executivo, que

se materializou em 22 de março de 1991 através da lei municipal 2503.

O Fundo Municipal de Saúde foi criado logo a seguir, através da lei 2752, de

24/11/1992. (SANTOS, H, 2005, p. 25-26). Os primeiros passos para o município se ajustar as

leis federais 8.080 e 8142, denominadas “Lei Orgânica da Saúde” fora dado.

A eleição de 1992 para prefeito e vereadores foi um marco para a saúde de Joinville. A

pressão popular pela efetivação do direito a saúde levou Joinville a um crescimento não

planejado das unidades de saúde.

A pressão das comunidades por melhoria na qualidade da saúde levou o Prefeito a

responder com a implantação dezenas de Postos de Saúde3, como forma de buscar votos. A

entrevista 1 trouxe elementos importantes para entender a dinâmica de instalação dos Postos

ou Unidades Básicas de Saúde.

3 Posto de Saúde, ou unidade de saúde, de acordo com documento do Ministério da saúde, é a unidade de saúde que presta assistência a uma população determinada, estimada em até 2.000 habitantes, utilizando técnicas apropriadas e esquemas padronizados de atendimento. Não dispõe de profissionais de nível superior no seu quadro. permanente, sendo a assistência prestada por profissionais de nível médio ou elementar, com apoio e supervisão. (BRASIL, 1990, p. 7)

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A eleição estava se aproximando, e era preciso oferecer uma resposta para a

população. Como a pressão vinha de setores organizados, uma das opções adotadas

foi a instalação de Postos de saúde nos espaços das entidades demandantes, como

associações de moradores, centros sociais urbanos e igrejas. (entrevista 1)

O movimento de implantação de postos ou unidades de saúde sem planejamento

fragilizou a garantia do acesso à saúde. Postos de saúde em locais inadequados, sem a

estrutura mínima necessária a realização de exames clínicos e consultas dos profissionais de

saúde, geraram sentimento de falta de credibilidade junto a população, agravando o problema

na medida que aumentava a demanda por mais hospitais.

A entrevista 2, realizada com gestora de uma regional de saúde do município à época

de implantação do PSF, destacou os problemas enfrentados pela expansão desorganizada e

sem planejamento das Unidades de Saúde no início dos anos 1990, e que cobrava seu preço

no começo de 1995.

A localização inadequada destes postos de saúde levou a população a “pular” o

atendimento no posto, buscando auxílio no ponto socorro do hospital São José, no

centro da cidade. O gestor municipal da saúde tentou atenuar o problema criando

um Pronto Atendimento (PA) na região sul da cidade, com o objetivo de desafogar

o pronto socorro do hospital São José, localizado no centro (entrevista 2).

Apesar do esforço na instalação dos postos ou unidades de saúde, a gestão de saúde

(entrevista 1) observou que a falta de resolutividade e capacidade instalada para realizar

procedimentos básicos de atenção a saúde, levou a população a ignorar esta porta de entrada

no sistema de saúde. Muitas unidades acabaram sendo apelidadas em várias comunidades,

como “postes de saúde”, devido a essa fragilidade.

Algumas entrevistas realizadas junto a população puderam captar este sentimento,

ilustrando essa má impressão, pois pessoas com plano de saúde, moradoras em área sem PSF,

que nunca haviam visitado a Unidade de Saúde, destacaram com veemência a inoperância da

unidade de saúde da região, justificando a necessidade de um plano de saúde “para se

garantir”. (entrevistas “a” e “i”).

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Apesar dos esforços oriundos do processo de normatização que buscava implantar o

SUS no Brasil, materializado com as (NOB) SUS 01/91 e a NOB/SUS 01/92, somente com a

Norma Operacional Básica (NOB) 01/93 foi dada mais ênfase na municipalização da atenção

a saúde. A NOB 01/93 estabeleceu as condições de habilitação dos municípios aptos ao

repasse de transferências do Fundo Nacional da Saúde, e definiu critérios de acordo com as

condições de gestão (incipiente, parcial, semiplena), com transferência direta de recursos para

os fundos municipais de saúde.

A NOB 93 também instituiu a constituição espaços de pactuação de políticas e

estratégias integradas de saúde, com as Comissões Intergestores Bipartites (CIB) e Comissão

Intergestores Tripartite (CIT). As CIBs se constituíram como espaços estaduais de pactuação,

reunindo representantes dos gestores municipais e o gestor estadual de saúde. A CIT se

formou como o espaço nacional de pactuação, reunindo representantes dos gestores

municipais, estaduais e o gestor federal da saúde.

A criação dos espaços de pactuação (CIB e CIT) colocou Joinville no mapa nacional

da gestão da saúde, devido a capacidade de articulação política do Secretário Municipal de

Saúde da época, que integrou o COSEMS (Conselho Estadual de Secretários Municipais de

Saúde) e o CONASEMS (Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde), chegando

a participar ativamente das reuniões da CIT .

Em 1994, a CIT pactuou a implantação do Programa de Saúde da Família (PSF) como

estratégia de reorientação dos serviços de atenção básica à saúde. O PSF representou uma

estratégia estruturante dentro do processo de reorganização da atenção à saúde nos municípios

brasileiros e sua implantação procurou substituir as antigas práticas, baseadas na valorização

do hospital e focadas nas doenças por práticas com foco na promoção da saúde e na

participação da comunidade.

Foram 55 os municípios que primeiro implantaram o PSF, formando 328 Equipes de

Saúde da Família4. Joinville estava entre os primeiros municípios do país a implantar o PSF

no Brasil. De Santa Catarina, somente Joinville, devido a sua liderança política na CIT e

Criciúma integravam o projeto piloto. Para pensar a implantação do PSF em Joinville, foi

criado um grupo de trabalho, que mapeou o município de Joinville e identificou as áreas de

4 cada equipe, desde então, é composta por 1 médico, 1 enfermeiro, 1 auxiliar de enfermagem e de 4 a 6 agentes comunitários de saúde.

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maior risco de adoecer e morrer. A partir desta identificação, foram definidos os locais onde o

PSF começaria a ser implantado.

O plano elaborado para implantação do Programa de Saúde da Família buscou,

segundo a entrevista 1 “dar um abraço na cidade” (entrevista 1), a partir das áreas mais pobres

e de risco social, situada nas periferias distantes do centro da cidade.

A idéia de priorizar as regiões das periferias pobres estava em acordo com as diretrizes

nacionais do Programa (BRASIL, 2001, p. 70), o que representou uma opção por beneficiar as

pessoas mais necessitadas e com maior grau de vulnerabilidade social e foi um aspecto

fundamental para o entendimento espacial do acesso a saúde em Joinville.

Todas as áreas identificadas para implantação do PSF em Joinville se constituíam em

espaços de recente expansão urbana, verdadeiras franjas, com população composta em sua

maioria por migrantes, em áreas com pouca ou nenhuma infra-estrutura urbana.

Novamente a dificuldade para operacionalizar a gestão dos serviços levou ao processo

de rediscussão da normatização do SUS. O processo de discussão entre as várias esferas da

gestão do SUS apontou vários problemas e uma nova Norma foi pactuada - a NOB SUS 01/96.

A NOB SUS 01/96 procurou redefinir as condições de gestão dos municípios – Gestão

da Atenção Básica e Gestão Plena do Sistema Municipal de Saúde –, e estados – Gestão

Avançada e Gestão Plena do Sistema Estadual. Esta norma possibilitou uma expansão mais

acelerada da rede de serviços municipais de saúde.

No momento da publicação da NOB SUS 01/96, o município de Joinville já contava

com 15 equipes de saúde da família, e o governo federal consolidava o PSF como resposta

federal para reorganização do sistema de saúde pública.

Em 1998, a implantação do Piso de Atenção Básica (PAB), definindo

responsabilidades sanitárias aos entes federados e um repasse financeiro regular e automático

per capita, foi outra transformação no modelo de financiamento da atenção básica, sendo uma

das principais medidas tomadas pelo Ministério da Saúde para viabilizar a organização da

atenção básica à saúde nos municípios brasileiros.

O PAB destinou um montante de recursos financeiros per capita exclusivamente para

ações básicas de saúde, independentemente de sua natureza - de prevenção, promoção ou

recuperação. Os recursos poderiam ser utilizados tanto para custeio de despesas correntes,

como para aquisição de materiais permanentes ou para realização de obras de construção ou

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reforma de unidades. A transferência ocorria de forma regular e automática, do Fundo

Nacional de Saúde para os fundos municipais. Foi uma modalidade de transferência de

recursos que viabilizou estratégias de mudança de modelo, pois escapou da lógica centrada no

pagamento por procedimentos médicos.

Somente com a descentralização dos recursos e a flexibilização da sua utilização em

acordo com as prioridades definidas pela gestão municipal foi possível planejar. Uma das

estratégias planejadas, justificada pela necessidade de descentralizar e aproximar dos

moradores os atendimentos de emergência, e levou a criação do Pronto Atendimento (PA) da

zona sul da cidade, assim como um PA da zona norte.

Um último elemento foi importante para o entendimento do momento atual do SUS no

município de Joinville foi a instituição da Norma Operacional de Assistência a Saúde (NOAS-

SUS 2001). As dificuldades advindas com o processo de atomização da assistência a saúde,

levou o Governo a empreender esforços no sentido de definir regiões de saúde, que pudessem

otimizar a eficiência da prestação de todos os níveis de assistência. A Norma Operacional de

Assistência à Saúde, introduziu na normalização do SUS o Plano Diretor de

Regionalização/PDR, como proposta de ordenamento do processo de organização da

assistência à saúde.

A NOAS buscou identificar as funções de cada município no sistema de saúde da

região e suprir as iniqüidades na atenção à saúde. Para isso, identificou um conjunto de ações

de atenção básica, que deveriam estar disponíveis em todos os municípios, e a criação de

incentivos para a criação de unidades referenciadas capazes de atender as demandas de saúde

de um conjunto maior de pessoas, dada uma localização geográfica adequada.

A NOAS procurou garantir uma maior flexibilidade da solução dos problemas

regionais na área da saúde, pois permitiu que Planos fossem elaborado de acordo com as

especificidades epidemiológicas, sanitárias, geográficas, sociais e no acesso aos serviços de

saúde de cada região.

3.7 O SUS na Atualidade

Todo o histórico apresentado na escala federal e seus rebatimentos no plano municipal,

configuraram em 2004 um desenho assistencial da saúde de Joinville que proporcionou um

aumento do acesso aos serviços de saúde, e vários dados provam isso.

Page 63: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

63

Para confirmar essa tese, podem ser apresentados dados como a evolução do número

de consultas, de equipes de saúde da família e agentes comunitários de saúde. Os números

mostram que houve um aumento expressivo do número de consultas médicas a população no

período, como demonstra a Quadro 7.

Em 1998 foram realizadas em Joinville pela rede pública de serviços de saúde um total

de 10.504 consultas médicas. Este número chegou a 148.231 consultas em 2004.

Quadro 7 – Número de consultas médicas realizadas na rede pública de Joinville, 1998-2004

Ano Número de consultas

1998 10.504

1999 35.741

2000 53.848

2001 75.684

2002 58.435

2003 100.585

2004 148.231

Fonte: Brasil, 2007b.

O significativo aumento do número de consultas entre 1998, primeiro ano em que os

dados consultados se mostraram disponíveis, e 2004, pode ser creditado ao fortalecimento da

rede de atenção básica, principalmente no investimento realizado pelo município no aumento

de equipes de saúde da família, o que também é confirmado pelas entrevistas realizadas com

os gestores da época. Todas as entrevistas ressaltaram o compromisso dos diversos gestores

de saúde que passaram pela Secretaria Municipal de Saúde com o projeto de implantação do

SUS.

O Quadro 8 identifica a evolução da implantação do Programa de Saúde da Família

(PSF) no município, e é possível identificar a importante ampliação do número de equipes de

saúde da família (ESF) e de agentes comunitários de saúde (ACS).

Page 64: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

64

Os 29 agentes comunitários de saúde que Joinville contava em 1998 passaram a 411

em 2004. As 15 equipes de saúde da família existentes em 1998 chegaram a 43 equipes

implantadas em 2004 (BRASIL, 2007b).

Quadro 8 – Número de ACS e de ESF implantados em Joinville, 1998-2004

Ano ACS implantados ESF implantados

1998 29 15

1999 32 23

2000 32 23

2001 69 23

2002 86 23

2003 196 31

2004 411 43

Fonte: Brasil, 2007b

O quadro 9 apresenta a evolução da população de Joinville no período de 1998 a 2004,

importante para apresentar como a evolução da implantação das equipes de saúde da família

foi superior ao crescimento populacional da cidade no período, ampliando o acesso da

população a rede básica de serviços.

Cruzando o número de consultas com a população, foi possível elaborar um novo

quadro (quadro 10), identificando o número de consultas per capita.

O quadro 10 apresenta um aumento real no número de consultas na rede pública de

Joinville, per capita, passando de 2,6 consultas por habitante em 1998 para 32,1 consultas em

2004.

Entretanto, os dados apresentados não revelam as desigualdades existentes no acesso a

saúde de Joinville, e o que poderia ser uma demonstração inequívoca do sucesso do SUS,

ratificada por inúmeros dados, ganha novos contornos quando observado do ponto de vista

espacial, considerando que existe uma importante camada da população, que está localizadas

em bairros de classe média e baixa de Joinville, que não tem garantido o acesso a saúde.

Page 65: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

65

Quadro 9 - População de Joinville, 2000-2004

Ano população

1998 399.943

1999 409.142

2000 429.604

2001 446.064

2002 453.765

2003 461.578

2004 463.057

Fonte: Joinville, 2006

Apesar de todos os dados apresentados até o momento ressaltarem o aumento real do

acesso à saúde pública em Joinville, o acesso não é igualmente garantido ao conjunto dos

habitantes de Joinville.

O processo de evolução de implantação do Sistema Único de Saúde, a partir do

levantamento realizado, quando observado sob o viés espacial, possibilitou identificar que a

garantia do acesso aos serviços de saúde se deu de forma desigual no espaço, isto é, nem

todos tiveram garantido seu acesso ao sistema de saúde, e esta desigualdade foi observada

espacialmente.

Quadro 10 – Número de consultas per capita em Joinville, 1998-2004

Ano Número de consultas per capita

1998 2,6

1999 8,7

2000 12,6

2001 17,0

2002 13,1

2003 22,2

2004 32,1

Fonte: Santos, A.A.

Page 66: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

66

As informações colhidas no Sistema de Informações da Atenção Básica do Ministério

da Saúde informam que em dezembro de 2004, havia um total de 141.927 habitantes

vinculados a ESF, ou 30,6% da população do município (quadro 12).

Quadro 11 - Indicadores de cobertura da Atenção Básica (PSF) em Joinville, 2000-2004

Ano População coberta % população coberta

2000 77.221 18,0

2001 77.230 17,3

2002 76.712 16,9

2003 96.302 20,9

2004 141.927 30,6

Fonte: Brasil, 2007b

Este percentual era 18% em 2000, o que significa que o número de pessoas cobertas

pelo PSF em Joinville quase dobrou no curto período de quatro anos.

Por outro lado, informações da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)

informam que no ano de 2000, haviam 204.416 pessoas vinculadas a planos privados de

saúde, ou 47%,6 da população de Joinville. Em dezembro de 2004 esse número havia

diminuído para 163.018 habitantes de Joinville cadastrados como beneficiários de planos

privados de saúde, ou 35,1% da população (quadro 12), o que significa que houve uma

redução significativa de pessoas, superior a 12%, que buscaram garantir o acesso a saúde

através de planos privados.

Page 67: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

67

Quadro 12 – Número de pessoas cobertas por Assistência Médica Privada por ano de

Competência em Joinville, 2000 - 2004

Competência Total % da população coberta

2000 204.416 47,6

2001 158.449 35,5

2002 161.345 35,6

2003 155.605 33,7

2004 163.018 35,1

Fonte: Brasil, 2007a

Logo, excluindo os que tinham acesso a saúde através do PSF e dos planos privados de

saúde, foi possível identificar em dezembro de 2004, 158.112 habitantes de Joinville, ou

34,1% da população, que dispunha como porta principal de entrada no sistema de saúde as

unidades de saúde “não PSF” ou as portas dos hospitais públicos.

Fica evidente que este contingente de mais de 34% da população não tem garantido o

acesso a saúde, visto que se trata de um acesso hospitalar não integrado com políticas de

prevenção e promoção da saúde, e essa falta de acesso prejudica o funcionamento de toda a

rede de saúde do município.

A fragilidade na garantia do acesso a saúde também fica evidenciada em documentos

da Secretaria Municipal de Saúde. O Plano Municipal de Saúde de Joinville para o quadriênio

2006-2009, por exemplo, apresenta de maneira sintética todas as dificuldades já identificadas,

assim como os motivos que, na visão da Secretaria, impedem o real acesso à saúde ao

conjunto da população de Joinville.

O Plano Municipal de Saúde (PMS) de Joinville para o quadriênio 2006-2009, foi

organizado pela equipe gestora da Secretaria Municipal de Saúde de Joinville, e se constitui

em documento fundamental para o processo de desenvolvimento das ações do município,

visto que foi apresentado e aprovado pelo Conselho Municipal de Saúde.

O Plano apresenta uma análise com as dificuldades, ameaças, fortalezas e

oportunidades do sistema municipal de saúde. Uma das principais fraquezas apontadas no

documento é a dualidade do sistema de saúde implantado em Joinville, caracterizado como

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68

“Modelo hospitalar” e identificando-o como um Modelo de atenção em saúde curativo

(JOINVILLE, 2007, p. 18).

A fraqueza, quando analisada de maneira articulada a identificação dos diversos

condicionantes de saúde do município, também apresentada no Plano Municipal de Saúde

2006/2009, revelou vários aspectos relevantes da situação de organização do sistema de saúde

de Joinville:

a) Demanda não apropriada para serviço de emergência;

b) Emergência lotada (devido à proximidade da BR 101, indústrias, e rede básica

insuficiente);

c) Demora no atendimento de solicitações de procedimentos de média e alta

complexidade;

d) Grandes deslocamentos dos usuários para coleta de material para exames de análises

clínicas;

e) Insatisfação da clientela usuária devido: a demora ou ausência do atendimento,

condições ambientais da espera, objetividade do atendimento (devido à sobrecarga dos

profissionais) e inadequação do discurso e comunicação;

f) Grandes distâncias para acesso ao atendimento na atenção básica;

g) Oferta de serviços inferior aos parâmetros assistenciais vigentes;

h) Insuficiência de equipamentos necessários à realização dos procedimentos nas

Unidades Básicas de Saúde(JOINVILLE, 2007, p. 16).

Todas as informações trazidas pelo Plano Municipal de Saúde reforçam e validam as

informações já levantadas, indicando a existência de disputa entre os modelos de atenção a

saúde, e como essa disputa vem limitando a efetivação da garantia do acesso a saúde pelo

conjunto da população de Joinville.

Page 69: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

69

Mapa 5 – Distribuição espacial dos equipamentos de saúde do município de Joinville, 2004

Fonte: Santos, A.A.

Page 70: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

70

Quando se observa no mapa a espacialização dos equipamentos públicos de saúde de

Joinville em 2004 (mapa 5), fica nítida a falta de unidades básicas de saúde nos bairros que

compõem a região central da cidade.

Também é possível visualizar a espacialização dos equipamentos hospitalares de uma

maneira que segue a lógica da “Teoria do Lugar Central”, uma vez que os mesmos se

encontram nos espaços centrais/nobres da cidade.

E para entender os motivos que levam a falta de unidades básicas de saúde na região

central da cidade, foi preciso identificar as diferenças advindas da renda per capita agrupada

por bairro da população de Joinville (quadro 13).

Quando se identifica as diferenças de renda per capita por bairro, se observa a

concentração da população mais rica do município nos bairros do centro da cidade. As

características de uma cidade média com perfil industrial justificam o achatamento na renda

das parcelas da população com renda per capita menor, com um grande parcela da população

ganhando menos que um salário mínimo, e uma outra grande parcela da população ganhando

entre 1 e 2 salários mínimos.

Para atingir os objetivos propostos, visando identificar as parcelas descobertas do

acesso a saúde pública, foi necessário realçar uma divisão dos bairros de Joinville em três

tercis, levando em consideração o salário mínimo da época, fixado em R$ 260,00 (BRASIL,

2004a).

Esta divisão em tercis caracterizados por uma divisão centrada em salários mínimos,

foi mais adequada pelo perfil achado da base, formado por um grande números de bairros de

periferia com baixa renda per capita (até 2 salários mínimos), o que em uma divisão típica por

classes sociais ou por quartis, não produziria o destaque necessário para o tercil médio,

formado pelos bairros que possuem renda per capita entre 1 e 2 salários mínimos.

O primeiro tercil foi identificado pelos bairros com maior renda per capita (2 salários

mínimos ou mais) - Atiradores, Centro, Anita Garibaldi, América, Bucarein, Glória, Santo

Antônio e Saguaçú.

O segundo tercil foi identificado pelos bairros com renda per capita entre 1 e 2 salários

mínimos – Costa e Silva, Bom Retiro, Floresta, Guanabara, Pirabeiraba, São Marcos, Iririú,

Boa Vista, Itaum, Vila Nova, Nova Brasília, Petrópolis, Jardim Iririú, Aventureiro,

Boehmervaldt.

Page 71: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

71

Quadro 13 – Renda per capita e população dos bairros de Joinville, 2004

Bairro Renda per capita População Atiradores 1.764,31 4.834 Centro 1.719,23 4.868 Anita Garibaldi 1.102,73 8.419 América 1.102,73 10.851 Bucarein 915,43 5.743 Gloria 880,93 9.023 Santo Antonio 832,93 5.203 Saguaçú 786,60 12.220 Costa e Silva 487,69 24.499 Bom Retiro 476,35 10.414 Floresta 467,47 18.666 Guanabara 445,82 10.325 Pirabeiraba 406,97 4.357 São Marcos 390,42 2.722 Iririú 379,00 23.464 Boa Vista 377,81 18.236 Itaum 352,21 12.709 Vila Nova 302,87 17.243 Nova Brasília 279,34 13.051 Petrópolis 272,88 14.353 Jardim Iririú 270,63 21.053 Aventureiro 269,69 33.395 Boehmervaldt 261,04 15.656 Santa Catarina 254,21 10.000 Jardim Sofia 243,95 3.482 Ulysses Guimarães 241,94 6.726 Adhemar Garcia 241,94 8.660 Espinheiros 239,01 6.744 Comasa 238,95 20.927 Jarivatuba 238,14 12.898 João Costa 236,40 2.632 Itinga 235,36 16.875 Rio Bonito 226,21 5.635 Dona Francisca 225,21 1.203 Parque Guarani 221,93 10.124 Paranaguamirim 221,93 14.671 Fátima 219,45 16.565 Itoupava-Açú 189,81 1.349 Morro do Meio 189,61 8.145 Vila Cubatão 171,69 1.182 Jardim Paraíso 171,69 13.935 TOTAL 463.057

Fonte: Joinville, 2006.

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72

Mapa 6 – Renda per capita (R$) por bairro de Joinville, 2004

Fonte: Santos, A.A.

O terceiro tercil foi formado pelos bairros com renda per capita até 1 salário mínimo -

Santa Catarina, Jardim Sofia, Ulysses Guimarães, Adhemar Garcia, Espinheiros, Comasa,

Page 73: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

73

Jarivatuba, João Costa, Itinga, Rio Bonito, Dona Francisca, Parque Guarani, Paranaguamirim,

Fátima, Itoupava-Açú, Morro do Meio, Vila Cubatão, Jardim Paraíso.

A partir da divisão em três tercis, foi possível compreender melhor os limites da

garantia do acesso a saúde pública de Joinville.

Com o quadro 13 foi possível identificar esses três grandes grupos de bairros, que com

sua características peculiares, materializam de forma diferenciada a garantia do acesso a saúde

do município. A existência de uma forte desigualdade espacial cristalizadora dos espaços dos

ricos e dos pobres em Joinville foi identificada, e pode ser observada no mapa 6, que

espacializou esta desigualdade.

É possível observar no mapa 6 que os bairros do centro de Joinville são aqueles que

concentram a população mais rica e que os bairros da periferia distante do município como os

que concentram a população mais pobre, oferecendo um caminho para identificar onde estão

os clientes dos planos privados de saúde, e onde estão os clientes do PSF.

A partir da espacialização da desigualdade social existente em Joinville, foi possível

inferir como alguns bairros possuem acesso a saúde e outros não.

A análise geográfica dos dados apresentados até o momento indica uma relação

espacial muito forte entre a alta renda per capita ou a existência em seu bairro da equipes de

saúde da família com a capacidade das pessoas terem garantido o acesso aos serviços de saúde

em Joinville.

Page 74: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

74

4 OS LIMITES ATUAIS DA GARANTIA DO ACESSO A SAÚDE

Procura-se, neste capítulo, analisar dois aspectos importantes da saúde pública

brasileira em cidades médias e em Joinville em particular: primeiro, como a configuração

espacial da rede do Programa de Saúde da Família nas cidades médias similares a Joinville

conformou os limites do processo de reforma sanitária, freando a capacidade de efetivar a

universalidade do acesso à saúde a parcela da população enquadrada em faixas médias de

renda. Segundo, como a não-efetivação da universalidade do acesso à saúde em Joinville

provocou um grande vazio de atenção básica, que sobrecarrega a rede hospitalar publica

municipal, conformado principalmente por bairros com renda entre 1 e 2 salários mínimos,

não cobertas pelo PSF.

4.1 Limites da Reforma Sanitária

A década de 1990 foi um marco para a gestão da saúde pública no Brasil, apesar do

avanço das políticas neoliberais no país. Os atores do campo da saúde coletiva conseguiram

incluir na agenda política decisória do Governo Federal, ações, diretrizes e estratégias

voltadas para o fortalecimento do Sistema Único de Saúde.

Depois de muitos anos desenvolvendo ações e investimentos de maneira dicotomizada,

separando as ações de prevenção/promoção das ações de recuperação da saúde, e priorizando

aquelas centradas no hospital, realizando repasse de recursos calculados com base em

realização de procedimentos médicos, o Ministério da Saúde procurou reorientar a política de

financiamento dos estados e municípios Buscaram-se estratégias que pudessem garantir a

implementação dos princípios constitucionais da universalidade, integralidade e equidade.

São exemplos da inflexão e busca de interação entre prevenção/promoção e ações de

recuperação a incorporação do INAMPS pelo Ministério da Saúde, medida que colocou no

Page 75: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

75

mesmo lugar a gestão, a prevenção, a promoção e a recuperação da saúde antes dividida em

dois Ministérios, Previdência e Saúde. Criaram-se, também, mecanismos que viabilizassem a

transferência direta de recursos de maneira regular e automática, calculados por habitantes,

que dessem aos gestores locais condições de organizar minimamente uma rede integral e

articulada de saúde.

A história da evolução do sistema público de saúde, apresentada no capítulo 3,

demonstrou quão importante foi a Constituição de 1988 para promover uma inflexão na

política de saúde em direção da efetivação a saúde como direito social e dever do Estado.

Neste contexto, a divulgação pelo Ministério da Saúde, em setembro de 1994, do primeiro

documento sobre o PSF, em que os mecanismos de financiamento da proposta eram

apresentados, foi a mais forte tentativa de inversão do modelo, apesar de sua proposta inicial

tratar apenas da cobertura de áreas com maior risco social (BRASIL, 2005, p. 16),

Somente a partir de 1997 o PSF passou a ser defendido pelo Ministério da Saúde como

uma proposta de reorientação do modelo de atenção a saúde. Por trás do desejo e da vontade

de mudar, e das dificuldades encontradas, encontrava-se a disputa entre dois modelos de

atenção, o flexneriano e o da saúde coletiva.

O PSF obteve importantes resultados, identificados em pesquisas avaliativas, como

uma ação do governo que produziu avanços na garantia do acesso à saúde pela parcela mais

pobre da população (BRASIL, 2006, p. 170):

Os indicadores relacionados a morbi-mortalidade declinaram e os que refletem a

cobertura dos serviços cresceram significativamente. A magnitude dessa variação

mostrou-se, em geral, mais intensa nos estratos de cobertura mais elevada do

Programa de Saúde da Família. (...) os resultados sugerem que a ampliação da

cobertura de serviços na atenção básica, nas regiões mais desfavoráveis, a partir da

expansão do Programa de Saúde da Família, está contribuindo positivamente para

reduzir os diferenciais no acesso e na prestação dos serviços de saúde no Brasil.

Pesquisa realizada em 10 grandes centros urbanos, com o objetivo de promover

avaliação da implementação da estratégia de saúde da família confirmou que “a população

atendida pelo PSF é extremamente vulnerável” (BRASIL, 2005, p. 200).

Entender a dificuldade de avanço do PSF como estratégia estruturante da

reorganização da saúde, com capacidade de proporcionar uma cobertura que incorpore a

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76

classe média e como isso se reflete na organização dos serviços de saúde, implica em

explicitar como os diferentes modelos de organização da atenção disputam a organização do

PSF:

os atores que defendem o modelo flexneriano, principalmente a classe médica

hospitalocêntrica, tentam fazer do PSF um programa de saúde de pobres para pobres,

tal como demonstrado nas pesquisas, e percebido pelas entrevistas estruturadas

realizadas em Joinville. Defendem que o PSF seja um programa focalizado à camada

mais pobre, com a adoção de procedimentos simplificados e baratos para garantir o

acesso a saúde para o conjunto maior e mais pobre da população, com pouca ênfase na

atuação clínica e individual. Esse desenho não afetaria os interesses econômicos do

grupo flexneriano, pois o modelo continuaria a ser a resposta aos extratos sociais mais

elevados da sociedade;

os defensores do modelo da saúde coletiva, defendem o PSF como uma “estratégia

estruturante dos sistemas municipais de saúde, visando a reorientação do modelo de

atenção e uma nova dinâmica de organização dos serviços e ações de saúde” (BRASIL,

205, p. 17). Esse desenho contraria os interesses econômicos do modelo flexneriano,

pois trabalharia contra a lógica mercadológica ainda dominante no sistema público

de saúde.

Tal disputa marcou o PSF e hoje é possível identificar os limites gerados pela disputa.

O limite criado pelo PSF foi espacial e econômico. Trata-se de um limite observável, e que

em cidades médias com história de formação similar a de Joinville adquire características

próprias.

O primeiro limite é territorial, formado pelas bordas do conjunto dos territórios

adscritos às 21.232 equipes de saúde da família implantadas no Brasil em dezembro de 2004.

O PSF nesses territórios, mais pobres e vulneráveis em sua esmagadora maioria, garantiu o

acesso à atenção básica de saúde para 38,99% da população, ou cerca de 69,1 milhões de

pessoas, conforme dados do Ministério da Saúde (MS/SAS/DAB, 2007). As pesquisas

indicam uma percepção positiva da população adscrita a esses territórios:

este grupo faz uma avaliação positiva do Sistema de Saúde, conforme indicam as

pesquisas. Pesquisa de opinião encomendada pelo Ministério indica que esse

segmento dá nota 7 para o atendimento. Em compensação, quem não depende da

rede pública confere nota 3,5. (UNICAMP, 2001, p.12)

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77

Outro limite de acesso à saúde foi econômico, vinculado a capacidade de pagamento

de um plano de saúde pelas pessoas. A baixa percepção de qualidade da saúde pública pela

população não usuária do PSF, levou as camadas com melhores condições econômicas a

buscar os planos privados para garantir o acesso a bens e serviços com maior qualidade.

É possível, a partir dessa premissa, confirmada por dados da Agência Nacional de

Saúde Suplementar (BRASIL, 2007) identificar os beneficiários dos planos privados de saúde

através da identificação da população de maior poder aquisitivo, encontrada nos espaços mais

valorizados do município.

Em municípios com história de formação sócio-espacial similar a Joinville, as

características de configuração do espaço urbano (terras mais valorizadas situadas no centro

do município, que se desvalorizam na medida em que se afastam dele, forçando as camadas

mais pobres da população a buscar os espaços mais distantes, caracterizando mais fortemente

as periferias distantes do centro urbano como os espaços dos pobres), permitem lançar uma

hipótese, a ser confirmada em outras pesquisas, de que o espaço central é o espaço dos planos

privados de saúde.

Os dois limites, espacial e econômico, podem conformar um desenho econômico-

espacial com capacidade de explicar o desenho da rede de atenção a saúde, apresentando as

dificuldades de efetivação do acesso universal a saúde, na medida em que identifica um

terceiro grupo, descoberto de qualquer acesso a saúde que não seja a fila da emergência dos

hospitais públicos do país, ou de unidades de saúde sem compromisso com o

desenvolvimento de ações de prevenção à doenças e de promoção a saúde.

Os limites apresentam um desenho, apresentado figura 3, e sua adaptação ao desenho

dos municípios brasileiro é uma possibilidade a ser verificada, como se observou no estudo do

caso de Joinville.

Page 78: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

78

Figura 3 – Modelo de cobertura da saúde no espaço municipal

Fonte: Santos, A.A.

A figura 3 buscou simplificadamente sintetizar o desenho do nó da efetivação do

acesso a saúde nos municípios, considerando que seu uso é melhor adaptado a cidades

médias, não se aplicando a municípios menores (menos de 100 mil habitantes), pela

dificuldade em contar em sua sede estruturas de maior complexidade tecnológica como

hospitais, com capacidade suficiente para dar conta da atenção de alta complexidade, nem a

municípios com mais de 500 mil habitantes, pela complexidade intrínseca desses processos de

urbanização.

Os números demonstram haver uma parcela, que se encontra no tercil médio das

tabelas de renda per capita por bairros de uma cidade média, que não encontram cobertura

pelo PSF e não tem condições financeiras de pagar por planos de saúde, não tendo garantido o

acesso a saúde de maneira digna e sobrecarregando o sistema de saúde pública como um todo,

considerando que a população destes bairros tende a se constituir em fator causal da

sobrecarga dos hospitais públicos do município.

A falta de uma porta de entrada adequada, similar à existente nas comunidades que

recebem a atenção do PSF, com capacidade de resolver 85% dos problemas de saúde dessa

parcela dessassistida, leva para o ambiente hospitalar toda uma demanda não atendida

previamente. A população moradora dos bairros que possuem renda per capita no segundo

tercil de uma cidade média se configura, por isso, numa população moradora em fronteira

entre dois modelos de atenção a saúde.

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79

De um lado, os moradores com renda per capita maior, que usufruem dos benefícios

dos planos privados que podem pagar. De outro, os beneficiários do PSF, que tem garantido a

atenção básica em padrão de qualidade e de maneira articulada com os princípios da

integralidade, e equidade. No meio, os que vivem no não-lugar do acesso a saúde pública.

Santos (2007, p. 3) defende que são nesses espaços, “não–lugares, nos limites dos territórios,

nas zonas de fronteira, nas franjas, que se desenvolvem os mais acentuados exemplos de

problemas da saúde pública da atualidade”.

Trata-se de um grande contingente populacional, e na escala nacional se constitui no

maior dentre todos (42,28%), já que os dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar

(ANS) informam que a população coberta em dezembro de 2004 por planos privados de saúde

foi de 18,73% (BRASIL, 2007a), e os dados do Ministério da Saúde registram que a

população coberta pelo PSF foi de 38,99% (BRASIL, 2007b) . Trata-se de uma maioria

localizada em grandes áreas metropolitanas, que sofre com a configuração espacial da rede de

atenção a saúde existente no Brasil, pois a contingência de acessar o sistema de saúde apenas

pelas portas das emergências dos hospitais públicos, colocando-os no centro da crise existente

em boa parte do país.

A indefinição ou a disputa pelos dois modelos de atenção a saúde, materializada nos

limites espaciais da rede de atenção a saúde do PSF, conforma neste momento um desafio a

radicalização do processo de reforma sanitária. Um limite que pode ser identificado em todo

o país e melhor visualizado espacialmente nas cidades médias e que freia a capacidade dos

municípios em efetivar a universalidade do acesso a saúde, demandando políticas, estratégias

e ações adequadas e específicas para as populações que estão fora do mapa de cobertura da

saúde pública.

4.2 Sobrecarga da rede hospitalar publica municipal em Joinvile

A compreensão do processo de constituição do sistema público de saúde de Joinville,

como tratado no capítulo 3, evidenciou como o planejamento das ações de saúde centrado na

medicina científica, hegemônico até meados dos anos 1990, consolidou a organização de uma

rede de serviços descolada das necessidades de saúde da maioria da população local. Foi um

processo que respondeu aos interesses da classe médica, que não conseguiu efetivar uma

política pública de saúde universal e de qualidade.

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80

As entrevistas com gestores da saúde pública de Joinville da época, identificaram a

existência de um “processo de hegemonia da definição das políticas pela classe médica”

(entrevistas 3 e 4). Vários autores (VALENTIM, 1997; VEIGA JÚNIOR, 1993) também

apontaram a importância da classe médica como ator hegemônico na determinação das

políticas de saúde de Joinville.

A Sociedade Joinvilense de Medicina (SJM), entidade de representação da classe

médica de Joinville, conseguiu criar mecanismos com capacidade de impedir a entrada de

novos médicos no município, evitando a realização de concurso público municipal, no início

dos anos 1990, o que dificultou a reorganização do sistema público de saúde em Joinville

(VEIGA JÚNIOR, 1993, p. 101).

A SJM também exerceu fortemente o poder de indicação e veto de Secretários

Municipais de Saúde e Diretores de Hospital, durante os últimos 20 anos do século XX

(VALENTIM, 1997, p. 143; VEIGA JÚNIOR, 1993, p. 73).

Foi a classe médica de Joinville que trabalhou de modo geral em favor da manutenção

da medicina científica como modelo de saúde para o município, defendendo a existência de

uma saúde pública para os pobres e uma saúde privada suplementar, materializada no

município pela Unimed, para os assalariados formais e os que pudessem pagar por isso

(VALENTIM, 1997, p. 143, 146, 147, 303).

A crise econômica das décadas de 1980 e 1990 levou uma importante parcela dos

trabalhadores da indústria de Joinville, até então cobertos por plano privado de saúde, a uma

situação de desemprego, terceirização, ou informalidade. Este contingente da classe média

passou a depender mais do sistema público de saúde, colocando a saúde pública na agenda

política e demandando maior qualidade do sistema.

A necessidade de reorganização do sistema público de saúde de Joinville e o aumento

da demanda por um sistema de saúde público e de qualidade, articulada a todo o debate

oriundo da Reforma Sanitária trouxe os defensores da reforma sanitária do município para a

arena política municipal e possibilitou a apresentação de novas respostas governamentais para

a gestão da saúde pública.

Foi nesta arena conflituosa, de embate entre a medicina flexneriana e a saúde coletiva,

que o município de Joinville configurou a partir da década de 1990, a sua rede de serviços

públicos de saúde. As características dessa configuração permitem confirmar a dificuldade do

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81

PSF atingir outras parcelas da população que não as camadas mais pobres e vulneráveis

localizadas nas distantes periferias do município.

O PSF representou para Joinville o primeiro planejamento sistemático e organizado de

oferta de saúde para as regiões mais pobres. Representou a realização de um planejamento

geográfico, que orientou a indicação das regiões com maior carência e vulnerabilidade, apesar

de não romper com a lógica hospitalocêntrica existente na cidade. Os bairros indicados pela

SMS para iniciar o processo de implantação do PSF foram bairros com o mais alto índice de

incremento populacional e de expansão urbana, ou seja, as franjas urbanas e periferias em

formação.

A sistemática de iniciar a implantação pelas áreas mais pobres e vulneráveis seguia o

desenho proposto pelo Ministério da Saúde e foi um desenho que seguiu uma lógica espacial.

A entrevista 1 confirmou essa hipótese quando apresentou como foi o processo de

planejamento da implantação do PSF em Joinville. O entrevistado disse o seguinte:

os fluxos realizados pelos pacientes na referencia da atenção básica para a atenção

especializada e os fluxos econômicos e sociais foram levados em consideração no

planejamento para implantação do PSF em Joinville. Os pacientes não deveriam

buscar atenção especializada fora dos fluxos já estruturados pela rede de transporte

público existentes. Os pacientes deveriam sempre sair do bairro, em direção ao

centro da cidade, segundo o fluxo das necessidades, e também o fluxo viário de

deslocamento das pessoas.

Entretanto, este processo de implantação foi marcado por conflitos de várias naturezas,

alguns deles com fundamento na incapacidade dos gestores em entender a complexidade do

processo de (re)produção do espaço.

Os problemas provieram de três fatores: a) localização inadequada dos postos de saúde

no período pré-SUS; b) percepção de ineficiência dos postos de saúde por parte da população;

e c) resistência de parcelas da população a proposta de reorientação do modelo de saúde. Os

conflitos foram trabalhados pela gestão municipal da saúde, mas foi possível observar a

dificuldade de resolução de conflitos oriunda das disputas e das fragilidades conceituais

presentes no processo de reorganização do sistema de saúde.

Quanto ao primeiro fator, a localização de unidades de saúde, no período pré-SUS,

essencial para garantir a acessibilidade à saúde da população mais pobre, não foi

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82

espacialmente pensada pelo gestor municipal de saúde. A mobilização dos movimentos

sociais locais influenciou a decisão dos gestores pelos locais de instalação, muitas vezes sem

um processo de planejamento espacial e de demanda adequado.

As entrevistas 2 e 5, que foram realizadas com gestores da SMS de Joinville no

período de 1996 a 2004, período de implantação do PSF, registraram a dificuldade de

implantação do PSF em unidades de saúde, por causa daquela política pré-SUS, de

implantação de unidades de saúde em lugares inadequados. Registraram que no período pré-

Sus, “a SMS buscou responder com a implantação de postos de saúde em igrejas e

associações de moradores, vários deles em locais inadequados do ponto de vista da

acessibilidade” (entrevistas 2 e 5).

Em 1993 a SMS já contava com 42 postos de saúde, espalhados da maneira

desorganizada pelo município, em situação precária e com localizações que dificultavam o

acesso.

Quanto ao segundo fator, a percepção de ineficiência dos postos de saúde, prejudicou

o processo de reorientação do modelo assistencial, influindo na capacidade da rede de

serviços básicos em garantir o acesso a saúde para a população. A visão da ineficiência dos

postos de saúde por parte da população atendida deveu-se principalmente às limitadas funções

de prevenção (vacinas, educação em saúde, entre outras) de vários postos, ao fato de contar

apenas com pessoal de nível técnico e elementar (entrevista 1) e à localização periférica ou de

difícil acesso (entrevistas 1 e 2) dos postos, quando a população demandante morava em áreas

mais centrais dos bairros. Por último, a Sociedade Joinvilense de Medicina pressionou muito

para não fosse realizado concurso público para médicos (VEIGA JUNIOR, 1993, p. 101), o

que não melhorou o atendimento.

Os moradores tinham uma opinião muito negativa da capacidade resolutiva dos postos

de saúde. Em várias entrevistas esse problema foi identificado, como nas entrevistas “c” e

“n”, que se queixaram dizendo que “ os médicos não resolvem nada, só encaminham para

exames e especialistas” e “ médico bom havia antigamente, hoje eles nem olham na cara da

gente”. Outras entrevistas abordaram de forma subjetiva o problema, ao registrar a

necessidade de mais médicos especialistas (entrevistas “ l” e “n”).

A implantação do PSF reorganizava a atenção e, em muitos casos, implicava em

deslocar médicos especialistas que atendiam em alguns postos de saúde para sedes das

regionais de saúde. A proposta de implantação do PSF em bairros com grande desigualdade

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na ocupação espacial, bairros onde a classe média sofria com áreas de invasão de loteamentos

de baixo custo, gerou problemas para a gestão. Não foi fácil convencer moradores da classe

média que a retirada do médico especialista não seria um retrocesso, mas um avanço do

sistema de saúde. As entrevistas 1,2 e 5 identificaram conflitos decorrentes desse processo,

geradores de gargalos na efetivação da garantia do acesso a saúde para esta parcela da

população.

A entrevista 1, realizada com a gestora que esteve a frente do processo de implantação

do PSF em Joinville identificou conflitos da implantação do PSF em vários bairros de

Joinville, como o São Marcos e Pirabeiraba, bairros com uma condição econômica mais

favorável, mas com recortes e bolsões de pobreza que justificavam a implantação do PSF.

Foram bairros em que a população resistiu a substituição do modelo flexneriano pelo modelo

da saúde coletiva. Para esses moradores, com condição econômica mais privilegiada, seria um

retrocesso deixar de contar com médicos especialistas (pediatra, ginecologista) no posto de

saúde, para ter a disposição “apenas um médico generalista” (entrevista 1).

Este exemplo ilustra a dificuldade que a gestão municipal teve para reorientar o

modelo, ultrapassar os limites das camadas mais pobres da população, devido a visão

flexneriana arraigada junto as classes médias, que entendiam o PSF como uma proposta de

saúde pobre para os pobres, retomando o debate sobre o desafio conceitual que permeia a

universalização da garantia do acesso a saúde.

A dificuldade de acesso e a percepção de ineficiência dos postos de saúde levaram a

um movimento, por parte dos usuários de saúde com melhor renda, de ignorar o posto de

saúde como porta de entrada do sistema, cristalizando a cultura centrada no hospital e

prejudicando a rede de saúde. As pessoas buscavam a resposta para todos os problemas de

saúde, mesmo os mais simples, no Hospital Municipal São José (localizado no centro da

cidade), engrossando as filas do Pronto Socorro.

A partir de 1993, a gestão municipal de saúde, para resolver as questões do acesso ao

sistema, procurou aplicar os conceitos espaciais baseados na Teoria do Lugar Central (mesmo

sem conhecer de fato a teoria) para fazer a reespacialização dos postos de saúde e das

regionais de saúde. Inclusive foi aprovada pelo Conselho Municipal de Saúde uma diretriz

impedindo a Secretaria Municipal de Saúde de implantar novas unidades de saúde sem que

todas as existentes estivessem adequadamente equipadas, conforme informado na entrevista 1.

O processo de planejamento foi destacado nas entrevistas 1, 2 e 5, realizados com gestores da

SMS de Joinville do período.

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84

A readequação da localização das sedes das regionais de saúde ainda não foi concluída,

sendo possível ver a dificuldade de acesso da unidade básica de saúde da Vila Cubatão para

sua regional de Saúde, localizada no bairro Aventureiro, conforme a entrevista 2

é possível identificar ainda hoje a utilização de referências que não seguem a lógica

espacial de acessibilidade, como a Sede regional do bairro Aventureiro, que

referencia a Unidade Básica de Saúde/UBS da vila Cubatão até na atualidade, um

complicador do ponto de vista do fluxo e do acesso (entrevista 2).

Como um exemplo positivo do processo de planejamento a partir da Teoria do Lugar

Central, apresentou-se o exemplo da implantação do Pronto Atendimento (PA) da Zona Sul de

Joinville. A entrevista 1 ressaltou que

O principal eixo de escoamento da zona sul de Joinville, cruzamento dos maiores

fluxos da população da zona sul em direção ao centro da cidade, ao lado de um

terminal de integração do transporte urbano foi o local escolhido para o pronto

atendimento da zona sul. A localização foi fundamental para garantir a

acessibilidade do PA, como espaço de urgência em saúde para toda a região

(entrevista 1)

O Pronto Atendimento (PA) da Zona Sul foi planejado pela Secretaria Municipal de

Saúde para atender a demanda da região mais carente do município. A Zona Sul de Joinville

congrega um conjunto de bairros de baixa renda, e a implantação do PA nesta região tinha o

objetivo de desafogar o Hospital Municipal São José, do centro da cidade.

Outro exemplo, na direção contrária a utilização da Teoria do Lugar Central, resultou

num PA sub-utilizado até os dias de hoje. Desde a implantação do PA da Zona Sul, as

lideranças políticas da zona norte passaram a cobrar a implantação de um PA na Zona Norte

de Joinville. Ao não priorizar aspectos espaciais para definição do local de implantação do

Pronto Atendimento (PA), priorizando uma região que não possuía as melhores condições de

atração populacional, que não respeitava os fluxos utilizados pela população, a gestão da

saúde deu exemplo recente do que pode acontecer quando não se planeja espacialmente a rede

de serviços de saúde.

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85

4.3 Resistências e o não-lugar da atenção a saúde de Joinville

Outro problema identificado nas entrevistas como elemento dificultador da expansão

do PSF para além das regiões mais pobres, ocorreu devido a resistência de parcelas da

população com maior poder aquisitivo a proposta. A implantação do PSF reorganizava a

atenção, e em muitos casos implicava em deslocar médicos especialistas que atendiam em

alguns postos de saúde para sedes das regionais de saúde.

A proposta de implantação do PSF em territórios marcados por grande desigualdade

na ocupação espacial, em bairros onde o processo de especulação imobiliária proporcionou

uma elevada abertura de loteamentos voltados a população de baixo poder aquisitivo, gerando

bolsões de pobreza em bairros com renda per capita maior, criou problemas para a gestão de

saúde.

Houve grande dificuldade por parte da gestão de saúde em convencer moradores com

maior poder aquisitivo, da importância da implantação do PSF. Os moradores com maior

renda não aceitavam a retirada do médico especialista das unidades de saúde. As entrevistas 1,

2 e 5 identificaram conflitos decorrentes desse processo, todos ocorridos em bairros com

renda per capita entre 1 e 2 salários mínimos, com bolsões de pobreza nas suas bordas,

ratificando os problemas decorrentes da disputa dos modelos de atenção a saúde, geradores

de gargalos na efetivação da garantia do acesso a saúde para esta parcela da população.

É possível verificar tal dificuldade quando se observa que o PSF não conseguiu

ultrapassar a sua área de cobertura para áreas com maior renda per capita, localizada nas

regiões centrais da cidade de Joinville (mapa 7)

Os fatores apresentados permitem inferir a existência de um grande vazio de acesso

real a rede de atenção básica de saúde em Joinville, o não-lugar da saúde pública de Joinville,

o não-lugar que cria o lugar das filas nos prontos-atendimentos, que sobrecarrega a rede

hospitalar publica municipal. O não-lugar da atenção básica em saúde de Joinville é

conformado principalmente por bairros com renda entre 1 e 2 salários mínimos, que ainda

não estão cobertos pelo PSF e que não possuem renda para aderir a planos privados de saúde.

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Mapa 7 – Bairros com equipes de saúde da família implantados em Joinville, 2004

Fonte: Santos, A.A.

Foi possível identificar em Joinville, ao invés de um grande Sistema Único de Saúde

(SUS), universal, integral e de qualidade, três grandes subsistemas de saúde, concorrentes e

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em parte sobrepostos, em busca da atenção à saúde dos joinvilenses: o público orientado pelo

PSF; o público “não-PSF” e o privado, confirmando a hipótese geral da existência de três

grandes círculos da atenção a saúde em Joinville:

O primeiro, formado pela periferia do município coberta pelo Programa de Saúde da

Família, que em 2004 atendia 111 mil pessoas, ou 23% da população (BRASIL,

2007b), situado nas periferias da cidade;

O segundo, formado por aqueles que não possuem condições de ter um plano de saúde

privado, nem estão cobertos pelo programa de Saúde da Família, que somam cerca de

186 mil pessoas ou 41% da população de Joinville,localizados entre o centro e a

periferia, mas já invadidos por bolsões de pobreza atendidos pelo PSF;

O último, formado pelo centro da cidade, onde se concentram as famílias mais ricas do

município, e que estão cobertas por planos privados de saúde ou por atendimento

privado. Nesta situação encontravam-se cerca de 169 mil pessoas em dezembro de

2004, ou 36% da população de Joinville (BRASIL, 2007a).

Ao fazermos um cruzamento entre os dados da cobertura dos planos privados de saúde

e do PSF em Joinville, com o mapa da desigualdade espacial (mapa 6), e os bairros

caracterizados em cada um dos tercis, observa-se como eles estão próximos.

Os bairros que conformam o tercil superior, com renda per capita superior a 2 salários

mínimos, possuem uma população aproximada de 61.161 habitantes, ou 13,2% da população,

o que significa que o acesso aos planos privados de saúde está disponível para parcelas

importantes da população em bairros localizados fora do tercil superior. É um fato plausível,

devido a existência de várias grandes indústrias que mantém convênios com planos privados

de saúde para seus trabalhadores.

Os bairros que conformam o tercil médio, com renda entre 1 e 2 salários mínimos,

possuem uma população aproximada de 240.143 habitantes, ou seja, 51,9% da população do

município. Encontram-se majoritariamente nesses bairros os contingentes populacionais que

não tem acesso ao PSF e não tem condições de financiar um plano privado de saúde. Como

nesses bairros encontram-se vários bolsões de pobreza, devido a complexidade de sua

formação sócio-espacial, são os espaços em que os conflitos oriundos da implantação do PSF

são mais evidentes, conforme já demonstrados pelas entrevistas.

Os bairros do tercil inferior, com renda até 1 salário mínimo, apresentam uma

população aproximada de 161.753 habitantes, ou 34,9% da população. Como a população

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adscrita a equipes de saúde da família conformam 23% da população, é possível identificar

que existem ainda em Joinville cerca de 11% da população, mais pobre, sem acesso ao PSF, o

que se constitui em um problema adicional.

O recorte estabelecido trouxe à luz a necessidade de um olhar sobre o os bairros

formados pelo segundo tercil, com renda entre 1 e 2 salários mínimos. O segundo círculo, o

não-lugar e gargalo da efetivação do acesso universal a saúde, demanda do gestor o

desenvolvimento de estratégias que busquem a inclusão dessas parcelas ao Sistema Único de

Saúde, que possibilitem uma entrada qualificada da rede pública de saúde que não seja a porta

de emergência dos hospitais. A efetiva reorganização do sistema público de saúde passa pelo

enfrentamento dessa questão, na medida em que se constitui em importante segmento da

população com capacidade de defender o sistema do ponto de vista do debate das políticas

públicas.

As entrevistas realizadas com a população expressam as diferentes visões dos grupos

nos três espaços, e trazem características que auxiliam a explicar como os diferentes

segmentos populacionais são afetados pelo acesso a saúde. Entrevistas realizadas com as

pessoas que possuem perfil de renda mais alto, com maior escolaridade, indicam uma visão

multifacetada, complexa. Algumas das entrevistas, como a “h”, “o” e “p” revelam uma visão

ampliada de saúde, indicando a importância das determinações sociais para a saúde da

população, numa perspectiva ampliada. Essas entrevistam captam a possibilidade do sistema

público de saúde atender uma parcela da população mais bem estruturada financeiramente, a

partir do momento que ele seja percebido como um sistema de qualidade.

Outras entrevistas, como as “f” e “i”, realizadas também em bairros centrais, com

pessoas com mais 11 anos de escolaridade, que se identificaram como possuidoras de um

plano privado de saúde, sinalizam como é forte o sentimento em parcelas mais ricas da

população, de desprezo pelo sistema público de saúde, e como o debate entre os modelos de

saúde é atravessado pelo discurso e interesses de diferentes grupos. Como afirmar que “o SUS

péssimo”, e que “faltam hospitais com atendimento de qualidade”, se não se percebem como

usuários do sistema público?

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Mapa 8 - A cobertura Espacial do PSF e dos planos privados de saúde em Joinville, 2004

Fonte: Santos, A.A.

As entrevistas “b”,“d” e “e”, realizadas em bairros com renda per capita inferior a 1

salário mínimo, onde há cobertura do PSF, apontam várias críticas, mas é possível identificar

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nas respostas uma postura diferenciada, reflexo da aproximação do PSF com os usuários. Esta

visão mais qualificada do SUS é confirmada por várias pesquisas nacionais realizadas pelo

Ministério da Saúde (UNICAMP, 2001, p. 12) que indicam uma percepção da qualidade

diferenciadas dos usuários do PSF. As entrevistas “b” e “c” fazem elogios ao SUS e ao PSF.

A crítica de “b” é feita ao processo de territorialização, rejeitando os limites traçados pelas

equipes de saúde da família, o que demonstra que parte da população entende como a rede de

serviços deve funcionar, o que também é positivo.

Algumas críticas identificadas nas entrevistas com moradores de área do PSF revelam

como está presente o modelo flexneriano no imaginário popular, que demanda médico,

diagnóstico e remédio para tratamento, pois se ressentem do fato do agente comunitário não

receitar remédios - “o ACS vem em casa, mas não medica a gente e não dá remédio para

tomar” (entrevista “e”).

Outras críticas identificadas em entrevistas realizadas em bairros cobertos pelo PSF

demonstraram a existência de conflito no processo de implantação do SUS, o que também

reforça que a disputa entre os modelos continua presente e atual na sociedade. A entrevista “j”

foi um exemplo disso, quando relatou a contrariedade pela saída do médico especialista

(pediatra) do posto de saúde com a implantação do PSF. A entrevista “m” não criticou o PSF

diretamente, mas apontou um gargalo na proposta: “no posto tudo vai bem, mas quando

precisa de um médico especialista (´otorrino´ por exemplo) aí demoram meses” (entrevista

“m”).

Por fim, as maiores e mais variadas críticas apresentadas nas entrevistas foram

identificadas em bairros onde a população possui entre 1 e 2 salários mínimos, nos não-

lugares da saúde pública. As entrevistas realizadas nesses bairros registram uma crítica

contundente ao SUS como um todo, assim como a crítica pontual a falta de médicos e a fila

dos hospitais. As entrevistas “a”, “g”, “k” apontam todos esses problemas.

As entrevistas, apesar de não objetivarem quantificar as percepções dos diferentes

grupos populacionais, foram fundamentais para qualificar a percepção da população sobre a

questão do acesso a saúde, seus determinantes e limites, assim como a percepção de como

isso se reflete no cotidiano da busca pela saúde no município.

Page 91: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

91

4.4 O PSF e a capacidade de configuração de espaços produtores de saúde

A última questão trabalhada foi relacionada com a capacidade de desenvolvimento

criativo dos diferentes modelos de saúde, em valorizar o espaço local e o conhecimento

prático, como estruturante de estratégias de promoção da saúde, reconhecendo o papel dos

conceitos espaciais para isso.

Em Joinville, as equipes de saúde da família apresentaram vários exemplos de

iniciativas centradas em uma concepção do espaço local como lócus privilegiado de ação de

saúde, visando à integralidade da atenção em saúde. A localização das equipes de saúde da

família em bairros com baixa renda per capita (até 2 salários mínimos), conformou um

conjunto de iniciativas ajustadas a essa realidade.

Vários estudos realizados em Joinville demonstraram a iniciativa de Equipes de Saúde

da Família (ESF) na promoção de ações de valorização do espaço local, do lugar, na estratégia

de promover saúde. Várias equipes de saúde da família entenderam e valorizaram o trabalho

na perspectiva de conhecimento da realidade local para atuação, como premissa para geração

de espaços promotores e produtores de saúde.

A equipe de saúde da família do bairro Paranaguamirim foi um exemplo da utilização

desse princípio, quando uma atividade para tratar de pedículo (piolhos) foi disparadora de

ação de promoção de saúde nitidamente intersetorial, conforme apresentado por Almeida,

E.A.R.S. (2002, p. 22-23). A ação intersetorial com a comunidade, que envolveu a escola do

bairro, e os resultados positivos alcançados, demonstraram a importância da articulação da

saúde com a educação para atingir objetivos vinculado a um conceito de saúde ampliado, que

envolva aspectos de promoção de saúde.

A equipe de saúde da família do bairro Nova Brasília (Joinville, 2002, p. 36), também

trabalhou nesta direção, quando realizou ação de promoção de saúde junto à população idosa

da comunidade. O trabalho envolveu a realização de confraternização e disponibilizou

também serviços de cabeleireiros, manicure, pedicure e lanches, além de várias opões de

entretenimento, que iam de atrações artísticas, tarde dançante com concurso de melhor dupla,

até corrida da batata. O fato foi identificado como positivo em entrevista realizada com

morador do bairro (entrevista e), reforçou a auto-estima dos moradores e atuou como

estratégia adequada e esta parcela da população, mais pobre.

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No bairro Boehmervaldt, uma equipe de saúde da família trabalhou com os agravos de

saúde comuns na infância, conforme Mello et all (2002, p. 24-25). Nesta comunidade, foi

identificada a dificuldade da família em trabalhar os agravos de saúde comuns na infância

como tal. As famílias estavam tratando desses casos como casos de urgência. As mães

haviam perdido a capacidade de lidar com os cuidados básicos da saúde da família, um efeito

concreto da influencia dos modelos de atenção baseados na medicina científica. A ESF optou

por um trabalho de empoderamento com as mães em sua capacidade de lidar com o cuidado

das doenças comuns da infância. As ações resgataram os valores de comunidade, um caso

paradigmático de trabalho com base no princípio de geração de "espaço promotor de saúde".

Outro exemplo que veio do bairro Parque Guarani foi o desenvolvimento de ação

articulada com a comunidade na busca de atuar os determinantes sociais do processo de

saúde-doença da mulher. Esta ação foi apresentada por Nachtigal et all (2002, p. 32-33).

Nachtigal revelou que a ESF do Parque Guarani trabalhou no processo de promoção da saúde

da mulher, buscando reverter quadros de baixa auto-estima e depressão na gestação. A ESF do

Parque Guarani optou por trabalhar questões particulares ao universo feminino, tais como o

autocuidado estético. Reuniões com mães, puerperas e lactantes em diferentes momentos

foram realizadas, entremeadas com cortes de cabelo, escova, maquiagem, tratamento de pele e

unha gratuitamente, ofertada por profissionais ligados a área da beleza e estética, de forma

voluntária. Ainda assim, é um trabalho a ser potencializado, visto que não é acessível ao

conjunto dos moradores (entrevista m).

A realização de ação intersetorial e integrada produz mudanças, e a população tende a

incorporar esta visão no seu discurso. Duas entrevistas estruturadas realizadas pelo autor

identificaram pessoas preocupadas com essa visão, onde questões de saúde estão em sintonia

com as ações educativas e de infra-estrutura básica em saneamento, numa uma visão

sistêmica de saúde, em acordo com os princípios da saúde coletiva (as entrevistas “o” e “p”,

por exemplo, indicam a necessidade de ações educativas como ações de saúde prioritárias em

saúde, e destacam como problema de saúde a falta de saneamento básico).

No bairro Paranaguamirim, Pereira et all (2002, p. 26) apresentou o caso a ESF do

Estevão de Mattos, que utilizou a valorização do lugar como elemento promotor de saúde. A

ESF identificou alto índice de consumo de medicamentos antidepressivos. Os medicamentos

eram prescritos principalmente devido a transtornos mentais vinculados a fatores sócio-

econômicos, como depressão, insegurança, revolta e falta de alto-estima. Em consonância

com essa realidade, a ESF apresentou projeto denominado "Raio de Luz", criando espaço de

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93

encontro comunitário, realização de atividades e trabalhos artesanais e discussões do

cotidiano da comunidade. Após cinco meses, constatou-se que houve a apropriação do espaço

pela comunidade como espaço terapêutico, em mais um exemplo de utilização do conceito de

lugar como espaço promotor de saúde.

Por fim, a importância do PSF como estratégia garantidora do acesso integral em

saúde em Joinville, não apenas da atenção básica em, foi identificada por vários autores.

Niemayer et all (2002, p. 20-21) relataram como uma equipe de saúde da família do bairro

Jardim Paraíso trabalhou com a dificuldade de acesso da unidade de saúde. A partir da

realização de um projeto de educação em saúde, houve uma aproximação com o

fortalecimento do vinculo com a comunidade, o que materializou a organização da

comunidade para reivindicar a construção de um posto de saúde mais próximo da

comunidade, o que foi viabilizado em 2002 pela SMS de Joinville.

Ao apresentar um caso de acidente vascular cerebral (AVC) na comunidade do Morro

do Amaral, localizado no bairro Paranaguamirim, Paiva (2002, p. 28-30), tratou da

importância da estratégia de saúde da família para casos de tratamento em que o paciente

apresentasse dependência de cuidados e locomoção. A família da paciente informou que a

prescrição médica de continuidade de tratamento em clinica de fisioterapia era muito difícil

devido à distância do centro da cidade (15 km). A falta de transporte e as baixas condições

sócio-econômicas mostraram-se outro agravante. Neste caso, a Equipe de Saúde da Família

assumiu o processo de tratamento domiciliar, por contar com profissional habilitado para

tanto na equipe (fisioterapeuta), o que também revelou a importância de equipe

multidisciplinar na ESF, proporcionando sensível melhora nas condições gerais do paciente.

Todos os relatos apresentados confirmam o relevo e a importância do espaço na

estruturação de respostas da gestão de saúde e como modelos de saúde “espaço-centrados”

podem responder mais resolutivamente aos problemas de saúde de uma determinada

comunidade.

O Programa de Saúde da Família (ou como é chamado atualmente pela gestão Federal

do SUS - Estratégia de Saúde da Família - por entender que a proposta não se caracteriza

como um programa com inicio, meio e fim, mas algo maior, reorganizador da rede de serviços

de saúde) ofertou respostas à questão do acesso, centradas na inversão da lógica de atuação,

que colocaram a comunidade como privilegiado no planejamento e atuação da equipe de

saúde.

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94

As ações apresentadas demonstraram a capacidade das equipes de saúde da família

trabalhar com conceitos “espaço-centrados”, e oferecem exemplos de como a gestão de saúde

pode atuar na geração de espaços promotores de saúde, ao trabalhar com equipes de saúde da

família que tenham a valorização da comunidade, do lugar enquanto espaço privilegiado para

a ação de saúde.

Se for verdade que diferentes modelos de saúde configuram de maneira diferente o

espaço, então é correto supor que modelos que trabalhem sob os princípios do SUS têm o

potencial para gerar ou manter estados saudáveis, pensado a partir do espaço local. Tal

necessidade leva a uma discussão sobre as estratégias adequadas a este desafio, de incluir as

parcelas que se encontram descobertas do sistema, de maneira a trabalhar sob a perspectiva da

equidade e da integralidade.

Se não é consenso na literatura científica a capacidade da estratégia de saúde da

família em garantir o acesso a saúde a parcelas com maior renda per capita, que se encontra

alijada do acesso a saúde, por outro lado é um fato que essa inadequação será tanto maior

quanto mais afastada da construção coletiva da resposta estiver a população interessada em

obter acesso a saúde pública.

Universalizar o acesso a saúde pública implica em pensar no espaço vivido pelos

diferentes grupos sociais, e ajustar os desenhos da atenção a saúde a essas diferentes

realidades, de forma a garantir o princípios constitucionais da equidade, integralidade e

universalidade.

Page 95: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

95

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao estudar como os dois modelos de saúde apresentaram respostas para a política de

saúde de Joinville ao longo do processo de implantação do SUS, conformando uma rede de

serviços de saúde com determinadas características espaciais, eis que novos territórios se

revelaram. Espaços encobertos, espaços de omissão do poder publico, zonas encobertas da

ação publica pela frieza de números e estatísticas, para além das já tradicionais marginalizadas

periferias, que igualam os diferentes, e diferenciam os iguais, afastando a saúde publica do

principio da universalidade e da equidade.

Além e ao lado dos espaços encobertos, os limites do objeto recortado no campo de

aproximação da saúde com a geografia, identificou limites no processo de efetivação do

princípio da universalidade do acesso a saúde. O estudo também registrou a capacidade do

sistema municipal de saúde de oferecer suporte ao processo de inovação de estratégias

centradas na valorização do espaço local e do conhecimento prático advindo deste, na busca

pela formação de espaços saudáveis, verdadeiros espaços promotores de saúde, entendidos

como aqueles que possuem capacidade de oferecer qualidade de vida efetiva para seus

habitantes.

As respostas orientadas por modelos oriundos da reforma sanitária, no entanto, ainda

não conseguiram efetivar propostas com capacidade para substituir por completo o modelo da

medicina científica, apresentando grandes limitações oriundas da dificuldade em incorporar

em sua plenitude a dinamicidade do processo de produção e reprodução do espaço. O modelo

da saúde coletiva/comunitária/social acabou por criar a figura da porta única de entrada no

sistema, representada pela unidade básica de saúde, que deveria proceder ao processo de

triagem dos casos, levando a um endurecimento da rede de serviços para o acolhimento das

necessidades dos usuários.

Page 96: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

96

Estudar a geografia e a saúde sob o recorte proposto possibilitou explicitar o embate

existente no país e em todos os seus municípios, dos dois grandes modelos de organização da

saúde, um focado em procedimentos médicos, na especialização e na fragmentação de

procedimentos, e que entende a saúde como uma relação de consumo, e outro focado num

conceito de saúde ampliado, voltado para o entendimento das relações sociais e econômicas

na determinação da saúde, para o trabalho em equipe, que toma a saúde como direito do

cidadão, e que teve como um desdobramento concreto no Brasil, o chamado Programa de

Saúde da Família (PSF).

Possibilitou entender como as diferentes propostas de organizar a gestão de saúde

materializam a aplicação dos conceitos espaciais, assim como o grande vazio gerado pela

falta de efetividade das respostas governamentais que garantam o acesso a saúde de parte da

população de Joinville com renda entre 1 e 2 salários mínimos.

Entretanto, é necessário novos estudos que possam confirmar a hipótese da

generalização do não-lugar em outros municípios de porte e história similar ao de Joinville, já

que a generalização não foi objeto deste estudo.

A implantação das políticas de saúde em Joinville foi marcada por disputas. Disputas

políticas, ancoradas em interesses, representadas nos diferentes modelos de organização da

saúde.

Foi uma disputa também territorial e ela pôde ser espacialmente demonstrada. A

gestão da saúde pública, caso tenha o real interesse em garantir a universalidade do acesso a

saúde, precisará planejar estratégias e ações, assim como um agir espacial, voltado para

diminuir as desigualdades sociais cristalizadas no espaço. O desafio de incluir as parcelas da

população não cobertas pelo PSF e sem condições de arcar com os custos de planos privados

de saúde é hoje um grande desafio para o SUS.

Identificar espacialmente a parcela da sociedade que não está coberta pelo PSF nem

por planos privados de saúde foi importante para ajustar a capacidade do governo em planejar

ações voltadas para esta parcela da população, o que demanda capacidade criativa e inovação

do gestor, e convencimento político, tendo em vista que a disputa entre os dois modelos de

gestão ainda coloca para esta parcela a inviabilidade do PSF como resposta.

Por outro lado, entender que existem diferenças nos modelos de gestão de saúde que

podem promover a saúde ou provocar a doença, foi identificado através da apresentação de

vários exemplos, ao demonstrar com vários exemplos como o PSF atuou nesta direção.

Page 97: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

97

As evidências empíricas trazidas pela análise dos dados indicam a existência de

grandes círculos ou faixas que apresentam diferente capacidade de acesso a saúde. Este

reflexo da espacialização da disputa entre os modelos de atenção a saúde, se apresenta com

fronteiras fluidas e não tão nítidas, devido a complexidade do processo de configuração do

espaço urbano atual.

A capacidade analítica trazida pelo autor com o modelo das faixas, entretanto, não

pretende ser endurecido como resposta final para a configuração dos limites do acesso a

saúde. Pelo contrário, pretende trazer uma contribuição da geografia para o debate, que não

seja reducionista e simplificador. O processo de formação sócio-espacial possui uma

complexidade que demanda análises adicionais para entender o fato em toda sua concretude.

Por fim, a identificação de um modelo de análise espacial com capacidade de

replicação em outras cidades de porte médio, aportou novidade para gestão de municípios

desse porte.

Entre os aspectos que foram visualizados como elementos para futuras pesquisas,

destacam-se:

1. a necessidade dos gestores trabalhem na perspectiva intersetorial de

identificação de lugares, isto é, de identificação de espaços que “apesar” de não

apresentarem condições de saúde desejáveis, aceitáveis tal como apresentados pelos

indicadores de saúde, possuem características culturais, relacionais, subjetivas e

identitárias que possibilitam um pensar e agir coletivo que se configure em espaço

promotor de saúde. Em tais espaços, “lugares”, é preciso radicalizar, acentuando e

estimulando os aspectos subjetivos da identidade local como elemento central de

trabalho. Será um trabalho de ourives, de lapidário, que identificará nas diferenças de

pensar e agir em saúde, algo a ser estimulado e reforçado. Assim como existem os

grupos dominantes e a maioria dominada, se produzem os espaços dominantes e os

territórios dominados. A divisão do trabalho se espacializa e a sua espacialização

condiciona a própria reprodução intrínseca do espaço no tempo;

2. a necessidade de fortalecimento da capacidade das pessoas que habitam

em não-lugares e territórios, nas fronteiras e nas franjas, em buscar individual e

coletivamente a formação de lugares, visando planejar espaços produtores de saúde,

lugares que tenham a capacidade de estabelecer novas perspectivas saudáveis e

qualidade de vida para as pessoas.

Page 98: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

98

3. a contribuição do conceito de lugar para a reorientação das práticas e da

gestão em saúde.O gestor da saúde encontrou na vivencia prática da realidade,

respostas pautadas pela integralidade das ações de saúde. Ao analisar o conteúdo das

respostas, muitas apontaram para o trabalho a partir do conceito de “lugar”. Essa

resposta da saúde, espaço-centrada, em muito se deve a sua capilaridade e proposta

pautada pela incorporação do espaço entendido em seu dinamismo. A saúde, como o

primeiro braço do Estado a chegar aos espaços de exclusão, colocou a saúde como

mirante da realidade cruel da desigualdade social nos diferentes espaços. A tecnologia

de gestão centrada no espaço, espaço-centrada é uma tecnologia centrada também nas

pessoas que vivem no lugar. É uma tecnologia capaz de produzir o novo, de instituir

relações entre as pessoas e os espaços, operando e se aproveitando da riqueza, da

subjetividade e da realidade local.

Page 99: CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DA REDE DE ATENÇÃO A SAÚDE EM CIDADES MEDIAS DO BRASIL E A EFETIVAÇÃO DA UNIVERSALIDADE DO ACESSO A SAÚDE

99

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106

ANEXO 1

TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO LIVRE E ESCLARECIDO

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA MESTRADO EM GEOGRAFIA

TÍTULO DA PESQUISA: A Geografia da Saúde em Joinville - SC PESQUISADOR: Alexandre André dos Santos. Telefone: (61)33152598 e (61) 33832064 – E-mail: [email protected] [email protected] . Endereço: Qi 1 – Bloco E – apto. 308 – Guara 1 - CEP 70-020-050. Brasília/DF.

TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO LIVRE E ESCLARECIDO Eu, Alexandre André dos Santos realizo estudo sobre a Geografia da saúde em Joinville – SC, orientado pela Dra. Marília Peluso, e pretendo analisar a utilização de conceitos da ciência geográfica no planejamento e gestão de políticas públicas de saúde, através do estudo de caso do município de Joinville - Santa Catarina, no período compreendido entre a constituição do Sistema Único de Saúde-SUS e 2003. Nessa busca, espero identificar as diferentes concepções de território e região presentes nos discursos e ações dos gestores municipais de saúde de Joinville, desde o início do processo de implantação do SUS no município, até 2003 e relacionar as diferentes concepções com deficiências, ameaças, fortalezas e oportunidades identificadas pelos gestores na implantação das políticas de saúde do município no período. Sua participação consiste em responder a perguntas de entrevista. Fica claro que a qualquer momento do estudo você estará livre para se recusar a participar ou retirar seu consentimento. Sua participação é livre e voluntária. A assinatura e envio deste Termo preenchido ao pesquisador consiste no aceite em participar da pesquisa. Serão enviadas duas cópias, uma deve ser remetida ao endereço do pesquisador e a outra fica com você. Eu, _____________________________________________ fui informado dos objetivos da pesquisa acima de maneira clara e detalhada. Recebi informação sobre esta situação e esclareci minhas dúvidas. Caso tiver novas perguntas sobre este estudo, posso solicitar esclarecimento à pesquisadora através dos contatos fornecidos.

Alexandre André dos Santos _____________________________________________________________ (nome – Assinatura) ___________________________, ______ de __________________________ de 2005.

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ANEXO 2

ROTEIRO DE ENTREVISTA

2.1 (SEMI-ESTRUTURADA) 2.2 (ESTRUTURADA)

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA MESTRADO EM GEOGRAFIA

TÍTULO DA PESQUISA: A Geografia da Saúde em Joinville - SC PESQUISADOR: Alexandre André dos Santos. Telefone: (61)33152598 e (61) 33832064 – E-mail: [email protected] [email protected] . Endereço: Qi 1 – Bloco E – apto. 308 – Guara 1 - CEP 70-020-050. Brasília/DF.

Joinville, de de .

Roteiro de Entrevista SEMI-ESTRUTURADA (INFORMANTE-CHAVE)

A Geografia da saúde em Joinville – SC

Pesquisador: Alexandre André dos Santos Orientadora: Dra. Marília Peluso Você está sendo convidado(a) a responder a algumas perguntas sobre o processo de implantação do SUS no município de Joinville. Suas respostas visam qualificar a busca de informações necessárias para desenvolver um corpo de conhecimentos que permita refletir sobre o papel que conceitos e temas da ciência geográfica tiveram sobre o processo de implantação do SUS no município. Esta pesquisa se constitui na dissertação a ser apresentada ao Instituto de Ciências Humanas da Universidade de Brasília como pré-requisito para obtenção do título de Mestre em Geografia. Sua participação consiste em responder as perguntas abaixo. 1. Relate situações de conflito no processo de implantação do SUS. 2. Identifique critérios espaciais para planejamento da rede de atenção em saúde. 3. Caracterize os principais atores que disputam o poder na saúde de Joinville, e seus interesses 4. Apresente o histórico de implantação do SUS 5. Apresente como a variável espacial foi trabalhada no planejamento das ações de saúde. 6. Como foi o processo de participação popular na definição das políticas e ações de saúde. Cite exemplos. 7. Avalie a participação dos usuários no processo de gestão das políticas de saúde Agradeço sua colaboração e saliento a importância das suas respostas, as quais não pretendem ocupar mais do que 120 minutos de seu tempo. Para responder as questões éticas do Conselho Nacional de Ética em Pesquisa com Seres Humanos envio em anexo o Termo de Consentimento que, após aceito, deve ser assinado, demonstrando o seu aceite em participar da pesquisa.

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA MESTRADO EM GEOGRAFIA

TÍTULO DA PESQUISA: A Geografia da Saúde em Joinville - SC

Roteiro de Entrevista ESTRUTURADA (POPULAÇÃO)

Pesquisador: Alexandre André dos Santos Orientadora: Dra. Marília Peluso Você está sendo convidado(a) a responder a algumas perguntas sobre a saúde de Joinville. Esta pesquisa se constitui na dissertação a ser apresentada ao Instituto de Ciências Humanas da Universidade de Brasília como pré-requisito para obtenção do título de Mestre em Geografia. Sua participação consiste em responder as perguntas abaixo. Dados pessoais: 1. Nome: 2. Idade: 3. Sexo: 4. Endereço:

5. Bairro: 6. Comunidade: 7. Formação/Escolaridade:

Questões de entrevista: 8. O que é um problema de saúde pública?Cite alguns exemplos ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 9. Como poderiam ser resolvidos os problemas de saúde da população? ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 10. Mapeie a delimitação do PSF no seu bairro. ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 11. Relacione as situações em que procurou o SUS nos últimos 6 meses. ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 12. É correta a divisão das áreas do PSF em seu bairro? Porque? ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 13. Já participou de movimento pela melhoria da saúde? ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 14. Qual sua avaliação sobre a qualidade da saúde pública? ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Mais uma vez agradeço a sua colaboração nesta pesquisa. Atenciosamente, Alexandre Data: ___/___/___ Assinatura: ___________________________________________________