condominio edilicio - natureza juridica

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Câmara dos Deputados Praça dos 3 Poderes Consultoria Legislativa Anexo III - Térreo Brasília - DF CONDOMÍNIOS EDILÍCIOS – AUSÊNCIA DE PERSONALIDADE JURÍDICA – PERSONALIDADE JUDICIÁRIA – REGIME TRIBUTÁRIO E O SIMPLES ESTUDO Novembro/2003 Nadja Machado Botelho Consultora Legislativa da Área II Direito Civil e Processual Civil, Direito Penal e Processual Penal, de Família, do Autor, de Sucessões, Internacional Privado

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Câmara dos DeputadosPraça dos 3 PoderesConsultoria LegislativaAnexo III - TérreoBrasília - DF

CONDOMÍNIOS EDILÍCIOS – AUSÊNCIA DE

PERSONALIDADE JURÍDICA – PERSONALIDADE

JUDICIÁRIA – REGIME TRIBUTÁRIO E O SIMPLES

ESTUDO

Novembro/2003

Nadja Machado BotelhoConsultora Legislativa da Área II

Direito Civil e Processual Civil, Direito Penal e Processual Penal,de Família, do Autor, de Sucessões, Internacional Privado

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© 2003 Câmara dos Deputados.

Todos os direitos reservados. Este trabalho poderá ser reproduzido ou transmitido na íntegra, desde que

citado a autora e a Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados. São vedadas a venda, a reprodução

parcial e a tradução, sem autorização prévia por escrito da Câmara dos Deputados.

I – DA NATUREZA JURÍDICA DO CONDOMÍNIO EDILÍCIO – LEI Nº 4.591/64, O NOVOCÓDIGO CIVIL E O CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – ENTE DOTADO APENAS DEPERSONALIDADE JUDICIÁRIA – ASSOCIAÇÃO E COOPERATIVA - DIFERENÇAS ........ 3

II – DO REGIME TRIBUTÁRIO DOS CONDOMÍNIOS EDILÍCIOS – LEI Nº 9.317/96,INSTITUIDORA DO SIMPLES ................................................................................................................. 8

ÍNDICE

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O ilustre Deputado solicitou a elaboração deestudo relativo aos condomínios no qualfosse abordada a possibilidade de conferir-

lhes personalidade jurídica, equipará-los às cooperativas ou àsassociações (na medida em que seriam associações de moradores),bem como inseri-los na Lei do SIMPLES.

As alterações teriam como objetivo viabilizar acaptação de créditos pelos referidos condomínios (juntos aosBancos do Povo ou Microcrédito) para fins de reformas emelhorias, além de diminuir custos através do recolhimentointegrado das contribuições, dando margem à contratação de ummaior número de pessoas, tendo o parlamentar sugerido, ainda,que o valor da arrecadação do condomínio no mês anterior sirvade base de cálculo para a apuração do valor a ser pago por meiodo SIMPLES.

A fim de responder aos anseios do ilustre deputado,faz-se mister uma breve digressão sobre o tema, qual seja, anatureza jurídica e as características do condomínio de edifíciosou de apartamentos, já que, pelo teor da solicitação, a estamodalidade condominial se refere o estudo.

I – DA NATUREZA JURÍDICA DO CONDOMÍNIO

EDILÍCIO – LEI Nº 4.591/64, O NOVO CÓDIGO CIVIL

E O CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – ENTE DOTADO

APENAS DE PERSONALIDADE JUDICIÁRIA –

ASSOCIAÇÃO E COOPERATIVA - DIFERENÇAS

A crise habitacional provocada por inúmeros fatores- dentre eles os movimentos migratórios de massas da populaçãoda zona rural para a urbana, a aglomeração urbana e a extremaalta dos preços dos terrenos - levou ao desenvolvimento da técnicade construção de forma a permitir o melhor aproveitamento dos

CONDOMÍNIOS EDILÍCIOS – AUSÊNCIA DE

PERSONALIDADE JURÍDICA – PERSONALIDADE

JUDICIÁRIA – REGIME TRIBUTÁRIO E O SIMPLES

Nadja Machado Botelho

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espaços e a mais suportável distribuição de encargos econômicos, processo que culminou com osurgimento dos chamados condomínios de apartamentos.

As cidades passaram a crescer em sentido vertical, e, ironicamente, tais condomíniosreceberam o apelido de propriedade horizontal, em razão de o edifício achar-se dividido por planoshorizontais.

O fenômeno, que deixou de ser devidamente abordado pelo Código Civil de 1916, veioa ser regulado pela Lei nº 4.591, de 16 de Dezembro de 1964 e, mais recentemente, pela Lei nº10.406, de 10 de Janeiro de 2002, que instituiu o Novo Código Civil. Este último diploma codificadoderrogou boa parte da Lei nº 4.591/64, mas a legislação esparsa continua em vigor naquilo em quenão for incompatível com o Código de 2002.

Tanto no Código Civil de 2002 quanto na Lei nº 4.591/64, a essência do condomínio deedifícios permaneceu inalterada, com algumas diferenças relativas a regras pontuais, que poucainfluência terão neste trabalho. Em qualquer caso, trata-se de edificação em que partes são depropriedades exclusivas, e partes são propriedade comum dos condôminos. Assim, a cada unidadeautônoma corresponde uma fração ideal do terreno e das partes comuns.

Várias teorias tentam explicar a natureza jurídica de condomínio em estudo, dentre elas:a) a acéfala, que nega a existência de verdadeira propriedade nessa forma de condomínio; b) a dapropriedade horizontal como servidão, adotada pelo direito francês; c) a da propriedade horizontalcomo direito de superfície, adotada pelo direito alemão. A corrente mais aceita e consentânea com oordenamento jurídico brasileiro, entretanto, descreve o condomínio edilício como um entedespersonalizado, não classificado como pessoa jurídica1.

De pronto, percebe-se que o condomínios não se confundem com as associações,mesmo porque estas são pessoas jurídicas de direito privado constituídas pela reunião de pessoas quese organizam para fins não econômicos, não havendo, entre os associados, direitos e obrigaçõesrecíprocos, consoante se depreende dos artigos 44, I e 53, caput e parágrafo único, da Lei nº 10.406/2002.

Enquanto as associações vêm reguladas no Livro I – Das Pessoas, Título II – DasPessoas Jurídicas, Capítulo II – Das Associações, do Código Civil de 2002, os condomínios encontram-se no Capítulo VII – Do Condomínio Edilício, que integra o Título III – Da Propriedade, que, por suavez, é parte integrante do Livro III – Do Direito das coisas. A posição topográfica dos dois institutosnão é sem propósito e uma interpretação sistemática já aponta para a diversidade jurídica entre ostemas.

O condomínio não é pessoa jurídica; não existe nele um ente dotado de personalidade,composto do conjunto de co-proprietários, com direitos sobre a coisa comum. Também não há umapersonificação do acervo patrimonial, ad instar do que se passa com as fundações.

Na verdade, o condomínio constitui modalidade especial de propriedade, direito real porexcelência, não sendo, portanto, pessoa, nem se aproximando da associação. Acerca da possibilidadede restar caracterizada alguma espécie de associativismo, assim se pronunciou Caio Mário da SilvaPereira 2, um dos maiores civilistas brasileiros e um dos doutrinadores que mais se dedicou ao estudoda matéria, tendo sido o idealizador da Lei nº 4.591/64:

“Mas não é o que ocorre com o edifício de apartamentos ou de escritórios. Aqui os proprietários

não são associados. O domínio do imóvel não pertence a uma pessoa jurídica. A

reunião dos condôminos é destituída de personalidade. Falta completamente a

affectio societatis. E se um vínculo jurídico os congrega, não é, certamente, pessoal, mas real, representados

os direitos dos condôminos pelos atributos dominiais sobre a unidade e uma co-propriedade indivisa, indissociável

daqueles, sobre as coisas comuns.” (grifou-se)

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Tanto que Carlos Maximiliano3 defende a coexistência e superposição de propriedadesdistintas, conjugadas com uma indivisão forçada e perene: direito exclusivo sobre o andar e co-propriedade sobre as coisas comuns, em regime de indivisibilidade perpétua. Semelhantemente,Hércules Aghiarian4 dá notícia do posicionamento doutrinário acerca do tema:

“São ainda unânimes os autores em reconhecer que faltando a affectio societatis, não há como se reconhecer

o surgimento da personalidade jurídica, apenas de um ser novo, pessoa nova admitida pela lei.”

E, diferentemente da associação, na qual inexistem direitos e deveres recíprocos entre osassociados, no condomínio há essa reciprocidade de obrigações, como bem demonstra a doutrina, aoabordar as limitações e interferências ao direito dos proprietários das unidades autônomas5:

“Mas existe naquelas limitações algo mais do que a simples interferência de interesses alheios, pois que

cada um dos proprietários das unidades autônomas tem deveres para com os demais co-proprietários, além da

simples restrição à propriedade em função da vizinhança próxima.”

Vê-se, daí, que não há como equiparar figuras tão distintas como as associações e oscondomínios, sendo, ainda, de se negar personalidade jurídica a este último, como o fazem eminentesjuristas. Com efeito, a corrente da personificação, que pretendeu atribuir personalidade jurídica aocomplexo e dotar a entidade do condomínio do atributo específico da subjetividade, não obteveêxito, mormente em face da sistemática adotada pelo Direito Brasileiro.

Afigura-se inadequada a invocação do conceito de personificação, ainda mais quando talpossibilidade foi suscitada por ocasião da elaboração da Lei nº 4.591/64 e foi rejeitada, não recebendo,igualmente, guarida no Novo Código Civil, recentemente debatido.

A doutrina chegou a alegar que a ausência de personalidade jurídica seria indispensávelpara que o proprietário permanecesse como tal e não se tornasse mero titular de uma parte social,conservando a qualidade imobiliária do seu direito6. Serpa Lopes também se insurgiu contra apersonificação, cuja idéia em nosso direito não se coaduna com o fenômeno comunitário do edifíciode apartamentos, que pressupõe em cada proprietário um interesse próprio, muito embora em comunhãoorgânica 7.

A propriedade horizontal representa, pois, a fusão da idéia de propriedade com a idéia decondomínio, aglutinando propriedade exclusiva com co-propriedade, formando um todo indissolúvel,inseparável e unitário, verdadeira unidade jurídica. O condomínio não constitui uma propriedadedistinta que tenha como titular uma pessoa abstrata, mas uma propriedade exercida em comum pelosproprietários dos apartamentos, insuscetível de alienação destacada da unidade autônoma a queadere, e insuscetível de divisão. Destarte, não se reconhece o condomínio como pessoa jurídica,senão como ser abstrato, impessoal, realidade sui generis, dado que não resulta da unidade doscondôminos um ente autônomo8.

Há mesmo quem entenda despiciendo maior esforço em vislumbrar a sua natureza jurídica,ante o fato inquestionável da previsão legal de uma representação legitimada, a ser prestada pelosíndico nos assuntos que digam respeito ao condomínio.

Por outro lado, não se deve confundir a ausência de personalidade jurídica de que setratou alhures com a personalidade judiciária, que o Código de Processo Civil assegura aocondomínio edilício.

Além do Código Civil de 2002, na esteira da Lei nº 4.591/64, dispor ser dever do síndicorepresentar, ativa e passivamente, o condomínio (artigo 1.348, inciso I), tal norma é reforçada peloartigo 12, IX, segundo o qual o condomínio será representado, em juízo, pelo administrador ou síndico.Confere-se, então, capacidade de ser parte (um dos pressupostos processuais) a tal ente, que,assim como a massa falida e o espólio, pode demandar e ser demandado, sendo comumente denominadoente formal.

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Ou seja, embora estejamos diante de um ente que, segundo a civilista Maria HelenaDiniz9, não possa ser subsumido ao regime legal das pessoas do Código Civil, pode o condomínio agirativa e passivamente, já que os entes despersonalizados constituem um conjunto de direitos eobrigações, de pessoas e/ou bens sem personalidade jurídica, mas com capacidade processual.

No mesmo sentido é a afirmação do saudoso Hely Lopes Meirelles, em sua obra “Direitode Construir”:

“O condomínio não tem personalidade jurídica, mas tem capacidade processual para postular em juízo

ativa e passivamente, em defesa dos interesses dos condôminos coletivamente considerados.”

Pertinente a menção a julgado do Superior Tribunal de Justiça, de relatoria do eminente Ministro

Humberto Gomes de Barros, in litteris:

“(...) A ciência processual, em face dos fenômenos contemporâneos que a cercam,

tem evoluído a fim de considerar como legitimados para estar em juízo, portanto,

com capacidade de ser parte, entes sem personalidade jurídica, quer dizer,

possuidores, apenas, de personalidade judiciária.

No rol de tais entidades estão, além do condomínio de apartamentos, da massa

falida, do espólio, da herança jacente ou vacante e das sociedades sem personalidade própria e legal, todos por

disposição de lei, (omissis)”.

Assim, a ausência de personalidade jurídica do condomínio de apartamentos não impedeque ele, representado pelo síndico, acione o Poder Judiciário e pleiteie a prestação da tutela jurisdicional;nem, de outro norte, o exime de ser apontado como réu numa ação judicial.

Do exposto, nota-se que não há como confundir condomínio e associação, dada anatureza jurídica de um e outro. Lei que equiparasse figuras essencialmente distintas incorreria emartificialismo não condizente com os princípios que regem nosso ordenamento jurídico, que teria,assim, abalada sua harmonia e unidade sistêmica.

Mesmo porque, ainda que se tivesse como jurídica tal equiparação, há que se atentar paraos efeitos práticos de tal medida, que submeteria os condomínios à disciplina traçada pelos artigos 40a 61 do Novo Código Civil, que impõem uma séria de exigências às associações. Já se vislumbra adificuldade jurídica e prática de sujeitar os condomínios edilícios, simultaneamente, ao regramentodas disposições referentes às associações (artigos 53 a 61, CC/2002) e das normas atinentes aopróprio condomínio (artigos 1.331 a 1.358, CC/2002). Nada impede, contudo, que os moradores dedeterminado condomínio venham a constituir uma associação, nos termos da lei.

O mesmo se pode dizer acerca das cooperativas, regidas pela Lei nº 5.764, de 16 deDezembro de 1971, que define a Política Nacional de Cooperativismo, institui o regime jurídico dassociedades cooperativas, e dá outras providências.

De acordo com os artigos 3º e 4º daquela lei, “celebram contrato de sociedade cooperativaas pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de umaatividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de lucro”, tratando-se de sociedade de pessoas,com forma e natureza jurídica próprias, constituída para prestar serviços aos associados.

Ora, os condôminos não celebram contrato de condomínio, não se destinam a prestarserviços a supostos associados e nem visam ao exercício de uma atividade econômica. Além do mais,não preenchem as características previstas nos incisos do artigo 4º da Lei das Cooperativas, emespecial por não terem capital social representado por quotas partes, nem têm seu funcionamentoregulado nos termos do artigo 17 daquele diploma legal.

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Da exposição feita anteriormente, pode-se concluir que o condomínio também nãoconfigura sociedade, nem mesmo cooperativa, estando o direito societário devidamente apartado noLivro II – Do Direito de Empresa, Título II – Da sociedade, Subtítulo II – Da sociedadepersonificada, Capítulo I – Da sociedade simples (vide artigo 982, parágrafo único, in fine).

Entende-se, portanto, que equiparar os condomínios às cooperativas seria tambémsubverter nosso ordenamento, medida que igualmente traria conseqüências indesejáveis, já que associedades cooperativas possuem regramento diverso, inclusive tributário, estando sujeitas a inúmerostributos não suportados pelos condomínios, que não são empresas.

Nada impede, no entanto, a abertura de linhas de créditos voltadas especialmente paraos condomínios de apartamentos, a fim de viabilizar, aos interessados, a captação de recursos juntoa instituições financeiras autorizadas. Aliás, a Caixa Econômica Federal disponibilizou umfinanciamento destinado aos Condomínios – o Programa “Caixa-Condomínio”, criado no ano de2001 e que acabou sendo extinto devido ao pouco interesse despertado no segmento.

Mesmo porque, embora não constituam pessoas jurídicas, os condomínio edilícios sãoinscritos no CNPJ, conforme comprovam as informações fornecidas pela Receita Federal10, in verbis:

“Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica - CNPJ

Informações Gerais

O CNPJ é o cadastro administrado pela Receita Federal que registra as informações cadastrais das

pessoas jurídicas e de algumas entidades não caracterizadas como tais.

Quem está obrigado a se inscrever

1. Todas as pessoas jurídicas, inclusive as equiparadas (firma individual e pessoa física equiparada à

pessoa jurídica);

2. As seguintes entidades não caracterizadas como pessoa jurídica:

a) os condomínios em edifícios, comerciais ou residenciais, que aufiram ou paguem rendimentos

sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte;”

Mas o fato de estarem inscritos no CNPJ não faz dos condomínios pessoas jurídicas contribuintes do

Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ), consoante esclarece a própria Receita Federal:

“MINISTÉRIO DA FAZENDA

SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL

DELEGACIA DA RECEITA FEDERAL DE JULGAMENTO EM BRASÍLIA

4ª TURMA

ACÓRDÃO Nº 6024, DE 22 DE MAIO DE 2003

ASSUNTO: Obrigações Acessórias

EMENTA: CONDOMÍNIO DE EDIFÍCIOS – Os condomínios de edifícios não

se caracterizam como pessoa jurídica, para fins de apuração do Imposto de Renda,

ainda que inscritos no CNPJ.

EXERCÍCIO: 1998

RESULTADO DO JULGAMENTO: Lançamento Improcedente”

E aqui esbarramos em outro ponto que merece ser abordado nesse estudo, qual seja, otratamento tributário dado aos condomínios edilícios e a possibilidade de sua inclusão no SIMPLES,assunto de que nos ocuparemos no tópico a seguir.

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II – DO REGIME TRIBUTÁRIO DOS CONDOMÍNIOS EDILÍCIOS – LEI Nº 9.317/96,

INSTITUIDORA DO SIMPLES

No tocante aos impostos e às taxas que recaem sobre o imóvel, em virtude de sua naturezaespecial, o tributo não incide globalmente sobre o bem, havendo um desmembramento na arrecadaçãofiscal, de forma que o edifício de apartamentos é considerado, frente ao Fisco, não como uma unidade,mas uma pluralidade de devedores. Cada unidade autônoma é devedora de uma quota tributária ecada proprietário é obrigado a contribuir diretamente com o que lhe cabe, mediante lançamentoautônomo.

Tanto que a Lei nº 4.591/64 já previa, em seu artigo 11, que, “para efeitos tributários,cada unidade autônoma será tratada como prédio isolado, contribuindo o respectivo condômino,diretamente, com as importâncias relativas aos impostos e às taxas federais, estaduais e municipais,na forma dos respectivos lançamentos.” Em nosso sistema de registros públicos, inclusive, cadaunidade é individualizada de modo a constituir um registro particular, uma matrícula individual paracada direito de propriedade, relativo a cada uma das unidades autônomas.

Pertinente lembrar-se que o mencionado artigo 11 da Lei nº 4.591/64 teve como escopoevitar a repercussão dos débitos tributários de um consorte nos demais condôminos. Nem poderia serdiverso o tratamento dado às unidades, eis que a sua autonomia tributária está veiculada ao caráterexclusivo da sua titularidade. Por este motivo, consta do rol de não-contribuintes do Imposto deRenda devido por Pessoa Jurídica11:

“Não se caracterizam como pessoas jurídicas, ainda que se encontrem inscritas

no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) por exigência legal ou que tenham seus atos

constitutivos registrados em Cartório ou Juntas Comerciais:

a) os condomínios em edificações que têm por fim exclusivo cuidar dos interesses comuns dos

co-proprietários do Edifício, mesmo que possuam CNPJ;”

Contudo, algumas observações devem ser feitas.Vimos que os condomínios não se caracterizam como pessoa jurídica tanto na forma da

legislação civil, como na fiscal, por força até mesmo do artigo 110 do Código Tributário Nacional,segundo o qual a lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos,conceitos e formas de direito privado.

O entendimento da Receita Federal vem, como não poderia deixar de ser, corroborandoessa afirmação, eis que:

“MINISTÉRIO DA FAZENDA

SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL

SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DA RECEITA FEDERAL/10ª REGIÃO

FISCAL

SOLUÇÃO DE CONSULTA Nº 132, DE 05 DE SETEMBRO DE 2003

ASSUNTO: Imposto sobre a Renda Retido na Fonte - IRRF

EMENTA: CONDOMÍNIOS. RETENÇÃO DO IRRF. Os condomínios, por não

se caracterizarem como pessoa jurídica na forma das legislações civil e fiscal, não

estão obrigados a reter o imposto de renda na fonte quando o cumprimento desta obrigação exigir da fonte

pagadora a condição de pessoa jurídica.

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DISPOSITIVOS LEGAIS: Art. 649 do Decreto nº 3.000, de 1999, RIR/1999; Parecer Normativo

CST nº 37, de 1972; ADN CST nº 29, de 1986.”

Mas na medida em que contrata empregados para os serviços de limpeza e vigilância(como faxineiros e porteiros), o condomínio acaba por se converter em contribuinte de algumascontribuições para a Seguridade Social, já que o artigo 195, I, da Constituição Federal diz competiraos empregadores, empresas e entidades a ela equiparadas recolher a referida contribuição socialincidente sobre a folha de salário, a receita ou o faturamento e o lucro, conforme o caso.

Destarte, o condomínio edilício, na condição de empregador responsável por encargostrabalhistas e previdenciários, fica obrigado a pagar a contribuição patronal (INSS) e a relativa aoPIS/PASEP - Programa de Integração Social e Programa de Formação do Patrimônio do ServidorPúblico, instituídos, originalmente, pelas Leis Complementares nºs 7 e 8, de 1970 e constitucionalizadospela Carta Magna de 1988, no artigo 239, respectivamente.

De acordo com as Leis nºs 8.212/91, 9.701/98 e 9.715/98, a contribuição referente aoPIS será calculada com base na Folha de Salários, sendo a legislação federal interpretada e aplicadada seguinte forma pela Receita Federal12:

“Contribuirão para o PIS/Pasep (Leis nºs 9.701/98 e 9.715/98):

a) as pessoas jurídicas de direito privado e as que lhes são equiparadas pela legislação do Imposto de

Renda, inclusive as empresas públicas e as sociedades de economia mista e suas subsidiárias (PIS/Pasep –

faturamento);

b) as entidades sem fins lucrativos, definidas como empregadoras pela legislação trabalhista, inclusive as

fundações (PIS/Pasep – folha de salários);

Obs.: os condomínios de edifícios que tiverem empregados, embora sem

personalidade jurídica, estão sujeitos ao pagamento do PIS, de acordo com este item ‘b’.

(...)”

Realmente, os condomínios que possuem empregados são empregadores, tendo em vistaos artigos 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e 15, parágrafo único, da Lei nº 8.212/91,motivo pelo qual ficam obrigados a efetuar o recolhimento da contribuição patronal (INSS) e do PIS,este último à alíquota de 1% (um por cento) sobre a folha de salários, consoante determina o artigo13, IX, da MP 2.158-35/2001.

Por outro lado, o SIMPLES – Sistema Integrado de Pagamento de Impostos eContribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte, instituído pela Lei nº 9.317/96em obediência ao comando constitucional do artigo 179 da Constituição Federal, visa a, como opróprio nome indica, conferir tratamento diferenciado, simplificado e favorecido àquelas empresas,pessoas jurídicas que tenham auferido receita bruta anual igual ou inferior a R$ 120.000,00 e R$1.200.000,00, respectivamente (artigos 1º e 2º da Lei nº 9.317/96).

Além de o condomínio não ser pessoa jurídica e, muito menos empresa, a lei não lheseria, s.m.j, de grande valia, pois destina-se àqueles contribuintes de vários tributos, dentre os quaisapenas as contribuições para a Seguridade Social e o PIS são devidos pelos condomínios deapartamentos.

Com efeito, a inscrição no SIMPLES implica pagamento mensal e unificado dos seguintesimpostos e contribuições (artigos 3º, §1º e 4º, da Lei nº 9.317/96) :

• Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ); Contribuição para os Programas deIntegração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/PASEP); ContribuiçãoSocial sobre o Lucro Líquido (CSLL); Contribuição para Financiamento da Seguridade Social(COFINS); Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI); outras Contribuições para a Seguridade

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Social, além do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Serviços deTransporte Interestadual e Intermunicipal (ICMS) e Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza(ISS), sendo que a inclusão destes dois últimos tributos no SIMPLES depende de Convênio doEstado ou Município em questão.

Ou seja, o SIMPLES se destina a simplificar as obrigações tributárias de empresas quecontribuem para todos ou quase todos esses tributos, não sendo o caso do condomínio, de forma quesua inclusão na referida lei não teria muita razão de ser, já que ele somente responde pela contribuiçãopatronal e pelo PIS de seus empregados, não sendo contribuinte do IRPJ, da CSLL, da COFINS, doIPI, etc.

Por fim, é importante ter em vista que o SIMPLES possui raiz constitucional (artigo 179,CF/88), constituindo um sistema excepcional cuja ampliação deve ser feita com extrema cautela,consoante adverte o estudo denominado “A Experiência Brasileira na Tributação das Micro e PequenasEmpresas”13, que pede-se vênia para transcrever, ainda que parcialmente:

“A Experiência Brasileira na Tributação das Micro e Pequenas Empresas

Hipóteses de Exclusão do Regime

Um sinal da boa aceitação do regime especial por parte dos contribuintes é a forte demanda para a

inclusão de alguns tipos de contribuinte no sistema, como, por exemplo, os profissionais liberais e os importadores.

Essa também não é uma questão fácil de ser decidida pois é razoável supor que sempre haverá pressão de

alguns setores da economia por receber um tratamento tributário favorecido e reduzir o seu custo tributário.

No entanto, existe um limite para se ampliar um sistema de exceção, de modo a

que ele não acabe prejudicando sobremaneira os contribuintes que se adequam à

regra geral. É preciso ter claro que o nível de financiamento da sociedade tem que ser mantido e, caso se

conceda isenções ou redução de imposto para alguns, outros terão que arcar com o custo.

Mais do que isso, é importante recordar os motivos que justificam a criação do mecanismo de tratamento

favorecido. Como já salientado, os programas de apoio às pequenas empresas existem para corrigir certas

assimetrias e falhas de mercado. Assim, eles devem ser focados para beneficiarem os agentes econômicos que,

efetivamente, sofrem a assimetria. Caso se comece a ampliar o universo dos beneficiários, o governo estará,

contrariamente à sua intenção inicial, adicionando tratamentos injustificados e injustos no mercado, pois

concederá benefícios a contribuintes que não têm razão de recebê-los.

Portanto, essa é uma questão realmente delicada. Parece fácil, sobretudo do ponto de vista político, assinar

uma resolução ampliando o universo dos contribuintes. Na margem, a perda de arrecadação é pequena e

sempre poderá ser compensada de outras maneiras. Porém, o policy maker tem que ter muito

claro o porquê do sistema, suas razões econômicas, de competição de mercado e

eficiência produtiva. Do contrário, como é comum em qualquer sistema de

incentivos, o risco de se beneficiar setores que não precisam da isenção é grande, e

o que ocorre é a indução à competição desleal, onde alguns privilegiados têm o

benefício e outros não.” (grifou-se)

Outrossim, se a intenção é minorar a carga tributária suportada pelos condomínios edilícios,talvez o ideal fosse alterar as alíquotas legais relativas à contribuição patronal e/ou ao PIS, no tocanteaos condomínios. Contudo, para uma análise mais acurada acerca da melhor forma de se promover amodificação da legislação tributária, talvez fosse aconselhável recorrer-se aos préstimos da Área IIIdesta Consultoria Legislativa, especializada em Tributário.

Esperamos, com esse estudo, ter atendido aos anseios do ilustre Deputado, mediante osesclarecimentos necessários à melhor elucidação da matéria, cabendo a V. Exa. analisar as informaçõesora prestadas e formar sua convicção.

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NOTAS DE REFERÊNCIA

1 COUTO FILHO, Reinaldo de Souza. “As despesas do condomínio especial em apartamentos (Leinº 4.591/64)”, Jus Navigandi, Teresina, a. 4, n. 46, out. 2000. Disponível em: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=587.2 PEREIRA, Caio Mário da Silva. “Condomínio e Incorporações”, 6ª ed., Rio de Janeiro: Forense,1991, p. 81/82.3 MAXIMILIANO, Carlos. “Condomínio”, nº 82, apud Caio Mário da Silva Pereira, ob. cit., p. 85.4 Aghiarian, Hércules. “Curso de Direito Imobiliário”, 4ª ed., Forense: Rio de Janeiro, 2003, p. 216.5 PEREIRA, Caio Mário. Ob. Cit., p. 82.6 Hébraud. “La Copropriété par Appartements”, in Revue Trimestrielle de Droit Civil, 1938, p. 49.7 SERPA LOPES, M. M. “Curso de Direito Civil”, Vol. VI, nº 219.8 AGHIARIAN, Hércules. “Curso de Direito Imobiliário”, Ob. Cit., p. 215.9 DINIZ, Maria Helena. “Curso de Direito Civil Brasileiro”, 13ª ed., São Paulo: Saraiva, 1997, Vol. 1,p. 188-197.10 www.receita.fazenda.gov.br.11 Informação também obtida no site da Receita Federal, já mencionado.12 Informação extraída do Programa de Formação de Auditor-Fiscal da Receita Federal – Ministérioda Fazenda – 2001; TA – Tributos Administrados pela Secretaria da Receita Federal, p. 57.13 Estudo obtido no site da Receita Federal: www.receita.fazenda.gov.br.

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