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FABIO ZVEIBIL COMPETITIVIDADE E CUSTO DE CAPITAL: UMA ANÁLISE DO CASO DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE Trabalho de Formatura apresentado à Escola Politécnica para a obtenção do Diploma de Engenheiro de Produção São Paulo 2004

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FABIO ZVEIBIL

COMPETITIVIDADE E CUSTO DE CAPITAL: UMA ANÁLISE DO CASO DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE

Trabalho de Formatura apresentado à Escola Politécnica para a obtenção do Diploma de Engenheiro de Produção

São Paulo

2004

FABIO ZVEIBIL

COMPETITIVIDADE E CUSTO DE CAPITAL: UMA ANÁLISE DO CASO DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE

Trabalho de Formatura apresentado à Escola Politécnica para a obtenção do Diploma de Engenheiro de Produção

Orientador: Prof. Dr. Renato de Castro Garcia

São Paulo 2004

AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, Silvio e Cecilia, e minha irmã, Natalia, por apoiar e compreender

minhas escolhas e decisões, especialmente nos dois últimos anos, e principalmente

pela minha formação pessoal.

Ao Prof. Renato Garcia, pelas dicas e sugestões, cuja orientação e parceria foram

importantes para transformar idéia em TF.

À Escola Politécnica, em especial aos professores do Departamento de Engenharia

de Produção, pela formação que recebi ao longos dos últimos cinco anos.

Aos meus amigos e amigas, que foram fundamentais para uma boa convivência na

Poli e para meu crescimento pessoal e profissional. Espero que todos continuemos

juntos por muitos anos.

À minha família, especialmente meus avôs e avós, pela carinho e orgulho.

Aos colegas do Citi, pelos quase dois anos de trabalho, aprendizado e longas horas.

RESUMO

Este trabalho apresenta uma análise dos fatores de sucesso da Companhia Vale do

Rio Doce. Através de um acompanhamento diário do suas atividades, desempenho e

fatos relevantes, constatou-se que a CVRD conseguia obter retornos melhores que

seus principais concorrentes internacionais mesmo enfrentando um custo de capital

mais elevado, o que pode ser considerada uma contradição. Com base nisto, o

trabalho busca compreender a companhia e fornecer o embasamento teórico e

posteriormente a confirmação numérica da contradição constatada. Em seguida, são

identificados e discutidos os principais fatores competitivos (e suas interações) que

influenciaram diretamente a evolução e o sucesso da CVRD para se tornar a empresa

conhecida atualmente, e que certamente influenciarão seu promissor futuro.

ABSTRACT

This paper presents an analysis of Companhia Vale do Rio Doce’s success factors.

Through daily coverage of its activities, performance and current events, it was

found that CVRD was able to achieve higher returns when compared to its major

international peers even when subject to a higher cost of capital, what can be

considered a contradiction. Based on this, the paper seeks to understand the company

and to provide the theoretical background and further numerical confirmation of the

contradiction found. Next, it identifies and discusses the major competitive factors

(and their interactions) that directly influenced CVRD evolution and success to

become the presently known company, and that will certainly influence its promising

future.

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ................................................................................................... 1 2. A COMPANHIA VALE DO RIO DOCE ........................................................... 4

2.1. Operações..................................................................................................... 5

2.1.1. Ferrosos ................................................................................................ 5

2.1.2. Não-Ferrosos ........................................................................................ 6

2.1.3. Logística............................................................................................... 7

2.1.4. Energia ................................................................................................. 8

2.1.5. Alumínio .............................................................................................. 8

2.1.6. Siderurgia ............................................................................................. 9

2.2. Estratégia de Negócio ................................................................................ 10

2.3. Fatores de Risco ......................................................................................... 11

2.3.1. Riscos relacionados ao negócio ......................................................... 11

2.3.2. Riscos relacionados ao Brasil ............................................................ 14

2.4. Destaques do Desempenho ........................................................................ 15

2.4.1. Desempenho Financeiro..................................................................... 15

2.4.2. Distribuição da Receita ...................................................................... 16

2.4.3. Desempenho do EBITDA .................................................................. 17

2.4.4. Investimentos ..................................................................................... 18

2.4.5. Composição Acionária ....................................................................... 18

2.4.6. Desempenho da Ação......................................................................... 19

2.4.7. Mercado Transoceânico de Minério de Ferro .................................... 19 3. O CUSTO DE CAPITAL .................................................................................. 20

3.1. Introdução .................................................................................................. 20

3.2. Custo de Capital de Terceiros .................................................................... 21

3.3. Custo de Ações Preferenciais..................................................................... 23

3.4. Custo de Capital Próprio ............................................................................ 24

3.4.1. Modelo de Crescimento de Dividendos ............................................. 24

3.4.2. CAPM – Capital Asset Pricing Model............................................... 26

3.4.3. Custo de Capital Próprio .................................................................... 27

3.5. WACC – Weighted Average Cost of Capital ............................................ 28

3.6. Algumas Particularidades para Empresas Brasileiras ................................ 29

3.7. PRP – Prêmio de Risco Político................................................................. 30

3.8. Conclusão................................................................................................... 32 4. AS GRANDES MINERADORAS DIVERSIFICADAS .................................. 33

4.1. Introdução .................................................................................................. 33

4.2. Peers Comparáveis ..................................................................................... 34

4.2.1. BHP Billiton....................................................................................... 34

4.2.2. Rio Tinto ............................................................................................ 36

4.2.3. Anglo American................................................................................. 37

4.3. Comparativo............................................................................................... 38

4.3.1. Evolução dos preços das ações .......................................................... 39

4.3.2. Indicadores e Índices Financeiros ...................................................... 41

4.3.3. WACC................................................................................................ 49

4.4. Conclusões ................................................................................................. 51 5. ANÁLISE DOS FATORES DE SUCESSO DA COMPANHIA VALE DO RIO

DOCE ................................................................................................................ 53

5.1. Introdução .................................................................................................. 53

5.2. Fatores Históricos ...................................................................................... 54

5.2.1. Período de Criação ............................................................................. 55

5.2.2. Período de 1942 a 1950...................................................................... 56

5.2.3. Período de 1951 a 1967...................................................................... 58

5.2.4. Período de 1968 a 1978...................................................................... 61

5.2.5. Período de 1978 a 1990...................................................................... 64

5.2.6. Período de 1990 a 1997...................................................................... 65

5.2.7. Período de 1997 até hoje .................................................................... 66

5.3. Fatores Competitivos ................................................................................. 69

5.3.1. Fatores Ganhadores de Pedido........................................................... 69

5.3.2. Fatores Qualificadores ....................................................................... 84 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................. 90

LISTA DE REFERÊNCIAS ...................................................................................... 94

LISTA DE FIGURAS Figura 2.1: Mapa das Operações da CVRD................................................................. 4

Figura 2.2: Breakdown da Receita Bruta de 2003 por Produto ................................. 16

Figura 2.3: Breakdown da Receita Bruta de 2003 por Destino.................................. 16

Figura 2.4: Breakdown do EBITDA de 2003 por Área de Negócio .......................... 17

Figura 2.5: Evolução do EBITDA ............................................................................. 17

Figura 2.6: Evolução do capex................................................................................... 18

Figura 2.7: Composição Acionária – Agosto de 2004 ............................................... 18

Figura 2.8: Evolução do preço da ação e volume negociado..................................... 19

Figura 2.9: Mercado Transoceânico de Minério de Ferro.......................................... 19

Figura 3.1: Evolução dos juros pagos pelos títulos do governo americano ............... 21

Figura 3.2: Evolução dos spreads para ratings considerados Nível de Investimento

(Investment Grade) ................................................................................. 22

Figura 3.3: Evolução dos spreads para ratings considerados Nível Especulativo

(High Yield) ou Junk ............................................................................... 22

Figura 3.4: CAPM...................................................................................................... 26

Figura 3.5: Evolução do Risco Brasil ........................................................................ 31

Figura 4.1: BHP Billiton – Breakdown das Vendas de 2003 por Produto................ 35

Figura 4.2: BHP Billiton – Breakdown das Vendas de 2003 por Destino ................. 35

Figura 4.3: Rio Tinto – Breakdown das Vendas de 2003 por Produto ..................... 37

Figura 4.4: Rio Tinto – Breakdown das Vendas de 2003 por Destino...................... 37

Figura 4.5: Anglo American – Breakdown das Vendas de 2003 por Produto ........... 38

Figura 4.6: Anglo American – Breakdown das Vendas de 2003 por Destino ........... 38

Figura 4.7: Evolução nos preços das ações – ADRs.................................................. 40

Figura 4.8: Evolução nos preços das ações – Locais ................................................. 41

Figura 4.9: Retorno x Custo de Capital...................................................................... 51

Figura 5.1: Composição mineral de certas jazidas de minério de ferro ..................... 71

LISTA DE TABELAS

Tabela 2.1: Investimentos em minério de ferro ........................................................... 5

Tabela 2.2: Investimentos em não-ferrosos ................................................................. 7

Tabela 2.3: Investimentos em energia.......................................................................... 8

Tabela 2.4: Investimentos em alumínio ....................................................................... 9

Tabela 2.5: Desempenho Financeiro.......................................................................... 15

Tabela 4.1: Receita Líquida ....................................................................................... 42

Tabela 4.2: EBITDA .................................................................................................. 43

Tabela 4.3: Margem de EBITDA............................................................................... 43

Tabela 4.4: Lucro Líquido ......................................................................................... 44

Tabela 4.5: Margem Líquida...................................................................................... 44

Tabela 4.6: Capex ...................................................................................................... 45

Tabela 4.7: Nível de Capex ........................................................................................ 46

Tabela 4.8: ROE......................................................................................................... 47

Tabela 4.9: ROA ........................................................................................................ 47

Tabela 4.10: ROCE .................................................................................................... 48

Tabela 4.11: WACC................................................................................................... 50

Tabela 5.1: Atividade de Fusões e Aquisições da CVRD entre 2000 e 2004............ 68

Capítulo 1 – Introdução 1

1. INTRODUÇÃO

A Companhia Vale do Rio Doce (“CVRD”) é notadamente uma empresa

diferenciada e de destaque. Ela é um caso de sucesso no Brasil e na indústria de

mineração global, com características únicas acumuladas ao longo de sua história.

O interesse pela CVRD surgiu durante o período de estágio realizado na área

de Banco de Investimentos do Citigroup Global Markets. Como ela está presente

diariamente nos meios de comunicação e o estágio propiciava um grande acesso às

mais diversas fontes de informações, o interesse foi uma consequência direta do

crescente contato e acompanhamento da companhia.

Parte das fontes de informação disponibilizavam a cobertura e opinião de

diversos analistas independentes, que realizam pesquisas sobre companhias abertas

de mercado. Da leitura e análise dos relatórios destes analistas pôde ser identificada

uma contradição intrínseca ao caso específico da CVRD: como pode sua

performance ser melhor que a de seus concorrentes internacionais quando ela

enfrenta as limitações de um custo de capital mais elevado.

Assim, optou-se por utilizar a estrutura disponível no dia-a-dia do trabalho

para analisar um tema que exigiria diversas ferramentas de Engenharia de Produção

para um melhor entendimento.

A motivação desse trabalho de formatura (“TF”) é, portanto, entender as

razões que justificam o melhor desempenho da CVRD quando comparada a seus

principais concorrentes internacionais mesmo num contexto onde ela enfrenta as

limitações, dificuldades e implicações de um custo de capital mais alto.

Na busca inicial por uma resposta às questões que surgem desta motivação,

foram pesquisados basicamente dois ambientes distintos: o meio acadêmico e a visão

do mercado. Na busca por publicações acadêmicas, foi grande a surpresa quando se

descobriu que a CVRD tem sido tema de um número muito pequeno de análises,

especialmente quando são levados em consideração seu porte e sua

representatividade. Este fato também é mencionado por Silva (2001, p. 42), que

realizou uma extensiva pesquisa sobre a companhia para o desenvolvimento de sua

tese de doutorado.

Capítulo 1 – Introdução 2

Já nas pesquisas voltadas para o entendimento da visão do mercado sobre a

companhia, e mais especificamente para o tema em questão, o resultado encontrado

foi limitado, e de certa forma decepcionante. Isto porque, na maioria dos casos onde

o tema é ao menos mencionado, as análises são geralmente simplistas demais ao

tratarem das vantagens competitivas da CVRD, reduzindo-as basicamente às

vantagens em termos de custos mais baixos, de matérias-primas e de mão-de-obra, e

com relação às enormes reservas de alta qualidade.

Assim, dadas a existência de uma forte motivação, a averiguação de que a

questão não havia sido ainda propriamente abordada e a possibilidade de aplicar

alguns conhecimentos obtidos no decorrer do curso de Engenharia de Produção,

decidiu-se por prosseguir com o tema aqui proposto.

Para a estruturação do trabalho foi utilizada uma sequência lógica de assuntos

e temas, que deveriam ser inicialmente compreendidos e em seguida compostos para

o crescente entendimento dos fatores que compõem a questão proposta. Assim, a

organização segue como descrito a seguir.

O Capítulo 2 – “A Companhia Vale do Rio Doce” apresenta uma descrição

bastante completa da companhia, detalhando suas operações, estratégias de negócio e

principais fatores de risco. Também é apresentada uma seção com destaques do

desempenho recente da companhia, que fornece os principais dados necessários para

sua avaliação e comparação.

O Capítulo 3 – “O Custo de Capital” visa fornecer o embasamento teórico

necessário para o entendimento e cálculo do custo de capital de uma empresa,

culminando com a escolha do método mais apropriado. São detalhados também seus

componentes e as respectivas formas de cálculo. Outro objetivo do capítulo é discutir

algumas das particularidades enfrentadas pelas empresas na captação de recursos, e

como isso afeta seus custos financeiros. É destacado o caso da CVRD.

O Capítulo 4 – “As Grandes Mineradoras Diversificadas” busca posicionar a

CVRD com relação a seus principais concorrentes. Neste sentido, é apresentado o

racional para a escolha das companhias comparáveis e uma breve descrição das

escolhidas. Em seguida, é apresentado um detalhado comparativo entre as

companhias (inclusive a CVRD), composto basicamente de indicadores e índices

financeiros. Este comparativo visa confirmar ou desmentir a contradição que

Capítulo 1 – Introdução 3

motivou esse TF, viabilizando ou não sua continuidade e relevância. Por fim, é feita

uma discussão envolvendo as conclusões tiradas deste e dos capítulos anteriores,

posicionando a discussão central.

O Capítulo 5 – “Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio

Doce” visa identificar e analisar os principais fatores de sucesso da CVRD, que

refletem seu desempenho superior mesmo com as dificuldades geradas pelo alto

custo de capital. O capítulo é dividido entre fatores históricos – onde é apresentada a

história da companhia com destaque para os fatores que contribuíram para seu

sucesso, enfatizando a importância do timing para entender os resultados obtidos – e

fatores de competitividade – onde são identificados e discutidos os principais fatores

que influenciaram a companhia ao longo de sua história, sejam eles necessários para

sua sobrevivência ou fundamentais para sua diferenciação.

O Capítulo 6 – “Considerações Finais” resume tudo o que foi identificado,

analisado e discutido ao longo do TF, avaliando se os objetivos foram alcançados e

se a motivação efetivamente gerou discussões que agregassem valor à produção

acadêmica e a um melhor entendimento da Companhia Vale do Rio Doce.

Capítulo 2 – A Companhia Vale do Rio Doce (“CVRD”) 4

2. A COMPANHIA VALE DO RIO DOCE

“A CVRD é a maior produtora e exportadora de minério de ferro e pelotas

do mundo, a maior mineradora diversificada das Américas e uma das maiores

companhias do Brasil, com direitos de exploração sobre uma área de 7,6 milhões de

hectares e um grande portifólio de produtos minerais. A CVRD é também a maior

empresa de logística do país, operando grandes sistemas logísticos totalmente

integrados às suas operações de mineração, e tem participações (através de

coligadas e joint ventures) em energia, alumínio e aço.”

Fonte: Relatório Anual 2003.

Figura 2.1: Mapa das Operações da CVRD

Capítulo 2 – A Companhia Vale do Rio Doce (“CVRD”) 5

2.1. Operações

2.1.1. Ferrosos

As principais atividades da CVRD em mineração envolvem o minério de

ferro. A empresa opera no Brasil dois sistemas integrados de produção e distribuição

do minério, cada um consistindo de minas, ferrovias, portos e terminais. O Sistema

Sul, baseado nos estados de Minas Gerais e Espírito Santo, contém reservas

agregadas prováveis e possíveis de aproximadamente 3,4 bilhões de toneladas de

minério com um grau médio de 53,6% de ferro, e capacidade de produção de 90

milhões de toneladas ao ano. O Sistema Norte, baseado nos estados do Pará e

Maranhão, contém 1,5 bilhão de toneladas de minério, com um grau médio de 66,6%

de ferro, e capacidade de produção de 70 milhões de toneladas ao ano. Também

produzem minério de ferro o sistema Caemi/MBR (também localizado em Minas

Gerais), com reservas prováveis e possíveis de aproximadamente 600 milhões de

toneladas e capacidade produtiva de 36 milhões de toneladas ao ano, e a mina de

Urucum, no Mato Grosso do Sul. Os principais investimentos previstos beiram

US$1,0 bilhão, conforme a tabela 2.1 abaixo:

Capacidade (mtpa)

Início Capex US$/t

Expansão Sistema Norte +15 2006 12,30+15 2009 12,30

Expansão Sistema Sul 3 2006 18,70Fabrica Nova - fase 1 10 2005 5,67Fabrica Nova - fase 2 +5 2007 5,67Brucutu - fase 1 12 2006 12,22Brucutu - fase 2 +12 2008 12,22Gongo Soco +3,5 2004 7,14Fazendão 14 2006 6,35Aumento Total 89,5 10,25 (a)

Fonte: Apresentações da empresa e relatórios de analistas independentes.

(a) Custo médio de investimento por tonelada.

mtpa = milhões de toneladas por ano. Tabela 2.1: Investimentos em minério de ferro

Capítulo 2 – A Companhia Vale do Rio Doce (“CVRD”) 6

A CVRD também opera 10 plantas de pelotização1, 6 das quais através de

joint ventures com parceiros internacionais. A capacidade nominal total destas

plantas ultrapassa 53 milhões de toneladas ao ano. A companhia ainda está estudando

dois novos projetos que adicionarão 7 milhões de toneladas à capacidade anual. Os

investimentos previstos são de US$250 milhões (média de US$35,71 por tonelada).

2.1.2. Não-Ferrosos

Como parte das atividades de prospecção e desenvolvimento, a CVRD

adquiriu extensa experiência em técnicas e processos de exploração mineral. Aliada

às diversas políticas de diversificação ao longo de sua história, essa experiência

resultou em operações de exploração de minerais não-ferrosos, com destaque para:

• Manganês: 4 minas, com reservas estimadas em mais de 60 milhões de

toneladas e capacidade anual de produção de 2,7 milhões de toneladas.

Ferroligas (compostas de ferro e manganês) são produzidas em 8 plantas, com

capacidade anual de produção de 675 mil toneladas;

• Cobre: operação na mina localizada em Sossego foi iniciada em junho de

2004, com produção anual estimada em 140 mil toneladas. As reservas totais,

incluíndo todos os projetos, são estimadas em 1,1 bilhão de toneladas, e a

capacidade produtiva deve atingir 600 mil toneladas por ano até 2010;

• Ouro: encontrado juntamente com o cobre, sua produção anual deverá

alcançar 15,9 toneladas (500,000 onças) até 2010;

• Potássio: reservas estimadas em 13 milhões de toneladas e capacidade anual

sendo expandida de 600 mil para 850 mil toneladas;

• Caulim: capacidade de 1,3 milhão de toneladas por ano, através de sua

subsidiária Caemi, que controla a Cadam e a Pará Pigmentos;

• Níquel e platina.

1 Pelotização é um processo de beneficiamento de minérios com graduação fina e ultra-fina, transformando-o em pelotas de tamanhos variados que se adaptem às necessidades do cliente e têm melhor desempenho nos alto-fornos. É um produto de maior valor agregado que o minério de ferro in natura.

Capítulo 2 – A Companhia Vale do Rio Doce (“CVRD”) 7

A tabela 2.2 abaixo destaca os principais investimentos previstos para esta

divisão operacional:

Projeto Metal Reservas (milhões de t)

Capacidade (000 tpa)

Inícioprevisto

Capex(US$ mi)

118 Cobre 64 36 2007 211Salobo Cobre 784 100 2008 722Cristalino Cobre 250 90 2008 335Alemão Cobre 200 150 2008 479Salobo Ouro | 4 2008 (a)Cristalino Ouro 15,9 1,3 2008 (a)Alemão Ouro | 9 2008 (a)Vermelho Níquel 218 46 2008 840Vermelho Cobalto - 2,1 2008 (a)Taquari-Vassouras Potássio 13 +250 2005 67Fonte: Apresentações da empresa e relatórios de analistas independentes.(a) Sub-produtos de exploração, capex incluso no projeto maior.000 tpa = milhares de toneladas por ano.

Tabela 2.2: Investimentos em não-ferrosos

2.1.3. Logística

A CVRD é a maior operadora logística do país, com aproximadamente 16%

do movimento total de cargas, 55% do volume transportado por ferrovias, 65% da

movimentação portuária de granéis sólidos e 39% da movimentação do comércio

exterior. Ela presta a seus clientes várias formas de serviços de transporte e

atividades relacionadas, como armazenagem e serviços portuários e de terminais.

Cada um dos complexos de minério de ferro incorpora uma rede ferroviária

integrada a instalações automatizadas nos terminais e portos, preparadas para prover

transporte de minério de ferro, de fretes em geral e de passageiros, armazenagem em

terminais e carregamento de navios, para a própria empresa e para terceiros.

A rede é composta por 9.306km de ferrovias e 8 terminais portuários, com

destaque para:

• Ferrovias: Estrada de Ferro Carajás (EFC, 982km e capacidade anual de 58

milhões de toneladas), Estrada de Ferro Vitória-Minas (EFVM, 905km e

capacidade anual de 120 milhões de toneladas) e Ferrovia Centro-Atlântica

(FCA, 7.080km);

Capítulo 2 – A Companhia Vale do Rio Doce (“CVRD”) 8

• Portos: Terminal Marítimo de Ponta da Madeira, servindo ao Sistema Norte,

com capacidade de movimentação de 85 milhões de toneladas por ano e

Complexo Portuário de Tubarão, servindo ao Sistema Sul, com capacidade

anual de movimentação de 80 milhões de toneladas;

• Serviço de navegação costeira: Docenave.

2.1.4. Energia

Desde 2001, a CVRD considera a geração de energia como uma importante

atividade de suporte. A companhia tem participação em 9 usinas hidrelétricas

(sempre através de parcerias), com capacidade total projetada de 3.364MW, como

descrito na tabela 2.3:

Localização Participação CVRD (%)

Início Capacidade Projetada (MW)

Capex CVRD (US$ mi)

Em OperaçãoIgarapava S. Paulo / M. Gerais 38,15 jan/99 210 52,0 Porto Estrela Minas Gerais 33,33 set/01 112 19,0 Funil Minas Gerais 51,00 dez/02 180 57,0 Candonga Minas Gerais 50,00 set/04 140 45,3

Em ConstruçãoAimorés Minas Gerais 51,00 jul/05 330 127,1 Capim Branco I Minas Gerais 48,42 fev/06 240 82,4 Capim Branco II Minas Gerais 48,42 dez/06 210 79,8

Em PlanejamentoFoz do Chapecó S. Catarina / R.G. Sul 40,00 jul/08 855 202,4 Estreito Tocantins / Maranhao 30,00 out/08 1.087 197,9

Total 39,64 3.364 862,9

Fonte: Relatório 20F e website da companhia. Tabela 2.3: Investimentos em energia

2.1.5. Alumínio

A CVRD está presente em todas as fases da cadeia de produção do alumínio,

desde a extração da bauxita, passando pelo refino da alumina, até a produção de

alumínio primário.

Capítulo 2 – A Companhia Vale do Rio Doce (“CVRD”) 9

A mineração da bauxita é realizada através da participação na MRN. Ela tem

reservas de 112 milhões de toneladas e capacidade anual de produção de 16,3

milhões de toneladas.

O refino da alumina é conduzido através da participação na Alunorte, que tem

capacidade anual de produção de 2,4 milhões de toneladas. A produção de alumínio

primário é feita através das participações nas subsidiárias Albrás e Valesul, que

juntas tem capacidade anual de produção de 516 mil toneladas.

A tabela 2.4 destaca os principais investimentos previstos neste segmento:

Capacidade (mtpa) Início Capex

(US$ mi)Capex (US$/t)

BauxitaParagominas - fase 1 4,5 2006 271 60,22Paragominas - fase 2 +4,5 2009 270 60,00Paragominas - fase 3 +4,5 ND 187 41,56

AluminaAlunorte - estágios 4 e 5 +1,8 2006 583 324Alunorte - estágios 6 e 7 +1,8 2009 635 353Refinaria ABC 1,8 2007 1.000 556

Investimento Total 2.946Fonte: Apresentações da empresa e relatórios de analistas independentes.

mtpa = milhões de toneladas por ano.

Tabela 2.4: Investimentos em alumínio

2.1.6. Siderurgia

A CVRD tem investimentos em 3 siderúrgicas:

• CSI (Califórnia): chapas laminadas a frio e a quente, tubos e aço galvanizado;

• Siderar (Argentina): lingotes, chapas laminadas a quente e a frio, aço

galvanizado e folhas de flandres;

• Usiminas (Brasil): chapas laminadas a frio e a quente, chapas grossas e aço

eletro-galvanizado.

Segundo a política interna de focar nas operações de mineração, a CVRD

colocou à venda todos os investimentos neste negócio (vendeu recentemente sua

participação na Companhia Siderúrgica de Tubarão – CST), ao mesmo tempo que

Capítulo 2 – A Companhia Vale do Rio Doce (“CVRD”) 10

procura se associar a grandes siderúrgicas mundiais para implantar novas usinas no

Brasil. O objetivo é incentivar a criação de demanda adicional para seus produtos

(ferrosos), não obter resultado financeiro direto com estas operações.

2.2. Estratégia de Negócio

O objetivo da CVRD é fortalecer sua posição entre as principais mineradoras

do mundo focando no crescimento diversificado em mineração (principalmente com

base em reservas próprias e novas iniciativas de exploração) e no desenvolvimento

de novos negócios em logística e energia. A companhia procura um crescimento

disciplinado dos lucros e da geração de caixa, buscando maximizar o retorno sobre o

capital investido e o retorno total de seus acionistas. A CVRD dará ênfase para o

crescimento orgânico em seus principais negócios, porém continuará fazendo

aquisições seletivas para complementar sua estratégia e diversificar seu portifólio.

Ao longo dos últimos anos, a CVRD desenvolveu uma estrutura de

governança corporativa mais eficiente e um robusto processo de planejamento

estratégico de longo prazo. Agora está se aproveitando destas mudanças para

construir ambiciosos planos de longo alcance em cada uma de suas principais áres de

atuação. No período de 2004 a 2007, a empresa pretende investir US$6 bilhões em

crescimento orgânico.

As principais estratégias definidas pela empresa são:

• Manter a posição de liderança no mercado transoceânico de minério de

ferro: em 2003, a CVRD alcançou uma participação de 32,9% num mercado

de 537 milhões de toneladas;

• Expandir a capacidade de pelotização para atender às atuais demandas do

mercado: a CVRD tem capacidade para produzir anualmente 53 milhões de

toneladas de pelotas;

• Crescer no segmento de logística: aproveitar a experiência e a infra-estrutura

existentes para se estabelecer no mercado, focando na integração física e

comercial dos ativos, no aumento do transporte de cargas de terceiros e no

desenvolvimento do transporte intermodal;

Capítulo 2 – A Companhia Vale do Rio Doce (“CVRD”) 11

• Desenvolver o segmento de cobre: os projetos de cobre da companhia estão

entre os mais competitivos do mundo em custo e, quando entrarem em

operação, encontrarão um mercado sub-abastecido;

• Aumentar atividades no segmento de alumínio: já há diversos investimentos

programados para bauxita e alumina, e a companhia também considera buscar

aquisições em alumínio primário, dependendo no nível dos preços da energia

elétrica;

• Desenvolver projetos de geração de energia: desde a época do “apagão”

(2001), o gerenciamento e fornecimento de energia tornaram-se prioridade

para a CVRD, que pretende proteger-se da volatilidade do preço e da oferta;

2.3. Fatores de Risco

Em alguns de seus relatórios (20F, prospectos, etc.), a CVRD descreve os

principais riscos que devem ser considerados pelos investidores. É importante incluí-

los para fornecer uma descrição completa da companhia:

2.3.1. Riscos relacionados ao negócio

Parte dos riscos enfrentados pela companhia são relacionados exclusivamente

aos seus negócios. Os principais são identificados a seguir:

• Flutuações na demanda por aço,: a indústria siderúrgica mundial é cíclica, e

depende fortemente do crescimento econômico;

• Intensa competitividade da indústria de mineração: alguns concorrentes

têm grandes depósitos em regiões mais próximas aos principais clientes

asiáticos e europeus;

• Demanda por minério de ferro em períodos de pico pode ultrapassar a

capacidade produtiva: a habilidade para rapidamente aumentar a produção é

limitada, e pode não haver minério disponível no mercado para compra e

posterior revenda;

Capítulo 2 – A Companhia Vale do Rio Doce (“CVRD”) 12

• Ciclicalidade dos preços do minério de ferro e volatilidade nos preços de

alumínio, cobre e ouro (comercializados ativamente em bolsas de

mercadorias): por se tratarem de commodities, os produtos da empresa estão

sujeitos a flutuações nos preços;

• Produtos brasileiros de exportação podem perder a competitividade

internacional, reduzindo a demanda interna por serviços de logística;

• Suscetibilidade a condições adversas em outros países, especialmente a

China: a CVRD exporta boa parte de sua produção, e portanto pode sofrer

consequências do enfraquecimento das economias dos países que compram

seus produtos;

• As reservas estimadas podem ser materialmente diferentes das quantidades

de mineral que pode realmente ser extraído, as estimativas de vida útil das

minas podem ser imprecisas e flutuações nos preços de mercado e mudanças

nos custos operacionais e de capital pode tornar a exploração de certas

reservas economicamente inviáveis: há diversos riscos inerentes à avaliação

de reservas e capacidade de produção das minas, dependendo muito de

estudos de engenharia complexos;

• Não há garantia de reposição das reservas: programas de prospecção,

atividade de capital muito intensivo, pode não trazer novas reservas,

diminuindo a capacidade de manter os atuais níveis de produção no longo

prazo (após o esgotamento das atuais reservas);

• Após a descoberta de reservas, ainda existem os riscos de perfuração e

produção: é necessário um grande período para:

- Estabelecer as reservas através de perfurações;

- Determinar os processos metalúrgicos apropriados para otimizar a

taxa de recuperação do metal contido no minério;

- Obter o minério e extrair o metal;

- Construir instalações de mineração e processamento em projetos

greenfield (novos).

Se o projeto provar-se economicamente inviável no início da fase de exploração,

podem ser necessárias baixas de ativos (write-offs). Potenciais mudanças ou

Capítulo 2 – A Companhia Vale do Rio Doce (“CVRD”) 13

complicações durante a vida útil do projeto podem gerar custos extras, inviabilizando

sua continuidade.

• Custos de extração aumentam com a diminuição dos depósitos: a empresa

tem diversas minas operando há muitos anos, e os custo de extração nas

mesmas podem crescer no futuro;

• Custos de combustíveis e energia elétrica: muitas operações –

principalmente logística, pelotização e alumínio – dependem

consideravelmente de fontes de energia (11,2% do custo com mercadorias

vendidas em 2003);

• A CVRD está sob investigações anti-truste no momento: em julho de 2004

havia 14 processos sob análise do CADE, a maioria com relação a aquisições

e joint ventures passadas, e as demais relativas a reclamações de condutas

anti-competitivas;

• O principal acionista pode ter influência significativa sobre a empresa: a

Valepar controla a empresa, com 52,3% do capital votante e 33,6% do capital

total da CVRD. O BNDES e o governo brasileiro (através de sua golden

share) também exercem grande poder sobre a empresa;

• Algumas operações dependem de joint ventures, que podem ser afetadas se

os parceiros não observarem seus compromissos: a CVRD espera que seus

parceiros em joint ventures nos negócios de pelotização, logística, energia,

alumínio e siderurgia cumpram suas obrigações de aporte de capital, compra

de produtos e fornecimento de executivos;

• A estratégia de gestão de riscos pode não ser efetiva: a empresa utiliza

algumas operações de hedge para se proteger de flutuações em taxas de juros,

câmbio e preços de commodities;

• A CVRD está sujeita a certos riscos e perigos genéricos: acidentes

industriais e ferroviários, reclamações trabalhistas, desabamentos, danos

ambientais, falta de eletricidade, falhas em equipamentos ou embarcações,

fenômenos naturais ou meteorológicos. Alguns destes riscos são cobertos por

apólices de seguros, mas mesmo estas podem não cobrir todos os prejuízos.

• Dificuldades em implementar o software de sistema de gestão integrada

podem interferir no funcionamento normal dos negócios;

Capítulo 2 – A Companhia Vale do Rio Doce (“CVRD”) 14

2.3.2. Riscos relacionados ao Brasil

Além desses riscos, a companhia também é suscetível a alguns riscos

relacionados ao Brasil, onde estão baseadas suas operações. Os principais são:

• Influência do Governo brasileiro sobre a economia nacional: as condições

políticas e econômicas brasileiras têm um impacto direto no negócio e no

valor de mercado dos títulos da companhia, e o Governo frequentemente

intervém na economia e faz mudanças substanciais na política;

• Flutuação do real frente ao dólar: pode resultar em incertezas na economia

e no mercado de capitais brasileiro. Também influencia diretamente o

resultado da companhia, já que a maioria das receitas (quase 90%) é recebida

em dólares enquanto boa parte dos custos (em torno de 70%) é incorrido em

reais;

• Captação de recursos e custo de empréstimos são diretamente

influenciados pela percepção de riscos dos investidores quanto à economia

brasileira e as economia emergentes em geral;

• Operações de mineração, logística e energia dependem de autorizações de

agências regulatórias: mudanças em leis e marcos regulatórios podem exigir

investimentos para adaptação, gerando custos não previstos. Este item é

particularmente sensível no ambiente regulatório brasileiro;

• Mudanças na legislação ambiental brasileira podem afetar os negócios de

mineração e energia: as operações envolvem uso de recursos naturais e de

materiais perigosos, ambos enquadrados em leis ambientais. O enrijecimento

das leis (especialmente uma envolvendo a possível cobrança pelo uso da

água, atualmente inexistente) pode trazer custos extras à empresa;

• As políticas do governo brasileiro com relação à falta de energia: da mesma

forma que ocorreu em 2001, existe o risco de, no futuro, haver mais

“apagões”, devido ao crescimento econômico aliado a uma expansão

inadequada da capacidade de geração. As operações diretamente afetadas

seriam as de alumínio e ferro-ligas

Capítulo 2 – A Companhia Vale do Rio Doce (“CVRD”) 15

2.4. Destaques do Desempenho

Nesta seção serão apresentadas as principais informações operacionais e

financeiras da CVRD. Serão utilizadas informações segundo a US GAAP (Práticas

Contábeis Geralmente Aceitas nos Estados Unidos), principalmente porque estas

informações serão usadas posteriormente para comparações com outras empresas

globais, além de algumas particularidades em relação à disponibilidade de

informações consolidadas.

2.4.1. Desempenho Financeiro

A tabela 2.5 abaixo apresenta um resumo com os principais indicadores

financeiros geralmente utilizados para apresentar uma companhia:

US GAAP (em milhões de dólares) 2001 2002 2003 2004E 2005E 2006E 2007EDemonstrat ivo de Resultados

Receita Líquida 3,935 4,123 5,350 7,971 10,028 10,840 11,432Lucro Bruto 1,663 1,860 2,222 4,016 5,454 5,912 5,999EBITDA 1,174 1,643 1,882 3,566 4,829 5,284 5,358EBIT 962 1,429 1,644 3,198 4,420 4,805 4,865Despesas Financeiras Líquidas 200 248 249 479 357 359 349Lucro Líquido 1,287 680 1,548 2,503 3,043 3,272 3,331

Balanço PatrimonialCaixa 1,117 1,091 585 2,503 2,545 2,991 3,989Dívida Total 3,244 3,331 4,028 4,807 4,832 5,432 5,432 Curto Prazo 1,053 965 1,257 1,107 1,013 1,139 1,695 Longo Prazo 2,191 2,366 2,771 3,700 3,819 4,293 3,737Dívida Líquida 2,127 2,240 3,443 2,304 2,287 2,441 1,443Patrimônio Líquido 4,640 3,287 4,884 6,595 8,512 10,458 12,396

Capitalização de Mercado em 11/ 16/ 2004 25,442.6Valor da Empresa (Firm Value ) 27,524.6

ÍndicesMargem Bruta (%) 42.3 45.1 41.5 50.4 54.4 54.5 52.5Margem de EBITDA (%) 29.8 39.8 35.2 44.7 48.2 48.7 46.9Margem de EBIT (%) 24.4 34.7 30.7 40.1 44.1 44.3 42.6Margem Líquida (%) 32.7 16.5 28.9 31.4 30.3 30.2 29.1Dívida Líquida / EBITDA 1.8x 1.4x 1.8x 0.6x 0.5x 0.5x 0.3xDívida Total / EBITDA 2.8 2.0 2.1 1.3 1.0 1.0 1.0EBITDA / Desp. Fin. Líquidas 5.9 6.6 7.6 7.4 13.5 14.7 15.4

Valor da Empresa / Receita Líquida NM NM NM 3.5x 2.7x 2.5x 2.4xValor da Empresa / Ebitda NM NM NM 7.7 5.7 5.2 5.1

Fonte: Demonstrativos financeiros enviados à SEC, Relatórios de Wall Street, Bloomberg.Nota: Valores de 2004 a 2007 são estimativas independentes de analistas financeiros de Wall Street.NM: Não medido.

Tabela 2.5: Desempenho Financeiro

Capítulo 2 – A Companhia Vale do Rio Doce (“CVRD”) 16

2.4.2. Distribuição da Receita

As figuras 2.2 e 2.3 fornecem uma noção da distribuição geográfica e do mix

dos produtos vendidos pela companhia no ano de 2003:

Alumínio, alumina e bauxita

15,4%

Minério de Ferro48,0%

Pelotas15,1%

Serviços de logística10,9%

Manganês e ferro-ligas6,3%

Caulim1,7%

Potássio1,7% Ouro

0,4% Outros0,5%

Fonte: Relatórios Financeiros.

Figura 2.2: Breakdown da Receita Bruta de 2003 por Produto

Ásia (ex Japão)15,0%

Europa32,2%

Brasil30,7%

Japão7,6%

EUA3,4%

Resto do Mundo11,1%

Fonte: Relatórios Financeiros.

Figura 2.3: Breakdown da Receita Bruta de 2003 por Destino

Capítulo 2 – A Companhia Vale do Rio Doce (“CVRD”) 17

2.4.3. Desempenho do EBITDA

O EBITDA, como será melhor explicado no próximo capítulo, é uma das

melhores medidas para o desempenho de uma companhia. As figuras 2.4 e 2.5

mostram, respectivamente, a distribuição em 2003 e a evolução nos últimos anos:

Logística8,5%

Minerais Não-ferrosos

1,5% Outros3,4%Alumínio

9,3%

Minerais Ferrosos77,3%

Fonte: Relatórios Financeiros.

Figura 2.4: Breakdown do EBITDA de 2003 por Área de Negócio

1.5151.587

1.6861.780 1.825

1.8902.000

2.130

2.431 2.912

1T02 2T02 3T02 4T02 1T03 2T03 3T03 4T03 1T04 2T04

EBITDA ajustado, referente aos últimos 12 meses terminados no

trimestre em questão, em US$ milhões:

Fonte: Apresentações da CVRD.

Figura 2.5: Evolução do EBITDA

Capítulo 2 – A Companhia Vale do Rio Doce (“CVRD”) 18

2.4.4. Investimentos

A CVRD é uma das empresas que mais investem no Brasil. A figura 2.6

mostra a evolução dos investimentos de capital nos últimos anos:

507412

265

1.602 1.537

898

1.988

1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003

Investimentos de capital (capex), em US$ milhões:

Fonte: Apresentações da CVRD.

Figura 2.6: Evolução do capex

2.4.5. Composição Acionária

A figura 2.7 abaixo mostra a estrutura acionária recente da CVRD:

ValeparInvestidores Institucionais Estrangeiros

ADR Investidores Locais (1)

34,2% Total26,8% ON47,4% PN “A”

34,1% Total53,3% ON0,0% PN “A”

16,7% Total10,3% ON28,5% PN “A”

8,7% Total2,6% ON

19,5% PN “A”

BNDESParGoverno Brasileiro (Tesouro)

1,3% Total0,0% ON3,7% PN “A”

5,0% Total7,2% ON1,0% PN “A”

(1) Inclui investidores institucionais e de varejo, e participação do FGTS(2) Inclui a participação direta da Bradespar e suas participações indiretas através de Eletron e Bradesplan(3) Refere-se à participação indireta do Opportunity através da Eletron

Litel/LitelaPart.

58,1% Total 49,0% ON

Bradespar (2) Mitsui Opportunity (3)

0,02% Total 0,03% ON

17,4% Total 21,2% ON

15,0% Total 18,2% ON

BNDESPar

9,5% Total 11,6% ON

ValeparInvestidores Institucionais Estrangeiros

ADR Investidores Locais (1)

34,2% Total26,8% ON47,4% PN “A”

34,1% Total53,3% ON0,0% PN “A”

16,7% Total10,3% ON28,5% PN “A”

8,7% Total2,6% ON

19,5% PN “A”

BNDESParGoverno Brasileiro (Tesouro)

1,3% Total0,0% ON3,7% PN “A”

5,0% Total7,2% ON1,0% PN “A”

(1) Inclui investidores institucionais e de varejo, e participação do FGTS(2) Inclui a participação direta da Bradespar e suas participações indiretas através de Eletron e Bradesplan(3) Refere-se à participação indireta do Opportunity através da Eletron

Litel/LitelaPart.

58,1% Total 49,0% ON

Bradespar (2) Mitsui Opportunity (3)

0,02% Total 0,03% ON

17,4% Total 21,2% ON

15,0% Total 18,2% ON

BNDESPar

9,5% Total 11,6% ON

Fonte: Relatórios Financeiros.

Figura 2.7: Composição Acionária – Agosto de 2004

Capítulo 2 – A Companhia Vale do Rio Doce (“CVRD”) 19

2.4.6. Desempenho da Ação

A figura 2.8 mostra o desempenho da ação preferencial da CVRD (VALE5)

desde o início do ano 2000.

0

1.000

2.000

3.000

4.000

5.000

6.000

7.000

jan-00 ago-00 mar-01 out-01 jun-02 jan-03 ago-03 mar-04 out-04

Vol

ume

(milh

ões)

10

20

30

40

50

60

Cot

ação

(R$)

Volume Cotação Fonte: Bloomberg.

Figura 2.8: Evolução do preço da ação e volume negociado

2.4.7. Mercado Transoceânico de Minério de Ferro

O mercado transoceânico de minério de ferro fornece o market share nas

exportações mundiais. A CVRD lidera este ranking há quase 30 anos, com grande

dominância sobre outros grandes competidores, como mostra a figura 2.9:

CVRD33,0%

Índia (público e privado)10,2%

Kumba3,7%

Outros16,8%

BHP Billiton16,4%

Rio Tinto19,9%

Fonte: Apresentações da CVRD.

Figura 2.9: Mercado Transoceânico de Minério de Ferro

Capítulo 3 – O Custo de Capital 20

3. O CUSTO DE CAPITAL

“Custo de capital pode ser definido tanto como a taxa de retorno mínima que

uma empresa precisa obter sobre seus investimentos para manter seu valor

inalterado como a sua taxa de captação de recursos no mercado de capitais. A

determinação do custo de capital é fundamental para as decisões de investimento e

para a definição da estrutura de capital.”

3.1. Introdução

Assim como outros recursos corporativos, o capital – tanto próprio como de

terceiros – é limitado, e sua obtenção gera custos financeiros para a empresa. Pode-se

dizer que o capital é “comprado” de credores e investidores, e então empregado em

projetos, que devem ter um retorno que não somente cubra o custo de capital, mas

também proporcione um aumento no valor da empresa.

Gitman (2002) afirma que o custo de capital atua como o maior elo de ligação

entre as decisões de investimento a longo prazo da empresa e a riqueza dos

proprietários, conforme determinado pelos investidores do mercado.

Podem-se citar algumas das principais aplicações do custo de capital. Uma é a

utilização como taxa de desconto para os fluxos de caixa a serem gerados pelo

investimento, ou seja, seu custo de oportunidade. Da mesma forma, analistas

financeiros utilizam o custo de capital para descontar os fluxos de caixa projetados

para uma empresa, derivando, por exemplo, o “valor justo” de suas ações no

mercado. Da mesma forma, o custo de capital é a taxa utilizada na avaliação

(valuation) de uma empresa. Outra aplicação importante é na definição da estrutura

ótima de capital da empresa, balanceando as diversas formas de capital disponível

para a maximização do seu valor.

É importante ressaltar também que, devido à sua definição básica e aos seus

principais usos, o custo de capital deve refletir o custo médio dos fundos captados

pela empresa por um longo prazo, com base nas melhores informações possíveis, que

são os valores atuais de mercado dos instrumentos utilizados e a estrutura-meta de

capital da empresa (COPELAND, 1996) ou estrutura de capital do mercado

Capítulo 3 – O Custo de Capital 21

(BREALEY; MYERS, 2000), flexíveis às flutuações comuns do mercado de capitais

e às perspectivas da empresa.

Neste capítulo, serão definidas as mais importantes fontes de capital e seus

métodos de cálculo. Em seguida, será apresentado o método de cálculo do custo

combinado de capital, conhecido como WACC2, escolhido principalmente por ser o

mais utilizado por empresas e por analistas financeiros.

3.2. Custo de Capital de Terceiros

O custo de capital de terceiros mede o custo atual para a empresa dos

empréstimos de longo prazo contratados e/ou títulos de dívida emitidos, ou seja,

quanto a empresa pagaria hoje caso decidisse acessar o mercado de dívida. Em

termos gerais, ele envolve as seguintes variáveis:

1. O nível atual das taxas de juros do mercado, mais especificamente da taxa-

base a ser utilizada, conhecida como benchmark. No caso de emissões

internacionais, geralmente são utilizadas as taxas de juros pagas pelos títulos

do governo americano (U.S. Treasury de 3, 5, 10 e 30 anos, dependendo do

prazo da emissão), por serem consideradas livres de risco. A figura 3.1 mostra

a evolução destas taxas nos últimos 10 anos.

0,0

1,0

2,0

3,0

4,0

5,0

6,0

7,0

8,0

9,0

1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004

(%)

UST 3 anos UST 5 anos UST 10 anos UST 30 anos

Fonte: Bloomberg.

Figura 3.1: Evolução dos juros pagos pelos títulos do governo americano

2 Weighted Average Cost of Capital, ou Custo Médio Ponderado de Capital

Capítulo 3 – O Custo de Capital 22

2. O risco associado à empresa, normalmente calculado como um spread3 sobre

o benchmark. Este spread é determinado pelo mercado, e é altamente

correlacionado e baseado no rating4 internacional da empresa (ou seja,

embute no seu valor o rating soberano5 do país onde a empresa está sediada).

As figuras 3.2 e 3.3 exemplificam esta situação mostrando uma média

ponderada dos spreads de algumas categorias de rating com relação a uma

interpolação de prazos dos U.S. Treasury.

0

50

100

150

200

250

300

350

400

1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2002 2003 2004

(bps

)

AAA AA+, AA, AA- A+, A, A- BBB+, BBB, BBB-

Fonte: Citigroup.

Figura 3.2: Evolução dos spreads para ratings considerados Nível de Investimento (Investment Grade)

0

500

1.000

1.500

2.000

2.500

3.000

1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2002 2003 2004

(bps

)

BB+, BB, BB- B+, B, B- CCC+, CCC, CCC-

Fonte: Citigroup.

Figura 3.3: Evolução dos spreads para ratings considerados Nível Especulativo (High Yield) ou Junk

3 Também utiliza-se prêmio ou margem na nomenclatura de mercado. 4 Rating é uma nota que as agências de classificação de risco de crédito atribuem à capacidade de um emissor de honrar o pagamento de uma dívida. Esta nota serve para que os investidores possam ter uma idéia do grau de risco dos títulos de dívida que estão adquirindo. Atualmente, as principais empresas de classificação de risco no mundo são: S&P (Standard & Poor’s), FitchRatings e Moody’s. 5 Soberano é termo utilizado quando se faz referência ao rating de um país.

Capítulo 3 – O Custo de Capital 23

3. A vantagem fiscal associada com a dívida, já que os juros são dedutíveis de

pagamento de impostos, ou seja, o custo da dívida após os impostos é uma

função da alíquota fiscal paga pela empresa.

Portanto, o custo de capital de terceiros pode ser calculado pela seguinte

equação:

)1()( TspreadRk fd −×+=

Onde:

kd : Custo de capital de terceiros;

Rf : Risk-Free Rate, ou Taxa livre de risco;

T : Taxa Efetiva de Impostos.

Em resumo, conforme a fórmula acima e a discussão anterior, o custo de

capital de terceiros – quase sempre equivalente também à taxa paga sobre títulos de

dívida emitidos – é calculado pela soma de uma taxa paga por títulos sem risco (ou

seja, a taxa mínima de remuneração exigida pelo investidor) a um prêmio pago pelo

risco adicionado pela empresa (spread), ajustado pelo benefício fiscal calculado

através da taxa de impostos efetivamente paga pela mesma empresa.

3.3. Custo de Ações Preferenciais

Ações preferenciais têm algumas características de dívida (o dividendo

preferencial é especificado no momento da emissão e é pago antes do dividendo

ordinário) e outras de capital próprio (prazo indefinido e dividendos não-dedutíveis

de imposto).

Dada a perpetuidade da ação preferencial, o cálculo do seu custo é bastante

simples, conforme a equação a seguir. Segundo Damodaran (1994), deve-se assumir

que os dividendos são constantes em termos nominais e que a ação não tem cláusulas

especiais (conversibilidade, etc.):

Capítulo 3 – O Custo de Capital 24

p

pp P

Dk =

Onde:

Kp : Custo de ações preferenciais;

Dp : Dividendos da ação preferencial;

Pp : Preço da ação preferencial;

É importante ressaltar que o conceito de ação preferencial nos Estados Unidos

e no Brasil é completamente diferente, e as ações preferenciais negociadas no Brasil

devem ser tratadas como capital próprio, já que não apresentam as características

descritas acima (exceto em raros casos). Elas diferem das ações ordinárias em apenas

alguns pontos, com destaque para:

• Não têm direito a voto;

• Têm direito a dividendos 10% maiores que os ordinários, além de serem

pagos antes destes.

3.4. Custo de Capital Próprio

O custo do capital próprio – seja ele em forma de ações ordinárias ou de

lucros retidos – é a taxa de retorno que os acionistas exigem pelo investimento feito

na empresa. Os dois principais métodos usados para estimar este custo são: o modelo

de crescimento de dividendos e o CAPM (Capital Asset Pricing Model) ou modelo

de formação de preços de ativos de capital.

3.4.1. Modelo de Crescimento de Dividendos

Ele se baseia na premissa de que, para empresas com crescimento estável de

lucro e dividendos, o valor de suas ações é igual ao valor presente dos dividendos

esperados, conforme a equação:

Capítulo 3 – O Custo de Capital 25

gkDP

e −= 1

0

Onde:

P0 : Preço atual da ação;

D1 : Dividendos esperados para o próximo ano;

ke : Taxa de retorno esperada pelos acionistas;

g : Taxa constante de crescimento dos dividendos.

Com uma simples manipulação, pode-se chegar a uma equação para o cálculo

do custo de capital próprio:

gPDke +=

0

1

Segundo Ross (2000) no caso de empresas com ações negociadas

publicamente e que pagam dividendos, D1 e P0 podem ser observados no mercado,

porém a taxa de crescimento constante g deve ser estimada. A estimação de g pode

ser feita basicamente de duas maneiras, através das taxas de crescimento históricas

ou então através da projeção de analistas.

A maior vantagem do modelo de crescimento de dividendos é a sua

simplicidade. No entanto, vários problemas podem ser citados:

1. Qualquer que seja o método utilizado para estimar a taxa de crescimento

requer uma série de suposições (DAMODARAN, 2002);

2. O modelo de crescimento de dividendos só é aplicável a empresas que

paguem dividendos;

3. Os dividendos nunca crescem a uma taxa constante (ROSS, 2000);

4. Essa abordagem não considera o risco.

Dessa maneira, embora o modelo de crescimento dos dividendos seja um dos

mais simples métodos de cálculo de custo de capital, ele é bastante limitado e pode

variar muito relativamente a variações nos dados de entrada.

Capítulo 3 – O Custo de Capital 26

3.4.2. CAPM – Capital Asset Pricing Model

O CAPM foi desenvolvido na década de 60 por Sharpe (1964) e Lintner

(1965), em resposta ao desejo dos investidores de inferir sobre qual deveria ser o

prêmio de risco para investir em diferentes tipos de ativos.

Segundo eles, o prêmio a ser pago por um ativo qualquer, em um mercado

competitivo, é diretamente proporcional ao seu índice beta (β). Usado para medir o

risco não-diversificável, ele é um índice do grau de movimento do retorno de um

ativo em resposta à mudança no retorno do mercado (retorno de uma carteira

incluindo todos os títulos do mercado).

Isso significa que todos os ativos deveriam estar dispostos sobre uma linha

reta num gráfico β x Retorno, chamada linha do mercado de títulos ou Security

Market Line (SML). A SML é uma linha reta que cruza o eixo y no ponto chamado

Rf ou Risk Free6. Nos EUA, no caso do mercado de ações, os ativos considerados

livres de risco são os U.S. Treasury de 10 e 30 anos (dado que investimentos neste

mercado são, por definição, considerados como de longo prazo). A linha que liga o

Rf ao ponto de intersecção entre o retorno da carteira de mercado (Rm) e o β define a

SML. A figura 3.4 ilustra a teoria.

0,0 0,5 1,0 1,5 2,0

β

Retorno Esperado

R f

R m

SML

Fonte: BREALEY; MYERS (2003).

Figura 3.4: CAPM

6 Da mesma forma que no custo de capital de terceiros, esse ponto é a remuneração mínima exigida pelos investidores para ativos livres de risco.

Capítulo 3 – O Custo de Capital 27

Deste gráfico, pode-se derivar a equação da reta, que é também a equação

geral do modelo CAPM:

( )fmifi RRRR −=− β

Onde:

Ri : Retorno exigido sobre o ativo i;

Rf : Risk-Free Rate, ou Taxa livre de risco;

βi : Beta do ativo i;

Rm : Retorno da carteira de mercado.

O termo (Rm – Rf) é também conhecido como Equity Market Risk Premium

(EMRP) ou Prêmio de Risco do Mercado Acionário. Segundo Ross (2000), ele é o

retorno excedente exigido de uma aplicação em um ativo com risco acima do exigido

de uma aplicação livre de risco. Há diversos estudos, realizados tanto por acadêmicos

como por analistas financeiros, totalmente dedicados a avaliar este prêmio, levando

em consideração séries históricas, diferentes portifólios e diversos tipos de

ponderação.

Neste momento, já seria possível derivar uma equação para o cálculo do custo

de capital próprio. Entretanto, devido à presença de companhias estrangeiras aos

Estados Unidos na análise que será feita ao longo dessa dissertação, há mais um fator

que deve ser incluso: o risco político.

3.4.3. Custo de Capital Próprio

Utilizando o método CAPM e incluíndo o fator de risco político (detalhado ao

final do capítulo), o custo de capital próprio pode ser calculado conforme a seguinte

equação:

PRPEMRPRk fe +×+= β

Onde:

ke : Custo de capital proprio;

Rf : Risk-Free Rate, ou Taxa livre de risco;

Capítulo 3 – O Custo de Capital 28

β: Beta a ser utilizado7;

EMRP : Equity Market Risk Premium, ou prêmio de

risco do mercado de ações;

PRP : Prêmio de Risco Político.

3.5. WACC – Weighted Average Cost of Capital

WACC é definido como uma média ponderada dos custos dos diferentes

instrumentos utilizados por uma empresa para se financiar, e deve refletir o futuro

custo médio esperado para a captação de fundos pela empresa, no longo prazo

(GITMAN, 2002).

Ele é encontrado ponderando-se o custo de cada tipo específico de capital por

sua proporção no capital da empresa, conforme a seguinte equação:

epd kFVEk

FVPk

FVDWACC ×+×+×=

Onde:

D : Valor de mercado do capital de terceiros na

empresa;

FV : Valor total de mercado da empresa8;

kd : Custo de capital de terceiros;

P : Valor de mercado das ações preferenciais;

Kp : Custo de ações preferenciais

E : Valor de mercado do capital próprio na empresa;

ke : Custo de capital próprio.

Este cálculo deve gerar a melhor estimativa para os custos de captação de

recursos pela empresa e, como discutido anteriormente, deve ser utilizado na

avaliação da empresa como um todo (valuation).

7 Normalmente o β utilizado não é específico da empresa, mas sim uma mediana dos β das empresas comparáveis, seja da indústria ou do mercado. 8 Mais conhecido como Firm Value (FV).

Capítulo 3 – O Custo de Capital 29

3.6. Algumas Particularidades para Empresas Brasileiras

Com a teoria explicitada anteriormente, é possível calcular o custo de capital

de qualquer empresa que se deseje. Entretanto, é interessante, para um melhor

entendimento das análises que serão feitas posteriormente, aprofundar um pouco

mais a discussão com relação a empresas situadas no Brasil. Para isso, será utilizada

uma tese de mestrado que trata do tema.

Valle (2000) analisou o custo de captação nos mercados americano de bonds

e internacional de eurobonds, estudando as captações das maiores empresas do setor

de Papel & Celulose no período de 1991-98. Além do custo de captação, foram

pesquisados os ratings e o desempenho (medido por indicadores contábil-

financeiros) das empresas e os ratings dos seus países. Os resultados da pesquisa

evidenciam que as empresas brasileiras da amostra pagaram um alto prêmio para

captarem recursos no mercado financeiro internacional e indicam que o prêmio pago

pode ser parcialmente explicado pelas variáveis que caracterizam o desempenho

econômico-financeiro das empresas e o risco-país. Adicionalmente, encontraram-se

indícios de que as empresas brasileiras pagaram mais por serem brasileiras e por

terem recebido um rating de nível especulativo, como herança do “teto soberano”9.

Da análise de indicadores contábil-financeiros, abstraiu-se que as empresas

melhor classificadas em quaisquer dos indicadores sempre conseguiam captar

recursos a um baixo custo. Já as empresas brasileiras, por estarem mal classificadas

em quase todos os indicadores (rentabilidade a patrimônio líquido histórico, índices

de cobertura de juros, tamanho, coeficiente de variação do fluxo de caixa, entre

outros) pagavam mais por suas captações. Entretanto, não deveriam pagar tanto

quanto empresas “quebradas”, como mostra o histórico das captações.

Apesar deste fator (má classificação em um ou mais indicadores contábil-

financeiros) ter um grande poder explicativo na análise, ele não deve ser entendido

como regra para todas as empresas brasileiras, já que atualmente muitas são líderes

em seus segmentos e apresentam altíssimo nível de competitividade global10.

9 Teto soberano é a limitação imposta pelo risco soberano para o custo de captação das empresas sediadas neste país, ou seja, seus custos de captação serão, exceto raras exceções, no mínimo iguais (e frequentemente maiores) aos obtidos pelas emissões soberanas. 10 Mesmo essas pagam mais pelos recursos captados do que suas concorrentes internacionais menos competitivas.

Capítulo 3 – O Custo de Capital 30

Com relação ao prêmio adicional explicado pelo risco país e/ou pelo rating

atribuído ao “teto soberano”, pode-se argumentar que, por um lado, o mercado

analisa o país e coloca um preço para isto, e por outro, analisa a empresa pelo seu

rating e também coloca um preço para isto, porém o rating da empresa não é o seu

rating "puro”, mas o rating “teto soberano”. O exemplo dado pelo autor é o da

comparação entre uma empresa BBB de um país BB- ou uma empresa BB- de um

país BB-: seria possível sustentar que a primeira é melhor e que suas operações

oferecem um menor risco de crédito. No entanto, as duas empresas, por conta do

“teto soberano”, entram no mercado como sendo a mesma coisa, ou seja, empresas

BB- de um país BB-, pagando pelo BB- do país e pelo BB- que receberam

“gratuitamente” por conta do fenômeno “teto soberano”.

Esta situação continua válida até hoje. Pode-se observar no mercado que as

empresas brasileiras que emitem no mercado de bonds pagam no mínimo o que paga

o governo brasileiro. Isso é válido inclusive para empresas majoritariamente

exportadoras, produtoras de commodities com valores fixados internacionalmente,

grandes conglomerados, entre outras empresas que tem altíssima qualidade de

crédito, mas são limitadas pelo “teto soberano”. Mais recentemente, Petrobras e

CVRD conseguiram ratings melhores e emissões mais baratas do que as do Governo,

mas devem ser consideradas casos à parte, numa tendência que vem surgindo apenas

recentemente. As condições da CVRD serão discutidas em maiores detalhes ao longo

desse trabalho de formatura.

3.7. PRP – Prêmio de Risco Político

Dado que a taxa livre de risco utilizada é a dos títulos do tesouro americano,

há a necessidade de se adicionar ao cálculo do custo de capital próprio um fator que

considere o risco de se investir em uma empresa estrangeira a este mercado, já que

este risco não é contemplado pelo β.

O risco político é o risco de ocorrerem perturbações políticas que possam

afetar a performance da companhia, como hiperinflação, desapropriação de ativos,

desvalorização cambial, barreiras contra o fluxo livre de capitais, maior volatilidade

do mercado de capitais, instabilidade regulatória e problemas relacionados a

governança corporativa.

Capítulo 3 – O Custo de Capital 31

Para estimar este prêmio, os investidores normalmente utilizam o chamado

risco-país, que nada mais é do que uma ponderação dos spreads pagos pelos diversos

títulos emitidos pelo país em questão com relação à taxa livre de risco (novamente

são usados os títulos do tesouro americano). Para o Brasil, pode-se utilizar algum

título específico (como o C-Bond ou o Global 40) ou o índice EMBI+ (apresentado

na figura 3.5) calculado pelo Banco JP Morgan, que pondera diversos títulos. A

metodologia de cálculo do índice leva em consideração o spread soberano, o

diferencial da taxa (yield) do título em relação ao título americano de prazo

equivalente e o yield ajustado pelo prazo. Esses números refletem a visão do

mercado com relação ao país, levando em consideração sua capacidade em honrar

suas dívidas.

Na aplicação do prêmio de risco político para estimar o custo de capital de

uma empresa, a principal complicação que surge é com relação à parcela deste risco

a qual a empresa é suscetível. Ou seja, deve ser incluído todo o prêmio de risco

político ou apenas uma parte dele? Há divergências entre diversos autores, dada a

subjetividade desta questão, então, quando necessário, será assumido que o prêmio

de risco político aplicado a cada empresa seguirá critérios próprios, com base em

estudos da real taxa aplicada pelo mercado no momento da análise ou em valores

baseados na evolução histórica da taxa.

0

500

1.000

1.500

2.000

2.500

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004

(bps

)

Fonte: JP Morgan.

Figura 3.5: Evolução do Risco Brasil

Capítulo 3 – O Custo de Capital 32

3.8. Conclusão

São basicamente dois os objetivos desse capítulo. O primeiro é discutir e

definir um método para o cálculo de custo de capital, que inclusive será utilizado

amplamente no capítulo 4. O segundo é entrar um pouco na discussão das

particularidades enfrentadas pelas empresas brasileiras na captação de recursos, e

como seus custos são afetados.

A metodologia definida foi a do WACC, que mede o custo médio de capital

de uma empresa ao ponderar os custos das diferentes fontes de recursos pela

proporção destas fontes na estrutura de capital da empresa. Foram discutidos os

métodos específicos para o cálculo dos custo de capital de terceiros e próprio, além

de suas particularidades e riscos.

Já a discussão do caso das empresas brasileiras é feita ao longo do capítulo, e

chega à conclusão de que a maior dificuldade enfrentada, que aumenta muito os

custos de captação, é a existência do “teto soberano”. Ele estabelece em um patamar

muito alto o custo mínimo que as empresas devem pagar por seus recursos, o que

acaba reduzindo sua competitividade e dificultando suas operações. Mesmo assim,

diversas empresas brasileiras são líderes em seus mercados e competem pelos

clientes espalhados ao redor do mundo. É o caso da Companhia Vale do Rio Doce,

que, além de competir em nível de igualdade, tem os melhores níveis de retorno de

sua indústria no mundo, como será visto no capítulo 4.

Por isso a análise do caso da CVRD é tão interessante, e é fundamental

esclarecer e apresentar a questão do custo de capital para isolar sua influência e

entender realmente os fatores que permitem o sucesso da companhia. Isto será

progressivamente revelado ao longo dos próximos capítulos.

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 33

4. AS GRANDES MINERADORAS DIVERSIFICADAS

“Apesar da predominância do minério de ferro, a CVRD está cada vez mais

próxima de se tornar uma grande mineradora diversificada. Suas principais

concorrentes, neste sub-segmento da indústria de mineração, são: BHP Billiton, Rio

Tinto e Anglo American. É fundamental para a evolução deste trabalho posicionar a

CVRD neste setor específico, e compará-la diretamente com seus peers11.”

4.1. Introdução

A indústria de mineração passou, nos últimos anos, por uma grande fase de

consolidação. Desta fase, surgiu uma estrutura que pode ser dividida em três grupos

bem definidos e distintos, que englobam todas as empresas que atuam nesta

indústria.

No primeiro grupo estão as “três grandes mineradoras diversificadas” –

Anglo American, BHP Billiton e Rio Tinto, as maiores mineradoras do mundo tanto

em capitalização de mercado quanto em ativos e receitas – que atingiram portes

colossais nos últimos anos devido a uma intensa atividade de fusões e aquisições e a

um acelerado processo de crescimento orgânico.

O segundo grupo é formado basicamente por líderes em produtos específicos

(sem levar em conta a participação das mineradoras do primeiro grupo), como Alcoa

e Alcan (alumínio), Xstrata (carvão), Codelco e Phelps Dodge (cobre), CVRD

(minério de ferro), Norilsk e Inco (níquel) e Newmont, Barrick e Goldfields (ouro).

Já o último grupo engloba as mineradoras restantes, de menor porte e/ou com

atividades concentradas em poucos produtos.

Com relação à CVRD, incluída automaticamente no segundo grupo, sua

recente estratégia de intensificar a diversificação de atividades e mercados, aliada a

um rápido crescimento do seu valor de mercado e de sua rentabilidade (fatores que

serão melhor analisados mais à frente), implicam que uma comparação justa e eficaz

11 Peer é a palavra normalmente utilizada para designar um par ou similar, neste caso as companhias comparáveis à CVRD.

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 34

deve ser feita com relação às empresas do primeiro grupo. Este critério de

comparação já vem também sendo utilizado por analistas de grandes bancos de

investimento, como o recente relatório “Origin & EVAlution of a new species”12, o

que valida a premissa aqui adotada.

4.2. Peers Comparáveis

Como já discutido anteriormente, a CVRD está posicionada para competir

com as grandes mineradoras diversificadas. Assim, é importante conhecer melhor

seus principais peers, com destaque para suas áreas de atuação, produtos e

orientações estratégicas. A seguir serão apresentados os perfis de cada uma três

integrantes do grupo.

4.2.1. BHP Billiton

Em 2001, a australiana BHP Limited (hoje BHP Billiton Limited) e a

britânica Billiton plc (hoje BHP Billiton plc) se uniram através de uma fusão,

formando a BHP Billiton, uma empresa com duas sedes (Melbourne, na Austrália, e

Londres, no Reino Unido) e dual-listed13, operando com os mesmos Conselho de

Administração e gerência.

A BHP Billiton é a maior mineradora diversificada do mundo (em termos de

capitalização de mercado), com operações divididas em 7 setores:

• Materiais para Aço Carbono: minério de ferro e pelotas, carvão metalúrgico

(coque), manganês e ligas metálicas;

• Petróleo: óleo bruto, gás natural, gás natural liqüefeito, GLP e etano;

• Alumínio: bauxita, alumina, alumínio e produtos finais;

• Metais Básicos: cobre, prata, zinco, chumbo e ouro;

12 Skirrow (2004). 13 A estrutura de uma companhia dual-listed envolve um acordo contratual entre duas companhias de operar seus negócios como uma empresa unificada, mantendo identidades legais separadas e listagem em Bolsas de Valores (no caso Australian Stock Exchange, na Austrália, e London Stock Exchange, no Reino Unido) independentes.

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 35

• Carvão Térmico: carvão para geração de energia elétrica e para usos

industriais gerais;

• Materiais para Aço Inoxidável: níquel, cromo e cobalto;

• Diamantes e Outros: diamantes, empresas como Titanium Minerals e Integris

Metals, e áreas de exploração e tecnologia.

A estratégia da BHP Billiton é baseada num portifólio global (já existente) de

ativos de alta qualidade, nos diversos setores em que opera. Sua preferência é por

ativos upstream, ou seja, mais próximos do material primário (minério), o que

contribui para as altas margens de lucro do negócio.

A empresa espera crescer através de significativas expansões brownfield14 no

curto prazo, da manutenção da sua escala e da capacidade de capturar novas

oportunidades de crescimento globalmente, seja através de aquisições ou de novos

projetos (greenfield).

As figuras 4.1 e 4.2 mostram a distribuição das vendas no último ano:

Petróleo19,6%

Alumínio19,0%

Metais Básicos11,8%

Carvão Térmico11,7%

Diamantes e outros10,9%

Materias p/ Aço Inoxidável

6,7% Materias p/ Aço Carbono20,4%

Figura 4.1: BHP Billiton – Breakdown das Vendas de 2003 por Produto

Austrália e resto da Ásia21,7%

China9,1%

Japão12,6%

América do Norte11,7%

Europa34,8%

Resto do Mundo10,1%

Figura 4.2: BHP Billiton – Breakdown das Vendas de 2003 por Destino

Fonte: Demonstrativos financeiros e website.

14 Expansão de projetos já existentes.

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 36

4.2.2. Rio Tinto

No final de 1995, a britânica RTZ Corporation plc (hoje Rio Tinto plc) e sua

associada australiana CRA Limited (hoje Rio Tinto Limited) se uniram através de

uma fusão, formando a Rio Tinto, uma empresa com duas sedes (Melbourne, na

Austrália, e Londres, no Reino Unido) e dual-listed, operando com os mesmos

Conselho de Administração e gerência.

A Rio Tinto é a segunda maior mineradora do mundo (em termos de

capitalização de mercado), com operações divididas nos seguintes setores:

• Minério de Ferro: minério de ferro e pelotas;

• Energia: carvão para geração de energia elétrica e produção de aço (coque e

térmico, respectivamente), e urânio para energia nuclear;

• Minerais Industriais: boratos, sal industrial, talco e dióxido de titânio;

• Alumínio: bauxita, alumina e alumínio;

• Cobre: cobre e ouro (sub-produto);

• Diamantes: diamante industrial e precioso;

• Outros: chumbo, molibidênio, níquel, prata, estanho, zinco e áreas de

exploração e tecnologia.

Ao focar em operações de larga escala e longa vida-útil, a Rio Tinto resistiu a

flutuações nos preços das commodities ao longo dos anos. O estilo de gestão

operacional rígido, ao mesmo tempo que traz excelentes margens de lucro, gera

irritação nos sindicatos, que reclamam das práticas ambientais e trabalhistas da

empresa.

A estratégia da Rio Tinto é continuar focando em operações de larga escala,

longa vida-útil e baixo custo, de preferência em um pequeno número de minas de

maior tamanho e geograficamente dispersas, aproveitando ao máximo ganhos de

escala, reservas e possíveis expansões internas. A empresa pretende também

continuar focando em operações upstream nas já diversificadas divisões existentes.

As figuras 4.3 e 4.4 mostram a distribuição das vendas no último ano:

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 37

Europa23,3%Resto da Ásia

21,5%

Japão18,0%

América do Norte25,7%

Outros4,2%Austrália

7,2%

Figura 4.3: Rio Tinto – Breakdown das Vendas de 2003 por Produto

Energia18,1%

Minerais Industriais

15,7%

Alumínio15,7%

Cobre12,7%

Ouro9,1%

Minério de Ferro18,4%

Outros5,5%Diamantes

4,7%

Figura 4.4: Rio Tinto – Breakdown das Vendas de 2003 por Destino

Fonte: Demonstrativos financeiros e website.

4.2.3. Anglo American

A Anglo American plc é a terceira maior mineradora diversificada do mundo

(em termos de capitalização de mercado). Baseada no Reino Unido – após transferir-

se da África do Sul em 1999, situação que culminou de um período intenso de

reestruturação, no qual a companhia comprou e vendeu ativos, reorganizou

participações e cresceu organicamente – a empresa tem operações nos seguintes

negócios:

• Produtos Florestais: celulose, papéis gráficos, embalagens de papel e papelão

e produtos sólidos de madeira;

• Minerais Industriais: materiais para construção (areia, brita, concreto,

cimento, argamassa, pedras, asfalto, entre outros), STPP e fertilizantes

fosfatados;

• Platina: platina, paládio e ródio;

• Metais Básicos: cobre, zinco, níquel e areias minerais;

• Ouro;

• Industriais: processamento de açúcar, amido, glicose, alumínio, nitrogênio,

amônia, entre outros;

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 38

• Carvão: carvão para geração de energia elétrica, carvão metalúrgico, coque e

PCI (pulverized coal injection);

• Metais Ferrosos: minério de ferro, aço carbono e inoxidável, vanádio, cromo

e manganês;

• Diamantes: participação na De Beers (maior mineradora de diamantes do

mundo, baseada na África do Sul).

A estratégia da Anglo American é crescer através de melhorias operacionais,

expansões de capacidade, aquisições estratégicas e geração e desenvolvimento de

novas oportunidades. A empresa não pretende expandir para novos setores, e deve se

aproveitar de seu portifólio diversificado de nível global para gerar valor.

As figuras 4.5 e 4.6 mostram a distribuição das vendas no último ano:

Diamantes11,9%

Indústrias9,3%

Platina9,1%

Carvão7,4%

Outros1,3%

Minerais Industriais

13,3%

Produtos Florestais

22,6%

Metais Básicos8,5%

Ouro8,2%

Metais Ferrosos8,2%

Figura 4.5: Anglo American – Breakdown das Vendas de 2003 por Produto

África do Sul18,8%

Austrália e Ásia14,2%

Europa52,2%

Resto da África1,6%

América do Sul4,6%

América do Norte8,6%

Figura 4.6: Anglo American – Breakdown das Vendas de 2003 por Destino

Fonte: Demonstrativos financeiros e website.

4.3. Comparativo

Para aprofundar o que foi discutido até o momento, é interessante apresentar

um comparativo numérico, posicionando a CVRD com relação às outras três grandes

mineradoras diversificadas. Para isso, serão utilizados e calculados alguns

indicadores e índices financeiros, além de comparativos mostrando a evolução dos

preços das ações.

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 39

Em seguida, será apresentada uma discussão dos números calculados, que

servirá como base para a análise mais aprofundada da evolução sofrida pela CVRD

desde sua criação para se tornar uma empresa de destaque tanto no cenário brasileiro

quanto no cenário da mineração global.

Para efeito de simplificação, serão usadas as seguintes siglas até o final do

capítulo:

• CVRD = Companhia Vale do Rio Doce

• AA = Anglo American

• BHP = BHP Billiton

• RT = Rio Tinto

• CAGR = Compounded Annual Growth Rate, ou Taxa Anual de Crescimento

Composto, que representa uma aproximação da taxa média anual de

crescimento do indicador

• ND = Não Disponível

4.3.1. Evolução dos preços das ações

Analisar a evolução do preço da ação de uma companhia não serve apenas

para orientar decisões de investimento, como também pode ser usada para entender a

percepção do mercado com relação ao desempenho geral desta companhia.

No caso desse TF, uma análise comparativa da evolução dos preços das ações

das quatro mineradoras diversificadas pode gerar conclusões valiosas quanto a como

o mercado vê estas empresas.

É interessante notar também que, ao usar uma análise comparativa, fatores

específicos do mercado acionário influem igualmente sobre todas as companhias,

tornando a comparação mais coerente.

A figura 4.7 a seguir mostra a evolução dos preços das ADRs15 desde

21/03/2002, data de lançamento das ADRs da CVRD. Há também uma linha com a

evolução do índice S&P50016.

15 ADR (American Depositary Receipt) é um certificado negociado na Bolsa de Nova York (NYSE) que representa um certo número de ações de uma companhia não-americana.

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 40

50

75

100

125

150

175

200

225

250

275

mar/02 jun/02 set/02 dez/02 abr/03 jul/03 out/03 jan/04 abr/04 jul/04 out/04

CVRD BHP Billiton Rio Tinto Anglo American S&P 500

235,11

177,33

136,38130,72

97,97

Fonte: Bloomberg.

Figura 4.7: Evolução nos preços das ações – ADRs

Pode-se perceber que o desemprenho da CVRD é bem superior ao dos peers e

mais que duas vezes melhor que o da referência de mercado.

Alternativamente, é interessante mostrar a evolução dos preços das ações

mais líquidas17 de cada empresa, negociadas em seus mercados locais (São Paulo

para CVRD, Sydney para BHP e Londres para RT e AA), como mostra a figura 4.8 a

seguir. Neste caso, foram utilizadas cotações desde 24/05/1999, data de lançamento

das ações da AA. Há novamente a linha do S&P500, considerado um índice amplo e

neutro para representar o mercado.

16 Índice que consiste de 500 ações americanas escolhidas por tamanho de mercado, liquidez e representatividade em sua indústria. O seu valor é ponderado por valor de mercado, com o peso de cada ação no índice sendo proporcional ao seu valor de mercado. O S&P500 é uma das referências mais utilizadas no mercado acionário amplo. 17 Termo de mercado utilizado para denominar o nível de negociação de um ativo.

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 41

25

50

75

100

125

150

175

200

225

250

275

300

325

350

mai/99 dez/99 jun/00 jan/01 jul/01 fev/02 ago/02 mar/03 set/03 abr/04 out/04

CVRD BHP Billiton Rio Tinto Anglo American S&P 500 Ibovespa

296,39

211,11

172,02161,62

86,50

123,14

Fonte: Bloomberg.

Figura 4.8: Evolução nos preços das ações – Locais

O desempenho destas ações nos últimos cinco anos é bastante similar ao

verificado no gráfico anterior, confirmando o desempenho historicamente melhor da

CVRD, superior ao dos seus peers e muito superior ao da referência de mercado.

4.3.2. Indicadores e Índices Financeiros

4.3.2.1. Receita Líquida de Vendas e Serviços

Refere-se ao valor nominal das vendas de bens ou de serviços prestados por

uma empresa, no exercício social considerado, deduzidos os diversos valores que não

a pertencem, tais como impostos indiretos (ICMS, IPI, etc.), descontos e

abatimentos, e devoluções de mercadorias.

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 42

Este indicador é divulgado por todas as empresas, sendo retirado diretamente

do Demonstrativo de Resultado do Exercício, e tem grande representatividade, já que

ilustra claramente o tamanho da empresa, através do total arrecadado com vendas.

(em milhões de US$) 1999 2000 2001 2002 2003 CAGR

CVRD $3.076 $3.935 $3.935 $4.123 $5.350 14,8%

BHP Billiton ND 17.551 14.052 12.554 18.484 1,7Rio Tinto 7.197 7.875 8.152 8.443 9.228 6,4Anglo American 11.578 14.824 14.786 15.145 18.637 12,6

Mediana 7.197 11.350 11.102 10.499 13.856 9,5Média 7.284 11.046 10.231 10.066 12.925 8,9Fonte: Relatórios financeiros das companhias.

Tabela 4.1: Receita Líquida

Analisando a tabela 4.1 acima, pode-se constatar que a AA tem

historicamente a maior receita líquida do grupo e a CVRD a menor. Por outro lado, a

CVRD tem o maior crescimento médio do período, o que mostra sua rápida evolução

e crescimento.

Entretanto, é importante ressaltar que este indicador não pode ser analisado

individualmente, já que sofre influência de diversos fatores, como mix de produtos,

comportamento dos preços internacionais dos produtos vendidos (em especial

quando se tratam de commodities), aquisição e venda de subsidiárias, entre muitos

outros.

4.3.2.2. EBITDA e Margem de EBITDA

EBITDA (Earnings before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization) –

ou LAJIDA, Lucro antes de Juros, Impostos, Depreciação e Amortização – é o fluxo

de caixa gerado pelas operações de uma empresa. É calculado somando-se a

depreciação de ativos imobilizados e a amortização de intangíveis (normalmente

divulgados no Demonstrativo de Origens e Aplicações de Recursos ou no

Demonstrativo de Fluxos de Caixa) ao lucro operacional da empresa (que por sua vez

é obtido através da receita líquida subtraída de: custo dos produtos vendidos e dos

serviços prestados; despesas gerais e administrativas; despesas com pesquisa e

desenvolvimento; e outros despesas operacionais).

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 43

Nem todas as empresas divulgam este indicador ou utilizam os mesmos

critérios de cálculo, portanto, para efeito desta análise, o EBITDA foi calculado

utilizando-se o método descrito acima, com os resultados mostrados na tabela 4.2.

A importância deste indicador reside no fato de ser financeiramente muito

representativo, sendo inclusive amplamente utilizado no mercado financeiro como o

principal indicador para análises e avaliações. Isto por que ele é uma boa estimativa

da geração de fluxo de caixa operacional de uma empresa.

(em milhões de US$) 1999 2000 2001 2002 2003 CAGR

CVRD $1.079 $1.121 $1.174 $1.643 $1.882 14,9%

BHP Billiton ND 4.876 4.370 4.253 5.243 2,5Rio Tinto 2.438 3.037 3.206 2.863 2.562 1,2Anglo American 2.041 3.296 3.656 3.350 3.207 12,0

Mediana 2.041 3.167 3.431 3.107 2.885 7,2Média 1.853 3.082 3.102 3.027 3.224 7,6Fonte: Relatórios financeiros das companhias.

Tabela 4.2: EBITDA

Já a margem de EBITDA é calculada dividindo-se o EBITDA do período pela

receita líquida do período. Esta margem é amplamente utilizada como um indicador

de lucratividade de empresas, demonstrando a proporção da receita líquida que é

efetivamente um fluxo de caixa operacional, como mostra a tabela 4.3.

1999 2000 2001 2002 2003 Evolução Média Mediana

CVRD 35,1% 28,5% 29,8% 39,8% 35,2% + 0,1 33,7% 35,1%

BHP Billiton ND 27,8 31,1 33,9 28,4 + 0,6 30,3 29,7Rio Tinto 33,9 38,6 39,3 33,9 27,8 - 6,1 34,7 33,9Anglo American 17,6 22,2 24,7 22,1 17,2 - 0,4 20,8 22,1

Mediana 33,9 28,1 30,5 33,9 28,1 - 5,8 32,0 31,8Média 28,9 29,3 31,2 32,4 27,1 - 1,7 29,9 30,2Fonte: Relatórios financeiros das companhias.

Tabela 4.3: Margem de EBITDA

Analisando as duas tabelas anteriores, pode-se constatar que a BHP tem

historicamente a maior geração de caixa, porém com baixíssimo crescimento, ao

contrário da CVRD, que tem os menores valores absolutos, porém alto crescimento

médio. Com relação às margens, CVRD, BHP e RT têm médias e medianas entre

30% e 35%, contra 21% a 22% da AA.

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 44

É interessante observar que a CVRD têm obtido as maiores margens e taxa de

crescimento nos últimos anos, o que demonstra novamente a crescente evolução da

empresa frente suas concorrentes.

4.3.2.3. Lucro Líquido do Exercício e Margem Líquida

Refere-se ao valor do lucro operacional que sobra para a empresa após

deduções financeiras, não-operacionais, de impostos, de participações e de

contribuições. A tabela 4.4 apresenta o comparativo.

Este indicador é tirado do Demonstrativo de Resultado do Exercício, e seu

significado é mais contábil do que real, devido à grande quantidade de ajustes e itens

não-recorrentes que podem haver antes de sua apuração, além de grandes diferenças

entre práticas contábeis adotadas nos diversos países (especialmente carga tributária).

(em milhões de US$) 1999 2000 2001 2002 2003 CAGR

CVRD $412 $1.086 $1.287 $680 $1.548 39,2%

BHP Billiton ND 2.114 1.569 1.404 2.328 3,3Rio Tinto 1.282 1.507 1.079 651 1.508 4,1Anglo American 1.552 1.957 3.176 1.563 1.592 0,6

Mediana 1.282 1.732 1.428 1.042 1.570 3,7Média 1.082 1.666 1.778 1.075 1.744 11,8Fonte: Relatórios financeiros das companhias.

Tabela 4.4: Lucro Líquido

Já a margem líquida é calculada dividindo-se o lucro líquido do período pela

receita líquida do período. Esta margem mostra a proporção de lucro obtida pela

empresa com relação à sua receita, conforme os resultados da tabela 4.5.

1999 2000 2001 2002 2003 Evolução Média Mediana

CVRD 13,4% 27,6% 32,7% 16,5% 28,9% + 15,5 23,8% 27,6%

BHP Billiton ND 12,0 11,2 11,2 12,6 + 0,6 11,7 11,6Rio Tinto 17,8 19,1 13,2 7,7 16,3 - 1,5 14,8 16,3Anglo American 13,4 13,2 21,5 10,3 8,5 - 4,9 13,4 13,2

Mediana 13,4 16,2 17,4 10,8 14,5 + 1,1 14,1 14,8Média 14,9 18,0 19,6 11,4 16,6 + 1,7 16,0 17,2Fonte: Relatórios financeiros das companhias.

Tabela 4.5: Margem Líquida

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 45

Analisando as duas tabelas anteriores, pode-se constatar que a BHP tem

historicamente o maior lucro líquido. O lucro da CVRD foi o que mais cresceu (39%

na média), alcançando os valores absolutos de RT e AA em 2003. Com relação às

margens, a CVRD foi a que mais evoluiu, passando de 13% em 1999 para 29% em

2003. Sua média e mediana são quase duas vezes maiores que as das outras três

companhias, demonstrando a qualidade da gestão da empresa, ao longo do tempo.

4.3.2.4. Capex (Investimentos de Capital) e Nível de Capex

É o valor aplicado pela empresa em investimentos de capital, ou seja, adições

ao ativo fixo (máquinas, equipamentos, terrenos, instalações, etc.).

O capex pode ser divido entre: (i) de manutenção, ou seja, investimentos

necessários para a continuidade da operação, como, por exemplo, substituição de

equipamentos obsoletos ou totalmente depreciados; (ii) crescimento, ou seja,

investimentos realizados visando aumentos de produção, produtividade, cesta de

produtos, etc. É importante ressaltar que investimentos em aquisições de subsidiárias

ou de outras empresas não fazem parte desta medida.

Este indicador é normalmente divulgado pelas empresas em seu

Demonstrativo de Origens e Aplicações de Recursos ou Demonstrativo de Fluxos de

Caixa, na seção de atividades operacionais. A tabela 4.6 apresenta o comparativo.

(em milhões de US$) 1999 2000 2001 2002 2003 CAGR

CVRD $265 $447 $595 $766 $1.543 55,3%

BHP Billiton ND ND 3.487 2.616 2.568 (14,2)Rio Tinto 776 818 1.351 1.296 1.533 18,6Anglo American 1.251 1.511 1.787 2.139 3.025 24,7

Mediana 776 818 1.569 1.718 2.056 21,6Média 764 925 1.805 1.704 2.167 21,1Fonte: Relatórios financeiros das companhias.

Tabela 4.6: Capex

Já o nível de capex é relação entre o capex e a receita líquida, ou seja, a

proporção da receita que a empresa aplica em investimentos operacionais, como

pode ser visto na tabela 4.7 a seguir.

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 46

1999 2000 2001 2002 2003 Evolução Média Mediana

CVRD 8,6% 11,4% 15,1% 18,6% 28,8% + 20,2 16,5% 15,1%

BHP Billiton ND ND 24,8 20,8 13,9 - 10,9 19,8 20,8Rio Tinto 10,8 10,4 16,6 15,3 16,6 + 5,8 13,9 15,3Anglo American 10,8 10,2 12,1 14,1 16,2 + 5,4 12,7 12,1

Mediana 10,8 10,4 15,8 17,0 16,4 + 5,6 15,2 15,2Média 10,1 10,6 17,1 17,2 18,9 + 8,8 15,7 15,8Fonte: Relatórios financeiros das companhias.

Tabela 4.7: Nível de Capex

Analisando as duas tabelas anteriores, pode-se constatar que a CVRD tem o

menor capex absoluto, mas com taxa robusta de crescimento (55%), inclusive

ultrapassando a RT em 2003.

Com relação ao nível de capex, a BHP tem as maiores média e mediana,

enquanto as outras três têm níveis similares. Entretanto, é interessante notar que em

2003 a CVRD apresentou uma taxa muito maior que a das outras três, o que pode

significar uma estratégia mais agressiva de crescimento, que só se refletirá no

resultado da empresa ao longo dos próximos anos.

4.3.2.5. ROE – Return on Equity (Retorno sobre o Patrimônio

Líquido)

Refere-se, como diz o nome, ao retorno obtido pela empresa com relação ao

seu patrimônio líquido, ou seja, sobre o capital investido pelos acionistas.

Usualmente, utiliza-se o lucro líquido como medida de retorno e o patrimônio líquido

divulgado no Balanço Patrimonial.

Apesar de ser amplamente utilizado, este indicador é muito criticado. Como

discutido anteriormente, o lucro líquido é um dado demasiadamente contábil, que

não reflete verdadeiramente a realidade da empresa. Outro problema é a utilização do

valor contábil do patrimônio líquido, que também não reflete o real valor do

investimento dos acionistas.

De qualquer maneira, é importante analisar este indicador (tabela 4.8), devido

ao seu grande nível de aceitação. Além disso, a utilização do mesmo critério para

todas as empresas torna a comparação consistente.

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 47

1999 2000 2001 2002 2003 Evolução Média Mediana

CVRD 8,2% 23,8% 27,7% 20,7% 31,7% + 23,5 22,4% 23,8%

BHP Billiton ND 18,1 12,9 12,2 17,9 - 0,2 15,3 15,4Rio Tinto 18,1 20,5 15,0 8,7 15,0 - 3,1 15,5 15,0Anglo American 9,6 12,6 23,7 9,6 7,8 - 1,8 12,7 9,6

Mediana 9,6 19,3 19,3 10,9 16,4 + 6,8 15,4 15,2Média 11,9 18,7 19,8 12,8 18,1 + 6,1 16,4 15,9Fonte: Relatórios financeiros das companhias.

Tabela 4.8: ROE

Uma análise da tabela anterior mostra claramente que a CVRD tem

historicamente o maior retorno do grupo, além de uma expressiva evolução entre

1999 e 2003, ao contrário das outras três, que apresentaram evolução negativa do

indicador.

4.3.2.6. ROA – Return on Assets (Retorno sobre o Ativo)

Refere-se, como diz o nome, ao retorno obtido pela empresa com relação ao

seu ativo total, ou seja, sobre todas as aplicações de recursos realizadas pela empresa.

Usualmente, utiliza-se o lucro líquido como medida de retorno e o ativo total

divulgado no Balanço Patrimonial.

Este indicador também é amplamente utilizado, especialmente como uma

medida da qualidade dos investimentos realizados pela empresa, como mostra a

tabela 4.9.

1999 2000 2001 2002 2003 Evolução Média Mediana

CVRD 4,6% 11,1% 13,5% 8,5% 13,5% + 8,9 10,3% 11,1%

BHP Billiton ND 7,7 5,7 5,2 7,8 + 0,1 6,6 6,7Rio Tinto 8,1 7,8 5,5 3,2 6,3 - 1,9 6,2 6,3Anglo American 5,8 6,4 12,5 4,7 3,6 - 2,2 6,6 5,8

Mediana 5,8 7,7 9,1 4,9 7,0 + 1,2 6,6 6,5Média 6,2 8,2 9,3 5,4 7,8 + 1,6 7,4 7,5Fonte: Relatórios financeiros das companhias.

Tabela 4.9: ROA

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 48

Uma análise da tabela anterior mostra, novamente, que a CVRD tem

historicamente o maior retorno do grupo, além de uma expressiva evolução entre

1999 e 2003, ao contrário das outras três, que apresentaram evolução negativa ou

marginalmente positiva do indicador.

4.3.2.7. ROCE – Return on Capital Employed (Retorno sobre o

Capital Empregado)

Refere-se, como diz o nome, ao retorno obtido pela empresa com relação ao

capital empregado na sua operação, medido pela soma entre dívida líquida (dívida

total menos caixa) e patrimônio líquido.

Diferentemente do ROE e do ROA, para o ROCE utiliza-se o lucro

operacional como medida de retorno. Esta diferença torna o ROCE um indicador

mais confiável e realístico que os dois anteriores, tendo inclusive maior aplicação

para avaliação de empresas e decisões de investimento, como mostrado na tabela

4.10 abaixo.

1999 2000 2001 2002 2003 Evolução Média Mediana

CVRD 14,8% 14,7% 14,2% 25,9% 19,7% + 4,9 17,9% 14,8%

BHP Billiton ND 15,0 11,8 12,1 15,4 + 0,4 13,6 13,6Rio Tinto 16,9 17,6 17,7 14,5 9,5 - 7,3 15,2 16,9Anglo American 8,1 12,4 17,1 10,9 6,5 - 1,6 11,0 10,9

Mediana 14,8 14,9 15,7 13,3 12,5 - 2,3 14,4 14,2Média 13,2 14,9 15,2 15,8 12,8 - 0,4 14,4 14,0Fonte: Relatórios financeiros das companhias.

Tabela 4.10: ROCE

Analisando a tabela anterior, pode-se perceber que CVRD e RT têm os

maiores retornos. Entretanto, a CVRD tem evoluido e registrado os maiores retornos

ao longo dos últimos anos, enquanto a RT viu seus retornos cairem quase pela

metade em cinco anos. A BHP apresentou os retornos mais estáveis, e a AA

novamente registrou os piores retornos.

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 49

4.3.3. WACC

Como discutido no capítulo 2, o WACC é o indicador utilizado para resumir

o custo de capital de uma empresa, que também é utilizado como taxa de desconto

para fluxos de caixa futuros e como referência para a taxa de retorno de projetos de

investimento, entre outras aplicações.

Dado que a motivação primária desse TF foi o alto custo de capital da CVRD,

é interessante compará-lo com o de seus peers.

Analisando a tabela 4.11 a seguir, comprova-se claramente a suspeita de que

o custo de capital da CVRD é realmente maior que o das outras três empresas.

Na média, a CVRD paga 5 pontos percentuais a mais por seu capital. Uma

análise mais aprofundada mostra que a diferença ocorre tanto para o capital próprio

quanto para o capital de terceiros. No primeiro caso, a diferença advém basicamente

do prêmio de risco político, enquanto no segundo o impacto vem, além do PRP,

também do maior spread de crédito e da menor taxa efetiva de impostos.

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 50

Data base: 31/12/2003 CVRD BHP Rio Tinto Anglo American

Mínimo Médio Máximo Mínimo Médio Máximo Mínimo Médio Máximo Mínimo Médio Máximo

CUSTO DE CAPITAL PRÓPRIO

Taxa livre de risco (U.S. Treasury de 30 anos) 5,2% 5,2% 5,2% 5,2% 5,2% 5,2% 5,2% 5,2% 5,2% 5,2% 5,2% 5,2%

Prêmio de risco do mercado de ações (a) 5,5% 6,5% 7,5% 5,5% 6,5% 7,5% 5,5% 6,5% 7,5% 5,5% 6,5% 7,5%

Beta (b) 0,61 0,61 0,61 0,82 0,82 0,82 0,83 0,83 0,83 0,65 0,65 0,65

Prêmio de risco do mercado de ações ajustado 3,4% 4,0% 4,6% 4,5% 5,3% 6,2% 4,6% 5,4% 6,2% 3,6% 4,2% 4,9%

Prêmio de risco político (a) 5,0% 6,0% 7,0% 0,0% 0,0% 0,0% 0,0% 0,0% 0,0% 0,0% 0,0% 0,0%

Total 13,5% 15,1% 16,8% 9,7% 10,5% 11,3% 9,7% 10,6% 11,4% 8,8% 9,4% 10,1%

CUSTO DE CAPITAL DE TERCEIROS

Taxa livre de risco (U.S. Treasury de 10 anos) 4,4% 4,4% 4,4% 4,4% 4,4% 4,4% 4,4% 4,4% 4,4% 4,4% 4,4% 4,4%

Spread de crédito (c) 3,2% 3,2% 3,2% 0,4% 0,4% 0,4% 0,3% 0,3% 0,3% 1,0% 1,0% 1,0%

Custo da dívida antes dos impostos 7,6% 7,6% 7,6% 4,8% 4,8% 4,8% 4,7% 4,7% 4,7% 5,4% 5,4% 5,4%

Taxa efetiva de impostos 18,0% 18,0% 18,0% 27,3% 27,3% 27,3% 27,1% 27,1% 27,1% 29,0% 29,0% 29,0%

Total 6,2% 6,2% 6,2% 3,5% 3,5% 3,5% 3,4% 3,4% 3,4% 3,8% 3,8% 3,8%

WACC 12,4% 13,7% 15,1% 8,7% 9,4% 10,0% 8,9% 9,6% 10,3% 7,5% 8,0% 8,5%

Fontes: Bloomberg e relatórios financeiros das companhias.Notas:(a) Estimado pelo Citigroup.(b) Beta semanal ajustado, período de 2 anos, Bloomberg.(c) Baseado no bond de 10 anos mais líquido da empresa.

24,7%(Dívida Total + Capitalização de Mercado)

13,7% 13,7% 24,7% 24,7%16,3% 16,3% 16,3% 13,7%Dívida Total

15,6% 15,6% 15,6%

Tabela 4.11: WACC

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 51

4.4. Conclusões

A coleta e a organização das informações apresentadas neste capítulo

contribuiram para embasar conclusões condizentes com as motivações e impressões

iniciais apresentadas na introdução desse TF. Foram introduzidos os conceitos de Custo

de Capital e WACC, abrindo espaço para seus cálculos e para uma análise mais

aprofundada envolvendo a CVRD e seus principais peers – BHP Billiton, Rio Tinto e

Anglo American. Também foram desenvolvidas análises de indicadores financeiros,

principalmente de rentabilidade, para as quatro mineradoras.

Além das considerações pontuais tiradas ao longo do capítulo, é interessante

avaliar as conclusões que podem ser tiradas agregando todas as análises realizadas. Isso

servirá como base para a continuação desse TF, que consistirá da análise aprofundada

que havia sido envisionada inicialmente.

Focando as atenções na Companhia Vale do Rio Doce, podem-se tirar duas

grandes considerações do que foi visto e analisado até agora: a CVRD realmente tem um

maior custo de capital que suas concorrentes diretas, e ainda assim consegue obter

melhores níveis de rentabilidade (e crescimento), como mostra a figura 4.9 abaixo.

8,0%

9,5%

13,7%

19,7%15,4%9,5%6,5%

Anglo American

Rio Tinto BHP Billiton

CVRD

6%

7%

8%

9%

10%

11%

12%

13%

14%

15%

0% 2% 4% 6% 8% 10% 12% 14% 16% 18% 20% 22% 24%

RO CE

WA

CC

5,7%

4,2%

13,2%

10,2%

4,3%

Elaborado pelo autor.

Figura 4.9: Retorno x Custo de Capital

Capítulo 4 – As Grandes Mineradoras Diversificadas 52

Em contato com especialistas em mercados de capitais e com traders18,

descobre-se que a CVRD enfrenta maiores dificuldades, quando comparada a seus peers

internacionais, para acessar e obter recursos de investidores, o que se reflete também no

seu alto custo de capital. A principal explicação para esta situação, como foi exposto no

Capítulo 2, é a restrição de rating imposta pelo teto soberano, que afeta até uma empresa

globalizada e com boa parte de suas receitas garantida por contratos de longo prazo em

dólares como a CVRD. A companhia vem trabalhando de forma continuada e agressiva

para se desvincular do Risco Brasil, sendo esta, atualmente, uma das maiores

preocupações de sua alta gerência.

Por outro lado, mesmo com essas dificuldades de financiamento, a CVRD tem

desempenho superior ao de seus peers. Isso já podia ser percebido através do

acompanhamento de relatórios emitidos pelos diversos bancos e corretoras que

acompanham a companhia e até pela evolução do preço da ação. Entretanto, foi

fundamental realizar uma análise mais completa dos indicadores financeiros, para

realmente entender e confirmar este fato.

O desempenho da CVRD, especialmente nos últimos anos, é expressivo.

Análises do seu histórico, desde a criação na década de 40 até os dias de hoje, das

estratégias adotadas e dos produtos oferecidos, aliadas a discussões importantes, como

com relação ao mercado global de metais e minérios, a dinâmica da CVRD com o

governo federal e posteriormente sua privatização, entre outras, fornecerão insumos para

um melhor entendimento da companhia como ela é hoje e suas perspectivas para o

futuro, que dá todas as indicações de ser extremamente promissor.

É fundamental, portanto, entender as razões pelas quais a Companhia Vale do

Rio Doce consegue ter um paradoxal melhor desempenho com maior custo de capital,

respondendo as questões que motivaram esse TF em primeiro lugar. O próximo capítulo

identificará os principais fatores que devem ser discutidos e irá a fundo em cada um,

com o objetivo de, ao final, fornecer um raio-x completo da CVRD, a segunda maior

empresa brasileira e quinta maior mineradora do mundo.

18 Nomenclatura utilizada para se referir aos profissionais que trabalham na negociação de ativos nos mercados de capitais.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 53

5. ANÁLISE DOS FATORES DE SUCESSO DA COMPANHIA

VALE DO RIO DOCE

“A Vale estatal desenvolveu e investiu muito dinheiro para tornar viáveis várias

operações: Carajás, alumínio, logística, Sistema Sul. Depois, com a privatização, a Vale

ganhou em eficiência e em produtividade. Agora está numa fase focada no crescimento,

que é uma fase de muito desafio [...]. O que mais me impressionou quando cheguei na

Vale foi a simpatia e determinação dos empregados. A Vale é uma empresa fantástica.

Ela pode cada vez mais projetar o Brasil lá fora. E é a memória que faz a personalidade

da empresa. Temos que, de alguma maneira, reverenciar os empregados, ex-

empregados e presidentes, porque foram eles que construíram a Vale. Hoje temos a

responsabilidade de estar construindo o futuro. É uma história de sucesso.”

Roger Agnelli, diretor-presidente (2001-presente)19

5.1. Introdução

A evolução da CVRD, desde sua criação na década de 40 até os dias de hoje,

mostra que a companhia passou por inúmeros momentos de definição, formando e

alterando suas características até transformar-se na gigante que hoje conhecemos.

Neste capítulo, serão identificados e analisados os principais desses momentos,

discutindo-se as decisões tomadas, suas motivações e suas repercussões. Também serão

analisados alguns fatores competitivos da companhia, muitos dos quais existem desde

sua criação, outros que foram sendo incorporados ao longo dos anos.

Antes de iniciar, é importante destacar que muitos dos fatores que influenciaram

a CVRD têm diversas motivações políticas, econômicas e sociais. Não é o intuito desse

trabalho analisá-las, mas apenas entender a influência destes fatores sobre a empresa.

Entretanto, caso mostre-se necessário, eles serão contextualizados e discutidos.

19 Histórias da Vale (2002, p. 256).

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 54

5.2. Fatores Históricos

A história da CVRD, desde sua criação até os dias de hoje, pode ser dividida em

alguns períodos com características distintas entre si:

• Criação: período até a criação em 1942, marcado por grandes dificuldades para o

estabelecimento da companhia ;

• 1942-1950: período marcado por grande fragilidade operacional, comercial,

financeira e organizacional, quando a companhia batalhou para estabelecer

condições mínimas de operação;

• 1951-1967: período no qual a CVRD adotou uma postura orientada para o

mercado externo, estabelecendo as condições necessárias para se transformar

numa grande exportadora;

• 1968-1978: período marcado por grande expansão e diversificação, oscilações no

mercado (demanda e preços de minérios e metais) e relativa influência

governamental;

• 1978-1990: período no qual a CVRD se redefiniu e se reestruturou como um

conglomerado empresarial;

• 1990-1997: período de evolução da companhia, sustentada em projetos e

operações sólidas;

• 1997-hoje: período pós-privatização, marcado por grandes ganhos de

produtividade e eficiência, além do posicionamento competitivo para crescer

sustentavelmente nos anos seguintes.

Em cada um destes períodos podem-se identificar fatores importantes para o

sucesso e para a evolução da CVRD. Muitos deles serão discutidos em mais detalhes nos

tópicos seguintes, tanto individualmente quanto com relação às suas inter-relações.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 55

5.2.1. Período de Criação

A criação da CVRD foi influenciada tanto pela conjuntura interna quanto pela

conjuntura externa no início da década de 40.

No plano interno, sua criação fez parte do impulso governamental de criar

estatais nos setores definidos como de interesse nacional estratégico, tais como

mineração, siderurgia, energia elétrica e petróleo. Ao mesmo tempo, o Governo

estabelecia diversas restrições aos investimentos estrangeiros nestes setores,

inviabilizando seu desenvolvimento a não ser que pela via estatal, considerando a fraca

elite industrial que existia no país na época.

Mais especificamente na atividade de mineração, ao final da década de 30 já

haviam sido estabelecidos sua regulamentação e seu arcabouço jurídico completos, que

exigiam a nacionalização da posse e da operação de toda e qualquer lavra e proibiam a

participação de estrangeiros na atividade, entre outras coisas.

Neste contexto, o grande impedimento que ainda restava para a criação de uma

mineradora nacional de minério de ferro no Brasil (situação que se mantinha pendente

desde o início do século XX) era a idéia de que deveria obrigatoriamente haver uma

integração vertical com a atividade siderúrgica. Isto foi resolvido com a criação, em

1941, da Companhia Siderúrgica Nacional (“CSN”).

Já no plano externo, o fator decisivo para a criação da CVRD foi a Segunda

Guerra Mundial. Nesta conjuntura mundial, o Governo brasileiro negociou habilmente e

estabeleceu, em conjunto com os Governos dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha, os

denominados Acordos de Washington, cujos objetivos primoridias seriam a cooperação

mútua nos esforços de guerra e a promoção da exploração econômica de recursos

naturais no Brasil.

No que tange à CVRD, os Acordos de Washington estabeleceram as condições

para sua criação e viabilidade, segundo três pontos básicos: investimentos, através da

incorporação de ativos já existentes; financiamentos, a serem fornecidos pelo Export-

Import Bank (“Eximbank”) americano; e contratos de compra, garantidos pelos

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 56

governos americano e britânico, que tinham grande demanda por minério de ferro em

meio aos esforços de guerra.

Assim, em 1o de junho de 1942, através do Decreto-Lei 4.352, era criada a

Companhia Vale do Rio Doce. Pelo decreto-lei, deveriam ser encampadas a Companhia

Brasileira de Mineração e Siderurgia, a Companhia Itabira de Mineração e a Estrada de

Ferro Vitória a Minas (“EFVM’). Além disso, seriam disponibilizados US$14 milhões

em empréstimos do Eximbank e seriam firmados contratos de fornecimento de até 1,5

milhão de toneladas/ano por 3 anos, renováveis (pelos compradores) até o final da

guerra20.

Apesar do grande componente político da criação da CVRD, a principal

característica que deve ser observada aqui é a presença do complexo mina-ferrovia-porto

desde o início, mesmo tendo sido criado “sem querer” pelo Governo, no que se provou,

segundo Linhares21, “um clique de genialidade”. Este complexo integrado utilizado pela

companhia foi fundamental para sua existência, como será discutido em maior

profundidade no item 5.3.1.1.

5.2.2. Período de 1942 a 1950

Logo no início de sua existência, a CVRD enfrentou muitas dificuldades,

basicamente nos seguintes aspectos:

• Operacional: apesar de ter “herdado” toda a estrutura necessária para sua

operação, esta estrutura não estava em boas condições, devido principalmente à

extensa obsolescência dos equipamentos. Isso exigiu um completo

reaparelhamento das minas e dos portos, além da capacitação da ferrovia para o

transporte de minério;

• Comercial: como os contratos de fornecimentos foram pré-estabelecidos nos

Acordos de Washington, a companhia não se preocupou em criar uma estrutura 20 Apesar de garantir a demanda para o minério extraído, estes contratos foram negociados a preços muito abaixo dos valores de mercado. 21 Histórias da Vale (2002, p. 35).

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 57

comercial que suportasse sua operação, o que praticamente inviabilizou as

vendas uma vez que a guerra terminou e a demanda por minério de ferro reduziu-

se drasticamente. Assim, tornou-se necessário o uso de intermediários para

vendas, mesmo com isso significando a obtenção de preços abaixo dos praticados

pelo mercado;

• Financeiro: apesar do empréstimo de US$14 milhões fornecido pelo Eximbank,

esta quantia não foi suficiente para atender os investimentos necessários. Além

disso, o Governo Federal dava maior importância à CSN no período, fornecendo

pouco apoio à CVRD. O pagamento de juros do empréstimo também “amarrou”

a companhia por muitos anos;

• Organizacional: condicionada ao empréstimo do Eximbank estava a presença de

representantes americanos na diretoria da CVRD. Como seus interesses eram

completamente diferentes daqueles dos brasileiros, a companhia enfrentou

grandes dificuldades na realização de investimentos e na gestão do seu dia-a-dia.

Entretanto, ao final da década a CVRD já havia avançado muito no sentido de

solucionar seus principais problemas, efetuando melhorias no complexo mina-ferrovia-

porto e obtendo um superávit em 1950 suficiente para cobrir os déficits acumulados.

Estas ações foram fundamentais para a sobrevivência da companhia.

Além dessas ações, alguns outros fatores foram importantes para a sobrevivência

da companhia neste período, como o novo empréstimo obtido com o Eximbank (US$7,5

milhões), o aumento de capital realizado pelo Governo brasileiro e a grande vitória

obtida na disputa de poderes com os representantes do Eximbank (motivada

principalmente pelo sentimento nacionalista que desejava que a estatal fosse 100%

nacional). Também foi importante a gradual melhoria da demanda e dos preços do

minério de ferro nos mercados internacionais.

Outro ponto válido de se mencionar é a grande autonomia desfrutada pela

CVRD, ao contrário do que normalmente era verificado nas estatais. Este é um fator

importante que já se manifestava desde a criação da companhia, e será melhor discutido

no item 5.3.2.1.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 58

Silva (2001, p. vii) afirma que uma análise mais aprofundada do período

demonstra “as estratégias e ações levadas a efeito pelos dirigentes brasileiros, na

empresa, no sentido de manter tanto a sobrevivência da estatal, em condições que eram

muito adversas, como, sobretudo, garantir que o controle, a direção da empresa,

permanecesse nacional”.

5.2.3. Período de 1951 a 1967

Nesse período, a CVRD adotou uma nova postura, totalmente voltada para o

mercado externo, o que acabou permitindo que ela se tornasse a maior exportadora de

minério de ferro do mundo em meados da década de 70. Para atingir este objetivo, era

necessário à companhia adquirir alta eficácia técnico-operacional e desempenho

competitivo, o que gerou pressões e demandas internas que resultaram numa forte auto-

regulação e numa cultura empresarial voltada para eficiência e lucratividade.

Com a companhia já em situação estável, a Guerra da Coréia em 1951 emergiu

como uma grande oportunidade. Neste momento iniciou-se uma virada comercial, na

qual foram adotadas diretrizes agressivas para a venda do minério de ferro. Os

resultados desta política foram o aumento substancial das vendas e a diversificação dos

mercados atendidos pelas exportações. Ao final da década de 50, a CVRD já havia

consolidado sua posição no mercado mundial de minério de ferro.

O aumento das vendas, por sua vez, subsidiou um aumento significativo dos

investimentos. Os principais realizados nesse período foram relacionados à

modernização do complexo mina-ferrovia-porto, através da mecanização da atividade

mineradora, da contínua melhoria da produtividade, da redução dos acidentes na

ferrovia22, da construção de novos terminais portuários e da melhoria das operações

portuárias.

Outro fator fundamental para o desenvolvimento futuro da companhia, e que

nasceu nesse período, foi a crescente importância dada aos investimentos em

22 Utilizando uma ferrovia americana como benchmark, a CVRD transformou a EFVM em uma das melhores ferrovias do mundo.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 59

desenvolvimento tecnológico e de novos produtos. Destacam-se aqui uma maior

utilização das graduações de minério finos e ultra-finos e uma maior customização dos

produtos para os clientes cativos.

Entretanto, as principais ações do período ocorreram na década de 60, com

destaque para a indicação de Eliezer Batista à presidência da companhia. Sob sua gestão

foram implementados ou concebidos, com destaque:

• Contratos de longo prazo: negociações com clientes (principalmente japoneses e

alemães) evoluíram para a constituição destes contratos, fundamentais na história

da CVRD;

• Vínculos com os países clientes: mais que os contratos, a associação de longo

prazo com capitais oriundos dos países-clientes e o estabelecimento de

subsidiárias para venda direta nestes países estreitaram os laços entre a CVRD e

seus clientes, garantindo demanda futura para seu minério;

• Verticalização da atividade: além das operações do complexo mina-ferrovia-

porto, a CVRD passou a realizar também o transporte marítimo23 e a

comercialização dos produtos (sendo uma das primeiras mineradoras do mundo a

ter uma área internacional de comercialização, reduzindo sua dependência de

traders24). Isso foi fundamental para reduzir os custos da operação e tornar o

produto mais competitivo frente aos concorrentes, a maioria deles em melhor

localização geográfica com relação aos principais mercados consumidores. Isso

também permitiu à CVRD maiores independência e flexibilidade;

• Construção do Porto de Tubarão: após o estabelecimento dos contratos de longo

prazo com as siderúrgicas japonesas, descobriu-se que estes só teriam viabilidade

econômica se fossem utilizados navios com capacidade muito maior que os

existentes no período. A construção deste porto visou a acomodação destes

navios25, e só ocorreu graças ao apoio do Ministério da Fazenda;

23 Através da DOCENAVE, subsidiária de navegação criada em 1961. 24 Intermediários para a venda dos produtos. 25 A relação da CVRD com os japoneses revolucionou a navegação mundial, principalmente o transporte de produtos em grandes volumes, como minérios, carvão e petróleo. Neste período foram construídos os primeiros mega-graneleiros e minero-petroleiros, que hoje dominam o comércio marítimo mundial.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 60

• Carga de retorno: para reduzir ainda mais os custos de frete, foram estabelecidos

contratos com algumas siderúrgicas brasileiras e com a Petrobras para que os

navios que levavam o minério da CVRD para o Oriente retornassem trazendo

cargas de carvão siderúrgico (principalmente da Austrália) ou de petróleo (do

Oriente Médio);

• Estrito cumprimento de prazos: mesmo localizada a grande distância, a CVRD

adquiriu ampla confiança dos seus clientes, o que também contribuiu para o

estabelecimento de uma sólida base de clientes;

• Trabalho à base do conhecimento de custos: a CVRD foi pioneira nesta

atividade, dada a necessidade de um estrito controle de custos para o aumento

das margens de lucro, já que os contratos tinham preços referenciados em

contratos internacionais;

• Diversificação dos produtos: dedicou-se muita atenção às demandas específicas

dos clientes e às constantes mudanças nas tendências de mercado. Daqui

surgiram os estudos para a implantação das usinas de pelotização a partir do

início da década de 70;

• Reforma administrativa: por fim, empenhou-se na realização de uma ampla

reforma administrativa na companhia, visando prepará-la para as constantes

mudanças no mercado internacional e para suas grandes perspectivas de evolução

no futuro. O grande destaque foi a criação da divisão de desenvolvimento, em

1962.

Pelo que foi descrito anteriormente, pode-se perceber que a CVRD deu um

grande salto nas décadas de 50 e 60, e ainda se preparou cuidadosamente para o futuro.

A companhia conseguiu estabelecer políticas e ações corretas nos momentos certos, o

que permitiu obter crescentes retornos (largamente reinvestidos nas operações próprias)

e passar sem dificuldades pelas oscilações frequentes do mercado.

Além disso, o estabelecimento dos contratos de longo prazo, a vinculação com os

países clientes e a verticalização das operações permitiram uma maior previsibilidade e

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 61

garantia de fluxos financeiros, que por sua vez permitiram a programação de maiores e

melhores investmentos com relativa antecedência.

Em resumo, pode-se dizer que a CVRD saiu do período com sua posição

estabelecida no mercado mundial de minério de ferro, com uma estratégia sólida e

promissora de crescimento e com uma estrutura que garantia uma robusta capacidade

para enfrentar crescentes desafios.

5.2.4. Período de 1968 a 1978

Neste período, a CVRD foi muito influenciada por uma força que praticamente

desconhecia até então: o Governo. Após o golpe militar de 1964, o novo Governo tratou

de dar mais atenção à companhia, ao mesmo tempo que a usaria como instrumento de

desenvolvimento regional, nos âmbitos econômico e social (através, principalmente, dos

dois Planos Nacionais de Desenvolvimento). O grande problema desta política

governamental foi que os projetos nem sempre eram economicamente viáveis ou

recomendáveis, o que acabou “sugando” os recursos da companhia e contribuindo para

seu alto nível de endividamento ao final da década de 70, já que na segunda metade

desta década a indústria mundial do aço passou por uma grave crise, reduzindo a sempre

crescente geração de recursos.

Por outro lado, o Governo militar decidiu dedicar suas atenções também para a

atividade mineral como um todo. Dentro deste novo direcionamento político, podem-se

identificar como principais pontos: (i) maior regulamentação do setor, especialmente

após a criação do Ministério das Minas e Energia e com a reorganização do

Departamento Nacional de Produção Mineral (“DNPM”); (ii) estímulo à iniciativa

privada, através da concessão de licenças de pesquisa e exploração; (iii) encorajamento

dos investimentos e financiamentos privados; e (iv) interesses em promover um rápido

aumento do conhecimento do subsolo brasiliero e de intensificar a exploração das

jazidas já conhecidas.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 62

Do lado positivo, o principal efeito deste novo contexto sobre a CVRD foi a

possibilidade de efetivamente realizar os investimentos planejados na década de 60,

tanto os necessários (de manutenção) como os desejados (de crescimento), aproveitando

também as condições favoráveis do mercado internacional de minério de ferro do

começo da década.

Então, a companhia começou a diversificar suas operações, com os objetivos

principais de reduzir sua exposição e dependência exclusiva do minério de ferro e de

alavancar seu vasto conhecimento adquirido em exploração mineral. Os primeiros

projetos foram nas áreas florestal e de papel e celulose, com a criação da subsidiária

Florestas Rio Doce e da joint venture Cenibra (com o capital japonês). Também foram

desenvolvidos projetos nas áreas de alumínio, manganês, titânio e fertilizantes.

No segmento de minério de ferro, os principais investimentos realizados neste

período, além dos necessários em tecnologia de operação e beneficiamento, foram nas

usinas de pelotização. A companhia aproveitou-se da crescente demanda por este

produto e de seu avançado conhecimento no beneficiamento do minério para construir

algumas destas usinas, concebidas na década de 60 para entrar em operação a partir da

década de 70. O mais interessante, no entanto, foi o modelo utilizado para essas

empreitadas: as joint ventures. Após construir duas usinas próprias na região do porto de

Tubarão, a CVRD, com recursos em falta para atender às crescentes demandas do

mercado, aproveitou-se de sua grande credibilidade e confiança com alguns clientes para

constituir joint ventures e construir mais quatro usinas:

• Itabrasco: em conjunto com a italiana Italsider, começou a operar em 1977 com

capacidade de 3 milhões de toneladas por ano;

• Nibrasco: em conjunto com a japonesa Nippon Steel (e algumas outras

siderúrgicas japonesas), começou a operar em 1978 com capacidade de 6 milhões

de toneladas por ano em duas usinas;

• Hispanobrás: em conjunto com a espanhola INI, começou a operar em 1979 com

capacidade de 3 milhões de toneladas por ano;

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 63

O racional por trás da implatação das usinas de pelotização deve ser enfatizado.

A CVRD resolvia seu problema de transformar o que até então eram simples rejeitos

(minérios finos e ultra-finos) em produtos para exportação com maior valor agregado

que o minério in natura, e com mercados cativos assegurados previamente (os próprios

parceiros). Além disso, ao mesmo tempo que estimulava a ampliação do mercado

interno para absorção de sua produção, a companhia potencializava o uso de sua infra-

estrutura de serviços ferroviários e portuários. Isso tudo compartilhando riscos e

investimentos.

Do lado dos sócios estrangeiros, as vantagens estavam na fonte segura de

suprimento de matéria-prima de longo prazo, no produto com melhor rendimento nos

alto-fornos e no desconto sobre os preços praticados pelo mercado. Isso tudo além das

vantagens fiscais oferecidas pelo Governo brasileiro, tornando ainda mais vantajosos os

investimentos.

Influenciada pelas crescentes iniciativas de diversificação da sua cesta de

produtos e pelos interesses governamentais em conhecer melhor o subsolo do país, e

pressionada pelo rápido avanço das descobertas que vinham sendo realizadas por

mineradoras estrangeiras, em 1971 a CVRD criou a Rio Doce Geologia e Mineração

(“Docegeo”), que seria seu braço de prospecção e pesquisa de novas jazidas. Esta nova

empresa não foi criada como uma mera formalidade, já que foram contratados os

melhores profissionais do mercado, com altos salários, visando resultados concretos a

médio e longo prazos, como será comprovado mais à frente.

Entretanto, as grandes descobertas minerais do período não foram resultado

destas iniciativas: (i) minério de ferro na região de Carajás (leste do estado do Pará),

realizada pela americana U.S. Steel em 1967; e (ii) bauxita metalúrgica no rio Trombetas

(norte do estado do Pará), realizada pela canadense Alcan em 1966. Mesmo assim, elas

influenciaram profundamente a CVRD a partir de meados da década de 70 até os dias

atuais. Ambas merecem análises à parte, que serão feitas nos itens 5.3.1.3.1 e 5.3.1.3.2,

respectivamente.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 64

5.2.5. Período de 1978 a 1990

No decorrer dos anos 80, como resultado da política de diversificação de

atividades implementada na década anterior, a CVRD consolidou um novo perfil

empresarial. Além de manter-se na posição de maior exportadora mundial de minério de

ferro, a companhia transformou-se num dos maiores conglomerados empresariais do

país, industrializando e exportando diversas matérias-primas de origem mineral e

vegetal, além do minério de ferro.

A conjuntura na qual a companhia estava inserida no início deste período era de

crise econômica no país e na indústria mundial do aço. Neste contexto, os grandes

investimentos que vinham sendo realizado e as novas decisões que vinham sendo

tomadas, especialmente no que tange a Carajás, tornam-se suspeitas. Mesmo assim, a

mentalidade e a cultura da companhia levaram os investimentos adiante, o que provou-se

extremamente fortuito quando se olha a posteriori.

Segundo Mascarenhas (1987, p. 14) apud Silva (2001, p. 177), em 1987 a

companhia enfrentava uma gama de desafios: “Hoje, englobamos sob o desafio maior,

que é o de tornar a Vale do Rio Doce cada vez mais pujante, uma série de desafios

menores e que enfrentamos com a mesma confiança de sempre: o desafio do mercado,

mercados que se estabilizam ou diminuem terão que ser estimulados ou novos

encontrados, seja através de uma abertura maior para os países em fase de

industrialização, seja ampliando os reforços comerciais naquelas áreas onde a empresa já

atua ou venha a atuar buscando produtos de maior densidade econômica – maior valor

agregado – e tecnológica, explorando novas fronteiras na tecnologia dos metais; o

desafio tecnológico – estamos na área das inovações e o novo de hoje já é o velho de

amanhã. A Vale sabe disso e possui em Belo Horizonte o que talvez seja um dos

melhores laboratórios de pesquisa do País; o desafio mineral, trabalhando em todo o

Brasil para revelar, estudar, avaliar e criar novas riquezas do subsolo do país e novos

pólos de desenvolvimento regional; o desafio financeiro, de administrar com os

recursos disponíveis um programa de atividades racionalmente concebido; o desafio

humano, de manter o entusiasmo dos nossos empregados, uma equipe treinada e

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 65

experiente, que contribui, direta ou indiretamente para o engrandecimento da Vale, com

a convicção de que pode enfrentar desafios maiores”.

Em resumo, pode-se dizer que este período foi tomado pela concepção,

construção e início das operações de dois dos principais sistemas operacionais da

CVRD, o Sistema Norte de minério de ferro em Carajás e o Complexo bauxita-alumina-

alumínio.

5.2.6. Período de 1990 a 1997

No contexto operacional, este período não foi muito significativo em termos de

mudanças. A companhia continuou sua estratégia de realizar contínuas melhorias

operacionais, especialmente nos sistemas que haviam acabado de ser inaugurados ao

final da década anterior. Também continuou expandindo para outros produtos, como

conseqüência da arrojada estratégia de pesquisas geológicas e tecnológicas realizadas

nos anos 70, com a criação da Docegeo. Além disso, nos anos de 1992 e 1993 a

companhia adquiriu participações estratégicas em três siderúrgicas recém privatizadas

(CST, Açominas e CSN), com o objetivo de garantir demanda para seus produtos

também no mercado interno.

Já no contexto administrativo, este período marcou o início de mudanças

significativas. A crise interna enfrentada em 1987, após a conclusão do projeto minério

de ferro em Carajás, exibiu as principais fraquezas da companhia. Assim, em 1990

iniciou-se um profundo processo de otimização e profissionalização da estrutura

administrativa, que apesar de ter sempre sido gerida como uma empresa privada, ainda

apresentava alguns traços de estatal. Conforme as reformas avançavam, pode-se dizer

que a companhia estava sendo preparada para a grande virada de sua história: a

privatização.

Em 1o de junho de 1995, a CVRD foi incluída no Plano Nacional de

Desestatização. Os meses seguintes foram marcados por conturbadas polêmicas e

críticas a esta decisão de diversos setores da sociedade civil, sendo o principal

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 66

argumento centrado na lucratividade e eficiência da companhia, não havendo

necessidade ou urgência para sua venda. Mesmo assim, em 10 de outubro de 1996 foi

aprovado o modelo de desestatização, que seria constituído de três etapas:

1. leilão de um lote entre 40% e 45% das ações ordinárias, a ser adquirido por um

grupo de no mínimo três investidores que passariam a controlar a companhia26;

2. os empregados da CVRD poderiam adquirir 10% das ações da União,

correspondentes a 5,1% do capital total;

3. seria vendido em oferta pública, no Brasil e no exterior, o restante das ações

pertencentes ao governo27.

Em 6 de março de 1997, o BNDES divulgou o edital de privatização, fixando o

preço mínimo de venda. Após uma série de adiamentos, principalmente devido a

protestos, recursos e liminares perpretados na Justiça, em 6 de maio de 1997 o

Consórcio Brasil, liderado pela CSN28, venceu o leilão arrematando 41,73% das ações

ordinárias do Governo Federal pelo montante de US$3,338 bilhões29. A partir deste

momento a história da CVRD seria mais uma vez profundamente alterada.

5.2.7. Período de 1997 até hoje

Apesar da permanente gestão autônoma e orientada para o mercado externo,

visando a eficiência e a rentabilidade, a CVRD nunca deixou de ser estatal, e de carregar

consigo alguns dos fardos desta característica. Foi a partir da privatização que tudo

mudou.

Mesmo após completada a operação, as críticas não paravam de surgir. Muitos

reclamavam que o Governo estava se desfazendo de um patrimônio nacional, outros

26 Este grupo deveria ser de capital majoritariamente nacional. É importante ressaltar também que o Governo instituiu a criação da “golden share”, que lhe dá poder de veto sobre algumas questões específicas na companhia. 27 Esta etapa acabou se concretizando a partir de fevereiro de 2002. 28 E também composto pelos fundos de pensão do Banco do Brasil (Previ), da Petrobras (Petros), da CESP (Fundação Cesp) e da Caixa Econômica Federal (Fundef), e pelos bancos Opportunity e Nations Bank. 29 Valor que avalia a companhia como um todo em aproximadamente US$11 bilhões.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 67

afirmavam que, além da dimensão econômico-financeira, uma avaliação justa da

companhia deveria levar em consideração também fatores sociais, políticos,

tecnológicos, culturais e ambientais, e mais inúmeras críticas.

Por outro lado, os argumentos favoráveis à privatização também eram robustos.

Os principais giravam em torno de basicamente duas idéias: em primeiro lugar, o

Governo Federal não tinha recursos para investimentos na modernização de

equipamentos e de técnicas produtivas, o que prejudicaria seriamente a competitividade

da CVRD. Além disso, a companhia privatizada ganha em flexibilidade operacional,

competitividade e eficiência, o que, no futuro, se reverte em maiores receitas, lucros,

impostos e empregos.

E isso é o que realmente ocorreu. A CVRD deu um salto de qualidade já nos seus

primeiros anos como empresa privada, o que se refletiu (e continua se refletindo) nos

seus resultados, como pôde ser visto nos capítulos anteriores.

Na área administrativa, foram aprofundadas as iniciativas de otimização da

estrutura organizacional e foram introduzidas práticas de gestão mais eficientes e

eficazes. Também iniciou-se um processo de transformação do comportamento dos

funcionários, na tentativa de torná-los mais focados em performance. Além disso, foram

adotadas as melhores práticas para gestão estratégica e seleção de projetos, sempre

baseada em critérios rigorosos e retornos obrigatoriamente superiores ao elevado custo

de capital da companhia. O melhor exemplo é a taxa de retorno mínima estabelecida,

atualmente, em 15%, para qualquer projeto ser aprovado.

A CVRD também participou da tendência de concentração através de fusões e

aquisições da atividade de exploração de minério de ferro, perspectiva demonstrada pela

organização do setor em escala internacional. Destacam-se as aquisições de Caemi,

Ferteco, Samarco / Samitri, Socoimex, GIIC, SIBRA e CPFL. Com exceção das 3

últimas (que visam diversificação), todas tinham sinergias com as operações existentes

da CVRD no Sistema Sul, seja por proximidade geográfica, por utilização da mesma

infra-estrutura de transportes, pelo relacionamente com clientes, ou por outros motivos.

Além do minério de ferro, a companhia também passou a investir na geração de

energia e ampliou os investimentos na logística de transporte de cargas não só para os

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 68

produtos próprios como também para produtos de terceiros. Avançaram também os

investimentos em minerais não-ferrosos, com destaque para o cobre e para os produtos

da cadeia do alumínio. Ao mesmo tempo, a companhia começou a se desfazer de

investimentos não considerados centrais – como papel e celulose, fertilizantes e

siderurgia –, acumulando recursos para aquisições e outros investimentos. A tabela 5.1

mostra todas as aquisições e vendas feitas pela CVRD no período de 2000 a 2004.

Aquisições Vendas

Empresa Negócio Valor (US$ mi) Empresa Negócio Valor (US$ mi)Socoimex Mineração - ferro $48 Açominas Siderurgia $10Samitri / Samarco Mineração - ferro 710 CSN Siderurgia 260GIIC Pelotas 92 Bahia Sul Celulose e Papel 320Ferteco Mineração - ferro 566 Cenibra Celulose 671Belém Mineração - holding 25 Rio Doce Portuário 10Sossego Mineração - cobre 43 Navios Docenave Navegação 63Caemi (50%) Mineração e logística 279 Florestas Rio Doce Madeira 52Salobo Mineração - cobre 51 Fazenda Brasileiro Mineração 21Alunorte Alumina 42 Fosfértil Fertilizantes 84MVC Mineração - bauxita 2 Navios Docenave Navegação 36Rana Ferro-ligas 18 CST Siderurgia 578CST Siderurgia 60Caemi (50%) Mineração e logística 426

2,362 2,105Fonte: Apresentações da empresa e relatórios de analistas independentes.

Tabela 5.1: Atividade de Fusões e Aquisições da CVRD entre 2000 e 2004

Atualmente, os principais objetivos da CVRD visam posicioná-la entre as

grandes mineradoras diversificadas do mundo. A companhia não tem medido esforços

para alcançá-las em termos de variedade de produtos, receita e influência. Segundo

analistas, a companhia tem boas chances de atingir um rápido crescimento dados seus

relativamente baixos custos e a ampla riqueza mineral oferecida pela Brasil, aliadas à

alta rentabilidade da companhia (parcialmente obtida devido às receitas em dólares, que

fornecem um hedge natural aos custos, quase totalmente em reais).

As prioridades da CVRD continuam sendo investir em mineração e logística,

sem se desviar muito de seus segmentos centrais (core businesses). A companhia

também pretende focar no crescimento orgânico de suas atividades antes de buscar

novas aquisições, dada a alta qualidade das reservas no Brasil e a busca por reservas de

nível global ao redor do mundo.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 69

5.3. Fatores Competitivos

Conforme foi mostrado no item 5.2, a CVRD foi muito influenciada por

conjunturas políticas, econômicas e sociais ao longo de sua história de mais de 60 anos.

A apresentação dos fatores históricos em ordem aproximadamente cronológica destaca a

importância do timing de suas ocorrências, especialmente as decisões acertadas tomadas

em momentos críticos.

Além disso, a CVRD também foi intensamente influenciada por uma gama de

fatores competitivos, que moldaram e direcionaram suas decisões, estrutura,

desenvolvimento e evolução. Assim, este tópico visa identificar e abordar os principais

dentre estes fatores.

Para uma melhor priorização dos fatores, será aplicada a forma de divisão

utilizada por Hill (1993)30, que diferencia entre critérios ganhadores de pedidos e

critérios qualificadores.

5.3.1. Fatores Ganhadores de Pedido

São os fatores que direta e significativamente contribuem para a realização de um

negócio. São, portanto, os aspectos mais importantes da forma como uma empresa

define sua posição competitiva. No caso desse TF, os fatores ganhadores de pedidos são

aqueles considerados fundamentais para o sucesso e para a posição de destaque da

CVRD na indústria da mineração.

30 HILL, T. Manufacturing strategy. 2. ed. Macmillian, 1993. apud Slack (1996, p. 79).

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 70

5.3.1.1. Complexo Mina-Ferrovia-Porto

Desde sua criação, a CVRD pôde usufruir desta característica diferenciada, que

foi fundamental para seu sucesso. Ao operar todo seu sistema produtivo até, no mínimo,

o embarque do produto no navio (às vezes até a porta do cliente), a companhia tem

controle total também sobre seus custos, o que é fundamental numa atividade onde os

preços são estabelecidos, em geral, pelo mercado ou por contratos.

Inclusive, a CVRD é uma das “... poucas empresas mineradoras que conseguiu

integrar todas as operações necessárias à sua atividade sob comando próprio e único, da

mina à porta do cliente, usando minério, transportes, portos, navios e serviços

integralmente seus”31.

Assim, ao longo dos anos, a necessidade de redução de custos através de

melhorias operacionais e ganhos de produtividade era atendida com muito mais eficácia,

exatamente pelo fato da companhia não depender de terceiros ao longo do processo

produtivo (neste caso, o transporte é tão importante que também é considerado parte do

processo produtivo).

Há ainda outro ângulo para se analisar o mérito da CVRD nesta decisão

estratégica. A companhia transformou uma de suas principais fragilidades – a grande

distância geográfica com relação a seus principais mercados consumidores – em força,

ao possuir e operar um dos sistema logísticos mais eficientes do mundo, construído com

pesados investimentos realizados continuamente através dos anos.

Num passado mais recente, essa vantagem foi ainda mais potencializada. Com os

vultosos investimentos realizados na infra-estrutura ferroviária e portuária, a CVRD

dispunha de alguma capacidade ociosa para vender. Com as reformas administrativas,

especialmente as dos anos 90, esta capacidade começou a ser explorada com maior

empenho, já que foi percebido seu grande potencial de receita. Hoje, a companhia já é a

maior empresa de logística de transportes e portuária do país, sendo que tudo começou

com a gestão integrada da produção com o transporte do minério.

31 VIANA, Agripino A. (presidente da CVRD: 14-9-1987 a 20-4-1990). CVRD – A opção pela via tecnológica. CVRD – Revista, v. 8, num. 29, p. 3-10, dez. 87 (palestra proferida na FIESP, em novembro de 1987, em encontro promovido pelo IBRAM). apud Silva (2001, p. 173).

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 71

5.3.1.2. Qualidade das Jazidas e dos Produtos

Como consequência de alguns dos fatores discutidos neste capítulo, além de

outros externos, a CVRD pode usufruir hoje de jazidas de alta qualidade e oferecer

produtos de alto valor agregado.

Com relação às jazidas, o principal destaque são as localizadas no norte do país,

como Carajás (ferro), Paragominas (bauxita), Sossego (cobre), entre outras. As reservas

de ferro de Carajás, por exemplo, são consideradas as melhores do mundo no segmento,

tanto pelo seu tamanho (estimativas atuais falam em 18 bilhões de toneladas) quanto por

sua concentração média de ferro (67%), uma das mais altas já descobertas. A figura 5.1

demonstra a superioridade das jazidas da CVRD contra seus principais concorrentes32:

Ferro

57.5%

58.4%

58.8%

63.4%

63.6%

66.6%

67.6%

Robe River(Rio Tinto)

BHP Yandi(BHP)

HI Yandi(BHP)

Mt. Newman(BHP)

Hamersley(Rio Tinto)

Itabira(CVRD)

Carajás(CVRD)

Fósforo

0.042%

0.040%

0.050%

0.071%

0.072%

0.023%

0.034%

Silica e Alumina

7.5%

6.3%

5.8%

6.3%

5.3%

3.9%

1.4%

Fonte: Santander Investments.

Ferro

57.5%

58.4%

58.8%

63.4%

63.6%

66.6%

67.6%

Robe River(Rio Tinto)

BHP Yandi(BHP)

HI Yandi(BHP)

Mt. Newman(BHP)

Hamersley(Rio Tinto)

Itabira(CVRD)

Carajás(CVRD)

Fósforo

0.042%

0.040%

0.050%

0.071%

0.072%

0.023%

0.034%

Silica e Alumina

7.5%

6.3%

5.8%

6.3%

5.3%

3.9%

1.4%

Fonte: Santander Investments.

Figura 5.1: Composição mineral de certas jazidas de minério de ferro

A qualidade das jazidas também pode ser avaliada pelo seu custo de exploração.

Neste sentido, a CVRD é muito privilegiada, já que tem alguns dos menores custos de

investimento (capex) por tonelada do mundo, como de minério de ferro (US$10 contra 32 A qualidade de uma jazida de minério de ferro é medida, entre outros critérios, pelo conteúdo de certos elementos. Quanto maior o conteúdo de ferro e menor o conteúdo de outros elementos, melhor será considerada a jazida.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 72

US$15-22 dos competidores), de alumina (US$340 contra US$450 do competidores) e

de cobre (Sossego foi de US$2.760 contra uma média de US$3.800 da indústria).

Outro fator influenciado diretamente pela qualidade das jazidas é o custo do

minério. No caso da CVRD, como boa parte de suas jazidas tem alto teor de ferro, não é

necessário fazer o beneficiamento do minério (o padrão é de no mínimo 64% de ferro),

consequentemente reduzindo seu custo e permitindo maiores margens de lucro.

Já com relação aos produtos, dada a aliança entre as tecnologias desenvolvidas ao

longo dos anos e a alta qualidade e diversidade das jazidas, a CVRD pode oferecer,

principalmente no segmento de minério de ferro e pelotas, uma enorme gama de

produtos (mais de cem tipos), variando propriedades físicas e químicas e níveis de

beneficiamento para adequar-se às necessidades dos clientes e agregar valor aos seus

produtos. Isso é ainda mais importante em períodos de alta demanda (como hoje), já que

o minério de alta qualidade é preferido pelos consumidores, por ter melhor desempenho

nos alto-fornos e por demandar menores gastos com energia elétrica e com purificação

da matéria-prima.

5.3.1.3. CVRD como Estatal

A CVRD quase sempre gozou de ampla autonomia frente ao Governo, como será

discutido mais à frente. Entretanto, o fato de ser estatal trouxe algumas dificuldades

inerentes, que prejudicavam a competitividade da companhia. Para compensar estas

dificuldades, a grande vantagem da CVRD, especialmente com relação aos concorrentes

que se aventuraram na tentativa de estabelecer operações no Brasil, foi a relação muito

próxima com o Ministério das Minas e Energia. Muitos de seus presidentes tornaram-se

ministros desta pasta, e o mesmo ocorreu na direção inversa. Isto foi de suma

importância para a companhia em alguns casos, com destaque para o da Hanna Mining

no início da década de 6033 e principalmente para os projetos de Carajás e de alumínio,

que serão apresentados em detalhe em seguida.

33 A Hanna Mining teve seus direitos de exploração em Minas Gerais revogados e até seus bens desapropriados, chegando a recorrer ao Tribunal Federal de Recursos. Alguns analistas afirmam que caso a empresa tivesse efetivamente entrado em operação, a CVRD teria sido inviabilizada.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 73

5.3.1.3.1. Carajás

Tudo começou, em 1967, com a descoberta de importantes depósitos ferríferos

na serra dos Carajás, no sul do Pará, pela Companhia Meridional de Mineração (“CMM”

– subsidiária da americana U.S. Steel). Embora a descoberta tenha dado direito de

preferência para pesquisa à U.S. Steel, isso não foi muito bem visto pelo Governo, dadas

as já projetadas grandes riquezas minerais da região.

Da descoberta até o final da década de 60, o diretor do DNPM, o ministro das

Minas e Energia e o presidente da CVRD juntos conseguiram bloquear as ações da

companhia americana até que fosse estabelecida uma joint venture com a CVRD. O

resultado deste esforço foi a criação, em 1970, da Amazônia Mineração S.A.

(“AMZA”), com a seguinte composição acionária: CVRD (51%) e CMM (49%). Já aqui

pode ser registrada a primeira importante vitória da CVRD.

O objetivo da AMZA seria realizar pesquisas minerais na região, e já em 1972 se

confirmaram reservas em torno de 18 bilhões de toneladas de minério de ferro de alto

teor, além de depósitos significativos de outros minérios. Estas descobertas despertaram

diversos interesses na região, e consequentemente conflitos emergiram.

Ao longo da década de 70, o que se viram foram interesses distintos entre os

acionistas da AMZA. Enquanto a CVRD queria realizar aumentos de capital e implantar

o projeto de exploração rapidamente, a U.S. Steel usava seu poder de veto para protelar,

com a justificativa de que o mercado mundial de ferro enfrentava uma grave crise. Além

disso, era claro o alinhamento da CVRD com os japoneses, situação que desagradava a

companhia americana.

Enfim, em 1977, utilizando a “cláusula de compra”34, a CVRD pagou US$50

milhões e assumiu o controle total sobre a AMZA e sobre o Projeto Ferro Carajás. Essa

foi a segunda grande vitória da companhia neste projeto. Para mais detalhes, é

interessante analisar os dois lados da história.

34 Cláusula aprovada em 1976 que estabelecia que, no caso de um desentendimento irremediável em torno de alguma questão vital para o sócio majoritário, este teria o direito de adquirir as ações do grupo dissidente por preços ajustados na ocasião e em prazos de pagamento relativamente elásticos.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 74

Segundo Fernandes (1982, v. 1, p. 110 apud CVRD, 1992a, p.399): “A CVRD

negociou de forma dura, inflexível [...]. Detentora dos conhecimentos tecnológicos

básicos em relação ao minério de ferro, já possuidora de cerca de 20% do mercado

transoceânico de minério e ciente de propostas concretas de financiamento externo,

como por exemplo do BIRD [...], a CVRD se considerou em posição confortável para

negociar com uma U.S. Steel que não lhe assegurava fatia considerável de mercado, não

vinha injetando recursos no projeto e [...] encontrava-se em fase de declínio econômico-

gerencial, apresentando situação financeira deteriorada”.

Do lado da U.S. Steel, é interessante o depoimento de Schettino35. Ele detalha

que o motivo da falta de interesse da U.S. Steel por Carajás era sua empresa de

mineração na Venezuela (Orinoco Mining), e que a insistência dos dirigentes da CVRD

acabou convencendo os dirigentes da companhia americana a vender sua participação, e

por um valor muito baixo. Esta atitude seria, no entanto, lamentada por um novo

dirigente da U.S. Steel alguns anos depois, após visita a Carajás.

Outra disputa ocorreu na escolha do sistema de transporte a ser utilizado entre a

mina e o porto de embarque. Diversas opções foram estudadas, mas apenas duas

mostraram-se viáveis. A primeira consistia em utilizar 870km de ferrovias até o porto de

Ponta da Madeira, em São Luís (MA). A segunda seria a opção fluvial, através do rio

Tocantins e da utilização do porto da Ilha dos Guarás (PA). A grande diferença consistia

na capacidade dos portos. Enquanto o primeiro poderia receber enormes graneleiros de

até 280 mil toneladas, favorecendo contratos com as companhias japonesas, o segundo

se limitava a navios de 60 mil toneladas, favorecendo embarques apenas para os Estados

Unidos e para a Europa.

E mais, além das decisões técnicas e estratégicas, as negociações envolveram

interesses econômicos, políticos, sociais e multinacionais. Por fim, a decisão tomada foi

a utilização da ferrovia, pelo critério estratégico, já que a CVRD não queria amarrar a

demanda pelo minério de Carajás a Estados Unidos e Europa, tendo a flexibilidade de

poder exportar para a Ásia. Esta decisão se provou acertada com o passar do tempo.

35 Histórias da Vale (2002, p. 124).

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 75

Resolvidas as disputas da U.S. Steel e do sistema logístico, a CVRD realizou

novos estudos de viabilidade para o projeto. Entretanto, a conjuntura do momento não

era muito favorável. Enquanto no plano externo as negociações de financiamentos e a

busca de novos sócios não progrediam devido à crise no mercado ferrífero, no plano

interno a companhia estava muito focada no complexo do alumínio (discutido em

seguida), dando menor prioridade a Carajás.

Mesmo assim, a CVRD insistia na viabilidade do projeto, através basicamente de

dois argumentos: (i) as crescentes demandas por minérios finos de alto teor não

conseguiriam ser atendidas pelo Sistema Sul (que exigiria altos investimentos), ou seja,

o minério de Carajás teria colocação garantida no mercado; e (ii) o prognóstico de que o

mercado voltaria à normalidade em 1985, e, portanto, Carajás, com sua excelente

qualidade, atenderia o mercado externo, enquanto o Sistema Sul atenderia

preferencialmente o mercado interno. Além disso, Carajás era absolutamente necessário

para a sobrevivência da companhia como uma grande exportadora.

Em 1979, entretanto, a conjuntura local mudou. Segundo Schneider (1994, p. 225

apud Silva (2001, p. 277)), no governo Figueiredo (1979-84) “... a combinação de

motivações políticas e técnicas criou uma nova coalizão pró-Carajás”. Segundo ele, os

principais personagens desta mudança foram Eliezer Batista, grande entusiasta da

CVRD que voltou para seu segundo mandato como presidente da companhia, César

Cals, novo ministro das Minas e Energia e favorável à transferência de recursos para o

norte do país e Delfim Netto, novo “superministro” da Fazenda que acreditava que um

grande projeto de exportação melhoraria a qualidade do crédito brasileiro no exterior.

Assim, durante o ano de 1980 foram realizadas todas as etapas para a aprovação

do projeto Ferro Carajás. Além dele, também foi criado o projeto Grande Carajás, que

visava aproveitar os recursos naturais de Carajás e do percurso até o porto no Maranhão

nos setores minero-metalúrgico, florestal e agropastoril. Foram previstos US$30,6

bilhões em investimentos ao longo de 10 anos. Entretanto este projeto não foi

efetivamente implantado, mas foi fundamental para a aprovação e implantação das

condições físicas e institucionais necessárias à viabilidade do Projeto Ferro Carajás.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 76

Logo após a aprovação, mais dificuldades começaram a surgir. Críticas de

algumas organizações da sociedade civil, como a CNI e o Clube de Engenharia, listavam

numerosos motivos contrários à implantação do projeto. A conjuntura, tanto interna

como externa, continuava extremamente desfavorável. Além disso, apesar da

credibilidade da companhia no exterior, não seria fácil levantar os US$4,4 bilhões

(depois reduzidos a US$2,9 bilhões) necessários para a construção da mina e da ferrovia.

Os recursos vieram de diversas fontes. Primeiramente, a CVRD negociou

contratos de longo prazo para fornecimento de minério com clientes europeus e

asiáticos. Os principais argumentos eram a qualidade do minério, descontos e facilidades

nos fretes, disposição de contrair empréstimos e vantagens para eventuais participações

no Projeto Grande Carajás. Estes contratos, que somaram 25 milhões de toneladas (70%

da produção inicial estimada), seriam utilizados como garantia de financiamentos com

as instituições financeiras.

Em seguida, a companhia viabilizou os recursos da seguinte maneira:

• Recursos próprios e reinvestimento de dividendos (44%);

• Brasil (24%):

- Empréstimos com BNDES e outros bancos estatais;

- Emissões de debêntures conversíveis no Mercado de Capitais;

• Exterior (32%):

- BIRD (Banco Mundial): empréstimos e operações de co-financiamento com

bancos comerciais;

- Japão: empréstimos com o Eximbank e com um consórcio de instituições

financeiras, e lançamento de bonds no mercado institucional de capitais;

- Europa: empréstimos com o KFW36 e linha de crédito com a Comunidade

Européia do Carvão e Aço;

- Financiamentos vinculados à importação de equipamentos.

Zraick (1983, p. 4-5) apud Silva (2001, p. 286-287)

36 Equivalente da Alemanha para BNDES brasileiro.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 77

A obtenção destes recursos pode ser considerada mais uma grande vitória da

companhia. Ainda segundo Zraick, o plano financeiro se apoiou em um “[...] respeitável

elenco de instituições, cuja concordância final em participar da inicialtiva veio como que

trazer o aval da comunidade internacional à CVRD e ao Projeto Ferro Carajás”.

Resolvidos os problemas iniciais, começaram as obras. A CVRD repetiu algumas

de suas principais fórmulas de sucesso nesta implantação. Primeiramente, a companhia

não abriu mão de utilizar o sistema integrado mina-ferrovia-porto, sendo cada uma de

suas partes construída com o melhor da tecnologia. Como exemplo, pode-se citar que a

EFC é uma cópia melhorada e com grandes inovações sobre a EFVM (que já vinha

sendo aprimorada há décadas), tendo condições de ser considerada uma das melhores

ferrovias do mundo.

No sentido mais operacional, a ampla capacidade gerencial e o expertise técnico

transformaram uma implantação complexa (grande escala, difícil localização e escassez

de mão-de-obra qualificada) numa potencialidade, ao entregar o projeto em tempo

recorde. Além disso, a companhia decidiu tocar o projeto baseada em iniciativas de

desenvolvimento sustentável, fator que tem ganho cada vez mais importância na

avaliação e reconhecimento de empresas.

A grande razão para o sucesso inicial deste projeto, porém, foi que, ao mesmo

tempo que implantava os sistemas paulatinamente, a companhia montava e treinava a

estrutura de pessoal que iria operá-los, através de esquemas de pré-operação. Com isso,

quando se concluiu a última fase de implantação, todos os sistemas tinham condições de

operação simultânea, restando apenas alguns pequenos ajustes, naturais ao início da

operação de qualquer empreendimento.

Por mais paradoxal que possa ter parecido a implantação de um projeto tão

ambicioso e de tal porte numa conjuntura tão desfavorável, a evolução do projeto mostra

que, apesar das críticas e de algumas falhas e problemas que realmente ocorreram, a

decisão de levá-lo adiante foi acertada. Também não podem ser descartadas algumas

vitórias fortuitas, como a criação da AMZA e a compra da participação da U.S. Steel,

mas o mérito é da CVRD, que sempre se orgulha do sucesso da implantação e operação

do projeto.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 78

Hoje, o Projeto Ferro Carajás é uma das maiores áreas de exploração de minério

de ferro do mundo, com capacidade superior a 70 milhões de toneladas anuais.

Sucessivas ampliações do complexo foram realizadas, e projetos para novas ampliações

continuam sendo discutidos e aprovados pela companhia (atualmente, os planos apontam

para uma ampliação atingindo 100 mihões de toneladas anuais até 2009).

5.3.1.3.2. Complexo Bauxita-Alumina-Alumínio

Outro projeto de grande importância para o atual sucesso da CVRD é o complexo

bauxita-alumina-alumínio. Ele surgiu de um interesse do Governo brasileiro de tornar o

país menos dependente de importações de alumínio, que chegaram a 70% das

necessidades nacionais no final da década de 6037. E a encarregada de levar adiante este

interesse seria a CVRD.

Em 1966, a canadense Alcan descobriu, na região do rio Trombetas, no norte do

estado do Pará, uma enorme reserva de bauxita, e logo iniciou as gestões necessárias

para realizar a exploração imediatamente. Em 1967 foi criada a Mineração Rio do Norte

(“MRN”), como subsidiária para a operação. Em 1969, a companhia obteve a concessão

e a aprovação do projeto para exploração de 1 milhão de toneladas por ano, e já em

1971, com a situação da mina regularizada, criou a infra-estrutura mínima para iniciar a

mineração.

Entretanto, em 1972, a Alcan desistiu do projeto e abandonou a MRN,

argumentando: preços em queda no mercado internacional, novas fontes mais acessíveis

do minério, antigas fontes ativas além do esperado, risco de explorar na Amazônia e

estimativas de custos crescentes para o projeto. Este fato surgiu como uma ótima

oportunidade tanto para o Governo, que expressou seu interesse no alumínio, como para

a CVRD, que buscava a diversificação de suas operações.

Assim, após intensas negociações, em 1974 ressurge a MRN como uma joint

venture entre CVRD (46%), Alcan (19%), CBA-Votorantim (10%) e outros 5 grupos

37 De forma mais simplista, alguns comentários apontam que a razão para o governo se interessar na produção de alumínio foi a construção da usina hidrelétrica de Tucuruí, que teria grande geração de energia elétrica em ociosidade na região norte do país.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 79

estrangeiros38 (5% cada). Apesar do controle nacional (CVRD e Votorantim), a MRN

sofreria grande influência dos acionistas estrangeiros, especialmente da Alcan.

Com a entrada da CVRD no negócio, diversas características do projeto foram

alteradas. As dimensões foram ampliadas para 3,3 milhões de toneladas por ano e a

infra-estrutura foi composta por 4 unidades básicas: mina, ferrovia, instalações de

beneficiamento e porto. Em 1979 foram iniciadas as operações.

Porém, os planos do Governo, não se restringiam apenas a exploração e

exportação do minério in natura, incluindo também a criação de condições para a

instalação de projetos de alumina e alumínio primário. Alguns fatores foram decisivos

para a viabilização dos projetos:

• Conjuntura adversa no Japão, especialmente com relação aos altos custos de

energia elétrica, exigiam que este país buscasse alternativas mais baratas para

produção do metal;

• Vantagens oferecidas pelo Governo brasileiro para a transferência de plantas

para o Brasil, com destaque para a proposta de realização de consórcios com

empresas brasileiras;

• Criação em 1973 da Eletronorte, para a construção da usina hidrelétrica de

Tucuruí, garantindo o fornecimento de energia elétrica. Por outro lado, a viabilização dos projetos também enfrentaria algumas

dificuldades. Primeiramente, deveria-se considerar o “fator Amazônia”, que

automaticamente elevava em muito as projeções de custos dos projetos. Com isso, suas

viabilidades estariam condicionadas à grande escala, com produção voltada para o

mercado externo. Isto, por sua vez, dependeria da criação de joint ventures com grandes

multinacionais, o que geraria grande dependência dos mercados internacionais.

Mesmo com as dificuldades mencionadas, em 1974 a CVRD iniciou os estudos

de pré-viabilidade para um projeto integrado de alumina (1,3 milhão de toneladas por

ano) e alumínio primário (640.000 toneladas por ano), utilizando o mesmo modelo

empregado no Sistema Sul, que provou ser um sucesso, ou seja, a atração e

38 As norueguesas Aardal og Sunndal Verk e Norsk Hydro, o grupo holandês Royal Dutch / Shell, a americana Reynolds Aluminium e a espanhola Compañia Española del Aluminio.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 80

compromentimento dos consumidores com a aquisição futura dos produtos e a utilização

de joint ventures.

Em 1976, os Governos brasileiro e japonês aprovaram os estudos que situavam

os investimentos necessários em US$1,3 bilhão. Ao mesmo tempo, forma criadas a

Alunorte (alumina) e a Albrás (alumínio), com a participação da CVRD (60,8% e 51,0%

respectivamente) e o NAAC – Nippon Amazon Aluminium Co39 com a participação

remanescente. Em 1978 foram fechados os acordos e iniciaram-se as obras, que se

extenderiam até o final da década de 80, quando o complexo atingiu sua capacidade

plena de operação.

O que se pode destacar deste complexo produtivo é que a confluência de um

amplo conjunto de interesses, entres eles os do Governo brasileiro – de reduzir a

dependência nacional da importação de alumínio e aumentar as exportações e a geração

de divisas – os do Governo japonês – de reduzir sua vulnerabilidade no segmento de

alumínio e encontrar locais de produção com menores custos de energia elétrica – e os

da CVRD, de diversificar suas operações, aliados a mudanças frequentes nos contextos

nacional e internacional, culminaram em um projeto que trouxe vantagens para todas as

partes interessadas.

Mais especificamente com relação à CVRD, o impacto destes projetos sobre seu

portifólio foi expressivo, e hoje em dia o segmento de alumínio é bastante representativo

para a empresa, inclusive com alguns projetos já aprovados ou em fase aprovação para

expansão de capacidade e para construção de projetos greenfield

5.3.1.4. Relacionamentos de Longo Prazo A partir do início da década de 60, a adoção desta política foi fundamental para a

expansão da companhia, na medida em que as vendas futuras para mercados cativos

permitiam à empresa planejar seu horizonte de futuro em bases mais sólidas do que

aquelas garantidas pelo livre jogo do mercado. Entretanto, é importante ressaltar que

esta é uma tática amplamente utilizada na indústria de mineração, especialmente de

minério de ferro, sendo fundamental para a sobrevivência das empresas no longo prazo.

39 Consórcio formado entre diversas empresas japonesas.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 81

A adoção de uma estratégia de vendas capaz de garantir fluxos comerciais

contínuos, através do estabelecimento de contratos de fornecimento de longo prazo,

representou o primeiro passo. O seguinte consistiu em assegurar a permanência destes

mercados por meio da associação com capitais estrangeiros oriundos dos países que

eram seus maiores consumidores efetivos ou potenciais, de modo a estabelecer vínculos

mais consistentes com estes mercados, e em criar subsidiárias para realização direta das

vendas. Esse foi o grande diferencial da CVRD.

Deste segundo passo consistiram, entre outros, as usinas de pelotização

construídas ao longo da década de 70 na região do porto de Tubarão, os projetos das

áreas de florestas e celulose e o grande projeto de bauxita-alumina-alumínio, além da

implantação dos diversos escritórios de representação espalhados pelo mundo.

Um traço forte da CVRD, presente em depoimentos da maioria dos seus

presidentes, é a idéia de que a companhia deveria cumprir seu papel de alavancagem do

desenvolvimento econômico através da associação com o capital privado, tanto

estrangeiro (predominante) quanto nacional. Ou seja, a estratégia tornou-se parte da

cultura da empresa, o que facilitou muito sua implantação e seu sucesso.

Dentre todos os clientes e países com os quais a companhia estabeleceu

relacionamentos de longo prazo, é interessante destacar o principal deles: o Japão. Desde

a década de 50, o intercâmbio entre a CVRD e os japoneses superou meros acordos

comerciais, tornando-se uma real parceria, ou, como descreveu Eliezer Batista, “uma

verdadeira ponte econômica”, baseada na confiança mútua. Da parceria, os principais

resultados obtidos foram: estabelecimento de contratos de longo prazo, utilização de

navios de maior porte, adaptação de portos, intercâmbios de técnicos, trocas de

conhecimentos e técnicas gerenciais e joint ventures, entre elas a Nibrasco, a Cenibra e

algumas companhias do complexo do alumínio, além do grande apoio financeiro

fornecido pelos japoneses para alguns projetos da CVRD.

Portanto, o que pode-se concluir deste fator é que a CVRD transformou uma

prática comum da indústria, os contratos de longo prazo para venda de minério, em reais

parcerias, adquirindo a confiança dos clientes e o interesse dos paises. Esta estratégia

potencializou muitas das atividades da companhia, inclusive sendo o fator decisivo na

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 82

viabilidade de alguns projetos. E no caso do Japão, o intercâmbio foi tão intenso ao

ponto de chegar à troca de know how e experiências.

5.3.1.5. Cultura / Pessoas

Apesar de seu aspecto intangível e um pouco subjetivo, este fator é um dos

grandes responsáveis pelo sucesso da CVRD. Ao longo de sua história, a companhia e

seus empregados criaram uma cultura fortíssima e relacionamentos que ultrapassavam o

orgulho e a dedicação, beirando a paixão. Segundo apurou Jorge Caldeira40, “milhares

de vezes, os homens e mulheres que construíram a empresa fizeram a diferença que

explica a distância entre um bom crescimento e a liderança”. Segundo ele, os

empregados “vestiam a camisa” da empresa, 24 horas por dia.

Paralelamente, sempre esteve presente na mentalidade, principalmente dos

dirigentes da companhia, uma ambição moral para o desenvolvimento, que permeou,

num contexto mais geral, a definição e a implementação das ações estratégicas.

Ao mesmo tempo, muitos presidentes comentam que o objetivo número um da

CVRD foi o tratamento do capital intelectual e humano. Esta característica também deu

motivação e empuxo à companhia.

Um tipo de prática bastante comum dentro da CVRD é a aplicação de métodos

poucos usuais para a resolução de problemas. O melhor exemplo é o de que os

empregados tinham que “se virar” para resolver boa parte dos problemas, já que não

havia suporte ou expertise interno. Assim, boa parte das respostas eram baseadas

principalmente no bom senso e na capacidade de olhar a realidade em volta. Com o

tempo, esta prática ajudou a capacitar os empregados e fazê-los entender e enfrentar o

mundo melhor, já que eles encaravam os desafios como oportunidades, não como fardos.

Nos mesmos alicerces, pode-se dizer que uma das principais tecnologias

desenvolvidas pela empresa foi a capacidade de adaptação. Os fatos históricos mostram

que a utilização de conhecimentos não-técnicos e de experimentação criativa geraram

soluções reais que surpreenderam técnicos por suas inovações e efetividade prática.

40 Histórias da Vale (2002, p. 9).

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 83

Também influenciou muito a cultura da companhia, de forma ampla, a questão

de que sempre houve um contato permanente com realidades culturais muito diversas

nas regiões onde ela opera. Mais importante ainda foi sua capacidade de, ao mesmo

tempo, respeitar e entender as diferentes culturas, aprender com elas, e manter uma forte

identidade própria.

Jorge Caldeira41 tem mais uma frase interessante, que mostra a interação de

alguns dos tópicos mencionados anteriormente: “Aquilo que é mais importante desse

comportamento aberto e tolerante com a realidade vem a ser o fato de que é neste

contato que a empresa se transformou em detentora de tecnologia de ponta – e derrubou

concorrente atrás de concorrente. Cada vez que um desafio “irracional” é vencido, a

empresa se torna capaz de fazer algo que seus concorrentes não conseguem. E, como na

maior parte das vezes o componente fundamental da vantagem é uma combinação que

depende tanto do saber técnico, acessível aos concorrentes, como de soluções tiradas do

conhecimento tradicional do interior brasileiro – inacessível aos olhos dos rabiscadores

de projetos – o resultado efetivo é muito difícil de ser copiado”.

Já a relação entre a CVRD e seus empregados é outro fator que influenciou o

sucesso da companhia. Inicialmente, ao mesmo tempo que mantinha um relacionamento

tradicional de “manda e obedece”, ela também fornecia infra-estrutura e qualidade de

vida, inclusive para as famílias e comunidades. Com o tempo, buscou-se aumentar a

produtividade dos funcionários melhorando as condições de trabalho, numa constante

evolução. Paralelamente, a companhia também se dedicou muito para manter boas

relações com os sindicatos, tendo obtido bons resultados ano a ano.

A união e mistura de todos estes fatores citados é que formou a afamada cultura

organizacional da CVRD. São raras as empresas que conseguem sobreviver por tão

longo tempo e manter as características culturais, mesmo passando por tantas mudanças

e desafios. É neste paradoxo que se prova a real influência da cultura sobre o sucesso da

companhia ao longo do tempo. Ou seja, na CVRD a cultura tornou-se um diferencial, ao

influenciar estratégias, ações e resultados, enquanto em outras empresas não passa de

um fator necessário porém suficiente em si próprio.

41 Idem (p. 18)

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 84

5.3.2. Fatores Qualificadores

São os fatores competitivos nos quais o desempenho da empresa deve estar

acima de um nível determinado para ser sequer considerado pelos consumidores, ou

seja, sendo necessários para que a empresa se mantenha no mercado. Entretanto, não são

os principais determinantes do sucesso competitivo. No caso desse TF, os fatores

qualificadores são aqueles que permitiram à CVRD sobreviver no mercado altamente

competitivo e desafiador no qual atua.

5.3.2.1. Autonomia no Relacionamento com o Governo

Conforme fora mencionado anteriormente em algumas oportunidades, a CVRD

quase sempre gozou de ampla autonomia frente ao Governo, nas esferas operacional,

financeira e administrativa. Há algumas razões principais para isso.

Nos primeiros anos de existência da companhia, o foco tanto do governo Vargas

(1930-45) como do governo Dutra (1946-50) estavam claramente voltados para a

indústria do aço. Assim, a implantação de soluções separadas para o minério de ferro

(CVRD) e para o aço (CSN), levou a maiores investimentos no estabelecimento das

siderúrgicas e, por consequência, a um financiamento inadequado da CVRD. Neste

contexto, a companhia precisou estabelecer uma certa autonomia (e auto-regulação),

para que pudesse sobreviver às pressões enfrentadas.

Segundo Silva (2001, p. 44), a autonomia tem raízes ainda mais profundas. A

autora afirma que “a partir desse pressuposto mais geral42 formula-se a hipótese de que o

processo de regulação do caso da CVRD especifica-se por um mix institucional –

constituído no âmbito das regulações emanadas do mercado internacional, do Estado

brasileiro e da auto-regulação empresarial e de que é da convergência dessas três fontes,

relativamente autônomas de regulação, que deriva a ampla autonomia da empresa em

relação ao Estado [grifos da autora], a qual singulariza o caso da CVRD entre as

empresas do Setor Produtivo Estatal”.

42 No qual a singularidade específica da CVRD, entre as estatais brasileiras, deve-se ao fato de que ela é uma empresa ligada quase que exclusivamente ao comércio exterior, portanto, mais sujeita aos padrões das relações internacionais do que aos padrões das relações do mercado doméstico.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 85

Ao longo dos anos, a autonomia foi mantida (exceto talvez por partes do período

sob governo militar), com alguma variação em sua intensidade, principalmente devido

ao fato da CVRD manter bons níveis de rentabilidade e de consistentemente trazer

divisas do exterior para o país (ajudando no equilíbrio do balanço de pagamentos). Isso

foi fundamental, em diversas ocasiões, para que a companhia passasse ilesa por crises

sofridas pelo Estado. Neste sentido deve-se destacar que, a despeito dos governos terem

diferentes ideologias, todos respeitavam a companhia e permitiam que houvesse uma

certa continuidade administrativa.

De forma mais ampla, a relação da CVRD com o Governo sempre foi amistosa,

apesar das grandes e constantes mudanças políticas e institucionais, além das freqüentes

mudanças nas diretrizes do setor mineral. O fato de ser estatal foi fundamental também,

além do que já foi discutido, no fato de que muitos dos investimentos dificilmente teriam

sido feitos pela iniciativa privada, dados seus longos prazos de retorno e altos

investimentos iniciais necessários.

5.3.2.2. Foco no Mercado Externo

Esta importante característica está presente na CVRD desde seus primórdios.

Logo após a conclusão das disputas com os acionistas e diretores americanos

(representantes do Eximbank), a companhia pôde implementar a estratégia de focar no

mercado externo, com o objetivo direto de sobreviver às pressões e à competitividade do

mercado após perder os contratos cativos estabelecidos nos Acordos de Washington. Foi

essa visão que permeou a evolução da companhia como uma grande exportadora e

também boa parte de suas decisões na época em que ela ainda não havia se estabelecido

frente a seus clientes e concorrentes.

Além disso, o estreito intercâmbio criado com os japoneses a partir de meados da

década de 50 fez com que os corpos técnico e gerencial da companhia absorvessem

muito do know how japonês em termos de gerência, planejamento estratégico,

administração e visão do desenvolvimento. Esse know how trouxe uma grande vantagem

competitiva, aproveitada e desenvolvida ao longo da história da companhia.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 86

Também neste contexto, Silva (2001, p. 162) comenta e vai ainda mais fundo: “À

Companhia Vale do Rio Doce estava reservada a tarefa de gerar divisas para

contrabalançar as contas do Balanço de Pagamentos. Para cumprir tal missão, a CVRD

tanto precisou construir a infra-estrutura necessária [...] como, também, adquirir alta

eficácia técnico-operacional e desempenho competitivo em sua área de atuação. Da

conjunção dessas demandas e pressões, resultou uma forte auto-regulação e uma cultura

empresarial própria que conduziu tanto seu staff gerencial e administrativo como seu

corpo técnico e operacional a agir em torno de um mística nacional-desenvolvimentista,

materializada na idéia, sempre reiterada pelos dirigentes da empresa, de sua importância

estratégica na geração de divisas para o País [...]”.

5.3.2.3. Diversificação

“A partir de 1968 começava a surgir na Rio Doce a idéia de diversificação de

atividades. Nessa época a Rio Doce já pensava em abrir mais seu horizonte de projetos,

além daqueles considerados como uma extensão de suas atividades no minério de ferro

[...]. Era necessário, num conceito moderno de grande empresa, diluir o risco dos

enormes investimentos destinados apenas a um produto de venda no exterior. Era

necessário, também, aplicar a experiência adquirida em mineração, transporte e handling

de granéis e comercialização externa, para aumentar as exportações brasileiras.

Finalmente, era conveniente para o país, usar o exponencial conceito empresarial

adquirido pela Rio Doce fora do Brasil, mercê de sua correta e eficiente atuação, como

catalisadora de novos investimento estrangeiros.”43

Por outro lado, alguns relatos dizem que a diversificação aconteceu mais por uma

estratégia do Governo do que da CVRD. Não é do mérito desse trabalho esta discussão,

mas apenas destacar a importância da política de diversificação adotada e seu impacto

sobre a companhia.

43 CVRD. Divisão de Desenvolvimento. Relatório Decenal – 1962/72. O Minério, maio 1973, apud Abranches, Dain & Salgado (1978, p. 83) apud Silva (2001, p. 210).

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 87

No início dos anos 70, a política de diversificação tinha basicamente três

objetivos, vistos como essenciais para a companhia: (i) aumentar a cesta de produtos,

diversificando em um série de alternativas na área mineral, como manganês, cobre,

titânio, ouro e carvão, entre outros; (ii) estabelcer vínculos mais fortes com os

consumidores internacionais, criando mercados cativos para os produtos; e (iii) utilizar o

grande volume de recursos gerados nas operações de minério de ferro, que não tinham

reinvestimentos viáveis no mesmo produto.

Para auxiliar na política de diversificação, em 1971 foi criada a Docegeo. Os

resultados de seus esforços começaram a ser percebidos a partir de meados da década de

80, e repercutem até hoje nos novos projetos da companhia.

Mais recentemente, além da diversificação de produtos, a CVRD começou a

investir mais efetivamente na diversificação geográfica. Já existem algumas operações

de beneficiamento e siderurgia fora do Brasil, mas a companhia tem voltado suas

atenções para a prospecção de novas jazidas, focando em regiões da África

(Moçambique e Gabão), da Ásia (China e Mongólia) e da América do Sul (Chile, Peru e

Venezuela).

De forma mais genérica, é interessante, para um melhor entendimento dos

reflexos da diversificação sobre uma empresa, discutir seu trade-off básico:

margem/retorno vs. crescimento. Com base num relatório do banco Deutsche Bank44,

podem ser identificadas algumas vantagens:

• Menor volatilidade de lucros e fluxos de caixa;

• Melhores possibilidades e potencial de crescimento;

• Menor dependência de previsões e efetivos preços de commodities;

• Menor dependência dos ciclos para o timing do crescimento;

• Conforme aumenta a escala, a administração consegue conciliar mais

apropriadamente crescimento com fatores competitivos;

• Melhor gerenciamento de risco;

• Opções de investimento de longo prazo mais atrativas.

44 Driving to diversification (2004, p.8).

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 88

Por outro lado, a grande desvantagem é a redução nos retornos do negócio, já que

a diversificação implica no investimento em indústrias, negócios e operações com

menores margens e taxas de retorno.

Em resumo, pode-se dizer que as empresas que optam pela estratégia de

diversificação, que é o caso da CVRD (ainda em menor escala, porém com forte

tendência e investimentos) e das três grandes mineradoras diversificadas discutidas no

capítulo anterior, têm visão de mais longo prazo. Isso porque é difícil sobreviver às

oscilações do mercado quando se depende de um único produto. Mesmo que a

diversificação tenda a diminuir os retornos, ela permite uma estabilidade muito maior à

empresa, além de protegê-la de concorrentes mais preparadas que podem ameaçar com

aquisições ou através de um melhor desempenho em geral. No caso da CVRD, sua busca

desde a década de 70 por uma crescente diversificação, intensificada desde a

privatização em 1997, mostra que este é o caminho correto a ser seguido.

5.3.2.4. Reinvestimento de Lucros e Dividendos

Esta é uma política que foi adotada ao longo da história da companhia. Desde o

início da década de 50, o reinvestimento de grande parte dos retornos positivos na

manutenção e modernização do sistema gerou um círculo virtuoso de manutenção e

ampliação do seu padrão de eficiência. Foi essa iniciativa que permeou o crescimento da

CVRD ao longo do período entre 1948 e 1966, considerado a “fase heróica da

empresa”45, quando a companhia criou as bases para seu crescimento futuro. É

importante destacar que, além do fato de poder contar com estes recursos, a companhia

ainda tinha a vantagem de ser isenta de imposto de renda na parcela do lucro cabível ao

Governo46, que sempre foi o acionista majoritário até a privatização.

Outro racional utilizado para o reinvestimento foi o de que era o melhor

investimento para o acionista (neste caso, basicamente o Governo), tanto por ser mais

rentável quanto por ser, legitimamente, a melhor aplicação possível para estes recursos.

45 Eliezer Batista. Entrevista à autora. Rio de Janeiro, 27 set. 2000 apud Silva (2001, p. 315). 46 Situação que se manteve até por volta de 1976.

Capítulo 5 – Análise dos Fatores de Sucesso da Companhia Vale do Rio Doce 89

Era mais vantajoso, tanto financeiramente quanto em outros aspectos, ver a empresa

crescer do que privá-la destes recursos, correndo o risco de se enfraquecer e ficar para

trás tecnicamente.

Além do reinvestimentos dos lucros e dividendos, que já são montantes livres

para absorção pelos acionistas, alguns dispositivos estatutários permitiram à CVRD

manter um alto nível de investimentos. Entre eles estavam: (i) fundos complementares

de depreciação e exaustão, considerados necessários para assegurar a substituição e a

conservação do valor dos bens que se destinam à exploração do objeto social; (ii) fundo

para expansão, destinado a assegurar a capacidade de desenvolvimento da sociedade

anônima; (iii) fundo de reserva financeira; (iv) fundo de desenvolvimento tecnológico

para aplicação em seus programas de desenvolvimento tecnológico.

Assim, é fácil identificar que este fator é realmente qualificador. Os recursos

disponibilizados e empregados foram fundamentais para permitir que a CVRD se

mantivesse competitiva com relação aos seus concorrentes, mas não gerou nenhum

diferencial além das melhorias viabilizadas.

Capítulo 6 – Conclusões Finais 90

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esse Trabalho de Formatura analizou as razões que justificam o melhor

desempenho da CVRD quando comparada a seus principais concorrentes internacionais

mesmo num contexto onde ela enfrenta as limitações, dificuldades e implicações de um

custo de capital mais elevado.

Como a CVRD é o objeto da análise, o início do trabalho foi dedicado à sua

apresentação, visando fornecer uma boa noção da companhia como um todo, entre suas

operações, estratégias, riscos e desempenho recente. Com isto em mente, é mais fácil o

entendimento dos fatores de sucesso, dado que eles deixam de parecer fatores

estritamente pontuais e passam a ter uma finalidade, verificada pela fotografia do

momento atual da companhia.

Conhecida a empresa a ser analisada, começaram a ser investigadas as questões

que motivaram o TF. Inicialmente, é apresentada a teoria do custo de capital, fornecendo

as ferramentas necessárias para seu cálculo. Em seguida, a discussão relativa às

particularidades enfrentadas pelas empresas brasileira identifica de forma prática

algumas das dificuldades com as quais a CVRD tem que lidar em seu ambiente

competitivo. A principal dificuldade é proporcionada pelo chamado “teto soberano”

brasileiro, que impõe um custo mínimo às captações feitas por empresas nacionais. A

CVRD é um caso à parte, conseguindo captar recursos mais baratos que o Governo,

porém ainda assim ela paga boa parte do prêmio de risco político, mesmo tendo suas

atividades voltadas para o mercado externo e robustas garantias contra o default de sua

dívida. Estima-se que o fato de ter suas principais operações no Brasil aumenta o custo

de capital da companhia em 4 a 5 pontos percentuais, limitando sua competitividade.

Em seguida, são comprovadas as suspeitas que motivaram o trabalho, de que a

CVRD realmente tem melhor performance e maior custo de capital que seus

concorrentes, como mostrado na figura 6.1. Neste ponto, foram identificadas e

apresentadas as empresas com as quais a CVRD é mais comparável: BHP Billiton, Rio

Tinto e Anglo American. À partir disto, foram feitas algumas análises de indicadores

financeiros e de evolução dos preços das ações, comparando as quatro empresas. Estas

Capítulo 6 – Conclusões Finais 91

análises mostram, entre outras coisas, a superioridade histórica da performance da

CVRD – tanto em termos de rentabilidade quanto com relação à percepção dos

mercados de capitais – e o rápido crescimento atingido em praticamente todos os

indicadores, além da já esperada grande diferença no custo de capital.

Até este momento, o trabalho consistia da identificação prática de uma

contradição (o problema), da comprovação númerica dos componentes desta contradição

(o embasamento teórico e a aplicação prática da teoria) e da apresentação detalhada do

objeto de análise (a empresa). Estava criado então o contexto necessário para uma

análise detalhada dos fatores de sucesso da Companhia Vale do Rio Doce, procedida

adiante.

A primeira parte da análise refere-se aos Fatores Históricos. A trajetória da

companhia é apresentada de forma aproximadamente cronológica, e são destacados e

discutidos os principais fatores que influenciaram sua evolução, divididos em sete

períodos distintos da história. É interessante destacar a importância do timing e da

sequência dos fatos, que compõem uma história única de sucesso, marcada por algumas

coincidências e muitas decisões estratégicas acertadas.

Já a segunda parte é constituída da análise dos Fatores Competitivos. Após

extensiva pesquisa, tanto acadêmica como na mídia, foram identificados alguns fatores

que fizeram parte da história da CVRD, influenciando diretamente sua evolução. Alguns

deles podem ser classificados como fatores qualificadores, ou seja, sua existência é

necessária para assegurar a sobrevivência da companhia e uma competição em nível de

igualdade no mercado. Dentre estes fatores estão: (i) Autonomia no Relacionamento

com o Governo; (ii) Foco no Mercado Externo; (iii) Diversificação; e (iv)

Reinvestimento de Lucros e Dividendos.

Além dos fatores competitivos qualificadores, foram identificados alguns fatores

competitivos ganhadores de pedido. Eles são os responsáveis diretos pelo sucesso da

CVRD ao longo de sua história e principalmente nos dias de hoje, por tê-la diferenciado

das concorrentes em diversas características. Estes fatores foram organizados por ordem

de importância, e é interessante discutí-los brevemente para as considerações gerais.

Capítulo 6 – Conclusões Finais 92

O Complexo Mina-Ferrovia-Porto sempre fez parte da estrutura operacional da

CVRD. Sua criação “acidental” e gestão eficiente são os principais responsáveis pelo

sucesso da companhia, dado que a integração vertical entre produção e transporte

permitiu um completo controle de custos, fundamental para competir num negócio de

venda de commodities com alcance global. Percebendo o potencial desta vantagem

competitiva, a CVRD investiu continuamente no complexo e repetiu a estrutura em

novos projetos, alavancando sua eficiência.

Outro fator fundamental é a Qualidade das Jazidas e dos Produtos. A CVRD

tem ativos de altíssima qualidade em seu portifólio, muitas vezes os melhores do mundo

em alguns segmentos, que propiciam inúmeras oportunidades estratégicas, como

diferenciação e customização de produtos, menor necessidade de beneficiamento

gerando menores custos e maiores margens, e custos de investimentos (capex) por

tonelada muito inferiores aos dos concorrentes.

Um fator relativamente controverso porém de grande impacto na companhia hoje

é a CVRD como Estatal. Ele destaca a importância da “mão” do Governo em algumas

situações que beneficiaram a CVRD em detrimento de mineradoras internacionais, como

os dois casos a seguir.

Primeiramente deve-se destacar Carajás. Da descoberta em 1967, passando pela

joint venture com a U.S. Steel, pela compra de sua participação, pela aprovação do

investimento em um período nebuloso, pela escolha acertada do sistema logístico e pela

eficiente implantação do projeto, esta jazida que compõe o Sistema Norte de minério de

ferro foi fundamental para o sucesso da CVRD, dado seu porte, qualidade e diversidade.

Outro caso de destaque é o Complexo Bauxita-Alumina-Alumínio, construído

em parte graças à desistência da Alcan de exploração da bauxita e em parte graças aos

apoios dos Governos brasileiro e japonês para a implantação do projeto integrado de

alumina e aluminío primário. O complexo é hoje altamente competitivo e tem ainda

grande espaço para novos investimentos com baixos custos.

Os Relacionamentos de Longo Prazo também foram fundamentais para o salto

que a companhia deu a partir da década de 60. É importante ressaltar que os contratos de

fornecimento de longo prazo são amplamentes utilizados na indústria, sendo um fator

Capítulo 6 – Conclusões Finais 93

qualificador, porém o passo além dado pela CVRD é que o torna um diferencial. A

companhia estabeleceu fortes vínculos com seus principais clientes e países de origem,

através inclusive da formação de joint ventures para projetos de interesse mútuo. Ela foi

mais além no relacionamento com o Japão, no qual estabeleceu-se uma parceria e uma

relação de confiança tão fortes a ponto de haver trocas de know how e experiências

técnicas e gerenciais.

Por fim, um fator muito importante para o sucesso da companhia mas raramente

levado em consideração: Cultura / Pessoas. A CVRD tem uma cultura organizacional

muito forte, baseada em pessoas orgulhosas, dedicadas e até apaixonadas pela

companhia. Apesar de pouco concreto, este fator tem sua importância na grande

influência exercida pelos funcionários sobre estratégias, ações e resultados da CVRD,

tornando a cultura um diferencial.

Concluída a análise dos fatores de sucesso da CVRD, pode ser feita uma

avaliação geral deste Trabalho de Formatura. Do lado pessoal, a dedicação ao seu

desenvolvimento trouxe novos conhecimentos e desafios e gerou novos interesses, além

de permitir a aplicação de conceitos de Engenharia de Produção num caso prático.

Também resultou numa forte realização pessoal, ao exigir e propiciar um melhor

entendimento de assuntos que dificilmente seriam estudados em outra situação.

Em termos gerais, ele atende aos seus três principais objetivos: responder de

maneira eficaz ao problema levantado, contribuir para a produção acadêmica ao gerar

discussões úteis em resposta à motivação do trabalho, e entender melhor a empresa-

objeto da análise.

Assim, ao atender aos objetivos descritos, esse TF pode ser muito útil em

diversas outras aplicações, como na questão do custo de capital e as particularidades

enfrentadas pelas empresas brasileiras, como um modelo de comparação entre empresas

em alguns casos específicos e em análises mais aprofundadas sobre a Companhia Vale

do Rio Doce, que não pode-se deixar de frisar, é um caso muito interessante de sucesso

no Brasil e na indústria de mineração global.

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