comentários sobre lembranças de 1848

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  • 7/25/2019 Comentrios Sobre Lembranas de 1848

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    Alexis de Tocqueville

    Lembranas de 1848: As jornadasrevolucionrias em Paris

    Em uma Frana saturada de beletrismo e teatralidade cortes,esgotada pelas sucessivas revolues que, em apenas sessenta anos,

    haviam alternado imperadores, presidentes, ditadores e reis nocomando do Estado, a Revoluo de 1848 foi desde o primeiromomento interpretada por seus observadores mais lcidos comouma espcie de encenao da Revoluo Francesa. Nesta reediosangrenta e farsesca do conflito de classes que convulsionava asociedade, Alexis-Henri-Charles Clrel, conde de Tocqueville(1805-59), exerceu com distino os papis de testemunha e

    protagonista do violento jogo poltico disputado entrerepublicanos, monarquistas e socialistas.Em 1848, Tocqueville era um parlamentar com quase uma

    dcada de servios prestados a seu partido na Cmara dosDeputados. Respeitado homem de letras e ex-presidente daAcademia Francesa, tornara-se conhecido em toda a Europa porseu relato sobre a vida poltica nos Estados Unidos em Ademocracia na Amrica. Mas, embora fosse um entusiasta das

    liberdades democrticas e do liberalismo econmico norte-americanos e desprezasse o regime totalitarista francs, nosmomentos decisivos, Tocqueville sempre esteve ao lado das foraspolticas mais conservadoras de seu pas, inclusive apoiando acensura imprensa e restries ao direito de reunio quando julgounecessrio. O chamado partido da ordem, que agregava numa sfrente reacionria republicanos moderados, monarquistas, clrigos

    e demais defensores da hierarquia e da propriedade comosustentculos da sociedade, era visto por ele como o nico capaz deevitar a catstrofe da tomada do poder pelo povo.

    Lembranas de 1848foi escrito como uma coleo privada dememrias sobre os acontecimentos daquele ano de insurreio

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    generalizada na Frana as agitaes de fevereiro, a abdicao dorei, a formao da Assembleia Constituinte, os quatro dias debarricadas e massacres em junho, a restaurao da ordem e emtoda a Europa. Preciso na reconstituio dos fatos e implacvel nosretratos de figuras clebres, o livro seria publicado somente em

    1893, quando as paixes polticas narradas estavam arrefecidas emuitos de seus personagens j haviam morrido, incluindo o prprioautor.

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    1. Tocqueville expe a tese de que os acontecimentos de 1848constituram um prolongamento do drama revolucionrio iniciadoem 1789. Quais eram as foras polticas e sociais em conflito naFrana e qual a inovao do movimento de 1848?

    Segundo Tocqueville, toda a histria do pas desde a RevoluoFrancesa se resume ao conflito entre os remanescentes do AntigoRegime e os interesses da burguesia, classe sem distino denascimento, mas detentora do poder econmico.

    Contudo, a numerosa classe operria de Paris e de outrascidades industriais leva para o movimento de 1848 uma grandenovidade: se as revoltas anteriores destinavam-se mudana naforma de governo, no fim da dcada de 1840 estava em jogo oprincipal fundamento da sociedade segundo Tocqueville: o direito propriedade. (parte 1, cap. 1)

    2. Ao longo do livro, Tocqueville se vale de diversas metforas parailustrar a situao poltica ou o comportamento dos personagensenvolvidos. Uma das mais famosas pertence a um de seus discursoscomo parlamentar da Monarquia de Julho, poucos dias antes dosacontecimentos de fevereiro de 1848. Que metfora essa?

    Em seu discurso de 29 de janeiro, advertindo os parlamentaresda situao de ameaa iminente ao direito propriedade e

    ordem pblica representada pela propagao das ideias socialistas,Tocqueville compara a situao do pas a um vulco adormecido,sobre cuja cratera os responsveis pela defesa da sociedade isto, os polticos representantes da ordem dormiam, desatentos catastrfica movimentao das massas subterrneas. (parte 1, cap. 1)

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    3. No dia 22 de fevereiro, durante uma sesso na Cmara dosDeputados, que observao leva o autor a concluir que a situao nasruas era pior do que a descrita pelo governo?

    Tocqueville observa que, enquanto a situao nas ruas seagravava a cada momento, a Cmara dos Deputados se pusera a

    discutir os assuntos mais incuos, talvez numa tentativa de sublimara tenso que eletrificava Paris. Um de seus colegas, o deputadoDuchtel, assegurou ao autor que a situao estava sob controle.Entretanto, a intensificao do tique nervoso de Duchtel, quemexia frequentemente o pescoo e os ombros, era para Tocquevilleo sinal sutil que denunciava a ansiedade geral da cidade e do pas,especialmente entre os conservadores e monarquistas. (parte 1, cap. 3)

    4. Os dias 23 e 24 de fevereiro marcaram o colapso da monarquia. Queacontecimentos precipitaram a abdicao do rei Lus Filipe?

    O aumento da agitao nas ruas e na Guarda Nacional (milciaformada pela burguesia) leva o rei a destituir seu ministrioconservador em 23 de fevereiro e convocar um novo gabinete pormeio do primeiro-ministro Louis-Mathieu Mol, com o objetivode apaziguar a oposio republicana, reprimir os tumultos de rua erestabelecer a ordem. Entretanto, desprovido de qualquer legitimidadepoltica, o novo governo dura menos de um dia: a revolta toma acidade no dia 24 e diversas barricadas so erguidas pela populao.Tiroteios e massacres so relatados, e a hesitao da Guarda Nacionale do Exrcito coloca em xeque a prpria segurana do regime,ameaada pelo grande nmero de operrios e populares revoltososem torno dos principais palcios da cidade. Os ministros do governo

    debandam e o prprio rei foge de Paris aps abdicar quase em segredona madrugada do dia 24 de fevereiro. (parte 1, cap. 4-5)

    5. Durante a tumultuada ltima sesso da Cmara dos Deputadosantes da queda da monarquia, Tocqueville destaca as presenas daduquesa de Orlans, do conde de Paris e do duque de Nemours noParlamento. Qual era o significado da presena desses aristocratas entre

    os deputados?O conservadorismo monrquico do governo de Lus Filipe sempre se

    dividira entre os legitimistas, assim chamados por desejarem a restauraoda monarquia absoluta; e os orlanistas, partidrios da entronizaoda casa de Orlans, vista pela populao como uma alternativa liberal

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    de poder desde a Revoluo de 1789. Os Orlans descendem de umalinhagem real colateral originada no sculo XIV, e por sua posioeminente na nobreza francesa sempre tiveram um papel polticodestacado. Seus trs representantes presentes no Parlamento no dia 24 defevereiro, ciosos de sua importncia dinstica mas cegos realidade das

    ruas, desejavam reivindicar o trono. A invaso da Cmara pela massade revoltosos logo encerra essas ambies infundadas, a repblica proclamada e um governo provisrio institudo. (parte 1, cap. 5)

    6. Segundo Tocqueville, quais foram as causas da Revoluo deFevereiro?

    Acreditando que a histria uma composio entre a conjuntura

    econmica, poltica e social e os acasos do destino, Tocquevilledestaca como causas gerais para a ecloso da Revoluo de Fevereiroa influncia da Revoluo Industrial, que tornara Paris uma cidadecercada de populosos bairros operrios, suscetveis inveja materialocasionada pela desigualdade; a pregao socialista de agitadorescomo Auguste Blanqui e Louis Blanc; a centralizao de toda apoltica francesa em Paris; e o hbito revolucionrio desenvolvido pelapopulao da cidade sessenta anos antes. Como causas acidentais,Tocqueville cita a inabilidade da oposio, que incentivou a revoltapopular desejando apenas uma reforma poltica; a fuga dos principaisministros na noite de 23 de fevereiro; a hesitao dos generaisresponsveis pela defesa do Estado; e, finalmente, a imbecilidade senildo rei, cujas fraquezas e falta de capacidade de reao precipitaram osacontecimentos. (parte 2, cap. 6)

    7. Aps o fim da monarquia, o governo provisrio liderado pelopoeta Alphonse de Lamartine convoca eleies gerais para a novaAssembleia Constituinte, e Tocqueville resolve apresentar-se comocandidato. Que razes ele fornece para justificar a continuidade de suaparticipao no processo poltico?

    Embora desiludido com a mediocridade da poltica de seutempo era um monarquista liberal de convices democrticas e

    reconhecendo-se pouco dotado para os discursos pblicos, Tocquevilleconsidera que a situao da Frana aps fevereiro to grave eperigosa que exige de todos os homens honestos uma contribuiocorajosa para a defesa das leis e, sobretudo, da propriedade,ameaadas pelo socialismo demaggico. Por isso, considerando que

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    ainda jovem e contando com o apoio de sua mulher, Tocquevilledecide apresentar-se aos eleitores de seu departamento natal, aMancha. O autor termina por receber uma votao macia, emborano cesse de demonstrar seu ntimo desagrado durante a campanhaeleitoral. (parte 2, cap. 8)

    8. Aps a posse da Assembleia, a esquerda republicana e socialistaaglutina-se no partido minoritrio da Montanha. Como Tocquevillecaracteriza esse grupo de adversrios?

    Segundo o autor, os montanheses se dividiam em dois gruposdistintos mas frequentemente intercambiveis. De um lado, osrevolucionrios da velha escola, republicanos e jacobinos veteranos

    das vrias sublevaes antimonarquistas que haviam se seguidodesde 1789. De outro, os socialistas, novo grupo poltico inspiradopelas teorias cientficas que propunham a completa subverso dostatu quo da sociedade francesa por meio do combate implacvel propriedade privada. Tocqueville afirma que essa diviso dasesquerdas foi um dos principais fatores que evitaram a subida aopoder dos socialistas (que ele acredita constiturem, por suas ideias, afaco mais perigosa). (parte 2, cap. 8)

    9. Que defeitos o autor aponta no poeta Lamartine, provisoriamenteencarregado da conduo dos trabalhos da Assembleia Constituinte?

    Tendo sido um dos responsveis diretos pela Revoluo deFevereiro por sua militncia antimonarquista, Lamartine fora indicadopor seus correligionrios para anunciar ao povo a proclamao daRepblica, fato que aumentara seu j enorme prestgio poltico.

    Entretanto, Tocqueville aponta no poeta uma srie de falhas decarter que teriam contribudo para seu posterior descrdito, como aincapacidade de sacrificar interesses pessoais ou partidrios pelo bempblico, o egosmo exacerbado, o desprezo pela verdade, a faltade sinceridade e o gosto vaidoso pelo efeito retrico de seus discursospolticos. (parte 2, cap. 11)

    10. No ms de junho, os operrios voltam a sublevar-se em Paris,ameaando as instituies do Estado por meio de numerosasbarricadas e tomando o controle de vrios bairros da capital. Qual areao do governo e a opinio de Tocqueville sobre ela?

    Premidos pelo estado calamitoso da ordem pblica, os membros

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    do governo resolvem dissolver a Comisso Executiva e entregar todoo poder ao general Louis-Eugne Cavaignac, comandante das forasregulares da capital que ento passa a ser ditador e chefe de Estadoda Frana. Embora reconhea seu horror s ditaduras, Tocquevilleapoia com entusiasmo essa espcie de golpe de Estado civil-militar,

    ressaltando a necessidade imperiosa de derrotar por todos os meios osrevoltosos socialistas. De fato, aps quatro dias de intenso canhoneioe massacres indiscriminados, a revolta sufocada e o partido daordem reconquista o controle da situao. (parte 2, cap. 14-5)

    11. Como Tocqueville se posiciona na Assembleia Constituinte?A despeito de sua simpatia pelas liberdades democrticas norte-

    americanas, o autor se mostra refratrio s transformaes sociaispropostas pelos setores progressistas da Assemblia Constituinte,defendendo sempre a moderao poltica e a manuteno do statu quodos proprietrios e aristocratas. Por outro lado, ele expressa seutemor, compartilhado por muitos observadores, de que Lus Napoleo,sobrinho do imperador e poltico ardiloso, usurpe a Repblica da qualfora eleito presidente no final de 1848 para se perpetuar no poder.Entre os dezoito membros da Comisso, Tocqueville se destaca porsuas propostas inspiradas na Constituio dos Estados Unidos, comoo sufrgio universal e a possibilidade de reeleio do presidente daRepblica. (parte 2, cap. 16)

    12. Em suas consideraes sobre o trabalho da AssembliaConstituinte, Tocqueville afirma que a centralizao do Estado e dogoverno em Paris estar sempre a salvo das revolues. Por qu?

    O autor acredita que essa centralizao seja conveniente tanto paraos defensores do statu quo que de sua posio central controlamtodos os aspectos da vida do pas como para os conspiradores, queprecisam apenas dominar a capital para apoderar-se de toda a Frana.A posio central da cidade no sistema poltico dificilmente seriamodificada, porque cmoda para os dois partidos antagnicos.(parte 2, cap. 16)

    13. Quais so as principais questes enfrentadas por Tocqueville comoministro dos Negcios Estrangeiros?

    Em decorrncia do espraiamento da Revoluo Francesa por todaa Europa, diversos governos estavam s voltas com a represso aos

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    insurretos locais, entre os quais a ustria e a Rssia, baluartes doabsolutismo no continente. A prpria Frana republicana enviaratropas a Roma para ajudar a sufocar a revolta contra o domniopapal. O tsar e o imperador Habsburgo, por sua vez, exigiam doImprio Otomano as cabeas dos lderes socialistas e separatistas que

    haviam se refugiado alm do rio Danbio (regio ento controladapelos turcos), demanda que afrontava diversos tratados internacionaise que a Frana, ao lado da Inglaterra, combateu com a nfase exigidapor seus interesses na ocasio.

    O sucesso dessa manobra diplomtica foi acompanhado por outravitria, relativa ao Piemonte. A pequena nao ao norte da pennsulaitaliana, vizinha do sudeste da Frana, enfrentava o assdio imperial

    por manter instituies representativas e parlamentares, ousadia que austria considerava daninha manuteno de seus domnios italianos.A iminente invaso austraca foi repelida pelo apoio diplomticofrancs aos piemonteses. (parte 3, cap. 20)

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    Leituras recomendadas

    Hobsbawm, Eric. Ecos da Marselhesa: Dois sculos reveem aRevoluo Francesa. So Paulo: Companhia das Letras, 1996.

    Marx, Karl. O 18 de brumrio de Lus Bonaparte. So Paulo: BoitempoEditorial, 2011.

    Tocqueville, Alexis de. A democracia na Amrica. Livro I: Leis ecostumes. 2 ed. So Paulo: Martins Fontes, 2001.

    Tocqueville, Alexis de. A democracia na Amrica. Livro II: Sentimentos

    e opinies. So Paulo: Martins Fontes, 2000.

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