cesário verde - características - ii
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Cesário Verde
Camponês preso em liberdade pela cidade. Alberto Caeiro
Contextualização
Nasce em Lisboa a 25 de Fevereiro de 1855 e morre de tuberculose a 19 de Junho de 1886. As suas poesias são reunidas e
publicadas, postumamente em 1887 em O Livro de Cesário Verde.
Principais características de Lisboa da segunda metade do século XIX: - rápido aumento populacional provocado pelo êxodo rural;
- relação “pouco saudável” entre os novos habitantes e a cidade;
- nascimento do proletariado urbano;
- desenvolvimento contraditório e desumanizado da cidade: os candeeiros a gás e a eletricidade, a água canalizada a par de ruas de
terra, malcheirosas e escuras, a falta de higiene das casa e dos mercados abastecedores;
- bairro como microcosmos dentro da cidade;
- violência social e doméstica;
- contrastes entre ricos e pobres;
- miséria social;
- doenças e acidentes de trabalho;
- condições sub-humanas em que viviam e trabalhavam os operários.
Cesário Verde – Principais características
Aspetos gerais: Contemporâneo de Antero e Eça (Eça critica a sociedade portuguesa em geral – a alta burguesia e a aristocracia – e Cesário critica
sobretudo a cidade, denunciando as condições miseráveis em que vivem as camadas populares);
Contemporâneo do realismo, que influencia alguns aspetos da sua poesia:
- descrição objetiva do real;
- presença de figuras do povo;
- preocupação social;
- expressão de solidariedade social.
Aspetos específicos: - carácter deambulatório;
- aspeto cinético e visualismo: o poeta faz a apresentação de aspetos genéricos e globalizantes, descendo depois aos aspetos
particulares que descreve pormenorizadamente;
- aspecto pictórico: influência dos movimentos e técnicas pictóricas da época (Realismo e Impressionismo)
C o l é g i o A m o r d e D e u s – C a s c a i s P o r t u g u ê s 1 1 º a n o
F i c h a d e T r a b a l h o
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C o l é g i o A m o r d e D e u s – C a s c a i s P o r t u g u ê s 1 1 º a n o
F i c h a I n f o r m a t i v a
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- presença do quotidiano citadino e campestre;
- binómio campo (vida, pureza, felicidade, saúde, alegria, liberdade, luz) / cidade (morte, tristeza, doença, infelicidade, prisão, sombra)
- nova imagem da mulher: do povo, sofredora e doente «Contrariedades» e «Num Bairro Moderno»; leviana «Sentimento de um
Ocidental»; sedutora e bela «De Tarde» e «De Verão»;
- intenção crítica e a questão social;
- mito de Atneu – o contacto com a terra, com a realidade confere força e vitalidade;
- fugas imaginativas e a pretensa objectividade.
à Como poeta parnasiano: æ não dá a conhecer aquilo que sente, não é sua intenção dar-se a conhecer;
æ procura descrever os objetos, pintá-los e despertar nos outros ideias e sensações;
æ propõe uma explicação para o que observa com objetividade e, quando recorre à subjetividade, apenas transpõe, pela imaginação
transfiguradora, a realidade captada numa outra que só o olhar de artista pode notar;
æ preocupa-se com a perfeição, rigor formal, regularidade métrica, estrófica e rimática;
æ a nível morfossintáctico recorre à expressividade verbal, à adjetivação abundante, rica e expressiva, por vezes em hipálage, à
precisão vocabular e ao colorido da linguagem.
à Poeta-pintor: æ capta as impressões da realidade que o cerca com objetividade;
æ intencionalmente realista – atento a pormenores mínimos que servem para transmitir as percepções sensoriais;
æ preocupa-se com a expressão clara, objetiva e concreta;
à Cidade – Lisboa æ cidade onde deambula;
æ descreve ruas soturnas e melancólicas, com sombras e bulício e absorve-lhes a monotonia, o «desejo absurdo de sofrer»;
æ projeta imagens da mulher formosa, fria e altiva, os vícios e as fantasias mórbidas;
æ Exemplos de poemas «Num Bairro Moderno»; «Cristalizações»; «Sentimento de um Ocidental»;
à Campo – Linda-a-pastora æ canta a vida rústica de canseiras, a sua vitalidade e saúde;
æ no campo identifica-se com o povo;
æ Exemplos de poemas: «Nós»; «De Tarde»; «Em Petiz»;
à Poetização do real (objectividade/subjectividade) æ interesse pelo real, procura traduzir impressões para reconstituir a realidade, ou seja o real quotidiano com as suas emoções;
æ poetizar o real = visionar situações vividas no dia-a-dia pela atenção permanente do que o rodeia;
æ procura representar a impressão que o real deixa em si próprio;
æ «A poesia do quotidiano nasceria da impressão que o “fora” deixa no “dentro” do artista (...) O artista procura surpreender o momento
em que os objetos imersos numa dada relação de luz e sombra, ganham a sua inteira individualidade» Massaud Moisés
æ Exemplos de poemas «Cristalizações», «Contrariedades», «O Sentimento de um Ocidental».
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à Binómio Cidade /Campo: æ amor ao rústico e ao natural;
æ repúdio da perversidade e pseudovalores humanos e industriais;
æ sexualização da cidade e do campo que incorpora as alegorias da morte e da vida;
æ «Para escapar à dupla limitação da cidade, Cesário tenta encontrar uma solução social e pessoal através de uma identificação activa
e concreta com o campo». Hélder Macedo;
à Subjetividade do tempo e da morte: æ a oposição cidade/campo conduz à oposição morte/vida;
æ Cesário cria uma repulsa à cidade, onde gostava de deambular, que acaba por aprisioná-lo;
æ Cesário reconhece a certeza da morte e identifica-a com a cidade soturna, com focos de epidemia, cheia de solidão e de miséria,
sendo por isso o campo a única salvação;
æ a cidade torna-se «capital maldita» e Cesário revolta-se sobretudo com a morte da irmã, «doce irmã», «essa flor precoce/Que
cresceu e morreu rapidamente» («Nós» parte II) e do irmão «pobre rapaz robusto e cheio de futuro» («Nós» parte III).
à Relacionamento estético com a imagética feminina: æ a cidade surge associada à mulher fatal e à morte, enquanto o campo se une à imagem da mulher angélica e da vida;
æ a mulher fatal surge incorporando um valor erótico que simultaneamente desperta o desejo e arrasta para a morte.
à Questão social: realismo de intenção basicamente naturalista: æ Cesário procura pintar «quadros por letras, por sinais»;
æ interessa-se pelo conflito social do campo e da cidade, procurando documentá-lo e analisá-lo;
æ Cesário «foi o primeiro que fez a anatomia do homem esmagado pela cidade, e para o qual esta contou como elemento da própria
consciência, foi o poeta que viveu a cidade e a trouxe para a poesia». Adolfo Casais Monteiro.
à Inovação da arte poética: modelo de naturalidade e de «sereno realismo visual»: æ retrata coisas simples que observa a cada instante, por isso é considerado um poeta do concreto e do quotidiano. O assunto mais
simples e trivial torna-se grandioso e objeto de reflexão;
æ preocupa-se em escolher as palavras que reflitam a realidade;
æ é dotado da técnica impressionista por acumular pormenores das sensações captadas e pelo recurso às sinestesias, que lhe
permitem transmitir sugestões e impressões da realidade
à Mito de Anteu: æ Anteu, filho de Gea (Terra) e de Posídon, era um gigante muito possante, que vivia na região de Marrocos, e que era invencível
enquanto estivesse em contacto com a mãe-terra. Desafiava todos os recém-chegados em luta até à morte. Vencidos e mortos os seus
cadáveres passavam a ornar o templo do deus do mar, Posídon. Hércules, de passagem pela Líbia, entrou em combate contra Anteu e,
descobrindo o segredo da sua invencibilidade, conseguiu esmagá-lo, mantendo-o no ar.
æ O mito de Anteu permite caracterizar o novo vigor que se manifesta quando há um reencontro com a origem, com a mãe-terra.
æ Pode falar-se do mito de Anteu em Cesário, na medida em que o contacto com o campo parece reanimá-lo, dando-lhe forças,
energias e saúde;
æ O mito de Anteu surge em Cesário para traduzir o esgotamento gerado pelo afastamento da terra, do espaço positivo do campo.