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Meteorologia Geral 2011 Cláudio Paulo & Gilberto Mahumane Página 1 CAPITULO V MOVIMENTOS ATMOSFÉRICOS A causa fundamental dos movimentos atmosfericos é a diferença de Pressões entre duas regiões. O vento é resultado da acção de forças, das quais a força devida à pressão é a origem do movimento. A atmosfera age através do vento como uma resposta às diferenças de pressão, no sentido de diminuir essas diferenças. Assim é de esperar que o vento sopre no sentido das regiões de Pressão mais Alta para as de regiões mais Baixa. Figura 5.1: O Vento. 5.1 O Gradiente de Pressão Atmosférica Em princípio, para uma função tridimensional como a pressão atmosférica o gradiente é definido como: (, ,) ( ) ( ) ( ) p xyz p xi p yj p zk

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Meteorologia Geral 2011

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CAPITULO V

MOVIMENTOS ATMOSFÉRICOS

A causa fundamental dos movimentos atmosfericos é a diferença de Pressões entre

duas regiões.

O vento é resultado da acção de forças, das quais a força devida à pressão é a origem

do movimento. A atmosfera age através do vento como uma resposta às diferenças de

pressão, no sentido de diminuir essas diferenças. Assim é de esperar que o vento

sopre no sentido das regiões de Pressão mais Alta para as de regiões mais Baixa.

Figura 5.1: O Vento.

5.1 O Gradiente de Pressão Atmosférica

Em princípio, para uma função tridimensional como a pressão atmosférica o gradiente

é definido como:

( , , ) ( ) ( ) ( )p x y z p x i p y j p z k

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Na prática esse vector dá a taxa de variação da pressão em função da distância, na

direcção em que essa variação é máxima.

Se, por exemplo, forem calculadas as components horizontais, a variação maior se dá

na direcção perpendicular às isóbaras, como se vê na Figura 5.2.

Figura 5.2: Gradiente de Pressão.

O gradiente da pressão no ponto A da Figura 5.2 sera calculado por:

3

908 904 80

4 80 0,05

5 10

p s p s

hPa km

hPa km hPa km

Pa m

Note-se que no ponto B da Figura 5.2, embora a diferença de pressão seja a mesma, o

espaçamento entre as linhas é maior. Substituindo na expressão:

3(908 904) 120 3,3 10p s hPa km Pa m

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Ou seja, o gradiente de pressão é maior em regiões onde o espaçamento entre as

isóbaras é menor, desde que a diferença de pressão entre duas isóbaras vizinhas seja

sempre o mesmo. (No exemplo da Figura 5.2, elas estão espaçadas de 4 hPa).

5.2 Força Gradiente de Pressão

Considere-se a Figura 5.3, de um element de volume de ar. Na direção x a parcela

sofre a ação de forças devidas à pressão sobre as duas paredes opostas.

Figura 5.3: Força de Gradiente de Pressão.

Se na Parcela à esquerda a pressão é P , a força atuando da esquerda para direita é:

xF P A P y z

A força atuando na parte direita, em sentido contrário, onde a pressão é P P P , é:

( )xF P y z P P y z P y z

A força por unidade de massa é então:

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.

(1 ) ( )

px pxf F M P y z v P y z x y z

P x

ou:

( 1 ) ( )pxf P x

ou seja, a força gradiente de presão na direção x é proporcional ao gradiente de

pressão nauqela direção.

As expressões são análogas para as outras direções, então se pode escrever:

(1 ) ( ) ( ) ( ) (1 )P Pf P x i P y j P z k

A componente vertical da força gradiente de pressão é aproximadamente equilibrada

pelo peso da parcela, razão pela qual na análise dos movimentos atmosféricos se

calcula a força gradiente de pressão somente na horizontal:

(1 ) 1 ( ) ( )PH Hf P P x i P y k

ou, se se considerar, como no caso da Figura ao lado, a direção perpendicular às

isóbaras:

(1 )( )PHf P S

O sinal negativo da expressão indica que a força tem sentido oposto ao da variação

positiva da pressão.

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O cálculo pode ser feito também em mapas de alturas geopotenciais para superfícies

isobáricas. Na Figura 5.4, o segmento inclinado faz parte de uma superfície isobárica.

Pode-se escrever:

1 ( )PXf P P x

Ao mesmo tempo, usando a equação hidrostática entre os pontos B e C:

P P g z

ou

P P g z

Substituindo na equação da força gradiente de pressão:

(1 )Pxf g z x

Fazendo , 0x y , Pxf g z x

onde z x é o gradiente de altura geopotencial para variação horizontal da distância.

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Figura 5.4: Força de Gradiente de Pressão.

5.3 Força de Coriolis

A força de coriolis é uma força fictícia que aparece quando se observa o movimento da

atmosfera a partir de um sistema de referência preso à Terra, devido à própria rotação

da Terra. Para entender o seu significado, pode – se observar a Figura 5.5.

Figura 5.5: Força de Coriolis.

Suponha-se inicialmente que a Terra esteja girando e com ela arrastando o ar. Uma

parcela sobre o Equador terá velocidade V R V onde é a velocidade angular da

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Terra e R é a distância entre o ponto na supeficie da Terra e o eixo de rotação. No

caso, 57,292 10 rd s e 66.370 6,370 10R km m .

Se uma força resultante agindo perpendicularmente à velocidade inicial levar esta

parcela de ar até um ponto ao norte do Equador, a componente da velocidade paralela

ao Equador não vai variar. Porém, distância da parcela ao eixo de rotação num ponto

afastado do Equador é menor que a distância no Equador (na latitude de 30 N ela vale

6cos30 5,523 10R R m ). Assim, a velocidade de um ponto preso à superfície da

Terra naquela latitude será menor que um ponto preso ao Equador e portanto menor

que a velocidade da parcela que veio do Equador até aquele ponto. Ou seja a parcela

vai ter uma velocidade em relação à Terra na direcção oeste-leste para a direita. Como

essa velocidade era nula quando a parcela estava no Equador, para um observador no

solo parece-lhe que a parcela foi acelerada por uma força perpendicular à velocidade

sul-norte. Se a parcela estivesse inicialmente parada num ponto acima do equador e

fosse levada em direcção ao Equador, o desvio seria para oeste. Assim, no hemisfério

norte a força de Coriolis, actua perpendicularmente ao movimento da parcela,

apontando para o lado direito do movimento. No hemisfério sul ela actuaria em sentido

oposto, isto é, para o lado esquerdo do movimento.

Além disso, a força de Coriolis é proporcional à velocidade, é maxima nos polos e nula

no Equador.

Devido ao facto de a força de Coriolis ser perpendicular ao movimento, o trabalho

realizado por ela é nulo, portanto ela só actua no sentido de mudar a direcção da

velocidade e não alterá-la.

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5.4 Balanço Geostrófico

Pode-se agora verificar o efeito das duas forças sobre uma parcela de ar.

Seja, na Figura 5.6, a parcela inicialmente parada, porém sugeita à força gradiente de

pressão Pf . No início, como a velocidade é nula, a força de Coriolis também é nula. A

força gradiente de pressão vai acelarar a particula e, à medida que a velocidade fôr

aumentando, vai aumentando a força de Coriolis que vai desviando a partícula para a

esquerda (no hemisfério sul). Essa força não altera a velocidade da parcela, mas esta

será acelerada pela força gradiente de pressão e a força de Coriolis vai tornando a

velocidade cada vez mais paralela às isóbaras e portanto a força de Coriolis se torna

cada vez mais paralela à força gradiente de pressão e oposta a esta. No momento em

que as duas forças se igualam, a força resultante é nula e a velocidade não vai mais

variar, isto é, a força gradiente de pressão não vai mais acelerar a parcela. Esse

equilíbrio é chamado “balanço geostrófico” e a velocidade correspondente é chamada

“velocidade geostrófica”, indicada por gV . Caso houvesse um súbito aumento da força

gradiente de pressão, a parcela seria acelerada, aumentaria a força de Coriolis e se

restabeleceria o equilíbrio.

Figura 5.6: Balanço Geostrófico.

Pode-se aqui estabelecer uma regra de que o movimento das parcelas em equilíbrio

dinâmico se processa paralelamente às isóbaras, de forma que as baixas pressões se

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encontram à esquerda do movimento no hemisfério sul e à direita do movimento no

hemisfério norte.

No caso de isóbaras curvas, às forças gradiente de pressão e força de Coriolis deve-se

acrescentar outra força fictícia que é a força centripeta, de forma que no equilíbrio a

velocidade da parcela tangencie as isóbaras.

No caso de isóbaras fechadas o movimento será em torno dos centros. No caso de

centros de baixa pressão, o movimento será horário, e no caso de centros de alta

pressão, no sentido anti-horário, ambos os casos no hemisfério sul. No hemisfério norte

a regra é oposta.

A seguinte regra mecânica é válida para o hemisfério sul:

Tabela 1: Regra mecânica para o Hemisfério Sul.

Hemisfério Sul

Centro de pressão Alta Baixa

Sentido do movimento Anti-Horario Horario

Nome do sistema Anti-Ciclone Ciclone

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Figura 5.7: Balanço Geostrófico num sistema curvo.

5.5 Força de Atrito

Suponha-se que a atmosfera seja dividida em camadas superpostas e que camadas

adjacentes tenham velocidades médias diferentes. Neste caso diz-se que existe um

cisalhamento vertical do vento. Cisalhamento é então definido como uma variação da

intensidade do vento quando se desloca perpendicularmente a ele.

Na verdade, cada camada é composta de moléculas com velocidades distribuidas

caoticamente em todas as direcções e que em média resultam na velocidade do ar na

camada.

Como vai haver moléculas passando de uma camada para outra, as moléculas que

passam da camada mais lenta para a camada mais rápida, vão em média diminuir a

velocidade desta, e as que passam da camada mais rápida para a mais lenta vão em

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media aumentar a velocidade desta. Esse fenómeno se chama “transporte de momento

na vertical”. O efeito macroscópico desse fenómeno é a variação do momento linear

das camadas, que pode ser representado por uma força, chamada a “força de atrito”

( af ). Como mostra a Figura 5.8, a força de atrito actua na camada mais rápida no

sentido de diminuir a velocidade e, na camada mais lenta, no sentido de acelerá-la.

No caso da camada adjacente à superficie da terra, a transferência de momento se dá

entre a terra e a camada de ar, sendo que a terra tem momento zero e quando a

camada de ar lhe transmite momento, a variação de velocidade da Terra é

imperceptível.

Em termos práticos, a força de atrito tem as seguintes características:

Figura 5.8: Força de Atrito.

a) É contrária ao movimento, isto é, actua em sentido contrário ao da

velocidade.

b) É proporcional à velocidade,

c) É tanto maior quanto mais próximo da superfície da terra.

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O efeito das três forças (gradiente de pressão, Coriolis e atrito) está representado na

Figura 5.9. Neste caso também se atinge um equilíbrioentre as forças. Note-se aqui

que a velocidade tem uma componente perpendicular às isóbaras, no sentido das

pressões mais altas para as pressões mais baixas. Em torno de centros de baixa

pressão e de alta pressão, essa componente tem o sentido de entrar nos de baixa e

sair dos de alta pressão.

Figura 5.9: O Efeito das três forças (em cima) e o sentido da velocidade em torno dos centros de baixa e

alta pressão.

A força de atrito, sendo maior próximo da superfície, determina o cruzamento das

isóbaras pelo vento, com muito mais eficiência para os níveis mais baixos da

atmosfera. As duas Figuras abaixo (Figura 5.10 e 5.11) exemplificam esse facto. Na

carta de superfície os ventos são mais fracos e cruzam as isóbaras. Na carta de 500

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hPa , os ventos são mais fortes e paralelos às fortes e paralelos às isolinhas de altura

geopotencial.

Figura 5.10: Direcção do Vento.

5.6 Perfil Vertical do Vento

Devido ao atrito do solo, o vento tem velocidade zero na superfície. O cisalhamento

devido ao atrito, ou a variação vertical da velocidade horizontal do vento, depende da

velocidade do vento e da rugosidade da superfície. Essa rugosidade pode ser

provocada pela presença de plantas na superfície ou outros obstáculos, e o perfil

vertical toma a forma:

0ln( )V k z z

onde k é uma constante aproximadamente igual a 1 e 0z é um parámetro de

rugosidade que varia de 0,1cm para superfície de areia até cerca de 10cm para grama

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alta. Note-se na Figura 5.12 que, para plantas mais altas a velocidade junto ao solo é

menor.

Figura 5.12: Perfil vertical do vento.

5.7 Vento Térmico

Outra causa do cisalhamento vertical do vento é o chamado “vento térmico”. O

fenômeno pode ser visualizado na figura seguinte onde estão representadas algumas

superficies isobáricas. Percebe-se que a atmosfera é mais quente no lado direito da

Figura 5.13, onde a espessura da camada entre as superficies isobáricas é maior.

Nota-se que a inclinação das superficies vai aumentando com a altura. Este facto faz

com que a força gradiente de pressão na horizontal também aumente com a altura,

pois ela é proporcional ao gradiente de pressão, a velocidadedo vento num nível

superior P2 e num nível inferior P1 é chamada “vento térmico” e é proporcional ao

gradiente horizontal de temperatura.

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Figura 5.13: Vento Térmico.

5.8 Movimentos na Vertical

Como foi visto, as forças que actuam na atmosfera na vertical estão quase sempre em

equilíbrio, ou seja, as acelerações na vertical são muito pequenas comparadas com as

acelerações na horizontal. Em consequência disso, enquanto as velocidades na

horizontal podem variar de zero 0 até 150 ou 200m s , a velocidade vertical não

ultrapassa algumas dezenas de cm s , excepto em condiçoes muito especiais, de

topografia abrupta ou de convecção intensa. Os movimentos verticais geralmente

acontecem associados a movimentos horizontais e, embora pequenos, são muito

importantes para a determinação do tempo presente.

Entre as causas da componente vertical do vento, temos a convergência e divergência,

os efeitos orográficos, a convecção e a ascenção nas frentes.

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a) Convergência e divergência

Ao se observer um cemtro de baixa pressão na superfície, percebe-se que o ar é

forçado a se movimentar em direcção ao centro. Como o ar não pode se concentrar ali,

ele é obrigado a subir (uma vez que não pode descer e penetrar no solo). Esse

movimento do ar, de modo que ele entra numa região, é chamado de convergência,

como ocorre no caso dos ciclones. Ocorre o contrário num centro de alta pressão na

superfície, onde o ar é forçado a sair da região (divergência) e ser substituído por ar

vindo das camadas superiors, constituindo um movimento vertical para baixo, também

chamado de subsidência. A conservação da massa do ar exige que a circulação se

complete, havendo novos centros de convergência e divergência na atmosfera

superior, como na Figura 5.14.

Figura 5.14: Convergência e divergência.

Devido ao movimento vertical do ar, os centros de baixa pressão geralmente se

associam a regiões de alta nebulosidade e precipitação e os centros de alta pressão a

regiões de céu limpo.

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b) Efeitos orográficos

Quando a barreira de uma montanha se opõe ao vento, este é obrigado a subir sobre

ela. Por essa razão é comum que a face da montanha à montante (de onde o vento

flui), seja mais nebulosa e chuvosa e a face à vazante seja mais seca e quente, pois a

humidade já foi condensada e transformada em precipitação antes do ar atingir esta

outra face da montanha.

Figura 5.15: Efeito Orográfico.

c) Convecção

Como já foi visto no texto, a convecção ocorre em atmosferas instáveis. Ela pode,

porém, ser iniciada pela convergência do vento ou por efeito orográfico, ou também

pode ser inibida pela divergência ou pela subsidência do ar ao descer uma montanha.

d) Ascenção nas frentes frias e quentes

O ar frio que se forma nos pôlos, flui em direcção ao Equador, formando oque se

chama a “frente polar”. Essa frente, quando encontra o ar quente proveniente das

regiões de latitudes menores, determina regiões alternadas, umas em que o ar frio

invade regiões de ar quente e outras em que o ar quente invade regiões de ar frio. As

primeiras são limitadas pelas chamadas frentes frias e as outras pelas frentes quentes.

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Os perfis verticais das frentes frias e quentes são diferentes, como mostram as figuras.

Como o ar quente é menos denso e oferece menor resistência ao avanço do ar frio, a

superfície limite entre as duas massas de ar é quase vertical próximo ao solo.O ar

quente é obrigado a subir abruptamente, devido ao avanço do ar frio e ali se formam

nuvens e precipitação.

No caso da frente quente, o ar frio oferece maior resistência ao avanço do ar quente,

então este sobe suavemente sobre o ar frio. As nuvens e a precipitação ocorrem muito

à frente da frente na superfície e a precipiteção é mais leve e contínua. Note-se que a

escala vertical das figuras está exagerada, uma vez que é da ordem da altura da

troposfera, isto é, aproximadamente 10km .

Figura 5.15: Frentes.

5.9 Escalas de Circulação

5.9.1 A Célula de Hadley ou de circulação directa

A circulação do ar se inicia geralmente com o aquecimento diferencial entre duas

regiões vizinhas. É intuitivo que o aquecimento do ar na superfície pode provocar a

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convecção, o ar sobe e deve ser substituído por ar da vizinhança na superfície.

Entretanto a Figura 5.16 ilustra como se inicia o movimento na horizontal.

Figura 5.16: Célula de Hadley.

Sejam duas colunas de ar próximas, com a mesma temperatura inicial. Ambas têm a

mesma espessura. Se a coluna da direita fôr aquecida, sua espessura será aumentada

e a pressão à altura original será aumentada. O gradiente horizontal de pressão assim

criado é que vai produzir o movimento. Esse tipo de circulação é conhecido como

circulação térmica directa, formando a célula de circulação directa ou célula de Hadley.

5.9.2 Circulação primária ou planetária

Em 1735 Hadley concluíu que, pelo facto de a região equatorial ser fortemente

aquecida, o ar ali deveria ser ascendente, formando assim uma célula de circulação

directa descendente nos pôlos. O ar se moveria então, na superfície, dos pôlos para o

equador e, na alta atmosfera, do Equador para os pôlos. Devido à força de Coriolis, o

vento que sopra na direcção do Equador seria desviado para o oeste, resultando assim

os ventos alíseoa das regiões tropicais.

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Figura 5.17: Circulação Planetária.

Porém, Hadley não previu que a própria força de Coriolis iria acelerar o vento na alta

atmosfera para o leste, de modo que a velocidade seria altíssima quando atingisse

latitudes acima de 30 (a 30 a velocidade já teria aumentado 62m s e a 45 teria

aumentado 135m s ).

Isso causaria um desequilíbrio dinâmico e por isso o ar seria obrigado a descer

aproximadamente à latitude de 30 . Próximo aos pôlos se forma outra célula de

circulação directa e entre as duas células há uma outra de circulação indirecta. Essa

distribuição de ventos produz uma distribuição de climas sobre o globo terrestre: a

cerca de 30 de latitude situam-se os desertos do mundo e a 45 50 , onde o ar é

ascendente, está a faixa onde se encontra a frente polar, com suas frentes frias e

quentes associadas.

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5.9.3 Circulação secundária ou sinótica

É a circulação associada aos ciclones e anti-ciclones, e às frentes frias e quentes, com

dimensões de uns poucos milhares de quilómetros.

Como sabemos, a frente polar separa o ar frio dos polos do ar quente da zona

temperada. Nessas duas regiões o vento sopra no sentido leste-oeste no ar frio e

oeste–leste no ar quente.

Figura 5.18: Frentes.

O atrito entre as duas massas de ar se movendo em sentidos opostos produz uma

ondulação na frente polar. A convergência dos ventos no vértice da ondulação produz

um ciclone que se move com as frentes fria e quente no sentido oeste-leste.

Note-se que a circulação em torno do ciclone transporta ar quente em direcção ao polo

sul e ar frio em direcção ao equador. Isso quer dizer que o ciclone em latitudes médias,

com suas frentes associadas, é um mecanismo de transporte de calor das regiões

equatoriais para as regiões polares, que recebem menos energia solar.

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Figura 5.19: As Frentes e os Ciclones.

5.9.3.1 Ciclones tropicais

Os ciclones tropicais ocorrem fora da frente polar, mais próximos do equador, em

regiões de convergências de ventos sobre o mar, que vão se intensificar pela liberação

de calor latente em nuvens de grande profundidade. Os ventos aí atingem velocidades

altíssimas, que produzem desastres no mar e nas regiões costeiras. Uma vez que os

ciclones tropicais entram terra adentro, perdem a fonte de energia que é a unidade

evaporada do mar e decaem gradualmente até desaparecer.

5.9.3.2 Anti-ciclones

Os anti-ciclones se formam em geral em regiões mais frias, de ar descendente ou entre

dois ciclones. Em geral, no verão, a terra é mais quente que o mar, então se formam

ciclones em terra e anti-ciclones nos mares adjacentes.

5.9.4 Circulação terceária

São sistemas de ventos localizados com dimensões de ordem de 100km e curta

duração.

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5.9.4.1 Brisa marítima e terrestre

As brisas marítimas e terrestres são células de circulação directa do tipo de Hadley.

No caso da brisa marítima, que ocorre durante o dia, a terra é aquecida pelo sol, e por

sua vez aquece a atmosfera. O ar aquecido sobe e é substituído por ar mais frio do

mar. Sobre o mar, então se formará um ramo de circulação descendente. O alcance da

brisa marítima formada chega a 40 km terra adentro, e ela é responsável pelas chuvas

à tarde. Note-se que o mar também recebe radiação durante o dia, porém se aquece

menos que a terra.

À noite, sem a fonte de energia solar, a terra se resfria mais rapidamente que o mar e a

circulação é em sentido contrário, sendo chamada ”brisa terrestre”, que sopra da terra

para o mar.

Figura 5.20: Desenvolvimento da brisa marítima e terreste.

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5.9.4.2 Ventos de montanha e de vale

Nos vales, devido ao aquecimento maior nas encostas, o ar é forçado a subir durante o

dia. Por outro lado, à noite as encostas se resfriam mais rapidamente e o fluxo se

inverte.

Figura 5.21: Schematic illustration of flow in a valley: Left: in the early afternoon when the valley and up-

slope winds are occuring; Rigth: about midnigth when the floww is down the valley and the slope.