aula de filosofia - como argumentar

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Aprenda a discordar usando a lógica do papel higiênico 11/06/2012 por Dakir Larara 6 Comentários Qual é a forma certa de se colocar um rolo de papel higiênico no banheiro? POR CIMA! 60% das pessoas têm a certeza absoluta que o certo é o estilo “cachoeira”, com o papel saindo por cima. É mais fácil achar a ponta, dá pra rasgar certinho no picote, não fica raspando a mão na parede (menos bactérias!) e hotéis podem sinalizar aos seus hóspedes que o banheiro foi higienizado, com dobras elaboradas ou colando selinhos. POR BAIXO!

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Argumentação

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Page 1: Aula de Filosofia - Como Argumentar

Aprenda a discordar usando a lógica do papel higiênico11/06/2012 por Dakir Larara 6 Comentários

Qual é a forma certa de se colocar um rolo de papel higiênico no

banheiro?

POR CIMA!

60% das pessoas têm a certeza absoluta que o certo é o estilo

“cachoeira”, com o papel saindo por cima. É mais fácil achar a ponta, dá

pra rasgar certinho no picote, não fica raspando a mão na parede

(menos bactérias!) e hotéis podem sinalizar aos seus hóspedes que o

banheiro foi higienizado, com dobras elaboradas ou colando selinhos.

POR BAIXO!

Os outros 40% acham esses 60% uns loucos e estão certos que o melhor

é por baixo. O “caimento” é melhor, o papel não fica sobrando, gatos e

crianças não conseguem desenrrolar um monte de papel e basta uma

Page 2: Aula de Filosofia - Como Argumentar

puxadinha para rasgar um quadradinho, porque para baixo tem mais

tração.

Mas, afinal, quem está certo e quem está errado? Todo mundo. Não tem

certo nem errado. O papel higiênico é seu, e você usa do jeito que

quiser. É uma decisão totalmente pessoal, influenciada apenas por

hábitos, com as duas maneiras suportadas por motivos bastante

pertinentes.

POR QUE ISSO INTERESSA?

Essa questão bizarra do papel higiênico serve como dinâmica para

colocar o foco na nossa habilidade de argumentação e não para se

chegar a uma resposta, já que não tem o certo nem o errado. Por

exemplo, o professor de sociologia Edgar Alan Burns, do Eastern Institute

of Technology Sociology, usa esse truque no primeiro dia de aula. Ele

pergunta aos seus alunos:

“Como vocês acham que o papel higiêncico deve ser colocado?”

E nos 50 minutos seguintes, os alunos naturalmente começam a avaliar

os MOTIVOS para suas respostas e acabam chegando sozinhos a

questões sociais muito maiores como:

• diferenças de papéis sociais entre homens e mulheres

• diferenças entre comportamentos públicos e privados

• diferenças entre classes sociais

• etc

São relações de construção social que nunca pararam para pensar antes,

mas que agora, sem que ninguém os orientasse, conseguiram enxergar.

Sozinhos, começaram a raciocinar e perceberam correlações e fatos. E,

principalmente, começaram a argumentar.

No dia-a-dia, quase nunca fazemos isso. Geralmente, tomamos um

partido e passamos a defendê-lo de forma passional, enxergando só o

que nos interessa. Somos bons de discutir, mas ruins para argumentar.

Piores ainda para mudar de ideia. Mais para o boxe do que para o tênis.

Page 3: Aula de Filosofia - Como Argumentar

O que parece ser uma estratégia não muito inteligente para encarar essa

nova sociedade em que conversamos com muito mais gente, sobre

muito mais coisas, todo santo dia.

APRENDER A DISCORDAR

A aula do papel higiênico devia ser dada de cara para crianças. A escola

ensina que existe o certo e o errado, e dá notas baseadas nisso. Mas

podia estimular abordagens diferentes, habilidade de argumentação,

capacidade de deduzir (algumas já fazem, eu sei, mas a maioria ainda

não).

Do mesmo jeito que tem nota para as melhores respostas, deveria ter

para as melhores perguntas também. Senão a gente vai continuar

crescendo com essa mania de preferir estar certo do que aprender algo

novo, do que parar pra pensar e repensar sempre. Aproveitar a bagagem

e o raciocínio do outro.

Já reparou como a maioria dos comentários feitos todos os dias na

internet não tem elaboração nenhuma? Ou é genial ou é a coisa mais

estúpida que já se viu em toda a a história da humanidade. O

programador Paul Grahan fez um gráfico bacana, que mostra a

“Hierarquia da Discordância”, do mais ao menos elegante, do mais ao

menos eficiente.

Page 4: Aula de Filosofia - Como Argumentar

O design thinking é isso. A maneira de pensar de um designer não é a do

certo ou do errado, porque não existe certo ou errado na hora de

projetar um bule de café. Mas existe o melhor, o mais eficiente. É uma

maneira de pensar em que se evolui a realidade.

Quem sabe um dia a gente consegue argumentar sobre futebol, política

e religião. Dizem que não se discute, mas a recomendação só existe

porque somos meio trogloditas. A propósito, o grande designer Donald

Norman coloca os rolos de papel higiênico na sua casa… assim:

Abraços

Dakir Lara