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Associação Nacional dos Cursos de Graduação em Administração Administração: Ensino e Pesquisa Volume 11 Número 1 Rio de Janeiro Janeiro/Fevereiro/Março 2010

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Associação Nacional dos Cursos de Graduação em Administração

Administração: Ensino e Pesquisa Volume 11 Número 1

Rio de Janeiro Janeiro/Fevereiro/Março

2010

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A Administração: Ensino e Pesquisa é um periódico trimestral da ANGRAD (Associação Nacional dos cursos de Graduação em Administração) que tem como missão difundir o estado da arte do ensino e pesquisa em Administração. Administração: Ensino e Pesquisa, v. 11, n. 1, (Janeiro/Fevereiro/Março 2010) – Rio de Janeiro: ANGRAD, 2010 – trimestral. 1. Administração – Periódico ISSN – 2177-6083 Projeto Gráfico: Bruno Gomes Editoração: Gabrielle Junqueira Hernandes Revisão Editorial: Gabrielle Junqueira Hernandes Tiragem: 1200 Impressão: Gráfica Data de Impressão: 31 de Março de 2010 As opiniões emitidas nos textos publicados são de total responsabilidade dos seus respectivos autores. Todos os direitos de reprodução, tradução e adaptação estão reservados. A Administração: Ensino e Pesquisa completa um volume a cada ano e é distribuída gratuitamente aos seus associados. As associações podem ser feitas por meio da homepage da ANGRAD (www.angrad.org.br). Os números anteriores estarão disponíveis enquanto durarem os estoques.

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Conselho Editorial Prof. Dr. Antonio de Araujo Freitas Junior Fundação Getúlio Vargas – Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas Rio de Janeiro/RJ – Brasil Profa. Dra. Arilda Schmidt Godoy Universidade Presbiteriana Mackenzie São Paulo/SP – Brasil Profa. Dra. Maria da Graça Pitiá Barreto Universidade Federal da BahiaSalvador/BA – Brasil Prof. Dr. Pedro Lincoln Universidade Federal de PernambucoRecife/PE – Brasil Prof. Dr. Roberto Costa Fachin Universidade Federal do Rio Grande do Sul Porto Alegre/RS – Brasil Prof. Dr. Rui Otávio Bernardes de Andrade Universidade do Grande Rio Rio de Janeiro/RJ - Brasil Profa. Dra. Sylvia Constant Vergara Fundação Getúlio Vargas – Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas Rio de Janeiro/RJ – Brasil Profa. Dra. Sylvia Maria Azevedo Roesch London School of Economics Londres – Inglaterra Profa. Dra. Tânia Maria Diederichs Fischer Universidade Federal da BahiaSalvador/BA – Brasil

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Corpo Editorial Científico Prof. Dr. Antonio Carlos Coelho Universidade Federal do Ceará Fortaleza/CE – Brasil

Prof. Dr. Carlos Osmar Bertero Fundação Getúlio Vargas - Escola de Administração de Empresas de São Paulo São Paulo/SP – Brasil

Prof. Dr. Diógenes de Souza Bido Universidade Presbiteriana Mackenzie São Paulo/SP – Brasil

Profa. Dra. Eliane P. Zamith Brito Fundação Getúlio Vargas - Escola de Administração de Empresas de São Paulo São Paulo/SP – Brasil

Profa. Dra. Manolita Correia de Lima Escola Superior de Propaganda e MarketingSão Paulo/SP – Brasil

Prof. Dr. Marcelo Gattermann Perin Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul Porto Alegre/RS – Brasil

Prof. Dr. Martinho Isnard R de Almeida Universidade de São Paulo São Paulo/SP – Brasil

Prof. Dr. Piotr Trzesniak Universidade Federal de Itajubá Itajubá/MG – Brasil

Profa. Dra. Sônia Maria Rodrigues Calado Dias Faculdade Boa Viagem Recife/PE – Brasil

Prof. Dr. Tomás de Aquino Guimarães Universidade de Brasília Brasília/DF – Brasil

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Gestão ANGRAD (2010/2011) Conselho Diretor Presidente: Prof. Adm. Mauro Kreuz Faculdade Campo Limpo Paulista Campo Limpo Paulista/SP – Brasil Vice-Presidente: Prof. Adm. Mário César Barreto Moraes Universidade do Estado de Santa Catarina Florianópolis/SC – Brasil Diretor de Administração e Finanças: Prof. Dr. Francisco Marcelo G. Barone do Nascimento Fundação Getúlio Vargas - Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas Rio de Janeiro/RJ – Brasil Diretor de Ensino e Pesquisa: Prof. Ms. Gildo Galindo Faculdade Frassinetti do Recife Recife/PE – Brasil Diretor de Relações Institucionais: Prof. Ms. Antônio Carlos Dias Athayde Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Contagem/MG – Brasil Diretor de Marketing: Profa. Dra. Cláudia de Salles Stadtlober Instituto Superior de Educação do Instituto Porto Alegre da Igreja Metodista Porto Alegre/RS – Brasil Diretor de Publicações: Profa. Dra. Tânia Maria da Cunha Dias Faculdade Castro Alves Salvador/BA – Brasil Diretor de Relações Internacionais: Prof. Dr. Vicente Nogueira Filho Associação Internacional de Educação Continuada Brasília/DF – Brasil

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Conselho Fiscal Prof. Ms. Jorge Henrique Mariano Cavalcante Faculdades Atenas Maranhenses São Luís/MA – Brasil Prof. Dr. Rogério Augusto Profeta Universidade de Sorocaba Sorocaba/SP – Brasil Profa. Dra. Andréa Maria Accioly Minardi Instituto de Ensino e Pesquisa São Paulo/SP – Brasil Suplente: Prof. Ms. José Carlos Pacheco Coimbra Faculdade de Jaguariúna Jaguariúna/SP – Brasil Conselho Consultivo Prof. Dr. Rui Otávio Bernardes de Andrade Universidade do Grande Rio Rio de Janeiro/RJ – Brasil Prof. Dr. Alexander Berndt Ad Homines Associação Educacional São Paulo/SP – Brasil Prof. Dr. Antonio de Araujo Freitas Junior Fundação Getúlio Vargas - Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas Rio de Janeiro/RJ – Brasil Equipe ANGRAD Superintendente Executivo: Adm. Luiz Carlos da Silva Assessora de Eventos: Helena Almeida Auxiliar Administrativo: Bruno Gomes Estagiária: Thaís Carreira

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EDITORIAL

Começo esta mensagem com os agradecimentos ao Prof. Dr. Antonio Freitas Junior e sua diretoria, que me apoiaram no meu primeiro ano como editora científica da Revista Angrad e também ao Prof. Dr. Mauro Kreuz e sua diretoria que a partir de janeiro de 2010 assumiram a direção da Angrad, renovando e fortalecendo este apoio. A Revista Angrad a partir deste número terá seu nome alterado para Administração: Ensino e Pesquisa. Fizemos esta mudança para que fosse possível, já a partir do nome do periódico, refletir sua missão. Queremos ser o periódico que concentra a publicação do que é pesquisado no Brasil sobre ensino de Administração na graduação, mas também nos cursos de especialização e MBA, nos mestrados acadêmicos e profissionais, e no doutorado. Priorizaremos também a publicação de estudos que tratem da metodologia de pesquisa em Administração, incluindo análises e reflexões sobre teorias da área. Entendemos que revisões em profundidade a respeito de teorias em Administração poderão ser muito valiosas para os professores desenvolverem conteúdos com seus alunos. Ferramentas de apoio ao ensino, também serão publicadas. Enfim, queremos ser o espaço democrático que estimula e facilita a aprendizagem da área de Administração.

Serão priorizados relatórios de pesquisa, ensaios e pensatas que tratam de temáticas como: teorias de aprendizagem; tecnologia a serviço do ensino; ensino a distância; aprendizagem individual e coletiva; transferência de conhecimento; questões éticas no ensino; ensino de habilidades emocionais; avaliação e garantia de aprendizagem; coaching e mentoring; comunidades de prática, entre outros. Com relação aos temas de pesquisa gostaríamos de receber trabalhos que discutam as questões filosóficas, epistemológicas e metodológicas, incluindo avaliações sobre o uso de técnicas específicas de pesquisa. Nesta edição apresentamos seis artigos. O primeiro, que tem autoria de Iani D. Lauer-Leite e Alice da S. Moreira, é o resultado de uma pesquisa sobre expectativas dos alunos de graduação relativas ao seu primeiro emprego. Os resultados mostram que o jovem espera que em seu emprego ele seja aceito e possa conviver bem no ambiente de trabalho. Alinhamento de metas entre empresas e o jovem e a possibilidade para o crescimento pessoal são também relevantes para eles. Cabe às empresas entender como trabalhar estas expectativas, considerando o perfil deste jovem.

O trabalho de Marcelo de R. Pinto, Michele C. D. da Silva e Rodrigo C. de Freitas teve como objetivo explorar como alunos do curso

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de Administração de uma faculdade particular compreendem o conceito de responsabilidade social. A pesquisa realizada constatou que os estudantes compreendem apenas algumas facetas do conceito, o que demanda atenção por parte das instituições de ensino e também dos professores no sentido de ajudá-los a construir uma visão mais consciente, madura e voltada para a ação social. Paulo R. da Cunha, Ilse M. Beuren, Rita B. Rausch e Daniela Benvenuti são os autores do terceiro artigo. Este identifica a área de abrangência da contabilidade gerencial na visão dos docentes que atuam nos cursos de ensino superior em ciências contábeis das instituições que compõem a Associação Catarinense das Fundações Educacionais de Santa Catarina. Um levantamento com 40 docentes de nove universidades apontou as principais temáticas de abrangência da contabilidade gerencial e comparou os resultados com os achados em pesquisa anterior feita com IES do Paraná, constatando-se alguma convergência.

Dimária Silva e Meirelles é a autora do ensaio que propõe uma abordagem teórica para estratégias competitivas e barreiras de entrada em serviços. Este tipo de trabalho é relevante para análises em profundidade e de forma transversal de temáticas específicas em sala de aula. Queremos incentivar autores a submeterem este tipo de reflexão, em especial os alunos de doutorado que fazem revisões teóricas em profundidade que poderiam ser extremamente úteis aos professores em sala de aula.

O quinto artigo tem autoria de Darlan J. Roman, Eliane S. Filippim e Silvio Santos Júnior e trata da importância da questão ambiental no processo de tomada de decisão de compras. O trabalho consultou 36 empresas clientes do setor de papel e celulose e constatou que a decisão de compra não é afetada pela postura do fornecedor com relação ao tratamento das questões ambientais de sua produção. O estudo também constatou que os clientes conhecem pouco sobre práticas ambientais. A publicação anual da CartaCapital – As empresas mais admiradas no Brasil 2009, reforça estes achados, à medida que os gestores do setor papel e celulose atribuem pouca importância ao desenvolvimento sustentável. Ricardo Gonzaga Martins de Araújo e Adriane Vieira conduziram um estudo na Nansen S/A – Instrumentos de Precisão que analisou de que maneira as mudanças tecnológicas introduzidas na empresa influenciaram no desenvolvimento de competências tanto organizacionais, como funcionais e individuais.

Desejo a todos boa leitura.

Eliane Pereira Zamith Brito Editora Científica

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SUMÁRIO  11-29 EXPECTATIVAS QUANTO AO PRIMEIRO EMPREGO: A VISÃO

DE UNIVERSITÁRIOS DOS CURSOS DE ADMINISTRAÇÃO, SISTEMAS DE INFORMAÇÃO E ECONOMIA

EXPECTATIONS RELATED TO THE FIRST JOB: VIEWS OF STUDENTS FROM BUSINESS ADMINISTRATION, INFORMATION SYSTEMS AND ECONOMICS COURSES

Iani Dias Lauer-Leite e Alice da Silva Moreira 31-52 RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL: O QUE OS

ALUNOS DE GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO TÊM A DIZER?

CORPORATE SOCIAL RESPONSIBILITY: WHAT DO UNDERGRADUATE BUSINESS ADMINISTRATION STUDENTS HAVE TO SAY?

Marcelo de Rezende Pinto, Michele Cristina Duarte da Silva e Rodrigo Cassimiro de Freitas

53-78 ABRANGÊNCIA DA CONTABILIDADE GERENCIAL SEGUNDO OS DOCENTES DE CONTABILIDADE DE SANTA CATARINA – BRASIL

SCOPE OF MANAGERIAL ACCOUNTING ACCORDING TO THE ACCOUNTING FACULTIES OF SANTA CATARINA – BRAZIL

Paulo Roberto da Cunha, Ilse Maria Beuren, Rita Buzzi Rausch e Daniela Benvenuti 79-100 ESTRATÉGIAS COMPETITIVAS E POTENCIAL DE BARREIRAS

DE ENTRADA EM SERVIÇOS: UMA PROPOSTA DE ABORDAGEM TEÓRICA

COMPETITIVE STRATEGIES AND POTENTIAL OF ENTRY BARRIERS IN SERVICES: A PROPOSAL OF THEORETICAL APPROACH PROPOSAL

Dimária Silva e Meirelles

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101-120 A INFLUÊNCIA DA QUESTÃO AMBIENTAL NA DECISÃO DE COMPRA DO CLIENTE DO SETOR DE PAPEL E CELULOSE

THE INFLUENCE OF ENVIRONMENTAL ISSUE ON THE CUSTOMER OF PAPER AND CELLULOSE BUSINESS SECTOR PURCHASING DECISION

Darlan J. Roman, Eliane Salete Filippim e Silvio Santos Júnior

121-148 INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS E NOVAS COMPETÊNCIAS:

UM ESTUDO DE CASO NA NANSEN S/A

TECHNOLOGICAL INNOVATIONS AND NEW COMPENTENCES: ACASE STUDY AT NANSEN S/A

Ricardo Gonzaga Martins de Araújo e Adriane Vieira

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EXPECTATIVAS QUANTO AO PRIMEIRO EMPREGO: A VISÃO DE

UNIVERSITÁRIOS DOS CURSOS DE ADMINISTRAÇÃO, SISTEMAS DE

INFORMAÇÃO E ECONOMIA

EXPECTATIONS RELATED TO THE FIRST JOB: VIEWS OF STUDENTS FROM

BUSINESS ADMINISTRATION, INFORMATION SYSTEMS AND ECONOMICS

COURSES

IANI DIAS LAUER-LEITE ([email protected]) UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

ALICE DA SILVA MOREIRA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ RESUMO Este trabalho teve como objetivos principais descobrir quais as expectativas do jovem ao escolher seu primeiro emprego. Foram pesquisados alunos de cursos de Sistemas de Informação, Administração e Economia, por apresentarem diferentes níveis de empregabilidade de seus egressos, segundo o Guia de Profissões e Mercado de Trabalho, da editora Oriente-se (2001). Participaram da pesquisa 431 universitários de uma faculdade particular, da cidade de Belém (PA) que responderam à Escala de Expectativas quanto ao Primeiro Emprego e preencheram uma folha de dados pessoais. Os resultados apontam que, entre as cinco variáveis pesquisadas, os alunos indicaram priorizar o relacionamento interpessoal na escolha do emprego, mostrando uma preocupação em ser aceito e conviver bem no ambiente de trabalho. Em segundo e terceiro lugar na relevância para a escolha estão, respectivamente, as diretrizes estabelecidas pela empresa em relação a suas metas e relacionamento com o funcionário e a possibilidade crescimento pessoal. Os dados apontam diferenças entre os alunos dos diferentes cursos. O conhecimento gerado poderá ser útil na criação de estratégias que busquem a congruência entre objetivos individuais e organizacionais e a manutenção dos jovens em empregos adequados no mercado de trabalho. Palavras-chave: empregabilidade; escolha profissional; jovens.

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Expectativas quanto ao primeiro emprego

ABSTRACT This study had as its objective to find out the expectations of young people in relation to their first job and the influence of socio-demographic variables on their expectations. The sample population consisted of 431 students from the Administration, Information Systems and Economy courses of a private University in the city of Belem (PA).The students answered questions from the First Job Expectations Scale (EPE) and a socioeconomic questionnaire. The results showed that the subjects prioritized Interpersonal Relationships (M=4.52) in the choice of jobs, followed by Personal Politics and Processes (M=4.36), Growth (M=4.14), Personal Advantages (M=3.60) and Ease (M=3.12).The results of the Regression Analysis and the MANCOVA technique showed that the variables course, age, gender and professional performance were correlated with the EPE scale factors. The knowledge generated by this study may be useful in the creation of strategies that seek the congruence between individual and organizational goals and the retention of young people in appropriate jobs in the job market. Keywords: employability; professional choice; young people. INTRODUÇÃO A busca do primeiro emprego e toda a complexidade que envolve o tema tem sido alvo de discussões em várias áreas do conhecimento. Economistas, estudiosos do mercado de trabalho têm se preocupado em entender como as experiências e treinos efetivos de trabalho afetam os ganhos de salário e benefícios na vida do jovem. Psicólogos e sociólogos procuram os efeitos do trabalho sobre o desenvolvimento social e psicológico na vida adulta. Educadores observam como o trabalho afeta o aprendizado e os resultados de outras atividades escolares (STONE; MORTIMER, 1998). Essa preocupação é notada ao se verificar a variedade de focos dados ao tema na literatura científica: Jovens e desemprego (WESTCOTT, 2002); Políticas de emprego para jovens (FOUGÈRE; KRAMARZ; MAGNAC, 2000; O'HIGGINS, 2002); Transição da escola para o trabalho (GENDA; KUROSAWA, 2001; VIEIRA; COIMBRA, 2006); Riscos e danos presentes nos empregos para jovens (DUNN et al, 1998; FRONE, 1998; EVENSEN et al, 2000); Experiências de vida como preditores de realização ocupacional (SNELL et al, 1994); Impacto negativo de trabalhos de meio-período para

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Iani Dias Lauer-Leite e Alice da Silva Moreira

adolescentes (STEINBERG; DORNBUSCH; SANFORD et al, 1993); Características do emprego e conflitos do trabalho-escola (MARKEL; FRONE, 1998); Adolescentes e saúde ocupacional (SIMOYI; FREDERICK; NIEZEN, 2001); Emprego e mortalidade de jovens (MORREL et al, 1999); Significado do trabalho e o processo de socialização no início da carreira (HARPAZ; HONIG; COETZIER, 2002); Preparo de jovens sob agência de cuidados com o bem-estar (COOK, 1994); O emprego de jovens e o desenvolvimento vocacional (STONE; MORTIMER, 1998). Mais recentemente discutem-se as questões psicológicas envolvidas na expectativa frente à inserção ocupacional (COELHO et al, 2008; BRANDÃO, 2009).

No Brasil comenta-se acirradamente essa temática, pois o jovem brasileiro não raro entra precocemente no mercado de trabalho. Pochmann (2000) afirma que as responsabilidades assumidas muito cedo pelo jovem comprovam a ideia da juventude como a configuração de um estilo coletivo de vida e de pensar, ao invés de ser uma etapa de preparação para a vida adulta. Dessa forma a entrada no mercado de trabalho sem a devida preparação técnica e acadêmica, resulta em subempregos que dificultam a escalada rumo a uma melhor situação de vida.

A educação nesse contexto pode tornar-se o instrumento para propiciar a mobilidade social necessária a uma melhor qualidade de vida. Em relação a outros países em desenvolvimento, o Brasil comemora avanços significativos no acesso ao ensino superior; contudo esse acesso representa apenas 5% do total de matrículas do sistema educacional. Segundo Pochmann (2000), apenas 13% dos jovens entre 20 e 24 anos estão na universidade. Dentre estes não é raro encontrar aqueles que já mantém um emprego. No entanto, um emprego para o jovem deve ser dotado de algumas características que auxiliem na sua formação profissional.

Stone e Mortimer (1998) definiram algumas dimensões de um emprego de qualidade para jovens: possibilidade de utilizar o próprio conhecimento; treinamento e oportunidades para aprender coisas novas; tarefas variadas; oportunidades para trabalhar com pessoas; ajudar outros; bom salário; supervisores que possam fornecer informações sobre como o jovem está realizando as tarefas; e encorajamento para que desenvolva bons hábitos de trabalho. Essas características promovem o crescimento profissional do jovem e também propiciam que ele permaneça no emprego. Outros autores como Harpaz, Honig e Coetsier (2002) determinaram características como: oportunidade para aprender, relacionamento interpessoal, possibilidade de promoção, horas Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 11-29 • Jan/Fev/Mar 2010 13

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Expectativas quanto ao primeiro emprego

trabalhadas, variedade, trabalho interessante, segurança do emprego, semelhança entre o trabalho e as habilidades próprias, pagamento, condições de trabalho e autonomia. A própria literatura empresarial apresentou componentes importantes do emprego como: desafios, salários e benefícios, estabilidade, qualidade de vida, responsabilidade social, carreira internacional e visibilidade. Diante desse tão grande espectro de componentes necessários ao emprego para o jovem, questiona-se: quais características inerentes ao emprego que o jovem considera importantes? Quais variáveis sócio-demográficas influenciam na escolha?

Este artigo tem dois objetivos: 1) Analisar quais são as características desejáveis ao primeiro emprego pós-universidade na opinião de jovens universitários; 2) Averiguar a influência de algumas variáveis sócio-demográficas sobre a escolha dessas características. Tais resultados poderão ser usados na busca de congruência entre as expectativas dos jovens quanto ao emprego e as expectativas das instituições empregadoras, facilitando assim a entrada do jovem no mercado de trabalho e a sua permanência no emprego.

Antes da apresentação dos resultados será realizada uma breve discussão das características desejáveis ao emprego, tanto na literatura científica quanto empresarial, com o objetivo de embasar a pesquisa empírica realizada. A seguir será apresentado o delineamento da pesquisa e os resultados encontrados.

Jovens e mercado de trabalho A entrada dos jovens no mercado de trabalho é um dos muitos ritos de passagem da adolescência para a vida adulta. Nessa etapa da vida, não raro os jovens estão cheios de expectativas e sonhos. Em sociedades consideradas “primitivas”, a passagem da adolescência para a vida adulta é frequentemente marcada por rituais que envolvem medo e sofrimento físico. Contudo esses rituais são aguardados ansiosamente pelos jovens, que os vêem como uma oportunidade de provar seu valor perante a comunidade adulta de suas tribos (LEVISKY, 1995). Em tribos africanas, meninos adolescentes são raptados por homens mascarados, de sua própria tribo, e deixados na floresta durante dois meses para sobreviverem sozinhos. Este ritual conta com a aquiescência dos pais, embora os adolescentes não o saibam. Durante esse período, as meninas ficam na companhia das mulheres mais velhas da tribo e aprendem a cuidar da casa, do marido e demais atividades relacionadas ao papel feminino adulto. Após esse tempo, os meninos voltam da floresta e escolhem com

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quem vão casar. Para a tribo, eles já são adultos, capazes de criar e manter uma nova família, independente dos pais. (MARCONDES, 2002).

Em outras tribos, o ritual de passagem para a vida adulta consiste em que o jovem do sexo masculino permita que um ancião da tribo arranque alguns de seus dentes, usando apenas instrumentos primitivos como um prego velho e uma pedra redonda, sem qualquer tipo de anestesia. Durante o processo, não é permitido que o jovem emita qualquer sinal de dor (ROBINSON, 1972).

Na sociedade ocidental, embora não haja ritos de passagem definidos, espera-se que o jovem cumpra alguns requisitos para ser aceito no mundo adulto. Levisky (1995) comenta sobre cinco pontos importantes que o indivíduo deve cumprir, relacionados ao status de adulto: maturidade, independência, autodeterminação, responsabilidade e atividade sexual efetivamente adulta (procriação e condições socioeconômicas para estabelecer uma família). A entrada no mercado de trabalho pode ser considerada um rito de passagem, pois, mediante esta, o jovem adquire independência financeira e torna-se um consumidor pleno.

No Brasil, é comum que a entrada no mercado de trabalho aconteça prematuramente, não raro, no mercado informal. Jovens que trabalham e estudam é uma situação rotineira. Pochmann (2000) comenta que a inserção no mercado de trabalho feita de maneira inadequada e antecipada, pode comprometer a trajetória profissional do jovem. Como rito de passagem, a entrada no mercado de trabalho deve ser pensada, discutida e analisada, incluindo nessa discussão o ponto de vista do jovem.

Jovens e primeiro emprego: indicativos da literatura científica e empresarial Na literatura científica e também na empresarial encontram-se indicativos da existência de múltiplos aspectos relevantes para o jovem no momento da escolha do primeiro emprego. Alguns autores como Stone e Mortimer (1998), em revisão de literatura sobre desenvolvimento vocacional, pontuam algumas características necessárias a um emprego para jovens. Conforme esses autores, um emprego de qualidade para esse público específico deve ter algumas características como: possibilidades de desenvolver e utilizar o conhecimento adquirido, chances para apreender novos conhecimentos, diversidade de tarefas, supervisão adequada do trabalho, fornecimento de feedback, bom salário e possibilidade de ajudar outras pessoas.

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Nota-se, contudo, carência de dados empíricos que comprovem essas dimensões. A seguir serão relatados estudos relacionados ao tema, sendo um deles encontrado na literatura empresarial e dois encontrados na literatura científica.

Indicativos de expectativas quanto ao emprego na literatura empresarial A literatura empresarial é prolífica quanto ao tema “emprego”. Nos últimos anos o tema jovens e emprego tem sido bastante abordado. Contudo, na maioria das vezes, a literatura aborda as dimensões do desejável quanto ao emprego, do ponto de vista da empresa. Em outros casos, a origem da dimensionalidade não está clara. Como exemplo da literatura empresarial, a revista Você S/A publicou em 2001 uma reportagem de capa sob o título: “Qual a empresa ideal para você trabalhar?” (SILVEIRA, 2001) Foram definidos sete grupos de características desejáveis ao candidato: desafios, remuneração e benefícios, estabilidade, qualidade de vida, responsabilidade social, carreira internacional e visibilidade. Essas características são detalhadas a seguir:

a) Desafios: É preciso gostar de assumir riscos, ser motivado a trabalhar com parceiros e objetivos diferentes, ter flexibilidade, aprender com facilidade; b) Salários e benefícios: Sentir-se à vontade em mercados agressivos e competitivos, disponibilidade para trabalhar fora do país, saber transformar planos em realidade, ter boas redes de relacionamento, facilidade para lidar com mudanças e gostar de riscos; c) Estabilidade: Preferir cargos que exijam desempenho previsível e constante, gostar de benefícios em longo prazo, preocupar-se mais com o contexto do trabalho, ser leal; d) Qualidade de vida: Ter boas relações dentro e fora do trabalho, ter saúde emocional, física, espiritual e profissional; e) Responsabilidade social: Ser politizado, não encarar o salário como item fundamental para ficar no emprego, ter alta resistência à frustração, ser perseverante, generoso e organizado, gostar de trabalho em grupo, ser proativo; f) Carreira internacional: Ter boa capacidade de comunicação, ter alta sociabilidade, ter flexibilidade cultural, saber negociar de forma colaborativa;

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Iani Dias Lauer-Leite e Alice da Silva Moreira

g) Visibilidade: Gostar de ficar em evidência, planejar a carreira, ser independente, assertivo, saber equilibrar vida pessoal e profissional, assumir riscos.

O artigo apresentou ainda resultados de uma pesquisa realizada online com internautas, na qual eles deveriam responder à pergunta: Se você tivesse de escolher uma nova empresa, que critério utilizaria? Os resultados mostraram que 42% dos 684 respondentes preferiram empresas que dessem maiores chances de desenvolvimento e desafios; 20% optaram por trabalhar numa organização que tivesse salários acima da média e oferecesse benefícios especiais; 15% preferiram empresas que oferecessem estabilidade no emprego; 8% escolheram empresas com maior qualidade de vida; 7% afirmaram preferir organizações socialmente responsáveis; 5% escolheram empresas que dessem oportunidade de carreira internacional e 3% queriam trabalhar em companhias que permitissem maior visibilidade no mercado. A ideia da reportagem foi possibilitar ao leitor a identificação do próprio perfil profissional com o das empresas participantes do guia Exame – As 100 melhores empresas para você trabalhar (2001). No entanto, no artigo não foram encontradas referências que mostrassem base teórica ou empírica para a formação de tais categorias, inferindo-se que sua criação foi arbitrária. Indicativos das expectativas quanto ao emprego na literatura científica Dois estudos da literatura científica apresentaram alguns indicativos das prioridades dos indivíduos em relação ao emprego. Esses estudos não versaram diretamente sobre o tema expectativas quanto ao primeiro emprego, mas mostraram evidências da multidimensionalidade desse construto.

Harpaz, Honig e Coetsier (2002) realizaram um estudo transcultural sobre o significado do trabalho e o processo de socialização em início de carreira, utilizando nesse estudo o conceito de Significado do Trabalho (MOW – meaning of work). Segundo esses autores, o significado do trabalho é determinado pelas escolhas e experiências individuais e pelo contexto organizacional e ambiental nos quais o indivíduo vive e trabalha. Nesse sentido, o significado do trabalho é mensurado por três aspectos: a) a centralidade do trabalho; b) normas sociais sobre o trabalho e c) importância dos objetivos de trabalho. Esses três aspectos ou domínios dão origem ao significado do trabalho. O domínio “Objetivos de Trabalho” se refere a objetivos e valores que são priorizados pelos indivíduos em sua vida profissional. Foram Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 11-29 • Jan/Fev/Mar 2010 17

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Expectativas quanto ao primeiro emprego

apresentados 11 objetivos de trabalho aos indivíduos participantes da pesquisa: oportunidade para aprender, relacionamento interpessoal, possibilidade de promoção, horas trabalhadas, variedade, trabalho interessante, segurança do emprego, semelhança entre o trabalho e as habilidades próprias, pagamento, condições de trabalho e autonomia.

Um segundo estudo, no qual consta a temática “expectativas quanto ao emprego”, foi realizado por Genda e Kurosawa (2001) no Japão, tendo como uma das finalidades analisar determinantes de probabilidade para deixar um emprego. O estudo controlou as preferências dos trabalhadores em termos do mais importante critério para escolher um emprego. Os critérios apresentados foram: satisfação com o emprego ou ocupação, tamanho da empresa ou valor do nome da empresa no mercado, perspectivas futuras, valor social do emprego, mérito por tempo de serviço, bom pagamento, boas condições de trabalho (horas, feriados), boa localização, sem transferências ou transferência limitada, conveniente para substituição e outros critérios não mencionados.

No Brasil, alguns estudos mais recentes apontam para a variedade de características que o emprego deve ter, para ser desejável. Morin, Tonelli e Pliopas (2007) realizaram pesquisa utilizando o conceito de centralidade do trabalho para jovens executivos e encontraram que as categorias variedade nas tarefas, aprendizagem, autonomia, reconhecimento e segurança eram necessários para dar sentido ao trabalho.

Os estudos citados, apesar de focarem outros aspectos da relação jovem-trabalho, forneceram a ideia de que existem critérios de decisão na escolha do emprego. Embora a ideia sobre a existência de critérios de escolha esteja confirmada pela literatura empresarial, nota-se, contudo, ausência de teste empírico sistematizado para verificar quais são os critérios que de fato norteiam o jovem no momento da escolha.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS São necessárias duas definições preliminares à descrição do método: quem é o jovem; e o que é o primeiro emprego. Jovem é aqui definido como o sujeito entre 17 e 30 anos, que ainda está na faculdade. O primeiro emprego é definido como o emprego que o jovem universitário obterá após concluir seus estudos no ensino superior, tendo ele experiências anteriores de emprego ou não. Após a conclusão da graduação, o jovem possui um conhecimento mais específico, que possibilitará a ele ter mais opções de escolha no mercado de trabalho.

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Quanto às limitações, o estudo foi restrito a uma faculdade particular da cidade de Belém (PA). Optou-se pela faculdade particular em virtude de haver maior possibilidade de controle da variável nível sócio-econômico, já que foi delimitado no desenho de pesquisa que a amostra seria obtida predominantemente no nível de classe média. A faculdade particular, onde o estudo foi realizado, é considerada de classe média, e comumente estudam pessoas com maior poder aquisitivo. Além disso, nessa instituição, a amplitude de faixa etária é menor, o que atende a outra limitação do desenho de pesquisa, que é o fato de se propor a pesquisar apenas jovens. O estudo deixa possibilidades de novas pesquisas com estudantes do ensino médio e estudantes de instituições da rede pública de ensino. Amostra A amostra foi selecionada, segundo o critério de conveniência, em uma universidade particular na cidade de Belém, Pará. Três cursos foram escolhidos representando graus de empregabilidade (alta, média e baixa), conforme o Guia de Profissões e Mercado de Trabalho, da editora Oriente-se (2001), um manual de profissões para jovens. Os cursos escolhidos foram: Administração (média empregabilidade), Sistemas de Informação (alta empregabilidade) e Economia (baixa empregabilidade). Participaram 431 universitários que responderam os instrumentos de pesquisa. De cada curso participaram: Administração (207), Sistemas de Informação (116), e Economia (108). Todos os sujeitos estudavam entre o primeiro e terceiro ano, estando assim distribuídos: 225 (52,2%) pertenciam ao primeiro ano, 89 (20,6%) ao segundo ano e 117 (27,1%) ao terceiro ano. Não fizeram parte dessa amostra sujeitos do quarto ou quinto ano (conforme o curso), por não existirem na faculdade pesquisada turmas cursando essas etapas do curso. A média de idade dos participantes foi de 21,73 (DP 2,91). A renda familiar média geral foi de 5.847,85, não havendo diferenças estatisticamente significativas entre os cursos. Mediante o teste do qui-quadrado, observou-se diferença significativa de gênero entre os cursos (χ2

(5, N=431) = 34,13, p<0,001). O curso Sistemas de Informação apresentou maior percentagem de pessoas do gênero masculino e menor percentagem do gênero feminino. Os cursos de Administração e Economia apresentaram maior porcentagem de alunos do gênero feminino, e menor de alunos do gênero masculino.

Os resultados apontaram ainda que a maior parte da amostra residia com os pais, não se caracterizando, ao menos aparentemente, uma situação de independência financeira.

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Expectativas quanto ao primeiro emprego

Quanto à atuação profissional, procedeu-se à classificação dos resultados segundo duas categorias: “não trabalha”, que agregou os indivíduos que nunca trabalharam; já trabalharam, mas no período de coleta de dados não estavam trabalhando e aqueles que faziam estágio. A categoria “trabalha” uniu as respostas de indivíduos que estavam trabalhando na área de formação ou fora dela. Os resultados indicaram que a grande maioria dos sujeitos, em todos os cursos, não trabalhava. Pelo teste do Qui-quadrado, verificou-se a não existência de diferenças significativas entre os cursos para esta variável, ou seja, grande parte dos sujeitos dos cursos pesquisados não trabalhava. Esse resultado mostra a adequação da amostra ao objetivo geral dessa pesquisa, que é verificar as expectativas desses jovens na escolha do primeiro emprego. Instrumentos Foram utilizados dois instrumentos: Uma ficha com solicitação de informações sobre idade, gênero, situação de moradia e atuação profissional e a Escala de Expectativas quanto ao Primeiro Emprego.

A escala de expectativas quanto ao primeiro emprego foi desenvolvida no Brasil em 2003, como parte do projeto de mestrado da primeira autora (LAUER-LEITE, 2003), tendo em vista a inexistência de um instrumento que mensurasse quais as características desejáveis em um emprego, do ponto de vista do jovem. A escala foi construída tendo como base a literatura científica, literatura empresarial e entrevistas prévias realizadas com universitários. O instrumento foi aplicado e validado com a mesma amostra deste estudo. . Os resultados apresentados aqui são, portanto, parte desse projeto. Para a validação da escala foram realizadas análises fatoriais, que objetivam fazer emergir a estrutura latente do construto. Os resultados mostraram uma estrutura com cinco fatores, com alphas de Cronbach que variaram de 0,61 a 0,75. Os fatores são definidos a seguir:

a) Políticas e processos: Diretrizes estabelecidas pela empresa em relação a suas metas e relacionamento com o funcionário; b) Vantagens pessoais: Priorização de aspectos relacionados à obtenção de vantagens que propiciem ganho pessoal; c) Crescimento: Características embasadas nas políticas de trabalho da empresa que propiciam crescimento profissional; d) Relacionamento Interpessoal: Convívio com todas as pessoas ligadas à empresa, direta ou indiretamente e a necessidade de satisfação pessoal daí derivada;

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e) Facilidades: Preocupação com o bem-estar próprio, desejo de facilidades e possibilidade de obter benefícios/crescimento com pouco esforço.

A escala é composta por 81 itens, que devem ser avaliados por uma escala de cinco pontos e que varia de (1) concordo fortemente a (5) discordo fortemente. Coleta de dados Os dados foram coletados na própria universidade, nas salas de aula, mediante prévia autorização dos coordenadores de curso e agendamento realizado com os professores das disciplinas. No dia marcado para a coleta, um membro pesquisador convidava os estudantes a participar da pesquisa, informando da participação voluntária e da não-necessidade de identificação dos participantes. Os alunos que aceitaram participar responderam aos questionários em sala de aula e o entregaram ao pesquisador.

Análise dos dados Os dados foram analisados mediante recursos da estatística descritiva e, para avaliar a relação entre o curso e as expectativas quanto ao emprego, foram realizadas análises de regressão e testes MANCOVA. O programa SPSS 11.0 foi utilizado para a análise dos dados. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados das médias dos fatores das Expectativas quanto ao Primeiro Emprego apontaram o fator Relacionamento Interpessoal como o mais priorizado pela amostra (M=4,52), seguido por Políticas e Processos (M=4,36), Crescimento (M=4,14), Vantagens Pessoais (M=3,60) e, por último, Facilidades (M=3,12).

O fator Relacionamento Interpessoal, que obteve maior média, demonstrou que os estudantes de todos os cursos pesquisados estão preocupados em trabalhar em locais nos quais seja possível desenvolver relacionamentos, nos quais encontrem aceitação e compreensão por parte de seus chefes e colegas. Os itens desse fator demonstram a preocupação com o ser aceito, como “Anseio conviver num lugar onde as pessoas gostem de mim” e “bons colegas de trabalho e um chefe legal é o que eu espero”. A literatura confirma a necessidade do ser humano,

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Expectativas quanto ao primeiro emprego

especialmente quando ainda adolescente, de ser aceito em um grupo e da importância para ele de fazer parte de determinado grupo (WEBLEY et al, 2001). Assim, é possível que nessa fase da vida os relacionamentos sejam vistos como critérios prioritários na hora de escolher um emprego.

O segundo fator com maior média foi Políticas e Processos. Os itens desse fator deixam transparecer a imagem da empresa moderna, que se preocupa não apenas com o funcionário, mas com a comunidade. Dá a ideia de nitidez e transparência, o que significa segurança para quem deseja trabalhar nesse tipo de empresa. Logo, quem prioriza esse fator, quando vai escolher um emprego, deseja trabalhar em um local onde haja clareza de informações para o funcionário, o que bane em grande parte as inseguranças de quem está começando a trabalhar.

O fator seguinte, que é Crescimento, está relacionado a Políticas e Processos, pois mostra o desejo de trabalhar em um local que, por suas políticas e processos, propicie o crescimento profissional do funcionário, como ser uma empresa de grande porte e oportunidades de carreira internacional.

Os fatores Vantagens Pessoais e Facilidades alcançaram as menores médias. O fator Vantagens pessoais parece estar também ligado à imagem de empresa moderna, que propicia altos salários e inúmeras vantagens para quem lá trabalha. Pessoas que priorizaram esse fator estão em busca de poder, alta remuneração e visibilidade. Empresas com essas características são encontradas em mercados de trabalho muito competitivos e agressivos.

O fator Facilidades parece estar ligado a empresas que não têm características muito agressivas no mercado. Pessoas que priorizaram esse fator preferem estabilidade e tranquilidade e não parecem estar buscando uma carreira meteórica e competitiva.

Em relação à literatura buscada observou-se que os fatores citados, que indicam multidimensionalidade do construto, de forma geral estão incluídos nos fatores da escala EPE. As categorias encontradas na literatura empresarial e científica foram contempladas, sendo que a maior parte delas está de acordo com as categorias políticas e processos e crescimento. No estudo de Harpaz, Honig e Coetzier (2002) destaca-se a categoria Relacionamento Interpessoal, que foi encontrada também na Escala de Expectativas quanto ao emprego. Quanto aos fatores Vantagens Pessoais e Facilidades, não foram encontrados correlatos na literatura pesquisada.

Para análise das variáveis que estão relacionadas às expectativas quanto ao emprego foram realizadas análises de regressão e testes

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MANCOVA. Os resultados dessas análises podem ser vistos graficamente na figura 1. Figura 1: Preditores dos fatores das expectativas quanto ao emprego

Políticas e processos

B= 0,12 p<0,05 Idade

B= 0,15 p<0,05 Para análise das variáveis que estão relacionadas às expectativas

quanto ao emprego, foram realizadas análises de regressão e testes MANCOVA. Para o fator Políticas e processos (R2 = 3%) foram preditores significativos curso (B=0,10, p<0,05) e idade (B=0,12, p<0,05). No teste multivariado da MANCOVA, idade foi significativo nos 04 testes (Pillar´s Trace, Wilks´Lambda, Hotelling´s Trace e Roy´s Largest Root), com p<0,01. Esse resultado indica que quanto maior a idade, maior a preocupação com aspectos do trabalho relacionados ao bem-estar coletivo. Na análise do curso como preditor foi verificado que Administração é o curso no qual os estudantes obtiveram os maiores escores. É possível que este resultado tenha se dado pelas características do curso, que por sua natureza é voltado para todas as questões que envolvem as políticas e processos da empresa, sendo a administração eficiente desta, a maior preocupação e objetivo dos estudantes desse curso.

Para Crescimento (R2 = 13%), a variável idade foi significativa como preditora (B=0,15, p<0,01), indicando que pessoas com mais idade priorizaram mais “Crescimento”quando da escolha do primeiro emprego

B=0,10 p<0,05

B= - 0,10 p<0,05

B= - 0,13 p<0,05

B=0,13 p<0,05

B= 0,10 p<0,05

Curso

Gênero

Atuação profissional

Crescimento

Vantagens pessoais

Facilidades

Rel. interpessoal

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Expectativas quanto ao primeiro emprego

que as pessoas com menos idade, talvez pelo fato de as primeiras terem mais claramente em vista seus objetivos, que as pessoas mais novas.

A variável Atuação Profissional (R2 = 13%) entrou como preditora com beta negativo (B=-0,10 p<0,01), talvez como indicativo de que estudantes que trabalham são menos propensos a dar prioridade à possibilidade de crescimento na escolha de um emprego, quando comparados a estudantes que não trabalham. Possivelmente, isso se deva ao fato de pessoas que já trabalham tenham uma noção mais exata do quanto podem crescer na empresa; sendo possível que isso não aconteça com aqueles que não trabalham ou estão em busca do primeiro emprego. Contudo, a diferença entre as médias não foi significativa.

O fator Vantagens Pessoais não teve preditores demográficos ou sócio-econômicos na Análise de Regressão. Contudo, no teste MANCOVA o curso teve efeito significativo (p<0,05). Houve diferenças significativas (p<0,05) nas comparações pairwise entre as médias dos cursos: Economia (M=3,66) e Administração (M=3,51) e Administração (M=3,51) e Sistemas de Informação (M=3,68). Os alunos de Economia e Sistemas de Informação buscaram mais Vantagens Pessoais que os alunos de Administração. Analisando sob a ótica da empregabilidade, é interessante observar que o curso mais empregável (Sistemas de Informação) e o menos empregável (Economia) buscaram mais Vantagens Pessoais que o curso de média empregabilidade. A resposta para essa aparente contradição pode ser encontrada no raciocínio de que quem procura um curso com alta possibilidade de emprego deseja vantagens pessoais, tanto quanto quem procura um curso com baixa possibilidade de emprego. A diferença entre esses dois grupos (alta e baixa empregabilidade) talvez esteja no tipo de empresa procurada para se obter vantagens pessoais. Pessoas que escolhem cursos mais empregáveis atualmente, como Sistemas de Informação, esperam trabalhar em empresas modernas, agressivas no mercado, que ofereçam muitos benefícios, mas que exijam muito do profissional. Então, ao mesmo tempo em que a empresa oferece vantagens, ela também “cobra alto” por essas vantagens. Pessoas que escolhem cursos menos empregáveis, como Economia, buscam em geral mais estabilidade e um espaço menos agressivo no mercado de trabalho. Empresas consideradas menos agressivas são mais tradicionais e também oferecem vantagens pessoais, como salários altos e poder. Contudo, a política e os processos para a distribuição dessas vantagens pode ser diferente das empresas consideradas mais modernas.

Para o fator “Facilidades” (R2 = 13%) a variável atuação profissional apresentou efeito significativo (B=-0,13, p<0,01). O teste t 24 Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 11-29 • Jan/Fev/Mar 2010

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indicou diferença significativa (p<0,01) entre as médias dos universitários que não trabalham (M=3,18), comparado àqueles empregados (M=2,97). Isso evidencia a priorização de “Facilidades” por aqueles não trabalham. Possivelmente, as pessoas que já trabalham tenham mais noção da realidade das empresas e, por isso, priorizam outros aspectos mais relevantes e reais para suas carreiras. Por outro lado, pessoas que não trabalham, como as que estão buscando seu primeiro emprego, não vivenciaram o dia-a-dia do mercado de trabalho e por isso, muitas vezes, possuem ideias equivocadas acerca da realidade existente lá.

Para o fator Relacionamento Interpessoal (R2 = 3%) a variável gênero apresentou efeito na MANCOVA e foi preditora na Análise de Regressão (B=0,13, p<0,05). As mulheres (M=4,58) tiveram médias mais altas que os homens (M=4,43), significando que priorizam mais os relacionamentos que os homens na escolha do emprego. Contudo, do ponto de vista prático, a diferença entre as médias foi muito pequena, ainda que estatisticamente significativa. Tal resultado pode ter sido influenciado pelo tamanho da amostra, conforme afirma Hair et al (2005), ao comentar sobre a significância estatística.

CONCLUSÃO Este estudo objetivou conhecer as expectativas quanto ao primeiro emprego de estudantes universitários dos cursos de Administração, Sistemas de Informação e Economia. Observou-se que a amostra como um todo priorizou Relacionamento Interpessoal na escolha do emprego, indicando uma preocupação em ser aceito e conviver bem no ambiente de trabalho. As variáveis curso, idade, gênero e atuação profissional correlacionaram-se com as expectativas, sendo possível compreender melhor de que forma estas interferem na escolha do emprego.

Como limitações apontam-se o fato de o estudo ter abarcado apenas estudantes de uma faculdade particular localizada no norte do país e também a pesquisa ter sido realizada apenas com estudantes do 1º ao 3º ano das graduações escolhidas. A partir dessas limitações, várias possibilidades de pesquisa tornam-se possíveis e necessárias: a pesquisa comparativa entre estudantes de universidades particulares e públicas, entre calouros e finalistas, entre estudantes de outros cursos e até mesmo estudantes do ensino médio, uma vez que a entrada no mercado de trabalho acontece muito cedo no Brasil.

Ainda nesse sentido, observou-se que as relações encontradas entre as variáveis independentes: gênero, idade, curso e atuação

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profissional, e as variáveis dependentes foram estatisticamente fracas, e algumas diferenças encontradas entre médias foram pequenas. Como exemplo cita-se a diferença estatisticamente significativa encontrada nas médias de homens e mulheres para o fator Relacionamento Interpessoal. Tal diferença, ainda que apontada como significativa, foi muito pequena na prática (0,15) e pode ter se dado como conseqüência do tamanho da amostra. Segundo Hair et al (2005), ainda que haja significância estatística, isso não é sinônimo de significância na prática. Portanto, sugere-se que em pesquisas futuras sejam incluídas outras variáveis, como aquelas relacionadas à personalidade, para averiguar seu poder de predição sobre as expectativas quanto ao emprego.

Apesar das limitações citadas, o estudo em questão e os demais que se seguirão podem propiciar conhecimentos válidos para o universo acadêmico e empresarial. De fato, conhecer as expectativas quanto ao emprego de jovens universitários de diferentes cursos fornecerá subsídios para pelo menos três segmentos: para o universo acadêmico, em especial as universidades, possibilitará conhecimento que poderá ser útil na reformulação dos elementos constituintes de cada curso, de forma a preparar melhor esses jovens para o mercado de trabalho que os aguarda. Para o mercado de trabalho, em especial as empresas, conhecer o que o jovem prioriza na escolha do emprego permitirá o desenvolvimento de estratégias organizacionais que busquem congruência entre os objetivos individuais e organizacionais, além de políticas de manutenção do jovem no emprego. Para o jovem, permitirá que conheça suas prioridades e estabeleça objetivos mais alinhados com o seu perfil, de modo a alcançar o sucesso no mercado de trabalho. REFERÊNCIAS As 100 melhores empresas para você trabalhar. Exame, Edição especial, 2001.

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DADOS DOS AUTORES IANI DIAS LAUER-LEITE ([email protected]) Graduação em Administração de Empresas, mestrado e doutorado em Teoria e Pesquisa do Comportamento pela Universidade Federal do Pará Instituição de vinculação: Professora Adjunta I do Instituto Multidisciplinar em Saúde Anísio Teixeira/ Universidade Federal da Bahia Vitória da Conquista/BA – Brasil Áreas de interesse em pesquisa: Valores Individuais e Desenvolvimento Humano, Socialização Econômica. ALICE DA SILVA MOREIRA ([email protected]) Graduação em Psicologia e mestrado em Teoria e Pesquisa do Comportamento pela Universidade Federal do Pará e doutorado em Psicologia pela Universidade de Brasília Instituição de vinculação: Professora aposentada do Programa de Pós Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento pela Universidade Federal do Pará Belém/PA – Brasil Áreas de interesse em pesquisa: Valores, Psicologia Econômica. Recebido em: 11/04/2008 • Aprovado em: 28/12/2009

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RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL: O QUE OS ALUNOS DE

GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO TÊM A DIZER?

CORPORATE SOCIAL RESPONSIBILITY: WHAT DO UNDERGRADUATE BUSINESS ADMINISTRATION STUDENTS HAVE TO SAY?

MARCELO DE REZENDE PINTO ([email protected]) MICHELE CRISTINA DUARTE DA SILVA RODRIGO CASSIMIRO DE FREITAS PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS RESUMO Verifica-se um crescente interesse em relação ao tema da responsabilidade social tanto no meio empresarial como no meio acadêmico. Contudo, percebe-se que poucos trabalhos lançam luz sobre a temática do ensino em Responsabilidade Social em nosso país. Sendo assim, este trabalho tem por objetivo conhecer e discutir como alunos do curso de graduação em Administração de uma universidade privada do país entendem o conceito de responsabilidade social. Para isso, conduziu-se uma pesquisa, qualitativa, com 118 alunos de graduação em Administração da PUC-MG, Brasil, que é uma universidade privada. Aos alunos foi solicitada a elaboração de um pequeno texto com base na seguinte indagação: o que você entende por responsabilidade social empresarial? Por meio da técnica de Análise de Conteúdo, chegou-se à conclusão que os alunos privilegiam somente alguns aspectos da responsabilidade social. Ao final, são apresentadas reflexões a fim de se promover uma (re)discussão que vise ao desenvolvimento de uma postura mais socialmente responsável dos alunos de Administração. Palavras-chave: responsabilidade social; ensino em Administração; projeto pedagógico do curso de Administração.

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Responsabilidade Social Empresarial:

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ABSTRACT There is a growing interest nowadays in the subject of social responsibility in the corporate as well as in the academic environment. However, very few studies focus on the teaching of Social Responsibility in our country. Therefore, this article has the goal of stating and discussing how the students of private Administration Universities in our country understand the Social Responsibility concept. For this purpose, some qualitative research was conducted with 118 Administration students of a private Brazilian University. The students were asked to write a small text answering the following question: What do you understand as corporate social responsibility? Using the Content Analysis Technique, it can be concluded that the students privilege only some aspects of what Social responsibility. Finally, some observations are presented in order to promote a wide (re)discussion which aims at the development of a more socially responsible attitude in the administration students. Keywords: social responsibility; Administration teaching; pedagogical project of the Administration course. INTRODUÇÃO Verifica-se um interesse crescente em relação ao tema da responsabilidade social tanto no meio empresarial como no meio acadêmico. Termos como filantropia, cidadania corporativa, ética e responsabilidade social das empresas passaram a figurar no repertório de políticos, empresários e na mídia nacional. Na área acadêmica, em virtude da pujança do tema, há poucos anos, foi criada uma nova área temática no EnANPAD (Encontro Nacional da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração) – Gestão Social e Ambiental, com foco exclusivo em trabalhos nesse campo.

No meio empresarial, contudo, percebe-se que os empresários encontram-se um pouco confusos com relação à conceituação e abrangência do movimento da responsabilidade social, ainda que se sintam compelidos a adotar posturas politicamente corretas e socialmente responsáveis, impulsionados pelas recentes tendências ou por pressões concorrenciais e mercadológicas (CANOPF; PASSADOR, 2004).

Nesse sentido, os profissionais de Administração, diante dos desafios impostos pelo ambiente caracterizado pela competição crescente,

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rapidez dos avanços tecnológicos, velocidade de lançamento de novos produtos e serviços e mudanças do comportamento dos consumidores, deverão estar preparados para enfrentar situações que envolvam questões de cunho ético e, principalmente, voltados para questões sociais. Sendo assim, conforme salientado por Canopf e Passador (2004), as instituições de ensino devem assumir uma importante função social, que é a de proporcionar ao aluno de Administração subsídios que o permitam contemplar aspectos envolvendo o ambiente de negócios com maior rigor crítico.

Uma consulta aos principais veículos de divulgação da produção acadêmica em Administração leva à constatação de que poucos trabalhos lançam luz sobre a temática do ensino em Responsabilidade Social em nosso país. Alguns estudos encontrados foram o de Souza, Carvalho e Xavier (2003), Canopf e Passador (2004), Pessoa et al (2005), Silva (2006), Nicolini e Schommer (2007) e Oliveira, Guerra e Lins (2008).

É nessa lacuna do conhecimento que se insere a proposta do presente trabalho, cujo objetivo é conhecer e discutir como alunos do curso de graduação em Administração entendem o conceito de responsabilidade social. Em primeiro lugar, trata-se de uma temática que não tem sido plenamente privilegiada pelos pesquisadores da área de Ensino e Pesquisa em Administração nem pelos estudiosos do campo da Gestão Social. Segundo, os resultados da pesquisa podem servir de subsídios para coordenadores de curso, chefes de departamentos e outros profissionais na tarefa de delinear qual deve ser o papel de uma formação voltada para as questões de responsabilidade social das empresas nos currículos dos cursos de Administração do país. Em síntese, espera-se com os resultados desse trabalho tragam para discussão uma temática que interessa a estudantes, professores, coordenadores de curso, dirigentes de organizações ligadas à disseminação do conceito de responsabilidade social, empresários, bem como pesquisadores da área.

O artigo está estruturado da seguinte forma: inicialmente, buscou-se discutir sucintamente o conceito de responsabilidade social na visão de alguns autores. Em seguida, também de forma resumida, são apresentadas algumas questões levantadas na literatura existente quanto ao ensino sobre responsabilidade social empresarial no Brasil. A seguir, são apresentados os procedimentos metodológicos utilizados na pesquisa empírica. A próxima seção, dividida em duas partes, primeiramente expõe algumas características do curso de Administração sobre o qual a pesquisa foi realizada, em seguida, exibe e discute os resultados da pesquisa. Por fim, a última seção tem o objetivo de apresentar algumas

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reflexões finais a partir dos resultados, bem como limitações da pesquisa e propostas para estudos futuros.

RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL

Ao se fazer uma pesquisa detalhada sobre o tema responsabilidade social, constata-se que o seu conceito ainda não se encontra suficientemente consolidado e que, portanto, pode ser considerado em construção, visto que suscita uma série de interpretações (ASHLEY, 2002; MOHR; WEBB, 2001). De acordo com Duarte e Dias (1986), para alguns, o termo representa a ideia de obrigação legal; para outros, impõe às empresas padrões mais altos de comportamento; há os que o traduzem como prática social, papel social e função social; enquanto outros o veem associado ao comportamento eticamente responsável ou à filantropia. Por fim, há os que entendem o seu significado como ser responsável ou socialmente consciente.

No entender de Carroll (1999), o conceito de responsabilidade social é o mesmo no passado e no presente. Contudo, frisa que as mudanças aconteceram nas questões enfrentadas pelas empresas e no relacionamento empresa–sociedade.

De qualquer forma, vale afirmar que a inclusão da responsabilidade social representa uma transformação na concepção da empresa e de seu papel na sociedade. Isso ocorre uma vez que esta ideia se funda numa nova visão da realidade econômica, que propõe um novo modo de conceber as relações entre os fatores de produção, em particular entre capital e trabalho. Daí decorrem uma nova concepção da empresa e de seu papel na sociedade e o reconhecimento de que os efeitos das decisões das corporações alcançam um universo de agentes sociais bem mais amplo do que o composto por seus sócios e acionistas (DUARTE; DIAS, 1986; BORGER, 2001).

Optou-se por adotar neste estudo a definição proposta pelo Instituto Ethos, que define responsabilidade social como:

[...] a forma de gestão que se define pela relação ética e transparente da empresa com todos os públicos com os quais ela se relaciona e pelo estabelecimento de metas empresariais compatíveis com o desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando recursos ambientais e culturais para as gerações futuras, respeitando a diversidade e promovendo a redução das desigualdades sociais (INSTITUTO ETHOS, 2007).

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Complementarmente, como o escopo da responsabilidade social é bastante amplo, é essencial ressaltar que:

Responsabilidade social dobra-se a múltiplas exigências: relações de parceria entre clientes e fornecedores, produção com qualidade ou adequação ao uso com plena satisfação dos usuários, contribuições para o desenvolvimento da comunidade, investimentos em pesquisa tecnológica, conservação do meio ambiente mediante intervenções não predatórias, participação dos trabalhadores nos resultados e nas decisões da empresa, respeito ao direito dos cidadãos, não discriminação dos gêneros, raças, idades, etnias, religiões, ocupações, preferências sexuais, investimentos em segurança do trabalho e em desenvolvimento profissional (SROUR, 2000, p.294).

Enquanto nos países desenvolvidos o debate acerca da responsabilidade social remonta a década de 1950, no Brasil, a propagação da ideia é mais recente. As primeiras discussões datam de meados da década de 1970, tendo como precursora a Associação dos Dirigentes Cristãos de Empresa (ADCE), cuja finalidade era promover o debate sobre o balanço social (LIMA, 2002).

Conforme Toldo (2002), a partir daí, em 1982, a Câmara Americana do Comércio lançou o prêmio Eco de Cidadania Empresarial. Em 1983, o sociólogo Herbert de Souza idealizou a Campanha Nacional de Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida, que constituiu o marco de aproximação dos empresários com as ações sociais. Um ano depois, em 1984, a Nitrofértil destaca-se por ser a primeira empresa brasileira a publicar um balanço social. Em 1998, foi criado o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, cujo objetivo é disseminar a prática da responsabilidade social por meio de publicações, experiências, programas e eventos para os interessados no assunto.

Atualmente, muitas entidades brasileiras promovem premiações no âmbito da responsabilidade social, o que demonstra um crescimento da temática no Brasil. Entre essas iniciativas, Lima (2002) aponta o Selo Empresa Cidadã (Câmara Municipal de São Paulo), o prêmio Top Social ADVB (Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing do Brasil), o prêmio Eco (AMCHAM – Câmara Americana de Comércio) e o Selo Empresa Amiga da Criança (Fundação Abrinq).

Ressalta-se também, hodiernamente, no Brasil, um movimento que caracteriza uma valorização do tema. Além da criação do Instituto Ethos, verifica-se o surgimento de outras entidades: Instituto de Cidadania Empresarial; Conselho de Cidadania Empresarial da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (FIEMG); Grupo de Institutos,

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Fundações e Empresas (GIFE); Fundação Instituto de Desenvolvimento Empresarial e Social (FIDES) (LIMA, 2002).

Borger (2001) ressalta também o trabalho desenvolvido por várias entidades no campo da responsabilidade social empresarial no Brasil. Entre elas estão: Pensamento Nacional das Bases Empresariais (PNBE); Comitê de Entidades Públicas no Combate à Fome e pela Vida (COEP); Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável; e Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE).

Outra fonte de dados e informações acerca da atuação de empresas são as pesquisas realizadas pela revista Exame da Editora Abril, com o “Guia As 150 Melhores Empresas para Você Trabalhar” e também com o “Guia da Boa Cidadania Corporativa”. Em relação ao primeiro, pode-se afirmar que se baseia em um extenso levantamento realizado junto a empresas instaladas no Brasil. O guia, que é inspirado na pesquisa idealizada pelo Great Place to Work Institute e realizado em parceira com este, seleciona as 150 empresas mais admiradas pelos seus funcionários. Já o “Guia de Boa Cidadania Corporativa”, a partir do ano de 2007 rebatizado de “Guia Exame de Sustentabilidade”, compõe-se de uma pesquisa com diversas empresas de todo o Brasil a fim de se conhecer quais delas têm uma postura socialmente responsável.

No tocante à questão da operacionalização e mensuração da responsabilidade social por parte das empresas, alguns trabalhos têm sido apresentados. Um deles é o de Davenport (2000), que realizou uma pesquisa tentando operacionalizar o conceito. O autor, utilizando como metodologia de pesquisa o método Delphi, relata que a maioria dos participantes do estudo concordou em três tipos de indicadores: comportamento ético nos negócios, comprometimento com os stakeholders e comprometimento com o meio ambiente. Carroll (1991) também propõe uma forma de operacionalização por meio da convergência entre os conceitos de cidadania corporativa e responsabilidade social empresarial, apontando quatro dimensões: econômica, legal, ética e filantrópica.

Contudo, nesse trabalho, serão consideradas as dimensões da responsabilidade social propostas pelo Instituto Ethos. O Quadro 1 discute cada uma dessas dimensões.

Finalmente, vale ressaltar a existência de outras pesquisas e estudos executados em âmbito regional, com enfoques diferenciados e utilizando metodologias diversas com o intuito de se conhecer a postura das empresas frente o conceito de responsabilidade social empresarial.

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Quadro 1: As dimensões da Responsabilidade Social Empresarial

Conteúdo

Valores e transparência

A cultura organizacional é constituída por valores e princípios éticos, como elementos balizadores das ações e da missão. A transparência das ações da empresa e de sua missão legitima, assim, sua existência.

Público interno

A empresa deve ultrapassar a linha do simples cumprimento das obrigações trabalhistas. Deve investir no desenvolvimento pessoal e profissional de seus empregados, bem como na melhoria das condições de trabalho e no estreitamento dessas relações.

Meio ambiente A empresa socialmente responsável deve procurar minimizar os impactos negativos e ampliar os positivos

Fornecedor

À empresa socialmente responsável cabe a transmissão dos valores de seu código de conduta a todos os participantes da cadeia. É de sua responsabilidade também a preocupação no aprimoramento dos processos, o cumprimento dos contratos estabelecidos, bem como o fortalecimento dos elos mais fracos da cadeia.

Consumidores

A responsabilidade social em relação aos clientes e consumidores exige da empresa o investimento permanente no desenvolvimento de produtos e serviços confiáveis, que minimizem os riscos de danos à saúde dos usuários e das pessoas em geral. A empresa deve alinhar-se aos interesses do cliente e buscar satisfazer suas necessidades.

Comunidade

O investimento pela empresa em ações que tragam benefícios para a comunidade é uma contrapartida justa, além de reverter em ganhos para o ambiente interno e à percepção que os clientes têm da própria empresa. O respeito aos costumes e culturas locais e o empenho na educação e na disseminação de valores sociais devem fazer parte de uma política de envolvimento comunitário da empresa, resultado da compreensão de seu papel de agente de melhorias sociais.

Governo e Sociedade

A empresa deve relacionar-se de forma ética e responsável com os poderes públicos, cumprindo as leis e mantendo interações dinâmicas com seus representantes. O comportamento ético pressupõe que a relação entre a empresa e governo seja transparente para a sociedade, os acionistas, os empregados, os clientes, os fornecedores e os distribuidores. Compete à empresa manter uma atuação política coerente com seus princípios éticos e que evidencie seu alinhamento com os interesses da sociedade.

Fonte: Instituto Ethos (2007) O curso de Administração e o ensino da Responsabilidade Social Empresarial no Brasil As Diretrizes Curriculares do Curso de Administração, conforme consta do Parecer CNE/CES 4/2005 do Conselho Nacional de Educação/Câmara

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de Educação Superior, contemplam o perfil desejado, os conteúdos curriculares e habilidades que se esperam dos profissionais dessa área de conhecimento. O citado Parecer expressa em seu artigo 3º:

O Curso de Graduação em Administração deve ensejar como perfil desejado do formando, capacitação e aptidão para compreender as questões científicas, técnicas, sociais e econômicas da produção e de seu gerenciamento, observados níveis graduais do processo de tomada de decisão, bem como para desenvolver gerenciamento qualitativo e adequado, revelando a assimilação de novas informações e apresentando flexibilidade intelectual e adaptabilidade contextualizada no trato de situações diversas, presentes ou emergentes, nos vários segmentos do campo de atuação do administrador.

É oportuno salientar que a diretriz foca no desenvolvimento de uma racionalidade instrumental dos graduandos, uma vez que fica clara a preocupação na preparação dos profissionais para atuar no mercado de trabalho.

O Quadro 2 apresenta as competências e habilidades requeridas do Administrador, bem como os conteúdos curriculares expressos no Parecer 04/2005.

Percebe-se que as competências e habilidades requeridas do Administrador envolvem componentes de natureza técnica, científica e econômico-social centrados na ideia de formação de um tomador de decisão em situações diversas ou emergentes nos diferentes segmentos da área de atuação do administrador. Ademais, as competências e habilidades ficam centradas na ideia de ética no exercício profissional, e não no papel social ou na atuação do indivíduo em outras esferas da vida além do trabalho (SOUZA; CARVALHO; XAVIER, 2003).

Cabe salientar que as diretrizes do curso de Administração propõem conteúdos bastante diversos que contemplam disciplinas dos campos das Ciências Sociais e Humanas e também privilegiam disciplinas que se destinam a desenvolver a racionalidade substantiva e habilitar o estudante a elaborar e julgar valores associados à vida e à existência humana.

Alguns estudos foram publicados com o intuito de discutir questões concernentes ao ensino de conteúdos voltados para a responsabilidade social no curso de Administração. Entre eles, pode-se citar o de Souza, Carvalho e Xavier (2003). Esse estudo objetivou, a partir da análise das Diretrizes Nacionais dos Cursos de Administração e de Ciências Contábeis, discutir a forma como valores de mercado, éticos e de

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responsabilidade social estão contemplados na formação dessas duas áreas.

Quadro 2: Competências, habilidades e conteúdos curriculares dos Cursos de Graduação em Administração

Competências e habilidades Conteúdos curriculares • Reconhecer e definir problemas, equacionar soluções, pensar estrategicamente, introduzir modificações no processo produtivo, transferir e generalizar conhecimento e decidir em diferentes graus de complexidade. • Desenvolver expressão e comunicação compatíveis com o exercício profissional, inclusive nos processos de negociação e nas comunicações interpessoais ou intergrupais. • Refletir e atuar criticamente sobre a esfera da produção, compreendendo sua posição e função na estrutura produtiva sob seu controle e gerenciamento. • Desenvolver raciocínio lógico, crítico e analítico para operar com valores e formulações matemáticas presentes nas relações formais e causais entre fenômenos produtivos, administrativos e de controle, bem como expressando-se de modo crítico e criativo diante dos diferentes contextos organizacionais e sociais. • Ter iniciativa, criatividade, determinação, vontade política e administrativa, vontade de aprender, abertura às mudanças e consciência da qualidade e das implicações éticas do seu exercício profissional. • Desenvolver capacidade de transferir conhecimentos da vida e da experiência cotidianas para o ambiente de trabalho e do seu campo de atuação profissional, em diferentes modelos organizacionais, revelando-se profissional adaptável. • Desenvolver capacidade para elaborar, implantar e consolidar projetos em organizações. • Desenvolver capacidade para realizar consultoria em gestão e administração, pareceres e perícias, gerenciais, organizacionais, estratégicos e operacionais.

Conteúdos de formação básica: Relacionados com estudos antropológicos, sociológicos, psicológicos, ético-profissionais, políticos, comportamentais, econômicos e contábeis, bem como os relacionados com as tecnologias da comunicação e da informação e das Ciências Jurídicas. Conteúdos de formação profissional: Relacionados com as áreas específicas, envolvendo Teorias da administração e das organizações e a administração de recursos humanos, mercado e marketing, materiais, produção e logística, financeira e orçamentária, sistema de informações, planejamento estratégico e serviços. Conteúdos de Estudos Quantitativos e suas tecnologias: Abrangem pesquisa operacional, teoria dos jogos, modelos matemáticos e estatísticos e aplicação de tecnologias que contribuam para definição e utilização de estratégias e procedimentos inerentes à administração. Conteúdos de Formação Complementar: Estudos opcionais de caráter transversal e interdisciplinar para o enriquecimento do perfil do formando.

Fonte: Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Administração 04/2005.

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Souza, Carvalho e Xavier (2003) chegaram à conclusão de que os conteúdos propostos pelos dois cursos trabalham a racionalidade instrumental na maior ou menor convergência para atingir fins organizacionais preestabelecidos, uma vez que as diretrizes dos dois cursos estão orientadas para a capacitação técnica na tomada de decisão e na implantação de ações. Alguns estudos foram publicados com o intuito de discutir questões concernentes ao ensino de conteúdos voltados para a responsabilidade social no curso de Administração. Entre eles, pode-se citar o de Souza, Carvalho e Xavier (2003). Esse estudo objetivou, a partir da análise das Diretrizes Nacionais dos Cursos de Administração e de Ciências Contábeis, discutir a forma como valores de mercado, éticos e de responsabilidade social estão contemplados na formação dessas duas áreas. Os autores chegaram à conclusão de que os conteúdos propostos pelos dois cursos trabalham a racionalidade instrumental na maior ou menor convergência para atingir fins organizacionais preestabelecidos, uma vez que as diretrizes dos dois cursos estão orientadas para a capacitação técnica na tomada de decisão e na implantação de ações.

Canopf e Passador (2004) investigaram qual concepção de responsabilidade social está presente no trabalho de formação dos acadêmicos de quatro cursos de graduação em Administração da Região Sudoeste do Paraná. As autoras analisaram alguns aspectos: missão da instituição e do curso, perfil do egresso pretendido e referências explícitas ao termo responsabilidade social. Elas concluíram que os cursos apresentaram uma mistura de conceitos, utilizando enunciados em alguns momentos críticos e em outros normativos, preocupados somente em formar profissionais que visem o lucro para suas organizações.

Pessoa et al (2005) também publicaram um trabalho com o propósito de apresentar o modelo teórico do Programa Integrado de Capacitação Empreendedora (PICE) como forma de complementação da formação do aluno de graduação em Administração, o qual pode ser utilizado como alternativa ao Estágio Curricular. De modo geral, constatou-se que o referido programa pode ser utilizado como alternativa para integrar futuros administradores na questão da responsabilidade social e do empreendedorismo.

Também pode ser citada a pesquisa de Silva (2006), que teve como objetivo verificar se uma instituição de ensino superior pode promover de forma continuada a inserção de pessoas em programas de voluntariado. Os resultados mostraram que essa relação é possível, visto que houve um sensível aumento dos alunos envolvidos em projetos de responsabilidade social a partir da implantação da pesquisa.

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Contudo, verificou-se a inexistência de estudos voltados a dar voz aos alunos para buscar indícios de como eles percebem o movimento de responsabilidade social. A presente pesquisa tem esse objetivo. A próxima seção destaca pontos no tocante aos aspectos metodológicos adotados para a investigação empírica.

METODOLOGIA De início, é importante ressaltar que esta pesquisa pode ser classificada como exploratória, uma vez que tem como objetivo proporcionar uma visão geral acerca de determinado fato (GIL, 1999). Ademais, pode-se dizer que as pesquisas exploratórias são realizadas quando o tema escolhido é pouco explorado e torna-se difícil formular hipóteses precisas e operacionalizáveis sobre ele.

O trabalho foi desenvolvido privilegiando-se o discurso dos informantes, levando em conta o ambiente e as condições em que foram formuladas. A pesquisa, realizada no mês de fevereiro de 2008, contou com a colaboração de 118 estudantes universitários do curso de graduação em Administração da Unidade Barreiro da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, localizada em Belo Horizonte.

Os procedimentos da pesquisa foram baseados na metodologia proposta por Kronberger e Wagner (2002). Na etapa de coleta de dados, foi pedido aos alunos que elaborassem um pequeno texto respondendo à seguinte indagação: o que você entende por Responsabilidade Social Empresarial? Em seguida, foi solicitado o preenchimento de quatro questões fechadas: período do curso, sexo, estado civil e faixa etária. Nenhuma informação foi dada ao aluno antes da elaboração do texto, somente a explicação de que se tratava de uma pesquisa conduzida por alunos de pós-graduação da instituição para conhecer qual a percepção dos alunos da graduação no tocante ao tema da responsabilidade social. Não foi permitida que respondentes discutissem entre eles o conceito foco da pesquisa, ou seja, responsabilidade social.

Com relação à análise dos textos elaborados pelos alunos, utilizou-se a técnica denominada Análise de Conteúdo, visto que parece ser a mais apropriada quando se visa identificar o que está sendo dito a respeito de determinado tema (VERGARA, 2005). Para Bardin (1977, p.42), análise de conteúdo é:

Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos, sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que

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permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens.

Bardin (1977) afirma que essa técnica ou estratégia de pesquisa é utilizável em muitos campos e compreende três etapas básicas: (1) pré-análise; (2) exploração do material e (3) tratamento dos dados e interpretação. A pré-análise refere-se à seleção do material e à definição dos procedimentos a serem seguidos. Já a exploração do material diz respeito à implantação desses procedimentos. Por fim, o tratamento e a interpretação referem-se à geração de inferências e dos resultados da investigação.

A partir dos procedimentos propostos por Bardin (1977), optou-se por executar a análise em duas fases: a pré-análise (leitura flutuante das verbalizações dos sujeitos de pesquisa), a identificação de temas e seu agrupamento (busca por tornar os dados significativos e válidos), e a categorização. O agrupamento de temas foi feito elegendo-se uma proposição “tipo” que exprimisse toda uma família de proposições tendo relação com um mesmo conteúdo, ainda que formuladas/expressadas de maneira diferente. Já a categorização buscou a compilação dos temas com base na correspondência de significação.

Após esta categorização, foi executada a digitação dos dados no software SPSS 13.0, a fim de se levantar a frequência de cada categoria. O texto de cada aluno poderia suscitar de uma a três categorizações. Dessa forma, a partir da análise dos textos dos alunos, chegou-se a 221 categorizações. Em seguida, foram elaborados os quadros com a síntese dos resultados. O curso de Administração onde a pesquisa foi realizada

A fim de se apresentar o contexto do curso no qual a pesquisa com os alunos foi conduzida, torna-se importante caracterizar a instituição que o abriga. Trata-se de uma universidade privada com sede em Belo Horizonte – estado de Minas Gerais – a Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas). Pode-se afirmar que a criação da PUC Minas começou a se definir no final da década de 1940, quando dom Antônio dos Santos Cabral, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, propôs a um grupo de intelectuais mineiros a constituição de uma Universidade Católica em Belo Horizonte. O objetivo que justificou a proposição de dom Cabral se traduzia na necessidade de formar quadros dirigentes comprometidos com os princípios cristãos. Com o intuito de viabilizar a proposta, criou-se a Sociedade Mineira de Cultura – uma

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sociedade civil, sem fins lucrativos, que se destinava a instituir e administrar as faculdades, os institutos que formariam a futura Universidade Católica de Minas Gerais e os colégios ligados à Arquidiocese da Capital. Desde então, a Universidade Católica de Minas Gerais, reconhecida em 1958, desenvolveu-se e vem procurando proporcionar uma educação de qualidade, baseada nos princípios teórico-científicos e técnico-profissionais, não descuidando, entretanto, de assegurar sua identidade, fundada na busca da formação humana de seu corpo discente.

A partir do início da década de 1990 a PUC Minas expande-se para outras regiões da região metropolitana de Belo Horizonte e para o interior do estado de Minas Gerais: o Campus de Contagem; o Campus de Betim; o Campus de Poços de Caldas; o Campus de Arcos. Em 1999 estabelece-se a Unidade da PUC Minas no Bairro São Gabriel; em 2002, implanta-se a Unidade da PUC Minas no Barreiro; e em 2003, criou-se o Campus da cidade do Serro.

A pesquisa foi conduzida na Unidade da PUC Minas no Barreiro, localizada em uma das regiões da cidade de Belo Horizonte dotada de autonomia comercial, industrial e de serviços, composta por 47 bairros, cerca de trezentos mil habitantes e associações diversificadas, e um universo empresarial de aproximadamente duas mil empresas.

No tocante ao curso de Administração da instituição, cabe dizer que ele surgiu no Campus Coração Eucarístico em 1984, resultante do desmembramento do Curso Integrado adquirido da Faculdade Mineira de Administração e Ciências Contábeis (FAMCE) e da reforma curricular aprovada pelo Conselho de Ensino e Pesquisa por meio da Resolução n. 11 de 1983.

A missão do Curso de Administração da PUC Minas consiste em atender às necessidades de adaptação às transformações ambientais, por meio da formação de um profissional qualificado, apto a atuar como agente de mudança e a gerir sistemas organizacionais, com espírito empreendedor, nas organizações e na sociedade em geral. O ensino, a pesquisa e a extensão, em Administração, refletirão a busca permanente de padrões de excelência do Curso, dentro de princípios éticos e filosóficos adotados pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, contribuindo para o desenvolvimento econômico e o bem-estar social.

Os Cursos de Administração da PUC Minas definem como premissa básica, para o cumprimento de sua missão, o comprometimento com uma postura orientada pelos seguintes princípios filosóficos: visão humanística; excelência como busca permanente; produção de

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conhecimento; interdisciplinaridade; prática do diálogo; preservação de valores éticos; universalidade e pluralidade de pensamento; comprometimento com o desenvolvimento sustentável.

O projeto pedagógico aprovado pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão no final de 2006 estabelece que o objetivo do curso é contribuir para a formação de profissionais da área de Administração por meio da transmissão, análise e questionamento acerca do conhecimento e ferramentas que favoreçam o desenvolvimento de competências e habilidades específicas, a fim de assegurar níveis de competitividade e de legitimidade frente às transformações econômicas e sociais que vêm ocorrendo no âmbito interno e externo das organizações.

Uma análise da matriz curricular proposta pelo projeto pedagógico do curso leva à constatação de que apenas uma disciplina, com carga horária de 30 horas-aulas, oferecida no último semestre do curso, contemplada o tema da responsabilidade social. Essa pouca importância atribuída ao conceito, conforme já verificado por Canopf e Passador (2004), pode levar a uma dificuldade dos alunos em entender o que vem a ser uma empresa socialmente responsável. Contudo, o curso oferece aos alunos um conjunto relativamente abrangente de disciplinas de cunho humanístico – Filosofia I e II e Cultura Religiosa I e II. A próxima seção do trabalho discute os resultados da pesquisa com os alunos. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS Quanto à caracterização da amostra, é importante frisar que houve uma preocupação em pesquisar alunos de todas as fases do processo de formação do curso. Além disso, pôde-se observar que quase 60% dos alunos entrevistados são do sexo feminino, a maioria (73,7%) declarou ser solteiro e quase 80% tem até 30 anos de idade. Vale destacar também que os alunos são do turno da noite e podem ser categorizados como alunos-trabalhadores.

Observa-se no Quadro 3 que nove categorias emergiram dos textos elaborados pelos alunos. Percebe-se que boa parte dos alunos considera a responsabilidade social de forma focada em apenas uma área de atuação ou interesse, ou seja, os alunos parecem perceber que as ações socialmente responsáveis são estanques e voltadas para somente um aspecto importante. Essa constatação não é coincidente com o conceito de responsabilidade social proposta pelo Instituto Ethos adotada no estudo.

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Quadro 3: Categorias apresentadas na análise

Categorias Grupo Ideias

1 Comunidade e sociedade

Compreensão e preocupação com questões sociais, bem-estar da comunidade e da sociedade em geral, melhoria da qualidade de vida, projetos de apoio comunitário.

2 Meio ambiente

Compromisso com o meio ambiente, projetos voltados para a preservação ambiental.

3 Qualificação

dos funcionários

Geração de empregos, qualificação dos funcionários, responsabilidade com o bem-estar dos funcionários, formação dos indivíduos, responsabilidade social interna.

4 Filantropia Assistência à população carente, ação social das empresas, apoio às instituições filantrópicas.

5 Ética Ética no relacionamento com clientes, oferecimento de produtos e serviços com ética.

6 Crítica Instrumento de fachada utilizado pelas empresas. 7 Stakeholders Preocupação com os stakeholders.

8 Visão equivocada

Desenvolvimento sócio-econômico, preocupação com o lucro, desenvolvimento da organização, sucesso da organização.

9 Outros Citações diversas.

A Tabela 1 também apresenta alguns dados interessantes e complementa os dados apresentados no Quadro 3. Praticamente metade dos alunos (47,96%) entende que a responsabilidade social está voltada para ações de apoio à comunidade e à sociedade. Tabela 1: Percentual das citações a partir das categorias surgidas na análise

Grupo % das citações Comunidade e sociedade 47,96% Meio ambiente 19,00% Qualificação dos funcionários 7,24% Filantropia 5,43% Ética 0,90% Crítica 0,45% Stakeholders 0,45% Visão equivocada 7,69% Outros 3,62%

As principais ideias apresentadas pelos alunos vão ao sentido de

que a responsabilidade social é a busca por compreensão e preocupação

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com questões sociais, bem-estar da comunidade e da sociedade em geral, melhoria da qualidade de vida e projetos de apoio comunitário. Nesse caso, parece ser a mídia um veículo importante na disseminação desse conceito, uma vez que se percebe no dia a dia um número considerável de campanhas publicitárias patrocinadas por grandes empresas veiculando sua postura socialmente responsável por meio de projetos na área social.

A segunda categoria mais citada pelos alunos é “meio ambiente”. Observa-se que 19% das categorizações faziam alguma citação ao tema de meio ambiente. A categoria qualificação dos funcionários teve uma participação de 7,24% de todas as citações (os alunos citaram que a responsabilidade social teria uma relação direta com a geração de empregos, qualificação dos funcionários, responsabilidade com o bem-estar dos funcionários, formação dos indivíduos, responsabilidade social interna).

A categoria “filantropia” aparece com 5,43% e algumas das citações encontradas nos textos dos alunos foram: assistência à população carente; ação social das empresas; e apoio às instituições filantrópicas.

Deve-se ressaltar o percentual considerável das categorias citadas pelos alunos (7,69%) com origem numa compreensão equivocada do conceito, o que mostra que uma boa parte dos alunos do curso de Administração pesquisada não possui uma ideia clara do que vem a ser responsabilidade social. Muitos apontaram que responsabilidade social é a preocupação com o lucro, desenvolvimento socioeconômico da organização, sucesso da organização entre outros. O Quadro 4 apresenta algumas das ideias apresentadas pelos alunos.

Quadro 4: Citações apresentadas pelos alunos quanto ao conceito de Responsabilidade Social

Citações acerca do conceito de Responsabilidade Social pelos alunos Compromisso com o meio ambiente Contribuir para o bem estar da sociedade Projetos voltados para o meio ambiente e educação Preocupação com a comunidade Políticas sociais Promover o envolvimento com a comunidade Projetos de apoio comunitário Interação da empresa com a sociedade Projetos, ações e parcerias para melhorar uma região Contribuição para uma sociedade mais justa e igualitária Retorno do lucro com ações sócio-culturais Transformar a realidade social Preocupação com os stakeholders Economia sustentável Redução dos impactos ambientais

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Cabe ressaltar também que apenas um aluno (o que corresponde a 0,45% de todas as citações) apresentou uma visão mais crítica acerca do conceito de responsabilidade social, pois escreveu em seu texto que se trata de um “instrumento de fachada utilizado pelas empresas com o intuito de promover a empresa”. Outra questão importante refere-se à constatação de que somente um aluno levou em consideração o conceito de stakeholders ao discutir a responsabilidade social empresarial. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho tinha como objetivo geral conhecer e discutir como alunos do curso de graduação em Administração da PUC-MG entendem o conceito de responsabilidade social. Os dados apreendidos possibilitaram verificar que não há uma uniformidade de percepção, mas sim um mosaico entre as interpretações dos entrevistados, o que é natural, pois a própria literatura da temática ainda está em construção.

Porém, alguns pontos precisam ser ressaltados. Em primeiro lugar, notou-se que os textos elaborados pelos alunos estão longe de retratar ou, pelo menos, privilegiam somente alguns aspectos do que vem a ser responsabilidade social da forma como vem sendo trabalhada pela literatura, principalmente na conceituação que foi adotada neste trabalho proposta pelo Instituto Ethos. Parece notório que o conhecimento que o aluno adquire no tocante a essa temática não tem origem na sala de aula, mas sim no senso comum ou baseado no que é veiculado pela mídia. Um problema decorrente disso é que é crescente o aumento de publicações de artigos em revistas e jornais destinados ao público em geral mencionando questões referentes ao tema, muitas vezes sem embasamento teórico, utilizando conceitos equivocados e não raramente contraditórios. Além disso, na visão de Soares (2004), verifica-se que uma parcela significativa dos trabalhos sobre o tema se caracteriza por uma visão essencialmente acrítica em relação ao conceito, ressaltando sempre seus aspectos positivos.

Em segundo lugar, observou-se que o discurso dos alunos reflete o conteúdo do projeto pedagógico do curso pesquisado que, por sua vez, é consistente com as Diretrizes Nacionais do Curso de Administração. Ou seja, parece plausível afirmar que esse discurso é fruto de uma concepção de curso de Administração no qual as competências e habilidades ficam restritas à ideia de ética no exercício profissional, e pouco contemplam o papel social ou a atuação do indivíduo em outras esferas da vida além do trabalho.

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Dessa forma, é relevante ressaltar a importância de uma ampla discussão no âmbito dos formuladores das diretrizes e também nas esferas das coordenações de faculdades e de cursos, do papel dos cursos de graduação em desenvolver habilidades e competências que levem em consideração uma postura mais socialmente responsável de seus alunos. A pesquisa parece mostrar que o entendimento do conceito por parte do corpo discente não vem sendo atingido.

Como possível solução para a questão, seria plausível não somente a oferta de disciplinas cujos conteúdos contemplassem a temática da responsabilidade social, mas também o desenvolvimento de um eixo norteador do curso, que permitisse ao aluno ter conhecimento e construir uma postura mais ética e cuidadosa sobre questões sociais e ambientais. Para isso, é necessária a contribuição de todos os atores envolvidos, de formuladores das diretrizes aos professores que atuam diretamente na sala de aula, passando evidentemente por diretores de faculdades, chefes de departamentos e coordenadores de cursos. Com relação aos professores, seria interessante a reciclagem dos conceitos, visando a um maior entendimento e sensibilidade quanto à responsabilidade social.

Digna de menção também é a preocupação de que o aluno deve construir seu conhecimento com base em seu contexto cultural e social, levando em consideração o que ele vivencia no seu cotidiano. Nesse sentido, seria interessante a divulgação de uma literatura nacional mais rica e profunda focada nas questões brasileiras quanto à responsabilidade social, alternativa às obras estrangeiras, que ressalte as peculiaridades, bem como os desafios da gestão social em médios e pequenos empreendimentos localizados nas grandes ou pequenas cidades do país.

Deve- se apontar que a escolha da amostra de alunos que se limitou a somente uma Unidade de uma Universidade escolhida é um fator limitador do trabalho. Na análise dos dados, pode-se considerar também como limitação a dificuldade de se compreender a utilização de alguns vocábulos por parte dos alunos que, não raramente, utilizaram termos sem o seu sentido correto, dificultando o entendimento. Outra limitação refere-se ao pequeno espaço de tempo em que foi realizada a pesquisa e a não inclusão de juízes na avaliação das categorias-síntese. Também é relevante, como limitação, a não inclusão de outros públicos, como os professores que ministram disciplina do campo de Administração, bem como o coordenador de curso, que poderiam dar subsídios para compreender melhor os resultados da pesquisa.

Ainda que o tema possa ter sido tratado de maneira exploratória, a pesquisa possibilitou a descoberta de atributos qualitativos e indicou novas possibilidades de estudo na temática do ensino da responsabilidade

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social nos cursos de graduação em Administração no Brasil. Pode-se ressaltar que a presente pesquisa não esgota a possibilidade de futuros estudos com essa temática. No entanto, espera-se que ela possa contribuir na formulação de novos questionamentos que revelem contradições, desafios e perspectivas para a (re)inclusão de temas que, não obstante sua complexidade e profundidade, são úteis na formação do administrador consciente de suas responsabilidades no contexto atual.

Sendo assim, podem ser sugeridas algumas ideias como possibilidades para futuras pesquisas. Uma primeira sugestão seria a incorporação de alunos de outras instituições de ensino superior de Belo Horizonte e de outras regiões do país com vistas a fazer uma comparação entre os resultados encontrados. Essa comparação deveria ser feita levando-se em conta o projeto pedagógico do curso, a missão da instituição, os objetivos do curso, sem esquecer o contexto no qual essas instituições estão inseridas. Seria interessante também a inclusão na pesquisa de outros públicos como professores e coordenadores de curso ou aqueles responsáveis pela elaboração do projeto pedagógico do curso.

Por fim, uma terceira sugestão caminharia no sentido de se pesquisar como os livros didáticos das diversas disciplinas adotados no curso de Administração utilizam e discutem o conceito de responsabilidade social. Fica, portanto, feito o convite para que outros pesquisadores venham contribuir para um melhor entendimento dos temas tratados nesse trabalho. REFERÊNCIAS

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DADOS DOS AUTORES MARCELO DE REZENDE PINTO ([email protected]) Doutor em Administração pela Universidade Federal de Minas Gerais Instituição de vinculação: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Belo Horizonte/MG – Brasil Áreas de interesse em pesquisa: Responsabilidade Social Empresarial, Marketing Social, Pesquisa do Consumidor. MICHELE CRISTINA DUARTE DA SILVA ([email protected]) Graduada em Administração pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Belo Horizonte/MG – Brasil Áreas de interesse em pesquisa: Responsabilidade Social Empresarial. RODRIGO CASSIMIRO DE FREITAS ([email protected]) Graduado em Administração pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Belo Horizonte/MG - Brasil Áreas de interesse em pesquisa: Responsabilidade Social Empresarial, Antropologia do Consumo. Recebido em: 31/07/2008 • Aprovado em: 05/03/2010

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ABRANGÊNCIA DA CONTABILIDADE GERENCIAL SEGUNDO OS DOCENTES DE CONTABILIDADE DE SANTA CATARINA – BRASIL

SCOPE OF MANAGERIAL ACCOUNTING ACCORDING TO THE ACCOUNTING

FACULTIES OF SANTA CATARINA – BRAZIL PAULO ROBERTO DA CUNHA ([email protected]) ILSE MARIA BEUREN RITA BUZZI RAUSCH DANIELA BENVENUTI UNIVERSIDADE REGIONAL DE BLUMENAU RESUMO O estudo objetiva identificar a área de abrangência da contabilidade gerencial na visão dos docentes que atuam nos cursos de ciências contábeis das Instituições de Ensino Superior (IES) do sistema ACAFE (Associação Catarinense das Fundações Educacionais) de Santa Catarina - Brasil. Pesquisa descritiva quantitativa foi realizada por meio de uma survey, com aplicação de um questionário de perguntas fechadas. A população compreende os docentes dos cursos de ciências contábeis das 15 IES ligadas ao sistema ACAFE e a amostra dos 40 docentes de nove universidades que responderam ao questionário. Os resultados mostram que na visão dos docentes pesquisados, as principais temáticas de abrangência da contabilidade gerencial são: informações contábeis para tomada de decisão; custos para avaliação, controle e tomada de decisão; controle gerencial por áreas de responsabilidade; avaliação de desempenho e lucro empresarial. Comparando-se os resultados com pesquisa idêntica realizada no estado do Paraná, constatou-se que as informações contábeis para tomada de decisão e custos para avaliação, controle e tomada de decisão foram itens convergentes, considerados muito importantes. Palavras-chave: abrangência; contabilidade gerencial; docentes de contabilidade.

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Abrangência da contabilidade gerencial segundo os docentes de contabilidade de SC

ABSTRACT This study aims to identify the scope of managerial accounting according to the views of some professors who teach at the Accounting courses of Higher Education Institutions in the ACAFE (Associação Catarinense das Fundações Educacionais) system in Santa Catarina state, in Brazil. A quantitative descriptive study was conducted using a survey done with closed questions. The population of the study includes the professors of Accounting courses of 15 HEI connected to the ACAFE system and the sample 40 professors who answered the questionnaire. The results show that, according to the professors surveyed, the main items related to the scope of managerial accounting are: accounting information for decision-making; costs for evaluation, control and decision-making; managerial control of areas of responsibility; performance evaluation and corporate profit. Comparing these results to a similar study conducted in the state of Paraná, it was found out that the most important items which were convergent were: accounting information for decision-making and costs of evaluation as well as control and decision-making. Keywords: scope; managerial accounting; accounting faculty. INTRODUÇÃO

A contabilidade possui uma metodologia própria para registrar, acumular, organizar e interpretar os fenômenos ocorridos em entidades pessoa jurídica ou física, privada ou pública. No entanto, sob o ponto de vista da literatura e das práticas empresariais, a contabilidade pode ser dividida em duas grandes áreas, ambas com características distintas, ainda que fortemente imbricadas: a contabilidade financeira e a contabilidade gerencial.

Segundo Jiambalvo (2002, p. 1), “a contabilidade financeira enfatiza os conceitos e procedimentos contábeis que se relacionam à preparação de relatórios para usuários externos da informação contábil”. No que concerne à contabilidade gerencial, o autor cita que ela “enfatiza os conceitos e os procedimentos contábeis que são relevantes à preparação de relatórios para os usuários internos da informação contábil”.

Atkinson et al (2000, p.36-37) explicam que a contabilidade financeira é responsável pelo “processo de elaboração de demonstrativos financeiros para propósitos externos: pessoal externo à organização, como

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Paulo Roberto da Cunha, Ilse Maria Beuren, Rita Buzzi Rausch e Daniela Benvenuti

acionistas, credores e autoridades governamentais”. Em relação à contabilidade gerencial aduzem que ela é responsável pelo “processo de produzir informação operacional e financeira para funcionários e administradores”.

De maneira geral, pode-se observar diante do exposto que a distinção entre a contabilidade financeira e a gerencial é a destinação da informação gerada, ou seja, usuários externos (contabilidade financeira) e internos (contabilidade gerencial). Embora existam outros itens que façam tal distinção entre ambas, a principal refere-se aos relatórios produzidos e aos usuários a que se destinam as informações.

Há pesquisas realizadas na tentativa de identificar estas divergências quanto à abrangência da contabilidade gerencial. Exemplo disso é o trabalho publicado no 7º Congresso USP de Controladoria e Contabilidade, de 2007, intitulado: A abrangência da contabilidade gerencial segundo os docentes paranaenses de contabilidade. Nesse estudo, Souza et al (2007) buscaram identificar, na visão dos docentes paranaenses, a abrangência da contabilidade gerencial, bem como sua comparação com um estudo similar na Nova Zelândia.

A motivação para realizar estudo semelhante sobre a abrangência da contabilidade gerencial decorre da premissa de que uma das formas de construção do conhecimento é por meio da replicação de pesquisas anteriores realizadas sobre o tema em outros países e até mesmo em outras regiões geográficas de um país. Assim, com interesse em identificar a visão dos docentes de outras regiões do País a respeito do tema, surgiu a idéia de investigar a percepção dos docentes do curso de ciências contábeis de Santa Catarina – Brasil.

Elaborou-se então a seguinte questão problema: Quais as áreas de abrangência da Contabilidade Gerencial na visão de professores de ciências contábeis das Instituições de Ensino Superior (IES) ligadas ao sistema ACAFE de Santa Catarina - Brasil? Nesse sentido, o objetivo deste estudo é identificar qual a área de abrangência da contabilidade gerencial na visão dos docentes que atuam nos cursos de Ciências Contábeis das Instituições de Ensino Superior (IES) ligadas ao sistema ACAFE (Associação Catarinense das Fundações Educacionais) de Santa Catarina – Brasil.

A ACAFE (Associação Catarinense das Fundações Educacionais) foi criada em 1974 para integrar todas as faculdades de ensino superior de Santa Catarina. Ainda que diversas faculdades privadas tenham sido constituídas após essa data e não integram esse sistema, a escolha das IES do sistema ACAFE para realizar esta pesquisa deve-se a sua representatividade no estado de Santa Catarina, em torno de 129.611

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Abrangência da contabilidade gerencial segundo os docentes de contabilidade de SC

alunos matriculados nos diversos cursos, com 8.951 professores vinculados (ACAFE, 2009). A pesquisa evidencia sua relevância ao buscar contribuir para a convergência dos temas entendidos como específicos à contabilidade gerencial, de forma a poder compará-los e adicioná-los a outros estudos já realizados. Justifica-se particularmente por se poder efetuar uma análise comparativa entre os resultados encontrados na pesquisa com os docentes do estado de Santa Catarina com os resultados do estudo realizado no estado do Paraná – Brasil. Os docentes supostamente estudam a respeito da abrangência da contabilidade gerencial e repassam suas convicções aos alunos, por isso da importância de pesquisar suas concepções.

Abordagens conceituais da contabilidade gerencial

A contabilidade gerencial tem como objetivo gerar informações relevantes e úteis aos gestores, auxiliando-os no processo de planejamento, controle e tomada de decisões nas organizações. De maneira geral, esta ideia é corroborada por diversos autores, com maior ou menor aprofundamento do conceito, conforme pode ser observado na seqüência, mas, na essência, constitui-se em conceituação central que a contabilidade gerencial auxilia na geração de informações que visam a tomada de decisões.

Atkinson et al (2000, p. 36) definem que “a contabilidade gerencial é o processo de identificar, mensurar, reportar e analisar informações sobre os eventos econômicos das empresas”. Horngren, Sundem e Stratton (2004, p. 4) consideram que “a contabilidade gerencial é o processo de identificar, mensurar, acumular, analisar, preparar, interpretar e comunicar informações que auxiliem os gestores a atingir objetivos organizacionais”.

Horngren (1985, p. 4) aborda a contabilidade gerencial como a contabilidade administrativa e descreve que ela “se interessa pela cumulação, classificação e interpretação de informações que ajudem os executivos a atingir objetivos organizacionais tal como explícita ou implicitamente definidos pela direção”.

Garrison e Noreen (2001, p. 1) descrevem que “a contabilidade gerencial destina-se ao fornecimento de informações aos gerentes, isto é, pessoas que estão dentro da organização, que dirigem e controlam as operações desta”. Jiambalvo (2002, p. 2) expõe que “a meta da contabilidade gerencial é fornecer informações de que eles (gerentes) precisam para o planejamento, controle e tomada de decisão”.

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Paulo Roberto da Cunha, Ilse Maria Beuren, Rita Buzzi Rausch e Daniela Benvenuti

Outros conceitos e objetivos da contabilidade gerencial de autores internacionais são contemplados no Quadro 1. Quadro 1: Conceitos/objetivos da contabilidade gerencial

Fontes Conceitos/objetivos da contabilidade gerencial

Anderson, Needles e

Cadwell (1989)

Processo de identificação, mensuração, acumulação, análise, preparação, interpretação e comunicação da informação financeira usada pelos gestores para planejar, avaliar e controlar dentro da organização para assegurar o apropriado uso e accountability dos seus recursos.

Lourdeback et al (2000)

Prover informações para dar apoio às necessidades dos gestores internos da organização.

Anthony e Welsch (1981)

Fornecer informações úteis para os gestores, pessoas que estão dentro da organização.

Hansen e Mowen (1997)

Identificar, coletar, mensurar, classificar e reportar informações que são úteis para os gestores no planejamento, controle e processo decisório.

Horngren, Foster e Datar

(2000)

Medir e reportar as informações financeiras e não financeiras que ajudam os gestores a tomar decisões, para atingir os objetivos da organização.

Fonte: Adaptado de Frezatti, Aguiar e Guerreiro (2006).

Frezatti, Aguiar e Guerreiro (2006) expõem que “a contabilidade gerencial, destinada a apoiar o processo decisório das empresas, volta-se da ‘porta para dentro’ da entidade.” Os autores complementam que “nesse sentido, atende os usuários internos, os gestores da organização e a demanda por seus artefatos, que são mais numerosos que os da contabilidade financeira, dependem de uma percepção de custo/benefício dos gestores”. Padoveze (1994, p. 24) menciona que “a contabilidade gerencial é relacionada com o fornecimento de informações para administradores, isto é, aqueles que estão dentro da organização e que são responsáveis pela direção e controle de suas operações”.

Iudícibus (1998, p. 22) explica que “a contabilidade gerencial, num sentido mais profundo, está voltada única e exclusivamente para a administração da empresa, procurando suprir informações que se encaixem de maneira válida e efetiva no modelo decisório do administrador”. Complementa que, de maneira geral, portanto, “pode-se afirmar que todo procedimento, técnica, informação ou relatório contábil, feitos ‘sob medida’ para que a administração os utilize na tomada de decisões entre alternativas conflitantes, ou na avaliação de desempenho, recai na contabilidade gerencial”.

A partir das conceituações expostas de diversos autores internacionais e nacionais, verificam-se pontos em comum relacionados

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ao conceito/objetivos da contabilidade gerencial, conforme apresentado no Quadro 2.

Quadro 2: Pontos comuns dos conceitos de contabilidade gerencial abordados

Pontos Descrição

Composição do processo

Alguns autores expõem com maior ou menor detalhe, porém de forma geral é identificar, mensurar, acumular, analisar, preparar, interpretar e comunicar informações.

Destinação das informações

De forma geral está direcionada aos usuários internos. Há autores que detalham: gestores, executivos, gerentes, administradores.

Finalidade

As expressões apresentam-se diferentes com propósitos similares: tomada de decisão; auxílio na gestão; direção e controle das operações; auxílio nas funções gerenciais; planejamento, controle e tomada de decisão; atingir objetivos organizacionais.

Observa-se no Quadro 2 que, embora as conceituações dos autores

sejam diferenciadas, suas definições estão revestidas de similaridade quanto ao conceito e ao objetivo da contabilidade gerencial. Áreas de abrangência da contabilidade gerencial Pesquisas realizadas em contabilidade gerencial podem ser utilizadas como forma de inferir sobre a área de abrangência da contabilidade gerencial. A pesquisa realizada por Hesford et al (2007) consistiu de um estudo bibliométrico sobre contabilidade gerencial. O estudo contemplou artigos de contabilidade gerencial que foram publicados em 10 periódicos internacionais, de 1980 a 2000, ou seja, em um período de 20 anos. A amostra contemplou 916 artigos que foram analisados sob duas perspectivas: mapeamento de campo e análise da comunidade. As análises foram realizadas observando-se distintamente cada década, na perspectiva de observar tendências ao longo do período.

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Os temas de contabilidade gerencial foram divididos em: Custos, Controle e Outros temas, para classificação e conseqüente tabulação dos dados. Em custos foram classificados os seguintes temas: alocação de custos, outros tópicos de contabilidade de custos e práticas de custos. Em controle, os temas foram segregados em orçamento, orçamento de capital, mensuração e avaliação de desempenho, controle organizacional e controle internacional. Por fim, em outros temas, tem-se sistemas de informação contábil, benchmarking, qualidade (TQM), Just in time, métodos de pesquisa, gerenciamento estratégico e preço de transferência. O resultado dos temas abordados nos artigos pode ser observado na Tabela 1.

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Tabela 1: Temas estudados em contabilidade gerencial entre 1980 a 2000

1981-2000 % 1981-1990 % 1991-2000 % Custos Alocação de custos 140 15% 36 11% 104 17% Outros tópicos de contabilidade de custos 21 2% 14 4% 7 1%

Práticas de custos 15 2% 4 1% 11 2% Outros 1 0% 0 0% 1 0% Subtotal 177 19% 54 17% 123 21% Controle Orçamento 134 15% 64 20% 70 12% Orçamento de capital 47 5% 14 4% 33 6% Mensuração e avaliação de desempenho 148 16% 35 11% 113 19%

Controle organizacional 296 32% 119 37% 177 30% Controle internacional 16 2% 4 1% 12 2% Outros 3 0% 1 0% 2 0% Subtotal 644 70% 237 74% 407 68% Outros Sistemas de informação contábil 7 1% 4 1% 3 1%

Benchmarking 2 0% 0 0% 2 0% Qualidade (TQM) 9 1% 0 0% 9 2% Just in time 7 1% 0 0% 7 1% Métodos de pesquisa 20 2% 6 2% 14 2% Gerenciamento estratégico 15 2% 7 2% 8 1%

Preço de transferência 31 3% 9 3% 22 4% Outros 4 0% 3 1% 1 0% Subtotal 95 10% 29 9% 66 11% Total 916 100% 320 100% 596 100% Fonte: Hesford et al (2007).

Verifica-se na classificação atribuída pelos autores, que 70% dos artigos estão relacionados com controle, 20% com custos e 10% com outros temas. Ao realizar a análise segregada por décadas, de 1980 a 1990 e 1991 a 2000, nota-se que a área de custos teve um aumento de 17% para 21%, sendo que o tema alocação de custos obteve o maior crescimento de uma década para outra.

Na área de controle, observa-se uma redução de 74% para 68% da primeira para a segunda década. Os temas que apresentaram maior redução de abordagem foram: orçamento de 20% para 12% e controle organizacional de 37% para 30%. Porém, observa-se um aumento no tema mensuração e avaliação de desempenho de 11% para 19%.

Quanto aos demais temas classificados em outros, observa-se uma estabilidade entre as décadas analisadas. Porém, temas como

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benchmarking, qualidade (TQM), Just in time foram estudados somente na segunda década. Em quantidade de artigos, verifica-se um crescimento nos temas preço de transferência e métodos de pesquisa.

Frezatti et al (2008) efetuaram um estudo com o intuito de realizar uma análise crítica da contabilidade gerencial no Brasil sob a ótica dos professores de pós-graduação stricto sensu da área de contabilidade. Do total de 51 professores, 80% participaram da pesquisa com o preenchimento de um questionário. Um dos itens questionados aos docentes diz respeito aos temas que consideram relevantes em contabilidade gerencial. A Tabela 2 apresenta os resultados encontrados.

Tabela 2: Temas relevantes de contabilidade gerencial

Temas % Sistema de informações gerenciais 68,3%Relatórios gerenciais 68,3%Planejamento estratégico formal 41,5%Orçamento 22,0%Gestão estratégica de custos 19,5%Avaliação de desempenho 19,5%Métodos de custeio/sistema de acumulação/sistema de custeio 12,2%Unidade de negócios 9,8% Governança 4,9% Lucro residual 2,5% Opções reais 2,5% Beyond Budget 2,4% Custeio/gestão baseada em atividades 2,4% Balanced Scorecard 2,4% Logística 2,4% Benchmarking interno 2,4% Fluxo de caixa investimento 0,0% Análise da cadeia de valor 0,0% Benchmarking 0,0%

Fonte: Frezatti et al (2008). Comparativamente à pesquisa de Hesford et al (2007), o estudo de

Frezatti et al (2008) apresentou os temas de forma mais analítica. Verifica-se que os temas sistemas de informações gerenciais e relatórios gerenciais foram os mais apontados pelos docentes, com 68,3% cada, seguidos pelo planejamento estratégico formal com 41,5%.

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Nota-se nos dois estudos apresentados, que não há um entendimento convergente quanto à área de abrangência da contabilidade gerencial, conferindo à presente pesquisa relevância ao tentar contribuir

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para a construção do conhecimento sobre o que é atribuição da contabilidade gerencial. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Buscou-se delinear este estudo a partir das tipologias de pesquisa definidas por Raupp e Beuren (2008), no que se refere aos objetivos, aplicação dos procedimentos e abordagem do problema. Esta pesquisa caracteriza-se, quanto aos objetivos, como uma pesquisa descritiva, visto que descreve as características de determinada população, provendo as informações necessárias ao estudo.

Gil (1991, p. 46) aponta que “as pesquisas descritivas tem como objetivo primordial a descrição das características de determinada população ou fenômeno ou, então, o estabelecimento de relações entre variáveis”. Cervo e Bervian (2002, p. 66) afirmam que a pesquisa descritiva “observa, registra, analisa e correlaciona fatos ou fenômenos (variáveis) sem manipulá-los. Procura descobrir, com a precisão possível, a freqüência com que um fenômeno ocorre, sua relação e conexão com outros, sua natureza e características”.

Quanto aos procedimentos, a pesquisa configura-se como sendo de levantamento ou survey. Segundo Gil (1991, p. 70), pesquisa de levantamento ou survey implica “interrogação direta das pessoas cujo comportamento se deseja conhecer. Basicamente, procede-se à solicitação de informações a um grupo significativo de pessoas acerca do problema estudado, para em seguida, mediante análise quantitativa, obter as conclusões correspondentes aos dados coletados”.

Silva (2003, p. 62) diz que “a pesquisa levantamento ou survey consiste na coleta de dados referentes a uma dada população com base em amostra selecionada, de forma clara e direta, dos quais se objetiva saber o comportamento”. A presente pesquisa é de levantamento, devido ao fato de se investigar a área de abrangência da contabilidade gerencial segundo o entendimento dos docentes catarinenses do curso de ciências contábeis das IES do sistema ACAFE.

A abordagem da pesquisa é quantitativa. Richardson (1989, p. 29) afirma que a abordagem quantitativa “caracteriza-se pelo emprego da quantificação tanto nas modalidades de coleta de informações, quanto no tratamento dessas por meio de técnicas estatísticas, desde as mais simples como frequência, média e desvio-padrão, às mais complexas, como coeficiente de correlação, análise de regressão etc”. Pelo fato de utilizar-se da pesquisa de levantamento ou survey, reforça-se o enquadramento do

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estudo com abordagem quantitativa, devido ao fato de se utilizar da estatística descritiva para análise e tratamento dos dados colhidos.

O contato com os docentes catarinenses ocorreu por intermédio dos coordenadores do curso de ciências contábeis das 15 IES do sistema ACAFE. O objetivo da realização do estudo, acompanhado do questionário foi encaminhado por correio eletrônico aos coordenadores. Solicitou-se que os coordenadores encaminhassem o e-mail enviado com o questionário anexado a todos os professores do curso de ciências contábeis, ou seja, os sujeitos da pesquisa, independentemente de serem ou não professores da disciplina de contabilidade gerencial.

Não se obteve o número total de docentes de ciências contábeis das 15 IES estudadas, mas uma amostra dessa população, na medida em que os questionários retornavam. A escolha de todos os professores de ciências contábeis dessas instituições de ensino superior, em detrimento de somente os professores de contabilidade gerencial, justifica-se para possibilitar uma comparação com os resultados da pesquisa realizada no estado do Paraná, a qual contemplou todos os professores de ciências contábeis.

Portanto, da população apresentada, obteve-se uma amostra por acessibilidade de 40 docentes que responderam ao questionário enviado. Como instrumento de coleta de dados, a decisão foi pela utilização de questionário. Martins e Theóphilo (2007, p. 90) definem questionário como “um conjunto ordenado e consistente de perguntas a respeito de variáveis e situações que se deseja medir ou descrever”. Os autores destacam ainda que “o questionário é encaminhado para potenciais informantes, selecionados previamente, tendo que ser respondido por escrito e, geralmente, sem presença do pesquisador”.

O questionário estruturado com perguntas fechadas foi extraído da pesquisa “A abrangência da contabilidade gerencial segundo os docentes paranaenses de contabilidade” de Souza et al (2007) apresentado no 7º Congresso USP de Controladoria e Contabilidade. Verificou-se na pesquisa citada que o questionário foi estruturado com itens selecionados com base em vários livros-textos sobre contabilidade gerencial. Consta no trabalho dos anais do evento que os autores realizaram um pré-teste com três professores para então chegarem aos itens constantes no questionário.

Anexo ao questionário foi enviada uma explicação sobre a natureza da pesquisa, sua importância e a necessidade de se obter resposta. O intuito foi despertar interesse nos respondentes para que efetuassem o preenchimento e retornassem o questionário. Para o tratamento dos dados efetuou-se a inclusão das perguntas do questionário em planilha eletrônica Excel, sendo que as respostas eram digitadas assim

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que o questionário retornava. Com os 40 questionários recebidos, passou-se a efetuar as tabulações. As tabulações ocorreram de forma aleatória, atribuindo um número de 1 a 40 para que não houvesse possibilidade de identificação dos sujeitos da pesquisa.

Ainda que se tenha procurado revestir a análise e interpretação dos dados e os procedimentos metodológicos empregados dentro de um rigor necessário, expressam-se algumas limitações encontradas. Quanto à representatividade, foram considerados nesta pesquisa, apenas os docentes que responderam ao questionário, desconhecendo assim o número total de docentes dos cursos de ciências contábeis dessas IES, ou seja, a população. A dependência da disponibilidade desses docentes em responder aos questionários enviados, bem como a forma como esses profissionais interpretaram tais questionamentos, a subjetividade que possa ter ocorrido e a intensidade com que as respostas foram dadas, também representa uma limitação deste estudo. Por último, o fato de não proporcionar nenhuma pergunta aberta pode ter limitado o poder de expressão desses respondentes.

DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS Esta seção descreve e analisa os dados da pesquisa. Primeiramente faz uma análise dos dados referentes à classificação das áreas abrangidas pela contabilidade gerencial, na opinião dos docentes do curso de ciências contábeis que atuam nas IES do sistema ACAFE. Em seguida, analisa a convergência entre as respostas da pesquisa realizada com os docentes de Santa Catarina e a pesquisa com os docentes do Paraná. Classificação das áreas de abrangência da contabilidade gerencial pelos professores das IES do Sistema ACAFE Inicialmente efetuou-se a tabulação dos dados para mostrar a distribuição dos respondentes por universidade e sua titulação, conforme apresentado na Tabela 3.

Verifica-se na Tabela 3 que das 15 IES vinculadas ao sistema ACAFE, 9 participaram da pesquisa mediante retorno dos questionários. Das IES participantes, destacam-se a FURB e a UNESC, com 35% e 25% respectivamente do total de respondentes. Observa-se que 60,0% dos respondentes possuem a titulação de mestre ou doutor, o que revela alto nível de titulação dos respondentes. Além disso, verifica-se que o tempo médio de docência dos respondentes é de 10,5 anos. Com base nas

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titulações apresentadas e no tempo de docência dos respondentes, a amostra sugere que os respondentes possuem conhecimento acerca do assunto.

Como já mencionado anteriormente, o questionário adotado (Anexo A) foi extraído da pesquisa “A abrangência da contabilidade gerencial segundo os docentes paranaenses de contabilidade”, apresentado no 7º Congresso USP de Controladoria e Contabilidade, de 2007. O questionário foi encaminhado aos professores e foi solicitado que atribuíssem a cada ponto uma nota de 0 a 5, conforme o grau de importância em relação à abrangência da contabilidade gerencial. A escala apresentada aos professores foi: 0 considera-se fora do campo de abrangência da CG, 1 apresenta nenhuma importância; 2 apresenta pouca importância; 3 apresenta uma importância média; 4 apresenta-se importante no campo de abrangência da CG; e 5 muito importante. Tabela 3: Distribuição dos respondentes por universidades e por titulação

Universidade Especialistas Mestres Doutores Total %

Tempo de titulação

(média em anos)

FURB 1 11 2 14 35% 15,9 UNC 1 1 3% 14,0 UNERJ 1 1 3% 6,0 UNESC 10 10 25% 4,6 UNIFEBE 3 1 4 10% 8,8 UNISUL 1 1 2 5% 16,5 UNIVALI 3 3 8% 9,3 UNOCHAPECÓ 1 1 3% 11,0 UNOESC 3 1 4 10% 5,9 Totais 16 21 3 40 100% 10,5

O questionário foi encaminhado com perguntas fechadas, isto é,

sem nenhuma possibilidade de discorrer sobre o questionamento. Além disso, os autores do trabalho que serviu de base a essa pesquisa relatam que, de forma proposital, foi incluída no questionário uma alternativa que, em linhas gerais, não tem nada a ver com a CG, a linha de elaboração dos demonstrativos contábeis. Entendem que é função específica da contabilidade financeira, assim o intuito era de identificar respostas irrefletidas, que seriam descartadas. Posteriormente, os autores, tendo examinado os casos nos quais se atribuiu importância ao item, entenderam que os respondentes podem ter interpretado que a elaboração de demonstrativos contábeis também faz parte da CG, quando tem

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finalidades gerenciais, caso da Demonstração de Resultado do Exercício sob o enfoque do custeio variável.

Assim, a partir das respostas dos professores das IES do sistema ACAFE ao questionário foi efetuada a tabulação dos dados e calculou-se a média da pontuação atribuída pelos respondentes a cada ponto solicitado no questionário, conforme exposto na Tabela 4.

Tabela 4: Classificação das áreas abrangidas da contabilidade gerencial pelas IES do sistema ACAFE segundo a pontuação média

Ordem Áreas de abrangência da contabilidade gerencial Pontuação média 1º Informações contábeis para tomada de decisão 4,79 2º Custos para avaliação, controle e tomada de decisão 4,58 3º Controle gerencial por áreas de responsabilidade 4,39 4º Avaliação de desempenho 4,34 5º Lucro empresarial 4,34 6º Técnicas de contabilidade gerencial estratégica 4,32 7º Custo-padrão e análise das variações = custos para controle 4,29 8º Orçamento operacional 4,16 9º Projeções orçamentárias 4,13 10º Relação / Análise custo-volume lucro 4,11 11º Gestão de fluxos de caixa 4,03 12º Planejamento (estratégico, tático e operacional) 4,03 13º Orçamento de capitais 4,00 14º Análise de investimento 3,97 15º Planejamento e controle tributário 3,97 16º Formação do preço de venda 3,95 17º Técnicas de custeio 3,82 18º Balanced Scorecard – BSC 3,76 19º Sistemas informatizados (ERPs) 3,74 20º Custeio baseado em atividades (ABC) 3,68 21º Avaliação de patrimônio 3,66 22º Análise de rentabilidade de clientes 3,63 23º Elaboração dos demonstrativos contábeis 3,42 24º Preço de transferência 3,16 25º Teoria das restrições – TOC 3,13 26º Análise diferencial ou análises de variância 3,11 27º Efeitos inflacionários na empresa 3,11 28º Planejamento e controle na administração pública 3,11

29º Gerenciamento da qualidade, tecnologias e conceitos de administração de produção 3,05

30º Logística empresarial 2,95 31º Implicações comportamentais 2,71

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Depois de apurada a média das notas atribuídas a cada ponto, efetuou-se também a média das notas das 31 opções constantes no questionário, bem como o cálculo do desvio padrão (DP), para atribuir os mesmos conceitos da escala de nenhuma importância a muito importante.

A média das pontuações das notas atribuídas pelos docentes do curso de ciências contábeis das IES do sistema ACAFE foi de 3,79 e o desvio padrão foi de 0,53, conforme exposto na Tabela 5.

Tabela 5: Escala de classificação de importância das IES do sistema ACAFE-SC

Classificação Critério Muito importante Além de 1 DP acima da média > 4,32 Importante Entre a média e 1 DP acima da média > 3,79 e < 4,32 Importância média = 3,79 = 3,79 Pouca importância Entre a média e 1 DP abaixo da média < 3,79 e > 3,26 Nenhuma importância Além de 1 DP abaixo da média < 3,26

Com a escala apresentada na Tabela 5, foi então possível

classificar as áreas de abrangência da contabilidade gerencial como apresentado na Tabela 6.

Observa-se na Tabela 6 que existe convergência nos pontos classificados como muito importante e importante com os pontos apresentados em livros-textos, com destaque para as informações contábeis para tomada de decisão; custos para avaliação, controle e tomada de decisão; controle gerencial por áreas de responsabilidade; avaliação de desempenho e lucro empresarial. Entre esses pontos há o item custos para avaliação, controle e tomada de decisão, que em determinado momento pode ser questionado por fazer parte da disciplina de custos.

Se tal análise se estender aos pontos classificados como importante, tem-se novamente tópicos abordados em disciplinas de custos e análise de custos, como: custo-padrão e análise das variações = custos para controle; relação/análise custo-volume lucro e técnicas de custeio. Ainda observando-se nesta ótica, tem-se pontos como orçamento operacional e orçamento de capitais, planejamento (estratégico, tático e operacional) sendo atribuídos à disciplina de controladoria.

Nessa análise, verificou-se também a pontuação dos respondentes separados por titulação de mestre e doutor comparativamente ao resultado do total da amostra. Verificaram-se divergências nos seguintes pontos: para os mestres e doutores foram classificados com pouca importância os seguintes itens: gestão do fluxo de caixa; planejamento (estratégico, tático

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e operacional); análise de investimentos; planejamento e controle tributário; e técnicas de custeio. Por sua vez, em relação à amostra total, estes foram classificados como importantes.

Na sequência, buscou-se fazer a comparação em relação à área de abrangência da Contabilidade Gerencial indicada pelos docentes de Santa Catarina versus os docentes do estado do Paraná.

Tabela 6: Classificação das áreas abrangidas da contabilidade gerencial pelas IES do sistema ACAFE, segundo a escala de importância

Áreas de abrangência da contabilidade gerencial

Pontuação média Classificação

1 Informações contábeis para tomada de decisão 4,79 Muito importante

2 Custos para avaliação, controle e tomada de decisão 4,58 Muito importante

3 Controle gerencial por áreas de responsabilidade 4,39 Muito importante

4 Avaliação de desempenho 4,34 Muito importante 5 Lucro empresarial 4,34 Muito importante 6 Técnicas de contabilidade gerencial estratégica 4,32 Importante

7 Custo-padrão e análise das variações = custos para controle 4,29 Importante

8 Orçamento operacional 4,16 Importante 9 Projeções orçamentárias 4,13 Importante 10 Relação / Análise custo-volume lucro 4,11 Importante 11 Gestão de fluxos de caixa 4,03 Importante 12 Planejamento (estratégico, tático e operacional) 4,03 Importante 13 Orçamento de capitais 4,00 Importante 14 Análise de investimento 3,97 Importante 15 Planejamento e controle tributário 3,97 Importante 16 Formação do preço de venda 3,95 Importante 17 Técnicas de custeio 3,82 Importante 18 Balanced Scorecard – BSC 3,76 Pouca importância 19 Sistemas informatizados (ERPs) 3,74 Pouca importância 20 Custeio baseado em atividades (ABC) 3,68 Pouca importância 21 Avaliação de patrimônio 3,66 Pouca importância 22 Análise de rentabilidade de clientes 3,63 Pouca importância 23 Elaboração dos demonstrativos contábeis 3,42 Pouca importância 24 Preço de transferência 3,16 Nenhuma importância 25 Teoria das restrições – TOC 3,13 Nenhuma importância 26 Análise diferencial ou análises de variância 3,11 Nenhuma importância 27 Efeitos inflacionários na empresa 3,11 Nenhuma importância

28 Planejamento e controle na administração pública 3,11 Nenhuma importância

29 Gerenciamento da qualidade, tecnologias e conceitos de administração de produção 3,05 Nenhuma importância

30 Logística empresarial 2,95 Nenhuma importância 31 Implicações comportamentais 2,71 Nenhuma importância

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Outras divergências foram constatadas no item avaliação patrimonial, considerado importante para os mestres e doutores e de pouca importância para a amostra. Também o item elaboração das demonstrações contábeis apresentou-se com nenhuma importância aos mestres e doutores e pouca importância na amostra obtida. Verifica-se assim que entre os docentes de ciências contábeis das IES vinculadas à ACAFE, não existe unanimidade relacionada à abrangência da contabilidade gerencial. Porém, verifica-se que existem alguns tópicos considerados como sendo desta área, que são os 17 primeiros itens listados na Tabela 6.

Comparação da classificação das áreas abrangidas pela CG pelos docentes das IES de Santa Catarina e do Paraná Neste tópico buscou-se apresentar a classificação obtida no estudo realizado no estado do Paraná, conforme Tabela 7, para, na sequência, efetuar tal comparação com o estudo realizado em Santa Catarina.

A classificação exposta na Tabela 7 foi extraída da pesquisa efetuada com docentes do Estado do Paraná, que foi utilizada como referência para comparação com a pesquisa realizada em Santa Catarina.

Dos 31 itens elencados para análise, 15 apresentaram convergência entre as duas pesquisas, ou seja, 48,3% dos itens. Para facilitar a descrição, intitulou-se grupo 1 a pesquisa realizada em Santa Catarina e grupo 2 a pesquisa efetuada no Paraná.

Os itens 1 a 3, ou seja, informações contábeis para tomada de decisão, custos para avaliação, controle e tomada de decisão e avaliação de desempenho, foram os itens convergentes, entendidos pelos dois grupos como muito importantes dentro da área de contabilidade gerencial.

Outros oito itens, itens 4 a 11, apresentaram-se convergentes entre os docentes dos dois estados, na classificação “importante”. Observa-se que embora enquadrados pelos dois grupos como “importante”, o grupo 2 apresentou médias mais elevadas do que o grupo 1, exceto para o item 4 (custo-padrão e análise das variações = custo para controle) e o item 9 (orçamento de capital), em que o grupo de docentes de SC atribuiu uma média mais elevada. Para os itens com pouca importância e nenhuma importância, as convergências ocorreram com dois itens em cada classificação. Com pouca importância tem-se os itens 12 e 13, sistemas informatizados (ERPs) e custeio baseado em atividades (ABC), respectivamente. Ambos os grupos consideraram o planejamento e controle na administração pública e implicações comportamentais com

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“nenhuma importância”, não considerando assim itens necessários de abordagem na área de contabilidade gerencial. Tabela 7: Classificação das áreas abrangidas pela contabilidade gerencial na pesquisa realizada no Paraná Áreas de abrangência da contabilidade gerencial Pontuação

média Classificação

Informações contábeis para tomada de decisão 4,67 Muito importante Custos para avaliação, controle e tomada de decisão 4,63 Muito importante Relação / Análise custo-volume lucro 4,54 Muito importante Técnicas de contabilidade gerencial estratégica 4,43 Muito importante Avaliação de desempenho 4,38 Muito importante Orçamento operacional 4,31 Importante Gestão de fluxos de caixa 4,28 Importante Controle gerencial por áreas de responsabilidade 4,25 Importante Projeções orçamentárias 4,23 Importante Planejamento (estratégico, tático e operacional) 4,22 Importante Custo-padrão e análise das variações = custos para controle 4,17 Importante

Análise de investimento 4,06 Importante Formação do preço de venda 3,99 Importante Orçamento de capitais 3,94 Importante Análise de rentabilidade de clientes 3,85 Importante Balanced Scorecard – BSC 3,83 Importante Custeio baseado em atividades (ABC) 3,77 Pouca importância Sistemas informatizados (ERPs) 3,73 Pouca importância Teoria das restrições – TOC 3,73 Pouca importância Lucro empresarial 3,72 Pouca importância Preço de transferência 3,69 Pouca importância Análise diferencial ou análises de variância 3,63 Pouca importância Técnicas de custeio 3,62 Pouca importância Efeitos inflacionários na empresa 3,46 Pouca importância Gerenciamento da qualidade, tecnologias e conceitos de administração de produção 3,34 Pouca importância

Logística empresarial 3,32 Pouca importância

Planejamento e controle tributário 3,15 Nenhuma importância

Avaliação de patrimônio 3,06 Nenhuma importância

Implicações comportamentais 2,70 Nenhuma importância

Elaboração dos demonstrativos contábeis 2,60 Nenhuma importância

Planejamento e controle na administração pública 2,60 Nenhuma importância

Fonte: Souza et al (2007).

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Abrangência da contabilidade gerencial segundo os docentes de contabilidade de SC

Tabela 8: Convergências de classificação das áreas da contabilidade gerencial abrangidas segundo pesquisa realizada em Santa Catarina versus Paraná

Áreas de abrangência da contabilidade gerencial Santa Catarina Paraná

Pontuação média Classificação Pontuação

média Classificação

1 Informações contábeis para tomada de decisão 4,79 Muito

importante 4,67 Muito importante

2 Custos para avaliação, controle e tomada de decisão 4,58 Muito

importante 4,63 Muito importante

3 Avaliação de desempenho 4,34 Muito importante 4,38 Muito

importante

4 Custo-padrão e análise das variações = custos para controle 4,29 Importante 4,17 Importante

5 Orçamento operacional 4,16 Importante 4,31 Importante 6 Projeções orçamentárias 4,13 Importante 4,23 Importante 7 Gestão de fluxos de caixa 4,03 Importante 4,28 Importante

8 Planejamento (estratégico, tático e operacional) 4,03 Importante 4,22 Importante

9 Orçamento de capitais 4,00 Importante 3,94 Importante 10 Análise de investimento 3,97 Importante 4,06 Importante 11 Formação do preço de venda 3,95 Importante 3,99 Importante

12 Sistemas informatizados (ERPs) 3,74 Pouca importância 3,73 Pouca

importância

13 Custeio baseado em atividades (ABC) 3,68 Pouca

importância 3,77 Pouca importância

14 Planejamento e controle na administração pública 3,11 Nenhuma

importância 2,60 Nenhuma importância

15 Implicações comportamentais 2,71 Nenhuma importância 2,70 Nenhuma

importância Expostas as convergências, na sequência são apresentadas as divergências encontradas entre os dois grupos, como pode ser visto na Tabela 9, a seguir. Observaram-se três itens divergentes entre a classificação de muito importante para importante, ou vice-versa entre o dois grupos. Enquanto no grupo 1 foi classificado o controle gerencial por áreas de responsabilidade como muito importante, o grupo 2 classificou como importante. Por outro lado, o grupo 1 classificou técnicas de contabilidade gerencial estratégica, relação e análise de custo-volume-lucro como importante; o grupo 2 o classificou como importante.

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Tabela 9: Divergências de classificação das áreas da contabilidade gerencial abrangidas segundo pesquisa realizada em Santa Catarina versus Paraná

Áreas de abrangência da contabilidade gerencial Santa Catarina Paraná

Pontuação média Classificação Pontuação

média Classificação

1 Controle gerencial por áreas de responsabilidade 4,39 Muito

importante 4,25 Importante

2 Técnicas de contabilidade gerencial estratégica 4,32 Importante 4,43 Muito

importante

3 Relação / Análise custo-volume lucro 4,11 Importante 4,54 Muito

importante

4 Lucro empresarial 4,34 Muito importante 3,72 Pouca

importância

5 Planejamento e controle tributário 3,97 Importante 3,15 Nenhuma

importância

6 Técnicas de custeio 3,82 Importante 3,62 Pouca importância

7 Balanced Scorecard – BSC 3,76 Pouca importância 3,83 Importante

8 Análise de rentabilidade de clientes 3,63 Pouca

importância 3,85 Importante

9 Avaliação de patrimônio 3,66 Pouca importância 3,06 Nenhuma

importância

10 Elaboração dos demonstrativos contábeis 3,42 Pouca

importância 2,6 Nenhuma importância

11 Preço de transferência 3,16 Nenhuma importância 3,69 Pouca

importância

12 Teoria das restrições – TOC 3,13 Nenhuma importância 3,73 Pouca

importância

13 Análise diferencial ou análises de variância 3,11 Nenhuma

importância 3,63 Pouca importância

14 Efeitos inflacionários na empresa 3,11 Nenhuma

importância 3,46 Pouca importância

15 Gerenciamento da qualidade, tecnologias e conceitos de administração de produção

3,05 Nenhuma importância 3,34 Pouca

importância

16 Logística empresarial 2,95 Nenhuma importância 3,32 Pouca

importância Ocorreu somente uma divergência de classificação de muito

importante para pouca importância, no item lucro empresarial. O grupo 1 classificou como muito importante e o grupo 2 somente com pouca importância. Outra divergência de classificação foi de importante, para o grupo 1 e de nenhuma importância para o grupo 2, relacionado ao item

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Abrangência da contabilidade gerencial segundo os docentes de contabilidade de SC

planejamento e controle tributário. Três divergências ocorreram da classificação importante e de pouca importância. O grupo 1 classificou como importante o item técnicas de custeio e o grupo 2 com pouca importância. O contrário ocorreu nos itens Balanced Scorecard e análise de rentabilidade de clientes, que para o grupo 1 foi de pouca importância e o grupo 2 classificou como importante.

Por fim, tem-se a diferença de classificação de itens nos conceitos pouca importância e nenhuma importância, ocorrida em oito itens. O grupo 1 classificou como pouca importância a avaliação de patrimônio e o item elaboração dos demonstrativos contábeis, classificados como nenhuma importância para o grupo 2. O contrário ocorreu nos itens preço de transferência; teoria das restrições; análise diferencial ou análises de variância; efeitos inflacionários na empresa; gerenciamento da qualidade, tecnologias e conceitos de administração de produção; logística empresarial classificados como nenhuma importância para o grupo 1 e como pouca importância ao grupo 2. CONSIDERAÇÕES FINAIS A contabilidade gerencial tem por finalidade prover os gestores de informações que os auxiliem no planejamento, controle e tomada de decisões. Analisando diversos autores, foram verificados conceitos diferenciados sobre a contabilidade gerencial, porém todos revestidos de similaridade quanto ao conceito e ao objetivo da contabilidade gerencial.

Três pontos foram identificados como comuns ao conceito de contabilidade gerencial, sendo quanto à composição do processo, a destinação das informações e a finalidade. Quanto à composição do processo, alguns autores expõem com maior ou menor detalhe, mas de modo geral, o conceituam como identificar, mensurar, acumular, analisar, preparar, interpretar e comunicar informações.

No que concerne à destinação das informações, de forma geral está direcionada aos usuários internos. Há autores que detalham: gestores, executivos, gerentes, administradores. Quanto à finalidade, as expressões apresentam-se diferentes, mas com propósitos similares: tomada de decisão; auxílio na gestão; direção e controle das operações; auxílio nas funções gerenciais; planejamento, controle e tomada de decisão; atingir objetivos organizacionais.

As informações geradas pela contabilidade gerencial interagem com diversas áreas, o que resulta em questionamentos quanto à abrangência da contabilidade gerencial. Nessa perspectiva, o objetivo do

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presente estudo foi identificar a área de abrangência da contabilidade gerencial na visão dos docentes que atuam nos cursos de ciências contábeis das Instituições de Ensino Superior (IES) do sistema ACAFE (Associação Catarinense das Fundações Educacionais) de Santa Catarina - Brasil.

Constatou-se na visão dos docentes catarinenses do curso de Ciências Contábeis das IES ligadas ao sistema ACAFE que: informações contábeis para tomada de decisão, custos para avaliação, controle e tomada de decisão, controle gerencial por áreas de responsabilidade, avaliação de desempenho e lucro empresarial, foram itens considerados muito importantes na abrangência da contabilidade gerencial.

Por outro lado, foram considerados sem nenhuma importância: preço de transferência; teoria das restrições; análise diferencial ou análise de variância; efeitos inflacionários; planejamento e controle na administração pública; gerenciamento da qualidade, tecnologia e conceitos de administração de produção; logística empresarial; implicações comportamentais.

Ao comparar os resultados do presente estudo com o realizado no estado do Paraná, constatou-se que as informações contábeis para tomada de decisão e custos para avaliação, controle e tomada de decisão foram itens convergentes, considerados como muito importantes. Como sem nenhuma importância as convergências foram nos itens planejamento e controle na administração pública e implicações comportamentais.

Observaram-se divergências entre os grupos, porém somente entre um nível e outro, ou seja, de muito importante para importante, de importante para pouca importância e de pouca importância para sem nenhuma importância. A maior divergência foi no item planejamento e controle tributário, que para os docentes catarinenses é considerado importante e para os paranaenses sem nenhuma importância.

Conclui-se com base nas respostas dos docentes que atuam nos cursos de ciências contábeis das Instituições de Ensino Superior (IES) do sistema ACAFE (Associação Catarinense das Fundações Educacionais) de Santa Catarina – Brasil, que não há consenso a respeito dos itens que devem constar na área de abrangência da contabilidade gerencial. Os resultados desta pesquisa coadunam-se com os achados da pesquisa realizada com os docentes do Paraná e com a nebulosidade sobre a área de abrangência da contabilidade gerencial encontrada na literatura.

Com base nesta pesquisa, delimitadas às IES de Santa Catarina ligadas ao sistema ACAFE, recomenda-se a realização de outros estudos, privilegiando os seguintes aspectos:

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Abrangência da contabilidade gerencial segundo os docentes de contabilidade de SC

a) Ampliar a investigação para universidades de outros Estados a fim de conhecer a realidade destes, verificando as convergências com esta pesquisa e aumentando assim a base de dados para análise; b) Com uma base de dados ampliada, utilizar-se de outros métodos quantitativos, que possibilitem fazer outras relações de análise, como a classificação atribuída e o grau de formação, tempo que leciona, se leciona, lecionou ou nunca lecionou a disciplina de contabilidade gerencial; c) Aplicar tal metodologia de pesquisa aos estudantes dos programas de pós-graduação em nível de mestrado e doutorado do Brasil; d) Fazer uma análise das ementas curriculares dos cursos de ciências contábeis e verificar a abrangência da contabilidade gerencial no ensino brasileiro. REFERÊNCIAS

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Paulo Roberto da Cunha, Ilse Maria Beuren, Rita Buzzi Rausch e Daniela Benvenuti

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Abrangência da contabilidade gerencial segundo os docentes de contabilidade de SC

DADOS DOS AUTORES PAULO ROBERTO DA CUNHA ([email protected]) Doutorando em Ciências Contábeis e Administração Instituição de Vinculação: Universidade Regional de Blumenau Blumenau/SC – Brasil Áreas de interesse em pesquisa: Usuários Externos e Contabilidade Gerencial ILSE MARIA BEUREN ([email protected]) Doutora em Controladoria e Contabilidade pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo Instituição de Vinculação: Universidade Regional de Blumenau Blumenau/SC – Brasil Áreas de interesse em pesquisa: Contabilidade Gerencial RITA BUZZI RAUSCH ([email protected]) Doutora em Educação pela Universidade Estadual de Campinas Instituição de Vinculação: Universidade Regional de Blumenau Blumenau/SC – Brasil Áreas de interesse em pesquisa: Educação DANIELA BENVENUTI ([email protected]) Graduada em Ciências Contábeis pela Universidade Regional de Blumenau Blumenau/SC – Brasil Recebido em: 29/08/2009 • Aprovado em: 10/01/2010

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Paulo Roberto da Cunha, Ilse Maria Beuren, Rita Buzzi Rausch e Daniela Benvenuti

Anexo A - Questionário 1) Nome do Professor: 2) Telefone para contato: 3) E-mail: 4) Universidade: 5) Tempo que leciona no ensino superior: 6) Formação acadêmica: Bacharel. Qual(is) curso(s)? ( ) Especialização: Qual(is) curso(s)? ( ) Mestrado: Qual(is) curso(s)? ( ) Doutorado: Qual(is) curso(s)? ( ) 7) Para identificar qual dos itens tem maior abrangência na Contabilidade Gerencial (CG), solicita-se que você atribua uma nota, na escala de 0 a 5, com a seguinte instrução: 0 - Considera-se fora do campo de abrangência da CG 1 - Apresenta nenhuma importância no campo de abrangência da CG 2 - Apresenta pouca importância no campo de abrangência da CG 3 - Apresenta uma importância média para o campo de abrangência da

CG 4 - Apresenta importante no campo de abrangência da CG

Itens selecionados Nota

Análise de investimento ( ) Análise de rentabilidade de clientes ( ) Análise diferencial ou análises de variância ( ) Avaliação de desempenho ( ) Avaliação de patrimônio ( ) Balanced Scoreard - BSC ( ) Controle gerencial por áreas de responsabilidade ( ) Custeio baseado em atividades (ABC) ( ) Custo-padrão e análise das variações = custos para controle ( ) Custos para avaliação, controle e tomada de decisão ( ) Efeitos inflacionários na empresa ( ) Elaboração dos demonstrativos contábeis ( ) Formação do preço de venda ( ) Gerenciamento da qualidade, tecnologias e conceitos de Adm. de produção

( )

Gestão de fluxos de caixa ( ) Implicações comportamentais ( )

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Abrangência da contabilidade gerencial segundo os docentes de contabilidade de SC

Informações contábeis para tomada de decisão ( ) Logística empresarial ( ) Lucro empresarial ( ) Orçamento de capitais ( ) Orçamento operacional ( ) Planejamento (estratégico, tático e operacional) ( ) Planejamento e controle na administração pública ( ) Planejamento e controle tributário ( ) Preço de transferência ( ) Projeções orçamentárias ( ) Relação / Análise custo-volume lucro ( ) Sistemas informatizados (ERPs) ( ) Técnicas de contabilidade gerencial estratégica ( ) Técnicas de custeio ( ) Teoria das restrições - TOC ( )

Fonte: Souza et al (2007).

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ESTRATÉGIAS COMPETITIVAS E POTENCIAL DE BARREIRAS DE ENTRADA EM SERVIÇOS: UMA PROPOSTA DE ABORDAGEM TEÓRICA

COMPETITIVE STRATEGIES AND POTENTIAL OF ENTRY BARRIERS IN

SERVICES: A THEORETICAL APPROACH PROPOSAL

DIMÁRIA SILVA E MEIRELLES ([email protected]) UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE RESUMO O objetivo deste artigo é apresentar uma proposta de abordagem teórica para estratégias competitivas e barreiras de entrada em serviços. Utiliza-se uma definição de serviços baseada no pressuposto de que o processo de trabalho pode ser humano ou mecânico, com a utilização tanto de recursos humanos quanto máquinas e equipamentos. Dessa perspectiva propõe-se uma matriz de classificação das estratégias competitivas em serviços baseada em duas variáveis: grau de intensidade de capital e escala de operação. Quatro possibilidades de prestação do serviço e as respectivas estratégias competitivas são identificadas: i) baixa intensidade de capital e pequena escala de operação – estratégias voltadas para a reputação e fidelização de clientes; ii) baixa intensidade de capital e larga escala de operação – estratégias baseadas no controle e padronização de procedimentos; iii) alta intensidade de capital e pequena escala de operação – estratégias de inovação e aumento do conteúdo tecnológico; e iv) alta intensidade de capital e larga escala de operação – estratégias de exploração de economias de escala. Em seguida, propõe-se uma matriz que conecta essas estratégias com barreiras de entrada, as quais podem ser relacionais, de custo, tecnológicas e de escala. Palavras-chave: barreiras de entrada; escala de operação; estratégias competitivas; intensidade de capital; serviços.

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Estratégias competitivas e potencial de barreiras de entrada em serviços:

ABSTRACT This article aims to present a theoretical approach to competitive strategies and market structures in services. It uses a definition of services which states that a work process may be either human or mechanical, based on human resources or machines and equipment. From this standpoint, a matrix of services competitive strategies classification is built, which is based on the degree of capital intensity and scale of operations. Four possibilities are detected: i) low capital intensity and small scale of operation: strategies targeting reputation and customer loyalty; ii) low capital intensity and large scale of operations: strategies based on control and standardization of procedures; iii) high capital intensity and small scale of operation: strategies of innovation and increase of technological content; and iv) high capital intensity and large scale of operation: scale economy exploration strategies. After that, a matrix is presented which connects these strategies with entry barriers, which may be relational, cost, technological and of scale. Keywords: capital intensity; entry barriers; scale of operation; services; competitive strategies. INTRODUÇÃO O setor de serviço vem passando por profundas mudanças nos seus aspectos de produção e consumo, provocadas, sobretudo, pelas inovações no âmbito das tecnologias da informação e comunicação (TICs). Dentre as mudanças em curso, destaca-se a tendência de redução do uso de recursos humanos no processo de prestação dos serviços em geral. Comumente apontado como o atributo mais característico das atividades de serviço, o uso de recursos humanos tem ficado obsoleto na medida em que se verifica o avanço das TICs. Serviços que antes utilizavam intensivamente recursos humanos para o processamento e interpretação de dados, ou mesmo para estabelecer um canal de comunicação com os usuários, substituíram esses recursos pelo uso de computadores e redes de telecomunicação (TIGRE, 2006).

Outras características específicas que também estão perdendo importância na definição de serviços são a intangibilidade, a inestocabilidade e a interatividade pessoal entre prestadores e usuários. Esse novo perfil dos serviços apresenta fortes implicações na organização e design do processo produtivo. A produção, anteriormente não-contínua,

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Dimária Silva e Meirelles

com limitadas economias de escala, passou a ser padronizada e reorganizada de maneira mais integrada entre suas unidades, com componentes padronizados e alta divisão do trabalho (MILES, 1993; KON, 1999; 2004).

Essas mudanças, por sua vez, apresentam questões importantes sobre o tratamento teórico de estratégias em serviço: Em primeiro lugar, a padronização e a operação em larga escala se aplica apenas a alguns grupos de serviços? Em segundo lugar, qual o potencial e os limites de exploração de economias de escala em serviços? E, em terceiro, quais as implicações dessas estratégias competitivas do ponto de vista da conformação das estruturas de mercado?

Via de regra, tanto na literatura de marketing quanto de operações em serviços, as estratégias têm sido classificadas de acordo com o grau de padronização e customização dos serviços (TÉBOUL, 2002; KOTLER; KELLER, 2007), volume (SILVESTRO et al, 1992; SILVESTRO, 1999) e variedade (LOVELOCK; WRIGHT, 2002) bem como em relação ao grau de controle e envolvimento de clientes e gerentes (COLLIER; MEYER, 1998) e o grau de intensidade de mão-de-obra (SCHMENNER, 1999).

Subjacente a essas tipologias está a hipótese de que o grau de contato com o cliente está diretamente relacionado com o conteúdo de trabalho e este define a natureza do serviço: se customizado e oferecido em pequena escala ou padronizado e oferecido em massa. Quanto maior o conteúdo de trabalho, maior o contato e maior a customização. E, vice-versa, quanto menos trabalho, menos contato e maior padronização ou massificação.

A associação entre grau de contato e conteúdo de trabalho vale para grande parte dos serviços, principalmente os serviços pessoais. Entretanto, existem casos claros de alta intensidade de contato e massificação, como serviços de restaurantes e cadeias de hotéis. Por outro lado, há serviços que utilizam pouca mão-de-obra, porém há alta intensidade de contato, como é o caso dos serviços hospitalares de diagnóstico, pela complexidade e necessidade de “participação direta” do cliente.

A resposta a esses aparentes paradoxos reside na adoção de um conceito de serviço, proposto em Silva e Meirelles (2003; 2006), em que o processo de trabalho pode ser humano ou mecânico, baseado tanto no uso de recursos humanos quanto de máquinas e equipamentos. A seguir será apresentado um breve resumo dessa abordagem conceitual e de classificação dos serviços. A partir dessa abordagem, propõe-se uma matriz de posicionamento estratégico de acordo com a relação entre Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 79-100 • Jan/Fev/Mar 2010 81

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Estratégias competitivas e potencial de barreiras de entrada em serviços:

intensidade de capital e escala de operações. Por fim, associadas a essas estratégias identificam-se as barreiras de entrada típicas no setor. Conceito e classificação dos serviços Nas abordagens contemporâneas em geral, seja na literatura econômica, de marketing e de operações de serviços, são identificados quatro atributos essenciais dos serviços em relação à natureza dos recursos produtivos utilizados e o resultado do trabalho realizado: intangibilidade, simultaneidade, interatividade e inestocabilidade. Só é considerada atividade de serviço, a atividade cujo processo de produção seja intangível, baseado em insumos e ativos intangíveis, cuja relação de produção e consumo seja simultânea e interativa, resultando num produto também intangível e inestocável (THOMAS, 1967; BROWNING; SINGELMAN, 1978; GERSHUNY; MILES, 1983; NUSBAUMER, 1984; WALKER, 1985; MARSHALL; WOOD, 1995; SCHMENNER, 1999; FITZSIMMONS; FITZSIMMONS, 2000; GIANESI; CORRÊA, 1996; LOVELOCK; WRIGHT, 2002).

Essa perspectiva conceitual de serviços está presente nas estatísticas oficiais em geral. De acordo com o padrão ISIC (International Standard Industrial Classification) adotado por organismos multilaterais, como Organização das Nações Unidas (ONU), Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional(FMI) as atividades classificadas como de serviço apresentam a característica predominante de produzir e gerar bens intangíveis, não duradouros e não mensuráveis. Estas atividades objetivam atender e dar suporte à produção de bens e produtos tangíveis. Quatro principais categorias de serviço, correspondentes às subdivisões 50 a 99 do padrão ISIC, são identificadas: transporte e comunicação; distribuição e armazenamento de bens e matérias-primas; serviços financeiros; e serviços relacionados às atividades de negócio em geral (business services), tais como aluguel, consultoria, marketing, serviços técnicos e pessoais, entre outros.

No entanto, essa definição de serviços apresenta limitações, na medida em que não dá conta de uma série de atividades que apresentam características distintas, principalmente devido à possibilidade de armazenamento, como é o caso de vários serviços de infra-estrutura, conforme reconhece a própria ONU (2008).

Conforme assinala Schmenner (1999), a classificação oficial em geral segue um critério residual, ou seja, são classificadas como serviços todas aquelas atividades que não são de indústria ou da agricultura. Em decorrência, permanecem problemas de definição, como os serviços 82 Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 79-100 • Jan/Fev/Mar 2010

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públicos de infra-estrutura, que envolvem etapas típicas de operação industrial, como é o caso da geração de energia elétrica. No nível das empresas, ressalta esse autor, o problema de definição é ainda maior, pois há empresas que desenvolvem atividades ligadas tanto à indústria quanto aos serviços.

Em função dessas lacunas e incoerências conceituais em serviços, torna-se necessária uma proposta de abordagem teórica mais ampla, que abarque as atividades de serviço em geral, independentemente das características do processo produtivo (se intensivo em recursos humanos ou em capital) ou dos resultados desse processo (se tangível ou intangível). Apoiada na hipótese de que serviço é trabalho em processo e que os atributos específicos dos serviços devem ser compreendidos a partir dessa natureza essencial, defendem-se aqui os seguintes postulados teóricos para a abordagem de serviços propostos em Silva e Meirelles (2006, p. 130): a) Serviço é trabalho na sua acepção ampla e fundamental, podendo ser realizado por recursos em geral, não só por meio dos recursos humanos (trabalho humano), mas também por máquinas e equipamentos em geral (trabalho mecânico). b) Serviço é trabalho em processo, ou seja, serviço é trabalho na concepção dinâmica do termo, trabalho em ação. c) Todo serviço é realização de trabalho, mas nem toda realização de trabalho é serviço, ou seja, não existe uma relação biunívoca entre serviço e trabalho.

O primeiro postulado proporciona uma visão ampla e dinâmica da participação dos serviços na economia. De um lado permite classificar como atividades de serviço não só aquelas intensivas em recursos humanos como também as de capital-intensivas, como é o caso dos serviços de infra-estrutura econômica. Além disso, permite compreender a modernização dos serviços, cada vez mais baseados em novos “meios” de se realizar trabalho, novos dispositivos ou ativos que se combinam ao trabalho humano ou o substituem (SILVA E MEIRELLES, 2006).

Essa visão de serviços encontra respaldo, em primeiro lugar, na própria definição de energia proveniente da Física: energia expressa um potencial de realização de trabalho. Normalmente as formas de energia estão relacionadas a uma força. Na visão econômica, via de regra, o conceito de trabalho é associado à força de trabalho humano. Entretanto, conforme assinala Landes (1994), no decorrer dos avanços tecnológicos que marcaram as Revoluções Industriais, novas fontes de energia inanimada foram substituindo a energia da força humana e animal. Nesse

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sentido, a generalização da natureza do trabalho em humano e mecânico se aplica não só aos serviços como também às atividades de indústria.

Em segundo lugar, essa estreita relação entre serviços e recursos encontra respaldo na visão de alguns autores da literatura econômica clássica, como é o caso de Say (1803). De acordo com Say (1803), o homem coloca a seu serviço as forças da natureza e das máquinas e equipamentos. Não é de surpreender, portanto, diz o autor, o emprego das seguintes expressões: trabalho ou serviços produtivos da natureza, trabalho ou serviços produtivos dos capitais. Essa definição está presente também na teoria da firma de Penrose (1959) bem como na própria visão contemporânea da - Resource Based Theory(RBT) (PETERAF; BERGEN, 2003).

O segundo postulado proposto em Silva e Meirelles (2006) permite compreender a diferença entre serviços e produtos em geral. Enquanto serviço é trabalho em processo, produto, por outro lado, é o resultado desse processo, um trabalho acumulado. Nesse sentido, o produto ao qual o serviço está relacionado pode ser tangível ou intangível, ou seja, tanto pode ser um bem físico ou uma informação, pois o que caracteriza efetivamente uma atividade como de serviço é, única e exclusivamente, a realização de trabalho em processo.

Dessa definição de serviço é possível compreender os atributos típicos de serviços, como a intangibilidade, simultaneidade, interatividade e inestocabilidade. Em primeiro lugar, serviço é intangível porque, sendo trabalho em processo, não se conhece a priori o seu resultado final. “Prestar um serviço, seja ele qual for, consiste em cumprir uma promessa de atendimento de especificações de demanda, firmadas ex-ante em contratos (formais ou informais) que se realizarão ex-post” (SILVA E MEIRELLES, 2006, p. 133). Nessa perspectiva, a intangibilidade se faz presente em todas as atividades de serviço, mesmo que sejam utilizados insumos e ativos tangíveis no processo de trabalho, ou mesmo que o trabalho realizado resulte num produto concreto e tangível.

A oferta e a demanda são simultâneas, pois a prestação do serviço só acontece a partir do momento em que este é demandado e se encerra assim que a demanda é atendida. É possível interromper um serviço, mas não revertê-lo, porque parte de sua ação e de seu efeito já se deu ao longo do processo de trabalho (SILVA E MEIRELLES, 2006). Nesse sentido, depreende-se também o caráter inestocável dos serviços. É impossível armazenar um serviço e ofertá-lo em outro ponto do tempo ou do espaço, pois a oferta só se dá de acordo com a demanda. Ou seja, é possível estocar os recursos utilizados no processo, mas não a sua utilização.

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É interessante ressaltar que, a inestocabilidade configura, em princípio, o serviço como non tradeable, isto é, não passível de comercialização, porque não é capaz de ser armazenado e transportado entre localidades distintas. Entretanto, é possível realizar o serviço utilizando redes físicas e comerciais que permitem a interconexão e a operação em múltiplos mercados (como as franquias, por exemplo).

Destaca-se assim um dos atributos fundamentais dos serviços, a interatividade. Para que o serviço se realize é necessário um canal relacional que mantenha prestadores e usuários do serviço conectados durante um período de tempo ou extensão geográfica. Esse canal pode ser pessoal e direto, pela presença física de prestadores e usuários, ou essencialmente técnico, a partir de meios físicos de conexão, como as redes físicas de fios, cabos e dutos utilizadas para a prestação de serviços de infra-estrutura econômica (telecomunicações, distribuição de água e energia elétrica, transportes, etc).

Por fim, o terceiro postulado permite afirmar que em todas as etapas dos processos econômicos em que se realiza trabalho, há um serviço em potencial. No entanto, para a realização desse potencial é necessário que o processo de trabalho em questão seja uma atividade econômica autônoma, estruturada a partir de um arranjo contratual (formal ou informal), e cujo propósito de constituição seja a prestação de trabalho (SILVA E MEIRELLES, 2006).

Na medida em que se intensifica o processo de divisão do trabalho, revela-se o potencial de serviço presente nas atividades econômicas, principalmente aquelas ligadas à indústria. A delegação a terceiros faz com que determinadas etapas de realização de trabalho passem a ser efetivamente serviço, ou seja, atividades econômicas que se tornam independentes por meio de arranjos contratuais. Nesse caso o que muda são as relações contratuais. Com freqüência, a realização de trabalho se dá a partir da utilização das mesmas máquinas e até mesmo da mesma mão-de-obra empregada anteriormente (SILVA E MEIRELLES, 2003).

Como demonstrado em Silva e Meirelles (2003), o potencial de serviços, de modo geral, pode se dar nos três níveis dos processos econômicos: (1) trabalho puro; (2) transformação e produção; (3) troca e circulação.

No nível 1 do diagrama ocorre a prestação dos serviços puros. São serviços em que o resultado do processo de trabalho é o próprio trabalho. Não necessariamente o trabalho realizado resulta num produto concreto e acabado, pronto para o consumo final. Pode se incluir nesse grupo todas as atividades usualmente consideradas de serviço, como educação, Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 79-100 • Jan/Fev/Mar 2010 85

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serviços médicos, de consultoria, lazer e entretenimento, dentre outras. No nível 2 localizam-se os serviços de transformação, relacionados à transformação de insumos e matérias-primas em novos produtos, como é o caso dos serviços de alimentação e serviços decorrentes da terceirização de etapas do processo de transformação. No nível 3 encontram-se os serviços relacionados à: comercialização; armazenamento; e transporte. Nesta última categoria estão transporte de: pessoas; matérias-primas; produtos acabados tangíveis; intangíveis (informação, por exemplo); e moeda, como é o caso dos serviços bancários.

Diagrama 1: Os processos econômicos e o potencial de serviços

Insumos e Matérias-primas

Máquinas/ Equipamentos Recursos Humanos

Trabalho mecânico Trabalho Humano

Produto

Máquinas/ Equipamentos

Consumidor/ Usuário Final

Serviços

Recursos Humanos

Trabalho mecânico Trabalho Humano

Serviços

Consumidor/ Usuário Final

+(2) Processo de transformação

+

(3) Processo de troca e circulação

Fonte: Silva e Meirelles (2003). Vale observar que, de acordo com o tipo de serviço, os quatro

atributos (intangibilidade, simultaneidade, interatividade e inestocabilidade) podem ser mais ou menos preponderantes. Nos serviços puros, todos são bastante evidentes, principalmente a intangibilidade e a interatividade. São atividades baseadas, em geral, no uso e transferência de habilidades e conhecimentos adquiridos, portanto, fundamentalmente intangíveis e interativas. Ou seja, o trabalho não tem uma representação 86 Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 79-100 • Jan/Fev/Mar 2010

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material e a sua realização só se dá a partir da interação entre prestador e usuário. Já nos serviços de transformação, os atributos dos serviços não aparecem de modo tão evidente, principalmente porque há um forte vínculo do serviço entre os substratos materiais (insumos, ativos físicos, equipamentos e mecanismos em geral) do processo de produção e o produto final resultante. São serviços aparentemente tangíveis, porque o trabalho tem uma representação material que pode ser expressa na qualidade e eficiência dos processos, bem como no volume e/ou na qualidade do produto final. Além disso, são serviços que apresentam certo potencial de “estocabilidade”, dado que o resultado do trabalho está consubstanciado em produtos quase sempre concretos e tangíveis, portanto, estocáveis. Nesse sentido, os limites que diferenciam a prestação do serviço e a produção tangível em si são quase imperceptíveis. Entretanto, é importante lembrar que esses atributos são dos serviços e não do produto ao qual estão relacionados. São decorrentes da natureza constitutiva do serviço, isto é, de ser essencialmente um processo de trabalho, portanto intangível, instantâneo, inestocável e interativo (SILVA E MEIRELLES, 2003). No quadro 1 apresenta-se a tipologia de serviços proposta em Silva e Meirelles (2006) e alguns exemplos.

De acordo com essa tipologia de serviços, em todos os três níveis de prestação dos serviços, seja no processo de trabalho puro, nos processos de produção e transformação ou na troca e circulação, é possível ter composições variadas de recursos e, por conseguinte, de trabalho humano e trabalho mecânico. Essa perspectiva conceitual soluciona alguns dos paradoxos em estratégia identificados na introdução deste artigo, permitindo que em qualquer categoria de serviço seja possível implantar estratégias de mercado variadas, que incluem tanto padronização quanto customização, alta ou baixa escala de operação.

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Quadro 1: Classificação dos serviços nos processos econômicos

Processo econômico Tipo de serviço Exemplos

Processo de trabalho puro

Serviço puro Consiste em realizar um trabalho único e exclusivo. O resultado do processo de trabalho é o próprio trabalho, não há necessariamente um produto resultante.

Serviços domésticos; Serviços de entretenimento e lazer; Serviços de consultoria; Serviços de assistência técnica; Serviços de pesquisa e desenvolvimento de produtos; Serviços de saúde e educação; Serviços governamentais de defesa e segurança, etc.

Processo de transformação

Serviço de transformação Consiste em realizar o trabalho necessário à transformação de insumos e matérias-primas em novos produtos.

Serviços de alimentação; Serviços decorrentes da terceirização de etapas do processo de transformação.

Processo de troca e

circulação

Serviço de troca e circulação Consiste em realizar o trabalho de troca e circulação, seja de pessoas, bens (tangíveis ou intangíveis), moeda, etc.

Serviços bancários; Serviços comerciais; Serviços de armazenamento e transporte; Serviços de comunicação; Serviços de distribuição de energia elétrica, água, etc.

Fonte: Silva e Meirelles (2006). Estratégias Competitivas e Barreiras de Entrada em Serviços A abordagem teórica das estratégias competitivas aqui defendida está baseada no conceito de serviço como processo de trabalho (SILVA E MEIRELLES, 2006) e se utiliza de duas variáveis para classificação dos serviços: escala de operação e intensidade de capital. A escala de operação é uma variável que está presente tanto na abordagem tradicional de Organização Industrial (SCHERER; ROSS, 1990), quanto na de Administração de Operações em Serviços (SILVESTRO et al, 1992; SCHMENNER, 1999). Já a intensidade de capital é uma variável pouco explorada em serviços. Na verdade, a intensidade de mão-de-obra é o que tem prevalecido nas abordagens de serviço, como é o caso da matriz de processos de serviços proposta por Schmenner (1999).

Defende-se aqui que a variável relevante para a análise das estratégias competitivas em serviços é a intensidade de capital, expressa na relação entre trabalho mecânico e trabalho humano. Dessa perspectiva teórica é possível avaliar o potencial de barreiras de entrada em serviços.

Na opinião de Schmenner (1999, p. 22), são poucas as barreiras de entrada no setor de serviços, pois os serviços são intensivos em mão-de-

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obra. A maioria das operações requer pouco investimento de capital bem como unidades operacionais múltiplas ou de desenvolvimento de tecnologia própria. Nesse sentido, segundo esse autor, o setor vivencia uma forte competição, “há uma disputa contínua pela posição e uma necessidade constante de pensar estrategicamente sobre o que está acontecendo”. Entretanto, o autor chama a atenção para o fato de que os serviços vêm sofrendo fortes influências externas, sobretudo de cunho tecnológico, que podem mudar os serviços oferecidos, a forma com que estão sendo oferecidos, o tamanho e a estrutura das empresas.

O investimento em capital e em desenvolvimento tecnológico é considerado aqui uma tendência estrutural do setor de serviços na economia moderna, e não uma influência externa, oriunda dos desenvolvimentos tecnológicos da indústria. Ademais, os serviços em geral apresentam uma barreira de entrada típica, oriunda dos relacionamentos entre prestadores e usuários dos serviços, denominada aqui de barreira relacional. Como será apresentado a seguir, essas barreiras se constroem a partir dos custos e do tempo necessário à formação da reputação no mercado.

A análise das barreiras de entrada em serviços aqui apresentada está baseada no trabalho original de Bain (1956) sobre o papel da concorrência potencial nas vantagens competitivas das empresas. É esse trabalho que inspirou o modelo das cinco forças de Porter (1979). Mais especificamente, trata-se de uma classificação das estratégias, de acordo com as condições estruturais de entrada no setor de serviços.

Como assinala Porter (1979), a estratégia deve ser abordada a partir da identificação das forças que moldam a competição. Essas forças, por sua vez, são definidas por um conjunto de características técnicas e econômicas específicas a cada indústria. Essa visão de competição, segundo o autor, se aplica tanto às atividades de indústria quanto de serviços.

Conforme proposto por Bain (1956), a dificuldade de entrada dos concorrentes potenciais está baseada em três aspectos: i) vantagens absolutas de custo das firmas estabelecidas, como o controle de métodos de produção, de insumos (com ou sem patentes), controle de equipamentos, mão-de-obra qualificada e capacidade empresarial; ii) vantagens decorrentes das preferências dos consumidores pelos produtos das empresas já estabelecidas; iii) existência de economias significativas de escala, de maneira que a escala ótima mínima de entrada corresponda a uma parcela expressiva do mercado.

Além desses três aspectos, Porter (1979) adiciona três fontes adicionais de barreiras de entrada (aprendizagem, canais de distribuição e Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 79-100 • Jan/Fev/Mar 2010 89

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política de governo). Todavia, o foco neste artigo são as três fontes de barreiras de entrada originariamente propostas por Bain (1956). Estratégias Competitivas em Serviços Considerando que a relação entre trabalho mecânico e trabalho humano expressa a intensidade de capital do serviço, propõe-se aqui uma matriz de classificação das estratégias competitivas baseada em quatro possibilidades de prestação de serviços apresentadas na Figura 1: • Quadrante I: baixa intensidade de capital e pequena escala de operação; • Quadrante II: baixa intensidade de capital e larga escala de operação; • Quadrante III: alta intensidade de capital e pequena escala de operação; • Quadrante IV: alta intensidade de capital e larga escala de operação. Figura 1: Matriz de Estratégias Competitivas em Serviços

Baixa

Alta

INTENSIDADE DE CAPITAL

ESCALA DE OPERAÇÃO

II Controle e Padronização de

Procedimentos e Exploração de Economias de Aprendizagem

Serviços intensivos em mão-de-obra e baseados em habilidades gerenciais

de coordenação e controle (Ex: correios e franquias de serviços em

geral).

III Atualização Tecnológica e

Inovação Serviços baseados em

conhecimento especializado e ativos complementares

(máquinas e equipamentos em geral). (Ex: serviços de

diagnóstico médico, informática, manutenção veicular, etc).

Alta

I Reputação e Fidelização

Serviços baseados no uso de habilidades e conhecimentos especializados (Ex: serviços

de consultoria, limpeza, alimentação, educação, etc).

IV Infra-estrutura física e Exploração

de Economias de Escala Serviços baseados no uso de infra-

estrutura física de conexão e atendimento, envolvendo

investimentos em redes, instalações, meios de transporte, etc. (Ex: serviços

de logística, telecomunicações, distribuição de energia elétrica, gás e

água; serviços bancários, etc).

Os quadrantes I e III incluem grande parte das empresas de

serviço, ou seja, empresas de pequeno e médio porte. No quadrante I estão empresas de serviços tradicionais, baseadas no uso de habilidades e conhecimentos especializados. As estratégias mais comuns nesses casos estão relacionadas à reputação da empresa e fidelização de clientes,

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desenvolvidas a partir de investimentos na construção e fortalecimento dos vínculos entre prestadores e usuários. O cuidado nos relacionamentos estabelecidos é fundamental para garantir a competitividade da empresa. Por isso mesmo, o relacionamento com clientes tem sido tema recorrente na literatura de serviços, principalmente em marketing de serviços (FITZSIMMONS; FITZSIMMONS, 2000; LOVELOCK; WRIGHT, 2002).

Já no quadrante III, em função do perfil mais tecnológico e mais intensivo em conhecimento e capital, as estratégias adotadas estão voltadas para a atualização tecnológica e inovação. Em geral, as empresas desenvolvem suas atividades apoiadas em ativos dedicados, priorizando o fornecimento de serviços especializados e personalizados, aspectos fundamentais da competitividade nesse segmento. O vínculo entre empresa e cliente é fundamental não só para a fidelização, mas, sobretudo, para a identificação de necessidades e oportunidades.

Conforme apontado por autores que tratam dos serviços intensivos em conhecimento – Knowledge Intensive Business Sevices (KIBS), é da constante interface entre prestadores e usuários que nascem grande parte das soluções e inovações nesses serviços (MILES et al, 1995; MILES, 2008).

Nos quadrantes II e IV encontram-se as empresas de serviço que optam pela operação em larga escala. As estratégias típicas nessas duas situações consistem na coordenação e controle operacional bem como na exploração de economias de escala, pois proporciona a diluição dos custos e riscos associados ao atendimento de múltiplos mercados em áreas geográficas distintas.

A capacidade de coordenação e de investimento e o planejamento da demanda no longo prazo, de modo a garantir a oferta do serviço em condições adequadas, são cruciais nas operações em larga escala, pois define, em última instância, a competitividade das empresas. No caso do quadrante II, em função da baixa intensidade de capital, em geral, a coordenação se dá por meio do controle e padronização de procedimentos. Normalmente as empresas se estruturam numa ampla rede de filiais ou por meio de terceiros, via contratos de franquia, por exemplo.

Já as empresas de alta intensidade de capital (quadrante IV) desenvolvem a coordenação apoiadas fortemente na própria infra-estrutura física. É o caso em especial das empresas que operam em rede, como telefonia e distribuição de energia elétrica. As redes físicas de conexão permitem o atendimento contínuo e sistêmico de múltiplos usuários, em múltiplos espaços geográficos.

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Estratégias competitivas e potencial de barreiras de entrada em serviços:

Vale observar que a importância da coordenação não se restringe aos casos de operação em larga escala. Na verdade, de acordo com a visão de gestão de operações em serviço (SCHMENNER, 1999), as atividades de serviço em geral demandam controle e planejamento em função da própria natureza de processo.

A necessidade de atender a demanda de serviço de forma simultânea à sua prestação, sem que seja possível estocá-lo, faz com a oferta de serviço seja mais inelástica que a de um bem ou produto qualquer. É possível ter uma reserva adicional de capacidade de realização de trabalho, seja pela aquisição de máquinas e equipamentos ou de recursos humanos, mas não é possível estocar trabalho em processo. A inelasticidade ganha uma dimensão mais acentuada frente às flutuações sazonais de demanda, pois essa demanda por serviço nem sempre se distribui uniformemente ao longo do tempo ou do espaço, concentrando-se em determinados horários, dias, semanas ou meses do ano. Nesse contexto, seja para aproveitar oportunidades e ou evitar gargalos na oferta, as empresas de serviço precisam de um planejamento adequado de suas instalações capaz de garantir o atendimento nos horários de pico, i.e., de maior demanda. Ao mesmo tempo, esse planejamento deve envolver um real dimensionamento da demanda de longo prazo, evitando excesso de capacidade ociosa.

A manutenção de uma elevada margem de capacidade ociosa eleva sobremaneira os custos operacionais. Entretanto, esses custos podem ser reduzidos na medida em que seja possível explorar economias de escala.

Segundo Kupfer e Hasenclever (2002), as economias de escala podem ser obtidas por meio de dois principais fatores: ganhos de especialização, proporcionados pelo avanço da divisão do trabalho, que envolvem a utilização eficaz tanto de pessoas como máquinas ou instrumentos; e ganhos oriundos das indivisibilidades técnicas do capital, em que a utilização crescente da capacidade produtiva proporciona a diluição dos custos fixos.

Nos casos de baixa intensidade de capital e larga escala de operação (quadrante II), as economias de escala estão relacionadas principalmente aos ganhos de especialização, dependendo, portanto, de habilidades gerenciais de gestão de pessoas e processos. Pode-se denominar nesses casos que as economias são de aprendizagem.

Já nos casos de alta intensidade de capital e larga escala de operação (quadrante IV), sobretudo nos serviços de rede, a economia de escala é uma decorrência natural da própria natureza dos ativos, altamente específicos e indivisíveis, ou seja, são economias de rede. 92 Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 79-100 • Jan/Fev/Mar 2010

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Por meio da exploração de economias de escala é possível garantir a sobrevivência no mercado e, ao mesmo tempo, impedir a entrada de novos concorrentes. Steindl, já em 1945, assinalava que a ausência ou a dificuldade de exploração de economias de escala é o principal fator explicativo das vantagens da grande empresa em relação às pequenas. Conforme será analisado a seguir, as estratégias competitivas adotadas e as barreiras daí decorrentes (barreiras relacionais, de custo, tecnológicas e ou de escala) são fundamentais para compreender a configuração das estruturas de mercado, se mais concentradas ou menos concentradas. Barreiras de Entrada em Serviços De acordo com Bain (1956), a concorrência potencial, determinada pelas condições de entrada, explica em grande parte a dinâmica concorrencial e a configuração das estruturas de mercado. Na visão do autor, a dificuldade de entrada dos concorrentes potenciais está baseada em três aspectos: i) vantagens absolutas de custo das firmas estabelecidas, como o controle de métodos de produção, de insumos (com ou sem patentes), controle de equipamentos, mão-de-obra qualificada e capacidade empresarial; ii) vantagens decorrentes das preferências dos consumidores pelos produtos das empresas já estabelecidas; iii) existência de economias significativas de escala, de maneira que a escala ótima mínima de entrada corresponda a uma parcela expressiva do mercado. Dependendo das condições de entrada no mercado, as estruturas de mercado podem apresentar um maior ou menor grau de concentração.

No caso das atividades de serviço, a natureza das barreiras e o grau de dificuldade de entrada podem ser pensados a partir da matriz de estratégias competitivas definida anteriormente, ou seja, de acordo com a intensidade de capital e a escala de operação. Na Figura 2, apresenta-se uma matriz em que se identificam quatro tipos de barreiras de entrada: relacionais; de custo e ou tecnológicas; e de escala.

Nas situações de baixa intensidade de capital e pequena escala de operação (quadrante I), predominam barreiras relacionais, decorrentes dos vínculos estabelecidos entre prestador de serviço e usuário. Esses vínculos são fundamentais no estabelecimento de vantagens de preferências dos usuários, pois, em última instância, são a garantia do atendimento de expectativas quanto ao resultado final do serviço. Há situações em que esses vínculos exigem investimentos em atividades que proporcionem satisfação e fidelidade, como é o caso dos gastos com treinamento e marketing. Entretanto, esses gastos não constituem fator relevante de impedimento de entrada. Normalmente o impedimento à Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 79-100 • Jan/Fev/Mar 2010 93

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Estratégias competitivas e potencial de barreiras de entrada em serviços:

entrada é dado pelo tempo de relacionamento e pela reputação da empresa. Indicações de terceiros são muito comuns nesses casos, já que conhecem a qualidade do serviço prestado.

As barreiras relacionais podem se reforçar em situações de alto conteúdo tecnológico, em que o domínio do conhecimento é específico àquela relação, principalmente quando a prestação do serviço envolve o uso de ativos dedicados. É o caso das empresas do quadrante III. Nessas situações, além das barreiras relacionais estão presentes barreiras tecnológicas definidas pelo conhecimento técnico especializado, e barreiras de custo, em função dos gastos na aquisição, manutenção e atualização tecnológica de máquinas e equipamentos, bem como em treinamento para utilizá-los.

As barreiras de custo estão fortemente presentes nas situações de alta intensidade de capital e larga escala de operação (Quadrante IV). Todavia são barreiras bem mais acentuadas que as verificadas no quadrante III, em função do alto volume de investimento e riscos envolvidos. É o caso, em especial, dos serviços de infra-estrutura econômica, em que a indivisibilidade e a especificidade dos ativos elevam tantos os custos de entrada quanto de saída (sunk costs) do mercado. A oferta desses serviços normalmente se dá a partir de uma ampla capacidade ociosa, de forma a atender demandas simultâneas, em horários de pico, elevando ainda mais os custos das empresas que operam no setor. Nesses casos as empresas exploram economias de escala para diluir os custos envolvidos, configurando, portanto barreiras de escala.

Por fim, em relação aos casos de operação em larga escala e baixa intensidade de capital (Quadrante II), predominam barreiras de escala, notadamente barreiras relativas aos gastos e às habilidades de gestão de fatores organizacionais e tecnológicos que compõem a estrutura de coordenação. Nesses casos, em várias atividades de serviço, como os serviços de alimentação e correios, por exemplo, as franquias são uma solução de governança largamente utilizada, visto que torna possível a operação em larga escala com custos operacionais menores.

O grau de concentração de mercado, aspecto fundamental na configuração das estruturas de mercado, se mais competitivas ou de tendência oligopolista e monopolista, está diretamente relacionado às barreiras de entrada.

Na visão aqui proposta a intensidade das barreiras de entrada em serviços está associada a duas características estruturais: intensidade de capital e escala de operação. Quanto mais intensiva em capital e maior a escala de operação, mais fortes são as barreiras de entrada. 94 Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 79-100 • Jan/Fev/Mar 2010

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Figura 2: Matriz de Barreiras de Entrada em Serviços

Baixa

AltaIV

Barreiras de Custo e de Escala

(gastos relativos à infra-estrutura física de atendimento

e estrutura de coordenação)

ESCALA DE OPERAÇÃO

II Barreiras de Escala

(gastos relativos à gestão de fatores organizacionais e

tecnológicos que compõem estrutura de coordenação)

III Barreiras Relacionais

(atendimento especializado e uso de ativos dedicados), tecnológicas

(domínio de conhecimento especializado) e de custo (gastos com aquisição, manutenção de

equipamentos e treinamento para utilização)

Alta

I Barreiras Relacionais

(tempo de relacionamento e reputação)

INTENSIDADE DE CAPITAL

A combinação de barreiras de custo e de escala resulta em

estruturas de mercado bastante concentradas, em nível regional, nacional ou até internacional. Em alguns segmentos, como é o caso da distribuição de energia elétrica, a operação só é viável e rentável se apenas uma empresa atua no mercado, conformando uma situação típica de monopólio natural - em geral, monopólios garantidos por contratos de concessão de longo período de duração (entre 15 e 25 anos). Já nas situações em que predominam barreiras relacionais e tecnológicas não necessariamente ocorre concentração de mercado, porém essas barreiras abrem espaço para reservas de mercado.

As estruturas de mercado em serviços tendem a ser mais competitivas (baixo grau de concentração de mercado), pois as barreiras de entrada predominantes são relacionais. Entretanto, não se defende aqui uma perspectiva estática da competição, tal como defendido por Bain (1956), em que a estratégia da empresa está condicionada pela estrutura de mercado (modelo ECD: estrutura-conduta-desempenho). Numa perspectiva dinâmica do processo competitivo, tal como proposto por Schumpeter (1984), as estratégias empresariais co-evolvem com as estruturas de mercado, num processo contínuo e dinâmico de construção e destruição de barreiras de entrada. Mesmo nas situações de maior potencial de concentração de mercado é possível a co-existência de empresas grandes e pequenas, estas últimas atuando em nichos de

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Estratégias competitivas e potencial de barreiras de entrada em serviços:

mercado que não são explorados pelas grandes. É o caso, por exemplo, de alguns serviços de telecomunicação como telemarketing, comunicação de dados, internet, etc.

Conforme assinala Penrose (1959), o limite ao crescimento de uma empresa é dado pelas suas capacidades e habilidades gerenciais de identificar e explorar oportunidades de crescimento. Ao longo do seu processo evolutivo, a empresa de serviço encontra diversas possibilidades de crescimento no mercado, podendo explorar barreiras de entrada a partir de estratégias variadas. Nessa perspectiva é possível sair de uma posição de pequena empresa, baseada em conhecimento especializado, para posições de grande empresa, explorando não só barreiras relacionais como barreiras de custo e de escala. Como decorrência, novas estruturas de mercado surgem, mais concentradas, oligopólicas ou até monopólicas. CONSIDERAÇÕES FINAIS A proposta de abordagem teórica das estratégias competitivas e barreiras de entrada em serviços aqui apresentada está baseada na definição de serviço como essencialmente um processo de trabalho, que tanto pode ser realizado pelos recursos humanos (trabalho humano) quanto por máquinas e equipamentos (trabalho mecânico). Essa definição permite compreender os serviços na economia moderna e, ao mesmo tempo, amplia o leque de possibilidades estratégicas em serviços, sobretudo do ponto de vista da exploração de economias de escala e da obtenção de ganhos de produtividade.

Com os avanços nas tecnologias da informação e comunicação e o aprofundamento da divisão do trabalho, nota-se que os processos de prestação de serviços tornam-se mais intensivos em capital e passam a ter um maior vínculo com atividades industriais. Essas mudanças permitem o desenvolvimento de novas formas de organização da produção e novos canais de comunicação entre prestadores e usuários, proporcionando padronização e operação em larga escala, inclusive em escala internacional. Além disso, o uso intensivo de máquinas e equipamentos abre espaço para inovações tecnológicas e ganhos de produtividade, marcando o surgimento de atividades de serviço baseadas no uso intensivo de tecnologia e conhecimento (Knowledge Intensive Businesses Services - KIBS.

Vale observar, entretanto, que as mudanças em curso não destituem as atividades de serviço dos seus atributos essenciais, como a intangiblidade e a inestocabilidade. É o entendimento de ser trabalho em

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Dimária Silva e Meirelles

processo, ou fluxo de trabalho, que permite compreender que serviço é intangível, pois é processo, portanto, não se visualiza o seu resultado ex-ante. Ademais, não se estoca um processo.

A natureza do processo de trabalho e as características desse processo, se intensivo em capital ou intensivo em mão-de-obra, é fundamental para compreender a dinâmica competitiva em serviços. Se o processo de trabalho é intensivo em capital há espaço para o desenvolvimento de estratégias competitivas que proporcionam barreiras de entrada (de custos e tecnológicas), garantindo reserva de mercado e maior sustentabilidade da vantagem competitiva.

Quando a alta intensidade de capital se combina com operações em larga escala, a vantagem competitiva é ainda mais forte e duradoura, tendo em vista que as barreiras de custo se associam às barreiras de escala. Entretanto esse é o grande desafio das empresas de serviço no seu processo de crescimento, pois operar em larga escala demanda o desenvolvimento de habilidades relativas à gestão de fatores organizacionais e tecnológicos que compõem a estrutura de coordenação (fundamental em serviços). Nas situações de baixa intensidade de capital, a padronização e o controle de procedimentos, como é o caso das franquias, é uma saída para a operação em larga escala. De qualquer forma, em qualquer categoria de serviço é possível implantar estratégias competitivas variadas, incluindo tanto padronização quanto customização, alta ou baixa escala de operação.

Vale observar que determinadas estratégias competitivas não estão circunscritas a determinados tipos de atividades de serviço. É possível crescer nas atividades típicas de operação em pequena escala, como é o caso dos serviços puros. Exemplo disso são os serviços de educação, que, com a implantação de plataformas virtuais, têm explorado o ensino à distância, proporcionando a operação em larga escala.

No processo de expansão das empresas, as estratégias tecnológicas são de fundamental importância. O setor de software é um exemplo paradigmático, haja vista o caso Microsoft e Google. Do ponto de vista teórico, esse é um espaço ainda a ser explorado, principalmente porque as tipologias de estratégias tecnológicas usualmente conhecidas (MALERBA; ORSENIGO, 1993; PAVITT, 1984) estão inspiradas em exemplos de indústria.

Na verdade, o estudo de estratégias no setor de serviços ainda é um campo a ser explorado, nos mais variados níveis (negócios, corporativo, organizacional e coletivo). A proposta deste artigo em particular se restringe ao nível das estratégias de negócio. Ademais, é importante frisar que esta é uma proposta de abordagem teórica, portanto Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 79-100 • Jan/Fev/Mar 2010 97

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Estratégias competitivas e potencial de barreiras de entrada em serviços:

apenas um passo inicial. É necessário que esta proposta seja validada em estudos empíricos (qualitativos e quantitativos).

No atual estágio de desenvolvimento das pesquisas em estratégias, que tem como principal referência a visão baseada em recursos (RBV), uma sugestão inicial de pesquisa futura é a identificação do papel dos recursos na criação de barreiras de entrada, tal como apontado no trabalho seminal de Wernerfelt (1984). Considerando que a barreira de entrada predominante em serviços é a relacional, uma importante linha de pesquisa teria como foco os recursos humanos, principal fonte de barreira relacional. REFERÊNCIAS BAIN, J. Barriers to New Competition. Cambridge: Harvard University Press, 1956. BROWNING, H.C.; SINGELMANN. The transformation of the US Labour Force: the interaction of industry and occupation. Politics and Society, v. 8, n. 7-4, p.481-509, 1978. COLLIER, D.; MEYER, S. A service positioning matrix. International Journal of Operations and Production Management. v.18, n.12, p.1223-1244, 1998. FITZSIMMONS, J. A.; FITZSIMMONS, M. J. Administração de serviços: operações, estratégia e tecnologia de informação. 2. Ed. São Paulo: Bookman, 2000. GERSHUNY, J.I.; MILES, I.D. The New Service Economy – The Transformation of Employment in Industrial Societies. London: Frances Pinter, 1983. GIANESI, I. G. N.; CORRÊA, H.L. Administração estratégica de serviços: operações para satisfação do cliente. São Paulo: Atlas, 1996. KON, A. Sobre as atividades de serviço: revendo conceitos e tipologias. São Paulo: Revista de Economia Política, v. 19, n. 2 (74), p.64-83, 1999. KON, A. Economia de Serviços: Teoria e evolução no Brasil, Elsevier/Campus, Rio de Janeiro, 2004. KOTLER, P.; KELLER, K. Administração de marketing. 12. Ed. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2007. KUPFER, D.; HASENCLEVER, L. Economia Industrial: Fundamentos teóricos e práticas no Brasil. Rio de Janeiro: Campus, 2002.

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Estratégias competitivas e potencial de barreiras de entrada em serviços:

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Recebido em: 02/10/2009 • Aprovado em: 22/02/2010

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A INFLUÊNCIA DA QUESTÃO AMBIENTAL NA DECISÃO DE COMPRA DO CLIENTE DO SETOR DE PAPEL E CELULOSE

THE INFLUENCE OF ENVIRONMENTAL ISSUE ON THE CUSTOMER OF PAPER

AND CELLULOSE BUSINESS SECTOR PURCHASING DECISION

DARLAN JOSÉ ROMAN ([email protected]) UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

ELIANE SALETE FILIPPIM SILVIO SANTOS JÚNIOR UNIVERSIDADE DO OESTE DE SANTA CATARINA RESUMO Este artigo aborda a relevância da questão ambiental no processo de tomada de decisão de compras organizacionais no setor de papel e celulose. Discute-se a relação entre questão ambiental e decisão de compra. Após a apresentação e discussão do conceito de tomada de decisão, discute-se o Marketing Verde como estratégia organizacional para informar o mercado sobre as iniciativas ambientais da organização. Esse conceito tem sido abordado como parte dos esforços para compreender o lugar da variável ambiental nas dinâmicas organizacionais e sociais. Com base na relação de empresas disponibilizadas pela Federação das Indústrias dos Estados, foram coletados dados de 36 empresas compradoras do setor de papel e celulose. Os dados coletados e sua posterior análise mostraram fortes evidências de que a questão ambiental parece não afetar as preferências dos compradores institucionais do setor no momento da decisão de compra. Na mesma linha, conclui-se que não há conhecimento satisfatório das práticas ambientais reais das empresas por parte dos compradores. Palavras-chave: questão ambiental; tomada de decisão; marketing verde; setor de papel e celulose.

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A influência da questão ambiental na decisão de compra do cliente do setor de papel e celulose

ABSTRACT This article discusses the relevance of environmental issues in the process of decision-making of organizational purchases from the paper and cellulose sector. It discusses the relationship between environmental issues and purchase decisions. It starts with the presentation and discussion of the concept of decision-making. It discusses Green Marketing as an organizational strategy to inform the market about environmental initiatives of the organization. This concept has been used as part of some efforts to understand the place of environmental variables in organizational and social dynamics. From the list of companies provided by the Federation of Industries of different states of Brazil, information was collected from 36 purchasing companies from the paper and cellulose sector. The data collected and the subsequent analysis showed strong evidence that environmental issues do not seem to affect the preferences of institutional buyers in this sector when they decide to purchase the products. It also concludes that purchasers don’t have a satisfactory knowledge of actual environmental practices of the companies. Keywords: environmental issues; decision-making; green marketing; paper and cellulose.

INTRODUÇÃO Os valores ambientais evoluíram de um interesse marginal para o centro de interesse de muitas organizações. Este trabalho tem por objetivo identificar qual é a relevância da adoção de práticas ambientais por empresas do setor de papel e celulose na decisão de compra de compradores organizacionais. A escolha do setor de papel e celulose como foco de análise deve-se às suas particularidades de produção, que acabam por criar uma imagem de poluição e devastação do meio ambiente, e pelos expressivos investimentos em mecanismos de produção limpa feitos na última década pelo setor.

O setor de papel e celulose se caracteriza pelos consideráveis impactos ambientais em seus processos de produção. Surge então a necessidade, até para atender a legislação vigente, de estratégias que permitam mitigar os danos causados ao meio. No entanto, essas estratégias podem avançar e tratar a questão ambiental não como uma

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Darlan José Roman, Eliane Salete Filippim e Silvio Santos Júnior

ameaça, mas uma oportunidade de se conseguir diferenciação em relação aos concorrentes.

O marketing, que tradicionalmente busca obter vantagens financeiras para a organização por meio da venda de produtos e estímulo de atividades de consumo que visem satisfazer as necessidades humanas, busca cada vez mais atender à dinâmica do desenvolvimento sustentável e tornar conhecidas do mercado as iniciativas sustentáveis praticadas. Nesse sentido, o marketing verde tenta criar junto aos consumidores a percepção de que determinada marca está atenta às necessidades de seus clientes, sem se descuidar das questões ambientais.

Da mesma forma, o que parece é que cada vez mais os consumidores, sejam eles individuais ou organizacionais, estão se preocupando com as questões ambientais. Entretanto, são desconhecidos dados empíricos que possam afirmar que o fato de os consumidores demonstrarem preocupação, e até comprometimento, com o ambiente natural, irá influenciar na decisão de compra de determinado produto em detrimento de outro.

Imagina-se que, por meio da adoção e divulgação de programas ambientalmente sustentáveis, uma empresa esteja adquirindo diferencial competitivo em relação ao seu concorrente. No entanto, a prática pode apresentar resultados intrigantes. Abordagens (ROCHA; MARQUES, 2005; PORTER, 1999) sobre a influência das atitudes organizacionais em relação ao meio ambiente e seu reflexo no momento da decisão de compra dos consumidores relatam que na maior parte dos casos as atividades favoráveis a decisões de caráter ambiental não se traduzem em comportamento e consumo condizente.

Surgiram então algumas reflexões que levaram ao estudo da relação existente entre as políticas ambientais desenvolvidas e divulgadas pelas empresas de celulose e papel e a influência dessas ações na decisão de compra dos seus produtos. O Processo de Tomada de Decisão

O processo de tomada de decisões faz parte do dia a dia do ser humano que, com frequência, se depara com situações nas quais é necessário optar entre alternativas para solucionar problemas que podem ou não merecer uma análise mais aprofundada. No meio organizacional, a tomada de decisão assume caráter estratégico. A decisão é uma dimensão de administração tanto quanto trabalho e tarefa, resultados e desempenho, e relações (DRUCKER, 1986).

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A influência da questão ambiental na decisão de compra do cliente do setor de papel e celulose

No ambiente empresarial, dominado pela atmosfera da incerteza, busca-se tomar decisões mais rápidas, precisas e abrangentes. Essas decisões, por sua vez, buscam minimizar perdas, maximizar ganhos e criar uma situação em que, comparativamente, o decisor julgue que ocorreu ganho após implantar a decisão, tentando se posicionar em relação ao futuro. São, geralmente, decisões complexas que devem atender a múltiplos objetivos e, não obstante, seus impactos podem não ser precisamente identificados.

Até a primeira metade do século XX, utilizava-se basicamente a expectativa matemática para a tomada de decisão em condições consideradas aleatórias. Na década de 1950, em razão dos problemas logístico-militares surgidos durante a Segunda Guerra Mundial, foram desenvolvidos métodos estritamente matemáticos para se encontrar a solução ótima de problemas como custos, despesas e lucros (GOMES; GOMES; ALMEIDA, 2006).

Observa-se atualmente, entretanto, a emergência do foco nos bens intangíveis. Eles passam a compor o conjunto de elementos observáveis no processo de decidir. Dos bens intangíveis relevantes para o gerenciamento das organizações, destaca-se o dado, a informação e o conhecimento como subsídios essenciais à comunicação e à tomada de decisão (ANGELONI, 2003). “As informações e o conhecimento que se relacionam com as decisões surgem em vários pontos da organização” (SIMON, 1979, p.162).

Nesse quadro, o desafio maior para que possa emergir subsídios para uma boa tomada de decisão está em transformar dados em informação e as informações em conhecimento de uma forma clara e objetiva. No entanto, além da disponibilidade dos dados, informações e conhecimentos, “o processo de comunicação e o trabalho em equipe desempenham papéis relevantes para resolver algumas das dificuldades essenciais no processo de tomada de decisão” (ANGELONI, 2003, p.19).

As decisões são algo mais do que simples proposições factuais. Para ser mais preciso, elas são descrições de um futuro estado de coisas, podendo essa descrição ser verdadeira ou falsa, num sentido empírico. Por outro lado, elas possuem, também, uma qualidade imperativa, pois selecionam um estado de coisas futuro em detrimento de outro, e orientam o comportamento rumo à alternativa escolhida (SIMON, 1979, p. 16).

A tomada de decisão que envolve um maior número de pessoas tende a resultados mais qualificados, reduzindo o perigo dos vícios e modelos mentais e aumentando o conhecimento da situação de decisão.

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O processo de tomar decisões se configura em escolher levando-se em conta as variáveis. O processo decisório é uma maneira de produzir variadas hipóteses em relação ao assunto em questão, com o objetivo da escolha ou ordenação das alternativas. Para Gomes, Gomes e Almeida (2006), o processo de decisão requer a existência de um conjunto de alternativas factíveis para a sua composição, em que cada decisão (escolha de uma alternativa factível) tem associados um ganho e uma perda.

A solução de qualquer problema de decisão em atividades empresariais pode ser dada em quatro passos: percepção da necessidade de decisão ou oportunidade, formulação das alternativas de ação, avaliação das alternativas em termos de suas respectivas contribuições e escolha de uma ou mais alternativas para fins de execução (SIMON, 1979). Marketing Verde Marketing pode ser entendido como o planejamento, criação, oferta e troca de produtos e serviços, por meio de um complexo sistema organizacional. Entre as várias definições para marketing, merece destaque o conceito de Kotler (1998, p.32): “Marketing é um processo social e gerencial pelo qual indivíduos e grupos obtêm o que necessitam e desejam por meio da criação, oferta e troca de produtos de valor com outros”.

Las Casas (2005) visualiza o marketing como uma área do conhecimento que envolve um complexo de atividades ligadas às relações de troca, tendo em vista a satisfação dos desejos e necessidades dos consumidores e a concretização dos objetivos das empresas.

Entendendo que o marketing visa substancialmente à satisfação dos desejos e necessidades do grande público, há pontos comuns na literatura (LAS CASAS, 2005; DIAS, 2007; PORTER, 1999) argumentando que a satisfação deve considerar o meio ambiente de atuação e o impacto que essas relações causam no bem-estar da sociedade. Desse modo, o marketing busca cada vez mais atender à dinâmica da responsabilidade ambiental. Os desejos se ampliam para além das necessidades básicas, e é seguindo esse caminho que as pessoas encontram justificativa para o lazer, a estética, a preocupação com o meio ambiente, entre outras.

A crescente preocupação das sociedades modernas em relação à preservação do meio ambiente acaba por refletir no surgimento de novas necessidades e desejos ligados à questão ambiental. Nessa linha, o

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A influência da questão ambiental na decisão de compra do cliente do setor de papel e celulose

marketing verde apresenta-se como uma estratégia capaz de se enquadrar nesse novo cenário. “As informações ambientais são de interesse de todos os grupos de usuários, como os fornecedores, o governo, os bancos, os investidores, a sociedade etc., uma vez que afetam direta ou indiretamente o patrimônio das empresas” (COSTA; MARION, 2007, p.21).

Em meio às crescentes preocupações com o meio ambiente, decorrentes do uso indiscriminado de recursos de baixa resiliência, e das pressões dos governos e de grupos sociais organizados, o marketing verde surge então como alternativa para mostrar que as organizações agem de forma responsável para com o meio ambiente. Dessa forma, ações de marketing verde podem ser fontes de vantagem competitiva, via ações ambientalmente corretas. O Quadro 1 relaciona algumas características do marketing verde em relação ao marketing convencional. Quadro 1: Novos paradigmas do marketing verde

Elemento Marketing convencional Marketing verde

Consumidores • Consumidores com estilos de vida • Seres humanos com vidas

Produtos • Produtos do “berço ao túmulo” • Produtos “tamanho único”

• Produtos do “berço ao berço” • Serviços flexíveis

Marketing e comunicação

• Beneficiários finais orientados para vendas

• Valores educacionais

Empresa

• Reativa • Independentes • Competitivas • Departamentalizadas • Orientadas para curto prazo • Maximizadoras de lucro

• Proativos • Interdependentes • Cooperativos • Holísticos • Orientados para o longo prazo

Fonte: Adaptado de J. Ottman Consulting apud Giordano (2003, p.311).

O marketing verde atinge um horizonte além da propaganda de produtos com características ecológicas, como “recicláveis” ou que “não ataca a camada de ozônio”. Portanto, mais que a simples comunicação ou incorporação da questão ambiental à marca de uma organização, o termo implica planejar todas as ações de marketing considerando a variável meio ambiente.

Marketing verde é um conjunto de políticas e estratégias de comunicação (promoção, publicidade, relações públicas, entre outras) destinadas a obter uma vantagem comparativa de diferenciação para os produtos ou serviços que oferece a empresa, em relação às marcas concorrentes, conseguindo, desse modo,

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incrementar a participação no mercado, consolidando seu posicionamento competitivo (DIAS, 2007, p.75).

Peattie apud Palhares (2003, p.34) explica que “marketing verde é o processo gerencial responsável por identificar, antecipar e satisfazer as exigências dos consumidores e da sociedade de uma forma rentável e sustentável”. Logo, o marketing verde implica na incorporação de novas técnicas de produção, divulgação e apresentação de bens e serviços. Para Giordano (2003, p. 317), o marketing verde pode ser entendido como:

Um sistema que envolve a produção de um produto ou serviço em todo o seu ciclo de vida e o conjunto de regras de transmissão de conhecimento e informação para os cidadãos que realmente mostrem conceitos de comprometimento corporativo, governamental ou não, com a sustentabilidade do meio ambiente no longo prazo, minimizando impactos e unindo interesses ambientais globalizados.

O marketing verde consiste numa ampla adoção de políticas ambientais que contempla toda a cadeia produtiva, desde a coleta da matéria-prima até a sua disposição. Dessa forma, para posicionar-se como ambientalmente responsável, a empresa deve organizar todas as suas atividades na dinâmica do desenvolvimento sustentável. O Setor de Papel e Celulose O setor de papel e celulose brasileiro, conforme a Associação Brasileira de Celulose e Papel (BRACELPA, 2007), é composto por cerca de 220 empresas localizadas em 450 municípios, em 16 estados, sendo que 35 empresas são exportadoras habituais. Essas empresas em conjunto produzem 10,1 milhões de toneladas de celulose e 8,6 milhões de toneladas de papel ao ano, e sua participação no PIB é de 1,4%. No ranking mundial, o Brasil é o 6° maior produtor de celulose – sendo líder na produção de celulose de fibra curta – e o 11º na produção de papel.

O setor tem contribuído de forma relevante para o desenvolvimento econômico e social, seja pela geração de renda, de tributos e de empregos, como pelas negociações no mercado internacional. Outro fato relevante é que o setor utiliza exclusivamente madeira de florestas plantadas (eucalipto e pinus), com 1,7 milhões de hectares em 11 estados e 394 municípios, 1,5 milhões de florestas nativas preservadas e cultivadas e três milhões de toneladas de papel recicladas anualmente (BRACELPA, 2007).

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A influência da questão ambiental na decisão de compra do cliente do setor de papel e celulose

Graças aos programas de investimentos empreendidos pelo setor, espera-se um crescimento anual na ordem de 5% na produção de celulose e 3% na produção de papel (BRACELPA, 2007). O objetivo do setor é aumentar a capacidade produtiva e a competitividade das empresas de celulose e papel, com crescimento das exportações e criação de novas oportunidades de trabalho.

Na Tabela 2 são apresentados os maiores produtores mundiais de papel e celulose.

Tabela 2: Maiores produtores mundiais de celulose e papel

Celulose Papel

País Mil toneladas País Mil

toneladas

1. EUA 52.926 1. EUA 82.628 2. Canadá 25.38 2. China 56.000 3. China 16.310 3. Japão 30.951 4. Finlândia 12.619 4. Alemanha 21.679 5. Suécia 12.103 5. Canadá 19.199 6. Brasil 11.139 6. Finlândia 12.391 7. Japão 10.839 7. Suécia 11.737 8. Rússia 7.460 8. Coréia do Sul 10.548 9. Indonésia 5.468 9. França 10.331 10. Índia 3.351 10. Itália 9.998 11. Brasil 8.744

Fonte: Bracelpa (2007).

Entre os principais insumos presentes no processo de produção de papel e celulose, pode-se citar a madeira, óleo combustível e diversos aditivos químicos, tais como soda cáustica, peróxido de hidrogênio, cloro químico, caulim, amido e alvejante. Analisando as características de produção da indústria de papel e celulose, fica evidente a complexa relação que a atividade tem com o meio ambiente.

Dessa maneira, o setor é classificado por muitos órgãos ambientalistas como um dos mais poluentes. Esse fato há algum tempo vem sendo alvo de preocupação de muitos executivos do ramo, como fator de ameaça ou oportunidade que abre espaço para a criação de novas estratégias que poderão trazer às organizações vantagem competitiva.

As empresas do setor recuperam e preservam 2,6 milhões de hectares de recursos florestais, abrangendo a totalidade das áreas de preservação permanente e de reserva legal, que excedem o disposto pela legislação ambiental brasileira. Se por um lado há expressivo

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investimento em programas ambientais, por outro, a divulgação para o mercado é precária. Em estudo sobre a uniformidade na evidenciação das informações ambientais nas empresas de papel e celulose, Costa e Marion (2007, p.31), concluem que:

Existe grande dificuldade em se analisarem as informações ambientais e, consequentemente, serem identificadas as empresas mais comprometidas com a preservação, recuperação e manutenção do meio ambiente devido à falta de uniformidade na estrutura dos relatórios utilizados pelas empresas e pelo uso, na maioria das vezes, de textos sem qualquer tipo de preocupação com os dados que possam vir a serem retirados deles.

A diferença entre o que é evidenciado e as práticas ambientais reais das empresas deve ser reduzida ao máximo. As empresas precisam se conscientizar que a garantia da sua sobrevivência está relacionada com o vínculo de fidelidade para com os seus clientes. Um dos caminhos para isso pode ser transparecer o seu comprometimento com o meio ambiente (COSTA; MARION, 2007).

METODOLOGIA O presente trabalho caracteriza-se por um enfoque descritivo, que se justifica por tratar-se de uma pesquisa que busca identificar e analisar uma realidade.

Para realizar o estudo identificaram-se empresas compradoras do setor de papel e celulose por meio do banco de dados da Federação das Indústrias dos estados do Rio Grande do Sul (FIERGS), Santa Catarina (FIESC), Paraná (FIEP) e São Paulo (FIESP). Após análise das planilhas, verificou-se que 1.003 empresas pertencem ao mercado consumidor de papel e celulose. Dessa forma, o universo da pesquisa proposta nesta abordagem se configurou em 1.003 empresas. Para viabilizar a coleta dos dados, a amostra foi determinada, considerando um nível de confiança de 95% e um erro amostral de 7%, obtendo-se como resultado uma amostra de 171 empresas. Após o cálculo da amostra, realizou-se um sorteio para determinar quais empresas seriam abordadas para a pesquisa.

Fatores diversos como a alegação de falta de tempo e mesmo o desinteresse em participar de estudos de caráter acadêmico, acabaram por refletir que a amostra planejada para a pesquisa de campo (171 empresas compradoras da indústria de papel e celulose) resultou em 36 empresas que participaram efetivamente. Entrevistados de 19 das 36 empresas

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A influência da questão ambiental na decisão de compra do cliente do setor de papel e celulose

fizeram comentários diversos sobre os aspectos relacionados ao tema da pesquisa e esses foram registrados e analisados como fonte complementar da pesquisa.

Os entrevistados exerciam cargo de comprador e/ou gerente de compras ou produção, podendo ser caracterizados como tomadores de decisão. A coleta dos dados ocorreu no período de agosto a outubro do ano de 2007.

Para a coleta dos dados, elaborou-se um instrumento composto por quatro questões fechadas e duas abertas. Nas questões fechadas a intenção foi coletar dados sobre os principais fatores verificados no momento da compra e os fatores que afetam de forma negativa a decisão. A satisfação em relação à política ambiental das empresas fornecedoras de papel e celulose e a preocupação dessas empresas com a devastação do meio ambiente nortearam as outras duas questões fechadas.

Nas questões abertas foi solicitado ao entrevistado que citasse as empresas do setor mais importantes e os principais adjetivos/atributos que ele atribuía às empresas citadas que retratasse sua política ambiental. Também foi solicitado um comentário sobre o grau de satisfação no processo de negociação entre empresas fabricantes de papel e celulose e as clientes do setor.

A obtenção dos dados se deu por meio da aplicação de entrevistas via telefone e envio de formulários por e-mail. Na ocasião em que o entrevistado não dispunha de tempo para responder via telefone, o formulário era enviado em sequência por e-mail. Houve, no mínimo, três tentativas de contato até que se considerasse a empresa como não respondente, sendo a primeira tentativa sempre feita via telefone.

As limitações metodológicas deste trabalho estão relacionadas à amostra, pois as empresas pesquisadas não representam a totalidade dos consumidores da indústria de papel e celulose. As características presentes nas empresas pesquisadas podem não estar presentes em outras unidades. Não foi um estudo de caso e sim um survey num setor.

RESULTADO E ANÁLISE DOS DADOS

Busca-se, a seguir, apresentar os dados da pesquisa de campo, incluindo os comentários dos entrevistados, como comentado na seção anterior. A descrição desses comentários e dos outros dados tem o objetivo de proporcionar um melhor entendimento ao leitor quanto à percepção dos compradores organizacionais, em relação aos diversos fatores envolvidos no decorrer de um processo de negociação de compra e venda. 110 Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 101-120 • Jan/Fev/Mar 2010

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O mercado de papel e celulose no Brasil é composto por 220 empresas, fato que possibilita aos compradores desse produto certa flexibilidade para escolher, por meio de diferentes critérios, qual a melhor opção para se negociar e até fechar uma parceria. Na Tabela 3 é possível observar as principais empresas de papel e celulose lembradas pelos compradores. Nessa questão, foi solicitado ao respondente que citasse até três empresas e percebeu-se que as empresas citadas, em sua grande maioria, são ou já foram fornecedoras do respectivo entrevistado.

Tabela 3: Principais empresas lembradas pelos entrevistados

Empresa Número de vezes citada Klabin S/A 18 Primo Tedesco 8 Trombini Industrial S/A 7 Votorantim Celulose e Papel (VCP) 6 Adami S/A 3 Celulose Irani S/A 3 Artivinco Ltda 3 São Carlos S/A 2 Orsa S/A 2 Rigesa S/A 2 Avelino Bragagnolo S/A 2 Artivinco 2 Demais empresas 44

Os principais adjetivos/atributos associados à empresa citada estão

descritos na Tabela 4. A busca dos compradores pela qualidade fica explícita nos dados apresentados, e foi lembrada 21 vezes. A segunda variável mais lembrada, o preço, obteve 15 citações. Em terceiro lugar, aparece o item atendimento, com nove citações. A responsabilidade ambiental aparece duas vezes.

Em última análise, considera-se que a empresa lembrada pelo tomador de decisão de compra (Tabela 3) deixa transparecer qualidade nos produtos oferecidos, bem como bom preço e atendimento. Nessa questão ocorreu que nem todos os respondentes associaram variáveis às empresas, ou seja, alguns deixaram o espaço correspondente em branco.

Os principais fatores que influenciam diretamente, e de forma positiva, a escolha de um fornecedor de papel e/ou derivados de papel são apresentados na Tabela 5. Os dados apresentados emergiram de uma questão fechada, em que o termo qualidade não foi considerado pelos pesquisadores. A exclusão se deu pelo fato de se considerar a qualidade um termo muito abrangente, sem retratar especificamente a real intenção Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 101-120 • Jan/Fev/Mar 2010 111

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A influência da questão ambiental na decisão de compra do cliente do setor de papel e celulose

do entrevistado. Esse fato não acarretará prejuízos para os resultados do trabalho, pois a intenção não foi verificar quais os fatores considerados, e sim, especificamente, a questão ambiental. Tabela 4: Adjetivos e atributos associados às empresas

Adjetivo/Atributo Número de vezes citado Qualidade 21 Preço 15 Atendimento 9 Tradição 6 Inovação 4 Agilidade 3 Flexibilidade 3 Pontualidade 3 Responsabilidade Ambiental 2 Empresa idônea 2 Marca 2 Parceira 2 Boa logística 2 Confiabilidade 2 Acessível 2 Demais adjetivos/atributos 23

O Preço e a Distribuição e entrega foram os fatores mais

destacados. Em seguida, aparece o desempenho do produto e a responsabilidade ambiental. Nessa questão, o respondente poderia marcar até três alternativas, se assim julgasse necessário.

Tabela 5: Fatores que influenciam diretamente no momento da compra

Fatores citados Número de vezes assinalado Preço 28 Distribuição e entrega (pontualidade) 28 Desempenho do produto 19 Responsabilidade Ambiental 11 Inovação (criação e desenvolvimento de novos produtos) 8

Atendimento (vendedor) 7 Assistência Técnica 5

Na Tabela 6 são apresentados os dados que dizem respeito à

influência da degradação do meio ambiente no momento da compra. De acordo com os dados obtidos, apenas um comprador não considera a

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degradação do meio ambiente durante o ato da compra e três se mostraram indiferentes. No entanto, para 16 entrevistados, esse aspecto influencia muito, e para outros 16 a degradação ambiental exerce influência. Existe, portanto, evidências preliminares de que os danos ao meio ambiente influenciam a decisão de compra.

Tabela 6: A influência da degradação do meio ambiente na decisão de compra

Grau de influência Número de vezes assinalado Influencia muito 16 Influencia 16 Indiferente 3 Não influencia 1

Observando os dados apresentados no Gráfico 1, é possível

perceber, entretanto, que a variável ecológica perde importância quando considerada junto com outros fatores. Nesse caso, foi perguntado que fator influenciaria de forma negativa no momento da escolha de um fornecedor. A qualidade, mais uma vez, foi a mais lembrada pelos compradores (36 vezes), sendo que o item devastação do meio ambiente no processo de produção (18 vezes) ficou pouco abaixo do segundo item mais lembrado, o preço relativamente alto (22 vezes). Completando a análise, a distribuição ineficiente atingiu 18 marcações e a assistência técnica demorada foi lembrada por 12 entrevistados. Para essa questão, cada respondente poderia selecionar até três alternativas, se assim julgasse necessário.

Gráfico 1: Influência negativa no momento da decisão de compra

05

10152025303540

Produto dequalidadeduvidosa

Devastação domeio ambiente no

processo deprodução

Preçorelativamente alto

Distribuiçãoineficiente

Assistênciatécnica demorada

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A influência da questão ambiental na decisão de compra do cliente do setor de papel e celulose

Não existe insatisfação dos tomadores de decisão entrevistados em relação à política ambiental desenvolvida pela empresas de papel e celulose, conforme se pode visualizar na Tabela 7. Por outro lado, os compradores que consideram a questão ambiental nas empresas de papel e celulose satisfatória, boa ou muito boa, somam 31. Apenas cinco consideram regular a atuação das empresas em relação ao meio ambiente.

Tabela 7: Satisfação dos compradores em relação à política ambiental dos fornecedores

Satisfação dos compradores Número de vezes assinalado Satisfeito 13 Muito bom 10 Bom 8 Regular 5 Insatisfeito 0

No decorrer das entrevistas, observaram-se percepções

diferenciadas sobre a concentração, a conduta e o desempenho das empresas pertencentes ao setor de papel e celulose A seguir, são descritos os comentários que dizem respeito ao fator qualidade.

C1: “Deve ser melhorado a qualidade e descartado as negociações demoradas e compridas, para se chegar ao preço que já se sabia antes”.

C2: “As empresas poderiam buscar mais a certificação de seus sistemas de gestão, para que haja uma maior garantia de qualidade”.

C3: “O custo do produto deve ser reduzido, maior aproveitamento dos recicláveis, mais estudos e adoção de tecnologias para redução de custo sem redução da qualidade”.

Em alguns comentários, pode-se observar a preocupação dos compradores em relação ao preço.

C4: “O principal comentário que faço é em relação à política de preços adotado por este segmento industrial (papel e celulose), que se aproveita das condições de mercado e pratica aumentos abusivos e sem nexo”.

C5: “O que posso dizer é em relação à dificuldade nas negociações, pois nos últimos meses tivemos que absorver um percentual de aumento muito elevado e sem condições de se fechar um bom negócio”.

C6: “A cada aumento de preço do mercado, todas as empresas executam percentuais parecidos, quando se solicita novos orçamentos, eles distanciam-se bastante do aumento da tabela”.

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Outro fator comentado foi a questão do atendimento e capacitação do vendedor.

C7: “Primeiramente, é necessário um representante de alto grau de conhecimento dos produtos fornecidos, modo de fabricação e as especificações técnicas do produto. Não adianta um vendedor pensar em somente vender seu produto, deve se preocupar em como sua empresa vai fazer para atender ao pedido, de modo que o cliente final não venha a ser prejudicado, nem a sua empresa tenha perda de mercado”.

C8: “Mais profissionalismo, deixando os interesses pessoais de lado, procurando ser imparcial”.

A questão ambiental também foi comentada.

C9: “Em minha opinião, na negociação com empresas transformadoras de papel e celulose, é muito importante salientar, além das questões comerciais e técnicas, as exigências de atendimento a legislação ambiental”.

C10: “Em uma negociação, eu observo a transparência, as condições de parceria e a co-responsabilidade para com o meio ambiente”.

C11: “A matéria-prima a ser usada pelas empresas de celulose não devem ser de espécies que agridem o meio ambiente e, gradativamente, deve-se desenvolver pesquisas para substituir o pinus e o eucalipto, a exemplo do uso do bambu”.

Pode-se perceber que o fato de as empresas não desenvolver programas ecológicos não, necessariamente, influenciará no momento da decisão de compra de seus clientes. No entanto, se as empresas assumirem para si uma imagem de devastação do meio ambiente, poderão sofrer restrições durante uma negociação.

C12: “A realidade é que na hora da compra, para nós, usuários, interessa preço, qualidade e entrega. É claro que se tivermos conhecimento sobre uma conduta condenável sobre política ambiental de um fornecedor, ele é sumariamente descartado, mas não somos fiscais e não queremos assumir funções do governo.

C13: “Na empresa onde trabalho está completamente fora de cogitação entrar em algum acordo com empreiteiras ou fornecedores que burlem ou tentem não cumprir alguma lei ambiental ou social. As normas adotadas são delineadas pela certificação SA8000”.

Alguns compradores relataram a incapacidade de seus fornecedores em divulgar de forma satisfatória informações sobre as políticas ambientais adotadas.

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A influência da questão ambiental na decisão de compra do cliente do setor de papel e celulose

C14: “Nós dispomos de poucas informações sobre a conservação do meio ambiente pelos fabricantes de papel”.

C15: “O problema da preocupação e/ou devastação do meio ambiente, consideramos como de importância fundamental, porém, na hora da compra fica difícil avaliar quem procede corretamente, aliás, esse é um problema que deve ser fiscalizado e combatido pelas autoridades de nosso País (Governo)”.

Os demais comentários foram:

C16: “Consideramos que a indústria nacional de papéis, papelão e cartões, têm muito bom nível, comparável a empresas do primeiro mundo”.

C17: “É um mercado monopolizado, fica difícil a negociação”.

C18: “A gente analisa muitos fatores para a negociação ter uma efetivação boa para a empresa. Cada caso é um caso”.

C19: “De um tempo pra cá, as fábricas de papelão (Paraná, no caso) estão fabricando os mesmos produtos de seus clientes. No Sul estão concentrados os fabricantes de papelão e em São Paulo, as fábricas de itens derivados de papelão. Se as fábricas do Sul concentrassem suas vendas na região Sul não haveria problema, mas elas estão expandindo suas vendas para todo o território nacional, o que acaba atrapalhando as vendas de seus clientes, criando um canibalismo. Nossas vendas acabam por diminuir justamente pela concorrência de nossos próprios fornecedores. Então acho que seria uma boa estratégia essas fábricas concentrarem suas vendas nas regiões onde seus clientes ainda não atuam, porque pelo fato de os produtos chegarem ao consumidor excluindo um de seus intermediários (no caso as fábricas dos derivados) fica difícil concorrer”. Dos 36 compradores entrevistados, apenas os 19 relatados

expressaram suas opiniões e impressões. A seguir são apresentadas as considerações finais desta abordagem.

CONSIDERAÇÕES FINAIS De acordo com os objetivos propostos, este estudo buscou mostrar qual a importância da implantação e divulgação de programas ambientais desenvolvidos por empresas do setor de papel e celulose na percepção dos compradores organizacionais de seu produto. Considerou-se o marketing

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verde como estratégia das empresas para tornar os investimentos ambientais conhecidos pelo mercado.

Atualmente, a incorporação de processos produtivos ambientalmente sustentáveis parece distante de se refletir em um diferencial competitivo que possa influenciar no momento da decisão de compra, pelo menos no curto prazo. Fatores como qualidade, preço e atendimento são os mais importantes. O modelo capitalista que há tempos dita as regras no cenário econômico global, de um modo geral, não apresenta indícios de que o item sustentabilidade, efetivamente, seja levado a sério durante os processos de negociação.

No entanto, mesmo que não da maneira desejada, alguns sinais de mudança podem ser identificados. Consumidores deixam transparecer que está descartada a possibilidade de trabalhar com fornecedores dos quais se tenha informações sobre atuação ambiental irresponsável. Da mesma forma, quando a questão ambiental é considerada de forma isolada, ou seja, sem ser cruzada com outro atributo, a maioria dos compradores manifestam que ela influenciará no momento da compra.

Nota-se uma demanda por informações relativas a aspectos ambientais e sociais da atuação das empresas, tanto no que diz respeito às empresas que agridem o meio ambiente, tanto as que incorporam prática sustentáveis. Fato que evidencia a importância do marketing verde no processo de comunicação. A informação, desse modo, pode assumir uma função estratégica na medida em que fornece critérios para um maior reconhecimento de empresas que se autodefinem verdes.

Alguns comentários são evidências que a eficaz divulgação das ações ambientais desenvolvidas poderá proporcionar ganhos num processo de negociação. Se os consumidores desconsideram a hipótese de trabalhar com fornecedores que agridem o ambiente, pode-se pensar que estes mesmos consumidores podem dar preferência a fornecedores que exercem ações de responsabilidade ambiental, se elas se tornarem conhecidas.

Os fatores mais observados no momento da decisão de compra foram a qualidade, o preço e o atendimento. Nota-se que o comprador organizacional de papel e celulose deseja, mais do que um produto ambientalmente correto, um produto que não altere os padrões de qualidade adotados por sua empresa.

Algumas evidências na análise que se fez neste estudo sinalizam que ainda não existe uma relação de harmonia entre sustentabilidade e decisão de compra. No entanto, o que se pode constatar também é o fato que, possivelmente, os elementos que estão direcionando as empresas para um comportamento ambientalmente responsável possam ir além do Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 101-120 • Jan/Fev/Mar 2010 117

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A influência da questão ambiental na decisão de compra do cliente do setor de papel e celulose

holístico foco nos compradores. Os resultados aqui apresentados sugerem que a inserção da variável meio ambiente nas empresas deve ser examinada de uma forma mais ampla, tanto no sentido das pressões sociais e legais, como no sentido da motivação dos seus acionistas e investidores.

Por fim, percebe-se que há uma oportunidade real de associar as Questões Ambientais com a Qualidade (adjetivo/atributo mais relevante para os compradores). Fazendo dessa associação uma meta estratégica, as empresas produtoras de papel e celulose podem utilizar-se do Marketing Verde como um diferencial competitivo.

Assim, e se realmente o objetivo do complexo econômico que forma a indústria de papel e celulose no Brasil for a busca pelo desenvolvimento sustentável, vê-se à frente um enorme caminho a ser pavimentado, seja pela falta de responsabilidade ambiental de algumas empresas fabricantes, seja pelo modelo de consciência ambiental presente em algumas empresas compradoras. REFERÊNCIAS ANGELONI, M. T. Elementos intervenientes na tomada de decisão. Ciências da Informação, v.32, n.1, p. 17-22, 2003.

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A influência da questão ambiental na decisão de compra do cliente do setor de papel e celulose

DADOS DOS AUTORES DARLAN JOSÉ ROMAN ([email protected]) Mestrando em Administração pela Universidade Federal de Santa Catarina Florianópolis/SC – Brasil Áreas de interesse em pesquisa: Administração da Produção, Estratégia e Competitividade Organizacional. ELIANE SALETE FILIPPIM ([email protected]) Doutorado em Engenharia de Produção e Sistemas pela Universidade Federal de Santa Catarina e Pós-doutorado em Administração Pública e Governo pela Fundação Getúlio Vargas - Escola de Administração de Empresas de São Paulo Instituição de vinculação: Universidade do Oeste de Santa Catarina Joaçaba/SC – Brasil Áreas de interesse em pesquisa: Administração Pública; Estratégia; Desenvolvimento. SILVIO SANTOS JÚNIOR ([email protected]) Mestre em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Doutorando em Agronegócios pela mesma Universidade Instituição de vinculação: Universidade do Oeste de Santa Catarina Joaçaba/SC – Brasil Áreas de interesse em pesquisa: Estratégia e Gestão, Redes, Desenvolvimento Recebido em: 18/09/2009 • Aprovado em: 21/02/2010

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INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS E NOVAS COMPETÊNCIAS: UM ESTUDO DE CASO NA NANSEN S/A

TECHNOLOGICAL INNOVATIONS AND NEW COMPENTENCES: A CASE STUDY

AT NANSEN S/A

RICARDO GONZAGA MARTINS DE ARAÚJO ([email protected]) ADRIANE VIEIRA FACULDADE NOVOS HORIZONTES RESUMO Em 1990, a empresa Nansen S/A – Instrumentos de Precisão deu início à fabricação de medidores eletrônicos de energia elétrica, que, diferentemente dos elétricos, minimizam a possibilidade de fraudes e de prejuízos às distribuidoras. O objetivo geral desta pesquisa foi verificar como as mudanças tecnológicas introduzidas na Nansen influenciaram no desenvolvimento de competências organizacionais, funcionais e individuais. Um estudo de caso do tipo qualitativo-descritivo foi realizado com a finalidade de coletar os dados necessários. Foram entrevistados oito funcionários ligados às funções estratégicas. A inovação tecnológica introduzida na Nansen desencadeou um conjunto de mudanças organizacionais, envolvendo todas as áreas da empresa. A nova competência organizacional seletiva identificada foi o relacionamento comercial com os clientes. Novas competências funcionais foram desenvolvidas, especialmente nas áreas de vendas e de suporte técnico. Para o desenvolvimento de novas competências individuais, a Nansen adotou uma prática de gestão de pessoas focada, principalmente, no desenvolvimento das lideranças e do conhecimento formal. Palavras-chave: inovações tecnológicas; mudança organizacional; competências.

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ABSTRACT In 1990, Nansen S/A – Precision Instruments started the production of electronic power meters, which, differently from the electric ones, minimize the possibility of fraud and loss for the distributors. The general objective of this research was to verify how the technological changes introduced at Nansen influenced the development of organizational, functional and individual competences. A qualitative-descriptive case study was carried out with the aim of collecting the necessary data. Eight employees in charge of the strategic functions were interviewed. The technological innovation introduced at Nansen triggered a number of organizational changes in all areas of the company. The new selective organizational competence identified was related to the commercial relationship with the clients. New organizational competences were developed, especially in the areas of sales and technical support. For the development of new individual competences, Nansen adopted a new practice of people management, focused, mainly, on the development of leadership skills and formal knowledge. Keywords: technological innovations; organizational change; competences.

INTRODUÇÃO O setor elétrico brasileiro está passando por profundas modificações, muitas delas acontecendo de forma pouco estruturada. A sociedade brasileira, no período de 2001 a 2002, foi submetida a um rigoroso esquema de redução de consumo de energia elétrica, com reflexos na economia e na vida das pessoas, em face da perspectiva de interrupção do fornecimento.

Segundo Alvim (2003), após o período de racionamento de energia elétrica, o número de clientes que passaram a adulterar o marcador de energia aumentou e, para reduzir as perdas, as empresas passaram a utilizar medidores com tecnologia microeletrônica, aparentemente com boas perspectivas para dificultar essas adulterações.

Esses novos medidores eletrônicos, similares ao processador de um computador, executam a cada intervalo de medição um cálculo matemático do produto do valor da voltagem e da corrente, que representa a energia instantânea consumida, e vão acumulando esses valores em uma posição de memória. Dessa forma, ele pode ser lido à distância,

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utilizando-se das facilidades dos sistemas de comunicação, como telefone, rádio e internet, e as distribuidoras podem emitir a conta para os consumidores sem precisarem fazer a leitura dos medidores presencialmente. Outra característica dos medidores eletrônicos é que eles medem tanto a corrente que entra nas unidades consumidoras como a que sai delas. Essas correntes devem ser iguais; a existência de diferença entre elas é indício de fraude. O medidor pode informar à distribuidora tal suspeita, ou simplesmente considerar, para o cálculo do consumo, o maior valor de corrente e, baseando-se nela, emitir a conta correta.

As inovações tecnológicas são essenciais às empresas, mas, em geral, implicam em mudança em seus processos e demandam novas habilidades e conhecimento e atitudes no desempenho de várias funções ocupacionais. Então, entender este processo de adaptação tornar-se relevante e desta, forma, entendeu-se como oportuno um estudo das alterações implantadas nos processos de produção e de sua influência nas competências organizacionais decorrentes da introdução de uma inovação. Para explorar essa temática tomou-se como referência o caso da empresa Nansen S/A Instrumentos de Precisão. Assim sendo, o objetivo geral desta pesquisa é verificar como as mudanças tecnológicas introduzidas na Nansen durante o período de 2000 a 2004, influenciaram no desenvolvimento de competências organizacionais, funcionais e individuais na empresa.

REFERENCIAL TEÓRICO Inovações tecnológicas Segundo Berkun (2007), a inovação é a habilidade de ver um problema combinada com o talento de resolução. Inovação também pode ser vista como a capacidade de ver conexões e oportunidades e obter vantagens sobre elas. Tidd, Bessant e Pavitt (2005) afirmam que o processo inovativo difere de acordo com o setor, o tipo de inovação, o período histórico e o país estudado. Ressaltam também que deve ser considerado, ainda, o tamanho da empresa.

Quando o foco é tratar inovação como geração de sustentabilidade, Berkhout e Green (2002) relatam que a inovação tecnológica e a organizacional constituem o centro dos discursos sobre sustentabilidade, onde a inovação é a chave para a solução.

A questão da inovação, segundo Drucker (2003), ultrapassa o caráter técnico, ou seja, vai além da criação de novos produtos ou

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processos resultantes das mudanças e dos investimentos em P&D. Para o autor, ela deve ser analisada sob uma perspectiva econômica e social, característica da chamada sociedade do conhecimento.

De acordo com Schumpeter (1972), o processo de inovação pode ser representado em três momentos. O primeiro momento é o da passagem dos arranjos rotineiros aos arranjos de risco, no qual alguns indivíduos patrocinadores dessa passagem podem ser considerados marginais do ponto de vista do circuito econômico dominante. No segundo momento, quando as possibilidades de lucro são evidentes, os imitadores aparecem e criam uma série de inovações secundárias, a partir da reprodução e transformação das mudanças que foram inicialmente previstas. Essa fase é a da violência e da destruição dos equilíbrios. No terceiro momento, a situação se estabiliza novamente pela definição progressiva das novas regras do jogo e pela redução do impulso inovador.

Schumpeter (1972) acredita que a inovação destrói as formas sociais estabelecidas, provocando desordem e incentivando a transgressão, o que permite a emergência da criatividade e de novas formas sociais. Há entre o social e o econômico uma articulação necessária ao movimento de inovação, que, por sua vez, não está vinculado unicamente à história de uma tecnologia ou a um método de gestão, mas a um emaranhado de circunstâncias, nas quais o risco e a transgressão tornam-se uma situação corriqueira. Nesse contexto as inovações criam novos produtos, novos mercados e novas formas de gestão, geradas pela nova condição oferecida pela tecnologia. Em consequência, ocorre um expressivo aumento da complexidade do trabalho, obrigando os empregados a encontrarem novas e difíceis soluções para atender às exigências quanto ao nível de desempenho.

Três tipologias de estratégias tecnológicas serão aqui apresentadas para dar suporte à análise dos dados da pesquisa: a de Ansoff e Stewart (1967), a de Freeman (1974) e a de Miles e Snow (1978).

Ansoff e Stewart (1967) apresentam quatro tipos de estratégias tecnológicas: - Primeiro no mercado: baseada em um programa forte de P&D, liderança técnica e alta taxa de risco; - Seguir o líder: baseada na capacidade de desenvolvimento forte e na habilidade de reagir prontamente assim que o mercado entra em sua fase de crescimento; - Engenharia de aplicação: baseada em modificações do produto para atender as necessidades de consumidores específicos em um mercado maduro;

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- “Eu também”: baseada na capacidade de produção superior e no controle de custos.

Freeman (1974), por sua vez, propõe uma classificação de seis pontos: - Ofensiva: a empresa busca a liderança tecnológica e de mercado; - Defensiva: a empresa acompanha as mudanças tecnológicas, mas não tem o objetivo de ser líder. Procuram aprender com os que são líderes; - Imitativa: a empresa tem interesse nas mudanças tecnológicas, mas não tem possibilidade de diminuir o hiato tecnológico em relação às empresas líderes; - Dependente: a empresa adota uma postura reativa, promovendo mudanças em seus produtos ou processos somente mediante a solicitação de seus clientes ou matrizes; - Tradicional: a empresa não tem interesse em mudanças e não há pressão de mercado para mudança; - Oportunista: está ligada à sensibilidade do empresário em perceber uma oportunidade de mercado (em rápida mudança). Normalmente a necessidade pode ser atendida com pouco esforço de desenvolvimento.

Miles e Snow (1978) desenvolveram uma tipologia baseada em quatro posturas estratégicas da empresa: - Defensor: organizações com domínio estreito do produto-mercado, que não buscam oportunidades fora de seus domínios; - Prospector: organizações que buscam novas oportunidades constantemente; - Analítico: organizações criadoras de mudança e incerteza, que operam na frente estável e rotineira e, ao mesmo tempo, na busca constante de novas ideias; - Reativo: organizações que percebem mudanças em seu ambiente, mas são incapazes de responder adequadamente por não possuírem uma relação consistente entre estratégia e estrutura.

Nakano (1998) afirma que as três tipologias se diferenciam porque Ansoff e Stewart (1967) se basearam no tempo de entrada do produto no mercado, enquanto Freeman (1974) tem como base a política de inovação da empresa e Miles e Snow (1978) a postura estratégica da empresa em relação ao seu ambiente.

Segundo dados da OCDE (2004), as inovações desempenham um papel central em uma economia baseada no conhecimento. No nível macro, as evidências apontam que a inovação é um fator dominante no crescimento econômico nacional e nos padrões do comércio internacional; e no nível micro a P&D (pesquisa e desenvolvimento) é vista como um fator que amplia a capacidade das empresas absorverem Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 121-148 • Jan/Fev/Mar 2010 125

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novos conhecimentos de todo o tipo. Outros fatores de fundamental importância apontados como capazes de influenciar o aprendizado das empresas são: facilidade de comunicação, canais eficazes de informação, transmissão de competências e a acumulação de conhecimentos dentro das organizações. Nesta pesquisa daremos foco ao desenvolvimento de competências.

A noção de competência Para Perrenoud (1999), a competência seria uma característica presente na espécie humana, que se constitui na capacidade de criar respostas, sem que seja necessário tirá-las de um repertório pré-estabelecido. Certamente, os seres humanos têm a faculdade intelectual ancorada em seu patrimônio genético, de construir competências. No entanto, nenhuma competência é estimulada desde o início da vida dos indivíduos. Essas potencialidades natas do sujeito só se transformam em competências efetivas por meio de aprendizados que não se realizam da mesma maneira em cada indivíduo. “As competências são aquisições, aprendizados construídos, e não virtualidades da espécie” (PERRENOUD, 1999, p.21).

Zarifian (2001, p. 68) propõe outra definição para competência, que complementa o conceito anterior. Para ele “competência é ‘ tomar iniciativa’ e ‘ assumir responsabilidade’ diante de situações profissionais com as quais o individuo se depara”. Segundo esse autor, "tomar iniciativa" significa que o ser humano não é um robô aplicativo, mas tem capacidade de imaginação e de invenção, que, além de lhe permitir abordar o singular e o imprevisto, o dota da liberdade de iniciar alguma coisa nova, nem que seja de forma modesta. A competência "é assumida", ou seja, resulta de um procedimento pessoal do indivíduo, que aceita assumir uma situação de trabalho e ser responsável por ela. A responsabilidade é, sem dúvida, a contrapartida da autonomia e da descentralização das tomadas de decisão. Não se trata mais de executar ordens (por cuja pertinência as pessoas não se sentem responsáveis), mas de assumir a responsabilidade pela avaliação da situação, pela iniciativa que pode exigir e pelos efeitos que vão decorrer dessa situação. As competências organizacionais Para iniciar a discussão das competências organizacionais há que se considerar o conceito de Penrose (apud SILVA; FLEURY, 2003, p. 4), que suportado pela Teoria Baseada em Recursos, afirma que:

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Uma organização de negócios é tanto uma organização administrativa quanto uma coleção de recursos produtivos (humanos e materiais). Não são os recursos que são os inputs no processo produtivo, mas os serviços que eles viabilizam. Tais serviços são resultado da experiência e conhecimento que foram acumuladas ao longo do tempo. Serviços são específicos e é aqui que reside a unicidade da organização.

Nesse caso, conforme Silva e Fleury (2003), as competências organizacionais constituiriam o conjunto das capacidades decorrentes da integração entre esses recursos e as competências específicas das pessoas. Assim, uma organização seria um conjunto de capacidades dinâmicas organizacionais, as quais produziriam uma vantagem competitiva para a organização. Tais competências são acumuladas durante a execução das atividades da organização e sua existência e características são dependentes do conhecimento, habilidade, experiência e trabalho em equipe e das capacidades humanas organizadas para explorar o potencial dos processos tecnológicos.

Segundo Ruas (2003), a competência organizacional se situa na instância das corporações e, como uma competência coletiva, está associada aos elementos da estratégia da organização: à visão, à missão e à intenção estratégica propriamente dita. Essa competência organizacional, conforme definida por Prahalad e Hamel (1990), por meio do conceito de Core Competence, ou Competências Essenciais, defende que uma estratégia competitiva não pode prescindir da análise das capacidades dinâmicas internas à organização e se constitui na base da ação estratégica externa. Há, portanto, nessa condição, um deslocamento do ambiente externo para o ambiente interno na formulação de estratégias geradoras de vantagem competitivas.

Para esses autores existem pelo menos três testes que podem ser aplicados para identificar as competências essenciais da organização: a) A competência essencial provê acesso em potencial a uma ampla variedade de mercados; b) A competência essencial deve trazer uma significativa contribuição para os benefícios percebidos pelo consumidor dos produtos finais; c) A competência essencial deve ser difícil de ser imitada pela concorrência.

No entanto, segundo Ruas (2003), quando se trata de replicar o teste das competências essenciais no Brasil, a validação dos três critérios torna-se problemática, principalmente quando a referência é o mercado internacional. Mas, isso não quer dizer que as organizações não possuam

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competências organizacionais; apenas que elas se apresentam em outros dois níveis, além do das competências essenciais: - O das competências organizacionais seletivas, que viabilizam diferenciação de uma organização no espaço de competição formado por mercados regionais e/ou nacionais, com base no relacionamento com clientes ou no redimensionamento de serviços; e - O das competências organizacionais básicas, que são competências qualificadoras para atuação num certo mercado ou para a sobrevivência da empresa. Neste caso também estariam aquelas competências que permitem a uma empresa industrial oferecer produtos com preços compatíveis para o mercado ou competências que contribuem para uma empresa atingir níveis de atendimento satisfatório.

Um modelo de competências organizacionais mais complexo e mais bem adaptado às empresas brasileiras poderia ser obtido pela união da configuração proposta por Ruas (2003) com o conceito de Competências Essenciais defendido por Prahalad e Hamel (1990). A proposta de união feita por Ruas (2003) mostra a configuração dos diferentes níveis de consistência das competências organizacionais apresentadas na figura 1.

Figura 1: Articulação entre os diferentes níveis de competitividade das competências organizacionais.

Competências organizacionais básicas

Competências organizacionais

seletivas

Competências organizacionais

essenciais Contribuem

decisivamente para a sobrevivência da

organização no médio prazo

Sobrevivência

Diferenciam a organização no espaço

de competição onde atua, contribuindo para

uma posição de liderança (ou quase)

nesse mercado

Diferenciadoras

Diferenciam a organização no espaço

de competição internacional,

contribuindo para uma posição de pioneirismo

nesse mercado

Excepcionais Fonte: Ruas (2003).

As observações empíricas efetuadas por Ruas (2003) permitem concluir que a configuração proposta na figura 1 não representa um processo evolutivo, no qual uma competência menos consistente evolui necessariamente para outra mais consistente. A seta em duplo sentido é empregada para mostrar que existe uma relação de mão dupla entre elas, ou seja, que uma competência organizacional essencial pode tornar-se

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seletiva por mudanças no mercado ou na gestão da competência. O mesmo pode ocorrer com uma competência organizacional seletiva, que pode passar também para uma competência essencial.

Segundo Ruas (2003), essa tipologia de competências organizacionais revela-se útil na avaliação da contribuição de determinada competência na competitividade organizacional. Ainda segundo Ruas (2003), a noção de competência, ao ser adotada formalmente pela organização, vai transitar em três instâncias da empresa, a saber: ao nível organizacional, ao nível funcional ou de áreas e ao nível individual. As competências funcionais As competências funcionais ou de grupos são identificadas como uma categoria intermediária, que se articulam entre as competências do negócio ou organizacionais e as individuais. Elas são, segundo Ruas (2003, p.7), as competências associadas ao exercício das principais funções coletivas da organização descritas nos itens a seguir: conceber e produzir produtos e serviços adequados às condições do mercado; garantir a comercialização de produtos e serviços no médio prazo; obter insumos e/ou informações necessárias para a produção dos produtos e serviços; gerir a manutenção e a logística dentro e fora da organização; promover a gestão dos recursos tangíveis e intangíveis, etc.

Essas competências, ainda na visão de Ruas (2003), são normalmente atribuídas aos grupos mais específicos, embora se possa relacioná-las com toda a empresa, estando associadas às responsabilidades funcionais. Nessa dimensão funcional e intermediária é que se dá o desdobramento das capacidades demandadas ao nível corporativo ou organizacional para toda a empresa. Embora essas competências possam estar efetivamente presentes em todas as áreas da empresa, elas são apropriadas de forma desigual, na medida em que certos tipos de competências têm mais relevância para determinadas funções da organização do que para outras.

Por outro lado, uma competência funcional também pode, com o passar do tempo, vir a se constituir numa competência organizacional essencial. Um exemplo disso é o caso da Honda, citado nos estudos de Prahalad e Hamel (1990), em que o desenvolvimento das técnicas e processos de produção de motores gerou uma competência essencial, sendo a Honda Motors reconhecida mundialmente por isso.

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As competências organizacionais essenciais originárias das competências funcionais, identificadas por Ruas (2003) são apresentadas a seguir na tabela 1. Tabela 1: Relação entre competências funcionais e organizacionais

Empresa Função Competência funcional tornada organizacional

Wal-Mart Distribuição e sistema de informações

Logística capaz de colocar à disposição dos clientes toda a gama de produtos

Fedex Comunicação e gerência de rede Capacidade de entrega: tempo e custo

Motorola Produção flexível/gestão de estoques

Capacidade de planejar e realizar projetos adequados

SONY Pesquisa e produto Capacidade de inovação

GAP Fabricação e projeto Qualidade de produto e projeto e capacidade de prever tendências do vestuário

Fonte: Ruas (2003, p. 08).

Para Ruas (2003), essas competências funcionais aparentam ser uma das instâncias mais adequadas para uma avaliação da aderência do conceito de estratégica competitiva (organizacional) às práticas de trabalho das diversas áreas. Assim sendo, pode-se assumir que a noção de competência se tornará um dos elementos de referência na formulação das diretrizes e práticas das diversas áreas, tais como os objetivos e metas, as atribuições das áreas e dos gestores, dos programas de capacitação gerencial e da remuneração.

Alguns modelos utilizados para a diversificação de produtos e para a formulação de estratégias de entradas em novos mercados podem ser guiados pelas competências essenciais e não somente pela atratividade dos mercados. Assim, Prahalad e Hamel (1990) sustentam que, olhando-se para as competências essenciais, pode-se obter produtos e serviços capazes de gerar vantagem competitiva para as organizações, pondo-se como uma alternativa à perspectiva de que o mercado define as condições de lançamento de produtos e de competitividade das empresas.

Uma variante a ser considerada no estudo das competências funcionais é competência gerencial. Nesse sentido, Bitencourt (2003, p.1), diz que:

Os modelos de competências gerenciais propostos apresentam um amplo escopo de reflexões acerca das necessidades de planejamento, desenvolvimento e acompanhamento do perfil e da formação gerencial a partir da realidade individual e da estratégia competitiva de cada empresa; fato esse que caracteriza uma visão processual (desenvolvimento de competência), diferenciando-se de

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construtos que priorizam a listagem de atributos que por si só não agregam valor à organização ou às pessoas.

Le Boterf (1997) afirma que a diferenciação pela competência de uma empresa ou de uma unidade (divisão, departamento, serviço) não é provocada pela competência de seus membros. Esse diferencial não depende de seus elementos, mas da forma e da qualidade da combinação e da articulação entre seus elementos constituintes.

Nesse contexto, a competência funcional é um processo e não um fim. Precisa ser desenvolvida e aprendida no interior das organizações. Esse aprender, segundo Ruas (1999), está relacionado à capacidade de transformação contínua da empresa. É baseado tanto no desenvolvimento individual quanto no organizacional, mas deve ser considerado sob a forma de um processo de aprendizagem coletivo, oriundo da interação entre as pessoas dentro da empresa. Assim, pode-se imaginar a aprendizagem como algo norteador e necessário ao desenvolvimento dessas competências. Essa dimensão deve estar presente nas empresas que se instalam em mercados competitivos. As competências individuais

Muito já se escreveu sobre competências individuais. Esse é um conceito controverso e complexo. Pode-se destacar na literatura duas correntes a abordarem o tema, a anglo-saxônica, mais pragmática em suas formas de classificação, e a francesa, que integra em seus conceitos elementos da sociologia, da economia e da educação para o trabalho (RUAS, 2003). Dentre os representantes da escola francesa estão Zarifian (1996) e Le Bortef (1995), que desenvolveram conceitos adotados neste trabalho.

Para Le Boterf (1995, p. 22), as competências dos indivíduos são conjuntos de conhecimentos, de capacidade, de ações e de comportamentos estruturados em função de um fim e em um tipo de situação dada. A competência pressupõe a capacidade de transferência, de aprendizagem e de adaptação. Não é imitar, mas adaptar a conduta às situações novas e imprevistas.

Segundo Zarifian (1996), o tema competência dos indivíduos deve ser entendido de duas maneiras. Primeiramente como uma responsabilidade pessoal que o empregado assume diante das situações produtivas. Deve ser uma atitude de comprometimento ou envolvimento, de engajamento social, mobilizando a inteligência e a subjetividade dos empregados e, por isso mesmo, significando também assumir os riscos de um possível fracasso. Em segundo lugar, a competência deve ser

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reconhecida também como o exercício sistemático da reflexividade no trabalho. Essa reflexividade, entendida como um distanciamento crítico diante do trabalho precisa estabelecer um questionamento sistemático dos modos de trabalhar e dos conhecimentos que a pessoa utiliza e, como tal deve advir da própria pessoa, não podendo, portanto, ser imposta.

Zarifian (1996) propõe ainda, que essa competência não funciona sem a aquisição, isto é, sem a aprendizagem. Argumenta que o trabalhador, além da capacidade de enfrentar situações novas com iniciativa e responsabilidade, é guiado pela inteligência prática do que está ocorrendo, coordenando-se com outros atores na mobilização de suas próprias capacidades. Fica, portanto, ressaltada a dimensão compreensiva da situação e a interação social que se estabelecem para a interpretação dos comportamentos.

Sveiby (1998) considera que o conceito de competência individual integra cinco elementos: o conhecimento explícito, a habilidade, a experiência, os julgamentos de valor e a rede social, o que justifica considerar a competência como um fenômeno contextualizado, portanto, não passível de cópia.

Nessa mesma linha de raciocínio, Steffen (1998) considera que o mundo do trabalho de hoje requer pessoas que: tomem iniciativas; assumam responsabilidades; tenham capacidades para usar instrumentos e equipamentos sofisticados e inteligentes; estejam preparadas para o trabalho em equipe; possam liderar equipes, quando solicitadas; e que tenham capacidade para planejar e executar projetos complexos. METODOLOGIA Quanto à abordagem, esta pesquisa caracteriza-se por ser qualitativa. Para Rey (2002), a abordagem qualitativa está orientada em direção à exploração, ao descobrimento e à lógica indutiva. Um enfoque avaliativo é indutivo se o pesquisador tenta criar sentido da situação, sem impor expectativas sobre o fenômeno ou cenário estudado. A análise indutiva começa com observações específicas e se constrói em direção a padrões gerais. As categorias ou dimensões de análises emergem de observações abertas sobre como o avaliador chega a compreender os padrões do mundo sob estudo.

Quanto aos fins, trata-se de um estudo descritivo, pois o que se pretendeu foi descrever as mudanças tecnológicas ocorridas na empresa em estudo, no período de 2000 a 2004, identificando as competências

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organizacionais e funcionais demandadas e desenvolvidas pela introdução dos medidores eletrônicos.

Quanto aos meios, foi realizado um estudo de caso na empresa Nansen - Instrumentos de Precisão. Segundo Yin (2001), os estudos de caso representam a estratégia preferida quando se colocam questões do tipo "como" e "por que", quando o pesquisador tem pouco controle sobre os eventos e quando o foco se encontra em fenômenos contemporâneos inseridos em algum contexto da vida real. Esse foi exatamente o caso da pesquisa elaborada. A unidade de análise da pesquisa foi a empresa Nansen Instrumentos de Precisão, e a unidade de observação foi o nível diretivo da empresa.

A escolha dos sujeitos da pesquisa foi intencional e não-probabilística, ou seja, os pesquisadores deliberadamente escolheram os sujeitos a serem investigados. Os escolhidos foram: o diretor presidente, o diretor de novos negócios e marketing, o diretor de tecnologia, todos os gerentes (quatro), e um coordenador de engenharia, resultando em um total de oito entrevistados.

A escolha dos entrevistados foi feita de forma a abranger toda a esfera diretiva da empresa, acrescida de um coordenador de engenharia, com o objetivo de avaliar mais profundamente os impactos nessa área. A coleta de dados foi feita por meio de entrevistas semi-estruturadas. Elas foram realizadas no ambiente de trabalho dos entrevistados, em um local pouco sujeito a interrupções e interferências externas. Foram gravadas integralmente e, posteriormente, transcritas para arquivos tipo doc, estando disponíveis para análise em ambiente computacional. As entrevistas tiveram uma duração aproximada de uma hora. As questões foram formuladas visando a obtenção de dados sobre: o processo de mudanças tecnológicas ocorridas na empresa; as competências organizacionais, funcionais e individuais demandadas em função dos medidores eletrônicos; e se e como as competências organizacionais, funcionais e individuais foram desenvolvidas. Além dessa fonte de coleta de dados foram realizadas observações livres e consultas a documentos internos da empresa, como informativos e manuais operacionais.

Os dados foram analisados com base na técnica de análise de conteúdo. De acordo com Richardson (1985), entre as diversas técnicas de análise de conteúdo, a mais antiga e utilizada é a análise por categoria, que se baseia na decodificação de um texto em diversos elementos, os quais são classificados, formando agrupamentos analógicos. Entre as possibilidades de categorização, a mais utilizada, mais rápida e eficaz, quando se trata de conteúdos diretos (manifestos) e simples, é a análise por temas ou análise temática. Esta categorização consiste em isolar Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 121-148 • Jan/Fev/Mar 2010 133

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temas de um texto e extrair as partes utilizáveis, de acordo com o problema pesquisado, para permitir sua comparação com outros textos escolhidos da mesma maneira.

Para viabilizar a análise de conteúdo, primeiramente realizou-se a leitura de todas as entrevistas, mais de uma vez, o que permitiu o destaque de trechos dos registros, que foram retirados para compor as unidades de conteúdo, a partir de um tema.

Após a definição dos temas, os trechos selecionados da fala de cada entrevistado foram recortados e colocados em bloco, utilizando-se, para isso, os recursos do programa de texto Microsoft Word. Dessa forma, todas as falas a respeito de um mesmo tema foram reunidas cada uma das quais recebeu um número aleatório referente ao entrevistado, chegando-se à seguinte estrutura final: características da inovação tecnológica, competências organizacionais, competências funcionais ou coletivas, competências individuais.

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS A Nansen foi inaugurada em 1930, pelo médico Nansen Araújo, denominando-se inicialmente Fábrica Nacional de Instrumentos Científicos Nansen. Nos primeiros tempos, fabricou camas para hospitais, pinças, escalas para termômetros, afastadores de língua, aparelhos para medir pressão e uma série de outros instrumentos (FARIA; PEREIRA, 2000). Em 1937, a convite do então prefeito de Belo Horizonte, Otacílio Negrão de Lima, iniciou a produção de hidrômetros Para isso criou a Cia. Brasileira de Instrumentos Científicos Nansen, conseguindo engajar no empreendimento 43 novos sócios.

Atualmente, a empresa está estruturada em três segmentos de negócio que, conjuntamente, atuam em um mercado exigente, primando pela excelência no desenvolvimento de soluções tecnológicas: Medidores de Energia, Equipamentos & Instrumentos, e Soluções em Medição de Energia.

A empresa conta com aproximadamente 380 funcionários em seu quadro, 220 dos quais são operadores diretos da produção. A Área de Engenharia, que suporta as Áreas de Medidores (DME) e de Equipamentos e Instrumentos (DVEI), conta com um contingente de 25 funcionários, oito dos quais engenheiros.

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Características da inovação tecnológica Na década de 1960, a Nansen expandiu sua produção de hidrômetros em função do Plano Nacional de Água e Saneamento – PLANASA – que previa a distribuição de água potável a 90% dos brasileiros. Em 1970, o primeiro medidor de energia elétrica foi entregue à CEMIG. Em 1987 foi inaugurada a Nansen do Nordeste, em Montes Claros/MG, que passaria a montar os hidrômetros, recebendo as peças fabricadas em Belo Horizonte. Em 1995, a Nansen obteve o certificado ISO 9002 para sua área de hidrômetros e, em 1997, para os medidores de energia elétrica. Nesse período associou-se à Asea Brown Boveri, empresa sueca da área de medidores, e em 1998 passou a fabricar os hidrômetros na planta de Montes Claros, em regime de parceria. Em 2000 deu início à fabricação dos medidores eletrônicos.

Nesse ano, o Grupo Nansen era composto por três empresas; a Nansen Contagem, a Nansen Montes Claros (uma parceria com a Asea Brown Boveri - ABB), e a Mecol na Colômbia. Em 2004, o grupo fechou a Mecol da Colômbia e reduziu sua participação acionária na operação de hidrômetros com a ABB.

Os medidores de energia da Nansen, tanto os eletromecânicos quanto os eletrônicos incorporam o que existe de mais recente em tecnologia de medição. Ela detém, atualmente, aproximadamente 30% do mercado de medição de energia elétrica no Brasil e exporta entre 30% e 35% de sua produção para países da América Latina e Caribe. Esta unidade está vivendo sob o novo paradigma dos medidores eletrônicos, que já estão instalados e em funcionamento normal, tanto no Brasil quanto na América Latina e no Caribe.

No inicio dos anos 90 a Nansen percebeu que haveria uma transição de medição eletromecânica para eletrônica, ao observar um movimento no mercado para cobrar tarifas diferenciadas de energia, as chamadas tarifa azul e tarifa verde, que seriam aplicadas aos consumidores de energia elétrica do comércio e da indústria. No inicio, o Brasil desenvolveu um Registrador Eletrônico Programável - REP, que logo em seguida transformou-se em Registrador Digital de Tarifa Diferenciada – RDTD - para desempenhar essa função. Esse dispositivo deveria ser alimentado pelos medidores eletromecânicos instalados nos consumidores.

Para se manter no mercado de medição, a Nansen, naquela ocasião, instalou um registrador eletrônico programável no seu medidor eletromecânico, criando um medidor híbrido, enquanto procurou desenvolver, sem sucesso, parcerias com empresas já estabelecidas que Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 121-148 • Jan/Fev/Mar 2010 135

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tivessem um RDTD. Essa postura estratégica da empresa está associada ao tipo reativo proposto por Miles e Snow (1978), revelando uma percepção da necessidade de mudança, mas também uma incapacidade de responder adequadamente às demandas do meio ambiente. Considerando essa situação, a empresa mudou de estratégia e passou a procurar um medidor que, sozinho, concentrasse as características do RDTD e do medidor de energia elétrica, ou seja, um medidor totalmente eletrônico. Assim, em 1997 estabeleceu uma parceria com a Siemens, gerando como produto o Medidor Eletrônico - MEL. Utilizando-se a tipologia de Freeman (1974), pode-se dizer que nesse momento a estratégia adotada foi “defensiva”, ou seja, por meio da associação com uma empresa, ela procurou aprender com os que são líderes.

O MEL era um medidor do tipo multifuncional, que exigia muita programação e tinha um design moderno e arrojado. No entanto, esse medidor eletrônico apresentou alguns problemas relacionados à adaptação da tecnologia alemã à rede de distribuição de energia elétrica brasileira.

Como a Nansen ainda não tinha expertise em software para corrigir os problemas, e a Siemens também não demonstrou interesse em solucionar o problema, decidiu desenvolver por conta própria um novo produto. Para isso, contratou novos engenheiros com sólida bagagem em software. O projeto de desenvolvimento culminou com o lançamento do medidor eletrônico SPECTRUM, com capacidade para medir e armazenar até 12 grandezas elétricas. Esse último posicionamento da empresa com relação à inovação pode ser identificado como o de “seguir o líder” (ANSOFF; STEWART, 1967), no que se refere ao tempo de entrada do produto no mercado. No tocante à estratégia de inovação, a empresa deixou de ser defensiva para adotar uma postura ofensiva, na busca da liderança tecnológica e de mercado (FREEMAN, 1974), e adotou uma postura estratégica analítica em relação ao meio ambiente (MILES; SNOW, 1978).

Para fazer esse produto a empresa fez uma pesquisa comparativa com os produtos dos grandes concorrentes internacionais. No entanto o alto custo de produção comprometeu sua comercialização, fazendo surgir a necessidade de re-projetar o produto, utilizando novos componentes com custos mais baixos. A empresa passou, então, a desenvolver sua terceira geração de medidores, o SPECTRUM-S. Em seguida, a empresa desenvolveu outro medidor com menos funções e mais barato ainda, o medidor SPECTRUM-K. Por último, para atender ao mercado de exportação, a empresa desenvolveu o medidor SPECTRUM-M, um medidor monofásico de energia para uso em residências e pequenos consumidores; todos em comercialização. 136 Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 121-148 • Jan/Fev/Mar 2010

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Quanto à concepção de medidores eletrônicos, a empresa procurou trabalhar numa linha de “conceito de negócio”, na qual toda a equipe Nansen (Comercial, Engenharia, Produção, etc.) foi profundamente envolvida. Esse envolvimento traduziu-se em um “Plano de Negócio” para um determinado produto, que identificou as necessidades do mercado, as expectativas de venda, o preço objetivo, o prazo de desenvolvimento e o investimento necessário.

Para entender essas necessidades do mercado, a empresa utilizou-se de contatos com os clientes e da análise de pesquisas. Essas informações foram reunidas em um documento interno chamado Proposta de Especificação de Requisitos - PER - que se integrou ao Plano de Negócio.

Definida a PER e o Plano de Negócio, a Diretoria e as áreas estratégicas da empresa deliberaram sobre a aprovação do desenvolvimento daquele produto. Aprovado o Plano de Negócio, o projeto de desenvolvimento do produto foi desdobrado em ações, segundo a metodologia sugerida pelo Project Management Institute - PMI.

A forma e o processo de produção foram decididos no Plano de Negócio e implantados durante o projeto do produto. A função engenharia industrial se incumbiu de desenvolver as atividades de produção nos volumes estabelecidos, na qualidade estabelecida, com os controles adequados, para garantir que o produto fosse disponibilizado aos clientes conforme foi concebido. Contudo, de acordo com os entrevistados, ainda se faz necessário aperfeiçoar o processo de aferição por meio de um software que está em desenvolvimento. Assim, os documentos relativos ao “como fazer” e “como aferir” poderão atender aos padrões internacionais de qualidade.

As mudanças ocorridas revelam que a gerência e uma visão estratégica adequada são fatores que influenciam na capacidade das organizações aprenderem e inovarem (OCDE, 2004). No caso estudado, há uma forte sinergia entre as ligações externas e as atitudes positivas da empresa, que proporcionaram receptividade à adoção de práticas e tecnologias mais aprimoradas. As competências organizacionais Tomando-se como referência o modelo proposto por Ruas (2003) para a identificação das competências organizacionais, se pôde evidenciar na Nansen a presença de competências organizacionais seletivas. Isso foi identificado na disposição que a empresa demonstrou de correr o risco e para a capacidade de gerenciá-lo, e também pela presença de cooperação Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 121-148 • Jan/Fev/Mar 2010 137

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interna entre os vários departamentos durante o processo de mudanças (OCDE, 2004). Como salientam Prahalad e Hamel (1990), uma estratégia competitiva não pode prescindir da análise das capacidades dinâmicas internas à organização e que se constitui na base da ação estratégica externa.

Quando a empresa, nos anos 1990, percebeu um movimento de mercado no sentido da transição dos medidores de energia elétrica para os microeletrônicos, imediatamente deu início a um processo de mudança tecnológica e organizacional. Para desenvolver novas competências organizacionais seletivas, que segundo Ruas (2003) viabilizam a diferenciação de uma organização no seu espaço de competição, a empresa inicialmente realizou pesquisa comparativa com os produtos dos grandes concorrentes internacionais (benchmarking) e contratou novos engenheiros qualificados para desenvolver medidores com a nova tecnologia, obtendo com isso uma quase liderança de mercado.

Evidentemente que nós temos concorrentes que são estritamente nacionais e concorrentes que são internacionais. Só que os concorrentes internacionais que estão no Brasil têm uma estrutura de engenharia extremamente fraca e são muito dependentes do que vêm de fora. E quando eles trazem de fora, eles não têm a flexibilidade e nem atendem aquilo que os clientes querem com a rapidez, com a dedicação e a customização que eles necessitam. Em relação aos concorrentes nacionais, que são mais rápidos e têm uma característica semelhante à Nansen, eu acredito que a Nansen é entre eles a que mais investe em engenharia, em [desenvolvimento de] competência. (Entrevistado 5).

A Nansen procurou posicionar-se, então, como uma empresa de tecnologia que está à frente nas inovações em produtos e serviços, e que se propõe a apresentar soluções completas de medição de energia para as concessionárias. Assim ela revela a habilidade de ver um problema combinado com o talento de resolvê-lo (BERKUN, 2007), e também de obter vantagens por meio de conexões e oportunidades identificadas por si mesmas (TIDD; BESSANT; PAVITT, 2005). Essa é sua competência organizacional seletiva.

Agora a imagem que a gente quer que ela [a Nansen] tenha aí fora [no mercado] é de uma empresa inovadora, uma empresa de produção cientifica, produção tecnológica. Uma empresa que esteja sempre inovando, com uma fábrica moderna e com produtos tecnológicos. (Entrevistado 2).

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De acordo com os entrevistados, outra competência organizacional seletiva é sua capacidade de relacionamento com os clientes, por meio de canais eficazes de informação e de facilidade de comunicação (OCDE, 2004).

Eu diria que o ponto mais forte hoje é relacionamento. É difícil de ser imitado. Eu diria que demanda muito tempo para ser construído. A concorrência não vai conseguir construir o nível de relacionamento que a gente tem conseguido ao longo desses anos da noite para o dia. Então a gente vê isso com um grande diferencial para nós, uma competência essencial; o forte relacionamento que a gente tem com os clientes. (Entrevistado 6).

Existe uma competência que a Nansen executa hoje, na minha maneira de ver com perfeição, que é o marketing de relacionamento. A Nansen tem, muitas vezes, superado alguns problemas tecnológicos inerentes ao produto novo por meio do profundo relacionamento que ela desenvolve com os clientes. (Entrevistado 5).

De acordo com Tidd, Bessant e Pavitt (2005), é comum que empresas nesse ramo de atividade busquem uma parcela considerável de informações e conhecimentos entre os seus clientes, complementando internamente seu núcleo de tecnologia. Na Nansen, as informações vêm da área de marketing e a estratégia é otimizar a relação preço/qualidade com manufatura Classe Mundial, com foco nas decisões de onde produzir, como distribuir, como suprir, quais os equipamentos de produção, qual o sistema de gestão, padronização de produtos e, principalmente, produtos tipo commodities. Os investimentos acontecem de forma incremental, com foco em: Engenharia Simultânea, Design for Manufacturability (técnica que considera, durante a fase de projeto, os aspectos de fabricação do produto que será desenvolvido) e Design for Serviceability (técnica que considera, durante o projeto de um produto, como os serviços agregados a ele serão prestados ao longo de sua vida

til). ú

O nosso cliente está comprando hoje basicamente por questão de estar voltado para excelência operacional. Partindo do principio que a qualidade é intrínseca ao produto, ele tem que funcionar direitinho e tal. O que está diferenciando mesmo e de fato é o preço e o atendimento adequado, na hora, com entregas programadas e realizadas dentro do que foi previsto. (Entrevistado 4).

Nessa perspectiva, a maioria dos entrevistados mencionou que o ambiente de competição dos medidores eletrônicos é o de excelência

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operacional, pois viabilizam a sua diferenciação no espaço de competição com base no relacionamento com os clientes e no redimensionamento de serviços (RUAS, 2003). Nesse caso, a atividade de marketing pode ser considerada uma atividade de inovação tecnológica em produtos e processos (TPP), pois é necessária à implantação de um produto tecnologicamente novo. O desenvolvimento, aquisição e adaptação dos softwares também permeiam as atividades de inovação TPP, envolvendo pesquisas e desenvolvimento experimental, no caso estudado (OCDE, 2004).

Competências funcionais ou coletivas De acordo com Ruas (2003) as competências funcionais ou grupais são desdobramentos das competências organizacionais e aparecem como uma categoria intermediária, que dependendo das circunstâncias incorporam também competências individuais. Ainda segundo o autor, embora possam estar presentes em todas as áreas da empresa, normalmente são apropriadas de forma desigual pelas mesmas, uma vez que algumas delas têm mais afinidade com a missão organizacional e com a competência estratégica da organização.

Evidenciou-se pelo relato dos entrevistados que a introdução do processo produtivo de medidores eletrônicos na empresa causou mudanças em todas as áreas da empresa, influenciando no processo de desenvolvimento de novas competências funcionais.

A primeira grande mudança, em suas percepções, se deu na capacitação dos agentes de vendas, dos quais passaram a ser requeridos conhecimento adicionais tais como: programação do medidor; alimentação e extração de dados; e cuidados especiais na instalação, que deveriam ser repassados aos clientes.

O processamento interno das vendas também foi alterado, como uma consequência da introdução dos medidores eletrônicos. Uma vez recebido o pedido de compra do cliente, a área comercial alimenta o novo sistema integrado de gestão de recursos, o Entreprise Resource Planning - ERP – que dispara toda uma sequência de eventos na empresa. Começa na aquisição dos insumos, passa pela programação e execução da produção, pelo controle da qualidade, pela embalagem, pela expedição final e termina com o recebimento do produto pelo cliente. Tudo controlado e monitorado pelo sistema ERP.

Na área de Suporte Técnico, também chamado de pós-vendas, as alterações tecnológicas advindas dos medidores eletrônicos foram sentidas. 140 Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 121-148 • Jan/Fev/Mar 2010

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A empresa teve que repensar o serviço de pós-venda, toda sua forma de atender o cliente do ponto de vista das questões técnicas, de instalação e de problemas em campo, já que a taxa de falha [do medidor eletrônico] é maior. Também houve uma mudança significativa na visão do serviço de pós-venda. A taxa de falhas, que era da ordem de 0,1% a 0,2% no eletromecânico, passou para 3%, 4%, 5% no eletrônico. Isso mudou completamente a forma de abordar o cliente. (Entrevistado 7).

A garantia dos produtos está prevista nos contratos de fornecimento com as concessionárias de energia elétrica. A expectativa é de que não se tenha que utilizá-la. “Nossa visão é que temos que oferecer um produto altamente confiável ao cliente de forma que o cliente não precise exercer essa garantia” (Entrevistado 6). Essa garantia pode ser exercida por meio de uma manutenção no campo ou pela substituição dos medidores defeituosos. A substituição completa de um medidor defeituoso, em detrimento de uma manutenção no campo, depende de uma série de fatores, tais como custos, prazos, reflexos na imagem da empresa perante o cliente, e é tomada normalmente pela área comercial, ouvindo a área de engenharia e de produção.

Quando necessário, dependendo do cliente, a Nansen manda um novo produto em garantia, faz a substituição. Ela também melhorou bastante o processo de assistência técnica. A gente vê que hoje isso é um fator que faz diferença. A assistência técnica não é encarada como um negócio para a empresa, mas ela entende que esse é um fator fundamental para garantir a satisfação do cliente. (Entrevistado 1).

A qualificação da equipe de suporte técnico às vendas também sofreu alterações, permitindo classificar o treinamento como uma atividade de inovação, uma vez que se tornou necessária para a efetiva implantação dos produtos e processos tecnologicamente novos, de acordo com a OCDE (2004).

Na equipe que dá suporte técnico a vendas, sim. O pessoal tem que ser especializado, [tem que ser] muito conhecedor da aplicação do medidor e da forma de trabalhar com o medidor, na sua programação, na coleta de dados e mais, em pequenos problemas que aparecem [no campo]. (Entrevistado 3).

Os medidores eletrônicos trouxeram a necessidade de utilização de matérias-primas diferentes das que eram adquiridas no ambiente eletromecânico. As compras passaram a ser feitas em locais diferentes, em quantidades diferentes e sob condições totalmente novas para a área

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de logística, tais como compras em lotes definidos pelos fornecedores e não de acordo com a necessidade de produção e adoção de processos intermediários de gravação de software.

A área de logística, principalmente com a incorporação de novos produtos, novos itens na lista de materiais e até uma decisão de como fazer isso, interno, compra e repassa, compra pronto, foram decisões que foram tomadas e que impactaram a forma de trabalhar da organização. (Entrevistado 4).

Outra mudança importante diz respeito ao desenvolvimento dos fornecedores, para que atendam aos requisitos da qualidade. Nesse aspecto, os entrevistados destacaram a atuação ativa da área de Qualificação de Fornecedores, em parceria com a Engenharia Industrial.

Na estrutura do [medidor] eletromecânico tinha uns caras aqui de dentro que [saíam da empresa e] montavam uma empresinha aqui fora e começavam a fornecer para Nansen. Essa é uma cultura que não funciona no [setor] eletrônico; os processos são diferentes. (Entrevistado 4).

As competências individuais Para implantar a mudança tecnológica, a empresa buscou no mercado pessoas com maior domínio da tecnologia eletrônica. Ela também reviu os processos internos de produção, admitindo que a produção do medidor eletrônico é diferente da produção do eletromecânico. Os cuidados com manuseio, com armazenamento, com os fornecedores teriam que ser diferentes dos adotados no medidor eletromecânico, com uma área de produção diferente e um processo também diferente. Essas mudanças foram feitas de forma incremental, à medida que a empresa percebia a necessidade. De acordo com os depoimentos, ela dava pequenos passos na direção da oportunidade revelada e avaliava os resultados. Os passos seguintes eram dados de acordo com os resultados obtidos nesse passo inicial, e com as novas percepções das oportunidades ou dos problemas que tivessem surgido nessa mudança.

Essas ações estão de acordo com os estudos de Silva e Fleury (2003), que defendem o processo da estratégia como o de dar passos deliberados (ou realizar mudanças) tendo em vista determinado objetivo, medir e avaliar os efeitos dos passos e ajustar (se necessário) o objetivo, decidindo os próximos passos.

Nessa linha, a empresa percebeu que tinha algumas dificuldades na organização dos processos, com perdas por falhas operacionais,

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processos mal-estruturados e um sistema de acompanhamento pouco adequado. A partir dessa percepção, ela iniciou um trabalho voltado para os aspectos relacionados ao comportamento gerencial, caracterizado basicamente por treinamentos em capacidade gerencial.

Para Ruas (2003), as competências individuais incluem também as competências gerenciais,

É exatamente nessa dimensão que aparecem as oportunidades de desenvolvimento de competências em todos os níveis, pois é a partir das competências gerenciais e individuais que se atinge as dimensões organizacional e funcional. (Entrevistado 4).

A tarefa de desenvolver as competências dos gerentes na Nansen foi preparada e conduzida por uma empresa de consultoria. Os funcionários que ocupavam cargos ou posições de coordenação de pessoas, tais como os gerentes, supervisores, coordenadores e líderes, foram entrevistados. Foi realizado um mapeamento geral das habilidades, conhecimentos e atitudes existentes e das que deveriam ser desenvolvidas nessas pessoas, tomando como base uma condição idealizada pelo presidente e corroborada pela assessoria. O plano de formação e treinamento elaborado consistiu em quatro períodos de imersão de três dias para 25 funcionários selecionados, em que o conhecimento, as habilidades e as atitudes eram estimulados e desenvolvidos por meio de técnicas de trabalho em grupo, jogos de desafios, atividades de desenvolvimento de confiança e de atividades de desenvolvimento de relacionamento interpessoal. O foco desse treinamento foi o desenvolvimento de técnicas gerenciais, tais como planejamento, administração de tempo, gestão de conflitos profissionais, aprendizagem e outras.

Por ocasião do encerramento da pesquisa, a Nansen estava elaborando a segunda etapa desse treinamento, um projeto para identificação e desenvolvimento das competências necessárias, com a perspectiva de implantação ao longo dos dois ou três anos seguintes.

Quanto às demais competências individuais, não apenas gerenciais, os relatos dos entrevistados foram congruentes. Todos disseram ser necessário para o desempenho de suas funções possuírem o conhecimento formal, que variara em tipo de acordo com a área de atuação de cada um deles. Foram citadas pelos entrevistados as seguintes áreas de conhecimento formal: engenharia; eletricidade; eletrônica; software; produção; economia; análise de custos e reflexos no balanço; e negociação. As áreas de conhecimento que cada entrevistado citou apresentavam íntima relação com sua atuação, ou seja, os profissionais

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das áreas de engenharia citaram os conhecimentos de eletricidade, eletrônica, software, os de vendas e aqueles que atuam em compras citaram negociação, custos, balanço e assim por diante.

A análise das respostas apresenta uma concentração em conhecimentos formais técnicos, relacionados aos medidores eletrônicos e ao eletromecânico que ainda são fabricados na empresa. No entanto, o destaque para análise de custo, balanço e correlações, na área financeira, demonstra uma preocupação de áreas não financeiras com os resultados e a lucratividade da empresa a tal ponto que a requalificação da formação educacional seja considerada importante pelos entrevistados.

O conhecimento técnico generalista citado por dois entrevistados descreve a preocupação em possuir os conhecimentos necessários ao negócio sem, no entanto, se concentrar nos detalhes tecnológicos envolvidos.

Também se constatou que a empresa tem um forte apelo pelos conhecimentos empíricos, advindos do aprendizado formal (escolas, universidades), valorizando-os regiamente. Nessa perspectiva, a valorização dos diplomas pela empresa incentiva os funcionários a buscarem a aquisição do saber formal. A empresa também possui um programa de bolsas de ensino para curso superior, em que ela subsidia até 50% das mensalidades para alguns de seus funcionários. A seleção dos elegíveis a esta bolsa é feita por indicação das gerências e está atrelada a um plano de formação de sucessores em cada área da empresa.

Com relação ao saber-ser, que deve ser entendido como saber social, que mobiliza estratégias e raciocínios complexos, interpretações e visões de mundo, as respostas “[...] ter um pouco de psicologia, de tal forma que você possa levar as pessoas.” (Entrevistado 3); “[...] conhecer os mecanismos de motivação, vai ajudar as pessoas a criarem um processo de motivação que vai levá-las a produzir mais, isso para mim é essencial.” (Entrevistado 4); “[...] liderança muito importante, motivação e liderança; começaria por isso.” (Entrevistado 6); coincidem com o conceito dessa categoria.

Os dados coletados permitem concluir que existe um desequilíbrio entre as três vertentes da competência na empresa pesquisada, com uma forte tendência para o conhecimento formal. Isso pode se dever ao momento de virada tecnológica da empresa e sua preocupação com o desenvolvimento de know-how. Contudo, é necessário que a empresa atente para as outras competências se desejar manter-se competitiva. 144 Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 121-148 • Jan/Fev/Mar 2010

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CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao final deste trabalho torna-se mais fácil justificar a escolha da empresa Nansen como objeto de estudo. Apesar de alguns pesquisadores considerarem que a metodologia de estudo de caso único pode trazer pouca contribuição aos temas estudados, o caso escolhido revela-se singularmente representativo da importância desse tipo de empresa para a economia dos países em crescimento.

Ao abandonar a postura estratégica do tipo reativa e adotar um posicionamento ofensivo e analítico, na busca pela liderança do mercado, a Nansen deu início a um processo de geração de conhecimento não apenas tecnológico, mas também de outros tipos, como: canais mais eficazes tanto na comunicação interna quanto com clientes e fornecedores, processos de transmissão de competências, cooperação entre áreas e processos de pós-vendas mais eficientes.

As mudanças introduzidas na empresa revelam, ainda, como as competências organizacionais, funcionais e estratégicas estão articuladas e se alimentam mutuamente. Processos de aprendizagem não acontecem apenas nos espaços formais, como em sala de aula, o que nos permite entender a competência, conforme Perrenoud (1999), como uma característica da espécie humana com sua capacidade de criar respostas novas, adquiridas por meio de aprendizados construídos coletivamente.

O que se evidencia por meio da fala dos sujeitos é o entendimento da importância da acumulação de conhecimentos e soluções criativas, de forma a possibilitar que os trabalhadores se desenvolvam e se insiram em um ambiente de aprendizagem constante.

A presença de competências organizacionais seletivas, conforme proposição de Ruas (2003) foi identificada no relacionamento comercial com os clientes, para a antecipação das necessidades do mercado, para as correções e adaptações dos medidores ao longo do processo de desenvolvimento, e para a manutenção da relação de confiança entre empresa e clientes.

Mesmo diante dos problemas de qualidade experimentados em algumas situações com os clientes, a confiança na capacidade de solução da empresa foi conquistada. Essa competência organizacional seletiva é, portanto, um diferencial da empresa, que dela se utiliza para conseguir vantagens competitivas em relação aos concorrentes.

Novas competências funcionais foram desenvolvidas em todas as áreas, mas, especialmente na de vendas e de suporte técnico, para melhor atender os clientes no que se refere às questões de instalação, uso e manutenção dos novos medidores. Administração: Ensino e Pesquisa • Rio de Janeiro • v. 11 • n. 1 • p. 121-148 • Jan/Fev/Mar 2010 145

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Quanto às competências individuais, a Nansen adotou uma nova prática de gestão de pessoas, concentrando nas gerências a responsabilidade pelo planejamento, administração de tempo, gestão de conflitos e aprendizagem. Percebe-se, pelos achados da pesquisa, que a empresa está empenhada em buscar critérios, procedimentos e estratégias que a auxiliem na tarefa de identificar, reduzir ou controlar os riscos dos seus projetos, também buscando um ciclo de aprendizagem na base que estrutura seus negócios.

Cabe salientar que um das limitações da pesquisa foi ter centrado sua coleta de dados junto ao quadro diretivo, em função de restrições estabelecidas pela empresa naquele momento. Para estudos futuros sugere-se ampliar o universo da pesquisa. REFERÊNCIAS ALVIM, C. Companhia Paulista de Força e Luz – CPFL, CPFL reduz perdas comerciais com furto de energia para menos de 2%. Revista Eletrônica Canal Energia, 2003. Disponível em: <http:// www.canalenergia.com.br > Acessado em: 25/06/2003.

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POLÍTICA EDITORIAL FOCO A revista Administração: Ensino e Pesquisa é uma publicação que busca difundir o estado da arte do ensino e da pesquisa em Administração, oportunizando a apresentação em forma de artigos, teorias, modelos, pesquisas e retrospectivas que abordem o processo de ensino-aprendizagem e intensifiquem o aprendizado dos alunos em disciplinas dos cursos de Administração. ESTILO Os trabalhos enviados para a revista Administração: Ensino e Pesquisa devem ser inéditos nacional e internacionalmente e demonstrar uma linguagem clara e objetiva, não podendo estar em avaliação paralela em outros veículos de divulgação. Recomenda-se atenção especial com a estrutura geral do artigo e com o contexto lógico dos argumentos.

Os artigos encaminhados para a revista Administração: Ensino e Pesquisa deverão ser apresentados no seguinte formato: Editor de texto: Word for Windows 6.0 ou posterior. 1

• Configuração das páginas

o Tamanho do papel: A4 (29,7 x 21 cm) o Margens: superior 3cm, inferior 2cm, esquerda 3cm e direita 2 cm; o Espaçamento: Simples (entre caracteres, palavras e linhas); o Número de palavras: O artigo deve conter entre 5.000 e 10.000 palavras, excluindo-se o resumo e o abstract, as ilustrações, as referências e as notas de final de texto. OBSERVAÇÕES • Conteúdo da primeira página

o Título do trabalho centralizado, em português e inglês. o Resumo em português e inglês, contendo o objetivo do trabalho, o método utilizado, os resultados obtidos e as conclusões com no mínimo 10 (dez) e no máximo 15 (quinze) linhas; seguido de palavras-chave e keywords (no mínimo três e no máximo cinco palavras-chave).

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o As ilustrações, tabelas, quadros e gráficos não poderão ser coloridos e deverão ser enviados em formato editável (Word, Power Point ou Excel) com fonte tamanho 10.

• As referências completas deverão ser apresentadas em ordem alfabétical ao final do texto, de acordo com as normas da ABNT.

• As notas devem ser reduzidas ao mínimo necessário e serem apresentadas ao final do texto sequencialmente depois das referências.

• Trabalhos publicados em decorrência de atividades financiadas por quaisquer órgãos de fomento, por exemplo, CNPq, CAPES, dentre outros, deverão, necessariamente, fazer menção ao apoio recebido, após as referências, com as seguintes notas: a) se publicado individualmente: “O presente trabalho foi realizado com o apoio da (Nome da Instituição)’’; b) se publicado em co-autoria: “Beneficiário de auxílio financeiro da (Nome da Instituição)’’. Os artigos que não estiverem dentro de tais parâmetros serão remetido aos autores solicitando que os envie novamente em formato adequado. ENVIO DO TRABALHO Os artigos podem ser enviados em português, espanhol, inglês ou francês e deverão ser encaminhados por meio da homepage da ANGRAD (www.angrad.org.br/revista/artigos/insert/) Os artigos submetidos à Administração: Ensino e Pesquisa com identificação dos autores no corpo do texto serão automaticamente desconsiderados, tendo em vista que as informações para identificação dos autores são solicitadas na página para submissão do artigo, além de levar em consideração que a revista segue o processo de blind review na avaliação dos trabalhos. PROCESSO DE AVALIAÇÃO Os artigos enviados para publicação na revista Administração: Ensino e Pesquisa são submetidos a um processo de avaliação, objetivando divulgar as melhores contribuições recebidas e avaliadas até o momento da finalização do exemplar.

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O processo de avaliação da revista Administração: Ensino e Pesquisa inicia com uma avaliação do editor que observará a adequação do artigo à política editorial da revista. O editor encaminhará os artigos para avaliadores seguindo um processo de revisão sem identificação de autor e revisor, no qual os avaliadores recebem um relatório com aspectos a serem observados no artigo. Os critérios analisados estão listados abaixo e são aplicados com base na natureza e no tipo do compuscrito. Originalidade e importância das principais ideias; • Qualidade do tratamento e relevância da literatura existente; • Qualidade de apresentação das ideias; • Concepção e execução dos métodos de pesquisa; • Contribuição do artigo para o avanço do conhecimento.

Na análise, destacam pontos importantes que justificam a sua avaliação, contribuindo para o aperfeiçoamento do trabalho do autor.

Os comentários dos avaliadores são enviados ao autor para que realize as sugestões recebidas. Feitas as melhorias, o artigo retorna aos avaliadores que farão nova avaliação, indicando ou não a publicação do trabalho.

Após ser aceito para publicação, o artigo passa por uma revisão ortográfica e estilística profissional. É por tudo isso fortemente recomendado que os autores solicitem a opinião crítica de algum colega antes do envio do artigo.

O editor poderá rejeitar artigos que não apresentem condições mínimas ou que não estejam alinhados com a política da revista sem a necessidade de apresentar pareceres de modo a agilizar a submissão do trabalho em outros periódicos. PROCESSO DE ESCOLHA Por ser um veículo nacional, a revista Administração: Ensino e Pesquisa publicará sempre artigos de autores oriundos de toda a federação.

Após a análise e aprovação dos avaliadores, o editor da Revista procurará sempre selecionar para publicação em cada fascículo artigos de autores vinculados as instituições das mais diversas localidades do país.

A revista se permite o direito de publicação em cada fascículo de um artigo internacional que também passará pelos mesmos critérios de avaliação.

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DIREITOS AUTORAIS Ressaltamos que as opiniões emitidas nos textos publicados são de total responsabilidade de seus respectivos autores. Todos os direitos de reprodução, tradução e adaptação estão reservados.

Quando o trabalho for aprovado para publicação, os autores serão comunicados por e-mail e receberão uma carta para a cessão de direitos autorais e autorização para publicação em meio eletrônico, em nome da Administração: Ensino e Pesquisa, esta deverá ser preenchida por cada um dos autores do trabalho, assinada e remetida em formato digitalizado via e-mail. Também é necessário o envio de um breve currículo de cada um dos autores, no qual deverá constar: nome completo; titulação acadêmica; instituição de afiliação; cidade; estado; país; áreas de interesse em pesquisa; endereço completo e e-mail.