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GAIA INOVAÇÃO E APRENDIZAGEM O GAIA (Grupo de Apoio à Inovação e Aprendizagem em Sistemas Organizacio- nais) é um grupo de pesquisas aplicadas sediado na Divisão de Gestão de Empresas do CTI, cujo propósito é contribuir para o desenvolvimento sustentável de empresas brasileiras, orientando-as para o uso do ca- pital intelectual disponível e para o cresci- mento profissional e pessoal de seus cola- boradores. Acredita-se que dessa maneira seja possível apoiar inovações organizacio- nais e tecnológicas que incrementem a sus- tentabilidade dessas organizações. Um dos objetivos do GAIA é disseminar informações de interesse para os seus pú- blicos-alvos, razão de ser deste livro e dos outros três volumes da série “Gestão da Sus- tentabilidade Organizacional”. A proposta desses quatro volumes é registrar alguns dos vários temas que foram abordados em palestras realizadas nos anos de 2010, 2011 e 2012, no âmbito de um dos projetos mais conhecidos do GAIA para difusão de conhe- cimento, denominado Manhãs da Inovação. As Manhãs da Inovação são eventos abertos ao grande público, que a partir de 2004 são realizados mensalmente no audi- tório do CTI. Desde 2010 esse projeto vem recebendo aporte de recursos do CNPq o que permite também a filmagem e a sua disponibilização na Internet. Esses conteúdos e outros relacionados com os temas de interesse estão disponí- veis em: http://www.cti.gov.br/tecnologias-gaia-dtsd AUTORES Organizador principal Marco Antonio Silveira Organizadoras Nanci Gardim Sylvia Regina Trindade Yano Autores de capítulos Ana Claudia Moreira Cardoso Angela Macedo Magalhães Bruno César Kawasaki Catarina Fátima Laborda Claudio Marcelo Brunoro Denise Razzouk Elza Maria de Souza Frida Marina Fischer Ivan Bolis João Silvestre da Silva-Junior Johan Hendrik Poker Júnior José Agnaldo Gomes Kenneth Nunes Tavares de Almeida Laerte Idal Sznelwar Lídice Miranda Santos Marcelo de Andrade Pinheiro Marco Antonio Silveira Nanci Gardim Odair Furtado Renata Coelho Vieira Renata Leatriz de Campos Temps Sylvia Regina Trindade Yano Tereza Aparecida Asta Gemignani SOBRE O CTI O Centro de Tecnologia da Informação Re- nato Archer (CTI) é uma unidade de pesqui- sas do Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovação (MCTI), com sede na cidade de Campinas-SP. A profunda interação tanto com setores acadêmicos, por meio de di- versas parcerias em pesquisa, como com o setor produtivo, em vários projetos de coo- peração, mantém o CTI no estado da arte em seus principais focos de atuação, com- preendendo áreas como gestão, sistemas, tecnologias assistivas, componentes ele- trônicos, microeletrônica, software e aplica- ções de Tecnologia da Informação (TI). Visite o site da instituição: www.cti.gov.br ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E SUSTENTABILIDADE EM ORGANIZAÇÕES: Saúde, Segurança e Qualidade de Vida no Trabalho ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E SUSTENTABILIDADE EM ORGANIZAÇÕES: Saúde, Segurança e Qualidade de Vida no Trabalho ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E SUSTENTABILIDADE EM ORGANIZAÇÕES Esta obra é o quarto volume de uma série de coletâneas de artigos focados na promoção de organizações sustentáveis, aqui entendidas como aquelas que contribuem para o desenvolvimento sócioeconômico pois que geram riquezas econômicas com benefícios sociais. O primeiro volume, “Gestão da sustentabi- lidade organizacional: desenvolvimento de eco-sistemas colaborativos”, lançado no final de 2011, trata do gerenciamento de eco-sistemas organizacionais, que são conjuntos de organizações públicas, privadas e do terceiro setor que inte- ragem dinamicamente entre si para viabilizar a produção de bens e serviços. O segundo volume intitulado “Gestão da sustentabilidade organizacional: inova- ção, aprendizagem e capital humano”, lançado em 2012, é focado no nível da organização considerada em sua individualidade, explorando maneiras de via- bilizar a inserção do capital humano em estratégias organizacionais. O terceiro volume, “Inovação para desenvolvimento de organizações sustentáveis” é de 2013 e tem como foco principal as relações entre trabalho e fatores psicossociais, em suas vertentes organizacional e econômico-financeira. Este quarto volume apresenta onze capítulos cobrindo uma gama mais abrangente de temas, orga- nizados em três seções: “Ambiente saudável: impulsionador da sustentabilidade organizacional”, “Fundamentos e indicadores nas tomadas de decisões sobre am- biente de trabalho e trabalhador” e “Fatores psicossociais e influências na dinâmica do trabalho”. Esta é uma obra resultante do esforço colaborativo empreendido por profissionais pertencentes a renomadas instituições brasileiras que traba- lham para a implantação de uma rede de estudos e pesquisas sobre aspectos psicossociais no trabalho. São instituições públicas e privadas com interesse no desenvolvimento ou nos resultados de novos conhecimentos e de práticas rela- cionadas com os múltiplos fatores associados à dimensão subjetiva do trabalho e seus impactos na saúde dos trabalhadores e no desempenho organizacional, bem como os impactos sócio-econômicos decorrentes, em especial, nos siste- mas de saúde e previdenciário. Marco Antonio Silveira (organizador principal) Nanci Gardim Sylvia Regina Trindade Yano (organizadoras)

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GAIAINOVAÇÃO E APRENDIZAGEM

O GAIA (Grupo de Apoio à Inovação e Aprendizagem em Sistemas Organizacio-nais) é um grupo de pesquisas aplicadas sediado na Divisão de Gestão de Empresas do CTI, cujo propósito é contribuir para o desenvolvimento sustentável de empresas brasileiras, orientando-as para o uso do ca-pital intelectual disponível e para o cresci-mento profissional e pessoal de seus cola-boradores. Acredita-se que dessa maneira seja possível apoiar inovações organizacio-nais e tecnológicas que incrementem a sus-tentabilidade dessas organizações.

Um dos objetivos do GAIA é disseminar informações de interesse para os seus pú-blicos-alvos, razão de ser deste livro e dos outros três volumes da série “Gestão da Sus-tentabilidade Organizacional”. A proposta desses quatro volumes é registrar alguns dos vários temas que foram abordados em palestras realizadas nos anos de 2010, 2011 e 2012, no âmbito de um dos projetos mais conhecidos do GAIA para difusão de conhe-cimento, denominado Manhãs da Inovação.

As Manhãs da Inovação são eventos abertos ao grande público, que a partir de 2004 são realizados mensalmente no audi-tório do CTI. Desde 2010 esse projeto vem recebendo aporte de recursos do CNPq o que permite também a filmagem e a sua disponibilização na Internet.

Esses conteúdos e outros relacionados com os temas de interesse estão disponí-veis em:

http://www.cti.gov.br/tecnologias-gaia-dtsd

AUTORESOrganizador principalMarco Antonio Silveira

OrganizadorasNanci GardimSylvia Regina Trindade Yano

Autores de capítulosAna Claudia Moreira CardosoAngela Macedo MagalhãesBruno César KawasakiCatarina Fátima LabordaClaudio Marcelo BrunoroDenise RazzoukElza Maria de SouzaFrida Marina FischerIvan BolisJoão Silvestre da Silva-JuniorJohan Hendrik Poker JúniorJosé Agnaldo GomesKenneth Nunes Tavares de AlmeidaLaerte Idal SznelwarLídice Miranda SantosMarcelo de Andrade PinheiroMarco Antonio SilveiraNanci GardimOdair FurtadoRenata Coelho VieiraRenata Leatriz de Campos TempsSylvia Regina Trindade YanoTereza Aparecida Asta Gemignani

SOBRE O CTI O Centro de Tecnologia da Informação Re-nato Archer (CTI) é uma unidade de pesqui-sas do Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovação (MCTI), com sede na cidade de Campinas-SP. A profunda interação tanto com setores acadêmicos, por meio de di-versas parcerias em pesquisa, como com o setor produtivo, em vários projetos de coo-peração, mantém o CTI no estado da arte em seus principais focos de atuação, com-preendendo áreas como gestão, sistemas, tecnologias assistivas, componentes ele-trônicos, microeletrônica, software e aplica-ções de Tecnologia da Informação (TI).

Visite o site da instituição: www.cti.gov.br

ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E SUSTENTABILIDADE

EM ORGANIZAÇÕES:

Saúde, Segurança e Qualidade de Vida no Trabalho

ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E SUSTENTABILIDADE EM ORGANIZAÇÕES:

Saúde, Segurança e Qualidade de Vida no Trabalho

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Esta obra é o quarto volume de uma série de coletâneas de artigos focados na promoção de organizações sustentáveis, aqui entendidas como aquelas que contribuem para o desenvolvimento sócioeconômico pois que geram riquezas econômicas com benefícios sociais. O primeiro volume, “Gestão da sustentabi-lidade organizacional: desenvolvimento de eco-sistemas colaborativos”, lançado no final de 2011, trata do gerenciamento de eco-sistemas organizacionais, que são conjuntos de organizações públicas, privadas e do terceiro setor que inte-ragem dinamicamente entre si para viabilizar a produção de bens e serviços. O segundo volume intitulado “Gestão da sustentabilidade organizacional: inova-ção, aprendizagem e capital humano”, lançado em 2012, é focado no nível da organização considerada em sua individualidade, explorando maneiras de via-bilizar a inserção do capital humano em estratégias organizacionais. O terceiro volume, “Inovação para desenvolvimento de organizações sustentáveis” é de 2013 e tem como foco principal as relações entre trabalho e fatores psicossociais, em suas vertentes organizacional e econômico-financeira. Este quarto volume apresenta onze capítulos cobrindo uma gama mais abrangente de temas, orga-nizados em três seções: “Ambiente saudável: impulsionador da sustentabilidade organizacional”, “Fundamentos e indicadores nas tomadas de decisões sobre am-biente de trabalho e trabalhador” e “Fatores psicossociais e influências na dinâmica do trabalho”. Esta é uma obra resultante do esforço colaborativo empreendido por profissionais pertencentes a renomadas instituições brasileiras que traba-lham para a implantação de uma rede de estudos e pesquisas sobre aspectos psicossociais no trabalho. São instituições públicas e privadas com interesse no desenvolvimento ou nos resultados de novos conhecimentos e de práticas rela-cionadas com os múltiplos fatores associados à dimensão subjetiva do trabalho e seus impactos na saúde dos trabalhadores e no desempenho organizacional, bem como os impactos sócio-econômicos decorrentes, em especial, nos siste-mas de saúde e previdenciário.

Marco Antonio Silveira(organizador principal)

Nanci GardimSylvia Regina Trindade Yano(organizadoras)

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Marxismo e descendência · 1

ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E SUSTENTABILIDADE EM ORGANIZAÇÕES:

SAúDE, SEGURANÇA E qUALIDADE DE vIDA NO TRABALhO

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ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E SUSTENTABILIDADE EM

ORGANIZAÇÕES:

SAúDE, SEGURANÇA E qUALIDADE DE vIDA NO TRABALhO

Organizador principalMarco A. Silveira

OrganizadorasNanci Gardim

Sylvia Regina Trindade Yano

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Organizador principalMarco Antonio Silveira

OrganizadorasNanci Gardim

Sylvia Regina Trindade Yano

Autores de capítulosAna Claudia Moreira CardosoAngela Macedo Magalhães

Bruno César KawasakiCatarina Fátima LabordaClaudio Marcelo Brunoro

Denise RazzoukElza Maria de SouzaFrida Marina Fischer

Ivan BolisJoão Silvestre da Silva-JuniorJohan hendrik Poker Júnior

José Agnaldo GomesKenneth Nunes Tavares de Almeida

Laerte Idal SznelwarLídice Miranda Santos

Marcelo de Andrade PinheiroMarco Antonio Silveira

Nanci GardimOdair Furtado

Renata Coelho vieiraRenata Leatriz de Campos Temps

Sylvia Regina Trindade YanoTereza Aparecida Asta Gemignani

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Impresso no Brasil, janeiro de 2014

Copyright © 2014 by Marco Antonio Silveira

Os direitos desta edição pertencem ao CTI (Centro de Tecnologia da Informação “Renato Archer”) Rodovia Dom Pedro I, Km 143,6 – 13069-901 – Campinas SP, BrasilTelefone de contato: +55 (19) 3746-6083E-mail de contato: [email protected]ço eletrônico: http://www.cti.gov.br/gaia

OrganizadoresMarco Antonio SilveiraNanci GardimSylvia Regina Trindade Yano

Gestão EditorialCEDET – Centro de Desenvolvimento Profissional e Tecnológico Ltda.

RevisãoThomas Perroni

EditoraçãoMaurício Amaral

Imagem de fundo da capa© hugolacasse | Dreamstime.com

Reservados todos os direitos desta obra.Proibida toda e qualquer reprodução desta edição por qualquer meio ou forma, seja ela eletrônica ou mecâ-nica, fotocópia, gravação ou qualquer outro meio de reprodução, sem permissão expressa do editor.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Marco Antonio Silveira (organizador principal); Nanci Gardim e Sylvia Regina Trinda-de Yano (organizadoras)

Aspectos Psicossociais e Sustentabilidade em Organizações: saúde, segurança e qualidade de vida no trabalho; Organização de Marco Antonio Silveira; Nanci Gardim; Sylvia Regina Trindade Yano – Campinas, SP: CTI (Centro de Tecnologia da Informação “Renato Archer”), 2014.

ISBN 978-85-65163-04-0

1. Gestão Organizacional 2. Saúde Ocupacional 3. Inovação Tecnológica. 4. Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer. I. Título.

CDD – 658.406

Índices para Catálogo Sistemático:1. Gestão Organizacional – 658.4062. Saúde Ocupacional - 6133. Inovação Tecnológica – 338.064

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SUMÁRIOPrefácioDra. Julietta Rodríguez-Guzmán ....................................................................................................... 13

seção i - ambiente saudável: impulsionador da sustentabilidade organizacional

Capítulo 1: Desenvolvimento sócio-econômico e aspectos psicossociais nas organizações. Marco Antonio Silveira e Nanci Gardim ................................................................................................27

Capítulo 2: Prevenção dos transtornos mentais relacionados ou não ao trabalho: ações para a prática nas organizações. Sylvia Regina Trindade Yano e Elza Maria de Souza ...........................................................................45

Capítulo 3: Gestão de riscos associados a fatores psicossociais: definições conceituais e práticas de intervenção do SESI Nacional e do Departamento Regional da Bahia. Kenneth Nunes Tavares de Almeida, Lídice Miranda Santos, Angela Macedo Magalhães e Catarina Fátima Laborda ......................................................................63

Capítulo 4: Proposições para superar os desafios para identificar a relação entre o capital humano e a performance organizacional. Johan Hendrik Poker Junior .....................................................................................................................79

seção ii – fundamentos e indicadores nas tomadas de decisões sobre ambiente de trabalho e trabalhador

Capítulo 5: A intensificação como peça fundamental no mecanismo de agravos psicossociais do trabalho. Renata Coelho Vieira ................................................................................................................................93

Capítulo 6: Meio-ambiente de trabalho saudável e desenvolvimento sustentável: a importância dos marcos legais. Tereza Aparecida Asta Gemignani......................................................................................................... 115

Capítulo 7: Indicadores sobre riscos psicossociais no trabalho. Ana Claudia Moreira Cardoso .............................................................................................................. 129

seção iii – fatores psicossociais e influências na dinâmica do trabalho

Capitulo 8: Capital mental e produtividade: estratégias de redução do impacto econômico dos transtornos mentais no ambiente de trabalho. Marcelo de Andrade Pinheiro e Denise Razzouk ................................................................................ 147

Capítulo 9: A mediação dos fatores psicossociais do trabalho no absenteísmo-doença por transtornos mentais. João Silvestre da Silva-Junior e Frida Marina Fischer .........................................................................159

Capítulo 10: Trabalhar em um contexto de sustentabilidade: uma visão da ergonomia da atividade e da psicodinâmica do trabalho. Claudio Marcelo Brunoro, Laerte Idal Sznelwar, Ivan Bolis e Bruno César Kawasaki ................... 177

Capítulo 11: Trabalho, subjetividade e saúde mental dos trabalhadores. Odair Furtado, José Agnaldo Gomes e Renata Leatriz de Campos Temps ....................................... 197

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SOBRE OS AUTORES

Marco Antonio Silveira (Organizador principal) Doutor em sistemas de gestão (UNICAMP), reconhecido pelo CNPq como pesquisador de alta produtividade nível DT-2, com mais de 90 publicações e coordenação de diversos projetos de inovação e qualidade de vida em empresas. Experiência em gestão tecnológica, empresarial e acadêmica através de atividades de direção, assessoria, ensino e pesquisa em empresas, universidades e unidades de pesquisa. Experiência docente em diversos cursos de pós-graduação (na UNICAMP, PUC-Campinas, UNISAL, INPG, entre outros). Orienta pesquisadores de vários níveis, inclusive em projetos de pós-doutorado. É pesquisador da Divisão de Gestão de Empresas do CTI/MCTI de onde coordena o GAIA/CTI.

Nanci Gardim (Co-Organizadora) Mestre em Política Científica e Tecnológica pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Atualmente trabalha em questões relacionadas com relações cooperativas, gestão da inovação, fluxo e Gestão do Conhecimento, Transferência de Tecnologia e Propriedade Intelectual. Trabalhou por dois anos na Agência de Inovação da Unicamp (Inova Unicamp) e, desde outubro de 2010, é pesquisadora do Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer – instituição vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.

Sylvia Regina Trindade Yano (Co-Organizadora) Mestre em Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente pelo SENAC/SP. Trabalhou por 26 anos no Departamento Nacional do SESI – especialista em SST. Pesquisadora convidada do GAIA/CTI. Professora do Curso de Especialização em Segurança do Trabalho – UNIP/Brasília e Goiânia. Cirurgiã-dentista – Faculdade de Odontologia do Planalto Central de Brasília. Enfermeira pela Universidade Federal do Paraná. Especialista em Saúde Pública pelo Centro São Camilo de Administração da Saúde. Especialista em Enfermagem do Trabalho pelo Centro São Camilo de Administração da Saúde. Especialista em Odontologia do Trabalho pelo Conselho Federal de Odontologia. Especialista em Educação Ambiental pela Universidade Católica de Brasília.

Ana Claudia Moreira Cardoso Pós-doutorado pelo CRESPPA - Centre de Recherche Sociologique et Politique de Paris e membro do grupo responsável por elaborar uma pesquisa sobre Riscos Psicossociais no Trabalho, coordenado pelo Ministério do Trabalho Francês. Doutora pela Universidade de São Paulo e pela Universidade de Paris VIII, França. Trabalha no DIEESE (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) desde 1990 e atualmente é Professora Titular da Escola DIEESE de Ciências do Trabalho. Em 2009, publicou o livro “Tempos de trabalho, tempos de não trabalho: disputas em torno da jornada do trabalhador”.

Angela Macedo Magalhães Coordenadora do Setor de Promoção da Saúde no Serviço Social da Indústria – SESI – Bahia e Responsável Técnica pelo Programa de Prevenção ao Uso Indevido de Drogas no SESI-Bahia. Especialista em Ergonomia pela Universidade Federal de Minas Gerais, em Saúde e Segurança no Trabalho pela Universidade Federal da Bahia, Administração e Qualidade em Saúde pela Universidade Federal da Bahia, Gestão de Projetos pela Fundação Getúlio Vargas. Graduada em Enfermagem pela Universidade Federal da Bahia.

Bruno César Kawasaki Graduado e mestrando em Engenharia de Produção pela Escola Politécnica da USP. É pesquisador na área de Trabalho, Tecnologia e Organização nos temas ergonomia, psicodinâmica do trabalho, organização do trabalho e sustentabilidade. Tem experiência em gestão de desastres.

Catarina Fátima Laborda Coordenadora do Programa Arte na Empresa entre outros projetos do SESI-Ba, como o Festival SESI Música, Festival SESI Literário e Encontro de Corais. Pós-Graduada em Coreografia pela UFBA e Especialização em Estudos Avançados do Lazer pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG Graduada em Dança pela Universidade Federal da Bahia – UFBA. Organizou as publicações Antologia Poética do Trabalhador da Indústria, XIV Concurso de Poesia, 1º Festival SESI Literário e Teatro-Fórum e Pedagogia da Intervenção na Indústria.

8 | ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E SUSTENTABILIDADE EM ORGANIZAÇÕES

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SOBRE OS AUTORES | 9

Claudio Marcelo Brunoro Engenheiro de Produção pela Escola Politécnica da USP. Mestre em Engenharia Elétrica pela Escola Politécnica da USP. Doutorando em Engenharia de Produção pela Escola Politécnica da USP, pesquisador na área de Trabalho, Tecnologia e Organização nos temas ergonomia, psicodinâmica do trabalho, organização do trabalho e sustentabilidade.

Denise Razzouk Médica psiquiatra, com mestrado e doutorado pelo Depto de Psiquiatria da Unifesp e Pós-doutorado em Economia em Saúde Mental pelo King´s College (Univ. Londres). Professora afiliada do Depto. de Psiquiatria da UNIFESP sendo orientadora do seu Programa de Pós-graduação e Coordenadora do seu Centro de Economia em Saúde Mental (CESM). Professora Titular da Disciplina de Psiquiatria na Unimes. Atua como pesquisadora na área de economia da saúde, avaliação de serviços de saúde mental, custos, “burden” e impacto econômico e social dos transtornos mentais em diferentes setores da sociedade, avaliação de intervenções em saúde mental, esquizofrenia e outros transtornos psicóticos, custo-efetividade de psicotrópicos.

Elza Maria de Souza Médica (pela UFPA) com mestrado em Epidemiologia (pela UnB) e doutorado em Saúde Coletiva e Promoção da Saúde (pela Universidade de Londres). Professora-adjunta da UnB. Especialização em saúde do idoso pela Universidade de Southampton. Professora-adjunta e pesquisadora do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Saúde da Universidade de Brasília – UnB. Atuou na Secretaria de Estado de Saúde (DF) como médica na atenção básica e como cardiologista. Atuou também como Diretora do Centro de Desenvolvimento de Recursos Humanos para a Saúde.

Frida Marina Fischer Professora Titular do Departamento de Saúde Ambiental, Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. Editora Associada da Revista de Saúde Pública. Presidente da Working Time Society e chair do Sub-Comitê da ICOH "Shiftwork and working time". Atua na área de saúde do trabalhador, com os seguintes temas: trabalho em turnos e noturno, doenças relacionadas com o trabalho, envelhecimento funcional precoce, trabalho de jovens.

Ivan Bolis Engenheiro de Produção pela Escola Politécnica da USP e Engenheiro Industrial pelo Politécnico di Milano. Doutorando e Mestre em Engenharia de Produção pela Escola Politécnica da USP, pesquisador na área de Trabalho, Tecnologia e Organização nos temas ergonomia, organização do trabalho e sustentabilidade.

João Silvestre da Silva-Junior Médico pela Universidade de Pernambuco, Especialista em Medicina do Trabalho pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP), Doutorando e Mestre em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. Perito Médico do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) do Ministério da Previdência Social. Coordenador adjunto e professor do Curso de Especialização em Medicina do Trabalho da FCMSCSP. Diretor Científico Adjunto da Associação Paulista de Medicina do Trabalho.

Johan Hendrik Poker Júnior Professor de Administração Financeira da Faculdade de Ciências Aplicadas da UNICAMP, coordenador associado dos cursos de Administração e Administração Pública. Pós-doutorado no CTI Renato Archer, mestre e doutor em Administração de Empresas pela UPM, bacharel em Estatística pela UNICAMP, líder do LabFiC – Laboratório de Finanças e Contabilidade –, participante do GAIA-CTI como pesquisador. Possui ampla experiência profissional tendo atuado nas áreas financeiras em empresas como Shell, Itaú e Redecard.

José Agnaldo Gomes É doutor em Psicologia Social e do Trabalho pela Universidade de São Paulo. Atualmente é professor do curso de Psicologia da FACHS/PUC-SP. Atua na área de Psicologia do Trabalho, com ênfase em Desenvolvimento Social e Saúde do Trabalhador, atuando principalmente nos seguintes temas: participação social, organização social, pessoas em situação de rua e organização política, cortadores de cana-de-açúcar, qualidade de vida no trabalho e desenvolvimento solidário. É pesquisador do NUTAS e autor dos livros: “Do trabalho penoso à dignidade no trabalho: o itinerário de canavieiros da psicologia do trabalho” (Ideias e Letras, 2010) e “A comuna da terra: utopia e alternativa” (Abya-Yala, 2005).

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Kenneth Nunes Tavares de Almeida Gerente do Núcleo Estratégico do SESI-Ba; Pós-Doutor em Administração pela FEA – USP; Doutor em Administração pela Universidade Federal de Lavras/Instituto Superior de Economia Gestão – Portugal; Mestre em Administração pela Universidade Federal de Minas Gerais e Psicólogo pela Universidade Federal da Bahia.

Laerte Idal Sznelwar Graduação em Medicina pela UNICAMP, doutorado em Ergonomia pela Conservatoire National des Arts et Metiers e pós-doutorado no Laboratoire de Psychologie du Travail et de l'Action du CNAM. Professor na faculdade de Engenharia de Produção da POLI/USP. Tem experiência Ergonomia, Saúde do Trabalhador, Psicodinâmica do Trabalho. Integrante do Grupo de Pesquisas Trabalho, Tecnologia e Organização do Trabalho.

Lídice Miranda Santos Assessora de Desenvolvimento para Gestão Empresarial Socialmente Responsável – SESI-Ba. Mestranda em Desenvolvimento Profissional e Gestão Social (CIAGS/UFBA), graduada em Pedagogia pela Faculdade de Educação da Bahia, pós-graduada em Educação pela Universidade do Estado da Bahia, e em Gestão de Iniciativas Sociais com ênfase em Responsabilidade Social/Universidade Federal do Rio de Janeiro. Formada pelo Grupo Multirreferencial – abordagem para se trabalhar com grupos.

Marcelo de Andrade Pinheiro Psicólogo clínico, professor de psicologia de graduação, pós-graduação e programas internacionais da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP), onde coordena a disciplina Psicologia I e orienta trabalhos de conclusão de curso de graduação. Mestre em psicologia (PUC-SP), Pesquisador do CESM (Centro de Economia em Saúde Mental) da UNIFESP. Suas atividades de ensino e pesquisa abrangem os temas ansiedade e depressão e seus impactos econômicos, psicológicos e sociais no trabalho; avaliação de intervenções em saúde mental; os sentidos do trabalho, motivação, engajamento e desempenho; aconselhamento de carreira; análise transacional e psicanálise.

Odair Furtado É doutor em Psicologia Social pela PUC-SP e ministra aulas nesta universidade desde 1983. É professor associado e, no momento, coordenador do Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Social desta universidade. No programa também coordena o Núcleo de Pesquisa e Estudos em Trabalho e Ação Social (NUTAS). É autor do livro “Trabalho e Solidariedade” (Cortez) e co-autor do “Psicologias: uma introdução ao estudo da psicologia”. Sua linha de pesquisa atual é o Trabalho e as Dimensões Subjetivas da Realidade.

Renata Coelho Vieira Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina. Procuradora do Ministério Público do Trabalho. Pós-graduada a título de Aperfeiçoamento em Direito do Trabalho (UNIVALI/SC e AMATRA XII). Pós-graduanda em Economia do Trabalho e Sindicalismo pela UNICAMP. Representante da COORDIGUALDADE/MPT (Coordenadoria de Promoção de Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação no Trabalho) na PRT da 15ª região (Campinas/SP).

Renata Leatriz de Campos Temps Mestre em Psicologia Social pela PUC SP. Professora na Anhanguera Educacional –Unidade Jundiaí, e na Faculdade Pitágoras, também em Jundiaí. Ministra disciplinas de Consultoria Interna e Processos em Recursos Humanos, Psicologia Existencial e Filosofia da Educação. Participa de projetos no Núcleo de Pesquisa e Estudos em Trabalho e Ação Social (Nutas) – PUC-SP. Sua linha de pesquisa é o Trabalho e as Dimensões Subjetivas da Realidade.

Tereza Aparecida Asta Gemignani Ingressou na magistratura em 1988, atuando como desembargadora desde 2006, escolhida pelo critério de merecimento. Doutora em Direito do Trabalho pela Faculdade de Direito (USP), pós-graduação stricto sensu, pesquisadora e professora universitária, é membro integrante do corpo docente e atual vice-diretora da Escola da Magistratura do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª região – Campinas. Autora de livros e vários artigos jurídicos publicados em revistas especializadas, é presidente do Conselho Editorial da Revista do TRT da 15ª região, ocupando a cadeira nº 70 da ANDT – Academia Nacional de Direito do Trabalho.

10 | ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E SUSTENTABILIDADE EM ORGANIZAÇÕES

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PREFACIO 1

Dra. Julietta Rodríguez- GuzmánMD SOH MScA SO Asesora regional en Salud de los

Trabajadores y los Consumidores Organización Panamericana de la Salud/Organización Mundial de la Salud OPS/OMS

Correo electrónico: [email protected]

Todas las personas en edad de trabajar tenemos derecho a un trabajo decente, saludable y productivo en condiciones de libertad, equidad, seguridad y dignidad humana (OIT, 2014). 2 El trabajo realizado en estas condiciones contribuye sustancialmente a la identidad de la persona, proveyendo el ingreso para ella y su familia, y dándole la oportunidad de realizar contribuciones significativas a su vida en comunidad (Rodríguez-G., J., 2012). 3 El trabajo además es fuente de cinco categorías de experiencia psicológica que promueven el bienestar y la salud mental de las personas: i) la estructuración del tiempo (eliminando cargas psicológicas mayores); ii) el contacto social (por el intercambio con compañeros y colegas de trabajo); iii) los propósitos y esfuerzos colectivos (ofreciendo un contexto social por fuera de la familia); iv) la identidad social (elemento fundamental para auto-definirse); y v) las regularización de actividades de la persona (dando organización a la vida cotidiana) (OMS, 2005) 4. Estas premisas permiten comprender la profunda inter-relación entre el desempeño y la productividad, con la salud y el bienestar de la persona que trabaja.

No obstante, la introducción de la globalización, la apertura internacional de mercados, el desarrollo de la tecnología de la información y la tercerización de empleos y servicios, entre otros, han generado muchos cambios en los procesos de

1 A tradução do Prefácio para português está disponível na página 19.2 OIT (2014) Programa de trabajo decente. Consulta virtual realizada en Enero 30/2014, disponible en línea en: http://ilo.org/global/about-the-ilo/decent-work-agenda/lang--es/index.htm 3 Rodríguez-Guzmán, J. Impacto de los riesgos psicosociales en la salud de las trabajadoras del sector de la salud. 1er Congreso Internacional de Riesgos Psicosociales, Estrés Trabajo. OPS. Facultad de Psi-cología. Universidad de los Andes. RIPSOL Bogotá, Agosto 2012 4 World Health Organization (2005) Mental Health Policies and Programmes in the Workplace [Men-tal Health Policy and Service Guidance Package] ISBN 92 4154679 4 (NML classification: WA 495) WHO Library Cataloguing-in-publication data. WHO China

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trabajo, requiriendo cambios y re-definiciones de roles y condiciones de trabajo de la población trabajadora (OPS, 2007). 5 Por ejemplo, la modificación de las condiciones de empleo y trabajo que trajo la tercerización (empleos tradicionalmente ofrecidos y contratados directamente por empresas o instituciones de servicios pero ahora contratados por terceros), desencadenaron graves consecuencias tales como la inestabilidad o inseguridad laboral, la restricción o exclusión de la protección social, las dificultades de comunicación entre empleadores y trabajadores, la alteración de las cargas del trabajo (físicas y mentales) y la angustia del trabajador y su familia (OPS, 2003 6; Rodríguez-Guzmán, J., 2002). 7 Es decir, con la presencia de trabajos de menor calidad, de tiempo parcial, con salarios bajos o inferiores a su capacidad, incluso a veces no remunerado, se logró consolidar la precarización del trabajo y disminuir la calidad de vida de los y las trabajadoras y sus familias.

Esto ha afectado el bienestar y la salud mental de los trabajadores. Desde la declaración de Tokio en 1998, se reconoce que los cambios económicos y tecnológicos en los puestos de trabajo contribuyen a incrementar el estrés en el trabajo y gran variedad de desórdenes mentales en el lugar de trabajo, reconocidos como “Condiciones clínicas significativas caracterizadas por alteraciones del pensamiento, las emociones o el comportamiento, asociadas con angustia o disfuncionalidad” (WHO/ILO, 2000). 8 Mayoritariamente son la resultante de una mezcla compleja de factores biológicos, psicológicos, sociales y ambientales, así como los contenidos del trabajo que conjuntamente contribuyen a que haya o no presencia de trastornos mentales, tales como diferentes formas de depresión, ansiedad, abuso de sustancias y estrés (OMS, 2005). Todos tienen grave impacto sobre la salud individual y colectiva. Afectan a los individuos y sus familias, sus compañeros de trabajo; y en general, a la sociedad y las comunidades a las que pertenecen. Su desempeño laboral se merma por incremento del ausentismo, la reducida productividad y el incremento de costos de atención de salud para solventarlos (4, 5). Sin embargo, la salud ocupacional y la medicina del trabajo por tradición han dado mayor atención a los riesgos de la salud física que al bienestar y la salud mental.

Por tanto, teniendo en consideración la extensión de los problemas de salud mental y su omnipresencia en la vida de la persona trabajadora, desde el 2000 la

5 OPS (2007) Evaluación del Plan regional de salud de los trabajadores: 10 anos de experiencias. Docu-mento de trabajo, Washington, DC6 Tennassee, M. (2003) Salud mental y trabajo: Una visión desde la OPS. Palencia en: Hemispheric Conference on Work and Mental Health, Mexico City, Mexico October 20037 Rodríguez-Guzmán, J. (2002) Riesgos Ocupacionales de los trabajadores de la salud. En: Memorias del II Congreso Centro Americano y del Caribe de Salud Ocupacional FECACSO, San José, Costa Rica, 20028 Harnois, G. & Gabriel, Ph. (2000) Mental Health and work: Impact, issues and Good Practices. Na-tions for Mental health. World Health Organization and International Labour Organization. WHO/MSD/MPS/00.2 Limited distribution. Available only in English. WHO Geneva

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OMS y la OIT reconocen la atención de las enfermedades mentales de la fuerza de trabajo como una prioridad de atención (WHO/ILO, 2000). Se estimaba entonces, que cinco de la diez causas de discapacidad a nivel mundial se debían a problemas mentales mayores tales como depresión, esquizofrenia, desórdenes bipolares, desórdenes obsesivo-compulsivos y adicción al alcohol/drogas; que junto con otras afecciones como el estrés, la ansiedad y la depresión, tenían graves impactos en la salud y el desempeño en el trabajo, por lo cual debían intervenirse en el lugar de trabajo (WHO/ILO, 2000). Desde entonces juntos OMS y OIT, han venido diseñando múltiples estrategias e intervenciones para atender a los trabajadores que padecen de estas enfermedades.

Para el 2001 la OMS indicaba que en cualquier momento 450 millones de personas padecían de trastornos mentales o neurológicos, siendo el orden de prevalencia de 121 millones con depresión, 70 millones con problemas por alcohol, 50 millones con epilepsia, 37 millones con Alzheimer y 24 millones con esquizofrenia. Para el 2002 se adicionaron entre 10 y 20 millones de intentos de suicido, siendo que 815.000 efectivamente lo lograron. Encima de esta carga, se agrega el sufrimiento adicional por causa del estigma, la discriminación y la violación a los derechos humanos de las personas que sufren este tipo de problemas, que en muchos casos se detecta en la discriminación en el lugar de trabajo, el rechazo laboral o las restricciones para el aseguramiento o los servicios de salud para las y los trabajadores (5, 6, 7).

Para el caso de América Latina y el Caribe, en el 2009 OPS estimaba que el 25% de las personas –es decir -1 de cada 4- padecía uno o más trastornos mentales o del comportamiento a lo largo de su vida (Rodríguez, J, et al., 2009) 9. Indicaba también que los trastornos mentales y neurológicos que en 1990 representaban el 8.8% de la carga de la enfermedad de la región, se incrementaron a 22.2% en el 2002, demostrando la importancia y la carga de estas enfermedades, así como la necesidad de su detección y control (OPS, 2009). 10 Desde la perspectiva laboral, – es decir de los trastornos mentales causados por el trabajo – , son pocos los países que han incluido las enfermedades y trastornos mentales en sus listados profesionales (solo Colombia,Chile y Brasil), aspecto que poco ayuda a su reconocimiento y prevención (3). No hay precisión sobre las cifras de estos trastornos a nivel de los países, ni entre sectores económicos, aunque viene aumentando el número de estudios que recogen la evidencia, además de los registros de discapacidad que ellos ocasionan. De hecho, la OIT estimaba en el 2003 que 7% del costo total de todos los accidente de trabajo y las

9 Rodríguez, J., Kohn, R & Levav, I. (2009) Epidemiologia de los trastornos mentales en América Latina y el Caribe. Cap. 3. En: Rodríguez, J. (Ed.) Salud mental en la Comunidad. Organización Panamericana de la Salud. Serie PALTEX para Ejecutores de programas de Salud No. 49. Washington, DC OPS 200910 Organización Panamericana de la Salud (2009) Estrategia y Plan de Acción sobre Salud mental. Reso-lución No. 49 del Consejo directivo. CD 49/11 (Esp.) Washington DC 2009

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enfermedades profesionales se atribuían a las enfermedades mentales en el trabajo. Los sectores de la educación y de la salud han sido bastantes estudiados por causa de

estos problemas. Por ejemplo, el Instituto Nacional de Seguridad y Salud Ocupacional realizó una serie de estudios en los hospitales en Estados Unidos (NIOSH, 2009), 11 indicando que el estrés detectado era causado por varios estresores, siendo que desde el ámbito organizacional, los más comunes eran los niveles insuficientes de personal, largas horas de trabajo, el trabajo en turnos, la ambigüedad de roles y la exposición a sustancias e infecciones peligrosas. También destacaba que los estresores variaban entre profesiones y ocupaciones según los tipos de tareas realizadas; la calidad, las creencias y las presiones del cargo; y la carga de trabajo matizada por el menor soporte y la baja disponibilidad de recursos. Las reacciones más gravosas detectadas en esta población fueron: psicológicas (irritabilidad, insatisfacción laboral y depresión); comportamentales (problemas de sueño y ausentismo); y físicas (cefaleas, dolor de estómago, alteraciones de la presión arterial); pero también se registraron Síndromes de estrés post-traumático por eventos traumáticos agudos, así como errores médicos y retiro prematuro del trabajo.

Sin embargo, co-existen otros riesgos como las diferentes formas de violencia que convergen en el lugar de trabajo, las diferentes formas de acoso (sicológico, sexual, de genero), y las agresiones van desde amenazas verbales, gestuales, corporales o escritas; hasta asaltos a la integridad física (cachetadas, golpes), atracos, violaciones u homicidios con el uso de bombas, armas de fuego o armas blancas (NIOSH, 2012; 12 Rodríguez-G., J., et al 2002) 13 Sus consecuencias individuales van desde el trauma físico menor hasta las lesiones físicas graves, la discapacidad física temporal y permanente, hasta el trauma psicológico y la muerte. Y también tienen efectos en la organización produciendo baja moral en la fuerza de trabajo, aumento del estrés, los retiros y la pérdida de la confianza en la administración y los compañeros de trabajo por un ambiente de trabajo muy hostil.

También es importante mencionar el síndrome de desgaste profesional (burnout) en el que diferentes condiciones sociodemográficas como el género, demostraron tener relación con la impulsividad, la agresividad, la ira y agresividad física de la violencia entre trabajadores, así como la consistente expectativa de las mujeres jóvenes de sufrir agotamiento profesional entre los grupos de estudio analizados (Pando et

11 NIOSH (2009) Exposures to Stress: Occupational Hazards in Hospitals. Department of Health and Human Services. Centers for disease Control and Prevention. National Institute for Occupational Safety and Health. Safer healthier people. DHHS (NIOSH) Publication No. 2008-136 12 CDC (2012) Occupational Violence. Work Safety and Health topics. Disponible en línea y recabado el 31 de julio de 2012 en: http://www.cdc.gov/niosh/topics/violence/13 Rodríguez –Guzmán, J. et al. (2001) Modulos de prevención de la violencia en el trabajo. FISO. Bogotá

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al., 2011). 14 Los autores destacan la pregunta sobre la causa del futuro sombrío que vislumbran las mujeres jóvenes con agotamiento emocional, despersonalización, falta de realización y ser víctimas de violencia en su futuro profesional, sin tener claridad en la respuesta, e invitando a realizar más investigación sobre el tema.

Otro problema que amerita especial mención es la depresión. Desde 1990, el estudio de carga de la enfermedad de la OMS y la Universidad de Harvard, la catalogaron como la segunda causa de morbilidad en el mundo (Murray et al, 1996). 15 Muchas de las condiciones de trabajo y de empleo antes descritas, son capaces de alterar los estados de ánimo en forma permanente y desencadenar en las mujeres en general y en las trabajadoras de la salud en particular, uno o varios de los tipos de depresión que hoy se reconocen: a) Trastorno Depresivo Mayor o Grave –unipolar o depresión clínica-; b) Trastorno Depresivo Menor –distimia-; y c) Enfermedad Maniaco-Depresiva o bipolar. Se estima que la cantidad de mujeres que sufren de depresión son casi el doble de los hombres (NIMH, 2009). 16 También se considera que las mujeres tienen una mayor cantidad de situaciones de estrés que se dan cuando convergen sus responsabilidades primordiales asumidas en el hogar y en el trabajo, que se agravan cuando se divorcian o separan, junto con otros factores culturales agravantes como la raza, la etnia y la pobreza. Por tanto, cada caso debe ser considerado en forma individual. También suelen coexistir con otras enfermedades, particularmente anorexia nerviosa, bulimia, trastornos de ansiedad (síndromes post-traumáticos, trastornos obsesivo-compulsivos, trastornos de pánico y fobia social), consumo de sustancias psicoactivas –aunque en menor proporción- y otras enfermedades mayores como la diabetes, el cáncer o el SIDA (Córdoba, et a., 2011). 17

Por todo lo anterior, resulta fundamental que este tipo de problemas se detecten en el trabajo lo más pronto posible. Por un lado, un tratamiento temprano y adecuado ayuda a la persona a salir adelante satisfactoriamente; y por el otro, entre más temprano se inicie del tratamiento hay mayor la probabilidad de reversión del problema. Asimismo, este manejo debe acompañarse de acciones para corregir los factores de riesgo del empleo o del trabajo, tanto a nivel organizacional (organización del trabajo, jerarquías y niveles de mando, comunicaciones, responsabilidades, etc.) como a nivel individual (compañeros de trabajo, comportamientos, lenguaje,

14 Pando M., Rodríguez, MC & Aranda, C. (2011) Factores psicosociales de riesgos ocupacional en es-tudiantes y profesionales de enfermería. Estudio transcultural México-Bolivia. Universidad de Guada-lajara. Consejo Nacional de Ciencia y Tecnología CONACyT. Primera edición. ISBN: 978-607-00-5199-9 México. 15 Murray CJL, Lopez AD, Eds. The Global Burden of Disease: A Comprehensive Assessment of Mor-tality and Disability from Diseases, Injuries, and Risk Factors in 1990 and Projected to 2020. Boston, Massachusetts: Harvard School of Public Health; 1996.16 National Institute of Mental health (2009) Women and depression. Discovering hope.17 Córdoba, JJ, Fuentes, A & Ruiz R, C. (2011) Revisión bibliográfica sobre características sociodemo-gráficas y repercusiones de la depresión en el trabajador. Med Segur Trab (Internet) 2011; 57 (223) 174-187

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relaciones sociales, etc.). Si bien los Programas de Asistencia al Empleado suelen ser una alternativa de ayuda, se requiere definir oportunamente la necesidad de referir al trabajador a los especialistas para dar el apoyo con psicoterapia y tratamiento farmacológico. Asimismo, las redes sociales en el lugar de trabajo y el hogar pueden brindar apoyo emocional, escucha y entendimiento, paciencia y de estímulo/ánimo, atendiendo a la persona sin menospreciarla en la escucha, focalizando en la palabra para incorporarla a su realidad laboral y social.

Evidentemente se trata de un tema de la salud de los trabajadores que demanda incrementar su investigación y ampliar la evidencia para la toma de decisiones en la materia a nivel nacional y de las empresas. Por estas razones, es con gran beneplácito que la OPS reconoce y felicita el esfuerzo mancomunado de la Red Brasileña de estudios e investigaciones sobre los factores psicosociales en el trabajo, para hacer evidente los problemas de salud mental y trabajo que tiene la fuerza de trabajo del Brasil; sus esfuerzos en materia de investigación sobre intervenciones para prevenir los daños al bienestar y la salud mental; y su inagotable esfuerzo para continuar en la búsqueda de intervenciones que apoyen el trabajo decente, el bienestar , la salud y la vida de la fuerza de trabajo del Brasil.

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Dra. Julietta Rodríguez-Guzmán

MD SOH MScA SO, assessora regional em Saúde dos Trabalhadores e Consumidores, Organização Panamericana da Saúde/Organização

Mundial da Saúde (OPS/OMS); [email protected]

Todas as pessoas com idade para trabalhar têm o direito a um trabalho decente, saudável e produtivo em condições de liberdade, eqüidade, segurança e dignidade humana. 1 O trabalho realizado nessas condições contribui substancialmente para a identidade da pessoa, proporcionando renda para ela e sua família, dando-lhe a oportunidade de fazer contribuições significativas para a vida em comunidade. 2 Além disso, o trabalho é fonte de cinco categorias de experiência psicológica que promovem o bem-estar e a saúde mental das pessoas: 1) a estruturação do tempo (eliminando cargas psicológicas maiores); 2) o contato social (pelo intercâmbio com os companheiros e colegas de trabalho); 3) os propósitos e esforços coletivos (oferecendo um contexto social fora da família); 4) a identidade social (elemento fundamental para se auto-definir); e 5) as regularizações de atividades da pessoa (dando organização à vida cotidiana). 3 Estas premissas permitem compreender a profunda inter-relação entre o desempenho e a produtividade, com a saúde e o bem-estar da pessoa que trabalha.

Não obstante, a introdução da globalização, a abertura internacional de mercados, o desenvolvimento da tecnologia da informação e a terceirização de empregos e serviços, entre outros, têm gerado muitas mudanças nos processos de trabalho, requerendo alterações e redefinições de papéis e condições de trabalho da população trabalhadora. 4 Por exemplo,

1 OIT (2014), Programa de trabajo decente, disponível em: http://ilo.org/global/about-the-ilo/decent--work-agenda/lang--es/index.htm, acesso em: 30/01/2014.2 RODRÍGUEZ-GUZMÁN, J. Impacto de los riesgos psicosociales en la salud de las trabajadoras del sector de la salud. 1º Congresso Internacional de Riscos Psicossociais, estresse e trabalho. OPS, Facul-dade de Psicologia, Universidade de Los Andes. RIPSOL, Bogotá, agosto de 2012.3 World Health Organization (WHO), Mental Health Policies and Programmes in the Workplace [Men-tal Health Policy and Service Guidance Package]. ISBN 92 4154679 4 (NML classification: WA 495) WHO Library Cataloging-in-publication data. WHO China, 2005.4 OPS, Evaluación del Plan regional de salud de los trabajadores: 10 anos de experiencias. Documento de trabajo, Washington, DC, 2007.

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a modificação das condições de emprego e trabalho que gerou a terceirização (empregos tradicionalmente oferecidos e contratados diretamente pelas empresas ou instituições de serviços, agora contratados por terceiros), desencadearam graves conseqüências tais como a instabilidade ou insegurança laboral, a restrição ou exclusão da proteção social, as dificuldades de comunicação entre empregadores e trabalhadores, a alteração das cargas do trabalho (físicas e mentais), a angústia do trabalhador e sua família. 5 Ou seja, com a presença de trabalhos de menor qualidade, de tempo parcial, com salários baixos ou inferiores à capacidade do trabalhador, por vezes, até mesmo não remunerado, consolidou-se a precarização do trabalho e reduziu-se a qualidade de vida dos trabalhadores e suas famílias.

Isso afetou o bem-estar e a saúde mental dos trabalhadores. A partir da declaração de Tókio, em 1998, reconheceu-se que as mudanças econômicas e tecnológicas ocorridas nos postos de trabalho contribuem para o aumento do estresse no trabalho e para uma grande variedade de desordens mentais relacionadas ao trabalho, reconhecidas como “condições clí-nicas significativas caracterizadas por alterações do pensamento, das emoções ou do compor-tamento, associadas com angústia ou disfuncionalidade”. 6 Majoritariamente são resultantes de uma mescla completa de fatores biológicos, psicológicos, sociais e ambientais, assim como os conteúdos do trabalho que conjuntamente contribuem para que ocorra ou não a presença dos transtornos mentais, tais como diferentes formas de depressão, ansiedade, abuso de subs-tâncias e estresse (WHO, 2005). Todos têm grave impacto sobre a saúde individual e coletiva. Afetam os indivíduos e suas famílias, seus colegas de trabalho e em geral, a sociedade e as comunidades a que pertencem. O desempenho laboral diminui face ao aumento do absente-ísmo, a redução da produtividade e o incremento dos custos na atenção à saúde. Contudo, a saúde ocupacional e a medicina do trabalho, por tradição, têm dado maior atenção aos riscos referentes à saúde física do que ao bem-estar e à saúde mental.

Portanto, levando-se em consideração a extensão dos problemas de saúde mental e sua onipresença na vida da pessoa trabalhadora, desde 2000 a OMS e a OIT reconhecem como uma prioridade de atenção, as enfermidades mentais da força de trabalho (WHO/ILO, 2000). Foi então estimado que, em nível mundial, cinco entre as dez causas de incapacidade para o trabalho eram problemas mentais maiores tais como depressão, esquizofrenia, desordens bipolares, desordens obsessivo-compulsivas e dependência de álcool/drogas, que junto com outras afecções como o estresse, a ansiedade e a depressão, tinham sérios impactos sobre a saúde e o desempenho laboral, exigindo intervenção no local de trabalho (WHO/ILO, 2000). Desde então, juntos OMS e OIT vêm desenvolvendo múltiplas estratégias e intervenções para ajudar os trabalhadores que sofrem dessas doenças.

5 TENNASSEE, M. Salud mental y trabajo: Una visión desde la OPS. Palestra em Hemispheric Confe-rence on Work and Mental Health, Cidade do México, México, outubro de 2003; e RODRÍGUEZ-GUZ-MÁN, J. “Riesgos Ocupacionales de los trabajadores de la salud”. In Memorias del II Congreso Centro Americano y del Caribe de Salud Ocupacional FECACSO, San José, Costa Rica, 2002.6 HARNOIS, G.; GABRIEL, P. “Mental Health and work: Impact, issues and Good Practices”. Nations for Mental Health. World Health Organization and International Labour Organization. WHO/MSD/MPS, Genebra, 2000.

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Em 2001, a OMS indicava que 450 milhões de pessoas padeciam de transtornos mentais ou neurológicos, com uma prevalência de 121 milhões com depressão, 70 milhões com problemas relacionados ao consumo de álcool, 50 milhões com epilepsia, 37 milhões com Alzheimer e 24 milhões com esquizofrenia. Para 2002 se acrescentou entre 10 e 20 milhões de tentativas de suicídio, sendo que 815.000 efetivamente ocorreram. Acrescenta-se a essa carga, o sofrimento por causa do estigma, da discriminação e da violação dos direitos humanos das pessoas que sofrem deste tipo de problema, destacando-se que muitas vezes ocorre, no local de trabalho, a rejeição do trabalhador ou ainda restrições ao seguro e aos serviços de saúde.

Em relação à América Latina e ao Caribe, em 2009 a OPS estimava que 25% das pessoas – 1 em cada 4 – padecia de um ou mais transtornos mentais ou de comportamento durante a vida. 7 Indicava também que os transtornos mentais e neurológicos que em 1990 representavam 8.8% da carga de doenças da região, aumentou para 22.2% em 2002, demostrando a importância dessas enfermidades, assim como a necessidade de detecção e controle. 8 Na perspectiva laboral – transtornos mentais causados pelo trabalho –, são poucos os países que têm incluído as enfermidades e transtornos mentais nas suas listas de doenças professionais (somente Colômbia, Chile e Brasil), aspecto que pouco ajuda no reconhecimento e prevenção. Não se possui dados precisos sobre a ocorrência desses transtornos em nível de país ou setores econômicos, assim como registros de incapacidade que ocasionam embora venham aumentando o número de estudos que coletam evidências. De fato, a OIT estimou em 2003 que 7% do custo total de todos os acidentes de trabalho e doenças ocupacionais foram em decorrência à doença mental relacionada ao trabalho.

Os setores da educação e da saúde têm sido bastante estudados em relação a esses problemas. Por exemplo, o Instituto Nacional de Segurança e Saúde Ocupacional realizou uma série de estudos nos hospitais dos Estados Unidos, 9 indicando que o estresse detectado era causado por vários estressores, sendo que no âmbito organizacional, os mais comuns eram o quantitativo insuficiente de pessoal, longas jornadas de trabalho e trabalho em turnos, a ambigüidade de papéis e a exposição a substâncias e infecções perigosas. Também destacava que os estressores variavam entre profissões e ocupações segundo os tipos de tarefas realizadas, a qualidade, as crenças e as pressões do cargo; e a carga de trabalho era agravada pelo menor suporte e a baixa disponibilidade de recursos. As reações mais graves detectadas nessa população foram: psicológicas (irritabilidade, insatisfação no trabalho e depressão), comportamentais (alterações de sono e absenteísmo) e físicas (cefaléias, dores no estômago, alterações da pressão arterial); foram também registrados síndromes de estresse

7 RODRÍGUEZ-GUZMÁN, J.; KOHN, R.; LEVAV, I. “Epidemiologia de los trastornos mentales en América Latina y el Caribe”. In RODRÍGUEZ-GUZMÁN, J. (org.), Salud mental en la Comunidad. Or-ganização Panamericana da Saúde, série PALTEX para Executores de Programas de Saúde, nº 49, Wa-shington, DC 2009.8 ORGANIZAÇÃO PANAMERICANA DA SAÚDE (OPS), Estrategia y Plan de Acción sobre Salud mental. Resolução nº 49 do Conselho diretivo, Washington, DC, 2009.9 NIOSH, Exposures to Stress: Occupational Hazards in Hospitals. Department of Health and Human Services, Centers for Disease Control and Prevention, National Institute for Occupational Safety and Health, Safer Healthier People. In DHHS (NIOSH) Publication, nº 136, 2009.

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pós-traumático por eventos traumáticos agudos, assim como erros médicos e aposentadoria prematura do trabalho.

No entanto, outros riscos coexistem como as diferentes formas de violência que convergem no ambiente de trabalho, as diferentes formas de assédio (psicológico, sexual e de gênero), essas agressões vão desde ameaças verbais, gestuais, corporais ou mesmo escritas até ameaças à integridade física (tapas e socos), assalto, estupro ou assassinato com o uso de bombas, armas ou facas. 10 Suas conseqüências individuais vão desde um trauma físico menor até lesões físicas graves, à incapacidade física temporal e permanente, até o trauma psicológico e a morte. Situações como essas também afetam à organização produzindo baixo moral na força de trabalho, aumento do estresse, as faltas e a perda de confiança na administração e nos colegas de trabalho face a um ambiente de trabalho muito hostil.

Também é importante mencionar a síndrome do esgotamento profissional (burnout) em que diferentes condições sócio-demográficas, como o gênero, demostraram ter relação com a impulsividade, a agressividade, a ira e a agressividade física da violência entre trabalhadores, assim como a consistente expectativa das mulheres jovens sofrerem esgotamento profissional entre os grupos de estudo analisados. 11 Os autores destacam a pergunta – qual é a causa desse futuro sombrio? – mulheres jovens com esgotamento emocional, despersonalização, falta de realização e vítimas de violência na vida profissional, sem terem clareza da resposta e convidando a realizar-se mais investigações sobre o tema.

Outro problema que merece especial atenção é a depressão. Em 1990, o estudo da carga da doença realizado pela OMS e Universidade de Harvard, classificou-a como a segunda principal causa de morbidade em todo o mundo. 12 Muitas das condições de trabalho e de emprego anteriormente citadas, são capazes de alterar os estados de ânimo de forma permanente e desencadear nas mulheres, em geral, e nas trabalhadoras da saúde, em particular, um ou vários tipos de depressão: a) Transtorno Depressivo Maior ou Grave – unipolar ou depressão clínica; b) Transtorno Depressivo Menor – distimia; e c) Doença Maníaco-Depressiva – bipolar. Estima-se que a quantidade de mulheres que sofrem de depressão são quase o dobro que de homens. 13 Considera-se que as mulheres enfrentam mais situações de estresse face à convergência de suas responsabilidades primordiais assumidas em casa e no trabalho, agravando-se quando se divorciam ou separam, somadas a outros fatores culturais agravantes como a raça, a etnia e a pobreza. Portanto, cada caso deve ser considerado de forma individual. Muitas vezes coexistem com outras doenças, particularmente anorexia nervosa, bulimia,

10 CDC, Occupational Violence. Work Safety and Health Topics, disponível em: http://www.cdc.gov/niosh/topics/violence/, acesso em: 31/07/2012; e RODRÍGUEZ-GUZMÁN, J. et al., Modulos de preven-ción de la violencia en el trabajo, FISO, Bogotá, 2012.11 PANDO M.,; RODRÍGUEZ, M. C.; ARANDA, C. “Factores psicosociales de riesgos ocupacional en estudiantes y profesionales de enfermería”. Estudo trans-cultural México-Bolivia, Universidade de Gua-dalajara, Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia CONACyT, 1ª ed., México, 2011.12 MURRAY, C. J. L.; LOPEZ, A. D.;(org.). The Global Burden of Disease: A Comprehensive Assessment of Mortality and Disability from Dis-eases, Injuries, and Risk Factors in 1990 and Projected to 2020. Boston, Massachusetts: Harvard School of Public Health, 1996.13 NATIONAL INSTITUTE OF MENTAL HEALTH, Women and depression. Discovering hope, 2009.

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transtornos de ansiedade (síndromes pós-traumáticas, transtornos obsessivo-compulsivos, transtornos de pânico e fobia social), consumo de substâncias psicoativas – ainda que em menor proporção – e outras doenças como o diabetes, o câncer e a Aids. 14

Em face a tudo o que já foi referido é fundamental que este tipo de problema seja detectado no trabalho e o mais cedo possível. Por um lado, um tratamento precoce e adequado ajuda a pessoa a seguir adiante mais facilmente; e por outro, quanto mais cedo se inicie o tratamento, maior a probabilidade de reversão do problema. Além disso, essas situações devem ser acompanhadas por ações de gestão para corrigir os fatores de risco relacionados ao emprego ou ao trabalho, tanto no nível organizacional (organização do trabalho, hierarquias e níveis de controle, comunicação, responsabilidades, etc.) como em nível individual (colegas de trabalho, comportamentos, lingüagem, relações sociais, etc.). Programas de Assistência ao Empregado geralmente são uma ajuda alternativa, sendo necessário definir quanto à necessidade de encaminhamento para especialistas, visando a fornecer apoio com psicoterapia e medicamentos. Além disso, as redes sociais no local de trabalho, assim como as da família podem dar apoio emocional, a escuta e a compreensão, paciência e incentivo/ânimo à pessoa sem menosprezar sua escuta, focalizando na palavra, incorporando-a à sua realidade de trabalho e também social.

Evidentemente trata-se de tema referente à saúde dos trabalhadores que demanda aumento na investigação e ampliação de evidência, visando à tomada de decisões em nível nacional e pelas empresas. Por essas razões, é com grande prazer que a OPAS reconhece e parabeniza o esforço conjunto da Rede brasileira de estudos e pesquisas sobre aspectos psicossociais no trabalho, por evidenciar os problemas de saúde mental relacionados ao trabalho vivenciados pela força de trabalho do Brasil, seus esforços na pesquisa sobre intervenções para prevenir danos ao bem-estar e à saúde mental e seu incansável esforço para continuar a busca por intervenções que apoiem o trabalho decente, o bem-estar, a saúde e a vida da força de trabalho no Brasil.

14 CÓRDOBA, J. J.; FUENTES, A.; RUIZ, R. C. Revisión bibliográfica sobre características sociodemo-gráficas y repercusiones de la depresión en el trabajador, Med Segur Trab (internet), 2011.

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SEÇÃO I

AMBIENTE SAUDÁvEL: IMPULSIONADOR DA SUSTENTABILIDADE ORGANIZACIONAL

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CAPÍTULO 1

Desenvolvimento socioeconômico e aspectos psicossociais nas organizações

Marco antonio Silveira e nanci GardiM

ӹ Introdução

Pesquisas apontam problemas nos modelos organizacionais adotados pela gran-de maioria das empresas em todo o mundo. Vários pesquisadores postulam que, se forem considerados os custos associados às suas externalidades ambientais e sociais, muitas das empresas supostamente “lucrativas” teriam reveladas a sua inviabilidade econômica.

Os prejuízos gerados pelas externalidades sociais negativas, mesmo que alguns impactos sociais sejam de difícil identificação (como por exemplo, sofrimentos emo-cionais e transtornos mentais potencializados por essas empresas), acabam sendo pagos pela sociedade, tanto na forma de custos financeiros nos sistemas de saúde, previdenciário e judiciário trabalhista, como em outras formas de prejuízos menos evidentes, como a diminuição da capacidade produtiva dos trabalhadores afetados, os transtornos gerados na vida dos seus familiares, entre outras.

Houve certamente alguns avanços nas empresas ao longo do século anterior, mas a maioria deles resultantes mais de imposições e restrições legais – como limite a jornada de trabalho, redução de impactos ambientais e respeito à leis trabalhistas – do que de avanços significativos nos conhecimentos sobre a natureza dos sistemas organizacionais e de como aumentar a governabilidade sobre os mesmos.

O conflito capital-trabalho se arrasta por mais de três séculos, e a questão continua concentrada em como “dividir” o lucro. Passamos ao largo das reflexões e proposições consistentes de alternativas melhores aos modelos vigentes. Os modelos adotados em sua maioria não consideram adequadamente os aspectos subjetivos do trabalho e os fatores psicossociais relacionados, presentes em todo sistema organizacional. Trata-se de uma importante falha, que vem cobrando um alto preço a todos os envolvidos.

Neste capítulo são feitas algumas análises sobre impactos dos modelos organi-zacionais baseadas tanto em publicações como em nossos estudos e pesquisas. O

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propósito é refletir sobre os fatores psicossociais com maior potencial para promo-ver, simultaneamente, a competitividade da organização e a qualidade de vida no trabalho. O investimento em fatores com tal característica tende a gerar o desenvol-vimento sustentável da organização com base no enfoque Triple Botton Line – isso é, na busca de equilíbrio no atendimento a demandas econômicas, ambientais e sociais – uma vez que irá beneficiar diretamente os dois principais stakeholders da organi-zação (os seus proprietários e trabalhadores), reduzir a probabilidade de conflitos capital-trabalho, entre outros benefícios socioeconômicos.

O enfoque Triple Bottom Line (TBL) para sustentabilidade, proposto inicialmente por Elkington (1999), quando aplicado às organizações resgata os princípios subja-centes a uma gestão de excelência, na medida em que introduz a necessidade de pen-sar a organização de forma holística, equilibrada e responsável. Constitui-se, portan-to, no fundamento do verdadeiro desenvolvimento socioeconômico na acepção da palavra, isso é, a geração de riquezas integrada com benefícios sociais.

ӹ A importância sócio-econômica das organizações no mundo atual

Toda organização, ou sistema organizacional – entre elas, empresas, universida-des, organizações do terceiro setor, redes organizacionais e institutos de pesquisa –, independentemente de sua natureza, porte ou segmento de atuação, interage con-tinuamente com o seu ambiente externo, de onde importa os recursos para as suas atividades e para onde exporta o resultado dessas atividades, normalmente na forma de produtos, sejam esses bens tangíveis ou não.

Devido à dinâmica do jogo competitivo, ao desenvolvimento tecnológico, à vo-latilidade das condições econômicas e sócio-políticas em vários países, entre outros fatores, as características do ambiente de atuação das organizações mudam rápida e continuamente. Portanto, a inovação – aqui entendida como toda mudança benéfica para a organização – é condição fundamental para que as organizações possam rea-justar o seu nível de competitividade frente às demais forças competitivas presentes no seu ambiente e, assim, mantenham o sucesso ao longo do tempo.

Sucesso deve ser entendido no sentido da organização ser bem-sucedida em seus propósitos, sejam esses propósitos de natureza financeira, social, ou outra qualquer. Mas, se estamos buscando caminhos para que as organizações sejam instrumentos efe-tivos de desenvolvimento sócio-econômico, essas inovações devem ser buscadas consi-derando também a qualidade de vida dos trabalhadores. Uma maior qualidade de vida no trabalho é um fator de aumento do capital intelectual, que se constitui em um pre-cioso recurso no contexto da nova economia, como discutido no item 2 deste capítulo.

A inovação é condição fundamental para o sucesso de organizações (ou, de uma cadeia de suprimentos como um todo) atuando nos mercados atuais, os quais mu-dam continuamente e exigem níveis de desempenho sucessivamente melhores. E a gestão competente do capital humano – componente fundamental na geração e consolidação do capital intelectual – é o fator que alavanca a inovação de produtos, de processos, de serviços e de outros aspectos de interesse para uma organização

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empresarial, como o design de produto, a estrutura organizacional, os métodos ge-renciais, as relações no trabalho entre outros aspectos.

ӹ A natureza dos sistemas organizacionais

As organizações como conhecemos são relativamente recentes, sendo que até o final do século XIX existiam poucas com algum porte ou importância (DAFT, 2002). Mas, atualmente, a importância sócio-econômica das organizações cresceu muito, razão pela qual uma atenção maior à sua atuação deve ser dada, considerando-se não somente a sua viabilidade econômica, como também os impactos ambientais e sociais gerados, em especial, nos seus trabalhadores.

Os impactos das organizações na sociedade se dão em cinco diferentes aspectos:

• Econômico: as riquezas econômicas são geradas pelas atividades empresariais;• Social: os empregos gerados pelas organizações são responsáveis pelo susten-

to financeiro da maioria das famílias;• Relações humanas: as pessoas estão na maior parte do tempo em seus am-

bientes de trabalho;• Desenvolvimento pessoal: o trabalho exerce papel central na vida das pes-

soas, sendo importante fator de realização do potencial humano;• Ambiental: as principais agressões ao meio ambiente têm origem nas ativi-

dades das organizações dos setores primário e secundário.

Vários especialistas em teoria das organizações enfatizam que toda organização é, antes de qualquer coisa, um sistema social e como tal deve ser tratada:

“Organizações são entidades sociais dirigidas por metas, desenhadas como siste-mas de atividades deliberadamente estruturados e coordenados, e são ligadas ao am-biente externo. O principal elemento de uma organização não é um edifício ou um conjunto de políticas e procedimentos: as organizações são compostas por pessoas e seus relacionamentos [...]” (DAFT, 2002; 2011).

As organizações sendo sistemas sociais, a sua “unidade fundamental” é o ser humano que, ao contrário de outros indivíduos – animais e plantas – é dotado de livre-arbítrio. “Livre-arbítrio” pode ser entendido como a capacidade inerente, e in-transferível, de uma pessoa agir de acordo com seus próprios interesses e opções.

Essa afirmação leva à percepção de uma série de conseqüências para os resul-tados de uma organização, entre as quais, a importância de se considerar os múlti-plos aspectos que influenciam o nível de capital humano que pode ser fornecido por cada trabalhador (motivação, liderança, capacitação, entre outras). A existência do livre-arbítrio tem também como conseqüência que para a organização atingir um nível adequado de coerência interna (ou, equilíbrio dinâmico) existem duas grandes vertentes de possibilidades, a saber, mecanismos de coerção e controle, ou, desenvol-vimento de valores e interesses compartilhados pelos trabalhadores.

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Coerção e controle apresentam dois problemas: são ineficientes, pois requerem dispêndio permanente de recursos para o controle (tempo, dinheiro, capital humano, espaço físico) e ineficazes, pois subutilizam o capital humano, tanto dos indivíduos que são controlados como dos indivíduos que controlam. Além disso, os mecanismos de coerção e controle são muito baseados em emoções negativas, como o medo e a in-segurança; e, essas emoções não são sustentáveis, pois é da natureza humana buscar meios de se livrar delas.

É verdade que as alternativas aos mecanismos de coerção e controle também requerem dispêndios de recursos, como aqueles relacionados com a educação dos trabalhadores. No entanto, as experiências demonstram que numa perspectiva de longo prazo, é muito mais vantajoso para o sistema social o investimento em educa-ção (sentido lato da palavra: em empresas, numa família, num país, para recuperação de marginalizados etc.), pelo fato de que cada indivíduo “educado” passa a ser uma nova fonte de capital humano, enquanto que o “indivíduo controlado” requer que o “sistema” drene permanentemente recursos para o seu controle.

ӹ Modelos reducionistas

A grande quantidade de demandas e de atividades internas em uma organização implica que entender que ela é um todo integrado, isso é, um sistema no qual os seus diferentes elementos internos interagem dinamicamente entre si e com os elementos presentes no seu ambiente de atuação, contribui para o aumento da eficácia e efi-ciência organizacional. Nos anos 1960, época em que o pensamento gerencial estava orientado para funções individuais, já havia sido identificada a necessidade de uma forma holística (sistêmica) de se pensar as empresas, articulando-se para isso o con-ceito de estratégia (MONTGOMERY; PORTER, 1998).

O enfoque sistêmico aplicado às organizações, através do qual se busca enten-dê-las como um sistema em transformação, formado por múltiplos níveis de sub-sistemas que são interdependentes e que interagem entre si, oferece um meio efetivo de prover as capacidades estratégicas que são valorizadas pelos clientes e pelos seg-mentos de mercado onde a organização atua, sendo essas capacidades a base para se alcançar e manter uma posição competitiva em longo prazo e as boas condições de trabalho. Mas não é isso que se observa na maioria das empresas atuais. E essa visão reducionista e fragmentada da organização traz uma série de problemas.

Imaginemos um computador que fosse utilizado apenas como uma calculadora para realizar operações aritméticas simples. Além do evidente desperdício de todo o potencial do computador, aquelas partes “menos nobres” do computador, respon-sáveis por operações simples e repetitivas, seriam sobre demandadas, enquanto as demais praticamente não seriam utilizadas, representando uma perda significativa dos investimentos feitos para aquele computador.

Os trabalhadores daquelas empresas que têm na busca do lucro financeiro sua úni-ca razão de existir, são como as partes daquele computador “reduzido” a uma mera cal-culadora aritmética. Com uma diferença significativa: somos seres humanos e, como

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tal, sofremos uma série de conseqüências quando a riqueza do nosso potencial não encontra caminhos para se realizar. Ao se reduzir uma organização complexa apenas como um instrumento gerador de lucros, uma série de conseqüências indesejadas ne-cessariamente irá ocorrer, vitimando em especial os membros da organização, ou seja, os seus trabalhadores dos vários níveis hierárquicos. Como esses trabalhadores fazem parte da sociedade, todos sofrerão impactos diretos (se forem nossos amigos ou fami-liares) ou indiretos das mazelas praticadas dentro das empresas.

Nossa percepção é que esse modelo reducionista perverso ainda se mantém pra-ticamente intacto em todo o mundo principalmente devido a três motivos: a) conve-niência dos detentores do capital, protegida pela conivência dos governantes; b) inca-pacidade de visualizar sistemas complexos, decorrente da formação mecanicista e da ortodoxia acadêmica, incapaz de lidar com objetos de estudos transdisciplinares; c) (como conseqüência) inexistência de referências que ajudem a viabilizar efetivamen-te esses novos modelos.

ӹ Sistemas organizacionais complexos

A complexidade inerente aos sistemas organizacionais requer instrumentos de gestão e de governança adequados a esta realidade. Isso implica buscar caminhos para tornar o pensamento complexo viável aos indivíduos comuns, como o são os gestores e demais trabalhadores da empresa.

A primeira e mais importante mudança é superar a já mencionada perspectiva maniqueísta que legitima a geração do lucro como sendo a única finalidade da em-presa. Mesmo sob um enfoque estritamente gerencial, isso é, mesmo sem qualquer juízo de valor ético ou moral, o paradigma do “lucro a qualquer preço” (que está pro-fundamente arraigado na grande maioria dos gestores) se mostra um grave equívoco. A existência do lucro é condição fundamental para existência e o primeiro sintoma de saúde organizacional. Mas não é a única coisa a se preocupar, e nem a primeira, uma vez que o lucro é “efeito” das atividades. Dirigir uma empresa olhando só para as finanças é algo tão perigoso como pilotar uma aeronave de grande porte olhando só para o tanque de combustível.

As organizações são sistemas complexos em contínua interação com o ambiente externo (o mercado é uma parte importante deste ambiente) nos quais fatores huma-nos, sociais, tecnológicos, mercadológicos e econômicos interagem dinamicamente entre si. As implicações desta constatação são várias, entre as quais:

• Sistemas complexos são virtualmente incontroláveis devido aos múltiplos laços de realimentação existentes, que são de difícil previsibilidade; essa é a razão de os planos raramente se cumprirem exatamente da maneira como foram concebidos; o que cabe à boa gestão é direcionar e priorizar as ten-dências que podem favorecer os objetivos que a organização deseja alcançar

• São múltiplas as possibilidades de configuração para se chegar a um mesmo resultado; portanto, a organização pode (e deve!) buscar caminhos que fa-voreçam o maior número possível de stakeholders, que á a base de modelos

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sustentáveis e, por isso mesmo, aumentam a probabilidade de manutenção do sucesso ao longo do tempo.

A complexidade de qualquer sistema (organizacional ou não) depende do número de elementos que o compõe, da quantidade de variáveis associada a cada elemento e do nível de interação entre eles. Assim, a complexidade de uma organização irá depender do seu porte, diversidade de processos, tecnologias, entre outros aspectos. É por essa razão que a maioria das organizações de médio e grande porte são consi-deradas à luz da teoria de sistemas como “sistemas hiper-complexos”, isto é, sistemas que possuem um grande número de variáveis que interagem dinamicamente entre si, sendo muitas e diversificadas as consequências disso, como por exemplo:

• Os processos organizacionais em sua maioria dependem de diversos depar-tamentos, níveis hierárquicos e fatores associados às múltiplas dimensões de existência da empresa. Isso requer clareza na identificação dos elementos e das variáveis críticas, para que possa ocorrer o seu adequado gerenciamento;

• Os processos e seus resultados podem ser influenciados por fatores aparen-temente sem relação e, portanto, de difícil identificação;

• É oneroso e contraproducente gerenciar todas as variáveis intervenientes na empresa;

• Em função da quantidade de variáveis internas e externas e da interdependên-cia entre elas, é virtualmente impossível prever o que irá ocorrer no futuro.

Para viabilizar a gestão das organizações, o que requer conseguir entender os ele-mentos organizacionais e suas principais relações, um instrumento útil é a construção de modelos que facilitam a lida com a complexidade organizacional. Uma proposta é modelar o sistema organizacional como sendo constituído de três dimensões (ou, sub-sistemas) inextricavelmente integradas, como ilustrado na figura apresentada a seguir: Dimensão físico-tecnológica: é a dimensão visível da empresa, constituída por todos os artefatos físicos, mobiliários, equipamentos e ambiente físico-químico.

I Dimensão organizacional: ligada à concepção e estruturação da organiza-ção em si mesma, sendo essa dimensão constituída dos processos, estraté-gias, sistema de gestão entre outros elementos organizacionais.

II Dimensão psicossocial: associada à dimensão subjetiva da vida huma-na, é nesta dimensão que se situam os conhecimentos e as competências individuais e onde se forjam as relações que podem fortalecer (ou não) os processos coletivos.

O nosso postulado, que está sendo confirmado pelas observações de campo, é que uma grande parte dos problemas deriva ou de falhas específicas nos elementos da em-presa (especialmente naqueles pertencentes às dimensões organizacional e psicosso-cial), ou de incoerências entre as três dimensões da empresa. Essas observações são via-bilizadas pela avaliação integrada da organização nas três dimensões acima propostas.

Um dos resultados mais ilustrativos dos efeitos provocados pela incoerência exis-tente entre as três dimensões propostas no modelo acima citado foi observado em uma empresa do setor metal-mecânico, pertencente a uma corporação multinacional de

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origem japonesa. No espaço de 12 meses, três funcionários que ocupavam uma mesma função, denominada pela empresa de “Contramestre”, haviam sido afastados devido a transtornos mentais. Estudos integrados na dimensão organizacional revelaram uma série de falhas no desenho organizacional (relação entre áreas, indicadores de desem-penho e mecanismos de comunicação) que gerava pressão excessiva naquela função específica, potencializando problemas que se refletiram na dimensão psicossocial.

ӹ Dimensão psicossocial das organizações

As empresas estão inseridas em mercados que trazem uma gama imensa de de-safios a serem superados. Num ambiente assim, é de se esperar que os gestores – que em sua grande maioria têm formação com viés tecnicista (engenheiros e técnicos) ou tecnocrático (administradores e economistas) – considerem prioritariamente os fato-res mais evidentes, como aqueles pertencentes às dimensões física e organizacional.

Por essas razões acima, reforçadas pela nossa cultura que não prima pela valoriza-ção da subjetividade inerente ao ser humano, a dimensão psicossocial é aquela mais desconhecida e, portanto, ignorada e negligenciada. Isso é um grande equívoco que cobra um preço alto das organizações (na forma de desempenhos sub-ótimos), dos seus trabalhadores (incluindo os gestores que também são submetidos a sofrimentos psíquicos e emocionais) e da sociedade como um todo, que arca com todos os ônus das mazelas sócio-econômicas decorrentes dessa negligência.

Além dos impactos nas pessoas, a dimensão psicossocial tem uma grande im-portância para os resultados da organização. É nessa dimensão que se enquadram os conhecimentos e as competências individuais, que são base do capital humano e do capital intelectual, importantes ativos econômicos no contexto da nova economia, como será discutido a seguir.

Figura 1: modelo da organização como sendo constituída de três dimensões (elaboração própria)

EMPRESA

Dimensão Física e

Tecnológica

Dimensão Organizacional

Dimensão Psicossocial

• Tecnologia• Equipamentos• Ambientefísico• Mobiliário• etc.

• Processos• Estratégiacompetitiva• Sistemadegestão• Sist.Informação• Estruturaorg.• etc.

• Conhecimentos• Relaçõeshumanas• Cultura• Climaorganiz.• etc.

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Os aspectos psicossociais também são essenciais para se construir relações que podem fortalecer (ou não) os processos organizacionais. Esquecemo-nos que a orga-nização é um sistema social, onde todo trabalho é coletivo: o sentido que damos para as relações humanas irá afetar diretamente os resultados dos processos em termos de produtividade, qualidade, prazos, custos e outros indicadores. Assim, trabalhar por ambientes com bom clima organizacional, onde vicejam relações cooperativas, é uma maneira bastante efetiva de conseguir também melhores resultados financeiros.

Visando aprofundar o entendimento sobre como o enriquecimento cognitivo, as relações cooperativas e a socialização do conhecimento contribuem com a inovação para sustentabilidade organizacional, foi desenvolvido um estudo exploratório com o objetivo de estudar os fatores organizacionais com maior potencial para promover, si-multaneamente, a competitividade da organização e a qualidade de vida no trabalho. Para tanto foi desenvolvido um modelo com vinte e três fatores organizacionais agru-pados em sete indicadores (SILVEIRA, GARDIM, 2013; SILVEIRA, KIKUCHI, 2013).

Os resultados do estudo acima, ainda preliminares, sinalizam no sentido da via-bilidade de organizar diversos desses fatores organizacionais – como bom clima or-ganizacional, carga de trabalho adequada, acolhimento pelos colegas, informações integradas com acesso comum, enriquecimento cognitivo – de modo tal que con-tribuam para o desenvolvimento sustentável da organização, melhorando de forma integrada o desempenho competitivo e a qualidade de vida no trabalho.

ӹ Modelos organizacionais sustentáveis: viabilidade e inevitabilidade

Ao longo das últimas décadas, vários autores alertam para os prejuízos causados pelas empresas, como Aktouf (1991) que pondera sobre a insustentabilidade do modelo industrial vigente, advertindo que “lucro de curto prazo significa destruição no longo prazo”, ou Morgan (1996) ao afirmar que “nossas empresas estão nos matando, adulte-rando comida, poluindo ambientes, submetendo pessoas a condições insalubres [...]”.

O mencionado enfoque Triple Bottom Line para sustentabilidade organizacional visa corrigir esses impactos sócio-ambientais indesejados, uma vez que pressupõe o equilíbrio no atendimento dos interesses e das necessidades de todos os stakehol-ders da organização: clientes, proprietários, fornecedores, funcionários e a sociedade como um todo.

O arcabouço da ação em um projeto desenvolvido de 2010 a 2012 com nove em-presas fabricantes de equipamentos eletromédicos – denominado “Projeto Piloto ABIMO” (SILVEIRA, 2013) – previu uma complexa e inovadora articulação de um grande número de variáveis multidimensionais relacionadas com os diversos agentes, aspectos e objetivos envolvidos. Isso permitiu o gerenciamento integrado de fatores humanos e tecnológicos de interesse. Para que essa articulação desejada produzisse os resultados esperados, foi necessário incluir conceitos de gestão aplicáveis a eco--sistemas organizacionais complexos, mecanismos para viabilizar a sustentabilidade

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TBL em empresas, além de vários conhecimentos e metodologias sobre gestão do ca-pital intelectual, estratégias organizacionais, gestão da inovação, sistemas integrados de gestão entre outros.

No projeto foi dada ênfase ao aproveitamento do capital intelectual como fator de produção, uma vez que o seu uso competente pode proporcionar os meios ne-cessários para que se consigam as desejadas vantagens competitivas sustentáveis ao longo do tempo nos mercados atuais, de maneira integrada com a qualidade de vida no trabalho. A proposta incluía algumas soluções inovadoras, como a viabilização de sustentabilidade TBL nas empresas através do desenvolvimento de estratégias ba-seadas em diferenciação, as quais são implantadas através da coordenação entre as inovações necessárias em produtos e processos, com a gestão integrada do composto de marketing do produto e a integração dos vários sistemas de gestão da empresa.

ӹ Cooperação e capital intelectual para o desenvolvimento sócio-econômico

O Brasil vem adotando desde a década passada, principalmente nas áreas de ciên-cia, tecnologia e inovação, modelos que privilegiam a cooperação inter-organizacio-nal, como os INCT/Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (criados em 2009), as várias redes organizacionais do SIBRATEC/Sistema Brasileiro de Tecnologia (em operação desde 2007), além de várias outras modalidades de arranjos organizacio-nais, como os APL/Arranjos Produtivos Locais, Parques Tecnológicos entre outros.

Os conceitos associados à teoria de sistemas permitem entender as razões pelas quais esses arranjos cooperativos produzem mais e melhores resultados, uma vez que existem tanto ganhos de escala (pela sinergia gerada), como ganhos de escopo (pelas propriedades emergentes do sistema cooperativo). É por isso que os padrões cooperativos são mais sustentáveis, pois, além de proporcionar um melhor aprovei-tamento dos recursos alocados, proporcionam uma abordagem mais abrangente (sis-têmica) das questões envolvidas.

Mas, para que um sistema organizacional seja efetivamente sustentável, não é su-ficiente a disponibilidade de um conjunto adequado de recursos e de competências. É necessário também que estes sejam convenientemente integrados e articulados de modo a criar melhores condições sistêmicas para produzir os resultados esperados nas dimensões econômica, social e ambiental.

Na abordagem da teoria neoclássica, os recursos organizacionais restringem-se a capital, trabalho e terra. Mas, como conseqüência da dinâmica evolutiva do momen-to atual, a teoria dos recursos incluiu entre os recursos organizacionais as “entidades tangíveis e intangíveis que a firma tem à sua disposição e que lhes permitem produzir com mais eficiência ou eficácia” (SVEIBY, 1998).

O conjunto de recursos intangíveis é denominado por vários autores como Capi-tal Intelectual, entendido como aqueles recursos que não possuem existência física, mas assim mesmo, representam valor para a empresa (EDVISSON, MALONE, 1998).

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Sveiby identifica três conjuntos de fatores que compõem o capital intelectual: ca-pital humano, que são os conhecimentos e as competências dos funcionários coloca-dos a serviço da empresa; capital estrutural, envolvendo tanto os softwares e sistemas de gestão, como os demais ativos organizacionais que possam ser relacionados na categoria de “propriedade intelectual” (marcas, patentes entre outros); capital de rela-cionamento, correspondente à geração de conhecimento resultante das relações com outras organizações, como clientes e fornecedores.

Todos os autores que tratam do tema capital intelectual enfatizam a importância do componente “capital humano” por três razões: o seu potencial para aumentar o capital estrutural; a sua capacidade para internalizar na empresa os frutos do capital de relacionamento e, assim, potencializar os resultados advindos; a sua capacidade para gerar novos conhecimentos.

Feitos esses esclarecimentos iniciais, é possível compreender porque soluções com base no uso competente do capital intelectual, principalmente quando estão mobilizados em algum tipo de arranjo cooperativo inter-organizacional, tendem a contribuir para a sustentabilidade. Isso se fundamenta em três conjuntos de fatores: o primeiro é de natureza econômica, o segundo é de natureza tecnológica e o terceiro é de natureza intrinsecamente sistêmica.

O capital intelectual é um ativo econômico, assim como os três fatores econômicos de produção clássicos, terra, capital e trabalho. O uso competente desse quarto fator econômico pode se constituir numa interessante alternativa aos investimentos depen-dentes de recursos financeiros, como historicamente se verificou na retomada do de-senvolvimento em diversos países, como na recuperação do Japão e de suas empresas no pós-Guerra (décadas de 70-80), ou no surgimento dos tigres asiáticos (década de 90). Em ambos os casos, a recuperação ocorreu baseada fortemente na otimização e na integração do capital intelectual das diversas organizações desses países.

Os erros e distorções cometidos de forma sucessiva e cumulativa ao longo de toda a história recente do Brasil resultaram em um país que apresenta importantes lacu-nas em termos de infra-estrutura física e de capacidade de investimento. Isso implica que o setor industrial brasileiro hoje apresenta déficits comparativos em relação a um grande número de países, como os países dos blocos asiático e europeu.

Desse modo, a opção por estratégias e operações que valorizam o capital intelec-tual é uma alternativa para que o país e suas empresas possam superar as restrições devidas às suas limitações de investimentos financeiros frente aos demais compe-tidores. Vale ressaltar a afirmação anterior de que essa opção pelo foco no capital intelectual – em especial, na sua componente “capital humano” – foi a estratégia uti-lizada para a bem sucedida recuperação e crescimento de diversos países.

O capital intelectual, especialmente na sua componente capital humano, é tam-bém o motor propulsor da inovação. Desse modo, a opção por estratégias e operações que valorizam o capital intelectual permite que a empresa alcance níveis de competi-tividade adequados às demandas dos mercados atuais, sem abrir mão dos interesses e das necessidades dos seus trabalhadores, da sociedade e de outros stakeholders.

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ӹ Cooperação e geração de conhecimento

Entender a organização é entender sua história e cultura, que formam um sistema complexo constituído especialmente por crenças e valores. No que tange a geração de novos conhecimentos e produtos dentro da organização – possibilitados pela in-tensificação e prática de mecanismos de aprendizados individuais e/ou coletivos –, as relações cooperativas se revelam cada vez mais imperativas. Em linhas gerais, sabe-se que as instituições não geram conhecimento por si só, sem a participação ativa dos indivíduos e dos processos interativos que ocorrem dentro dos grupos. Esses proces-sos de interação, no entanto, podem transpassar inúmeros processos psicológicos, que em sua grande maioria vão além da fronteira do consciente de cada um (GAR-DIM, CORRALES, 2013).

Compreendida como ação coletiva essencial para a integração da sociedade, a cooperação ainda é um conceito polissêmico – Rodriguez (1990), sobre Durkheim; Freund (1987), sobre Max Weber; Bourdieu (1989); Simmel (1983); Lima, 2006. Con-tudo, no ambiente laboral há uma percepção cada vez maior da ampliação de seus benefícios. A informação e o conhecimento, quando bem gerenciados, tendem a promover (dentre outros benefícios) redução de custos, aumento de receitas, melhor atendimento aos clientes e maior capacidade inovadora.

De maneira bem simplificada, a Figura 2 apresenta o fluxo da geração do co-nhecimento dentro das organizações. O ordenamento de diferentes tipos de dados, advindos dos ambientes interno ou externo da organização, dão origem a diferentes tipos de informações, que podem (ou não) serem trabalhadas com fins estratégicos para a empresa.

Nessa perspectiva, o aprendizado individual e organizacional, considerado insu-mo importante e necessário para a geração de conhecimento novo e de inovação, im-plica na existência de um movimento constante de informações e reflexões, centrado na interação entre os conhecimentos tácito e explícito. Conforme colocam Nonaka e Takeuchi (1997), o conhecimento precisa ser transformado, desenvolvido e traba-lhado pelas organizações; caso contrário, ele será apenas um amontoado isolado de informações sem importância. Em outras palavras, é importante que se exercite a “reflexão” sobre as mais variadas informações ao qual se teve acesso; esta reflexão ca-paz de gerar conhecimento novo se dá, prioritariamente, no interior do ser humano.

Partindo do pressuposto de que o conhecimento humano é criado e expandido através da interação social, Nonaka e Takeuchi (1997; 2000; 2006) focam sua análise no processo de criação e transformação do conhecimento dentro da organização, propondo um modelo conhecido como “espiral do conhecimento” (ou modelo SECI). Os processos que compõem essa “espiral do conhecimento” podem ser concentrados, principalmente, entre os esforços de transformação das informações em conheci-mentos novos, potencialmente com valor (monetário) para a organização, conforme sinalizado na Figura 2 pela imagem em espiral.

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Quando um conhecimento novo gerado/desenvolvido no interior da empresa apresenta possibilidade de ganho (monetário) – seja pelo aumento do processo de acumulação, seja pela redução de custos – provavelmente a organização estará diante de um produto e/ou processo inovador (ao menos para ela).

De acordo com Nonaka e Tackeuch (1997), a construção do conhecimento insti-tucional é um processo em espiral, que começa no nível do indivíduo e vai subindo, expandindo comunidades de interação, que cruzam os limites entre seções, depar-tamentos, divisões e organizações. A espiral do conhecimento ilustra o processo de transferência de conhecimento tácito individual para conhecimento tácito organiza-cional, trazendo à tona quatro fases de conversão/transformação do conhecimento: socialização, externalização, combinação e internalização.

Dentro deste contexto, a socialização é a fase que gera conhecimento comparti-lhado, a externalização transforma-o em conhecimento conceitual, a combinação dá origem ao conhecimento sistêmico e a internalização é momento em que se produz conhecimento operacional (GARDIM et al., 2011; GARDIM, CORRALES, 2013).

Na organização, um dos grandes desafios dentre esses processos é a externaliza-ção, conversão do conhecimento tácito (subjetivo) para conhecimento explícito (ob-jetivo). De acordo com Nonaka e Takeuchi (2006), essa conversão envolve a formação de um modelo mental compartilhado e articulado por diálogo, construído e mantido por diversas variáveis dentro da empresa. A fase de combinação, no entanto, é a etapa em que o conhecimento individual explícito é convertido em conhecimento explícito para o grupo e para a instituição. O conhecimento explícito do indivíduo pode ser compartilhado, por exemplo, em reuniões, através do uso de relatórios, documentos ou por meio de programas de educação corporativa. Contudo, no que se refere ao processo de internalização, no qual se dá a transferência de conhecimento explícito em tácito, as interações tendem a ocorrer com mais intensidade mediante um pro-cesso de tentativa e erro. Nota-se aqui, que a cooperação no ambiente laboral pode ser entendida como um grande agente facilitador da fruição e implantação desses processos na prática.

Dessa maneira, é possível entender que o desenvolvimento de relações coope-rativas no âmbito organizacional pode influenciar positivamente diversos aspectos relacionados à inovação, ganhos de eficiência e ganho de competitividade, visto que permitem um aumento latente do fluxo de conhecimento entre os indivíduos, esti-mulando o desenvolvimento de ambientes laborais mais humanizados.

A dimensão cognitiva do conhecimento tácito influencia de modo significativo a relação do indivíduo com o ambiente organizacional (HASEGAWA, 2001; NO-NAKA, TAKEUCHI, 2006; GARDIM, CORRALES, 2013), na medida em que este conhecimento reflete a noção (ou processo de construção) da realidade da pessoa, assim como sua visão de futuro – isto é, a crença daquele indivíduo sobre como as coisas deveriam ser, tendo como base a experiência que desfrutou anteriormente. Nesse cenário, a capacidade de inovação e geração de conhecimento se mostra cada

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vez mais sensível e carente da criação de processos psicossociais mais saudáveis no interior dos grupos e instituições (GARDIM, CORRALES, 2013).

Figura 2: fluxo simplificado da geração do conhecimento na organização (elaboração própria)

ӹ Saúde como bem estar social: a importância de vínculos cooperativos

O desenvolvimento das relações cooperativas intra e inter-organizacional, assim como dos processos cognitivos dos indivíduos (capaz de aumentar seu potencial de aprendizado) no ambiente de trabalho, se mostra fundamental para uma efetiva sus-tentabilidade no âmbito das organizações (GARDIM, CORRALES, 2013).

Neste contexto, como destacam Marques e Gutierrez (2006), os incentivos forte-mente destinados às práticas competitivas que visam melhorar a produtividade da organização, estabelecem formas de reações descoladas do todo, da noção de grupo e de unidade da empresa; o que pode ser prejudicial ao rendimento profissional dos funcionários, assim como à sua saúde e relações pessoais.

De acordo com a Constituição da Organização Mundial da Saúde (OMS), saúde é “um estado de completo bem-estar físico, mental e social”, que “não consiste apenas na

DADO

INOVAÇÃO

CONHECIMENTO NOVO

INFORMAÇÃO

ORDENAMENTO

REFLEXÃO

VALOR PARA A INSTITUIÇÃO

AMBIENTE – EXTERNO OU INTERNO – DA ORGANIZAÇÃO

INTERIOR DOSER HUMANO

NA ORGANIZAÇÃO(Capital Intelectual)

}}}

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ausência de doença ou de enfermidade”. 1 Um ambiente que tem como base o estímulo a ações cooperativas propicia que os indivíduos se conheçam e a realização de obje-tivos comuns se torne algo de responsabilidade de todos, assim como a manutenção desses ambientes positivos. Essas condições são favoráveis à melhoria do bem-estar e conseqüentemente da produtividade dos sujeitos. Isto é, um êxito em metas coletivas seria de todos, assim com o fracasso (MARQUES, GUTIERREZ, 2006).

Muito do que se entende como bem-estar social no ambiente laboral pode ser associado ao desenvolvimento de “capital social” das organizações. Em linhas gerais, o capital social sugere o desenvolvimento da confiança entre parceiros e a disposição de cooperar e trabalhar em conjunto (HASEGAWA, 2001). De acordo com Hasegawa (2001), capital social é o estoque de confiança 2 ou boa vontade mutua resultante de relações de cooperação, o qual pode ser acessado pelos participantes para garantir resultados e recursos desejados. Nesta perspectiva, o aumento dos níveis de capital social indica que os participantes de uma organização estão interagindo com maior confiança, o que colabora para a redução dos custos de transação e auxilia a eficiência da interação (KINGSLEY, MELKERS, 1999).

Hasegawa (2001) destaca, no entanto, que em redes convergentes, nas quais os atores estão dispostos a trabalhar juntos em cooperação, “a reciprocidade é um ele-mento chave e necessariamente presente na base de sustentação das mesmas, uma vez que cooperar não é uma decisão individual e independente, mas sim uma atitude conjunta”. Em outras palavras isso significa: “eu coopero porque/desde que todos co-operem”. Tal reciprocidade é fundamental para a confiança, já que, para confiar o indivíduo precisa saber que pode dividir seu conhecimento com o outro, pois o outro está cumprindo a parte dele. Conforme destaca a autora, se não houver reciprocida-de, não haverá confiança, portanto não haverá criação de capital social.

Com um olhar complementar sobre esta questão, Nonaka e Takeuchi (1997) res-saltam que indivíduos de culturas diferentes 3 precisam de mais tempo para compar-tilhar o conhecimento tácito, sendo assim, faz-se necessário, dentro da “espiral do conhecimento” uma fase mais prolongada de socialização e externalização entre eles para promover os ajustes necessários e para desenvolver a confiança. Dentro desta fase de socialização, é o quadro referencial interpretativo (ou conhecimento tácito cognitivo) que é compartilhado; assim, visões de mundo, maneiras de pensar que

1 Constituição da Organização Mundial da Saúde (OMS). Disponível em: http://www.direitoshuma-nos.usp.br/index.php/OMS-Organiza%C3%A7%C3%A3o-Mundial-da-Sa%C3%BAde/constituicao-da-organizacao-mundial-da-saude-omswho.html.2 Confiança é um conceito multidimensional e pode ser percebido de maneiras diferentes por diversos agentes de uma relação, evoluindo ao longo da construção de um relacionamento – pode ser gerada, cultivada, mantida e reforçada, por vezes quebrada, e muito dificilmente revitalizada (GARDIM, COR-RALES, 2013).3 Nonaka e Takeuchi (1997) entendem que a cultura organizacional pode ser vista como um conjunto de conhecimentos, crenças e valores compartilhados pelos membros da instituição.

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vão se tornando claras durante o diálogo informal e a convivência. De acordo com os autores, é este contato informal e a externalização do conhecimento tácito cognitivo, que permitem a um ator conhecer, compreender e confiar no outro. Desta maneira, para a homogeneização da lingüagem nas organizações e possibilitar a comunicação/troca de conhecimentos se faz necessário alguma convivência e troca de experiên-cias. Tal alinhamento, a coordenação e o desenvolvimento da confiança se dariam por meio da convivência e da socialização; e permitiriam um aumento do capital social na instituição.

Isso faz com que as empresas despertem para importância dos ambientes posi-tivos, nos quais os trabalhadores possam encontrar condições favoráveis para tra-balhar com maior eficiência e eficácia, aliando-se a isso a oportunidade de efetivos estímulos para o desenvolvimento e sustentabilidade organizacional na visão do Triple Bottom Line (TBL), que tem por objetivo integrar as dimensões econômica, ambiental e social (GARDIM, CORRALES, 2013).

ӹ Organização saudável para desenvolvimento socioeconômico

Uma das críticas á literatura gerencial é a falta de questionamento sobre os “por-quês” das organizações, interessando-se mais pelo “como”. Aktouf faz comentários contundentes em relação a esta falta de posicionamento ideológico dos pesquisadores do mundo organizacional, apontando para as problemáticas relações capital-traba-lho ao longo dos últimos séculos (AKTOUF, 1991).

O foco neste capítulo foi a crítica à ênfase que nos parece excessiva na vertente econômica das organizações, em detrimento dos seus aspectos sociais. A lógica de máximo lucro ainda domina o imaginário associado. Mas, pensar as organizações como instrumento de desenvolvimento sócio-econômico requer olhar para a plu-ralidade de efeitos provocados por sua atuação, que não se restringem às questões ambientais. As perturbações no meio ambiente físico e a deterioração dos recursos naturais são os efeitos mais visíveis e contundentes de modelos industriais, econômi-cos e políticos contrários ao bem comum, que vêm sendo adotados em larga escala há séculos.

A relevância de estudos sobre os fatores presentes numa organização com maior potencial para promover simultaneamente a competitividade da organização e a qua-lidade de vida no trabalho, se deve ao fato que o investimento em fatores que melho-ram tanto os indicadores econômico-financeiros como os indicadores humano-so-ciais tendem a gerar o desejável desenvolvimento sócio-econômico da organização.

Os resultados obtidos em vários estudos sinalizam fortemente no sentido da via-bilidade de organizar os fatores organizacionais de modo tal que possam contribuir significativamente para o desenvolvimento sustentável da organização, melhorando de forma integrada o seu desempenho. Nessa perspectiva, os resultados disponíveis na literatura são bastante significativos, destacando-se que ações bem planejadas,

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como o desenvolvimento de um ambiente organizacional adequado, podem favore-cer simultaneamente o desempenho competitivo da empresa e os seus trabalhadores.

Outro aspecto importante é o impacto positivo da promoção de mecanismos co-operativos, os quais possuem bom potencial para incrementar o desempenho da em-presa em seus múltiplos aspectos. A grande maioria dos mecanismos para promoção da cooperação interna possui uma relação custo/benefício bastante favorável para a empresa, uma vez que os custos para sua implantação são relativamente baixos quan-do comparados com os retornos potenciais para várias dimensões organizacionais. São exemplos desses mecanismos o estímulo ao trabalho envolvendo vários departa-mentos, a promoção de projetos multidisciplinares, o desenvolvimento de ambiente que contribua para o acolhimento e respeito aos trabalhadores e o reconhecimento ao desempenho em equipe (e não só ao desempenho individual).

Destaque-se também a importância de uma maior atenção das empresas para o desenvolvimento de tarefas que tenham um nível adequado de estímulo cognitivo aos trabalhadores, o que pode ser obtido também com soluções de custo muito baixo para a empresa.

Empresas com competência para valorizar o seu corpo de funcionários, investir na geração de conhecimentos estratégicos e buscar continuamente as inovações ne-cessárias, possuem seu lugar à frente dos concorrentes na corrida da vantagem com-petitiva. Com isso, aumentam-se o potencial para obtenção de níveis de desempenho organizacional continuamente melhores, gerando resultados mais expressivos, com agregação de valor a todos as partes envolvidas e, conseqüentemente, contribuindo para a desejada prosperidade socioeconômica.

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CAPÍTULO 2

PREvENÇÃO DOS TRANSTORNOS MENTAIS RELACIONADOS OU NÃO AO TRABALhO –

AÇÕES PARA A PRÁTICA NAS ORGANIZAÇÕES

Sylvia Regina Trindade Yano e Elza Maria de Souza

ӹ Introdução

Este capítulo propõe inicialmente apresentar um panorama dos perigos existen-tes nos ambientes de trabalho, contextualizando o cenário internacional e o brasilei-ro, ressaltando os fatores que levam aos transtornos mentais. Em seguida, pretende demonstrar que os transtornos mentais manifestam-se tanto em decorrência de as-pectos externos – características do trabalho, eventos negativos de vida – como de aspectos internos ou do individuo – com relação a comportamento e relacionamento ou ainda à tendência familiar. Ambos comprometem a saúde, impactando a vida social e laboral. Para tanto, apresenta ações a serem implementadas no ambiente de trabalho para a prevenção primária, secundária e terciária, utilizando como ferra-menta a Matriz Haddon.

ӹ Perigos e riscos no processo de trabalho – tradicionais e emergentes

Foram consideradas as definições adotadas em segurança e saúde no trabalho: para perigo ou fator de risco, algo que tem o potencial de causar danos à saúde ou à segurança de uma pessoa, à propriedade, equipamentos ou meio ambiente, podendo tratar-se de materiais, equipamentos, substâncias, micro-organismos, métodos, or-ganização de trabalho e práticas da cultura da organização. Para risco, combinação da probabilidade de um perigo ou fator de risco resultar em lesão, doença, dano, com a gravidade desse dano (ILO, 2013a). Diante das ameaças que o processo de trabalho pode oferecer, muitos países, organizações governamentais e representantes da socie-dade civil vêm buscando reduzir os acidentes e doenças do trabalho decorrentes dos

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perigos de acidentes, físicos, químicos, biológicos, ergonômicos, nestes incluídos os fatores de risco psicossociais.

O século XX trouxe a inovação de Henry Ford e Frederick Winslow Taylor que implantaram métodos para aumentar a produtividade por meio do controle do tem-po gasto e da eficiência do processo produtivo. No final desse século e o início do século XXI, evidencia-se um avanço tecnológico sem precedentes, marcado pela glo-balização e rápida integração dos mercados, pelo desemprego na Europa e escassez de mão de obra especializada no Brasil; pelo domínio da informática, conectividade, microeletrônica e a tecnologia nuclear; pelo trabalho em casa (home office) e as novas tecnologias de material e do processo produtivo (MEDEIROS et al., 2004).

Concomitantemente, verifica-se aumento das desigualdades entre a população num mesmo país e entre países, exacerbação dos conflitos étnicos, agressão ao meio ambiente, deterioração do espaço urbano, intensificação da violência e desrespeito aos direitos humanos.

Nesse processo de transformação social e inovação, não obstante os benefícios tecnológicos, enfrentam-se – no ambiente de trabalho – antigas e novas ameaças para a saúde integral dos trabalhadores, comprometendo o bem-estar individual e coletivo, onerando os sistemas de saúde e da previdência social, influenciando o au-mento dos custos da produção e, por conseguinte, a competitividade e os resultados das organizações.

Embora em toda a história do trabalho estejam presentes os fatores de risco psi-cossociais, só recentemente ficaram mais evidenciados e reconhecidos, passando a ser considerados como perigos emergentes à segurança e saúde no trabalho (EU--OSHA, 2007; EU-OSHA, 2009; ILO, 2010a).

Kivimäki et al, (1997) relataram alguns fatores de riscos psicossociais que po-dem ser considerados externos, incluindo as características do trabalho, os eventos negativos de vida, a falta de apoio social e fatores internos ou do próprio individuo, estão os traços de personalidade e a tendência familiar como preditores de transtor-nos mentais. Portanto, indivíduos podem estar expostos a fatores psicossociais nos eventos de vida, compreendendo a violência das grandes cidades ou a doméstica, os relacionados ao estilo de vida, como hábito de fumar, o consumo de álcool e outras drogas. Podem estar ainda submetidos aos fatores relativos à personalidade, compor-tamento e relacionamento, como por exemplo, a forma como o indivíduo age e reage nas relações familiares, sociais e no trabalho e, aos eventos diários da vida.

Por outro lado, a exposição aos fatores psicossociais pode estar relacionada ao que Kivimäki et al., (1997) denominaram características do trabalho: alta demanda, bai-xa autonomia nas decisões sobre sua própria atividade, conflito nos relacionamentos, discriminações. Ambas as exposições podem contribuir para o adoecimento ou uma das exposições pode agravar a condição da outra, comprometendo a saúde e a capaci-dade para o trabalho (ILO, 2010), contribuindo para problemas de saúde mental mas também para problemas orgânicos como os musculoesqueléticos, cardiovasculares,

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digestivos, gerando baixo rendimento laboral, afastamento do trabalho, e custos eco-nômico, financeiro e sociais (NIEDHAMMER, 1998; BARTYS et al., 2005; DA COS-TA e VIEIRA, 2010; ILO, 2010; WHO, 2010).

ӹ Cenário mundial dos agravos à saúde do trabalhador

Segundo dados estimados pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), 2,34 milhões de pessoas morreram em 2008, no mundo, decorrente de acidentes ou doenças relacionadas ao trabalho. Dessas, 2.02 milhões (86%) por vários tipos de do-enças e 321 mil (14%) pessoas por acidentes de trabalho. Nesse mesmo ano, estimou--se que 317 milhões de trabalhadores sofreram acidentes de trabalho não fatais que levaram a afastamentos de mais de quatro dias, uma média de 850 mil acidentes diários (ILO, 2011).

Verifica-se que os afastamentos e mortes são muito maiores por doenças que por acidentes. Dentre as doenças destacam-se as musculoesqueléticas que, em 2005 re-presentavam 59% de todas as enfermidades profissionais, seguida pelos transtornos psicossociais (EU-OSHA, 2010). Em vários países desenvolvidos, sobretudo os Euro-peus, foram reduzidos os perigos laborais que levam aos acidentes de trabalho.

Organizações internacionais do trabalho e da saúde reconhecem os transtornos mentais como um problema mundial no ambiente laboral (ILO, 2010 e 2013b; WHO, 2010; MURRAY et al., 2012), com tendência de crescimento. Na Dinamarca, quando comparada às demais doenças relacionadas ao trabalho, a percentagem de doenças psicossociais subiu de 3,1% em 1993 para 13,6% em 2003 (EUROFOUND, 2005).

De acordo com 4º Estudo Europeu sobre Condições de Trabalho, realizado em 2005, o estresse atingia 22% dos trabalhadores europeus, quase um em cada quatro trabalhadores, sendo responsável por 50 a 60% dos dias de trabalho perdidos e por 25% dos afastamentos com duração superior a duas semanas por motivos de doenças ocupacionais (ILO, 2011 e 2013b).

Em 2002 foi estimado um custo de 20 milhões de euros com o estresse relacio-nado ao trabalho nos quinze países membros da União Europeia (EU-OSHA, 2009). Identificou-se que o aumento da demanda quantitativa de trabalho, ou seja, trabalhar mais rápido e cumprir os prazos; falta de controle sobre o trabalho, sobretudo quanto ao método e velocidade; o assédio e a violência (incluindo o bullying) têm sido os principais fatores para o estresse (LEKA et al., 2004; HOUTMAN et al., 2007; EU-OSHA, 2009). Bloom et al., (2011) demonstrou que os custos globais em 2010 foram de aproximadamente 2,5 trilhões de dólares americanos, com previsão de aumento para 6 trilhões em 2030.

Estudo realizado por Timms (2006) estimou que anualmente 30% dos trabalha-dores norte-americanos terão algum acometimento em saúde mental, sendo a de-pressão um dos mais prováveis.

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Na América Latina, no estudo da carga da doença realizado em 1990 os transtor-nos depressivos maiores eram a 10a causa do indicador DALY – Disability Adjusted Life of Years (Anos de vida perdidos ajustados por incapacidade). No entanto, em 2010 já havia subido para a 6a posição e os transtornos de ansiedade que ocupavam o 18º lugar subiram para o 13º no mesmo período (MURRAY et al., 2012).

ӹ Cenário brasileiro dos agravos à saúde do trabalhador

O Brasil ainda luta para enfrentar questões já superadas por muitos países, so-bretudo os Europeus, principalmente no que diz respeito aos acidentes de trabalho, típicos e de trajeto, que continuam sendo a primeira causa de afastamento laboral. Em 2012 chegaram a 526.331 (74,6%) casos, seguidos das doenças, com 14.955 ca-sos. Destaca-se que ainda existem mais 163.953 casos não registrados por Comu-nicação de Acidente de Trabalho (CAT), impedindo identificar se foram acidentes ou doenças. Entre as doenças, as musculoesqueléticas, a exemplo de outros países, constituem 53,5% e os transtornos mentais 5,3% sendo as mais prevalentes no País (BRASIL, 2012).

Análise feita nos afastamentos ocorridos na indústria demonstrou que quando se analisa os dados com base no gênero, a causa dos afastamentos diferem. Os ho-mens são acometidos por acidentes, distúrbios osteomusculares e transtornos men-tais, nessa ordem Já as mulheres por distrúrbios osteomusculares, transtornos men-tais e acidentes, estimando-se que os afastamentos gerem em média quatro dias de trabalho perdidos, por trabalhador, ao ano (SANTANA e SANTANA, 2011), o que demonstra que o Brasil precisa superar os perigos tradicionais, sobretudo os de aci-dentes e os emergentes, como os decorridos dos fatores psicossociais.

Em 2009, ainda no contexto das empresas industriais, ocorreram 190.372 casos de transtornos mentais atendidos pelo beneficio previdenciário e em 2010, de janeiro a outubro, ocorreram 124.971 casos, com maior frequência dos Episódios Depressivos, Outros Transtornos Ansiosos e o Transtorno Depressivo Recorrente. Destaca-se que estes três primeiros transtornos, comparados aos dez mais frequentes, correspon-dem a 64,15% em 2009 e a 62,13% em 2010, demonstrando quais as morbidades mais prevalentes (MENDES et al., 2011). No estudo World Health Survey, realizado em 2003, 18,8% dos brasileiros relataram ter recebido um diagnóstico de depressão nos últimos 12 meses (WHO, 2010 apud SCHMIDT et al., 2011).

A avaliação da carga de doença no Brasil mostrou que as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) foram responsáveis por 66% dos anos de vida perdidos ajus-tados por incapacidade (“DALYs”), sendo os transtornos neuropsiquiátricos (19%) os mais frequentes, seguido pelas doenças cardiovasculares (13%), as doenças respirató-rias crônicas (8%), os cânceres (6%), as doenças musculoesqueléticas (6%) e o diabetes (5%), confirmando o impacto dos problemas mentais ceifando vidas em idade produ-tiva (SCHRAMM et al., 2004).

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PREvENÇÃO DOS TRANSTORNOS MENTAIS RELACIONADOS OU NÃO AO TRABALhO | 49

Para que se tenha uma ideia do impacto financeiro dos transtornos mentais no Brasil, foi estimado que o custo direto mensal, incluindo despesas com assistência profissional de saúde, intervenções, tecnologias, medicamentos, programas, gasto por paciente com depressão no primeiro tratamento, é de 374 euros. Nos casos de remissão, os custos reduzem para 273 euros. Já o custo indireto por paciente, con-siderando valores com o próprio paciente e seus parentes para atendê-lo, incluindo transporte para os atendimentos de saúde, tempo dispendido, atendimento de cui-dador, perda de produtividade, dias perdidos de trabalho é de 3.448 euros mensais (LIMA et al., 2013).

Ainda estimando os impactos econômicos dos transtornos mentais e analisan-do somente um dos custos diretos, observa-se que, em 2011, os gastos previdenci-ários com auxílio-doença acidentário foram de 319.445 benefícios, totalizando R$323.344.000,00, com um custo médio por benefício de R$833,81. Do total de bene-fícios acidentários, 12.337 (3,9%) foram em razão de transtornos mentais, estimando--se um custo de R$10.286.713,97, o que representa cerca de 3% do custo total dos benefícios acidentários, custo esse que em 2012 já chegou a 5% (BRASIL, 2011 e 2012). A princípio pode-se pensar que é pouco, mas com base na tendência mundial de cres-cimento desse tipo de morbidade, estima-se, em médio prazo, um grande impacto econômico.

Cabe ressaltar que só recentemente os transtornos mentais foram reconhecidos como doenças relacionadas ao trabalho (ILO, 2010; BRASIL, 2003) e que estabelecer o nexo com o trabalho, a despeito da nova legislação do Nexo Técnico Epidemioló-gico Previdenciário (NTEP) ainda não é fácil e comum. Isso nos leva a conjecturar que muitos casos ainda estão recebendo auxílio-doença e não auxílio-doença aci-dentário. Em paralelo, há que se considerar toda a carga sóciocultural dos transtor-nos mentais como a discriminação e o estigma, contribuindo para que o indivíduo esconda o problema pelo maior tempo possível, o que pode acarretar outros danos, tanto ao doente quanto à coletividade.

ӹ Os fatores psicossociais e seus impactos

Conforme demonstrado na Figura 1, os fatores psicossociais podem estar relacio-nados ao indivíduo, à sociedade ou a organizações, e interagem entre si. O fenômeno mundial crescente dos transtornos mentais está afetando a saúde das pessoas, preju-dicando a capacidade social e laborativa e, por conseguinte, impactando o ambiente de trabalho. Esse impacto negativo pode ser traduzido pela redução da produtivida-de, no aumento do presenteísmo e do absenteísmo, e, consequentemente, no aumento dos custos com saúde, auxílios previdenciários, ações no judiciário e tributos. Esse processo gera uma rede de perdas que inclui o próprio trabalhador, a família, a em-presa, o governo e a sociedade em geral.

Page 52: ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E SUSTENTABILIDADE EM … · fluxo e Gestão do Conhecimento, Transferência de Tecnologia e Propriedade Intelectual. Trabalhou por dois anos na Agência de

50 | ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E SUSTENTABILIDADE EM ORGANIZAÇÕES

Figura 1 – Fatores psicossociais relacionados com o indivíduo e com o ambiente 1

Para enfrentar este fenômeno, é preciso entender que a responsabilidade não é somente do indivíduo, do empresário ou de um dos agentes sociais, mas de toda uma sociedade que precisa se mobilizar para ações que possam promover a saúde, preve-nir o adoecimento, assistir e recuperar o doente.

Pode-se tomar como referência o que Marc Lalonde em 1974 propôs como ele-mentos da promoção da saúde, o incremento ambiental (abordagem estruturalista) e o comportamento populacional (abordagem comportamental do estilo de vida) com medidas ambientais, econômicas, socioculturais e legais (SOUZA e GRUNDY, 2004).

Ou ainda, o que a OMS, em 1984, apresentou como os fundamentos para a pro-moção de saúde, definidos na carta de Ottawa: desenvolvimento de políticas públicas saudáveis, criação de ambiente sustentável (ambiente externo – sociedade – e am-biente interno – organizações, empresas ou instituições), fortalecimento da partici-pação comunitária (entendendo-se que essa participação ocorra no ambiente exter-no, mas também no ambiente interno), desenvolvimento de habilidades individuais e reorientação dos serviços de saúde (SOUZA e GRUNDY, 2004). São necessárias ações de governo, das organizações e das próprias pessoas, incluindo os trabalhado-res, para que se contenha o crescimento dos transtornos mentais.

No que cabe às organizações – tendo como princípio que numa economia globa-lizada e competitiva a inovação é fundamental e, para tanto, o capital intelectual é in-dispensável – os trabalhadores precisam estar saudáveis, com toda a sua capacidade cognitiva, criativa e laboral preservada. Assim, o espaço da organização é estratégico para promover pessoas saudáveis e um ambiente de trabalho seguro com foco na sus-

1 Elaboração: Sylvia Yano. Arte: Walder Junior.

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PREvENÇÃO DOS TRANSTORNOS MENTAIS RELACIONADOS OU NÃO AO TRABALhO | 51

tentabilidade (OMS, 2010), apoiando os trabalhadores que apresentam transtornos mentais decorrentes dos fatores psicossociais relacionados ao indivíduo, à sociedade, e prevenindo novos agravos, sobretudo aqueles causados pelo trabalho, promovendo uma cultura organizacional e uma organização do trabalho que promova a saúde e como parte desta, a saúde mental.

Fundamentado nesses pressupostos propõe-se ações que podem ser implemen-tadas pela organização, utilizando-se da estrutura da Matriz de Willian Haddon (1972), inicialmente criada para identificar princípios básicos de saúde pública para a prevenção de acidentes de trânsito. Essa matriz vem sendo adaptada para a prevenção de outros acidentes e doenças e foi adotada aqui como ferramenta para tornar visíveis as origens dos problemas, apresentando algumas medidas para seu enfrentamento, visando à redução dos fatores psicossociais que estão gerando os transtornos mentais e estimular medidas de promoção da saúde, prevenção e correção.

Conforme o Quadro 1, essa matriz apresenta, nas colunas, quatro públicos para a atuação, que devem ser incluídos para a implementação das medidas de intervenção: o trabalhador; o empresário e a alta gestão da empresa; o ambiente interno e o am-biente externo, combinando com as ações dispostas, nas linhas, em três etapas – a primeira, antes da doença, refere-se à prevenção dos agravos; a segunda, durante a doença, caracteriza-se pelo diagnóstico precoce seguido de suporte e tratamento; e, finalmente, a terceira, depois da doença, que é a de reabilitação de um agravo insta-lado e suas complicações (RUNYAN, 1998). Essas etapas devem envolver o trabalha-dor, a família e o empregador.

Incluem-se ainda na Matriz os fatores psicossociais desencadeantes dos trans-tornos mentais, classificando-os em dois grupos, conforme Figura 1: os não-rela-cionados ao trabalho, portanto fatores relacionados ao indivíduo ou à sociedade, e os organizacionais, relacionados ao trabalho. O primeiro – pessoais ou sociais – são compostos por fatores de risco referentes ao estilo de vida, à genética, às patologias que têm uma característica familiar, os ligados ao comportamento e relacionamento e os eventos de vida (OMS, 2012).

Já, o segundo, relacionado ao trabalho, trata dos fatores de risco gerados pelas condições do ambiente, sobretudo os perigos do ambiente físico, como por exemplo o risco iminente de acidente, os de conteúdo e teor do trabalho, como atividades labo-rais que compreendam ciclos curtos, fragmentados, sem sentido, ausência de varia-ções, com alto nível de incerteza, sobrecarga ou pouca carga, turnos, longas jornadas, baixo controle sobre a atividade, ritmo de trabalho. Os relacionados a competências, abrangendo as responsabilidades e exigências abaixo ou acima das competências, estagnação na carreira, remuneração precária, baixo reconhecimento, apoio para o desenvolvimento e, ainda, cultura e características da organização, considerando os princípios da gestão organizacional, os valores, a ética, o espaço para participação, a valorização do capital humano e intelectual, as relações com superiores e pares, qua-lidade e quantidade das informações, níveis de apoio para solução de conflitos, falta de definição dos objetivos da organização (OMS, 2012).

Page 54: ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E SUSTENTABILIDADE EM … · fluxo e Gestão do Conhecimento, Transferência de Tecnologia e Propriedade Intelectual. Trabalhou por dois anos na Agência de

Etapas

Fatores

NIV

EIS D

E A

TU

ÃO

IND

IVÍD

UO

(trabalhador)A

GE

NT

E (em

presário/gestores)A

MB

IEN

TE

INT

ER

NO

(empresa)

AM

BIE

NT

E E

XT

ER

NO

(normas, políticas, recursos)

Antes dA doençA

nÃo ReLACIonAdo Ao tRABALHo

estILo de VIdAe

stimular e facilitar a adesão a progra-

mas de atividade física; alim

entação saudável; cessação de uso do fum

o, consum

o de álcool e outras drogas; gestão do orçam

ento doméstico; equi-

líbrio trabalho/vida social e familiar,

qualidade e tempo de sono adequados.

Informar,

com

evidências científicas

e inform

ações de retorno do investimento

(RoI), a im

portância e as vantagens de estim

ular e promover aos trabalhadores

o acesso à adoção de estilo de vida sau-dável (ex: w

ww.phi.org/uploads/im

ages/phi-prevention-m

eans-business).

Promover ações que inform

em e esti-

mulem

os trabalhadores na adoção de estilo de vida saudável: estím

ulo à ativi-dade física, alim

entação saudável, quali-dade do sono, prevenção do fum

o, con-sum

o moderado de álcool e cessação de

outras drogas, gestão do orçamento do-

méstico e saneam

ento de dívidas, equilí-brio trabalho/vida social e fam

iliar.

Articular parcerias com

instituições públi-cas, não governam

entais e governamen-

tais, como apoio para as ações afirm

ativas, oportunizando aos trabalhadores a adoção de estilo de vida saudável; buscar externa-m

ente experiências de excelência em práti-

cas para o estímulo da adoção de estilo de

vida saudável - benchmarking.

Manter jornada de trabalho de acordo com

a legislação, evitando fadiga e pressões, perm

itindo tempo para atividades físicas e

de lazer, bem com

o vida social.

eVentos de VIdA

Preparar para

enfrentamento

dos eventos de vida cotidiana: violências (assalto, sequestro, tiroteio, m

orte, as-sédio físico e psicológico dom

éstico), trânsito intenso e dem

orado, catás-trofes

ambientais

(inundação, in-

cêndio, desm

oronamento),

perdas im

portantes.

Informar ao em

presário e gestores que ex-periências de violência dom

éstica ou social podem

impactar a saúde do trabalhador,

influenciando na redução da capacidade para o trabalho, para a criatividade e inova-ção; esclarecer, com

demonstrações concre-

tas, que ações que preparem os trabalha-

dores tanto para prevenirem com

o para en-frentarem

melhor as situações estressantes

e violentas na vida cotidiana contribui para a prom

oção de trabalhadores mais seguros,

felizes , criativos e produtivos.

Promover oficinas sobre com

o enfrentar situações de violência cotidiana, social e dom

éstica, assim com

o calamidades

públicas e ambientais (ajustado às ca-

racterísticas da região), e a enfrentar as perdas.

Influenciar nas políticas públicas de segu-rança social e am

biental; apoiar as ações de controle das calam

idades da região (respon-sabilidade social corporativa).

GenÉtICA, CoMPoRtA-Mento, ReLACIon.

Apoiar para que o trabalhador busque

suporte clínico/social/ psicológico para enfrentar os aspectos genéticos que possam

contribuir para o adoecimento

físico e mental, dificuldades e confli-

tos de comportam

ento e de relaciona-m

ento com ações para a prom

oção da auto-estim

a, da gestão e controle da personalidade, gestão de conflitos (fa-m

iliares e laborais), desenvolvimento

da resiliência, enfrentando as diversas situações com

positividade.

Informar ao em

presário e gestores que o absenteísm

o, mesm

o que causado por questões não relacionadas ao trabalho, im

pacta a competitividade da em

presa, im

pede a criatividade e inovação, portanto desenvolver ações que prom

ovam o equilí-

brio da saúde mental do trabalhador é um

a m

edida preventiva eficiente para um bom

resultado no trabalho.

Apoiar a diversidade e inclusão; prom

o-ver a cultura do respeito m

útuo, inde-pendente da hierarquia; prom

over ações e suporte que prom

ovam auto-estim

a, gestão e controle da personalidade, di-ficuldades de relacionam

ento e compor-

tamento, gestão de conflitos (fam

iliares e laborais), resiliência, enfrentando as diversas situações da vida e trabalho, com

positividade; promover o auto-co-

nhecimento e o auto-controle; estim

ular à auto-avaliação nos relacionam

entos.

Identificar modelos de intervenção exis-

tentes na sociedade ou em outras em

pre-sas que possam

ajudar as pessoas ao auto-conhecim

ento e desenvolvimento de com

-petências relacionais.

Quadro 1 - ESTR ATéGIA DE ABORDAGEM ORGANIzAcIONAl AOS FATORES PSIcOSSOcIAIS ANTES DA DOENÇA E NÃO RElAcIONADO AO TR ABAlhO

Page 55: ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E SUSTENTABILIDADE EM … · fluxo e Gestão do Conhecimento, Transferência de Tecnologia e Propriedade Intelectual. Trabalhou por dois anos na Agência de

Etapas

Fatores

NIV

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E A

TU

ÃO

IND

IVÍD

UO

(trabalhador)A

GE

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E (em

presário/gestores)A

MB

IEN

TE

INT

ER

NO

(empresa)

AM

BIE

NT

E E

XT

ER

NO

(normas, políticas, recursos)

Antes dA doençA

ReLACIonAdo Ao tRABALHo

CondIçÕes AMBIentAIs

Informar sobre os perigos de acidentes e

doenças existentes no trabalho; capacitar nos procedim

entos e informar sobre as es-

tratégias para reduzir os riscos no trabalho (saber dos perigos existentes e com

o preve-ni-los); e

stimular a adoção de com

porta-m

ento seguro e responsabilidade coletiva; e

stimular a participação com

sugestões para a prom

oção da segurança.

Informar o em

pregador e gestores sobre os peri-gos e riscos de acidentes e doenças no trabalho existentes na organização, sua contribuição para o adoecim

ento físico e mental, bem

como para

a acidentalidade, com ênfase nos fatores psicos-

sociais do trabalho uma vez risco em

ergente; inform

ar, com evidências, o custo dos acidentes

e doenças para o negócio e quanto se pode ter de Ro

I investindo na prevenção e na promoção de

ambientes saudáveis e seguros.

Implantar a gestão da segurança e saúde no trabalho

(sst), reduzindo e controlando os perigos físico,

químicos, biológicos, de acidentes, ergonôm

icos e psi-cossociais; prom

over capacitações para a prevenção dos acidentes (típicos e de trajeto) e doenças no trabalho, incluindo ações preventivas e corretivas para os fatores de risco psicossociais gerados pelo trabalho; ofertar os equipam

entos de proteção coletiva e individual, ade-quados a cada atividade e tipo de trabalhador, capaci-tando-os para seu uso.

Buscar externamente experiências de ex-

celência em práticas seguras e saudáveis

no ambiente de trabalho – benchm

arking; contribuir

para as

políticas públicas

quanto à segurança no transporte (aci-dentes de trajeto representaram

18,9%

dos acidentes com C

At, em

2012, com

pequeno crescimento a cada ano, de

2010 a 2012); seguir os dispositivos le-gais de segurança e saúde no trabalho.

ConteÚdo/teoR do tRABALHo

envolver no planejam

ento e controle so-bre suas atividades; dar significado às suas atividade laborais, identificando sua con-tribuição para o todo; aprender a lidar com

o trabalho em

turno ou noturno, no sen-tido de m

anter o equilíbrio do sono; apren-der a gerir o tem

po, reconhecer suas habili-dades e com

petências, aplicando-as no dia a dia; exercer seu direito de fala, utilizando os canais institucionais para sugerir ajustes e adequações para a m

anutenção da saúde.

Informar sobre o valor do conhecim

ento e par-ticipação dos trabalhadores, até m

esmo para a

inovação; informar sobre o im

pacto dos fatores: ritm

o, monotonia, carga, turno, noturno, con-

trole e autonomia na gestão de suas próprias

atividades, sobre a saúde e produtividade do tra-balhador, visando a sustentabilidade.

Promover a participação, criando espaços de fala para

o trabalhador; permitir o controle do trabalhador sobre

a sua atividade laboral; demonstrar o sentido e o valor

das tarefas e sua contribuição para os resultados; acom-

panhar e orientar como enfrentar trabalhos em

turno e noturno; estim

ular a não ultrapassar a jornada de trabalho regulam

entar; identificar modelos de gestão

que possam estar causando um

carga negativa sobre os trabalhadores e capacitar os gestores para a adoção de m

odelos saudáveis de gestão do trabalho e das pessoas.

seguir os dispositivos legais de segu-rança e saúde no trabalho; buscar m

ode-los de gestão de pessoas que prom

ova a valorização do ser hum

ano.

CoMPetÊnCIAs

estim

ular a adesão à oportunidades para seu desenvolvim

ento pessoal, bem com

o a aplicação de suas habilidades e com

petên-cias nas atividades de sua responsabilidade e nas oportunidades de inovação.

Informar e dem

onstrar as vantagens e ganhos com

a valorização e estímulo ao desenvolvi-

mento dos trabalhadores para o sucesso dos

negócios; estimular um

a gestão com definição

de papéis e responsabilidades adequada ao perfil de cada um

; promover um

a cultura organizacio-nal que valorize e respeite o capital hum

ano.

Criar program

a de estímulo e apoio ao desenvolvi-

mento de pessoal; reconhecer e valorizar por com

-petência (sistem

a de reconhecimento form

al e infor-m

al); definir e comunicar os objetivos da organização;

deixar claro as expectativas para cada trabalhador e apoiar no seu crescim

ento profissional; utilizar o po-tencial e com

petência do trabalhador sem ultrapassar

suas possibilidades, estimulando-o a crescer.

Identificar m

odelos de

gestão que

valorizam o desenvolvim

ento profis-sional, im

plementado no contexto da

organização; identificar oportunidades de desenvolvim

ento de competências e

oferecer aos trabalhadores.

CULtURA e CARACteRÍs-tICA dA oRGAnIZAçÃo

Fortalecer o

trabalhador para

que se

manifeste e participe, dando-lhe segu-

rança, suporte, informando os canais de

comunicação.

Informar sobre a im

portância de promover um

a cultura organizacional que prom

ova saúde (seja sustentável), estim

ule a criatividade/inovação, confiança e colaboração.

Capacitar os gestores para gerir pessoas construindo

um clim

a organizacional construtivo e de confiança; capacitar os líderes para reconhecim

ento dos fatores de risco psicossociais relacionados ao trabalho, pre-parando-os para serem

líderes que promovam

saúde e não doença, dem

onstrando os ganhos pessoais, para a equipe e para a em

presa; dar suporte frente à con-flitos; criar canais de com

unicação interna; respeitar e estim

ular a jornada regulamentar e o equilíbrio entre

trabalho e vida pessoal; estabelecer e fazer vigorar o código de ética para a organização; prevenir e intervir frente à violência e o assédio no trabalho.

Identificar estratégias e modelos para

promover um

a cultura organizacional que valorize o capital intelectual assim

com

o valoriza o capital financeiro.

Quadro 2 - ESTR ATéGIA DE ABORDAGEM ORGANIzAcIONAl AOS FATORES PSIcOSSOcIAIS ANTES DA DOENÇA E RElAcIONADO AO TR ABAlhO

Page 56: ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E SUSTENTABILIDADE EM … · fluxo e Gestão do Conhecimento, Transferência de Tecnologia e Propriedade Intelectual. Trabalhou por dois anos na Agência de

Etapas

Fatores

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(trabalhador)A

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E (em

presário/gestores)A

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NO

(empresa)

AM

BIE

NT

E

EX

TE

RN

O (norm

as, políticas, recursos)

dURAnte A doençA

nÃo ReLACIonAdo Ao tRABALHo

estILo de VIdA

estim

ular a adoção ou manuten-

ção de hábitos saudáveis; Buscar o diagnóstico e tratam

ento pre-coce das doenças físicas e m

entais, evitando agravam

ento, sobretudo quanto ao uso abusivo de álcool e consum

o de outras drogas.Inform

ar sobre a importância e

ganhos em prom

over ações de acom

panhamento do trabalha-

dor adoecido para antecipar a re-cuperação, evitar o afastam

ento e reduzir o tem

po de afastamento,

se esse ocorrer.

oportunizar e estim

ular os hábitos saudáveis, sobretudo tem

po e qualidade de sono, alimen-

tação, atividade física, não uso de drogas lícitas e ilícitas; facilitar o acesso a atendim

ento de saúde, visando o diagnóstico precoce e o trata-m

ento correto, acompanhando o trabalhador

adoecido para apoiar numa recuperação m

ais breve.

Buscar modelos de inter-

venção e serviços de acom-

panhamento que apoiem

o trabalhador adoecido para um

recuperação completa e

mais rápida.

eVentos de VIdA

Apoiar para reconhecer que está

doente e buscar tratamento.

dar acesso a serviços de saúde e apoio para

enfrentamento das situações de violência do-

méstica ou social, perdas frente à efeitos da na-

tureza ou outros motivos com

o de familiares,

doenças graves; dar suporte na readaptação pós-traum

ática.

Buscar apoio nas estruturas sociais de apoio à violência dom

éstica, estresse

pós--traum

ático e outras violên-cias ou calam

idades, apro-xim

ando estes recursos dos trabalhadores doentes

GenÉtICA, CoMPoRtAMen-to, ReLACIonAMento

Apoiar para reconhecer que está

doente e buscar tratamento; ajudar a

identificar caminhos para m

elhorar as relações e com

portamento; dar

suporte durante o tratamento, iden-

tificando necessidades especificas.

Informar

que problem

as não

relacionados ao trabalho tam-

bém im

pactam o rendim

ento no trabalho e que a em

presa pode apoiar para prom

over a saúde e m

anter o trabalhador produ-tivo, evitando o absenteísm

o e redução da capacidade para o trabalho.

oportunizar o acesso a serviços especializados

para desenvolvimento das características pes-

soais; oportunizar a realização das consultas e tratam

ento; apoiar na aquisição dos medica-

mentos necessários e no de uso correto e sem

interrupção; fortalecer a cultura organizacional para um

a gestão que não agrave a morbidade

já existente; trabalhar a ética e valores, respei-tando as diferenças; identificar necessidades especificas do trabalhador frente ao tratam

ento (ex: horário flexível face ao uso de m

edicação com

prejuízo funcional e cognitivo, psicotera-pia, realização de exam

es).

Identificar rede de profis-sionais que possam

atender aos trabalhadores; articular com

profissionais horários de

atendimento

que não

impeça trabalhar e que seja

conveniente ao trabalhador.

Quadro 3 - ESTR ATéGIA DE ABORDAGEM ORGANIzAcIONAl AOS FATORES PSIcOSSOcIAIS DUR ANTE A DOENÇA E NÃO RElAcIONADO AO TR ABAlhO

Page 57: ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E SUSTENTABILIDADE EM … · fluxo e Gestão do Conhecimento, Transferência de Tecnologia e Propriedade Intelectual. Trabalhou por dois anos na Agência de

Etapas

Fatores

NIV

EIS D

E A

TU

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IND

IVÍD

UO

(trabalhador)A

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E (em

presário/gestores)A

MB

IEN

TE

INT

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NO

(empresa)

AM

BIE

NT

E E

XT

ER

NO

(normas, políticas, recursos)

dURAnte A doençA

ReLACIonAdo Ao tRABALHo

CondIçÕes AMBIentAIs

Informar sobre os perigos e riscos

existentes e medidas de controle

dos m

esmos;

orientar para

o m

anuseio correto

de equipa-

mentos, m

aquinários, soluções, seguindo os procedim

entos de segurança

e os

equipamentos

coletivos e individuais definidos pela equipe de segurança da em

-presa; seguir o acom

panhamento

dos profissionais de saúde para sua recuperação.

Informar

sobre aos

requisitos legais

quanto ao ambiente de trabalho, fator

importante para a segurança e saúde do

trabalhador, sobretudo para que se sinta protegido e cuidado pela em

presa; infor-m

ar sobre a legislação dos nexo técnico

Profissional/trabalho, n

exo técnico

epidem

iológico Previdenciário – nt

eP

ou nexo técnico por d

oença equipara-

da a Acidente do trabalho, visando ações

que promovam

a recuperação do traba-lhador e evite o afastam

ento.

Identificar os perigos e avaliar os riscos, inclusive os psi-cossociais, nas atividades desenvolvidas pelo trabalha-dor doente, inserindo m

edidas de controle, eliminando

ou reduzindo o perigo e o risco; promover relaciona-

mento interpessoal de qualidade nas relações chefe/

chefiado e entre colegas; capacitar supervisores e líderes na gestão dos fatores de risco, inclusive os psicossociais; capacitar o trabalhador sobre as m

edidas de redução e controle dos perigos e riscos e garantir que a exposição que desencadeou o adoecim

ento seja retirada.

seguir a legislação vigente, quan-to à gestão dos perigos e riscos no am

biente de trabalho; manter a jor-

nada de trabalho condizente com a

legislação de modo a evitar pressões,

ritmos acelerados e fadiga.

ConteÚdo/teoR do tRABALHo

Apoiar o trabalhador para ex-

plicitar seus sentimentos e sin-

tomas aos profissionais de saúde.

Informar aos em

presários e alta direção sobre a im

portância de identificar as condições de trabalho e organização do trabalho que tem

gerado adoecimento

na empresa e dem

onstrar o custo direto e indireto para o trabalhador, em

presa e sociedade.

estim

ular o potencial e a capacidade de trabalho mesm

o que adoecido, oportunizando trabalhar m

esmo que com

lim

itações, visando seu reajuste na empresa; garantir que

o trabalhador adoecido tenha a assistência e acompanha-

mento necessário para que se recupere; garantir que os

processos geradores da doença sejam corrigidos, evitan-

do o agravamento do quadro e novos casos; aproveitar o

aprendizado com o processo de adoecim

ento e capacitar os líderes para que não se repita; capacitar líderes para ge-rir pessoas de form

a a promover saúde e não adoecim

ento.prom

over um bom

clima organizacional.

seguir a legislação vigente, quan-to à gestão dos perigos e riscos no am

biente de trabalho; manter a

jornada de

trabalho condizente

com a legislação de m

odo a evitar pressões, ritm

os acelerados e fadi-ga. Identificar rede de profissionais que possam

atender aos trabalha-dores; articular com

profissionais de saúde horários de atendim

ento que não im

peça trabalhar e que seja conveniente ao trabalhador.

CoMPe-tÊnCIAs

Reforçar as com

petências já exis-tentes e identificar junto com

o trabalhador novas com

petências que possam

ser aplicadas, visan-do dar condições de trabalho.

Identificar competências e habilidades do trabalhador

que possam ser otim

izadas no período de doença, para que continue produtivo, sinta-se útil, m

as sem excesso de

pressão; desenvolver cultura e política de gestão que ga-ranta adequação de tarefas conform

e competências.

CULtURA e CA-RACteRÍstICA dA

oRGAnIZAçÃo

Apoiar para que identifique a

melhora no processo de traba-

lho e na cultura organizacional; criar condições para que se sin-ta apoiado e com

condições de trabalhar

de form

a saudável,

respeitosa.

Informar aos em

presários e alta direção sobre a im

portância de identificar as questões culturais e características da gestão organizacional que têm

gerado adoecim

ento na empresa; dem

onstrar o custo direto e indireto para o trabalha-dor, em

presa e sociedade, visando desen-volver correções e elim

inar esses aspec-tos adoecedores, além

de providenciar a recuperação dos trabalhadores adoecidos por esses aspectos.

Identificado adoecimento, im

plementar e retroalim

en-tar as ações da fase anterior para evitar novos casos; pro-curar identificar precocem

ente o problema para evitar

agudização e maior gravidade; facilitar o acom

panha-m

ento clínico do trabalhador para que o tratamento seja

feito e com qualidade e eficácia; acom

panhar o traba-lhador, dando suporte no período de doença, atuando de form

a a evitar se possível a necessidade de licenças; se trabalhador afastado, fazer acom

panhamento sistem

áti-co para garantir o acesso e seguim

ento do tratamento e

retorno no menor tem

po possível.

Identificar culturas organizacionais e m

odelos de gestão organizacional que prom

ovem a saúde com

o ben-chm

arking para implem

entação na organização.

Quadro 4 - ESTR ATéGIA DE ABORDAGEM ORGANIzAcIONAl AOS FATORES PSIcOSSOcIAIS DUR ANTE A DOENÇA E RElAcIONADO AO TR ABAlhO

Page 58: ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E SUSTENTABILIDADE EM … · fluxo e Gestão do Conhecimento, Transferência de Tecnologia e Propriedade Intelectual. Trabalhou por dois anos na Agência de

Etapas

Fatores

NIV

EIS D

E A

TU

ÃO

IND

IVÍD

UO

(trabalhador)A

GE

NT

E (em

presário/gestores)A

MB

IEN

TE

INT

ER

NO

(empresa)

AM

BIE

NT

E E

XT

ER

NO

(normas, políticas, recursos)

dePoIs dA doençA

nÃo ReLACIonAdo Ao tRABALHo

estILo de VIdAe

stimular a adesão e/ou conti-

nuidade de atividades que pro-m

ovam um

estilo de vida saudá-vel, com

destaque ao consumo

moderado de bebidas alcoólicas

e não consumo de outras drogas.

enfatizar que estim

ular os traba-lhadores à adoção a um

estilo de vida saudável prom

ove saúde, au-xilia na recuperação e na volta ao trabalho, aum

enta a auto-estima

e, conseqüentem

ente contribui

para a produtividade.

Facilitar o acesso do trabalhador em

recuperação e sobretudo os que retornam

ao trabalho, à opções de estilo de vida saudável, com

ações internas à organização e estím

ulo na participação de ações externas.

Identificar possibilidades

para a

participação do trabalhador em re-

cuperação à ações que são promo-

vidas pela

sociedade, incentivando

internamente.

eVentos de VIdA

Apoiar o trabalhador a reco-

nhecer que vivenciar a doença o tornou m

ais forte e que pode inclusive ajudar outros a se pre-venir e/ou passarem

por situação sim

ilar; estimular a que busque

ajuda sempre que vivenciar situa-

ções que o deixe vulnerável.

destacar aos em

presários que tra-balhadores que vivenciaram

expe-riências de violência podem

con-tribuir m

uito com program

as de prevenção e suporte a colegas em

situações sim

ilares, podendo con-tribuir nos program

as da empresa.

Consultar o trabalhador se gosta-

ria de aproveitar a experiência vi-venciada para poder ajudar colegas que vivenciam

situações similares

assim com

o, contribuir com seu

testemunho com

o um elem

ento no processo de prevenção e enfrenta-m

ento de situações de violência, catástrofes, perdas.

Influenciar nas políticas públicas de segurança social e am

biental; apoiar as ações de controle das calam

idades da

região (responsabilidade

social corporativa); identificar recursos da com

unidade que possam ser otim

iza-dos para o am

biente organizacional no processo de prevenção de novos casos e acom

panhamento dos que já se

recuperaram.

GenÉtICA, CoMPoRtA-Mento, ReLACIon.

Apoiar o trabalhador a perce-

ber que

a experiência

vivida pode trazer lições aprendidas, visando à prevenção de recidi-vas com

o poderá ajudar a co-legas que vivenciam

situações sim

ilares; estimular a sem

pre buscar ajuda frente a situações problem

a.

Informar

que doenças

pré--existentes

com

características de transm

issão genética podem

ser controladas com tratam

ento e que o trabalhador tem

total con-dição de produzir, basta que esteja seguindo o tratam

ento, e que a em

presa pode dar suporte para que

o tratam

ento seja

seguido rigorosam

ente.

Reforçar e valorizar o trabalhador

que se recuperou de uma situação

aguda e apoiá-lo para a retomada

de suas atividades ou, se for o caso, em

seu retorno ao trabalho.

Identificar grupos de apoio, existen-tes na com

unidade, a portadores de doenças psicossociais com

tendência de trasm

issão familiar, assim

como

à problem

as de

comportam

ento e

relacionamento.

Quadro 5 - ESTR ATéGIA DE ABORDAGEM ORGANIzAcIONAl AOS FATORES PSIcOSSOcIAIS DEPOIS DA DOENÇA E NÃO RElAcIONADO AO TR ABAlhO

Page 59: ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E SUSTENTABILIDADE EM … · fluxo e Gestão do Conhecimento, Transferência de Tecnologia e Propriedade Intelectual. Trabalhou por dois anos na Agência de

Etapas

Fatores

NIV

EIS D

E A

TU

ÃO

IND

IVÍD

UO

(trabalhador)A

GE

NT

E (em

presário/gestores)A

MB

IEN

TE

INT

ER

NO

(empresa)

AM

BIE

NT

E E

XT

ER

NO

(normas, políticas, recursos)

dePoIs dA doençA

ReLACIonAdo Ao tRABALHo

CondIçÕes AMBIentAIs

Apoiar o trabalhador na continuidade de

suas atribuições, caso não tenha se afastado ou, apoiar no retorno à sua atividade; oferecer acom

panhamento profissional ao trabalha-

dor, no período pós doença, estimulando-o a

falar de seus sentimentos; identificar com

o trabalhador e equipe de saúde se pode m

an-ter-se na atividade anterior ou se necessita ser readaptado à nova posição, neste caso, m

obi-lizá-lo a capacitar-se para a nova atividade.

Informar sobre o valor em

reter profissionais e contribuir para sua recuperação, assim

como fa-

zer correções no ambiente de trabalho evitando

novos adoecimentos e por conseguinte, perda na

contribuição do capital humano, custos com

, tri-butos previdenciários, ações judiciais, gastos com

saúde e redução da produtividade.

Criar um

canal de comunicação e de

referência para busca de apoio frente a situações que possam

levar a uma re-

cidiva; garantir que os fatores de risco físico, quím

ico, biológico, de acidente, ergonôm

ico e psicossociais que leva-ram

ao adoecimento do trabalhador

tenham sido rem

ovidos ou controla-dos, acom

panhando o processo para que perm

aneçam sob controle.

seguir os

requisitos legais;

verificar se existe experiência bem

sucedida em em

presas ex-ternas para apoiar no processo de readaptação pós-doença.

ConteÚdo/teoR do tRABALHo

Apoiar o trabalhador a identificar condições

e aspectos do trabalho que possam com

pro-m

eter a saúde; estimular o trabalhador a de-

senvolver um olhar otim

ista e positivo sobre as situações corriqueiras do trabalho, com

abertura para a fala, no sentido de prevenir novos episódios de adoecim

ento.

dem

onstrar aos empresários e gestores o valor do

capital intelectual mesm

o que em atividades que

pareçam sim

ples; demonstrar que o equilíbrio na

carga de trabalho, nas relações e a adequação do conteúdo com

o perfil do trabalhador contribuem

para a produtividade, reduzindo o presenteísmo,

absenteísmo e o adoecim

ento; demonstrar que

dar condições para que o trabalhador se recupere totalm

ente e mantenha-se saudável é investir na

retenção de profissionais mais com

prometidos

com a em

presa.

Contribuir para que aspectos do tra-

balho que causaram o adoecim

ento não estejam

mais presentes; garantir

acompanham

ento e suporte ao traba-lhador nesta fase de adaptação, crian-do um

canal de fala para manisfestação

de situações adoecedoras.

Buscar externamente experiên-

cias de excelência em práticas

seguras e saudáveis no ambiente

de trabalho – benchmarking;

contribuir para as políticas pú-blicas quanto à segurança no transporte; seguir os dispositi-vos legais de segurança e saúde no trabalho.

CoMPetÊn-CIAs

Apoiar o trabalhador a reconhecer suas

competências e negociar com

seus superio-res a adequação de suas atividades; estim

ular o desenvolvim

ento de novas competências e

o crescimento pessoal.

dem

onstrar aos empresários e gestores o perfil

dos trabalhadores para o século XX

I, visando a sustentabilidade do negócio, pautado no talento intelectual, na resolução de problem

as, na pró--atividade, na criatividade e inovação, funda-m

entando a importância de um

a política de de-senvolvim

ento e valorização do desenvolvimento.

Capacitar gestores para que saibam

identificar as com

petências dos traba-lhadores, valorizando-as no processo de trabalho, designando atribuições adequadas com

cada perfil; construir um

a política de desenvolvimento e va-

lorização de competências.

Identificar programas e políti-

cas de desenvolvimento e va-

lorização de competência que

possam ser adaptadas para a

organização.

CULtURA e CA-RACteRÍstICA dA

oRGAnIZAçÃo

estim

ular o trabalhador a reconhecer as me-

lhorias da organização; apoiar no processo de adaptação aos colegas, líderes e am

bien-te de trabalho com

o um todo; estim

ular o trabalhador para que seja um

elemento que

contribua para o desenvolvimento de um

a cultura organizacional que valorize e res-peite a todos.

dem

onstrar para os empresários e gestores da

alta direção o Retorno do Investim

ento (Ro

I) com

modelos de gestão que prom

ovam um

a cul-tura organizacional do bem

-estar no trabalho, da valorização do capital hum

ano; demonstrar à m

é-dia gerência o quanto que um

ambiente de bom

relacionam

ento, respeito mútuo e valorização das

pessoas contribui para a produtividade, resolução de problem

as, criatividade e comprom

etimento -

reflexo direto nos resultados.

Garantir que os fatores de risco psicos-

sociais relacionados com o m

odelo de gestão da organização que desencade-aram

ou agravaram a doença tenham

sido corrigidos.

Identificar modelos organiza-

cionais que promovam

saúde, que valorizem

o capital huma-

no, que estimulem

a criativi-dade e inovação, contribuindo para a sustentabilidade.

Quadro 6 - ESTR ATéGIA DE ABORDAGEM ORGANIzAcIONAl AOS FATORES PSIcOSSOcIAIS DEPOIS DA DOENÇA E RElAcIONADO AO TR ABAlhO

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58 | ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E SUSTENTABILIDADE EM ORGANIZAÇÕES

ӹ Considerações finais

Considerando a globalização, as tendências da indústria, da automação, da co-municação digital, este novo século passa a exigir um novo perfil profissional. O trabalho mecânico vem paulatinamente sendo substituído pelo intelectual e criativo e as empresas carecem de trabalhadores capacitados, que tenham ideias, resolvam problemas, criem soluções inovadoras, trabalhem em equipe e sejam flexíveis às constantes mudanças, para que se mantenham competitivas no mercado (WORLD ECONOMIC FORUM, 2011).

Se o mercado está em busca desse perfil muito mais criativo é condicionante en-tender que a criatividade e inovação, a total capacidade de trabalho, de lidar e se adaptar às mudanças, o bom relacionamento entre pares e superiores, a pró-atividade estão diretamente condicionadas ao estado de saúde.

As organizações precisam compreender que promover ambientes saudáveis de trabalho, valorizar o capital intelectual assim como se valoriza o capital financeiro e, estrategicamente promover a saúde e bem-estar de seus trabalhadores é atrair, esti-mular e reter talentos para que garanta a sustentabilidade de seu negócio. Diretores executivos de todo o mundo vêm se mobilizando neste sentido, pois já reconheceram que o capital humano é hoje um de seus maiores desafios (WORLD ECONOMIC FORUM, 2012).

Para isto a gestão organizacional precisa estar pautada na cultura do respeito e da ética, colocada em prática com ações que acolham e ajudem os trabalhadores subme-tidos aos fatores de risco psicossociais na família ou na sociedade, além de atuar de forma a não permitir que o ambiente corporativo, o processo de trabalho e as rela-ções de trabalho sejam elementos geradores de fatores de risco psicossocial.

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PREvENÇÃO DOS TRANSTORNOS MENTAIS RELACIONADOS OU NÃO AO TRABALhO | 59

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CAPÍTULO 3

GESTÃO DE RISCOS ASSOCIADOS A FATORES PSICOSSOCIAIS: DEFINIÇÕES CONCEITUAIS E

PRÁTICAS DE INTERvENÇÃO DO SESI NACIONAL E DO DEPARTAMENTO REGIONAL DA BAhIA

Kenneth Nunes Tavares de Almeida e Lídice Miranda Santos

(com co-autoria de Angela Macedo Magalhães e Catarina Fátima Laborda)

ӹ Introdução

A introdução da abordagem relativa aos riscos associados aos Fatores Psicosso-ciais (FPS) no ambiente de trabalho e sua influência na saúde dos trabalhadores é uma temática contemporânea. Apesar de contemporânea, a relação entre os FPS e a produtividade de uma organização é estudada desde o início do século XX. Os es-tudos de Elton Mayo e Fritz Roethlisberger (mais especificamente nos anos de 1924 a 1927) já destacavam o impacto que a percepção e subjetividade de trabalhadoras (naquele estudo, especificamente avaliou-se o gênero feminino) da indústria manu-fatureira (linha de produção de componentes telefônicos – relés) possuía em relação à produtividade de grupos de trabalho submetidos a diferentes condições (físicas e psicológicas). Observou-se, naquela altura, que o fator psicológico foi preponderante em relação aos fatores físicos no que concerne ao bem-estar (auto-estima) com conse-qüências diretas na produtividade do grupo de trabalho. Desde esse estudo seminal, ampliou-se o reconhecimento que as condições físicas e psicológicas dos trabalhado-res se inter-relacionam e se associam à produtividade no ambiente organizacional, considerando-se a competitividade atingida por organizações que organizam estra-tégias de gestão de tais fatores.

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Segundo o relatório PRIMA-EF (documento de referência sobre a temática da Organização Mundial de Saúde), 1 a gestão dos FPS é um fator-chave para o sucesso de pessoas e organizações. Os riscos psicossociais abrangem aspectos de concepção e gestão do trabalho e os contextos sociais e organizacionais que têm o potencial de causar danos psicológicos ou físicos. Segundo o mesmo documento, tais riscos associam-se a aspectos de Segurança e Saúde no Trabalho (SST) na medida em que podem provocar ou promover comportamentos e atitudes inadequados no ambiente industrial. Estratégias inovadoras de prevenção e intervenção vêm sendo desenvolvi-das nesse contexto, amplamente discutidas 2 e, sobretudo, gerando novas proposições para organizações otimizarem a gestão de tais elementos em um ambiente de alta complexidade.

Entendendo a importância da temática, o SESI-DN vem desenvolvendo estudos--chave que evidenciam a análise epidemiológica sobre os fatores de afastamento de longo prazo no Brasil, em especial com um olhar sobre os FPS. Na pesquisa SESI sobre o afastamento do trabalho por doenças e acidentes relacionados ao trabalho de Santana (2011), observou-se que: a) acidentes e b) doenças osteomusculares ocupam, respectivamente, a primeira e segunda causa de afastamento no ambiente de traba-lho e concessão de Benefícios relacionados à Saúde (BS) – proporcionados pelo Insti-tuto Nacional do Seguro Social (INSS). 3 Entretanto, ao se analisar as demais causas, o afastamento associado aos FPS assumiu uma participação expressiva, proporcional-mente, entre diferentes setores (14% considerando-se Indústria e Comércio). 4 Isolada-mente, na indústria essa participação é menos expressiva (10,8%), embora se observe um aumente gradativo na participação. Dando seqüência ao primeiro estudo desen-volvido por Santana (2011), aprofundou-se a análise sobre os principais transtornos mentais relativos aos afastamentos que compunham o percentual de 10,8%. Nesse caso, Mendes (2011) identificou que os transtornos depressivos e transtornos de an-siedade ocupam, nessa ordem, as principais causas de afastamento e concessão de BS.

Os dados estudados pelo SESI vêm apoiando a fundamentação de um modelo de prevenção, gestão e intervenção visando à melhoria na organização do ambiente de trabalho frente aos riscos associados aos FPS. O SESI tem uma longa trajetória de atuação nesse campo, trazendo ao contexto das organizações práticas que pro-movem instrumentos e técnicas de prevenção e gestão no ambiente organizacional. No Departamento Regional da Bahia, por exemplo, os projetos de Prevenção de

1 Guidance on the European Frameworke for Psychosocial Risk Management. Traduzido para o portu-guês pelo SESI com o título “Modelo Europeu para a Gestão de Riscos Psicossociais – Um recurso para empregadores e representantes dos trabalhadores”.2 A exemplo dos eventos da Comissão sobre Trabalho Organizacional e Fatores Psicossociais (WOPS), que discutem a temática em nível global.3 Dados relativos ao ano de 2006.4 Nesse estudo, Santana (2011) não utilizou dados referentes a servidores públicos.

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Álcool e Outras Drogas (PREVDROGAS), o estímulo aos programas de voluntaria-do, o Teatro Fórum (TF), o Programa de Preparação para a Aposentadoria (PPA), além do Diagnóstico e intervenção no Clima Organizacional (DCO) têm alcançado resultados expressivos sob o viés qualitativo e quantitativo, proporcionando múlti-plas soluções que compõem um acervo de estratégias de mais amplo alcance.

Realizar ações de prevenção e intervenção nas organizações é um dos pilares de atuação do SESI sob o viés de disseminação nacional. A capilaridade institucional aliada à disseminação de soluções compõe um mosaico com diferentes ferramentas e instrumentos que somente fazem sentido ao alcançar uma escala expressiva para a gestão do impacto de riscos relacionados aos FPS na saúde e bem-estar dos traba-lhadores. Entre as ações elencadas, o SESI-Ba estruturou um fórum de intercâmbio de práticas bem-sucedidas em organizações que desenvolveram soluções no campo do bem-estar dos trabalhadores, 5 envolvendo, diretamente, a gestão dos riscos asso-ciados aos FPS. Trata-se de um modelo de gestão do conhecimento que, acredita-se, promove a melhor divulgação de casos nos quais organizações industriais promovem o desenvolvimento de um ambiente seguro e saudável para os trabalhadores, conver-tendo-se, por conseqüência em maior competitividade organizacional.

Nos capítulos a seguir, apresentam-se os conceitos centrais dessa atuação, dados epidemiológicos que fundamentam a estratégia de intervenção, bem com os casos práticos estruturados e seus resultados.

ӹ Desenvolvimento conceitual: entendimento da subjetividade e fatores psicossociais nas atividades de pessoas na indústria

A atuação do SESI na gestão dos riscos associados aos FPS ancora-se no conheci-mento acumulado ao longo de décadas de diagnósticos e atuação em organizações do setor industrial. Também, e não menos importantes, fazem parte dessa construção os estudos sobre as bases de dados públicas, especialmente dos Ministérios da Saúde e da Previdência. Entendendo a importância da temática, o SESI tem promovido, sistematicamente, a convergência dessas informações sobre o impacto dos FPS na saúde e bem-estar do trabalhador, tanto sob o viés epidemiológico quanto nos casos de indústrias onde insere sua intervenção. A utilização de indicadores epidemiológi-cos, segundo Santana (2011), revela a dimensão dos problemas relacionados à saúde do trabalhador, quantificando o impacto econômico do adoecer. A incidência cumu-lativa, proporção de casos novos em determinado período de tempo e a prevalência, segundo a autora, são exemplos de medidas comuns e de fácil compreensão para se

5 Seminário de realização bienal sediado em Salvador – Bahia.

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entender a magnitude dos problemas no campo. A partir de tais dados, também se torna possível avaliar o impacto social associado ao avanço de riscos relacionados à saúde do trabalhador.

Nos estudos de Santana (2011) realizados com bases de dados do ano de 2006, identificou-se a realidade de afastamentos de longo prazo no Brasil. Sob o prisma epidemiológico, conforme citado anteriormente, os fatores que mais afastaram tra-balhadores gerando BS, independentemente do setor (indústria ou comércio), foram os acidentes em geral (28,1%), as doenças ósteo-musculares (D-OM, 25,7%) e as do-enças mentais (14%), nessa ordem. Ao serem analisados os BS relativos à indústria especificamente, os acidentes em geral têm maior proporção (33,8%), seguidos pelas D-OM (26,4%) e, em menor proporção, as doenças mentais (10,8%). Ao se estreitar o foco sobre variáveis independentes, identificou-se o gênero como um fator preditivo. Homens e mulheres afastam-se por causas diferentes considerando-se o estudo po-pulacional dos trabalhadores da indústria. Enquanto para os primeiros os acidentes provocam maior impacto no afastamento (40,2%) seguidos por D-OM (26%) e em menor escala as doenças mentais (9,0%), para as mulheres essa lógica se modifica com as D-OM ocupando a maior causa de afastamento (29,2%), seguida das doenças mentais (16,7%) e, por fim, os acidentes (12,5%) (SANTANA, 2011). Essa constatação sugere uma compreensão mais aprofundada sobre o impacto dos FPS na indústria e, em simultâneo, descortina alguns aspectos que interferem no afastamento de longo prazo de trabalhadores, como o gênero.

Tendo como base esses dados, e a fim de estreitar o entendimento de quais são os principais elementos dentro dos riscos associados aos FPS, o SESI-DN realizou uma nova pesquisa buscando caracterizar de forma detalhada esse tipo de afastamento. Ainda em 2011, a Universidade de Brasília, a convite do SESI, realizou nova pesquisa com este objetivo e identificou que os transtornos depressivos episódicos e o trans-torno depressivo recorrente ocuparam 49,44% das causas de concessão de BS em 2009, e 47,58% em 2010 – dados completos no ano de 2009 e de janeiro a outubro no ano de 2010 (MENDES, 2011). No que concerne ao adoecimento associado aos FPS, essa realidade não é local. Trata-se de um fenômeno que afeta países desenvolvidos e em desenvolvimento (OPAS, 2001), assumindo uma relevância significativa e com dados evolutivos crescentes a despeito das melhorias nos índices de saúde globais.

Frente a essa realidade, a Organização Mundial da Saúde convocou países mem-bros da Comunidade Europeia a proporem um modelo de prevenção, gestão e inter-venção que promovesse maior bem-estar e, consequentemente, menor adoecimento dos trabalhadores. Trata-se do modelo PRIMA-EF. Nele, considera-se, que o ado-ecimento associado aos FPS tem diferentes etiologias, condicionado por diferentes elementos, conforme pode ser mais bem observado na Figura 1:

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Figura 1: Modelo de Indicador de Riscos Psicossociais no trabalho relacionados à ação preventiva e intervenções (RPS – riscos psicossociais) (PRIMA, 2012)

A estratégia de intervenção passa por diferentes níveis. Nos estudos realizados por Mendes (2011), identificou-se a importância de ampliar as ações no que tange à gestão de fatores psicossociais. Dois dos principais elementos envolvidos implicam níveis de intervenção em aspectos educacionais (considerando que a maior parte dos gestores de Indústria teve ou tem pouca formação para proporcionar uma organização do tra-balho amigável a fatores psicossociais) e também a construção de espaços de diálogo com os trabalhadores. De acordo com a Agência Européia para a Segurança e Saúde no Trabalho (2012, p. 1), a gestão dos riscos psicossociais é realizada, de forma siste-mática, em diversas organizações. Entretanto, os esforços vão além do estímulo à ado-ção de uma abordagem ordenada da prevenção dos riscos psicossociais em um grupo de organizações. De acordo com esta agência, será necessário assegurar que a maior parte delas implemente um amplo leque de ações preventivas que gerem resultados eficazes, com vistas no trabalhador para reduzir o absenteísmo, atender a legislação e responder às exigências do mercado, além de salvaguardar a produtividade.

Por considerar o trabalhador um dos mais importantes stakeholders da organi-zação, torna-se necessário atuar de forma socialmente responsável com este público, não apenas no que diz respeito aos direitos garantidos pela legislação, mas, também, investir no cuidado com a sua integridade física e mental, no desenvolvimento pesso-al e profissional, assim como oferecer contínuas melhorias nas suas condições de tra-balho. Além de promover os estudos citados, o SESI tem adotado uma linha de ação proativa, considerando que o universo de relacionamento com a indústria implica desenvolver estratégias de promoção da saúde e bem-estar do trabalhador, aliando tais elementos a práticas de prevenção, gestão e transformação dos riscos psicosso-

Fatores Sociais

Fatores Organizacionais

Fatores de Trabalho Individuais

Impacto Social

Impacto Organizacional

Impacto Individual

ESTRESSE RELACIONADO AO TRABALHO

Características Individuais

Ações e Intervenções preventivas

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ciais. A seguir, apresentam-se as medidas adotadas pelo SESI-Ba para exemplificar alguns desses elementos.

ӹ Medidas adotadas na gestão dos riscos associados aos fatores psicossociais: a atuação do SESI Nacional e as práticas do SESI-Ba

Nacionalmente, o SESI conta com equipes de atuação no campo da responsabili-dade social que abarcam intervenção na gestão dos FPS. Nelas, há, aproximadamen-te, 10% de sua mão de obra composta por profissionais com nível de formação em psicologia. Esses dados somados à capilaridade da instituição permitem estabelecer uma série de práticas em rede que promovem a interação dos profissionais e a consti-tuição de um banco de soluções em nível nacional.

Agregam-se ações que os Departamentos Regionais desenvolvem no campo dos FPS, algumas específicas por departamento, mas, a maior parte estruturada em tor-no de um modelo nacional de intervenção. Tais atuações vêm ao encontro dos ele-mentos identificados nos estudos prévios e pautados em uma reflexão crítica acerca do significado do trabalho e o impacto dos FPS. No Quadro 1, identificam-se as ações e os Departamentos Regionais associados.

Quadro 1: atuação dos diferentes Departamentos Regionais em Programas de Gestão de FPS no Brasil – adaptado de Yano (2013)

1 Gerenciamento do Stress SC

2 Pesquisa/diagnóstico de Clima OrganizacionalBA, SC, PR, AL, ES, MA, PB

3 Gestão do Clima Organizacional BA, SC, PR, GO

4 Gestão de Afastamentos BA, SC e AL

5 Desenvolvimento de LiderançasBA, AL, CE, ES, MA, MG, SC

6 Prevenção ao Uso de Drogas no Trabalho e na Família BA, RS, PR

7 Projeto Empresa Consciente – A Favor da Vida CE

8Avaliação dos riscos psicossociais de trabalhos em altura e em confinamento

SC, PR

9 Sistema webSESI de gestão do absenteísmo na indústria BA

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10 Atendimento psicossocial RS

11 Programa de Preparação para a Aposentadoria BA, RS

12 Melhoria das Condições Psicossociais do Indivíduo BA, SC

13Impactos do Capital Humano no Desempenho Organizacional: Prevenção de Acidentes e Promoção da Saúde e Qualidade de Vida em indústria paulista

BA, SP

14Circuito de seminários de sensibilização das empresas para controle do absenteísmo e presenteísmo

RN

Considera-se central as implicações para a segurança, saúde e bem-estar do tra-balhador, dentro de um movimento de instituições atentas para as grandes perdas em relação ao trabalho considerando-se o impacto para trabalhadores e indústrias.

No sentido de aumentar a sensibilização para os riscos psicossociais, assim como a prestação de apoio e de orientação, apresenta-se, a seguir, abordagens e iniciativas empreendidas pelo SESI do Departamento Regional da Bahia (SESI-Ba) no sentido de promover a mudança de comportamento das organizações em relação à saúde física e mental de seu trabalhador, na perspectiva da sustentabilidade de seus negócios. As iniciativas foram organizadas em quadros que sintetizam a motivação, objetivo, metodologia, benefícios e resultados associados.

ӹ Diagnóstico de Clima Organizacional

Quadro 2: Diagnóstico de Clima Organizacional (elaboração própria, a partir de SESI, 2011)

Item Descrição

Motivação

A conjuntura mundial impõe uma nova visão em relação à gestão das organizações, pois em tempo de crise econômica e financeira, convém a estas manter as atividades relacionadas às práticas socialmente responsáveis, a fim de evitar impacto significativo em seus negócios. Este cenário motivou a elaboração e implantação do Diagnóstico do Clima Organizacional, enquanto ferramenta de gestão eficaz para o fortalecimento da Responsabilidade Social Empresarial voltada para o público interno, a fim de contribuir, de forma estratégica, para a melhoria do ambiente organizacional e o crescimento da empresa. Salienta-se que esta metodologia foi elaborada pelo Departamento Nacional do SESI, sob a coordenação do Departamento Regional de Santa Catarina e um Grupo de Trabalho para a elaboração técnica, composto por representantes dos Departamentos Regionais: Bahia, Espirito Santo, Goiás e Tocantins.

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Item Descrição

Síntese

O Diagnóstico de Clima Organizacional constitui-se numa ferramenta estratégica de gestão que oportuniza o estreitamento e o fortalecimento das relações e do diálogo dentro da empresa, e contribui para a identificação dos pontos fortes e das oportunidades de melhorias, que necessitam de revisão e intervenção. Os resultados obtidos nortearão a empresa na definição de proposições e planos de ação para a melhoria do ambiente organizacional. Este envolve cinco áreas temáticas: Liderança, Comunicação, Condições de Trabalho, Desenvolvimento Profissional e Imagem da Empresa, as quais têm impacto direto na satisfação, motivação e engajamento dos trabalhadores em relação à empresa. Salienta-se que o processo é totalmente confidencial.

ObjetivoConhecer o nível de satisfação dos trabalhadores, identificar os pontos fortes e as oportunidades de melhoria relacionadas à qualidade do ambiente e das relações no trabalho.

Metodologia

O método é participativo e sua aplicação ocorre, inicialmente, pela etapa de planejamento que prevê reuniões e visitas ao processo produtivo, seguido da aplicação dos questionários com trabalhadores, por amostragem, análise e entrega dos resultados. Para a aplicação dos questionários utiliza-se a Régua de Avaliação, que contempla uma escala crescente de 1 a 10, e indica o nível de satisfação ou de insatisfação dos trabalhadores em relação a cada questão e situação avaliada.

Benefícios

Contribui para o desenvolvimento da gestão participativa;Identifica práticas socialmente responsáveis e oportunidades de melhoria na relação empresa e público interno;Fornece à empresa, informações para o planejamento estratégico organizacional, em especial, para implementação dos aspectos relacionados ao público interno;Potencializa a responsabilidade social interna;Promove o alinhamento das expectativas dos trabalhadores às estratégias de negócio;Contribui para a imagem e reputação da empresa.

Resultados

Identificação de práticas socialmente responsáveis e de oportunidades de melhoria na relação entre empresa e público interno;Alinhamento das expectativas dos trabalhadores às estratégias de negócio da empresa;Definição de planos de ação para melhoria do Clima Organizacional e, consequentemente, da produtividade da empresa;Criação de um ambiente de trabalho mais propício à inovação;Subsídios para as ações de Recursos Humanos – atração e retenção de profissionais qualificados;Contribuição para a imagem e reputação da empresa;Contribuição para o desenvolvimento da gestão participativa e da gestão do conhecimento dentro da empresa.

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ӹ Programa de Voluntariado Empresarial

Quadro 3: Programa de Voluntariado Empresarial (elaboração própria, a partir de Goldberg, 2001)

Item Descrição

Motivação

O despertar das empresas para o seu papel social proporcionou a criação e implantação de fundações e institutos com o propósito de desenvolver ações em prol da comunidade e do fortalecimento de políticas sociais. Neste cenário, fortalecem-se os conceitos de Cidadania Empresarial e Responsabilidade Social Empresarial, período em que o PVE ganha vulto enquanto vetor da gestão socialmente responsável, no âmbito do Investimento Social Privado.

Síntese

Considerado uma rota estratégica, o PVE se caracteriza por um conjunto de ações empresariais, que incentiva e apóia o envolvimento de seus trabalhadores em atividades voluntárias voltadas para a comunidade. Sua execução agrega benefícios para a empresa, à comunidade e aos trabalhadores. Conta com suporte de Gestão de Pessoas para efetivar-se na dinâmica dos negócios da organização. Além disto, possibilita ao trabalhador desenvolver habilidades e competências, pautado nos princípios de livre participação, não auto-promoção e de espaço democrático de debate e decisões.

Objetivo

Auxiliar o desenvolvimento de estratégias e ações para implementação, consolidação e monitoramento da atuação social da empresa com foco no Voluntariado Empresarial.Identificar potencialidades e experiências entre os trabalhadores, além de capacitá-los para o exercício de ações voluntárias.

Metodologia

O processo de elaboração do PVE ocorre de maneira particular e participativa, de acordo com as características de cada empresa. Entretanto, recomenda-se seguir os passos, que acontecem em interação e simultaneidade com outras fases do processo, apresentadas a seguir:I) Construção do Programa;II) Implementação: oficinas preparatórias para trabalhadores e gestores de instituições do terceiro setor, construção do banco de oportunidades; III) Monitoramento e Avaliação: indicadores de acompanhamento e relatórios.

Benefícios

Para o voluntário: satisfação e realização pessoal; proporciona o exercício da cidadania e desenvolvimento de novas habilidades; melhoria da autoestima; aprendizado para realização de trabalho em equipe e conquista de novas amizades; e sentir-se valorizado e pertencente a um grupo.Para a empresa: ampliação da atuação socialmente responsável; melhoria nas relações interpessoais; descoberta de novos talentos; contribuição para o fortalecimento da imagem e da reputação da empresa na sociedade.Para a sociedade: possibilidade de resolução de problemas sociais, resultando na melhoria da qualidade de vida do público-alvo.

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Item Descrição

Resultados

Ampliação e/ou desenvolvimento de competências relacionais integradas ao trabalho, assim como maior satisfação pessoal e profissional;Fonte de satisfação e elevação da autoestima;Melhoria na qualidade de vida, ajudando a construir uma sociedade mais saudável.

ӹ Programa de Preparação para a Aposentadoria (PPA)

Quadro 4: Programa de Preparação para a Aposentadoria (elaboração própria, a partir de SESI, 2012)

Item Descrição

Mot

ivaç

ão

Na atualidade, com o boom do envelhecimento populacional, as empresas se deparam com dados referentes ao aumento da expectativa de vida de seus trabalhadores e, pautadas em estatísticas, começam a repensar os conceitos referentes ao processo de aposentadoria e do envelhecimento. A fragilidade emocional do trabalhador frente ao período de pré-aposentadoria, associado a perdas, seja de ordem física, intelectual e social, e a crescente sensibilização empresarial para uma gestão socialmente responsável, configurou-se no cenário propício para o SESI-Ba investir competências para estimular e apoiar a empresa industrial, para tratar das questões do envelhecimento da força de trabalho.

Sínt

ese

O trabalho representa um fator de extrema relevância na vida do ser humano e, na perspectiva de perda ou desvinculação mediante a aposentadoria, gera influência significativa em relação à gestão, por considerar que está diretamente atrelada à prevenção dos riscos psicossociais e a promoção da saúde mental do trabalhador. Portanto, como forma de minimizar conflitos e sofrimentos que o processo da aposentadoria possa causar, o PPA oportuniza ao participante conhecer aspectos teóricos e práticos do processo de transição entre a situação de trabalhador ativo e planejar o encerramento de suas atividades na empresa e o início de uma nova etapa de vida. Este programa reforça a importância da qualidade de vida e a possibilidade de novas fontes de realização, frente à aposentadoria. Salienta-se que esta metodologia foi elaborada pelo Departamento Regional da Bahia com o apoio consultivo do Departamento Regional do Rio Grande do Sul.

Obj

etiv

os

Foco Empresarial:Fortalecer o exercício da Responsabilidade Social Empresarial, proporcionando ao trabalhador e à empresa um pensar sobre o processo de desvinculação gerado pela aposentadoria; estabelecer, dentro da empresa, um espaço para análise, debate e interação de temas e implicações relacionadas à aposentadoria, a fim de estimular a criação e/ou revisão de programas e diretrizes voltadas para o público interno.Foco trabalhador:Minimizar os impactos causados na vida do profissional pelo fim da relação de trabalho; oportunizar aos trabalhadores da indústria um espaço de reflexão sobre a nova etapa da vida, a fim de contribuir para a melhoria e/ou manutenção da qualidade de vida; proporcionar novas perspectivas, assim como ampliação da visão de mundo, frente às novas fontes de realização pós-aposentadoria.

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Item Descrição

Met

odol

ogia

O método é composto por uma fase preparatória que envolve o levantamento de informações internas, a formação do comitê gestor, o mapeamento do público elegível e o workshop de sensibilização. São realizados em oito módulos formativos presenciais, cujo produto final é o Projeto de Vida elaborado. Salienta-se que todo o processo formativo é desenvolvido por meio de vivências, exposições dialogadas, exercícios, leitura comentada, trabalho em grupos, exibição de cenas de filmes e pode contar com a participação de parceiros, a exemplo do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) e outros.

Ben

efíc

ios

Valorização do trabalhador, com vistas ao aumento da produtividade e à redução do índice de afastamentos por problemas ocasionados no ambiente de trabalho;Contribuição para melhoria da qualidade de vida e desenvolvimento dos trabalhadores, sem que haja perdas de valores tecnológicos e culturais da empresa;Prevenção de conflitos e tensões, por meio de informações sobre os aspectos legais e sociais da aposentadoria;Consolidação do compromisso social da empresa com os trabalhadores e seus familiares; Visibilidade devido à implantação de uma tecnologia social inovadora;Fortalecimento da imagem da empresa junto aos diversos públicos;Minimização dos impactos negativos advindos do processo de desligamento do trabalhador;A empresa se mostra socialmente responsável ao apoiar-se no Estatuto do Idoso (Art. 28 § II).

Res

ulta

dos

Mediante avaliação realizada com participantes do PPA realizado na empresa piloto, observa-se que, em relação às temáticas mais significativas, consideram-se:Aspectos financeiros e Empreendedorismo: 40%Saúde e Qualidade de Vida: 20%Vida Afetiva, Social e Familiar: 13%Legislação: 13%Aspectos Psicossociais da Aposentadoria: 7%Papel da Empresa/Voluntariado: 7%89% sentem-se preparados para a aposentadoria

ӹ Programa de Prevenção ao uso indevido de Álcool e outras Drogas (PREVDROGAS)

Quadro 5: Programa de prevenção ao uso indevido de álcool e outras drogas (elaboração própria, a partir de SESI, 2011)

Item Descrição

Motivação

Segundo dados do Ministério da Saúde (2003), no Brasil, problemas decorrentes do uso de álcool ocuparam o terceiro lugar em relação a motivos de absenteísmo no trabalho e o oitavo lugar na concessão do auxílio-doença do Ministério da Previdência Social. O SESI, reconhecido como centro colaborador da Organização Mundial de Saúde (OMS) na prevenção ao uso abusivo de álcool e outras drogas no local de trabalho, reflete acerca do cenário da inserção do consumo indevido e crescente do uso destas substâncias na sociedade, e, em particular, no ambiente laboral, implementa uma metodologia de prevenção, com vistas a reduzir os agravos gerados pela problemática em questão e seu forte impacto econômico e social.

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Item Descrição

Síntese

O Programa de Prevenção do Uso Indevido de Álcool e Outras Drogas (PREVDROGAS), concebido em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Controle Internacional de Drogas, promovido pelo UNODC, OIT/OMS, conta com o apoio do Ministério da Saúde e o Centro de Estudos e Terapia do Abuso de Drogas – CETAD/UFBA, e busca proporcionar aos trabalhadores habilidades que contribuam para mudança de atitudes e comportamentos e, conseqüente redução dos fatores de risco e danos decorrentes do consumo indevido de álcool e outras drogas, de forma integrada, em um sistema de redes de suporte entre empresa, instituições qualificadas, trabalhadores e familiares. Programa voltado para uma ação coletiva, preconiza uma abordagem interdisciplinar com ênfase nos conteúdos educativos e na promoção da qualidade de vida.

ObjetivoPromover a redução do uso indevido de álcool e outras drogas a um maior contingente de trabalhadores nas empresas, através da prevenção e redução de riscos e danos, fundamentados nos princípios de valorização da vida.

Metodologia

A implantação do programa é feita por etapas que envolvem:Planejamento: Pesquisa diagnóstica ex-ante, formação de grupos técnicos, análise de perfil da empresa, treinamentos, construção de política de prevenção e outros;Desenvolvimento: treinamentos, realização de ações educativas, atendimento e orientações;Avaliação: realização de diagnóstico ex-post.

Benefícios

Fornecimento de informações atualizadas e confiáveis para a tomada de decisões sobre políticas de prevenção mais adequadas no ambiente de trabalho;Redução do presenteísmo, absenteísmo e dos níveis de estresse;Aumento dos índices de satisfação individual da equipe e do clima organizacional;Melhoria dos indicadores de desempenho da empresa;Imagem positiva da empresa vinculada à elevação dos níveis de saúde e qualidade de vida; Redução da perda de matéria-prima e de acidentes;Redução dos níveis de consumo indevido do álcool e outras drogas;Capacitação das empresas para desenvolver a metodologia após o término da assessoria.

Resultados

Avaliações em andamento com resultados qualitativos identificados em:Redução dos níveis de consumo indevido do álcool e outras drogas;Redução do presenteísmo, absenteísmo e dos níveis de estresse;Aumento dos índices de satisfação individual da equipe;Melhoria do clima organizacional;Melhoria dos indicadores de desempenho da empresa.

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ӹ Teatro-Fórum e pedagogia da intervenção: dimensões político-formativas com os trabalhadores da indústria

Quadro 6: Teatro-Fórum e Pedagogia da Intervenção (elaboração própria, a partir de SESI, 2013)

Item Descrição

Mot

ivaç

ão

A idéia de desenvolver uma nova tecnologia teatral com trabalhadores da indústria surgiu em 2006, durante uma capacitação para atores, professores e técnicos da classe teatral realizada no Centro Cultural SESI Rio Vermelho/Departamento Regional da Bahia. Um dos módulos desenvolvidos na capacitação foi o Teatro do Oprimido, ministrado pela Prof.ª Antônia Pereira, Professora Adjunta da Universidade Federal da Bahia e na época Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas. A partir desse contato, elabora-se o projeto com a possibilidade de alavancar um novo fazer teatral dentro das empresas. Experimentar questões pertinentes ao mundo do trabalho, à vida dos trabalhadores e suas rotinas com o Teatro do Oprimido, mais precisamente com o Teatro-Fórum, pela relação estabelecida entre palco e platéia.

Sínt

ese

É um projeto de inovação social, enquanto enriquecimento cultural que privilegia a investigação e o fazer teatral, com ênfase nas dimensões estética e político-social dessa arte.  Essa forma de atuar com teatro na empresa pode ser estimulada nas mais diversas áreas inerentes ao mundo do trabalho, como a saúde, segurança, educação e meio-ambiente, objetivando a melhoria da qualidade de vida do trabalhador e do clima organizacional das empresas. Considerada uma das técnicas mais completas e elaboradas do Teatro do Oprimido, incita os espectadores a tomarem consciência da profunda mecanização, propondo alguns exercícios que colocam em evidência suas tensões, destencionando a atmosfera e integrando o público presente que propõe a resolução da cena, transforma o fenômeno da representação teatral na soma de tentativas e soluções oriundas dos espectadores de forma organizada, agenciada e dirigida. Através dessa nova vertente teatral, os trabalhadores são estimulados a participarem, numa atitude voluntariosa, através das oficinas, dinâmicas e ensaios para as apresentações.

Obj

etiv

o Desenvolver no SESI Bahia tecnologia teatral com trabalhadores da indústria, através de experimentos cênicos pelo viés da técnica do Teatro-Fórum, inspirados nos modelos dramatúrgicos de Augusto Boal, com a perspectiva de realizar uma pesquisa na busca de uma inovação e construção de um novo fazer teatral.

Met

odol

ogia

O projeto foi realizado através das seguintes ações: vivências por meio de oficinas práticas e teóricas dos elementos universais inerentes ao teatro de Augusto Boal; realização de três espetáculos, estabelecendo uma grade analítica para observação e apontamento das dimensões a serem interrogadas: a dimensão político-pedagógica e o nível de exigência estética; estabelecimento de interfaces com as áreas da empresa, como saúde e segurança, qualidade e outros; registro através de recursos áudio-visuais e literários das etapas do processo de construção da tecnologia; avaliação e apresentação dos resultados obtidos no âmbito da pesquisa teórica e prática, na forma de publicação.

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Item Descrição

Ben

efíc

ios Levar o Teatro-Fórum para o ambiente industrial, como catalisador das ações culturais para

a construção da cidadania, o desenvolvimento de talentos e a transmissão de conhecimentos, estimulando a criação, difusão e consumo de experiências voltadas à investigação de novos significados;Melhoria da qualidade de vida do trabalhador e do clima organizacional das empresas.

Res

ulta

dos

Número de intervenções teatrais: 3- “Cresça e Apareça” – texto do Grupo Embasart (criação coletiva);- “A Revolução da América do Sul” – adaptação do texto de Augusto Boal;- “A Máquina Escavadora” – adaptação do texto de Armand Gatti.Número de participantes: meta de 100% de ampliação de participantes do Grupo Embasart.Histórico: o grupo possuía 8 integrantes antes do projeto. Após divulgação e realização do projeto, a participação do Grupo Embasart cresceu em 125%:- “Cresça e Apareça”: 12 participantes;- “A Revolução da América do Sul”: 18 participantes;- “A Máquina Escavadora”: 17 participantes (1 integrante ficou de licença médica)Foram realizadas avaliações durante o processo de cada montagem do projeto. Satisfação:- 1ª avaliação: 7,5; - 2ª avaliação: 10;- 3ª avaliação: 7,7;- Média Final: 8,4.Produtos entregues: 1 publicação e registro em DVD.

ӹ Considerações finais

Situações como ambiente de trabalho hostil, assédio, fracasso, mudanças cons-tantes na organização do trabalho, fatores relacionados ao tempo, alinhados com o nível de pressão exercida junto ao trabalhador, podem provocar tensão e, por conse-guinte, sofrimento e distúrbios mentais, o que ocasiona absenteísmo e impacta di-retamente na produtividade da indústria. As medidas apresentadas de intervenção no ambiente organizacional estão pautadas no desenvolvimento de estudos do SESI quanto aos FPS que afetam a saúde do trabalhador. Nelas, evidenciam-se fatores de intervenção em prevenção, gestão e transformações dos riscos, por meio de ferra-mentas e estratégias práticas de melhoria do ambiente e organização do processo de trabalho.

Percebe-se que a indústria brasileira possui gerenciamento direcionado pelos as-pectos legais, acerca do auxílio-doença e acidentes de trabalho vinculados a FPS. Entretanto, e por meio de ações estruturadas, vem evoluindo com proposições que ultrapassam as determinações legais. Intervém-se, de forma sistematizada, no clima organizacional, na gestão de pessoas tratando de maneira direta nos FPS que interfe-rem no absenteísmo, a exemplo das medidas ora apresentadas.

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GESTÃO DE RISCOS ASSOCIADOS A FATORES PSICOSSOCIAIS | 77

Desta forma, ressalta-se que parte desse trabalho resultou em uma discussão or-ganizada e desenvolvida pelo SESI em um fórum acerca da saúde e bem-estar no tra-balho, no qual foram apresentados os resultados alcançados nos projetos destinados à indústria, voltados a este tema, promovendo um diálogo com os principais atores sobre os pontos de intercessão de práticas, independentemente dos segmentos de atu-ação, e de eventual melhoria.

No âmbito nacional, o SESI, entendendo a importância da temática, estabeleceu como prioritária a estruturação de uma Rede Nacional de Fatores Psicossociais, ini-ciativa da Unidade Nacional de Qualidade de Vida, para promover atendimento em rede às indústrias com soluções de promoção e prevenção à saúde mental e compor-tamental, e intervenção com ações de controle dos riscos psicossociais no ambiente de trabalho, aproveitando o poder de capilaridade do SESI para proporcionar uma maior possibilidade de atendimento às industriais.

Com este tipo de organização e estratégia, pretende-se avançar na sistematização de práticas comuns para solução de problemas já identificados pelos próprios estudos do SESI. Cabe às instituições de apoio como o Serviço Social da Indústria, consolidar esse movimento gerando informação qualificada e propostas de intervenção coeren-tes com esse contexto.

ӹ REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho. Compreender a gestão dos riscos psicossociais e a participação dos trabalhadores através do Esener: Uma síntese de quatro relatórios de análise secundária. Europa, 2012.

GOLDBERG, Ruth. Como as empresas podem implementar programas de voluntariado. Instituto Ethos e do Programa Voluntários. São Paulo, 2001.

MENDES, A. M. Diagnósticos dos riscos no trabalho para os transtornos psicossociais nos diferentes setores da indústria. Brasília: SESI, 2011.

PRIMA-EF. Orientações do modelo Europeu para a gestão de riscos psicossociais: um recurso para empregadores e representantes dos trabalhadores. Tradução do Serviço Social da Indústria – Departamento Nacional. Brasília: SESI, 2012.

SANTANA, V. S. Custo e impacto sobre a produtividade na Indústria no Brasil: afasta-mentos de trabalho por acidentes e doenças relacionados ao trabalho. Brasília: SESI, 2011.

Serviço Social da Indústria - SESI. Manual para implantação do Programa de Prepara-ção para a Aposentadoria de Trabalhadores da Indústria. Departamento Regional da Bahia. Salvador: Sistema FIEB, 2012.

_________. Teatro-Fórum e pedagogia da intervenção na indústria. Salvador: Sistema FIEB, 2012.

_________. Manual do Programa de Prevenção ao Uso Indevido de Álcool e Outras Drogas. Salvador: Sistema FIEB, 2004.

YANO, S. Atuação dos diferentes Departamentos Regionais em Programas de Gestão de FPS no Brasil. Publicação eletrônica. Brasília: SESI, 2013.

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ӹ SIGLAS

CETAD – Centro de Estudos e Terapia do Abuso de DrogasFPS – Fatores PsicossociaisINSS – Instituto Nacional do Seguro SocialOIT – Organização Internacional do TrabalhoOMS – Organização Mundial de SaúdeONU – Organização das Nações UnidasPPA – Programa de Preparação para a AposentadoriaPVE – Programa de Voluntariado EmpresarialPREVDROGAS - Programa de Prevenção do Uso Indevido de Álcool e Outras

Drogas SEBRAE - Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas EmpresasSESI-DN – Serviço Social da Indústria – Departamento Nacional SESI-Ba – Serviço Social da Indústria – Departamento Regional BahiaUFBA – Universidade Federal da BahiaUNODC - Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime

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CAPÍTULO 4

PROPOSIÇÕES PARA IDENTIFICAR A RELAÇÃO ENTRE O CAPITAL hUMANO E A PERFORMANCE

ORGANIZACIONAL

Johan Hendrik Poker Júnior

ӹ Introdução

Este capítulo discute os desafios atuais na identificação da relação entre o capi-tal humano e a performance organizacional. A principal contribuição deste capítulo é a identificação das barreiras impostas à atuação dos gestores na mensuração, as proposições atuais para superar estes obstáculos e a quantificação das contribuições do capital humano para a performance organizacional considerando as limitações impostas por limitações informacionais, padronizações contábeis, vieses perceptivos e políticas organizacionais.

Ao identificar estas barreiras, espera-se incentivar o leitor a repensar as práticas gerenciais estabelecidas, incorporando novas práticas de mensuração do capital hu-mano e métodos de análise da sua relação com a performance organizacional. Esse desafio não é pequeno e tampouco novo, Drucker (1969) está entre os primeiros a declarar seu desconforto com a incapacidade das organizações de relacionar de for-ma objetiva o investimento em capital humano e a performance organizacional. Há quase 45 anos, o autor já apontava a intuitiva relação entre estes fatores sem, contudo, apresentar ferramentas objetivas para sua mensuração.

Desde então, a academia vem se dedicando a formular diversas proposições para relacionar estas variáveis, obtendo variados graus de sucesso, mas esbarrando nas limitações acima relacionadas. Como forma de reconhecer estes desafios e propor medidas para contorná-los, o presente capítulo está organizado na seguinte estru-tura: definição de capital humano na visão da teoria organizacional e sua inserção na teoria de capital intelectual, capital humano e sua relação com o investimento

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em recursos humanos, dificuldades na mensuração da performance organizacional decorrente do capital humano e considerações finais.

ӹ Definição teórica de capital humano e sua inserção na teoria de capital intelectual

Como parte do processo de compreensão do conceito de capital humano e de sua inserção na teoria de capital intelectual, pode-se recorrer ao trabalho de Andriessen (2004). Neste trabalho, o autor fez uma análise do estado da arte em relação à avalia-ção e à mensuração do capital intelectual. Com esta finalidade, foi constituída uma análise das proposições dos principais autores que trabalharam o tema até a data em que foi produzido o artigo. Com o propósito de analisar o conceito de capital huma-no como parte do capital intelectual, são analisados aqui as pesquisas que contribuí-ram com conceitos operacionalizáveis dos termos, como forma de garantir a análise empírica dos resultados e a aplicabilidade prática dos resultados apresentados.

O detalhado trabalho de Andriessen (2004) relacionou vinte e cinco autores que, até a data em que foi publicado seu estudo, apresentaram conceituações diferentes de capital intelectual. No entanto, graças a Aguiar (2009), pode-se identificar as oito conceituações que, diferente das demais, estão atreladas a modelos de mensuração e controle, o que restringe o universo de proposições operacionalizáveis por organiza-ções e pela sociedade.

Mas então como analisar o capital humano e sua inserção no capital intelectual com estas informações? Conforme pode ser observado na Tabela 1, todos os oito au-tores identificados por Aguiar (2009), dentre os listados por Andriessen (2004), que propuseram modelos mensuráveis, consideraram como componente do capital inte-lectual o capital humano. Estes autores sugerem, como será apresentado na seção se-guinte do capítulo, a mensuração do componente de capital humano dentro do capi-tal intelectual como estando relacionada com o investimento em recursos humanos.

Convém ainda mencionar que os demais componentes das oito definições de ca-pital intelectual não têm a mesma consonância de opiniões nem mesmo entre os autores dedicados a estudá-las. A razão pra tanto é a dificuldade em expressar estes componentes de forma tangível, o que os torna, ao menos em parte, exercícios de reflexão silogística, em lugar de definições pragmáticas. Longe de serem descarta-das, requerem, portanto, um aprofundamento teórico maior dos interessados para a compreensão e o juízo a respeito dos termos. Ressalvadas estas condições, os auto-res conduzem uma classificação que, como veremos a seguir, acaba por ser ou mais específica ou mais abrangente, mas cujos elementos inclusos apresentam aproxima-damente características do que será chamado capital estrutural e capital relacional.

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PROPOSIÇÕES PARA IDENTIFICAR A RELAÇÃO ENTRE O CAPITAL hUMANO... | 81

Tabela 1: os componentes do capital intelectual na literatura da área 1

O capital humano é um componente reconhecido como fundamental para a conceituação do capital intelectual. Muito embora não seja possível uma definição consensual, podemos perceber pelos autores relacionados uma tendência a adotar o conceito de capital intelectual como composto pelo capital humano, o capital es-trutural (ou organizacional) e o capital relacional. Tais definições tendem, em sua maioria, a serem influenciadas pelos conceitos da RBA (resource based approach). Um aprofundamento na literatura da RBA seria necessário para a formulação de mecanismos de mensuração para os demais componentes do capital intelectual, não sendo a proposta para este estudo.

Embora não debatido neste estudo, convém referir-se a Roos et al. (1997), Roos (2003), Viedma (2004) e Silveira (2012), cujas definições de capital intelectual con-vergem nas categorias mais gerais, ou seja: capital humano, capital estrutural (orga-nizacional) e capital relacional. Como definição de cada um destes termos tem-se: a) capital estrutural (ou organizacional), normalmente denominado como ativo in-tangível, e que pode ser exemplificado por marcas, códigos IP, software, estruturas organizacionais, sistemas de controle etc.; b) capital relacional que representa o valor dos recursos obtidos pelo relacionamento da organização com os atores externos, tais como fornecedores, clientes, comunidades locais, governos, acionistas e outros stakeholders presentes em sua rede de relacionamentos.

1 Fonte: adaptado de Andriessen (2004) e de Aguiar (2009).

AuTOR ANO NOME COMPONENTES DO CAPITAL INTELECTuAL

Brooking 1996 Capital Intelectual Auditado

Ativos de mercado

Ativos centrados em

humanos

Ativos de infra-estrutura

Ativos de propriedade intelectual

Intellectual Capital Services Ltd. 1997 Enfoque do valor

holístico (HVA)Capital

RelacionalCapital

HumanoCapital

Organizacional

Roos et all. 1997 Capital Intelectual Indexado

Capital Humano

Capital Estrutural

Edvinsson e Malone 1997 Navegador Skandia Capital de

clientesCapital

Humano

Capital organizacional:

de processo

Capital organizacional:

de inovação

Sullivan 2000 Capital Humano

Ativos intelectuais:

Ativos intangíveis estruturais

Ativos intelectuais:

Ativos intangíveis

comercializáveis

McPherson e Pike 2001 Metodologia do Valor Inclusivo

Capital Estrutural Relacional

Capital Humano

Capital Estrutural de Organização

Capital estrutu-ral de Inovação

Bonfour 2002 Valor Dinâmico do Capital Intelectual

Capital de mercado

Capital Humano

Capital Estrutural

Capital de Inovação

Viedma 2004Sistema

Benchmarking de Capital Intelectual

Capital Relacional

Capital Humano

Capital Estrutural

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Já o capital humano é conceituado por Roos et al. (1997), Roos (2003), Viedma (2004) e Silveira (2012) pelos elementos presentes nos indivíduos atuantes na organi-zação como: o conhecimento tácito, a destreza, a motivação e a habilidade comuni-cativa, entre outros. Estes elementos individuais, entendidos de maneira geral como conhecimentos, são benéficos às atividades das organizações, ao ampliar a geração de recursos, promovida pela aplicação do trabalho dos indivíduos em conjunto com o capital para a geração de performance. Os elementos do capital humano são men-suráveis quando admitida a sua indissociabilidade dos recursos humanos, a remu-neração pelo conhecimento ocorre conjuntamente com a remuneração pelo trabalho nas organizações.

ӹ Capital humano e sua relação com os investimentos em recursos humanos

A literatura em gestão de recursos humanos é vasta em proposições para promo-ver o desenvolvimento do capital humano, livros consagrados como Ulrich (1994) exploram extensivamente o tema considerando as suas especificidades. Para o autor, gerenciar recursos humanos compreende o processo de conversão dos recursos fi-nanceiros investidos nos indivíduos da organização (recursos humanos) em perfor-mance organizacional.

No entanto, este investimento implica em riscos. Um artigo clássico que discute os investimentos em capital humano e seus riscos foi desenvolvido por Becker (1962). Neste artigo, o autor analisa os ganhos aos indivíduos e às organizações ao investir em capital humano, justificando o ganho das organizações no investimento em capi-tal humano pelo risco incorrido ao realizá-lo.

Neste artigo clássico, Becker (1962) reconhece como dimensões do investimento em capital humano, conforme a natureza e o propósito como: 1) formação na área de atuação, que pode ser a) geral ou b) específica; 2) formação acadêmica; 3) outros conhecimentos, que incluem o conhecimento tácito e a experiência no mercado de atuação (quais os melhores fornecedores, quais os clientes pontuais, qual a melhor forma de reparar um equipamento etc.); 4) taxa de produtividade, que inclui o inves-timento em saúde física e emocional.

Na medida em que se incorre riscos ao investir recursos na melhoria do capi-tal humano, os detentores do capital aplicado aos recursos esperam um retorno na forma de performance organizacional. Um dos grandes desafios na mensuração da performance organizacional obtida pelo capital humano está no reduzido acompa-nhamento externo dos dados relacionados com os gastos em recursos humanos, par-ticularmente na forma como Becker (1962) apresenta em seu artigo.

Desta forma, acompanhar os investimentos em recursos humanos não faz parte hoje do que o mercado financeiro costuma realizar, basicamente pelo fato da conta-bilidade financeira não obrigar as organizações a reportar suas despesas nesta área,

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PROPOSIÇÕES PARA IDENTIFICAR A RELAÇÃO ENTRE O CAPITAL hUMANO... | 83

mas também por haver um desconhecimento dos investidores quanto ao potencial relacionado ao investimento em capital intelectual.

Atualmente as dificuldades para investidores e a sociedade determinarem a po-tencialidade do investimento em capital humano pelas organizações no Brasil são grandes. O principal motivo é a ausência de mecanismos de divulgação de informa-ções contábeis relacionadas com os valores gastos com recursos humanos. Apenas um modelo de relatório voluntário relacionado com políticas de sustentabilidade or-ganizacional, promovido pelo IBASE e denominado Balanço Social atende os requi-sitos listados por Becker (1962).

No entanto, como mostra a Figura 1, este modelo tem sido preterido em relação a outros mecanismos de divulgação de dados de sustentabilidade organizacional com foco exclusivamente em sustentabilidade externa, deixando de lado as informações internas.

Figura 1: número de empresas adotando o relatório IBASE por ano (elaboração própria)

Pode-se perguntar a razão para o gasto em recursos humanos ser uma informa-ção tão difícil de ser divulgada pelas organizações. Parte da questão diz respeito à forma como o capital humano é visto gestores. Diferente de ativos tangíveis, estes não constam do balanço das empresas, apesar disso, sua despesa de manutenção (os gastos com recursos humanos), constam dos fluxos de caixa das organizações e ainda fazem parte do chamado capital circulante, ou seja, os recursos cuja minimização é o foco de todos os programas de melhoria de desempenho organizacional.

0

20

200

180

160

140

120

100

80

60

40

1996 1997 1998 1999 2000 2001 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011

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Assim, divulgar os gastos com recursos humanos torna-se, na visão do gestor, um ato de autoflagelo, visto que as variações deste serão vistos como redução da eficiên-cia organizacional. Sem a contrapartida visível do incremento do capital humano, e, como veremos a seguir, da performance a ele vinculada, o gestor opta por omitir esta informação, se possível, ou ainda, a divulga sob a égide da sustentabilidade, ao in-vés de buscar os argumentos para defender estes gastos no aumento da performance organizacional.

ӹ Dificuldades na mensuração da performance organizacional decorrente do capital humano

A relação entre a performance organizacional e os componentes do capital inte-lectual podem ser construídas por diversas abordagens, a depender do que se entenda como performance organizacional. Uma das dificuldades presentes na avaliação da relação entre o capital humano e a performance organizacional é a identificação de um conceito de performance organizacional que seja capaz de captar os efeitos do investimento realizado em pessoas.

As propostas de mensuração de performance organizacional podem ser divididas em duas categorias, as propostas relacionadas a medidas internas da organização e as medidas de performance organizacional relacionadas ao mercado financeiro. Embora o propósito de ambas as categorias seja a mensuração do valor econômico da empresa, ambas sofrem de vieses de percepção dos gestores e dos investidores res-pectivamente, além de deter um componente de assimetria informacional que pode dificultar a garantia da acuidade do indicador.

Tratando primeiramente da mensuração da performance pelo mercado financei-ro, deve-se considerar o efeito de convergência entre o valor de mercado e o valor eco-nômico da organização. Segundo Copeland et al. (2002), o valor de mercado de uma organização tende ao longo do tempo por coincidir com o valor econômico, uma vez que as expectativas dos fluxos de caixa futuros sejam verificadas.

Como medida de performance organizacional capaz de captar o efeito nos fluxos de caixa futuros do investimento em capital humano, pode-se adotar a relação com entre valor de mercado e valor contábil (market-to-book ratio – MBR). Esta medida possui propriedades interessantes na captura da contribuição dos valores futuros, segundo McNichols et al. (2010), desde que sejam consideradas algumas de suas limi-tações, particularmente as relacionadas com a capacidade de captura de informações da padronização contábil sob a premissa do conservadorismo contábil.

Segundo McNichols et al. (2010), o conceito por trás da diferença entre o valor contábil e o valor de mercado de uma organização está em dois componentes fun-damentais, o primeiro diz respeito à diferença na captura do valor de ativos atuais devido ao conservadorismo contábil (CC), o segundo diz respeito a avaliação dos investidores da presença de potencial de gerar ganhos futuros, denominada valor

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PROPOSIÇÕES PARA IDENTIFICAR A RELAÇÃO ENTRE O CAPITAL hUMANO... | 85

futuro sobre o valor contábil (future-to-book ratio – FBR). Este segundo componente corresponde à expectativa pelos investidores do valor presente dos fluxos de caixa incrementais futuros decorrentes de investimentos em ativos intangíveis, ou seja, ativos não passíveis de serem capturados pela contabilidade das organizações. Na Figura 2 é apresentada uma ilustração do conceito de fluxos de caixa incrementais. Pode-se, portanto, entender o MBR como sendo:

MBR = CC + FBR

Conforme McNichols et al. (2010), nenhum dos componentes da equação (1) po-dem ser observados diretamente, uma vez que o primeiro diz respeito ao componente não capturado do valor dos ativos atuais, cuja estimação foi desenvolvida pelos auto-res com base na diferença em períodos anteriores por empresa e por setor. Já o FBR é estimado com base na diferença entre o MBR e o CC.

Figura 2: ilustração de fluxo de caixa incremental criado por projeto de investimento em capital humano

O estudo empírico conduzido por McNichols et al. (2010) demonstra a proporção entre o CC e o FBR no valor do MBR, enquanto o CC estimado foi de 1,83, o FBR foi de 1,165, totalizando um MBR de 2,995. Ou seja, apesar de existir fundamento na argumentação de que o MBR é uma medição influenciada pelo CC, a importância do FBR é inegável.

ano 0

ano 1

ano 3ano 2ano 4

ano 5

Fluxo de caixa original

Fluxo de caixa incremental

Valor Presente Líquido (VPL) da organizaçãosem implementação do projeto incremental

Valor Presente Líquido (VPL) do projetoincremental implementado }

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Utilizando os resultados empíricos das pesquisas conduzida por Ballester et al. (2002) e mais recentemente por Sáenz (2005), pode-se identificar a contribuição do capital humano no FBR. O primeiro estudo conduzido pelos autores utilizou uma amostra de empresas americanas que, de maneira espontânea e regular, divulgam seu gasto total com recursos humanos (salários, benefícios, custos previdenciários, etc.), estas empresas são, em sua grande maioria, grandes empresas ou empresas em segmentos regulados, sendo assim, empresas que apresentam uma expectativa de re-lação entre capital humano e desempenho menores (dado que a maioria das grandes empresas e das empresas reguladas são empresas de capital intensivo, muitas delas extrativistas ou de transformação).

Os resultados de Ballester et al. (2002), mesmo com a amostra viesada em desfa-vor ao capital humano, indicam que 16% da diferença entre o valor de mercado e o valor contábil das empresas é derivado do investimento em capital humano. O estu-do revela ainda que os investimentos em capital humano são amortizados por estas empresas a uma taxa de 34% ao ano. Na Figura 3 é ilustrada a participação relativa do capital humano no MBR.

Sáenz (2005) conduziu estudo semelhante para os bancos espanhóis, encontrando relação positiva entre o investimento em recursos humanos e o desempenho organi-zacional mensurado pelo MBR. Apesar da significância encontrada, vale observar que também a amostra de Sáenz (2005) não contemplou empresas que se esperariam usufruir maiores benefícios do capital humano, particularmente as empresas em se-tores de alta tecnologia.

Figura 3: a contribuição do capital humano para o market-to-book ratio (elaboração própria)

Enquanto as medidas de performance organizacional revelam ao investidor o ga-nho obtido pelo investimento em capital humano, os gestores dependem de ferramen-tas de mensuração internas para conduzir a organização a decisões que representem a vontade do investidor, ou seja, decisões que maximizem o valor da organização.

Uma ferramenta proposta com o propósito de ser um medidor interno do desem-penho do capital intelectual é o VAIC, Value Added Intellectual Coefficient, desenvol-vido por Pulic (2004). Este indicador foi testado empiricamente em amostras de di-

Valor de Mercado

Valor Contábil

Conservadorismo Contábil

Future-to-Book Ratio Capital HumanoDemais

componentes

Market-to-Book Ratio McNichols et al. (2010) Ballester et al. (2002)

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PROPOSIÇÕES PARA IDENTIFICAR A RELAÇÃO ENTRE O CAPITAL hUMANO... | 87

versos países e segmentos organizacionais com resultados positivos em diversos dos estudos conduzidos. Entre suas propriedades está o fato de ser um índice combinado de três índices: eficiência do capital econômico empregado, eficiência do capital es-trutural e eficiência do capital humano. A equação 2 ilustra a composição do índice –

(1) VAIC™ = ECH + ECS + ECE

–, onde VAIC™: valor adicionado do capital intelectual; ECH: eficiência do capital humano; ECS: eficiência do capital estrutural; ECE: eficiência do capital empregado.

Para obter os indicadores de eficiência listados, é utilizado o conceito de valor adicionado (VA). Nos artigos empíricos que testam este indicador é recomendada a utilização da medida de valor adicionado proposta inicialmente por Firer e Williams (2003) e Chen e Cheng (2005) que aumenta a precisão do cálculo ao considerar apenas os componentes que representam resultados efetivos (lucro retido e dividendos) da receita operacional, da seguinte forma:

(2) VA = DIV + LR + CE + A + D + I

– onde DIV: dividendos; LR: lucros retidos; CE: custo dos empregados; D: depre-ciação; I: impostos; A: amortização.

Nesta equação (3), o custo dos empregados inclui todas as dimensões propos-tas por Becker (1962). Considerando-se este custo dos empregados como o custo de manutenção demandado no período para a geração de um determinado valor adi-cionado, calcula-se a eficiência do capital humano conforme a equação 4. Se conside-rarmos que o capital estrutural será o responsável pela geração do excedente do VA, temos então as equações 5 e 6 apresentadas:

(3) ECH = VA/CH

(4) CS = VA – CH

(5) ECS = CS/VA

– onde ECH: eficiência do capital humano; ECS: eficiência do capital estrutural; VA: valor adicionado; CH: capital humano; CS: capital estrutural.

As equações 4 e 6 representam a eficiência do trabalho e do conhecimento da or-ganização na criação de valor adicionado, no entanto, não importa a eficiência desses elementos sem o capital a eles aplicado, assim, Pulic (2004) propõe um terceiro índice de eficiência, agora para o capital empregado, conforme equação 7 –

(6) ECE = VA/AL

– onde AL: total de ativos empregados.O modelo VAIC™ apresenta algumas propriedades interessantes para seu uso

como modelo de mensuração para as organizações: (1) é um dos primeiros que tenta expressar o capital intelectual exclusivamente baseando-se nos elementos contábeis;

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(2) é um modelo que se alinha com as proposições da área de estudos organizacio-nais, promovendo uma aproximação das duas áreas do conhecimento; e (3) mensura a eficiência em lugar do volume, possibilitando identificar quando os desempenhos organizacionais forem alcançados às custas da redução da eficiência em lugar de aumento.

ӹ Considerações finais

Apesar dos desafios apresentados serem diversos e complexos, conforme vimos, existe na literatura acadêmica proposições que superam estas barreiras para a avalia-ção da performance organizacional decorrente do capital humano. Estas proposições poderão ser adotadas pelas organizações, quanto maior for a percepção da impor-tância do capital humano para as organizações. A percepção da importância se dá na medida em que a mensuração deste elemento prescreva vantagens aos agentes envolvidos com as organizações.

Diferentes públicos podem obter, a partir do que foi exposto, subsídios para de-senvolver políticas de seu próprio interesse, a saber: (1) os investidores, cientes da potencialidade do capital humano como gerador de performance organizacional po-dem demandar das organizações estratégias organizacionais que atendam seus inte-resses considerando este elemento; (2) os gestores, organizando medidores internos para otimizar a alocação de recursos em capital humano e utilizando da performan-ce obtida como argumento para o aumento das despesas com recursos humanos; (3) governantes e representantes dos trabalhadores, sabendo das potencialidades decor-rentes do investimento em capital humano, podem gerar mecanismos que, através da determinação da performance organizacional podem demandar melhorias em condições de trabalho, saúde física e emocional e formação dos trabalhadores.

Assim, com a implementação de medidas de performance organizacional e men-suração interna, os benefícios da gestão do capital humano podem passar a ser reco-nhecidos de maneira mais ampla e seu papel valorizado.

ӹ REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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SEÇÃO II

FUNDAMENTOS E INDICADORES NAS TOMADAS DE DECISÕES SOBRE AMBIENTE

DE TRABALhO E TRABALhADOR

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CAPÍTULO 5

A INTENSIFICAÇÃO COMO PEÇA FUNDAMENTAL NO MECANISMO DE AGRAvOS PSICOSSOCIAIS DO

TRABALhO

Renata Coelho Vieira

“A racionalização econômica do trabalho venceu, portanto, a resistência das anti-gas ideias de liberdade e de autonomia existenciais. Fez nascer o indivíduo que, aliena-do em seu trabalho, também o será, obrigatoriamente, em seu consumo e, finalmente, em suas necessidades. Porque não há limite à quantidade de dinheiro suscetível de ser ganho e gasto, também não haverá limite às necessidades que o dinheiro cria, nem à necessidade de dinheiro. Sua extensão cresce com a riqueza social. A monetarização do trabalho e das necessidades fará finalmente explodir os limites que lhe eram impostos pelas filosofias da vida” (GORZ, 2003).

ӹ Introdução

Este ensaio visa a refletir, de forma breve, sobre a ampliação dos poderes de con-trole e direção do empregador, com influência direta na intensificação do trabalho, 1 o que impacta de forma drástica nos agravos psicossociais à saúde do trabalhador. 2

1 Consoante Ricardo Antunes: “Como o capital não pode eliminar o trabalho vivo do processo de mer-cadorias, sejam elas materiais ou imateriais, ele deve, além de incrementar sem limites o trabalho morto corporificado no maquinário tecno-científico, aumentar a produtividade do trabalho de modo a intensifi-car as formas de extração do sobretrabalho em tempo cada vez mais reduzido. Tempo e espaço se convulsio-nam nessa nova fase dos capitais”. ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho? Ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade no mundo do trabalho. 15ª ed. São Paulo: Cortez Editora, 2013, p. 175.2 Considera-se aqui agravos ou riscos psicossociais do trabalho aqueles relacionados à forma como o trabalho é concebido, organizado ou gerido. São os agentes nocivos associados especialmente à saúde mental do trabalhador, às exigências emocionais e à energia psíquica necessária à realização do trabalho. Incluem os métodos de cobranças e exigências sobre as capacidades e competências, que podem afetar o bem-estar psicológico do trabalhador, perpassando por formas de gestão e organização do trabalho.

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Numa sociedade em que o trabalho ocupa grande parte de nossas vidas, sendo, muitas vezes, o maior referencial de quem somos, considerado não apenas meio de sustento, mas de inclusão social e de promoção da dignidade, ainda está o trabalhador distante da ampla proteção de seus direitos fundamentais. No atual estágio do sistema capitalista e após longos anos de predomínio do pensamento neoliberal, quedou-se o trabalhador bastante oprimido em meio ao poder dos empregadores e à lógica perversa de organização do trabalho implementada nas empresas.

Estamos, talvez como nunca na História, vivenciando de forma clara e perigosa os contrassensos do trabalho, conforme alertavam pensadores como Marx e, mais recentemente, obras de psicopatologias do trabalho, como de Dejours (2003). O tra-balho que liberta e aprisiona, que emancipa e aliena, que causa prazer e sofrimento.

Em plena Era da Informação, e mesmo com a suposta proximidade de um nível de “pleno emprego”, porém com alto grau de intensidade de trabalho, não parecem as relações de trabalho mais “humanizadas”. Essa a percepção do Ministério Público do Trabalho e de órgãos de defesa de direitos e da saúde do trabalhador com os quais se relaciona.

Lutas recentes por redução da jornada do trabalho não surtiram o resultado esperado, nem vieram acompanhadas de limites no incremento da produção e do controle.

Aliás, Marx, citado por Harvey, já advertia que “os pequenos momentos são os elementos que formam o lucro” (HARVEY, 2013). E Harvey conclui: “Os capitalistas tentam aproveitar todo e qualquer momento do tempo do trabalhador no processo de trabalho. Os capitalistas não só compram a força de trabalho de um trabalhador por doze horas, como têm de assegurar que cada momento dessas doze horas seja usado com o máximo de intensidade” (HARVEY, 2013).

Existem hoje em voga os mais variados tipos e combinações de jornadas, descan-sos são suprimidos, horas extras são frequentes em alguns segmentos, a imposição do ritmo e da cadência é ditada pelo empregador, com objetivo único de produtividade cada vez maior, em menos tempo e com menos trabalhadores. Inclusive no tempo para “além-jornada”, cada vez mais difícil o desapego, o “desligamento” dos traba-lhadores, acessados que são pelas facilidades tecnológicas e demandados que são em ampliação de capacidades, competências e atingimento de resultados. 3

Lembra Antunes que “as máquinas inteligentes não podem extinguir o trabalho vivo. Ao contrário, a sua introdução utiliza-se do trabalho intelectual do operário que, ao interagir com a máquina informatizada, acaba também por transferir parte dos seus novos atributos à nova máquina que resulta desse processo. Estabelece-se, então, um complexo processo interativo entre trabalho e ciência produtiva, que não leva à extinção do trabalho, mas a um processo de retroalimentação que gera a necessidade de encontrar uma força de trabalho ainda mais complexa, multifuncional, que deve ser explorada de maneira mais intensa e sofisticada, ao menos nos ramos produtivos dotados de maior incremento tecnológico”. Ibid., p. 176.3 Diz Marx, citado por Harvey, que “tempo para a formação humana, para o desenvolvimento inte-lectual, para o cumprimento de funções sociais, para relações sociais, para o livre jogo das forças vitais

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Tudo isso anda lado a lado com o sofrimento psicológico, a pressão, a busca da perfeição e dos padrões cada vez mais altos de qualidade total que, caso não atingidos, geram o sofrimento pelo desgosto, pelo cansaço que não foi compensado, pelo senti-mento de incompetência ou de não ser o operário padrão do mês, pela necessidade de mentir, trapacear, enganar ou prejudicar outrem a fim de manter-se em destaque.

Como nos lembra Dejours: “Com a reorganização do trabalho, em consequência das últimas reformas estruturais, criaram-se condições extremamente dolorosas em relação aos valores do trabalho bem feito, o sentido da responsabilidade e a ética pro-fissional. A obrigação de fazer mal o trabalho, de ter que dá-lo por terminado ou men-tir, é uma fonte importantíssima e extremamente frequente de sofrimentos no tra-balho: está presente na indústria, nos serviços, na administração” (DEJOURS, 2013).

A mesma concorrência que impele às terceirizações, por exemplo, vai ao encontro da precarização. 4 O Ministério Público do Trabalho tem constatado em sua atuação que até algumas grandes redes internacionais e nacionais, com a finalidade de tornar seu produto ainda mais competitivo e aumentar sua margem de lucro, valem-se de medidas de gestão maléficas à saúde do trabalhador e aderem a práticas reprováveis como trabalho escravo e infantil. 5

O que nos dizem as notícias, os estudos, os processos judiciais e as investigações nos inquéritos trabalhistas é que, ainda hoje, quando temos tantas normas protetivas estabelecidas e uma gama bem complexa de direitos trabalhistas e sociais, completa-mos 25 anos de nossa Constituição da República e 65 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, encontramo-nos numa época em que o trabalhador sofre cada vez mais com abusos patronais à sua dignidade, 6 integridade, honra, imagem,

físicas e intelectuais, mesmo o tempo livre do domingo (...) é pura futilidade! Mas em seu impulso cego e desmedido, sua voracidade de lobisomem por mais trabalho, o capital transgride não apenas os limites morais da jornada de trabalho, mas também seus limites puramente físicos. Ele usurpa o tempo para o crescimento, o desenvolvimento e a manutenção saudável do corpo. Rouba o tempo requerido para o consumo de ar puro e de luz solar. Avança sobre o horário das refeições e o incorpora sempre que possível, ao processo de produção”. HARVEY, David. Para entender O Capital. São Paulo: Boitempo, 2013, p. 144.4 “Paralelamente à globalização produtiva, a lógica do sistema produtor de mercadorias vem conver-tendo a concorrência e a busca da produtividade num processo destrutivo que tem gerado uma imensa sociedade dos excluídos e dos precarizados”. ANTUNES, op. cit., p. 181.5 Entende Dal Rosso que “a principal contradição do sistema do capital é o fato de o capital se apropriar dos valores produzidos pelo emprego do trabalho alheio. A crise não é de regulação nem de moderni-dade; ao contrário, ela decorre da deterioração das condições de trabalho, do aumento do desemprego crônico e da intensificação da taxa de exploração. Sob o sistema de controle social capitalista, não pode haver outra forma de escapar de tais distúrbios e disfunções de curto prazo, a não ser pela intensificação das taxas específicas de exploração”. DAL ROSSO, Sadi. “Crise socioeconômica e intensificação do tra-balho”, in Riqueza e miséria do trabalho no Brasil II. 1ª ed. São Paulo: Boitempo, 2013, p. 48.6 Para citar uma notícia (http://gazetaonline.globo.com/_conteudo/2013/04/noticias/dinheiro/ 1430588-em-tres-meses-casos-de-assedio-no-trabalho-ja-representam-37-de-todo-o-ano-passado.html) de

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emoções, bem-estar mental, personalidade, 7 tendo os riscos psicossociais do trabalho grande repercussão na saúde obreira.

ӹ Proteção do patrimônio moral do trabalhador: noções preliminares

Demorou séculos para nossa sociedade e, com ela, o Direito, evoluir no sentido de proteger a pessoa, seus direitos personalíssimos, 8 seus bens imateriais. A origem pa-trimonial do Direito, a busca da defesa da propriedade e de bens materiais permitiu por muito tempo o degredo do patrimônio moral. 9

22/04/2013: “Em três meses, casos de assédio no trabalho já representam 37% de todo o ano passado. Cresce a denúncia de trabalhadores por conta de apelidos pejorativos, gracinhas e discriminações. [...] Apelidos, falas ríspidas, brincadeiras de mau gosto, exigências descabidas. Vale tudo na hora de impor metas e fazer cobranças aos funcionários, até mesmo esquecer os direitos trabalhistas do funcionário. O número de ações judiciais movidas no Tribunal Regional de Trabalho do Espírito do Santo (TRT-ES), relacionados a discrimi-nação, assédio moral e sexual é alto. Em 2012, foram movidos 474 processos do tipo, em primeira e segunda instância. Só nos três primeiros meses desse ano foram 176 ações, o equivalente a 37% de todo o ano passado. O assunto volta à tona por conta do caso da funcionária da rede de hipermercados Carrefour que ganhou, no Tribunal Superior do Trabalho (TST), o direito de ser indenizada em R$15 mil por ser chamada de “sapa-tona” pelos colegas de trabalho, pelo fato de ser solteira. A atitude configura assédio moral, ou seja, quando a vítima é discriminada repetidamente. Atitudes do tipo podem causar depressão, angústia, síndromes de terror e pânico, irritação constante, dentre outros problemas, conforme o desembargador do TRT-ES, Carlos Henrique Bezerra Leite. ‘A ação repetitiva faz com que a pessoa chegue ao ponto de pedir demissão. A autoes-tima da pessoa fica comprometida, e o assediado acaba desenvolvendo uma série de doenças, que complicam o comportamento social e familiar’, explica Leite. Embora haja ampla divulgação de campanhas de cons-cientização sobre discriminação e assédio, o número de casos é cada vez maior. ‘Essas ações vêm crescendo assustadoramente. No Tribunal, analisamos muitos casos de discriminação por idade, raça e cor. Há também discriminação contra as mulheres, principalmente negras e as grávidas. E até por obesidade’, avalia [...]”.7 Na definição de Marcius Geraldo Porto de Oliveira: “Honra, moral, identidade e intimidade são conceitos abstratos e dependem dos valores específicos consagrados em determinado grupo social. Num país com dimensões continentais como o Brasil, é difícil conceituar e enumerar com precisão os valores morais da sociedade”. OLIVEIRA, Marcius Geraldo Porto de. Dano moral. Proteção jurídica da consciên-cia. São Paulo: Editora de Direito, 1999, p. 62.8 Como sustenta Caio Mário da Silva Pereira, os direitos da personalidade são “os ‘inatos’ (como o direito à vida, o direito a integridade física e moral), sobrepostos a qualquer condição legislativa, são absolutos, irrenunciáveis, intransmissíveis, imprescritíveis: absolutos, porque oponíveis erga omnes; ir-renunciáveis, porque estão vinculados à pessoa de seu titular. Intimamente vinculados à pessoa, não pode esta abdicar deles, ainda que para subsistir; intransmissíveis, porque o indivíduo goza de seus atributos, sendo inválida toda tentativa de sua cessão a outrem, por ato gratuito como oneroso; imprescritíveis, por-que poderá o titular invocá-los, mesmo que por largo tempo deixa de utilizá-los”. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Vol. 1, 6ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994, p.156.9 Para João de Lima Teixeira Filho, dano moral ou dano ao patrimonial moral “é o sofrimento humano provocado por ato ilícito de terceiro que molesta bens imateriais ou magoa valores íntimos da pessoa, os

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Nas relações de trabalho e no Direito do Trabalho não foi diferente. Até porque nossa história vem lastreada em regimes de produção baseados na acumulação, no lucro a qualquer preço e longa já foi a estrada que levou do escravagismo ao trabalho “livre” e remunerado. Mesmo com o desenvolvimento do capitalismo e sua regula-ção, não há como se negar seja da lógica desse regime a exploração da “mais valia” 10

no intuito do lucro, ainda que para tanto preciso seja preterir a condição de pessoa do trabalhador.

Por certo devemos reconhecer que desde as primeiras lutas por jornada, por erra-dicação da mão-de-obra infantil, por seguridade social até os dias de hoje enorme foi a evolução. Passamos de uma época em que mulheres e crianças eram objetos, que a pessoa com deficiência era descartada por inútil, ao reconhecimento de sua condição de seres humanos com direitos consagrados, merecedores, inclusive, de normas de especial proteção. Superamos a visão de que o trabalho era penalidade, depois de que era o necessário apenas à sobrevivência, e passamos a visão de que o trabalho digni-fica o homem, tendo valor para muito além de seu sustento econômico.

Todavia, passamos ao largo da utopia marxista e, não obstante toda a evolução social, jurídica, política e econômica, hoje somos o que produzimos. Nossa identida-de para a família e a sociedade é nossa profissão. Ao contrário dos anseios de célebres pensadores e teóricos do capitalismo, passamos mais tempo no trabalho que com nossos amigos e parentes. Mesmo quando nem chegamos ao trabalho ou dele já saí-mos ainda pensamos em trabalho ou a algo mesmo indiretamente com ele relaciona-do. A ideia de centralidade do trabalho nunca esteve tão evidente.

Por vezes em férias pensamos em trabalho – o e-mail a ser respondido, o retorno daquela ligação, o tal documento que precisa ser assinado, o estudo que tem que ser lido, a próxima meta a ser cumprida, etc. A intensidade do trabalho aumentou – o que será explicitado mais adiante – e para isso contribuiu a tecnologia, o implemen-to de ideias neoliberais na organização do trabalho e a divisão social do trabalho contemporânea.

Gorz lembra que “no lugar de trazer uma liberação, a informatização provoca, com frequência, uma “densificação” do trabalho pela eliminação dos “tempos mor-tos” e obrigação de acelerar sua cadência” (GORZ, 2003). Tal formulação é hoje cons-tatação de nossa realidade.

Parece que o ser humano trabalhador chegou ao seu limite psicológico com rela-ção ao trabalho e ao volume que ele consome de energia, dedicação, atenção, esforço mental. Quando ainda nem resolvemos questões seculares relativas a trabalho escra-vo, trabalho infantil, trabalho além das forças, anotação de Carteira do Trabalho,

quais constituem o sustentáculo sobre o qual sua personalidade é moldada e sua postura nas relações em sociedade é erigida”. SÜSSEKIND, Arnaldo, et al. Instituições de direito de trabalho. Vol. 1, 17ª ed. São Paulo: LTr, 1997, p. 627.10 O conceito marxista de “mais-valia” vem modernamente também nominado de “mais-valor”.

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jornadas excessivas e outros, nos deparamos com os problemas relativos à intimida-de, à honra, 11 à privacidade, 12 à moralidade, à integridade e à saúde mental e emocio-nal do trabalhador.

Ora, há séculos tentando resolver questões mais “visíveis”, mais “materiais”, mais factíveis e elas ainda estão longe de serem erradicadas. Realmente, não seria no cam-po do “invisível”, do imaterial, da psique do trabalhador que as conquistas sociais viriam imediatamente.

Contudo, não se pode deixar de reconhecer que vivemos um momento de busca de regulação de condutas que violam os direitos personalíssimos do trabalhador e seus bens morais. 13 Momento de estudos aprofundados da matéria, de debates jurídi-cos, políticos e econômicos, de reorganização da luta sindical, de análise de situações que até agora tinham sido relegadas a um segundo plano, como saúde mental, dum-ping social, trabalho degradante, consideradas que eram de somenos importância talvez, para uma sociedade e um Direito, como dito, que visavam à defesa dos bens materiais apenas.

E, no entanto, é um momento também em que nos deparamos com um número assombroso de situações, notícias ou processos em que o trabalhador é tratado de forma desumana, indigna, submetido as mais variadas formas de humilhação em-butidas em manobras perversas e muitas vezes de uma criatividade surpreendente,

11 Aníbal Bruno inclui no conceito de honra a noção de dignidade: “Aquele sentimento da própria dig-nidade que se forma no foro íntimo do indivíduo não lhe basta. É sobretudo no meio social que ele tem de realizar o seu destino. E, portanto, não se contenta com aquela representação interior da sua dignidade; necessita de que esse valor seja reconhecido pelos demais, que estes lhe tributem a consideração de que se julga merecedor e assim se afirme a sua boa reputação, cujo respeito a ordem jurídica lhe assegura como atributo da sua personalidade. Mas, embora se manifeste, assim, com esses dois semblantes, a honra é uma estrutura unitária, um valor em que se apoia o indivíduo para o conceito que tenha de si mesmo e a imposição da própria pessoa no meio social”. Apud FREITAS. Manoel Mendes. “Ação de indenização por dano moral – incompetência da Justiça do Trabalho”, in Revista LTr, vol. 63, nº 5, maio/1999, p. 597.12 “A doutrina sempre lembra que o Juiz americano Cooly, em 1873, identificou a privacidade como o direito de ser deixado tranquilo, em paz, de estar só: right to be alone”. SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 10ª ed. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 202.13 Na lição de Jorge Pinheiro Castelo: “O direito do trabalho não foge à tendência moderna de cobrir os direitos e obrigações dos novos fenômenos e das novas classes de necessidades, principalmente, para proteger direitos não patrimoniais. As considerações do elemento personalístico e a correlativa exigên-cia da tutela da dignidade do empregado se acentuam, modernamente, com a preocupação de proteger totalmente o empregado a partir do contrato de trabalho. A tutela da dignidade moral do trabalhador se manifesta em face dos atos relativos aos poderes de organização e de controle da empresa, de modo a ins-trumentalizar a subordinação do trabalhador nos limites do cumprimento da prestação, impedindo que os atos empresariais possam entrar em conflito com os direitos personalíssimos e com a esfera moral do trabalhador”. CASTELO, Jorge Pinheiro. “Dano moral trabalhista – configuração própria e autônoma, competência da Justiça do Trabalho, ações individuais para tutela de direitos morais laborais tradicio-nais, novas e ações civis públicas trabalhistas”, in Revista LTr, vol. 63, nº 2, fevereiro/1999, p. 195.

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digna da célebre frase de Mae West. 14 Direitos básicos relativos à saúde e segurança, à intimidade, 15 à honra, à garantia de tratamento igualitário, à liberdade (em sentido amplo) são sonegados em atitudes completamente reprováveis, para dizer o mínimo.

Grandes empresas multinacionais, como o grupo espanhol Zara e o grupo brasi-leiro Restoque S. A. – dono de grifes como John John e Le Lis Blanc – são acusados pelo Ministério Público do Trabalho de financiar trabalho escravo em oficinas de costura em plena metrópole do poder, da riqueza e do luxo, São Paulo. Ações indi-viduais e coletivas por assédio moral, discriminação, violação à intimidade, adoeci-mentos mentais multiplicam-se.

Enfim, parece que chegamos a um estágio evoluído juridicamente, e para vários economistas atingimos, da mesma forma, o ponto mais próximo do pleno emprego. 16 Todavia, parecem ter evoluído também a malícia, as artimanhas, a engenhosidade humana para reforçar a eficácia de métodos de extração do máximo de força de tra-balho no menor tempo possível.

Contudo, diferentemente das épocas passadas, a crueldade, a exploração desme-dida, os agravos à saúde, não são praticados de forma acintosa e visível a todos, porque ganham ares de comandos, direção e disciplina insertos nos poderes do empregador e em seu jus variandi, manifestados, muitas vezes, por meio de câmeras, telefone, computadores, redes sociais e por medidas de organização do trabalho, como ritmo, metas, gestão pelo terror, “prisão” por dívida, dentre outras que serão aqui citadas.

Afora isso, na Era da Informação, em que o conhecimento virou mercadoria, não só o trabalhador braçal, o que vendia sua força de trabalho mecânica, não só os me-nos qualificados que já eram submetidos ao taylorismo submetem-se cada vez mais à exploração, como também os mais qualificados, os detentores de conhecimento es-pecíficos e habilidades especiais, apresentam-se premidos pelo poder de controle do empregador cada vez maior, possibilitados pela tecnologia e a rapidez da informação.

“Na prática, o taylorismo limitou-se, até meados deste século, principal-mente à indústria de transformação e aos trabalhadores braçais. A compu-tadorização tornou possível sua extensão a esferas de atividades e grupos de trabalhadores até então intocados. [...] dirigindo-se a uma conferência de exe-cutivos, Franco de Benedetti, diretor-gerente da Olivetti, referiu-se ao proces-samento eletrônico de dados como uma nova ‘tecnologia organizacional’ que, ‘tal como a organização do trabalho, exerce uma função dupla como força produtiva e instrumento de controle do capital’. ‘A taylorização das primeiras

14 “Quando sou boa, sou ótima. Quando sou má sou melhor ainda”. Filme: Não sou santa, 1933.15 Pontifica José Cretella Júnior, ao tratar da intimidade, que “há um direito ou liberdade pública de estar só, de não ser importunado, devassado, visto por olhos estranhos”. Apud SÜSSEKIND, Arnaldo Lopes, et al., op. cit., 1997, p. 639. 16 Vale dizer que o próprio presidente Luiz Inácio da Silva, em 2010, alegou estar o Brasil em “pleno emprego”. “Lula afirma que o país está em padrão de pleno emprego”. Brasil Econômico, 20/12/2010.

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fábricas [...] permitiu que a força de trabalho fosse controlada e constituiu um pré-requisito necessário da subsequente mecanização e automação dos processos produtivos [...] a tecnologia da informação é basicamente uma tec-nologia de coordenação e controle da força de trabalho, e dos trabalhadores de colarinho branco, que a organização tayloriana não abrangia’ (De Benedetti, 1979)” (KUMAR, 2006).

Numa era em que deveríamos buscar o maior tempo livre para ampliação e de-dicação a outras esferas da vida – a família, os amigos, o lazer, o trabalho comuni-tário, as vocações e ao conhecimento para além-trabalho – o menor tempo possível de trabalho vendido e pago, o trabalhador acabou por vender não só sua força fí-sica e habilidades manuais, como seus pensamentos, sua criatividade, sua própria personalidade.

Apontava Manuela Alonso Olea, com interpretação do pensamento hegeliano:

“Ao contrário, ‘aqueles bens [...] que constituem minha própria personali-dade e a essência da minha autoconsciência são inalienáveis’. Estes bens com-preendem – além da minha vida, naturalmente – e da minha ‘personalidade enquanto tal, minha vida ética e minha religião’, compreendem ‘minha liber-dade’. Uma hipotética alienação da minha liberdade não o seria em sentido jurídico, porque constituiria um ato de disposição sobre o que é para mim indisponível e, obviamente, para todos os demais. Um exemplo típico deste ato nulo de alienação seria, repetindo a citação, aquele em virtude do qual eu pretendesse ‘alienar totalmente a minha personalidade’. Este é um contrato impossível, por versar sobre algo que está fora da minha capacidade de dispo-sição” (OLEA, 1990).

Pois parece que, atualmente, na prática, tais contratos vêm sendo executados a todo momento. Vendemos hoje não só o que é externo a nós e independente de nos-sa pessoa, mas nossa liberdade, nossa autonomia, nosso lazer, o espaço familiar, na medida em que o empregador pode a todo instante lançar mão dos mais variados meios e nos acessar imediatamente, interrompendo atividades que antes eram reser-vadas à esfera pessoal. Podemos ser contatados, conectados, filmados, localizados a toda hora e lugar. A esfera privada já não é mais tão privada e até hábitos, horários, percursos podem ser facilmente detectados num só clique. Vendemos hoje também nossa essência.

A evolução do capitalismo deveria ter levado à libertação no sentido de o traba-lho não ser mais obrigação para subsistência, mas uma seara da vida que, ao lado de outras, enobreceria, enriqueceria e completaria o ser humano. Não deveríamos mais viver para o trabalho, como instrumentos passivos, essa era a meta, que tudo indica está longe de ser alcançada.

Nas palavras de BELL, analisando a teoria marxista,

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“para substituir o lavrador, surgiu o operário industrial e, durante os últi-mos cem anos, mais ou menos, as vicissitudes deste último – seus anseios por dignidade e status, suas reivindicações por uma maior parcela dos dividendos industriais, seu desejo de poder manifestar-se quanto às condições que afetam seu trabalho e contratação – têm caracterizado as lutas sociais deste século. Mas, além disso, nas utópicas concepções de Marx e do movimento socialista, a classe operária, tendo tomado consciência de seu destino pelas condições da luta, era vista como o agente da emancipação não somente industrial como também humana: os últimos grandes freios à produção e à abundância seriam removidos quando a classe operária assumisse o controle dos meios de produ-ção e desse início ao milênio socialista” (BELL, 1977).

Todavia, em meio à 3ª Revolução Industrial e num suposto pleno emprego, tais freios não foram acionados. A máquina do consumo e da necessidade de dinheiro, a monetarização de todos os espaços da vida parece, de fato, desenfreada.

No nosso ponto de desenvolvimento social, político, jurídico e econômico, há muito o direito de resistência do trabalhador deveria se sobrepor aos poderes do em-pregador. Estaria hoje o trabalhador em condições de, legitimamente, “recusar-se ao cumprimento de uma ordem, por exemplo, que o colocasse em grave risco, que fugis-se à natureza do trabalho contratado, que o humilhasse ou diminuísse moralmente, que fosse ilícita, ilegal ou de execução extraordinariamente difícil”. 17 Mas não é o que vemos na Justiça, na mídia, no dia-a-dia da labuta sindical.

Hodiernamente, não só ainda lidamos com trabalho escravo, trabalho infantil, trabalho em condições degradantes, como mesmo em ambientes mais “elevados”, em meio a grandes empresas, a hospitais, ao serviço público, a cargos que exigem qualificação – por trás de fachadas de móveis ergonômicos, estruturas impecáveis, máquinas modernas, uniformes bem feitos e aparente ambiente de amizade e cola-boração – o denegrimento do bem-estar, da imagem, da personalidade, da liberdade, da moralidade e da dignidade do trabalhador atingem níveis alarmantes.

A advertência de KUMAR parece ainda ter lugar:

“Mas, até agora pelo menos, é uma sociedade projetada, como as antigas, por e para uns poucos: as ricas e poderosas classes, nações e regiões do mundo. A revolução da informação ainda não aconteceu e em parte alguma é visí-vel exceto nos escritórios de corretores de ações, banqueiros, mestres-espiões, meteorologistas e sedes de empresas transacionais. Seus objetivos e efeitos são rigorosamente definidos pelos objetivos tradicionais das elites políticas e eco-nômicas: expandir o poder do Estado, tanto contra seus próprios cidadãos, quanto contra outras nações, aumentar a produtividade e o lucro das empre-sas capitalistas, sobretudo através da criação de um mercado global integrado.

17 MARANHÃO. Délio et al. Instituições do Direito do Trabalho. 17ª ed., São Paulo: LTr, 1997, p. 251.

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[...] é reconhecida e notável a velocidade da difusão da TI. Como também sua potencialidade de produzir mudanças radicais nos costumes sociais. A nova tecnologia, porém, está sendo aplicada em uma estrutura política e econômica que confirma e reforça padrões existentes, ao invés de gerar outros. O trabalho e o lazer são ainda mais industrializados, ainda mais submetidos a padrões fordistas e tayloristas de mecanização, rotinização e racionalização. As desi-gualdades sociais existentes são mantidas e ampliadas [...]” (KUMAR, 2006).

ӹ Intensificação do trabalho: um impacto na saúde do trabalhador

Ensina Dal Rosso que

“toda atividade laborativa humana, da mais simples à mais complexa, é realizada de acordo com um grau de intensidade, que requer maior ou menor dispêndio de energia e produzirá mais ou menos resultados, bens e serviços. Os modos de produção distinguem-se uns dos outros pelo controle da organização do trabalho e pelo estabelecimento de normas relativas à intensidade com que esse trabalho é realizado. [...] no trabalho assalariado, a intensidade com que o trabalho é realizado decorre de uma disputa aberta ou oculta entre traba-lhadores e gestores. Assim, o termo intensidade remete à rapidez, ao grau de concentração, à densidade, ao ritmo, à velocidade e à energia física, intelectual e emocional que o trabalhador despende na atividade” (DAL ROSSO, 2013).

Explica, ainda, DAL ROSSO:

“Sempre que falamos da intensidade do trabalho partimos da análise de quem trabalha, isso é, do trabalhador. Dele é exigido algo a mais, um empe-nho maior, seja física, seja intelectual, seja psiquicamente, ou alguma com-binação desses três elementos. A intensidade é, portanto, mais que esforço físico, pois envolve todas as capacidades do trabalhador sejam as de seu corpo, a acuidade de sua mente, a afetividade despendida ou os saberes adquiridos através do tempo ou transmitidos pelo processo de socialização. Há intensifi-cação do trabalho quando se verifica maior gasto de energias do trabalhador no exercício de suas atividades cotidianas” (DAL ROSSO, 2008).

Tendo esse conceito em foco, urge pontuar que, seguindo a lição de Dal Rosso, “a literatura internacional (GOLLAC e VOLKOFF, 1996; FAIRRIS, 2000) identifica uma onda de intensificação do trabalho operando em escala mundial a partir dos anos 1980. Tal onda vincula-se com as formas de gestão vigentes, entre as quais, toyotismo, qualidade total, acumulação flexível e outras propostas em uso nos locais de traba-lho” (DAL ROSSO, 2013).

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Estudos nacionais, como do IPEA, 18 DAL ROSSO, 19 e internacionais, como o SUMER 2010 (Surveillance Médicale des Expositions aux Risques Professionnels) 20 – esse último realizado pela European Foundation for the Improvement of Living and Working Conditions, numa parceria de vários órgãos, como o Ministério do Trabalho da França – comprovam em números e gráficos a intensificação do trabalho nos últi-mos anos. Aumentou o ritmo, aumentaram as cobranças, a necessidade de respostas e resultados imediatos, as exigências de atendimento ao cliente e ao público, a multipli-cidade de tarefas, a pressão e vigilância constantes ao longo da jornada, por exemplo.

O trabalho, ao “invadir” todas as esferas de vida, consumir muito de tempo e energia dentro e fora da jornada fixada, e ao ganhar o status de poderoso elemento de inclusão e identificação do indivíduo, tornou-se referência crucial do bem-estar do trabalhador. Saúde no trabalho e no meio ambiente de trabalho é condição de saúde da pessoa e, por outro lado, mal-estar no trabalho e meio ambiente de trabalho noci-vo têm como consequência direta o adoecimento do trabalhador.

Conforme Catttani, ao apresentar as conclusões dos estudos de Dal Rosso, “as constatações são irrefutáveis. Hoje, considerado um período de tempo

relativamente curto, o trabalho é mais intenso, o ritmo e a velocidade são maiores, a cobrança de resultados é mais forte, idem a exigência de polivalên-cia, versatilidade e flexibilidade, [...] a intensificação do trabalho traduz-se em maiores desgastes físico, intelectual e emocional. As conseqüências negativas são comprovadas pela maior incidência de estresse e de acidentes de trabalho, pelo acréscimo das lesões por esforços repetitivos, enfim, pelo adoecimento que afasta o trabalhador, que repercute sobre sua família, com custos para o con-junto da sociedade” (DAL ROSSO, 2008).

Como base no acima afirmado e nos estudos destacados, a intensidade do traba-lho acaba, nos dias de hoje, sendo relevante fator de abalo não só à saúde física, como à saúde mental e emocional do trabalhador e da maior sujeição ou “sensibilidade” aos efeitos deletérios dos poderes do empregador. Até porque, segundo os estudos men-cionados, a intensificação do trabalho veio acompanhada do aumento de práticas de assédio moral e de adoecimentos no trabalho.

É, como dito brevemente na introdução, um dos possíveis fatores a explicar o con-trassenso regulação versus aumento de processos, por exemplo, no que diz respeito aos direitos personalíssimos na seara trabalhista. 21

18 Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, estudo encontrado em http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/SIPS/120307_sips_intensidadedotrabalho_1.pdf.19 Dal Rosso realizou sua própria pesquisa com base em entrevistas no Distrito Federal. Os resultados estão nas tabelas publicadas em sua obra DAL ROSSO, Sadi. Mais Trabalho! A intensificação do labor na sociedade contemporânea. São Paulo: Boitempo, 2008.20 http://www.eurofound.europa.eu/ewco/surveyreports/FR1301011D/FR1301011D.pdf.21 Para os economistas da atualidade há ainda um outro paradoxo que é o pleno emprego versus au-mento de casos de violação moral na relação de emprego. Isso porque para um grande número de respei-

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Se em várias atividades houve melhora nas condições materiais do trabalho, o mesmo não se pode dizer das condições imateriais. As melhorias estruturais, mecâ-nicas e jurídicas não vieram acompanhadas de humanidade, de respeito ao trabalha-dor como pessoa.

Lembra HARVEY que “houve uma época em que as telefonistas tinham tempo de conversar conosco. Hoje os telefonistas têm uma meta rígida de chamadas que devem atender por hora. Se não a cumprem, são demitidos. E a meta aumenta cons-tantemente” (HARVEY, 2013).

Voltando à intensidade do trabalho, seu conceito vem primeiro cuidado por eco-nomistas clássicos, porém estudado mais a fundo e melhor exprimido por Marx, em O Capital, quando verificada a importância da intensidade do trabalho no desen-volvimento do capitalismo e da lógica de exploração máxima da mais-valia, mesmo diante de obtenção de direitos como limite de jornada.

“‘A intensidade do trabalho é consequência da ação organizativa, da for-ma como é acertada a cooperação entre os trabalhadores. Se o trabalho for organizado de forma a produzir mais resultados, exercerá impactos sobre o grau de esforço físico, intelectual e emocional exigido do trabalhador, consu-mirá mais energia dele e produzirá mais resultados, mais valores. Elevando-se a intensidade do trabalho, aumenta-se a produção do valor. Dessa forma, isola-se um componente organizativo da teoria do valor. A intensificação do processo de trabalho resulta em mais trabalho na mesma duração de jornada, com o mesmo número de trabalhadores e o mesmo padrão tecnológico. Mais trabalho também é mais valor, assim com intensidade do trabalho significa produção de mais valor. É dessa forma que a intensidade integra a teoria do valor. As relações entre duração de jornada, produtividade e intensidade do trabalho em suas variações simultâneas ou individuais são fundamentais para o entendimento conjunto do mais-valor absoluto e relativo’ (MARX, 1867)” (DAL ROSSO, 2013).

táveis economistas nacionais estamos em economia de pleno emprego ou muito próximo disso, o que é atualmente motivo de grandes debates no cenário nacional. E em várias teorias o pleno emprego acaba sendo um dos fatores que leva a melhores condições de trabalho, trabalho decente, bem remunerado. Desde Marx (O Capital) a autores como Keynes e Kalecki estuda-se os aspectos não só econômicos como políticos do pleno emprego e de seus benefícios na melhoria das condições de trabalhador. A diminuição do “exército industrial de reserva” ou taxas de desemprego próximas a zero retiram do capitalista e dos empregadores em geral, parte de seu poder disciplinar e de controle, por exemplo e, em contrapartida, aumentam o poder de barganha dos trabalhadores por maiores salários e benefícios relativos a jornada, férias, produção, etc. Para entender mais a respeito ver PRONI, Marcelo W. “O debate sobre a tendência ao pleno emprego no Brasil”, in Revista Economia & Tecnologia (RET). Vol. 8, nº 2, abril-junho/2012, p. 23-50 e KALECKI, Michal. Crescimento e ciclo das economias capitalista – Cap. 6: Os aspectos políticos do pleno emprego. São Paulo: Editora Hucitec, 1977.

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Vivenciamos o aumento claro da intensidade de trabalho, 22 justamente porque limites já estão postos quanto à jornada, por exemplo, e, para expandir lucros e pro-dução, necessário manipular fatores como salário por produção, ritmo de trabalho, gestão por resultados, perfeição na produção, aumento da exigência técnica e intelec-tual do trabalhador, etc.

O consentimento do trabalhador, a cooptação, a persuasão, a colaboração são parte essencial desse jogo entre capital e trabalho, para garantir o sucesso das inten-ções daquele e a tal conclusão já chegava Marx, que, nas palavras de HARVEY, tinha no centro de sua sensibilidade crítica “a ideia de que os seres humanos podem muito facilmente se tornar prisioneiros de seus próprios produtos e projetos, para não falar de suas falsas concepções de mundo” (HARVEY, 2013).

O Taylorismo teve papel acentuado nas formas de organização de trabalho que levaram ao que temos constatado na atualidade. Inaugurou uma nova organização científica do trabalho e uma nova relação salarial, com objetivo claro de extrair do trabalhador toda força de trabalho possível, visando sempre mais, melhor e mais rá-pido, inclusive, como salientado, com consentimento do próprio trabalhador.

A ideia taylorista foi, ainda, como recorda Hirata, sendo aperfeiçoada com regras e círculos de controle de qualidade, em que se reduz a porosidade da jornada de tra-balho, acelera-se o ritmo, elimina-se o “tempo morto”, impondo-se uma generaliza-da concorrência entre grupos de trabalhadores engajados nos programas de controle de qualidade que, com isso, praticam supressões voluntárias de pausas para obter melhores resultados que os demais e “os melhores lugares nos painéis afixados nos locais de trabalho” (HIRATA, 2002).

Mesmo as linhas de montagem podem ter sido aperfeiçoadas em questões de ma-quinário, modernização, mas se mantêm desumanizadas, desgastantes, estressantes, alienantes. Hoje o empregador moderniza a linha de montagem, mas aumenta as metas, impõe ritmo exaustivo e implementa práticas perversas de gestão, como a discriminação aos doentes e acidentados, a não emissão de CAT – Comunicação de Acidente do Trabalho – atos antissindicais; impõe ginástica laboral mas faz controle

22 “Les années 1980-1990 ont vu une intensification du travail qui s’est manifestée notamment par un dé-veloppement des contraintes de rythme de travail: les contraintes liées à la demande du public ou à celle de l’extérieur, les normes et le contrôle hiérarchique [...] venant se cumuler aux contraintes techniques et à la dépendance par rapport au travail des collègues. Le palier observé dans le mouvement d’intensification du travail peut s’expliquer notamment par le ralentissement des innovations organisationnelles observé dans les entreprises au début de la décennie 2000: les changements opérés dans les années 1990 – généralisation des procédures de qualité, développement des progiciels de gestion intégrée, recentrage et externalisation… – ont atteint leur maturité. Ainsi la proportion de salariés qui déclarent être gênés par les interruptions imprévues dans leur travail passe de 48% en 1998 à 40% en 2005. De même, 42% des salariés en contact avec le public signalent en 2005 vivre des situations de tension, «souvent ou suffisamment pour perturber le travail», contre 48% en 1998”. COUTROT, Thomas, 2008, p. 65 (http://www.insee.fr/fr/ffc/docs_ffc/ref/EMPLOIR08g.PDF).

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exacerbado de pausas, idas ao banheiro, anula micropausas, e estimula o terror no ambiente de trabalho.

Intensificado está o trabalho em vários níveis e setores e dessa conclusão não podemos mais fugir. Cumpre, todavia, destacar a advertência de Dal Rosso, que se é certo que o trabalho está mais intenso, também é certo que há uma diversidade nesse processo. “Este não é homogêneo nem predominante em todos os ramos de atividade econômica. Os setores em que o trabalho é predominantemente mais intenso são o bancário, o de telefonia e comunicação, o de transporte rodoviário, os serviços de saúde privados, os serviços de ensino privado, os serviços especializados e a indústria gráfica. [...] o problema que se coloca no momento é como interpretar um processo de intensificação em curso, não único, nem homogêneo e sim diferenciado por ramos de atividade” (DAL ROSSO, 2008).

ӹ A intensidade e os riscos psicossociais do trabalho. Doente o trabalhador porque doente a sociedade, ou o contrário?

Perceba-se que as atividades apontadas como as de maior intensificação do tra-balho nos últimos anos são justamente as atividades em que os profissionais mais se queixam de práticas de assédio moral e em que há um elevado número de adoeci-mentos, pela experiência prática do Ministério Público do Trabalho em suas inves-tigações e nos processos judiciais dos quais participa. 23 O setor bancário, nesse ano de 2013, foi o escolhido para a Semana Nacional de Conscientização sobre Assédio Moral no Trabalho, do Ministério Público do Trabalho, que culminou com atos pú-blicos em todo o país e com o lançamento de uma cartilha específica para questões de assédio moral 24 nesse setor de atividade.

23 Conforme dados coletados pelo Ministério Público do Trabalho, o assédio moral já é considerado pela OIT questão de saúde pública. “Pesquisa realizada pela OIT, mostra que 8% dos trabalhadores sofreram medidas de intimidação, 4% foram objeto de violências físicas e 2% de assédio sexual. No Brasil, em pes-quisa feita com 42 mil trabalhadores de empresas públicas e privadas, 23,8% dos entrevistados declararam ter sofrido algum tipo de violência psicológica e humilhação no trabalho. Em pesquisa realizada com bancários brasileiros, 33,89% dos 2.609 pesquisados relataram terem sido expostos a, pelo menos, uma situação constrangedora nos últimos 6 meses; 56,42% relataram ter sido alvo de gritos e agressividade; 51,83% relataram ser constantemente lembrados de erros; 50,46% relataram ter boatos espalhados a seu respeito; 48,11% disseram ter sido pressionados a não reclamar direitos; 47,11% afirmaram ter recebido supervisão excessiva”. Cartilha lançada no 1º Seminário da Serra Gaúcha sobre Assédio Moral no Trabalho – um manual de promoção à vida para trabalhadores e trabalhadoras. Publicação do MPT, 2013, p. 5.24 Para Marie-France Hirigoyen assédio moral no trabalho é “toda e qualquer conduta abusiva (gesto, palavra, comportamento, atitude...) que atente, por sua repetição ou sistematização, contra a dignidade ou a integridade psíquica ou física de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou degradando o clima de trabalho”. HIRIGOYEN, Marie-France. Mal-estar no trabalho: redefinindo o assédio moral. Rio de Ja-neiro: Bertrand Brasil, 2002, p. 17.

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Também esse setor foi objeto de interessante estudo de Santos, em razão dos alar-mantes números de suicídios nessa categoria, cujas razões, segundo o autor, são espe-cialmente a intensificação do trabalho e as práticas nocivas de gestão. 25

Hoje somos o nosso trabalho, vivemos o nosso trabalho a todo o tempo e lugar. A intensidade do trabalho para muitos estudiosos chegou ao seu pico, porque aliado ao desgaste físico, já no limite há décadas, chegamos ao limite do desgaste emocional e moral. Manobras antigas como salário por produção ou comissão e alongamento de jornadas foram aperfeiçoadas com participações nos lucros e tornaram menos “controvertido” o aumento de ritmo e velocidade, acúmulo de tarefas e funções, exer-cício de diversas atividades simultaneamente, cobranças de resultados, controles de qualidade e de todo o processo de trabalho. Todo esse aparato organizacional aliado, muitas vezes, com práticas assediadoras e ameaças de despedida, agridem sobrema-neira a psique do trabalhador, o campo de suas emoções, desestabilizam sua saúde mental, perfazendo riscos psicossociais determinantes em adoecimentos por conta do trabalho.

Por certo devemos grande parte disso aos “engenheiros do consumo”, ao consu-mo de massa, à ânsia pelo ter, à difusão de pensamentos liberais, individualistas, à concorrência desmedida. O suor do rosto não é mais só para ganhar o pão, é para ter também o fútil ou o que nos encaixa numa sociedade das posses e dos bens. Esses valores auxiliaram no consentimento e na cooperação do trabalhador, já vistos como elementos essenciais na organização do trabalho voltada à intensificação.

“Reunidos em grandes unidades, os trabalhadores cooperam entre si e au-mentam sua produtividade. Por isso, a cooperação é explorada pelos capita-listas para elevar o retorno objetivo em uma mesma jornada. Organizar o trabalho realizado por esses trabalhadores e, portanto, controlar o mecanismo fundamental de produção de mais-valor (como o alongamento da jornada de trabalho e a inovação tecnológica). Dessa forma, organizar o processo de trabalho e a cooperação é tão importante quanto contratar o próprio trabalho, pois, conforme a cooperação entre os trabalhadores, maior ou menor será o resultado obtido no processo de trabalho. Esse argumento nos conduz à noção de intensidade do trabalho” (DAL ROSSO, 2013).

Interessante aqui resgatar a frase de Henry Ford que disse: “a fixação do salário da jornada de 8 horas em cinco dólares foi uma das mais belas economias que já fiz na vida, mas elevando-o a seis dólares fiz uma economia melhor ainda” (CASTEL, 2001).

A Era da Informação também é a da propaganda e da manipulação de gostos e necessidades do trabalhador que, agora, é definido pelo consumo. É a Era da “mone-tarização da vida”, como diria Gorz.

25 SANTOS, Marcelo Augusto Finazzi. Patologia da solidão: o suicídio de bancários no contexto da nova organização de trabalho. Tese de doutorado apresentada para a UnB, em 2009 (http://repositorio.unb.br/handle/10482/4266?mode=full&submit_simple=Mostrar+item+em+formato+completo).

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De acordo com o que esclarece Kumar, “o taylorismo tornou-se o centro de uma nova ideologia tecnocrática que não parou na fábrica ou no escritório, mas espalhou--se por todo o mundo. Tendo conquistado a produção, volta agora a atenção para o consumo” (KUMAR, 2006).

O trabalhador, que talvez esteja nos últimos anos ganhando em salários e vanta-gens econômicas – ao menos segundo estatísticas nacionais publicadas – bem como em regulação das condições de trabalho, continua a perder no campo invisível, no que se refere a direitos personalíssimos e garantias constitucionais como a saúde, vida, segurança, honra, intimidade, privacidade e trabalho digno.

Está, portanto, no limite. Dados relativos a doenças mentais ou distúrbios emo-cionais ligados direta ou indiretamente ao trabalho assustam.

Estudos na França 26 estão mais avançados no que diz respeito ao tema intensidade do trabalho, riscos psicossociais do trabalho e práticas abusivas, como assédio moral.

Coutrot, por exemplo, em suas pesquisas, obras e palestras 27 alerta que a pe-nosidade física não retrocede, a intensidade do trabalho aumenta e a organização neoliberal do trabalho é patogênica, elevando os riscos psicossociais do trabalho, neles incluídas as exigências de mais trabalho e o aumento de exigências emocionais, bem como redução da autonomia e margens de decisão do trabalhador. As relações sociais e as relações no trabalho têm, segundo o economista e autor francês, sido fragmentadas, instigadas pela competitividade, pela formação de grupos, de times, de equipes que se contrapõem. Os objetivos são impossíveis de serem alcançados, os prazos só reduzem, o número de trabalhadores para as mesmas atividades diminui. O trabalhador, em meio a tudo isso, é ainda obrigado a esconder suas emoções, lidar sozinho com seu sofrimento e conviver com medo no trabalho, vítima de observação constante. Fazer coisas que desaprova, mentir para os clientes, ver-se impedido de realizar um bom trabalho porque tem que se preocupar com a rapidez, com a for-mação de filas, com a contagem de tempo e a produção. São esses conflitos éticos e práticos que se colocam dia-a-dia na vida do trabalhador.

A pesquisa SUMER 2010 já mencionada aponta que a falta de reconhecimento, a falta de latitude decisional, a demanda psicológica, a falta de apoio social, e a insegu-rança no emprego são as principais queixas em casos de adoecimento.

26 De acordo com o dossiê sobre condições de trabalho elaborado por pesquisadores franceses em 2008, “les risques psycho-sociaux peuvent notamment se développer quand l’organisation du travail impose une forte charge mentale (pression temporelle, travail haché, tâches complexes) sans accorder suffisamment de marges de manoeuvre aux salariés pour faire face à ces exigences. L’intensification du travail au cours des années 1980 et 1990 a contribué au développement de ces risques”. COUTROT, Thomas et al. L’évolution des conditions de travail (http://www.insee.fr/fr/ffc/docs_ffc/ref/EMPLOIR08g.PDF).27 O economista, professor, autor e pesquisador do Ministério do Trabalho Francês, Thomas Coutrot, considerado um verdadeiro estadista para alguns, esteve recentemente no Brasil, em evento do DIEESE, onde apresentou os dados da SUMER 2010 e as conclusões acima descritas.

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Percebe-se, nesse cenário, quão dileto é o pensamento de Gorz de que “o desvelo contínuo ao trabalho não serve nem à criatividade nem à eficácia; ele serve à vontade de poder daqueles que defendem a posição e o status que sua posição no trabalho permite” (GORZ, 2003).

Ou seja, o mesmo trabalho assalariado que antes libertou e um sistema capitalis-ta de que alguma forma possibilitou conquistas de direitos humanos e trabalhistas, aprisionam. 28

Temos, ainda, uma legião de precarizados e excluídos. Há também aqueles que alcançaram nos últimos anos um trabalho formal com algumas condições míni-mas. Entretanto, mesmo os trabalhadores com garantias trabalhistas e ocupações menos precárias, na ânsia por receber um pagamento capaz de garantir toda a gama de consumo definido pela sociedade como o essencial para alcançar certa posição, certo reconhecimento, certo “sucesso” ou mesmo certa satisfação que compense os dessabores da vida, abre mão cada vez mais do “tempo de viver”, 29 amplia sua “escra-vidão”. O trabalhador em diversas atividades tem entregado sua força de trabalho, e também sua personalidade, sua criatividade, suas horas de lazer e com a família, sempre buscando mais, um fim que nunca chega, um objetivo que a cada momento que conquista é alterado para algo ainda mais inatingível.

Essa nova “ratio” foi a grande virada do capitalismo e é o que desmancha no ar as utopias de libertação por meio dele.

Em um primeiro momento o trabalho era visto como pena, sanção, era para os escravos. Depois, uma forma de satisfação pessoal. Ao longo do tempo, passou, com o pagamento de salário, a ser visto como um meio de subsistência e de acesso ao necessário, não merecendo mais esforço nem mais horas do dia que as essenciais à estrita sobrevivência. Passada essa fase, abertas foram as possibilidades de consumo e engendradas as fórmulas para instigar, excitar o lado consumidor de cada um de nós e de fazer o trabalhador “aderir” aos objetivos de prosperidade da empresa, 30 “ves-

28 “Da ótica marxiana, portanto, um mesmo e único processo de racionalização engendra, de uma parte, como o mecanismo, uma relação demiúrgica, poiética do homem com a natureza e, de outra parte, funda o poder colossal das forças produtivas sobre uma organização do trabalho que retira ao trabalho e ao trabalhador qualquer atributo humano. Os agentes diretos da dominação maquínica e da autopoiésis da humanidade são uma classe proletária cujos indivíduos vêm suas faculdades ‘mirando’ e ‘mutilando-se’, embrutecidos pelo trabalho, oprimidos pela hierarquia e dominados pela maquinaria a que servem”. GORZ, André. Metamorfoses no trabalho: crítica da razão econômica. São Paulo: Annablume, 2003, p. 48.29 “Experiências passadas mostraram que os trabalhadores se tornam mais exigentes no que se refere às condições e às relações de trabalho quando estas lhes deixam tempo e energia para uma vida pessoal. Inversamente, o desenvolvimento pessoal tem por condição um trabalho que, por sua duração e sua na-tureza, não mutile as faculdades físicas e psíquicas do trabalhador. O movimento sindical tem portanto, como no passado, de lutar em dois plenos ao mesmo tempo: pela humanização, pelo enriquecimento do trabalho e pela redução de sua duração, sem perda de rendimentos”. Idem, p. 221.30 Esse processo se dá tanto no meio urbano como no rural. Segundo Guanais, “as premiações também servem como um importante mecanismo de envolvimento dos trabalhadores rurais, que passam a não

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tindo a camisa” do negócio. Vislumbra-se a “loucura do trabalho” – acordando com expressão que intitula obra de Dejours – o adoecimento do trabalhador no trabalho e pelo trabalho.

No caminho que vem sendo trilhado, estamos deixando de lado valores morais, preceitos religiosos, laços familiares, nossa vida, nossa saúde e bem-estar, para aces-sarmos cada vez mais bens e com eles suprir o vazio deixado por aquilo que quería-mos tempo para fazer e já não possuímos. Desse modo, mesmo em atividades menos precarizadas, o trabalhador não busca menos trabalho e mais tempo livre, porque preocupado em se incluir pelo consumo, em satisfazer ideais forjados pela cultura de massa. Todavia, não há consumo que console a solidão que essa mesma socie-dade e racionalidade individualista encerram e, nesse sentido, ao final, parecemos caminhar – ou já nos encontramos – para uma sociedade adoecida, onde imperarão o desmazelo, a indiferença, o isolamento, o sofrimento psíquico e a busca incessante de socorro em mais bens, em algo sempre fora de nós, porque dentro, nesse estágio, pouco restará.

ӹ Conclusão

Conclui-se, do que explanado, que existe modernamente mais trabalho em todos os sentidos: “o trabalho ocupa a pessoa como um todo”, diz Dal Rosso; 31 a intensidade do trabalho aumentou; a empregabilidade, o número de ocupações e a variada gama de atividades também aumentou, muito embora questionável, ainda, a afirmação de estarmos em situação de pleno emprego.

questionar nem se opor aos objetivos e metas da empresa, porque são também seus objetivos e metas. Em outras palavras, o interesse pelo aumento crescente de produtividade passa a ser a principal meta tanto das usinas quanto de grande parte dos trabalhadores. Para as primeiras, o aumento de produtividade significa aumento de lucros e de capital; para os segundos, representa não só melhor remuneração, como também oportunidade de manter o emprego, ser bem-visto pelos superiores (e muitas vezes também pelos colegas de trabalho) e até mesmo tornar-se um ‘campeão de produtividade’ (Novaes, 2007)”. GUA-NAIS, Juliana Biondi. “Quanto mais se corta, mais se ganha. Uma análise sobre a funcionalidade do salário por produção para a agroindústria canavieira”, in Riqueza e miséria do trabalho no Brasil II. São Paulo: Boitempo, 2013, p. 313.31 “Toda definição de trabalho passa por um certo componente de reflexão intelectual ou envolvimento efetivo do trabalho que não seja apenas exercício de força física, ainda que esse trabalho possa ser o do escravo que lida na lavoura de café, do assalariado que carrega sacos de cimento ou do funcionário pú-blico que separa as correspondências sem cessar. Em qualquer desses exemplos podem ser identificadas a participação da inteligência, da cultura adquirida, da socialização herdada e das relações construídas pelo trabalhador. O trabalho ocupa a pessoa como um todo. Todos os aspectos da personalidade são envolvidos até certa medida no ato de trabalhar. [...] em decorrência do aprofundamento da divisão social do trabalho e do emprego de equipamentos de comunicação e de armazenamento de informações particularmente poderosos, na atualidade o espaço ocupado pelo trabalho imaterial no conjunto das atividades humanas expandiu-se muito”. DAL ROSSO, op. cit., p. 40.

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Não obstante essa assertiva, todo esse trabalho a mais não veio acompanhado até o momento, na mesma medida, de mais eficácia dos direitos fundamentais, ao con-trário do que previam teóricos e economistas consagrados. Permanece o trabalhador tratado como um meio, não como uma pessoa e um fim em si mesmo. 32

O trabalhador encontra-se ainda alienado. Perdeu o controle de seu trabalho, de sua produção, não mais reconhece seu empregador nem a destinação final do que é feito. O empregador é onipresente por meio da tecnologia e das formas perversas de organização do trabalho. O trabalho invadiu a vida em todas as suas esferas e o consumo veio como mote perfeito aos interesses capitalistas e de uma sociedade que suprime valores éticos, morais, familiares, religiosos em prol de conquistas tecnoló-gicas e materiais.

Preceitua Antunes que“a nova fase do capital, portanto, re-transfere o savoir faire para o traba-

lho, mas o faz apropriando-se crescentemente da sua dimensão intelectual, das suas capacidades cognitivas, procurando envolver mais forte e intensa-mente a subjetividade operária. Mas o processo não se restringe a essa di-mensão, uma vez que parte do saber intelectual é transferido para as má-quinas informatizadas, que se tornam mais inteligentes, reproduzindo parte das atividades a elas transferidas pelo saber intelectual do trabalho. Como a máquina não pode suprimir o trabalho humano, ela necessita de uma maior interação entre a subjetividade que trabalha e a nova máquina inteligente. E, nesse processo, o envolvimento interativo aumenta ainda mais o estranha-mento e a alienação do trabalho, amplia as formas modernas da reificação, distanciado ainda mais a subjetividade do exercício de uma vida autêntica e autodeterminada” (ANTUNES, 2013).

A ciência evolui para que vivamos cem anos em média. Mas à medida que aumen-ta a expectativa de vida aumenta o tempo de trabalho heterônomo, vendido, adia-se a aposentadoria. Horas livres conquistadas são preenchidas por um segundo emprego, ou por um lazer comercial, ampliando a alienação em vez de servir de espaço à cul-tura, ao saber, à família, ao ócio simplesmente.

Apregoa Cattani em sua apresentação da obra de Dal Rosso que “ jamais na história da humanidade, houve tamanha criação material:

bens e serviços abundantes e de melhor qualidade, inovações que proporcio-nam mais conforto e saúde, possibilidade de fruição de novas dimensões de vida, disponibilidade de aparatos tecnológicos que facilitam os deslocamentos e as comunicações dos indivíduos. Porém, o preço a pagar revelou-se absur-

32 Em conformidade com dados extraídos do sistema MPT Digital, na PRT da 15ª região e publicados pelo Jornal Destak em 23/10/2013, p. 2, “[...] de 2011 a 2013 houve um aumento de 25% no número de em-presas investigadas pela prática de assédio moral, no interior do estado de São Paulo. São 962 empresas acusadas. 166 novos casos no interior no primeiro semestre de 2013”.

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damente alto. A lógica inexorável do princípio da acumulação ilimitada e da concentração do capital leva à destruição da natureza e ao crescimento das desigualdades socioeconômicas de modo indigno. Mas, sobretudo, a forma capitalista de produção continua baseada no princípio da fungibilidade fí-sica e intelectual do trabalho vivo, organizado e disciplinado em condições desinteressantes e estressantes que levam ao embotamento da inteligência, à alienação de muitos para o benefício de poucos” (DAL ROSSO, 2008).

Desafiador para as instituições que atuam em prol da saúde do trabalhador, en-contrar espaço em meio a isso tudo, sem se deixar levar pela mesma lógica de mone-tarização, de metas, de imediatismo.

Em busca de uma falsa inclusão, das ideias de sucesso que são vendidas, do ter e do dinheiro, o trabalhador sujeita-se aos mais diversos abusos. E não por necessidade apenas, como sempre ocorreu na história da humanidade, mas agora também por in-tegração, vaidade, por posição ou reconhecimento social, por futilidades, por acesso a bens que a comunidade entende como necessários, porquanto assim programada.

Difundem-se práticas empresariais que muito lembram o agir de Lucius Veratius, que já na Roma antiga, como imperador, deliciava-se esbofeteando o rosto dos cida-dãos livres que encontrava na rua. Atrás de si vinha um seu escravo entregando 25 asses a todos em que o dominus batia (citado por FLORINDO, 1996). Dizia-se “saúde não tem preço”, porém agora se relativiza esse brocardo “repartindo” lucros e resulta-dos, indenizando adoecimentos e danos morais, pagando o intervalo não usufruído e as horas extenuantes, “compensando” o trabalho em feriados, nas férias, em casa, os e-mails e mensagens de texto respondidos o dia todo a toda hora com pagamentos por metas e salário por comissão ou produção. É a lógica posta e que tem prevalecido num processo pernicioso de danos à saúde mental do trabalhador.

A humanidade nas relações de trabalho permanece perdida. O direito de resis-tência do trabalhador limitado em praticamente todas as ocupações, até níveis mais elevados. A sociedade colabora para a reprodução do lado mesquinho do ser huma-no, egoísta e acumulador, sendo o trabalho um instrumento nesse sistema. Adoece o trabalhador, adoecemos todos.

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CAPÍTULO 6

MEIO AMBIENTE DE TRABALhO SAUDÁvEL E DESENvOLvIMENTO SUSTENTÁvEL: A IMPORTâNCIA DOS MARCOS LEGAIS

Tereza Aparecida Asta Gemignani

“Nenhuma sociedade pode florescer, ou mesmo funcionar, se seu povo não se sente responsável por ela” – Roberto Campos.

“Fortalecer as estruturas institucionais para permitir uma integração ple-na entre as questões relativas a meio ambiente e desenvolvimento, em todos os níveis do processo de tomada de decisões” – Conferência das Nações Unidas sobre meio ambiente e desenvolvimento, AGENDA 21, capítulos 8.3 e 8.16.

ӹ Introdução

Talvez tenhamos demorado demais para perceber a importância da questão am-biental pelo fato de habitarmos um país exuberante, dourado pelo sol intenso em quase todo ano e rico em fontes de energia limpa, que desfruta da fartura dos manan-ciais de água doce, num território dotado de dimensões continentais, com extensa costa banhada pelo oceano Atlântico.

Entretanto, o alcance maior dos meios de comunicação veio possibilitar a divul-gação da ocorrência de fatos lesivos ao meio ambiente, que não só prejudicam nossa qualidade de vida no presente, mas também comprometem as condições de vida das gerações futuras.

A fim de garantir a reparação dos danos causados “ao meio ambiente e a ter-ceiros”, a Lei 6.938/81 visou conferir proteção jurídica a bens que se tornaram cada vez mais preciosos, quando se tornou explícita a relação direta entre a preservação do meio ambiente e sadia qualidade de vida, para obtenção de um desenvolvimento sustentável.

A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, rea-lizada no Rio de Janeiro em 1992, vinte anos após a Conferência das Nações Unidas

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sobre o Meio Ambiente Humano, ocorrida no ano de 1972 em Estocolmo, contou com a participação de 179 países, 116 chefes de Estado, mais de 10.000 ativistas e teve o mérito de alargar os horizontes deste debate. Entre os documentos que produ-ziu, merece destaque a “Declaração sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento”, cujos preceitos possibilitaram a criação da “Agenda 21”, que visou à obtenção de melhores resultados no planejamento de sociedades sustentáveis, assim constando do Plano de Ação, então elaborado para impulsionar um movimento de sinergia entre sociedade, métodos de proteção ambiental, justiça social e eficiência econômica.

Passados mais vinte anos, a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvi-mento Sustentável, realizada no Rio de Janeiro em 2012 (“Rio + 20”) também reuniu expressiva quantidade de participantes e multiplicidade de debates. Em decorrência de vários fatores, entre os quais a crise econômica que passou a assolar vários países, não conseguiu obter os resultados esperados, mas produziu um documento oficial denominado “O futuro que queremos”, em que ressalta a gravidade da questão, pon-tuando a necessidade de somar esforços e adotar medidas mais eficazes para garantir um futuro econômico, social e ambientalmente sustentável.

Mais não é só.Ao tratar da economia verde chamou atenção para a necessidade de garantir meio

ambiente saudável também no local de trabalho, assim contribuindo para superar antiga mentalidade, que atribuía a tal questão a condição pejorativa de “custo a ser evitado”, passando a caracterizá-la como “investimento a ser realizado” para possibi-litar o desenvolvimento de organizações produtivas sustentáveis.

Com efeito, na era contemporânea as questões afetas ao meio ambiente alçaram tal relevância, que torna oportuno trazer à colação a reflexão de Diogo de Figueiredo Moreira Neto, 1 ao tratar dos contra-poderes na democracia, quando chama atenção para a necessidade de abertura dos canais comunicantes entre

“[...] valores aparentemente antagônicos, mas intimamente intercausais, que precisam ser absorvidos e vividos intensamente, não importando a que custo: a liberdade e a solidariedade. A liberdade, realçando a singularidade de sermos individualmente diferentes e aptos a escolher o que pretendemos para nossas vidas, e, com ela interagindo, a solidariedade ressaltando nossa complexa dependência da sociedade para que efetivamente o logremos com plenitude” (MOREIRA NETO, 2011).

Assim sendo, as resistências ao cumprimento dos marcos legais passaram a ser vencidas na medida em que se conseguiu desatrelar a idéia da preservação do meio ambiente de trabalho saudável, da noção de aumento de custo, aliando-a ao con-ceito de investimento, necessário para otimizar a atividade empresarial produtiva. Nesta nova configuração, a observância dos marcos legais se torna imprescindível

1 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. “Democracia e contra-poderes”, in Revista de Direito Admi-nistrativo. Rio de Janeiro: Editora Direito Rio – FGV, vol. 258, setembro-dezembro/2011, p. 47-80.

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para garantir que a questão ambiental seja considerada parte integrante do projeto de desenvolvimento sustentável, assim considerado aquele que “atende às necessida-des das gerações atuais sem comprometer a capacidade de as futuras gerações terem suas próprias necessidades atendidas”, conforme já definira o Relatório Brundtland, 2

tido como o primeiro documento internacional que indica a necessidade de com-patibilizar a conservação do meio-ambiente com a implementação das atividades econômicas.

ӹ A importância dos marcos legais

A Constituição Brasileira de 1988 inovou ao destinar todo um capítulo para tratar do meio ambiente, constituindo-se numa das Cartas Políticas mais avançadas do mundo nesta questão. Ensina José Afonso da Silva, 3 que o artigo 225 da CF/88 pode ser dividido em três conjuntos de normas:

a) A matriz consignada em seu caput estabelece que o meio ambiente ecologi-camente equilibrado é direito a ser usufruído por todos, assim norteando não só as relações verticais do indivíduo com o Estado, mas também as relações horizontais entre particulares, o que se reveste de importância sig-nificativa para as relações de trabalho.

b) Instituiu instrumentos para efetivação deste escopo, discriminando-os nos parágrafos 1º e 2º, do artigo 225 da CF/88, como imposições dirigidas ao Estado.

c) Explicitou determinações destinadas a balizar condutas e conferir concre-tude a estes objetivos, como as constantes dos parágrafos 2º, 3º, 4º e 5º do mesmo artigo 225 da CF/88.

A concretização destes objetivos exige não só a atuação do Poder Executivo na arena político-administrativa e do Poder Legislativo na elaboração das leis que pos-sam operacionalizar esta implementação, mas também do Poder Judiciário, a quem cabe conferir efetividade ao marco legal.

Neste sentido decidiu o STF na ADI 3540, ao estabelecer que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como “direito de terceira geração”, de modo que incumbe não só ao Estado, mas também a toda coletividade a obrigação de “defender e preservar, em benefício das presentes e futuras gerações, esse direito de titularidade coletiva e de caráter trans-individual”. 4

2 O Relatório Brundtland, que recebeu este nome em homenagem à então Ministra da Noruega que o presidiu, é conhecido também como “Relatório Nosso Futuro Comum”. Foi apresentado em 1987 pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento criada pela ONU.3 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. 9ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2011, p. 52 et seq.4 Disponível em: www.stf.jus.br/imprensa/pdf/adi3540ementa.

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Interessante observar que, ao elencar no artigo 170 os princípios gerais que devem reger a atividade econômica, a Constituição Federal dentre eles inseriu o inciso III, que atribui à propriedade uma função social, assim conferindo suporte jurídico às ações destinadas a preservar o meio ambiente laboral como um bem social, fixando a solidariedade como valor importante para edificar uma sociedade saudável em con-sonância com o balizamento explicitado no artigo 225.

Destaca Fabiano Melo Gonçalves de Oliveira que “[...] o caput do artigo 225 co-loca como dever do Estado e da coletividade a proteção ao meio ambiente, como obrigação comum e obrigatória entre entes políticos e a sociedade civil”. 5

ӹ Os princípios do direito ambiental

Quando tratamos de marcos legais, imperioso analisar os princípios de direito ambiental, que influenciam diretamente sua formatação, entre os quais podem ser destacados.

O princípio da prevenção

A lesão à saúde e integridade física/mental no ambiente de trabalho se reveste de tal importância, que a mera reparação do dano já ocorrido se revela insuficiente para garantir a restitutio in integrum. Como bem pondera Oliveira, o direito ambiental não pode ficar restrito à ótica reparatória, pois isso o “tornaria um direito inócuo”, já que os danos ambientais “em regra, são praticamente irreversíveis”, razão pela qual o direito ambiental é intrinsecamente preventivo.

A prevenção implica em atuar para impedir a ocorrência de dano quando há um risco conhecido. Explica Germana Parente Neiva Belchior que o princípio da preven-ção consiste na adoção de medidas definidas, que possam evitar a ocorrência de um dano provável, em uma determinada situação fática, reduzindo ou eliminando suas causas, quando se tem conhecimento de um risco concreto. 6

O princípio da precaução

Quando o risco não é conhecido, mas a possibilidade de sua ocorrência pode ser vislumbrada, imperiosa a adoção de condutas marcadas pela prudência e cautela, balizadas pela diretriz in dubio pro seguritate.

Tal diretriz consta do Princípio 15, da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, 7 ao estabelecer que “com o fim de proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deverá ser amplamente observado pelos Estados, de acordo

5 GONÇALVES DE OLIVEIRA, Fabiano Melo. Direito Ambiental – difusos e coletivos. São Paulo: Edi-tora Revista dos Tribunais, 2009, p. 45 et seq.6 BELCHIOR, Germana Parente Neiva. Hermenêutica Jurídica Ambiental. São Paulo: Editora Saraiva, 2011, p. 208 et seq.7 Disponível em: http://www..onu.org.br/rio20/img/2012/rio92.pdf.

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com suas capacidades. Quando houver ameaça de danos graves ou irreversíveis, a au-sência de certeza científica absoluta não será utilizada como razão para o adiamento de medidas economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental”.

Esclarece Paulo Affonso Leme Machado, que o princípio da precaução implica na adoção antecipada de medidas amplas, que possam evitar a ocorrência de pos-sível ameaça à saúde e segurança. 8 Assim, enquanto o princípio da prevenção está direcionado para evitar riscos determinados, o princípio da precaução aponta para a adoção de medidas acautelatórias gerais, considerando o risco potencial.

O princípio do poluidor/pagador

Inserido no inciso VII, do artigo 4° da Lei 6.938/81, ao estabelecer que a Política Nacional do Meio Ambiente visa à “imposição, ao poluidor e ao predador, da obri-gação de recuperar e/ou indenizar os danos causados”, tal preceito foi recepcionado pelo parágrafo 3º, do artigo 225 da CF/88. Ressalta Fabiano Melo que foi erigido como princípio de natureza econômica, cautelar e preventiva, que “obriga a internalização das externalidades negativas”, de modo que “os custos ambientais devem ser suporta-dos pelo empresário/empreendedor”, evitando que sejam repassados à comunidade. Neste contexto, se o dano ocorrer mesmo com a adoção de medidas preventivas, o poluidor tem responsabilidade objetiva pela reparação.

ӹ A peculiaridade da questão referente ao meio ambiente de trabalho

As questões afetas ao meio ambiente de trabalho têm suscitado um número ex-pressivo e crescente de controvérsias, decorrentes dos novos modos de trabalhar, pautados pela exigência de ritmos frenéticos, metas ambiciosas e longas jornadas, que avançam pelos espaços da vida privada, debilitando física e mentalmente o tra-balhador pela exaustão.

Como já ressaltei em artigo que assinei como co-autora, “é impossível haver pres-tação de trabalho sem envolvimento e comprometimento da pessoa do trabalhador. Assim, ao ingressar numa relação de trabalho, além de trazer consigo todos os direi-tos fundamentais inerentes a sua condição de pessoa, agrega os que a lei lhe garante como trabalhador, o que vai repercutir não só na execução do próprio contrato mas até mesmo na organização empresarial”. 9

A descoberta de novas tecnologias e a exigência de intensificação dos ritmos de trabalho tem obrigado o indivíduo a ultrapassar os limites de sua capacidade física

8 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores, 2006, p. 68 et seq.9 GEMIGNANI, Tereza A. A.; GEMIGNANI, Daniel. “A eficácia dos direitos fundamentais nas rela-ções de trabalho”, in Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, nº 35, julho-dezembro/2009, Campinas, p. 74.

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e mental, levando à intensificação das doenças existentes e surgimento de novas, de diagnóstico muitas vezes difícil, o que retarda o tratamento e a cura, aumentando os efeitos perversos das conseqüências não somente para si, mas também para a empre-sa e toda sociedade.

Doente e afastado do trabalho, sofre prejuízos em sua evolução profissional e em-pregabilidade futura. Em decorrência disso, o nível de renda da família cai, os filhos são retirados da escola mais cedo para ajudar nas despesas, a precariedade das novas condições de vida pode levar ao alcoolismo e a violência doméstica, num circulo vi-cioso que aumenta os níveis de pobreza e compromete o desenvolvimento do país. A empresa perde tudo que investiu em treinamento, arca com percentual maior de se-guro previdenciário, além de ter que responder judicialmente por ações regressivas, 10 que vem sendo ajuizadas pela União.

No que se refere aos marcos legais, importante ponderar que, diferentemente dos demais, o arcabouço normativo do direito ambiental, e também do trabalhista, não é pautado apenas por critérios de justiça comutativa (que disciplinam as relações con-tratuais), mas também de justiça distributiva (originariamente atrelados às políticas públicas), não só em decorrência da assimetria entre os contratantes, mas também porque desde sua gênese este ramo do direito sempre esteve imbricado com as ques-tões econômicas, sociais e políticas que lhe são subjacentes, vertentes de discussão que também vem permear o debate sobre qualidade de vida e meio ambiente do tra-balho, requisitos indispensáveis para garantir o desenvolvimento de organizações sustentáveis.

Tal ocorre porque, além de fixar a função social do contrato, a Constituição Fede-ral de 1988 também estabeleceu expressamente que o direito de propriedade só pode ser exercido com legitimidade se observada sua função social (artigo 170, III), o que inclui o aspecto socioambiental, objeto de referência específica nos artigos 225 e 186, incisos II e III, quanto à propriedade urbana e rural.

Ademais, o inciso XXII, do artigo 7º, da CF 88 veio assegurar o direito à “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança”,

10 A possibilidade de entrar com ações regressivas está prevista no artigo 120 da Lei da Previdência Social – nº 8.213, de 1991. As ações regressivas acidentárias podem ser ajuizadas pela AGU quando con-figurada a conduta culposa do empregador, sempre que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) tiver que pagar um benefício previdenciário para a vítima ou seu dependente, no caso de falecimento do trabalhador, em razão de um acidente de trabalho. O número de ações regressivas ajuizadas vem aumen-tando a cada ano. A Procuradoria-Geral Federal (PGF), órgão da AGU, ajuizou 174 ações em 2011, com expectativa de ressarcimento de R$41.575.505,54, e 261 ações em 2012, com expectativa de indenização de R$66.968.816,00. Em 2013 foram ajuizadas 315 ações regressivas acidentárias em todo o país. A ex-pectativa é que R$ 258.056.176,44 sejam ressarcidos aos cofres públicos de modo a cobrir os gastos com benefícios previdenciários concedidos por conta de acidentes de trabalho. Levantamento da PGF revela que, ao todo, já foram ajuizadas 2.421 ações regressivas acidentárias, com expectativa de ressarcir aos cofres públicos em R$433.392.745,57. O índice de vitória é de cerca de 70%.

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assim colocando o direito ao meio ambiente de trabalho saudável como fundamen-tal, diretriz reiterada no inciso VIII, do artigo 200, de modo que o local de trabalho também deve observar as exigências contidas no artigo 225 da Carta Constitucional a fim de possibilitar a “sadia qualidade de vida”.

ӹ O sistema jurídico brasileiro

O sistema jurídico brasileiro distingue basicamente dois tipos principais de res-ponsabilidade. Em relação ao meio ambiente de trabalho, cada um está disciplinado por um dispositivo constitucional específico.

A responsabilidade subjetiva

O inciso XXVIII, do artigo 7º da CF/88, imputa expressamente ao empregador o dever de indenizar “quando incorrer em dolo ou culpa”, enquanto o artigo 186 do Código Civil estabelece o dever de reparação àquele que, por ação ou omissão volun-tária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral.

Portanto, a configuração da responsabilidade subjetiva exige três requisitos:

• Ação ou omissão – conduta ilícita;• Culpa ou dolo do agente;• Nexo de causalidade com o dano sofrido pela vítima.

A Consolidação das Leis do Trabalho também disciplina a questão, estabelecendo que cabe às empresas (artigo 157 da CLT):

I. Cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho;II. Instruir os empregados, através de ordens de serviço, quanto às precauções

a tomar no sentido de evitar acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais;III. Adotar as medidas que lhes sejam determinadas pelo órgão regional

competente;IV. Facilitar o exercício da fiscalização pela autoridade competente.

Assim sendo, há culpa por negligência quando o empregador deixa de observar o dever geral de cautela, consistente na obrigação de zelar pela segurança dos seus empregados, omitindo-se quanto à tomada de medidas preventivas hábeis a evitar a ocorrência de eventos danosos, previsíveis em razão das circunstâncias fáticas a que o trabalhador é submetido no seu ambiente laboral.

Os processos trabalhistas evidenciam que as condutas patronais negligentes mais freqüentes são:

• Falta de treinamento;• Falta de manutenção dos equipamentos e máquinas utilizados no trabalho;• Falta de condições de segurança no meio ambiente de trabalho;

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Exclusão da responsabilidade subjetiva

Haverá exclusão da responsabilidade subjetiva do empregador em caso de:

a) Caso fortuito e força maior:Apesar de divergências quanto à configuração e distinção de caso fortuito e força

maior, cuja digressão não cabe neste trabalho, basta atentar para o disposto no pará-grafo único do artigo 393 do Código Civil, ao estabelecer que o “caso fortuito e a for-ça maior verificam-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou im-pedir”, de modo que ocorridos nestes termos, afastam a responsabilidade patronal.

b) Culpa do empregado:A configuração de culpa do empregado é tormentosa. Alegada em muitos proces-

sos deve ser aferida caso a caso, com base na prova dos autos, tendo em vista os crité-rios legais. Para tanto, haverá culpa do empregado quando descumprir os requisitos previstos no artigo 158 da CLT ao estabelecer que cabe aos empregados:

I. Observar as normas de segurança e medicina do trabalho, inclusive as ins-truções de que trata o item II do artigo anterior;

II. Colaborar com a empresa na aplicação dos dispositivos deste Capítulo (pa-rágrafo único): “Constitui ato faltoso do empregado a recusa injustificada:a. à observância das instruções expedidas pelo empregador na forma do

item II do artigo anterior;b. ao uso dos equipamentos de proteção individual fornecidos pela

empresa.

A responsabilidade objetiva

A responsabilidade objetiva na área trabalhista foi delineada pelo inciso XXII, do artigo 7º da CF/88, que imputa ao empregador o dever de providenciar a “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança”.

As novas formas de organizar a produção e a exigência de ritmos acelerados de trabalho têm aumentado as situações de risco, a tal ponto que a imputação de respon-sabilidade subjetiva se revelou insuficiente. Em decorrência disso, o ordenamento jurídico passou a prever a possibilidade de responsabilização nos termos constitu-cionais supra-referidos, atraindo a aplicação do disposto no parágrafo único do ar-tigo 927 do Código Civil ao determinar que: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.

Há várias teorias do risco, entre as quais podem ser mencionadas as seguintes:

• Risco Proveito: só é devida a indenização se a parte auferiu algum proveito em detrimento de outrem;

• Risco Integral: empregador responde mesmo em caso de culpa da vítima;

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• Risco Profissional: decorre da atividade profissional da vítima;• Risco Criado: empregador responde quando a atividade econômica, por sua

natureza, expor o trabalhador a uma situação de risco.

Nosso ordenamento jurídico adotou a teoria do risco criado, considerando confi-gurada a responsabilidade patronal quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano, mesmo que seja lícita, por sua natureza implicar na criação de um risco concreto quanto à probabilidade da ocorrência de dano aos direitos do empregado.

Importante registrar que tal diretriz legal prescinde de qualquer consideração quanto a existência de culpa e, por isso, não pode ser confundida com o instituto da culpa presumida, agasalhado pelo artigo 6º, inciso VIII, da lei 8078/90 – Código de Defesa do Consumidor – do qual não se cogita no caso de responsabilidade objetiva.

Destarte, a configuração da responsabilidade objetiva exige apenas dois requisitos:

• A existência de um dano;• Nexo causal.

Como a responsabilidade objetiva está fundada no conceito de risco, aquele que no exercício de sua atividade cria riscos a outrem responde pela reparação dos preju-ízos, mesmo que não tenha incidido em qualquer culpa, ou dolo.

Tal se dá porque na responsabilidade objetiva não se procura um culpado, mas um responsável.

O abuso de direito

Ao tratar do abuso de direito, estabelece o artigo 187 do Código Civil que tam-bém “comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifesta-mente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”, de modo que tais ocorrências também configuram a responsabili-dade do empregador.

ӹ O acidente de trabalho e a doença profissional

Os marcos legais, que tratam do acidente de trabalho e da doença profissional, estão explicitados nos artigos 19 e 20 da Lei 8213/91, que estabelecem:

• Artigo 19: Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou tempo-rária, da capacidade para o trabalho;

• Artigo 20: Também devem ser tratadas como acidente de trabalho: ӹ Doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e cons-

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tante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social e

ӹ Doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições.

ӹ A responsabilidade da pessoa jurídica e a possibilidade de sua desconsideração

O sistema jurídico brasileiro imputa à pessoa jurídica, quando empregadora, a responsabilidade pelo ressarcimento do dano.

Em caso de inadimplência da empresa, o Direito trabalhista não aplica a regra contida no artigo 50 do Código Civil de 2002 (Teoria da Maior Desconsideração), adotando a Teoria da Menor Desconsideração, prevista no artigo 4º da Lei 9.605/1998 (Lei do Meio Ambiente), estabelecendo que para a desconsideração da personalida-de jurídica basta que não haja bens suficientes em seu patrimônio para satisfazer o débito.

Ademais, em vista da crescente criatividade empresarial na gestão de bens e pa-trimônio, a solução destas controvérsias agora também pode ser pautada pela teoria da “desconsideração inversa da personalidade jurídica”, aplicada quando ocorre con-fusão patrimonial entre o titular, pessoa física, e a empresa, pessoa jurídica, que passa a ser chamada a responder pelas obrigações contraídas por aquele, a fim de garantir o pagamento da dívida.

ӹ A configuração da responsabilidade trabalhista é distinta da previdenciária

Embora possa apresentar alguns pontos de tangenciamento, a concessão de bene-fícios previdenciários não se confunde com a responsabilidade do empregador, que tem fato gerador diverso e implica no ressarcimento integral do dano.

Os benefícios previdenciários concedidos pelo INSS tem natureza assistencial, como seguro estatal obrigatório (artigo 194 e seguintes da CF/88), de modo que o pagamento independe da configuração de culpa, dolo ou existência de risco na ativi-dade explorada. Estão fundados na solidariedade, postulado que sustenta a atuação previdenciária – artigos 3º I, 40 e 194 da CF/88 e artigo 1º, parágrafo único da Lei 8212/91.

A indenização devida pelo empregador implica na reparação do dano causado por um ato ilícito, assim configurado pelos artigos 186 do Código Civil e 157 da CLT, ou advém da responsabilidade pelo risco gerado pela atividade econômica explorada, nos termos do parágrafo único do artigo 927 do Código Civil.

Assim sendo, os requisitos para concessão dos benefícios previdenciários não são os mesmos exigíveis para a configuração dos casos de responsabilidade trabalhista,

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de sorte que a indenização devida pelo empregador não pode ser compensada com os benefícios pagos pelo INSS, pois são institutos que detém natureza jurídica com-pletamente diferente.

ӹ A indenização

A responsabilidade patronal deve ser integral, pautada pela restitutio in integrum e compreende vários tipos de indenização.

Despesas do tratamento – dano emergente

Dano emergente é a reparação do prejuízo imediato e mensurável causado pelo acidente. É o ressarcimento pela diminuição do patrimônio (ex.: despesas de hospital).

Lucros cessantes até o fim da convalescença

Lucro cessante é o prejuízo que a vítima sofre no período que estiver em convalescença. O art. 402 do Código Civil considera lucros cessantes aqueles títulos cujo recebimento seria correto esperar.

Pensão

Ao disciplinar a questão, o artigo 950 do Código Civil estabelece que “se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do trata-mento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu”.

Quando o acidente provoca a redução da capacidade de trabalho do empregado, o valor da pensão deverá ser proporcional ao nível da invalidez constatada (artigo 950 do Código Civil). Assim, se o laudo pericial indicar que o empregado teve redução de sua capacidade de trabalho em 30%, cabe ao empregador arcar com o pagamento de uma pensão mensal vitalícia correspondente a 30%.

Entre os critérios exigidos para o pagamento da pensão, cabe destacar:

• As condições pessoais do empregado: idade, situação no mercado de trabalho, rendimento, grau de instrução e repercussão das seqüelas incapacitantes;

• As condições profissionais do empregado: aferir se continua no mercado de trabalho, se houve redução de suas possibilidades de ascensão profissional ou comprometimento de sua empregabilidade futura.

• Verificar se a lesão acarreta incapacidade irreversível, ainda que parcial, con-siderando que com o passar da idade as consequencias tendem ao agrava-mento, sendo que na velhice haverá maiores gastos em decorrência desta incapacidade.

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ӹ Perda de chance

O artigo 949 do Código Civil estabelece claramente que a indenização abrange não só as despesas de tratamento e os lucros cessantes até o fim da convalescença, mas também outros prejuízos que o ofendido prove haver sofrido, assim incluindo também a reparação da lesão causada por perda de uma chance.

Para a configuração deste prejuízo não basta a mera probabilidade, sendo ne-cessária a existência de indícios concretos e consistentes. Por outro lado não é exigí-vel a certeza absoluta, devendo-se guiar pelo bom senso e pelo que ordinariamente acontece.

ӹ A culpa levíssima

A culpa levíssima não afasta a obrigação de indenizar, mas interfere de forma decisiva na fixação do valor da indenização, conforme dispõe o artigo 944 do Código Civil, ao estabelecer que:

• A indenização mede-se pela extensão do dano (parágrafo único): se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir equitativamente a indenização.

Importante ressaltar, entretanto, que o artigo 944 do Código Civil não se aplica às hipóteses de responsabilidade objetiva.

ӹ Conclusões

A proteção ao meio ambiente não pode ficar restrita apenas aos recursos naturais, devendo considerar primordialmente o valor da vida e da integridade física e mental do ser humano.

O novo conceito de economia verde chamou atenção para a necessidade de garan-tir meio ambiente saudável também no local de trabalho, assim contribuindo para superar antiga mentalidade, que a reduzia à condição pejorativa de “custo a ser evita-do”, passando a caracterizá-la como “investimento a ser realizado” para possibilitar o desenvolvimento das organizações produtivas.

Os marcos legais estabelecidos pela Constituição Federal, além dos dispostos no ordenamento infra-constitucional, com foco na CLT e na aplicação subsidiária do Código Civil, atuam de forma relevante para o cumprimento deste escopo, apresen-tando uma evolução crescente no sentido de demonstrar que o ressarcimento patri-monial de um dano já ocorrido vem se revelando insuficiente, pois a lesão advinda de um acidente de trabalho ou doença profissional/do trabalho provoca conseqüências muito mais amplas, atingindo não só a pessoa do trabalhador, mas também a empre-sa e todo o entorno social e familiar em que ocorre, além de comprometer a eficiência econômica do país.

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Neste contexto, a real efetivação destes marcos legais se apresenta como questão crucial, desafiando os atores sociais a um comportamento mais proativo, no sentido de estimular a prevenção e a precaução para evitar a ocorrência da lesão e garantir a preservação da integridade física/mental do trabalhador.

Esta nova configuração revela a importância do exercício dos contra-poderes num regime democrático, a fim de preservar o valor da solidariedade para coesão da vida em sociedade.

A configuração de direitos tidos por fundamentais pela Carta Constitucional de 1988, dentre os quais estão inseridos os trabalhistas, abriu o horizonte deste debate, principalmente nos pontos em que o artigo 7º da CF/88 navega em intersecção e con-fluência com o disposto no artigo 5º da Carta Constitucional.

Diferentemente do que aduzem alguns doutrinadores, as diferentes “gerações” de direitos fundamentais não se apresentam mais setorizadas em compartimentos estanques, passando a atuar de forma dinâmica em sinergia, em prol de uma socie-dade mais saudável, que prioriza o valor da vida humana, assim como a integridade física e mental do trabalhador, requisitos indispensáveis para garantir o crescimento sustentável do país.

ӹ REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BELCHIOR, Germana Parente Neiva. Hermenêutica Jurídica Ambiental. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.

GEMIGNANI, Tereza Aparecida Asta; GEMIGNANI, Daniel. “A eficácia dos direitos fundamentais nas relações de trabalho”. In Revista do Tribunal Regional do Traba-lho da 15ª Região, nº 35, julho-dezembro/2009, Campinas.

___________. “Meio ambiente de trabalho: precaução e prevenção”. In Revista CEJ, ano XVI, janeiro-abril/2012.

GONÇALVES DE OLIVEIRA, Fabiano Melo. Direito ambiental - difusos e coletivos. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores, 2006.

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. “Democracia e contra-poderes”. In Revista de Direito Administrativo, vol. 258, setembro-dezembro/2011, p. 47-80, Rio de Janei-ro: Editora Direito Rio – FGV.

SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. 9ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2011.

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CAPITULO 7

INDICADORES SOBRE RISCOS PSICOSSOCIAIS NO TRABALhO

Ana Claudia Moreira Cardoso

ӹ Introdução

A dinâmica das transformações políticas e econômicas tem tido impacto profun-do no mundo do trabalho, sobretudo nas últimas quatro décadas. Neste processo, algumas conseqüências são mais visíveis e, por isso mesmo, estão presentes na agen-da sindical e política, como o desemprego, a flexibilização do trabalho e a desregula-mentação dos direitos trabalhistas. Há outras implicações, entretanto, que têm ficado fora deste processo de discussão, justamente por serem menos evidentes e explícitas. Entre elas está a chamada gestão “pelo estresse”, a crescente intensidade do traba-lho, o aumento da pressão e do controle, da responsabilização, da competição entre os trabalhadores, da sobrecarga mental e emocional de trabalho (CARDOSO, 2013). Mas há uma dimensão ainda menos visível à sociedade que são as consequências dessas mudanças para a saúde dos trabalhadores. Diversos autores têm enfatizado o aumento e a diversificação das formas de sofrimento e das doenças ligadas ao exercí-cio do trabalho, como a fadiga generalizada, dores musculares, estresse, ansiedade, angústia, depressão, medo, esgotamento profissional (burn out), síndrome do pâni-co, Lesões por Esforço Repetitivo/Distúrbios Osteomusculares Relacionadas ao Tra-balho (LER/DORT), alcoolismo, problemas cardíacos (RIVOLIER, 1989; GOLLAC, 2005; DAL ROSSO, 2008; SELINGMANN-SILVA, 2011).

Este contexto explicita a necessidade de construção de novos conhecimentos so-bre a relação entre trabalho e saúde para que seja efetivamente possível inseri-la no debate político e social. Desta forma, visando ampliar a reflexão sobre o “trabalho como determinante no processo saúde-doença”, como previsto na Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora, este artigo discute alguns indicadores sobre os Riscos Psicossociais no Trabalho que podem contribuir para a construção de uma pesquisa nacional sobre “Trabalho e Saúde” no Brasil.

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ӹ A construção de uma pesquisa nacional sobre “Trabalho e Saúde” no Brasil

A construção de uma pesquisa nacional sobre “Trabalho e Saúde”, abrangendo diversas categorias profissionais e setores da economia, em muito contribuiria para a ampliação da reflexão e discussão sobre os impactos do trabalho na saúde do traba-lhador. “Trabalho”, neste caso, teria um significado amplo, englobando as formas de organização do trabalho, de gestão, o processo de trabalho, as situações e condições de trabalho, as relações sociais, assim como o ambiente de trabalho. A “Saúde” seria pensada de forma ampla, incluindo aspectos físicos, emocionais e mentais. Por sua vez, o “Trabalho” e a “Saúde” seriam compreendidos como construções sociais, re-sultantes de processos onde os atores sociais, com seus interesses, poderes e disputas, exercem um papel essencial em suas definições e redefinições. 1

O próprio processo de construção coletiva dessa pesquisa, ao incluir os diversos atores sociais, já seria um espaço importante para a reflexão. Além disso, ela teria um papel essencial na objetivação e quantificação da relação “Trabalho e Saúde”, so-bretudo no que se refere ao adoecimento mental. Isto porque, enquanto o chamado adoecimento “físico” é muito mais visível e perceptível, tanto do ponto de vista indi-vidual como coletivo, a percepção do adoecimento emocional e mental é muito mais complexa, justamente por ele ser resultado de múltiplos fatores e se apresentar de formas diversas e diferentes (MAENO e PAPARELLI, 2013).

Por sua vez, a objetivação, quantificação e melhor compreensão da relação entre o trabalho e a saúde permitiria aos atores sociais a construção de legislações que tivessem como foco não apenas o adoecimento e suas conseqüências, mas, sobretu-do, suas causas, ou seja, os fatores decorrentes do exercício do trabalho que causam e agravam o processo de adoecimento. Por outro lado, os conhecimentos advindos dessa pesquisa poderiam ser utilizados pelos trabalhadores e seus representantes para a efetiva inclusão do tema da saúde no processo de negociação coletiva. E para, da mesma forma, possibilitar a negociação para além das conseqüências do adoeci-mento e dos acidentes. Isto porque, como já analisado em outro estudo (CARDOSO et al. 2011), são poucas as cláusulas nos acordos ou convenções coletivas que tratem da relação entre o trabalho e o processo de adoecimento do trabalhador. As poucas cláusulas encontradas não têm como objeto as causas do processo de adoecimento, como pode ser observado, por exemplo, num acordo do setor de processamento de dados sobre a temática do estresse. Neste, está previsto que o ambiente de trabalho deve ser tranqüilo, que deve haver ginástica laboral, que as salas de trabalho devem

1 É importante destacar que as pesquisas nacionais atualmente disponíveis no Brasil sobre saúde não abordam essa dimensão. Por outro lado, as pesquisas que tratam da relação entre trabalho e saúde são estudos de caso, ou tem como foco uma única categoria profissional, ou um setor da economia, ou ainda uma pequena região. Assim, uma pesquisa nacional poderia ser complementada pelos estudos de caso que, normalmente, são mais aprofundados.

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ter plantas, entre outras medidas, mas nada se fala sobre as causas do estresse, ou seja, sobre a intensificação do trabalho, a pressão cotidiana, a quantidade de trabalho, a relação com a coordenação.

Além disso, as informações e conhecimentos advindos da realização e da análise da pesquisa seriam informações essenciais sobre as causas dos acidentes e do adoeci-mento nos locais de trabalho. Isto porque, ter acesso às informações das empresas é algo muito difícil e os trabalhadores e o movimento sindical também não conseguem participar ou interferir nos processos de inovação tecnológica e organizacional das empresas (CARDOSO, 2009). Contribui para a dificuldade em se obter informações a inexistência de uma legislação que garanta a organização no local de trabalho e o fato de que muitas CIPAS 2 são geridas unicamente pelos empregadores.

Finalmente, do ponto de vista dos trabalhadores, uma pesquisa que mostre o per-centual daqueles que explicitam estar sofrendo e adoecendo em função do exercício do trabalho oferecerá elementos para que eles repensem seu próprio processo de ado-ecimento. Para que percebam que, apesar das especificidades, não se trata, apenas, de uma vivência individual, mas também coletiva. Uma vivência coletiva que inclui trabalhadores de outros setores, de outros estados e, inclusive de outros países.

ӹ Organização do trabalho, intensificação e a saúde do trabalhador

A intensificação do trabalho tem sido ressaltada por diversos autores que têm como foco o trabalho no contexto atual, bem como a saúde do trabalhador, e que assim tornam explícita a forte relação entre intensificação do trabalho e adoecimento (GOLLAC, 2005; DAL ROSSO, 2008; CARDOSO, 2009). Esta discussão pode ser sis-tematizada em quatro pontos importantes, 3 sendo que o primeiro diz respeito à difi-culdade de visualização da intensificação do trabalho. Segundo JÉGOUREL (2010), dada as diversas causas da intensificação, suas variadas formas de manifestação, bem como a proximidade com outras noções, vê-se que só é possível determinar aquilo que está em torno da intensidade, mas dificilmente a própria intensidade.

E para se determinar o que está em seu entorno, é necessário analisar o conjunto das condições e relações de trabalho, cruzando tais informações com as caracterís-ticas dos próprios sujeitos. É preciso, ainda, conhecer a relação entre as exigências físicas, emocionais e mentais do posto de trabalho e as capacidades e possibilida-des de ação e reação dos trabalhadores, num determinado ambiente de trabalho e num determinado contexto macro. É preciso considerar a vivência do trabalhador em relação à carga de trabalho/nível de esforço, por um determinado período, num

2 CIPA – Comissão Interna de Prevenção de Acidentes.3 Esta discussão foi elaborada de forma aprofundada no artigo “Organização e Intensificação do Tempo de Trabalho” (CARDOSO, 2013b).

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contexto organizado localmente e socialmente (KARASEK, 1979 in ARAÚJO, 2003). Finalmente, tais informações devem ser analisadas em diálogo com as questões liga-das à saúde dos trabalhadores.

Por sua vez, para captar esse amplo leque de informações é necessário partir do trabalhador, pois dele é exigido um empenho maior para a realização do trabalho (GOLLAC, 2005; DAL ROSSO, 2008). Esse é o segundo ponto frisado pelos autores na análise do processo de intensificação do trabalho. Assim, a intensidade é entendi-da como a quantidade de dispêndio das capacidades dos trabalhadores, do ponto de vista físico, psicológico e emocional (BÁRTOLI, 1980 in FERNEX, 1998). Assim, to-das as situações que exigem do trabalhador maior carga de trabalho, aumento de de-manda e/ou pressão resultam na elevação de seu nível de esforço, de sua atenção e/ou dedicação. Logo, para se analisar a intensidade do trabalho é necessário considerar a vivência do sujeito em relação à carga de trabalho/nível de esforço, por um determi-nado período, num contexto organizado localmente e socialmente (FERNEX, 1998).

Um terceiro ponto diz respeito às determinantes da elevação do nível de esforço dos trabalhadores, uma vez que as novas formas de organização e gestão do trabalho, implantadas pelo capital, estão na origem dessa intensificação. O Toyotismo busca aumentar o fluxo da produção, sua variedade, capacidade de responder às flutuações do mercado, com um percentual cada vez menor de trabalhadores (ALVES, 2011). Além disso, são inúmeras as fontes de intensificação a que estão submetidos os tra-balhadores: gestão por metas e objetivos; maior ritmo; maior densificação do tempo com redução das pausas e das chamadas porosidades; multiplicação das tarefas; mul-tifuncionalidade; prazos cada vez mais rígidos e curtos; interrupções freqüentes de uma tarefa para realização de outra; necessidade de reação cada vez mais imediata e urgente; mudanças cada vez mais freqüentes e que exigem mais tempo de aprendi-zado das novas tarefas; ampla gama de normas a serem seguidas pelos trabalhadores (CARDOSO, 2013).

Assim, um quarto ponto refere-se à relação entre essa nova organização e ges-tão do trabalho, o processo de intensificação e a saúde do trabalhador. Esta é uma organização que tem sido apontada como fonte de degradação das condições de tra-balho (GOLLAC, 2005; VALEYRE, 2007), gerando aumento da penosidade devido à crescente insegurança, ao aumento dos acidentes, bem como das doenças físicas, psíquicas e emocionais (DAVEZIES, 2001; ASKENAZY et al., 2006; SELIGMANN--SILVA, 2011).

ӹ Riscos Psicossociais no Trabalho

Em meio ao debate sobre os impactos do trabalho na saúde do trabalhador, diver-sos conceitos estão sendo elaborados, 4 entre eles o de “Riscos Psicossociais no Tra-

4 Entre eles: estresse no trabalho (LÉGERON, 2003), sofrimento (DEJOURS, 1999), penosidade (LIN-HART, 2005), assédio moral (HIRIGOYEN, 1998), mal estar, esgotamento e violência no trabalho (DE-JOURS, 2007).

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balho”. Este conceito inclui os riscos profissionais que ameaçam a integridade física e mental dos trabalhadores, como o estresse, o mal estar no trabalho, os diferentes tipos de assédio, a violência interna e externa no trabalho e o esgotamento profissio-nal. De acordo com LEROUGE (2009), os riscos psicossociais no trabalho designam “uma nova categoria de riscos associados aos fenômenos de transformação do tra-balho ligados à intensificação, à precarização, às novas formas de organização das empresas e à introdução de novas tecnologias”. Em diversos países esse conceito tem sido amplamente utilizado nas discussões e negociações que se desenvolvem tanto nos locais de trabalho como nos espaços públicos. 5

Na França, as discussões sobre riscos psicossociais no trabalho ganharam força após a ocorrência de diversos casos de suicídio em empresas como a France Telecon, a Peugeot-Citroën, a La Poste, entre outras. Tal contexto obrigou o governo e a própria sociedade a darem atenção ao sofrimento e ao mal estar advindos dos locais de traba-lho. Nesta discussão, evidenciou-se que a atual organização e gestão do trabalho con-tinuavam a adoecer o trabalhador do ponto de vista físico, mas que também havia um “outro” tipo de sofrimento e de adoecimento, mais difícil de ser detectado e apreendi-do, que é o adoecimento mental e emocional. Na realidade, eles se tratam de eventos atrelados e que não podem ser tomados separadamente (GOLLAC e BODIER, 2011).

Neste contexto, em 2008, foi constituído o College d’Expertise pelo Insee, 6 a partir de uma demanda do Ministério do Trabalho para a elaboração de um relatório sobre a forma de identificar e quantificar os riscos de origem psicossociais no trabalho. Neste relatório, os riscos psicossociais são definidos como “riscos para a saúde men-tal, física e social, causados pelas condições de emprego e pelos fatores organizacio-nais e relacionais susceptíveis de interagir com o funcionamento mental” (GOLLAC e BODIER, 2011). Por sua vez, ressaltam os autores que a investigação a respeito des-ses riscos deve abranger tanto o ambiente organizacional como a percepção deste ambiente por parte dos trabalhadores. Para tanto, são sugeridos seis indicadores de análise: exigências do trabalho; exigências emocionais; autonomia ou margem de manobra; relações sociais e relações de trabalho; conflitos de valores e insegurança na situação de trabalho e emprego (GOLLAC e BODIER, 2011).

5 Por exemplo, em 2012 aconteceu a “Campanha Européia de Inspeção do Trabalho”, promovida pelo Committee of Senior Labour Inspectors – SLIC (Comitê de Altos Responsáveis pela Inspeção do Tra-balho), tendo como foco os riscos psicossociais no trabalho, através da inspeção (http://www.beswic.be/fr/news_board/psycho_risks). Também foi criado um grupo de pesquisadores de vários países da Europa, do Canadá e do Japão denominado Approche juridique comparée des risques psychosociaux au travail – COMPARISK (Abordagem jurídica em relação aos riscos psicossociais no trabalho), para analisar os aspectos jurídicos dos riscos psicossociais no trabalho (http://halshs.archives-ouvertes.fr/docs/00/70/52/44/PDF/Synthese_journees_1er2mars2010_acteurs-sociaux.pdf).6 O Institut National de la Statistique et des Études Économiques – Insee (Instituto Nacional de Es-tatística e de Estudos Econômicos) faz parte do Ministério da Economia e Finança da França, sendo responsável por produzir e analisar informações sobre a economia e a sociedade francesa.

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ӹ Indicadores e questões sobre Riscos Psicossociais no Trabalho

Para analisar tais indicadores, cada um deles será detalhado de acordo com o definido no relatório do College d’Expertise e, a partir do estudo de algumas pesqui-sas que tratam dessa temática 7, serão dados alguns exemplos de questões utilizadas em seus questionários. 8 Finalmente, serão considerados os resultados da pesquisa SIP – Saúde e Itinerário Profissional 9 –, que já incorporou os seis indicadores em seu questionário.

Faz parte do primeiro indicador – exigências do trabalho – a temática da organi-zação do tempo de trabalho, considerando: a duração; a distribuição ao longo do dia, da semana e do mês; a determinação do horário de trabalho; as formas de controle da jornada; a hora-extra; o tempo dedicado ao trabalho, no domicílio; a relação entre o tempo de trabalho e de não trabalho; entre outras. São diversas as pesquisas que tratam desta temática, entre elas a EWCS, 10 onde podem ser observadas as seguintes questões:

• Quantas horas trabalha habitualmente? • Quantas horas utiliza no transporte?

7 As pesquisas que estão sendo analisadas são: Karasek – Modelo Demanda-Controle/Job Strain Model; Siegrist – ERI (Effort Reward Imbalance) – Equilíbrio/Relação Esforço-Recompensa; EWCS – Enquete Européia sobre Condições de Trabalho – Eurofound; K10 WHO-HPQ – Health Performance Questionnaire – EUA; CT – Enquete Francesa sobre Condições de Trabalho – França; GHQ – General Health Questionnaire – Escala de Goldberg; SIP – Santé et l’Itineraire Professional, França; SUMER – Surveillance Medicale des Risques Profissionnels, França; ERGOSTRESSIE – Yves Lasfargue, França; EQCOTESST – Enquête Québécoise sur des Conditions deTtravail, d’Emploi et de Sante et de Securite du Travail, Canadá; Primera Encuesta Nacional de Empleo, Trabajo, Salud y Calidad de Vida de los Trabaja-dores y Trabajadoras, Chile; COPSOQ – Questionnaire de Copenhague sur les Facteurs Psychosociaux au Travail, Dinamarca; VOW-QFT – Questionnaire sur les Facultes de Travail, Bélgica e NHP – Nottingham Health Profile.8 No que se refere às questões, é importante ressaltar que o objetivo é apenas apresentar alguns ex-emplos, sem nos preocuparmos muito com o rigor das questões. Elas foram traduzidas e adaptadas e, por terem sido retiradas de questionários diferentes, algumas estão em forma de pergunta e outras de afirmação. Além disso, é preciso ter claro que cada umas das questões/afirmações tem diferentes alter-nativas de respostas – “sim” e “não” ou “totalmente de acordo”, “de acordo”, “em desacordo” ou ainda “sempre”, “freqüentemente”, “às vezes” e “nunca” – como poderá ser observado na análise dos resultados da pesquisa SIP.9 A pesquisa SIP – Santé et l´Itineraire Professional (Saúde e Itinerário Profissional), coordenada pelo Insee – França, foi realizada nos anos de 2007 e de 2010. Neste ano foi desenvolvido um questionário de auto-preenchimento, composto por algumas questões sobre riscos psicossociais no trabalho elaboradas a partir dos indicadores presentes no relatório provisório do College d’Expertise. Este questionário, por sua vez, servirá como base para a construção da nova pesquisa sobre riscos psicossociais no trabalho que está sendo elaborada na França, conforme já mencionado no presente artigo.10 A European Working Conditions Survey – EWCS (Enquete Européia sobre Condições de Trabalho) é realizada pelo Eurofound, a cada cinco anos desde 1995, em todos os países da União Européia.

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• Trabalha o mesmo número de horas por dia? • Trabalha segundo horários fixos ou em turno? • De qual maneira é fixado o horário de trabalho? • Há margem de manobra para organizar meu tempo de trabalho? • Há, freqüentemente, mudanças no horário de trabalho? • Com qual antecedência é comunicada essa mudança? • O tempo de trabalho se acorda com o tempo de não trabalho? • Nos últimos 12 meses você trabalhou no tempo livre? • Qual o grau de satisfação em relação à organização do tempo de trabalho?

Além da duração e da distribuição do tempo de trabalho, também estão incluí-das questões sobre a intensidade e a complexidade do trabalho, tendo como objetivo compreender a relação entre as chamadas “demandas” de trabalho e o esforço rea-lizado pelo trabalhador, tanto do ponto de vista físico como psicológico. Questões sobre o ritmo de trabalho, a existência de instruções contraditórias, metas irrealistas, polivalência, responsabilidade, interrupções da atividade, existência de prazos. A se-guir, alguns exemplos advindos da EWCS:

• Você deve freqüentemente interromper uma tarefa que está fazendo para fazer outra não prevista? Se sim, você diria que essa interrupção de atividade atrapalha o seu trabalho?

• Você está obrigado a se apressar para fazer o seu trabalho?• O seu trabalho implica trabalhar em função de prazos rígidos?• Seu ritmo de trabalho é imposto por: movimento automático de um pro-

duto ou peça; cadência automática de uma máquina; dependência imediata vis-à-vis o trabalho de um ou mais colegas; normas de produção, ou prazos, a serem respeitados; demanda externa que exige uma resposta imediata (pú-blico, clientes, diretores); controles ou monitoramento permanente exercido pela hierarquia?

O segundo indicador proposto – exigências emocionais – também visa captar a relação entre as "demandas" de trabalho e o esforço realizado pelo trabalhador, mas com ênfase nas exigências emocionais. Entre elas destacam-se: a necessidade de o trabalhador ter que controlar e/ou ocultar suas emoções na relação de trabalho com público (sejam pacientes, usuários, clientes, alunos, entre outras), bem como o contato com o sofrimento do público. Inclui-se, ainda, a questão do medo que os trabalhadores podem ter em relação a acidentes, à violência interna e externa e ao fato de sentirem que não têm condições para a realização de um trabalho bem feito. Nas pesquisas francesas SUMMER e SIP é possível ver alguns exemplos de questões e afirmações:

• Você está em contato pessoalmente ou por telefone com o público? Se sim, você vive situações de tensão no seu relacionamento com o público?

• “No meu trabalho, eu devo esconder as minhas emoções ou parecer que es-tou de bom humor”;

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• “Ocorre de eu ter medo durante o meu trabalho”.

A “autonomia ou margem de manobra” é o terceiro indicador proposto e busca compreender se o trabalhador tem autonomia para definir os objetivos do trabalho, os procedimentos, o momento para realizar as pausas, os prazos, entre outras ques-tões. Também inclui a temática da previsibilidade do trabalho e a possibilidade de antecipá-lo, bem como a utilização e o desenvolvimento de competências profissio-nais. Outros aspectos que fazem parte deste indicador são: participação em decisões, satisfação no trabalho, monotonia e repetição. Na pesquisa SUMMER existem al-guns exemplos:

• Para fazer o seu trabalho, você tem a capacidade de alterar os seus prazos?• Você tem a possibilidade de alterar a ordem das tarefas a serem realizadas

em seu trabalho?• Quando acontece algum problema/algo anormal/incidente, você:

ӹ resolve pessoalmente o problema, ӹ resolve pessoalmente o problema, mas apenas em casos específicos, previstos anteriormente ou

ӹ geralmente chama outras pessoas para resolver o problema/incidente?

Também são utilizadas, para se compreender este indicador, as afirmações pre-sentes no questionário de Karasek:

• Eu tenho a possibilidade de influenciar no desenvolvimento do meu trabalho?• Meu trabalho demanda um alto nível de competência?• No meu trabalho eu tenho atividades variadas?

“Relações sociais e relações de trabalho” é o quarto indicador e diz respeito às re-lações que se estabelecem entre os trabalhadores, entre estes e a hierarquia e também com os usuários. Assim como no caso do indicador “autonomia e margem de mano-bra”, o indicador “relações sociais” refere-se ao que se denomina como “meios” que as empresas disponibilizam para que os trabalhadores possam realizar o trabalho, isto é, atender às “demandas”. Inclui ainda temas relacionados ao coletivo de trabalho, cooperação, assédio moral, organizacional e sexual, estratégias e ideologias defen-sivas, relação com o exterior da empresa e valorização da profissão. Está em diálogo com as noções desenvolvidas no modelo “equilíbrio esforço-recompensa” de Siegrist:

• Meus superiores e as pessoas importantes me dão o reconhecimento que eu mereço?

• As oportunidades de trabalho e promoção são escassas?• Se penso em todo o trabalho e o esforço que realizo, considero adequado o

reconhecimento que recebo?• As pessoas mais próximas dizem que eu me esforço demais em relação ao

meu trabalho?

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INDICADORES SOBRE RISCOS PSICOSSOCIAIS NO TRABALhO | 137

Na pesquisa Summer é possível encontrar outras questões que buscam captar a relação do trabalhador com os outros trabalhadores e com a hierarquia:

• Quando se depara com um problema para fazer o seu trabalho corretamen-te, você pode falar:

ӹ com os seus colegas? ӹ com seus superiores?

• Para realizar adequadamente seu trabalho, você geralmente tem: ӹ informação clara e suficiente? ӹ número de colegas e colaboradores suficientes? ӹ a possibilidade de cooperar? ӹ os meios/recursos adequados e suficientes? ӹ formação suficiente e adequada?

No que se refere ao assédio organizacional e sexual, pode-se observar que muitas pesquisas têm como referencial o questionário LPT – Leymann Inventory of Psycho-logical Terrorization –, sobre violência no trabalho:

• Você foi confrontado no trabalho as seguintes situações: ӹ relação de trabalho crítica; ӹ ameaça; ӹ dificuldade de se exprimir; ӹ algum tipo de assédio, ӹ isolamento sistemático; ӹ tarefas mudadas como punição (novas, humilhantes, difíceis); ӹ ataque à pessoa (ridicularizar, rumores, xingar, injúrias); ӹ violência e ameaça e sexual?

• Qual a freqüência e por quanto tempo?• Qual é a sua situação atual?• Quem praticou o assédio?• Quantas pessoas se colocaram contra você?• Há alguém/houve alguém com quem você pudesse conversar sobre o assunto?• Foi testemunho de tal atitude em relação à outra pessoa?

O quinto indicador – conflitos de valores – busca compreender a dimensão do sofrimento ético no trabalho, pensado a partir da obrigatoriedade de realização de tarefas que se oponham aos valores sociais ou profissionais dos trabalhadores, às suas convicções ou à consciência profissional. Também a chamada "qualidade impe-dida" do trabalho é outro fator relevante no processo de adoecimento, bem como o sentimento de realização de um trabalho inútil. Na pesquisa SIP, realizada em 2010, encontram-se duas afirmações sobre essa temática:

• No meu trabalho eu devo fazer coisas que eu desaprovo (venda abusiva, rea-lizar demissões, entre outras)?

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• Eu tenho os meios para realizar um trabalho de qualidade?

Finalmente, o sexto indicador – insegurança na situação de trabalho e de empre-go – tem como objetivo captar se os trabalhadores estão expostos a situações de ins-tabilidade, insegurança e, conseqüentemente, à perda de referenciais. Assim, inclui o risco de perder o emprego, de ter o salário reduzido, de vivenciar mudanças não previstas, seja na remuneração, na organização do trabalho, em relação aos colegas de trabalho, à hierarquia, ao tipo de produto ou serviço, à função, entre outras. No questionário da SIP, de 2010 e na EWCS é possível encontrar as seguintes perguntas:

• No meu trabalho eu vivo mudanças imprevisíveis ou mal preparadas?• Posso perder meu emprego nos próximos seis meses?• Se perdesse o meu atual emprego ou me demitisse, seria fácil para eu encon-

trar um emprego com salário semelhante?• Daqui até a data de sua aposentadoria você pensa que seu trabalho pode

prejudicar a sua saúde?• Nos anos futuros, você pensa em mudar de qualificação ou profissão?• Você se sente capaz de realizar o mesmo trabalho que atualmente até os 60

anos?

Quando são analisados os questionários que têm como foco os “Riscos Psicosso-ciais no Trabalho” ou mesmo aqueles sobre "Condição de Trabalho e Saúde", é possí-vel observar que sempre há um bloco destinado às perguntas específicas sobre saúde. As questões buscam captar a percepção dos trabalhadores em relação ao seu estado de saúde no momento presente e também futuro. A temática das licenças-saúde, do absenteísmo e, sobretudo, do presenteísmo também estão presentes. Na EWCS en-contram-se, por exemplo:

• Nos últimos 12 meses trabalhou estando doente?• Pensa que a sua saúde ou a sua segurança estão ameaçadas devido ao seu

trabalho?• No último ano, quantos dias esteve ausente do trabalho por motivos de

saúde?

A questão da saúde declarada também é muito presente em diversos questioná-rios, tendo como objetivo apreender os sentimentos dos trabalhadores, como pode ser observado no questionário K10 WHO-HPQ – Health Performance Questionnaire:

• Nos últimos 30 dias, com qual frequência você se sentiu: ӹ nervoso? ӹ desesperado? ӹ agitado? ӹ deprimido?

• Nos últimos 30 dias, com qual frequência você teve o seguinte sentimento: perda de interesse ou prazer pelas coisas que normalmente te interessam?

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INDICADORES SOBRE RISCOS PSICOSSOCIAIS NO TRABALhO | 139

• Nos últimos 30 dias, quando você estava se sentindo deprimido e/ou sem interesse pela maior parte das coisas, você vivenciou uma das situações seguintes:

ӹ seu apetite foi modificado? ӹ você teve problemas para dormir? ӹ você está falando ou se locomovendo mais lentamente que o habitual? ӹ você se sente sem valor ou culpado?

ӹ Alguns resultados sobre Riscos Psicossociais no Trabalho – pesquisa SIP

Para dar continuidade à análise dos indicadores de riscos psicossociais no tra-balho, serão apresentados, de forma resumida, alguns resultados da pesquisa SIP – Saúde e Itinerário Profissional –, a partir do relatório elaborado pela DARES, 11 no início de 2013.

Para a análise dos dados proveniente da pesquisa SIP, realizada em 2010, a DARES elaborou uma tipologia, considerando que “o grau de exposição dos trabalhadores aos riscos psicossociais varia segundo o emprego ocupado e a situação de trabalho e que os riscos podem, ainda, se acumular” (DARES, 2103). Assim, foram criados seis grupos de trabalhadores buscando melhor compreender sua relação com os indica-dores de Riscos Psicossociais no Trabalho, resumidos a seguir:

• Pouco expostos: composto por trabalhadores que explicitam, mais do que os outros, não estarem/estarem pouco expostos aos Riscos Psicossociais e serem reconhecidos pelo trabalho que realizam;

• Distantes do trabalho: neste agrupamento os trabalhadores ressaltam a au-sência de reconhecimento e, ao mesmo tempo, o não sofrimento em fun-ção desta situação. Além disso, dizem não estar sujeitos à forte pressão no trabalho;

• Confrontados ao público: caracteriza-se por trabalhadores que frisam estar mais expostos às “exigências emocionais”. Vivem em situação de estresse em função do trabalho que realizam com o público, explicitando, ainda, peno-sidade física como “postura cansativa” e a necessidade de “carregar peso”;

• Sob pressão: este grupo é composto por trabalhadores que explicitam esta-rem submetidos a fortes “exigências no trabalho”, como a necessidade de pensar em várias coisas ao mesmo tempo ou trabalhar sob pressão. Também declaram terem que realizar tarefas contra os valores e a ética profissional;

11 DARES – Direction de l’animation de la recherche, des études et des statistiques (Direção de Animação e Pesquisa, de Estudos e de Estatísticas), vinculada ao Ministério do Trabalho, do Emprego e da Saúde francês e responsável pela elaboração de pesquisas sobre condição de trabalho e saúde.

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• Mal amados: grupo de trabalhadores que ressaltam, muito mais do que aqueles classificados nos outros grupos, tanto a falta de reconhecimento no trabalho como a existência de relações profissionais difíceis;

• Super-expostos: composto por aqueles que relataram estar expostos a uma combinação de vários riscos, ao mesmo tempo em que declaram a existência de um trabalho monótono e sem a possibilidade de aprender coisas novas.

Muito interessante perceber que na própria construção da tipologia, os diversos indicadores de Riscos Psicossociais já aparecem combinados e relacionados.

A análise mais geral sobre a relação entre riscos psicossociais no trabalho e a saú-de dos trabalhadores aponta que entre os trabalhadores “pouco expostos” aos riscos psicossociais, 8% declaram ter “limitação para a realização de atividades por pelo menos seis meses em função de problemas de saúde”, proporção que chega a 22% en-tre os “super expostos”. A mesma discrepância é verificada em relação à saúde men-tal, caso em que 7% dos trabalhadores classificados como “confrontados ao público” relatam ter vivenciado um episódio depressivo maior ou um problema de ansiedade generalizada; percentual que corresponde a 12% entre os trabalhadores “sob pressão” e a 19% entre os “super expostos”. Ou seja, quanto mais expostos estiverem os tra-balhadores, maior a probabilidade de serem acometidos por um problema de saúde.

Um estudo um pouco mais detalhado dos seis indicadores sobre riscos psicosso-ciais no trabalho permite um melhor entendimento de sua relação com o processo de adoecimento dos trabalhadores. Os indicadores sobre “exigências do trabalho”, por exemplo, demonstram que o trabalho atual exige do trabalhador não apenas um aumento da intensidade física, mas também mental e emocional. De acordo com os dados da SIP, 23% dos trabalhadores pesquisados responderam que “sempre” ou “freqüentemente” devem realizar uma quantidade excessiva de trabalho e 45%, que devem pensar em várias coisas ao mesmo tempo. No caso dos trabalhadores classifi-cados como “sob pressão” esse percentual chega a 92%.

No que se refere ao segundo indicador – “exigências emocionais” –, 34,4% dos tra-balhadores pesquisados dizem que “sempre”, “freqüentemente” e “às vezes” têm medo durante o trabalho em relação a sua própria segurança ou a dos usuários; 13%, que vivem situações de tensão em relação ao público “sempre” ou “frequentemente”; e 42%, que devem esconder suas emoções ou mostrar-se de bom humor durante o trabalho.

Ainda em relação às “demandas” do trabalho, outro potencial de adoecimento, agrupado em torno do indicador “conflito de valor”, tem sido ressaltado por um per-centual elevado de trabalhadores: 36,4% declaram que “sempre” devem fazer traba-lhos contra sua própria moral, como realizar vendas abusivas, efetivar demissões, agir de forma ilegal ou aplicar sansões. Por sua vez, 17% ressaltam que “às vezes” ou “nunca” têm os meios para realizar um trabalho de qualidade. Este percentual au-menta para 35% e 42% para os trabalhadores classificados como “mal amados” (sujei-tos a uma relação de trabalho onde predomina a falta de reconhecimento e a relação profissional difícil) e para os “super-expostos”, respectivamente. Como ressaltado

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por Pezé (2008), a percepção, por parte do trabalhador, de que realiza um trabalho que vai contra seus princípios, que não tem qualidade ou utilidade, em muito con-tribui para a perda de sentido do trabalho e, consequentemente, para o processo de adoecimento.

Como vimos anteriormente, por “um lado” há as demandas físicas, mentais e emocionais relativas ao trabalho e, por “outro”, há os meios que poderiam e deve-riam ser disponibilizados pelas empresas/organizações para que os trabalhadores pudessem enfrentá-las sem que isso significasse um esforço excessivo. Por exemplo, no que diz respeito ao terceiro indicador – “autonomia ou margem de manobra” –, praticamente 18% dos entrevistados afirmam que “sempre” e “frequentemente” têm pouca liberdade para decidir sobre como realizar o trabalho e 15% que “às vezes” ou “nunca” têm a possibilidade de empregar plenamente as competências profissionais.

Ou seja, a maior parte dos trabalhadores não tem participação sobre a definição de seu trabalho e sua influência restringe-se a alterações superficiais para o cum-primento de tarefas já prescritas. Como ressaltam CONINCK E GOLLAC (2006), considerando que um dos fatores preponderantes no processo de intensificação do trabalho está relacionado à gestão por metas e objetivos, as pesquisas mostram que os trabalhadores podem até definir a maneira para se atingir os objetivos fixados pelas empresas, mas não os objetivos propriamente. Além disso, dada a intensidade e a urgência com que o trabalho tem sido realizado, a interferência do trabalhador dificilmente seria viabilizada, em função da falta de tempo para a reflexão sobre o planejamento e a reorganização do trabalho.

No que se refere às perspectivas futuras, ainda de acordo com o relatório da DA-RES (2013), quando os trabalhadores são questionados sobre o risco de o trabalho prejudicar a saúde até a idade de 60 anos ou até a aposentadoria, nota-se que o per-centual de respostas positivas tem uma variação importante quando relacionadas ao grau de exposição aos Riscos Psicossociais no Trabalho. Dentre aqueles classificados como “pouco expostos”, 17% estimam que o trabalho pode prejudicar a saúde, per-centual que passa a 43% entre os trabalhadores “sob pressão” e a 75% entre os que es-tão submetidos a uma combinação de vários riscos. Finalmente, além da perspectiva de que o trabalho pode exercer influência negativa sobre a saúde, também o medo de perder o emprego ameaça os trabalhadores e, conseqüentemente, afeta de forma negativa o processo saúde-doença. No que diz respeito ao sexto indicador de Riscos Psicossociais no Trabalho – “insegurança na situação de emprego e trabalho” –, em torno de 22% dos entrevistados afirmam que têm medo de perder o emprego “sem-pre”, “frequentemente” ou “às vezes” (DARES, 2013).

ӹ Considerações finais

Com a análise que realizamos foi possível perceber que há diversas dimensões do trabalho, no contexto atual, que tem tido impactos negativos na vida dos trabalhado-res tanto dentro como fora do local de trabalho. No contexto de crescente precariza-

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ção, flexibilização, intensificação, competição e individualização, pode-se observar que aos riscos antigos somam-se novos riscos, ao mesmo tempo em que se torna cada vez mais complexa a percepção da relação entre “Trabalho e Saúde”. Entretanto, ao mesmo tempo em que esta apreensão fica mais intricada, ela mostra-se cada vez mais necessária para que seja possível compreender por que o adoecimento mental tem aumentado em todo o mundo.

Se em vários países é possível notar um aumento no número de estudos e pesqui-sas sobre a relação entre o trabalho e a saúde do trabalhador, no caso do Brasil, ainda são poucas as discussões, negociações e legislações que consideram essa relação. Di-versas são as razões para essa situação, e pode-se dizer que a principal deve-se ao fato de que realizar essa discussão significa questionar a própria organização e gestão do trabalho, questões vistas pelo capital como de cunho privado, onde nem os trabalha-dores e nem o Estado devem intervir.

Assim, considerando as limitações e dificuldades já discutidas ao longo deste artigo, no que diz respeito ao acesso à informação das empresas/organizações e à participação dos trabalhadores e seus representantes nas discussões dos processos de inovação, é essencial que a sociedade se mobilize para a construção de informações amplas e abrangentes que possam subsidiar as discussões e ações dos atores sociais. Essas informações devem, também, orientar tanto o processo de negociação coletiva como a construção de políticas públicas que tenham como foco a relação entre o trabalho e saúde; oferecer conhecimentos para “as ações coletivas de promoção, de prevenção, de vigilância dos ambientes, processos e atividades de trabalho, e de in-tervenção sobre os fatores determinantes de saúde dos trabalhadores”, como previsto na Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora.

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SEÇÃO III

FATORES PSICOSSOCIAIS E INFLUêNCIAS NA DINâMICA DO TRABALhO

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CAPÍTULO 8

CAPITAL MENTAL E PRODUTIvIDADE: ESTRATéGIAS DE REDUÇÃO DO IMPACTO ECONôMICO DOS

TRANSTORNOS MENTAIS NO AMBIENTE DE TRABALhO

Marcelo de Andrade Pinheiro e Denise Razzouk

ӹ Introdução

Na década de 60, os economistas enfatizaram a qualidade do capital humano como um componente essencial para o crescimento econômico de um país. Embora a saúde emocional fosse considerada como um elemento do capital humano, a qua-lidade do trabalho humano centrava-se na mensuração dos anos de escolaridade, na qualificação técnica e na experiência laboral. Porém, estes componentes não eram suficientes para determinar uma maior eficiência do trabalho humano (WEEHUI-ZEN, 2008).

Os fatores que têm se mostrado preponderantes no aumento da produtividade do trabalho humano são o capital mental e o bem-estar (KIRKWOOD et al., 2008). O conceito de capital mental está relacionado à habilidade que um indivíduo tem de aplicar, em sua totalidade, sua capacidade cognitiva e emocional. Em outras palavras, uma boa saúde mental é imprescindível para a qualidade do capital mental. Ter uma boa saúde mental permite uma flexibilidade cognitiva e emocional, essenciais para as habilidades sociais e resiliência frente às situações de estresse do cotidiano, para trabalhar de forma produtiva e para contribuir com a sua comunidade.

Desde a década de 90, a Organização Mundial de Saúde vem alertando para a crescente carga (“burden”) dos transtornos mentais para a sociedade (WHO, 2001). Os custos relacionados aos transtornos mentais equivalem a 4% do PIB dos países eu-ropeus. Estes custos têm impactos negativos para os indivíduos, familiares, serviços públicos e para o setor produtivo. O maior custo da doença mental é o custo indireto, ou seja, a perda do capital humano e da produtividade laboral, baixa qualificação profissional (abandono escolar), a morte precoce, a exclusão social, a baixa qualidade de vida e o empobrecimento do indivíduo e de suas famílias.

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Uma boa parcela das pessoas com transtornos mentais não trabalha ou tem di-ficuldade de encontrar emprego, ou são mais mal remuneradas, ou ainda, são apo-sentadas precocemente. Por exemplo, nos Estados Unidos, é estimado que cinco a seis milhões de pessoas, anualmente, permanecem desempregadas em virtude do transtorno mental. A taxa de desemprego entre os portadores de transtornos mentais varia entre 30 a 52%.

As doenças mentais, em particular, a depressão e a ansiedade, estão entre as cau-sas mais frequentes de absenteísmo e de licenças no ambiente ocupacional (WANG et al., 2003). A Organização Mundial de Saúde estima que até 2020, a depressão será o segundo transtorno mental mais incapacitante no mundo, correspondendo a 15% do total dos custos com doenças (MURRAY, LOPES, 1996). No Brasil, a depressão afeta aproximadamente 17 milhões de pessoas e constitui atualmente a terceira causa de afastamento do trabalho.

Entretanto, os custos gerados pelos transtornos mentais costumam ser subesti-mados, apesar das fortes evidências de seus impactos sociais na redução da produ-tividade no trabalho (MARCOTTE, WILCOX-GOK, 2001). Países como o Canadá, Estados Unidos e Inglaterra estimam que os transtornos mentais no ambiente de trabalho custam mais de U$5 bilhões por ano. As organizações, usualmente, esti-mam os custos despendidos com os planos de saúde e benefícios corporativos e não consideram os impactos econômicos dos transtornos mentais de seus funcionários na perda de produtividade. Os custos com a perda de produtividade derivam dos custos associados ao absenteísmo (faltas ou afastamentos no trabalho) e ao presen-teísmo (diminuição do desempenho no trabalho devido à presença de problemas de saúde, aumento no índice de erros e acidentes de trabalho, dificuldades na tomada de decisão e planejamento, baixo engajamento nas atividades) (HARNOIS, PHYLLIS, 2002; ROBERTS, 2005).

Apesar da alta prevalência de estresse, problemas emocionais e transtornos men-tais no ambiente de trabalho, existe muito desconhecimento por parte dos emprega-dores e dos próprios funcionários sobre a prevenção, identificação e tratamento dos transtornos mentais. Além disso, a questão do estigma em relação aos portadores de transtornos mentais (THORNICROFT et al., 2007) representa uma importante bar-reira para a inserção e manutenção destas pessoas no mercado de trabalho.

A Organização Mundial de Saúde e outras instituições voltadas para a promo-ção de saúde no ambiente de trabalho vêm alertando para se priorizar a promoção de saúde mental no trabalho através de um pacote de intervenções que podem ser eficazes na prevenção e na redução de estresse, na identificação precoce e manejo dos transtornos mentais e no tratamento adequado quando necessário (BHUI et al., 2012; HARNOIS, PHYLLIS, 2002; POMAKI et al., 2012; SULLIVAN, 2005; SUN et al., 2013).

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ӹ A influência do ambiente ocupacional na saúde mental e na produtividade

Em função da recessão econômica global, pressão financeira e eliminação de car-gos, um maior nível de estresse no ambiente de trabalho tem contribuído para conse-quências adversas tanto para as organizações como para os indivíduos e a sociedade (KAMAALDEEP et al., 2012). Esse cenário econômico instável e altamente competi-tivo têm levado as organizações a elevarem cada vez mais os níveis de exigência com os funcionários em relação a um maior desempenho, disponibilidade e disciplina (DEJOURS, 2001). Essa situação de extrema demanda por resultados e pressão exces-siva por desempenho no trabalho gera estresse nos indivíduos, com consequências imediatas nos âmbitos físico, mental e social para os indivíduos e financeiras para as organizações, e é de se esperar que o sofrimento no trabalho associe-se a uma série de manifestações psicopatológicas (WANG et al., 2003).

Dessa forma, fatores do ambiente de trabalho podem precipitar sintomas psíqui-cos bem como perpetuar incapacitações associadas com transtornos mentais. Há evidências de que fatores estressores específicos, tais como teor do cargo, ritmo e carga laboral, relações interpessoais, desenvolvimento de carreira e inter-relação en-tre trabalho e vida pessoal estão associados com um risco mais alto de morbidade psiquiátrica (BILSKER et al., 2006). O estresse no ambiente de trabalho tem sido de-finido pela Organização Mundial de Saúde como “um padrão de reações fisiológicas, cognitivas e comportamentais a alguns conteúdos de trabalho, conteúdos organiza-cionais e ambiente de trabalho com aspectos extremamente onerosos” (WHO, 2007). Cerca de 40% dos norte-americanos relatam que seu trabalho é altamente estressante e um quarto relata que o trabalho é a primeira causa de estresse em suas vidas (KA-MAALDEEP et al., 2012).

ӹ Transtornos mentais e redução na produtividade: absenteísmo, presenteísmo, acidentes e afastamentos

Os transtornos mentais são mais prevalentes do que o diabetes e as doenças car-díacas. A prevalência dos transtornos mentais varia de 25 a 40% dependendo do país. Dentre os transtornos mentais mais comuns no ambiente de trabalho, destacam-se os transtornos depressivos, ansiosos, o alcoolismo e uso de substâncias psicoativas. A ansiedade, a depressão e o estresse representam quase 50% de todos os dias per-didos no trabalho por motivo de doença no Reino Unido (KAMAALDEEP et al., 2012). A depressão é a primeira causa de absenteísmo no trabalho e sua prevalência em empresas norte-americanas varia de 12 a 17% (GABRIEL, 2000) e no Canadá, a depressão acomete 10% das mulheres no ambiente de trabalho (DEWA et al., 2004). Um quarto dos canadenses relata ter perdido emprego por causa da depressão.

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O impacto econômico dos transtornos mentais no trabalho se expressa pela re-dução da produtividade e do desempenho laboral. Por exemplo, nos Estados Unidos, 76% dos custos com depressão são devidos ao absenteísmo no trabalho (GABRIEL, 2000). A mensuração destes custos pode ser estimada através dos custos gerados pelo absenteísmo, presenteísmo, afastamentos e acidentes de trabalho.

ӹ Absenteísmo

O absenteísmo pode ser definido como o não comparecimento do indivíduo ao trabalho e obviamente é difícil para as organizações atingirem seus objetivos se seus funcionários não comparecem para trabalhar (ALONSO et al., 2009). Assim, os cus-tos com o tempo perdido no trabalho na forma de absenteísmo podem ser estimados pelo número de ausências do funcionário (por motivo de doença) multiplicado pelo que se investe no funcionário por dia (por exemplo, o salário e encargos). Porém, o impacto do absenteísmo pode variar com o tipo de função exercida, tipo de empresa e região. Se o absenteísmo é prolongado, há necessidade de se treinar ou de se con-tratar outro profissional para exercer a função do funcionário ausente, gerando mais custos para o empregador.

A depressão é a principal causa de absenteísmo no trabalho, sendo que o número de dias perdidos de trabalho por depressão chega a 13 vezes mais o absenteísmo por diabetes, 10 vezes por hipertensão e 7,5 vezes por asma (DEWA et al., 2004). O absen-teísmo entre os usuários regulares de álcool foi estimado em empresas belgas como sendo o dobro em relação aos bebedores eventuais (TECCO et al., 2013). Porém, ou-tro estudo mostrou que 40% dos funcionários das empresas australianas faziam uso nocivo de álcool e que o absenteísmo era 20 vezes mais frequente entre os usuários crônicos de álcool e entre aqueles que usavam dose excessiva de álcool (ROCHE et al., 2008). Apesar da evidente relação entre alcoolismo e absenteísmo, 50% das empresas consultadas na Austrália ignoravam essa associação.

ӹ Presenteísmo

O presenteísmo constitui na perda ou na diminuição da capacidade laboral por motivos de saúde que ocorrem quando o indivíduo está fisicamente presente no am-biente de trabalho. As organizações estão cada vez mais preocupadas com os custos do presenteísmo em adição aos custos dos planos médicos e do absenteísmo os quais têm sido tradicionalmente averiguados (SCHULTZ et al., 2009). Assim, a produti-vidade dos funcionários inclui muito mais que o tempo dispendido no ambiente de trabalho ou em atividades ligadas ao trabalho, mas também à qualidade e à produ-tividade vinculadas à realização da atividade. Enquanto as organizações conseguem facilmente rastrear o tempo dispendido fora do trabalho, o presenteísmo permanece um custo oculto para muitos empregadores (SCHULTZ et al., 2009).

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ӹ Afastamentos, licenças, aposentadoria e desemprego

Os transtornos mentais estão entre as solicitações de afastamento mais prevalen-tes e correspondem aos maiores custos comparados às outras doenças no ambiente de trabalho, com impactos diretos nos benefícios ativos pagos pelo Ministério da Previdência e Assistência Social. Os afastamentos do trabalho podem ser temporá-rios ou permanentes. As licenças médicas constituem os afastamentos temporários de três dias a 24 meses. Os afastamentos por motivo de saúde de até 15 dias são pagos pelo empregador e a partir desta data os custos recaem sobre o INSS. Quando se constata a incapacidade de retorno ao trabalho após esse período o afastamento é permanente, ou seja, constitui a aposentadoria por invalidez.

Os transtornos mentais representam ao redor de 30% dos afastamentos do traba-lho entre os servidores públicos estaduais de São Paulo (CRUZ et al., 2011). Dentre os transtornos mentais nesta população, a depressão corresponde a 41% dos afasta-mentos com uma média de 47 dias perdidos de trabalho. Os transtornos relaciona-dos ao álcool representam 3% dos casos de afastamento, com uma média de quatro dias de trabalhos perdidos. Em outro estudo, com os servidores públicos estaduais de Alagoas, os afastamentos por transtornos mentais alcançaram 20% do total de afastamentos, sendo que os transtornos do humor corresponderam a 60% dos afas-tamentos (SILVA et al., 2012). Um estudo realizado com servidores públicos no Rio Grande do Sul estimou que os transtornos mentais correspondiam a 16% das causas de afastamento, sendo que os transtornos do humor representaram quase 60% dos afastamentos por transtornos mentais (FONSECA, CARLOTTO, 2011).

ӹ Estratégias e intervenções para a redução do impacto sociológico e econômico dos transtornos mentais no ambiente de trabalho

O ambiente de trabalho tem sido identificado como local apropriado para inter-venções de cuidados primários para melhorar a saúde e também por sua vez elevar a produtividade no trabalho (BAMBRA et al., 2007. O foco tem sido, principalmente, no estresse, em geral, e não na identificação e manejos de transtornos mentais (HIL-LER et al., 2005). Há diversos tipos de intervenções para trabalhadores diagnostica-dos com algum tipo de transtorno mental no ambiente de trabalho: intervenções em grupo, sessões de aconselhamento, medicação, terapia comportamental cognitiva, dentre outras. As intervenções em saúde mental nos locais de trabalho podem vi-sar à população ativa que não (ou ainda não) tenha sido diagnosticada com algum transtorno mental, à população já diagnosticada com algum transtorno mental e à população em situação de afastamento do trabalho devido ao diagnóstico de trans-torno mental, nesse último caso, intervenções de retorno ao trabalho. Dessa forma, intervenções preventivas primárias visam a toda a força de trabalho de forma a pro-

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mover a saúde mental e evitar problemas de saúde mental. Intervenções preventi-vas secundárias visam trabalhadores de alto risco, e objetivam reduzir os problemas de saúde mental e evitar os afastamentos por transtornos mentais. Intervenções via tratamento têm como foco os indivíduos diagnosticados com transtornos mentais que estejam afastados por períodos curtos ou longos e, finalmente, as intervenções ligadas ao retorno ao trabalho estão focadas em melhorar o desempenho daqueles diagnosticados com algum transtorno mental.

Dentre as intervenções que tem demonstrado resultados positivos na promoção de saúde mental e redução de absenteísmo e presenteísmo nos ambientes de trabalho, destacam-se:

ӹ Rastreamento precoce para depressão e ansiedade

O rastreamento para depressão e ansiedade no ambiente de trabalho consiste no auto-preenchimento pelos funcionários de questionários específicos de sintomas psí-quicos, seguidos do encaminhamento para atendimento daqueles que apresentarem os sintomas ou estiverem em risco de desenvolver transtorno depressivo ou de ansie-dade (KNAPP et al., 2011). A intervenção precoce reduz as chances do agravamen-to dos sintomas e a evolução para os quadros mais incapacitantes dos transtornos mentais e, mesmo quando estes vêm a ocorrer, aumentam as chances de retorno dos indivíduos ao trabalho (KNAPP et al., 2011). A ênfase das intervenções, geralmente, é dada em abordagens assertivas na forma de workshops ou encaminhamento para serviços de tratamento via psicoterapia breve (KNAPP et al., 2011). Os serviços de psicoterapia usualmente são contratados pelas organizações via fornecedores de ser-viços de saúde e os workshops costumam ser oferecidos por empresas especializadas na área de consultoria psicológica.

ӹ Workshop de Terapia Comportamental Cognitiva

É oferecido, aos indivíduos identificados, um workshop de seis sessões ao longo de 12 semanas, baseado em Terapia Comportamental Cognitiva (TCC), com o objetivo de reduzir os sintomas de depressão e ansiedade e redução das perdas de produti-vidade (KNAPP et al., 2011). Essa intervenção tem se mostrado efetiva em diversos estudos no enfrentamento da depressão e na redução das perdas de produtividade em vários ambientes de trabalho (KAMAALDEEP et al., 2012; KNAPP et al., 2011). Os benefícios são obtidos por meio tanto da redução do nível de absenteísmo como da elevação dos níveis de produtividade devido à redução do presenteísmo. Algu-mas evidências sugerem que a TCC gere benefícios particulares no que diz respeito à recuperação funcional. Inicialmente, estudos indicam que a TCC tem um efeito benéfico no funcionamento laboral superior e mais amplo do que o impacto dos me-dicamentos antidepressivos para os quadros clínicos mais leves (SHERBOURNE et

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al., 2001). Outro estudo concluiu que a TCC possui uma vantagem específica sobre os medicamentos antidepressivos no que diz respeito à redução da incapacitação e às faltas no trabalho, apesar de os tratamentos serem equivalentes na redução da sintomatologia do transtorno depressivo (MYNORS-WALLIS et al., 1997). Outra pesquisa sugeriu que a TCC tem efeito direto no funcionamento psicossocial por focar a terapia em temas relevantes, tais como a construção de habilidades sociais (HIRSCHFELD et al., 2002).

De qualquer maneira, pesquisas adicionais são necessárias para determinar a abordagem mais efetiva para acelerar a recuperação dos indivíduos com transtor-nos mentais. Nesse momento, a utilização de intervenções tais como o TCC deveria ser associada tratamentos farmacológicos padronizados quando não tenham efeti-vamente atingido a recuperação adequada das capacidades funcionais do indivíduo (BILSKER et al., 2006).

ӹ Promoção de bem-estar mental no trabalho

A deterioração do bem-estar no ambiente de trabalho é potencialmente custosa para as organizações à medida que pode elevar os índices de absenteísmo e presen-teísmo. O local de trabalho oferece um ambiente propício para se lidar com uma variedade de problemas de saúde mental que impactam nos custos organizacionais. As intervenções no ambiente de trabalho podem aumentar a produtividade das orga-nizações, a imagem e a segurança no ambiente de trabalho. Podem, também, reduzir a vulnerabilidade dos indivíduos em relação aos transtornos de saúde mental rela-cionados ao trabalho.

Há uma larga amplitude de abordagens em relação à promoção de saúde mental no trabalho – isso inclui estudos de esquemas de trabalho flexível, implantação de processos de oportunidades de crescimento de carreira, e programas de treinamento de habilidade de reconhecimento de fatores de risco de saúde mental empobrecida por parte dos gestores (KNAPP et al., 2011).

ӹ Educação financeira

Mesmo antes da crise global financeira, estimava-se que 8% da população em países desenvolvidos tinham problemas financeiros sérios e outros 9% mostravam sinais de estresse financeiro (FEARNLY, 2007). A Confederação Nacional do Co-mércio (CONFEDERAÇÃO NACIONAL DO COMÉRIO 2012; Idem, 2013) divulgou a Pesquisa Nacional de Endividamento e Inadimplência do Consumidor Brasileiro, segundo a qual o percentual de famílias brasileiras endividadas é de 63,2% em no-vembro de 2013. Pesquisas mostram uma ligação entre presença de endividamentos e pior saúde mental – indivíduos que inicialmente não apresentavam transtornos mentais, mas que adquiriram débitos não administráveis em períodos de até 12 me-

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ses tiveram um risco 33% maior de desenvolver transtornos relacionados à ansiedade e à depressão quando comparados com a população sem problemas financeiros no mesmo período (BENDER, FARVOLDEN, 2008; SKAPINAKIS et al., 2006). A vasta maioria desses problemas de saúde mental toma a forma de transtornos relacionados à depressão e à ansiedade (KNAPP et al., 2011). Essas condições estão associadas à significativa elevação dos custos da utilização dos serviços de saúde, recuperação de crédito e perda de produtividade nos ambientes de trabalho (KNAPP et al., 2011). Apenas metade dos indivíduos com problemas de dívida procura auxílio de orien-tação financeira e sem a intervenção financeira apropriada, aproximadamente, dois terços das pessoas com problemas de débitos não gerenciáveis irão enfrentar os pro-blemas pelo período de 12 meses subsequentes (PLEASENCE et al., 2004).

A evidência atual sugere que há potencial para intervenções de educação finan-ceira para aliviar o débito ruim, assim, reduzindo os problemas mentais resultantes do descontrole financeiro (KNAPP et al., 2011). Para a população em geral, o contato com serviços de aconselhamento financeiro face-a-face está associado com 56% de probabilidade de que a dívida venha a se tornar administrável (WILLIAMS, SAN-DOM, 2007). É oferecido aos indivíduos identificados um workshop presencial com o objetivo de instruí-los financeiramente e capacitá-los a mais bem administrar suas vidas financeiras de forma a reduzir os sintomas de depressão e ansiedade e, conse-qüentemente, seus impactos na redução da produtividade e no aumento dos custos no trabalho.

ӹ Educação parental para prevenção de condutas anti-sociais dos filhos

Desvios de conduta são os problemas mais comuns relacionados aos transtornos infantis. Os comportamentos destrutivos dos filhos impactam negativamente nos pais em termos de custos relacionados ao absenteísmo e ao presenteísmo, uma vez que os pais necessitam dedicar tempo e cuidados aos filhos em horários em que pre-cisariam estar trabalhando ou têm seu foco de atenção voltado para preocupações relacionadas aos filhos.

Programas de educação parental são direcionados aos pais com filhos com pro-blemas ou risco de desenvolver problemas de conduta e são desenvolvidos para me-lhorar as habilidades parentais e qualidade dos relacionamentos entre pais e filhos (KNAPP, 2011). Programas educacionais para os pais têm um efeito positivo no comportamento dos filhos e que tais benefícios se estendem pelo período de um ano (DRETZKE et al., 2009). Entre aquelas crianças cujos pais completaram o programa, 38% melhoraram consideravelmente sua situação de problemas de conduta (KNAPP et al., 2011). A melhoria na mudança de comportamento se sustentou por um período de um ano para 50% das crianças (KNAPP et al., 2011).

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ӹ Tratamento medicamentoso para depressão

Há evidências de que o tratamento medicamentoso para depressão tem um efeito positivo no funcionamento ocupacional (RAZZOUK, 2008). Em alguns casos, o tra-tamento para depressão não altera o número de dias com doença, mas há indícios de associação entre remissão da depressão e aumento na produtividade ocupacional e diminuição no absenteísmo. Outro estudo mostrou uma associação entre a remissão completa da depressão e a redução do custo total com depressão no final do segundo ano de seguimento, sugerindo que o impacto da melhora da depressão na redução dos custos indiretos pode ser tardio (SIMON et al., 2000). O tratamento da depres-são também melhora a adesão ao tratamento de doenças somáticas como diabetes, hipertensão, o que leva a uma redução no uso dos serviços de saúde e uma redução no custo total com doenças. Ou seja, o tratamento de um transtorno mental melhora o tratamento para doenças somáticas, contribuindo para um melhor desempenho global do indivíduo.

ӹ Conclusão

Embora muitos fatores relacionados ao desempenho profissional e saúde mental precisem ser mais bem elucidados, as evidências científicas até o momento, demons-tram clara vantagem em se promover a saúde mental e em tratar os transtornos men-tais o mais precocemente possível de forma a melhorar o desempenho do indivíduo, sua qualidade de vida e reduzir os custos com uso de serviços de saúde, absenteísmo, acidentes, auxílio doença e aposentadoria precoce.

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CAPÍTULO 9

A MEDIAÇÃO DOS FATORES PSICOSSOCIAIS DO TRABALhO NO ABSENTEÍSMO-DOENÇA

POR TRANSTORNOS MENTAIS

João Silvestre da Silva-Junior e Frida Marina Fischer

ӹ Introdução: o trabalho e o absenteísmo por doença

O trabalho faz parte do processo de integração social dos indivíduos. A parti-cipação em novas experiências, o desenvolvimento de atividades que vão além dos interesses individuais e a construção da identidade social reforçam a autoestima e confiança nas próprias capacidades (VEZINA et al., 2004). A repercussão do traba-lho na subjetividade individual e nos modos de vida influencia a saúde física e mental das pessoas (MIRANDA et al., 2009).

As ausências ao trabalho por doença são consideradas um problema de saúde pública e têm impacto importante na economia. Os custos dos adoecimentos podem ser estimados de forma direta ou indireta em seus aspectos econômicos e sociais. A queda da produtividade, por perda na eficiência e absenteísmo por doença, afeta de forma direta os custos de produção. Como consequência, pode ocorrer elevação dos preços de bens e serviços pela redução da rentabilidade e da competitividade das empresas. Além disso, gastos com assistência em saúde, pagamentos de benefícios por incapacidade laborativa temporária e aposentadoria precoces oneram o Estado (WÜNSCH FILHO, 2004).

Na Dinamarca, o absenteísmo por doença atinge até 5% da força de trabalho (LUND, LABRIOLA, 2009). Na Noruega, em um dia útil, cerca de 7% dos emprega-dos faltam ao trabalho por adoecimento (MARKUSSEN et al., 2011). Em um estudo de base populacional no Brasil, a prevalência de faltas ao trabalho na indústria, de-correntes de doenças e agravos à saúde, foi de 13,5% (YANO, SANTANA, 2012).

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ӹ Ausências ao trabalho por doença

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) conceitua o absenteísmo como “o período de ausência laboral que se aceita como atribuível a uma incapacidade do indivíduo, exceção feita para aquela derivada de gravidez normal ou prisão”. 1

O absenteísmo-doença é definido como a ausência ao trabalho por motivo de doença ou problema de saúde, relacionado ou não ao trabalho; e tem sido usado frequentemente como um indicador da saúde dos trabalhadores (VAHTERA et al., 2000). O estudo do absenteísmo-doença é relevante por ser uma medida de morbi-dade que permite estabelecer programas de prevenção a partir do conhecimento dos seus preditores (MARMOT et al., 1995).

Enquanto curtos períodos de ausência podem estar associados a fatores sociais e/ou ocupacionais, longos períodos de ausência são indicadores mais confiáveis do estado de saúde do trabalhador (MARMOT et al., 1995).

A literatura sobre o tema não apresenta um ponto de corte preciso para determi-nar os afastamentos considerados de longo prazo. Estudos estabelecem a partir de oito dias, entre trabalhadores ingleses (MARMOT et al., 1995), a partir de 21 dias, en-tre holandeses (ROELEN et al., 2008) ou mesmo a partir de 56 dias entre noruegueses (FOSS et al., 2010). No Brasil, estudos com informações auto-referidas optaram pelo prazo superior a dez dias (GRIEP et al., 2010; FERREIRA et al., 2012).

O regulamento da Previdência Social brasileira estipula que caberá ao emprega-dor manter o pagamento integral do salário ao funcionário até quinze dias de ausên-cia ao trabalho por incapacidade decorrente de doença, atestada por médico. Caso haja continuidade comprovada da incapacidade laboral, o trabalhador deverá ser en-caminhado para solicitação de benefício junto ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), autarquia federal vinculada ao Ministério da Previdência Social. 2 Portanto, para estudos que se propõem analisar a questão do absenteísmo-doença, o ponto de corte de quinze dias pode ser considerado adequado para caracterização do longo afastamento do trabalho por doença.

O impacto dos afastamentos do trabalho por doença sobre os gastos com pre-vidência pública é um problema global (SCHEIL-ADLUNG, SANDNER, 2010). No Brasil, o afastamento do trabalho devido ao adoecimento da população economica-mente ativa gera importantes custos ao Estado. Entre os beneficiários estão pessoas em idade produtiva e acometidas por doenças crônicas não transmissíveis. Este adoe-cimento incapacitante para o trabalho pode inicialmente ser um quadro temporá-rio, mas que pode evoluir clinicamente para situações permanentes (MOURA et al., 2007).

1 OIT – Oficina Internacional Del Trabajo. Enciclopédia de Salud, Seguridad e higiene em el trabajo. Espanha: Centro de Publicaciones del Ministerio de Trabajo Y Seguridad Social, 1991. 2 Brasil. Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Diário Oficial da União, 14/08/1991.

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Entre 2007-2010 houve uma incidência média anual de 3,8% de concessões do benefício previdenciário auxílio-doença, entre os segurados da Previdência Social. No ano de 2010 foram concedidos mais de 2,2 milhões de novos benefícios auxílio-doença para uma população de aproximadamente 60 milhões de contribuintes. 3 No ano de 2011 mais de dois bilhões de reais foram comprometidos para pagamento de novos benefícios previdenciários por incapacidade laborativa. 4

Considerando o aspecto individual, a exclusão social do trabalhador adoecido pode interferir nas dimensões econômicas e psicossomáticas. Esse ciclo de desgaste perpetua o sofrimento, que não contribui para a melhora do estado físico e mental dos trabalhadores (TOLDRÁ et al., 2010).

ӹ Ausência ao trabalho por transtornos mentais e comportamentais

Os transtornos mentais e comportamentais estão entre as principais causas de perdas de dias no trabalho no mundo. Os casos leves causam perda de quatro dias de trabalho/ano e os graves cerca de 200 dias de trabalho/ano, em média (DEMYT-TENAERE et al., 2004). Esses quadros são frequentes e comumente incapacitantes, evoluindo ao absenteísmo pela doença e redução de produtividade (NIEUWENHUI-JSEN et al., 2006). Os quadros depressivos e ansiosos são as principais enfermidades mentais que causam absenteísmo-doença ao redor do mundo e são uma importante fonte de custos para sistemas de previdência social (CATALINA-ROMERO et al., 2013).

O adoecimento mental se manteve como a terceira principal causa de concessão de novos benefícios auxílio-doença por incapacidade laborativa no Brasil entre 2008 e 2011. Mais de 203 mil novos benefícios foram concedidos por ano, sendo que 6,3% foram considerados pela perícia previdenciária como relacionados a fatores presentes no trabalho (SILVA-JUNIOR, FISCHER, 2014).

Os trabalhadores com adoecimento mental incapacitante demoram mais tempo para serem reinseridos no mercado do que aqueles portadores de outras patologias, até porque tendem a durar mais que outros problemas (HENSING, SPAK, 1998). Portanto, o impacto sócio-econômico desses agravos é relevante e ações preventivas ainda representam desafios aos programas de promoção à saúde pública.

Na Dinamarca, detectou-se que após um ano de acompanhamento de pessoas afastadas do trabalho por transtornos mentais, 12,7% não haviam retornado ao tra-balho (NIELSEN et al., 2011). Para um melhor prognóstico e aumento da probabili-dade de retorno ao trabalho, a abordagem do trabalhador com transtornos mentais deve ser feita o mais rápido possível (ROELEN et al., 2012).

3 MPS – Ministério da Previdência Social. Anuário Estatístico da Previdência Social 2010. Brasília: MPS/DATAPREV, 2011.4 MPS – Ministério da Previdência Social. Anuário Estatístico da Previdência Social 2011. Brasília: MPS/DATAPREV, 2012.

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ӹ Absenteísmo por doença e estresse ocupacional

O absenteísmo por doença está relacionado às flutuações cíclicas na economia. Descreve-se esta relação em decorrência da reação dos trabalhadores às pressões no trabalho, que podem piorar quando há solicitação de aumento de produtividade e li-mitações na flexibilidade, sobretudo da organização temporal do trabalho. Portanto, o absenteísmo varia segundo tempo e lugar (LUSINYAN, BONATO, 2007).

Na segunda metade do século XX houve grandes transformações no modelo eco-nômico capitalista com internacionalização dos mercados, fenômeno que foi deno-minado de globalização (WÜNSCH FILHO, 2004). O aporte de inovações tecnológi-cas gerou reestruturação produtiva e organizacional, conduzindo a novas formas de organização, gestão e controle do trabalho, mudando a sua natureza e estabelecendo novos cenários produtivos (WÜNSCH FILHO, 2004). Esse processo de transforma-ção demandou mudanças no perfil dos trabalhadores, com valorização da polivalên-cia funcional, do comportamento organizacional, da qualificação técnica, da parti-cipação criadora, da mobilização da subjetividade e da capacidade de diagnosticar e decidir (GASPARINI et al., 2006).

Para atender às novas exigências e desenvolver esse novo perfil, os trabalhado-res precisam adquirir novas competências e capacidade para transitar para um novo modo de ser, fazer e pensar (GASPARINI et al., 2006). Em contrapartida, tem havido negligência das organizações acerca das necessidades de crescimento e desenvolvi-mento profissionais impossibilitando a plena concretização de autorrealização dos trabalhadores. Esta realidade gera uma maior insegurança no emprego, repercutindo na preocupação e tensão psicológica dos trabalhadores (SILVA et al., 2009).

O estresse ocupacional é descrito como a resposta que o trabalhador desenvol-ve quando está exposto a exigências e pressões no trabalho sem ter conhecimentos suficientes ou habilidades para lidar, as quais desafiam sua capacidade de adaptação (LEKA et al., 2004). Mudanças no perfil epidemiológico do adoecimento de traba-lhadores no Brasil e no mundo estão relacionadas às situações na qual o processo de adaptação humana não tem acompanhado o ritmo imposto pelas organizações.

A cobrança para alcançar a eficiência e cumprimento das solicitações impostas pelos gestores gera um excesso global da carga laboral nos aspectos físico, psíquico e cognitivo. As exigências são originadas a partir dos aspectos de desenho, organização e gestão do trabalho, além de seus contextos sociais e organizacionais (KIVIMÄKI et al., 2006). Como consequência, a sobrecarga sobre o trabalhador predispõe a um aumento do risco de doenças relacionadas ao estresse (BELKIC et al., 2004).

Em uma visão mais abrangente, o ajustamento inadequado entre pessoa e meio-ambiente envolve aspectos qualitativos e quantitativos. Ou seja, não apenas o equilíbrio no volume de demandas de trabalho e capacidade individual de resposta, mas também nas dificuldades para executar tarefas, por limitações individuais, são estressores. Poder-se-ia então dizer que coexistem quatro áreas (distintas e inter-re-

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lacionadas) no contexto de trabalho que influenciam na saúde dos trabalhadores: as tarefas, as relações inter-pessoais, as normas e os processos (SILVA et al., 2009).

O estudo da associação entre incapacidade para o trabalho por adoecimento e os fatores psicossociais do trabalho

No campo da saúde do trabalhador se reconhece a necessidade de investir na compreensão da subjetividade do trabalhador e das suas relações de trabalho. O ob-jetivo é apreender a dinâmica dos processos mórbidos pela confrontação do sujeito com a realidade a qual está exposto (NEVES, NUNES, 2009).

De acordo com Seligman-Silva (1994), o conhecimento da organização do traba-lho e das situações de tensão vivenciadas coletivamente pelos trabalhadores é passo fundamental para compreender melhor as vias de desgaste mental, que se traduzem em adoecimentos individualizados. O estabelecimento de nexo causal entre adoeci-mento e situação laborativa é visto como uma questão complexa que envolve idios-sincrasias, características individuais, história de vida e de trabalho enquanto fatores influenciadores, configurando-se num processo específico para cada indivíduo. Gli-na et al. (2001) recomendam que deva ser analisado, além do ambiente e da organiza-ção do trabalho, a percepção do trabalhador a respeito da influência do trabalho no seu processo de adoecimento.

As “doenças relacionadas ao trabalho” são agravos à saúde cuja exposição a am-biente e/ou condições de trabalho desfavoráveis contribuem como fatores provocado-res ou agravadores de distúrbios latentes e doenças pré-existentes (MENDES, 1988). Nessa trajetória, a saúde do trabalhador é análoga à saúde da população em geral. Rompeu-se a concepção hegemônica de relação unicausal do adoecimento por agen-tes biológicos, físicos ou químicos presentes no ambiente de trabalho, e passou a pre-valecer a análise multifatorial dos riscos ocupacionais. Assim, ao se trazer à tona os determinantes sociais da saúde, reduziu-se o olhar que pairava principalmente sobre o processo produtivo e se ampliaram questões subjetivas relacionadas ao exercício das profissões (MENDES, DIAS, 1991).

O nexo de causalidade entre doença e condições desfavoráveis de trabalho tem gerado conflitos entre empresas, seguradoras e trabalhadores em todo o mundo, o que estimula o sub-registro. Nesse contexto são inclusas as doenças osteomusculares e os transtornos por comprometimento da saúde mental relacionados ao estresse no trabalho (SILVA et al., 2007; SARDA JUNIOR et al., 2009).

Por seu impacto social, econômico e financeiro, a perda e/ou redução da capaci-dade para o trabalho da população economicamente ativa do país por adoecimento mental é um problema de saúde pública. A abordagem de estressores psicossociais negativos no trabalho é de particular interesse porque podem ser mais preveníveis, ao contrário de situações de tensão resultante de eventos da vida que são muito mais imprevisíveis (BONDE, 2008). Portanto, é imprescindível seu estudo para subsidiar debates e elaborar políticas de promoção de saúde, prevenção de doenças e reabilita-ção profissional.

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ӹ Riscos psicossociais e os fatores psicossociais do trabalho

Os riscos psicossociais são considerados respostas subjetivas do trabalhador à sua interação com as condições ambientais e organizacionais do trabalho. A percepção individual frente a tais situações pode ser influenciada por aspectos como: capacida-de, necessidades e expectativas do trabalhador, hábitos e cultura, e questões relativas a condições não relacionadas ao trabalho. 5

A OIT descreve a presença frequente de estressores psicossociais nas condições de trabalho. Tais situações por vezes ultrapassam a capacidade humana de adaptação, traduzindo-se em problemas de saúde.

Estressores decorrentes do ambiente, conteúdo ou contexto do trabalho podem estar associados a potencial desencadeamento de impactos negativos sobre a saúde, desempenho e satisfação do trabalhador (SAUTER et al., 1998), além de absenteísmo e rotatividade.

Os principais fatores psicossociais do trabalho (FPS), conforme Levi (1998), e atu-alizado por Leka, Griffiths e Cox (2004), são:

• No conteúdo do trabalho: ӹ Conteúdo das tarefas – monotonia, repetitividade, subutilização de habilidades, tarefas que o trabalhador vê como sem sentido, tarefas de-sagradáveis ou repugnantes;

ӹ Carga e ritmo de trabalho – sobrecarga ou pouca carga de trabalho, trabalhar sob pressão de tempo;

ӹ Horário de trabalho – pouca flexibilidade nos horários, longas jorna-das, trabalho em horários na qual não há convívio social, horários im-previsíveis, esquema de turnos mal concebidos;

ӹ Participação e controle – baixa participação na tomada de decisões, pouco controle em relação aos métodos de trabalho, ritmo de trabalho, horários e ambiente de trabalho;

• No contexto do trabalho: ӹ Desenvolvimento de carreira, status e salário – insegurança no traba-lho, baixas perspectivas ou pouca possibilidade de promoção, trabalho de baixo valor social, pagamento por produtividade, sistemas de ava-liação de desempenho pouco claros ou injustos, ser mais qualificado ou ter baixo nível de qualificação para o trabalho;

ӹ Papel na organização – ambiguidade de papéis, papéis conflitantes dentro do mesmo trabalho/cargo, responsabilidade por pessoas, ter que lidar continuamente com outras pessoas e seus problemas;

ӹ Relações interpessoais – precariedade nas relações com supervisores, baixo apoio social dos colegas, “bullying”, assédio e violência no traba-

5 ILO – International Labour Office. “Psychosocial factors at work: recognition and control”. Report of the Joint ILO/WHO Committee on Occupational Health – Nona sessão. Genebra, 1984.

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lho, isolamento físico ou social, não existir procedimentos estabeleci-dos para lidar com problemas ou queixas;

ӹ Cultura organizacional – má comunicação, liderança não represen-tativa, falta de clareza sobre os objetivos organizacionais e estrutura organizacional;

ӹ Interface entre trabalho e situação doméstica – demandas conflitantes entre trabalho e vida pessoal, baixo apoio no trabalho referente aos problemas domésticos e da família em relação às questões do trabalho;

ӹ Condições ambientais – agentes ocupacionais de natureza física e química.

A exposição contínua a tais situações estressoras no trabalho pode desencade-ar repercussões psicológicas e comportamentais. Toomingas et al. (1997) discutem a tensão psicossocial ocupacional crônica como responsável pela diminuição no limiar de características psicológicas, tais como exaustão emocional. Krause et al. (1997b) descrevem evidências de que as cargas físicas e os fatores psicossociais do trabalho são simultâneos e independentes aos desfechos em saúde.

Distúrbios cognitivos – como dificuldade de concentração, memória e capacida-de de decisão – comprometem o desempenho profissional e os seus efeitos em longo prazo estão relacionados a queixas psicossomáticas, sintomas psiquiátricos e altera-ções do bem-estar. O esgotamento físico-mental, a frustração psicológica, a falta de prazer e apatia para desenvolver estratégias de enfrentamento predispõem ao adoeci-mento mental, especialmente aos transtornos depressivos (SILVA et al., 2009).

Estudos descrevem os estressores psicossociais como associados ao absenteísmo--doença por qualquer motivo (NORTH et al., 1996), inclusive quadros depressivos (NETTERSTRØM, 2008). Aspectos psicossociais desfavoráveis no trabalho, como tensão psicológica e insatisfação, foram associados a situações de aposentadoria por invalidez (KRAUSE et al., 1997a).

A atenção dada ao tema “estresse ocupacional” tem crescido e vários modelos teóricos foram desenvolvidos a fim de conceituar e explicar seus efeitos na saúde do trabalhador. Dois desses modelos têm recebido especial atenção: o Modelo De-manda-Controle (KARASEK, 1979) e o Modelo Desequilíbrio Esforço-Recompensa (SIEGRIST, 1996). Ambos se mostraram úteis na identificação de componentes espe-cíficos da organização da situação de trabalho e da sua interação com o trabalhador que afetam negativamente a saúde.

ӹ Modelo Demanda-Controle

Descrito por Karasek (1979), o Modelo Demanda-Controle (MDC), ou Job Strain Model, foi desenvolvido inicialmente para avaliar o risco de distúrbio cardiovascu-lar e sua associação com aspectos psicossociais do trabalho. Sua metodologia está baseada na avaliação de características específicas na execução do trabalho: grau

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de controle (ou latitude de decisão) e demandas psicológicas do trabalho. O modelo distingue situações laborativas específicas estabelecendo combinação entre essas di-mensões. Cada uma destas dimensões indica riscos diferenciados à saúde e à motiva-ção em uma ampla gama de ocupações.

As demandas referidas no modelo demanda-controle são estressores de natureza psicológica – tanto quantitativas, quanto qualitativas. Os aspectos quantitativos se referem à sobrecarga de trabalho, tempo disponível e o ritmo empreendido para tal. Os qualitativos seriam, por exemplo, o grau de dificuldade para execução de tare-fas e a existência de ordens de trabalho contraditórias ou discordantes. O controle sobre as tarefas abrange autonomia decisória (grau de autoridade para tomada de decisões, influência sobre o grupo de trabalho e sobre política gerencial) e o uso de competências individuais variadas (desenvolvimento de habilidades, aprendizagem de novas práticas, criatividade, variabilidade/repetitividade) (KARASEK et al., 1981; ARAÚJO et al., 2003).

Propõe-se que os trabalhadores expostos a condições sob alta demanda psicológi-ca e baixo controle no trabalho estão sob tensão que, caso persista ao longo do tempo, pode desencadear perda da capacidade funcional e aumento do risco de desenvolvi-mento das doenças relacionadas ao estresse (DE LANGE et al., 2002).

Uma versão expandida deste modelo de estresse no trabalho foi proposta por Jo-hnson e Hall (1988) ao adicionar a dimensão apoio social como um terceiro compo-nente. A ênfase na conexão individual entre a pessoa e o seu trabalho sofre influência das relações coletivas estabelecidas de forma horizontal (com os colegas) e vertical (chefias).

Baseando-se na percepção do trabalhador acerca dos fatores psicossociais na sua rotina laboral, Karasek (1985) elaborou uma escala de medida do estresse no traba-lho, o Questionário sobre Conteúdo do Trabalho (JCQ – “Job Content Questionnai-re”) (ARAÚJO et al., 2003).

A partir da combinação de níveis alto e baixo das dimensões, o modelo pressupõe quatro situações específicas de trabalho que configuram riscos diferenciados para a saúde (KARASEK, THEÖRELL, 1990):

• Alta exigência (“ job strain”): a combinação de alta demanda psicológica e baixo grau de controle favorece as reações mais adversas por desgaste físico e mental;

• Trabalho ativo: a combinação de alta demanda psicológica e alto controle predispõe à aprendizagem e crescimento profissional;

• Trabalho passivo: baixa demanda psicológica e baixo controle é um cenário pouco motivador e pode levar à perda gradativa de habilidades previamente adquiridas;

• Baixa exigência: baixas demandas psicológicas e alto controle sobre as tare-fas se configuram numa situação de trabalho em estado confortável, pois o trabalhador poderia ditar seu próprio ritmo.

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No Brasil, foi constatada elevada prevalência de transtornos mentais comuns em ocupações cuja percepção foi de alta exigência como: médicos (NASCIMENTO SO-BRINHO et al., 2006), trabalhadores de enfermagem (ARAÚJO et al., 2003), profes-sores da rede pública (REIS et al., 2005) e da rede particular de ensino (PORTO et al., 2006).

Em estudo com eletricitários, o comprometimento da saúde mental esteve as-sociado à alta exigência e ao baixo apoio social no trabalho (SOUZA et al., 2010). O nível de apoio social influencia a tensão no trabalho, pois a coesão das equipes repre-senta um forte fator de proteção à saúde dos trabalhadores (PALÁCIOS et al., 2002).

O baixo apoio social já foi descrito como associado ao afastamento do trabalho por longa duração (GRIEP et al., 2010), especialmente decorrente de adoecimento mental (FOSS et al., 2010). Santos et al. (2011) afirmaram que o baixo apoio social au-menta a gravidade dos casos, levando a um aumento de dias de ausência. Condições de isolamento social, principalmente onde a competitividade é acirrada, podem levar a situações de violência no trabalho. Sendo assim, torna-se de vital importância que as relações de trabalho sejam saudáveis para manter a saúde mental dos trabalhadores.

Na avaliação do Modelo Demanda-Controle completo, a situação de alta exigên-cia com baixo apoio social é a pior situação quando se analisa o absenteísmo-doença (GRIEP et al., 2010). Vezina et al. (2004) descrevem que o processo de intensificação do trabalho promove um aumento de exigências, inclusive psicológicas, e o baixo apoio social diminui a margem de manobra reconhecida como latitude decisória. O trabalhador se vê isolado tendo que ser resolutivo frente a demandas excessivas com baixa possibilidade de decidir soluções.

Portanto, o maior risco de adoecimento é assumido como sendo relacionado ao trabalho sob alta tensão e isolamento social, denominado “iso-strain”, caracterizado por alta demanda, baixo controle e baixo apoio social (KIVIMÄKI et al., 2006). Esta situação estressora aumentaria a excitação fisiológica, promovendo alterações neuro-endócrinas, metabólicas e distorção dos mecanismos homeostáticos. Em termos de mecanismos psicológicos, o impacto de um trabalho estressante é mediador de sen-timentos de desvalorização profissional, diminuição da autoestima e autocontrole, afetando a saúde mental (STANSFELD, CANDY, 2006).

Em uma coorte francesa com trabalhadores da distribuidora de eletricidade e gás estatal (GAZEL) houve associação entre o trabalho de alta exigência com baixo suporte social tanto com sintomas depressivos (NIEDHAMMER et al., 1998), quanto com a incapacidade para o trabalho por doença (MELCHIOR et al., 2003).

ӹ Modelo Desequilíbrio Esforço-Recompensa

Os estudos sobre os efeitos do estresse ocupacional por exposição a fatores psi-cossociais do trabalho têm avançado significativamente ao longo das últimas três décadas. A abordagem conceitual voltada para questões relacionadas ao indivíduo e

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ao mercado de trabalho tem ganhado espaço no rol dos estudos sobre saúde no tra-balho (KIVIMÄKI et al., 2006). Um exemplo é a teoria do Modelo de Desequilíbrio Esforço-Recompensa (MDER) ou “Effort-Reward Imbalance” (ERI).

Desenvolvido por Siegrist (1996; 1998), o modelo baseia-se na reciprocidade de intercâmbio na vida profissional, descrevendo o trabalho como fonte de ganho de auto-estima, eficácia e integração social, por meio de trocas sociais. O equilíbrio se dá quando esforços empreendidos pelo trabalhador e as recompensas adquiridas em contrapartida são equiparáveis. As recompensas esperadas podem abranger três as-pectos: financeiro (salário, benefícios), auto-estima (reconhecimento profissional) e percepção de controle do trabalhador sobre o seu status social (segurança no empre-go, ascensão profissional) (CANEPA et al., 2008; CHOR et al., 2008).

A noção da reciprocidade contratual está no cerne das relações de trabalho, na qual há retribuição às tarefas realizadas através de um retorno adequado. Nas situa-ções em que há o desequilíbrio entre altos esforços e baixas recompensas há o desen-volvimento de resposta negativa ao estresse, com consequências para a saúde física e emocional do trabalhador em longo prazo (SIEGRIST, 1996).

O mecanismo de desgaste parte da erosão da auto-estima, aflição psicológica e excitação do sistema nervoso autônomo pela percepção de que a situação profissional não lhe proporciona recompensas suficientes (STANSFELD, CANDY, 2006). Aque-les que se mantém em exposição a esse desequilíbrio o fazem por diversos moti-vos, como: dependência econômica por falta de alternativas no mercado de traba-lho, escolha profissional por investimento estratégico no planejamento da carreira e/ou excesso de comprometimento (SIEGRIST, 1996). Este último é um componente intrínseco do modelo relacionado com a excessiva disponibilidade e dedicação ao trabalho. É motivado por um perfil psicológico com forte desejo de ser aprovado, mas também por exposição a um ambiente de trabalho excessivamente competitivo e hostil (SIEGRIST, 1998).

Foram formuladas três hipóteses para o modelo:

• O desequilibro esforço-recompensa (“effort-reward imbalance” - ERI): situa-ção de alto esforço e baixa recompensa com aumento do risco para agravos à saúde, acima e além das questões individuais;

• O excesso de comprometimento intrínseco: baseia-se em exagero contínuo nos esforços intrínsecos, sem haver um desequilíbrio esforço-recompensa;

• A hipótese interativa: desequilíbrio esforço-recompensa com excesso de comprometimento, que se constitui como a pior situação para a saúde do trabalhador.

A teoria desenvolvida por Siegrist vem sendo utilizada em diversas pesquisas cujos desfechos envolvem a saúde do trabalhador. Van Vegchel (2005) e Tsutsumi et al. (2001) citam seu uso em grupos ocupacionais para análise de associação de FPS e distúrbios cardiovasculares, osteomusculares e psiquiátricos.

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Situações de desequilíbrio esforço-recompensa foram descritas como associadas a absenteísmo-doença de longa duração (HEAD et al., 2007) e ao absenteísmo-doen-ça por transtornos mentais (NDJABOUÉ et al., 2013). O elevado excesso de compro-metimento foi descrito como fator de risco para depressão (TSUTSUMI et al., 2001).

Para este modelo teórico foi desenvolvido um questionário (“Effort-Reward Imba-lance Questionnaire” – ERI-Q) composto por 46 itens sobre a percepção do trabalha-dor frente aos fatores psicossociais do trabalho (SIEGRIST, PETER, 1996). Há uma versão reduzida que já foi traduzida, adaptada e validada para o português falado no Brasil (CHOR et al., 2008).

ӹ Associação entre os Modelos Teóricos de Estresse Ocupacional

Seligman-Silva (1994) descreveu que a diversidade metodológica, teórica e con-ceitual limita os estudos voltados à avaliação dos aspectos relacionados à organização do trabalho e suas repercussões sobre a saúde do trabalhador. Ao se encontrar pontos de similaridade em abordagens distintas abrange-se o olhar sobre questões que en-volvem o trabalhador e sua relação com o trabalho.

Avaliação conjunta da exposição às dimensões dos dois modelos de estresse ocu-pacional (MDC e MDER) pode auxiliar no aprofundamento do estudo sobre as con-dições de trabalho (PETER et al., 2002). Bosma et al. (1998) descrevem que há asso-ciação significativa entre o desequilíbrio esforço-recompensa (alto esforço e baixa recompensa) e situações de baixo controle sobre o trabalho, a partir do MDC. Esta observação não é surpreendente, pois a dimensão “controle do trabalho” é essencial para os dois modelos. Ela se associa tanto ao desempenho da tarefa (aspecto micro, no MDC), quanto nas questões mais abrangentes de recompensa (aspecto macro, no MDER). Também o esforço extrínseco e as dimensões de demanda psicológica tem grande semelhança (PETER et al., 2002).

Meta-análise que investigou situações de exposição a estressores psicossociais no trabalho de alta exigência e com desequilíbrio esforço-recompensa descreveu asso-ciação de situações psicossociais desfavoráveis no trabalho e risco aumentado de de-senvolvimento de transtornos mentais comuns (STANSFELD, CANDY, 2006).

Em Taiwan, Chen et al. (2011) detectaram associação de quadros depressivos e as-pectos ocupacionais – como alta demanda, baixo apoio social, desequilíbrio esforço-recompensa – entre engenheiros da indústria microeletrônica. Tsutsumi et al. (2001) encontraram, entre trabalhadores japoneses, a associação entre quadro depressivo e situação de baixo controle sobre o trabalho, desequilíbrio esforço-recompensa e ex-cesso de comprometimento. No Brasil, estudos com profissionais de saúde têm sido realizados para avaliar o poder explicativo dos dois modelos teóricos sobre desfechos em saúde do trabalhador.

Em estudo de Griep et al. (2011) a piora na situação de saúde auto-referida en-tre profissionais de enfermagem esteve associada aos modelos demanda-controle e

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esforço-recompensa. A combinação de todas as dimensões diminuiu as limitações inerentes a cada modelo independente e contribuiu para aumentar a força das asso-ciações. Ou seja, os autores defendem que há uma valorização das escalas quando analisadas em conjunto. O MDC seria eficaz em discutir o estresse decorrente de ta-refas do trabalho. Já as dimensões do MDER reforçariam a interpretação individual do trabalhador frente às condições de trabalho.

A presença das dimensões mais negativas dos modelos estiveram associadas, en-tre bancários brasileiros, com autopercepção de qualidade de vida considerada ruim (SILVA, BARRETO, 2012). Esta percepção pode estar diretamente associada a con-dições mórbidas prévias ou mesmo o desgaste físico-mental decorrente da condição de trabalho. Tal situação pode predispor a episódios de presenteísmo e absenteísmo-doença. Em recente estudo realizado com trabalhadores brasileiros que requereram auxílio-doença, tais fatores psicossociais do trabalho também foram associados ao longo afastamento do trabalho por transtornos mentais (SILVA-JUNIOR, 2012).

As situações de baixo apoio social podem desencadear um excesso de comprome-timento pessoal para suprir a falta de um ambiente de trabalho acolhedor. Portanto, promoveriam desgaste individual para suprir as expectativas que o trabalhador assu-me como sendo requeridas pelas chefias. O esgotamento mental pode vir da tentativa realizada pelo trabalhador para se sobressair em situações de competitividade no ambiente de trabalho. Essas situações podem estar presentes em condições de tra-balho onde a eficácia não é visível, a avaliação é subjetiva e não necessariamente há reconhecimento por parte dos pares e chefia.

Quando há perda da identificação do trabalhador com o seu trabalho pela per-cepção de sobrecarga cognitiva por excesso de demandas, o esforço para realizar múltiplas tarefas pode estar relacionado ao sofrimento mental. Também a ausência de perspectiva de crescimento profissional, por baixo controle ou baixa recompensa, pode ser promovedora do desgaste psíquico.

Assim, apesar dos modelos teóricos serem estruturados em bases conceituais e operacionais distintas, justifica-se estudá-los de forma integrada para uma amplia-ção do entendimento das distintas esferas e nuances que permitem avaliar, de forma mais abrangente, os estressores no trabalho e seus riscos à saúde (BELKIC et al., 2004).

ӹ Considerações finais

O adoecimento mental, por apresentar características de um processo de sofri-mento crônico, pode levar à incapacidade laborativa temporária ou permanente e resultar em envelhecimento funcional precoce. Portanto, pode ser considerado um problema de saúde pública. É fundamental conhecer a magnitude do problema para programar políticas de promoção de saúde que evitem ou minimizem repercussões clínicas.

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A exposição ocupacional a condições desfavoráveis de natureza psicossocial deve ser reconhecida como contribuidora dos afastamentos do trabalho por transtornos mentais e comportamentais.

Os fatores psicossociais do trabalho são vivências coletivas nas formas de organi-zar o trabalho. Portanto, é fundamental lançar olhares sobre a complexidade e a di-nâmica que envolvem as situações reais de trabalho. Ruiz e Araújo (2012) consideram que a avaliar a defasagem entre o trabalho prescrito e o real, bem como o saber oriun-do da experiência, são aspectos fundamentais para se conhecer o risco psicossocial.

A avaliação dos FPS nas situações de trabalho apresenta dificuldades conceituais e metodológicas. Sendo assim, haverá condições nas quais os estressores desfavorá-veis não sejam reconhecidos, ou pode haver um subdimensionamento dos fatores de risco. No atual contexto de saúde e segurança no trabalho há algumas opções de ferramentas para mensuração da presença de FPS. Tais instrumentos devem ser im-plantados como rotina nas organizações empresariais como forma de compreender e dar visibilidade à presença de riscos ocupacionais, até então considerados invisíveis ou com baixa visibilidade.

Fischer (2012) ressalta a necessidade de realização de estudos de intervenção para preencher lacunas acerca da investigação de fatores de natureza psicossocial e reper-cussões na saúde dos trabalhadores. A implantação de estudos em nível corporativo, a partir dos serviços de saúde e segurança no trabalho, é factível e necessária.

O esclarecimento, por vezes difícil, do nexo causal entre doença mental e estres-sores ocupacionais (GLINA et al., 2001) poderia ser mais bem identificado a partir da instituição de protocolos para abordagem dos diversos fatores de risco. Além disso, após um longo período de absenteísmo-doença, cabe ao empregador promover um ambiente de retorno ao trabalho favorável. Isto só pode ocorrer se houver conheci-mento dos fatores de risco psicossociais associados ao afastamento por adoecimento (GLINA et al., 2010).

A imposição de políticas organizacionais com características desfavoráveis, tan-to nas esferas públicas como nas privadas, submetem os trabalhadores a desgastes mentais com comprometimento geral da sua capacidade laborativa. Portanto, vê-se a necessidade de um olhar mais atento para tais situações no intuito de ampliar as perspectivas de antecipação ao risco e implantação de ações intervencionistas que minimizem impactos negativos no processo saúde-doença. É altamente recomendá-vel serem estimular os programas de promoção em saúde do trabalhador. E é mais lógico, sob todos os pontos de vista, que estas ações se deem de forma preventiva, pois são menos onerosas que a reparação dos danos.

A legislação brasileira é insuficiente no que tange à regulação da organização do trabalho como risco ocupacional. São observadas situações desfavoráveis no traba-lho que frequentemente são interpretadas como sendo inevitáveis e parte do contexto e conteúdo do trabalho de determinadas funções.

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As repercussões sobre a saúde física e mental do trabalhador às condições es-tressoras de natureza psicossocial não apresentam um limite individual legal, dife-rentemente dos patamares de tolerância descritos para diversos agentes ambientais. Portanto, ressalta-se a necessidade de um acompanhamento sistêmico e eficaz para construção de medidas de ação primária na prevenção de exposição ocupacional aos fatores psicossociais do trabalho.

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DESENvOLvIMENTO SOCIOECONôMICO E ASPECTOS PSICOSSOCIAIS..... | 177

CAPÍTULO 10

TRABALhAR EM UM CONTExTO DE SUSTENTABILIDADE: UMA vISÃO DA ERGONOMIA

DA ATIvIDADE E DA PSICODINâMICA DO TRABALhO

Claudio Marcelo Brunoro, Laerte Idal Sznelwar, Ivan Bolis e Bruno César Kawasaki

ӹ Introdução

A temática da sustentabilidade originou-se a partir de um trabalho publicado em 1713 por Carlowitz (2013), no qual se discutia as necessidades de considerar as limita-ções de recursos naturais sobre o desenvolvimento econômico de uma determinada região. Esta temática foi retomada e aprofundada no início do século XX e se difun-diu em nível internacional, principalmente nas últimas quatro décadas, através do conceito de desenvolvimento sustentável. Este conceito foi formalmente introduzido na Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente Humano em 1972 (DRESNER, 2012), tendo como definição mais reconhecida aquela proposta em 1987 pela Comis-são Mundial sobre Ambiente e Desenvolvimento: “Desenvolvimento sustentável é o desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capa-cidade das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades” (WCED, 1987).

Da temática do desenvolvimento sustentável, surgem outros conceitos corre-lacionados direcionados a níveis mais restritos, como o das organizações (FIGGE, HAHN, 2004; GLADWIN et al., 1995). Neste caso, é adotado o termo “sustentabi-lidade corporativa” (SC) (BANSAL, 2005; MONTIEL, 2008; STEURER et al., 2005; VAN MARREWIJK, 2003).

“Na [década de 1990], o termo ‘sustentabilidade corporativa’ ganhou con-siderável interesse entre os profissionais das empresas e também foi examina-da na literatura acadêmica (por exemplo, GLADDWIN et al., 1995a; GLA-DWIN et al., 1995b; HART, 1997; DYLLIC, HOCKERTS, 2002; SCHALTEG-GER, DYLLICK, 2003)” (SCHALTEGGER, BURRITT, 2005, p. 189).

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A SC é um conceito que nasce nas empresas, induzindo novas formas de atuar. Mesmo que inicialmente focada apenas em questões ambientais, hoje em dia a atua-ção das empresas é pautada em três dimensões, a econômica, a social e a ambiental, como proposto na ideia do “tripé da sustentabilidade” (Triple Bottom Line) (ELKIN-GTON, 1994; Idem, 1997). Ao mesmo tempo, muitas propostas são identificadas na literatura de SC, sendo que esta é atualmente fortemente relacionada ao conceito de “responsabilidade social corporativa”, que trata, na maioria das vezes, de questões semelhantes, senão coincidentes (EBNER, BAUMGARTNER, 2006; KLEINE, VON HAUFF, 2009; MONTIEL, 2008; STEURER et al., 2005; VAN MARREWIJK, 2003).

Savitz e Weber (2007, p. 2) afirmam que “empresa sustentável é aquela que gera lucro para os acionistas, ao mesmo tempo em que protege o meio ambiente e melhora a vida das pessoas com as quais interage”. No entanto, os mesmo autores (2007, p. 47) salientam que “nenhuma das empresas que merecem algum registro nos primórdios da sustentabilidade apresentam bom desempenho ao longo dos anos em todas as três áreas de responsabilidade, a social, a ambiental e a econômica”.

Gladwin et al. (1995a) afirmam que o conceito de sustentabilidade está fundamen-tado na percepção de que só a perspectiva econômica não é suficiente para nortear as ações de uma corporação. Nessa mesma linha, Dyllick e Hockerts (2002, p. 132) defendem que manter o foco exclusivamente nas questões econômicas pode angariar sucesso no curto prazo, entretanto, no longo prazo, todas as três dimensões deveriam ser satisfeitas simultaneamente. Dyllick e Hockerts (2002, p. 132) ainda propõem três elementos principais para a SC: 1) a integração dos aspectos econômicos, ambientais e sociais; 2) a integração dos aspectos de curto prazo e de longo prazo; 3) a utilização do rendimento e não do capital (do recurso em si). Esse último é considerado pelos autores uma condição básica para uma gestão responsável, com a necessidade de ge-rir não somente o capital econômico, mas também o capital natural e o social.

Apesar de SC ainda ser um conceito em desenvolvimento, com múltiplas inter-pretações e abordagens, em algumas delas os temas relacionados ao trabalho são ex-plicitamente mencionados (EPSTEIN, 2008; LITTIG, GRIESSLER, 2005; LOZANO 2013; VAN MARREWIJK, WERRE, 2003). O que aparece na atualidade é a introdu-ção, na rotina das empresas, de diretrizes de sustentabilidade que mencionam ques-tões sociais (GRI, 2013; ISO, 2010; UNGC, 2013) com menção às questões do trabalho (ex.: emprego e relações de trabalho; condições de trabalho e proteção social; diálogo social; saúde e segurança no trabalho; desenvolvimento humano; treinamento; direi-tos humanos).

Desde a estreia do conceito desenvolvimento sustentável, a questão do trabalho, compreendida sob diferentes ângulos, foi incluída nos aspectos a serem tutelados pela humanidade. Desde 1972, os documentos da Organização das Nações Unidas (ONU) que balizam as ações das empresas no âmbito da sustentabilidade (UN – UNITED NATIONS –, 2000; Idem, 2000; Idem, 2002; Idem, 2005; UNCED, 1992; UNCHE, 1972; WCED, 1987) já abordam questões sobre o tema trabalho (ex.: garantia de

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emprego e estabilidade, aspectos de saúde e segurança no trabalho, conteúdos da Declaração Universal dos Direitos Humanos e da Declaração dos Princípios e Direi-tos Fundamentais no Trabalho). O primeiro e o quinto parágrafos da Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano proclamam que

“1. O homem é tanto criador como criatura de seu ambiente, o que lhe dá a sustentação física e a oportunidade para um crescimento intelectual, moral, social e espiritual. […] Ambos os aspectos do ambiente humano, o natural e o criado pelo homem, são essenciais para o seu bem-estar e para o aproveita-mento dos direitos humanos básicos e o próprio direito a vida. [...] 5. [...] De todas as coisas do mundo, as pessoas são as mais preciosas” (UNCHE, 1972).

O primeiro princípio da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvi-mento proclama que “os seres humanos estão no centro das preocupações do desen-volvimento sustentável. Eles têm direito a uma vida saudável e produtiva, em har-monia com a natureza” (UNCED, 1992). Na Rio 92, ficou explícito que a necessidade de satisfazer desejos materiais não deve acontecer em detrimento da saúde do ser humano (SCOTT, 2008, p. 498), o que remete a discussão às situações de trabalho. Os documentos mais recentes mencionam o conceito de trabalho decente, que envolve a criação de emprego para homens e mulheres, a extensão da proteção social, a promo-ção do diálogo social e os Direitos e Princípios Fundamentais no Trabalho (GHAI, 2003). A introdução de tal conceito resultou principalmente da necessidade de se opor às condições de trabalho precárias, em especial nos países em desenvolvimento industrial, e de dar uma resposta à indignação quanto aos sweatshops, casos consa-grados de espaços de trabalho em péssimas condições (BLOCK et al., 2001; CHAN, 2001; O’ROURKE, 2003).

No contexto das organizações, a avaliação da sustentabilidade de um processo, tanto de geração de produtos quanto de serviços, acontece predominantemente se-gundo as dimensões econômica e ambiental. Ao analisar as entradas e saídas de um processo produtivo, priorizam-se soluções que são viáveis respeitando esses aspectos, ou seja, primando pelos resultados econômicos favoráveis e pelo uso racional dos recursos, que se expressa sob diversas formas: preferência por materiais de menor impacto ambiental, redução dos insumos da cadeia produtiva (GUTBERLET, 2000), diminuição do consumo e descarte adequado de produtos finais, uso eficiente de água e utilização de fontes de energia renováveis.

A realização de qualquer processo produtivo – o que inclui o seu planejamento – requer a participação ativa de pessoas, logo, de trabalho. Sendo assim, um pro-cesso considerado sustentável também deve zelar pela a sustentabilidade do traba-lho envolvido. O trabalhador deve ser compreendido como protagonista da ação, e o trabalho como protagonista da produção (SZNELWAR, 2013). Destaca-se, então, a centralidade do trabalho para a sustentabilidade, sendo necessário retirá-lo da usual posição de variável de ajustamento ao final, depois que todo o processo técnico foi concebido e imposto (ABRAHÃO et al., 2009).

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Em geral a relação entre trabalho e sustentabilidade se estabelece por meio dos possíveis impactos ambientais do processo, estando sua análise focada nos resultados do trabalho, e não na realização propriamente dita, o que inclui o indispensável en-gajamento do trabalhador para garantir a execução do processo. Nesta perspectiva é que se coloca uma abordagem não usual: 1) sendo necessário haver trabalho em prol da garantia da sustentabilidade (seja ela qual for), as tarefas são modificadas para se propor novas formas de produzir; 2) ao mesmo tempo, o trabalho das pessoas deve ser inserido em um contexto de sustentabilidade, que implique a possibilidade de os sujeitos se desenvolverem profissionalmente, se realizarem e construírem a sua saú-de, tanto no que diz respeito ao indivíduo quanto aos coletivos, contribuindo tam-bém, em um sentido amplo, para o desenvolvimento da cultura.

Em particular, o escopo dessa análise se estabelece por meio da intersecção entre os conceitos relacionados às organizações e ao desenvolvimento sustentável (Figura 1), ou sustentabilidade na perspectiva das empresas (SC). Mais especificamente, o foco está na dimensão social da sustentabilidade associada aos processos internos e às ações da organização. Uma especial atenção recai sobre as empresas engajadas em sustentabili-dade, ou seja, que pretendem atuar em alinhamento com os elementos da SC.

Figura 1 – escopo da análise

econômica

ambiental social

Desenvolvimento Sustentável

Sustentabilidade Corporativa / Responsabilidade Social Corporativa

Dimensão Ambiental

Dimensão Social

Dimensão Econômica

Externa Interna

TRABALHO

Tripé da sustentabilidade(triple bottom line - Elkington, 1994)

Organizações

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Muitas empresas consideram seu público interno como um de seus maiores “re-cursos”, sendo por isso denominado de “capital humano”, mas como garantir a sus-tentabilidade para esse “recurso”? O que seria, então, a sustentabilidade enfocando aquele que realiza o trabalho, que faz o processo acontecer? O que seria um trabalho “sustentável”? Estas são as questões centrais que nortearão este capítulo, sendo que a análise fará substancial proveito de conhecimentos já bem estabelecidos pela ergo-nomia da atividade e pela psicodinâmica do trabalho. O ponto de vista da ergonomia da atividade está baseado naquilo que os trabalhadores fazem, como cada sujeito usa de si para realizar aquilo que foi previsto nas tarefas e, ao mesmo tempo, aquilo que não foi previsto, para se obter os resultados de produção almejados, com a finalidade de compreender o trabalho para melhorá-lo, com a premissa de adaptar o trabalho ao ser humano e não o contrário (ABRAHÃO et al., 2009). A psicodinâmica do tra-balho estuda, fundamentalmente, o viver junto, a racionalidade páthica das condutas humanas (ligada à autenticidade e à construção da identidade), que está relacionada com mobilização subjetiva que ocorre a partir das inter-relações estabelecidas no e com o trabalho. Dessa forma, os temas principais que se sobressaem em psicodinâ-mica do trabalho são aqueles relacionados à realização de si, ao reforço do processo da identificação, tratando o sujeito como participante de um determinado coletivo de trabalho, ao sentimento de justiça e ao reconhecimento (DEJOURS, 2007; Idem, 2012). Espera-se, assim, enriquecer a compreensão da sustentabilidade nas organiza-ções e, ao mesmo tempo, orientar a sua prática.

ӹ Análise e discussão

As práticas das empresas engajadas em sustentabilidade são norteadas por dire-trizes de organizações de apoio que, por sua vez, se fundamentam em documentos elaborados em fóruns internacionais e que servem de referência para a sustentabili-dade. Entre os temas mais diretamente associados ao tema trabalho, pode-se citar a centralidade do ser humano, a cooperação, o desenvolvimento humano, a qualidade de vida, o equilíbrio entre vida profissional e pessoal, padrões sustentáveis de pro-dução e consumo, os direitos humanos, a noção de vida saudável e produtiva, e o conceito de trabalho decente.

Outros aspectos mencionados pelo referencial teórico de sustentabilidade, ape-sar de terem uma relação menos direta com o tema trabalho, são: consideração de valores, respeito e ética; temporalidade (ações da geração atual criam ou restringem as oportunidades das próximas gerações); múltiplas escalas de análise e interdepen-dência (ações locais têm efeitos regionais e potencialmente globais); várias dimensões (a ecológica, a social e a econômica); interdependência e integração entre esses ele-mentos, para o que é necessário desenvolver soluções ganha-ganha-ganha, isto é, que conciliem o tripé da sustentabilidade (MARTENS, 2006). Visto de forma semelhante

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(GLADWIN, KENNELLY, KRAUSE, 1995, p. 878): inclusão (entre sistemas ambien-tais e humanos, entre próximos e distantes, entre presente e futuro); conectividade (dos problemas do mundo, sendo que são interconectados e interdependentes); equi-dade (distribuição justa dos recursos e direitos de propriedade); e prudência (deveres de cuidado e prevenção, como é o caso do princípio da precaução).

O relatório Sustainability nears a tipping point, publicado em 2012 pela revista MIT Sloan Management Review (KIRION et al., 2012), indica os resultados de uma survey respondida por mais de 4.000 gerentes e diretores de 113 países. É retratada a introdução de questões relacionadas direta ou indiretamente com sustentabilidade na agenda das organizações, sendo a sustentabilidade entendida em muitos setores como condição necessária para se manterem competitivas. Uma das perguntas do questionário avalia se o termo sustentabilidade é útil e concreto, no sentido de bem definido. As respostas indicam que os conceitos sustentabilidade e desenvolvimento sustentável ainda se mantêm polissêmicos, apresentando diferentes interpretações e abordagens para cada área do conhecimento humano. Outro aspecto diz respeito ao desenvolvimento de novas maneiras de produzir para que as empresas se legitimem com relação à sustentabilidade, uma vez que esta depende de mudanças em processos de produção e nas respectivas tarefas. Em outras palavras, até mesmo devido à multi-plicidade das interpretações para SC, há ampla margem para que as empresas classi-fiquem um grande número de ações como “sustentáveis”, com poucas exigências para considerá-las como tais. Isto abre um flanco significativo com relação ao que seria de fato sustentável no âmbito das ações das empresas.

Percebe-se um elevado truncamento de elementos no espaço e no tempo, e não é à toa que a sustentabilidade seja interpretada de diversas maneiras, dado os diferentes posicionamentos e visões de mundo. Pouco é tratado, neste tema, com relação ao ponto de vista de outros autores, como os organismos de representação dos traba-lhadores. A mudança para um paradigma de sustentabilidade implica em reconhecer as interdependências e os efeitos que uma ação provoca em uma teia de elementos, e também em ser capaz de agir sobre as raízes dos efeitos negativos.

ӹ Trabalho e sustentabilidade: duas vias e múltiplas escalas

Quando se coloca o trabalho como questão central na SC, é possível identificar duas categorias para a relação entre trabalho e sustentabilidade (Figura 2): “Trabalho para a sustentabilidade” e “trabalho sustentável”, esta última podendo também ser compreendida como sustentabilidade para o (ou do) trabalho na perspectiva do ser humano.

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Figura 2 – A responsabilidade corporativa sobre o trabalho 1

A primeira categoria, denominada “trabalho para a sustentabilidade”, está rela-cionada com as ações necessárias para garantir a sustentabilidade. A literatura é rica em teorias e estudos de caso que podem aí ser classificados, como esforços de capa-citação, ações de sensibilização, códigos de conduta e comitês de ética. Por exemplo, é possível destacar os códigos de conduta corporativos (BÉTHOUX et al., 2007) que descrevem ações que os trabalhadores devem executar, a fim de manter ou garantir a sustentabilidade ambiental, bem como o incentivo à realização de ações externas, a exemplo do trabalho voluntário e da incorporação das práticas de sustentabilidade em sua vida pessoal.

Em suma, os elementos que pertencem a uma visão de mundo sustentável pressu-põem que há um trabalho a ser realizado, justamente para que se tornem concretos. Mesmo com a introdução de processos automatizados, ainda assim haverá um novo trabalho humano a ser realizado (monitorar, vigiar, decidir, agir em imprevistos, rea-valiar processos, comunicar, gerir etc.), com novos conteúdos, desafios e restrições, dos quais o trabalhador precisará “dar conta” ou “dar de si” para garantir o sucesso da produção.

A segunda categoria, denominada “trabalho sustentável”, está relacionada com as ações de sustentabilidade que têm o trabalhador como alvo. A literatura também contém um vasto material classificável nesta categoria, referente a assuntos como condições de trabalho, saúde e segurança no trabalho, desenvolvimento humano e bem-estar. Em particular, por meio de estudos de caso envolvendo 10 empresas en-gajadas em sustentabilidade, foi mencionado pelos entrevistados que um trabalho

1 Fonte: adaptado de Bolis, Morioka, Sznelwar (2013).

Responsabilidade Social corporativa sobre o trabalho (RSc = Sc)

efetivo interesse no trabalhador

Imagem corporativa

trabalho para sustentabilidade

teoria do stakeholder Irresponsabilidade corporativa

trabalhos verdes

Mudanças nos processos de trabalho

trabalho sustentável

sustentabilidade econômica

trabalho para sustentabilidadeð ï

ò òø

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sustentável deve “dar prazer”, “fazer sentido”, “ter significado” e, no limite, “levar à felicidade”, devendo ser estabelecida em uma relação ganha-ganha para os trabalha-dores e para a empresa (BRUNORO, 2013).

Tomando o tema trabalho como eixo condutor, a sustentabilidade será avaliada em diferentes escalas, indo do nível macro ao micro: sociedade, organização (empre-sa), equipe/coletivo de trabalho e indivíduo (Figura 3).

Figura 3 – Proposta para um trabalho em uma perspectiva de sustentabilidade (BRuNORO, 2013)

No nível macro, o da sociedade, encontram-se os conceitos associados ao desen-volvimento sustentável, já mencionados. Na escala menor seguinte, se encontram as organizações e empresas. Por ser este um nível contido no anterior, suas ações tam-bém devem ser balizadas segundo os conceitos gerais do desenvolvimento sustentá-vel, apresentando, dessa forma, um sistema produtivo (de trabalho) condizente.

Um sistema de trabalho sustentável visa a regeneração dos recursos que ele utiliza – humano, social e material, incluindo os recursos naturais – devolvendo-os à socie-dade preservados ou melhorados (desenvolvidos) (DOCHERTY et al., 2009; SHAMI, 2009; KIRA, EIJNATTEN, 2009). O desenvolvimento de um tipo de recurso não deve ocorrer às custas da degeneração dos outros tipos, e a responsabilidade por custos externos deve ser reconhecida pela organização. Posto que as empresas exercem um papel fundamental na sociedade contemporânea, há uma forte conexão entre os ní-

SOCIEDADEDesenvolvimento Sustentável

INDIVÍDuO

Centralidade do TrabalhoSubjetividade

EQuIPE / COLETIVO

Construção da SaúdeTrabalhar

ORGANIZAÇÃO

Sustentabilidade Corporativa

Sistemas de Trabalho Sustentáveis

Ambientes de Trabalho Saudáveis

ê

ê

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veis interno e externo da dimensão social da SC. Se o trabalho não for abordado com a devida profundidade no cotidiano das empresas (nível micro), não há como viabi-lizar o desenvolvimento sustentável (nível macro).

Quanto aos “recursos” humanos, as práticas balizadas na SC devem promover a saúde dos indivíduos em sentido amplo e positivo. No caso, citando apenas o con-ceito estabelecido pela Organização Mundial de Saúde (OMS), saúde é “um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doença” (WHO, 1948). Em particular,

“[...] saúde mental é definida como um estado de bem-estar em que cada indivíduo percebe o seu próprio potencial, podendo lidar com o stress normal da vida, trabalhar de forma produtiva e criativa, sendo capaz de contribuir para sua comunidade” (WHO, 2011).

Assim, já é possível compreender que para abordar a saúde é preciso ir além das incidências, prevalências, absenteísmos e patologias.

Apesar de todo processo de transformação dos sistemas produtivos gerar algum tipo de impacto negativo tanto na dimensão ambiental quanto na social, há proces-sos que podem gerar menos do que outros. Mesmo havendo dificuldade de avaliação quantitativa das alternativas, ainda assim é possível uma análise cautelosa e qualita-tiva, contemplando os potenciais cenários gerados pela introdução de sistemas tec-nicamente viáveis. A OMS também defende a importância de incluir o trabalhador (da linha de frente) neste processo decisório e adotar uma agenda de saúde positiva, promotora de saúde:

“Um ambiente de trabalho saudável é aquele em que os trabalhadores e os gestores colaboram para o uso de um processo de melhoria contínua da prote-ção e promoção da segurança, saúde e bem-estar de todos os trabalhadores e para a sustentabilidade do ambiente de trabalho tendo em conta as seguintes considerações estabelecidas sobre as bases das necessidades previamente de-terminadas: questões de segurança e saúde no ambiente físico de trabalho; questões de segurança, saúde e bem-estar no ambiente psicossocial de traba-lho, incluindo a organização do trabalho e cultura da organização; recursos para a saúde pessoal no ambiente de trabalho; e envolvimento da empresa na comunidade para melhorar a saúde dos trabalhadores, de suas famílias e outros membros da comunidade” (OMS, 2010, p. 6).

ӹ O posicionamento do trabalho na prática da sustentabilidade

Em geral, as iniciativas empresariais relacionadas à prática da sustentabilidade social podem ser classificadas da seguinte forma:

• Dirigidas ao público externo: trabalho voluntário, parcerias com ONGs e instituições, programas de envolvimento com a comunidade;

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• Dirigidas ao público interno: desenvolvimento dos green jobs (foco em ga-rantir um trabalho que seja ambientalmente adequado), planos de carreira bem estruturados, programas de participação nos lucros e resultados (PLRs), programas de saúde e segurança no trabalho, trabalho decente, ginástica laboral, planos de assistência de saúde, creches, distribuição de benefícios, vale-alimentação, previdência privada.

É possível perceber que a abordagem empresarial para a sustentabilidade social pouco tem sido direcionada ao ato de trabalhar e aos os sujeitos que trabalham. O mesmo vale para as iniciativas voltadas ao público interno, que têm caráter neutro ou mitigatório sobre os efeitos negativos do trabalho, ao invés de abordar suas causas (ginástica laboral, planos de assistência de saúde). Enfim, pouca importância se dá à organização do trabalho e ao seu conteúdo, nos níveis prático e simbólico.

Uma explicação para este fenômeno talvez seja a percepção de que, para os resul-tados efetivos da produção, o ato de trabalhar seria pouco relevante em comparação com os outros elementos do sistema de produção (SZNELWAR, 2009), visto que o trabalho é visto como uma mera execução de tarefas programadas pela gestão. Outra hipótese é que as discussões internacionais e políticas sobre os meios necessários para a SC não evoluíram tanto quanto aquelas sobre seus objetivos, ao longo das últimas décadas. Há de se reconhecer que os entraves envolvidos são complicados e desafiadores, conforme será explicado na seção a seguir.

ӹ Transformações no mundo e desafios para o trabalho sustentável

Em diversos setores econômicos, as mudanças regulatórias, instabilidades geopo-líticas e evoluções tecnológicas caracterizam cenários competitivos de elevada incer-teza e dinamismo, em função do que se passou a exigir um novo perfil de trabalha-dor: polivalente, comprometido, em contínua qualificação, proativo, hábil para atuar em equipe e capaz de permanentemente assimilar novas tecnologias (ABRAHÃO et al., 2009). Tais transformações ocorreram no sentido de submeter o ser humano a uma mudança na realidade empresarial, em que também as unidades de negócio pre-cisam ser suficientemente flexíveis para atender a demandas diversificadas, específi-cas e dinâmicas do mercado (GRINT, 1998, p. 363). Vale observar que o paradigma do taylorismo e fordismo, com toda a problemática do trabalho altamente fragmen-tado e repetitivo, não foi totalmente superado; pelo contrário, permanece presente na cadeia produtiva de diversas corporações.

O acirramento da competitividade (tanto entre as empresas quanto entre os indi-víduos pelas vagas de trabalho); a constante pressão pela terceirização e redução do quadro de funcionários (downsizing), a fim de reduzir custos; e o clima de incerteza geral (flexibilização dos direitos trabalhistas, rápidas mudanças macroeconômicas, fusões e aquisições, guinadas de estratégia), são elementos que caracterizam um novo cenário de trabalho descrito por diversos autores (DEJOURS, 2007, p. 51; GRINT,

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1998, p. 377; LIMA, 2013; LIMA, 2003), sendo frequente a utilização do termo “tra-balho precário”. Não será discutido aqui se as condições de trabalho pioraram ou melhoraram nas últimas décadas; será enfatizado, todavia, como esta nova realidade se configura e o que se pode fazer a respeito.

A transição do capitalismo industrial para o financeiro representou a redução gradual da relevância do papel do trabalho para o acúmulo de capital (HARVEY, 2000). Ao mesmo tempo, segundo a OIT, a crise financeira de 2008 evidenciou a oportunidade de um possível reposicionamento do trabalho no planejamento estra-tégico das organizações, o que, no entanto, não se sucedeu. Na mesma época, uma iniciativa estabelecida pela ONU, por meio do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD ou UNEP – United Nations Environment Programme), vis-lumbrou um novo modelo econômico denominado Green Economy Initiative. Nele é explicitamente mencionada a problemática enfrentada nessa crise financeira, suge-rindo uma forma de restabelecer a economia global:

“As múltiplas crises que ameaçam a economia mundial hoje exigem o mes-mo tipo de iniciativa como mostrado pelo New Deal de Roosevelt na década de 1930, mas em escala global e com a adoção de uma visão mais ampla. A combinação correta de ações políticas podem estimular a recuperação e, ao mesmo tempo, melhorar a sustentabilidade da economia mundial. [...] Uma visão expandida é fundamental para o sucesso duradouro de uma recupera-ção da economia mundial. Reviver o crescimento, garantir a estabilidade fi-nanceira e criar postos de trabalho devem ser objetivos essenciais. Mas, a me-nos que novas iniciativas políticas também abordem outros desafios globais, [... será a] única forma de revitalizar a economia de maneira mais sustentada” (BARBIER, 2009).

Harvey (2000) ressalta que a lógica da acumulação do capital modifica drastica-mente todos os níveis de uma organização, e não só a área de produção. É neste novo contexto de obsessão por metas, prazos e indicadores, essenciais para a sobrevivência das empresas, que se compreende a introdução massiva de novos métodos de ges-tão, os quais modificaram profundamente a organização do trabalho. Em especial, os métodos imbuídos da ideia de “flexibilização” minaram as relações de confiança (SENNET, 1999). Tais transformações intensificaram a racionalização da produção (TERTRE, 2011, p. 74), considerando o trabalho e o trabalhador em uma posição secundária, de variável de ajuste.

Nessa mesma linha, há diversos estudos que demonstram como as técnicas de gestão focadas em redução de custos provocaram a intensificação do trabalho e o tornaram mais anxiogênico, gerando inclusive perdas – que era justamente o que queria ser combatido – por adoecimentos (ASKENAZY et al., 2006; GREEN, 2006; WESTGARD, WINKEL, 2011). Assim, uma nova filosofia de produção, nascida no setor privado de produção de bens materiais, passou a se difundir rapidamente entre

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as empresas do setor serviços e também no setor público, muito antes que seus efeitos sobre a saúde do trabalhador fossem socialmente e plenamente reconhecidos.

“Enquanto mais pesquisas são necessárias para compreender plenamente as suas implicações, já é aceito também que esses fatores [psicossociais] po-dem ter um impacto significativo sobre a saúde dos trabalhadores, o absenteís-mo e o desempenho” (ILO, 2010, p. 6).

Deve ser salientado que não é possível atribuir estas profundas transformações apenas ao desenvolvimento das novas técnicas de gestão, como se fossem um desdo-bramento determinístico do avanço do conhecimento e da tecnologia. Como realida-de construída, há de se reconhecer a participação ativa dos atores sociais.

Apesar de muitas organizações atenderem às exigências impostas pelas normas jurídicas que estabelecem condições mínimas de trabalho, os desafios para abordar ampla e adequadamente a realidade do trabalho vão mais além, conforme sugere a generalizada e elevada incidência de distúrbios ocupacionais de natureza psíquica ou mental – além daqueles de ordem física que já são mais reconhecidos no contexto das Lesões por Esforço Repetitivo e Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Traba-lho (LER/DORT) (ILO, 2013; MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012). Será elucidado como o cumprimento das normas trabalhistas não é suficiente para resguardar a saúde do trabalhador.

“A reestruturação da organização do trabalho, o downsizing, a subcon-tratação e a terceirização, por exemplo, têm inevitavelmente provocando im-pactos sobre as condições de trabalho, tornando mais difícil de alcançar um equilíbrio saudável entre trabalho e vida pessoal. [...] o estresse pode ser um importante fator que contribui para a depressão e até mesmo suicídio. Tudo isso representa um custo potencialmente enorme em termos de sofrimento hu-mano e de ônus econômico para o indivíduo e para a sociedade” (ILO, 2010, p. 6).

A seguir será tratado o ponto de vista da psicodinâmica do trabalho, a partir do qual se pode compreender melhor a crescente e grave incidência de distúrbios mentais relacionados ao trabalho. Os sentimentos de impotência e a ansiedade, as-sociados a ambientes de trabalho com metas ambiciosas e extrema competitividade, resultam em uma enorme carga psíquica que está por trás do trabalhador multifun-cional, altamente qualificado, do qual se exige também uma entrega emocional e psicológica (“dar o sangue”, “vestir a camisa da empresa”). O trabalhador passou a ter de conviver com a ameaça iminente do desemprego ou subemprego, a gestão pelo medo, e a vergonha de expor seu sofrimento invisível (DEJOURS, 2007, p. 48). Enfim, as empresas se tornaram cenários cada vez mais propícios para o desenvolvimento de sofrimento patogênico.

Do medo em discutir o real do trabalho contemporâneo, com seus dramas e im-passes particulares, decorre o silêncio, não obstante todos os seus efeitos nefastos

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sobre a saúde e dignidade humanas. Portanto, a abordagem sobre o tema trabalho sem a sua devida profundidade pode ser interpretada como fruto de um silêncio constrangedor acerca do assunto (DEJOURS, 2007, p. 47). Ao mesmo tempo, o dis-curso oficial da sustentabilidade, originado de debates internacionais, chega no nível corporativo e expõe um notável descompasso com a realidade: como pôr em prática um desenvolvimento socialmente sustentável em meio a condições de trabalho tão precárias, que comprometem a subjetividade dos envolvidos e solapam a consolida-ção do que há de coletivo na produção? Como abordar tais injustiças, sobre as quais nem mesmo as organizações de apoio falam abertamente?

A introdução da ideia de SC nas organizações não raro se manifesta através de ações pretensamente sustentáveis, moldadas a posteriori em fase com objetivos pri-mordialmente econômicos. Este modo de agir nas organizações pode levar a um afastamento evidente entre o discurso e a prática relacionada ao que seria um desen-volvimento sustentável. Por exemplo, ocultar exemplos de não sustentabilidade ou de graves externalidades negativas provocadas por essa pseudo-sustentabilidade, a fim de resguardar a imagem corporativa. O discurso oficial para a sustentabilidade, quando é impreciso neste sentido, não deve ser menosprezado, pois contribui para a distorção comunicacional na organização. Esta implica o nível subjetivo dos traba-lhadores, gera um sofrimento ético, capaz de se manifestar de diversas formas (por exemplo, desespero, depressão, alcoolismo, revolta) como fruto de uma descompen-sação psicopatológica (DEJOURS, 2007, p. 123).

Ademais, a discussão das relações interpessoais se reduz, muitas vezes, à relação líder/liderado, com foco nas responsabilidades individuais pela produção. Trata-se de uma visão empobrecida dos relacionamentos nos espaços de trabalho, considerando-se que “trabalhar não é, em tempo algum, apenas produzir: é também e sempre viver junto” (DEJOURS, 2012, p. 38). Assim, a psicodinâmica do trabalho permite rela-cionar questões individuais e coletivas, que apesar de essencialmente invisíveis, têm efeitos concretos sobre a saúde. É também em razão da gravidade destes efeitos – os quais atingem os trabalhadores de todos os níveis hierárquicos – que a subjetividade precisa ser considerada para a prática da sustentabilidade. Ressalta-se que o trabalho, em sua centralidade, também é fundamental para o desenvolvimento da cultura.

ӹ Propostas para um trabalho em um contexto de sustentabilidade

Dentre os elementos evidenciados pela ergonomia da atividade e pela psicodinâ-mica do trabalho, destacam-se as seguintes contribuições para um trabalho em um contexto de sustentabilidade:

• Compreender o trabalho para transformar: a ergonomia da atividade, em especial, propicia condições para a identificação do conteúdo das novas ta-refas, restrições e impactos para os trabalhadores em situações de trabalho que possuem, por exemplo, premissas, metas e políticas de sustentabilidade;

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• Identificar os indutores (as fontes) para o trabalho sustentável (ou não-sus-tentável): mesclando tanto o trabalho para a sustentabilidade quanto a sus-tentabilidade do trabalho, essas disciplinas possibilitam identificar as exter-nalidades desconhecidas, especialmente aquelas relacionadas aos aspectos organizacionais que nem sempre são considerados;

• Alinhamento organizacional quanto a questões relacionadas ao trabalho: em uma perspectiva de uma sustentabilidade para o trabalho no sentido da ação, atividade, essas disciplinas podem ajudar a alinhar os esforços de de-partamentos que influenciam diretamente o trabalho, especialmente o de Produção e Recursos Humanos.

O trabalho em um contexto de sustentabilidade depende da construção de uma agenda positiva para a saúde. Logo, mais do que simplesmente identificar de situações patogênicas ou de risco à saúde física, é preciso cultivar os elementos que promovem a realização de si e que dão oportunidade para a emancipação. A psicodinâmica do trabalho reconhece que o trabalho, sendo central na vida dos indivíduos, nunca é neutro em relação à saúde. É o desbloqueio nos canais de expressão, comunicação e cooperação, que permite a circulação da palavra e a construção de um discurso compartilhado sobre o trabalho, capaz de fortalecer o senso de identidade individual e coletivo. Estas são, ao mesmo tempo, as condições que favorecem a adequação da organização do trabalho e da produção às variabilidades humanas, conforme enun-ciado pela ergonomia da atividade (ABRAHÃO et al., 2009; DANIELLOU, 2004).

Trabalhar é relacionar-se, e é preciso ir além da visão excessivamente focada na proatividade, competência e responsabilidade individuais, ou no relacionamento lí-der/liderado. Em um contexto de sustentabilidade, também se faz necessário enten-der: a dinâmica do reconhecimento dos esforços, a qual é capaz de dar significado ao sofrimento e possibilitar o prazer em trabalhar; os mecanismos (individuais e coletivos) de defesa desenvolvidos de modo a atenuar a carga psíquica do trabalho, embora não alterem a realidade material de um ambiente patogênico; as inteligên-cias que o trabalhador mobiliza para proteger e desenvolver a sua identidade. Deve ser compreendido como um ambiente modulado pelo risco e medo permanentes é capaz de disparar a competição em níveis degradantes, a sobrecarga de trabalho e a desolação, que, inevitavelmente, prejudicam a vivência de todos os atores envolvidos (DEJOURS, 2012).

“A questão principal está no desenvolvimento de outra racionalidade. O trabalho humano não seria algo que se usa e se consome. Aliás, seria o único “recurso” que pode ser desenvolvido e ampliado (HUBAULT, 2004, p. 132) [...], se considerarmos as possibilidades de aprendizagem através da acumulação de experiências profissionais e de vida; assim a questão fundamental seria abordar o tema do quão sustentável o processo é para os sujeitos. O desenvolvi-mento dessa abordagem pode avaliar o quão sustentável, segundo a dimensão social, é o trabalho quando se analisa numa perspectiva duradoura, quanto ao

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seu desenvolvimento (profissional), sua qualidade (de vida), o seu envelheci-mento e a sua saúde física e mental” (SZNELWAR et al., 2009, p. 153).

Compreender a relevância desses elementos, e até mesmo ser capaz de transfor-má-los, é uma tarefa dificultada por diversos fatores. Primeiro, os instrumentos ra-cionais que norteiam a gestão moderna, como indicadores e sistemas informatizados, são insatisfatórios para tratar de elementos relacionados ao conteúdo do trabalho e sua importância para o ser humano. Segundo, as situações não são simplesmente de causa e efeito de vínculo comprovável, tampouco possuem uma única fonte. São difusas, invisíveis, sutis. Terceiro, estas questões ficam acobertadas sob uma aparente normalidade, também por conta das estratégias coletivas e mecanismos individuais de defesa. Mas isso não significa que não possam ser identificadas. Mesmo conside-rando que “nunca se pôde colocar em evidência a existência de um elo causal entre uma situação do trabalho e uma doença mental” (MOLINIER, 2013, p. 61), já há conhecimento para que as questões de adoecimento psíquico que, no limite, levam ao suicídio, possam ser analisadas à luz da influência da organização do trabalho. Isto permite ir além das ações mitigatórias e desfazer a percepção geral de que são meramente desencadeadas por razões individuais.

As recomendações da ergonomia da atividade e da psicodinâmica do trabalho se dirigem substancialmente aos níveis das organizações, das equipes e dos indivíduos. O reconhecimento de que outra perspectiva é possível (isto é, o ser humano, e não o capital ou a produtividade na posição central) constitui condição necessária para a transformação de uma realidade social severa, conforme descrito na seção anterior. É esperado que tal transformação enfrente questões políticas e econômicas, mas cabe reconhecer o trabalho humano como ação sobre a realidade. Conforme Moscovitz (1971, p. 213), “a saúde do trabalhador deve ser um fim e não o meio de progresso de nossa civilização tecnicista”. Daí emerge a noção de que o trabalhar não deve se res-tringir ao pragmatismo de cumprir tarefas ou girar a máquina econômica; trata-se em última análise de um agir no mundo, capaz de configurar novos cenários modu-lados por outros valores culturais.

Em outras palavras, propõe-se que por meio da vivência coletiva no trabalho, cal-cada na confiança e cooperação genuínas, seja percebida a oportunidade de recons-truir o viver em sociedade. Trata-se de reconhecer os espaços de trabalho como locais de exercício de cidadania (WANDELLI, 2009), e de redirecionar a força extraordiná-ria do trabalho como fonte do processo civilizatório (DEJOURS, 2012). Para tanto, se faz necessário assumir a premissa de que é possível transformar o trabalho (SZ-NELWAR, 2011, p. 15).

ӹ Conclusão

Além de SC ser um assunto em construção, sua relação com o tema trabalho também passa por amadurecimento, com diferentes abordagens tanto no universo

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corporativo como no acadêmico. Segundo as contribuições da ergonomia da ativida-de e da psicodinâmica do trabalho, em um contexto de sustentabilidade,

“[...] trabalho é acreditado como ser aquele que, provido de sentido e per-meado pelas relações de confiança e cooperação, melhora o desempenho da organização, promove o desenvolvimento profissional, possibilita a constru-ção da saúde dos trabalhadores em um sentido amplo e positivo, favorece o desenvolvimento da criatividade e a mobilização das inteligências, conside-rando a relevância das questões físicas, cognitivas e organizacionais e, sobre-tudo, ocupa posição central para o desenvolvimento da cultura e da socieda-de” (BRUNORO, 2013).

Mais do que propor um elenco de ações ou indicadores a serem seguidos, propôs--se uma visão alternativa para a ação das organizações, na qual o trabalho e o tra-balhador se tornem centrais, justamente por se entender que esta é uma condição necessária para o desenvolvimento sustentável.

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CAPÍTULO 11

TRABALhO, SUBJETIvIDADE E SAúDE MENTAL DOS TRABALhADORES

Odair Furtado, José Agnaldo Gomes e Renata Leatriz de Campos Temps

ӹ Introdução

A constituição da Rede SST, reunindo vários setores de pesquisa e serviços em prol da saúde do trabalhador ou que se preocupam com a questão, é uma iniciativa muito bem-vinda para compor e elucidar o cenário das relações de trabalho e produção de subjetividade, nem sempre favorável aos trabalhadores em geral. Nós do NUTAS, Núcleo de Pesquisa e Estudos em Trabalho e Ação Social, núcleo pertencente ao Pro-grama de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Social da Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde da PUC-SP, somos um dos nós dessa Rede e apresentamos aqui nossa posição sobre essa relação entre o trabalho, a subjetividade do trabalhador e a sua saúde mental. Primeiramente, discutindo os fundamentos de nossa proposta de trabalho e em seguida comentando o trabalho de pesquisa que estamos desenvolven-do no período mais recente.

ӹ O que pensamos sobre trabalho

A proposta central do NUTAS é pesquisar e elaborar conhecimentos sobre o tema trabalho do ponto de vista da sua condição fundante das relações humanas e do ponto de vista da sua expressão social e histórica de insersão do ser humano no mundo. Estamos conceiturando o trabalho como atividade constitutiva do próprio ser humano. Nossas referências estão fundamentadas na forma como Marx e Engels concebem o trabalho: processo de humanização e elemento central nos caminhos da evolução que nos leva ao homo sapiens. Recentemente, publicações realizadas a partir de descobertas da paleontologia (MITHEN, 2002) estabelecem como a cultura humana depende da atividade humana concreta e ao mesmo tempo que a cultura

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passa a interferir nos próprios caminhos da evolução e da constituição do psiquismo humano (comprovando tese de Vigotski).

Nos fundamentamos também na relação que produz o psiquismo a partir da atividade do ser humano no mundo e das mediações necessárias para estabelecer a dinâmica entre a subjetividade e a objetividade, considerando principalmente a lingüagem como elemento chave dessa relação e considerando também a capacidade humana de simbolizar conforme propõe Vigotski.

Não se trata do trabalho strictu-senso, na sua forma de emprego como sucede na sociedade capitalista, mas do trabalho na sua condição genérica de atividade hu-mana regulada pelas condições sociais e históricas. Todo esfoço intencionalmente realizado através de atividade concreta e que é capaz de direta ou indiretamente transformar a natureza em proveito da própria humanidade. Isso significa dizer uma atividade consciente e emocionada (LANE, 1999) definida a partir de uma intensão determinada social e historicamente.

As formas de regulação da atividade humana são social e historicamente determi-nadas. Partindo desse a priori é preciso considerar que toda atividade está vinculada às formas de produção e reprodução das relações sociais de um determinado período, de um determinado sistema econômico. Como a atividade é elemento material fun-damental para o engendramento das categorias centrais constitutivas do psiquismo e como a principal mediação da consciência/pensamento é a linguagem, temos, como decorrência, que a produção de sentido é uma das principais portas de entrada para a compreensão das dimensões subjetivas da realidade.

Não há atividade humana que não tenha como base a ação social se considerar-mos a atividade humana como atividade coletiva orientada pelas relações grupais. No caso do NUTAS, nosso entendimento de ação social é da ação social transformadora, organizada politicamente e com objetivo de melhorar as condições de vida humana através de uma ação concreta no mundo. Estamos falando de ação que considere as condições históricas de dominação de classes e derivados dessa dominação como aquelas que levam ao preconceito racial, discriminação por gênero e qualquer outra manifestação que de alguma forma subjugue o outro, mesmo não tendo as relações de classe como indutor direto dessa relação.

Evidentemente, o quadro social atual no Brasil nos leva a encarar uma realidade que coloca o emprego e a geração de renda como fenômeno importante quando se fala em relações de trabalho e forma de reprodução do capital. Além disso, a reorga-nização social e política do nosso país, rumo à sua democratização, coloca no centro da discussão a maneira como os atores sociais se organizam para garantir maior participação e a construção de um caminho para uma sociedade menos desigual e mais justa. Trabalho e ação social estão no vértice dos caminhos que o movimento social organizado (vide novo sindicalismo, MST, FSM) busca nesse momento para construir uma pauta para o entendimento de que mundo e que transformação mais lhes convém.

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TRABALhO, SUBJETIvIDADE E SAúDE MENTAL DOS TRABALhADORES | 199

ӹ O cenário no qual se constitui a subjetividade do sujeito 1

Vivemos hoje numa sociedade em crise de transição e de mudanças rápidas. O núcleo dessa crise está configurado pelo “paradigma de produção”. Estamos vivendo um período de transição, de uma sociedade que conseguiu inserir a maioria dos ci-dadãos no processo de trabalho produtivo remunerado para uma sociedade com cri-térios seletivos. Esses critérios produzem duas categorias de trabalhadores diferen-tes: uma parcela minguante de trabalhadores inseridos num processo de sofisticação tecnológica, bem remunerados, e outra sendo obrigada a se submeter a condições de precarização contínua. A sociedade que emerge dessa crise não será uma sociedade sem trabalho, mas o trabalho remunerado de qualidade vai ser um bem cada vez mais escasso. Ao mesmo tempo, vai produzir e já está produzindo uma riqueza con-siderável para poucos. (GOMES, 2012).

Como sustentar o contrato social e transformar esse “para poucos” em suficiente trabalho e riqueza para todos? É possível emancipar o cidadão não do trabalho como tal, mas do trabalho penoso e mal remunerado, e garantir-lhe dignidade no trabalho como parte da dignidade humana? As lutas sociais hoje são lutas pela “redistribui-ção” de renda e bens (terra, água, acesso às fontes energéticas, trabalho) e, ao mes-mo tempo, pelo “reconhecimento” de identidades específicas (questões de gênero, indígenas, afrodescendentes, migrantes) e valores universais (dignidade humana). Ambas as lutas podem divergir em seus prazos, mas convergem em seus objetivos de construção de uma sociedade de iguais e diferentes.

Nesse cenário, a nova morfologia do trabalho oferece um espaço pequeno para intervenções e transformações que levem em conta os interesses da classe operária. As exigências da flexibilidade em detrimento dos interesses dos operários atingiram o tempo de trabalho, seu lugar e sua durabilidade. Todo posto de trabalho bem remu-nerado está ameaçado de ser extinto, por novas tecnologias, por fusões de fábricas ou por uma transferência do lugar de produção para regiões cuja legislação trabalhista pouco protege seus operários.

Cada transformação de um modo de produção é inovadora e herdeira. O artesa-nato manual e o trabalho braçal não foram totalmente extintos pelo trabalho meca-nizado ou pela linha de montagem fordista. O mesmo ocorre com a reestruturação produtiva produzida pela informatização da linha de montagem. Na chamada “rees-truturação industrial”, a partir dos anos de 1970, o capital procura garantir e ampliar a sua cota de acumulação utilizando o avanço tecnológico para ampliar sua capacida-de produtiva e ao mesmo tempo sua capacidade de explorar a mais-valia.

Com o fortalecimento do sistema capitalista 2 e as mazelas da industrialização, essa crença otimista num progresso linear se tornou insustentável. A universaliza-

1 Esta parte do texto tem como pano de fundo Gomes, 2012.2 Acompanhando a famosa frase de Marx e Engels no Manifesto Comunista, “no capitalismo tudo o que é sólido, desmancha no ar”, analisar a fase atual do capitalismo tardio não é tarefa fácil e não é

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ção do capitalismo “patológico” não permitiu mais pensar a racionalidade universal como norte do processo histórico. A partir da segunda metade do século XIX per-cebeu-se que o progresso tecnológico, resultado de uma dominação crescente da na-tureza, se materializa não só na dominação da natureza, mas também na exploração crescente dos trabalhadores. Estes são reduzidos em seu valor de pessoa ao valor de mercadorias que produzem. Nesse sentido, o capitalismo não é só um sistema injus-to, mas um sistema que bloqueia o reconhecimento do outro e todas as condições do bem viver e da vida feliz e exitosa. A patologia social está configurada a partir do momento em que a organização da sociedade reprime o potencial racional pre-sente nas forças produtivas. Cada autor nomeia as patologias sociais diferentemente. Horkheimer lamenta a organização “irracional” da sociedade. Para Adorno, a vida é “danificada” e friamente “administrada”; para Marcuse, a sociedade é “unidimensio-nal”. Habermas descreve o mundo vivencial como um mundo “colonizado”. A vida intacta, segundo esses autores, seria a realização social e universal da racionalidade como autorrealização cooperativa, na qual a liberdade de um possibilita a liberdade do outro. Os sujeitos chegam a esse ideal do bem viver, à comunidade de pessoas livres e à auto-realização cooperativa, quando partilham reciprocamente, além de seus interesses individuais, um núcleo de convicções e valores comuns. A conexão cooperativa representa um aumento de racionalidade social. Se a causa da deforma-ção patológica são fenômenos sociais, também deve ser possível que novas práticas sociais impulsionem a emancipação dos sujeitos.

Nas condições concretas da sociedade capitalista é quase impossível realizar o “bem viver”. Novas práticas sociais são bloqueadas, porque as causas das patologias sociais no sistema capitalista são estruturais. Esses bloqueios históricos representam um desafio moral e ético, porque impedem a orientação em direção a uma vida não danificada. As pessoas se percebem como seres coisificados. Em vez de se relacio-narem com reconhecimento recíproco, os sujeitos se percebem como objetos sub-jugados aos valores e interesses de mercado. Como podem ser desbloqueados, se as patologias lhes criam um grau de consentimento e deslumbramento que os fazem concordar com a vida falsa? Muitas vezes não percebem sua alienação e começam a se acostumar com a prisão que lhes rouba a liberdade (GOMES, 2012).

possível em poucas linhas como fazemos aqui. O período que vai dos anos de 1970 até a passagem para o século XXI viu uma forte reestruturação do modo de produção e novas formas de desenvolvimento das forças produtivas. Entretanto, o sistema vive crises constantes e de forte intensidade como a iniciada em 2008 e que atingiu o coração do dragão. Neste momento, 2014, a crise do capitalismo parece arrefecer, mas nada garante que não se reproduza de maneira mais forte logo adiante. As crises econômicas dos anos de 1980 redundaram no chamado neoliberalismo. A crise atual parece ter enterrado essa estratégia de manutenção do modo de produção, mas o fato é que novas estratégias de manutenção desse sistema são elaboradas o tempo todo e de formas cada vez mais sofisticadas.

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ӹ As condições atuais de trabalho

São inúmeros os estudos que demonstram as profundas transformações no mun-do do trabalhao a partir da década de 1970. Alguns chegam a denominar esse perío-do de Terceira Revolução Industrial e o que vimos, no mundo todo, foi um impres-sionante processo de reestruturação produtiva que afetou diretamente as relações de trabalho. Passamos do sistema conhecido como just-in-case do fordo-taylorismo para o just-in-time do toytismo e passamos a conviver com um novo ritmo de traba-lho. Talvez tenha sido essa o fator principal de mudança na vida dos trabalhares, ou ao menos, um dos que mais contribuiram para o agravamento de problemas enfren-tados na linha de produção. Svartman (2010) aponta com muita propriedade como as novas condições de trabalho alteraram a vida dos trabalhadores nas fábricas e Vieira (2013) desmonstra que este processo ocorre para além do chão de fábrica e de maneira dramática, nos bancos.

A automatização dos equipamentos produtivos, a automação da linha de produ-ção, no caso da indústria, retirou do trabalhador o controle do ritmo da produção. No sistema fordista, que trabalha com a lógica do estoque, a demanda não é vital e a produção é regulada pela capacidade de estocagem e de comercialização do que se produz. No sistema toyotista, a demanda é imperativa e como a velocidade produtiva aumentou consideralmente e os novos equipamentos permitem a alteração da planta da fábrica em menor tempo, pode-se trabalhar sob a encomenda do mercado.

Evidentemente, isso tenciona o sistema produtivo que passa a correr atrás dos prazos. A exigência de maior rapidez na linha de montagem é realizada com maior pressão sobre os operários. Não obstante esse fator as máquinas, agora automatiza-das, são programadas para aumentar o ritmo da produção. Não é mais o trabalhador que controla esse ritmo, mas a própria máquina. Um caso relatado por Svartman (2010) é bastante esclarecedor e fala de uma trabalhadora da indústria eletro-eletrô-nica, que trabalha no setor de produção de bobinas. Essa operária trabalha no setor há mais de vinte anos e gosta do que faz, mas diz que o prazer pelo trabalho dimi-nui muito com os novos equipamentos. A bobina chega em sua bancada num ritmo que exige atenção o tempo todo e atividade contínua. Não há mais possibilidade de troca de olhares com o trabalhador da bancada vizinha, da possibilidade de esticar os braços para um saúdavel alongamento, de uma avaliação do que foi produzido o do que resta produzir no período de trabalho. Agora, se ela não fica, atenta as peças vão acumulando na bancada e no limite caem no chão produzindo forte ruído que chama atenção de toda a linha de produção. Ela prefere obedecer esse ritmo imposto a passar vergonha frente ao colegas de trabalho ou do chefe do setor. Vejam que a condição de trabalhadora “exemplar”, identidade construída de um lado pela cultura produtivista e de outro pelas disposições pessoais construídas a partir da vivência do trabalho estranhado, é o que justifica a aceitação incondicional do novo ritmo e ao mesmo tempo impõe condição de humilhação para o trabalhador que não consegue responder adequadamente a essa circunstância.

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O trabalhador é capturado moralmente por algo que não vem dele próprio e nem por ele é definido. As condições de um trabalho que não lhe pertence se apresenta como trabalho estranhado e trabalho realizado em condições completamente adver-sas (MARX, 2008 [1844]).

Mas não é somente o trabalho nas fábricas, o trabalho no setor de serviços também sofre mudanças e passa a exigir dos trabalhadores novos enfrentamentos. O caso dos bancários é exemplar e, como demonstrou Vieira (2013), o cumprimento de metas passa a ser o fator central de desgaste e adoecimento dos trabalhadores do setor bancá-rio. O trabalho dos bancários antes da reestruturação produtiva no setor era bem defi-nido. Mesmo sendo trabalho exaustivo e tenso (trabalhar com dinheiro) o caixa sabia como começava e como terminava sua atividade. A responsabilidade por fazer chegar o cliente ao caixa era do próprio banco (seu sistema de divulgação e convencimento da clientela e a confiança que o cliente depositava no determinado banco).

Hoje o bancário é um funcionário multi-tarefa e passa a ser responsável pela cap-tação de investimentos, orientação ao cliente, atendimento ao público, caixa (no caso do atendimento prime). O serviço anteriormente realizado pelo bancário está auto-matizado e é realizado via internet ou via caixa eletrônico. A tarefa de captação de investimentos antes realizado pelo gerente da agência agora é realizada por vários desses funcionários do atendimento ao cliente. Do trabalho burocrático pré-definido o trabalhador bancário passou a perseguir metas abusivas que o obrigam a vender produtos de investimentos que ele não domina completamente e que exige procedi-mentos nem sempre éticos, como empurrar o pacote de interesse do banco à senhora idosa. Vieira (2013) demonstrou que estes procedimentos discutíveis acabam pro-duzindo desgastes de ordem moral ao trabalhador, que dorme mal, sente remorsos, crise de consciência e se vê obrigado a passar por cima dos seus valores éticos para manter o emprego. Vejam como a subjetividade passa a ser peça chave na relação de trabalho nesse setor.

A descrição das novas condições de trabalho confirmam o argumento de Alves (2011) que afirma:

“[...] no toyotismo a ‘mecanização’atinge corpo e mente do homem produ-tivo. Na verdade, a ‘captura’ das subjetividade é a ‘subjetividade às avessas’. O avesso não significa a subjetividade ao contrário. Na verdade, é outra subjeti-vidade. O que parece ser a recomposição do velho nexo psico-físico do trabalho profissional qualificado é o seu ‘simulacro’. O que significa que a solicitação da inteligência, da fantasia e da inciativa do trabalhador se dá no interior de uma nova rotinização do trabalho” (ALVES, 2011, p. 64).

É o que Alves, apropriando-se de análise de Vladimir Safatle, chama de “racio-nalidade cínica”.

A racionalidade cínica é o signo da fase atual das relações capitalistas em todos os setores da vida e atinge também o mundo do trabalho através da sinergia dos fluxos das diferentes dimensões dos nossos modos de vida. Entre eles, a vida do trabalhador

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nas relações de trabalho que inclui suas expectativas, valores, politicas de produção de identidade (CIAMPA, 2002). É preciso considerar que o trabalhador na fábrica, no banco, na companhia que instala o cabo de TV, na escola, na fazenda plantando soja, em todo e qualquer setor protutivo, comércio, de serviços, setor público, todos os trabalhadores estão sujeitos à política de produção de identidade através da dimen-são subjetiva vivida no presente momento sob esse signo da racionalidade cínica. As pessoas buscam administrar a maneira como exercem sua subjetividade no cotidia-no submetidas a essa política identitária, algumas vezes de forma progressiva, como identidade pós-convencional (CIAMPA, 2002), na maior parte das vezes de forma regressiva como não-metamorfose, capturadas pelo modo de ser convencional e sub-metidas às formas subjetivas de reprodução das relações de produção.

Essa dimensão subjetiva produz os critérios de negociação da política de identi-dade através de padrões morais, valores de conduta, critérios éticos, sistemas de con-trole subjetivo. Parte deste sistema é capturado ou utilizado nas relações de trabalho na forma do controle típico do ambiente de trabalho (o ambiente corporativo) que ocorre de forma mais intensa e dramática no chão de fábrica e de forma mais flexivel e atenuada no setor administrativo. Mas o mundo corporativo é também atravessado pela forma comum, cotidiana de controle subjetivo como o realizado pela família, pelos grupos, pela religião, pelos sistemas morais de controle do comportamento tí-picos das relações cotidianas, marcadas produndamente pelo que Kosik (1976) cha-ma de pseudo-concreticidade. O ambiente da fábrica, do escritório, do banco, da loja de departamentos, da redação dos jornais, da sala de aula etc. não é diferente do mundo da vida cotidiana, apenas é um local de maior controle que as ruas, que o lar, que o clube (que, evidentemente, não são isentos de controle), apenas lugares em que a produção é centralizada e isso implica, em nome de uma racionalidade administra-tiva, no controle específico da atividade que redunda no objetivo central do negócio. Em última instância, ali não se brinca porque ali é o locus da mais-valia. Esse fenô-meno é o que induz o analista sistêmico, que geralmente trabalha com a superfície dos fenômenos, imaginar que o ambiente corporativo produz uma “cultura” própria, diferente da cultura em geral. A despeito que tais ambientes corportativos acabam por produzir formas específicas, e cada vez mais sofisticadas e indiretas, de controle e que podem ser estudadas e identificadas como modus operandi desta ou daquela empresa e que tal modus operandi pode ser compartilhado entre os executivos e pro-fissionais de gestão de pessoas buscado métodos de controle do comportamento e da subjetividade dos trabalhadores em geral.

Nesse ambiente de trabalho a racionaliade cínica é exercida atualmente não mais através do controle direto do trabalhador, como se seu corpo não lhe pertencesse. As derscrições clássicas de Marx no primeiro capítulo de O Capital sempre vêm a tona quando se fala nesse tipo de exploração limite. A crônica do cotidiano do trabalha-dor, descrevendo seu martírio foi realizada pelos escritores ingleses do período. En-gels analisou o drama vivido pelos trabalhadores explorados à exaustão. Mas depois

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de Taylor e do advento da administração científica, depois da organização dos traba-lhadores em seus sindicados e de suas lutas, a luta de classes foi ganhando noções de civilidade. Em última instância, o capitalismo sabe que não vive sem a exploração do trabalhador, mas ela é feita de forma regulada e, depois da crise de 1929, ela passa a ser regulada pelo Estado.

O período de walfere-state vivido pela Europa ocidental levou essa premissa, a regulação do Estado, ao seu limite, controlada pela social-democracia e sua organi-zação, de uma forma ou de outra, ganhou o planeta com a mundialização do setor produtivo. Entretanto, as crises sucessivas do capital a partir de 1982 simplesmente detonaram o que parecia ser o paraiso desse modo de produção e o walfere-state foi enterrado sem muitas honras pelo neoliberalismo que o sucessedeu com sua noção de Estado mínimo e de livre concorrência. A alcunha de “neo” para o velho libera-lismo se deu pela manutenção do Estado como regulador, mas desta vez regulando a expansão das premissas neoliberais e espalhando pelo mundo a dilaceração das conquistas dos trabalhadores. Apesar do esgotamento dessa nefasta fórmula com a recente crise nos Estados Unidos e, no momento, a crise européia, o fantasma do neoliberalismo perciste. Seu espectro, com suas fórmulas e receitas, mantem-se como solução para uma economia destroçada.

O toyotismo não é filho do neoliberalismo, surgiu antes dele como solução para a crise japonesa no pós-guerra e ganhou consistência com a informatização da linha de produção. Uma revolução tecnológica associada a uma inovação administrativa. Em certo aspecto representa a humanização das relações de produção, o que não repre-senta nenhuma novidade na história do trabalho humano desde que ele, o trabalho foi por nós, humanos, inventado e também nos inventou. Mas como tudo o que é criado no atual modo de produção, visa potencializar o sistema produtivo e ampliar a mais-valia. No final, exercendo a contradição básica do capitalismo que é a luta de classes, o que o toyotismo realmente trouxe foi uma nova forma de exploração, ainda não completamente desvelada, que implicou na captura não somente dos corpos dos trabalhadores, mas de sua mente.

Não se trata das formas de atravessamento da moral cotidiana no abiente de fábrica, de uma construção ideológica que convence trabalhadores a respeito da ga-rantia jurídica, quase divina, da propriedade burguesa como aponta Hardt e Ne-gri (2013). Acreditamos piamente na justiça do lugar que ocupamos socialmente e transformamos estas crenças em padrão ético, moral e normativo de nossa condu-ta cotidiana. Desempenhamos nossas tarefas cotidianas nas relaçoes de trabalho conduzidos por essa crença e reproduzimos as relações de produção defendendo a garantia do status quo.

O toyotismo é mais sutil e insidioso e toma essa relação de poder já domesticada como dada e vai além. Num simulacro de liberdade e responsabilidade chama o tra-balhador a assumir aquilo que ele reivindicava: maior participação nas decisões na linha de produção. Aqui se realiza plenamente a racionalidade cínica, ao oferecer um

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pseudo-controle da linha de produção, quando na realidade, passa-se a responsabili-zar os trabalhadores por algo que é função do administrador. O real poder de decisão e o acesso à mais-valia continuam na mão do board dirigente, o ritmo da produção é dividido com os trabalhadores que agora não podem mais reclamar de um ritmo que ajudaram a implantar. A cínica denominação de “colaboradores” 3 no lugar de operá-rios, apesar de representar a superfície do fenômeno, é bem esclarecedora.

Antes da reestruturação produtiva no sistema bancário, o cargo de gerente era bastante valorizado. Ser gerente de uma agência do Banco do Brasil em uma pequena cidade do interior equivalia em prestígio ao cargo do delegado da cidade, do juíz ou do prefeito. Cargo de distinção e poder disputado e valorizado. Hoje o cargo é oferecido a jovens iniciantes e são vários os gerentes em uma agência bancária. Na realidade, não passam de atendentes privilegiados e o prestígio da posição se esvaiu. Mas a majestade do cargo permaneceu e o jovem funcionário é seduzido por algo que já não tem o mesmo valor social. A exigência de trabalho e responsabilidade não é equivalente ao salário e prestígio, mas isso coloca o jovem funcionário numa posição difícil, na medida em que é responsável pela decisão que definiram as metas e ele é um dos responsáveis pelo sua realização. No momento de decidir a meta ele é o algoz e no momento de executá-la é a vítima. Essa é a raiz dos males que assolam a saúde mental do trabalhador no sistema bancário.

ӹ Trabalho e saúde mental do trabalhador

As atuais condições de trabalho que descrevemos acima apontam para um des-gaste do trabalhador de outra ordem. Como dissemos inicialmente (GOMES, 2012), as crises recentes do capitalismo ensinaram o management empresarial a enxugar todo e qualquer gasto considerado desnecessário, não importando o quanto viesse a custar aos trabalhadores. Essa lógica, somada ao dinamismo imposto pelo toyotismo à linha de produção, passa a exigir o aumento de ritmo de trabalho, mas também uma maior dedicação cognitiva dos trabalhadores em geral. Deram o nome de com-petência e habilidades a essa nova lógica de exploração do trabalhador. Aparente-mente, uma promessa de abandono das formas brutas de exploração dos corpos dos trabalhadores em operações automatizadas, muito bem descrita pela famosa imagem do Carlitos (Chaplin) em Tempos Modernos. Operações automatizadas que não exi-giam raciocínio e que Dejours (1994) analisou muito bem, apontando o fenômeno da perda da imaginação pelos trabalhadores nessa condição. Vale dizer que essa condi-

3 O termo “colaborador” surge originalmente com o sistema Kamban no qual o fornecedor de peças e equipamentos assume o setor na montadora pelo qual é responsável. Com isso, trabalhadores da em-presa de autopeças passam a trabalhar dentro do ambiente fabril da montadora. Não é um operário da montadora, apesar de ali trabalhar. Portanto, trata-se de um colaborador, funcionário da empresa cola-boradora. O termo passou a constituir metáfora para operário/trabalhador em qualquer circunstância, bem ao gosto daqueles que preferem esconder a reais relações embaixo de armadilhas linguísticas.

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ção ainda não desapareceu da linha de produção, particularmente da brasileira. 4 Mas a nova condição, a de uma atividade menos penosa e mais cognitiva, vai aos poucos ocupando o lugar da anterior fadada ao desaparecimento. Finalmente, o capitalismo ofereceria uma condição de trabalho mais humana e racional e os trabalhadores não mais precisariam utilizar a força física, mas suas competências e habilidades, deixan-do o trabalho duro e pesado para as máquinas inteligentes. Avizinhava-se a “Era do Conhecimento” como propalava o sociólogo britânico Antony Giddens (FURTADO, 2012; 2010).

Como ocorre desde o seu aparecimento, o capitalismo oferece uma coisa e entrega outra! O conhecimento exigido dos trabalhadores é um conhecimento instrumen-tal e sua melhor competência e habilidade é a de se adaptar ao ritmo desumano de trabalho. Sim, mas algo mudou de fato. Os novos equipamentos, dos PCs nas mesas do trabalhador administrativo aos tornos automatizados, passando pelos caixas au-tomáticos nos bancos, o advento da internet e do e-commerce, passaram de fato a exigir conhecimento e habilidades específicas e maior comprometimento cognitivo dos trabalhadores. Mas não em proveito de uma melhoria de qualidade de vida des-ses trabalhadores. Muito ao contrário, a tecnologia contemporânea permite que o trabalhador seja encontrado ou acionado a qualquer momento e em qualquer lugar, que ele leve o trabalho onde estiver, seja esse trabalho na forma física ou mental. A virtualização das relações de trabalho permite que esse o acompanhe onde estiver e o trabalho operativo, que depende da máquina e que agora exige solução de problemas, acompanha o trabalhador mentalmente, ocupa-o no horário de lazer, transforma-se em assunto do seu interesse.

O controle no ambiente de trabalho, ao contrário do propalado, não diminuiu, mudou de caráter e passou a ser mais eficiente e cruel, mas também mais invisível e, não raramente, auto-exercido pelo próprio trabalhador. O chamado presenteísmo,

4 As condições do desenvolvimento econômico desigual e combinado colocam países como o Brasil em uma situação curiosa. País industrializado, mas que não desenvolve tecnologia de ponta e o que mais tem a oferecer é a mão-de-obra com baixa remuneração. Essa mão-de-obra a preços módicos não é qualificada e serve ao padrão mundial de descentralização da produção e de entrega de produtos, com baixa e média tecnologia, próximo ao consumidor final. Isso define o padrão industrial brasileiro que reúne uma grande quantidade de pequenas e médias indústrias de baixa tecnologia e que não aderiram completamente à lógica toyotista e um número menor de grandes indústrias, conectadas com o circuito mundial de produção e distribuição, que são altamente tecnológicas, mas que importam o know-how de suas matrizes. Temos pouquíssimo desenvolvimento de saber tecnológico no país à exceção dos setores liga-dos ao agronegócio (grande polo exportador) e à exploração de petróleo em águas profundas. Vale mencio-nar a improvável excepcionalidade da indústria aeronáutica com a presença da nacional EMBRAER, uma das poucas a desenvolver tecnologia de alto padrão no país. Assim, nossos trabalhadores convivem com o mais tacanho processo fordista remanescente até as formas mais avançadas de toyotismo. Esse movimento produz um híbrido que institui um toyotismo à brasileira aplicando as fórmulas de maior rapidez na pro-dução e ao mesmo tempo de pouca participação dos trabalhadores no processo de decisão. Evidentemente, esse toyotismo à brasileira é ainda mais danoso para os nossos trabalhadores.

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sintoma das condições atuais de trabalho (SELIGMANN, 2011), o aumento das no-tificações de afastamento por depressão, os casos mais dramáticos como os suicídios na situação de trabalho (casos da Renault na França e Foxconn na China divulgados pela imprensa) representam o limite a que pode chegar a exploração do trabalhador.

Ocorre uma mudança importante na dimensão subjetiva do exercício do trabalho e que foi apontada por Sennett em A Corrosão do Caráter (1999) e em La cultura del nuevo capitalismo (2006). É possível exemplificar essa transformação na subjetivida-de contemporânea com o aparecimento do termo “empregabilidade”. O termo indica uma mudança considerável atribuindo ao próprio trabalhador a responsabilidade pelo seu desemprego ou desatualização (que possa gerar seu desemprego). A ima-gem criada é a de um trabalhador que deve se atualizar por sua própria conta e sem conhecimento objetivo dos caminhos a seguir. A exigência de flexibilidade, de multi--funcionalidade, de tempo de vigência no emprego (ficar mais de cinco anos passa a ser considerado indicativo de desatualização). A maneira mais objetiva que o traba-lhador tem para medir esses atributos é o conhecimento sobre atividades que possa desempenhar da forma mais abrangente possível. Para tanto, dedica-se a aprender de tudo um pouco nos cursos de qualificação oferecidos. De habilidades em línguas a operação de equipamentos, de noções de gerenciamento a suspeitíssimos cursos que oferecem o despertar da criatividade. O fato é que a super-especialização foi trocada pelo multi-saber. Há uma artimanha sedutora que convence trabalhadores em geral a exigir o máximo de si, para garantir um emprego de qualidade, num mercado de trabalho seletivo e em constante mutação.

De acordo com Seligmann (2011), comentando a presença da flexibilidade:“[...] a exacerbação da competitividade está na raiz do individualismo

e, muitas vezes, da própria violência. A super-valorização da flexibilidade é certamente o aspecto que tem sido alvo do maior número de estudos críti-cos, e também assume papel importante nas questões sobre precarização do trabalho, a flexibilidade contribui para incrementar a tensão e a fadiga dos trabalhadores, por causa dos esforços de adaptação continuada às sucessivas mudanças de todo tipo” (SELIGMANN, 2011, p. 497).

Seligmann tem razão ao comentar a condição de precarização atual das relações de trabalho, fenômeno apontado por vários analistas como E. Alves (1997), G. Alves (2011), Antunes (1999; 2006), Antunes e Silva (2004), Teixeira (1996), entretanto é ne-cessário considerar que essa precarização é camuflada por uma capa de moderniza-ção e de avanço tecnológico que a torna invisível aos trabalhadores, particularmente aqueles trabalhadores que estão nos postos de trabalho mais valorizados. 5

5 Estamos cientes de que falamos dos trabalhadores do mercado formal, mas sabemos que as condições de trabalho no Brasil enfrentam outro tipo de precariedade que atinge trabalhadores do mercado infor-mal e que são chamados por André Singer (2012) de subproletariado e bem analisado por Jessé de Souza em A ralé (2009), Os batalhadores (2010) e A construção social da subcidadania (2006). Guy Standing em

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Nesse sentido, a exigência de flexibilidade das competências e habilidade, hoje tão propaladas no universo corporativo, leva os trabalhadores a uma exigência sobre-hu-mana não raramente fadada ao insucesso e que lhes impõem uma carga de cobrança e de mudanças constantes às quais são submetidos. Para Sennett,

“na atualidade, em muitas organizações, a impaciência é institucionaliza-da, em detrimento do trabalho bem feito e do tempo para escutar, pensar e tra-tar seus subordinados, colegas e clientes com atenção e respeito às dificulda-des que possam apresentar. Estamos assim, diante das pessoas aceleradas que atuam em organizações velozes, onde as também rápidas mudanças sequer permitem o aprendizado correto do trabalho que se modifica a cada passo, o que se torna fonte de frustração e angústia, quando não de erros e acidentes” (SENNETT apud SELIGMANN, 2011, p. 498).

Este tipo de procedimento organizacional, pautado na política da excelência, nada mais é do que um jogo de sedução, que tenta cooptar o trabalhador para seguir regras e normas absurdas e serve como política de controle para que este continue em condição servil. A política da excelência atrelada à rapidez na realização das tarefas tem levado os trabalhadores ao adoecimento que tanto poderá ser de ordem psíquica ou até mesmo acidente, devido o ritmo de trabalho acelerado.

As mudanças tecnológicas e administrativas produzem também novas formas de adoecimento e os transtornos mentais passaram a ocupar o topo das estatísticas sobre adoecimento na situação de trabalho. Na realidade, vivemos uma nova epi-demia de transtornos mentais ou de doenças produzidas a partir de somatizações como LER e DORT. Algumas, como a depressão, que eram subnotificadas na medida em que não se reconhecia o nexo entre as condições de morbidade e as condições de trabalho que a produziam.

Há que se considerar que a identificação da subnotificação de transtornos mentais ocorre em função de vários fatores. Devemos a superação dessa condição a um con-junto de ações em prol da saúde mental da população em geral e que também chega ao campo da saúde do trabalhador. Dentre essas ações podemos incluir a discussão presente na luta pelo fim dos manicômios no Brasil (movimento da luta anti-manico-mial) que coloca em cheque o estigma produzido pela loucura e o maior acesso da po-pulação aos serviços psicológicos (através da rede básica de atenção à saúde) que leva a população em geral a reconhecer sintomas psíquicos e a buscar o tratamento antes de sua cronificação. Transtornos mais leves que a psicose e que antes eram ocultados pelos portadores e pela família passam a ser considerados como parte do processo da vida e tratados com maior rapidez. O avanço da psicofarmacologia garantindo um

seu livro Precariado – a nova classe perigosa também analisa o fenômeno para além das condições brasi-leiras. Temos estudado o fenômeno, mas não caberia, por falta de espaço, introduzir aqui a discussão. Para acompanhar nosso trabalho veja as dissertações de Bentivi (2012), Lima (2011), Moler (2011) e Temps (2013) defendidas no NUTAS recentemente.

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controle maior e mais rápido dos sintomas diminuindo consideravelmente o afas-tamento do trabalho. O reconhecimento, ainda que não tenha superado o estigma completamente, de que a depressão não representa fraqueza de espírito, esquisitice ou desculpa para escapar das tarefas, mas que é fruto das condições concretas da vida e das adversidades que o indivíduo padece, entre elas, a pressão exacerbada no ambiente de trabalho. Pesquisas como as realizadas por Codo (2006) sobre a condi-ção de trabalho dos professores da rede pública de ensino no Brasil, demonstrou de forma muito consistente a relação entre condições de trabalho e o aparecimento do burnout entre professores.

Esse conjunto de fatores, entre outros, permitiu que setores antes resistentes a esse tipo de sintoma (peritos do INSS; representantes patronais; responsáveis pelas políticas públicas no campo da saúde do trabalhador) reconhecem o problema como real. Além do mais, as mudanças nas condições de trabalho descritas acima passam a determinar o recrudescimento dessas morbidades (os transtornos mentais) que pro-duzem absenteísmo, afastamentos prolongados e, nos casos mais graves, afastamento definitivo e o fenômeno não pode mais ser evitado ou ocultado. Sua exposição permi-te que pesquisadores interessados no assunto possam divulgar seus resultados com maior eficiência, que a política pública voltada para a saúde do trabalhador paute o problema com maior insistência e que os representantes sindicais dos trabalhadores sejam ouvidos. 6

ӹ Considerações finais

Em linhas gerais, consideramos que aqui estão expostos os determinantes cen-trais que devem ser estudados para uma maior compreensão da relação entre subjeti-vidade e a saúde dos trabalhadores. De um lado, clareza sobre as relações de trabalho nas condições atuais do capitalismo que permitam desvelar as formas de ocultamen-to da exploração dos trabalhadores que acabam se transformando em formas de cul-pabilização do próprio trabalhador. Além disso, uma melhor definição sobre quem é esse trabalhador, entendendo que as definições clássicas não descrevem com precisão o intrincado e emaranhado das relações sociais no mundo do trabalho, considerando no caso brasileiro o exponencial crescimento da área de serviços e, ao mesmo tempo, da manutenção de enormes contingentes populacionais vivendo em condições pre-cárias do subemprego. Por fim, aprofundar o trabalho que já vem sendo realizado, e que a rede SST está mostrando com essa publicação, das pesquisas em torno da saúde mental do trabalhador. Nos parece que essa pauta pode ser a desencadeadora de uma discussão e ação profícua para o próximo período.

6 É possível verificar na recente tese defendida por Ilídio Rodas Neves (2013), pelo NUTAS, o avanço e os percalços da implantação da política pública no campo da saúde do trabalhador.

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