as mÚltiplas facetas do rural no triÂngulo mineiro

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AS MÚLTIPLAS FACETAS DO RURAL NO TRIÂNGULO MINEIRO

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Marcelo Cervo ChelottiRoberto Barboza Castanho

ORGANIZADORES

AS MÚLTIPLAS FACETAS DO RURAL NO TRIÂNGULO MINEIRO

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Beatriz Anselmo Olinto (Unicentro-PR)

Carlos Roberto dos Anjos Candeiro (UFG)

Claudio Cezar Henriques (UERJ)

Ezilda Maciel da Silva (FAAO)

João Medeiros Filho (UCL)

Leonardo Santana da Silva (UFRJ)

Luciana Marino do Nascimento (UFRJ)

Maria Luiza Bustamante Pereira de Sá (UERJ)

Michela Rosa di Candia (UFRJ)

Olavo Luppi Silva (UFABC)

Orlando Alves dos Santos Junior (UFRJ)

Pierre Alves Costa (Unicentro-PR)

Rafael Soares Gonçalves (PUC-RIO)

Robert Segal (UFRJ)

Roberto Acízelo Quelhas de Souza (UERJ)

Sandro Ornellas (UFBA)

Sergio Azevedo (UENF)

Sérgio Tadeu Gonçalves Muniz (UTFPR)

Conselho EditorialSérie Letra Capital Acadêmica

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CONSELHO EDITORIAL

Prof. Dr. Adriano Rodrigues de Oliveira

Universidade Federal de Goiás (UFG)

Prof. Dr. Evaldo Ferreira

Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT)

Prof. Dr. Flamarion Dutra Alves

Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL)

Prof. Dr. Jailson Macedo Souza

Universidade Estadual da Região Tocantina do Maranhão (UEMASUL)

Prof. Dr. Murilo Mendonça Oliveira de Souza

Universidade Estadual de Goiás (UEG)

Prof. Dr. Silvio Moisés Negri

Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT)

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Copyright © Marcelo Cervo Chelotti, Roberto Barboza Castanho, (orgs.), 2018

Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei nº 9.610, de 19/02/1998.Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida ou transmitida, sejam quais forem os meios

empregados, sem a autorização prévia e expressa do autor.

EDITOR João Baptista Pinto

CAPA Victor Matheus da Cruz de Carvalho

Discente do curso de Geografia Orientando do Laboratório de Cartografia - LABCARTO Estudante integrante do Núcleo de Estudos e Pesquisas em

Geoprocessamento Aplicado a Mapeamentos Ambientais - NEPEGAMAUniversidade Federal de Uberlândia - Faculdade de Ciências Integradas do Pontal - Ituiutaba/MG

FOTOS Marcelo Cervo Chelotti

Instituto de Geografia - IG Professor Doutor Universidade Federal de Uberlândia - UFU

PROJETO GRÁFICO E EDITORAÇÃO Luiz Guimarães

REVISÃO Hellen Cristine Almeida Silva

E-mail: [email protected]

LETRA CAPITAL EDITORA

Telefax: (21) 3553-2236/[email protected]

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃOSINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

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Sumário

Prefácio ...............................................................................................9

Apresentação ....................................................................................13

Grandes projetos de investimentos no Cerrado: transformações territoriais a partir do estado e do desenvolvimento ......................................................................17 Alex Cristiano de Souza Marcelo Cervo Chelotti

A reestruturação do cenário agropecuário da microrregião geográfica de Ituiutaba: a inserção da soja .............36 Eduardo Marques Silveira Meri Lourdes Bezzi

As peculiaridades da rizicultura na microrregião geográfica de Ituiutaba - 1970 a 2000 .............................................51 Matheus Eduardo Souza Teixeira Roberto Barboza Castanho

Ciganos assentados em áreas de reforma agrária no Triângulo Mineiro ......................................................................65 Franco Andrei Borges

O cenário produtivo da agroindústria leiteira do município de Ituiutaba/MG: (re)articulação socioespacial .....................................................................................86 Thales Silveira Souto Meri Lourdes Bezzi

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Ginástica laboral e saúde do trabalhador no setor sucroenergético da microrregião geográfica de Ituiutaba - MG ............................................................................... 101 Jeziel Alves Rezende Joelma Cristina dos Santos

Geografia, direito agrário e sustentabilidade ............................. 123 Fausto Amador Alves Neto Yann Almeida Batista

Os organizadores e os autores ..................................................... 136

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Prefácio

A análise das atuais transformações no campo brasileiro torna-se fundamental, pois esse, além de desempenhar as funções

tradicionais de fornecer mão de obra e matérias-primas para a cidade, bem como consumir produtos oriundos dela, abriga, cada vez mais, atividades não agrícolas, como a produção industrial e os serviços. Há que se destacar o contínuo processo de migração da cidade para o campo, pois as pessoas buscam sua inserção no mercado de trabalho e uma melhor qualidade de vida. O campo, além de ser o local da produção agropecuária, transforma-se em um espaço no qual inúmeras atividades não agrícolas são realizadas.

O espaço rural torna-se fortemente marcado pelo conteúdo da técnica e do capital, representado pelos complexos agroindustriais e pelo agronegócio – que correspondem ao espaço de produção agrícola, o qual é fruto da revolução verde, da modernização e da industrialização da agricultura, mas também é notável pela produ-ção familiar, pela exclusão e pela luta em busca do acesso à terra.

Com novas qualidades e impressão de marcas fortes na paisa-gem configuram-se novas relações entre o campo e a cidade. Além da produção agrícola e da industrialização, temos, hoje, novas ativi-dades que devem ser identificadas para caracterizar o campo e suas relações com a cidade. A presença de uma enorme diversidade de atividades que se encontram no campo decorre da ação dos peque-nos produtores, que contribuem de forma significativa para a produ-ção de alimentos e que, criativamente, traçam suas estratégias para sobreviver. No campo, há também muitos sujeitos sociais, como os grandes e os pequenos proprietários, os assalariados, os parceiros, os trabalhadores volantes e os sem-terra com sua luta pelo acesso à terra. Tais sujeitos materializam no espaço rural, mediante o seu trabalho, uma ampla diversidade de objetos, elementos e situações que fazem do campo um espaço bastante complexo. Soma-se a essa complexidade de situações a presença de pessoas oriundas da cida-

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Prefácio

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de, que, muitas vezes, desempenham outras atividades que não a agrícola.

Esse crescimento de atividades não agrícolas é decorrente do desenvolvimento tecnológico representado pela melhoria e expansão das vias de comunicação, como estradas, telefonia e meios de transporte. Surgem, portanto, novas relações campo--cidade, alterando a vida e o trabalho e influenciando, inclusive, a atuação dos movimentos sociais do campo que lutam pelo acesso à terra no país.

Destarte, existe uma complexidade presente no espaço rural brasileiro decorrente das profundas transformações ocorridas recentemente, e a presente publicação tem a finalidade de con-tribuir, por meio de sete capítulos, para uma maior compreensão desses processos, tendo como recorte empírico o Triângulo Mi-neiro. As análises contemplam as modificações no Cerrado me-diante a prática da agropecuária e os movimentos decorrentes desse avanço.

Assim, são investigados temas, como o dos grandes projetos no Cerrado, que apresentam recursos estatais e proporcionam sig-nificativas transformações nesse bioma brasileiro. É averiguada, também, a expansão da produção de soja na microrregião geo-gráfica de Ituiutaba e como ela provocou profundas alterações na forma de produção, bem como são objetos de investigação o ocaso da produção de arroz nessa microrregião – com o avanço da pro-dução, sobretudo da soja – e, ainda, a expansão da produção de leite e da sua agroindustrialização.

Além dos fatores já citados, também merecem atenção os mo-vimentos socioterritoriais e, neste livro, a população cigana com seus deslocamentos e atuação frente ao avanço do agronegócio no Cerrado, e a saúde dos trabalhadores no setor sucroenergético, que também é investigada na microrregião de Ituiutaba. Por fim e igualmente importante, é tratado o tema da sustentabilidade no âmbito da geografia e do direito agrário.

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Prefácio

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Os diversos temas presentes neste livro, os quais decorrem de pesquisas no Triângulo Mineiro, contribuem para a reflexão sobre as transformações em curso no rural brasileiro. Mediante os diversos exemplos elencados, é possível verificar a complexi-dade desse rural.

Portanto, convidamos todos a se aprofundarem na leitura des-ta complexidade e diversidade pelo viés do Triangulo Mineiro.

Rio de Janeiro, primavera de 2017.

Glaucio José MarafonNúcleo de Estudos de Geografia FluminenseInstituto de Geografia/Universidade do Estado do Rio de Janeiro

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Apresentação

Vindo de encontro com as atividades promovidas pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas em Geoprocessamento Aplicado a Mapeamentos Ambientais /NEPEGAMA, as investigações que compõem a presente coletânea visam destacar a diversidade da ruralidade encontrada no Triângulo Mineiro. Trata-se, portanto, de um esforço conjunto de pesquisadores vinculados ao Programa de Pós Graduação em Geografia do Pontal (PPGEP-FACIP/UFU) e ao Programa de Pós Graduação em Geografia (PPGEO – IG/UFU), visando estreitar os laços de solidariedade entre os envolvidos, bem como suas ações de pesquisa e consequente divulgação.

A ideia de organizar uma obra contendo pesquisas elaboradas por diversos colegas da Geografia que se dedicam a compreen-der a produção do espaço geográfico do Triangulo Mineiro, prin-cipalmente em sua dimensão rural, surgiu a partir dos frutos de pesquisas, principalmente no âmbito do mestrado, que necessitam de divulgação do conhecimento científico produzido sobre essa im-portante região que compõem o Estado de Minas Gerais.

Marcado por uma mescla de uso e ocupação do espaço, graças às confluências dos vizinhos estados de Goiás, Mato Grosso e São Paulo, o Triângulo Mineiro apresenta uma pluralidade geografia, marcada pela fertilidade dos solos, a suavidade do terreno, a hidro-grafia abundante, a intensa rede de rodovias, ferrovias e localiza-ção geográfica peculiar. Tal gama de diversidade potencializou as pesquisas, principalmente na compreensão das múltiplas facetas do rural no Triângulo Mineiro.

A partir dessas premissas, os mais diferentes temas serão en-contrados nos sete capítulos que integram esta obra, versando es-pecialmente sobre o espaço rural e suas dinâmicas, perpassando desde o processo de modernização e os grandes projetos de ocupa-ção delineados a partir de 1970, e sua consequente reestruturação socioespacial até a inserção de novos atores, tornando, assim, a

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Apresentação

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região do Triângulo Mineiro um excelente laboratório para as pes-quisas geográficas.

Neste contexto, no primeiro capítulo os autores buscam discu-tir a implantação do Programa de Desenvolvimento do Cerrado (POLOCENTRO) e do Programa Nipo-Brasileiro de Desenvolvi-mento Agrícola da região dos Cerrados (PRODECER) implantado no ano de 1979. Tais projetos de investimento, financiados pelo Estado no bojo do período desenvolvimentista, encampou uma ocupação do Cerrado, via Revolução Verde, promovendo agudas transformações não apenas na paisagem e no setor econômico, mas também nas relações de sociais, ambientais, culturais, produti-vas, alimentares e trabalhistas.

Em relação ao segundo capítulo, os autores visam compreen-der a dinâmica resultante da implantação das agroindústrias pro-cessadoras de leite bovino no município de Ituiutaba, na escala temporal de 1974 a 2013. O amplo recorte temporal possibilitou compreender a dinâmica vinculada à cadeia produtiva do leite no panorama produtivo agropecuário local, bem como propiciou a verificação das modificações decorrentes dessa atividade para a or-ganização espacial do município de Ituiutaba.

O Capítulo 3 traz importantes contribuições sobre a produ-ção da rizicultura na Microrregião Geográfica de Ituiutaba, e sua atribuição como “capital nacional do arroz” na década de 1950, impulsionada pelos pacotes tecnológicos adotados pelo Brasil na época, promovendo a significativa produção de tal cereal. Aspec-tos relacionados do apogeu ao declínio da produção de arroz na Microrregião Geográfica de Ituiutaba, são alguns importantes as-pectos presentes neste capítulo.

No Capítulo 4 o autor destaca algumas características dos ci-ganos que encontram-se assentados em áreas de reforma agrária, sendo a principal delas a que tem como traço de identidade um constante processo de Territorializar, Desterritorializar-Reterrito-rializar (T-D-R), e que ao engajarem-se na luta pela terra reterrito-rializam-se, e assim passam a reconstruir seus espaços de sociabi-lidade no novo lugar de morada, frente ao constante dilema de ir

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Apresentação

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e vir de sazonalidades temporais que conduzem tradicionalmente suas vidas.

O Capítulo 5 traz ao leitor o perfil produtivo a partir da im-plantação da agroindústria leiteira do município de Ituiutaba, ten-do como recorte temporal os anos de 1974 a 2013. A produção de leite, as crises do setor, bem como sua importância para o muni-cípio, e respectiva representatividade no Triangulo Mineiro, são abordagens constantes traçadas pelos autores. Um levantamento detalhado, e representado através de gráficos, tabelas e registros fotográficos, permitem que se obtenham informações bastante sig-nificativas acerca da temática.

A importância da ginástica laboral e a saúde dos trabalhadores ligados ao setor sucroenergético da Microrregião Geográfica de Ituiutaba é a discussão presente no Capítulo 6. Nele os autores enfatizam a importância da temática, perpassando por conceitos que vão desde os cuidados pela saúde, qualidade de vida, e prin-cipalmente, uma analogia das ações cotidianas dos trabalhadores dedicados ao ramo da produção sucroenergética presente na Mi-crorregião Geográfica de Ituiutaba. Uma investigação científica que primou pela análise e levantamento de dados em campo, de-talhando as principais práticas de ginástica laboral realizadas nos ambientes de trabalho do setor analisado, bem como os principais problemas detectados pelos trabalhadores podem ser observados ao longo do texto.

Finalizando esta obra, onde os mais diversos temas relaciona-dos ao Triangulo Mineiro se fazem presentes, tem-se o Capítulo 7, um texto que relaciona Geografia, Direito Agrário e sustentabilida-de, instigando os leitores à compreensão dos principais conceitos de cada elemento norteador da temática e sua relação com os as-pectos agrários, desde impactos positivos e negativos. A dicotomia produção agrária e sustentabilidade fazem parte de importantes discussões elaboradas pelos autores, através de aspectos balizado-res e ao mesmo tempo ilustrativos de práticas que fazem parte da rotina de produção do espaço rural e suas consequências para a organização do espaço de maneira em geral.

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Apresentação

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Diante da diversidade de textos que compõem essa obra, o in-tuito maior é proporcionar a todos que acessarem a mesma pos-sam, além de compreender todas as multiplicidades encontradas no rural do Triangulo Mineiro, permitam-se inteirar um pouco mais sobre essa importante região de Minas Gerais, que se insere no cenário nacional com destaque principalmente para o mundo rural, sendo este o tema propulsor da presente obra.

Os organizadoresCerrado Mineiro, primavera de 2017

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Grandes projetos de investimentos no Cerrado: transformações territoriais a partir do estado

e do desenvolvimentoAlex Cristiano de Souza Marcelo Cervo Chelotti

Introdução

Neste trabalho buscamos discutir a implantação do Programa de Desenvolvimento do Cerrado (POLOCENTRO) e do Programa Nipo-Brasileiro de Desenvolvimento Agrícola da região dos Cerra-dos (PRODECER), também conhecido como Projeto Cerrado ou JICA (Japan International Cooperation Agency), implantado no ano de 1979, ocupando uma área superior a 200.000 hectares.

Esses grandes projetos de investimento, financiados pelo Esta-do no bojo do período desenvolvimentista, encampou uma ocupa-ção do Cerrado, via Revolução Verde, promovendo agudas trans-formações não apenas na paisagem e no setor econômico, mas também nas relações de sociais, ambientais, culturais, produtivas, alimentares e trabalhistas.

O crescimento econômico neste período fora alcançado, con-forme expressão de Porto-Gonçalves (2005), à custa de “dólares e dores”, por meio de grandes projetos, exigidos pela modernidade urbana e industrial, de matriz estadunidense e eurocêntrica. Desde a construção de barragens para fins de geração de energia elétrica à construção de rodovias, ampliando as estruturas para a produ-ção geral de mercadorias, até a modernização agricultura grandes projetos que foram instituídos durante a década de 1970, conheci-da hoje como a década do “Milagre Econômico”, possibilitando o “desenvolvimento” deste país periférico.

Para apreender os grandes projetos de investimento, em es-pecial o POLOCENTRO e o PRODECER, é necessária uma abor-dagem que tenha como ponto de partida o Estado, seu real plane-

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Grandes projetos de investimentos no Cerrado...

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jador e executor, para então melhor compreender a conjuntura desenvolvimentista e, por fim, ter maior clareza em examinar os impactos e as contradições postas na realidade, aqui encaradas a partir das transformações territoriais.

O Estado e os Grandes projetos de investimento

A história recente do Brasil, a partir do século XIX, é marcada por importantes transformações em suas configurações agrárias e urbanas. Desde o fim do regime escravagista e a ocupação do campo, em algumas regiões do país por imigrantes europeus, pas-samos por uma transição de um país eminentemente agrário para um país que teve um rápido processo de urbanização.

Porém, mesmo com a maior parte da população se concentran-do em áreas urbanas, a matriz econômica permaneceu calcada nas atividades agropecuárias. A concentração da estrutura fundiária no campo tem equiparação na concentração da terra urbana, que passa a receber os migrantes, revelando grandes problemas estru-turais, como falta de infraestrutura básica (serviços de água, eletri-cidade, vias de circulação), moradias precárias, ampla concorrên-cia por empregos, baixa remuneração, além de poucos e esparsos mecanismos de educação, saúde e lazer.

O processo de modernização do país foi baseado no proces-so urbano industrial tendo dois períodos de maior relevância. O primeiro iniciado por Vargas (1930-1945) e, posteriormente, o de Juscelino Kubitschek (1955-1960), marcado pelo Programa de Me-tas. É deste segundo período que datam os grandes projetos de investimentos.

Martins (1993) apresenta que os grandes projetos econômicos são factíveis a partir da aplicação do desenvolvimento tecnológico, reconvertendo a ciência de sua cômoda posição de neutralidade a ações práticas, de transformações radicais no contexto sócio-polí-tico-econômico-cultural nas áreas e entornos de implementação, a partir de uma determinada orientação política. Grandes projetos de investimentos, como são os casos das rodovias, das hidrelétricas e dos planos de colonização, envolvem como reflexos imediatos grandes impactos sociais, econômicos e ambientais. Compreen-

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dendo esses eventos enquanto processo contraditório, que envolve mais de um agente, em uma complexa dialética do território, como é o caso dos movimentos indígenas e camponeses na resistência de suas terras frente ao avanço do capital.

A abordagem de Vainer e Araújo (1992) aponta os grandes projetos de investimentos, enquanto modo de produção do espaço, uma vez que sua função é criar meios para reorganização da produ-ção, alterando as lógicas (produtivas, culturais, sociais, econômicas e políticas) local/regional/nacional. Suas implementações são, em via de regra, associadas aos discursos de modernização e de de-senvolvimento econômico, enquanto na prática sua eficácia não é comprovada.

Seguindo por esta lógica, a implementação dos grandes pro-jetos de investimentos está longe de qualquer abordagem que se possa aproximar da neutralidade política e científica, já que seus impactos são, mesmo que não devidamente divulgados, de grande monta, tanto no campo ambiental quanto no social, no político e no econômico.

Orientados por interesses econômicos, baseados por laudos técnicos, os grandes projetos ocupam amplas áreas, alterando a paisagem local, a fauna, a flora e tendo de realocar os moradores atingidos pelo empreendimento, destruindo articulações históri-cas de desenvolvimento e cooperações regionais em detrimento de um re-ordenamento territorial orientado pelo Estado, de foco setorial que não dá conta da Inserção Regional (IR) na área de in-corporação do estabelecimento, como abordam os autores:

A IR que era a incorporação do empreendimento ao espaço loca/regional com vistas a uma redistribuição de custos e bene-fícios, transforma-se em incorporação da região ao processo de planejamento, implantação e operação do empreendimento. Curiosa inversão, mas não destituída de coerência: a região é olhada a partir do empreendimento, enquanto espaço de inser-ção; ela não é alvo de política, mas espaço de uma política que é (e permanece) setorial, determinada por objetivos, lógicas e metodologias setoriais. Postulada como meio de outro fim, a IR não é senão o mecanismo de amoldoamento, aos fins buscados, do meio regional.Não há dúvida: estamos longe de uma elaboração de uma pers-

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pectiva crítica do processo concreto (...) vem se apropriando e transformando o território e os espaços regionais/locais segun-do lógica e decisões ditadas por dinâmicas estranhas a esses espa-ços. Trata-se, isto sim, de buscar conferir maior racionalidade a esse processo concreto, com o objetivo de reduzir as resistências dos espaços considerados como de inserção, e, consequentemen-te, reduzir custos suplementares decorrentes de conflitos mal ad-ministrados. Trata-se, mais que isso, de construir os instrumentos políticos que sustentem a continuação de um modo de apropria-ção e mobilização territorial de que os grandes projetos são veícu-lo e forma típica (VAINER e ARAÚJO, 1992, p. 68-69).

Os grandes projetos de investimentos, em geral, são impostos por agentes deliberativos, exógenos às áreas diretamente afetadas, articulados e financiados por um Estado cuja organização e funcio-namento são marcados por interesses de uma minoria proprietária em detrimento dos interesses da maioria vendedora de força de trabalho.

Tomando o Estado em sua formulação marxista, com funções determinantes na sociedade, desde as análises do Manifesto Comu-nista, de Marx & Engels (2005), em que o Estado é considerado como gestor dos negócios da burguesia em consolidação. Poste-riormente, na maturidade de seus estudos, como assinalam Ho-bsbawm, Marx & Engels, reconhecem uma “função social geral” do Estado, impedindo a desagregação social e também o aceitam como “elemento de ocultação do poder, ou domínio por mistifica-ção ou consentimento ostensivo, implícito no fato de o Estado pa-recer colocar-se acima da sociedade” (HOBSBAWM, 2011, p. 57).

Lenin (2010) reconhece e aponta o papel das classes sociais, abordando o Estado como “instrumento de exploração da classe oprimida”, que se faz valer do campo econômico e das normas administrativas/jurídicas, através do direito, na manutenção do modo de produção capitalista, que deve fazer uso de todas as ferra-mentas para o mantenimento da ordem, garantindo e defendendo a propriedade privada capitalista (fazendo uso da violência quan-do necessário), mantendo a divisão social e territorial do trabalho e a exploração da mais-valia, mas também permitindo pequenas concessões, reformas, para se manter e aprimorar o padrão de re-produção do sistema em voga.

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Para fins de uma contextualização mais contemporânea sobre a organização e a função do Estado em uma sociedade de classes, Saes (2001, p. 34) compreende que

[...] a concepção segundo a qual, nas formações sociais cindidas em classes sociais antagônicas, o Estado é a organização mate-rial/humana que desempenha a função latente – acobertada cotidianamente pela proclamação da função expressa de satis-fazer o “interesse geral da sociedade” – de atenuar o conflito de classes, contendo-o dentro de certos limites. Ao desempenhar essa função, o Estado coloca-se objetivamente, quaisquer que sejam as intenções de seus agentes (= funcionários), a serviço dos interesses mais gerais da classe exploradora. O Estado, por-tanto, está longe de ser uma organização a serviço de “todo o povo” ou de “todos os indivíduos”; ele tem um caráter de classe, quaisquer que sejam a complexidade e a variedade das vias de concretização desse caráter.

Fernandes (2005) contribui, a partir da análise da Revolução Burguesa, para pensarmos o Estado no Brasil. Esse tardio processo contribuiu para a inserção do país na economia capitalista inter-nacionalizada do século XX, mantendo seu caráter dependente, ou seja, subjugada aos interesses internacionais. A economia es-teve voltada à exportação de matérias-primas e bens com pouco valor agregado, produzidos a partir da constituição de indústrias de base, além da modernização conservadora, com grande filão no campo, ambos financiados com capital internacional, que tiveram como reflexo a ampliação da dívida externa (elemento central no aprofundamento da dependência). O Estado exerceu, nesse senti-do, papel fundamental nesse processo desenvolvimentista, com a justificativa ideológica do progresso nacional, tendo no comando as classes dominantes ligadas ao capital internacional.

Ainda de acordo com Fernandes (2005), é necessário ressaltar duas importantes características dessa burguesia que dirigiu (e ain-da dirige) o Estado Brasileiro. A primeira é o caráter contrarrevo-lucionário, relativo ao desinteresse em realizar, no Brasil, reformas burguesas, como é o caso da reforma agrária, ocorrida em países europeus. Esta prática é conciliada com o objetivo da exportação em larga escala, já que o latifúndio se mantém como uma forma

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apropriada para tal, na produção e reprodução do capital e na manutenção da propriedade privada. A segunda é o seu caráter anti-social, na medida em que a burguesia nacional esteve disposta a se beneficiar desse modelo de capitalismo dependente, o Estado não poupou esforços em reprimir – inclusive com auxílio da vio-lência física – qualquer tentativa de realização de reformas popu-lares no Brasil que pudessem modificar a estrutura dependente. Não obstante, a ditadura militar brasileira foi apoiada e teve ampla participação do empresariado nacional, e os conflitos no campo permaneceram sendo tratados com truculência.

Com o processo de redemocratização do país, realizado de forma “lenta, gradual e segura”, arquitetado em comum acordo entre militares e setores das classes dominantes, já que o regime autoritário, afinal, havia cumprido seu papel na consolidação do capitalismo dependente no Brasil (FERNANDES, 1989), o Estado brasileiro estava com terreno limpo, apesar dos movimentos or-ganizados de insatisfação crescentes, para acelerar a chegada do neoliberalismo e, com ele a dinâmica perversa do agronegócio.

Assim, no tempo presente, garantindo a institucionalidade burguesa, através de investimento de capitais, o Estado brasileiro financia diferentes organizações que, no campo, vão desde o agro-negócio até a agricultura camponesa, com evidentes e enormes disparidades sobre o total investido, como apontam Paulino e Al-meida (2010) a despeito dos financiamentos do BNDEs a essas duas formas de organização da agricultura. Em referência ao Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), as autoras observam que há

[...] um modesto orçamento. Analisando o período citado [2003 – 2010] a média de investimento anual foi de R$ 502,57 milhões, em meio as descontinuidades no movimento de cres-cimento do volumes de recursos, uma vez que em 2007 houve redução de 7,5% em relação ao ano anterior (BRASIL, 2010).Comparando estes dados com a política de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BN-DES) à agricultura capitalista, não por acaso denominada agri-cultura comercial pelos órgãos públicos, temos a dimensão do quanto insignificante tem sido o PAA enquanto medida para minimizar os graves problemas que cercam a produção e a co-mercialização dos pobres do campo. Por exemplo, no caso do

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financiamento do BNDES ao setor celulose-papel, observamos que nos últimos dez anos esse setor obteve mais de 9 bilhões de reais de financiamento, R$ 2,3 bilhões somente em 2006 (PAULINO; ALMEIDA, 2010, p.21).

Além de estabelecer seu papel na organização social, tendendo a uma minoria em detrimento de uma maioria, o Estado atua di-retamente nas transformações territoriais. Cumprindo os requisi-tos básicos para a reprodução do capital (produção/distribuição/circulação/consumo), incide na transformação da natureza, sobre o trabalho, na organização social e produtiva e na acumulação do capital, reorganizando, insistentemente, o território.

Do território e do desenvolvimento

A partir destes apontamentos, trabalhamos com o território desde as contradições impostas pelo desenvolvimento desigual e combinado, impresso pelo modo de produção capitalista, para o qual, Mitidiero Junior (2008) organiza as noções basilares na es-truturação deste conceito, estabelecendo princípios teóricos para sua apreensão, bem como para seu uso acadêmico e político. Para este autor

1) o território é produto da ação/trabalho humano e constitui-se posteriormente a existência do espaço (RAFFESTIN, 1993);2) a atividade humana valoriza o espaço fixando valores huma-nos em diferentes delimitações espaciais, ou melhor, em dife-rentes circunscrições territoriais (MORAES, 1999, 2000, 2005);3) nenhuma análise e interpretação correta de território pode prescindir das considerações dos fatores políticos que o in-fluenciaram e o influenciam, assim como nenhuma ação políti-ca pode prescindir da concreta situação territorial em que ele se coloca (PELLEGRINI, 1974);4) a lógica da organização da sociedade, representada princi-palmente pela existência do Estado, deve ser levada em consi-deração, já que o Estado apresenta e representa a delimitação dos territórios nacionais;5) não é possível interpretar a estrutura territorial sem levar em consideração o fator político-econômico (QUAINI, 1983);

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6) apesar de dominante, a lógica territorial estatal não é, obvia-mente, a única grande marca do caráter territorial da socieda-de moderna (HAESBAERT, 2004);7) as práticas e expressões simbólicas e culturais valorizam e se apropriam do território;8) não é possível interpretar o território sem o exame dos pro-cessos decisórios, das relações de força e de conflito de interes-ses entre os diferentes grupos sociais (MITIDIERO JUNIOR, 2008, p. 62-63).

Para Oliveira (1999, p. 74), o território, a partir da perspectiva do materialismo histórico e dialético, deve ser entendido como uma

síntese contraditória, como totalidade concreta do processo/modo de produção/distribuição/circulação/consumo e suas articulações e mediações supraestruturais (políticas, ideoló-gicas, simbólicas, etc.) onde o Estado desempenha a função de regulação. O território é assim, produto concreto da luta de classes travada pela sociedade no processo de produção de sua existência. Sociedade capitalista que esta assentada em três classes sociais fundamentais: proletariado, burguesia e os pro-prietários de terra.Dessa forma, são as relações sociais de produção e o processo contínuo/contraditório de desenvolvimento das forças produ-tivas que dão configuração histórica e específica ao território. Logo o território não é um prius ou um a priori, mas a contí-nua luta da sociedade pela socialização igualmente contínua da natureza.O processo de construção do território é simultaneamente de construção/destruição/manutenção/transformação. Em sínte-se, é a unidade dialética, portanto, contraditória, da espaciali-dade que a sociedade tem e a desenvolve.

Assim, a partir das ponderações de Mitidiero Junior (2008) e de Oliveira (1999), podemos concluir que o território não deve ser compreendido apenas como uma parcela do espaço delimita-da, circunscrita, dada, mas enquanto processo permanente, tenso, considerando o território enquanto relações de poder e de domi-nação em uma sociedade formada por classes sociais antagônicas. Devemos, pois, o considerar como produto das relações desiguais

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e contraditórias entre as classes. Esta concepção acompanhará as análises sobre as transformações decorrentes dos processos de de-senvolvimento.

Porto-Gonçalves (2011) em sua abordagem sobre o desenvolvi-mento, o aponta como valor universal, com natureza contraditória da dimensão desenvolvimentista aliando campos políticos diver-gentes (da direita liberal aos social-democratas e socialistas) e os opõe aos movimentos ambientalistas, que em outro momento his-tórico empreenderam lutas pelo desenvolvimento zero ou mesmo contra o desenvolvimento. Os marxistas são os mais combativos contra o desenvolvimento hegemônico (desigual), apontando crí-ticas à desigualdade do desenvolvimento, mas apostando que este seria um direito de todos, mesmo diante das relações desiguais entre Primeiro e Terceiro Mundo. Desta forma, Porto-Gonçalves (2011, p. 64-65) apresenta a situação histórica da mundialização, da modernização e, de uma parcela de sua intencionalidade

Assim, entre a crítica ao desenvolvimento que se fazia nos anos de 1950/60 na Europa e nos EUA e sua repercussão com a crítica ao subdesenvolvimento no Terceiro Mundo, o desenvol-vimento globalizou-se, sob o patrocínio dos agentes que se afir-mam em escala global, como as oligarquias financeiras e indús-trias com suas empresas situadas no Primeiro Mundo, aliadas a importantes setores das burguesias nacionais desenvolvimentistas do Terceiro Mundo, das oligarquias latifundiárias (a revolução verde lhes foi uma bênção), assim como os gestores estatais civis e militares.Assim, sob os auspícios do Banco Mundial e outros organis-mos supranacionais, se construirão grandes hidrelétricas em vários cantos do mundo, se abrirão estradas por todo o lado, indústrias se transladarão por regiões que antes desconheciam, assim como a revolução verde colonizará os espaços agrários na América Latina, na Ásia e na África. Mais uma vez, como desde sempre, a modernização foi colonização.

As seguidas ondas de desenvolvimento das economias nacio-nais, em geral, têm como ponto de partida, a provisão infraestru-tural como medidas necessárias para iniciar e/ou ampliar a pro-dução e, de modo igual, beneficiar a circulação das mercadorias,

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do capital e do dinheiro, das empresas e das pessoas, sobretudo enquanto força de trabalho.

A modernização no Terceiro Mundo, baseada no projeto de industrialização, urbanização e Revolução Verde, seguida pela in-tegração à economia global, refletiu sobre o processo de formação territorial brasileira, explicitando a alta concentração da proprie-dade privada, impactando de forma direta na organização do Es-tado, nas disparidades regionais, de classe e de frações de classes sociais.

Celso Furtado (1974) discorre sobre o mito do desenvolvimen-to econômico, ao abordar questões como a divisão internacional do trabalho e as contradições do padrão de desenvolvimento, opondo uma minoria afortunada a uma maioria faminta. Assim, faz-se necessário outros rumos para o desenvolvimento, alterando as relações entre Estado, empresas e os padrões de produção e de consumo, tendo em vista que o desenvolvimento é limitado em suas possibilidades de reprodução, segundo a relação produção/consumo. O autor chama de modernização “o processo de ado-ção de padrões de consumo sofisticados (privados e públicos) sem o correspondente processo de acumulação de capital e progresso nos métodos produtivos” (FURTADO, 1974, p.81).

Assim, no Mito do Desenvolvimento Econômico, postulado por Celso Furtado, tira-se o foco dos reais problemas enfrenta-dos pela coletividade e as possibilidades que a ciência abria “para concentrá-las em objetivos abstratos como são os investimentos, as exportações e o crescimento” (FURTADO, 1974, p. 75).

E em sua ácida crítica ao debate sobre o desenvolvimento, Montenegro Gómez (2007), desfere provocações na reflexão do que realmente representa o termo modernização. O autor resgata Rist (2002), coloca o desenvolvimento como uma crença, sendo este “apenas uma religião moderna” acompanhado de práticas e mitos contraditórios; Escobar (1998 [1996]), apresenta que “o dis-curso do desenvolvimento é uma invenção que modela a concep-ção de realidade e ação social daqueles considerados subdesen-volvidos...”, ou seja, é uma forma de “destruir as superstições e relações arcaicas”; e a referência de Sachs (2000[1992]) coloca que “o conceito de desenvolvimento se assemelha a uma ameba”, se al-terando de acordo com o tempo histórico, na busca de apresentar

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eficiência em todas as áreas, mas mantendo o padrão do modo de produção capitalista.

Por fim, o desenvolvimento territorial rural, conceito que tem como base o desenvolvimento rural e o desenvolvimento local, é tido por Montenegro Gómes e Thomaz Júnior (2005) como mais uma forma de metamorfose conceitual, estrategicamente utilizada pelo Estado em sua incansável busca pelo desenvolvimento, que nunca há de chegar em sua plenitude. Considerando, como os au-tores, o desenvolvimento territorial rural como política encampada por organizações do capital internacional, como o Banco Mundial, FMI, Bird, o discurso do desenvolvimento age com o propósito de desarticular as organizações e os movimentos populares, defenden-do a propriedade privada e o status quo capitalista.

Sob a perspectiva científica, o respaldo para estas ações está calcado em uma ciência, pretensamente neutra, que busca o desen-volvimento e o progresso, comprometido com a reprodução am-pliada do capital e o mantenimento das relações contraditórias sus-tentadas pela oposição entre as classes (LÖWY, 1994). Planejando de cima para baixo, guiado por dinâmicas internacionais (conside-ra-se a subserviência nacional), o Estado brasileiro busca/buscou o “desenvolvimento” a partir da ocupação e apropriação dos cer-rados às lógicas de produção referenciadas no mercado mundial.

O Polocentro e o Prodecer como grandes projetos econômicos

Sob a prerrogativa do crescimento econômico e do desenvol-vimento das forças produtivas, o que marca o ingresso do cerrado como importante espaço para a exploração capitalista são as inter-venções promovidas pelo Estado a partir da década de 1960, pro-movendo infraestrutura necessária para a integração regional na lógica da produção global capitalista. Durante as décadas de 1970 e 1980 a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRA-PA) inicia seus estudos, sobretudo na correção do solo e na seleção de sementes aptas para esta região (PORTO-GONÇALVES, 2011).

Desse contexto desenvolvimentista nacional, com grandes projetos de investimentos pelos quatro cantos do país, há o im-

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pacto não apenas nas áreas diretamente afetadas, mas, como já abordado, de incidência sobre a totalidade da formação territorial brasileira, provocando transformações nas relações de produção/distribuição/circulação/consumo segundo a atualidade do modo capitalista de produção. Assim, ao considerar o fenômeno da urba-nização, o desenvolvimento técnico-científico na indústria ampliou a produtividade e, no campo, selou a aliança entre agricultura e in-dústria, conformando a moderna agricultura capitalista com eleva-da utilização de maquinaria e do progresso laboratorial da ciência.

Conforme San Martin e Pelegrini (1984) e Pêssoa (1988), em período anterior aos grandes projetos no cerrado como o POLO-CENTRO e o PRODECER, houve outras iniciativas que deram iní-cio à ocupação da agricultura capitalista nesta região, como são os casos do Programa de Crédito Integrado e Incorporação dos Cerrados (PCI) e o Programa de Assentamento Dirigido do Alto Paranaíba (PADAP).

De qualquer forma, a modernização do cerrado brasileiro tem seu grande impulso a partir da criação do Programa de Desenvol-vimento dos Cerrados (POLOCENTRO), programa de interven-ção do Governo Federal, em 1975, na busca por incorporar a área do bioma1 na produção agrícola mundial, como alertara Oliveira (1988), colocando em destaque os recursos minerais e agrícolas.

De grande investimento financeiro, o POLOCENTRO teve mais de 3.300 projetos aprovados de desenvolvimento agrário, en-volvendo “U$$ 577 milhões até o ano de 1982”, sendo que os bene-fícios se concentravam em uma minoria de grandes propriedades, conforme afirma Matos (2011, p. 96)

81% operavam em propriedades com mais de 200 hectares, absorvendo 88% do volume total de crédito do programa. As propriedades acima de 1.000 hectares representam 39% do nú-mero total dos projetos e absorveram 60% dos recursos totais do programa.

Completando a análise de forma mais objetiva, Estevam (2012, p. 82), referindo-se ao POLOCENTRO, assinala que

1 O POLOCENTRO foi efetivado nos seguintes estados da federação: Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.

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Foi bastante explícito em seus objetivos e teve como orientação única a modernização das atividades agropecuárias no Centro--Oeste e no oeste de Minas Gerais. Distinguiu-se dos demais pela sua natureza tipicamente setorial: não visou extrapolar metas marcadamente de timbre econômico e estruturou-se em algumas atividades básicas, especificamente na dotação de in-fraestrutura, pesquisa agropecuária e concessão de linhas de financiamento rural.

Como forma de analisar esta situação, recorremos a Massimo Quaini (1983), quando aborda o determinismo geográfico como forma instrumentalizada da ciência em mistificar a condição de alienação do território ao homem, já que é construído a partir das relações de classe, mas não se vê enquanto pertencente neste processo. Daí a fantasiosa construção teórica que analisa a relação social como natural, separando-as das relações sociais, mantendo o território como objetividade meramente material, ambiental. Tal pensamento predominou por largo tempo nas ciências e na políti-ca, justificando casos como a modernização do território em áreas do cerrado brasileiro, em um processo que busca o desenvolvimen-to de áreas até então declaradas como “atrasadas”, “marginaliza-das” e “pobres”.

Os desequilíbrios regionais são vistos como fatos naturais, sua explicação apóia-se na riqueza-pobreza do solo e do subsolo, nas dificuldades ambientais, na distância dos centros de produ-ção e de mercado, etc. O efeito é que, por exemplo, o atraso, o isolamento e a marginalização de uma região, na medida em que é vista principalmente em sua dimensão naturalista – a dis-tância como distância física, o isolamento como fato geomorfo-lógico, a pobreza como um fato geológico e as jazidas minerais como ou de recursos naturais – torna-se causa e, deste modo, toda tentativa de explicação efetiva é impossível. As consequ-ências no plano político operativo são evidentes: “este feixe de erros ou de aproximações, cuidadosamente mantido, tende a fazer desempenhar um papel social bem preciso à geografia: convencer os homens à resignação em relação às disparidades regionais, dado que estas seriam antes de mais nada naturais (QUAINI, 1983, p. 44).

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Estas concepções permitiram que a ocupação do cerrado brasileiro fosse possível, pautando o discurso do desenvolvimen-to, inserindo áreas de “atraso” econômico à lógica mundial da produção em larga escala, confundindo e alterando, por conse-guinte, as concepções entre agri-cultura e agro-negócio (PORTO--GONÇALVES, 2011).

Como formação histórica, o cerrado abrigava uma multiplici-dade enriquecedora de uso da terra, combinando, nas chapadas e nos vales, as suas duas principais formações, sendo: a agricultura praticada nos fundos de vale, brejos e pântanos e; nas encostas e nas chapadas, pela dificuldade na captação de águas, o gado era criado solto e havia a cultura da coleta de frutos. De forma diferen-te, aborda Porto-Gonçalves (2004, p. 18) que nas terras ocupadas pelo agronegócio, por serem planas

significam custos energéticos menores. Essa é uma regra geral do espaço agrário brasileiro, onde a grande exploração comer-cial, quase sempre, de exportação, ocupa as áreas de topogra-fia mais planas ou suavemente onduladas, deixando aos campo-neses as terras mais acidentadas2. A grande expansão recente pelo agronegócio dos amplos cerrados, volta a se aproveitar desse legado natural de topografias planas, acrescido do fato de serem terras de uso comum das populações locais ou per-tencentes a grandes fazendeiros criadores de gado que, até os anos 60, faziam uma pecuária extensiva e, não raro, permitiam livre acesso aos camponeses para a coleta de frutos, resinas, ervas e remédios em geral. A apropriação dessas terras seja por grilagem, prática amplamente utilizada, ou adquiridas a baixo preço de fazendeiros pecuaristas, foi a forma com que se deu a expansão privada sobre as terras de chapadas que o campesina-to aproveitava na forma de uso comum extensivo (importância do extrativismo), associado a outros usos nas encostas e baixa-das (brejos, várzeas, ‘pântanos’).

Outro importante e grande projeto de investimento no cerra-

2 As populações remanescentes de quilombos quase sempre ocupam terrenos acidentados e de difícil acesso, até como estratégia de liberdade. Na Amazônia, mais especificamente no vale do Trombetas, as cachoeiras são conhecidas como símbolo de liberdade, posto que viver acima delas dava uma certa garantia de proteção.

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do foi o PRODECER, criado em 1979, a partir de uma cooperação econômica entre Japão e Brasil, objetivando intensificar o desen-volvimento do cerrado. Contando com aparato financeiro do Esta-do, agricultores, em sua grande maioria, oriundos do sul do país tiveram acesso à terra mediante financiamento estatal.

Os grandes investimentos do PRODECER se deram através de três projetos, sendo: PRODECER I – Plano piloto na região do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, ocupando uma área de 58.754 hectares; PRODECER II – iniciado em 1987, desta vez com dois projetos no Estado da Bahia, além de projetos na região Centro--Oeste, com projetos em Mato Grosso, Goiás e Mato Grosso do Sul, ocupando uma área superior a 200.000 hectares e; a terceira e última etapa efetivada3 teve início em 1994, com um claro objetivo da ampliação da fronteira agrícola para o norte e o nordeste do país, abarcando Maranhão e Tocantins. Em sua totalidade, o PRO-DECER ocupa uma área total aproximada de 350.000 hectares nas áreas de cerrado brasileiro (MATOS e PESSÔA, 2014).

Os povos cerradeiros, em raras exceções foram incorporados ao PRODECER, já que se priorizava a valorização da “importação de colonos” da região sul do país, transformando-os em agricultores (empresários rurais modernos), numa perspectiva ideológica, afas-tando das limitações naturais do cerrado a partir do enaltecimento de suas capacidades para modernização. Estes fatos, considerando elementarmente, os vultuosos investimentos a juros baixos e a assis-tência técnica especializada, contribuem com o processo de “aniqui-lamento” dos camponeses desta região (MENDONÇA, 2004).

Frederico (2010) ao abordar as cidades do agronegócio, em seus processos contraditórios, parte do resultado do desenvolvi-mento desigual da agricultura comercial no cerrado. Retomando Martins (1993), além da urbanização, considerando também as contribuições da temática que envolve a modernização conserva-dora, os grandes projetos de integração e desenvolvimento no país atingiram a região como são os projetos de colonização, constru-ção de hidrelétricas e aberturas de rodovias, sempre apresentando grandes embates entre Estado, Capital, por um lado e, movimentos indígenas, camponeses, quilombolas, cerradeiros etc., por outro.

3 Fora prevista uma quarta etapa que não chegou a se concretizar.

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Considerações finais

Grandes projetos de investimentos, compreendidos enquanto instrumentos de modos de produção do espaço transformaram radicalmente o cerrado brasileiro, a partir do desenvolvimento desigual no território nacional, guiado pelo modelo mundial de agricultura referenciado pela “Revolução Verde”.

Estado e Capital, em aliança permanente para a reprodução do status quo, imprimem no território marcas indeléveis na superação do “passado” e do “atraso” por meio de uma modernização voraz que varre do bioma as práticas sustentáveis, secularmente pratica-das pelos povos cerradeiros, como registrado por Porto-Gonçalves (2004) e ilustrado por Mesquita (2009, p. 27)

As avós cerradeiras, muito sábias e cuidadosas com a saúde da família recorriam aos “santo remédio” do Cerrado e na forma de implastros, garrafadas, banhos e chás de plantas como: Bar-batimão; Pé de Perdiz; Algodãozinho; Lixeira; Pau Doce; Sucu-pira; Lobeira; Articum; Óleo de Copaíba e outros, amenizavam muitas dores e curavam muitas feridas. Sabiam curar as feridas do corpo e da alma com as rezas e as bênçãos. As novenas do Santo Padroeiro e os Terços Cantados “arreunia” toda comu-nidade com festas e comilanças. A imagem do Santo Padroei-ro permanecia em uma morada por alguns dias abençoando aquela família depois era levado em procissão para outra casa onde já era esperado com um altar cheio de flores.Quando um vizinho estava “precisado” a comunidade se reunia e organizava a “treição” ou o mutirão de ajuda mútua. A festa começava com a chegada de todos juntos ainda de madrugada com gritos e foguetório. O beneficiado era pego de “surpre-sa” mas coincidentemente, na véspera havia matado o porco e as galinhas já estavam debaixo do balaio, prontas para serem abatidas. Durante todo o dia as mulheres cuidavam da farta comida e os homens batiam pasto, limpavam o rego, colhiam a roça... E a noite, para completar, se organizava o pagode, no qual o sanfoneiro e o violeiro tocavam e cantavam, enquanto todos dançavam e depois iam embora ainda catando suas mo-das pelos trieiros iluminados pela lua. Havia ainda o mutirão de fiandeiras, organizado especialmente pelas mulheres e me-ninas para ajudar as vizinhas que tinham colhido o algodão e

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precisavam de “fiar” porque assim era melhor para conservar o mesmo. As fiandeiras não só fiavam, mas faziam todo o proces-so de beneficiamento do algodão com descaroçar, bater e car-dar. O “serviço” era feito entre muita cantoria e muita comida.Os camponeses, com estas práticas, reafirmavam a solidarieda-de que lhes era, e ainda é natural, onde o campesinato ainda resiste as investidas do capital e do capitalismo [...].

A inserção do cerrado na divisão internacional do trabalho oferece aos países capitalistas “desenvolvidos” matéria-prima agrí-cola e mineral ao peso dos impactos ambientais (estresse hídrico, poluição, contaminação, desmatamento) e sociais (concentração da propriedade privada da terra, precarização do trabalho, des-locamentos populacionais, transformações culturais e nos hábitos alimentares, etc.) deixados aos países explorados.

Por fim, podemos brevemente concluir, sem nenhum pesar, que este tipo de modernização, vinda de cima para baixo, empla-cada por anseios internacionais, além de manter e controlar a sub-serviência nacional, a partir de relações econômicas, sociais e ide-ológicas, estabelece quadros conjunturais difíceis de serem supe-rados por outra perspectiva de desenvolvimento. Outro padrão de desenvolvimento, em que a organização social não esteja baseada neste modelo de divisão do trabalho, que a exploração do homem (proprietário de sua força de trabalho) pelo homem (proprietário dos meios de produção) acabe junto e, em movimento dialético, com a propriedade privada (da terra e dos meios de produção). Para isso é necessário agudizar a crítica e, em consonância com o movimento real, poder intervir, no sentido de possibilitar transfor-mações objetivas nesta região tão cara.

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A reestruturação do cenário agropecuário da microrregião geográfica

de Ituiutaba: a inserção da sojaEduardo Marques Silveira

Meri Lourdes Bezzi

Introdução

A ciência geográfica tem como foco de estudo as relações entre a natureza e a sociedade, sendo que, através destas, é que se têm as transformações espaciais, ou seja, as relações sociais presentes entre o homem e meio natural. Com base nas mudanças espaciais, considerando as temporalidades, é que se estrutura a organização e a reorganização dos recortes espaciais.

A Microrregião Geográfica de Ituiutaba/MG (MRG 017), foco de estudo desta pesquisa, é um exemplo das modificações presentes no campo e da evolução que estas podem proporcionar. A MRG, ao longo do tempo, passou por mudanças em seu meio agrário, reestruturando o cenário produtivo de suas unidades territoriais, sendo elas: Ituiutaba, Santa Vitória, Gurinhatã, Ipiaçu, Cachoeira Dourada e Capinópolis. (Figura 1).

Destaca-se que o desenvolvimento agrário brasileiro é prove-niente destas transformações, ou seja, com a organização/reorga-nização espacial é possível a inserção de novos elementos que ten-dem a modificar o espaço como um todo. Um exemplo disto são as alterações provenientes das mudanças de produção que ocorrem nas unidades territoriais em estudo.

A Microrregião Geográfica de Ituiutaba está localizada na Me-sorregião Geográfica do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (MSG 3105), situa-se a oeste do estado de Minas Gerais e apresenta uma extensão territorial de 8.736,204 km². Atualmente, possui uma população de 150.977 habitantes, com densidade demográfica de 17,29 hab./km (IBGE, 2015).

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Ressalta-se que a MRG de Ituiutaba apresenta excelente posi-ção geográfica, pois possui interligações com importantes rodovias, como as BR’s 364, 365, 461, 226, as quais facilitam o escoamento de produtos e a locomoção de pessoas. A mesma faz divisa com o Estado de Goiás, estando próxima dos Estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul.

Ao longo da história, esse recorte espacial passou por diversas reorganizações no âmbito rural/local. Tal fato refere-se aos ciclos produtivos agropecuários. Nesse cenário, o município de Ituiutaba, na década 1970 foi considerado “A capital do arroz no Brasil” (OLI-VEIRA, 2003). No entanto, com o decorrer do tempo, houve um re-direcionamento produtivo, alicerçado pelas políticas e ações tanto in-ternas quanto externas de origem públicas e privadas, as quais foram responsáveis por mudanças estratégicas nos modelos produtivos.

Figura 1 Localização da Microrregião Geográfica de Ituiutaba/Minas Gerais

Fonte: Base digital do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (2010).Org.: SILVEIRA, E. M. (2016).

Cabe enfatizar que a modernização da agricultura foi um dos fatores responsáveis pelas novas reorganizações espaciais presentes

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no espaço rural da Microrregião Geográfica de Ituiutaba. Estas transformações ocorreram após a Segunda Guerra Mundial, pois foi neste período que se teve um maior avanço tecnológico, propor-cionando com que também o campo passasse a usufruir de novas técnicas e, consequentemente de mudanças espaciais significativas.

A problemática desta pesquisa é analisar as principais reor-ganizações espaciais em nível rural que ocorreram ao longo dos períodos de 1990 a 2014 na MRG de Ituiutaba, visto que neste recorte temporal teve-se uma maior dinâmica dos diferentes tipos de cultivares presentes na mesma e, consequentemente, uma maior transformação do espaço agrário da MRG supracitada. Assim, é fundamental entender quais são as consequências ocasionadas pe-las metamorfoses pelas quais o espaço agrário da MRG de Ituiuta-ba tem passado.

Outros elementos fundamentais do desenvolvimento e orga-nização do espaço agrário são o capital e o Estado, sendo eles os principais dinamizadores do desenvolvimento e das transforma-ções do meio rural, através de ações conjuntas. Cita-se, por exem-plo, as iniciativas provenientes do governo para a atração de novas empresas no país, tais como a Monsanto, Souza Cruz, Nestlé, entre outras. Assim, entende-se que o Estado e o capital são essenciais para a produção agrária brasileira, pois é através deles que se tem aumentado a produtividade das culturas, bem como a consolida-ção de indústrias que dinamizam a produção agrícola.

Através de políticas agrárias e de projetos idealizados pelo Es-tado, teve-se como resultado a introdução de novos cultivos, como a soja, na década de 1980, bem como a sua expansão a partir de 2000. Tal fato foi responsável pela alteração do cenário econômico rural/local da microrregião em estudo.

O espaço agrário brasileiro sofreu diversas transformações entre os anos de 1970 a 2000. Assim, salienta-se que a escolha do recorte temporal de 1990 a 2014 ocorreu pelo fato de que em 1990 as políticas públicas e as dinâmicas privadas influen-ciavam fortemente o bioma Cerrado, sendo que é nesse período que ocorreram as maiores mudanças no seu espaço agrário. Nos anos subsequentes o espaço passou a se modificar, principalmen-te pelo desenvolvimento tecnológico.

Nesse sentido, justifica-se a escolha da escala temporal em aná-

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lise, pois foi nesse intervalo que se reestruturou a configuração do campo na MRG de Ituiutaba, visando atender as dinâmicas produ-tivas na atualidade. Desse modo, a realização desta pesquisa tem o intuito de compreender as dinâmicas espaciais que ocasionaram as transformações do setor agropecuário, identificando os novos arranjos espaciais. Para atingir essa proposta, foram utilizadas téc-nicas de geoprocessamento como ferramentas norteadoras, mais especificamente, os softwares livres. Tendo em vista que esse tipo de trabalho com a utilização de softwares livres e de técnicas de re-gionalização são recentes na Microrregião Geográfica de Ituiutaba, faz-se necessário uma abordagem crítica e com maior aprofunda-mento nas relações entre a inserção da tecnologia no campo e dos novos arranjos organizacionais presentes na MRG em estudo.

Os processos teórico-metodológicos da pesquisa foram estru-turados em etapas, as quais permitiram trabalhar de forma orga-nizacional, visando atingir os objetivos propostos. A fase inicial correspondeu à estruturação da matriz teórica e à definição do mé-todo científico adotado, ou seja, procurou-se trabalhar inicialmen-te com a revisão bibliográfica, sendo esta pautada nos conceitos norteadores da pesquisa, como a modernização da agricultura, as políticas públicas e/ou privadas para o desenvolvimento do meio agrário e a organização e/ou reorganização espacial. Através des-tes foi possível compreender as questões relacionadas com o setor agrário da Microrregião Geográfico de Ituiutaba.

Por compreender que o método é um caminho para respostas, a pesquisa tem como método investigativo o dialético, entendendo que ela é um dos fatores responsáveis pela composição e organiza-ção do espaço, compreendendo-o como um processo que apresen-ta mudanças no decorrer do tempo.

Desta forma, compreende-se que o arranjo produtivo da Mi-crorregião Geográfica de Ituiutaba ocorre através das modifica-ções que a mesma apresentou ao longo de sua história, uma vez que foi possível verificar os agentes transformadores do mesmo, tais como os fatores econômicos, as políticas públicas e sociais, a inserção de novas culturas, entre outros, que foram organizando e/ou reorganizando as unidades territoriais que integram a MRG em foco (CARGNIN, 2009).

Realizada a primeira etapa do trabalho, a segunda correspon-

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deu ao trabalho de campo. Neste tinha-se como preocupação cen-tral verificar a organização/reorganização da MRG em questão. Desta maneira, procurou-se entender como a mesma alterou sua estrutura econômica mediada pela produção da soja.

Para a realização do trabalho de campo foram estruturadas duas modalidades de entrevistas. Na primeira, realizou-se a coleta de dados em órgãos gestores como os sindicatos rurais, prefeituras municipais e a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (EMATER – MG). Na segunda, as en-trevistas direcionaram-se para os produtores rurais das unidades territoriais da MRG em questão.

Por intermédio das informações obtidas na EMATER foram selecionados os produtores por município para serem entrevis-tados, totalizando 109. Destaca-se que o número de entrevistas variou de um município para outro, pois o método de coleta de informações aplicado foi baseado na quantidade de estabe-lecimentos agropecuários e estes também são variáveis de uma unidade territorial para outra.

A terceira etapa corresponde à coleta e tabulação de dados secundários pertinentes à MRG de Ituiutaba. Nessa etapa procu-rou-se analisar as informações referentes aos Censos Agropecuá-rios elaborados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nos anos de 1996 e 2006. Deve-se destacar que foram utili-zados os demais bancos de dados do IBGE, como forma de consul-ta. Além do IBGE, buscaram-se informações na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA).

Através da realização dos procedimentos anteriores e do aces-so às informações, bem como a análise dos dados, realizou-se a espacialização, ou seja, a elaboração de cartogramas que represen-taram a reorganização da agropecuária, ou seja, as transformações ocorridas na MRG de Ituiutaba na escala temporal selecionada. Nessa etapa, utilizou-se do programa Quantum Gis, sendo este um software livre. O movimento do programa livre é um meio de compartilhamento do conhecimento tecnológico que teve início na década de 1980, havendo diversos adeptos pelo mundo. Seus maio-res defensores são os hackers, um grande número de acadêmicos, cientistas, os mais diferentes combatentes pela causa da liberdade e, mais recentemente, as forças político-culturais que apoiam a dis-

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tribuição mais equitativa dos benefícios da chamada “Era da infor-mação” (SILVEIRA, 2004).

Anteriormente, a confecção dos mapas realizou a tabulação dos dados coletados. Para tal, foram necessários cálculos, os quais possibilitaram a confecção dos mapas coropléticos. Com tal finali-dade utilizou-se de Sturges e da Amplitude Total de Variação. Por fim, foi executado o cálculo referente aos Intervalos de Classes, que tem por objetivo estabelecer os ciclos que serão utilizados para ela-borar os cartogramas. Como resultado foi definido três intervalos de classes para a cultura da soja nas devidas escalas temporais.

Na quarta etapa efetuou-se um prognóstico da MRG em es-tudo, demonstrando a sua reorganização espacial mediada pela produção da soja. E, na última fase, como produto final dessa pro-posta, realizou-se, a análise e interpretação das informações de-monstrando através da espacialização os antigos e novos cenários produtivos presentes na MRG de Ituiutaba.

Desenvolvimento

A técnica estabelecida no campo pode ser compreendida atra-vés dos avanços científicos de uma determinada época e, por inter-médio desta, é possível modificar constantemente os métodos e/ou os meios de produção. Com a aplicação de novas técnicas é possível que ocorram rearranjos e/ou reorganizações espaciais no meio pro-dutivo, como por exemplo: efeitos nos empregos e salários, sobre a ampliação de oportunidades de investimentos, e o resultado das transformações atrasadas em relações capitalistas de produção (BE-ZZI, 1985).

Bezzi (1985, p. 95) salienta que a inserção da técnica no meio produtivo transforma as relações entre o capital, pois

A penetração de novas técnicas no processo produtivo interfere nas formas de organização da produção, modificando as relações entre o capital e o trabalho e subordinado o conjunto de recursos ao domínio do capital. Sabe-se que a adoção dessas técnicas não se dá de forma generalizada, o que quer dizer que as relações capitalistas de produção coexistem com as formas não-capitalistas, estando subordinadas ao capital.

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Dessa forma, percebe-se que o capital, cada vez mais, insere--se nos meios produtivos, ditando a forma com que ocorrem. A soja torna-se um exemplo do modelo capitalista e de sua inserção no meio agrário, pois nas últimas décadas o Brasil tornou-se um grande exportador da oleaginosa, causando uma reestruturação no território nacional como um todo.

Toma-se a produção da soja como exemplo da importância da inserção de técnica no meio agrário, uma vez que esta necessita de uma série de fatores favoráveis para a sua produção, envolvendo o clima, o solo, a temperatura e a utilização de tecnologias. Assim, a técnica é vital para que haja o plantio e a colheita da soja, pois foi através dela que se pode corrigir as dificuldades que estão presentes nas regiões de cultivo, como por exemplo, o centro-oeste brasileiro. Salienta-se que, o capital foi um dos grandes responsáveis por essa reorganização produtiva, pois se fazia necessário o plantio da soja para sua exportação e, consequentemente, exigia uma grande produção.

Cita-se como exemplo o município de Ituiutaba, que segundo Souto (2016, p. 65) sofreu alterações em seu perímetro urbano pro-veniente do desenvolvimento do meio rural.

A configuração urbana ituiutabana se desenvolveu mediante as dinâmicas produtivas agropecuárias, dentre as quais se des-tacaram a produção de arroz o cultivo do milho, algodão. Na década de 1980, tem início o cultivo da soja além da produção de cana de açúcar as quais são responsáveis por uma nova di-nâmica produtiva no município. [...] dentre as mudanças ocor-ridas, nota-se a construção de prédios horizontais que outrora serviam para o armazenamento e beneficiamento do arroz e que na atualidade são utilizadas para novas funções, como a instalação de academias de ginástica e templos religiosos.

Minas Gerais se configurou no território brasileiro como um grande produtor agropecuário, contribuindo de forma significa-tiva para a economia do país. Neste sentido, a MRG de Ituiutaba pode ser destacada para demonstrar a importância na produção agrícola do estado de Minas Gerais - MG. Para tal, selecionaram--se os dados referentes à cultura da soja. De acordo com o IBGE (2014), observou-se que a quantidade produzida de soja correspon-

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deu a 3.345.549 toneladas, no Estado de Minas Gerais, sendo a mesma fundamental para a economia local/regional.

A Microrregião Geográfica de Ituiutaba apresentou mudanças ao longo do período analisado, principalmente em relação aos cul-tivares da soja, pois tendem oscilar na sua produtividade, tendo como fatores responsáveis por essa dinâmica o mercado, a moder-nização da agricultura e as políticas públicas e privadas.

Destaca-se que a produção da soja na MRG de Ituiutaba possui investimentos tanto privados quanto por parte dos produtores, ou seja, há presença de famílias que migraram para os municípios, vin-das, principalmente, do noroeste do estado do Rio Grande do Sul, bem como empresas que arrendam as terras e produzem os grãos para, posteriormente, exportar. Cita-se, como exemplo, a Monsan-to, Algar Agro e a empresa local Campofert, que contribuem com seu capital privado para o aumento na produção da soja.

Os incentivos envoltos na produção de soja se fazem presen-tes desde o seu primeiro ano de plantio, pois foi através do apoio gerado pelo Estado que foi possível a inserção e produção de legu-minosa na Microrregião Geográfica de Ituiutaba, sendo que esta reorganização ocorre por incentivo deste cultivar até os dias atuais. Deve-se salientar também que para se compreender o atual cenário da produção da soja faz-se fundamental conhecer a amplitude da atividade na escala temporal de análise, que se refere aos anos de 1990, 1996, 2000, 2006 e 2014 (Gráfico 1).

Analisando o Gráfico 1, ressalta-se o crescimento gradativo da produção de soja ao longo dos cinco anos avaliados. Entre o período de 1990 e 1996 é possível observar um aumento de 14.575 toneladas. Já entre 1996 e 2000 ocorre um acréscimo de 132% na produção da soja. Apesar dessa expansão, nos anos de 2000 e 2006 ocorreu o au-mento na produção da soja em cerca de 829 toneladas. Entre 2006 e 2014 verifica-se um aumento de 82% na produção deste cultivar. Alguns pontos podem ser destacados, por exemplo, nas décadas de 1990 e 2000, quando verificou-se um aumento de 308%. Esse cresci-mento é reflexo dos incentivos fiscais que passaram a ser implemen-tados na microrregião, dos estímulos voltados para a mecanização no campo e da existência de um mercado promissor, o que, conse-quentemente, foi responsável por sua significativa expansão.

A produção de soja, no ano de 1996, fazia-se presente em todos

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os municípios da MRG de Ituiutaba. Entretanto, algumas unidades territoriais, como Capinópolis e Cachoeira Dourada, destacam-se na sua produção. As políticas de implementação de projetos para a mo-dernização do Cerrado contribuíram para a inserção deste cultivo na MRG em estudo e, principalmente, nesses municípios. Cita-se, como exemplo, o POLOCENTRO e o PRODECER, que são dois programas que tinham como objetivo ocupar e modernizar esse bio-ma. Enfatiza-se o caso do PRODECER, que ainda tinha como meta o desenvolvimento da produção da soja no Cerrado (Mapa 1).

A produção da soja nos municípios pertencentes à MRG em estu-do busca se consolidar, ou seja, verifica-se um aumento da produtivi-dade em algumas unidades territoriais. Isto ocorre porque o mercado voltado para a soja se consolidou na MRG. Após dez anos, em 2006, verifica-se que a soja permanece avançando nos municípios de Capi-nópolis e Ituiutaba, tornando ambos os principais produtores de soja na MRG de Ituiutaba (Mapa 2). Destaca-se, também, que esta MRG é uma grande produtora do estado de Minas Gerais. No ano de 2014 verificou-se que houve grande expansão produtiva da soja (Mapa 3).

Gráfico 1 Quantidade produzida (toneladas) de soja na Microrregião

Geográfica de Ituiutaba/MG

Fonte: Censos Agropecuários do IBGE de 1990, 1996, 2000 e 2006 e Pesquisa Agrícola Municipal IBGE/SIDRA para os dados de 2014.Org.: SILVEIRA, E. M. (2016).

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Mapa 1 Regionalização da produção da soja (toneladas) na Microrregião

Geográfica de Ituiutaba/MG, no ano de 1996

Fonte: Censo Agropecuário do IBGE de 1996.Org.: SILVEIRA, E. M. (2016).

No ano de 1996 apenas um município se destacava na produ-ção de soja, sendo ele Capinópolis. Entretanto, Cachoeira Doura-da também produz esta leguminosa em menor quantidade e os demais municípios tendem a se estabilizar na produção. Em 2006 verifica-se uma reorganização espacial produtiva, pois Capinópo-lis continua sendo o maior produtor, mas Ituiutaba passa a ser o segundo a produzir soja e as demais unidades territoriais tendem a se estabilizar. Salienta-se que há um aumento produtivo compa-rando os anos de 1996 e 2006. Assim, o ano de 2014 se equipara ao de 2006, em contrapartida a produção de soja (em toneladas) tende a aumentar.

Considerando a produção de soja em 1996 e em 2014 tem-se um aumento de 652%. Isto pode ser explicado pela demanda, ou seja, passou-se a produzir mais soja devido ao aumento no consumo

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e na exportação da leguminosa, principalmente para a China. Entre-tanto, o fator fundamental de seu crescimento é a mecanização e a tecnificação presente no campo. As tecnologias estão cada vez mais inseridas no meio rural e são responsáveis pelo maior rendimento nas colheitas atreladas às pesquisas genéticas que permitiram maior adaptação edáfica e, consequentemente, maior produção.

A soja deve ser considerada uma dinamizadora do espaço agropecuário da Microrregião Geográfica de Ituiutaba, pois o seu desenvolvimento agrícola se deu através desta leguminosa. Isto ocorreu por intermédio do auxílio de políticas públicas e privadas, que observaram o potencial da MRG em estudo para a inserção do cultivar, uma vez que a sua dinâmica proporcionou maior visibili-dade para o cenário agrícola nacional.

Mapa 2 Regionalização da produção da soja (toneladas) na Microrregião

Geográfica de Ituiutaba/MG, no ano de 2006

Fonte: IBGE/SIDRA – Pesquisa Agrícola Municipal de 2006.Org.: SILVEIRA, E. M. (2016).

Foram fundamentais, para a expansão da soja, as políticas do PO-LOCENTRO e PRODECER. Elas foram importantes instrumentos

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políticos, que auxiliaram no desenvolvimento dessa cultura nas unida-des territoriais da MRG analisada. Assim, estas políticas contribuíram, através de implementação de técnicas e de maquinários, para que fos-se possível o plantio deste grão. Outro fator dinamizador desta cultura foi a concretização do Brasil, como um exportador de soja.

No período de 1996 a 2006 ocorreram algumas alterações no cenário produtivo da soja na MRG de Ituiutaba. Embora tenha um aumento na produção, Ituiutaba ultrapassa Cachoeira Dourada no ano de 2006. Assim Ituiutaba se torna um dos principais produto-res da MRG supracitada. O município de Capinópolis continua a ser o grande produtor de soja da MRG em estudo. As demais uni-dades territoriais apresentam oscilações produtivas, mas não afe-tam o aumento produtivo da soja na microrregião como um todo.

Mapa 3 Regionalização da produção da soja (toneladas) na Microrregião

Geográfica de Ituiutaba/MG, no ano de 2014

Fonte: IBGE/SIDRA – Pesquisa Agrícola Municipal de 2014.Org.: SILVEIRA, E. M. (2016).

Justifica esta reorganização espacial, em consequência das di-nâmicas do mercado, ou seja, em Cachoeira Dourada, na década

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de 1990, tinha-se alojado uma unidade da empresa Monsanto, que visava a produção e plantio da soja no município. Entretanto, a partir de 2000 o empreendimento fechou. Nesse mesmo período, no ano de 1999, na unidade territorial de Capinópolis se instala a Campofert, um empreendimento que visa a estocagem e venda de grãos para a MRG de Ituiutaba. Paralelamente, novas iniciati-vas privadas se abrigaram em Capinópolis, como exemplo, a Algar Agro. Essas mudanças no cenário econômico da MRG de Ituiutaba proporcionam um aumento produtivo da soja nos municípios de Capinópolis e Ituiutaba (TRABALHO DE CAMPO, 2015).

Apesar da produção da soja se concentrar, principalmente, em dois municípios (Capinópolis e Ituiutaba), em 2014 as de-mais unidades territoriais também aumentaram a sua demanda, se compararmos os anos de 2006 e 2014. Esta realidade é con-sequência do mercado exportador da soja que está consolidado no Brasil, sendo o principal produto de exportação. Entretanto, apesar do aumento produtivo da MRG em estudo, o município de Gurinhatã deixou de produzir soja no ano de 2014. Isto ocor-re, pois, a unidade territorial está voltada para a produção da bovinocultura, sendo este um grande produtor pecuário, não tendo representatividade na agricultura.

Considerações Finais

A Microrregião Geográfica de Ituiutaba é composta por seis municípios com grande representatividade na produção agrícola estadual e nacional. Desse modo, a Microrregião em estudo tem sua economia voltada principalmente para o setor primário, mas também, se fazem presentes as indústrias e agroindústrias que con-tribuem para o seu desenvolvimento socioeconômico e para sua dinâmica local/regional.

A MRG de Ituiutaba é considerada dinâmica, pois apresenta um desenvolvimento econômico expressivo. Entretanto, salienta-se que esta passou por diversas mudanças ao longo de sua história, ou seja, o recorte espacial supracitado tem se reorganizado constante-mente, principalmente em seu meio agrário, em consequência das exigências impostas pelo capital.

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É importante ressaltar que a reorganização que ocorreu no es-paço agrário da MRG de Ituiutaba no período de 1990 a 2014 é proveniente de uma série de fatores, podendo-se destacar a moder-nização no campo, os incentivos por parte do Estado e de empresas privadas, as dinâmicas de mercado e o próprio desenvolvimento produtivo das unidades territoriais em análise.

Através das políticas públicas implantadas, foi possível o desen-volvimento do espaço brasileiro, bem como da MRG em análise. Estas proporcionaram a inserção de alguns cultivares na MRG de Ituiutaba, ou seja, programas como PRODECER, que incentivaram a ocupação do espaço agrário do Cerrado brasileiro contribuíram para uma reorganização espacial. Através desta política foi possível a implementação de técnicas e tecnologias no campo, proporcio-nando a produção de cultivares que não são endêmicos de uma localidade, destacando a soja.

A soja contribuiu para a reorganização espacial da MRG de Ituiu-taba, sendo uma das principais culturas que contribuíram para a di-namização e, por consequência, o desenvolvimento agrário do recorte espacial em estudo. Assim, a soja é uma das culturas de maior re-presentatividade na MRG de Ituiutaba na atualidade. Ela apresentou transformações no seu espaço produtivo ao longo dos anos de 1990 a 2014, principalmente pelo aumento da demanda de mercado. No re-corte temporal analisado a produção da soja se fez presente no ano de 1990 nos municípios de Cachoeira Dourada e Capinópolis. Em 2006, no município de Capinópolis e de Ituiutaba. Já em 2014 essa realidade permanece em todos os municípios da microrregião. Percebe-se, des-ta forma, que a soja reorganizou o a dinâmica produtiva da MRG de Ituiutaba bem como, as relações de trabalho.

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As peculiaridades da rizicultura na microrregião geográfica de Ituiutaba - 1970 a 2000

Matheus Eduardo Souza TeixeiraRoberto Barboza Castanho

Introdução

Sabe-se que o termo “espaço agrário” difere-se de “espaço agrícola”. É o que o autor Graziano da Silva discute em sua obra “O que é Questão Agrária” (2001). Assim, a questão agrária trata--se com indicadores relacionados à organização do trabalho e da produção, o nível de renda e emprego dos trabalhadores rurais, a produtividade das pessoas ocupadas no campo e entre outros fatores, além de estarem ligados às transformações nas relações de produção, seja como produz ou de que forma se produz. Já no que diz respeito às questões agrícolas, a mesma se relaciona com os aspectos da sua produção, ou seja, o que produz, o que se produz e o quanto se produz, neste sentido, fatores como as quantidades e o preço dos bens produzidos, são importantíssimos nesta discussão.

Quando se refere à expressão “questão agrária” na ciência Ge-ográfica, quer dizer a respeito da forma em que a sociedade vai se apropriar da utilização do principal bem da natureza, que no caso é a terra, e assim, como irá ocorrer à ocupação humana nesse território.

Stédile (1997) ainda discorre que a expressão “questão agrá-ria”, a princípio, foi um termo criado pelos estudiosos da Eco-nomia Política que começaram a analisar como se desenvolvia o capitalismo na agricultura, que, posteriormente, esses estudiosos foram taxado como “clássicos”, pois os mesmos realizaram estudos fundamentais sobre a forma de o capital se desenvolver nos dife-rentes modos de produção, em específico no capitalismo. Ainda assim o termo “questão agrária” é usado para auxiliar a explicar a evolução da luta política e a luta de classes para o domínio e o controle dos territórios e da posse da terra.

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Antes de se discutir toda a questão agrária ou até mesmo a me-tamorfose do Espaço e da temática da agropecuária, faz-se necessá-rio uma contextualização de como é tratada a questão agrícola no Brasil, para que assim possam estabelecer-se reflexões acerca desse assunto e compreender os objetivos desta investigação.

Compreender a dinâmica do espaço, seja ele agrário ou agrícola do Brasil, é ter uma visão holística de como se estabelece alguns fatores, sendo o social, econômico, político e, sobretudo, as relações da formação do território brasileiro, sendo aspectos fundamentais no processo histórico-econômico do Brasil. Ciente disso, ressalta--se que analisar essa distribuição é de extrema relevância para os diversos planejamentos, seja em um âmbito local ou regional ou até mesmo mais abrangente, englobando todo o território nacional.

O Brasil é um dos países de maior produção de produtos primá-rios, juntamente com China e Estados Unidos, sendo de origem vege-tal e animal que advém do meio agrícola. No caso do Brasil, variáveis como a extensão territorial, atreladas com outros fatores, sendo as condições climáticas, vegetação, relevo, são aspectos de fundamental importância no que se refere a um alicerce para uma boa produção de alimentos e matéria-prima neste determinado território.

Um dos motivos dessa produção explica-se com a evolução da agricultura, após a década de 1950, período conhecido como mo-dernização da agricultura. Mais adiante seria implantado o pro-grama “Revolução Verde”, advindo dos Estados Unidos e que se consolidou no Brasil na década de 1960. Assim, houve uma cres-cente no que se refere à agricultura, principalmente no agronegó-cio, caracterizado por extensas monoculturas. Com isso, facilitou--se muito a produção e a produtividade em todo o mundo e isso influenciou nas exportações.

Essa modernização da agricultura associada ao programa da Revolução Verde imposta neste período através de políticas públi-cas governamentais propiciou o uso extensivo de agrotóxicos, com a finalidade de controlar as pragas e aumentar a produtividade das monoculturas em geral.

Para Silva Junior (2008), a partir da década de 1960, com a Revolução Verde o Brasil conseguiu adquirir uma série de tecnolo-gias, fazendo com o mesmo se tornasse a nona economia mundial, mesmo tendo inúmeros problemas sociais. Ainda assim, a grande

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As peculiaridades da rizicultura na microrregião geográfica de Ituiutaba...

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riqueza do país se encontra nos campos agrícolas espalhados pela sua extensão territorial.

Diante do exposto, esta pesquisa teve o propósito de investigar a cultura do arroz na Microrregião Geográfica de Ituiutaba e suas trans-formações na quantidade de sua produção nos anos de 1970 até 2000.

Diante da temática exposta nesta investigação, onde se tra-ta da produção de arroz na MRG de Ituiutaba, faz-se necessário elucidar em qual espaço esta atividade primária está inserida e como se configuram as características do recorte espacial da re-gião analisada.

Nesta perspectiva, diante do objetivo de discutir-se sobre a produção de arroz, estabeleceram-se a Microrregião Geográfica (MRG) de Ituiutaba (MG) para se fazer tal análise, a mesma se localiza na parte noroeste do Triângulo Mineiro, no Estado de Minas Gerais e no território brasileiro. A MRG é formada por seis municípios, sendo eles: Ituiutaba, Santa Vitória, Gurinhatã, Capinópolis, Cachoeira Dourada e Ipiaçu, conforme observados no Mapa 01.

Mapa 01 Localização da Microrregião Geográfica de Ituiutaba

Fonte: IBGE (2010). Org.: Victor Matheus da Cruz de Carvalho (2017).

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É importante ressaltar que o estudo do espaço agrário é de grande relevância, pois desempenha um papel fundamental na questão da produção de alimentos para o Brasil e também na produção de produtos primários para a exportação. Nesse senti-do, fazem-se necessários estudos sobre o meio agrário no Brasil, o qual está entre os maiores produtores do mundo, ou seja, um importante colaborador de produtos advindos do meio agrário, contribuindo com a produção de alimentos, não somente em nível nacional, mas também mundial.

Dentro deste contexto justifica-se a presente pesquisa no intuito de estabelecer dados de informações relevantes entre a comunidade acadêmica e a sociedade como um todo. Sendo as-sim, estabelecer reflexões do espaço agrário da Microrregião Geográfica de Ituiutaba e também elucidar as políticas públicas governamentais que atuaram dentro dos recortes espacial e tem-poral estabelecidos.

Salienta-se que a área de estudo vem em um constante aprofun-damento no que tange aos aspectos de pesquisas acadêmicas, o que se instiga mais ainda novas discussões a respeito.

Caminhos da Pesquisa

Para execução do presente estudo os procedimentos metodo-lógicos foram divididos em algumas etapas fundamentais, visando o desenvolvimento pleno da pesquisa.

Inicialmente realizou-se um levantamento bibliográfico, em que foram observadas questões objetivas/subjetivas acerca da temática, bem como as variadas linhas de pensamento para a consolidação do entendimento do presente estudo. Destacam--se alguns temas, tais como: Questão Agrária, Modernização da Agricultura, Rizicultura, Microrregião Geográfica de Ituiutaba e Revolução Verde, dentre outros.

Na sequência, efetuou-se a coleta de dados censitários da cul-tura do arroz, sendo estes disponibilizados em dois segmentos, o primeiro no Censo Agrícola do IBGE e o segundo também no site do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), através do sistema de recuperação automática (SIDRA), correspondendo,

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ao todo, nos aos de 1970 a 2000. Ainda referente aos dados, sele-cionou-se o cultivo de arroz, sendo correspondente à Microrregião Geográfica de Ituiutaba.

Ressalta-se que para a execução deste trabalho utilizou da pro-dução de arroz em toneladas dos anos de 1970, 1980, 1990 e 2000, uma vez que, após as análises, verificou-se que esses resultados des-ses respectivos anos compreenderam a realidade do objetivo pro-posto pela pesquisa.

De posse destes dados realizou-se a sua tabulação, que consis-tiu na elaboração de gráficos, tabelas, fluxogramas etc., permitin-do maior e ampla visualização das informações obtidas.

O fluxograma foi realizado na ferramenta Word versão 2013 e as tabelas e o gráfico foram realizados na ferramenta Origin Pro versão 9. Ainda assim, para a realização do gráfico utilizou-se da linha de tendência com o valor de R2, ou seja, a partir dos dados de tendência, pode-se ter uma previsão em relação aos dados esta-tísticos apontados.

De acordo com Oliveira (2013, p. 165), o R2 pode ser explicado como:

R² ou coeficiente de determinação é uma medida de ajustamen-to de um modelo estatístico linear, ou seja, medida do suces-so da estimativa (tendência) dos valores observados. R² varia entre 0 e 1, indicando, em percentagem o quanto o modelo consegue explicar os valores observados. Quanto maior o R², mais explicativo é o modelo, melhor ele se ajustam à amostra.

Após a elaboração desses produtos realizou-se a análise dos mesmos, tendo como foco principal a validação da pesquisa, bem como a veracidade dos dados em relação à representação da realidade. Vale ressaltar que houve uma reambulação no re-corte espacial estabelecido, visando um melhor entendimento da área em estudo.

Neste sentido, realizou-se a redação final da pesquisa, que, após as observações apontadas, respondeu aos objetivos propostos, bem como à problemática que alicerçou a pesquisa.

Ainda assim, como forma de melhor elucidar os procedimen-tos metodológicos, segue abaixo um fluxograma para compreen-der melhor essas questões.

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Figura 01 Fluxograma do percurso metodológico

Org.: Matheus Eduardo Souza Teixeira (2017).

A rizicultura na MRG de Ituiutaba: do apogeu ao seu declínio

A rizicultura é o termo denominado à cultura do arroz, que é um dos alimentos mais consumidos no mundo. Entre os países que mais se destacam na produção do arroz, destacam-se os países asiáticos, entretanto, considera-se o Brasil um dos maiores produ-tores, uma vez que se encontra entre os dez países mais produtores desta cultivar.

A MRG de Ituiutaba até os anos de 1970 teve uma participa-ção bem significativa na produção do arroz em escala nacional, ou seja, até essa década, a produção mais relevante era o arroz. Nesta microrregião, destaca-se o município de Ituiutaba, que foi o muni-cípio com a maior participação na produção deste cereal, que foi taxado com a “capital do arroz”.

Diante disso, Oliveira (2003) destaca que as décadas de 1950 a 1970 o município de Ituiutaba passou por importantes transfor-

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mações socioeconômicas com o desenvolvimento da rizicultura. Houve uma reestruturação do espaço urbano para “acolher” a população que chegava, principalmente da Região Nordeste do país. Esse processo refletiu, sobretudo, na ampliação da rede de infraestrutura urbana como energia elétrica, serviços de água, bem como no crescimento do comércio e de outras atividades econômicas.

Ainda neste contexto, destaca-se o motivo pelo qual o municí-pio de Ituiutaba se configura como sendo a “capital do arroz”, o Portal Ituiutaba (2016, s/p) escreve,

Nos aspectos industriais, é importante destacar o título de “Capital de Arroz” que Ituiutaba recebeu a partir de déca-da de 1950. Tudo começou quando em 1915 foi instalada a primeira máquina de beneficiar arroz, de propriedade de Sr. José Temíscoles Petraglia juntamente com o seu sogro Antô-nio Severino. Em meados da década 1930, por iniciativa do Sr. Tonico Franco foram instaladas novas máquinas de arroz que ficava no quarteirão da rua vinte, entre as avenidas cinco e sete. Porém, foi somente em 1938 que foi instaurada a pri-meira indústria de Ituiutaba, o empreendimento do que viria a ser as Indústrias Reunidas Fazendeiras (“Baduy e Cia.”) que congregava: várias máquinas de beneficiar arroz e máquinas para a fabricação de manteiga de leite e óleo de caroço de al-godão. Em 1965, deu-se a maior safra já vista na região, sendo armazenada pela Casemg (Companhia de Armazéns e Silos do Estado de Minas Gerais), mais de um milhão e duzentos mil sacas de arroz em casca. Assim, no início da década de 1950, o município foi o maior produtor de arroz do estado de Minas Gerais, aonde chegou a contar mais de cem (100) máquinas de beneficiamento de arroz, recebendo o título de Capital Brasileira do Arroz.

Apesar do município de Ituiutaba se destacar na produção de arroz neste período, a MRG de Ituiutaba também possui uma par-ticipação representativa, uma vez que o arroz cultivado nos outros municípios também era beneficiado no município de Ituiutaba.

Destaca-se que algumas variáveis foram preponderantes para a expansão do cultivo de arroz na MRG de Ituiutaba, entre

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elas, cita-se: as propriedades do solo, os fatores climáticos da re-gião, a necessidade desta cultura para o abastecimento da MRG de Ituiutaba, bem como para a demanda de toda a região e até mesmo do país.

Nota-se que na MRG de Ituiutaba ocorreu uma redução na produção de arroz após a década de 1970. Na busca de elucidar esses fatos, utilizou-se do IBGE - Sistema de Recuperação Automática - doravante SIDRA, dados que mostram a redução na produção de arroz, o que possibilitou a observação do crescimento de outras produções, sendo milho, soja, e nas duas últimas décadas, da cana-de-açúcar.

Neste sentido, segue abaixo o Gráfico 01, que mostra a produ-ção de arroz dos anos de 1970, 1980, 1990 e 2000 dos municípios da MRG de Ituiutaba.

Gráfico 01 Produção de Arroz da MRG de Ituiutaba nos anos de 1970,

1980, 1990 e 2000

Fonte: IBGE – Censo Agrícola (1970 – 1980) e SIDRA (1990 – 2010).Org.: Matheus Eduardo Souza Teixeira (2017).

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O Gráfico 01 evidencia a queda na produção de arroz a partir dos anos de 1970, onde a queda é gradativamente no ano de 1980 e, a partir disso, já se mostra uma queda brusca nos anos de 1990 e 2000 e, a partir disso, ela será praticamente nula na MRG de Ituiutaba.

Salienta-se que mesmo no auge da produção de arroz, os municípios que mais sobressaem nesse quesito são Ituiutaba, Gurinhatã e Santa Vitória, seguidos de Ipiaçu e Cachoeira Dou-rada, esses dois últimos com participações mais discretas na produção de arroz.

Ainda no que diz respeito às análises no Gráfico 01, o mesmo evidencia que a tendência se mostra de queda para a produção de arroz, com isso, a queda não variou, sendo mostrada que, com o passar dos anos, mais se obteve a queda na produção de arroz e que isso provavelmente continuará nos próximos anos adiante.

Desta forma, a produção de arroz na MRG de Ituiutaba teve suas variações ao longo dos anos, de acordo com a atuação do mercado e outros fatores, sendo esses atrelados à necessidade e à inserção de novos tipos de produções agroindustriais, políticas de desenvolvimento desta área e também por meio da busca de melhores rendimentos econômicos pelos grandes produtores ru-rais. Houve a entrada de outras culturas, reduzindo a área plantada de arroz em hectares (ha) nos municípios pertencentes à MRG de Ituiutaba (CASTANHO e SOUTO, 2014).

O declínio da rizicultura na MRG de Ituiutaba está atrelado à expansão da produção de outras culturas, principalmente da soja, que veio junto com a modernização da agricultura nas áreas de Cerrado, com os incentivos à expansão agrícola, principalmente na monocultura da soja. Contudo, destaca-se que a facilidade ban-cária, os incentivos fiscais, aliados ao mercado, foram fatores de grande relevância para a expansão de outros cultivos.

O crescimento de outras atividades do setor primário na MRG de Ituiutaba se norteou na valorização dada pelo mercado, na im-plantação de instituições de pesquisa. E para absorver melhor este mercado em rotação, além das propriedades rurais terem que se adaptar às novas exigências, e aos novos modelos de produções, os setores prestadores de serviços também tiveram que evoluir (SOU-TO, 2013).

Neste sentido, Oliveira (2003, p. 96) destaca

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Após a década se 1970/80, os municípios da Microrregião de Ituiutaba passaram a investir numa economia voltada ao setor leiteiro e de carnes; serviços foram adaptados em função desse novo rural; técnicos e instituições de pesquisa ganharam rele-vância, tais como Embrapa, Emater, Universidade do estado de Minas Gerais-UEMG, entre outros.

Diante do exposto, vários incentivos fiscais foram8 disponíveis, juntamente com as políticas públicas voltadas para a expansão de outros cultivos, como o POLOCENTRO, PRODECER, PROÁLCO-OL, entre outros, que favoreceram ainda mais para que outros cul-tivos evoluíssem e contribuindo, principalmente, para o declínio da rizicultura.

Após a década de 1970, diante de todas as variáveis aponta-das, houve uma dinamização da produção agrícola no cenário nacional, fazendo com que as produções tradicionais, como a produção de arroz na MRG de Ituiutaba, que não se adaptou a este momento da inserção de tecnologia no campo, reduzisse ex-pressivamente na sua área plantada, bem como na sua produção (OLIVEIRA, 2003).

Ainda com base nas discussões a respeito do declínio da rizi-cultura na MRG de Ituiutaba, Castanho e Souto (2014, p. 8) dis-correm,

Considera-se que as políticas adotadas pelo governo e a facili-dade de crédito para determinados tipos de produções, como a soja e a cana-de-açúcar na área estudada, sendo essas culturas permeadas pelas necessidades do mercado interno e externo, além dos fatores naturais fizeram com que a cultura do arroz na sua MRG diminuísse. Os produtores deste cereal não con-seguiram adaptar-se às novas necessidades de desenvolvimento de técnicas para melhor rendimento, sendo assim, diminuíram a produção dele e alguns até deixaram de cultivá-lo, mesmo sendo este um dos principais alimentos presentes na mesa da população brasileira.

Portanto, com toda a criação de políticas públicas de moder-nização do território, principalmente as direcionadas para o do-mínio Cerrado, priorizou-se o setor primário voltados para ex-

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portação, exigindo, assim, um maior potencial tecnológico. Com isso, essa gama tecnológica norteando as culturas, com o manejo, atrelado ao melhoramento genético e outras possibilidades, são fatores que melhoram a alta da produção, bem como na qualida-de do produto final.

Considerações Finais

A Microrregião Geográfica de Ituiutaba teve um importante papel na produção de arroz até o ano de 1970, principalmente o município de Ituiutaba, que foi taxado até de “capital do arroz” neste período. Não só na produção desse primário, mas também no que tange aos aspectos de emprego, PIB, urbanização, entre outros.

Destaca-se que a rizicultura perdeu esse espaço para outros cultivos que aderiram à modernização da agricultura, ou seja, a cultura do arroz não se adaptou ao processo dessa modernização, e com isso, decresceram os números em produção e até mesmo na sua área plantada. Mesmo após essa modernização da agricul-tura, outra política pública se estabeleceu e influenciou a MRG de Ituiutaba, que foi a expansão da agricultura nas áreas de Cerrado, neste caso, em específico, foi o PRODECER I, que se estabeleceu em 1980 no oeste de Minas Gerais, e assim, influenciado o recorte espacial estabelecido na pesquisa.

Com isso, o PRODECER I foi um fator que impulsionou o culti-vo de grãos nessas áreas, principalmente a sojicultura, que cresceu muito em área plantada e produção nessa região correspondente à MRG de Ituiutaba. Não só a política pública do PRODECER I que influenciou essa área, outra política pública governamental que pos-sibilitou a diminuição da produção de arroz foi o PROÁLCOOL, criado em 1975 pelo governo brasileiro, como contrapartida da crise do petróleo em 1973, que incentivou a produção de cana-de--açúcar em todo o território nacional, principalmente na produção de etanol.

Assim, todo o espaço que antes era destinado à rizicultura foi substituído pelos grãos (soja e milho), cana-de-açúcar e mais tarde surge também a pecuária de corte e de leite nesta região, essas úl-

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timas com influências de agroindústrias que se inseriram nesta mi-crorregião.

Portanto, o espaço Agrário da MRG de Ituiutaba foi metamor-foseado no que diz respeito aos cultivos produzidos no mesmo, sendo assim, ocasionados pelas políticas públicas governamentais, pelo mercado e também pelas agroindústrias que se instalaram nestes locais, culminando, assim, com a queda da produção do ar-roz no recorte espacial estudado.

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Ciganos assentados em áreas de reforma agrária no

Triângulo MineiroFranco Andrei Borges

Introducão

A luta pela terra seja em qualquer frente estabelecida pelos diversos segmentos de movimentos socioterritoriais atuantes, se distingue pela ação e estratégicas dentro do cenário agrário brasi-leiro. Alguns destes movimentos são dissidentes de outros maiores, de siglas e ou bandeiras diferentes, de ideologias ou partidarismos e ações distintas e com um único objetivo, servem para que novos elementos humanos ou mesmo aqueles destituídos de suas terras, possam buscar frente a estas bandeiras, siglas e cores um apoio e um propósito para suas vidas que é o acesso à terra, sejam estes no-vos candidatos ou aqueles que outrora já tiveram a posse da terra.

Há uma diversidade muito grande de elementos humanos, gênero, cor, etnias no Brasil, que por ser um país de dimensões continentais, já era esperada nestes movimentos socioterritoriais, que ganharam notoriedade pela organização e ações frentes ao mo-nopólio agrário e estrutural do Brasil.

Esta grande miscigenação de novos sujeitos em processos socioterritoriais é o que trabalhamos neste capítulo, um campo múltiplo de elementos humanos e de uma diversidade política e ideológica muito grande, que se faz presente em assentamentos e acampamentos que ainda insistem na proposta, diante de um país que ignora ao clamor social.

No contexto de uma pesquisa trabalhada por Borges (2015) e Chelotti (2015), foram encontrados na linha de frente destes movi-mentos, 60 famílias de assentados ciganos junto a um universo de 220 assentadas, que deram início em abril de 2005, com o processo de acampamentos e êxito de efetivação do assentamento no ano de 2010.

Os ciganos, novos figurantes e futuros pretensos camponeses

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deixam seu modo de vida — que pensávamos serem nômades, com territórios móveis, indo e vindo de seus deslocamentos sazonais — para uma lógica político social de inclusão de se fixarem em um ponto, para começar a trabalhar a terra, agregar a sua condição um modo de vida que seja inerente a valores que são, a princípio, distintos de sua cultura, mas, que se mostram presente em relapsos de suas vidas e história, através da representatividade de trabalhos destes sujeitos na atividade agrícola sazonal dos pontos em que sempre armaram acampamento nas regiões do Triângulo Mineiro, Alto Paranaíba em Minas Gerais e Sul de Goiás.

Juntamente com os ciganos, seus companheiros de luta polí-tica e social, são posseiros — camponeses expropriados do campo por conduta governamental, principalmente de ordem econômica e política oriundos dos mais recônditos lugares, dos mais diversos credos e uma grande diversidade de gênero que foram de alguma forma tirados de seus meios de produção e de sobrevivência, como o que ocorreu com a expansão das monoculturas promovida pela Revolução Verde no cenário do Cerrado brasileiro, fenômeno que levou tais sujeitos em direção aos centros urbanos para lá viverem na condição de moradores das periferias. Tornando-se, muitas vezes, profissionais desqualificados, muitos posteriormente retornaram ao campo para não mais para trabalharem como campesinos, e sim como trabalhadores volantes no mesmo sistema que os expropriou de serem atores nesta expansão da fronteira agrícola do cerrado.

Temos um movimento constante que integra essa massa de su-jeitos em meio às lutas por acesso à terra e inclusão socioterrito-rial, buscando no campo como um novo modo de vida através da aquisição dos lotes da reforma agrária junto a idealizações coletivas de acesso à terra. A região do Triângulo Mineiro também é foco de tensão na luta pela terra, principalmente em função da atuação de diversos movimentos sociais. De acordo com dados do DATA-LUTA, entre os anos de 1990 e 2011 a região do Triângulo Mineiro foi palco de 224 ocupações de movimentos de luta pela terra, des-tacando-se o município de Uberlândia, com 53 dessas ocupações. Logo em seguida está o município de Prata, com 18 ocupações, das quais cinco ocorreram somente entre os anos de 2009 e 2011. A luta pela terra na região foi fator determinante para a movimenta-ção e a efetivação dos vários assentamentos, com a conquista de lo-

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tes por muitas famílias. Outras tantas, entretanto, ainda margeiam as rodovias, acampadas, ignoradas pelos que passam e ludibriadas por aqueles que apenas levam promessas.

Nesse contexto, tínhamos, de uma parte, os ciganos, novos su-jeitos imersos na luta por terra e objeto de estudo do presente tra-balho. Com a lógica de organização inerente a seu meio e a sua co-letividade, seus fortes laços familiares e sua oralidade, conseguiram bons lotes por meio de afinidade ou parentesco ou até mesmo por pressão política de massa, onde, por meio da sua organização, ação política e força, fizeram frente à distribuição dos lotes, para aqueles que quiseram ser vizinhos ou que tinham laços familiares para fica-ram próximos entre si, gerando uma vizinhança geograficamente fronteiriça entre amigos e/ou parentes, em amarelo na Figura 01, observa-se nas áreas de chapada os lotes dos ciganos remanescentes.

Figura 1 Mapa de localização dos lotes de assentados

ciganos remanescentes em 2015

Fonte: SUPRAM - UBERLÃNDIA 2014 - Organização: Borges, Franco Andrei (2017).

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De outro lado, figuravam no meio social que pesquisamos os camponeses, com seus sonhos, ideais de luta, organização social e sindical. Arraigados em um processo de construção e manutenção de uma vida familiar camponesa, caracterizam-se, conforme a leitura aqui adotada, como não ciganos, que, excluí-dos de um processo organizado, ficaram com os lotes menos do-tados de estrutura básica, que foram lotes em terras ditas como fracas e processos já efetivos de voçoroca, áreas muito íngreme, entre outras. Diante destas e outras situações de privilégios sur-giram, consequentemente, algumas tensões também derivadas de disputas de poder entre os grupos em questão, justamente por serem os ciganos mais organizados e unidos em ideais, isso durante o acampamento e o assentamento.

Por outro lado, após o assentamento, a maioria dos não ciga-nos começou a investir em uma idéia de unidade individualizada de produção, o que batia de frente com a organização dos ciganos e seus propósitos.

O desenvolvimento do trabalho se dá mediante o objetivo ge-ral de compreender e descrever algumas características dos sujei-tos ciganos. A principal delas tem como traço de identidade um constante processo de territorializar, desterritorializar e reterrito-rializar (T-D-R) que engajam-se em movimentos de luta por terra e reterritorializam-se no campo para fazerem parte de um univer-so novo e sendo eles os novos sujeitos, abandonando ou tentando abandonar a cultura que lhes é inerente, que é o ir e o vir de sazo-nalidades temporais que conduzem as suas vidas.

Como método para a realização deste trabalho, analisaram--se dados coletados em campo durante as viagens entre Uber-lândia e o assentamento P.A. Paulo Faria, bem como em uma viagem ao município de Prata, com o objetivo de contatar líde-res dos movimentos socioterritoriais que tinham ali a sua base. Foram realizadas doze entrevistas com ciganos e não ciganos para a coleta de dados sobre sua inserção na estrutura fundiária agrária por meio dos movimentos socioterritoriais. Buscaram-se informações sobre suas histórias de vida, os conflitos envolvidos na luta (internos ou externos ao assentamento) e o porquê de sua inserção junto aos movimentos.

As gravações das entrevistas foram feitas após as devidas auto-

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rizações, que se estendiam a fotografias de posses, tendas, utensí-lios domésticos e de trabalho laboral dos mesmos, juntamente com símbolos e imagens, mas neste trabalho não divulgamos suas ima-gens. O estudo tem caráter metodológico qualitativo devido aos dados já catalogados por meio de questionários aplicados. Nestes, a possibilidade de o entrevistado falar do tema se torna mais abran-gente, sem perder o foco. De acordo com Gil (1999), “a entrevista é uma forma de investigação social em que há um diálogo assimé-trico entre dois elementos se encontram” – um deles fornecendo dados, o outro apresentando indagações relevantes à investigação que a seus olhos se mostra interessante à pesquisa.

Com estes dados destas perguntas pode-se construir um mapa social da vida desses sujeitos. Tomam-se por base fragmentos de sua história de vida, ou toda ela, e faz-se uma cronologia de suas andanças e construções sociais ao longo de suas desterritorializações e reterrito-rializações, um mapa dos seus deslocamentos e dos vários municípios pelos quais transitam ou transitavam, seus hábtitos e condutas.

A observação dos ciganos no trabalho de campo fornece da-dos de seu cotidiano e seus afazeres. Na prosa que antecede o al-moço, discute-se quem tem gado de leite, ou seja, vacas leiteiras para vender, se é ou não bom fazer negócios, se o melhor está disponível, se alguém está “apertado” e a possibilidade de se obter um preço menor de compra e de renda futura com o negócio a ser realizados, fala-se sobre a origem e os preços comercializados na região etc., um pouco mais confiantes nos relata sobre as divisões hierárquicas e social do trabalho das tarefas que são realizadas no âmbito de vida da família cigana. As mulheres cuidam dos afazeres domésticos, do preparo dos alimentos, da venda de alguns serviços para vizinhos próximos. Um exemplo é a mão de obra domésti-ca, paga em dinheiro, itens alimentares ou de limpeza, tais como sabão, um frango ou um litro de banha de porco (que ainda é uti-lizada por muitos no meio rural, substituindo o tradicional óleo de soja no preparo de alimentos). Os homens ficam com a parte bruta do trabalho: montar e desmontar o acampamento, cuidar das tropas de animais, sair para realizar contatos para a venda de animais, a vizinhos do fazendeiro ou até ao dono da fazenda onde estiverem acampados. Também são responsáveis por consertos em selas e arreios, bem como artesanato em couro etc.

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Procuramos relatar tudo de forma que o pesquisador já não seja percebido como um estranho, como alguém que já seja convidado a juntar-se a eles e participar de uma conversa onde lembranças são contadas através da oralidade por todos do gru-po, no meio cigano confiança e respeito são os valores base de seu povo.

Assim, neste contexto, é analisando a leitura de Malinowski (1976) que exemplifica seu trabalho em sua pesquisa onde insere--se no contexto de vida de povos da Nova Guiné e das ilhas Tro-biand, passando-se por observador, sem influenciar os atos do gru-po. Contudo, em uma realidade distinta, usamos o mesmo proces-so para com os ciganos na coleta de parte dos dados, de forma a observá-los sem interferir na lida de suas tarefas, coletando dados em conversas, nos afazeres domésticos, de lida com o gado de lei-te, pretensos negócios e segurança para a família. Olhando assim parecem e se comportam com muitos de nós que tivemos vidas no meio rural, mas o vestir, o falar, os trejeitos denunciam e o tempo e as sazonalidades também.

Temos, ainda, a abordagem que remete à pesquisa bibliográ-fica. As obras de determinados autores foram fundamentais para subsidiar nossas análises a respeito do tema de pesquisa, a exemplo de Haesbaert (1997, 2002, 2004, 2005, 2007), Hall (2007), Raffes-tin (1993), Fernandes (2005) e Canclini (1997), entre outros.

A pesquisa sintetiza a forma como diversos sujeitos, em suas diversas concepções e formações político-culturais, se mesclam em um único lugar: neste caso, o campo. Palco de disputa entre grandes empreendimentos e pessoas que tentam voltar a ele por processos de reterritorialização, juntamente com novos sujeitos, esse espaço deixa de ser exclusividade apenas de quem um dia já teve laços no local.

A estrutura do texto se faz em duas partes. Na primeira, apre-sentamos o assentamento e nosso locus de pesquisa, o quantita-tivo de sujeitos territorializados. Na segunda, apresentamos os ciganos em seu contexto que imaginávamos nômades, definido pelo constante acampar e levantar acampamento, alguns relatos de suas histórias, que mostram sua presença pretérita no campo agrícola produtivo da região e sua inserção na luta pela terra por intermédio dos movimentos socioterritoriais.

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Estudando os Ciganos

O local de estudo desta pesquisa é o assentamento Paulo Faria (P.A.), com área de 5.854,72 hectares, que é formado pelas proprie-dades: Oncinha, Retiro do Lobo, Taquara, Santa Bárbara e Apra-zível, ali 220 famílias de camponeses ciganos e não ciganos estão assentadas nos lotes. Especificamente neste projeto há a divisão de dois municípios que são divididos pelo Rio do Peixe, fronteira natural entre os municípios de Prata e Campo Florido (Figura 01).

Figura 2 Localização do Assentamento Paulo Faria

Divisa dos Municípios de Prata e Campo Florido - MG – Fonte: Supram; Uberlândia, 2014. Organização: Borges, Franco Andrei (2017).

O lugar que apresentado é um rural novo pelos novos elemen-tos humanos que se mostraram como pretensos camponeses devi-

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dos às suas peculiaridades culturais e velho, ao mesmo tempo, por ser o mesmo palco de lutas por terra, que talvez não tenha sido até o momento deste estudo percebido como um rural multicultural no que concerne à composição social dos sujeitos reterritorializa-dos neste assentamento. Isto se mostra de forma evidente pela pre-sença destes dois grupos específicos: o grupo dos ciganos, compos-to por sessenta das duzentos e vinte famílias assentadas, e o grupo dos camponeses não ciganos, composto pelas demais famílias.

Apesar dos quase nove anos de assentamento, vários dos assen-tados sequer têm uma residência para morar e a grande maioria vive sob barracos de lona preta ou sacarias de sementes, visão co-mum da residência temporária que se torna definitiva de muitos assentados. Assim, as dimensões materiais consistem principal-mente em infraestrutura que, geralmente, é precária, em maiores proporções nos primeiros anos de assentados. Isso constitui um fator de desmotivação para aqueles que querem se tornar campo-neses. Além disso, as disputas internas pelas migalhas de poder e controle dos poucos insumos que estão à disposição, como trator e outras ferramentas geram uma instabilidade nas relações entre os assentados ciganos e não ciganos.

A Figura 3, por exemplo, mostra uma tenda cigana – não totalmente montada, mas com alguns itens que fazem entender que não se trata de uma barraca de um assentado comum e sim de uma senhora cigana. É notável a forma de construção da tenda, as diversas panelas, chaleiras e bules de alumínio que brilham intensamente de tão areados e limpos que estão, como se observa nesta imagem em seu canto superior direito, e isso é o que é comum em tendas e acampamentos ciganos, há esteios a espera de mais cobertura provavelmente lona de cores varia-das, a forma de construir difere das barracas de lona dos não ciganos, percebe uma antena parabólica e uma TV apenas como objeto decorativo, haja vista que não existe energia elétrica nes-te lote, logo na entrada um fogão feito com restos de tijolões que atendem as necessidades, ao fundo um varal improvisado com roupas lavadas a secar ao sol, mostra que mesmo diante das difi-culdades enfrentadas é preciso manter se uma casa\tenda limpa e confortável diante de suas necessidades.

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Figura 3 Tenda cigana no Assentamento “Paulo Faria”

Fonte: Coleta de dados da pesquisa (2014).

2.1 Os ciganos fixam território no assentamento

Em seus lotes, os ciganos passam a estabelecer um perímetro de domínio, uma área em outra maior, seus lotes mesmo que cer-cados mas fronteiriços entre parentes, amigos, formam um grande território cigano dentro do assentamento. Essa área se caracteri-za como um território específico, visto e respeitado pelos demais assentados circunscrito por fronteiras físicas e simbólicas, dentro da lógica de um espaço peculiar de domínio que propaga pelos fronteiriços aos assentamentos, sendo reconhecidos como “o assen-tamento dos ciganos”.

Na leitura de Haesbaert (2005), o território nasce com uma du-pla conotação material e simbólica, etimologicamente, aparece pró-ximo tanto de terra (territorium) quanto de térreo (territor ou ter-ror, aterrorizar), ou seja, tem a ver com dominação (jurídico-política) da terra e com a inspiração do terror e do medo – especialmente para aqueles que, com essa dominação, ficam alijados da terra, ou no territorium são impedidos de entrar. Diante disso, analisando

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nosso estudo, fica evidente um terror ou um medo que já existe dos ciganos, quantos aos seus lotes, há, para muitos não ciganos, um im-pedimento, mesmo que subjetivo ou imaginário, de adentrar os seus território (lotes) sem a devida permissão ou convite.

Ao mesmo tempo, por extensão, para aqueles que usufruem deste espaço, o território inspira a identificação (positiva) e a efe-tiva “apropriação”. Assim, em qualquer acepção, “território” está relacionado a poder, mas não apenas ao tradicional, e sim ao po-lítico. Segundo o mesmo autor, este poder de ter o lote e/ou o território caracteriza aqueles que o conseguiram como vitoriosos e exemplos, designando-os como líderes, influentes diante dos de-mais, destinando a eles um poder de ser referência, o que inspira o empoderado a tomar a frente de assuntos de interesse do grupo.

A multiplicidade do território, para Haesbaert (2005), está in-serida em relações de dominação e/ou apropriação sociedade-es-paço. A territorialização deve ser trabalhada na multiplicidade de suas manifestações – que é também, e, sobretudo, a multiplicidade de poderes incorporados pelos múltiplos agentes/sujeitos envolvi-dos, como é o caso do P.A. Paulo Faria.

O assentamento agrega espaços, alguns, como posse de ciga-nos que fixaram moradia nessa localidade específica, trazendo sua própria identidade cultural, seus modos de vida e seus recorrentes significados no intuito de garantir a sobrevivência. Por isso, segun-do Haesbaert (2005), devemos primeiro distinguir os territórios de acordo com os sujeitos que os constroem, quer sejam indivíduos, grupos sociais, o Estado, empresas ou instituições, e ali existe esta distinção estabelecida como o território dos ciganos.

Dessa forma, a territorialidade, como um componente do po-der, não é apenas um meio para se criar e manter a ordem, mas uma estratégia para que o ser humano se estabeleça e permaneça no contexto geográfico onde experiência o mundo dotado de signi-ficados (HAESBAERT, 2005). Assim, todo território é, ao mesmo tempo e obrigatoriamente, em diferentes combinações, funcional e simbólico, pois os sujeitos exercem domínio sobre o espaço, tanto para realizar trabalhos quanto para produzir significados relacio-nados que justificam o uso da terra.

O território é funcional, a começar pela condição de fonte es-trutural, seja de proteção ou abrigo, seja de recursos naturais. Os

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ciganos constroem e moldam sua territorialidade naquilo que lhes é inerente – a peculiaridade de seus costumes, suas tradições –, a exemplo da criação e do comércio de cavalos, muares e, agora, da criação de gado leiteiro no assentamento.

O processo de sedentarismo, vale dizer, facilita esta última ati-vidade; no entanto, ela não se aplica a todos os membros ciganos, mas apenas a alguns que, com recursos próprios, começaram a investir na terra.

Em relação aos cavalos e muares, o deslocamento desses ani-mais não era problema anteriormente, pois era mais fácil lidar com a sazonalidade das andanças em função dos deslocamentos atra-vés de seus pontos de paradas, necessários para o reabastecimento de gêneros essenciais ao dia a dia da família como para suprir as necessidades da tropa que se mostrava fácil encontrar trato para os animais nos pastos, que geralmente crescem desordenadamente em beiras de rodovias ou lotes vagos nas periferias das cidades, os quais lhes serviam de destino para alimento dos animais.

Na concepção de Haesbaert (2004), mais do que a desterrito-rialização desenraizadora, manifesta-se um processo de reterrito-rialização espacialmente descontínuo e extremamente complexo. Esses processos de (multi)territorialização precisam ser compreen-didos especialmente pelo potencial de perspectivas políticas inova-doras que implicam.

Nesse sentido, há de se compreender que buscar o entendi-mento de que os assentamentos são exemplos de processos de T-D--R (Territorialização-Desterritorialização-Reterritorialização) que, na reforma do campo, envolvem dimensões materiais e imateriais da organização e do planejamento do espaço rural. Na lógica dos ciganos, esse processo de fixar-se em um assentamento pode se estabelecer como o fim do seu território-rede, no qual esse ir e vir era anteriormente um processo contínuo e cíclico. Haesbaert (2004, p. 279-280) esclarece:

talvez seja esta a grande novidade da nossa experiência espaço--temporal dita pós-moderna, onde controlar o espaço indispen-sável à nossa reprodução social não significa (apenas) controlar áreas e definir “fronteiras”, mas, sobretudo viver em redes, onde nossas próprias identificações e referências espaço-simbólicas

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são feitas não apenas no enraizamento e na (sempre relativa) es-tabilidade, mas na própria mobilidade – uma parcela expressiva da humanidade identifica-se no e com o espaço em movimento, podemos dizer. Assim, territorializar-se significa também, hoje, construir e ou controlar fluxos/redes e criar referências simbóli-cas num espaço em movimento, no e pelo movimento.

Sobre os ciganos e estes territórios-rede e esta mobilidade ter-ritorial intrínseca a eles, foram estabelecidos nos grupos dos ciga-nos, por meio de processos familiares e coletivos de socialização com outros grupos não ciganos que os acolheram em suas andan-ças. Esta tradição foi repassada aos novos andantes desses territó-rios, ou seja, aos descendentes ciganos, estabelecendo-se, assim, uma memória coletiva dos territórios-rede por meio da oralidade, que ficou fixado como uma marca e um símbolo para o grupo, como um planejamento de paradas pré-programadas em locais que eles eram aceitos.

Com relação aos ciganos rurais, quando havia um estreito laço de amizade com o fazendeiro, os ciganos permaneciam por um perí-odo maior na fazenda e, em períodos cíclicos de colheita, os homens trabalhavam na colheita de produtos como feijão, algodão, arroz e sementes de capim para a formação de pastos para o gado leiteiro e de corte. Um relato de um entrevistado do grupo cigano, cujo nome será preservado (chamado aqui de “senhor W”), nos narra um pou-co de como era ser cigano, trabalhar na roça e sofrer estigmas:

se tivesse serviço nois fazia, aqui mesmo nesta região, já traba-lhei tirando semente, é como se falou, tinha preconceito sim, nós entramos dentro do caminhão lá em Comendador Gomes, quando entramos no caminhão eles achou que nós não sabia cortar arroz, éramos violento (bons de serviço) enquanto eles pe-gava uma rua só, nos pegávamos duas, hora que eles chegavam no meio da linha, já estávamos saindo na de lá, batemos arroz normal, saca de arroz de 60 quilo éramos 2 enquanto eles eram 3, depois havia leilão para levar nós para colher arroz, enquanto chegava um que pagava dez reais outro oferecia doze para levar nós para trabalhar, ficamos uns três meses assim. Aqui em Co-mendador Gomes e Algodão lá em Carneirinho. (“W”, Relato de assentado cigano sem alteração ou correção ortográfica, 2014).

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Para muitos cidadãos não ciganos, o fato de um cigano decla-rar que já trabalhou ou trabalha convencionalmente pode gerar es-panto, devido às muitas concepções trazidas ou absorvidas, que se mesclam a dúvidas e preconceito. Isto mostra que, ao contrário de muitas inquietações a seu respeito, os ciganos são pessoas normais que, por uma condição peculiar e cultural, se diferenciam e se in-serem de forma laboral no processo produtivo da sociedade que os julga. Mostrando através do trabalho braçal no campo como me-eiros de outros produtores no plantio de arroz ou feijão que eram mais comuns, na fala de muitos de produtores que conversamos, os ciganos, que comumente acampavam nas cercanias das fazendas, eram esperados com certa saudade por muitos de seus territórios móveis, para o trabalho de colheita destes gêneros alimentícios, devido a sua força braçal e por serem “bons de serviço”.

2.2 - A rede de territórios Ciganos

Estávamos convictos de que antes da realização deste trabalho, que os ciganos viviam errantes e sem destino em pequenas cidades e fazendas do Triângulo Mineiro e sul do Estado de Goiás, sendo um erro pensar desta maneira. O presente estudo mostra que há um vínculo estreito entre eles e a terra – seja pelo comércio de cavalos, que prevalece até os dias atuais, seja pelo contato com a produção de gêneros alimentícios (como arroz, feijão, laranja, aba-caxi e outras frutas regionais), que têm lavouras e colheitas sazo-nais nestas regiões em função das quais fazem e/ou faziam os seus deslocamentos programados.

De encontro com os ciclos de colheitas, preestabelecia-se um cronograma e um projeto mental de viagens, os deslocamentos eram feitos sempre pelo mesmo caminho e o acampamento era quase sempre montado onde já tinha havido acolhimento por par-te dos fazendeiros e ou parentes dos mesmos.

Estabelecia-se, assim, um fluxo de rede entre alguns pontos de destino que, muitas vezes, atravessavam as fronteiras físicas — no caso do assentamento P.A., entre Goiás e Minas Gerais. Nesse roteiro, os ciganos acabavam ficando apenas o tempo necessário, sempre em contato com outras caravanas e grupos de ciganos, de forma a ter uma melhor opção de destino. Assim, estabeleciam

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territórios móveis e temporários a ser utilizados de acordo com a sua conveniência.

Haesbaert (2004) frisa a lógica territorial cigana e seus fluxos de rede, reconhecendo quatro perspectivas que abrangem o proces-so de territorialização: (a) as concepções materialistas, nas quais o território é entendido como um objeto material e, mesmo que sua determinação seja concebida por relações, é visto como um produto definido, consolidado; (b) as concepções idealistas, que veem o ter-ritório a partir da ação de sujeitos e comunidades; (c) as concepções que integram as diferentes dimensões do social e acolhem as objeti-vações delineadas pelos enfoques materialista e idealista; e, incluída nesse último grupo; e (d) a concepção relacional, que compreende a articulação entre os processos sociais e o espaço material, em que o território é entendido primordialmente como uma relação, mais do que como fato consolidado, uma relação com este espaço que cria os vínculos e reconhecimento no tempo e espaço.

De acordo com a leitura de Haesbaert (2004), a multiterrito-rialidade contemporânea envolve a presença de uma extensa mul-tiplicidade de territórios/espaços e sua articulação se dá em forma de territórios-rede. Com isso, a territorialidade (a multiterritoria-lidade) deve ser analisada como uma manifestação sociopolítica e cultural geral ligada à humanidade.

O autor afirma ainda que a multiterritorialidade não é fator ex-clusivo da temporalidade contemporânea, ou seja, a transformação do meio (a compressão espaço-tempo) tem ampliado a perspectiva de sua manifestação. Dessa maneira, torna-se uma condição, de modo equivalente ao território, sendo a transterritorialidade uma de suas vertentes.

Autores como Hall (2007) discutem a criação do sujeito pós--moderno que, partindo de uma identidade unificada e estável, está-se tornando fragmentado, dando lugar a esse sujeito novo, que assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que não são unificadas ao redor de um “eu” coe-rente. E afirma ainda que “a identidade plenamente unificada, completa, segura e coerente é uma fantasia”. Os ciganos, em sua constante movimentação, podem ter assumido – ou olhado com mais critério – o seu entorno, e percebido a possibilidade de terem atributos condizentes com o que estava acontecendo à sua

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volta, analisando os acampados e se inserindo em um processo de absorção cultural, social e política.

Para isso, seria preciso adaptação, como no sujeito pós-moder-no de que Hall (2007) trata, aquele capaz de se mesclar e atender às necessidades impostas. Para isso, os ciganos não perderiam seus símbolos, tampouco sua identidade; pelo contrário, mesclariam uma identidade à outra, criando a possibilidade de serem, ao mes-mo tempo, ciganos e camponeses.

Na leitura de Canclini (1997), o autor denomina a isso de “hi-bridismo”, ou seja, a mescla de culturas e sujeitos no espaço-tempo, criando-se o novo, o cigano camponês. A união se dá a partir de concepções e formações culturais distintas em uma lógica de inte-resses iguais: o movimento de luta pela terra.

A partir da conquista, da posse dos lotes, mesclam-se duas li-nhas: a criação de novos sujeitos identitários e a constituição de mutiterritórios, sejam estes os territórios ciganos/camponeses e/ou os territórios propriamente dos camponeses em sua essência.

Para se estabelecerem no P.A., os ciganos tiveram de passar pelo processo de T-D-R – em síntese, ter uma referência ou base, desterritorializar-se e, logo em seguida, reterritorializar-se. Por isso, vivenciaram a adaptação de sua identidade cultural a uma nova rea-lidade, uma vez que o uso da terra é uma forma básica pela qual os homens se territorializam, desenvolvem atividades econômicas e im-plantam estruturas e sistemas de fixação. O uso da terra é cada vez mais normatizado e regulado em face das exigências sociopolíticas e ambientais. Os zoneamentos de planejamento e gestão territorial, bem como os de organização de cidades, os zoneamentos agrícolas, a demarcação de territórios étnico-culturais e a criação de áreas de preservação são algumas dessas formas (HEIDRICH, 2012).

O autor entende que o processo de desterritorialização tem diversas implicações sociais, econômicas, políticas ou culturais, já que esse todo se relaciona entre si e no formato espaço-tempo. Me-lhor explica Ianni (1995, p. 93):

O conceito de desterritorialização aplica-se não apenas a ób-vios exemplos, como corporações transnacionais e mercados monetários, mas também a grupos étnicos, lealdade ideológica e movimentos políticos que atuam crescentemente em moldes

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que transcendem fronteiras e identidades territoriais específi-cas. A desterritorialização tem afetado as lealdades de grupos envolvidos em diásporas complexas, suas manipulações mone-tárias e outras formas de riqueza e investimento, bem como as estratégias de Estado. O debilitamento dos vínculos entre povo, riqueza e territórios, por sua vez, tem alterado a base de mui-tas interações globais significativas e, simultaneamente, põe em causa a definição tradicional de Estado.

Nota-se que o homem, em seu processo de busca pela sobrevi-vência no campo (espaço rural), onde se firma em locais distintos à sua cultura, se desterritorializa para, logo em seguida, se reterri-torializar, e o que se mantém territorializado já não é mais a mes-ma coisa, muda de aspecto, adquire novo significado, desfigura--se devido às novas realidades reafirmadas no mesmo espaço – ou seja, absorve mesmo que indiretamente modos, culturas, formas de linguagem. Rompem-se os quadros geográficos e históricos pre-valecentes e emergem outras conotações para o que é singular, particular ou universal em outras mediações (IANNI, 1995).

A lógica dos ciganos e seus processos de reterritorialização no campo pode ser qualificada como singular. Essa dualidade cigano/camponês serve apenas para que os ciganos se afirmem ainda mais em seus processos culturais, não se isolando, mas se consolidando como ciganos e firmando esta condição por meio de uma nova identidade: a de ciganos camponeses.

No mundo moderno, as culturas regionais se unem para man-ter suas próprias identidades culturais. Estas, de acordo com Cas-tells (1999), ocorrem em meio a um “processo de construção de signifi-cados, tendo como base a experiência de um determinado povo”.

Na mesma linha do autor, na perspectiva sociológica, toda e qualquer identidade é construída. Muitas vezes, a criação da identi-dade ocorre em um contexto marcado por relações de poder — por exemplo, uma “identidade de resistência”, que se caracteriza pela mobilização de agentes/sujeitos “em posições/condições desvalo-rizadas e/ou estigmatizadas pela lógica da dominação, construin-do assim trincheiras de resistência e sobrevivência”. Na luta pela defesa de seus territórios e identidades, esses grupos vão reforçan-do o limite de “resistência coletiva diante de uma opressão que, do contrário, não seria suportável” (CASTELLS, 1999, p. 22-25).

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Assim, a relação com o território está intrinsecamente ligada à construção das identidades dos sujeitos. Neste assentamento, essa premência destaca-se nos dois grupos já referenciados. Ana-lisar o processo T-D-R dos ciganos é entender que o território é um elemento preponderante na reconstrução das identidades e na reafirmação de culturas, sendo a base das práticas sociais, das representações e das significações, mesmo que esteja diante de uma reconstrução de territórios, que eram móveis, para a cons-trução de um território fixo.

No campo descobriu-se que os ciganos “teceram” uma rede de territórios que englobam municípios dos estados de Goiás e Minas Gerais (Tupaciguara, Araguari, Campina Verde, Prata e Campo Florido em Minas Gerais e Corumbaíba, Marzagão, Anhanguera e Cumari em Goiás). A Figura 4 apresenta um mapa dos municí-pios em questão e da rede de deslocamentos dos sujeitos ciganos, caracterizando os territórios-rede em questão por meio de suas afirmações nesses territórios, na forma das atividades praticadas.

Figura 4 Rede de deslocamento “territórios-rede”

Fonte: Costa, R.S. (2014).

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Compreendemos que os ciganos teceram uma rede de territó-rios que servem como pontos de comércio e deslocamentos even-tuais. Os ciganos compram cavalos de uma determinada região e depois se mudam para vendê-los em outro município. A figura aci-ma nos mostra esses deslocamentos dentro da malha de territórios móveis, esses deslocamentos podem coincidir com determinadas épocas ou estações de colheita, nas quais os ciganos vendem tam-bém a sua força de trabalho. É o que mostra a fala a seguir:

“[...] Meu irmão e eu já ajudava a mexer com gado; se tivesse serviço, nóis fazia. Aqui mesmo nesta região, já trabalhei desde a colheita de “arroiz” quebrando “mii” e depois nois ia pra otros lugar, porque tinha que andar né, o povo num gostava muito da gente não, se juntava um dinheirim a gente comprava um animal e vendia mais na frente pra ganhar um lucrin e as-sim a gente ia viveno, num era fácil não, chuvia muito naquela época e nois, a muie e os fiio debaixo de lona ficava todo mun-do doente, mas nois foi criado assim...” (Relato de assentado cigano sem alteração ou correção ortográfica, 2014).

A terra passa a ter um papel essencial em sua vida, o lote traz segurança aos ciganos, já que, por meio do título de pos-se, conseguem se adequar às leis. Leis estas que impedem ou dificulta o transporte dos animais, já que são necessárias guias de transporte de animais para ir de um município a outro e, principalmente, de um Estado a outro; e, para conseguir a guia, é necessária uma ligação legal com a terra (posse ou arrenda-mento). Era muito oneroso para os ciganos obterem terra, então o movimento permitiu de forma mais “fácil” a adequação à le-gislação. A fala a seguir demonstra como os ciganos viam esses deslocamentos com os animais.

“uai, nois comprava os animal, juntava a tropa e levava pela rodovia, na frente ia as muie e os mininos que iam aramando o acampamento, no caminho a gente rezava pra num topá com a rodoviária “Policia rodoviária estadual”, pois eles era difícil, se encontrava prendia os animal e nois num tinha jeito de tirá, ai ocê já tinha pago os animal e leva prejuízo, agora nois tem a ter-ra e dá pra tirá a guia de deslocamento de animal ne? Favorece

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muito!” (Relato de assentado cigano sem alteração ou correção ortográfica, 2014).

Dentre os ciganos, alguns se empreitaram na produção de lei-te, comprando matrizes leiteiras e insumos necessários à produção leiteira com recursos próprios. Outros, que não tinham recursos financeiros e ainda estavam à espera de financiamentos como o PRONAF, trabalhavam como peões de gado em fazendas próxi-mas, na colheita de frutas em lavouras dos municípios de seu eixo de deslocamento e/ou ainda continuavam no assentamento a com-prar e vender carros (na maioria velhos), cavalos, éguas etc. A fala a seguir ilustra esse fato.

“Sô era difícil pra nois..., eu lembro que nois saia daqui ia pra carneirinho, prata (cidades próxima). Levava todo mundo, ficava lá até acabar a coieta de arroiz, depois nois ia pro goias, temo famia lá, ficava um tempo e vortava de novo, era bão, mais cansava muito, corria risco nas istradas, os mininos ficava duente, as veis ocê nun vendia o animal num preço que ocê imaginava... dava pra viver, mais era difícil dimais sô... hoje nois vive num paraiso... temos umas vaquinha, o comprador de cavalo vem na porta...”. (Relato de assentado cigano sem alteração ou correção ortográfica, 2014).

A fala acima apenas reafirma que, para aqueles que ficaram, ter um lote e fixar território, ter um lar traz possibilidades que não tinham antes, como qualidade de vida para suas famílias. Há que se destacar que, dos 220 assentados, entre essas 60 famílias de ciganos, restam, no ano de 2016, apenas 16 famílias de assentados ciganos que continuam a produzir leite, catirar, trabalhar nas co-lheitas sazonais da região. Os demais assentados ciganos não se adaptaram ao travestir de camponês.

Considerações Finais

Nesta pesquisa observou que os assentamentos de reforma agrá-ria em particular o P.A. Paulo Faria, no universo de sujeitos assen-tados, além das questões de gênero, cor, religião, há as questões ét-

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nicas que começam a serem observadas, como neste trabalho, que apresentou os ciganos como camponeses. Nos embates políticos e de luta pela terra, esses sujeitos, antes excluídos das literaturas socio-lógica e geográfica, são apresentados em uma nova roupagem: a que querem, lutam e conseguem seus lotes de terra nos processos de as-sentamento propostos pelo INCRA. A partir daí, tornam-se campo-neses, passando a adotar um discurso atual que busca soluções para as dificuldades enfrentadas individualmente e pela classe no campo.

Os resultados que tivemos foram sobre o nosso equívoco de pensar de que os ciganos estavam em um processo nômade de vida. Na verdade, eles se deslocavam através de seus territórios mó-veis e aqueles remanescentes se destinam agora a uma condição de territorializar, deixaram suas rotas de fuga ou seus territórios-rede para fixar no campo.

Assim, a luta pela terra apenas fortalece a cultura cigana, mes-mo diante do condicionamento de uma sociedade hegemônica e homogênea de dominação e apropriação do espaço vivido, os ci-ganos se mantêm intactos nos seus processos simbólicos e cultu-rais, assimilando aquilo que lhes é útil, participando ativamente da construção e das conquistas para o assentamento, sem com isso perderem o que os define como ciganos: sua identidade, seus tra-ços, sua oralidade, sua cultura e a persistência no que fazem.

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O cenário produtivo da agroindústria leiteira do município de Ituiutaba/MG:

(re)articulação socioespacialThales Silveira SoutoMeri Lourdes Bezzi

Introdução

Abordar as múltiplas facetas do rural na organização socio-espacial da Mesorregião Geográfica do Triângulo Mineiro é im-portante para compreender os processos balizadores da produção do espaço, tanto do passado quanto do presente, possibilitando refletir sobre as futuras modificações, conhecendo as limitações, as expectativas e os possíveis caminhos para o incremento e valori-zação do espaço rural deste recorte espacial.

A este respeito, neste capítulo, o objetivo geral visa compreen-der a dinâmica resultante da implantação das agroindústrias pro-cessadoras de leite bovino no município de Ituiutaba, na escala temporal de 1974 a 2013. Os objetivos específicos têm como fina-lidade: (a) verificar a importância das processadoras de leite do município de Ituiutaba para a manutenção e/ou crescimento da produção de leite bovino; (b) analisar as transformações socioespa-ciais originadas nesta unidade territorial, por meio da implantação das agroindústrias leiteiras; e (c) conhecer a realidade do produtor leiteiro de Ituiutaba no cenário produtivo agropecuário atual (Fi-gura 1).

Esta unidade territorial se caracteriza como uma importante bacia leiteira. Destaca-se a existência de três agroindústrias proces-sadoras de leite bovino, que são: a Fazendeira (capital de origem local), que iniciou a coleta do leite em 1938, a Nestlé (multinacio-nal), que é a principal unidade industrial leiteira, implantada em 1974 e a processadora de leite Canto de Minas, que iniciou suas atividades em 1994 (capital de origem local). Além dessas indús-trias, há coleta do leite para atender a demanda das demais agroin-

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dústrias dos municípios limítrofes, que são: Alimentos Triângulo – Doce Mineiro (Canápolis, MG), COOPRATA – Cooperativa dos Produtores do Município de Prata (Prata, MG), CALU – Coope-rativa Agropecuária Limitada de Uberlândia (Uberlândia, MG) e Catupiry (Santa Vitória, MG).

Figura 1 Localização do município de Ituiutaba/MG

Fonte: IBGE (2010).

Para o desenvolvimento deste capítulo, estruturou-se as seguin-tes etapas metodológicas: Na primeira, fez-se o levantamento teóri-co, buscou-se nortear e conceituar a temática em estudo, gerando aprofundamento na abordagem investigativa. A segunda se relacio-nou à coleta de dados dos Censos Agropecuários de 1970, 1980, 1996 e 2006 e, também, à Pesquisa Pecuária Municipal (1974 a 2015), disponíveis no site do IBGE. Na terceira, realizou-se o traba-lho de campo, verificando a atual organização do espaço produtivo de Ituiutaba. Nesta, coletou-se informações por meio da realização de entrevistas. A última etapa se referiu à análise dos dados primá-rios, obtidos nas entrevistas estruturadas realizadas aos órgãos pú-

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blicos, às agroindústrias leiteiras, às empresas do setor agropecu-ário e, também, aos produtores de leite dessa unidade territorial, gerando as respectivas análises.

Todas as fases anteriores possibilitaram compreender a dinâ-mica vinculada à cadeia produtiva do leite no panorama produtivo agropecuário local, bem como propiciou a verificação das modifi-cações decorrentes dessa atividade para a organização espacial do município de Ituiutaba.

O papel da produção de leite bovino na dinamização socioespacial brasileira

O setor leiteiro passou por dificuldades até o fim da década de 1980. Este período é marcado pela inserção dos interesses interna-cionais no campo brasileiro e pelas ações desenvolvidas pelo Es-tado. Aponta-se que a iniciativa privada, juntamente com o poder público, priorizou o desenvolvimento da agricultura. Além disso, havia restrições ao setor leiteiro, como por exemplo, tabelamento pelo governo do preço do litro do leite produzido.

Neste cenário, a pecuária leiteira obteve significativa desvalo-rização, devido, principalmente, à importância fornecida a pou-cos segmentos produtivos agrícolas, como os relacionados à soja, à cana-de-açúcar e ao milho, os quais são reflexos das ações e in-teresses do mercado externo, congruente às políticas de desenvol-vimento agrícola. Neste período, ocorreu ainda a redução do pro-grama de crédito rural subsidiado e a elevação da taxa de juros (GOBBI, 2006). Nessa perspectiva, Souza (1999, p. 41) salienta que o panorama produtivo de leite relaciona-se as políticas econômi-cas adotadas, pois, “ao analisar a conjuntura econômica brasilei-ra, observam-se reduções da produção de leite no início dos anos 1980, em função da crise econômico-financeira ocorrida nesse pe-ríodo”. Esta situação ocasionou um atraso tecnológico, gerando baixa competitividade e perda de mercados.

No entanto, a partir da década de 1990 houve o crescimento do setor leiteiro no país, o qual se vinculou à expansão da necessidade desse produto no mercado interno e externo. Destaca-se que o siste-ma agroindustrial leiteiro passou por mudanças importantes. Jank e

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Galan (1997) enfatizam que, inicialmente, houve a desregulamenta-ção do mercado, liberando os preços do produto, e, posteriormente, com a abertura comercial ao exterior, devido à criação do Mercosul, ampliou o mercado. Aliado a isso, houve uma estabilização da eco-nomia do país, congruente a criação do Plano Real, que aumentou a renda do consumidor, estimulando o crescimento do agronegócio do leite.

A produção de leite nessa perspectiva passou por um significa-tivo incremento, segundo Jank e Galan (1997). No entanto, os auto-res destacam que, “[...] há muitos anos o País também se posiciona como grande importador de produtos lácteos, principalmente de leite em pó integral (maior do mundo), leite em pó desnatado, queijos, manteiga e até leite longa vida” (JANK e GALAN, 1997, p. 199).

É importante destacar também que “[...] a Cadeia Agroin-dustrial do Leite se configura como uma das mais importantes do agronegócio brasileiro, tanto sob a ótica econômica como so-cial”, (CAMPOS e PIACENTI, 2007, p. 9). De acordo com Gomes (2001), a Cadeia Produtiva do Leite, em abrangência nacional, vem desempenhando um relevante papel no suprimento de alimentos e na geração de empregos e de renda para a população. Ribeiro e Lírio (2006, p. 2) dizem que

Em decorrência, a cadeia produtiva da bovinocultura constitui uma prioridade no agronegócio porque visa principalmente aumentar a geração de divisas com foco na sustentabilidade dos sistemas de produção e a melhoria da qualidade de vida da população por meio da oferta racional de alimentos com elevado valor nutricional. A Cadeia Agroindustrial do Leite se configura como uma das mais importantes do agronegócio brasileiro, tanto sob a ótica econômica como social.

Essa atividade, segundo Gomes (1999, p. 1), é fundamental, até porque o leite possui valor nutritivo elevado, sendo considera-do essencial para a alimentação das crianças. Além disso, contribui para a “[...] geração de renda de centenas de produtores e pela alta participação do leite e derivados na cesta básica e, por consequên-cia, nos índices que calculam a inflação”.

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No cenário produtivo agropecuário, Campos e Piacenti (2007, p. 4) referem que “[...] a atividade leiteira participa na formação da renda de grande número de produtores, além de ser responsável por elevada absorção de mão de obra rural (contratada e familiar), propiciando a fixação do homem no campo”.

Pode-se afirmar, então, que a indústria de laticínios foi funda-mental para o incremento da pecuária bovina de leite no país. Ve-rifica-se ainda, a importância do complexo agroindustrial leiteiro para as transformações espaciais, as quais são resultantes das ações deste setor. Contudo, observa-se que ainda há imprescindibilidade de melhorias no processo produtivo inicial, sobretudo para aten-der a necessidade tanto do crescente mercado interno quanto do exigente mercado consumidor externo.

Este setor produtivo é fundamental, pois ele atua como agre-gador socioespacial de muitos municípios brasileiros. Enfatizando, neste capítulo, a unidade territorial de Ituiutaba, a qual obteve um significativo processo (re)articulador espacial, sobretudo, devido à implantação das agroindústrias de leite, como a multinacional Nestlé e as de capital local, Fazendeira e Canto de Minas, será apre-sentado a sua importância para a organização e a dinamização so-cioespacial.

A agroindústria processadora de leite bovino na dinamização socioespacial do município de Ituiutaba/MG

No município de Ituiutaba, entre os anos de 1974 a 2015, hou-ve o crescimento de 43.881 litros de leite produzido (mil litros), tendo uma produção 11 vezes maior, expandindo 1106,7% (IBGE, 2015). Tal resultado corresponde à necessidade desta matéria-pri-ma pela Nestlé (implantada em 1974) e às demais processadoras de leite, que são a Fazendeira (datada de 1938) e a Canto de Minas (instalada em 1994). Além dessas indústrias, há coleta do leite para atender a demanda das demais agroindústrias dos municípios li-mítrofes.

No que tange às agroindustriais leiteiras desta unidade terri-torial, salienta-se uma breve caracterização destas. A mais antiga e

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ainda presente no cenário produtivo é a Fazendeira. Por meio da realização de entrevista no trabalho de campo com o responsável por essa empresa, foi informado que ela foi estruturada com capital local e que as suas operações iniciaram em 1938. Na atualidade, existem 51 fornecedores de leite e no processo industrial, a em-presa possui 50 funcionários empregados de forma direta e cerca de 20 funcionários indiretamente. No que diz respeito à produção, a agroindústria possui a capacidade de transformação de 80.000 litros de leite por dia. Outra informação relevante se refere ao nú-mero de produtos industrializados, totalizando cinco diferentes va-riedades, que são a manteiga de leite, o leite pasteurizado, o leite condensado, as sobremesas lácteas e o doce de leite. Os produtos industrializados são comercializados nos seguintes estados: Minas Gerais, Goiás, São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Para-ná (Trabalho de campo, 2015).

Em relação à Nestlé, que foi implantada em Ituiutaba em 1974, esta caracteriza-se como a maior agroindústria leiteira do municí-pio. Possui papel fundamental para o desenvolvimento econômico e social dessa unidade territorial, assim como é um importante alicerce na dinâmica produtiva leiteira. Verificou-se nas entrevistas do trabalho de campo com o responsável por esta planta industrial que existem 240 trabalhadores diretos (chegando a 250 quando a produção está em alta) e 200 de forma indireta. Há 280 fornecedo-res de leite (a coleta do produto possui um raio de 180 km a partir da fábrica). Ocorre a coleta diária de leite de cerca de 1.800.000 litros, possuindo uma capacidade produtiva de 2.000.000 de litros de leite por dia. Cabe ressaltar também que a fábrica produz ape-nas o leite em pó (Ninho) e atende o mercado consumidor nacio-nal (Trabalho de campo, 2015).

No que diz respeito à agroindústria leiteira Canto de Minas, que iniciou suas atividades em 1994, e foi estruturada com capi-tal local. A família empreendedora já possuía histórico no ramo agroindustrial. Outrora foram proprietários de beneficiadora de arroz, inclusive, o prédio que na atualidade é a fábrica transforma-dora de leite, era o galpão de beneficiamento do grão entre as dé-cadas de 1940 a 1970 (quando este cultivo foi a principal atividade agrícola do município). Ressalta-se que na atualidade, essa planta leiteira produz 53 itens derivados do leite, com o volume de pro-

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cessamento de 70.000 litros de leite por dia. A agroindústria possui 150 fornecedores da matéria prima e emprega de forma direta 220 funcionários. Possui como mercado consumidor a Mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (a oeste de Minas Gerais) e o estado de Goiás (Trabalho de campo, 2015).

Ressalta-se que as unidades industriais processadoras de leite instaladas em Ituiutaba são fundamentais para a manutenção e o desenvolvimento do setor pecuário leiteiro local. O atual cenário dessa atividade e o histórico de desenvolvimento da produção lei-teira no município se tornam fundamentais para a análise das trans-formações e/ou reorganização espacial procedentes, tanto no que se refere à economia quanto às dinâmicas agropecuária e agroin-dustrial, as quais são responsáveis, também, pela metamorfose da paisagem rural e, por consequência, pelas mudanças na infraestru-tura urbana.

Neste contexto, para se compreender o atual cenário produtivo leiteiro dessa unidade territorial, é fundamental destacar a amplitu-de dessa atividade na escala temporal de análise, que se refere aos anos de 1970 a 2013. Comparando os anos de 1975 e 1980, aponta--se o crescimento da produção de leite em 158%. Faz-se importante considerar que no ano de 1980 já havia se instalado, em Ituiutaba, a unidade da Nestlé, sendo responsável pelo aumento significati-vo deste produto. Destaca-se ainda, o crescimento da produção de leite no ano de 2006 se comparado aos anos anteriores, pois, além da Fazendeira e Nestlé, ocorreu a instalação da Fábrica de laticí-nios Canto de Minas (iniciou suas operações em 1994). Este fato também contribuiu para o aumento da produção. Enfatiza-se que o crescimento se deve ainda às melhorias realizadas tanto no pasto quanto no rebanho e no processo de coleta do leite, o qual teve expansão do uso da ordenha mecanizada, aumentando a produtivi-dade (Gráfico 1).

Para a análise da evolução deste setor produtivo, deve-se levar em consideração o uso de áreas para o cultivo de pastagem. Esta cultura é fundamental para a alimentação das vacas. Comparando a utilização de área para a pastagem plantada e natural, verifica-se a redução da utilização da pastagem natural de 43,05% entre os anos de 1975 e 1980. Em contrapartida, houve um aumento nes-se mesmo período da utilização da pastagem plantada de 78,38%.

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Salienta-se a redução do uso de pastagem natural de 162,64% em 1996, se comparado ao ano de 1980. Já a utilização de pastagem plantada entre 1980 e 1996 aumentou 44,04%. No que tange à re-dução da utilização de pastagem plantada em 2006, se comparado a 1996, esta ocorreu em função da expansão de algumas culturas, como a cana-de-açúcar, a qual teve crescimento significativo em Ituiutaba após o ano 2000 e, consequentemente, houve a utilização de áreas antes destinadas à pastagem e a outros cultivos.

Gráfico 1 Quantidade produzida de leite de vaca nos estabelecimentos

agropecuários de Ituiutaba - MG (mil litros) na escala temporal de análise

Fonte: Censo Agrícola do IBGE de 1960 e Censos Agropecuários do IBGE de 1970, 1975, 1980, 1985, 1990, 1996 e 2006. SIDRA/IBGE – Pesquisa Pecuária Municipal de 2013.Org.: SOUTO (2015).

A redução da utilização da pastagem natural é considerada devido à exploração do Cerrado (a partir da década de 1960) para o plantio das culturas comerciais (soja, milho e cana-de-açúcar). Paralelamente, a produção de alimentos para o consumo do gado também teve crescimento, destacando-se o cultivo de milho, soja, sorgo, cana-de- açúcar, entre outros. O crescimento da utilização de pastagem plantada, portanto, deve ser considerado, devido à necessidade de alimentação dos bovinos.

De acordo com os dados dos Censos agropecuários do IBGE para o período de análise, foi possível verificar o cenário evolutivo do número de bovinos em Ituiutaba. Verifica-se um crescimento constante entre os anos de 1980, 1996 e 2006. Este incremento refere-se ao período em que as fábricas de derivados de leite já estavam operando em Ituiutaba. Destaca-se que o crescimento foi

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de 98,74% entre os anos de 1970 e 1980, período da implantação da Nestlé em Ituiutaba.

Para o diagnóstico do crescimento do setor produtivo leiteiro, faz-se importante analisar ainda a quantidade de vacas ordenhadas no município. Apresenta-se esse cenário no período referente aos anos de 1974, 1984, 1994, 2004 e 2013, observando-se que houve o crescimento significativo de vacas ordenhadas no ano de 1984, se comparado a 1974. Tal fato é explicado, principalmente, pela insta-lação da Nestlé no município, a qual foi responsável pelo aumento de 249,10%. No entanto, ressalta-se a redução da quantidade de vacas ordenhadas em 2004, se comparado a 1994, a qual foi de 39,27%. Observa-se ainda a redução do número de vacas ordenha-das entre 2004 e 2013 de 10%. Salienta-se que esse fato pode ser comparado à diminuição da utilização de áreas para pastagens no município em função da expansão da produção agrícola.

Ressalta-se que a produção de leite aumentou no período anali-sado, mesmo frente à redução da quantidade de vacas ordenhadas. Tal informação pode ser verificada nos dados dos Censos Agrope-cuários do IBGE, pois entre 1985 e 2013 houve um crescimento de 58,80% na quantidade produzida de leite (mil litros).

Para conhecer a realidade vivenciada pelo produtor leiteiro de Ituiutaba, levaram-se em consideração algumas variáveis nas entre-vistas realizadas, entre elas, a quantidade de vacas em produção. Nesta entrevista, verificou-se que 71,86% possuem menos de 41 vacas em produção. No cenário referente à percentagem da produ-ção/dia de leite nos estabelecimentos visitados, 59,37% produzem até 200 litros de leite/dia (Trabalho de campo, 2015).

Levando em consideração as respostas dos entrevistados, sa-lienta-se que elas vão de encontro com a resposta a respeito da cole-ta de leite pelas agroindústrias, pois, de acordo com a entrevista às agroindústrias, duas delas possuem fornecedores de leite referentes ao pequeno e médio produtor e uma respondeu que seus fornece-dores são pequenos, médios e grandes produtores. Nessa perspec-tiva, observa-se que a área em hectares dos estabelecimentos agro-pecuários produtores de leite em Ituiutaba é variável. Verificou-se ainda que a maioria dos produtores de leite dessa unidade territo-rial se encontra no estrato de área entre 10 e 50 ha, ou seja, 81,24%, caracterizando a relevância desses estabelecimentos, os quais, em

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sua maioria, referem-se aos pequenos e médios produtores (Traba-lho de campo, 2015). Vilela, Bressan e Cunha (2001) consideram que existe uma quantidade expressiva de pequenos e médios pro-dutores de leite no Brasil. Em Ituiutaba, esse fato foi verificado no trabalho de campo.

Diante a existência de considerável número de produtores de pequena e média produção, as agroindústrias locais desenvolvem ações para auxiliar e garantir a produção dessa matéria prima. A política das agroindústrias nesse município tem como finalidade melhorar a produtividade e, ao mesmo tempo, aumentar os lucros dos fornecedores que conseguem se adaptar frente à realização de investimentos, proporcionando melhorias no processo produtivo.

Considerando o aumento da quantidade produzida de leite na escala temporal de análise, salienta-se a utilização de métodos e equipamentos para o crescimento da produtividade no municí-pio estudado. Nessa perspectiva, averiguou-se, nas entrevistas, que 39,07% dos entrevistados utilizam a ordenha mecanizada, 100% possuem o tanque refrigerador do leite in natura e também uti-lizam ração comprada e 26,57% fazem inseminação artificial nas vacas (Trabalho de campo, 2015).

Nessa perspectiva, aponta-se que a suplementação alimentar utilizada é um fator essencial para a melhoria da produtividade do animal, a qual proporciona maior nutrição, complementando as exigências necessárias para maior e melhor produção da vaca. Sendo assim, nas entrevistas foi constatado que 25% dos produto-res utilizam cana-de-açúcar como uma complementação alimentar, 23,43% utilizam a casquinha de soja, 21,87% utilizam o sal mine-ral, 10,93% fazem o uso do milho, 3,13% o sorgo, 1,56% o protei-nado e 7,82% responderam utilizar apenas a pastagem natural e plantada (Trabalho de campo, 2015).

Nos estabelecimentos em que foram realizadas as entrevistas, verificou-se que, no período especificado para análise sobre a produ-tividade de leite (ano 2000), a produtividade tem aumentado para 51,56% dos entrevistados, ao passo que 6,25% consideram ter di-minuído, 18,75% responderam que a mesma manteve-se, enquanto 23,43% não produziam leite antes de 2000. Em relação aos produto-res que começaram a produzir leite após 2000, ressalta-se que, em sua maioria, referem-se aos assentados (Trabalho de campo, 2015).

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Contudo, algumas adversidades prejudicam a produção do leite, bem como a manutenção e evolução do produtor frente às demais atividades. Entre os principais problemas enfrentados pelos produ-tores, a queda no valor do produto é a principal reclamação, que se destaca na fala de alguns entrevistados: “O valor pago pelo litro do leite, muitas vezes, não cobre as despesas”. Outro entrevistado salienta: “Daqui a alguns dias não poderemos continuar produzindo leite, o preço pago pelo laticínio cada vez mais está diminuindo”. Um entrevistado destacou: “Deveriam aumentar o valor pago pelo litro do leite, desse jeito poderiam aumentar a qualidade do pro-duto final, pois assim, iríamos conseguir investir na propriedade e na produção”. Além desses fatores, destacam-se problemas edáficos como a seca, a falta de amparo técnico, deficiência de mão de obra, problemas de financiamento e de crédito, e o alto valor dos equi-pamentos, ração e suplementos alimentares do gado (Trabalho de campo, 2015).

Nesse sentido, procurou-se entender o que os entrevistados acham da atuação dos laticínios junto ao auxílio, à manutenção e valorização do produtor. Assim, 54,68% dos entrevistados respon-deram que os laticínios valorizam a atividade, a qual é permeada pela assistência técnica, pela oferta de crédito e pelo empréstimo a baixos juros, pela organização de eventos e palestras para aumen-tar o repasse de informações essenciais para melhor qualidade do produto in natura e, também, para maior produtividade. Já 45,32% disseram que os laticínios não valorizam a atividade, visto que as reclamações destes produtores alicerçam-se, principalmente, ao valor pago pelo litro do leite, o que impossibilita a realização de investimentos no estabelecimento, dificultando o desenvolvimento dos mesmos no setor (Trabalho de campo, 2015).

Nas entrevistas aos produtores de leite desse município foi avaliada a quantidade de pessoas que trabalham nos estabeleci-mentos, bem como, a verificação do pessoal ocupado, conside-rando a utilização de mão de obra assalariada e familiar. Foi pos-sível conhecer que a mão de obra familiar possui maior represen-tatividade, destacando que a maioria dos estabelecimentos possui duas pessoas nessa função, ou seja 43,75%. Nesse viés, buscou-se conhecer a realidade do trabalhador assalariado. Assim, verifi-cou-se o valor do salário dos empregados dos estabelecimentos

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produtores de leite. De acordo com a entrevista, 61,90% dos em-pregados recebem dois salários (o salário mínimo no período de realizado do trabalho de campo e de realização das entrevistas correspondia ao valor de R$ 788,00).

A partir da realização das entrevistas com os órgãos selecio-nados, foi possível a compreensão dos principais entraves do atual cenário produtivo do leite em Ituiutaba. Portanto, considera-se que a pecuária leiteira tem importância fundamental para essa unida-de territorial, isso no que tange à geração de emprego e renda. Por sua vez, fomenta a demanda das agroindústrias, destacando as processadoras de leite existentes no município e proporcionando o giro do capital.

No entanto, deve-se apontar também a importância da ativida-de agrícola, como a lavoura da soja, a qual após 1980 teve funda-mental relevância no redirecionamento produtivo, ocupando, na atualidade, a segunda maior área plantada (ha), de acordo com dados do IBGE (2016). Ainda em relação à produção agrícola, res-salta-se o plantio de cana-de-açúcar, que a partir de 2000 obteve considerável expansão em toda a MRG de Ituiutaba, possuindo a maior quantidade de área plantada (ha) no município investigado.

Verificou-se também que está ocorrendo o crescimento na ocu-pação de áreas antes destinadas à pastagem, tanto natural quanto plantada. Portanto, enquanto a área destinada à pastagem tem di-minuído, o volume de produção do leite tem aumentado conside-ravelmente, isto de acordo com os dados do IBGE. O crescimento da produtividade do leite é consequência dos avanços tecnológicos e da inclusão de técnicas, como a inseminação artificial, o melho-ramento genético, as pastagens plantadas, a suplementação alimen-tar da vaca, a melhoria da infraestrutura dos estabelecimentos, en-tre outros.

No que tange ao processo relacionado às mudanças infraes-truturais nos estabelecimentos produtores de leite (instituídos pela Vigilância Sanitária e Ministério da Agricultura, Pecuária e Abas-tecimento - MAPA), devido às exigências de maior qualidade pelas agroindústrias leiteiras, destaca-se a instrução normativa nº. 51, de 18 de setembro de 2002, a qual aponta a necessidade da utilização do uso de sistema de ordenha mecânica, sistema de decantação, bem como, exige o sistema de resfriamento do leite.

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Ao considerar as mudanças infraestruturais nos estabelecimen-tos produtores de leite por meio das exigências sanitárias, aponta--se o exemplo citado pela EMATER de Ituiutaba, a qual ressaltou o programa de qualidade do leite da Nestlé e a valorização da quali-dade do mesmo, destacando a importância da presença de maior quantidade de gordura e proteína e também, a menor Contagem de Células Somáticas (CCS) e Contagem de Bactérias Totais (CBT), que determinam o valor do leite e a sua qualidade.

Nesse contexto, pelas informações obtidas nos bancos de da-dos do IBGE, bem como das fontes primárias, foi possível conhe-cer a dinâmica produtiva agropecuária de Ituiutaba, averiguando as mudanças agregadas ao setor na escala temporal analisada. Afirmando ainda a importância que as agroindústrias leiteiras pos-suem para esta unidade territorial, destacando as transformações resultantes da implantação dessas e salientando as mudanças visu-alizadas no espaço rural.

Considerações finais

As unidades agroindustriais processadoras de leite instala-das em Ituiutaba (Fazendeira, Nestlé e Canto de Minas), bem como as demais que estão implantadas nos municípios limítro-fes (Alimentos Triângulo – Doce Mineiro (Canápolis, MG), CO-OPRATA – Cooperativa dos Produtores do Município de Prata (Prata, MG), CALU – Cooperativa Agropecuária Limitada de Uberlândia (Uberlândia, MG), Catupiry (Santa Vitória, MG)), são fundamentais para a manutenção e o desenvolvimento do setor pecuário leiteiro local.

Neste aspecto, mesmo diante a expansão de algumas produ-ções agrícolas nesta unidade territorial, como relacionado à soja (a partir do fim dos anos 1980 e início de 1990) e a cana-de-açúcar (a partir de 2000), destaca-se que a produção de leite obteve um crescimento na sua produtividade.

Destarte, o atual cenário produtivo leiteiro e o histórico de desenvolvimento desta produção em Ituiutaba são fundamentais para a análise das metamorfoses espaciais resultantes, tanto no que se refere à economia quanto às dinâmicas agropecuária e agroin-

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dustrial, as quais são responsáveis, também, pelas transformações da paisagem rural e, por consequência, pelas mudanças na infraes-trutura urbana.

Portanto, enfatiza-se que a dinamização do setor produtivo agropecuário é o resultado da atuação dos diferentes atores e pro-cessos, os quais perpassam pela esfera política nacional, devido ao desenvolvimento de programas e ações para o incremento inter-no, bem como, aos interesses do capital privado externo, como as agroindústrias multinacionais, por exemplo, determinando, dessa forma, os processos balizadoras para a organização/reorganização socioespacial do município enfocado.

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Ginástica laboral e saúde do trabalhador no setor sucroenergético da microrregião

geográfica de Ituiutaba - MGJeziel Alves Rezende

Joelma Cristina dos Santos

Introdução

Este texto tem como objetivo apresentar e discutir o Progra-ma de Ginástica Laboral em uma empresa do setor sucroenergé-tico localizada na Microrregião Geográfica de Ituiutaba (MG)4. O programa em questão, em tese, deve priorizar as atividades fí-sicas direcionadas às necessidades do trabalhador e constitui-se em importante elemento dentre as políticas de atenção à saúde do trabalhador.

As discussões apresentadas neste artigo pretendem contribuir para com os espaços de discussão, cujas reflexões sejam pautadas em princípios teóricos e comprovações práticas e, assim, condu-zam a uma visão adequada sobre a temática referente à saúde do trabalhador. Estas reflexões devem sempre vir acompanhadas de indicativos de políticas públicas mais eficientes e/ou formas de esclarecimento para profissionais que atuem neste campo, con-siderando os exercícios físicos, as dinâmicas de socialização e os momentos de informação e palestra, como instrumento dinami-zador de uma qualidade de vida, sem esquecer o papel que as condições precárias de trabalho desempenham nas doenças rela-cionadas ao trabalho.

Acreditamos que tais reflexões devem ser compartilhadas, discutidas e transformadas coletivamente, no intuito de minimi-zar os inúmeros problemas de saúde do trabalhador decorren-te das atividades laborais. Como e quando usá-las dependerá de

4 O nome da empresa não é mencionado por motivo de que não tivemos autorização oficial por parte da empresa para uso do nome e da logomarca. Tal procedimento faz parte da política da empresa.

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nossa capacidade de habitar esse terreno a partir de nossas expe-riências e desafios.

Importante frisar que as reflexões aqui apresentadas derivam dos resultados obtidos quando da realização do Mestrado5 em Ge-ografia, na Faculdade de Ciências Integradas do Pontal (FACIP), da Universidade Federal de Uberlândia.

A convivência com profissionais de diversas áreas possibilita-ram experiências e contribuições importantes, já que visões de bi-ólogos, advogados, profissional de Educação Física e outros tantos profissionais, enriqueceram o conjunto das discussões e contribuí-ram para reflexões mais amplas.

Em sua origem, o foco deste estudo, ou seja, a temática da Ginástica Laboral (GL), foi abordada a partir da influência de al-gumas áreas do conhecimento, quais sejam, as Ciências Sociais, a Geografia (via Geografia do Trabalho), a Medicina e a Educação Física.

Se nos atermos ao comparativo e acompanhamento da evolu-ção do processo estudado, a partir da análise da ginástica laboral em empresa do setor sucroenergético da Microrregião Geográfica de Ituiutaba, tendo como elemento primordial de análise a atenção a saúde do trabalhador e, por conseguinte, uma melhoria na quali-dade de vida, constatamos que o desafio é grande para diferentes áreas do conhecimento, desde as Ciências Sociais, bem como para as ditas Ciências da Saúde.

Este artigo será composto, além desta introdução, por três se-ções. Na primeira seção abordaremos os conceitos e princípios da ergonomia e da ginástica laboral e sua importância na assistência à saúde do trabalhador. Na segunda seção o foco recai sobre pontos importantes na Promoção da saúde e a Qualidade de vida do traba-lhador. A terceira seção versa sobre os resultados obtidos a partir da pesquisa de campo sobre a ginástica laboral em empresa do setor sucroenergético. Finalizando temos as considerações finais e as referências.

5 Referimo-nos à nossa dissertação de mestrado intitulada: “GINÁSTICA LABORAL: uma análise do ambiente de trabalho enquanto espaço de saúde e produtividade no setor sucroenergético na Microrregião Geográfica de Ituiutaba (MG)”, defendida em março de 2017.

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Ergonomia e ginástica laboral: elementos importantes na assistência à saúde do trabalhador

Vários pesquisadores apoiam e recomendam a prática da ativi-dade física no ambiente de trabalho como uma das atitudes preven-tivas de saúde: Polleto (2002); Pereira, Lima e Ceschini (2005); Pe-dersen et al. (2009); Conn (2009) e Pereira (2009), Rezende; Santos (2016); Rezende (2017), entre outros autores, perceberam em seus estudos os efeitos benéficos da atividade física aplicada no trabalho sobre a saúde do trabalhador.

Concordamos com Pereira, Lopez e Vilarta (2013) que os Pro-gramas de Ginástica Laboral (PGL) são atualmente estruturados na tentativa de minimizar os fatores de risco existentes nas em-presas, dos mais variados setores, para que possam contribuir so-bre o universo macro da promoção da saúde em ambiente laboral, prevenindo, mantendo e promovendo a saúde do trabalhador por meio da prática de exercícios, dinâmicas de socialização e lazer, acrescidas de dicas de saúde.

A Ginástica Laboral, de acordo com o Conselho Federal de Educação Física (CONFEF), é um conjunto de exercícios físicos, planejados e dinamizados por Profissionais de Educação Física, realizados no próprio local de trabalho, durante o horário de ex-pediente, de acordo com as características da atividade desempe-nhada em cada função (CREF9/PR, 2014). Alguns pesquisadores enriquecem as definições acerca deste tema, o que discorreremos na sequência.

Rezende (2017) enfatiza que a Ginástica Laboral (GL) consiste em sua essência em atividades físicas orientadas e específicas, rea-lizadas no ambiente de trabalho e direcionadas para a musculatura mais requisitada ao trabalhador, além de propiciar momentos de pausa que favorecem tanto os aspectos fisiológicos, principalmente por meio da recuperação de oxigenação muscular aliada a nutrien-tes, bem como os processos psicológicos e de sociabilidade.

Maciel (2010), por sua vez, define a GL como a prática de exer-cícios físicos específicos e preventivos, planejados de acordo com as características de cada tarefa laboral, realizados durante a jorna-da de trabalho, buscando compensar os movimentos repetitivos e posturas assumidas.

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Outro ponto-chave dentro das conceituações sobre o tema, ve-rificamos em Lima (2007), ao afirmar que essas práticas devem ser complementadas com ações educativas que possibilitem acesso às informações sobre promoção de saúde, dinâmicas lúdicas e de in-tegração, visando promover maior descontração e resgate do equi-líbrio e bem-estar do trabalhador.

A busca na melhoria da qualidade de vida no trabalho é carac-terizada por diversos elementos e, um primeiro a ser considerado refere-se a uma boa avaliação ergonômica dos postos de trabalho, já que é aí que o trabalhador passa um terço do seu dia. Rezende (2017, p. 83) aponta que:

[...] por meio dos referencias teóricos e das técnicas indicadas da Ergonomia procura-se levantar diversos aspectos, dentre eles questões de ordem anatomofisiológica, com foco em deter-minar os movimentos e as demandas musculares no trabalho, aliadas às dimensões emocional e social do trabalho.

Um ponto importante a ser considerado, por influenciar sobre-maneira o potencial dos trabalhadores, refere-se às perdas muscu-lares naturais, decorrentes do envelhecimento e do sedentarismo, acelerado pelas demandas e ritmos impostos pelo capital em sua fase de reestruturação produtiva.

Temos dois processos principais que induzem ao aparecimento de doenças ocupacionais e à diminuição da qualidade de vida, são eles: os ambientes de trabalho, onde as condições são muitas ve-zes precárias e as exigências e pressões cada vez maiores. O outro processo refere-se ao envelhecimento natural do ser humano, já que demandas musculares, pressões sobre articulações e exigências ao corpo são alteradas com a perda de massa muscular, redução dos líquidos das articulações e déficit no funcionamento cardior-respiratório, fatos estes que são ocasionados pelo envelhecimento (BELLUSCI e FISCHER, 1999).

Quem também pontua sobre este tema é Leite (1996, p. 18), ao afirmar que:

[...] à medida que o indivíduo declina fisicamente, pode haver uma deterioração concomitante na sensação de bem-estar, re-

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sultando em autoestima precária, ansiedade, fadiga e depres-são. Esses estão frequentemente associados à pouca motivação e uma redução adicional na atividade física.

Comungamos com Leite (1996) que há um ciclo pernicioso do envelhecimento e da falta de atividade física, o que resulta em: baixa capacidade funcional, fraqueza e fadiga, osteoporose e mau funcionamento metabólico hormonal, estresse, depressão, perda da autoestima e da vitalidade, diminuição das atividades físicas de rotina diária, tornando-se sedentário.

Com referência às condições de trabalho, reforça-se que du-rante toda a fase produtiva o corpo humano sofre alterações decor-rentes dos esforços aos quais é submetido, o que é intensificado du-rante o processo de reestruturação produtiva do capital, que tem em seu bojo a exploração cada vez maior do trabalhador, levando à precarização do trabalho e também à precarização no trabalho6.

Frisamos que o ritmo excessivo de trabalho, postura inadequa-da, esforço físico demasiado, movimentos repetitivos e condições físicas inadequadas dos postos de trabalho causam tensões e altera-ções sérias no corpo. Ao continuar analisando estas questões, cons-tatamos que Polleto (2002) já havia destacado elementos próximos aos que citamos, e ela ainda afirma que estas condições maléfi-cas desencadeiam crises à saúde que podem ser responsáveis pelo afastamento temporário ou mesmo por invalidez permanente dos trabalhadores. As tensões ainda podem ocasionar falta de atenção no trabalho, caminho direto para baixa produtividade e acidentes de trabalho.

O sentido de ergonomia é entendido com base nas ideias de Sznelwar et al. (2011), Mattos e Másculo (2011, p. 325), o qual con-ceituam a Ergonomia como:

[...] ciência multidisciplinar que estuda a relação do homem com o seu trabalho, sendo seu objetivo básico a humanização e

6 A diferenciação entre Precarização do Trabalho e Precarização no trabalho reside no fato que a Precarização do trabalho refere-se às condições adversas que formam o universo macro do atual mundo de trabalho (Terceirizações, Contratos intermitentes, etc), já a Precarização no trabalho refere-se às condições próximas ao trabalhador no ambiente de trabalho (posições anatômicas inadequadas, operação de máquinas com vibração constante, dentre outras).

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a melhoria da produtividade do trabalho. Para tanto, procura fornecer meios para a melhoria da qualidade de vida dos traba-lhadores, adaptando alguns elementos do trabalho às caracte-rísticas anatômicas, fisiológicas e psicológicas do trabalhador.

A junção destas duas vertentes possibilita o desenvolvimento de doenças ocupacionais ao longo da trajetória da vida no traba-lho. Consideramos que esse processo altamente prejudicial ao tra-balhador pode ser enfrentando através da Ergonomia, visando a promoção da saúde e consequente melhoria da qualidade de vida, fato explicitado no próximo item deste texto.

Promoção da saúde e qualidade de vida

Percebemos que a partir da década de 2000 as empresas come-çam a investir na saúde do trabalhador, atendendo estudos e orien-tações do setor, como por exemplo, o Global Fórum for Health Research - GFHR (Fórum Global Pesquisa em Saúde – 2004), que demostra ser ótimo negócio investir na prevenção e manutenção da saúde do trabalhador visando aumento do lucro (REZENDE, 2016).

Seguimos as ponderações de Martins e Barreto (2007), quan-do eles afirmam que tanto a Organização Pan-Americana de Saúde como a Organização Mundial da Saúde (OMS) entendem que ao se promover a Qualidade de Vida no Trabalho (QVT), há a pos-sibilidade de se beneficiar a sociedade em que o trabalhador está inserido.

Quem também coloca esta nova visão de atenção ao trabalha-dor é Alves e Vale (1999), ao informarem a existência de um novo posicionamento, de enfoque biopsicossocial, que se estrutura na criação de serviços e implantação de projetos voltados para a pre-servação e desenvolvimento das pessoas, indicando procedimento que exige a realização de diagnóstico e acompanhamento durante o trabalho na empresa (ALVES e VALE, 1999).

Neste caminho vemos que um Programa de Promoção da Saú-de do Trabalhador (PPST) deve prover desde o atendimento mé-dico específico dentro da empresa até o exercício físico e pausas,

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efetuado pela ginástica laboral – GL, daí dizer que esta apresenta--se como componente chave neste tipo de programa de saúde, po-dendo atuar positivamente, melhorando a qualidade de vida do trabalhador

Por meio das entrevistas, aplicadas durante a pesquisa de cam-po do mestrado, tanto aos trabalhadores como aos profissionais de Educação Física, constatamos que se aplicam as orientações legais quanto a equipe de profissionais da área de saúde que dão atendi-mento, mas subentende-se que estes programas de atenção à saúde visam, principalmente, a manutenção dos lucros e continuidade do domínio do território, por meio da subjetivação do trabalhador.

Para efeito de melhor entendimento, vamos contextualizar o que é a qualidade de vida, já que nossa abordagem se refere a esta temática. Assim, a qualidade de vida (QV) é definida por Minayo et al. (2000, p. 8) como “uma noção eminentemente humana, que tem sido aproximada ao grau de satisfação encontrado na vida familiar, amorosa, social e ambiental e à própria estética existen-cial”. Mesmo sendo considerada subjetiva, é definida como sendo um sentido de bem-estar7 em relação à vida. Embora a saúde seja um importante domínio da qualidade de vida, “há que se consi-derar também as boas condições de trabalho, a vida doméstica, a escola, a vizinhança e os aspectos de cultura, valores e espirituali-dade” (CDC8, 2000, p. 5).

A subjetividade reside no fato de que a qualidade de vida é diferente de pessoa para pessoa e, normalmente, é variável ao lon-go dos anos, pois muitos fatores interferem nela. A combinação desses fatores que estruturam o cotidiano do ser humano resulta numa rede de fenômenos e situações que, abstratamente, o induza procurar este viver melhor.

Desta forma, muitas vezes as empresas, por meio dos progra-mas de Ginástica Laboral, procuram contribuir para a qualidade de vida no trabalho e, à medida que se considera que tal emprei-tada seja de sucesso, haverá um clima participativo e, por parte

7 Bem-estar pode ser definido como o resultado da avaliação subjetiva individual, formado pela integração harmoniosa dos componentes mentais, físicos, espirituais e emocionais. (NAHAS, 2001)8 CDC, significa Centers for Disease Control and Prevention (Centro de Controle e Prevenção de doenças).

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do trabalhador, a satisfação de pertencer à empresa, contribuin-do para a captura da subjetividade operária. (PEREIRA, 2003; ALVES, 2011).

O termo saúde aqui debatido vai de encontro com o que se apresenta na carta princípios da Organização Mundial da Saúde, em 1948, referendada em 1978 na declaração final da Conferência Internacional de Assistência Primária à Saúde realizada na cidade Alma-Ata - Cazaquistão, onde temos: “Saúde é o estado do mais completo de bem-estar físico, mental e social e não apenas a au-sência de doenças”. Acrescenta-se a “possibilidade do indivíduo ter recursos de buscar e manter seu bem-viver através de componentes éticos e estéticos” (PATRÍCIO 1996, p. 57).

Os benefícios das atividades físicas e sua influência na saúde podem ser resumidos como benefício fisiológico da prática de ativi-dades físicas a hipertrofia muscular, aliada ao desenvolvimento da força e resistência, ao aumento da resistência dos ossos, retardando o processo de osteoporose, a proteção das articulações reduzindo as degenerações, agregado a maior tolerância a sobre cargas.

Com relação aos benefícios psicológicos e sociais decorren-tes do uso de atividades físicas orientadas, seguimos as ideias de Nahas (2001). Para este autor, a ginástica propicia uma sensação de bem-estar geral, diminui a fadiga mental e o nível de ansiedade, melhora o humor, melhora a qualidade, gera maior integração so-cial aliada ao senso de grupo e espírito de equipe.

Todo este conjunto de benefícios advindos do uso de ativida-des físicas regulares e orientadas pode atuar sobre a prevenção das doenças ocupacionais, ganhando daí espaço nas empresas. Acres-centa-se aí a preocupação do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e também do Ministério da Previdência Social (MPS), que, através de princípios legais, procuram normatizar as condições mí-nimas de saúde e segurança no trabalho, aliadas à prevenção de acidentes e doenças por meio da ginástica, já que assim, ao fazê--lo, diminui-se o alto ônus financeiro que decorre dos acidentes e doenças do trabalho, pois são estes ministérios que arcam com os gastos de pagamento aos doentes e acidentados no trabalho.

Investir em prevenção é o caminho para evitar o desenvol-vimento de doenças, que a cada dia ganham espaço e novas for-mas de manifestação. Em Rezende (2017, p.67) temos referência

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à Norma Regulatória (NR 17), que cria os Comitês de Ergonomia (COERGO) que “têm o objetivo de obter ações preventivas e não somente corretivas, relacionadas com as situações adversas do trabalho”.

Para Pereira (2003), o investimento em Programas de Pro-moção da Saúde do Trabalhador leva, com certeza, à melhoria da qualidade de vida no trabalho, fato que, em seu conjunto, oferece benefícios tanto para o funcionário como para empresa, já que esta contará com bons serviços prestados e satisfação de todos. Outro fator que muitas vezes passa despercebido, mas que tem importância de destaque, é com relação às pausas durante a jornada de trabalho.

Os exercícios ou atividades de ginástica devem ser dosados de modo que se obtenha um aquecimento e a oxigenação necessária à melhoria do estado físico geral e postura, promovendo maior dis-posição para o trabalho, maior capacidade respiratória, vitalidade muscular e mental, além de descontração no ambiente/relação de trabalho. (PEREIRA, 2003)

A melhoria do estado geral, tanto físico como psíquico, agre-gada à melhoria da postura, reduzirá bastante os riscos de lesões e doenças advindas do mundo do trabalho. As principais qualidades físicas envolvidas no trabalho, se referem à Resistencia Muscular, à Força e Equilíbrio, já que são elas que favorecem uma postura e condições fisiológicas benéfica ao trabalhador.

A resistência muscular pode ser conceituada como a capaci-dade de manter uma atividade muscular por longo tempo, com intensidade baixa ou média em padrões respiratórios aeróbicos, daí ser ela junto com a força, duas qualidades que precisam receber atenção. Lembramos que os músculos inativos se tornam flácidos e com menos elasticidade. Para evitar tal situação, os exercícios físicos regulares aumentam a resistência muscular.

Aplica-se então, o princípio da sobrecarga, no qual há uma exi-gência de adaptação fisiológica, estimulando o processo de desen-volvimento muscular onde, com o passar do tempo, haverá melho-ra do desempenho e redução da fadiga. Estas sobrecargas devem obedecer a princípios científicos e metodologias adequadas, sob a orientação e supervisão de profissionais da Educação Física.

Afirmamos que músculos fortes protegem mais as articulações,

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evitando lesões de ligamentos e problemas de dores musculares, lombalgias, conjuntamente com favorecimento de uma circulação sanguínea que leve nutrientes como as vitaminas e os sais minerais (com ênfase no cálcio e potássio), prevenindo a osteoporose, des-vios anatômicos e renovação celular.

Temos como definição de força enquanto qualidade de apti-dão física, a capacidade de gerar tensão nos músculos esqueléticos de forma voluntária. Ela é diretamente proporcional à capacidade contrátil das fibras musculares e da capacidade de recrutamento das unidades motoras (POLETTO, 2002; NAHAS, 2001). Propos-tas que estimulem o aumento da força propiciarão uma estrutura anatomofisiológicas que protegerá o homem de acidentes e ques-tões posturais, à medida que servirá de ‘escudo’ frente a outras forças ou pressões externas.

A flexibilidade como qualidade essencial ao trabalhador é ca-racterizada como a capacidade das fibras musculares se estende-rem sem rompimento e aliada a aumento da capacidade articular entre as junções ósseas, no limite dos ligamentos e tendões. Ela cumpre papel importante, principalmente quando da exigência de movimentos laborais em posições anatômicas adversas e incomuns, que poderiam levar a estiramentos e distensões, pois a preparação do conjunto de músculos e articulações, executando movimentos próximos aos limites, minimizará os riscos, principalmente no final do expediente quando já se apresentarem a fadiga muscular.

Daí a importância da inclusão da ginástica laboral como pro-grama dentro do universo maior de promoção da saúde, pois ela pode contribuir favorecendo as qualidades físicas e metabolismo, como também para amenizar as tensões e propiciar contato breve entre colegas de turno. Diante destes subsídios citados, na próxima seção aprofundaremos conceitos e reflexões sobre a ginástica labo-ral, notadamente em empresa do setor sucroenergético na Micror-região geográfica de Ituiutaba (MG).

Para melhor entendimento e investigação sobre as políticas de atenção à saúde do trabalhador, tendo como apoio a ergonomia focalizada nos de Ginástica Laboral, procuraremos no item seguinte esclarecer pontos importantes às necessidades psicossociais do trabalhador e sua relação com a ginástica laboral no setor sucroenergético.

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Ginástica laboral e sua aplicação em empresa do setor sucroenergético em Ituiutaba - MG

A Ginástica Laboral (GL) consiste basicamente em atividades físicas específicas, realizadas no ambiente de trabalho e direcio-nadas para a musculatura mais requisitada do trabalhador, além de propiciar momentos de pausa que favoreçam tanto os aspectos fisiológicos, bem como os psicológicos e sociais (POLLETO, 2002; DE OLIVEIRA, 2007).

Dentre os objetivos da ginástica na empresa pesquisada, te-mos a possibilidade de aquecimento e adaptação muscular ca-paz de atenuar os acidentes de trabalho causados por esforço físico demasiado, em postura errada e com movimentos sem pausa, fatos que caracterizam a Ginástica Laboral Preparatória. No Gráfico 1 temos os tipos de ginástica praticados na empresa pesquisada, e podemos observar o destaque dado à ginástica preparatória.

Gráfico 1 Microrregião de Ituiutaba (MG): tipos de Ginástica

praticados na empresa

Fonte: Trabalho de campo, dez. 2016Org.: Rezende, J. A. (2016)

Quando aplicada a ginástica compensatória, notadamente veri-fica-se que ela é apenas para o trabalhador do setor administrativo em situações onde se percebe que trabalhadores começam a dar

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sinal de problemas por LER/DORT. Os outros tipos de ginástica laboral são pouco utilizados no programa.

Como componente de atuação junto à prevenção de doenças ocupacionais, ou seja, cuidados com a saúde, cabe-nos esclarecer que ela precisa ser planejada, conduzida e avaliada por profissio-nal capacitado, preferencialmente por profissional de Educação Física, já que este profissional possui capacidade de integrar os movimentos ou atividades físicas a dinâmicas de lazer e sociali-zação. Este fato foi realçado quando ouvimos os trabalhadores, pois, resumidamente, eles disseram que “quando as atividades são dadas pelas professoras eles ficam mais animados e o tempo voa”, fato que não acontece quando atividades são comandas pe-los monitores/colegas.

Ao consultarmos as profissionais de Educação Física, respon-sáveis pela ginástica dentro da empresa, constatamos que elas, ao fazerem os planos semanais, tinham a preocupação de incluir algu-mas brincadeiras ou dinâmicas.

Outro importante ponto que indica os benefícios da implan-tação de um programa de Ginástica Laboral é a possibilidade das pausas. As pausas percebidas como “intervalos de tempo entre as atividades diárias, são adotadas de acordo com a necessidade de re-cuperação ou repouso do indivíduo” (POLETTO, 2002, p. 28). A pausa no trabalho é indispensável, já que permite troca rítmica entre gastos de energia e reposição de força, processo que compõe o uni-verso laboral, caracterizado por trabalho e descanso. Cabe salientar que as pausas são necessárias tanto em trabalhos de força física, cha-mados manuais, tanto naqueles chamados mentais ou intelectuais.

Comprovadamente, existem mecanismos que durante as pausas ajudam a prevenir lesões por esforço, pois na pausa há um fluxo nor-mal de sangue que retira o ácido lático do músculo diminuindo as dores e aumentando a propriocepção9, e também na pausa permite--se que os tendões voltem à sua estrutura normal e eficiente, devido à atuação do líquido sinovial10, evitando o atrito entre as estruturas.

9 Propriopercepção - É a capacidade de perceber as estruturas anatômicas (músculos, articulações e sentido tátil) de si mesmo, e daí levando informações ao cérebro. Conhecido como Sinestesia. 10 Líquido sinovial – substância que tem a função de lubrificar as articulações sinoviais, permitindo seu movimento suave e indolor.

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O que pode ser analisado por meio das respostas nos questio-nários e entrevistas é que o elemento pausa na rotina de trabalho não é aplicado convenientemente. Diante dos levantamentos rea-lizados e do balizamento das respostas, verificamos que as profis-sionais de Educação Física recebem orientações para que se evite o máximo possível a quebra da rotina laboral, “pois depois que os processos de produção diário começam fica difícil interrompê-los” (Profissional de Educação Física entrevistada).

Em algumas respostas quando dos levantamentos realizados junto aos participantes desta pesquisa, percebemos quanto os tra-balhadores, especialmente do sexo feminino, procuram esconder seus sentimentos e sensações, fato que infelizmente faz parte da “cultura do medo” que o capitalismo alimenta no afã de manter o controle sobre o trabalhador.

Sobre a cultura do medo na agroindústria na microrregião de Ituiutaba, já foi também descrita por Silva e Santos (2014, p. 218), quando eles descrevem que:

O controle e a disciplina no ato do trabalho são exercidos por um pessoal especializado: fiscais, feitores, encarregados. Estes controlam os níveis de produtividade, [...]. Forma-se, assim, a força produtiva do trabalho social. É a combinação das forças reguladas pelo tempo. Essa combinação ocorre graças aos me-canismos de controle criados no próprio processo de trabalho.

Constatamos que a ginástica laboral possui diferentes objeti-vos, tanto para os funcionários como para empresas. Para os tra-balhadores, os principais objetivos são: aumentar a resistência à fadiga central e periférica, promover o bem-estar geral, melhorar a qualidade de vida, combater o sedentarismo e diminuir o estresse ocupacional.

Notadamente, observamos que para a empresa, os principais objetivos são: diminuir os acidentes de trabalho, reduzir o absen-teísmo e a rotatividade, aumentar a produtividade, melhorar a qualidade total, prevenir e reabilitar os Distúrbios Osteomuscular Relacionados ao Trabalho (DORT).

Ao observar o Gráfico 2 deduzimos que os funcionários gostam de fazer a ginástica laboral, pois 78 dos 80 questionados disseram

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que participam das sessões e deste número de participantes consta-tamos que grande parte deles considera que a ginástica laboral foi benéfica a eles, por melhorar suas condições físicas e psicológicas, ajudando-os a se prepararem para o dia de trabalho. Os poucos casos de trabalhadores que afirmaram não sentirem melhoras, se deve ao fato de terem participado de pouco tempo de atividades, já que eram novatos na empresa e outro fato indica que eles não estavam preparados para as atividades.

Gráfico 2 Participação e percepção quanto à ginástica laboral na empresa

Fonte: Trabalho de campo, dez. 2016.Org.: Rezende, J. A. (2016).

Tecnicamente, a Ginástica Laboral classifica-se em cinco ti-pos, listados a seguir, conforme Delani e Evangelista, (2013), sendo que a classificação tem como referências o horário, o se-tor e objetivo de sua aplicação. De forma resumida e didática as mostraremos:

1) Ginástica Laboral Preparatória (GLP): É ministrada no co-meço do expediente do turno em que o empregado trabalha, e se constitui em atividades de flexibilidade, velocidade, força e resis-tência. A GLP visa o aquecimento, a preparação da musculatura e das articulações que serão utilizadas no trabalho, o que previne acidentes, distensões musculares e doenças ocupacionais.

Comprovamos que a ginástica preparatória é o principal tipo no programa de GL utilizado, por ser mais fácil de estruturar as

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sessões para serem aplicadas nos três turnos, já que na chegada à usina ou ao canavial, os trabalhadores se juntam em espaços pré--determinados e fazem a ginástica com a orientação de professores ou de monitores preparados para tal atividade.

2) Ginástica Laboral Compensatória (GLC) ou Ginástica de Pausa: É aplicada no meio do expediente ou no horário de pico de fadiga; nela se faz uma pausa ativa. Tendo como objetivo evitar as más posturas do trabalho, além de atuar como preventivo/tera-pêutico dos movimentos repetitivos.

Segundo as profissionais responsáveis pelo programa na em-presa, este tipo de sessão era poucas vezes executado com o pessoal da administração e apoio. As profissionais de Educação Física in-formaram que os trabalhadores aprendiam os principais movimen-tos de uma série e depois eles mesmos executavam sozinhos.

Ainda com relação à execução da ginástica compensatória, um trabalhador deixou transparecer que em alguns momentos de roti-na cansativa e repetitiva, ao parar para alongar um pouco as mãos, braço e região cervical, os colegas e o ‘chefe’ achavam que ele esta-va burlando o trabalho.

3) Ginástica Laboral de Relaxamento (GLR): é aplicada no fim do expediente e deve ser iniciada 10 a 15 minutos antes do término do expediente de trabalho. Esse tipo de ginástica é aplicado para grupos que têm como atividade foco atendimento ao público e/ou de grupos de trabalhadores, por exemplo, os coordenadores e supervisores de turno. No caso deste estudo, o que ficou realçado é que este tipo de ginástica não é usado nesta empresa,

Em uma das conversas quando da entrega do questionário, um trabalhador chegou a brincar: “– cê tá doido!!! A gente quer é ir para casa, tomar um banho, tirar o pó e descansar. É perda de tempo.”

4) Ginástica Corretiva (GC): Visa restabelecer o equilíbrio musculoesquelético, fazendo uso de atividades específicas para alongar os músculos que estão encurtados e fortalecer os que es-tão enfraquecidos. Entende-se que este tipo de ginástica deve ser conduzido pelos fisioterapeutas em casos individualizados, e não como elemento de um programa de ginástica laboral.

Necessário mencionar que um outro tipo de ginástica laboral tem, por vez prescrição, trata-se da Ginástica Laboral de Manuten-

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ção (GLM), mas que por ser uma atividade que exige procedimen-to com equipamentos ou espaços próprios para o condicionamen-to físico, não foi foco deste estudo.

Percebeu-se nas respostas dos questionários e em conversas com funcionários, que durante as sessões de ginástica eles rece-bem dicas e informações sobre a necessidade de contínuo cuida-do com o corpo. Cuidado que passa por procurar atividades de preparação física que possa manter os níveis de condicionamento físico e funcionamento orgânico, por meio de esporte, academia, ou outro exercício.

Ao questionar os trabalhadores se eles consideravam apenas a ginástica laboral suficiente para manter a saúde, grande parte, notadamente 86% dos trabalhadores, respondeu que não, e que, apesar da dificuldade de conciliar horário para esta complemen-tação, muitos deles procuravam atividades físicas complementa-res fora da empresa. No Gráfico 3 fica visível que os trabalhado-res acham insuficiente o número de sessões e a intensidade da GL apenas na empresa.

Mesmo trabalhando em turnos variados e longos, pois o tem-po gasto para o trabalho pode chegar a 10 horas, em decorrência do tempo para pegar a ‘condução’ na ida e na volta do trabalho, eles procuram, futebol de várzea ou ida ao clube SESI, e até mes-mo academia de bairro, no intuito de estar executando atividade física extra. Acrescentar-se que a implantação da ginástica busca despertar nos trabalhadores a necessidade de mudança do estilo de vida e não apenas de alteração nos momentos de ginástica orientados na empresa, fato que transparecem no trabalho de campo realizado em 2016.

Quando questionados se sentem dor no corpo em decorrên-cia da profissão, temos como resposta um percentual alto de res-postas afirmativas. Por meio do Quadro 1, podemos compreen-der que os trabalhadores sentem dor, e esta dor está concentrada no tronco e cervical, regiões responsáveis pela sustentação postu-ral e por acumularem as tensões geradas pelo restante do corpo e pelas emoções.

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Gráfico 3 Percepção do trabalhador sobre a ginástica laboral apenas na empresa

Fonte: Trabalho de campo, dez. 2016Org.: Rezende, J. A. (2016)

Quadro 1 Percepção de dor em regiões do corpo dentre os trabalhadores

da empresa11

Região do corpo Quantidade citada12

Pés/Perna 8

Tronco superior 38

Abdômen 12

Ombro/Cabeça 48

Braço/Mãos 18

Total 124

Fonte: Trabalho de campo, dez. 2016.Org.: Rezende, J. A. (2016).

Tal constatação nos instiga a indicar como caminho para a re-dução destas dores - o uso de atividades compensatórias, a inclusão de momentos de relaxamento e pausas orientadas, a utilização de

11 A quantidade citada é maior do que o número de participantes devido ao fato de que foi aceito mais de uma resposta em relação a regiões corporal dolorida por par-ticipante.

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técnicas de massagens que devem fazer parte do programa de Gi-nástica Laboral.

Estas indicações se fazem necessárias à medida que estes pro-cedimentos produzem uma melhoria na capacidade de recupera-ção de lesões e propiciam a nível mental descanso e consequente regeneração celular e de metabolismo dos neurotransmissores, que vão produzir condições adequadas para uma melhora qualida-de de vida do trabalhador dentro e fora da empresa.

Ponto importante e que merece ser mais estudado diz res-peito à percepção que o trabalhador tem sobre a importância da ginástica laboral, em um ambiente que muitas vezes é indutor de problemas de ordem fisiológica ou psicossocial, pois, em geral, o trabalhador encontra-se sobre forte pressão emocional. Os traba-lhadores percebem que a ginástica laboral é essencial para eles, pois contribui na saúde e bem-estar deles e dos colegas de setor. Porém, enfatizamos que a melhoria da saúde derivada do uso da ginástica laboral só se concretizará se o programa se afastar um pouco dos padrões econômicos vigentes, ou seja, baseado na busca incessante pelo lucro, onde alguns poucos minutos podem reduzir a produção e consequente o lucro.

Esta constatação vem de encontro a Antunes (2010), onde o autor enfatiza que a estrutura de gestão organizacional e o avan-ço tecnológico desprezam os trabalhadores, visto impossibilitar que as atividades físicas sejam pensadas e realizadas como mo-mentos únicos, com lazer, descontração e ócio12 tão necessários ao homem. Concordamos com Alves (2007), o ócio parece tor-nar-se impossível nas condições do capitalismo global. O trabalho estranhado envolve tudo e a todos, inclusive as relações afetivo--existenciais, medidas sob os parâmetros dos valores de desempe-nho e produtividade.

Considerações finais

Os elementos apresentados artigo tiveram como objetivo com-preender o funcionamento da ginástica laboral em empresa do

12 Ócio, entendido nesse trabalho como tempo-espaço fora da produção fabril, ou seja, o tempo livre vivido com prazer.

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setor sucroenergético da Microrregião Geográfica de Ituiutaba (MG), envolvendo questões de saúde, qualidade de vida do traba-lhador e aumento da produtividade.

Por meio do trabalho de campo, aliado aos referencias teóri-cos que compuseram parte dos estudos que resultaram em nossa dissertação de mestrado e que aqui trouxemos alguns dos resulta-dos, buscamos responder a alguns dos questionamentos: Como a empresa se utiliza da ginástica laboral, como elemento de apoio da ergonomia? Tem o trabalhador percebido a importância da ginás-tica laboral? Que tipo de ginástica laboral é mais utilizada? Aplica--se o princípio de pausas com elemento recuperador? As dúvidas expressas nesses questionamentos induziram a busca de outros ob-jetivos de ordem mais específica, que geraram encaminhamentos e direcionamentos.

No que se refere à precarização das relações de trabalho na agroindústria canavieira, foi verificado que realmente existe a pre-carização para o trabalhador no setor, fato que conjugado a outros elementos, fica evidente ao verificarmos a necessidade do traba-lhador produzir mais para não prejudicar o seu salário, e mesmo o salário do colega, fato que pode ocorrer quando há diminuição na produção.

Outra constatação é que a mecanização dos processos de pro-dução via maquinários para plantio e colheita não conseguiram minimizar os problemas, pois o trabalhador continua a atuar em ambiente insalubre (poeira no campo agravado pelo vai e vem das máquinas, proximidade a caldeiras com temperaturas mais eleva-dos junto aos difusores, e vários outros), os operadores de máqui-nas sofrem com as trepidações e passam grande parte do tempo sentado nas colhedoras e tratores, ocasionando outros sofrimen-tos, devido a posturas anatômicas incorretas e sobrecargas físicas.

Nos levantamentos de dados primários realizados por meio de questionários e entrevistas, observou-se que a metodologia de gi-nástica laboral utilizada preenche alguns requisitos considerados ideais para a empresa, já que o tipo de ginástica laboral praticada é a preparatória, com foco nos exercícios de alongamento e resis-tência localizada.

Com relação ao programa de ginástica laboral investigado jun-to à empresa que se constituiu em objeto desse estudo, foi obser-

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vado que a ginástica é aplicada, independente do setor e das neces-sidades dos trabalhadores, realizada somente no início dos turnos de trabalho, o que pode ser entendido como uma forma de não se perder tempo, já que o trabalhador ainda não iniciou suas ativida-des do dia.

Notou-se que pouco ou quase nada é feito para preparar ver-dadeiramente o trabalhador para as tarefas trabalhistas ou para compensar os efeitos destas. As “pausas” inexistem e tempos para recuperação orgânica são por vez considerados “preguiça” ou ati-tudes para burlar os afazeres. As questões relativas à ergonomia são, por vez, esquecidas ou negligenciadas por parte dos gestores da empresa pesquisada, que limitam, conforme interesse do capital, levando à execução um programa não completamente adequado ao atendimento das reais necessidades dos trabalhadores, contribuin-do para o desenvolvimento e agravo de problemas de saúde dos seus funcionários.

A ginástica laboral, enquanto ferramenta ergonômica com uso de atividades físicas, é um investimento que precisa cada vez mais ser fortalecido e implantado por muitos segmentos da sociedade, em especial nas agroindústrias canavieiras, já que estas envolvem trabalhadores que atuam tanto no setor agrícola como também setor industrial e administrativo.

Espera-se que os resultados aqui apresentados possam provocar outras reflexões sobre temas tão atuais e necessários, quais sejam: trabalho, precarização e a melhoria de qualidade de vida do traba-lhador. Pelo viés dos programas de atenção à saúde do trabalhador, que têm na ginástica laboral seu instrumento mais adequado para minimizar as doenças ocupacionais, tanto de ordem anatomofisio-lógicas como psicossociais, pode-se de fato obter benefícios para o trabalhador, desde que haja tempo e espaços adequados para possi-bilitar verdadeiramente melhorias em sua saúde e qualidade de vida.

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Geografia, direito agrário e sustentabilidade

Fausto Amador Alves Neto Yann Almeida Batista

Introdução

Não há mais dúvidas de que a sustentabilidade é, atualmente, um dos maiores desafios. Apesar de ser um tema bastante recor-rente, não se pode afirmar existente uma definição exata do que realmente é sustentável. A utilização frequente do termo, sem dú-vida, colabora para uma utilização errônea, equivocada, sem que haja nenhum aprofundamento e incoerente da real intenção dos que designaram essa terminologia, sendo necessário resgatar o conceito mais adequado.

A sustentabilidade é um tema que percorre todas as áreas do conhecimento humano, ocasionando uma grande modificação nos paradigmas em todo aquele que objetiva ajustar sua perspectiva aos pilares que compõe essa definição.

Com as atividades agrárias, tal cenário não é diferente, sobre-tudo considerando que estas lidam inerentemente com o meio ambiente natural, permeando radicalmente neste, de maneira a extrair produtos indispensáveis ao atual estilo de vida.

Atualmente a produção agrária não enfrenta apenas o proble-ma da necessidade de se expandir, já que a população cada vez maior requer mais alimentos e outros bens primordiais advindos da atividade agrária, como também necessita buscar uma maneira de satisfazer essas necessidades sem necessariamente comprome-ter as futuras gerações. Não cabe mais, em nossa sociedade, uma atividade agrária irresponsável e imediatista, aquela que intenta satisfazer somente o produtor ou a indústria economicamente.

Essa afirmação, que era restrita ao campo da ética, causa re-percussão também na seara do Direito, pois as normas jurídicas também possuem tal preocupação. A sustentabilidade influencia a realidade e as atividades humanas, implicando em uma ruptura de

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Geografia, direito agrário e sustentabilidade

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paradigmas acerca das regras de condutas que lhe são aplicáveis. A busca pela sustentabilidade implica uma inovação no âmbito das atividades agrárias e, ao mesmo tempo, no Direito que incide nessas atividades.

Há muito tempo que o tema sustentabilidade vem sendo dis-cutido, e sempre englobou as atividades agrárias. Entretanto, são poucos os estudos que compreendem essa ligação sob a perspecti-va jurídica, necessitando assim, o preenchimento desta lacuna, já que este é um dos maiores desafios da atualidade.

Definição de sustentabilidade

Sustentabilidade possui uma significante conotação valorativa: remete mais a uma expressão dos desejos e valores de quem a ma-nifesta do que algo concreto, de aceitação geral. Em razão disso, são vagas e amplas as definições de desenvolvimento sustentável. Com o antagonismo de crescer e com o processo da imposição de um inevitável desgaste nas reservas de recursos naturais, ou con-servar o meio ambiente, o crescimento sustentável prevê os dois: crescimento com conservação, se qualificando como um objetivo social eticamente legítimo.

Por volta da década de 80, principalmente nos países ricos, houve uma grande preocupação e discussão acerca dos impactos que a agriculta moderna poderia ocasionar, como as chuvas áci-das, a destruição da camada atmosférica de ozônio, o aquecimen-to global, assim como o “efeito estufa”. Uma grande dúvida era até quando os recursos naturais conseguiriam suportar o ritmo de crescimento econômico imposto pelo industrialismo até mesmo se a própria humanidade iria resistir às consequências advindas desse modelo de desenvolvimento econômico.

Diante disso, houve a consolidação de um novo paradigma, um novo ideal: a sustentabilidade. A Comissão sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, em 1987, publicou o relatório Brundtland (nos-so futuro comum), o qual contribuiu para propagar o ideal de um desenvolvimento sustentável para diversos setores das sociedades modernas, como a agricultura e a economia.

Inicialmente a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e De-

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senvolvimento, trouxe, em 1987, o primeiro conceito de desenvol-vimento sustentável (1991, p. 46): “o desenvolvimento sustentável é aquele que satisfaz as necessidades da geração presente sem com-prometer as possibilidades das gerações futuras em satisfazer as suas necessidades”. Por intermédio desse conceito outros surgiram.

Dentre a gama de discussão advinda dos conceitos de susten-tabilidade, verifica-se que o desenvolvimento sustentável deve pro-mover uma melhora na qualidade de vida, que a agricultura possa controlar os processos biológicos e utilizar com uma maior eficiên-cia os recursos naturais, assim como aumentar o bem-estar de uma geração, sem necessariamente ter que comprometer o bem-estar das futuras.

Cunha, Mueller e Alves (1994, p. 256) mencionam que “dentro do conceito de desenvolvimento sustentável, quatro aspectos estão relacionados entre si: a eficiência técnica, a sustentabilidade econô-mica, a estabilidade social e a coerência ecológica”.

A Organização das Nações Unidas (ONU) menciona que a sus-tentabilidade engloba os aspectos da conservação do solo, da água e dos recursos genéticos animais e vegetais, bem como o de não destruir o ambiente, ser tecnicamente apropriado, economicamen-te viável e socialmente aceito (GIORDANO, 2000).

De outro norte, Borges (2016) alude que a sustentabilidade se dá quando todos os habitats são preservados, gerando uma inte-gração do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais, sempre respeitando a vida animal e vegetal, para que, ao final, a vontade do ser humano seja satisfeita.

O termo sustentabilidade tem uma abrangência muito grande, já que vai além do simples não danificar o ambiente, englobando questões de qualidade de vida, competividade empresarial, resulta-dos positivos, tecnologias limpas, utilização racional dos recursos, responsabilidade social, dentre outros.

Ao descrever um dos programas que o SEBRAE desenvolve, Tecnologia Social do PAIS, acerca da sustentabilidade menciona que (2009, p. 06): “[..] é sustentável porque preserva a qualidade do solo e das fontes de água, incentiva o associativismo dos pro-dutores e aponta novos canais de comercialização dos produtos, permitindo boas colheitas agora e no futuro”. Diante dessa de-finição, observa-se que a ideia de sustentabilidade não engloba

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apenas as questões ambientais, mais também aspectos comerciais e sociais.

O crescimento da agricultura será considerado sustentável apenas quando puder crescer sem a elevação dos custos, sendo a capacidade da tecnologia de afastar a ameaça dos rendimentos de-crescentes, sem aqueles advindos do fortalecimento a exploração sobre uma base fixa de recursos naturais, ou os que poderão vir degenerar a base de recursos.

O Governo Federal, por meio do IPEA (Instituo de Pesquisa Econômica Aplicada), destaca a conceituação levantada a partir da visão de Bryan G. Norton, um dos mais renomados pesquisado-res norte-americanos sobre o assunto, onde a sustentabilidade é a ligação existente entre sistemas econômicos dinâmicos e sistemas ecológicos maiores, que modificam-se de forma lenta, fazendo com que a vida humana possa continuar indefinidamente, e, ainda, rela-ção na qual os efeitos das atividades humanas permanecem dentro de limites que não deterioram a saúde e a integridade de sistemas auto-organizados que fornecem o contexto ambiental para essas atividades (IPEA, 2010).

Assim, percebe-se que o termo sustentabilidade, ainda que am-plo e sem pretensa delimitação, abrange a vida humana e toda sua correlação com o meio ambiente, de forma que sua integração per-mite maior qualidade de vida e ainda consolidação dos ecossistemas.

O direito ambiental e a sustentabilidade

O Estado brasileiro criou algumas leis com o fim de regular o uso e, principalmente, preservar o meio ambiente, consequen-temente, promovendo as questões pertinentes à sustentabilidade. Como primeiro exemplo, podemos citar a edição da Lei nº. 6.938, de 1981, que estabeleceu os critérios da Política Nacional do Meio Ambiente.

Posteriormente, como consagração “absoluta” e “sólida”, te-mos a Carta Magna de 1988, que estabeleceu de forma expressa essa regulamentação. Vejamos em seu art. 225: “Todos têm direi-to ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso co-mum do povoe essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao

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Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Observa-se também a Lei nº. 8.629/93 em seu artigo 9º, pa-rágrafo 3º, que define a preservação do meio ambiente como a manutenção das características próprias do meio natural e da qua-lidade dos recursos naturais ambientais, na medida adequada à preservação do equilíbrio ecológico da propriedade e da saúde e qualidade de vida.

A referida lei dispõe também que áreas não suscetíveis de apro-veitamento por deverem ser atribuídos à preservação permanente, imprescindível à preservação dos recursos naturais em razão de sua localização ou outras características peculiares.

Milaré (2007, p. 72-77) menciona que é preciso pensar em uma estratégia mundial para que se possa alcançar uma sociedade sus-tentável. O autor propõe os seguintes princípios como norteadores da sustentabilidade,

a) Respeitar e cuidar da comunidade dos seres vivos;b) Melhorar a qualidade de vida humana;c) Conservar a vitalidade e a diversidade do planeta Terra;d) Minimizar o esgotamento de recursos não renováveis;e) Permanecer nos limites da capacidade de suporte do planeta Terra;f) Modificar atitudes e práticas pessoais;g) Permitir que as comunidades cuidem de seu próprio meio ambiente;h) Gerar uma estrutura nacional para a integração de desenvolvimento e conservação e, por fim;i) Constituir uma aliança global entre todos os países.

Posto isto, a lei brasileira, juntamente às normas e tratados internacionais, propiciam uma proteção abrangente dos recursos naturais e sua aplicação mostra-se precisa pelos Poderes Judiciá-rio e Executivo que destinam-se a garantir que as normas sejam cumpridas exatamente como determinadas pelo legislador. Acerca desses tratados internacionais, é nítido que as consequências da degradação do meio ambiente ultrapassam os limites do Estado nacional, surgindo a necessidade de promover um sistema de pro-teção a esse bem (GUERRA e GUERRA, 2014, p. 29).

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Em uma perspectiva mundial, é importante citar que o Brasil foi sede de uma das conferências internacionais sobre meio am-biente, a conhecida Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (ECO-92), ocorrida na cidade do Rio de Janeiro, em 1992, e também do RIO + 20, em 2012 (IPEA, 2010, p. 219). Tais eventos suscitaram as questões pertinentes à sustenta-bilidade, fazendo com que os Estados discutissem, entre si, quais medidas deveriam ser tomadas, para que o meio ambiente, o bem em comum dos todos, fosse preservado e seu uso regulado.

As bases da sustentabilidade e a produção agrária

O Direito Agrário está em um constante remodelamento, isso em razão da noção normativa de sustentabilidade. Necessário se faz, então, analisar quais as consequências dessas considerações no tratamento jurídico das atividades de produção agrária.

A sustentabilidade possui três pilares: o econômico, social e ambiental, dos quais não há controvérsias. O componente ético também não pode ser esquecido; sendo assim, também será ana-lisado.

Por diversos anos técnicas foram desenvolvidas para que pu-dessem proporcionar uma maior durabilidade das áreas as quais são realizadas técnicas de produção agrária, tentando mantê-la com certa lucratividade da atividade. Porém, esse esforço, nos tempos atuais, não tem se mostrando muito eficaz, já que a agri-cultura é atividade que raramente se desenvolve sem algum tipo de incentivo estatal, sendo o próprio Direito Agrário expressão que define necessariamente a intervenção do Estado na ativida-de agrícola. Isso acontece, principalmente, depois da “Revolução Verde” (FRANCISCO, 2017), identificada pelo desenvolvimento de novas tecnologias, como utilização de variedades de alto ren-dimento e o emprego de produtos químicos, os quais aumentam a produção, entretanto, os custos também se elevam (PRIMAVES, 1992, p. 9-10).

Importante ressaltar que um dos produtos mais usados e origi-nários dessas tecnologias, são os agrotóxicos, uma vez que o Brasil é um dos países que mais os utilizam em todo o mundo, vindo

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até mesmo liderar o ranking mundial nesse aspecto consumerista. Segundo a Anvisa, na última década, o uso desses produtos cres-ceu cerca de 190%, sendo que 28% desses produtos ainda não são autorizados em nosso país. Esses dados são assustadores quando relacionamos eles com a alimentação, por exemplo. Estudos fei-tos pela Organização Mundial da Saúde indicam que boa parte do surgimento de doenças graves, como o câncer e intoxicações, estão ligadas diretamente ao consumo dos agrotóxicos (ROSSI, 2016). Esse alto consumo, junto às suas consequências, suscitam questões como: Até onde o uso dos agrotóxicos não interfere na sustentabi-lidade de todos que o usam, tanto de forma direta, como indireta?

Quando surgiu a “Revolução Verde” foi bastante útil para o aumento da produção de alimentos, porém, com o decorrer do tempo, constatou-se que esta trouxe graves problemas em relação à equidade da distribuição dos alimentos, assim como à estabilidade e sustentabilidade da produção.

Atualmente, o agricultor está em uma situação na qual neces-sita comprar insumos com um preço elevado, sem poder negociar pelos preços, já que são adquiridos nas grandes empresas multina-cionais, e, concomitantemente, se vê obrigado a vender sua produ-ção com baixa margem de negociação do preço, já que este é dita-do pelas indústrias e pelo mercado internacional (SCAFF, 2012). A sustentabilidade econômica da produção agrária, a princípio, seria muito fácil de ser alcançada, porém hodiernamente é questionada.

É principalmente no aspecto econômico que surge o proble-ma do aumento da produtividade. A possibilidade de a atividade continuar por tempo indeterminado no mercado, ou seja, a sus-tentabilidade econômica de uma atividade produtiva é alcançada quando as receitas são maiores que as despesas. Em princípio, se-ria alcançado com a expansão da produtividade, que requer uma maior eficiência no aproveitamento dos insumos, diminuindo cus-tos e aumentando a receita. É preciso que ocorra um aumento de produtividade, analisando esse aspecto.

A sustentabilidade econômica da produção agrária pode ficar prejudicada se o aumento da produção for excessivo, isso porque se houver uma elevação exacerbada na oferta os preços podem so-frer uma queda, e, por consequência, diminuir a rentabilidade da atividade, isso no continente europeu.

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No Brasil o cenário, pode-se dizer que é inverso, já que a nossa produção agrária se destina aos mercados consumidores externos, ou seja, à exportação. Com isso, quanto mais houver produção, melhor, já que o mercado externo requer uma grande e crescente quantidade, que dificilmente seriam atendidas somente com a pro-dução brasileira.

A produção agrícola cada vez maior é interessante também em outra visão, como a da segurança alimentar, onde a maior oferta de produção ocasionará uma disponibilidade aos alimentos, além de ocasionar uma diminuição nos preços, tornando-os mais acessíveis. E, na realidade brasileira, contribuirá com a campanha contra o desmatamento, já que com uma produtividade maior, não seria necessário ampliar as fronteiras agrícolas para obter maiores produções.

Existem incentivos que contribuem para aumentar a renta-bilidade da atividade agrária, como o pagamento por serviços ambientais, onde ocorre a transferência de recursos a quem con-tribui para manter ou a produzir serviços ambientais. As pessoas que contribuem para a conservação e a manutenção dos serviços ambientais recebem incentivos (NOVION, 2017), assim como as políticas que remuneram os agricultores por outras atividades diferentes do cultivo.

Ainda sobre esses incentivos promovidos pelo Estado, pode-se citar os projetos de lei que estão tramitando na câmara legislativa, o PL-1465/2015, PL-1891/2015, PL-2410/2015 e o PL-4226/2015. Os mesmos versam, por exemplo, sobre a possibilidade dos pro-prietários rurais que promovam proteção e recuperação de nas-centes e demais recursos hídricos em áreas ou bacias hidrográficas, fossem beneficiados com incentivos fiscais e financeiros (MIRAN-DA e BECKER, 2017). Tal proposta exemplifica o equilíbrio eco-nômico que deve ser buscado, onde o produtor/proprietário rural continua exercendo lucros com a utilização da terra, melhor dizen-do, do bem comum, mas não deixa de lado a preservação de tal área, gerando o montante esperado pela sustentabilidade.

A produção agrária sustenta-se não apenas economicamente. É preciso também que ocorra a sustentabilidade social. Nessa visão, a atividade agrária deve propiciar não apenas alguns produtos in-dispensáveis à sociedade (função social), mas também através de

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meios que garantam justiça social, com inclusão e equidade, al-cançando os mais diversos grupos sociais em contato com o meio rural (FREITAS, 2012).

A sustentabilidade, no aspecto social, não pode ser vista como o simples aumento da produção, isso deve acontecer atra-vés da oferta de trabalhos decentes, o qual engloba quatro ele-mentos: emprego, proteção social, os direitos dos trabalhadores e o diálogo social. Na esfera rural, a necessidade de se ter um trabalho decente é ainda mais urgente, já que esses trabalhado-res, por diversas vezes, se encontram em precárias condições, vivendo em extrema pobreza e recebendo baixíssimos salários, e na informalidade. Além de buscar a prática dos empregos ver-des, definidos como aqueles empregos que, nas áreas agrícola, industrial, dos serviços e da administração, buscam preservar e restaurar a qualidade ambiental, diminuindo o impacto ambien-tal de empresas e de setores econômicos para níveis sustentáveis, de maneira a tornar a atividade agrária “socialmente aceitável”.

O último pilar da sustentabilidade da atividade agrária é o ambiental. A necessidade de preservar o ambiente e conservar os recursos naturais são princípios do Direito Agrário. Assim como a produção agrária, a qual não poderá desenvolver-se sem que haja condições ambientais mínimas para que as presentes e futuras ge-rações continuem a desenvolver essa atividade.

Algumas dessas degradações são inerentes à atividade agrá-ria. Para que o meio ambiente fosse protegido integralmente seria preciso que toda atividade produtiva parasse. Entretanto, isso não é possível, já que acabaria com a espécie humana, e não é o que preconiza a noção de sustentabilidade, já que esta também busca o desenvolvimento econômico e social.

Importante se faz ressaltar também acerca das mudanças cli-máticas, sendo um dos problemas ambientais mais sérios, e objeto de diversos tratados internacionais, principalmente pela necessi-dade de uma integração entre grande parte dos países para obter uma solução, ou pelo menos reduzir os seus efeitos. As consequ-ências advindas das mudanças climáticas agridem diretamente a atividade agrária, que terá severos impactos com o aquecimento global, assim como, de outro lado, é essa atividade um dos princi-pais causadores dessas mudanças.

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Ainda sobre essas mudanças climáticas, em uma breve análi-se social, entende-se que tais consequências não serão distribuídas de forma equitativa, visto que na âmbito prático, ou seja, fora do ambiente literário, os países e os povos mais pobres deverão ser os primeiros a serem afetados e os que sofrerão mais com esses impactos, principalmente com os danos maiores, uma vez que a inversão de tal prejuízo é lenta, ainda mais quando os recursos são escassos (IPEA, 2010).

Assim, analisando o que já foi explanado, percebe-se a com-plexidade que está inserida na aplicação dos tradicionais ele-mentos da sustentabilidade às atividades agrárias. Para que pos-sa ser considerada sustentável, é preciso que todos os elementos estejam integrados em todas as atividades que são utilizadas no meio rural, de maneira a alcançar uma sustentabilidade forte e verdadeira.

Outro elemento pode ser encontrado ainda na sustentabi-lidade é o ético, já que, independentemente de sua rentabilida-de econômica, de seu alcance social e de seus paradigmas am-bientais, esse objetivos provocam uma mudança nas noções do que é certo ou não na conduta humana daquele que convive hoje com seus semelhantes e precisa também conviver com o amanhã, com as futuras gerações, e também com o próprio meio ambiente.

O conflito, aparente, entre o desenvolvimento econômico e proteção do meio ambiente é superado pelo paradigma ético da sustentabilidade. Na visão ética, não se pode admitir que uma con-duta que privilegia ganhos econômicos de uns poucos indivíduos em prejuízo de toda a sociedade, no que se atende ao elemento social da sustentabilidade. Também, na visão ética sobre as futuras gerações, ou seja, ao reconhecer que devemos agir de maneira a não deteriorar também aquelas gerações, é que se utiliza o elemen-to ambiental da sustentabilidade.

Importante aduzir que existe, até mesmo área de estudo sobre essa questão, o Ecocentrismo. Tal seara coloca em primeiro plano de discussão e proteção o equilíbrio dos ecossistemas e do meio ambiente natural, onde a natureza, tanto os fatores vivos quanto os fatores que auxiliam a vida e suas inter-relações são protegidos. Isto é, o meio ambiente é protegido por si só, não por seus benefícios

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ao homem, tendo a vida como foco principal (ABREU e BUSSIN-GUER, 2013).

Ainda sobre a questão da ética, Borges (2016) levanta um dos temas mais debatidos atualmente, que é o Direito de Propriedade. Comparando esse ponto com a ética, o referido autor afirma a exis-tência de um choque de interesses patrimoniais com os princípios éticos e morais, bem como, com os direitos humanos, sendo todos esses, influenciadores na forma como são elaboradas as normas de convivência social. Diante de tal indagação, é nítida a importância da ética sobre a elaboração das normas que buscam preservar o meio ambiente, ou melhor dizendo, de todo aquele produto espe-rado pela sustentabilidade. Isto é, o equilíbrio entre o ser humano e os seus direitos naturais.

Palavras Finais

Como dito anteriormente, a definição de sustentabilidade não é pacífica, porém, com o agrupamento de três elementos, os quais devem ser observados simultaneamente, é possível encontrar certa regularidade. Neste sentido, sustentável é a atividade que propor-ciona benefícios econômicos, sociais e ambientais, no mínimo sen-do memorável que o parâmetro ético é também de grande relevân-cia para que isso seja alcançado.

Mesmo que, a princípio, a sustentabilidade não possa ser de-lineada e conceituada, é uma obrigatoriedade dos tempos moder-nos, o que acaba por disseminar um conteúdo normativo, no mun-do e no Brasil, estabelecendo o dever jurídico de observar seus elementos, de maneira conjunta.

O setor agrário é imprescindível na realização dos objetivos da sustentabilidade, que restaura não somente as práticas realizadas com o objetivo de se alcançar a produção agrária como também todo o Direito Agrário.

Uma vez reconhecida que a sustentabilidade possui influência no Direito e também na produção agrária, foi possível enumerar diversas consequências específicas.

Economicamente, a sustentabilidade acarreta um aumento na produtividade; entretanto, de maneira limitada, não comprome-

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tendo os demais aspectos da sustentabilidade, assim como amplia aquilo que se considera produção, diversificando a produção e também os serviços ambientais que ela gera.

O pilar social prevê que a atividade agrária deve buscar elimi-nar a pobreza e a fome, assim como propiciar trabalho decente, podendo materializar pela execução de empregos verdes, indispen-sáveis para o desenvolvimento de uma atividade sustentável.

No aspecto ambiental, compete não só que tecnologias ade-quadas sejam empregadas e dissipadas, como também que os re-cursos naturais utilizados sejam valorizados, cuidando para que não ocorra a destruição da terra, com as mudanças climáticas.

Finalmente, é necessário que ocorra uma correção nos rumos da ética humana, para integrar outras formas de vida como sujei-tos e não objetos, da definição do que é certo e errado. Todos os seres que fazem parte do meio ambiente são sujeitos capacitados a exigir uma nova conduta do ser humano. Sem renovar esses para-digmas, a sustentabilidade, inclusive na atividade agrária, não será inteiramente alcançada.

Referências

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Os organizadores

Marcelo Cervo Chelotti Professor Associado, docente nos cursos de Graduação (Bacha-

relado e Licenciatura) e Pós-Graduação (Mestrado e Doutorado) em Geografia da Universidade Federal de Uberlândia (MG). Dou-torado em Geografia pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU-MG), com estágio na Universidade de Buenos Aires (UBA). Mestrado em Geografia pela Universidade Estadual Paulista (UNESP-PP). Graduação em Geografia pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM-RS). Membro do Laboratório de Geogra-fia Agrária (LAGEA) e Núcleo de Estudos Agrários e Territoriais (NEAT-CNPq). Experiência em Geografia Humana, com ênfase em Geografia Agrária, atuando principalmente nos seguintes te-mas: Desenvolvimento Rural; Processos de Reterritorialização, Re-produção Social da Agricultura Familiar e Educação do Campo. E-mail: [email protected]

Roberto Barboza Castanho Possui graduação em Geografia Licenciatura pela Universidade

Federal de Santa Maria - UFSM (2000), mestrado em Engenharia Agrícola pela Universidade Federal de Santa Maria (2003) com par-te realizada na Università Degli Studi di Udine - em Udine na Itália. Realizou o Doutorado em Geografia na Universidade Federal de Uberlândia - UFU (2006), já na Universidad de Buenos Aires - UBA, efetuou os estudos de Pós-Doutorado em Ciencias Humanas y So-ciales (2013) da Facultad de Filosofía y Letras. Atualmente é profes-sor Associado II da Universidade Federal de Uberlândia, Campus de Ituiutaba, MG, na Faculdade de Ciências Integradas - FACIP, no Curso de Graduação em Geografia e no Programa de Pós Gradua-ção em Geografia - PPGEP. Tem experiência na área de Geografia, com ênfase em Geoprocessamento, atuando principalmente nos seguintes temas: Cartografia, Sistema de Informações Geográficas, Sensoriamento Remoto, Fotointerpretação, meio ambiente, geo-grafia agrária, agricultura sustentável e desenvolvimento regional. Coordena o Laboratório de Cartografia da FACIP – LABCARTO. E-mail: [email protected]

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Os organizadores e os autores

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Os autores

Alex Cristiano de Souza Possui graduação em Geografia Licenciatura pela Universidade

Federal de Alfenas (2012) e mestrado em Geografia pela Uni-versidade Federal de Uberlândia (2016). Atualmente é estudante de doutorado da Universidade Federal de Uberlândia. Tem ex-periência na área de Geografia, com ênfase em Geografia Hu-mana, atuando principalmente nos seguintes temas: Educação, Ensino de Geografia, educação do campo e Geografia Agrária. E-mail: [email protected]

Eduardo Marques Silveira Graduado em Geografia, Licenciatura e Bacharelado pela Univer-

sidade Federal de Uberlândia - Faculdade de Ciências Integradas do Pontal (2014). Mestre no Programa de Pós-Graduação em Ge-ografia pela Universidade Federal de Santa Maria. Tem como te-mática de pesquisas geotecnologias, a produção agropecuária e a regionalização. É membro do Núcleo de Estudos Regionais e Agrá-rios (NERA).

E-mail: [email protected]

Fausto Amador Alves Neto Advogado. Mestre em Geografia pela Universidade Federal de Uber-

lândia (2016). Especialista em Direito do Trabalho pela Universida-de Norte do Paraná (2014). Graduação em Direito pela Fundação Educacional de Ituiutaba - UEMG (2011). Presidente da Comissão OAB/Jovem da 44ª Subseção da OAB/MG (triênio 2016/2018). Professor dos cursos de Direito e Educação Física na Universida-de do Estado de Minas Gerais (UEMG) - Unidade Ituiutaba/MG. E-mail: [email protected]

Franco Andrei Borges Possui Mestrado em Geografia (2015) - Licenciatura e Bacharelado

em Geografia pela Universidade Federal de Uberlândia (2010), es-pecialização em educação ambiental, é membro do laboratório de Geografia Agrária - LAGEA do Instituto de Geografia da Universi-dade Federal de Uberlândia - MG , estuda e pesquisa temas como Território, Desterritorialização, Territorialização e Reterritorializa-

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Os organizadores e os autores

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ção, Identidade cultura, origem cigana, cultura oral e ciganos em Uberlândia, assentados ciganos em projetos de reforma agrária. E-mail: [email protected]

Jeziel Alves Rezende Possui Licenciatura Educação Física (1983), Pós-graduação em

Educação Física pela Universidade Federal de Uberlândia (1993), Mestrado em Psicanalise, Educação e Sociedade (Ata de Defesa - 2010 ). Mestrado em Geografia pelo Programa de Pós-graduação em Geografia na UFU - FACIP. Atualmente é professor Assistente na UEMG ( Unidade Ituiutaba 40 hs/ semanal), e PSE-10 da Pre-feitura Municipal de Ituiutaba. Na Geografia desenvolve estudos no campo da Geografia do Trabalho, sendo membro do GEPEAT (Grupo de Pesquisa e Estudos em Geografia Agrária e Trabalho). E-mail: [email protected]

Joelma Cristina dos Santos Possui graduação em Geografia pela Universidade Estadual Pau-

lista Júlio de Mesquita Filho (2001), mestrado em Geografia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2004) e Doutorado em Geografia pela Universidade Federal de Uberlândia (2009). Atualmente é docente com dedicação exclusiva no curso de graduação em Geografia da FACIP/UFU, em Ituiutaba/MG e do Programa de Pós-Graduação em Geografia - PPGEP (Mestrado Acadêmico - FACIP/UFU). Tem experiência na área de Geografia, com ênfase em Geografia Econômica, Geografia Agrária, Geogra-fia do Trabalho, atuando principalmente nos seguintes temas: rela-ção capital x trabalho, mundo do trabalho, relação cidade-campo, migração, precarização, agroindústria canavieira. Colaboradora em projeto de Pesquisa/extensão financiado pela FAPEMIG e coordenadora de projetos com financiamento externo do CNPq. E-mail: [email protected]

Matheus Eduardo Souza Teixeira Discente do Curso de Graduação de Licenciatura e Bachare-

lado em Geografia da Universidade Federal de Uberlândia, na Faculdade de Ciências Integradas do Pontal - FACIP. Atual-mente é bolsista do PIBIC/CNPq, da Faculdade de Ciências In-tegradas do Pontal - FACIP - UFU. Membro do Núcleo de Estu-dos e Pesquisas em Geoprocessamento aplicado a Mapeamen-

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Os organizadores e os autores

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tos Ambientais (NEPEGAMA). Estuda e pesquisa temas como Produção Agropecuária; Geoprocessamento; Território; Cir-cuitos Produtivos; Círculos de Cooperação e Espaço Agrário. E-mail: [email protected]

Meri Lourdes Bezzi Possui Graduação em Estudos Sociais pela Faculdade de Filosofia

Ciências e Letras/ Imaculada Conceição - FIC- Santa Maria (1981); Bacharelado em Geografia pela Universidade Federal de Santa Maria (1982); Graduação em Geografia Licenciatura Plena pela Universidade Federal de Santa Maria (1983); Mestre em Geografia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho/Rio Claro (1986) e Doutora em Geografia pela Universidade Estadu-al Paulista Júlio de Mesquita Filho/Rio Claro (1997). Atualmen-te é professora Titular no Departamento de Geociências/UFSM, atuando nos Cursos de Graduação em Geografia Bacharelado e Geografia Licenciatura Plena e no Programa de Pós - graduação em Geografia da UFSM orientado mestrado e doutorado. Coor-dena o Núcleo de Estudos Regionais e Agrários, NERA - UFSM. Coordenadora do Curso de Geografia Licenciatura- EAD. Tem experiência na área de Geografia, com ênfase em Geografia Hu-mana e Regional, atuando principalmente nos seguintes linhas: Organização do Espaço, Região e Regionalização, Geografia Cultural, Desenvolvimento local/regional e Geografia Agrária. E-mail: [email protected]

Thales Silveira Souto Doutorando em Geografia pelo Programa de Pós-Graduação

em Geografia, na Universidade Federal de Santa Maria - UFSM. Bolsista CAPES. Mestre em Geografia pelo Programa de Pós--Graduação em Geografia, na Universidade Federal de Santa Maria - UFSM. Bolsista CAPES (2016). Graduado em Geografia com habilitação em Bacharelado e Licenciatura pela Universida-de Federal de Uberlândia / Faculdade de Ciências Integradas do Pontal / Câmpus Pontal, em Ituiutaba, MG (2014). Discente Membro dos Grupos de Pesquisas: Núcleo de Estudos Regio-nais e Agrários; Núcleo de Estudos e Pesquisas em Geoproces-samento Aplicado a Mapeamentos Ambientais; Grupo de Es-tudos e Pesquisas: Geotecnologias e Dinâmicas Socioespacial. E-mail: [email protected]

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Os organizadores e os autores

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Yann Almeida Batista Técnico em Informática pelo Instituto Federal do Triângulo

Mineiro - Campus Ituiutaba (2011-2013). Atualmente é discente do Curso de Direito na Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Ituiutaba. Monitor de Processo Civil I na mesma instituição. Estagiário lotado na 1ª Vara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais - Comarca de Ituiutaba. Colaborador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Geoprocessamento aplicado a Mapeamentos Ambientais (NEPEGAMA) da Faculdade de Ciência Integradas do Pontal - FACIP – UFU. E-mail: [email protected]

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Esta obra foi impressa em processo digital, na Oficina de Livros para a Letra Capital Editora.

Utilizou-se o papel Pólen Soft 80g/m² e a fonteITC-NewBaskerville corpo 11 com entrelinha 14.

Rio de Janeiro, janeiro de 2018.