apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

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1 DIREITO DAS OBRIGAÇÕES Direito das Obrigações: Em objetiva definição, trata-se do conjunto de normas e princípios jurídicos reguladores das relações patrimoniais entre um credor (sujeito ativo) e um devedor (sujeito passivo) a quem incumbe o dever de cumprir, espontânea ou coativamente, uma prestação de dar, fazer ou não fazer. INTRODUÇÃO INTRODUÇÃO INTRODUÇÃO INTRODUÇÃO 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS: Relação Jurídica: Vínculo entre pessoas, em razão do qual uma pode pretender um bem a que a outra é obrigada. Só haverá relação jurídica se o vínculo entre pessoas estiver normatizado, isto é, regulado por norma jurídica, que tem por escopo protegê-lo. Elementos da relação jurídica: Sujeito ativo: beneficiário principal Sujeito passivo: sujeito que adota determinado comportamento a favor do sujeito ativo Vínculo: ligação entre o sujeito ativo e o sujeito passivo – concretização da norma jurídica Objeto: razão pela qual é instituída a relação jurídica

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Page 1: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

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DIREITO DAS OBRIGAÇÕES

Direito das Obrigações: Em objetiva definição, trata-se do conjunto de normas

e princípios jurídicos reguladores das relações patrimoniais entre um credor

(sujeito ativo) e um devedor (sujeito passivo) a quem incumbe o dever de

cumprir, espontânea ou coativamente, uma prestação de dar, fazer ou não

fazer.

INTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃO

1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS:

Relação Jurídica:

Vínculo entre pessoas, em razão do qual uma pode pretender um bem a

que a outra é obrigada. Só haverá relação jurídica se o vínculo entre pessoas

estiver normatizado, isto é, regulado por norma jurídica, que tem por escopo

protegê-lo.

Elementos da relação jurídica:

• Sujeito ativo: beneficiário principal

• Sujeito passivo: sujeito que adota determinado comportamento a favor do

sujeito ativo

• Vínculo: ligação entre o sujeito ativo e o sujeito passivo – concretização

da norma jurídica

• Objeto: razão pela qual é instituída a relação jurídica

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De acordo com o objeto, a relação jurídica pode ser:

a) Obrigacional:

- objeto: prestação (dar, fazer ou não fazer alguma coisa)

- sujeito passivo determinável (relação se estabelece entre duas

pessoas)

b) Real

- objeto: bem ou coisa (direito de propriedade)

- sujeito passivo indeterminável (coletividade)

c) Pessoal:

- objeto: modo de ser da pessoa (direitos da personalidade)

- sujeito passivo indeterminável (coletividade)

Direito Obrigacional Direito Real Relações humanas Exercido e recai diretamente sobre

a coisa Tem sujeito ativo e passivo Segundo a teoria clássica, tem

apenas sujeito ativo Direito relativo – a prestação só pode ser exigida do devedor

Direito absoluto – oponível contra todos

Cooperativo – comporta sujeito ativo (credor), sujeito passivo (devedor), e a prestação (objeto da relação).

Atributivo – não comporta mais de um titular, que exerce seu poder sobre a coisa objeto de seu direito de forma direta e imediata.

Concede direito a uma ou mais prestações efetuadas por uma pessoa.

Concede o gozo e a fruição de bens.

O credor, quando recorre à execução forçada, tem apenas uma garantia geral do patrimônio do devedor, não podendo escolher

Direito de sequela: seu titular pode perseguir o exercício de seu poder perante quaisquer mãos nas quais se encontre a coisa.

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determinados bens para recair a satisfação de seu crédito. Caráter essencialmente transitório. Sentido de inconsumibilidade, de

permanência. Extingue-se pela inércia Conserva-se até que haja uma

situação contrária em proveito de outro titular

Relações obrigacionais são infinitas.

Numerus clausus

Obs.: Categorias jurídicas híbridas:

� Obrigações propter rem:

- são as que recaem sobre uma pessoa por força de um determinado

direito real, permitindo sua liberação pelo abandono do bem.

- caracteres: . vinculação a um direito real

. possibilidade de exoneração do devedor

. transmissibilidade por meio de atos jurídicos, caso em que

a obrigação recairá sobre o adquirente

- natureza jurídica: são figuras transacionais entre o direito real e o

pessoal, de fisionomia autônoma, constituindo um tertium genus, ou seja,

obrigações acessórias mistas, por serem uma relação jurídica na qual a

prestação está vinculada a um direito real.

� Ônus reais: são obrigações que limitam a fruição e a disposição da

propriedade. São obrigações de realizar periodicamente uma prestação,

que recaem sobre o titular de certo bem; logo, ficam vinculadas à coisa,

que servirá de garantia ao seu cumprimento.

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� Obrigação com eficácia real: a obrigação terá eficácia real quando, sem

perder seu caráter de direito a uma prestação, se transmite e é oponível a

terceiro que adquira direito sobre determinado bem.

2. CONCEITO DE OBRIGAÇÃO

A obrigação é a relação jurídica, de caráter transitório, estabelecida entre

devedor e credor e cujo objeto consiste numa prestação pessoal econômica,

positiva ou negativa, devida pelo primeiro ao segundo, garantindo-lhe o

adimplemento através de seu patrimônio.

3. RELAÇÃO JURÍDICA OBRIGACIONAL

• Elementos:

a) Sujeito ativo: credor

b) Sujeito passivo: devedor

O sujeito ativo tem a expectativa de obter do devedor o desempenho da

obrigação, isto é, o fornecimento da prestação, enquanto ao sujeito passivo

cumpre o dever de colaborar com o credor, fornecendo-lhe a prestação devida.

Note-se que na espécie surge uma limitação à liberdade do devedor, que

deve dar, fazer ou não fazer alguma coisa em favor de outrem. Mas tal

limitação ou adveio de sua vontade, ou de seu comportamento desastrado

(hipótese de ato ilícito), ou derivou de imposição legal. Em qualquer dos casos,

entretanto, está ele legalmente vinculado e, na hipótese de inadimplemento,

pode o credor colher, judicialmente, no patrimônio do devedor, recursos para a

satisfação de seu direito.

c) Vínculo jurídico: sujeita o devedor à realização de um ato positivo ou

negativo no interesse do credor, unindo os dois sujeitos e abrangendo o dever

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da pessoa obrigada (debitum) e sua responsabilidade, em caso de

inadimplemento (obligatio). Assim, na obrigação reúnem-se e se completam,

constituindo uma unidade, o dever primário do sujeito passivo de satisfazer a

prestação, e o correlato direito do credor de exigir judicialmente o seu

cumprimento, investindo contra o patrimônio do devedor, visto que o mesmo

fato gerador do débito produz a responsabilidade.

Teorias:

- Monista: um único vínculo entre credor e devedor

- Dualista: existe o vínculo de débito e o vínculo de responsabilidade

- Eclética: débito e responsabilidade fazem parte de um único vínculo

Obs.: O elemento débito consiste no dever que incumbe ao sujeito passivo

de prestar aquilo a que se comprometeu.

O elemento responsabilidade é representado pela prerrogativa conferida

ao credor, ocorrendo inadimplência, de proceder à execução do patrimônio do

devedor, para obter satisfação de seu crédito. Da maneira que o devedor se

obriga, seu patrimônio responde.

O elemento débito supõe a atividade espontânea do devedor, que a pode

descumprir, mas da responsabilidade não se pode ele esquivar.

Questão – Que se entende por “Schuld” e “Haftung”? Em alemão, “Schuld” pode significar culpa ou débito. “Haftung”, e também

“Haftpflicht”, por sua vez, podem traduzir responsabilidade. No Direito Civil, a palavra Schuld identifica-se com o débito e Haftung com a

responsabilidade. Normalmente, débito e responsabilidade se verificam conjuntamente na mesma

pessoa do devedor, mas é perfeitamente possível que a responsabilidade seja de outro sujeito que não o devedor, como nos casos de fiança, de aval, de direitos reais de garantia (hipoteca, penhor, anticrese).

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d) Objeto da obrigação: prestação positiva ou negativa do devedor, desde que

lícita, possível física e juridicamente, determinada ou determinável, e suscetível

de estimação econômica.

- imediato: prestação (dar, fazer ou não fazer alguma coisa)

- mediato: um bem (é a coisa devida) – É o objeto da prestação, e não da

obrigação. Ex: o objeto da obrigação de um médico para com seu cliente é

prestação geradora de obrigação de fazer. Já o objeto dessa prestação é, p.ex., a

realização de cirurgia plástica.

• Conceito de relação jurídica obrigacional: Obrigação, em sentido jurídico

e enquanto objeto do Direito das Obrigações, é vínculo jurídico pelo qual

devedor fica adstrito a cumprir prestação de caráter patrimonial em favor de

credor, p qual poderá exigir judicialmente seu cumprimento.

4. PRINCÍPIOS DO DIREIRO OBRIGACIONAL

a) Boa-fé objetiva:

A boa-fé pode ser compreendida sob dois enfoques: o subjetivo e o

objetivo.

A boa-fé subjetiva consiste no estado de espírito do agente, sendo

caracterizada pela análise das intenções da pessoa cujo comportamento se

queira qualificar. Traduz-se na sinceridade, veracidade ou franqueza com que a

parte se relaciona, não se utilizando de mentira, hipocrisia ou duplicidade,

enfim, não se utilizando de má-fé.

Já como princípio informador da validade e eficácia das obrigações,

deve ser observado a boa-fé objetiva, princípio integrante da concepção social

do direito contratual, que representa uma cláusula geral de lealdade e

colaboração para o alcance dos fins contratuais.

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A boa-fé objetiva consiste num dever geral de conduta, que atribui às

partes o dever de agir no sentido da recíproca cooperação, confiança, lealdade,

correção e lisura, a fim de se garantir a segurança e manutenção das relações

jurídicas.

Boa-fé objetiva significa uma atuação “refletida”, uma atuação

refletindo, pensando no outro, no parceiro contratual, respeitando-o, respeitando

seus interesses legítimos, suas expectativas razoáveis, seus direitos, agindo com

lealdade, sem abuso, sem obstrução, sem causar lesão ou desvantagem

excessiva, cooperando para atingir o bom fim das obrigações: o cumprimento

do objetivo contratual e a realização dos interesses das partes.

b) Autonomia da Vontade:

O princípio da autonomia da vontade significa que a obrigação

contratual tem por fonte única a vontade das partes, que podem convencionar o

que desejarem, na forma que quiserem, dentro dos limites de ordem pública.

Cabe a lei apenas assegurar o respeito ao que foi livremente estipulado e

fornecer elementos interpretativos ou supletivos da vontade das partes.

A autonomia da vontade pauta-se na existência da faculdade de

escolha entre contratar ou não contratar, de escolha do outro contratante, além

da escolha do conteúdo e da forma do contrato. Assim, tem como alicerce a

ampla liberdade contratual, o poder dos contratantes de disciplinar os seus

interesses mediante acordo de vontades, suscitando efeitos tutelados pela ordem

jurídica.

c) Proibição de enriquecimento ilícito:

- Conceito: Existe enriquecimento ilícito sempre que houver uma

vantagem de cunho econômico em detrimento de outrem, sem justa causa.

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Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.

Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido.

Art. 885. A restituição é devida, não só quando não tenha havido causa que justifique o enriquecimento, mas também se esta deixou de existir.

- Subsidiariedade (art. 886, CC):

Art. 886. Não caberá a restituição por enriquecimento, se a lei conferir ao lesado outros meios para se ressarcir do prejuízo sofrido.

A ação é o último meio de que se pode valer a parte, na inexistência de

qualquer outra no sistema jurídico, isto é, na impossibilidade de uma ação

derivada de um contrato, ou de um ato ilícito, ou simplesmente da ação de

anulação ou nulidade de um negócio jurídico.

O caráter subsidiário da ação resulta de circunstâncias de fato, pois,

enquanto não esgota o prejudicado todos os meios normais de ressarcimento,

não há que se falar em empobrecimento. Daí concluir-se que a inexistência de

qualquer outro remédio para o agente é um fator a mais a concluir pela

inexistência de um injusto enriquecimento, numa verdadeira condição de

procedibilidade.

- prescrição: “Art. 206. Prescreve: (...) § 3o Em três anos: (...) IV - a

pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa;”

5. FONTES:

Constituem fontes das obrigações os fatos jurídicos que dão origem aos

vínculos obrigacionais, em conformidade com as normas jurídicas.

A – Fonte Imediata: Lei

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B – Fonte Mediata:

a) Contrato: negócio jurídico bilateral ou plurilateral, originário de acordo de

vontades, em conformidade com a lei, capaz de criar, modificar e extinguir

direitos.

b) Quase-contrato: assemelha-se ao contrato, com o qual mantém afinidade,

distinguindo-se dele, todavia, porque lhe falta o acordo de vontades.

b.1) Gestão de negócios: é a administração de negócios alheios sem o

conhecimento do dono. Assim, se recolho a correspondência de vizinhos em

viagem, sem qualquer combinação prévia, serei gestor de negócios. Se em meio

à correspondência descubro conta vincenda e a pago, farei jus ao reembolso,

como se o vizinho me houvesse pedido para pagar. Na verdade, não houve

contrato, mas é como se tivesse havido.

b.2) Promessa de recompensa

b.3) Pagamento indevido: ocorre quando o devedor realiza o pagamento

não ao credor, mas sim a uma outra pessoa (com a qual inexiste a relação

jurídica obrigacional). Dessa situação surgem duas consequências: quem paga

mal para duas vezes; repetição do indébito (pedir de volta). É importante

ressaltar que existem casos em que não cabe a repetição.

Art. 880. Fica isento de restituir pagamento indevido aquele que, recebendo-o

como parte de dívida verdadeira, inutilizou o título, deixou prescrever a pretensão ou

abriu mão das garantias que asseguravam seu direito; mas aquele que pagou dispõe

de ação regressiva contra o verdadeiro devedor e seu fiador.

Art. 881. Se o pagamento indevido tiver consistido no desempenho de obrigação

de fazer ou para eximir-se da obrigação de não fazer, aquele que recebeu a prestação

fica na obrigação de indenizar o que a cumpriu, na medida do lucro obtido.

Art. 882. Não se pode repetir o que se pagou para solver dívida prescrita, ou

cumprir obrigação judicialmente inexigível.

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Art. 883. Não terá direito à repetição aquele que deu alguma coisa para obter fim

ilícito, imoral, ou proibido por lei.

Parágrafo único. No caso deste artigo, o que se deu reverterá em favor de

estabelecimento local de beneficência, a critério do juiz.

b.4) Delito (dolo): é ato ilícito doloso, praticado com a intenção de causar

dano a outrem.

b.5) Quase-delito (culpa): é ato ilícito culposo, involuntário. Baseia-se

não no dolo, mas na imprudência, negligência ou imperícia do agente.

6. DISTINÇÃO ENTRE OBRIGAÇÃO E RESPONSABILIDADE:

A relação jurídica obrigacional resulta da vontade humana ou da vontade

do Estado, por intermédio da lei, e deve ser cumprida espontânea e

voluntariamente. Quando tal fato não acontece, surge a responsabilidade. Esta,

portanto, não chega a despontar quando se dá o que normalmente acontece: o

cumprimento da prestação. Cumprida, a obrigação se extingue. Não cumprida,

nasce a responsabilidade, que tem como garantia o patrimônio geral do

devedor.

A responsabilidade é, assim, a consequência jurídica patrimonial do

descumprimento da relação obrigacional. Pode-se, pois, afirmar que a relação

obrigacional tem por fim precípuo a prestação devida e, secundariamente, a

sujeição do patrimônio do devedor que não a satisfaz.

Embora os dois conceitos estejam normalmente ligados, nada impede que

haja uma obrigação sem responsabilidade ou vice-e-versa.

Como exemplo do primeiro caso, costuma-se citar as obrigações naturais,

que não são exigíveis judicialmente, mas que, uma vez pagas, não dá margem à

repetição do indébito, como ocorre em relação às dívidas de jogo e aos débitos

prescritos pagos após o decurso do prazo prescricional.

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Há, ao contrário, responsabilidade sem obrigação no caso de fiança, em

que o fiador é responsável, sem ter dívida, surgindo o seu dever jurídico com o

inadimplemento do afiançado em relação à obrigação originária por ele

assumida.

7. CLASSIFICAÇÃO DAS OBRIGAÇÕES:

Obrigações consideradas em si mesmas

Em relação ao seu vínculo Obrigação moral Obrigação civil Obrigação natural

Quanto ao seu objeto

Relativamente à sua natureza

Obrigação de dar Obrigação de fazer Obrigação de não fazer Obrigação positiva e negativa

Em atenção à sua liquidez

Obrigações líquidas Obrigações ilíquidas

Quanto ao seus elementos

Obrigações simples Obrigações compostas ou complexas

Cumulativas ou conjuntivas Alternativas Facultativas

Relativamente ao tempo de adimplemento

Obrigação momentânea ou instantânea Obrigação de execução diferida Obrigação de execução continuada ou periódica

Quanto aos elementos acidentais

Obrigação pura Obrigação condicional Obrigação modal Obrigação a termo

Em relação à pluralidade de sujeitos

Obrigação única

Obrigação múltipla Obrigação divisível ou indivisível Obrigação solidária

Quanto ao conteúdo Obrigação de meio Obrigação de resultado Obrigação de garantia

Obrigações reciprocamente

consideradas

Obrigação principal: subsistem por si. Obrigação acessória: dependem da existência da obrigação principal e lhe seguem o destino.

Obrigações com cláusula penal

São aquelas em que há a cominação de uma multa ou pena para o caso de inadimplemento ou de retardamento do cumprimento da avença.

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a) Em relação ao vínculo: Civis, Morais ou Naturais:

� Obrigação Civil: é a que, fundada no vinvulum juris, sujeita o devedor à

realização de uma prestação no interesse do credor, estabelecendo um

liame entre os dois sujeitos, abrangendo o dever da pessoa obrigada

(debitum) e sua responsabilidade em caso de inadimplemento (ibligatio),

possibilitando ao credor recorrer à intervenção estatal para obter a

prestação, tendo como garantia o patrimônio do devedor.

� Obrigação Moral: é a que, fundada no vinculum solius aequitatis, sem

obligatio, constitui mero dever de consciência, sendo cumprida apenas

por questão de princípios; logo, sua execução é mera liberalidade.

� Obrigação Natural:

- Conceito: é aquela em que o credor não pode exigir do devedor certa

prestação, embora em caso de seu adimplemento, espontâneo ou voluntário,

possa retê-la a título de pagamento e não de liberalidade.

- Caracteres:

. Não é obrigação moral

. Acarreta inexigibilidade da prestação

. Se for cumprida espontaneamente por pessoa capaz, ter-se-á a

validade do pagamento

. Produz irretratabilidade do pagamento feito em seu cumprimento

. Seus efeitos dependem de previsão normativa

- Efeitos:

. Ausência do direito de ação do credor para exigir seu

adimplemento

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. Denegação da repetitio indebiti ao devedor que a realizou

. Não é suscetível de novação e de compensação

. Não comporta fiança

. Não lhe será aplicável o regime prescrito para os vícios

redibitórios

- Obrigação natural no direito brasileiro

Art. 814. As dívidas de jogo ou de aposta não obrigam a pagamento; mas não se pode recobrar a quantia, que voluntariamente se pagou, salvo se foi ganha por dolo, ou se o perdente é menor ou interdito.

§ 1o Estende-se esta disposição a qualquer contrato que encubra ou envolva reconhecimento, novação ou fiança de dívida de jogo; mas a nulidade resultante não pode ser oposta ao terceiro de boa-fé.

§ 2o O preceito contido neste artigo tem aplicação, ainda que se trate de jogo não proibido, só se excetuando os jogos e apostas legalmente permitidos.

§ 3o Excetuam-se, igualmente, os prêmios oferecidos ou prometidos para o vencedor em competição de natureza esportiva, intelectual ou artística, desde que os interessados se submetam às prescrições legais e regulamentares.

Art. 815. Não se pode exigir reembolso do que se emprestou para jogo ou aposta, no ato de apostar ou jogar.

Art. 882. Não se pode repetir o que se pagou para solver dívida prescrita, ou cumprir obrigação judicialmente inexigível.

Art. 883. Não terá direito à repetição aquele que deu alguma coisa para obter fim ilícito, imoral, ou proibido por lei.

Parágrafo único. No caso deste artigo, o que se deu reverterá em favor de estabelecimento local de beneficência, a critério do juiz.

-Natureza: trata-se de norma não autônoma, por não autorizar o

emprego da coação como meio para conseguir a observância de seus preceitos,

mas que tem juridicidade por se ligar essencialmente a uma norma que

contenha tal autorização, visto que apenas estabelece negativamente o

pressuposto da sanção.

b) Quanto aos seus elementos: Obrigações Simples ou Complexa

Obrigações simples são as que se apresentam com um sujeito ativo, um

sujeito passivo e um único objeto, ou seja, com todos os elementos no singular.

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Se um dos elementos estiver no plural, a obrigação é composta ou

complexa.

As obrigações compostas com multiplicidade de objetos podem ser:

- cumulativas ou conjuntivas: objetos ligados pela conjunção “e”;

- alternativas: objetos ligados pela disjuntiva “ou”;

- facultativas: com faculdade de substituição do objeto, conferida ao

devedor.

c) Impessoais (fungíveis) ou Intuito personae (infungíveis)

Impessoal é a obrigação em que o importante é o objeto e não os sujeitos.

É a obrigação em que a pessoa do devedor é facilmente substituível.

Quando a obrigação é contraída tendo em mira exclusivamente a pessoa

do devedor, como é o caso do artista contratado para restaurar uma obra de arte,

a obrigação é intuito personae, porque se leva em conta as qualidades pessoais

do obrigado.

Logo, as obrigações impessoais, sempre que possível, se transmitem aos

herdeiros do devedor morto, o que não ocorre com as intuito personae. Desse

modo, se compro um imóvel e o vendedor morre antes de concluído o contrato

definitivo, seus herdeiros serão obrigados a concluí-lo. Tal não ocorrerá se um

palestrista morrer antes de proferir a palestra que lhe fora encomendada. O

máximo que pode acontecer, neste caso, é que caso o palestrista tenha recebido

honorários adiantados, seus herdeiros terão que restituí-los, tirando-os da

herança que receberem, e não do próprio patrimônio.

d) Quanto ao conteúdo: Obrigações de Meio ou de Resultado

Nas obrigações de meio, o resultado não é o seu objeto, mas sim o

processo para se alcançar. Assim, é obrigação do médico fornecer os meios para

curar o doente. Não é de resultado, por ser este imprevisível.

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Logo - obrigação de meio: cumpro a obrigação se utilizar os meios

adequados para tanto. [ex.: advogado, médico (exceto cirurgião plástico)]

A obrigação é de resultado quando o fim por ela colimado é algo perfeito,

acabado. Ex.: obrigação contraída em compra e venda – o objetivo, qual seja, a

transferência da propriedade de um bem ao comprador, é resultado.

Logo – obrigação de resultado: cumpro a obrigação ao obter o resultado

esperado [ex.: dentista, transportador] – responsabilidade objetiva.

Nas obrigações de resultado, a inexecução implica falta contratual,

dizendo-se que existe, em linhas gerais, presunção de culpa, ou melhor, a culpa

é irrelevante na presença do descumprimento contratual (art. 389, CC). Nas

obrigações de meio, por outro lado, o descumprimento deve ser examinado na

conduta do devedor, de modo que a culpa não pode ser presumida, incumbindo

ao credor prová-la cabalmente.

e) Reais ou Propter rem:

Vínculo real é elo entre titular de coisa e os não titulares. Assim, se sou

dono de uma coisa, haverá elo entre mim, titular, e todas as demais pessoas da

sociedade, ou seja, não-titulares. Para mim, haverá direito sobre a coisa, direito

de propriedade. Para todos os demais, haverá dever de não molestar meu direito

de propriedade. A esse dever de se abster, em frente ao direito que uma pessoa

tem sobre uma coisa, chamam obrigação real.

Quando a um direito real acede uma faculdade de reclamar prestação de

uma pessoa determinada, surge para esta a chamada obrigação propter rem.

“Propter rem” quer dizer “por causa de uma coisa”. Também chamada de “ob

rem” ou simplesmente “in rem”.

Trata-se, em verdade, de uma obrigação de natureza mista (real e

pessoal), e que se vincula a uma coisa, acompanhando-a (ex.: obrigação de

pagar taxa condominial). São determinadas por lei.

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Nesse sentido, tem-se o seguinte julgado do STJ:

“AÇÃO DE COBRANÇA. COTAS DE CONDOMÍNIO. LEGITIMIDADE PASSIVA. PROPRIETÁRIO DO IMÓVEL, PROMISSÁRIO COMPRADOR OU POSSUIDOR. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA. RECURSO NÃO CONHECIDO. 1. As cotas condominiais, porque decorrentes da conservação da coisa, situam-se como obrigações propter rem, ou seja, obrigações reais, que passam a pesar sobre quem é o titular da coisa; se o direito real que a origina é transmitido, as obrigações o seguem, de modo que nada obsta que se volte a ação de cobrança dos encargos condominiais contra os proprietários. 2. Em virtude das despesas condominiais incidentes sobre o imóvel, pode vir ele a ser penhorado, ainda que gravado como bem de família. 3. O dissídio jurisprudencial não restou demonstrado, ante a ausência de similitude fática entre os acórdãos confrontados. 4. Recurso especial não conhecido.” (REsp 846.187/SP, Rel. Ministro Hélio Quaglia Barbosa, Quarta Turma, julgado em 13.03.2007, DJ 09.04.2007 p. 255).

No próximo julgado, observa-se que a obrigação de pagar taxa de

condomínio (propter rem) tem preferência, inclusive, sobre a obrigação de

pagar credor com garantia de hipoteca sobre o imóvel:

“CIVIL E PROCESSUAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CRÉDITO CONDOMINIAL. PREFERÊNCIA AO CRÉDITO HIPOTECÁRIO. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. ALEGAÇÃO DE OFENSA A DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. ANÁLISE IMPOSSÍVEL NA VIA RECURSAL ELEITA. IMPROVIMENTO. I. O crédito condominial tem preferência sobre o crédito hipotecário por constituir obrigação propter rem, constituído em função da utilização do próprio imóvel ou para evitar-lhe o perecimento. Precedentes do STJ. II. Inviável ao STJ, na sede recursal eleita, a apreciação de suposta ofensa a normas constitucionais, por refugir à sua competência. III. Agravo regimental improvido.” (AgRg no REsp 1039117/SP, Rel. Ministro Aldir Passarinho Junior, Quarta Turma, julgado em 23/06/2009, DJe 24/08/2009). São características das obrigações propter rem:

- são acessórias de direito real, do qual decorrem;

- apesar de acessórias dos direitos reais, não geram direitos reais para o

credor. Ex.: o Fisco não tem direito real sobre o imóvel sobre o qual recai o

IPTU;

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- são típicas, enumeradas em lei, exatamente por estarem ligadas aos

direitos reais. Em outras palavras, não podem ser criadas por convenção.

Não confunda a “obrigação propter rem” com a “obrigação com eficácia

real”, que traduz, simplesmente, uma obrigação com oponibilidade erga omnes,

ou seja, oponível a qualquer pessoa. É o caso da anotação da obrigação locatícia

(contrato de locação) levada ao Registro de Imóveis (art. 8º da Lei do

Inquilinato): neste caso, mesmo com a alienação do imóvel a obrigação em face

do locatário deverá ser respeitada por qualquer eventual adquirente. Trata-se de

uma obrigação com eficácia real.

f) Específicas ou Genéricas

Distinguem-se as genéricas das específicas pelo objeto da prestação, se é

individuado (um carro X, da marca Y, ano Z, etc.) ou não (uma tonelada de

minérios). Nas genéricas, o objeto da prestação é determinado apenas em seu

gênero e qualidade. Nas específicas, determina-se não só o gênero, como a

espécie.

Não se confundem obrigações genéricas e específicas com ilíquidas e

líquidas. Uma obrigação poderá ser líquida e genérica. Se A se obriga a entregar

a B uma saca de café no valor de R$100,00, teremos obrigação líquida e

genérica.

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OOOOBRIGAÇÃO DE DARBRIGAÇÃO DE DARBRIGAÇÃO DE DARBRIGAÇÃO DE DAR

1. OBRIGAÇÃO DE DAR COISA CERTA

A- Aspectos gerais

• Há obrigação de dar coisa certa quando seu objeto é corpo certo e

determinado, como casa, carro, soma em dinheiro.

• Obrigação específica.

• O que foi objeto da obrigação, a coisa certa, é que servirá para o

adimplemento da obrigação.

Art. 313. O credor não é obrigado a receber prestação diversa da que lhe é devida, ainda que mais valiosa.

• Os contratos devem ser cumpridos tal qual foram ajustados (pacta sunt

servanda).

• As obrigações de dar coisa certa abrangem seus acessórios, salvo disposição

contrária.

Art. 92. Principal é o bem que existe sobre si, abstrata ou concretamente; acessório, aquele cuja existência supõe a do principal.

Art. 93. São pertenças os bens que, não constituindo partes integrantes, se destinam, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro.

Art. 94. Os negócios jurídicos que dizem respeito ao bem principal não abrangem as pertenças, salvo se o contrário resultar da lei, da manifestação de vontade, ou das circunstâncias do caso.

Art. 95. Apesar de ainda não separados do bem principal, os frutos e produtos podem ser objeto de negócio jurídico.

Art. 96. As benfeitorias podem ser voluptuárias, úteis ou necessárias. § 1o São voluptuárias as de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso

habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor. § 2o São úteis as que aumentam ou facilitam o uso do bem. § 3o São necessárias as que têm por fim conservar o bem ou evitar que se

deteriore.

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Art. 97. Não se consideram benfeitorias os melhoramentos ou acréscimos sobrevindos ao bem sem a intervenção do proprietário, possuidor ou detentor.

Art. 233. A obrigação de dar coisa certa abrange os acessórios dela embora não

mencionados, salvo se o contrário resultar do título ou das circunstâncias do caso. • Se A vender seu carro a B, todos os acessórios se presumem vendidos juntos.

Assim, rádio, rodas de liga leve, etc., seguirão com o carro, a não ser que A e

B expressamente combinem o contrário.

• O proprietário do bem é quem sofre os prejuízos e os ganhos relacionados

ao bem (princípio res perito domino).

• A tradição (entrega, pelo devedor, do bem comprado ao credor) é que

transfere a propriedade do bem móvel.

• A transferência do bem imóvel se dá mediante a Inscrição no Registro de

Imóveis.

B- Perda da coisa:

• Em sentido jurídico, é o desaparecimento completo da coisa para fins

jurídicos.

• Perda sem culpa do devedor: resolve-se a obrigação.

• Perda por culpa do devedor: o devedor responde pelo equivalente, mais

perdas e danos.

Art. 234. Se, no caso do artigo antecedente, a coisa se perder, sem culpa do devedor, antes da tradição, ou pendente a condição suspensiva, fica resolvida a obrigação para ambas as partes; se a perda resultar de culpa do devedor, responderá este pelo equivalente e mais perdas e danos.

C- Deterioração:

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• Quando a coisa sofre danos, sem que desapareça; perda parcial; há

diminuição do valor da coisa, tendo em vista perda de parte de suas

faculdades, de sua substância ou capacidade de utilização.

• Deterioração sem culpa do devedor: duas alternativas ao credor:

- resolver a obrigação, recebendo a restituição do preço, se já tiver pago;

- aceitar a coisa, no estado em que ficou, abatendo-se em seu preço o

valor da depreciação.

Art. 235. Deteriorada a coisa, não sendo o devedor culpado, poderá o credor resolver a obrigação, ou aceitar a coisa, abatido de seu preço o valor que perdeu.

• Deterioração com culpa do devedor: o credor terá a alternativa de

receber ou enjeitar a coisa, mas sempre com direito de haver perdas e

danos. O valor da indenização será apurado, geralmente, por

intermédio de perícia.

Art. 236. Sendo culpado o devedor, poderá o credor exigir o equivalente, ou aceitar a coisa no estado em que se acha, com direito a reclamar, em um ou em outro caso, indenização das perdas e danos.

D- Benfeitorias:

Art. 237. Até a tradição pertence ao devedor a coisa, com os seus melhoramentos e acrescidos, pelos quais poderá exigir aumento no preço; se o credor não anuir, poderá o devedor resolver a obrigação.

Até a tradição da coisa, os melhoramentos acrescidos, isto é, as

benfeitorias, pertencem ao devedor, que pode pedir aumento no preço ou a

resolução da obrigação, se o credor não aceitar o aumento.

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Assim, se A vende seu carro a B e, antes da entrega, vem a consertar-lhe

certo amassado, poderá pedir aumento proporcional no preço, desde que B haja

fechado o negócio sabendo do amassado.

E- Frutos:

Art. 237, Parágrafo único. Os frutos percebidos são do devedor, cabendo ao credor os pendentes.

Frutos pendentes são aqueles ainda não colhidos.

Se A compra vaca prenhe, o bezerro nascituro reputa-se fruto pendente,

pertencendo a ele, comprador. Se o bezerro já for nascido, considera-se fruto

percebido, pertencendo ao vendedor, no caso, devedor da vaca.

F- Perdas e Danos:

Sempre que houver culpa, haverá direito a indenização por perdas e

danos.

As perdas e danos são avaliados pelo efetivo prejuízo causado pelo

descumprimento.

Art. 402. Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar.

Art. 403. Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual.

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2. OBRIGAÇÃO DE RESTITUIR:

A- Definição:

A obrigação de restituir é aquela que tem por objeto uma devolução de

coisa certa, por parte do devedor, coisa essa que, por qualquer título, encontra-

se em poder do devedor, como ocorre, p. ex., no comodato (empréstimo de

coisas infungíveis), na locação e no depósito.

Na obrigação de restituir, a coisa já pertencia ao credor, que a recebe de

volta, em devolução.

B- Perda da coisa:

• Sem culpa do devedor: o credor sofrerá a perda (princípio res perito

dominio). Resolve-se a obrigação porque desapareceu seu objeto.

Ressalva a lei, contudo, os direitos do credor até o dia da perda, tais

como aluguéis, seguro etc.

Art. 238. Se a obrigação for de restituir coisa certa, e esta, sem culpa do devedor, se perder antes da tradição, sofrerá o credor a perda, e a obrigação se resolverá, ressalvados os seus direitos até o dia da perda.

• Por culpa do devedor: o devedor, que tem a coisa alheia sob sua

guarda, deve zelar por ela. Caso, por desídia ou dolo, a coisa se perca,

deve repor o equivalente, com perdas e danos.

Art. 239. Se a coisa se perder por culpa do devedor, responderá este pelo equivalente, mais perdas e danos.

C- Deterioração da coisa:

• Sem culpa do devedor: o credor deverá receber a coisa, tal qual se

ache, sem direito a indenização.

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• Por culpa do devedor: o credor pode exigir o equivalente ou aceitar a

devolução da coisa tal como se encontra, com direito a reclamar, em

qualquer das duas hipóteses, indenização das perdas e danos.

Art. 240. Se a coisa restituível se deteriorar sem culpa do devedor, recebê-la-á o credor, tal qual se ache, sem direito a indenização; se por culpa do devedor, observar-se-á o disposto no art. 239.

Obs.: o art. 240 remete-se ao art. 239; contudo, o correto seria referir-se

ao art. 236, que dispõe, in verbis: “Sendo culpado o devedor, poderá o credor

exigir o equivalente, ou aceitar a coisa no estado em que se acha, com direito a

reclamar, em um ou em outro caso, indenização das perdas e danos”.

D- Benfeitorias (arts. 1.219 e 1.220 do CC):

(Obs.: algumas regras referentes às benfeitorias adiante expostas não são

aplicáveis aos casos de locação de imóveis)

• Benfeitorias necessárias:

- Se o devedor for possuidor de boa-fé, possui o direito à indenização,

além do direito de retenção até seu pagamento.

- Se o devedor for possuidor de má-fé, só tem direito à indenização, não

podendo reter a coisa até o reembolso.

• Benfeitorias úteis:

- Se o devedor for possuidor de boa-fé, possui o direito à indenização,

além do direito de retenção até seu pagamento.

- Se o devedor for possuidor de má-fé, possui o direito de levantar a

benfeitoria, desde que não traga prejuízo ao bem.

• Benfeitorias voluptuárias:

- Se o devedor for possuidor de boa-fé, receberá sempre pelas

autorizadas, não tendo direito de retenção. Se não autorizadas, poderá

levantá-las, desde que não prejudique a coisa. O credor poderá, por outro

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lado, indenizar o devedor pelas benfeitorias voluptuárias, tendo, assim, o

direito de não permitir seu levantamento.

- Se o devedor for possuidor de má-fé, não terá qualquer direito, nem

mesmo o de levantá-las.

Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis.

Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem o de levantar as voluptuárias.

Obs.: Lei 8.245/91 (Lei de Locações):

Art. 35. Salvo expressa disposição contratual em contrário, as benfeitorias necessárias introduzidas pelo locatário, ainda que não autorizadas pelo locador, bem como as úteis, desde que autorizadas, serão indenizáveis e permitem o exercício do direito de retenção.

Art. 36. As benfeitorias voluptuárias não serão indenizáveis, podendo ser levantadas pelo locatário, finda a locação, desde que sua retirada não afete a estrutura e a substância do imóvel.

E- Frutos:

Art. 1.214. O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos.

Parágrafo único. Os frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fé devem ser restituídos, depois de deduzidas as despesas da produção e custeio; devem ser também restituídos os frutos colhidos com antecipação.

Art. 1.215. Os frutos naturais e industriais reputam-se colhidos e percebidos, logo que são separados; os civis reputam-se percebidos dia por dia.

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Art. 1.216. O possuidor de má-fé responde por todos os frutos colhidos e percebidos, bem como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber, desde o momento em que se constituiu de má-fé; tem direito às despesas da produção e custeio.

F- Acessão Imobiliária:

Acessões imobiliárias são plantações e edificações.

Segundo o art. 1253, toda plantação ou construção existente em terreno se

presume feita pelo proprietário ou as suas custas, até prova em contrário.

Art. 1.254. Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno próprio com sementes, plantas ou materiais alheios, adquire a propriedade destes; mas fica obrigado a pagar-lhes o valor, além de responder por perdas e danos, se agiu de má-fé.

Art. 1.255. Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno alheio perde, em proveito do proprietário, as sementes, plantas e construções; se procedeu de boa-fé, terá direito a indenização.

Parágrafo único. Se a construção ou a plantação exceder consideravelmente o valor do terreno, aquele que, de boa-fé, plantou ou edificou, adquirirá a propriedade do solo, mediante pagamento da indenização fixada judicialmente, se não houver acordo.

Art. 1.256. Se de ambas as partes houve má-fé, adquirirá o proprietário as sementes, plantas e construções, devendo ressarcir o valor das acessões.

Parágrafo único. Presume-se má-fé no proprietário, quando o trabalho de construção, ou lavoura, se fez em sua presença e sem impugnação sua.

Art. 1.257. O disposto no artigo antecedente aplica-se ao caso de não pertencerem as sementes, plantas ou materiais a quem de boa-fé os empregou em solo alheio.

Parágrafo único. O proprietário das sementes, plantas ou materiais poderá cobrar do proprietário do solo a indenização devida, quando não puder havê-la do plantador ou construtor.

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3. OBRIGAÇÃO DE DAR DINHEIRO:

a) Obrigação pecuniária:

• É a obrigação de entregar dinheiro, ou seja, de solver dívida em

dinheiro. É, portanto, espécie particular de obrigação de dar. Tem por

objeto uma prestação em dinheiro e não uma coisa.

Art. 315. As dívidas em dinheiro deverão ser pagas no vencimento, em moeda

corrente e pelo valor nominal, salvo o disposto nos artigos subseqüentes.

• O CC adotou o princípio nominalista, pelo qual se considera como

valor da moeda o valor nominal que lhe atribui o Estado, no ato da

emissão ou cunhagem. De acordo com o princípio, o devedor de uma

quantia em dinheiro libera-se entregando a quantidade de moeda

mencionada no contrato ou título da dívida, e em curso no lugar do

pagamento, ainda que desvalorizada pela inflação, ou seja, mesmo que

a referida quantidade não seja suficiente para a compra dos mesmos

bens que podiam ser adquiridos, quando contraída a obrigação.

• Uma das formas de combater os efeitos maléficos decorrentes da

desvalorização monetária é a adoção da cláusula de escala móvel, pela

qual o valor da prestação deve variar segundo os índices de custo de

vida. Foi por essa razão que surgiram, no Brasil, os diversos índices de

correção monetária, que podiam ser aplicados sem limite temporal, até

a edição da MP nº 1.106/95, convertida na Lei nº 10.192/01, que,

pretendendo desindexar a economia, declarou “nula de pleno direito

qualquer estipulação de reajuste ou correção monetária de

periodicidade inferior a um ano” (art. 2º, §1º).

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Art. 316. É lícito convencionar o aumento progressivo de prestações

sucessivas.

Art. 318. São nulas as convenções de pagamento em ouro ou em moeda

estrangeira, bem como para compensar a diferença entre o valor desta e o da

moeda nacional, excetuados os casos previstos na legislação especial.

• A moeda nacional tem curso forçado, sendo passíveis de nulidade os

contratos de direito interno que estipulem o pagamento em moeda

estrangeira, ouro, ou que restrinjam seu curso. Na verdade, só é

defeituosa a cláusula, sendo a obrigação convertida em moeda

nacional.

b) Dívida de valor:

• O dinheiro não constitui objeto da prestação, mas apenas representa

seu valor. Não se visa diretamente o dinheiro, que não é, por seu valor

nominal, o objeto da prestação, mas sim o meio de medi-lo ou de

valorá-lo.

• A obrigação de indenizar, decorrente da prática de um ato ilícito, por

exemplo, constitui dívida de valor, porque seu montante deve

corresponder ao do bem lesado.

c) Dívida remuneratória:

• Consiste numa remuneração pelo uso de capital alheio, mediante

pagamento de quantia proporcional ao seu valor e ao tempo de sua

utilização. A prestação de juros é uma dívida desse tipo.

• Os juros constituem, com efeito, remuneração pelo uso de capital

alheio, que se expressa pelo pagamento, ao dono do capital, de quantia

proporcional ao seu valor e ao tempo de sua utilização. Pressupõe,

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28

portanto, a existência de uma dívida de capital, consistente em

dinheiro ou outra coisa fungível. Daí a sua natureza acessória.

4. OBRIGAÇÃO DE DAR COISA INCERTA:

• Conceito:

Tem por objeto a entrega de uma quantidade de certo gênero e não

uma coisa especificada. Assim, prepondera a indeterminação específica do

objeto da prestação. Mas essa indeterminação não é absoluta, pois a coisa

deverá ser identificada ao menos pelo gênero e quantidade. Ex.: dar um carro –

quantidade: um; gênero: carro.

• Escolha (art. 244):

Na obrigação de dar coisa incerta há um momento precedente à

entrega da coisa que é o ato de escolher o que vai ser entregue. A regra geral

atribui a escolha ao devedor. Mas a norma é dispositiva, ou seja, por acordo

pode-se dispor que a escolha caiba ao credor.

Uma vez feita a escolha, de acordo com o contratado, ou conforme

estabelece a lei (trata-se do que a lei denomina concentração do débito), a

obrigação passa a ser regida pelos princípios da obrigação de dar coisa certa.

Art. 244. Nas coisas determinadas pelo gênero e pela quantidade, a escolha pertence ao devedor, se o contrário não resultar do título da obrigação; mas não poderá dar a coisa pior, nem será obrigado a prestar a melhor.

• Perecimento (art. 246):

A obrigação de dar coisa incerta é uma obrigação genérica.

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29

A posição do devedor na obrigação ora tratada é mais favorável do

que na de dar coisa certa, porque se desvencilha do vínculo com a entrega de

uma das coisas ou de um conjunto de coisas compreendidas no gênero indicado.

No entanto, sua responsabilidade pelos riscos será maior, pois,

como o gênero não perece, antes da escolha o devedor não poderá alegar perda

ou deterioração da coisa, ainda que por força maior ou caso fortuito. Após a

determinação, a obrigação transforma-se em obrigação de dar coisa certa.

Assim, p. ex., se devo a João um carro novo, na faixa de R$

30.000,00, cabendo a mim a escolha da marca e modelo, até que faça essa

opção, não poderei alegar que o carro se perdeu ou se deteriorou. No entanto,

uma vez feita a escolha do carro Y, da marca X, a obrigação se transforma em

obrigação de dar coisa certa, aplicando-se suas regras.

Art. 246. Antes da escolha, não poderá o devedor alegar perda ou deterioração da coisa, ainda que por força maior ou caso fortuito.

• Coisa incerta limitada:

É quando o gênero pode ser limitado, isto é, não existe com

abundância suficiente.

É o caso, p. ex., da obrigação de entregar garrafas de vinho de

determinada marca que não mais é produzido e que vai rareando com o passar

do tempo. Ou o caso da obrigação de entregar certo material químico que não

existe em grandes quantidades, ou cuja produção é controlada.

Nesses casos, se o gênero é limitado, a inviabilidade do atendimento

da obrigação, examinável em cada caso concreto, acarretará a extinção da

obrigação.

Logo, o gênero, neste caso, pode perecer.

Ressalte-se que o Código Civil não disciplina a coisa incerta

limitada, aplicando-se, portanto, as regras da obrigação de dar coisa certa.

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OOOOBRIGAÇÃO DE FAZERBRIGAÇÃO DE FAZERBRIGAÇÃO DE FAZERBRIGAÇÃO DE FAZER

1- Conceito:

É prestação de fato. O conteúdo da obrigação de fazer é uma

“atividade” do devedor, no sentido mais amplo: tanto pode ser a prestação de

uma atividade física ou material (pintar casa, levantar muro, etc.), como uma

atividade intelectual, artística ou científica (escrever obra literária, realizar

experiência científica, etc.). Ademais, o conteúdo da atividade do devedor na

obrigação de fazer pode constituir-se numa atividade que pouco aparece

externamente, mas cujo conteúdo é essencialmente jurídico, como a obrigação

de locar ou emprestar imóvel, de realizar outro contrato, etc.

Nem sempre existe distinção entre as obrigações de dar e de fazer.

Ambas as espécies constituem-se nas obrigações positivas, em contraposição às

obrigações negativas, que são as obrigações de não fazer.

Na compra e venda, p. ex., o vendedor contrai a obrigação de

entregar a coisa (dar), bem como de responder pela evicção e vícios redibitórios

(fazer). Na empreitada, o empreiteiro contrai a obrigação de fornecer a mão-de-

obra (fazer) e de entregar os materiais necessários (dar).

Diante disso, o ponto crucial da diferenciação entre a obrigação de

dar e de fazer está em verificar: se o dar ou entregar é ou não consequência do

fazer. Assim, se o devedor tem de dar ou entregar alguma coisa, não tendo,

porém, de fazê-la previamente, a obrigação é de dar; todavia, se, primeiramente,

tem ele de confeccionar a coisa para depois entregá-la, tendo de realizar algum

ato, do qual será mero corolário o de dar, tecnicamente a obrigação é de fazer.

Além disso, na obrigação de dar a tradição é imprescindível, o que

não ocorre na obrigação de fazer. Ademais, na grande maioria das obrigações

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de fazer, é costume enfatizar que a pessoa do devedor é preponderante no

cumprimento da obrigação, o que não ocorre nas obrigações de dar.

Por último, as obrigações de dar autorizam, em geral, a execução

coativa. As obrigações de fazer possuem apenas meios indiretos de execução

coativa, por não permitirem a intervenção direta na esfera de atuação da pessoa

do devedor.

2- Infungível e fungível:

Terá natureza infungível nos contratos intuitu personae, isto é,

naqueles celebrados com base na confiança recíproca entre as partes, bem como

nas qualidades específicas do devedor. Ex.: contrato em que editora encomenda

obra a certo autor famoso. Aqui vigora o princípio de que o credor não pode ser

obrigado a aceitar que outro cumpra a obrigação, caso em que esta se resolverá

em perdas e danos, se houver sido descumprida por culpa do devedor.

Terá natureza fungível quando qualquer um puder executar a

obrigação. Não sendo adimplida, o credor pode escolher entre mandar fazer à

custa do devedor ou exigir perdas e danos. Ex.: se contrato pedreiro para

levantar muro, e este não o faz, posso escolher uma das duas opções.

3- Impossibilidade de Prestar:

3.1- Sem culpa do devedor: resolve-se a obrigação.

3.2- Com culpa do devedor:

o Prestação não é mais útil: recebe o equivalente mais

perdas e danos. Ex.: contratada uma orquestra para um

evento e não se apresentando na data designada, por

culpa dela, de nada adianta essa orquestra comprometer-

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se a comparecer em outra data, pois o dano é

irreversível.

Art. 248. Se a prestação do fato tornar-se impossível sem culpa do devedor, resolver-se-á a obrigação; se por culpa dele, responderá por perdas e danos.

Art. 247. Incorre na obrigação de indenizar perdas e danos o devedor que recusar a prestação a ele só imposta, ou só por ele exequível.

o Prestação ainda útil: existe a multa cominatória, a qual é um meio de coerção para que o devedor cumpra a obrigação.

Observação:

Sempre que houver dúvida acerca da recusa por parte do devedor e

ainda houver possibilidade de a prestação ser útil para o credor, deve ser

aplicado o princípio da execução específica do art. 461 do CPC.

Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

§ 1o A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente.

§ 2o A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa (art. 287). § 3o Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de

ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o réu. A medida liminar poderá ser revogada ou modificada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada.

§ 4o O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.

§ 5o Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.

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§ 6o O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva.

Segundo o §4º desse artigo, o juiz pode impor multa cominatória

diária, de índole pecuniária, por dia de atraso no cumprimento da obrigação,

cujo valor reverterá sempre para o autor.

A multa deve ser de montante tal que constranja o devedor a

cumprir a obrigação. Nada impede que as partes, contratualmente, já estipulem

a multa e seu valor, mas caberá sempre ao juiz colocá-la em seus devidos

parâmetros. Essa estipulação de multa deverá ter limite temporal, embora a lei

não o diga, sob pena de transformar-se em obrigação perpétua. Decorrido o

prazo máximo de imposição diária, essa constrição perderá seu sentido,

devendo a situação resolver-se em perdas e danos para se colocar um fim à

demanda.

4- Art. 249, do CC:

Art. 249. Se o fato puder ser executado por terceiro, será livre ao credor mandá-lo executar à custa do devedor, havendo recusa ou mora deste, sem prejuízo da indenização cabível.

Parágrafo único. Em caso de urgência, pode o credor, independentemente de autorização judicial, executar ou mandar executar o fato, sendo depois ressarcido.

É interessante notar que, em seu parágrafo único, há a possibilidade

de procedimento de justiça de mão própria. Imagine-se a hipótese da

contratação de empresa para fazer a laje de concreto de um prédio,

procedimento que requer tempo e época precisos. Caracterizada a recusa e a

mora, bem como a urgência, a hipótese de aguardar uma decisão judicial, ainda

que liminar, no caso concreto, poderá causar prejuízo de difícil reparação.

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34

Poderá, então, o credor contratar terceiro para a tarefa, sem

qualquer ingerência judicial, requerendo posteriormente, a devida indenização.

Para a caracterização da recusa ou mora do devedor, sob pena de frustrar-se o

posterior pedido de indenização, deverá o credor resguardar-se com a

documentação necessária possível, tais como notificações, constatação do fato

por testemunhas, fotos, etc. nada impede, porém, antes se aconselha, que, se

houver tempo razoável, seja obtida a autorização judicial.

Essa solução, é evidente, não poderá ocorrer quando se tratar de

obrigação infungível.

5- Obrigação de praticar ato jurídico:

A ação de obrigação de prestar declaração de vontade ocorre

quando existe um contrato preliminar e o devedor compromete-se a outorgar

contrato definitivo. Nesse caso, existe uma obrigação de fazer que possui como

conteúdo uma declaração de vontade.

Assim, em certos contratos, como a compra e venda de imóveis, se

o devedor, no caso o vendedor, se negar a assinar a escritura de compra e

venda, apesar de já ter sido celebrado contrato de promessa de compra e venda

(irretratável), o credor poderá obter do juiz sentença que produza o mesmo

efeito do contrato. Por outros termos, com a sentença judicial, o credor, no caso

o comprador, poderá registrar o imóvel em seu nome.

Lembre-se, no entanto, que, como no sistema pátrio o contrato

simplesmente não tem o condão de transferir a propriedade, a sentença,

consequentemente, nessas premissas, também, por si só, não a transfere. Assim,

tratando-se de bem imóvel, compromissado à venda em instrumento que não

contenha cláusula de arrependimento e registrado no Cartório de Registro de

Imóveis, poderá o credor, considerado nesse caso titular de direito real, requerei

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ao juiz a sua adjudicação compulsória, se houver recusa do alienante em

outorgar a escritura definitiva, como dispõem os arts. 1417 e 1418 do CC.

Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel.

Art. 1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel.

OOOOBRIGAÇÃO DE NÃO FAZERBRIGAÇÃO DE NÃO FAZERBRIGAÇÃO DE NÃO FAZERBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER

1- Conceito:

As obrigações de não fazer são obrigações negativas, nas quais o

devedor compromete-se a uma abstenção.

A imposição de uma obrigação negativa determina ao devedor uma

abstenção que pode ou não ser ilimitada no tempo.

A obrigação de não fazer ora se apresenta como pura e simples

abstenção, como no caso do alienante de estabelecimento comercial que se

compromete a não se estabelecer num mesmo ramo de negócios, em

determinada zona de influência (art. 1147, do CC), ora como um dever de

abstenção ligado a uma obrigação positiva, como é o caso do artista que se

compromete a exibir-se só para determinada empresa.

Também a obrigação de não fazer pode surgir como simples dever

de tolerância, ou seja, não realizar atos que possam obstar ou perturbar o direito

de uma das partes ou de terceiros, como é o caso do locador que se compromete

a não obstar o uso pleno da coisa locada.

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Na realidade, nessa espécie de obrigação, o devedor compromete-se

a não realizar algo que normalmente, estando ausente a proibição, poderia fazer.

Toda obrigação deve revestir-se de objeto lícito, negócio jurídico

que é. Na obrigação de não fazer, tal licitude reveste-se de um especial aspecto,

pois será lícita sempre que não envolva restrição sensível à liberdade individual.

2- Impossibilidade:

o Sem culpa do devedor: resolve-se a obrigação.

Art. 250. Extingue-se a obrigação de não fazer, desde que, sem culpa do

devedor, se lhe torne impossível abster-se do ato, que se obrigou a não praticar.

Embora possa parecer estranho à primeira vista, às vezes a

abstenção prometida pelo devedor torna-se impossível ou extremamente

gravosa. O exemplo clássico é do devedor que se compromete a não levantar

muro, para não tolher a visão do vizinho, e vem a ser intimado pelo Poder

Público a fazê-lo. Na dicção do Código, extingue-se a obrigação. A imposição

da municipalidade tem o condão de fazer desaparecer a obrigação de não fazer.

o Por culpa do devedor: o credor pode exigir que seja desfeito o

ato pelo devedor ou às suas custas (a escolha é realizada por meio

da análise da utilidade), mais perdas e danos. (art. 251, do CC; arts.

642 e 643, do CPC).

Art. 251. Praticado pelo devedor o ato, a cuja abstenção se obrigara, o credor pode exigir dele que o desfaça, sob pena de se desfazer à sua custa, ressarcindo o culpado perdas e danos.

Obs.: Havendo urgência, o credor desfará o que houver sido feito,

independentemente de autorização judicial, para, depois, pedir o devido

ressarcimento.

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Art. 642. Se o devedor praticou o ato, a cuja abstenção estava obrigado pela lei ou pelo contrato, o credor requererá ao juiz que Ihe assine prazo para desfazê-lo.

Art. 643. Havendo recusa ou mora do devedor, o credor requererá ao juiz que mande desfazer o ato à sua custa, respondendo o devedor por perdas e danos.

Parágrafo único. Não sendo possível desfazer-se o ato, a obrigação resolve-se em perdas e danos.

OOOOBRIGAÇÃO ALTERNATIVABRIGAÇÃO ALTERNATIVABRIGAÇÃO ALTERNATIVABRIGAÇÃO ALTERNATIVA

1- Considerações gerais:

As obrigações alternativas são aquelas que têm por objeto duas ou mais

prestações, sendo que o devedor exonera-se cumprindo apenas uma delas.

Assim, nas obrigações alternativas existem dois ou mais objetos

(obrigação complexa).

Essas obrigações se caracterizam pela presença da conjunção “ou” (ex.:

entregar carro ou seu equivalente em dinheiro). Nesse caso, o devedor apenas

está obrigado a entregar uma das coisas objeto da obrigação.

2- Escolha:

De acordo com o art. 252, a escolha cabe ao devedor, se outra coisa não

se estipulou. No entanto, as partes podem convencionar que a escolha

(tecnicamente denominada concentração do débito) caiba ao credor ou mesmo a

um terceiro.

Enquanto não for efetivada a concentração, o credor não terá qualquer

direito sobre os objetos, no sentido de que não poderá exigir a entrega desta ou

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daquela coisa. Somente quando é feita a escolha, a concentração, é que o credor

pode exigir o pagamento.

Por serem os objetos da prestação independentes entre si, tem-se o fato de

que o devedor não pode obrigar o credor a receber parte em uma prestação e

parte em outra (art. 252, §1º). Também, se uma das prestações tornar-se

inexequível (ou for impossível), subsistirá o débito quanto à outra (art. 253). Da

mesma forma, se a escolha cabe ao credor, este não poderá pedir o pagamento

parte de um e parte de outro dos objetos.

Pode haver uma pluralidade de credores ou devedores. Nesse caso, há

necessidade de que os vários credores ou devedores se acertem sobre a escolha

(decisão unânime). Se os credores não chegarem a um acordo, devem se valer

de uma decisão judicial. Não havendo acordo unânime entre os interessados, o

Código defere a solução ao juiz, após este ter concedido um prazo para

deliberação (art. 252, §3º).

Quando a obrigação for de prestações periódicas, haverá direito de o

devedor exercer em cada período sua opção (art. 252, §2º).

Feita a escolha, a obrigação concentra-se na prestação eleita. As

consequências jurídicas, a partir daí, passam a ser de uma obrigação simples.

Esse é o efeito fundamental da concentração, ou seja, converter uma obrigação

alternativa em obrigação de coisa certa; há a concentração dos deveres do

devedor sobre esse objeto.

Ainda, a concentração é irrevogável. Uma vez operada, sobre um dos

objetos, os demais objetos que compunham a prestação possível deixam de

estar sujeitos às pretensões do credor, o que é consequência natural da

conversão da obrigação alternativa em obrigação de coisa certa.

Art. 252. Nas obrigações alternativas, a escolha cabe ao devedor, se outra coisa não se estipulou.

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§ 1o Não pode o devedor obrigar o credor a receber parte em uma prestação e parte em outra.

§ 2o Quando a obrigação for de prestações periódicas, a faculdade de opção poderá ser exercida em cada período.

§ 3o No caso de pluralidade de optantes, não havendo acordo unânime entre eles, decidirá o juiz, findo o prazo por este assinado para a deliberação.

§ 4o Se o título deferir a opção a terceiro, e este não quiser, ou não puder exercê-la, caberá ao juiz a escolha se não houver acordo entre as partes.

3- Perecimento:

• Sem culpa do devedor: se houver o perecimento de um dos objetos,

ocorre a concentração do débito no restante. Se ambos os objetos

perecerem, resolve-se a obrigação.

Art. 253. Se uma das duas prestações não puder ser objeto de obrigação ou se tornada inexeqüível, subsistirá o débito quanto à outra.

Art. 256. Se todas as prestações se tornarem impossíveis sem culpa do devedor, extinguir-se-á a obrigação.

• Por culpa do devedor: se a escolha couber ao devedor, perecendo somente

um dos objetos, ocorre a concentração do débito no que restar. Se ocorrer

o perecimento de todos os objetos, o devedor é obrigado a pagar o

equivalente do último que perecer mais perdas e danos.

Art. 254. Se, por culpa do devedor, não se puder cumprir nenhuma das prestações, não competindo ao credor a escolha, ficará aquele obrigado a pagar o valor da que por último se impossibilitou, mais as perdas e danos que o caso determinar.

• Quando a escolha couber ao credor e uma das prestações tornar-se

impossível por culpa do devedor, o credor terá direito de exigir a

prestação subsistente ou o valor da outra, com perdas e danos; se, por

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culpa do devedor, ambas as prestações se tornarem inexequíveis, poderá o

credor reclamar o valor de qualquer das duas, além da indenização por

perdas e danos. (art. 255).

4- Retratabilidade:

O devedor pode se retratar para exercer posteriormente o direito de

escolha, quando, ignorando que a obrigação era alternativa e que, portanto,

havia direito de escolha, efetua o pagamento, supondo-se obrigado a uma única

prestação.

Porém, a repetição só pode ser admitida se a obrigação for cumprida com

erro do declarante, porque a regra geral é a irretratabilidade da escolha e não

poderia ser de outro modo.

5- Acréscimos:

Podem ser admitidos os seguintes aspectos para os acréscimos na

obrigação alternativa:

a) Se todas as coisas sofreram acréscimo, o credor deve pagar o maior

volume daquela que ele ou o devedor escolher; se não se chegar a esta

solução, o devedor pode dar como extinta a obrigação;

b) Se alguma das coisas aumentou de valor e a escolha couber ao

devedor, poderá ele cumprir a obrigação entregando a de menor valor;

se a escolha couber ao credor, deverá ele contentar-se com a escolha da

que não sofreu melhoramentos, ou, então, se escolher a coisa de maior

valor, pagar a diferença.

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OOOOBRIGAÇÃO FACULTATIVABRIGAÇÃO FACULTATIVABRIGAÇÃO FACULTATIVABRIGAÇÃO FACULTATIVA

• Não está disciplinada no Código Civil.

• A obrigação dita facultativa é aquela que, tendo por objeto apenas

uma obrigação principal, confere ao devedor a possibilidade de liberar-se

mediante o pagamento de outra prestação prevista na avença, com caráter

subsidiário.

• Ex.: o vendedor compromete-se a entregar 100 sacas de café, mas o

contrato admite a possibilidade de liberar-se dessa obrigação entregando a

cotação do café em ouro.

• Nessas obrigações, há uma prestação principal, que constitui o

verdadeiro objeto da obrigação, e uma acessória ou subsidiária. Essa segunda

prestação constitui um meio de liberação que o contrato reconhece ao devedor.

Assim, são obrigações com faculdade de substituição de objeto.

• É a prestação principal que determina a natureza do contrato. Se a

obrigação principal é nula, fica sem efeito a obrigação acessória; mas a nulidade

da prestação acessória não tem qualquer influência sobre a principal. Trata-se

de aplicação do princípio de que o acessório segue o principal.

• Nessa obrigação apenas um objeto é devido, podendo ser

substituído por outro in facultate solutionis. A faculdade de escolha é exclusiva

do devedor. Ao demandar a obrigação facultativa, o credor só pode exigir a

obrigação principal.

• Na obrigação facultativa não existe propriamente uma concentração

(escolha) da obrigação, mas o exercício de uma opção. E o devedor pode optar

pela prestação subsidiária até o efetivo cumprimento.

• Ao contrário das obrigações alternativas, no caso de erro, não pode

haver retratação se o devedor cumpre a obrigação principal, pois esta é que dá a

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natureza a obrigação. Já se o devedor cumpre, por erro, a subsidiária, poderá

repetir, pela mesma razão pela qual pode repetir nas obrigações alternativas.

• A perda da coisa principal, sem culpa do devedor, extingue a

obrigação. (O credor não tem direito ao objeto acessório. Fica a cargo do

devedor aceitar em cumprir a obrigação com a entrega do objeto acessório).

• Se a perda ou impossibilidade ocorreu por culpa do devedor, o

credor pode pedir o preço da coisa que pereceu (o equivalente) mais perdas e

danos. Também pode o credor receber o outro objeto.

• A nulidade da obrigação principal extingue também a acessória.

• A perda ou deterioração do objeto da prestação acessória, com ou

sem culpa do devedor, em nada influencia a obrigação principal, que se mantém

incólume.

• Obs.: não confundir a obrigação facultativa com a dação em

pagamento. Nesta é imprescindível a concordância do credor (art. 356, CC),

enquanto na obrigação facultativa a faculdade é do próprio devedor e só dele.

Ademais, na dação em pagamento a substituição do objeto do pagamento ocorre

posteriormente ao nascimento da obrigação, enquanto da facultativa a

possibilidade de substituição participa da raiz do contrato.

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OOOOBRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO MOMENTÂNEABRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO MOMENTÂNEABRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO MOMENTÂNEABRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO MOMENTÂNEA

• É aquela que se realiza em um só ato.

• As partes adquirem e cumprem seus direitos e obrigações no mesmo

momento do contrato. Ex.: compra e venda à vista, quando o pagamento se

contrapõe a tradição da coisa.

• Obs.: nesse tipo de obrigação a resolução por inexecução deve recolocar

as partes no estado anterior.

OOOOBRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO DIFERIDABRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO DIFERIDABRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO DIFERIDABRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO DIFERIDA

• É a que também se exaure em um só ato, porém a ser realizado em data

futura e não no mesmo instante em que é contraída.

• Desse modo, tanto pode ser diferida a obrigação assumida pelo

comprador, de pagar, no prazo de 30 dias, o preço da coisa adquirida, como a

do vendedor, que se compromete a entregá-la no mesmo prazo.

OOOOBRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO CONTINUADA OU PERIÓDICABRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO CONTINUADA OU PERIÓDICABRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO CONTINUADA OU PERIÓDICABRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO CONTINUADA OU PERIÓDICA

• É a obrigação que se cumpre periodicamente.

• A obrigação de execução continuada, duradoura, contínua, de trato

sucessivo ou periódica é a que se protrai no tempo, caracterizando-se pela

prática ou abstenção de atos reiterados, solvendo-se num espaço mais ou menos

longo de tempo. Por exemplo: a obrigação do locador de ceder ao inquilino, por

certo tempo, o uso e gozo de um bem infungível, e a obrigação do locatário de

pagar o aluguel convencionado.

• Ocorre quando as relações das partes desenvolvem-se por um período

mais ou menos longo, devido à própria natureza da relação (ex.: contrato de

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locação, de trabalho, seguro etc.) ou devido à própria vontade das partes (ex.:

compra e venda com pagamento a prazo).

• Nesta espécie de obrigação há maior probabilidade de conflitos espaço-

temporais, pois, relativamente ao seu inadimplemento, sobreleva o fato de que

sua resolução será irretroativa, pois as prestações seriadas e autônomas e

independentes já cumpridas não serão atingidas pelo descumprimento das

demais prestações, cujo vencimento se lhes seguir, uma vez que seu

adimplemento possui força extintiva.

• Os efeitos do inadimplemento da obrigação de execução continuada se

dirigem ao cumprimento das prestações futuras e não ao das pretéritas, já

extintas pelo seu cumprimento.

• A prescrição se aplica as prestações isoladas da obrigação e não a

obrigação toda.

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. OBRIGAÇÃO SUCESSIVA. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. APOSENTADORIA. SUPLEMENTAÇÃO. REAJUSTE. AUMENTO REAL. PREVISÃO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE. Em se tratando de obrigações de trato sucessivo, a violação do direito acontece de forma contínua, renovando-se o prazo prescricional em cada prestação periódica não cumprida. Logo, impõe-se reconhecer a prescrição, tão-só em relação à pretensão do reajustamento anterior aos cinco anos que antecederam o ajuizamento da demanda, nos termos do art. 103, da Lei nº 8.213/91.(...)”. (TJMG. Processo nº 1.0317.09.101899-2/001(1). Rel. Des.(a) Luciano Pinto. DP: 27/01/2011. DJ: 15/02/2011)

• Nesta modalidade de obrigação situa-se o campo de aplicação da Teoria

da Imprevisão (teoria da onerosidade excessiva):

Art. 317. Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação.

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OOOOBRIGAÇÃO CONDICIONAL, OBRIGAÇÃO A TERMO E BRIGAÇÃO CONDICIONAL, OBRIGAÇÃO A TERMO E BRIGAÇÃO CONDICIONAL, OBRIGAÇÃO A TERMO E BRIGAÇÃO CONDICIONAL, OBRIGAÇÃO A TERMO E

OBRIGAÇÃO COM ENCARGO OU MODALOBRIGAÇÃO COM ENCARGO OU MODALOBRIGAÇÃO COM ENCARGO OU MODALOBRIGAÇÃO COM ENCARGO OU MODAL

1- Elementos do ato jurídico:

a) Elementos essenciais: são os estruturais, indispensáveis à existência do

ato e que lhe formam a substância: a declaração de vontade nos negócios em

geral; a coisa, o preço e o consentimento na compra e venda, por exemplo.

b) Elementos naturais: são as consequências ou efeitos que decorrem da

própria natureza do negócio, sem necessidade de expressa menção. Normas

supletivas já determinam essas consequências jurídicas, que podem ser

afastadas por estipulação contrária. P. ex.: responsabilidade do alienante pelos

vícios redibitórios (art. 441, CC) e pelos riscos da evicção (art. 447, CC); o

lugar do pagamento quando não convencionada (art. 327, CC).

c) Elementos acidentais: consistem em estipulações acessórias, que as

partes podem facultativamente adicionar ao negócio, para modificar alguma de

suas consequências naturais. São eles: condição, termo e encargo ou modo.

2- Classificação das obrigações quanto aos elementos acidentais:

a) Obrigação pura e simples: são as que produzem efeitos imediatos, logo

que contraídas, como sucede normalmente nos negócios inter vivos e pode

ocorrer também nos negócios causa mortis. Ex.: pode o doador ou testador

dizer que doa ou deixa determinado bem para certa pessoa, de forma pura e

simples, isto é, sem subordinar os efeitos da liberalidade a qualquer condição ou

termo e sem impor nenhum encargo ao beneficiário.

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b) Obrigação condicional

c) Obrigação a termo

d) Obrigação com encargo ou modal

3- Obrigação Condicional:

a) Conceito:

São condicionais as obrigações cujos efeitos estiverem subordinados ao

implemento de condição; só produzirá efeitos dependendo de evento futuro e

incerto, que poderá ou não ocorrer.

b) Suspensiva:

Condição suspensiva é aquela que subordina os efeitos do ato jurídico a

seu implemento.

Antes do implemento da obrigação que está sob condição suspensiva, o

credor possui um direito eventual. Não existe a obrigação, não podendo o

credor exigir seu cumprimento, enquanto não ocorrer o implemento. Frustrada a

condição, por outro lado, a obrigação deixa de existir. Aqui reside a maior

distinção com as obrigações a termo, pois nestas o direito existe desde logo.

Destarte, não tendo ocorrido o evento e tendo o devedor cumprido a

obrigação, assiste-lhe o direito de repetição, porque se trata de pagamento

indevido (art. 876).

O direito eventual tem como característica principal o fato de seu titular

poder exercer os meios assecuratórios para conservá-lo (art. 130, do CC).

Assim, se alguém promete entregar coisa sob condição suspensiva e, pendente

esta, enquanto não ocorre o evento, abandona a coisa, sujeitando-se à

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deterioração, pode o credor, p. ex., pedir caução ou pleitear para si o depósito

da coisa.

A morte do credor ou do devedor, antes de ocorrido o evento suspensivo,

em nada modifica a situação jurídica criada pelo negócio condicional, a menos

que se trate de fato personalíssimo da parte falecida, porque o cumprimento se

torna impossível.

Não se esqueça, porém, que sempre que a parte impede que o faro se

realize, a condição se tem por cumprida e se torna exigível a obrigação (art.

129). Da mesma forma, o mesmo artigo considera não verificada a condição

maliciosamente levada a efeito por aquele a quem aproveita seu implemento.

O alienante da coisa fixada sob condição suspensiva conserva a

propriedade e gozo da coisa enquanto não ocorrer o implemento. A coisa

continua consigo por sua conta e risco; se a coisa perece, perece para ele, não

tendo, pois, o alienante direito de exigir o cumprimento da obrigação da outra

parte, já que não há objeto. Por conseguinte, se o adquirente já houvera pago

em parte o preço, com o perecimento da coisa pode pedir a devolução ao

alienante, com perdas e danos caso tenha havido culpa por parte deste último.

Ocorrendo o implemento da condição, imediatamente é exigível a

obrigação (art. 332). Cabe ao credor provar que o devedor teve ciência do

evento.

Art. 332. As obrigações condicionais cumprem-se na data do implemento da condição, cabendo ao credor a prova de que deste teve ciência o devedor.

c) Resolutiva:

Condição resolutiva é aquela que extingue os efeitos da obrigação com o

implemento da condição.

No tocante às condições resolutivas, como o direito se adquire de plano,

tal aquisição não se diferencia das obrigações puras e simples. Como

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consequência, tendo o adquirente a posse da coisa objeto da obrigação, tem ele

o poder de disposição e o gozo, se diverso não resultar do negócio. Se a coisa

perece, o possuidor suporta a perda, nada podendo exigir da outra parte na

relação obrigacional.

A condição resolutória não proíbe a disposição da coisa para terceiro e,

tendo isso ocorrido, e não sendo possível ir buscar a coisa com quem se

encontre, só resta a resolução em perdas e danos. Na verdade, na condição

resolutiva, o vínculo alcança terceiros, que adquirem uma propriedade

resolúvel. O implemento da condição resolutiva, na realidade, invalida o

vínculo. Quando se trata de imóveis, deve a resolução constar de registro, para

que os terceiros não possam alegar ignorância.

Com o implemento da condição resolutiva, deve o possuidor entregar a

coisa com seus acessórios naturais. A questão das benfeitorias, se não constar

da avença, rege-se por seus princípios legais.

As diminuições ocorridas com a coisa, quando da entrega, deverão ser

indenizadas pelo possuidor apenas se agiu com culpa.

Na condição resolutiva, quando se frustra o implemento, a obrigação que

já era tratada como pura e simples assim permanecerá.

4- Obrigação a Termo:

• São obrigações cujo início ou fim vêm determinados, precisados no

tempo. Quase todos os negócios jurídicos admitem a fixação de um lapso

temporal para o cumprimento, salvo exceções principalmente sediadas no

direito de família (casamento, reconhecimento de filiação etc.).

• O termo, que depende do tempo, é inexorável. No termo, o direito é

futuro e certo, mas diferido, já que não impede a aquisição do direito, cuja

eficácia fica apenas em suspenso.

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• O termo, uma vez aposto à obrigação, indica o momento em que sua

exigibilidade se inicia ou se extingue:

a) termo inicial (dies a quo): indica o momento do início. Segundo o art.

131, pendente o termo, pode o beneficiário usar de todos os meios

acautelatórios para a preservação de seus direitos. Além disso, dada a

semelhança, o art. 135 determina que, ao termo inicial, aplique-se o disposto à

condição suspensiva.

b) termo final (dies ad quem): indica o momento que deve cessar o

exercício do direito. O art. 135 determina que, ao termo final, aplique-se o

disposto à condição resolutiva.

• Pelo termo protela-se a aquisição dos direitos (termo suspensivo),

ou limitam-se seu exercício a determinado prazo (termo resolutivo).

• Prazo é o intervalo entre o termo inicial e o termo final. Os termos

estão, pois, nas extremidades dos prazos.

Art. 132. Salvo disposição legal ou convencional em contrário, computam-se os prazos, excluído o dia do começo, e incluído o do vencimento.

§ 1o Se o dia do vencimento cair em feriado, considerar-se-á prorrogado o prazo até o seguinte dia útil.

§ 2o Meado considera-se, em qualquer mês, o seu décimo quinto dia.

§ 3o Os prazos de meses e anos expiram no dia de igual número do de início, ou no imediato, se faltar exata correspondência.

§ 4o Os prazos fixados por hora contar-se-ão de minuto a minuto.

Art. 133. Nos testamentos, presume-se o prazo em favor do herdeiro, e, nos contratos, em proveito do devedor, salvo, quanto a esses, se do teor do instrumento, ou das circunstâncias, resultar que se estabeleceu a benefício do credor, ou de ambos os contratantes.

Art. 134. Os negócios jurídicos entre vivos, sem prazo, são exeqüíveis desde logo, salvo se a execução tiver de ser feita em lugar diverso ou depender de tempo.

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• O termo é sempre inexorável. O prazo é que pode ser certo ou

incerto, como uma data exata ou prontamente fixável no calendário. O termo é

certo, e somente será incerto quando não se souber a data em que se cumprirá a

obrigação.

• Termo final certo: se o devedor descumpre o termo, ele constitui em

mora (inadimplemento culposo). O ordenamento jurídico pátrio acolheu a regra

romana dies interpellat pro homine, segundo a qual, tendo sido fixada data para

o pagamento, o seu descumprimento acarreta automaticamente, sem

necessidade de qualquer providência do credor, a mora do devedor (ex re).

• Termo final incerto: neste caso, é necessário que o devedor seja

notificado pelo credor sobre o fim do prazo, transformando o termo incerto em

certo, para só assim constituí-lo em mora, se não cumprir o prazo conferido.

• Termo essencial: o negócio é “absolutamente fixo”, a falta de

prestação no momento devido é um caso de impossibilidade. Logo, neste caso,

se a obrigação não for cumprida pelo devedor no momento determinado, perde

a utilidade para o credor.

Inadimplemento:

a) Relativo: a obrigação ainda é útil para o credor. Constitui o

devedor em mora.

b) Absoluto: a obrigação não é mais útil para o credor (termo

essencial).

5- Obrigação com Encargo ou Modal:

Obrigação modal é a que se encontra onerada por cláusula acessória, que

impõe um ônus ao beneficiário de determinada relação jurídica.

Ocorre quando o benefício conferido a uma pessoa vier acompanhado de

ônus, ou seja, de um encargo. Evidentemente que esse ônus será menor do que

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o benefício; do contrário, seria contraprestação, como na compra e venda, por

exemplo. O comprador recebe uma coisa, mas terá a obrigação de realizar

contraprestação equivalente em dinheiro a favor do vendedor. Já o encargo,

característico dos atos jurídicos gratuitos, não será proporcional ao benefício.

Se recebo uma herança com a obrigação de constituir uma escola, o preço da

obra deverá ser bem inferior à herança. Se for igual, seguramente renunciarei a

meus direitos hereditários. Daí que o encargo não pode ser confundido com

contraprestação, característica dos atos jurídicos onerosos. Na verdade, o

encargo visa limitar a vantagem percebida pelo beneficiário.

O encargo se diferencia da condição, pois esta subordina a validade do ato

a seu implemento, e aquele não, apesar de ser exigível. Por exemplo, têm-se a

condição: “Deixo meus bens ao Fulano, se ele construir uma escola”. Se não for

construída tal escola, a herança não será deferida ao Fulano. Já no encargo

(“Deixo meus bens a Fulano, ficando ele obrigado a construir escola”) a

herança irá para o Fulano de qualquer jeito. Caso, porém, não construa a escola,

será forçado a tanto por qualquer interessado ou pelo Ministério Público. Se, de

qualquer forma, não construir, ser-lhe-ão tomados tantos bens quantos forem

necessários para custear as obras. Só perderia os bens deixados se o testamento,

expressamente, o determinasse: “Deixo meus bens a Fulano, ficando ele

obrigado a construir escola. Caso não construa, perderá os bens em favor de

Beltrano”. Neste caso, estaríamos diante de verdadeira condição, não encargo.

Cabe ressaltar que terceiro beneficiário pode exigir o cumprimento do

encargo, mas não está legitimado a propor ação revocatória. Esta é privativa do

instituidor, podendo os herdeiros apenas prosseguir na ação por ele intentada,

caso venha a falecer depois do ajuizamento. O instituidor também pode

reclamar o cumprimento do encargo. O Ministério Público só poderá fazê-lo

depois da morte do instituidor, se este não o tiver feito e se o encargo foi

imposto no interesse geral.

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OOOOBRIGAÇÕES DIVISÍVEIS E INDIVISÍVEISBRIGAÇÕES DIVISÍVEIS E INDIVISÍVEISBRIGAÇÕES DIVISÍVEIS E INDIVISÍVEISBRIGAÇÕES DIVISÍVEIS E INDIVISÍVEIS

1- Noções Gerais:

Obrigações Divisíveis são aquelas cujas prestações possibilitam

cumprimento parcial. Por sua vez, Obrigações Indivisíveis são aquelas cujas

prestações somente por inteiro podem ser cumpridas.

O interesse prático dessa divisão é escasso quando o vínculo obrigacional

se estabelece entre um só credor e um só devedor; em tal hipótese, não importa

que a prestação seja divisível ou indivisível; a execução se processa como se

indivisível fora, e ao devedor compete solvê-la por inteiro, de uma só vez, salvo

estipulação em contrário. (Assim como o credor não é obrigado a receber

pagamento fracionado, não deve também subdividir sua pretensão).

Havendo, porém, multiplicidade de credores, ou de devedores, adquire

grande relevo tal modalidade. Se a obrigação é divisível, cada credor só tem

direito a uma parte, podendo reclamá-la, independentemente dos demais

sujeitos. Por seu turno, cada devedor responde exclusivamente pela sua quota,

liberando-se assim com o respectivo pagamento. Indivisível, porém, a obriga-

ção, cada credor pode exigir o cumprimento integral, como cada devedor

responde pela totalidade.

Sendo vários os credores numa só relação, a indivisibilidade é ativa; se de

devedores a pluralidade, diz-se passiva. Observe-se ainda que tal

multiplicidade, seja qual for seu lado, pode ser originária, quando nasce com a

própria obrigação, ou derivada, como no caso de herança.

É de atentar-se, antes de tudo, que todas as coisas, em princípio, podem

ser divididas. Aqui, entretanto, estamos a considerar a divisibilidade e

indivisibilidade no prisma, eminentemente, jurídico.

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Assim, tem-se que as coisas são divisíveis quando podem e indivisíveis

quando não podem se partir em porções reais e distintas, formando cada qual

um todo perfeito, sem que com isso se altere sua substância, podendo, ainda, a

indivisibilidade resultar, não da própria natureza do objeto, mas da

determinação da lei ou da convenção das partes.

2- Espécies de indivisibilidade:

À luz do art. 88, do CC, podem-se distinguir três espécies de

indivisibilidade: física, legal e contratual.

Na primeira, a indivisibilidade da prestação, e, pois, da obrigação, resulta

da indivisibilidade física, material, da coisa ou fato, que constitui objeto da

mesma obrigação. Ex: a obrigação de entregar um cavalo, a obrigação de exibir

um documento e a obrigação do inquilino de restituir o prédio locado, findo o

contrato de locação.

É a própria natureza da obrigação que a torna indivisível. Mas também

pode ser assim por motivo de ordem econômica, como ocorreria com um

terreno que só pudesse ser edificado se mantivesse íntegra a área original.

Embora o bem comportasse divisão física, economicamente só teria valor

mantendo-se na dimensão original.

Na segunda, a indivisibilidade da prestação, e, portanto, da obrigação,

decorre da lei, posto seja ela naturalmente divisível. É o que acontece,

exemplificativamente, com os fundos de reserva das cooperativas, não

distribuídos entre os associados, ainda no caso de dissolução da sociedade (Lei

n. 5.764, de 16-12-1971, art. 68, VI), com as ações de sociedades anônimas em

relação à pessoa jurídica (Lei n. 6.404, de 15-12-1976, art. 28) e com os direitos

reais de garantia (Cód. Civil, art. 1.420, § 2).

Na terceira, finalmente, a indivisibilidade da prestação, e, pois, da

obrigação, provém da vontade das partes, embora em tese seja materialmente

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divisível. Sirva de exemplo o contrato de conta corrente, em que os créditos

escriturados se fundem num todo indissolúvel e de que não podem ser

separados. É o caso ainda de dois devedores que se obrigam a entregar, por

inteiro, a coisa prometida. Em regra, quando convencional, a indivisibilidade

vem estabelecida no interesse do credor.

A primeira categoria, acima referida, corresponde à da indivisibilidade

verdadeira e própria; as duas últimas configuram a chamada indivisibilidade

imprópria ou imperfeita.

A tais espécies de indivisibilidade pode-se acrescentar a denominada

judicial, não incluída nas categorias anteriores e que, no entanto, tem sido

reconhecida e proclamada pelos tribunais, como sucede com a obrigação de

indenizar nos acidentes do trabalho e a de responder pela revisão da mesma

indenização. Trata-se, nesses casos, de objeto indivisível por mera ficção.

3- Da indivisibilidade em relação às várias modalidades de obrigações

As obrigações de dar, em regra, são divisíveis: a) quando se trata de

obrigação pecuniária; b) quando se trata de obrigação de dar coisa fungível; c)

quando compreende ela número certo de objetos da mesma espécie, igual ao

dos co-credores, ou dos co-devedores, ou submúltiplo desse número, como se a

obrigação é de dar dez semoventes a duas ou a cinco pessoas; d) quando tenha

por objeto a transferência da propriedade, ou outro direito real, pois é sempre

possível a divisão em partes ideais.

Como se vê, as obrigações de dar são quase todas divisíveis, salvo os

casos em que o objeto da prestação é corpo certo e determinado, seja móvel

(automóvel, animal) ou imóvel (apartamento), pois seu fracionamento

modificará a substância e o valor do objeto.

As obrigações de restituir são geralmente indivisíveis: o comodatário,

obrigado a devolver a coisa emprestada, há de fazê-lo integralmente, não

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podendo reter uma parte, salvo permissão do comodante. Da mesma forma, nos

contratos de mútuo e de depósito. Numa retomada para uso próprio, o inquilino

vencido não pode reter a parte comercial do prédio locado, só restituindo a

residencial.

Quanto às obrigações de fazer, cumpre distinguir: serão indivisíveis

quando tiverem por objeto um trabalho completo, dotado de individualidade

própria, como a feitura de uma estátua, o levantamento de uma construção ou a

obrigação de proceder a inventário. Divisíveis serão, contudo, todas as

obrigações em cujo facere ínsita esteja uma idéia de duração do trabalho, ou de

quantidade (por exemplo, plantar dez mil eucaliptos, ou prestar contas de um

período de três anos). Por outras palavras, são divisíveis as obrigações de fazer

cujo objeto se constitua de atos fungíveis; ou então aquelas que se relacionam

com as divisões do tempo.

No tocante às obrigações de não fazer, serão divisíveis aquelas em que o

ato cuja abstenção se promete pode ser satisfeito por partes, e indivisíveis na

hipótese contrária. Veja-se, por exemplo, a obrigação de não demandar; se a

eventual demanda concerne a uma obrigação pecuniária, intrinsecamente

divisível, o non facere é divisível; se diz respeito a uma obrigação indivisível, o

non facere é também indivisível; em tal caso, considera-se violada a obrigação

ainda que o devedor só parcialmente realize o ato cuja abstenção garantira.

Por último, com relação às obrigações alternativas e às obrigações

genéricas, estão elas incluídas entre as obrigações indivisíveis. Até a

concentração, não se sabe exatamente qual a prestação devida de fato, ficando

assim em suspenso o caráter divisível ou indivisível da obrigação.

4- Disposições legais

Ainda que a obrigação tenha por objeto prestação divisível, não pode o

credor ser obrigado a receber, nem o devedor a pagar, por partes, se assim não

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se ajustou (art. 314). O texto só se refere às obrigações em que haja um só

credor e um só devedor; se houver pluralidade de credores, ou de devedores,

prevalecerão as regras dos artigos seguintes.

Obrigação que tenha por objeto prestação pecuniária é de natureza

divisível, comportando, pois, em tese, execução parcelada. Todavia, o credor

não pode ser compelido a recebê-la por partes, se assim não se ajustou, salvo a

hipótese do art. 22 do Decreto n. 2.044/08 (Dispõe que o portador da letra de

câmbio é obrigado a receber o pagamento parcial, ao tempo do vencimento.

Ressalte-se que o pagamento parcial de uma letra de câmbio não significa

adimplemento da obrigação, porque o portador continua com o direito de levá-

la a protesto por falta de pagamento do remanescente).

Por igual, o devedor não pode ser coagido a solver por partes se não

existe pacto expresso a respeito. Na hipótese do art. 314, é a prestação que, pelo

seu objeto, imprime cunho de divisibilidade ou indivisibilidade à obrigação.

Inexistindo cláusula em contrário, a obrigação é de uma só prestação, embora

divisível seu objeto.

Tenha-se presente que a execução parcial pelo solvens de obrigação

anulável, com ciência do vício que a inquina, importa ratificação (art. 174), com

renúncia de todas as ações, ou exceções, de que dispunha contra o ato (art. 175).

Havendo mais de um devedor ou mais de um credor em obrigação

divisível, esta se presume dividida em tantas obrigações, iguais e distintas,

quantos os credores, ou devedores (art. 257). A dívida pode ter realmente

numerosos sujeitos ativos ou passivos, quer originariamente, quer de modo

derivado (por cessão ou herança). Em tal hipótese, resultarão as seguintes e

importantes consequências jurídicas:

a) cada um dos credores só tem direito de exigir sua fração no crédito;

b) de modo idêntico, cada um dos devedores só tem de pagar a própria

quota no débito (exemplo: art 1.380, do CC);

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c) se o devedor solver integralmente a dívida a um só dos vários credores,

não se desobrigará com relação aos demais concredores;

d) o credor que recusar o recebimento de sua quota, por pretender solução

integral, pode ser constituído em mora;

e) a insolvência de um dos co-devedores não aumentará a quota dos

demais;

f) a suspensão da prescrição, especial a um dos devedores, não aproveita

aos demais (art. 201);

g) a interrupção da prescrição por um dos credores não beneficia os

outros; operada contra um dos devedores, não prejudica os demais (art. 204).

Indivisível a obrigação, advirão estas consequências havendo pluralidade

de partes:

a) cada um dos credores pode exigir a dívida por inteiro;

b) cada um dos devedores responde integralmente pela dívida;

c) o devedor que paga integralmente o débito a um dos vários credores

desonerar-se-á em relação aos demais;

d) o credor não pode recusar o pagamento por inteiro, sob pena de ser

constituído em mora;

e) sendo indivisível a obrigação, a prescrição aproveita a todos os

devedores, desde que em favor de um venha a ser reconhecida;

f) sua suspensão ou interrupção aproveita ou prejudica todos;

g) a nulidade quanto a um dos interessados se estende a todos.

A obrigação ainda é indivisível quando a prestação tem por objeto uma

coisa ou um fato não suscetíveis de divisão, por sua natureza, por motivo de

ordem econômica, ou dada a razão determinante do negócio jurídico (art. 258).

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Assim, a indivisibilidade não decorre apenas da natureza da prestação ou

da lei, mas também por motivo de ordem econômica.

Efetivamente, por força do disposto no art. 259, "se, havendo dois ou

mais devedores, a prestação não for divisível, cada um será obrigado pela

dívida toda". Uma vez que a obrigação é indivisível, cada um dos devedores

responde pela totalidade, como acontece na solidariedade. Aliás, os credores de

prestação indivisível deverão considerar-se credores solidários, enquanto

subsistir a indivisibilidade.

Dispõe ainda o parágrafo único do art. 259 que "o devedor, que paga a

dívida, sub-roga-se no direito do credor em relação aos outros coobrigados". Aí

está uma das aplicações do art. 346, n. III: a sub-rogação opera-se, de pleno

direito, em favor do interessado, que paga a dívida pela qual era ou podia ser

obrigado, no todo ou em parte. O devedor, demandado por obrigação

indivisível, não pode exigir que o credor acione conjuntamente todos os co-

devedores; qualquer deles, à escolha do autor, pode ser demandado

isoladamente pela dívida inteira. Nessa faculdade reside, precisamente, a função

prática da indivisibilidade, que constitui a salvaguarda da unidade do objeto, ou

da prestação, no que concerne ao implemento da obrigação. Ressalva-se apenas

ao devedor que solve sozinho o débito por inteiro sub-rogação dos direitos

creditórios, a fim de reaver dos consortes, liberados quanto ao primitivo credor,

as quotas respectivas.

Se a pluralidade for dos credores, poderá cada um destes exigir a dívida

inteira. Mas o devedor ou devedores se desobrigarão, pagando: I - a todos

conjuntamente; II - a um, dando este caução de ratificação dos outros credores

(art. 260).

Sendo vários os credores, pode qualquer deles reclamar a dívida inteira. O

devedor só se desobrigará pagando a todos conjuntamente, ou a um deles

apenas, desde que autorizado pelos demais. Faltando essa autorização, só

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deverá pagar se aquele que demanda o pagamento der caução de ratificação dos

outros credores. Eis aí, sem dúvida, outro traço distintivo com referência à

solidariedade, pois, quanto a esta, como se verá, pagamento feito a um dos

credores libera o devedor, independentemente da prestação de caução.

Se um só dos credores receber a prestação por inteiro, a cada um dos

outros assistirá o direito de exigir dele em dinheiro a parte que lhe caiba no total

(art. 261).

Aplicável será esse dispositivo sempre que entre os co-credores inexista

estipulação particular disciplinadora de suas mútuas relações internas. Em tal

hipótese, ausente a disposição, quer a lei que o credor beneficiado pelo

recebimento total reembolse os demais pelo valor de suas quotas. Se tal

reembolso não puder ser efetuado in natura, em virtude da natureza da

prestação, far-se-á em dinheiro, por estimação.

Na falta de estipulação em contrário, presumem-se iguais as quotas dos

credores e dos devedores, na indivisibilidade ativa e na indivisibilidade passiva.

Se um dos credores remitir a dívida, a obrigação não ficará extinta para

com os outros; mas estes só a poderão exigir descontada a quota do credor

remitente (art. 262). Exemplo: o objeto da obrigação é dar um cavalo. Dos três

credores, um remite a dívida. Os outros dois exigem pagamento, que só de um

modo poderá ser feito: entregando o devedor o cavalo devido. Mas os credores

se locupletariam com o alheio se não indenizassem o devedor da parte

correspondente ao credor que perdoou a dívida. Essa parte deve, portanto, ser

oportunamente descontada.

Acrescenta o parágrafo único do art. 262 que "o mesmo critério se

observará no caso de transação, novação, compensação ou confusão".

Transação é contrato pelo qual, mediante concessões recíprocas, se

previne ou termina uma lide. Se um dos credores, em obrigação indivisível,

transige com o devedor, faz extinguir entre ambos a relação obrigacional. Mas,

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como o ato não aproveita nem prejudica senão aos que nele tomaram parte,

ainda que diga respeito a coisa indivisível, segue-se que os demais credores

inibidos não ficam de cobrar do devedor comum, de-duzindo-se, obviamente,

em tempo oportuno, a quota que pertenceria ao credor transigente.

Novação, por seu turno, é a conversão de uma dívida em outra, tomando

esta o lugar daquela, que fica extinta. Celebrada, por conseguinte, entre um dos

credores e o devedor comum, extingue-se a dívida deste, não pelo total,

naturalmente, mas pela sua quota, podendo, assim, os demais credores, a

qualquer tempo, reclamar as parcelas a que têm direito.

O mesmo acontece ainda com a compensação e a confusão, a que se

aplicam, mutatis mutandis, todas as considerações feitas com relação aos outros

modos indiretos de extinção das obrigações.

Por último, preceitua o art. 263 que "perde a qualidade de indivisível a

obrigação que se resolver em perdas e danos". A obrigação que se resolve em

perdas e danos vem a ser representada por somas em dinheiro, que, por sua

natureza, são divisíveis.

Acrescenta o § 1- que "se, para efeito do disposto neste artigo, houver

culpa de todos os devedores, responderão todos por partes iguais". Sofrem

todos, portanto, as conseqüências da mora coletiva.

Remata o § 2-, estabelecendo que, "se for de um só a culpa, ficarão

exonerados os outros, respondendo só esse pelas perdas e danos". Em se

tratando de obrigação divisível, a mora será forçosamente individual.

Caracterizar-se-á, destarte, com relação a cada devedor, ou a cada credor,

isoladamente, sem que o atraso de um induza culpa de outro. Como se vê, trata-

se de hipótese muito simples e que não comporta qualquer problema.

Já no tocante à obrigação indivisível, o pagamento deve ser oferecido a

todos conjuntamente, ou a um deles apenas, se ele der caução de ratificação dos

demais. No primeiro caso, se um deles se recusa a receber, claro é que sua

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negativa não induz mora dos demais. Só o culpado responderá pelas perdas e

danos.

Art. 257. Havendo mais de um devedor ou mais de um credor em obrigação divisível, esta presume-se dividida em tantas obrigações, iguais e distintas, quantos os credores ou devedores.

Art. 258. A obrigação é indivisível quando a prestação tem por objeto uma coisa ou um fato não suscetíveis de divisão, por sua natureza, por motivo de ordem econômica, ou dada a razão determinante do negócio jurídico.

Art. 259. Se, havendo dois ou mais devedores, a prestação não for divisível, cada um será obrigado pela dívida toda.

Parágrafo único. O devedor, que paga a dívida, sub-roga-se no direito do credor em relação aos outros coobrigados.

Art. 260. Se a pluralidade for dos credores, poderá cada um destes exigir a dívida inteira; mas o devedor ou devedores se desobrigarão, pagando:

I - a todos conjuntamente;

II - a um, dando este caução de ratificação dos outros credores.

Art. 261. Se um só dos credores receber a prestação por inteiro, a cada um dos outros assistirá o direito de exigir dele em dinheiro a parte que lhe caiba no total.

Art. 262. Se um dos credores remitir a dívida, a obrigação não ficará extinta para com os outros; mas estes só a poderão exigir, descontada a quota do credor remitente.

Parágrafo único. O mesmo critério se observará no caso de transação, novação, compensação ou confusão.

Art. 263. Perde a qualidade de indivisível a obrigação que se resolver em perdas e danos.

§ 1o Se, para efeito do disposto neste artigo, houver culpa de todos os devedores, responderão todos por partes iguais.

§ 2o Se for de um só a culpa, ficarão exonerados os outros, respondendo só esse pelas perdas e danos.

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OOOOBRIGAÇÕES SOLIDÁRIASBRIGAÇÕES SOLIDÁRIASBRIGAÇÕES SOLIDÁRIASBRIGAÇÕES SOLIDÁRIAS

1- Conceito

A solidariedade na obrigação é um artifício técnico para reforçar o

vínculo, facilitando o cumprimento ou a solução da dívida.

A obrigação é solidária quando a totalidade de seu objeto pode ser

reclamada por qualquer dos credores ou qualquer dos devedores.

Assim, pode ocorrer a solidariedade de credores (ativa) e a solidariedade

de devedores (passiva), que é a mais útil e mais comum.

O efeito fundamental é o mesmo das obrigações indivisíveis, mas nesse

caso a possibilidade de reclamar a totalidade não deriva da natureza da

prestação, mas da vontade das partes ou da lei. De fato, a solidariedade não se

presume, resultando da lei ou da vontade das partes (art.265).

"Há solidariedade quando na mesma obrigação concorre mais de um

credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado à dívida

toda" (art. 264).

Destarte, a solidariedade é modalidade especial de obrigação que possui

dois ou mais sujeitos, ativos ou passivos, e, embora possa ser divisível, pode

cada credor demandar e cada devedor é obrigado a satisfazer a totalidade, com a

particularidade de que o pagamento feito por um devedor a um credor extingue

a obrigação quanto aos outros coobrigados.

2- Obrigações in Solidum

De acordo com nosso ordenamento, a solidariedade uma só.

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No entanto, é inafastável o fato de existirem situações em que vários

agentes aparecem devendo a totalidade, sem serem solidários.

Exemplos:

1- Um motorista particular atropela e fere um pedestre, agindo com culpa.

No evento, surge dupla responsabilidade: a do condutor do veículo e a

de seu proprietário, que responde por culpa indireta. Ambos estarão

obrigados pela totalidade da indenização. O credor tem o direito de

acionar qualquer obrigado indistintamente.

2- Suponhamos um caso de incêndio de uma propriedade segurada,

causada por culpa de um terceiro. Tanto a seguradora, como o autor do

incêndio, devem à vítima a indenização pelo prejuízo; a seguradora no

limite do contrato, e o agente, pela totalidade. A vítima pode reclamar

a indenização de qualquer um deles, indistintamente, e o pagamento

efetuado por um libera o outro devedor. Contudo, não existe

solidariedade entre os devedores porque não existe uma causa comum,

uma origem comum na obrigação.

No caso do acidente de veículo, a responsabilidade do motorista funda-se

em sua culpa; a responsabilidade do dono do automóvel resulta exatamente de

sua condição de proprietário, independentemente da perquirição de culpa.

No caso do incêndio, a responsabilidade da companhia seguradora tem

como fonte um contrato, enquanto a responsabilidade do incendiário decorre

dos princípios do art. 186 do Código Civil: o ato ilícito.

Desse modo, temos as obrigações in solidum, nas quais os liames que

unem os devedores ao credor são totalmente independentes, embora ligados

pelo mesmo fato. Assim sendo, como conseqüência, a prescrição referente aos

devedores é independente; a interpelação feita a um dos devedores não constitui

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em mora os outros; a remissão da dívida feita em favor de um dos credores não

beneficia os outros.

Todavia deve ser lembrado que, enquanto a dívida solidária é suportada

por igual por todos os devedores, pode ocorrer nas obrigações in solidum que os

devedores não sejam responsáveis, todos, pelo mesmo valor. No caso da

companhia seguradora, por exemplo, o valor segurado pode ser inferior aos

danos. O incendiário será responsável pelo valor integral do dano, mas a

seguradora responde até o limite fixado no contrato.

3- Características e Fundamento da Solidariedade

A obrigação solidária é relação obrigatória unitária, compreensiva do

credor e de todos os devedores solidários, que encerra uma pluralidade de

créditos, do credor contra cada um dos devedores solidários (ou com maior

razão, quando a solidariedade for ativa). Cada uma das relações entre o lado

ativo e o lado passivo pode desenvolver-se até certo grau, com certa

independência com as demais. No entanto, todas essas relações obrigatórias

permanecem unidas entre si por meio da unidade finalística da prestação, cuja

realização alcança sua finalidade de conformidade com a avença, incluindo-se,

assim, todas as relações obrigatórias singulares.

Portanto, ressaltam-se, de plano, duas importantes características: a

unidade da prestação (qualquer que seja o número de credores ou devedores, o

débito é sempre único) e a pluralidade e independência do vínculo.

Sobre esse último aspecto, enfatize-se, mais uma vez, que a unidade de

prestação não impede que o vínculo que une credores e devedores seja distinto

e independente. Tal independência no vínculo dá margem a algumas

consequências:

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a) a obrigação pode ser pura e simples para algum dos devedores e pode

estar sujeita à condição, ao prazo ou ao encargo para outros (art. 266);

b) se uma obrigação é nula porque um dos credores é incapaz, por

exemplo, conserva sua validade quanto aos demais;

c) um dos devedores pode ser exonerado de sua parte da dívida,

permanecendo a obrigação para com os demais. Contudo, não devemos ver uma

independência total de vínculos, caso em que haveria somente uma obrigação

composta ou mancomunada, e nunca solidariedade.

Fala-se, também, que a obrigação solidária tem uma unidade de causa,

pois caso contrário, encontrar-se-ia perante uma obrigação in solidum e não

perante uma obrigação solidária.

Como consequência dessas características, elementarmente, portanto, as

obrigações solidárias têm uma pluralidade de credores ou de devedores e uma

co-responsabilidade entre os interessados. Como consequência dessa última

característica, por conseguinte, o que solve a dívida pode reaver dos demais a

quota-parte de cada um na obrigação. Do lado da solidariedade ativa, da mesma

forma, o recebimento por parte de um dos credores extingue o direito dos

demais. Todavia, o que recebe deve entregar aos demais credores o que cada

um tem direito.

O que deve ficar bem claro, desde o princípio, mormente na solidariedade

passiva, é que as relações internas do vínculo entre os vários devedores é

absolutamente irrelevante para o credor. Após um dos devedores ter solvido a

dívida é que ele vai entender-se com os demais companheiros do lado passivo.

Assim é que um dos devedores solidários pode ter se obrigado por mera

liberalidade, em razão de um negócio de sociedade, porque tinha direitos para

com o credor etc. Todas essas relações são irrelevantes para o credor.

Portanto, sob o aspecto externo, todos os devedores e todos os credores

solidários estão em pé de igualdade.

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66

Logo, percebe-se claramente que a finalidade da solidariedade passiva

(que é a mais comum) tem em mira assegurar a solvência, reforçar o vínculo. O

credor passa a uma situação de maior garantia, pelo simples fato de poder exigir

de qualquer devedor o cumprimento de toda a obrigação. Ainda, facilita a

cobrança por parte do credor, que no caso de inadimplemento não fica obrigado

a mover uma ação contra todos os devedores (o que não poderia ocorrer se a

obrigação fosse simplesmente mancomunada).

Do lado da solidariedade ativa, embora sua utilização seja restrita, os

credores têm a vantagem de que qualquer um deles pode atuar no recebimento

do crédito, demandando o pagamento integral. Há um poder recíproco que

facilita o recebimento.

4- Fontes da Solidariedade

Dispõe o art. 265: "A solidariedade não se presume; resulta da lei ou da

vontade das partes."

A obrigação solidária possui um verdadeiro caráter de exceção dentro do

sistema, não se admitindo responsabilidade solidária fora da lei ou do contrato.

Assim sendo, não havendo expressa menção no título constitutivo e não

havendo previsão legal, prevalece a presunção contrária à solidariedade. Não

estando presente o instituto, a obrigação divide-se, cada devedor sendo

obrigado apenas a uma quota-parte, ou cada credor tendo direito a apenas uma

parte.

Na dúvida, interpreta-se a favor dos devedores, isto é, pela inexistência de

solidariedade. No entanto, uma vez fixada a solidariedade, não se ampliam as

obrigações.

A solidariedade, portanto, não pode decorrer da sentença, como à

primeira vista em alguns casos pode parecer. O juiz, na verdade, não faz senão

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67

por declarar o direito das partes e não pode condenar solidariamente os réus se a

solidariedade já não preexiste num contrato ou na lei. Contudo, não é sem

frequência que surge, na sentença, uma obrigação in solidum. No anterior

exemplo do incêndio, se o autor move a ação contra a companhia seguradora e

contra o autor do dano, surgirá essa forma de condenação.

Há necessidade, então, que a solidariedade seja expressa. Não precisa,

contudo, de palavras sacramentais, bastando que fique clara a vontade de se

obrigar solidariamente.

Como não existe presunção de solidariedade, quem a alega tem que

provar. Provindo da lei, não há necessidade de prova.

Não há dúvida, no entanto, de que a solidariedade pode ser provada por

testemunhas, quando o valor do contrato o permitir (ver art. 401 do CPC e art.

227 do CC). Meras presunções e indícios podem reforçar a prova da

solidariedade, mas não a induzem.

5- Solidariedade Ativa

A solidariedade ativa é a que contém mais de um credor, todos podendo

cobrar a dívida por inteiro.

Sua importância prática é escassa, pois não tem outra utilidade a não ser

servir como mandato para recebimento de um crédito comum, efeito que se

pode obter com o mandato típico. Nossa lei não contém exemplos de

solidariedade ativa. Logo, os exemplos de solidariedade ativa devem decorrer

da manifestação de vontade, do contrato ou testamento.

A matéria vem regulada no Código Civil em seus arts. 267 a 274.

A vantagem dessa modalidade é a de que qualquer credor pode exigir a

totalidade de dívida, sem depender da aquiescência dos demais credores (art.

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267) e cada devedor (ou o devedor, se for um só) poderá se liberar da obrigação

pagando a prestação a qualquer um dos credores (art. 269).

O grande inconveniente da solidariedade ativa, o que certamente é causa

de seu desuso, é o fato de que qualquer credor, recebendo a dívida toda, exonera

o devedor, tendo então os demais credores que se entenderem com o credor que

deu quitação.

5.1- Efeitos da solidariedade ativa

1. Cada credor pode reclamar de qualquer dos devedores (ou do devedor)

a dívida por inteiro (art. 267), não podendo, assim, o devedor pretender pagar

parcialmente, sob a alegação de que há outros credores.

2. O pagamento feito a um dos credores, a compensação, a novação e a

remissão da dívida feita por um dos credores a qualquer dos devedores extingue

também a obrigação (art. 269).

No entanto, o direito livre de pagar dos devedores sofre uma limitação de

ordem processual: se um dos credores já acionou o devedor, este só poderá

pagar àquele em juízo ou em razão dele.

Complementando o art. 269, parágrafo único, diz o art. 272: "O credor

que tiver remitido a dívida ou recebido o pagamento responderá aos outros pela

parte que lhes caiba."

Assim, pode o credor remitir, isto é, abrir mão da cobrança da dívida,

perdoá-la, mas não poderá, com essa atitude, prejudicar os demais credores,

devendo pagar-lhes a parte devida.

3. A constituição em mora feita por um dos co-credores favorece a todos

os demais.

4. A interrupção da prescrição por um dos credores beneficia os demais

(art. 204, § 1°). Já a suspensão da prescrição em favor de um dos credores

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69

solidários só aproveitará aos outros se o objeto da obrigação for indivisível (art.

201). A renúncia da prescrição em face de um dos credores aproveitará aos

demais.

5. Qualquer credor poderá propor ação para a cobrança de crédito. Outro

credor poderá ingressar na ação na condição de assistente (art. 54 do CPC).

6. A incapacidade de um dos credores não obsta que a obrigação

mantenha seu caráter solidário a respeito dos demais.

7. Enquanto não for cobrada a dívida por algum credor, o devedor pode

pagar a qualquer um dos credores (art. 268). Havendo demanda haverá

prevenção judicial e o devedor só poderá pagar em juízo.

8. A constituição em mora do credor solidário, pela oferta de pagamento

feita pelo devedor comum, prejudicará a todos os demais, que passarão a

responder, todos, pelos juros, riscos e deteriorações da coisa.

9. Na forma do art. 270: "Se falecer um dos credores solidários, deixando

herdeiros, cada um destes só terá direito a exigir e receber a quota do crédito

que corresponder ao seu quinhão hereditário, salvo se a obrigação for

indivisível."

Assim, nessa hipótese, desaparece a solidariedade para os herdeiros. Os

demais credores continuarão solidários.

10. A conversão da prestação em perdas e danos não faz desaparecer a

solidariedade, correndo em proveito de todos os credores os juros de mora (art.

271).

11. A relação interna, a natureza do débito e a quota de cada credor no

débito é irrelevante para o devedor (trata-se de relação interna entre os

credores), e o credor que receber deve prestar contas aos demais, pela parte que

lhes caiba (art. 272). Os demais credores terão ação regressiva contra os

accipiens, de acordo com o título de cada um. É claro que, se a solidariedade

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70

ativa foi estabelecida apenas para outorgar um poder a outros para receber,

haverá um único interessado no negócio, que terá direito à totalidade do crédito.

5.2- Extinção da solidariedade ativa

A solidariedade ativa não termina apenas pelo pagamento a qualquer dos

credores. Pode ocorrer por novação (conversão de uma dívida em outra,

extinguindo-se a primeira (arts. 360 a 367); compensação (que é um encontro

de dívidas, uma extinção recíproca de obrigações (arts. 368 a 380) e remissão

(em última análise, o perdão da dívida, arts. 385 a 388).

O pagamento por consignação (arts. 334 a 345) também libera o devedor,

mesmo quando efetuado a apenas um dos credores.

Igualmente, a confusão que se configura por ocorrer na mesma pessoa as

qualidades de credor e devedor (arts. 381 a 384); e a transação que se

caracteriza pela extinção do débito mediante concessões recíprocas (arts. 840 a

850) extinguem os débitos. Quando há confusão, os credores que dela

participam não podem prejudicar os credores estranhos a essa forma de

extinção, devendo receber suas quotas-partes, assim como na transação, por

aplicação do princípio do art. 272.

6- Solidariedade Passiva

Solidariedade passiva é aquela que obriga todos os devedores ao

pagamento total da dívida.

É muito grande sua importância na vida negocial por se tratar de meio

muito eficiente de garantia, de reforço do vínculo, facilitando o adimplemento.

Para que o credor fique insatisfeito é necessário que todos os devedores fiquem

insolventes, uma vez que pode acionar qualquer um deles pela dívida toda.

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71

Desde que presente a solidariedade, fica facilitada a conduta do credor. Sua

aplicação, portanto, é infinitamente maior do que a solidariedade ativa.

Externamente todos os devedores são coobrigados na solidariedade

passiva. Internamente, cada devedor poderá ser responsável por valores

desiguais na obrigação ou, até mesmo, ter unicamente a responsabilidade, sem

que haja débito, como é o caso da fiança com equiparação solidária.

6.1- Principais efeitos da obrigação solidária

1. Direito individual de persecução. Cada credor (se for mais de um) tem

direito de reclamar de qualquer dos devedores a totalidade da dívida (art. 275).

Não é aconselhável, no entanto, que o credor demande a mais de um devedor

em processos diversos, concomitantemente, pois processualmente é

inconveniente. Poderão ocorrer decisões contraditórias e não é isso que busca o

sistema. Deverão, portanto, ser reunidas as ações para um julgamento conjunto.

Nesse mesmo diapasão, o Código aponta, no parágrafo único do art. 275,

uma das regras fundamentais da solidariedade: "Não importará renúncia da

solidariedade a propositura de ação pelo credor contra um ou alguns dos

devedores."

O pagamento parcial também pode ser efetuado, assim como a remissão.

Segundo o art. 277: "O pagamento parcial feito por um dos devedores e a

remissão por ele obtida não aproveitam aos outros devedores, senão até à

concorrência da quantia paga, ou relevada."

2. A morte de um dos devedores solidários não extingue a solidariedade.

Dispõe o art. 276: "Se um dos devedores solidários falecer deixando herdeiros,

nenhum destes será obrigado a pagar senão a quota que corresponder ao seu

quinhão hereditário, salvo se a obrigação for indivisível; mas todos reunidos

Page 72: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

72

serão considerados como um devedor solidário em relação aos demais

devedores."

Tal se deve pelo fato de que os herdeiros respondem pelos débitos do de

cujus, desde que não ultrapassem as forças de herança (princípio do benefício

do inventário). Cada herdeiro fica responsável por sua quota na parte do

falecido, a menos que a obrigação seja indivisível, caso em que se mantém a

solidariedade por impossibilidade material. Existe uma relação íntima do

art.276 com o art. 270, que diz respeito à solidariedade ativa.

3. De acordo com o art. 278: "Qualquer cláusula, condição, ou obrigação

adicional, estipulada entre um dos devedores solidários e o credor, não poderá

agravar a posição dos outros, sem consentimento destes."

O princípio geral é que ninguém pode ser obrigado a mais do que desejou,

a não ser que concorde expressamente. Os atos descritos nesse artigo alteram a

relação obrigacional, prejudicando os devedores solidários. Poderão apenas

obrigar o devedor que estipulou tais cláusulas, sem aquiescência dos demais.

4. Culpa. Se a obrigação se extinguir sem culpa dos devedores, o

princípio geral já estudado é que extinguirá a dívida para todos. Porém, pode

ocorrer que haja culpa de algum dos devedores.

Art. 279: "Tornando-se inexeqüível a prestação por culpa de um dos

devedores solidários, subsiste para todos o encargo de pagar o equivalente; mas

pelas perdas e danos só responde o culpado."

Portanto, a “apenação” de perdas e danos só será carreada ao culpado.

Igual solução ocorrerá se a impossibilidade da prestação se deu quando o

devedor já estava em mora. Este responderá pelos riscos, mesmo que tenha

havido caso fortuito ou força maior (ver art. 399). A tal propósito acrescenta o

art. 280: "Todos os devedores respondem pelos juros de mora ainda que a ação

tenha sido proposta somente contra um; mas o culpado responde aos outros pela

obrigação acrescida."

Page 73: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

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5. Exceções pessoais e exceções gerais.

Art. 281: "O devedor demandado pode opor ao credor as exceções que lhe

forem pessoais e as comuns a todos; não lhe aproveitando, porém, as pessoais a

outro co-devedor."

O terno exceção significa forma e meio de defesa.

Na obrigação solidária, embora haja uma única prestação devida, há

multiplicidade de vínculos motivada pela existência de mais de uma pessoa no

pólo passivo ou no pólo ativo. De acordo com o dispositivo estudado, tudo que

disser, respeito à própria obrigação pode ser alegado por qualquer devedor

demandado. Situações tais como inexistência da obrigação, quitação, ilicitude

da obrigação, ausência de forma prescrita, prescrição, extinção da obrigação,

tudo isso fere diretamente a obrigação, ficando qualquer devedor intitulado para

sua alegação, pois esses fenômenos colhem a obrigação em si, e não os diversos

vínculos. Essas exceções, por isso, são denominadas comuns ou reais, e que nós

preferimos denominar gerais, porque possibilitam a qualquer coobrigado alegá-

las.

Porém, como essa obrigação é subjetivamente complexa, podem existir

meios de defesa, exceções, particulares e próprias só a um (ou alguns) dos

devedores. Aí, então, só o devedor exclusivamente atingido por tal exceção é

que poderá alegá-la. São as exceções pessoais, que não atingem nem

contaminam o vínculo dos demais devedores. Assim, um devedor que se tenha

obrigado por erro, só poderá alegar este vício de vontade em sua defesa. Os

outros devedores, que se obrigaram sem qualquer vício, não podem alegar em

sua defesa a anulabilidade da obrigação, porque o outro coobrigado laborou em

erro. Destarte, cada devedor pode opor em sua defesa, nas obrigações solidárias,

as exceções gerais (todos coobrigados podem fazê-lo), bem como as exceções

que lhe são próprias, as pessoais. Assim, não pode o coobrigado, que se

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74

comprometeu livre e espontaneamente, tentar invalidar a obrigação porque

outro devedor entrou na solidariedade sob coação.

Em apertada síntese, pode-se dizer que as exceções pessoais são meios de

defesa que podem ser opostos por um ou vários dos co-devedores; exceções

gerais são os meios de defesa que podem ser opostos por todos os co-devedores

da obrigação solidária. Como se vê da dicção do art. 278, um devedor solidário,

individualmente, pode obter até mesmo a remissão da dívida, podendo, pois,

atingir benefícios próprios e, na forma do artigo, qualquer cláusula, condição ou

obrigação adicional, não poderá agravar a situação dos demais, sem seu

consentimento.

6.2- Aspectos processuais da solidariedade. A coisa julgada

Pelo fato de o credor poder acionar quer um, quer alguns, quer todos os

devedores, nos termos do art. 275, parágrafo único, há reflexos no processo que

merecem ser vistos.

Quando um devedor solidário é acionado, os demais podem intervir no

processo como assistentes, na figura de assistente qualificado (art. 54 do CPC).

Note-se, porém, que, se a defesa do acionado é por exceção pessoal, a

assistência será simples.

Em relação à eficácia da coisa julgada, quando da ação não participam

todos os devedores solidários, a questão deve ser vista pelo prisma processual.

Muito discutiu a doutrina sobre o problema, mas o fato é que para

existirem os efeitos da coisa julgada deve haver a tríplice identidade (de objeto,

de causa de pedir e de pessoas). Assim sendo, a moderna doutrina inclina-se em

ver efeitos da coisa julgada apenas para os partícipes da ação. O julgado

restringe-se às partes e só elas são atingidas por ele.

Page 75: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

75

No entanto, é evidente que o Poder Judiciário, como poder estatal, é uno.

Devem os julgados, sempre que possível, evitar decisões contraditórias, ou

conflitantes, que confundem os que dele se valem, causam instabilidade social e

prejudicam a figura do magistrado. Desse modo, embora não haja comunicação

de coisa julgada, os tribunais devem procurar sempre proferir decisões

homogêneas. Tomando conhecimento de uma decisão, ou de um processo, em

que se discute a mesma obrigação, como é o caso da solidariedade, o julgador

deve buscar uma decisão única, reunindo-se os processos, para decisão

conjunta, sempre que for viável. Quando já existe uma decisão, deve procurar o

julgador decisão que seja homogênea àquela, sem violentar seu convencimento.

6.3- Pagamento parcial

Diz o art. 277: "O pagamento parcial feito por um dos devedores e a

remissão por ele obtida não aproveitam aos outros devedores, senão até à

concorrência da quantia paga, ou relevada."

Entenda-se a razão da regra. Se o credor já recebeu parcialmente a dívida,

não poderá exigir dos demais co-devedores a totalidade, mas apenas abater o

que já recebeu.

O credor pode exigir parcialmente a dívida apenas se desejar, porque a

obrigação não é essa. No entanto, se já foi paga parcialmente, por iniciativa de

um dos devedores e com a concordância do credor, os demais devedores podem

pagar o saldo, não sendo mais obrigados pela dívida toda.

Da mesma forma opera-se com a remissão parcial. Ocorre o contrário do

que sucede na solidariedade ativa (art. 269). Quando o credor perdoa a dívida

em relação a um dos devedores solidários, isso não faz com que a dívida

desapareça com relação aos demais devedores, que permanecem vinculados à

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76

solução da dívida, com abatimento daquela parte que foi dispensada pelo

credor.

Se, contudo, a remissão ocorrer totalmente e sem ressalvas, atinge toda a

dívida e todos os devedores.

7- Extinção da Solidariedade

A solidariedade, quer ativa, quer passiva, pode desaparecer, deixando de

existir, portanto, a faculdade ínsita a essa modalidade de obrigação, que é a de o

credor exigir a dívida por inteiro de qualquer coobrigado ou de qualquer credor;

na solidariedade ativa, pode exigir também a dívida toda do devedor.

Na solidariedade ativa, os credores poderão abrir mão da solidariedade, da

mesma forma que a criaram, isto é, convencionalmente: a partir de então, cada

credor só poderá exigir sua quota-parte no crédito. O devedor só deverá pagar a

quota respectiva a cada credor.

Há uma hipótese legal, contudo, na qual o vínculo da solidariedade,

embora não desapareça, fica irregular. É a hipótese do art. 270 do Código Civil:

"Se um dos credores solidários falecer deixando herdeiros, cada um destes só

terá direito a exigir e receber a quota do crédito que corresponder ao seu

quinhão hereditário, salvo se a obrigação for indivisível."

Nesse caso, a solidariedade só desaparece para os herdeiros do falecido

credor, persistindo essa espécie de vínculo para os credores solidários

sobrevivos. Note-se, no entanto, que os herdeiros em questão, em conjunto, são

tratados como o credor falecido; podem todos eles, em conjunto, exigir a dívida

toda.

Como diz a lei, no caso de obrigação indivisível, os herdeiros do credor

falecido podem, qualquer um deles, exigir a dívida por inteiro. Tal decorre da

Page 77: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

77

natureza material da prestação e não do vínculo jurídico. Existe impossibilidade

do cumprimento parcelado da obrigação.

No caso de solidariedade passiva, as situações de extinção são mais

frequentes.

Na hipótese de morte de um dos devedores solidários, deixando herdeiros,

"nenhum destes não será obrigado a pagar senão a quota que corresponder ao

seu quinhão hereditário, salvo se a obrigação for indivisível; mas todos reunidos

serão considerados como um devedor solidário em relação aos demais

devedores" (art. 276).

Os herdeiros, portanto, serão responsáveis apenas por sua quota na dívida.

Em conjunto, são considerados um único devedor. Enquanto não houver

partilha, o crédito pode ser exigido do monte-mor. Após a partilha, o credor só

poderá pedir a quota de cada herdeiro na dívida, não podendo os co-herdeiros

ser compelidos a saldar a dívida toda.

Nos termos do art. 282, também a renúncia pode extinguir a

solidariedade: "O credor pode renunciar à solidariedade em favor de um, de

alguns ou de todos os devedores. Parágrafo único. Se o credor exonerar da

solidariedade um ou mais devedores, subsistirá a dos demais."

Entretanto, se houver rateio entre os co-devedores, para reembolso do

devedor que solveu a obrigação, todos contribuirão, mesmo aqueles que tiveram

a dívida remitida (art. 284). Isso porque, se é dado ao credor abrir mão de seu

direito, tal não interfere no relacionamento entre os vários devedores, porque

nesse caso específico haveria agravamento da situação dos devedores em

benefício de um (ou mais de um) deles.

Renunciar é abrir mão de direitos. Todos aqueles plenamente capazes

podem fazê-lo. Deve a renúncia ser cabal. Pode ser expressa, quando o credor

declara que não deseja mais receber o crédito, ou que, no caso, abre mão da

solidariedade. Pode ser tácita, quando na falta de declaração expressa a atitude

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78

do credor é incompatível com a continuidade da solidariedade. É o caso, por

exemplo, de o credor receber parcialmente de um devedor e dar-lhe quitação.

Aí o credor demonstra desinteresse em receber a integridade da dívida. O

mesmo ocorre quando o credor demanda judicialmente apenas parte do crédito

a um devedor, ou recebe, reiteradamente, pagamentos parciais, sem qualquer

reserva.

Na prática, são muitos os casos em que pode ocorrer extinção da

solidariedade, ainda que não descritos em lei.

COMPARATIVO ENTRE INDIVISIBILIDADE E COMPARATIVO ENTRE INDIVISIBILIDADE E COMPARATIVO ENTRE INDIVISIBILIDADE E COMPARATIVO ENTRE INDIVISIBILIDADE E

SOLIDARIEDADE:SOLIDARIEDADE:SOLIDARIEDADE:SOLIDARIEDADE:

Ambas têm realmente estreitas afinidades e analogias. Numa e noutra,

cada devedor, ou cada credor, responde por inteiro, ou pode exigir a prestação

integral. Numa e noutra, permanecem os interessados em pé de igualdade:

aquele que paga tem direito de regresso contra os demais; aquele que recebe

responde pelas quotas dos consortes. Por outras palavras, tanto na

indivisibilidade como na solidariedade, existe entre as partes identidade de

efeitos nas suas relações externas.

Mas, se parecidas, não são idênticas. Na solidariedade, o credor pode

exigir de qualquer devedor solidário pagamento integral da prestação, porque

qualquer deles é devedor do total. Na indivisibilidade, o credor pode reclamar

igualmente, de qualquer co-devedor, satisfação integral, não porque o

demandado seja devedor do total exigido (ele só deve parte), mas porque a

prestação, sendo indivisível, não comporta execução fracionada. Assim, na

obrigação solidária os devedores respondem totaliter e nas obrigações

indivisíveis, in totum.

Page 79: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

79

Prima a solidariedade, portanto, pela feição subjetiva; ela reside nas

próprias pessoas e advém da lei, ou do título constitutivo da obrigação (arts.

264 e 265).

Caracteriza-se a indivisibilidade pela sua índole objetiva; ela repousa na

própria coisa que constitui objeto da prestação, e resulta, em regra, ex

necessitate, da natureza desta.

Ademais, a obrigação solidária, convertendo-se em perdas e danos,

conserva os atributos inerentes à solidariedade (art. 271); a obrigação

indivisível, com a mesma transformação, vê-se privada da indivisibilidade

primitiva (art. 263). Tais prejuízos, uma vez liquidados, se pagam em dinheiro,

e assim a obrigação, inicialmente indivisível, se converte num dare, de natureza

pecuniária, e, pois, divisível.

Mas não é só: a obrigação solidária, transmitindo-se aos herdeiros, despe-

se dessa característica, no que tange à quota do falecido (art. 270). A

solidariedade extingue-se com a morte. Na obrigação indivisível, ao revés,

subsiste o predicado da indivisibilidade, sem embargo de sua transmissão

hereditária. Por outras palavras, nesta obrigação, o respectivo objeto não se

divide entre os sucessores; antes, mantém-se íntegro, já que por lei, por na-

tureza ou por convenção ele é indivisível. Naquela, ao inverso, fraciona-se o

objeto entre os diversos titulares, uma vez ocorrida a transmissão hereditária.

Insista-se: obrigação solidária, por si só, não é obrigação indivisível; vice-

versa, obrigação indivisível, só por si, não é solidária. Nada impede, todavia, se

reúnam na mesma obrigação as duas qualidades, tornando-se assim,

simultaneamente, solidária indivisível.

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80

DO PAGAMENTODO PAGAMENTODO PAGAMENTODO PAGAMENTO

1- Generalidades

Quando nada existe de anormal, de patológico, no cumprimento da

obrigação, extingue-se ela pelo pagamento. O pagamento é, pois, o meio

normal de extinção das obrigações.

O pagamento refere-se à execução voluntária da obrigação ou a entrega

da prestação devida (praestatio vera rei debitae). Aliás, o efeito natural da

obrigação, o escopo para o qual tende esta, é o implemento da prestação.

Na linguagem comum, a palavra pagamento aplica-se mais par-

ticularmente à prestação em dinheiro. Mas, na linguagem técnica, tem o

vocábulo maior amplitude, significando a execução voluntária da obrigação,

não importando a natureza da prestação.

Emprega-se igualmente a palavra solução (do latim solutio), para traduzir

o cumprimento da obrigação.

Os requisitos essenciais para a validade do pagamento são:

a) existência do vínculo obrigacional;

b) intenção de solvê-lo;

c) cumprimento da prestação;

d) pessoa que efetua o pagamento (solvens);

e) pessoa que o recebe (accipiens).

2- Natureza Jurídica do Pagamento:

Quanto à questão relativa à natureza jurídica do pagamento, verifica-se

ser bastante controvertida na doutrina. Para uns, é contrato (ponto de vista

Page 81: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

81

dominante); para outros, fato jurídico; para outros ainda, ato não livre, e,

finalmente, segundo alguns, ato devido.

Venosa afirma que, em sentido lato sensu, o pagamento será sempre um

fato jurídico, que é gênero do ato e do negócio jurídico.

3- De Quem Deve Pagar: O Solvens

Essa pessoa pode ser qualquer interessado. Entre os interessados, em

primeiro lugar, encontra-se naturalmente o próprio devedor, que, pagando,

cumpre a prestação a que se obrigara. Trata-se, em tal hipótese, de pagamento

verdadeiro e próprio.

Mas há ainda outros interessados: o fiador, o coobrigado, o herdeiro,

outro credor do devedor e o adquirente do imóvel hipotecado. Qualquer deles

tem legítimo interesse no cumprimento da obrigação; assiste-lhe, pois, o direito

de efetuar o pagamento, sub-rogando-se então em todos os direitos creditórios

(art. 346).

O direito do terceiro interessado em solver a dívida acha-se previsto no

art. 304, segundo o qual "qualquer interessado na extinção da dívida pode pagá-

la, usando, se o credor se opuser, dos meios conducentes à exoneração do

devedor".

Igual direito cabe ao terceiro não interessado, se o fizer em nome e por

conta do devedor, salvo oposição deste (art. 304, parágrafo único).

Quando o Código fala em terceiro não interessado quer aludir àquele que

não tem ligação alguma com o contrato, nada tendo a temer com o não-

pagamento da obrigação, se o devedor se torna impontual ou inadimplente.

Cite-se, p. ex., o caso de um pai que paga a dívida de um filho. Seu interesse

não é jurídico. Faz o pagamento com interesse altruístico, moral. Contudo, paga

em nome e por conta do filho devedor. Não há representação, nem mesmo

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82

autorização ou mesmo ciência do devedor. O pagamento, porém, deve ser

aceito. E o solvens, aqui, tem a mesma legitimidade de consignar, se houver

resistência.

Se o terceiro não interessado pagar em seu próprio nome, tem direito a

reembolsar-se do que pagar, mas não se sub-roga nos direitos do credor. Há

direito a uma ação de cobrança singela do que foi pago. Quando é o interessado

que paga, sub-roga-se em todos os direitos do crédito (art. 346). Já, por outro

lado, se é o terceiro não interessado que paga em nome do devedor, como o

caso do pai que paga dívida do filho, o faz por simples liberalidade, ou por

mero espírito de filantropia, nada pode reaver; se o faz, contudo, como gestor

de negócios, terá então ação contra o devedor para reembolsar-se do que pagou.

A questão de saber se o pagamento ocorreu por mera filantropia ou não se

desloca para as circunstâncias do caso. Entende-se que sempre haverá

possibilidade de ação de enriquecimento sem causa, no caso de pagamento

desinteressado, a não ser que o terceiro expressamente abra mão desse último

remédio. A ação de enriquecimento sem causa é uma aplicação de regra de

equidade.

Contudo, no caso do terceiro não interessado que paga em seu próprio

nome, a ação de reembolso é singela e não de sub-rogação, porque tal

pagamento pode ter sido efetuado com intuito especulativo, e inclusive agravar

a situação do devedor, ou até mesmo para colocá-lo numa posição moralmente

vexatória. Imagine-se o exemplo de um devedor conhecido na comunidade que

tem sua dívida paga pelo inimigo. Após o fato, o solvens alardeia que Fulano

não consegue nem mesmo pagar suas dívidas e mostra à sociedade a prova do

pagamento efetuado. A situação poderá até mesmo se deslocar para a esfera

criminal. Desse modo, a lei não defere a esse terceiro a sub-rogação.

Page 83: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

83

O mesmo se diga quanto à intenção da lei, no tocante a pagamento

antecipado da dívida: "se pagar antes de vencida a dívida, só terá direito ao

reembolso no vencimento" (art. 305, parágrafo único).

Pode ocorrer, no entanto, que o devedor tenha justo motivo para não

pagar a dívida e se surpreende ao ver que terceiro se adiantou no pagamento. É

o caso, por exemplo, de a dívida não ser exigível por inteiro, de estar no todo ou

em parte prescrita, de promanar de negócio anulável, de existir a possibilidade

de exceptio non adimpleti contractus (exceção de contrato não cumprido) etc.

Para tal situação estatui o art. 306: “O pagamento feito por terceiro, com

desconhecimento ou oposição do devedor, não obriga a reembolsar aquele que

pagou, se o devedor tinha meios para ilidir a ação.”

O motivo da oposição deve ser justo. O terceiro solvens deve ter

conhecimento da oposição pelo devedor, antes de pagar. Pagará, nesse caso,

assumindo um risco. Questão importante pode ocorrer no caso de o terceiro

pagar sem que o devedor tome conhecimento, e este tinha motivo justo para não

fazê-lo. Se o terceiro pagou mal, só poderá reembolsar-se até o total que

aproveitou ao devedor. O que pagou mal deverá repetir do credor que, em tese,

recebeu mais do que lhe competia.

Ou seja, se o devedor tinha meios para se opor ao pagamento, esse

pagamento feito contra sua vontade ou sem o seu conhecimento não o obriga a

reembolsar, pois não lhe foi útil. Da mesma forma na hipótese de

desconhecimento por parte do devedor: impõe-se que o solvens informe o

devedor que vai pagar, sob pena de pagar mal. Em qualquer situação, o

montante do pagamento que foi útil para o devedor deve ser reembolsado, sob

pena de ocorrer injusto enriquecimento. A óptica se transplanta, no caso

concreto, para o âmbito da prova.

Questão não erigida na lei é aquela em que tanto o devedor como o credor

se opõem ao pagamento por terceiro. Suponha-se a hipótese em que há dúvida

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84

de se a obrigação é personalíssima ou não. O credor diz que não aceita a solutio

por terceiro. O devedor informa ao terceiro que não deve pagar. Aí não se pode

negar a impossibilidade do pagamento, pois o terceiro passa a ser

absolutamente inconveniente numa relação jurídica a que não pertence.

O art. 307 trata de pagamento que importe em transmissão de domínio:

Art. 307. Só terá eficácia o pagamento que importar transmissão da propriedade, quando feito por quem possa alienar o objeto em que ele consistiu.

Parágrafo único. Se se der em pagamento coisa fungível, não se poderá mais reclamar do credor que, de boa-fé, a recebeu e consumiu, ainda que o solvente não tivesse o direito de aliená-la.

Vale o princípio de que ninguém pode transferir mais direitos do que tem.

Para a transmissão do domínio deverão estar presentes todos os requisitos do

negócio jurídico. A alienação a non domino, por quem não seja o dono da coisa,

é ineficaz. Um pagamento nessa situação abre à vítima a possibilidade de

indenização.

Se, porém, se tratar de coisa fungível (parágrafo único), já consumida, de

boa-fé, pelo credor, não se pode mais reclamar a coisa deste. Não havendo mais

a coisa a ser reivindicada, a situação é do substitutivo indenizatório. Do credor,

contudo, não se pode reclamar. A questão resolver-se-á entre o terceiro que

pagou e o devedor. Para a exceção do parágrafo tratado, há necessidade de três

condições: que o pagamento seja de coisa fungível, que tenha havido boa-fé por

parte do accipiens e que tenha sido consumida a coisa. Enquanto não

consumida, haverá direito à repetição, no todo ou em parte, da coisa.

4- A Quem se Deve Pagar. O Accipiens

O pagamento deve ser feito ao credor ou a quem de direito o represente,

sob pena de só valer depois de por ele ratificado, ou tanto quanto reverter em

seu proveito (art. 308).

Page 85: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

85

Credor não é somente aquele em cujo favor se constitui originariamente o

crédito. Também o são: o herdeiro, na proporção de sua quota hereditária, o

legatário, o cessionário e o sub-rogado nos direitos creditórios.

Se solidária ou indivisível a obrigação, qualquer dos co-credores pode

recebê-la, nos termos dos arts. 260 e seguintes e 267 e seguintes, todos do

Código Civil.

Se ao portador, quem apresentar o título será o credor, assistindo-lhe o

direito de receber o pagamento. Empenhado o título de crédito, cabe ao credor

pignoratício receber a respectiva importância (art. 1.459, n. IV, do CC).

O representante do credor pode ser legal, judicial e convencional. Legal é

aquele a quem a própria lei outorga mandato para administrar bens e interesses

alheios, como o pai, o tutor e o curador, em relação aos filhos menores, pupilos

e curatelados. Todavia, em se tratando de capital, o representante legal, para

recebê-lo, depende de autorização judicial, uma vez que o ato excede os

poderes da simples administração. Para recebimento de juros, entretanto, não se

exige qualquer autorização.

Judicial é o representante nomeado pelo juiz, como o inventariante, o

síndico e o depositário. Mas o inventariante depende igualmente de licença

judicial para receber certos pagamentos, que excedem os poderes de

administração ordinária, como o proveniente de dívida hipotecária. Também o

oficial de justiça, quando vai proceder a penhora nos bens do devedor, caso este

não pague a dívida, se acha investido de poderes para recebê-la.

Convencional, por sua vez, é o representante com mandato, expresso ou

tácito.

Expresso, quando o instrumento da procuração, revestido das

formalidades legais, confere poderes especiais para recebimento da dívida. Não

bastam os poderes impressos, que habitualmente constam da procuração;

Page 86: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

86

exigem-se especiais, embora se torne desnecessária a menção do quantum

devido. Basta que o débito fique perfeitamente individuado.

É tácito o mandato quando o mandatário se apresenta perante o devedor

com o título, que lhe deve ser entregue como quitação. Presume-se que o

respectivo portador se acha autorizado pelo credor a receber a dívida, e válido

se tornará o pagamento a ele efetuado.

Entre os representantes convencionais expressamente constituídos,

merece referência especial a pessoa nominalmente designada no próprio título

para receber a prestação. Essa pessoa denomina-se adjectus solutionis causa ou

adjectus solutionis gratia. Assim se chama a pessoa que devedor e credor, de

comum acordo, designam para efeito de receber o pagamento. Trata-se de

verdadeiro cessionário, desde o início constituído, e não de procurador comum,

já que não se lhe pode revogar ou alterar aquela designação, nem se extingue

com a morte do credor.

4.1- Credor Putativo

Pode ocorrer o pagamento a pessoa que tenha a aparência de credor ou de

pessoa autorizada. E o caso do credor putativo.

Suponha-se o caso de alguém que, ao chegar a um estabelecimento

comercial, paga a um assaltante, que naquele momento se instalou no guichê de

recebimentos, ou a situação de um administrador de negócio que não tenha

poderes para receber, mas aparece aos olhos de todos como um efetivo gerente.

Não se trata apenas de situações em que o credor se apresenta falsamente

com o título ou com a situação, mas de todas aquelas situações em que se reputa

o accipiens como credor. Dispõe o Código: “o pagamento feito de boa fé ao

credor putativo é válido, ainda provando-se depois que não era credor”

(art.309).

Page 87: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

87

A lei condiciona a validade do pagamento ao fato de o accipiens ter a

aparência de credor e estar o solvens de boa-fé. Restará ao verdadeiro credor

haver o pagamento do falso accipiens.

4.2- Quando o Pagamento Feito a Terceiro Desqualificado Será Válido

O devedor pode se exonerar mesmo pagando a terceiro não intitulado, em

três situações:

1. no caso de ratificação, pelo credor, do pagamento recebido (art. 308).

Tal ratificação equivale a um mandato. Pago ao filho de credor e este

posteriormente confirma o recebimento, por exemplo;

2. no caso em que o pagamento reverte em benefício do credor (art. 308),

a prova será ônus do solvens. Por exemplo, paga-se à mulher do credor, prova-

se que o pagamento reverteu em seu benefício. Tudo, aqui, também dependerá

das circunstâncias. Lembre-se, porém, de que o pagamento só valerá até o

montante do benefício: a dívida é de 1.000; pagou-se o total à mulher do credor;

aquela, no entanto, só entregou 500 a ele; só até esse montante valerá o

pagamento, doutro modo, ocorreria locupletamento indevido. O mesmo se diga

a respeito do pagamento feito ao inibido de receber, por incapacidade. O

devedor deve provar que o pagamento reverteu em benefício do incapaz (art.

310);

3. o último caso refere-se ao credor putativo descrito no tópico anterior.

4.3- Pagamento Feito ao Inibido de Receber

Certas pessoas, embora figurem na posição de credoras, são inibidas de

receber, e quem paga a elas arrisca-se a pagar mal.

O art. 310 refere-se ao pagamento efetuado ao incapaz de quitar. Ora, a

incapacidade inibe o agente para os atos da vida civil. No entanto, há uma

aplicação especial dessa incapacidade quanto ao pagamento. Dispõe o artigo:

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“não vale, porém, o pagamento cientemente feito ao credor incapaz de quitar, se

o devedor não provar que em beneficio dele efetivamente reverteu”.

Observe-se que a lei usa do termo cientemente, isto é, são situações em

que o solvens tem pleno conhecimento da incapacidade do accipiens. O

representante legal do credor terá legitimidade para impugnar o pagamento.

Cabe ao solvens provar que o resultado do pagamento reverteu no benefício do

incapaz. Nem sempre será prova fácil. Imagine-se, por exemplo, o caso de

pagamento efetuado a um pródigo. A lei também não distingue a incapacidade

relativa ou absoluta. Valerá o pagamento, todavia, se o que paga não tinha

conhecimento dessa incapacidade. Lembre-se do art. 180, que reforça essa

ideia. É a situação do menor, relativamente incapaz, que dolosamente oculta sua

condição em um negócio jurídico.

Outra situação que inibe o credor de receber é a do art. 312: “se o devedor

pagar ao credor, apesar de intimado da penhora feita sobre o crédito, ou da

impugnação a ele oposta por terceiros, o pagamento não valerá contra estes, que

poderão constranger o devedor a pagar de novo, ficando-lhe, entretanto, salvo o

regresso contra o credor”.

Essa situação também é de ineficácia do pagamento e não propriamente

de validade. É requisito, porém, que o solvens tenha tomado ciência da penhora

ou da oposição de terceiro. Se pagar ao credor, assumirá o risco. Trata-se de

modalidade de aplicação das garantias dos direitos de crédito. A lei equipara,

para os efeitos, tanto a ciência da penhora, quanto a ciência por notificação ou

interpelação feita por terceiro. Ao terceiro, nesse caso, cabe depositar em juízo,

ou nos autos em que foi efetivada a penhora, ou consignar em pagamento, se

tiver dúvidas quanto à validade do pagamento que efetuaria a terceiro. No caso

desse terceiro ter agido de forma abusiva, impedindo ou retardando o

recebimento do crédito pelo credor, responderá pelo abuso ou má-fé.

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5- Do objeto do pagamento

Na Seção III, do Capítulo II, do Título III, refere-se o Código Civil,

particularmente, ao pagamento em dinheiro, que oferece maior interesse

jurídico. De todas as prestações, a pecuniária vem a ser a mais importante, por-

quanto as demais são suscetíveis de nela transformar-se.

O pagamento em dinheiro, sem determinação da espécie, far-se-á em

moeda corrente no lugar do cumprimento da obrigação (art. 315).

O pagamento só poderá efetuar-se em apólices federais, estaduais ou

municipais se nisso convier o credor, ou tiver sido estipulado no contrato. O

mesmo sucederá no tocante ao pagamento mediante cheque, que é recebido pro

solvendo e não pro soluto; se não houver provisão, o pagamento é ineficaz.

O art. 316 diz que: "É lícito convencionar o aumento progressivo de

prestações sucessivas". É o que a doutrina convencionou chamar de cláusula de

escala móvel, mediante a qual o valor da prestação será automaticamente

reajustado, após determinado lapso de tempo, segundo índice escolhido pelas

partes. A Lei n. 10.192, de 14-2-2001, declara nula de pleno direito qualquer

estipulação de reajuste ou correção de periodicidade inferior a um ano.

Preceitua o art. 317: "Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier

desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de

sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure,

quanto possível, o valor real da prestação". Esse dispositivo adota a teoria da

imprevisão, permitindo que o valor da prestação seja corrigido por decisão

judicial sempre que houver desproporção entre o que foi ajustado durante a

celebração do contrato e o valor da prestação na época da execução. Para tanto,

é imprescindível que a causa da desproporção tenha sido realmente imprevisível

e que tenha havido pedido expresso de uma das partes, sendo vedado ao juiz

determinar a correção de ofício. Antes da vigência do Código Civil de 2002,

Page 90: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

90

esse princípio já era adotado pela jurisprudência, que consagrou, para tais

hipóteses, a aplicação da cláusula rebus sic stantibus (enquanto as coisas estão

assim).

Por seu turno, o art. 318 consigna que: "São nulas as convenções de

pagamento em ouro ou em moeda estrangeira, bem como para compensar a

diferença entre o valor desta e o da moeda nacional, excetuados os casos

previstos na legislação especial". Repete as regras constantes no Decreto n.

23.501, de 27-11-1933, e do Decreto-lei n. 857, de 11-9-1969, que já

declaravam nulas quaisquer estipulações de pagamento em ouro ou em outra

espécie de moeda que não fosse a nacional, salvo previsão em legislação

específica. Nesse sentido é também a Lei n. 10.192, de 14-2-2001.

6- Da prova do pagamento

O devedor que paga tem direito a quitação regular (art. 320), e pode reter

o pagamento enquanto lhe não for dada (art. 319). Quitação é a prova do

pagamento. Para firmeza das relações jurídicas e tranquilidade social, devem os

atos jurídicos revestir a forma legal, que lhes atribui existência e visibilidade.

No caso de pagamento, a forma é a quitação; a ela tem direito o devedor, que

pode retardar a solução, até que a forneça o credor. Esse direito de reter o

pagamento, enquanto se não passa o recibo, constitui garantia do devedor e tem

assento na boa razão.

Quem paga deve munir-se da necessária quitação passada pelo credor. Se

o fizer em confiança, não poderá mais tarde invocar essa circunstância, ao ser

cobrado de novo. Não se acolhe tal alegação em juízo, porque pagamentos se

comprovam apenas através de quitações regulares e não se demonstram por

testemunhas, se excedem à taxa legal.

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Regular se diz a quitação na hipótese do art. 320: a quitação, que sempre

poderá ser dada por instrumento particular, designará o valor e a espécie da

dívida quitada, o nome do devedor, ou quem por este pagou, o tempo e o lugar

do pagamento, com a assinatura do credor ou do seu representante. Por outras

palavras, a quitação deve ser expressa, positiva, com especificada menção da

dívida quitada, valor e espécie.

O parágrafo único do art. 320 estatui que: "Ainda sem os requisitos

estabelecidos neste artigo valerá a quitação, se de seus termos ou das

circunstâncias resultar haver sido paga a dívida".

Recusando o credor à quitação, ou não a dando na devida forma (art.

320), pode o devedor citá-lo para esse fim, e ficará quitado pela sentença que

condenar o credor. Trata-se de obrigação de fazer, a cargo do credor, cujo

cumprimento pode ser realizado pelo juiz. No tocante às locações, é obrigatório

o recibo do aluguel, e sua recusa importa contravenção penal (Lei n. 8.245, de

18-10-1991, art. 22, n. VI).

No art. 321, edita o Código Civil que "nos débitos, cuja quitação consista

na devolução do título, perdido este, poderá o devedor exigir, retendo o

pagamento, declaração do credor que inutilize o título desaparecido".

Em tais condições, se a dívida se acha inteiramente paga, o devedor tem

direito à restituição do título; se o credor alega o respectivo extravio, tem aquele

direito de exigir declaração que invalide o título. Se a ela se nega o credor, pode

o devedor reter o pagamento, como no caso de quitação, até que lhe seja

passado tal documento.

Contudo, casos existem em que o credor tem razões para reter o título.

Por exemplo, se neste figuram co-devedores, cujas obrigações ainda não se

extinguiram. Ou então se o título lhe serve para a prova de outros direitos. Em

ambos os casos pode o credor negar a restituição, mas deverá passar declaração

ao devedor, comprobatória do pagamento por este efetuado.

Page 92: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

92

A posse do título pelo credor constitui presunção de que não foi pago;

mas essa presunção pode ser destruída por prova em contrário. Aliás, o

pagamento pode ser provado por qualquer meio admitido em direito.

Em seguida, no art. 322, dispõe o Código Civil: "Quando o pagamento for

em quotas periódicas, a quitação da última estabelece, até prova em contrário, a

presunção de estarem solvidas as anteriores". Pagamento da última prestação,

sem qualquer ressalva, faz presumir pagamento das precedentes, porque natural

não é que o credor consinta em receber aquela, ficando estas para trás, sem

solução. Mas essa presunção, como a decorrente da posse do título pelo credor,

é apenas juris tantum, cedendo frente prova em contrário.

Outras presunções estabelecem ainda o legislador em matéria de

pagamento: a) sendo a quitação do capital sem reserva dos juros, estes

presumem-se pagos; b) a entrega do título ao devedor firma a presunção do

pagamento (art. 324). Ficará, porém, sem efeito a quitação assim operada se o

credor provar, dentro de sessenta dias, o não-pagamento (parágrafo único).

Pode acontecer, todavia, que o título tenha ido parar nas mãos do devedor

por meios clandestinos ou ilícitos, como furto, estelionato, apropriação indébita.

Nesse caso, ao credor assiste o direito de comprovar, no prazo legal, que não

entregou voluntariamente o título e que, por isso, extinta não se acha a

obrigação. Trata-se de uma das aplicações da exceção non numeratae pecuniae.

A lei processual não estatui processo algum para prova do fato a que se

refere o art. 324, parágrafo único, do Código Civil. Tem-se admitido por isso

simples justificação avulsa, processada de acordo com os arts. 861 e seguintes

do Código de Processo Civil.

Presumem-se a cargo do devedor as despesas com o pagamento e

quitação. Se ocorrer aumento por fato do credor, suportará este a despesa

acrescida (art. 325).

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Se o pagamento se houver de fazer por medida, ou peso, entender-se-á, no

silêncio das partes, que aceitaram os do lugar da execução (art. 326).

7- Lugar do Pagamento. Dívidas Quérables e Portables

No silêncio da avença, o pagamento será efetuado no domicílio do

devedor. É a regra geral do art. 327. Em geral, portanto, a dívida é quérable.

Cabe ao credor procurar o devedor para a cobrança.

Em caso de disposição contratual em contrário, quando o devedor deve

procurar o credor em seu domicílio, ou no local por ele indicado, a dívida é

portable.

Sempre será o acordo das partes que prevalecerá. A matéria é dispositiva,

de acordo com o art. 78. Há obrigações que, por força de circunstâncias ou de

sua natureza, mormente de costumes, devem ser executadas ora no domicílio do

credor, ora no domicílio do devedor. A lei também pode fixar o lugar do

pagamento. Tudo isso está no art. 237. Suas regras são supletivas da vontade

das partes.

O parágrafo único do art. 327 acresce que, se forem designados dois ou

mais lugares, caberá ao credor a escolha. O credor deve, no entanto, manifestar

sua escolha ao devedor, em tempo hábil, para que este possa efetuar o

pagamento.

Problema surge quando o devedor muda de domicílio. O credor não pode

ficar preso ao capricho do devedor. Embora haja divergência na doutrina, e

sendo a lei omissa, o mais lógico é que o credor opte por manter o mesmo local

originalmente fixado. Se isso não for possível e o pagamento tiver que ser

necessariamente feito em outro local, no novo domicilio do devedor, arcará este

com as despesas acarretadas ao credor, tais como taxas de remessa bancária,

viagens etc.

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Embora o contrato possa fixar a dívida como quérable, se continuamente

o devedor procura o credor para pagar, há animus de mudança de local de

pagamento. Ou vice-versa. A habitualidade há de ser vista como intenção de

mudar o lugar de pagamento, salvo se as partes fizerem ressalva que a inversão

do que consta no contrato é mera liberalidade.

A grande importância na exata fixação do lugar do pagamento reside na

ocorrência da mora. Quem paga em lugar errado, paga mal, na grande maioria

das vezes.

O art. 328 trata de pagamento consistente na tradição de um imóvel,

dizendo que se fará no lugar onde este se acha. As prestações relativas a

imóveis, ditas na lei, não significam aluguéis, mas são referentes a serviços só

realizáveis no local do imóvel, como reparações de cerca, retificações de curso

de córregos, mudança de servidão etc. No entanto, sempre que a natureza da

obrigação o permitir, as partes poderão dispor diferentemente.

Por sua vez, dispõe o art. 329: "Ocorrendo motivo grave para que se não

efetue o pagamento no lugar determinado, poderá o credor fazê-lo em outro,

sem prejuízo para o credor."

A regra ratifica o brocardo pelo qual nada se pode fazer perante uma

impossibilidade. Imagine-se que o local do pagamento esteja isolado ou em

estado de calamidade pública: o devedor poderá efetuar o pagamento em outro

local, o mais cômodo possível para o credor. A expressão "sem prejuízo para o

credor" deverá ser entendida com reservas. O simples fato de o pagamento

efetuar-se em outro local já acena com o descumprimento de uma obrigação. Se

o credor deve ou não ser ressarcido dos incômodos de receber em local diverso

do combinado é matéria para ser examinada no caso concreto. Lembre-se que,

como regra, o caso fortuito e a força maior não autorizam indenização.

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95

Outra regra importante é trazida pelo o art. 330: "O pagamento

reiteradamente feito em outro local faz presumir renúncia do credor

relativamente ao previsto no contrato."

Essa presunção é relativa, pois pode o contrato ter assinalado que o

recebimento do pagamento em local diverso do indicado, ainda que reiterado, é

feito por mera liberalidade, sem prejuízo de o credor exigi-lo no local apontado.

Não se deve esquecer que neste caso, como em qualquer situação contratual, o

juiz deve examinar a conduta dos contratantes sob o prisma da boa-fé objetiva e

dos costumes do local.

8- Tempo do Pagamento

Diz o Código, no art. 331, que, "não tendo sido ajustada época para o

pagamento, o credor pode exigi-lo imediatamente". Tal assertiva deve ser vista

com a reserva necessária. Há obrigações que, por sua própria natureza, não

podem ser exigidas de plano, como no caso do empréstimo, da locação, do

depósito.

Quando as partes ou a lei não estipulam um prazo para o pagamento, a

prestação pode ser exigida a qualquer momento: são as obrigações puras. As

obrigações com prazo fixado são as obrigações a termo.

Quando existe um prazo, a obrigação só pode ser exigida pelo credor com

o advento do termo desse prazo. O prazo presume-se estipulado em benefício

do devedor (art. 133). Sendo um favor seu, nada impede que cumpra

antecipadamente a obrigação. O credor não pode exigir seu cumprimento, mas a

obrigação, nesses moldes, é cumprível pelo devedor desde sua constituição.

Não é muito comum, mas a obrigação pode ter um prazo fixado em

benefício do credor. Nesse caso, não pode ser o credor obrigado a receber

antecipadamente. Suponha-se, por exemplo, o comprador de uma mercadoria

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que fixa um prazo de 90 dias para recebê-la, porque nesse período estará

construindo um armazém para guardá-la. O prazo foi instituído a seu favor,

porque o recebimento antecipado lhe seria sumamente gravoso.

O tempo na obrigação pode ser estipulado concomitantemente, em

benefício tanto do credor, quanto do devedor. Aí não se admite, também,

antecipação do cumprimento.

Se a obrigação consistir de obrigações periódicas, cada pagamento deve

ser examinado de per si. Cada prestação periódica deve ser estudada

isoladamente.

A obrigação, se por um lado pode ser cumprida antecipadamente, salvo os

casos examinados, não pode ser cumprida além do prazo marcado. Isto é, se

ainda for útil para o credor, a obrigação em retardo pode ser cumprida, mas já

com os encargos de mora. Se, de um lado, o devedor pode antecipar o

cumprimento, inclusive com medida judicial, não pode pedir dilação de prazo

ao juiz, ressalvadas as situações de caso fortuito ou de força maior.

O credor não pode exigir o pagamento antes do vencimento, sob pena de

ficar obrigado a esperar o tempo que faltava para o vencimento, a descontar os

juros correspondentes, embora estipulados, e a pagar as custas em dobro (art.

939). A jurisprudência tem entendido que essa pena do final do artigo só é

impingida nos casos de dolo do agente.

O devedor que se antecipa e paga antes do termo, o faz por sua conta e

risco. Destarte, não pode repetir a prestação, não lhe trazendo qualquer

vantagem a solução antes do tempo, tais como redução de juros ou de taxas, a

não ser que convencionado.

Quando a obrigação não tem termo certo, o credor pode interpelar o

devedor para que cumpra a obrigação num prazo razoável, que poderá ser

fixado pelo juiz.

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No dia do pagamento, termo final, portanto, há que se entender que ele

pode ser feito até a expiração das 24 horas do dia. Não é assim, no entanto,

quando se trata de pagamento que dependa de horário de atividade do comércio,

horário bancário ou forense. Terminado o expediente, cujo horário é fixado por

norma administrativa, frustra-se a possibilidade de se efetuar o pagamento

naquela data.

As obrigações condicionais são tratadas pela regra do art. 332. Para seu

cumprimento, dependem do implemento da condição. O credor deve provar a

ciência desse implemento pelo devedor.

O credor, conforme já visto, não pode exigir o pagamento antes do

vencimento, sob as penas do art. 939. No entanto, o art. 333 faculta ao credor

cobrar a dívida antes de vencido o prazo, em três situações:

“I - no caso de falência do devedor, ou de concurso de credores;

II - se os bens, hipotecados ou empenhados, forem penhorados em

execução por outro credor;

III - se cessarem, ou se se tornarem insuficientes, as garantias do débito,

fidejussórias, ou reais, e o devedor, intimado, se negar a reforçá-las.

Parágrafo único. Nos casos deste artigo, se houver, no débito,

solidariedade passiva, não se reputará vencido quanto aos outros devedores

solventes.”

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98

DO PAGAMENTODO PAGAMENTODO PAGAMENTODO PAGAMENTO POR CONSIGNAÇÃOPOR CONSIGNAÇÃOPOR CONSIGNAÇÃOPOR CONSIGNAÇÃO

1- Generalidades

O devedor, e não apenas o credor, também tem interesse no sentido de

que a obrigação seja extinta. Não pagando o devedor no tempo, local e forma

devidos, sujeitar-se-á aos ônus da mora. Ainda, se sua obrigação consistir na

entrega de coisa, enquanto não houver a tradição, o devedor é responsável pela

guarda, respondendo por sua perda ou deterioração.

Se o credor não toma a iniciativa de receber, ou pretende receber de forma

diversa do contratado, ou quando não é conhecido o paradeiro do credor, como

exemplos, o devedor tem o meio coativo de extinguir sua obrigação: a

consignação em pagamento.

A consignação é simultaneamente instituto de direito civil e de processo.

A substância e os seus efeitos são de direito privado, mas a forma constitui

matéria de direito processual. Dele se ocupam o Código Civil nos arts. 334 a

345 e o Código de Processo Civil nos arts. 890 a 900.

Define-se a consignação em pagamento como o depósito judicial ou

extrajudicial da coisa devida, realizada pelo devedor, com causa legal. Trata-se

de pagamento compulsório, só excepcionalmente admitido; ou melhor,

representa meio especial concedido ao devedor para liberar-se da obrigação.

Não se imagine que a consignação só cabe quando se cuide de dívida em

dinheiro. Conquanto sejam esses, realmente, os casos mais frequentes, ela tem

cabimento, por igual, nas hipóteses em que a prestação consista em coisas

móveis ou mesmo imóveis. Só nas obrigações de fazer, ou de não fazer, pela

sua natureza, descabe a consignação. Numa palavra, a consignação só é

compatível com a prestação de coisas.

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99

2- Casos de consignação

O pagamento deve ser feito, em regra, ao próprio credor, ou a quem de

direito o represente (art. 308, CC), no lugar (art. 327), no tempo (art. 331) e

pelo modo convencionados. Muitas vezes, porém, ocorrem fatos ou cir-

cunstâncias que impedem o pagamento direto ao credor, como pode suceder

ainda que venha este a recusar a prestação oferecida pelo devedor. A lei faculta

então o recurso à consignação em pagamento. De fato, estatui o art. 334 do

Código Civil: "Considera-se pagamento, e extingue a obrigação, o depósito

judicial ou em estabelecimento bancário da coisa devida, nos casos e forma

legais".

A consignação tem lugar (art. 335):

I- se o credor não puder, ou, sem justa causa, recusar receber o

pagamento, ou dar quitação na devida forma;

II- se o credor não for, nem mandar receber a coisa no lugar, tempo e

condições devidos;

III- se o credor for incapaz de receber, for desconhecido, estiver declarado

ausente ou residir em lugar incerto, ou de acesso perigoso ou difícil;

IV- se ocorrer dúvida sobre quem deva legitimamente receber o objeto do

pagamento;

V- se pender litígio sobre o objeto do pagamento.

Dentre as hipóteses referidas pelo Código Civil, a mais frequente é a de

recusa do credor, que, sem justa causa, se nega a receber ou a dar quitação na

devida forma (n. I). Há o entendimento de se reputar supérflua a locução sem

justa causa, pois essa justa causa para recusa só pode influir no julgamento da

ação consignatória e não sobre o direito de fazer a consignação. De qualquer

modo, a oferta pelo devedor há de ser concreta.

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100

De acordo com o n. II, constituirá também motivo para o depósito se o

credor não for, nem mandar receber a coisa no lugar, tempo e condições

devidos. Esse dispositivo aplica-se às dívidas em que o pagamento se efetua

fora do domicílio do credor. Ante a inércia deste, o devedor não é obrigado a

suportar indefinidamente as consequências da mora creditoris. Faculta-lhe,

destarte, o direito de liberar-se, consignando judicialmente a coisa devida.

Ressalte-se que a hipótese do inc. I se trata de dívida portáble, enquanto

que a hipótese do inc. II se trata de dívida quérable.

Consoante o n. III tem também lugar a consignação se o credor for

incapaz de receber, for desconhecido, estiver declarado ausente ou residir em

lugar incerto ou de acesso difícil ou perigoso. Evidentemente, em princípio, não

se admite existência de obrigação contraída com pessoa originariamente

desconhecida. Mas, contraída com pessoa conhecida e certa, pode

posteriormente tornar-se desconhecido o credor, em virtude de sucessão do

credor originário. Em tal hipótese, cabível vem a ser a consignação. Igualmente,

justifica-se o depósito judicial se o credor se ausenta do seu domicílio e retira-

se para lugar ignorado; ou, então, quando se afasta para ponto de difícil ou

perigoso acesso, e ainda, finalmente, quando se torna ignorado o seu paradeiro.

Outro caso de consignação é aquele em que paire dúvida sobre quem deva

legitimamente receber o objeto do pagamento (n. IV). Dois ou mais credores

apresentam-se; não pode o devedor, nesse caso, dar preferência a qualquer dos

pretendentes. Cabe-lhe, sim, indeclinavelmente, obrigação de consignar em

juízo o quantum de seu débito, a ser levantado oportunamente por quem de

direito.

Cabe ainda a consignação se pende litígio sobre o objeto do pagamento. O

litígio a que se refere o n. V é o que se trava entre credor e terceiro, não entre

devedor e credor. Ante a contenda, age com culpa o devedor que se antecipa ao

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101

pronunciamento judicial e paga a um dos litigantes. Seu dever, em face do

pleito, é consignar a coisa, levantada a final por quem obtiver ganho de causa.

A consignação é restrita aos casos de pagamento. Exclui-se, assim, de seu

âmbito qualquer matéria de outra natureza. Ela não comporta, pois, discussão

sobre infração contratual ou legal, nem controvérsias sobre a substância da

obrigação ou o mérito desta.

3- Requisitos

Para que a consignação tenha força de pagamento, é necessário que

concorram, em relação às pessoas, ao objeto, modo e tempo, todos os requisitos

sem os quais não é válido o pagamento (art. 336). Não é possível, por

conseguinte, por meio da ação consignatória, questionar-se sobre o quantum

devido; o meio é impróprio sempre que se trate de débito ilíquido e incerto.

O depósito requerer-se-á no lugar do pagamento, cessando, tanto que se

efetue, para o depositante, os juros da dívida e os riscos, salvo se for julgado

improcedente (art. 337).

4- Levantamento do depósito

Enquanto o credor não declarar que aceita o depósito, ou não o impugnar,

poderá o devedor requerer o levantamento, pagando as respectivas despesas, e

subsistindo a obrigação para todas as consequências de direito (art. 338).

Julgando procedente o depósito, o devedor já não poderá levantá-lo,

embora o credor consinta, senão de acordo com os outros devedores e fiadores

(art. 339).

O credor que, depois de contestar a lide ou aceitar o depósito, aquiescer

no levantamento perderá a preferência e garantia que lhe competiam com

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102

respeito à coisa consignada, ficando para logo desobrigados os co-devedores e

fiadores que não anuíram (art. 340).

5- Outros preceitos contidos no Código Civil

Se a coisa devida for imóvel ou corpo certo que deva ser entregue no

mesmo lugar onde está, poderá o devedor citar o credor para vir ou mandar

recebê-la, sob pena de ser depositada (art. 341).

Se a escolha da coisa indeterminada competir ao credor, será ele citado

para esse fim, sob cominação de perder o direito e de ser depositada a coisa que

o devedor escolher. Feita a escolha pelo devedor, proceder-se-á como no artigo

antecedente (art. 342).

As despesas com o depósito, quando julgado procedente, correrão à conta

do credor, e, no caso contrário, à conta do devedor (art. 343). Duas correntes

comportam a exegese desse dispositivo legal: para a primeira, o artigo refere-se

a despesas com o depósito (guarda e conservação), e não compreende ho-

norários de advogado. Para a segunda, porém, o texto é amplo e abrange todos

os dispêndios, inclusive a honorária. Sem dúvida, esta é a inteligência que se

impõe, ante a literalidade da lei e os objetivos por ela visados.

O devedor de obrigação litigiosa exonerar-se-á mediante consignação,

mas, se pagar a qualquer dos pretendidos credores, tendo conhecimento do

litígio, assumirá o risco do pagamento (art. 344).

Se a dívida se vencer, pendendo litígio entre credores que se pretendem

mutuamente excluir, poderá qualquer deles requerer a consignação (art. 345).

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103

6- Disposições processuais

Nos casos previstos em lei, poderá o devedor ou terceiro requerer, com

efeito de pagamento, a consignação da quantia ou da coisa devida (CPC, art.

890).

Tratando-se de obrigação em dinheiro, poderá o devedor ou terceiro optar

pelo depósito da quantia devida, em estabelecimento bancário oficial, onde

houver, situado no lugar do pagamento, em conta com correção monetária,

cientificando-se o credor por carta com aviso de recepção, assinado o prazo de

dez dias para a manifestação da recusa (art. 890, §lº). Decorrido esse prazo, não

havendo recusa, reputar-se-á liberado da obrigação o devedor, ficando à dis-

posição do credor a quantia depositada (§2°). Ocorrendo recusa, manifestada

por escrito ao estabelecimento bancário, o devedor ou terceiro poderá propor,

dentro de trinta dias, a ação de consignação, instruindo a inicial com a prova do

depósito e da recusa (§3º). Não proposta a ação no prazo estipulado, ficará sem

efeito o depósito, podendo levantá-lo o depositante (§4º).

Requerer-se-á a consignação no lugar do pagamento, cessando para o

devedor, tanto que se efetue o depósito, os juros e os riscos, salvo se for julgada

improcedente (CPC, art. 891).

Quando a coisa devida for corpo que deva ser entregue no lugar em que

está, poderá o devedor requerer a consignação no foro em que ela se encontra

(CPC, art. 891, parágrafo único).

Na petição inicial, o autor requererá o depósito da quantia ou da coisa

devida, a ser efetivado no prazo de cinco dias do deferimento, ressalvada a

hipótese do art. 890, §3º, bem como a citação do réu para levantar o depósito ou

oferecer resposta (art. 893, I e II).

Se o objeto da prestação for coisa indeterminada e a escolha couber ao

credor, será este citado para exercer o direito dentro de cinco dias, se outro

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104

prazo não constar de lei ou do contrato, ou para aceitar que o devedor o faça,

devendo o juiz, ao despachar a petição inicial, fixar lugar, dia e hora em que se

fará a entrega, sob pena de depósito (CPC, art. 894).

Se ocorrer dúvida sobre quem deva legitimamente receber o pagamento, o

autor requererá o depósito e a citação dos que o disputam para provarem o seu

direito (CPC, art. 895).

Na contestação poderá o réu alegar que: I- não houve recusa ou mora em

receber a quantia ou coisa devida; II- foi justa a recusa; III- o depósito não se

efetuou no prazo ou no lugar do pagamento; IV- o depósito não é integral

(CPC, art. 896).

Não sendo oferecida contestação, e ocorrentes os efeitos da revelia, o juiz

julgará procedente o pedido, declarará extinta a obrigação e condenará o réu no

pagamento das custas e honorários advocatícios (art. 897). Proceder-se-á do

mesmo modo se o credor receber e der quitação (parágrafo único).

Quando a consignação se fundar em dúvida sobre quem deva

legitimamente receber, não comparecendo nenhum pretendente, converter-se-á

o depósito em arrecadação de bens de ausente; comparecendo apenas um, o juiz

decidirá de plano; comparecendo mais de um, o juiz declarará efetuado o

depósito e extinta a obrigação, continuando o processo a correr unicamente

entre os credores; caso em que se observará o procedimento ordinário (art. 898).

Quando na contestação o réu alegar que o depósito não é integral, é lícito

ao autor completá-lo, dentro em dez dias, salvo se corresponder a prestação

cujo inadimplemento acarrete a rescisão do contrato (art. 899).

Cumpre ajuntar ainda que a consignação deve ser livre, completa e real.

Livre, no sentido de que não pode ser submetida a condições, ou ressalvas, que

venham restringir injustamente o direito do credor. Completa, porque há de

compreender integralmente a coisa devida, inclusive juros, frutos e despesas.

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105

Real, vale dizer, efetiva, concreta, mediante positiva exibição da coisa ou do

dinheiro que constitui objeto da prestação.

DO PAGAMENTO COM SUBDO PAGAMENTO COM SUBDO PAGAMENTO COM SUBDO PAGAMENTO COM SUB----ROGAÇÃOROGAÇÃOROGAÇÃOROGAÇÃO

1- Generalidades

O termo sub-rogação significa substituição. A sub-rogação não extingue

propriamente a obrigação. O instituto contemplado nos arts. 346 ss do Código

faz substituir o sujeito da obrigação. O termo pode também ser empregado para

a sub-rogação real, quando uma coisa de um patrimônio é substituída por outra.

É o que ocorre quando se substituem os vínculos de inalienabilidade,

impenhorabilidade e incomunicabilidade de um imóvel a outro (art. 1.848, §2º).

No pagamento com sub-rogação, um terceiro, e não o primitivo devedor,

efetua o pagamento. Esse terceiro substitui o devedor originário da obrigação,

de forma que passa a dispor de todos os direitos, ações e garantias que tinha o

primeiro. Ressalta evidente que, quando alguém paga o débito de outrem, fique

com o direito de reclamar do verdadeiro devedor o que foi pago e que esse

crédito goze das mesmas garantias originárias. Não há prejuízo algum para o

devedor, que em vez de pagar o que deve a um, deve pagar o devido a outro.

O fato é que a dívida conserva-se não se extingue. É um instrumento

jurídico muito utilizado na prática. Permite que, muitas vezes, um devedor

pressionado por credor poderoso tenha sua dívida paga por outrem, que passa a

ser seu credor, de forma mais acessível e com melhores condições de

pagamento.

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106

2- Natureza jurídica

Diversas correntes procuram explicar-lhe a natureza jurídica. A primeira

vê na sub-rogação uma cessão de crédito, cujo preço seria representado pela

quantia paga pelo terceiro. Mas, como será visto, não obstante seus pontos de

contacto, diversificam profundamente os dois institutos.

Para a segunda corrente, a sub-rogação é uma das faces da sucessão

singular ope legis. Não pode ser aceita, entretanto, essa teoria, pois o crédito

extinto e o novo são diferentes pela diversidade de sujeitos.

A verdadeira concepção é aquela que a considera como instituto

autônomo, através do qual o cumprimento pelo terceiro atua sobre o direito do

credor, mas deixa sobreviver a respectiva obrigação, mediante substituição do

credor.

3- Definição e espécies

Sub-rogação é a transferência dos direitos do credor para aquele que

solveu a obrigação, ou emprestou o necessário para solvê-la.

Nos casos comuns, em que o próprio devedor efetua o pagamento, no

exato instante em que o credor recebe a prestação devida, aquele se libera e a

obrigação se extingue. No pagamento com sub-rogação, todavia, embora

satisfeito o credor, não se verifica a liberação do devedor nem a extinção da

obrigação, porquanto todos os direitos creditórios se transferem para aquele que

satisfez a prestação.

Como essa transferência de direitos se opera por disposição de lei ou por

convenção, segue-se que a sub-rogação pode ser legal e convencional. Da

primeira se ocupa o Código Civil no art. 346, e da segunda, no art. 347.

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107

4- Sub-rogação legal

O art. 346 traz três situações em que a sub-rogação opera de pleno direito,

em favor:

"I - do credor que paga a dívida do devedor comum;"

A situação pressupõe a existência de mais de um credor do mesmo

devedor. Pode ocorrer que esse credor tenha interesse em afastar o outro que

tenha prioridade no crédito, preferindo ficar sozinho na posição de credor,

aguardando momento mais oportuno para cobrar a dívida. Alguém é credor

quirografário juntamente com um credor trabalhista, que tem, portanto,

preferência. Afastando o débito trabalhista, pode aguardar com maior calma o

momento oportuno de, por exemplo, levar bem penhorado à praça e se ressarcir

de toda a dívida, a sua e a dívida trabalhista que pagou e nela se sub-rogou.

"II - do adquirente do imóvel hipotecado, que paga a credor hipotecário,

bem como do terceiro que efetiva o pagamento para não ser privado de direito

sobre o imóvel;"

Imóvel, mesmo hipotecado, pode ser alienado. O adquirente tem o maior

interesse em extinguir a hipoteca. Na prática, é muito raro que a hipótese

ocorra. Geralmente, o adquirente deseja que o bem lhe alcance as mãos já livre

e desembaraçado excluindo-se a hipoteca, a priori. Em determinadas situações

fatícas, porém, alguém poderia ser levado a adquirir o bem hipotecado. Não

ocorre a hipótese da lei se é o próprio vendedor quem recebe o dinheiro do

adquirente e paga a hipoteca. A hipótese vale, também, quando incide mais de

uma hipoteca sobre o bem. O adquirente pode ter maior interesse em livrar-se

ao menos da primeira hipoteca.

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108

E dispositivo também declara a sub-rogação de pleno direito para o

terceiro que efetiva o pagamento para não ser privado de direito sobre imóvel.

A situação trazida é de justiça. A hipótese se aplica, por exemplo, ao

promissário adquirente de imóvel que paga dívida sobre o imóvel contraída e

não paga pelo transmitente do direito, para que não se veja privado dos direitos

sobre o bem.

"III - do terceiro interessado, que paga a dívida pela qual era ou podia ser

obrigado, no todo ou em parte."

É a questão mais comum e útil na prática. O fiador paga a dívida do

afiançado e sub-roga-se nos direitos do credor. Da mesma forma, um dos

devedores solidários paga toda a dívida. Sua sub-rogação, de acordo com a

forma pela qual foi contraída a solidariedade, é parcial ou total da dívida. A

finalidade primordial do inciso é colocar o devedor que paga a cobro de uma

situação difícil e embaraçosa. O fiador pode ter, por exemplo, o máximo

interesse em não ver o afiançado acionado. Note-se que a lei fala em terceiro

interessado que paga.

Se for terceiro não interessado, não haverá sub-rogação, como já visto. O

terceiro não interessado que paga a dívida em seu próprio nome não se sub-roga

nos direitos do credor (art. 305). Só terá direito ao reembolso, por uma questão

de equidade, para evitar-se o enriquecimento sem causa.

Em todos esses casos, a obrigação continua a existir para o devedor, mas

houve mudança de credor.

A lei pode trazer outros casos de sub-rogação, mas o fenômeno só existirá

se a lei autorizar, quando for expressa, não comportando aplicação analógica.

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109

5- Sub-rogação Convencional

O art. 347 admite duas formas de sub-rogação convencional:

I - quando o credor recebe o pagamento de terceiro e expressamente lhe

transfere todos os seus direitos;

II - quando terceira pessoa empresta ao devedor a quantia precisa para

solver a dívida, sob a condição expressa de ficar o mutuante sub-rogado nos

direitos do credor satisfeito.

No primeiro caso, há iniciativa do credor, que recebe a importância de

terceiro. O devedor não necessita aquiescer; o fenômeno pode ocorrer com ou

sem seu conhecimento.

No segundo caso, há iniciativa do devedor, que consegue alguém que lhe

empreste o numerário para pagar a dívida e passa a dever, com todos os direitos

originários, ao mutuante.

Ambas as figuras são úteis. No primeiro caso, o credor vê-se satisfeito,

numa situação de adimplemento duvidoso. No segundo caso, o devedor

consegue talvez se livrar de um credor poderoso, mais insistente, e poderá

pagar, depois, a quem lhe emprestou, quiçá em situação mais favorável. Ambos

os casos favorecem o adimplemento da dívida.

Difere da cessão de crédito, pois nesta há necessidade de ciência do

devedor (art. 290).

O segundo caso ocorre com muita frequência nos financiamentos dos

bancos ditos sociais. As Caixas Econômicas costumam liquidar os débitos de

devedores com instituições privadas, fornecendo financiamentos em condições

mais favoráveis.

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110

6- Efeitos da Sub-rogação

No pagamento com sub-rogação, fica satisfeito o primitivo credor. No

entanto, a obrigação persiste: "a sub-rogação transfere ao novo credor todos os

direitos, ações, privilégios e garantias do primitivo, em relação à dívida, contra

o devedor principal e os fiadores" (art. 349).

Esse artigo descreve a essência do instituto. Tais princípios aplicam-se

tanto à sub-rogação legal, quanto à sub-rogação convencional. O sub-rogado

não recebe mais do que receberia o credor originário. Não pode haver finalidade

especulativa na sub-rogação.

Da mesma forma, o sub-rogado não tem ação contra o sub-rogante no

caso de o devedor ser insolvente. Agora, se a obrigação for nula ou não existir,

pelo princípio do enriquecimento sem causa, o que pagou tem direito ao

reembolso.

Nada impede, porém, que as partes expressem sua vontade no sentido de

alterar os valores da sub-rogação, o que não ocorre na sub-rogação legal: "Na

sub-rogação legal o sub-rogado não poderá exercer os direitos e as ações do

credor, senão até à soma, que tiver desembolsado para desobrigar o devedor"

(art. 350).

Portanto, na sub-rogação convencional as partes podem dispor

diferentemente. Mas, se não houver pacto expresso, tem plena aplicação o

disposto no art. 350.

O art. 351 fala de pagamento parcial ao credor originário: "O credor

originário, só em parte reembolsado, terá preferência ao sub-rogado, na

cobrança da dívida restante, se os bens do devedor não chegarem para saldar

inteiramente o que a um e outro dever."

Suponha-se que a dívida seja de 1.000. Um terceiro paga 500 e sub-roga-

se nos direitos dessa importância. O devedor fica então a dever 500 ao credor

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111

originário e 500 ao sub-rogado. Quando da cobrança de seus 500, o credor

originário não encontra bens suficientes para seu crédito de 500.

Terá ele preferência, recebendo, no que tiver, antes do sub-rogado, que

ficará irressarcido. Alguns vêem injustiça na solução, acreditando melhor na

solução italiana que manda fazer um rateio entre sub-rogante e sub-rogado, que

suportariam igualmente a insolvência do devedor. No entanto, quem se sub-

roga na forma atualmente prescrita assume o risco da insolvência do devedor.

Disso já tem ciência pelos termos expressos no artigo mencionado.

DDDDA IMPUTAÇÃO DOA IMPUTAÇÃO DOA IMPUTAÇÃO DOA IMPUTAÇÃO DO PAGAMENTOPAGAMENTOPAGAMENTOPAGAMENTO

1- Definição e elementos

Pode acontecer que o pagamento se mostre insuficiente para saldar todas

as dívidas do mesmo devedor ao mesmo credor. Surge então a dificuldade de

saber a qual ou a quais dessas dívidas se deve aplicar o pagamento oferecido. A

essa aplicação se denomina imputação do pagamento, que se define como

operação por via da qual, dentre vários débitos do mesmo devedor para com o

mesmo credor, se determina em qual deles se deve aplicar o pagamento.

Dela se ocupa o Código Civil, art. 352: a pessoa obrigada, por dois ou

mais débitos da mesma natureza, a um só credor, tem o direito de indicar a qual

deles oferece pagamento, se todos forem líquidos e vencidos.

De acordo com esse dispositivo, a imputação pressupõe cinco elementos:

a) dualidade ou multiplicidade de débitos;

b) identidade de credor e de devedor;

c) os débitos devem ser da mesma natureza;

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112

d) devem estes ser ainda líquidos e vencidos;

e) o pagamento deve cobrir qualquer desses débitos.

Em primeiro lugar, a imputação supõe a existência de dois ou mais

débitos. Essa a regra geral. Sem dualidade ou multiplicidade de dívidas, não se

justifica a imputação do pagamento. Como exceção, admite-se esta no caso de

uma única dívida, se esta vence juros. Nessa hipótese, segundo o art. 354,

imputa-se o pagamento primeiro nos juros vencidos, e, depois, no capital.

A segunda condição diz respeito à identidade de credor e devedor. Citado

art. 352 alude a dois ou mais débitos a um só credor. Claro, porém, que, em se

tratando de obrigação solidária ativa, o credor é sempre um só, para efeito de

imputação do pagamento e extinção da obrigação.

A imputação requer, em terceiro lugar, que as dívidas sejam da mesma

natureza, vale dizer, tenham por objeto coisas fungíveis de idêntica espécie e

qualidade. Não é possível, assim, imputação do pagamento quando os débitos

não compartilham da mesma natureza. Uma pessoa que devesse a outra R$

10.000,00 e um automóvel, que lhe vendera anteriormente, pagando ao credor

R$ 5.000,00, não poderia imputar essa quantia no débito referente ao veículo.

Seriam, no entanto, da mesma natureza, proporcionando destarte a imputação,

débitos provenientes de aluguéis, empréstimos em dinheiro e fornecimento de

mercadorias. Em tal caso, tendo todos a mesma natureza, o devedor pode

indicar em qual deles pretende se faça imputação do pagamento oferecido.

Em quarto lugar, as dívidas devem ser líquidas e vencidas. Considera-se

líquida a obrigação certa quanto à sua existência e determinada quanto ao seu

objeto. Vencida, por sua vez, é a exigível, por ter ocorrido o termo prefixado

para o vencimento. Não é impossível imputação em dívida condicional, antes

do implemento da condição. O mesmo acontece no tocante à dívida ainda não

vencida, salvo se estipulado o prazo em favor do devedor (art. 133 do CC), caso

em que, para efeito de imputação, o débito é havido como vencido.

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113

Finalmente, o último requisito exigido é o de que o pagamento se mostre

suficiente para extinguir pelo menos uma dívida ou outra, na qual pretenda o

devedor imputá-lo. Se o pagamento não basta para extinguir ao menos uma das

dívidas, descabe a imputação, porquanto, do contrário, se constrangeria o credor

a receber pagamento parcial, ao que evidentemente se não acha obrigado (art.

314). Amortização, ou pagamento parcelado do débito, só se permite quando

convencionada entre as partes.

Oferecido pagamento pelo devedor, para imputação numa das dívidas,

líquidas e vencidas, não pode o credor recusá-lo; se o fizer, incorrerá em mora

accipiendi, e o devedor terá direito de requerer consignação, a fim de que o

pagamento se impute na dívida designada.

2- Imputação do devedor

A imputação realizar-se-á por indicação do devedor, ou do credor, e ainda

em virtude de lei. Existem, assim, três espécies de imputação: do devedor, do

credor e legal.

Na primeira, a regra fundamental é a de que o devedor que paga tem

direito de declarar qual o débito que almeja resgatar. Mas não é livre a

imputação, e naturalmente comporta exceções:

a) havendo capital e juros, o pagamento imputar-se-á primeiro nos juros

vencidos, e depois no capital, salvo estipulação em contrário, ou se o credor

passar a quitação por conta do capital (art. 354). Nessas condições, não pode o

devedor, pagando certa quantia ao credor, pretender que ela seja imputada no

capital, quando se acha a dever juros deste. Ressalva-se, todavia, pacto em

contrário, ou se o credor concorda com a aplicação no capital;

b) não pode o devedor imputar aquilo que paga numa dívida cujo

montante seja maior. Do contrário, o credor seria obrigado a receber por partes,

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114

quando assim não se ajustara, com violação do art. 314. Muda o caso de figura,

porém, se o accipiens aceita o pagamento parcelado;

c) o devedor não pode imputar pagamento numa dívida ainda não

vencida, se convencionado o prazo respectivo em proveito do credor. Nas

obrigações, geralmente, o prazo é estabelecido em favor do devedor, caso em

que pode este renunciá-lo, tendo-se, assim, por vencida a dívida. Nessa

hipótese, admissível se torna a imputação no débito, cujo prazo se renuncia.

Não lhe será lícito fazê-lo, porém, se esse prazo se convenciona em proveito

exclusivo do credor. A imputação do devedor não pode ser prejudicial ao

credor.

3- Imputação do credor

Quando o devedor não declara qual das dívidas quer pagar, ao credor

compete efetuar a imputação. É o que se chama imputação do credor. Cabe

então a este, logo que passa quitação (art. 319), exercer seu direito. Não pode

fazê-lo posteriormente, em outra oportunidade. Perdida a ocasião, passa a atuar

a imputação legal. Dispõe a respeito o art. 353 que, "não tendo o devedor

declarado em qual das dívidas líquidas e vencidas quer imputar o pagamento, se

aceitar a quitação de uma delas, não terá direito a reclamar contra a imputação

feita pelo credor, salvo provando haver ele cometido violência ou dolo".

4- Imputação legal

Se o devedor não fizer a indicação do art. 352, e a quitação for omissa

quanto à imputação, esta se fará nas dívidas líquidas e vencidas em primeiro

lugar. Se as dívidas forem todas líquidas e vencidas ao mesmo tempo, a

imputação far-se-á na mais onerosa (art. 355).

Page 115: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

115

É a chamada imputação legal, cujas regras, preconizadas pela doutrina

são as seguintes:

a) preferência da dívida vencida em face de não vencida;

b) preferência da dívida líquida em concorrência com a ilíquida;

c) sendo todas líquidas, na mais onerosa;

d) em igualdade de ônus, na mais antiga;

e) preferência dos juros vencidos em concorrência com o capital;

f) preferência da dívida existente no próprio nome do devedor,

isoladamente, em concorrência com aquela por ele solidariamente devida.

A expressão dívida mais onerosa comporta diversos esclarecimentos:

a) é mais onerosa a que produz juros, relativamente à que não produz;

b) a que produz juros mais elevados em relação à que os produz mais

módicos;

c) a que for garantida por hipoteca, ou outro direito real, em relação à que

não contém esse ônus;

d) a que justificar ação executiva, em relação à que apenas enseja ação

ordinária;

e) a garantida por cláusula penal, em relação à que não encerra essa pena;

f) a garantida por fiança em relação à não assegurada;

g) aquela em que o solvens é devedor principal e não mero coobrigado;

h) a já ajuizada, em relação àquela que não o foi;

i) a caucionada, em relação à não caucionada.

Por fim, edita o art. 379 que, sendo a mesma pessoa obrigada por várias

dívidas compensáveis, serão observadas, no compensá-las, as regras

estabelecidas quanto à imputação de pagamento.

Page 116: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

116

DA DAÇÃO EM PAGAMENTODA DAÇÃO EM PAGAMENTODA DAÇÃO EM PAGAMENTODA DAÇÃO EM PAGAMENTO

1- Conceito

Se o credor consentir, a obrigação pode ser resolvida substituindo-se seu

objeto. Dá-se algo em pagamento, que não estava originalmente na obrigação.

Esse é o sentido da datio in solutum. Só pode ocorrer com o consentimento do

credor, pois ele não está obrigado a receber nem mesmo coisa mais valiosa (art.

313).

O art. 356 fala da substituição da prestação: "o credor pode consentir em

receber prestação diversa da que lhe é devida". A dação em pagamento, como

se nota, não se restringe à substituição de dinheiro por coisa. Basta que se

substitua, quando do cumprimento da obrigação, o objeto original dela. É um

acordo liberatório que só pode ocorrer após o nascimento da obrigação. Pode

consistir na substituição de dinheiro por coisa (rem pro pecuni), como também

de uma coisa por outra (rem pro re), assim como a substituição de uma coisa

por uma obrigação de fazer.

Quando existe entrega de uma coisa, em substituição, há alienação, daí

por que sua analogia com a compra e venda, decantada pelo art. 357. Assim,

quando se substitui, com aquiescência do credor, o objeto da prestação, ocorre a

dação.

É de se notar que se a obrigação for alternativa, ou mesmo facultativa, só

haverá a datio in solutum se nenhuma das prestações originalmente avençadas

for cumprida, e sim uma prestação totalmente estranha ao pacto original.

Sua utilidade é grande no comércio jurídico, mormente quando há falta de

numerário por parte do devedor ou escassez de mercadoria originalmente

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117

prometida. É mais conveniente para o credor receber coisa diversa do que nada

receber ou receber com atraso.

2- Requisitos e Natureza Jurídica

Para que ocorra a dação, há necessidade de uma obrigação inicialmente

criada, um acordo posterior, em que o credor concorda em aceitar coisa diversa

e, por fim, a entrega da coisa diversa com a finalidade de extinguir a obrigação.

Trata-se, pois, de negócio jurídico bilateral, oneroso e real, pois implica a

entrega de uma coisa (a não ser que a prestação substituída seja de fazer ou não

fazer, pura e simples). Sua finalidade é extinguir a dívida. Se a coisa entregue

foi imóvel, segue todas as regras aplicadas às alienações de imóveis:

necessidade de escritura pública se superior ao valor legal, outorga conjugal etc.

Na dação em pagamento não há necessidade de equivalência de valor na

substituição. Não há nem mesmo necessidade de que as partes expressem um

valor. Tão só que manifestem sua intenção de extinguir a dívida com a entrega.

Pode a dação ser parcial. Parte do conteúdo da obrigação é substituído. O

devedor, por exemplo, não tendo dinheiro suficiente, dá parte em dinheiro e

parte em espécie. Pode também o credor concordar em receber parcialmente in

solutum remanescendo parte da dívida na obrigação originária. Aí, há

necessidade de se explicitar o valor que fica em aberto.

Não existe dação no pagamento com títulos de crédito, porque, aí, haverá

cessão de crédito (art. 358).

O pagamento com cheque é pagamento e não dação; assim também o

pagamento feito por cartão de crédito. Se houver substituição de título de

crédito, o problema transfere-se para o instituto da novação.

A aceitação da dação em pagamento depende de plena capacidade do

credor. Se o credor for incapaz, sem autorização judicial não poderá fazê-lo,

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118

pois possibilitará acarretar prejuízo. O representante necessita de poderes

especiais para dar esse tipo de quitação, que foge ao exato cumprimento da

obrigação. O mandatário com poderes gerais não poderá aceitá-la.

3- Equiparação da Datio in Solutum à Compra e Venda

Dispõe o art. 357: "determinado o preço da coisa dada em pagamento, as

relações entre as partes regular-se-ão pelas normas do contrato de compra e

venda".

A contrario sensu, portanto, se não foi determinado o preço da coisa que

substitui a obrigação, não serão aplicados os dispositivos da compra e venda.

A questão tem importância na dação de imóvel porque deve constar um

valor, ao menos para fins fiscais. Daí por que a equiparação ora tratada tem

maior aplicação quando da entrega de imóvel, quando as partes estipulam valor

no negócio. Lembre-se de que equiparação não é identidade. O que é

equiparado não é igual.

Tratando-se de negócio jurídico oneroso, aplicam-se todas as regras

atinentes ao negócio, suas questões de nulidade e anulabilidade, haja vista que,

com frequência, pode ocorrer fraude contra credores e simulação na dação em

pagamento.

O art. 357 incide tanto se o bem objeto da dação for móvel quanto se for

imóvel. No caso de perda da coisa pela evicção, repristina-se a obrigação

originária. Essa é a opção do legislador: "se o credor for evicto da coisa

recebida em pagamento, restabelecer-se-á a obrigação primitiva, ficando sem

efeito a quitação dada".

O art. 359 acrescenta, porém, ao final: "ressalvados os direitos de

terceiros". Trata-se de efeito semelhante à condição resolutiva. Os terceiros, no

caso concreto, não podem ser prejudicados pela ineficácia da dação em

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119

pagamento, sob pena de instabilidade nas relações negociais. O terceiro

protegido, no caso, é o de boa-fé.

O mesmo não deve ocorrer no tocante a vício redibitório na coisa

entregue. O legislador a ele não se referiu. Vigoram aí os princípios dos vícios

redibitórios. Já no caso de perda pela evicção, total ou parcial, a situação é

como se não tivesse havido quitação; a obrigação mantém-se tal como contraída

originalmente.

Note-se, contudo, que a fiança não se restabelece por disposição expressa

de lei: o fiador ficará desobrigado, "se o credor, em pagamento da dívida,

aceitar amigavelmente do devedor objeto diverso do que este era obrigado a lhe

dar, ainda que depois venha a perdê-lo por evicção" (art. 838, III).

As garantias reais, no entanto, permanecem. Contudo, como é expresso o

estatuto civil, em benefício da aparência no Direito, devem ser protegidos os

terceiros de boa-fé, adquirentes, por exemplo, de imóvel que já se liberara da

hipoteca pela dação em pagamento da dívida. Se a evicção ocorre quando já

estava liberado o imóvel no registro de imóveis, não podem ser prejudicados os

terceiros de boa-fé.

Se o objeto não for pecuniário e houver substituição por outra coisa, a

analogia é com a troca (art. 533) e não com a compra e venda.

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120

DA CONFUSÃODA CONFUSÃODA CONFUSÃODA CONFUSÃO

1- Conceito e Natureza Jurídica:

Na obrigação, é essencial a existência de dois pólos, um credor do lado

ativo e um devedor do lado passivo.

Ninguém pode ser credor ou devedor de si mesmo. Quando, por fatores

externos à vontade das partes, as características de credor e devedor se fundem,

se confundem na mesma pessoa, há impossibilidade lógica de sobrevivência da

obrigação.

Portanto, há confusão na acepção do direito obrigacional ora em estudo,

quando se reúnem na mesma pessoa a qualidade de credor e devedor.

Art. 381: “Extingue-se a obrigação, desde que na mesma pessoa se

confundam as qualidades de credor e devedor”.

Ex.: Antônio, filho de João, é credor deste último. Com a morte de João,

Antônio, seu herdeiro, passa a possuir as qualidades de credor e devedor ao

mesmo tempo e o débito se extingue.

Já se discutiu se este é realmente um meio de extinção de dívidas ou uma

paralisação do direito creditório, porque uma vez cessado o estado de confusão,

restabelece-se a obrigação, com todos os seus acessórios (art. 384).

Não há, modernamente, como se sustentar que a dívida não se extinga.

Os códigos modernos tratam do fenômeno como extinção da obrigação. A

possibilidade de a obrigação restabelecer-se não inibe o efeito extintivo, pois o

mesmo fenômeno já ocorre na dação em pagamento (art. 359). O princípio que

governa a extinção da obrigação não reside num pagamento, mas numa

incompatibilidade lógica de persistência do vínculo.

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121

2- Fontes da Confusão:

A confusão pode originar-se de uma transmissão universal de patrimônio:

a) Esse fenômeno pode ocorrer causa mortis, o que é mais comum. O

herdeiro passa a ter ambas as qualidades de credor e devedor com o

desaparecimento do autor da herança, e a dívida se confunde.

b) Pode ocorrer por ato entre vivos quando, por exemplo, uma empresa,

credora de outra, vem a receber, por qualquer razão (um decreto governamental,

por exemplo), todo o patrimônio da última. Os débitos confundem-se até onde

se compensarem.

Não obstante, não se confundem confusão e compensação. Na confusão,

há identidade de pessoas, credor e devedor, com relação a um único débito; na

compensação, há existência de dois créditos que se eliminam.

Pode o fenômeno derivar de um título singular, no caso, por exemplo, de

alguém ter uma dívida com outrem que lhe faz legado de crédito, já que o

legado importa numa transmissão a título singular e não universal. Também

pode derivar de cessão de crédito, de sub-rogação.

Pode ocorrer, inter vivos, por ato gratuito ou oneroso.

3- Espécies:

A confusão pode extinguir toda a dívida ou apenas parte dela. Assim,

tem-se a confusão total ou parcial. Se no fato causa mortis o herdeiro é apenas

credor de uma parte de dívida divisível do de cujus, a confusão é parcial.

No caso de dívida indivisível, a questão resolve-se pelos princípios já

vistos da indivisibilidade das obrigações, não deixando de existir, porém, a

confusão parcial.

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122

No caso de herança, existindo sempre o benefício de inventário (art.

1.792), tem-se que enquanto houver separação de patrimônios entre credor e

devedor, isto é, enquanto não houver partilha, não se opera a confusão.

Nos títulos ao portador, como eles são circuláveis por natureza, a

confusão será meramente transitória, pois a qualquer momento o portador pode

transferi-los.

O art. 383 trata da confusão na solidariedade: “A confusão operada na

pessoa do credor ou devedor solidário só extingue a obrigação até a

concorrência da respectiva parte no crédito, ou na dívida, subsistindo quanto ao

mais a solidariedade”.

Ou seja, mesmo no caso de solidariedade os efeitos da confusão são

limitados à parcela do crédito ou débito que se confundiram em uma única

pessoa. Não se comunica aos demais credores ou devedores solidários.

4- Efeitos:

O efeito primordial é extintivo da obrigação.

A questão que se destaca é a colocada no art. 384: o restabelecimento da

obrigação, uma vez cessada a confusão. Por exemplo: alguém é devedor de um

estabelecimento e vem a adquiri-lo. Operou-se a confusão. Posteriormente,

aliena o mesmo estabelecimento. Restabelece-se a obrigação primitiva. O

dispositivo é peremptório no sentido de que também revivem todos os

acessórios da obrigação. Revigora-se a fiança e a hipoteca que garantiam a

dívida, por exemplo.

É preciso, contudo, ressalvar que, mesmo no regime do CC/02, cujo art.

384 tem a amplitude acima acusada, as garantias reais e os direitos de terceiros

têm de ser respeitados, quando constituídas aquelas ou adquiridos estes na

pendência do efeito extintivo da confusão. Se, p. ex., a restauração da garantia

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hipotecária defronta uma nova inscrição, realizada após aquela extinção, não

terá sobre ela prioridade, pois que perde o grau que anteriormente gozava.

Se a confusão extingue as obrigações acessórias, a recíproca não ocorre.

Se existe confusão na pessoa do credor e do fiador, extingue-se a fiança,

que é acessória, mas não a obrigação principal. A questão também é de

impossibilidade lógica.

5- Requisitos:

a) uma só pessoa reúna as qualidades de credor e devedor.

b) deve ocorrer essa reunião de qualidades em relação a uma mesma

obrigação.

c) há necessidade de que não haja separação de patrimônios. (Se o diretor

de uma empresa, como pessoa física, é credor da pessoa jurídica, há distinção

de patrimônios, não ocorrendo a confusão. O mesmo ocorre na herança ainda

não atribuída).

DA REMISSÃODA REMISSÃODA REMISSÃODA REMISSÃO

1- Definição:

Remissão é a liberação graciosa de uma dívida, ou a renúncia efetuada

pelo credor, que, espontaneamente, abre mão de seus direitos creditórios,

colocando-se na impossibilidade de exigir-lhes o respectivo cumprimento.

A remissão da dívida, aceita pelo devedor, extingue a obrigação, mas sem

prejuízo de terceiro (art. 385).

Page 124: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

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A aceitação do devedor, expressa ou tácita, é pressuposto indispensável a

que a remissão possa extinguir a obrigação. O devedor opondo-se à remissão,

nada poderá impedi-lo de realizar o pagamento.

Para que se mostre eficaz, preciso se torna que o remitente seja capaz de

alienar, e o remitido capaz de adquirir. Assim se expressa o art. 386, in fine, do

Código Civil.

No tocante ao primeiro – remitente – , exige-se, imprescindivelmente,

essa idoneidade jurídica, mesmo porque remissão vale alienação, a qual requer,

para a sua eficácia, plena capacidade do agente. Em relação ao segundo –

remitido –, porém, dispensável se tornava expressa referência do legislador, em

face da regra geral de que todo ente é capaz de direitos e obrigações, na ordem

civil.

Cumpre não confundir remissão e renúncia. De modo geral, esta é o

gênero, de que aquela é a espécie. Em verdade, entretanto, elas se equivalem

quanto aos seus efeitos. A renúncia, mais ampla, pode incidir sobre

determinados direitos pessoais de natureza não patrimonial. A remissão, ao

revés, é peculiar aos direitos creditórios. Mas a remissão reveste-se de caráter

convencional, porquanto depende de aceitação do remitido, que, no caso de

recusa, pode socorrer-se da ação de consignação em pagamento.

2- Espécies:

A remissão pode ser total ou parcial. É sempre um ato de disposição do

credor. Se ele não é obrigado a receber parcialmente a dívida, pode perdoá-la

parcialmente. Persistirá o débito no montante não remitido.

Pode ser também expressa ou tácita.

Será expressa, de forma contratual ou não, quando firmada por escrito,

público ou particular, declarando o credor que não deseja receber a dívida. Não

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há necessidade da palavra remissão, mas a intenção deve ser clara. Por se tratar

de ato de disposição, não é de admitir interpretação ampliativa. A interpretação

do negócio deve ser restritiva.

A remissão expressa pode decorrer também de ato causa mortis, de um

testamento. A remissão de dívida por testamento é típico ato de última vontade

e segue as formalidades do negócio testamentário. Não será válida, se inválido

for o testamento.

Os arts. 386 e 387 trazem situações de remissão tácita.

Art. 386. A devolução voluntária do título da obrigação, quando por escrito particular, prova desoneração do devedor e seus co-obrigados, se o credor for capaz de alienar, e o devedor capaz de adquirir.

Art. 387. A restituição voluntária do objeto empenhado prova a renúncia do credor à garantia real, não a extinção da dívida.

Há, em ambos, uma presunção de perdão da dívida.

O primeiro dos dispositivos fala da entrega voluntária do título da

obrigação, quando por escrito particular. Diz a lei que tal tradição do título

“prova a desoneração do devedor e seus coobrigados, se o credor for capaz de

alienar, e o devedor, capaz de adquirir". Destarte, incumbe que a entrega do

título (particular, não pode ser de escritura pública) seja espontânea, com a

intenção de perdoar a dívida. A presunção, de qualquer modo, não é absoluta,

pois o ato pode emanar de erro, por exemplo. De qualquer modo, feita a entrega

do título, é o credor que deve provar que sua intenção não foi de remitir.

Quando o título for representado por escritura pública, a contrario sensu,

é imprescindível a remissão expressa.

A situação do art. 387 diz respeito à entrega da coisa empenhada. Tal

entrega implica renúncia à garantia pignoratícia, que se perfaz com a tradição.

Prova a renúncia à garantia, mas não a remissão da dívida. O que a tradição

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prova é o desaparecimento da garantia real. A garantia pignoratícia é acessória.

Pode desaparecer o acessório, sem desaparecer o principal.

Do mesmo modo, pode o credor abrir mão da fiança ou da hipoteca, sem

abrir mão de seu crédito.

Por fim, destaca-se que apenas as obrigações de índole privada podem ser

objeto de remissão. O perdão da dívida pública depende de autorização

legislativa.

3- Outras disposições

• A remissão concedida a um dos co-devedores extingue a dívida na parte a

ele correspondente; de modo que, ainda reservando o credor a solidariedade

contra os outros, já lhes não pode cobrar o débito sem dedução da parte

remitida (art. 388).

O credor só pode exigir dos demais co-devedores o restante do crédito,

deduzida a quota do remitido. Os consortes não beneficiados pelo perdão só

poderão ser demandados, não pela totalidade, mas com abatimento da quota

relativa ao devedor relevado.

• Em se tratando de obrigação indivisível, se um dos credores remitir a dívida,

a obrigação não ficará extinta para com os outros; mas estes só a poderão

exigir descontada a quota do credor remitente (art. 262).

• Segundo o art. 334, a entrega do título ao devedor firma a presunção de

pagamento. De acordo, porém, com o estatuído no art. 386, a devolução do

título prova a desoneração do devedor. Pergunta: a entrega do título prova o

pagamento ou apenas a desoneração do devedor?

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Resposta: se o devedor alega que pagou, a posse em que se acha do

escrito da dívida faz presumir o pagamento e que o título lhe foi entregue

pelo credor; mas, se alega que o credor lhe remitiu a dívida, já não será

suficiente a posse do título: deve provar ainda que foi o próprio credor quem

espontaneamente lho entregou.

• A Lei n. 5.172, de 25-10-1966, que dispõe sobre o Código Tributário

Nacional, prevê, em seu art. 172: "A lei pode autorizar a autoridade

administrativa a conceder, por despacho fundamentado, remissão total ou

parcial do crédito tributário, atendendo: I — à situação econômica do sujeito

passivo; II — ao erro ou ignorância, escusáveis do sujeito passivo, quanto a

matéria de fato; III — a diminuta importância do crédito tributário; IV — a

considerações de eqüidade, em relação com as características pessoais ou

materiais do caso; V — a condições peculiares a determinada região do

território da entidade tributante".

DA NOVAÇÃODA NOVAÇÃODA NOVAÇÃODA NOVAÇÃO

1- Definição e espécies de novação:

A novação corresponde a meio liberatório singular, sendo modo especial

de extinguir-se a obrigação. Chega-se a compará-la a um pagamento fictício.

Define-se como "a conversão de uma dívida em outra para extinguir a

primeira".

É a substituição de uma dívida por outra, eliminando-se a precedente.

Desaparece a primeira, e, em seu lugar, surge nova.

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Esse o seu conteúdo essencial, aliás, duplo: um extintivo, referente à

obrigação antiga; outro gerador, relativo à obrigação nova. Não existe, pois,

tão-somente, uma transformação; o fenômeno é mais complexo, abrangendo a

criação de nova obrigação, que se substitui à antiga.

Divide-se a novação em objetiva ou real e subjetiva ou pessoal. Consiste

a primeira na mutação do objeto devido entre as mesmas partes. A segunda, por

seu turno, implica mudança de um ou de ambos os sujeitos da obrigação, ativo

ou passivo.

Três são, portanto, os modos por que se opera a novação:

- pela mudança de objeto da prestação;

- pela mudança do devedor; e

- pela mudança do credor.

O Código Civil ocupa-se de cada um desses modos no art. 360, segundo o

qual se dá a novação:

I - quando o devedor contrai com o credor nova dívida para extinguir e

substituir a anterior (novação pela mudança de objeto);

II - quando novo devedor sucede ao antigo, ficando este quite com o

credor (novação pela mudança do devedor);

III - quando, em virtude de obrigação nova, outro credor é substituído ao

antigo, ficando o devedor quite com este (novação pela mudança do credor).

No n. I cuida o Código da novação objetiva ou real, e, nos n. II e III, da

novação subjetiva ou pessoal.

a) Novação objetiva ou real:

De acordo com o n. I, existe novação objetiva ou real no seguinte

exemplo: um indivíduo deve a outro a soma de R$ 100.000,00; no respectivo

vencimento convencionam ambos que a importância devida se converta em

renda vitalícia ou perpétua. Outro exemplo: no vencimento daquela mesma

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129

obrigação, o credor pede ao devedor que, em vez de solvê-la, fique com ela

como depositário. Num e noutro caso ocorre novação objetiva, porque nova

obrigação surge entre as partes, extinguindo-se a primeira.

Mas existe novação objetiva não só quando se muda a causa debendi

(exemplo do mútuo transformado em depósito), como também quando se

modifica a natureza da prestação: uma obrigação de dar substituída por outra de

fazer, ou vice-versa; uma obrigação genérica substituída por outra específica,

ou vice-versa, e assim por diante.

Em suma, verifica-se novação objetiva, sempre que haja transformação

contratual, entre as mesmas partes anteriormente vinculadas, de uma obrigação

em outra.

b) Novação subjetiva ou pessoal:

Por sua vez, a primeira modalidade de novação subjetiva decorre da mu-

dança de devedor (mutatio debitoris). Essa mudança efetua-se de dois modos:

pela delegação e pela expromissão.

Na primeira – delegação – a substituição do devedor opera-se com o

consentimento deste. O primeiro devedor encarrega o segundo de pagar ao

credor em seu lugar. Por exemplo, o indivíduo “A” deve a “B” a quantia de R$

100.000,00. O primeiro entende-se com o segundo, propondo-lhe que o

indivíduo “C” fique como seu devedor, extinguindo-se a dívida de “A”. Aceita

a proposta, perfaz-se a delegação.

Insista-se, porém: a delegação só importa novação se houver extinção da

primitiva obrigação; se não houver liberação do primeiro devedor, inexistirá

novação.

A segunda espécie de novação subjetiva resulta da expromissão. Ocorre

esta se a substituição do devedor se efetua sem o seu consentimento (ignorante

ou invito debitore). O novo devedor, espontaneamente, contrai com o credor

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nova dívida, com o objetivo de extinguir-se o débito do primitivo devedor: “A”

deve a “B” R$ 100.000,00. “C”, que é amigo de “A” e sabe da existência do

débito, pede ao credor libere “A”, ficando “C” como devedor. Configura-se

assim a expromissão, que se resume, portanto, num ajuste exclusivo entre o

credor e o terceiro, que assume a dívida. Prescinde-se nela do consentimento do

devedor. Dispõe, efetivamente, o art. 362 que "a novação por substituição do

devedor pode ser efetuada independentemente do consentimento deste".

Por sua vez, tem-se a novação subjetiva pela mudança do credor (mutatio

creditoris). Verifica-se ela quando, em virtude de obrigação nova, outro credor

se substitui ao antigo, ficando o devedor quite com este. Por exemplo: “A”

deve-me R$ 100.000,00; proponho-me, porém, a liberá-lo da obrigação, caso

ele concorde em contrair com “B” débito de igual quantia. A proposta é aceita,

a dívida de “A” para comigo desaparece, e em seu lugar nova dívida surge, de

“A” para com “B”.

2- Requisitos

Para que ocorra a novação exigem-se os seguintes requisitos:

a) existência de obrigação anterior, que se extingue com a constituição de

nova, que a substitui (obligatio novanda);

b) criação dessa nova obrigação, em substituição à anterior, que se ex-

tingue (aliquid novi);

c) intenção de novar (animus novandi).

O primeiro requisito consiste na existência de obrigação anterior. Não

podem ser objeto de novação obrigações nulas ou juridicamente inexistentes.

Não se pode novar o que não existe. Assim dispõe o art. 367: "Salvo as

obrigações simplesmente anuláveis, não podem ser objeto de novação

obrigações nulas ou extintas".

Page 131: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

131

Quando se tratar, porém, de obrigação simplesmente anulável, pode ser

confirmada pela novação.

No tocante às obrigações naturais, tem-se que elas não comportam

novação, porque insuscetíveis de pagamento compulsório.

Quanto à obrigação condicional, por sua vez, é ela passível de novação. A

nova dívida, que se contrair em substituição à primeira, poderá ser, por sua vez,

pura e simples ou também condicional. Neste último caso, a validade da

novação dependerá do implemento da condição (resolutiva ou suspensiva), a

que se subordina a obrigação.

O segundo requisito da novação diz respeito à criação de nova obrigação,

em lugar da anterior, que se extingue. Torna-se necessário que a nova tome o

lugar da antiga. Se assim não acontece, se apenas ocorre eliminação da dívida

antiga, haverá mera remissão, isto é, liberação graciosa por parte do credor. Se

nula a nova obrigação, inexistirá igualmente novação, subsistindo a antiga. Mas

essa nova obrigação, como se frisou, pode ser pura e simples, ou sujeita a termo

ou condição. Tudo depende da convenção das partes.

O terceiro requisito prende-se à intenção de novar. Para que se exteriorize

esse elemento interno não se reclama o uso de palavras sacramentais ou

fórmulas predeterminadas. Urge, porém, que o animus resulte de modo claro,

induvidoso, sem possibilidade de impugnações. Em caso de perplexidade,

exclui-se a ideia de novação, devendo cogitar-se, de preferência, da constituição

de nova obrigação.

A doutrina não ministra critério seguro e certo para identificação do

animus novandi. Deve este ser investigado em cada caso, tendo em vista suas

peculiaridades. De modo geral, todavia, pode-se afirmar que o animus novandi,

quando não consignado em termos expressos, existirá sempre que venha a

ocorrer incompatibilidade entre a antiga e a nova obrigação, tornando-se

impossível a coexistência de ambas.

Page 132: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

132

Nessas condições, não há novação quando à obrigação apenas se

adicionam novas garantias, quando se concede moratória ao devedor, quando se

lhe defere abatimento de preço, maiores facilidades de pagamento ou reforma

do título.

Discutiu-se se existe novação quando alguém, devendo a outrem certa

quantia, proveniente da compra de objeto, ou por outra razão, lhe passa uma

cambial. Em tal conjuntura, preferível a opinião daqueles que sustentam

inexistir novação, destinando-se o título emitido, salvo circunstâncias especiais,

a facilitar a cobrança do débito. Simples emissão de cambial, sem outra

declaração de vontade, expressa ou tácita, não constitui novação.

Em resumo: intenção de novar não se presume. Deve ser expressa ou

tacitamente declarada pelas partes ou resultar, de modo inequívoco, da natureza

das obrigações, inconciliáveis entre si. Não havendo ânimo de novar, a segunda

obrigação confirma simplesmente a primeira (art. 361).

3- Efeitos da novação

O mais importante efeito da novação é a extinção da dívida antiga,

substituída por nova, que lhe toma o lugar. Nisso se resume, em última análise,

esse singular fenômeno jurídico. Não há falar em novação quando a dívida

continua a mesma e modificação alguma se verifica nas pessoas dos

contratantes.

A novação extingue os acessórios e garantias da dívida, sempre que não

houver estipulação em contrário (art. 364, primeira parte). A palavra garantias

se tornava desnecessária; nos acessórios se compreendem as garantias.

Abrangem estas tanto as reais como as pessoais, tanto as que resultam da

convenção como as que nascem da lei, como os privilégios.

Page 133: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

133

Adverte, todavia, a segunda parte do art. 364 que "não aproveitará,

contudo, ao credor ressalvar o penhor, a hipoteca ou a anticrese, se os bens

dados em garantia pertencerem a terceiro que não foi parte na novação".

Operada a novação entre o credor e um dos devedores solidários, somente

sobre os bens do que contrair a nova obrigação subsiste as preferências e

garantias do crédito novado. Os outros devedores solidários ficam, por esse

fato, exonerados (art. 365).

Importa exoneração do fiador a novação feita sem seu consenso com o

devedor principal (art. 366). Se a obrigação novada for à fiança, inalterada se

conservará a obrigação principal.

Finalmente, na novação subjetiva, "se o novo devedor for insolvente, não

tem o credor, que o aceitou, ação regressiva contra o primeiro, salvo se este

obteve por má-fé a substituição" (art. 363).

DA COMPENSAÇÃODA COMPENSAÇÃODA COMPENSAÇÃODA COMPENSAÇÃO

1- Definição e pressupostos

Define-se a compensação como a extinção de duas obrigações, cujos

credores são ao mesmo tempo devedores um do outro. Ou, então, é o desconto

que reciprocamente se faz no que duas pessoas devem uma à outra.

Controverte-se sobre a sua natureza jurídica:

a) pagamento fictício;

b) dupla confusão;

C) modo particular de extinção das duas obrigações e que decorre da

especial posição em que estas se encontram.

Page 134: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

134

Para o Código Civil Brasileiro de 2002, compensação é modo indireto de

extinção das obrigações.

Será total, se de valores iguais as duas obrigações. Trata-se de mera

aplicação de um princípio científico: duas forças iguais e opostas anulam-se.

Será parcial, no caso em que, sendo de valores desiguais, a extinção se

processa até a concorrência dos respectivos valores.

Dispõe, efetivamente, o art. 368 que, "se duas pessoas forem ao mesmo

tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até

onde se compensarem".

Dispõe o art. 369 que "a compensação efetua-se entre dívidas líquidas,

vencidas e de coisas fungíveis".

Logo, seus pressupostos são em número de quatro:

a) reciprocidade das dívidas;

b) que elas sejam líquidas;

c) que sejam vencidas;

d) que sejam homogêneas.

O primeiro requisito diz respeito, por conseguinte, à reciprocidade das

dívidas. Urge que a um débito do devedor corresponda crédito deste contra o

credor. Se o credor nada deve ao seu devedor, não há cogitar de compensação.

O terceiro não interessado pode pagar, se o fizer em nome e por conta do

devedor, salvo oposição deste (art. 304, parágrafo único), mas não tem direito

de compensar. Por outro lado, porém, torna-se incompensável débito do sócio

com o crédito da sociedade, de que faça parte, contra o credor.

O segundo requisito é concernente à liquidez das dívidas. Só dívidas

líquidas são compensáveis. Por dívida líquida se entende a obrigação certa,

quanto à existência, e determinada, quanto ao objeto.

Page 135: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

135

Considera-se líquida a dívida que se determina pela natureza, qualidade e

quantidade, e que se expressa por meio de número certo ou de uma cifra. Se a

obrigação depende de prévia apuração, liquidação ou verificação pelos meios

regulares de direito, deixará de ser líquida e não autorizará a compensação. Se o

suposto crédito do devedor contra o respectivo credor depende ainda de prévio

reconhecimento judicial, ilíquido será para os fins do citado art. 369.

Em terceiro lugar, não basta que as dívidas sejam líquidas; exige-se ainda

já estejam vencidas, por ter ocorrido o respectivo vencimento, normal ou

antecipado (arts. 331, 332 e 333, do CC). Quando se tratar de obrigação

condicional, ou a termo, não poderá valer-se o titular da compensação, só

permitida depois do implemento da condição, ou do vencimento do termo. Mas

os prazos de favor, embora consagrados pelo uso geral, não obstam a com-

pensação (art. 372).

Tenha-se presente que a lei só se refere a dívidas vencidas; ela não

subordina a compensação à exigibilidade da obrigação. Assim, a compensação

é possível, posto que uma das dívidas, já vencida, se torne temporariamente

inexigível, por exemplo, em virtude dos favores da moratória, outorgados a um

dos devedores.

Identicamente, não cabe a compensação se uma das dívidas se acha

prescrita e o magistrado acolhe a prescrição alegada pelo devedor, ou a

reconhece de ofício.

Sendo vincenda, a dívida é incompensável.

Por fim, o último requisito concerne à homogeneidade das prestações,

cuja compensação se pretenda. Torna-se preciso que elas sejam fungíveis entre

si. Dívidas em dinheiro só se compensam com dívidas em dinheiro, dívidas de

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136

café só se compensam com dívidas de café. Não é possível compensar dívida

em dinheiro com dívida em café.

Todavia, “embora sejam do mesmo gênero as coisas fungíveis, objeto das

duas prestações, não se compensarão, verificando-se que diferem na qualidade,

quando especificadas no contrato” (art. 370). Assim, dívidas de café

pertencentes a determinado tipo só se compensam com produto de igual

qualidade; se diversos os tipos, inviável se tornará a compensação. O mesmo

ocorre com produtos manufaturados.

2- Espécies de compensação

A compensação é legal, convencional ou judicial.

É legal, quando advém da lei; ela independe da vontade das partes e opera

ainda que uma das partes se oponha.

É convencional, quando resulta de acordo das partes, as quais podem tran-

sigir, no sentido de dispensar algum de seus requisitos.

Finalmente, é judicial, quando realizada em Juízo pela autoridade

judiciária, nos casos legais. Esta última espécie inclui-se na compensação legal.

A compensação legal não pode ser declarada ex officio; cumpre ao

interessado alegá-la na fase própria do processo. A convencional produz seus

efeitos no instante em que se estabelece o acordo de vontades.

3- Casos de exclusão da compensação

Dispõe o art. 373 que a diferença de causa nas dívidas não impede a

compensação, exceto:

I- se provier de esbulho, furto ou roubo;

II- se uma se originar de comodato, depósito ou alimentos;

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137

III- se uma for de coisa não suscetível de penhora.

No n. I tem-se em mira a aplicação da máxima spoliatus ante omnia

restituendus. Esbulho, furto e roubo constituem atos ilícitos. Se a dívida tiver

uma dessas origens, não comportará compensação. Ex.: devo R$ 100.000,00; o

credor, não logrando obter o respectivo pagamento, por sua própria autoridade,

apodera-se da soma devida. Movo então ao credor ação tendente a obter a

devolução do numerário, de que me vi desapossado. É claro que o credor, réu

nesse feito, não poderá arguir compensação pelo crédito que tem contra mim.

Ainda que as duas dívidas sejam concomitantemente de origem ilícita ou

criminosa, inadmissível se tornará a compensação.

Também em relação ao comodato e ao depósito, que se baseiam,

sobretudo, na mútua confiança reinante entre os interessados, o pagamento só

se efetua mediante restituição da própria coisa emprestada ou depositada. O

credor não é obrigado a receber prestação diversa da que lhe é devida, ainda que

mais valiosa (art. 313). Nessas condições, possível não seria compensá-la por

outra prestação, que desnaturaria a peculiar feição desses contratos, além de

importar quebra de confiança, um dos traços mais característicos desses atos

jurídicos. Só se abre uma exceção, a referente às dívidas provenientes de outro

depósito, como estabelece o art. 638, in fine, do Código Civil.

Art. 638. Salvo os casos previstos nos arts. 633 e 634, não poderá o

depositário furtar-se à restituição do depósito, alegando não pertencer a coisa ao

depositante, ou opondo compensação, exceto se noutro depósito se fundar.

As dívidas alimentares, pela sua índole, não comportam compensação.

Destinam-se os alimentos à subsistência do alimentado, que não tem recursos

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138

para viver, nem pode prover às suas necessidades pelo trabalho. Permitir

compensação seria privar o alimentado dos recursos indispensáveis à própria

mantença, condenando-o assim a inevitável perecimento. Por conseguinte, se o

devedor de pensão alimentícia se torna credor da pessoa alimentada, não pode

opor seu crédito, quando exigida a pensão.

Finalmente, não se opera a compensação se uma das dívidas se relaciona

a coisa suscetível de penhora. O Código de Processo Civil, no art. 649, enumera

os casos de impenhorabilidade. A compensação supõe dívidas judicialmente

exigíveis; se uma delas não se acha nessas condições, a compensação se desvela

impraticável.

A lei prevê ainda outros casos em que não cabe a compensação:

a) não pode esta realizar-se, havendo renúncia prévia de um dos

devedores (art. 375, in fine, do CC). Com esse dispositivo, filiou-se o Código à

opinião geralmente seguida de que a compensação comporta renúncia

antecipada.

b) não se admite compensação em prejuízo do direito de terceiro. O

devedor que se torne credor do seu credor, depois de penhorado o crédito deste,

não pode opor ao exequente a compensação, de que contra o próprio credor

disporia (art. 380 do CC). Como modo abreviado de efetuar pagamento, a com-

pensação não pode prejudicar terceiros estranhos à operação. Mas essa proteção

ao direito de terceiros há de ser por estes reclamada e não pelo próprio devedor;

c) igualmente, não haverá compensação quando credor e devedor por

mútuo acordo a excluírem (art. 375, primeira parte, do CC);

Page 139: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

139

4- Outros princípios peculiares à compensação

O devedor somente pode compensar com o credor o que este lhe dever;

mas o fiador pode compensar sua dívida com a de seu credor ao afiançado (art.

371). No caso de crédito garantido por fiança, o devedor principal não pode

compensar seu débito com o débito do credor para com o fiador; mas este pode

opor ao credor, em compensação, o que o mesmo deva ao devedor principal.

Em regra, só cabe a compensação entre pessoas que entre si sejam

reciprocamente credor e devedor. Assim, a obrigação do mandante para com

terceiro não se compensa com a do mandatário em relação a esse terceiro; a do

tutor para com terceiro não se compensa com a dívida deste em relação ao

tutelado. A única exceção que se abre a essa regra diz respeito ao fiador, na

forma anteriormente acentuada.

Obrigando-se por terceiro uma pessoa, não pode compensar essa dívida

com a que o credor dele lhe dever (art. 376). Quem se obriga em favor de

terceiro não se exime de sua obrigação, pretendendo compensar-se com o que

lhe deve o credor. Assim deve ser entendido o citado art. 376, para evitar

discrepância com o art. 371.

Dignos de nota os efeitos jurídicos no caso de cessão. Dispõe o art. 377:

"O devedor que, notificado, nada opõe à cessão que o credor faz a terceiros dos

seus direitos, não pode opor ao cessionário a compensação, que antes da cessão

teria podido opor ao cedente. Se, porém, a cessão lhe não tiver sido notificada,

poderá opor ao cessionário compensação do crédito que antes tinha contra o

cedente".

Page 140: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

140

Segundo o disposto no art. 290, a cessão de crédito não vale em relação

ao devedor, senão quando a este notificada. Mas a cessão feita sem notificação

não se ressente de nulidade; sem essa notificação, a cessão apenas se considera

res inter alios relativamente ao devedor. Interessante, pois, averiguar a extensão

da cessão, no caso em que o devedor, por sua vez, venha a ser credor do

cedente. Quais os efeitos da cessão no tocante à compensação?

Se, notificado, o devedor nada opõe, perde o direito de compensar; nessa

hipótese, não pode argüir contra o cessionário o meio extintivo, de que

dispunha contra o cedente. Não notificado, porém, assistir-lhe-á o direito de

invocar contra o cessionário a compensação exercitável contra o cedente. Tais

as soluções expressamente consagradas pelo citado art. 377.

Quando as duas dívidas não são pagáveis no mesmo lugar, não se podem

compensar sem dedução das despesas necessárias à operação (art. 378).

Sendo a mesma pessoa obrigada por várias dívidas compensáveis, serão

observadas, no compensá-las, as regras estabelecidas quanto à imputação de

pagamento (art. 379). Quer dizer, ao intentar a compensação, indicará o devedor

à dívida que pretende seja compensada. Se omitir a indicação, a escolha far-se-á

pelo credor, que consignará na quitação a dívida pela qual optou. Silente o

devedor e omissa a quitação, far-se-á a imputação com observância do disposto

no art. 355.

Não se admite a compensação em prejuízo de direito de terceiro. O

devedor que se torne credor do seu credor, depois de penhorado o crédito deste,

não pode opor ao exeqüente a compensação de que contra o próprio credor

disporia (art. 380).

Page 141: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

141

Finalmente, cumpre salientar ainda a maneira pela qual se opõe a

compensação. Basta seja invocada na contestação, ou seu acolhimento demanda

formulação de pedido reconvencional?

A nosso ver, ela constitui matéria a arguir-se em contestação, tornando-se,

pois, dispensável oferecimento de reconvenção. Compensar é pagar, e

pagamento vem a ser a arguição de defesa, alegável em contestação (Cód. Proc.

Civil, art. 333, n. II).

Contudo, como há quem julgue necessária a reconvenção, aconselhável se

torna assim se proceda, a fim de pôr-se o interessado a salvo de eventual

malogro judicial, perfeitamente evitável.

A compensação pode ser deduzida igualmente em execução de sentença,

como faculta o art. 741, n. VI, do estatuto processual. A compensação a que

alude o texto é a superveniente, quando o fato extintivo só vem a ocorrer após a

prolação da sentença exequenda.

Ressalte-se ainda que a compensação, mencionada pela lei adjetiva e apta

a determinar a suspensão do curso da execução, só é cabível se existe execução

aparelhada (executio parata). Sentença condenatória que careça de prévia

liquidação não constitui título executório.

CESSÃO DE CRÉDITOCESSÃO DE CRÉDITOCESSÃO DE CRÉDITOCESSÃO DE CRÉDITO

1- Definição e abrangência:

O crédito constitui entidade patrimonial suscetível de transferência.

Quando, no direito, a alienação tem por fim bens imateriais, toma o nome

de cessão.

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142

Define-se a cessão de crédito como a transferência que o credor faz a

outrem de seus direitos. Num sentido amplo, porém, a palavra cessão indica a

transferência, a título gratuito ou oneroso, de bens, direitos e ações.

A cessão de crédito é, pois, um negócio jurídico em que o credor transfere

a um terceiro seu direito. O negócio jurídico tem feição nitidamente contratual.

Nesse negócio, o crédito é transferido intacto, tal como contraído;

mantém-se o mesmo objeto da obrigação. Há apenas uma modificação do

sujeito ativo.

Na cessão necessariamente figuram o cedente e o cessionário. O primeiro

é aquele que aliena ou transfere seus direitos e o segundo, aquele que os

adquire, investindo-se na titularidade respectiva. O devedor, a quem

propriamente se costuma denominar cedido, não intervém no ato jurídico. Para

ele, indiferente se torna ter este ou aquele como credor. Interessa-lhe apenas

saber qual o legítimo detentor do crédito, para oportunamente solver-lhe a

prestação. Só para esse fim se lhe comunica a cessão, mas sua anuência ou

intervenção é dispensável.

A cessão induz alienação, e por isso exige plena capacidade por parte do

cedente (CC, art. 104).

Tratando-se de ato que ultrapassa os limites da simples administração,

não pode ser realizado pelo pai, com relação a crédito pertencente ao filho me-

nor, sem prévia autorização do juiz (art. 1.691, CC). Identicamente, para efetuar

cessão, depende o mandatário de poderes especiais e expressos (art. 661, § l,

CC). Se o crédito envolver direito real de garantia, como a hipoteca,

subordinar-se-á naturalmente à existência de outorga uxória, salvo se o regime

do casamento for o da separação de bens.

O tutor não pode constituir-se cessionário de crédito contra o pupilo (art.

1.749 do CC), proibição que igualmente se estende ao curador, no tocante aos

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143

débitos de seu curatelado (art. 1.774). Mas o advogado pode tornar-se

cessionário do crédito de cuja cobrança fora encarregado.

2- Créditos suscetíveis de cessão

O credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser a natureza da

obrigação, a lei ou a convenção com o devedor. Contudo, a cláusula proibitiva

da cessão não poderá ser oposta ao cessionário de boa-fé se não constar do

instrumento da obrigação (CC, art. 286).

Em regra, todos os créditos podem ser objeto de cessão; a negociabilidade

é a regra em matéria de direitos patrimoniais, desde que haja boa-fé.

De acordo, porém, com aquele dispositivo legal, créditos existem que não

podem ser cedidos. A interdição decorre da natureza do crédito, de disposição

da lei e de convenção das partes.

Pela sua natureza, não podem ser cedidas relações jurídicas estritamente

pessoais, inerentes à própria pessoa do titular, como as de direito de família,

nome civil e alimentos.

Por lei, não comportam cessão os seguintes direitos e obrigações:

a) a obrigação de fazer, quando infungível a prestação (art. 247 do CC);

b) a preempção (art. 520);

c) a obrigação originada da ingratidão do donatário (art. 560);

d) a do locador de serviços (art. 607);

e) a do mandato, salvo existindo poder de substabelecimento (art. 682, n.

11);

f) o usufruto, exceto na hipótese prevista no art. 1.393 do Código Civil;

g) o benefício da justiça gratuita (Lei n. 1.060, de 5-2-1950, art. 10).

A essa enumeração acrescente-se ainda o direito de remir.

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144

São cessíveis, no entanto:

a) o exercício do usufruto (art. 1.393 do CC);

b) o direito de haver reparação do dano causado pelo delito;

c) os aluguéis vincendos de um prédio, cuja percepção constitui direito de

fundo econômico;

d) as indenizações que não tenham caráter alimentar, como despesas de

tratamento médico e hospitalar.

Por fim, a incessibilidade pode resultar de convenção das partes.

3- Espécies de cessão

A cessão de crédito pode ser convencional, legal ou judicial. A primeira

decorre da declaração de vontade entre cedente e cessionário; a segunda

promana da lei, e a terceira resulta de sentença.

Pouco se tem a dizer da cessão convencional, sem dúvida a mais comum.

Efetua-se a título oneroso ou gratuito. No primeiro caso, constitui espécie de

venda, com a diferença de que tem esta por objeto a transmissão de uma coisa,

ao passo que aquela objetiva créditos ou direitos de natureza econômica. Mas à

cessão aplica-se a regra do art. 497 do Código Civil, relativa à venda (art. 498).

Se a título gratuito, a cessão assemelha-se à doação, pois implica benemerência

ou liberalidade.

São casos de cessão legal:

a) os de sub-rogação legal, especificados no art. 346 do Código Civil, pois

o sub-rogado adquire os direitos do credor primitivo;

b) os de cessão dos acessórios, em consequência da cessão da dívida

principal (art. 287).

Merece destaque a cessão legal mencionada na letra b: salvo disposição

em contrário, na cessão de um crédito se abrangem todos os seus acessórios.

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145

Nessas condições, cedido determinado crédito, igualmente se transferem ao

cessionário, independentemente de expressa menção, cláusula penal, juros e

garantias, reais ou pessoais, como a fiança e a hipoteca; bem assim, nas

obrigações genéricas e alternativas, o direito de escolha. Mas os interessados

podem convencionar o contrário, excluindo um, alguns ou todos os acessórios.

Finalmente, constituem casos de cessão judicial: o de adjudicação no

juízo divisório, o de sentença condenatória que venha suprir declaração de

cessão por parte de quem era obrigado a fazê-la e o de assinação ao credor de

crédito do devedor.

Por fim, tem-se que, desde que se opere uma cessão, implícita se tornará

também a transferência dos direitos correspondentes à sua cobrança judicial.

Em suma: salvo disposição em contrário, o crédito cedido passa ao

cessionário no estado em que se encontra antes da cessão; qualquer modificação

depende de cláusula expressa.

4- Suas formas

A cessão convencional não exige, em regra, forma especial para valer

entre as próprias partes; mas para ter eficácia contra terceiros depende de

redução a escrito, público ou particular, seguido de transcrição no registro

competente.

Dispõe, efetivamente, o art. 288 do CC que "é ineficaz, em relação a

terceiros, a transmissão de um crédito, se não celebrar-se mediante instrumento

público, ou instrumento particular revestido das solenidades do §1º do art. 654".

Por sua vez, acrescenta a Lei n. 6.015/73, art. 129, n. 9, que no Registro

de Títulos e Documentos, para surtir efeitos em relação a terceiros, será feito o

registro dos instrumentos de cessão de direitos e de créditos, de sub-rogação e

de dação em pagamento.

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146

Com efeito, as cessões operadas por instrumento público, constituindo

prova plena, produzem todos os efeitos jurídicos, sem dependência de registro.

Efetuadas, porém, por instrumento particular, dependem dessa formalidade para

valer contra terceiros, desnecessárias, porém, em relação ao devedor cedido.

Na cessão por instrumento particular, reporta-se a lei às solenidades do

art. 221 (subscrição do ato por duas testemunhas). Todavia, da inobservância

dessa formalidade não resulta a nulidade da cessão. O instrumento, por si só,

deixará de fazer prova completa, que poderá, no entanto, ser completada por

outros elementos de convicção.

Observe-se ainda que, de acordo com o art. 289, "o cessionário de crédito

hipotecário tem o direito de fazer averbar a cessão no registro do imóvel".

Em regra, a cessão convencional não exige forma especial. Entretanto,

nos contratos em que a escritura pública seja da substância do ato, a cessão

efetuar-se-á também por escritura pública. Logo, na cessão de crédito

hipotecário ou de direitos hereditários, só por escritura pública se admite o ato.

5- Notificação do devedor

O devedor é estranho à cessão, em que apenas intervém cedente e

cessionário. Prescreve o CC, todavia, em seu art. 290, primeira parte, que "a

cessão do crédito tem eficácia em relação ao devedor, senão quando a este

notificada".

Torna-se necessária essa notificação para que o devedor não fique

prejudicado, pois, desconhecendo a transmissão, pode efetuar o pagamento ao

credor primitivo. Mas a notificação não é imprescindível; ela visa a impedir que

o cedido validamente pague ao cedente. Portanto, se o cessionário exige

pagamento e se o devedor não prova haver pago ao cedente, não lhe aproveita a

falta de notificação.

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147

Dispõe, no mesmo art. 290, segunda parte, que por notificado se tem o

devedor que, em escrito público ou particular, se declarou ciente da cessão feita.

A notificação pode ser judicial ou extrajudicial. Qualquer dos

intervenientes, cessionário ou cedente, tem qualidade para efetuá-la. Se incapaz

o devedor, deve ser feita ao respectivo representante legal; se solidária a

obrigação, notificados devem ser todos os co-devedores.

Saliente-se que a citação inicial para a ação de cobrança equivale à

notificação da cessão, produzindo os mesmos efeitos desta. Identicamente, o

devedor comerciante considera-se notificado com a simples habilitação do

crédito cedido em sua falência.

Créditos existem cuja transferência dispensa a notificação, porquanto sua

transferência obedece à forma especial. Tais são os títulos ao portador, que se

transferem por simples tradição manual, as ações nominativas das sociedades

anônimas, que se transmitem pela inscrição nos livros de emissão, mediante o

termo a que se refere o art. 31, § lº, da Lei n. 6.404, de 15-12-1976, e os títulos

à ordem, transferíveis por endosso.

Fica desobrigado o devedor que, antes de ter conhecimento da cessão,

paga ao credor primitivo, ou que, no caso de mais de uma cessão notificada,

paga ao cessionário, que lhe apresenta, com o título da cessão, o da obrigação

cedida (art. 292 do CC).

Não tendo sido notificado, a cessão é inexistente para o devedor, e, assim,

em atenção à sua boa-fé, válido se tornará o pagamento que venha a efetuar ao

cedente. Mas não se desobrigará se a este pagar, depois de cientificado da

cessão.

Se notificado de várias cessões, deve pagar ao cessionário que se

apresente com o título comprobatório da obrigação. Para esse efeito, dispôs o

Código Civil, no art. 291, que, "ocorrendo várias cessões do mesmo crédito,

prevalece a que se completar com a tradição do título do crédito cedido".

Page 148: Apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10

148

Se nenhum dos cessionários se apresentar com o título da dívida, cumpre

ao devedor recorrer à ação consignatória para obter sua liberação (art. 335, IV).

O devedor pode opor tanto ao cessionário como ao cedente as exceções

que lhe competirem no momento em que tiver conhecimento da cessão (art.

294, do CC).

Nessas condições, se anulável a obrigação por erro, dolo ou relativa

incapacidade do agente, vícios que, por sua natureza, aderem ao ato, pode o

devedor argui-los não só contra o cedente como também contra o cessionário,

embora não tenha feito qualquer protesto ou reclamação no ato de ser

notificado. Pode ele, outrossim, opor defesa fundada em pagamento.

Em regra, pois excluídas naturalmente as exceções pessoais entre credor

primitivo e devedor, ao cessionário são oponíveis todas as alegações cabíveis

contra o cedente.

O devedor que, notificado, nada opõe à cessão que o credor faz a terceiros

dos seus direitos não pode opor ao cessionário a compensação, que antes da

cessão teria podido opor ao cedente. Se, porém, a cessão lhe não tiver sido

notificada, poderá opor ao cessionário compensação de crédito que antes tinha

contra o cedente (art. 377, CC).

6- Responsabilidade do cedente

Na cessão por título oneroso, o cedente, ainda que se não responsabilize,

fica responsável ao cessionário pela existência do crédito ao tempo em que lho

cedeu. A mesma responsabilidade lhe cabe nas cessões por título gratuito, se

tiver procedido de má-fé (art. 295, CC).

O cedente enriquecer-se-ia ilicitamente se recebesse pagamento por

crédito irreal, de incerta existência. Por essa razão, a lei lhe impõe a obrigação

de responder pela positiva existência do crédito cedido.

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Em três hipóteses diferentes subsiste a responsabilidade do cedente:

a) transfere esse crédito inexistente;

b) contra o crédito cedido existe exceção, que o inutiliza, como a de dolo,

ou compensação;

c) o crédito tem existência positiva, mas não em favor do cedente, que

assim aliena bem alheio.

Em qualquer dessas hipóteses, ainda que omisso o título da cessão,

responde o cedente. Só desaparece a garantia legal quando o cessionário tem

conhecimento dos riscos e perigos do crédito.

A responsabilidade abrange o crédito e seus acessórios, como fiança,

penhor e hipoteca. Assegura o cedente a existência dessas garantias, embora

não responda pela sua eficácia.

Quando se tratar de cessão a título gratuito, o cedente só responde na

hipótese de má-fé. Como ele realiza uma liberalidade, só ressarcirá o dano

quando comprovar dolo.

Em qualquer caso, preciso se torna que o cessionário aja judicialmente

contra o devedor. Só depois de vencido quanto à existência do crédito, ou dos

acessórios, poderá voltar-se contra o cedente.

Salvo estipulação em contrário, o cedente não responde pela solvência do

devedor (art. 296, CC). Enquanto o cedente responde sempre pela “existência e

legitimidade do crédito cedido”, o mesmo não acontece quanto à “solvência do

devedor”. Todavia, mediante convenção, poderá assumir tal responsabilidade,

respondendo então pela idoneidade financeira do cedido, quer no instante da

cessão, quer no momento em que se vencer a obrigação.

O cedente, responsável ao cessionário pela solvência do devedor, não

responde por mais do que daquele recebeu, com os respectivos juros, mas tem

de ressarcir-lhes as despesas da cessão e as que o cessionário houver feito com

a cobrança (art. 297, CC).

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7- Outras disposições

O crédito, uma vez penhorado, não pode mais ser transferido pelo credor

que tiver conhecimento da penhora; mas o devedor que o pagar, não tendo

notificação dela, fica exonerado, subsistindo somente contra o credor os direitos

de terceiro (art. 298, CC).

Com a penhora, torna-se o crédito indisponível; sua transferência

implicará fraude de execução. Notificado daquele ato judicial, o devedor não

mais pode pagar ao credor; não notificado, porém, válido se tornará o

pagamento, ressalvado ao exequente o direito de agir contra o accipiens.

Falecendo o alienante ou o cedente, poderá o adquirente ou o cessionário

prosseguir na causa, juntando aos autos o respectivo título e provando a sua

identidade (CPC, art. 1.061). Ao cessionário cabe o direito de promover a

execução, ou nela prosseguir (CPC, art. 567, n. II).

ASSUNÇÃO DE DÉBITOASSUNÇÃO DE DÉBITOASSUNÇÃO DE DÉBITOASSUNÇÃO DE DÉBITO

1- Definição

A assunção de débito está prevista no Código Civil nos artigos 299 a 303.

Essa operação consiste em negócio jurídico por meio do qual o devedor

transfere para outra pessoa a sua posição na relação jurídica, deixando de ser

devedor e repassando o débito para o novo sujeito passivo. Ex.: cessão de

financiamento na aquisição de um veículo.

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Na assunção de débito exige-se a anuência do credor, o que não ocorre na

cessão de crédito, que basta a notificação do devedor. Assim, não basta outra

pessoa desejar assumir a dívida de outrem. Para se efetivar a operação é

necessário que o credor aceite o novo devedor como o sujeito passivo na

relação obrigacional.

2- Formas de constituição

O art. 299 do Código Civil diz que:

Art. 299. É facultado a terceiro assumir a obrigação do devedor, com o consentimento expresso do credor, ficando exonerado o devedor primitivo, salvo se aquele, ao tempo da assunção, era insolvente e o credor o ignorava.

Parágrafo único. Qualquer das partes pode assinar prazo ao credor para que consinta na assunção da dívida, interpretando-se o seu silêncio como recusa.

A assunção pode ser de todas as dívidas, presentes e futuras, aí incluídos

os deveres secundários do devedor, a exemplo da atualização monetária e dos

juros de mora. Nos casos de transferência de estabelecimento comercial, o

Código Civil disciplina a assunção do passivo nos arts. 1.145 e 1.146.

Art. 1.145. Se ao alienante não restarem bens suficientes para solver o seu passivo, a eficácia da alienação do estabelecimento depende do pagamento de todos os credores, ou do consentimento destes, de modo expresso ou tácito, em trinta dias a partir de sua notificação.

Art. 1.146. O adquirente do estabelecimento responde pelo pagamento dos débitos anteriores à transferência, desde que regularmente contabilizados, continuando o devedor primitivo solidariamente obrigado pelo prazo de um ano, a partir, quanto aos créditos vencidos, da publicação, e, quanto aos outros, da data do vencimento.

A assunção de dívida ocorre de duas formas distintas:

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a) pela expromissão, caracterizada pelo contrato entre credor e um

terceiro, que assume a posição de novo devedor, sem necessidade de

comparecimento do antigo devedor; e

b) pela delegação, caracterizada pelo acordo entre o devedor originário e

o terceiro que vai assumir a dívida, cuja validade depende da aquiescência do

credor.

As duas formas de ocorrência podem, ainda, possuir efeitos liberatórios

ou cumulativos.

Diz-se que a assunção de dívida é liberatória quando a liberação ocorre

por parte do primitivo devedor.

E que é cumulativa quando se dá o ingresso do terceiro no pólo passivo

da obrigação, sem que ocorra a liberação do antigo devedor, que permanece na

relação, com liame de solidariedade com o novo.

A assunção de débito não se confunde com a fiança, em que o fiador

responde por dívida alheia, enquanto o assuntor cumulativo é titular do débito,

em nome próprio. É também chamada co-assunção, adesão ou adjunção à

dívida.

O art. 299 do Código Civil não dispôs sobre as modalidades de assunção

de dívida, parecendo referir-se apenas à segunda (forma delegatória), na qual o

consentimento expresso do credor constitui requisito de eficácia do ato. Na

forma expromissória não haveria falar em consentimento do credor, uma vez

que é o próprio credor quem celebra o negócio com o terceiro que vai assumir a

posição do primitivo devedor. O citado dispositivo legal também se omitiu

quanto aos efeitos da assunção delegatória antes do assentimento do credor,

além de se abster completamente de tratar da assunção cumulativa.

A lei civil, no seu art. 299, exige, ainda, que a aceitação do credor seja

expressa, não admitindo, em regra, a aceitação tácita, que ocorre quando o

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credor, sem reserva de espécie alguma, recebe parte da dívida ou consente a

prática de outro ato que faça supor ter o terceiro a qualidade de devedor.

O Código Civil admite em um único caso a aceitação tácita, na hipótese

de inação do credor de que trata o art. 303.

Art. 303. O adquirente de imóvel hipotecado pode tomar a seu cargo o pagamento do crédito garantido; se o credor, notificado, não impugnar em trinta dias a transferência do débito, entender-se-á dado o assentimento.

Na hipótese de insolvência do novo devedor, fica sem efeito a exoneração

do art. 299, não sendo ressalvada a hipótese de as partes, aceitando correr o

risco, exonerarem o primitivo devedor mesmo se o novo for insolvente à época

da celebração do contrato.

Assim, na forma prevista no art. 299, não existe alternativa: se o novo

devedor já era insolvente à época da assunção e o credor o ignorava, não resulta

exonerado o antigo devedor. Mas pode o credor preferir correr o risco,

liberando-o por vários outros motivos.

Com relação ao parágrafo único do art. 299, Caio Mário da Silva Pereira

considera-o desnecessário, "pois se a assunção de dívida não for concertada, de

comum acordo, com o credor, de nada vale sua interpelação para que manifeste

a sua anuência. Se ele não a deu, na fase dos entendimentos, ou se o devedor

não a obteve, não será a interpelação que mudará seus propósitos".

3- Seus efeitos

O art. 300 do Código Civil diz que:

Art. 300. Salvo assentimento expresso do devedor primitivo, consideram-se extintas, a partir da assunção da dívida, as garantias especiais por ele originariamente dadas ao credor.

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As garantias especiais dadas pelo devedor primitivo ao credor – em suma,

aquelas garantias que não são da essência da dívida e que foram prestadas em

atenção à pessoa do devedor, por exemplo, as garantias dadas por terceiros

(fiança, aval, hipoteca de terceiro) – só subsistirão se houver concordância

expressa do devedor primitivo e, em alguns casos, também do terceiro que

houver prestado a garantia. Isso porque várias das garantias prestadas por

terceiros só poderão subsistir com a ressalva destes.

Ocorrendo a anulação do contrato de assunção, renasce a obrigação para o

devedor originário, com todos os seus privilégios e garantias, salvo as que

tiverem sido prestadas por terceiro. De fato, as garantias especiais, prestadas

por terceiros, e que haviam sido exoneradas pela assunção, não podem ser

restauradas, em prejuízo do terceiro, salvo se este tinha conhecimento do

defeito jurídico que viria pôr fim à assunção. Trata-se, aqui, de simples

aplicação do princípio da boa fé (art. 301).

Art. 301. Se a substituição do devedor vier a ser anulada, restaura-se o débito, com todas as suas garantias, salvo as garantias prestadas por terceiros, exceto se este conhecia o vício que inquinava a obrigação.

O art. 302 do Código Civil preceitua que:

Art. 302. O novo devedor não pode opor ao credor as exceções pessoais que competiam ao devedor primitivo.

Assim, aquele que assume a posição do devedor na relação obrigacional

só pode alegar contra o credor as defesas decorrentes do vínculo anterior

existente entre credor e primitivo devedor, não lhe cabendo invocar as defesas

pessoais que derivem das relações existentes entre ele, o novo devedor, e o

primitivo devedor, ou entre este e o credor. Não pode alegar, por exemplo, o

direito de compensação que possuía o primitivo devedor em face do credor.

Finalmente, diz o art. 303 do Código Civil que:

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Art. 303. O adquirente de imóvel hipotecado pode tomar a seu cargo o pagamento do crédito garantido; se o credor, notificado, não impugnar em trinta dias a transferência do débito, entender-se-á dado o assentimento.

Cuida o dispositivo de uma exceção à regra geral de que o consentimento

do credor há de ser expresso, admitindo a hipótese de concordância tácita do

credor hipotecário que, notificado da assunção, não a impugna no prazo de

trinta dias.

O Prof. SILVIO RODRIGUES entende que deveria ser até mesmo dispensada

a anuência do credor, sobretudo se o valor da hipoteca for superior ao débito,

devendo "a lei permitir a cessão por mero acordo entre devedor e cessionário,

pois a oposição do credor não encontra outro esteio que não seu capricho, visto

que seu interesse não sofre ameaça, por força da excelência da garantia".

A segurança do credor reside muito mais na garantia em si do que na

pessoa do devedor. Se, com a assunção do débito pelo terceiro adquirente do

imóvel, permanece a garantia real, pouca ou nenhuma diferença fará quem será

o credor. Daí a mitigação da exigência de que o consentimento do credor seja

expresso, sobretudo nessas hipóteses em que a garantia é superior ao débito.