apostila-de-direito-das-obrigacoes-30-10
DESCRIPTION
TRANSCRIPT
1
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
Direito das Obrigações: Em objetiva definição, trata-se do conjunto de normas
e princípios jurídicos reguladores das relações patrimoniais entre um credor
(sujeito ativo) e um devedor (sujeito passivo) a quem incumbe o dever de
cumprir, espontânea ou coativamente, uma prestação de dar, fazer ou não
fazer.
INTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃO
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS:
Relação Jurídica:
Vínculo entre pessoas, em razão do qual uma pode pretender um bem a
que a outra é obrigada. Só haverá relação jurídica se o vínculo entre pessoas
estiver normatizado, isto é, regulado por norma jurídica, que tem por escopo
protegê-lo.
Elementos da relação jurídica:
• Sujeito ativo: beneficiário principal
• Sujeito passivo: sujeito que adota determinado comportamento a favor do
sujeito ativo
• Vínculo: ligação entre o sujeito ativo e o sujeito passivo – concretização
da norma jurídica
• Objeto: razão pela qual é instituída a relação jurídica
2
De acordo com o objeto, a relação jurídica pode ser:
a) Obrigacional:
- objeto: prestação (dar, fazer ou não fazer alguma coisa)
- sujeito passivo determinável (relação se estabelece entre duas
pessoas)
b) Real
- objeto: bem ou coisa (direito de propriedade)
- sujeito passivo indeterminável (coletividade)
c) Pessoal:
- objeto: modo de ser da pessoa (direitos da personalidade)
- sujeito passivo indeterminável (coletividade)
Direito Obrigacional Direito Real Relações humanas Exercido e recai diretamente sobre
a coisa Tem sujeito ativo e passivo Segundo a teoria clássica, tem
apenas sujeito ativo Direito relativo – a prestação só pode ser exigida do devedor
Direito absoluto – oponível contra todos
Cooperativo – comporta sujeito ativo (credor), sujeito passivo (devedor), e a prestação (objeto da relação).
Atributivo – não comporta mais de um titular, que exerce seu poder sobre a coisa objeto de seu direito de forma direta e imediata.
Concede direito a uma ou mais prestações efetuadas por uma pessoa.
Concede o gozo e a fruição de bens.
O credor, quando recorre à execução forçada, tem apenas uma garantia geral do patrimônio do devedor, não podendo escolher
Direito de sequela: seu titular pode perseguir o exercício de seu poder perante quaisquer mãos nas quais se encontre a coisa.
3
determinados bens para recair a satisfação de seu crédito. Caráter essencialmente transitório. Sentido de inconsumibilidade, de
permanência. Extingue-se pela inércia Conserva-se até que haja uma
situação contrária em proveito de outro titular
Relações obrigacionais são infinitas.
Numerus clausus
Obs.: Categorias jurídicas híbridas:
� Obrigações propter rem:
- são as que recaem sobre uma pessoa por força de um determinado
direito real, permitindo sua liberação pelo abandono do bem.
- caracteres: . vinculação a um direito real
. possibilidade de exoneração do devedor
. transmissibilidade por meio de atos jurídicos, caso em que
a obrigação recairá sobre o adquirente
- natureza jurídica: são figuras transacionais entre o direito real e o
pessoal, de fisionomia autônoma, constituindo um tertium genus, ou seja,
obrigações acessórias mistas, por serem uma relação jurídica na qual a
prestação está vinculada a um direito real.
� Ônus reais: são obrigações que limitam a fruição e a disposição da
propriedade. São obrigações de realizar periodicamente uma prestação,
que recaem sobre o titular de certo bem; logo, ficam vinculadas à coisa,
que servirá de garantia ao seu cumprimento.
4
� Obrigação com eficácia real: a obrigação terá eficácia real quando, sem
perder seu caráter de direito a uma prestação, se transmite e é oponível a
terceiro que adquira direito sobre determinado bem.
2. CONCEITO DE OBRIGAÇÃO
A obrigação é a relação jurídica, de caráter transitório, estabelecida entre
devedor e credor e cujo objeto consiste numa prestação pessoal econômica,
positiva ou negativa, devida pelo primeiro ao segundo, garantindo-lhe o
adimplemento através de seu patrimônio.
3. RELAÇÃO JURÍDICA OBRIGACIONAL
• Elementos:
a) Sujeito ativo: credor
b) Sujeito passivo: devedor
O sujeito ativo tem a expectativa de obter do devedor o desempenho da
obrigação, isto é, o fornecimento da prestação, enquanto ao sujeito passivo
cumpre o dever de colaborar com o credor, fornecendo-lhe a prestação devida.
Note-se que na espécie surge uma limitação à liberdade do devedor, que
deve dar, fazer ou não fazer alguma coisa em favor de outrem. Mas tal
limitação ou adveio de sua vontade, ou de seu comportamento desastrado
(hipótese de ato ilícito), ou derivou de imposição legal. Em qualquer dos casos,
entretanto, está ele legalmente vinculado e, na hipótese de inadimplemento,
pode o credor colher, judicialmente, no patrimônio do devedor, recursos para a
satisfação de seu direito.
c) Vínculo jurídico: sujeita o devedor à realização de um ato positivo ou
negativo no interesse do credor, unindo os dois sujeitos e abrangendo o dever
5
da pessoa obrigada (debitum) e sua responsabilidade, em caso de
inadimplemento (obligatio). Assim, na obrigação reúnem-se e se completam,
constituindo uma unidade, o dever primário do sujeito passivo de satisfazer a
prestação, e o correlato direito do credor de exigir judicialmente o seu
cumprimento, investindo contra o patrimônio do devedor, visto que o mesmo
fato gerador do débito produz a responsabilidade.
Teorias:
- Monista: um único vínculo entre credor e devedor
- Dualista: existe o vínculo de débito e o vínculo de responsabilidade
- Eclética: débito e responsabilidade fazem parte de um único vínculo
Obs.: O elemento débito consiste no dever que incumbe ao sujeito passivo
de prestar aquilo a que se comprometeu.
O elemento responsabilidade é representado pela prerrogativa conferida
ao credor, ocorrendo inadimplência, de proceder à execução do patrimônio do
devedor, para obter satisfação de seu crédito. Da maneira que o devedor se
obriga, seu patrimônio responde.
O elemento débito supõe a atividade espontânea do devedor, que a pode
descumprir, mas da responsabilidade não se pode ele esquivar.
Questão – Que se entende por “Schuld” e “Haftung”? Em alemão, “Schuld” pode significar culpa ou débito. “Haftung”, e também
“Haftpflicht”, por sua vez, podem traduzir responsabilidade. No Direito Civil, a palavra Schuld identifica-se com o débito e Haftung com a
responsabilidade. Normalmente, débito e responsabilidade se verificam conjuntamente na mesma
pessoa do devedor, mas é perfeitamente possível que a responsabilidade seja de outro sujeito que não o devedor, como nos casos de fiança, de aval, de direitos reais de garantia (hipoteca, penhor, anticrese).
6
d) Objeto da obrigação: prestação positiva ou negativa do devedor, desde que
lícita, possível física e juridicamente, determinada ou determinável, e suscetível
de estimação econômica.
- imediato: prestação (dar, fazer ou não fazer alguma coisa)
- mediato: um bem (é a coisa devida) – É o objeto da prestação, e não da
obrigação. Ex: o objeto da obrigação de um médico para com seu cliente é
prestação geradora de obrigação de fazer. Já o objeto dessa prestação é, p.ex., a
realização de cirurgia plástica.
• Conceito de relação jurídica obrigacional: Obrigação, em sentido jurídico
e enquanto objeto do Direito das Obrigações, é vínculo jurídico pelo qual
devedor fica adstrito a cumprir prestação de caráter patrimonial em favor de
credor, p qual poderá exigir judicialmente seu cumprimento.
4. PRINCÍPIOS DO DIREIRO OBRIGACIONAL
a) Boa-fé objetiva:
A boa-fé pode ser compreendida sob dois enfoques: o subjetivo e o
objetivo.
A boa-fé subjetiva consiste no estado de espírito do agente, sendo
caracterizada pela análise das intenções da pessoa cujo comportamento se
queira qualificar. Traduz-se na sinceridade, veracidade ou franqueza com que a
parte se relaciona, não se utilizando de mentira, hipocrisia ou duplicidade,
enfim, não se utilizando de má-fé.
Já como princípio informador da validade e eficácia das obrigações,
deve ser observado a boa-fé objetiva, princípio integrante da concepção social
do direito contratual, que representa uma cláusula geral de lealdade e
colaboração para o alcance dos fins contratuais.
7
A boa-fé objetiva consiste num dever geral de conduta, que atribui às
partes o dever de agir no sentido da recíproca cooperação, confiança, lealdade,
correção e lisura, a fim de se garantir a segurança e manutenção das relações
jurídicas.
Boa-fé objetiva significa uma atuação “refletida”, uma atuação
refletindo, pensando no outro, no parceiro contratual, respeitando-o, respeitando
seus interesses legítimos, suas expectativas razoáveis, seus direitos, agindo com
lealdade, sem abuso, sem obstrução, sem causar lesão ou desvantagem
excessiva, cooperando para atingir o bom fim das obrigações: o cumprimento
do objetivo contratual e a realização dos interesses das partes.
b) Autonomia da Vontade:
O princípio da autonomia da vontade significa que a obrigação
contratual tem por fonte única a vontade das partes, que podem convencionar o
que desejarem, na forma que quiserem, dentro dos limites de ordem pública.
Cabe a lei apenas assegurar o respeito ao que foi livremente estipulado e
fornecer elementos interpretativos ou supletivos da vontade das partes.
A autonomia da vontade pauta-se na existência da faculdade de
escolha entre contratar ou não contratar, de escolha do outro contratante, além
da escolha do conteúdo e da forma do contrato. Assim, tem como alicerce a
ampla liberdade contratual, o poder dos contratantes de disciplinar os seus
interesses mediante acordo de vontades, suscitando efeitos tutelados pela ordem
jurídica.
c) Proibição de enriquecimento ilícito:
- Conceito: Existe enriquecimento ilícito sempre que houver uma
vantagem de cunho econômico em detrimento de outrem, sem justa causa.
8
Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.
Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido.
Art. 885. A restituição é devida, não só quando não tenha havido causa que justifique o enriquecimento, mas também se esta deixou de existir.
- Subsidiariedade (art. 886, CC):
Art. 886. Não caberá a restituição por enriquecimento, se a lei conferir ao lesado outros meios para se ressarcir do prejuízo sofrido.
A ação é o último meio de que se pode valer a parte, na inexistência de
qualquer outra no sistema jurídico, isto é, na impossibilidade de uma ação
derivada de um contrato, ou de um ato ilícito, ou simplesmente da ação de
anulação ou nulidade de um negócio jurídico.
O caráter subsidiário da ação resulta de circunstâncias de fato, pois,
enquanto não esgota o prejudicado todos os meios normais de ressarcimento,
não há que se falar em empobrecimento. Daí concluir-se que a inexistência de
qualquer outro remédio para o agente é um fator a mais a concluir pela
inexistência de um injusto enriquecimento, numa verdadeira condição de
procedibilidade.
- prescrição: “Art. 206. Prescreve: (...) § 3o Em três anos: (...) IV - a
pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa;”
5. FONTES:
Constituem fontes das obrigações os fatos jurídicos que dão origem aos
vínculos obrigacionais, em conformidade com as normas jurídicas.
A – Fonte Imediata: Lei
9
B – Fonte Mediata:
a) Contrato: negócio jurídico bilateral ou plurilateral, originário de acordo de
vontades, em conformidade com a lei, capaz de criar, modificar e extinguir
direitos.
b) Quase-contrato: assemelha-se ao contrato, com o qual mantém afinidade,
distinguindo-se dele, todavia, porque lhe falta o acordo de vontades.
b.1) Gestão de negócios: é a administração de negócios alheios sem o
conhecimento do dono. Assim, se recolho a correspondência de vizinhos em
viagem, sem qualquer combinação prévia, serei gestor de negócios. Se em meio
à correspondência descubro conta vincenda e a pago, farei jus ao reembolso,
como se o vizinho me houvesse pedido para pagar. Na verdade, não houve
contrato, mas é como se tivesse havido.
b.2) Promessa de recompensa
b.3) Pagamento indevido: ocorre quando o devedor realiza o pagamento
não ao credor, mas sim a uma outra pessoa (com a qual inexiste a relação
jurídica obrigacional). Dessa situação surgem duas consequências: quem paga
mal para duas vezes; repetição do indébito (pedir de volta). É importante
ressaltar que existem casos em que não cabe a repetição.
Art. 880. Fica isento de restituir pagamento indevido aquele que, recebendo-o
como parte de dívida verdadeira, inutilizou o título, deixou prescrever a pretensão ou
abriu mão das garantias que asseguravam seu direito; mas aquele que pagou dispõe
de ação regressiva contra o verdadeiro devedor e seu fiador.
Art. 881. Se o pagamento indevido tiver consistido no desempenho de obrigação
de fazer ou para eximir-se da obrigação de não fazer, aquele que recebeu a prestação
fica na obrigação de indenizar o que a cumpriu, na medida do lucro obtido.
Art. 882. Não se pode repetir o que se pagou para solver dívida prescrita, ou
cumprir obrigação judicialmente inexigível.
10
Art. 883. Não terá direito à repetição aquele que deu alguma coisa para obter fim
ilícito, imoral, ou proibido por lei.
Parágrafo único. No caso deste artigo, o que se deu reverterá em favor de
estabelecimento local de beneficência, a critério do juiz.
b.4) Delito (dolo): é ato ilícito doloso, praticado com a intenção de causar
dano a outrem.
b.5) Quase-delito (culpa): é ato ilícito culposo, involuntário. Baseia-se
não no dolo, mas na imprudência, negligência ou imperícia do agente.
6. DISTINÇÃO ENTRE OBRIGAÇÃO E RESPONSABILIDADE:
A relação jurídica obrigacional resulta da vontade humana ou da vontade
do Estado, por intermédio da lei, e deve ser cumprida espontânea e
voluntariamente. Quando tal fato não acontece, surge a responsabilidade. Esta,
portanto, não chega a despontar quando se dá o que normalmente acontece: o
cumprimento da prestação. Cumprida, a obrigação se extingue. Não cumprida,
nasce a responsabilidade, que tem como garantia o patrimônio geral do
devedor.
A responsabilidade é, assim, a consequência jurídica patrimonial do
descumprimento da relação obrigacional. Pode-se, pois, afirmar que a relação
obrigacional tem por fim precípuo a prestação devida e, secundariamente, a
sujeição do patrimônio do devedor que não a satisfaz.
Embora os dois conceitos estejam normalmente ligados, nada impede que
haja uma obrigação sem responsabilidade ou vice-e-versa.
Como exemplo do primeiro caso, costuma-se citar as obrigações naturais,
que não são exigíveis judicialmente, mas que, uma vez pagas, não dá margem à
repetição do indébito, como ocorre em relação às dívidas de jogo e aos débitos
prescritos pagos após o decurso do prazo prescricional.
11
Há, ao contrário, responsabilidade sem obrigação no caso de fiança, em
que o fiador é responsável, sem ter dívida, surgindo o seu dever jurídico com o
inadimplemento do afiançado em relação à obrigação originária por ele
assumida.
7. CLASSIFICAÇÃO DAS OBRIGAÇÕES:
Obrigações consideradas em si mesmas
Em relação ao seu vínculo Obrigação moral Obrigação civil Obrigação natural
Quanto ao seu objeto
Relativamente à sua natureza
Obrigação de dar Obrigação de fazer Obrigação de não fazer Obrigação positiva e negativa
Em atenção à sua liquidez
Obrigações líquidas Obrigações ilíquidas
Quanto ao seus elementos
Obrigações simples Obrigações compostas ou complexas
Cumulativas ou conjuntivas Alternativas Facultativas
Relativamente ao tempo de adimplemento
Obrigação momentânea ou instantânea Obrigação de execução diferida Obrigação de execução continuada ou periódica
Quanto aos elementos acidentais
Obrigação pura Obrigação condicional Obrigação modal Obrigação a termo
Em relação à pluralidade de sujeitos
Obrigação única
Obrigação múltipla Obrigação divisível ou indivisível Obrigação solidária
Quanto ao conteúdo Obrigação de meio Obrigação de resultado Obrigação de garantia
Obrigações reciprocamente
consideradas
Obrigação principal: subsistem por si. Obrigação acessória: dependem da existência da obrigação principal e lhe seguem o destino.
Obrigações com cláusula penal
São aquelas em que há a cominação de uma multa ou pena para o caso de inadimplemento ou de retardamento do cumprimento da avença.
12
a) Em relação ao vínculo: Civis, Morais ou Naturais:
� Obrigação Civil: é a que, fundada no vinvulum juris, sujeita o devedor à
realização de uma prestação no interesse do credor, estabelecendo um
liame entre os dois sujeitos, abrangendo o dever da pessoa obrigada
(debitum) e sua responsabilidade em caso de inadimplemento (ibligatio),
possibilitando ao credor recorrer à intervenção estatal para obter a
prestação, tendo como garantia o patrimônio do devedor.
� Obrigação Moral: é a que, fundada no vinculum solius aequitatis, sem
obligatio, constitui mero dever de consciência, sendo cumprida apenas
por questão de princípios; logo, sua execução é mera liberalidade.
� Obrigação Natural:
- Conceito: é aquela em que o credor não pode exigir do devedor certa
prestação, embora em caso de seu adimplemento, espontâneo ou voluntário,
possa retê-la a título de pagamento e não de liberalidade.
- Caracteres:
. Não é obrigação moral
. Acarreta inexigibilidade da prestação
. Se for cumprida espontaneamente por pessoa capaz, ter-se-á a
validade do pagamento
. Produz irretratabilidade do pagamento feito em seu cumprimento
. Seus efeitos dependem de previsão normativa
- Efeitos:
. Ausência do direito de ação do credor para exigir seu
adimplemento
13
. Denegação da repetitio indebiti ao devedor que a realizou
. Não é suscetível de novação e de compensação
. Não comporta fiança
. Não lhe será aplicável o regime prescrito para os vícios
redibitórios
- Obrigação natural no direito brasileiro
Art. 814. As dívidas de jogo ou de aposta não obrigam a pagamento; mas não se pode recobrar a quantia, que voluntariamente se pagou, salvo se foi ganha por dolo, ou se o perdente é menor ou interdito.
§ 1o Estende-se esta disposição a qualquer contrato que encubra ou envolva reconhecimento, novação ou fiança de dívida de jogo; mas a nulidade resultante não pode ser oposta ao terceiro de boa-fé.
§ 2o O preceito contido neste artigo tem aplicação, ainda que se trate de jogo não proibido, só se excetuando os jogos e apostas legalmente permitidos.
§ 3o Excetuam-se, igualmente, os prêmios oferecidos ou prometidos para o vencedor em competição de natureza esportiva, intelectual ou artística, desde que os interessados se submetam às prescrições legais e regulamentares.
Art. 815. Não se pode exigir reembolso do que se emprestou para jogo ou aposta, no ato de apostar ou jogar.
Art. 882. Não se pode repetir o que se pagou para solver dívida prescrita, ou cumprir obrigação judicialmente inexigível.
Art. 883. Não terá direito à repetição aquele que deu alguma coisa para obter fim ilícito, imoral, ou proibido por lei.
Parágrafo único. No caso deste artigo, o que se deu reverterá em favor de estabelecimento local de beneficência, a critério do juiz.
-Natureza: trata-se de norma não autônoma, por não autorizar o
emprego da coação como meio para conseguir a observância de seus preceitos,
mas que tem juridicidade por se ligar essencialmente a uma norma que
contenha tal autorização, visto que apenas estabelece negativamente o
pressuposto da sanção.
b) Quanto aos seus elementos: Obrigações Simples ou Complexa
Obrigações simples são as que se apresentam com um sujeito ativo, um
sujeito passivo e um único objeto, ou seja, com todos os elementos no singular.
14
Se um dos elementos estiver no plural, a obrigação é composta ou
complexa.
As obrigações compostas com multiplicidade de objetos podem ser:
- cumulativas ou conjuntivas: objetos ligados pela conjunção “e”;
- alternativas: objetos ligados pela disjuntiva “ou”;
- facultativas: com faculdade de substituição do objeto, conferida ao
devedor.
c) Impessoais (fungíveis) ou Intuito personae (infungíveis)
Impessoal é a obrigação em que o importante é o objeto e não os sujeitos.
É a obrigação em que a pessoa do devedor é facilmente substituível.
Quando a obrigação é contraída tendo em mira exclusivamente a pessoa
do devedor, como é o caso do artista contratado para restaurar uma obra de arte,
a obrigação é intuito personae, porque se leva em conta as qualidades pessoais
do obrigado.
Logo, as obrigações impessoais, sempre que possível, se transmitem aos
herdeiros do devedor morto, o que não ocorre com as intuito personae. Desse
modo, se compro um imóvel e o vendedor morre antes de concluído o contrato
definitivo, seus herdeiros serão obrigados a concluí-lo. Tal não ocorrerá se um
palestrista morrer antes de proferir a palestra que lhe fora encomendada. O
máximo que pode acontecer, neste caso, é que caso o palestrista tenha recebido
honorários adiantados, seus herdeiros terão que restituí-los, tirando-os da
herança que receberem, e não do próprio patrimônio.
d) Quanto ao conteúdo: Obrigações de Meio ou de Resultado
Nas obrigações de meio, o resultado não é o seu objeto, mas sim o
processo para se alcançar. Assim, é obrigação do médico fornecer os meios para
curar o doente. Não é de resultado, por ser este imprevisível.
15
Logo - obrigação de meio: cumpro a obrigação se utilizar os meios
adequados para tanto. [ex.: advogado, médico (exceto cirurgião plástico)]
A obrigação é de resultado quando o fim por ela colimado é algo perfeito,
acabado. Ex.: obrigação contraída em compra e venda – o objetivo, qual seja, a
transferência da propriedade de um bem ao comprador, é resultado.
Logo – obrigação de resultado: cumpro a obrigação ao obter o resultado
esperado [ex.: dentista, transportador] – responsabilidade objetiva.
Nas obrigações de resultado, a inexecução implica falta contratual,
dizendo-se que existe, em linhas gerais, presunção de culpa, ou melhor, a culpa
é irrelevante na presença do descumprimento contratual (art. 389, CC). Nas
obrigações de meio, por outro lado, o descumprimento deve ser examinado na
conduta do devedor, de modo que a culpa não pode ser presumida, incumbindo
ao credor prová-la cabalmente.
e) Reais ou Propter rem:
Vínculo real é elo entre titular de coisa e os não titulares. Assim, se sou
dono de uma coisa, haverá elo entre mim, titular, e todas as demais pessoas da
sociedade, ou seja, não-titulares. Para mim, haverá direito sobre a coisa, direito
de propriedade. Para todos os demais, haverá dever de não molestar meu direito
de propriedade. A esse dever de se abster, em frente ao direito que uma pessoa
tem sobre uma coisa, chamam obrigação real.
Quando a um direito real acede uma faculdade de reclamar prestação de
uma pessoa determinada, surge para esta a chamada obrigação propter rem.
“Propter rem” quer dizer “por causa de uma coisa”. Também chamada de “ob
rem” ou simplesmente “in rem”.
Trata-se, em verdade, de uma obrigação de natureza mista (real e
pessoal), e que se vincula a uma coisa, acompanhando-a (ex.: obrigação de
pagar taxa condominial). São determinadas por lei.
16
Nesse sentido, tem-se o seguinte julgado do STJ:
“AÇÃO DE COBRANÇA. COTAS DE CONDOMÍNIO. LEGITIMIDADE PASSIVA. PROPRIETÁRIO DO IMÓVEL, PROMISSÁRIO COMPRADOR OU POSSUIDOR. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA. RECURSO NÃO CONHECIDO. 1. As cotas condominiais, porque decorrentes da conservação da coisa, situam-se como obrigações propter rem, ou seja, obrigações reais, que passam a pesar sobre quem é o titular da coisa; se o direito real que a origina é transmitido, as obrigações o seguem, de modo que nada obsta que se volte a ação de cobrança dos encargos condominiais contra os proprietários. 2. Em virtude das despesas condominiais incidentes sobre o imóvel, pode vir ele a ser penhorado, ainda que gravado como bem de família. 3. O dissídio jurisprudencial não restou demonstrado, ante a ausência de similitude fática entre os acórdãos confrontados. 4. Recurso especial não conhecido.” (REsp 846.187/SP, Rel. Ministro Hélio Quaglia Barbosa, Quarta Turma, julgado em 13.03.2007, DJ 09.04.2007 p. 255).
No próximo julgado, observa-se que a obrigação de pagar taxa de
condomínio (propter rem) tem preferência, inclusive, sobre a obrigação de
pagar credor com garantia de hipoteca sobre o imóvel:
“CIVIL E PROCESSUAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CRÉDITO CONDOMINIAL. PREFERÊNCIA AO CRÉDITO HIPOTECÁRIO. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. ALEGAÇÃO DE OFENSA A DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. ANÁLISE IMPOSSÍVEL NA VIA RECURSAL ELEITA. IMPROVIMENTO. I. O crédito condominial tem preferência sobre o crédito hipotecário por constituir obrigação propter rem, constituído em função da utilização do próprio imóvel ou para evitar-lhe o perecimento. Precedentes do STJ. II. Inviável ao STJ, na sede recursal eleita, a apreciação de suposta ofensa a normas constitucionais, por refugir à sua competência. III. Agravo regimental improvido.” (AgRg no REsp 1039117/SP, Rel. Ministro Aldir Passarinho Junior, Quarta Turma, julgado em 23/06/2009, DJe 24/08/2009). São características das obrigações propter rem:
- são acessórias de direito real, do qual decorrem;
- apesar de acessórias dos direitos reais, não geram direitos reais para o
credor. Ex.: o Fisco não tem direito real sobre o imóvel sobre o qual recai o
IPTU;
17
- são típicas, enumeradas em lei, exatamente por estarem ligadas aos
direitos reais. Em outras palavras, não podem ser criadas por convenção.
Não confunda a “obrigação propter rem” com a “obrigação com eficácia
real”, que traduz, simplesmente, uma obrigação com oponibilidade erga omnes,
ou seja, oponível a qualquer pessoa. É o caso da anotação da obrigação locatícia
(contrato de locação) levada ao Registro de Imóveis (art. 8º da Lei do
Inquilinato): neste caso, mesmo com a alienação do imóvel a obrigação em face
do locatário deverá ser respeitada por qualquer eventual adquirente. Trata-se de
uma obrigação com eficácia real.
f) Específicas ou Genéricas
Distinguem-se as genéricas das específicas pelo objeto da prestação, se é
individuado (um carro X, da marca Y, ano Z, etc.) ou não (uma tonelada de
minérios). Nas genéricas, o objeto da prestação é determinado apenas em seu
gênero e qualidade. Nas específicas, determina-se não só o gênero, como a
espécie.
Não se confundem obrigações genéricas e específicas com ilíquidas e
líquidas. Uma obrigação poderá ser líquida e genérica. Se A se obriga a entregar
a B uma saca de café no valor de R$100,00, teremos obrigação líquida e
genérica.
18
OOOOBRIGAÇÃO DE DARBRIGAÇÃO DE DARBRIGAÇÃO DE DARBRIGAÇÃO DE DAR
1. OBRIGAÇÃO DE DAR COISA CERTA
A- Aspectos gerais
• Há obrigação de dar coisa certa quando seu objeto é corpo certo e
determinado, como casa, carro, soma em dinheiro.
• Obrigação específica.
• O que foi objeto da obrigação, a coisa certa, é que servirá para o
adimplemento da obrigação.
Art. 313. O credor não é obrigado a receber prestação diversa da que lhe é devida, ainda que mais valiosa.
• Os contratos devem ser cumpridos tal qual foram ajustados (pacta sunt
servanda).
• As obrigações de dar coisa certa abrangem seus acessórios, salvo disposição
contrária.
Art. 92. Principal é o bem que existe sobre si, abstrata ou concretamente; acessório, aquele cuja existência supõe a do principal.
Art. 93. São pertenças os bens que, não constituindo partes integrantes, se destinam, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro.
Art. 94. Os negócios jurídicos que dizem respeito ao bem principal não abrangem as pertenças, salvo se o contrário resultar da lei, da manifestação de vontade, ou das circunstâncias do caso.
Art. 95. Apesar de ainda não separados do bem principal, os frutos e produtos podem ser objeto de negócio jurídico.
Art. 96. As benfeitorias podem ser voluptuárias, úteis ou necessárias. § 1o São voluptuárias as de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso
habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor. § 2o São úteis as que aumentam ou facilitam o uso do bem. § 3o São necessárias as que têm por fim conservar o bem ou evitar que se
deteriore.
19
Art. 97. Não se consideram benfeitorias os melhoramentos ou acréscimos sobrevindos ao bem sem a intervenção do proprietário, possuidor ou detentor.
Art. 233. A obrigação de dar coisa certa abrange os acessórios dela embora não
mencionados, salvo se o contrário resultar do título ou das circunstâncias do caso. • Se A vender seu carro a B, todos os acessórios se presumem vendidos juntos.
Assim, rádio, rodas de liga leve, etc., seguirão com o carro, a não ser que A e
B expressamente combinem o contrário.
• O proprietário do bem é quem sofre os prejuízos e os ganhos relacionados
ao bem (princípio res perito domino).
• A tradição (entrega, pelo devedor, do bem comprado ao credor) é que
transfere a propriedade do bem móvel.
• A transferência do bem imóvel se dá mediante a Inscrição no Registro de
Imóveis.
B- Perda da coisa:
• Em sentido jurídico, é o desaparecimento completo da coisa para fins
jurídicos.
• Perda sem culpa do devedor: resolve-se a obrigação.
• Perda por culpa do devedor: o devedor responde pelo equivalente, mais
perdas e danos.
Art. 234. Se, no caso do artigo antecedente, a coisa se perder, sem culpa do devedor, antes da tradição, ou pendente a condição suspensiva, fica resolvida a obrigação para ambas as partes; se a perda resultar de culpa do devedor, responderá este pelo equivalente e mais perdas e danos.
C- Deterioração:
20
• Quando a coisa sofre danos, sem que desapareça; perda parcial; há
diminuição do valor da coisa, tendo em vista perda de parte de suas
faculdades, de sua substância ou capacidade de utilização.
• Deterioração sem culpa do devedor: duas alternativas ao credor:
- resolver a obrigação, recebendo a restituição do preço, se já tiver pago;
- aceitar a coisa, no estado em que ficou, abatendo-se em seu preço o
valor da depreciação.
Art. 235. Deteriorada a coisa, não sendo o devedor culpado, poderá o credor resolver a obrigação, ou aceitar a coisa, abatido de seu preço o valor que perdeu.
• Deterioração com culpa do devedor: o credor terá a alternativa de
receber ou enjeitar a coisa, mas sempre com direito de haver perdas e
danos. O valor da indenização será apurado, geralmente, por
intermédio de perícia.
Art. 236. Sendo culpado o devedor, poderá o credor exigir o equivalente, ou aceitar a coisa no estado em que se acha, com direito a reclamar, em um ou em outro caso, indenização das perdas e danos.
D- Benfeitorias:
Art. 237. Até a tradição pertence ao devedor a coisa, com os seus melhoramentos e acrescidos, pelos quais poderá exigir aumento no preço; se o credor não anuir, poderá o devedor resolver a obrigação.
Até a tradição da coisa, os melhoramentos acrescidos, isto é, as
benfeitorias, pertencem ao devedor, que pode pedir aumento no preço ou a
resolução da obrigação, se o credor não aceitar o aumento.
21
Assim, se A vende seu carro a B e, antes da entrega, vem a consertar-lhe
certo amassado, poderá pedir aumento proporcional no preço, desde que B haja
fechado o negócio sabendo do amassado.
E- Frutos:
Art. 237, Parágrafo único. Os frutos percebidos são do devedor, cabendo ao credor os pendentes.
Frutos pendentes são aqueles ainda não colhidos.
Se A compra vaca prenhe, o bezerro nascituro reputa-se fruto pendente,
pertencendo a ele, comprador. Se o bezerro já for nascido, considera-se fruto
percebido, pertencendo ao vendedor, no caso, devedor da vaca.
F- Perdas e Danos:
Sempre que houver culpa, haverá direito a indenização por perdas e
danos.
As perdas e danos são avaliados pelo efetivo prejuízo causado pelo
descumprimento.
Art. 402. Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar.
Art. 403. Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual.
22
2. OBRIGAÇÃO DE RESTITUIR:
A- Definição:
A obrigação de restituir é aquela que tem por objeto uma devolução de
coisa certa, por parte do devedor, coisa essa que, por qualquer título, encontra-
se em poder do devedor, como ocorre, p. ex., no comodato (empréstimo de
coisas infungíveis), na locação e no depósito.
Na obrigação de restituir, a coisa já pertencia ao credor, que a recebe de
volta, em devolução.
B- Perda da coisa:
• Sem culpa do devedor: o credor sofrerá a perda (princípio res perito
dominio). Resolve-se a obrigação porque desapareceu seu objeto.
Ressalva a lei, contudo, os direitos do credor até o dia da perda, tais
como aluguéis, seguro etc.
Art. 238. Se a obrigação for de restituir coisa certa, e esta, sem culpa do devedor, se perder antes da tradição, sofrerá o credor a perda, e a obrigação se resolverá, ressalvados os seus direitos até o dia da perda.
• Por culpa do devedor: o devedor, que tem a coisa alheia sob sua
guarda, deve zelar por ela. Caso, por desídia ou dolo, a coisa se perca,
deve repor o equivalente, com perdas e danos.
Art. 239. Se a coisa se perder por culpa do devedor, responderá este pelo equivalente, mais perdas e danos.
C- Deterioração da coisa:
• Sem culpa do devedor: o credor deverá receber a coisa, tal qual se
ache, sem direito a indenização.
23
• Por culpa do devedor: o credor pode exigir o equivalente ou aceitar a
devolução da coisa tal como se encontra, com direito a reclamar, em
qualquer das duas hipóteses, indenização das perdas e danos.
Art. 240. Se a coisa restituível se deteriorar sem culpa do devedor, recebê-la-á o credor, tal qual se ache, sem direito a indenização; se por culpa do devedor, observar-se-á o disposto no art. 239.
Obs.: o art. 240 remete-se ao art. 239; contudo, o correto seria referir-se
ao art. 236, que dispõe, in verbis: “Sendo culpado o devedor, poderá o credor
exigir o equivalente, ou aceitar a coisa no estado em que se acha, com direito a
reclamar, em um ou em outro caso, indenização das perdas e danos”.
D- Benfeitorias (arts. 1.219 e 1.220 do CC):
(Obs.: algumas regras referentes às benfeitorias adiante expostas não são
aplicáveis aos casos de locação de imóveis)
• Benfeitorias necessárias:
- Se o devedor for possuidor de boa-fé, possui o direito à indenização,
além do direito de retenção até seu pagamento.
- Se o devedor for possuidor de má-fé, só tem direito à indenização, não
podendo reter a coisa até o reembolso.
• Benfeitorias úteis:
- Se o devedor for possuidor de boa-fé, possui o direito à indenização,
além do direito de retenção até seu pagamento.
- Se o devedor for possuidor de má-fé, possui o direito de levantar a
benfeitoria, desde que não traga prejuízo ao bem.
• Benfeitorias voluptuárias:
- Se o devedor for possuidor de boa-fé, receberá sempre pelas
autorizadas, não tendo direito de retenção. Se não autorizadas, poderá
levantá-las, desde que não prejudique a coisa. O credor poderá, por outro
24
lado, indenizar o devedor pelas benfeitorias voluptuárias, tendo, assim, o
direito de não permitir seu levantamento.
- Se o devedor for possuidor de má-fé, não terá qualquer direito, nem
mesmo o de levantá-las.
Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis.
Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem o de levantar as voluptuárias.
Obs.: Lei 8.245/91 (Lei de Locações):
Art. 35. Salvo expressa disposição contratual em contrário, as benfeitorias necessárias introduzidas pelo locatário, ainda que não autorizadas pelo locador, bem como as úteis, desde que autorizadas, serão indenizáveis e permitem o exercício do direito de retenção.
Art. 36. As benfeitorias voluptuárias não serão indenizáveis, podendo ser levantadas pelo locatário, finda a locação, desde que sua retirada não afete a estrutura e a substância do imóvel.
E- Frutos:
Art. 1.214. O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos.
Parágrafo único. Os frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fé devem ser restituídos, depois de deduzidas as despesas da produção e custeio; devem ser também restituídos os frutos colhidos com antecipação.
Art. 1.215. Os frutos naturais e industriais reputam-se colhidos e percebidos, logo que são separados; os civis reputam-se percebidos dia por dia.
25
Art. 1.216. O possuidor de má-fé responde por todos os frutos colhidos e percebidos, bem como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber, desde o momento em que se constituiu de má-fé; tem direito às despesas da produção e custeio.
F- Acessão Imobiliária:
Acessões imobiliárias são plantações e edificações.
Segundo o art. 1253, toda plantação ou construção existente em terreno se
presume feita pelo proprietário ou as suas custas, até prova em contrário.
Art. 1.254. Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno próprio com sementes, plantas ou materiais alheios, adquire a propriedade destes; mas fica obrigado a pagar-lhes o valor, além de responder por perdas e danos, se agiu de má-fé.
Art. 1.255. Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno alheio perde, em proveito do proprietário, as sementes, plantas e construções; se procedeu de boa-fé, terá direito a indenização.
Parágrafo único. Se a construção ou a plantação exceder consideravelmente o valor do terreno, aquele que, de boa-fé, plantou ou edificou, adquirirá a propriedade do solo, mediante pagamento da indenização fixada judicialmente, se não houver acordo.
Art. 1.256. Se de ambas as partes houve má-fé, adquirirá o proprietário as sementes, plantas e construções, devendo ressarcir o valor das acessões.
Parágrafo único. Presume-se má-fé no proprietário, quando o trabalho de construção, ou lavoura, se fez em sua presença e sem impugnação sua.
Art. 1.257. O disposto no artigo antecedente aplica-se ao caso de não pertencerem as sementes, plantas ou materiais a quem de boa-fé os empregou em solo alheio.
Parágrafo único. O proprietário das sementes, plantas ou materiais poderá cobrar do proprietário do solo a indenização devida, quando não puder havê-la do plantador ou construtor.
26
3. OBRIGAÇÃO DE DAR DINHEIRO:
a) Obrigação pecuniária:
• É a obrigação de entregar dinheiro, ou seja, de solver dívida em
dinheiro. É, portanto, espécie particular de obrigação de dar. Tem por
objeto uma prestação em dinheiro e não uma coisa.
Art. 315. As dívidas em dinheiro deverão ser pagas no vencimento, em moeda
corrente e pelo valor nominal, salvo o disposto nos artigos subseqüentes.
• O CC adotou o princípio nominalista, pelo qual se considera como
valor da moeda o valor nominal que lhe atribui o Estado, no ato da
emissão ou cunhagem. De acordo com o princípio, o devedor de uma
quantia em dinheiro libera-se entregando a quantidade de moeda
mencionada no contrato ou título da dívida, e em curso no lugar do
pagamento, ainda que desvalorizada pela inflação, ou seja, mesmo que
a referida quantidade não seja suficiente para a compra dos mesmos
bens que podiam ser adquiridos, quando contraída a obrigação.
• Uma das formas de combater os efeitos maléficos decorrentes da
desvalorização monetária é a adoção da cláusula de escala móvel, pela
qual o valor da prestação deve variar segundo os índices de custo de
vida. Foi por essa razão que surgiram, no Brasil, os diversos índices de
correção monetária, que podiam ser aplicados sem limite temporal, até
a edição da MP nº 1.106/95, convertida na Lei nº 10.192/01, que,
pretendendo desindexar a economia, declarou “nula de pleno direito
qualquer estipulação de reajuste ou correção monetária de
periodicidade inferior a um ano” (art. 2º, §1º).
27
Art. 316. É lícito convencionar o aumento progressivo de prestações
sucessivas.
Art. 318. São nulas as convenções de pagamento em ouro ou em moeda
estrangeira, bem como para compensar a diferença entre o valor desta e o da
moeda nacional, excetuados os casos previstos na legislação especial.
• A moeda nacional tem curso forçado, sendo passíveis de nulidade os
contratos de direito interno que estipulem o pagamento em moeda
estrangeira, ouro, ou que restrinjam seu curso. Na verdade, só é
defeituosa a cláusula, sendo a obrigação convertida em moeda
nacional.
b) Dívida de valor:
• O dinheiro não constitui objeto da prestação, mas apenas representa
seu valor. Não se visa diretamente o dinheiro, que não é, por seu valor
nominal, o objeto da prestação, mas sim o meio de medi-lo ou de
valorá-lo.
• A obrigação de indenizar, decorrente da prática de um ato ilícito, por
exemplo, constitui dívida de valor, porque seu montante deve
corresponder ao do bem lesado.
c) Dívida remuneratória:
• Consiste numa remuneração pelo uso de capital alheio, mediante
pagamento de quantia proporcional ao seu valor e ao tempo de sua
utilização. A prestação de juros é uma dívida desse tipo.
• Os juros constituem, com efeito, remuneração pelo uso de capital
alheio, que se expressa pelo pagamento, ao dono do capital, de quantia
proporcional ao seu valor e ao tempo de sua utilização. Pressupõe,
28
portanto, a existência de uma dívida de capital, consistente em
dinheiro ou outra coisa fungível. Daí a sua natureza acessória.
4. OBRIGAÇÃO DE DAR COISA INCERTA:
• Conceito:
Tem por objeto a entrega de uma quantidade de certo gênero e não
uma coisa especificada. Assim, prepondera a indeterminação específica do
objeto da prestação. Mas essa indeterminação não é absoluta, pois a coisa
deverá ser identificada ao menos pelo gênero e quantidade. Ex.: dar um carro –
quantidade: um; gênero: carro.
• Escolha (art. 244):
Na obrigação de dar coisa incerta há um momento precedente à
entrega da coisa que é o ato de escolher o que vai ser entregue. A regra geral
atribui a escolha ao devedor. Mas a norma é dispositiva, ou seja, por acordo
pode-se dispor que a escolha caiba ao credor.
Uma vez feita a escolha, de acordo com o contratado, ou conforme
estabelece a lei (trata-se do que a lei denomina concentração do débito), a
obrigação passa a ser regida pelos princípios da obrigação de dar coisa certa.
Art. 244. Nas coisas determinadas pelo gênero e pela quantidade, a escolha pertence ao devedor, se o contrário não resultar do título da obrigação; mas não poderá dar a coisa pior, nem será obrigado a prestar a melhor.
• Perecimento (art. 246):
A obrigação de dar coisa incerta é uma obrigação genérica.
29
A posição do devedor na obrigação ora tratada é mais favorável do
que na de dar coisa certa, porque se desvencilha do vínculo com a entrega de
uma das coisas ou de um conjunto de coisas compreendidas no gênero indicado.
No entanto, sua responsabilidade pelos riscos será maior, pois,
como o gênero não perece, antes da escolha o devedor não poderá alegar perda
ou deterioração da coisa, ainda que por força maior ou caso fortuito. Após a
determinação, a obrigação transforma-se em obrigação de dar coisa certa.
Assim, p. ex., se devo a João um carro novo, na faixa de R$
30.000,00, cabendo a mim a escolha da marca e modelo, até que faça essa
opção, não poderei alegar que o carro se perdeu ou se deteriorou. No entanto,
uma vez feita a escolha do carro Y, da marca X, a obrigação se transforma em
obrigação de dar coisa certa, aplicando-se suas regras.
Art. 246. Antes da escolha, não poderá o devedor alegar perda ou deterioração da coisa, ainda que por força maior ou caso fortuito.
• Coisa incerta limitada:
É quando o gênero pode ser limitado, isto é, não existe com
abundância suficiente.
É o caso, p. ex., da obrigação de entregar garrafas de vinho de
determinada marca que não mais é produzido e que vai rareando com o passar
do tempo. Ou o caso da obrigação de entregar certo material químico que não
existe em grandes quantidades, ou cuja produção é controlada.
Nesses casos, se o gênero é limitado, a inviabilidade do atendimento
da obrigação, examinável em cada caso concreto, acarretará a extinção da
obrigação.
Logo, o gênero, neste caso, pode perecer.
Ressalte-se que o Código Civil não disciplina a coisa incerta
limitada, aplicando-se, portanto, as regras da obrigação de dar coisa certa.
30
OOOOBRIGAÇÃO DE FAZERBRIGAÇÃO DE FAZERBRIGAÇÃO DE FAZERBRIGAÇÃO DE FAZER
1- Conceito:
É prestação de fato. O conteúdo da obrigação de fazer é uma
“atividade” do devedor, no sentido mais amplo: tanto pode ser a prestação de
uma atividade física ou material (pintar casa, levantar muro, etc.), como uma
atividade intelectual, artística ou científica (escrever obra literária, realizar
experiência científica, etc.). Ademais, o conteúdo da atividade do devedor na
obrigação de fazer pode constituir-se numa atividade que pouco aparece
externamente, mas cujo conteúdo é essencialmente jurídico, como a obrigação
de locar ou emprestar imóvel, de realizar outro contrato, etc.
Nem sempre existe distinção entre as obrigações de dar e de fazer.
Ambas as espécies constituem-se nas obrigações positivas, em contraposição às
obrigações negativas, que são as obrigações de não fazer.
Na compra e venda, p. ex., o vendedor contrai a obrigação de
entregar a coisa (dar), bem como de responder pela evicção e vícios redibitórios
(fazer). Na empreitada, o empreiteiro contrai a obrigação de fornecer a mão-de-
obra (fazer) e de entregar os materiais necessários (dar).
Diante disso, o ponto crucial da diferenciação entre a obrigação de
dar e de fazer está em verificar: se o dar ou entregar é ou não consequência do
fazer. Assim, se o devedor tem de dar ou entregar alguma coisa, não tendo,
porém, de fazê-la previamente, a obrigação é de dar; todavia, se, primeiramente,
tem ele de confeccionar a coisa para depois entregá-la, tendo de realizar algum
ato, do qual será mero corolário o de dar, tecnicamente a obrigação é de fazer.
Além disso, na obrigação de dar a tradição é imprescindível, o que
não ocorre na obrigação de fazer. Ademais, na grande maioria das obrigações
31
de fazer, é costume enfatizar que a pessoa do devedor é preponderante no
cumprimento da obrigação, o que não ocorre nas obrigações de dar.
Por último, as obrigações de dar autorizam, em geral, a execução
coativa. As obrigações de fazer possuem apenas meios indiretos de execução
coativa, por não permitirem a intervenção direta na esfera de atuação da pessoa
do devedor.
2- Infungível e fungível:
Terá natureza infungível nos contratos intuitu personae, isto é,
naqueles celebrados com base na confiança recíproca entre as partes, bem como
nas qualidades específicas do devedor. Ex.: contrato em que editora encomenda
obra a certo autor famoso. Aqui vigora o princípio de que o credor não pode ser
obrigado a aceitar que outro cumpra a obrigação, caso em que esta se resolverá
em perdas e danos, se houver sido descumprida por culpa do devedor.
Terá natureza fungível quando qualquer um puder executar a
obrigação. Não sendo adimplida, o credor pode escolher entre mandar fazer à
custa do devedor ou exigir perdas e danos. Ex.: se contrato pedreiro para
levantar muro, e este não o faz, posso escolher uma das duas opções.
3- Impossibilidade de Prestar:
3.1- Sem culpa do devedor: resolve-se a obrigação.
3.2- Com culpa do devedor:
o Prestação não é mais útil: recebe o equivalente mais
perdas e danos. Ex.: contratada uma orquestra para um
evento e não se apresentando na data designada, por
culpa dela, de nada adianta essa orquestra comprometer-
32
se a comparecer em outra data, pois o dano é
irreversível.
Art. 248. Se a prestação do fato tornar-se impossível sem culpa do devedor, resolver-se-á a obrigação; se por culpa dele, responderá por perdas e danos.
Art. 247. Incorre na obrigação de indenizar perdas e danos o devedor que recusar a prestação a ele só imposta, ou só por ele exequível.
o Prestação ainda útil: existe a multa cominatória, a qual é um meio de coerção para que o devedor cumpra a obrigação.
Observação:
Sempre que houver dúvida acerca da recusa por parte do devedor e
ainda houver possibilidade de a prestação ser útil para o credor, deve ser
aplicado o princípio da execução específica do art. 461 do CPC.
Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.
§ 1o A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente.
§ 2o A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa (art. 287). § 3o Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de
ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o réu. A medida liminar poderá ser revogada ou modificada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada.
§ 4o O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.
§ 5o Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.
33
§ 6o O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva.
Segundo o §4º desse artigo, o juiz pode impor multa cominatória
diária, de índole pecuniária, por dia de atraso no cumprimento da obrigação,
cujo valor reverterá sempre para o autor.
A multa deve ser de montante tal que constranja o devedor a
cumprir a obrigação. Nada impede que as partes, contratualmente, já estipulem
a multa e seu valor, mas caberá sempre ao juiz colocá-la em seus devidos
parâmetros. Essa estipulação de multa deverá ter limite temporal, embora a lei
não o diga, sob pena de transformar-se em obrigação perpétua. Decorrido o
prazo máximo de imposição diária, essa constrição perderá seu sentido,
devendo a situação resolver-se em perdas e danos para se colocar um fim à
demanda.
4- Art. 249, do CC:
Art. 249. Se o fato puder ser executado por terceiro, será livre ao credor mandá-lo executar à custa do devedor, havendo recusa ou mora deste, sem prejuízo da indenização cabível.
Parágrafo único. Em caso de urgência, pode o credor, independentemente de autorização judicial, executar ou mandar executar o fato, sendo depois ressarcido.
É interessante notar que, em seu parágrafo único, há a possibilidade
de procedimento de justiça de mão própria. Imagine-se a hipótese da
contratação de empresa para fazer a laje de concreto de um prédio,
procedimento que requer tempo e época precisos. Caracterizada a recusa e a
mora, bem como a urgência, a hipótese de aguardar uma decisão judicial, ainda
que liminar, no caso concreto, poderá causar prejuízo de difícil reparação.
34
Poderá, então, o credor contratar terceiro para a tarefa, sem
qualquer ingerência judicial, requerendo posteriormente, a devida indenização.
Para a caracterização da recusa ou mora do devedor, sob pena de frustrar-se o
posterior pedido de indenização, deverá o credor resguardar-se com a
documentação necessária possível, tais como notificações, constatação do fato
por testemunhas, fotos, etc. nada impede, porém, antes se aconselha, que, se
houver tempo razoável, seja obtida a autorização judicial.
Essa solução, é evidente, não poderá ocorrer quando se tratar de
obrigação infungível.
5- Obrigação de praticar ato jurídico:
A ação de obrigação de prestar declaração de vontade ocorre
quando existe um contrato preliminar e o devedor compromete-se a outorgar
contrato definitivo. Nesse caso, existe uma obrigação de fazer que possui como
conteúdo uma declaração de vontade.
Assim, em certos contratos, como a compra e venda de imóveis, se
o devedor, no caso o vendedor, se negar a assinar a escritura de compra e
venda, apesar de já ter sido celebrado contrato de promessa de compra e venda
(irretratável), o credor poderá obter do juiz sentença que produza o mesmo
efeito do contrato. Por outros termos, com a sentença judicial, o credor, no caso
o comprador, poderá registrar o imóvel em seu nome.
Lembre-se, no entanto, que, como no sistema pátrio o contrato
simplesmente não tem o condão de transferir a propriedade, a sentença,
consequentemente, nessas premissas, também, por si só, não a transfere. Assim,
tratando-se de bem imóvel, compromissado à venda em instrumento que não
contenha cláusula de arrependimento e registrado no Cartório de Registro de
Imóveis, poderá o credor, considerado nesse caso titular de direito real, requerei
35
ao juiz a sua adjudicação compulsória, se houver recusa do alienante em
outorgar a escritura definitiva, como dispõem os arts. 1417 e 1418 do CC.
Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel.
Art. 1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel.
OOOOBRIGAÇÃO DE NÃO FAZERBRIGAÇÃO DE NÃO FAZERBRIGAÇÃO DE NÃO FAZERBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER
1- Conceito:
As obrigações de não fazer são obrigações negativas, nas quais o
devedor compromete-se a uma abstenção.
A imposição de uma obrigação negativa determina ao devedor uma
abstenção que pode ou não ser ilimitada no tempo.
A obrigação de não fazer ora se apresenta como pura e simples
abstenção, como no caso do alienante de estabelecimento comercial que se
compromete a não se estabelecer num mesmo ramo de negócios, em
determinada zona de influência (art. 1147, do CC), ora como um dever de
abstenção ligado a uma obrigação positiva, como é o caso do artista que se
compromete a exibir-se só para determinada empresa.
Também a obrigação de não fazer pode surgir como simples dever
de tolerância, ou seja, não realizar atos que possam obstar ou perturbar o direito
de uma das partes ou de terceiros, como é o caso do locador que se compromete
a não obstar o uso pleno da coisa locada.
36
Na realidade, nessa espécie de obrigação, o devedor compromete-se
a não realizar algo que normalmente, estando ausente a proibição, poderia fazer.
Toda obrigação deve revestir-se de objeto lícito, negócio jurídico
que é. Na obrigação de não fazer, tal licitude reveste-se de um especial aspecto,
pois será lícita sempre que não envolva restrição sensível à liberdade individual.
2- Impossibilidade:
o Sem culpa do devedor: resolve-se a obrigação.
Art. 250. Extingue-se a obrigação de não fazer, desde que, sem culpa do
devedor, se lhe torne impossível abster-se do ato, que se obrigou a não praticar.
Embora possa parecer estranho à primeira vista, às vezes a
abstenção prometida pelo devedor torna-se impossível ou extremamente
gravosa. O exemplo clássico é do devedor que se compromete a não levantar
muro, para não tolher a visão do vizinho, e vem a ser intimado pelo Poder
Público a fazê-lo. Na dicção do Código, extingue-se a obrigação. A imposição
da municipalidade tem o condão de fazer desaparecer a obrigação de não fazer.
o Por culpa do devedor: o credor pode exigir que seja desfeito o
ato pelo devedor ou às suas custas (a escolha é realizada por meio
da análise da utilidade), mais perdas e danos. (art. 251, do CC; arts.
642 e 643, do CPC).
Art. 251. Praticado pelo devedor o ato, a cuja abstenção se obrigara, o credor pode exigir dele que o desfaça, sob pena de se desfazer à sua custa, ressarcindo o culpado perdas e danos.
Obs.: Havendo urgência, o credor desfará o que houver sido feito,
independentemente de autorização judicial, para, depois, pedir o devido
ressarcimento.
37
Art. 642. Se o devedor praticou o ato, a cuja abstenção estava obrigado pela lei ou pelo contrato, o credor requererá ao juiz que Ihe assine prazo para desfazê-lo.
Art. 643. Havendo recusa ou mora do devedor, o credor requererá ao juiz que mande desfazer o ato à sua custa, respondendo o devedor por perdas e danos.
Parágrafo único. Não sendo possível desfazer-se o ato, a obrigação resolve-se em perdas e danos.
OOOOBRIGAÇÃO ALTERNATIVABRIGAÇÃO ALTERNATIVABRIGAÇÃO ALTERNATIVABRIGAÇÃO ALTERNATIVA
1- Considerações gerais:
As obrigações alternativas são aquelas que têm por objeto duas ou mais
prestações, sendo que o devedor exonera-se cumprindo apenas uma delas.
Assim, nas obrigações alternativas existem dois ou mais objetos
(obrigação complexa).
Essas obrigações se caracterizam pela presença da conjunção “ou” (ex.:
entregar carro ou seu equivalente em dinheiro). Nesse caso, o devedor apenas
está obrigado a entregar uma das coisas objeto da obrigação.
2- Escolha:
De acordo com o art. 252, a escolha cabe ao devedor, se outra coisa não
se estipulou. No entanto, as partes podem convencionar que a escolha
(tecnicamente denominada concentração do débito) caiba ao credor ou mesmo a
um terceiro.
Enquanto não for efetivada a concentração, o credor não terá qualquer
direito sobre os objetos, no sentido de que não poderá exigir a entrega desta ou
38
daquela coisa. Somente quando é feita a escolha, a concentração, é que o credor
pode exigir o pagamento.
Por serem os objetos da prestação independentes entre si, tem-se o fato de
que o devedor não pode obrigar o credor a receber parte em uma prestação e
parte em outra (art. 252, §1º). Também, se uma das prestações tornar-se
inexequível (ou for impossível), subsistirá o débito quanto à outra (art. 253). Da
mesma forma, se a escolha cabe ao credor, este não poderá pedir o pagamento
parte de um e parte de outro dos objetos.
Pode haver uma pluralidade de credores ou devedores. Nesse caso, há
necessidade de que os vários credores ou devedores se acertem sobre a escolha
(decisão unânime). Se os credores não chegarem a um acordo, devem se valer
de uma decisão judicial. Não havendo acordo unânime entre os interessados, o
Código defere a solução ao juiz, após este ter concedido um prazo para
deliberação (art. 252, §3º).
Quando a obrigação for de prestações periódicas, haverá direito de o
devedor exercer em cada período sua opção (art. 252, §2º).
Feita a escolha, a obrigação concentra-se na prestação eleita. As
consequências jurídicas, a partir daí, passam a ser de uma obrigação simples.
Esse é o efeito fundamental da concentração, ou seja, converter uma obrigação
alternativa em obrigação de coisa certa; há a concentração dos deveres do
devedor sobre esse objeto.
Ainda, a concentração é irrevogável. Uma vez operada, sobre um dos
objetos, os demais objetos que compunham a prestação possível deixam de
estar sujeitos às pretensões do credor, o que é consequência natural da
conversão da obrigação alternativa em obrigação de coisa certa.
Art. 252. Nas obrigações alternativas, a escolha cabe ao devedor, se outra coisa não se estipulou.
39
§ 1o Não pode o devedor obrigar o credor a receber parte em uma prestação e parte em outra.
§ 2o Quando a obrigação for de prestações periódicas, a faculdade de opção poderá ser exercida em cada período.
§ 3o No caso de pluralidade de optantes, não havendo acordo unânime entre eles, decidirá o juiz, findo o prazo por este assinado para a deliberação.
§ 4o Se o título deferir a opção a terceiro, e este não quiser, ou não puder exercê-la, caberá ao juiz a escolha se não houver acordo entre as partes.
3- Perecimento:
• Sem culpa do devedor: se houver o perecimento de um dos objetos,
ocorre a concentração do débito no restante. Se ambos os objetos
perecerem, resolve-se a obrigação.
Art. 253. Se uma das duas prestações não puder ser objeto de obrigação ou se tornada inexeqüível, subsistirá o débito quanto à outra.
Art. 256. Se todas as prestações se tornarem impossíveis sem culpa do devedor, extinguir-se-á a obrigação.
• Por culpa do devedor: se a escolha couber ao devedor, perecendo somente
um dos objetos, ocorre a concentração do débito no que restar. Se ocorrer
o perecimento de todos os objetos, o devedor é obrigado a pagar o
equivalente do último que perecer mais perdas e danos.
Art. 254. Se, por culpa do devedor, não se puder cumprir nenhuma das prestações, não competindo ao credor a escolha, ficará aquele obrigado a pagar o valor da que por último se impossibilitou, mais as perdas e danos que o caso determinar.
• Quando a escolha couber ao credor e uma das prestações tornar-se
impossível por culpa do devedor, o credor terá direito de exigir a
prestação subsistente ou o valor da outra, com perdas e danos; se, por
40
culpa do devedor, ambas as prestações se tornarem inexequíveis, poderá o
credor reclamar o valor de qualquer das duas, além da indenização por
perdas e danos. (art. 255).
4- Retratabilidade:
O devedor pode se retratar para exercer posteriormente o direito de
escolha, quando, ignorando que a obrigação era alternativa e que, portanto,
havia direito de escolha, efetua o pagamento, supondo-se obrigado a uma única
prestação.
Porém, a repetição só pode ser admitida se a obrigação for cumprida com
erro do declarante, porque a regra geral é a irretratabilidade da escolha e não
poderia ser de outro modo.
5- Acréscimos:
Podem ser admitidos os seguintes aspectos para os acréscimos na
obrigação alternativa:
a) Se todas as coisas sofreram acréscimo, o credor deve pagar o maior
volume daquela que ele ou o devedor escolher; se não se chegar a esta
solução, o devedor pode dar como extinta a obrigação;
b) Se alguma das coisas aumentou de valor e a escolha couber ao
devedor, poderá ele cumprir a obrigação entregando a de menor valor;
se a escolha couber ao credor, deverá ele contentar-se com a escolha da
que não sofreu melhoramentos, ou, então, se escolher a coisa de maior
valor, pagar a diferença.
41
OOOOBRIGAÇÃO FACULTATIVABRIGAÇÃO FACULTATIVABRIGAÇÃO FACULTATIVABRIGAÇÃO FACULTATIVA
• Não está disciplinada no Código Civil.
• A obrigação dita facultativa é aquela que, tendo por objeto apenas
uma obrigação principal, confere ao devedor a possibilidade de liberar-se
mediante o pagamento de outra prestação prevista na avença, com caráter
subsidiário.
• Ex.: o vendedor compromete-se a entregar 100 sacas de café, mas o
contrato admite a possibilidade de liberar-se dessa obrigação entregando a
cotação do café em ouro.
• Nessas obrigações, há uma prestação principal, que constitui o
verdadeiro objeto da obrigação, e uma acessória ou subsidiária. Essa segunda
prestação constitui um meio de liberação que o contrato reconhece ao devedor.
Assim, são obrigações com faculdade de substituição de objeto.
• É a prestação principal que determina a natureza do contrato. Se a
obrigação principal é nula, fica sem efeito a obrigação acessória; mas a nulidade
da prestação acessória não tem qualquer influência sobre a principal. Trata-se
de aplicação do princípio de que o acessório segue o principal.
• Nessa obrigação apenas um objeto é devido, podendo ser
substituído por outro in facultate solutionis. A faculdade de escolha é exclusiva
do devedor. Ao demandar a obrigação facultativa, o credor só pode exigir a
obrigação principal.
• Na obrigação facultativa não existe propriamente uma concentração
(escolha) da obrigação, mas o exercício de uma opção. E o devedor pode optar
pela prestação subsidiária até o efetivo cumprimento.
• Ao contrário das obrigações alternativas, no caso de erro, não pode
haver retratação se o devedor cumpre a obrigação principal, pois esta é que dá a
42
natureza a obrigação. Já se o devedor cumpre, por erro, a subsidiária, poderá
repetir, pela mesma razão pela qual pode repetir nas obrigações alternativas.
• A perda da coisa principal, sem culpa do devedor, extingue a
obrigação. (O credor não tem direito ao objeto acessório. Fica a cargo do
devedor aceitar em cumprir a obrigação com a entrega do objeto acessório).
• Se a perda ou impossibilidade ocorreu por culpa do devedor, o
credor pode pedir o preço da coisa que pereceu (o equivalente) mais perdas e
danos. Também pode o credor receber o outro objeto.
• A nulidade da obrigação principal extingue também a acessória.
• A perda ou deterioração do objeto da prestação acessória, com ou
sem culpa do devedor, em nada influencia a obrigação principal, que se mantém
incólume.
• Obs.: não confundir a obrigação facultativa com a dação em
pagamento. Nesta é imprescindível a concordância do credor (art. 356, CC),
enquanto na obrigação facultativa a faculdade é do próprio devedor e só dele.
Ademais, na dação em pagamento a substituição do objeto do pagamento ocorre
posteriormente ao nascimento da obrigação, enquanto da facultativa a
possibilidade de substituição participa da raiz do contrato.
43
OOOOBRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO MOMENTÂNEABRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO MOMENTÂNEABRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO MOMENTÂNEABRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO MOMENTÂNEA
• É aquela que se realiza em um só ato.
• As partes adquirem e cumprem seus direitos e obrigações no mesmo
momento do contrato. Ex.: compra e venda à vista, quando o pagamento se
contrapõe a tradição da coisa.
• Obs.: nesse tipo de obrigação a resolução por inexecução deve recolocar
as partes no estado anterior.
OOOOBRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO DIFERIDABRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO DIFERIDABRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO DIFERIDABRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO DIFERIDA
• É a que também se exaure em um só ato, porém a ser realizado em data
futura e não no mesmo instante em que é contraída.
• Desse modo, tanto pode ser diferida a obrigação assumida pelo
comprador, de pagar, no prazo de 30 dias, o preço da coisa adquirida, como a
do vendedor, que se compromete a entregá-la no mesmo prazo.
OOOOBRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO CONTINUADA OU PERIÓDICABRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO CONTINUADA OU PERIÓDICABRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO CONTINUADA OU PERIÓDICABRIGAÇÃO DE EXECUÇÃO CONTINUADA OU PERIÓDICA
• É a obrigação que se cumpre periodicamente.
• A obrigação de execução continuada, duradoura, contínua, de trato
sucessivo ou periódica é a que se protrai no tempo, caracterizando-se pela
prática ou abstenção de atos reiterados, solvendo-se num espaço mais ou menos
longo de tempo. Por exemplo: a obrigação do locador de ceder ao inquilino, por
certo tempo, o uso e gozo de um bem infungível, e a obrigação do locatário de
pagar o aluguel convencionado.
• Ocorre quando as relações das partes desenvolvem-se por um período
mais ou menos longo, devido à própria natureza da relação (ex.: contrato de
44
locação, de trabalho, seguro etc.) ou devido à própria vontade das partes (ex.:
compra e venda com pagamento a prazo).
• Nesta espécie de obrigação há maior probabilidade de conflitos espaço-
temporais, pois, relativamente ao seu inadimplemento, sobreleva o fato de que
sua resolução será irretroativa, pois as prestações seriadas e autônomas e
independentes já cumpridas não serão atingidas pelo descumprimento das
demais prestações, cujo vencimento se lhes seguir, uma vez que seu
adimplemento possui força extintiva.
• Os efeitos do inadimplemento da obrigação de execução continuada se
dirigem ao cumprimento das prestações futuras e não ao das pretéritas, já
extintas pelo seu cumprimento.
• A prescrição se aplica as prestações isoladas da obrigação e não a
obrigação toda.
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. OBRIGAÇÃO SUCESSIVA. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. APOSENTADORIA. SUPLEMENTAÇÃO. REAJUSTE. AUMENTO REAL. PREVISÃO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE. Em se tratando de obrigações de trato sucessivo, a violação do direito acontece de forma contínua, renovando-se o prazo prescricional em cada prestação periódica não cumprida. Logo, impõe-se reconhecer a prescrição, tão-só em relação à pretensão do reajustamento anterior aos cinco anos que antecederam o ajuizamento da demanda, nos termos do art. 103, da Lei nº 8.213/91.(...)”. (TJMG. Processo nº 1.0317.09.101899-2/001(1). Rel. Des.(a) Luciano Pinto. DP: 27/01/2011. DJ: 15/02/2011)
• Nesta modalidade de obrigação situa-se o campo de aplicação da Teoria
da Imprevisão (teoria da onerosidade excessiva):
Art. 317. Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação.
45
OOOOBRIGAÇÃO CONDICIONAL, OBRIGAÇÃO A TERMO E BRIGAÇÃO CONDICIONAL, OBRIGAÇÃO A TERMO E BRIGAÇÃO CONDICIONAL, OBRIGAÇÃO A TERMO E BRIGAÇÃO CONDICIONAL, OBRIGAÇÃO A TERMO E
OBRIGAÇÃO COM ENCARGO OU MODALOBRIGAÇÃO COM ENCARGO OU MODALOBRIGAÇÃO COM ENCARGO OU MODALOBRIGAÇÃO COM ENCARGO OU MODAL
1- Elementos do ato jurídico:
a) Elementos essenciais: são os estruturais, indispensáveis à existência do
ato e que lhe formam a substância: a declaração de vontade nos negócios em
geral; a coisa, o preço e o consentimento na compra e venda, por exemplo.
b) Elementos naturais: são as consequências ou efeitos que decorrem da
própria natureza do negócio, sem necessidade de expressa menção. Normas
supletivas já determinam essas consequências jurídicas, que podem ser
afastadas por estipulação contrária. P. ex.: responsabilidade do alienante pelos
vícios redibitórios (art. 441, CC) e pelos riscos da evicção (art. 447, CC); o
lugar do pagamento quando não convencionada (art. 327, CC).
c) Elementos acidentais: consistem em estipulações acessórias, que as
partes podem facultativamente adicionar ao negócio, para modificar alguma de
suas consequências naturais. São eles: condição, termo e encargo ou modo.
2- Classificação das obrigações quanto aos elementos acidentais:
a) Obrigação pura e simples: são as que produzem efeitos imediatos, logo
que contraídas, como sucede normalmente nos negócios inter vivos e pode
ocorrer também nos negócios causa mortis. Ex.: pode o doador ou testador
dizer que doa ou deixa determinado bem para certa pessoa, de forma pura e
simples, isto é, sem subordinar os efeitos da liberalidade a qualquer condição ou
termo e sem impor nenhum encargo ao beneficiário.
46
b) Obrigação condicional
c) Obrigação a termo
d) Obrigação com encargo ou modal
3- Obrigação Condicional:
a) Conceito:
São condicionais as obrigações cujos efeitos estiverem subordinados ao
implemento de condição; só produzirá efeitos dependendo de evento futuro e
incerto, que poderá ou não ocorrer.
b) Suspensiva:
Condição suspensiva é aquela que subordina os efeitos do ato jurídico a
seu implemento.
Antes do implemento da obrigação que está sob condição suspensiva, o
credor possui um direito eventual. Não existe a obrigação, não podendo o
credor exigir seu cumprimento, enquanto não ocorrer o implemento. Frustrada a
condição, por outro lado, a obrigação deixa de existir. Aqui reside a maior
distinção com as obrigações a termo, pois nestas o direito existe desde logo.
Destarte, não tendo ocorrido o evento e tendo o devedor cumprido a
obrigação, assiste-lhe o direito de repetição, porque se trata de pagamento
indevido (art. 876).
O direito eventual tem como característica principal o fato de seu titular
poder exercer os meios assecuratórios para conservá-lo (art. 130, do CC).
Assim, se alguém promete entregar coisa sob condição suspensiva e, pendente
esta, enquanto não ocorre o evento, abandona a coisa, sujeitando-se à
47
deterioração, pode o credor, p. ex., pedir caução ou pleitear para si o depósito
da coisa.
A morte do credor ou do devedor, antes de ocorrido o evento suspensivo,
em nada modifica a situação jurídica criada pelo negócio condicional, a menos
que se trate de fato personalíssimo da parte falecida, porque o cumprimento se
torna impossível.
Não se esqueça, porém, que sempre que a parte impede que o faro se
realize, a condição se tem por cumprida e se torna exigível a obrigação (art.
129). Da mesma forma, o mesmo artigo considera não verificada a condição
maliciosamente levada a efeito por aquele a quem aproveita seu implemento.
O alienante da coisa fixada sob condição suspensiva conserva a
propriedade e gozo da coisa enquanto não ocorrer o implemento. A coisa
continua consigo por sua conta e risco; se a coisa perece, perece para ele, não
tendo, pois, o alienante direito de exigir o cumprimento da obrigação da outra
parte, já que não há objeto. Por conseguinte, se o adquirente já houvera pago
em parte o preço, com o perecimento da coisa pode pedir a devolução ao
alienante, com perdas e danos caso tenha havido culpa por parte deste último.
Ocorrendo o implemento da condição, imediatamente é exigível a
obrigação (art. 332). Cabe ao credor provar que o devedor teve ciência do
evento.
Art. 332. As obrigações condicionais cumprem-se na data do implemento da condição, cabendo ao credor a prova de que deste teve ciência o devedor.
c) Resolutiva:
Condição resolutiva é aquela que extingue os efeitos da obrigação com o
implemento da condição.
No tocante às condições resolutivas, como o direito se adquire de plano,
tal aquisição não se diferencia das obrigações puras e simples. Como
48
consequência, tendo o adquirente a posse da coisa objeto da obrigação, tem ele
o poder de disposição e o gozo, se diverso não resultar do negócio. Se a coisa
perece, o possuidor suporta a perda, nada podendo exigir da outra parte na
relação obrigacional.
A condição resolutória não proíbe a disposição da coisa para terceiro e,
tendo isso ocorrido, e não sendo possível ir buscar a coisa com quem se
encontre, só resta a resolução em perdas e danos. Na verdade, na condição
resolutiva, o vínculo alcança terceiros, que adquirem uma propriedade
resolúvel. O implemento da condição resolutiva, na realidade, invalida o
vínculo. Quando se trata de imóveis, deve a resolução constar de registro, para
que os terceiros não possam alegar ignorância.
Com o implemento da condição resolutiva, deve o possuidor entregar a
coisa com seus acessórios naturais. A questão das benfeitorias, se não constar
da avença, rege-se por seus princípios legais.
As diminuições ocorridas com a coisa, quando da entrega, deverão ser
indenizadas pelo possuidor apenas se agiu com culpa.
Na condição resolutiva, quando se frustra o implemento, a obrigação que
já era tratada como pura e simples assim permanecerá.
4- Obrigação a Termo:
• São obrigações cujo início ou fim vêm determinados, precisados no
tempo. Quase todos os negócios jurídicos admitem a fixação de um lapso
temporal para o cumprimento, salvo exceções principalmente sediadas no
direito de família (casamento, reconhecimento de filiação etc.).
• O termo, que depende do tempo, é inexorável. No termo, o direito é
futuro e certo, mas diferido, já que não impede a aquisição do direito, cuja
eficácia fica apenas em suspenso.
49
• O termo, uma vez aposto à obrigação, indica o momento em que sua
exigibilidade se inicia ou se extingue:
a) termo inicial (dies a quo): indica o momento do início. Segundo o art.
131, pendente o termo, pode o beneficiário usar de todos os meios
acautelatórios para a preservação de seus direitos. Além disso, dada a
semelhança, o art. 135 determina que, ao termo inicial, aplique-se o disposto à
condição suspensiva.
b) termo final (dies ad quem): indica o momento que deve cessar o
exercício do direito. O art. 135 determina que, ao termo final, aplique-se o
disposto à condição resolutiva.
• Pelo termo protela-se a aquisição dos direitos (termo suspensivo),
ou limitam-se seu exercício a determinado prazo (termo resolutivo).
• Prazo é o intervalo entre o termo inicial e o termo final. Os termos
estão, pois, nas extremidades dos prazos.
Art. 132. Salvo disposição legal ou convencional em contrário, computam-se os prazos, excluído o dia do começo, e incluído o do vencimento.
§ 1o Se o dia do vencimento cair em feriado, considerar-se-á prorrogado o prazo até o seguinte dia útil.
§ 2o Meado considera-se, em qualquer mês, o seu décimo quinto dia.
§ 3o Os prazos de meses e anos expiram no dia de igual número do de início, ou no imediato, se faltar exata correspondência.
§ 4o Os prazos fixados por hora contar-se-ão de minuto a minuto.
Art. 133. Nos testamentos, presume-se o prazo em favor do herdeiro, e, nos contratos, em proveito do devedor, salvo, quanto a esses, se do teor do instrumento, ou das circunstâncias, resultar que se estabeleceu a benefício do credor, ou de ambos os contratantes.
Art. 134. Os negócios jurídicos entre vivos, sem prazo, são exeqüíveis desde logo, salvo se a execução tiver de ser feita em lugar diverso ou depender de tempo.
50
• O termo é sempre inexorável. O prazo é que pode ser certo ou
incerto, como uma data exata ou prontamente fixável no calendário. O termo é
certo, e somente será incerto quando não se souber a data em que se cumprirá a
obrigação.
• Termo final certo: se o devedor descumpre o termo, ele constitui em
mora (inadimplemento culposo). O ordenamento jurídico pátrio acolheu a regra
romana dies interpellat pro homine, segundo a qual, tendo sido fixada data para
o pagamento, o seu descumprimento acarreta automaticamente, sem
necessidade de qualquer providência do credor, a mora do devedor (ex re).
• Termo final incerto: neste caso, é necessário que o devedor seja
notificado pelo credor sobre o fim do prazo, transformando o termo incerto em
certo, para só assim constituí-lo em mora, se não cumprir o prazo conferido.
• Termo essencial: o negócio é “absolutamente fixo”, a falta de
prestação no momento devido é um caso de impossibilidade. Logo, neste caso,
se a obrigação não for cumprida pelo devedor no momento determinado, perde
a utilidade para o credor.
Inadimplemento:
a) Relativo: a obrigação ainda é útil para o credor. Constitui o
devedor em mora.
b) Absoluto: a obrigação não é mais útil para o credor (termo
essencial).
5- Obrigação com Encargo ou Modal:
Obrigação modal é a que se encontra onerada por cláusula acessória, que
impõe um ônus ao beneficiário de determinada relação jurídica.
Ocorre quando o benefício conferido a uma pessoa vier acompanhado de
ônus, ou seja, de um encargo. Evidentemente que esse ônus será menor do que
51
o benefício; do contrário, seria contraprestação, como na compra e venda, por
exemplo. O comprador recebe uma coisa, mas terá a obrigação de realizar
contraprestação equivalente em dinheiro a favor do vendedor. Já o encargo,
característico dos atos jurídicos gratuitos, não será proporcional ao benefício.
Se recebo uma herança com a obrigação de constituir uma escola, o preço da
obra deverá ser bem inferior à herança. Se for igual, seguramente renunciarei a
meus direitos hereditários. Daí que o encargo não pode ser confundido com
contraprestação, característica dos atos jurídicos onerosos. Na verdade, o
encargo visa limitar a vantagem percebida pelo beneficiário.
O encargo se diferencia da condição, pois esta subordina a validade do ato
a seu implemento, e aquele não, apesar de ser exigível. Por exemplo, têm-se a
condição: “Deixo meus bens ao Fulano, se ele construir uma escola”. Se não for
construída tal escola, a herança não será deferida ao Fulano. Já no encargo
(“Deixo meus bens a Fulano, ficando ele obrigado a construir escola”) a
herança irá para o Fulano de qualquer jeito. Caso, porém, não construa a escola,
será forçado a tanto por qualquer interessado ou pelo Ministério Público. Se, de
qualquer forma, não construir, ser-lhe-ão tomados tantos bens quantos forem
necessários para custear as obras. Só perderia os bens deixados se o testamento,
expressamente, o determinasse: “Deixo meus bens a Fulano, ficando ele
obrigado a construir escola. Caso não construa, perderá os bens em favor de
Beltrano”. Neste caso, estaríamos diante de verdadeira condição, não encargo.
Cabe ressaltar que terceiro beneficiário pode exigir o cumprimento do
encargo, mas não está legitimado a propor ação revocatória. Esta é privativa do
instituidor, podendo os herdeiros apenas prosseguir na ação por ele intentada,
caso venha a falecer depois do ajuizamento. O instituidor também pode
reclamar o cumprimento do encargo. O Ministério Público só poderá fazê-lo
depois da morte do instituidor, se este não o tiver feito e se o encargo foi
imposto no interesse geral.
52
OOOOBRIGAÇÕES DIVISÍVEIS E INDIVISÍVEISBRIGAÇÕES DIVISÍVEIS E INDIVISÍVEISBRIGAÇÕES DIVISÍVEIS E INDIVISÍVEISBRIGAÇÕES DIVISÍVEIS E INDIVISÍVEIS
1- Noções Gerais:
Obrigações Divisíveis são aquelas cujas prestações possibilitam
cumprimento parcial. Por sua vez, Obrigações Indivisíveis são aquelas cujas
prestações somente por inteiro podem ser cumpridas.
O interesse prático dessa divisão é escasso quando o vínculo obrigacional
se estabelece entre um só credor e um só devedor; em tal hipótese, não importa
que a prestação seja divisível ou indivisível; a execução se processa como se
indivisível fora, e ao devedor compete solvê-la por inteiro, de uma só vez, salvo
estipulação em contrário. (Assim como o credor não é obrigado a receber
pagamento fracionado, não deve também subdividir sua pretensão).
Havendo, porém, multiplicidade de credores, ou de devedores, adquire
grande relevo tal modalidade. Se a obrigação é divisível, cada credor só tem
direito a uma parte, podendo reclamá-la, independentemente dos demais
sujeitos. Por seu turno, cada devedor responde exclusivamente pela sua quota,
liberando-se assim com o respectivo pagamento. Indivisível, porém, a obriga-
ção, cada credor pode exigir o cumprimento integral, como cada devedor
responde pela totalidade.
Sendo vários os credores numa só relação, a indivisibilidade é ativa; se de
devedores a pluralidade, diz-se passiva. Observe-se ainda que tal
multiplicidade, seja qual for seu lado, pode ser originária, quando nasce com a
própria obrigação, ou derivada, como no caso de herança.
É de atentar-se, antes de tudo, que todas as coisas, em princípio, podem
ser divididas. Aqui, entretanto, estamos a considerar a divisibilidade e
indivisibilidade no prisma, eminentemente, jurídico.
53
Assim, tem-se que as coisas são divisíveis quando podem e indivisíveis
quando não podem se partir em porções reais e distintas, formando cada qual
um todo perfeito, sem que com isso se altere sua substância, podendo, ainda, a
indivisibilidade resultar, não da própria natureza do objeto, mas da
determinação da lei ou da convenção das partes.
2- Espécies de indivisibilidade:
À luz do art. 88, do CC, podem-se distinguir três espécies de
indivisibilidade: física, legal e contratual.
Na primeira, a indivisibilidade da prestação, e, pois, da obrigação, resulta
da indivisibilidade física, material, da coisa ou fato, que constitui objeto da
mesma obrigação. Ex: a obrigação de entregar um cavalo, a obrigação de exibir
um documento e a obrigação do inquilino de restituir o prédio locado, findo o
contrato de locação.
É a própria natureza da obrigação que a torna indivisível. Mas também
pode ser assim por motivo de ordem econômica, como ocorreria com um
terreno que só pudesse ser edificado se mantivesse íntegra a área original.
Embora o bem comportasse divisão física, economicamente só teria valor
mantendo-se na dimensão original.
Na segunda, a indivisibilidade da prestação, e, portanto, da obrigação,
decorre da lei, posto seja ela naturalmente divisível. É o que acontece,
exemplificativamente, com os fundos de reserva das cooperativas, não
distribuídos entre os associados, ainda no caso de dissolução da sociedade (Lei
n. 5.764, de 16-12-1971, art. 68, VI), com as ações de sociedades anônimas em
relação à pessoa jurídica (Lei n. 6.404, de 15-12-1976, art. 28) e com os direitos
reais de garantia (Cód. Civil, art. 1.420, § 2).
Na terceira, finalmente, a indivisibilidade da prestação, e, pois, da
obrigação, provém da vontade das partes, embora em tese seja materialmente
54
divisível. Sirva de exemplo o contrato de conta corrente, em que os créditos
escriturados se fundem num todo indissolúvel e de que não podem ser
separados. É o caso ainda de dois devedores que se obrigam a entregar, por
inteiro, a coisa prometida. Em regra, quando convencional, a indivisibilidade
vem estabelecida no interesse do credor.
A primeira categoria, acima referida, corresponde à da indivisibilidade
verdadeira e própria; as duas últimas configuram a chamada indivisibilidade
imprópria ou imperfeita.
A tais espécies de indivisibilidade pode-se acrescentar a denominada
judicial, não incluída nas categorias anteriores e que, no entanto, tem sido
reconhecida e proclamada pelos tribunais, como sucede com a obrigação de
indenizar nos acidentes do trabalho e a de responder pela revisão da mesma
indenização. Trata-se, nesses casos, de objeto indivisível por mera ficção.
3- Da indivisibilidade em relação às várias modalidades de obrigações
As obrigações de dar, em regra, são divisíveis: a) quando se trata de
obrigação pecuniária; b) quando se trata de obrigação de dar coisa fungível; c)
quando compreende ela número certo de objetos da mesma espécie, igual ao
dos co-credores, ou dos co-devedores, ou submúltiplo desse número, como se a
obrigação é de dar dez semoventes a duas ou a cinco pessoas; d) quando tenha
por objeto a transferência da propriedade, ou outro direito real, pois é sempre
possível a divisão em partes ideais.
Como se vê, as obrigações de dar são quase todas divisíveis, salvo os
casos em que o objeto da prestação é corpo certo e determinado, seja móvel
(automóvel, animal) ou imóvel (apartamento), pois seu fracionamento
modificará a substância e o valor do objeto.
As obrigações de restituir são geralmente indivisíveis: o comodatário,
obrigado a devolver a coisa emprestada, há de fazê-lo integralmente, não
55
podendo reter uma parte, salvo permissão do comodante. Da mesma forma, nos
contratos de mútuo e de depósito. Numa retomada para uso próprio, o inquilino
vencido não pode reter a parte comercial do prédio locado, só restituindo a
residencial.
Quanto às obrigações de fazer, cumpre distinguir: serão indivisíveis
quando tiverem por objeto um trabalho completo, dotado de individualidade
própria, como a feitura de uma estátua, o levantamento de uma construção ou a
obrigação de proceder a inventário. Divisíveis serão, contudo, todas as
obrigações em cujo facere ínsita esteja uma idéia de duração do trabalho, ou de
quantidade (por exemplo, plantar dez mil eucaliptos, ou prestar contas de um
período de três anos). Por outras palavras, são divisíveis as obrigações de fazer
cujo objeto se constitua de atos fungíveis; ou então aquelas que se relacionam
com as divisões do tempo.
No tocante às obrigações de não fazer, serão divisíveis aquelas em que o
ato cuja abstenção se promete pode ser satisfeito por partes, e indivisíveis na
hipótese contrária. Veja-se, por exemplo, a obrigação de não demandar; se a
eventual demanda concerne a uma obrigação pecuniária, intrinsecamente
divisível, o non facere é divisível; se diz respeito a uma obrigação indivisível, o
non facere é também indivisível; em tal caso, considera-se violada a obrigação
ainda que o devedor só parcialmente realize o ato cuja abstenção garantira.
Por último, com relação às obrigações alternativas e às obrigações
genéricas, estão elas incluídas entre as obrigações indivisíveis. Até a
concentração, não se sabe exatamente qual a prestação devida de fato, ficando
assim em suspenso o caráter divisível ou indivisível da obrigação.
4- Disposições legais
Ainda que a obrigação tenha por objeto prestação divisível, não pode o
credor ser obrigado a receber, nem o devedor a pagar, por partes, se assim não
56
se ajustou (art. 314). O texto só se refere às obrigações em que haja um só
credor e um só devedor; se houver pluralidade de credores, ou de devedores,
prevalecerão as regras dos artigos seguintes.
Obrigação que tenha por objeto prestação pecuniária é de natureza
divisível, comportando, pois, em tese, execução parcelada. Todavia, o credor
não pode ser compelido a recebê-la por partes, se assim não se ajustou, salvo a
hipótese do art. 22 do Decreto n. 2.044/08 (Dispõe que o portador da letra de
câmbio é obrigado a receber o pagamento parcial, ao tempo do vencimento.
Ressalte-se que o pagamento parcial de uma letra de câmbio não significa
adimplemento da obrigação, porque o portador continua com o direito de levá-
la a protesto por falta de pagamento do remanescente).
Por igual, o devedor não pode ser coagido a solver por partes se não
existe pacto expresso a respeito. Na hipótese do art. 314, é a prestação que, pelo
seu objeto, imprime cunho de divisibilidade ou indivisibilidade à obrigação.
Inexistindo cláusula em contrário, a obrigação é de uma só prestação, embora
divisível seu objeto.
Tenha-se presente que a execução parcial pelo solvens de obrigação
anulável, com ciência do vício que a inquina, importa ratificação (art. 174), com
renúncia de todas as ações, ou exceções, de que dispunha contra o ato (art. 175).
Havendo mais de um devedor ou mais de um credor em obrigação
divisível, esta se presume dividida em tantas obrigações, iguais e distintas,
quantos os credores, ou devedores (art. 257). A dívida pode ter realmente
numerosos sujeitos ativos ou passivos, quer originariamente, quer de modo
derivado (por cessão ou herança). Em tal hipótese, resultarão as seguintes e
importantes consequências jurídicas:
a) cada um dos credores só tem direito de exigir sua fração no crédito;
b) de modo idêntico, cada um dos devedores só tem de pagar a própria
quota no débito (exemplo: art 1.380, do CC);
57
c) se o devedor solver integralmente a dívida a um só dos vários credores,
não se desobrigará com relação aos demais concredores;
d) o credor que recusar o recebimento de sua quota, por pretender solução
integral, pode ser constituído em mora;
e) a insolvência de um dos co-devedores não aumentará a quota dos
demais;
f) a suspensão da prescrição, especial a um dos devedores, não aproveita
aos demais (art. 201);
g) a interrupção da prescrição por um dos credores não beneficia os
outros; operada contra um dos devedores, não prejudica os demais (art. 204).
Indivisível a obrigação, advirão estas consequências havendo pluralidade
de partes:
a) cada um dos credores pode exigir a dívida por inteiro;
b) cada um dos devedores responde integralmente pela dívida;
c) o devedor que paga integralmente o débito a um dos vários credores
desonerar-se-á em relação aos demais;
d) o credor não pode recusar o pagamento por inteiro, sob pena de ser
constituído em mora;
e) sendo indivisível a obrigação, a prescrição aproveita a todos os
devedores, desde que em favor de um venha a ser reconhecida;
f) sua suspensão ou interrupção aproveita ou prejudica todos;
g) a nulidade quanto a um dos interessados se estende a todos.
A obrigação ainda é indivisível quando a prestação tem por objeto uma
coisa ou um fato não suscetíveis de divisão, por sua natureza, por motivo de
ordem econômica, ou dada a razão determinante do negócio jurídico (art. 258).
58
Assim, a indivisibilidade não decorre apenas da natureza da prestação ou
da lei, mas também por motivo de ordem econômica.
Efetivamente, por força do disposto no art. 259, "se, havendo dois ou
mais devedores, a prestação não for divisível, cada um será obrigado pela
dívida toda". Uma vez que a obrigação é indivisível, cada um dos devedores
responde pela totalidade, como acontece na solidariedade. Aliás, os credores de
prestação indivisível deverão considerar-se credores solidários, enquanto
subsistir a indivisibilidade.
Dispõe ainda o parágrafo único do art. 259 que "o devedor, que paga a
dívida, sub-roga-se no direito do credor em relação aos outros coobrigados". Aí
está uma das aplicações do art. 346, n. III: a sub-rogação opera-se, de pleno
direito, em favor do interessado, que paga a dívida pela qual era ou podia ser
obrigado, no todo ou em parte. O devedor, demandado por obrigação
indivisível, não pode exigir que o credor acione conjuntamente todos os co-
devedores; qualquer deles, à escolha do autor, pode ser demandado
isoladamente pela dívida inteira. Nessa faculdade reside, precisamente, a função
prática da indivisibilidade, que constitui a salvaguarda da unidade do objeto, ou
da prestação, no que concerne ao implemento da obrigação. Ressalva-se apenas
ao devedor que solve sozinho o débito por inteiro sub-rogação dos direitos
creditórios, a fim de reaver dos consortes, liberados quanto ao primitivo credor,
as quotas respectivas.
Se a pluralidade for dos credores, poderá cada um destes exigir a dívida
inteira. Mas o devedor ou devedores se desobrigarão, pagando: I - a todos
conjuntamente; II - a um, dando este caução de ratificação dos outros credores
(art. 260).
Sendo vários os credores, pode qualquer deles reclamar a dívida inteira. O
devedor só se desobrigará pagando a todos conjuntamente, ou a um deles
apenas, desde que autorizado pelos demais. Faltando essa autorização, só
59
deverá pagar se aquele que demanda o pagamento der caução de ratificação dos
outros credores. Eis aí, sem dúvida, outro traço distintivo com referência à
solidariedade, pois, quanto a esta, como se verá, pagamento feito a um dos
credores libera o devedor, independentemente da prestação de caução.
Se um só dos credores receber a prestação por inteiro, a cada um dos
outros assistirá o direito de exigir dele em dinheiro a parte que lhe caiba no total
(art. 261).
Aplicável será esse dispositivo sempre que entre os co-credores inexista
estipulação particular disciplinadora de suas mútuas relações internas. Em tal
hipótese, ausente a disposição, quer a lei que o credor beneficiado pelo
recebimento total reembolse os demais pelo valor de suas quotas. Se tal
reembolso não puder ser efetuado in natura, em virtude da natureza da
prestação, far-se-á em dinheiro, por estimação.
Na falta de estipulação em contrário, presumem-se iguais as quotas dos
credores e dos devedores, na indivisibilidade ativa e na indivisibilidade passiva.
Se um dos credores remitir a dívida, a obrigação não ficará extinta para
com os outros; mas estes só a poderão exigir descontada a quota do credor
remitente (art. 262). Exemplo: o objeto da obrigação é dar um cavalo. Dos três
credores, um remite a dívida. Os outros dois exigem pagamento, que só de um
modo poderá ser feito: entregando o devedor o cavalo devido. Mas os credores
se locupletariam com o alheio se não indenizassem o devedor da parte
correspondente ao credor que perdoou a dívida. Essa parte deve, portanto, ser
oportunamente descontada.
Acrescenta o parágrafo único do art. 262 que "o mesmo critério se
observará no caso de transação, novação, compensação ou confusão".
Transação é contrato pelo qual, mediante concessões recíprocas, se
previne ou termina uma lide. Se um dos credores, em obrigação indivisível,
transige com o devedor, faz extinguir entre ambos a relação obrigacional. Mas,
60
como o ato não aproveita nem prejudica senão aos que nele tomaram parte,
ainda que diga respeito a coisa indivisível, segue-se que os demais credores
inibidos não ficam de cobrar do devedor comum, de-duzindo-se, obviamente,
em tempo oportuno, a quota que pertenceria ao credor transigente.
Novação, por seu turno, é a conversão de uma dívida em outra, tomando
esta o lugar daquela, que fica extinta. Celebrada, por conseguinte, entre um dos
credores e o devedor comum, extingue-se a dívida deste, não pelo total,
naturalmente, mas pela sua quota, podendo, assim, os demais credores, a
qualquer tempo, reclamar as parcelas a que têm direito.
O mesmo acontece ainda com a compensação e a confusão, a que se
aplicam, mutatis mutandis, todas as considerações feitas com relação aos outros
modos indiretos de extinção das obrigações.
Por último, preceitua o art. 263 que "perde a qualidade de indivisível a
obrigação que se resolver em perdas e danos". A obrigação que se resolve em
perdas e danos vem a ser representada por somas em dinheiro, que, por sua
natureza, são divisíveis.
Acrescenta o § 1- que "se, para efeito do disposto neste artigo, houver
culpa de todos os devedores, responderão todos por partes iguais". Sofrem
todos, portanto, as conseqüências da mora coletiva.
Remata o § 2-, estabelecendo que, "se for de um só a culpa, ficarão
exonerados os outros, respondendo só esse pelas perdas e danos". Em se
tratando de obrigação divisível, a mora será forçosamente individual.
Caracterizar-se-á, destarte, com relação a cada devedor, ou a cada credor,
isoladamente, sem que o atraso de um induza culpa de outro. Como se vê, trata-
se de hipótese muito simples e que não comporta qualquer problema.
Já no tocante à obrigação indivisível, o pagamento deve ser oferecido a
todos conjuntamente, ou a um deles apenas, se ele der caução de ratificação dos
demais. No primeiro caso, se um deles se recusa a receber, claro é que sua
61
negativa não induz mora dos demais. Só o culpado responderá pelas perdas e
danos.
Art. 257. Havendo mais de um devedor ou mais de um credor em obrigação divisível, esta presume-se dividida em tantas obrigações, iguais e distintas, quantos os credores ou devedores.
Art. 258. A obrigação é indivisível quando a prestação tem por objeto uma coisa ou um fato não suscetíveis de divisão, por sua natureza, por motivo de ordem econômica, ou dada a razão determinante do negócio jurídico.
Art. 259. Se, havendo dois ou mais devedores, a prestação não for divisível, cada um será obrigado pela dívida toda.
Parágrafo único. O devedor, que paga a dívida, sub-roga-se no direito do credor em relação aos outros coobrigados.
Art. 260. Se a pluralidade for dos credores, poderá cada um destes exigir a dívida inteira; mas o devedor ou devedores se desobrigarão, pagando:
I - a todos conjuntamente;
II - a um, dando este caução de ratificação dos outros credores.
Art. 261. Se um só dos credores receber a prestação por inteiro, a cada um dos outros assistirá o direito de exigir dele em dinheiro a parte que lhe caiba no total.
Art. 262. Se um dos credores remitir a dívida, a obrigação não ficará extinta para com os outros; mas estes só a poderão exigir, descontada a quota do credor remitente.
Parágrafo único. O mesmo critério se observará no caso de transação, novação, compensação ou confusão.
Art. 263. Perde a qualidade de indivisível a obrigação que se resolver em perdas e danos.
§ 1o Se, para efeito do disposto neste artigo, houver culpa de todos os devedores, responderão todos por partes iguais.
§ 2o Se for de um só a culpa, ficarão exonerados os outros, respondendo só esse pelas perdas e danos.
62
OOOOBRIGAÇÕES SOLIDÁRIASBRIGAÇÕES SOLIDÁRIASBRIGAÇÕES SOLIDÁRIASBRIGAÇÕES SOLIDÁRIAS
1- Conceito
A solidariedade na obrigação é um artifício técnico para reforçar o
vínculo, facilitando o cumprimento ou a solução da dívida.
A obrigação é solidária quando a totalidade de seu objeto pode ser
reclamada por qualquer dos credores ou qualquer dos devedores.
Assim, pode ocorrer a solidariedade de credores (ativa) e a solidariedade
de devedores (passiva), que é a mais útil e mais comum.
O efeito fundamental é o mesmo das obrigações indivisíveis, mas nesse
caso a possibilidade de reclamar a totalidade não deriva da natureza da
prestação, mas da vontade das partes ou da lei. De fato, a solidariedade não se
presume, resultando da lei ou da vontade das partes (art.265).
"Há solidariedade quando na mesma obrigação concorre mais de um
credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado à dívida
toda" (art. 264).
Destarte, a solidariedade é modalidade especial de obrigação que possui
dois ou mais sujeitos, ativos ou passivos, e, embora possa ser divisível, pode
cada credor demandar e cada devedor é obrigado a satisfazer a totalidade, com a
particularidade de que o pagamento feito por um devedor a um credor extingue
a obrigação quanto aos outros coobrigados.
2- Obrigações in Solidum
De acordo com nosso ordenamento, a solidariedade uma só.
63
No entanto, é inafastável o fato de existirem situações em que vários
agentes aparecem devendo a totalidade, sem serem solidários.
Exemplos:
1- Um motorista particular atropela e fere um pedestre, agindo com culpa.
No evento, surge dupla responsabilidade: a do condutor do veículo e a
de seu proprietário, que responde por culpa indireta. Ambos estarão
obrigados pela totalidade da indenização. O credor tem o direito de
acionar qualquer obrigado indistintamente.
2- Suponhamos um caso de incêndio de uma propriedade segurada,
causada por culpa de um terceiro. Tanto a seguradora, como o autor do
incêndio, devem à vítima a indenização pelo prejuízo; a seguradora no
limite do contrato, e o agente, pela totalidade. A vítima pode reclamar
a indenização de qualquer um deles, indistintamente, e o pagamento
efetuado por um libera o outro devedor. Contudo, não existe
solidariedade entre os devedores porque não existe uma causa comum,
uma origem comum na obrigação.
No caso do acidente de veículo, a responsabilidade do motorista funda-se
em sua culpa; a responsabilidade do dono do automóvel resulta exatamente de
sua condição de proprietário, independentemente da perquirição de culpa.
No caso do incêndio, a responsabilidade da companhia seguradora tem
como fonte um contrato, enquanto a responsabilidade do incendiário decorre
dos princípios do art. 186 do Código Civil: o ato ilícito.
Desse modo, temos as obrigações in solidum, nas quais os liames que
unem os devedores ao credor são totalmente independentes, embora ligados
pelo mesmo fato. Assim sendo, como conseqüência, a prescrição referente aos
devedores é independente; a interpelação feita a um dos devedores não constitui
64
em mora os outros; a remissão da dívida feita em favor de um dos credores não
beneficia os outros.
Todavia deve ser lembrado que, enquanto a dívida solidária é suportada
por igual por todos os devedores, pode ocorrer nas obrigações in solidum que os
devedores não sejam responsáveis, todos, pelo mesmo valor. No caso da
companhia seguradora, por exemplo, o valor segurado pode ser inferior aos
danos. O incendiário será responsável pelo valor integral do dano, mas a
seguradora responde até o limite fixado no contrato.
3- Características e Fundamento da Solidariedade
A obrigação solidária é relação obrigatória unitária, compreensiva do
credor e de todos os devedores solidários, que encerra uma pluralidade de
créditos, do credor contra cada um dos devedores solidários (ou com maior
razão, quando a solidariedade for ativa). Cada uma das relações entre o lado
ativo e o lado passivo pode desenvolver-se até certo grau, com certa
independência com as demais. No entanto, todas essas relações obrigatórias
permanecem unidas entre si por meio da unidade finalística da prestação, cuja
realização alcança sua finalidade de conformidade com a avença, incluindo-se,
assim, todas as relações obrigatórias singulares.
Portanto, ressaltam-se, de plano, duas importantes características: a
unidade da prestação (qualquer que seja o número de credores ou devedores, o
débito é sempre único) e a pluralidade e independência do vínculo.
Sobre esse último aspecto, enfatize-se, mais uma vez, que a unidade de
prestação não impede que o vínculo que une credores e devedores seja distinto
e independente. Tal independência no vínculo dá margem a algumas
consequências:
65
a) a obrigação pode ser pura e simples para algum dos devedores e pode
estar sujeita à condição, ao prazo ou ao encargo para outros (art. 266);
b) se uma obrigação é nula porque um dos credores é incapaz, por
exemplo, conserva sua validade quanto aos demais;
c) um dos devedores pode ser exonerado de sua parte da dívida,
permanecendo a obrigação para com os demais. Contudo, não devemos ver uma
independência total de vínculos, caso em que haveria somente uma obrigação
composta ou mancomunada, e nunca solidariedade.
Fala-se, também, que a obrigação solidária tem uma unidade de causa,
pois caso contrário, encontrar-se-ia perante uma obrigação in solidum e não
perante uma obrigação solidária.
Como consequência dessas características, elementarmente, portanto, as
obrigações solidárias têm uma pluralidade de credores ou de devedores e uma
co-responsabilidade entre os interessados. Como consequência dessa última
característica, por conseguinte, o que solve a dívida pode reaver dos demais a
quota-parte de cada um na obrigação. Do lado da solidariedade ativa, da mesma
forma, o recebimento por parte de um dos credores extingue o direito dos
demais. Todavia, o que recebe deve entregar aos demais credores o que cada
um tem direito.
O que deve ficar bem claro, desde o princípio, mormente na solidariedade
passiva, é que as relações internas do vínculo entre os vários devedores é
absolutamente irrelevante para o credor. Após um dos devedores ter solvido a
dívida é que ele vai entender-se com os demais companheiros do lado passivo.
Assim é que um dos devedores solidários pode ter se obrigado por mera
liberalidade, em razão de um negócio de sociedade, porque tinha direitos para
com o credor etc. Todas essas relações são irrelevantes para o credor.
Portanto, sob o aspecto externo, todos os devedores e todos os credores
solidários estão em pé de igualdade.
66
Logo, percebe-se claramente que a finalidade da solidariedade passiva
(que é a mais comum) tem em mira assegurar a solvência, reforçar o vínculo. O
credor passa a uma situação de maior garantia, pelo simples fato de poder exigir
de qualquer devedor o cumprimento de toda a obrigação. Ainda, facilita a
cobrança por parte do credor, que no caso de inadimplemento não fica obrigado
a mover uma ação contra todos os devedores (o que não poderia ocorrer se a
obrigação fosse simplesmente mancomunada).
Do lado da solidariedade ativa, embora sua utilização seja restrita, os
credores têm a vantagem de que qualquer um deles pode atuar no recebimento
do crédito, demandando o pagamento integral. Há um poder recíproco que
facilita o recebimento.
4- Fontes da Solidariedade
Dispõe o art. 265: "A solidariedade não se presume; resulta da lei ou da
vontade das partes."
A obrigação solidária possui um verdadeiro caráter de exceção dentro do
sistema, não se admitindo responsabilidade solidária fora da lei ou do contrato.
Assim sendo, não havendo expressa menção no título constitutivo e não
havendo previsão legal, prevalece a presunção contrária à solidariedade. Não
estando presente o instituto, a obrigação divide-se, cada devedor sendo
obrigado apenas a uma quota-parte, ou cada credor tendo direito a apenas uma
parte.
Na dúvida, interpreta-se a favor dos devedores, isto é, pela inexistência de
solidariedade. No entanto, uma vez fixada a solidariedade, não se ampliam as
obrigações.
A solidariedade, portanto, não pode decorrer da sentença, como à
primeira vista em alguns casos pode parecer. O juiz, na verdade, não faz senão
67
por declarar o direito das partes e não pode condenar solidariamente os réus se a
solidariedade já não preexiste num contrato ou na lei. Contudo, não é sem
frequência que surge, na sentença, uma obrigação in solidum. No anterior
exemplo do incêndio, se o autor move a ação contra a companhia seguradora e
contra o autor do dano, surgirá essa forma de condenação.
Há necessidade, então, que a solidariedade seja expressa. Não precisa,
contudo, de palavras sacramentais, bastando que fique clara a vontade de se
obrigar solidariamente.
Como não existe presunção de solidariedade, quem a alega tem que
provar. Provindo da lei, não há necessidade de prova.
Não há dúvida, no entanto, de que a solidariedade pode ser provada por
testemunhas, quando o valor do contrato o permitir (ver art. 401 do CPC e art.
227 do CC). Meras presunções e indícios podem reforçar a prova da
solidariedade, mas não a induzem.
5- Solidariedade Ativa
A solidariedade ativa é a que contém mais de um credor, todos podendo
cobrar a dívida por inteiro.
Sua importância prática é escassa, pois não tem outra utilidade a não ser
servir como mandato para recebimento de um crédito comum, efeito que se
pode obter com o mandato típico. Nossa lei não contém exemplos de
solidariedade ativa. Logo, os exemplos de solidariedade ativa devem decorrer
da manifestação de vontade, do contrato ou testamento.
A matéria vem regulada no Código Civil em seus arts. 267 a 274.
A vantagem dessa modalidade é a de que qualquer credor pode exigir a
totalidade de dívida, sem depender da aquiescência dos demais credores (art.
68
267) e cada devedor (ou o devedor, se for um só) poderá se liberar da obrigação
pagando a prestação a qualquer um dos credores (art. 269).
O grande inconveniente da solidariedade ativa, o que certamente é causa
de seu desuso, é o fato de que qualquer credor, recebendo a dívida toda, exonera
o devedor, tendo então os demais credores que se entenderem com o credor que
deu quitação.
5.1- Efeitos da solidariedade ativa
1. Cada credor pode reclamar de qualquer dos devedores (ou do devedor)
a dívida por inteiro (art. 267), não podendo, assim, o devedor pretender pagar
parcialmente, sob a alegação de que há outros credores.
2. O pagamento feito a um dos credores, a compensação, a novação e a
remissão da dívida feita por um dos credores a qualquer dos devedores extingue
também a obrigação (art. 269).
No entanto, o direito livre de pagar dos devedores sofre uma limitação de
ordem processual: se um dos credores já acionou o devedor, este só poderá
pagar àquele em juízo ou em razão dele.
Complementando o art. 269, parágrafo único, diz o art. 272: "O credor
que tiver remitido a dívida ou recebido o pagamento responderá aos outros pela
parte que lhes caiba."
Assim, pode o credor remitir, isto é, abrir mão da cobrança da dívida,
perdoá-la, mas não poderá, com essa atitude, prejudicar os demais credores,
devendo pagar-lhes a parte devida.
3. A constituição em mora feita por um dos co-credores favorece a todos
os demais.
4. A interrupção da prescrição por um dos credores beneficia os demais
(art. 204, § 1°). Já a suspensão da prescrição em favor de um dos credores
69
solidários só aproveitará aos outros se o objeto da obrigação for indivisível (art.
201). A renúncia da prescrição em face de um dos credores aproveitará aos
demais.
5. Qualquer credor poderá propor ação para a cobrança de crédito. Outro
credor poderá ingressar na ação na condição de assistente (art. 54 do CPC).
6. A incapacidade de um dos credores não obsta que a obrigação
mantenha seu caráter solidário a respeito dos demais.
7. Enquanto não for cobrada a dívida por algum credor, o devedor pode
pagar a qualquer um dos credores (art. 268). Havendo demanda haverá
prevenção judicial e o devedor só poderá pagar em juízo.
8. A constituição em mora do credor solidário, pela oferta de pagamento
feita pelo devedor comum, prejudicará a todos os demais, que passarão a
responder, todos, pelos juros, riscos e deteriorações da coisa.
9. Na forma do art. 270: "Se falecer um dos credores solidários, deixando
herdeiros, cada um destes só terá direito a exigir e receber a quota do crédito
que corresponder ao seu quinhão hereditário, salvo se a obrigação for
indivisível."
Assim, nessa hipótese, desaparece a solidariedade para os herdeiros. Os
demais credores continuarão solidários.
10. A conversão da prestação em perdas e danos não faz desaparecer a
solidariedade, correndo em proveito de todos os credores os juros de mora (art.
271).
11. A relação interna, a natureza do débito e a quota de cada credor no
débito é irrelevante para o devedor (trata-se de relação interna entre os
credores), e o credor que receber deve prestar contas aos demais, pela parte que
lhes caiba (art. 272). Os demais credores terão ação regressiva contra os
accipiens, de acordo com o título de cada um. É claro que, se a solidariedade
70
ativa foi estabelecida apenas para outorgar um poder a outros para receber,
haverá um único interessado no negócio, que terá direito à totalidade do crédito.
5.2- Extinção da solidariedade ativa
A solidariedade ativa não termina apenas pelo pagamento a qualquer dos
credores. Pode ocorrer por novação (conversão de uma dívida em outra,
extinguindo-se a primeira (arts. 360 a 367); compensação (que é um encontro
de dívidas, uma extinção recíproca de obrigações (arts. 368 a 380) e remissão
(em última análise, o perdão da dívida, arts. 385 a 388).
O pagamento por consignação (arts. 334 a 345) também libera o devedor,
mesmo quando efetuado a apenas um dos credores.
Igualmente, a confusão que se configura por ocorrer na mesma pessoa as
qualidades de credor e devedor (arts. 381 a 384); e a transação que se
caracteriza pela extinção do débito mediante concessões recíprocas (arts. 840 a
850) extinguem os débitos. Quando há confusão, os credores que dela
participam não podem prejudicar os credores estranhos a essa forma de
extinção, devendo receber suas quotas-partes, assim como na transação, por
aplicação do princípio do art. 272.
6- Solidariedade Passiva
Solidariedade passiva é aquela que obriga todos os devedores ao
pagamento total da dívida.
É muito grande sua importância na vida negocial por se tratar de meio
muito eficiente de garantia, de reforço do vínculo, facilitando o adimplemento.
Para que o credor fique insatisfeito é necessário que todos os devedores fiquem
insolventes, uma vez que pode acionar qualquer um deles pela dívida toda.
71
Desde que presente a solidariedade, fica facilitada a conduta do credor. Sua
aplicação, portanto, é infinitamente maior do que a solidariedade ativa.
Externamente todos os devedores são coobrigados na solidariedade
passiva. Internamente, cada devedor poderá ser responsável por valores
desiguais na obrigação ou, até mesmo, ter unicamente a responsabilidade, sem
que haja débito, como é o caso da fiança com equiparação solidária.
6.1- Principais efeitos da obrigação solidária
1. Direito individual de persecução. Cada credor (se for mais de um) tem
direito de reclamar de qualquer dos devedores a totalidade da dívida (art. 275).
Não é aconselhável, no entanto, que o credor demande a mais de um devedor
em processos diversos, concomitantemente, pois processualmente é
inconveniente. Poderão ocorrer decisões contraditórias e não é isso que busca o
sistema. Deverão, portanto, ser reunidas as ações para um julgamento conjunto.
Nesse mesmo diapasão, o Código aponta, no parágrafo único do art. 275,
uma das regras fundamentais da solidariedade: "Não importará renúncia da
solidariedade a propositura de ação pelo credor contra um ou alguns dos
devedores."
O pagamento parcial também pode ser efetuado, assim como a remissão.
Segundo o art. 277: "O pagamento parcial feito por um dos devedores e a
remissão por ele obtida não aproveitam aos outros devedores, senão até à
concorrência da quantia paga, ou relevada."
2. A morte de um dos devedores solidários não extingue a solidariedade.
Dispõe o art. 276: "Se um dos devedores solidários falecer deixando herdeiros,
nenhum destes será obrigado a pagar senão a quota que corresponder ao seu
quinhão hereditário, salvo se a obrigação for indivisível; mas todos reunidos
72
serão considerados como um devedor solidário em relação aos demais
devedores."
Tal se deve pelo fato de que os herdeiros respondem pelos débitos do de
cujus, desde que não ultrapassem as forças de herança (princípio do benefício
do inventário). Cada herdeiro fica responsável por sua quota na parte do
falecido, a menos que a obrigação seja indivisível, caso em que se mantém a
solidariedade por impossibilidade material. Existe uma relação íntima do
art.276 com o art. 270, que diz respeito à solidariedade ativa.
3. De acordo com o art. 278: "Qualquer cláusula, condição, ou obrigação
adicional, estipulada entre um dos devedores solidários e o credor, não poderá
agravar a posição dos outros, sem consentimento destes."
O princípio geral é que ninguém pode ser obrigado a mais do que desejou,
a não ser que concorde expressamente. Os atos descritos nesse artigo alteram a
relação obrigacional, prejudicando os devedores solidários. Poderão apenas
obrigar o devedor que estipulou tais cláusulas, sem aquiescência dos demais.
4. Culpa. Se a obrigação se extinguir sem culpa dos devedores, o
princípio geral já estudado é que extinguirá a dívida para todos. Porém, pode
ocorrer que haja culpa de algum dos devedores.
Art. 279: "Tornando-se inexeqüível a prestação por culpa de um dos
devedores solidários, subsiste para todos o encargo de pagar o equivalente; mas
pelas perdas e danos só responde o culpado."
Portanto, a “apenação” de perdas e danos só será carreada ao culpado.
Igual solução ocorrerá se a impossibilidade da prestação se deu quando o
devedor já estava em mora. Este responderá pelos riscos, mesmo que tenha
havido caso fortuito ou força maior (ver art. 399). A tal propósito acrescenta o
art. 280: "Todos os devedores respondem pelos juros de mora ainda que a ação
tenha sido proposta somente contra um; mas o culpado responde aos outros pela
obrigação acrescida."
73
5. Exceções pessoais e exceções gerais.
Art. 281: "O devedor demandado pode opor ao credor as exceções que lhe
forem pessoais e as comuns a todos; não lhe aproveitando, porém, as pessoais a
outro co-devedor."
O terno exceção significa forma e meio de defesa.
Na obrigação solidária, embora haja uma única prestação devida, há
multiplicidade de vínculos motivada pela existência de mais de uma pessoa no
pólo passivo ou no pólo ativo. De acordo com o dispositivo estudado, tudo que
disser, respeito à própria obrigação pode ser alegado por qualquer devedor
demandado. Situações tais como inexistência da obrigação, quitação, ilicitude
da obrigação, ausência de forma prescrita, prescrição, extinção da obrigação,
tudo isso fere diretamente a obrigação, ficando qualquer devedor intitulado para
sua alegação, pois esses fenômenos colhem a obrigação em si, e não os diversos
vínculos. Essas exceções, por isso, são denominadas comuns ou reais, e que nós
preferimos denominar gerais, porque possibilitam a qualquer coobrigado alegá-
las.
Porém, como essa obrigação é subjetivamente complexa, podem existir
meios de defesa, exceções, particulares e próprias só a um (ou alguns) dos
devedores. Aí, então, só o devedor exclusivamente atingido por tal exceção é
que poderá alegá-la. São as exceções pessoais, que não atingem nem
contaminam o vínculo dos demais devedores. Assim, um devedor que se tenha
obrigado por erro, só poderá alegar este vício de vontade em sua defesa. Os
outros devedores, que se obrigaram sem qualquer vício, não podem alegar em
sua defesa a anulabilidade da obrigação, porque o outro coobrigado laborou em
erro. Destarte, cada devedor pode opor em sua defesa, nas obrigações solidárias,
as exceções gerais (todos coobrigados podem fazê-lo), bem como as exceções
que lhe são próprias, as pessoais. Assim, não pode o coobrigado, que se
74
comprometeu livre e espontaneamente, tentar invalidar a obrigação porque
outro devedor entrou na solidariedade sob coação.
Em apertada síntese, pode-se dizer que as exceções pessoais são meios de
defesa que podem ser opostos por um ou vários dos co-devedores; exceções
gerais são os meios de defesa que podem ser opostos por todos os co-devedores
da obrigação solidária. Como se vê da dicção do art. 278, um devedor solidário,
individualmente, pode obter até mesmo a remissão da dívida, podendo, pois,
atingir benefícios próprios e, na forma do artigo, qualquer cláusula, condição ou
obrigação adicional, não poderá agravar a situação dos demais, sem seu
consentimento.
6.2- Aspectos processuais da solidariedade. A coisa julgada
Pelo fato de o credor poder acionar quer um, quer alguns, quer todos os
devedores, nos termos do art. 275, parágrafo único, há reflexos no processo que
merecem ser vistos.
Quando um devedor solidário é acionado, os demais podem intervir no
processo como assistentes, na figura de assistente qualificado (art. 54 do CPC).
Note-se, porém, que, se a defesa do acionado é por exceção pessoal, a
assistência será simples.
Em relação à eficácia da coisa julgada, quando da ação não participam
todos os devedores solidários, a questão deve ser vista pelo prisma processual.
Muito discutiu a doutrina sobre o problema, mas o fato é que para
existirem os efeitos da coisa julgada deve haver a tríplice identidade (de objeto,
de causa de pedir e de pessoas). Assim sendo, a moderna doutrina inclina-se em
ver efeitos da coisa julgada apenas para os partícipes da ação. O julgado
restringe-se às partes e só elas são atingidas por ele.
75
No entanto, é evidente que o Poder Judiciário, como poder estatal, é uno.
Devem os julgados, sempre que possível, evitar decisões contraditórias, ou
conflitantes, que confundem os que dele se valem, causam instabilidade social e
prejudicam a figura do magistrado. Desse modo, embora não haja comunicação
de coisa julgada, os tribunais devem procurar sempre proferir decisões
homogêneas. Tomando conhecimento de uma decisão, ou de um processo, em
que se discute a mesma obrigação, como é o caso da solidariedade, o julgador
deve buscar uma decisão única, reunindo-se os processos, para decisão
conjunta, sempre que for viável. Quando já existe uma decisão, deve procurar o
julgador decisão que seja homogênea àquela, sem violentar seu convencimento.
6.3- Pagamento parcial
Diz o art. 277: "O pagamento parcial feito por um dos devedores e a
remissão por ele obtida não aproveitam aos outros devedores, senão até à
concorrência da quantia paga, ou relevada."
Entenda-se a razão da regra. Se o credor já recebeu parcialmente a dívida,
não poderá exigir dos demais co-devedores a totalidade, mas apenas abater o
que já recebeu.
O credor pode exigir parcialmente a dívida apenas se desejar, porque a
obrigação não é essa. No entanto, se já foi paga parcialmente, por iniciativa de
um dos devedores e com a concordância do credor, os demais devedores podem
pagar o saldo, não sendo mais obrigados pela dívida toda.
Da mesma forma opera-se com a remissão parcial. Ocorre o contrário do
que sucede na solidariedade ativa (art. 269). Quando o credor perdoa a dívida
em relação a um dos devedores solidários, isso não faz com que a dívida
desapareça com relação aos demais devedores, que permanecem vinculados à
76
solução da dívida, com abatimento daquela parte que foi dispensada pelo
credor.
Se, contudo, a remissão ocorrer totalmente e sem ressalvas, atinge toda a
dívida e todos os devedores.
7- Extinção da Solidariedade
A solidariedade, quer ativa, quer passiva, pode desaparecer, deixando de
existir, portanto, a faculdade ínsita a essa modalidade de obrigação, que é a de o
credor exigir a dívida por inteiro de qualquer coobrigado ou de qualquer credor;
na solidariedade ativa, pode exigir também a dívida toda do devedor.
Na solidariedade ativa, os credores poderão abrir mão da solidariedade, da
mesma forma que a criaram, isto é, convencionalmente: a partir de então, cada
credor só poderá exigir sua quota-parte no crédito. O devedor só deverá pagar a
quota respectiva a cada credor.
Há uma hipótese legal, contudo, na qual o vínculo da solidariedade,
embora não desapareça, fica irregular. É a hipótese do art. 270 do Código Civil:
"Se um dos credores solidários falecer deixando herdeiros, cada um destes só
terá direito a exigir e receber a quota do crédito que corresponder ao seu
quinhão hereditário, salvo se a obrigação for indivisível."
Nesse caso, a solidariedade só desaparece para os herdeiros do falecido
credor, persistindo essa espécie de vínculo para os credores solidários
sobrevivos. Note-se, no entanto, que os herdeiros em questão, em conjunto, são
tratados como o credor falecido; podem todos eles, em conjunto, exigir a dívida
toda.
Como diz a lei, no caso de obrigação indivisível, os herdeiros do credor
falecido podem, qualquer um deles, exigir a dívida por inteiro. Tal decorre da
77
natureza material da prestação e não do vínculo jurídico. Existe impossibilidade
do cumprimento parcelado da obrigação.
No caso de solidariedade passiva, as situações de extinção são mais
frequentes.
Na hipótese de morte de um dos devedores solidários, deixando herdeiros,
"nenhum destes não será obrigado a pagar senão a quota que corresponder ao
seu quinhão hereditário, salvo se a obrigação for indivisível; mas todos reunidos
serão considerados como um devedor solidário em relação aos demais
devedores" (art. 276).
Os herdeiros, portanto, serão responsáveis apenas por sua quota na dívida.
Em conjunto, são considerados um único devedor. Enquanto não houver
partilha, o crédito pode ser exigido do monte-mor. Após a partilha, o credor só
poderá pedir a quota de cada herdeiro na dívida, não podendo os co-herdeiros
ser compelidos a saldar a dívida toda.
Nos termos do art. 282, também a renúncia pode extinguir a
solidariedade: "O credor pode renunciar à solidariedade em favor de um, de
alguns ou de todos os devedores. Parágrafo único. Se o credor exonerar da
solidariedade um ou mais devedores, subsistirá a dos demais."
Entretanto, se houver rateio entre os co-devedores, para reembolso do
devedor que solveu a obrigação, todos contribuirão, mesmo aqueles que tiveram
a dívida remitida (art. 284). Isso porque, se é dado ao credor abrir mão de seu
direito, tal não interfere no relacionamento entre os vários devedores, porque
nesse caso específico haveria agravamento da situação dos devedores em
benefício de um (ou mais de um) deles.
Renunciar é abrir mão de direitos. Todos aqueles plenamente capazes
podem fazê-lo. Deve a renúncia ser cabal. Pode ser expressa, quando o credor
declara que não deseja mais receber o crédito, ou que, no caso, abre mão da
solidariedade. Pode ser tácita, quando na falta de declaração expressa a atitude
78
do credor é incompatível com a continuidade da solidariedade. É o caso, por
exemplo, de o credor receber parcialmente de um devedor e dar-lhe quitação.
Aí o credor demonstra desinteresse em receber a integridade da dívida. O
mesmo ocorre quando o credor demanda judicialmente apenas parte do crédito
a um devedor, ou recebe, reiteradamente, pagamentos parciais, sem qualquer
reserva.
Na prática, são muitos os casos em que pode ocorrer extinção da
solidariedade, ainda que não descritos em lei.
COMPARATIVO ENTRE INDIVISIBILIDADE E COMPARATIVO ENTRE INDIVISIBILIDADE E COMPARATIVO ENTRE INDIVISIBILIDADE E COMPARATIVO ENTRE INDIVISIBILIDADE E
SOLIDARIEDADE:SOLIDARIEDADE:SOLIDARIEDADE:SOLIDARIEDADE:
Ambas têm realmente estreitas afinidades e analogias. Numa e noutra,
cada devedor, ou cada credor, responde por inteiro, ou pode exigir a prestação
integral. Numa e noutra, permanecem os interessados em pé de igualdade:
aquele que paga tem direito de regresso contra os demais; aquele que recebe
responde pelas quotas dos consortes. Por outras palavras, tanto na
indivisibilidade como na solidariedade, existe entre as partes identidade de
efeitos nas suas relações externas.
Mas, se parecidas, não são idênticas. Na solidariedade, o credor pode
exigir de qualquer devedor solidário pagamento integral da prestação, porque
qualquer deles é devedor do total. Na indivisibilidade, o credor pode reclamar
igualmente, de qualquer co-devedor, satisfação integral, não porque o
demandado seja devedor do total exigido (ele só deve parte), mas porque a
prestação, sendo indivisível, não comporta execução fracionada. Assim, na
obrigação solidária os devedores respondem totaliter e nas obrigações
indivisíveis, in totum.
79
Prima a solidariedade, portanto, pela feição subjetiva; ela reside nas
próprias pessoas e advém da lei, ou do título constitutivo da obrigação (arts.
264 e 265).
Caracteriza-se a indivisibilidade pela sua índole objetiva; ela repousa na
própria coisa que constitui objeto da prestação, e resulta, em regra, ex
necessitate, da natureza desta.
Ademais, a obrigação solidária, convertendo-se em perdas e danos,
conserva os atributos inerentes à solidariedade (art. 271); a obrigação
indivisível, com a mesma transformação, vê-se privada da indivisibilidade
primitiva (art. 263). Tais prejuízos, uma vez liquidados, se pagam em dinheiro,
e assim a obrigação, inicialmente indivisível, se converte num dare, de natureza
pecuniária, e, pois, divisível.
Mas não é só: a obrigação solidária, transmitindo-se aos herdeiros, despe-
se dessa característica, no que tange à quota do falecido (art. 270). A
solidariedade extingue-se com a morte. Na obrigação indivisível, ao revés,
subsiste o predicado da indivisibilidade, sem embargo de sua transmissão
hereditária. Por outras palavras, nesta obrigação, o respectivo objeto não se
divide entre os sucessores; antes, mantém-se íntegro, já que por lei, por na-
tureza ou por convenção ele é indivisível. Naquela, ao inverso, fraciona-se o
objeto entre os diversos titulares, uma vez ocorrida a transmissão hereditária.
Insista-se: obrigação solidária, por si só, não é obrigação indivisível; vice-
versa, obrigação indivisível, só por si, não é solidária. Nada impede, todavia, se
reúnam na mesma obrigação as duas qualidades, tornando-se assim,
simultaneamente, solidária indivisível.
80
DO PAGAMENTODO PAGAMENTODO PAGAMENTODO PAGAMENTO
1- Generalidades
Quando nada existe de anormal, de patológico, no cumprimento da
obrigação, extingue-se ela pelo pagamento. O pagamento é, pois, o meio
normal de extinção das obrigações.
O pagamento refere-se à execução voluntária da obrigação ou a entrega
da prestação devida (praestatio vera rei debitae). Aliás, o efeito natural da
obrigação, o escopo para o qual tende esta, é o implemento da prestação.
Na linguagem comum, a palavra pagamento aplica-se mais par-
ticularmente à prestação em dinheiro. Mas, na linguagem técnica, tem o
vocábulo maior amplitude, significando a execução voluntária da obrigação,
não importando a natureza da prestação.
Emprega-se igualmente a palavra solução (do latim solutio), para traduzir
o cumprimento da obrigação.
Os requisitos essenciais para a validade do pagamento são:
a) existência do vínculo obrigacional;
b) intenção de solvê-lo;
c) cumprimento da prestação;
d) pessoa que efetua o pagamento (solvens);
e) pessoa que o recebe (accipiens).
2- Natureza Jurídica do Pagamento:
Quanto à questão relativa à natureza jurídica do pagamento, verifica-se
ser bastante controvertida na doutrina. Para uns, é contrato (ponto de vista
81
dominante); para outros, fato jurídico; para outros ainda, ato não livre, e,
finalmente, segundo alguns, ato devido.
Venosa afirma que, em sentido lato sensu, o pagamento será sempre um
fato jurídico, que é gênero do ato e do negócio jurídico.
3- De Quem Deve Pagar: O Solvens
Essa pessoa pode ser qualquer interessado. Entre os interessados, em
primeiro lugar, encontra-se naturalmente o próprio devedor, que, pagando,
cumpre a prestação a que se obrigara. Trata-se, em tal hipótese, de pagamento
verdadeiro e próprio.
Mas há ainda outros interessados: o fiador, o coobrigado, o herdeiro,
outro credor do devedor e o adquirente do imóvel hipotecado. Qualquer deles
tem legítimo interesse no cumprimento da obrigação; assiste-lhe, pois, o direito
de efetuar o pagamento, sub-rogando-se então em todos os direitos creditórios
(art. 346).
O direito do terceiro interessado em solver a dívida acha-se previsto no
art. 304, segundo o qual "qualquer interessado na extinção da dívida pode pagá-
la, usando, se o credor se opuser, dos meios conducentes à exoneração do
devedor".
Igual direito cabe ao terceiro não interessado, se o fizer em nome e por
conta do devedor, salvo oposição deste (art. 304, parágrafo único).
Quando o Código fala em terceiro não interessado quer aludir àquele que
não tem ligação alguma com o contrato, nada tendo a temer com o não-
pagamento da obrigação, se o devedor se torna impontual ou inadimplente.
Cite-se, p. ex., o caso de um pai que paga a dívida de um filho. Seu interesse
não é jurídico. Faz o pagamento com interesse altruístico, moral. Contudo, paga
em nome e por conta do filho devedor. Não há representação, nem mesmo
82
autorização ou mesmo ciência do devedor. O pagamento, porém, deve ser
aceito. E o solvens, aqui, tem a mesma legitimidade de consignar, se houver
resistência.
Se o terceiro não interessado pagar em seu próprio nome, tem direito a
reembolsar-se do que pagar, mas não se sub-roga nos direitos do credor. Há
direito a uma ação de cobrança singela do que foi pago. Quando é o interessado
que paga, sub-roga-se em todos os direitos do crédito (art. 346). Já, por outro
lado, se é o terceiro não interessado que paga em nome do devedor, como o
caso do pai que paga dívida do filho, o faz por simples liberalidade, ou por
mero espírito de filantropia, nada pode reaver; se o faz, contudo, como gestor
de negócios, terá então ação contra o devedor para reembolsar-se do que pagou.
A questão de saber se o pagamento ocorreu por mera filantropia ou não se
desloca para as circunstâncias do caso. Entende-se que sempre haverá
possibilidade de ação de enriquecimento sem causa, no caso de pagamento
desinteressado, a não ser que o terceiro expressamente abra mão desse último
remédio. A ação de enriquecimento sem causa é uma aplicação de regra de
equidade.
Contudo, no caso do terceiro não interessado que paga em seu próprio
nome, a ação de reembolso é singela e não de sub-rogação, porque tal
pagamento pode ter sido efetuado com intuito especulativo, e inclusive agravar
a situação do devedor, ou até mesmo para colocá-lo numa posição moralmente
vexatória. Imagine-se o exemplo de um devedor conhecido na comunidade que
tem sua dívida paga pelo inimigo. Após o fato, o solvens alardeia que Fulano
não consegue nem mesmo pagar suas dívidas e mostra à sociedade a prova do
pagamento efetuado. A situação poderá até mesmo se deslocar para a esfera
criminal. Desse modo, a lei não defere a esse terceiro a sub-rogação.
83
O mesmo se diga quanto à intenção da lei, no tocante a pagamento
antecipado da dívida: "se pagar antes de vencida a dívida, só terá direito ao
reembolso no vencimento" (art. 305, parágrafo único).
Pode ocorrer, no entanto, que o devedor tenha justo motivo para não
pagar a dívida e se surpreende ao ver que terceiro se adiantou no pagamento. É
o caso, por exemplo, de a dívida não ser exigível por inteiro, de estar no todo ou
em parte prescrita, de promanar de negócio anulável, de existir a possibilidade
de exceptio non adimpleti contractus (exceção de contrato não cumprido) etc.
Para tal situação estatui o art. 306: “O pagamento feito por terceiro, com
desconhecimento ou oposição do devedor, não obriga a reembolsar aquele que
pagou, se o devedor tinha meios para ilidir a ação.”
O motivo da oposição deve ser justo. O terceiro solvens deve ter
conhecimento da oposição pelo devedor, antes de pagar. Pagará, nesse caso,
assumindo um risco. Questão importante pode ocorrer no caso de o terceiro
pagar sem que o devedor tome conhecimento, e este tinha motivo justo para não
fazê-lo. Se o terceiro pagou mal, só poderá reembolsar-se até o total que
aproveitou ao devedor. O que pagou mal deverá repetir do credor que, em tese,
recebeu mais do que lhe competia.
Ou seja, se o devedor tinha meios para se opor ao pagamento, esse
pagamento feito contra sua vontade ou sem o seu conhecimento não o obriga a
reembolsar, pois não lhe foi útil. Da mesma forma na hipótese de
desconhecimento por parte do devedor: impõe-se que o solvens informe o
devedor que vai pagar, sob pena de pagar mal. Em qualquer situação, o
montante do pagamento que foi útil para o devedor deve ser reembolsado, sob
pena de ocorrer injusto enriquecimento. A óptica se transplanta, no caso
concreto, para o âmbito da prova.
Questão não erigida na lei é aquela em que tanto o devedor como o credor
se opõem ao pagamento por terceiro. Suponha-se a hipótese em que há dúvida
84
de se a obrigação é personalíssima ou não. O credor diz que não aceita a solutio
por terceiro. O devedor informa ao terceiro que não deve pagar. Aí não se pode
negar a impossibilidade do pagamento, pois o terceiro passa a ser
absolutamente inconveniente numa relação jurídica a que não pertence.
O art. 307 trata de pagamento que importe em transmissão de domínio:
Art. 307. Só terá eficácia o pagamento que importar transmissão da propriedade, quando feito por quem possa alienar o objeto em que ele consistiu.
Parágrafo único. Se se der em pagamento coisa fungível, não se poderá mais reclamar do credor que, de boa-fé, a recebeu e consumiu, ainda que o solvente não tivesse o direito de aliená-la.
Vale o princípio de que ninguém pode transferir mais direitos do que tem.
Para a transmissão do domínio deverão estar presentes todos os requisitos do
negócio jurídico. A alienação a non domino, por quem não seja o dono da coisa,
é ineficaz. Um pagamento nessa situação abre à vítima a possibilidade de
indenização.
Se, porém, se tratar de coisa fungível (parágrafo único), já consumida, de
boa-fé, pelo credor, não se pode mais reclamar a coisa deste. Não havendo mais
a coisa a ser reivindicada, a situação é do substitutivo indenizatório. Do credor,
contudo, não se pode reclamar. A questão resolver-se-á entre o terceiro que
pagou e o devedor. Para a exceção do parágrafo tratado, há necessidade de três
condições: que o pagamento seja de coisa fungível, que tenha havido boa-fé por
parte do accipiens e que tenha sido consumida a coisa. Enquanto não
consumida, haverá direito à repetição, no todo ou em parte, da coisa.
4- A Quem se Deve Pagar. O Accipiens
O pagamento deve ser feito ao credor ou a quem de direito o represente,
sob pena de só valer depois de por ele ratificado, ou tanto quanto reverter em
seu proveito (art. 308).
85
Credor não é somente aquele em cujo favor se constitui originariamente o
crédito. Também o são: o herdeiro, na proporção de sua quota hereditária, o
legatário, o cessionário e o sub-rogado nos direitos creditórios.
Se solidária ou indivisível a obrigação, qualquer dos co-credores pode
recebê-la, nos termos dos arts. 260 e seguintes e 267 e seguintes, todos do
Código Civil.
Se ao portador, quem apresentar o título será o credor, assistindo-lhe o
direito de receber o pagamento. Empenhado o título de crédito, cabe ao credor
pignoratício receber a respectiva importância (art. 1.459, n. IV, do CC).
O representante do credor pode ser legal, judicial e convencional. Legal é
aquele a quem a própria lei outorga mandato para administrar bens e interesses
alheios, como o pai, o tutor e o curador, em relação aos filhos menores, pupilos
e curatelados. Todavia, em se tratando de capital, o representante legal, para
recebê-lo, depende de autorização judicial, uma vez que o ato excede os
poderes da simples administração. Para recebimento de juros, entretanto, não se
exige qualquer autorização.
Judicial é o representante nomeado pelo juiz, como o inventariante, o
síndico e o depositário. Mas o inventariante depende igualmente de licença
judicial para receber certos pagamentos, que excedem os poderes de
administração ordinária, como o proveniente de dívida hipotecária. Também o
oficial de justiça, quando vai proceder a penhora nos bens do devedor, caso este
não pague a dívida, se acha investido de poderes para recebê-la.
Convencional, por sua vez, é o representante com mandato, expresso ou
tácito.
Expresso, quando o instrumento da procuração, revestido das
formalidades legais, confere poderes especiais para recebimento da dívida. Não
bastam os poderes impressos, que habitualmente constam da procuração;
86
exigem-se especiais, embora se torne desnecessária a menção do quantum
devido. Basta que o débito fique perfeitamente individuado.
É tácito o mandato quando o mandatário se apresenta perante o devedor
com o título, que lhe deve ser entregue como quitação. Presume-se que o
respectivo portador se acha autorizado pelo credor a receber a dívida, e válido
se tornará o pagamento a ele efetuado.
Entre os representantes convencionais expressamente constituídos,
merece referência especial a pessoa nominalmente designada no próprio título
para receber a prestação. Essa pessoa denomina-se adjectus solutionis causa ou
adjectus solutionis gratia. Assim se chama a pessoa que devedor e credor, de
comum acordo, designam para efeito de receber o pagamento. Trata-se de
verdadeiro cessionário, desde o início constituído, e não de procurador comum,
já que não se lhe pode revogar ou alterar aquela designação, nem se extingue
com a morte do credor.
4.1- Credor Putativo
Pode ocorrer o pagamento a pessoa que tenha a aparência de credor ou de
pessoa autorizada. E o caso do credor putativo.
Suponha-se o caso de alguém que, ao chegar a um estabelecimento
comercial, paga a um assaltante, que naquele momento se instalou no guichê de
recebimentos, ou a situação de um administrador de negócio que não tenha
poderes para receber, mas aparece aos olhos de todos como um efetivo gerente.
Não se trata apenas de situações em que o credor se apresenta falsamente
com o título ou com a situação, mas de todas aquelas situações em que se reputa
o accipiens como credor. Dispõe o Código: “o pagamento feito de boa fé ao
credor putativo é válido, ainda provando-se depois que não era credor”
(art.309).
87
A lei condiciona a validade do pagamento ao fato de o accipiens ter a
aparência de credor e estar o solvens de boa-fé. Restará ao verdadeiro credor
haver o pagamento do falso accipiens.
4.2- Quando o Pagamento Feito a Terceiro Desqualificado Será Válido
O devedor pode se exonerar mesmo pagando a terceiro não intitulado, em
três situações:
1. no caso de ratificação, pelo credor, do pagamento recebido (art. 308).
Tal ratificação equivale a um mandato. Pago ao filho de credor e este
posteriormente confirma o recebimento, por exemplo;
2. no caso em que o pagamento reverte em benefício do credor (art. 308),
a prova será ônus do solvens. Por exemplo, paga-se à mulher do credor, prova-
se que o pagamento reverteu em seu benefício. Tudo, aqui, também dependerá
das circunstâncias. Lembre-se, porém, de que o pagamento só valerá até o
montante do benefício: a dívida é de 1.000; pagou-se o total à mulher do credor;
aquela, no entanto, só entregou 500 a ele; só até esse montante valerá o
pagamento, doutro modo, ocorreria locupletamento indevido. O mesmo se diga
a respeito do pagamento feito ao inibido de receber, por incapacidade. O
devedor deve provar que o pagamento reverteu em benefício do incapaz (art.
310);
3. o último caso refere-se ao credor putativo descrito no tópico anterior.
4.3- Pagamento Feito ao Inibido de Receber
Certas pessoas, embora figurem na posição de credoras, são inibidas de
receber, e quem paga a elas arrisca-se a pagar mal.
O art. 310 refere-se ao pagamento efetuado ao incapaz de quitar. Ora, a
incapacidade inibe o agente para os atos da vida civil. No entanto, há uma
aplicação especial dessa incapacidade quanto ao pagamento. Dispõe o artigo:
88
“não vale, porém, o pagamento cientemente feito ao credor incapaz de quitar, se
o devedor não provar que em beneficio dele efetivamente reverteu”.
Observe-se que a lei usa do termo cientemente, isto é, são situações em
que o solvens tem pleno conhecimento da incapacidade do accipiens. O
representante legal do credor terá legitimidade para impugnar o pagamento.
Cabe ao solvens provar que o resultado do pagamento reverteu no benefício do
incapaz. Nem sempre será prova fácil. Imagine-se, por exemplo, o caso de
pagamento efetuado a um pródigo. A lei também não distingue a incapacidade
relativa ou absoluta. Valerá o pagamento, todavia, se o que paga não tinha
conhecimento dessa incapacidade. Lembre-se do art. 180, que reforça essa
ideia. É a situação do menor, relativamente incapaz, que dolosamente oculta sua
condição em um negócio jurídico.
Outra situação que inibe o credor de receber é a do art. 312: “se o devedor
pagar ao credor, apesar de intimado da penhora feita sobre o crédito, ou da
impugnação a ele oposta por terceiros, o pagamento não valerá contra estes, que
poderão constranger o devedor a pagar de novo, ficando-lhe, entretanto, salvo o
regresso contra o credor”.
Essa situação também é de ineficácia do pagamento e não propriamente
de validade. É requisito, porém, que o solvens tenha tomado ciência da penhora
ou da oposição de terceiro. Se pagar ao credor, assumirá o risco. Trata-se de
modalidade de aplicação das garantias dos direitos de crédito. A lei equipara,
para os efeitos, tanto a ciência da penhora, quanto a ciência por notificação ou
interpelação feita por terceiro. Ao terceiro, nesse caso, cabe depositar em juízo,
ou nos autos em que foi efetivada a penhora, ou consignar em pagamento, se
tiver dúvidas quanto à validade do pagamento que efetuaria a terceiro. No caso
desse terceiro ter agido de forma abusiva, impedindo ou retardando o
recebimento do crédito pelo credor, responderá pelo abuso ou má-fé.
89
5- Do objeto do pagamento
Na Seção III, do Capítulo II, do Título III, refere-se o Código Civil,
particularmente, ao pagamento em dinheiro, que oferece maior interesse
jurídico. De todas as prestações, a pecuniária vem a ser a mais importante, por-
quanto as demais são suscetíveis de nela transformar-se.
O pagamento em dinheiro, sem determinação da espécie, far-se-á em
moeda corrente no lugar do cumprimento da obrigação (art. 315).
O pagamento só poderá efetuar-se em apólices federais, estaduais ou
municipais se nisso convier o credor, ou tiver sido estipulado no contrato. O
mesmo sucederá no tocante ao pagamento mediante cheque, que é recebido pro
solvendo e não pro soluto; se não houver provisão, o pagamento é ineficaz.
O art. 316 diz que: "É lícito convencionar o aumento progressivo de
prestações sucessivas". É o que a doutrina convencionou chamar de cláusula de
escala móvel, mediante a qual o valor da prestação será automaticamente
reajustado, após determinado lapso de tempo, segundo índice escolhido pelas
partes. A Lei n. 10.192, de 14-2-2001, declara nula de pleno direito qualquer
estipulação de reajuste ou correção de periodicidade inferior a um ano.
Preceitua o art. 317: "Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier
desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de
sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure,
quanto possível, o valor real da prestação". Esse dispositivo adota a teoria da
imprevisão, permitindo que o valor da prestação seja corrigido por decisão
judicial sempre que houver desproporção entre o que foi ajustado durante a
celebração do contrato e o valor da prestação na época da execução. Para tanto,
é imprescindível que a causa da desproporção tenha sido realmente imprevisível
e que tenha havido pedido expresso de uma das partes, sendo vedado ao juiz
determinar a correção de ofício. Antes da vigência do Código Civil de 2002,
90
esse princípio já era adotado pela jurisprudência, que consagrou, para tais
hipóteses, a aplicação da cláusula rebus sic stantibus (enquanto as coisas estão
assim).
Por seu turno, o art. 318 consigna que: "São nulas as convenções de
pagamento em ouro ou em moeda estrangeira, bem como para compensar a
diferença entre o valor desta e o da moeda nacional, excetuados os casos
previstos na legislação especial". Repete as regras constantes no Decreto n.
23.501, de 27-11-1933, e do Decreto-lei n. 857, de 11-9-1969, que já
declaravam nulas quaisquer estipulações de pagamento em ouro ou em outra
espécie de moeda que não fosse a nacional, salvo previsão em legislação
específica. Nesse sentido é também a Lei n. 10.192, de 14-2-2001.
6- Da prova do pagamento
O devedor que paga tem direito a quitação regular (art. 320), e pode reter
o pagamento enquanto lhe não for dada (art. 319). Quitação é a prova do
pagamento. Para firmeza das relações jurídicas e tranquilidade social, devem os
atos jurídicos revestir a forma legal, que lhes atribui existência e visibilidade.
No caso de pagamento, a forma é a quitação; a ela tem direito o devedor, que
pode retardar a solução, até que a forneça o credor. Esse direito de reter o
pagamento, enquanto se não passa o recibo, constitui garantia do devedor e tem
assento na boa razão.
Quem paga deve munir-se da necessária quitação passada pelo credor. Se
o fizer em confiança, não poderá mais tarde invocar essa circunstância, ao ser
cobrado de novo. Não se acolhe tal alegação em juízo, porque pagamentos se
comprovam apenas através de quitações regulares e não se demonstram por
testemunhas, se excedem à taxa legal.
91
Regular se diz a quitação na hipótese do art. 320: a quitação, que sempre
poderá ser dada por instrumento particular, designará o valor e a espécie da
dívida quitada, o nome do devedor, ou quem por este pagou, o tempo e o lugar
do pagamento, com a assinatura do credor ou do seu representante. Por outras
palavras, a quitação deve ser expressa, positiva, com especificada menção da
dívida quitada, valor e espécie.
O parágrafo único do art. 320 estatui que: "Ainda sem os requisitos
estabelecidos neste artigo valerá a quitação, se de seus termos ou das
circunstâncias resultar haver sido paga a dívida".
Recusando o credor à quitação, ou não a dando na devida forma (art.
320), pode o devedor citá-lo para esse fim, e ficará quitado pela sentença que
condenar o credor. Trata-se de obrigação de fazer, a cargo do credor, cujo
cumprimento pode ser realizado pelo juiz. No tocante às locações, é obrigatório
o recibo do aluguel, e sua recusa importa contravenção penal (Lei n. 8.245, de
18-10-1991, art. 22, n. VI).
No art. 321, edita o Código Civil que "nos débitos, cuja quitação consista
na devolução do título, perdido este, poderá o devedor exigir, retendo o
pagamento, declaração do credor que inutilize o título desaparecido".
Em tais condições, se a dívida se acha inteiramente paga, o devedor tem
direito à restituição do título; se o credor alega o respectivo extravio, tem aquele
direito de exigir declaração que invalide o título. Se a ela se nega o credor, pode
o devedor reter o pagamento, como no caso de quitação, até que lhe seja
passado tal documento.
Contudo, casos existem em que o credor tem razões para reter o título.
Por exemplo, se neste figuram co-devedores, cujas obrigações ainda não se
extinguiram. Ou então se o título lhe serve para a prova de outros direitos. Em
ambos os casos pode o credor negar a restituição, mas deverá passar declaração
ao devedor, comprobatória do pagamento por este efetuado.
92
A posse do título pelo credor constitui presunção de que não foi pago;
mas essa presunção pode ser destruída por prova em contrário. Aliás, o
pagamento pode ser provado por qualquer meio admitido em direito.
Em seguida, no art. 322, dispõe o Código Civil: "Quando o pagamento for
em quotas periódicas, a quitação da última estabelece, até prova em contrário, a
presunção de estarem solvidas as anteriores". Pagamento da última prestação,
sem qualquer ressalva, faz presumir pagamento das precedentes, porque natural
não é que o credor consinta em receber aquela, ficando estas para trás, sem
solução. Mas essa presunção, como a decorrente da posse do título pelo credor,
é apenas juris tantum, cedendo frente prova em contrário.
Outras presunções estabelecem ainda o legislador em matéria de
pagamento: a) sendo a quitação do capital sem reserva dos juros, estes
presumem-se pagos; b) a entrega do título ao devedor firma a presunção do
pagamento (art. 324). Ficará, porém, sem efeito a quitação assim operada se o
credor provar, dentro de sessenta dias, o não-pagamento (parágrafo único).
Pode acontecer, todavia, que o título tenha ido parar nas mãos do devedor
por meios clandestinos ou ilícitos, como furto, estelionato, apropriação indébita.
Nesse caso, ao credor assiste o direito de comprovar, no prazo legal, que não
entregou voluntariamente o título e que, por isso, extinta não se acha a
obrigação. Trata-se de uma das aplicações da exceção non numeratae pecuniae.
A lei processual não estatui processo algum para prova do fato a que se
refere o art. 324, parágrafo único, do Código Civil. Tem-se admitido por isso
simples justificação avulsa, processada de acordo com os arts. 861 e seguintes
do Código de Processo Civil.
Presumem-se a cargo do devedor as despesas com o pagamento e
quitação. Se ocorrer aumento por fato do credor, suportará este a despesa
acrescida (art. 325).
93
Se o pagamento se houver de fazer por medida, ou peso, entender-se-á, no
silêncio das partes, que aceitaram os do lugar da execução (art. 326).
7- Lugar do Pagamento. Dívidas Quérables e Portables
No silêncio da avença, o pagamento será efetuado no domicílio do
devedor. É a regra geral do art. 327. Em geral, portanto, a dívida é quérable.
Cabe ao credor procurar o devedor para a cobrança.
Em caso de disposição contratual em contrário, quando o devedor deve
procurar o credor em seu domicílio, ou no local por ele indicado, a dívida é
portable.
Sempre será o acordo das partes que prevalecerá. A matéria é dispositiva,
de acordo com o art. 78. Há obrigações que, por força de circunstâncias ou de
sua natureza, mormente de costumes, devem ser executadas ora no domicílio do
credor, ora no domicílio do devedor. A lei também pode fixar o lugar do
pagamento. Tudo isso está no art. 237. Suas regras são supletivas da vontade
das partes.
O parágrafo único do art. 327 acresce que, se forem designados dois ou
mais lugares, caberá ao credor a escolha. O credor deve, no entanto, manifestar
sua escolha ao devedor, em tempo hábil, para que este possa efetuar o
pagamento.
Problema surge quando o devedor muda de domicílio. O credor não pode
ficar preso ao capricho do devedor. Embora haja divergência na doutrina, e
sendo a lei omissa, o mais lógico é que o credor opte por manter o mesmo local
originalmente fixado. Se isso não for possível e o pagamento tiver que ser
necessariamente feito em outro local, no novo domicilio do devedor, arcará este
com as despesas acarretadas ao credor, tais como taxas de remessa bancária,
viagens etc.
94
Embora o contrato possa fixar a dívida como quérable, se continuamente
o devedor procura o credor para pagar, há animus de mudança de local de
pagamento. Ou vice-versa. A habitualidade há de ser vista como intenção de
mudar o lugar de pagamento, salvo se as partes fizerem ressalva que a inversão
do que consta no contrato é mera liberalidade.
A grande importância na exata fixação do lugar do pagamento reside na
ocorrência da mora. Quem paga em lugar errado, paga mal, na grande maioria
das vezes.
O art. 328 trata de pagamento consistente na tradição de um imóvel,
dizendo que se fará no lugar onde este se acha. As prestações relativas a
imóveis, ditas na lei, não significam aluguéis, mas são referentes a serviços só
realizáveis no local do imóvel, como reparações de cerca, retificações de curso
de córregos, mudança de servidão etc. No entanto, sempre que a natureza da
obrigação o permitir, as partes poderão dispor diferentemente.
Por sua vez, dispõe o art. 329: "Ocorrendo motivo grave para que se não
efetue o pagamento no lugar determinado, poderá o credor fazê-lo em outro,
sem prejuízo para o credor."
A regra ratifica o brocardo pelo qual nada se pode fazer perante uma
impossibilidade. Imagine-se que o local do pagamento esteja isolado ou em
estado de calamidade pública: o devedor poderá efetuar o pagamento em outro
local, o mais cômodo possível para o credor. A expressão "sem prejuízo para o
credor" deverá ser entendida com reservas. O simples fato de o pagamento
efetuar-se em outro local já acena com o descumprimento de uma obrigação. Se
o credor deve ou não ser ressarcido dos incômodos de receber em local diverso
do combinado é matéria para ser examinada no caso concreto. Lembre-se que,
como regra, o caso fortuito e a força maior não autorizam indenização.
95
Outra regra importante é trazida pelo o art. 330: "O pagamento
reiteradamente feito em outro local faz presumir renúncia do credor
relativamente ao previsto no contrato."
Essa presunção é relativa, pois pode o contrato ter assinalado que o
recebimento do pagamento em local diverso do indicado, ainda que reiterado, é
feito por mera liberalidade, sem prejuízo de o credor exigi-lo no local apontado.
Não se deve esquecer que neste caso, como em qualquer situação contratual, o
juiz deve examinar a conduta dos contratantes sob o prisma da boa-fé objetiva e
dos costumes do local.
8- Tempo do Pagamento
Diz o Código, no art. 331, que, "não tendo sido ajustada época para o
pagamento, o credor pode exigi-lo imediatamente". Tal assertiva deve ser vista
com a reserva necessária. Há obrigações que, por sua própria natureza, não
podem ser exigidas de plano, como no caso do empréstimo, da locação, do
depósito.
Quando as partes ou a lei não estipulam um prazo para o pagamento, a
prestação pode ser exigida a qualquer momento: são as obrigações puras. As
obrigações com prazo fixado são as obrigações a termo.
Quando existe um prazo, a obrigação só pode ser exigida pelo credor com
o advento do termo desse prazo. O prazo presume-se estipulado em benefício
do devedor (art. 133). Sendo um favor seu, nada impede que cumpra
antecipadamente a obrigação. O credor não pode exigir seu cumprimento, mas a
obrigação, nesses moldes, é cumprível pelo devedor desde sua constituição.
Não é muito comum, mas a obrigação pode ter um prazo fixado em
benefício do credor. Nesse caso, não pode ser o credor obrigado a receber
antecipadamente. Suponha-se, por exemplo, o comprador de uma mercadoria
96
que fixa um prazo de 90 dias para recebê-la, porque nesse período estará
construindo um armazém para guardá-la. O prazo foi instituído a seu favor,
porque o recebimento antecipado lhe seria sumamente gravoso.
O tempo na obrigação pode ser estipulado concomitantemente, em
benefício tanto do credor, quanto do devedor. Aí não se admite, também,
antecipação do cumprimento.
Se a obrigação consistir de obrigações periódicas, cada pagamento deve
ser examinado de per si. Cada prestação periódica deve ser estudada
isoladamente.
A obrigação, se por um lado pode ser cumprida antecipadamente, salvo os
casos examinados, não pode ser cumprida além do prazo marcado. Isto é, se
ainda for útil para o credor, a obrigação em retardo pode ser cumprida, mas já
com os encargos de mora. Se, de um lado, o devedor pode antecipar o
cumprimento, inclusive com medida judicial, não pode pedir dilação de prazo
ao juiz, ressalvadas as situações de caso fortuito ou de força maior.
O credor não pode exigir o pagamento antes do vencimento, sob pena de
ficar obrigado a esperar o tempo que faltava para o vencimento, a descontar os
juros correspondentes, embora estipulados, e a pagar as custas em dobro (art.
939). A jurisprudência tem entendido que essa pena do final do artigo só é
impingida nos casos de dolo do agente.
O devedor que se antecipa e paga antes do termo, o faz por sua conta e
risco. Destarte, não pode repetir a prestação, não lhe trazendo qualquer
vantagem a solução antes do tempo, tais como redução de juros ou de taxas, a
não ser que convencionado.
Quando a obrigação não tem termo certo, o credor pode interpelar o
devedor para que cumpra a obrigação num prazo razoável, que poderá ser
fixado pelo juiz.
97
No dia do pagamento, termo final, portanto, há que se entender que ele
pode ser feito até a expiração das 24 horas do dia. Não é assim, no entanto,
quando se trata de pagamento que dependa de horário de atividade do comércio,
horário bancário ou forense. Terminado o expediente, cujo horário é fixado por
norma administrativa, frustra-se a possibilidade de se efetuar o pagamento
naquela data.
As obrigações condicionais são tratadas pela regra do art. 332. Para seu
cumprimento, dependem do implemento da condição. O credor deve provar a
ciência desse implemento pelo devedor.
O credor, conforme já visto, não pode exigir o pagamento antes do
vencimento, sob as penas do art. 939. No entanto, o art. 333 faculta ao credor
cobrar a dívida antes de vencido o prazo, em três situações:
“I - no caso de falência do devedor, ou de concurso de credores;
II - se os bens, hipotecados ou empenhados, forem penhorados em
execução por outro credor;
III - se cessarem, ou se se tornarem insuficientes, as garantias do débito,
fidejussórias, ou reais, e o devedor, intimado, se negar a reforçá-las.
Parágrafo único. Nos casos deste artigo, se houver, no débito,
solidariedade passiva, não se reputará vencido quanto aos outros devedores
solventes.”
98
DO PAGAMENTODO PAGAMENTODO PAGAMENTODO PAGAMENTO POR CONSIGNAÇÃOPOR CONSIGNAÇÃOPOR CONSIGNAÇÃOPOR CONSIGNAÇÃO
1- Generalidades
O devedor, e não apenas o credor, também tem interesse no sentido de
que a obrigação seja extinta. Não pagando o devedor no tempo, local e forma
devidos, sujeitar-se-á aos ônus da mora. Ainda, se sua obrigação consistir na
entrega de coisa, enquanto não houver a tradição, o devedor é responsável pela
guarda, respondendo por sua perda ou deterioração.
Se o credor não toma a iniciativa de receber, ou pretende receber de forma
diversa do contratado, ou quando não é conhecido o paradeiro do credor, como
exemplos, o devedor tem o meio coativo de extinguir sua obrigação: a
consignação em pagamento.
A consignação é simultaneamente instituto de direito civil e de processo.
A substância e os seus efeitos são de direito privado, mas a forma constitui
matéria de direito processual. Dele se ocupam o Código Civil nos arts. 334 a
345 e o Código de Processo Civil nos arts. 890 a 900.
Define-se a consignação em pagamento como o depósito judicial ou
extrajudicial da coisa devida, realizada pelo devedor, com causa legal. Trata-se
de pagamento compulsório, só excepcionalmente admitido; ou melhor,
representa meio especial concedido ao devedor para liberar-se da obrigação.
Não se imagine que a consignação só cabe quando se cuide de dívida em
dinheiro. Conquanto sejam esses, realmente, os casos mais frequentes, ela tem
cabimento, por igual, nas hipóteses em que a prestação consista em coisas
móveis ou mesmo imóveis. Só nas obrigações de fazer, ou de não fazer, pela
sua natureza, descabe a consignação. Numa palavra, a consignação só é
compatível com a prestação de coisas.
99
2- Casos de consignação
O pagamento deve ser feito, em regra, ao próprio credor, ou a quem de
direito o represente (art. 308, CC), no lugar (art. 327), no tempo (art. 331) e
pelo modo convencionados. Muitas vezes, porém, ocorrem fatos ou cir-
cunstâncias que impedem o pagamento direto ao credor, como pode suceder
ainda que venha este a recusar a prestação oferecida pelo devedor. A lei faculta
então o recurso à consignação em pagamento. De fato, estatui o art. 334 do
Código Civil: "Considera-se pagamento, e extingue a obrigação, o depósito
judicial ou em estabelecimento bancário da coisa devida, nos casos e forma
legais".
A consignação tem lugar (art. 335):
I- se o credor não puder, ou, sem justa causa, recusar receber o
pagamento, ou dar quitação na devida forma;
II- se o credor não for, nem mandar receber a coisa no lugar, tempo e
condições devidos;
III- se o credor for incapaz de receber, for desconhecido, estiver declarado
ausente ou residir em lugar incerto, ou de acesso perigoso ou difícil;
IV- se ocorrer dúvida sobre quem deva legitimamente receber o objeto do
pagamento;
V- se pender litígio sobre o objeto do pagamento.
Dentre as hipóteses referidas pelo Código Civil, a mais frequente é a de
recusa do credor, que, sem justa causa, se nega a receber ou a dar quitação na
devida forma (n. I). Há o entendimento de se reputar supérflua a locução sem
justa causa, pois essa justa causa para recusa só pode influir no julgamento da
ação consignatória e não sobre o direito de fazer a consignação. De qualquer
modo, a oferta pelo devedor há de ser concreta.
100
De acordo com o n. II, constituirá também motivo para o depósito se o
credor não for, nem mandar receber a coisa no lugar, tempo e condições
devidos. Esse dispositivo aplica-se às dívidas em que o pagamento se efetua
fora do domicílio do credor. Ante a inércia deste, o devedor não é obrigado a
suportar indefinidamente as consequências da mora creditoris. Faculta-lhe,
destarte, o direito de liberar-se, consignando judicialmente a coisa devida.
Ressalte-se que a hipótese do inc. I se trata de dívida portáble, enquanto
que a hipótese do inc. II se trata de dívida quérable.
Consoante o n. III tem também lugar a consignação se o credor for
incapaz de receber, for desconhecido, estiver declarado ausente ou residir em
lugar incerto ou de acesso difícil ou perigoso. Evidentemente, em princípio, não
se admite existência de obrigação contraída com pessoa originariamente
desconhecida. Mas, contraída com pessoa conhecida e certa, pode
posteriormente tornar-se desconhecido o credor, em virtude de sucessão do
credor originário. Em tal hipótese, cabível vem a ser a consignação. Igualmente,
justifica-se o depósito judicial se o credor se ausenta do seu domicílio e retira-
se para lugar ignorado; ou, então, quando se afasta para ponto de difícil ou
perigoso acesso, e ainda, finalmente, quando se torna ignorado o seu paradeiro.
Outro caso de consignação é aquele em que paire dúvida sobre quem deva
legitimamente receber o objeto do pagamento (n. IV). Dois ou mais credores
apresentam-se; não pode o devedor, nesse caso, dar preferência a qualquer dos
pretendentes. Cabe-lhe, sim, indeclinavelmente, obrigação de consignar em
juízo o quantum de seu débito, a ser levantado oportunamente por quem de
direito.
Cabe ainda a consignação se pende litígio sobre o objeto do pagamento. O
litígio a que se refere o n. V é o que se trava entre credor e terceiro, não entre
devedor e credor. Ante a contenda, age com culpa o devedor que se antecipa ao
101
pronunciamento judicial e paga a um dos litigantes. Seu dever, em face do
pleito, é consignar a coisa, levantada a final por quem obtiver ganho de causa.
A consignação é restrita aos casos de pagamento. Exclui-se, assim, de seu
âmbito qualquer matéria de outra natureza. Ela não comporta, pois, discussão
sobre infração contratual ou legal, nem controvérsias sobre a substância da
obrigação ou o mérito desta.
3- Requisitos
Para que a consignação tenha força de pagamento, é necessário que
concorram, em relação às pessoas, ao objeto, modo e tempo, todos os requisitos
sem os quais não é válido o pagamento (art. 336). Não é possível, por
conseguinte, por meio da ação consignatória, questionar-se sobre o quantum
devido; o meio é impróprio sempre que se trate de débito ilíquido e incerto.
O depósito requerer-se-á no lugar do pagamento, cessando, tanto que se
efetue, para o depositante, os juros da dívida e os riscos, salvo se for julgado
improcedente (art. 337).
4- Levantamento do depósito
Enquanto o credor não declarar que aceita o depósito, ou não o impugnar,
poderá o devedor requerer o levantamento, pagando as respectivas despesas, e
subsistindo a obrigação para todas as consequências de direito (art. 338).
Julgando procedente o depósito, o devedor já não poderá levantá-lo,
embora o credor consinta, senão de acordo com os outros devedores e fiadores
(art. 339).
O credor que, depois de contestar a lide ou aceitar o depósito, aquiescer
no levantamento perderá a preferência e garantia que lhe competiam com
102
respeito à coisa consignada, ficando para logo desobrigados os co-devedores e
fiadores que não anuíram (art. 340).
5- Outros preceitos contidos no Código Civil
Se a coisa devida for imóvel ou corpo certo que deva ser entregue no
mesmo lugar onde está, poderá o devedor citar o credor para vir ou mandar
recebê-la, sob pena de ser depositada (art. 341).
Se a escolha da coisa indeterminada competir ao credor, será ele citado
para esse fim, sob cominação de perder o direito e de ser depositada a coisa que
o devedor escolher. Feita a escolha pelo devedor, proceder-se-á como no artigo
antecedente (art. 342).
As despesas com o depósito, quando julgado procedente, correrão à conta
do credor, e, no caso contrário, à conta do devedor (art. 343). Duas correntes
comportam a exegese desse dispositivo legal: para a primeira, o artigo refere-se
a despesas com o depósito (guarda e conservação), e não compreende ho-
norários de advogado. Para a segunda, porém, o texto é amplo e abrange todos
os dispêndios, inclusive a honorária. Sem dúvida, esta é a inteligência que se
impõe, ante a literalidade da lei e os objetivos por ela visados.
O devedor de obrigação litigiosa exonerar-se-á mediante consignação,
mas, se pagar a qualquer dos pretendidos credores, tendo conhecimento do
litígio, assumirá o risco do pagamento (art. 344).
Se a dívida se vencer, pendendo litígio entre credores que se pretendem
mutuamente excluir, poderá qualquer deles requerer a consignação (art. 345).
103
6- Disposições processuais
Nos casos previstos em lei, poderá o devedor ou terceiro requerer, com
efeito de pagamento, a consignação da quantia ou da coisa devida (CPC, art.
890).
Tratando-se de obrigação em dinheiro, poderá o devedor ou terceiro optar
pelo depósito da quantia devida, em estabelecimento bancário oficial, onde
houver, situado no lugar do pagamento, em conta com correção monetária,
cientificando-se o credor por carta com aviso de recepção, assinado o prazo de
dez dias para a manifestação da recusa (art. 890, §lº). Decorrido esse prazo, não
havendo recusa, reputar-se-á liberado da obrigação o devedor, ficando à dis-
posição do credor a quantia depositada (§2°). Ocorrendo recusa, manifestada
por escrito ao estabelecimento bancário, o devedor ou terceiro poderá propor,
dentro de trinta dias, a ação de consignação, instruindo a inicial com a prova do
depósito e da recusa (§3º). Não proposta a ação no prazo estipulado, ficará sem
efeito o depósito, podendo levantá-lo o depositante (§4º).
Requerer-se-á a consignação no lugar do pagamento, cessando para o
devedor, tanto que se efetue o depósito, os juros e os riscos, salvo se for julgada
improcedente (CPC, art. 891).
Quando a coisa devida for corpo que deva ser entregue no lugar em que
está, poderá o devedor requerer a consignação no foro em que ela se encontra
(CPC, art. 891, parágrafo único).
Na petição inicial, o autor requererá o depósito da quantia ou da coisa
devida, a ser efetivado no prazo de cinco dias do deferimento, ressalvada a
hipótese do art. 890, §3º, bem como a citação do réu para levantar o depósito ou
oferecer resposta (art. 893, I e II).
Se o objeto da prestação for coisa indeterminada e a escolha couber ao
credor, será este citado para exercer o direito dentro de cinco dias, se outro
104
prazo não constar de lei ou do contrato, ou para aceitar que o devedor o faça,
devendo o juiz, ao despachar a petição inicial, fixar lugar, dia e hora em que se
fará a entrega, sob pena de depósito (CPC, art. 894).
Se ocorrer dúvida sobre quem deva legitimamente receber o pagamento, o
autor requererá o depósito e a citação dos que o disputam para provarem o seu
direito (CPC, art. 895).
Na contestação poderá o réu alegar que: I- não houve recusa ou mora em
receber a quantia ou coisa devida; II- foi justa a recusa; III- o depósito não se
efetuou no prazo ou no lugar do pagamento; IV- o depósito não é integral
(CPC, art. 896).
Não sendo oferecida contestação, e ocorrentes os efeitos da revelia, o juiz
julgará procedente o pedido, declarará extinta a obrigação e condenará o réu no
pagamento das custas e honorários advocatícios (art. 897). Proceder-se-á do
mesmo modo se o credor receber e der quitação (parágrafo único).
Quando a consignação se fundar em dúvida sobre quem deva
legitimamente receber, não comparecendo nenhum pretendente, converter-se-á
o depósito em arrecadação de bens de ausente; comparecendo apenas um, o juiz
decidirá de plano; comparecendo mais de um, o juiz declarará efetuado o
depósito e extinta a obrigação, continuando o processo a correr unicamente
entre os credores; caso em que se observará o procedimento ordinário (art. 898).
Quando na contestação o réu alegar que o depósito não é integral, é lícito
ao autor completá-lo, dentro em dez dias, salvo se corresponder a prestação
cujo inadimplemento acarrete a rescisão do contrato (art. 899).
Cumpre ajuntar ainda que a consignação deve ser livre, completa e real.
Livre, no sentido de que não pode ser submetida a condições, ou ressalvas, que
venham restringir injustamente o direito do credor. Completa, porque há de
compreender integralmente a coisa devida, inclusive juros, frutos e despesas.
105
Real, vale dizer, efetiva, concreta, mediante positiva exibição da coisa ou do
dinheiro que constitui objeto da prestação.
DO PAGAMENTO COM SUBDO PAGAMENTO COM SUBDO PAGAMENTO COM SUBDO PAGAMENTO COM SUB----ROGAÇÃOROGAÇÃOROGAÇÃOROGAÇÃO
1- Generalidades
O termo sub-rogação significa substituição. A sub-rogação não extingue
propriamente a obrigação. O instituto contemplado nos arts. 346 ss do Código
faz substituir o sujeito da obrigação. O termo pode também ser empregado para
a sub-rogação real, quando uma coisa de um patrimônio é substituída por outra.
É o que ocorre quando se substituem os vínculos de inalienabilidade,
impenhorabilidade e incomunicabilidade de um imóvel a outro (art. 1.848, §2º).
No pagamento com sub-rogação, um terceiro, e não o primitivo devedor,
efetua o pagamento. Esse terceiro substitui o devedor originário da obrigação,
de forma que passa a dispor de todos os direitos, ações e garantias que tinha o
primeiro. Ressalta evidente que, quando alguém paga o débito de outrem, fique
com o direito de reclamar do verdadeiro devedor o que foi pago e que esse
crédito goze das mesmas garantias originárias. Não há prejuízo algum para o
devedor, que em vez de pagar o que deve a um, deve pagar o devido a outro.
O fato é que a dívida conserva-se não se extingue. É um instrumento
jurídico muito utilizado na prática. Permite que, muitas vezes, um devedor
pressionado por credor poderoso tenha sua dívida paga por outrem, que passa a
ser seu credor, de forma mais acessível e com melhores condições de
pagamento.
106
2- Natureza jurídica
Diversas correntes procuram explicar-lhe a natureza jurídica. A primeira
vê na sub-rogação uma cessão de crédito, cujo preço seria representado pela
quantia paga pelo terceiro. Mas, como será visto, não obstante seus pontos de
contacto, diversificam profundamente os dois institutos.
Para a segunda corrente, a sub-rogação é uma das faces da sucessão
singular ope legis. Não pode ser aceita, entretanto, essa teoria, pois o crédito
extinto e o novo são diferentes pela diversidade de sujeitos.
A verdadeira concepção é aquela que a considera como instituto
autônomo, através do qual o cumprimento pelo terceiro atua sobre o direito do
credor, mas deixa sobreviver a respectiva obrigação, mediante substituição do
credor.
3- Definição e espécies
Sub-rogação é a transferência dos direitos do credor para aquele que
solveu a obrigação, ou emprestou o necessário para solvê-la.
Nos casos comuns, em que o próprio devedor efetua o pagamento, no
exato instante em que o credor recebe a prestação devida, aquele se libera e a
obrigação se extingue. No pagamento com sub-rogação, todavia, embora
satisfeito o credor, não se verifica a liberação do devedor nem a extinção da
obrigação, porquanto todos os direitos creditórios se transferem para aquele que
satisfez a prestação.
Como essa transferência de direitos se opera por disposição de lei ou por
convenção, segue-se que a sub-rogação pode ser legal e convencional. Da
primeira se ocupa o Código Civil no art. 346, e da segunda, no art. 347.
107
4- Sub-rogação legal
O art. 346 traz três situações em que a sub-rogação opera de pleno direito,
em favor:
"I - do credor que paga a dívida do devedor comum;"
A situação pressupõe a existência de mais de um credor do mesmo
devedor. Pode ocorrer que esse credor tenha interesse em afastar o outro que
tenha prioridade no crédito, preferindo ficar sozinho na posição de credor,
aguardando momento mais oportuno para cobrar a dívida. Alguém é credor
quirografário juntamente com um credor trabalhista, que tem, portanto,
preferência. Afastando o débito trabalhista, pode aguardar com maior calma o
momento oportuno de, por exemplo, levar bem penhorado à praça e se ressarcir
de toda a dívida, a sua e a dívida trabalhista que pagou e nela se sub-rogou.
"II - do adquirente do imóvel hipotecado, que paga a credor hipotecário,
bem como do terceiro que efetiva o pagamento para não ser privado de direito
sobre o imóvel;"
Imóvel, mesmo hipotecado, pode ser alienado. O adquirente tem o maior
interesse em extinguir a hipoteca. Na prática, é muito raro que a hipótese
ocorra. Geralmente, o adquirente deseja que o bem lhe alcance as mãos já livre
e desembaraçado excluindo-se a hipoteca, a priori. Em determinadas situações
fatícas, porém, alguém poderia ser levado a adquirir o bem hipotecado. Não
ocorre a hipótese da lei se é o próprio vendedor quem recebe o dinheiro do
adquirente e paga a hipoteca. A hipótese vale, também, quando incide mais de
uma hipoteca sobre o bem. O adquirente pode ter maior interesse em livrar-se
ao menos da primeira hipoteca.
108
E dispositivo também declara a sub-rogação de pleno direito para o
terceiro que efetiva o pagamento para não ser privado de direito sobre imóvel.
A situação trazida é de justiça. A hipótese se aplica, por exemplo, ao
promissário adquirente de imóvel que paga dívida sobre o imóvel contraída e
não paga pelo transmitente do direito, para que não se veja privado dos direitos
sobre o bem.
"III - do terceiro interessado, que paga a dívida pela qual era ou podia ser
obrigado, no todo ou em parte."
É a questão mais comum e útil na prática. O fiador paga a dívida do
afiançado e sub-roga-se nos direitos do credor. Da mesma forma, um dos
devedores solidários paga toda a dívida. Sua sub-rogação, de acordo com a
forma pela qual foi contraída a solidariedade, é parcial ou total da dívida. A
finalidade primordial do inciso é colocar o devedor que paga a cobro de uma
situação difícil e embaraçosa. O fiador pode ter, por exemplo, o máximo
interesse em não ver o afiançado acionado. Note-se que a lei fala em terceiro
interessado que paga.
Se for terceiro não interessado, não haverá sub-rogação, como já visto. O
terceiro não interessado que paga a dívida em seu próprio nome não se sub-roga
nos direitos do credor (art. 305). Só terá direito ao reembolso, por uma questão
de equidade, para evitar-se o enriquecimento sem causa.
Em todos esses casos, a obrigação continua a existir para o devedor, mas
houve mudança de credor.
A lei pode trazer outros casos de sub-rogação, mas o fenômeno só existirá
se a lei autorizar, quando for expressa, não comportando aplicação analógica.
109
5- Sub-rogação Convencional
O art. 347 admite duas formas de sub-rogação convencional:
I - quando o credor recebe o pagamento de terceiro e expressamente lhe
transfere todos os seus direitos;
II - quando terceira pessoa empresta ao devedor a quantia precisa para
solver a dívida, sob a condição expressa de ficar o mutuante sub-rogado nos
direitos do credor satisfeito.
No primeiro caso, há iniciativa do credor, que recebe a importância de
terceiro. O devedor não necessita aquiescer; o fenômeno pode ocorrer com ou
sem seu conhecimento.
No segundo caso, há iniciativa do devedor, que consegue alguém que lhe
empreste o numerário para pagar a dívida e passa a dever, com todos os direitos
originários, ao mutuante.
Ambas as figuras são úteis. No primeiro caso, o credor vê-se satisfeito,
numa situação de adimplemento duvidoso. No segundo caso, o devedor
consegue talvez se livrar de um credor poderoso, mais insistente, e poderá
pagar, depois, a quem lhe emprestou, quiçá em situação mais favorável. Ambos
os casos favorecem o adimplemento da dívida.
Difere da cessão de crédito, pois nesta há necessidade de ciência do
devedor (art. 290).
O segundo caso ocorre com muita frequência nos financiamentos dos
bancos ditos sociais. As Caixas Econômicas costumam liquidar os débitos de
devedores com instituições privadas, fornecendo financiamentos em condições
mais favoráveis.
110
6- Efeitos da Sub-rogação
No pagamento com sub-rogação, fica satisfeito o primitivo credor. No
entanto, a obrigação persiste: "a sub-rogação transfere ao novo credor todos os
direitos, ações, privilégios e garantias do primitivo, em relação à dívida, contra
o devedor principal e os fiadores" (art. 349).
Esse artigo descreve a essência do instituto. Tais princípios aplicam-se
tanto à sub-rogação legal, quanto à sub-rogação convencional. O sub-rogado
não recebe mais do que receberia o credor originário. Não pode haver finalidade
especulativa na sub-rogação.
Da mesma forma, o sub-rogado não tem ação contra o sub-rogante no
caso de o devedor ser insolvente. Agora, se a obrigação for nula ou não existir,
pelo princípio do enriquecimento sem causa, o que pagou tem direito ao
reembolso.
Nada impede, porém, que as partes expressem sua vontade no sentido de
alterar os valores da sub-rogação, o que não ocorre na sub-rogação legal: "Na
sub-rogação legal o sub-rogado não poderá exercer os direitos e as ações do
credor, senão até à soma, que tiver desembolsado para desobrigar o devedor"
(art. 350).
Portanto, na sub-rogação convencional as partes podem dispor
diferentemente. Mas, se não houver pacto expresso, tem plena aplicação o
disposto no art. 350.
O art. 351 fala de pagamento parcial ao credor originário: "O credor
originário, só em parte reembolsado, terá preferência ao sub-rogado, na
cobrança da dívida restante, se os bens do devedor não chegarem para saldar
inteiramente o que a um e outro dever."
Suponha-se que a dívida seja de 1.000. Um terceiro paga 500 e sub-roga-
se nos direitos dessa importância. O devedor fica então a dever 500 ao credor
111
originário e 500 ao sub-rogado. Quando da cobrança de seus 500, o credor
originário não encontra bens suficientes para seu crédito de 500.
Terá ele preferência, recebendo, no que tiver, antes do sub-rogado, que
ficará irressarcido. Alguns vêem injustiça na solução, acreditando melhor na
solução italiana que manda fazer um rateio entre sub-rogante e sub-rogado, que
suportariam igualmente a insolvência do devedor. No entanto, quem se sub-
roga na forma atualmente prescrita assume o risco da insolvência do devedor.
Disso já tem ciência pelos termos expressos no artigo mencionado.
DDDDA IMPUTAÇÃO DOA IMPUTAÇÃO DOA IMPUTAÇÃO DOA IMPUTAÇÃO DO PAGAMENTOPAGAMENTOPAGAMENTOPAGAMENTO
1- Definição e elementos
Pode acontecer que o pagamento se mostre insuficiente para saldar todas
as dívidas do mesmo devedor ao mesmo credor. Surge então a dificuldade de
saber a qual ou a quais dessas dívidas se deve aplicar o pagamento oferecido. A
essa aplicação se denomina imputação do pagamento, que se define como
operação por via da qual, dentre vários débitos do mesmo devedor para com o
mesmo credor, se determina em qual deles se deve aplicar o pagamento.
Dela se ocupa o Código Civil, art. 352: a pessoa obrigada, por dois ou
mais débitos da mesma natureza, a um só credor, tem o direito de indicar a qual
deles oferece pagamento, se todos forem líquidos e vencidos.
De acordo com esse dispositivo, a imputação pressupõe cinco elementos:
a) dualidade ou multiplicidade de débitos;
b) identidade de credor e de devedor;
c) os débitos devem ser da mesma natureza;
112
d) devem estes ser ainda líquidos e vencidos;
e) o pagamento deve cobrir qualquer desses débitos.
Em primeiro lugar, a imputação supõe a existência de dois ou mais
débitos. Essa a regra geral. Sem dualidade ou multiplicidade de dívidas, não se
justifica a imputação do pagamento. Como exceção, admite-se esta no caso de
uma única dívida, se esta vence juros. Nessa hipótese, segundo o art. 354,
imputa-se o pagamento primeiro nos juros vencidos, e, depois, no capital.
A segunda condição diz respeito à identidade de credor e devedor. Citado
art. 352 alude a dois ou mais débitos a um só credor. Claro, porém, que, em se
tratando de obrigação solidária ativa, o credor é sempre um só, para efeito de
imputação do pagamento e extinção da obrigação.
A imputação requer, em terceiro lugar, que as dívidas sejam da mesma
natureza, vale dizer, tenham por objeto coisas fungíveis de idêntica espécie e
qualidade. Não é possível, assim, imputação do pagamento quando os débitos
não compartilham da mesma natureza. Uma pessoa que devesse a outra R$
10.000,00 e um automóvel, que lhe vendera anteriormente, pagando ao credor
R$ 5.000,00, não poderia imputar essa quantia no débito referente ao veículo.
Seriam, no entanto, da mesma natureza, proporcionando destarte a imputação,
débitos provenientes de aluguéis, empréstimos em dinheiro e fornecimento de
mercadorias. Em tal caso, tendo todos a mesma natureza, o devedor pode
indicar em qual deles pretende se faça imputação do pagamento oferecido.
Em quarto lugar, as dívidas devem ser líquidas e vencidas. Considera-se
líquida a obrigação certa quanto à sua existência e determinada quanto ao seu
objeto. Vencida, por sua vez, é a exigível, por ter ocorrido o termo prefixado
para o vencimento. Não é impossível imputação em dívida condicional, antes
do implemento da condição. O mesmo acontece no tocante à dívida ainda não
vencida, salvo se estipulado o prazo em favor do devedor (art. 133 do CC), caso
em que, para efeito de imputação, o débito é havido como vencido.
113
Finalmente, o último requisito exigido é o de que o pagamento se mostre
suficiente para extinguir pelo menos uma dívida ou outra, na qual pretenda o
devedor imputá-lo. Se o pagamento não basta para extinguir ao menos uma das
dívidas, descabe a imputação, porquanto, do contrário, se constrangeria o credor
a receber pagamento parcial, ao que evidentemente se não acha obrigado (art.
314). Amortização, ou pagamento parcelado do débito, só se permite quando
convencionada entre as partes.
Oferecido pagamento pelo devedor, para imputação numa das dívidas,
líquidas e vencidas, não pode o credor recusá-lo; se o fizer, incorrerá em mora
accipiendi, e o devedor terá direito de requerer consignação, a fim de que o
pagamento se impute na dívida designada.
2- Imputação do devedor
A imputação realizar-se-á por indicação do devedor, ou do credor, e ainda
em virtude de lei. Existem, assim, três espécies de imputação: do devedor, do
credor e legal.
Na primeira, a regra fundamental é a de que o devedor que paga tem
direito de declarar qual o débito que almeja resgatar. Mas não é livre a
imputação, e naturalmente comporta exceções:
a) havendo capital e juros, o pagamento imputar-se-á primeiro nos juros
vencidos, e depois no capital, salvo estipulação em contrário, ou se o credor
passar a quitação por conta do capital (art. 354). Nessas condições, não pode o
devedor, pagando certa quantia ao credor, pretender que ela seja imputada no
capital, quando se acha a dever juros deste. Ressalva-se, todavia, pacto em
contrário, ou se o credor concorda com a aplicação no capital;
b) não pode o devedor imputar aquilo que paga numa dívida cujo
montante seja maior. Do contrário, o credor seria obrigado a receber por partes,
114
quando assim não se ajustara, com violação do art. 314. Muda o caso de figura,
porém, se o accipiens aceita o pagamento parcelado;
c) o devedor não pode imputar pagamento numa dívida ainda não
vencida, se convencionado o prazo respectivo em proveito do credor. Nas
obrigações, geralmente, o prazo é estabelecido em favor do devedor, caso em
que pode este renunciá-lo, tendo-se, assim, por vencida a dívida. Nessa
hipótese, admissível se torna a imputação no débito, cujo prazo se renuncia.
Não lhe será lícito fazê-lo, porém, se esse prazo se convenciona em proveito
exclusivo do credor. A imputação do devedor não pode ser prejudicial ao
credor.
3- Imputação do credor
Quando o devedor não declara qual das dívidas quer pagar, ao credor
compete efetuar a imputação. É o que se chama imputação do credor. Cabe
então a este, logo que passa quitação (art. 319), exercer seu direito. Não pode
fazê-lo posteriormente, em outra oportunidade. Perdida a ocasião, passa a atuar
a imputação legal. Dispõe a respeito o art. 353 que, "não tendo o devedor
declarado em qual das dívidas líquidas e vencidas quer imputar o pagamento, se
aceitar a quitação de uma delas, não terá direito a reclamar contra a imputação
feita pelo credor, salvo provando haver ele cometido violência ou dolo".
4- Imputação legal
Se o devedor não fizer a indicação do art. 352, e a quitação for omissa
quanto à imputação, esta se fará nas dívidas líquidas e vencidas em primeiro
lugar. Se as dívidas forem todas líquidas e vencidas ao mesmo tempo, a
imputação far-se-á na mais onerosa (art. 355).
115
É a chamada imputação legal, cujas regras, preconizadas pela doutrina
são as seguintes:
a) preferência da dívida vencida em face de não vencida;
b) preferência da dívida líquida em concorrência com a ilíquida;
c) sendo todas líquidas, na mais onerosa;
d) em igualdade de ônus, na mais antiga;
e) preferência dos juros vencidos em concorrência com o capital;
f) preferência da dívida existente no próprio nome do devedor,
isoladamente, em concorrência com aquela por ele solidariamente devida.
A expressão dívida mais onerosa comporta diversos esclarecimentos:
a) é mais onerosa a que produz juros, relativamente à que não produz;
b) a que produz juros mais elevados em relação à que os produz mais
módicos;
c) a que for garantida por hipoteca, ou outro direito real, em relação à que
não contém esse ônus;
d) a que justificar ação executiva, em relação à que apenas enseja ação
ordinária;
e) a garantida por cláusula penal, em relação à que não encerra essa pena;
f) a garantida por fiança em relação à não assegurada;
g) aquela em que o solvens é devedor principal e não mero coobrigado;
h) a já ajuizada, em relação àquela que não o foi;
i) a caucionada, em relação à não caucionada.
Por fim, edita o art. 379 que, sendo a mesma pessoa obrigada por várias
dívidas compensáveis, serão observadas, no compensá-las, as regras
estabelecidas quanto à imputação de pagamento.
116
DA DAÇÃO EM PAGAMENTODA DAÇÃO EM PAGAMENTODA DAÇÃO EM PAGAMENTODA DAÇÃO EM PAGAMENTO
1- Conceito
Se o credor consentir, a obrigação pode ser resolvida substituindo-se seu
objeto. Dá-se algo em pagamento, que não estava originalmente na obrigação.
Esse é o sentido da datio in solutum. Só pode ocorrer com o consentimento do
credor, pois ele não está obrigado a receber nem mesmo coisa mais valiosa (art.
313).
O art. 356 fala da substituição da prestação: "o credor pode consentir em
receber prestação diversa da que lhe é devida". A dação em pagamento, como
se nota, não se restringe à substituição de dinheiro por coisa. Basta que se
substitua, quando do cumprimento da obrigação, o objeto original dela. É um
acordo liberatório que só pode ocorrer após o nascimento da obrigação. Pode
consistir na substituição de dinheiro por coisa (rem pro pecuni), como também
de uma coisa por outra (rem pro re), assim como a substituição de uma coisa
por uma obrigação de fazer.
Quando existe entrega de uma coisa, em substituição, há alienação, daí
por que sua analogia com a compra e venda, decantada pelo art. 357. Assim,
quando se substitui, com aquiescência do credor, o objeto da prestação, ocorre a
dação.
É de se notar que se a obrigação for alternativa, ou mesmo facultativa, só
haverá a datio in solutum se nenhuma das prestações originalmente avençadas
for cumprida, e sim uma prestação totalmente estranha ao pacto original.
Sua utilidade é grande no comércio jurídico, mormente quando há falta de
numerário por parte do devedor ou escassez de mercadoria originalmente
117
prometida. É mais conveniente para o credor receber coisa diversa do que nada
receber ou receber com atraso.
2- Requisitos e Natureza Jurídica
Para que ocorra a dação, há necessidade de uma obrigação inicialmente
criada, um acordo posterior, em que o credor concorda em aceitar coisa diversa
e, por fim, a entrega da coisa diversa com a finalidade de extinguir a obrigação.
Trata-se, pois, de negócio jurídico bilateral, oneroso e real, pois implica a
entrega de uma coisa (a não ser que a prestação substituída seja de fazer ou não
fazer, pura e simples). Sua finalidade é extinguir a dívida. Se a coisa entregue
foi imóvel, segue todas as regras aplicadas às alienações de imóveis:
necessidade de escritura pública se superior ao valor legal, outorga conjugal etc.
Na dação em pagamento não há necessidade de equivalência de valor na
substituição. Não há nem mesmo necessidade de que as partes expressem um
valor. Tão só que manifestem sua intenção de extinguir a dívida com a entrega.
Pode a dação ser parcial. Parte do conteúdo da obrigação é substituído. O
devedor, por exemplo, não tendo dinheiro suficiente, dá parte em dinheiro e
parte em espécie. Pode também o credor concordar em receber parcialmente in
solutum remanescendo parte da dívida na obrigação originária. Aí, há
necessidade de se explicitar o valor que fica em aberto.
Não existe dação no pagamento com títulos de crédito, porque, aí, haverá
cessão de crédito (art. 358).
O pagamento com cheque é pagamento e não dação; assim também o
pagamento feito por cartão de crédito. Se houver substituição de título de
crédito, o problema transfere-se para o instituto da novação.
A aceitação da dação em pagamento depende de plena capacidade do
credor. Se o credor for incapaz, sem autorização judicial não poderá fazê-lo,
118
pois possibilitará acarretar prejuízo. O representante necessita de poderes
especiais para dar esse tipo de quitação, que foge ao exato cumprimento da
obrigação. O mandatário com poderes gerais não poderá aceitá-la.
3- Equiparação da Datio in Solutum à Compra e Venda
Dispõe o art. 357: "determinado o preço da coisa dada em pagamento, as
relações entre as partes regular-se-ão pelas normas do contrato de compra e
venda".
A contrario sensu, portanto, se não foi determinado o preço da coisa que
substitui a obrigação, não serão aplicados os dispositivos da compra e venda.
A questão tem importância na dação de imóvel porque deve constar um
valor, ao menos para fins fiscais. Daí por que a equiparação ora tratada tem
maior aplicação quando da entrega de imóvel, quando as partes estipulam valor
no negócio. Lembre-se de que equiparação não é identidade. O que é
equiparado não é igual.
Tratando-se de negócio jurídico oneroso, aplicam-se todas as regras
atinentes ao negócio, suas questões de nulidade e anulabilidade, haja vista que,
com frequência, pode ocorrer fraude contra credores e simulação na dação em
pagamento.
O art. 357 incide tanto se o bem objeto da dação for móvel quanto se for
imóvel. No caso de perda da coisa pela evicção, repristina-se a obrigação
originária. Essa é a opção do legislador: "se o credor for evicto da coisa
recebida em pagamento, restabelecer-se-á a obrigação primitiva, ficando sem
efeito a quitação dada".
O art. 359 acrescenta, porém, ao final: "ressalvados os direitos de
terceiros". Trata-se de efeito semelhante à condição resolutiva. Os terceiros, no
caso concreto, não podem ser prejudicados pela ineficácia da dação em
119
pagamento, sob pena de instabilidade nas relações negociais. O terceiro
protegido, no caso, é o de boa-fé.
O mesmo não deve ocorrer no tocante a vício redibitório na coisa
entregue. O legislador a ele não se referiu. Vigoram aí os princípios dos vícios
redibitórios. Já no caso de perda pela evicção, total ou parcial, a situação é
como se não tivesse havido quitação; a obrigação mantém-se tal como contraída
originalmente.
Note-se, contudo, que a fiança não se restabelece por disposição expressa
de lei: o fiador ficará desobrigado, "se o credor, em pagamento da dívida,
aceitar amigavelmente do devedor objeto diverso do que este era obrigado a lhe
dar, ainda que depois venha a perdê-lo por evicção" (art. 838, III).
As garantias reais, no entanto, permanecem. Contudo, como é expresso o
estatuto civil, em benefício da aparência no Direito, devem ser protegidos os
terceiros de boa-fé, adquirentes, por exemplo, de imóvel que já se liberara da
hipoteca pela dação em pagamento da dívida. Se a evicção ocorre quando já
estava liberado o imóvel no registro de imóveis, não podem ser prejudicados os
terceiros de boa-fé.
Se o objeto não for pecuniário e houver substituição por outra coisa, a
analogia é com a troca (art. 533) e não com a compra e venda.
120
DA CONFUSÃODA CONFUSÃODA CONFUSÃODA CONFUSÃO
1- Conceito e Natureza Jurídica:
Na obrigação, é essencial a existência de dois pólos, um credor do lado
ativo e um devedor do lado passivo.
Ninguém pode ser credor ou devedor de si mesmo. Quando, por fatores
externos à vontade das partes, as características de credor e devedor se fundem,
se confundem na mesma pessoa, há impossibilidade lógica de sobrevivência da
obrigação.
Portanto, há confusão na acepção do direito obrigacional ora em estudo,
quando se reúnem na mesma pessoa a qualidade de credor e devedor.
Art. 381: “Extingue-se a obrigação, desde que na mesma pessoa se
confundam as qualidades de credor e devedor”.
Ex.: Antônio, filho de João, é credor deste último. Com a morte de João,
Antônio, seu herdeiro, passa a possuir as qualidades de credor e devedor ao
mesmo tempo e o débito se extingue.
Já se discutiu se este é realmente um meio de extinção de dívidas ou uma
paralisação do direito creditório, porque uma vez cessado o estado de confusão,
restabelece-se a obrigação, com todos os seus acessórios (art. 384).
Não há, modernamente, como se sustentar que a dívida não se extinga.
Os códigos modernos tratam do fenômeno como extinção da obrigação. A
possibilidade de a obrigação restabelecer-se não inibe o efeito extintivo, pois o
mesmo fenômeno já ocorre na dação em pagamento (art. 359). O princípio que
governa a extinção da obrigação não reside num pagamento, mas numa
incompatibilidade lógica de persistência do vínculo.
121
2- Fontes da Confusão:
A confusão pode originar-se de uma transmissão universal de patrimônio:
a) Esse fenômeno pode ocorrer causa mortis, o que é mais comum. O
herdeiro passa a ter ambas as qualidades de credor e devedor com o
desaparecimento do autor da herança, e a dívida se confunde.
b) Pode ocorrer por ato entre vivos quando, por exemplo, uma empresa,
credora de outra, vem a receber, por qualquer razão (um decreto governamental,
por exemplo), todo o patrimônio da última. Os débitos confundem-se até onde
se compensarem.
Não obstante, não se confundem confusão e compensação. Na confusão,
há identidade de pessoas, credor e devedor, com relação a um único débito; na
compensação, há existência de dois créditos que se eliminam.
Pode o fenômeno derivar de um título singular, no caso, por exemplo, de
alguém ter uma dívida com outrem que lhe faz legado de crédito, já que o
legado importa numa transmissão a título singular e não universal. Também
pode derivar de cessão de crédito, de sub-rogação.
Pode ocorrer, inter vivos, por ato gratuito ou oneroso.
3- Espécies:
A confusão pode extinguir toda a dívida ou apenas parte dela. Assim,
tem-se a confusão total ou parcial. Se no fato causa mortis o herdeiro é apenas
credor de uma parte de dívida divisível do de cujus, a confusão é parcial.
No caso de dívida indivisível, a questão resolve-se pelos princípios já
vistos da indivisibilidade das obrigações, não deixando de existir, porém, a
confusão parcial.
122
No caso de herança, existindo sempre o benefício de inventário (art.
1.792), tem-se que enquanto houver separação de patrimônios entre credor e
devedor, isto é, enquanto não houver partilha, não se opera a confusão.
Nos títulos ao portador, como eles são circuláveis por natureza, a
confusão será meramente transitória, pois a qualquer momento o portador pode
transferi-los.
O art. 383 trata da confusão na solidariedade: “A confusão operada na
pessoa do credor ou devedor solidário só extingue a obrigação até a
concorrência da respectiva parte no crédito, ou na dívida, subsistindo quanto ao
mais a solidariedade”.
Ou seja, mesmo no caso de solidariedade os efeitos da confusão são
limitados à parcela do crédito ou débito que se confundiram em uma única
pessoa. Não se comunica aos demais credores ou devedores solidários.
4- Efeitos:
O efeito primordial é extintivo da obrigação.
A questão que se destaca é a colocada no art. 384: o restabelecimento da
obrigação, uma vez cessada a confusão. Por exemplo: alguém é devedor de um
estabelecimento e vem a adquiri-lo. Operou-se a confusão. Posteriormente,
aliena o mesmo estabelecimento. Restabelece-se a obrigação primitiva. O
dispositivo é peremptório no sentido de que também revivem todos os
acessórios da obrigação. Revigora-se a fiança e a hipoteca que garantiam a
dívida, por exemplo.
É preciso, contudo, ressalvar que, mesmo no regime do CC/02, cujo art.
384 tem a amplitude acima acusada, as garantias reais e os direitos de terceiros
têm de ser respeitados, quando constituídas aquelas ou adquiridos estes na
pendência do efeito extintivo da confusão. Se, p. ex., a restauração da garantia
123
hipotecária defronta uma nova inscrição, realizada após aquela extinção, não
terá sobre ela prioridade, pois que perde o grau que anteriormente gozava.
Se a confusão extingue as obrigações acessórias, a recíproca não ocorre.
Se existe confusão na pessoa do credor e do fiador, extingue-se a fiança,
que é acessória, mas não a obrigação principal. A questão também é de
impossibilidade lógica.
5- Requisitos:
a) uma só pessoa reúna as qualidades de credor e devedor.
b) deve ocorrer essa reunião de qualidades em relação a uma mesma
obrigação.
c) há necessidade de que não haja separação de patrimônios. (Se o diretor
de uma empresa, como pessoa física, é credor da pessoa jurídica, há distinção
de patrimônios, não ocorrendo a confusão. O mesmo ocorre na herança ainda
não atribuída).
DA REMISSÃODA REMISSÃODA REMISSÃODA REMISSÃO
1- Definição:
Remissão é a liberação graciosa de uma dívida, ou a renúncia efetuada
pelo credor, que, espontaneamente, abre mão de seus direitos creditórios,
colocando-se na impossibilidade de exigir-lhes o respectivo cumprimento.
A remissão da dívida, aceita pelo devedor, extingue a obrigação, mas sem
prejuízo de terceiro (art. 385).
124
A aceitação do devedor, expressa ou tácita, é pressuposto indispensável a
que a remissão possa extinguir a obrigação. O devedor opondo-se à remissão,
nada poderá impedi-lo de realizar o pagamento.
Para que se mostre eficaz, preciso se torna que o remitente seja capaz de
alienar, e o remitido capaz de adquirir. Assim se expressa o art. 386, in fine, do
Código Civil.
No tocante ao primeiro – remitente – , exige-se, imprescindivelmente,
essa idoneidade jurídica, mesmo porque remissão vale alienação, a qual requer,
para a sua eficácia, plena capacidade do agente. Em relação ao segundo –
remitido –, porém, dispensável se tornava expressa referência do legislador, em
face da regra geral de que todo ente é capaz de direitos e obrigações, na ordem
civil.
Cumpre não confundir remissão e renúncia. De modo geral, esta é o
gênero, de que aquela é a espécie. Em verdade, entretanto, elas se equivalem
quanto aos seus efeitos. A renúncia, mais ampla, pode incidir sobre
determinados direitos pessoais de natureza não patrimonial. A remissão, ao
revés, é peculiar aos direitos creditórios. Mas a remissão reveste-se de caráter
convencional, porquanto depende de aceitação do remitido, que, no caso de
recusa, pode socorrer-se da ação de consignação em pagamento.
2- Espécies:
A remissão pode ser total ou parcial. É sempre um ato de disposição do
credor. Se ele não é obrigado a receber parcialmente a dívida, pode perdoá-la
parcialmente. Persistirá o débito no montante não remitido.
Pode ser também expressa ou tácita.
Será expressa, de forma contratual ou não, quando firmada por escrito,
público ou particular, declarando o credor que não deseja receber a dívida. Não
125
há necessidade da palavra remissão, mas a intenção deve ser clara. Por se tratar
de ato de disposição, não é de admitir interpretação ampliativa. A interpretação
do negócio deve ser restritiva.
A remissão expressa pode decorrer também de ato causa mortis, de um
testamento. A remissão de dívida por testamento é típico ato de última vontade
e segue as formalidades do negócio testamentário. Não será válida, se inválido
for o testamento.
Os arts. 386 e 387 trazem situações de remissão tácita.
Art. 386. A devolução voluntária do título da obrigação, quando por escrito particular, prova desoneração do devedor e seus co-obrigados, se o credor for capaz de alienar, e o devedor capaz de adquirir.
Art. 387. A restituição voluntária do objeto empenhado prova a renúncia do credor à garantia real, não a extinção da dívida.
Há, em ambos, uma presunção de perdão da dívida.
O primeiro dos dispositivos fala da entrega voluntária do título da
obrigação, quando por escrito particular. Diz a lei que tal tradição do título
“prova a desoneração do devedor e seus coobrigados, se o credor for capaz de
alienar, e o devedor, capaz de adquirir". Destarte, incumbe que a entrega do
título (particular, não pode ser de escritura pública) seja espontânea, com a
intenção de perdoar a dívida. A presunção, de qualquer modo, não é absoluta,
pois o ato pode emanar de erro, por exemplo. De qualquer modo, feita a entrega
do título, é o credor que deve provar que sua intenção não foi de remitir.
Quando o título for representado por escritura pública, a contrario sensu,
é imprescindível a remissão expressa.
A situação do art. 387 diz respeito à entrega da coisa empenhada. Tal
entrega implica renúncia à garantia pignoratícia, que se perfaz com a tradição.
Prova a renúncia à garantia, mas não a remissão da dívida. O que a tradição
126
prova é o desaparecimento da garantia real. A garantia pignoratícia é acessória.
Pode desaparecer o acessório, sem desaparecer o principal.
Do mesmo modo, pode o credor abrir mão da fiança ou da hipoteca, sem
abrir mão de seu crédito.
Por fim, destaca-se que apenas as obrigações de índole privada podem ser
objeto de remissão. O perdão da dívida pública depende de autorização
legislativa.
3- Outras disposições
• A remissão concedida a um dos co-devedores extingue a dívida na parte a
ele correspondente; de modo que, ainda reservando o credor a solidariedade
contra os outros, já lhes não pode cobrar o débito sem dedução da parte
remitida (art. 388).
O credor só pode exigir dos demais co-devedores o restante do crédito,
deduzida a quota do remitido. Os consortes não beneficiados pelo perdão só
poderão ser demandados, não pela totalidade, mas com abatimento da quota
relativa ao devedor relevado.
• Em se tratando de obrigação indivisível, se um dos credores remitir a dívida,
a obrigação não ficará extinta para com os outros; mas estes só a poderão
exigir descontada a quota do credor remitente (art. 262).
• Segundo o art. 334, a entrega do título ao devedor firma a presunção de
pagamento. De acordo, porém, com o estatuído no art. 386, a devolução do
título prova a desoneração do devedor. Pergunta: a entrega do título prova o
pagamento ou apenas a desoneração do devedor?
127
Resposta: se o devedor alega que pagou, a posse em que se acha do
escrito da dívida faz presumir o pagamento e que o título lhe foi entregue
pelo credor; mas, se alega que o credor lhe remitiu a dívida, já não será
suficiente a posse do título: deve provar ainda que foi o próprio credor quem
espontaneamente lho entregou.
• A Lei n. 5.172, de 25-10-1966, que dispõe sobre o Código Tributário
Nacional, prevê, em seu art. 172: "A lei pode autorizar a autoridade
administrativa a conceder, por despacho fundamentado, remissão total ou
parcial do crédito tributário, atendendo: I — à situação econômica do sujeito
passivo; II — ao erro ou ignorância, escusáveis do sujeito passivo, quanto a
matéria de fato; III — a diminuta importância do crédito tributário; IV — a
considerações de eqüidade, em relação com as características pessoais ou
materiais do caso; V — a condições peculiares a determinada região do
território da entidade tributante".
DA NOVAÇÃODA NOVAÇÃODA NOVAÇÃODA NOVAÇÃO
1- Definição e espécies de novação:
A novação corresponde a meio liberatório singular, sendo modo especial
de extinguir-se a obrigação. Chega-se a compará-la a um pagamento fictício.
Define-se como "a conversão de uma dívida em outra para extinguir a
primeira".
É a substituição de uma dívida por outra, eliminando-se a precedente.
Desaparece a primeira, e, em seu lugar, surge nova.
128
Esse o seu conteúdo essencial, aliás, duplo: um extintivo, referente à
obrigação antiga; outro gerador, relativo à obrigação nova. Não existe, pois,
tão-somente, uma transformação; o fenômeno é mais complexo, abrangendo a
criação de nova obrigação, que se substitui à antiga.
Divide-se a novação em objetiva ou real e subjetiva ou pessoal. Consiste
a primeira na mutação do objeto devido entre as mesmas partes. A segunda, por
seu turno, implica mudança de um ou de ambos os sujeitos da obrigação, ativo
ou passivo.
Três são, portanto, os modos por que se opera a novação:
- pela mudança de objeto da prestação;
- pela mudança do devedor; e
- pela mudança do credor.
O Código Civil ocupa-se de cada um desses modos no art. 360, segundo o
qual se dá a novação:
I - quando o devedor contrai com o credor nova dívida para extinguir e
substituir a anterior (novação pela mudança de objeto);
II - quando novo devedor sucede ao antigo, ficando este quite com o
credor (novação pela mudança do devedor);
III - quando, em virtude de obrigação nova, outro credor é substituído ao
antigo, ficando o devedor quite com este (novação pela mudança do credor).
No n. I cuida o Código da novação objetiva ou real, e, nos n. II e III, da
novação subjetiva ou pessoal.
a) Novação objetiva ou real:
De acordo com o n. I, existe novação objetiva ou real no seguinte
exemplo: um indivíduo deve a outro a soma de R$ 100.000,00; no respectivo
vencimento convencionam ambos que a importância devida se converta em
renda vitalícia ou perpétua. Outro exemplo: no vencimento daquela mesma
129
obrigação, o credor pede ao devedor que, em vez de solvê-la, fique com ela
como depositário. Num e noutro caso ocorre novação objetiva, porque nova
obrigação surge entre as partes, extinguindo-se a primeira.
Mas existe novação objetiva não só quando se muda a causa debendi
(exemplo do mútuo transformado em depósito), como também quando se
modifica a natureza da prestação: uma obrigação de dar substituída por outra de
fazer, ou vice-versa; uma obrigação genérica substituída por outra específica,
ou vice-versa, e assim por diante.
Em suma, verifica-se novação objetiva, sempre que haja transformação
contratual, entre as mesmas partes anteriormente vinculadas, de uma obrigação
em outra.
b) Novação subjetiva ou pessoal:
Por sua vez, a primeira modalidade de novação subjetiva decorre da mu-
dança de devedor (mutatio debitoris). Essa mudança efetua-se de dois modos:
pela delegação e pela expromissão.
Na primeira – delegação – a substituição do devedor opera-se com o
consentimento deste. O primeiro devedor encarrega o segundo de pagar ao
credor em seu lugar. Por exemplo, o indivíduo “A” deve a “B” a quantia de R$
100.000,00. O primeiro entende-se com o segundo, propondo-lhe que o
indivíduo “C” fique como seu devedor, extinguindo-se a dívida de “A”. Aceita
a proposta, perfaz-se a delegação.
Insista-se, porém: a delegação só importa novação se houver extinção da
primitiva obrigação; se não houver liberação do primeiro devedor, inexistirá
novação.
A segunda espécie de novação subjetiva resulta da expromissão. Ocorre
esta se a substituição do devedor se efetua sem o seu consentimento (ignorante
ou invito debitore). O novo devedor, espontaneamente, contrai com o credor
130
nova dívida, com o objetivo de extinguir-se o débito do primitivo devedor: “A”
deve a “B” R$ 100.000,00. “C”, que é amigo de “A” e sabe da existência do
débito, pede ao credor libere “A”, ficando “C” como devedor. Configura-se
assim a expromissão, que se resume, portanto, num ajuste exclusivo entre o
credor e o terceiro, que assume a dívida. Prescinde-se nela do consentimento do
devedor. Dispõe, efetivamente, o art. 362 que "a novação por substituição do
devedor pode ser efetuada independentemente do consentimento deste".
Por sua vez, tem-se a novação subjetiva pela mudança do credor (mutatio
creditoris). Verifica-se ela quando, em virtude de obrigação nova, outro credor
se substitui ao antigo, ficando o devedor quite com este. Por exemplo: “A”
deve-me R$ 100.000,00; proponho-me, porém, a liberá-lo da obrigação, caso
ele concorde em contrair com “B” débito de igual quantia. A proposta é aceita,
a dívida de “A” para comigo desaparece, e em seu lugar nova dívida surge, de
“A” para com “B”.
2- Requisitos
Para que ocorra a novação exigem-se os seguintes requisitos:
a) existência de obrigação anterior, que se extingue com a constituição de
nova, que a substitui (obligatio novanda);
b) criação dessa nova obrigação, em substituição à anterior, que se ex-
tingue (aliquid novi);
c) intenção de novar (animus novandi).
O primeiro requisito consiste na existência de obrigação anterior. Não
podem ser objeto de novação obrigações nulas ou juridicamente inexistentes.
Não se pode novar o que não existe. Assim dispõe o art. 367: "Salvo as
obrigações simplesmente anuláveis, não podem ser objeto de novação
obrigações nulas ou extintas".
131
Quando se tratar, porém, de obrigação simplesmente anulável, pode ser
confirmada pela novação.
No tocante às obrigações naturais, tem-se que elas não comportam
novação, porque insuscetíveis de pagamento compulsório.
Quanto à obrigação condicional, por sua vez, é ela passível de novação. A
nova dívida, que se contrair em substituição à primeira, poderá ser, por sua vez,
pura e simples ou também condicional. Neste último caso, a validade da
novação dependerá do implemento da condição (resolutiva ou suspensiva), a
que se subordina a obrigação.
O segundo requisito da novação diz respeito à criação de nova obrigação,
em lugar da anterior, que se extingue. Torna-se necessário que a nova tome o
lugar da antiga. Se assim não acontece, se apenas ocorre eliminação da dívida
antiga, haverá mera remissão, isto é, liberação graciosa por parte do credor. Se
nula a nova obrigação, inexistirá igualmente novação, subsistindo a antiga. Mas
essa nova obrigação, como se frisou, pode ser pura e simples, ou sujeita a termo
ou condição. Tudo depende da convenção das partes.
O terceiro requisito prende-se à intenção de novar. Para que se exteriorize
esse elemento interno não se reclama o uso de palavras sacramentais ou
fórmulas predeterminadas. Urge, porém, que o animus resulte de modo claro,
induvidoso, sem possibilidade de impugnações. Em caso de perplexidade,
exclui-se a ideia de novação, devendo cogitar-se, de preferência, da constituição
de nova obrigação.
A doutrina não ministra critério seguro e certo para identificação do
animus novandi. Deve este ser investigado em cada caso, tendo em vista suas
peculiaridades. De modo geral, todavia, pode-se afirmar que o animus novandi,
quando não consignado em termos expressos, existirá sempre que venha a
ocorrer incompatibilidade entre a antiga e a nova obrigação, tornando-se
impossível a coexistência de ambas.
132
Nessas condições, não há novação quando à obrigação apenas se
adicionam novas garantias, quando se concede moratória ao devedor, quando se
lhe defere abatimento de preço, maiores facilidades de pagamento ou reforma
do título.
Discutiu-se se existe novação quando alguém, devendo a outrem certa
quantia, proveniente da compra de objeto, ou por outra razão, lhe passa uma
cambial. Em tal conjuntura, preferível a opinião daqueles que sustentam
inexistir novação, destinando-se o título emitido, salvo circunstâncias especiais,
a facilitar a cobrança do débito. Simples emissão de cambial, sem outra
declaração de vontade, expressa ou tácita, não constitui novação.
Em resumo: intenção de novar não se presume. Deve ser expressa ou
tacitamente declarada pelas partes ou resultar, de modo inequívoco, da natureza
das obrigações, inconciliáveis entre si. Não havendo ânimo de novar, a segunda
obrigação confirma simplesmente a primeira (art. 361).
3- Efeitos da novação
O mais importante efeito da novação é a extinção da dívida antiga,
substituída por nova, que lhe toma o lugar. Nisso se resume, em última análise,
esse singular fenômeno jurídico. Não há falar em novação quando a dívida
continua a mesma e modificação alguma se verifica nas pessoas dos
contratantes.
A novação extingue os acessórios e garantias da dívida, sempre que não
houver estipulação em contrário (art. 364, primeira parte). A palavra garantias
se tornava desnecessária; nos acessórios se compreendem as garantias.
Abrangem estas tanto as reais como as pessoais, tanto as que resultam da
convenção como as que nascem da lei, como os privilégios.
133
Adverte, todavia, a segunda parte do art. 364 que "não aproveitará,
contudo, ao credor ressalvar o penhor, a hipoteca ou a anticrese, se os bens
dados em garantia pertencerem a terceiro que não foi parte na novação".
Operada a novação entre o credor e um dos devedores solidários, somente
sobre os bens do que contrair a nova obrigação subsiste as preferências e
garantias do crédito novado. Os outros devedores solidários ficam, por esse
fato, exonerados (art. 365).
Importa exoneração do fiador a novação feita sem seu consenso com o
devedor principal (art. 366). Se a obrigação novada for à fiança, inalterada se
conservará a obrigação principal.
Finalmente, na novação subjetiva, "se o novo devedor for insolvente, não
tem o credor, que o aceitou, ação regressiva contra o primeiro, salvo se este
obteve por má-fé a substituição" (art. 363).
DA COMPENSAÇÃODA COMPENSAÇÃODA COMPENSAÇÃODA COMPENSAÇÃO
1- Definição e pressupostos
Define-se a compensação como a extinção de duas obrigações, cujos
credores são ao mesmo tempo devedores um do outro. Ou, então, é o desconto
que reciprocamente se faz no que duas pessoas devem uma à outra.
Controverte-se sobre a sua natureza jurídica:
a) pagamento fictício;
b) dupla confusão;
C) modo particular de extinção das duas obrigações e que decorre da
especial posição em que estas se encontram.
134
Para o Código Civil Brasileiro de 2002, compensação é modo indireto de
extinção das obrigações.
Será total, se de valores iguais as duas obrigações. Trata-se de mera
aplicação de um princípio científico: duas forças iguais e opostas anulam-se.
Será parcial, no caso em que, sendo de valores desiguais, a extinção se
processa até a concorrência dos respectivos valores.
Dispõe, efetivamente, o art. 368 que, "se duas pessoas forem ao mesmo
tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até
onde se compensarem".
Dispõe o art. 369 que "a compensação efetua-se entre dívidas líquidas,
vencidas e de coisas fungíveis".
Logo, seus pressupostos são em número de quatro:
a) reciprocidade das dívidas;
b) que elas sejam líquidas;
c) que sejam vencidas;
d) que sejam homogêneas.
O primeiro requisito diz respeito, por conseguinte, à reciprocidade das
dívidas. Urge que a um débito do devedor corresponda crédito deste contra o
credor. Se o credor nada deve ao seu devedor, não há cogitar de compensação.
O terceiro não interessado pode pagar, se o fizer em nome e por conta do
devedor, salvo oposição deste (art. 304, parágrafo único), mas não tem direito
de compensar. Por outro lado, porém, torna-se incompensável débito do sócio
com o crédito da sociedade, de que faça parte, contra o credor.
O segundo requisito é concernente à liquidez das dívidas. Só dívidas
líquidas são compensáveis. Por dívida líquida se entende a obrigação certa,
quanto à existência, e determinada, quanto ao objeto.
135
Considera-se líquida a dívida que se determina pela natureza, qualidade e
quantidade, e que se expressa por meio de número certo ou de uma cifra. Se a
obrigação depende de prévia apuração, liquidação ou verificação pelos meios
regulares de direito, deixará de ser líquida e não autorizará a compensação. Se o
suposto crédito do devedor contra o respectivo credor depende ainda de prévio
reconhecimento judicial, ilíquido será para os fins do citado art. 369.
Em terceiro lugar, não basta que as dívidas sejam líquidas; exige-se ainda
já estejam vencidas, por ter ocorrido o respectivo vencimento, normal ou
antecipado (arts. 331, 332 e 333, do CC). Quando se tratar de obrigação
condicional, ou a termo, não poderá valer-se o titular da compensação, só
permitida depois do implemento da condição, ou do vencimento do termo. Mas
os prazos de favor, embora consagrados pelo uso geral, não obstam a com-
pensação (art. 372).
Tenha-se presente que a lei só se refere a dívidas vencidas; ela não
subordina a compensação à exigibilidade da obrigação. Assim, a compensação
é possível, posto que uma das dívidas, já vencida, se torne temporariamente
inexigível, por exemplo, em virtude dos favores da moratória, outorgados a um
dos devedores.
Identicamente, não cabe a compensação se uma das dívidas se acha
prescrita e o magistrado acolhe a prescrição alegada pelo devedor, ou a
reconhece de ofício.
Sendo vincenda, a dívida é incompensável.
Por fim, o último requisito concerne à homogeneidade das prestações,
cuja compensação se pretenda. Torna-se preciso que elas sejam fungíveis entre
si. Dívidas em dinheiro só se compensam com dívidas em dinheiro, dívidas de
136
café só se compensam com dívidas de café. Não é possível compensar dívida
em dinheiro com dívida em café.
Todavia, “embora sejam do mesmo gênero as coisas fungíveis, objeto das
duas prestações, não se compensarão, verificando-se que diferem na qualidade,
quando especificadas no contrato” (art. 370). Assim, dívidas de café
pertencentes a determinado tipo só se compensam com produto de igual
qualidade; se diversos os tipos, inviável se tornará a compensação. O mesmo
ocorre com produtos manufaturados.
2- Espécies de compensação
A compensação é legal, convencional ou judicial.
É legal, quando advém da lei; ela independe da vontade das partes e opera
ainda que uma das partes se oponha.
É convencional, quando resulta de acordo das partes, as quais podem tran-
sigir, no sentido de dispensar algum de seus requisitos.
Finalmente, é judicial, quando realizada em Juízo pela autoridade
judiciária, nos casos legais. Esta última espécie inclui-se na compensação legal.
A compensação legal não pode ser declarada ex officio; cumpre ao
interessado alegá-la na fase própria do processo. A convencional produz seus
efeitos no instante em que se estabelece o acordo de vontades.
3- Casos de exclusão da compensação
Dispõe o art. 373 que a diferença de causa nas dívidas não impede a
compensação, exceto:
I- se provier de esbulho, furto ou roubo;
II- se uma se originar de comodato, depósito ou alimentos;
137
III- se uma for de coisa não suscetível de penhora.
No n. I tem-se em mira a aplicação da máxima spoliatus ante omnia
restituendus. Esbulho, furto e roubo constituem atos ilícitos. Se a dívida tiver
uma dessas origens, não comportará compensação. Ex.: devo R$ 100.000,00; o
credor, não logrando obter o respectivo pagamento, por sua própria autoridade,
apodera-se da soma devida. Movo então ao credor ação tendente a obter a
devolução do numerário, de que me vi desapossado. É claro que o credor, réu
nesse feito, não poderá arguir compensação pelo crédito que tem contra mim.
Ainda que as duas dívidas sejam concomitantemente de origem ilícita ou
criminosa, inadmissível se tornará a compensação.
Também em relação ao comodato e ao depósito, que se baseiam,
sobretudo, na mútua confiança reinante entre os interessados, o pagamento só
se efetua mediante restituição da própria coisa emprestada ou depositada. O
credor não é obrigado a receber prestação diversa da que lhe é devida, ainda que
mais valiosa (art. 313). Nessas condições, possível não seria compensá-la por
outra prestação, que desnaturaria a peculiar feição desses contratos, além de
importar quebra de confiança, um dos traços mais característicos desses atos
jurídicos. Só se abre uma exceção, a referente às dívidas provenientes de outro
depósito, como estabelece o art. 638, in fine, do Código Civil.
Art. 638. Salvo os casos previstos nos arts. 633 e 634, não poderá o
depositário furtar-se à restituição do depósito, alegando não pertencer a coisa ao
depositante, ou opondo compensação, exceto se noutro depósito se fundar.
As dívidas alimentares, pela sua índole, não comportam compensação.
Destinam-se os alimentos à subsistência do alimentado, que não tem recursos
138
para viver, nem pode prover às suas necessidades pelo trabalho. Permitir
compensação seria privar o alimentado dos recursos indispensáveis à própria
mantença, condenando-o assim a inevitável perecimento. Por conseguinte, se o
devedor de pensão alimentícia se torna credor da pessoa alimentada, não pode
opor seu crédito, quando exigida a pensão.
Finalmente, não se opera a compensação se uma das dívidas se relaciona
a coisa suscetível de penhora. O Código de Processo Civil, no art. 649, enumera
os casos de impenhorabilidade. A compensação supõe dívidas judicialmente
exigíveis; se uma delas não se acha nessas condições, a compensação se desvela
impraticável.
A lei prevê ainda outros casos em que não cabe a compensação:
a) não pode esta realizar-se, havendo renúncia prévia de um dos
devedores (art. 375, in fine, do CC). Com esse dispositivo, filiou-se o Código à
opinião geralmente seguida de que a compensação comporta renúncia
antecipada.
b) não se admite compensação em prejuízo do direito de terceiro. O
devedor que se torne credor do seu credor, depois de penhorado o crédito deste,
não pode opor ao exequente a compensação, de que contra o próprio credor
disporia (art. 380 do CC). Como modo abreviado de efetuar pagamento, a com-
pensação não pode prejudicar terceiros estranhos à operação. Mas essa proteção
ao direito de terceiros há de ser por estes reclamada e não pelo próprio devedor;
c) igualmente, não haverá compensação quando credor e devedor por
mútuo acordo a excluírem (art. 375, primeira parte, do CC);
139
4- Outros princípios peculiares à compensação
O devedor somente pode compensar com o credor o que este lhe dever;
mas o fiador pode compensar sua dívida com a de seu credor ao afiançado (art.
371). No caso de crédito garantido por fiança, o devedor principal não pode
compensar seu débito com o débito do credor para com o fiador; mas este pode
opor ao credor, em compensação, o que o mesmo deva ao devedor principal.
Em regra, só cabe a compensação entre pessoas que entre si sejam
reciprocamente credor e devedor. Assim, a obrigação do mandante para com
terceiro não se compensa com a do mandatário em relação a esse terceiro; a do
tutor para com terceiro não se compensa com a dívida deste em relação ao
tutelado. A única exceção que se abre a essa regra diz respeito ao fiador, na
forma anteriormente acentuada.
Obrigando-se por terceiro uma pessoa, não pode compensar essa dívida
com a que o credor dele lhe dever (art. 376). Quem se obriga em favor de
terceiro não se exime de sua obrigação, pretendendo compensar-se com o que
lhe deve o credor. Assim deve ser entendido o citado art. 376, para evitar
discrepância com o art. 371.
Dignos de nota os efeitos jurídicos no caso de cessão. Dispõe o art. 377:
"O devedor que, notificado, nada opõe à cessão que o credor faz a terceiros dos
seus direitos, não pode opor ao cessionário a compensação, que antes da cessão
teria podido opor ao cedente. Se, porém, a cessão lhe não tiver sido notificada,
poderá opor ao cessionário compensação do crédito que antes tinha contra o
cedente".
140
Segundo o disposto no art. 290, a cessão de crédito não vale em relação
ao devedor, senão quando a este notificada. Mas a cessão feita sem notificação
não se ressente de nulidade; sem essa notificação, a cessão apenas se considera
res inter alios relativamente ao devedor. Interessante, pois, averiguar a extensão
da cessão, no caso em que o devedor, por sua vez, venha a ser credor do
cedente. Quais os efeitos da cessão no tocante à compensação?
Se, notificado, o devedor nada opõe, perde o direito de compensar; nessa
hipótese, não pode argüir contra o cessionário o meio extintivo, de que
dispunha contra o cedente. Não notificado, porém, assistir-lhe-á o direito de
invocar contra o cessionário a compensação exercitável contra o cedente. Tais
as soluções expressamente consagradas pelo citado art. 377.
Quando as duas dívidas não são pagáveis no mesmo lugar, não se podem
compensar sem dedução das despesas necessárias à operação (art. 378).
Sendo a mesma pessoa obrigada por várias dívidas compensáveis, serão
observadas, no compensá-las, as regras estabelecidas quanto à imputação de
pagamento (art. 379). Quer dizer, ao intentar a compensação, indicará o devedor
à dívida que pretende seja compensada. Se omitir a indicação, a escolha far-se-á
pelo credor, que consignará na quitação a dívida pela qual optou. Silente o
devedor e omissa a quitação, far-se-á a imputação com observância do disposto
no art. 355.
Não se admite a compensação em prejuízo de direito de terceiro. O
devedor que se torne credor do seu credor, depois de penhorado o crédito deste,
não pode opor ao exeqüente a compensação de que contra o próprio credor
disporia (art. 380).
141
Finalmente, cumpre salientar ainda a maneira pela qual se opõe a
compensação. Basta seja invocada na contestação, ou seu acolhimento demanda
formulação de pedido reconvencional?
A nosso ver, ela constitui matéria a arguir-se em contestação, tornando-se,
pois, dispensável oferecimento de reconvenção. Compensar é pagar, e
pagamento vem a ser a arguição de defesa, alegável em contestação (Cód. Proc.
Civil, art. 333, n. II).
Contudo, como há quem julgue necessária a reconvenção, aconselhável se
torna assim se proceda, a fim de pôr-se o interessado a salvo de eventual
malogro judicial, perfeitamente evitável.
A compensação pode ser deduzida igualmente em execução de sentença,
como faculta o art. 741, n. VI, do estatuto processual. A compensação a que
alude o texto é a superveniente, quando o fato extintivo só vem a ocorrer após a
prolação da sentença exequenda.
Ressalte-se ainda que a compensação, mencionada pela lei adjetiva e apta
a determinar a suspensão do curso da execução, só é cabível se existe execução
aparelhada (executio parata). Sentença condenatória que careça de prévia
liquidação não constitui título executório.
CESSÃO DE CRÉDITOCESSÃO DE CRÉDITOCESSÃO DE CRÉDITOCESSÃO DE CRÉDITO
1- Definição e abrangência:
O crédito constitui entidade patrimonial suscetível de transferência.
Quando, no direito, a alienação tem por fim bens imateriais, toma o nome
de cessão.
142
Define-se a cessão de crédito como a transferência que o credor faz a
outrem de seus direitos. Num sentido amplo, porém, a palavra cessão indica a
transferência, a título gratuito ou oneroso, de bens, direitos e ações.
A cessão de crédito é, pois, um negócio jurídico em que o credor transfere
a um terceiro seu direito. O negócio jurídico tem feição nitidamente contratual.
Nesse negócio, o crédito é transferido intacto, tal como contraído;
mantém-se o mesmo objeto da obrigação. Há apenas uma modificação do
sujeito ativo.
Na cessão necessariamente figuram o cedente e o cessionário. O primeiro
é aquele que aliena ou transfere seus direitos e o segundo, aquele que os
adquire, investindo-se na titularidade respectiva. O devedor, a quem
propriamente se costuma denominar cedido, não intervém no ato jurídico. Para
ele, indiferente se torna ter este ou aquele como credor. Interessa-lhe apenas
saber qual o legítimo detentor do crédito, para oportunamente solver-lhe a
prestação. Só para esse fim se lhe comunica a cessão, mas sua anuência ou
intervenção é dispensável.
A cessão induz alienação, e por isso exige plena capacidade por parte do
cedente (CC, art. 104).
Tratando-se de ato que ultrapassa os limites da simples administração,
não pode ser realizado pelo pai, com relação a crédito pertencente ao filho me-
nor, sem prévia autorização do juiz (art. 1.691, CC). Identicamente, para efetuar
cessão, depende o mandatário de poderes especiais e expressos (art. 661, § l,
CC). Se o crédito envolver direito real de garantia, como a hipoteca,
subordinar-se-á naturalmente à existência de outorga uxória, salvo se o regime
do casamento for o da separação de bens.
O tutor não pode constituir-se cessionário de crédito contra o pupilo (art.
1.749 do CC), proibição que igualmente se estende ao curador, no tocante aos
143
débitos de seu curatelado (art. 1.774). Mas o advogado pode tornar-se
cessionário do crédito de cuja cobrança fora encarregado.
2- Créditos suscetíveis de cessão
O credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser a natureza da
obrigação, a lei ou a convenção com o devedor. Contudo, a cláusula proibitiva
da cessão não poderá ser oposta ao cessionário de boa-fé se não constar do
instrumento da obrigação (CC, art. 286).
Em regra, todos os créditos podem ser objeto de cessão; a negociabilidade
é a regra em matéria de direitos patrimoniais, desde que haja boa-fé.
De acordo, porém, com aquele dispositivo legal, créditos existem que não
podem ser cedidos. A interdição decorre da natureza do crédito, de disposição
da lei e de convenção das partes.
Pela sua natureza, não podem ser cedidas relações jurídicas estritamente
pessoais, inerentes à própria pessoa do titular, como as de direito de família,
nome civil e alimentos.
Por lei, não comportam cessão os seguintes direitos e obrigações:
a) a obrigação de fazer, quando infungível a prestação (art. 247 do CC);
b) a preempção (art. 520);
c) a obrigação originada da ingratidão do donatário (art. 560);
d) a do locador de serviços (art. 607);
e) a do mandato, salvo existindo poder de substabelecimento (art. 682, n.
11);
f) o usufruto, exceto na hipótese prevista no art. 1.393 do Código Civil;
g) o benefício da justiça gratuita (Lei n. 1.060, de 5-2-1950, art. 10).
A essa enumeração acrescente-se ainda o direito de remir.
144
São cessíveis, no entanto:
a) o exercício do usufruto (art. 1.393 do CC);
b) o direito de haver reparação do dano causado pelo delito;
c) os aluguéis vincendos de um prédio, cuja percepção constitui direito de
fundo econômico;
d) as indenizações que não tenham caráter alimentar, como despesas de
tratamento médico e hospitalar.
Por fim, a incessibilidade pode resultar de convenção das partes.
3- Espécies de cessão
A cessão de crédito pode ser convencional, legal ou judicial. A primeira
decorre da declaração de vontade entre cedente e cessionário; a segunda
promana da lei, e a terceira resulta de sentença.
Pouco se tem a dizer da cessão convencional, sem dúvida a mais comum.
Efetua-se a título oneroso ou gratuito. No primeiro caso, constitui espécie de
venda, com a diferença de que tem esta por objeto a transmissão de uma coisa,
ao passo que aquela objetiva créditos ou direitos de natureza econômica. Mas à
cessão aplica-se a regra do art. 497 do Código Civil, relativa à venda (art. 498).
Se a título gratuito, a cessão assemelha-se à doação, pois implica benemerência
ou liberalidade.
São casos de cessão legal:
a) os de sub-rogação legal, especificados no art. 346 do Código Civil, pois
o sub-rogado adquire os direitos do credor primitivo;
b) os de cessão dos acessórios, em consequência da cessão da dívida
principal (art. 287).
Merece destaque a cessão legal mencionada na letra b: salvo disposição
em contrário, na cessão de um crédito se abrangem todos os seus acessórios.
145
Nessas condições, cedido determinado crédito, igualmente se transferem ao
cessionário, independentemente de expressa menção, cláusula penal, juros e
garantias, reais ou pessoais, como a fiança e a hipoteca; bem assim, nas
obrigações genéricas e alternativas, o direito de escolha. Mas os interessados
podem convencionar o contrário, excluindo um, alguns ou todos os acessórios.
Finalmente, constituem casos de cessão judicial: o de adjudicação no
juízo divisório, o de sentença condenatória que venha suprir declaração de
cessão por parte de quem era obrigado a fazê-la e o de assinação ao credor de
crédito do devedor.
Por fim, tem-se que, desde que se opere uma cessão, implícita se tornará
também a transferência dos direitos correspondentes à sua cobrança judicial.
Em suma: salvo disposição em contrário, o crédito cedido passa ao
cessionário no estado em que se encontra antes da cessão; qualquer modificação
depende de cláusula expressa.
4- Suas formas
A cessão convencional não exige, em regra, forma especial para valer
entre as próprias partes; mas para ter eficácia contra terceiros depende de
redução a escrito, público ou particular, seguido de transcrição no registro
competente.
Dispõe, efetivamente, o art. 288 do CC que "é ineficaz, em relação a
terceiros, a transmissão de um crédito, se não celebrar-se mediante instrumento
público, ou instrumento particular revestido das solenidades do §1º do art. 654".
Por sua vez, acrescenta a Lei n. 6.015/73, art. 129, n. 9, que no Registro
de Títulos e Documentos, para surtir efeitos em relação a terceiros, será feito o
registro dos instrumentos de cessão de direitos e de créditos, de sub-rogação e
de dação em pagamento.
146
Com efeito, as cessões operadas por instrumento público, constituindo
prova plena, produzem todos os efeitos jurídicos, sem dependência de registro.
Efetuadas, porém, por instrumento particular, dependem dessa formalidade para
valer contra terceiros, desnecessárias, porém, em relação ao devedor cedido.
Na cessão por instrumento particular, reporta-se a lei às solenidades do
art. 221 (subscrição do ato por duas testemunhas). Todavia, da inobservância
dessa formalidade não resulta a nulidade da cessão. O instrumento, por si só,
deixará de fazer prova completa, que poderá, no entanto, ser completada por
outros elementos de convicção.
Observe-se ainda que, de acordo com o art. 289, "o cessionário de crédito
hipotecário tem o direito de fazer averbar a cessão no registro do imóvel".
Em regra, a cessão convencional não exige forma especial. Entretanto,
nos contratos em que a escritura pública seja da substância do ato, a cessão
efetuar-se-á também por escritura pública. Logo, na cessão de crédito
hipotecário ou de direitos hereditários, só por escritura pública se admite o ato.
5- Notificação do devedor
O devedor é estranho à cessão, em que apenas intervém cedente e
cessionário. Prescreve o CC, todavia, em seu art. 290, primeira parte, que "a
cessão do crédito tem eficácia em relação ao devedor, senão quando a este
notificada".
Torna-se necessária essa notificação para que o devedor não fique
prejudicado, pois, desconhecendo a transmissão, pode efetuar o pagamento ao
credor primitivo. Mas a notificação não é imprescindível; ela visa a impedir que
o cedido validamente pague ao cedente. Portanto, se o cessionário exige
pagamento e se o devedor não prova haver pago ao cedente, não lhe aproveita a
falta de notificação.
147
Dispõe, no mesmo art. 290, segunda parte, que por notificado se tem o
devedor que, em escrito público ou particular, se declarou ciente da cessão feita.
A notificação pode ser judicial ou extrajudicial. Qualquer dos
intervenientes, cessionário ou cedente, tem qualidade para efetuá-la. Se incapaz
o devedor, deve ser feita ao respectivo representante legal; se solidária a
obrigação, notificados devem ser todos os co-devedores.
Saliente-se que a citação inicial para a ação de cobrança equivale à
notificação da cessão, produzindo os mesmos efeitos desta. Identicamente, o
devedor comerciante considera-se notificado com a simples habilitação do
crédito cedido em sua falência.
Créditos existem cuja transferência dispensa a notificação, porquanto sua
transferência obedece à forma especial. Tais são os títulos ao portador, que se
transferem por simples tradição manual, as ações nominativas das sociedades
anônimas, que se transmitem pela inscrição nos livros de emissão, mediante o
termo a que se refere o art. 31, § lº, da Lei n. 6.404, de 15-12-1976, e os títulos
à ordem, transferíveis por endosso.
Fica desobrigado o devedor que, antes de ter conhecimento da cessão,
paga ao credor primitivo, ou que, no caso de mais de uma cessão notificada,
paga ao cessionário, que lhe apresenta, com o título da cessão, o da obrigação
cedida (art. 292 do CC).
Não tendo sido notificado, a cessão é inexistente para o devedor, e, assim,
em atenção à sua boa-fé, válido se tornará o pagamento que venha a efetuar ao
cedente. Mas não se desobrigará se a este pagar, depois de cientificado da
cessão.
Se notificado de várias cessões, deve pagar ao cessionário que se
apresente com o título comprobatório da obrigação. Para esse efeito, dispôs o
Código Civil, no art. 291, que, "ocorrendo várias cessões do mesmo crédito,
prevalece a que se completar com a tradição do título do crédito cedido".
148
Se nenhum dos cessionários se apresentar com o título da dívida, cumpre
ao devedor recorrer à ação consignatória para obter sua liberação (art. 335, IV).
O devedor pode opor tanto ao cessionário como ao cedente as exceções
que lhe competirem no momento em que tiver conhecimento da cessão (art.
294, do CC).
Nessas condições, se anulável a obrigação por erro, dolo ou relativa
incapacidade do agente, vícios que, por sua natureza, aderem ao ato, pode o
devedor argui-los não só contra o cedente como também contra o cessionário,
embora não tenha feito qualquer protesto ou reclamação no ato de ser
notificado. Pode ele, outrossim, opor defesa fundada em pagamento.
Em regra, pois excluídas naturalmente as exceções pessoais entre credor
primitivo e devedor, ao cessionário são oponíveis todas as alegações cabíveis
contra o cedente.
O devedor que, notificado, nada opõe à cessão que o credor faz a terceiros
dos seus direitos não pode opor ao cessionário a compensação, que antes da
cessão teria podido opor ao cedente. Se, porém, a cessão lhe não tiver sido
notificada, poderá opor ao cessionário compensação de crédito que antes tinha
contra o cedente (art. 377, CC).
6- Responsabilidade do cedente
Na cessão por título oneroso, o cedente, ainda que se não responsabilize,
fica responsável ao cessionário pela existência do crédito ao tempo em que lho
cedeu. A mesma responsabilidade lhe cabe nas cessões por título gratuito, se
tiver procedido de má-fé (art. 295, CC).
O cedente enriquecer-se-ia ilicitamente se recebesse pagamento por
crédito irreal, de incerta existência. Por essa razão, a lei lhe impõe a obrigação
de responder pela positiva existência do crédito cedido.
149
Em três hipóteses diferentes subsiste a responsabilidade do cedente:
a) transfere esse crédito inexistente;
b) contra o crédito cedido existe exceção, que o inutiliza, como a de dolo,
ou compensação;
c) o crédito tem existência positiva, mas não em favor do cedente, que
assim aliena bem alheio.
Em qualquer dessas hipóteses, ainda que omisso o título da cessão,
responde o cedente. Só desaparece a garantia legal quando o cessionário tem
conhecimento dos riscos e perigos do crédito.
A responsabilidade abrange o crédito e seus acessórios, como fiança,
penhor e hipoteca. Assegura o cedente a existência dessas garantias, embora
não responda pela sua eficácia.
Quando se tratar de cessão a título gratuito, o cedente só responde na
hipótese de má-fé. Como ele realiza uma liberalidade, só ressarcirá o dano
quando comprovar dolo.
Em qualquer caso, preciso se torna que o cessionário aja judicialmente
contra o devedor. Só depois de vencido quanto à existência do crédito, ou dos
acessórios, poderá voltar-se contra o cedente.
Salvo estipulação em contrário, o cedente não responde pela solvência do
devedor (art. 296, CC). Enquanto o cedente responde sempre pela “existência e
legitimidade do crédito cedido”, o mesmo não acontece quanto à “solvência do
devedor”. Todavia, mediante convenção, poderá assumir tal responsabilidade,
respondendo então pela idoneidade financeira do cedido, quer no instante da
cessão, quer no momento em que se vencer a obrigação.
O cedente, responsável ao cessionário pela solvência do devedor, não
responde por mais do que daquele recebeu, com os respectivos juros, mas tem
de ressarcir-lhes as despesas da cessão e as que o cessionário houver feito com
a cobrança (art. 297, CC).
150
7- Outras disposições
O crédito, uma vez penhorado, não pode mais ser transferido pelo credor
que tiver conhecimento da penhora; mas o devedor que o pagar, não tendo
notificação dela, fica exonerado, subsistindo somente contra o credor os direitos
de terceiro (art. 298, CC).
Com a penhora, torna-se o crédito indisponível; sua transferência
implicará fraude de execução. Notificado daquele ato judicial, o devedor não
mais pode pagar ao credor; não notificado, porém, válido se tornará o
pagamento, ressalvado ao exequente o direito de agir contra o accipiens.
Falecendo o alienante ou o cedente, poderá o adquirente ou o cessionário
prosseguir na causa, juntando aos autos o respectivo título e provando a sua
identidade (CPC, art. 1.061). Ao cessionário cabe o direito de promover a
execução, ou nela prosseguir (CPC, art. 567, n. II).
ASSUNÇÃO DE DÉBITOASSUNÇÃO DE DÉBITOASSUNÇÃO DE DÉBITOASSUNÇÃO DE DÉBITO
1- Definição
A assunção de débito está prevista no Código Civil nos artigos 299 a 303.
Essa operação consiste em negócio jurídico por meio do qual o devedor
transfere para outra pessoa a sua posição na relação jurídica, deixando de ser
devedor e repassando o débito para o novo sujeito passivo. Ex.: cessão de
financiamento na aquisição de um veículo.
151
Na assunção de débito exige-se a anuência do credor, o que não ocorre na
cessão de crédito, que basta a notificação do devedor. Assim, não basta outra
pessoa desejar assumir a dívida de outrem. Para se efetivar a operação é
necessário que o credor aceite o novo devedor como o sujeito passivo na
relação obrigacional.
2- Formas de constituição
O art. 299 do Código Civil diz que:
Art. 299. É facultado a terceiro assumir a obrigação do devedor, com o consentimento expresso do credor, ficando exonerado o devedor primitivo, salvo se aquele, ao tempo da assunção, era insolvente e o credor o ignorava.
Parágrafo único. Qualquer das partes pode assinar prazo ao credor para que consinta na assunção da dívida, interpretando-se o seu silêncio como recusa.
A assunção pode ser de todas as dívidas, presentes e futuras, aí incluídos
os deveres secundários do devedor, a exemplo da atualização monetária e dos
juros de mora. Nos casos de transferência de estabelecimento comercial, o
Código Civil disciplina a assunção do passivo nos arts. 1.145 e 1.146.
Art. 1.145. Se ao alienante não restarem bens suficientes para solver o seu passivo, a eficácia da alienação do estabelecimento depende do pagamento de todos os credores, ou do consentimento destes, de modo expresso ou tácito, em trinta dias a partir de sua notificação.
Art. 1.146. O adquirente do estabelecimento responde pelo pagamento dos débitos anteriores à transferência, desde que regularmente contabilizados, continuando o devedor primitivo solidariamente obrigado pelo prazo de um ano, a partir, quanto aos créditos vencidos, da publicação, e, quanto aos outros, da data do vencimento.
A assunção de dívida ocorre de duas formas distintas:
152
a) pela expromissão, caracterizada pelo contrato entre credor e um
terceiro, que assume a posição de novo devedor, sem necessidade de
comparecimento do antigo devedor; e
b) pela delegação, caracterizada pelo acordo entre o devedor originário e
o terceiro que vai assumir a dívida, cuja validade depende da aquiescência do
credor.
As duas formas de ocorrência podem, ainda, possuir efeitos liberatórios
ou cumulativos.
Diz-se que a assunção de dívida é liberatória quando a liberação ocorre
por parte do primitivo devedor.
E que é cumulativa quando se dá o ingresso do terceiro no pólo passivo
da obrigação, sem que ocorra a liberação do antigo devedor, que permanece na
relação, com liame de solidariedade com o novo.
A assunção de débito não se confunde com a fiança, em que o fiador
responde por dívida alheia, enquanto o assuntor cumulativo é titular do débito,
em nome próprio. É também chamada co-assunção, adesão ou adjunção à
dívida.
O art. 299 do Código Civil não dispôs sobre as modalidades de assunção
de dívida, parecendo referir-se apenas à segunda (forma delegatória), na qual o
consentimento expresso do credor constitui requisito de eficácia do ato. Na
forma expromissória não haveria falar em consentimento do credor, uma vez
que é o próprio credor quem celebra o negócio com o terceiro que vai assumir a
posição do primitivo devedor. O citado dispositivo legal também se omitiu
quanto aos efeitos da assunção delegatória antes do assentimento do credor,
além de se abster completamente de tratar da assunção cumulativa.
A lei civil, no seu art. 299, exige, ainda, que a aceitação do credor seja
expressa, não admitindo, em regra, a aceitação tácita, que ocorre quando o
153
credor, sem reserva de espécie alguma, recebe parte da dívida ou consente a
prática de outro ato que faça supor ter o terceiro a qualidade de devedor.
O Código Civil admite em um único caso a aceitação tácita, na hipótese
de inação do credor de que trata o art. 303.
Art. 303. O adquirente de imóvel hipotecado pode tomar a seu cargo o pagamento do crédito garantido; se o credor, notificado, não impugnar em trinta dias a transferência do débito, entender-se-á dado o assentimento.
Na hipótese de insolvência do novo devedor, fica sem efeito a exoneração
do art. 299, não sendo ressalvada a hipótese de as partes, aceitando correr o
risco, exonerarem o primitivo devedor mesmo se o novo for insolvente à época
da celebração do contrato.
Assim, na forma prevista no art. 299, não existe alternativa: se o novo
devedor já era insolvente à época da assunção e o credor o ignorava, não resulta
exonerado o antigo devedor. Mas pode o credor preferir correr o risco,
liberando-o por vários outros motivos.
Com relação ao parágrafo único do art. 299, Caio Mário da Silva Pereira
considera-o desnecessário, "pois se a assunção de dívida não for concertada, de
comum acordo, com o credor, de nada vale sua interpelação para que manifeste
a sua anuência. Se ele não a deu, na fase dos entendimentos, ou se o devedor
não a obteve, não será a interpelação que mudará seus propósitos".
3- Seus efeitos
O art. 300 do Código Civil diz que:
Art. 300. Salvo assentimento expresso do devedor primitivo, consideram-se extintas, a partir da assunção da dívida, as garantias especiais por ele originariamente dadas ao credor.
154
As garantias especiais dadas pelo devedor primitivo ao credor – em suma,
aquelas garantias que não são da essência da dívida e que foram prestadas em
atenção à pessoa do devedor, por exemplo, as garantias dadas por terceiros
(fiança, aval, hipoteca de terceiro) – só subsistirão se houver concordância
expressa do devedor primitivo e, em alguns casos, também do terceiro que
houver prestado a garantia. Isso porque várias das garantias prestadas por
terceiros só poderão subsistir com a ressalva destes.
Ocorrendo a anulação do contrato de assunção, renasce a obrigação para o
devedor originário, com todos os seus privilégios e garantias, salvo as que
tiverem sido prestadas por terceiro. De fato, as garantias especiais, prestadas
por terceiros, e que haviam sido exoneradas pela assunção, não podem ser
restauradas, em prejuízo do terceiro, salvo se este tinha conhecimento do
defeito jurídico que viria pôr fim à assunção. Trata-se, aqui, de simples
aplicação do princípio da boa fé (art. 301).
Art. 301. Se a substituição do devedor vier a ser anulada, restaura-se o débito, com todas as suas garantias, salvo as garantias prestadas por terceiros, exceto se este conhecia o vício que inquinava a obrigação.
O art. 302 do Código Civil preceitua que:
Art. 302. O novo devedor não pode opor ao credor as exceções pessoais que competiam ao devedor primitivo.
Assim, aquele que assume a posição do devedor na relação obrigacional
só pode alegar contra o credor as defesas decorrentes do vínculo anterior
existente entre credor e primitivo devedor, não lhe cabendo invocar as defesas
pessoais que derivem das relações existentes entre ele, o novo devedor, e o
primitivo devedor, ou entre este e o credor. Não pode alegar, por exemplo, o
direito de compensação que possuía o primitivo devedor em face do credor.
Finalmente, diz o art. 303 do Código Civil que:
155
Art. 303. O adquirente de imóvel hipotecado pode tomar a seu cargo o pagamento do crédito garantido; se o credor, notificado, não impugnar em trinta dias a transferência do débito, entender-se-á dado o assentimento.
Cuida o dispositivo de uma exceção à regra geral de que o consentimento
do credor há de ser expresso, admitindo a hipótese de concordância tácita do
credor hipotecário que, notificado da assunção, não a impugna no prazo de
trinta dias.
O Prof. SILVIO RODRIGUES entende que deveria ser até mesmo dispensada
a anuência do credor, sobretudo se o valor da hipoteca for superior ao débito,
devendo "a lei permitir a cessão por mero acordo entre devedor e cessionário,
pois a oposição do credor não encontra outro esteio que não seu capricho, visto
que seu interesse não sofre ameaça, por força da excelência da garantia".
A segurança do credor reside muito mais na garantia em si do que na
pessoa do devedor. Se, com a assunção do débito pelo terceiro adquirente do
imóvel, permanece a garantia real, pouca ou nenhuma diferença fará quem será
o credor. Daí a mitigação da exigência de que o consentimento do credor seja
expresso, sobretudo nessas hipóteses em que a garantia é superior ao débito.