almeida, marcelo. a união poliafetiva à luz da dignidade

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Rio de Janeiro, ano 16, n. 16, jan-dez. JURIS POIESIS REVISTA DO CURSO DE DIREITO DA UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ

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  • Rio de Janeiro, ano 16, n. 16, jan-dez.

    JURIS POIESISREVISTA DO CURSO DE DIREITO DA UNIVERSIDADE ESTCIO DE S

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    FICHA CATALOGRFICA E SOLICITAO DE TROCA

    Juris Poiesis ano 16, n.16, jan-dez. 2013. Rio de Janeiro:

    Universidade Estcio de S, Mestrado e Doutorado em Direito, 1999-

    Revista do Curso de Direito da Universidade Estcio de S

    Descrio baseada em: ano 1, n.1 1999 ISSN 1516-6635 1 Direito Peridicos I. Mestrado e Doutorado

    em Direito II. Universidade Estcio de S

    Juris Poiesis: Revista do Curso de Direito da Universidade Estcio de S.Mestrado e Doutorado em Direito.Rua So Jos, 35 15 andar.CEP 20010-020 Centro - Rio de Janeiro Brasil.Tel: (21) 3231-2015 ou (21) 3231-2005 FAX: (21) 3231-2042.

  • Juris PoiesisRevista do Curso de Direito da Universidade Estcio de S

    Rio de Janeiro, ano 16, n. 16, jan-dez. 2013. ISSN 1516-6635.

  • ReitoriaPaula Caleffi

    Vice-Reitor de Ps-Graduao e PesquisaLuciano Medeiros

    Editor CientficoFbio Corra Souza de Oliveira

    Editor ExecutivoRafael Mario Iorio Filho

    Conselho Editorialngel Oquendo University of Connecticut/Estados Unidos da Amrica.

    Antnio Carlos Wolkmer UFSC.Carlos Alberto Bolonha UFRJ.

    Carlos Emilio Gaviria Diaz - Universidad de Antio-quia / Corte Constitucional da Colmbia.

    Daniela Mesquita Leutchuk UNISINOS.Fabio Corra Souza de Oliveira UNESA

    Fernando Antonio de Carvalho Dantas PUC/PRHumberto Dalla Bernardina de Pinho UNESA.

    Lenio Luiz Streck UNESA.Leonardo Greco UFRJ/UERJ.

    Luciana Aboim Machado Gonalves da Silva UFSE.Maria Clara Dias UFRJ (IFCS).

    Miguel Angel Linera Presno - Universidad de Oviedo / Espanha.Miguel Azpitarte Snchez - Universidad de Granada / Espanha.

    Nilton Cesar Flores UNESA.Raiza Mndez - Universidad de Los Andes / Venezuela.

    Sergio Cademartori UFSC.Vanice Lrio do Valle UNESA.

    Vicente Barretto UNESA.

  • Avaliadores Ad Hoc

    Andr Luiz Nicolitt IBMEC.

    Brbara Gomes Lupetti Baptista PPGD/UCP.

    Carlos Eduardo Adriano Japiass PPGD/UNESA.

    Cipriana Nicolitt Cordeiro UNESA.

    Delton Ricardo Soares Meirelles PPGSD/UFF.

    Edna Raquel Rodrigues Santos Hogemann PPGD/UNESA.

    Eduardo Manuel Val PPGD/UNESA.

    Fabiano Soares Gomes UFRJ.

    Fernanda Duarte Lopes Lucas da Silva PPGD/UNESA.

    Fernanda Luiza Fontoura de Medeiros PUCRS.

    Marcello Raposo Ciotola - PPGD/UNESA.

  • Corpo Docente

    Coordenador:Fbio Corra Souza de Oliveira

    Doutor Universidade do Estado do Rio de Janeiro

    Coordenador adjunto:Carlos Eduardo Adriano Japiass

    Doutor Universidade do Estado do Rio de Janeiro

    Alusio Gonalves de Castro MendesDoutor Universidade Federal do Paran

    Edna Raquel Rodrigues Santos HogemannDoutora Universidade Gama Filho

    Eduardo Manuel ValDoutor Pontifcia Universidade Catlica do Rio de Janeiro

    Fernanda Duarte Lopes Lucas da SilvaDoutora Pontifcia Universidade Catlica do Rio de Janeiro

    Humberto Dalla Bernardina de PinhoDoutor Universidade do Estado do Rio de Janeiro

    Lenio Luiz StreckDoutor Universidade Federal de Santa Catarina

    Marcello Raposo CiotolaDoutor Pontifcia Universidade Catlica do Rio de Janeiro

    Nilton Csar FloresDoutor Universidade Federal de Santa Catarina / Universidad de Valencia

    Rafael Mario Iorio FilhoDoutor Universidade Gama Filho

    Doutor Universidade Federal do Rio de Janeiro

    Rogrio Jos Bento Soares do NascimentoDoutor Universidade do Estado do Rio de Janeiro

  • SUMRIOEditorial ..................................................................................................... 11

    A competncia da Justia Federal para processar e julgar crimes tipificados na lei n 9.605/98the jurisdiction of the Federal Court to adjudicate crimes described in law n. 9605/98 ............................................ 13Rbia Chassot de Almeida, Luiz Eduardo Cleto Righetto

    A internao compulsria dos viciados em crack a partir da ponderao entre liberdade e dignidade humanaCompulsory hospitalization of crack addicts from the balance balance between freedom and human dignity ................................................ 27Jessica Hind Ribeiro Costa

    A subjetividade dos direitos sociais prestacionais: um dilogo com a Corte Sul-Africanathe subjectivity of the social rights: a dialogue with the South african Court ......................................................... 53Fabiana de Almeida Maia Santos

    A unio poliafetiva luz do princpio da dignidade da pessoa humanaPolyaffetive marriage in view of the principle of human dignity ...................... 69Marcelo Santoro Pires de Carvalho AlmeidaEdna Raquel Hogemann

    Audincias pblicas na Suprema Corte Brasileira: novas tendncias para o dilogo socialPublic Hearings at Brazilian Supreme Court: new tendences about social dialogue............................................................. 85Igor Ajouz, Cecilia de Almeida Silva

    Cidadania GlobalGlobal Civics................................................................................................. 109Hakan Altiney

    Da obsolescncia programada face ao desenvolvimento econmico e jurdico sob a tica do cdigo de defesa do consumidorobsolescence of scheduled to face legal and economic development the perspective of the code of consumer protection ..................................... 131Victor da Silva Mauro

    Direito fundamental propriedade aos quilombolas: efetividade do artigo 68 do ADCT da Constituio Federalthe fundamental right of property to quilombolas: effectiveness of the clause 68 of the adCt of the Brazilian Constitution .... 147Virginia Junqueira Rugani Brando

  • Discriminaes lcitas e igualdade: uma relao necessriaPositive discriminations and equality: a necessary relation.......................... 163Denny Mendes Santiago, Fabiana Figueiredo Felcio dos Santos

    Heris da natureza, inimigos dos animaisHeroes of nature, enemies of animals .......................................................... 181Daniel Braga Loureno, Fbio Corra Souza de Oliveira

    Michael Walzer e as duas formas da argumentao moralMichael Walzer and the two forms of moral argument ................................. 207Marcello Ciotola

    O governo brasileiro quase unificado e o Executivo own-boundedThe brazilian almost-unified government and the executive own-bounded .... 219Henrique Rangel, Marina Rezende, Carlos Bolonha

    O princpio da afetividade e a famlia constitucionalizadaPrinciple of family and affectivity constitutionalized ...................................... 241Eloisa de Souza Hobus Linhares, Cludia Regina Althoff Figueiredo

    O princpio da dignidade para alm da vida humanathe principle of the dignity beyond human life ............................................. 273Fernanda Luiza Fontoura de Medeiros

    O Uso da Epistemologia Pragmtica de John Dewey para ensinar a disciplina Anlise e Comunicao JurdicasUsing John deweys Pragmatist Epistemology to teach legal analysis and Communication ................................................ 307David T. Ritchie

    Os Direitos Humanos entre o universalismo e o relativismo:uma possvel contribuio da Histria para o DireitoHuman rights between universalism and relativism: a possible contribution of History to the law studies.................................... 335Cecilia Perlingeiro, Vinicius Scarpi

    Os novos direitos e as medidas alternativas pr-delitivasthe new rights and the pre-delict alternative measures ............................... 347Thas Aline Mazetto Corazza

    Poder Judicirio brasileiro e tratamento igualitrio a homossexuais: uma anlise do caso histrico -Ao Civil Pblica no. 2000.71.00.009347-0Brazilian judicial branch and equal protection to homosexuals: an analysis of historical case - ao Civil Pblica no. 2000.71.00.009347-0 ................. 375Fernanda Duarte, Rafael Mario Iorio Filho

  • Reflexes sobre a judicializao do direitofundamental sade a partir do ativismo judicialReflections on judicialization of thefundamental right to health from judicial activism ......................................... 401Heletcia Leo de Oliveira

    Sustentabilidade nas relaes de trabalho e o elementardireito resposta pelo Tribunal Superior do TrabalhoSustainability in labor relations and the basic right to the response by the tribunal Superior do trabalho...................................... 431Nilton Cesar Flores, Daniele Regina Terribile

    NorMaS GEraiS Para PUBliCao dE traBalHoS ........................ 451

  • EDITORIAL

    O nmero 16 da Juris Poiesis, ano de 2013, deve ser o ltimo no formato im-presso. A partir de 2014 a Revista do PPGD/UNESA passar ao modelo eletrnico e, com isso, possivelmente ganhar mais de uma edio por ano.

    Este o terceiro nmero seguido em que a Juris Poiesis adota os critrios exigidos para o qualis B1 (CAPES). Contamos para esta edio com um expres-sivo elenco de avaliadores ad hoc, nomeados anteriormente, que vm a emprestar as suas autoridades publicao, a quem muito agradecemos. Registramos um obrigado especial ao mestrando Ricardo Granja, que trabalhou dedicadamente neste nmero da Revista.

    A Juris Poiesis de nmero 16 encerra mais uma trienal, conforme o perodo de avaliao da Ps-Graduao Stricto Sensu pela CAPES (2010-2012). O resultado desta trienal, que consolidou o Mestrado e Doutorado em Direito da Universidade Estcio de S com a nota 5, denotando o progresso alcanado pelo Programa, faz com que a presente edio tenha um sabor de regozijo e de trabalho cumprido.

    Os novos caminhos a serem trilhados pela Juris Poiesis, a partir da forma ele-trnica, somam-se aos desafios que o PPGD/UNESA tem de enfrentar em conformi-dade com a responsabilidade advinda da avaliao da CAPES e de novas conquistas.

    O sucesso obtido partilhado entre os docentes do Programa, bem como os alunos, e se encontra parcialmente retratado na Juris Poiesis.

    A Revista continua sendo disponibilizada em PDF na pgina do PPGD/UNESA.

    Fbio Corra Souza de OliveiraCoordenador do Programa de Mestrado e Doutorado

    em Direito da Universidade Estcio de S

  • A competncia da Justia Federal para processar e julgar crimes tipificados na lei n 9.605/98

    The jurisdiction of the Federal Court to adjudicate crimes described in Law n. 9605/98

    Rbia Chassot de Almeida1Luiz Eduardo Cleto Righetto2

    ______________________________________________________________________

    RESUMO

    O presente estudo tem como objetivo sintetizar as regras que definem a com-petncia da Justia Federal na tutela penal ambiental, trazendo o entendimento mais atual, tanto doutrinrio quanto jurisprudencial, no que diz respeito aos conflitos de jurisdio quanto aos principais crimes tipificados na lei n 9.605/98. A lei de crimes ambientais no definiu competncia para apreciao dos tipos penais que instituiu, o que acarreta na prtica uma srie de dvidas de atribuio, principalmente no mo-mento do ajuizamento das aes penais ambientais. Por isso, se faz necessrio um estudo atual, obedecendo as regras de competncia estabelecidas na Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988 e colacionando as mais recentes decises dos tribunais brasileiros.

    PALAVRAS-CHAVE

    Crimes Ambientais. Justia Federal. Competncia. Conflitos.

    ABSTRACT

    The present study aims to summarize the rules which define the jurisdiction of the Federal Court in criminal oversight environmental bringing understanding most current, both doctrinal as jurisprudence, with respect to conflicts of jurisdiction as to the principal crimes described in Law n. 9605/98. The environmental crimes law did not define competence for consideration of criminal types who instituted, resul-ting in a number of practical questions of attribution, especially at the time of the filing of criminal environmental actions. Therefore, it is necessary to study current,

    1 Bacharel em Direito pela Universidade Vale do Itaja - Univali no Campus de Balnerio Cambori/SC e servidora da Justia Federal do estado de Santa Catarina. E-mail: [email protected] e [email protected].

    2 Advogado Criminalista; Especialista em Direito Pblico pela Escola Superior da Magistratura Federal do Estado de Santa Catarina; Mestre em Cincia Jurdica pela Universidade do Vale do Itaja - UNIVALI; Professor de Direito Penal e Processo Penal da Universidade do Vale do Itaja - UNIVALI; Professor de Deontologia Jurdica e Prtica Processual Penal do Morgado Concursos (Curso Preparatrio para Concursos) e Professor de Tpicos Especiais de Direito Processual Penal no Curso de Ps-Graduao da Universidade do Oeste Catarinense - UNOESC.

  • 14 Rbia Chassot De Almeida, Luiz Eduardo Cleto Righetto

    obeying the rules of jurisdiction laid down in the Constitution of the Federative Re-public of Brazil 1988 and the most recent decisions of the courts of Brazil.

    KEYWORDS

    Environmental Crimes. Federal Court. Competence. Conflicts.

    INTRODUO

    O artigo em questo aborda o tema sobre a competncia da Justia Federal para processar e julgar crimes tipificados na lei n 9.605/98 e tem por objetivo es-clarecer quais os delitos descritos na lei de crimes ambientais devem ser julgados por juzes federais.

    Atualmente, a problemtica da degradao e da destruio do meio ambiente atinge o mundo inteiro, afetando de alguma forma toda a humanidade. Os estragos muitas vezes so irremediveis, e a fauna, flora e os recursos minerais que, embora abundantes, so passveis de extino, de exaurimento. Ademais, o meio Ambiente no se restringe ao ambiente fsico e biolgico, mas inclui tambm as relaes so-ciais, econmicas e culturais.

    Nessa esfera, a questo da preservao do meio ambiente tem atrado a aten-o dos legisladores, e com o objetivo de regulamentar o art. 225 da Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88), foi criada lei n 9.605/98.

    Devido criao da referida lei, condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente passaram a ser punidas civil, administrativa e criminalmente. Assim, constatada a degradao ambiental, seja o poluidor, seja o destruidor, alm de ser obrigado a promover a sua recuperao, responde com o pagamento de multas pe-cunirias e com processos criminais.

    O tema reveste-se da maior importncia haja vista a necessidade de que seja esclarecida a competncia para processar e julgar os crimes tipificados na lei su-pracitada. A hiptese levantada no presente estudo a de que a lei que versa sobre crimes ambientais no definiu competncia para apreciao dos tipos penais que instituiu, restando necessria a consulta doutrina e jurisprudncia quando do ajuizamento de aes desta natureza.

    A CRFB/88 imbuda do desejo de proteo integral e universal atribuiu Unio, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municpios a competncia comum para proteger o meio ambiente e combater a poluio em qualquer de suas formas, bem como preservar as florestas, a fauna e a flora (art. 23, VI e VII). Alm disso, atribuiu competncia concorrente Unio, aos Estados e ao Distrito Federal para legislar sobre temas relacionados s florestas, caa e pesca, fauna, conservao da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteo do meio ambiente e con-trole da poluio (art. 24, VI). Essa autonomia dada aos entes da federao quanto proteo ambiental acarreta dvida em definir de quem a competncia para jul-gar crimes ambientais.

  • 15A competnciA dA JustiA FederAl pArA processAr e JulgAr crimes tipiFicAdos nA lei n 9.605/98

    A competncia da Justia Federal, fincada direta e expressamente na CRFB/88, de natureza absoluta, e est direcionada no sentido de julgar causas em que h in-teresses, servios ou bens da Unio envolvidos. Esse modelo um tanto complexo, gerando, na prtica, uma srie de conflitos de competncia, suscitados muitas vezes pelos prprios magistrados frente incerteza de ter ou no jurisdio sobre a matria.

    A pesquisa utilizou-se do mtodo indutivo, sendo possvel a partida de um ponto maior da Cincia Penal para chegar a uma gama de conhecimento especfico sobre o referido tema.

    Este estudo abordar a competncia da Justia Federal segundo a CRFB/88, breves comentrios lei n 9.605/98 e a competncia da Justia Federal nos crimes tipificados na lei n 9.605/98. O presente artigo se encerra com as consideraes finais, nas quais so apresentados pontos conclusivos sobre o tema abordado.

    1. DA COMPETNCIA CRIMINAL DA JUSTIA FEDERAL SEGUNDO A CRFB/88

    Este primeiro captulo tem como objetivo descrever, luz da CRFB/88, a com-petncia da Justia Federal na esfera criminal.

    Na definio de CAPEZ, competncia a delimitao do poder jurisdicional. Aponta quais os casos que podem ser julgados pelo rgo do Poder Judicirio, sendo, portanto, uma verdadeira medida da extenso do poder de julgar.3 Para Mirabete, a medida e o limite da jurisdio, a delimitao do poder jurisdicional.4

    Seguindo esse raciocnio, Tourinho Filho5 e Mirabete6 entendem que a limi-tao do exerccio jurisdicional feita com base na natureza da lide (ratione mate-riae), no territrio e nas funes que os rgos podem exercer dentro dos processos.

    Na CRFB/88, a distribuio de competncia encontra-se expressamente pre-vista segundo a estrutura do Poder Judicirio nacional. A competncia da Justia Federal expressamente descrita em seu art. 109. Aquilo que no couber a ela, e nem s outras Justias Especializadas, caber, por excluso, Justia Estadual.7

    Seguem os incisos do art. 1098, que tratam de matria criminal afeta Justia Federal:

    Art. 109. Aos juzes federais compete processar e julgar:[...]IV - os crimes polticos e as infraes penais praticadas em detrimento de bens, servios ou interesse da Unio ou de suas entidades autrquicas ou empresas pblicas, excludas as contravenes e ressalvada a competncia da Justia Militar e da Justia Eleitoral;

    3 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo penal. 9. ed. So Paulo: Saraiva, 2003. p. 188.4 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal. 10 ed. So Paulo: Atlas, 2000. p. 167.5 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. Vol 2. So Paulo: Saraiva, 25. ed., 2003. p. 76.6 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal. p. 168.7 COSTA E NETO, Nicolao Dino de Castro; BELLO FILHO, Ney Barros; CASTRO E COSTA, Flvio Dino de. Crimes e

    infraes administrativas ambientais Comentrios Lei 9.605/98. 2. ed. Braslia: Braslia Jurdica, 2001. p. 130.8 BRASIL, Constituio da Repblica Federativa do Brasil. Braslia, DF: Senado Federal, 1988.

  • 16 Rbia Chassot De Almeida, Luiz Eduardo Cleto Righetto

    V - os crimes previstos em tratado ou conveno internacional, quando, iniciada a execuo no Pas, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente;V-A as causas relativas a direitos humanos a que se refere o 5 deste artigo;VI - os crimes contra a organizao do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econmico-financeira;VII - os habeas-corpus, em matria criminal de sua competncia ou quando o constrangimento provier de autoridade cujos atos no estejam diretamente sujeitos a outra jurisdio;[...]IX - os crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competncia da Justia Militar;X - os crimes de ingresso ou permanncia irregular de estrangeiro, a execuo de carta rogatria, aps o exequatur, e de sentena estrangeira, aps a homologao, as causas referentes nacionalidade, inclusive a respectiva opo, e naturalizao;XI - a disputa sobre direitos indgenas.

    Os crimes ambientais no so da competncia da Justia Federal, necessaria-mente, pois no h nos incisos do art. 109 da CRFB/88 previso a respeito. Alm disso, segundo o art. 225, caput, da Carta Magna9, o meio ambiente considerado bem de uso comum do povo10. Jos Afonso da Silva11 leciona que a Constituio define o meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito de todos e lhe d a natureza de bem de uso comum do povo e essencial sadia qualidade de vida.

    Entretanto, possvel que uma infrao penal tenha mais de um titular do di-reito lesado12. Isto pode ocorrer tambm nos crimes ambientais, podendo a Unio e suas autarquias ou empresas pblicas estarem ao lado do sujeito passivo coletivida-de. Assim, atrai-se a competncia para a Justia Federal (CRFB/88, art. 109, IV)13.

    A Smula 122, do Superior Tribunal de Justia (STJ), diz que compete Jus-tia Federal o processo e julgamento unificado dos crimes conexos de competncia federal e estadual, no se aplicando a regra do art. 78, II, a, do Cdigo de Processo Penal14. Assim, a competncia especial fixada na Constituio para a Justia Fe-deral d-lhe a condio especial sobre a competncia geral no julgamento de crimes conexos, ou seja, infrao penal em detrimento de bens, servios ou interesse da Unio e crime comum de competncia da Justia Estadual.

    9 Art. 225. Todos tm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Pblico e coletividade o dever de defend-lo e preserv- lo para as presentes e futuras geraes.

    10 FREITAS, Vladimir Passos de; FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes contra a natureza. 8. ed. rev. atual. e ampl. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 54.

    11 SILVA, Jos Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 27. ed. So Paulo: Malheiros, 2006. p. 846.12 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal, v. III, 24. ed. So Paulo: Atlas, 2010. p. 307.13 FREITAS, Vladimir Passos de; FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes contra a natureza. p. 54.14 Art. 78. Na determinao da competncia por conexo ou continncia, sero observadas as seguintes regras: [...] Il - no

    concurso de jurisdies da mesma categoria: a) preponderar a do lugar da infrao, qual for cominada a pena mais grave.

  • 17A competnciA dA JustiA FederAl pArA processAr e JulgAr crimes tipiFicAdos nA lei n 9.605/98

    2. BREVES COMENTRIOS LEI N 9.605/98

    Com o objetivo de regulamentar o referido art. 225 da CRFB/88, entrou em vigor, nos seus aspectos penais, a partir de 30/03/1998, a Lei n 9.605/98, conhecida como a Lei de Crimes Ambientais.

    O citado diploma legal decorrente da imperativa necessidade de normatiza-o das condutas que afetavam e afetam o meio ambiente nacional. Com patrimnio natural inestimvel, buscou-se no somente para o pas o controle e punio das aes perniciosas natureza, mas a prpria garantia de que tal patrimnio se perpe-tue no tempo.15

    A lei no apenas penal, pois contm dispositivos de ordem administrativa. Consoante Freitas16, esses dispositivos, de todo oportunos, foram elaborados por outra comisso, possibilitando ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (IBAMA) atuar com maior eficcia.

    Segundo Fiorillo17, as disposies gerais da lei n 9.605/98 procuraram atender no s os regramentos que fundamentam o direito criminal e penal constitucional, como as especificidades criadas pelo direito criminal ambiental constitucional e pelo direito penal ambiental constitucional.

    A citada lei, alm de apontar a possibilidade de aplicao de sanes penais para as pessoas fsicas, possibilitou a responsabilizao penal das pessoas jurdicas, sejam elas de direito pblico ou de direito privado, inclusive com a aplicao do instituto da desconsiderao da pessoa jurdica18.

    O captulo V da Lei 9.605/98 traz como objeto jurdico geral tutelado o am-biente, e est dividido em cinco sees, a saber: (seo I) crimes contra a fauna; (seo II) crimes contra a flora; (seo III) crimes de poluio e outros crimes am-bientais; (seo IV) crimes contra o ordenamento urbano e o patrimnio cultural; e (seo V) crimes contra a administrao ambiental. Os crimes capitulados apresen-tam-se quase sempre como delitos pluriofensivos, isto , descrevem vrias condutas ou vrios objetos jurdicos.

    Freitas19 leciona, ainda, que a lei n 9.605/98 alterou profundamente a tipifi-cao de condutas, pois antes dela, a matria relativa ao Direito Ambiental Penal estava dispersa em vrias leis, as quais eram pouco conhecidas e desrespeitadas. Cita algumas condutas reprovveis que se tornaram crimes: maus-tratos contra ani-mal domstico (art. 3220), pesca de espcies com aparelhos no permitidos (art. 34, pargrafo nico, II21), poluio do mar por leo, includa a forma culposa (art. 54,

    15 LOURES, Srgio Lopes; MIRANDA, Marcos Paulo de Souza; OLIVEIRA, Ana Raquel Cardoso de. Consideraes acerca da nova Lei de Crimes Ambientais. Jus Navegandi. Acesso em 25/07/2011.

    16 FREITAS, Vladimir Passos de. A Constituio federal e a efetividade das normas ambientais. 2. ed. rev. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 212.

    17 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 4. ed. ampl. So Paulo: Saraiva, 2003. p. 376.18 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. p. 376.19 FREITAS, Vladimir Passos de. . A Constituio federal e a efetividade das normas ambientais. p. 217.20 Art. 32. Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domsticos ou domesticados, nativos ou

    exticos: Pena - deteno, de trs meses a um ano, e multa.21 Art. 34. [...] Pargrafo nico. Incorre nas mesmas penas quem: II - pesca quantidades superiores s permitidas, ou

    mediante a utilizao de aparelhos, petrechos, tcnicas e mtodos no permitidos.

  • 18 Rbia Chassot De Almeida, Luiz Eduardo Cleto Righetto

    2, inciso V, e 322), construo de obras sem estudo de impacto ambiental (art. 6023) e impedimento ou embarao ao fiscalizadora do Poder Pblico no trato de questes ambientais (art. 6924).

    Para Freitas, nobre desembargador federal aposentado, a maior parte das in-fraes penais ambientais sujeita-se lei dos Juizados Especiais Criminais, pois ne-nhuma delas tem pena mnima superior a um ano. Sendo assim, ou so passveis de transao, por ser a sano mxima de um ano, ou admitem suspenso do processo, por ser a pena mnima de um ano. O citado professor salienta: importante que as condies para gozar das regalias da lei especial s sejam concedidas se o infrator procurar reparar o mal. Se o infrator polui um rio, a suspenso do processo ter como condio alguma atividade relacionada diretamente com a ao reprovvel25.

    No obstante aos avanos trazidos pela lei de crimes ambientais, Milar e Costa Jnior fazem expressa crtica lei no que tange a presena de um excessivo nmero de normas penais em branco. Afirmam que o comportamento proibido no deve ser enunciado de forma vaga, ou complementado por dispositivos legais, ou atos normati-vos extravagantes. Trazem como exemplo o disposto no art. 29, 4, incisos I e VI26, no qual no se acham discriminadas as espcies raras ou ameaadas de extino, nem esto definidos os mtodos ou instrumentos capazes de provocar destruio em massa27.

    Mesmo contendo erros grosseiros, como utilizar a expresso exportar para o exterior no caput do art. 30, e outros tantos equvocos que ferem a boa tcnica legislativa, a lei de crimes ambientais j regula as atuais relaes do homem com o meio ambiente.

    3. COMPETNCIA DA JUSTIA FEDERAL NOS CRIMES TIPIFICADOS NA LEI N 9.605/98

    A lei n. 9.605/98 no determinou a competncia para julgamento de seus cri-mes. Assim, torna-se necessrio um estudo detalhado da matria, levando-se em conta

    22 Art. 54. Causar poluio de qualquer natureza em nveis tais que resultem ou possam resultar em danos sade humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruio significativa da flora: Pena - recluso, de um a quatro anos, e multa. [...] 2 Se o crime: [...] V - ocorrer por lanamento de resduos slidos, lquidos ou gasosos, ou detritos, leos ou substncias oleosas, em desacordo com as exigncias estabelecidas em leis ou regulamentos: Pena - recluso, de um a cinco anos.

    23 Art. 60. Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar, em qualquer parte do territrio nacional, estabelecimentos, obras ou servios potencialmente poluidores, sem licena ou autorizao dos rgos ambientais competentes, ou contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes: Pena - deteno, de um a seis meses, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.

    24 Art. 69. Obstar ou dificultar a ao fiscalizadora do Poder Pblico no trato de questes ambientais: Pena - deteno, de um a trs anos, e multa.

    25 FREITAS, Vladimir Passos de. A Constituio federal e a efetividade das normas ambientais. 2. ed. rev. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 218 e 220.

    26 Art. 29. Matar, perseguir, caar, apanhar, utilizar espcimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratria, sem a devida permisso, licena ou autorizao da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida: Pena - deteno de seis meses a um ano, e multa. [...] 4 A pena aumentada de metade, se o crime praticado: I - contra espcie rara ou considerada ameaada de extino, ainda que somente no local da infrao;[...] VI - com emprego de mtodos ou instrumentos capazes de provocar destruio em massa.

    27 MILAR, dis; COSTA JUNIOR, Paulo Jos da. Direito penal ambiental Comentrios lei 9.605/98. Campinas: Millenium, 2002. p. 35-36.

  • 19A competnciA dA JustiA FederAl pArA processAr e JulgAr crimes tipiFicAdos nA lei n 9.605/98

    a particularidade do caso concreto, para que se possa definir a competncia da Justia Federal ou da Justia Estadual nos delitos praticados contra o meio ambiente.

    Para a incidncia da norma constitucional (art. 109, IV), basta a ofensa direta a bens, servios ou interesse da Unio ou de suas entidades autrquicas ou empresas pblicas, no sendo necessria a ocorrncia de efetivo prejuzo28.

    3.1 CRIMES CONTRA A FAUNA

    Antes da edio da lei n 9605/98, a jurisprudncia do Superior Tribunal de Justia havia consagrado, por meio da smula 91, a competncia da Justia Federal para o conhecimento dos crimes contra a fauna29. A mencionada smula foi cancela-da, e segundo Freitas, o raciocnio desenvolvido para concluir pela competncia da Justia Estadual foi o de que a lei n 9.605/98 no disps sobre competncia, caben-do, a partir da CRFB/88, Unio, Estados e Municpios zelar pelo meio ambiente30.

    Segue o posicionamento atualmente pacificado do STJ31 a respeito:

    PENAL E PROCESSO PENAL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETNCIA. CRIME CONTRA A FAUNA. AUSNCIA DE OFENSA A BENS, SERVIOS OU INTERESSES DA UNIO, SUAS AUTARQUIAS, OU EMPRESAS PBLICAS. COMPETNCIA DO JUZO ESTADUAL.1. No havendo prejuzo Unio, Autarquias Federais ou Empresas Pblicas Federais, o processamento e julgamento de crime contra a fauna compete Justia Estadual. 2. Conflito conhecido e provido para declarar competente o Juzo do Primeiro Juizado Especial Criminal da Comarca de Nova Iguau/RJ, Suscitado.

    Assim, a competncia para processar e julgar crimes contra a fauna da Jus-tia Estadual e, excepcionalmente da Justia Federal nos casos em que os crimes forem praticados em detrimento de bens, servios ou interesses da Unio, suas au-tarquias ou empresas pblicas. Como exemplo, crimes contra espcies protegidas em reas da Unio como parques nacional e reservas indgenas.

    Segundo Freitas, sero tambm da competncia da Justia Federal os casos de trfico de animais para o exterior, haja vista o Brasil ter se comprometido a reprimir tal conduta atravs da Conveno sobre o Comrcio Internacional de espcies da Flora e Fauna Selvagem em Perigo de Extino (CITES), aprovada no Brasil pelo decreto legislativo 54, de 26/06/197532.

    3.2 CRIMES CONTRA A FLORA

    Consoante se infere das decises dos tribunais superiores, nada h que justifi-que a competncia federal para processar e julgar os crimes contra a flora, a no ser

    28 BRASIL, Superior Tribunal de Justia. RHC 40, Relator. Min. Costa Leite, DJ 28.08.89. 29 Smula 91 STJ (cancelada). Compete Justia Federal processar e julgar os crimes praticados contra a fauna.30 FREITAS, Vladimir Passos de; FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes contra a natureza. p. 56.31 BRASIL, STJ, CC 114798 / RJ. Relatora Min. Maria Thereza de Assis Moura. DJE 21/03/2011.32 FREITAS, Vladimir Passos de; FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes contra a natureza. 8. ed. rev. atual. e ampl. So

    Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 56.

  • 20 Rbia Chassot De Almeida, Luiz Eduardo Cleto Righetto

    que o delito tenha sido praticado contra bens da Unio, incidindo a regra geral do art. 109, inciso IV da CRFB/8833.

    Assim, se o crime for praticado em rea de conservao federal, a competncia ser da Justia Federal. Em contrapartida, se o mesmo crime for perpetrado contra rvores ou florestas de particulares, a competncia ser da justia Estadual.

    O STJ34 possui inmeras decises nesse sentido:

    CONFLITO POSITIVO DE COMPETNCIA. CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE. ART.39 DA LEI 9.605/98. CORTE DE RVORES EM REA DE PROTEO AMBIENTAL SITUADA NO ENTORNO DO PARQUE NACIONAL DO ITATIAIA. COMPETNCIA DA JUSTIA FEDERAL. 1. A competncia da Justia Federal, expressa no art. 109, IV, da Carta Magna, restringe-se s hipteses em que os crimes ambientais so perpetrados em detrimento de bens, servios ou interesses da Unio, suas autarquias ou empresas pblicas. 2. Delito em tese cometido no interior de rea de proteo ambiental localizada no Entorno do Parque Nacional do Itatiaia, criado pelo Decreto 1.713/37, floresta contgua aludida unidade de conservao, o que faz incidir na espcie o disposto no art. 9 da Lei n 4.771/65 (Cdigo Florestal), verbis: as florestas de propriedade particular, enquanto indivisas com outras, sujeitas a regime especial, ficam subordinadas s disposies que vigorarem para estas. 3. Logo, tendo em vista que a rea na qual houve o prejuzo ambiental vizinha a outra submetida a regime especial (bem da Unio), compete Justia Federal processar e julgar o feito, nos termos do art. 109, inciso IV, da Carta Magna (grifo nosso).

    importante salientar que no h se confundir patrimnio nacional com bem da Unio. Aquela locuo revela proclamao de defesa de interesses do Brasil dian-te de eventuais ingerncias estrangeiras35. Apesar de o art. 225, 4 da CRFB/88 atribuir carter de patrimnio nacional Floresta Amaznica, Serra do Mar, Mata Atlntica, ao Pantanal e Zona Costeira, no significa que so bens da Unio.

    Entretanto, evidente que h um interesse nacional na preservao de tais ecossistemas, porquanto um patrimnio que diz respeito a todos os brasileiros, e no apenas aos habitantes da regio36.

    O Tribunal Regional da 4 Regio entende que se houver extrao de bens oriundos de reas consideradas patrimnio nacional, a competncia da Justia Federal, conforme segue37:

    33 Art. 109. Aos juzes federais compete processar e julgar: [...] IV - os crimes polticos e as infraes penais praticadas em detrimento de bens, servios ou interesse da Unio ou de suas entidades autrquicas ou empresas pblicas, excludas as contravenes e ressalvada a competncia da Justia Militar e da Justia Eleitoral.

    34 BRASIL, Superior Tribunal de Justia. CC 92722 / RJ. Relator Min. Jorge Mussi. DJE 19/04/2010.35 BRASIL, Superior Tribunal de Justia. CC 99294 / RO. Relator Min. Maria Thereza de Assis Moura. DJE 21/08/2009.36 COSTA E NETO, Nicolao Dino de Castro; BELLO FILHO, Ney Barros; CASTRO E COSTA, Flvio Dino de. Crimes e

    infraes administrativas ambientais Comentrios Lei 9.605/98. p. 130.37 BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4 REGIO, Acrdo 0024168-68.2010.404.0000. Relator Nfi Cordeiro, DE

    28/10/2010.

  • 21A competnciA dA JustiA FederAl pArA processAr e JulgAr crimes tipiFicAdos nA lei n 9.605/98

    PROCESSUAL PENAL. CONFLITO DE COMPETNCIA. EXTRAO E TRANSPORTE DE PALMITO SEM LICENA. COMPETNCIA. 1. Embora realmente ainda apenas induzida a origem do palmito encontrado, h indicao por co-investigado da extrao no Parque Nacional do Iguau, em feitos similares tendo a investigao comprovado a exclusiva origem do palmito dessa Unidade de Conservao federal, com srios danos ambientais, assim justificando-se por ora o prosseguimento das investigaes nesta jurisdio tanto para o crime de extrao irregular, como para o conexo transporte posterior. 2. Declarada a competncia do juzo suscitante.

    Como se v, a amplitude do interesse a ser tutelado evidencia a predominncia

    do interesse federal, sendo a Justia Federal competente para julgar os crimes que tenham como objeto os ecossistemas supracitados.

    Por fim, cabe frisar que o Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar o Habeas Corpus 81916/PA, afirmou que a lavratura de auto infracional, pelo Instituto Brasi-leiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis (IBAMA), em trans-porte irregular de toras de madeira no implica, por si s, a competncia da Justia Federal, pois essa atividade de fiscalizao, ainda que relativa ao cumprimento da lei de crimes ambientais, configura apenas interesse genrico ou indireto da Unio38.

    3.3 POLUIO DE GUAS

    No que tange poluio do mar territorial no h controvrsias quanto com-petncia para julgar esse tipo de crime, tendo em vista o disposto no art. 20, inciso VI, da CRFB/88, o qual diz que o mar territorial bem da Unio, sendo, desta for-ma, competente para processar e julgar esses crimes a Justia Federal.

    Os rios e os lagos que banhem mais de um estado, que sirvam de limite com outro pas ou se estendam a territrio estrangeiro ou dele provenham pertencem Unio, nos termos do inciso III, do art. 20, da CRFB/88. Desta forma, havendo poluio em um rio ou lago de domnio da Unio, a competncia ser da Justia Federal. Nesse sentido, o ministro Marco Aurlio, do STF, ao julgar o RE 454740/AL, definiu que competente a Justia Federal para julgar ao em que determinada empresa havia sido denunciada por descartar resduos txicos sobre rio que atraves-sa o Estado de Alagoas39.

    O STJ adota o mesmo entendimento no que se refere aos rios que banham mais de um estado da federao40:

    CONFLITO NEGATIVO DE COMPETNCIA. JUZO FEDERAL E JUZO ESTADUAL. AO DE USUCAPIO. IMVEL QUE CONFRONTA COM RIO FEDERAL. INTERESSE DA UNIO. COMPETNCIA DA JUSTIA FEDERAL.De acordo com a Nota Tcnica n. 18/2005/NGI e a Resoluo n. 399 da

    38 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. HC 81916/PA. Relator Min. Gilmar Mendes, DJ 11/10/2002.39 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. RE 454740/AL. Relator Min Marco Aurlio Mello. Julgamento 28/04/2009.40 BRASIL, Superior Tribunal de Justia. CC 97359 / SP. Relator Min. Sidnei Beneti. DJE 26/06/2009.

  • 22 Rbia Chassot De Almeida, Luiz Eduardo Cleto Righetto

    Agncia Nacional de guas - ANA, o Rio Piracicaba, por banhar mais de um estado da Federao, considerado federal, nos termos do artigo 20, III, da Constituio Federal. Conflito conhecido, declarando-se competente o Juzo Federal da 3 Vara de Piracicaba- SJ/SP .

    Segundo as lies de Castro e Costa Neto, a poluio resultante do uso de pes-ticidas, se no ofender aos bens, servios ou interesses da Unio, de suas autarquias ou empresas pblicas, ser de competncia da Justia Estadual. Porm, se o uso de determinado agrotxico prejudicar a sade de uma comunidade indgena, a compe-tncia passar a ser da Justia Federal41.

    3.4 LAVRA DE RECURSOS MINERAIS

    A lavra ou extrao de recursos minerais sem autorizao, permisso, con-cesso ou licena, ou em desacordo com a obtida est prevista no art. 55 da lei n 9.605/98. O rgo responsvel pelo fornecimento da licena o Departamento Nacional de Produo Mineral (DNPM), e a competncia da Justia Federal, pois os recursos minerais so bens da Unio, consoante art. 20, inciso IX, da CRFB/8842.

    Neste sentido, j decidiu o STJ43:

    PROCESSUAL PENAL - EXTRAO ILEGAL DE RECURSOS MINERAIS - RIO DE DOMNIO DA UNIO - ARTIGO 20, IX, DA CONSTITUIO FEDERAL.- O artigo 20, IX, da Constituio Federal, dispe que os recursos minerais, inclusive os do subsolo, so bens da Unio. Assim sendo, a competncia a para o processo e julgamento do caso da Justia Federal. - Ordem concedida para, anulando o feito processado perante a Justia Estadual, determinar a competncia da Justia Federal, prosseguindo-se, assim, somente a denncia oferecida pelo parquet federal no processo n 1999.61.13.004979-4 .

    Apesar de ser o entendimento supracitado o predominante, h julgados do pr-prio STJ (3 Seo) no sentido de que se se tratar de extrao de areia em pequeno rio a cu aberto, em propriedade particular, no h interesse da Unio, devendo o feito ser julgado pela Justia Estadual44:

    CONFLITO NEGATIVO DE COMPETNCIA. JUZO ESTADUAL X JUZO FEDERAL. CRIME AMBIENTAL. EXTRAO DE AREIA EM PEQUENO RIO A CU ABERTO. PROPRIEDADE PARTICULAR. INEXISTNCIA DE INTERESSE DA UNIO. COMPETNCIA DA JUSTIA ESTADUAL.No atenta contra bens, servios ou interesses da Unio Federal, a extrao, sem autorizao do rgo competente, de areia de pequeno rio denominado

    41 COSTA E NETO, Nicolao Dino de Castro; BELLO FILHO, Ney Barros; CASTRO E COSTA, Flvio Dino de. Crimes e infraes administrativas ambientais Comentrios Lei 9.605/98. p. 136.

    42 FREITAS, Vladimir Passos de; FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes contra a natureza. 8. ed. rev. atual. e ampl. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 59.

    43 BRASIL, Superior Tribunal de Justia. HC 23286/SP. Relator Min. Jorge Scartezzini. DJ 19/12/2003.44 BRASIL, Superior Tribunal de Justia. CC 36206/MG. Relator Min. Paulo Medina, DJ 16/06/2003.

  • 23A competnciA dA JustiA FederAl pArA processAr e JulgAr crimes tipiFicAdos nA lei n 9.605/98

    Ribeiro dos Paiva, localizado em propriedade particular. O citado ribeiro no est entre os bens da Unio, haja vista que o mesmo no est situado em seu terreno de domnio, no banha mais de um Estado, no serve de limite com outro pas e no se estende a estado estrangeiro, conforme dispe o art. 20, inciso III, da CF/88. Conflito conhecido para declarar competente o Juzo de Direito da Comarca de Belo Vale/MG.

    Neste mesmo diapaso45:

    CONSTITUCIONAL. COMPETNCIA. EXTRAO DE AREIA. CRIME FEDERAL.INEXISTNCIA. - A extrao de areia a cu aberto, em leito de pequeno rio no configura crime da competncia da Justia Federal, pois no atenta contra bens, servios ou interesses da Unio Federal. - Conflito de Competncia conhecido. Competncia da Justia Estadual. (Juzo suscitado).

    Como visto, h posicionamentos diferentes quanto extrao de recursos mi-nerais, adotando a 3 Seo do STJ entendimento no sentido de que se a extrao sem autorizao do rgo competente for em leito de pequeno rio, em propriedade particular, a cu aberto, a competncia ser da Justia Estadual, e no da Federal.

    CONSIDERAES FINAIS

    Baseando-se na estruturao deste artigo cientfico, percebe-se a ligao entre os tpicos que, atravs de um mtodo indutivo, traz ao leitor o conhecimento amplo da matria para o perfeito entendimento do cerne da questo, qual seja: como definir a competncia para processar e julgar crimes ambientais diante da autonomia outor-gada pela CRFB/88 aos estes federativos para proteger o meio ambiente como um todo e diante da falta de previso a respeito na lei n 9.605/98?

    Inicialmente estudou-se a competncia da Justia Federal luz da CRFB/88, a qual vem descrita no art. 109 da Carta Magna. Em seguida foram feitos breves comen-trios lei n 9.605/98, a qual trata de crimes ambientais. no captulo 3 foi colacionado entendimento doutrinrio e jurisprudencial acerca da competncia da Justia Federal nos crimes tipificados na lei n 9.605/98, principalmente no que tange aos crimes con-tra a fauna, contra a flora, poluio de guas e lavra de recursos minerais.

    Na ausncia de previso legal especfica, aplica-se a regra geral da repartio de competncia, reservados Justia Federal, na tutela penal ambiental, os crimes cometidos em detrimento de bens, servios ou interesses da Unio, ou de suas enti-dades autrquicas ou empresas pblicas, nos termos do art. 109, IV, CRFB/88, e a competncia da Justia Estadual ampla e residual.

    Ademais, o interesse da Unio na preservao do meio ambiente genrico e no tem a capacidade de, por si s, nos crimes ambientais, atrair a competncia da Justia Federal. O entendimento predominante na jurisprudncia, inclusive do STF e do STJ, de que o interesse da Unio para atrair a competncia da Justia Federal deve ser direto e especfico, aferido caso a caso, pontualmente.

    45 BRASIL, Superior Tribunal de Justia. CC 36225/SP. Relator Min. Vicente Leal. DJ 09/12/2002.

  • 24 Rbia Chassot De Almeida, Luiz Eduardo Cleto Righetto

    O entendimento majoritrio da jurisprudncia ptria, que para incidir a nor-ma constitucional do art. 109, inciso IV, basta a ofensa direta a bens, servios ou interesse da Unio ou de suas entidades autrquicas ou empresas pblicas, no sen-do necessria a ocorrncia de efetivo prejuzo. Ainda, a atividade de fiscalizao ambiental exercida pelo IBAMA, configura interesse genrico, mediato ou indireto da Unio, dessa forma, no atrai a competncia da Justia Federal, salvo se estiver presente um dos requisitos constitucionais: ofensa a bem, servio ou interesse da Unio, ou de suas entidades autrquicas e empresas pblicas.

    REFERNCIAS

    BRASIL. Lei n. 9.605. Dispe sobre as sanes penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e d outras providncias. Publi-cada no D.O.U. em 13 de fevereiro de 1998. BRASIL, Constituio da Repblica Federativa do Brasil. Braslia, DF: Senado Fe-deral, 1988.BRASIL. Superior Tribunal de Justia. RHC 40, Relator. Min. Costa Leite, DJ 28.08.89. Disponvel em:. Acesso em 05/04/2013.BRASIL. Superior Tribunal de Justia. CC 114798 / RJ. Relatora Min. Maria The-reza de Assis Moura. DJE 21/03/2011. Disponvel em:. Acesso em 05/04/2013.BRASIL. Superior Tribunal de Justia. CC 92722 / RJ. Relator Min. Jorge Mussi. DJE 19/04/2010. Disponvel em:. Acesso em 08/04/2013.BRASIL. Superior Tribunal de Justia. CC 99294 / RO. Relator Min. Maria Thereza de Assis Moura. DJE 21/08/2009. Disponvel em:. Acesso em 06/04/2013.BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4 REGIO, Acrdo 0024168-68.2010.404.0000. Relator Nfi Cordeiro, DE 28/10/2010. Disponvel em:

  • 25A competnciA dA JustiA FederAl pArA processAr e JulgAr crimes tipiFicAdos nA lei n 9.605/98

    COSTA E NETO, Nicolao Dino de Castro; BELLO FILHO, Ney Barros; CASTRO E COSTA, Flvio Dino de. Crimes e infraes administrativas ambientais Co-mentrios Lei 9.605/98. 2. ed. Braslia: Braslia Jurdica, 2001.FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 4. ed. ampl. So Paulo: Saraiva, 2003.FREITAS, Vladimir Passos de. A Constituio federal e a efetividade das normas ambientais. 2. ed. ver. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.FREITAS, Vladimir Passos de; FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes contra a na-tureza. 8. ed. rev. atual. e ampl. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.LOURES, Srgio Lopes; MIRANDA, Marcos Paulo de Souza et al. Consideraes acerca da nova Lei de Crimes Ambientais. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 27, 23 dez. 1998. Disponvel em: . Acesso em 02 jul. 2011.MILAR, dis; COSTA JUNIOR, Paulo Jos da. Direito penal ambiental Co-mentrios lei 9.605/98. Campinas: Millenium, 2002.MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. So Paulo: Atlas. 10 ed., 2000.MIRABETE, Jlio Fabbrini. Manual de direito penal Volume III, 24. ed. So Paulo: Atlas, 2010.SILVA, Jos Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 27. ed. So Paulo: Malheiros, 2006.TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. Vol 2. 25. ed. So Paulo: Saraiva, 2003.

    Recebido em: 28/09/2013.Aprovado em: 29/09/2013.

  • A internao compulsria dos viciados em crack a partir da ponderao entre liberdade e dignidade humana

    Compulsory hospitalization of crack addicts from the balance between freedom and human dignity

    Jessica Hind Ribeiro Costa1______________________________________________________________________

    RESUMO

    O presente trabalho visa estudar a ponderao entre o direito liberdade individual e a dignidade da pessoa humana dos dependentes qumicos residentes em cracolnidas. O ponto de partida da seguinte ponderao a questo de total miserabilidade em que vivem neste ambiente. Assim, chega-se a constatao de que muitos deles no tm a capacidade de tomarem decises acerca de seu tratamento. Isso implica afirmar que possvel estabelecer uma ponderao entre o princpio da autonomia e o princpio da dignidade da pessoa humana, chegando a concluso de que o segundo deve ser assegurado nestes casos em detrimento da autonomia destes indivduos. Para isso, necessrio a anlise da ponderao, tcnica de soluo para o conflito entre princpios, e o princpio da razoabilidade, que norteia a avaliao do caso concreto, que aqui aplicado dependncia qumica no crack. Assim, defende-se que as internaes compulsrias so uma medida vlida para assegurar direitos a estes indivduos, tem por objetivo reinseri-los na sociedade de forma digna, assegurando-lhes direitos fundamentais, e ainda possibilitando a estes o resgate da sua capacidade de autodeterminar-se. A internao compulsria, tema longe de esgotar-se, no defendida como nica sada (embora seja talvez a melhor), mas no se pode negar sua eficcia no mbito das cracolndias para mitigar o quadro de miserabilidade que vivem.

    PALAVRAS-CHAVE

    Crack. Liberdade. Direitos fundamentais. Ponderao. Internao compulsria.

    ABSTRACT

    This research aim to study the deliberation between the individual right free-dom and the human dignity of addicts living in Cracolndia.The bottom line of the following deliberation is the question of total misery of who lives in this surrou-dings.Thus, realize that many of them do not have the capacity to make decisions

    1 Bacharel em Direito pela Universidade Vale do Itaja - Univali no Campus de Balnerio Cambori/SC e servidora da Justia Federal do estado de Santa Catarina. E-mail: [email protected] e [email protected].

  • 28 Jessica Hind Ribeiro Costa

    about their treatment. This claim implies that it is possible to establish a deliberation between the principle of autonomy and the principle of human dignity, concluding that the second should be ensured in these cases to the detriment of the autonomy of these individuals.So, its necessary the analyze of deliberation, technique solution to the conflict between principles, and the principle of reasonableness, which guides the assessment of the case, which is here applied to the crack addiction. Thus, it is argued that compulsory admission are a valid measure to ensure these rights for these individuals, aims to reintegrate them into society in a dignified way, assuring them fundamental rights, and still allowing them the rescue of their the capacity to determine itself.The compulsory admission, subject away from running out, is not advocated as the unique solution (although it is perhaps the best), but you can not deny yours efficiency in cracolncias ambits to mitigate the misery way that they use to live.

    KEYWORDS

    Crack. Autonomy. Fundamental rights. Weighting. Compulsory hospitalization.

    INTRODUO

    O uso de drogas prtica que faz parte da cultura da humanidade desde a Pr-histria. Com o passar dos anos, o uso destas substncias pelos povos da An-tiguidade veio a estar ligado, tambm, obteno de prazer e a fins teraputicos, conforme foram progressivamente descobertas e exploradas suas propriedades or-gnicas. No entanto, foi a busca por sensaes de xtase e relaxamento, assim como o desejo de fuga temporria da realidade mundana, constituram o principal mvel do homem em direo ao consumo de drogas ao longo da histria e esto na raiz deste hbito, hoje associado a variados motivos.

    Ocorre que o uso das drogas se d em diferentes nveis, perpassando desde o mero usurio ocasional, at graus de elevada dependncia, apresentando diver-sas manifestaes e condies de uso, bem como padres de usurios distintos. A dessemelhana de situaes em que se d o uso deve conduzir, igualmente, a uma desigualdade de tratamento dos sujeitos envolvidos.

    Em casos mais graves, os indivduos acabam por afastar-se da realidade se inse-rindo numa espcie de realidade paralela, onde passam a viver em razo do vcio do crack, passando pois a viver (e/ou transitar) pelas chamas cracolndas. Neste meio a maioria dos sujeitos passa a desenvolver distrbios fisiolgicos e psquicos causados pelas drogas ou a elas associados, encontram-se em situao de especial fragilidade, desemparados, sem condies de tomar decises autnomas neste tocante.

    Necessrio, pois, que o Estado interfira nesta realidade, assegurando a estes dependentes qumicos um tratamento apropriado mesmo que de forma involunt-ria. Isto porque, considerando a situao em que vivem, que ser apresentada mais detalhadamente explicada no decorrer do presente trabalho, estes indivduos podem

  • 29A internAo compulsriA dos viciAdos em crAck A pArtir dA ponderAo entre liberdAde e dignidAde humAnA

    perder a capacidade de se determinarem ou a terem mitigada em detrimento da ponderao de princpios.

    Assim, a ponderao deve ser feita para que se analise at que ponto deve ser assegurado a estes indivduos direitos de liberdade, considerando-os autnomos, apesar dessa atitude corroborar pra uma situao de degradao do indivduo. Por isso, devem ser sopesados os direitos e princpios que se confrontam nesta situao, merecendo destaque, neste contexto, a dignidade da pessoa humana.

    DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

    Os direitos fundamentais do homem no resultam de um nico acontecimento histrico, mas sim de uma evoluo, fruto do conhecimento e experincias acumu-lados ao longo do tempo. Assim, no possvel estabelecer um marco cronolgico seguro, bem como impossvel traar em breves linhas o desenvolvimento histrico destes, at mesmo porque esta no a proposta do presente artigo.

    No entanto, apenas para trazer algumas notcias histricas que corroborem com a noo de importncia e antiguidade dos direitos fundamentais, necessrio remeter doutrina estoica greco-romana e do cristianismo, dos quais advieram as teses da unidade da humanidade e da igualdade de todos os homens em dignidade. Por isso se diz que o primeiro embrio daquilo que ser chamado de Direitos Fundamentais aparece em Roma, mais precisamente na Roma Imperial, e pode ser estabelecido como o Cristianismo.

    Neste sentido, importante citar a lio de Walber de Moura Agra que tambm destaca a contribuio romana do conceito de jus gentium2. Reconheceu-se aos es-trangeiros a condio de sujeitos de direito. Progressivamente, houve a atribuio de direitos aos habitantes do Imprio e at da prpria cidadania romana, demons-trando, pela primeira vez, a universalidade dos direitos3, permitindo assim que estes fossem aplicados no mbito mais expressivo, territorial, em detrimento da aplicao pessoal.

    Como visto anteriormente, a partir do cristianismo que o homem adquire um grau mais elevado de dignidade, por ser considerado imagem e semelhana de Deus. So Tomas de Aquino afirmava que o termo pessoa j designaria subsistncia e dignidade inerentes natureza racional do ser humano, pelo simples fato de ser o homem a imagem e semelhana de Deus. Neste sentido:

    A dignidade humana, [...] a despeito das mltiplas concepes que costuma suscitar, denota o reconhecimento de um valor intrnseco do qual o ser humano dotado. Este valor foi desenvolvido por So Toms de Aquino, grande expoente da filosofia Escolstica, que reconhecendo a racionalidade humana, repousa a dignidade do homem no fato de ser ele imagem de Deus.

    2 O Ius gentium ou jus gentium (direito das gentes ou direito dos povos, em latim) compunha-se das normas de direito romano que eram aplicveis aos estrangeiro. Desenvolveu-se em contraposio ao ius civile, isto , o conjunto de instituies jurdicas aplicveis aos cidados romanos.

    3 AGRA, Walber de Moura. Curso de Direito Constitucional, Rio de Janeiro: Forense, 2009, p.136.

  • 30 Jessica Hind Ribeiro Costa

    Por tal motivo, decorre da filosofia tomista que a pessoa sempre um fim em si mesmo, nunca um meio.4

    Neste sentido, Lus Roberto Barro, afirma que a dignidade da pessoa humana seria, pois, um valor e princpio subjacente ao grande mandamento, de origem religiosa do respeito ao prximo. Assim, a partir do momento em que possvel se reconhecer no outro a condio de ser humano, este j teria assegurado, por si, o direito de ter seus direitos fundamentais respeitados5.

    O jusnaturalismo, amplamente difundido na Idade Mdia, contribuiu para a sedimentao dos direitos humanos, partindo do princpio de que o homem dotado de direitos que independem dos entes estatais, visto que tais prerrogativas resultam da natureza humana, sem a exigncia de nenhuma condio para que eles fossem assegurados.

    Tambm no Renascimento o ser humano ocupou o centro das atenes em todas as reas do conhecimento cientfico, artstico servindo tal efervescncia cultural como alicerce para vrias correntes doutrinrias, dentre elas o contratualis-mo, o socialismo, o humanismo, o racionalismo, etc.

    Fatos sociais e histricos, em diferentes pocas, ensejaram Declaraes favo-rveis ao desenvolvimento e positivao dos direitos humanos e fundamentais, a exemplo da Magna Carta firmada na Inglaterra em 1215, pelo Rei Joo Sem-Terra e pelos bispos e bares ingleses, que inspirou inmeras constituies do ps-guerra.

    Neste contexto surgem as duas declaraes mais famosas e com maior carga de proteo de direitos fundamentais, so elas: a Declarao Universal de Direi-tos do Homem e do Cidado 1989 e a Declarao Universal dos Direitos do Homem 1948.

    A primeira ficou conhecida como marco do constitucionalismo liberal, pro-clamando os princpios de liberdade, igualdade, propriedade, legalidade, bem como as garantias fundamentais. Preocupava-se mais com o homem e com seus direitos, tendo como aspectos fundamentais o intelectualismo, o mundialismo e o individu-alismo. O Estado, entendido aqui como Nao, ganhou grande importncia neste contexto na medida em que era um instrumento de satisfao dos interesses e asse-gurao dos direitos. Por sua vez, a Declarao Universal dos Direitos do Homem, igualmente fundamental, se estabelecendo, inclusive, como paradigma tico de go-vernos e ideal comum a ser alcanado por todos os povos. Os seus artigos procla-mam direitos humanos em que se baseiam uma srie de tratados e constituies. A ttulo exemplificativo, sob pena de ser feita aqui uma compilao da Declarao, merecem destaque: o direito vida, liberdade de locomoo, presuno de inocn-cia, privacidade, asilo poltico, propriedade, expresso coletiva, direitos polticos, educao, sade, bem-estar, cultura, dentre outros6.

    4 LEO JR., Paulo Silveira Martins; OLIVEIRA, Maurine Morgan Pimentel de Oliveira. Direito Fundamental a Vida: Pilar do Estado Democrtico de Direito. In: Vida, Morte e Dignidade Humana. So Paulo: Editora GZ, 2011, p. 316.

    5 BARROSO, Lus Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporneo: os conceitos fundamentais e a construo do novo modelo. So Paulo: Saraiva, 2009, p. 250.

    6 CUNHA JNIOR, Dirley da, Curso de Direito Constitucional, 4 Ed. Salvador: Jus Podivm, 2013, p. 568-578.

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    Depois que os direitos fundamentais so reconhecidos, notadamente no mbi-to internacional, torna-se comum dividi-los em geraes ou dimenses, que sero a seguir apresentadas. Apenas para introduzir a seguinte diviso, salienta-se que o iderio poltico revolucionrio francs se cunhava numa mxima, qual seja: igual-dade, liberdade e fraternidade. Cada uma dessas expresses representa uma das geraes a seguir expostas, sendo, pois a concretizao da conquista destes postu-lados pela humanidade7.

    O progressivo reconhecimento dos novos direitos fundamentais pressupem um caminho em que no se admite a supresso dos direitos j reconhecidos, sen-do um movimento apenas de ampliao das garantias subjetivas individuais. Neste contexto de interdependncia, as dimenses dos direitos fundamentais no podem ser examinadas de maneira isolada tendo em vista a interdependncia que existe entre elas. Vale ressaltar aqui que as geraes se referem a uma ordem cronolgica do reconhecimento dos direitos fundamentais, no significando qualquer hierarquia entre eles. Inclusive, embora o termo geraes pressuponha gradao isso no ocor-re no mbito dos direitos fundamentais8. Passamos, pois, a examinar as geraes:

    A Primeira Gerao caracteriza-se por possuir um cunho fortemente individu-alista. Nesta fase o Estado visto como inimigo que deveria ser contido, devendo somente atuar com o objetivo de promover segurana interna e externa. So assim concebidos como direitos dos indivduos perante o Estado, mais especificamente, como direitos de defesa, demarcando uma zona de no interveno do Estado e uma esfera de autonomia individual em face de seu poder.

    So por esse motivo apresentados como direitos de cunho negativo, uma vez que dirigidos a uma absteno, e no a uma conduta positiva por parte dos poderes pblicos, sendo, neste sentido, direitos de resistncia ou de oposio pe-rante o Estado.

    Trata-se de produto peculiar do pensamento liberal-burgus do sculo XVIII e por isso mesmo serviram muito bem para a classe dominante da poca, refletindo a exigncia de no interferncia/interveno por parte do Estado nos direitos de pensamento, de crena, liberdade de associao.

    Estes direitos so compostos por um leque de liberdades, as quais incluem as liberdades de expresso coletiva (liberdades de expresso, imprensa, manifestao, reunio, associao etc.) e os direitos de participao poltica, como o direito de voto e a capacidade eleitoral passiva, revelando, de tal sorte, a ntima correlao dos direitos fundamentais e a Democracia. Tambm se enquadram algumas garantias processuais como o devido processo legal, o habeas corpus e o direito de petio. No entanto, como direito mais importante para a nossa pesquisa, destaca-se aqui o direito liberdade, que pressupe a autonomia do indivduo e a capacidade de autodeterminar-se, o que ser adiante estudado.

    J os direitos fundamentais de Segunda Gerao, resultado das consequncias da industrializao, quais sejam os problemas sociais e econmicos que decorreram

    7 PINHO, Rodrigo Csar Rebello. Teoria Geral da constituio e dos direitos fundamentais. So Paulo: Saraiva, 2002, p. 66.8 CUNHA JNIOR, Dirley da, Curso de Direito Constitucional, 4 Ed. Salvador: Jus Podivm, 2013, p. 580-583.

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    das amplas liberdades asseguradas aos indivduos, bem como os estudos das dou-trinas socialistas e a constatao de que a apenas a consagrao formal de liberdade e igualdade no gerava garantia de sua efetiva concretizao. Esta observncia fez surgir amplos movimentos reivindicatrios e o reconhecimento progressivo de di-reitos, atribuindo ao Estado o comportamento ativo na realizao da justia social.

    O Estado passa a ser visto assim, no mais como um inimigo mas sim um aliado, um viabilizador daquilo que exigido e que deve ser construdo. Muda-se o perfil do Estado, o qual passa a ser o Estado do bem-estar Social.

    Esta segunda gerao traz baila novos direitos fundamentais. Estes, dessa vez, asseguram aos indivduos direitos a prestaes, ou seja, a atuaes con-cretas do Estado, tais como assistncia social, sade, educao, trabalho etc., revelando uma transio das liberdades formais abstratas para as liberdades ma-teriais concretas. Vale frisar que no Sculo XX e, sobretudo, nas Constituies do segundo ps-guerra, que estes novos direitos fundamentais so consagrados num nmero significativo de Constituies, alm de constiturem o objeto de diversos pactos internacionais.

    A Terceira Gerao teria sido consagrada nas constituies imediatamente posteriores a segunda guerra e nas constituies ps-trmino de perodos ditatoriais. Trazem como nota distintiva o fato de se desprenderem, em princpio, da figura do homem-indivduo como seu titular, destinando-se proteo de grupos humanos. Consequentemente, pode-se afirmar que se referem aos direitos de titularidade tran-sindividual, abrangidos a os direitos fundamentais difusos ou coletivos. Em outras palavras, a natureza destes faz com que o seu perfil de defesa no se esgote em apenas um indivduo, ou seja, no so defendidos apenas por um indivduo, mas sim passveis de defesa de uma coletividade. Isso porque medida que os processos sociais se tornam mais complexos, necessrio que hajam instrumentos de proteo do coletivo e do ambiente.

    Dentre os direitos fundamentais desta dimenso so mais citados os direitos paz, autodeterminao dos povos, ao desenvolvimento, ao meio ambiente e quali-dade de vida, bem como o direito conservao e utilizao do patrimnio histrico e cultural e o direito de comunicao. Cuida-se, na verdade, do resultado de novas reivindicaes fundamentais do ser humano, geradas, dentre outros fatores, pelo impacto tecnolgico, pelo estado crnico de beligerncia, bem como pelo processo de descolonizao do segundo ps-guerra e suas contundentes consequncias, acar-retando profundos reflexos na esfera das garantias fundamentais.

    DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

    Importante iniciar este tpico tratando da questo da dignidade para Kant, que se relaciona com a noo do indivduo como fim em si mesmo. Tal acepo se coaduna com a noo de respeito que at hoje est interligada com o conceito prin-cipiolgico da dignidade da pessoa humana.

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    Para Kant, aquello que constituye la condicin para que algo sea un fin en si mismo, eso no tiene meramente valor relativo o precio, sino un valor intrnseco, esto es, dignidad. Segn Kant, en consecuencia, la persona humana no tiene precio (que es el valor que le ponemos a las cosas que non son medios y no llegan a ser fines). En lugar de precio, los seres humanos tenemos dignidad. En consecuencia, la dignidad es un valor, una cualidad irreal que tenemos todos los humanos por el hecho de pertenecer a la especie, y por habernos autoconferido la caracterstica de ser fines y no medios.9

    Na dico de Antnio Junqueira de Azevedo, muitas civilizaes, graas especialmente a seus heris e santos, tiveram considerao pela dignidade da pessoa humana, mas a verbalizao da expresso, foi um passo notvel dos tempos mais prximos10.

    No sculo XX, aps a Segunda Grande Guerra, a dignidade da pessoa humana deixou de ser mero conceito filosfico, de contedo moral, e ganhou carter nor-mativo, passando a estar determinada expressamente em uma srie de Declaraes e Constituies, dentre as quais a brasileira11. Neste sentido:

    A consolidao dogmtica do conceito de dignidade humana vem crescendo desde o final da Segunda Guerra Mundial, do que exemplo a Declarao Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada pela Resoluo n 217, da Assembleia Geral das Naes Unidas em 10 de dezembro de 1948, tendo sido assinada pelo Brasil naquela mesma data.12

    De todas as inovaes trazidas pela Constituio de 1988, sem dvida a mais positiva e valiosa foi o destaque mpar na nossa histria conferido aos direitos fundamentais. Alm de incorporar ao seu texto um elenco amplo e generoso de direitos individuais, polticos, sociais, difusos e coletivos, em perfeita sintonia com a tendncia internacional de proteo destes direitos, a Constituio elevou-

    9 YNEZ, Gonzalo Fugueroa. La Dignidad y el derecho a la vida (vivir com dignidade). In: Revista del Derecho y Genoma Humano, Bilbao, Fundaacin BBV, N.18. Enero-Junio, 2003, p. 134-135.

    10 In RTDC Revista Trimestral de Direito Civil. Rio de Janeiro: Padma Editora, vol.9, 2002.11 Exemplificativamente, podem ser citadas a Declarao Universal dos Direitos do Homem, proclamada pelas Naes

    Unidas em 1948: [] Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da famlia humana e de seus direitos iguais e inalienveis o fundamento da liberdade, da justia e da paz do mundo []Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. So dotados de razo e conscincia e devem agir em relao uns aos autros com esprito de fraternidade. (Art. 1)

    A Constituio da Repblica italiana, de 1947:Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. So dotados de razo e conscincia e devem agir em relao uns aos autros com esprito de fraternidade. (Art. 3, 1 parte).

    A Lei Fundamental da Alemanha, de 1949:A dignidade do homem intangvel. Respeit-la e proteg-la obrigao de todo o poder pblico. (Art. 1.1).

    A Constituio da Repblica Portuguesa, de 1976:Portugal uma Repblica soberana, baseada, entre outros valores, na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construo de uma sociedade livre, justa e solidria. (Art. 1). Todos os cidados tm a mesma dignidade social e so iguais perante a lei (art. 13, 1 alnea).

    A Constituio brasileira de 1988: Art. 1 A Repblica Federativa do Brasil, formada pela unio indissolvel dos Estados e Municpios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrtico de Direito e tem como fundamentos:[...]III a dignidade da pessoa humana.

    12 LEO JR., Paulo Silveira Martins; OLIVEIRA, Maurine Morgan Pimentel de Oliveira. Direito Fundamental a Vida: Pilar do Estado Democrtico de Direito. In: Vida, Morte e Dignidade Humana. So Paulo: Editora GZ, 2011, p. 326.

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    -os condio de clusula ptrea expressa, imunizando-os da ao corrosiva do constituinte derivado.

    A prpria estruturao interna da Constituio, que, diversamente do que ocor-ria na ordem constitucional pretrita, ps os direitos fundamentais na parte inicial do texto magno, antes das normas sobre a organizao do Estado, revela bem a importncia sem precedentes conferida a tais direitos, que passam a desfrutar de in-disputvel primazia axiolgica no novo regime. Neste sentido, importante observar que a CF, j no seu art. 1, III, contm preceito expresso que admite a fundamentali-dade material destes direitos, como consequncia do reconhecimento da dignidade da pessoa humana como alicerce do Estado, demonstrando a importncia e o desta-que que este instituto tem para o Estado Democrtico brasileiro.

    Trata-se, pois, de um valor supremo dos sistemas jurdicos de inspirao de-mocrtica, que foi elevado ao patamar de fundamento do Estado Democrtico de Direito, integrando a categoria dos princpios fundamentais, ao lado de outras nor-mas principiolgicas, como o princpio republicano, o princpio federativo e o prin-cpio da separao de poderes (arts. 1 e 2).

    Ingo Sarlet conceitua a dignidade da pessoa humana da seguinte forma:

    qualidade intrnseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e considerao por parte do Estado e da comunidade, implicando, nesse sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que garantam a pessoa contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, bem como venham a lhe assegurar as condies existenciais mnimas para uma vida saudvel, alm de propiciar e promover sua participao ativa e corresponsvel nos destinos da prpria existncia da vida em comunho com os demais seres.13

    Tal princpio reconhece o ser humano como sujeito de direitos e, assim, de-tentor de uma dignidade prpria, cuja base (lgica) o universal direito da pessoa humana a ter direitos14. A dignidade da pessoa humana se traduz assim, como um ncleo de integridade fsica, moral e espiritual do indivduo.

    Este princpio se impe como um dos poucos consensos tericos mundiais, no sendo, pois diferente esta noo no Brasil15. No entanto, a dignidade da pes-soa humana deve ser concebida de forma intersubjetiva, haja vista que, conforme variando de acordo com cada povo e momento histrico, bem como nos distintos espaos e tempos.

    Apesar desta variao no entendimento do que seria a dignidade da pessoa humana quando leva-se em conta diferentes culturas, imperioso reconhecer que se trata de um valor tornado cogente. Este valor imperioso est por trs de todos os outros valores que baseiam os direitos fundamentais. Todos os valores de todos os

    13 SARLETE, Ingo. Apud: SOARES, Ricardo Maurcio Freire. O princpio constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. So Paulo: Saraiva, 2010, p. 142.

    14 MORAES, Maria Celina Bodin de (coord). Princpios do Direito Civil Contemporneo. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 13.15 SOARES, Ricardo Maurcio Freire. O princpio constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. So Paulo: Saraiva,

    2010, p. 135.

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    direitos fundamentais podem ser considerados assim como um reflexo da dignidade da pessoa humana.

    Por estas razes costuma-se afirmar que o princpio da dignidade da pessoa humana costura e unifica todo o sistema ptrio dos direitos fundamentais, represen-tando, pois, o epicentro axiolgico da ordem constitucional, irradiando efeitos sobre todo o ordenamento jurdico e balizando no apenas os atos estatais, mas tambm toda a mirade de relaes privadas que se desenvolvem no seio da sociedade civil e no mercado.

    O princpio da dignidade da pessoa humana perpassa, assim, todos os direitos fundamentais que, em maior ou menor medida, podem ser considerados como con-cretizaes ou exteriorizaes suas. Ademais, ele desempenha papel essencial na revelao de novos direitos, no inscritos no catlogo constitucional, haja vista que no sendo o rol de direitos fundamentais estanques, este deve incorporar queles direitos que se relacionem com a premissa maior da dignidade humana.

    DO DIREITO LIBERDADE AUTONOMIA PRIVADA

    O direito fundamental liberdade se relaciona com uma srie de acepes e desdobramentos, entretanto, para restringir melhor o mbito que se quer abordar na pesquisa qual seja, a liberdade e autonomia do viciado em crack, destaca-se aqui dois principais escoamentos deste direito inerente ao indivduo:

    Liberdade de agir fazer ou deixar de fazer qualquer coisa, desde que esta no seja vedada por lei.

    Liberdade de locomoo traduzido de maneira leiga como o direito de ir e vir.

    Ambos esto previstos na Constituio, no art. 5, que disciplina direitos ine-rentes aos indivduos, respectivamente nos incisos II e XV. Assim, quaisquer medi-das que intervenham nestas garantias individuais ofenderiam estas premissas.

    Isto porque, sendo os indivduos autnomos, estes tm a capacidade de optarem livremente aquilo que devem fazer, bem como podem exercer livremente seu direito de locomoo para livremente transitar e/ou permanecer onde julgar conveniente.

    Importante, aqui abordar a temtica da autonomia individual, vista aqui como desdobramento do direito fundamental liberdade. A partir desta contextualizao, necessrio fazer determinadas colocaes a respeito do tema.

    O termo autonomia, segundo a enciclopdia Larousse Cultural, se define como: Faculdade de governa-se por suas prpria leis, dirigir-se por vontade pr-pria, sendo os autnomos os indivduos livres, independentes16. Este o conceito veiculado pelos dicionrios, no entanto, necessrio lembrar que existem uma srie de acepes e desdobramentos do que denomina-se autonomia.

    16 Larousse Cultural, V. 3, Editora Nova Cultural, 1995, p. 544.

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    Assim, em linhas gerais, e de forma leiga, costuma-se entender que o indiv-duo autnomo aquele que reina soberano sobre o seu corpo e sua mente, poden-do fazer suas escolhas de forma livre. No entanto, para melhor compreendermos a noo de autonomia que se refere o texto necessrio libertar-se desta noo simplis-ta de autonomia para compreender este conceito de forma mais ampla e abrangente.

    Incialmente, para melhor estudarmos o instituto da autonomia fazer referncia a Kant pela importncia que este teve no estudo da liberdade e da autonomia como traos inerentes aos indivduos. Este filsofo define autonomia como a possibilidade de escolha aquelas mximas que podem ser almejadas como leis universais, sendo, pois, a essncia deste princpio a funo autolegisladora. Isso significa, em linhas gerais, a capacidade de determinar as leis as quais pretende se submeter17.

    Fbio Konder Comparato, adotando uma postura kantina, entende que sendo a pessoa um fim em si mesmo, apenas pode guiar-se pela sua vontade natural, sendo este o trao distintivo entre as pessoas e as coisas18.

    Conforme afirma Denis Franco Silva, o conceito de autonomia utilizado pelos juristas uma verso falseada da autonomia kantiana, definida como sendo a von-tade livre das necessidades presentes no mundo da sensibilidade, configurando as medidas a si impostas mximas universais19. No entanto, esta noo no conseguiu perpetuar-se com o decurso do tempo, tendo assumido o termo autonomia diversos outros significados, que no convm serem aqui explicitados.

    A autonomia privada representa um dos componentes primordiais da liberda-de. Significa o poder do sujeito de autorregulamentar seus prprios interesses. En-tretanto, essa autonomia no absoluta, pois precisa ser conciliada, primeiramente com o direito de outras pessoas, e, alm disso, com outros valores, a exemplo da autonomia pblica (democracia), da igualdade, da solidariedade e da segurana.20

    O VCIO EM DROGAS COM ENFOQUE NO CRACK

    As drogas so substncias naturais ou sintticas que, ao penetrarem no orga-nismo humano sob qualquer forma ingeridas, injetadas, inaladas ou absorvidas pela pele alteram funes do organismo. O que se defende neste texto a possibi-lidade de que a alterao do estado de vigilncia do indivduo pelo uso continuado da droga possa terminar por ensejar a mitigao da autonomia que lhe inerente.

    Importante acrescentar, neste ponto, que no s os efeitos biolgicos das drogas no organismo exercem influncia na pessoa do usurio, como tambm as condies socioculturais em que est inserido delineiam um diferente tipo de rela-

    17 Poder querer para todos o que se quer para si a mxima expresso da autonomia. Ser autor de leis universais para um reino dos fins do qual fazemos parte como seres racionais e razoveis a mxima expresso da liberdade e dignidade. WEBER, Thadeu. Autonomia, dignidade da pessoa humana e respeito em Kant. In: Sujeito e liberdade: investigaes a partir do idealismo alemo. (UTZ, Konrad; BAVARESCO, Agemir; KOZEN, Paulo Roberto (Org.). Porto Alegre: EDIPUCRS, 2012, p. 17).

    18 COMPARATO, Fbio Konder. A Afirmao Histrica dos Direitos Humanos. So Paulo. Saraiva, 2005, p 21.19 SILVA, Denis Franco. O princpio da autonomia: da reinveno reconstruo. In: Princpios do Direito Civil

    Contemporneo. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 138-139.20 SARMENTO, Daniel. Direitos Fundamentais e Relaes Privadas, Rio de Janeiro: Lmen Juris, 2010, p. 154-155.

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    cionamento com as substncias que utiliza. Com efeito, Marlatt aduz que a ao das drogas no organismo humano representa um dos fatores de uma equao complexa e dinmica. O resultado final dessa equao um produto tambm de crenas, ex-pectativa e poderes que indivduos e grupos sociais atribuem s diferentes substn-cias, em um determinado momento e ambiente21.

    Embora muitos sejam os indivduos que se utilizam de drogas, a inteno deste trabalho no defender que em todos os casos a liberdade do usurio de drogas pode ser mitigada. Isto porque, em muitos casos estes indivduos continuam por realizar ativida-des corriqueiras da sua vida, tendo assegurados todos os direitos fundamentais que lhes so garantidos. Isto porque o relacionamento que cada indivduo mantm com a droga significativamente distinto. Certamente uma pessoa insone que precisa fazer uso de tranquilizantes para dormir e os dependentes que vivem em uma cracolndia tm grau de uso, sujeio e reao aos efeitos das drogas definitivamente diversos.

    A mitigao do princpio em comento, apenas pode ser empregada quando o consumo da droga ultrapassa a noo de mero uso, para tornar-se um vcio do qual o sujeito no pode mais governar-se, tornando-se, assim, prisioneiro do uso contnuo de uma dada substncia.

    Isto porque, existem indivduos que utilizam a droga de maneira eventual no se justificando, nestes casos, que sejam adotadas medidas compulsrias para limi-tar a autonomia destes indivduos, haja vista que estes se apresentam num estgio fronteirio que no interfere de forma permanente na sua capacidade de autode-terminao. Neste sentido, interessante ressaltar a definio de Howard Becker:

    [...] o usurio, nesse estagio, no esta usando a droga o tempo todo. Seu uso planejado; considera-o apropriado em certas ocasies, no em outras. A prpria existncia desse planejamento lhe permite assegurar a si mesmo que controla a droga, e ela torna-se um smbolo da inocuidade da pratica. Ele no se considera um escravo da droga porque capaz de ater a seu plano e se atm , seja qual for a quantidade que se prope a consumir o fato de haver ocasies em que, a principio, ele no usa droga, pode lhe servir como um a prova para si mesmo de sua liberdade com relao a ela.22

    No entanto, em muitos casos, o uso de drogas ultrapassa essa noo de inter-mitncia para se tornar uma situao de falta de controle, o que acarreta consequ-ncias negativas. Neste sentido Liliana Basso Musso afirma que el momento del reconocimiento de la adiccin est relacionado, con el momento en que la droga deja de producir episodios placenteros y gratificantes y estos efectos experimenta-dos vivencialmente, tienen consecuencias negativas23.

    A dependncia da droga pode ser reconhecida e identificada atravs da entre-vista psiquitrica e da anlise do quadro clnico, comportamental e pelo seu padro

    21 MARLATT, Beatriz Carlini. Drogas Mitos e verdades. So Paulo: tica, 2004, p.80.22 BECKER, Howard Saul. Outsiders: estudos de sociologia do desvio. Rio de Janeiro: ZAHAR, 2008, p. 84.23 MUSSO, Liliana Basso. La vivencia de la dependencia en un consumidor de drogas psicoactivas. In: ndice Enferm vol.20

    n.1-2 Granada janeiro-junho. 2011. Disponvel em: .

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    do uso. Alguns indivduos ultrapassam essa (tnue) barreira entre o uso de droga e a dependncia qumica, perdendo assim o controle do uso da droga em razo da necessidade psicolgica e fsica da mesma.

    Dentre as diversas drogas sejam elas narcticas, estimulantes ou tranquili-zante destaca-se no mbito desta pesquisa o crack. Esta droga surgiu a partir do crescimento do consumo de cocana e do aumento das polticas de represso sua produo e comercializao. Entre elas, a identificao e o fechamento de laborat-rios de refino e a restrio disponibilidade de solventes essenciais para a transfor-mao da pasta base em cocana, foram fundamentais para o surgimento deste uma droga ainda mais potente e rentvel: o crack24.

    Esta merece destaque por se tratar de uma droga com alto poder de devastao que, alm de prejudicar a capacidade psicomotora do indivduo, provoca leses irreversveis em rgos vitais. Dentre estas leses, ressalta-se, alm da iminncia de overdose, complicaes pulmonares e cardacas:

    No h consenso sobre qual a dose de cocana, muito menos de crack, necessria para desencadear problemas srios sade ou mesmo vida do usurio, mas acreditase que o consumo ao redor de 2-4 mg/kg traga reduo discreta do fluxo coronariano e aumento da mesma magnitude na frequncia cardaca e na presso arterial. Alm da toxicidade inerente substncia, a presena concomitante de doenas nos rgos mais afetados pela ao simpatomimtica da cocana torna seus portadores ainda mais suscetveis s complicaes (coronariopatias, hipertenso arterial sistmica, aneurismas, epilepsias e doena pulmonar obstrutiva crnica).25

    Assemelha-se, pois, a uma doena que agrava o grau de fragilidade e vulne-rabilidade do indivduo, expondo-o tambm a um maior risco de morte. Inclusive, a dependncia qumica , sim, uma doena crnica caracterizada pelo uso conti-nuado de substncias psicoativas que provocam alteraes na estrutura e funcio-namento do crebro26.

    Devido ao baixo custo da droga e da facilidade de acesso, muitos dos morado-res de ruas se viciam no Crack, o que gera uma aglomerao de pessoas dependentes dessa substncia. Sendo por isso que a maior parte dos viciados nesta droga esto inseridos nas camadas mais pobres e vulnerveis da sociedade. Assim, passam a viver neste ambiente marginalizado, reunindo-se nas ruas em espaos denominados como cracolndias.

    Um dependente qumico em grau avanado, inserido nestes ambientes, no consegue estabelecer vnculos saudveis, tampouco realizar atividades corriqueiras

    24 RAUPP, Luciane Marques. Circuitos de uso de crack nas cidades de So Paulo e Porto Alegre: Cotidiano, prticas e cuidado. Tese de Doutorado. Programa de Ps-Graduao em Sade Pblica da Faculdade de Sade Pblica da Universidade de So Paulo, 2011, p. 22.

    25 ANDRADA, Nathalia Carvalho de. Abuso e dependncia: crack. In: Rev. Assoc. Med. Bras. vol.58 no.2 So Paulo Mar./Apr. 2012. Disponvel em: .

    26 LARANJEURA, Ronaldo. Bases do tratamento da dependncia de crack. In: O tratamento do usurio de crack. 2 ed. Porto Alegre: Artmed, 2012, p. 23.

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    relacionadas aos direitos fundamentais inerentes a sua pessoa. Isto porque, o uso de drogas intermitente, interrompe etapas importantes de aprendizagem, mitigando a capacidade do indivduo de raciocinar e discernir de maneira clara e equilibrada.

    V-se, portanto, que os nveis de uso nocivo e de dependncia de drogas re-presentam uma alterao orgnica patolgica do indivduo; o usurio, nestes casos, padece de uma doena. Nestes graus, o uso de drogas acarreta-lhe, como j dito, consequncias danosas nas esferas fsica e social, comprometendo a normalidade das funes biolgicas e provocando estados mentais de perturbao.

    Diante deste um estado significativamente alterado do funcionamento do or-ganismo, acompanhado de representaes mentais desordenadas, o dependente de drogas no tem condies de se autodeterminar e se comportar socialmente de forma controlada. Sofrendo, pois, complicaes fisiolgicas, psquicas ou sociais por decor-rncia do consumo. Isso significa que os dependentes, por sua peculiar situao de instabilidade orgnica, carecem das ferramentas adequadas ao exerccio satisfatrio da autonomia, e, por conseguinte, esto em posio de maior exposio a ofensas de terceiros, seja contra sua integridade fsica, seja contra sua liberdade decisria.

    preciso, assim, oportunizar e recuperar a sade biopsquica destas pessoas a partir de tratamentos teraputicos adequados, fazendo-o transitar pelas etapas ne-cessrias reconstituio da sua sade. Embora existam um srie de medidas que possam ser tomadas no caso concreto como forma de reintegrar este indivduo so-ciedade, no entanto, esta pesquisa se dedica a analisar as intervenes compulsrias no sentido de internar estes dependentes que residem em cracolndias.

    Para defender esta internao, necessrio que seja feita uma ponderao en-tre a liberdade e autonomia do indivduo e a dignidade da pessoa humana, bem como outros direitos fundamentais que dela decorrem, para que assim se possa es-tabelecer uma opinio melhor fundamentada sobre o tema.

    A PROPORCIONALIDADE ENTRE LIBERDADE E DIGNIDADE HUMANA

    So os princpios mandamentos de otimizao em face das possibilidades jur-dicas, ou seja, exigncia de sopesamento, decorre da relativizao em face das pos-sibilidades jurdicas. Sendo assim, necessrio observar os critrios de sopesamento, propostos por Alexy para a soluo de problemas que envolvam a coliso entre dois ou mais mandamentos. So eles: a necessidade, a adequao, bem como a propor-cionalidade em sentido estrito. Quando uma norma de direito fundamental com ca-rter de princpio colide com um princpio antagnico, a possibilidade jurdica para realizao dessa norma depende do princpio antagnico, se fazendo necessrio um sopesamento nos termos da lei de coliso27.

    Os princpios em tela servem, assim, para que seja analisada uma feio sist-mica ao conjunto de normas que formam a Constituio. Representando um norte

    27 ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. So Paulo: Malheiros, 2006, p. 117-118.

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    para o intrprete que busca o sentido e o alcance das normas e formam o ncleo basilar do ordenamento jurdico28.

    As regras, ao contrrio dos princpios, no tm a dimenso do peso ou da im-portncia. Quando os princpios se intercruzam, aquele que vai resolver o conflito tem de levar em conta a fora relativa de cada um. Esta no pode ser, por certo, uma mensurao exata e o julgamento que determina que um princpio ou uma poltica particular mais importante que outra frequentemente ser objeto de controvrsia29.

    Neste sentido, Dieter Grimm leciona acerca da controvrsia entre os direitos fundamentais, afirmando que nestes casos de conflitos so admitidas restries le-gais com o intuito de coibir abusos:

    Tambm em sua validade, para o legislador, os direitos fundamentais admitem restries legais a fim de que possam ser evitados abusos liberdade e compensadas liberdades opostas. Por isso, maioria dos direitos fundamentais acrescentada uma restrio legal.30

    Direitos Fundamentais, ao contrrio do que j se pensou, so relativos. A pr-tica j provou isto. A todo o momento os direitos esto cedendo em favor de outros. O prprio direito vida, por exemplo, tido como dos m