almeida (2012) - a armadilha do vício; uma interação entre cérebro e contexto

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livro sobre drogas

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A armadilha do vício

Uma interação entre cérebro e contexto.

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Copyright © desta edição:ESETec Editores Associados. Santo André, 2012.

Todos os direitos reservados

Almeida, A. M. C.

A armadilha do vício: uma interação entre cérebro e contexto. 1a Santo André, SP: ESETec Editores Associados, 2012,

80p. 21 cm

1. Psicologia do Comportamento: pesquisa, aplicações

CDD 155.2 ISBN 978857918042-2

Capa: Ana Carolina Grassi Leonardi

Solicitação de exemplares: [email protected] 11 4990 56 83

www.esetec.com.br

Page 5: Almeida (2012) - A Armadilha Do Vício; Uma Interação Entre Cérebro e Contexto

A armadilha do vício

Uma interação entre cérebro e contexto.

A. Ma ria na Costa de Almeida

ESETec2012

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Agradecimentos

Ao Prof. Dr. José Lino de Oliveira Bueno pela oportunidade que me proporcionou, pela condução na trajetória acadêmica, paciência, generosidade em dividir seus conhecimentos, pela confiança e liberdade depositada em todo meu trabalho realizado, corresponsável pelas minhas conquistas acadêmicas.

Aos meus filhos Carlos Júnior, Glauce e Renatapela compreensão das horas roubadas do convívio familiar e fonte de força que me ampara e motiva as minhas realizações.

Ao meu companheiro Carlos por compreender minhas ausências e pelo apoio incondicional nos momentos difíceis.

Aos meus colegas de laboratório do Prof. Dr. Lino, da USP de Ribeirão Preto, que me apoiaram em todos os momentos em que precisei, incentivando quando me faltava ânimo para continuar na luta.

Aos meus professores da Neurociências e Comportamento do Instituto de Psicologia da USP de São Paulo, em especial Prof. Dr. Marcus Vinícius Baldo e Prof. Dr. Gilberto Xavier, os quais contribuíram de maneira importante para meu enriquecimento teórico.

Por fim, aos meus pais, Vitória e Rufino que me transmitiram os genes e ambiente necessários, fe rram entas ind ispensáve is para m inhas conquistas.

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Sumárior

Introdução 9

Epidemiologia do uso da cocaína 15

Uma visão geral da farmacologia da cocaína 19

Uma breve caracterização dos colaboradores 21

Tolerância e adicção 33

Modelos de entendimento da adicção 45

Tratamento 51

Questões clínicas e perspectivas 69

Referência Bibliográfica 75

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Introdução

Mães que se esvaiam em lágrimas se perguntando “onde eu errei?” Adictos que me diziam: “por favor, me amarre para eu não voltar para a droga, não aguento me olhar no espelho, já estou no fundo do poço” (referindo- se ao fato de que já haviam passado a usar “crack”). Isso sem contar a grande porcentagem de adictos que, depois de desintoxicados, após um período de internação muitas vezes longo (os quais poderiam estender-se até nove meses), e tratados aparentemente com sucesso (manifestando subjetiva ausência de desejo pela droga), recaíam no uso, quando retornavam para seu contexto prévio de uso da droga.

Atuando como psicóloga em consultório privado e em uma clínica de tratamento para adictos de cocaína durante 4 anos presenciei tais situações e uma gama diversa de muitas outras, variáveis em dramaticidade, vividas não só pelo adicto, como também pelos seus familiares. Usarei os termos adicção e adicto como sinônimos, respectivamente, para dependência de droga/ vício e viciado(a). Tais experiências motivaram-me a escrever sobre o assunto.

Duas são as ideias que estão na gênese deste livro. A primeira é explorar os conhecimentos atuais sobre o processo de adicção. Para essa finalidade, foram revisados os resultados de pesquisas científicas mais recentes. A segunda é discutir sobre várias questões que possam fornecer subsídios para os profissionais de

A armadilha do vício 9

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saúde que lidam com o problema, para os pais e para os leitores interessados no tema.

A adicção está ligada a uma somatória de interações que na maioria das vezes são analisadas de forma simplista, linear. Poucas vezes são tratadas com a complexidade que merecem. Exemplo disso é a prioridade dada ao contexto socioeconômico familiar no fenômeno da adicção. Não significa que não tenha importância, deve-se, contudo, ter em mente que a adicção não se restringe a uma classe socioeconômica específica. É muito comum, adictos provenientes de classe média alta, relatarem que tiveram uma infância “feliz” , que sempre “sentiram-se protegidos”, como podemos observar no relato a seguir:

Tive uma infância feliz. Fui muito protegido. Meu pai me levava à escola e também me buscava. Após as aulas ia para o clube. Nos finais de semana ia para a casa de praia. Sou apaixonado por surf. Participei de inúmeros campeonatos. Viajei para diversos países ( R1).

Outros relatos, no entanto, mostram-nos um lado distinto, em que se expressam nitidamente as sensações de abandono e rejeição, como por exemplo:

Minha mãe se separou do meu pai quando eu tinha três anos e se casou com outro. Passei grande parte da infância na rua. Eu furava as bonecas, eu rasgava, passava esmalte vermelho, fazia que era sangue. Eu sou uma pessoa agressiva por dentro. Além de sentir muita raiva, eu me sinto muito triste, uma pessoa desprezada. Minha mãe não liga pra mim, pouco se lixa (L 2 ).

Com base nos dois relatos acima, percebemos que há indivíduos que sofrem ou sofreram pressões ambientais e sociais intensas e viveram situações caracterizadas pela sensação de abandono, de solidão, e

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recorreram à droga. Tais indivíduos poderiam estar mais sujeitos à experiência da droga e, portanto, seriam^mais vulneráveis à adicção. E há indivíduos que tiveram suas vidas marcadas pelo extremo oposto - se relevarmos exclusivamente o referencial socioeconômico familiar que se consideravam “protegidos”, sabiam-se possuidores de condições materiais capazes de lhes satisfazer as vontades, e mesmo assim recorreram à droga. À questão social, outros ingredientes precisam ser acrescentados na abordagem do uso e do abuso da droga.

Às vezes é comum os adictos perguntarem o motivo pelo qual “outros”, referindo-se a muitos dos que foram seus companheiros no uso de droga, conseguiram seguir em frente, não se tornaram dependentes, e eles não: “Porque eu?”, perguntam-se, “Porque eu fui para o fundo do poço?” e outros que “cheiraram” com ele por um tempo e depois se livraram da cocaína. Apesar dos grandes avanços no campo da neurobiologia, ainda se constitui um desafio entender como ocorre a transição do uso controlado da droga para o descontrole.

Sabe-se que drogas que atuam sobre o sistema nervoso central e provocam a sensação de euforia, prazer e alívio de tensão contribuem para um comportamento de ingestão de forma excessiva. No livro As Portas da Percepção{22), o autor diz parecer improvável que a humanidade seja capaz de, um dia, dispensar os chamados “paraísos artificiais”.

No entanto, se a euforia - sensação subjetiva de prazer é resultado da ação farmacológica de drogas psicoativas sobre estruturas neurais específicas do sistema nervoso central, sendo sua obtenção a motivação para o uso repetido, culminando com a perda de controle, em que o usuário é amplamente subjugado pela droga, por que razão alguns usuários tornam-se adictos enquanto que outros não?

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A vulnerabilidade à adicção envolve uma somatória complexa de fatores que interagem entre si: o neuroquímico, o familiar, psicológico, o socioeconômico e cada qual com valência distinta em amplitude, que assume um lugar na experiência de uso da droga do indivíduo. Dessa maneira, as sensações subjetivas, prazer, euforia são interpretadas de maneira diferenciada pelo usuário, de acordo com a dimensão de significados que ele atribui a elas, dentro de um contexto do uso da droga. Os relatos que seguem abaixo exemplificam esta ideia.

A cocaína nunca decepciona, não pede nada em troca, não se enjoa dela, não nos abandona e está sempre disponível.

Nosso propósito neste livro não é o de abranger toda esta complexa somatória envolvida no fenômeno da adicção; nosso objetivo é examinar o relato espontâneo das pessoas adictas em tratamento e abstinentes do uso da cocaína, de seu cotidiano dentro do contexto do uso da droga. É possível examinar os relatos sob a ótica do paradigma organismo-contexto no qual a aprendizagem desempenha um importante papel no mosaico dos fatores que têm sido implicados no processo da adicção. Tanto resultados de pesquisas básicas de laboratório, utilizando modelo animal, quanto de experiências com humanos dão suporte a essa ideia.

Nesse processo de aprendizagem estão presentes mecanismos cognitivos e de significados do que se está representando do contexto do uso da droga, de modo que o contexto não é mera reprodução de sinais externos. Para ilustrar a ideia, utilizamos relatos de adictos em tratamento em clínicas especializadas e abstinentes de cocaína por mais de um ano, os quais foram

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colaboradores para nossa dissertação de mestrado e posterior tese de doutorado, e um estudo de caso clínico proveniente de nossa experiência na clínica privada.

Os relatos dos entrevistados escolhidos serão citados para exemplificação, e seus autores identificados pelas iniciais de nomes fictícios atribuídos a eles, seguidos de um número, que segue a ordem de entrevistas. Todos eles assinaram termo de consentimento e esclarecimento quanto aos objetivos da entrevista e tiveram sua identidade preservada.

Foram entrevistados 15 indivíduos abstinentes (todos do sexo masculino) e 10 adictos em tratamento (9 homens e uma mulher). A decisão em relação ao número de pessoas a serem entrevistadas não foi aleatória, levou em conta que, além desse número, os relatos não mais acrescentavam informações relevantes.

A cocaína foi a droga de escolha devido aos seguintes fatores: - a sua rápida expansão epidemiológica; - a heterogeneidade da população usuária; - dificuldade de desenvolver tratamento adequado; - o risco da passagem para o uso de crack;- por se tratar de droga com grande potencial de dependência.

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Epidemiologia do uso da cocaína

Quando se considera a epidemiologia do uso da cocaína, dois fatos sobressaem: primeiro, o seu uso aumentou consideravelmente durante a década de 1980 e, segundo, a cocaína se transformou em um fenômeno diversificado, tanto em termos da população envolvida quanto em relação ao modelo de uso. A via de administração intranasal (“cheirada”) era a preferida entre os jovens com mais de 18 anos, e a base livre (a cocaína de base livre tem um ponto de fusão baixo, por isso pode ser fumada) foi optada apenas por cerca de um quinto de usuários de cocaína, com mais de 18 anos de idade(61'51).

Anteriormente a 1980, os adictos de cocaína eram considerados minoria, concentrada em estratos sociais de maior poder aquisitivo. Contudo, a partir de 1990, o número de adictos na faixa etária entre os 18 e os 25 anos aumentou de forma significativa(57) .Com o advento do “crack”, juntamente com o baixo preço, ocasionou- se o aumento da população de adictos desta droga, especialmente entre o público mais jovem(58).

Dados epídemiológicos mais recentes sobre o uso de cocaína no Brasil, realizados pelo Centro Brasileiro sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID), em 2001 (pesquisa domiciliar) e em 2004 (pesquisa entre estudantes do ensino fundamental e médio), mostraram que, embora a cocaína apresentasse porcentagens bem menores comparadas com vários outros países, trata-

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se de um fenômeno crescente. Além disso, outros dados recentes mostram que as apreensões de cocaína, feitas pela Polícia Federal no Brasil, vêm apresentando aumento importante quando comparadas com as apreensões feitas a partir de 2001(14).

De acordo os autores apontados, a prevalência do uso de cocaína nas 107 maiores cidades do Brasil foi de 2,3%, porcentagem relativamente próxima às encontradas no Chile (4,5%), na Espanha (3,2%), no Reino Unido (3,0%), na Holanda (2,6%); e superior à observada na Dinamarca (1,7%), Colômbia (1,6%), França (1,5%), Grécia (1,3%), Suécia (1,0%), Bélgica (0,5%) e Alemanha (0,2%); e bem inferior ao constatado nos EUA (5,4%). Embora, em termos comparativos, os dados configurem uma parcela pequena da população, retratam, também, uma gravidade em vista dos graves prejuízos individuais em termos biológicos, psicológicos e sociais decorrentes da adicção.

Em geral, os dados registrados sobre usuários e adictos da cocaína são arbitrários, distantes de espelhar a realidade, uma vez que se trata de uma droga ilegal e, portanto, ter acesso aos usuários dela, é difícil. Provavelmente os dados correspondam àquela parcela da população adicta que, de algum modo, envolveu-se com problemas com a justiça ou que se encontrava internada em hospitais sob tratamento ou para desintoxicação. Acrescente-se a isso o fato de que a maioria das chamadas comunidades terapêuticas existentes não tem registro oficial e muitas vezes não tem controle sobre o número de fluxo de entrada e saída daqueles que são internados.

Os resultados de diversas pesquisas apontaram para um aumento do consumo da cocaína e para mudança no perfil do consumidor, abrangendo segmentos variados da população brasileira, principalmente a partir do advento do

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“crack”. Esta droga possui menor teor de pureza que a cocaína em pó e maior potência de ação, acarretando redução do custo para quem compra e aumento do lucro para quem vende, e com isso, possibilitando o aumento do consumo de cocaína, bem como a diversificação do perfil do usuário(51). Esse fato se toma preocupante uma vez que o uso de cocaína impulsiona e elicia uma variedade de comportamentos que colocam os indivíduos em risco de diversos modos, como a imersão na criminalidade.(5 1339)

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Uma visão geral da farmacologia da cocaína

Os efeitos farmacológicos da cocaína lembram os da anfetamina, sendo causadores de euforia, verborragia, hiperatividade motora e um exagero das sensações de prazer. As ações simpaticomiméticas periféricas levam à taquicardia (aumento dos batimentos cardíacos), sudorese (suor em profusão), vasoconstrição e um aumento na pressão sanguínea. Atemperatura do corpo pode aumentar devido a um aumento de atividade motora associada à redução dos processos de perda de calor. Não produz nenhuma síndrome de abstinência física específica, se comparada às que são causadas pelo uso de opioide ou de álcool, mas tende a causar depressão e disforia seguindo-se o efeito estimulante inicial(57). Por não provocar sintomas fisiológicos evidentes de “retirada” (abstinência) iguais aos do álcool e da heroína, a cocaína foi considerada, no passado, não produtora de dependência física<45).

1 Ação central da cocaínaA cocaína tem uma propriedade crítica que é a de

tornar-se reforçadora quando administrada repetidamente, produzindo uso compulsivo. A via dopaminérgica mesoacumbens (ver figura abaixo), estendendo-se da área tegmental ventral (VTA, na figura representada pela letra B) do mesencéfalo ao estriado ventral (núcleo accumbens, o maior componente do estriado ventral, representado por E) tem sido identificada parte integrante

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do substrato do efeito de reforço da cocaína e anfetamina e de outras drogas de dependência(23).

Vias Dopaminergicas

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Modificado de Carlson, 2001 por Salum, 2008

O mecanismo crítico pelo qual a cocaína produz reforço se deve à sua propriedade de aumentar níveis sinápticos de dopamina no circuito mesolímbico. Ela bloqueia o transportador da recaptação da dopamina (DAT). O efeito da cocaína tem duração de ação muito curta, o que leva a um típico modelo de administração: ratos ou humanos, quando lhes são dada a opção de autossupri mento de cocaína, apresentam autoadministração com doses espaçadas bem de perto, no decorrer de um longo período de tempo.

Há evidência considerável de que a ativação de circuitos de dopamina medeia a recompensa em resposta a drogas estimulantes, como a cocaína(ia60). Assim, através de sua ação sobre poderosos centros endógenos de recompensa, ela produz intensa euforia, que reforçaria seu uso subsequente. Por conseguinte, para alguns estudiosos, a euforia constituir-se-ia em uma chave dinâmica da adicção.

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Uma breve caracterização dos colaboradores

Os colaboradores foram 10 adictos em tratamento e 15 indivíduos abstinentes com mais de 1 ano de abstinência. A identificação foi feita por letras maiúsculas das iniciais de nomes fictícios a eles atribuídos e com letras maiúsculas seguidas de um número que segue a ordem de entrevista, respectivamente. As tabelas que seguem se referem apenas aos colaboradores abstinentes de cocaína.

1. Características dos abstinentes de cocaína

HOMENS N=15 (100%)

20- 25 anos 4 26.6%

IDADE 25- 30 anos 3 20.0%

30- 35 anos 3 20.0%

35 anos ou mais 5 33.4%

2fl grau inc. 2 13.3%ESCOLARIDADE 2a grau completo 11 73.4%

superior 2 13.3%

solteiro 4 26.6%ESTADO CIVIL casado 5 33.4%

separado 6 40.0%

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HOMENS N=15 (100%)

Idade do início 13-15 anos 12 80.0%

do uso da 15-18 anos 2 13.3%maconha 18- 20 anos 1 6.7%

Idade do início 13-15 anos 4 26.7%

do uso da 15-18 anos 8 53.3%cocaína 18- 20 anos 3 20.0%

Motivo da curiosidade 8 53.3%

iniciação na amigos 3 20.0%droga festas 4 26.7%

Fatores que bebida 8 53.3%

lavorecem a amigos 4 26.7%recaída outros 3 20.0%

Fatores quepensamento ou medo de morrer 7 46.7%

lavorecem a abstinência Deus 5 33.3%

outros 3 20.0%

Crenças sentir-se poderoso 7 46.7%atribuidas aos efeitos da ajudar na desinibição 4 26.7%

cocaína outros 4 26.7%

2. Faixa etária

A maioria dos colaboradores tem mais de 35 anos. Essa característica, possivelmente, deve-se ao fato de se tratar de abstinentes de cocaína, dado que grande parte dos adictos permanece por longo período no universo do uso da droga. É um tempo considerável essa trajetória se considerarmos que o início do uso deu-se na adolescência, aos 13 anos de idade em média.

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3. EscolaridadeA maior parte dos colaboradores abstinentes possui

o 2o grau completo e a minoria, o superior completo. Provavelmente se deve ao fato de que o universo do adicto estreita-se sobremaneira, atrelando-se progressivamente à droga, reduzindo a prática de atividades sociais, esportivas, de estudos e lazer.

4. Trajetória no uso de droga ilícita4.1. Idade do uso da maconha

A trajetória no uso de droga ilícita apresenta um denominador comum, quando se observa os relatos tanto dos adictos em tratamento quanto os dos abstinentes. Em geral, o início ocorre quando o indivíduo é bastante jovem, entre 11 e 16 anos de idade, e com a experimentação da maconha, como os exemplos que se seguem;

[...] eu com treze anos para catorze. Foi a primeira vez que usamos a maconha (R.M).

Comecei aos doze anos fumando maconha (P.S).

Com dezesseis anos, usei maconha (Z.C).

Tinha dez ou onze anos... e a gente andava numa turm inha... Aí um dia eu peguei e fui fumar (maconha) com ele (S.T).

A maconha é referida por todos os entrevistados como a primeira droga psicoativa usada (excetuando-se o álcool e o tabaco). Essa constatação está de acordo com a literatura. Pode-se pensar que a maconha seja a “porta de entrada” para outras drogas mais pesadas e de maior poder para causar dependência(9). No entanto, alguns autores discordam dessa ideia e apontam interpretações diferentes para a passagem para outras drogas: 1) eventuais experiências positivas com a

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maconha encorajam experiências com outras drogas; 2) o contato com outras pessoas que possuem ou usam outras drogas facilita o acesso do indivíduo a outras drogas psicoativas<32).

4. 2. Motivo da iniciaçãoUma das razões apontadas como motivadoras

para a iniciação da droga, como mostram os relatos, parece ser a curiosidade.

Na maioria das vezes, os fatores que contribuem para a iniciação no comportamento de ingestão da droga são comuns entre eles, destacando-se:- curiosidade: “Comecei fumando maconha com 13 anos, por

curiosidade” (M.B).- influência de amigos: "Meus amigos me apresentaram a

maconha e disseram que eu ia sentir diferente, né” , (V,P).

4. 3. Idade do início do uso da cocaínaNa trajetória do uso da droga ilícita, a idade do início

da cocaína se concentra na faixa entre 15 a 18 anos de idade. Esses resultados apontam para uma transição da passagem da maconha para a cocaína compreendendo um período em média de 2 a 3 anos.

Muitas vezes, o adicto da cocaína “escala” para outra droga, o “crack", situação muito comum na trajetória da adicção da cocaína, conforme mostrado pela maioria dos relatos, dentre eles, alguns aqui selecionados:

A minha última experiência foi com o “crack” (B.T).

Durante uns 15 anos de minha vida consumi cocaína...aí então fui experimentar, me apaixonei pelo crack (R.M).

O uso do “crack” será discutido em momento posterior.

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5. Fatores que favoreceram a manutenção da abstinência

A manutenção da abstinência, para o adicto de cocaína, é uma tarefa difícil e árdua. Necessitam de motivadores significativos que se contraponham à vontade de uso da cocaína ou de fatores aversivos importantes, ou mesmo de ambas as situações. Os relatos dos entrevistados apontaram vários fatores que atuaram, isoladamente ou em conjunto, para a manutenção da abstinência:- perdas sofridas: “Nesse tempo de uso de drogas, eu perdi

vários amigos, uns morreram, outros a polícia matou, outros morreram porque se endividou com traficantes”(E8).

- religiosidade: “Enquanto não se evocar que não acreditar que Deus, caminhar no caminho de Deus e se liberar, não sai m esm o das drogas. É Deus. Não exis te outra explicação”( K2).

- fam ília: “Quando acontece uma situação problema, eu volto meus olhos pra Deus... procuro me orientar com meu pai e familiares”(A5).

- situações aversivas: “ Tinha noção de que eu iria me acabar. Seria preso pela polícia ou acabaria levando tiro de traficante. Precisava sair dessa situação... agora, estou tentando transferir para a minha vida o mesmo ritmo da clínica de recuperação”(T 11).

- mudança de ambiente: “ quis sair, morar em outro canto, lugar, mudar os amigos. Se tiver um grupo “careta” talvez eu não usasse... .” (RB).

6. Crenças/representação dos efeitos da cocaína

As dimensões dadas às experiências com a cocaína, atribuindo-lhes um colorido particular aos seus efeitos, estão relacionadas com as características pessoais do adicto, as quais, por sua vez, associam-8i

A armadilha do vido

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à sua autobiografia, que é construída de acordo com sua realidade social subjetiva(3). Os efeitos de uma determinada droga, por conseguinte, podem ser sentidos com maior ou menor vigor. A “embriaguez", em toda a sua duração, pode parecer para alguns indivíduos um imenso sonho, graças à intensidade das cores de todas as situações vivenciadas. Contudo, a sua tonalidade guardará atribuições particulares.46

Independente da dose ou da natureza farmacológica da cocaína, os efeitos subjetivos atribuídos a ela são “temperados” pelas combinações de sensações fisiológicas e emocionais e que passam a constituir um conjunto de representações do sujeito, parte integrante da sua vida psíquica, conforme exemplos contidos nos relatos transcritos abaixo:

Eu gostava de me sentir poderoso (M.10).

[...] escudo, protetor para minhas dificuldades(M.9).

[...] muitos prazeres que a droga me trazia que,eu sem ela, eu não estava tendo (V.12).

“Sem cocaína, nada tinha sentido (A. 15).

[...] comecei a ficar conhecido, mais famoso, maisrespeitado (Z.7).

[...] conseguia dominar mais a pessoa (S.8).

Ela te renova a vontade. Não faz perder a graça(W.4),

7. RecaídasRecaída é uma característica da adicção.

Experiências de clínicas que atuam em programas de recuperação de adictos e resultados de pesquisas mostram que muitos usuários de droga que cessam o seu uso, frequentemente recaem após um limitado

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período de abstinência. Adictos de cocaína têm múltiplas recaídas embora haja dados mais consistentes em relação à recaída ao álcool e cigarros <19). Mesmo após desintoxicação em hospital ou mesmo após um longo período de tratamento nas chamadas “comunidades terapêuticas” ou mesmo em centros de reabilitação, o dependente pode ter inesperados episódios de repentina compulsão ou impulso para obter a droga. Nestas ocasiões, a recaída pode ser iminente. Mesmo para aqueles que retornaram para a sua família ou emprego, e argumentam que nunca mais usarão droga outra vez; pode parecer que eles estejam contando histórias.

Avanços científicos nos últimos anos mostraram que a adicção à droga é uma crônica doença de recaída que resulta de prolongados efeitos da droga no cérebro(29). Mas, o que significa recaída? Significa o retorno ao uso da droga após um período de abstinência. Estender este conceito à cocaína é mais complexo porque o adicto de cocaína se envolve no chamado “binge” (“farra”), período de intenso uso, por dias ininterruptos seguidos de um curto período de abstinência, característica que parece ser a regra geral desta natureza intermitente de uso. Torna-se, desse modo, difícil diferenciar um uso periódico de uma recaída clássica(19).

Diversos investigadores clínicos tentam resolver a questão sugerindo que o conceito de recaída deveria ser restrito a adictos de cocaína em que o retorno à autoadmínistração ocorresse após um período de mais de um mês de abstinência(50). Embora esta ideia seja útil do ponto de vista clínico, em pesquisa, torna-se complicada porque é preciso diferenciar os usuários ocasionais dos dependentes e, neste caso, o conceito acima deve restringir-se a adictos da droga.

Alguns clínicos sugerem que a primeira recaída pode facilitar uma abstinência por período maior por

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ajudar o dependente a identificar os fatores ou situações que o levaram a recair.

7.1. Fatores associados à recaída.

Influência psicossocial

Diversas variáveis psicossociais têm sido apontadas com potencial importante na recaída à cocaína. Relatos anedóticos relacionam a recaída com a bebidas, amigos, ambiente, a sintomas de abstinência e a fatores motivacionais (desejo ou não de ficar abstinente).

Fatores motivacionais

Práticas farmacoterápicas para dependentes de cocaína têm mostrado que a ineficácia no período correspondente ao tratamento, com altas taxas de recaída teve, como um dos motivos para esta ocorrência, o fator motivacional, como por exemplo, o desinteresse pelo tratamento. Sugere-se assim, que seja feita a inclusão de avaliação motivacional pré e pós-tratamento(33) como podemos examinar nos relatos abaixo:

Acho que a maioria não quer “sair” (da droga). Não adianta a família querer que você saia. A pessoa tem que sair porque quer. Porque é difícil. Não é fácil, não. Conheço gente que ficou internado sete meses e voltou a usar de novo, entendeu? Acho que no fundo não pára. Toma uma cervejinha e daí estimula (B.T.).Mas era assim, eu ia pra lá (clínica de recuperação) porque meus pais ficavam em cima. Nas outras vezes (em que foi internado) ia pra engordar (V.P.).

Você não pensa em parar porque vai perdendo a confiança das pessoas. Começam a desconfiar de

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você, não bota mais fé. Aí vai perdendo a vontade de parar. Na minha cabeça eu achava que na çlínica eles tinham uma coisa mágica que ia me tirar a vontade de usar droga. Quando passou um mês já não aguentava mais ficar lá e a vontade de usar era muito grande. Saí de lá e voltei a usar (RA.).

Quando eu estava nesses trinta dias lá (internado) eu só vivia pensando: como vou fazer quando sair daqui. Acho que posso cheirar uma carreirinha e não vai fazer nada. Aonde eu me perdia, né? Eu pensava como ia conseguir, onde eu ia arrumar dinheiro pra conseguir mais. Fazia mil promessas. Vou parar, não quero mais... depois tomei um chope. Recaí por causa de um chope (P.S.).

Eu com a cocaína foi um amor longo, muito longo e talvez ela tenha entrado numa época que eu emocionalmente eu estava muito bem. Então simplesmente veio completar. Eu estava muito feliz, naquela época. (R.M.).

Síndrome da abstinência

Os sintomas da retirada da cocaína, que se desenvolvem dentro de algumas horas a alguns dias após a cessação (ou redução) do seu uso intenso e prolongado, não são tão acentuados quanto os do álcool ou mesmo os da heroína. Eles se caracterizam pelo desenvolvimento de um humor disfórico, acompanhado por duas ou mais das seguintes alterações fisiológicas: fadiga, sonhos vívidos e desagradáveis, insônia ou hipersonia, maior apetite e retardo ou agitação psicomotora. Apenas uma parcela considerável dos indivíduos adictos de cocaína apresenta pouco ou nenhum sintoma de abstinência evidente ao cessar o uso da substância (DSM-IV, 1995). Apesar disso, adictos de cocaína permanecem vulneráveis a “craving” e como consequência, recaída, mesmo após anos de abstinência.

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“CravingVFissura”

“Fissura”, termo comum dentro da linguagem coloquial do dependente da cocaína, que na literatura é conhecido como “craving”. Significa um forte impulso subjetivo para usar a substância psicoativa (DSM- IV, 1995). É um fenômeno que resulta em respostas fisiológicas e psicológicas a partir de um forte desejo para obter e consumir a droga. Pode significar um mal estar causado pela ausência da droga gerando uma compulsão para o uso e perda do controle(37). Muitos adictos relatam sobre craving - um forte desejo - para consumir a droga outra vez, fator este, atribuído por muitos adictos como a principal razão para recaída ou para a falha de tornar-se abstinente. Os relatos de adictos podem ilustrar esta ideia:

Se parar de cheirar daí uma hora vai acabando (o efeito), você fica na “fissura” de querer cheira (B.T.).

Quando está na “fissura" você faz tudo pra conseguir, vai vendendo seu corpo, suas coisas, acaba com tudo. Vende a mãe se for preciso. Hoje se eu pensar muito nela ( droga ), assim não consegue ficar internada... Que nem agora, se não tivesse remédio, já teria arrebentado a porta e saído. Agora eu desconto no cigarro (S.T.).

Recentemente algumas drogas com um efeito anti “craving” tem sido estudadas(62).

A literatura acrescenta mais duas categorias que atuam como facilitadores de recaída como a via de administração e a polidroga.

Via de administração

Um dos fatores que contribuem para a recaída é a via de administração da cocaína. Usuários de cocaína que utilizam a via nasal (cheiram) apresentam taxas mais altas de abstinência quando comparados àqueles que

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fumam crack. Estudiosos acreditam que a cocaína fumada pode ter um maior potencial de dependência porque alcança um pico no nível sanguíneo mais alto e mais rápido que a cocaína cheirada.

Polidroga

É muito comum que dependentes de cocaína também abusem de outras drogas; a maioria deles com intuito de aumentar a propriedade do efeito da euforia promovido pela cocaína ou para aliviar alguns dos efeitos disfóricos psicoativos. Entre os adictos de cocaína, a combinação desta droga com o álcool é muito comum, possivelmente para se obter um aumento na intensidade da sensação de euforia sentida, maior que se fosse apenas com a cocaína sozinha ou, ao contrário, para sentir uma menor intensidade de desconforto advindo após o uso da cocaína. Os relatos apontam para uma concorrência de efeitos entre as duas drogas, como o que se segue:

A cocaína estabiliza a bebida, não deixa você ficar alcoolizado. Eu chegava em casa alegre e não aparentava estar alcoolizado (RM).

A droga mais abusada é geralmente o álcool, seguido de maconha. A combinação do uso de drogas, com as citadas, são fatores críticos para a recaída da cocaína.

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Tolerância e adicção■v

1. TolerânciaEmbora tolerância e adicção não sejam conceitos

sinônimos, os dois fenômenos estão intimamente ligados.

Atinge-se um momento em que a quantidade de droga, que antes causava euforia já não é suficiente e por isso, os usuários precisam de uma quantidade cada vez maior para sentirem o mesmo efeito anterior, - conceito de tolerância(38). Assim, o uso ocasional, recreativo e limitado de uma droga, com o potencial de abuso difere da adicção, a qual se caracteriza por um aumento na frequência e dose e com a emergência de um crônico estado-dependente(27 23). Muitas vezes, a passagem de uma etapa para outra, acontece de forma tênue.

Dessa forma, se constitui um desafio no campo da neurobiologia entender como ocorre a transição do uso controlado da droga para a perda de seu controle. Hoje, a pesquisa neurobiológica procura justamente entender a neurofarmacologia e os mecanismos adaptativos dentro de específicos neurocircuitos que medeiam a transição do uso ocasional e controlado da droga (tolerância) para o seu uso descontrolado.

Muitos indivíduos fazem uso de drogas psicoativas ocasionalmente e, no entanto, não se tornam dependentes. A adicção recai sobre indivíduos que não conseguem administrar essa ingestão. Tornam-se

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adictos para manter em equilíbrio o seu organismo apesar dos prejuízos que vão do psicológico ao social(17).

Tolerância à cocaína foi avaliada comparando efeitos agudos da cocaína em 6 homens abstinentes de droga com idade de 21-32 anos que relataram uso ocasional com 6 homens, média de idade 26-35 anos, os quais foram diagnosticados como adictos. Os estudos concluíram que a tolerância aos efeitos fisiológicos, neuroendócrinos e subjetivos da cocaína pode ocorrer como uma função do uso crônico(35>.

Os relatos que seguem exemplificam o efeito da tolerância à sensação subjetiva de euforia, prazer, apontando para aumento da quantidade como também da frequência do uso com o desenvolvimento da tolerância, ou seja, diminuição do efeito à euforia. Com a necessidade de aumento da dose para se obter o mesmo efeito anterior.

O prazer da cocaína foi diminuindo totalmente. Fui aumentando. Comecei com uma grama e estava cheirando quatro a cinco gramas (B.T).

Comecei com um papel (papelote 0,5 grama), ...a sensação diminuía, depois parece que é só “noia” (paranóia), sente “encanado.” Só usar ali, o prazer parece que fica menor. Chegamos a usar muito, pelota assim 25 gramas na noite. Tudo que ganhava na semana eu gastava com a cocaína (V.P).

... foi que essa carreirinha não fazia efeito. Passei pra duas, três, né. Foi indo, foi indo, daí eu estava cheirando todo dia. Já não conseguia mais ficar duas horas sem (PS).

... no começo o corpo ainda está imune. Mas eu geralmente procurava fazer as “lagartas”(carreira de cocaína com maior espessura). Geralmente quando o pó era bom, dava uma cheirada e um intervalo maior. ...depois o intervalo vai diminuindo, ...um atrás do outro, dez em dez minutos (M.B).

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Alguns autores propõem que a escalada na ingestão da droga é devida a uma diminuição (tolerância) nos efeitos da droga.

No caso da cocaína, a falta de poder aquisitivo leva o indivíduo, muitas vezes, a escalar para o “crack”, droga considerada devastadora pelo alto poder de causar adicção(11).

2. Adícção (dependência)Adicção, conceito também sinônimo de

dependência, cuja característica consiste numa compulsão na autoadministração da droga, com perda do controle sobre o seu uso, com um aumento progressivo na frequência e na intensidade do uso da droga(27). Trata-se de uma desordem crônica de recaída associada com estados de “craving” (desejo compulsivo) pela droga. Os efeitos agudos da cocaína levam a um modelo de uso que, em indivíduos geneticamente vulneráveis, resultam eventualmente em adicção(27).

Para que uma droga provoque adicção/ dependência é necessário que a sua autoadministração seja seguida rapidamente de sensações de prazer (o comportamento do uso da droga é seguido de uma consequência que é o prazer, conceito denominado de reforço positivo) ou após o seu uso haja o alívio de tensões desagradáveis (conceito denominado de reforço negativo).

A ideia da atuação da cocaína como um reforçador positivo ou negativo, como citado acima, constitui uma hipótese para analisar o fenômeno da adicção sob o ponto de vista motivaciona(27),cujo substrato neural está representado pela via dopaminérgica mesoaccumbens. Está comprovado que, no decorrer do tempo, com o aumento de dose da cocaína e frequência do uso, sua presença promove alterações neuronais, de tal forma queA armadilha do vício 35

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sua retirada gera desconforto. Este estado afetivo negativo seria aliviado através do uso subsequente da droga, ou seja, com a ocorrência de reforçamento negativo. Assim, reforçamento positivo/negativo e alterações de circuitaria neuronal (que seriam adaptações para manter homeostase), constituiriam a chave da dependência.

A adicção também é hipotetizada ser o resultado de mudanças plásticas em múltiplos circuitos neuronais. Os tipos de plasticidade, os quais estão subjacentes à adicção, são classificados em três grupos: 1) adaptações compensatórias no sistema neural que regula funções somáticas e autonômicas; 2) adaptações na circuitaria de recompensa na área cerebral do mesoaccumbens resultando nos aspectos emocionais e motivacionais da adicção e sindrome de abstinência; 3) plasticidade, envolvendo circuitaria mesoccumbens e outros circuitos límbicos, resultando em sensibilização e sinais dependentes de memórias positivas do uso de droga que podem levar a recaídas(23).

Alguns autores usam o termo dependência fisiológica separando, portanto, o conceito de dependência em fisiológica e psicológica(17,.A dependência fisiológica consiste em uma adaptação do organismo à presença contínua da droga, de tal forma, que a sua retirada desencadeia distúrbios fisiológicos, muitas vezes acentuados, cujo sentido, em geral, é oposto ao dos efeitos farmacológicos da droga.

O conceito de dependência física e psíquica advém da adicção de opioide, droga mais antiga e por isso, melhor caracterizada. No decorrer do século XIX, o termo adicção não estava associado ao uso de droga. Somente por volta do século XX esse termo foi apropriado por autoridades médicas como uma propriedade de narcóticos. Os marcadores comportamentais e

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psicológicos da adicção foram codificados em sintomas de abstinência e “craving” num modelo determinista que replicou a ideia de doença do alcoolismo pela perda de controle induzido pela droga(45). Por volta de 1960, o comitê da Organização Mundial da Saúde (OMS), especialista em drogas que produzem dependência, separa a adicção física e psicológica, afirmando que a dependência psíquica é a mais poderosa dentre todos os fatores envolvidos na intoxicação crônica de drogas psicotrópicas(45). As divisões em dependência física e psicológica estão relacionadas às diferentes regiões do organismo que respondem pelos efeitos de opiáceos. A diminuição do efeito analgésico estaria ligada à área da medula espinhal e a da euforia a regiões límbicas do cérebro(45).

Os critérios adotados pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-IV), em 1995, para caracterização de dependência de substância psicoativa são mais amplos e envolvem, dentre outros, os seguintes itens (pelo menos três são necessários para caracterizar dependência): 1) Substância frequentemente usada em grandes quantidades ou por um período maior do que a pessoa pretendia; 2) Desejo persistente ou uma ou mais tentativas malsucedidas de interromper ou controlar o uso da substância; 3) muito tempo gasto com atividades necessárias para se obter e tomar substâncias ou para recuperar-se dos efeitos delas; 4)Atividades sociais, profissionais ou recreativas importantes são abandonadas ou reduzidas devido ao uso da substância; 5) uso contínuo da substância, apesar dos problemas; 6) Sintomas de abstinência característicos e que dependem de cada droga; 7) A substância é frequentemente usada para aliviar ou evitar sintomas de abstinência; 8-apresentar tolerância (DSM-IV, 1995).

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O adicto vive em uma condição em que o seu universo se resume em atividades relacionadas com a droga, desde a sua aquisição, autoadministração e relações sociais (companheiros da droga) são preponderantes às outras atividades, como mostram os relatos:

É só droga, droga, droga. Não tinha nada... Podia ter uma pessoa pelada, bonita de corpo e a droga. Você vai na droga e não na moça. O mundo dele fica só na droga. Nós cansamos de estar passando na rua, meninas mexendo com nós: psiu, psiu, metidos, nem olhava, fazia de conta que não estava escutando (V.P.).

Tudo era motivo pra cheirar. Todas as vezes que eu me lembrava dela. Eu estava vivendo para a droga. Já estava “desandado” (R.A.).

No decorrer da frequência do uso e aumento da dose da droga, além da tolerância ao efeito euforia, prazer, do repertório de comportamento do adicto ficar muito limitado, restrito à droga, o processo da adicção envolve comportamentos específicos.

2.1. Características comportamentais específicas decorrentes da adicção:Paranóia: caracteriza-se pela sensação de medo e de constante perseguição. É muito comum, profissionais da saúde não familiarizados com a história do paciente, em caso de atendimentos de urgência, confundir os sintomas apresentados pelo adicto intoxicado pelo excesso da cocaína (ou outro psicoestimulante, como anfetamina, e.g) e fazer um diagnóstico como delírio, sintoma de uma esquizofrenia. Isto porque a cocaína atua em um neurotransminssor chamado dopamina, em uma via neunonal do cérebro chamada dopaminérgica mesolímbica,

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que é o mesmo neurotransmissor, o qual desempenha um papel importante na esquizofrenia.

Ela (cocaína) me deixou elétrico. Eu fiquei esperto. Comecei a conversar mais. ... fui mudando. Já comecei a entrar em depressão, já não queria conversar com ninguém. Na minha casa, se alguém viesse falar comigo, eu estourava.... vivia trancado dentro do quarto, que nem bicho dentro de uma jaula, Eu saía com aqueie medo, só pra ir buscar e voltava e daí ficava dois, três dias trancado. Tinha medo de mim mesmo. Muito medo. Não podia escutar um barulho. Uma vez, meu pai precisou estourar a porta do banheiro de casa porque eu escutava barulho de motor. Eu dizia: Tem polícia aí. Fui internado por depressão (P.S.).

É a sensação diminuía, depois parece que é só sente encanado, polícia atrás de você. A paranóia é maior. Só usar ali, o prazer parece que fica menor. Vai acabando. Só tem a vontade (V.P.).

.. foi coisa de menos de um ano de perder esse prazer de conviver com as pessoas. Depois eu virei um bicho. Depois eu comprei a moto. Eu sempre ficava nesse barzinho, eu já não ficava no barzinho. Eu só passava em frente. ... eu não queria falar com ninguém. Levava um amigo porque eu tinha uma moto e ia na “boca.” Parava a moto, “trabalhava” (fazia “carreira” da cocaína) ali no orelhão, cheirava, saía e ficava andando a noite inteira sem falar nada, com o “cara” que estava atrás, sempre “cabreiro” que a polícia está atrás. ... no barzinho eu ficava desesperado. Tenho que sair, tenho que sair, nem conversava com as menina (G.V.).

Depois com o passar do tempo, devido o uso ser muito grande eu já fui ficando meio amedrontado. Tinha lugares em que estava cheirando, não queria sair. Fui tendo a sensação de medo, medo da polícia. Eu evitava lugares públicos. Daí, já o medo,

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então não conversava mais. ...as reações foram mudando (M.B.).

Anedonia: O estado de desprazer (anedonia), consequência do uso intenso e frequente da cocaína ou “crack”, não só contribui para a recaída como também concorre, muitas vezes, em tentativa de suicídio, conforme o relato de um adicto que já tinha “escalado” da cocaína para o crack; “Minha vida não tem valor. É melhor morrer”. De acordo com funcionários do hospital que atende adictos para desintoxicação - onde foram realizadas algumas de nossas entrevistas, - é muito comum, o internamento de dependentes de cocaína ou “crack” por tentativa de suicídio.

Os adictos de cocaína experimentam um humor deprimido, com a sensação de perda de sentido para eventos do cotidiano com os relatos a seguir:

Então a gente não curte namorada. Você não tem vontade de nada. Você perde tudo. Você perde o amor da vida. Parece que você não quer mais viver (V.P.).

Você quer tentar ter uma vida legal mas não consegue.... namorar direitinho, jogar bola, coisas que você fazia perde o sentido. Não acho graça em nada (B.T.).

Sabe, a droga vai acabando com seus sentimentos... .(R.M)

A anedonia seria resultado da depleção da reserva dopaminérgica(57). Alguns estudiosos defendem a ideia de que a ocorrência desse estado de humor, que se caracteriza como estando ligada a processos adaptativos como uma tentativa de o organismo conter os efeitos agudos da droga. Dentro desta estrutura, presume-se que o intenso prazer da droga (euforia) reflete um

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processo hedônico positivo e o estado de humor negativo (disforia) está associado com o término do uso da droga ou abstinência após um período de “farra” ou “binge”(27). A hipótese chamada “processo oponente” propõe que qualquer estímulo que produza um efeito emocional positivo imediato, também produz um efeito posterior que é oposto a este efeito inicial(56).

O fenômeno da anedonia pode contribuir para manutenção da adicção e favorecer as recaídas. Neste caso, a droga, no caso a cocaína poderia funcionar como um reforçador negativo, porque na autoadministração da droga, o adicto estaria retirando a sensação de desprazer.

"Crack"Como comentado anteriormente, é muito comum,

adictos de cocaína “escalarem” para o uso do “crack”, após um determinado período do uso de cocaína. É uma droga considerada de alto custo, o qual varia de acordo com o grau de pureza. M uitas vezes, com o desenvolvimento da tolerância - necessidade do aumento da dose para atingir efeito anterior, o gasto financeiro se torna maior. Então, aqueles adictos que não têm este poder aquisitivo, passam a consumir o “crack”, além de ser uma droga considerada de menor custo monetário, é uma fonte de prazer mais rápido e mais intenso. Independentemente desta questão, há outra que está relacionada com a falta de cocaína no mercado da droga.

Usei cocaína durante três anos. Depois passei pro “crack”. Depois que conheci o “crack”, não gosto mais de cheirar (cocaína). No começo era forte, só queria cocaína (B.T.).

Além disso é caro (cocaína), não tá fazendo efeito, Então o dinheiro que tá nas mãos dá pra comprar mais pedra (V.P.).

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Cocaína é caro.. . Aí, foi indo, indo, entrei no “crack”. Então se fosse pra usar cocaína eu tinha que pegar pelo menos cinquenta reais pra passar uma noite e o “crack” se eu pegasse quinze, eu passava a noite. Quando eu conseguia emprego e conseguia o primeiro dinheiro, aí eu voltava pra cocaína, quando ia acabando eu voltava pro "crack”(G.V,).

Tráfico: muitas vezes a partir do uso do “crack” desenvolve comportamentos marginais como roubo ou tráfico. O “craving” ou “fissura, desejo intenso de consumir a droga, muitas vezes, contribui para a prática de delitos por falta de condições financeiras para adquiri-la.

Roubei, fui para o tráfico.Tudo que eu ganhava era para a droga e repartido com a polícia (Z.C.).

... vendi minha moto pro traficante, Peguei mil (hum) reais em dinheiro e cinquenta gramas de cocaína. ...tirei metade pra mim e metade, fiz papel (papelote de cocaína) pra vender pro meus colegas. Vendi, com o dinheiro comprei mais e usei tudo em quatro dias (G.V.).

Estes encontros estão de acordo com a literatura; uma porcentagem dos adictos (36%) se envolve no tráfico drogas, desde a venda para amigos até assumir o tráfico como atividade profissional(9) .

... às vezes não tinha dinheiro, roubava (P.B.).

[...] fiquei sem dinheiro. Fui embora de casa, fiquei um ano fora e fiz coisas horríveis (entre elas o tráfico), que não gosto de me lembrar (G.V).

Autoimagem: O processo adicção, no início um estado de prazer e com o tempo, com aumento da frequência e intensidade do uso, ocorrem as perdas e sofrimento. Este processo contribui para a construção de uma autoimagem

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negativa, contribuindo para uma baixa autoestima geradora de sentimentos de fracasso e de inabilidadapara responder de maneira adequada aos desafios da vida diária. A criança não nasce com autoestima. Este sentimento se desenvolve durante a vida do indivíduo e passa a ser produto de contingências de reforçamento de origem social. O indivíduo com um bom desenvolvimento de autoestima, sentindo-se amado pelo outro, aprenderá a amar a si mesmo e aprenderá que tem capacidade de emitir comportamentos que poderiam ser geradores de reforçamentos por ele mesmo(18). Os relatos a seguir exemplificam a autoimagem negativa:

Assim: me sentia fraco, impotente, me sentia um lixo. Vamos dizer assim: não me sentia mais um ser humano normal ( E8).

Eu não podia ir mais pra minha casa, minha família não me aceitava mais tava numa pensão. Falei: pô, eu vou morrer... Olha mãe, não aguento mais, se continuar assim eu vou morrer. Quero me internar (G.V.).

Drogada, cheia de tatuagem, família já não é aquelas coisa, não tem quem aceite. Portadora (do vírus da Aids) não tem chance (S.T.).

... mas é difícil. Você faz trapalhadas, começa a mentir. Antes de usara droga eu era diferente: era bom, gostava de mim mesmo (B.T.).

Acho que cheguei no fundo do poço. As dores que senti foram muito grandes. Fui preso. Apanhei muito. Achei que estava todo arrebentado. Eles queriam que eu entregasse (de onde recebia a droga) e como não entreguei fui tirado de lá mas tive que sair de lá senão morreria (Z.C.).

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Modelos de entendimento jda adicção

Várias são as teorias que embasam as técnicas ou estratégias para o tratamento da adicção e formulam programas de tratamento, usando elementos que se d iferem entre si em re lação aos fundam entos e pressupostos das teorias empregadas. Assim , as perspectivas teóricas do tra tam ento c lín ico são decorren tes dos m odelos de entend im ento do comportamento da adicção e o processo envolvido no tratamento da adicção. Então, é necessário fazer um “passeio” pelas variadas maneiras de entender este mecanismo, ao longo do tempo, como também analisar os princípios básicos da diferentes teorias sobre o processo da adicção.

No passado, por volta do século XIX, as pessoas que tinham problemas com drogas eram consideradas fracas de caráter, de moral ou, ainda, pobres em autocontrole. Eram qualificadas de crim inosas ou pecadoras e tais conceitos se constituíam em problemas diante do sistema legal ou clerical(34).

Mais tarde, um movimento social na Inglaterra defendeu, entre outros problemas sociais da época, um tratamento para os criminosos, incluindo os alcoólatras. Assim, foi defendida a ideia de que o alcoolismo era uma doença. Vieram, posteriormente, outras mudanças a respeito do grande abuso de drogas, que na época, eram a morfina e o ópio. Dessa forma, a percepção do abuso

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de droga, que foi revista como uma doença e não um pecado, levou à adoção de uma nova terminologia. Foi adotado, mesmo pelos médicos, o termo “adicção”, o qual começou a ser usado para diagnóstico e explicação do excessivo uso de droga e, com isso, foi dado à adicção o conceito de doença(34).

1. O modelo de doençaA expectativa em relação ao comportamento das

pessoas estabelece que elas façam coisas que lhes sejam reforçadoras e proporcionem sentimentos de prazer e evitem o da dor. Porém, os adictos parecem se comportar de maneira diferente. Uma das características do seu comportamento aparece na compulsão, ou seja, o comportamento está além do controle voluntário do indivíduo e poderá ser extremamente autodestrutivo. Porque gastam eles todo seu tempo para obter e administrarem a droga e, frequentemente, às custa de seus empregos, de suas famílias e do conforto. Um comportamento, que destoa das regras que governam uma conduta “normal”, só poderia ser explicado pela presença de algo “anormal”, possivelmente um estado de doença, responsável por todas as ações irracionais características do comportamento adicto(34).

A 4a edição da DSM-IV, publicada em 1994, não em prega o term o “doença” e sim “desordem comportamental” ou “psicológica significante” . Esta mudança de terminologia, no entanto, parece não diferir muito da ideia do “anormal”, sendo, então, uma forma de comportamento que não segue um padrão “normal”, como se as regras que governassem um comportamento comum não fossem as mesmas para os adictos. Por esta razão, o conceito de doença tem a explicação possível para a perda de controle, em outras palavras, presume- se existir a doença por ser esta a única explicação

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racional para a perda de controle. A dificuldade do conceito de '“doença” para explicação do comportamento do adicto relaciona-se com o fato de que a sua natureza ainda não foi identificada totalmente.

2. Modelo bioquímico da adicçãoEste modelo se baseia no fato de que as drogas

psicoativas, como a cocaína e seu derivado o “crack”, atuam em áreas cerebrais consideradas áreas de recompensa, em outras palavras, áreas do cérebro que estão relacionadas com resposta emocional de prazer e por isso, atuariam na forma de estímulos reforçadores positivos. Um reforçador positivo tem sido definido em termos de seus efeitos sobre o comportamento como qualquer estímulo que aumente a frequência de um comportamento contingente a ele.

Pesquisadores demonstraram que a sensação de recompensa, prazer, está relacionada com uma cascata de reações que envolvem diversos neurotransmisssores e estruturas do sistema límbico, cujo resultado final do processo é a ativação da via dopam inérg ica mesolímbicat27 38). Por essa razão, muitos pesquisadores defendem a ideia de que drogas, no caso a cocaína, que estimulam a via neural dopaminérgica mesolímbica, área cerebral do circuito da recompensa, levariam o usuário a repetir o comportamento de autoadministração da droga.

Outra hipótese ligada a esse modelo é a Síndrome da deficiência da recompensa - SDR. Normalmente, se a cascata de reações, que envolve d iversos neurotransmisssores, por exemplo, a dopamina e o circuito mesolímbico, é completada corretamente, a recompensa é expressa de maneira usual, que é a sensação de bem estar. Esta sensação se obtém sob o suporte de certas condições básicas executadas. Porém, quando o nível de

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dopamina declina nos receptores nos neurônios pós- sinápticos da via mesolímbica, tanto devido ao déficit de produção de dopamina na área tegmental ventral quanto em função da redução no número de receptores D2 no núcleo accumbens e no hipocampo, a cadeia de cascata não é executada corretamente, nesta condição, não é suficiente para gerar sensação de prazer ou bem esta r^. A consequência é a tendência de um estado permanente de ansiedade algumas vezes associada à depressão e a uma série de desordens compulsivas e impulsivas. Tais seriam os sintomas primários da SDR, pois o abuso de drogas químicas parece induzir ao aumento de liberação de dopamina no sistema límbico, como é o caso da cocaína.

Então, a SDR passa a ser uma hipótese para explicar o consumo abusivo de certas substâncias químicas, inserindo um comportamento alternativo, ou seja, uma automedicação quando falha a sensação de recompensa(43).

A hipótese de um déficit neurológico presente em adictos de estimulantes, como a cocaína, considerada responsável para a perpetuação abuso da droga que pode ser uma forma de autom edicação. O conceito de automedicação por adictos de droga é embasada pela maioria das teorias da psiquiatria biológica. Enquanto uma maioria de adictos de drogas são usuários de polidroga, parece haver uma preferência para um particular tipo de droga entre as diferentes populações de adictos*25,31-43-11*.

3. Fatores socioculturais e familiaresAlguns fatores são elencados como protetores de

risco para uso de droga. Por exemplo, o exercício de colocação de limites por parte dos pais, o monitoramento familiar e ter uma refeição diária junto com os filhos (BROWN, IN KESSLER ET AL., 2003).

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Necessário se faz conhecer os fatores de risco do desenvolvimento do abuso de droga entre adolescentes. Q uanto mais cedo eles forem detectados m aior probabilidade de intervenção na desordem de abuso de droga e futura dependência. Isto porque o inicio do uso de droga acontece por volta dos 14 ou 15 anos de idade e de um modo geral, pode se ter uma previsibilidade por algumas características de comportamento social e acadêmica já aos 7 a 9 anos de idade como habilidades sociais pobres, dificuldades de aprendizagem. Os fatores de risco, de acordo com a autora citada, estão categorizados em natureza de ordem cultural e social, interpessoal e de genética:1) de ordem cultural e social estão por exemplo a permissividade

social e disponibilidade de droga;2) interpessoal como conflitos familiares e ou sexual, eventos

estressantes, rejeição dos seus pares na escola ou outros contextos; precoce e persistente problema de conduta, fracasso escolar, habilidades sociais frágeis, desordem de aprendizagem, depressão, inabilidade de esperar gratificação;

3) Biogenética: vulnerabilidade psicofisiológica ao efeito de drogas e desordem de atenção e hiperatividade. Os fatores de risco refletem tanto influência genética como ambiental agravados pelo papel exercido pela família, como família com problemas com álcool e droga, pobre e inconsistente manejo familiar, personalidade dos pais. São mostrados como fatores protetores: alto grau de motivação, forte vínculo pai e filho, supervisão parental, disciplina consistente, associação com amigos não usuários de drogas(55).

É preciso não esquecer de que para que o indivíduo se torne adicto de droga há uma combinação, de magnitude variável de componentes de ordem biológica, psicológica e contexto social(29) .Então, pode-se falar em vulnerabilidade à adicção e parece ser resultado da interação de maneira complexa destes fatores.

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Tratamento■ v =

Os m odelos de entend im ento da adicção direcionam para duas maiores linhas de desenvolvimento de intervenções, as quais estão focadas no tratamento farmacológico e comportamental.

1. Enfoque farmacológicoPesquisadores têm concentrado atenção nos

estudos em agentes farmacológicos que possam ser úteis no tratamento de sintomas de retirada da cocaína (abstinência), prevenindo ou reduzindo o “craving” (“fissura”) ou bloqueando a euforia. Alguns estudiosos tentaram encontrar solução em pesquisas com duplo cego*, utilizando hidrocloridrato de desipram ina - antidepressivo, e encontraram significativa redução do uso de cocaína bem como o sintoma de “craving”, no grupo tratado com o referido fármaco(15). Outros agentes farmacológicos têm sido sugeridos por pesquisadores como potencialmente promissores incluindo agonistas e antagonistas dopaminérgicos e anticonvulsivantes(2). É sugerido também que pesquisa na literatura referente à depressão pode o fe rece r subsíd ios para a fa rm acoterap ia assim com o para a psicoterap ia ,

* Em pesquisa, o termo duplo cego se refere ao fato de nem o pesquisador e nem o sujeito pesquisado tem conhecimento de qual fármaco está sendo administrado,

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chamando a atenção para o problema da ausência de um modelo de farmacoterapia para adictos de cocaína(7). É pontuado também para a necessidade de identificação dos subtipos clínicos baseados no uso da droga e a severidade psiquiátrica no tratamento farmacológico.

O tratamento farmacológico deve ser somente parte de uma estratégia de tratamento e deve ser direcionado para aspectos específicos, como por exemplo, para sintomas de retirada da droga (abstinência), redução de “craving”, ou tratamento de condições de comorbidade psiquiátrica.

Em um programa de tratamento é fundamental que a farmacoterapia seja um complemento para uma intervenção de natureza comportamental

2. Enfoque comportamentahorganismo/ contexto

A interação organismo-contexto pode oferecer um adequado paradigma psicológico para entender o processo da adicção, sobretudo porque é no contexto do uso da droga - ambiente específico, que ocorrem as sensações subjetivas de prazer, euforia. Esta ideia é corroborada com pesquisas mostradas na literatura especializada que apontam resultados, tanto com modelo anim al-com ratos de laboratório, quanto com humanos, em que um ambiente específico do uso da droga é capaz de eliciar o estado de “craving", um fenômeno da adicção, fator significado de recaídas frequentes*49 63 12' 52 8 30}.

De acordo com relatos anedóticos, adictos de cocaína quando se deparam com sinais que foram associados com o uso da droga, como a aparência de algo que lembra droga, as pessoas, os sinais, os sons, os odores ou as situações que frequentemente estão

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associados com o uso da droga podem tornar-se preditores do início dos efeitos da droga, por exemplo o “craving” acompanhado de respostas similares às da cocaína incluindo uma generalizada excitação, aumento de batimentos cardíacos e até mesmo euforia, mesmo na ausência da droga. A natureza dessas respostas semelhantes a da droga leva a hipotetizar que as estruturas ativadas durante o “craving” pela cocaína podem estar entre aquelas ativadas pela própria cocaína, incluindo região cerebral, a límbica dopaminérgica - a região do cérebro denominada límbica está implicada na resposta emocional e a dopamina é um neurotransmissor que responde pelos efeitos prazerosos.

Pesquisadores testaram estruturas cerebrais do sistema límbico como a amígdala, o cingulado anterior, o polo temporal, o hipocampo e o córtex orbito frontal, as quais poderiam ser diferentemente ativadas durante o “craving” induzidas por sinais associados à cocaína. Esta experiência implicou a medição do fluxo sanguíneo dessas regiões cerebrais em 14 adictos de cocaína, do sexo m asculino e 6 inexperientes durante vídeos relacionados com droga e não droga em uma única sessão de tomográfica com emissão de pósitron (PET) e cond ições de repouso como linha de base. Paralelamente, outras regiões cerebrais (gânglio basal, cerebelo, córtex pré-frontal dorsolateral, tálamo e córtices visuais) foram também monitoradas, para efeito de comparação e também para determinara especificidade regional dos efeitos desencadeadores por pistas de cocaína. Os resultados mostraram que durante o vídeo com cenas relacionadas ao uso de cocaína, os adictos experimentaram o estado de “craving” e também um modelo de aumento do fluxo sanguineo nas regiões cerebrais límbicas - amigdala, cingulado anterior, diferindo do grupo de sujeitos inexperientes de cocaína. Porém, os dois grupos, adictos e inexperientes, não

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apresentaram diferenças quando foram comparados os padrões de respostas relacionados com a apresentação do vídeo com cenas neutras, vídeo não droga. Também não diferiram na comparação de regiões cerebrais do córtex pré-frontal dorsolateral, cerebelo, tálamo e córtex visual. A ativação tanto da amígdala como cingulado anterior, durante o estado de "craving” induzido por sinais relacionados à cocaína, é consistente com a importância dessas duas regiões cerebrais no comportamento afetivo e aprendizagem emocional. Ambas as estruturas estão anatomicamente ligadas com o núcleo accumbens, uma região cerebral importante nas propriedades reforçadoras da cocaína(8’30) . Além disso, a amigdala, estrutura relacionada com a memória emocional foi mais ativada que o hipocampo, estrutura mais envolvida na memória cognitiva.

Os resultados de pesquisas como esta, com uso de neuroimagem mostram:1) Há uma interação da resposta do organismo e sinais do

contexto: o fenômeno neurobiológico e experiências, ambos estão fortemente ligados. Há portanto, uma necessidade de reeleitura da visão dualista de mente e corpo, por exemplo a de que uma droga pode causar dependência apenas psicológica e naõ física, como alguns autores afirmam;

2) As estruturas cerebrais amígdala e cingulado anterior estão envolvidas nas respostas relacionadas a funções de sobrevivência, como por exemplo, alimento, e sexo e, no entanto, são ativadas por sinais associados ao uso da cocaína. Esta questão mostra a necessidade de se pensar na adicção de forma mais abrangente porque não se trata de fenômenos neuroquímicos pontuais;

3) A memória emocional influencia fortemente a memória cognitiva, isso possivelmente explique, em parte, o papel do “craving” nas recaídas ou a não manutenção da abstinência do uso da droga, apesar de todas as perdas sofridas pelo adicto;

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4) A eliciação do estado do “craving" mesmo na ausência da droga é um indicativo de que houve uma antecipação^dos efeitos da droga, na presença de sinais que foram associados ao uso dela. Desse modo, o “craving” é uma resposta condicionada.

Constatações como as citadas acima encorajam o investimento de pesquisas para encontrar estratégias baseadas em princípios de condicionamento.

2. 1. Paradigma do condicionamentoO modelo do condicionamento Pavloviano tem sido

muito em pregado para a descrição de processos envolvidos na adicção. Para o entendimento deste construto teórico torna-se importante observar uma breve síntese da sua origem e da sua terminologia. Pavlov - daí o nome pavloviano - realizou várias pesquisas com animal, cujas pesquisas consistiram em procedimento em que emparelhava um estímulo inicialmente neutro, por exemplo, uma campainha com alimento estímulo incondicionado. O alim ento provocava salivação, resposta incondicionada, no animal, e a campainha, pareada consistentemente com o alimento, depois de um determ inado tempo, adquiria a propriedade do alimento, ou seja, passava a eliciar salivação no animal, mesmo na ausência do alimento. A salivação recebeu a denominação de resposta condicionada.

As inúmeras mudanças no sistema orgânico, pela cocaína, tais como cardiovascular, digestiva, e no sistema endócrino, podem não ser perceptíveis para o adicto por exemplo, a taquicardia, no entanto pode contribuir para uma sensação excitação geral. Essas mudanças ocorrem repetidamente dentro de um contexto ou de procura da droga ou do ambiente de uso, as quais se associam aos sinais estím ulos, consistentem ente

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presentes mesmo antes do usuário experimentar os efeitos da droga. O usuário não necessariamente tem consciência da ocorrência desta associação de sinais com efeitos da droga. Dessa maneira, com frequentes repetições, estímulos podem funcionar como efeitos pré- droga levando ao comportamento de administração da droga. Por esta razão, o papel do contexto na lembrança de uma informação tem sido alvo de interesse de estudiosos da memória tanto de animais quanto de humanos.

O paradigma da teoria do condicionamento se apoia na ideia de uma aprendizagem associativa entre estímulos presentes no momento do uso da droga e uma resposta do organismo preditiva a este estímulo. Por isso, os adictos em abstinência são orientados a evitar pessoas, lugares e coisas associadas com o uso da cocaína.

No entanto, não se trata de contexto no sentido geográfico, porque o conceito contexto pode ser entendido como um am biente in terno e externo; o interno compreende os próprios pensamentos, sensações e o externo compreende os eventos que compõem o ambiente do uso da droga como o lugar, os companheiros, os instrumentos de uso. Além disso, a força da lembrança de uma informação relacionada a um determinado estímulos do contexto está mais ligada à aprendizagem da valência dos significados que o estímulo adquire dentro de uma configuração da situação dentro do contexto, com consequente “recaída” ao uso da droga. Assim, um estímulo, por exemplo, uma bebida, pode ter uma força eliciadora - desencadeadora, de um estado de “craving” para o uso da droga em uma determinada configuração do contexto - vamos chamar de contexto X, e este mesmo estímulo cerveja, ter uma força desencadeadora nula, em um contexto Y.

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Para m elhor en tend im ento dessa h ipótese selecionamos relatos de algumas sessões clínicas, - com a devida assinatura de consentimento do cliente. Trata-se de Karlos - nome fictício, 26 anos de idade, com nível de escolaridade correspondente ao ensino médio. A mãe é falecida. Não possui irmão, vivia com o pai antes de se tornar adicto. Envolveu-se em comportamentos marginais foi para a FEBEM e depois que saiu passou a v iver com uma tia, irmã de sua mãe. Estava em abstinência durante 6 meses quando com eçou o processo terapêutico. A seguir trechos dos relatos selecionados como importantes para o entendimento da hipótese mencionada acima. A abreviação K corresponde a Karlos e T de terapeuta. Os relatos estão transcritos sem correção alguma:K - Um dia depois que saí da Febem, eu tava indo numa firma

procurar emprego. Me falaram que eles tava contratando gente pra trabalhar. No caminho, comecei a pensar na minha vida. Eu falava pra mim mesmo que não ia mais usar. Entrei no bar só pra tomar café. Vi uns caras bebendo com um jeito que era igual quando a gente usava droga. Não sei explicar. Meu coração começou a disparar, comecei a suá. Sentia tudo isso no tempo da “ativa”. Dali mesmo já fui pra boca e deixei meu relógio porque não tinha dinheiro, daí caí de novo.

T - Você já tinha usado cocaína neste local?K - Nesse não, mas perto dali mora um colega meu e quando

eu não tinha dinheiro eu ia lá. Ele sempre tinha. Ele me devia favores; já vendi pra ele (essa pessoa é traficante).

T - Veja K. o que você está me falando: o bar, perto de onde você já tinha usado droga e a imagem de alguém que lembrava um estado do uso da droga formaram um conjunto de coisas que, de alguma maneira, no passado, esteve junto com a droga. Tudo isso fez com que você sentisse estas reações de que você me falou: coração disparado, suor.

Farmacologicamente não havia razão para K. experienciar esses sintomas após 1 ano sem uso de droga (ficara abstinente durante 1 ano na Febem, embora

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anteriormente a este período tenha feito uso). Isso parece ser um exemplo clássico de condicionamento resultante de repetidos paream entos de s ina is am bienta is (estím ulos condicionados) com a droga (estím ulo incond ic ionado) levando aos sin tom as re latados (resposta incondicionada). Após repetidos pareamentos entre estímulos ambientais e a droga, os primeiros podem, por si só, precipitar “craving” e quebra da abstinência.

Esta experiência relatada reafirma que fatores não farmacológicos podem ter um papel importante nos sintomas tanto relacionados com os da retirada da droga - abstinência da droga, indicando a existência de condicionam ento nessas respostas, abundante na literatura referente ao tema e bastante explorada no textot40)

Assim, a preocupação priorizada nos encontros que se seguiram, foi fazer com que K aprendesse a discriminar o seu estado corporal e os estímulos que se associavam a ele, que funcionavam como antecedentes para o uso da droga, e a que estímulos específicos o comportamento de K estava respondendo.

Há três elementos chaves no comportamento de adicção, atenção seletiva, comportamento de procura pela droga e estado emocional. Há incerteza sobre qual deles é condicionado.K - Sabia que eu tenho medo de dormir?T - Como assim? Medo de escuro? (Risos)K - Fico vendo televisão até tarde e quando vou dormir sonho

sempre que estou usando droga. Levanto com o coração batendo e pra melhorar, vou ler a bíblia.

T - Eu sei que isso acontece com frequência com pessoas que usaram droga por muito tempo. São imagens que ficaram gravadas na sua memória a respeito da droga, o que os seus efeitos representaram para você. Parece que você já arrumou uma estratégia, que é ler a bíblia, para lidar com situações

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eliciadoras da vontade de usar a droga. Agora, você deve ampliar as estratégias. Gostaria de te passar uma taçefa: todas as vezes que você tiver vontade de usar cocaína, se sentir mal, ou tiver uma dificuldade que acreditar que não vai dar conta, escreva para podermos falar sobre isso.

Os estímulos condicionados podem ser tanto públicos (o ambiente da administração da droga) como privados - pensamentos, imaginação, sensação, sonhos, e podem ser considerados como intensificadores da efetividade de exposição a estímulos. Tais estímulos têm uma codificação neural, por meio de técnica de neuro- imagem conforme já mencionado.K - Conheci umas meninas, que o G me apresentou (ex - adicto,

com quem K esteve internado em uma clín ica de recuperação).

T - Olha que bom. E você se interessou por alguém?K -São duas amigas. O G tá interessado numa delas. Eu acho

que a outra não vai interessar por mim. Não quero correr risco de levar um não.

T - Se você não tentar, a probabilidade de ser aceito é zero. Se você tentar, a probabilidade deixa de ser zero. Faz sentido para você?

K- A gente - K, o G e as garotas, tem ido passar os fins de semana na chácara do A - O A abreviação de Alberto, nome fictício, mora nesta chácara com a mulher e o filho do casal, O A e a mulher dele tomam cerveja. Eu e o G não. Não sinto mais falta. O Afalou que gosta que a gente vai lá porque ele não sai de casa, e a gente indo lá, faz companhia pra ele.

RecaídaA recaída aconteceu após 3 meses de tratamento

psicoterápico. As circunstâncias que envolveram a recaída poderiam ser indicativas de um processo de condicionamento, uma associação de estímulos com valência desigual entre diferentes contextos.

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K - Vim te pedir ajuda. Não sei explicar direito o que aconteceu. A gente sempre está junto eu o K e as menina jogava baralho na casa do A. Via sempre os dois tomar cerveja. Eu e o G tomava refrigerante. Normal pra mim, tava acostumado já. Não sentia nada, nenhuma vontade de usar cocaína. Achei que nunca mais ia recair. Eu tô com vergonha de você. Te decepcionei.

T - Não é a mim que você decepcionou. Acho que foi a você mesmo. Bem, agora não é hora para isso. Conte com detalhes como tudo aconteceu.

K- A gente ia se encontrar no bar. Atrasei um pouco, quando cheguei o G e as meninas já tavam numa mesa. Quando cheguei, na hora que bati o olho e vi o G, as meninas e latas de cerveja, senti que não ia segurar. Não deu outra. Senti o mesmo que da outra vez, bebi e dali já fui pra bocada e passei a noite cheirando cocaína e daí meu dinheiro acabou, passei pro “crack”. Fiquei dois dias sem trabalhar e fui mandado embora do serviço. Minha tia também me mandou embora de casa.

A quebra da abstinência poderia ser explicada:

Contexto X Contexto Y

Chácara Bar

{[G e cerveja ] -} {[G cerveja]+}

O estímulo cerveja adquire valência diferente como função eliciadora do “craving”.

Nesta equação o sinal + é a representação da cocaína, um estímulo incondicionado. O sinal - é a ausência da cocaína.

Quando K está na chácara, contexto A, o arranjo de estímulos representado pelo amigo G a cerveja ingerida pelo casal A e sua esposa, não funciona como

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estímulo condicional, eliciador da reposta de “craving”. K aprendeu que o contexto A , não vem acompanhado de cocaína. No entanto, no contexto B, um bar, pode vir acom panhado de cocaína, porque em ocasiões anteriores, o arranjo de estímulos em que a bebida esteve presente, juntamente com G, foi preditiva do uso de droga. Pode-se pensar que a cerveja, em um contexto (bar), representou a cocaína (+) e em outro (chácara/ -), não. Bar era provavelmente um contexto de uso de droga. No passado, esteve associado à cocaína. G já tinha sido companheiro de uso de droga de K. A especificidade do contexto não depende de fe ições específicas da informação mas das feições específicas da situação que leva os participantes a prestar atenção ao contexto ou mais precisamente à configuração do contexto.

O trabalho terapêutico a partir deste evento, ou seja, da recaída, passou a ter um foco baseado na tomada de consciência das contingências preditivas entre estímulos, respostas e reforçadores e o esvanecimento da força dessa associação condicionada, portanto aprendida; esvanecimento da força dos significados que os efeitos da cocaína ocupa na sua vida psíquica e promoção de substituição por outros estímulos geradores de prazer que não a droga. Foram priorizados registros de eventos de contexto ameaçadores à recaída, como mudanças comportamentais ampliando repertórios discriminativos de situações de risco.

A aprendizagem envolvida na adicção tem sido examinada tanto da perspectiva do condicionamento respondente como também da operante,

2 .2 . Perspectiva do Condicionamento OperanteEm uma proposta comportamental, a procura pela

droga é conceituada como um comportamento operante, ou seja, o comportamento que opera no seu ambiente e é mantido por suas consequências. Drogas de abuso

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são consideradas como desempenhando um papel re fo rçador e que funciona da mesma form a que poderosos reforçadores como a comida, a água e o sexo. Desta forma, a ingestão de droga é considerada uma forma de comportamento que resulta de uma inter- re lação de fundam enta is processos b io lóg icos e com porta menta is.

Assim, sinais do ambiente que foram associados com o uso da droga, no passado, podem evocar m udanças fis io lóg icas , por exem plo, respostas autonôm icas - sudorese, aumento da frequência cardíaca, boca seca etc., que o adicto interpreta como “craving” ou sintomas de abstinência. Esses sintomas podem, por sua vez, motivar voluntariamente a procura pela droga um comportamento operante. Se a droga procurada é encontrada, forma-se uma cadeia de reforço proporcionados pelos sentimentos de prazer induzidos (atuação da droga no cérebro), como também os induzidos farmacológicos em vários outros sistemas do organismo(42).

Os clínicos centralizam seu trabalho terapêutico mais em um paradigma do que em outro, ou mesmo na combinação de ambos, o do condicionamento operante com o do pavloviano(16). Estas ênfases são derivadas, parcialmente, de observações empíricas e conceitos teóricos de determinantes do uso da droga. Dessa forma, os que adotam o paradigma operante, a ingestão de droga seria conceituada como um comportamento operante, ou seja, o comportamento opera em seu ambiente e se mantém por suas consequências, o que estabelece uma relação específica entre um comportamento e sua consequência define um elemento fundamental de intervenção comportamental(26). A estratégia básica de tratamento portanto, consistiria em um rearranjo do am biente de tal form a que o uso da droga seja prontamente detectado, sendo abstinência reforçada e

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o seu uso tem consequência contrária, ou seja, a perda do reforço.

O suporte empírico para este enfoque deriva da observação de animais de laboratório, os quais auto- administram a maioria das mesmas drogas que são abusadas por humanos: álcooi, a cocaína e os opioides. Tais animais não necessitam de ter uma história anterior de exposição ou dependência destas drogas para que elas funcionem como reforçadoras e, com isso, a manutenção do comportamento de sua ingestão<16). Em relação aos modelos temporais de ingestão de droga, gera lm ente , há também s im ila ridade entre os comportamentos de animais de laboratório e humanos. Deste modo, as causas de au toadm in is tração e dependência devem permanecer no nível de bases biológicas e processos com portam entais que são compartilhados através das espécies (20' 21).

3. Programas de intervenção utilizados na adicção

De uma perspectiva clínica, cessar o uso da droga (desintoxicação) é somente o começo do tratamento. Um programa de reabilitação/ intervenção deve ter como prioridade a manutenção da abstinência. Deve oferecer aos pacientes um suporte

O adicto deve ser encorajado para com frequência participar de programas como Narcóticos Anônimos (NA). A maioria de especialistas têm enfatizado o valor de grupos de autoajuda como os Narcóticos Anômimos ( NA).

Membros da família devem participar das atividades desenvolvidas nestes programas de intervenção para entender o seu papel com codependentes no xadrez da adicção.

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Uma das modalidades de intervenção terapêutica que prolifera no país são as chamadas Comunidades Terapêuticas (CT).

3.1.Comunidades TerapêuticasProgram as para tratam ento da adicção são

inovações relativamente recentes. Eles surgiram de maneira organizada em 1960 como uma resposta ao problema de saúde pública e social nos Estados Unidos.

O term o com unidade terapêutica foi usado primeiramente por Maxwell Jones, que dirigia o hospital Dingleton, na Escócia. Era um psiquiatra preocupado com o fato de que a psiquiatria tradicional parecia não ajudar os pacientes. Para solucionar esse problema, convidou vários profissionais distintos com o objetivo de investigar como falar diretamente com seus pacientes em seu próprio nível procurando assim desmistificar a imagem autoritária do hospital, insistindo na ideia da autoajuda, de ajuda mútua e de que todos deveriam trabalhar juntos para não só ajudarem a si mesmos com também aos demais.

Três m odalidades em ergiram como tipos de tratamento: programas de pacientes não internos, program as de tra tam ento com m anutenção de metadona, e um programa residencial com maior tempo de tratamento chamado de comunidade terapêutica (TC). Mais recentemente, programas residenciais com menor tempo de permanência com uso de procedimento dos 12 passos e outros que não TC(59).

Os programas refletem a visão de que o cliente adicto tem um repertório social deficiente e requer tratamento social. Este tratamento social pode ser caracterizado um esforço organizado para ressocializar o cliente com a comunidade, como um agente de mudança de personalidade

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As TCs têm uma perspectiva de autoajuda como um movimento social e por isso utilizam uma abordagem social e seus dirigentes não fazem uso de medicamentos no tratam ento. Dessa form a,dada sua história , e perspectiva de autoajuda, sua equipe incluem ex-adictos e profissionais da saúde.

As TCs tendem a compartilhar a mesma visão dos clientes, ou seja, uma ênfase na estrutura e hierarquia dentro do programa, necessidade de isolar o indivíduo de in fluências com petitivas durante o tratam ento, necessidade de um período prolongado de tratamento em que com preende fases e claras norm as de responsabilidade e com portamento que formam a essência do tratamento.

Os objetivos das CT não são só os resultados do tratamento, mas também as consequências de uma reabilitação social envolvendo intervenção também em outros locais fora do espaço da CT<47>.

Hoje, para conseguir lidar com a demanda de pacientes que vão buscar tratamento em CTs., a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e a Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD) editaram uma resolução que foi capaz de regulamentar o funcionamento de todas as CTS existentes no país.

O aumento significativo de CTs é consequência do aumento do consumo de drogas psicoestimulantes. No Brasii, temos mais de 80 CT filiadas à Federação Brasileira de Comunidades Terapêuticas (FEBRACT)(53).

Quando os princípios de recuperação, resgate da cidadania, reabilitação física e psicológica e de reinserção social são corretamente aplicados, os tratamentos apresentam resu ltados pos itivos. No entanto , a preocupação maior é com as “clandestinas” para as quais a ANVISA, exigiu o funcionamento por meio de regulamentação, normas e fiscalização a desde 2003.

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Dados da FEBRACT, as estatísticas em nível mundial, em termos de eficiência, apontam de 30% a 35% das pessoas que frequentaram CT e deixaram definitivamente de consumir drogas(53).

As CTS são um modelo de tratamento residencial utilizado durante muito tempo para pacientes com patologias psiquiátricas crônicas.

No Brasil, existem três modelos de intervenção utilizados: internação hospitalar, que é de curta duração, para desintoxicação, com uso de medicamentos; clínicas especializadas particulares nas quais o tratamento é feito a médio ou a longo prazo, atendendo na maioria das vezes pacientes de alto poder aquisitivo; e as CTs que apresentam uma ampla flexibilidade a fim de adaptar-se a várias culturas e níveis sociais trabalhando basicamente em três linhas de atuação: de caráter espiritual (focado na religiosidade e apoio de ex-internos), de caráter p ro fiss iona l (presença de psicó logos, m édicos, assistentes sociais), e mista (espiritual e presença de p ro fiss iona is hab ilitados). É comum nas CTs a colaboração de companheiros adictos no auxílio para assimilar normas sociais e desenvolver habilidades mais eficazes no enfrentamento à recaídas. A visão básica Humanitária das CTs é a de que todos podem crescer e, para isso, precisam da ajuda uns dos outros.

Os elementos centrais das CTs são:1) social. Esse sistema social deve facilitar uma aprendizagem

que, em si mesmo, é terapêutica;2) o sistema é organizado através das normas de convivência

e do enquadramento de tarefas;3) o enquadramento e a normatividade baseiam-se no conceito

da abstinência das drogas, enquanto se realiza o aprendizado;

4) o trabalho concreto na instituição é de uma educação na co-responsabilidade;

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5) as CTs têm hierarquias de acordo com as conquistas que cada residente tenha feito e no conhecimento de si mesmo,-no trabalho sobre os outros e nas lideranças positivas que possa ir progressivamente assumindo;

6) A CT é uma sistemática de grupo onde cada um dos gruposresponde a diferentes necessidades dos residentes. O adicto recuperado integrado à equipe de intervenção funciona como um modelo de papel útil em todo o projeto terapêutico. A família está envolvida de maneira contínua(59).

Um outro aspecto que deve ser ressaltado é a abertura das CT para outros grupos de ajuda como Alcoólicos Anônimos (AA) Narcóticos Anônimos (NA) e Amor Exigente, o que possibilita aos residentes, através das partilhas de sentimentos e situações.

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Questões clínicas e perspectivas

1. Regiões Cerebrais e Comportamento Motivado na Adicção

As complicações para se oferecer um tratamento clínico eficaz para a adicção de cocaína envolvem os efeitos com portam enta is como condicionam ento, questões relativas à propriedade reforçadora da droga bem como passagem para droga com grande potencial de dependência como o “crack”.

A cocaína atua nas vias neuronais dopaminérgicas do sistem a cerebral denom inado m esolím bico. A dopamina é reconhecidamente um neurotransmissor responsável pela sensação subjetiva de prazer e euforia. Estas vias dopaminérgicas vão desde a região cerebral denom inada m esencé fa lo até a região cerebra l denom inada sistema límbico, daí a denom inação mesolímbico. Como já foi dito anteriormente, certas áreas do cérebro, que fazem parte desse sistema, entre elas a amígdala, o núcleo accumbens, hipocampo têm papel importante na memória emocional, cognitiva como também atua no sistema de controle motivacional (S.C.M). O S.C.M. controla diferentes funções e é ativado quando há algum desequilíbrio como por exemplo, a fome, a sede. Os circuitos neuronais deste sistema acionam outros e em um “ loop ing ” ativam o comportamento para alcançar o objeto e restaurar o equilíbrio do organismo. A cocaína por ativar vias neurais do sistema que está também implicado na fome, na sede

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e no sexo, então para o cérebro, a droga passa a ter a equivalência deles. No caso da cocaína, a satisfação da necessidade é acompanhada de prazer intenso então a ordem que emana desse sistema motivacional é: repita a ação(34).

Por causa destas implicações cerebrais, drogas que produzem rápida sensação de prazer no indivíduo tendem a serem autoadministradas excessivamente.

Além disso, é preciso acrescentar que aos efeitos subjetivos de intenso prazer e euforia são interpretados pelo usuário de acordo com a dimensão que adquire no decorrer da sua experiência com a droga e atendem a uma necessidade psicológica que resultou da construção de sua autobiografia, como alguns relatos mostraram:

“ .....eu não gostava do que eu era, sem a droga”;“ ....ela te renova à vontade. Não faz perdera graça. Se, por exemplo, eu compro um carro, que era o meu sonho, depois de muito tempo, perde a graça. Perdeu a graça, não quero mais”; “ comecei a ficar conhecido, mais famoso, mais respeitado”.

A atuação reforçadora da cocaína não está só por proporcionar prazer resultado de uma resposta da a tuação no s istem a responsável pela resposta emocional, mas da maquiagem a ela se presta para cada necessidade específica do adicto. Talvez por isso, a adesão ao tratamento seja uma questão difícil.

Se por um lado, a eficácia do tratamento da adicção deixa a desejar, por outro lado, ainda é escasso o conhecimento a respeito de como os indivíduos recuperam das amarras da cocaína no decorrer do tempo, e quais os pontos chaves na recuperação levam a cessar a procura e o uso da droga. Deveria haver um esforço sistemático para integrar a pesquisa e tratamento.

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2. MotivaçãoA baixa adesão do adicto ao tratamento é atribaída

ao fator motivacional. A modificação do comportamento adictivo envolve motivação e ela ocorre em progressão através de estágios e por isso é recom endado a aplicação de entrevista motivacional para entender a m otivação como um fa to r de aum ento da sua manutenção no tratamento.

Por exemplo, no estágio da pré-contemplação a pessoa está se comportando ativamente dentro do comportamento problema e não o percebe, embora outros o façam. Na contemplação, não investe no esforço de pensar sobre o problema ou tentativa para mudar e dessa maneira, não procura tratamento a não ser por circunstâncias que o forçam como pressão da família ou problemas com a justiça. No estágio da contemplação o indivíduo começa a experimentar uma ambivalência a respeito do comportamento problema, considera que faz algo a respeito, porém não procura tratamento. Não está convencido de que o problema seja sério o suficiente para isso. O contemplador pode permanecer neste estágio indefinidamente. “Amanhã eu deixarei (a droga)”, um comportamento vacilante o que reflete uma ambivalência e o conflito motivacional, que são características deste estágio.

No estágio de decisão ou determinação, há uma tendência em favor da mudança. Neste estágio, no início há uma tentativa ativa para fazer alguma coisa para resolver o comportamento problema(48) .

O conceito de estágios motivacionais foi fortalecido no início da década de 80 e serviu de base para a construção de uma proposta de intervenção terapêutica (Entrevista Motivacional) bem estabelecida e que vem sendo testada, internacionalmente, há pelo menos uma década e recentemente, no Brasil(36'644).

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ConsideraçõesOs programas de tratamento devem contemplar

uma estrutura que integra estabilização do humor do adicto (se incluir medicamentos), aprendizagem, suporte social e estratégias para prevenir recaídas. O objetivo do programa deve ser a abstinência e para isso o adicto deve ser orientado a:1- mudança em estilo de vida;2- um ambiente que lhe dê suporte para recuperação com

engajamento em atividades contínuas como parte de reabilitação;

3- contínuo cuidado com fatores que facilitam a recaída. Para isso deve ter conhecimento de contingências preditivas entre estímulos, respostas e reforçadores.

É preciso levar em consideração a variedade de adictos de cocaína, com diferentes níveis de severidade no uso da droga, diferentes níveis socioeconômico, envolvimento com outras drogas, nível de repertório social, grau de enfraquecimento do laço familiar, comorbidade psiquiátrica. O comportamento da adicção está fortemente associado com a compulsão. Estratégias para lidar com comportamentos de impulsos podem ser de grande ajuda para resistir a recaídas.

A probabilidade de sucesso de uma intervenção está também na capacidade para promover mudança no estilo de vida do adicto, ampliar habilidades sociais como também mecanismos para criar comportamentos alternativos geradores de prazer.

Uma abordagem teórica que poderia ser adequada em programas de tratam ento é a comportamental cognitiva porque abrange não só comportamentos m anifestos propriam ente d itos, operantes e respondentes, mas também cognições (pensamentos, respostas verbais, representações, interpretações, percepções etc.) e sentimentos ou emoções e seus correlatos fisiológicos.

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Em função de uma demanda crescente para tra tam ento torna d ifíc il espera r por se rv iço ^ de atendim ento com cuidados técnicos que possam responder com eficácia ao tratamento da adicção pela com plexidade inerente ao problema, variáveis de natureza psicológica, neurobiológica e social. Por isso, proliferam as chamadas “clínicas de recuperação” que atuam, muitas vezes de maneira intuitiva, sem quadro técnico que a situação requer, por escassez de uma política de fiscalização por parte dos órgãos competentes e atuam no vazio deixado peto estado. Em muitas dessas “clínicas”, chamadas de comunidades terapêuticas a condução do tratamento está a cargo de ex-adi dos, cujos procedimentos são arbitrários, intuitivo por deficiência de form ação técnica. Muitas vezes, os instrum entos terapêuticos se restringem a trabalho braçal e religião.

O valor do tratamento nas TCs necessita ser dem onstrado com u tilização de conce itos mais informativos e realistas de sucessos, recaídas e níveis de abandono do tratamento.

A maioria dos programas de tratamento tem um funcionam ento direcionado para a manutenção da abstinência, o que é um real desafio para superar a adicção.

Pesquisas mostram que a psicoterapia sozinha pode ser adequada para alguns subgrupos de adictos. Por exemplo, respostas mais eficazes seriam dadas por adictos com baixo nível de severidade, aqueles que podem sustentar períodos de abstinência entre episódios de uso.

Medicamentos poderiam ser utilizados como interm ediários na fase inicial da abstinência, para estabilizar o paciente e aumentar viabilidade para a psicoterapia. Eles podem reduzir o “craving” relacionado com a lte rações em receptores pós-s inápticos. A

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psicoterapia pode ser mais eficaz na manutenção da abstinência quando melhora a motivação do adicto e melhora as hab ilidades para o enfrentam ento de situações de alto risco para recaídas presentes no seu cotidiano.

O processo da recuperação inclui vários abandonos ao tratamento bem como recaídas após períodos iniciais da abstinência. Usualmente é dito que é mais fácil parar de usar a droga do que ficar permanentemente na abstinência - em outras palavras “ parar é fácil, o difícil é manter. O desafio durante este estágio é consolidar a conquista realizada para mantê-la e continuar gozando dos ganhos positivos e evitar recaídas.

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Em sua experiência, quer em consultório particular, quer em clínica para tratamento de adictos de cocaína, a autora presenciou situações vivenciadas por pacientes e seus familiares que forneceram subsídios para a elaboração desta obra. Em linguagem clara e precisa, mas de amplo acesso, a autora discute o processo de adicção e demais questões pertinentes ao tema que representa foco de interesse, não apenas dos profissionais de saúde e familiares de adictos, mas ao público em geral.