armadilha da divida

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A ARMADILHA DA DÍVIDA Como a dívida pública interna impede o desenvolvimento econômico e aumenta a desigualdade social Panorama de 150 anos de finanças públicas no Brasil Buraco nas contas públicas: FHC quebrou o Brasil Propostas para enfrentar a dívida interna A política fiscal como instrumento de distribuição de renda Reinaldo Gonçalves e Valter Pomar Reinaldo Gonçalves e Valter Pomar A ARMADILHA DA DÍVIDA

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Page 1: Armadilha Da Divida

A ARMADILHA DA DÍVIDAComo a dívida pública

interna impedeo desenvolvimento

econômico e aumenta adesigualdade social

Panorama de 150 anos de finanças públicas no BrasilBuraco nas contas públicas: FHC quebrou o Brasil

Propostas para enfrentar a dívida internaA política fiscal como instrumento de distribuição de renda

PARA GARANTIR a continuidade do pagamento das dívidasfinanceiras, o governo Fernando Henrique Cardoso tempromovido um avassalador calote de todas as dívidas sociais,desviando para pagamento dessas dívidas recursos que poderiamgarantir moradia, saúde, educação, transporte, terra e trabalhopara todos os brasileiros.A questão da dívida interna tem um papel central nesseprocesso, pois, nos últimos anos, o governo tem gasto mais com opagamento da dívida pública interna do que com a dívida externa.Assim, é fundamental saber qual a origem da dívida públicainterna, qual sua composição e quem são seus beneficiários.A armadilha da dívida – dos mesmos autores de O Brasilendividado (também publicado na coleção Brasil Urgente) –sistematiza as informações disponíveis sobre a dívida públicainterna brasileira desde 1850 até os dias de hoje, com destaquepara o que ocorreu durante o governo FHC. Esperamos que aleitura deste livro nos ajude a enfrentar os “senhores da dívida”.

. Como a dívida pública per capita aumentoude R$ 1.000 em 1995 para R$ 5.300 em 2002. Governo FHC: o maior déficit, a maior cargatributária, a maior dívida interna eum desempenho econômico medíocre

Reinaldo Gonçalves e Valter Pomar

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Reinaldo Gonçalves e Valter Pomar

A ARMADILHA DA DÍVIDAISBN

85-86469-63-7

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A ARMADILHA DA DÍVIDAComo a dívida pública

interna impedeo desenvolvimento

econômico e aumenta adesigualdade social

Panorama de 150 anos de finanças públicas no BrasilBuraco nas contas públicas: FHC quebrou o Brasil

Propostas para enfrentar a dívida internaA política fiscal como instrumento de distribuição de renda

PARA GARANTIR a continuidade do pagamento das dívidasfinanceiras, o governo Fernando Henrique Cardoso tempromovido um avassalador calote de todas as dívidas sociais,desviando para pagamento dessas dívidas recursos que poderiamgarantir moradia, saúde, educação, transporte, terra e trabalhopara todos os brasileiros.A questão da dívida interna tem um papel central nesseprocesso, pois, nos últimos anos, o governo tem gasto mais com opagamento da dívida pública interna do que com a dívida externa.Assim, é fundamental saber qual a origem da dívida públicainterna, qual sua composição e quem são seus beneficiários.A armadilha da dívida – dos mesmos autores de O Brasilendividado (também publicado na coleção Brasil Urgente) –sistematiza as informações disponíveis sobre a dívida públicainterna brasileira desde 1850 até os dias de hoje, com destaquepara o que ocorreu durante o governo FHC. Esperamos que aleitura deste livro nos ajude a enfrentar os “senhores da dívida”.

. Como a dívida pública per capita aumentoude R$ 1.000 em 1995 para R$ 5.300 em 2002. Governo FHC: o maior déficit, a maior cargatributária, a maior dívida interna eum desempenho econômico medíocre

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A ARMADILHA DA DÍVIDAISBN

85-86469-63-7

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A armadilha da dívidaComo a dívida pública interna impede o desenvolvimento

econômico e aumenta a desigualdade social

Reinaldo Gonçalves

Valter Pomar

EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO

Coleção Brasil Urgente

COLEÇÃO BRASIL URGENTE

Page 4: Armadilha Da Divida

Fundação Perseu AbramoInstituída pelo Diretório Nacional

do Partido dos Trabalhadoresem maio de 1996

DiretoriaLuiz Dulci – presidente

Zilah Abramo – vice-presidenteHamilton Pereira – diretor

Ricardo de Azevedo – diretor

Editora Fundação Perseu Abramo

Coordenação EditorialFlamarion Maués

Assistente EditorialCandice Quinelato Baptista

RevisãoMaurício Balthazar Leal

Capa, Ilustrações e Projeto GráficoGilberto Maringoni

Ilustração da CapaÂngelo Agostini, Revista Ilustrada nº 561

Editoração Eletrônica Augusto Gomes

Impressão Gráfica Vida e Consciência

1a edição: fevereiro de 2002Tiragem: 5 mil exemplares

Todos os direitos reservados àEditora Fundação Perseu Abramo

Rua Francisco Cruz, 23404117-091 – São Paulo – SP – Brasil

Telefone: (11) 5571-4299Fax: (11) 5571-0910

Home-page: http://www.fpabramo.org.brE-mail: [email protected]

Copyright © 2002 by Reinaldo Gonçalves e Valter PomarISBN 85-86469-63-7

Page 5: Armadilha Da Divida

Sumário

APRESENTAÇÃO .............................................................................. 7As várias dívidas ................................................................... 8

OITO ANOS QUEBRANDO O BRASIL .................................................. 9Mentiras neoliberais .................................................................................. 9

Maratonistas e perdedores .................................................................... 10Qual estabilidade? ...................................................................................... 11Menos crescimento, mais desigualdade .................................................... 12A paranóia do superávit primário ............................................................. 14

Retrógrados, rentistas e barões da privatização .................................. 14Juros baixos: só quando as galinhas tiverem dentes ............................ 16A Lei de Responsabilidade Fiscal ......................................................... 17

Para inglês ver ........................................................................................... 18Estados Unidos: déficit público e gastos militares ............................. 18

Ampliando a dependência ......................................................................... 20Estado e economia ..................................................................................... 21

Plano Real e endividamento público .................................................... 22Social-democracia de araque ..................................................................... 23Dívida e abertura comercial ...................................................................... 24

A volta da ciranda financeira ............................................................... 25Tirando mais de quem tem menos .......................................................... 26

FHC implode o federalismo fiscal ........................................................ 27Para o infinito e além ............................................................................... 28

Encargos financeiros X programas sociais ........................................... 29

A RADIOGRAFIA DA BOMBA ............................................................. 33Conceitos da dívida ............................................................................... 34

Os senhores da dívida ............................................................................... 35Privatização e moedas podres .............................................................. 35

Estrangeiros e protegidos .......................................................................... 36Incentivos, reeleição e empresas automobilísticas ............................... 37

A DÍVIDA INTERNA NA HISTÓRIA BRASILEIRA .................................... 39Segundo Reinado (1850-1889) .................................................................. 40Guerra do Paraguai .................................................................................... 40Seca no Nordeste ....................................................................................... 41República Velha (1889-1930) .................................................................... 42A Era Vargas ............................................................................................. 44Da “redemocratização” ao golpe (1946-1963) .......................................... 46A ditadura militar ...................................................................................... 47Período de turbulências ............................................................................. 48

Page 6: Armadilha Da Divida

DESMONTANDO A ARMADILHA DA DÍVIDA ........................................ 51A armadilha do esquecimento ................................................................... 51A armadilha da estatização ....................................................................... 52A armadilha da chantagem ........................................................................ 53Outro modelo é possível ........................................................................... 53

Auditoria da dívida ............................................................................... 54A armadilha do “calote” ......................................................................... 55Em defesa do status quo ......................................................................... 55Assustando os setores médios ................................................................. 56Um programa alternativo ........................................................................... 56

Desmonte do sistema de fiscalização .................................................... 57Financiamento e desenvolvimento ............................................................ 58

Brasil: o paraíso da sonegação fiscal .................................................. 58Justiça fiscal ............................................................................................ 59

O debate sobre a CPMF ....................................................................... 59Como sonegar: o vale tudo do Refis .................................................... 60Distribuição de riqueza no Brasil ........................................................ 61

BIBLIOGRAFIA ................................................................................. 63

ANEXOS – QUADROS E TABELAS ..................................................... 67

Page 7: Armadilha Da Divida

Não empreste nem peça emprestado:quem empresta perde o amigo e o dinheiro;

quem pede emprestado já perdeu o controle de sua economia.

(Polônio, Lord camarista),William Shakespeare, Hamlet

Page 8: Armadilha Da Divida

Reinaldo GonçalvesNasceu em 1951, no Rio de Janeiro. É professor titular de economia da UniversidadeFederal do Rio de Janeiro (UFRJ) e autor de mais de uma centena de trabalhos, publica-dos na Europa (Alemanha, França, Inglaterra, Itália, Suécia, Suíça, Portugal e Iugoslá-via), Ásia (Japão, Coréia do Sul e Índia), África (Cabo Verde), América do Norte (Esta-dos Unidos e México) e América do Sul (Brasil, Chile, Uruguai e Venezuela).

Valter PomarNasceu em 1966, em São Paulo. É historiador e 3o vice-presidente nacional do Partidodos Trabalhadores. É organizador de Socialismo ou barbárie (São Paulo, EditoraViramundo, 2000) e co-autor de O Brasil endividado (São Paulo, Editora FundaçãoPerseu Abramo, 2000).

Leia dos mesmos autores:O BRASIL ENDIVIDADO

Como nossa dívida externa aumentou mais de 100 bihões de dólares nos anos 90Coleção Brasil Urgente – Editora Fundação Perseu Abramo

Page 9: Armadilha Da Divida

7 REINALDO GONÇALVES & VALTER POMAR

A realização de plebiscitos e referendosé uma prática comum em vários países domundo. Não é o caso do Brasil. Em escalanacional, nosso país realizou apenas doisplebiscitos oficiais: em 1963, quando sedecidiu pela volta do presidencialismo; eem 1993, quando foi vitoriosa a propostade manutenção da República e, novamen-te, do presidencialismo.

Em 2000, um conjunto de igrejas, mo-vimentos sociais e partidos políticos to-mou a iniciativa de organizar um plebisci-to popular, não-oficial, sobre temas de po-lítica econômica: o acordo com o FundoMonetário Internacional (FMI), a dívidaexterna e a interna.

Este Plebiscito, realizado de 2 a 7 desetembro de 2000, consultou a opiniãopopular sobre três questões:• “O governo brasileiro deve manter o atualacordo com o Fundo Monetário Interna-cional?”• “O Brasil deve continuar pagando a dí-vida externa, sem realizar uma auditoriapública dessa dívida, como previsto naConstituição de 1988?”

• “Os governos federal, estaduais e muni-cipais devem continuar usando grandeparte do orçamento público para pagar adívida interna aos especuladores?”

O Plebiscito foi um enorme sucesso:votaram mais de 6 milhões pessoas. Maisde 95% dos participantes respondeu comum “não” às três perguntas feitas na cédu-la. O acontecimento gerou muita polêmi-ca e incômodo na mídia, no governo e en-tre os grandes empresários. O presidenteda República fez críticas públicas e o mi-nistro da Fazenda atacou diretamente asentidades que promoveram o Plebiscito,acusando seus organizadores de patroci-nar o “calote das dívidas”.

Pura hipocrisia: afinal, exatamente ogoverno federal, ao longo da década de1990, tem promovido um avassalador ca-lote de todas as dívidas sociais, descum-prindo determinações constitucionais,contingenciando verbas carimbadas, des-viando para pagamento de dívidas finan-ceiras recursos que poderiam garantirmoradia, saúde, educação, transporte, ter-ra e trabalho para todos os brasileiros.

Apresentação

Page 10: Armadilha Da Divida

8A ARMADILHA DA DÍVIDA

Para garantir a continuidade do paga-mento das dívidas financeiras, o governoFernando Henrique Cardoso (FHC) tam-bém cortou investimentos, privatizou em-presas estatais e, mais recentemente, fezaprovar a Lei de Responsabilidade Fis-cal (veja box na p. 17).

O “calote das dívidas sociais” torna-seevidente quando observamos o orçamen-to da União, dos estados e dos municípios;quando verificamos as conseqüências doacordo com o FMI; ou quando analisamosa dinâmica do endividamento externo, quefaz a riqueza produzida no Brasil sersugada e transportada para governos eempresas estrangeiras, instituições finan-ceiras internacionais e também brasileiroscom aplicações no exterior.

Já no caso da dívida interna, as coisasnão são tão claras. Há quem diga, porexemplo, que a dívida pública interna, di-ferentemente da externa, seria uma dívi-da “conosco mesmo”, uma dívida do go-

verno para com toda a sociedade brasi-leira.

Ocorre que, nos últimos anos, nossosgovernos têm gasto mais com a dívidapública interna do que com a dívida exter-na. Assim, é fundamental saber qual a ori-gem dessa dívida, qual sua composição equem são seus beneficiários.

Este livro é uma pequena contribuiçãopara este desafio. A exemplo do que fize-mos em O Brasil endividado, que tratavada dívida externa, neste livro buscamos sis-tematizar as informações disponíveis sobrea dívida pública interna brasileira. Incluí-mos um capítulo que trata da dívida públi-ca brasileira de 1850 até 1994 (ao leitor não-familiarizado com o tema, sugerimos que aleitura deste capítulo seja feita após a leitu-ra do restante do livro). E demos destaquepara o que ocorreu durante o governo FHC,por razões que ficarão óbvias. Esperamosque a leitura deste livro nos ajude a enfren-tar os senhores da dívida.

Uma dívida pode ser externa ou interna, priva-da ou pública. Quando falamos que uma dívida éinterna ou externa, na prática estamos designan-do o tipo de moeda em que essa dívida terá de serpaga: se a dívida tem de ser paga em moeda es-trangeira, trata-se de dívida externa; se a dívidapode ser paga em reais, trata-se de dívida interna.

Já quando falamos que uma dívida é públicaou privada, estamos nos referindo a quem con-traiu o empréstimo: se foi uma pessoa física ouuma empresa privada, a dívida é privada; se foium órgão público, a dívida é pública.

A dívida pública, portanto, é a soma de tudoaquilo que todos os órgãos do Estado brasileirodevem, incluindo o governo federal, estados,municípios e empresas estatais.

Mas como o setor público é também um gran-de credor, tanto de outros órgãos públicos comode entidades privadas, o conceito de dívida líqui-

da traduz mais claramente a posição financeirado setor público.

Na prática, a dívida líquida é quanto o Estadodeve, menos aquilo que ele deve para si mesmo.

A dívida pública interna possui três origens prin-cipais: o financiamento de novos gastos públicosem bens e serviços (despesas com educação,construção de novas obras etc.), os gastos comjuros sobre as dívidas contraídas no período an-terior e, no caso do governo federal, a políticamonetária e cambial.

Fonte: PEREIRA, Fábio. O Plano Real e o cresci-mento da dívida pública no Brasil. São Paulo, FGV/EAESP, 2000. Dissertação de mestrado apresenta-da à Escola de Administraçõa de Empresas de SãoPaulo, Fundação Getúlio Vargas; GONÇALVES ePOMAR. O Brasil endividado. São Paulo, EditoraFundação Perseu Abramo, 2000.

As várias dívidas

Page 11: Armadilha Da Divida

9 REINALDO GONÇALVES & VALTER POMAR

Quando o presidente Fernando HenriqueCardoso tomou posse, no início de 1995, oprimeiro brasileiro que nasceu recebeu jun-to com a certidão uma dívida pública de1.000 reais. No final do ano 2000, essa dí-vida já havia crescido para 3.391 reais (Ta-bela 1 – veja as tabelas a partir da p. 66).

Mantidas as tendências atuais, a dívidalíquida total do Brasil no final de 2002pode chegar a 900 bilhões de reais. Nessecaso, quando FHC estiver arrumando suasgavetas, cada brasileiro estaria devendo5.300 reais!

Esse crescimento da dívida pública nãoseria tão grave se, primeiro, esta dívidadecorresse de investimentos feitos na me-lhoria da vida do povo brasileiro; segun-do, se a dívida tivesse crescido tanto pornão termos pago nada nesse período; ter-ceiro, se a renda dos brasileiros tivessecrescido pelo menos proporcionalmente aocrescimento da dívida.

Mas não foi nada disso o que aconte-ceu. Na realidade, o brasileiro tornou-semais endividado: de 1994 a 2000, nossoProduto Interno Bruto (PIB) nominal percapita cresceu 200%, enquanto nossa dí-vida per capita cresceu 339%.

O Brasil também ficou mais endivida-do: em 1994, a relação entre a dívida pú-blica e o PIB era de 29,2%. Em 2000, che-gou a 49,3%. Em 2001, quando escrevía-mos este livro, já havia chegado a 56%. Acontinuar assim, a relação entre a dívidapública e o PIB pode chegar a 66,7% nofinal de 2002.

Isto significaria que, se quiséssemospagar nossa dívida pública de uma vez só,precisaríamos transferir para os credorestudo aquilo que o país inteiro é capaz deproduzir em oito meses (ou 243 dias) se-guidos!

Mentiras neoliberais

Parte da mídia, o governo e os grandesempresários costumam dizer que a dívidapública existe porque o governo é gasta-dor e irresponsável. Ou seja: o setor pú-blico estaria gastando mais do que arreca-da e, por isso, se veria obrigado a obterempréstimos com o setor privado.

Como em toda mentira, nesta há um pou-co de verdade: a maior parte da dívida pú-blica brasileira é, realmente, de responsa-

Oito anosquebrando o Brasil

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10A ARMADILHA DA DÍVIDA

bilidade do governo federal e do BancoCentral.

Quando FHC assumiu, em janeiro de 1995,nossa dívida líquida total era de 153 bilhõesde reais. Deste total, o governo federal e oBanco Central deviam 66 bilhões de reais.No final de 2000, a dívida líquida total erade 563 bilhões de reais, dos quais 353 bi-lhões de reais eram de responsabilidade dogoverno federal e do Banco Central.

Portanto, além de responder pela maiorparte da dívida, o governo federal e o Ban-

co Central também respondem pela parteda dívida que cresce mais rápido: de 1994a 2000, enquanto nossa dívida líquida totalcresceu 367%, a dívida líquida do governofederal e do Banco Central cresceu 536%.

O que os neoliberais não contam é que,durante os primeiros seis anos do governoFHC, as receitas foram sempre maioresque as despesas. Até porque o governo temampliado a arrecadação, ao mesmo tempoem que arrocha os investimentos, os gas-tos sociais e os salários do funcionalismo.

Do século XIX ao século XXI, da monarquia àrepública, de regimes civis a militares, o Brasilteve maratonistas e perdedores na chefia do Es-tado brasileiro.

Os perdedores foram aqueles que tiveram,durante o seu mandato, uma taxa média de cres-cimento anual do PIB muito inferior à taxa médiahistórica do país (4,4%).

Antes de tudo, alguns comentários de nature-za metodológica. A fonte de dados até 1947 é oInstituto de Pesquisa Econômica Aplicada, IPEA(CONTADOR, 1977); a partir de 1947 os dadosprovêm da Fundação Getúlio Vargas (Conjuntu-ra Econômica, Rio de Janeiro, diversos núme-ros). A taxa média refere-se à média aritméticadas variações anuais percentuais do PIB. Osdados para Pedro II referem-se ao período 1862-1889, pela ausência de dados anteriores a 1862.Para 2001 e 2002 consideraram-se as taxas de1,3% e 1,9%, respectivamente, como as previ-sões de crescimento do PIB, com base na revis-ta The Economist de 23 de outubro de 2001.

Como, de modo geral, as eleições presiden-ciais são em novembro e a posse em janeiro, hácoincidência entre o período de cálculo do PIB(janeiro-dezembro) e o mandato presidencial. Noscasos de diferenças mais expressivas (seis me-ses ou mais), fez-se a interpolação aritmética(Afonso Pena, Nilo Peçanha e Epitácio Pessoa).Excluíram-se as presidências com mandato infe-rior a um ano: Delfim Moreira, José Linhares,Nereu de Oliveira Ramos e Pascoal RanieriMazzilli. Considerou-se a taxa média de GetúlioVargas nos dois governos.

E, então, quem são os perdedores? Quantos“fernandos” estão entre eles?

Prudente de Morais e Barros, 11/1894 a 11/1898,com uma taxa média anual de crescimento do

Maratonistas e perdedoresPIB de -6,8%, ocupa a posição número 1 entreos sete perdedores. Seu governo foi marcado porcrise econômica e política, queda dos preços in-ternacionais do café (1896), conflitos políticosinternos (Guerra de Canudos, 1896-1897) e cres-cimento da dívida pública.

O segundo perdedor é Fernando Collor deMello, 3/1990 a 9/1992, com uma taxa médiaanual de crescimento do PIB de -1,4%, cujo go-verno caracterizou-se por crise econômica, pro-blemas cambiais, má gestão, incompetência ecorrupção.

Deodoro da Fonseca, 11/1889 a 11/1891, é oterceiro perdedor. Foi responsável por uma taxamédia anual de crescimento do PIB de - 1,3%. Oseu governo foi marcado por conflitos internos ecrise institucional, repercussões da abolição daescravidão (1888) e da proclamação da repúbli-ca (1889).

O quarto perdedor é Floriano Peixoto, 11/1891a 11/1894, com uma taxa média anual de cresci-mento do PIB de - 0,7%. No seu governo o paístambém experimentou crise institucional, proble-mas financeiros (Encilhamento, 1892) e conflitospolíticos internos (Revolta da Armada, 1893; Re-volução Federalista no Rio Grande do Sul).

Venceslau Brás, 11/1914 a 11/1918, é o quintoperdedor. No seu mandato a taxa média anualde crescimento do PIB foi de 2,1%. O país sofreucrise econômica, crise cafeeira (queima de 3 mi-lhões de sacas), fim do ciclo da borracha e con-flitos políticos internos (Guerra do Contestado,1915).

O sexto perdedor foi Washington Luís, 11/1926a 10/1930, com uma taxa média anual de cresci-mento do PIB de 2,1%, cujo mandato foi marca-do por crise da dívida externa, revoltas tenentistase crise mundial (outubro de 1929).

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11 REINALDO GONÇALVES & VALTER POMAR

Desempenho dos chefes de Estado no Brasil: do pior para o melhor

(taxa média anual de crescimento real do PIB, em %)

O último dos sete perdedores é Fernando Hen-rique Cardoso, 1/1995 a 2001. A taxa estimadade crescimento médio anual do PIB é de 2,4% noperíodo 1995-2001. A taxa média estimada parao período 1995-2002 é a mesma. O desempe-nho medíocre de FHC tem se caracterizado pela

“africanização” do Brasil, isto é, a ocorrência si-multânea dos seguintes processos: deses-tabilização macroeconômica, desmonte do apa-relho produtivo, esgarçamento do tecido social,deterioração política, degradação institucional eperda de governança.

Nota: Elaboração de Reinaldo Gonçalves.Média aritmética das taxas anuais. Média histórica = 4,4%. Excluíram-se as presidências com período inferior a um ano: Delfim Moreira(de 15/11/1918 a 28/7/1919); José Linhares (de 29/10/1945 a 31/1/1946); Nereu de Oliveira Ramos (de 11/11/1955 a 31/1/1956); ePascoal Ranieri Mazzilli (de 1/4/1964 a 15/4/1964). Considerou-se a taxa média de Getúlio Vargas nos dois governos.

Os “gastos” que explicam o crescimen-to da dívida, portanto, são financeiros:pagamento de juros e amortização do prin-cipal, novos empréstimos para pagar dívi-das velhas, crescimento da dívida por con-ta da taxa de juros e custos decorrentes dapolítica monetária e cambial.

Em outras palavras: o governo brasilei-ro é, efetivamente, gastador e irresponsá-vel. Mas é preciso ver com quem ele gastae com quem ele é irresponsável.

Qual estabilidade?

O crescimento da dívida pública durante ogoverno FHC faz parte de uma política deli-berada, que beneficia pequenos segmentosda população e deixa uma herança malditapara a maioria dos brasileiros: dívida social,desestabilização macroeconômica, desman-telamento do aparelho produtivo, degrada-ção do tecido social, deterioração político-institucional e um Estado quebrado.

Chefe de Estado e período Taxa média Ordem

Prudente José de Morais e Barros, 11/1894 a 11/1898 -6,8 1 Fernando Collor de Mello, 3/1990 a 9/1992 -1,4 2 Manuel Deodoro da Fonseca, 11/1889 a 11/1891 -1,3 3 Floriano Vieira Peixoto, 11/1891 a 11/1894 -0,7 4 Venceslau Brás Pereira Gomes, 11/1914 a 11/1918 2,1 5 Washington Luís Pereira de Souza, 11/1926 a 10/1930 2,1 6 Fernando Henrique Cardoso, 1/1995 a 2001 2,4 7 João Baptista de Oliveira Figueiredo, 3/1979 a 3/1985 2,5 8 Pedro II (1840-1889) 3,0 9 Hermes Rodrigues da Fonseca, 11/1910 a 11/1914 3,4 10 João Belchior Goulart, 9/1961 a 4/1964 3,5 11 Getúlio Dornelles Vargas, 11/1930 a 10/1945; e 1/1951 a 8/1954 4,0 12 Humberto de Alencar Castello Branco, 4/1964 a 3/1967 4,3 13 José Sarney, 3/1985 a 3/1990 4,4 14 Itamar Cautiero Franco, 9/1992 a 1/1995 5,2 15 Ernesto Geisel, 3/1974 a 3/1979 6,7 16 Epitácio da Silva Pessoa, 7/1919 a 11/1922 6,9 17 Artur da Silva Bernardes, 11/1922 a 11/1926 7,5 18 Arthur da Costa e Silva, 3/1967 a 8/1969 7,8 19 Francisco de Paula Rodrigues Alves, 11/1902 a 11/1906 7,9 20 Eurico Gaspar Dutra, 1/1946 a 1/1951 8,0 21 Juscelino Kubitschek de Oliveira, 1/1956 a 1/1961 8,1 22 Afonso Augusto Moreira Pena, 11/1906 a 6/1909 8,6 23 João Café Filho, 8/1954 a 11/1955 8,7 24 Jânio da Silva Quadros, 1/1961 a 8/1961 8,8 25 Manuel Ferraz de Campos Sales, de 11/1898 a 11/1902 10,4 26 Emílio Garrastazu Médici, 10/1969 a 3/1974 11,9 27 Nilo Procópio Peçanha, 6/1909 a 11/1910 14,0 28

Page 14: Armadilha Da Divida

12A ARMADILHA DA DÍVIDA

Os defensores do governo FHC costu-mam apontá-lo como responsável por“estabilizar” a economia do país. Ocorreque nesse período o desemprego cresceu,a violência cresceu, a crise social cresceu,a miséria cresceu, a dívida externa cres-ceu, a dívida interna cresceu, os déficitsexternos cresceram...

Na verdade, a única variável da econo-mia brasileira que permanece em níveisaparentemente satisfatórios desde 1995 éa inflação. Mas o custo social que tem sidopago para manter baixas as taxas inflacio-nárias é descomunal.

Além disso, uma inflação média anualda ordem de 8% só parece satisfatória secomparada com a experiência recente dealtas taxas de inflação das últimas duasdécadas. No contexto de um desempenhoeconômico medíocre, uma inflação médiaanual de 8% representa um crescente des-conforto para quem vive de salário ou re-cebe algum tipo de renda fixa.

Além disso, a estabilidade econômica esocial inclui a estabilidade monetária, masnão pode se limitar a ela. Para os credoresde dívidas, para os rentistas, a estabilida-de monetária pode até ser suficiente. Maspara o restante da população brasileira,numa sociedade tão desigual como a nos-sa, é preciso muito mais do que “estabili-dade”: é preciso “movimento”, um movi-mento que distribua riquezas.

Dessa perspectiva, o governo FHC foium total fracasso. Quando se leva em contaoutros indicadores macroeconômicos (taxade investimento, taxa de crescimento, taxade desemprego e contas públicas), o quese verifica é que o governo FHC não pro-duziu estabilidade, mas uma instabilidadeconcentradora de renda e riqueza.

Menos crescimento,mais desigualdade

Uma das principais características do Bra-sil é a extrema concentração de proprie-dade e de renda, intimamente relaciona-das. A desigualdade é tamanha que mui-tos analistas se perguntam: por que estapanela de pressão ainda não explodiu?

Uma das respostas para essa perguntaestá no crescimento da economia brasilei-ra ao longo do século XX. O crescimento,mesmo preservando a desigualdade, pos-sibilita a mobilidade social. Ou seja: ain-da que em termos relativos se amplie ofosso entre ricos e pobres, o crescimentopermite certa melhora no padrão de con-sumo e na qualidade de vida de amplossetores da população.

Ocorre que, durante o governo FHC, ataxa média anual de crescimento econô-mico tem sido medíocre: 2,4% ao ano noperíodo 1995-2001, quando a média his-tórica do país é de 4,4%.

De Pedro II até FHC, o país teve 28 che-fes de Estado que ficaram pelo menos umano no governo. Quando calculamos astaxas de crescimento médio anual do PIBpara cada um desses chefes de Estado,verificamos que FHC está no grupo dos“perdedores”, aqueles sete chefes de Es-tado com os piores desempenhos em ter-mos de crescimento do PIB (Tabela 2).

Quando comparamos o desempenho daeconomia brasileira com o de outras eco-nomias de porte continental, a constata-ção é a mesma. No período 1995-1999,os dados mostram que a renda per capitada China cresceu 11 vezes mais que a bra-sileira; a da Índia cresceu quase sete ve-zes mais; e a dos Estados Unidos cresceuquatro vezes mais do que a brasileira (Ta-bela 3).

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13 REINALDO GONÇALVES & VALTER POMAR

O crescimento econômico medíocre estáligado a taxas igualmente medíocres deinvestimento. No período 1995-2000 a taxamédia de investimento da economia bra-sileira foi de 19,5% a preços correntes e16,8% a preços constantes (Tabela 4). Es-sas taxas foram inferiores à taxa média dasdécadas “perdidas” (1980-2000).

Ao colocar um freio no desenvolvimen-to econômico, o governo FHC ampliou adesigualdade. Taxas medíocres e decres-centes de investimento resultam, por exem-plo, na elevação da taxa de desemprego etambém na precarização do trabalho du-rante o governo FHC (MATTOSO, 2000;JAKOBSEN et alli, 2000 ).

Enquanto a participação dos salários narenda nacional reduziu-se de 32% em 1994para 26,5% em 1999, a participação docapital aumentou de 38,4% para 41,4%nesse mesmo período (Tabela 5).

A maior participação do capital na distri-buição da renda nacional é, em grande me-dida, explicada pela remuneração elevadados rentistas, beneficiários das elevadas ta-xas de juro real, as mesmas que ajudam aentender o desempenho medíocre da eco-nomia brasileira.

Quando um capitalista investe no lado“real-produtivo” da economia, este investi-mento se traduz em empregos, salários, con-sumo. Portanto, o investimento “transborda”com força para outros setores da sociedade.Já quando o mesmo capitalista investe nolado “virtual-financeiro” da economia, a re-percussão deste investimento em termos deempregos, salários e consumo popular é bemmenor ou até mesmo negativa.

A financeirização da economia não ape-nas freia o desenvolvimento, mas tambémamplia a desigualdade social. O crescimen-to descomunal das dívidas financeiras tor-na-se, portanto, um freio ao desenvolvimen-to do país graças a seu efeito concentradorde riqueza e renda.

A concentração da riqueza e da renda noBrasil, desde 1995, é visível na evoluçãoda remuneração do capital e do trabalho.

No período 1995-2000, o crescimentomédio anual do rendimento real do traba-lhador foi de aproximadamente 3,3%; ataxa média anual de crescimento da mas-sa de salários reais na indústria paulistafoi de 0,5% (Tabela 6).

Já a taxa média de lucro, nas 500 em-presas que constituem o núcleo do capita-lismo brasileiro, foi de 4,1% no período1995-2000. Essa taxa de lucro é maior doque a taxa de crescimento real dos rendi-mentos do trabalhador e do PIB no perío-do, o que é um indicador incontestável deconcentração de riqueza e de renda.

Esta taxa de lucro de 4,1% é menos dametade da taxa histórica de rentabilidadedo patrimônio das empresas do núcleoduro do capitalismo brasileiro, que foi de8,3% no período 1974-2000 (Exame, Me-lhores e Maiores, 2001, p. 22). O que podesugerir que, entre os próprios capitalistas,está ocorrendo um processo de concentra-ção. Hipótese que fica reforçada quandoverificamos qual vem sendo a remunera-ção do capital financeiro.

Tomando-se os nove maiores bancos pri-vados nacionais (de propriedade de brasi-leiros), verifica-se que entre 1995 e 2000a taxa média anual de rentabilidade do pa-trimônio foi de 15,7%. Isto é, os grandesbancos tiveram uma taxa de rentabilidademédia de quase quatro vezes a taxa do ca-pital invertido no lado “real-produtivo” daeconomia brasileira.

Qual o segredo? Uma parte da respostaestá na taxa média de rentabilidade anualdos títulos públicos, que foi de 17,4% noperíodo 1995-2000. Na medida em que osbancos são os principais detentores de tí-tulos públicos, o resultado é a elevada taxade rentabilidade do setor bancário no Bra-sil, mais de seis vezes superior à taxa mé-

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14A ARMADILHA DA DÍVIDA

O grupo Votorantim era até há pouco tempo omaior grupo empresarial de capital nacional. Ini-ciou o ano de 2001 com um patrimônio líquido de8,2 bilhões de reais. Esse grupo é caracteristica-mente de natureza familiar. Há pelo menos 20herdeiros trabalhando em cargos de direção nogrupo, e entre os 62 principais diretores 12 (to-dos homens) têm o sobrenome da família Moraes,que é a controladora. No início dos anos 90 ogrupo montou um banco múltiplo (BancoVotorantim). Durante a década de 1990 obser-vam-se três movimentos simultâneos que têmmarcado a atuação do grupo: perda de posiçãorelativa, expansão das atividades financeiras eparticipação no processo de privatização.

O grupo Votorantim tem origem em uma tece-lagem, em 1918. Na década de 1930 o grupo jápossuía uma fábrica de cimento. Ao longo de 80anos expandiu-se e concentrou-se em atividadesbas de gamme, isto é, setores intensivos em re-cursos naturais e com reduzido dinamismotecnológico. Nestes setores, o grupo Votorantimtem gerenciado estruturas oligopólicas de mer-cado de produtos homogêneos. O grupo tem exer-cido liderança de mercado nas áreas de: níquel(65%), zinco (50%), cimento (42%) e alumínio(30%). O grupo Votorantim tem, atualmente, in-vestimentos em cimento, metalurgia, siderurgia,química, alimentos, mecânica, papel, celulose,energia elétrica e no setor financeiro. No entan-to, este grupo, que foi durante muitos anos o maisimportante grupo industrial do país, tem concen-trado seus investimentos em setores marcadospor estruturas oligopólicas (e, eventualmente,estruturas cartelizadas, como foi o caso do ci-

Retrógrados, rentistas e barões da privatizaçãomento até recentemente), intensivos em recur-sos naturais e com reduzido dinamismo tecnoló-gico.

No início dos anos 90, quando foi fundado obanco múltiplo, o grupo tinha 96 empresas. Hoje,tem cerca de 60 , sendo 25 fábricas de cimento e17 usinas hidrelétricas. O número de emprega-dos caiu de 60 mil no início da década de 1990para 30 mil atualmente (Balanço Anual, GazetaMercantil, 1998, p. 51). O patrimônio líquido dogrupo aumentou de 4,5 bilhões de reais em 1994para 8,2 bilhões de reais em 2000. Nesse mes-mo período, o grupo desceu da posição de pri-meiro maior grupo econômico privado no Brasilpara a posição de 11o maior grupo empresarial.

Ao longo dos anos 90 observa-se, no entanto,que as atividades financeiras do grupo Votorantimse expandiram. O patrimônio líquido do bancoaumentou de 61 milhões de reais em 1994 para576 milhões de reais em 2000. O patrimônio dobanco representou 1,4% do patrimônio total dogrupo em 1994 e 7% em 2000. A crescente econtínua importância relativa do banco no con-junto das atividades do grupo também está ex-pressa nos lucros. O lucro líquido do banco re-presentou 5,3% do lucro total do grupo em 1994,17,8% em 1998, 14,5% em 1999 e 7,5% em 2000.Esses dados indicam, na realidade, que o grupoestá fazendo o percurso inverso do modelo tradi-cional de capital financeiro. Assim, o Votorantim,até recentemente o mais importante grupo indus-trial brasileiro, está se envolvendo cada vez maiscom atividades financeiras. De industriais a finan-cistas ou, melhor dizendo, de industriais arentistas da dívida pública.

dia anual de crescimento do PIB no perío-do em questão.

Não é de estranhar, portanto, que em-presas “produtivas” tenham grande partede seus recursos aplicados em títulos públi-cos.

Como vimos, há uma relação direta en-tre o problema da dívida pública e o mo-delo econômico brasileiro. A dívida pú-blica torna-se um freio ao crescimento euma causa de maior desigualdade na so-ciedade brasileira. Crescer distribuindoriqueza e renda exige, portanto, atacar oproblema da dívida.

A paranóia dosuperávit primário

O governo FHC é responsável pelo maisgrave ciclo de endividamento (internoe externo) da história da economia bra-sileira, ao mesmo tempo em que redu-ziu as taxas de crescimento e investi-mento.

Na verdade, a política econômica do go-verno federal premiou – por exemplo, pormeio dos juros altos – aqueles capitalistas

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15 REINALDO GONÇALVES & VALTER POMAR

que aplicaram seus recursos na área finan-ceira.

O extraordinário aumento da dívida in-terna a partir de 1995 implicou a absorçãode recursos na área financeira que, de ou-tra forma, poderiam ter tido aplicação naesfera produtiva.

É claro que, em qualquer época, os ca-pitalistas sempre aplicam parte de seusrecursos nos mercados financeiros. Umacaracterística da época atual, de hegemo-nia das políticas econômicas chamadas deneoliberais, é exatamente o predomínio dafinanceirização. O governo FHC “apenas”levou essas tendências ao paroxismo.

Durante o governo FHC, a economiabrasileira teve taxas de juros absurdamenteelevadas, das maiores do mundo.

Com taxas de juro real que excederam12% ao ano, não é de estranhar que o Bra-sil tenha tido taxas de investimento me-díocres (inferiores a 20%) a partir de1995.

Empresas não-financeiras deixam de fa-zer investimentos produtivos para comprartítulos públicos. E assalariados cuja rendapermite alguma sobra no final do mês dei-xam de fazer gastos de consumo para fa-zer aplicações financeiras lastreadas emtítulos públicos.

O reduzido dinamismo do lado real da econo-mia brasileira durante os anos 90, aliado aos lu-cros extraordinários das operações financeiras(financiamento da dívida pública a juros escor-chantes) são, provavelmente, os principais de-terminantes desta mudança de orientação es-tratégica do grupo Votorantim. Entretanto, o gru-po tem também se aproveitado das oportunida-des de negócios criadas pelo processo deprivatização. Nestes sentido, o grupo chegou acaptar US$ 1,5 bilhões no mercado internacio-nal em 1995 para adquirir o controle da Compa-nhia Vale do Rio Doce. O grupo Votorantim aca-bou perdendo para o grupo Steinbruch, que tam-bém contou com financiamento internacional.

A derrota no caso Vale do Rio Doce não impe-diu que o grupo Votorantim continuasse se bene-ficiando do processo de privatização. O grupocomprou parte da Companhia Estadual de Ener-gia Elétrica (CEEE) do Rio Grande do Sul, daCompanhia Paulista de Força e Luz (CPFL) e daUsiminas. Neste sentido, o grupo Votorantim temse beneficiado do extraordinário processo de con-centração e centralização de capital na econo-mia brasileira a partir de 1994. O grupo Votorantim(juntamente com o seu “nocauteador”, o grupoSteinbruch) pode ser visto como exemplo de in-dustriais brasileiros que estão se transformandoem “barões da privatização”.

O grupo Votorantim não é, naturalmente, re-presentativo dos grupos empresariais brasilei-ros e, portanto, não pode ser usado para gene-ralizações. Na realidade, este é um caso tão não-generalizável quanto importante. Todavia, elemostra que, dada a estrutura empresarial brasi-leira e a evolução macroeconômica do país ao

longo das últimas duas décadas, o modelo decapital financeiro pode ser colocado de “cabeçapara baixo”.

Assim, no lugar de grupos bancários se trans-formarem em capital financeiro, por meio dainterpenetração entre capital bancário e industri-al, são os grupos industriais que acabam cadavez mais envolvidos em atividades financeiras.O principal fator determinante desse processo é,sem dúvida alguma, o crescimento exponencialda dívida pública.

Nos últimos anos da década de 1990 (maisprecisamente, durante o governo FHC) gruposempresariais marcados pelo dinamismo tecno-lógico (e.g., Metal Leve) foram adquiridos pelocapital estrangeiro. Ao mesmo tempo, os gru-pos privados nacionais mais retrógrados — ex-ploradores intensivos de recursos naturais egerentes de estruturas de mercado altamenteconcentradas (como o Votorantim) – enveredam-se por atividades financeiras. Nestas últimas, ainapetência destes grupos pela alta tecnologiaassocia-se formidavelmente com os baixos ris-cos e a enorme rentabilidade. Ademais, a acu-mulação destes grupos empresariais retrógra-dos ocorre por meio de salto “quântico” com oprocesso de privatização.

Desta forma, industriais transformam-se em fi-nancistas (ou melhor dizendo, rentistas da dívidapública) e “barões da privatização”, que passama ser gerentes de oligopólios (e.g., siderurgia) oumonopólios naturais (e.g., energia elétrica). Noâmbito da economia política o resultado é evi-dente: concentração do poder econômico e polí-tico na mão de grandes grupos empresariais re-trógrados.

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16A ARMADILHA DA DÍVIDA

Para financiar o pagamento destes títu-los, o governo implantou um tremendoarrocho fiscal. O aumento da carga tribu-tária bruta, que cresceu de 28,4% em 1995para 31,7% em 1999, reduziu a renda pes-soal disponível na economia.

A combinação, desde 1995, desse tipode política monetária e fiscal resultou na-quela taxa média anual de crescimento realde 2,4% no período 1995-2001, medíocresegundo qualquer padrão de referência,seja o desempenho histórico da economiabrasileira, seja o desempenho da econo-mia mundial.

No que diz respeito ao desempenho daeconomia mundial, vale destacar que elacresceu a uma taxa média anual de 3,6%no período 1995-2001, enquanto a “loco-motiva” norte-americana cresceu 3,7%anualmente (FMI, 2000).

Na prática, portanto, o governo FHCadotou políticas que reduziram o cresci-mento econômico no Brasil, embora cer-tamente tenham ajudado no crescimentoeconômico verificado nos países capita-

listas centrais. Agora que mesmo aquelespaíses estão num momento de desacelera-ção econômica, o Brasil se vê no pior dosmundos.

Para realizar esta “façanha”, o governo,a mídia e os grandes empresários lança-ram mão de vários mecanismos econômi-cos, políticos e ideológicos.

Um dos mecanismos ideológicos foi acriação de uma “paranóia”: a dos superávitsprimários. O entendimento deste e de ou-tros conceitos é importante para se com-preender os principais problemas de finan-ças públicas no Brasil.

Imaginemos um governo cujas dívidassejam unicamente as relativas ao ano cor-rente. Este governo tem que arrecadar umvolume de impostos necessário para pa-gar suas despesas correntes. Se as receitasforem inferiores às despesas, o governoterá um déficit. Se as receitas forem supe-riores as despesas, o governo terá um su-perávit.

Agora imaginemos que este governo te-nha, além das despesas correntes, dívi-

Os juros no Brasil continuam entre os mais al-tos do mundo. As promessas de FHC de baixaros juros não podem se realizar porque a políticaeconômica está limitada pela vulnerabilidade ex-terna do país e, principalmente, pela escassezde dólares. A abertura econômica faz com que oBrasil dependa dramaticamente da entrada dedólares. Ocorre que, apesar dos excelentes ne-gócios gerados pelas privatizações e pelas com-pras de empresas nacionais por estrangeiros, asituação econômica do país torna o Brasil poucoseguro para os investidores internacionais. Poresta razão, FHC coloca os juros nas alturas, como propósito de atrair capital estrangeiro (dólares)para aplicações de curto prazo. Esta pode pare-cer uma boa idéia para os especuladores, masagrava ainda mais a situação de vulnerabilidadee instabilidade crônica da economia brasileira.

FHC está entre a “cruz e a caldeirinha”. Sebaixa os juros, o capital estrangeiro não entra nopaís, o que provoca um aumento da taxa de câm-

Juros baixos: só quando as galinhas tiverem dentesbio e, provavelmente, uma crise cambial. O re-sultado seria, de saída, o aumento ainda maiorda inflação, que já está de volta. Se aumenta osjuros, a dívida pública (União, estados e municí-pios) explode ainda mais e as contas públicasficam fora de controle, o que aumenta o risco decalote sobre a dívida interna e agrava a situaçãoeconômica do país, com recessão, aumento dodesemprego e da violência. Ao mesmo tempo, acredibilidade de FHC vai para o buraco e o Esta-do perde legitimidade. Cresce, assim, o poten-cial de crise política e institucional.

A abertura econômica precisa ser revertida,com a restrição às importações de bens e servi-ços supérfluos (torradas portuguesas e biquínisamericanos!) e a imposição de fortes controlessobre a entrada e saída de capital estrangeiro. OBrasil precisa, também, de políticas orientadaspara a expansão do mercado interno de consu-mo de massas, acompanhadas por uma profun-da reforma do sistema financeiro nacional.

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das herdadas de anos anteriores. Ele teráque gerar um superávit equivalente às dí-vidas. Senão, incorrerá num déficitoperacional e, caso não queira dar um ca-lote nos seus credores, terá que lançarmão de suas reservas, vender patrimônio,pedir novos empréstimos e “rolar” as dí-vidas (ou seja, trocar dívida velha pordívida nova).

Há duas maneiras de criar um superávit(que chamamos de superávit primário):aumentando as receitas e reduzindo as des-pesas correntes (despesas não-financeiras).

Nisso consiste a “paranóia do superávitprimário”: fazer de tudo para aumentar asreceitas fiscais e para reduzir os gastospúblicos, com o objetivo de sobrar dinhei-ro para pagar a dívida pública.

No governo FHC, a necessidade de fi-nanciamento do setor público está toda

focada no pagamento das dívidas finan-ceiras, mais exatamente dos juros dessasdívidas. Em 1998, por exemplo, houve umequilíbrio (primário) nas contas públicas:as despesas não-financeiras foram equiva-lentes às receitas. Ocorre que o pagamen-to de juros representou 7,5% do PIB e,como resultado, o déficit operacional foide, exatamente, 7,5% do PIB. Em dólarescorrentes, o pagamento de juros foi equi-valente a 60 bilhões ou cerca da metadedo total do investimento produtivo reali-zado no país naquele ano. Resultado: cen-tenas de milhares de postos de trabalhodeixaram de ser criados.

A paranóia do superávit primário temresultados que lembram a parábola da ga-linha dos ovos de ouro. Para gerar su-perávits, o governo corta despesas e am-plia receitas; mas o governo corta despe-

Para conseguir os recursos necessários aopagamento das dívidas financeiras, o governoadotou vários instrumentos, entre eles a chama-da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). “Cha-mada” porque a LRF ajuda a consolidar a dívidaanterior, mesmo que ela tenha sido produto deilegalidades e irresponsabilidades flagrantes. ALei não penaliza, não impede nem coíbe a princi-pal causa de aumento da dívida pública, que é apolítica de juros patrocinada pelo governo fede-ral. Ao contrário: os “prejuízos” do Banco Centralsão automaticamente cobertos pelo Tesouro Na-cional e ações como o socorro aos bancos priva-dos estão livres de qualquer restrição orçamen-tária. A Lei transfere para os municípios e esta-dos a conta da “irresponsabilidade” federal. Afi-nal, os prefeitos e governadores não são os prin-cipais responsáveis pelo crescimento do endivi-damento público ao longo dos últimos sete anos.A “responsabilidade” apregoada pelos autores daLei resume-se ao seguinte: os prefeitos e gover-nadores devem priorizar, custe o que custar, opagamento das dívidas financeiras.

A “responsabilidade” de que falam tem, por-tanto, um claríssimo sentido de classe: trata-sede garantir os direitos dos credores, dos “senho-res da dívida”. Nossa “responsabilidade” deve ser

A Lei de Responsabilidade Fiscaloutra: com o pagamento das “dívidas sociais”,com o desenvolvimento econômico, com as ne-cessidades da esmagadora maioria da popula-ção. A Lei dificulta a ampliação de despesas compessoal e gastos correntes com serviços públi-cos, que só são autorizadas mediante aumentode tributação ou crescimento econômico. Situa-ções insólitas podem acontecer, como a prisão,entre um e quatro anos, de um prefeito ou gover-nador que não aceite demitir professores, médi-cos ou policiais ou mesmo resolva implementarprogramas sociais sem a devida autorização dedespesa e o correspondente aumento da cargatributária. Mas para casos de desvios de dinheiroou negligência administrativa a Lei não prevêpunições. Mesmo com dinheiro em caixa, os go-vernantes não dispõem de autonomia para fazerfrente a seus compromissos legitimados pelasurnas. Novos programas sociais continuados nãopodem ser financiados a partir da melhora da ar-recadação ou do crescimento econômico. Qual-quer nova despesa está condicionada à criaçãoou ao aumento de tributos. As despesas sociaisficam atreladas ao cumprimento das metas fis-cais, ou seja, o pagamento da dívida social ficadependendo do pagamento das dívidas financei-ras.

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sas exatamente de quem ele cobra mais.As vítimas dos cortes, do arrocho e do cres-cimento medíocre são os assalariados e ossetores médios, os mesmos que têm suarenda supertributada pelo governo, paragerar o superávit primário. Chegará o diaem que, como na Argentina de 2001, ogoverno não terá mais como ampliar re-ceitas nem como reduzir despesas. Nessedia, a galinha dos ovos de ouro estarámorta.

Em resumo: a dívida criada pelo gover-no FHC é a principal herança que ele dei-xa para as próximas gerações de brasilei-ros. Por essa razão, diz-se que FHC com-prometeu o futuro no Brasil. O descontro-le das contas públicas é parte essencial dapolítica de FHC, responsável por uma das

maiores transferências de riqueza e de ren-da ocorridas na história do Brasil.

Para inglês ver

No Brasil de FHC, servir as dívidas finan-ceiras tornou-se uma prioridade acima detodas as outras.

A dívida implica o pagamento de juroselevados, a deterioração das contas públi-cas, o aumento da carga tributária, a redu-ção dos investimentos, o baixo nível deatividade econômica.

Isto reduz o potencial de crescimentoeconômico e também a capacidade do Es-tado de combater a pobreza e a desigual-dade social, provoca a degradação dos ser-

Os cenários econômicos para o mundo não sealteraram significativamente após os aconteci-mentos violentos do dia 11 de setembro de 2001,nos Estados Unidos. Em 2000 já se delineavaclaramente um cenário de desaceleração da eco-nomia norte-americana, devido à interação dequatro fatores: queda dos investimentos, redu-ção dos preços das ações, aumento da taxa dejuros e elevação do preço do petróleo.

O governo norte-americano reagiu à situaçãoreduzindo a taxa básica de juros. Houve sete re-duções sucessivas nos oito primeiros meses de2001. A taxa básica de juros (taxa anualizada deempréstimo interbancário de um dia) reduziu-sesignificativamente: de 6,5% em janeiro para 4,5%em abril, e 3,5% em agosto. Na semana seguin-te aos eventos de Nova York e Washington, oBanco Central norte-americano reduziu a taxa dejuros para 3% e, pouco depois, para 2,5%.

Mas o endividamento privado nos EstadosUnidos e o crescimento do passivo externo daeconomia norte-americana atingiram níveis preo-cupantes. E a situação das contas externas dosEstados Unidos tem influência no sistema de ta-xas de câmbio das principais moedas da econo-mia internacional. O problema mais relevante serefere à depreciação abrupta e significativa damoeda norte-americana em relação a outrasmoedas. A redução do valor em moeda nacionaldo patrimônio dos investidores internacionais nosEstados Unidos poderá implicar uma contração

Estados Unidos: déficit público e gastos militaresda liquidez internacional. Na medida em que sereduz o peso de ativos “seguros” (denominadosem dólares) no portfólio dos investidores interna-cionais, há um movimento no sentido de se redu-zir o peso de ativos de maior risco (como, porexemplo, títulos de empresas e governos).

Após o dia 11 de setembro de 2001, os dile-mas persistem. A desaceleração econômica dosEstados Unidos pode se transformar em recessãoprofunda e duradoura. Da mesma forma que an-tes dos atentados, a trajetória econômica demédio prazo dependerá, em grande medida, dadisposição do governo norte-americano de reali-zar gastos públicos substantivos. Mais especifi-camente, a saída era e é transformar o atual equi-líbrio fiscal em um elevado déficit.

No que diz respeito aos efeitos macroeconômi-cos, faz pouca diferença deixar de gastar 100 bi-lhões de dólares em programas sociais para gastá-los em conflitos bélicos. Um engenheiro militarganhando 6.000 dólares na Califórnia tem o mes-mo impacto na economia que dois assistentessociais ganhando cada um 3.000 dólares para tra-balhar nos subúrbios pobres de Nova York.

Na ausência de conflitos bélicos, o presidenteBush provavelmente seria levado a um certo equi-líbrio entre os gastos sociais e os gastos na indús-tria de armamentos. Com os acontecimentos deNova York e Washington, Bush viu-se na confor-tável posição de poder concentrar os gastos nocomplexo industrial e militar norte-americano.

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viços públicos, agravando problemas so-ciais como o desemprego e a violência.

Em decorrência, parcelas crescentes dapopulação se decepcionam com a demo-cracia, com os partidos, com os políticos,com os processos eleitorais. Um dos re-sultados disso é o comprometimento dasinstituições públicas e a tensão política queatravessa o Brasil e todos os países em queo neoliberalismo deitou raízes.

Os analistas conservadores em geral res-tringem o problema do endividamento in-terno a duas questões: custo e prazo. Emoutras palavras: devemos administrar a dí-vida (ampliando os prazos de pagamento ereduzindo os juros), sem questionar as cau-sas e conseqüências do endividamento.

Assim, a visão conservadora propõe “ad-ministrar o presente”, sem alterar as con-dições que deram origem a este presente econdicionam o futuro. Atitude previsívele coerente de quem “proclamou” a inde-pendência política do Brasil mas mantevea dependência econômica; dos que nego-ciaram a abolição mas recusaram a refor-ma agrária; dos que aceitam que o povoeleja os políticos mas tentam impedir quea população decida as políticas.

Do ponto de vista dos que querem nãoapenas administrar o presente mas enfren-tar o passado/presente para criar outro fu-turo, é preciso compreender as causas econseqüências das dívidas e do endivida-mento.

O fenômeno do endividamento públicosó é compreensível visto do ângulo críticoda economia política, sob a ótica “externa”(relação entre diferentes Estados-nação) esob a ótica “interna” (da luta de classes).

É impossível, por exemplo, entender oendividamento sem tomar em conta as re-lações entre as classes sociais (trabalha-dores, capitalistas, pequenos proprietá-rios), os movimentos e características docapital (“produtivo”, “especulativo”), a

dimensão “doméstica” e a dimensão ex-terna da dívida (as pressões do FMI parataxas de juros elevadas, a emissão de títu-los públicos com correção cambial etc).

Após a Segunda Guerra Mundial, amaior parte dos governos não era adeptada “paranóia do superávit primário”, nemfazia da busca do superávit fiscal o leit-motiv de sua ação.

Naquele momento, ao contrário, os go-vernos encaravam a expansão dos gastospúblicos e os déficits fiscais como instru-mentos necessários para estabilizar as eco-nomias capitalistas e, também, para pro-mover o desenvolvimento econômico.

Após a crise dos anos 70 e a introduçãodas políticas neoliberais, importantes gover-nos continuaram a utilizar os gastos públi-cos como instrumento de política econômi-ca, mesmo quando diziam o contrário.

Um exemplo paradoxal é o da econo-mia norte-americana. Tanto a política de-senvolvida pelo governo Reagan (1981-1989) como a fórmula encontrada pelogoverno George W. Bush, iniciado em2001, para tirar os Estados Unidos da tra-jetória recessiva iniciada no final de 2000tiveram por base a expansão dos gastospúblicos.

Outro exemplo a destacar é o da Alema-nha, país reconhecidamente rigoroso quan-to ao equilíbrio das contas públicas. A tra-jetória recessiva da economia mundial em2001 provocou um relaxamento do con-trole orçamentário, de tal forma que o dé-ficit público originalmente previsto, de 1%do PIB em 2001, foi ampliado para pelomenos 2,5% (The Economist, ediçãobrasileira encartada no jornal Valor, 9 deoutubro, p. 12).

Esses exemplos mostram que um défi-cit público orientado para combater a ex-clusão ou para permitir a realização dacapacidade produtiva (e, portanto, sua ex-pansão) é visto como algo positivo até

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mesmo por governos que, na casa dos ou-tros, estimulam a paranóia do superávitprimário.

Mostram, também, que mesmo governoscontrolados pelo capital financeiro perce-bem que um superávit fiscal orientado parao pagamento de juros pode significar umfreio ao desenvolvimento.

Portanto, a “paranóia” do superávit pri-mário imposta pelo FMI e realizada pelogoverno FHC não é equívoco, ingenuida-de, ignorância ou esquizofrenia do presi-dente da República, mas sim uma políticadeterminada e deliberada de concentraçãoe transferência de riquezas.

Ampliando a dependência

Junto com a desigualdade e a democraciarestrita, a dependência externa é uma dasprincipais características da sociedade bra-sileira.

Esta dependência conviveu, durantevários períodos de nossa história, com ci-clos de crescimento econômico. Doisexemplos disso: as décadas de 1950 e de1970, quando os capitais estrangeiros con-tribuíram ativamente para a expansão doPIB nacional.

Nos anos 90, o país também recebeu in-vestimentos estrangeiros de monta. Mas,na ocasião, aqueles investimentos não vie-ram participar de um ciclo de crescimen-to; em compensação resultaram num apro-fundamento sem igual da dependênciaexterna do Brasil.

Dois indicadores deixam isso claro: osaldo em conta corrente e o passivo ex-terno. O saldo em conta corrente conta-biliza as relações do Brasil com os de-mais países do mundo: se o saldo é nega-tivo, isso significa que o país está envi-ando mais recursos para o exterior do querecebendo.

O passivo externo, por sua vez, é a somade nossa dívida externa com o investimen-to estrangeiro no Brasil (no mercado fi-nanceiro, acionário ou sob a forma de in-vestimento direto): o valor resultante in-dica a presença do capital estrangeiro naeconomia brasileira. Se abatermos dessenúmero nossas reservas em moeda estran-geira mais os haveres externos dos ban-cos brasileiros, obteremos um indicadorchamado “passivo externo líquido”. Emoutras palavras: o saldo em conta correnteé uma medida de “fluxo”, enquanto o pas-sivo externo é uma medida de “estoque”.

Em 1991, o saldo de transações corren-tes entre o Brasil e o mundo era negativoem 1,4 bilhão de dólares. Já em 2000, nos-so saldo negativo foi de 24,6 bilhões dedólares. Em apenas uma década, multipli-camos por 17 nosso déficit em transaçõescorrentes. Em percentuais, a relação entreo déficit no balanço de pagamentos (saldode transações correntes) e o PIB aumen-tou de menos de 1% para um déficit de4,4% em 2000 (Tabelas 7 e 8).

Em 1994, nosso passivo externo líquidoera de 185 bilhões de dólares. Em 2000,ele cresceu para 355 bilhões de dólares.Isso indica um aumento da vulnerabilidadeexterna da economia brasileira. Ou seja,hoje somos mais suscetíveis, ou menosresistentes, a pressões, fatores desestabi-lizadores e choques externos.

Uma análise qualitativa da presença docapital estrangeiro na economia brasileiraconfirma que o modelo econômico inicia-do no governo Collor e ampliado e apro-fundado no governo FHC implicou sériosdesequilíbrios nas esferas comercial, fi-nanceira, produtiva e tecnológica (Gonçal-ves, 1999). Mais que isso: FHC quebrou oEstado brasileiro.

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Estado e economia

No âmbito da teoria, há diferentes defini-ções sobre o que é o Estado. Uma das maiscomuns é a definição segundo a qual ele éa instituição que possui o monopólio daforça, da moeda e da capacidade de regu-lar as relações entre os homens e as coi-sas, entre os homens e a natureza e entreos próprios homens na sociedade.

Qualquer que seja a definição, é inegá-vel que nos últimos 50 anos a ação estatalmostrou-se decisiva, especialmente empaíses como o Brasil, no estímulo ao de-senvolvimento econômico e na manuten-ção de algum tipo de bem-estar social.

Falar de finanças públicas é falar dascontas (receitas e despesas) do Estado. Apolítica fiscal tem várias funções impor-tantes, que os especialistas costumam clas-sificar em três tipos: “alocativa”, “distri-butiva” e “estabilizadora”.

A função alocativa diz respeito ao for-necimento dos bens públicos, como a ilu-minação das ruas, a segurança pública e ocontrole da poluição. Como sabemos, umadas características das políticas neolibe-rais é tentar ampliar a esfera do mercado,privatizando os bens públicos.

A função distributiva diz respeito ao usodos dispêndios e da arrecadação de impos-tos. A política fiscal pode ser um podero-so instrumento de distribuição de renda ede redução da desigualdade, por meio dosgastos públicos e da estrutura tributáriaprogressiva.

A progressividade fiscal significa que osgrupos sociais com riqueza e renda maiselevadas pagam proporcionalmente maisimpostos do que os grupos sociais maispobres. Mas a política fiscal também podecumprir um papel regressivo. É o que te-mos visto no Brasil, onde os impostosincidem prioritariamente sobre os assala-

riados e os setores médios. Os grandesempresários escapam, utilizando a lei, asbrechas da lei e a ilegalidade pura e sim-ples.

A função estabilizadora diz respeito aouso do dispêndio e da arrecadação comoparte de uma política macroeconômica.Como vimos na análise do caso brasileiro,a política fiscal também pode estar a servi-ço de uma política econômica que, ao con-trário de estabilizar, provoca instabilidade.

Os governos estão, invariavelmente, emsituações de desequilíbrio nas suas con-tas. Assim, o exame das finanças públicastambém trata da discussão das formas definanciamento do déficit ou da disposiçãodo superávit.

Há basicamente quatro formas de finan-ciar o déficit público: a emissão de moe-da, o endividamento externo, o endivida-mento interno e a venda de patrimônio (so-bre as privatizações, ver BIONDI, 1999).

Quando há um déficit muito elevado eele é financiado pela emissão, gera-se umexcesso de oferta de moeda na economiae a tendência é de ocorrência de inflação.

Deve-se notar, entretanto, que o proces-so inflacionário pode ter outras causas quenão o financiamento do déficit público. NoBrasil recente, ocorreu às vezes o oposto:o déficit público aumentou em decorrên-cia de fatores que foram determinantesbásicos da inflação (maxidesvalorizaçãocambial no início dos anos 80 e no iníciode 1999; grande desvalorização cambial,da ordem de 30%, no primeiro semestrede 2001). Ocorreu, também, de o déficitpúblico aumentar como resultado de políti-cas econômicas orientadas para combatera inflação (é o caso da política de jurosaltos, principalmente a partir de 1995).

Paradoxalmente, o déficit público tam-bém pode ser financiado, até um certo ní-vel, pelo chamado imposto inflacionário,que incide sobre a base monetária (papel-

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moeda em poder do público + reservas dosbancos comerciais). Ao emitir moeda parapagar suas dívidas, o Estado gera inflação,que reduz o valor real daquelas dívidas.Na prática, há uma transferência de recur-sos reais para o Estado, que os utiliza parafinanciar seus déficits (CARVALHO etalii, 2001, p. 94-96).

Estima-se que em uma situação de in-flação anual de 100%, com uma base mo-netária de 2,9% do PIB, o imposto infla-cionário seja de 2% do PIB (GIAMBIAGIe ALÉM, 1999, p. 109). Isto é, com essesparâmetros o governo poderia financiardéficits fiscais equivalentes (em termosreais) a 2% do PIB, por meio da emissãode moeda e de sua depreciação.

Governos podem também tomar emprés-timos ou emitir diferentes tipos de títulos,

no exterior, para financiar os seus déficits.Surge, então, o endividamento externo jun-to a credores internacionais. Os credorespodem ser oficiais (instituições multilate-rais ou bilaterais) ou privados (bancos co-merciais, instituições financeiras, fundosde pensão, fundos de investimento, segu-radoras e outros).

O endividamento interno é outra das for-mas de financiamento do déficit público.Por meio da emissão de diferentes tiposde títulos, os governos e o Banco Centralcontraem dívidas junto a residentes, quepodem ser pessoas físicas ou jurídicas re-sidentes no país, inclusive subsidiárias deempresas transacionais e filiais de bancosestrangeiros atuando no país.

O governo também pode vender títulos,não para financiar seu déficit, mas sim para

Em 1994, o então ministro da Fazenda lançouo Plano Real. Sob o pretexto de derrubar a infla-ção, o governo promoveu uma intensa aberturacomercial. As exportações cresceram muito, masas importações cresceram mais ainda, gerandodéficit crescente na balança comercial. Ao longodesses anos, cresceu também o gasto do paíscom o serviço da dívida externa – o quanto paga-mos de juros e amortização –, com as remessasde lucro, com as viagens internacionais e com opagamento de royalties. Resultado: o Brasil pas-sou a ter um enorme déficit nas transações cor-rentes com os outros países.

Este déficit foi financiado por capitais estran-geiros, que vieram para o Brasil sob a forma deinvestimento, empréstimo ou investimento decurto prazo. O governo estimulou a vinda dessescapitais por meio de vários expedientes, entre elesas altas taxas de juro.

Como resultado, cresceu o estoque da dívidae também o serviço da dívida, tanto externacomo, principalmente, interna. Entre 1994 e1999, o país gastou com juros mais de 250 bi-lhões de reais.

A política de juros altos também teve efeitosdesastrosos sobre as finanças públicas estaduaise municipais. Como boa parte das dívidas des-ses governos estava contratada com taxas de

Plano Real e endividamento públicojuros flutuantes, e que chegaram a mais de 33%ao ano em termos reais em 1995, houve umaexplosão dessas dívidas. Foi o caso da dívida deestados como São Paulo e Rio Grande do Sul,forçados depois a renegociá-las em termos alta-mente desfavoráveis aos seus interesses.

A entrada de capitais estrangeiros contribuiu paraa valorização do real em relação ao dólar. Somen-te o custo de acumulação de reservas internacio-nais no Banco Central pode ser estimado em até76 bilhões de reais, dependendo dos parâmetrosutilizados (considerando-se nesse caso todo o di-ferencial de juros entre o rendimento das reservase a taxa de juros básica do Banco Central).

Uma parte também expressiva da dívida foi acu-mulada em outras despesas decorrentes da polí-tica monetária e cambial praticada nesse período,bem como da disposição do governo de protegera todo custo os interesses do grande capital finan-ceiro. Uma dessas fontes foi o Programa de Estí-mulo à Reestruturação do Sistema FinanceiroNacional (Proer). Depois de negar, contra todasas evidências, que o Proer teria um elevado custofiscal, o Banco Central foi obrigado a reconhecerum prejuízo já realizado de mais de 13 bilhões dereais, valor incorporado à dívida interna.

Além dessas implicações imediatas no cresci-mento da dívida interna, a política econômica do

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controlar a liquidez (isto é, a quantidadede moeda na economia) e evitar a infla-ção. Por exemplo: se há uma entrada mui-to forte de capitais estrangeiros no país,haverá um crescimento equivalente daquantidade de moeda na economia. Comoresultado, pode haver inflação. Para evi-tar isso, o governo pode vender títulos, queserão adquiridos com uma parte daquelaquantidade excessiva de moeda (na práti-ca, troca-se moeda, que tem altíssimaliquidez, por títulos, cuja liquidez é me-nor).

Foi exatamente isso que ocorreu nos úl-timos anos: um forte endividamento ex-terno do setor privado, que poderia causarinflação; para evitar isso, o governo fede-ral optou por vender títulos, o que causouum aumento da dívida pública interna!

Nesse caso, o crescimento da dívida pú-blica interna não tem nada a ver com odéficit público, mas sim com o endivida-mento externo do setor privado. Ou seja:a dívida pública interna pode aumentarcomo resultado do crescimento da dívidaexterna.

Social-democraciade araque

Na história do Brasil, não se pode dizerque as finanças públicas tenham algumavez sido postas a serviço da criação de umEstado de bem-estar social. Apesar disso,o Estado construiu um relevante aparatoadministrativo, produtivo e de políticas

governo FHC também produziu um grande saltoda dívida interna por ocasião da desvalorizaçãocambial de janeiro de 1999.

Para tentar defender uma taxa de câmbio com-pletamente artificial, o Banco Central vendeu de-zenas de bilhões de reais em títulos públicos comgarantia de correção pela variação cambial. Quan-do veio a desvalorização, de aproximadamente50%, mais de 30 bilhões de reais foram adiciona-dos à dívida interna, e embolsados pelos bancosque vinham apostando contra a política cambial.

O mais grave de todo esse quadro é que essegigantesco aumento da dívida pública brasileirase deu no mesmo período em que foram vendi-das empresas estatais federais e estaduais novalor de mais de 60 bilhões de dólares, sem in-cluir as vendas do ano de 1999. Além da explo-são do endividamento, grande parte do patrimô-nio público foi vendida. O Estado brasileiro setornou duplamente mais pobre: aumentou os pas-sivos e diminuiu os ativos. Encontra-se naquelasituação da família que se endivida, vende seupatrimônio para pagar a dívida e ainda assim adívida aumenta.

Mas, se o Estado se encontra mais pobre, éda natureza da dívida pública interna que seto-res privados se encontrem mais ricos. E estessetores são os detentores do capital financeiro,que receberam os juros de agiota pagos durantetodo esse período, detêm os títulos públicos re-presentativos da dívida e ainda compraram uma

grande parte das estatais, liquidadas para garantiro pagamento a eles mesmos.

O acordo assinado entre o Brasil e o FMI emdezembro de 1998 buscava assegurar, além dacontinuidade do envio de recursos ao exterior parao pagamento da dívida externa, a viabilidade dopagamento dos juros da dívida pública interna aosgrandes bancos e capitalistas. O ajuste fiscal, soba ótica do FMI e de FHC, significa cortar gastosem todas as áreas, menos no pagamento dasdívidas financeiras.

Esse é também o espírito dos acordos derefinanciamento das dívidas com os estados emunicípios e da Lei de Responsabilidade Fiscalrecentemente aprovada. O Ministério da Fazen-da passa a atuar, na relação com os estados emunicípios, como a direção do FMI no acordoentre o Fundo e o Brasil: é o responsável pelafiscalização do cumprimento das metas, que vi-sam a assegurar a tranqüilidade daqueles que,depois de receber rios de dinheiro como paga-mento de juros nos últimos anos, se sentiamameaçados pela situação pré-falimentar em quese encontram esses governos.

Fonte: PEREIRA, Fábio. O Plano Real e o cresci-mento da dívida pública no Brasil. São Paulo, FGV/EAESP, 2000. Dissertação de mestrado apresenta-da à Escola de Administraçõa de Empresas de SãoPaulo, Fundação Getúlio Vargas

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públicas, que poderia servir de base paraa construção de um modelo alternativo deeconomia, sociedade e política.

Mas quando a “social-democracia bra-sileira” chegou ao governo federal, em1995, com a eleição do presidente Fernan-do Henrique Cardoso, as finanças públi-cas foram colocadas a serviço de uma po-lítica de desmonte do Estado, socialmenteregressiva e geradora de instabilidade eco-nômica.

A situação fiscal brasileira degradou-se significativamente ao longo do gover-no FHC. A partir de 1995, o desempe-nho medíocre da economia brasileiraestá associado a um aumento importantedos gastos públicos, bem como à ocor-rência de sucessivos déficits públicos(Tabela 9).

Os dados do governo central mostramuma forte tendência de aumento da rela-ção gastos/PIB, que saltou de 14% em1995 para 22,7% em 2000. Em 1995 oTesouro Nacional apresentou um superá-vit, mas a partir de então têm ocorridodéficits crônicos.

Os dados de estoque da dívida públicamostram a mesma situação de deteriora-ção ao longo do governo FHC. O cresci-mento da dívida mobiliária interna foiexponencial a partir de 1995. Em valorescorrentes essa dívida saltou de 62 bilhõesde reais no final de 1994 para 579 bilhõesde reais em junho de 2001 (ConjunturaEconômica, agosto de 2001, p. XI). Issosignifica um crescimento médio anual su-perior a 40% em termos nominais e a 30%em termos reais.

A relação entre a dívida interna líquidado governo central e o PIB aumentou de9,8% em 1995 para 23,4% em 2000, comuma nítida tendência de crescimento du-rante o governo FHC. Nesse período temhavido, ainda, o aumento da dívida públi-ca externa. A relação dívida externa/PIB

mais do que duplicou, tendo aumentadode 3,5% em 1995 para 7,5% em 2000. Oresultado é que a relação entre a dívidalíquida total do governo central e o PIBaumentou de 13,2% em 1995 para 30,9%em 2000.

Essa degradação das finanças públicasparece ser única na histórica econômicabrasileira. Os dados mostram que, para oconjunto do setor público brasileiro, o dé-ficit operacional médio foi de 4,2% noperíodo 1995-2000. Nesse mesmo perío-do houve um superávit fiscal médio de 1%.Isso significa que o pagamento de jurosreais sobre a dívida pública representouem média 5,2% do PIB (Tabela 10).

Comparativamente ao período de altainflação (1980-1994), a situação fiscal bra-sileira (tomando como base as contas dogoverno federal) piorou significativamentedurante o governo FHC. A relação médiajuros reais/PIB aumentou de 4,6% em1983-1994 para 5,2% no período 1995-2000, enquanto a relação média superávitprimário/PIB foi de 2,2% e 1% respecti-vamente. O déficit nominal do PIB foi daordem de 8% durante o governo FHC.

Dívida e aberturacomercial

Os analistas conservadores dizem que odéficit existente nas contas externas doBrasil é causado pelo déficit público. Ouseja: o rombo causado pelos gastos exces-sivos do Estado geraria, por diversos ca-minhos, um déficit em nossas relações como restante do mundo.

Um daqueles caminhos, muito citado,está relacionado ao chamado “custo Bra-sil”: para cobrir o déficit público, o go-verno cobra muitos impostos, o que enca-rece os produtos fabricados no Brasil, di-

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ficultando nossas exportações e amplian-do as importações, gerando déficit na ba-lança comercial.

Outro caminho, também muito citado:devido à alta taxa de juros vigente no Bra-sil, os empresários seriam levados a tomarempréstimos no exterior, aumentando anossa dívida externa e gerando déficit nabalança de serviços.

Novamente, como em toda mentira, nes-ta há um pouco de verdade: sem dúvidaexiste uma relação entre o déficit públicoe o déficit no “balanço de pagamentos”.Mas a relação de causalidade é oposta àapontada pelos analistas conservadores:não é o déficit público que causa o déficitnas contas externas; pelo contrário, é apolítica de abertura econômica (e o resul-tante déficit nas contas externas) que temsido a determinante principal da dívidapública interna.

A abertura comercial e as medidas quefacilitaram a entrada e saída de capitaisentrangeiros, adotadas a partir do gover-no Collor, resultaram num enorme déficit

em nossas contas externas. Para financiareste déficit, mantendo a inflação em ní-veis relativamente baixos e comprimindoos gastos de empresas e famílias, reduzin-do a demanda por importações, o governoFHC manteve extremamente elevadas astaxas de juros. O resultado é simples: ju-ros altos provocam déficit, que, por seuturno, gera maior dívida pública interna,que resulta em mais déficit.

Naturalmente, ao elevar os juros inter-nos, o governo estimulou o crescimentoda dívida externa privada. E no períodoem que houve maior liquidez internacio-nal (ou seja, em que havia mais capitaldisponível para investimentos no Brasil),principalmente em 1996, o governo ven-deu grande quantidade de títulos para evi-tar que a entrada de investimentos estran-geiros resultasse em inflação.

Em termos mais técnicos, o governoaumentou a dívida pública mobiliária fe-deral, com o objetivo de esterilizar o ex-cesso de moeda decorrente do aumento dasreservas internacionais, provocado pela

Indústrias como Gradiente, Bombril e Bardellaganham hoje mais dinheiro no mercado finan-ceiro do que em sua atividade principal. No pri-meiro semestre, 15 companhias abertas obtive-ram resultado financeiro maior do que o lucrooperacional.

No setor de eletroeletrônicos, Semp Toshiba eSpringer vêm, há alguns anos, ganhando maisno mercado financeiro do que com a venda debens de consumo. A Gradiente, ao contrário, vi-nha bem até a venda da participação na NG In-dustrial, fabricante de celulares. Com o negócio,a receita da Gradiente caiu quase 70% em rela-ção ao ano passado, o que resultou em prejuízooperacional. Em compensação, o caixa, reforça-do, era de R$ 322 milhões no fim de junho.

Mas não é preciso caixa para dar lucro. A Men-des Jr. Engenharia, apesar de praticamente pa-rada, mantém-se no azul com um ganho finan-ceiro, resultado contábil de expectativa de vitóri-as judiciais.

A volta da ciranda financeiraCom um perfil que seria mais apropriado a um

banco, elas ganham mais dinheiro no mercadofinanceiro do que na sua atividade principal. Pormotivos diferentes, empresas como Gradiente,Bombril e Ideiasnet – que supostamente deve-riam estar fazendo dinheiro com a venda deeletroeletrônicos, produtos de limpeza e com tec-nologia – estão tendo melhores resultados naaplicação de recursos do que na sua atividade-fim.

PERÍODO: 1° SEMESTRE DE 2001 (R$ MIL)

Fonte: NIERO, Nelson. “Empresas ainda ganhamcom a ciranda financeira”. Valor, São Paulo, 23 deoutubro de 2001, p. A1 e B1.

Resultadofinanceiro

líquido

Lucrooperacional

Bombril 83.558 5.447Guararapes 24.423 - 667Bardella 10.032 - 2.568Bicicletas Monark 6.577 1.964Semp Toshiba 2.071 - 10.960

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entrada de recursos externos (endivida-mento externo, inclusive).

Os dados do Banco Central do Brasilsobre necessidades de financiamento dosetor público para as diferentes esferas degoverno comprovam claramente essas afir-mações. No caso do governo federal veri-ficou-se, inclusive, equilíbrio ou superá-vit primário em 1998-2000. Mas os jurosabsurdamente elevados, inclusive em de-corrência das crises cambiais recorrentes,provocaram gigantescos déficits nominais(Tabela 11).

A mesma situação tem se verificado nocaso dos governos estaduais e municipais,que têm sido vítimas da política de jurosaltos do governo federal. Em 2000, porexemplo, os governos estaduais tiveramum superávit primário de 0,4% do PIB, quefoi mais do que absorvido por um déficitcorrespondente ao pagamento de juros de2,2% do PIB. A situação dos municípiosnão é diferente: o superávit primário foide 0,1% do PIB, enquanto o pagamentode juros correspondeu a 0,4% do PIB no-minal. No caso das estatais, a situação édistinta apenas porque, em 1999 e 2000,houve superávits primários que mais doque compensaram o pagamento de juros.Isto é, as empresas estatais contribuíramem quase 1% para a redução do total dasnecessidades de financiamento do setorpúblico, apesar dos juros absurdos.

A importância do pagamento de jurospara a degradação das contas públicas bra-sileiras, bem como o papel dos juros comofreio ao crescimento econômico, são cla-ramente demonstrados pelos dados. Nogoverno FHC, a relação média entre o pa-gamento de juros sobre a dívida pública eo PIB foi de 6,2%, significativamentemaior do que a média do período 1983-2000, que foi de 4,5% (Tabela 12).

O desempenho do governo FHC tambémfoi inferior, se comparado ao período an-

terior, em termos tanto da taxa de investi-mento como da taxa de crescimento doPIB.

Ao analisarmos a relação entre o paga-mento de juros sobre a dívida pública e ataxa de investimento, verificaremos queaproximadamente um quarto (26,4%) doinvestimento total na economia foi trans-ferido do governo para os rentistas, na for-ma de pagamento de juros. Não é por ou-tra razão que a ciranda financeira retornacom o governo FHC.

Considerando que parte expressiva darenda proveniente de juros fica no circuitofinanceiro, e, portanto, não retorna ao sis-tema produtivo, dá para se ter uma idéia doefeito contracionista dos juros da dívidainterna. Se essa renda tivesse sido gasta pelosetor público, como investimento ou cus-teio, haveria uma injeção de gastos corres-pondente a um quarto dos investimentos.

Tirando mais de quemtem menos

Ao longo do governo FHC houve umaumento significativo da carga tributária,que pulou de 28,4% do PIB em 1995 para31,7% em 1999 (Tabela 13).

Entretanto, essa situação não pode sergeneralizada para as diferentes esferas degoverno. Ela é válida, sobretudo, para ogoverno federal, cuja carga tributária bru-ta aumentou de 18,5% do PIB em 1995para 21,8% em 1999. Esse aumento dearrecadação tributária do governo federalocorreu tanto nas unidades administrati-vas como na Previdência Social.

Em 1999, o governo federal respondeupor aproximadamente 70% da carga tri-butária bruta no Brasil. Isto significa queno final do século XX e no início do sécu-lo XXI a distribuição da carga tributária

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no Brasil tem um padrão muito mais pró-ximo ao do período monárquico do queao do período republicano.

A proclamação da república federativase expressou historicamente com a redu-ção da participação do governo federal naarrecadação tributária. Às vésperas da pro-clamação da república, a centralização eratamanha que o governo federal respondiapor mais de 70% da receita tributária bru-ta (aproximadamente 10% do PIB). Maisde cem anos depois, a carga tributária brutatriplicou e a centralização fiscal foi recu-perada após a longa história de mais deum século de tradição republicana de fe-deralismo fiscal.

No que se refere aos governos estaduais,a situação é distinta, visto que não parecehaver uma tendência seja de aumento, sejade redução da carga tributária bruta. A re-ceita tributária dos governos estaduais édeterminada, em grande medida, pela ar-recadação do Imposto sobre Circulação deMercadorias e Serviços (ICMS), que de-

pende principalmente do nível de ativida-de. Assim, o desempenho medíocre da eco-nomia brasileira tem afetado negativamen-te a arrecadação tributária dos estados.

No que diz respeito aos municípios, pa-rece ter havido uma certa melhora da ar-recadação ao longo do período. Como par-te da arrecadação dos municípios indepen-de do nível de renda (por exemplo, o Im-posto Predial e Territorial Urbano – IPTU),no contexto de aumento de taxas de jurose de endividamento, há maior margem deaumento da arrecadação tributária, embo-ra a situação geral de crise possa ampliara inadimplência e a sonegação.

Quando se analisam os dados sobre areceita disponível após as transferênciasentre as esferas de governo, a tendênciade aumento da receita do governo federalé mantida. A participação do governo fe-deral aumentou de 14,6% do PIB em 1995para 16,9% em 1999 (Tabela 14).

O aumento significativo da carga tribu-tária federal permitiu uma maior transfe-

A descentralização das receitas tributárias de-cidida pelos constituintes de 1988 foi desfeita.Em 1999, a União arrecadou 70,5% dos impos-tos, taxas e contribuições recolhidas no país eficou com 62,3% do total, mais do que a parcelacom que contava antes da Constituinte. Esta-dos e municípios estão tendo que se contentarcom uma fatia cada vez menor da arrecadaçãotributária.

Ao longo dos últimos seis anos, o governo fe-deral conseguiu recompor e até aumentar suaparticipação no bolo tributário em detrimento dosgovernos estaduais e das prefeituras.

A União conseguiu recompor sua participaçãono bolo com a criação de contribuições (o piortipo de imposto, na opinião do próprio governo) eo aumento de alíquotas das já existentes. Umestudo realizado pelo IPEA e pelo Banco Nacio-nal de Desenvolvimento Econômico e Social(BNDES) mostra que, em 1988, cerca de 51%da arrecadação da União eram provenientes deimpostos e o restante de contribuições. No ano

FHC implode o federalismo fiscalpassado, as contribuições já representavam60,7% da arrecadação federal.

Na luta para aumentar sua participação na re-ceita disponível, o governo usou tributos de pou-ca racionalidade econômica, que incidem emcascata e que ajudaram decididamente a distorcero sistema tributário. São exemplos dessa situa-ção a Contribuição para o Financiamento da Se-guridade Social (Cofins), a Contribuição Provisó-ria sobre Movimentação Financeira (CPMF), oPrograma de Integração Social/Programa de For-mação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/Pasep) e a Contribuição Social sobre o Lucro Lí-quido (CSLL).

O uso de contribuições, no entanto, teve umarazão prática. A União não é obrigada a dividir aarrecadação desses tributos com estados e mu-nicípios, como ocorre com parte dos impostos.

Fonte: OLIVEIRA, Ribamar. “União volta a centrali-zar receita e retoma nível pré-Constituição”. Valor,São Paulo, 2 de maio de 2000, p. A3.

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rência para os governos estaduais, quemais do que compensou a perda de arre-cadação desses governos correspondentea níveis mais baixos de atividade econô-mica. Assim, a receita disponível dos es-tados manteve-se relativamente estável noperíodo 1995-1999, graças às transferên-cias feitas pelo governo federal. No casodos municípios, verificou-se um aumentoda receita disponível em decorrência dastransferências federais ao longo do perío-do em questão.

A situação acima não parece se alterarsignificativamente no caso da carga tribu-tária líquida (impostos + taxas + contri-buições - subsídios - benefícios - transfe-rências) do governo federal, que mostrauma nítida tendência de crescimento apartir de 1995 (Tabela 15).

Há uma redução da carga tributária lí-quida dos estados e uma certa estabilida-de da carga tributária líquida dos municí-pios. Em 1999, a carga tributária líquida(como percentual do PIB) dos governosfederal, estadual e municipal era de 9,8%,5,7% e 1%, respectivamente. Isto é, o go-verno federal respondeu por cerca de 60%da carga tributária líquida na economiabrasileira em 1999.

A arrecadação bruta de receitas federaisaumentou significativamente a partir de1995 e, principalmente, depois de 1997.Curiosamente, o aumento da arrecadaçãoocorreu simultaneamente à desaceleração(e ao desempenho medíocre) da economiabrasileira. De fato, a arrecadação bruta dogoverno federal quase duplicou durante ogoverno FHC, pois foi de aproximadamen-te 95 bilhões de reais em 1995-96 e de 176bilhões de reais em 2000.

Mesmo se descontarmos uma inflaçãoacumulada de 40% (IGP-ID acumulado noperíodo 1997-2000), houve um crescimen-to real de aproximadamente 50%. Essecrescimento decorreu, em grande medida,

do aumento do imposto de renda sobre aspessoas físicas, da Cofins e da CPMF. Demodo geral, comparando-se o ano 2000com 1995-1996, pode-se afirmar que oaumento de 80 bilhões de reais de arreca-dação foi proveniente do imposto de ren-da das pessoas físicas (20 bilhões de reais),da Cofins (20 bilhões de reais) e da CPMF(15 bilhões de reais). Isto é, mais de doisterços do aumento de arrecadação derivamde três tributos (um imposto e duas con-tribuições).

Em resumo: o governo FHC aplicou umapolítica monetária contracionista (jurosaltos) e uma política fiscal restritiva (im-postos altos). Assim, é fácil entender tan-to o desempenho medíocre da economiabrasileira durante o governo FHC como aconcentração de riqueza e renda. Afinal,o aumento da carga tributária tem signifi-cado que o governo retira renda da maio-ria das famílias e das empresas para pagaros juros altos devidos aos rentistas.

O principal dilema da política tributáriadurante o governo FHC não reside no au-mento da carga, e sim no destino dado aosrecursos extraídos da sociedade. Afinal,conforme já mencionado, o aumento dosimpostos pode ter diversos efeitos positi-vos sobre a economia e a sociedade. En-tretanto, no caso do governo FHC, o au-mento de impostos tem sido acompanha-do da contração de gastos públicos no ladoreal da economia, ao mesmo tempo em quecrescem as despesas financeiras do gover-no. Essa redução dos gastos públicos(exceto juros), com transferência de ren-da para os rentistas do sistema financeiro,coloca uma trava na economia brasileira eestá na origem da degradação da infra-estrutura do país, inclusive da crise de e-nergia elétrica.

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Para o infinito e além

O aumento da carga tributária poderia tersido utilizado para financiar o processo deacumulação e crescimento da economiabrasileira, por meio de investimentos pú-blicos maciços. Contudo, durante o gover-no FHC o que vimos foi um crescimentoextraordinário da dívida do setor públicoe, principalmente, do governo federal. Osdados mostram que a dívida fiscal líquidado setor público como proporção do PIBaumentou de 30,5% em 1995 para 46%em 2000 (Tabela 16).

O principal responsável por esse desco-munal endividamento foi o governo FHC,cuja dívida líquida total aumentou de13,2% do PIB em 1995 para 30,9% do PIBem 2000. Houve também um aumento nãodesprezível da dívida líquida total dos es-tados e municípios, que passou de 10,6%do PIB em 1995 para 16,2% em 2000. Odesempenho das empresas estatais foi ooposto, visto que a dívida líquida totaldessas empresas reduziu-se de 6,7% doPIB em 1995 para 2,2% em 2000.

Houve, também, aumento do endivida-mento externo das diferentes esferas degoverno (principalmente do governo fede-

O pagamento de juros sobre a dívida pública éuma forte restrição ao desenvolvimento. A impor-tância relativa desse pagamento pode ser facil-mente entendida. Vejamos alguns indicadores.Em 1999, a economia brasileira teve um desem-penho medíocre: a taxa de crescimento da rendafoi de 0,8%, a taxa de desemprego foi de 7,6% eo total dos investimentos no Brasil foi de 182 bi-lhões de reais, isto é, uma taxa de investimentode 18,9% (Conjuntura Econômica, agosto de2001, p. XIX).

Segundo dados do Inesc (Instituto de EstudosSocioeconômicos), em 1999 os encargos finan-ceiros da União totalizaram 58 bilhões de reais.Supondo que os juros pagos sobre a dívida inter-na foram mantidos no circuito financeiro e que es-ses 58 bilhões de reais houvessem sido usadoscomo investimento público, o total do investimen-to teria sido de 240 bilhões de reais. A taxa de

Encargos financeiros X programas sociaisinvestimento teria sido, então, de 25%. Em paísescomo Índia, Coréia do Sul e Polônia essa taxa temsido compatível com um crescimento médio anualdo PIB da ordem de 5% a 6%. O resultado diretoda conversão do pagamento de juros da dívidapública em investimento público é evidente: maiorcrescimento econômico e menor desemprego.

Podemos considerar, ainda, o efeito da dívidapública sobre a desigualdade social. A importân-cia relativa do pagamento dos juros sobre a dívi-da pública pode ser facilmente entendida quan-do esse pagamento é comparado com os gastossociais do governo. Os dados do Inesc para 1999mostram que os encargos financeiros da Uniãode 58 bilhões de reais responderam por 23,8%dos gastos totais. Esses encargos representa-ram 3,9 vezes os gastos com a área da saúde,7,7 vezes os gastos com ensino fundamental e82,3 vezes os gastos com reforma agrária.

Gastos do governo federal: Encargos financeiros e gastos sociais, 1999

Nota: O gasto total exclui o refinanciamento da dívida pública do governo federal (228,3 bilhões de reais).Fonte: Inesc. Políticas públicas e sociais. A execução orçamentária da União de 1999. Brasília, Inesc, 2000, p. 54.

Valor(bilhões de Reais)

Participaçãopercentual nos

gastos totais

Relação entreencargos financeiros

e gastos comprogramas sociais

Total 243,592 100,0 –

Encargos financeiros 57,989 23,8 –

Programas selecionados Saúde 15,046 6,2 3,9 Ensino fundamental 7,513 3,1 7,7 Proteção ao trabalhador 5,455 2,2 10,6 Ensino superior 4,993 2,0 11,6 Transporte rodoviário 1,077 0,4 53,8 Reforma agrária 0,705 0,3 82,3

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ral). A dívida externa líquida do setor pú-blico aumentou de 5,6% do PIB em 1995para 9,7% em 2000. Mais uma vez, o des-taque fica por conta do aumento do endi-vidamento do governo federal, cuja dívi-da externa líquida (como proporção doPIB) mais do que dobrou no período emquestão.

Entretanto, o fato de maior relevância éo crescimento brutal da dívida interna lí-quida do setor público. A relação entreessa dívida e o PIB passou de 24,9% em1995 para 39,5% em 2000. O governo fe-deral é, sem dúvida alguma, o principalvilão dessa história dramática. A relaçãoentre a dívida interna do governo federale o PIB aumentou de 9,8%, em 1995, para23,4% em 2000. O aumento do endivida-mento dos governos estaduais e municipaisé, quase que totalmente, compensado pelaqueda do endividamento das empresas es-tatais. Em 2000, o governo federal e oBanco Central respondiam por aproxima-damente 60% da dívida líquida total dosetor público.

O aumento da dívida interna do setorpúblico decorre, em grande medida, dapolítica de taxas de juros altas do governoFHC. Essa política de juros altos decor-reu, principalmente, da necessidade deobter financiamento para os déficits crô-nicos das contas externas e enfrentar ascrises cambiais recorrentes.

O desequilíbrio externo também está naorigem de uma importante mudança noprocesso de endividamento do governofederal, a saber, a crescente indexação dostítulos públicos à taxa de câmbio.

Quando o governo vende um título pú-blico, ele assume um compromisso: ao fi-nal de um determinado prazo, ele deve pa-gar ao portador do título o valor de facedo título, mais um valor adicional. Estevalor adicional pode ser definido no atoda venda do título (nesse caso, teremos

uma dívida pré-fixada) ou pode ser defi-nido no ato do resgate do título (nesse caso,teremos uma dívida pós-fixada). No casodas dívidas pós-fixadas, é comum se tra-balhar com dois tipos de indexador: a taxade juros ou a variação cambial. Natural-mente, existem as variantes de cada tipode indexador, bem como a combinaçãoentre ambos.

Quando o governo vende títulos pós-fi-xados, baseados na variação da taxa decâmbio, seu objetivo principal é criar ummecanismo de proteção para as empresasno Brasil que têm passivos em dólares.Neste grupo incluem-se todas as empre-sas endividadas em dólares ou aquelascujos proprietários são estrangeiros (sub-sidiárias e filiais de empresas transnacio-nais ou bancos estrangeiros).

As empresas que têm dívidas em dóla-res podem perder muito dinheiro, casohaja uma desvalorização cambial. Porexemplo: se a taxa de câmbio era de 1:1(um real = um dólar) quando a dívida foicontraída e, no momento de pagar a dívi-da, a taxa de câmbio for de 2:1 (dois reais= um dólar), a empresa devedora terá queprovidenciar o dobro de recursos em reaispara poder pagar a mesma dívida em dó-lares.

Imaginemos que esta empresa endivida-da comprou títulos do governo, pós-fixa-dos com base na variação da taxa cambial.Suponhamos que ela comprou 1 milhão dereais em títulos públicos, numa taxa de 1:1,portanto o equivalemente a 1 milhão dedólares. Quando chega o momento do res-gate dos títulos, a taxa de câmbio é de 2:1.Resultado: o governo é obrigado a pagar2 milhões de reais (o equivalente a 1 mi-lhão de dólares).

Nesse caso, quem tomou prejuízo coma desvalorização cambial foi o governo,não a empresa. Por isso, as empresasendividadas em dólar costumam fazer

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hedge (proteção), comprando títulos dadívida pública pós-fixados com base navariação da taxa cambial. Dessa forma,transferem para o governo boa parte, senão todos, dos prejuízos decorrentes deuma eventual desvalorização.

Como o risco de uma desvalorização foicrescente ao longo do governo FHC, aparticipação dos títulos públicos com cor-reção cambial no total da dívida mobiliá-

ria interna também cresceu, de 15,4% em1995 para 26,4% em 2000 (Tabela 17).

Com a indexação da dívida interna dogoverno federal à taxa de câmbio, toda adepreciação cambial implica necessaria-mente aumento da dívida pública interna.Esse fenômeno foi particularmente eviden-te em 1999 e no primeiro semestre de 2001,períodos em que houve forte depreciaçãoda moeda nacional.

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Fio vermelho ou fio preto? Em algunsfilmes de ação, este é o momento de maiortensão, quando o herói tem que escolherqual fio deverá cortar para impedir a ex-plosão de uma bomba-relógio.

No Brasil real, início do terceiro milê-nio, nossa bomba-relógio chama-se dívi-da pública. E para saber quais fios terãoque ser cortados é importante conhecer emdetalhes a composição da bomba. Mas,para isso, é necessário enfrentar a compli-cada terminologia adotada pelos especia-listas, bem como a ausência de alguns da-dos essenciais.

A dívida do setor público inclui as con-tas do governo federal, do Banco Central,dos estados, dos municípios e das empre-sas estatais (federais, estaduais e muni-cipais). Essas contas incluem um conjun-to comum de itens para todas as esferasde governo (dívida mobiliária, dívida ban-cária, depósitos à vista, assunção de pas-sivo, renegociação de dívida, além de “ou-tras” contas, como arrecadação a recolher).

A distinção maior ocorre no caso do go-verno federal, que também incorpora no seuendividamento as contas do Banco Central(base monetária, depósitos compulsórios,

crédito junto a instituições financeiras, car-teira de fundos e outras contas). O governofederal tem, ainda, três outras contas: moe-das de privatização, recursos do Fundo deAmparo ao Trabalhador (FAT) e Previdên-cia Social (Tabelas 18 e 19).

Em 1999 e 2000, a dívida pública exter-na foi de aproximadamente 10% do PIB.Já a dívida pública interna representoucerca de 39% do PIB. Em 2000, o gover-no federal respondeu por 60% da dívidainterna líquida do setor público. O princi-pal componente do endividamento do go-verno federal é a dívida mobiliária (títu-los públicos federais em poder do públi-co). Se a emissão de títulos é o principalpassivo do governo federal, o principalativo decorre de renegociação da dívidade estados e municípios (13,6% do PIBem 2000).

O Banco Central, por seu turno, tem nabase monetária o seu principal passivo(3,6% do PIB em 2000). Entretanto, oBanco Central contribuiu para a reduçãoda dívida interna líquida do governo fede-ral (1,5% do PIB) em decorrência dos seuscréditos junto às instituições financeiras eda sua carteira de fundos.

A radiografia da bomba

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• Dívida mobiliária: Para o governo central, cor-responde ao total dos títulos públicos federais forado Banco Central, incluindo, além dos títulos deemissão do Tesouro Nacional, os títulos de emis-são do Banco Central. Como se trata de dívidaconsolidada, os títulos de emissão do TesouroNacional pertencentes à carteira do Banco Cen-tral não estão incluídos. Para os governos esta-duais e municipais, corresponde ao total dos tí-tulos emitidos pelos respectivos tesouros menosos títulos em tesouraria. Incluem-se os títulos emi-tidos para pagamento de precatórios.• Dívida bancária líquida: Corresponde ao endivi-damento líquido de aplicações do setor público jun-to ao sistema financeiro. Estão incluídas as dívi-das renegociadas com o governo federal relativasà Lei nº 8.727/1993. O endividamento do setorpúblico junto ao Fundo de Garantia por Tempo deServiço (FGTS) também é incluído nessa rubrica.• Arrecadação a recolher: Trata-se de conta queregistra o total de tributos arrecadados pela redebancária e ainda não transferidos aos respecti-vos tesouros. Como é uma conta transitória, re-gistra o total de tributos arrecadados nos últimosdias do mês e que serão creditados ao caixa dostesouros nos primeiros dias do mês seguinte.• Aviso MF-30: Conta cujo saldo líquido do setorpúblico consolidado é zero, registra os créditosda União junto a estados, municípios e suas em-presas estatais, e os débitos desses níveis degoverno para com a União, decorrentes da as-sunção, pelo governo federal, dos passivos ex-ternos dessas entidades.• Moedas de privatização: Correspondem ao to-tal das dívidas emitidas pelo governo federal, uti-lizáveis nos processos de privatização. Incluemos Certificados de Privatização, as diversas dívi-das vencidas e renegociadas e os Títulos da Dí-vida Agrária (TDA).• Recursos do FAT: Compreendem as disponibi-lidades do Fundo de Amparo ao Trabalhador(FAT) e as aplicações compulsórias do FAT noBNDES que se encontram aplicadas tanto noFundo Extramercado do Banco do Brasil comono próprio BNDES.• Base monetária: É o passivo monetário do Ban-co Central e corresponde ao somatório do papel-moeda emitido e das reservas bancárias.• Outros depósitos no Banco Central:Correspondem aos depósitos compulsórios em

Conceitos da dívidaespécie, depositados no Banco Central, inciden-tes sobre depósitos de poupança, depósitos aprazo, fundos de aplicações financeiras e outros.• Créditos do Banco Central às instituições finan-ceiras: Compreendem o total dos créditos doBanco Central junto ao sistema financeiro, de-corrente de empréstimos de liquidez, créditos cominstituições em regime de liquidação extrajudiciale créditos do Proer. Incluem também o crédito doBanco Central junto aos bancos estaduais decor-rente da venda a termo de títulos de emissão doBanco Central (LBC-E) para aquelas instituiçõesfinanceiras (“troca de dívidas estaduais”).• Carteira de fundos: Compreende o total das dis-ponibilidades de fundos que se encontram apli-cados tanto no Fundo Extramercado do Bancodo Brasil como nos setores público e privado.• Demais contas do Banco Central: Correspon-dem à soma líquida de diversas contas ativas epassivas do Banco Central, tais como créditos areceber, outras contas passivas etc.• Previdência Social: Corresponde ao total líqui-do dos créditos e débitos do sistema público deprevidência social com o sistema financeiro.• Renegociação com os estados (Lei nº 9.496/1997): Conta cujo saldo líquido do setor públicoconsolidado é zero, registra os créditos da Uniãocom os estados, decorrentes da Lei nº 9.496, de11.9.1997, e a dívida dos estados com a União.• Depósitos à vista: Compreendem as disponibi-lidades de estados, municípios e empresas esta-tais mantidas em contas de depósitos à vista nosistema financeiro.• Dívida com empreiteiros e fornecedores: Com-preende o total do endividamento em atraso dasempresas estatais federais com os seus forne-cedores e empreiteiros de obras.• Debêntures: Correspondem ao saldo remanes-cente de debêntures emitidos por empresas es-tatais federais.• Carteira de títulos públicos das empresas esta-tais: Corresponde ao total das disponibilidadesdas empresas estatais aplicado em títulos públi-cos, no Fundo Extramercado do Banco do Brasil(empresas estatais federais) ou em fundos deaplicação financeira.

Fonte: BACEN. Manual de Finanças Públicas.Brasília, Banco Central do Brasil, 2001, cap. 5.

Os recursos do FAT e da PrevidênciaSocial têm sido fatores de redução do es-toque da dívida interna líquida do gover-

no federal nos últimos anos. Como desta-que de passivo, resta mencionar o estoquede moedas de privatização, que tem se re-

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duzido ao longo dos anos, mas que aindarepresentava 2,5% do PIB em 2000. Namedida em que o governo continua a a-ceitar as “moedas podres” nos processosde privatização, a tendência é a reduçãodesse passivo.

No que se refere aos governos estaduaise municipais, o principal componente dopassivo é o estoque de dívida junto ao go-verno federal, proveniente das renegocia-ções. No caso dos governos estaduais, adívida junto ao governo federal represen-tou 14,3% do PIB em 2000, enquanto adívida interna líquida desses governos foide 13,1% do PIB. Isto é, os governos esta-duais têm outros ativos que compensamparte da sua dívida com o governo federale, portanto, reduzem sua dívida interna lí-quida. O mesmo ocorre, ainda que emmenores proporções, com os governosmunicipais.

As empresas estatais tinham uma dívidainterna líquida correspondente a 0,9% doPIB em 2000. Esse resultado foi determi-nado, principalmente, pelas empresas dosgovernos estaduais, visto que as empresasfederais têm ativos maiores do que os seuspassivos.

Deve-se notar que, no que diz respeito àscontas consolidadas do setor público, asrenegociações de dívida envolvendo os go-vernos federal, estadual, municipal e as em-

presas estatais envolvem unicamente umatransferência de titularidade (“troca de dívi-das”). Dessa forma, o saldo líquido é zero.

A análise da estrutura da dívida públicainterna mostra, então, que o foco princi-pal do desequilíbrio das contas públicasestá no governo federal. Nesse sentido, oinstrumento principal do enorme desequi-líbrio de estoque (dívida pública) tem sidoa emissão de títulos públicos. A principalrazão desse endividamento é a política dejuros altos do governo FHC. Não é poroutra razão que o próprio governo formu-lou a Lei de Responsabilidade Fiscal, cujoprincipal aspecto é garantir o pagamentode juros da dívida pública.

Os senhores da dívida

O governo não divulga uma desagregaçãoda dívida pública interna que permita umaidentificação social precisa dos credores.Os dados disponíveis mostram, no entan-to, que as instituições financeiras são asprincipais detentoras de títulos públicos.Em 1999, a carteira própria das institui-ções financeiras absorveu 37,7% do esto-que total dos títulos federais em poder dopúblico (Tabela 20).

Os títulos e valores mobiliários repre-sentam uma parcela expressiva do total de

Vendidos o Banco do Estado de São Paulo(Banespa) e o Banco do Estado do Paraná(Banestado), os mais atraentes para o mercado,o governo federal decidiu dar um novo estímuloàs privatizações bancárias e aceitar “moedaspodres” nos próximos leilões de bancos esta-duais. Quem levar o controle dos bancos federa-lizados que restam para venda poderá pagar até90% do preço em títulos federais oriundos dasecuritização de dívidas (Siderbrás, Sunaman,Embraer, Fundo de Compensação de VariaçãoSalarial – FCVS –, entre outros).

Privatização e moedas podresA medida já obteve aprovação tanto do Conse-

lho Monetário Nacional (CMN) como do ConselhoNacional de Desestatização (CND). Proposta peloBanco Central, a autorização dada pelos dois or-ganismos se aplica às privatizações dos bancosestaduais de Goiás (BEG), do Amazonas (BEA),do Maranhão (BEM), do Piauí (BEP), do Ceará(BEC) e de Santa Catarina (BESC).

Fonte: ZAGUIRRE, Mônica. “BC aceitará ‘moe-da podre’ na privatização de bancos”. Valor, SãoPaulo, 10 de outubro de 2001, p. C3.

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ativos do sistema financeiro brasileiro. Aopção das instituições financeiras pelostítulos públicos deriva, entre outras razões,“da busca pela rentabilidade incompará-vel desses papéis frente a qualquer outroativo existente no mercado, se considera-dos o baixo risco, a alta liquidez e o retor-no garantido por eles proporcionados”(ANDIMA – Associação Nacional das Ins-tituições do Mercado Aberto , 2001, p. 67).

Ainda segundo a Associação Nacionaldos Dirigentes do Mercado Aberto(ANDIMA, 2001, p. 34),

“a grande atratividade dos prêmios de ju-ros embutidos no carregamento de papéispúblicos federais – usados como fonte derentabilidade, liquidez (reserva secundá-ria) e hedge – conduziu a uma reestrutura-ção da composição da receita das institui-ções financeiras, com o aumento signifi-cativo da parcela de títulos e valores mo-biliários. Entre 1994 e 1998, tal rubricasaltou de 4,9% para 24% no caso dos ban-cos públicos, e de 8,6% para 26,5% no quese refere aos bancos privados nacionais,que em 1999 chegaram a ter 31,8% de suasreceitas oriundas da aplicação em títulose valores mobiliários”.

Deve-se notar que em dezembro de 1994os títulos da dívida mobiliária federal (empoder do público) representaram 44,7% doestoque total de ativos financeiros, en-quanto os papéis emitidos por empresas(bancárias ou não) representaram 55,3%do total (Tabela 21).

Em 1998, essas proporções tinham sidode 71,4% e 28,6%, respectivamente. Emdezembro de 2000, a participação dos tí-tulos públicos federais chegou a 79,9%.Verificou-se, por um lado, o crescimentoextraordinário da dívida mobiliária inter-na em poder do público (de 13,1% do PIBem 1994 para 45,4% do PIB em 2000).

Por outro lado, a relação entre o estoquede ativos privados e o PIB caiu de 16,1%em 1994 para 11,4% em 2000. Assim,houve não somente uma participação cres-cente dos títulos públicos no conjunto deativos financeiros como também uma re-dução significativa da proporção entre ovalor do estoque dos títulos privados e arenda nacional.

O endividamento público acelerado du-rante o governo FHC repercutiu na com-posição da carteira de ativos do setor ban-cário. Em dezembro de 2000, os títulospúblicos representaram 38,2% do valortotal da carteira de títulos do setor bancá-rio. Essa participação é particularmentemais elevada nos bancos públicos e nosbancos estrangeiros. Nesses casos, os tí-tulos públicos representam aproximada-mente metade do valor total dos títulos nascarteiras dos bancos (Tabela 22).

Estrangeiros e protegidos

Os bancos estrangeiros têm “preferênciarevelada” por títulos públicos com corre-ção cambial. Assim,

“em 2000, do total aplicado pelo setor ban-cário em papéis cambiais, 54% foram paraa carteira dos bancos estrangeiros e 35%para o segmento privado nacional. Os ban-cos oficiais, por sua vez, responderam pelamaior parcela das aplicações em títulos pós-fixados do setor, com 65% do total, refle-tindo a capitalização do Banco do Brasil viaLFT [Letras Financeiras do Tesouro] em1998, para saneamento de sua carteira decréditos” (ANDIMA, 2001, p. 68).

A “preferência revelada” de bancosestrangeiros por títulos com correção cam-bial deve-se, muito provavelmente, ao fatode eles possuírem uma proporção maior de

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No final de 1996, o governo federal, em buscade apoio político das bancadas de regiões me-nos desenvolvidas do país, implanta uma medi-da de desenvolvimento regional: a Medida Provi-sória (MP) 1.532, de 18/12/1996, que concedeuma série de incentivos fiscais – mais amplos doque aqueles contidos no regime automotivo na-cional e não limitados ao imposto de importação– a montadoras de diferentes tipos de veículos(incluindo motocicletas, não beneficiadas pelo re-gime nacional) e produtores de autopeças quese estabelecessem nas regiões Norte, Nordestee Centro-Oeste do país. Alguns desses incenti-vos estavam previstos para durar até o ano 2000,outros até 2010, para quando ficou fixado o fimdo regime regional. O prazo final para adesão aonovo regime por montadoras, inicialmente pre-visto para março de 1997, seria estendido paramaio por ocasião da aprovação da Medida Provi-sória pelo Congresso Nacional, que passa entãoa ser regulamentada pela Lei 9.440 de 13/3/97.Na redação da lei, o prazo final para os fornece-dores é prorrogado para março do ano seguinte.

Como seria de esperar, a primeira manifesta-ção externa contra o novo regime parte da Ar-gentina. Essa posição seria abrandada por con-cessões nas regras do comércio bilateral. O go-verno brasileiro também deve ter previsto novosproblemas no âmbito da Organização Mundial doComércio (OMC), onde a MP foi notificada aoComitê SMC (Subsídios e Medidas Compensa-tórias). Para adesão ao regime especial, são es-tipuladas condições que incluem o requisito decompensação comercial e índice de nacionaliza-ção (de 50% até 2001 e 60% a partir de 2002).Essas medidas contrariam provisões dos Acor-dos TRIMs (Questões de Investimento Externorelativas ao Comércio Internacional) e SMC; mas,aparentemente, um problema adicional na esfe-ra das regras para o comércio internacional foiconsiderado menos relevante do que o apoio, noCongresso, para uma questão de política inter-na: a emenda sobre a reeleição do presidente.

Incentivos, reeleição e empresas automobilísticasEntre as 25 montadoras de diferentes tipos de

veículos que aderiram ao regime regional no pra-zo citado (até maio de 1997), a coreana AsiaMotors, controlada pela Kia, com projeto para serdesenvolvido em Camaçari, na Bahia, foi a queassumiu compromissos de investimento mais ele-vados (US$ 719 milhões). Tendo sido uma dasprimeiras a aderir ao novo regime, a empresa logocomeça a importar veículos com alíquota reduzi-da pela metade, com o compromisso de cumpriro requisito de exportações a partir de 1999, paraquando estava previsto o início de sua atividadeprodutiva no país (Gazeta Mercantil, 20/1/1997).

A crise asiática do final de 1997 levaria a Kia àfalência e o projeto de sua subsidiária deixa deser cumprido. A empresa fica, então, sujeita aopagamento da multa prevista no acordo, devidoaos veículos importados com benefícios fiscaisem 1997. A massa falida da empresa seria pos-teriormente absorvida pela Hyundai, que aindatentava, no início de 2001, livrar-se das multas eobter os incentivos às custas do contrato que foraassinado pela Kia, para reativar o antigo projetodesta empresa.

O projeto proposto pela Asia Motors seria am-plamente superado pelo da Ford que, em 1999,viria transferir seu projeto originalmente destina-do ao Rio Grande do Sul para a Bahia, após aretirada do apoio do novo governo do estado gaú-cho. Isso exigiu uma modificação da Lei 9.440(resultante da aprovação do Congresso, em14/3/1997, da MP dos incentivos regionais), com oestabelecimento de um novo período (até o finalde 1999) para adesão ao regime regional. Os in-centivos associados ao projeto da Ford foram es-timados em US$ 1,3 bilhão e contariam com oapoio de empréstimos do Banco Nacional de De-senvolvimento Econômico e Social (BNDES), doBanco do Nordeste e do governo baiano.

Fonte: HOLANDA FILHO, Sérgio B. “O regime au-tomotivo brasileiro e as consultas na OMC”. Revis-ta de Economia Contemporânea, no prelo.

clientes estrangeiros atuando no Brasil, queprecisam fazer operações de hedge cambial(proteção contra variações nas taxas decâmbio). Naturalmente, os proprietários dosbancos estrangeiros no Brasil exigem lu-cros em moeda estrangeira e, como resul-tado, esses bancos tendem a ter preferênciapor ativos com correção cambial.

A crescente participação dos títulospúblicos nos ativos dos bancos tem efeitodireto sobre a receita. A receita provenien-te de operações com títulos e valores mo-biliários tem tido uma participaçãocrescente na receita total do setor bancá-rio. Essa tendência é válida tanto para ban-cos públicos como para bancos privados.

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38A ARMADILHA DA DÍVIDA

Entretanto, o aumento das receitas oriun-das de aplicações em títulos públicos pa-rece ser mais evidente no caso dos bancosestrangeiros. A participação da receita pro-veniente de aplicações em títulos e valo-res mobiliários na receita total dos bancosestrangeiros aumentou de 4,2% em 1994para 48,9% em 2000 (Tabela 23).

No caso dos bancos estrangeiros, a re-ceita com títulos e valores mobiliários re-presentou quase metade da receita totaldesses bancos em 1999-2000, enquantonos bancos nacionais essa proporção foide aproximadamente um quarto da receitatotal.

Na realidade, a partir de 1995, o que vemse observando no sistema financeiro bra-sileiro é a perda de importância relativadas operações de crédito. É bem verdadeque o peso das operações de crédito e daprestação de serviços é muito maior nocaso dos bancos públicos do que no dosbancos privados (nacionais e estrangeiros).Nos bancos privados e, principalmente,nos bancos estrangeiros, tendem a predo-minar as operações relativas a câmbio e astransações com títulos e valores mobiliá-rios (com predominância dos títulos pú-blicos e preferência pelos títulos públicoscom correção cambial).

Deve-se notar, também, que a evoluçãodo sistema financeiro brasileiro ao longodo governo FHC tem sido marcada por doisprocessos que têm implicações importan-

tes para a dívida pública (interna e exter-na). Esses dois processos são o aumentoda concentração no setor bancário e a cres-cente desnacionalização desse setor.

Em 1995, os 20 maiores bancos respon-deram por 66,5% do total dos ativos dosetor bancário brasileiro. Em 2000 essaparticipação foi de 86% (ANDIMA, 2001,p. 32). O número de bancos diminuiu de246 em 1994 para 192 em 2000.

O processo de desnacionalização do se-tor bancário também é evidente. A parti-cipação dos bancos com controle estran-geiro no total dos ativos do setor bancárioaumentou continuamente ao longo dosanos. Essa participação passou de 7,2% em1994 para 23,9% em 2000 (Tabela 24).

Assim, FHC endivida o Brasil, vendesuas empresas estatais, vende ou facilita aaquisição de bancos nacionais (estatais ouprivados) por bancos estrangeiros e aindatransforma os bancos estrangeiros em im-portantes credores do Estado brasileiro.

Como se tudo isso não fosse suficiente,o governo FHC montou um esquema deincentivos fiscais para as empresas estran-geiras do setor automobilístico. Entre ou-tras conseqüências, a crescente desnacio-nalização da economia causou uma “guer-ra fiscal” entre estados e municípios, queresulta num extraordinário benefício paraas empresas estrangeiras, mas impõe umônus fiscal significativo ao conjunto dasociedade brasileira.

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39 REINALDO GONÇALVES & VALTER POMAR

A historiografia tradicional delimita osgrandes períodos da história do Brasil apartir de alguns “fatos”, de natureza ge-ralmente política, como por exemplo aproclamação da independência (1822) e ada república (1889).

Mas a compreensão adequada da histó-ria brasileira exige que levemos em contaprocessos econômico-sociais, o que trazpara o primeiro plano questões como olatifúndio, a escravidão, a Lei de Terras(1850), as migrações, a introdução do tra-balho assalariado e a industrialização. Semeles, os fatos políticos tornam-se incom-preensíveis e/ou perdem significado.

Sob este prisma, a década de 1850 é umdivisor de águas na história brasileira. A Leide Terras, o império pacificado e consolida-do sob D. Pedro II, a introdução paulatinade modificações nas relações de escravidãoe o peso crescente da produção de café sãocomponentes de um ciclo histórico que seestenderá até a Revolução de 1930.

O governo Vargas oferece as condiçõesadequadas para um impulso industrializan-

te, que marcará outro ciclo histórico, quese estende até o final dos anos 70, quandoo modelo construído ao longo destes 50anos (1930-1980) entra em crise.

Durante os anos 80, o grande empresa-riado brasileiro não se pôs de acordo so-bre como superar a “crise do modelo”.Economicamente conhecida como a “dé-cada perdida”, a década de 1980 foi deintensas mobilização e organização dos se-tores populares: em 1989, uma coligaçãode partidos de esquerda quase vence aseleições presidenciais.

Bastaria isso para explicar por que ogrande empresariado supera suas diferen-ças e se unifica, não apenas em torno deFernando Collor, mas também em tornodo projeto neoliberal (ou “Consenso deWashington”).

Hegemônico durante a década seguinte,o neoliberalismo não apenas fracassou emsuperar a “crise de modelo” como aindapiorou as condições econômicas e sociaisdo país. No que diz respeito às finançaspúblicas, por exemplo, não há na história

A dívida internana históriabrasileira

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40A ARMADILHA DA DÍVIDA

do Brasil registro tão lamentável quanto odo governo FHC.

O único momento que se aproxima dodesempenho medíocre de FHC é o perío-do após a Guerra do Paraguai (1865-1870)e que termina com a proclamação da re-pública (1889).

Neste capítulo, apresentaremos um bre-ve panorama da história das finanças pú-blicas brasileiras do Segundo Reinado(1850-1889) até o final do século XX, comdestaque para as principais tendências re-lativas ao nível da receita e do dispêndiogovernamental, bem como do déficit pú-blico, com ênfase no governo central (ta-bela 25).

Na história econômica do país, houvemudanças significativas na evolução dosistema monetário e das finanças públicas.Por exemplo: desde a Independência atéos dias de hoje, o Brasil teve 12 moedas(Tabela 26).

Mas há tendências claras: as finançaspúblicas, por exemplo, passaram do perío-do de centralização fiscal na época damonarquia para a maior descentralizaçãono período da república, ainda que no go-verno FHC haja cada vez menos federa-lismo e cada vez mais centralização fiscal(Tabela 27).

Devido ao caráter didático deste texto,não há uma preocupação maior em se dis-cutir a composição dos gastos, a estruturadas receitas governamentais, as finançasdos estados e municípios, o financiamen-to do déficit governamental.

Segundo Reinado(1850-1889)

A centralização do poder nas mãos de D.Pedro II refletia-se no fato de que aproxi-madamente quatro quintos das receitas fis-

cais estavam concentradas no governo cen-tral (Goldsmith, 1986, p. 71).

Entre 1851 e 1889, os gastos do gover-no central representaram, em média, 9,6%do PIB, enquanto o déficit médio anual foide - 1,6% do PIB. A relação média entre adívida interna e o PIB foi de 20,2% (Ta-bela 28).

O processo de endividamento interno seagravou durante o Segundo Reinado, ca-bendo distinguir alguns períodos distintos:o primeiro deles vai de 1851 até 1865.

Neste período houve, de modo geral, umequilíbrio nas contas do governo central.O déficit público é pouco expressivo (mé-dia de 0,2%) no período 1851-1865. A dí-vida interna como percentual do PIB semantém relativamente estável, oscilandoem torno da média de 11,6% .

Guerra do Paraguai

A situação mudou significativamente coma Guerra do Paraguai, a partir de maio de1865 até março de 1870. Com a guerra,houve um aumento extraordinário dos gas-tos públicos, que passaram de 9,9% do PIBem 1864 para 13% em 1865 e chegaram a14,4% no auge da guerra, em 1868. Os gas-tos militares absorveram cerca de metadedo orçamento do governo central durantea década de 1860 e aproximadamente trêsquintos deste orçamento durante a guerra(GOLDSMITH, 1986, p. 71). O resultadofoi um aumento do déficit público. No pe-ríodo de guerra, o déficit público corres-pondeu a 5,7% do PIB. O resultado foi ocrescimento relativo da dívida interna,principal instrumento usado para o finan-ciamento do déficit. A relação entre a dí-vida interna e o PIB aumentou de 11,7%em 1864 para 20,2% em 1869.

Deve-se ressaltar que também houve umaumento do endividamento externo com

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o intuito de financiar a guerra. A dívidaexterna aumentou de 7,9 milhões de librasesterlinas em 1864 para 14,7 milhões delibras esterlinas em 1865 (IBGE, 1990, p.586).

A relação entre dívida externa e PIB au-mentou de 8,8% em 1864 para 13,1% em1869, enquanto a relação entre a dívidaexterna e a receita do governo central au-mentou de 124% para 186% neste mesmoperíodo (Tabela 29).

Entretanto, no período 1865-1870, oendividamento externo respondeu poraproximadamente 12% do financiamentototal do déficit.

Conforme mencionado, o endividamen-to interno (empréstimos, emissão de apó-lices e de bilhetes do Tesouro) foi a prin-cipal fonte de financiamento (57% no pe-ríodo), enquanto a emissão de papel-moe-da cobriu 31% do déficit (Carreira, 1889,p. 467).

A partir de então, o problema do endivi-damento interno do governo central ten-deu a se agravar, de forma que os níveisde endividamento do final do SegundoReinado eram piores do que os do iníciodesse período.

No período 1865-1889, a relação médiaentre a dívida interna e o PIB foi de 25%.Ademais, a relação entre a dívida internae o PIB mostrou uma clara tendência decrescimento até o final do período monár-quico. Essa relação cresceu de aproxima-damente 20% em 1868-1869 para cerca de30% em 1888-1889.

O pagamento dos juros sobre as dívidasinterna e externa passou, então, a onerarsignificativamente as contas públicas. Es-tima-se que o serviço dessas dívidas te-nha representado cerca de 40% dos gastosdo governo central a partir da Guerra doParaguai (Goldsmith, 1986, p. 74).

Seca no Nordeste

Outro período marcante da história brasi-leira, na segunda metade do século XIX,do ponto de vista das contas públicas, de-corre da seca que atingiu o Nordeste entre1875-1879.

Aproximadamente 40% do déficit regis-trado no período 1875-1879 (média anualde 3%) deveram-se aos gastos extraordiná-rios nos estados atingidos pela seca: Ceará,Paraíba, Rio Grande do Norte e Piauí (Car-reira, 1889, p. 540). Neste período houve,ainda, investimentos expressivos na infra-estrutura (construção de estradas de ferro,telégrafos e encanamento de água).

No que se refere às fontes de financia-mento do déficit público, cabe destacar queno período de déficits reduzidos (1850-1864) a principal fonte de financiamentoera o endividamento externo.

Como os déficits eram reduzidos, a dí-vida externa mostrou um crescimentomoderado, tendo passado de 6,2 milhõesde libras esterlinas em 1850 para 7,9 mi-lhões de libras esterlinas em 1864.

No período da Guerra do Paraguai(1865-1870), a situação se alterou radical-mente, na medida em que as fontes inter-nas de financiamento passaram a predo-minar. Nesse período se apelou não somen-te para empréstimos, mas também para aemissão de moeda.

Nas duas décadas seguintes, os déficitsforam ainda mais elevados. Esses déficitspassaram a ser financiados, na mesma pro-porção, por empréstimos internos e exter-nos. A emissão de moeda teve um papelmenos importante como fonte de financia-mento do déficit do governo central no pe-ríodo 1870-1889 (Tabela 30).

Conforme mencionado, a centralizaçãodurante o Segundo Reinado era significa-tiva. O resultado é que

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42A ARMADILHA DA DÍVIDA

“a dívida das províncias, ao fim do perío-do, de pouco acima de 50 milhões de mil-réis (dos quais quatro quintos possuíamfundos), ou aproximadamente 3% do pro-duto interno, correspondia a apenas cercade 8% da do governo central, sendo a dosmunicípios consideravelmente menor. Asprovíncias e municípios não realizavam,por esse motivo, grandes demandas sobreo mercado de capitais e seus títulos parti-cipavam apenas moderadamente na car-teira dos investidores” (Goldsmith, 1986,p. 79).

No que se refere à distribuição regionaldas finanças públicas, a característica maismarcante é a perda de importância relati-va dos estados do Nordeste e o aumentoda importância de São Paulo, dos estadosdo Norte (produção de borracha) e do Cen-tro Oeste (ibid., p. 78).

O deslocamento da produção de café doVale do Paraíba, no Rio de Janeiro, para ointerior de São Paulo também significouuma perda de posição relativa da capitaldo império.

República Velha(1889-1930)

As transformações foram bastante ex-pressivas durante o período inauguradopela abolição da escravidão e pela procla-mação da república. O crescimento eco-nômico na década de 1890 não foi muitosignificativo, apesar do surto industrial(substituição de importações) provocadopela política tarifária e pela desvaloriza-ção cambial (Villela e Suzigan, 1973, p.127-133). A economia brasileira sofreu,ainda, os efeitos da política ortodoxa deJoaquim Murtinho em 1898-1901, carac-terizada por apreciação cambial, redução

do estoque de moeda e equilíbrio orçamen-tário (Peláez e Suzigan, 1976, p. 180).

A partir da virada do século, a econo-mia brasileira apresentou taxas elevadasde crescimento econômico. Vários fato-res contribuíram para essa fase de prospe-ridade: forte imigração, investimentos pú-blicos em infra-estrutura, aumento dasexportações, melhoria na relação de tro-cas e na capacidade de importar (Gonçal-ves, 1981).

As finanças públicas oscilaram entreperíodos de expansão e fases de conten-ção. De modo geral, não se observa mo-mentos de grandes desequilíbrios orça-mentários (Tabela 31).

Neste período, a relação média entre osgastos públicos e o PIB foi de 9,5%. Arelação média entre o déficit público e oPIB foi de 1,1%. Deve-se mencionar queeste é um dos períodos da história brasi-leira em que houve um número expressi-vo de anos com superávit nas contas pú-blicas: em 7 dos 24 anos do período regis-trou-se superávit.

No que diz respeito à dívida interna, ve-rificou-se uma clara tendência de reduçãoda relação entre a dívida interna e o PIB. Oalto nível de endividamento herdado doperíodo monárquico foi reduzido. A rela-ção dívida interna/PIB diminuiu de 24,7%em 1889 para 11% em 1913. A redução daimportância relativa da dívida interna sebeneficiou das políticas de equilíbrio or-çamentário dos governos republicanos,bem como do crescimento econômico (e,portanto, do crescimento da receita fiscal).

Por outro lado, os primeiros governosrepublicanos aumentaram sobremaneira oendividamento externo do país. A relaçãoentre a dívida externa e o PIB aumentoude 14,2% em 1889 para 35,7% em 1913(Tabela 32).

Esse indicador de endividamento tomacomo referência a dívida externa medida

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em moeda nacional e, portanto, sofre ainfluência da taxa de câmbio.

Assim, a dívida externa aumentou de 282milhões de mil-réis em 1889 para 2,186bilhões de mil-réis em 1913, isto é, umcrescimento médio anual de 8,9%. Essataxa foi maior do que a de crescimento dadívida interna, de 6,1% no período 1889-1913.

Se considerarmos o valor da dívida ex-terna em libra esterlina, verificaremos quea dívida passou de 31 milhões de librasesterlinas em 1889 para 145 milhões delibras esterlinas em 1913, isto é, um cres-cimento médio anual de 6,6%.

A taxa de câmbio apresentou grandeoscilação no período, mas se tomarmos osanos inicial e final observaremos que hou-ve uma depreciação nominal da ordem de60% (a taxa de câmbio, que era de 9 mil-réis por libra esterlina, aumentou para 15mil-réis por libra esterlina). Em outraspalavras, a desvalorização nominal docâmbio explica parte do crescimento dadívida externa, quando expressa em moe-da nacional.

Entretanto, se considerarmos que a taxamédia de inflação anual no Brasil foi daordem de 3,5%, veremos que a taxa anualmédia de crescimento real da dívida inter-na foi de aproximadamente 2,5% no pe-ríodo 1889-1913.

Essa taxa é significativamente inferiorà taxa de crescimento anual (6,6%) da dí-vida externa medida em libras esterlinas.Mesmo descontando a taxa de inflação naInglaterra no período em questão, de 0,6%ao ano (LEWIS, 1978, p. 70), permaneceuma diferença razoável, da ordem de 3,5%,entre as taxas de crescimento real das dí-vidas interna e externa.

Esse diferencial significou que, em ter-mos reais, a proporção entre dívida exter-na e dívida interna duplicou em um perío-do de 20 anos. Isto foi o que, aparente-

mente, ocorreu entre a proclamação darepública e a Primeira Guerra Mundial.

O resultado desses processos foi o au-mento do pagamento de juros, principal-mente no que se refere à dívida externa(Tabela 33).

A relação entre pagamento de juros ereceita do governo aumentou de cerca de12% nos primeiros anos da república paramais de 20% nos anos anteriores à Primei-ra Guerra Mundial. Esse aumento pode serexplicado, quase que totalmente, pelo au-mento do pagamento de juros sobre a dí-vida externa. Essa situação se repete nocaso do pagamento de juros como percen-tual do PIB.

Assim, nas primeiras décadas da Repú-blica Velha verificou-se que os desequilí-brios orçamentários do governo centralnão significaram um agravamento do pro-blema da dívida interna. Muito pelo con-trário, houve até mesmo uma redução daimportância relativa dessa dívida, em de-corrência do crescimento econômico ob-servado, principalmente, a partir da vira-da do século. Entretanto, nesse período ogoverno central apelou, de forma signifi-cativa, para os recursos externos. E, por-tanto, houve incrementos importantes nosindicadores tanto de crescimento do esto-que da dívida externa como do pagamen-to de juros.

Em 1913, o governo central pagou, dejuros da dívida externa, quase o dobro doque pagou de juros da dívida interna. E,ademais, esses recursos absorviam umaparcela expressiva (aproximadamente20%) dos recursos públicos.

A proclamação da república implicouuma menor centralização orçamentária.Assim, em meados da década de 1850, namonarquia, o governo central respondiapor cerca de três quartos da receita tribu-tária total. Na República Velha observou-se um declínio significativo da participa-

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ção do governo central na arrecadação tri-butária. Para ilustrar, a participação dogoverno central na arrecadação diminuiude aproximadamente dois terços em 1907para metade em 1931. A república federa-tiva expressou-se, concretamente, na es-trutura da arrecadação tributária no senti-do da maior importância relativa, princi-palmente, dos estados (Tabela 34).

Essa mudança esteve também associadaa uma redistribuição regional das receitas edos gastos. Neste período manteve-se a ten-dência de perda da importância relativa doRio de Janeiro e dos estados do Nordeste.

A participação de São Paulo no total dasreceitas dos governos estaduais aumentoude 12% em 1886 para 33% em 1913, en-quanto a participação do conjunto dos es-tados do Nordeste diminuiu de 29% para23% neste mesmo período (GOLDSMITH,1986, p. 78). A participação do Rio Janei-ro caiu de 16% em 1886 para 5% em 1913.

No período final da República Velha(1913-30), manteve-se a tendência de des-centralização das finanças públicas, quevinha da proclamação da república. A par-ticipação dos estados na receita aumentoude 27% em 1913 para 35% em 1929. Esseaumento ocorreu em detrimento do gover-no central, visto que a participação dosmunicípios se manteve relativamente es-tável (oscilando em torno de 10%).

A Era Vargas

A Revolução de 1930 inaugura um novoperíodo na história do Brasil. O capitalis-mo se desenvolve intensamente, com ên-fase na industrialização e na urbanizaçãodo país.

Do ponto de vista das finanças públicas,a Era Vargas (1930-45) interrompe a ten-dência de descentralização das finançaspúblicas. A participação relativa do gover-

no central na arrecadação tributária girouem torno de 55%, enquanto a participa-ção dos estados foi de aproximadamente35% e a dos municípios de cerca de 10%.

Outra diferença marcante: no períodofinal da República Velha, havia ocorridouma nítida tendência de redução das re-ceitas, das despesas e dos déficits do go-verno central. Assim, a relação média en-tre os gastos do governo central e o PIBreduziu-se de 9,5% no período inicial daRepública Velha (1890-1913) para 8,5%no período 1913-1929 (Tabela 35).

No que se refere à dívida interna, verifi-cou-se também uma redução. A relaçãoentre a dívida interna do governo centrale o PIB reduziu-se de 13,4% em 1890-1913 para 11,7% em 1914-29. Por outrolado, a relação média déficit público/ PIBaumentou de 1,1% em 1890-1913 para 2%em 1914-1929.

Na Era Vargas, por sua vez, houve umpequeno aumento relativo dos gastos dogoverno central, bem como do déficit pú-blico. A relação média gastos/ PIB foi de8,8% e a relação déficit público/ PIB foide 1,7%.

Houve, de fato, uma razoável oscilaçãoem torno dessas médias e não se consta-tou nenhuma tendência clara de aumento.Houve anos em que ocorreram aumentosabruptos das despesas, como, por exem-plo, em 1932, em decorrência da chamadaRevolução Constitucionalista e da seca noNordeste. A política de compra da produ-ção excedente de café também teve umimpacto não desprezível sobre os gastospúblicos entre 1933 e 1937.

Durante a Era Vargas foi interrompida atendência de queda da relação dívida in-terna/ PIB, que oscilou bastante neste pe-ríodo. Não obstante, a evidência mostraque esta relação média no período 1930-45 (9,4%) foi inferior à relação média doperíodo 1913-29 (11,7%).

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Ademais, cabe ressaltar que no períododa Segunda Guerra Mundial houve umaredução significativa tanto da dívida in-terna como da dívida externa.

A dívida interna do governo federal tevecrescimento em termos absolutos, mas emdecorrência do crescimento real do PIB(11% acumulados no período 1940-45) eda inflação (mais de 60% acumulados), arelação dívida interna/ PIB caiu de 12,5%em 1940 para 7% em 1945.

A dívida externa, por seu turno, sofreuuma redução significativa em decorrênciado processo de renegociação em 1943:“Estima-se que os ganhos brasileiros as-sociados à redução de taxas de juros e res-gate de títulos com deságio tenha sido daordem de 110 milhões de libras, reduzin-do à metade a dívida total de 220 milhões”(Abreu, 1990, p. 101).

Assim, na Era Vargas se verificou umatendência de redução significativa da dí-vida externa, mas não houve uma tendên-cia clara de redução relativa da dívida in-terna. Não obstante, a relação média dívi-da interna/ PIB diminuiu nesse período.

O endividamento do governo federaldurante a Era Vargas foi reduzido signifi-cativamente quando comparado ao perío-do da República Velha.

As proporções entre as dívidas (internae externa) e o PIB, bem como entre as dí-vidas e a receita governamental, reduzi-ram-se significativamente. A relação dí-vida total/ PIB diminuiu de 45% em 1931para 11% em 1945, em grande parte comodecorrência da redução da dívida externa(Tabela 36).

A relação entre dívida total e receitagovernamental caiu de 636% em 1931 para171% em 1945.

A posição das finanças públicas melho-rou significativamente no período de 1914a 1945. Durante o período da RepúblicaVelha, houve uma queda significativa da

dívida interna, enquanto na Era Vargashouve uma redução extraordinária da dí-vida externa (em relação tanto à impor-tância relativa como ao valor absoluto).

O resultado do menor endividamentopúblico foi a redução das despesas comjuros no período 1930-45. A participaçãodo serviço da dívida pública no total degastos do governo federal caiu de 30% em1929 para 19% em 1939 e 13% em 1945(Tabela 37).

No que se refere às finanças estaduais emunicipais, houve não somente um au-mento da importância dos estados e dosmunicípios nas receitas públicas, mas tam-bém no estoque da dívida pública.

A evidência empírica disponível é pre-cária e indica um aumento expressivo dadívida pública interna dessas instâncias degoverno.

No que diz respeito à dívida externa dosestados e municípios, “até 1931, os esta-dos e os municípios, em especial São Pau-lo e Rio de Janeiro, realizaram emprésti-mos no exterior, principalmente em NovaYork, em escala considerável” (Goldsmi-th, 1986, p. 212). Ocorre que “a partir daíos empréstimos cessaram, e os saldos pen-dentes foram bastante reduzidos através deamortizações e, aproximadamente ao fimdo período, por depreciação” (ibid., p. 212).

A conclusão mais importante a respeitodas finanças públicas no período em ques-tão talvez seja a seguinte:

“Fica, portanto, evidente que a inadimplên-cia temporária e as depreciações perma-nentes de sua dívida externa foram decrucial importância para o balanço de pa-gamentos e as finanças das instituiçõespúblicas do país, não apenas entre 1932 e1945, mas também no período imediata-mente do pós-guerra” (GOLDSMITH,1986, p. 211).

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46A ARMADILHA DA DÍVIDA

Da “redemocratização”ao golpe

Nesse período, os gastos do governo fe-deral responderam, em média, por 8% doPIB, enquanto o déficit médio anual foide 1,1% do PIB (Tabela 38).

Comparativamente ao período entreguerras, observou-se uma redução relati-va dos gastos e manteve-se o nível de dé-ficit. Entretanto, há dois momentos distin-tos neste período.

Nos dez anos que se seguiram ao finalda guerra, verificou-se uma redução darelação gastos/PIB, ao mesmo tempo emque houve déficits muito pequenos, e atéalguns anos de superávit fiscal.

A partir de 1955, no chamado períododesenvolvimentista, ocorreu uma clara ten-dência de aumento dos gastos públicos edos déficits. Assim, a relação média gas-tos/PIB aumentou de 7,5% em 1945-1955para 8,8% em 1956-1964, enquanto o dé-ficit público aumentou de 0,4% para 2%,respectivamente.

Não obstante o incremento dos gastose do déficit, houve em todo o período1945-1963 uma tendência nítida e firmede redução da dívida interna. No final doperíodo, a dívida interna tinha diminuí-do significativamente. Conseqüentemen-te, o pagamento de juros sobre a dívidado governo central caiu de 15% do totaldas despesas em 1945 para 3% em 1964(GOLDSMITH, 1986, p. 315). Vale res-saltar que no período em questão o avan-ço do processo inflacionário implicoutaxas de juros reais negativas. Para ilus-trar, os títulos dos governo federal tinhamtaxas de juros nominais da ordem de 7%enquanto a inflação superava os 10% nosanos 50 (ibid., p. 278). A redução da taxade juro real sobre a dívida publica ten-

deu a aumentar a partir de meados dosanos 50.

Considerando o conjunto do setor pú-blico (federal, estadual e municipal), ve-rificou-se também a tendência de perda deimportância relativa da dívida interna, detal forma que a relação entre dívida inter-na e PIB caiu de 16,9% em 1945 para13,1% em 1954 e para 3,7% em 1964 (Ta-bela 39).

No imediato pós-Segunda Guerra, a dí-vida interna do governo federal não se al-terou significativamente. O endividamen-to mais expressivo foi dos estados e mu-nicípios. Assim, entre 1946 e 1952, en-quanto a dívida interna do governo cen-tral se mantinha relativamente estável (emtermos nominais e, portanto, diminuindoem termos reais), a dívida interna dos es-tados e municípios mais do que duplicou(MALAN et alii, 1980, p. 487).

Ocorre que a Constituição liberal de1946 criou condições mais favoráveis parao federalismo fiscal. O resultado foi que aparticipação do governo central no totalda dívida pública diminuiu de 53% em1945 para 38% em 1952.

A redução significativa da dívida públi-ca interna também foi acompanhada peladiminuição da dívida externa. De fato, aolongo das duas décadas que se seguem aofinal da guerra houve praticamente a eli-minação da dívida externa, que passou de10,2% do PIB em 1945 para 0,2% em1964. A dívida externa voltou a ser umsério problema para a economia brasileiranos últimos dez anos do regime militar.

A participação do governo federal no to-tal das finanças públicas oscilou em tornode 50%. Os estados e municípios, por seuturno, tiveram déficits moderados (média re-lativamente estável de 0,6% do PIB total).

No que diz respeito ao gastos públicos,uma característica marcante do período foique parte expressiva desses gastos esteve

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associada aos investimentos em infra-estrutura. Estima-se que a formação brutade capital fixo do setor público tenha sidosuperior ao déficit em mais de 50% e te-nha absorvido aproximadamente 20% dosgastos governamentais (ibid., p. 309 e p.312). Em síntese, o aumento dos investi-mentos e a aceleração do crescimento eco-nômico (bem como o avanço da inflação)estiveram associados ao incremento dosgastos e dos déficits do setor público, aomesmo tempo em que houve uma melho-ra significativa da situação de endivida-mento do setor público (tanto da dívidainterna como da externa).

A ditadura militar

A ditadura militar instalada pelo golpe de1964 durou até o início de 1985, tendodesenvolvido ao longo desse período di-ferentes políticas econômicas.

No período 1964-1979, os governos mi-litares mantiveram a tendência de aumen-to dos gastos públicos herdada da épocadesenvolvimentista pós-1955. Ainda quenão haja uma tendência nítida de aumentoao longo do período, a relação média en-tre os gastos do governo central e o PIBaumentou para 10,4% (mais elevada doque a média de 8,8% do período 1956-1963; ver Tabela 40).

Não obstante esse aumento dos gastos,o orçamento público (Tesouro Nacional)manteve-se relativamente equilibrado. Arelação média déficit/PIB foi de 0,2%, in-ferior às médias dos déficits no períododo pós-Segunda Guerra Mundial (0,4%) eno período desenvolvimentista (2%).

Na década de 1970, o aumento do in-vestimento e a elevada taxa de crescimen-to do PIB foram determinados, em grandemedida, pela política de crédito do gover-no e pelo comportamento das empresas

estatais. Governos e empresas estatais res-pondiam por aproximadamente metadedos investimentos totais. A expansão dasempresas estatais exigiu financiamentopara o grande volume de investimentosrealizados no período. As empresas esta-tais recorreram a empréstimos e financia-mentos na medida em que os recursos in-ternos respondiam somente por uma par-cela de suas necessidades financeiras –aproximadamente metade dos recursospara investimento no período 1965-1975(Lago, 1990, p. 269).

O aumento dos gastos esteve associadoà tendência de aumento da dívida interna.A relação entre a dívida do governo cen-tral e o PIB aumentou de 0,6% em 1964para 6,7% em 1980. Deve-se observar quenos últimos anos do governo Geisel essarelação aproximou-se de 10%. No perío-do 1964-1979 a relação média dívida in-terna/PIB foi de 5,2%, isto é, mais do queo dobro dessa mesma relação nas duasdécadas posteriores à Segunda GuerraMundial. Assim, no regime militar, a dí-vida interna, que praticamente tinha desa-parecido, retornou como uma fonte de de-sequilíbrio das contas públicas.

A partir do início dos anos 70, paralela-mente ao aumento da dívida interna, hou-ve o crescimento significativo do endivi-damento externo. Estima-se que a relaçãomédia entre a dívida externa do governofederal e o PIB aumentou de 7,4% em 1968para 13,9% em 1980 (Tabela 41).

A dívida pública externa, que era de 2,4bilhões de dólares em 1960, aumentou para4,7 bilhões de dólares em 1970 e 17,9 bi-lhões de dólares em 1975 (BID, 1985, p.424).

O endividamento externo mais extraor-dinário ocorreu no governo Geisel: em1980 a dívida externa do setor público erade 50,9 bilhões de dólares. O resultadomais direto desse grande endividamento

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48A ARMADILHA DA DÍVIDA

foi o aumento do serviço da dívida exter-na, que saltou de menos de 400 milhõesde dólares em 1970 para 8 bilhões de dó-lares em 1980 (ibid., p. 429). A gravidadeda crise da dívida externa chegou a talponto que o serviço da dívida externa to-tal representou 8,7% do PIB em 1982, sen-do que dois terços da dívida eram do setorpúblico (CERQUEIRA, 1997, p. 148). Co-meçou, então, o longo período de instabi-lidade e crise da economia brasileira, quecontinua até os dias de hoje.

No que se refere às finanças estaduais emunicipais, ocorreu também o aumento dadívida interna. Esse endividamento repre-sentou, entretanto, uma pequena fração dadívida do governo federal. No que se refe-re à dívida externa, o envolvimento dosgovernos estaduais e municipais foi peque-no (GOLDSMITH, 1986, p. 496).

No final de 1980 iniciou-se um profun-do processo recessivo e a taxa de inflaçãoanual superou os 100%. O desequilíbriohistoricamente marcante ocorreu em 1982,com a eclosão da crise da dívida externa:estamos na “década perdida”.

Período de turbulências

Embora igualmente marcado pelas altastaxas de inflação, o período que vai de1980 até 1994 pode ser subdividido emtrês subperíodos. O primeiro foi o do tér-mino do regime militar (1980-1984); osegundo foi o da “Nova República” (1985-1989); e o terceiro (1990-1994) começoucom as eleições presidenciais de 1989,passou pelo impeachment de Collor em1992 e pelo processo de hiperinflação(1993-1994), desembocando no PlanoReal (julho de 1994) e na eleição de FHC(1994).

A situação fiscal foi distinta em cada umdestes períodos, ainda que as altas taxas

de inflação e os desequilíbrios externos(decorrentes do problema da dívida exter-na) tenham sido os determinantes econô-micos comuns nestes subperíodos.

O término do regime militar e o inícioda redemocratização do país determinaramum período marcado por forte instabilida-de econômica, com desempenho medío-cre da atividade econômica e altas taxasde inflação. Deve-se notar que as taxasanuais de inflação superiores a 200% di-ficultam o cálculo do resultado fiscal.Além disso, há sérios problemas deconfiabilidade nos dados disponíveis(GIAMBIAGI e ALÉM, 1999, p. 102).

Durante o último governo militar (1980-1985) os gastos do governo federal (Te-souro Nacional) mantiveram-se relativa-mente estáveis como proporção do PIB eforam registrados superávits fiscais emtodos os anos (Tabela 42).

Em termos de valores correntes, a pro-porção entre a dívida mobiliária interna(em poder do público) e o PIB não sofreugrandes alterações até 1984.

Trabalhando-se com indicadores fiscaisque descontam o efeito da inflação, verifi-cou-se que para o conjunto do setor públi-co houve tendência de redução do déficitpúblico no período 1980-1985 (Tabela 43).

Entretanto, com a eclosão da crise dadívida externa e a política ortodoxa deajuste (centrada na contração da renda eem taxas de juros reais elevadas), houveum aumento da relação entre a dívida in-terna líquida do governo central e o PIBao longo do período em questão.

A situação fiscal se deteriorou signifi-cativamente com a Nova República, em1985. Todos os indicadores de gasto, dé-ficit e dívida mostram uma tendência dedeterioração entre 1985 e 1989. Para ilus-trar, o déficit operacional do governo cen-tral aumentou continuamente, passando de1,2% em 1985 para 4% em 1989. Para o

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conjunto do setor público, verificou-setambém a tendência de piora das contaspúblicas. O déficit operacional aumentoude 4,4% em 1985 para 6,9% em 1989. Acaracterística marcante da situação fiscalneste período é o aumento dos gastos pú-blicos. No caso do governo central, a rela-ção gastos/ PIB cresceu de 8,7% em 1985para 17,1% em 1989 (Tabela 40). Por ou-tro lado, para o governo central, bem comopara o conjunto do setor público, não hou-ve aumento expressivo da receita tributáriaem todo o período 1981-1994 (Tabela 44).

Entretanto, o aumento de gastos públi-cos não se expressou em taxas elevadasde crescimento econômico, exceto nosdois primeiros anos (1985 e 1986). A taxaanual de crescimento real do PIB mostrouuma nítida tendência de queda ao longodo período 1985-1989 e a taxa média anualfoi de 4,4%, isto é, idêntica à taxa históri-ca de crescimento da economia brasileira.De fato, o governo Sarney se caracterizoupelo agravamento de problemas, não so-mente com a aceleração do processo in-flacionário e a desaceleração do cresci-mento econômico, mas também pela pio-ra da situação fiscal.

O governo Collor começou com o “ca-lote” da dívida pública, baseado no con-gelamento dos ativos financeiros e suaposterior restituição com uma correçãomonetária parcial. Não é por outra razãoque a relação entre a dívida interna líqui-da do governo central e o PIB caiu de 6,8%em 1989 para 0,4% em 1990.

Com o impeachment de Collor, o vice-presidente Itamar Franco assumiu o gover-no em 1992. Em 1993-1994, a situaçãofiscal continuou piorando, enquanto avan-çava o processo hiperinflacionário.

Talvez a característica marcante de todoesse período (primeira metade dos anos 90)tenha sido o fato de que, para o conjuntodo setor público, houve um superávit pri-

mário significativo (média de 3,5% doPIB) que, contudo, foi absorvido em gran-de parte pelo pagamento de juros (médiade 3,1% do PIB) (Tabela 40, novamente).

Os dados das contas nacionais mostram,ainda, que o setor público teve uma pou-pança média negativa correspondente a2,8% do PIB no período 1991-1994, sen-do que as despesas com juros responde-ram por 2,8% do PIB neste mesmo perío-do (Tabela 41). O resultado direto foi oaumento da dívida pública interna a partirde 1991. Assim, neste período de eleva-das taxas de inflação, já se observava acaracterística marcante da grave situaçãofiscal e de crescimento da dívida pública,que marcarão o período seguinte, de taxasrelativamente baixas de inflação.

Deve-se ainda ressaltar que a dívida in-terna do setor público mostrou uma ten-dência de crescimento ao longo do perío-do 1981-1994, que foi interrompida duasvezes: em 1986, com o Plano Cruzado, eem 1990, com o Plano Collor. Essas inter-rupções foram curtas (menos de dois anos)e incapazes de reverter a tendência de lon-go prazo (Tabela 45).

A restrição fundamental às finanças pú-blicas nesse período não foi tanto a dívidainterna, mas sim a dívida externa. Com ex-ceção de 1989, 1993 e, principalmente,1994 (quando houve a renegociação da dí-vida externa e a abrupta apreciação cam-bial no final do ano), em todos os anos doperíodo a dívida externa foi relativamentemaior do que a dívida interna. No período1980-1994, a relação média dívida internalíquida/ PIB foi de 16,4% enquanto a rela-ção média dívida externa/ PIB foi de 22,9%.

Nos anos 80, ao mesmo tempo em que sedavam os primeiros passos no sentido daprivatização das empresas estatais, houve oprocesso de estatização da dívida externa. Osetor público representava 68% da dívidaexterna, em 1981, passando a 90% em 1989

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50A ARMADILHA DA DÍVIDA

(CERQUEIRA, 1977, p. 144). A dívida ex-terna do setor público aumentou de 42 bi-lhões em 1981 para 89 bilhões de dólaresem 1989, enquanto a dívida externa privadadiminuiu de 20 bilhões de dólares em 1981para 10 bilhões de dólares em 1989.

A dívida externa privada voltou a cres-cer mais significativamente a partir de1992, quando houve melhora nas condi-ções de liquidez internacional e maior li-beralização financeira no Brasil. Deve-senotar que o início dos anos 90 foi marca-do pelo enorme diferencial entre a taxa dejuro interna e a taxa de juro externa. Parailustrar, entre janeiro de 1992 e junho de1994, a taxa média de juros externa foi de3,8% enquanto a taxa de juros interna(corrigida pela variação cambial) foi de31,1%, isto é, a taxa de juros interna era8,2 vezes a taxa de juros internacional(GONÇALVES, 1996, p. 146). Assim, ocapital aplicado no Brasil ganhava em cer-ca de sete semanas o mesmo que ganhavaem todo um ano de aplicação no mercadofinanceiro internacional.

A dívida externa respondeu por cerca dedois terços do total do endividamento dosetor público no período 1981-1994. Defato, as políticas macroeconômicas orto-doxas estiveram, em grande parte do pe-ríodo, orientadas para o ajuste das contasexternas. Essas políticas consistiram, prin-

cipalmente, de taxas de juros reais eleva-das. O juro alto, além de ser um freio aocrescimento econômico, provocou o pro-cesso vicioso que determinou o desempe-nho medíocre da economia brasileira: dí-vida externa => desequilíbrio do balançode pagamentos => juros altos => déficitpúblico => endividamento interno do se-tor público. A relação entre dívida internae externa é evidente entre 1980 e 1994.

A relação entre as dívidas interna e ex-terna é ainda mais evidente no período1995-2001, de crescimento acelerado tan-to da dívida interna como da externa. Nes-se período, a liberalização financeira im-plicou aumento do desequilíbrio nas con-tas externas e do endividamento externo,o que causou maior vulnerabilidadeexterna da economia brasileira.

A reação do governo FHC às crises cam-biais recorrentes tem sido o uso de taxasde juros altas para reduzir os gastos comimportações, atrair capital estrangeiro eestimular as empresas e bancos que atuamno país a buscar recursos no exterior. Oresultado é tão simples quanto dramático:enquanto aumenta a dívida externa, os ju-ros elevados pagos pelos títulos se consti-tuem na principal causa do déficit públicoe, portanto, do próprio aumento da dívidapública interna, que cresce aceleradamentea partir de 1995.

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51 REINALDO GONÇALVES & VALTER POMAR

O caminho que pode levar a um Brasilde igualdade, democracia e soberania estácheio de armadilhas. Algumas são institu-cionais: os acordos e tratados internacio-nais firmados pelo governo Fernando Hen-rique, a Lei de Responsabilidade Fiscal ea proposta de independência do BancoCentral. Outras são econômicas: é o casodas dívidas financeiras (externas e inter-nas). Para adotar outro modelo econômi-co, teremos que desmontar estas armadi-lhas, a começar pelas mais perigosas, asideológicas, tais como as seis críticas fei-tas pelo ministro da Fazendo Pedro Malanao Plebiscito da Dívida: “a dívida era umproblema há 15 anos, hoje não é mais”; “adívida externa pública vem diminuindo”;“a dívida externa é principalmente priva-da”; “falar em suspensão de pagamentosprejudicaria os investimentos no país”;“toda a população é credora da dívida pú-blica interna”; “todos os partidos deveri-am fazer um acordo em torno dos princí-pios básicos da atual política econômica”.

A armadilha doesquecimento

Na época em que a ditadura nos endivi-dou fortemente, o então todo-poderosoministro Delfim Neto também dizia queos empréstimos não constituíam proble-ma. Ocorre que todo capital estrangeiroque vem para o país (sob a forma de em-préstimo, investimento estrangeiro diretoou capital especulativo) gera uma remes-sa futura de divisas (a pretexto de lucros,dividendos, pagamento de royalties, im-portações etc.).

Para conseguir estas divisas, o país pre-cisa gerar gigantescos superávits comer-ciais (exportar bem mais do que importa).Se isto não for possível, as alternativas são:privatizar as empresas públicas, oferecervantagens para os investidores estrangei-ros – como, por exemplo, juros altos –,conseguir novos empréstimos ou desvalo-rizar a moeda.

Desmontandoa armadilha

da dívida

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52A ARMADILHA DA DÍVIDA

Ocorre que as privatizações um dia aca-bam, a desvalorização é uma faca de doisgumes, os empréstimos geram dívida fu-tura e os juros altos aumentam a dívidapública interna. Em outras palavras, o en-dividamento externo coloca o país diantede uma “bomba-relógio” que, antes mes-mo da explosão, já nos causa prejuízo.

O serviço da dívida já constitui uma san-gria enorme de recursos, da ordem de 500bilhões de dólares, desde 1979.

A armadilhada estatização

Atualmente, a maior parte da dívida ex-terna é dívida privada. Mesmo assim, 100bilhões ou 136 bilhões de dólares (esto-que da dívida externa pública em junhode 2000) representam muito dinheiro emqualquer lugar do mundo, especialmentequando lembramos que se trata, em boaparte, de uma “herança” da dívida externacontraída na época da ditadura e contesta-da, durante os anos 1970 e 1980, pelo eco-nomista Pedro Malan e pelo sociólogo esenador Fernando Henrique.

O fato de esta dívida ter sido posterior-mente legalizada pelos governos Collor,Itamar e FHC não impede a populaçãobrasileira de contestar sua legalidade, sualegitimidade, bem como o fato de ela “játer sido paga várias vezes”.

Por outro lado, é inegável que a dívidaexterna privada deu um salto enorme, de55 bilhões de dólares em 1993 para 121bilhões de dólares em 2000 (registre-seque, recentemente, o governo “descobriu”que parte do endividamento privado jáhavia sido pago, embora continuasse cons-tando dos registros oficiais como dívida).O salto da dívida externa privada foi, nãopor coincidência, acompanhado pelo cres-

cimento da dívida interna pública, quepulou de 153 bilhões de reais para 563 bi-lhões de reais, naquele mesmo período.

A dívida externa privada cresceu por-que os grandes empresários contraem em-préstimos no exterior, a taxas de juros bai-xas, e investem no país a taxas de jurosvárias vezes maiores.

Mas quem determina os juros? O gover-no! E os juros são mantidos altos sob oargumento de que o Brasil precisa atraircapitais estrangeiros, que vêm para cá fi-nanciar nosso déficit em conta corrente,que não pára de crescer, entre outros mo-tivos, porque mantemos os juros altos.

Por trás deste círculo vicioso existemfortes interesses financeiros. Os grandescapitalistas se financiam com dinheirobarato, o governo paga a conta. E comofaz o governo para pagar a conta? Aumentaimpostos, corta gastos sociais e faz novosempréstimos (turbinados pelos juros al-tos). Portanto, perdem os “contribuintes”e a maior parte da população.

Vale lembrar, ainda, que quando umgrande capitalista contrai um empréstimoexterno ele gera uma dívida em dólares.Ele aplica os recursos deste empréstimoaqui no Brasil, onde obtém um enormelucro em reais, lucro que é pago com “oseu, o meu, o nosso esforço”.

Na hora de pagar sua dívida externa,supostamente privada, o grande capitalis-ta precisa de maior quantidade de dólares,que são atraídos pela economia brasileiragraças à política de juros altos, privatiza-ções, facilidades ao grande capital estran-geiro, salários arrochados para que o paíspossa exportar produtos mais “competiti-vos” etc.

Além de vantajoso para os credores pri-vados, o processo de endividamento ex-terno também pode ser útil para os gran-des países capitalistas centrais, abarrota-dos de dinheiro e de mercadorias. Com

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53 REINALDO GONÇALVES & VALTER POMAR

uma mão eles nos emprestam o dinheirocom o qual compramos as mercadorias queeles nos oferecem com a outra mão.

A armadilhada chantagem

Se o governo brasileiro adotar uma postu-ra firme no tocante à dívida externa (to-mando medidas como auditoria, renego-ciação soberana, suspensão do pagamen-to ou não-pagamento), poderemos sofrerrepresálias.

Mas hoje o Brasil é bem comportado enem por isso está imune às conseqüênciasde medidas unilaterais adotadas pelos Es-tados Unidos, inclusive suas retaliações àsnossas exportações.

Prejudicaremos a nossa imagem inter-nacional? Mas que imagem é esta, hoje,em que as “agências internacionais de clas-sificação de risco” chegaram a nos colo-car abaixo da Colômbia?

Acontece que estas “agências”, além deseus inconfessáveis interesses, sabem queo Brasil tem um enorme déficit em contacorrente. No dia em que cessar ou se re-duzir substancialmente o fluxo de capitaispara o Brasil, quebraremos. Portanto, nos-sa dependência é enorme.

Diante dela, há duas opções: mudar demodelo ou fazer todas as concessões pos-síveis para continuar atraindo capitais, queaumentam ainda mais nossa dependênciade recursos externos.

Eliminaremos uma “fonte de investi-mento”? Mas qual a vantagem deste in-vestimento internacional, que tem gera-do uma saída de dólares (por conta doserviço da dívida, da remessa de lucros,do pagamento de royalties, da amplia-ção das importações etc.) superior às en-tradas?

Eliminaremos uma “fonte de financia-mento do consumo”? Mas a que custo te-mos “financiado o consumo”? Qual con-sumo e feito por quem?

O crescimento das importações, nos últi-mos anos, tem sido prejudicial à nossa eco-nomia. Importamos coisas que poderiam edeveriam continuar sendo produzidas aqui.Precisamos reduzir as importações, ampliara produção e o mercado interno.

Financiar as importações com endivida-mento externo só “faz sentido” – comopolítica estrutural – se as importações ge-rarem alterações na economia nacional queampliem o seu potencial exportador.

É isso que vem acontecendo? Ou as im-portações estão substituindo a produçãonacional, sem alterar nossa pauta exporta-dora e nosso potencial comercial?

O Brasil ampliou muito suas exportações,nos últimos anos. Mesmo assim, experi-mentamos déficits enormes e, mais recen-temente, superávits comerciais ridicular-mente pequenos. “Abrimos a economia”nos últimos dez anos. Mas nossa participa-ção no comércio internacional continua in-ferior a 1% do total mundial e caindo.

Importamos desnecessariamente. E fa-zemos um esforço cavalar para exportarcada vez mais produtos a um preço cadavez menor. Quem ganha com isso?

Outro modelo é possível

Os conservadores consideram um despro-pósito debater, principalmente nas elei-ções, soluções alternativas para o endivi-damento externo e interno. “Paguem, semtugir nem mugir”, é o que nos dizem. Maspor que deveríamos seguir pagando o quejá foi pago? Daí a importância de umaauditoria das dívidas.

E por qual razão deveríamos seguir pa-gando além de nossa capacidade, amplian-

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do nosso endividamento? Daí a importân-cia de outra política econômica, com ou-tra prioridade que não o pagamento dasdívidas.

Se o atual modelo econômico fosse oúnico possível, então não poderíamosmudar nada, pois toda mudança provoca-ria prejuízos enormes e nenhuma vanta-gem. Todavia, e se for possível organizara economia de outra forma? E se for pos-sível utilizar os recursos da economia bra-sileira de forma mais “produtiva”, social-mente falando? Nesse caso, a questão pas-sa a ser outra: qual o modelo alternativo ecomo transitar do atual modelo para umnovo .

A transição do modelo atual, que temna especulação um de seus pilares, paraoutro modelo exigirá quebrar o círculo deferro do endividamento. Isso certamenteprovocará reações dos credores da dívida.

Podemos raciocinar com otimismo econcluir que, após muito reclamar, os gran-des capitalistas se acomodarão à nova si-tuação para não perder as vantagens denegociar com um país do tamanho do Bra-sil. Foi o que aconteceu, em certa medida,

com a Rússia, que declarou moratória departe de sua dívida em 1998.

Entretanto, caso os credores resolvamlevar a cabo suas ameaças, o repertório demedidas a sua disposição inclui: fim dosfinanciamentos externos, bloqueio de partedas importações e exportações, interrup-ção dos “programas sociais” alimentadospor recursos de organismos internacionais,ataques à “imagem” do país, ferrenha opo-sição e tentativas de desestabilização.

Achamos que o país tem como resistir auma eventual retaliação dos credores.Grande parte do que importamos poderiaser produzido aqui. Existem outros con-sumidores e fornecedores no mercado in-ternacional com quem podemos negociarem caso de bloqueio. O “financiamentoexterno” da nossa economia, ao menos nostermos atuais, causa mais prejuízos do quevantagens.

Se houver vontade política e apoio po-pular, bem como apoio internacional sig-nificativo, a resistência é possível. Atéporque não se pode desconsiderar o pesogeopolítico do Brasil para a América La-tina e mesmo para o sistema financeiro.

Auditoria da dívidaA auditoria cidadã da dívida pretende dissecar

todos os fatos já relatados e esclarecer a verda-deira natureza da dívida. Apenas para citar al-guns questionamentos:1) Será que nos endividamos para desenvolver opaís ou o endividamento só está se prestando afinanciar e remunerar os capitais especulativos?2) Os números do endividamento são uma cai-xa-preta: Quanto efetivamente tomamos empres-tado? Quanto já pagamos? Por que temos taxasde juros tão altas?3) Quanto efetivamente está entrando e saindodo país como capital especulativo camuflado sobo nome de “investimento direto”?4) Quem são os detentores dos títulos da dívidapública brasileira e, portanto, os beneficiários dosjuros mais altos do planeta?5) Quanto o país foi onerado, ao longo dos anos,com elevadas “taxas de risco” estipuladas pelos

credores, enquanto cumpria rigorosamente todosos pagamentos? Se o “risco” não se efetivou,estas parcelas deveriam ser consideradas comopagamento antecipado do principal. Na realida-de, estas elevadas taxas de risco sempre fize-ram parte de uma estratégia de espoliação.6) Por que foram eliminados os mecanismos decontrole institucional dos capitais especulativos,especialmente a partir de 1991?7) A razão para a grande crise que estamos en-frentando realmente decorre de fatos externos(em cada momento surge um vilão, que pode sera crise da Argentina, ou da Rússia, ou do Méxi-co, ou da Coréia etc.) ou se trata de total falta decontrole sobre o crescimento das nossas dívidas?

Fonte: Fisco Fórum Minas Gerais. Campanha Jubi-leu Sul, agosto de 2001 (www.fsmmg.ongnet.org.br).

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Isto é um trunfo a nosso favor para ter in-fluência e liderança em processos de des-monte dos mecanismos e organismos deagiotagem internacional.

Em qualquer caso, vale a pena enfrentara fúria dos credores. Pois a pergunta nãodeve ser só “o que nos acontecerá, se to-marmos uma atitude firme”, mas também“o que acontecerá, se as coisas continua-rem como hoje”: mais desigualdade social,mais violência, mais desesperança.

A armadilha do “calote”

O governo diz que os credores da dívida“financiam” o governo. E o que faz o go-verno com este “financiamento”? Paga oscredores...

Este círculo vicioso – alimentado conti-nuamente pela taxa de juros – é um dosprincipais problemas do endividamentopúblico.

No caso da dívida pública interna, já vi-mos que os dados são imprecisos, mas écerto que os credores são, em sua maiorparte, grandes empresas, principalmentedo setor financeiro, mas também grandesempresas “produtivas”.

Toda grande empresa brasileira tem nasua carteira títulos do governo. Todo gran-de capitalista participa da “especulaçãofinanceira”. Sem dívida pública, aliás, ocapitalismo moderno seria inimaginável.

O problema, está claro, não é a existên-cia de dívida, mas a importância e o papelque a dívida pública joga na economiabrasileira. A atividade econômica é infe-rior à possível devido, entre outras coisas,à alta taxa de juros. Os serviços públicosvão mal devido, principalmente, aos cor-tes promovidos pelo governo exatamentepara pagar a dívida.

O assalariado, o pequeno empresário, oaposentado, a viúva, que aplicam suas pe-

quenas economias, são envolvidos na en-grenagem do endividamento público. Massão a parte perdedora, pois, ao contráriodos grandes capitalistas, os pequenos in-vestidores não têm como se proteger dosefeitos macroeconômicos e macrossociaisdo alto endividamento.

Naturalmente, os maiores prejudicadossão as dezenas de milhões de brasileirosque vivem na miséria, que sobrevivem comum salário mínimo, que estão sem teto esem terra, os desempregados, os sem es-cola, os sem saúde.

Mudar esta situação, transferir poder,riqueza e renda da minoria para a maioria,exige uma série de medidas, cujo detalha-mento escapa dos propósitos deste livro(a esse respeito, ler “Outro Brasil é possí-vel”, PT Notícias, edição especial, agostode 2001). Mas, certamente, uma das me-didas necessárias é quebrar a atual estru-tura de endividamento.

Quando se fala isso, a mídia, o governoe os grandes capitalistas protestam contraa “quebra de contrato”. E dizem que issojá foi feito, no governo Collor, e deu erra-do. Vejamos isso melhor.

Em defesa do status quoSem “quebra de contrato”, não haveriaindependência das colônias, abolição daescravidão, voto universal e secreto, re-forma agrária. Por outro lado, a “quebrade contrato” é algo bastante usual na eraneoliberal, inaugurada exatamente por umato unilateral dos Estados Unidos, decla-rando a inconversibilidade do dólar emouro no início dos anos 70.

No governo FHC, por exemplo, quantosdireitos trabalhistas e sociais vêm sendoexpressa e assumidamente rasgados, emnome da “globalização”, da “modernida-de”, do “livre mercado” etc.?

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56A ARMADILHA DA DÍVIDA

Cabe ao povo decidir qual deve ser ocomportamento do governo federal diantedas dívidas financeiras. Este é um “con-trato” definido pelo povo, quando ele ele-ge seus governantes e parlamentares. Aalternância programática – e, portanto, apossibilidade de constituirem-se novoscontratos sociais que alterem os antigos –é uma possibilidade inscrita na naturezada democracia.

A não ser, é claro, que as elites enten-dam que o pagamento religioso das dívi-das financeiras é uma “cláusula pétrea”,imutável mesmo que a ampla maioria dapopulação brasileira deseje alterá-la.

Assustando os setoresmédios

Claro que as elites não podem defenderexplicitamente o status quo. Assim, posamde defensoras dos “setores médios”, apre-sentando-os como os supostamente maisprejudicados caso um novo governo mu-dasse a política de endividamento.

É preciso lembrar que existem menos de60 milhões de contas bancárias no Brasil.Menos de 20 milhões de cartões de crédi-to. E quase 50 milhões de pessoas que vi-vem na pobreza. Está claro, portanto, queapenas uma parcela minoritária da popu-lação é credora da dívida pública interna.

Claro que nessa parcela minoritária exis-tem diferenças. O assalariado que ganha 4mil reais por mês e consegue fazer umaaplicação de 1.000 reais é totalmente di-ferente das grandes empresas capitalistas,que lucram bilhões e aplicam centenas demilhões.

Justificar a especulação financeira emnome da poupança da classe média é maisou menos como justificar o latifúndio emnome da média propriedade produtiva.

Moralmente indecorosa e intelectual-mente fraudulenta, esta justificativa podeser politicamente eficaz: como sabemos,as elites são hábeis no jogo de fazer os“setores médios” lutarem contra os “po-bres”. Mas esse expediente eficaz precisade uma mentira para funcionar: no casoda reforma agrária, dizem que todas aspropriedades serão atingidas, inclusive aspequenas e médias. No caso da dívida pú-blica interna, fala-se em calote e confiscodas poupanças das viúvas e aposentados.

Expediente manjado, mas que exigirádos defensores de outro modelo elaborarde maneira muito precisa qual a políticaque pretendem adotar diante da dívidapública interna, de forma a deixar claroque só os “especuladores” serão punidos.

Um programaalternativo

Em 2000 e 2001, o ministro da Fazendapropôs repetidas vezes que todos os parti-dos, principalmente os de oposição, fizes-sem um acordo em torno dos fundamen-tos da atual política econômica. Ou seja:admite-se como possível apenas uma opo-sição às pessoas e aos métodos, não aosmodelos e aos programas.

Naturalmente, do ponto de vista da opo-sição democrático-popular e socialista,outro programa é possível e necessário.Um programa que deve ser capaz de ofe-recer alternativas, não apenas ao governoFHC ou ao modelo neoliberal, mas tam-bém aos principais traços da sociedadebrasileira: a dependência externa, a demo-cracia restrita e a desigualdade. Um pro-grama alternativo que inclua, portanto,pelo menos três dimensões ou metas fun-damentais: a soberania nacional, a demo-cracia popular e a igualdade social.

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57 REINALDO GONÇALVES & VALTER POMAR

Transformar estas metas em realidade éuma tarefa política, que exige estratégias,táticas e detalhamentos programáticos cujadiscussão escapa do âmbito deste traba-lho. Mas é possível afirmar algumas idéi-as básicas, relativas ao tema que estamosdiscutindo.

A primeira delas é que um novo mode-lo, uma nova sociedade, exige um novoEstado, distinto daquele existente na épo-ca da ditadura, mas também distinto doque existe hoje, após as reformasneoliberais. Um Estado desprivatizado edemocratizado, voltado para o atendimen-to das maiorias, com capacidade deregulação social e econômica, o que sópoderá ocorrer se ele for socialmente con-trolado.

Um Estado fortalecido e não, como ocor-re hoje, fragilizado. E fortalecido econo-micamente, o que exigirá interromper ereverter o programa de privatização deempresas estratégicas, em especial no casodas empresas de telecomunicações, de pro-dução e distribuição de energia e de pe-tróleo, sem o que não teremos controle donosso espaço econômico nacional. Seránecessário, também, apurar todos os indí-cios de irregularidade que possam ter ocor-

rido em processos de privatização e ado-tar as medidas cabíveis.

Impõe-se uma reforma do aparelho pro-dutivo do Estado. As empresas estataisdeverão ter sua gestão democratizada, pormeio de contratos de gestão e controlessociais, dotando-as de estrutura adminis-trativa que lhes permita desempenhar deforma mais adequada o seu papel, aumen-tar a produtividade e enfrentar a concor-rência.

Nessa mesma linha, não será suficientea existência de agências reguladoras: esta-rá recolocada a necessidade do monopó-lio constitucional da União sobre determi-nados segmentos e atividades econômicas.

Portanto, as medidas econômico-sociaisnecessárias para construir um país comsoberania, democracia e igualdade exigi-rão uma grande reforma do Estado, quepropicie maior agilidade administrativa,equacionamento e reabilitação do funcio-nalismo público, remontagem do sistemanacional de formulação e execução do pla-nejamento e da política econômica, rein-trodução da capacidade de seleção e prio-rização dos gastos públicos, sendo de fun-damental importância a construção de umefetivo sistema de fiscalização tributária,

Desmonte do sistema de fiscalizaçãoA Secretaria da Receita Federal perdeu sua

capacidade de investigar e a legislação está maistolerante com os que porventura caiam em des-graça com o leão. A administração tributária vivede sua capacidade de fiscalização. “Quando sefala em imposto, não se pode apostar em contri-buição espontânea. É o medo da penalidade, alia-do à justiça do sistema, que garante o pagamen-to do tributo. A fiscalização é que garante a per-cepção de risco.”

Restou ao atual governo eleger os impostosindiretos como fonte de financiamento de suasações. “Era a única saída para aumentar a arre-cadação sem botar a máquina para funcionar. Odesmonte da Receita Federal visa, em última ins-tância, desonerar os sócios do projeto em implan-

tação no país”, diz o presidente do Sindicato Na-cional dos Auditores Fiscais da Receita Federal(Unafisco Sindical), Paulo Gil. “Ao restringir asprerrogativas dos auditores fiscais e esvaziar afunção institucional da Receita, o governo tornamais difícil cobrar imposto de quem pode pagar.A função da tributação é financiar o Estado. Maso Estado não é neutro. Tributação também não.O governo escolhe que estratos sociais arcarãocom os recursos e que segmentos serão finan-ciados”, diz Paulo Gil.

Fonte: CAMPOS, Cyntia. “O desmonte da ReceitaFederal”. Conexão, Brasília, Unafisco Sindical,ano I, no 4, 2000, p. 20.

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58A ARMADILHA DA DÍVIDA

que tem sido vítima da política de desmon-te do governo FHC, motivo pelo qual oBrasil de FHC é o paraíso da sonegaçãofiscal.

A reforma do Estado terá que incluir, ain-da, o aperfeiçoamento do aparato regulató-rio e repressivo, no que se refere ao contro-le da ação dos monopólios e ao abuso dopoder econômico nas suas mais diversasmanifestações. Neste sentido, deverão serampliados os direitos do consumidor, pormeio da multiplicação e do fortalecimentodos serviços de proteção e da revitalizaçãoda Justiça encarregada de apreciar os cri-mes contra a economia popular.

Financiamentoe desenvolvimento

Em um governo democrático e popular, asprioridades serão outras: logo, deverá serfeito um significativo remanejamento dosgastos. E, qualquer que seja a solução ado-tada para o estoque da dívida, deve ocor-rer uma imediata redução no pagamentodos juros da dívida pública, principal fa-tor do enorme desequilíbrio orçamentáriodo país. Ademais, será necessária uma re-

forma tributária que aumente a carga tri-butária da elite brasileira, promovendo, porexemplo, o combate à sonegação, a tribu-tação das grandes fortunas, das grandesheranças e da grande propriedade ruralimprodutiva.

Deve-se notar que a situação brasileiraé tão grave que parte significativa da so-negação é, pura e simplesmente, apropria-ção indébita. É necessária uma políticadiametralmente oposta àquela do governoFHC, que tem tratado os sonegadores commecanismos generosos (e ineficazes) derefinanciamento das suas dívidas fiscais.

Para promover o refinanciamento doEstado, permitindo que ele possa desem-penhar suas novas funções econômicas esociais, é de fundamental importância im-pulsionar uma reforma tributária baseadaem cobrar mais de quem possui mais. Areforma tributária é a peça-chave do pro-cesso de mudança nos esquemas de finan-ciamento no país. A capacidade do Esta-do de equilibrar suas contas depende des-sa reforma.

A restruturação do sistema financeironacional deverá ser feita com o objetivo defortalecer o mercado de capitais domésti-co, reduzindo sua vulnerabilidade diante dosistema financeiro internacional e buscan-

Brasil: o paraíso da sonegação fiscalAs 530 maiores empresas não-financeiras do

país faturaram 226 bilhões de reais em 1998. Me-tade delas passou em branco pelo fisco. A outrametade recolheu 3 bilhões de reais em impostos.

Há três artifícios mais usados pelas grandesempresas para não pagar Imposto de Renda: dar“prejuízo”, recorrer à Justiça e usar expedientesbastante sofisticados de planejamento tributário.

Em 1996, a União teria a receber 1,9 bilhão dereais de Imposto Territorial Rural (ITR). Era aestréia do novo sistema de cobrança do ITR. Só24,7 milhões de reais (ou 1,3% do valor preten-dido) foram recolhidos. Os grandes proprietáriosrurais e seus representantes no Congresso, a

bancada ruralista, conseguiram suspender a co-brança do tributo, alegando “falhas técnicas” nocálculo dos valores mínimos de terra nua efetua-do pela Fundação Getúlio Vargas, como contamos auditores fiscais Fátima Gondim Farias e An-tônio Lopes dos Santos, no artigo “O imposto dolatifúndio: do mito da administração impossível àideologia da ineficiência fiscal”, publicado em Tri-butação em Revista, no 29.

Fonte: CAMPOS, Cyntia. “Os primeiros 500 anosde sonegação”. Conexão, Brasília, Unafisco, ano 1,no 1, 2000, p. 18-23.

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do solucionar o nosso estrangulamento es-trutural do financiamento de longo prazo.

O estímulo à poupança nacional estáassociado à reorientação da aplicação dosfundos de poupança compulsória dos tra-balhadores (FAT e FGTS, por exemplo)para iniciativas capazes de gerar empre-gos, distribuir riqueza e renda.

Justiça fiscal

As finanças públicas no Brasil, da mes-ma forma que quase tudo neste país, exi-gem justiça. A justiça fiscal deve ser a basepara as finanças públicas. Isso é verdade

sob a ótica dos gastos (que devem serorientados para os grupos sociais maisnecessitados) e sob a ótica da arrecadação(que deve pesar mais sobre as grandesempresas e as famílias muito ricas).

O Brasil precisa de uma política tributá-ria que grave a renda do capital e o esto-que de riqueza da elite econômica brasi-leira. Destacamos: é necessária uma fortetaxação, não somente sobre a renda dosricos, mas também sobre seu estoque deriqueza.

O imposto de renda das empresas preci-sa não somente ser elevado como efetiva-mente cobrado. O imposto de renda daspessoas físicas deve ter um significativo

A Contribuição Provisória sobre MovimentaçãoFinanceira (CPMF) foi criada em janeiro de 1997,supostamente com o objetivo de aumentar os re-cursos para a área da saúde. Entretanto, ao longodos anos a CPMF foi utilizada para financiar, emparte, o elevado déficit público provocado pelas al-tas taxas de juros sobre a dívida pública e se trans-formou atualmente em Contribuição Provisória so-bre Movimentação ou Transmissão de Valores ede Créditos e Direitos de Natureza Financeira.

Em 2000, a receita da CPMF foi de 14,5 bilhõesde reais, o que representou 8,2% da arrecadaçãobruta das receitas federais. A alíquota atual daCPMF é de 0,38%, cuja base fiscal é a movimen-tação financeira realizada pelo sistema bancário.

A principal característica da CPMF é o seu altograu de regressividade. A CPMF linear de 0,38%implica que os pobres são tributados na mesmaproporção que os ricos. Na medida em que noBrasil há uma significativa concentração de rique-za, de renda e, portanto, de movimentação finan-ceira, a CPMF encerra forte regressividade.

Um cheque de 100 reais passado por um tra-balhador para pagar as compras básicas no su-permercado da periferia recolhe o mesmo tributoque o cheque de 100 reais emitido pelos ricos.

Embora haja consenso na crítica ao caráterregressivo da CPMF, não existe consenso acer-ca da manutenção desta contribuição, como par-te de uma reforma tributária de caráter democrá-tico e popular no Brasil.

Mas não há dúvida sobre o seguinte: se formantida, será necessário introduzir um compo-

O debate sobre a CPMFnente de progressividade na CPMF, desonerandoos pobres, os quase-pobres e parte da classemédia brasileira, restringindo o pagamento daCPMF aos 10% mais ricos da população brasi-leira e, principalmente, à elite econômica do país(1% mais ricos), que pagaria o dobro da alíquotado segundo grupo mais rico (9% da população,classe média de renda alta).

Esses dois grupos respondem por 14% e 34%da renda total, respectivamente. Como é bastanteconhecido, no Brasil os 10% mais ricos têm umarenda equivalente a toda a renda dos 90% restan-tes. Portanto, a arrecadação da CPMF não se alte-raria se, por um lado, a alíquota de 90% da popula-ção brasileira fosse reduzida para zero e, por ou-tro, a alíquota dos 10% mais ricos fosse elevada.

Em termos operacionais, a proposta de umaCPMF progressiva não tem maiores dificuldades.Basicamente, é preciso (a partir de um conheci-mento detalhado da distribuição da movimenta-ção financeira por CPF) definir as classes de mo-vimentação financeira (com base, por exemplo,nos últimos 12 meses). Essas classes poderiamser, por hipótese: até 1.000 reais de movimenta-ção mensal, haveria isenção de CPMF; de 1.000até 10 mil reais, a alíquota seria de 0,32%; e amovimentação financeira mensal superior a 10mil reais pagaria uma CPMF de 0,64%. Natural-mente, se, além de introduzir a progressividadeno sistema tributário brasileiro o objetivo for au-mentar a carga tributária, as alíquotas do CPMFsobre a elite econômica deveriam ser ainda maiselevadas.

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componente de progressividade, com al-terações das classes de renda e aumentodas alíquotas das rendas mais altas. Im-postos sobre riqueza, como o Imposto Ter-ritorial Rural, devem deixar de ser umaficção. E deve ser implementado o impos-to anual sobre grandes fortunas. Por fim,há o “imposto de solidariedade”, que seconstitui em um tributo cobrado uma úni-ca vez sobre a riqueza líquida privada.

O elevado estoque de riqueza concen-trado na mão dos ricos brasileiros é a basede uma arrecadação extraordinária, que

permitiria viabilizar tanto um plano emer-gencial de combate à fome como a sus-tentação de uma política de juros baixos.

Em resumo, a solução para o grave pro-blema de descontrole das finanças públi-cas, que faz parte da herança trágica deFHC, passa pela seguinte equação: outrogoverno e outro programa econômico, queenfrentem o passado (a dívida e outrasformas de concentração de propriedade)na perspectiva de garantir um presente eum futuro digno para a imensa maioria dosque vivem no Brasil.

O governo colocou em marcha, com a Lei9.964, de abril de 1999, um plano que soterra osmais elementares princípios da boa prática tribu-tária. Trata-se do Programa de Recuperação Fis-cal (Refis), “um tipo de renegociação em que obeneficiário pode empurrar até o fim dos temposo parcelamento da sua dívida, sem um valor mí-nimo para as parcelas”.

No rol dos beneficiários podem ser admitidasempresas que descontam da folha de seus em-pregados as contribuições sociais e o impostode renda na fonte, mas não recolhem os valoresaos cofres públicos. Ou seja, empresários que,na melhor das hipóteses, financiam seu negóciocom dinheiro retirado compulsoriamente dos tra-balhadores, praticando crime de apropriaçãoindébita. Essa prática é coibida com sanções pre-vistas na Lei 8.137, de 1990, que trata dos cri-mes contra a ordem tributária.

Todavia, aqui nessas tristes paragens, o maupagador tem a vida que pediu aos céus. Já édifícil apanhá-lo, por conta das dificuldadesoperacionais da máquina arrecadadora e fis-calizadora, literalmente desmontada nos últi-mos 30 anos. “Nesse período, o número de fis-cais foi reduzido de 12 mil para insignificantes7 mil”, anota Clair Hickmann, diretora doUnafisco.

Uma das mais engenhosas obras do Refis é aque permite a compensação de multas e jurosdevidos pelos optantes, com prejuízos fiscaiscedidos por terceiros. Cedidos, vírgula, pois doque se trata mesmo é de venda, transação, ne-gociação. Os auditores da Receita protestam,alertando que por esse furo aberto na lei pode seestabelecer um tão promissor quanto nocivo co-mércio de prejuízos fiscais no país.

Como sonegar: o vale tudo do RefisO Instituto Nacional da Seguridade Social

(INSS) quer excluir 72 mil empresas do Progra-ma de Recuperação Fiscal (Refis). O grupo equi-vale a 56% das 129 mil companhias que aderi-ram ao refinanciamento de dívidas tributárias eprevidenciárias. O INSS fez uma auditoria e des-cobriu que essas 72 mil empresas não vinhamrecolhendo a contribuição previdenciária. A ina-dimplência, calculada em 1,5 bilhão de reais, serefere tanto à contribuição patronal quanto à des-contada dos empregados, o que configura crimede apropriação indébita. Um critério de exclusãoé a falta de pagamento das parcelas refinanciadaspor três meses consecutivos ou seis alternados.

Atualmente, apenas 117 mil empresas partici-pam do programa, pois 12 mil já foram excluídasnos últimos meses. Quase todas aderiram, masnão pagaram um único centavo de suas dívidasrepactuadas. Empresas como a Transbrasil, aVasp e a Calçados Ortopé já foram retiradas doprograma.

Segundo o diretor de arrecadação do INSS,Valdir Simão, “é prematuro afirmar que o progra-ma fracassou. Quero crer que a alta inadimplên-cia aconteceu por uma certa descrença dos con-tribuintes de que iríamos agir”. O Refis rolou umadívida total de 172 bilhões de reais, da qual 39bilhões de reais em débitos com o INSS, confes-sados por 53,8 mil empresas.

Fonte:BRANDÃO, Maria. “O vale tudo do Refis”. Cone-xão, Brasília, Unafisco Sindical, ano 1, no 6, 2000,p. 18-12.ALLAN, Ricardo. “INSS vai excluir 72 mil compa-nhias do Refis”. Valor, São Paulo, 26 de outubrode 2001, p. A2.

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Como fazer a redistribuição de riqueza no Bra-sil?Reinaldo Gonçalves: Vender a idéia de descon-centração de riqueza no Brasil é tão fácil quantovender a idéia de combate à inflação. Basta pe-gar o que os ricos têm! Afinal, o contraste é mui-to grande, e todos sabem disso. É só fazer o queos economistas chamam de once-for-all capitallevy, um imposto cobrado sobre o estoque de ri-queza de uma única vez. A França, a Bélgica, aFinlândia, a Alemanha e muitos outros fizeramisso. Para se ter uma idéia, o estoque de riquezaprivada no Brasil é de R$ 2 trilhões, ou seja, 400mil famílias controlam 50% da riqueza. E qual éa motivação delas? Manter a pobreza no país.Esse é um dos paradoxos aparentes do Brasil:menos pobreza exige menos riqueza.

Mas como é que os ricos vão pagar isso?Reinaldo Gonçalves: Com mensalão: 24 Darf’s,durante 24 meses! Se fizermos um capital levysobre uma base fiscal da ordem de 1 trilhão dereais e supormos uma perda operacional de 30%,teremos uma base de 700 bilhões de reais. Comum imposto (once-for-all capital levy) de 20%,chegamos a 140 bilhões de reais, divididos em24 prestações, correspondendo a 6 bilhões dereais/mês.

Ora, não diziam que iriam resolver o problemada miséria no Brasil com 7 bilhões de reais? Ima-gina 6 bilhões de reais/mês sendo investidos nopaís, gerando emprego e expandindo a deman-da e a oferta? Quem for pagar o mensalão vai terque tirar dinheiro do fundo de renda fixa e venderações e imóveis, o que é muito bom, porque faz

Distribuição de riqueza no BrasilEntrevista de Reinaldo Gonçalves para a revista Rumos

os preços caírem. No Brasil não se pode ter ex-pansão da demanda sem estar associada à ex-pansão da oferta, sob pena de termos, no míni-mo, inflação. Por isso também é necessária aintervenção do Estado, para aumentar a ofertade bens e serviços. Tirar essa massa de riquezadas mãos dos ricos e fazer apenas uma expan-são da demanda fará a inflação estourar em pou-cos meses. Não tem oferta que reaja. É precisocalibrar a expansão da demanda e da oferta, so-bretudo do povo, da base da pirâmide. Cabe des-tacar o papel dos bancos de desenvolvimento,que são agentes capazes de estimular a expan-são agrícola, industrial e de serviços. É óbvio queé complicado! O ideal é ir estimulando a oferta,soltando a demanda e, ao mesmo tempo, cali-brando. Mas, para isso, é preciso tirar o dinheirodos que integram o topo da pirâmide. É o impos-to de solidariedade.

E eles não vão reclamar?Reinaldo Gonçalves: É claro! Se não reclama-rem é porque enlouqueceram. Mas isso tem queser feito num contexto político muito particular.Precisamos de política de juros baixos e tributoalto sobre a renda dos ricos. Não dá mais parater desenvolvimento sem que haja desconcen-tração de riqueza. Não acho que seja difícil con-vencer o povo disso. Convencer os 120 milhõesnão é difícil, convencer a classe média tambémnão. Pelo contrário, ela será beneficiada. A elite,é lógico, vai reclamar, especialmente os rentistaset caterva. Mas não dá para fazer omelete semquebrar ovos. Afinal de contas, vivemos em umasociedade de classes.

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66A ARMADILHA DA DÍVIDA

Page 68: Armadilha Da Divida

67 REINALDO GONÇALVES & VALTER POMAR

Tabela 4Economia brasileira, indicadores: 1991-2000

(variação e coeficiente em percentagem)Indicador/Ano 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000

PIB real, variação 1,03 -0,54 4,92 5,85 4,22 2,66 3,27 0,22 0,79 4,46Indústria 0,3 -4,2 7,0 6,7 1,9 3,3 4,7 -1,4 -1,6 4,8Ind. de transformação -2,4 -4,1 8,1 7,8 1,7 1,1 3,6 -3,3 -1,6 5,9Agropecuária 1,4 4,9 -0,1 5,5 4,1 3,1 -0,8 1,9 7,4 2,9Serviços 0,3 0,3 1,8 1,8 1,3 2,3 2,6 1,1 1,9 3,6PIB per capita, variação -0,6 -2,1 3,4 4,3 2,8 1,3 1,9 -1,1 -0,5 3,1Taxa de investimento (preços 1980) 15,2 14,0 14,4 15,3 16,7 16,5 18,1 17,7 16,2 15,7Taxa de desemprego 4,8 5,7 5,3 5,1 4,6 5,4 5,7 7,6 7,6 7,1Inflação (IGP-DI) 414,8 991,4 2.103,4 2.406,9 67,5 11,1 7,9 3,9 20,0 9,8Total de salários reais (índice FIESP) nd nd 92,5 98,4 105,5 101,6 102,9 102,0 94,8 98,3Necessidade de financiamento do setorpúblico (% do PIB) nd nd nd nd 7,18 5,87 5,03 8,03 9,50 4,57Dívida líquida do setor público (R$ milhões) nd nd nd nd 208 269 308 386 517 563Saldo de transações correntes com oexterior (US$ bilhões) -1,4 6,1 -0,6 -1,7 -18,0 -24,3 -33,1 -33,6 -25,1 -24,6Saldo de transações correntes/PIB -1,2 0,9 -0,8 -0,9 -2,8 -3,2 -4,4 -5,0 -4,5 -4,4Dívida externa total (US$ bilhões) 124 136 146 148 159 180 200 241 241 231

Fonte: IBGE, FGV e IPEA.Nota: nd = não disponível.

Anexos – quadros e tabelasTabela 1

FHC e o descontrole da dívida pública interna, dados e previsões:1994-20021994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002

Valores em R$ bilhõesDívida líquida total (DLT) 153,2 208,5 269,2 308,4 385,9 516,6 563,2 700,0 900,0Dívida líquida do governofederal e Banco Central(DLTFBC) 65,8 90,4 128,4 167,7 231,3 316,2 353,0 440,0 550,0Dívida interna 108,8 170,3 237,6 269,8 328,7 407,8 451,8 560 700,0Dívida externa 44,4 38,1 31,6 38,6 57,2 108,8 111,3 140 200,0

Dívida per capita, valores em R$Dívida líquida total (DLT) 1.000 1.343 1.709 1.932 2.385 3.152 3.391 4.200 5.300

Dívida líquida do governofederal e Banco Central(DLTFBC) 430 582 815 1.051 1.430 1.929 2.125 2.600 3.200

MemorandoDívida líq. total/PIB (%) 29,2 30,5 33,3 34,3 41,7 49,4 49,3 56,5 66,7

PIB (R$ bilhões) 524,2 683,4 809,3 898,5 924,7 1.045,9 1.142,5 1.240,0 1.350,0

População (milhões) 153,1 155,3 157,5 159,6 161,8 163,9 166,1 168,4 170,7

PIB per capita (R$) 3.424 4.400 5.138 5.630 5.715 6.381 6.878 7.400 7.900

Fonte: Elaboração dos autores com base em dados do Banco Central do Brasil, Relatórios Anuais (1997, p. 74; 1998, p. 82; 2000, p. 16 e 106-107).Notas: PIB anual a preços do último mês do ano, ajustado pelo deflator IGP-DI, tendo como base a série publicada pelo IBGE.Estimativas do PIB em 2001 e 2002 supondo taxa anual de inflação de 7%, e crescimento real de 1,3% e 1,9%, respectivamente. Taxa anual de crescimento populacional:1,38%.

Tabela 2Ver página 11.

Tabela 3Grandes países e economias, indicadores

Fonte: Banco Mundial (2000) e FMI (2000), maio.Nota: (a) 1982-2000.

País EstadosUnidos

Japão Alemanha França China Índia Rússia Brasil

População (milhões) 1998 270 126 82 59 1.239 980 147 166Território (mil km2) 9.364 378 357 552 9.597 3.288 17.075 8.547PNB (PPP US$ bilhões) 1998 7.904 2.982 1.807 1.248 3.779 2.018 907 1.070PNB per capita (PPP US$ mil)1998 29,2 23,6 22,0 21,2 3,1 2,1 6,2 6,5Taxa anual de crescimento delongo prazo do PNB per capita(1965-1999) 1,6 3,5 1,9a 2,1 6,8 2,7 ... 2,2Taxa anual de crescimento doPIB (1995-1999) 3,8 1,2 1,5 2,2 8,8 6,4 -1,6 2,2Taxa anual de crescimento doPIB per capita (1995-1999) 2,9 0,6 1,3 1,8 7,8 4,7 -1,9 0,7

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68A ARMADILHA DA DÍVIDA

Tabela 5Distribuição funcional da renda, 1994-1999 (percentual do PIB)Discriminação 1994 1995 1996 1997 1998 1999Excedente operacional bruto 38,4 40,3 41,0 42,8 42,3 41,4Remuneração dos empregados 40,1 38,3 38,5 37,5 38,2 37,5Salários (32,0) (29,6) (28,8) (27,8) (27,5) (26,5)Rendimento de autônomos 5,7 5,9 5,7 5,6 5,5 5,1Impostos líquidos de subsídios 15,8 15,6 14,8 14,2 13,9 16,0

Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Departamento de Contas Nacionais.

Tabela 6Renda do trabalho e do capital, 1994-2000

Discriminação 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 Média1995-2000

TrabalhadorRendimento médio do pessoal ocupado(índice IBGE julho 1994 = 100)

100,4 106,7 118,0 126,7 129,3 128,7 121,6 3,4*

Massa de salários reais(índice FIESP junho 1994 = 100)

92,5 98,4 105,5 101,6 102,9 102,0 94,8 0,5*

Total de horas pagas(índice FIESP junho 1994 = 100)

100,5 100,2 90,7 86,3 80,0 75,3 76,5 -4,4*

Capitalista, lucroRentabilidade do patrimônio das 500maiores empresas (%)

10,7 6,1 5,0 4,8 4,2 -2,7 7,3 4,1

Rentista, juroRentabilidade real anual dos títulospúblicos (%)

24,2 33,4 16,5 16,1 26,6 4,7 7,0 17,4

Rentabilidade anual do patrimônio dosmaiores bancos privados nacionais

13,7 12,2 14,6 13,8 18,7 20,8 13,8 15,7

Fontes: Elaboração dos autores com base em Conjuntura Econômica, agosto de 2001, p. VIII; Exame, Melhores e Maiores, 2001, p. 22; Freitas(2000), p. 271; e ANDIMA, Retrospectiva, diversos anos.Notas: A rentabilidade anual do patrimônio dos maiores bancos privados nacionais refere-se à média dos nove maiores bancos.(*) Média aritmética das taxas anuais de crescimento.

Tabela 7Transações correntes, 1991-2000

(variação e coeficiente em percentagem)Indicador/Ano 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000

Saldo de transações correntes com oexterior (US$ bilhões) -1,4 6,1 -0,6 -1,7 -18,0 -24,3 -33,1 -33,6 -25,1 -24,6Saldo de transações correntes/PIB -1,2 0,9 -0,8 -0,9 -2,8 -3,2 -4,4 -5,0 -4,5 -4,4

Tabela 8Passivo externo do Brasil, 1993-2000

(US$ bilhões, final do ano)

Fonte: SOBEET, Carta no 17, 2001, p. 2.

1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 Passivo externo bruto 218 239 256 307 360 396 383 405 Dívida externa total 146 148 159 180 200 241 241 231 Investimento externo direto 62 66 73 86 106 136 117 147 Investimento de portfólio 10 25 24 41 53 19 25 27 Ativo externo 40 54 61 72 62 60 53 50 Reservas internacionais 32 39 52 60 52 44 36 33 Haveres externos dos bancos 8 15 9 12 10 16 17 17 Passivo externo líquido 178 185 195 235 298 336 330 355

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69 REINALDO GONÇALVES & VALTER POMAR

Tabela 9Finanças do governo central, 1995-2000 (em percentual do PIB)

Ano Gastos Superávit (+)ou déficit (-)

Necessidade definanciamento

nominal

Dívida mobiliáriainterna em poder

do público

Dívidainternalíquida

Dívidaexternalíquida

Dívidalíquidatotal

1995 14,0 0,6 7,2 15,2 9,8 3,5 13,21996 13,6 -1,1 5,9 21,4 14,3 1,6 15,91997 13,9 -0,6 6,1 28,7 16,7 1,9 18,71998 16,2 -1,0 7,9 34,6 20,8 4,2 25,01999 17,0 -0,5 10,5 40,6 22,3 8,0 30,22000 22,7 -1,1 4,5 45,4 23,4 7,5 30,9

Média 16,2 -0,6 7,0 31,0 17,9 4,5 22,3

Fontes e notas: Elaboração dos autores.• Os dados sobre gasto e déficit são de Conjuntura Econômica, agosto de 2001, p. X, e referem-se à execução financeira do Tesouro Nacional.• A dívida mobiliária interna em poder do público no ano t foi dividida pelo PIB do ano t, calculado como a média geométrica do PIB no ano t (ano base) e do PIB no ano t1. Afonte é Conjuntura Econômica, agosto de 2001.• Os dados de necessidades de financiamento e de dívida interna líquida do governo central incluem o governo federal e o Banco Central do Brasil. A fonte é Bacen (RelatórioAnual, diversos anos). Os dados não são perfeitamente comparáveis.

Tabela 10Necessidade de financiamento do setor público, indicadores: 1995-2000

(percentual do PIB)Ano Nominal Operacional Primário Juros

reais1995 7,2 4,9 -0,4 5,21996 5,9 3,8 0,1 3,71997 5,0 4,3 0,9 3,41998 8,0 7,5 -0,01 7,51999 9,5 3,3 -3,1 6,32000 4,5 1,1 -3,5 4,7

Média1983-1994 - 2,4 -2,2 4,61995-2000 8,0 4,2 -1,0 5,2

Fonte e notas: Conjuntura Econômica, agosto de 2001, p. XI.(+) superávit — (-) déficit

Tabela 11Necessidade de financiamento do setor público por esferas

de governo, 1995-2000 (percentual do PIB)Discriminação 1995 1996 1997 1998 1999 2000

Nominal 7,2 5,9 6,1 7,9 10,5 4,5 Governo federal e Bacen 2,3 2,6 2,6 5,4 7,4 3,1 Governos estaduais 3,6 2,7 3,0 1,8 2,7 1,8 Governos municipais - - - 0,2 0,5 0,3 Empresas estatais 1,3 0,6 0,4 0,5 -0,1 -0,7

Primário -0,4 0,1 1,0 0,0 -3,3 -3,5 Governo federal e Bacen -0,6 -0,4 0,3 -0,6 -2,4 -1,9 Governos estaduais 0,2 0,6 0,7 0,4 -0,2 -0,4 Governos municipais - - - -0,2 -0,1 -0,1 Empresas estatais 0,1 -0,1 -0,1 0,3 -0,7 -1,1

Juros nominais 7,5 5,8 5,1 7,9 13,8 8,0 Governo federal e Bacen 2,9 2,9 2,3 6,0 9,8 5,0 Governos estaduais 3,4 2,2 2,3 1,4 2,9 2,2 Governos municipais - - - 0,4 0,5 0,4 Empresas estatais 1,3 0,7 0,5 0,2 0,6 0,3

Fonte: BACEN, Relatório Anual, 1998 e 2000.Notas: Os dados dos governos estaduais e municipais estão agregados em 1995-97.(+) superávit — (-) déficit

Tabela 12Juro, investimento e crescimento, 1983-2000 (em percentagem)

Ano Pagamento dejuros

dívida pública/PIB

Investimento/PIB

Taxa decrescimento

do PIB

Juro/Investimento

Juro/Crescimento

1983 4,7 19,9 -2,9 23,6 –1984 6,9 18,9 5,4 36,5 127,81985 7,0 18,0 7,9 38,9 88,61986 5,2 20,0 4,5 26,0 93,31987 4,5 23,2 3,6 19,4 125,01988 5,7 24,3 -0,1 23,5 –1989 5,9 26,9 3,2 21,9 184,4

1990 3,3 20,2 -5,1 16,3 –1991 1,5 18,1 1,3 8,3 115,41992 4,4 18,4 -0,3 23,9 –1993 2,4 19,3 4,4 12,4 54,51994 3,9 20,8 5,9 18,8 66,1

1995 5,2 20,5 4,2 25,4 123,81996 3,7 19,3 2,7 19,2 137,01997 3,4 19,9 3,3 17,1 103,01998 7,5 19,6 0,2 38,3 –1999 6,3 18,9 0,8 33,3 787,52000 4,7 18,8 4,5 25,0 104,4MemorandoMédia:1983-1989 5,7 21,6 3,1 31,6 123,8*1990-1994 3,1 19,4 1,2 15,9 78,7*1995-2000 6,2 19,5 2,6 26,4 251,1*1983-2000 4,5 20,3 2,4 23,8 162,4*

Fonte: Elaboração dos autores com base em dados do IPEA e BACEN.Notas: Todos os dados são em valores reais, exceto a taxa de investimento, que é emvalores correntes.(*) Média somente dos valores positivos.

Page 71: Armadilha Da Divida

70A ARMADILHA DA DÍVIDA

Tabela 13Carga tributária bruta, por esfera de governo, 1995-1999

(em percentual do PIB)Esferas do governo 1995 1996 1997 1998 1999

Total 28,44 28,63 28,58 29,33 31,67

Federal 18,49 18,89 19,21 19,90 21,84Unidades administrativas 13,01 12,17 13,57 12,95 14,74Previdência 5,48 6,72 5,64 6,95 7,10

Estadual 8,53 8,32 7,90 7,89 8,33Unidades administrativas 8,13 7,95 7,58 7,53 7,97Previdência 0,40 0,37 0,32 0,36 0,36

Municipal 1,43 1,42 1,47 1,54 1,51Unidades administrativas 1,38 1,38 1,42 1,47 1,44Previdência 0,05 0,04 0,05 0,07 0,07

Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Departamento de Contas Nacionais.Carga tributária bruta = impostos + taxas + contribuições.

Tabela 14Receita disponível após as transferências entre as

esferas de governo, 1995-99 (em percentual do PIB)Esferas de governo 1995 1996 1997 1998 1999Total 28,44 28,63 28,58 29,33 31,67

Federal 14,62 14,99 15,12 15,16 16,91Unidades administrativas 9,28 9,31 9,49 8,22 9,82Previdência 5,34 5,68 5,64 6,95 7,10

Estadual 8,66 8,43 8,21 8,33 8,75Unidades administrativas 8,16 7,86 7,84 7,92 8,39Previdência 0,49 0,57 0,36 0,40 0,36

Municipal 5,17 5,21 5,25 5,83 6,01Unidades administrativas 5,10 5,16 5,20 5,77 5,94Previdência 0,07 0,05 0,05 0,07 0,07

Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Departamento de Contas Nacionais.Receita disponível = receita tributária própria + transferências recebidas – transferências concedidas.

Tabela 15Carga tributária líquida, 1995-1999 (percentual do PIB)

Esferas de governo 1995 1996 1997 1998 1999

Total 14,86 15,30 15,28 14,34 16,51

Federal 7,54 8,16 8,45 8,04 9,78Unidades administrativas 9,82 9,65 10,10 9,33 11,13Previdência (-)2,28 (-)1,49 (-)1,64 (-)1,29 (-)1,35

Estadual 6,35 6,14 5,81 5,26 5,71Unidades administrativas 6,43 6,24 5,80 5,26 5,72Previdência (-)0,08 (-)0,09 0,01 (-)0,00 (-)0,00

Municipal 0,97 0,99 1,02 1,04 1,01Unidades administrativas 0,95 0,98 1,01 1,03 1,00Previdência 0,02 0,01 0,01 0,01 0,01

Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Departamento de Contas Nacionais.Carga tributária líquida = impostos + taxas + contribuições - subsídios - benefícios - transferências.

Page 72: Armadilha Da Divida

71 REINALDO GONÇALVES & VALTER POMAR

Tabela 17Dívida mobiliária interna em poder do público,

por indexador, 1997-2001 (distribuição percentual)

Ano Variável Prefixado Câmbio1997 34,8 40,9 15,41998 69,1 3,5 21,01999 61,1 9,2 24,22000 52,4 15,3 21,72001, junho 26,4 10,9 26,4

Fonte e notas: Conjuntura Econômica, agosto de 2001, p. XI.

Tabela 18Estrutura da dívida pública

Governo federal Governos estaduais Governos municipais Empresas estatais

A1. Títulos públicos federais A2. Dívida mobiliária líquida A3. Dívida mobiliária líquida A4. Carteira de títulos públicosB1. Dívida bancária líquida B2. Dívida bancária líquida B3. Dívida bancária líquida B4. Dívida bancária líquidaC1. Depósitos à vista C2. Depósitos à vista C3. Depósitos à vista C4. Depósitos à vistaD1. Assunção de passivo externo de estados,municípios e empresas estatais (Aviso MF-30)

D2. Dívida externa assumida pela União(Aviso MF-30)

D3. Dívida externa assumida pela União(Aviso MF-30)

D4. Dívida externa assumida pela União(Aviso MF-30)

E1. Renegociação com estados, municípios eempresas estatais (Lei no 8.727/93, Lei no

9496/97, PROES, MP 2.043)

E2. Dívida renegociada com a União E3. Dívida renegociada com a União E4. Dívida renegociada com a União

F1. Outras contas: arrecadação a recolher F2. Outras contas: arrecadação arecolher

F3. Outras contas: arrecadação a recolher F4. Outras contas: dívida comfornecedores, debêntures, etc

G1. Moedas de privatizaçãoH1. Recursos do FATI1. Previdência SocialJ1. Banco CentralBase monetáriaOutros depósitos (depósitos compulsórios)Crédito junto às instituições financeiras(PROER etc.) Carteira de fundosDemais contasK1. Dívida externa líquida K2. Dívida externa líquida K3. Dívida externa líquida K4. Dívida externa líquidaL1. Ajuste patrimonial (privatização eincorporação de passivos contingentes“esqueletos” )

L2. Ajuste patrimonial (privatização eincorporação de passivos contingentes“esqueletos” )

L3. Ajuste patrimonial (privatização eincorporação de passivos contingentes“esqueletos” )

M1. Dívida interna líquida = A1+B1+ J1 M2. Dívida interna líquida = A2+B2+ F2 M3. Dívida interna líquida = A3+B3+ +F3 M4. Dívida interna líquida = A4+B4+ +F4N1. Dívida líquida total = M1+K1 N2. Dívida líquida total = M2+K2 N3. Dívida líquida total = M3+K3 N4. Dívida líquida total = M4+K4O1. Dívida fiscal líquida = N1+L1 O2. Dívida fiscal líquida = N2+L2 O3. Dívida fiscal líquida = N2+L2

P. Dívida líquida total do setor público = N1+N2+N3+N4Q. Dívida fiscal líquida do setor público = O1+O2+O3

Nota: Elaboração dos autores.

Tabela 16Dívida líquida do setor público, 1995-2000 (percentual do PIB)

Fonte: BACEN, Relatório Anual, 1998 e 2000.Nota: Em 1994-1996 os dados estão agregados para governos estaduais e municipais.

Discriminação 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000

Dívida fiscal líquida – 30,5 31,4 34,2 41,1 43,5 46,0

Ajuste patrimonial – – 1,9 0,1 0,6 3,9 3,3

Dívida líquida total 29,2 30,5 33,3 34,3 41,7 49,4 49,3 Governo federal e Bacen 12,6 13,2 15,9 18,7 25,0 30,2 30,9 Governos estaduais 9,7 10,6 11,5 12,9 12,2 14,1 14,1 Governos municipais – – – – 1,9 2,2 2,1 Empresas estatais 6,9 6,7 5,9 2,8 2,6 2,8 2,2

Dívida interna 20,8 24,9 29,4 30,0 35,5 39,0 39,5 Governo federal e Bacen 6,4 9,8 14,3 16,7 20,8 22,3 23,4 Governos estaduais 9,4 10,3 11,2 12,4 11,6 13,3 13,3 Governos municipais – – – – 1,8 2,1 2,0 Empresas estatais 5,0 4,9 3,9 0,9 1,2 2,1 0,9

Dívida externa 8,5 5,6 3,9 4,3 6,2 10,4 9,7 Governo federal e Bacen 6,2 3,5 1,6 1,9 4,2 8,0 7,5 Governos estaduais 0,3 0,3 0,4 0,5 0,6 0,8 0,8 Governos municipais – – – – 0,1 0,1 0,1 Empresas estatais 1,9 1,8 2,0 1,9 1,3 1,5 1,3

Page 73: Armadilha Da Divida

72A ARMADILHA DA DÍVIDA

Fonte: Banco Central.Notas: Dados no final do ano.1/ Inclui fundos constitucionais (a partir de junho de 1997).2/ Dívida mobiliária emitida menos títulos em tesouraria.3/ Líquida de reservas internacionais.

Tabela 19Estrutura da dívida líquida do setor público, 1998-2000

1998 1999 2000

% PIB % PIB % PIB Valor (R$)

Dívida fiscal líquida sem privatização 41,1 45,5 45,6 525.360

Ajuste privatização (base: dez/95) - 3,3 - 3,8 - 5,3 - 59.862

Dívida fiscal líquida com privatização 37,8 41,7 40,3 465.498

Ajuste patrimonial – outros (base: dez/95) 4,0 7,7 8,7 97.664

Dívida líquida total 41,7 49,4 49,0 563.163

Governo federal e Banco Central 25,0 30,2 30,7 352.967

Governos estaduais 12,2 14,1 13,9 161.184

Governos municipais 1,9 2,2 2,1 24.139

Empresas estatais 2,6 2,8 2,3 24.873

Dívida interna líquida 35.5 39,0 38,9 451.841

Governo federal e Banco Central 20.8 22,3 23,2 267.573

Títulos públicos federais 34.9 39,6 43,5 489.210

Dívida bancária líquida -2.1 - 3,0 - 3,0 - 36.937

Arrecadação a recolher -0.2 - 0,2 - 0,2 - 292

Aviso MF-30 -0.7 - 0,8 - 0,7 - 7.849

Moedas de privatização 3.0 3,2 2,5 28.077

Recursos do FAT -3.0 - 3,2 - 3,6 - 41.022

Base monetária 4.2 4,6 3,6 47.679

Outros depósitos no Banco Central 2.1 1,5 1,3 14.965

Créditos do Banco Central às inst. financeiras -5.2 - 3,9 - 3,3 - 37.341

Renegociação (Lei no 8.727/93) -0.4 - 0,5 - 0,4 - 4.755

Carteira de fundos 1/ -1.5 - 1,5 - 1,7 - 16.371

Demais contas do Banco Central -0.8 - 0,9 - 1,0 - 12.091

Previdência Social -0.1 - 0,1 - 0,1 - 870

Renegociação estados e municípios -9.4 - 12,6 - 13,6 - 154.830

(Lei no 9.496/97, PROES e MP 2.043)

Governos estaduais 11.6 13,3 13,1 151.557

Dívida mobiliária líquida 2/ 1.3 0,2 0,1 1.720

Dívida bancária 5/ 0.9 0,8 - 1,5 - 14.308

Arrecadação a recolher 0.0 0,0 0,0 - 228

Depósitos à vista -0.2 - 0,1 - 0,1 - 1.197

Aviso MF-30 0.3 0,3 0,3 3.148

Renegociação (Lei no 9.496/97 e PROES) 9.4 12,2 12,0 136.731

Renegociação (Lei no 8.727/93) 2,3 25.692

Governos municipais 1.8 2,1 1,7 22.706

Dívida mobiliária líquida 2/ 1.1 1,0 0,0 481

Dívida bancária 0.8 0,8 0,2 2.228

Arrecadação a recolher 0.0 0,0 0,0 - 49

Depósitos à vista -0.2 - 0,2 - 0,1 - 1.479

Aviso MF-30 0.1 0,1 0,1 828

Renegociação com a União (MP 2.043) - 0,4 1,6 18.100

Renegociação (Lei nº 8.727/93) - 0,2 2.598

Empresa estatais 1.2 1,3 0,9 10.004

Federais -0.3 - 0,5 - 1,0 - 12.520

Dívida bancária 1.0 0,9 1,0 12.036

Depósitos à vista -0.1 0,0 0,0 - 288

Dívida c/ empreiteiros e fornecedores 0.0 0,0 0,0 262

Debêntures 0.0 0,0 0,0 556

Carteira tít. púb. emp. estatais -1.3 - 1,5 - 2,0 - 23.817

Renegociação (Lei no 8.727/93) - 0,1 - 1.268

Estaduais 1.4 1,6 1,7 19.975

Dívida bancária 5/ 1.2 1,2 0,4 4.853

Depósitos à vista 0.0 0,0 0,0 - 215

Carteira tít. púb. emp. estatais 0.0 - 0,1 - 0,1 - 374

Aviso MF-30 0.3 0,4 0,4 3.862

Renegociação (Lei no 8.727/93) 1,0 11.849

Municipais 0.1 0,2 0,2 2.549

Dívida bancária 0.1 0,2 0,0 122

Depósitos à vista 0.0 0,0 0,0 - 35

Aviso MF-30 0.0 0,0 0,0 11

Renegociação (Lei no 8.727/93) 0,2 2.450

Dívida externa líquida 6,2 10,4 9,9 111.322

Governo federal e Banco Central 3/ 4,2 8,0 7,6 85.395

Governos estaduais 0,6 0,8 0,8 9.626

Governos municipais 0,1 0,1 0,1 1.433

Empresas estatais 1,3 1,5 1,3 14.869

Federais 0,8 0,9 0,7 8.299

Estaduais 0,5 0,7 0,6 6.564

Municipais 0,0 0,0 0,0 6

PIB4/ 942.682 1.045.942 100,0 1.142.473

4/ PIB dos últimos 12 meses a preços do mês assinalado. Deflator IGP-C centrado(média geométrica das variações do IGP-DI no mês e no mês seguinte).5/ Inclui debêntures desde julho de 1999.(*) Dados preliminares.

Page 74: Armadilha Da Divida

73 REINALDO GONÇALVES & VALTER POMAR

Tabela 20Detentores dos títulos federais em poder do público, dezembro de 1999

Fonte: ANDIMA. Retrospectiva 1999, p. 102.Notas: (a) Valores apurados com base na posição de carteira avaliada pelo preço de lastro das operações compromissadas.(b) Títulos vinculados a depósito compulsório, aumento de capital, recursos externos, empréstimos de liquidez, caução e depósitos judiciais.(c) Pessoa jurídica financeira abrange instituições sem conta individualizada no Sistema Especial de Liquidação e Custódia (Selic).(d) Os dados referem-se às contas Cliente Especial – FIF.

Tabela 21Estoque de títulos públicos e privados, 1994-2000

(valores em R$ bilhões, coeficientes em percentagem)

Ano (final) Dívida públicamobiliária (A)

Ativosprivados (B)

Total(C)

Participaçãodos títulos

públicos (A/C)

Participaçãodos títulos

privados (B/C)

PIB (D) Títulospúblicos /PIB(A/D)

Títulosprivados /PIB (B/D)

1994 61,8 76,4 138,2 44,7 55,3 475 13,1 16,11995 108,5 104,7 212,3 50,9 49,1 709 15,2 14,81996 176,2 107,4 283,6 62,1 37,9 824 21,4 13,01997 255,5 122,6 378,1 67,6 32,4 892 28,7 13,71997 323,9 129,5 453,4 71,4 28,6 937 34,6 13,81999 414,9 127,1 542,0 76,5 23,5 1023 40,6 12,42000 516,1 129,9 646,0 79,9 20,1 1136 45,4 11,4

Fonte: Elaboração dos autores com dados da ANDIMA (2001), p. 35 e 39.Nota: A dívida mobiliária interna em poder do público no ano t foi dividida pelo PIB do ano t, calculado como a média geométrica do PIB no ano t e do PIB no ano t+1. Afonte é Conjuntura Econômica, agosto de 2001.

Tabela 22Composição da carteira de títulos do setor bancário,

dezembro de 2000(em percentagem)

Item Bancospúblicos

Bancosprivadosnacionais

Bancosestrangeiros

Total dosetor

bancárioTítulos de renda fixa 47,0 33,0 50,1 43,2 Títulos públicos (Tesouro e Banco Central) 46,7 21,5 46,8 38,2 Títulos privados 0,3 11,5 3,3 5,0Títulos de renda variável 1,5 1,2 2,1 1,6Títulos vinculados a operações 42,6 50,4 28,6 41,0Títulos vinculados ao Banco Central 8,6 1,1 4,5 4,8

Fonte: ANDIMA (2001), p. 67.

Detentor Valor(R$ bilhões) (a)

Participaçãopercentual

1. Carteira própria 146,9 37,7

2. Títulos vinculados (b) 40,0 10,3

3. Clientes, total 198,3 50,9 Pessoa física 1,8 0,5 Pessoa jurídica não financeira 35,2 9,0 Pessoa jurídica financeira (c) 6,2 1,6 FIF (d) 145,5 37,3 Outros fundos 9,6 2,5

4. Mercado, total (1+2+3) 385,2 98,8

5. Extramercado 4,6 1,2

Total (4+5) 389,8 100,0

Page 75: Armadilha Da Divida

74A ARMADILHA DA DÍVIDA

Tabela 23Dívida pública e receita dos bancos, 1994-2000

(receita com títulos e valores mobiliários como percentual da receita total dos bancos)Ano Bancos

públicosBancosprivadosnacionais

Bancosestrangeiros

1994 7,3 10,1 4,21995 5,6 10,4 9,61996 6,1 13,1 17,71997 6,1 21,8 33,11998 19,7 27,5 41,41999 19,9 31,2 51,92000 24,4 28,8 48,9

Fonte: ANDIMA (2001), p. 71-72.

Tabela 24Desnacionalização do setor bancário brasileiro

Participação percentual de bancos com controle estrangeiroAno Ativos Depósitos Créditos

1993 8,4 4,8 6,61994 7,2 4,6 5,21995 8,4 5,4 5,71996 9,8 4,4 8,61997 12,8 7,5 11,71998 18,4 15,1 14,91999 23,2 16,8 19,82000 23,9 18,3 20,3

Fonte: ANDIMA (2001), p. 33.

Tabela 25Panorama das finanças públicas no Brasil, 1850-2000(governo central, coeficiente médio, percentual do PIB)

Período Gastos Déficit (-) ousuperávit (+)

Dívida interna

1851-1864 8,1 -0,3 11,61865-1889 10,4 -2,4 25,01890-1913 9,5 -1,1 13,41914-1929 8,5 -2,0 11,71930-1945 8,8 -1,7 9,41946-1955 7,5 -0,4 3,51956-1963 8,8 -2,0 0,61964-1979 10,4 -0,2 5,21980-1984 9,5 -0,7 5,61985-1989 13,9 -2,6 9,01990-1994 12,4 0,5 6,21995-2000 16,2 -7,0 31,0

Memorando1851-1889 9,6 -1,6 20,21890-1913 9,5 -1,1 13,41914-1945 8,8 -1,7 10,51946-1963 8,0 -1,1 2,21964-1979 10,4 -0,2 5,21980-1994 11,9 -1,0 6,91995-2000 16,2 -7,0 31,0

Fonte: Elaboração dos autores com base em dados de Goldsmith (1986), Abreu et alli (1990), IBGE(1990), Giambiagi e Além (1999) e BACEN (Relatórios Anuais, 1998 e 2000).Notas: Os dados não são perfeitamente comparáveis.1850-79: valores correntes.1980-94: superávit e déficit referem-se ao conceito “operacional”.1980-84: o déficit médio é uma estimativa baseada em dados de Giambiagi e Além (1999, p. 100)para os déficits operacionais do setor público e a participação do governo central na dívida líquidado setor público no período 1981-1984.1995-2000: déficit refere-se à necessidade de financiamento da União e do Banco Central noconceito “nominal”.1980-2000: dívida interna refere-se à dívida mobiliária interna em poder do público.

Tabela 26Unidades do Sistema Monetário Brasileiro

Unidade monetária Vigência Símbolo Normativo Correspondência

Real (plural: Réis) Período Colonial até7.10.1833

R Alvará S/N, de 1.9.1808 R 1$200 = 1/8 de ouro de22 K

Mil Réis 8.10.1833 a 31.10.1942 Rs Lei n0 59, de 8.10.1833 Rs 2$500 = 1/8 de ouro de22 K.

Cruzeiro 1.11.1942 a 30.11.1964 Cr$ DL n0 4.791, de 5.10.1942 Cr$ 1,00 = Rs 1$000 (umcruzeiro corresponde a mil-réis)

Cruzeiro (eliminados oscentavos)

1.12.1964 a 12.2.1967 Cr$ Lei n0 4.511, de 1.12.1964 Cr$ 1 = Cr$ 1,00

Cruzeiro Novo (voltaramos centavos)

13.2.1967 a 14.5.1970 NCr$ DL n0 1, de 13.11.1965, Decreton0 60.190, de 8.2.1967, e Res.CMN n0 47, de 8.2.1967.

NCr$ 1,00 = Cr$ 1.000

Cruzeiro 15.5.1970 a 14.8.1984 Cr$ Res. CMN n0 144, de 31.3.1970 Cr$ 1,00 = NCr$ 1,00Cruzeiro (eliminados oscentavos)

15.8.1984 a 27.2.1986 Cr$ Lei n0 7.214, de 15.8.1984 Cr$ 1 = Cr$ 1,00

Cruzado (voltaram oscentavos)

28.2.1986 a 15.1.1989 Cz$ DL n0 2.283, de 27.2.1986, DL n0

2.284, de 10.3.1986, e Res. CMNn0 1.100, de 28.2.1986.

Cz$ 1,00 = Cr$ 1.000

Cruzado Novo 16.1.1989 a 15.3.1990 NCz$ Res. CMN n0 1.565, de 16.1.1989e Lei n0 7.730, de 31.1.1989.

NCz$ 1,00 = Cz$ 1.000,00

Cruzeiro 16.3.1990 a 31.7.1993 Cr$ Res. CMN n0 1.689, de18.3.1990, e Lei n0 8.024, de12.4.1990.

Cr$ 1,00 = NCz$ 1,00

Cruzeiro Real 1.8.1993 a 30.6.1994 CR$ Res. CMN n0 2.010, de 2.7.1993,e Lei n0 8.697, de 27.8.1993.

CR$ 1,00 = Cr$ 1.000,00

Real A partir de 1.7.1994 R$ Res. CMN n0 2.082, de 30.6.1994e Lei n0 9.069, de 29.6.1995.

R$ 1,00 = CR$ 2.750,00

Fonte: Banco Central do Brasil. Manual de Finanças Públicas. Brasília, Bacen, 2001, Anexo 3, p. 184

Page 76: Armadilha Da Divida

75 REINALDO GONÇALVES & VALTER POMAR

Tabela 27Panorama histórico da dívida pública

Período Dívida interna Dívida externa Dívidapredominante

1851-1864 Estabilidade comoscilação moderada

Grande oscilação Dívida interna

1865-1889 Aumento extraordinário(Guerra do Paraguai, secano Nordeste) comtendência de crescimentoem todo o período

Tendência de aumento comgrande oscilação

Dívida interna

1890-1913 Comportamento cíclico:redução (até 1900),aumento (1901-1905) eredução (1906-1913)

Tendência de crescimentosignificativo

Dívida externa

1914-1929 Aumento inicialsignificativo e oscilaçãomoderada (1919-1929)

Oscilação, sem tendência Dívida externa

1930-1945 Grande oscilação Redução significativa,renegociação

Dívida externa

1946-1955 Tendência forte deredução

Tendência de redução Dívida interna

1956-1963 Estabilidade Tendência de redução Dívida interna1964-1979 Tendência forte de

aumentoTendência de crescimentosignificativo

Dívida externa

1980-1984 Tendência de aumento Crise e tendência deaumento significativo

Dívida externa

1985-1989 Grande oscilação Aumento Dívida externa1990-1994 Redução abrupta

(congelamento de 1990-1991) e crescimentosignificativo (1992-1994)

Estabilidade e renegociação Dívida externa

1995-2001 Forte tendência decrescimento acelerado

Tendência de crescimentoacelerado

Dívidainterna/Dívidaexterna

Tabela 28Finanças do governo central,

1851-1889 (percentual do PIB)Ano Gastos Superávit (+)

ou déficit (-)Dívidainterna

1850 - - -1851 8,6 -0,1 14,2*1852 10,4 -1,2 13,6*1853 7,5 1,5 13,7*1854 8,2 -0,4 13,61855 8,2 -0,6 12,7*1856 7,8 -0,3 11,8*1857 7,2 1,6 10,9*1858 8,5 -0,3 10,2*1859 8,2 -0,9 9,8*1860 7,8 -1,3 9,5*1861 7,5 -0,3 9,31862 7,7 -0,1 10,4*1863 8,1 -1,2 11,2*1864 7,6 -0,2 11,71865 9,9 -3,1 14,91866 13,0 -6,8 17,4*1867 11,7 -5,4 19,5*1868 14,4 -8,2 20,61869 12,3 -5,2 20,21870 11,7 -0,3 21,4*1871 8,7 0,1 23,4*1872 8,7 -1,0 23,91873 9,9 -1,5 23,6*1874 9,6 -1,7 24,91875 9,7 -2,0 24,71876 9,8 -2,8 25,0*1877 10,3 -3,2 24,41878 10,8 -5,0 25,4*1879 12,9 -2,1 27,81880 9,9 -0,7 26,81881 9,2 -0,6 28,11882 9,1 -1,5 28,6*1883 10,0 -1,4 29,71884 9,8 -2,3 28,9*1885 9,8 -1,7 28,71886 9,2 -0,5 27,9*1887 9,1 -0,7 31,11888 9,2 0,2 30,6*1889 10,5 -1,4 28,8

Memorando1851-64 8,1 -0,3 11,61865-89 10,4 -2,4 25,01851-89 9,6 -1,6 20,2

Fontes e notas: Elaboração dos autores com base em Goldsmith(1986), p. 73. Os dados referem-se à dívida interna total(consolidada + não consolidada). O asterisco refere-se aos dadosobtidos por interpolação aritmética.

Tabela 29Dívidas do governo central, anos

selecionados, 1849-1888Ano Como percentual da

receita do governoComo percentual do PIB

Dívidaexterna

Dívidainterna

Dívidaexterna

Dívidainterna

1849 135 - 10,4 -1854 96 174 7,3 13,31859 92 - 6,6 9,81864 124 159 8,8 11,21869 186 337 13,1 23,71874 125 301 9,8 23,61879 95 258 9,5 25,81884 117 385 8,6 28,21888 121 310 10,8 27,7

Fontes e notas: Goldsmith (1986), p. 76.

Tabela 30Financiamento do déficit dogoverno central, 1850-1913

(valores em bilhões de mil-réis)Período Déficit Fontes internas de

financiamentoFontes

externasPapel-moeda Empréstimos Empréstimos

1850-1859 0,01 -0,01 0,01 0,011860-1864 0,04 -0,01 0,03 0,021865-1869 0,32 0,11 0,20 0,051870-1879 0,26 0,04 0,10 0,041880-1889 0,16 0,00 0,07 0,131890-1899 0,67 0,55 0,20 0,421900-1909 -0,17 -0,10 -0,08 1,191910-1913 0,50 -0,03 0,17 0,46

Memorando1850-1865 0,05 -0,02 0,04 0,031870-1889 0,42 0,04 0,17 0,171850-1889 0,79 0,14 0,41 0,231890-1913 1,34 0,42 0,29 2,08

Fontes e notas: Goldsmith (1986), p. 77.

Page 77: Armadilha Da Divida

76A ARMADILHA DA DÍVIDA

Tabela 31Finanças do governo central,

1890-1913(percentual do PIB)

Ano Gastos Superávit (+)ou déficit (-)

Dívidainterna

1890 10,5 -1,2 25,61891 7,5 0,3 18,21892 8,0 -1,5 15,51893 8,5 -1,2 15,21894 9,3 -2,7 13,31895 8,3 -0,9 12,91896 8,7 -0,5 12,61897 8,4 -1,7 14,11898 13,6 -7,0 13,01899 6,0 0,5 13,01900 9,6 -2,8 11,31901 8,3 -0,7 14,11902 7,8 1,2 14,91903 9,2 1,3 14,31904 10,6 -0,5 13,31905 9,2 0,6 14,01906 9,7 0,2 12,81907 10,5 0,3 11,11908 10,6 -1,5 11,31909 9,9 -1,3 10,71910 10,8 -1,7 10,21911 11,0 -1,9 10,01912 11,0 -2,4 9,71913 11,5 -1,6 11,0

Memorando1890-1913 9,5 -1,1 13,4

Fontes e notas: Elaboração dos autores com base emGoldsmith (1986), p. 121-122. Os dados referem-se àdívida interna consolidada.

Tabela 32Dívida do governo federal, anos

selecionados, 1889-1913(percentual do PIB)Ano Dívida

internaDívidaexterna

Dívidatotal

1889 23,6 14,2 37,81894 13,1 19,2 32,31899 13,5 31,6 45,11904 13,7 34,1 47,81909 10,1 33,2 43,31913 16,4 35,7 52,1

Fontes: Goldsmith (1986), p. 125.Notas: Dados como proporção do PIB no final do ano.Os dados sobre dívida interna diferem e, portanto, há umadiferença com relação ao indicador dívida interna/PIBmostrado em outra tabela.

Tabela 33Pagamento de juros pelo governo

federal, anos selecionados,1889-1913

Ano Juro como percentual dareceita do governo

Juro como percentual doProduto Interno Bruto

Dívidainterna

Dívidaexterna

Dívidatotal

Dívidainterna

Dívidaexterna

Dívidatotal

1889 6,4 5,6 12,0 0,47 0,41 0,881894 5,1 7,6 12,7 0,36 0,54 0,901899 11,0 14,8 25,8 0,96 1,30 2,261904 8,4 16,0 24,4 0,67 1,26 1,931909 6,2 14,6 20,8 0,57 1,35 1,921913 7,7 12,9 20,6 0,61 1,01 1,62

Fontes e notas: Goldsmith (1986), p. 125.

Tabela 34Carga tributária e distribuição da

receita por níveis de governo,anos selecionados, 1856-1945

(em %)Ano Receita

tributária/PIBParticipação do governo

Federal Estadual Municipal1856 9,9 81,5 15,5 3,01886 10,2 76,3 18,5 5,21907 16,4 65,8 25,4 8,81913 15,4 64,3 26,6 9,11918 11,0 58,5 30,9 10,61921 11,9 57,9 32,4 9,71925 10,8 56,6 34,7 8,81929 12,5 54,2 35,4 10,41931 14,5 50,0 38,2 11,81935 14,8 53,9 37,2 8,91939 15,5 55,8 33,2 11,01945 13,2 55,7 36,1 8,2

Fontes e notas: Goldsmith (1986), p. 71 e 200.

Tabela 35Finanças do governo central,

1914-1945 (percentual do PIB)Ano Gastos Superávit (+)

ou déficit (-)Dívidainterna

1914 13,6 -6,1 15,81915 10,6 -4,4 14,51916 8,9 -2,7 12,71917 8,9 -2,9 12,01918 9,0 -2,6 11,81919 8,3 -2,7 10,51920 8,2 -2,0 9,91921 9,2 -2,3 13,91922 9,5 -3,0 13,61923 7,4 -1,5 11,11924 6,8 -0,2 11,21925 6,1 -0,1 10,01926 7,5 -0,9 11,41927 7,5 0,1 10,61928 7,1 -0,4 8,61929 7,4 -0,7 9,0

1930 9,2 -3,0 12,11931 8,5 -1,2 9,81932 11,2 -4,3 9,31933 8,8 -1,2 8,81934 10,5 -1,8 10,11935 8,4 -0,4 10,31936 8,3 -0,3 9,61937 9,3 -1,5 8,81938 9,9 -1,8 9,31939 9,7 -1,0 10,81940 9,7 -1,0 12,51941 8,8 -1,1 10,41942 9,2 -2,0 8,21943 7,5 -0,6 7,21944 7,5 -0,1 5,71945 8,1 -0,7 7,0

Memorando1914-29 8,5 -2,0 11,71930-45 9.0 -1,4 9.41914-45 8,8 -1,7 10,5

Fontes e notas: Elaboração dos autores com base em Goldsmith(1986), p. 202. Os dados se referem à dívida interna consolidada.Os dados da última coluna são de Abreu et alii (1990, p. 397).Os dados não são perfeitamente comparáveis.

Ano Percentual do produtointerno bruto

Percentual da receita estatal

Dívidainterna

Dívidaexterna

Dívidatotal

Dívidainterna

Dívidaexterna

Dívidatotal

1913 12 25 37 112 289 4011918 10 20 30 163 336 4991929 7 20 27 106 192 2981931 9 36 45 127 509 6361939 10 22 32 117 261 3781945 6 5 11 88 83 171

Tabela 36Dívida consolidada do governo fede-ral, anos selecionados, 1913-1945

Fontes e notas: Goldsmith (1986), p. 205.

Page 78: Armadilha Da Divida

77 REINALDO GONÇALVES & VALTER POMAR

Tabela 37Gastos do governo federal, anos

selecionados, 1914-1945(distribuição percentual)

Fontes e notas: Goldsmith (1986), p. 203.

Tabela 38Finanças do governo central,

1946-1963(percentual do PIB)

Fontes e notas: Elaboração dos autores. Os dados sobre gastos sãode Goldsmith (1986), p. 310, e referem-se à dívida internaconsolidada. Os dados da última coluna são de Abreu et alii (1990),p. 402 e 407. Os dados não são perfeitamente comparáveis.

Tabela 39Dívidas interna e externa do setor

público, anos selecionados,1945-1964 (percentual do PIB)

Fontes e notas: Goldsmith (1986, p. 315).

Tabela 40Finanças do governo central,

1964-1979(percentual do PIB)

Fontes e notas: Elaboração dos autores. Os dados sobre gasto, déficite PIB são de IBGE (1990), p. 617. Os dados da última coluna sãode Abreu et alii (1990), p. 407 e 412. Os dados não são perfeitamentecomparáveis.

Tabela 41Dívidas interna e externa do setor público, anos selecionados

(percentual do PIB)

Fontes: Goldsmith (1986), p. 492.Nota: Os indicadores referem-se ao percentual do PIB no fim do ano (média geométrica do PIB do ano e doano seguinte) e, portanto, esses dados não são comparáveis com os de outras tabelas.

Ano Dívida pública Formação brutade capital fixo

Outros Total

1914 18,0 21,5 60,5 100,01918 29,6 29,1 41,3 100,01921 20,5 25,7 53,8 100,01929 30,2 4,8 65,0 100,01931 36,5 3,2 60,3 100,01939 19,0 18,0 63,0 100,01945 13,4 14,2 72,4 100,0

Ano Gastos Superávit (+)ou déficit (-)

Dívidainterna

1946 8,5 -1,6 5,91947 7,2 0,3 5,61948 7,3 0,0 5,01949 8,3 -1,1 4,31950 8,0 -1,5 3,71951 6,5 0,9 3,01952 6,5 0,5 2,51953 7,6 -0,5 2,11954 7,1 -0,4 1,61955 7,6 -0,9 1,31956 9,4 -2,9 1,01957 8,5 -2,3 0,91958 8,8 -1,8 0,71959 8,0 -1,1 0,51960 8,3 -1,0 0,41961 8,8 -2,1 0,31962 9,3 -2,7 0,41963 9,0 -2,3 0,41964 10,1 -2,8 0,6

Memorando1946-55 7,5 -0,4 3,51956-63 8,8 -2,0 0,61946-63 8,0 -1,1 2,2

Ano Dívida interna Dívida externa Dívida total1945 16,9 10,2 27,11950 17,0 3,1 20,21954 13,1 2,3 15,41959 11,1 0,7 11,81964 3,7 0,2 4,0

Ano Gastos Superávit (+)ou déficit (-)

Dívida interna

1964 10,6 -2,9 0,61965 10,3 -1,9 0,41966 9,7 -0,1 1,81967 9,9 -1,0 3,81968 10,0 0,2 3,31969 12,4 0,6 3,21970 14,5 0,8 4,41971 10,1 0,4 5,91972 11,0 0,4 7,51973 9,9 0,4 4,31974 9,6 0,5 4,61975 9,9 -0,3 6,01976 10,3 0,3 9,41977 9,9 0,2 9,71978 9,8 0,0 9,91979 9,1 0,0 8,6

Memorando1964-79 10,4 -0,2 5,2

Ano Governo federal Governosestaduais emunicipais

Total Dívida interna Dívida externa1964 – 2,9 – –1968 13,8 6,4 7,4 0,461970 12,8 5,9 6,9 0,481973 13,8 6,2 7,6 0,531974 14,5 5,4 9,1 0,611975 16,6 7,3 9,3 1,041976 18,0 7,5 10,5 1,121977 19,0 7,8 11,2 1,011978 20,5 7,4 13,1 0,971979 22,7 5,8 16,9 0,931980 18,5 4,6 13,9 0,81

Page 79: Armadilha Da Divida

78A ARMADILHA DA DÍVIDA

Tabela 42Finanças do governo central, 1980-1994

(percentual do PIB)

Fontes e notas: Elaboração dos autores.Os dados sobre gasto e déficit são de Conjuntura Econômica, agosto de 2001, p. X., e se referem à execução financeira doTesouro Nacional.A dívida mobiliária interna em poder do público foi dividida pelo PIB do ano t, calculado como a média geométrica do PIB noano t e do PIB no ano t1. A fonte é Conjuntura Econômica, agosto de 2001.Os dados sobre superávit ou déficit operacional e sobre dívida interna líquida do governo central são de Giambiagi (1999), p.99, e Além (1999), p. 157. A dívida líquida pode ser negativa porque o crédito pode ser maior do que o passivo.Os dados não são perfeitamente comparáveis.

Tabela 43Necessidade de financiamento do setor público, 1981-1994

(percentual do PIB)

Fontes: Conjuntura Econômica, agosto de 2001, p. XI.Notas: (+) superávit — (-) déficit

Ano Gastos Superávit (+)ou déficit (-)

Superávit (+)ou déficit (-)operacional

Dívida mobiliáriainterna em poder

do público

Dívida internalíquida do

governo central1980 9,8 1,6 – 3,4 –1981 9,2 1,2 – 6,2 -0,21982 9,3 1,3 – 6,5 0,01983 10,0 1,3 – 4,6 2,71984 9,2 0,6 – 7,4 5,91985 8,7 1,0 -1,2 11,5 5,51986 13,6 -2,9 -1,3 5,5 2,51987 12,0 -1,6 -3,2 7,2 1,31988 17,9 -5,8 -3,5 9,5 2,51989 17,1 -5,6 -4,0 11,1 6,81990 13,0 0,4 2,4 3,0 0,41991 10,4 0,5 -0,1 2,3 -3,61992 11,1 -0,2 -0,6 5,5 -0,61993 14,0 -2,2 -0,6 7,1 0,91994 13,4 0,4 1,6 13,0 3,0

Memorando1980-84 9,5 1,2 – 5,6 2,11985-89 13,9 -3,4 -2,6 9,0 3,71990-94 12,4 -0,2 0,5 6,2 0,021980-94 11,9 -0,7 -1,0 6,9 1,9

Ano Operacional Primário Juros reais

1981 5,9 - -1982 6,6 - -1983 3,0 -1,7 4,71984 2,7 -4,2 6,91985 4,4 -2,6 7,01986 3,6 -1,6 5,21987 5,5 1,0 4,51988 4,8 -0,9 5,71989 6,9 1,0 5,91990 -1,3 -4,6 3,31991 1,4 -2,9 1,51992 2,2 -2,3 4,41993 -0,3 -2,7 2,41994 -1,3 -5,1 3,9

1983-94 2,4 -2,2 4,6

Page 80: Armadilha Da Divida

79 REINALDO GONÇALVES & VALTER POMAR

Tabela 44Finanças públicas, contas nacionais, 1971-1994

(percentual do PIB)

Fontes e notas: Varsano (1996), apud Giambiagi e Além (1999), p. 122.

Tabela 45Dívida líquida do setor público, 1981-1994

(percentual do PIB)

Período Receitatributária

Salários eencargos

Outrasdespesascorrentes

Assistência eprevidência

Subsídios Jurosreais

Poupançagoverno

1971-1975 25,3 7,4 2,9 6,7 1,5 0,5 6,3

1976-1980 25,1 6,8 2,9 7,6 2,1 0,8 4,9

1981-1985 25,3 6,9 3,1 8,5 2,3 3,0 1,5

1986-1990 25,5 9,2 4,7 8,2 1,7 2,3 -0,6

1991-1994 26,8 9,4 6,5 10,1 1,2 2,4 -2,8

1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 Média

Governo central 4,2 5,9 17,2 19,5 16,8 15,7 17,6 17,4 18,3 14,4 10,9 10,7 8,7 9,2 13,3 Dívida interna -0,2 0,0 2,7 5,9 5,5 2,5 1,3 2,5 6,8 0,4 -3,6 -0,6 0,9 3,0 1,9 Dívida externa 4,4 5,9 14,5 13,6 11,3 13,2 16,3 14,9 11,5 14,0 14,5 11,3 7,8 6,2 11,4

Estados e municípios 4,2 5,4 6,4 7,0 7,0 6,5 6,8 6,6 5,8 6,6 6,9 9,2 9,3 9,8 7,0 Dívida interna 3,3 4,3 4,8 5,2 4,9 4,7 5,2 5,2 4,9 5,5 5,9 8,1 8,3 9,5 5,7 Dívida externa 0,9 1,1 1,6 1,8 2,1 1,8 1,6 1,4 0,9 1,1 1,0 1,1 1,0 0,3 1,3

Empresas estatais 15,3 18,2 25,9 26,9 26,3 22,7 22,9 21,5 14,8 17,5 17,5 15,8 14,2 7,0 19,0 Dívida interna 5,7 7,2 9,1 9,1 9,1 9,0 10,8 12,0 8,6 9,6 9,7 9,5 8,6 5,1 9,5 Dívida externa 9,6 11,0 16,8 17,8 17,2 13,7 12,1 9,5 6,2 7,9 7,8 6,3 5,6 1,9 9,5

TotalDívida líquida 23,7 29,5 49,5 53,4 50,1 44,9 47,3 45,5 38,9 38,5 35,3 35,7 32,2 26,0 39,3 Dívida interna 8,8 11,5 16,6 20,2 19,5 16,2 17,3 19,7 20,3 15,5 12,0 17,0 17,8 17,6 16,4 Dívida externa 14,9 18,0 32,9 33,2 30,6 28,7 30,0 25,8 18,6 23,0 23,3 18,7 14,4 8,4 22,9

Page 81: Armadilha Da Divida

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