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ano 2 núMero 4 fevereiro 2013 Almanaque UBERLÂNDIA DE ONTEM & SEMPRE UMa ProDUÇÃo nós Projetos De conteúDo

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Almanaque finalizado

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  • ano 2 nMero 4 fevereiro 2013

    AlmanaqueuberlndiA de ontem & sempreUMa ProDUo ns Projetos De conteDo

  • direoCelso Machado

    realizaoPaulo Henrique Petri

    edio e projeto grficoAntonio Seara

    pesquisa e reportagemnbia Mota

    colaboraoAdriana FariaAdemir reisAntnio PereiraAnasa ToledoCarlos GuimaresClarissa AranyCora Capparelliilma de Moraes Jlio Csar de Oliveiranara SbreebowOscar Virglio

    capaHlvio de lima

    fotografiasroberto ChacurAcervos pessoais Arquivo PblicoCorreio de uberlndia

    revisoilma de Moraes

    tratamento de imagemnideias

    agradecimentosCarlos roberto ViolaCristiana Heluy de Castro

    rua tenente virmondes, 997centro, uberlndia mgfone: (34) 3236-8133www.close.com.br

    Sumrio2012 FUTEBOL

    racha rene ex-atletas 6

    1968-2012 paTrimniO

    Memria curta 8

    1933-2013 vida EmprEsariaL

    ACiub 80 anos 12

    1966 anTEs da qUEda dO mUrO

    Verdo x rssia 16

    1960 FacULdadE dE FiLOsOFia

    no rumo da uFu 18

    martinsiabonecas Pretas 20

    GenTe nOSSAdona Julieta Cupertino 22

    1943 a gOyana

    Templo da moda 28

    1996 INSTITUTO dO CORAO

    Cirurgia pioneira 30

    1938 JOrnaLismO

    Correio 75 anos 32

    1920 ImIgRAO jApONeSA

    Templo no cerrado 36

    boemiaSombrias noites 38

    artista da capaHlvio de lima 40

    UMA CIDADE EDUCADORA

    INCENTIVO:PRODUOREALIZAOPATROCNIO

  • concluir uma nova edio do almana-que uberlndia de ontem e sempre sempre uma alegria enorme que no deixa de provocar uma certa angstia pela incer-teza da reao que ir causar.por mais que tenhamos cuida-do, ateno e zelo, quando se lida com fatos e registros his-tricos, h sempre a probabili-dade de algum equvoco.mas, s erra quem faz.a tentativa de recuperar, regis-trar e valorizar uma histria to rica quanto a de uberln-dia e de sua gente vale esse risco.neste quarta edio, procura-mos mesclar fatos histricos relevantes com curiosidades. dentre todas as matrias, nos permitimos dois destaques. um para uma mulher que tem uma trajetria de vida exemplar e dignificante, julie-ta cupertino.de uma das nossas famlias tradicionais ela , aos 105 anos, a referncia viva do que h de melhor em nossa cidade. exemplo de uma mulher ativa, moderna e atuante. para quem o tempo nunca foi um proble-ma, mas um aliado. uma uber-landense que orgulha a todos ns.o outro destaque um alerta: o descuido que temos tido com nosso patrimnio pbli-co. prdios histricos demoli-

    dos pela insensibilidade da iniciativa privada e tambm da pblica, como foi o caso do antigo frum abelardo penna, um prdio de rara beleza ar-quitetnica que o estado der-rubou. at a igreja, normal-mente to conservadora, mo-dernizou seus templos, per-dendo a riqueza de suas con-cepes originais.ainda temos muito o que pre-servar e bom fazer isso en-quanto tempo. o distrito de cruzeiro dos peixotos um desses patrimnios que po-dem e devem ser cuidadosa-mente avaliados pelo poder pblico municipal. com seu jeito buclico, suas casas cen-tenrias, seu ar de tranquilida-de e encanto, corre um risco danado de ser sacrificado pela ganncia da modernidade. pe-los minha casa minha vida.s que pouco adianta tombar e no assumir os encargos de restaurao e manuteno.uberlndia tem sim (ainda) um patrimnio histrico valio-so que merece ser preservado, para que todos saibam que aqui tem gente empreendedo-ra, voltada para o futuro, mas que reverencia e preserva suas tradies. que tem dinamismo mas tambm sensibilidade.fica o registro e o alerta.boa leitura a todos.

    Celso Machadoengenheiro de Histrias

    Carta ao leitor

    1960 aFOnsO pEna

    A rua da lavoura 42

    1911 feRNANdO vIlelA

    Fazedor de estradas 44

    1950 vErEadOrEs

    A servio do eleitor 48

    scULO 17 cOLOnizaO

    A grande Caiapnia 51

    dcada dE 1960 pErsOnagEm

    Astolfo Silva 54

    1970 mOgiana

    A estao no cho 57

    1960 iOnEi siLva

    Mestre dos Magos 60

  • MeMriA e HiSTriA eM diFerenTeS CAPTulOS

    Calendrio

    uberlndia ganhou um calen-drio de mesa personalizado, com imagens antigas de locais modificados ou extintos com o tempo. no decorrer dos meses, as pessoas tm em casa ou no local de trabalho, 12 registros do filme uber-lndia cidade menina, uma pelcula da dcada de 40 feita pela cia. ci-nemathogrfica do rio de janeiro e recuperada pela close comunicao. a tiragem modesta de 500 exempla-res esgotou em dois dias. a recep-tividade mais uma vez suplantou a modesta previso.no fim do ano, ser lanada a se-gunda edio e com tiragem mais adequada.

    eventos

    em cada lanamento do almanaque uberlndia de ontem e sempre promovido um evento em que os personagens podem conviver com a

    obra e so apresentados registros do programa.desde a terceira edio homenage-ada uma figura relevante da histria uberlandense.como futebol tambm tem histria, em dezembro ltimo foi promovido um racha reunindo ex-atletas. um re-encontro em que o menos importan-te o resultado e o mais relevante, a recordao da histria de cada um. das passagens e lembranas de suas carreiras. o nome do racha e o slogan demonstram esse objetivo: racha dos velhos malandros, um jogo de vida ou gole!o evento foi destaque no correio de uberlndia.uma turma que j passou dos 50 anos, que sabe tudo de bola e tem muita histria para contar o ingre-diente perfeito para o projeto racha dos velhos malandros, idealizado pelo jornalista celso machado. o pro-jeto, que ser realizado uma vez por ano, integra o programa de tv uber-lndia de ontem e sempre.

    uberlndia de Ontem e Sempre, que comeou h sete anos com um pro-grama de tv, h dois lanou a verso impressa no formato almanaque, est dis-ponvel em site e continua ampliando formatos focando sempre na memria e histria de nossa cidade

    6 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    Fotos: Cleiton Borges

    Trs craques de geraes diferentes: Fazendeiro, Arara e Vilfredo

    Paulo Henrique entrega a charge que homenageia o craque Fazendeiro.

  • uberlndia de ontem e sempre um projeto maior que um programa de televiso. temos o almanaque, um site, lanamos o calendrio e va-mos fazer eventos artsticos. pensei ento em um evento futebolstico, porque futebol tem suas histrias que precisam ser relembradas, disse celso machado.na primeira edio do racha, o home-nageado foi edson gonzaga souza, o fazendeiro, dolo do uberlndia es-porte clube (uec) durante a dcada de 1960 e incio dos anos 70.sobre a homenagem, fazendeiro, de 70 anos, no esconde a emoo e ressalta a importncia do evento. uma iniciativa fantstica do celso. num momento como este que a gen-te v que, ao longo da vida, fez tantas amizades. sou muito grato pelo reco-nhecimento e sempre que o evento for realizado, quero estar junto, par-ticipando, mesmo sem ter condies para jogar, disse o ex-jogador que ganhou o apelido porque o pai tinha uma pequena propriedade rural no

    Fazendeiro destaca a importncia da homenagem

    racha dos Velhos Malandros resgata memrias do esporte e rene ex-atletas

    Edmundo, Banga, Gildo, Z Carlos, Fazendeiro, Arara,Viola, Celso, Marcelo, Lzio, Batista, Junior, Chico, Fernandinho, Moacir, Pascoal, Paulo Henrique, Hugsmar, Sidney, Ramiro, Estrango, Vilfredo e Zzinho, os craques daprimeira verso do Racha dos Velhos Malandros

    Quem sabe nunca esquece, Hugsmar e o seu toque de classe.

    Um dos maiores goleadores com um dos maiores goleiros, Fazendeiro e Moacir.

    municpio.fazendeiro foi pretendido por vrios times, mas preferiu vestir somente a camisa do uberlndia esporte. tive muitas propostas para sair daqui (uberlndia), mas, naquela poca, alm de jogar futebol, eu era banc-rio, ganhava um bom salrio. alm disso, tinha o que o clube me paga-va e o dinheiro que os torcedores davam para os jogadores depois da partida. quase sempre, o que eu ga-nhava dos torcedores era muito mais do que o meu salrio no banco e no uberlndia esporte. e, com certeza, tudo isso era muito mais do que os outros times pagavam. alm disso, eu sempre tive uma verdadeira pai-xo pela cidade, disse o craque.

    etc.

    a misso de uberlndia de ontem e sempre e a sua determinao de resgatar, divulgar e valorizar a hist-ria de uberlndia no vai parar. no-vos formatos esto vindo por a...

  • bens materiais e imateriais que marcaram a histria da

    cidade esto desaparecendo

    MeMriACurTA

    1968-2012 a passos lentos

    enquanto cidades de porte similar como juiz de fora tem 221 bens tombados, uber-lndia possui exatos 20 tomba-mentos registrados desde 1968. at 2002, a cidade tinha apenas quatro bens preservados: a igre-ja nossa senhora do rosrio, a casa da cultura, a oficina cul-tural e o conjunto formado pela praa clarimundo carneiro, o museu municipal e o coreto.por ser mais conhecida como ci-dade progressista, riquezas ma-teriais e imateriais do passado acabaram sendo deixadas para trs, enquanto empresas e no-vos moradores foram chegando. o trabalho de tombamento, segundo a ex-secretria muni-cipal de cultura mnica debs,

    no alto: Frum Abelardo Penna. no centro: Palcio dos lees, atual Museu Municipal, tombado em 1985. Abaixo: estao rodoviria, hoje biblioteca Municipal, tombada em 2009.

    8 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

  • teve que ser intensificado nos ltimos 12 anos com foco na formao das novas geraes. fizemos uma cartilha que foi distribuda para professores das escolas pblicas e um projeto de educao patrimonial, com visitas dirias de crianas a par-tir de 2 anos ao museu munici-pal. a mudana de atitude vai acontecer com o tempo.a preservao do patrimnio cabe secretaria municipal de cultura e ao conselho muni-cipal do patrimnio Histrico, arqueolgico, artstico e cul-tural de uberlndia (comphac), mas a concretizao do trabalho depende dos donos dos bens sujeitos a tombamento e da aju-da da comunidade. difcil. as pessoas pensam assim: por que voc no joga fora, destri e faz outro mais bonito e moderno? cultural. muitos acham que um prdio antigo atrapalha, afirmou valria cavalcante lo-

    pes, diretora de memria e pa-trimnio Histrico da secretaria municipal de cultura.para valria queiroz, o patrim-nio cultural pouco valorizado por grande parte dos moradores vindos de outros municpios, conhecidos como uberlandi-nos e que no tm laos afeti-vos significativos com a cidade. segundo pesquisa de 2012, do instituto brasileiro de geografia e estatstica (ibge), 48,5% dos moradores de uberlndia so de outras cidades. uberlndia o 39 entre os 853 municpios de minas gerais no ranking de populao no natural. Havia um painel em uma casa em obras no centro da cidade, um mosaico de vidro, muito bonito. sugeri pessoa responsvel que o reaproveitasse depois da obra. ela respondeu no conheo a histria, no sou daqui e jogou tudo no cho no outro dia, con-tou valria queiroz.

    9 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    Mercado Municipal, tombado em 2002

    Muitos acham que um prdio antigo atrapalha

    Coreto, tombado em 1985

  • O passado no cho

    no fundinho, em agosto de 2012, foi demolida a casa de dona adlia, do fim do scu-lo 19, considerada por espe-cialistas um patrimnio da cidade como a mais antiga construo remanescente do passado de uberlndia. a proprietria, a professo-ra de piano adlia santos frana que morreu em 2004, havia dado incio ao processo de tombamento. a procuradoria do municpio indeferiu o pedido pela falta de documentao e com-provao do valor histrico da edificao e pelas con-dies precrias da casa. a casa foi caindo aos poucos e limpamos o lote. como no tnhamos condio de refor-mar, pedimos prefeitura outro imvel em troca, mas eles no tiveram interesse, afirmou o sobrinho de dona adlia, que pediu para no ter o nome divulgado.outro caso conhecido o da casa dos migliorini, cons-truda na dcada de 1960 na praa coronel carneiro e uma das principais edifica-es da arquitetura moder-na da cidade. o pedido de tombamento foi aprovado por unanimidade pelos membros do comphac em 17 julho de 2008. dois dias depois, antes que um docu-mento fosse entregue pre-feitura e aos proprietrios, a casa foi demolida com uma retroescavadeira.

    10 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    igreja n. S. das dores

    igreja do rosrio

    escola estadual uberlndia (Museu)

    igreja de n. S. do rosrio (Miraporanga)

    escola estadual dr. duarte Pimentel de ulha

    estao Ferroviria Sobradinho

    Palacete ngelo naghettini

    Casa da Cultura

    Oficina Cultural

    biblioteca Municipal

    Praa Clarimundo Carneiro, Museu e Coreto

    Mercado Municipal

    residncia Chacur

    uberlndia Clube

    igreja esprito Santo do Cerrado

    imagem de nossa Senhora do Carmo

    Festa do Congado

    Crculo de Trabalhadores Cristos

    Painis em mosaico de vidro de Geraldo Queiroz

    escola estadual enas Oliveira Guimares

    Praa Tubal Vilela

    OS 20 TOMbAMenTOS

    Casa da Cultura, tombada em 1985

  • a imprensa e o empre-srio tito teixeira, em 1924, trabalharam para que se fundasse uma associao comercial em uberlndia. Houve algumas reunies, mas no tiveram se-quncia. pouco antes de 1933, a imprensa voltou a tocar no assunto. no sei se estimulado por ela ou no, jos de oliveira guimares, portugus, comer-ciante, scio de jos dos santos, tambm portugus, donos da casa castro, na avenida afonso pena, procurou os empresrios e lhes props a fundao de uma instituio que congregas-se os empresrios locais. o primeiro apoio que recebeu foi o do seu scio. o idealizador

    ACiub80 AnOS

    1933-2013 vida empresarial

    Apenas para comerciantes ou para todos os empresrios, o debate das mensalidades e uma carta esclarecedora. AnTniO PereirA narra os bastidores da fundao da Associao Comercial e industrial de uberlndia em 1933

    uma reunio das primeiras reunies da Associao Comercial, industrial e Agropecuria de uberlndia

  • do empreendimento recusou a presidncia e estimulou arman-te carneiro a aceit-la. antes da reunio que formou a entidade, tudo j estava mais ou menos preparado, tanto que armante carneiro telegrafou ao presi-dente da associao comercial de minas gerais pedindo que interferisse junto ao governo do estado para recolher a fisca-lizao que se realizava na cida-de e assinou como presidente. nem a associao existia, nem ele tinha sido eleito.no dia 15 de outubro de 1933, na sede do uberabinha sport club, reuniram-se vrios em-presrios. Homero monteiro de carvalho, por solicitao de jos de oliveira guimares,

    levou um projeto de estatuto que foi aprovado na ocasio. Houve alguns debates, sendo o mais interessante o levantado por youssuf andraus gassa-ni, que pretendia que a nova instituio s abrigasse comer-ciantes e que seu nome fosse apenas associao comercial de uberlndia. foi derrotado. o nome escolhido foi associao comercial, industrial e agrope-curia de uberlndia (aciapu) e aceitava no s empresrios, como profissionais liberais. um desses profissionais associados da nova instituio foi o advo-gado jacy de assis. quem tam-bm se ops a essa extenso da entidade foi o associado no presente, angelino pavan, que

    13 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    O PriMeirO PreSidenTe era de uberaba, onde fez os primeiros estudos. Foi para So Paulo e formou-se em Farmcia em 1902 e em enge-nharia em 1903. Trabalhou na estrada de Ferro Gois e foi agrimensor no sul goiano. Montou uma farmcia em uberaba, construiu a estrada de roda-gem ligando rio Verde a Mineiros e foi presidente da Companhia Auto Via-o Sul Goiana. Veio para uberabinha para montar uma fbrica de tecidos. reuniu scios e, em novembro de 1923, lanou a Fbrica de Tecidos uberabinha, construda dentro do ptio da Mogiana e, ao lado, as resi-dncias dos operrios que deram ori-gem Vila Operria, hoje pertencente ao bairro Aparecida. A indstria no teve sucesso. Armante tentou outras atividades. Montou ser-raria, teve a concesso para a constru-o de uma ferrovia de uberabinha a Porto Feliz, no rio Paranaba. A revo-luo de 1930 derrubou esse ltimo sonho. Voltou atividade farmacuti-ca. Foi presidente da Comisso da Construo da Catedral de Santa Tere-zinha. Foi presidente da Ao Catlica e fundou, em uberlndia, o Partido Catlico, do qual foi presidente.

    armante carneiro

    na fachada da primeira sede, o registro do primeiro nome

  • justificou sua ausncia por jos de oliveira guimares, portador de sua proposta de mudana do esta-tuto, que tambm foi rejeitada.

    A mensalidade

    outra questo muito debatida foi a da mensalidade. jos gonzaga de freitas e oscar miranda queriam que ela fosse de cinco mil ris (5$000) por ms porque os em-presrios de pequeno porte no suportariam valor maior. gassani e vicente maradei queriam que fosse de dez mil ris (10$000). oliveira guimares conciliou as propostas sugerindo que quem tivesse estoque inferior a dez contos de ris (10:000$000) pa-gasse cinco, quem tivesse estoque maior, pagasse dez. foi aprovado. o tesoureiro quem estabeleceria os limites.aps esses debates foi eleita a di-retoria. o presidente, assim como j tinha sido definido, era armante carneiro, o vice era tubal vilela, o segundo-vice era carlos de olivei-ra marquez, o secretrio-geral jos de oliveira guimares, o primeiro secretrio jos rezende filho, o primeiro tesoureiro aristides ber-nardes de assis, o segundo tesou-reiro era alcides borges de oliveira e o bibliotecrio era eullio de ulhoa cintra.

    UmA CARTA de gUImAReS

    14 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    O doutor Armante, que era meu amigo, no foi o funda-dor da Associao Comercial e sim o seu primeiro presi-dente, convidado por mim para exercer esse cargo, em uma reunio que convoquei, convidando vrios comer-ciantes e entre eles o doutor Armante, que aceitou meu convite com relutncia, alegando no ter participado dos trabalhos preparatrios para formalizar a Associao Co-mercial. Trabalhos esses que alis foram s meus.

    A ideia e execuo do plano de fundao da Associao Comercial so minhas, sendo eu, portanto, seu fundador, para o que contei com o apoio do meu ento scio Jos Santos.

    Para formalizar a Associao Comercial, contratei o Homero Monteiro de Carvalho, advogado, j falecido. Conjuntamente, o doutor Homero e eu elaboramos os estatutos da Associao Comercial e lhe demos o nome de Associao Comercial, industrial e Agro Pecuria de uberlndia, tendo eu funcionado como primeiro secre-trio, pois no ficaria bem que eu me constitusse presi-dente, quando eu era o criador da Associao, e, eis a a razo do convite ao doutor Armante.

    Quem conhece bem os primrdios da fundao da As-sociao Comercial o senhor Jos Santos Jnior que a est e pode comprovar o que digo.

    Talvez os novos diretores ignorem o quer aqui ex-ponho, mas os antigos, das primeiras diretorias, tm

    conhecimento disso.esta ser, alm do mais, uma contribuio para a

    histria da Associao Comercial, quando ela foi feita. era isso que desejava esclarecer e retificar.

    Muito obrigado pela ateno que se designarem dis-pensar a este esclarecimento e sem mais, subscrevo-me cordialmente,

    Jos de Oliveira Guimares

    (nota escrita por jos de oliveira guimares e publicada na revista da aciub em 1978, retificando reportagem da edio anterior que citava armante car-neiro como o idealizador da associao)

    Jos de Oliveira Guimares

    Houve alguns debates interessantes como o levantado por Youssuf Andraus Gassani, que pretendia que a nova instituio s abrigasse comerciantes

  • Houve alguns debates interessantes como o levantado por Youssuf Andraus Gassani, que pretendia que a nova instituio s abrigasse comerciantes

  • e m 1966, a seleo da ento unio sovitica, de olho na copa do mundo que seria disputada na inglaterra, veio ao brasil para se preparar para a competio. como parte do treina-mento, os soviticos participaram do torneio quadrangular magalhes pinto, em belo Horizonte, ao lado do atltico mineiro, cruzeiro e fla- mengo, no recm-inaugurado minei- ro. aproveitando a vinda do time ao estado, o ento presidente do uberlndia esporte clube (uec), renato freitas, convidou os russos para um amistoso contra o verdo, em dis-puta marcada para 9 de fevereiro de 1966,

    veRdO enCArA

    A urSS

    1966 antes da queda do muro

    16 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    Jogo foi debaixo de muita chuva e de muita pancadaria

    Foi uma noite de gala. um espetculo digno de ser assistido

    correio de uberlndia

    Moacir Lopes de Carvalho, diretor, e Luiz Cesar Fabrini, radialista, ambos da Rdio Educadora entregam um brinde ao capito da seleo russa

  • em uma quarta-feira, no estdio juca ribeiro. um dia depois da final do torneio na capital mineira, onde a unio sovi-tica venceu o cruzeiro por 1 a 0 e se sagrou campe, o time foi recebido em uberlndia. no dia do jogo, caiu uma chuva danada e a prefeitura no cobrou nenhum ingresso, lembrou renato de freitas em entrevista em 1998.no elenco do verdo, estava edson gonzaga souza, na poca com 23 anos e que hoje pouco se lembra da partida. lembro s que choveu muito e foi uma pancadaria. na poca, no tinha carto amarelo. se a gente casse, o jogador vinha e chutava a nossa cabea, disse fazendeiro. o carto amarelo foi introduzido pela fifa apenas na copa de 1970, disputada no mxico.como nas duas partidas que dis-putou em belo Horizonte contra o atltico mineiro (6 a 1) e o cruzeiro (1 a 0), a unio sovitica venceu o verdo por 2 a 0, com gols de bibo e um contra marcado pelo zagueiro dunga. jogou bem o time sovitico. mas jogou alm do que esperva-mos o conjunto dirigido por japiass (tcnico do verdo). foi de fato uma noite de gala. foi realmente um

    espetculo digno de ser assistido, publicou o correio de uberlndia na poca. foi tambm a primeira vez que um rbitro, armando marques, apitou com o uniforme da fifa em uberln-dia. vrias emissoras de rdio do pas reservaram linhas para transmitir o jogo, mas desistiram devido ao mau tempo. um dia depois, o tcnico japiass foi dispensado do uec.

    1uma reportagem do Correio de uberlndia depois do jogo di-vulgava contas feitas pelos fun-cionrios do Hotel Presidente, onde os jogadores soviticos se hospeda-ram do dia 7 ao dia 10 de fevereiro de 1966. Segundo o jornal, os russos comiam diariamente o que um homem comum comia durante uma semana. Alm dos pratos quentes, incluindo frango, fil parmegiana, mortadela, bananas e laranjas, os russos pediam refrige-rantes, doces e confeitos finos diariamente. nada menos que um milho de cruzeiros foi o preo da hospedagem da delegao em uberlndia, custeada pelo Verdo.

    2A camisa da seleo da unio Sovitica trazia as letras CCCP em branco sobre o vermelho, iniciais no alfabeto russo para unio das repblicas Socialistas Soviticas. A sigla CCCP, segundo uma piada que corria no pas na po-ca, significava Camarada, Cuidado (com o) Crioulo Pel. em 1958, a seleo sovitica foi a primeira a en-frentar Pel e Garrincha juntos, quando foi derrotada por 2 a 0 na Copa do Mundo da Sucia. Conta-se que Garrincha passou a chamar os adversrios de Joo depois deste jogo, pois no conseguia pronunciar o nome do russo que o marcou.

    FrAnG0, Fil, dOCeS e COnFeiTOS beM FinOS

    urss em uberlndia

    17 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    O reprter Josu Borges entrevista o rbitro Armando Marques.

  • ela nasceu no mesmo dia em que a faculdade de direito e tambm foi autorizada pelo ento presidente da repblica juscelino Kubitschek. um grupo de intelectuais catlicos, contrrios orientao marxista da faculdade de filosofia, que vinha sendo idealizada por nelson cupertino, procurou as irms do colgio nossa senhora. a comisso, formada pelo padre mrio forestan, superior dos

    O deSAFiO dA CONSTRUO dA uniVerSidAdeFaculdade pioneira do Colgio nossaSenhora foi um dos pilares da uFu

    1960 faculdade de filosofia, cincias e letras

    1970 - Alunos da Faculdade de Filosofia recebem a madre Maria Vilac, que autorizou a criao da instituio em 1960

    Formatura da primeira turma da faculdade, em dezembro de 1963

    18 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

  • padres salesianos, pelo presidente da cmara, andr fonseca, pelo diretor da rdio educadora, moacir de carvalho, e pelo professor do colgio estadual saint-clair netto foi recebida pela superiora, madre emlia ribeiro, e pela diretora do colgio, irm maria lzara fioroni, que ficaram interessadas no projeto de criao de uma outra faculdade. o advogado jacy de assis que, com a ajuda do ento deputado rondon pacheco, j se encontrava no processo de criao da faculdade de direito junto ao governo federal, colaborou na preparao dos papis necessrios para o curso de filosofia. no dia 12 de novembro de 1959, o correio de uberlndia antecipou a notcia e publicou na primeira pgina: faculdade de filosofia de uberlndia tambm funcionar em 1960. em dezembro, jacy de assis ligou do rio de janeiro, informando que o processo havia sido aprovado. no mesmo dia, um alto-falante anunciou a notcia nas ruas de uberlndia, que contava, na poca, com cerca de 80 mil habitantes.depois do primeiro vestibular, em

    fevereiro de 1960, que aprovou 22 alunos para os cursos de letras neo-latinas, anglo-germnicas e pedagogia, aconteceu a aula inaugural ministrada por francisco ribeiro sampaio, professor da pontifcia universidade catlica (puc) de campinas, que falou sobre santa tereza de vila. no dia 14 de maro, deu-se o incio das aulas. em janeiro de 1962, a madre superiora maria vilac transferiu a madre maria lzara fioroni, diretora da faculdade, para campinas (sp). em maro, para substitu-la, chegou de campinas a irm ilar garotti, ento com 27 anos. eu era orientadora de alunos da puc que moravam em um pensionato, onde tambm fiz faculdade de pedagogia lembrou irm ilar, hoje com 80 anos. ao chegar, irm ilar recorda que seu primeiro desafio foi fazer uma pesquisa para conhecer a demanda de novos cursos de graduao. o segundo foi conseguir trazer professores de ribeiro preto, campinas, so paulo, araraquara e

    goinia. era preciso equilibrar as finanas. os alunos pagavam pouco. os professores ficavam hospedados no colgio nossa senhora, com a esperana de que um dia a faculdade fosse federalizada, disse irm ilar.durante 18 anos, a faculdade de filosofia, com mdia de 2 mil alunos por ano, funcionou no colgio nossa senhora. em 1970, foi incorporada universidade de uberlndia (unu), hoje universidade federal de uberlndia (ufu).

    O deSAFiO dA CONSTRUO dA uniVerSidAde

    1970 - Alunos da Faculdade de Filosofia recebem a madre Maria Vilac, que autorizou a criao da instituio em 1960

    Cerimnia de instalao da universidade de uberlndia em 10 de fevereiro de 1970. da esquerda para a direita: Francisco Palma de Souza, Jacy de Assis, Gensio Melo Pereira, Milton de Magalhes Porto e irm ilar Garotti

    19 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    irm Maria lzara Fioroni, fundadora da faculdade em 1960

  • na rua da fortuna, no distrito de martinsia, uma histria de provao e dificuldade. onde vive, em uma casa modesta, elvira ferreira brasil e suas bonecas de pano, em grande parte irms de cor da criadora. como dona negrinha, como conhecida, no encontrava bonecas pretas nas lojas, resolveu cri-las na velha mquina de costura de segunda mo. medida que vo sendo finalizadas, as bonecas pretas ganham um nome. a

    maior delas a tutucona. personagens que de certa forma abrem a discusso sobre o preconceito racial levantada por esta senhora de 66 anos, com pouco estudo, mas de muita sabedoria. meu pai falava que nunca ia acabar o preconceito. algumas pessoas querem que acaba, mas sempre vai ter algum que no gosta dos negros, disse dona negrinha.o dom para o feitio de bonecas, que tambm ganham outras cores de pele e cabelo, vem desde a infncia, quando

    A neGrinHA dAS bOneCAS PreTAS

    MArTinSiA

    20 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    morava com os pais e seis irmos nas fazendas, onde trabalhavam em troca de arroz e feijo ou um pouco de fub para o angu. eu via as meninas brincando de boneca, minha me no podia comprar e ento ela enrolava um pano no sabugo para eu brincar, disse a artes que precisou sair de casa aos 8 anos para trabalhar. sofri demais, filho de gente honesta muito sacrificado. olhava menino dos outros, fazia comida e brincava com boneca quando dava.a gargalhada contagiante, s vezes, cede lugar s lgrimas quando ela se lembra dos maus-tratos de alguns patres. eles pegavam ns, davam casa para morar, a gente morria de trabalhar e, depois, eles jogavam a gente na beira da estrada, no cho, de qualquer maneira.apesar das ms lembranas, dona negrinha disse que hoje consegue passar por cima dessas ofensas e preconceitos por causa de sua cor. eu respeito para ser respeitada. se voc tiver um estudo grande, mas no tiver educao, no adianta. no vai viver bem, afirmou a artes. dona negrinha uberlandense nata, nascida em um quilombo prximo ao distrito de cruzeiro dos peixotos, durante a colheita do feijo. eles falavam assim: dias das mangas, das chuvas, da jabuticaba. fui registrada em julho, mas minha me contava que nasci no dia 14 de outubro, disse dona negrinha, casada com o potiguar jos brasil filho e me de trs filhos.

  • Tradutora uberlandense completa 105 anos de uma histria de alegria esuperao

    qual ser o segredo da longevidade? como algum pode chegar a mais de um sculo de vida ainda serena e relativamen-te saudvel? so questes dif-ceis de responder, embora seja esse o desejo da maioria e o grande desafio da cincia. em uberlndia, carregando consigo a lembrana de boa parte da his-tria de nossa cidade, julieta cupertino guimares celebrou, em outubro do ano passado, 105 anos de existncia. julieta cupertino, alm de exemplo de uma mulher vigoro-sa que atravessou mais de um sculo acompanhando a evolu-o dos tempos, teve uma vida de contribuies para a cidade, seja educando uberlandenses que se torna-ram pessoas de sucesso ou participando de grandes momentos de nossa histria. falar hoje de grandes hist-rias como a do praia clube e do uberlndia clube tam-bm lembrar

    da presena de dona julieta em todas elas. sabe-se que longevi-dade no sinnimo de vida tranquila. mesmo sendo um poo de tranquilidade, dona ju-lieta, como chamada por to-dos, alm de ter passado por al-guns dissabores na idade adulta, como a perda de filhos, teve in-fncia e adolescncia atribula-das, marcadas por dificuldades e pela luta para sobreviver em uma famlia de dez filhos. fam-lia e trabalho foram os grandes amores de julieta ao longo da vida. com a primeira, aprendeu a lidar com a vida e obteve os ensinamentos que lhe garanti-riam a trajetria profissional. em sua poca, para a mulher, bastava concluir o 1 grau esco-lar. ajudando os filhos na esco-

    la, obteve a licen-a para o magis-trio e, posterior-mente, aos 51 anos, aprendeu a lngua inglesa com o tio, nelson cupertino, e con-quistou o direito de ensin-la em qualquer lugar, com um diploma da universidade de michigan, nos estados unidos. como professora,

    22 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    GenTe nOSSA

    Julieta nos anos 1950

    por CARlOS gUImAReS COelhOcolaborou Clarissa Guimares Aranyi

  • JulieTAde todos os filHos

  • aposentou-se aos 72 anos. aos 84 anos, comeou a carreira de tradu-tora e descobriu a grande ferramen-ta de trabalho da modernidade, o computador, que foi uma boa com-panhia profissional e um grande entretenimento.

    Vida em famlia

    julieta foi a primeira filha de um funcionrio pblico, jos cuperti-no e de isolina perfeito cupertino, conhecida como dona zozola. dois de seus irmos faleceram precoce-mente em uma mesma semana do ano de 1908, quando ela tinha 11 anos, vtimas da gripe espanhola, epidemia que se alastrara pelo pla-neta, matando milhes de pessoas. at os 17 anos, julieta, envolvida com afazeres domsticos, ajudava a cuidar da casa e dos sete irmos. em um baile fantasia, para o qual foi convidada pela mulher do pre-feito, conheceu enas de oliveira guimares, por quem se apaixonou e com quem se casou. tiveram nove filhos: olavo, isolina, mauro, renato, outro renato, marcelo, fausto, alosio e maria cristina, to-dos guimares cupertino, aqui apresentados na ordem de chegada ao mundo. julieta perdeu quatro fi-lhos: renato, aos 2 anos, mauro, em um acidente com um planador aos 21 anos, e marcelo e fausto, os dois com cncer na meia idade. enas era de famlia conceituada de prata. ao lado dele, julieta diz ter vivido os melhores momentos de sua vida. o casal tinha agenda social movimentada e participou de momentos marcantes da vida da cidade, como a fundao do praia clube, da associao comer-cial e do uberlndia clube. julieta

    dona Julieta com 1 ano de vida

    A noiva Julieta entre as mulheres das famlias Guimares, Cupertino, Savastano, Fonseca e Carneiro

    24 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

  • tem o ttulo nmero trs do praia clube e frequentava o clube at h poucos anos, principalmente quan-do familiares vinham cidade para celebrar seu aniversrio. antes da festa oficial, havia sempre uma tar-de festiva em algum recanto do clu-be. ela lembra bem do incio do praia, quando um grupo se reunia para nadar no rio uberabinha no lo-cal conhecido como prainha. aos poucos, o nmero de pessoas foi aumentando e comearam os al-moos beneficentes e as quermes-ses para arrecadar fundos para a construo de um barraco e um vestirio. assim, a prainha come-ou a tomar a forma do clube que hoje um dos cartes-postais da ci-dade.da uberabinha, do fim dos anos de 1920, julieta recorda-se da primeira jardineira, o veculo de transporte coletivo da poca. antes dela, anda-va-se pela cidade a p ou de charre-te. a jardineira era chamada de te-reza pela populao. a crianada adorava. era um veculo aberto e bastante diferente para a poca, lembrou dona julieta.

    Vida social

    julieta cresceu observando o av, bernardo cupertino, trabalhar na impresso do jornal o progresso, o segundo da cidade, do qual era proprietrio, e a dinmica intelec-tual e a militncia poltica do tio, o professor nelson cupertino. viveu a juventude frequentando as sesses do theatro so pedro e do cine theatro uberlndia. na matu-ridade, frequentava com assiduida-de os sales do uberlndia clube, sempre em companhia do marido.

    Julieta, o marido, enas, e os filhos Aluzio e Cristina (sentados), Fausto, Marcelo, renato, Olavo, isolina e Mauro (em p)

    Julieta a scia nmero 3 do Praia e lembra das tardes na prainha no incio do clube

    25 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    dona Julieta aos 15 anos se dedicando aos livros

  • O computador, os livros e uma imagem recente de dona Julieta, ao celular, adequando-se aos tempos modernos

    uma mulher muito frente do seu tempo, sempre aberta a conhecer melhor o mundo

    26 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    1 Minha me era muito avanada para uma cidade que tinha apenas 40 mil habitantes. naquele tempo, uma ligao interurbana era bastante demora-da. ela tornou-se radioamadora, seguindo os passos do pai, Jos Cupertino. Fascina-do com o aparelho, eu tambm aprendi o cdigo Morse e, sem que minha me perce-besse, digitava o prefixo dela e, quase dia-riamente, me comunicava com mais de 120 pases. ela acompanhou a Segunda Guerra Mundial pela rdio bbC, de londres. uma mulher frente de seu tempo, sempre com abertura para conhecer melhor o mundo. aLUziO cUpErTinO gUimarEs

    2 Julieta passou a vida toda no Fundi-nho, centro histrico de uberlndia. Sua histria foi registrada no livro Chego aos 100 anos de bem com a vida, escrito por ela em 1997, mas est tambm registrada no patrimnio arquitetnico da cidade. recentemente, a escola que leva o nome de seu marido, enas de Oliveira Gui-mares, foi tombada como patrimnio his-trico de uberlndia. Outro imvel de im-portncia histrica, onde hoje funciona o restaurante Casaro, foi construdo pelo tio de Julieta, Alexandre Faria Marquez. A data da construo, 1924, est inscrita na fachada do imvel.

    3 O neto luiz Antnio recorda que ha-via se sado muito mal em uma prova de ingls. A professora comentou o fato com dona Julieta. A av chamou-o e lhe passou um pito. Sua me fala ingls, eu falo ingls, no h por que voc tirar uma nota dessas. Mas, ela no comentou com ningum o assunto, at que ele recu-perasse a nota. Manteve o segredo. isso me marcou muito, o cuidado e a discrio que teve comigo me emocionou muito, disse luiz Antnio.

    TrS VezeSJulieTA

  • julieta acompanhou a evoluo dos tempos. sempre foi moderna e, at com pouco mais de 100 anos, navegava na internet e realizava tradues literrias para a editora revan, no rio de janeiro, que per-tence ao seu filho renato. este, ao lado dos irmos, marcelo e fausto, dcadas antes, deram muitas preo-cupaes quando viveram momen-tos de difceis na luta poltica con-tra a ditadura militar. Hoje, aos 105 anos, dona julieta tem filhos, netos, bisnetos e tataranetos espalhados pelo pas e pelo mundo. todos a ve-neram como uma grande dama, que tem uma vida digna e um lega-do de sabedoria, de amor vida e a necessidade da evoluo intelectu-al. talvez seja este o segredo da lon-gevidade: no se entregar s intem-pries e levar a vida com leveza, por mais que o ba de memrias esteja lotado de saudades e, at mesmo, de algumas lembranas tristes.

  • 28 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    O TeMPlOdA MOdAloja vendia tecidos nacionais e importadosque vestiam os mais elegantes da cidade

    1943-2013 a gOyana 70 anOs

    a s mulheres dividiam os afazeres dirios com idas s costureiras, empenha-das com os feitios do ves-tidos do prximo fim de semana, en-quanto os homens frequentavam alfaiatarias e revezavam ternos de linho de tons claros, prprios para o vero, e os de tons escuros, feitos de

    tropical ingls, para quando esfriava. quem se lembra dessa poca sabe que os tecidos importados da itlia e da frana ou vindos de fbricas do rio e de so paulo eram o carro-che-fe de uma loja de trs andares que ficava na avenida afonso pena, em um prdio que existe at hoje. a loja a goyana, que tinha como slogan

    o templo da moda, vendia perfumes nacionais, roupas ntimas, calados e tinha uma seo de cama, mesa e banho. inaugurada h 70 anos, descendia de outra, com o mesmo nome, situada a poucos metros dali, onde cyro avelino franco trabalhou como arrumador de estoque. meu pai era muito trabalhador. nasceu em uma famlia simples. minha av era costureira. mas, ele se tornou um dos homens mais ricos desta cidade. andava muito bem vestido, com bons chapus, mas continuou sim-ples. nada de anis de brilhante, lembrou o empresrio vicente augusto santa ceclia franco.

    Comedor de bananas

    cyro avelino franco nasceu em indianpolis (mg). mudou-se para uberlndia ainda criana, onde o pai era vendedor das bolachas duchen, uma fbrica paulista inaugurada em 1903 e ainda em atividade. cyro logo conseguiu emprego em uma sapataria da cidade. era encar-regado de apanhar no cho os pregos usados para prender as solas. com o primeiro salrio, cyro franco com-prou um cacho de bananas e comeu todas as frutas de uma s vez. ele no dividiu com ningum e passou muito mal. mas sempre ajudou mui-to no sustento dos irmos e at dos sobrinhos, disse vicente franco. casou-se com a professora maria stella santa ceclia, com quem teve dois filhos: vicente , hoje com 78 anos, e paulo antnio santa ceclia franco, de 70 anos. cyro franco fundou tambm a concessionria uberlndia veculos, at hoje em atividade. a goyana fechou em 1981, ano da morte do empresrio aos 72 anos.

    CYrO AVelinO FrAnCO com os funcionrios na escadaria da loja

  • CirurGiA PiOneirAiCT foi o primeiro a fazer pontes de safena

    em maio de 1996, com a inaugurao do instituto do corao do tringulo mineiro (ict) do Hospital santa catarina, pacientes com problemas cardacos de uberlndia no precisavam mais ir a so paulo. procedimentos complexos e in-ditos como angioplastias, pontes de safena e transplantes cardacos passaram ser feitos na cidade. o ict foi o primeiro da amrica lati-na a fazer cateterismos com arqui-vo em cd. no incio dos anos 90, o ento pre-feito virglio galassi havia convoca-do um grupo de mdicos na prefei-tura. direto como sempre, virglio disse aos mdicos: chamei vocs aqui para gastarem mais dinheiro. como sou vendedor de uberlndia, vendo a cidade aqui e l fora. possveis investidores na cidade costumavam perguntar ao prefeito sobre a qualidade da assistncia mdica na cidade. o doutor vir-glio nos disse assim: uberlndia top em telefonia, na rea ataca-dista, o maior polo de armazena-mento de gros. e por isso gostaria que vocs tambm fossem tops. aquilo mexeu com o meu brio. fui embora remoendo o que ele falou, lembrou o mdico carlos salomo, diretor do Hospital santa catarina.quando o prprio virglio acabou sendo mandado a so paulo para colocao de pontes de safena, adib jatene foi visitar o ex-prefeito. que vergonha at o prefeito vir fazer a cirurgia aqui. morei em uberlndia at os 18 anos, o camilo abulmassih de tupaciguara, o roberto botelho de araguari. todos cardiologistas. precisamos devolver terra o que ganhamos dela, disse jatene. a partir da, adib jatene e sua

    1996 instituto de cardiologia do tringulo

    O mdico Adib Jatene apresentando como funcionaria o instituto do Corao do Tringulo

    Os mdicos Carlos Salomo, Abdala Miguel, roberto botelho com o prefeito Virgilio Galassi

  • equipe de mdicos foram atrs de potenciais hospitais em uberlndia que pudessem receber um centro cardiolgico. eu j vim para uber-lndia desanimado. rodei todos os hospitais e ningum quis. quando passei a lista de exigncia para o car-los (salomo) e ele balanou a cabe-a dizendo que sim, pensei: ele doido. o hospital no tinha condio nenhuma, disse o cardiologista ro-berto botelho, fundador do instituto do corao do tringulo mineiro. mesmo diante do grande desafio, o Hospital santa catarina j vinha se preparando ao longo do tempo em outras especialidades, com parte do aparato para receber o ict. foi mar-cada ento uma assembleia entre os 66 mdicos cotistas que prontamen-te autorizaram os investimentos pa-ra o novo empreendimento, em um total de 5 milhes de dlares. no jantar de comemorao, em um restaurante de frutos do mar aos fundos do estacionamento do Hospital santa catarina, carlos sa-lomo fez a premonio que logo se concretizou. no fundo do esta-cionamento tinha uma gruta, com a imagem de santa catarina e eu disse para o roberto (botelho): daqui um ano, voc vai fazer o primeiro cateterismo aqui. exatamente um ano depois isso aconteceu. em seis meses fizemos um prdio de 2,3 mil metros, disse carlos salomo.

    O paciente nmero 1

    adelino rosalen tem uma rotina normal desde que se submeteu a uma ponte de safena em 18 maio de 1996. mesmo aposentado, rosalen, hoje com 80 anos, ainda trabalha em manuteno de veculos e aproveita o bnus daquela que foi a primeira cirurgia cardaca realizada

    em uberlndia. o aposentado se lembra que por cinco meses pro-curou o diagnstico de uma dor no brao esquerdo. foi em vrios espe-cialistas, entre eles neurologistas e clnicos, at que o mdico domingos pimentel ulha o indicou o recm-inaugurado instituto do corao do tringulo mineiro (ict). ningum descobria o que eu tinha. o doutor roberto (botelho) fez o cateterismo e descobriu a veia entupida.com a facilidade de se tratar na ci-dade onde mora, o aposentado logo fez os exames necessrios e se sub-meteu bem-sucedida cirurgia. foi uma bno, porque se eu tivesse que ir para outra cidade, pagar via-gem, hotel para mim e para acompa-nhante, eu no teria condio. alm disso foi a sobrevida que tive, a graa de poder trabalhar at hoje, afirmou o primeiro paciente.trs meses depois, outra interven-o indita na regio foi a da recm-nascida geovnia, na poca com trs meses, que passou por um cate-terismo. em um ano de existncia, o ict realizou 750 procedimentos cirrgicos.

    Telemedicina

    apenas dois anos depois de ser inaugurado, o instituto do corao do tringulo mineiro (ict), em parceria com o grupo algar, deu outro ttulo indito a uberlndia, que passou a ser a primeira cidade do interior do brasil a operar a tele-medicina, considerado pouco tempo depois como o mais avanado siste-ma integrado da amrica latina.na poca, 40 pases trabalhavam com essa aparelhagem. no brasil, eram 18 capitais e uberlndia. o prprio paciente passou a fazer o eletrocardiograma em casa e a transmiti-lo para a central receptora. a conexo acontecia por meio de telefone convencional, celular e at mesmo telefone pblicos. segundo roberto botelho, o aten-dimento nas primeiras duas horas aps os primeiros sintomas pode salvar mais de 50% das vidas. e isso se deu graas a uberlndia ter um servio de telefonia to eficiente e que nasceu na prpria cidade. se fosse em outro lugar, no seria poss-vel, disse botelho.

    31 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    As instalaes do instituto do Corao ao lado do Hospital Santa Catarina

  • da redao instalada na antiga praa da matriz, 90, hoje praa ccero macedo, no dia 7 de fe-vereiro de 1938, numa segunda-feira, saiu o primeiro nmero do correio de uberlndia. a edio a nica sem um exemplar no arquivo pblico municipal, que conserva todos os nmeros do jornal a partir do segundo, que circulou no dia 20 de fevereiro com a manchete uberlndia, cidade de turismo. a iniciativa de editar o jornal na cidade foi do fazendeiro jos osrio junqueira, proprietrio de outros sete jornais no inte-rior de so paulo, entre eles o correio do oeste em ribeiro preto. com periodici-dade irregular, o correio de uberlndia era administrado pelo filho de junqueira, luiz nelson, tendo como redator-chefe abelardo teixeira. no incio da dcada de 1940, o jornal foi vendido para um grupo de 18 empresrios da cidade ligados unio democrtica nacional (udn), en-tre eles joo naves de vila, nicomedes alves dos santos e alexandrino garcia. naquela poca, o correio era paginado

    COrreiO75 AnOS

    deSde 1938 uberlndia acontece aqui

    32 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    O Correio era feito em linoti-pos, mquinas que montavam os textos linha por linha, fundidos em chumbo. em meados de 1950, o jornal instalou a primeira impres-sora rotativa

    A edio 2 do Correio, a mais antiga existente no Arquivo Pblico

  • mo e composto em linotipos, mqui-nas que montavam os textos linha por linha, fundidos em chumbo. a primeira reformulao grfica ocorreu em meados de 1950, quando a empresa instalou uma impressora rotativa, tambm tipogrfica, comprada do jornal o popular, de goi-nia. o equipamento, bastante moderno para a poca, foi usado at 1989, quando o jornal passou a ser impresso em uma rotativa off-set.a mudana para impresso off-set foi um projeto implantado pelo ento superin-tendente do correio, arly trindade, que tornou-se vivel quando a abc-editora base, hoje algar mdia, importou a nova mquina. o embrio da transformao efe-tiva foram as edies de domingo, chama-das correio de domingo, que ajudaram jornalistas e profissionais da rea grfica a se familiarizar com as vantagens do off-set, para produzir o novo correio. uber-lndia ganhou um jornal mais ilustrado, com mais espao para fotografias e bem mais gil. o correio, que levava cerca de 8 horas para ser produzido, com a nova

    mquina passou a ser impresso em apenas 1 hora. de 1952 at a o incio da dcada de 1970, valdir melgao barbosa se manteve na direo do correio, alternando o tra-balho no jornal com a carreira poltica.devido ao envolvimento poltico, o cor-reio tornou-se adversrio do jornal o tringulo, criado em 1956 por renato de freitas, pessedista roxo, em sociedade com rafael marino neto. o jornal circulava de tera a sbado com oito e depois 12 pginas. o redator-chefe era maral costa, ao lado de lycidio paes e dos irmos jacy de assis e ruth de assis. a sede, que ficava na rua santos dumont, passou para a avenida floriano peixoto e, em seguida, para a praa clarimundo car-neiro at se mudar definitivamente para o distrito industrial.em 1971, quando melgao afastou-se do veculo, a direo passou para srgio mar-tinelli. o jornal, ento, passou a circular de tera a domingo e ganhou o slogan correio de uberlndia, agora o dirio de todos os dias. ramos trs pessoas para fazer todo o jornal. eu era o diretor, vendia

    anncios, fazia uma coluna e escrevia notcias. o expedito (jos expedito) co-bria o esporte e o quirino (luiz fernando quirino) fazia as crnicas polticas e me ajudava na redao, afirmou martinelli.

    Grupo Algar assume

    na fase em que valdir melgao foi diretor, o jornal era deficitrio e a redao de-pendia de recortes de outros jornais para editar todo o espao das pginas. o telex foi instalado em 1979. em 1971, melgao vendeu suas cotas para agenor garcia, irmo do comendador alexandrino garcia. martinelli dispensou maral costa e im-plantou uma nova linha editorial, que ele chamava de financeira, ou seja, seguiria os interesses do grupo proprietrio. em 1986, o grupo algar assumiu o con-trole acionrio do jornal e o mantm at os dias atuais. desde ento, o correio de uberlndia passou por vrias mudanas grficas e editoriais e se firmou como o principal veculo impresso de uberlndia e da regio.

    33 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    As mquinas linotipos montavam os textos em linhas de chumbo e a impressora rotativa instalada na dcada de 1950

  • durante o regime militar, logo no incio, houve muita gente que, aproveitando do clima tenso que a revoluo provocou, fez denncias infundadas sobre pessoas com quem tinham alguma rusga. era a famosa deduragem que rotulava como comunistas pessoas que tinham pensamentos prprios e uma capacidade crtica mais aguada.como bastava a denncia para a priso ser efetuada, muita gente que passou por esse constrangimento nem gosta de tocar no assunto.por isso, o registro do fato, mas no a meno da fonte.

    aqui em uberlndia, uma pessoa que sofreu com isso foi um professor de gramtica altamente qualificado. daqueles que conheciam e lidavam com a ortografia como poucos. um mestre em lngua portuguesa.e coube a um de seus ex-alunos a triste incumbncia de lhe dar a voz de priso.sem muita polidez, o ex-aluno o abordou e foi logo falando: teje preso.o sbio professor sem perder a calma e com muita serenidade retorquiu: no vou preso no, porque aluno meu no fala errado. se quiser me prender, por favor corrija a expresso, o correto : esteja preso!recomendao atendida, l foi ele para o quartel explicar o que no precisava porque algum resolveu falar para os militares aquilo que no devia...

    TeJe PreSO!

    Custdio da Costa Pereira, em 28 de novembro de 1909, ainda na poca de So Pedro do uber-abinha, inaugurou a primeira casa de diverses da cidade. ele a batizou com o nome de Theatro So Pedro. era utilizado tambm como cinema e outros programas de entre-tenimento. O primeiro preo cobrado na bilheteria foi de 500 ris.

    VOC SAbiA?

    O Cine Teatro uberlndia, de propriedade de nicomedes Alves dos Santos, foi uma das mais luxuosas salas de cinema do in-terior brasileiro. Com cerca de 1,2 mil cadeiras estofadas, tinha palco que permitia a utilizao tambm para apresentaes teatrais. A recepo de muito bom gosto abrigava amplos bancos para que as pessoas pudessem aguardar a liberao do acesso sala de cinema. A lanchonete atendia os clientes por ocasio das sesses e funcionava tambm com acesso pela avenida Afonso Pena. era a preferida para os encontros de articulaes e ajustes polticos.

    Toda essa suntuosidade tinha um preo que no estava imputado no valor do ingresso, mas sim na exign-cia do traje masculino para as sesses noturnas: palet e gravata. Valia tanto

    para a primeira sesso, s 19h30, quanto para a segunda, s 21h30.Homem que no quisesse usar ou no possusse o traje tinha duas alternati-vas, ficar de fora ou ir para o poleiro, como era chamado a parte do mezza-nino com entrada independente, des-tinada tambm aos negros e policiais.

    O Cine Teatro uberlndia tinha movi-mentao diria intensa, mas a primei-ra sesso aos domingos era disputads-sima e tinha um ritual infalvel: as moas sentavam primeiro e os homens ficavam circulando pelos corredores fazendo suas insinuaes e galenteios, buscando a receptividade que os permi-tisse a recompensa maior de assistir ao filme muito bem acompanhados.bons tempos que, com o passar dos anos, o advento da TV e de novas formas de lazer fizeram com que ficassem ap-enas na recordao de quem os viveu.

    CineMA S de PAleT e GrAVATA

    34 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    instantneos

  • uM TeMPlO nO CerrAdO

    Monges pacifistas e curas espirituais na uberlndia do perodo entreguerras

    36 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    na dcada de 1930, quan-do a cidade mal chegava aos trilhos da mogiana, nas proximidades do atual terminal central, e resumia-se ao centro e ao fundinho, havia no alto da avenida brasil uma casa de cmodos ocupada por famlias de colonos japoneses. o advogado joo alberto de carvalho luz, 82 anos, lembra que o terreno ocu-pado pela casa tinha nos fundos uma plantao de abacaxi. ainda criana, de bicicleta, eu atravessava a mogiana e ia apanhando gabiroba. de vez em quando, pegava um aba-caxi atrs da cerca de arame far-pado da casa dos japoneses. eles ficavam bravos comigo. em uma fita gravada de posse do historiador antnio pereira, o relo-joeiro rikoto tanaka fala sobre ou- tra casa de colonos japoneses e um templo instalados nas imediaes de onde fica hoje o terminal rodovirio. os tanaka chegaram a uberlndia em 1927 e j encontra-ram algumas famlias orientais. eram principalmente agricultores e horticultores e uma pequena parte se dedicava ao comrcio. lembro que nesta outra casa, eles tomavam banho s 17h e dava para gente ver de longe, disse o advogado carv-alho luz. de acordo com luz, entre os colo-nos japoneses de uberlndia havia um grupo de monges pacifistas que, na dcada de 1920, teve que partir do japo para o exlio porque se opunha militarizao do pas. os monges teriam chegado ci-dade em meados de 1929 e eram importantes a ponto de receber companheiros vindos do japo em busca de aconselhamento. em uberlndia, havia fiis da seita omoto, que chegou ao brasil em 1924 trazida pelo missionrio teru-

    1920-1940 cOLOnizaO JapOnEsa

  • 37 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    kichi oyama, fora das colnias japone-sas. a seita foi acolhida por algumas famlias da cidade e comearam a cir-cular notcias de curas que teriam sido obtidas pelas oraes e pelo uso da gua fluida preconizada pelos adep-tos. de acordo com antnio pereira, um fiel agradecido teria at oferecido um terreno para a construo do tem-plo. tanaka se recorda de curas em uberlndia, depois de enormes gastos com mdicos e remdios. as oraes eram feitas em japons e traduzidas para os que no falavam a lngua. um dos que recorreram ao tratamento espiritual foi o lder coi marcos de freitas, influente poltico da cidade. os colonos japoneses ficaram em uberlndia at 1942, quando, em agosto, o brasil declarou guerra ao eixo (alemanha, itlia e japo). apa-receram na cidade policiais do dops (departamento de ordem poltica e social) que os levaram para so paulo, onde ficaram presos como espies em campos de concentrao at o fim da guerra, contou carvalho luz. tanaka foi um dos presos, acusado de espionagem. papis apreendidos com ele como provas foram traduzidos depois de algum tempo: eram cartas comerciais sobre adubos, sementes e implementos agrcolas. libertado, tanaka continuou na omoto, mas o templo de uberlndia foi desativado. anos mais tarde, ele coordenou a re-construo do templo em jandira, no interior paulista, e foi presidente ad-ministrativo da seita por vrios anos.

    Adeptos da seita oriental Omoto, em frente ao templo da cidade

  • diferentemente das noites marcadas pelos grandes espe-tculos teatrais e musicais, em que os holofotes buscavam iluminar o artista, captando-lhe os movimentos e registrando-lhe o sorriso, exis-tiam em uberlndia noites mal focadas pelas lanternas dos policiais. madrugadas povoa-das pelo tinir de suas armas.o que causava constrangimen-tos, medos e insegurana na populao da cidade era a temida cavalaria, que, segundo os jornais da poca, era man-tida pelos cofres municipais e ficava alojada na fazenda tubalina, de propriedade do ento prefeito tubal vilela. a cavalaria trazida pelo prefeito no incio dos anos 1950, aps uma greve de condutores de veculos considerada pacfica pela imprensa , tinha como um de seus objetivos ordenar o espao urbano, dele expur-gando negros e pobres: domingo, s nove horas da noite acima da linha, na rua guarany, soldados da polcia espancaram barbaramente um preto at que ele caiu no cho,

    tendo sido depois levado pela carrocinha. disse o vereador que acha necessrio o policia-mento da cidade. mas que es-pancamentos como estes no esto de acordo com uberln-dia, cujos moos, se precisam de correo, devem ser procu-rados, legalmente. terminou por afirmar que a situao cada vez se agrava entre os soldados e o povo, pedindo que o seu protesto fosse acompanhado de um pedido de providncias. (correio de uberlndia, uberlndia, n. 3522, p.1, 22/10/1952).alegando retirar dos prostbu-los os menores de idade, os beberres, desordeiros e crimi-nosos, a corporao utilizava-se de mtodos que oscilavam entre a extorso e a agresso fsica e moral de meretrizes que trabalhavam nessas casas de baixo meretrcio: anteontem, cerca das 19 horas, dois ou trs soldados da cavalaria da tubalina penetra-ram na penso de mulheres de propriedade de negrinha de tal, situada em pequena traves-sa que liga a extremidade alta da rua agenor paes a rua ipi-

    ranga, e l praticaram desor-dens, derrubando mesas e ca-deiras, quebrando garrafas e espancando as habitantes da casa, uma das quais teria fica-do ferida numa perna. os diri-gentes de uberlndia no com-preendero nunca que esses militares esto constituindo fator de permanente desas-sossego na cidade?. (correio de uberlndia, uberlndia, n. 3529, p.1, 1/11/1952).essa fora militar que causava furor em toda a sociedade, in-cluindo a imprensa, tambm afrontava impiedosamente as moas de famlia: as senhoritas cacilda de oliveira, que era professora do liceu de uber-lndia e da escola municipal noturna que funciona no gru-po escolar doutor duarte, e terezinha de oliveira foram agredidas por um soldado da cavalaria, de acordo, tambm, com os jornais da poca. no entanto, o dia a dia da ci-dade no era somente pautado na violncia e nos sinais acsticos da represso. nas noites chuvosas, devido ao silncio das ruas e casas, ou-via-se o tamborilar montono

    e tranquilizador da chuva que, insistentemente, batia nos telhados, nas copas das r-vores e nas torres das igrejas, para, logo em seguida, escorrer lenta pelo dorso dos rochedos e das ruas. nesses instantes, diversos indivduos cediam ao convite sonoro e montono das guas que copiosamente caam sobre os telhados, as rvores e as torres para en-tregarem-se ao sono reparador.aps as tempestades, escuta-va-se dos quintais e das grandes poas dgua que se formavam nos terrenos baldios a reverberao de uma orques-tra composta pelo lamrio da r-de-boca-estreita, o latido do sapo-cachorro, o trinado do sapo grilo-do-brejo, os sons de guizo do sapo-do-campo, o ronco do sapo-roedor e o ar-roto do sapo-boi. das caladas molhadas, ouvia-se o assobio solitrio de um bomio em-briagado de cachaa e, talvez, de amor.

    (*) doutor em Histria social pela puc/sp. autor do livro ontem ao luar: o cotidiano bomio da cidade de uberlndia (mg) nas dcadas de 1940 a 1960. (edufu, 2012)

    38 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    SOMbriAS nOiTeSbOeMiA

    por jlio csar de oliveira*

    A temida cavalaria do prefeito Tubal Vilela em formao na rea central da cidade

  • A primeira personalidade nacional a receber o ttu-lo de Cidado uberlandense foi o presidente Juscelino Kubitschek em 1959. A ho-menagem foi criada em 1957 por meio do Projeto de lei 878, de iniciativa do ento

    vereador renato de Freitas. Algumas das personalidades contempladas no vieram a uberlndia para receber o ttulo, como a atriz Fernanda Montenegro, o apresentador raul Gil e o cirurgio plstico ivo Pitanguy.

    JK FOi O PriMeirO CIdAdO hONORRIO

    1959 Homenagem da cidade

    O presidente Juscelino Kubitschek e renato de Freitas

    O presidente Juscelino Kubitschek em visita Camara Municipal

    em 1872, a populao es-crava no brasil represen-tava 15,24% do total e, em uberlndia, a proporo era semelhante. a vila de so pedro do uberabinha, ento pertencente a uberaba, era habitada por 3.483 brancos entre homens e mulheres, enquanto o nmero de negros era de 545 (15,64%). os dados foram levanta-dos em um censo elaborado naquele ano, a nica contagem de populao ocorrida durante o perodo imperial em todo o territrio brasileiro. os da-dos foram divulgados em 2012 pela fundao de amparo pes- quisa do estado de minas gerais.

    Analfabetismo

    o censo de 1872 registrou quase 10 milhes de habitantes no pas, distribudos em 21 provncias. cada provncia se subdividia em mu-nicpios, que, por sua vez, se subdi-vidiam em 1.440 parquias, as unidades mnimas de informao. a coleta foi realizada nas parquias.alm do levantamento do nmero de habitantes, foram investigadas informaes especficas sobre pes-soas com deficincia, acesso escola e profisses exercidas, entre outras. em uberlndia, 2.960 pessoas eram analfabetas e apenas 523 em toda a cidade sabiam ler e escrever, o que correspondia a 17% da populao livre, porque escravos no eram alfa-betizados.

    PeSQuiSAdiVulGA nMerOSindiTOS

    1872 o censo imperial

    39 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

  • dO FundinHOPArA O MundO

    artista da capa HlViO de liMA

    conversar com ele como dar um passeio pela uberlndia dos velhos tempos, quando ainda havia concursos de calouros nas rdios e o curso clssico, hoje ensino mdio, onde o ento aluno

    40 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    e futuro artista plstico j se destacava entre os colegas de classe nas aulas de desenho. Hlvio de lima, 65 anos, nasceu na antiga avenida dos andradas, hoje raulino cotta pacheco, prximo ao crrego cajub, que deu lugar avenida

    getlio vargas. com o pai, iracy de lima, que era pintor de paredes, aprendeu a trabalhar com as cores, e por incentivo da me, maria pereira lima, dona de casa e bandolinista, comeou tambm a cantar. o sonho da minha me era que a gente

    O filho de uma famlia de artistas

    de uberlndia tem sua obra nas

    cidades do planeta

    A Catedral de Santa Terezinha em construo na praa Tubal Vilela, no fim da dcada de 1930

    Hlvio com Adlia e os filhos, isabela e renan

  • fosse artista. aos 6 anos, fui cantar nas rdios difusora e educadora. como prmio, ganhava um guaran big boy, um macarro erlan ou um brinquedo da casa sabag. foi uma infncia feliz, disse Hlvio.o artista plstico era sobrinho do maes-tro carlos de alcntara, responsvel pela orquestra tapajs, no qual o ir-mo de Hlvio, o saxofonista Hlio de lima tambm tocava. Hlvio ainda irmo da pianista maria terezinha de jesus lima e de Helmo de lima, o nico sem dom para a msica. meu av materno, antnio alves pereira, tocava trombone na jazz band s de ouro, onde minha av carlota rezende pereira tocava piston, lembrou Hlvio.

    O desenho

    apesar da boa voz e de tantos msicos na famlia, ainda no curso clssico da escola bueno brando, Hlvio era o aluno preferido do professor de dese-nho eurico silva. foi o professor eurico quem me estimulou. lembro-me bem dele. usava bigodes, era per-fumado e estava sempre de terno. era escritor, cronista e morava no Hotel goyano. naquela poca, tnhamos muito respeito pelos professores, afir-mou Hlvio. j adulto, Hlvio chegou a se matricular em pequenos cursos

    41 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    A jazz Band s de Ouro e o maestro, av de Hlvio, Antnio Alves Pereira, o 2 da esquerda para direita. O tio Carlos de Alcntara o ltimo esquerda

    Hlvio (menor) com os pais e irmos

    particulares de desenho e pintura com a professora neusa barbosa neto. em 1968, fez as primeiras exposies de arte. uma no clube recreativo ara-guarino, na vizinha araguari, e outra no uberlndia clube e, a partir da, em vitrines de lojas da cidade. na faculdade de filosofia, cincias e letras, da qual foi aluno, fez as primeiras mostras indi-viduais em 1970 e 1971. foi apresentado, por meio da escri-tora martha pannunzio, marchande lourdes saraiva, que logo se encantou pelos quadros dele e, por sua vez, o apre-sentou a jos de moraes, o brao direito de cndido portinari e que desenhou o painel de pastilhas do uberlndia clube, executado por geraldo queiroz. Hoje, mesmo sem nunca ter deixado de morar na terra natal, a obra de Hlvio de lima se espalhou pelo brasil e mundo, com trabalhos vendidos para os esta-dos unidos e europa, acumulando da mesma forma, prmios nacionais e inter-nacionais. no me arrependo de no ter ido embora. aqui minha cidade, com pessoas de boa ndole, fechadas, mas muito solidrias, disse Hlvio.H 35 anos, Hlvio casado com a escul-tora adlia de lima, com quem tem dois filhos, isabela e renan. H dez anos, fun-dou o jornal fundinho, que conta as histrias dos moradores do bairro mais tradicional e onde uberlndia, assim como ele, deu os primeiros passos.

  • A ruA dAlAVOurAVia recebeu o primeiro calamento da cidade

    1900 avenida afonso pena

    na virada do sculo 19 para o 20, o comercian-te arlindo teixeira con-tratou o engenheiro da mogiana, james mellor, para fazer uma planta urbanizada do espao que ia do cemitrio que havia na praa clarimundo carneiro at a estao da mogiana, onde hoje a praa srgio pacheco. ele traou uma espcie de tabuleiro de xa-drez com cinco vias mais largas que iam de um ponto ao outro e vrias travessas mais estreitas.essa parte de cima chamou-se cidade nova e o bairro fundinho cidade velha. a avenida afonso pena, por sua vez, recebeu o nome de rua da lavoura e uma das primeiras residncias cons- trudas nela foi a do farmacutico antnio vieira gonalves. era uma avenida de terra, que possua rvores plantadas em seus dois lados. a rua recebeu o primeiro calamento da cidade, em 1922, da praa tubal vilela clarimun-do carneiro. obra do prefeito joo severiano rodrigues da cunha, o

    Vista da avenida Afonso Pena, coma concessionriairmos Garcia e a torre da catedralao fundo

    42 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    por anTniO pErEira

  • joanico. ali comeou o vaivm da rapa-ziada nos domingos e feriados e o carnaval de rua. a maioria dos assassinatos e tentativas tambm aconteceram nela. os alto-falantes, precursores das emissoras de rdio, ali se instala-ram e o maior cinema de minas gerais, o cine uberlndia, com 2,5 mil lugares. na dcada de 1960, tinha tantos anncios em neon que ganhou o slogan de cidade dos lumino-sos. os primeiros arranha-cus se ergueram nela: o edifcio da drogasil e o tubal vilela. os des-files cvicos e carnavalescos se

    realizavam nela. o mais famoso rei momo, o Hipopota, descia a avenida e abria o carnaval na praa tubal vilela.at 1970, foi impedida de expan-dir-se pelas linhas da estrada de ferro que, naquele ano, foram retiradas, durante a administra-o de renato de freitas.mas por que o nome do ex-go-vernador afonso pena? muito mais justa a homenagem seria se a avenida se chamasse coronel carneiro, fernando vilela, au-gusto csar ou joo severiano rodrigues da cunha: homens aos quais a cidade deve as sementes de quase tudo o que tem.

    43 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    detalhe das obras de calamento da avenida Afonso Pena

    na avenida Afonso Pena comeou o vaivm da rapaziada aos domingos e feriados e o Carnaval de rua

    eduardo Machado foi um viajante por-tugus boa praa que veio morar em uberlndia na dcada de 40. um dos fundadores do Clube Portugus foi tambm um dos organizadores das fa-mosas bacalhoadas que nos anos 60 e 70 atraam a sociedade uberlandense vida pela fantstica culinria lusitana.bem-humorado, Machado, por fora de sua atividade de representante comer-cial, ia todo ms a So Paulo. nessas viagens, nunca deixava de ir ao Mer-cado Municipal onde comprava baca-lhau e uma deliciosa linguia tipo por-tuguesa que servia aos felizardos ami-gos aqui em uberlndia. Tanta frequn-cia aliada simpatia no demorou que estabelecesse uma relao de amizade com o dono da banca que passou a lhe chamar de portugus de Minas. numa dessas idas, ficou frustradssimo ao saber que o estoque de linguia ha-via acabado. Como o dono da banca j se tornara seu amigo e sabia da sua pro-cedncia mineira perguntou-lhe em que cidade morava. Ao receber a res-posta de uberlndia soltou um largo sorriso e informou ao incrdulo Macha-do que a linguia que ele tanto apre-ciava e ia comprar em So Paulo era produzida em uberlndia. um produto da fbrica de banha Wanda, tradicional estabelecimento da avenida estrela do Sul, que produzia diversos derivados de carne suna. O irreverente Machado ficou sabendo que a linguia que tanto apreciava e que ia comprar em So Pau-lo era na verdade produzida aqui. A amizade continou, mas o dono da ban-ca perdeu um fiel cliente das linguias.

    lINgUIAbuMerAnGue

    portugus de minas

  • O INCANSvelFAzedOr de eSTrAdAS

    1911 fernando vilela

    fernando vilela, pio-neiro na construo de estradas no bra-sil central, nasceu h 140 anos em canpolis, a 121 km de uberlndia. estu-dou engenharia na escola politcnica do rio de janei-ro. recm-formado, mudou-se para ituiutaba, onde foi eleito agente executivo e presidente da cmara muni-cipal, o que na poca corres-pondia funo de prefeito da cidade. ocupou o cargo de 1908 a 1911.

    uberabinha

    a regio praticamente no tinha estradas e, em agosto de 1911, vilela mudou-se para uberabinha de posse de uma concesso do governo do estado para abrir uma estrada que ligasse a cidade a ituiutaba. uberabinha era

    44 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    O engenheiro queatraiu recursos da iniciativa privada para um dos mais ousados projetosdo brasil Central

    uma das primeiras jardineiras que fazia a ligao entre as cidades da regio

    o lugar ideal para centralizar uma grande rede rodoviria, porque a cidade j era o ponto final da ferrovia mogiana, era o centro dos mercados do trin-gulo mineiro e sudoeste goiano e a nica com iniciativa privada capaz de investir na construo das estradas. alm disso, vilela tinha credibilidade para unir os grupos polticos coces e cois em torno de um mesmo proje-to. em agosto de 1912, em frente estao da mogiana, a popula-o da cidade e as principais autoridades participaram da sesso solene que marcou o in-cio dos trabalhos de construo da estrada intermunicipal, que contava com uma verba estima-da em 250 contos de ris mais de trs vezes o oramento do municpio, que em 1912 havia sido de 73 contos de ris. foi criada uma sociedade annima, a companhia mineira de auto viao intermunicipal, com

    O engenheiro Fernando Vilela liderou, a partir de 1911, a construo da malha rodoviria da cidade

  • sede na chcara goiandira, que ficava onde hoje a esqui-na da avenida floriano peixo-to com a avenida joo naves de vila. os dois primeiros motoristas contratados tive-ram que aprender a dirigir.era enorme o espanto da po-pulao, acostumada apenas a ver carros de bois, com a frota da companhia: trs modernos caminhes fiat de trs tonela-das, um carro reboque para 2 mil quilos, o nibus fiat de 12 lugares e trs carros overland para cinco passageiros.em setembro de 1913, foram entregues os primeiros 74 km, que ligavam uberabinha a monte alegre de minas e, em janeiro de 1915, completaram-se os restantes 80 km at

    ituiutaba. em 1916, a extenso da rede operada pela empresa passaria para 333 km com a construo do trecho ligando uberabinha a bom jardim do prata. a companhia transpor-tava cargas e passageiros e de-cidiu ampliar os percursos para municpios de estados vizinhos. entre outras iniciati-vas, foi construda a rodovia entre itumbiara (go) e morri-nhos (go), um dos empreen-dimentos mais ousados da histria rodoviria do pas, que atraiu recursos da iniciati-va privada para uma obra com mais de 500 km de extenso.

    fonte

    das sesmarias ao polo urbano: formao e transformao de uma cidade, de oscar virglio pereira

    45 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    Mesmo precrias, estradas eram a base do crescimento regional

    A construo de estradas foi responsvel por intensa distribuio de mercadorias

    gilberto garcia, produtor de programas como os trapalhes e chico anysio show, pai das atrizes isabela e rosana garcia, foi funcionrio do correio de uberln-dia no fim da dcada de 50. gilberto era res-ponsvel por etiquetar e despachar os exem-plares dos assinantes para moacyr franco, o cantor, fazer as entregas de bicicleta. de acordo com moacyr franco, gilberto co-nheceu uma moa e ficava horas namorando pelo telefone do jornal. como no conseguia etiquetar todos os jornais, comeou a escon-d-los por cima do forro do teto. mesmo diante das reclamaes dos assinan-tes, o diretor do jornal, valdir melgao, no desconfiava de nada. em um dia de chuva for-te, o teto da sala de expedio foi abaixo com o peso de quilos de jornais velhos acumula-dos. gilberto garcia foi demitido na hora e co-meou sua carreira de sucesso na televiso.

    TeMPeSTAde de PAPel

    namoro no jornal

    Gilberto com a esposa dirce e os filhos Gilberto, ricardo, isabela e rosana

  • O brasil, num tempo no to longnquo assim, tinha padres de comportamento bastante preconceituosos. um deles que tristemente perdurou at ali pelo final dos anos 50, incio da dcada de 60, era o de no permitir a associao de pessoas negras nos principais clubes sociais das cidades.uberlndia infelizmente no fugiu regra e por algumas dcadas no permitiu o ingresso de negros no quadro de associados do mais importante clube recreativo da cidade, o praia. esse episdio para ser esquecido na histria do clube, acabou sendo responsvel tambm pelo surgimento de boatos que ganharam vida e sobreviveram ao longo dos anos. o mais famoso deles dava conta de que at pel, o rei do futebol, havia sido barrado na portaria do praia. o fato tem sido propagado com tanta nfase e por tantas pessoas, que no imaginrio popular considerado absolutamente verdadeiro.

    o porteiro do praia, otair rodrigues silva, mais conhecido como pedro, com a autoridade de quem comanda a portaria do clube h mais de 60 anos, em recente depoimento ao programa uberlndia de ontem e sempre afirmou categoricamente que isto jamais aconteceu.acrescentou que, por um tempo, a norma de no admitir pessoas negras como scias do praia realmente prevaleceu, mas que negros eram convidados por scios e iam ao clube.portanto, pel nunca foi barrado no praia clube. alis, h uma passagem muito interessante quando ele, acompanhando a equipe do cosmos, esteve almoando por l.depois de visitar as instalaes do praia, simptico como sempre foi, fez questo de elogiar a cozinheira e lhe dar um beijo no rosto. segundo consta (e pode ser que isto tambm seja um boato) , ela teria ficado uns trs dias sem tomar banho apenas para no tirar o trofu do rosto...

    Pel nO PrAiA

    O primeiro decreto-lei autorizando a cons-truo do Mercado Municipal data de 1923. Porm, a construo na rua Olegrio Maciel, 255, s iniciou em 1944, no mandato do prefeito Vasconcelos Costa.

    90 AnOS dATAS

    46 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    1982 lenda urbana

    Pel, cercado por scios, visita o Praia Clube em 1982 com o time do Cosmos

    A primeira edificao da igreja do rosrio foi planejada em 1876, e deveria ser construda na atual praa doutor duarte. Mas em 1891, Arlindo Teixeira, mem-bro da Comisso Procu-radora da irmandade de nossa Senhora do rosrio props a mu-dana de lugar. desta forma, ela foi iniciada em 1893, em um terreno vago onde atualmente a praa rui barbosa, que era, naquela poca, uma rea bastante afastada do centro urbano.

    120 AnOS

  • por ilma de moraes

    O salrio de um vereador na uberlndia de hoje gira em torno de r$ 15 mil mensais, alm de uma verba indeni-zatria de at r$ 10 mil. Mas, houve um tempo em que a remunerao de um vereador era simblica: um salrio mnimo mensal pelos servios prestados cidade. Os trs relatos a se-guir relembram a vida p-blica de vereadores que atuaram no legislativo Mu-nicipal quando no havia altos salrios (ou at mesmo salrio algum), mas que ti-veram mandatos significati-vos para o desenvolvimento da nossa cidade.

    Angelino Pavan

    depois de eleito verea-dor por cinco vezes pelo psd e exercer em vrias gestes o cargo de secretrio municipal, angeli-no pavan tornou-se um marco na vida poltica de uberlndia. a musicista cora pavan cappa-relli, nica filha de angelino, lembra que seu pai veio de ube-raba para uberlndia, aos 16

    A SeRvIO dO eleiTOr

    1950/60 quando os vereadores no tinHam salrios

    48 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    Angelino Pavan no dispensrio dos pobres no Mercado Municipal na dcada de 1960

  • anos, para trabalhar na livraria cos-mos. interessou-se por contabilidade, tipografia e estudou ingls e francs. cora conta que, desde jovem, pavan gostava de fazer trabalhos voluntrios e acabou tomando gosto pela poltica. eleito vereador, angelino era rotaria-no e maon. empresrio, dono de uma livraria e uma tipografia, ocupou a presidncia da associao comercial e industrial de uberlndia (aciub) por duas gestes, quando construiu a sede da entidade na avenida joo pi-nheiro. meu pai foi um batalhador na poltica. mesmo sem a alta remunera-o dos dias de hoje, ele no via difi-culdades em servir populao da cidade.

    Amir Cherulli

    contemporneo de pavan, o ex-vereador amir cherulli, hoje com 77 anos, recorda-se bem dos 34 anos de intensa vida parlamentar. ele conta que seu gosto pela poltica est no sangue e,

    Amir Cherulli emcampanha,

    49 Almanaqueuberlndia deontem e semprereynaldo Cazabona prepara ata em sesso da Cmara

    aos 10 anos de idade, trabalhou na campanha poltica do seu tio manoel crosara, presidente do prp (partido de representao popular), distri-buindo santinhos e folhetos. em 1962, pelo prp, amir cherulli fez sua primeira campanha para vereador, apoiando o candidato para prefeito raul pereira de rezende, vencedor do pleito daquele ano. eletricista e enca-nador, o homem do palet xadrez, como era chamado no correio de uberlndia pelo jornalista luiz fer-nando quirino, afirma que, naquela poca, os vereadores tinham outras profisses das quais tiravam seu sus-tento. ele ressalta ainda que as campa-nhas eram modestas, feitas muitas vezes com dinheiro prprio ou doa-es e consistiam em comcios nos bairros e no centro da cidade, nos quais a distribuio de panfletos e santinhos e os pronunciamentos ao ar livre divulgavam as propostas dos candidatos. tudo era feito por muito amor cidade e no por dinheiro, disse cherulli.

    reynaldo Cazabona

    o advogado aposentado rey-naldo cazabona, 75 anos, recorda-se que, desde os tempos da faculdade de direito, em uberaba, sempre gostou de fazer poltica. em 1962 elegeu-se vereador pela udn. segundo cazabo-na, no existiam assessores parlamen-tares e apenas os funcionrios da casa auxiliavam o vereador. cazabona lem-bra das animadas rodas de conversas no antigo senadinho, reduto poltico da cidade ao lado do cine uberlndia. Havia efervescncia poltica na cida-de! em 1964, a revoluo jogou nossa constituio no lixo e comeou um perodo de muita perseguio e re-presso a todos. cazabona, um dos fundadores do partido de oposio ao regime, o mdb, recorda que o governo militar determinou que apenas os municpios com mais de 200 mil ha-bitantes podiam remunerar os verea-dores. durante quatro anos foram ex-tintas as remuneraes na cmara.

  • HOMenAGenS vivas

    A cidade de uberlndia tem poucos rgos e logradouros pblicos homenageando pessoas vivas

    Humilde, nossa maestrina chegou a contestar o significado dessa ho-menagem.

    quando fiquei sabendo que o conser-vatrio levaria meu nome, fiquei preocu-pada. eu havia sugerido que se chamasse ladrio teixeira, um homem de muita importncia para a msica e que deixou uma grande obra, mas os trs deputados que colaboraram para a transformao do conservatrio falaram que no abririam mo de que o conservatrio levasse o meu nome. disseram que eu estava fazendo uma doao muito importante para o estado de minas. eu tinha a escola h mais de dez anos, doei 18 pianos, acordees violinos, diversos instrumen-tos e toda a minha biblioteca particular. ao mesmo tempo que tenho satisfao me esforcei muito para no desapontar, uma responsabilidade muito grande em vida ter uma instituio de tamanha importncia com o meu nome.

    o centro administrativo virgilio galassi tambm foi outra dessas homenagens, pois foi feita ainda com o ex-prefeito vivo. tanto que ele exerceu seu ltimo man-dato no prdio que tinha seu nome.

    a lei federal n. 6.454, de 24 de outubro de 1977, que proibe que se d o nome de pessoas vivas a prdios ou outros bens pblicos, acabou sendo responsvel pela retirada do nome de paulo ferolla do terminal central.

    certamente, a mais conhecida a avenida rondon pacheco, nossa principal via que leva o nome desse benfeitor da cidade e um dos mais respeitados homens pblicos do nosso pas.o acanhado teatro anexo ao uberlndia clube tambm tem o nome desse ilustre uberlandense.

    muito gratificante e confortador o cidado conviver na sua terra natal recebendo manifestaes de carinho e apreo. uma forma de reconhe-cimento da populao e dos setores

    representativos da cmara municipal e do prprio poder executivo no sentido de prestigiar o trabalho desenvolvido em favor da comunidade mineira e especialmente o compromisso poltico que sempre tive com uberlndia, com minas gerais e com a nossa amada p-tria querida, o brasil, disse rondon.

    outra homenagem viva est no conser-vatrio estadual que tem o nome da responsvel por sua criao e uma das pessoas que mais lutam pelo seu forta-lecimento e crescente significado, cora pavan capparelli.

    50 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    Avenida rondon Pacheco

    Cora

    celso macHado

    O estdio municipal tem o nome de outra pessoa viva, Joo Havelange. Homenagem contestada, pois ele nada teve com a histria da cidade. existe um projeto na Cmara para mudar essa denominao

  • com 180 km percorridos, das principais nascentes em uberlndia at a foz em tupaciguara, o rio uberabinha, no tupi gua que bri-lha, foi testemunha da histria da cidade desde os seus primrdios, quando a regio, ainda chamada serto da farinha podre, era domi-nada pelos ndios caiaps. segundo a antroploga ldia mei-relles, os caiaps formavam o maior grupo indgena em densida-de habitacional, transitando desde o pontal do tringulo mineiro ao sul de gois, noroeste de so paulo e leste do mato grosso do sul. isso fez com que o antroplogo darcy ribeiro chamasse a regio de gran-de caiapnia. os caiaps formaram um grande cinturo humano que bloqueou as frentes de expanso econmica.

    A GrAndeCAiAPniA

    SCulO 17 a cOLOnizaO dO cErradO

    51 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    Os caiaps eram o maior grupo da regio em densidade habitacional

  • foram um grande empecilho para a colonizao portuguesa. a resistncia caiap era tamanha que, segundo o historiador luis augusto bustamanti, a ocupao das terras da regio comeou bem mais tarde do que no restante de minas gerais. por aqui havia apenas uma estrada que ligava so paulo a gois, por onde passavam tropeiros. o resto era ocu-pado pelos caiaps que acabaram di-zimados pelos paulistas.

    Caiaps dizimados

    os ndios foram expulsos entre 1754 e 1758 e substitudos pelos bororo e pa-recis, do mato grosso, trazidos como soldados pelos paulistas e mais tarde empregados como de mo de obra pelos colonos que ocuparam a rea. o coronel antnio pires de campos, que perseguiu e dizimou caiaps, foi

    52 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    o responsvel pela distribuio dos novos moradores indgenas por al-deias, onde construam uma igrejinha e suas casas. mas, logo a regio come-ou a ser ocupada por colonos vindos do sul de minas gerais. e a rea dos ndios acabou invadida, como ainda acontece hoje em dia, afirmou a an-troploga ldia meirellesno livro brasil novo mundo, o ge-logo alemo Wilhelm von eschwege afirma que um certo antnio eust-quio, sargento-mor responsvel pelo povoamento do tringulo mineiro, desalojou 871 ndios na faixa de terra entre o rio das velhas e o rio grande,

    onde hoje fica uberaba e uberlndia. duas dessas aldeias se transformaram nos povoados de santanna e rio das pedras, que mais tarde se transforma-ram nas cidades de indianpolis e cascalho rico. em uberlndia, uma dessas aldeias, chamada rocinha, possivelmente tornou-se o atual dis-trito de tapuirama.

    fonte

    srie expedio rio uberabinha, produzida pela close comunicao com apoio da algar telecom e aprovao da lei estadual de inventivo cultura

    ima

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    A srie expedio rio uberabinha levantou informaes valiosas so-bre os Caiaps em uberlndia.

  • 54 Almanaqueuberlndia deontem e sempre

    a presena de pessoas tidas como diferentes na vida pblica brasileira no algo recente. H dcadas, em uberlndia inclusive, figuras tor-nam-se folclricas por sarem dos padres da sociedade e frequenta-rem os sales polticos, muitas vezes levantando bandeiras estapafrdias

    QueM Se leMbrA de ASTOlFO SilVA? entre delrios e questionamentos, ele marcou presena na Cmara Municipal

    dCAdA de 1960 deu a louca na poltica

    Foto rara de Astolfo Carlos da Silva, primeiro esquerda, entre figuras importantes de uberlndia

    cidade, na praa clarimundo car-neiro.se estivesse vivo, astolfo hoje estaria feliz de ver um sonho rea-lizado, pelo qual fez inmeros discursos, boa parte deles em pra-a pblica em cima de tambores. ele defendia arduamente a cons-truo de um teatro municipalpara a cidade.segundo o memorialista antnio pereira, astolfo era uma figura simptica, que conhecia todos os vereadores da casa. se as suas fa-las, em maior parte, no tinham nexo, j era outro assunto. mas, ele prprio levava a srio o que dizia. em um plano fictcio, por exemplo, se lanou candidato avereador e arrastou consigo a tru-pe das pessoas excntricas mais populares da cidade. o seu candi-dato a prefeito era jernimo coe-lho, um lenhador por profisso, e para deputados ele lanava no-mes como maria do pito aceso e paco, entre outros, todos perso-nagens reais de uberlndia, cuja insanidade mental era atestada pela populao.se a candidatura de astolfo ocor-reu em seu delirante plano imagi-nrio, houve ao menos uma oca-sio em que ela quase se tornou real. em 1988, o pdt chegou a lanar a sua candidatura. ele se apresentava aos eleitores com espada e com o figurino de um super heri dos desenhos anima-dos da poca, o He-man.uma de suas propostas era criar o recanto das mariposas, um lo-cal prximo a cruzeiro dos peixo-tos destinado ao pblico glt, que, naqueles tempos, eradenominado por expresses me-nos adequadas.essa forma inusitada de sua can-

    uberlndia conta com a presena em praa pblica de um candi-dato pobre contra um monto de cobre

    e, no raro, mobilizando a socieda-de. entre essas pessoas, na cidade, uma marcou a cena poltica em mea-dos do sculo passado. era astolfo carlos da silva, um cidado comum, com alguns sinais de demncia, fre-quentador assduo da cmara muni-cipal de uberlndia, quando esta funcionava onde est o museu da

    por CARlOS gUImAReS COelhO

  • Almanaqueuberlndia deontem e sempre55

    Astolfo frequentava as sesses da Cmara na poca em que elas aconteciam no Pal-cio dos lees

    didatura no passou despercebida pela rede globo, que veiculava p-lulas com 1 minuto de durao apresentando candidatos exticos.mas a justia eleitoral impugnou-a, alegando que ele no tinha domnio de suas capacidades mentais para a legislatura. uma contradio, uma vez que astolfo era eleitor. se ele tinha a capacidade de votar, portan-to poderia tambm se eleito.o estranho que, embora com a sade mental comprometida, astol-fo demonstrava certa erudio. mesmo com contedos desconexos e com muita inventividade, seus textos eram bem rechonchudos, com palavras difceis e tambm de difcil compreenso.o historiador poltico eduardo afonso registra que astolfo era figu-ra frequente, quase sempre nica, nas sesses da cmara de vereado-res. e muitas vezes era lhe dado o direito de fazer perguntas e at mesmo apresentar propostas.afonso lembra outros fatos pitores-cos dessa figura que foi marcante na vida de uberlndia.o primeiro deles at pela coincidn-cia, pois ambos comemoravam ani-versrio no mesmo dia, 28 de agos-to. astolfo tinha mania de produzir folhetos convidando todos que en-contrava para comemorar com ele essa data no recinto da cmara mu-nicipal. nesse dia, o movimento nas sesses costumava ser outro...de tanto conviver no meio poltico, conseguiu acesso ao pr morar e obteve uma casa no bairro tancre-do neves.e mais do que isso, o prefeito da poca, renato de freitas, escolheu sua residncia para que o ministro tancredo neves fizesse oficialmen-te a inaugurao do conjunto resi-dencial.

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