alegaÇÕes finais - 4 peÇa

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EXCELENTÍSSIMO (A) SENHOR (A) DOUTOR (A) JUIZ (A) DE DIREITO DA 6ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE VILA VELHA-ES. PROCESSO Nº: AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO RÉU: MARCELO LARÁPIO Marcelo Larápio, qualificado nos autos do processo-crime que lhe move o Ministério Público Estadual, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fundamento no art. 403, § 3º, do Código de Processo Penal, apresentar suas: ALEGAÇÕES FINAIS Passando a aduzir o que a seguir expõe: O acusado foi denunciado pelo Ministério Público por ter sido preso em flagrante imputando-lhe as condutas descritas na Nota de Culpa (art. 157, § 2º, I, do Código Penal Brasileiro), entendendo que o crime fora perpetrado com violência e grave ameaça a pessoa, e ainda, nas sanções do art. 14, da Lei 10.826/2003 (porte ilegal de arma de fogo), na forma do concurso material de crimes (art. 69, CP).

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Page 1: ALEGAÇÕES FINAIS - 4 PEÇA

EXCELENTÍSSIMO (A) SENHOR (A) DOUTOR (A) JUIZ (A) DE DIREITO DA 6ª VARA

CRIMINAL DA COMARCA DE VILA VELHA-ES.

PROCESSO Nº:

AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO

RÉU: MARCELO LARÁPIO

Marcelo Larápio, qualificado nos autos do processo-crime que lhe move o Ministério

Público Estadual, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fundamento

no art. 403, § 3º, do Código de Processo Penal, apresentar suas:

ALEGAÇÕES FINAIS

Passando a aduzir o que a seguir expõe:

O acusado foi denunciado pelo Ministério Público por ter sido preso em flagrante imputando-

lhe as condutas descritas na Nota de Culpa (art. 157, § 2º, I, do Código Penal Brasileiro),

entendendo que o crime fora perpetrado com violência e grave ameaça a pessoa, e ainda,

nas sanções do art. 14, da Lei 10.826/2003 (porte ilegal de arma de fogo), na forma do

concurso material de crimes (art. 69, CP).

Aduz a acusação que no dia no dia 11.04.2012, por volta das 22:00 horas, na rua Belo

Horizonte, próximo ao “Chalé Motel”, bairro Itapoã, neste município, sob o argumento de que

mediante grave ameaça, utilizando-se de uma arma de fogo desmuniciada, o acusado

subtraiu de uma diarista de nome Dorotéia Penedo, sua bolsa contendo a importância de R$

60,00 (sessenta reais), que acabara de receber de sua patroa a título de pagamento de uma

faxina, e vários objetos pessoais.

Recebida a denúncia, e apresentada, dentro do prazo legal, resposta à acusação, foi

designada e realizada audiência de instrução e julgamento.

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Realizada audiência de instrução em julgamento, encerrada a coleta de depoimentos, o MM.

Juiz deu por encerrada a instrução criminal abrindo prazo legal para oferecimento das

alegações finais na forma de memoriais.

Em alegações finais, pugnou o Ministério Público pela condenação do réu nos termos da

denúncia.

Ocorre Excelência, que o Nobre RMP, desvirtuou os fatos não vislumbrando a verdade

devidamente demonstrada pelo Acusado que em momento algum opôs qualquer resistência

em colaborar com a justiça demonstrando os fatos como realmente se deram, expondo

todos os eventos de forma contínua e clara.

Que o Acusado tinha na data dos fatos apenas 20 (vinte) anos de idade, e conforme

mencionado pela última testemunha, é pai de família, trabalhador, honesto, primário e de

bons antecedentes.

Uma testemunha ocular, em seu depoimento em juízo foi bastante clara ao afirma que o

acusado em momento algum praticou grave ameaça contra a vítima: “assevera ter

presenciado os fatos, bem como diz que viu quando o réu se aproximou da vítima e lhe

puxou a bolsa. Disse, contudo, que o réu seguia normalmente com as duas mãos no bolso

de sua jaqueta, quando da abordagem à vítima. Revelou que o réu sequer falou algo para a

vítima. Por fim, narrou que logo depois de arrancar a bolsa da vítima, o réu saiu em

disparada”. (grifo nosso)

Outra testemunha refuta a ideia de o acusado ter ameaçado a vítima e deste estar em posse

de uma arma de fogo: “afirmou que viu o réu se aproximar da vítima, e de forma sorrateira,

arrancou a bolsa dela. Disse que não viu o réu com a arma”.

A própria vítima em seu depoimento nega que o acusado tenha proferido qualquer palavra

que a fizesse se sentir ameaçada, e que após tal conduta evadiu-se do local.

Um policial militar arrolado como testemunha de acusação, afirma que no momento da

prisão o acusado confessou ter subtraído a bolsa da vítima, mas que não fora apreendido

portando arma de fogo, que somente fora encontrado tal arma em momento posterior aos

fatos e em um local próximo.

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Em seu interrogatório em juízo, o acusado admitiu ter subtraído a bolsa da vítima, porém,

asseverou não estar armado quando dos fatos. Disse, ademais, que estava apenas com as

mãos no bolso quando da aproximação à vítima, e, que em nenhum momento, simulou estar

armado.

Resta claro pelos depoimentos prestados em juízo que o acusado não praticou o delito

tipificado na denúncia.

1- PRLIMINARMENTE

1.1- DA INÉPCIA DA DENÚNCIA

Inicialmente a de se falar que a conduta prática pelo acusado não se enquadra na descrita

na denúncia, uma vez que o mesmo não se utilizou grave ameaça para subtrair a bolsa da

vítima, nem tampouco utilizou de outros meios para tal, apenas tomo-a para si, logo o crime

praticado por ele nada mais é do que um furto simples, descrito no art. 155 do CP, além do

mais em nenhum momento é provado o porte de arma de fogo, os policiais apenas

encontraram uma arma nas proximidades e por dedução atribuíram sua posse ao acusado.

Desse modo a denúncia oferecida pelo membro do parquet é INEPTA, portanto é nula.

Conforme leciona Nestor Távora:

O fundamento da previsão dessa nulidade consiste no fato de que a denúncia ou a queixa deve conter os requisitos legais para que possibilite ao acusado individualizado o exercício do contraditório e da defesa ampla.

1.2- DA AMPLA DEFESA

O membro do parquet ao oferecer uma denúncia inepta que posteriormente foi aceita por

este juízo fere de lei um dos princípios basilares em processo penal, o da ampla defesa, por

tirar do acusado o direito de contradizer o afirmado na acusação, nas palavras de Aury

Lopes Jr.:

O contraditório pode ser inicialmente tratado como um método de confrontação de prova e comprovação da verdade, fundando-se não mais sobre um juízo potestativo, mas sobre o conflito, disciplinado e ritualizado, entre partes contrapostas: a acusação e a defesa. É imprescindível para a própria existência da estrutura dialética do processo.

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2- DO MÉRITO

Quanto ao mérito, não obstante o campo probatório evidentemente desfavorável à

sustentação da denúncia houve por bem a acusação propugnar pela condenação do réu.

O caso em tela comporta solução diferente daquela adotada por inúmeros julgadores,

porquanto se trata de situação excepcionalíssima, em que é possível a aplicação do

principio da insignificância.

Com efeito, conforme narrado pela própria denúncia, o acusado subtraiu, para si, a

importância de R$ 60,00 (sessenta reais) da vitima, além de outros objetos pessoais.

A tipicidade do delito de roubo está condicionada a lesões a bens jurídicos distintos: o

patrimônio e a liberdade individual. Não sendo a lesão patrimonial significativa, aplica-se o

Principio da Insignificância tão- somente em relação ao bem jurídico patrimônio, mantendo-

se a reprovabilidade de norma em relação a ofensa contra a liberdade individual.

A releitura do art. 5º, XLVI, da Constituição Federal convence da inconstitucionalidade da

condenação por roubo quando o valor do objeto do crime é insignificante. (TAMG - 2ª Câm.

Crim. - Apelação criminal nº 331746-0, de 7/8/2001).

O acusado não praticou o crime da forma descrita na denúncia, uma vez que não se utilizou

grave ameaça para subtrair a bolsa da vítima, e tampouco o fez com uma arma de fogo,

todos os depoimentos prestados em juízo atestam esta tese. Logo, o crime praticado pelo

acusado deveria ser desclassificado para o crime de furto, tipificado no art. 155 do CP.

Soma-se a isso o fato de o acusado ser primário, possuir de bons antecedentes, e os

objetos furtados serem de pequeno valor, assim deve-se aplicar o §2º do referido diploma, in

verbis:

Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. § 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa.

Neste viés, ensinamento de Julio Fabbrini Mirabete;

A ameaça, também conhecida como violência moral (vis compulsiva ou vis animo illata), é a promessa de prática de um mal a alguém, dependendo da vontade do agente, perturbando-lhe a liberdade psíquica. Pode-se ameaçar

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por palavras, escritos, gestos, postura etc. A simulação de emprego de arma é idônea para intimidar e se constitui, portanto, em ameaça para o roubo. Não há roubo se a ameaça não é dirigida para a subtração e tem outra finalidade. Também não se configura o crime se a vítima está atemorizada por outra razão e não pela conduta do agente, restando residualmente o furto.

Aplicando a desclassificação do crime de roubo para o delito de furto, quando ausente a violência ou a grave ameaça, transcrevo os seguintes julgados:

PENAL - APELAÇÃO - ROUBO - AUSÊNCIA DE VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA - SENTENÇA DESCLASSIFICATÓRIA - FURTO - MANUTENÇÃO - LESÃO CORPORAL - CONSUNÇÃO - CRIME DE RESISTÊNCIA - INAFASTABILIDADE. - Para a configuração da violência do art. 157 do CP é necessário que o agente consiga incutir fundado medo no espírito da vítima, intimidando-a a ponto de que não reaja, reduzindo-lhe a capacidade de resistência. - Se a lesão consistiu, apenas, em crime meio para a consecução do crime fim, resistência, não restando dúvida de que houve unidade de desígnios, esta conduta absorveu aquela, aplicando-se o princípio da consunção.( Número do processo: 1.0193.06.016063-0/001(1) Relator: ELI LUCAS DE MENDONÇA Relator do Acórdão: ELI LUCAS DE MENDONÇA Data do Julgamento: 24/09/2008 Data da Publicação: 09/10/2008).

No que pertine à desclassificação do delito de roubo para o furto, verifica-se que não há

prova segura de que a vítima tenha sofrido violência ou grave ameaça na consecução do

delito.

Ora, para a configuração da violência ou grave ameaça do art. 157 do CP, é necessário que

o agente, intimide a vítima a ponto de que não reaja, por reduzir-lhe a capacidade de

resistência, o que não ocorreu in casu.

Por fim, não pode deixar de ser aplicado ao presente caso a atenuante da confissão

espontânea do acusado, prevista no artigo 65, III, d, do Código Penal, visto que, no seu

interrogatório, confessou a prática do delito

3- DOS PEDIDOS

Ante o exposto, requer:

a) A aplicação do princípio da insignificância, e assim sendo a absolvição sumária do

acusado;

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b) Caso não seja esse o entendimento de vossa excelência, a nulidade do processo

em razão de entender que o membro do parquet não fez uma narrativa fática como

na realidade aconteceu e em razão disso retirou do acusado o direito da ampla

defesa;

c) Não sendo admitida a tese acima narrada, requer a desclassificação do crime de

Roubo para o crime de furto conforme em razão de não ter havido emprego de grave

ameaça e tampouco o uso de arma de fogo.

d) Por fim, não pode deixar de ser aplicada a atenuante da confissão espontânea do

acusado, prevista no artigo 65, III, “d”, do Código Penal.

Nestes termos,

Pede e espera deferimento.

Vila Velha, 05 de novembro de 2012.

___________________________________

ADVOGADO

OAB-ES