a soberania popular e o equilíbrio dos poderes

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A Soberania Popular e o Equilíbrio dos Poderes Deputado Federal Nazareno Fonteles PEC - 33/2011 edição 2 leg jud.indd 1 17/05/2013 12:06:11

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Page 1: A Soberania Popular e o Equilíbrio dos Poderes

A Soberania Popular e o Equilíbrio dos Poderes

Deputado Federal Nazareno Fonteles

PEC - 33/2011

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A Soberania Popular e o Equilíbrio dos Poderes

Deputado Federal Nazareno Fonteles

2013

Reflexões sobre a Idéia de Povo “Sem esperança não há povo. O que faz um povo é a esperança comum. Não há esperança que não seja coletiva, esperança de uma multidão reunida em povo. A burguesia não tem esperança - quer segurança, quer proteger o que tem e acumular mais ainda, quer com o seu dinheiro criar mais dinheiro. Conta com a sua capacidade intelectual e social. Não conta com Deus. A burguesia é individualista, não se preocupa com o que acontece com a multidão. Por isso o conceito de povo não lhe diz nada - nem o conceito de “ Povo de Deus”. (...)

“ O conceito de povo entrou no vocabulário político da modernidade e está ligado ao conceito de democracia. O povo se define, então, pela soberania, pela liberdade e pela igualdade. Um povo governa-se por si mesmo. A democracia é o povo que se governa por si mesmo. Historicamente essa idéia de povo está presente em muitas mentes desde a Idade Média, proveniente da Bíblia. Desde a Idade Média houve tentativas de autogoverno e afirmação do povo em face ao Império ou às dominações locais de príncipes ou nobres. Mas a democracia entendida dessa maneira também é conceito de origem bíblica.”

“ Acusam-se teólogos ou militantes cristãos de quererem instalar a democracia na Igreja e imitar as democracias modernas. Acontece o contrário. A idéia de democracia procede do cristianismo e a idéia política de povo também. Adotando o conceito de povo a Igreja recupera o seu bem, que lhe foi tirado pela modernidade, ou, melhor, que ela entregou de “mão beijada” à modernidade. Rejeitando os conceitos de povo e de democracia a Igreja desconhece as suas fontes, o seu passado e a sua progenitura.” (...)

“O povo nasce e cresce num país quando os seus habitantes começam a sentir-se solidários, praticando a solidariedade nos desafios, na aceitação da condição comum. Se não há solidariedade pode-se afirmar que o povo ainda não existe.” (...)

“Sem pensamento personalizado, não há sujeito possível. Na realidade sem liberdade de pensamento não há povo possível. (...) Para ser cidadão é preciso ter a coragem de pensar por si mesmo. (...)não deixar de pensar por medo dos poderosos.” (...)

“ Onde nasceu a liberdade de pensamento, que é liberdade de pensar contra os preconceitos estabelecidos, contra o pensamento das autoridades e, até mesmo, contra as leis e os decretos dos reis e dos príncipes? Nasceu em Israel, com os profetas. Nem mesmo em Atenas, com Sócrates, o herói da antigüidade, houve essa ousadia de criticar as leis da cidade.”(...)

“Povo é colaboração e aliança entre pessoas livres, iguais e fraternas. Essa é a meta.”(...)

“A democracia moderna é forma secularizada do Povo de Deus.”...

“Todos os povos guardam a memória de acontecimentos simbólicos em que, como povo, se sentia e se experimentava porque agiam juntos - A campanha pelas “Diretas já!”, por exemplo. Eram acontecimentos em que se podia sentir a comunidade de vida, o agir juntos, sentir juntos formando um povo, um grande movimento de conjunto.”(...)

“Com a mídia, a manipulação das massas se torna inevitável e os eleitos não têm muita liberdade por serem controlados pelos que manipulam a mídia. Ninguém mais pode falar a verdade. Os governos, mesmo eleitos de modo chamado democrático, isto é, pelo atual circo das eleições, não podem nada se não sofrem pressões populares fortes, de alta visibilidade. Nunca tomarão medidas favoráveis ao povo, se não for por pressão das forças populares.

Pela mídia as elites dirigentes impedem que se tomem medidas desfavoráveis a elas.”

José Comblin, “O Povo de Deus”, ed. Paulus, págs. 142/143, 148,157, 210, 220/222 e 347.

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Expediente:

Gabinete Brasília: Câmara dos Deputados / Anexo IV - Gabinete 64070160-900 - Brasília - DF - Fone: (61) 3215-5640 - Fax (61) 3215-2640

Escritório no Piauí: Rua Des. Cromwell de Carvalho, 2037 - Jóquei64049-020 - Teresina - Piauí - Fone: (86) 3231-3132

Diagramação: Cibelle Resende Colaboração: Juarez Martins, Adriana Machado, João Paulo Lelis Fotos: Rodolfo Stuckert (Congresso Nacional); Divulgação (STF)

Site: www.nazarenofonteles.comFacebook: www.facebook.com/nazarenofonteles

Twitter: @dep_nazareno

SUMÁRIO

Os Poderes e a Soberania do Povo 07

Dignidade, Direitos e Democracia 11

Judicialização da Política 13

PEC-33/2011 19

Contra o Despotismo Legislativo do STF 21 Fortalecer a Soberania Popular para Equilibrar os Poderes 23 PEC-33, Separação de Poderes e o Aprisionamento Judicial da Constituição 25 Separação de poderes e a constitucionalidade da PEC-33/2011 31 Slides usados nas palestras/debates da USP e UnB 47

Proposta de Emenda à Constituição Nº 33, de 2011 61 PEC – 03/2011 79 O Congresso Nacional pode sustar decisões do STF? 81 Legislativo versus Judiciário 85 Requerimento de Nulidade do STF sobre Aborto Anencefálico 93 Proposta de Emenda à Constituição Nº 03, de 2011 97 Projeto de Resolução Nº 21, de 2011 107 Questão de Ordem 111 PEC-143/2012 113 Proposta de Emenda à Constituição Nº143, de 2012 115 Nazareno não se ajoelha ao STF e a Barbosa 121 ANEXOS 125 I – Projeto de Lei Nº 5241/2013 sobre a Vedação do Emprego

de Pronomes de Tratamento que exprimam superioridade 127 II – Sobre o Aborto de Anencefálos 131 III – Decisão do Ministro Toffoli sobre a PEC – 33/2011 155 IV – Projeto de Decreto Legislativo sobre o Número de Depu- tados por Estado 161 V – Resolução do CNJ de 14 de maio de 2013 171 VI – Deputados que assinaram as PEC’s 173 VII – Resumo das Propostas de Reforma Política 185 VIII - Requerimento de Indicação do pedido de exoneração do Procurador Roberto Gurgel 191 IX – RCL 4335/Acre – Art. 52,X e Controle de Constitucionalidade 195

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"Mas a constituição que é considerada como a mais essencialmente democrática ou popular resulta do direito comumente chamado democrático, e que consiste

na igualdade absoluta entre os cidadãos." Aristóteles, A Política, Ediouro, VII,1,§10.

"No es lo posible que exige ser realizado, sino la realidad la que exige volverse posible."

Giorgio Agamben, Estado de excepción, 4ª ed., Adriana Hidalgo,2010, Pag. 16.

"Tudo aquilo, portanto, que quereis que os homens vos façam, fazei-o vós a eles, pois esta é a Lei e os Profetas."

Jesus Cristo(Mt 7, 12).

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Os Poderes e a Soberania do PovoNazareno Fonteles

A nossa Constituição Federal deixa muito claro, logo no seu Art. 1º onde está o verdadeiro Poder no Estado Democrático de Direito em que se constitui a nossa República:

“Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.”

Ou seja, o Povo é o titular originário e permanente do Poder da República, o qual deve ser exercido por ele “diretamente”(voto direto, plebiscito, referendum, iniciativa popular, movimentos e manifestações públicas) ou por meio dos seus “representantes eleitos” do Poder Legislativo e do Poder Executivo.

Mas a nossa CF-88, legitimada pelo voto direto do Povo que elegeu a Assembléia Nacional Constituinte, atribui um dever/direito, de modo exclusivo, ao Congresso Nacional no seguintes termos:

“ Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:

( ... )

XI - zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes;”.

Noutras palavras, cabe exclusivamente ao Poder Legislativo(Congresso Nacional) decidir e tomar as devidas providências para sustar ou anular quaisquer atos dos outros Poderes, que violem a sua competência legislativa. Isto é um mandamento da Soberania do Povo que o Congresso Nacional deve cumprir para preservar a Independência/harmonia dos Poderes e o Estado Democrático de Direito.

Além disso, é importante salientar que dos Poderes referidos na Constituição, o único que tem a representação política global da Multidão do Povo é o Poder Legislativo. Pois, nele estão representadas as forças da situação e as de oposição, de modo permanente e cotidiano. E isto não ocorre com o Poder Executivo e muito menos com o Poder Judiciário. Este último nem legitimidade popular tem, posto que não é eleito. A “legitimidade indireta” do Judiciário é derivada dos dois Poderes legitimados pelo voto popular: Legislativo e Executivo. Tanto é assim, que a nomeação dos ministros do STF é feita pelo Presidente da República, após confirmação pelo Senado. E, evidentemente, a função do Judiciário é de Julgar e não de Legislar.

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Há, pois, dois movimentos distintos e ordenados. O primeiro sai direto da Soberania Popular para os Poderes Legislativo e Executivo. E o segundo parte dos poderes Executivo e Legislativo para o Poder Judiciário. Logo, é fácil deduzir que se o voto não emana do Povo, então não se constitui, democraticamente, os três Poderes da República. Em suma, a Soberania do Povo é o Poder Originário Permanente da República e do Estado Democrático de Direito. Aqui cabe, para maior compreensão, um comentário de Ingeborg Maus: “Nesse sentido, formula Sieyès, o grande construtor constitucional da Revolução Francesa, que apenas o governo, mas não o povo estaria vinculado à Constituição, isto é, o povo só está sujeito à Constituição e às leis enquanto não as tiver modificado; por outro lado, inversamente, os aparelhos estatais não estão autorizados a modificações.”(O Judiciário como Superego da Sociedade, Lumen Juris, pag. 181).

O Povo Brasileiro, por meio da Assembléia Nacional Constituinte, estabeleceu, no Art. 1º da Carta Magna, que a República Federativa do Brasil constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. E em seguida, no parágrafo único, proclama: “ Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termo desta Constituição.” Como se pode, claramente, perceber, os cinco fundamentos caracterizam os dois componentes principais do Estado Democrático: a soberania popular e a igualdade política. Esta última é descrita, com detalhes, nos artigos 3º e 5º da Constituição.

Destacamos no caput do Art. 5º da CF que “Todos são iguais perante a lei” e no seu inciso II que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

Pergunta-se: quem elabora as leis numa democracia representativa? Os representantes eleitos do Povo, a Soberania popular representada. Assim, como escreveu o prof. José de Albuquerque Rocha, «na democracia representativa, a pessoa humana só está sujeito à lei que é elaborada por seus representantes eleitos pelo procedimento democrático, como proclama solenemente o Art. 5º, II, da Constituição, pois a sujeição a normas impostas por um poder estranho à sua vontade, configuraria a heteronomia que é a negação da liberdade e, por consequência, da dignidade humana. Daí a justificativa racional da democracia que, sendo constituída pelos princípios da igualdade e autonomia individual e coletiva do ser humano, é o único sistema político compatível com a dignidade humana.»(Jurgen Habermas, 80 anos, Lumen Juris, p. 99).

Como todos os direitos fundamentais são expressos em leis, então há um nexo indestrutível entre esses direitos e a soberania popular. E esse nexo consiste no fato de que somente os próprios titulares dos direitos podem decidir sobre o conteúdo

de seus direitos. Portanto, não há tensão entre direitos humanos e soberania popular, como costumam afirmar os defensores do judicial review. Na realidade, a soberania popular é condição sine qua non de sua garantia. Noutras palavras, a Soberania popular é o direito fundamental do Povo e a garantia de todos os demais direitos. E como todos os direitos humanos são expressões daquilo que entendemos por dignidade da pessoa humana, então, a soberania popular é a expressão da Dignidade do Povo. Numa analogia com a Química, poderíamos afirmar que, Soberania popular e Direitos humanos são formas em «ressonância» do Povo se organizar, dentro da realidade dinamica da história. Ou como explicou Habermas:» a soberania do povo e os direitos humanos pressupõem-se mutuamente»( Direito e Democracia: entre facticidade e validade,vol II, Tempo Brasileiro, pag. 310.)

«Em uma república constitucional, na qual as instituições representativas estejam funcionando adequadamente, compete primariamente ao poder legislativo a implantação das leis necessárias para conduzir o Estado na direção da constituição ideal. Esse processo desenvolve-se historicamente, isto é, as mudanças constitucionais que promovem o aperfeiçoamento da república devem ser realizadas pelos próprios cidadãos no exercício da soberania popular, ao longo do processo histórico de consolidação do ideal republicano. As imperfeições constitucionais não podem ser corrigidas pela intervenção de órgãos que não representam diretamente a soberania popular. A concretização dos princípios metafísicos do direito não é transcendente à política; ao contrário, é inerente a ela. Por isso, nem deuses ex macchina nem juízes constitucionais podem sub-rogar-se no papel dos cidadãos.» (Cláudio Ari Mello, Kant e a Dignidade da Legislação, Liv. Do Advogado ed., pág. 174.)

Nestes últimos 10 anos da Era Lula /Dilma, o Poder Judiciário, através do STF e do TSE, tem, virulentamente, atacado a Soberania popular e o Poder Legislativo. São verdadeiros estupros constitucionais. Na verdade estão se colocando, ora como constituintes biônicos, ora como legisladores biônicos ou ora como substitutos biônicos do próprio Povo.

As violações constitucionais realizadas, neste período, pelo Judiciário, são um verdadeiro atentado ao Estado Democrático de Direito. Citamos, entre outras, aquelas relacionadas com: fidelidade partidária, pesquisa em células-tronco embrionárias, aborto de anencéfalos, lei dos royalties do petróleo, lei do FPE, união homo-afetiva, redução do número de vereadores, alteração da representação dos Estados na Camara Federal. E por último, a interrupção de um projeto de lei sobre fundo partidário e ameaça, com pedido de informações, de interromper a tramitação da PEC-33/2011. Um tipo de censura prévia ao exercício constitucional da competência legislativa do Congresso Nacional, com desculpa fraudulenta e fascistóide do controle de constitucionalidade por parte do STF. Atitude como esta de um ministro do Supremo é comparável àquelas dos juízes nazistas para atender

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Dignidade, Direitos e Democracia

“A Declaração Universal dos Direitos Humanos, promulgada pelas Nações Unidas em 10 de dezembro 1948, começa no artigo I com o princípio: «todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos». (Pag. 7)

“É interessante a circunstância em que somente após o final da Segunda Guerra Mundial o conceito filosófico de dignidade humana, que entrou em cena já na Antigüidade e adquiriu em Kant sua acepção válida atualmente, tenha sido introduzido nos textos do direito das gentes e nas diferentes constituições nacionais desde então em vigor. Em um tempo relativamente curto, ele veio a desempenhar um papel central também na jurisprudência internacional. Em contrapartida, o conceito de dignidade humana como conceito jurídico não aparece nem nas declarações clássicas dos direitos humanos do século XVIII, nem nas codificações do século XIX. Por que no direito o discurso dos «direitos humanos» surgiu tão mais cedo do que o da «dignidade humana»? (...)

Direitos humanos sempre surgiram primeiro a partir da oposição à arbitrariedade, opressão e humilhação. Hoje ninguém pode pronunciar algum desses artigos veneráveis - por exemplo, o principio: « ninguém será submetido a tortura nem a penas ou a tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes» (Declaração Universal dos Direitos Humanos, artigo 5) - sem ouvir o eco que ressoa do grito de incontáveis criaturas humanas torturadas ou assassinadas.

O apelo aos direitos humanos alimenta-se da indignação dos humilhados pela violação de sua dignidade humana.» (Págs. 9 - 11)

«A dignidade humana, que é una e a mesma em todo lugar e para cada um, fundamenta a indivisibilidade dos direitos fundamentais”. (Pag. 16).

“A idéia da dignidade humana é a da dobradiça conceitual que conecta a moral do respeito igual por cada um com o direito positivo e com a legislação democrática de tal modo que , na sua cooperação sob circunstâncias históricas favoráveis, pôde emergir uma ordem política fundamentada nos direitos humanos.» (Pag. 17).

« Mas a dignidade universal, atribuída igualmente a todas as pessoas, mantém ao mesmo tempo a conotação de um autorrespeito que se apóia no reconhecimento social. Sendo uma dignidade desse tipo, a dignidade humana requer também o ancoramento em um status civil, isto é, o pertencimento a uma comunidade

o seu chefe Hitler.

E se prestarmos bem atenção ao momento conjuntural em que as violentações da Constituição aconteceram, verificaremos nelas uma de duas coisas: ou era para favorecer a oposição política derrotada nas urnas e no Parlamento, ou era para junto aos setores da grande Mídia oligárquica contribuir para o rebaixamento e humilhação públicos do Congresso Nacional.

Foram por razões como essas, que revelam a usurpação da competência legislativa do Congresso Nacional por parte do STF e de outros setores do Judiciário, que propusemos as iniciativas legislativas apresentadas aqui neste livro, juntamente com outros textos de conteúdos correlacionados. É necessário e urgente resgatar o equilíbrio entre os três Poderes fortalecendo a Soberania do Povo.

Ao reforçar o papel do Poder Legislativo com estas iniciativas, longe de mim a mistificação ou idolatria dele. Daí porque incluí, neste volume, um resumo da proposta de Reforma Política que está em debate, neste momento, na Câmara dos Deputados. Prioritariamente, o Financiamento Público exclusivo das Campanhas eleitorais, sem coligações proporcionais, com responsabilidades maiores para os Partidos, deve ser o marco desta Reforma, no meu entender. Pois quase todos os “escândalos” relatados nos últimos anos têm forte ligações com isso.

O verdadeiro voto livre deve ser “direito-dever” de cada um(a) e não uma “mercadoria” a ser negociada durante as eleições. Pois, do contrário, o verdadeiro Poder da Multidão do Povo estará deformado na sua representação eleita.

Por isso, é desafio de todos e todas, que formam o Povo Brasileiro, fortalecerem a Soberania Popular, por meio da cidadania ativa e participação popular, nos espaços coletivos da Sociedade, do Estado e do Mercado. É preciso colocar em primeiro lugar o bem comum do nosso Povo, e bem abaixo dele, os interesses corporativos e os mercantis. Unamos, pois, nossos esforços para combater este avanço das forças retrógradas e anti-democráticas, tão presentes nos seguintes setores: STF, TSE, Tribunais, PGR, grande mídia oligárquica, e nas forças políticas de oposição ao atual governo democrático-popular.

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organizada no espaço e no tempo. Mas mesmo aqui o status deve ser igual para todos. O conceito de dignidade humana transfere o conteúdo de uma moral do respeito igual por cada um para a ordem de status de cidadãos que derivam seu autorrespeito do fato de serem reconhecidos pelos outros cidadãos como sujeitos de direitos iguais reivindicáveis.” (Pag. 23)

“Como destinatários, os cidadãos apenas começam a usufruir dos direitos que protegem sua dignidade humana quando conseguem estabelecer e manter em comum uma ordem política fundamentada nos direitos humanos. Por isso os direitos humanos não estão em oposição à democracia, mas são cooriginários com ela. Estão numa relação de pressuposição recíproca: direitos humanos tornam possível o processo democrático, sem o qual não poderiam, por sua vez, serem positivados e concretizados no espaço de um Estado constitucional constituído pelos direitos fundamentais.» (Pag. 24).

« Em uma democracia, os cidadãos são submetidos unicamente às leis que eles mesmos se deram por meio de um procedimento democrático.» (Pag. 51)

Trechos extraídos do Livro: Jürgen Habermas, Sobre a Constituição da Europa, ed. Unesp, 2012.

Judicialização da PolíticaLuiz Moreira1**

A Constituição brasileira decorre do Parlamento brasileiro, decorre mais especificamente de uma assembléia constituinte que, convocada pela soberania popular, obteve mandato para, em nome do povo brasileiro, substituir o regime autoritário por regime coerente com as exigências de redemocratização.

Promulgada a Constituição, entre as idas e vindas típicas da democracia, houve sua apropriação pelos juristas, resultando em transformação de tal documento de político em estritamente jurídico.

O processo é por todos conhecido: a democracia, a política e o parlamento foram progressivamente mitigados e em seu lugar houve a construção de uma teoria que, a pretexto de tutelar os direitos fundamentais, os substituiu pela supremacia judicial, operada pela complementaridade entre controle de constitucionalidade e mutação constitucional.

Os momentos de tal processo são os seguintes: (1) a transformação do processo constituinte em processo apartado da política, de modo a se produzir um fetiche do poder constituinte segundo o qual a assembléia constituinte exerceria poder absoluto e não poder representativo; (2) construída a imunização do poder constituinte em relação à política, as intervenções políticas na ordem constitucional foram tidas como maculadoras de sua pureza, de modo a se construir uma dicotomia entre democracia e constituição e (3) com o propósito de conservar a pureza e a magia da ordem constitucional, purificando-a da política, justifica-se o caminho que possibilita a interdição da política pelos tribunais, com o respectivo impedimento do processo político, com a transformação das eleições em ato judiciário, com a criminalização da política e sua judicialização e, por fim, com a substituição do parlamento como foro legitimado para produzir as normas jurídicas (constitucionais e legais) pelos tribunais, operada pela interpretação constitucional, seja com o controle de constitucionalidade, seja pela mutação constitucional.

Claro está que esse processo de interdição da política precisa ser substituído por um projeto que revigore a democracia e restitua à democracia a tarefa de estabelecimento do futuro. Isso por que aos tribunais compete tarefa retrospectiva, isto é, de manutenção daquilo que democraticamente fora deliberado, e às instâncias políticas a construção do que deve ser.

1 ** Luiz Moreira, 40, é Graduado em Direito pela Universidade Federal do Ceará, Mestre em Filosofia e Doutor em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais, pesquisador de Filosofia do Direito na Universidade de Tübingen, Alemanha, e autor, dentre outros, do livro “A Constituição como Simulacro”, Editora Lumen Juris.

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Por conseguinte, caberia à democracia a última palavra sobre o que é válido do ponto de vista jurídico. Nesse sentido, é imprescindível uma reforma política democrática que estabeleça o financiamento público de campanha, a fidelidade, lista partidária, a revisão do papel do Senado e novas regras atinentes às relações entre os poderes. Visamos fortalecer o princípio democrático segundo o qual “o poder emana do povo”. A crise da democracia – e qualquer crise, inclusive a política – só tem solução na democracia.

Por isso propomos a transformação do Senado Federal em câmara revisora a qual caberia a revisão dos atos tanto do legislador positivo (a Câmara dos Deputados) quanto do legislador negativo (o Supremo Tribunal Federal). A última palavra da democracia seria operada pela Revisão Parlamentar do Controle de Constitucionalidade.

I – O Poder da Assembléia Constituinte e o Poder do Parlamento

O que distingue o poder constituinte do processo legislativo? Ambos decorrem da soberania popular, melhor, ambos decorrem do poder que emana da associação dos cidadãos. Ambos emanam do poder dos cidadãos. O poder que torna possível a Constituição torna possível também os códigos e as leis.

É a autorização expressa (o voto) dos cidadãos que dota a assembléia constituinte do poder necessário para constituir todas as relações. Sua autoridade criativa repousa antes na faculdade que detêm os sujeitos de direito para criarem uma nova realidade jurídica do que em um ato fundante. Assim, os cidadão são livres e plenos de poderes para fazerem tantos atos fundadores, constituintes, quanto acharem conveniente, isto porque o ato fundador congênere do poder constituinte é tão-somente uma convenção.

Por convenção, por uma faculdade do livre dispor, a soberania dos cidadãos (os sujeitos de direito) põe em marcha um processo de formulação das novas engrenagens da sociedade, e a soberania desses mesmos cidadãos detém o poder constituinte, que convoca a assembléia especialmente para dispor sobre aquilo para o qual foi convocada.

Por conseguinte, são os sujeitos de direito, em ato soberano, que conferem existência e autorizam o exercício do poder constituinte. O poder constituinte é a formalização da soberania de sujeitos que, associadamente e por portarem direitos decorrentes do processo cultural e civilizatório, materializam seus anseios por uma nova ordem jurídica ao dotarem a assembléia de uma faculdade constitutiva em exercício.

Por conseguinte, o poder constituinte não é sede de poder algum, detém apenas o exercício de uma faculdade que emana diretamente dos cidadãos. Não há de se falar tampouco em poder originário, porque o poder não se origina no

ato fundante, nem na assembléia convocada para constituir o sistema jurídico. Origina-se dos cidadãos, por intermédio de projeto orquestrado pelos sujeitos de direito de constituir um sentido às normas e estruturá-las conforme o sentido atribuído.

A distinção entre poder constituinte e processo legislativo não remonta à origem, mas ao modo de seu exercício. Isto é, não há distinção categorial que oponha um ao outro, mas os dois processos comungam da mesma gênese. Fundando-se no poder dos cidadãos, tanto o processo constituinte quanto o processo legislativo permitem a atualização de um poder que estrutura a liberdade e a perpetua por meio de um ordenamento conceitualmente concatenado. Interpor-se, obstruindo a passagem da estrutura da liberdade (a Constituição), à sua ordenação concatenada (o Código), seria uma das grandes armadilhas da modernidade, ao tornar indisponível à soberania popular exprimir-se por meio de um processo que se atualiza mediante um trâmite diversificado.

Portanto, cabe à ciência do direito articular a passagem da estruturação da liberdade à sua ordenação concatenada, estabelecendo degraus que criam momentos diferentes de aplicação da soberania, aplicação que se desdobra como forma de a soberania se prolongar, compreendendo o amplo espectro do processo legiferante.

O processo legiferante, como forma jurídica do poder político, desdobrar-se-ia nos seguintes passos: I) o poder soberano dos sujeitos de direito põe a assembléia constituinte e lhe infunde poder; II) como exercício desse poder, a assembléia promulga as normas que exercerão o controle de validade das demais normas jurídicas; III) somente um novo ato constituinte pode substituir o ato constituinte precedente. E em decorrência: IV) fica estabelecido quorum especial às emendas à Constituição, mais exigente e com tramitação diferente daquele do V) processo legislativo, comumente de maioria simples.

Assim sendo, o processo constituinte e o processo legislativo decorrem ambos da soberania popular e, como formas de exercício da representação do poder político, circunscrito apenas aos cidadãos, não se distinguem entre si, tendo por isso mesmo apenas uma diferença quantitativa, mas de modo algum uma diferença qualitativa, pois o mandato de ambos é obtido da mesma fonte, ou seja, dos cidadãos.

A transformação da assembléia constituinte em instância apartada da política resultou em uma engenharia constitucional segundo a qual a representação do poder é deslocada das instâncias que decorrem do voto para as instâncias judiciárias, pois caberia às cúpulas dos tribunais garantir a efetividade da Constituição, por um lado, e por outro, em substituição ao parlamento, atribuir sentido às normas, pois mediante a interpretação constitucional fecha-se o círculo de judicizialização da vida. Este círculo submete a democracia

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deliberativa ao processo judicial por meio de uma complementaridade entre o controle de constitucionalidade e a mutação constitucional.

Acossado por um sistema jurídico que entende o Parlamento como maculador da pureza herdada da assembléia constituinte, a sociedade vê-se alijada de formas de expressão de vontade e de representação, operada por um ativismo judicial que passa a ser o titular da formulação, da interpretação e da efetividade das normas, reunindo, sob seu arbítrio, as prerrogativas legislativas, judicativas e executivas.

Este Estado de exceção ganha efetividade com os seguintes passos: (1) mediante uma complementaridade institucional entre Estado Executivo e Estado Judicial, justificado pela complementaridade ideológica entre as teorias de Carl Schmitt (todo poder ao executivo) e de Hans Kelsen (todo poder ao judiciário); (2) com a judicialização da política, operada pela submissão dos poderes políticos aos tribunais, com o respectivo controle judicial sobre as leis e sobre as políticas públicas; (3) com o protagonismo da justiça eleitoral, que transforma as eleições em dia de luto, no qual os candidatos são substituídos pelos juízes e promotores eleitorais e com o (4) estabelecimento entre da submissão da Política à técnica, mediante a dicotomia entre Estado e Governo, formulada pela blindagem das carreiras de Estado ante o resultado das urnas.

II – Política e Direito

É preciso dotar o Brasil de uma nova separação dos poderes. O desafio é fomentar a opinião pública para um novo debate nacional,

com o qual o Brasil possa sobriamente aprender com as lições do passado e construir uma fundação mais sólida para a democracia no século XXI, que seja capaz de repor a questão da legitimidade.

A democracia atual requer um novo arranjo institucional no qual as relações dos poderes se dê de modo complementar, sem a supremacia do Judiciário sobre o voto, sobre a Política, pois à política cabe pensar o futuro e solucionar as crises decorrentes do conflito entre as distintas visões de mundo. Ressalte-se: o mundo moderno, por secular, é o reino das crises e como tal só à democracia cabe solucioná-las.

Desse modo, é preciso desinterditar a democracia, liberando a força criativa da Política de modo que seja reconhecida à democracia o condão de dotar o direito e a constituição de legitimidade. A justiça se realiza nas situações de fato, situações que encontram formatação no encontro de vontades que é sintetizada apenas nos parlamentos com as leis; Utilizando uma metáfora: a sentença é o retrovisor; a política, o parabrisa, isto é, a tarefa do judiciária é retrospectiva, vez que delimitada a sentença por aquilo que foi normatizado

pelo parlamento, enquanto a tarefa do parlamento é prescritiva, aquilo que o consenso diz o que devo ser.

Essa separação dos poderes seria empreendida com a reforma política, revisando a relação dos poderes.

Assim, o Parlamento federal, como bicameral, teria uma Casa Propositora, a Câmara dos Deputados, e uma Casa Revisora, o Senado Federal. Transformado o Senado Federal em Câmara Revisora, a ele caberia estabelecer o controle sobre a Jurisdição Constitucional, assim como estabelecer o equilíbrio federativo. Do mesmo modo que o Parlamento tem a prerrogativa de derrubar veto do Presidente da República, o Senado realizaria a Revisão Parlamentar do Controle de Constitucionalidade.

Essa Revisão Parlamentar do Controle de Constitucionalidade e uma ampla e democrática reforma política devolveriam ao ordenamento jurídico legitimidade, tornando efetiva a relação entre Direito e Política.

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Contra o despotismo legislativo do STF (*)Nazareno Fonteles

A PEC 33/2011 é uma vacina contra o vírus mutante do despotismo legislativo do Supremo Tribunal Federal. A lista das “doenças invasoras”, causadas por esse mutante é vasta e inclui, entre outras, mudanças na Constituição Federal quanto à fidelidade partidária; a derrubada da verticalização das eleições; a suspensão liminar da lei dos royalties depois da derrubada do veto; aprovação da súmula vinculante que legislou sobre o uso de algemas; redução das vagas de vereadores; suspensão liminar da emenda dos precatórios; decisão sobre a lei do FPE e a suspensão liminar da tramitação do projeto de lei sobre o fundo partidário.

A lista acima ilustra como o STF tem violado, reiteradamente, as prerrogativas do Parlamento e ferido as cláusulas pétreas da separação dos Poderes e do voto direto e universal, que legitima o Congresso. Também fere os Artigos 1º e 2º da Constituição, que preceitua que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente” e que os três Poderes da União são independentes e harmônicos entre si. Assim, a soberania de mais de 130 milhões de votos é anulada pela Corte e o Parlamento é humilhado publicamente na sua função legislativa. O que fazer?

Na minha compreensão, e na de conceituados juristas, o Congresso Nacional pode sanar todas as citadas “doenças invasoras”, usando o artigo 49, XI, da Constituição, que afirma ser da competência exclusiva do Congresso Nacional zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes. Outro caminho é o Senado usar o artigo 52, X, que já o autoriza a suspender a validade das decisões sobre leis pelo Supremo no prazo que lhe aprouver. Estes dois artigos, somados aos artigos 103, 1º e 2º da Carta Magna confirmam que a última palavra sobre a Constituição quem deve dar é o povo, quer pelos representantes eleitos, quer pelo voto direto. Ou seja, «a constituição não é o que a Suprema Corte diz que ela é, e sim o que o povo, agindo constitucionalmente por meio dos outros poderes, permitirá à Corte dizer que ela é», como disse John Rawls.

A PEC 33/2011, de minha autoria, introduz no artigo 97 da Constituição um quorum qualificado de 4/5 dos votos dos membros de tribunais para declarar a inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo do poder público. No caso de súmula do STF, o seu efeito vinculante será deliberado por maioria absoluta, num prazo de noventa dias, pelo Congresso. E no caso de emenda constitucional, o Congresso terá prazo de 90 dias para deliberar, com quorum de 3/5, se concorda

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ou não com a decisão da Corte. Se não concordar, convocará consulta popular para que o povo, que é a fonte originária de todo o poder, possa diretamente dar a palavra final sobre o conflito entre os dois Poderes.

Assim, o avanço democrático proposto passa pela dignificação do Poder Legislativo e da participação direta dos cidadãos no controle de constitucionalidade sobre questões complexas. Sempre procurando o equilíbrio, a PEC cria uma barreira contra o despotismo do STF no controle de constitucionalidade, mas, ao mesmo tempo, preserva o Judiciário de excessos do Legislativo, quando remete ao povo a palavra final. Pois, como ensinou Montesquieu, só o poder detém o poder e só com a participação do povo podemos restabelecer o equilíbrio entre os poderes.

Nazareno Fonteles, 59, é deputado federal (PT-PI), médico e professor licenciado da Universidade Federal do Piauí.

(*) Artigo originalmente publicado no jornal Folha de São Paulo de 04/05/2013

Fortalecer a Soberania Popular para equilibrar os Poderes (*)

Nazareno Fonteles

É bastante comum ouvirmos a afirmação de que ao Supremo Tribunal Federal cabe a última palavra sobre a Constituição, ou ainda, a Constituição é o que o Supremo diz que ela é. Na verdade, de acordo com o artigo 1º da Constituição Federal, cabe ao povo, diretamente ou por meio de seus representantes eleitos, dizer a última palavra sobre a Carta Magna. Além disso, outros trechos da Constituição corroboram com isso, a exemplo dos artigos 49, inciso XI; 52, inciso X e o artigo 103, parágrafo 2º.

A Proposta de Emenda à Constituição 33 de 2011, de modo muito modesto, busca fazer alguns ajustes nesta direção, que é resgatar o valor da soberania popular e da dignidade da lei aprovada pelos representantes legítimos do povo, ameaçadas pela postura ativista e usurpadora do STF.

Para ilustrar a invasão legislativa do STF ou de seus membros destaco a Emenda Constitucional 52 de 2006, da verticalização das eleições; a decisão sobre as vagas de vereadores; a modificação da lei de fidelidade partidária; a aprovação de aborto de anencéfalos; a união homoafetiva; a emenda dos precatórios; a distribuição dos recursos do petróleo e a invasão no processo legislativo da lei do fundo partidário e da própria PEC-33/11. É uma espécie de enforcamento lento, gradual e progressivo do Congresso e da soberania popular.

No meu entendimento, bem como no do constitucionalista Ives Gandra Martins, expresso em vários artigos, o Congresso pode anular todas as invasões acima citadas, baseando-se no artigo 49, inciso XI da Constituição Federal que afirma expressamente que é da competência exclusiva do Congresso Nacional zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes.

O Congresso Nacional, a rigor, nem precisaria, pois, de nova emenda constitucional, para enfrentar o ativismo judicial legislativo do STF. Precisa, sim, de vontade política e coragem cívica para exercer seu dever constitucional perante os outros poderes.

Mas, então, o que a PEC-33 propõe em essência? Ela aumenta de 6 para 9 a quantidade de votos dos ministros do Supremo necessários para se declarar a inconstitucionalidade de leis ou normas do poder público; e no caso de emendas

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constitucionais o Congresso poderá recorrer à consulta popular.

Agora eu pergunto: em que estas alterações atentam contra a separação e a independência dos poderes? Absolutamente em nada! O povo é a fonte originária do Poder. E, se nem mesmo uma Assembleia Nacional Constituinte pode se sobrepor ao povo, pois ela só se torna legítima pelo voto soberano do povo que elegeu seus constituintes, muito menos o poder nomeado pelos poderes eleitos, no caso o Poder Judiciário.

Por último, em virtude das críticas levianas que a PEC 33/2011 suscitou, lembro o que afirmou o professor de Direito Constitucional Alfredo Canellas G. Silva: “Em termos de democracia a elite-minoritária fragilizada pela perda de espaço político-legislativo para a maioria popular, elegeu o Poder Judiciário como o Instrumento adequado e rápido para a conquista e/ou manutenção da hegemonia perdida ou ameaçada pela voz das urnas”.

Nazareno Fonteles, 59, é deputado federal (PT-PI), médico e professor licenciado da Universidade Federal do Piauí.

(*) Artigo originalmente publicado no jornal O Globo de 06/05/2013

PEC 33, separação de poderes e o aprisionamento judicial da Constituição

Cláudio Ladeira de Oliveira

Professor – Faculdade de Direito da Universidade de Brasília

É curiosa a reação negativa que a PEC 33/2011 despertou na imensa maioria dos juristas, que nela identificam uma ofensa à “separação de poderes” e à “democracia”. Em primeiro lugar, o objetivo essencial da PEC é retirar parte do imenso poder político que o STF possui atualmente, um poder que em parte foi ampliado pelo próprio tribunal, pela via de interpretações “construtivas”, “evolutivas” etc., com “fundamentações” sempre acompanhadas de citações de autores autorizados (“você-sabe-com-quem-está-falando?”), sem que isso despertasse reações da maioria dos agora defensores da “separação de poderes”. Ora, na prática o tribunal muitas vezes ampliou suas competências, as quais só poderiam ser ampliadas pelo Congresso, por EC. Em segundo lugar, o que é realmente incompatível com qualquer concepção razoável de democracia é um tribunal cujos membros, não raras vezes, “interpretam” a CF afirmando que “a constituição é aquilo que o STF diz que ela é”, um bordão que explicita os anseios aristocráticos de parte dos profissionais do ramo, o de viver numa “juristocracia”: o governo dos juízes, pelos juízes, para os juízes.

Bem, talvez seja o caso lembrar que o tal do “Congresso Nacional” é aquele órgão composto por representantes eleitos pelo povo, onde a Constituição foi amplamente debatida aprovada e que, nos termos desta mesma Constituição, é a única instituição competente para alterá-la. Sim, exatamente, o Congresso é aquele órgão repleto de problemas, todos eles originados no fato de que é uma instituição composta por seres humanos, um problema que atinge todas as instituições, especialmente aquelas que possuem alguma espécie de poder político e econômico, como é também o caso do judiciário, do ministério público, dos tribunais de contas, dos órgãos do poder executivo, dos órgãos da grande imprensa, das universidades... a lista é muito extensa! Bem, especificamente no caso do judiciário e do ministério público, são duas instituições que, sobretudo na estrutura de sua cúpula, ainda carecem de uma profunda democratização para torná-las plenamente compatíveis com a ordem inaugurada pela Constituição democrática de 1988, mas este é outro assunto.

Naturalmente a PEC 33 merece uma profunda discussão, não se trata

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de matéria simples e mesmo aqueles que são profundamente antipáticos ao controle judicial de constitucionalidade (é o meu caso) devem reconhecer o fato de que existem inúmeros arranjos institucionais que oferecem alternativas reais, plausíveis e funcionais ao “tudo ou nada” do “ou nenhum controle judicial ou o STF pode tudo, como agora”. Mas é justamente esse cuidado que não está presente em grande parte dos juristas que agora se apressam em gritar: “separação dos poderes! Montesquieu! Liminares! Honorários!”. Uma leitura do texto da PEC 33/2011 poderia ajudar bastante.

Em primeiro lugar, as limitações à “súmula de efeito vinculante” (SEV). Qual seria o problema se o Congresso simplesmente abolisse as SEV por emenda? Ora, se elas foram criadas por emenda à constituição por que motivo não poderiam ser abolidas pelo mesmo mecanismo? Pois muitos dos críticos da PEC 33 se esquecem de informar que ela mantém as SEV, apenas limitando a possibilidade de sua edição pelo STF, o que é algo no mínimo necessário para garantir a verdadeira “separação de poderes” e “democracia” que os críticos da PEC tanto conclamam! De acordo com o novo procedimento proposto pela PEC, o Congresso não poderá interferir no mérito da decisão do STF (as decisões particulares que motivaram a edição de uma súmula), mas apenas na possibilidade de atribuir a ela o efeito vinculante, isto é, na obrigação de todo o restante do judiciário a seguir, em outros casos, a mesma tese do STF. Em português bem claro, a PEC amplia a independência de todo o restante do poder judiciário para que seus membros julguem conforme sua própria opinião! Propõe a PEC: “A súmula deverá guardar estrita identidade com as decisões precedentes, não podendo exceder às situações que deram ensejo à sua criação”. Como alguém pode ser contra isso sob o argumento de que tal exigência fere a “separação dos poderes”? Neste ponto a PEC simplesmente impede que o STF, ao editar súmulas “livremente”, se transforme num poder legislativo unicameral, sem os típicos controles políticos e judiciais que limitam a atividade do poder legislativo. “Separação de poderes”, certo?

Em segundo lugar, a exigência de 4/5 de votos do STF para declarar a inconstitucionalidade de lei. Atualmente, e com uma frequência crescente, o STF tem declarado a “inconstitucionalidade” de leis “fundamentando” sua decisão em princípios altamente subjetivos (“dignidade humana”), cujo sentido não pode ser fixado sem que o tribunal realize uma escolha política que beneficia alguma opinião particular, travando debates tipicamente legislativos, não obstante o linguajar aparentemente técnico que acompanha essas escolhas. Na verdade, este é um velho problema da teoria e da prática constitucional: a atividade do controle de constitucionalidade, especialmente quando envolve a

“interpretação” de princípios politicamente controvertidos, não é uma atividade tipicamente judicial e sim política. Assim, quando se trata de uma “controvérsia moral razoável e duradoura” sobre valores abstratos, o local mais adequado para tratar do tema é o Congresso, onde quase 600 pessoas eleitas representam as divisões de opinião e crença, e não um tribunal composto por apenas 11 pessoas, não eleitas e sem mandato. O que a PEC faz, neste caso, exigindo um quórum mais elevado, é manter o controle judicial de constitucionalidade, mas limitando sua ocorrência aos casos de violação flagrante da Constituição. Ainda assim, fica mantida a possibilidade de que o STF realize um juízo subjetivo controvertido contrário ao do Congresso!

Por fim, em terceiro lugar, a parte mais complicada, e a meu ver correta, altera o art. 102, inserindo os §§ 2A, 2B e 2C. Uma decisão do STF, nem mesmo por maioria qualificada, não será suficiente para declarar materialmente inconstitucional uma Emenda à Constituição. Uma decisão do Tribunal neste sentido poderá ser revista, embora não revista “pelo Congresso” como sustentam muitos dos críticos da PEC. Tal decisão será, sim, submetida inicialmente ao Congresso, mas só será revista se sucessivamente (i) o Congresso, mediante 3/5 dos seus membros, rejeitar o juízo do STF, e (ii) um plebiscito popular também rejeitar a decisão do STF. Enfim, se 55% do congresso for contrário, prevalece a decisão do STF. Ou então, se 100% do Congresso rejeitar a decisão, mas o povo, de quem “emana todo o poder” (CF/88, art. 1º), estiver de acordo, prevalecerá a decisão do STF. Não se trata de um procedimento válido para qualquer decisão do STF em matéria de controle judicial de constitucionalidade, mas apenas as matérias que envolvem Emenda à Constituição, e esta é uma diferença importante. Afinal, se um órgão como o STF detiver “a última palavra” sobre a possibilidade de alterar a própria Constituição e, sobretudo, se exercitar este poder sem possibilidade de revisão (como ocorre atualmente), então este órgão agirá como uma espécie de “poder constituinte originário permanente”. É necessário insistir neste ponto: no regime atual, o STF – e não o Congresso – pode efetivamente promover profundas alterações na Constituição, bastando apenas disfarçar tais alterações com “teorias jurídicas” mais ou menos maleáveis, podendo também obrigar todos os integrantes do poder judiciário a seguirem imediatamente esta nova “interpretação” da Constituição. Na prática isso significa que o STF (instituição composta por apenas 11 pessoas, não eleitas diretamente, escolhidas após indicação do presidente da república e aprovação do senado, sem mandato definido) pode “emendar” a Constituição mediante uma maioria de poucas pessoas, inferior a uma dezena, sem observar os complexos trâmites processuais do poder legislativo, a começar pelo caráter bicameral e pela maioria de 3/5 em cada casa, exigida no Congresso. Ao impedir

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que o Congresso revise esta decisão do STF (apenas um plebiscito poderá fazê-lo) a PEC 33/2011 estimula um efetivo “diálogo institucional” entre Congresso e STF, um diálogo inviabilizado no atual sistema, em que o STF goza de amplos poderes políticos, praticamente sem controle algum.

Os críticos da PEC se esquecem de que o controle de constitucionalidade é político por natureza, é atividade bem distinta da prática de interpretação e aplicação da lei a casos particulares (e por isso também os críticos estão equivocados quando acusam a PEC de intervir no “poder judiciário”, como se as decisões do poder judiciário em geral não pudessem ser revistas!). Mesmo quando o controle de constitucionalidade é “judicial”, na prática ele assume a forma de um debate essencialmente político, sobre matérias sujeitas a controvérsias nada “técnicas”. E, nestas matérias, a resposta sempre será política, ainda que disfarçada com rococós jurídicos em latim. O STF, quando declara uma lei “inconstitucional” (especialmente quando o faz com base em princípios abstratos), exerce uma atividade essencialmente distinta da atividade de um juiz que, ao decidir uma causa, atua como “terceiro imparcial”. A atividade é distinta, pois, ao declarar que uma lei aprovada pelo Congresso é inconstitucional, o STF não pode (ainda que seus membros desejem) atuar como “terceiro imparcial”: em decisões desta natureza o tribunal sempre estará fixando quais são os limites de sua própria competência quando em confronto com o poder legislativo, portanto será parte interessada. Esta é outra ponto amplamente discutido no direito constitucional (conferir especialmente Jeremy Waldron) que é sonegado pelos críticos mais radicais da proposta de emenda. Um exemplo simples: imaginem o STF decidindo que a PEC 33/2011 é inconstitucional: se agir assim, o tribunal estará afirmando que uma alteração da Constituição que limita os seus próprios poderes (do STF) é inconstitucional. Mas o tribunal é parte diretamente interessada! São os seus poderes que serão limitados. Daí que, em assuntos desta natureza, se justifique um tipo de decisão judicial muito comum nos tribunais constitucionais mundo afora: decidir adotando uma postura de “auto-restrição”. Se a lei, cuja constitucionalidade é criticada, não fere explicitamente o texto, para além de qualquer dúvida razoável, então deve prevalecer a opinião aprovada majoritariamente pelo parlamento. Uma postura que, enfim, o STF tem rejeitado explicitamente com frequência, sobretudo em casos de maior repercussão política, exatamente o tipo de caso no qual tal postura mais se justifica. A PEC 33/2011 é uma reação natural e previsível a isso, e já será muito útil se ao menos for capaz de estimular um bom debate.

Por tudo isso, sobre a PEC 33/2011, é inevitável concluir o seguinte:

1) A PEC 33 trata, prioritariamente, do Supremo Tribunal Federal, justamente o tribunal mais distinto do restante da estrutura do poder judiciário, não apenas pela posição de hierarquia que ocupa ou pelo método de escolha de seus membros (indicação do Presidente da República e sabatina pelo Senado, ao invés de concurso público). A distinção fundamental reside no fato de que, para o restante do poder judiciário, prevalece a possibilidade de revisão de suas decisões, o que pode reduzir arbitrariedades e garantir algum controle da atividade jurisdicional. Mas, atualmente, quando o STF decide ação direta de inconstitucionalidade ou edita súmula de efeito vinculante, a despeito das consequências políticas dramáticas que podem resultar destas decisões, não há possibilidade de controle, nem mesmo por outra instancia judicial.

2) Em nenhum momento permite ao Congresso Nacional “rever decisões judiciais do STF”, como argumentam os críticos, pois: (2.1) ao limitar a possibilidade do congresso rever a edição de SEV, o que pode ser revisto não é a decisão judicial concretamente tomada pelo STF, mas apenas o caráter vinculante fixado na súmula, o que amplia a independência do judiciário, que não estará mais obrigado a adotar a decisão do STF; (2.2) a exigência de o quórum de 4/5 do STF para declarar inconstitucionalidade não permite ao congresso rever qualquer decisão, é apenas exigência de quórum! (2.3) mesmo no caso de declaração de inconstitucionalidade de Emenda à Constituição, o congresso não poder “rever” a decisão, mas apenas iniciar um processo que permitirá ao povo fazê-lo, pela via de um plebiscito.

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Separação de Poderes e a Constitucionalidade da PEC Nº - 33/2011 (*)

Gilberto Bercovici e Martonio Mont’Alverne Barreto Lima [1].

A semana de 21 a 27 de abril movimentou as instituições constitucionais brasileiras.

No dia 24 o Min. Gilmar Mendes deferiu medida liminar em mandado de segurança contra o Projeto de Lei nº 4.470/2012 do Senado Federal, o qual es-tabeleceria “que a migração partidária que ocorrer durante a legislatura, não importará na transferência dos recursos do fundo partidário e do horário de propaganda eleitoral no rádio e na televisão”.

A parte final da decisão entendeu que

“(i) a excepcionalidade do presente caso, confirmada pela extrema velocida-de de tramitação do mencionado projeto de lei – em detrimento da adequada reflexão e ponderação que devem nortear tamanha modificação na organização política nacional; (ii) a aparente tentativa casuística de alterar as regras para criação de partidos na corrente legislatura, em prejuízo de minorias políticas e, por conseguinte, da própria democracia; e (iii) a contradição entre a proposi-ção em questão e o teor da Constituição Federal de 1988 e da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 4430. A aprovação do projeto de lei em exame significará, assim, o tratamento desigual de parlamentares e partidos políticos em uma mesma legislatura. Essa interferência seria ofensiva à lealdade da concorrência democrática, afigurando-se casuística e direcionada a atores políticos específicos” [2].

No mesmo dia 24 de abril, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados aprovou a Proposta de Emenda à Constituição nº 33, de 2011, a qual “altera a quantidade mínima de votos de membros de tribunais para declaração de inconstitucionalidade de leis; condiciona o efeito vinculante de súmulas aprovadas pelo Supremo Tribunal Federal à aprovação pelo Poder Legislativo e submete ao Congresso Nacional a decisão sobre a inconstitucio-nalidade de Emendas à Constituição” [3].

Parlamentares e Ministros apressaram-se em manifestações públicas em todos os sentidos. Sobre o primeiro caso – Projeto de Lei nº 4.470/2012 – o próprio Presidente da Câmara dos Deputados não deixou dúvidas sobre sua di-vergência com a decisão proferida pelo Ministro Relator no Supremo Tribunal

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Federal.

Quanto ao segundo caso — Proposta de Emenda à Constituição nº 33, de 2011 – o mesmo Presidente da Câmara defendeu a necessidade de estudos so-bre o assunto.

Anteriormente ao nosso interesse neste breve texto, é necessário esclarecer que democracia é conflito.

A maturidade de uma democracia política afere-se exatamente pela capaci-dade de seu sistema constitucional em resolver os conflitos, sem que tal reso-lução venha a seduzir setores da mesma sociedade a pensarem em alternativas fora da democracia, fora da disputa política legitimada pelo poder constituinte, como é o caso do Brasil e de sua constituição dirigente.

Como não poderia deixar de ser, é nossa Constituição Federal provocadora e solucionadora dos conflitos.

Portanto, assumimos a posição de que direito constitucional e jurisdição constitucional nada mais são do que direito político, e que, qualquer questão de controle da constitucionalidade será sempre uma questão de poder constituin-te, ou, em outras palavras: será, novamente, uma questão política.

No Brasil e em qualquer país do mundo. A política a tentar esconder a polí-tica é que consiste numa atitude fora da democracia, devendo, desta maneira, ser banida dos embates democráticos e republicanos.

Relativamente ao controle da constitucionalidade temos que registrar sem eufemismos: quem lida com controle da constitucionalidade conviverá sempre com a real possibilidade de ultrapassar o texto constitucional, ou melhor, de ir além – ou aquém – do poder constituinte.

O problema passa, então, a ser a qualidade democrática do controlador da constitucionalidade e, sobretudo, se sobre este controlador paira algum instru-mento de controle direto da parte da sociedade.

Deve ser ressaltado desde já que a legitimidade do legislativo decorre direta-mente do poder constituinte, já que todos os seus integrantes são eleitos direta-mente pelo povo; a legitimidade do judiciário advém da Constituição.

Trata-se de uma legitimidade indireta.

Acaso seja aprovada a PEC nº 33/2011 ter-se-á o conflito, não a crise.

Não vemos como possa vir esta eventual aprovação desencadear crise, uma vez que, em seu próprio texto é extremamente limitativa e não se pode ima-ginar, com sinceridade, que todos os dias o Congresso Nacional esteja a rea-

preciar decisões do Supremo Tribunal Federal, ou sejamos todos os brasileiros chamados a manifestar-nos, por meio de plebiscito, a respeito destas decisões. Pelo simples e realista fato de que não se tem registro deste cenário na história constitucional brasileira, tampouco noutras sociedades.

Interessa-nos aqui a discussão em torno da Proposta de Emenda à Consti-tuição nº 33, de 2011.

Entendemos que é ela absolutamente constitucional e, em nenhum instante de seus termos, na forma como aprovada pela Comissão de Constituição de Justiça da Câmara dos Deputados, viola dispositivos do § 4º do art. 60 da Cons-tituição Federal, notadamente a radical separação de poderes caracterizadora da forma presidencialista.

Procuraremos sustentar nossa argumentação com base da filosofia política laica e revindicadora da democracia, a consolidar-se a partir do século XVII, mas cujos postulados são detectados quase cem anos antes.

Baruch de Espinosa é considerado o grande formulador da defesa da liber-dade, em toda a dimensão que o termo pode ensejar.

Quando Espinosa adverte-nos de que homens bons e corretos podem subir ao cadafalso ou serem enviados ao exílio, também lembra que “é impossível tirar aos homens a liberdade de dizerem o que pensam” [4].

Desta observação de Espinosa descende a liberdade de manifestação de pen-samento ardorosamente tomada como primeira reivindicação, ao lado da li-berdade de ir e vir, do conceito de democracia do Iluminismo revolucionário.

Como Espinosa não é um filósofo da teologia – quem faz da razão e da filo-sofia servas da fé com certeza “ensandecerá” [5] – sua afirmação sobre a liber-dade de manifestação de pensamento assenta-se no elemento cotidiano da vida de uma república, a demonstrar o afeto, a vontade de assim viverem todos, sob leis, mesmo que vícios sociais sejam praticados e não tenham como ser punidos como a avidez e inveja.

Espinosa é também o pensador da tolerância, dado que sua condição judia de origem portuguesa e perseguido pela Inquisição, obrigou sua família a ir para a tolerante Holanda.

Como se vê, está em Espinosa, e em seus autorizados intérpretes, a rejeição da moral e do moralismo como instrumento mediador da construção da vida em comum do homem, com a mesma intensidade que está presente a política; e esta não deve cair nas “armadilhas da moral e da tradição jusnaturalista” [6].

Constata-se, desta forma, que Espinosa não nega a “possibilidade de que os

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conflitos permaneçam existindo após a fundação da Cidade” [7], por força da pluralidade da natureza humana.

O que é reafirmado é o lugar das instituições, portanto da política e de seus desdobramentos, como essenciais à construção da tranquilidade social.

Referida tranquilidade em nada se relaciona com a ausência dos conflitos, já que suas soluções encaminham-se pela política; distante esta do “voluntarismo moralista” [8].

Qual a relação desta primeira reflexão com o tema da PEC nº 33/2011?

Ora, o parlamento tem o direito de manifestar-se como bem entender, até o final de sua competência constitucional, sem ser molestado por quem que seja.

Proposta de emendas à Constituição, projetos de leis complementares e or-dinárias, de decretos legislativos nada mais são do que projetos, como bem os definem seus termos constitucionais.

Não possuem eficácia nem vigência. Não estão no mundo.

Pela nossa Constituição, o controle judicial da constitucionalidade incide sobre uma espécie normativa; jamais sobre uma proposta que sequer concluiu todo o processo legislativo.

Reside nesta singela razão o motivo pelo qual o Poder Judiciário pode con-trolar a constitucionalidade por inobservância do processo legislativo, que tam-bém é devido processo legal. Mas tudo isto após gerada a vida legislativa da espécie normativa; não antes de seu nascimento.

Igualmente ancorada neste motivo a impossibilidade de serem expedidas medidas liminares.

Não há danos políticos a serem temidos.

Tão logo uma espécie normativa absolutamente inconstitucional – formal e/ou materialmente — ganhe “vida” incidirá sobre ela o controle judicial da constitucionalidade.

Até lá, nada se pode fazer, a exemplo de outras situações, para lembrarmos a lição de Paulo Brossard, quando Ministro do Supremo Tribunal Federal e de seus votos nos mandados de segurança contra atos da Câmara dos Deputados e do Senado Federal [9].

Está-se diante, na presidencialista separação de poderes, das questões políti-cas e, nestas, cada um decide na conformidade da disputa ocorrida nas eleições, defendendo seus interesses.

Um pensamento atrai o outro. Tem sido crença disseminada no chamado “neconstitucionalismo” ou “normativismo constitucional” a certeza de que a efetivação constitucional ou as deficiências de nossa democracia residem na interpretação das normas ou que todos os desafios poderiam ser resolvidos com a articulação interna dos dispositivos constitucionais.

Em tais abordagens, o papel da política, com todos os seus atores, é pratica-mente desprezado.

Não é necessário ir muito longe para enxergar a extrema fragilidade destas teses e a pobreza de sua força explicativa para dar conta dos conflitos democrá-ticos, como aqueles que enfrentamos nestes dias.

Há mais a autorizar, do ponto de vista da teoria da democracia moderna, a constitucionalidade da PEC nº 33/11. E, mais uma vez, Espinosa oferece-nos a indicação do bom caminho a ser seguido. “Políticos e profetas e doutores” da Igreja” ocupam centralidade nas formulações filosóficas políticas de Espinosa [10].

A disputa será sempre — entre todos estes, ou entre uns e outros — para a tentativa de fundação e manutenção da república na perspectiva de superação do medo, da barbárie e da tirania que poderá acometer a qualquer sociedade.

Porém, seriam os profetas e doutores ao procurarem, por meio de sua leitura e interpretação da sagrada escritura, com a consequente extensão desta reve-lação particular à sociedade, os responsáveis pela construção e manutenção o poder político.

Neste compasso, somente a lei revelada é que seria divina, vez que originada do debate de poucos, dos particulares. “O mais extraordinário para Espinosa é a demonstração de que a lei divina só será lei se não divina e só será divina se não for lei” [11].

Tais elementos estão internos à sociedade, e não externos a ela; “Se uma das teses fundamentais da política espinoseana é a de que o inimigo do corpo político é interno a ele e encarna-se nos particulares que enquanto particulares desejam apossar-se do poder, compreende-se que o caráter privado do poder eclesiástico apareça como um dos inimigos políticos principais porque se torna poder teológico-político” [12].

O aprisionamento do saber num só corpo consiste para Espinosa [13], aqui ao contrário de Hobbes, na possível fonte de instabilidade política. Se se objeti-va a estabilidade da política devem ser ouvidos diferentes atores, de modo que seja improvável a corrupção da maioria por poucos: “Com efeito, o que deter-mina a vontade de uma assembleia suficientemente numerosa é mais a razão

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do que a paixão” [14]. Eis aqui o temor de Hobbes que vem a ser o destemor espinoseano.

Ao promulgar-se a Emenda Constitucional 45/2004 reafirmou-se não so-mente a súmula vinculante como a pretensão do Supremo Tribunal Federal de revestir-se na condição de soberano, como se fosse o único corpo político a deter a última palavra sobre quase tudo.

O ativismo judicial disseminado em todas as instâncias do judiciário nacio-nal confirmam nossas palavras, mesmo a qualquer olhar desatento.

Cotidianamente, presencia-se verdadeiro esvaziamento – Ausräumung – da política e dos políticos pelo poder judiciário. Surpreende – no Brasil e mesmo nas democracias europeias ou dos Estados Unidos – que pouco enfrentamento tenha tal cenário desencadeado da parte da sociedade e de outros poderes po-líticos.

Na verdade, a discussão a envolver a constitucionalidade do efeito vinculan-te no Brasil após 1988 tinha-se concluído com o julgamento da ação declarató-ria de constitucionalidade nº 1, cuja relatoria coube ao Ministro Moreira Alves.

Como preliminar sobre a constitucionalidade da Emenda Constitucional nº 03/1993, foi possível ao Relator aprovar a astuta tese de que o direito à ampla defesa “com os meios e recursos a ela inerentes”, previsto pelo art. 5º, LV da Constituição Federal somente se aplica aos processos subjetivos, “para a defesa concreta de interesses de alguém juridicamente protegido”; e não aos processos objetivos, como os de controle concentrado da constitucionalidade [15].

Apesar de a Constituição da República não impor este limite, de os direitos e garantias individuais serem cláusula pétrea, e de o rol de direitos e garantias individuais do art. 5º poder ser somente alterado “para mais”, inexistiu impe-dimento a que o Supremo Tribunal Federal realizasse autêntica revelação do poder constituinte, trazendo para si o controle da política, o que acabou por se confirmar de 1993 aos nossos dias.

Há mais: como único ator institucional a ter o poder de decisão para reforma de suas próprias súmulas vinculantes, o Supremo Tribunal Federal desvincula--se de si próprio, procurando ratificar sua soberania sobre o poder constituinte.

O desafio aqui, quanto à PEC nº 33/2011 é que ela propõe o retorno à situa-ção de destaque do poder legislativo.

A rediscussão sobre os limites da jurisdição constitucional nada tem fora do contexto democrático de 1988.

Afinal, em todo o mundo, intelectuais sempre se dedicaram a este tema [16],

não desencadeando nenhuma reação que sequer pudesse ser, de longe, qualifi-cada de “morte ao tribunal”, contribuindo, ao contrário, com a maturidade dos conflitos democráticos.

Somente soluções fora da democracia é que poderiam estranhar a suprema-cia do poder legislativo ao longo do pensamento político moderno.

Na sua Metafísica dos Costumes, Immanuel Kant não deixa dúvidas quanto à preponderância do poder legislativo sobre o judiciário.

Pertence a Kant a afirmação de que “Todo Estado contém em si três poderes, isto é, a vontade geral se une em três pessoas políticas (trias politica): o poder soberano (a soberania), que reside no poder legislativo; o poder executivo, que reside em quem governa (segundo a lei) e o poder judiciário, (que possui a tarefa de dar a cada um o que é seu, na conformidade da lei), na pessoa do juiz (…)” [17].

Interpretação segura a respeito do postulado de Kant que afirma a suprema-cia do poder legislativo é presente na obra de Norberto Bobbio, quando este, recorrendo à Metafísica dos Costumes, entende que “Apesar da afirmação da subordinação de um poder ao outro, o fundamento da separação dos três po-deres é ainda a supremacia do poder legislativo sobre os outros dois poderes: o poder legislativo deve ser superior porque somente ele representa a vontade coletiva” [18].

Antes de Kant, Rousseau defendeu também a supremacia do legislativo: “O poder legislativo é o coração do Estado, o poder executivo é o cérebro, que dá o movimento a todas as partes. O cérebro pode cair em paralisia e o indivíduo prosseguir vivendo. Um homem fica imbecil e vive, mas assim que o coração cessar suas funções, o animal está morto. Não é pela lei que o Estado subsiste, mas pelo poder legislativo” [19].

O retorno da palavra final ao poder legislativo – somente em casos excepcio-nais, como deseja a PEC 33/2011 – apenas reorienta o que já se conhece.

Se a Constituição Federal manifesta-se como democrática, é óbvio que não tem ela como escapar da tradição democrática em cuja história se inserem sua origem, suas disputas a darem-lhe sentido concreto na vida da sociedade.

Como poderia cogitar-se de comprometimento da cláusula de separação de poderes se o poder constituinte é que dará o último sinal?

Não fosse assim, qual o sentido de referir-se a PEC nº 33/2011 à forma ple-biscitária?

O ponto principal aqui é a polêmica travada sobre a proposta de emenda

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constitucional, vista por seus opositores como grave ameaça à autonomia e in-dependência do Poder Judiciário, o que comprometeria, inclusive, o regime democrático e o princípio da “separação de poderes”.

Em nossa opinião, trata-se de um debate equivocado.

Em primeiro lugar, porque os opositores da PEC estão confundindo a posi-ção institucional do Poder Judiciário no regime constitucional. Falta, pelo visto, relembrar a velha e célebre distinção criada por Sieyès, ainda em 1789, entre poder constituinte e poderes constituídos [20].

Em segundo lugar, a “separação de poderes” não é ameaçada pelo maior controle do Poder Judiciário por parte do Poder Legislativo, pelo contrário.

Para os opositores da PEC nº 33/2011, o Supremo Tribunal Federal e o Po-der Judiciário não poderiam ser controlados, pois perderiam sua independên-cia, sua autonomia, sua capacidade de fiscalizar livremente as demais institui-ções republicanas.

Este discurso, na realidade, confunde a posição constitucional do Poder Ju-diciário e do STF.

De poderes constituídos, que efetivamente são, portanto, submetidos aos li-mites da Constituição e da lei, passariam a verdadeiros soberanos, sem nenhu-ma espécie de controle.

Afinal, o soberano é absoluto, o que significa incontrolável, não sujeito a de-terminados controles, não necessariamente totalitário ou autoritário [21].

Esta visão “absolutista” do papel do Poder Judiciário nas democracias con-temporâneas é mais comum do que costumamos imaginar, especialmente no que diz respeito à atuação das Cortes Constitucionais.

Faz parte de um fenômeno denominado, entre outros, por Pedro de Vega García, de positivismo jurisprudencial [22].

Os órgãos de controle de constitucionalidade, assim, são convertidos em taumaturgos, esquecendo-se da função transformadora da Constituição, deixa-da de lado por ser “política”, não “jurídica”.

O risco existente é o de supremacia do poder dos juízes, poder não eleito, diga-se de passagem, em detrimento do Executivo e do Legislativo [23].

Portanto, a questão fundamental (e não respondida pelos adeptos do “po-sitivismo jurisprudencial”) é a da substituição do Poder Legislativo, eleito pelo povo, pelo governo dos juízes constitucionais.

Em quem o cidadão deve confiar: no representante eleito ou no juiz consti-

tucional?

Se o legislador não pode fugir à tentação do arbítrio, por que o juiz poderia? [24]

A supremacia dos tribunais constitucionais sobre os demais poderes carac-teriza-se pelo fato de os tribunais pretenderem ser o “cume da soberania”, da qual disporiam pela sua competência para decidir em última instância com ca-ráter vinculante.

Desta forma, o tribunal constitucional transforma-se em substituto do po-der constituinte soberano [25].

A consequência disto é salientada por Pablo Lucas Verdú:

“(…) o monopólio do conceito e da prática da Constituição pelos Tribunais Constitucionais, conduz, às vezes, a que estes não se limitem a defender e a interpretar, como instância máxima, a Lei Fundamental, mas a assenhorear-se dela. Expressando em termos alemães: não se limitam a ser o Hüter da Consti-tuição, mas o Herr da mesma” [26].

A visão “absolutista” do Poder Judiciário não é, de maneira alguma, adequa-da ao Estado Constitucional.

Dentro do Estado Constitucional, segundo Olivier Beaud, não pode haver um soberano.

O soberano, no Estado Constitucional, está acima da Constituição, pois tem o poder de fazer e desfazer a Constituição, ou seja, é o titular do poder consti-tuinte. Soberano, acima do Estado Constitucional, só pode ser o povo [27].

O Poder Judiciário e, especialmente, o Supremo Tribunal Federal não são, apesar dos adeptos do “positivismo jurisprudencial”, detentores do poder cons-tituinte. Não são soberanos. São poderes constituídos, portanto, submetidos à Constituição e às leis [28].

Deste modo, não só podem, como devem ser controlados, para que não abusem de suas funções, ou para que não usurpem funções constitucionais de outros poderes constituídos ou, ainda, tentem usurpar o próprio poder consti-tuinte, colocando-se acima da própria Constituição e da soberania popular que a criou e a mantém.

Feita a crítica à visão “absolutista” do Poder Judiciário, passemos, breve-mente, ao discurso da “separação de poderes”.

A PEC nº 33/2011 seria inconstitucional por violar o artigo 60, §4º, III, que dispõe que não será apreciada emenda constitucional tendente a abolir a “sepa-

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ração de poderes”.

Não discutiremos aqui questões ligadas às chamadas “cláusulas pétreas” ou ao significado da expressão “tendente a abolir”.

Apenas nos limitaremos a demonstrar que a visão de “separação de poderes” defendida pelos opositores da PEC nº 33/2011 é mais ortodoxa que a do pró-prio Montesquieu.

No célebre capítulo VI do Livro XI do livro De L’Esprit des Lois (1748), Montesquieu teria afirmado a “separação de poderes” [29].

Na realidade, Montesquieu jamais afirmou que os poderes são separados de forma estanque.

Esta interpretação, chamada por Charles Eisenmann de “interpretação sepa-ratista” [30], ignorou a intenção de Montesquieu que, na tradição do chamado “governo misto” [31], buscava a instituição de um governo moderado, contro-lado.

A separação de Montesquieu diz respeito à não confusão, à não identidade entre os componentes das várias funções estatais, não tem nada a ver com se-paração total e absoluta.

Pelo contrário, Montesquieu exige que um poder controle o outro.

O controle recíproco é essencial em seu sistema, para evitar o abuso de qual-quer um dos poderes sobre os outros.

Os próprios norte-americanos entenderam que a “separação dos poderes” não exigiria que os poderes legislativo, executivo e judiciário fossem inteira-mente desvinculados uns dos outros.

Na realidade, o essencial era, inclusive, a sua vinculação e interpenetração, realizadas de maneira que cada um dos poderes obtivesse o controle constitu-cional sobre os demais.

A mera declaração escrita dos limites dos vários poderes não era suficiente [32].

O mecanismo encontrado na Constituição norte-americana foi, ao invés da separação total e absoluta dos poderes, a introdução do sistema de freios e con-trapesos (checks and balances).

No mesmo sentido, o célebre artigo 16 da Declaração dos Direitos do Ho-mem e do Cidadão, de 26 de agosto de 1789 [33], não propõe um modelo ideal para toda e qualquer Constituição, como muitos chegaram a interpretar.

Pelo contrário, trata-se de uma afirmação de que a França, naquele momen-to, estava sem Constituição, pois o poder todo estava concentrado nas mãos do Rei e, portanto, competia à Assembleia Nacional elaborar uma Constituição para os franceses em que se garantissem os direitos individuais e a separação de poderes, novamente, no sentido de não concentração de todas as funções estatais nas mãos de uma mesma pessoa [34].

O grande perigo nunca foi o controle de todos os poderes uns pelos outros. Pelo contrário, especialmente em relação ao Poder Judiciário, a ameaça sempre foi proveniente da sua falta de controle.

Em 1823, Thomas Jefferson já alertava como um Poder Judiciário sem con-trole poderia se tornar uma efetiva ameaça à democracia constitucional:

“No estabelecimento de nossa Constituição, os integrantes dos corpos judi-ciários eram tidos como os mais inofensivos dos membros do Estado. A experi-ência, no entanto, logo demonstrou os caminhos pelos quais eles se tornaram os mais perigosos: o de que a insuficiência de meios previstos para a sua remoção deu a eles liberdade e irresponsabilidade em seu ofício; o de que suas decisões, aparentemente dizendo respeito apenas aos litigantes individualmente, passam em silêncio e desapercebidas pelo público em geral; o de que essas decisões acabam se tornando lei por meio dos precedentes, subvertendo aos poucos as fundações da Constituição e promovendo sua mudança antes que alguém possa perceber que aquele invisível e inofensivo verme estava empregado ativamente, consumindo a sua substância” [35].

Podemos concluir, portanto, que um maior “controle” do Poder Judiciário por parte do Poder Legislativo não fere a “separação de poderes”.

Pelo contrário, o que se opõe a toda tradição constitucionalista de “separa-ção dos poderes” é, justamente, a falta de controle do Poder Judiciário.

A reação à ampliação do controle democrático sobre o Poder Judiciário se torna mais bizarra e virulenta quando associada à repulsa a qualquer forma de ampliação da participação popular direta nas decisões políticas essenciais, como pretende a PEC nº 33/2011.

A oposição aos instrumentos de participação direta do povo nas decisões políticas, com o argumento falacioso da “violação ao princípio da separação de poderes”, em suma, parece dar razão à afirmação de Victor Nunes Leal, ele próprio ex-Ministro do STF, cassado pela ditadura militar:

“Aí está, portanto, explicado o verdadeiro sentido sociológico da divisão de poderes. Era um sistema concebido menos para impedir as usurpações do exe-cutivo do que para obstar as reivindicações das massas populares (ainda em

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embrião, mas já carregadas de ameaça)” [36].

Talvez seja a hora de se prestar atenção menos nos integrantes do Supremo Tribunal Federal que apoiaram e sustentaram a ditadura militar, ou que a con-sideram, ainda hoje, um “mal necessário”, perpetuando, em uma decisão vergo-nhosa, a auto-anistia de 1979 aos torturadores e assassinos da ditadura (ADPF nº 153/DF), e voltar a atenção para aqueles raríssimos integrantes da Corte que, como Victor Nunes Leal, Hermes Lima ou Evandro Lins e Silva, jamais tiveram qualquer dúvida sobre qual deveria ser o papel do Supremo Tribunal Federal como um órgão inserido dentro da democracia, portanto, submetido aos limi-tes da Constituição e à livre e soberana vontade do povo.

[1] Gilberto Bercovici é Professor Titular da Faculdade de Direito da Uni-versidade de São Paulo. Martonio Mont’Alverne Barreto Lima é Professor Ti-tular da Universidade de Fortaleza e Procurador do Município de Fortaleza.

[2] In: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/MS_32033.pdf, p. 12. Acesso em 25.04.13

[3] In: http://imagem.camara.gov.br/Imagem/d/pdf/DCD26MAI2011.pdf#page=212, p. 2612. Acesso em 25.04.2013.

[4] Espinosa, Baruch de. Tratado Teológico-Político. SP: Martins Fontes, 2003, pp. 307-309.

[5] Espinosa, Baruch de. Tratado Teológico-Político, p. 224.

[6] Chauí, Marilena: Política em Espinosa. SP: Cia. das Letras, 2003, p. 129.

[7] Guimaraens, Francisco de. Direito, Ética e Política em Spinoza. RJ: Lu-men Juris, 2010, p. 186.

[8] Guimaraens, Francisco de. Direito, Ética e Política em Spinoza, p. 193.

[9] “O Presidente pode violar imunidades parlamentares, usurpar funções legislativas, descumprir decisões judiciais; sob inspirações facciosas, entrar em conflito com outros Poderes ou com os Poderes constituídos dos Estados (…) Pode arruinar o crédito nacional e comprometer o bom nome do país pelo acintoso descaso com que desrespeita obrigações internacionais. Pode alienar bens nacionais, contrair empréstimos e emitir moeda, sem autorização legal. Pode o Presidente retardar dolosamente a publicação das leis, decretar o estado de sítio, estando reunido o Congresso, e, sem licença deste, ausentar-se do País. (…) Pode, enfim, provocar animosidade entre as Forças Armadas, com o pre-miar da indisciplina, galardoar a incompetência, fomentar o nepotismo, pode cometer atos de hostilidade contra nação estrangeira, expondo a República ao perigo da guerra, celebrar tratados e convenções humilhantes para a nação…

(…) Este painel terrível pode ser o retrato do país e obra de um governante. (…) Qual a solução jurídica para o caso esdrúxulo, uma vez que a competência do Senado, para exercer-se, supõe decreto acusatório da Câmara? Nenhuma solução legal existe (BROSSARD, Paulo. In: Impeachment, Imprensa Nacional, Brasília, 1996

[10] V. Chauí, Marilena: Política em Espinosa. SP: Cia. das Letras, 2003, pp. 37ss.

[11] Chauí, Marilena: Política em Espinosa, p. 127.

[12] Chauí, Marilena: Política em Espinosa, p. 45.

[13] Spinoza, Baruch de: Tratado Político: Cap. 8º, § 6. SP: Tecnoprint, pp.89/90.

[14] Chauí, Marilena. Ib., p. 294.

[15] ADC nº 1-DF, p. 275. In: Mendes, Gilmar Ferreira: Moreira Alves e o Controle de Constitucionalidade no Brasil. SP: Instituto Brasileiro de Direito Constitucional, 2000.

[16] Os exemplos mais significativos são Ingeborg Maus na Alemanha; Ja-vier Perez Royo na Espanha, e Mark Tushnet nos Estados Unidos da América. Para não mencionar a ausência de controle concentrado a constitucionalidade na França, Inglaterra e Suécia, até os dias de hoje.

[17] Grifamos. KANT, Immanuel: Metaphysik der Sitten. Darmstadt: WBG, Bd. 7, 1983, pp. 431/342.

[18] Grifamos. BOBBIO, Norberto: Direito e Estado no Pensamento de Em-manuel Kant. SP: Mandarim, 2000, p. 227.

[19] ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do Contrato Social ou Princípios do Direi-to Político. SP:, Hemus, 1981, p. 96.

[20] SIEYÈS, Emmanuel-Joseph, Qu’est-ce que le Tiers Etat?, 2ª ed, Paris, PUF, 1989, capítulo V.

[21] Sobre esta concepção, vide BEAUD, Olivier, “Le Souverain”, Pouvoirs º 67, 1993, p. 36.

[22] GARCÍA, Pedro de Vega, “El Tránsito del Positivismo Jurídico al Po-sitivismo Jurisprudencial en la Doctrina Constitucional”, Teoría y Realidad Constitucional nº 1, janeiro/junho de 1998, pp. 85-86.

[23] VERDÚ, Pablo Lucas, La Constitución en la Encrucijada (Palingenesia Iuris Politici), Madrid, Real Academia de Ciencias Morales y Políticas, 1994,

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pp. 65-78 e 107-108.

[24] SOARES, Rogério Guilherme Ehrhardt, Direito Público e Sociedade Técnica, Coimbra, Atlântida Editorial, 1969, pp. 154-155 e 182-183 e BÖCKEN-FÖRDE, Ernst-Wolfgang, “Grundrechte als Grundsatznormen: Zur gegenwär-tigen Lage der Grundrechtsdogmatik” in Staat, Verfassung, Demokratie: Stu-dien zur Verfassungstheorie und zum Verfassungsrecht, 2ª ed, Frankfurt am Main, Suhrkamp, 1992, pp. 191 e 198-199.

[25] BÖCKENFÖRDE, Ernst-Wolfgang, “Grundrechte als Grundsatznor-men: Zur gegenwärtigen Lage der Grundrechtsdogmatik” cit., pp. 189-19 e; MAUS, Ingeborg, “Judiciário como Superego da Sociedade: O Papel da Ativi-dade Jurisprudencial na ‘Sociedade Órfã’”, Novos Estudos nº 58, novembro de 2000, pp. 190-193.

[26] VERDÚ, Pablo Lucas, La Constitución en la Encrucijada cit., pp. 75-76. Thomas Jefferson, em 1823, já fazia crítica semelhante: “A Constituição (…) significa que seus poderes coordenados devem ser limitados um pelo outro. Mas, a opinião que atribui aos juízes o direito de decidir quais leis são cons-titucionais e quais não são, não apenas para eles próprios, em sua esfera de atuação, mas para o Legislativo e para o Executivo em suas respectivas esferas, poderá tornar o Judiciário um poder despótico” in Carta de Thomas Jefferson a William Johnson (1823).

[27] BEAUD, Olivier, “Le Souverain” cit., pp. 36-40.

[28] BEAUD, Olivier, “Le Souverain” cit., pp. 40-41.

[29] MONTESQUIEU, De L’Esprit des Lois in Oeuvres Complètes, reimpr., Paris, Éditions du Seuil, 1990, Livro XI, Cap. VI.

[30] EISENMANN, Charles, “La Pensée Constitutionnelle de Montesquieu” in Cahiers de Philosophie Politiquenº 2-3: Montesquieu, Bruxelas, Éditions Ousia, 1985, pp. 38-50. Vide também TROPER, Michel, La Séparation des Pou-voirs et l’Histoire Constitutionnelle Française, Paris, L.G.D.J., 1980, pp. 109-120.

[31] Sobre a tradição do “governo misto” e da “constituição mista”, prove-nientes de Políbio e recorrentes na formação do constitucionalismo ocidental, especialmente na tradição inglesa, vide, por todos, POCOCK, J. G. A., The Ma-chiavellian Moment: Florentine Political Thought and the Atlantic Republican Tradition, Princeton, Princeton University Press, 1975, especialmente capítu-los IX e XI, pp. 272-273, 277, 286, 297-300, 304-308, 315-316, 323-328, 364-371, 382 e 395.

[32] HAMILTON, Alexander; MADISON, James & JAY, John, The Federa-list Papers, London/New York, Penguin Books, 1987, Artigo nº 48.

[33] Artigo 16: “Toda sociedade na qual não está assegurada a garantia dos direitos, nem determinada a separação de poderes, não tem constituição”.

[34] Vide TROPER, Michel, La Séparation des Pouvoirs et l’Histoire Cons-titutionnelle Française cit., pp. 157-160 e RIALS, Stéphane, La Déclaration des Droits de l’Homme et du Citoyen, Paris, Hachette, 1988, pp. 252-254.

[35]Carta de Thomas Jefferson a A. Coray (1823).

[36] LEAL, Victor Nunes, “A Divisão dos Poderes no Quadro Político da Burguesia” in Cinco Estudos: A Federação – A Divisão de Poderes (2 estudos) – Os Partidos Políticos – A Intervenção do Estado, Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 1955, p. 108.

(*) Artigo originalmente publicado no endereço eletrônico http://www.vio-mundo.com.br/politica/bercovici-e-barreto-lima.html. Acesso em 09/05/2013

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A SOBERANIA POPULAR PARA EQUILIBRAR OS PODERES

LEGISLATIVO X JUDICIÁRIO

Nazareno Fonteles PT/PI

PEC – 33/2011

REFLEXÕES DE MONTESQUIEU

“É necessário que o povo, em seu conjunto, exerça o poderlegislativo; mas como isso é impossível nos grandes Estados, ...,épreciso que o povo exerça pelos seus representantes tudo o que nãopode exercer por si mesmo.”

Montesquieu, Do Espírito das Leis, livro XI, VI.

"...todo homem que tem poder é sempre tentado a abusar dele; eassim irá seguindo, até que encontre limites. (...) Para que não sepossa abusar do poder, é preciso que pela disposição das coisas, opoder detenha o poder."

Montesquieu, Do Espírito das Leis, livro XI,IV.

"Há de fazer que a ambição controle a ambição."Federalista, nº 51. PEC-33/2011

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Slides usados nas palestras/debates da USP e da UnB

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REFLEXÕES DE MONTESQUIEU

"Se o poder judiciário estiver vinculado ao poder legislativo, opoder sobre a vida e a liberdade dos cidadãos seria arbitrário,pois o juiz seria legislador."Montesquieu, Do Espirito das Leis, livro XI,VI.

" Em Estados despóticos não há leis: o juiz é lei por si mesmo.(...) No governo republicano, é da natureza da Constituição ojuiz se ater à letra da lei."Montesquieu, Do Espirito das Leis, livro VI, III.

PEC-33/2011

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INTÉRPRETE DA CONSTITUIÇÃO

“Como não são apenas os intérpretes jurídicos daConstituição que vivem a norma, não detêm eles omonopólio da interpretação da Constituição”.

Peter Haberle

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REFLEXÕES SOBRE DIREITO/POLÍTICA

“Se esta tarefa [cuidar da coisa pública] compete a umaassembléia composta por todos os cidadãos, o poder público échamado democracia.”

Spinoza, Tratado Político, II, §17.

“O poder legislativo pode pertencer somente à vontade unidado povo, pois uma vez que todo o direito deve dele proceder, aninguém é capaz de causar injustiça mediante sua lei.”

Immanuel Kant, Metafísica dos Costumes, edipro, 2ª Ed. Revista, p.86.

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REFLEXÕES SOBRE DIREITO/POLÍTICA

"Em qualquer caso, enquanto vigora um governo, o legislativo éo poder supremo; o que deve fazer leis para os demais devenecessariamente ser-lhe superior; e uma vez que o legislativo ésuperior apenas pelo trabalho de fazer leis válidas para todosos membros da sociedade, prescrevendo regras às suasações,(...), o legislativo necessariamente terá de ser supremo, etodos os outros poderes vigentes na sociedade, dele derivadosou a ele subordinados."John Locke, Segundo Tratado Sobre o Governo, §150.

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REFLEXÕES SOBRE DIREITO/POLÍTICA

" Os estudiosos do direito que defenderam a revisão judicialnunca prestaram muita atenção ao significado da democracia.(...) a democracia é a única forma de governo que atende aointeresse comum, segundo diversos teóricos democratas. (...)Todos esses teóricos [Robert Dahl, Thomaz Christiano, RexMartin, Amy Gutman e Dennis Thompson] destacam que o maisimportante sobre a democracia não é o governo da maioria, mas,antes, um compromisso de tratar os cidadãos de maneiraigualitária e de assegurar que a real atuação do governo sirvapara promover os interesses de todos."Stephen M. Griffin, Supremacia judicial e isonomia em uma democracia de direitos.

PEC-33/2011

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PEC-33/2011

"A constituição não é o que a Suprema Corte diz que ela é, esim o que o povo, agindo constitucionalmente por meio dosoutros poderes, permitirá à Corte dizer que ela é. Umainterpretação específica da constituição pode ser imposta àCorte por emendas, ou por uma maioria política ampla eestável, como ocorreu no caso do New Deal."

John Rawls, O Liberalismo Político, ed. Ática, p. 288.

"La justicia social no es exclusiva del socialismo; le dimosla idea de un capitalismo igualitario y, con el New Deal,dimos un serio aunque limitado paso hacia ese logro.”

R. Dworkin, La Democracia Posible, Paidós, p. 203.

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Paulo Bonavides adverte: “que o juiz, em presença de uma lei cujotexto e sentido seja claro e inequívoco, não deve nunca dar-lhesentido oposto, mediante o emprego do método de interpretaçãoconforme a Constituição”. Logo depois acrescenta: “Não deve porconsequência esse método servir para alterar conteúdosnormativos, pois ‘isso e tarefa do legislador e não do tribunalconstitucional’.

Paulo Bonavides, Curso de Direito Constitucional, 24ª ed, Malheiros, págs. 520-521.

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LIMITES DA INTERPRETAÇÃO JUDICIAL

É bastante comum ouvirmos:I) Ao STF cabe a última palavra sobre a CF;II) A Constituição é o que o Supremo diz que ela é;

Mas quem legitima Constituinte/Congresso é o Povo.

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QUEM DÁ A ÚLTIMA PALAVRA SOBRE A CONSTITUIÇÃO?

O Art. 1º da CF afirma que todo o poder emana do povo,que o exerce por meio de representantes eleitos oudiretamente.

Outros artigos da CF: Art. 49, XI; Art. 52, X, Art. 101 e Art.103, §2º.

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R. Dworkin X J. Waldron “Sempre há uma perda para a democracia quando o ponto de

vista a respeito das condições democráticas é imposto poruma instituição não-democrática, mesmo que esse ponto devista esteja correto e apresente melhorias à democracia.”J. Waldron, O Judicial Review e as Condições da Democracia.

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DEBATE ACADÊMICO:

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DEBATE ACADÊMICO

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J. Habermas: Estado Democrático de Direito

Art. 1º da CF-88 ---> RF do BRASIL / Estado Democrático de Direito,Fundamentos: Sob.,Cid., Dignidade, Trab/Iniciativa e Pluralismo politico. 13

Direitos Humanos Soberania Popular [Co-originários]

Estado de Direito Democracia [Interdependentes]

Cidadãos (Sociedade) Cidadãos (Estado)

Autonomia Privada Autonomia Pública [Complementares]

[Complementares]

J. Habermas, Era das Transições, Tempo Brasileiro, 2003.

ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO - ART. 1º DA CF(FUNDAMENTOS)

Soberania Cidadania

A Dignidade da Pessoa Humana

Pluralismo Político Valores Sociais do Trab. e L. I.

Quem exerce o Poder Maior da República ?

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I) INVASÕES DO JUDICIÁRIO NO LEGISLATIVO

Fidelidade partidária; EC-52/2006 sobre verticalização das eleições; EC-62/2009 dos Precatórios; Lei dos royalties; Redução do poder do CNJ sobre os juízes/STF: Art.103-B, §4º; Anulação da exigência do Diploma de Jornalista.

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II) INVASÕES DO JUDICIÁRIO NO LEGISLATIVOSuspensão liminar do PL sobre o fundo partidário;Pesquisa em células-tronco embrionárias;Súmula das algemas;Redução das vagas de vereadores;Lei do FPE;Aborto de anencéfalos.

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“Quem disse que juízes de supremos tribunais não são animais políticos astuciosos?”;

“Os tribunais proferem decisões que favorecem pessoas sem poder, principalmente quando isso se harmoniza com valores e interesses da elite”.

Ran Hirschl

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JUDICIALIZAÇÃO DA MEGAPOLÍTICA “A Judicialização indiscriminada da Megapolítica reflete o fim da

doutrina da "Questão Política" e representa um desafio sério àdoutrina tradicional da separação de poderes.”

“Grupos sociopolíticos influentes, temerosos de perder seucontrole sobre o poder político, podem apoiar a Judicialização daMegapolítica, instituir o judicial review e, de forma mais geral, darpoderes a tribunais constitucionais como manobra de preservaçãoda hegemonia.”

Ran Hirschl, prof. de Ciência Política e Direito, Universidade de Toronto.

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CONSEQUÊNCIAS DAS INVASÕES DO JUDICIÁRIOViolação dos direitos constitucionais dos parlamentares e dos

cidadãos;Violação das cláusulas pétreas (Art. 60 da CF): a da separação

dos poderes e a do voto direto e universal que legitima oCongresso;

Violação dos Arts. 1º e 2º da CF que afirmam que o Brasil é umEstado Democrático de Direito, que todo o poder emana dopovo, que o exerce por meio de representantes eleitos oudiretamente e que os três Poderes da União são independentese harmônicos entre sí.

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I) SÍNTESE DA PEC-33/2011

Leis e Normas – Art. 97 Introduz quórum qualificado de 4/5 dos votos dos membros

de tribunais para declarar a inconstitucionalidade de lei ou deato normativo do poder público;

Como se justifica que Tribunais "contramajoritários", com tãopoucos membros nomeados, decidam pelo critério "majoritário"contra Legislativos, com tantos membros eleitos?

Obs: quórum de 2/3 para súmula vinculante e recursoextraordinário.

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II) SÍNTESE DA PEC-33/2011

Súmula vinculante – Art. 103 – A

O efeito vinculante de súmula do STF será deliberado pormaioria absoluta, num prazo de 90 dias, pelo CongressoNacional;

A súmula vinculante foi criada pela EC-45 de 2004.

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III) SÍNTESE DA PEC-33/2011Emenda Constitucional – Art. 102

O CN terá também 90 dias para deliberar, com quórum de 3/5, seconcorda ou não, com a decisão da Corte. Se não concordar, o CNconvocará uma consulta popular para que o povo, que é a fonteoriginária de todo o poder, possa diretamente, dar a palavra final sobreo conflito entre os dois Poderes;

Vedada suspensão da eficácia de EC por medida cautelar do STF;

A convocação da consulta popular é uma competência exclusiva doParlamento prevista no Art. 49, XV da CF-88.

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A EVOLUÇÃO DO VOTO POPULAR UNIVERSAL

Fonte: Adam Przeworski, Qué Esperar del lá Democracia, ed. Siglo Veintiuno, Buenos Aires, 2010, p.97.

REFLEXÕES SOBRE DIREITO/POLÍTICA

Doutrina da Sabedoria da Multidão (de Aristóteles):“O povo atuando como um corpo é capaz de tomar decisões

melhores reunindo o seu conhecimento, a sua experiência e oseu discernimento do que qualquer subconjunto de pessoasatuando como um corpo e reunindo o conhecimento, aexperiência e o discernimento dos membros do subconjunto.”

Jeremy Waldron, A Dignidade da Legislação, Martins Fontes, p. 116.

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“Vale a pena aproximar a jurisprudência, um pouco mais do quegeralmente se aproxima, das várias maneiras como as pessoasteorizaram sobre a política: pois o direito deve ser visto comofruto da política, diga a jurisprudência o que disser."Jeremy Waldron, A Dignidade da Legislação, Martins Fontes, p.201

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DIÁLOGO: JURISPRUDÊNCIA / LEGISLAÇÃO

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Bibliografia básica

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"Lo único que puede oponerse al eterno despotismo esla eterna idea de la democracia. Ante la realidade, la idea;ante el ser, el dever."

Oscar Correas, Teoria Critica dos Direitos Humanos, ed. Fórum, p. 92.

“Não abandonemos as coisas para ficar descansados;combatamos sempre, mesmo sem esperança de ganhara batalha. Que importa o sucesso? O que nos pede obom Deus é que não nos abandonemos às fadigas daluta, é que não desanimemos, (...) é preciso cumprir odever até o fim.”

Teresa de Lisieux, Obras Completas, Ed. Loyola, p. 1080.

PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO No 33, DE 2011

(Do Sr. Nazareno Fonteles e outros)

Altera a quantidade mínima de votos de membros de tribunais para declaração de inconstitucionalidade de leis; condiciona o efeito vinculante de súmulas aprovadas pelo Supremo Tribunal Federal à aprovação pelo Poder Legislativo e submete ao Congresso Nacional a decisão sobre a inconstitucionalidade de Emendas à Constituição.

As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do art. 60 da Constituição Federal, promulgam a seguinte emenda ao texto constitucional:

Artigo 1º. O art. 97 da Constituição Federal de 1988 passará a vigorar com a seguinte redação

“Art. 97 Somente pelo voto de quatro quintos de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou do ato normativo do poder público. ...(NR)”.

Artigo 2º. O art. 103-A da Constituição Federal de 1988 passará a vigorar com a seguinte redação

“Art. 103-A O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de quatro quintos de seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, propor súmula que, após aprovação pelo Congresso Nacional, terá

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efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal.

§ 1º A súmula deverá guardar estrita identidade com as decisões precedentes, não podendo exceder às situações que deram ensejo à sua criação.

§2º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.

§ 3º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade.

§4º O Congresso Nacional terá prazo de noventa dias, para deliberar, em sessão conjunta, por maioria absoluta, sobre o efeito vinculante da súmula, contados a partir do recebimento do processo, formado pelo enunciado e pelas decisões precedentes.

§5º A não deliberação do Congresso Nacional sobre o efeito vinculante da súmula no prazo estabelecido no §4º implicará sua aprovação tácita.

§6º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar súmula com efeito vinculante aprovada pelo Congresso Nacional caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso. ......(NR)”

Artigo 3º. O art. 102 da Constituição Federal de 1988 passará a vigorar acrescido dos seguintes parágrafos:

“Art. 102. ...

...

§ 2º-A As decisões definitivas de mérito proferidas pelo Supremo Tribunal Federal nas ações diretas de inconstitucionalidade que declarem a inconstitucionalidade material de emendas à Constituição Federal não produzem imediato efeito vinculante e eficácia contra todos, e serão encaminhadas à apreciação do Congresso Nacional que, manifestando-se contrariamente à decisão judicial, deverá submeter a controvérsia à consulta popular.

§ 2º-B A manifestação do Congresso Nacional sobre a decisão judicial a que se refere o §2º-A deverá ocorrer em sessão conjunta, por três quintos de seus membros, no prazo de noventa dias, ao fim do qual, se não concluída a votação, prevalecerá a decisão do Supremo Tribunal Federal, com efeito vinculante e eficácia contra todos.

§2º-C É vedada, em qualquer hipótese, a suspensão da eficácia de Emenda à Constituição por medida cautelar pelo Supremo Tribunal Federal.....(NR)”

JUSTIFICAÇÃOO protagonismo alcançado pelo Poder Judiciário, especialmente dos órgãos

de cúpula, é fato notório nos dias atuais. A manifestação desse protagonismo tem ocorrido sob duas vertentes que, embora semelhantes, possuem contornos distintos: a judicialização das relações sociais e o ativismo judicial.

Entendemos a judicialização das relações sociais como um fenômeno decorrente do modelo constitucional adotado no Brasil, visto que dispomos de uma Constituição analítica que interfere no cotidiano das pessoas. Parece-nos, nesse contexto, compreensível que as controvérsias sejam levadas ao Judiciário para a devida solução das questões concretas.

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Além da judicialização, temos a vertente do ativismo judicial. O ativismo denota um comportamento, um modo proativo de interpretar a Constituição por parte dos membros do Poder Judiciário. Adotando essa postura, os magistrados, para o deslinde da controvérsia, vão além do que o caso concreto exige, criando normas que não passaram pelo escrutínio do legislador.

O ativismo judicial tem sido fomentado pelo sistema brasileiro de controle de constitucionalidade, que combina aspectos dos sistemas americano e europeu, sendo considerado um dos mais abrangentes do mundo1. Trataremos dessa questão específica mais adiante.

Não são poucos os exemplos a ilustrar o ativismo exacerbado no Brasil. Comecemos pelo caso da fidelidade partidária, no qual o Supremo Tribunal Federal (STF) ratificou o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) – contido em Resolução2 - criando uma nova hipótese de perda de mandato parlamentar, em adição às enumeradas no art. 55, sem que houvesse qualquer menção expressa no texto constitucional relacionada à sanção por infidelidade partidária. Outro caso amplamente conhecido foi a extensão da vedação do nepotismo ao Poder Executivo e Legislativo, por meio de súmula vinculante, após o julgamento de um único caso.

Um dos casos mais emblemáticos foi a controversa verticalização das coligações partidárias, estabelecida por Resolução do TSE3 – aprovada a menos de sete meses das eleições de 2002. O Congresso Nacional reagiu a essa inovação jurídica e aprovou uma Emenda Constitucional (EC nº 52/2006) explicitando a vontade de legislador, dando liberdade aos partidos na formação de coligações. Embora ambos os normativos (as Resoluções do TSE e a Emenda à Constituição) tenham sido aprovados a menos de um ano da eleição, o STF entendeu que apenas a Emenda à Constituição devia observância ao princípio da anterioridade anual da lei eleitoral (CF/88; art. 16)4. Esse caso é um verdadeiro paradigma do ativismo e da insegurança jurídica fundamentados no poder regulamentar de que dispõe a Justiça Eleitoral para tão somente administrar eleições.

Há ainda os casos da redução de vagas de vereadores, da súmula das algemas, e tantos outros. É tarefa simples enumerar os casos de explícito

1 Mendes, Gilmar Ferreira. Jurisdição Constitucional, 2005. p. 146.2 Resolução TSE nº 22.610, de 25.10.2007; posteriormente alterada pela Resolução-TSE nº 22.733, de 11.03.2008, que disciplina o processo de perda de cargo eletivo e justificação de desfiliação partidária. 3 Resolução TSE nº 20.993, de 26.02.2002; e Resolução nº 21.002, de 15.03.2002. 4 Vários partidos políticos ajuizaram Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a Resolução do TSE (ADI 2628-3; do PFL) e ADI 2626-7; do PcdoB; PL; PT PSB e PPS), mas o STF não chegou a apreciar o mérito das ações, pois sequer as conheceu.

ativismo judicial. Difícil é mencionar exemplos de autocontenção de nossa Corte Suprema.

Por óbvio, devemos reconhecer as deficiências do Poder Legislativo, que tem passado por várias crises de credibilidade. Contudo, esse aspecto não deve justificar tais medidas, como se houvesse um vácuo político a ser ocupado pelo Supremo Tribunal Federal. O fortalecimento do Poder Legislativo deve ser debatido no âmbito da reforma político-eleitoral, mas não apenas nesse espaço. Há uma série de medidas de preservação e valorização da competência legislativa do Congresso Nacional que devem ser apreciadas, independentemente da aprovação de novas regras eleitorais.

O fato é que, em prejuízo da democracia, a hipertrofia do Poder Judiciário vem deslocando boa parte do debate de questões relevantes do Legislativo para o Judiciário. Disso são exemplos a questão das ações afirmativas baseadas em cotas raciais, a questão das células tronco e tantas outras.

As decisões proferidas nesses casos carecerão de legitimidade democrática porque não passaram pelo exame do Congresso Nacional. Estamos, de fato, diante de um risco para legitimidade democrática em nosso país.

Há muito o STF deixou de ser um legislador negativo, e passou a ser um legislador positivo. E diga-se, sem legitimidade eleitoral. O certo é que o Supremo vem se tornando um superlegislativo5.

Uma das causas apontadas para o protagonismo judicial decorre da recente democratização dos pleitos eleitorais. Conforme afirma Alfredo Canellas Guilherme Silva6: “Em temos de democracia a elite-minoritária fragilizada pela perda de espaço político-legislativo para a maioria popular elegeu o Poder Judiciário como o instrumento adequado e rápido para a conquista e/ou manutenção da hegemonia perdida ou ameaçada pela voz das urnas”.

É bastante comum ouvirmos a afirmação de que à Suprema Corte cabe a última palavra sobre a Constituição, ou ainda, a Constituição é o que o Supremo diz que ela é. Na verdade, deve caber ao povo dizer o que é a Constituição.

Precisamos, pois, resgatar o valor da representação política, da soberania popular e da dignidade da lei aprovada pelos representantes legítimos do povo, ameaçadas pela postura ativista do Judiciário. Restabelecer o equilíbrio entre os

5 Termo cunhado por Alfredo Canellas Guilherme da Silva, em seu artigo “Revisão e controle pelo Poder Legislativo das decisões da Suprema Corte”. 6 Silva, Alfredo Canellas Guilherme. Revisão e controle pelo Poder Legislativo das decisões da Suprema Corte.

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Poderes é, pois, o objetivo central da presente proposição.

Em primeiro lugar, entendemos salutar o aumento da maioria qualificada para declarar a inconstitucionalidade de lei aprovada no Parlamento. A opinião de apenas seis juízes, por mais cultos que sejam, não pode sobrepor a soberania popular, pois conhecimento jurídico não é fator de legitimação popular.

A redação atual do art. 97 da Constituição Federal estabelece o voto da maioria absoluta dos membros dos tribunais como requisito para declaração de inconstitucionalidade de leis. Estamos propondo o aumento de maioria absoluta para quatro quintos dos membros dos tribunais. No caso do Supremo, será necessário o voto de nove ministros e não apenas seis para que seja declarada a inconstitucionalidade de leis aprovadas no Congresso Nacional. Terá de haver nítida e clara homogeneidade no entendimento da Suprema Corte.

Voltando ao fenômeno do ativismo judicial, uma breve análise de sua evolução no Brasil aponta para um expressivo aumento a partir da promulgação da Emenda Constitucional nº 45, de 2004 (conhecida como Reforma do Judiciário). Essa Emenda tinha o justo objetivo de conferir meios ao Poder Judiciário para reduzir o imenso volume de processos repetitivos, gerando uma maior rapidez e efetividade das decisões judiciais. Nesse contexto, foram aprovadas medidas inovadoras no bojo da referida reforma, tais como a súmula vinculante (com “força de lei”) e a repercussão geral (como critério de admissibilidade de recursos extraordinários).

Um desses mecanismos inovadores voltados à racionalização da prestação jurisdicional postos à disposição do Poder Judiciário pelo Poder Legislativo, como já dito, foi a súmula vinculante. Aproximadamente sete anos após sua aprovação, é necessário que o Congresso Nacional promova uma avaliação do uso desse instrumento.

A nosso ver, a súmula vinculante vem sendo utilizada pelo STF como um “cheque em branco” posto à disposição pelo Poder Legislativo. Seu uso não está em consonância com o texto constitucional e, portanto, deve passar por ajustes. Um desses necessários ajustes resulta do desapego do Supremo aos contornos dos casos precedentes, bem como à necessidade de reiteradas decisões para que se edite uma súmula vinculante. Nesse contexto, vale registrar alguns trechos de debates em sessões de aprovação de súmulas vinculantes naquela Corte:

DEBATES E APROVAÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE Nº 11 (uso de algemas). (Nesse caso, os ministros não se ativeram ao caso concreto, mesmo

alertados pelo Procurador-Geral da República. É manifesto o ímpeto legiferante do STF).

O DR. ANTÔNIO FERNANDO BARROS E SILVA DE SOUZA (PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA) - Senhor Presidente, Senhores Ministros, (...) para manter a coerência da posição que assumi na manifestação oral, na sessão de julgamento do Habeas Corpus nº 91.952, desejo fazer breves observações para reflexão do Tribunal, neste momento em que se delibera a propósito do enunciado de Súmula Vinculante nº 11, que trata do uso das algemas. Algumas dessas observações, evidentemente, já foram até agitadas na discussão porque no texto inicial se referiam a questões previstas, mas no texto que agora se propõe algumas delas ficaram superadas visto que foram atendidas. Na sessão anterior, a questão foi enfrentada à luz de uma situação de fato que revelava a utilização de algemas durante uma sessão do Tribunal do Júri. Embora tenha sido essa a situação de fato, (...) o pronunciamento da Corte teve caráter abrangente, proclamando-se a excepcionalidade do uso das algemas em todos os casos.

DEBATES E APROVAÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE Nº 12 (cobrança de matrícula em universidades públicas). (Nesse caso, o ministro Eros Grau se mostra preocupado com a rotina adotada pelo Supremo de se passar do critério de admissibilidade de recursos (repercussão geral) diretamente para a súmula vinculante. Ao final o ministro lembra que a Constituição exige reiteradas decisões.

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO EROS GRAU – (...)Quero fazer uma observação do ponto de vista da minha posição na Corte. É breve. Hoje fico muito preocupado com o fato de da repercussão geral chegarmos diretamente à súmula. Porque há

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casos e casos. E hoje julgamos uma porção de recursos extraordinários, entre os quais seguramente há casos inteiramente distintos um do outro.

Só queria anotar essa minha preocupação.

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Senhor Presidente, eu me permitiria ponderar apenas o seguinte: reconhecidamente o Supremo Tribunal Federal adotou uma praxe salutar e logo após votada a repercussão geral nós elaboramos uma súmula vinculante. Isso tem desatravancado os nossos trabalhos, tem esclarecido os jurisdicionados. Parece-me uma prática que, data venia, deve ser mantida. Vencedores ou vencidos, temos que nos conformar com meia maioria formada no Plenário.

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO EROS GRAU – Senhor Presidente, não tenho nenhum inconformismo, eu só quis registrar e lembrar: A Constituição diz “... após reiteradas decisões ...”

Esses breves diálogos travados entre ministros da Corte revelam que o STF não está seguindo as regras do instrumento posto à sua disposição pelo Congresso Nacional. Cumpre ao Poder Legislativo rever as regras desse importante instrumento de racionalização das decisões judiciais, como forma de preservação de suas competências legislativas.

Nossa proposta aumenta para quatro quintos de seus membros a maioria necessária para aprovação da súmula vinculante. Exigir-se-á, a partir de agora, a concordância de pelo menos nove ministros para que se aprove uma súmula vinculante.

Além disso, o efeito vinculante da súmula perante os demais órgãos do Poder Judiciário e a Administração Pública somente operará após a aprovação da súmula, por maioria absoluta, em sessão conjunta do Congresso Nacional.

A apreciação do Congresso Nacional sobre a súmula proposta pelo STF avaliará a observância dos casos precedentes reiteradamente decididos e os eventuais “excessos legislativos”.

Na hipótese de rejeição do efeito vinculante pelo Congresso Nacional, a súmula tornar-se-á mais uma das súmulas ordinárias daquela Corte. Para não prejudicar a agilidade da decisão, assina-se o prazo de noventa dias, com a aprovação tácita no caso de não se ultimar a votação no prazo estabelecido.

Observamos que a elaboração de uma súmula vinculante, na qual o STF enuncia seu entendimento sobre questões constitucionais concretas e reiteradamente decididas, não tem natureza jurisdicional e, portanto, a presente proposição não viola o princípio da separação de poderes.

Essa medida, além de representar o cumprimento do que determina o art. 49, XI, da Constituição Federal ao Congresso Nacional – zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes -, deve induzir o necessário (e hoje inexistente) diálogo institucional entre os Poderes da República.

A sistemática proposta, como se pode notar, assemelha-se à apreciação de vetos do chefe do Poder Executivo a dispositivos de lei aprovadas pelo Legislativo, motivados por inconstitucionalidade ou contrariedade ao interesse público. O Congresso Nacional pode, por maioria absoluta, em sessão conjunta, rejeitar o veto presidencial e ratificar seu entendimento quando da aprovação da proposta. No caso do veto, não ocorre, contudo, a aprovação tácita por decurso do prazo.

Além de tratar de novos procedimentos de aprovação da súmula vinculante, a presente proposição também confere ao Poder Legislativo um papel relevante no controle de constitucionalidade de Emendas à Constituição Federal. Ressalte-se que, nesse tópico, a proposta versa apenas sobre o controle de constitucionalidade de Emendas à Constituição Federal.

A proposta consiste em submeter ao Congresso Nacional a decisão do STF, que não teria, de imediato, efeito vinculante e eficácia contra todos (“erga omnes”). Somente após a apreciação do Congresso Nacional reconhecendo a inconstitucionalidade defendida pelo Supremo é que operaria o efeito vinculante e a eficácia da decisão judicial. Na hipótese de o Congresso ratificar seu próprio entendimento já esposado anteriormente por ocasião da aprovação da Emenda, ficaria a população automaticamente convocada para opinar sobre o caminho a ser seguido. Assim, havendo divergências entre a posição dos juízes e dos representantes do povo, caberia ao próprio povo a última palavra.

A título de esclarecimento, vale lembrar que o efeito vinculante das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) não foram previstas no texto original

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da Constituição de 1988. Tal alteração foi introduzida apenas em 1993, pela Emenda à Constituição nº 3, que estabeleceu esse efeito apenas para as Ações Diretas de Constitucionalidade (ADC), e a partir de então, a jurisprudência do STF passou a conferi-lo também às ADI. Com a edição da Lei nº 9.868/1999 e, posteriormente, com a promulgação da EC nº 45/2004 (Reforma do Judiciário), o efeito vinculante foi expressamente estendido à ADI.

A respeito da participação do Poder Legislativo no tocante à aplicação de decisões do STF a todos (“erga omnes”), vale lembrar que o art. 52, X da Constituição Federal, já prevê a atuação do Senado Federal na suspensão da execução de lei declarada inconstitucional pela Corte Suprema em controle difuso de constitucionalidade. Esse papel do Senado Federal vem sendo previsto em textos constitucionais desde 1934. Em nossa opinião, não se trata de papel subalterno, mas de mecanismo concreto de equilíbrio entre Poderes, podendo a Câmara Alta decidir de forma contrária, como, de fato, já ocorreu.

Conforme o eminente constitucionalista Luís Roberto Barroso7,

“O Senado, como regra, suspende a execução do ato declarado inconstitucional. Há, contudo, precedente de não-suspensão: no caso do art. 9º da Lei nº 7.689/1988, que instituiu contribuição social sobre o lucro das pessoas jurídicas. Referido dispositivo teve sua inconstitucinalidade declarada incidentemente no RE 150.764-PE, por maioria apertada. O Senado Federal foi comunicado da decisão em ofício de 16 de abril de 1993. A matéria foi apreciada pela Comissão de Constituição e Justiça, que se manifestou pela não suspensão da norma, em parecer terminativo de 28 de outubro de 1993. Não houve recurso contra essa decisão, que se tornou definitiva em 5 de novembro de 1993, tendo sido comunicada à Presidência da República e ao Presidente do STF no dia 18 do mesmo mês”.

Não obstante, parte da doutrina, incluindo ministros8 do Supremo, defendem a ocorrência de uma mutação constitucional para relegar o papel do

7 Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro (4ª edição, Ed. Saraiva, p. 129). 8 MENDES, Gilmar Ferreira Mendes. O papel do Senado Federal no controle de constitucionalidade: um caso clássico de mutação constitucional. Revista de Informação Legislativa, ano 41, n. 162,abr./jun. 2004. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/web/cegrf/ril/Pdf/pdf_162/R162-12.pdf>. Acesso em: 27 abr. 2008.

Senado da República apenas a dar publicidade à decisão da Corte. Os que assim entendem vêem como justificativa da existência do referido dispositivo apenas razões históricas.

O fato é que uma série de instrumentos criados pelo próprio Poder Legislativo, e pelo próprio STF, têm contribuído para o progressivo esvaziamento dessa competência. Na prática, esse entendimento apenas reproduz o desprestígio do Poder Legislativo e expõe a nítida face do ativismo judicial.

Embora não seja objeto da presente PEC, podemos inserir no contexto do distanciamento do Poder Legislativo em relação à Constituição o fenômeno da “mutação constitucional”. Trata-se de um processo informal de mudança de sentido e alcance de dispositivos constitucionais, promovido unilateralmente pelo Judiciário, justificado apenas por exercícios de hermenêutica. Indaga-se: convém à sociedade ter o Poder Legislativo inerte diante de uma mudança silenciosa da Constituição a cargo apenas do Supremo?

Não podemos importar modelos de forma acrítica a partir da experiências de outros países que, por dificuldades extremas de promover mudanças nos textos constitucionais, tiveram de implementar formas alternativas e criativas para não “congelar” no tempo suas Constituições. Entendemos que o povo, por meio de seus representantes, deveria participar desse processo. Em momento mais adequado voltaremos a tratar desse tema.

Em síntese, já é hora de refletirmos, no contexto brasileiro, sobre esse modelo de controle de constitucionalidade que tem justificativa histórica cunhada no período pós-holocausto. Segundo Alfredo Canellas Guilherme da Silva9, “A desconfiança sobre o Poder Legislativo autenticou a ideia de que o Poder Judiciário deveria assumir o papel de guardião das normas constitucionais e seu mais importante valor da dignidade da pessoa humana, mesmo fosse necessária a declaração de inconstitucionalidade de leis democraticamente elaboradas pelas casas do povo ou o controle de sua omissão legislativa”.

Continua o eminente professor em seu brilhante artigo: “O ativismo judicial se resume num comportamento cometido pelo poder judicante ofensivo ao princípio democrático, mas retoricamente preocupado com a efetividade do princípio da supremacia constitucional, segundo a última e própria interpretação realizada pelo Poder Judiciário”. E arremata com precisão: ”Acerca do ativismo praticado pelo Supremo Tribunal Federal no Brasil, a doutrina identifica como questão de fundo a afirmação e ampliação da competência normativa da corte

9 Silva, Alfredo Canellas Guilherme. Revisão e controle pelo Poder Legislativo das decisões da Suprema Corte.

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e não a efetividade dos direitos fundamentais”.

As formas alternativas de controle de constitucionalidade tem sido debatidas e defendidas por eminentes juristas. Destacamos Jeremy Waldron10 e Mark Tushnet11, que questionam, de forma enfática, o monopólio do Judiciário em dizer a última palavra sobre a Constituição. Para Waldron,12 os tribunais também tomariam decisões baseadas em regras de maioria, sendo, portanto, tão arbitrárias (no sentido de imprevisíveis) quanto aquelas determinadas pelo Legislativo, não possuindo as qualidades decorrentes da legitimidade democrática.

Como forma de exemplificar um modelo alternativo de controle de constitucionalidade no qual o Poder Judiciário não tem o monopólio da última palavra, citamos o adotado pela constituição canadense. De acordo com o constitucionalista José Guilherme Berman Correa Pinto13,

“A Constituição canadense de 1982, ao prever um mecanismo conhecido como “cláusula não obstante” (notwithstanding clause), por meio da qual o Poder Legislativo pode aplicar um determinado diploma normativo, mesmo que ele contrarie o Texto Constitucional (na visão do Judiciário), despertou a atenção de estudiosos, especialmente daqueles que possuem ressalvas à prática tradicional do judicial review, e inspirou outros países a adotarem mecanismos semelhantes (Inglaterra, Nova Zelândia, Israel). Esta forma de fiscalização de constitucionalidade das leis, aqui chamada de controle brando de constitucionalidade (weak-form judicial review), sugere que o Judiciário, embora exerça um papel relevante na interpretação dos dispositivos constitucionais, não deve possuir a prerrogativa de deter a última palavra. Valoriza-se, assim, o componente democrático, de modo a permitir

10 Jeremy Waldron é um jurista neozelandês radicado nos Estados Unidos, autor de várias obras, incluindo “A Dignidade da Legislação”.11 Mark Tushnet é um jurista norte-americano, professor de Direito na Harvard Law School, também autor de várias obras, entre elas “Taking the Constitution away from the Courts” (Princeton University Press) e “Weak Courts, Strong Rights”. É defensor de forte limitação do “Judicial Review” e da “devolução” da Constituição ao povo.12 Waldron, Jeremy. A Dignidade da Legislação. Trad. Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2003.13 Pinto, José Guilherme Berman Correa. Artigo “Supremacia judicial e controle de constitucionalidade”, publicado em http://www.direitopublico.idp.edu.br/index.php/direitopublico/article/viewFile/799/668.

aos representantes do povo que afirmem de maneira definitiva quais são, precisamente, os compromissos básicos daquela sociedade”.

Já é hora, pois, de superarmos o argumento de que os legisladores são menos aptos a tratar dos direitos da minoria por serem suscetíveis às pressões da maioria. Afinal, são os próprios parlamentares que na Constituição e nas leis ordinárias consignaram tais direitos. Alega-se também que as maiorias legislativas são passageiras e circunstanciais, sendo natural o papel do Judiciário enfrentar, por não delas depender, as correntes majoritárias. Esse argumento falacioso menoscaba o Poder Legislativo, pregando-lhe a pecha de incapaz e inconsequente.

O Poder Judiciário brasileiro tem, com efeito, lançado mão de interpretações pós-positivistas, aplicando princípios constitucionais a todo tipo de situações concretas, demonstrando pouco apreço aos textos legais e adotando uma dogmática fluida, com elevado grau de liberdade. Acha-se sempre um princípio constitucional, até então pouco difundido, pronto a fundamentar uma nova decisão impregnada de valor moral. É o verdadeiro império do panprincipiologismo14.

Vale a pena citar Peter Härberle: “Sem dúvida, uma fixação exclusiva na jurisdição há de ser superada. É possível cogitar de uma opinião pioneira, na qual a doutrina constitucional integre também a teoria da legislação, isto é, seja admitida como uma interlocutora do legislador”. (...) Tem-se, pois, de desenvolver uma compreensão positiva para o legislador, enquanto intérprete da Constituição...” (Hermeneutica Constitucional, Porto Alegre, 1997. Tradução: Gilmar F. Mendes, p.53-55).

Por fim, o que temos observado a todo momento são decisões ativistas, que representam grave violação ao regime democrático e aos princípios constitucionais da soberania popular e da separação de poderes, os quais constam expressamente da Constituição Federal.

Tal anomalia precisa ser corrigida por mecanismos que fomentem o diálogo institucional entre os Poderes. É, portanto, o que se propõe, sem buscar suprimir qualquer parcela, ínfima que seja, da competência dos Poderes da República.

Desse modo, estamos, em síntese, propondo uma revisão da sistemática de aprovação de súmulas vinculantes e do modelo de controle de constitucionalidade de Emendas à Constituição Federal. Em ambos os mecanismos o Poder Legislativo assumirá, como deve ser, um papel relevante.

14 Expressão cunhada por Lênio Streck, para designar o uso aleatório e descompromissado dos princípios constitucionais, no livro Verdade e Consenso, Ed. Lumen Juris.

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A presente Proposta de Emenda à Constituição pretende, insistimos, fomentar o diálogo institucional mediante a valorização do papel do Poder Legislativo, muito caro à democracia, e que traz consigo a insubstituível legitimidade da escolha popular.

Esperamos contar com apoio dos nobres pares.

Sala das Sessões, em 25 de maio de 2011. 

         Deputado Nazareno Fonteles2011_1541

CÂMARA DOS DEPUTADOS

COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA E DE CIDADANIA

PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO Nº 33, DE 2011

Altera a quantidade mínima de votos de membros de tribunais para declaração de inconstitucionalidade de leis; condiciona o efeito vinculante de súmulas aprovadas pelo Supremo Tribunal Federal à aprovação pelo Poder Legislativo e submete ao Congresso Nacional a decisão sobre a inconstitucionalidade de emendas á Constituição. Autores: Deputado NAZARENO FONTELES e outros Relator: Deputado JOÃO CAMPOS

I - RELATÓRIO

A proposta de emenda à Constituição em epígrafe, que tem como primeiro signatário o Deputado Nazareno Fonteles, pretende alterar a quantidade mínima de votos de membros de tribunais para declaração de inconstitucionalidade de leis; condicionar o efeito vinculante de súmulas aprovadas pelo Supremo Tribunal Federal à aprovação pelo Poder Legislativo; e submeter ao Congresso Nacional a decisão sobre a inconstitucionalidade de emendas á Constituição.

Em alentada justificação, esclarece seu primeiro subscritor que “[...] o protagonismo alcançado pelo Poder Judiciário, especialmente os órgãos de cúpula, é fato notório nos dias atuais. A manifestação desse protagonismo tem ocorrido sob duas vertentes que, embora semelhantes, possuem contornos distintos: a judicialização das relações sociais e o ativismo judicial [...] O fato é que, em prejuízo da democracia, a hipertrofia do Poder Judiciário vem deslocando boa parte dos debates de questões relevantes do Legislativo para o Judiciário [...] Há muito o STF deixou de ser um legislador

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negativo e passou a ser um legislador positivo. E diga-se, sem legitimidade eleitoral. O certo é que o Supremo vem se tornando um superlegislativo”.

Adiante, aduz que “[...] nossa proposta aumenta para quatro quintos de seus membros a maioria necessária apara a aprovação da súmula vinculante [...] Exigir-se-á, a partir de agora, a concordância de pelo menos nove ministros para que se aprove uma súmula vinculante [...] Além disso, o efeito vinculante da súmula perante os demais órgãos do Poder Judiciário e a Administração Pública somente operará após aprovação da súmula, por maioria absoluta, em sessão conjunta do Congresso Nacional”.

Finalmente, conclui que, “[...] além de tratar de novos

procedimentos de aprovação da súmula vinculante, a presente proposição também confere ao Poder Legislativo um papel relevante no controle de constitucionalidade de emenda à Constituição [...] A proposta consiste em submeter ao Congresso Nacional a decisão do STF, que não teria, de imediato, efeito vinculante e eficácia contra todos (“erga omnes”): somente após a apreciação do Congresso Nacional, reconhecendo a inconstitucionalidade defendida pelo Supremo, é que operaria o efeito vinculante e a eficácia da decisão judicial”.

A matéria, nos termos do art. 202, caput, do Regimento

Interno, foi distribuída a esta Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania para análise de sua admissibilidade constitucional.

É o relatório. II - VOTO DO RELATOR

Os pressupostos de admissibilidade da proposição em exame são os prescritos no art. 60, inciso I, §§ 1º a 4º, da Constituição Federal, e no art. 201, incisos I e II, do Regimento Interno.

Assim, analisando a matéria sob o ponto de vista formal,

constatamos que a proposta em tela apresenta o número de subscrições necessárias – 219 assinaturas válidas –, conforme atesta a Secretaria-Geral da Mesa (fls. 12), e não há, no momento, embargo circunstancial que impeça a alteração da Carta Política, visto que o País passa por período de normalidade jurídico-constitucional, não se encontrando na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio.

No que concerne à análise material da proposição em

apreço, isto é, a sujeição de seu objetivo às cláusulas constitucionais imutáveis

CÂMARA DOS DEPUTADOS

– as chamadas cláusulas pétreas – verificamos que as alterações projetadas na Proposta de Emenda à Constituição nº 33, de 2º11, não pretendem atingir a forma federativa do Estado, o voto direto, secreto, universal e periódico e os direitos e garantias individuais.

Com efeito, no que se refere ao art. 1º da proposição em comento, no qual se pretende alterar o quórum para a declaração de inconstitucionalidade pelos tribunais de maioria absoluta para quatro quintos, nada a objetar, porquanto não se verifica na espécie violação ao princípio da separação dos Poderes.

De modo idêntico, com relação ao art. 2º da proposta epigrafada, em que se propõe condicionar o efeito da súmula vinculante à sua aprovação pelo Congresso Nacional, nada a objetar, pois esse instituto não tem natureza jurisdicional, vale dizer, não é ato judicial típico, o que afasta a ofensa ao princípio da separação dos Poderes.

Finalmente, no que tange ao art. 3º da proposição em

epígrafe, no qual se pretende submeter ao Congresso Nacional a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a inconstitucionalidade de proposta de emenda à Constituição, há, na espécie, manifesta inovação. Ao valorizar a soberania popular, reforçando o comando constitucional previsto no parágrafo único do art.1º da CF, contribui sobremaneira para o diálogo e a harmonia entre os Poderes Judiciário e Legislativo, bem como preserva a separação dos Poderes. E deixa claro que no caso de conflito entre estes Poderes, a decisão cabe soberanamente ao Povo, através de consulta popular.

No mais, importa salientar que a quadra atual é, sem dúvida,

de exacerbado ativismo judicial da Constituição. Nesse contexto, a autocontenção pelos tribunais (“judicial self-restraint”) não tem sido capaz de deter o protagonismo do Poder Judiciário. Essa circunstância apenas reforça a necessidade de alterações constitucionais, com vistas a valorizar o papel do Poder Legislativo de titular soberano da função de legislar.

Acresce que não pode o Congresso Nacional abdicar do

zelo de preservar sua competência legislativa em face da atribuição normativa de outros Poderes, consoante o que dispõe o art. 49, XI, da Constituição da República.

Elevar o quórum para propor súmulas e exigir que o Congresso Nacional as aprove, como prevê a Proposta de Emenda à Constituição nº 33, de 2011, as torna mais legítimas e equânimes. Previne-se, assim, a hipertrofia dos poderes do Supremo Tribunal Federal, evitando que atingissem, desmesuradamente, as instâncias que lhe são inferiores e, no limite, o cidadão e as pessoas jurídicas, haja vista o alcance da súmula e o seu efeito vinculante sobre as decisões administrativas e judiciárias. Registre-se

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ainda que nem mesmo as leis vinculam tão estritamente os juízes na sua atividade judicante como as súmulas. Eis por que a proposição que aqui se analisa me parece ponderada contribuição à matéria.

Pelas razões precedentes, voto pela admissibilidade da

Proposta de Emenda Constitucional nº 33, de 2011.

Sala da Comissão, em de de 2012.

Deputado JOÃO CAMPOS Relator

PEC - 03 / 2011

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O Congresso Nacional pode sustar decisões do STF? (*)

Nazareno Fonteles

Se essa pergunta fosse feita ao atual presidente do STF(Supremo Tribunal Federal), Joaquim Barbosa, a resposta seria: Nããoo! Pode nããoo! Deduzo isso por uma frase, digna de um discípulo de Hitler, que ele disse: “ A Constituição é aquilo que o Supremo Tribunal Federal diz que é”. Mas brevemente mostro, a seguir, que a Constituição Federal(CF), em vigor no Brasil, responde o contrário: Sim! Pode sim!

De acordo com o art.49, XI da CF, o Congresso Nacional tem a competência “exclusiva” de zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes. E no art. 102, a CF diz que ao STF(Supremo Tribunal Federal) compete, precipuamente, a guarda da Constituição.

Veja que a guarda da CF não é competência exclusiva do STF, mas, apenas, sua função principal. Exatamente por isso os outros Poderes devem guardá-la também.

Aliás, no art. 23 da Constituição Federal, está expressamente dito: “ É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: I - zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas...”. Noutras palavras, a guarda da CF é compartilhada, não é prerrogativa exclusiva do STF.

Por outro lado, observe que é exclusiva a competência do Congresso Nacional em preservar sua competência legislativa diante dos outros Poderes.

Logo quem decide, em última instância, se uma decisão, de qualquer órgão de outro Poder da República, interfere ou não na competência legislativa do Congresso Nacional, é o próprio CN e mais ninguém.

Por isso que o Congresso Nacional pode sustar decisões do STF e de qualquer órgão ou membro do Judiciário ou do Poder Executivo, se entender que sua competência legislativa está sendo usurpada ou violada.

Esta é a compreensão que está, de forma mais clara e incisiva, na Proposta que fiz de Emenda Constitucional, a PEC - 03/2011, já aprovada a sua admissibilidade, por unanimidade, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal.

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Porém, como colocado acima, não há, fundamentalmente, necessidade dessa emenda constitucional para o Congresso Nacional tomar decisões, nesta direção, contra o Poder Judiciário. A Soberania Popular, através da Constituinte de 87/88, já determinou, na CF de 88, que o CN tivesse essa prerrogativa exclusiva.

Mais ainda, na minha compreensão, a própria mesa do Congresso Nacional, pode sustar, preliminarmente, decisões do STF. E se for questionada sua decisão por algum de seus parlamentares, então colocará a mesma para apreciação do Plenário do Congresso Nacional. E foi por isso que solicitei, formalmente, ao presidente do CN, a anulação, pela mesa do Congresso Nacional, do ato do STF que permitiu o abortamento de anencefálicos.

Também é relevante salientar que não cabe ao STF questionar ou modificar um artigo da Constituição Federal. Quem colocou o artigo na CF foi a Assembléia Nacional Constituinte ou o Congresso Nacional, ambos eleitos pelo Povo. E não há nenhum artigo da CF que autorize o STF , através de interpretação, modificar o que nela está claramente expresso. Como aconteceu recentemente em relação às novas regras do FPE(Fundo de Participação dos Estados) e à perda de mandato dos deputados.

Mesmo em caso de contradição ou lacuna, o máximo que a Constituição Federal autoriza ao STF é fazer sua recomendação ao Congresso Nacional para tomar as providências e não, ao contrário, usurpar a competência legislativa do CN e dar prazos a este, como no caso do FPE. Já pensou o CN dando prazos ao Poder Judiciário para este julgar os processos que estão, há anos, esperando uma decisão jurídica? Pois é, o respeito mútuo entre os Poderes, é o caminho da “ harmonia” previsto na Constituição Federal.

Por último, manda a CF, em seu art. 103-B, §4º, com muita lucidez, que o CNJ(Conselho Nacional de Justiça) fiscalize os deveres funcionais de todos os magistrados, sem fazer exceção. Logo os juízes do Supremo estão inclusos nesta fiscalização. E por isso mesmo, a norma interpretativa, criada pelo STF para proteger seus membros da fiscalização do CNJ, deve ser sustada pelo Congresso Nacional. Se o CNJ estivesse agindo constitucionalmente, sem seguir essa fraude hermenêutica de auto-proteção, alguns ministros do STF já teriam sido afastados por mau comportamento e violação do Estatuto da Magistratura.

Medidas assim são parte da luta pela construção real e histórica do nosso Estado Democrático de Direito, estabelecido no art. 1º de nossa Carta Maior de 1988.

O Congresso Nacional está, pois, desafiado, neste momento, a cumprir com

seus deveres constitucionais de sustar os atos e decisões do Poder Judiciário que atentem contra sua competência legislativa, obedecendo ao que manda o art. 49, XI da CF.

Como membro do Congresso Nacional estou fazendo meus esforços para cumprir com o meu dever. Como diria Gandhi: “ Nunca me preocupei em saber quando vou ter êxito ou se vou ter êxito. Já fico satisfeito em perseverar nos meus esforços para fazer o que sei ser o meu dever.”

*Artigo originalmente publicado no site Brasil 247 de 06/02/2013

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Legislativo versus Judiciário

O SR. NAZARENO FONTELES (PT-PI. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, ocupo a tribuna no Grande Expediente para tratar de matéria relevante, motivo de debate, de decisão nesta Casa e de repercussão na sociedade, inclusive com muitas críticas sem embasamento, sem estudo, sem dedicação àquilo que nós aqui propusemos.

Lembro que apresentei a esta Casa, no ano passado, duas propostas de emenda à Constituição, levando em conta o que a nossa Constituição determina a respeito dos Poderes, a respeito da independência, da harmonia e do equilíbrio que é preciso haver entre eles, com o firme propósito de chamar a atenção para as invasões frequentes na função precípua de legislar do Poder Legislativo, por parte dos outros Poderes, mormente pelo Poder Judiciário, que não tem legitimidade popular alguma para substituir este Poder. Isto é golpe de Estado de baixa intensidade: quando um Poder usurpa outro Poder.

Baseado nisso, apelo para esta Casa no sentido de que assuma com altivez o seu dever constitucional. O art. 49, inciso XI, da Constituição Federal, determina que devemos zelar pela preservação de nossa competência legislativa diante das ameaças dos outros Poderes. Precisamos valorizar isso. A proposta de emenda à Constituição por mim apresentada e aprovada por unanimidade pela Comissão de Constituição e Justiça, na semana passada, apenas tenta tornar mais clara a significação do inciso XI. De acordo com o inciso V, temos o poder de sustar atos normativos invasivos do Poder Executivo. Que ele o faça com o Judiciário, porque já estabelece o inciso XI.

Ives Gandra Martins, que por reiteradas vezes escreveu sobre isso, escreve mais um artigo, que tenho em mão. Por gentileza, peço aos Deputados que queiram fazer um aparte que esperem até que eu acabe de ler o artigo de Ives Gandra, para que aqueles que acham que dominam o Direito, que são os grandes juristas e constitucionalistas desta Nação, escutem o que disse um antigo e já idoso professor de Direito Constitucional, muito requisitado por gregos e troianos desta República. É um artigo curto.

O Sr. Mauro Benevides - Deputado Nazareno Fonteles, peço permissão a V.Exa. para fazer uma breve intervenção, uma vez que a Comissão de Constituição e Justiça está reunida agora.

O SR. NAZARENO FONTELES - Peço a V.Exa. que tenha paciência, por favor. Eu sou membro da Comissão.

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O Sr. Mauro Benevides - Peço a aquiescência de V.Exa. para dizer o seguinte: a proposição de V.Exa. é relevante. Temos apenas de compatibilizá-la com o princípio da tripartição. E faremos isso como membros que podemos ser da Comissão Especial, e nos debruçaremos sobre essa matéria porque é inquestionavelmente relevante. Era o que gostaria de dizer a V.Exa.no instante em que me encaminho para a nossa Comissão de Constituição e Justiça, reunida já há 15 minutos.

O SR. NAZARENO FONTELES - Muito obrigado. Incorporo sua fala ao meu pronunciamento.

“Então, vou ler o que diz Ives Gandra neste artigo publicado pelo jornal Folha de S.Paulo, há poucos dias, intitulado Os Dois Supremos:

Um dos mais importantes pilares da atual Constituição foi a conformação de um notável equilíbrio de poderes, com mecanismos para evitar invasão de competências.

O Supremo Tribunal foi guindado expressamente a guardião da Constituição (artigo 102), com integrantes escolhidos por um homem só (artigo 101, § único), o presidente da República, que éeleito pelo povo (artigo 77), assim como os integrantes do Senado e da Câmara (artigos 45 e 46).

O Congresso Nacional tem poderes “— atentem bem — “para anular quaisquer decisões do Executivo ou do Judiciário que invadam a sua função legislativa (artigo 49, inciso XI), podendo socorrer-se das Forças Armadas para mantê-la (artigo 142), em caso de conflito.

Há, pois, todo um arsenal jurídico para assegurar a democracia no nosso país.”

Diz ainda o jurista Ives Gandra em seu artigo:

“Ora, a Suprema Corte Brasileira, constituída no passado e no presente por ínclitos juristas, parece hoje exercer um protagonismo político, que entendo contrariar a nossa Lei Suprema.”

Aqui abro um parêntese: que coincidência o ativismo do Supremo na hora em que chega um governo de cara mais popular, que atende aos reclamos dos mais pobres, que faz os direitos chegarem à vida cotidiana do povo pobre do nosso País. Ele age tentando usurpar o Poder mais popular, o Poder Legislativo.

Continuo a leitura do artigo:

“Assim é que, a partir dos nove anos da gestão Lula e Dilma, o Pretório Excelso passou a gerar normas.

Para citar apenas alguns casos: “— prestem bem atenção à lista das violações constitucionais do Supremo Tribunal à função deste Poder, que fica calado, não reage para cumprir o seu dever constitucional; e é o nosso apelo neste momento, ou seja, para que reaja e cumpra o seu dever constitucional — “empossar candidato derrotado “—virou moda o TSE e os TRE empossarem quem não foi eleito pelo povo, por decisão judicial; democracia rasgada! — “quando de cassação de governantes estaduais (artigo 81 da Constituição); a fidelidade partidária.”

Quem não se lembra da fidelidade partidária? A Constituição não tratava dela, nem esta Casa legislou sobre ela. O Supremo deu um golpe na Constituição, deu um golpe neste Poder e impôs uma fidelidade partidária cujo funcionamento até hoje ninguém compreende direito, porque isso não é função dos Ministros. Eles são incompetentes para tomar decisões políticas, mas tomam. Gostaram talvez dos holofotes da grande mídia, que muitas vezes é cúmplice desse mesmo Poder contra este, que atenta contra a democracia do mesmo jeito.

Eu abro um parêntese neste momento da leitura do artigo de Ives Gandra para lembrar o ano de 1989. Quem não se lembra do crime eleitoral cometido, na TV brasileira, contra o então candidato Lula e a favor do candidato Collor de Mello? E o que fez o Supremo? E o que fez o Ministério Público Federal, passados 23 anos? Nada! É porque mexia com os poderosos. Quando mexe com os pobres mortais, o rigor da lei está lá; quando mexe com os ricos e poderosos, eles se curvam e rasgam a Constituição que está aqui, neste tablet.

Vou continuar lendo o artigo para tentar fazer esta Casa acordar e honrar o cumprimento do seu dever constitucional, que está no art. 49, inciso XI, do qual esse jurista trata há vários anos, chamando-nos a atenção e implorando a esta Casa que ouse exercer a sua função. Peço paciência a V.Exas. para concluir a leitura.

Após citar a fidelidade partidária, diz o jurista:

“O aviso prévio (artigo 7º, inciso XXII); — onde eles meteram a colher — a relação entre homossexuais (artigo 226, § 3º); “— a união homoafetiva eles criaram, violando a Constituição e as prerrogativas deste Poder —” e o aborto de anencéfalos”.

Aliás, sobre o aborto de anencéfalos não há previsão no Código Penal nem na Constituição. Deu o golpe na Constituição o Supremo, sim! Aliás, o golpe foi reconhecido por dois membros do Supremo. Quanto a isso, faço justiça: li atentamente o voto do Ministro Lewandowski. Diz textualmente: Não é dado aos integrantes do Judiciário, que carecem da unção legitimadora do voto popular,

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promover inovações no ordenamento normativo como se parlamentares eleitos fossem.

Minha gente, está na Constituição — e vou ler para não haver erro —, no art. 1º:

Art. 1º ..............................................................................

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos — eleitos é um adjetivo forte — ou diretamente, nos termos desta Constituição.

O Judiciário não se enquadra numa alternativa nem na outra. Como é que ele pode nos espezinhar — nós, eleitos pelo povo para legislar — e nós ficarmos nos humilhando?Não se trata de humilhação nossa. Estamos humilhando o povo. A soberania popular está sendo rasgada por meia dúzia de juristas que, de maneira prepotente, querem impor uma ditadura de juízes neste País. E estamos deixando isso passar.

Foi desse jeito que o nazismo ascendeu, ou seja, com a conciliação de um Judiciário subserviente. E depois o Parlamento se agachou e se entregou àquela ditadura malvada, perversa e de triste memória que foi o nazismo.

Mas eu quero concluir a leitura do artigo de Ives Gandra:

“Tem-se, pois, duas posturas julgadoras drasticamente opostas: a dos magistrados de antanho”, — de antigamente — “que nunca legislavam, e a dos atuais, que legislam.

Sustentam alguns constitucionalistas que vivemos a era do neoconstitucionalismo, que comportaria tal visão mais abrangente de judicialização da política.

Como velho advogado e professor de direito constitucional, tenho receio dos avanços de um poder técnico sobre um poder político, principalmente quando a própria Constituição o impede (artigo 103, § 2º).”

Tenho em mão o art. 103, cujo § 2º diz o seguinte:

§ 2º Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias.

Ou seja, mesmo quando formos omissos, o máximo que o Judiciário pode fazer é pedir que façamos. Não tem nem direito a dar prazo. Ele, por exemplo, está dando prazo para a aprovação de nova lei sobre o Fundo de Participação dos

Estados. De acordo com o art. 103, §2º, o Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição, está desguardando e rasgando a Constituição, dando prazo a esta Casa para atender-lhe.

Nós somos a soberania do povo. Ou o povo a exerce diretamente por plebiscito, por referendo, ou por intermédio de nós. Acordem! Se não, o governo dos juízes dominará os Poderes, e nós cada vez mais perderemos a função, e a democracia terminará sendo destruída no nosso País.

Terminarei de ler o artigo de Ives Gandra e depois ouvirei os que desejam falar:

“Nem se argumente que ação de descumprimento de preceito fundamental — de cuja redação do anteprojeto participei, ao lado de Celso Bastos, Gilmar Mendes, Arnoldo Wald e Oscar Corrêa — autorizaria tal invasão de competência, visto que essa ação objetiva apenas suprir hipóteses não cobertas pelas demais ações de controle concentrado.

Meu receio é que, por força dos instrumentos constitucionais de preservação dos poderes, numa eventual decisão normativa do STF de caráter político nacional, possa haver conflito que justifique a sua anulação pelo Congresso (artigo 49, inciso XI), o que poderia provocar indiscutível fragilização do regime democrático no país.

É sobre tais preocupações que eu gostaria que magistrados e parlamentares se debruçassem para refletir.”

Ives Gandra da Silva Martins, 77, advogado, professor emérito da Universidade Mackenzie, da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e da Escola Superior de Guerra, é presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio.

Ouço o Deputado Vanderlei Siraque.

O Sr. Vanderlei Siraque - Deputado Nazareno Fonteles, eu estava ouvindo atentamente V.Exa., o debate que propõe a esta Casa. De fato, o Estado tem três funções essenciais: a administrativa, a legislativa e a jurisdicional. Preponderantemente, a função administrativa éexercida pelo Executivo; a legislativa, pelo Poder Legislativo; e a jurisdicional, pelo Poder Judiciário. Também temos que entender que a Constituição, como diz Mestre Canotilho, é formada por um conjunto de princípios e regras. Talvez esta Casa não leve muito em consideração os princípios constitucionais — dignidade da pessoa humana, defesa da vida, aqueles que fundamentam a República do Brasil. Eu entendo que, às vezes, o Judiciário extrapola o seu poder. Entretanto, a responsabilidade é desta Casa, por causa de sua omissão. Às vezes, demora anos para que um

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projeto de lei seja apreciado pelos nobres pares — alguns, mais nobres; outros, menos nobres. Alguns projetos andam mais rapidamente; outros, mais devagar. A sociedade acaba procurando o Poder Judiciário por causa da morosidade de algumas discussões que há nesta Casa. Demora-se muito para a apreciação, contrária ou favorável, de determinadas matérias. Mas V.Exa. está de parabéns por abrir o debate. Vejo que a sua intenção é a de fazer essa discussão. Daqui a pouco vamos ter que criar uma Frente Parlamentar em defesa do Parlamento. Já existe a Frente Parlamentar em Defesa do Judiciário, da qual participo, mas daqui a pouco vamos ter a Frente Parlamentar em Defesa do Parlamento, algo inusitado talvez, no mundo.

O SR. NAZARENO FONTELES - Antes de ouvir o próximo aparte, quero deixar bem claro que qualquer lacuna legislativa que este Poder deixe... Ele é representante do povo. Quando o povo quer, pressiona. Não cabe ao Poder Judiciário legislar. Sabem por quê? Algum poder tem mais acúmulo de processos não julgados do que o Judiciário? Talvez valesse a pena pegarmos cópias dos processos que estão encalhados há 10, 20 anos, colocá-las sobre a mesa do Presidente Inocêncio Oliveira e dizer: Hoje nós vamos deliberar sobre esses processos todos, porque a negligência, a lerdeza — para não dizer omissão completa — do dever do Poder Judiciário nos impõe julgar.

Ora, dois juristas escreveram artigo há poucos dias em que lembram causas de 1989, de interesse de Estados da Federação, sobre as quais o Supremo está sentado. Por que julgar aborto de anencéfalos, união homoafetiva, fidelidade partidária e aviso prévio? Porque agiram como Parlamentares, como se político fossem, à luz dos interesses, dos holofotes, para fazer média com a sociedade e desvalorizar esta Casa.

O que existe é preconceito dentro do Direito, em relação à mãe do Direito. A mãe do Direito é a política, conforme disseram Habermas e Jeremy Waldron, filósofos, renomados professores de Direito que debatem essa questão.

Eu estudei. Não estou citando Ives Gandra à toa, citando por citar. Eu li teses e mais teses de doutorado e continuo estudando. E percebi que, no nosso País, as escolas de Direito não o ensinam de maneira democrática. Dão somente a visão que interessa ao Judiciário como corporação e não a visão republicana, de interesse do povo e da democracia verdadeira. É preciso que vençamos isso.

Eu tenho uma filha formada em Direito. Quando cuidei dessas questões, ela me disse: Nunca ouvi falar sobre isso, papai. Nunca. Nem para citar, para lermos sobre o assunto.

E conversei com muitos. A nossa própria Casa tem dificuldades. A formação

dos nossos consultores e assessores é feita para beijar os pés do Supremo e dobrar o pescoço dos Parlamentares. É preciso, Sr. Presidente, Deputado Inocêncio Oliveira — e isto vale para os Presidentes Marco Maia e José Sarney —, reciclar as nossas consultorias, com as devidas exceções, para que estudemo Direito democrático, que nasce das decisões políticas e que tem que ser obedecido pelos Poderes da República.

Vejam um detalhe: o CNJ fomos nós que criamos — está aqui na Constituição. Através da Corregedoria, ele tem o direito de verificar e de fazer a correição, numa atuação ética, do comportamento dos juízes, dos Ministros do Supremo. Por que não faz? Porque os Ministros do Supremo, cometendo a fraude hermenêutica — essa é a palavra certa —, fraudando, por interpretação, a Constituição feita por nós, diz que o CNJ não pode investigar. Ora, se, por ordem hierárquica, não pudesse ser investigado, Fernando Collor não teria sido cassado, porque a maior autoridade do País é o Presidente da República. Nenhum de nós poderia ser investigado, porque somos a cúpula do Legislativo.

A cúpula do Judiciário quer escapar da Corregedoria? Ele está aí cheio de problemas! Até com relação a essas denúncias sobre Carlinhos Cachoeira há envolvimento. Conforme manda o art. 103-b, § 4º, não há exceção: todos os magistrados têm que se submeter à legislação. Mas a própria Ministra Eliana Calmon, nesta hora, quando a corporação domina, não se mete. Quem pode se meter? Nós que fizemos a Constituição, que emendamos a Constituição e que fazemos a lei é que temos de enquadrar o Judiciário no seu devido lugar, para que a democracia não sofra mais do que já está sofrendo no País.

Ouço o Deputado Severino Ninho.

O Sr. Severino Ninho - Deputado Nazareno Fonteles, quero parabenizar V.Exa. pelo pronunciamento. Aliás, li e recortei esse artigo para analisar os dispositivos que o Prof. Ives Gandra cita. Realmente, é de impressionar o que ele diz. É assunto muito relevante para esta Casa. Aprendemos, estudando Direito, que juiz não pode se negar a julgar, alegando lacuna na lei. Mas lacuna é uma coisa. Por exemplo: no que se refere a aborto, não há lacuna. O Código Penal é claro: só existem duas hipóteses. O Supremo traz uma terceira para o mundo do Direito. De modo que a PEC que V.Exa. apresenta é oportuna. O Prof. Ives Gandra diz até que já podemos sustar atos do Poder Judiciário que exorbitam a função regulamentar. Mas uma PEC que deixe isso mais claro é conveniente e oportuna. Parabéns, Excelência, pelo assunto e pelo pronunciamento.

O SR. NAZARENO FONTELES - Sr. Presidente, vejo que o meu tempo já se esgotou. Agradeço os apartes e concluo.

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Primeiro, quero agradecer a todos os membros da Comissão de Constituição e Justiça, principalmente aos Deputados das bancadas evangélica e católica, e dizer que não cabe a ninguém discriminar, como diz a Constituição, a iniciativa de quem quer que seja, por ter fé ou não ter fé. Eu tenho fé — estou com o Evangelho em mão — e não tenho preconceito contra quem não tem fé. É assim que se constrói uma democracia. E talvez o maior democrata que eu conheça seja Jesus Cristo, que disse que deveríamos ser todos irmãos; que ninguém deveria ser maior do que o outro. Mas o Supremo quer ser maior do que os outros Poderes, quer estar acima da lei, da crítica e da ética.

Que esta Casa tome providências. Vou apresentar requerimento — já está pronto — de anulação da decisão do Supremo. E que a Mesa do Congresso Nacional o faça, como diz o art. 49, inciso XI.

Muito obrigado.

Obs.: Este pronunciamento foi feito durante o Grande Expediente da sessão ordinária da Câmara Federal no dia 02/05/2012.

REQUERIMENTO

(Do Sr. Nazareno Fonteles)

Requer a declaração de nulidade da decisão do Supremo Tribunal Federal proferida na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54/DF, que autorizou o aborto de fetos anencefálicos, por ato conjunto das Mesas do Congresso Nacional, nos termos do art. 49, XI, combinado com o art. 103, § 2º, da Constituição Federal.

Senhor Presidente do Congresso Nacional:

Requeiro a V. Exa. seja declarada nula, mediante ato conjunto das Mesas do Congresso Nacional, a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF nº 54/DF, que autorizou o aborto de fetos anencefálicos, visando à preservação da competência normativa do Poder Legislativo, nos termos do art. 49, XI, combinado com o art. 103, § 2º, da Constituição Federal de 1988.

JUSTIFICAÇÃO

Têm sido cada vez mais frequentes as decisões do Supremo Tribunal Federal sobre matérias que são claramente objeto de decisão do Poder Legislativo.

Também tem sido usual se qualificar como omissão inconstitucional do

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Congresso Nacional quando os legisladores, legitimamente, optam por manter inalterado o ordenamento jurídico vigente.

Evidentemente, há omissões no Poder Legislativo, mas nem por isso outro Poder poderá suprir tal omissão, alegando, em face de provocação, a inevitável prestação jurisdicional.

Na verdade, com base no ônus de ter que decidir e ocultos por uma linguagem técnica e hermética, promovem-se, dia após dia, claras violações ao princípio da separação de Poderes, e criam-se normas jurídicas de caráter geral e abstrato, aplicáveis a todo o povo brasileiro.

A Constituição Federal, sabiamente, deu solução para as verdadeiras omissões inconstitucionais. Basta recorrer ao art. 103, § 2º, que diz: “Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva a norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias”.

Observe-se que sequer o prazo para a adoção de providências foi previsto no caso de omissão do Poder Legislativo. É difícil de crer, mas o Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição, vem desrespeitando reiteradamente essa regra constitucional.

Parece-nos que o entendimento que vigora na Suprema Corte brasileira é que se o Poder Legislativo não legisla, deverá legislar o Judiciário. Com que legitimidade os onze de Brasília poderão tomar decisões que têm natureza de escolhas políticas, sob o argumento de que somente atuam porque o Congresso Nacional insiste em quedar-se inerte?

Bem, constatada verdadeira omissão, devemos nós, membros do Poder Legislativo, produzirmos a legislação, e atender ao mandamento constitucional e o apelo do Supremo Tribunal Federal, em conformidade com o preceito acima citado (CF/88; art. 103, § 2º).

A situação mais complexa, no entanto, não é a omissão. Referimo-nos, especialmente, aos casos em que o legislador fez suas escolhas e é ignorado. Nesses casos, era de se esperar mais cautela e parcimônia da Suprema Corte brasileira.

Nos casos da fidelidade partidária, da posse de candidatos derrotados em eleições, da união homoafetiva, e da recente autorização para realização

de aborto em fetos anencefálicos, o legislador já tinha feito suas escolhas, que foram desconsideradas pelos ministros do STF, resolvendo, eles mesmos, fazê-las.

Cabe, aqui, ressalvar a manifestação do ministro Ricardo Lewandowski, no julgamento da APDF nº 54, que em seu voto, afirmou: “Não é dado aos integrantes do Poder Judiciário, que carecem de unção legitimadora do voto popular, promover inovações no ordenamento normativo como se parlamentares eleitos fossem”. Fez, ainda, citação do constitucionalista Luís Roberto Barroso: “Deveras, foi ao Poder Legislativo, que tem o batismo da representação popular e não o Judiciário, que a Constituição conferiu a função de criar o direito positivo e reger as relações sociais”.

Ademais, no âmbito internacional, parece ser esse o entendimento que tem prevalecido nas democracias. O jurista Ives Gandra Martins, cuja trajetória dispensa maiores considerações, em recente artigo publicado, dá notícia de decisão do Conselho Constitucional francês, em 27 de janeiro de 2011. Sobre a matéria da união homoafetiva, foi decidido: “não cabe ao Conselho Constitucional de substituir sua apreciação àquela do legislador”.

Também nos lembra Ives Gandra Martins de outro dispositivo constitucional que parece esquecido, mas que não lá está por acaso, e que nos parece, chegou o momento de ser aplicado com a necessária eficácia. Referimo-nos ao art. 49, que trata das competências exclusivas do Congresso Nacional, inciso XI, que diz: “zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes”.

Segundo Ives Gandra, no mesmo texto: “se o Congresso Nacional tivesse coragem, poderia anular tal decisão, baseado no artigo 49, inciso XI, da Constituição Federal, que lhe permite sustar qualquer invasão de seus poderes por outro Poder, contando, inclusive com a garantia das Forças Armadas (artigo 142, caput) para garantir-se nas funções usurpadas, se solicitar esse auxílio”.

Em alguns momentos da vida é preciso ter coragem. O Poder Legislativo deve se mostrar corajoso e deve se respeitar, e só assim será respeitado pela população brasileira e pelos demais Poderes da República. É nesse momento crucial que o Poder Legislativo não pode, como em outras oportunidades, quedar-se inerte e se omitir de seu dever constitucional.

Ante o exposto, requeiro que a Mesa Diretora do Congresso Nacional, movida pela preservação da competência do Poder Legislativo, em observância

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ao art. 49, XI, combinado com o art. 103, § 2º, da Constituição Federal, declare nula a decisão do STF que autorizou a realização de aborto de fetos anencefálicos.

Sala das Sessões, em de de 2012.

Deputado NAZARENO FONTELES

PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO Nº 03, DE 2011

(Do Sr. Nazareno Fonteles e outros)

Dá nova redação ao inciso V do art. 49 da Constituição Federal.

As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do art. 60 da Constituição Federal, promulgam a seguinte emenda ao texto constitucional:

Art. 1º O inciso V do art. 49 da Constituição Federal passa a vigorarcom a seguinte redação:

“Art.49.................................................................................................................................V – sustar os atos normativos dos outros poderes que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa;....................................................................

Art. 2º Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

Atualmente, a Constituição Federal prevê expressamente no seu artigo 49, caput, e inciso V, a competência do Poder Legislativo de sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do Poder Regulamentar ou dos limites de delegação legislativa.

Além disso, o art. 49, caput, e seu inciso XI da Lei Maior atribui ao

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Congresso Nacional competência exclusiva para “zelar pela preservação de sua competência legislativa em face de atribuição normativa dos outros poderes”. Tal competência tem natureza de verdadeiro controle político de constitucionalidade diante tanto do Poder Executivo quanto do Poder Judiciário.

Como, na prática, o Poder Legislativo (Congresso Nacional) poderá cumprir de forma plena o mandamento constitucional descrito no inciso XI, do art. 49, em relação ao Poder Judiciário? No nosso entendimento, há uma lacuna no inciso V, do art. 49, levando a uma desigualdade nas relações do Poder Legislativo com os outros Poderes, isto é: atualmente, o Poder Legislativo pode sustar atos do Poder Executivo, mas não pode fazer o mesmo em relação aos atos do Poder Judiciário. Esta Emenda visa, pois, preencher essa lacuna e corrigir essa desigualdade, contribuindo assim para o equilíbrio entre os três Poderes.

Como podemos observar, a redação que estamos apresentando para o inciso V, do art. 49, é congruente e coerente com a redação já existente no inciso XI, do referido artigo. Ou seja, a substituição da expressão “do Poder Executivo” por “dos outros poderes”.

Assim, nada mais razoável que o Congresso Nacional passe também a poder sustar atos normativos viciados emanados do Poder Judiciário, como já o faz em relação ao Poder Executivo. Com isso estaremos garantindo de modo mais completo a independência e harmonia dos Poderes, conforme previsto no art. 2º da CF.

A inscrição, nas constituições, de regras claras sobre o funcionamento harmônico e independente dos poderes fortalece o regime democrático, evitando que ocorram, com frequencia, conflitos de competência entre os mesmos e o conseqüente desgaste de suas imagens perante a opinião pública.

Por estas razões, contamos com a colaboração de nossos pares para aprovar a presente Proposta de Emenda à Constituição.

Sala das Sessões, em 10 de fevereiro de 2011.

COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA E DE CIDADANIA

PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO No 3, DE 2011

Dá nova redação ao inciso V do art. 49 da Constituição Federal.

Autor: Deputado NAZARENO FONTELES e outros

Relator: Deputado NELSON MARCHEZAN

JUNIOR

I - RELATÓRIO

Trata-se de Proposta de Emenda à Constituição (PEC), de autoria do ilustre Deputado Nazareno Fonteles, que tem como objetivo a alteração do inciso V do art. 49 da Constituição Federal, que dispõe sobre as competências exclusivas do Congresso Nacional.

A redação atual do dispositivo que se pretende alterar confere ao Congresso Nacional a competência exclusiva para sustar atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites da delegação legislativa.

A PEC substitui a expressão “Poder Executivo” por “outros Poderes”, criando a possibilidade de o Congresso Nacional sustar atos normativos emanados tanto do Poder Executivo quanto do Poder Judiciário.

Sustentam os autores, na justificação da proposição, que “há uma lacuna no inciso V do art. 49, levando a uma desigualdade nas relações do Poder Legislativo com os outros Poderes, isto é: atualmente, o Poder Legislativo pode sustar atos do Poder Executivo, mas não pode fazer o

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mesmo em relação aos atos do Poder Judiciário. (...) Esta Emenda visa, pois, preencher essa lacuna e corrigir essa desigualdade, contribuindo assim para o equilíbrio entre os três Poderes”.

É o relatório.

II - VOTO DO RELATOR

Consoante o disposto no art. 32, inciso IV, alínea „b‟, do Regimento Interno da Câmara dos Deputados (RICD), compete à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) realizar o exame de admissibilidade da Proposta de Emenda à Constituição n.º 3, de 2011.

A admissibilidade de uma PEC tem como pressuposto a conformidade da proposição em relação às limitações circunstanciais e materiais impostas ao poder constituinte reformador. Tais limitações estão consignadas no artigo 60 da Constituição Federal.

Na dicção do referido dispositivo, a Carta da República poderá ser emendada mediante proposta de 1/3 (um terço), no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal (inciso I), não podendo, porém, ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio (§ 1º).

A matéria tratada na proposição sub examine também não pode ter sido objeto de nenhuma outra PEC rejeitada ou tida por prejudicada na mesma sessão legislativa (art. 60, § 5º, CF/88).

Quanto a esses aspectos formais não há óbices à admissibilidade da PEC nº 3, de 2011.

Conforme o art. 60, § 4º do texto constitucional, não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir a forma federativa de Estado (inciso I); o voto direto, secreto, universal e periódico (inciso II); a separação dos Poderes (inciso III); e os direitos e garantias individuais (inciso IV).

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No que concerne à análise material da proposição em apreço, isto é, a sua sujeição às ditas cláusulas pétreas constitucionais, verifica-se que a reforma ora alvitrada não ofende o conteúdo de qualquer dos incisos supramencionados.

Por outro lado, a análise do mérito da PEC em análise extrapola o exame de admissibilidade incumbido a esta Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, devendo ficar reservada à Comissão Especial a ser constituída, nos termos regimentais, com esse fim específico (RICD, art. 202, §2º).

Tal fronteira, no entanto, nem sempre é tão precisa, sendo razoável, em alguns casos, que considerações meritórias permeiem o referido exame de admissibilidade.

Neste sentido, certa controvérsia sobre o conteúdo da Proposta poderia ser suscitada quando confrontada com o art. 60, § 4º, inciso III, CF/88 (separação dos Poderes), em face de suposta interferência do Poder Legislativo nas atividades do Poder Judiciário.

Entretanto, uma rápida análise no dispositivo proposto revela que o objeto da PEC (poder normativo) não se relaciona com a atividade típica do Poder Judiciário (atividade jurisdicional). Se, porventura, esta PEC submetesse uma decisão de natureza estritamente jurisdicional (a exemplo de Sentenças, Acórdãos ou Decisões Judiciais Interlocutórias) ao crivo e controle do Poder Legislativo, estar-se-ia diante de clara violação ao princípio constitucional da Separação dos Poderes. Todavia, não é disso que trata a PEC nº 3/2011, a qual versa, exclusivamente, sobre os atos normativos (atividade atípica e, portanto, de natureza não-jurisdicional) dos outros poderes, especialmente aqueles emanados pelos órgãos do Poder Judiciário, que possam ter extrapolado os limites da legalidade.

Como exemplo, imperioso destacar o poder normativo de que dispõe a Justiça Eleitoral, a ela concedido mediante dispositivo do Código Eleitoral e da Lei das Eleições1. À Justiça Eleitoral cabe fazer uso de seu poder normativo, delegado pelo Poder Legislativo, com o fim estrito de administração 1 Código Eleitoral – Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965 – Art. 23. Compete, ainda, privativamente, ao Tribunal Superior: (...) IX – expedir as instruções que julgar convenientes à execução deste Código. Lei das Eleições – Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997 - Art. 105. Até o dia 5 de março do ano da eleição, o Tribunal Superior Eleitoral, atendendo ao caráter regulamentar e sem restringir direitos ou estabelecer sanções distintas das previstas nesta lei, poderá expedir todas as instruções necessárias para sua fiel execução, ouvidos, previamente, em audiência pública, os delegados ou representantes dos partidos políticos.

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das eleições, respeitando o princípio da legalidade (art. 5º, inc. II, CF/88), atributo indelével do Estado Democrático de Direito.

É evidente que, no âmbito das resoluções da Justiça Eleitoral, qualquer inovação do ordenamento jurídico será ilegítima. Mas, não raro são observadas extrapolações aos limites dessa delegação legislativa.

O remédio para tais excessos tem sido a submissão do instrumento normativo ao exame do próprio Poder Judiciário, no caso, o Supremo Tribunal Federal (STF), para verificação dos excessos observados no processo eleitoral. Em contrapartida, ao Poder delegante da atividade normativa (Poder Legislativo) não tem cabido qualquer manifestação acerca destes excessos.

No Estado Democrático de Direito, não se pode admitir a

expedição de atos (Resoluções, Decretos, Portarias, etc.) por órgão

administrativo com força de lei, “circunstância que faz com que tais atos sejam

ao mesmo tempo legislativos e executivos, isto é, como bem lembra Canotilho,

a um só tempo „leis e execução de leis‟”.2

A título exemplificativo, importante registrar o ato desviado

de competência e alçada do CNJ, o qual, por maioria, declarou revogado o § 2º

do artigo 65 da LOMAN (Lei Orgânica da Magistratura Nacional) pela Emenda

Constitucional nº 19 e estendeu, administrativamente, aos magistrados

federais, por isonomia aplicada às avessas, direitos e vantagens garantidas por

lei aos membros do Ministério Público Federal.

A prática tem se repetido em outros atos, o que reforça a

necessidade da Proposta de Emenda ora em análise. Em outra oportunidade, o

CNJ avalizou a decisão do Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de

Pernambuco que determinara o pagamento, aos magistrados do Estado, da

verba indenizatória relativa ao auxílio-moradia pago, por força de lei, aos 2 “Os limites constitucionais das resoluções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP)”. Co-Autores: Lenio Luiz Streck, Ingo Wolfgang Sarlet, Clèmerson Merlin Clève. Divulgado em: 30 jul 2011. Fonte: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/7694/os-limites-constitucionais-das-resolucoes-do-conselho-nacional-de-justica-cnj-e-conselho-nacional-do-ministerio-publico-cnmp>.

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Deputados Estaduais Pernambucanos, tudo com fundamento em lei revogada -

que vigorou entre 1992 e 1997 - a qual fixava isonomia de vencimentos (não

indenização) entre juízes e parlamentares do Estado.

De fato verifica-se que o órgão de controle externo criado

para observar a moralidade no Poder Judiciário parece estar atuando, não

somente como legislador, mas também como legitimador de atos imorais que

beneficiam os fiscalizados.

Apesar desse cenário real, convém deixar consignado que o legislador constituinte originário determinou a este Congresso Nacional que zele por sua própria competência legislativa. Confira-se o dispositivo constitucional:

“Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:

XI – Zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes”.

O artigo 49, inciso XI, da CF/88 deixa claro que a Proposta em exame não viola qualquer dispositivo do núcleo imodificável da Carta Magna. Ao contrário, em obediência ao legislador constituinte, este Parlamento deve buscar meios de zelar por sua própria competência legislativa.

Há quem defenda ser despiciendo explicitar na Constituição a possibilidade do Poder Legislativo sustar atos normativos que extrapolem a delegação legislativa, quando emanados pelo Poder Judiciário. No entanto, em tempos de hermenêutica desapegada dos textos legais, deve convir ao Congresso Nacional dotar-se de instrumento claro, inequívoco, explícito, literal, que não admita ambiguidade, para preservação de sua competência.

O melhor entendimento, portanto, é no sentido de que a PEC nº 3/2011 dará ao Congresso Nacional esse instrumento, qual seja, a possibilidade de sustação, mediante decreto legislativo, de atos normativos e decisões administrativas, emanados pelo Poder Executivo, Poder Judiciário, CNJ, CNMP, Ministério Público, Defensoria Pública ou Tribunal de Contas da

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União (TCU), desde que extrapolem os limites da delegação legislativa de que dispõem.

A presente PEC homenageia, outrossim, a convivência harmônica dos Poderes da República (art. 2º, CF/88), que se soma à independência. O mecanismo institucional proposto fortalecerá o equilíbrio entre os Poderes e poderá favorecer o chamado diálogo institucional.

É bom que se diga que esta PEC poderá conferir, sob certa ótica, legitimidade aos atos normativos do Poder Judiciário, tendo em vista que o Poder Legislativo não mais poderá queixar-se dos excessos, pois disporá de meios para corrigi-los. Assim, a eventual omissão deste Poder diante de excessos normativos acabará, de certo modo, por legitimá-los.

Ainda que se aponte a crise da representatividade política dos Parlamentos como uma das causas do ativismo judicial, não pode o próprio Congresso Nacional abdicar do zelo por sua competência legislativa.

Embora não seja o escopo da PEC em exame, não podemos nos furtar a observar que o Poder Judiciário – mormente no exercício do controle de constitucionalidade -, tem deixado de lado o tradicional papel de legislador negativo para atuar como vigoroso legislador positivo. Tal fato atenta contra a democracia e as legítimas escolhas feitas pelo legislador.

Não deve o Poder Legislativo consentir com a tese de que a Suprema Corte representa um “arquiteto constitucional” com poderes de, por meio de suas decisões ativistas, “redesenhar” outras instituições e a própria Constituição.

Não obstante tais constatações fáticas, a presente PEC, como já frisado, tem como alvo direto o eventual abuso do poder normativo delegado a outros Poderes. Por essa razão, não cabe, nesta análise, tecer considerações adicionais a respeito de soluções para outras facetas do ativismo judicial.

Ante todo o exposto, louvando os autores da Proposta, especialmente seu primeiro signatário, manifesto voto no sentido da admissibilidade da Proposta de Emenda à Constituição nº 3, de 2011.

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Sala da Comissão, em de de 2011.

Deputado NELSON MARCHEZAN JUNIOR Relator

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Deputado NAZARENO FONTELES

PROJETO DE RESOLUÇÃO Nº 21, DE 2011

(Da Sr. NAZARENO FONTELES)

Acrescente-se o inciso XXI ao art. 32 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, para criar a Comissão de Controle Legislativo dos atos normativos dos Poderes Executivo e Judiciário.

A Câmara dos Deputados resolve:

Art. 1o O art. 32 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados passa a vigorar acrescido do seguinte inciso XXI:

“Art. 32................................................................................

..........................................................................................

................

XXI – Comissão de Controle Legislativo dos atos normativos dos Poderes Executivo e Judiciário:

a) atuação precípua no cumprimento do mandamento constitucional expresso no art. 49, incisos V e XI, da Constituição Federal;

b) matérias relativas ao Controle Legislativo dos atos normativos dos outros Poderes;

c) assuntos relacionados ao controle constitucional exercido pelo Poder Judiciário e Funções

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Essenciais à Justiça;

d) emitir pareceres sobre os atos normativos dos outros Poderes quanto à competência legislativa;

e) propor projeto de decreto legislativo para sustar atos normativos dos outros Poderes, quando estes exorbitarem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa;

f) propor proposições que aperfeiçoem o Controle Legislativo;

g) realizar estudos, seminários e audiências públicas sobre o papel do Poder Legislativo no fortalecimento do Estado Democrático de Direito.

........................................................................(NR)”

Art. 2º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

O Projeto de Resolução que levamos à consideração de nossos nobres Pares pretende criar uma nova Comissão Permanente no âmbito da Câmara dos Deputados: a Comissão de Controle Legislativo dos atos normativos dos Poderes Executivo e Judiciário.

O art. 49, inciso XI, da Constituição Federal determina que compete ao Congresso Nacional “zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes”.

Resta evidente, portanto, que o Constituinte foi expresso ao determinar que o Legislativo não pode permitir que os demais Poderes Estatais (Executivo e Judiciário) legislem em seu lugar, sob pena de violação do princípio constitucional e cláusula pétrea da Separação dos Poderes, que devem ser independentes e harmônicos entre si (art. 2º da CF).

Contudo, temos visto nos últimos anos o agigantamento sem precedentes do Judiciário nas questões políticas do País, o desrespeito à independência dos

Poderes por meio de decisões judiciais que legislam sobre temas relevantes para nossa sociedade ao atropelo de proposições legislativas em discussão e votação no Poder Legislativo.

A judicialização de questões da competência dos titulares da soberania popular degrada o princípio democrático e atende aos anseios de grupos que não estão interessados no respeito às decisões da maioria.

Na lição de Montesquieu, só o poder pode restringir o poder. Não havendo como um poder se autolimitar, há que se instituir o controle para contenção de abusos. A criação da Comissão de Controle Legislativo dos atos dos demais Poderes virá para restabelecer o equilíbrio e o respeito aos mandamentos constitucionais do Estado Democrático de Direito.

Pela relevância da iniciativa, voltada ao aprimoramento das Instituições nacionais e observância da Constituição Federal, contamos com os nobres Pares para o aperfeiçoamento e a aprovação do Projeto de Resolução ora apresentado.

Sala das Sessões, em 22 de fevereiro de 2011.

Deputado NAZARENO FONTELES

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QUESTÃO DE ORDEM 

(Do Dep. Nazareno Fonteles)           Senhor Presidente,                 Peço a palavra para levantar uma questão de ordem com fundamento no artigo 49, inciso XI, da Constituição Federal, e artigos 15, inciso VIII e 17, inciso VI, alínea “g”, do Regimento Interno da Câmara dos Deputados.         Senhor Presidente, observamos há algum tempo uma crescente ingerência do Poder Judiciário sobre matérias de competência legislativa do Congresso Nacional. Esse fenômeno tem sido objeto de preocupação de vários setores da sociedade, inclusive dos meios acadêmicos.         No entanto, creio que esta Casa não pode apenas expressar preocupação enquanto aceita passivamente esse avanço indevido sobre suas atribuições. Isso atenta contra a própria democracia, que depende fundamentalmente de um Poder Legislativo independente e atuante, pois são seus membros quem detêm mandato conferido pelo povo para expressar seus anseios, valores e propósitos por meio das leis propostas e aqui provadas.         Os Constituintes de 1988 tiveram a lucidez de prover nossa Constituição de instrumentos capazes de promover a independência e equilíbrio dos Poderes e, em especial, a preservação das competências do Legislativo.         Entre esses instrumentos está o disposto no inciso XI, do art. 49, da Carta que diz ser competência exclusiva do Congresso Nacional

“zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes”.          Senhor Presidente, o Regimento Interno da Câmara dos Deputados, diz em seu artigo 15, inciso VII, que compete à Mesa Diretora  

“adotar medidas adequadas para promover e valorizar o Poder Legislativo e resguardar o seu conceito perante a Nação”.

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         E no artigo 17, inciso VI, alínea “g”, está estabelecido que cabe a Vossa Excelência, como Presidente da Casa,  

“zelar pelo prestígio e decoro da Câmara, bem como pela dignidade e respeito às prerrogativas constitucionais de seus membros, em todo o território nacional”.

  Mas como V. Excelência pode perceber o regimento não deixou claro o procedimento operacional que esta Casa de Leis fará quando o citado mandamento constitucional for violado pelo Poder Judiciário.         A Constituição e o Regimento se tornarão letra morta se ficarmos apenas nos discursos e nas intenções, mas sem agir concretamente. É preciso dar a esses dispositivos  total e plena eficácia, como já ocorre de forma evidente com o artigo 24, XII do Reg. Interno em relação ao Art. 49, V da CF que manda este Poder sustar os atos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa, elaborando o respectivo decreto legislativo.         Assim, Senhor Presidente, indago a Vossa Excelência que instrumentos efetivos e meios legais dispõe esta Casa e quais os procedimentos que a Mesa deve adotar para que a competência legislativa desta Casa não seja constrangida, invadida ou usurpada pelo ativismo judicial do Poder Judiciário, violando a cláusula pétrea da separação dos poderes expressa no Art. 2º e de modo específico no Art. 49, inciso XI da nossa Carta Magna que preceitua o direito/dever exclusivo do Poder Legislativo de zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes           É a questão de ordem que formulo.                    Sala das Sessões, em              de fevereiro de 2011.                                                Deputado Nazareno Fonteles

PEC - 143/2012

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PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO No 143, DE 2012

(Do Sr. Nazareno Fonteles e outros)

Altera dispositivos da Constituição Federal, dispondo sobre a forma de escolha e a fixação de mandato de sete anos para Ministros do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais de Contas da União e dos Estados.

As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do § 3º do art. 60 da Constituição Federal, promulgam a seguinte emenda ao texto constitucional:

Art. 1º O art. 101 da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 101. O Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de trinta e cinco anos e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada.

§ 1º Os Ministros do Supremo Tribunal Federal serão escolhidos, de forma alternada, pelo Presidente da República e pelo Congresso Nacional.

§ 2º Os Ministros, indicados pelo Presidente da República, serão nomeados depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal.

§ 3º A indicação dos Ministros escolhidos

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pelo Congresso Nacional será realizada, alternadamente, pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal.

§ 4º O mandato dos Ministros do Supremo Tribunal Federal será de sete anos, vedada a recondução e o exercício de novo mandato.

§ 5º É vedado ao Ministro do Supremo Tribunal Federal o exercício de mandato eletivo ou de cargos em comissão em qualquer dos Poderes e entes da Federação, até quatro anos após o término do mandato previsto no § 4º”.

Art. 2º O art. 73 da Constituição Federal passa a vigorar acrescido do seguinte § 5º:

“Art. 73. ... .................................................................................................................................................§ 5º O mandato de Ministros do Tribunal

de Contas da União será de sete anos, vedada a recondução e o exercício de novo mandato.

Art. 3º O parágrafo único do art. 75 da Constituição

Federal passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 75. ..................................................................... Parágrafo único. As Constituições estaduais

disporão sobre os Tribunais de Contas respectivos, que serão integrados por sete conselheiros, com mandato de sete anos, vedada a recondução e o exercício de novo mandato.

Art. 4º As normas relativas à duração do mandato de Ministros do

Supremo Tribunal Federal e do Tribunal de Contas da União não se aplicam aos Ministros que tomarem posse antes da publicação desta Emenda Constitucional.

Art. 5º Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

Em que pese a sua longa tradição, parece-nos superado o modelo constitucional atual que prevê a forma de escolha de Ministros do Supremo Tribunal Federal e a vitaliciedade de seus mandatos.

De inspiração norte-americana, a forma de investidura adotada no Brasil (livre escolha pelo Presidente da República e aprovação pelo Senado Federal) foi coerente com a importação do modelo de controle difuso de constitucionalidade de leis. No entanto, gradualmente, o Brasil passou a incorporar o modelo concentrado de controle de constitucionalidade, adotado na Europa continental, que permite a apreciação da constitucionalidade de leis em caráter abstrato, com efeitos gerais.

Apesar dessa aproximação com o modelo europeu continental de controle de constitucionalidade, não se observou qualquer aproximação semelhante quanto às típicas formas de investidura e duração de mandatos.

A título de exemplo, na Alemanha, o Tribunal Constitucional Federal é composto por dezesseis membros, com mandatos de doze anos, vedada a recondução. Em Portugal, o Tribunal Constitucional é composto por treze juízes, com mandato de nove anos, também sem renovação. Na Espanha, o Tribunal Constitucional compõe-se de doze membros, com mandato de nove anos.

Na América Latina também há bons exemplos de Tribunais Constitucionais com mandatos fixos. No Chile, a Corte é composta por sete juízes, com mandato de oito anos. Na Colômbia, a Corte Constitucional é composta de nove juízes, com mandato de oito anos, sem recondução.

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Da mesma forma, em várias nações democráticas, observa-se participação mais efetiva do Parlamento no processo de escolha dos integrantes das Cortes Constitucionais. Trata-se de salutar prática democrática a qual também defendemos na presente proposição.

Convém deixar claro que as medidas ora propostas não causam qualquer prejuízo ao papel contramajoritário que a Suprema Corte, muitas vezes, é obrigada a adotar em suas decisões, sobretudo na proteção das minorias.

Por outro lado, sob a ótica da separação dos Poderes, é inegável que as Cortes Constitucionais exercem considerável ascendência sobre os demais Poderes do Estado, sobretudo quando decidem sobre a aplicação ou não de leis elaboradas democraticamente por representantes eleitos pelo povo. Some a esse fato a possibilidade de ativismo judicial, caracterizado por uma conduta consistente na substituição do papel do legislador.

É manifesto, também, o papel político, e não apenas jurisdicional, das Supremas Cortes. É nesse ambiente que surgem os debates a respeito da orientação político-ideológica de determinados Ministros.

Nesse contexto, afigura-nos desarrazoado que um Ministro possa permanecer na Corte Suprema por longos trinta e cinco anos. É, sem dúvida, demasiado tempo.

Ainda no tocante à questão da vitaliciedade, muitos a defendem como requisito indispensável à independência dos magistrados. Entendemos a questão da independência como um requisito de caráter absoluto, que deve integrar a própria conduta do magistrado, independentemente da garantia de vitaliciedade. A contrario sensu, caberia indagar: não seriam independentes os juízes constitucionais de nações democráticas da Europa continental que não adotam o modelo vitalício?

Não podemos deixar de mencionar, ainda, que a defesa da fixação de mandatos dos Ministros do Supremo Tribunal Federal também é feita por organizações da sociedade civil, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), e até de membros da própria Corte, como a Ministra Carmem Lúcia, e a recém-nomeada Ministra Rosa Weber.

Renomados Juristas, tais como Dalmo Dallari, Paulo Bonavides, José Afonso da Silva, Fábio Konder Comparato, Cezar Britto e Gustavo Binenbojm, também têm a mesma opinião.

Parece-nos, pois, consolidada e madura a corrente que pugna por uma reestruturação do Supremo Tribunal Federal, tanto no modo de investidura quanto na permanência de seus membros. A presente proposta de emenda à Constituição é um veículo apto a promover tal mudança.

No tocante às Cortes de Contas, temos como dado da realidade o indesejável e frequente caráter político de suas decisões. Há, no âmbito de suas competências, razoável espaço para o cotejamento de questões políticas.

Entendemos também como uma mudança positiva e salutar a adoção da fixação de mandatos de membros das Cortes de Contas, tanto na esfera federal, quanto nos Estados.

Certos de estarmos contribuindo para o aperfeiçoamento institucional de nosso País, contamos com o apoio dos nobres Pares para a aprovação das medidas ora propostas.

Sala das Sessões, em 08 de março de 2012.

Deputado NAZARENO FONTELES

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Alguns meios de comunicação no Piauí divulgaram que o deputado Nazare-no Fonteles (PT-PI) defendeu na tribuna o impeachment do ministro Joaquim Barbosa, implacável relator da Ação Penal 470, mais conhecida como mensalão petista.

Ao que de fato aconteceu no plenário, no fim da tarde do dia 13 de novem-bro de 2012.

Como Líder, pelo PSDB, falou o deputado Antonio Carlos Mendes Thame (SP). Elogiou o Supremo Tribunal Federal (STF) pela condenação e definição das penas dos "réus políticos do mensalão", uma demonstração "positiva no combate à impunidade no País". Segundo o tucano, o Brasil inicia "uma nova era, de uma nova fase da história da democracia".

Mendes Thame cobrou, então, do Governo Federal que recupere o "dinheiro do povo" que teria sido utilizado para "pagar" apoio parlamentar ao iniciante governo Lula, entre 2003 e 2005. E exagerou: "O total desse dinheiro é desco-nhecido, mas se contam aos bilhões".

Para o STF, o valor está entre R$ 50 milhões e R$ 156 milhões, justamente porque a denúncia do Ministério Público Federal admite que há recursos de origem desconhecida, o que não quer dizer que tenham sido desviados, e mes-mo que o valor máximo estimado para abastecer o mensalão seja real.

O PT insiste que os empréstimos contraídos junto aos Bancos Rural e BMG, atualmente em mais de R$ 12 milhões, não são fictícios e está abatendo a dívida de forma parcelada.

Ainda não foi encerrado o julgamento, que está na fase da dosimetria das penas impostas a 25 réus (os mais importantes, para a oposição, são José Dirceu e José Genoíno), mas o deputado Mendes Thame reclamou da demora para o cumprimento, que "só beneficia os corruptos e fortalece o dito popular, com o qual queremos acabar, enterrar, de que o crime compensa no Brasil".

Sobe à tribuna o petista Nazareno Fonteles (PI), para rebater o adversário tucano:

“Eu tenho primado na vida pública pela ética na política. Tenho defen-dido nesta Casa o resgate da autonomia deste Poder perante os outros, e sobretudo perante o Judiciário, que vive desrespeitando esta Casa com as fraudes hermenêuticas de interpretação da Constituição e das leis.

Nazareno não se ajoelha ao STF e a BarbosaPor: Mauro Sampaio (Acesse Piauí)

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E agora, por ocasião desse circo montado lá, porque é essa a verdade. Porque se tivesse compromisso com a justiça, de verdade, o mensalão dos tucanos teria sido analisado antes — o “engavetador-geral” (Procurador--Geral da República, Roberto Gurgel, ou o ex, Antonio Fernando, não ci-tou qual Nazareno Fonteles) não teria passado três anos em cima de uma denúncia que a Polícia Federal mostrou a correlação.

Por isso queremos, de fato, um tribunal isento, ministros fazendo à luz dos autos e das leis que esta Casa fez a verdadeira justiça.”

STF superpoderoso - Desde o ano passado, Nazareno Fonteles está em conflito com o Supremo Tribunal Federal.

Não por causa do julgamento do mensalão. O princípio são decisões toma-das pela Corte que teriam tomado a competência do Legislativo, como a decla-ração de constitucionalidade do aborto de feto anencéfalo e da união civil entre pessoas do mesmo sexo.

A bancada evangélica chegou a entregar ao Presidente do Senado Federal, José Sarney (PMDB-AP), o pedido de impeachment do ministro Marco Auré-lio, que havia dado declarações à imprensa simpáticas à interrupção da gravidez constatada a anecefalia.

A interpretação seria a de que houve uma antecipação ilegal de voto. Sarney recebeu e "arquivou".

O piauiense apresentou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 3/11, que confere ao Poder Legislativo a competência de sustar os atos normativos do Poder Executivo e do Judiciário que exorbitem do Poder Regulamentar ou dos limites de delegação legislativa". A Constituição só se refere ao Executivo.

Mais à frente, apresentou a PEC nº 33/11, outra tentativa de brecar o "ativis-mo político" do STF em suas súmulas vinculantes:

Temos observado a todo momento são decisões ativistas, que represen-tam grave violação ao regime democrático e aos princípios constitucionais da soberania popular e da separação de poderes, os quais constam expres-samente da Constituição Federal.

Tal anomalia precisa ser corrigida por mecanismos que fomentem o diálogo institucional entre os Poderes. É, portanto, o que se propõe, sem buscar suprimir qualquer parcela, ínfima que seja, da competência dos Poderes da República. Desse modo, estamos, em síntese, propondo uma revisão da sistemática de aprovação de súmulas vinculantes e do modelo de controle de constitucionalidade de Emendas à Constituição Federal.

Em ambos os mecanismos o Poder Legislativo assumirá, como deve ser, um papel relevante. A presente Proposta de Emenda à Constituição pre-tende, insistimos, fomentar o diálogo institucional mediante a valorização do papel do Poder Legislativo, muito caro à democracia, e que traz consigo a insubstituível legitimidade da escolha popular.

Já em 2012, antes de iniciado o julgamento do mensalão petista, Nazareno voltou ao ataque com a PEC nº 143/12, que fixa em sete anos o mandato dos ministros do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais de Contas da União e dos Estados. Explica:

Em que pese a sua longa tradição, parece-nos superado o modelo cons-titucional atual que prevê a forma de escolha de Ministros do Supremo Tribunal Federal e a vitaliciedade de seus mandatos.

A título de exemplo, na Alemanha, o Tribunal Constitucional Federal é composto por 16 membros, com mandatos de 12 anos, vedada a recondu-ção. Em Portugal, o Tribunal Constitucional é composto por 13 juízes, com mandato de nove anos, também sem renovação. Na Espanha, o Tribunal Constitucional compõe-se de 12 membros, com mandato de nove anos.

Na América Latina também há bons exemplos de Tribunais Constitu-cionais com mandatos fixos. No Chile, a Corte é composta por sete juízes, com mandato de oito anos. Na Colômbia, a Corte Constitucional é compos-ta de nove juízes, com mandato de oito anos, sem recondução.

É manifesto, também, o papel político, e não apenas jurisdicional, das Supremas Cortes. É nesse ambiente que surgem os debates a respeito da orientação político-ideológica de determinados ministros. Nesse contexto, afigura-nos desarrazoado que um ministro possa permanecer na Corte Su-prema por longos 35 anos. É, sem dúvida, demasiado tempo.

Legislativo cego - Retornando ao discurso em que Nazareno Fonteles teria pedido o impeachment do ministro Joaquim Barbosa, que assumirá a Presidên-cia do STF bo dia 22 de novembro.

O deputado está insatisfeito com a condenação dos seus companheiros de partido, não seria diferente. Também não seria de outra forma que um petista faria a leitura do julgamento do mensalão, "doa a quem doer". Ele continuou a contestar o tucano Mendes Thame:

Quando se age ideológica e politicamente, magistrado da Corte Supre-ma, é preciso que esta Casa abra o olho porque a democracia está ameaça-da e não fortalecida; porque quando o poder, que tem que aplicar as leis, respeitar a soberania do povo, viola as leis, julga sem prova, condena sem

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provas, ele desmoraliza a própria instituição.

O Senado da República precisa acordar porque muitos que hoje estão com a vestal de justiça suprema mereciam ser “impeachmados” no Senado por estar violando a postura de magistrados independentes, por estar de-sonrando colegas à luz dos holofotes, por estar mostrando incompetência na aplicação das leis e por estar sendo ovacionado por aqueles que fazem conluio com esta corrupção grande que está escondida há anos e que eles se calaram e não fizeram valer a justiça.

Por isso muitos que estão nos ouvindo pensam que o que tinha aí é algo para valer de renovação no Judiciário. Muito pelo contrário: é algo de reacionário, parcial e injusto. Esta Casa precisa abrir o olho, como repre-sentante do povo que é, porque democracia sem voto eu não conheço, só ditadura.

E nós já passamos essa página da nossa história. Não podemos tolerar ditadura de juízes. Os juízes têm que respeitar as leis e a Nação, e não pensar que são deuses e aplicar, de maneira autoritária, as leis nos seus julgamentos e condenações.

O bolso da magistratura - No dia 13/11/12, o presidente do STF, Carlos Ayres Britto, e seu sucessor, Joaquim Barbosa, reuniram-se com líderes par-tidários para pedir que o Congresso Nacional reajuste os salários dos juízes federais.

"Queremos uma compreensão do Poder Legislativo para esse estado de coi-sas (o "temerário desprestígio" da categoria), para essa quadra remuneratória preocupante. Que os senhores nos ajudem no sentido de nossa reprofissiona-lização", apelou Ayres Britto ao relator-geral do Orçamento, senador Romero Jucá (PMDB-RR), e aos deputados Lincoln Portela (PR-MG) e Sarney Filho (PV-MA).

Está aí um assunto, talvez o único, em que o Congresso Nacional atualmente coloque o Judiciário de joelhos.

No mais, se um deputado usa legitimamente a tribuna para enfrentar minis-tros do STF, é logo antipatizado pela opinião pública, que está em lua de mel com Joaquim Barbosa. Nazareno se recusa a fazer uma genuflexão.

ANEXOS

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PROJETO DE LEI No , DE 2013 (Do Sr. Nazareno Fonteles)

Veda o emprego de pronomes de tratamento que exprimam hierarquia funcional ou social, privilégio ou distinção de autoridades públicas em documentos e cerimônias oficiais, audiências públicas, e quaisquer outros atos e manifestações do Poder Público.

O Congresso Nacional decreta:

Art. 1º Esta Lei veda o emprego de pronomes de tratamento que exprimam hierarquia funcional ou social, privilégio ou distinção de autoridades públicas em documentos e cerimônias oficiais, audiências públicas, e quaisquer outros atos e manifestações do Poder Público.

Art. 2º É vedado o emprego de pronomes de tratamento que exprimam hierarquia funcional ou social, distinção ou privilégio de ocupantes de cargos ou funções públicas, de qualquer dos Poderes da República, da União, dos Estados e Municípios, em documentos e cerimônias oficiais, audiências públicas, e quaisquer outros atos e manifestações do Poder Público.

Parágrafo único. A referência aos chefes e membros de Poder e a todas as demais autoridades ocupantes de cargos e funções públicas será feita mediante o emprego do vocativo “Senhor”, seguido do respectivo cargo.

I - PROJETO DE LEI SOBRE A VEDAÇÃO DO EMPREGO DE PRONOMES DE TRATAMENTO QUE EXPRIMAM

SUPERIORIDADE

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2

Art. 3º O tratamento dispensado por qualquer pessoa a autoridades públicas, civis ou militares, quando realizado nos termos do art. 2º, não ensejará advertência ou censura de qualquer natureza.

Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

Embora o Brasil seja, formalmente, uma República há bem mais de um século, é usual se observar condutas não republicanas. Uma dessas condutas diz respeito à forma de tratamento das autoridades públicas.

De tão impregnadas na cultura brasileira, as pessoas não mais percebem - principalmente as mais humildes - que essas formas de tratamento, embora sugiram apenas respeito e cortesia, constituem, na verdade, expedientes linguísticos que afirmam e consolidam a diferença entre as pessoas comuns do povo e os ocupantes dos mais altos postos.

Em uma República não há lugar para a diferença e para distinções. Mesmos os Chefes dos Poderes devem receber o mesmo tratamento dispensado a qualquer pessoa.

Com efeito, não há razões socialmente aceitáveis para que os Chefes de Poderes sejam “Excelentíssimos” ou que Ministros de Estado, Governadores, Embaixadores, Oficiais-Generais das Forças Armadas, Prefeitos, Deputados, Senadores, Ministros de Tribunais e Juízes sejam todos “Excelências”.

Não temos dúvida de que o tratamento que eleva alguém ao patamar de “excelência”, apenas em razão do cargo que ocupa, só tem a serventia de aprofundar o abismo social que separa o povo de sua elite.

Caberia, então, indagar: seria desrespeitoso o tratamento dispensado ao mandatário maior da Nação, chamando-o(a) de “Senhor ou Senhora Presidente”? Evidentemente, não. Da mesma forma, haveria desrespeito em se tratar Deputados, Senadores, Ministros e demais autoridades de “Senhor” ou “Sua Senhoria”? Novamente, não.

3

A presente proposição busca, em seu art. 2º, disciplinar o tratamento formal que deve ser dispensado às autoridades públicas, em documentos e cerimônias oficiais, e quaisquer outras manifestações do Poder Público.

O art. 3º, por seu turno, consigna que o tratamento dispensado por qualquer pessoa a personalidades públicas, desde que em termos razoáveis e respeitosos, não ensejará qualquer tipo de advertência ou censura.

Nesse contexto, com o objetivo de induzir a extinção desse resquício não republicano, aparentemente inofensivo, mas que consolida quotidianamente a diferença entre os brasileiros, é que apresentamos a presente proposição para a qual pedimos o apoio dos senhores e senhoras congressistas.

Sala das Sessões, em de de 2013.

Deputado NAZARENO FONTELES

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ADPF 54/DF

VOTO DO MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI

I – BREVE RELATÓRIO

Cuida-se de ação de descumprimento de preceito

fundamental ajuizada pela Confederação Nacional

dos Trabalhadores da Saúde – CNTS, com o fim de

lograr “interpretação conforme a Constituição da

disciplina legal dada ao aborto pela legislação

penal infraconstitucional, para explicitar que ela

não se aplica aos casos de antecipação terapêutica

do parto na hipótese de fetos portadores de

anencefalia, devidamente certificada por médico

habilitado.”

A CNTS sustenta, em suma, que a interpretação

dos arts. 124, 126 e 128, I e II, do Código Penal,

que leva à proibição da antecipação do parto, por

motivos terapêuticos, no caso de fetos

anencefálicos, viola os preceitos fundamentais

abrigados nos arts. 1º, IV (princípio dignidade da

pessoa humana), 5º, II (princípios da legalidade e

autonomia da vontade humana), 6º, caput, e 196

(direito à saúde), todos da Carta da República.

II - SOBRE O ABORTO DE ANENCÉFALOS

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Alega, ainda, que a anencefalia corresponde a

uma má-formação fetal, incompatível com a vida

extra-uterina, que caracterizaria uma gravidez de

risco, constituindo a antecipação do parto a única

indicação terapêutica “para o tratamento eficaz da

paciente (a gestante) já que para reverter a

inviabilidade do feto não há solução”.

O feito foi distribuído ao Ministro Marco

Aurélio, que deferiu o pedido de liminar requerido

pela autora, tendo o Plenário desta Suprema Corte

cassado a sua decisão monocrática, por considerá-

la satisfativa, em razão da irreversibilidade dos

procedimentos médico deles decorrentes.

O parecer do Procurador-Geral da República à

época, Claudio Fonteles, foi pela improcedência da

ação.

II – DA LEGISLAÇÃO PENAL VIGENTE

Transcrevo abaixo, para melhor compreensão da

matéria, os dispositivos do Código Penal cuja

interpretação conforme a Constituição a autora

requer.

Art. 124. Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque:

Pena – detenção, de um a três anos.

(...)

Art. 126. Provocar aborto com o consentimento da gestante:

Pena – reclusão de um a quatro anos.

Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maios de quatorze anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência.

(...)

Art. 128. Não se pune o aborto praticado por médico:

I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante;

II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.

Como se vê, o objeto jurídico dos citados

preceitos da legislação penal vigente, quer dizer,

os bens ou valores que o legislador pretendeu

preservar são de duas ordens: de um lado, a vida

do nascituro; de outro, em especial no abortamento

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provocado por terceiro, a vida e a incolumidade

física e psíquica da gestante. 1

O art. 124 do Código Penal abriga duas figuras

típicas: na primeira parte do dispositivo, o

aborto cometido pela própria gestante, também

denominado de autoaborto; na outra, a morte do

feto provocada com o consentimento desta, ou seja,

permitindo que outra pessoa pratique o aborto.

Na segunda figura, em que há o consentimento

da gestante, o crime é duplo. A gestante é

enquadrada no art. 124, ao passo que aquele que

executa os atos materiais do aborto incide nas

penas do art. 126, as quais são mais graves do que

as do dispositivo anterior. 2

O legislador infraconstitucional, todavia,

isentou de pena, em caráter excepcional, o aborto,

desde que praticado por médico, em duas únicas

hipóteses, taxativamente definidas: no chamado

“aborto necessário” e no denominado “aborto

sentimental”, caracterizados, respectivamente, nos

incs. I e II do art. 128 do Codex repressivo.

1 DELMANTO, Celso et al. Código Penal Comentado. 6ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 268. 2Idem, p. 269.

O primeiro, também conhecido como

“terapêutico”, materializa-se quando “não há outro

meio de salvar a vida da gestante”. Já o segundo,

evidencia-se quando a gravidez resultar de estupro

praticado com violência, real ou presumida.

Celso Delmanto e outros renomados

criminalistas, estudando o aborto necessário ou

terapêutico, embora tecendo críticas ao instituto,

reconhecem que ele “não legitima o chamado aborto

eugenésico, ainda que seja provável ou até mesmo

certo que a criança nasça com deformidade ou

enfermidade incurável”. 3 Em outras palavras, o

legislador, de modo explícito e deliberado, não

afastou a punibilidade da interrupção da gravidez

nessas situações. Quer dizer, considerou

penalmente imputável o abortamento induzido de um

feto mal formado.

E não se diga que à época da promulgação do

Código Penal ou de sua reforma, levadas a efeito,

respectivamente, por meio do Decreto-lei nº 2.848,

de 7 de dezembro de 1940, e da Lei 7.209, de 11 de

junho de 1984, não existiam métodos científicos

para detectar eventual degeneração fetal. Como se

sabe, os diagnósticos de deformidades ou

patologias fetais, realizados mediante as mais 3Idem, ibidem, grifos meus.

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distintas técnicas, a começar do exame do líquido

amniótico, já se encontram de longa data à

disposição da Medicina. 4

Permito-me insistir nesse aspecto: caso o

desejasse, o Congresso Nacional, intérprete último

da vontade soberana do povo, considerando o

instrumental científico que se acha há anos sob o

domínio dos obstetras, poderia ter alterado a

legislação criminal vigente para incluir o aborto

de fetos anencéfalos, dentre as hipóteses de

interrupção da gravidez isenta de punição. Mas até

o presente momento, os parlamentares, legítimos

representantes da soberania popular, houveram por

bem manter intacta a lei penal no tocante ao

aborto, em particular quanto às duas únicas

hipóteses nas quais se admite a interferência

externa no curso regular da gestação, sem que a

mãe ou um terceiro sejam apenados.

III – DA INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO

Data da Antiguidade Clássica a discussão

epistemológica sobre a possibilidade do

4 http://www.bsc.gwu.edu/mfmu/history.pdf. Acesso em 10 de abril de 2012.

conhecimento da realidade circundante, isto é, do

mundo fenomenológico. Xenófanes, por exemplo,

prenunciando o ceticismo que caracterizaria o

Iluminismo Grego, cujo clímax se deu em Atenas, no

século V a. C., deixou-nos, a propósito, a

seguinte observação: “A verdade certa, homem

nenhum conheceu, nem conhecerá”. 5 Em que pesem,

contudo, as múltiplas divergências gnosiológicas,

todas as correntes filosóficas que se debruçaram

sobre o tema concluíram que conhecer o real

implica interpretá-lo de alguma maneira.

A compreensão dos textos escritos, de um modo

geral, incluída a dos livros sagrados e diplomas

normativos, também exige um esforço hermenêutico

daqueles que pretendem desvendar o seu exato

sentido.

No caso dos textos legais, raramente a mens

legis se revela de imediato. Com efeito, na maior

parte das vezes, o preciso significado de um

preceito jurídico só pode ser alcançado mediante

um esforço exegético que exige a combinação de

vários métodos hermenêuticos: o gramatical, o

sistemático, o histórico, o teleológico, dentre

outros. 5 Apud TARNAS. Richard. A epopéia do pensamento ocidental: para compreender as ideias que moldaram nossa visão de mundo. 7ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005, p. 39.

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Não bastasse isso, as normas legais

ordinárias - tendo em conta o postulado da

supremacia da Constituição, da qual nos fala Hans

Kelsen 6 - devem ser ainda confrontadas com os

princípios e regras nela abrigados, pois dela é

aquelas retiram sua validade, tal como o gigante

mítico Antão hauria da mãe Gaia a prodigiosa força

que exibia. Por essa razão é que, mediante o

controle de constitucionalidade, concentrado ou

difuso - este último realizado sempre em face de

um caso concreto – torna-se possível extirpar do

ordenamento jurídico uma lei ou ato normativo que

esteja em desconformidade com o Texto Magno.

Dado, porém, o princípio básico da conservação

das normas – que deriva da presunção de

constitucionalidade destas – é possível ou,

melhor, desejável, desde que respeitados seus

fins, conferir-lhes uma interpretação conforme a

Lei Maior, sem declará-las inconstitucionais. Essa

é precisamente a lição de Konrad Hesse, para o

qual “uma lei não deve ser considerada nula quando

ela pode ser interpretada em consonância com a

Constituição”. 7

6 KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 102. 7 HESSE, Konrad. Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha. Porto Alegre: Sérgio A. Fabris, 1998, pp. 71-72.

Isso porque, como explica Uadi Lammêgo Bulos,

esse método de interpretação funda-se na “lógica

do razoável”, cogitada por Chaim Perelman, de

acordo com a qual se deve presumir a obediência do

legislador aos ditames constitucionais, sem,

contudo, deixar-se de lado, ao interpretar a lei,

as questões políticas, econômicas e sociais

correspondentes ao contexto fático sobre as quais

as normas da Constituição incidem. 8

Com efeito, segundo assenta Paulo Bonavides, é

de presumir-se, “da parte do legislador, como uma

constante ou regra, a vontade de respeitar a

Constituição, a disposição de não infringi-la”.9

Daí porque “o método é relevante para o controle

da constitucionalidade das leis e seu emprego

dentro de razoáveis limites representa, em face

dos demais instrumentos interpretativos, uma das

mais seguras alternativas de que pode dispor o

aparelho judicial para evitar a declaração de

nulidade das leis”. 10

Em resumo, a interpretação conforme a

Constituição configura método preferível à pura e

simples declaração de inconstitucionalidade,

8 BULOS, Uadi Lammêgo. Manual de Interpretação Constitucional. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 54. 9 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 24ª. ed. São Paulo:Malheiros, 2009, p. 519. 10 Idem, p. 524.

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140 141

quando mais não seja em homenagem à vontade

soberana do legislador.

IV – DOS LIMITES DA INTERPRETAÇÂO CONFORME

Cumpre registrar, por oportuno, que a tarefa

dos exegetas, não raro, esbarra em limites

objetivos, em obstáculos insuperáveis,

representados pela univocidade das palavras, os

quais impedem que, em linguagem popular, “se dê o

dito pelo não dito” ou vice versa.

Nessa linha de raciocínio, a tão criticada - e

de há muito superada - Escola da Exegese, que

pontificou na França no século XIX, na esteira da

edição do Código Civil Napoleônico, legou-nos uma

assertiva de difícil, senão impossível,

contestação: In claris cessat interpretatio. Ou

seja, quando a lei é clara não há espaço para a

interpretação. 11

Impende ressaltar, ademais, naquilo que

interessa para a presente discussão, que a técnica

11 V. SICHES, Recaséns Luis. Nueva Filosofia de la interpretación del Derecho. 3ª ed. México: Porrúa, 1980, pp. 199 e segs.

de interpretação conforme a Constituição, embora

legítima e desejável, dentro de determinadas

circunstâncias, defronta-se com duas barreiras

intransponíveis, quais sejam: de um lado, não é

dado ao hermeneuta afrontar a expressão literal da

lei; de outro, não pode ele contrariar a vontade

manifesta do legislador e, muito menos,

substituir-se a ele.

É que, como explica Luís Roberto Barroso, o

postulado da independência e harmonia entre os

Poderes, “ao lado do princípio da presunção de

constitucionalidade dos atos do Poder Público, um

e outro atuam como mecanismos de autolimitação

Poder Judiciário (judicial self-restraint)”. 12 E

enfatiza: “Deveras, foi ao Poder Legislativo, que

tem o batismo da representação popular e não o

Judiciário, que a Constituição conferiu a função

de criar o direito positivo e reger as relações

sociais”. 13

Na sequência, o citado constitucionalista,

apoiado na lição de Gomes Canotilho, repisa que

essa técnica hermenêutica “só é legítima quando

12 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p.192 13 Idem, loc. cit.

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existe um espaço de decisão”, não se admitindo

jamais uma exegese contra legem. 14

Nessa mesma direção, o já mencionado Paulo

Bonavides, forte no magistério da Corte

Constitucional alemã, adverte “que o juiz, em

presença de uma lei cujo texto e sentido seja

claro e inequívoco, não deve nunca dar-lhe sentido

oposto, mediante o emprego do método de

interpretação conforme a Constituição”. Logo

depois acrescenta: “Não deve por consequência esse

método servir para alterar conteúdos normativos,

pois ‘isso é tarefa do legislador e não do

tribunal constitucional’ (Das ist Sache des

Gesetzgebers, nich des BVerfG)” . 15

De fato, como é sabido e ressabido, o Supremo

Tribunal Federal, à semelhança do que ocorre com

as demais Cortes Constitucionais, só pode exercer

o papel de legislador negativo, cabendo-lhe a

relevante – e por si só avassaladora - função de

extirpar do ordenamento jurídico as normas

incompatíveis com o Texto Magno.

14 Idem, loc.cit. 15 BONAVIDES, Paulo. Op. cit., pp. 520 -521.

Trata-se de uma competência de caráter, ao

mesmo tempo, preventivo e repressivo, cujo manejo,

porém, exige cerimoniosa parcimônia, tendo em

conta o princípio da intervenção mínima que deve

pautar a atuação da Suprema Corte. Qualquer

excesso no exercício desse delicadíssimo mister

trará como consequência a usurpação dos poderes

atribuídos pela Carta Magna e, em última análise,

pelo próprio povo, aos integrantes do Congresso

Nacional.

Destarte, não é lícito ao mais alto órgão

judicante do País, a pretexto de empreender

interpretação conforme a Constituição, envergar as

vestes de legislador positivo, criando normas

legais, ex novo, mediante decisão pretoriana. Em

outros termos, não é dado aos integrantes do Poder

Judiciário, que carecem da unção legitimadora do

voto popular, promover inovações no ordenamento

normativo como se parlamentares eleitos fossem.

Não se ignora que o tema do aborto é

extremamente controvertido, tanto aqui como

alhures, tendo despertado as mais vivas discussões

no mundo civilizado. Em alguns países, esse

palpitante assunto é submetido a consultas

populares; em outros, quando há espaço para tanto,

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é objeto de pronunciamentos judiciais, não raro

sujeitos a intensas controvérsias.

Interessantemente, tanto os que são

favoráveis à interrupção extemporânea da gravidez,

quanto os que são contrários a ela invocam, em

abono das respectivas posições, de modo enfático,

o princípio da dignidade humana.

Esse debate, como não poderia deixar de ser,

também alcançou o nosso Parlamento, o qual se

encontra profundamente dividido, refletindo,

aliás, a abissal cisão da própria sociedade

brasileira em torno da matéria. Os congressistas,

favoráveis e contrários ao aborto, têm entretido

apaixonadas polêmicas, sendo certo que os

representantes do povo, até o momento, não

chegaram ainda a uma solução de consenso. Por essa

razão continua em vigor o texto da legislação

penal que, como visto, não admite, dada a clareza

de seu enunciado, a ampliação das hipóteses do

chamado aborto terapêutico pela via da exegese.

A temática, com efeito, reveste-se de extrema

complexidade, não só do ponto de vista jurídico,

como também ético e até mesmo científico. É que,

além de envolver o princípio fundamental da

proteção à vida, consagrado em nossa Constituição

(art. 5º, caput), e em diversos tratados

internacionais subscritos pelo Brasil, a começar

da Convenção Americana de Direitos Humanos (art.

4,1), uma decisão favorável ao aborto de fetos

anencéfalos teria, em tese, o condão de tornar

lícita a interrupção da gestação de qualquer

embrião que ostente pouca ou nenhuma expectativa

de vida extra-uterina. Convém lembrar que a

Organização Mundial de Saúde, na Classificação

Estatística Internacional de Doenças e Problemas

Relacionados à Saúde, Décima Revisão (CID – 10),

em especial em seu Capítulo XVII, intitulado

Malformações Congênitas, Deformidades e Anomalias

Cromossómicas, arrola dezenas de centena

patologias fetais em que as chances de

sobrevivência dos seres gestados após uma gravidez

tempestiva ou temporã são nulas ou muito pequenas. 16

Nessa linha, o Doutor Rodolfo Acatuassú Nunes,

Professor Adjunto do Departamento de Cirurgia

Geral da Faculdade de Medicina da Universidade

Estadual do Rio de Janeiro, na Audiência Pública

realizada no Supremo Tribunal Federal sobre o

tema, assentou o seguinte:

16 www.who.int/classifications/icd/. Acesso em 10 de abril de 2010.

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“A anencefalia é ainda, nos dias de hoje, uma doença congênita letal, mas certamente não é a única; existem outras: acardia, agenedia renal, hipoplasia pulmonar, atrofia muscular espinhal, holoprosencefalia, ostogênese imperfeita letal, trissomia do cromossomo 13 e 15, trissomia do cromossomo 18. São todas afecções congênitas letais, listadas como afecções que exigirão de seus pais bastante compreensão devido à inexorabilidade da morte.

Por que foi escolhida a anencefalia para provocar-se a antecipação da morte, ainda no ventre materno, não se esperando o nascimento natural?

Em primeiro lugar, a anencefalia é um termo que induz ao erro. Há uma grande desinformação, que faz prevalecer e difundir a ideia de que a anencefalia significa ausência do encéfalo. Na realidade, anencefalia corresponde à ausência de uma parte do encéfalo. O nome mais correto para anencefalia seria ‘meroencefalia’, já que ‘mero’ significa ‘parte’.” 17

É fácil concluir, pois, que uma decisão

judicial isentando de sanção o aborto de fetos

portadores de anencefalia, ao arrepio da

legislação penal vigente, além de discutível do

ponto de vista ético, jurídico e científico,

diante dos distintos aspectos que essa patologia

pode apresentar na vida real, abriria as portas

para a interrupção da gestação de inúmeros outros

17 Transcrição de trecho da Audiência Pública realizada no STF, realizada no dia 26 de agosto de 2006, p. 34 da respectiva Ata.

embriões que sofrem ou venham a sofrer outras

doenças, genéticas ou adquiridas, as quais, de

algum modo, levem ao encurtamento de sua vida

intra ou extra-uterina.

Insista-se: sem lei devidamente aprovada pelo

Parlamento, que regule o tema com minúcias,

precedida de amplo debate público, retrocederíamos

aos tempos dos antigos romanos, em que se lançavam

para a morte, do alto da Rocha Tarpéia, ao

arbítrio de alguns, as crianças consideradas

fracas ou debilitadas.

Não se olvide, de resto, que existem vários

diplomas infraconstitucionais em vigor no País que

resguardam a vida intra-uterina, com destaque para

o Código Civil, o qual, em seu art. 2º, estabelece

que “a lei põe a salvo, desde a concepção, os

direitos do nascituro”. Ou seja, mesmo que se

liberasse genericamente o aborto de fetos

anencéfalos, por meio de uma decisão prolatada

nesta ADPF, ainda assim remanesceriam hígidos

outros textos normativos que defendem os

nascituros, os quais, por coerência, também teriam

de ser havidos como inconstitucionais, quiçá

mediante a técnica do arrastamento, ou, então,

merecer uma interpretação conforme a Constituição,

de modo a evitar lacunas no ordenamento jurídico

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no tocante à proteção legal de fetos que possam

vir a ter sua existência abreviada em virtude de

portarem alguma patologia.

Importa trazer a lume, ainda, a Portaria nº

487, de 2 de março de 2007, do Ministério da

Saúde, que reflete a preocupação das autoridades

médicas com o sofrimento dos fetos anencéfalos, os

quais, não obstante sejam dotados de um sistema

nervoso central incompleto, sentem dor e reagem a

estímulos externos.

O citado diploma normativo, fazendo alusão ao

consenso obtido no Seminário para a Discussão

sobre Anencefalia e Doação de Órgãos, realizado

pela Secretaria de Atenção à Saúde, do Ministério

da Saúde, em 24 de maio de 2006, integrado pelo

Coordenador-Geral do Sistema Nacional de

Transplantes, representantes da Academia

Brasileira de Neurologia, da Sociedade Brasileira

de Pediatria, do Conselho Federal de Medicina, da

Ordem dos Advogados do Brasil, da Procuradoria

Regional da República, da Associação Brasileira de

Transplantes de órgãos, da Consultoria Jurídica do

Ministério da Saúde, e considerando, em seu

preâmbulo, que “o respeito à dignidade humana

prevista no inciso III do art. 3º da Constituição

Federal implica que toda a pessoa humana,

indistintamente, deve ser tratada como um fim em

si mesma”, assenta, em seu art. 1º que a “retirada

de órgãos e/ou tecidos de neonato anencéfalo para

fins de transplante ou tratamento deverá ser

precedida de diagnóstico de parada cardíaca

irreversível”, sob pena de enquadramento dos

transgressores dessa determinação nas cominações

previstas nos arts. 14, 16 e 17 da Lei nº 9.434,

de 4 de fevereiro de 1997.

V – DOS PROJETOS DE LEI EM TRAMITAÇÃO NO CONGRESSO

Cumpre destacar, ademais - até para demonstrar

que o Congresso Nacional não está alheio à

problemática -, que se encontram sob o crivo dos

parlamentares pelo menos dois projetos de lei

objetivando normatizar o assunto.

Ambos revelam a complexidade do tema,

sobretudo a dificuldade envolvida no regramento de

seus distintos aspectos técnicos, jurídicos e

científicos, os quais, por isso mesmo, são

insuscetíveis de disciplina judicial.

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Um deles, o PL nº 4403/2004, de autoria da

Deputada Jandira Feghali, que acrescenta um inciso

ao art. 128 do Código Penal para, segundo a

ementa, “isentar de pena a prática de ‘aborto

terapêutico’ em caso de anomalia do feto,

incluindo o feto anencéfalo, que implique a

impossibilidade de vida extrauterina”, acha-se em

tramitação na Câmara dos Deputados.

O outro, a saber, o PL nº 50, de iniciativa do

Senador Mozarildo Cavalcanti, também inclui um

inciso no citado dispositivo do Codex Repressivo,

com a seguinte redação:

“Art. 128.

(...)

III – se o feto apresenta anencefalia e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal”.

A propositura do Senador Mozarildo recebeu

parecer da Comissão de Direitos Humanos e

Legislação Participativa da Câmara Alta, subscrito

pela Senadora Marinor Brito, que contém, dentre

outras, as ponderações abaixo resumidas.

A mencionada Senadora, após tecer

considerações sobre a relevância do assunto,

revela que tramitavam originalmente dois projetos

de lei na Câmara Alta com o objetivo de afastar a

punibilidade da interrupção voluntária da gravidez

nos casos de anencefalia fetal: um do Senador

Duciomar Costa, de nº 183, e outro do Senador

Mozarildo, de nº 227, ambos datados de 2004. O

primeiro foi retirado pelo próprio autor, um mês

depois de sua apresentação. O segundo permaneceu

inerte por cerca de meia década, sem jamais ter

sido apreciado por uma única comissão, até que foi

arquivado no final da última Legislatura.

A Senadora Marinor destaca, ainda, que o

Senador Mozarildo, convicto da importância do

tema, reapresentou o mesmo projeto de lei, em

2011, o qual recebeu o nº 50, como já observado.

Submetido à crítica de seus pares, foi objeto de

reparos por parte do Senador Edison Lobão, que, em

seu relatório, assentou o seguinte:

“(...) a referida propositura não detalha os requisitos de validade do diagnóstico e do consentimento da gestante. Entendemos, por força do mais elevado comando de segurança jurídica: a)que o diagnóstico deve ser subscrito por dois outros médicos (que não participem, portanto, do procedimento cirúrgico de

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interrupção da gravidez); b) que as técnicas de diagnóstico da anencefalia sejam reguladas pelo Conselho Federal de Medicina, de modo a uniformizar os procedimentos de investigação da referida anomalia; c) que a manifestação do consentimento da gestante ou de seu representante legal deve ser feita por escrito, para evitar, assim, qualquer tipo de dúvida ou questionamento” (grifos no original).

Em razão da opinião supra, a Senadora Marinor

manifestou-se pela aprovação do PL nº 50/2011,

ofertando, todavia, uma emenda substitutiva com o

seguinte teor:

“Art. 128.

(...)

III – se o feto apresenta anencefalia, diagnosticada por dois médicos que não integrem a equipe responsável pela realização do aborto, e o procedimento é precedido de consentimento por escrito da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.

Parágrafo único. Na hipótese do inciso III, o diagnóstico de anencefalia atenderá aos critérios técnicos definidos por resolução do Conselho Federal de Medicina”.

Cumpre sublinhar que essa propositura, a qual

busca estabelecer requisitos mínimos para que o

aborto voluntário de fetos anencéfalos seja isento

de punição – tarefa, seja-me permitido insistir,

totalmente estranha à competência de uma Corte

Constitucional -, continua sob a soberana

apreciação das duas Casas que compõem o Congresso

Nacional.

VI – DA PARTE DISPOSITIVA

Por todo o exposto, e considerando,

especialmente, que a autora, ao requerer ao

Supremo Tribunal Federal que interprete

extensivamente duas hipóteses restritivas de

direito, em verdade pretende que a Corte elabore

uma norma abstrata autorizadora do aborto dito

terapêutico nos casos de suposta anencefalia

fetal, em outras palavras, que usurpe a

competência privativa do Congresso Nacional para

criar, na espécie, outra causa de exclusão de

punibilidade ou, o que é ainda pior, mais uma

causa de exclusão de ilicitude, julgo improcedente

o pedido.

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MEDIDA CAUTELAR EM MANDADO DE SEGURANÇA 32.036 DISTRITO FEDERAL

RELATOR : MIN. DIAS TOFFOLI

IMPTE.(S) :CARLOS SAMPAIO ADV.(A/S) :ELIARDO FRANCA TELES FILHO IMPDO.(A/S) :MESA DA CÂMARA DOS DEPUTADOS ADV.(A/S) :ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

DECISÃO:

Vistos.

Por versarem matéria idêntica, passo à apreciação conjunta do pedido de liminar nos MMSS nºs 32.036/DF e 32.037/DF.

Cuida-se de mandados de segurança, com pedido de liminar, impetrados por Carlos Sampaio (MS nº 32.036/DF) e Roberto João Pereira Freire (MS nº 32.037/DF) em face, respectivamente, da Mesa da Câmara dos Deputados e do Presidente da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados, com o objetivo de obstar a tramitação e a deliberação da Proposta de Emenda à Constituição nº 33/2011.

Os impetrantes afirmam que são detentores de mandato eletivo de Deputado Federal, o que lhes confere legitimidade ativa ad causam para propor mandado de segurança, visando garantir o direito líquido e certo de, no exercício da função parlamentar, não deliberarem sobre propostas de emendas à Constituição tendentes a violar cláusulas pétreas.

Defendem a tese de que a PEC nº 33/2011 enuncia proposição legislativa tendente a alterar o equilíbrio e a harmonia entre os Poderes da República, em evidente violação à cláusula pétrea instituída no art. 60, § 4º, III, da CF/88.

Os fundamentos apresentados na peça vestibular podem ser assim sintetizados:

a) a alteração do quórum para declaração de inconstitucionalidade de leis - de maioria absoluta para 4/5 (quatro quintos) dos membros do Órgão Especial ou do Plenário -, além de expor o STF às contingências

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III - DECISÃO DO MINISTRO TOFFOLI SOBRE A PEC - 33/2011

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políticas de escolha de novos membros para composição da Corte (o que poderá inviabilizar o exercício de sua função típica de “guardião da

Constituição Federal”), impõe um número excessivo de votos concordantes que, embora não proíba expressamente o controle de constitucionalidade pelo Poder Judiciário, torna-o inexequível na prática no âmbito dos Tribunais;

b) o enunciado de súmula vinculante está estritamente relacionado com a jurisprudência reiterada do STF acerca de determinado tema ou norma, não possuindo qualquer efeito vinculante limitador da função legislativa, mas atuando como “instrumento de reforço das leis”, não sendo legítimo submeter a função jurisdicional à aprovação do Congresso Nacional, sob pena de violar o princípio da independência dos Poderes;

c) o artigo 3º da PEC nº 33/2011 – que, além de estabelecer condição suspensiva para que decisões do STF produzam efeitos, prevê a possibilidade de o Congresso Nacional e a população decidirem pela vigência de uma emenda constitucional declarada incompatível com a CF/88 pela Suprema Corte – tem o condão não apenas de violar a independência entre os Poderes, mas também a própria existência das cláusulas pétreas instituídas pelo Poder Constituinte originário como núcleo rígido da Constituição Federal, ou seja, como limitação à atuação do Poder Constituinte reformador na edição de emendas constitucionais.

Requerem os impetrantes que seja deferido o pedido de liminar para suspender a tramitação da PEC nº 33/2011 e, no mérito, que seja concedida a ordem para determinar o arquivamento definitivo da referida proposta de emenda à Constituição, assegurando-se-lhes, assim, o direito subjetivo líquido e certo de, enquanto parlamentares, participarem da atividade de elaboração de normas compatíveis com as cláusulas constitucionais que condicionam a atuação do Poder Legislativo.

Deferi o prazo de 72 (setenta e duas) horas para que as autoridades impetradas se manifestassem previamente à análise do pedido de liminar, tendo a Mesa da Câmara dos Deputados e a Presidência da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) enviado informações

2

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MS 32036 MC / DF

referentes à tramitação da PEC nº 33/2011, cujo último andamento data de 24/4/13, quando foi aprovado o parecer pela admissibilidade da proposta na CCJC.

É o relatório.

O poder de cautela, inerente ao ato de julgar, consiste em “determinar

as medidas provisórias que julgar adequadas, quando houver fundado receio

de que uma parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra lesão

grave e de difícil reparação” (art. 798, segunda parte, do CPC).O provimento cautelar está previsto também na lei que disciplina o

mandado de segurança, podendo ser deferido “quando houver fundamento

relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja

finalmente deferida” (art. 7º, III, da Lei nº 12.016/09).Assim, a concessão da medida cautelar está condicionada à

verificação da presença dos requisitos do fumus boni iuris - plausibilidade jurídica do direito subjetivo alegado - e do periculum in mora – fundado receio de consumação de lesão irreparável ao direito do postulante.

No caso dos autos, o ato impugnado consiste na tramitação da PEC nº 33/2011 na Câmara dos Deputados, cujo parecer pela admissibilidade foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, em 24/4/13.

As autoridades impetradas afirmam que foram respeitadas “todas as

regras regimentais, legais e constitucionais na tramitação da proposição”, com (i) a apresentação do parecer pelo Relator, Deputado João Campos (PMDB/GO), pela admissibilidade da matéria, (ii) a solicitação de “vista

conjunta pelos Deputados Alessandro Molon (PT/RJ), Artur Oliveira Maia

(PMDB/BA), Marcelo Almeida (PMDB/PR), Paes Landim (PTB/PI), Ricardo

Berzoini (PT/SP) e Vieira da Cunha (PDT/RS)” e (iii) a apresentação de votos em separado pelos Deputados Paes Landim e Vieira da Cunha no sentido da rejeição da PEC.

Registre-se que a tramitação de propostas de emenda à Constituição está disciplinada no Regimento Interno da Câmara dos Deputados, o qual

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Em face do exposto, indefiro o pedido de liminar.

Notifiquem-se as autoridades impetradas para que prestem as informações no prazo de lei (art. 7º, I, da Lei nº 12.016/09).

Após, com ou sem informações, dê-se vista dos autos à douta Procuradoria-Geral da República para que se manifeste como custos legis.

Publique-se.

Brasília, 10 de maio de 2013.

Ministro DIAS TOFFOLI

RelatorDocumento assinado digitalmente

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prescreve que, após admitida pela CCJC, a proposição deve ser devolvida à Mesa da Câmara dos Deputados (art. 202, caput, parte final), cujo Presidente “designará Comissão Especial para o exame do mérito da proposição,

a qual terá o prazo de quarenta sessões, a partir de sua constituição para proferir

parecer” (art. 202, § 2º).Não havendo notícia da designação da Comissão Especial

responsável pelo exame do mérito da proposição e elaboração de

parecer a ser submetido ao plenário da Casa Legislativa, é possível

afirmar que a tramitação da PEC nº 33/2011 encontra-se, atualmente,

suspensa na Câmara dos Deputados, o que evidencia, ao menos nesse

momento, a ausência de periculum in mora que justifique a atuação

desta Suprema Corte em sede de liminar.

Há, inclusive, declarações públicas de lideranças partidárias no sentido de recorrer ao Plenário daquela Casa Legislativa contra a aprovação da admissibilidade da PEC aqui impugnada.

Ausente, portanto, um dos requisitos necessários ao provimento cautelar - e sem adentrar no tema de fundo nesta oportunidade - não se justifica providência liminar, devendo-se aguardar o regular processamento da ação, no bojo da qual podem ser colhidos, além de outros elementos, o parecer do Procurador-Geral da República, os quais permitirão o exame mais judicioso das circunstâncias do caso em definitivo pelo plenário da Corte.

Ressalto, entretanto, que tal modo de agir não impede eventual reapreciação liminar da matéria caso alterada a moldura fático-jurídica subjacente à ação antes de concluída a instrução do processo para julgamento definitivo da lide. Dito de outra forma, acaso se apresente no futuro o periculum in mora, poderá então ser enfrentado o requisito da plausibilidade jurídica do pedido.

Mas, no momento, tudo indica que haverá tempo hábil para a instrução deste writ, permitindo o seu julgamento em definitivo antes de a proposição legislativa ser levada a deliberação pelo plenário da Câmara dos Deputados.

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IV - PROJETO DE DECRETO LEGISLATIVO SOBRE O NÚMERO DE DEPUTADOS POR ESTADO

PROJETO DE DECRETO LEGISLATIVO Nº 85, DE 2013

“Susta os efeitos da resolução administrativa expedida pelo Tribunal Superior Eleitoral nos autos da Petição nº. 9.495/AM, que redefine o número de Deputados Federais, Estaduais e Distritais.”

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

Art. 1º. Ficam sustados os efeitos da resolução administrativa expedida pelo Tribunal Superior Eleitoral nos autos da Petição nº. 9.495/AM, que redefine o número de Deputados Federais, Estaduais e Distritais.

Art. 2º Este Decreto Legislativo entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

O Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) deferiu, por maioria, na sessão administrativa realizada no dia 09 de abril do corrente ano, pedido da Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas, para a redefinição do número de deputados federais por Unidade da Federação e, como consequência, a adequação da composição das Assembleias Legislativas e da Câmara Distrital.

Com o deferimento do pedido, com base no voto da relatora, ministra Nancy Andrighi, vários Estados da Federação terão modificadas, para mais ou para menos, as suas representações parlamentares, seja na Câmara Federal, seja nas Assembleias Estaduais e Distrital.

Com efeito, a repercussão da referida alteração representativa não é de pouca monta. O Pará, por exemplo, ampliará em quatro cadeiras a sua bancada federal na próxima legislatura (2015-2018). O Ceará e Minas Gerais ganharão mais duas

SENADO FEDERAL

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2cadeiras cada, passando a representação do primeiro de 22 para 24 e a do segundo de 53 para 55.

Já Amazonas e Santa Catarina aumentam suas respectivas bancadas em um deputado federal, passando o primeiro de 8 para 9 cadeiras e o segundo de 16 para 17.

Os Estados da Paraíba e Piauí sofrerão a maior redução de bancada pela resolução aprovada pelo TSE, perdendo dois deputados federais cada: a representação da Paraíba cai de 12 para 10 e a do Piauí de 10 para 8.

Seis Estados perderão um deputado cada na Câmara Federal na próxima legislatura: Pernambuco cai de 25 para 24 cadeiras; Paraná, de 30 para 29; Rio de Janeiro, de 46 para 45; Espírito Santo, de 10 para 9; Alagoas de 9 para 8; e o Rio Grande do Sul, de 31 para 30 deputados federais.

Como se vê, a repercussão dessa decisão administrativa do TSE é enorme, seja pelo que representa na tomada de decisões no âmbito da Câmara Federal, seja por sua extensão à representação das Casas Legislativas estaduais.

De certo, e não por outro motivo, a Constituição Federal comete ao Congresso Nacional propor, mediante Lei Complementar, alterações nessa composição, importando a decisão do TSE em invasão de competência fixada ao do Poder Legislativo, incorrendo, portanto, em evidente desobediência à Carta Política.

O legislador constituinte previu com sabedoria a coexistência independente e harmônica dos Poderes da República, dotando a Carta Cidadã de mecanismos de controle recíprocos para evitar arbítrios e desrespeitos, como garantia da estabilidade do Estado Democrático de Direito. Tal aparato, concebido a partir da teoria de freios e contrapesos, decorre da adoção de outra teoria, a da separação dos poderes, consagrada na célebre obra de Montesquieu, o “Espírito das Leis”, confira-se:

“...precisa-se combinar os Poderes, regrá-los, temperá-los, fazê-los agir; dar a um poder, por assim dizer, um lastro, para pô-lo em condições de resistir a um outro. É uma obra-prima de legislação, que raramente o acaso produz, e raramente se deixa a prudência produzir... Sendo o seu corpo legislativo composto de duas partes, uma acorrentada a outra pela mútua faculdade de impedir. Ambas serão amarradas pelo Poder Executivo, o qual será, por seu turno, pelo Legislativo. Esses três Poderes deveriam originar um impasse, uma inação. Mas como, pelo movimento necessário das coisas, são compelidos a caminhar, eles haverão de caminhar em concerto”.(Alexandre de Moraes; in Constituição Brasil Interpretada; Atlas; 2004, 137).

No que respeita à usurpação de competência perpetrada pela Superior Corte Eleitoral, os mecanismos de garantia de coexistência harmônica e independente, bem como os meios para coibir tal prática, estão inequivocamente estampados na Constituição Federal, a saber:

3“Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. (...)Art. 45. A Câmara dos Deputados compõe-se de representantes do povo, eleitos, pelo sistema proporcional, em cada Estado, em cada Território e no Distrito Federal. § 1º - O número total de Deputados, bem como a representação por Estado e pelo Distrito Federal, será estabelecido POR LEI COMPLEMENTAR, proporcionalmente à população, procedendo-se aos ajustes necessários, no ano anterior às eleições, para que nenhuma daquelas unidades da Federação tenha menos de oito ou mais de setenta Deputados. (...)Art. 49. É da competência EXCLUSIVA do Congresso Nacional:XI - zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes;” Merece registro, que ao consignar a Lei Maior quanto à “exclusividade” da

competência atribuída ao Congresso Nacional, de zelar pela preservação de sua competência legislativa, colocou-a a salvo de qualquer possibilidade, sequer, de sua delegação a outro Poder.

A Lei Complementar em questão é a nº. 78, de 30 de dezembro de 1993que “Disciplina a fixação do número de Deputados, nos termos do art. 45, § 1º, da Constituição Federal”, oriunda do Projeto de Lei da Câmara nº. 221, de 1993, de autoria do Deputado Federal GENEBALDO CORREIA e outros, portanto, projeto de iniciativa parlamentar.

A decisão do TSE gerou divergência entre seus membros, dentre os quais de dois integrantes do Supremo Tribunal Federal, um deles a presidente da Corte Eleitoral, Ministra Carmen Lúcia. O ministro MARCO AURÉLIO iniciou essa divergência, alegando que o número de deputados federais deve ser definido pelo Congresso Nacional, com base em Lei Complementar. Afirmou ele no curso da discussão:

“Não é dado àquele que opera o Direito a manipulação de nomenclaturas. Não é dado concluir que onde, por exemplo, há exigência de lei no sentido formal e material se pode ter simplesmente uma Resolução em certo processo administrativo. (...) No ápice da pirâmide das normas jurídicas, tem-se a Constituição Federal que não versa a possibilidade de substituir-se a Lei Complementar por uma simples Resolução”.

Também a ministra CÁRMEN LÚCIA não poupou críticas à decisão da Corte por ela presidida, ao afirmar:

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4“Não vejo como se considerar que aqui, hoje, houve uma delegação.Reconheço a inconstitucionalidade nesta sessão, que é administrativa, porque tanto administrador, quanto legislador, quanto juiz tem que se submeter à Constituição e às leis da República”.

Por todas essas razões, peço o apoio dos nobres pares para aprovação deste Decreto Legislativo, de sorte a sustar os efeitos da resolução administrativa expedida pelo Tribunal Superior Eleitoral nos autos da Petição nº. 9.495/AM, que redefine o número de Deputados Federais, Estaduais e Distritais, e reestabelecer a competência legislativa usurpada do Congresso Nacional por aquela Corte.

Sala das Sessões, de abril, de 2013.

Senador EDUARDO LOPES

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LEGISLAÇÃO CITADA

CONSTITUIÇÃO FEDERAL

“Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

(...)

Art. 45. A Câmara dos Deputados compõe-se de representantes do povo, eleitos, pelo sistema proporcional, em cada Estado, em cada Território e no Distrito Federal.

§ 1º - O número total de Deputados, bem como a representação por Estado e pelo Distrito Federal, será estabelecido por lei complementar, proporcionalmente à população, procedendo-se aos ajustes necessários, no ano anterior às eleições, para que nenhuma daquelas unidades da Federação tenha menos de oito ou mais de setenta Deputados.

(...)

Art. 49. É da competência EXCLUSIVA do Congresso Nacional:

XI - zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes;”

(À Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania)

Publicado no DSF, de 11/04/2013.

Secretaria Especial de Editoração e Publicações do Senado Federal – Brasília-DF OS: 11465/2013

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PARECER Nº , DE 2013

De Plenário, sobre o Projeto de Decreto Legislativo nº 85, de 2013, do Senador Eduardo Lopes, que dispõe sobre a sustação de ato do Poder Judiciário.

RELATOR: Senador WELLINGTON DIAS

I – RELATÓRIO

O Projeto de Decreto Legislativo do Senado (SF) nº 85, de 2013, de autoria do Senador Eduardo Lopes, propõe sustar os efeitos da resolução administrativa expedida pelo Tribunal Superior Eleitoral nos autos da Petição nº. 9.495/AM, que redefine o número de Deputados Federais, Estaduais e Distritais.

A sustação deve-se em razão do deferimento por parte do Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que, por maioria, na sessão administrativa realizada no dia 09 de abril do corrente ano, concedeu pedido da Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas para a redefinição do número de deputados federais por Unidade da Federação e, como consequência, a adequação da composição das Assembleias Legislativas e da Câmara Distrital.

De acordo com o autor do decreto legislativo sob análise, com o deferimento do pedido, com base no voto da relatora, ministra Nancy Andrighi, vários Estados da Federação terão modificadas, para mais ou para menos, as suas representações parlamentares, seja na Câmara Federal, seja nas Assembleias Estaduais e Distrital.

A proposição foi distribuída à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), mas, com a leitura e posterior aprovação do Requerimento

nº 330, de 2013, de autoria das Lideranças Partidárias, o qual solicitou urgência para o presente projeto, a matéria figurou na Ordem do Dia da segunda sessão deliberativa ordinária, nos termos do art. 336, inciso II, do Regimento Interno, que deve iniciar a sua apreciação para decisão em caráter terminativo.

Não foram apresentadas emendas ao projeto.

II – ANÁLISE

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) alterou o coeficiente para a composição do número de deputados federais por Unidade da Federação e, como consequência, a adequação da composição das Assembleias Legislativas e da Câmara Distrital. Com isso, vários Estados da Federação terão modificadas, para mais ou para menos, as suas representações parlamentares, seja na Câmara Federal, seja nas Assembleias.

Cabe ressaltar que há inconstitucionalidade na nova divisão, uma vez que não caberia ao TSE decidir sobre a mudança, mas sim ao Congresso, vez que só se transfere a competência que a Constituição, assim, autoriza. O artigo 45, parágrafo 1°, da Constituição sequer menciona o TSE. O artigo diz que o número será estabelecido por lei complementar. Nesse sentido, in verbis:

“Art. 45. A Câmara dos Deputados compõe-se de representantes do povo, eleitos, pelo sistema proporcional, em cada Estado, em cada Território e no Distrito Federal.

§ 1º - O número total de Deputados, bem como a representação por Estado e pelo Distrito Federal, será estabelecido por lei complementar, proporcionalmente à população, procedendo-se aos ajustes necessários, no ano anterior às eleições, para que nenhuma daquelas unidades da Federação tenha menos de oito ou mais de setenta Deputados”.

Dentre as inconstitucionalidades e ilegalidades da decisão tomada pelo TSE, cabe mencionar, também:

1. Ofensa ao Princípio da Legalidade;

• Art.5º, II, Constituição Federal: “II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa

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senão em virtude de lei”;

2. Ofensa ao Princípio da Soberania Popular;

• Art.1º, Constituição Federal: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

3. Ofensa ao Princípio da Separação dos Poderes;

• Art. 2º, Constituição Federal: “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”.

4. Ofensa ao Princípio constitucional da Ampla Defesa e do Contraditório, sendo necessária, desde o início, a citação dos Estados da Paraíba, Piauí, Pernambuco, Paraná, Rio de Janeiro e dos demais estados que sofrerão redução de bancada, como litisconsórcios passivos necessários do processo;

• Art.5º, LV, Constituição Federal: “LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”;

• Art. 47, Código de Processo Civil: “Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo”.

5. Ofensa ao Princípio da irredutibilidade das bancadas;

• Art.4º, §2º, Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT: §2º “É assegurada a irredutibilidade da atual representação dos Estados e do Distrito Federal na Câmara dos Deputados”.

6. Matéria de Competência Exclusiva do Congresso Nacional, mediante Decreto Legislativo:

• Art. 49, Constituição Federal: “É da competência exclusiva do Congresso Nacional: XI - zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes”;

Por fim, cabe ressaltar que a República Federativa do Brasil está assentada em três poderes harmônicos e independentes. A Carta Magna delimita o campo de atuação de cada poder. A decisão do TSE incorreu em alteração não admitida nem autorizada no campo que é da competência do Poder Legislativo. Logo, que o Congresso Nacional, devidamente legitimado, possa fazer zelar os preceitos constitucionais, reclamando as atribuições que lhe são de pleno direito.

III – VOTO

Diante do exposto, o voto é pela aprovação do Projeto de Decreto Legislativo do Senado (SF) nº 85, de 2013, de autoria do Senador Eduardo Lopes.

Plenário,

, Presidente

, Relator

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V - RESOLUÇÃO DO CNJ DE 14 DE MAIO DE 2013

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SECRETARIA-GERAL DA MESA

CÂMARA DOS DEPUTADOS

Serviço de Análise de Proposições - SERAP( Fones: 3216-1110 / 1111 / 1112 - Fax: 3216-1105 - e-mail: [email protected] )

CONFERÊNCIA DE ASSINATURAS(54ª Legislatura 2011-2015)

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Conferência de Assinaturas

Proposição: PEC 0033/11

Ementa: Altera a quantidade mínima de votos de membros de tribunais para declaração de inconstitucionalidade de leis; condiciona o efeito vinculante de súmulas aprovadas pelo Supremo Tribunal Federal à aprovação pelo Poder Legislativo e submete ao Congresso Nacional a decisão sobre a inconstitucionalidade de Emendas à Constituição.

Data de Apresentação: 25/05/2011

Possui Assinaturas Suficientes: SIM

Totais de Assinaturas:

Autor da Proposição: NAZARENO FONTELES E OUTROS

Confirmadas 219Não Conferem 005Fora do Exercício 000Repetidas 001Ilegíveis 000Retiradas 000Total 225

Assinaturas ConfirmadasABELARDO CAMARINHA PSB SP1AELTON FREITAS PR MG2ALBERTO FILHO PMDB MA3ALEX CANZIANI PTB PR4ALFREDO KAEFER PSDB PR5ALICE PORTUGAL PCdoB BA6AMAURI TEIXEIRA PT BA7ANDERSON FERREIRA PR PE8ANDRE VARGAS PT PR9ANÍBAL GOMES PMDB CE10ANTHONY GAROTINHO PR RJ11ANTÔNIA LÚCIA PSC AC12ANTONIO CARLOS MAGALHÃES NETO DEM BA13ANTONIO IMBASSAHY PSDB BA14ARACELY DE PAULA PR MG15ARIOSTO HOLANDA PSB CE16ARTHUR LIRA PP AL17ARTHUR OLIVEIRA MAIA PMDB BA18ARTUR BRUNO PT CE19ASSIS CARVALHO PT PI20ASSIS DO COUTO PT PR21

VI - DEPUTADOS QUE ASSINARAM AS PEC’s

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Conferência de Assinaturas

FABIO TRAD PMDB MS71FÁTIMA BEZERRA PT RN72FÉLIX MENDONÇA JÚNIOR PDT BA73FERNANDO FERRO PT PE74FERNANDO MARRONI PT RS75FRANCISCO ESCÓRCIO PMDB MA76FRANCISCO PRACIANO PT AM77GABRIEL GUIMARÃES PT MG78GERALDO SIMÕES PT BA79GILMAR MACHADO PT MG80GIROTO PR MS81GIVALDO CARIMBÃO PSB AL82GORETE PEREIRA PR CE83HÉLIO SANTOS PSDB MA84HENRIQUE FONTANA PT RS85HENRIQUE OLIVEIRA PR AM86HEULER CRUVINEL DEM GO87HOMERO PEREIRA PR MT88ÍRIS DE ARAÚJO PMDB GO89IVAN VALENTE PSOL SP90IZALCI PR DF91JAIR BOLSONARO PP RJ92JANDIRA FEGHALI PCdoB RJ93JANETE ROCHA PIETÁ PT SP94JESUS RODRIGUES PT PI95JILMAR TATTO PT SP96JÔ MORAES PCdoB MG97JOÃO ANANIAS PCdoB CE98JOÃO CAMPOS PSDB GO99JOÃO CARLOS BACELAR PR BA100JOÃO PAULO LIMA PT PE101JORGE BOEIRA PT SC102JOSÉ AIRTON PT CE103JOSÉ CARLOS ARAÚJO PDT BA104JOSÉ DE FILIPPI PT SP105JOSÉ GUIMARÃES PT CE106JOSÉ HUMBERTO PHS MG107JOSÉ LINHARES PP CE108JOSÉ MENTOR PT SP109JOSÉ ROCHA PR BA110JOSEPH BANDEIRA PT BA111JOSIAS GOMES PT BA112JOVAIR ARANTES PTB GO113JÚLIO CAMPOS DEM MT114JÚLIO DELGADO PSB MG115JUNJI ABE DEM SP116LAUREZ MOREIRA PSB TO117LÁZARO BOTELHO PP TO118LEANDRO VILELA PMDB GO119

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Conferência de Assinaturas

AUGUSTO CARVALHO PPS DF22BENEDITA DA SILVA PT RJ23BERINHO BANTIM PSDB RR24BERNARDO SANTANA DE VASCONCELL PR MG25BETO FARO PT PA26BIFFI PT MS27BOHN GASS PT RS28BRIZOLA NETO PDT RJ29CARLINHOS ALMEIDA PT SP30CARLOS SOUZA PP AM31CARLOS ZARATTINI PT SP32CARMEN ZANOTTO PPS SC33CESAR COLNAGO PSDB ES34CHICO ALENCAR PSOL RJ35CHICO D'ANGELO PT RJ36CHICO LOPES PCdoB CE37CIDA BORGHETTI PP PR38CLÁUDIO PUTY PT PA39CLEBER VERDE PRB MA40DALVA FIGUEIREDO PT AP41DANILO FORTE PMDB CE42DARCÍSIO PERONDI PMDB RS43DAVI ALVES SILVA JÚNIOR PR MA44DÉCIO LIMA PT SC45DELEGADO PROTÓGENES PCdoB SP46DELEGADO WALDIR PSDB GO47DEVANIR RIBEIRO PT SP48DIEGO ANDRADE PR MG49DOMINGOS DUTRA PT MA50DR. ADILSON SOARES PR RJ51DR. ALUIZIO PV RJ52DR. GRILO PSL MG53DR. PAULO CÉSAR PR RJ54DR. ROSINHA PT PR55DR. UBIALI PSB SP56EDMAR ARRUDA PSC PR57EDSON SANTOS PT RJ58EDSON SILVA PSB CE59EDUARDO AZEREDO PSDB MG60EDUARDO BARBOSA PSDB MG61EDUARDO SCIARRA DEM PR62EFRAIM FILHO DEM PB63ELIANE ROLIM PT RJ64EMILIANO JOSÉ PT BA65ERIKA KOKAY PT DF66ESPERIDIÃO AMIN PP SC67EUDES XAVIER PT CE68EVANDRO MILHOMEN PCdoB AP69FÁBIO SOUTO DEM BA70

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Conferência de Assinaturas

LELO COIMBRA PMDB ES120LEONARDO MONTEIRO PT MG121LILIAM SÁ PR RJ122LINCOLN PORTELA PR MG123LUCI CHOINACKI PT SC124LÚCIO VALE PR PA125LUIS CARLOS HEINZE PP RS126LUIZ ALBERTO PT BA127LUIZ CARLOS SETIM DEM PR128LUIZ COUTO PT PB129LUIZ NOÉ PSB RS130LUIZA ERUNDINA PSB SP131MANDETTA DEM MS132MANOEL SALVIANO PSDB CE133MARÇAL FILHO PMDB MS134MARCELO CASTRO PMDB PI135MARCIO BITTAR PSDB AC136MÁRCIO MACÊDO PT SE137MARCON PT RS138MARCUS PESTANA PSDB MG139MARINA SANTANNA PT GO140MENDES RIBEIRO FILHO PMDB RS141MENDONÇA FILHO DEM PE142MILTON MONTI PR SP143MOREIRA MENDES PPS RO144NAZARENO FONTELES PT PI145NELSON MARCHEZAN JUNIOR PSDB RS146NELSON MARQUEZELLI PTB SP147NELSON PELLEGRINO PT BA148NEWTON LIMA PT SP149ODAIR CUNHA PT MG150ONOFRE SANTO AGOSTINI DEM SC151OSMAR JÚNIOR PCdoB PI152OSMAR SERRAGLIO PMDB PR153OSMAR TERRA PMDB RS154OTAVIO LEITE PSDB RJ155PADRE JOÃO PT MG156PADRE TON PT RO157PASTOR MARCO FELICIANO PSC SP158PAUDERNEY AVELINO DEM AM159PAULO CESAR QUARTIERO DEM RR160PAULO FREIRE PR SP161PAULO PIAU PMDB MG162PAULO PIMENTA PT RS163PAULO RUBEM SANTIAGO PDT PE164PAULO TEIXEIRA PT SP165PEDRO CHAVES PMDB GO166PEDRO EUGÊNIO PT PE167PEDRO UCZAI PT SC168

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Conferência de Assinaturas

PEPE VARGAS PT RS169PINTO ITAMARATY PSDB MA170POLICARPO PT DF171PROFESSOR SETIMO PMDB MA172PROFESSORA MARCIVANIA PT AP173RAIMUNDO GOMES DE MATOS PSDB CE174REBECCA GARCIA PP AM175REGINALDO LOPES PT MG176REINALDO AZAMBUJA PSDB MS177RENAN FILHO PMDB AL178RIBAMAR ALVES PSB MA179RICARDO BERZOINI PT SP180ROBERTO BRITTO PP BA181ROBERTO TEIXEIRA PP PE182RODRIGO MAIA DEM RJ183ROGÉRIO PENINHA MENDONÇA PMDB SC184ROMERO RODRIGUES PSDB PB185RONALDO CAIADO DEM GO186RONALDO FONSECA PR DF187RONALDO ZULKE PT RS188RUBENS OTONI PT GO189RUI COSTA PT BA190RUI PALMEIRA PSDB AL191RUY CARNEIRO PSDB PB192SÁGUAS MORAES PT MT193SANDES JÚNIOR PP GO194SANDRA ROSADO PSB RN195SANDRO ALEX PPS PR196SEBASTIÃO BALA ROCHA PDT AP197SÉRGIO BARRADAS CARNEIRO PT BA198SIBÁ MACHADO PT AC199SILVIO COSTA PTB PE200SIMÃO SESSIM PP RJ201SOLANGE ALMEIDA PMDB RJ202TAUMATURGO LIMA PT AC203TIRIRICA PR SP204VALADARES FILHO PSB SE205VALMIR ASSUNÇÃO PT BA206VANDER LOUBET PT MS207VICENTE CANDIDO PT SP208VICENTINHO PT SP209VITOR PENIDO DEM MG210WALDENOR PEREIRA PT BA211WALDIR MARANHÃO PP MA212WALTER IHOSHI DEM SP213WANDENKOLK GONÇALVES PSDB PA214WASHINGTON REIS PMDB RJ215WELITON PRADO PT MG216ZECA DIRCEU PT PR217

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Conferência de Assinaturas

ZOINHO PR RJ218ZONTA PP SC219

Assinaturas que Não ConferemELEUSES PAIVA DEM SP1HENRIQUE AFONSO PV AC2LUCIANO MOREIRA PMDB MA3PAULO MALUF PP SP4ZÉ GERALDO PT PA5

Assinaturas RepetidasNAZARENO FONTELES PT PI1 (confirmada)

SECRETARIA-GERAL DA MESA

CÂMARA DOS DEPUTADOS

Serviço de Análise de Proposições - SERAP( Fones: 3216-1110 / 1111 / 1112 - Fax: 3216-1105 - e-mail: [email protected] )

CONFERÊNCIA DE ASSINATURAS(53ª Legislatura 2007-2011)

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Proposição: PEC 0003/11

Ementa: Dá nova redação ao inciso V do art. 49 da Constituição Federal.

Data de Apresentação: 10/02/2011

Possui Assinaturas Suficientes: SIM

Totais de Assinaturas:

Autor da Proposição: NAZARENO FONTELES E OUTROS

Confirmadas 194Não Conferem 001Fora do Exercício 000Repetidas 001Ilegíveis 000Retiradas 000Total 196

Assinaturas ConfirmadasABELARDO CAMARINHA PSB SP1ACELINO POPÓ PRB BA2AFONSO HAMM PP RS3AGUINALDO RIBEIRO PP PB4ALBERTO FILHO PMDB MA5ALEX CANZIANI PTB PR6ALICE PORTUGAL PCdoB BA7AMAURI TEIXEIRA PT BA8ANDRE VARGAS PT PR9ANDREIA ZITO PSDB RJ10ANTHONY GAROTINHO PR RJ11ANTÔNIO ANDRADE PMDB MG12ANTÔNIO CARLOS BIFFI PT MS13ANTONIO CARLOS MENDES THAME PSDB SP14ARIOSTO HOLANDA PSB CE15ARLINDO CHINAGLIA PT SP16ARMANDO VERGÍLIO PMN GO17ARNALDO FARIA DE SÁ PTB SP18ARNALDO JARDIM PPS SP19ARNALDO JORDY PPS PA20AROLDE DE OLIVEIRA DEM RJ21ARTUR BRUNO PT CE22ASSIS CARVALHO PT PI23ASSIS DO COUTO PT PR24ASSIS MELO PCdoB RS25

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ÁTILA LINS PMDB AM26AUDIFAX PSB ES27AUGUSTO CARVALHO PPS DF28AUREO PRTB RJ29BENEDITA DA SILVA PT RJ30BERNARDO SANTANA DE VASCONCELL PR MG31BETO FARO PT PA32CARLAILE PEDROSA PSDB MG33CELSO MALDANER PMDB SC34CESAR COLNAGO PSDB ES35CHICO ALENCAR PSOL RJ36CHICO LOPES PCdoB CE37CLAUDIO CAJADO DEM BA38CLÁUDIO PUTY PT PA39CLEBER VERDE PRB MA40DALVA FIGUEIREDO PT AP41DAMIÃO FELICIANO PDT PB42DANIEL ALMEIDA PCdoB BA43DAVI ALVES SILVA JÚNIOR PR MA44DELEGADO PROTÓGENES PCdoB SP45DEVANIR RIBEIRO PT SP46DIMAS FABIANO PP MG47DOMINGOS DUTRA PT MA48DR. ALUIZIO PV RJ49DR. CARLOS ALBERTO PMN RJ50DR. JORGE SILVA PDT ES51DR. PAULO CÉSAR PR RJ52DR. ROSINHA PT PR53DR. UBIALI PSB SP54DUARTE NOGUEIRA PSDB SP55DUDIMAR PAXIUBA PSDB PA56EDINHO ARAÚJO PMDB SP57EDINHO BEZ PMDB SC58EDIO LOPES PMDB RR59EDSON EZEQUIEL PMDB RJ60EDSON SANTOS PT RJ61EDSON SILVA PSB CE62ELCIONE BARBALHO PMDB PA63ELEUSES PAIVA DEM SP64ELI CORREA FILHO DEM SP65ELIANE ROLIM PT RJ66ELVINO BOHN GASS PT RS67EMILIANO JOSÉ PT BA68ERIKA KOKAY PT DF69ERIVELTON SANTANA PSC BA70EUDES XAVIER PT CE71FÁBIO RAMALHO PV MG72FABIO TRAD PMDB MS73FÁTIMA BEZERRA PT RN74

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Conferência de Assinaturas

FELIPE BORNIER PHS RJ75FERNANDO COELHO FILHO PSB PE76FERNANDO FERRO PT PE77FERNANDO FRANCISCHINI PSDB PR78FERNANDO MARRONI PT RS79FRANCISCO PRACIANO PT AM80GABRIEL GUIMARÃES PT MG81GASTÃO VIEIRA PMDB MA82GERALDO RESENDE PMDB MS83GILMAR MACHADO PT MG84GIVALDO CARIMBÃO PSB AL85GORETE PEREIRA PR CE86GUILHERME CAMPOS DEM SP87HUGO LEAL PSC RJ88INOCÊNCIO OLIVEIRA PR PE89ÍRIS DE ARAÚJO PMDB GO90JANDIRA FEGHALI PCdoB RJ91JANETE ROCHA PIETÁ PT SP92JEAN WYLLYS PSOL RJ93JEFFERSON CAMPOS PSB SP94JESUS RODRIGUES PT PI95JÔ MORAES PCdoB MG96JOÃO ANANIAS PCdoB CE97JOÃO LEÃO PP BA98JOÃO MAGALHÃES PMDB MG99JOÃO PAULO LIMA PT PE100JONAS DONIZETTE PSB SP101JORGE BOEIRA PT SC102JORGE CORTE REAL PTB PE103JORGE TADEU MUDALEN DEM SP104JOSÉ AIRTON PT CE105JOSÉ CARLOS ARAÚJO PDT BA106JOSÉ DE FILIPPI JÚNIOR PT SP107JOSÉ GUIMARÃES PT CE108JOSE HUMBERTO PHS MG109JOSÉ MENTOR PT SP110JOSÉ ROCHA PR BA111JOSIAS GOMES PT BA112JUNJI ABE DEM SP113LÁZARO BOTELHO PP TO114LELO COIMBRA PMDB ES115LEONARDO PICCIANI PMDB RJ116LUCI CHOINACKI PT SC117LÚCIO VALE PR PA118LUCIO VIEIRA LIMA PMDB BA119LUIS CARLOS HEINZE PP RS120LUIZ ALBERTO PT BA121LUIZ COUTO PT PB122LUIZ FERNANDO MACHADO PSDB SP123

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Conferência de Assinaturas

LUIZ NOÉ PSB RS124LUIZA ERUNDINA PSB SP125MANATO PDT ES126MANOEL JUNIOR PMDB PB127MARCELO CASTRO PMDB PI128MÁRCIO MACÊDO PT SE129MARCON PT RS130MAURÍCIO DZIEDRICKI PTB RS131MAURÍCIO TRINDADE PR BA132MAURO BENEVIDES PMDB CE133MAURO NAZIF PSB RO134MENDES RIBEIRO FILHO PMDB RS135MILTON MONTI PR SP136NAZARENO FONTELES PT PI137NELSON MARQUEZELLI PTB SP138NELSON PELLEGRINO PT BA139NILDA GONDIM PMDB PB140NILTON CAPIXABA PTB RO141OSMAR SERRAGLIO PMDB PR142OSMAR TERRA PMDB RS143OTAVIO LEITE PSDB RJ144PADRE JOAO PT MG145PADRE TON PT RO146PASTOR EURICO PSB PE147PAULO FOLETTO PSB ES148PAULO PEREIRA DA SILVA PDT SP149PAULO PIMENTA PT RS150PEDRO CHAVES PMDB GO151PEDRO UCZAI PT SC152PEPE VARGAS PT RS153PROFESSOR SETIMO PMDB MA154PROFESSORA MARCIVANIA PT AP155RAUL HENRY PMDB PE156RAUL LIMA PP RR157REGINALDO LOPES PT MG158RENATO MOLLING PP RS159RENZO BRAZ PP MG160RIBAMAR ALVES PSB MA161ROBERTO BRITTO PP BA162RODRIGO GARCIA DEM SP163ROGÉRIO CARVALHO PT SE164ROMÁRIO PSB RJ165ROMERO RODRIGUES PSDB PB166RONALDO CAIADO DEM GO167RONALDO ZULKE PT RS168ROSANE FERREIRA PV PR169ROSE DE FREITAS PMDB ES170RUBENS OTONI PT GO171SALVADOR ZIMBALDI PDT SP172

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Conferência de Assinaturas

SANDES JÚNIOR PP GO173SANDRA ROSADO PSB RN174SANDRO ALEX PPS PR175SANDRO MABEL PR GO176SÉRGIO BARRADAS CARNEIRO PT BA177SIBA MACHADO PT AC178SILAS CÂMARA PSC AM179SILVIO COSTA PTB PE180SIMÃO SESSIM PP RJ181STEPAN NERCESSIAN PPS RJ182TIRIRICA PR SP183VALTENIR PEREIRA PSB MT184VICENTE CANDIDO PT SP185VIEIRA DA CUNHA PDT RS186WALDENOR PEREIRA PT BA187WASHINGTON REIS PMDB RJ188WELITON PRADO PT MG189WILLIAM DIB PSDB SP190ZÉ GERALDO PT PA191ZÉ SILVA PDT MG192ZEQUINHA MARINHO PSC PA193ZOINHO PR RJ194

Assinaturas que Não ConferemPOLICARPO PT DF1

Assinaturas RepetidasNAZARENO FONTELES PT PI1 (confirmada)

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VII - RESUMO DAS PROPOSTAS DE REFORMA POLÍTICA

Henrique Fontana1

A proposta de reforma política apresenta dois eixos principais, tratados mediante projeto de lei: o financiamento público exclusivo de campanhas eleitorais e a modificação de regras do sistema eleitoral.

Há, ainda, temas que exigem alteração da Constituição Federal. Em síntese: a vedação das coligações em eleições proporcionais, alteração das datas de posse em cargos do Poder Executivo para os primeiros dias de janeiro, alteração das regras de suplência de senadores, a simplificação dos requisitos de apresentação de projetos de lei de iniciativa popular, alteração das regras de domicílio eleitoral em eleições municipais e a instituição do segundo turno para a eleição dos Prefeitos e Vice- Prefeitos em Municípios com mais de cem mil eleitores. Essas matérias serão tratadas por meio de Propostas de Emenda à Constituição (PEC).

Iniciaremos o detalhamento das propostas pelas regras do financiamento público das campanhas eleitorais. Em seguida, passaremos às regras do novo sistema eleitoral.

Financiamento público exclusivo:

1. O financiamento das campanhas será realizado por meio de um fundo criado com esse fim específico, que receberá aportes de recursos do orçamento da União, admitindo, também, contribuições de pessoas físicas e jurídicas.

2. As campanhas serão financiadas exclusivamente com recursos desse fundo, sendo vedada a contribuição de pessoas jurídicas e físicas diretamente a partidos ou candidatos. Também fica vedada a utilização de recursos próprios de candidatos.

3. O montante dos recursos públicos destinados ao fundo de financiamento das campanhas será proposto pela Justiça Eleitoral, podendo o Congresso Nacional ajustá-lo por ocasião da feitura do orçamento anual.

1 Deputado Federal (PT-RS) relator da Comissão da Reforma Política.

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Apenas os partidos realizam gastos de campanha: os gastos de campanha serão realizados exclusivamente pelos partidos políticos a partir de contas bancárias abertas especificamente para registro de movimentações financeiras relativas a campanhas eleitorais. Não serão distribuídos recursos diretamente aos candidatos. Assim, apenas os partidos e os comitês financeiros de campanha prestarão contas à Justiça Eleitoral.

Acompanhamento dos gastos pela internet: a prestação de contas de campanha assumirá significativa importância, e poderá ser acompanhada por toda a sociedade brasileira pela internet.

Punições severas aos infratores: a proposta prevê sanções de natureza administrativa, eleitoral e criminal, nos casos de comprovados desvios de recursos ou arrecadação ilícita (caixa 2).

Regras para a contratação de cabos eleitorais: a proposta admitirá a participação do eleitor em atividades de campanha não remuneradas. Contudo, a contratação de pessoas (cabos eleitorais) para atividades remuneradas deverá ser registrada antecipadamente na Justiça Eleitoral.

A distribuição de recursos de campanha aos partidos será feita segundo o perfil de gastos de campanha declarados à Justiça Eleitoral nas eleições de 2010, e seguirá as seguintes regras:

a. Em primeiro lugar, são definidos os valores destinados para cada uma das eleições (cargos) em disputa, sendo uma parcela reservada aos órgãos nacionais dos partidos;

b. Em segundo lugar, são definidos os valores destinados a cada circunscrição;

c. Em terceiro lugar, são definidos os valores destinados a cada partido.

Teto de gastos por eleição: em cada circunscrição, haverá um teto de gastos para cada cargo em disputa, representado pelo maior valor recebido por algum dos partidos concorrentes.

Estratégias eleitorais dos partidos: os partidos disporão de parcela dos recursos recebidos para livre destinação às campanhas, conforme a estratégia política de cada agremiação, obedecidas regras e p e r c e n t u a i s específicos e, principalmente, o teto mencionado no item anterior.

No caso de coligações, os valores recebidos pelos partidos serão somados.

Eventuais sobras de campanha retornarão ao Tesouro Nacional.

A distribuição dos recursos para cada eleição far-se-á da seguinte forma:

a. Nas eleições presidenciais, federais e estaduais:

i. 11% para a eleição de presidente e vice-presidente da República;

ii. 19% para as eleições de governador e vice-governador;

iii. 8% para as eleições de senador (ou 4%, no ano em que se eleja um apenas senador);

iv. 27% para as eleições de deputado federal;

v. 27% para as eleições de deputado estadual e distrital;

vi. 8% para distribuição aos órgãos de direção nacional dos partidos (ou 12%, no ano em que se eleja um senador).

b. Nas eleições municipais:

i. 40% para a eleição de prefeito;

ii. 45% para eleição as eleições de vereadores;

iii. 15% para distribuição aos órgãos de direção nacional dos partidos;

Critérios para a distribuição dos recursos em cada circunscrição: uma vez definido o montante destinado a cada cargo em disputa, passa-se à divisão dos recursos entre as circunscrições, de acordo com critérios que guardam proporcionalidade com o número de eleitores e com a representação no Parlamento.

Percentuais distribuídos igualitariamente entre os partidos: em cada circunscrição, a distribuição de recursos entre os partidos obedecerá a critérios de divisão igualitária entre as agremiações registradas no TSE (5%), entre as que tenham um representante eleito na Câmara dos Deputados (10%) e entre as que tenham mais de dez representantes eleitos para a Câmara dos Deputados (10%).

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O restante (65%) seguirá critério de proporcionalidade em relação ao número de votos obtidos pelo partido para a Câmara dos Deputados ou Assembleia Legislativa, conforme a eleição em disputa. Nas eleições para prefeito e vereador, o critério de proporcionalidade seguirá a configuração política local, considerando os votos obtidos pelos partidos na Assembleia Estadual e Câmara de Vereadores.

Sistema Eleitoral – Lista flexível

1. O sistema eleitoral proposto mantém o critério da proporcionalidade de votos obtidos em relação ao número de cadeiras em disputa. Nesse contexto, não se fazem necessárias alterações por meio de PEC (Proposta de Emenda à Constituição), bastando alterações no Código Eleitoral.

2. O partido apresentará aos eleitores uma lista preordenada de candidatos, elaborada em conformidade com regras que fortalecem a democracia interna nos partidos.

3. Como no sistema atual, o eleitor disporá de um voto: no candidato de sua preferência ou na legenda partidária. Como o “tamanho” dos par t idos nos Parlamentos dependerá do somatório dos votos nominais e dos votos de legenda, a adoção da lista flexível será neutra em relação às dimensões das bancadas partidárias. Por sua vez, o número de cadeiras conquistadas pelos partidos ou coligações será calculado por meio do sistema das maiores médias (Fórmula D’Hondt).

4. Depois do cálculo do número de cadeiras conquistadas pelos partidos, trata-se de definir quem são os eleitos dentro do partido. Nova versão do projeto estabelece um mecanismo no qual o eleitor decide o “peso” e a “importância” que gostaria de conferir à lista partidária, por meio da “lista flexível”.

Eleitor terá total autonomia para decidir sobre a importância que deseja conferir ao partido ou ao candidato individual de sua preferência: se todos os eleitores votarem nominalmente nos candidatos, o sistema funciona como uma “lista aberta”; se todos os eleitores votarem na legenda, o sistema funciona como uma “lista fechada” tradicional.

Dependendo das estratégias do partido e das preferências dos eleitores, haverá diferenças na composição dos votos dos partidos (algumas agremiações podem ter mais votos nominais, outras mais votos de legenda).

Nesse sistema não haverá cláusula de exclusão: todos os partidos participarão da disputa de todas as cadeiras na circunscrição eleitoral.

Referendo em 2013

Submissão das regras de financiamento público exclusivo e do novo sistema eleitoral a referendo popular, a ser realizado em 2013. Dispositivos aprovados pelo Congresso só entrarão em vigor se forem referendados pelo voto dos cidadãos. Em consequência, nenhuma mudança no sistema eleitoral ou no modelo de financiamento será adotada sem a concordância do eleitor.

Outras disposições

Federação de partidos: admitir-se-á a criação de federação de partidos, que atuará como se fosse uma única agremiação, inclusive no registro de candidatos e funcionamento parlamentar. As federações poderão ter abrangência nacional ou estadual, devendo os partidos permanecerem filiados por, no mínimo, três anos.

Fortalecimento da participação feminina nos Parlamentos, mediante a obrigatoriedade de alternância de gênero na lista preordenada, de modo que a cada grupo de três candidatos, haja um de um gênero e dois de outro.

Criação de mecanismos de democracia interna do partido, especialmente no que diz respeito à elaboração da lista preordenada. Neste caso, o partido deverá escolher a forma que lhe convier, dentre as regras estabelecidas em lei, respeitando sempre o voto secreto dos convencionais ou filiados. As alternativas são:

a. Votação nominal em convenção.

b. Votação por chapas em convenção.

c. Prévias abertas à participação de todos os filiados do partido.

Limitação das comissões provisórias dos partidos: admite-se a apresentação de candidatos por partidos com órgão de direção constituído provisoriamente na circunscrição eleitoral apenas na primeira eleição após sua constituição.

Matérias de PEC

1. Vedação das coligações partidárias em eleições proporcionais.

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2. Alteração das datas de posse nos cargos do Poder Executivo. Os prefeitos tomarão posse em 5 de janeiro; os governadores em 10 de janeiro e o Presidente da República em 15 de janeiro.

3. Alteração das regras de suplência de senadores:

a. O suplente de senador passaria a ser o candidato a Deputado Federal mais votado nas últimas eleições para a Câmara dos Deputados, pelo mesmo partido do titular, ainda que não eleito.

b. O suplente substituiria o titular até a realização de eleições gerais, federais, estaduais ou municipais.

4. Instituição do segundo turno para a eleição dos Prefeitos e Vice-Prefeitos em Municípios com mais de cem mil eleitores;

5. Inelegibilidade do “prefeito itinerante”: exigência de domicílio eleitoral na circunscrição apenas para as eleições presidenciais, federais e estaduais. Nas eleições municipais, exige-se apenas o domicílio eleitoral no próprio estado. Torna inelegível, para um terceiro mandato consecutivo, os prefeitos que exerceram dois mandatos num mesmo estado da federação.

6. Simplificação dos mecanismos de democracia participativa:

a. O número mínimo de subscrições para apresentação de projeto de lei de iniciativa popular passará a ser de 500.000 eleitores.

b. Instituição de iniciativa popular para apresentação de Propostas de Emenda à Constituição (PEC), mediante a subscrição da proposição por, no mínimo, 1.500.000 eleitores.

c. Até que seja universalizado o fornecimento gratuito à população de meios de certificação digital, a subscrição em apoio a qualquer proposição poderá ser formalizada por meio da inserção de dados do eleitor em cadastro específico a ser mantido pela Câmara dos Deputados. A previsão do governo é que o RIC (Registro de Identidade Civil), que conterá dados biométricos do eleitor e certificação digital, levará cerca de dez anos para ser distribuído a toda a população brasileira.

d. Tão logo seja alcançado o número mínimo de subscrições, a proposição iniciará sua tramitação, conforme o regimento interno.

REQUERIMENTO DE INDICAÇÃO Nº , DE 2012 (Do Sr. Nazareno Fonteles)

Requer o envio de Indicação à Presidência da República, concernente ao processo de destituição do Procurador-Geral da República, antes do término de seu mandato.

Senhor Presidente: Consoante o art. 113, inciso I e § 1º, do Regimento

Interno da Câmara dos Deputados, requeiro a Vossa Excelência que seja encaminhada à Presidência da República a anexa Indicação, que tem por objeto a sugestão do encaminhamento de representação ao Senado Federal com vistas ao início de processo de exoneração do Procurador-Geral da República, nos termos do art. 52, inciso XI, da Constituição Federal, e do art. 25, parágrafo único, da Lei Complementar nº 75, de 1993.

Sala das Sessões, em de de 2012.

NAZARENO FONTELES Deputado Federal

2012_XXX

VIII -

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INDICAÇÃO Nº , DE 2012 (Do Sr. Nazareno Fonteles)

Sugere o envio ao Senado Federal de representação com vistas à exoneração do Procurador-Geral da República, antes do término de seu mandato.

Excelentíssima Srª Presidenta da República:

O Deputado Federal que subscreve a presente Indicação,

respeitosamente, sugere, em conformidade com o art. 52, inciso XI, da CF, e do art. 25, parágrafo único, da Lei Complementar nº 75, de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público), seja encaminhada representação ao Senado Federal com vistas ao início do processo de destituição do atual ocupante do cargo de Procurador-Geral da República, antes do término de seu mandato.

Como é do conhecimento de boa parte da sociedade brasileira, o Sr. Roberto Monteiro Gurgel Santos, atual Procurador-Geral da República, recebeu a documentação da investigação da operação Vegas, executada pela Polícia Federal, em 2009, e conduziu-se de forma omissa em relação às suas funções institucionais, previstas no Código de Processo Penal e no art. 129 da nossa Carta Magna, mormente a constante do inciso VIII – requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos de suas manifestações processuais.

As respostas do Sr. Procurador-Geral da República, manifestadas pela imprensa, foram no sentido de que a omissão era, na verdade, uma estratégia para que a investigação pudesse prosperar, atribuindo o êxito da Operação Monte Carlo ao acerto de sua conduta.

A despeito da “estratégia” do PGR, os fatos mostram que somente após a deflagração da Operação Monte Carlo, e a divulgação pela imprensa de diálogos telefônicos de um Senador da República com investigados, o PGR, coincidentemente, apressou-se em solicitar ao Supremo Tribunal Federal a abertura de inquéritos e quebras de sigilo.

Ademais, outras manifestações do PGR, em lugar de desejável colaboração, foram sempre no sentido de reagir aos legítimos trabalhos de investigação do Congresso Nacional - reunido em forma de Comissão Parlamentar Mista de Inquérito. Para o Chefe do Ministério Público, os trabalhos da CPMI são motivados por temor da aproximação do julgamento do processo conhecido como “Mensalão”, constituindo mera estratégia de defesa a promoção de desgaste do autor da denúncia.

Tais respostas causam perplexidade, visto que não são guardam coerência com o desenrolar dos fatos e não correspondem aos depoimentos dos delegados da Polícia Federal responsáveis pelas citadas operações, prestados à CPMI.

No mundo dos fatos, a conduta omissa do PGR resultou tão somente no embaraço das investigações da Polícia Federal – impedindo as interceptações dos diálogos telefônicos realizados diretamente por detentores de foro privilegiado -, e na alegação de nulidade das provas obtidas em face da não autorização judicial adequada.

A rigor, os fatos demonstram que o atual PGR – para quem as conclusões das investigações promovidas pela CPMI do Congresso Nacional deverão ser enviadas para tomada de providências – não mais desfruta da confiança e respeito do povo brasileiro, absolutamente imprescindível ao mais alto posto do Ministério Público de nosso País. Não é razoável que o Procurador-Geral da República permaneça no exercício de tão relevante função sob grave suspeita e desconfiança de obstaculizar investigações, se portado de modo omisso em suas funções institucionais e de afronta à soberania popular representada pelo CN e exercida através da CPMI referida.

Assim sendo, com o objetivo de restaurar a normalidade institucional das instâncias investigativas nacionais, sugerimos e exortamos à Exmª Presidenta da República a encaminhar representação ao Senado Federal, que por maioria absoluta de seus membros, poderá autorizar a

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destituição do atual ocupante do cargo de Procurador-geral da República, antes do término de seu mandato.

Sala das Sessões, em de de 2012.

NAZARENO FONTELES

Deputado Federal

19/04/2007 PLENÁRIO

RECLAMAÇÃO 4.335 ACRE

RELATOR : MIN. GILMAR MENDES

RECLTE.(S) :DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO RECLDO.(A/S) : JUIZ DE DIREITO DA VARA DE EXECUÇÕES

PENAIS DA COMARCA DE RIO BRANCO (PROCESSOS NºS 00102017345-9, 00105012072-8, 00105017431-3, 00104000312-5, 00105015656-2, 00105013247-5, 00102007288-1, 00106003977-0, 00105014278-0 E 00105007298-7)

INTDO.(A/S) :ODILON ANTONIO DA SILVA LOPES INTDO.(A/S) :ANTONIO EDINEZIO DE OLIVEIRA LEÃO INTDO.(A/S) :SILVINHO SILVA DE MIRANDA INTDO.(A/S) :DORIAN ROBERTO CAVALCANTE BRAGA INTDO.(A/S) :RAIMUNDO PIMENTEL SOARES INTDO.(A/S) :DEIRES JHANES SARAIVA DE QUEIROZ INTDO.(A/S) :ANTONIO FERREIRA DA SILVA INTDO.(A/S) :GESSYFRAN MARTINS CAVALCANTE INTDO.(A/S) : JOÃO ALVES DA SILVA INTDO.(A/S) :ANDRÉ RICHARDE NASCIMENTO DE SOUZA

V O T O(VISTA)

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI: Trata-se de reclamação ajuizada pela Defensoria Pública da União contra decisão do Juiz de Direito da Vara de Execuções Penais da Comarca de Rio Branco, Estado do Acre, que indeferiu pedido de progressão de regime a favor de condenados a penas de reclusão, em regime integralmente, fechado, pela prática de crimes hediondos.

Na espécie, alegou-se ofensa à autoridade da decisão da Corte no HC 82.959/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, que reconheceu a inconstitucionalidade do art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/90, o qual proibia a

Supremo Tribunal Federal

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IX - RCL 4335/ACRE - ART. 52,X E CONTROLE DE CONS-TITUCIONALIDADE

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progressão de regime a condenados pela prática desses delitos.

Em 21 de agosto de 2006, o Relator Min. Gilmar Mendes concedeu medida liminar, de ofício, para que afastar a vedação legal à progressão de regime até o julgamento final desta reclamação.

Na Sessão Plenária de 1º/2/2007, após voto do Relator Min. Gilmar Mendes, julgando procedente a reclamação, pediu vista o Ministro Eros Grau.

Na continuação do julgamento, em 19/4/2007, o Min. Eros Grau apresentou voto vista acompanhando o Relator. À ocasião, o Min. Sepúlveda Pertence manifestou-se pela improcedência do pedido, concedendo, todavia, o habeas corpus de ofício. O Ministro Joaquim Barbosa, por sua vez, não conheceu da reclamação, deferindo, porém, a ordem ex officio. Pedi vista dos autos, na sequência, para melhor exame da matéria.

Passo a votar.

A tese que se discute na presente reclamação, no fundo, diz respeito à função desempenhada por esta Corte e pelo Senado Federal no controle difuso de constitucionalidade das leis.

Trata-se de saber se a decisão proferida no HC 82.959, quanto ao art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/1990, em sua redação primitiva, é dotada de eficácia erga omnes, independente ou não do cumprimento do disposto no art. 52, X, da Constituição da República, que confere ao Senado a competência privativa para “suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal”.

Lembro, inicialmente, que o exame da compatibilidade entre as leis ordinárias e as normas constitucionais pelo Judiciário, o denominado

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judicial review, tem origem na célebre decisão do Chief Justice John Marshall da Suprema Corte dos Estados Unidos, no caso Marbury v. Madison, julgado em 1803, com base nas lições de Hamilton, 1 em precedentes jurisprudenciais, 2 e nos propósitos dos constituintes da Filadélfia, que consagraram a supremacy clause no inc. VI, al. 2ª, da Constituição americana de 17 de setembro de 1787.

Como bem observou Paulo Bonavides, o judicial review foi uma contribuição dos Estados Unidos da América para o mundo, tão importante quanto a do federalismo e do sistema presidencial de governo. 3

Naquele país, como se sabe, as decisões proferidas pela Suprema Corte no controle de constitucionalidade possuem eficácia erga omnes, por força do mecanismo conhecido como stare decisis, expressão que deriva da locução completa “stare decisis e non quieta movere”, a qual, em essência, significa que os precedentes judiciais devem ser obrigatoriamente observados. Esse sistema expandiu-se primeiramente para as ex-colônias inglesas, como a Austrália, Canadá e Índia, sendo depois adotado em outros países, a exemplo da Argentina, Japão e Suécia.

Durante o século XX, o sistema norte-americano cedeu espaço para um novo modelo de jurisdição constitucional, originário da Áustria, que

1 HAMILTON, Alexander; JAY, John; e MADISON, James. O Federalista: um

comentário à Constituição americana. Trad. Reggy Zacconi de Moraes. Rio de Janeiro:

Editora Nacional de Direito, 1959.

2 “Eis, pois, em sucinta nomenclatura, as decisões da Suprema Corte americana anulando atos do

congresso federal: 1 – Questão Hayburn. Ag. 1792. Contra a Lei de 23 de março de 1792, que conferia

autoridade aos tribunais em matéria de pensões; 2 – United States v. Yale Todd. Fev. 1794. Sentença

contra a lei de 23 de março 1792, já aludida, que conferia à justiça poderes não judiciais;” . BARBOSA,

Ruy. Cartas de Inglaterra: o Congresso e a Justiça no Regimen Federal. 2. ed. São Paulo: Livraria

Acadêmica Saraiva & C., 1929, p. 418.

3 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 21ª ed. São Paulo: Malheiros,

2007, p. 306.

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se concentra em um único Tribunal, ou melhor, numa Corte Constitucional (Verfassungsgerichtshof). Tal sistema foi idealizado por Kelsen que, a pedido do governo austríaco, colaborou na elaboração da Constituição de 1º de outubro de 1920, conhecida como Oktoberverfassung, que abrigou tal modelo.

Esse sistema de controle concentrado foi adotado especialmente na Europa continental, ou seja, na Alemanha, Bélgica, Espanha, Itália, Iugoslávia, Portugal, Tchecoslováquia, bem como na Turquia, entre outros países.

Consoante CAPPELLETTI,4 as razões que levaram os referidos

países a adotar o sistema concentrado de jurisdição constitucional têm a ver com a origem romanística de seu Direito, ou seja, com a civil law, que não contempla o stare decisis, característico da common law.

Essa particularidade faz com que se mostre recorrente, no sistema da civil law, o problema representado pelo conflito entre normas julgadas constitucionais por alguns juízes, e inconstitucionais por outros. Tal dissonância praticamente não existe no sistema da common law em razão da “força dos precedentes”, que decorre do stare decisis, no qual, como visto, as decisões da Suprema Corte vinculam todos os órgãos do Poder Judiciário.

No Brasil, o controle de constitucionalidade originou-se com a promulgação da primeira Carta republicana, em 1891,5 que adotou o modelo de controle difuso norte-americano, sem, contudo, incorporar a sistemática do stare decisis, tendo em vista a tradição romanística de nosso Direito.

4 CAPPELLETTI, Mauro. O controle judicial de constitucionalidade das leis no direito

comparado. Trad. Aroldo Plínio Gonçalves. Porto Alegre: Fabris, 1984.

5 LEWANDOWSKI, Enrique Ricardo. Reflexões em torno do Princípio Republicano.

Revista Justiça & Cidadania, São Paulo, n. 74, set. 2006, p. 6-11.

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Tal adaptação criou um problema para a jurisdição constitucional, uma vez que as decisões do Supremo Tribunal Federal, no controle difuso de constitucionalidade, operavam efeitos apenas entre as partes, ensejando a possibilidade de prosperarem soluções distintas para casos semelhantes.

Visando a atenuar o problema, o constituinte de 1934 resolveu atribuir competência ao Senado Federal para suspender a execução, no todo ou em parte, de qualquer lei ou ato, deliberação ou regulamento declarados inconstitucionais pelo Judiciário (arts. 91, IV, e 96). Tal fórmula foi mantida pelas Constituições de 1946 (art. 64), de 1967/69 (art. 42, VII) e a de 1988 (art. 52, X).

Explicando esse múnus constitucional, atribuído à Câmara Alta, o Relator desta Reclamação, Min. Gilmar Mendes, com base em precedentes da Casa,6 assentou, em seu voto, que

“(...) o Senado Federal não revoga o ato declarado inconstitucional, até porque lhe falece competência para tanto. Cuida-se de ato político que empresta eficácia erga omnes à decisão do Supremo Tribunal proferida em caso concreto. Não se obriga o Senado Federal a expedir o ato de suspensão, não configurando eventual omissão qualquer infringência a princípio de ordem constitucional. Não pode a Alta Casa do Congresso, todavia, restringir ou ampliar a extensão do julgado proferido pelo Supremo Tribunal Federal.”

Como se sabe, com o advento da Emenda Constitucional 16, de 26 de novembro de 1965, inaugurou-se no Brasil o controle concentrado de constitucionalidade dos atos normativos federais e estaduais – à moda kelseniana -, com a criação da representação genérica de inconstitucionalidade por iniciativa exclusiva do Procurador-Geral da República.

6 Voto do Min. Prado Kelly, proferido no MS 16.512, RTJ 38, n. 1, p. 16.

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Interessantemente, apenas em 1977 esta Suprema Corte firmou entendimento no sentido da dispensabilidade da intervenção do Senado Federal nas hipóteses de declaração de inconstitucionalidade de lei proferida em sede de controle abstrato, tendo em conta a ocorrência, nas palavras do Min. Moreira Alves, de “redução teleológica” quanto ao inc. VII do art. 42 da Constituição de 1967/69.

Em parecer administrativo elaborado sobre o tema, o referido Ministro assinalou o seguinte:

“Sou dos que entendem que a comunicação do Senado só se faz em se tratando de declaração de inconstitucionalidade incidente e, não, quando decorrente de ação direta, caso em que, se relativa a intervenção federal, a suspensão do ato é da competência do Presidente da República, e, se referente a declaração de inconstitucionalidade em tese, não há que se falar em suspensão, pois, passando em julgado o acórdão desta Corte, tem ele eficácia erga omnes e não há que se suspender lei ou ato normativo nulo com relação a todos”. 7

Estudando o assunto em sede acadêmica, Gilmar Mendes e Ives Gandra Martins ressaltam que o sistema de controle concentrado de constitucionalidade foi alargado e aperfeiçoado pela Carta de 1988, assentando que ela:

“(...) reduziu o significado do controle de constitucionalidade incidental ou difuso, ao ampliar, de forma marcante, a legitimação para propositura da ação direta de inconstitucionalidade (CF, art. 103), permitindo que, praticamente, todas as controvérsias constitucionais relevantes sejam submetidas ao Supremo Tribunal Federal mediante processo de controle abstrato de normas”.8

7 Cf. Parecer do Min. Moreira Alves no Processo Administrativo 4.477-72, DJ de

16/5/1977, p. 3.123-3.124.

8 MARTINS, Ives Gandra da Silva; MENDES, Gilmar Ferreira. Controle concentrado de

constitucionalidade: Comentários à Lei nº 9.868, de 10-11-1999. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 62.

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Entre as principais inovações trazidas pela Constituição de 1988, destacam-se a extensão do rol de legitimados para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade (art. 103), a exigência de citação do Advogado-Geral da União (art. 103, § 3º), a instituição da ação de inconstitucionalidade por omissão (art. 103, § 2º) e o julgamento, pelo STF, do mandado de injunção (art. 102, I, q), além da possibilidade de os Estados-membros instituírem a ação direta de inconstitucionalidade para o controle da higidez das leis e atos normativos municipais e estaduais em face das Constituições locais (art. 125, § 2º).

Analisando a evolução histórica do instituto, o Ministro Relator construiu as seguintes premissas: [i] não é mais possível atualmente cogitar da divisão clássica de poderes, retratada na Constituição de 1934, que ensejou a criação do instituto da suspensão pelo Senado da eficácia de dispositivo normativo declarado inconstitucional pelo STF; [ii] a Constituição vigente, ao ampliar o rol de legitimados, no controle concentrado, acabou por reduzir o significado do controle difuso; e [iii] o Supremo Tribunal Federal, não obstante essa competência da Câmara Alta, vem conferindo caráter geral a diversas decisões prolatadas no âmbito do controle difuso.

A partir dessas premissas, formulou a seguinte questão:

“Se o Supremo Tribunal pode, em ação direta de inconstitucionalidade, suspender, liminarmente, a eficácia de uma lei, até mesmo de uma Emenda Constitucional, por que haveria a declaração de inconstitucionalidade, proferida no controle incidental, valer tão somente para as partes?”

O Relator, então, salvo melhor juízo, concluiu que o instituto da suspensão de normas inconstitucionais, pelo Senado, “assenta-se hoje em razão de índole exclusivamente histórica”, o que permitiria cogitar-se de uma mutação constitucional no tocante ao art. 52, X, da Constituição de 1988.

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Após bem refletir sobre tal proposição, ouso divergir de Sua Excelência quanto à ocorrência da aludida mutação constitucional, por não entender tratar-se o instituto de mera reminiscência histórica.

É que, primeiro, constato que a Câmara Alta, não tem descuidado do cumprimento dessa relevante competência que os constituintes brasileiros lhe tem atribuído, de forma reiterada, desde o advento da Carta de 1934.

Nesse sentido, assinalo que, entre 7 de fevereiro de 2007 e 16 de junho de 2010, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal pautou, para deliberação dos Senadores, nada menos que 53 ofícios encaminhados por esta Corte, solicitando a promulgação de projeto de resolução para suspender a execução de dispositivos declarados inconstitucionais em sede de controle difuso.

Constatando o mesmo fato, o Min. Joaquim Barbosa, assinalou em seu voto que:

“(...) mesmo que se aceitasse a tese da mutação, entendo que seriam necessários dois fatores adicionais: o decurso de um espaço de tempo maior, para a constatação dessa mutação, e a consequente e definitiva ‘désuetude’ do dispositivo. Ora, em relação a este último fator, impede, a meu juízo, esse reconhecimento um dado empírico altamente revelador: pesquisa rápida na base de dados do Senado Federal indica que desde 1998 aquela Alta Casa do Congresso suspendeu a execução de dispositivos de quase 100 normas declaradas inconstitucionais (sendo sete em 2006, Resoluções do SF de nº 10,11,12,13,14,15 e 16; e uma já, neste ano, em 2007, resolução nº 2 )” (grifos no original).

Já segundo o voto do Min. Eros Grau, que comunga com o entendimento do Ministro Relator, a menção à competência do Senado Federal para

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“suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal”, haveria de ser entendida como “dar publicidade à suspensão da execução, operada pelo Supremo Tribunal Federal, de lei declarada inconstitucional, no todo ou em parte, por decisão definitiva do Supremo” (grifos meus).

Tal interpretação, contudo, a meu ver, levaria a um significativo aviltamento da tradicional competência daquela Casa Legislativa no tocante ao controle de constitucionalidade, reduzindo o seu papel a mero órgão de divulgação das decisões do Supremo Tribunal Federal nesse campo. Com efeito, a prevalecer tal entendimento, a Câmara Alta sofreria verdadeira capitis diminutio no tocante a uma competência que os constituintes de 1988 lhe outorgaram de forma expressa.

A exegese proposta, segundo entendo, vulneraria o próprio sistema de separação de poderes, concebido em meados do século XVIII na França pré-revolucionária pelo Barão de la Brède e Montesquieu, exatamente para impedir que todas as funções governamentais – ou a maioria delas - se concentrem em determinado órgão estatal, colocando em xeque a liberdade política dos cidadãos. O referido teórico, para tanto, concebeu a famosa fórmula segundo a qual “le pouvoir arrete le pouvoir”, de modo a evitar que alguém ou alguma assembleia de pessoas possa enfeixar todo o poder em suas mãos, ensejando, assim, o surgimento de um regime autocrático.

Não se desconhece que alguns críticos asseveram que a teoria da separação de poderes jamais foi aplicada tal como originalmente concebida, consubstanciando mera prescrição de natureza formal. 9 Em

9 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 20 ed. São Paulo:

Saraiva, 1998, p. 220. Assim afirma o autor: “A primeira crítica feita ao sistema de separação de

poderes é no sentido de que ele é meramente formalista, jamais tendo sido praticado. A análise do

comportamento dos órgãos de estedo, mesmo onde a Constituição consagra enfaticamente a separação

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que pesem, contudo, as imperfeições do sistema, que os norte-americanos denominam de checks and balances, após terem-no inserido pioneiramente em sua Constituição de 1787, 10 entendo que elas não têm o condão de legitimar a ablação de uma competência constitucional expressamente atribuída a determinado Poder.

Suprimir competências de um Poder de Estado, por via de exegese constitucional, a meu sentir, colocaria em risco a própria lógica do sistema de freios e contrapesos, como ressalta Jellinek. 11

Não se ignora que a Constituição de 1988 redesenhou a relação entre os poderes, fortalecendo o papel do Supremo Tribunal Federal, ao dotar, por exemplo, as suas decisões de efeito vinculante e eficácia erga omnes nas ações diretas de constitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade (art. 102, § 2º). O fortalecimento do STF, no entanto, não se deu em detrimento das competências dos demais poderes, em especial daquela conferida ao Senado Federal no art. 52, inc. X, da Carta em vigor.

Não há, penso eu, com o devido respeito pelas opiniões divergentes, como cogitar-se de mutação constitucional na espécie, diante dos limites formais e materiais que a própria Lei Maior estabelece quanto ao tema, a começar pelo que se contém no art. 60, § 4º, III, o qual erige a separação dos poderes à dignidade de “cláusula pétrea”, que sequer pode ser alterada por meio de emenda constitucional.

A nova interpretação que se pretende dar ao dispositivo em comento, a meu ver, difere - e muito - da mutação reconhecida quanto ao

dos poderes, demonstra que sempre houve um intensa interpenetração. Ou o órgão de um dos poderes

pratica atos que, a rigor, seriam de outro, ou se verifica a influência de fetores extralegais, fazendo com

que algum dos poderes predomine sobre os demais, guardando-se apenas a aparência da separação”.

10 MACDONAL, Forrest. Novus Ordo Seclorum: The intellectual origins of the Constitution.

Lawrence: University Press of Kansas, 1985, p. 84 e segs.

11 JELLINEK, Georg. Teoria General del Estado. Buenos Aires: ed. IB de F, 2005. p. 747.

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art. 97 da Constituição. Nesse caso, a transformação operou-se a partir de uma práxis processual adotada pela Suprema Corte, que, sem desrespeitar qualquer princípio ou norma fundamental de nosso ordenamento jurídico, acabou por dispensar a rígida observância do que nele se contém quando se trata da apreciação de casos cujas teses já tenham sido julgadas pelo Plenário.

Mas o que se propõe aqui é algo inteiramente diferente. Almeja-se, na verdade, deslocar uma competência atribuída pelos constituintes a determinado Poder para outro. Não me parece, contudo, seja possível materializar-se tal desiderato, mesmo porque os próprios teóricos da mutação constitucional reconhecem que esse fenômeno possui limites.

Nesse sentido, Uadi Lammego Bulos observa que

“A interpretação constitucional, em todas as suas formas de expressão, constitui um meio importante e eficiente para adaptar os dispositivos supremos do Estado às necessidades emergentes do cotidiano.

Todavia, se o ato interpretativo desvirtuar a letra das normas que embasam a Constituição, quebrando a juridicidade dos princípios informadores da ordem constituída, estaremos diante de mutações inconstitucionais”.

Esse é também o entendimento de Anna Cândida da Cunha Ferraz, especialista no tema, para a qual a exegese ensejadora da mutação constitucional apresenta limites, sendo vedada caso contrarie o sentido da norma constitucional. 12

Não se está a afastar, por evidente, a via da interpretação enquanto forma corriqueira e até mesmo salutar de modificação do alcance de uma norma constitucional, a fim de amoldá-la à evolução social. O que se está

12 FERRAZ, Ana Cândida da Cunha. Processos informais de mudança na Constituição. São

Paulo: Ed. Max Limonad, 1986, p. 9-10.

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a repudiar é a alteração de seu conteúdo essencial pela via da exegese. Em outras palavras, a hermenêutica constitucional desborda dos lindes nos quais lhe é lícito atuar quando afronta o próprio âmago da norma, como parece ser a hipótese sob exame.

O festejado Konrad Hesse, em primorosa obra sobre o tema, também faz alusão aos limites da interpretação constitucional, ao consignar que

“(...) uma mudança das relações fáticas pode – ou deve – provocar mudanças na interpretação da Constituição. Ao mesmo tempo, o sentido da proposição jurídica estabelece o limite da interpretação e, por conseguinte, o limite de qualquer mutação normativa. A finalidade (Telos) de uma proposição constitucional e sua nítida vontade normativa não devem ser sacrificadas em virtude de uma mudança da situação. Se o sentido de uma proposição normativa não pode mais ser realizado, a revisão constitucional afigura-se inevitável. Do contrário, ter-se-ia a supressão da tensão entre norma e realidade com a supressão do próprio direito” 13 (grifos nossos).

Para o autor alemão, duas são, portanto, as formas de mutação constitucional: a primeira consiste na revisão do texto magno, quando a “reforma constitucional expressa a ideia de que, efetiva ou aparentemente, atribui-se maior valor às exigências de índole fática do que à ordem normativa vigente”; a segunda corresponde à interpretação que encontra limites na teleologia da norma. 14 Em outras palavras, na impossibilidade de conciliação das exigências de ordem fática com o sentido íntimo da norma, devem os impasses ser resolvidos por meio de emendas à Constituição, por absoluta inadequação das técnicas puramente hermenêuticas.

É evidente que a aplicação da Constituição à realidade fática

13 HESSE, Konrad. A força normativa da Constituição. Trad. Gilmar Ferreira Mendes.

Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1991, p. 22-23.

14 HESSE, Konrad. Op. Cit., p. 22.

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pressupõe o processo de interpretação, até para que suas normas possam acompanhar a natural e permanente evolução dos cânones sociais. Mas existem parâmetros rígidos para tal. O primeiro deles, é, inegavelmente, o próprio sentido literal do texto. Segundo Heidegger, a palavra é essencial para conferir-se o ser às coisas. “Nenhuma coisa é onde a palavra, isto é, o nome, faltar”, diz ele. E a interpretação, por óbvio, há de encontrar limites também - e quiçá em primeiro lugar - na literalidade da norma, ou seja, em sua estrutura semântica. 15

Não me filio, por óbvio, à corrente dos legalistas extremados, que a partir da leitura francesa de Hans Kelsen - divulgador por excelência do positivismo jurídico - acabou por transformar o Estado de Direito em “Estado Legal”, substituindo a supremacia da Constituição pela primazia da lei. A doutrina e a jurisprudência, em um tal contexto, desempenham o papel de meros coadjuvantes relativamente aos preceitos legais.

Claro está que essa ótica, levada às últimas consequências, reduz o papel do Estado-julgador à simples “bouche de la loi”, traduzida na máxima da Escola da Exegese francesa, do século XIX, “in claris cessat interpretatio”, com a qual se buscava entronizar a norma legal em um sacrário inacessível.

Ocorre que, inconformada, “a sociedade reclamou uma renovação do Estado de Direito, exigindo que a lei seja necessariamente expressão da justiça”,16 levando ao fortalecimento do Judiciário, órgão governamental incumbido da magna tarefa de temperar, com a ótica de Themis, as normas

15 PISCITELLI, Tathiane dos Santos. Os limites à interpretação das normas tributárias. São

Paulo: Ed. Quartier Latin, 2007, p. 52. Assim afirma a autora: “A partir da mudança de

paradigma na filosofia, que passou a enxergar o mundo como manifestação da linguagem, verifica-se a

tendência propagada por alguns juristas, no sentido de aplicar as teorias da filosofia da linguagem ao

direito. Esses autores defendem a necessidade de se interpretar o direito como fenômeno linguístico,

abandonando-se a máxima da 'busca da vontade do legislador' e salientando que o sentido das normas

jurídicas deve ser construído mediante a interpretação”.

16 DA SILVA, Enio Moraes, Op. Cit., p. 222.

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eventualmente distanciadas do ideal de equidade.

Observo, ademais, que não se está, no caso, a falar de uma norma de natureza principiológica, à qual falece o atributo da auto aplicabilidade. Ao revés, a estrutura semântica do inc. X do art. 52 sugere tratar-se de um dispositivo constitucional de eficácia plena e aplicabilidade imediata, que não comporta grandes manobras exegéticas por parte de seus intérpretes.

Com efeito, se o dispositivo em questão assinala, com todas as letras, que compete ao Senado Federal a suspensão de norma declarada inconstitucional por esta Corte, assim o é, literalmente. Ainda que se possa, no mérito, discordar do que nele se contém, o preceito em tela constitui o Direito posto, e que não admite, dada a taxatividade com que está vazado, maiores questionamentos.

O renomado mestre José Afonso da Silva, emitindo juízo de valor sobre referido preceito constitucional, assim se manifesta:

“Seria mais prático e expedito que se desse à decisão definitiva do STF o efeito erga omnes a contar de sua publicação, também nos casos de recurso extraordinário (art. 102, III), que é o ponto final do controle de constitucionalidade incidenter tantum. Assim, porém, não quis o constituinte, de sorte que a interferência do Senado é de rigor.

(...)A suspensão é ato político; por isso cabe ao Senado o juízo de

conveniência e a oportunidade para fazê-lo” 17 (grifos nossos).

Reconheço que, na prática cotidiana dos tribunais, as questões decididas pelo STF, no controle difuso de constitucionalidade, têm considerável impacto tanto nas decisões da própria Corte como naquelas proferidas nas demais instâncias jurisdicionais. Não extraio, porém, desse

17 SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 3. ed. São Paulo:

Malheiros, 2007, p. 415-416.

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fato, a força necessária para atribuir novos contornos ao art. 52, X, da Constituição Federal.

Isso porque se está diante de dois fenômenos jurídicos que, embora acarretem resultados semelhantes, não podem ser confundidos entre si. O primeiro corresponde às decisões que produzem o denominado efeito erga omnes, que as tornam oponíveis a todos; o outro se refere às decisões que, pela autoridade do órgão jurisdicional que as prolatou, constituem fonte de Direito, como, de resto, ocorre com a jurisprudência em geral.

Esclareço melhor. Se, por um lado, o Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal confere a seus Ministros a competência para julgar monocraticamente determinado recurso extraordinário quando a decisão está em consonância com a jurisprudência predominante, não estão eles, de outro, obrigados a se curvar ao entendimento predominante na Casa, salvo em se tratando de posição estabelecida em controle concentrado de constitucionalidade ou por meio de súmula vinculante. No primeiro caso, tem-se a manifestação da força dos precedentes da Casa, como fonte de Direito; no segundo, um exemplo da força cogente do efeito erga omnes.

Prossigo, ainda, trazendo à baila uma exceção à regra que, como de praxe, contribui para confirmá-la. Com o advento da EC 45/2004, a nenhum Ministro é dado contrariar posição firmada pelo Supremo Tribunal Federal quanto à existência ou não de repercussão geral de matéria veiculada em determinado recurso extraordinário quando assim decidido pelo Plenário da Casa. Com isso, passou-se a conferir efeito erga omnes a decisões originadas em sede de controle difuso de constitucionalidade. Acontece que, nesses casos, o referido efeito conta com o beneplácito parlamentar, porquanto deriva de emenda constitucional, regulamentada por lei ordinária.

Sem embargo dos muitos julgados zelosamente colacionados pelo eminente Ministro Relator, os quais ilustram a coerência buscada pelos

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integrantes da Corte na compatibilização de seus pronunciamentos com a jurisprudência dominante, em homenagem ao princípio da segurança jurídica, penso que tal cuidado não autoriza a conclusão de que as decisões tomadas no controle difuso de constitucionalidade acabem produzindo efeito erga omnes, independentemente do cumprimento do que se contém no art. 52, X, da Carta de 1988.

Permito-me lembrar que propus exatamente em nome da segurança jurídica, em questão de ordem, ao egrégio Plenário, que conferisse efeito ex nunc às decisões proferidas nos REs 370.682/PR e 353.657/PR, que diziam respeito ao creditamento do IPI na utilização de insumos tributados à alíquota zero.

Ressalto que, naquela ocasião, não defendi a tese de que um precedente do Supremo Tribunal Federal, no controle difuso, tivesse força vinculante. Apenas sugeri a adoção da técnica de modulação dos efeitos daquelas decisões, as quais representaram abrupta alteração do entendimento da Corte acerca da matéria. Lembro, por oportuno, que o Tribunal, em peso, rechaçou a tese por mim ventilada.

De qualquer sorte, entendo que a questão aqui é outra, pois o que se pretende, como visto, é conferir efeito erga omnes às decisões tomadas pela Corte no controle difuso de constitucionalidade, independentemente do pronunciamento do Senado Federal.

Ora, conforme sublinhou o Min. Sepúlveda Pertence, ao proferir seu voto, se se deseja emprestar maior alcance às decisões do Supremo nessa sede, basta lançar mão das súmulas vinculantes. Eis o trecho que interessa de sua manifestação:

“A Emenda constitucional 45 dotou o Supremo Tribunal de um poder que, praticamente, sem reduzir o Senado a um órgão de mera publicidade de nossas decisões, dispensa essa intervenção. Refiro-me, é claro, ao instituto da súmula vinculante, que a Emenda

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Constitucional 45 de 2005, veio a adotar depois de mais de uma década de tormentosa discussão”.

A corroborar essa afirmação, lembro que em 23/12/2009 foi publicada a Súmula Vinculante 26 desta Corte, que incluiu em sua redação o tema discutido no julgado paradigma desta reclamação, cujo teor transcrevo:

“PARA EFEITO DE PROGRESSÃO DE REGIME NO CUMPRIMENTO DE PENA POR CRIME HEDIONDO, OU EQUIPARADO, O JUÍZO DA EXECUÇÃO OBSERVARÁ A INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 2º DA LEI N. 8.072, DE 25 DE JULHO DE 1990, SEM PREJUÍZO DE AVALIAR SE O CONDENADO PREENCHE, OU NÃO, OS REQUISITOS OBJETIVOS E SUBJETIVOS DO BENEFÍCIO, PODENDO DETERMINAR, PARA TAL FIM, DE MODO FUNDAMENTADO, A REALIZAÇÃO DE EXAME CRIMINOLÓGICO” (grifos meus).

Como se vê, sem necessidade de se proceder à nova interpretação do disposto no inciso X do art. 52 da Carta Maior, atingiu-se idêntica finalidade, qual seja, a de se conferir eficácia contra todos e efeito vinculante a um entendimento sufragado por este Tribunal no julgamento de um processo de índole subjetiva.

De fato, é grande o poder conferido a esta Corte pelos constituintes derivados, pois, como registrei em palestra que proferi na Associação dos Advogados de São Paulo, em evento organizado pelo Instituto Victor Nunes Leal, que ao Supremo, não só é dado, agora, conferir efeito vinculante às suas decisões, tomadas reiteradamente em sede de controle difuso de constitucionalidade, por meio de súmulas, como

“(...) poderá modular os seus efeitos temporais ou restringir o seu âmbito material de incidência, delimitando o alcance subjetivo do enunciado, de maneira a torná-lo de observância obrigatória apenas a determinados órgãos ou entes da administração pública federal,

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estadual, distrital ou municipal, casuisticamente, tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse público, assim como o faz nas ADIs (art. 4º da Lei)”. 18

Desse modo, também entendo que é possível e conveniente utilizar o referido instituto para ampliar o alcance das decisões da Corte no controle difuso de constitucionalidade, sem que se vulnere a competência do Senado Federal para manifestar-se sobre o tema, no exercício de uma competência que, como bem acentuou o ilustre Relator, tem um caráter eminentemente político.

Isso posto, pelo meu voto, não conheço da presente reclamação, concedendo o habeas de ofício, com as considerações supra.

18 Palestra sobre a Reforma do Judiciário e as súmulas vinculantes, no ciclo de debates

Diálogos sobre a jurisprudência constitucional brasileira, promovido pelo Instituto Victor

Nunes Leal e a Associação dos Advogados de São Paulo, em 4/12/2009.

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"Waldron acredita que apenas uma constituição que acolhe os princípios da soberania parlamentar e da supremacia da legislação efetivamente trata cada pessoa como igual e respeita o desacordo sobre questões de justiça, moral e política que é inevitável em uma sociedade plural, composta de pessoas livres e iguais.Um sistema jurídico que concede a função de criar direito a um grupo de juízes que não são representantes dos cidadãos, fatalmente entrega a eles o poder de dirigir a comunidade de acordo com as suas convicções pessoais sobre essas questões tormen-tosas, ainda que seja possível admitir que existam verdades objetivas e cognoscíveis pela mente humana em temas sobre justiça, moral e política. Waldron considera que os Estados que adotam um modelo constitucional de supremacia judicial cometem um equivoco político grave e potencialmente desastroso: eles simplesmente colocam em risco o futuro da democracia. E Waldron está também convencido que Kant res-paldaria as suas preocupações e referendaria a sua tese de que o processo legislativo é o meio mais legítimo para coordenar o inevitável desacordo entre concepções pessoais sobre a justiça e o bem e, assim, para erigir uma comunidade política comprometida com a liberdade e a paz." ...

"O filósofo alemão não outorga a tarefa de promover o aperfeiçoamento constitucional a reis filósofos como Platão ou a juízes míticos como Dworkin. Em uma republica constitucional, na qual as instituições representativas estejam funcionando adequada-mente, compete primariamente ao poder legislativo a implantação das leis necessárias para conduzir o Estado na direção da constituição ideal. Esse processo desenvolve-se historicamente, isto é, as mudanças constitucionais que promovem o aperfeiçoamento da republica devem ser realizadas pelos próprios cidadãos no exercício da soberania popular, ao longo do processo histórico de consolidação do ideal republicano. As im-perfeições constitucionais não podem ser corrigidas pela intervenção de órgãos que não representam diretamente a soberania popular. A concretização dos princípios metafísicos do direito não é transcendente à política; ao contrário, é inerente a ela. Por isso, nem deuses ex macchina nem juízes constitucionais podem sub-rogar-se no papel dos cidadãos."Cláudio Ari Mello, Kant e a Dignidade da Legislação, Liv. Do Advogado ed., págs. 157, 158 e 174.

"Este livro foi uma tentativa de fertilização cruzada. Vale a pena aproximar a juris-prudência, um pouco mais do que geralmente se aproxima, das várias maneiras como as pessoas teorizaram sobre a política: pois o direito deve ser visto como fruto da política, diga a jurisprudência o que disser. Espero, contudo, que o livro também tenha o efeito de ajudar os teóricos políticos a perceberem que esses tópicos da filosofia do direito não estão além do seu domínio, mas oferecem um foco útil para refrescar nossa compreensão de textos que, de outra maneira, são por demais conhecidos". Es-tas são as últimas palavras do jurista Jeremy Waldron em "A Dignidade da Legislação", ed. Martins Fontes.

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José Nazareno Cardeal Fonteles é deputado federal (PT-PI) desde 2003. É gradu-ado em Medicina e Matemática. Tem título de especialista pela SBOT em Orto-pedia e Traumatologia. Fez residência médica em Ribeirão Preto/SP e mestrado em Matemática na Universidade Federal do Ceará. Foi ortopedista do Pronto--Socorro do HGV de Teresina por vários anos. É professor licenciado da Univer-sidade Federal do Piauí. Foi vereador de Teresina, deputado estadual do Piauí e secretário de Estado da Saúde do Governo do Piauí. Atualmente é membro da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, da Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados e Coordenador-Geral da Frente Par-lamentar da Segurança Alimentar e Nutricional no Congresso Nacional, através da qual contribuiu para a aprovação da Emenda Constitucional 64/2010, que in-cluiu o direito à alimentação no artigo 6º da Constituição Federal. Também, com apoio da FAO, ajudou a criar a Frente Parlamentar contra a Fome na América

Latina e Caribe.

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