a literatura e a história

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A literatura e a história 1Conseguirão a peça de Césaire e o flme de Peck dizer a história? Colocar esta questão implica não só perguntar o que distingue uma tragédia e um flme de fcção de uma obra histórica sobre o mesmo tema mas igualmente o que esta !ltima pode "azer em relação # fcção$ Com esta re%e&ão sobre a relação da história com a fcção sobre a maneira como a literatura cons egue num outr o patamar de 'erdade dizer a história tocamos o cerne de um debate essencial que tem ocupado as ci(ncias sociais e humanas$ )ão se trata aqui de p*r em e'id(ncia a relação entre literatura+cinema e história mas de questionar especifcamente a natureza desta relação ho,e$ -.esde fnais do século // assistimos no campo da história # aceleração de uma mudança de paradigma uma mudança iniciada nos anos 0$ As noç2es emergentes sublinham a magnitude da crise3 4crise do tempo5 isto é 4crise do "uturo5 e 4clausura do "uturo5 são e&press2es que remetem para o que est6 em ,ogo$ 7e a história se interroga regularmente desde o século /8/ sobre os seus pressupostos teóricos a sua flosofa as bases da sua epistemologia essa mesma história "oi le'ada no fnal do século pas sado a du'idar da imp ermeabilidade das suas "ronteiras a pr6ticas afns da sua capacidade de e&primir todo o passado de apreender a natureza de certos acontecimentos 'iolentos$ 9: certo que as regras da cr;tica histórica e as técnicas de in'estigação garantem ao historiador a pos sibilidade de tra balhar sobre um tóp ico apo iando<se nos pressupostos da sua ci(ncia mas em determinados pontos questionamen tos precisos p2em em causa as certezas$ .e'er<se<6 notar entre outras a questão da escrita da história a natureza e os limites da 'erdade resultante da operação histórica o estatuto do testemunho e dos arqui'os a relação da história com a literatura$ =ste questionamento simultaneamente  epistemológico e flosófco surge nos primeiros anos deste século no momento em que ,o'ens romancis ta s in'estigam a história traum6tica do século // nomeadamente a 7egunda >uerra undial e a 7hoah com o ob,eti'o de dizer uma história que esses próprios autores não conheceram$ @s escritores em causa 'oltam # história apropriam<se de certas técnicas de in'estigação trabalham os arqui'os num conte&to social em que as testemunhas diretas praticamente ,6 desapareceram$ =sta literatura diz a história de maneira particular re'elando uma outra relação não com o tempo mas com a memória do tempo que passa com o que essa memória passou a signifcar para uma sociedade onde abundam os traços materiais do passado$ estam poucas d!'idas de que a literatura B mas o mesmo poderia ser dito sobre o cinema B in'este no campo da história quando esta é con"rontada com os seus limites epistemológicos$ 7er6 um pouco 'ão a partir deste ponto de 'ista querer constituir história e literatura como par antitético pois o que as distingue são antes de tudo regimes de 'er dade di"erentes aos quais o recetor não atribui o mesmo alcance$ Dm romance uma peça de teatro ou um flme sobre a 7hoah apropriam<se de uma série de acontecimentos e de atores sociais a fm de os trans"ormar em intriga e em personagens e ao "az(<lo criam discursos inscritos num conte&to histórico que e&plica em parte o que esses discursos signifcam$ A 'erdade de um tal te&to de fcção é "requentemente acoplada #s "ontes históricas sem no entanto se tornar numa obra identifcada como histórica$ Euanto aos historiadores con"rontados com o acontecimento 'iolento socorr em<se da fcção com o ob,eti'o de tornar sens;'el a pala'ra muda nomeadamente a da ';tima anónima$ F: neste conte& to de mist ur a de neros e de pr 6ticas que se coloca com prem(ncia a questão da 'erdade tanto a da história como a do romance$ A 'erdade e&iste por si só ou e&istir6 uma 'erdade histórica e uma 'erdade liter6ria GCoquio -19H? )ão se esgotar6 a questão da natureza da relação da literatura com a história a tentar responder<lhe pois como se sabe estamos perante dois regimes

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7/23/2019 A Literatura e a História

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A literatura e a história

1Conseguirão a peça de Césaire e o flme de Peck dizer a história? Colocar estaquestão implica não só perguntar o que distingue uma tragédia e um flme de fcçãode uma obra histórica sobre o mesmo tema mas igualmente o que esta !ltimapode "azer em relação # fcção$ Com esta re%e&ão sobre a relação da história com a

fcção sobre a maneira como a literatura consegue num outro patamar de'erdade dizer a história tocamos o cerne de um debate essencial que tem ocupadoas ci(ncias sociais e humanas$ )ão se trata aqui de p*r em e'id(ncia a relaçãoentre literatura+cinema e história mas de questionar especifcamente a naturezadesta relação ho,e$

-.esde fnais do século // assistimos no campo da história # aceleração de umamudança de paradigma uma mudança iniciada nos anos 0$ As noç2es emergentessublinham a magnitude da crise3 4crise do tempo5 isto é 4crise do "uturo5 e4clausura do "uturo5 são e&press2es que remetem para o que est6 em ,ogo$ 7e ahistória se interroga regularmente desde o século /8/ sobre os seus pressupostosteóricos a sua flosofa as bases da sua epistemologia essa mesma história "oile'ada no fnal do século passado a du'idar da impermeabilidade das suas

"ronteiras a pr6ticas afns da sua capacidade de e&primir todo o passado deapreender a natureza de certos acontecimentos 'iolentos$

9: certo que as regras da cr;tica histórica e as técnicas de in'estigação garantemao historiador a possibilidade de trabalhar sobre um tópico apoiando<se nospressupostos da sua ci(ncia mas em determinados pontos questionamentosprecisos p2em em causa as certezas$ .e'er<se<6 notar entre outras a questão daescrita da história a natureza e os limites da 'erdade resultante da operaçãohistórica o estatuto do testemunho e dos arqui'os a relação da história com aliteratura$ =ste questionamento simultaneamente epistemológico e flosófco surgenos primeiros anos deste século no momento em que ,o'ens romancistasin'estigam a história traum6tica do século // nomeadamente a 7egunda >uerraundial e a 7hoah com o ob,eti'o de dizer uma história que esses próprios autoresnão conheceram$ @s escritores em causa 'oltam # história apropriam<se de certastécnicas de in'estigação trabalham os arqui'os num conte&to social em que astestemunhas diretas praticamente ,6 desapareceram$ =sta literatura diz a históriade maneira particular re'elando uma outra relação não com o tempo mas com amemória do tempo que passa com o que essa memória passou a signifcar parauma sociedade onde abundam os traços materiais do passado$ estam poucasd!'idas de que a literatura B mas o mesmo poderia ser dito sobre o cinema Bin'este no campo da história quando esta é con"rontada com os seus limitesepistemológicos$

7er6 um pouco 'ão a partir deste ponto de 'ista querer constituir história eliteratura como par antitético pois o que as distingue são antes de tudo regimes

de 'erdade di"erentes aos quais o recetor não atribui o mesmo alcance$ Dmromance uma peça de teatro ou um flme sobre a 7hoah apropriam<se de uma sériede acontecimentos e de atores sociais a fm de os trans"ormar em intriga e empersonagens e ao "az(<lo criam discursos inscritos num conte&to histórico quee&plica em parte o que esses discursos signifcam$ A 'erdade de um tal te&to defcção é "requentemente acoplada #s "ontes históricas sem no entanto se tornarnuma obra identifcada como histórica$ Euanto aos historiadores con"rontados como acontecimento 'iolento socorrem<se da fcção com o ob,eti'o de tornar sens;'el apala'ra muda nomeadamente a da ';tima anónima$

F: neste conte&to de mistura de géneros e de pr6ticas que se coloca comprem(ncia a questão da 'erdade tanto a da história como a do romance$ A 'erdadee&iste por si só ou e&istir6 uma 'erdade histórica e uma 'erdade liter6ria GCoquio

-19H? )ão se esgotar6 a questão da natureza da relação da literatura com ahistória a tentar responder<lhe pois como se sabe estamos perante dois regimes

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de 'erdade di"erentes dois regimes de 'erdade que respondem a dois tipos derelação com a escrita o que corresponde a um ponto central$ A supostaneutralidade da escrita histórica baseada numa con"usão entre os pressupostoscient;fcos que o historiador adota e a transposição para a escrita não passa deuma miragem pois não e&iste uma escrita<tipo comum ao con,unto doshistoriadores$ : ,ustamente isso que de"ende Patrick Ioucheron historiador da

8dade édia num contributo sobre a relação entre fcção e história3

A maneira com que o discurso do historiador garante a sua própria cientifcidade ese demarca da in'enção fccional Gou simplesmente da suspeita que pesa sobre aposs;'el indistinção entre o discurso 'erdadeiro e o discurso in'entadoH não é nadamais do que um processo narrati'o J$$$K$ GIoucheron -113 LH

MPor isso o historiador escre'e utiliza processos narrati'os um estilo sóbrio eacadémico sem d!'ida mas tratar<se<6 de uma escrita do mesmo estilo da doromance? Pierre )ora tentou responder a esta questão apontando para um certon!mero de di"erenças entre a escrita da história e a escrita romanesca$ @ problemaé que # semelhança dos que se debruçaram sobre esta questão o que )ora prop2ea propósito da especifcidade da escrita histórica poderia sem difculdade seraplicado ao género romanesco$

0Assim argumenta que 4JNK a história é o produto de um lugar  social do qualemana tal como os bens de consumo são produzidos por uma empresa3 h6umafábrica da história5 G)ora -113 1H$ Poder<se<ia dizer precisamente o mesmopor e&emplo de um romance policial ou de fcção cient;fca ou mesmo histórico$ @autor acrescenta na mesma ocasião que 4esta relação com o corpo social é opróprio ob,eto da história5O ora o romance e&iste também e "undamentalmente emrelação com o corpo social$ Além disso certas afrmaç2es do historiador causamproblemas num outro mbito$ Euando afrma por e&emplo que 4a história demaneira distinta do romance que se pode escre'er apenas com a fnalidade dadistração certifca a e&ist(ncia de um mundo comum5 poder<nos<emos questionar

sobre que linha lógica )ora '( entre esse romance escrito com a fnalidade dadistração e a história que essencialmente confrma que partilhamos o mundo$Além disso embora pretenda abordar a especifcidade da escrita "ala da histórianão como escrita mas como disciplina e do romance não como pr6tica liter6ria mascomo intenção Gdistrair o recetorH$

Q)ota<se que quando se trata de distinguir a história da literatura não é raro oe&periente historiador ao rei'indicar ser capaz de o "azer contribuir ainda maispara a con"usão$ ona @zou" por sua 'ez ,ulga ter encontrado a principal distinçãoentre as duas pr6ticas na noção de 'erosimilhança$ As benevolentes de RonathanSittell ser'e aqui de contraponto$ 7e e&istir um só erro neste romance de"ende@zou" então o leitor de'e desconfar do con,unto$

Aqui h6 uma "ronteira cruzada uma transgressão que abala a nossa crença deleitor$ = esta simples obser'ação basta para mostrar toda a distncia que separa odiscurso romanesco do discurso histórico3 o historiador não pode "azer .anton casarcom qualquer uma$ @ romancista pode mas paga esta liberdade com o ceticismodo seu leitor$ G@zou" -113 1H

LDma 'ez mais é o historiador que con"unde aqui os dois n;'eis de 'erdade$ @recetor esse sabe onde se encontra sabe que tem um romance nas mãos bemdocumentado certamente mas um romance$ Euando se trata no mesmo lugar dedistinguir as pr6ticas liter6rias e romanescas @zou" apoia<se primeiro em critériosde cientifcidade Ge.g$ o historiador não pode e'itar o re"erente as datas e os "eitosas notasH antes de admitir que no fnal de contas tal pouco importa pois estamosperante dois tipos de relação com a 'erdade G@zou" -113 --H$ Euanto # escrita@zou" e )ora parecem não 'er o essencial nomeadamente que se o historiadordesen'ol'e um estilo B a 4bela linguagem5 isto é a eloqu(ncia "ruto do ensino de

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trabalhos uni'ersit6rios de leituras B este distingue<se do trabalho liter6rio sobre al;ngua$

1)este mbito a literatura e o cinema dizem a história mas num conte&toparticular onde a memória Go lado a"eti'o da relação do homem com o seu passadoHimporta tanto como a história Ga abordagem cient;fca ao passadoH$ = se a noção de

'erdade est6 de regresso nos discursos e nas preocupaç2es epistemológicas "6<loacompanhada de outras noç2es tais como memória ,ustamente mas tambémcatarse ,ustiça reparação GCoquio -19H$ A =uropa no século // esse continentede tre'as como lhe chamou o historiador arcus azoTer p*s<se sob o e"eito da ,ustiça a 'oltar ao seu passado tanto atra'és da memória como da história$ icoeuridentifcou este momento de con"usão em que emerge a noção de de'er dememória esta 4memória compelida5 posta em concorr(ncia com a históriaconcebida como disciplina cient;fca$ =sta in,unção parece f&ar os termos daalternati'a3 lembrar<se atra'és de uma multitude de comemoraç2es e decerimónias ou estudar o passado em toda a sua comple&idade$ icoeur 'ia nestede'er um aspeto duplo 4como se impondo de "ora ao dese,o e como e&ercendouma coação sentida sub,eti'amente como obrigação5 Gicoeur -3 10H$ : dombito então da ,ustiça con,ugar estes dois aspetos a fm de permitir ao corpo

social retirar da rememoração um ensinamento bem como uma no'a ética para o"uturo$ : certo que icoeur considera o de'er de memória perante a 7egunda>uerra undial e nunca em relação ao colonialismo e aos seus crimesO contudo asre%e&2es do flóso"o a,udam a pensar uma Urança uma Iélgica ou um Portugalpós<coloniais onde o =stado reconheça os seus crimes perante o @utro o que Balém da possibilidade de "azer ,ustiça B "a'orece a emerg(ncia de uma históriapartilhada que dei&e de ser uma história em con%ito Gibidem3 1QH$

11ecordar as ';timas da 7hoah sem d!'ida mas é necess6rio igualmente recordaro so"rimento ignorado produzido em grande parte como não e&istente desses@utros brutalizados pela =uropa durante o per;odo colonial$ Como lembrouaphaVlle >uidée G-19H é por as 'ozes das ';timas se apagarem que est6emergindo a in,unção imperiosa3 é necess6rio contar pois o esquecimento é quasetão monstruoso como o próprio crime$ Uace ao crescimento do n!mero de ';timas ede oprimidos acrescenta tornou<se imposs;'el para a história ter garantia e&clusi'ada 'erdadeO o recurso # arte em geral e # literatura em particular torna<seindispens6'el se quisermos apro&imar<nos um pouco mais da realidade doso"rimento$ A literatura e o cinema encontram<se desta maneira na con%u(nciadas noç2es de regime de 'erdade de memória e de história$ Como 'eremos mais #"rente ambos participam da história dizem parcialmente a história e ao mesmotempo coagem o recetor a lembrar<se de um passado mal conhecido e"requentemente manipulado por um discurso anterior$

1-Parece claro que Aimé Césaire e aoul Peck dizem a história a partir de um outroponto de 'ista sem ,amais perderem de 'ista a história hegemónica mas B e esta

questão é essencial B dizem<na num conte&to di"erente3 o primeiro pega emSumumba quando ainda não tinha tido lugar o ato de reparação da parte doopressor o segundo quando o =stado belga analisa apro"undadamente a suaparticipação no crime e apresenta o seu pedido de desculpas # "am;lia e ao po'ocongol(s Ga reparação moral do crime cometido em relação aos outros de que"ala'a icoeurH$ A partir deste ponto de 'ista Césaire e Peck são ambos apanhadosGe empenhadosH na história "azendo ao mesmo tempo parte da história das suaspr6ticas respeti'as$

A importncia do conte&to histórico para entender o propósito de Césaire e de Peck

1 )ote<se que para os obser'adores contemporneos dos acontecimentosem questão a colusão entre o e G$$$H

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19Para responder # questão colocada no in;cio deste artigo é preciso ter em contaas especifcidades dos dois meios mas igualmente o conte&to no qual as duasobras "oram produzidas$ A primeira 'ersão da tragédia de Césaire data de 1LMMmomento em que obutu assegura o seu poder sobre o Congo após oesmagamento da rebelião no Seste do pa;s com a a,uda de tropas belgas$Contempornea dos "actos que ser'em de base # peça esta descre'e a queda de

Sumumba o homem de e&ceção e a emerg(ncia de um poder neocolonial$ Césaireconhece o papel desempenhado pelo =stado belga na morte do primeiro<ministrosabe que sem esse papel teria sido di";cil a obutu a ascensão ao poder e a suamanutenção$1 Euando apresenta a 'ersão defniti'a da peça em 1L09 obutu queseria em bre'e considerado 4o dinossauro5 por causa da sua longe'idade pol;ticaGIraeckman 1LL-H reina incontestado sobre o Waire sempre com o apoio dos=stados Dnidos da Urança e em menor grau por causa das nacionalizaç2esconsecuti'as # pol;tica de autenticidade da Iélgica$ Xorna<se assim necess6rio releresta peça # luz das descolonizaç2es das inter'enç2es armadas das e&<pot(nciascoloniais e da instauração de regimes "ortes estruturados em torno de partidos!nicos$

2 Uoi o que notou precisamente um dos especialistas das dramaturgias

a"ricanas pós<coloniais3 4A 'iol G$$$H

1Além disso Une saison au Congo não "az realmente sentido se não "or integradano que denominamos dramaturgias da descolonização um con,unto de te&tos amaioria tragédias que colocam em cena personagens de e&ceção empenhadas naluta pela independ(ncia dos seus pa;ses respeti'os$ Como outros dramaturgos dosmundos a"ricanos e das Cara;bas Césaire descre'e uma personagem neste casoSumumba resistindo em nome do coleti'o # opressão colonial e neocolonial$ 7ena sua tragédia capta Sumumba no momento em que começa a sua 'ida p!blicaem Séopold'ille B Peck "ar6 o mesmo B é por ter decidido descre'er a curta carreirapol;tica e a morte daquele socorrendo<se da estrutura da narrati'a messinica$ Asucessão de acontecimentos que conduzem # queda do ser de e&ceção B em

fdelidade com a realidade B tendem a dot6<lo de um signifcado para acomunidade$ .ito por outras pala'ras a maioria destas personagens sãoapanhadas num ,ogo de tens2es dialéticas das quais não conhecem todas asregras e por isso acabam por morrer mas esta morte pelo seu lado sacrifcialacaba por apontar para a possibilidade de uma s;ntese superior a da nação unida'i'endo num =stado democr6tico$ A fgura oscilando entre história e mito d6 assimsentido # coleti'idade$2

3 @ original neerland(s "oi publicado em 1LLL GDe Moord op LumumbaH a'ersão "rancesa em - e a t G$$$H

1F7e em certos pontos o flme de Peck segue a tragédia de Césaire

nomeadamente no que diz respeito # trans"ormação de Sumumba em personagemmessinica o conte&to no qual se inscre'e é di"erente$ @s anos 1LL marcam de"acto uma 'iragem nas relaç2es entre o =stado belga e a ep!blica .emocr6tica doCongo G.CH$ Dma série de "atores ocorridos na !ltima década do século passadoe&plica em grande parte a natureza dessas mudanças$ =m primeiro lugar deu<seem 1LL0 a queda do regime autorit6rio de obutu atra'és da pressão de umarebelião dirigida por Saurent<.ésiré Yabila e apoiada por pa;ses 'izinhos em que seinclu;a o uanda$ 7e a história das relaç2es amb;guas entre o potentadopós<colonial e uma parte do mundo pol;tico belga ainda est6 por escre'er podemos ,6 afrmar que as ligaç2es entre os dois polos se tinham deteriorado "ortementedepois do in;cio dos anos L em consequ(ncia entre outros do massacre deestudantes na Dni'ersidade de Subumbashi G11<1- de maio de 1LLH$ : tambémnecess6rio ter em conta a mudança na Iélgica da maioria pol;tica a n;'el "ederal

em 1LLL com a passagem dos democratas<cristãos para a oposição e a criação deuma coligação inédita entre liberais socialistas e ecologistas mais inclinados do

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que os seus predecessores a uma re'isão do passado colonial e claramente a "a'orde um tipo de relação di"erente com Yinshasa$ : neste conte&to que o sociólogoSudo .e Zitte G-H publica a sua in'estigação sobre as circunstncias da mortedo primeiro<ministro congol(s3 publicação que est6 na origem da comissão deinquérito parlamentar 'isando estabelecer ofcialmente a responsabilidade do=stado belga nesses acontecimentos$ Para compreender o conte&to sociopol;tico da

criação desta comissão de inquérito aparentemente um caso !nico na históriarecente dos pa;ses colonizadores é necess6rio ter em conta a trans"ormaçãoinstitucional do =stado3 uma estrutura "ederal em que cada entidade "ederal sereposiciona em relação # história nacional$ Por fm de maneira concomitante umasérie de mani"estaç2es culturais e de li'ros desses anos interrogam o passadocolonial de maneira cr;tica e in"ormada G>illet -03 09<0FH$

1MContemporneo dos acontecimentos pol;ticos acima sublinhados Lumumba deaoul Peck Gcoprodução "ranco<belga<alemãH estreia em - e participa desse'asto con,unto de te&tos de di'ersos tipos que regressam ao passado colonial$ Xorna<se assim necess6rio ter em conta este conte&to particular a fm de captar emparte os signifcados da peça e do flme$ : preciso também atender #s suasespecifcidades respeti'as pois a an6lise de uma peça e de um flme numa

perspeti'a comparada con'oca "erramentas narratológicas di"erentes adaptadas aoseu ob,eto$ Contudo ambos os bens simbólicos t(m em comum o "acto de tereme'idenciado a importncia por um lado das representaç2es hegemónicas oriundasdas antigas metrópoles e por outro lado os ,ogos de tensão entre a cena ofcialconstru;da como tal pelas representaç2es medi6ticas dominantes e os bastidores daação pol;tica onde uma série de atores prepara a queda do go'erno de Sumumba$

10[ semelhança do que se passa numa tragédia a peça e o flme descre'em aqueda de um homem de poder captando<o no momento em que preso numa redecomple&a de causas est6 prestes a cair$ A escolha da pala'ra é essencial aqui poisse Césaire e Peck basearam as suas produç2es respeti'as num importante trabalhode documentação trans"ormaram o ator pol;tico em personagem de fcção maisespecifcamente em personagem de tragédia$ =mbora Peck tenha iniciado o flmecom um cartão em que anuncia que se trata de 4uma história 'erdadeira5 tudo naobra contribui para a fccionalidade3 a montagem a m!sica de "undo a 'oz<o\  deSumumba a dirigir<se # mulher após a e&ecução$ Xanto Une saison auCongo como Lumumba abrem respeti'amente com uma cena e uma sequ(ncia queassumem o seu estatuto de fcção$

Assumir a fcção para dizer a história

1Q7abemos que a cena de abertura numa tragédia tem uma "unção in"ormati'a3ainda que se destine ao duplo recetor de qualquer te&to de teatro 'isa sobretudo oespetador$ Algumas personagens são assim incumbidas de o in"ormar sobre ocronótopo a identidade e a "unção das personagens principais$ A didasc6lia inicial

de Une saison au Congo situa a ação num 4bairro a"ricano de Séopold'ille5 e doponto de 'ista temporal pouco antes da independ(ncia$ Césaire trabalha demaneira a induzir um e"eito de 'eracidade ao emaranhar a sua fcção comelementos 'er;dicos$ Assim Sumumba é apresentado como um cai&eiro<'ia,anteisto é o representante comercial encarregado de 'ender cer'e,a Polar o que afgura histórica "oi de "acto$ )ote<se que o dispositi'o te&tual duplica o dispositi'océnico 'irtual3 o bonimenteur  est6 em cena ator encarregado de 'ender a suamercadoria posição que ele apro'eita para res'alar do dom;nio do comércio para oda pol;tica$ .ois pol;cias belgas 'igiam esta cena dentro da cena e in"ormam orecetor da identidade do re'endedor$ @ teatro assume<se aqui como lugar de fcçãocomo fcção a ser "eita$ Assim a didasc6lia da cena 88 indica que entre idas e'indas se instala um bar a"ricano enquanto a 'oz do tocador de sanza cu,a "unçãoé a do comentador cr;tico da ação em curso ou então de anunciador do que se

seguir6 se ou'e no "ora de cena$

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1LPor seu lado a longa sequ(ncia de abertura do flme de Peck di'ide<seclaramente em duas partes$ A primeira tende a mostrar por um lado que aspopulaç2es locais "oram ob,eto de espoliação e de 'iol(ncias por parte dasautoridades coloniais e por outro lado atra'és da montagem paralela que aorigem do =stado pós<colonial de'e ser procurada no Congo colonial$ A sucessão derepresentaç2es "otogr6fcas e ";lmicas é re'eladora da intenção inicial do realizador$

@ flme começa com "otos da época a preto e branco acompanhadas de umam!sica de "undo mostrando a Force Publique em manobras seguida de uma outratambém a preto e branco de uma "am;lia anónima com ar triste a olhar f&amentepara a ob,eti'a$ A esta sucede<se atra'és da fgura do esbatimento encadeadouma curta sequ(ncia ";lmica mostrando em grande plano mãos a segurar um copode champanhe$ Dm no'o esbatimento encadeado le'a o recetor para o per;odocolonial com uma "oto de trabalhadores negros a empurrar um carrinho de mão'igiados por brancos$ : de sublinhar que se trata de um postal com a seguintelegenda em "ranc(s e neerland(s3 4Congo belga3 os primeiros meios detransporte5$ Dm outro esbatimento encadeado le'a<nos # "esta antes da passagema uma no'a "oto de um anónimo tirada de "rente$ 7empre atra'és do esbatimentoencadeado passamos a um grande plano de uma mão a cortar um pedaço de carnede uma cabeça de porco$ 7ucede<se uma série de duas "otografas a primeira a

mostrar duas mulheres agrilhoadas sob a guarda de um soldado da ForcePublique e a segunda um homem anónimo "rente # cmara$ A sequ(ncia retornaentão # "esta atra'és do esbatimento encadeado, com homens e mulheresbrancos e negros a comer e a beber$ Dma no'a série de "otografas da épocainter'ém como contraponto # "esta primeiro a de um homem prostrado no chãoalgemado submetido ao chicoteO a esta sucede<se uma que representa tr(s"uncion6rios coloniais com um negro sentado no chão "rente a uma mesa sobre aqual ,azem dois crnios humanos$ )ote<se que B algo essencial no mbito destaan6lise B o grupo olha para a ob,eti'a da m6quina "otogr6fca$ Dma terceira imagemconclui a série3 trata<se da e&ecução de um negro anónimo por en"orcamento que"oi ob,eto de um postal com a seguinte legenda 4=&ecução de um negro em Ioma5$A montagem le'a então o recetor # cerimónia B 'emos a; obutu no seu tronorodeado de soldados e de con'idados os da "esta 'islumbrados no in;cio dasequ(ncia$ @ fnal desta sequ(ncia alterna uma "oto a preto e branco de um grupode soldados da Force Publique com os seus ofciais brancos o retorno ao p!blico da"esta "rente a obutu e uma !ltima "oto a preto e branco de um outro p!blicocaptado numa posição semelhante Gtrata<se de uma cerimónia colonialH$ Dmesbatimento a negro encerra esta comple&a sequ(ncia inicial$

-](<se desde o in;cio que Peck p2e em cena # medida que a interroga a questãoda representação$ Para o )orte colonial o @utro colonizado praticamente nãoe&istiu a não ser atra'és da representação "otogr6fca e ";lmica Glembranças de"am;lia postais reportagensH$ Sumumba não escapou a este 'asto sistema derepresentaç2es e de construç2es medi6ticas tendo sido apresentado ao p!blicobelga como um agitador perigoso 'endido aos interesses de osco'o$ Como "oi

sublinhado por Sassi e Xcheu^ap retornar # fgura de Sumumba signifca igualmenteretornar ao discurso medi6tico hegemónico a fm de o desconstruir3

A questão central é preciso diz(<lo é a da palavra, da narra!o e da representa!o$@ discurso que ,ustifca o empreendimento imperialista mascarando todas asatrocidades coloniais de obras de benefc(ncia tal como é ilustrado pela locução dorei dos Ielgas é necessariamente desconstru;do$ GSassi e Xcheu^ap -L3 QQO 'erigualmente Iarr -113 Q0H

-1 Xer<se<6 notado a importncia do olhar nas "otos selecionadas por Peck3 su,eitoscoloniais todos anónimos olham f&amente a ob,eti'a da m6quina "otogr6fca eatra'és dela o recetor$ Eue dizem os olhares tristes? Como interpretar a "oto de"am;lia em que ninguém esboça um sorriso? : a isso que nos con'ida igualmente

Peck ao mostrar<nos fnalmente o p!blico da "esta da qual ti'éramos até entãoapenas segmentos3 um grupo também ele anónimo f&a a cmara com ar sério

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"rente a um obutu com postura hier6tica "ace imperturb6'el separado do p!blicopor um cordão de soldados$ A fgura doesbatimento encadeado simultaneamentefgura de retórica ";lmica e e"eito de montagem "requentemente associado a umacinematografa mais cl6ssica G]ernet 1LQQ3 FL<QQO ]illain 1LL13 11<11MH permiteapro&imar duas épocas mas igualmente dois n;'eis de 'erdade o da "oto a preto ebranco do per;odo colonial e o do flme a cores de Peck$ Cabe assim ao recetor

apreender o sentido produzido pela apro&imação3 a montagem instaura umarelação lógica de causa e"eito entre a situação colonial e&ibida nas "otos e asituação pós<colonial mostrada pelo flme$ Por outras pala'ras estamos narepresentação mas uma representação pró&ima pelo menos após esta abertura darealidade$ @ presente e&plica<se aqui pelo passado$

--Ao escolher uma montagem baseada numa fgura de re"er(ncia bem como numaligação lógica de causalidade Peck insere Lumumba simultaneamente no cinemada lisibilidade GAumont e arie -Q3 FH e num subgénero cinematogr6fcoo biopic "undado nos mesmos princ;pios narrati'os GIingham -1H$ @ pacto entreesta pr6tica e o seu recetor baseia<se em grande parte na credibilidade que ested6 #s in"ormaç2es dadas ao longo do flme pois ter6 de acreditar na realidade dosacontecimentos Ga conspiração contra SumumbaH sabendo<os "alsifcados Gtrata<se

de uma fcçãoH$ : esta e&ig(ncia que e&plica a inserção de um cartão no fnal destaprimeira parte da introdução que resume a história do Congo em duas datas3 1QQFGo Congo torna<se propriedade pessoal do rei Seopoldo 88H e 1LM GSumumbatorna<se primeiro<ministroH$ A afrmação que "echa o cartão B 4=sta é uma história'erdadeira5 B tende e'identemente a re"orçar a 'eracidade da narrati'a ";lmica quese seguir6 uma narrati'a que para pro'ar o seu respeito pela história tender6 are"orçar a sua lisibilidade a "azer esquecer que se trata de uma fcção algo queconstitui uma das marcas da cinematografa cl6ssica GAumont e arie -Q3 1MH$@ra representar uma parte da 'ida de Sumumba coloca a questão do que semostra e consequentemente do que se oblitera e da maneira de como se mostra$Césaire por seu lado multiplicar6 os e"eitos de distanciamento de mise en ab"menomeadamente atra'és dos coment6rios do tocador de sanza da alternncia entredi6logos e partes cantadas o que obriga o recetor a uma maior 'igilncia uma 'ezque lhe lembram constantemente que est6 perante uma fcção$

4 A an6lise ";lmica "ala a este propósito de "ocalização mental ou 'oznterior3 4@s pensamentos da p G$$$H

-9A segunda parte da introdução do flme representa um Sumumba "erido nointerior do carro que o le'a para o local da sua e&ecução$ @ que nos é dado aqui é oponto de 'ista narrati'o que se encarregar6 da diegese$ A personagemautodiegética descre'e atra'és de "ocalização interna o que acontecer6 ao seucorpo3 um plano apro&imado mostra Sumumba com a boca "echada o olhar f&andoo 'azio como que dirigido para si próprio a sua mensagem pro'indo da bandasonora como se se tratasse do seu esp;rito$4 =ste endereçamento tem um duplorecetor3 de "acto para l6 do tempo atra'és da fcção Sumumbadirige<se # suamulher mas também atra'és dela ao recetor do flme$ .uas prolepses de estatutodi"erente acompanham as pala'ras de Sumumba3 a primeira mostra os doismercen6rios belgas encarregados de desmembrar e "azer desaparecer o corpo deSumumba e dos seus companheirosO a segunda alicerçada em imagens de arqui'oa preto e branco representa alguns planos bre'es de mani"estaç2es pró<Sumumbaem cidades anónimas na =uropa ou nos =stados Dnidos$ A apro&imação entre osdois espaços<tempos atra'és da montagem induz o recetor a con"erir<lhes umestatuto de 'eracidade semelhante embora a primeira prolepse pertença aodom;nio da fcção ainda que no essencial se apro&ime do que se passou na alturaenquanto a segunda remete para um outro regime de 'erdade o das imagensgra'adas logo após o an!ncio da morte de Sumumba$

-A esta sucede<se uma analepse bastante surpreendente para o recetor pelomenos para o recetor pouco conhecedor de uma história que en'ol'e m!ltiplos

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atores$ eencontramos Sumumba em Séopold'ille pouco após o seu regresso deAccra em plena discussão com os seus ad'ers6rios pol;ticos do Yatanga$ Asameaças de o_se Xshombe ao "uturo Primeiro<inistro permitem atra'és daligação da causalidade a montagem com a sequ(ncia seguinte onde sempre em"ocalização interna Sumumba relata a sequ(ncia de e'entos Gas pala'rasacompanham o plano da traseira do camião que transporta os cad6'eres dos tr(s

homens assim como o material destinado a "azer desaparecer os corposH$ : apósesta introdução comple&a que começa a 'asta analepse que conduz o recetor dachegada de Sumumba a Séopold'ille até # sua morte$

-FA partir deste instante o flme de Peck e a peça de Césaire representam emparte o que "oram os !ltimos meses de 'ida de Sumumba um e outro dando umponto de 'ista sobre a história do Congo independente$ As duas obras contribuemcom os meios do teatro e do cinema para a edifcação de um discurso históricorelati'o #s raz2es que conduziram # queda do dirigente congol(s$ 7eria erradodes'alorizar os te&tos com base no seu estatuto de fcção3 o regime de 'erdade dafcção di"ere certamente do da historiografa como 'imos no in;cio mas não dei&ade se tratar de uma 'erdade que de'e apenas ser analisada com instrumentosdi"erentes$ Como sinaliza'a h6 pouco é necess6rio compreender que a 'erdade da

fcção depende do conte&to no qual essa fcção "oi produzida$ Por outras pala'rasanalisar uma peça ou um flme "az sentido em parte se ti'ermos em conta oconte&to de enunciaçãoO em parte pois os signifcados de um te&to Gneste sentidotanto importa se se trata de um flme ou de uma tragédiaH ,ogam<se também naan6lise das suas caracter;sticas "ormais e simbólicas$ Assim a an6lise de cenas dapeça de Césaire e de sequ(ncias do flme de Peck apenas "azem sentido quandoinscritas numa totalidade que en'ol'a simultaneamente o te&to e as suasestratégias narrati'as e retóricas e o conte&to da enunciação$ =ste trabalho sobre amaneira com que a arte produz ela própria discursos sobre a história "az ainda maissentido quando se trabalha a partir de uma perspeti'a comparada re'eladora dascaracter;sticas inerentes a uma e outra pr6tica art;stica$

5 Uoi o caso de Urank Carlucci segundo secret6rio da =mbai&ada dos=stados Dnidos agente da C8A es G$$$H

6 7egundo omuald Uonkoua Césaire modifcou o nome de obutu paraokutu a fm de e'itar um processo G$$$H

7 Césaire atribu;a ao teatro um papel de primeiro plano nos no'os =stadosndependentes3 trata'a<se G$$$H

-M7abemos que a "onte de enunciação em Lumumba coloca a diegese do lado da'erdade rei'indicando dar realmente conta dos acontecimentos com os nomes eos lugares a remeter por e&emplo para re"erentes identifc6'eis com asconsequ(ncias que podemos bem imaginar quando um ator ainda 'i'o não sereconhece no seu alter ego da fcção$5 Com Une saison au Congo, Césaire nãopretendia reproduzir mais ou menos felmente a realidade ainda que o trabalho depreparação tenha sido importante mas dar conta utilizando a estrutura datragédia da ascensão da queda e da morte de Sumumba$ Xe'e o cuidado demodifcar a maior parte dos nomes de personagens o que é certamente umamaneira de tentar e'itar certos aborrecimentos6 mas que se pode igualmenteperceber no conte&to de uma tragédia que pratica constantemente odistanciamento$ Com Césaire B no que é uma grande di"erença em relação ao flmede Peck B não se 'erifca uma linha narrati'a cl6ssica ansiosa por atenuar os sinaismais 'is;'eis da fcção$ @ teatro de Césaire é pelo contr6rio todo marcado pelo seloda mise en ab"me o teatro dentro do teatro o recurso # artifcialidade assumida

como tal$ Por outras pala'ras "ale do rei Christophe de Sumumba ou reescre'a7hakespeare o dramaturgo impede o seu recetor de aderir de maneira acr;tica #"6bula$ @s di'ersos arti";cios le'am o mesmo recetor a questionar os pontos de

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'ista o discurso dominante as atitudes e as tomadas de posição em suma aen'ol'er<se por e numa tragédia pouco inclinada # catarse de emoç2es$7

8 =is o que é dito na peça3 4Primeiro carcereiro3 )ada mal hã? Gbate#l$eHmaginas<te em Iru& G$$$H

-0A peça e o flme contam assim em parte a história e em certos momentoscontam<na de maneira semelhante como se Pascal Ionitzer o autor do guiãode Lumumba se ti'esse dedicado nessas alturas a uma releitura da tragédia deCésaire$ : assim na sequ(ncia da prisão durante a qual Sumumba é insultado emaltratado por dois guardas cu,a ação é interrompida pelo diretor da prisãoG1M`-9H$ =ste !ltimo anuncia ao prisioneiro a sua libertação por ordem de Iru&elasde modo a poder participar enquanto presidente do o'imento )acional Congol(snos trabalhos da esa edonda$ Dma apro&imação minuciosa "az aqui de Unesaison au Congo o palimpsesto que per"uraLumumba3 os dois carcereiros do flmeinsultam Sumumba de maneira id(ntica um deles descobre um te&to curto no qualo prisioneiro reclama a sua libertação a fm de poder deslocar<se # Iélgica paraparticipar nas negociaç2es relati'as ao "uturo da colónia o que induz um di6logo no

qual as pala'ras trocadas assimcomo os gestos são praticamente id(nticos$8

-Q Xanto a peça como o flme passam de seguida do espaço fccional congol(s parao de Iru&elas durante as negociaç2es belgo<congolesas de ,aneiro<"e'ereiro de1LM$ Para indicar a mudança espacial Césaire utiliza uma técnica recorrente nalinguagem teatral3 4Dm a'iso cai da 'arandaO l(<se3 Iru&elas sala da esa<edonda`5 GCésaire 1L093 --H$ =ste tipo de arti";cio "az parte dos códigos do teatroe não impede a adesão do recetor quer se,a o leitor ou o espetador$ @ espaçoteatral tem de "acto como particularidade precisar apenas de uma con'enção para"uncionar3 se uma didasc6lia técnica como é o caso nesta ocorr(ncia indica que aação tem lugar em Iru&elas o espaço fccional surge imediatamente como tal$ =steespaço dram6tico começa a e&istir mesmo ,unto de um leitor que neste ponto nãose distingue do leitor de uma obra histórica sobre o mesmo tema$ @ cinema por

sua 'ez não consegue "azer a economia da representação detalhada do espaçofccional realista Ge&istem certamente e&ceç2es da parte do cinema de autorH$ Peckconstruir6 o seu cen6rio de maneira a tornar plaus;'el B o fa%er como se do cinemada ilusão B o salto no espaço e no tempo Gos meios de transporte a roupa osmó'eis pretendem in'ocar a Iélgica de in;cio dos anos 1LMH$ @ra trata<se deapresentar o plaus;'el não o 'erdadeiro3 o espetador aceita acreditar ainda maispor isso Go cen6rio a história as personagensH parecer plaus;'el$ : possi'elmenteneste ponto que o trabalho do cineasta e da sua equipa técnica se apro&ima maisdo trabalho do historiador quando este tenta de'ol'er uma época atra'és dadescrição tão fel quanto poss;'el do que ela "oi materialmente$

-L)o que diz respeito # esa edonda Césaire e Peck optam por representar não a'ersão ofcial das negociaç2es mas as acomodaç2es os compromissos as tens2espresentes nos bastidores$ Além disso Césaire coloca os seus 4banqueiros5 na4antecmara5 da sala de negociaç2es uma 'ez que é precisamente ali quesegundo o seu ponto de 'ista se ,oga o "uturo do Congo$ Para o capitalismo belga eo mundo da fnança a independ(ncia não representa mais do que uma 'icissitudeque teria de ser gerida de acordo com os seus interesses$ @ 4quarto banqueiro5resume numa tirada o que ser6 o neocolonialismo no conte&to de um =stado quedisp2e de sinais e&teriores de independ(ncia$ )otar<se<6 que no original "ranc(s apersonagem se e&prime em ale&andrinos "orma poética de re"er(ncia para acultura burguesa$ Césaire salienta assim que a "orma poética nunca é neutra ecomporta ela também a marca da cultura colonial3

7iga a ideia3 o que querem eles? Postos t;tulos

Presidentes deputados senadores ministrosUinalmente o matabic$ Iem Carro conta no banco]i'endas sal6rios chorudos não 'ou poupar$

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A&ioma e isso é o importante3 empanturrem<nosesultado3 o coração amolece<lhes o humor torna<se<lhes sua'e$=stão a 'er pouco a pouco aonde o sistema nos le'a3=ntre o po'o deles e nós ergue<se a sua tropa$7e pelo menos com eles na "alta de amizade)este século ingrato sentimento obsoleto

7abemos amarrar os nós da cumplicidade$GCésaire 1L093 -H

9Após esta e&plicação poética o coro dos banqueiros grita 4urra urra ]i'a aindepend(ncia5$ Xoda a quarta cena do primeiro ato condensa segundo umaestética do dom;nio do grotesco a emerg(ncia de um no'o regime de depend(nciaque é posto em pr6tica em numerosas antigas colónias3 o neocolonialismo cu,osmecanismos )krumah descre'e no momento em que Césaire prepara eescre'e Une saison au Congo$ )esta cena como em toda a tragédia o te&to produzmudanças tanto no mbito do que é representado Gos quatro ou cinco homens dadidasc6lia técnica estão 4dis"arçados de banqueiros de caricatura3 casaco chapéualto grande charuto5H como do modo de representação Gos banqueirose&primem<se em ale&andrinosH o que impede a adesão completa # fcção e

desperta o sentido cr;tico do recetor$ =ste fca assim mais inclinado para seinterrogar sobre o que se ,oga nos bastidores das negociaç2es belgo<congolesas3Césaire parece dizer<nos que nem tudo é o que parece nesta cena grotesca comimplicaç2es éticas ainda mais importantes ,6 que a cena seguinte é a da "esta daindepend(ncia em Séopold'ille$ A 4multidão aplaudindo e alegre5 celebra a suaindepend(ncia ao ritmo de &nd'pendance C$a C$a, rumba "amosa de >rand Yallé edo A"rican Razz enquanto o recetor ,6 sabe após a cena anterior que a "esta ser6de curta duração$

91)este ponto Peck procede de maneira distinta pois a sequ(ncia da esaedonda é estruturada em torno de tr(s espaços3 a sala onde os representantescongoleses negociam aquela em que negoceiam os representantes do go'ernobelga e o espaço das cozinhas e dos ser'idores$ =sta !ltima representameta"oricamente os bastidores da cena principal isto é ,unto da instncia dareceção a presença do terceiro espaço signifca ao mesmo tempo pelo que é masmais "undamentalmente remete parcialmente para o pro,eto de Peck3 dar acessoaos bastidores da história$ 7e a estética é sempre a da lisibilidade do apagamentodas marcas da fcção não dei&a de permanecer uma fcção com os seus e"eitos deacentuação omissão e ainda de elipse$ Além disso ao recorrer # montagemalternada Peck passa de um espaço a outro e con"rontando os pontos de 'istabelga e congol(s induz ,unto do recetor a tomada de consci(ncia de que se de umlado se canta e se "este,a do outro se prepara ,6 uma e'entual inter'ençãoneocolonial$ A sequ(ncia da esa edonda "echa<se com a delegação congolesa acantar e dançar ao ritmo de &nd'pendance C$a C$a m!sica que permite a ligaçãocom a sequ(ncia seguinte em Séopold'ille na 'éspera da independ(ncia$ ais uma

'ez a pro&imidade entre os dois te&tos é notória tanto na estrutura Gsemelhançasna transição entre Iru&elas e Séopold'illeH como no corpo do próprio te&to onde asameaças de inter'enção belga no Congo são "ormuladas de maneira bastanteid(ntica$

Consideraç2es fnais

9-Após esta an6lise podemos afrmar que Lumumba e Une saison au Congo noque é um re%e&o da sua comple&idade signifcam em di'ersos n;'eis e requeremse quisermos p*r em e'id(ncia essa riqueza polissémica a utilização de di'ersosutens;lios anal;ticos$ Para captar o que nos dizem da relação da tragédia e do flmede fcção com a história é necess6rio como 'imos circular constantemente entreleitura interna Gpara por e&emplo p*r em e'id(ncia a importncia de uma fgura

cinematogr6fca como o esbatimento encadeadoH e leitura e&terna Gpara ter emconta os conte&tos di"erentes em que se inscre'em as duas obrasH$ 7e a fcção diz a

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história tal como nela participa imp2e igualmente uma distncia a da cr;tica emrelação # história ofcial ao arqui'o colonial e pelo seu poder de amplifcaçãoconsegue implicar Gmas também in"ormar e como'erH a comunidade de maneiradistinta de um li'ro de história$

99Além deste trabalho de releitura do passado a peça de Césaire e o flme de Peck

tendem igualmente a dar uma sepultura # fgura sem sepultura o que recordemosbre'emente é muito "requente na literatura e no cinema do trauma$ A partir desteponto de 'ista a arte desempenha um papel essencial pois permite com os meiosque são os seus fgurar como um lugar de memória$ @ra no conte&to social dere"er(ncia como sublinha o historiador congol(s @masombo Xshonda a aus(ncia desepultura para Sumumba tal como a não transmissão da história ,unto da populaçãoimpediram o processo de luto coleti'o G-3 -FH$ )este conte&to a literatura e ocinema 'eem<se dotados de um e&cedente de signifcação pois conseguem prestartestemunho de uma certa perman(ncia do ser ausente ,unto da comunidade$ @regime de 'erdade inerente # história certamente não tem por ob,eto principalser'ir de apoio # memória sub,eti'a e a"eti'a de um grupo social mas ao e'itar odebate com esta !ltima não "a'orece o trabalho de luto necess6rio$ : o que>authier de ]illers censurou nos peritos da comissão de inquérito parlamentar

sobre as circunstncias da morte de Sumumba3

@s peritos da comissão ao contr6rio do que tinha "eito a comissãosul<a"ricana (rut$ and )econciliation JNK não tentaram permitir uma con"rontaçãoentre a sua 'erdade de ordem "actual ou ,ur;dica e as 'erdades imbu;das dasub,eti'idade dos atores e testemunhas da época e de todos os que ho,e mant(m asua memória uma con"rontação que toda'ia só ela poderia ter permitidocontemplar este trabalho de 4terapia 5 coleti'a portanto o luto J$$$K$ Gde ]illers-3 -10H

9 )a sua cr;tica Rulia Zatson lembra que aquando da estreia em SosAngeles em ,ulho de -1 o real G$$$H

9Parece ser claro que a literatura e o cinema desempenham um papel importantenão apenas na transmissão de uma memória truncada dominada durante muitotempo por uma historiografa de origem colonial mas também na edifcação de umdiscurso histórico$ @ "acto de Césaire e Peck não serem congoleses dota as suasobras de mais um signifcado$ @riundos das Cara;bas Gartinica no caso do primeiroe aiti no do segundoH inscre'em<se numa pr6tica art;stica pós<colonial com"ronteiras perme6'eis onde o te&to 'em a signifcar "ora e dentro delas$ :re'elador a partir desta perspeti'a que um historiador da literatura congolesaintegre sem qualquer problema a obra de Césaire na história do teatro na ep!blica.emocr6tica do Congo GYadima<)zu,i -9H$ 7e Uanon ,6 pressentira o que a mortede Sumumba 'iria a signifcar para o con,unto do continente a"ricano ou se,a paral6 das "ronteiras estritas da .C Aimé Césaire e aoul Peck contribuem pela suaancoragem no Atlntico negro para uni'ersalizar a luta do homem de e&ceção$ :poss;'el considerar Une saison au Congo e Lumumba tanto como testemunhos'6lidos não somente da memória congolesa contempornea mas igualmente deoutras comunidades no mundo$9 Xal como se 'erifca com a memória da 7hoahquanto mais o assassinato de Sumumba e os crimes do colonialismo recuam notempo mais pertencem #s no'as geraç2es cu,a responsabilidade moral é assimessencial pois cabe<lhes a reati'ação ou não da memória do trauma$ : o queibeiro sublinha no conte&to da memória contempornea da 7hoah$ Xarde ou cedoa história dir6 o con,unto dos "actos relati'os ao acontecimento 'iolento descre'er6as suas origens o desenrolar e as consequ(ncias e é então muito depois dos "eitose #s geraç2es posteriores que se colocar6 a questão da natureza da ligação aoacontecimento3

As quest2es que permanecem e permanecerão em aberto as perguntas para asquais não ha'er6 tal'ez nunca resposta satis"atória B e que por isso demarcam

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abertamente os limites da teoria B não são pois da ordem da a'eriguação dos"actos nem da simples interpretação histórica mas sim da ordem da memória e dapós<memória isto é da ordem de uma relação com o passado estruturada a partirdo en'ol'imento presente de su,eitos concretos$ Gibeiro -13 1H

9FA peça de Césaire e o flme de Peck reati'am assim em parte a atualidade do

pensamento de Sumumba ,unto das no'as geraç2es de recetores no interior e noe&terior das "ronteiras congolesas participando da emerg(ncia de uma memóriacontempornea do acontecimento 'iolento$ 7e atra'és da fcção a biografa e oste&tos do homem pol;tico ainda 'ierem a signifcar algo de essencial é igualmenteporque Sumumba de"endeu a emancipação não apenas para o seu pa;s mastambém para todos os oprimidos da terra$ = lembr6<lo não é um dos méritosmenores da arte$

 Xopo da p6gina

Iibliografa

Aumont RacquesO arie ichel G-QH L*anal"se des +lms$ Paris3 Armand Colin$

Iarr Iurlin G-11H 4aoul Peck`s Lumumba and Lumumba La mort du prop$-te3@n Cultural Amnesia and istorial =rasure5 African tudies )evie/ FG1H AprilQF<11M$

Iingham .ennis G-1H 0$ose Lives Are ($e" An"/a"1 ($e 2iopic asContemporar" Film 3enre$ )eT ork3 utgers Dni'ersit^ Press$

Ioucheron Patrick G-11H 4@n nomme littérature la "ragilité de l`histoire5 LeD'bat  9G1MFH 1<FM$

Iraeckman Colette G1LL-H Le dinosaure. Le 4a5re de Mobutu$ Paris3 Ua^ard$Césaire Aimé G1L09H Une saison au Congo$ Paris3 7euil$

Coquio Catherine G-19H 4Se territoire des ogres5 Fabula+Les Colloques Sittératureet istoire en débats$ Consultado a -$1$-1emhttp3++TTT$"abula$org+colloques+document-1F$php$

Curto o&anna G-11H 4Xhe 7cience o" 8llusion<making in Aimé Césaire`s La(rag'die du )oi C$ristop$e and Une (emp6te5 )esearc$ in African Literatures-G1H 1F<101$

de ]illers >authier G-H 4istoire ,ustice et politique$ [ propos de la commission

d`enqu(te sur l`assassinat de Patrice Sumumba instituée par la Chambre belge desreprésentants5 Ca$iers d*7tudes Africaines 1G109<10H 1L9<--$

.e Zitte Sudo G-H L*assassinat de Lumumba$ Paris3 Yarthala$

Uanon Urantz G-MH Pour la r'volution africaine. 7crits politiques$ Paris3 Sa.écou'erte$

Uonkoua omuald G-1H Aim' C'saire$ Paris3 Perrin$

Uoran Rohan G-9H 4Lumumba b^ aoul Peck5 8ournal of 9aitian tudies LG1H7pring 1FQ<1M-$

>illet Ulorence G-0H 4Contrepoint$ S`histoire coloniale en débat3 e&amen d`uneIelgique en repentir5 Mouvements 9GF1H 0<00$

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>oliot<Sété AnneO ]ano^e Urancis G-0H Pr'cis d*anal"se +lmique$ Paris3 ArmandColin$

>uidée aphaVlle G-19H 4S`écriture contemporaine de la 'iolence e&tr(me3 #propos d`un malentendu entre littérature et historiographie5 Fabula+Les ColloquesSittérature et istoire en débats$ Consultado a 0$1$-1

emhttp3++TTT$"abula$org+colloques+document-QM$php$

 ReTsieTicki Iogumil G1LLMH 4Corps interdits$ Sa représentation christique deSumumba comme rédempteur du peuple za_rois5 Ca$iers d*7tudes Africaines9MG11<1-H 119<1-$

Yadima<)zu,i ukala G-9H 4Xhétre congolais et réécriture de l`histoirenationale5 in ukala Yadima<)zu,iO 7élom Yomlan >banou Gorgs$H L*Afrique aumiroir des litt'ratures, des sciences de l*$omme et de la soci't'$ M'langes o:erts ;<.=. Mudimbe$ Paris3 S`armattan A$$S :ditions 99F<9F9$

Sassi :tienne<arieO Xcheu^ap Ale&ie G-LH 4Se prophte son récit et l`histoire3Sumumba au cinéma5 )evue de l*universit' de Moncton G1H Q9<1F$

ége'and artin G-LH 4]iolence et dramaturgies postcoloniales5Litt'rature-G1FH L1<10$

)ora Pierre G-11H 4istoire et roman3 o passent les "rontires?5 Le D'bat 9G1MFH M<1-$

@masombo Xshonda Rean G-H 4Sumumba drame sans fn et deuil inache'é de lacolonisation5 Ca$iers d*'tudes africaines 1G109<10H --1<-M1$

@zou" ona G-11H 4écit des romanciers récit des historiens5 Le D'bat  9G1MFH19<-F$

Peck aoul Greal$H G-H Peck aoulO Ionitzer Pascal GguiãoH Lumumba 1hFF$

ibeiro António 7ousa G-1H 4emória identidade e representação3 @s limites dateoria e a construção do testemunho5 )evista Cr>tica de Ci6ncias ociais QQ L<-1$

icur Paul G-H La m'moire, l*$istoire, l*oubli$ Paris3 7euil$

]ernet arc G1LQQH De l*invisible au cin'ma. Figures de l*absence$ Paris3 Cahiers ducinéma$

]illain .ominique G1LL1H Le montage au cin'ma$ Paris3 Cahiers du cinéma$

Zatson Rulia G--H 4aoul Peck`s Lumumba3 A Uilm "or our Ximes5 )esearc$ in African Literatures 7ummer 99G-H -9<-9F$

 Xopo da p6gina

)otas

1 )ote<se que para os obser'adores contemporneos dos acontecimentos emquestão a colusão entre o e&<colonizador e certas elites locais era mais que ób'iaGe.g$ Uanon -M3 -1FH$

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2 Uoi o que notou precisamente um dos especialistas das dramaturgias a"ricanaspós<coloniais3 4A 'iol(ncia histórica representada por intermédio do percursoe&cecional ou e&emplar de uma fgura heroica encontra<se assim dotada de umsentido e articulada # fgura de um su,eito em torno do qual a coleti'idade presanas garras da 'iol(ncia descrita in'aria'elmente como desunida é 'irtualmente

capaz de se unir B a ponto de que este cen6rio pode fgurar como in'ariante m;ticodas dramaturgias desta geração$5 Gége'and -L3 LMH$ )isso o teatro não di"eredo e"eito criado pela 'asta produção pictural relati'a a Sumumba e oriunda dosmercados de Subumbashi$ Aqui ao mesmo tempo a arte é memória e diz umaoutra 'ersão da história GReTsieTicki 1LLM3 199<19H$

3 @ original neerland(s "oi publicado em 1LLL GDe Moord op LumumbaH a 'ersão"rancesa em - e a tradução portuguesa em -1$

4 A an6lise ";lmica "ala a este propósito de "ocalização mental ou 'oz interior3 4@s

pensamentos da personagem inter'(m apenas na banda sonora e não na banda'isual5 G>oliot<Sété e ]ano^e -03 90H$

5 Uoi o caso de Urank Carlucci segundo secret6rio da =mbai&ada dos =stadosDnidos agente da C8A estacionado no Congo no momento da independ(ncia quedesempenhar6 um papel não negligenci6'el na queda de Sumumba e na ascensãode obutu$ Euando o canal pri'ado americano I@ programa o flme em --Carlucci consegue "azer retirar o seu nome da banda sonora e do genérico GUoran-93 1M-H$

6 7egundo omuald Uonkoua Césaire modifcou o nome de obutu para okutu afm de e'itar um processo de di"amação por parte do presidente do Waire$ Por outrolado esta peça "oi a !nica das tr(s tragédias do poder a não ter passado pelapré<publicação na re'ista Pr'sence africaine tendo sido diretamente publicada na7euil$ 7egundo o seu biógra"o o escritor teria assim querido proteger a casa deedição de e'entuais repres6lias fnanceiras GUonkoua -13 99M<99QH$

7 Césaire atribu;a ao teatro um papel de primeiro plano nos no'os =stadosindependentes3 trata'a<se por um lado de atra'és do te&to educar o p!blicoad'erti<lo para os perigos que paira'am sobre os =stados em questão e decontribuir assim para a construção do =stadoO por outro lado trata'a<se de

importar pelas necessidades da encenação tecnologias indispens6'eis para amodernização do pa;s GCurto -113 1FQ<1FLH$

8 =is o que é dito na peça3 4Primeiro carcereiro3 )ada mal hã? Gbate#l$eH8maginas<te em Iru&elas sel'agem? = o que é que dirias ao rei se o 'isses? @ que éque dirias a ITana Yitoko?+ 7egundo carcereiro3 Ga bater H 7em d!'ida que quer serministro G)i#seH 8maginas<te e&cel(ncia macaco =&cel(ncia$5 GCésaire 1L093 -1H$A comparação com a sequ(ncia correspondente no flme é esclarecedora3 4Primeirocarcereiro3 8maginas<te em Iru&elas assim hã? = dizias o qu( ao rei hã? .izias oqu( a ITana Yitoko? 7egundo carcereiro3 Ga brutali%ar LumumbaH Ah quer serministro Euerem todos ser ministros$ Eueres condecoraç2es 'amos condecorar<teGtocando no peito de Lumumba com a matraca H Primeiro carcereiro3 Eueres que techamem e&cel(ncia é isso? acaco5 Gos dois $omem batem em LumumbaH GPeck

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7/23/2019 A Literatura e a História

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-3 10`90<1Q`--H$ .e seguida como na peça de Césaire o diretor da prisãointerrompe os dois guardas e anuncia a Sumumba que é li're e que ir6 apanhar oa'ião para Iru&elas no dia seguinte$

9 )a sua cr;tica Rulia Zatson lembra que aquando da estreia em Sos Angeles em

 ,ulho de -1 o realizador do aiti e&plicou que numerosos espetadores oriundosdo 7ul reconheciam em Sumumba um dos seus3 4Ualando com um certa dose deironia Peck notou que nos pa;ses em desen'ol'imento por esse mundo "ora B nasCara;bas e na América Satina bem como em "rica B o p!blico encontra'a deimediato paralelos com as suas próprias histórias nacionais na história da ascensãoe queda meteórica de Sumumba e nos ,ogos de intriga internacional que se ,ogaramem torno dele$5 GZatson --3 -9H$ Xopo da p6gina

Para citar este artigo

Referência do documento impresso

Uabrice 7churmans j =ntre história e fcção3 @ "racasso do homem de e&ceção$Unesaison au Congo GAimé CésaireH e Lumumba Gaoul PeckH )evista Cr>tica deCi6ncias ociais 1M -1F QF<1$

Referência eletrónica

Uabrice 7churmans j =ntre história e fcção3 @ "racasso do homem de e&ceção$Unesaison au Congo GAimé CésaireH e Lumumba Gaoul PeckH )evista Cr>tica deCi6ncias ociais J@nlineK 1M -1F colocado online no dia -Q Abril -1F criado a-0 Rulho -1F$ DS 3 http3++rccs$re'ues$org+FQQQ O .@8 3 1$+rccs$FQQQ

 Xopo da p6ginaAutor+a

Fabrice c!urmans

Centro de =studos 7ociais Dni'ersidade de CoimbraColégio de 7$ Rerónimo Sargo .$ .inis Apartado 9Q0 9<LLF Coimbra Portugal"schurmans^ahoo$"r

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A representação do migrante clandestino no cinema contemporneo3 ="eitose cenas de "ronteira JXe&to integralK

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