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A INEXISTÊNCIA DA VENDA CASADA DO SEGURO NOS CONTRATOS DE
ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA
Bernardo Buosi
Priscilla Rinaldi Lara
I. INTRODUÇÃO
As instituições financeiras do país se utilizam largamente da
garantia de alienação fiduciária nos contratos negociados para financiamento de
veículos, celebrando contratos na modalidade CDC – Crédito Direto ao Consumidor.
Assim, normalmente, além da existência da alienação
fiduciária para a garantia do valor a ser financiado, as instituições financeiras ofertam
a contratação de seguro, tanto na modalidade do seguro prestamista, quanto na de
proteção ao bem financiado.
Com isso, os Bancos pretendem garantir que o valor do
crédito liberado lhes será restituído, contudo, tal prática enseja discussão quanto a
existência de venda casada (vício na manifestação de vontade do consumidor);
quanto ao depositário infiel; a evicção do bem; e, como “pano de fundo”, a extrema
facilidade na concessão dos créditos e a relativização da boa-fé objetiva.
Desse modo, o presente trabalho visa demonstrar a
inexistência de venda casada do seguro nos contratos de financiamento com garantia
de alienação fiduciária, passando pelo estudo da doutrina e jurisprudência, bem
como da análise da atual ordem econômica e financeira do país.
II. CONTRATO DE FINANCIAMENTO NA MODALIDADE CDC – CRÉDITO
DIRETO AO CONSUMIDOR
O Contrato de financiamento na modalidade de crédito direto
ao consumidor se trata de uma operação de crédito concedida por Bancos,
Financeiras ou por intermédio de lojas de departamentos, a pessoas físicas ou
jurídicas, para a aquisição de bens e serviços.
O consumidor que contrata esse tipo de crédito passa a
desfrutar imediatamente de um bem que será pago com sua renda futura.
Normalmente é indicado para pessoas físicas e oferecido aos clientes correntistas de
um banco como parte de um pacote de serviços, com limites já pré-aprovados em
função do rendimento mensal comprovado no cadastro do cliente.
Tais contratos possuem, em sua grande maioria, o prazo de 60
(sessenta) meses para restituição do valor do crédito liberado.
As taxas de juros variam conforme a instituição financeira, o
prazo de pagamento e o valor do empréstimo. Mas podem ser consultadas
individualmente, através de simulações perante as Instituições Financeiras e pelo site
do Banco Central. Além da taxa, há a cobrança do Imposto sobre Operações
Financeiras (IOF).
Nesses tipos de operações, quase sempre o bem financiado
constitui a garantia da operação, permanecendo o financiado como depositário fiel do
bem. Em outros casos, a instituição financeira pode exigir a garantia de um avalista
pessoa física ou jurídica.
Desse modo, o crédito direto ao consumidor é um recurso
interessante para quem tem um rendimento estável. Sendo um empréstimo pré-
aprovado, vem sendo muito procurado, porque pode ser acessado pelos correntistas
de um banco sem burocracia. O dinheiro é liberado na hora, sem necessidade de se
apresentar comprovação de gastos ou justificativas.
Atualmente esta modalidade de contrato de financiamento é
utilizado para a compra de automóveis, pela facilidade de contratação e pelas taxas
menores de juros cobradas e prazo razoável para o pagamento.
A facilidade na contratação é tamanha que existe uma tabela
para o pagamento com parcelas fixas e juros pré-fixados. O valor a ser contratado e o
valor das parcelas pode ser simulado através da Internet. Após escolher o plano
adequado, basta confirmar a opção do crédito e validar a operação em um caixa
eletrônico.
Desse modo, vislumbramos de forma clara as vantagens do
contrato de crédito direto ao consumidor na medida em que possui fácil contratação,
eliminando, além da burocracia, as entrevistas com o gerente, bem como pouca
justificativa ou comprovação de crédito, o que o torna, ao mesmo tempo, atraente e
temerário. Traz também o benefício de desconto dos juros em caso de pagamento
antecipado das últimas parcelas.
Portanto, o contrato de crédito direto ao consumidor é um
produto prático e ágil para facilitar a vida do consumidor na obtenção/levantamento
de crédito.
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III. DA ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA
A alienação fiduciária é uma modalidade do direito de
propriedade. É direito real com a intenção de garantia, em que um comprador
adquire um bem a crédito.
O surgimento do instituto da alienação Fiduciária, no Brasil,
está relacionado com as influências advindas do direito romano, alemão e anglo-
saxão.
Nestes povos, desde a Antiguidade, a ideia de garantia ao
cumprimento de determinada obrigação, era atrelada a um compromisso de ordem
moral, inexistindo meios de sanção em caso de descumprimento da obrigação
principal.
Nesse sentido, Maria Helena Diniz comenta a origem da
Alienação Fiduciária: “No direito romano havia a fiducia cum amico e a fiducia cum
creditore. No direito alemão empregou-se pela primeira vez o termo negócio jurídico
fiduciário. E no direito anglo-saxão apresentaram-se o trust receipt e o chattel mort
gage1.”
A alienação fiduciária de coisas móveis entrou no
ordenamento jurídico brasileiro por meio da Lei 4.728/1965, como a primeira
modalidade deste instituto, tendo como função a garantia do cumprimento das
obrigações, por meio da transferência resolúvel da propriedade de um bem do
devedor para o credor. Posteriormente, o Decreto-Lei 911/1969 trouxe mecanismos
processuais que permitiram a rápida obtenção do bem pelo credor, no caso da
inadimplência do devedor, por meio da utilização da Ação de Busca e Apreensão.
Hoje, além da legislação especial (Lei 4.728/1965 e Decreto-Lei
911/1969), a Alienação Fiduciária também é regulada pelos artigos 1.361 até 1.368 do
Código Civil. Com a inclusão do artigo 1.368-A no Código Civil pela Lei 10.931/2004,
o instituto da alienação fiduciária contempla tanto bens fungíveis, quanto bens
infungíveis.
Contudo, conforme consta no § 3˚ do artigo 66-B da Lei
4.728/1965, na Alienação Fiduciária de Coisas Móveis fungíveis, tais como os títulos
1 DINIZ, Maria Helena. Tratado Teórico e Prático dos Contratos. 6ª edição. Volume 5. São Paulo. Editora
Saraiva. 2006. página 154.)
de crédito, tanto a posse direta quanto a posse indireta do bem deve ficar com o
credor. E nessa linha, no caso de inadimplência do devedor, o credor pode dispor do
bem para satisfação do seu crédito.
Desse modo, o instituto da alienação fiduciária ingressou no
Brasil no contexto de dinamização das relações econômicas, sobretudo para servir
como garantia ao credor, na liberação de crédito aos consumidores para obtenção de
bens móveis.
Portanto, a alienação fiduciária em garantia é o contrato pelo
qual o devedor (fiduciante), como garantia de uma dívida, pactua a transferência da
propriedade fiduciária do bem ao credor (fiduciário), sob condição resolutiva
expressa, qual seja o pagamento integral da obrigação principal. Assim, ocorrendo o
pagamento da obrigação assumida, a propriedade do bem volta ao âmbito da esfera
jurídica do devedor.
Deve-se, ainda, salientar que o advento do instituto da
alienação fiduciária de coisas móveis serviu como solução para as ineficácias do
penhor e da venda com reserva de domínio. Isso porque, nos institutos retro
mencionados, a coisa dada em garantia permanece na propriedade do devedor,
dificultando uma eventual e necessária obtenção do bem pelo credor.
Sendo assim, a alienação fiduciária de coisas móveis se
constitui por ser uma garantia de direito real para o cumprimento de obrigação
principal. Geralmente, o instituto é utilizado por meio de cláusula, no próprio
contrato que prevê a obrigação principal. Assim, esta garantia de direito real é
sempre acessória e condicionada à obrigação principal.
No Brasil, essa modalidade de crédito é comum na compra de
veículos ou de imóveis. Na primeira hipótese, a alienação fica registrada no
documento de posse do veículo, e na segunda, é comum que a propriedade
definitiva, atestada pela escritura, só seja transmitida após a liquidação da dívida. Em
ambos os casos, o comprador fica impedido de negociar o bem antes da quitação da
dívida, mas pode usufruir dele, configurando a limitação do direito de propriedade.
Tal garantia é também largamente utilizada nos contratos de
financiamento na modalidade de crédito direto ao consumidor, tratado no tópico
anterior, buscando garantir a satisfação do crédito liberado.
IV. CONTRATO DE SEGURO
O homem sempre esteve preocupado com a estabilidade de
sua existência. Por sofrer as conseqüências das variações climáticas e dos perigos da
vida, desde a antiguidade procurava se organizar em grupos para ter mais força e
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garantir o sustento e a segurança. Com o tempo, a evolução das atividades comerciais
mostrou a necessidade de proteção também contra os prejuízos financeiros.
Desta forma, justamente buscando garantir as finanças e
diminuir a insegurança nas atividades cotidianas, que surgiu o seguro.
O seguro nasceu, pois, da necessidade do homem em
controlar o risco. Existem indícios que já na Babilônia, 23 séculos antes de cristo,
caravanas de cameleiros que cruzavam o deserto mutualizavam entre si os prejuízos
com morte de animais. Na China antiga e no Império Romano também haviam
seguros rudimentares, através de associações que visavam ressarcir membros que
tivessem algum tipo de prejuízo.
Com o Renascimento e a expansão marítima da época do
Mercantilismo a cobertura aos riscos ganhou nova importância. Tornaram-se comuns
operações chamadas de Contrato de Dinheiro e Risco Marítimo que consistia num
empréstimo dado a um navegador, e que previa uma cobrança maior no caso de
sucesso da viagem e o perdão da dívida se a embarcação e a carga fossem perdidas.
Foi em virtude dos seguros marítimos que se desenvolveu a gestão de risco na maior
parte do mundo. Nessa época o seguro ainda inspirava dúvidas com relação à
integridade das “seguradoras” – que na verdade eram pessoas que assumiam os
riscos.
Mas, o seguro foi criando força e conquistando credibilidade,
e foi em Gênova, por volta de 1347, que o primeiro contrato de seguro foi escrito.
Nele continha inúmeras cláusulas que garantiam ou isentavam os seguradores de
pagarem as indenizações. As primeiras apólices são datadas de 11/07/1385 (Pisa/
Itália) e 10/07/1397 (Florença/ Itália). As apólices tornavam-se comuns no final do
século XIV.
No século XVII, o mercado securitário se expandiu e ganhou
novos produtos de cobertura terrestre, especialmente em decorrência do Grande
Incêndio de Londres de 1666, que destruiu cerca de 25% da cidade.
Com a Revolução Industrial, o seguro acabou se tornando um
item praticamente obrigatório em todas as áreas da atividade humana, afinal, os
avanços tecnológicos, as atividades de alto risco e os novos meios de transportes
podem causar prejuízos de proporções incalculáveis.
Todo esse crescimento da indústria, do comércio e dos meios
de transporte, fez com que as empresas seguradoras também evoluíssem para
acompanhar a demanda do mercado. Hoje existem seguradoras que controlam
vultosos valores, contribuindo com a sociedade, na geração de empregos e com
projetos de responsabilidade social.
Assim, vemos que o seguro é caracterizado por ser um
contrato em que há a transferência de risco, com finalidade de proteção ao
patrimônio, a saúde e à vida. Tem por princípios norteadores, além das cláusulas
legais, a sinceridade, o mutualismo e a boa-fé dos contratantes.
Cavalieri Filho, assim delineia o contrato de seguro:
“[...] Em apertada síntese, seguro é contrato pelo qual o
segurador, mediante o recebimento de um prêmio, assume
perante o segurado a obrigação de pagar-lhe uma determina
indenização, prevista no contrato, caso o risco a que está
sujeito se materialize em um sinistro. Segurador e segurado
negociam as conseqüências econômicas do risco, mediante a
obrigação do segurador de repará-las. Frise-se que em se
tratando de contrato de seguro, o segurador só poderá se
exonerar de sua obrigação se ficar comprovado o dolo ou a
má-fé do segurado. Da mesma forma, o agravamento do risco
pode servir de preceito ao não pagamento do sinistro, haja
vista o desequilíbrio da relação contratual, onde o segurador
receberá um prêmio inferior ao risco que estará cobrindo, em
desconformidade com o avençado” (2008, p. 419).
Nas palavras de DINIZ, o contrato de seguro é definido desta
forma:
“[...] é aquele pelo qual uma das partes (segurador) se obriga
para com a outra (segurado), mediante o pagamento de um
prêmio, a garantir-lhe interesse legítimo reativo a pessoa ou a
coisa e a indenizá-la de prejuízo decorrente de riscos futuros,
previstos no contrato” (CC, art. 757) (2002, p. 316).
Além disso, não se pode falar somente em fatos danosos, visto
que a atual amplitude do risco vai além dessa visão inicial, abrangendo inclusive
situações de insucesso, infortúnios ou constrangimentos no âmbito das atividades da
pessoa.
Nesse âmbito, acrescenta Diniz que “a noção de seguro supõe
a de risco, isto é, do fato de estar o sujeito exposto à eventualidade de um dano à sua
pessoa, ou aos seus bens, motivado pelo acaso” (2002, p. 317).
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No contrato de seguro, o segurado tem como obrigações a
prestação de informações corretas para que seja formulado o valor do prêmio, o qual
é estimado através do cálculo atuarial, o pagamento das parcelas e a comunicação à
seguradora da eventual ocorrência de sinistro, que deve ser imediata.
Por outro lado, as obrigações do segurador vão mais além,
sendo basicamente a prestação de informações ao segurado sobre as condições do
seguro, de forma completa e antes do contrato ser firmado, já na contratação o
fornecimento de cópia de documento que demonstre os termos da apólice, e a correta,
integral e célere indenização ou cobertura quando da ocorrência do sinistro.
A forma exigida para concretização do contrato em estudo é a
escrita, conforme determina o artigo 758 do Código Civil ao prescrever que “o
contrato de seguro prova-se com a exibição da apólice ou do bilhete do seguro, e, na
falta deles, por documento comprobatório do pagamento do respectivo prêmio”. No
entanto, atualmente, temos outras formas sendo admitidas, em razão do
acompanhamento da sociedade à evolução tecnológica.
O contrato de seguro possui previsão legal no Código Civil,
bem como suas regulamentações são realizadas pela Superintendência de Seguros
Privados - SUSEP. Quanto ao consumidor final, no entanto, o contrato de seguro se
submete aos dispositivos do Código de Defesa do Consumidor, cujo artigo 3º, § 2º
assim dispõe:
“Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou
privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes
despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção,
montagem, criação, construção, transformação, importação,
exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou
prestação de serviços.
§ 1° [...]
§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de
consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza
bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as
decorrentes das relações de caráter trabalhista.”
Incidindo, assim, a normatização consumerista nos contratos
de seguro, e sendo o segurado o destinatário final do serviço, para eximir-se do dever
de indenizar à seguradora deverá comprovar a culpa grave ou dolo do ato praticado
pelo segurado, como, por exemplo, o agravamento do risco por conduta deste.
Entendemos que o contrato de seguro possui indiscutível
contribuição e necessidade para o Direito e para a sociedade contemporânea, estando
intimamente ligado com o desenvolvimento da ordem econômica e a manutenção da
paz social, sendo que sua finalidade precípua é a proteção do patrimônio material e
abstrato da pessoa, com a minimização dos efeitos na eventual ocorrência do sinistro.
Por derradeiro, observamos que a boa relação jurídica no
contrato de seguro se dá quando há equilíbrio e boa-fé nos negócios realizados entre
segurador e segurado, de modo que a legislação pertinente – especialmente o Código
Civil e Código de Defesa do Consumidor – são taxativos ao estabelecer os requisitos
para a formalização deste contrato, sendo que para se evitar antinomias deve haver o
„Diálogo de Fontes‟.
V. SEGURO PRESTAMISTA X SEGURO DE PROTEÇÃO AO BEM
Primeiramente, cabe breve relato da origem do seguro
prestamista, a fim de se compreender sua finalidade e demonstrar a função social na
contratação deste produto.
O seguro prestamista surgiu da necessidade das instituições
financeiras transferirem o risco acerca de fatos alheios à sua vontade e à do próprio
consumidor para uma seguradora.
O termo “prestamista” é definido como a pessoa que empresta
a juros. Inicialmente, teria sido usado para definir quem vende a prestação. Dessa
forma, o seguro prestamista surgiu para proteger quem vende a crédito, numa
definição ampla, que engloba desde quem empresta dinheiro, passando por quem
vende um bem financiado, até quem administra os recursos de um grupo, como os
consórcios.
No Brasil, este seguro foi impulsionado pelos financiamentos
de veículos e, mais recentemente, pela explosão do crédito consignado. Ante a sua
boa aceitação e demanda crescente, o seguro prestamista apresenta diversificações de
uso.
Assim, o seguro prestamista tem por objetivo garantir a
quitação de uma dívida do segurado, no caso de sua morte ou invalidez ou até
mesmo desemprego involuntário.
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O primeiro beneficiário deste tipo de seguro, até o limite da
dívida, será sempre a empresa credora. O segurado também contará com a
tranquilidade de ter a sua dívida quitada, caso aconteça algum imprevisto. Para a
instituição que concede o crédito, o seguro prestamista é uma garantia de que a
inadimplência poderá ser evitada, no caso de morte ou invalidez ou desemprego do
segurado. Para quem não tem patrimônio, esse seguro é comparado a uma proteção
social, pois o seu objetivo é evitar a perda de algum bem adquirido.
Desse modo, essa modalidade de seguro surgiu para garantir
proteção adicional àqueles que têm prestações para pagar. Os compromissos
financeiros assumidos podem ser afetados por imprevistos, como falecimento, perda
involuntária do emprego ou incapacidade para exercer funções, mesmo que
temporariamente, impedindo que a pessoa ou mesmo sua família mantenha o
pagamento de algumas prestações ou mensalidades.
É bom lembrar também que, na hipótese de o segurado falecer
ou ficar inválido e ter contratado um seguro com garantia de pagamento superior à
dívida contraída, esta será quitada com a instituição financeira ou empresa que
concedeu o crédito ou o empréstimo. A diferença entre o valor pago da dívida e o da
indenização contratada será paga ao beneficiário que o segurado indicar ou a ele
próprio, no caso de invalidez.
O seguro de proteção ao bem se diferencia do seguro
prestamista por sua finalidade, ou seja, destina-se a proteger o bem da pessoa contra
furto/roubo, deterioração, evicção, incêndio, enquanto que o seguro prestamista se
destina à proteção do patrimônio do mutuário, no sentido de que, uma vez ocorrido
algum dano que cause a morte, invalidez permanente ou mesmo o desemprego, se
destinará a suprir/suportar o pagamento da dívida, sem ter que alterar a sua situação
patrimonial/financeira.
Nesse sentido, também se verifica uma proteção ao mutuário
haja vista que, se ocorrer qualquer problema com o bem, este não terá o seu
patrimônio afetado de forma brusca para reparo ou substituição do bem, restando
certa a função social do contrato de seguro nesse sentido.
Portanto, evidencia-se que o seguro quanto aos riscos que
podem ocorrer com o patrimônio da pessoa, tanto em relação a bem de sua
propriedade quanto à sua capacidade laboral se trata de proteção social que visa
garantir as operações financeiras realizadas, pacificando a vida em sociedade.
VI. DA VENDA CASADA NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
O instituto da venda casada é a prática que os fornecedores
têm de impor, na venda de algum produto ou serviço, a aquisição de outro não
necessariamente desejado pelo consumidor. Pode ocorrer também quando o
comerciante impõe quantidade mínima para a compra.
O que o Código de Defesa do Consumidor prescreve é que o
consumidor deve ter ampla liberdade de escolha quanto ao que deseja consumir.
Assim, não pode o fornecedor fazer qualquer tipo de
imposição ao consumidor quando da aquisição de produtos ou serviços, nem mesmo
quando este adquire outros produtos ou serviços do mesmo fornecedor.
Desse modo, pela legislação consumerista, a venda casada é
considerada prática abusiva, pois interfere indevidamente na vontade do
consumidor, que fica enfraquecido em sua liberdade de opção, desequilibrando a
relação contratual.
O Código de Defesa do Consumidor, artigo 39, esclarece de
forma inequívoca:
“Art. 39 - é vedado ao fornecedor de produtos ou serviços,
dentre outras práticas abusivas:
Inciso I: "condicionar o fornecimento de produtos ou serviços
ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem
justa causa, a limites quantitativos".
Nesse sentido, a legislação acima mencionada busca proteger
o consumidor para que não tenha que arcar com o ônus de adquirir um produto que
não pretendia, para garantir outro que é o seu real objeto de desejo.
No que se refere a limite quantitativo, entende-se que diz
respeito ao mesmo produto ou serviço. No entanto, neste caso, o Código
Consumerista não estabeleceu uma proibição absoluta. Assim o limite quantitativo é
admissível desde que haja justa causa para imposição. No entanto, o fornecedor não
pode obrigar o consumidor a contratar a maior ou menor do que as suas
necessidades.
A título de conhecimento, cabe comentar que a Lei 8137/1990
tipificou a prática de venda casada como crime, no seu art. 5º, incisos II e III:
“Art. 5º Constitui crime da mesma natureza:
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II - subordinar a venda de bem ou a utilização de serviço à
aquisição de outro bem, ou ao uso de determinado serviço;
III - sujeitar a venda de bem ou a utilização de serviço à
aquisição de quantidade arbitrariamente determinada;
Pena: detenção de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, ou multa".
Em algumas situações, porém, o consumidor pode aceitar a
imposição adicional e, em seguida, cancelar a parte da transação que não queria ter
contratado, como nos casos em que após o recebimento do empréstimo, o consumidor
envia uma carta de notificação ao banco informando que o seguro de vida que foi
imposto como condição à operação de crédito não lhe interessa.
Um exemplo muito comum é vivido por brasileiros ao tentar
obter empréstimos em bancos. Os bancos costumam realizar um empréstimo se o
cliente contratar um seguro (prestamista ou de proteção ao bem), ou outros
serviços/produtos do banco.
Não obstante, o artigo 39, inciso I do Código de Defesa do
Consumidor não pode ser aplicado de forma absoluta, haja vista que por vezes a
contratação do seguro é justificada pela necessidade da manutenção do preço a ser
pago no financiamento, bem como à própria viabilidade da operação.
Ademais, deve ser verificada também a finalidade da
contratação do seguro como acessório ao contrato principal, a fim de que se possa
configurar ou afastar a ocorrência de venda casada.
Ora, vislumbra-se de forma evidente a proteção ao mutuário
nos casos de contratos de financiamento firmados por idosos, em que o seguro
prestamista acaba se tornando questão essencial, como forma de cumprir, inclusive, a
sua função social no mercado, eis que seria até uma forma de “educação” econômico-
financeira para a sociedade.
Portanto, entendemos que a venda casada e o próprio Código
de Defesa do Consumidor não devem ser aplicados de forma absoluta e objetiva,
sendo que devem ser analisadas a finalidade, forma de contratação e grau de
entendimento do consumidor, a fim de evitar abusos e enriquecimento sem causa por
parte deste.
VII. INEXISTÊNCIA DA VENDA CASADA DO SEGURO NA ALIENAÇÃO
FIDUCIÁRIA
Conforme demonstramos nos tópicos acima há grande
celeuma quanto à existência da venda casada nos contratos de financiamentos na
modalidade de crédito direto ao consumidor com garantia de alienação fiduciária, no
que se refere ao contrato acessório de seguro prestamista ou de proteção ao bem.
Entendemos que tal questão deve ser analisada de forma
cautelosa e embasada, tanto para o fim de alterar a percepção de toda a sociedade
quanto ao serviço que está sendo prestado, quanto do próprio Poder Judiciário, a fim
de se afastar injustiças que resultam em prejuízos e em nada contribuem para a
“educação” da população quanto ao limite de seus direitos e do controle financeiro.
Ademais, a discussão travada no presente trabalho está
intimamente ligada à facilidade na concessão do crédito, ao grande endividamento da
população, bem como ao crescente número de casos que o consumidor “desaparece”
com o veículo, em razão da falta de punição para o depositário infiel.
Assim, como constatamos, o seguro prestamista tem por
objetivo garantir a quitação de uma dívida do segurado, no caso de sua morte ou
invalidez ou até mesmo desemprego involuntário, sendo que o segurado contará com
a tranquilidade de ter a sua dívida quitada, caso aconteça algum imprevisto (Proteção
Social).
Já o seguro de proteção ao bem realizado nos contratos de
alienação fiduciária, tem por finalidade garantir o estado e a conservação da coisa,
resguardando o consumidor dos riscos de evicção, uma vez que o consumidor se
torna o depositário do bem, respondendo por eventuais prejuízos/deterioração.
Desse modo, entendemos que não há que se falar em venda
casada em casos de contratação de seguro em alienação fiduciária, haja vista que não
há nesta hipótese cláusula que coloca em intolerável desvantagem um dos
contratantes, impondo-lhe uma obrigação iníqua e causando situação de significativo
desequilíbrio entre as partes, o que seria abrangido pela lei consumerista.
Sendo assim, não configura onerosidade excessiva ao
consumidor a previsão de contratação de seguro para o objeto da avença, em favor do
credor fiduciário.
Sustentar o contrário leva a uma incorreta interpretação da
finalidade última da proteção consumerista e a uma indevida ingerência na liberdade
de iniciativa, princípio e fundamento, respectivamente, da ordem econômica, nos
termos do artigo 170 da Constituição Federal.
De fato, o Código de Defesa do Consumidor, assim como
outras normas que visam à tutela jurídica dos hipossuficientes, das minorias e dos
direitos coletivos, possui, dentre outras, a função de inserir um elemento axiológico e
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de justiça social na dinâmica de um Estado que, ao mesmo tempo, adota a economia
de mercado e assegura como direito fundamental a propriedade privada.
Assim, é inevitável que existam interesses conflitantes,
quando se tem por meta, de um lado, o alcance pleno do lucro e, de outro, "assegurar a
todos uma existência digna".
Todavia, apesar de se mitigarem, um objetivo não pode anular
o outro, assim como um direito fundamental não pode ser aniquilado por outro. É,
portanto, necessária cautela no trato de ambas as matérias, sob pena de, com o brado
desmedido de proteção aos consumidores, ver-se o efeito contrário, como
consequência de imprudente ingerência nas relações econômicas.
Portanto, a cláusula que prevê a contratação de seguro, seja
prestamista, seja de proteção ao bem, em nenhuma hipótese impõe grave
desequilíbrio entre as partes nem o enriquecimento ilícito de uma em detrimento da
outra.
Ora, se é obrigação do devedor fiduciário, durante a execução
do contrato, a conservação do bem (depositário fiel), a contratação de um seguro só
vem a auxiliá-lo nesse ônus, já que o seguro se destina a garantir a integridade do
veículo (proteção ao bem).
Se, em outro aspecto, o seguro se destina à quitação do
contrato em caso de morte, desemprego involuntário ou invalidez permanente
(prestamista), não há o locupletamento sem causa do credor fiduciário, posto que, se
de um lado, garante-se o crédito deste, de outro, beneficia-se o devedor, protegido
que fica contra casos fortuitos.
Desse modo, resta demonstrado que a comercialização do
seguro nos contratos de financiamento com garantia de alienação fiduciária protege o
mutuário tanto quanto os riscos de evicção do bem quanto aos de incapacidade
financeira por caso fortuito, não havendo, pois a malícia da instituição financeira em
simplesmente embutir um produto ou serviço para a obtenção de mais lucro.
Verifica-se a plena existência da boa-fé contratual por parte da
Instituição Financeira, bem como do respeito à função social do contrato, no sentido
de que visa a proteção do mutuário, bem como à manutenção da ordem econômica
quanto ao endividamento da população.
Além disso, mais um motivo e justificativa aceitável para a
existência do seguro nesses casos é a facilidade na contratação do financiamento na
modalidade de crédito direto ao consumidor, como vimos no tópico específico, sendo
certo que se não houvesse qualquer existência de garantia ao mutuário, este ficaria
com seu patrimônio exposto a grande risco.
Entendemos, pois, que a contratação do seguro, nesses casos, é
também uma forma de educar o consumidor no que tange à obtenção de crédito, o
que também se destina a função social do contrato.
Não se trata de ignorar no presente trabalho que inexiste a
prática de venda casada, pois bem sabemos esta ocorre em demasia no mercado, nas
mais diversas transações realizadas no dia a dia pelos consumidores, contudo, é
necessário saber separar a questão da venda pela venda, visando apenas a obtenção
de lucro, da venda realizada com a devida prestação de informação e para a própria
proteção do mutuário.
Ademais, na atualidade, já houve grande acúmulo de
conhecimento por parte da população em geral, o que alterou, sobremaneira, o
entendimento das pessoas quanto às contratações de financiamentos, eis que é de
conhecimento notório as taxas de juros praticadas pelas instituições financeiras, a
existência do seguro nos contratos de financiamento, entre outras questões, sendo
certo que houve a patente redução do desequilíbrio entre as partes contratantes.
Entender de forma diversa, ignorando a capacitação dos
consumidores e aplicando de forma absoluta e objetiva a legislação consumerista,
sem qualquer indagação quanto a livre manifestação de vontade e a adequada
informação, enseja insegurança jurídica, bem como a relativização dos princípios
fundamentais da legislação civil, os quais não podem ser sumariamente aniquilados.
VIII. DA APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E DA
ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO
Diante de todo o discutido no presente trabalho, chegamos à
conclusão de que a segurança do credor, proprietário do bem na modalidade do
crédito direto ao consumidor está relativizada pela intervenção “ignorante” do Poder
Judiciário.
Esta relativização nos traz indagações no seguinte sentido: O
poder judiciário é imparcial e “cego”? O poder do judiciário gera proteção a quem?
Há atendimento ao princípio da igualdade?
Ora, evidente que se há aplicação da legislação consumerista,
fundamentada no fato de que o contrato é de adesão, que houve venda casada e que
há desvantagem exagerada ao consumidor, sem qualquer análise quanto a finalidade
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da contratação, o grau de instrução do consumidor, a prestação adequada das
informações, bem como a livre manifestação de vontade e a liberdade contratual,
estaremos diante de protecionismo exacerbado do consumidor em detrimento do
prestador de serviço, o que enseja desigualdade e desequilíbrio pelo próprio órgão
que deveria aplicar a norma de forma a garantir a paz social e expurgar as injustiças.
Assim, se o Código de Defesa do Consumidor já está
enraizado nos procedimentos operacionais e nos termos contratuais e é aplicado pelo
Judiciário como regra matemática, com inversões do ônus da prova sem verificação
dos próprios requisitos que o autorizam, baseando-se apenas em uma suposta
hipossuficiência, resta evidente o quadro de crise jurisdicional enfrentado nos dias de
hoje, em que vemos decisões absurdas que beneficiam a situação de inadimplência e
retiram do credor os meios para a satisfação do seu crédito.
Além disso, outra crítica ao Pode Judiciário é a questão de que
as ações envolvendo os seguros prestamistas acabaram caindo na “vala comum”,
estando presentes em ações que versam sobre revisionais, devolução de tarifas,
tornando-se corriqueiras e recebendo tratamento massificado, sem qualquer juízo de
valor.
Cabe ainda fazer uma discussão acerca das legislações que
acabam por corroborar com o problema, quais sejam, a publicação da Súmula 25 do
STF – a qual põe fim a prisão do depositário infiel, bem como as sentenças
massificadas que condenam na devolução em dobro do seguro prestamista.
Portanto, como sugestões para melhor aplicação da norma,
bem como para se evitar a fragilidade quanto ao sistema de concessão do crédito e
garantias do adimplemento, entendemos que o surgimento do cadastro positivo e a
não caracterização de venda casada a comercialização de seguro (prestamista e/ou do
bem) para alienação fiduciária são fatores importantes e relevantes para toda a
sociedade.
IX. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do estudo realizado, entendemos que embora a
legislação consumerista seja aplicável as relações que envolvem a contratação de
seguro, não se pode interpretar o Código de Defesa do Consumidor de modo a tornar
qualquer encargo contratual atribuído ao consumidor como abusivo, sem observar
que as relações contratuais se estabelecem, igualmente, através de regras de direito
civil.
Em princípio, a finalidade de um contrato não pode ser vista
isoladamente, tão-somente pelo prisma econômico de uma das partes. Deve-se, em
verdade, observar, entre outros aspectos, sobretudo o social e a proteção ao indivíduo
na sua relação em sociedade.
Salienta-se, nesse particular, que o Código de Defesa do
Consumidor não exclui a principiologia dos contratos de direito civil. Entre as
normas consumeristas e as regras gerais dos contratos, insertas no Código Civil e
legislação extravagante, deve haver complementação e não exclusão (diálogo das
fontes).
Na espécie, o seguro tem a finalidade de proteger o mutuário
por se prestar, no caso de sinistro, como uma solução para o pagamento da dívida
e/ou a perda/deterioração excessiva do bem.
Assim, a contratação de seguro nos casos de alienação
fiduciária se trata de situação que não se confunde com a malícia da parte credora de
querer impor, com a celebração do contrato, alcançar lucro extra com a venda de
outro produto que não tem qualquer razão protetiva aos interesses do comprador.
Está evidente que a garantia do ente financeiro é o próprio
veículo alienado fiduciariamente, enquanto que o seguro é uma garantia unicamente
do mutuário. Razões suficientes para se afastar eventual malícia caracterizadora da
"venda casada".
Portanto, concluímos que para se afastar a hipótese de venda
casada, deve o juiz, na aplicação da lei, aferir as finalidades da norma, para que,
diante do caso concreto, consiga bem definir, quando manifesta, a prática abusiva.
REFERÊNCIAS
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em 04.07.2013
http://www.cdc.net.br/, acessado em 04.07.2013
http://www.ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=
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2002.
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DINIZ, Maria Helena. Tratado Teórico e Prático dos Contratos. 6ª edição. Volume 5.
São Paulo. Editora Saraiva. 2006.
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 8 ed. São Paulo:
Atlas, 2008.
http://g1.globo.com/economia/seu-dinheiro/noticia/2012/12/banco-central-
aprova-resolucao-que-regulamenta-lei-do-cadastro-positivo.html acesso em
27.06.2013;
http://www.tudosobreseguros.org.br/sws/portal/pagina.php?l=392, acesso em
27.06.2013;
http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/Justica/detalhe.asp?numreg=200801106835
&pv=010000000000&tp=51, acesso em 27.06.2013;
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/808569/cef-venda-casada, acesso em
27.06.2013;
http://www.susep.gov.br/, acesso em 27.06.2013;
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04.07.2013;
http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&
artigo_id=11006, acessado em 04.07.2013.