a experiência de ser-no-mundo com um filho com síndrome de asperger · 2019-01-09 · a...

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A experiência de ser-no-mundo com um filho com Síndrome de Asperger Joana Patrício Ferreira Orientador de Dissertação: Professor Doutor Victor Amorim Rodrigues Tese submetida como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Psicologia Especialidade de Psicologia Clínica 2015

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Page 1: A experiência de ser-no-mundo com um filho com Síndrome de Asperger · 2019-01-09 · A experiência de ser-no-mundo com um filho com Síndrome de Asperger Joana Patrício Ferreira

A experiência de ser-no-mundo com um filho com Síndrome

de Asperger

Joana Patrício Ferreira

 

 

Orientador de Dissertação:

Professor Doutor Victor Amorim Rodrigues

 

 

Tese submetida como requisito parcial para a

obtenção do grau de Mestre em Psicologia

Especialidade de Psicologia Clínica

 

 

2015 

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Dissertação de Mestrado realizada sob a orientação de Victor

Amorim Rodrigues, apresentada no ISPA – Instituto

Universitário para obtenção de grau de Mestre na

especialidade de Psicologia Clinica

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iii

Agradecimentos

Agradecimentos especiais aos meus pais pela perseverança e espirito de trabalho que me

transmitiram desde cedo. Por me terem proporcionado os meios para chegar onde cheguei, a

todos os níveis. Sobretudo por acreditarem neste meu sonho que agora se concretiza. Grata pelo

vosso amor.

Obrigada à minha querida avó que sempre me deu toda a força e acreditou igualmente na

minha capacidade de conseguir tudo o que sonho. Grata pela ajuda que igualmente me prestou,

pelo amor e importante presença na minha vida.

Se por um lado temos família de sangue, por outro temos família que não é de sangue mas

que representa o mesmo. Daniela Mota e Patrícia Teixeira um enorme obrigada pela amizade

incondicional, nos momentos mais felizes e mais infelizes. Sem esse apoio não seria quem hoje

sou, todos somos uma construção e vocês fazem parte da minha. Grata pela fortaleza que

sempre proporcionaram.

Um forte agradecimento a todas as mães que participaram amavelmente no meu estudo, pela

partilha e interesse na mesma investigação.

Presto igualmente um especial agradecimento ao meu orientador Victor Rodrigues, que se

mostrou um excelente profissional, pela atenção sentida e orientação da investigação.

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Resumo: A experiência de ser-no-mundo com um filho com SA merece toda a atenção dada a

escassez de estudos qualitativos na área. O entendimento de como é ser cuidadora, do impacto

que tem o diagnóstico, das estratégias usadas, do suporte sentido e perspetivas de futuro, são

aspetos interessantes de estudo. Este estudo foi composto por 4 estudos de casos, onde

integraram quatro mães de crianças com SA em período escolar, utilizando o IPA (interpretative

phenomenological analysis). Surgiu como estrutura invariante a escassa informação sobre SA,

estratégias de enfrentamento do problema causando uma grande fonte de exaustão; valorização

do suporte escolar; atitude mais paciente das cuidadoras face aos conjugues; desejo de

normalização e preocupações a nível das relações interpessoais. A nível de variâncias nos casos

foi notado quer suporte familiar, quer falta dele, contudo, no último caso, marcados sentimentos

de tristeza e incompreensão; isolamento social por introjeção das características do filho num

dos casos; e reinterpretação positiva do diagnóstico por uma das mães.

Palavras-chave: Síndrome de Asperger | Cuidadoras | Ser-no-mundo

Abstract: The experience of being-in-the-world with a child with AS deserves all the attention

due to the scarcity of qualitative studies in the area. Understanding how to be caring, the impact

it has the diagnosis, the strategies used, the support direction and future prospects, are

interesting aspects of study. This study consisted of four case studies, which integrated four

mothers of children with AS in school time, using the IPA (interpretative phenomenological

analysis). It emerged as invariant structure the scant information about AS, strategies of facing

the problem causing a great source of exhaustion; enhancement of school support; more patient

attitude of caregivers face the spouses; desire for standardization and concerns when it comes

to interpersonal relationships. In the variance of the cases was noticed either family support or

lack of it, however, in the latter case, marked feelings of sadness and incomprehension; social

isolation by introjection of the child's features in one case; and positive reinterpretation of the

diagnosis by one of the mothers.

Key-words: Asperger's Syndrome | Caregivers | Being-in-the-world

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Índice

Resumo .................................................................................................................... iv

Abstract ................................................................................................................... iv

Índice de tabelas .................................................................................................... vii

Lista de abreviaturas: .......................................................................................... viii

Introdução ................................................................................................................ 1

Parte I - Enquadramento Teórico ............................................................................ 2

Capitulo I .................................................................................................................. 2

1.1 Evolução histórica do síndrome de Asperger ................................... 2

1.2 Caracterização do Síndrome de Asperger ........................................ 3

1.3. Interação social ................................................................................ 4

1.4. Comportamentos esterotipados ....................................................... 5

1.5. Comunicação e aspetos linguísticos ................................................ 6

1.6. Sensibilidade sensorial .................................................................... 7

1.7. Diagnóstico ...................................................................................... 8

1.8. Importância do suporte social como promotor do desenvolvimento11

Capitulo II ............................................................................................................. 13

2.1. O impacto do nascimento de um filho com deficiência ................ 13

2.2. O impacto de ter um filho com Síndrome de Asperger ................ 14

2.3. Bem-estar, stress parental e sintomas psicossomáticos. ............... 14

2.4. Estratégias de enfrentamento ........................................................ 16

2.5. Suporte social ............................................................................... 17

2.6. Impacto no subsistema conjugal .................................................... 18

2.7. Ter um filho com asperger – sentimentos ..................................... 18

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vi

Parte II – Estudo Empírico ................................................................................... 20

Capitulo III– Objetivos ................................................................................ 20

Capitulo IV – Amostra ................................................................................ 21

Capitulo V – Método .................................................................................... 21

Capitulo VI – Procedimento........................................................................ 23

Capitulo VII - Apresentação e discussão dos dados ................................. 24

Apresentação dos resultados ................................................................... 24

1.1. Estudo de caso I .......................................................................... 24

1.2. Estudo de caso II ......................................................................... 26

1.3. Estudo de caso III ........................................................................ 27

1.4. Estudo de caso IV........................................................................ 31

1.5. Estrutura Invariante ..................................................................... 33

1.6. Variâncias Realçadas .................................................................. 33

Discussão dos resultados......................................................................... 34

Capitulo VIII – Conclusão .......................................................................... 46

9. Anexos .............................................................................................................. 55

9.1. Consentimento Informado ........................................................................... 56

9.2 Guião de Entrevista Semi-Estruturada .......................................................... 59

9.3. Entrevistas .................................................................................................... 61

9.4. Quadros de Analise IPA ............................................................................ 103

9.5. Quadro de temas emergentes IPA .............................................................. 140

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Índice de tabelas

TABELA 1 - DSM-V - Síndrome de Asperger……………….……………………….10

TABELA 2 -CID-10 Síndrome de Asperger …………………………………..………11

TABELA 3 - Temáticas finais IPA - caso I……………………………………………25

TABELA 4 - Temáticas finais IPA - caso II …………………………………………..27

TABELA 5 - Temáticas finais IPA - caso III………………………………………….29

TABELA 6 - Temáticas finais IPA - caso IV……………………………………….…31

TABELA 7- Estrutura invariante ………………………………………………….33

TABELA 8 – Variâncias……………………………………………………………….33

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Lista de abreviaturas:

SA- Síndrome de Asperger

AS- Asperger's Syndrome

PEA- Perturbação do Espectro Autista

PGD – Perturbação Geral de Desenvolvimento

ASD – Autistic Aspectrum Disorder

CID - Classificação Internacional de Doenças e problemas relacionados com a Saúde

– OMS.

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Introdução

A designação de Espectro do transtorno Autista refere-se a uma condição clínica de

alterações cognitivas, linguísticas e neurocomportamentais, e que realça mais do que um

conjunto fixo de características. Representa várias combinações possíveis de sintomas

que pode ter maior ou menor intensidade. Reconhecer esta variabilidade de combinações

é fundamental para compreender as diferentes necessidades individuais (Direcção-Geral

de Inovação e de Desenvolvimento Curricular & Direcção de Serviços da Educação

Especial e do Apoio Sócio-Educativo, 2008).

Contudo, é de extrema importância olhar para a experiência do Outro e não

simplesmente categoriza-la. Deste modo, ser-no-mundo com síndrome de Asperger é

sempre uma experiência muito particular pois, tal como não existem duas pessoas iguais,

existem centenas de configurações da expressão, forma e intensidade das manifestações

para cada caso como é percetível de constatar no documentário Em Busca de Um Novo

Caminho (2012). Assim, a experiência de mães de filhos com autismo será então, também

ela, diferenciada da experiência das mães de filhos com SA, portanto, a meu ver, parece

tanto importante como investigar o SA em especifico, desenvolver estudos sobre o

impacto que pode ter na vida dos pais de portadores deste Síndrome.

Assim sendo, como é ser-no-mundo sendo mãe e pai de um filho com síndrome

de asperger? Esta investigação vem analisar detalhadamente essa mesma experiência

particular, numa visão fenomenológica-existencial, em busca da compreensão do sujeito

através das suas experiências de vida, com fim de chegar ao sujeito tal como ele se

apresenta.

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Parte I - Enquadramento Teórico

Capitulo I

1.1 Evolução histórica do síndrome de Asperger

As PEA enquadram-se em perturbações severas do neurodesenvolvimento que se

desenvolvem pelas manifestas dificuldades de comunicação e da interação, imaginação,

alterações de rotinas assim como manifestações de comportamentos estereotipados e

restritos. Assim, estas dificuldades dificultam a fluidez do pensamento comprometendo a

aprendizagem, em alguns casos, mas sobretudo o contacto e comunicação com o meio

(Geschwind, 2009). Sousa & Santos (2005) salientam que o universo autista é complexo

com conceitos distintos mas que se tocam em certos pontos. As pessoas com PEA, apesar

de apresentarem características diferentes entre si, podendo ser consideradas mais ou

menos graves dependendo do grau de autismo. Algumas crianças não são capazes de

comunicar oralmente, enquanto outras são capazes de produzir frases completas, ler e

escrever bem (Jordan, 2000).

O autismo foi descrito pela primeira vez em 1943, pelo psiquiatra austríaco Leo

Kanner, o psiquiatra ficou fascinado com os casos que recebera, onze crianças muito

diferentes entre si, e com condições únicas, dedicando-se apartir daí à consideração

detalhada das peculiaridades dos seus casos. De entre os casos acompanhados Kanner,

detetou dificuldades em manter conversas interpessoais, a maior parte das crianças não

falavam, outras tinham fala incoerente, dificuldades nos pronomes, tinham sensibilidade

a sons altos e agrado por movimentos giratórios e não estavam adaptadas as regras sociais.

Mostravam-se indiferença à presença dos parentes, num grande deficit de relacionamento

social, com grande satisfação no isolamento, tendo maior interesse por objetos (Kanner,

1943). Klin, A. (2006) Acrescenta que aproximadamente 60 a 70% dos indivíduos com

autismo funcionam na faixa do retardo mental. O autismo foi descrito por Ginger (2010)

como um fechamento em si mesmo com base numa solidão autista extrema sendo bastante

associado inicialmente à culpabilização das mães por uma não responsividade afetiva

para com os seus filhos, “mães frigorifico” (Klin, A., 2006).

Brito, A. et al. (2012) afirmam que distintamente aos casos de autismo de Kanner,

nos quatro casos do pediatra Hans Asperger as crianças não eram tão alheias e que o SA

atinge maioritariamente o sexo masculino, enquanto que no ultimo o sexo é

indiferenciado, apesar de tudo tinham igualmente prejuízos na interação social, fala e

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baixa coordenação motora, avançando assim com a hipótese de fazer parte de um

espectro.

Asperger em 1994, denominou-a como “psicopatia autística”, com um forte

isolamento social onde não encontrava deficits intelectuais. Apesar do trabalho de

Asperger ter sido conhecido nos anos 70 nos países germanos, este foi eliminado num

bombardeio que destruiu o seu laboratório (Klin, 2006; Grinker, 2010). Klin (2006),

entende que o SA classifica os indivíduos com QIs normais ou superiores, contudo as

crianças apresentavam bastantes dificuldades na comunicação não-verbal, e uma empatia

pobre para com o Outro. Observou que estas mesmas crianças tendiam a intelectualizar

as emoções, demonstravam uma linguagem com um grau de formalismo, e por isso os

denominou de “pequenos professores”, numa tendência de fala prolixa, em monólogo e

algumas das vezes incoerente. Os seus interesses ocupavam em foco o seu tempo

normalmente, interesses sobre temas incomuns e que abordavam durante as suas

conversas (Klin, 2006; Grinker, 2010).

Olhando para o cenário histórico pode-se constatar que o conceito de autismo

sofreu entretanto mudanças pragmáticas, sendo que inicialmente era categorizado como

psicose no DSM-II (Bosa, 2002), posteriormente passou a ser reconhecido e classificado

pela primeira vez, assim como as suas subcategorias (incluindo o SA) como uma

perturbação geral de desenvolvimento, quer no CID-10 que no DSM-IV (publicada em

1994) (Cassarini & Scorsolini-Comin citado por Teodoro, 2013). Recentemente, uma

nova alteração em 2013 com a publicação do DSM-V, no qual se extinguiram as

subcategorias do espectro passando a ser classificado qualquer quadro de autismo como

Transtorno do Espectro autista (assunto mais à frente explorado) (American Psychiatric

Association, 2013).

1.2 Caracterização do Síndrome de Asperger

O Síndrome de Asperger (SA) é conhecido como uma vertente mais suave e de

alta funcionalidade do espectro de desordens pervasivas (presentes e perceptíveis a todo

tempo) e de desenvolvimento do Espectro do Autismo (Teixeira, 2005). Klin (2006)

declara que o síndrome de Asperger é particularmente caracterizado pelo deficit na

interação social, segundo Salle et al, (2005) fortes dificuldades em se relacionarem com

pessoas e com situações novas. Um prejuízo significativo no que toca quer ao

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funcionamento social quer ao ocupacional, comportamentos estereotipados, focos de

interesse, tal como no autismo, contudo não apresenta retardo significativo na linguagem

falada, no desenvolvimento cognitivo e auto-cuidados (Klin, 2006).

Em termos de prevalência, Teixeira (2005) aponta que estudos mais recentes

estimam que existe uma prevalência de 20 a 25 por 10 000 crianças com SA, face a apenas

4 a cada 10 000 com autismo clássico. Vários estudos têm trabalhado também nas causas

para as PEA, contudo ainda não são precisas, mas é consensual que tem origem

multifactorial, já Asperger (1944), no seu trabalho anunciou que esta perturbação era

transmitida por via genética, afirmando que ela era uma limitação da personalidade

herdada. Ruter (2011) afirma que apesar de não serem clara as causas, existem evidências

científicas que apontam para que os fatores genéticos tenham um papel relevante e é cada

vez mais provável que fatores epigenéticos e ambientais influenciem o seu aparecimento

e gravidade. Do mesmo modo já Antunes (2009) admitiu que os estudos feitos com

gémeos verdadeiros vêm reforçar esta causa para o SA. Contudo, também fatores de

origem pré-natal podem ser preponderantes, como a APSA- Associação Portuguesa da

Síndrome de Asperger afirma, podendo ser desenvolvidas infeções, hipotiroidismo

congénito ou ate mesmo alterações que surgem no momento do parto.

1.3. Interação social

Apesar do seu isolamento, caracterizado pelos pais e professores como estando no

“seu próprio mundo ” e preocupados com a sua agenda, não são crianças tao distantes

como se observa nas crianças com autismo Teixeira (2005). De facto, as maiores

dificuldades são a nível do relacionamento inter-pessoal, onde se denota um uso limitado

de contacto visual e expressões faciais e corporais, nomeadamente dificuldade em elogiar

e reconhecer elogios durante uma interação, assim como o mantimento de

relacionamentos (Beidel et al., 2000 citado por Magalhães & Andrade, 2013). Brito et al,

(2012) avançam que os indivíduos com SA têm claras dificuldades de interpretação

literal, experienciam emoções básicas, apresentando uma fala pouco entusiasta e

dificuldades a nível da comunicação não-verbal. Estas crianças têm uma logica que pode

surpreender os outros mas desenvolvem dificuldades em compreender as regras sociais,

não percebendo como se faz uma coisa ou o que o outro tenta explicar. Também se

observam expressões “flat efect” em que se denotam expressões artificiais ou fixas

quando está um ambiente animado (Stliman, 2010).

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Apesar do grande obstáculo ser a relação inter-pessoal, não se quer dizer com isto que

o sujeito com SA não possa ter interesse em fazer amizades e conhecer pessoas, porque

os tem, apesar de tudo esses desejos acabam frustrados pelas abordagens desajeitadas e

pela insensibilidade que transmite ao outro através de por exemplo sinais de tédio ou

pressa para sair (Brito et al, 2012). Klin (2006) já havia dito que a abordagem do outro é

marcada pelos gestos anormais, atitudes inadequadas e por vezes excêntricas (Klin,

2006). Os indivíduos com SA tendem a manter mais contacto com interlocutores adultos,

através de uma conversa unilateral muito caracterizada pelo discurso prolixo e por norma

sobre temas fora do comum mas com bastante interesse e segurança para o mesmo (Brito

et al, 2012). Este comprometimento a nível das habilidades sociais leva a frequentes

comportamentos problemáticos, como agressão física ou verbal, serem excluídos e até

mesmo recorrerem ao isolamento (Bauminger et al. 2003 citado por Magalhães &

Andrade, 2013).

Assim sendo, estas circunstâncias podem abalar negativamente a qualidade de vida

de indivíduos com SA, podendo no futuro causar problemas de ansiedade e de humor

(Rogers, 2000 citado por Magalhães & Andrade, 2013). Recentemente, Ozsivadjian,

Knott & Magiati (2012) realizaram um estudo através de grupos focais com 17 pais de

crianças e adolescentes com Síndrome de Asperger e ansiedade. Estes pais relataram que

seus filhos tinham grande dificuldade em expressar suas preocupações verbalmente e

mais mostrou sua ansiedade através de mudanças em seu comportamento.

1.4. Comportamentos esterotipados

Os indivíduos com SA têm comportamentos estereotipados (Brito, A. et al, 2012)

sendo bastante comuns os interesses restritos que ocupam o foco de atenção e

incoordenação motora (Klin, 2006). Bauer (1996) postula que a característica evidente e

fascinante nos indivíduos com é a sua peculiar, idiossincrática área de “interesse

especial”. Este interesse que merece o foco destes indivíduos não é similar ao do autismo

típico, que se baseia sobre objetos ou parte deles, pelo contrario no SA o foca dirige-se a

áreas intelectuais particulares, que surgem como um interesse obsessivo à entrada da

escola, como por áreas de maremática, ciência, geografia ou historia, sendo o seu objetivo

saber tudo e falar sobre essa mesma área de interesse. Urbanski (2008) afirma ter visto

crianças com SA onde o seu foco são astronomia, mapas, componentes de carros, aviões,

foguetes Muitas crianças à entrada na escola demonstram hiperlexia, isto é uma

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capacidade de leitura rotineira na sua idade precoce (Bauer, 1996). Mais tarde, Brito, A.

et al (2012) colocam em enfase que estas capacidades notáveis nas áreas de interesse

podem levar mesmo a garantir o seu próprio sustento

Um sinal que desperta para o SA, segundo Urbanski (2008), é o facto de até aos 3

anos de idade algumas crianças com SA estarem atentas a coisas inusuais como as rotas

das viagens que fazem de carro, ou ate mesmo fascínio por desenhos animados como

Power Rangers ou dinossauros. Estas áreas de interesses podem se manter até à vida

adulta, outras podem mudar com o tempo, sendo substituídos por outras. Klin (2006)

refere que as pessoas com SA podem usar as suas características e talentos para serem

utilizados numa possível obtenção de emprego.

1.5. Comunicação e aspetos linguísticos

Frith (1994) afirmava que todos os sujeitos com SA pertencem ao espectro autista,

tendo em comum com o autismo a deficitária comunicação, apesar de não tão agravada

como no autismo, sendo que estas dificuldades são subtis sobretudo sobre uma linguagem

pragmática e social. Alguns anos depois, Teixeira (2005) afirma que uma característica

distinta das crianças com SA relativamente às com autismo é a função linguística normal

e as habilidades cognitivas, onde se encontram resultados de QI medio ou acima da média.

Apesar de dominarem a linguagem e terem um vocabulário rico não o conseguem usar

em contexto social, dai que a sua maior dificuldades é a de interpretar e aprender as

capacidades da interação social e emocional com os outros. klin (2006) remete para a

dificuldades na compreensão de metáforas e informações não literais emitidas pelos

outros, através do tom de voz ou respostas indiretas.

Assim Stilman (2010) aponta que o discurso tem um padrão muito particular,

monótono e sem-interesse, palavras ditas de forma robótica e cuidadosamente avaliadas,

e o som da sua voz tende a ser melodioso, como se fossem sons cantados. Como Asperger

(1994) já havia mencionado é uma linguagem que não parece natural e que não aparenta

ser dirigida ao ouvinte mas sim para a um espaço vazio.

Urbanski, (2008) havia explicado que apesar de terem linguagem normal, existem

algumas destas particularidades, nomeadamente a prosódia, isto é a entoação, ecolália,

ecoar o som, volume, inflexão e velocidade da linguagem. Um tom formal ou arrogante,

gírias mal aplicadas. As dificuldades de interpretação são imensas, em grande parte

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porque a sua compreensão tende para o concreto, o que complica quando a linguagem se

torna mais abstrata, pois não é entendido o significado. Como compensação é frequente

mudar o tema para a área de interesse especial.

Em indivíduos com SA onde as capacidades intelectuais podem ser excepcionais é

possível encontrar casos extemos de elevado desenvolvimento linguístico, com óptima

pronuncia e gramática, ate mesmo em línguas estrangeiras (Jordan & Powell ,1995 citado

por Frith, 1996). Frith,1994, afirma que o que pode mesmo distinguir indivíduos com SA

é esta capacidade de falar fluentemente pelos 5 anos, mesmo que anteriormente tenha

existido uma lentificação do desenvolvimento da mesma.

1.6. Sensibilidade sensorial

Aarons e Gittens (1992) relataram antecipadamente a hipersensibilidade sensorial

a pequenos ruídos. A perceção sensorial no geral pode ser diferente em crianças

diagnosticadas com perturbação do espectro autista, com maior sensibilidade em alguns

aspetos sensoriais (Blakemore et al., 2006). Dunn, W., Myles, S. & Orr, S. (2002 referem

que esta hipersensibilidade sensorial leva muitas a uma experiência intensa e dolorosa ou

no mínimo desconfortável.

Em 2010, Stillman afirma que um som intenso pode fazer as crianças chorar ou

retraírem-se pelo incómodo causado, como por exemplo com o choro de bebés,

ambulâncias ou pessoas a rir; O canal visual é o que as crianças com SA mais utilizam,

sendo capazes de captar detalhes em ambientes simples como objetos a girar ou a bater.

As luzes florescentes ou fortes podem também ser um problema pois levam a que se

sintam desconfortáveis para estas crianças; Quanto ao toque, as crianças com SA podem

ser bastante seletivas no que toca às texturas, pois algumas lhe causam desconforto,

nomeadamente em roupas. Stilman acrescenta que são ainda observadas alterações

somáticas funcionais oro-alimentares, que podem ser precoces, podendo levar a uma

recusa de certos alimentos, ingestão indiferenciada ou recusa em mastigar os alimentos.

Myles & Adreon (2001) ao estudarem as questões escolares de adolescentes com SA,

entenderam e explicaram que a simples refeição num refeitório escolar pode

sobrecarregar o mundo sensorial da criança rapidamente de tal como que esta chega ao

limite de ter de sair do mesmo dado o desconforto extremo.

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1.7. Diagnóstico

O diagnóstico das perturbações autísticas pode ser realizado através da avaliação

direta do comportamento do paciente seguindo por exemplo os critérios clínicos no

sistema de classificação do DSM-V e no CID, pois ambos se baseiam na tríade de

interação social, comunicação e comportamento. (Direcção-Geral de Inovação e de

Desenvolvimento Curricular & Direcção de Serviços da Educação Especial e do Apoio

Sócio-Educativo, 2008). Teodoro, M., Cassarini, C., Scorsolini-Comin,F. (2013)

adiantam que é um facto que historicamente, que a classificação do SA está muito

relacionada com o autismo, sendo importante um conhecimento prévio deste mesmo para

compreensão completa. O aparecimento dos sintomas especificamente do SA

dificilmente é reconhecido nos primeiros anos de vida, sendo diagnosticado por volta dos

5 ou 6 anos, em alguns casos associado a suspeita de superdotação (Brito, A. et al, 2012).

Existe uma diversidade de capacidades e personalidades, os indivíduos podem exibir

atrasos mentais graves, outros são extremamente intelectuais, alguns recorrem ao

isolamento, outros procuram situações sociais, uns têm respostas lentas, outros são muito

ativos no seu ambiente (Dunlap, Pierce & kay, 1999). Dada esta multiplicidade de

características e singularidade destas crianças, e por vezes acabam por não ser bem

diagnosticadas sendo confundidas com desordens de atenção, distúrbios emocionais,

entre outros.

É também provável que dados os sub-tipos pode haver alguma confusão relacionada

no que toca ao diagnóstico e é possível que crianças muito parecidas sejam diferentemente

diagnosticadas dentro do próprio quadro de PEA, dependendo de onde e por quem foram

avaliadas (Urbanski, 2008). Por isto mesmo, em 2013 o DSM-V veio trazer alterações na

organização do autismo, eliminando-se as categorias assinaladas no DSM-IV, todas elas

passaram a ser encaradas como um só denominando-se por Transtornos do Espectro

Autista. Isto deve-se ao facto das distinções entre os transtornos parecerem inconsistentes,

assim parece mais clara esta alteração dado que os sintomas são comuns, continuando

contudo a haver espaço para os quadros clínicos e singulares do paciente como por

exemplo a presença ou não de deficiência intelectual ou prejuízo na linguagem. A

presença de atrasos ou deficiências sociais de comunicação, comportamentos sensoriais

incomuns, interesses fixos, rotinas e comportamentos repetitivos, são preponderantes para

a distinção entre TEA e outros transtornos. Foram encaradas as e os seus interesses

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restritos, fixos e intensos assim como comportamentos repetitivos (American Psychiatric

Association., 2013).

Segundo o DSM-V, os critérios clínicos para efetuar um diagnóstico de Transtorno

do Espectro Autista são:

A. Déficits clinicamente significativos e persistentes na comunicação social e

nas interações sociais nos múltiplos contextos, manifestadas nas seguintes

maneiras:

1. Dificuldades na reciprocidade emocional-social, mudanças como por exemplo

uma anormal aproximação social e incapacidade de troca de dialogo. Uma

reduzida troca de interesses, emoção ou afetos. Uma incapacidade em iniciar ou

responder a interações sociais;

2. Deficits na comunicação não-verbal usada para interação social, como uma

pobre integração da comunicação não-verbal e verbal; anormalidades no

contacto ocular e linguagem corporal ou dificuldades em perceber e usar gestos;

uma total falta de expressões faciais e comunicação não-verbal.

3. Deficits em desenvolver, manter e perceber os relacionamentos. Por exemplo

dificuldades em adequar os comportamentos aos variados contextos sociais;

Dificuldades no jogo imaginativo e em fazer amigos e falta de interesse nos

pares.

B. Padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades,

manifestadas pelo menos duas das seguintes maneiras:

1. Comportamentos motores repetitivos ou estereotipados, uso de objeitos ou

discurso (por exemplo estereopatias motoras simples, alinhar ou lançar

objetos, ecolália ou frases idiossincráticas)

2. Insistências, adesão a rotinas inflexíveis ou padrões de comportamento

verbal ou não verbal (extremo stress a pequenas mudanças, dificuldades em

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transições, padrões de pensamento rígidos, necessidade em seguir a mesma

rota ou comer o mesmo todos os dias);

3. Interesses altamente restritos e fixos que são anormais em foco ou em

intensidade (por exemplo uma forte ligação ou preocupação com objetos

incomuns, excessivamente circunscritos ou interesses preservativos);

4. Hiper-ou Hiporeatividade a estímulos sensoriais ou interesse incomum em

aspetos sensoriais do ambiente (aparente indiferença à dor/ temperatura,

respostas adversas a sons específicos ou texturas; cheiro ou toque excessivo

de objetos, fascínio visual com luzes ou movimento).

C. Os sintomas devem estar presentes no início da infância, mas podem não

se manifestar completamente até que as demandas sociais excedam o limite de

suas capacidades.

D. Os sintomas causam prejuízo clinicamente significativo no funcionamento

social ou ocupacional ou em outras importantes áreas de funcionamento

actual.

E. Estes distúrbios não são explicados por deficiência intelectual (desordem

do desenvolvimento intelectual) ou atraso de desenvolvimento global. A

deficiência intelectual e o transtorno do espectro autista podem

frequentemente co-ocorrer; para fazer diagnósticos de co-morbidade de

espectro do autismo desordem e deficiência intelectual, a comunicação social

deve ser abaixo do esperado para o nível de desenvolvimento em geral.

Tabela 1 - DSM-V - Síndrome de Asperger

Traduzido de: American Psychiatric Association. (2013).

Já o CID-10 entende o SA como:

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Tabela 2 -CID-10 Síndrome de Asperger

1.8. Importância do suporte social como promotor do desenvolvimento

Brito et al (2012) vêm despertar para o facto de que o prognóstico pode ser bastante

favorável se o meio onde o indivíduo com SA está inserido for favorável ao seu

desenvolvimento, assim sendo a participação das pessoas que fazem parte da vida do

paciente tem especial relevância para o seu desenvolvimento. As próprias relações

interpessoais podem contribuir e muito para o processo de mudança na vida dos

indivíduos com SA, e foi isso que Fadda (2013) concluiu num estudo assente em histórias

de vida consultadas em filmes e livros autobiográficos de pessoas diagnosticadas com

autismo (autismo severo, autismo e Síndrome de Asperger) e entendeu que é fundamental

uma atitude facilitadora por parte do terapeuta, ou da pessoa de convívio, e isso envolve

ter uma postura aberta e de confiança, pois deste modo o individuo aceita a presença do

outro e consegue partilhar e elaborar melhor as experiencias vividas de modo a que este

se torne tudo o que pode ser.

Já em 1992, Castro afirmou que a família, em particular os pais, tem uma importância

determinante no desenvolvimento integral e global da criança, seja ela portadora ou não

de algum tipo de deficiência. Tem ainda como função, assegurar a segurança da criança,

na medida em que tem que satisfazer as suas necessidades mais elementares; protege-la

do exterior; facilitar o desenvolvimento coerente e estável proporcionando-lhe um clima

de autoaceitação. Também mais recentemente Brito at al (2012) realçou a grande

importância que todos os esforços sejam feitos no sentido de auxiliar o sujeito a conviver

com a patologia, sobretudo os familiares e amigos, devendo estes ter conhecimento da

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situação vivida pelo paciente, num ambiente de carinho e afeto. Os próprios pais de

crianças com SA, segundo o estudo de Morison, Sansosti & Hadley (2008), têm a

perceção de que o apoio social, sobretudo o próprio apoio/ suporte parental é

imprescindível para os seus filhos com SA.

Antunes, 2009 afirma que as dificuldades e exigências de uma criança com SA levam

a que seja necessária a adequações por parte de todos os intervenientes no seu

desenvolvimento. Esta adequação parece fundamental a nível do suporte escolar, segundo

a Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular & Direcção de Serviços

da Educação Especial e do Apoio Sócio-Educativo (2008) os órgãos da escola devem

estar envolvidos na procura de respostas adequadas, desde os docentes de educação

especial, técnicos terapêuticos, psicólogos, terapeutas a outros serviços da comunidade

que se mostrem pertinentes, até mesmo ao suporte dos próprios pais de forma a responder

às necessidades individuais dos alunos com PEA, até porque não é comum estes

partilharem a sua vida escolar com os pais, contudo é exatamente com eles que o trabalho

deve ser feito. Deve-se apostar então na criação de unidades de ensino estruturados para

estes alunos, de forma integrada com colaboração e participação dos pais na avaliação

que serão informados das dificuldades e onde podem também eles exprimir as suas

preocupações. Também Morison, Sansosti & Hadley (2008) fizeram um estudo com pais

de crianças com SA, onde estes chegaram ao consenso entre eles de que os professores

devem realçar os pontos fortes dos filhos e dar suporte, envolvendo todo o serviço escolar.

Jindal-Snape, Douglas, Topping, Kerr & Smith (2005) concluem que no caso de

crianças com SA e autismo clássico, é de primeira ordem tomar decisões adequadas no

que toca à oferta educativa da criança. Os pais no estudo elaborado pelos mesmos autores

são da opinião de que os professores devem ter formação específica de autismo, e

concomitantemente olhar caso a caso devido às necessidades diversificadas de cada

criança, assim, e só desta forma vêm vantagem em que a criança esteja em escolas de

ensino regular. Para que não seja uma utopia o ambiente inclusivo, na opinião destes pais,

só é possível quando ha disponibilidade, qualidade e atitude na equipa, assim como uma

modificação do currículo.

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Capitulo II –

2.1. O impacto do nascimento de um filho com deficiência

Aquando o nascimento de uma criança existe sempre uma grande mudança, quando

essa mesma é portadora de deficiência a situação é inesperada e assim sendo, tem um

impacto acrescido na vida familiar (Gongora, 2002). Neste sentido Fera (2009) afirma

que o é importante que a família responda de forma positiva e adaptada aos padrões da

relação.

A mudança pode ser drástica, pois uma experiencia que era expectável de ser repleta

de bons sentimentos, ou seja idealizada, passa a ser repleta de novas adversidades que

não eram esperadas, e deste modo exige um re-ajuste dos projetos e expectativas quanto

ao futuro (Gauderer, 1997). Para Franco & Apolónio (2002) o que acontece aquando se

espera um filho é idealização do mesmo, e ao receberem o filho essa idealizaçao não

desapareceu, continua mas de uma forma consideravelmente diferente. Sendo que algo

inesperado acontece há maior predisposição a desenvolver problemas de índole

psicológica. Estes mesmos autores no seu estudo, detectam que a vivência emocional dos

pais é manifesta por ansiedade, depressão, esgotamento e confusão e que estes têm de ser

cuidados tal como as necessidades desenvolvimentais das crianças com necessidades. A

reestruturação demonstra-se preponderante, assim como da dinâmica familiar. A coesão

familiar é tida como um pilar fundamental segundo as mães dando força e resistência

psicológica sendo sentida uma grande preocupação com o futuro.

Seltzer, Greenberg, Floyd, Petee & Hong (2001) fizeram um estudo longitudinal, em

três momentos da vida de pais que tiveram uma criança com uma deficiência de

desenvolvimento, um grave problema de saúde mental e um grupo de comparação

normativa, com o intuito de entender o impacto nas famílias a nível do bem-estar e

realização ao longo do tempo. Estes autores concluíram que os pais de crianças com um

atraso no desenvolvimento tiveram menores taxas de emprego e menores taxas de

participação social, mas com igual bem-estar psicológico aos pais de comparação.

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2.2. O impacto de ter um filho com Síndrome de Asperger

Também o contexto envolvente de um individuo com PEA sofre um impacto

significativo pois estes demonstram sintomas constantes em todos os contextos que

vivenciam. Muitas vezes, por não existirem características físicas da perturbação, ela

torna-se, aos olhos de quem não conhece a perturbação, invisível e com grande frequência

são sub-avaliadas as competências e emoções das famílias, ou por outro lado podem ser

mal interpretadas. Assim as PEA afetam o portador do síndrome e, pelas suas

características, sobretudo pelas dificuldades de interação e de apoio continuado, também

a família. (Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular & Direcção de

Serviços da Educação Especial e do Apoio Sócio-Educativo, 2008).

Mugno, Ruta, D 'Arrigo, & Mazzone (2007) afirmam que os pais dos indivíduos

diagnosticados com transtornos de desenvolvimento, incluindo síndrome de Asperger,

podem enfrentar desafios maiores do que os pais de indivíduos com desenvolvimento

típico. Madeira (2014) concluiu que os pais denotam mais impacto aquando a idade dos

filhos começarem a interagir, comunicar e aprender, sendo preponderante para a

adaptação o esclarecimento e o apoio na altura do diagnóstico e posteriormente.

2.3. Bem-estar, stress parental e sintomas psicossomáticos.

Surgem sentimentos ansiogenicos, stress, medo, incerteza face á criança e até

mesmo à reacção da família, que pode chegar mesmo a duvidar das suas capacidades

(Silva - Guzman, 2002). De facto, o bem-estar de mães de crianças com PEA foi alvo de

bastantes investigações, sendo registados altos níveis de depressão (Carter et al., 2009,

citado por Smith, Greenberg & Seltzer, 2011). Blacher & McIntyre (2006) afirmam que

as crianças com PEA relatam maiores níveis de angústia que mães de crianças portadoras

de outras deficiências. Giallo, Wood, Jellett & Porter (2013) chegaram às mesmas

conclusões ao compararem mães de crianças com desenvolvimento típico com mães de

crianças com PEA, percebendo que estas últimas experimentam mais fadiga, têm má

qualidade do sono, baixa atividade física e apoio social, mais stress, ansiedade e

depressão, acresce a menor eficácia parental e satisfação. Uma conclusão dos autores foi

a necessidade primordial a necessidade de assistência às mães nestas condições. No que

diz respeito a sintomas psicossomáticos, Smith, Seltzer & Greenberg (2012) concluíram

que as mães de crianças com PEA relataram mais dores de cabeça, costas, exaustão, dores

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musculares. Também Kuusikko-Gauffin et al. (2013) fizeram um estudo com pais de

crianças com PEA (autismo e SA) e sem outras perturbações e entenderam que as mães

do primeiro grupo atingem níveis de ansiedade social mais altos (causada por medo de

humilhação e/ou vergonha em situações sociais) e os pais também do primeiro grupo têm

mais sintomas somáticos e cognitivos face ao grupo de controlo. Reforçam a importância

de melhorar o bem-estar destes pais dado o seu contributo enorme para o desenvolvimento

emocional nos filhos.

Face à pluralidade de estudos que avaliam o stress em pais de crianças com PEA,

Epstein, Saltzman-Benaiah, O’Hare, Goll & Tuck (2008) desenvolveram o estudo do

stress parental em pais de crianças com SA percebendo que este era significativamente

maior nas mães que nos pais, associadas às grandes dificuldades de sensibilidade

sensorial e funções executivas, isto é planeamento, inibição e pelo quadro inconstante da

perturbação. Alertam ainda para a consideração deste stress parental quando se trabalha

com famílias.

A qualidade de vida das mães de crianças com SA tem também sido alvo de

estudos, Allik, Larsson & Smedje (2006) avaliaram a qualidade de vida de mães e 30

pais de crianças com SA, assim como de um grupo de pais de crianças com

desenvolvimento típico, sendo que nas primeiras as mães tinham menores níveis de bem-

estar sobretudo físico quando comparadas com os pais e que isso estaria relacionado com

os problemas de conduta e hiperatividade. Já Tonge (1999) havia notado que problemas

de comportamento eram comuns em indivíduos com SA. Mais recentemente, Brobst,

Clopton & Hendrick (2009) detetou que os pais de crianças com ASD experienciam mais

problemas comportamentais dos filhos. Igualmente Hastings (2002) havia dito também

que o bem-estar ou stress parental está relacionado com as próprias características da

criança, problemas de comportamento e a idade por exemplo. A pesquisa de Abbeduto et

al (2004) mostrou que o nível de stress parental e os desafios enfrentados pelos pais

variam conforme a gravidade e intensidade dos sintomas da criança assim como dos

factores familiares.

Mor., Ujiie, Smith & Howlin (2009) numa amostra de população japonesa,

estudaram também o stress parental em 193 famílias num grupo de pais de crianças com

SA e num grupo de pais de crianças com autismo, e concluíram que existiram níveis mais

altos nos pais de crianças com SA o que pode em grande parte ter a ter com os problemas

comportamentais e estereotipados que o quadro clinico revelam e os pais relacionam.

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Além disso, pais de adolescentes com a síndrome de Asperger autismo relatam menor

qualidade de vida do que os pais de crianças e adolescentes com autismo, o que é

indicativo das dificuldades vividas entre estes pais (Mugno, Ruta, D 'Arrigo, & Mazzone,

2007).

Taylor & Warren (2011) entendem que a compreensão da experiência de vida dos

cuidadores torna-se fundamental, é importante perceber o grau com que experienciam os

sintomas depressivos assim como compreender igualmente quais os factores que podem

atenuar ou activar a angústia.

2.4. Estratégias de enfrentamento

Bonanno (2004) explica que se torna preponderante um certo nível de resiliência

por parte dos casais de crianças com necessidades especiais de forma a manter o equilíbrio

emocional, cognitivo e físico face ao stress sentido pela condição dos filhos Este impasse

de resultados faz com que haja interesse na investigação sobre esta temática assim como

dos factores e riscos associados ao ajuste psicológico materno em termos de autoeficácia,

optimismo e coping utilizado (Benson 2010).

Glidden, Billings, & Jobe (2006) reforçam que é importante entender os recursos

que os pais utilizam para o enfrentamento da situação, isto é coping utilizado, pois quando

as estratégias de enfrentamento usadas são adaptativas, usando uma estratégia focada no

problema ou reavaliação positiva então terão maior bem-estar psicológico ao contrário de

estratégias de fuga por exemplo.

A religiosidade das mães tem sido alvo de estudos, para alguns autores como Ekas

et al., 2009 está associada a melhores resultados no tratamento das crianças, por outro

lado outras investigações como a Tarakeshwar e Pargament, (2001) consideram que há

que ter em atenção ao apego religioso na medida em que pode ser um apego negativo,

através de uma atitude passiva deixando tudo nas mãos de Deus.

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2.5. Suporte social

Bradford (1997) exaltou alguns factores que contribuem para a adaptação à doença

cronica, como as crenças sobre saúde, os sistemas de saúde, padrões de interação familiar

e padrões de comunicação intra e extrafamiliar, sendo que estes dois últimos iram oferecer

suporte.

Heiman & Berger (2008) realizaram um estudo com pais de crianças com SA e pais

de crianças com dificuldades de aprendizagem, comparados com pais de crianças sem

deficiência alguma, sendo concluído que os pais de crianças com SA têm além de maiores

níveis de stress, também menos expressividade na família, fraco sistema de amizades e

apoio social quando comparados com o grupo de controlo. Na verdade, os pais de crianças

com desordens desenvolvimentais demonstram dificuldade em pertencer a uma

organização social e ter amigos confidentes, sendo isto consequência do seu estilo de vida

mais acomodado à família em resposta às necessidades dos seus filhos (Seltzer, M.,

Greenberg, S., Floyd, J., Petee, Y. & Hong, J.,2001).

Milgram e Atzil (1988, citado por Schmidt & Bosa, 2003) empenharam-se na

avaliação dos diferentes papéis desempenhados por pais e mães de crianças com autismo

sendo que as mães pendem a apresentar maior risco de crise assim como stresse parental,

algo que está relacionado com os maior assunção dos cuidados com a criança como é

socialmente expectável, sendo frequentemente mencionado a falta de suporte dos

maridos, num desejo de que haja uma responsabilidade e cuidados conjuntos de forma a

não ser sentido tal desamparo. Por outro lado, entendem a menor participação pois vêm

o papel dos pais como um responsável pelas questões financeiras, que em contraposição

às expectativas.

Tudo aponta para que tal como para a criança com SA o apoio social é essencial,

também nos pais se mostra crucial para própria actuação do meio. Segundo Benson,

(2012) o apoio social, sobretudo familiares e amigos, apresentam efeitos benéficos sobre

a saúde emocional e física, reduzindo a angústia sentida pelas mães, constaram ainda e

que mães com mais perceção de apoio social tornam-se mais autoeficazes e humor acaba

por ser menos depressivo.

Todavia, outros autores como Valério (2004), investigaram mães de crianças

portadoras de deficiência mental em processo de reabilitação, concluindo que as mães

demonstram bons índices de qualidade de vida, a mesma ideia partilha Nunez (2003) onde

reforça que o importante é a reacção dos pais às doenças dos filhos .

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2.6. Impacto no subsistema conjugal

Aquando um filho com PEA nasce, dado o maior nível de stress, há maior

probabilidade de existirem conlitos entre os pais o que pode afetar a satisfação conjugal

(Hastings et al., 2005). Apesar de Hastings et al afirmarem que os níveis de ansiedade e

depressao são observados em pais e maes, Bendixen et al. (2011) relatam que o stress

sofrido pelo pai é diferente do das mães, o que não implica que seja em maior ou menor

grau. Os autores Hartley, Seltzer, Barker & Greenberg (2011) reforçam que os pais têm

interação conjugais negativas e que isso pode ser devido ao stress relacionado com o

problema do filho. Brobst, Clopton & Hendrick (2009) fizeram também um estudo

comparativo com pais de filhos com ASD e pais de filhos sem a perturbação, percebendo

que além de fraco suporte social, existia uma menor satisfação conjugal. Contudo, algo

interessante é que não houve diferenças significativas nos grupos no que toca à perceção

de apoio do cônjuge.

Hartley et al. (2010) chegam a considerar no seu estudo que o risco de divorcio

aumenta em pais de crianças com ASD, apesar da maioria continuar casada. A taxa de

divórcio foi maior quando as mães eram mais jovens aquando o nascimento da criança

com uma ASD e quando a criança nasceu mais tarde na ordem de nascimento. Já foi

referida a importância do suporte, e Dunn et al. (2001) perceberam que os pais de crianças

com ASD que têm maior suporte social (apoio da família e amigos sobretudo), e pais que

têm estratégias de enfrentamento do problema tendem a ter menor risco dessas mesmas

interação conjugais negativas pois os níveis de stress são também eles menores.

2.7. Ter um filho com asperger – sentimentos

Ivey & Ward (2010) fez um estudo de caso, muito particular, com uma irmã de um

rapaz com SA e que posteriormente teve um filho com SA e de como isso interferiu nas

suas praticas parentais e que demonstra a vivencia nos dois sentidos. A mãe realçou no

estudo que vai continuar a lutar durante toda a sua vida pelos direitos e autonomia do seu

filho. A experiência com o seu irmão com SA teve um grande impacto no que toca à

estruturação do seu estilo parental, na medida em que decidiu encarar a deficiência do seu

filho ao contrário do que anteriormente os seus pais fizeram com o seu irmão. Para esta

mãe devem-se aceitar as características únicas das crianças com SA e ter em atenção quais

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as necessidades das mesmas. Os seus outros filhos intervêm nas atividades diárias do

irmão e afirma que a sua família foi criada de forma a garantir que o irmão com SA fosse

entendido como normal. A mãe afirma que:

“Mothers [of children with autism] are the mother

tigers of the world. Whether you are born with this

personality or not… you become one.”p.10.

É uma facto que pais de crianças com autismo na maior parte das vezes não têm o

decrescer de responsabilidades consoante a idade dos filhos, dado que muitas vezes

continuam a viver com os mesmos na idade adulta (Seltzer et al., 2001) Em 2012, os

autores Griffith, Totsika, Nash, Jones & Hastings fizeram um estudo com o fim de entender

a experiência de pais de filhos adultos com SA, com três mães de adultos com SA e uma

mãe de um adulto com autismo atípico, através de entrevistas analisadas segundo o IPA,

deste emergiram seis temas: oferecer suporte “encoberto”, através da prestação de suporte

pratico (tarefas domésticas, lavar roupa, limpar, ir às compras e preparar refeições) apenas

um era independente, os restantes eram supervisionados nas tarefas domesticas e

crescimento pessoal pelos pais. Em termos de apoio emocional tendem a ser contactados

pelos filhos constantemente e respondem às suas ansiedades e desafios do dia-a-dia e

sentem isso como um papel que lhes é inerente; o papel de proteger, dado que a maior

parte das pessoas e serviços não sabe o que é nem como ligar com o SA; interação social,

que se demonstrou baixa havendo relatos de que o filho não tem amigos o que causa aos

pais muita tristeza e preocupação; a relação interfamilar, onde há grande diversidade

desde pais que sentem impossibilidade de chegar ao filho outros que chegam mas sentem-

se frustrados por não os “desbloquear” totalmente do seu “mundo” e que isso era uma

forma de barreira, relatam através de desculpabilização o comportamentos mais rudes dos

filhos; Suporte para os pais, demonstrou se uma grande surpresa pois estes sentiam que

não precisam dele, mas sim os seus filhos; e por fim, o suporte futuro, as mães dos filhos

dependentes delas referiram medos dado que precisam de apoio por toda a vida, quais os

familiares ou serviços que iram dar apoio, medos pela sua segurança e de oportunidades

sociais.

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Parte II – Estudo Empírico

Capitulo III– Objetivos

As perturbações do Espectro autista têm sido estudadas ao longo dos anos, contudo

pouca é a investigação especificamente com pais de crianças e jovens com SA. Viver com

um filho com SA não é uma experiência equivalente à de viver com um filho com

autismo, dada a singularidade da existência que nos compõem.

Não é de hoje o meu interesse pela temática, foram por mim realizadas entrevistas a

pais num estudo anterior no intuito de entender as particularidades das crianças e jovens

com SA. Nessa investigação foram por mim reconhecidas as dificuldades dos portadores

de SA mas também um alerta para o impacto que essas têm na vida quotidiana dos seus

cuidadores.

O que este estudo procura é entender a experiencia de ser-no-mundo com um filho

com SA, em várias vertentes da sua vida. É um facto referenciado literariamente que os

desafios com uma criança/jovens com SA são imensos, e isso tem necessariamente

repercussões na vida dos pais, tal facto não pode ser subestimado. Muitos estudos

quantitativos têm sido feitos sobre mães e pais de crianças com perturbações do espectro

autista, a nível da qualidade de vida e stress sentido.

Contudo, como será sentido concretamente pelas mães, como cuidadoras de crianças

com as características que o SA envolve? Espera-se então compreender esta vivência

desde o impacto do diagnóstico, apoio conjugal, familiar e do grupo de pares, apoio

social, tipos de coping, maiores preocupações sobre as dificuldades dos filhos,

preocupações futuras e expectativas. Turato (2005) refere que no contexto de saúde é

importante conhecer esses fenómenos no sentido saúde-doença, entendendo mais

profundamente os sentimentos, idéias e comportamentos dos doentes, mas também dos

seus familiares. Sendo as mães cuidadoras destas crianças importa explorar como é esta

vivência em termos qualitativos numa amostra selecionada neste diagnóstico específico.

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Capitulo I V – Amostra

A amostra, tal como o IPA pressupõe, é homogénea, sendo que os participantes

encontram-se todos eles na mesma situação de exploração podendo ser explorado o tema

em questão em profundidade, ou seja todos eles são cuidadores, mais propriamente, mães

de crianças portadoras de SA. A amostra é composta por mães da zona centro de Portugal.

A amostra foi recolhida através do contacto de mães que participam experiencias num

fórum, sobre os seus filhos com SA. Foram contactadas as primeiras 4 mães, verificando

o diagnóstico de SA. As idades das mães variam dos 37 aos 45 anos. Três das mães

encontram-se empregadas, sendo que uma deixou o emprego por opção de acompanhar o

filho. As idades dos seus filhos variam entre os 6 e os 10 anos.

Capitulo V – Método

Já Denzin & Lincoln (1994 citado por Turato, 2005) referiam que o estudo

qualitativo se debruça sobre o estudo de fenómenos no seu contexto natural, tentando dar

sentido ou interpretar os mesmos segundo as significações que as pessoas lhes atribuem.

Sendo que só podemos conhecer uma vivência, abordando-a tal como ela é expressa pelo

individuo, o método qualitativo foi o elegido para o desenvolvimento da investigação.

Segue-se o modelo fenomenológico-existencial, usando uma análise minuciosa,

aplicando o método IPA. A escolha de análise qualitativa dos resultados baseia-se na

riqueza que esta pode fornecer e pela sua escassez, quando comparada às pesquisas

quantitativas que se manifestam bastante mais alargadas nesta área de estudo. Como

Lagdridge (2007) refere, os estudos fenomenológicos abordam a pesquisa qualitativa em

jeito de entender mais sobre a experiência por meio da reflexividade. São usadas questões

de investigação abertas, seguindo um guião de entrevista semi-estruturada, de modo a

entender mais sobre um determinado assunto. As entrevistas foram concretizadas de

forma a privilegiar a reflexão do entrevistado. Assim não se pretendem obter

generalizações mas sim entender o fenómeno através das representações pessoais de cada

individuo, não em jeito de explicação mas sim de compreensão do fenómeno vivido.

O IPA foi o método utilizado, sobretudo por ser uma abordagem mais interpretativa

que descritiva. Foi desenvolvido por Jonathan Smith, na Universidade de Londres, sendo

a abordagem mais usada no Reino Unido. O IPA tem como objetivo ter uma exploração

detalhada da perceção que o individuo tem de um experiencia e qual o significado para

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si. Envolve a análise temática dos dados de amostras relativamente pequenas, dado que o

interesse não é efetuar generalizações mas sim compreender o fenómeno. Ao contrario da

fenomenologia descritiva, procura amostras homogéneas, usando vinhetas ou entrevistas,

predominantemente semi-estruturadas, com espaço para reflectir acerca da experiencia, o

seu impacto, família, amigos, métodos de coping, entre outros. A transcrição da gravação

de entrevistas inclui as perguntas do entrevistador e respostas do entrevistado, focando-

se no conteúdo semântico e não nos detalhes. Segue-se a leitura e re-leitura, as vezes que

forem necessárias para criar familiaridade ao descrito pelo entrevistado. São apontando

na margem esquerda comentários ou interpretações baseadas no conhecimento da

literatura psicológica, com o intuito de dar significação ao texto original. Seguidamente,

são apontados na margem direita do texto transcrito os temas emergentes que representam

por sua vez unidades de significado psicológico. Com significado que reflecte

teoricamente as questões significativas ou seja as maiores preocupações. Sendo que esses

termos podem mudar na próxima fase. Nesta terceira fase por sua vez, listam-se os temas

numa folha de papel e posteriormente identificam-se ligações entre os temas e

reorganizam-se os mesmos, alguns agrupam-se e alguns dividem-se. Na última fase de

análise é criada uma tabela com todos os temas em ordem coerente, sendo que alguns

podem ser ignorados no caso em que não acrescentem algo para a análise ou não se

encaixem bem. Finalmente, os temas são analisados e é encontrada a estrutura invariante

entre os casos explorados.

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Capitulo VI – Procedimento

Todas as participantes foram contactadas através mensagem num fórum de pais com

filhos com síndrome de Asperger, sendo contactadas por meio telefónico as que

demonstraram interessa na participação no estudo. Nesse primeiro contacto foram tidas

em conta as questões éticas que Langdridge (2007) abordou, como o consentimento,

anonimato e o objetivo da investigação, de forma aos mesmos o pleno conhecimento

sobre a natureza da investigação; a confidencialidade e anonimato, exaltando que todas

as informações recolhidas irão permanecer confidenciais e os seus nomes não serão

expostos. Após encontro e esclarecimento das participantes na investigação, foi elaborado

um guião semi-estruturado (Anexo A) com o intuito de colocar questões abertas,

propensas a reflexão do próprio. No último contacto telefónico foram ainda agendadas as

entrevistas.

Todas as entrevistas decorreram numa sala da universidade ISPA, num ambiente

relaxante e acolhedor, sendo dado de novo um enquadramento do estudo e o

consentimento informado. Procedeu-se à entrevista em si, gravada através do gravador

que compõe o telemóvel Huawei G6, sendo que as durações variaram de 30m a 1.15h.

Após as entrevistas estarem realizadas, e como o método o propõe, foram feitas as

transcrições sendo lidas variadas vezes de modo a criar familiaridade. Posteriormente

foram realizados os quadro de análise, onde no centro se encontrava o texto original das

entrevistas, comentários na marquem esquerda, e na margem direita os temas

preliminares. Esta fase representa o início do processo de conceptualização, onde se dá

um processo interativo entre o texto original e o leitor. Estas unidades de significado

psicológico, na margem direita, deram origem a temas preliminares. Estes mesmos temas

foram agrupados em clousters, de acordo com características comuns em termos de

significado, formando os quadros de temas emergentes analisados nos resultados que se

seguem. Para validar estes temas foram revistas as transcrições e ilustrados com citações.

Em seguida, os. Seguidamente os temas foram comparados e combinados em jeito de

um encontro com a estrutura invariante da experiência de ser-no-mundo mãe de um filho

com SA. Seguindo-se por fim, a respetiva discussão desses resultados.

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Capitulo VII - Apresentação e discussão dos dados

Apresentação dos resultados

1.1.Estudo de caso I

Dados pessoais:

Nome: Filipa* Profissão: Desempregada (anterior: Arquiteta)

Idade: 41 anos Filhos: Rapaz com 8 anos (filho único)

Estado Civil: Casada Idade de diagnóstico: 1º ano de escola (6 anos)

Temática Final IPA

Impacto do diagnóstico

Falta de informação

Esclarecimento das características

Surpresa, sentimentos de desorientação e medo.

Início difícil de ultrapassar

Preocupações acerca do comprometimento a nível da socialização

Consequências do diagnóstico

Cansaço, grande envolvimento.

Decisão de não ter mais filhos

Superação das dificuldades - maior tranquilidade.

Atual sentimento de apoio

Papel de mãe

Atitude mais paciente que o conjugue

Acompanhamento recorrente no CADIN

Coping ativo e emocional. Instrumental.

Valorização das competências

Suporte Familiar:

Aceitação e grande fonte de apoio

Suporte escolar:

Inicialmente nulo Vs Atualmente forte

Apoio e integração – sentimento de normalidade

Apoio e vigiamento da professora e psicóloga

Suporte no grupo de pares:

Maior parte desconhece - Pouca procura de apoio

Significados:

Valorização do suporte pelo acompanhamento

SA como um favorecimento de melhor preparação para as dificuldades do futuro

Futuro positivo

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Receios comuns aos de outros pais

Tabela 3 - Temáticas Finais - Caso I

No estudo de caso de Filipa* ficou evidente o sentimento de desamparo e falta de

informação após o diagnóstico, contudo pontoou maior esclarecimento sobre as

características do filho. Inicialmente foi difícil de ultrapassar e encontrar o caminho para

enfrentar o problema, contudo com o suporte sentido a nível escolar, psicóloga e familiar

tem superado as dificuldades. Sente-se mais tranquila pelo suporte ao filho, contudo não

esconde o grande envolvimento que é necessário da sua parte assim como o cansaço

adjacente a ele, levando a tomar a decisão de não ter mais filhos.

Filipa sente apoio por parte do seu conjugue contudo entende que ela tem uma

atitude mais paciente. Esta característica parece importante na medida em que é

essencial a seu ver para ultrapassar as dificuldades do filho, é uma“ responsabilidade

acrescida de ser paciente para o ajudar a ultrapassar as situações. Ultrapassar não no

sentido de ter cura, mas no sentido de aprender a lidar com isto e dar a volta por cima”

SIC. Presta ainda um Coping ativo virado para o problema, emocional e instrumental

na procura dos meios para o ultrapassar.

A entrevistada atribui um significado particular ao SA na medida em que ele

pode fornecer maior maturidade para enfrentar dificuldades futuras, tendo uma projeção

de um futuro positivo.

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1.2.Estudo de caso II

Dados pessoais:

Nome: Madalena Profissão: Domestica

Idade: 45 anos Filhos: Rapaz com 10 anos (filho único)

Estado Civil: Casada Idade de diagnóstico: 2º ano de escola (7

anos)

Tabela 4 - Temáticas Finais IPA - Caso II

Tabela temática Final

Impacto após diagnóstico

Stress e surpresa

Diagnostico como esclarecedor

Abandono da profissão (domestica)

Consequências do diagnóstico

Despoletamento de sentimentos de proteção

Problemas conjugais agravados com o diagnóstico

Rotina e cansaço, queixas psicossomática- enxaquecas

Desinvestimento em si própria

Sentimento de alteração do seu Eu– afastamento social

Papel como mãe:

Coping ativo, emocional e procura de suporte social instrumental

Centração nas dificuldades do filho

Atitude paciente Vs marido menos paciente

Suporte Escolar

Valorização da aliança entre psicóloga e professora

Melhoramento da socialização

Suporte familiar

Aceitação e disponibilidade para apoio.

Sem procura deste suporte

Suporte do grupo de pares

Chamada de atenção para o seu desinvestimento em si própria

Favorecimento do campo relacional do filho e mãe no contexto familiar

Significados

Diagnóstico com evolução

Descobriu capacidade de coping

Valorização do acompanhamento – tranquilização pelo progresso de socialização

Receios no campo relacional e amoroso (contacto com o Outro)

Desejo de normalização a nível emocional

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Madalena relatou uma vivência de grande stress e surpresa após o diagnóstico

de SA, apesar disso entende-o como esclarecedor da condição do filho. A exigência que

surgiu após o diagnóstico levou a que no momento do desemprego não procurasse

emprego. A sua situação conjugal era pontuada por discussões, sendo que o diagnóstico

veio agrava-las, pois têm visões diferentes em algumas formas de agir sobre o filho.

Apesar de inicialmente negar, a entrevistada foi refletindo em entrevista e consentiu uma

mudança do seu Eu, sobretudo a nível social, deixando de ter convívios e hobbies que

antes havia tido “eu tento transmitir calma a ele mas no fundo ando stressada com tudo o

que não lhe diz respeito, irritada, isolada.”SIC. O foco está no seu filho fazendo um

desinvestimento em si mesma, tentando proteger o filho do que o transtorna, entrando em

rotinas que a leva a sentir grande cansaço de tal forma que associa fortes enxaquecas ao

pós diagnostico.

Como mãe tem prestado Coping ativo, na procura de informação e

enfrentamento do problema. A procura de suporte social instrumental, isto é

acompanhamento adequado a nível escolar que se demonstrou preponderante para

melhorar socialização do filho. Destaca-se ainda o coping emocional. Madalena centra-

se nas dificuldades do filho tendo uma atitude paciente, sendo o seu conjugue menos

paciente para certas tarefas. A entrevistada valoriza bastante a aliança entre a psicóloga e

a professora. Não procura suporte familiar apesar de a este nível existir aceitação e

disponibilidade para tal, a nível do grupo de pares mantem alguns convívios no contexto

familiar.

Esta vivência para si significa um misto de descobertas e medos. Revela que

descobriu a sua capacidade de agir sobre o problema que desconhecia “ acho que

encontrei em mim forças para enfrentar o desconhecido” SIC. Entende que o SA é uma

patologia que permite uma evolução, valorizando a força do acompanhamento que a tem

tranquilizado. Tem por fim, um forte desejo de normalização das características do filho

e receios mais focados nas relações interpessoais a nível do contacto com o outro,

sobretudo a nível amoroso.

1.3.Estudo de caso III

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Dados pessoais:

Nome: Patrícia* Profissão: Analista de Negócios

Idade: 45 anos Filhos: Rapaz com 8 anos (dois irmãos)

Estado Civil: Casada Idade de diagnóstico: 7 anos

Tabela 5 - Temáticas Finais IPA - Caso III

Este caso foi marcado por uma particular dificuldade em encontrar o diagnóstico

correto, de SA. Primeiramente, as características eram entendidas como imaturidade.

Tabela temática Final

Impacto do diagnóstico

Preocupação e não aceitação do diagnóstico de psicanalista - Sentimento de ser má mãe

Identificação mas surpresa com o diagnóstico de SA

Diagnóstico esclarecedor

Pouca informação

Alívio e aceitação

Consequências do diagnóstico

Re-aproximação conjugal e envolvimento no acompanhamento

Alteração do quotidiano familiar – maior cansaço

Pouco tempo livre - dedicado ao contexto familiar

Boa adaptação/ resposta às crises relacionadas com o síndrome

Papel de mãe

Procura do diagnóstico correto e informação

Procura de suporte social instrumental e Coping emocional – Mãe como pilar

Desinteresse na adesão a fármacos

Papel maternal de persistência e negociação Vs pai menos paciente

Sobrevalorização do bem-estar do filho em prol da perca do seu bem-estar

Responsabilização pelo suporte e desenvolvimento do filho

Discrepância no Suporte familiar

Suporte familiar do lado materno Vs falta de suporte e negação da família paterna

Valorização do suporte de família materna no acompanhamento

Família paterna não encara SA como problema

Suporte escolar

Suporte Escolar - integração escolar

Professora empática – desenvolvimento das capacidades interpessoais

Suporte de amigos

Valorização da aceitação e suporte dos amigos próximos

Significados

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Mais tarde, procurou uma psicanalista que lhe alertou para o facto das características do

Diogo serem causa da fraca identificação com a figura materna criando-lhe um

sentimento de ser má mãe, embora não se identifica-se com as palavras ditas. Mais tarde

contactou com outro psicólogo especialista que lhe diagnosticou SA, sendo que esse

momento para si foi esclarecedor, aceitando por identificação das características e criando

um sentimento de alívio por saber o que se passa com o seu filho. Após o diagnóstico

houve uma grande alteração da rotina familiar, causando-lhe mais cansaço, tendo pouco

tempo livre, dado que dedica todo o seu tempo à família. A nível conjugal o SA

apresentou um significado muito particular na sua vida, a reaproximação ao seu marido,

o qual se envolve no acompanhamento do filho, fazendo uma díade com boa capacidade

de resposta e adaptação às crises do filho.

Encara que toda a procura do diagnóstico e informação se deveu a si, ou seja

teve um enfrentamento do problema, prestando uma procura de suporte social

instrumental, a nível escolar e no PIN, considerando-se o pilar para o filho. Entende que

o seu papel como mãe é o de ser persistente e usar estratégias de negociação com o filho,

sendo que o marido apesar de apoiar se mostra menos paciente. Tem a sensação de perca

de bem-estar, contudo prioriza o bem-estar do filho, responsabilizando-se pelo seu

desenvolvimento.

Sente que o suporte escolar adequado proporcionou a integração do filho e o

desenvolvimento das capacidades interpessoais. A nível do grupo de pares o suporte é

sentido e valorizado. Por outro lado, a nível familiar existe uma discrepância, por um lado

suporte da família materna o qual valoriza, por outro, falta de suporte e negação do

diagnóstico da família paterna.

Algo muito interessante de análise é ainda o entendimento de que após o diagnóstico entendeu

que, apesar de tentar controlar tudo, não é possível controlar tudo o que acontece. No geral

entende que é mais exigente educar o filho com SA, mas encara o futuro de forma

positiva, contudo revela receios quanto à impulsividade e distracção características do

filho, como o que possa acontecer a ele ou ele possa fazer ao outro. Receia ainda o

Perceção de que nem tudo é controlável

Noção da exigência do filho com SA face aos outros

Rotinas e entendimento literal como características mais trabalhosas.

Receio do preconceito e olhar crítico do Outro

Desejo de normalização

Receios quanto às suas crises (impulsividade e distração)

Encara futuro positivamente

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preconceito e olhar crítico do Outro quanto ao filho e forma de agir com ele. Manifesta o

seu desejo pela normalização.

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1.4.Estudo de caso IV

Dados pessoais:

Nome: Lara* Profissão: Professora

Idade: 37 anos Filhos: Rapaz com 6 anos (filho único)

Estado Civil: Casada Idade de diagnóstico: 6 anos (à quatro meses)

Tabela Temática Final

Impacto do diagnóstico

Surpresa, tristeza, desespero – pouca informação

Valorização do diagnóstico- esclarecedor

Procura de informação

Consequências do diagnóstico

Sentimento de esgotamento - Foco no suporte e compreensão do SA

Papel de mãe

Coping ativo e instrumental (procura de acompanhamento)e emocional.

Responsabilização pelo desenvolvimento –Tentativa de normalização

Necessidade de estar atenta, ser exigente e paciente - Dedicação total

Promoção da autonomia

Valorização das capacidades do filho

Marido aceita num papel mais permissivo Vs Mãe papel dominante e ativo

Valorização suporte escolar

Sentimento de acompanhamento adequado - tranquilização

Suporte familiar

Acusações e descredito no diagnóstico – sentimento de incompreensão

Má relação com irmã (psicóloga) após diagnóstico - tristeza

Suporte grupo de pares

Aceitação – apoio na necessidade de falar

Significados

Noção de trabalho das dificuldades

Preocupações relacionadas com socialização – receio de bullying

Expectativas positivas no futuro, dado o suporte

Dificuldade do outro em ver o problema

Tabela 6 - Temáticas Finais IPA - Caso IV

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Lara enquadro o momento do diagnóstico com surpresa, tristeza e desespero “uma

mistura de tristeza com desespero mesmo, porque o meu filho era autista e pouco conhecia

sobre, sobretudo os casos asperger desconhecia” levando-a a procurar de imediato

informação sobre a patologia pois não ficou esclarecida em consulta. Esse momento foi

contudo um momento importante porque “ sabendo do diagnóstico eu poderia entender

muita coisa que até ai não entendia” SIC. Todo o processo após o diagnóstico tem sido

esgotante para a entrevistada, que se foca no suporte e compreensão da patologia do filho.

Como mãe, Lara presta um coping ativo, direcionado para o problema, coping

emocional e instrumental na procura de acompanhamento adequado. Demonstra valorizar

o filho estando sempre atenta, com exigência e concomitantemente uma atitude paciente,

numa dedicação total. Sente-se responsabilizada pelo desenvolvimento do filho, numa

tentativa de normalização das características, promovendo a autonomia. Quanto ao seu

conjugue apoia apresentando um papel mais permissivo, enquanto que Lara tem um papel

mais ativo e dominante. O suporte escolar é positivo fazendo-a sentir tranquilizada a esse

nível. O grupo de pares parece crucial na questão de apoio a nível de sentir-se

compreendida e poder falar sobre o assunto. Esse apoio torna-se importante na medida

em que não tem suporte familiar, sendo descreditado o diagnóstico, causando um

sentimento de incompreensão. Denota-se ainda uma má relação com a irmã que surgiu

logo após o diagnóstico dada a negação do diagnóstico de SA por parte da mesma,

surgindo acusações, como consequência é algo que entristece Lara.

Atribui ao diagnóstico uma significação de trabalho sobre as dificuldades, e a

noção de que há dificuldade do Outro em ver o problema. Manifesta preocupações

relacionadas com as relações inter-pessoais, ou melhor as dificuldades neste campo, com

receio de bullying, contudo tem expectativas positivas quanto ao futuro através do suporte

que lhe é dado.

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1.5.Estrutura Invariante

Tabela 7- Estrutura Invariante

1.6.Variâncias Realçadas

Tabela 8 - Variâncias

Fraco suporte familiar- "sindrome invisivel"

Isolamento por introjecção

Tentativa de normalização

Estrutura invariante

Pouca informação sobre SA

Estratégias de coping direcionadas para

enfrentamento do problema

Valorização do suporte escolar

A nível conjugal mãe com papel ativo e

atitude paciente

Desejo de normalização

Preocupações a nível das relações

interpessoais

Surpresa e

desespero

Tranquilização

Valorização do

diagnóstico

Cansaço/exaustão

Receio do olhar

critico do Outro

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Discussão dos resultados

Desconhecimento do SA

A vivência de ter um filho com SA ficou marcada pelo impacto provocado pelo

desconhecimento do síndrome. Este parece uma condicionante na vivência, pois o

primeiro impacto com a problemática deve ser esclarecedor. As mães referiram no geral

um apanhado sobre a patologia em si, contudo não foi algo bem definido e explicitado.

Associado a um diagnóstico vem sempre a necessidade de perceber como agir sobre ele,

a variados níveis. Neste ponto de situação houve necessidade de todas as mães em

procurar informação detalhada através de livros, internet e outros meios, consultando

especialistas de forma a entender qual a facticidade do problema e como agir sobre ele.

“Na altura senti me um pouco perdida e surpresa porque desconhecia de todo a

existência deste síndrome, ficamos assustados com o síndrome mas também em

como ajuda-lo, que profissionais consultar, o que fazer” Filipa

Apesar do pouco entendimento aquando do impacto do diagnóstico, e da surpresa

e desespero relatados, o diagnóstico mostra-se valorizado pelas mães após o seu

entendimento, revelando-se uma explicação para as características, clarificando a razão

das mesmas, que até ai não eram entendidas, quer no contexto familiar, quer no contexto

escolar, onde são maioritariamente notadas e referidas como obstáculos ao

desenvolvimento.

“Eu senti que o diagnóstico foi importante, quando a médica falou até ela sentiu

que era importante para mim, porque sabendo do diagnóstico eu poderia entender

muita coisa que até ai não entendia” Lara

“Um alívio! Porque aquela ideia de que eu era má mãe saiu-me da cabeça, ok…

não foi nada que eu tivesse feito, não foi por falta de atenção da minha parte, não

foi por negligência, pronto não foi por nada…” Patrícia

Tenório (2003) afirmou que a pessoa, no processo de diagnóstico não deve ser

apreendida como um fenómeno único, assim sendo não deve ser apenas avaliada segundo

padrões de comportamento pré-estabelecidos, respeitando a singularidade de cada

expressão do mesmo no sujeito. Assim sendo, esta visão não descredibiliza a importância

do diagnóstico, pelo contrário, considera-o, contudo não o estabelece em características

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estabelecidas como os manuais de diagnóstico rotulam. O que parece ter tido impacto

negativo foi o facto de se olhar para o sujeito como um rótulo muito associado ao autismo,

e de não existir identificação dos filhos como autistas, dada a representação que as mães

têm do mesmo.

“(...) assustei-me… disse que o meu filho não era autista. Tinha aquela ideia de

que uma criança autista mal fala, se balança…” Madalena

Sendo o SA apresentado como um espectro do autismo, classificação refira no

DSM-V, leva a que surjam interpretações desajustadas, quer pela apresentação associada

sobretudo numa classificação das características e não nelas mesmas, algo agravado pelo

desconhecimento da patologia. Todos estes aspetos têm influência no olhar-sobre-o-

problema.

Assim sendo, talvez seja interessante considerar de que forma estes diagnósticos

sem rótulos vincados podem beneficiar o impacto e a vivência da pessoa com a patologia,

assim como o cuidador da mesma. Sobretudo a nível do SA, a literatura aponta para a

diversidade de expressões do mesmo, portanto deve-se entender a real importância de

colocar entre parênteses o conhecimento teórico (estabelecendo a epoché) e olhar a forma

de como a vivência se expressa, como é sentida. Considerando então que o diagnóstico

tem impacto na vivência posteriormente sentida parece interessante explorar esta

intersubjetividade. Assim beneficia-se a compreensão objetiva da realidade do sujeito e a

transmissão dessa mesma ao cuidador, tendo um significado mais genuíno e aproximado

da vivência do sujeito, e não baseado em classificações redutoras ou conceitos teóricos.

Estratégias de enfrentamento do problema

A forma de se lidar com um problema é algo crucial para entender a vivência da

pessoa. São várias as estratégias usadas para lidar com um problema ou uma situação

inesperada.

A experiência de ter um filho com SA, foi marcada por estratégias de enfrentamento.

Embora tenham sido apontados familiares onde tenha existido a negação do problema,

em nenhum caso foram relatas estratégias de negação do mesmo por parte das cuidadoras,

sendo notório a persistência para o esclarecimento do problema detetado nos seus filhos.

Neste sentido surgiram estratégias de enfrentamento do problema e das crises através de

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coping ativo, procura de suporte social e coping emocional. Carvalho, I.; Campos, L. &

Verissimo, L. (2010) no seu estudo revelaram que as estratégias mais utilizadas por

cuidadores informais de crianças com PEA são resolução de problemas (pela existência

de redes de suporte familiar, social e profissional capazes de responder às necessidades

do filho), indo ao encontro dos relatos dos casos analisados.

“comprei tudo o que há para comprar de livros de Asperger, tenho sete ou oito

livros diferentes” Patricia

“Tento dedicar o meu tempo todo, trabalhar as coisas que estão em deficit…”

Lara

“É mesmo ajuda-lo e procurar esse suporte, essa ajuda que ele precisar. Além

de todo o papel de mãe, que é dar carinho e estar presente.” Filipa

“Mostrar-lhe que não está sozinho, que o amo muito…”Lara

As estratégias de coping de enfrentamento do problema demonstram de tal

forma o envolvimento das cuidadoras que as leva a um ponto de exaustão, relatado por

todas as cuidadoras. Este resultado vai ao encontro dos estudos quantitativos elaborados

onde afirmam que existe em mães de crianças com PEA maior sentimento de angústia e

stress sentido (Giallo, Wood, Jellett & Porter,2013; Blacher & McIntyre, 2006).

Carvalho, Campos & Veríssimo (2010) referem igualmente que a avaliação mais negativa

referente à prestação de cuidados a crianças com PEA são os agravados sintomas de

stress.

“Leva-me a um ponto de exaustão enorme. Ele é muito absorvente… De uma

maneira que os irmãos não são.” Patrícia

No caso de Madalena há uma referência a aspetos a nível psicossomático,

nomeadamente as dores de cabeça, sintomatologia também referida como evidente em

mães de crianças com PEA no estudo de Smith, Seltzer & Greenberg (2012).

“Fisicamente esse cansaço fica evidente, se pensar bem até as enxaquecas

surgiram depois disso…” Madalena

O coping prestado é esclarecedor do significado que a vivência tem para o sujeito,

de um lado demonstra um enfrentamento necessário do problema que surgiu e que é

encarado no projeto de vida das cuidadoras, como algo a ser trabalhado pela vida fora.

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Por outro lado, deve ser entendido o impacto que este envolvimento tem. A exaustão

sentida deve ser atendida em acompanhamento evitando ainda situações como a detetada

num dos casos em estudo, e mais a frente abordada pela sua variância, o caso de

afastamento social e fusão com as características do filho. Dada esta compreensão é acima

de tudo essencial, tal como Taylor & Warren (2011), referiram no seu estudo, garantir o

bem-estar das cuidadoras pois são também elas as impulsionadoras do desenvolvimento

dos filhos.

Valorização do suporte escolar

É sem dúvida o contexto escolar que mais é abordado pelas mães de crianças com SA.

Tende a ser neste âmbito que surgem os primeiros alertas, sobretudo pelas dificuldades

óbvias nas relações interpessoais e os comportamentos desapropriados, tal com referido

por Madeira (2014) que concluiu que os pais têm maior alerta na idade em que os filhos

começam a interagir. É inquestionável a necessidade de se sentir apoio por todos os

envolventes para que sejam detetadas as inconsistências e surjam parcerias para

soluciona-las de forma correta e atempada. A intervenção a este nível deve ser uma

preocupação na medida em que condiciona bastante o desenvolvimento da criança e,

assim sendo, tem impacto na vivência das cuidadoras, na medida em que um bom

acompanhamento escolar é verdadeiramente valorizado.

“este ano não, porque a professora já teve problemas com crianças com as mesmas

características e sabe como lidar, mas por exemplo o ano passado o Diogo estava

completamente isolado. (…) aquilo custava-me horrores.(…). Mas pronto…(…) o

que se passa este ano é que como a professora tem esta sensibilidade isso não está

a acontecer.” Patrícia

Este relato de valorização do suporte escolar sentido não é exclusivo de Patrícia.

Todas as mães revelam maior tranquilização pelas competências e interação adquiridas

através dele. Benson, (2012) referiu que este apoio sentido reduz a angústia sentida pelas

mães, constaram ainda e que mães com mais perceção de apoio social tornam-se mais

autoeficazes.

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“quando os meninos não brincavam com ele, isso psicologicamente afetou-me

bastante. Foi uma altura muito má nas nossas vidas na minha e da dele, e fui-me

muito a baixo. Mas agora na altura só colégio tive muito apoio da professora e

mesmo a nível das auxiliares do colégio e tudo… nunca mais foi incomodado

pelos colegas, pelo contrário conseguiu-se integrar muito bem na turma.” Filipa

O aspeto que emerge com maior preponderância quanto ao suporte social sentido é

exatamente este, o desvanecimento das dificuldades de interação com o outro, na medida

em que neste contexto pode ser promovida a integração e envolvimento do aluno

identificado com os restantes, através de estratégias específicas. Sendo uma das maiores

preocupações as dificuldades de interação e questões de bullying, entende-se que este

sentimento de tranquilização surja com este apoio. Interessante de rever neste estudo que

tal como no de Griffith, Totsika, Nash, Jones & Hastings (2012) o suporte para os filhos é

destacado como prioritário.

Necessidade de atitude paciente e papel ativo

Invariante foi também a noção da necessidade de ter uma atitude paciente para atender

às dificuldades e acompanhar positivamente o acompanhamento do filho com SA. Dadas

as características fomentadas em rotinas e inflexibilidade, foi comum a todas as mães o

relato de paciência, persistência sobre essas mesmas, paciência essa que não existia em

algumas mais e tornou-se importante desenvolve-la.

“Além disto é uma responsabilidade acrescida de ser paciente para o ajudar a

ultrapassar as situações.” Filipa

Outra questão é o apoio a nível conjugal que é sentido, contudo o pai não tem em

nenhum caso um papel dominante no acompanhamento, são as mães que prestam um

apoio principal. Milgram e Atzil (1988, citado por Schmidt & Bosa, 2003) já haviam tido

interesse por esta questão concluindo no seu estudo que existem diferentes papéis

desempenhados por pais e mães de crianças com PEA, sendo os homens mais dedicados

à manutenção financeira.

Esta questão foi algo notado através das estratégias de enfrentamento e o grande

envolvimento que já foram relatados, contudo intensificado quando abordado o suporte

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conjugal. Os pais parecem ser mais impacientes no que toca no lidar com as características

ou tarefas das crianças com SA. Resultados que podem ser entendidos emparelhando a

visão de Bendixen et al. (2011) que relatam que o stress sofrido pelo pai é diferente do

das mães, o que não implica que seja em maior ou menor grau.

“Claro que eu é que domino nesta questão, em todas as casas há alguém que

domine, normalmente a mãe. Enquanto eu fizer as coisas ele deixa-se levar, se for

para fazer ele faz, mas sou eu que lhe passo a informação, acompanho o menino as

consultas, disse que era importante ir a psicóloga e ele foi (…) pronto há

determinadas situações onde faço questão que ele esteja e ele está lá e apoia e

acompanha, mas de um modo geral é a mãe que tá ali.” Lara

Tal como Brobst, Clopton & Hendrick (2009) referiram mães de filhos com ASD

não expressão uma perceção negativa do apoio do cônjuge. Compreende-se que

necessitam da sua aceitação e apoio, contudo o papel ativo sobre a patologia é entendida

como um papel seu, papel de mãe.

Tentativa de normalização

Se por um lado, há aceitação das mães quanto ao diagnóstico, por outro as estratégias

de enfrentamento do problema e os desejos passam por uma tentativa de normalização

das características do SA. A normalização segundo a reflexão de Casa-Nova (2013)

significa uma ideia de um modelo que se entende como algo a seguir pela sociedade,

como algo que deve ser adotado. Esperar que alguém aja com normalidade é esperar

alguma previsibilidade no comportamento do Outro, o que favorece segurança.

Compreende-se que esta vivencia seja caracterizada pelo desejo de normalização pois ele

confere segurança à vivência das cuidadoras no que toca ao futuro. Esta tentativa

demonstra-se de variadas formas, desde a nível interpessoal a nível de comportamentos

esperados.

“E espero que daqui a um, dois, três anos, ele esteja menos Aspie que agora.”

Patrícia

“E quero que um dia tenho uma mulher, case…” Madalena

“mas gostávamos que ele fizesse mais coisas, jogasse a bola, fizesse legos,

puzzles… essas coisas que os outros meninos fazem não é?” Lara

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De alguma forma, todas as mães desejam que dentro de alguns anos os seus

filhos tenham as suas mais fortes características do SA atenuadas. Parece existir uma

ligação entre este desejo de normalização pelo preconceito e incompreensão ainda

existente sobre as características do SA, estando muito associado também ao autismo.

Existe uma visão do olhar crítico do Outro e receio dele mesmo. Existe uma dualidade

entendida, por um lado a preocupação recai sobre o melhoramento da qualidade de vida

do filho, pelo atenuamento das características que a podem comprometer, entendendo o

diagnóstico como algo com evolução e não regressão, por outro também existe especial

atenção sobre como o Outro olha para o diagnóstico e como o compreende.

“agente diz que o Diogo tem Síndrome de Asperger, as pessoas dizem: ah isso é o

que? A gente diz que é uma doença do espectro autista, o que é que fica retido na

altura? Autismo, no dia a seguir já estão a dizer que o filho da Patricia* é autista

e dois dias depois o filho da Patrícia* já é deficiente, e eu não quero isso, porque

já viu o Diogo e o Diogo é uma criança normal…Tem algumas características

quando passa aquele bocadinho em que descompensa, é o fim do mundo, mas

tirando isso é uma criança normal.” Patrícia

Assim sendo, e também pelo já referido impacto que o diagnóstico tem nas mães,

mostra-se essencial fazer um esclarecimento à população em geral sobre este síndrome.

Existem já variados fóruns e sites de apoio ao autismo e as suas vertentes, contudo talvez

seja preponderante divulgar de forma mais abrangente pelos sistemas de comunicação,

de forma a que se entenda as habilidades e competências possíveis nestes futuros adultos.

Para romper com o estigma dirigido a estas crianças e o qual afeta o bem-estar das

cuidadoras, é importante mudar o paradigma da sociedade, compreender certos

comportamentos de crianças e adultos com SA como algo adaptado, não à sociedade em

geral, mas ao seu mundo-sentido. Como Galli (nd.) refere, ouvir ou entender os sintomas

não fará com que eles desapareçam, temos de integrar em nós mesmos o que representam,

de tal forma que os sintomas passam a ser algo que não necessitamos mais. É um facto

referido literariamente que na maior parte dos casos as características se mantêm pela

vida adulta. Na visão deste autor assim nestes casos transformasse a doença. Esta

perspetiva é interessante pois só assim é possível perceber a riqueza e ter o proveito das

capacidades destes futuros e particulares adultos.

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Preocupações a nível das relações interpessoais

Sendo as relações interpessoais a características mais vincada nas crianças com SA é

normal que seja esta uma das maiores preocupações das mães das mesmas. Nos casos

foram relatadas algumas relutâncias quanto a profissões em contacto direto com

pessoas, e dificuldades em entender e receber o afeto a nível amoroso. Foram ainda

salientadas preocupações relativas à impulsividade nas relações interpessoais, onde

existe medo de Patrícia* no magoar o outro, e ainda receios relacionados com bullying.

“imagino é que em trabalhos onde seja preciso o contacto com outras

pessoas se atrapalhe mais…” Madalena

“é só mais a parte afectiva que me preocupa, porque ele é muito afectuoso!

Mas às vezes não sabe como ter esse afecto.” Madalena

“Mesmo assim tenho receio que não as consiga manter pelas suas

características ou não consiga fazer novas amizades no futuro porque ele é

um menino de hábitos lá está….” Filipa

“As pessoas de fora, de quem ele não gosta evita muito o contacto, evita olhar

nos olhos” Patrícia

“o problema da socialização, o problema que mais me preocupa, porque é

com isso que vai ter de viver para o resto da vida, é a mais evidente nele e a

que mais me preocupa” Lara

Entende-se que é por meio da socialização que nos desenvolvemos, com o outro

como parte integrante no nosso projeto de vida, quer a nível de estruturação emocional,

quer a nível profissional. Griffith, Totsika, Nash, Jones & Hastings (2012) fizeram um estudo

com três mães de adultos com SA e uma mãe de um adulto com autismo atípico, através

do IPA e concluíram igualmente que a interação social na vida adulta se demonstrou baixa

havendo relatos de que o filho não tem amigos o que causa aos pais muita tristeza e

preocupação. Assim sendo, parece ser totalmente legítima esta preocupação.

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Variâncias

Apesar do IPA se basear no encontro de uma experiencia comum, entendida pela

estrutura invariante e evidente em todos os casos, também as variâncias têm importância

expressa. Sendo o homem um ser singular é justificável a emergência de diferentes

significados psicológicos nas cuidadoras, também eles explicativos da experiencia

individual e relevantes para análise e futuras reflexões e intervenções terapêuticas.

Suporte familiar – Síndrome “invisível”

Interessante também é reparar que apesar de nem todos terem um forte apoio

familiar, pela maioria dos casos parece existir tristeza quanto a isso. Sobretudo, parece

existir tristeza pela negação do mesmo pela desvalorização das características. No caso

de Lara admite sente que os familiares não veem um problema evidente, tendendo a

apontar o diagnóstico como um exagero, crendo que as características passam com a

idade. Lara revela sobretudo grande tristeza quanto a sua irmã que é psicóloga e nega o

diagnóstico de SA, acusando-a de ser ela a culpada das características do filho.

Para mim é algo muito mau, faz-me sentir incompreendida como se defendesse

algo absurdo mesmo fundamentado pelos psicólogos, pediatras,

professoras…Lara

Também no caso de Patrícia a família desconsidera a necessidade de gastos em

médicos e acompanhamentos:

“na cabeça deles com o Diogo não se passa nada, porque acham que o Diogo é

uma criança normal e que aquilo que ele tem é teimosia, e pronto- a tua cunhada também

era assim” Patrícia

Apesar de existir em apenas dois casos é importante ter um olhar critico sobre esta

questão e incluir nos planos de acompanhamento sessões dirigidas aos familiares onde

haja esclarecimento dos mesmos, favorecendo a credibilização do diagnóstico e apoio

para o enfrentamento do mesmo.

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Reflexão positiva do significado do diagnóstico

O significado atribuído ao diagnóstico mostra-se importante, no caso de Patrícia

entende-se que apesar de haver uma tentativa de normalização, tem noção de que algumas

não se apagaram no tempo. Que o que caracteriza o seu filho como pessoa engloba as

características do SA, aceitando-o de tal forma que não as mudaria se pudesse. Passo a

citar:

“E se me perguntarem se eu as mudava, não… não mudava, porque é assim que eu

gosto dele. Com estas características que ele tem porque… ele é assim!” Patrícia

Ainda no caso de Patrícia parece haver tal reinterpretação positiva do problema que a

entrevistada entende que lhe beneficiou, apesar da exaustão sentida, congruente com o

estudo quantitativo de Carvalho, Campos e Veríssimo (2010) onde detetaram uma

correlação positiva entre a resolução de problemas e criação de perceções alternativas dos

acontecimentos. Com esta vivência Patrícia tem entendido que nem tudo é controlável,

algo que antes era uma constante na sua vida. Esta vivência de controlo de horas e de

situações alterou-se, tendo consciência de que na vida tudo muda, não sendo uma

mudança algo incontornável. Entende assim algo muito importante, que o projeto de vida

não é imutável e composto por crises. De facto, a existência é isso mesmo, uma serie de

alterações, positivos ou negativas, onde deve existir uma adaptação, refletindo-se essa

mesma numa aprendizagem que constitui e significa o sujeito como um ser único.

“O Diogo é o desafio da minha vida”

Deste modo, o referido estudo de Carvalho, Campos & Verissimo (2010) sustenta este

entendimento, pois nele concluiu-se que cerca de 53% dos inquiridos revelam uma

experiência positiva dos cuidados a crianças com perturbações do espectro autista. Apesar

de tudo nesse mesmo estudo não são negadas experiências negativas, que coexistem com

as positivas. De facto, todas estas experiencias bloqueadoras pontuam o projeto de vida

de todos os sujeitos, fazendo parte da condição de existência. Segundo Heidegger (citado

por Galli, nd) é necessário que o homem em momentos de ruptura, saia da facticidade e

entre na transcendência, detectando as fontes de bloqueio, mobilizando-se para uma nova

atitude. Nesse sentido, o conflito não deve ser concebido como algo negativo mas sim

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como uma luta necessária inerente ao próprio processo da vida, sendo este momento

proporcionador de conhecimento e construção do homem e do mundo (Augras, 2002).

Isolamento social por introjeção

Não poderia ficar de lado a análise no caso de Madalena em que a entrevistada revelou

um envolvimento que se expressou num mecanismo desadaptado- introjeção- isto é

incorporando os padrões, atitudes e modos de agir e pensar que não são deles próprios,

nomeadamente a falta de investimento como ser-social, levando ao isolamento e

deixando certos hobbies. Segundo Galli (n.d.) um dos efeitos prejudiciais de quem

introjeta é que dificilmente distingue o que realmente sente e o que os outros sentem,

sendo entendível a incompreensão que sente quanto as chamadas de atenção do seu

marido.

“Ele diz que estou a ficar com as características dele e realmente nesse sentido

posso-lhe dar razão.” “Quando o meu marido me diz estas coisas fico irritada,

dá-me a sensação que não está a dar valor a algo que é preciso”.

Este mecanismo pode atuar como uma força desintegradora da personalidade, de

modo que não leva ao crescimento do sujeito, mais sim a um “vazio estéril”. A cuidadora

referiu de facto, após promoção de reflexão, mudanças quanto ao que era- antes-do-

diagnostico, referindo desinvestimento em si mesma. Destitui-se por escolha das suas

outras condições existenciais de ser-esposa, ser-amiga, ser-saudável. Estudos como os

de Hartley et al. (2010) chegam a considerar no seu estudo que o risco de divórcio

aumenta em mães de crianças com PEA.

Heidegger (citado por Araújo, 2010) parte do pressuposto que o homem existe como

ser, como forma de estar-no-mundo, enquanto que as coisas simplesmente são, isto é

revelam imutabilidade. Esta capacidade do sujeito estar no mundo representa um projeto

se si próprio, projeto esse que se refaz pela mudança, por aquilo que decide ser. Ele faz

escolhas, e até mesmo não escolher é uma escolha, por isso ele não só é, mas existe.

Reflectir sobre este entendimento é importante para interpretar o caso de Madalena, dado

que como cuidadora, escolheu não pensar sobre si, como que se anulando. “acho que não

penso muito no que se refere a mim…”SIC.

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Sendo a facticidade imutável deve ser encarada como é, fazendo uma enfrentamento

da mesma, contudo exercendo mudança para continuar a reflectir sobre os restantes níveis

da sua existência. A vivência do seu filho ter SA é uma facticidade e não a sua existência.

Assim é preponderante este aspeto na medida em que a intervenção terapêutica defina

estes campos, que podem ser revistos em mães de crianças com SA. Perceber de que

forma estão a entender o seu projeto de vida, o que deseja dele e a emergir a reflexão da

necessidade de atuar sobre ele a todos os níveis. Tal interiorização é conseguida através

da reflexão que o método fenomenológico propicia, algo que foi percetível ao promover

a reflexão em entrevista apenas.

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Capitulo VIII – Conclusão

A vivência de ser-no-mundo mãe de um filho com SA é caracterizada pela escassa

informação sobre SA, motivo de surpresa e desespero e que leva à valorização do

diagnostico por representar uma orientação e esclarecimento das características

observadas nos filhos. Em todos os casos foi igualmente evidentes estratégias de

enfrentamento do problema, desde coping ativo, emocional e procura de suporte social e

instrumental, manifestando grande envolvimento por parte das cuidadoras de tal modo

que se expressa numa grande fonte de exaustão dada a inflexibilidade das características

e trabalho necessário para as contornar. A valorização do suporte escolar é notória, sendo

o local onde são notadas as maiores dificuldades mas também onde, com o apoio

apropriado, elas se contornam, em reunião com professores-pais-psicóloga, levando a

sentimentos de tranquilização. É comum um entendimento de atitude mais paciente por

parte das cuidadoras face ao marido, tendo elas um papel mais ativo, embora sentindo

todas elas apoio pela aceitação do diagnóstico e participação pontual dos seus conjugues

em certas tarefas necessárias. Apesar de ser referida a aceitação dos filhos com SA e

enfrentamento do problema há um desejo de normalização compreensível dado o receio

do olhar crítico do Outro. Por fim, emergiram preocupações a nível das relações

interpessoais, algo que se compreende dado este ser o prejuízo mais frequente e difícil de

contornar nas crianças.

A nível de variâncias nos casos foi notado quer suporte familiar, quer falta dele,

contudo, no último caso, foi sentido tristeza e sentimentos de incompreensão sentindo-se

na pele a expressão de síndrome “invisível”, dado que os familiares de duas das

cuidadoras descredibilizam as características como um problema a ser trabalhado. O

isolamento social por introjeção das características do filho foi notado num dos casos,

sendo algo bastante interessante de analisar na vivência dessa mesma mãe. Aqui se

revelou a necessidade de “sentir como” para tentar compreender os obstáculos e refletir

sobre a questão. Por fim, foi destacada uma reinterpretação positiva do diagnóstico por

uma das mães, entendendo-se que esta pode ser uma experiencia com desafios mas

também grande riqueza pela construção de significados do homem e do mundo.

Entende-se assim que a "arte de viver" sendo mãe de um filho com asperger se baseia

na capacidade de aceitar a facticidade no sentido de a ultrapassar, agindo ativamente

integrando-a no projeto de vida.

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9. Anexos

9.1. Consentimento Informado

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9.2 Guião de Entrevista Semi-Estruturada

Guião de Entrevista Semi-Estruturada para a “Experiência de ser-no-

mundo com um filho com Síndrome de Asperger”

1) Informação contextual

1.1 Profissão

1.2. Estado civil

1.3. Que idade tem o seu filho?

1.4. Há quanto tempo o seu filho teve o diagnóstico de Asperger?

1.5. É filho único?

2) Impacto do diagnóstico

2.1. Pode descrever-me, por favor, o melhor possível como se sentiu aquando do diagnóstico

do seu filho?

2.2. Como é para si viver com o diagnóstico?

2.3. Pode-me falar um pouco das alterações que sente após o diagnóstico?

2.4.1 (Se não referir aspetos psicológicos e aspetos físicos…) Em termos físicos e

psicológicos sente alterações após o diagnóstico?

3) Estratégias de enfrentamento

3.1) Neste momento tenta enfrentar as dificuldades que surgem derivadas do transtorno?

Se sim…

3.1.1) Pod me dar exemplo das estratégias para ultrapassar as dificuldades que sente?

Se não…

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3.1.2) Quais os maiores obstáculos para que não o consiga fazer?

3.1.3) Como pensa que poderia ultrapassa-los?

3.2) Qual é para si o seu papel como mãe neste momento?

4) Suporte sentido

4.1.Como sente o apoio por parte do seu cônjuge?

4.2. Pode-me esclarecer quanto ao suporte que sente a nível escolar do seu filho?

4.3. Como é sentida por si o transtorno do seu filho aos olhos dos seus familiares?

4.4. Em termos do seu grupo de amigos como sente a compreensão por parte dos seus

amigos?

5) Significados e medos futuros

5.1. Quer partilhar comigo como se sente a respeito do futuro do seu filho?

5.2. Pode-me falar um pouco dos seus receios/expectativas?

5.3 O que sente que esta vivência lhe transmitiu?

6) Existe mais algum aspeto ou experiência que queira partilhar comigo?

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9.3. Entrevistas

9.3.1. Caso I

Psicóloga: Bom dia Filipa*

Entrevistada: Bom dia Joana

Psicóloga: Como lhe tinha falado, o estudo que estou a desenvolver é sobre a vivencia de

mães com filhos com síndrome de asperger, sendo lhe garantido o anonimato.

Entrevistada: Sim, senhora. Sem problema algum.

Psicóloga: Otimo. Então gostaria que me desse alguns dados pessoais como a idade.

Entrevistada: 41 anos.

Psicóloga: E em termos de empregabilidade?

Entrevistada: Sou arquiteta, tive um tempo fora da área mas de momento estou a exercer

Psicóloga: E estado civil?

Entrevistada: Casada.

Psicóloga: O seu filho que idade tem?

Entrevistada: 8 aninhos

Psicóloga: E tem mais algum filho?

Entrevistada: Não, não só o Ricardo, até porque concentramos todas as nossas energia

nele dado o problema. Optamos por não ter mais filhos.

Psicóloga: Claro, compreendo. O síndrome foi descoberto à quanto tempo?

Entrevistada: Cerca de dois anos, no primeiro período quando entrou para a escola

Psicóloga: Ok Filipa, gostaria que partilhasse comigo como se sentiu apos o diagnóstico

do seu filho

Entrevistada: Na altura senti me um pouco perdida e surpresa porque desconhecia de todo

a existência deste síndrome, ficamos assustados com o síndrome mas também em como

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ajuda-lo, que profissionais consultar, o que fazer, entretanto é mais tranquilo. Agora já

percebo de onde veem as características dele, coisa que não entendia.

Psicóloga: Como é para si viver com este diagnóstico?

Entrevistada: Neste momento é cansativo…é muito envolvimento de todos. Os sintomas

são muito pouco visíveis, mas conseguimos dar a volta às questões que dificultavam mais

a vida dele e agora estamos a viver com mais tranquilidade que no inicio.

Psicóloga: Ele tem tido algum tipo de acompanhamento?

Entrevistada: Sim, desde os 6 anos de idade que é acompanhado por uma psicóloga, agora

é acompanhado por um psicólogo do CADI, duas vezes por semana mesmo especializado

na síndrome de asperger, sempre foi também acompanhado por um psiquiatra do CADI.

Psicóloga: E como tem sido para si lidar com todo esse processo, quer em termos

psicológicos quer físicos

Entrevistada: No início, nem tanto na altura de descobrir o diagnóstico, mais quando

começou a ter problemas grandes na escola, quando os meninos não brincavam com ele,

isso psicologicamente afetou-me bastante. Foi uma altura muito má nas nossas vidas na

minha e da dele, e fui-me muito a baixo. Mas agora na altura só colégio tive muito apoio

da professora e mesmo a nível das auxiliares do colégio e tudo… nunca mais foi

incomodado pelos colegas, pelo contrário conseguiu-se integrar muito bem na turma.

Apartir daí as coisas foram ficando na faixa da normalidade.

Psicóloga: Sente que o suporte escolar é importante?

Entrevistada: Sim, muito importante. Encontrar um sitio na escola que lhe de o apoio que

ele precise, muito importante mesmo.

Psicóloga: Compreendo... quer partilhar comigo quais as estratégias que costuma utilizar

nos momentos mais complicados?

Entrevistada: Depende muito da situação... se o problema derivar da escola é falar com a

professora e ver o que podemos fazer para ultrapassar a situação. A nível de outras coisas

que não estão relacionadas com a escola é tentar arranjar um suporte para ele dar a volta

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a situação. Porque eles precisam mesmo de ajuda, senão as consequências podem ser

muito más.

Psicóloga: Claro… e para si qual o seu papel enquanto mãe?

Entrevistada: É mesmo ajuda-lo e procurar esse suporte, essa ajuda que ele precisar. Além

de todo o papel de mãe, que é dar carinho e estar presente. Além disto é uma

responsabilidade acrescida de ser paciente para o ajudar a ultrapassar as situações.

Ultrapassar não no sentido de ter cura, mas no sentido de aprender a lidar com isto e dar

a volta por cima.

Psicóloga: E como tem sido para si o suporte por parte do seu marido, quanto a si?

Entrevistada: O meu marido apoia-me em tudo que é necessário, embora a nível de apoio

do Ricardo eu tenha-o dado mais a nível de consultas e tudo mais, mas acaba por me dar

também apoio a mim e cá em casa, nas tarefas domésticas e com ele, para que seja

possível eu acompanha-lo.

Psicóloga: Diz-me que em termos de consultas e outros deslocamentos tende a ser mais

quem o acompanha, enquanto que o seu marido está presente mais em casa dando ai

suporto correto?

Entrevistada: Sim! Ele trabalha e não podemos os dois acompanhar o Ricardo, então

tendo a ser eu. Ele em casa puxa por ele nas tarefas que trás da escola também, mas não

há nada como a paciência da mãe.

Psicóloga: Compreendo, exige muita persistência...

Entrevistada: Exato, e com o cansaço as vezes torna-se difícil.

Psicóloga: E quanto aos familiares, como entenderam este diagnóstico?

Entrevistada: Muito bem, principalmente por parte dos avós que sempre ajudaram com o

que fosse, e isso é importante, porque estão muito próximos e é uma grande fonte de

apoio.

Psicóloga: No grupo de amigos sentiu o mesmo apoio?

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Entrevistada: Nós falamos sem problema nenhum sobre o assunto se ele se proporcionar,

mas não é algo que falemos muito, nem todos sabem só mesmo os mais próximos. Esses

compreendem mas a nível de apoio não nos apoiamos tanto neles mas sim mais nos

familiares.

Psicóloga: Quem estão mais presentes...

Exatamente e quem nos podem ajudar mais.

Psicóloga: Compreendo... Quer partilhar comigo o que pensa a respeito do futuro do seu

filho?

Entrevistada: Eu acho que ele vai conseguir ser tudo o que quiser... com muita luta e amor.

Porque quem já passou o que ele passou como as dificuldades a nível da escola... ele é

um lutador. Acho que em termos de futuro este síndrome até o fez ficar mais preparado

para as adversidades que possa encontrar na vida adulta.

Psicóloga: hum hum...

Entrevistada: Porque talvez tenha mais maturidade para lidar com os problemas, muitas

crianças com a idade dele não passaram por muita coisa e frustrações que ele passou,

talvez isso o ajude muito no futuro.

Psicóloga: Faz me todo o sentido o que me diz. E a nível de receios?

Entrevistada: Inicialmente o meu receio era que não conseguisse dar a volta por cima, não

conseguisse ser independente, ter uma profissão... mas neste momento vejo que não há

que ter esse medo. Ele agora quer ir para a faculdade, pronto... quer lutar pelo futuro dele.

Portanto os meus receios agora são semelhantes aos receios dos pais com filhos sem o

síndrome de asperger... que acabe o curso e não encontre emprego ou que haja alguma

má companhia que o desvie. enfim acaba por ser preocupações semelhantes às que os

outros pais têm. Antes de ter o apoio certo tinha receios bastante piores como o receio de

ele não ter um único amigo...

Psicóloga: Hum, hum... então sente que esses receios diminuíram consoante o

desenvolvimento que o Ricardo adquiriu pelo apoio que lhe tem sido prestado a variados

níveis?

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Entrevistada: Sim, claro... ele não estaria tão adaptado se não assim fosse. A nível de

amigos notou-se grandes desenvolvimentos, aliás ele agora não tem um bom grupo de

amigos, tem vários grupos de amigos.

Psicóloga: Isso são notórios desenvolvimentos... não sei se tem mais alguma experiencia

que queira partilhar comigo...

Entrevistada: É assim eu acho que o que me falta mesmo salientar é o facto de, ok que

agora já ha mais informação, mas no inicio mesmo assim os pais ficam um pouco perdidos

sem saber o que fazer e a quem recorrer e isso é um bocado assustador, falo por mim. E

depois é as consequências que isso pode ter nestas crianças em termos sociais mesmo

antes de serem acompanhados, como a exclusão na escola... O Ricardo chegou a acontecer

não ter um único amigo na escola, não ser convidado para as festas de aniversário, todos

os dias lhe baterem nos recreios, isso é horrível, isso é que é assustador. Mas apartir do

momento em que conseguimos encontrar a ajuda certa, alguém que colabore com eles

para dar a volta disso, e as coisas funcionarem... ai já tudo.. é engraçado porque à medida

que se resolve o aspeto socialização, as dificuldades escolares que possam existir parece

que se dissipam... estando bem socialmente dão a volta ao resto... Pelo menos com o

Ricardo foi assim, apartir do momento em que fez amigos deu a volta ao resto , as notas

dispararam. O pior ano dele em termos escolares foi o 3º ano, ele nunca teve tão mal a

beira de chumbar como no 3º ano de escolaridade e está no 11º. Quer dizer, os anos que

deveriam ser mais difíceis foram os anos que fez melhor, e é que isso coincidiu com as

dificuldades de socialização... Mesmo assim tenho receio que não as consiga manter pelas

suas características ou não consiga fazer novas amizades no futuro porque ele é um

menino de hábitos lá está….

Psicóloga: Compreendo, penso que está a querer transmitir que tudo é possível

trabalhando a questão socialização, sendo a dificuldade maior.

Entrevistada: Exacto, foram muito importantes as terapias, ele tinha 2 horas no CADIN

mais uma ou duas horas já não me lembro bem com a psicóloga que faz o

acompanhamento educacional. Portanto estava muito tempo em terapia. No CADIN tinha

sessões sozinho, sessões com outros meninos com asperger, foi... teve muito tempo em

terapia. A psicóloga do CADIN foi impecável, a outra também. Foi uma das minhas

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preocupações encontrar um colégio onde de facto mantivesse o acompanhamento, porque

não queria passar por aquilo que ele ja tinha passado no outro colégio onde esteve.

Psicóloga: Não tinha suporte no outro colégio?

Entrevistada: Não... a professora que lá estava recusava-se a colaborar com a psicóloga,

não seguia nada do que ela dizia, não fazia nada do que pedia, dizia que não tinha tempo.

Depois no recreio os meninos batiam-lhe, algo que também me perturbou muito, e ela

não fazia nada. Por isso quando escolhi um novo colégio, meti como condição ele vir a

ter um bom acompanhamento caso contrario não o iria inscrever. Este colégio também

me foi aconselhado por uma psicóloga que me disse que à partida eles teriam

disponibilidade para colaborar nessas situações. E assim foi... ele foi colocado numa

turma da primaria do 4º ano, em que a professora colaborou com tudo com a psicóloga,

tinha reuniões com ele, vigiava-o no recreio. Conseguiu a aceitação dos outros meninos

da sala, e o certo é que funcionou! Ele ficou mais maduro.. a nível oral é muito bom, o

pior é na escrita, e colocou-o a fazer apresentações nas aulas para impressionar os colegas

e valoriza-lo e o certo é que funcionou, apartir dai as coisas começaram a correr muito

melhor. Por isso é que eu acho que é tao importante o apoio psicológico e na escola.

Porque um menino que tem dificuldades de socialização tem mais dificuldades em

interagir e tem de ser ajudado ao máximo para o conseguir fazer, porque com pequenos

gestos é possível dar ali uma ajuda importantíssima. Claro que a ajuda no CADIN foi

importante... Haviam coisas simples que não conseguíamos mudar, por exemplo o

cumprimento do Ricardo era um encontram no ombro dos outros, não dizia bom dia... É

claro que isso levava a que as crianças lhe batessem e isso teve de ser trabalhado com ele.

Não foi num ano nem em dois mas resultou, basta ter paciência. E sobretudo, o mais

importante… dar-lhe todo o amor para que seja a base para ele se desenvolver, sem isso.

Ele precisa de se sentir amado, sinto isso… com isso e tempo tudo se consegue.

Psicóloga: Claro é um trabalho que é desenvolvido e a seu tempo, no tempo certo, dará

os seus frutos e é verdadeiramente isso que importa.

Entrevistada: Sem dúvida...

Psicóloga: Muito bem, queria disponibilizar-me para lhe oferecer toda a informação que

tenho sobre o síndrome, assim como para lhe mostrar os resultados da investigação assim

que concluída a dissertação.

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Entrevistada: Isso era excelente, nunca é demais e estamos sempre a aprender.

Psicóloga: Com certeza! Então desde já um muito obrigada pela participação neste estudo

e pelo relato da sua vivência.

Entrevistada: Obrigada eu, foi com tudo o gosto.

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9.3.2. Caso II

Psicóloga: Boa tarde Madalena*

Entrevistada: Boa tarde doutora

Psicóloga: Desculpe remarcar para uma hora depois do falado inicialmente mas ficou de

facto complicado pelo trabalho no hospital.

Entrevistada: Não tem problema, também foi melhor para mim.

Psicóloga: Otimo! Então como lhe tinha dito inicialmente, a investigação que estou a

desenvolver é sobre a vivencia de mães com filhos com síndrome de asperger, e tal como

as questões éticas exigem será lhe garantido o anonimato.

Entrevistada: Claro, claro.

Psicóloga: Pode-me dar alguns dados pessoais? como a idade…

Entrevistada: Sim claro, 45 anos.

Psicóloga: Profissão?

Entrevistada: Estive no desemprego desde que o meu filho teve o diagnostico e desde ai

por opção sou doméstica, para conseguir ter maior margem de manobra para acompanhar

o Filipe.

Psicóloga: compreendo…E estado civil?

Entrevistada: Casada…

Psicóloga: Reparei que o disse com alguma insegurança…

Entrevistada: Sim, estamos numa fase complicada, falamos em divórcio… não sei.

Psicóloga: E vejo que para si é algo difícil de falar…

Entrevistada: É… Sabe desde que o Filipe teve o diagnostico, tudo piorou, já estávamos

a algum tempo com duvidas, mas desde aí os tempos foram muito stressantes, são

exigidos muitos recursos financeiros, entramos em discórdia…

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Psicóloga: Entram em discórdia…

Entrevistada: Sim, qualquer coisa é razão para se discutir, até as dificuldades do Filipe

são motivo. Diz que eu o mimo muito e que assim não vai evoluir porque lhe faço as

vontades todas.

Psicóloga: E o que você acha sobre isso?

Entrevistada: Eu acho que não… por exemplo em termos sociais o Filipe tem dificuldades

e sente-se muito mal mesmo em shoppings e sítios com muito barulho. Eu tento-o afastar

desses sítios…Aconselhei-me com a psicóloga e ela disse-me que não ve problema nisso

desde que socialize no seu meio .

Psicóloga: Hum, hum… Compreendo. O seu filho que idade tem?

Entrevistada: 10 anos

Psicóloga: E tem mais algum filho?

Entrevistada: Não.

Psicóloga: À quanto tempo receberam o diagnóstico?

Entrevistada: Cerca de três anos, no segundo ano da escola, mas logo no primeiro ano que

vimos que algo se passava, mas pensamos que não passava de timidez e falta de jeito para

certas coisas.

Psicóloga: E isso foi algo sentido pela professora?

Entrevistada: Não… só nós notávamos isso. Ela dizia que ele tinha dificuldades mas

nunca falou de nada por ai além…

Psicóloga: Estou a entender… Madalena e como foi para si esse momento do diagnóstico

do seu filho? Como se sentiu?

Entrevistada: Não fazia ideia do que era… fiquei surpreendida mal ouvi autismo. A

psicóloga da escola disse que ele tinha características de uma criança com asperger, não

entendi... e ela disse que era uma vertente do autismo, e ai assustei-me… disse que o meu

filho não era autista. Tinha aquela ideia de que uma criança autista mal fala, se balança…

não fazia ideia, depois é que ela me deu a conhecer o espectro por alto e em casa fui

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pesquisar. Nesse dia que falou comigo deu-me o contacto da clinica onde, que acompanha

casos semelhantes, onde é agora seguido ainda, e fui a uma consulta. Até hoje está a ser

lá acompanhado.E muito bem. Se não fosse isso…

Psicóloga: Sente que o suporte na clinica é importante?

Entrevistada: Totalmente! Ele trabalha com a equipa dele todas as dificuldades do Filipe

e tem melhorado na socialização sobretudo…só que como tem muita sensibilidade

sensorial não o levo para onde tem muita gente. Mas tem dois grandes amigos e teve uma

namoradinha.

Psicóloga: como é isso para si?

Entrevistada: É uma grande alegria, para pais normais pode ser estranho mas para mim

ver o meu filho ter amigos e até uma namoradinha recentemente é importante. Sempre foi

um medo meu que não se conseguisse dar com outras pessoas. Ele é muito inseguro, não

olha as pessoas, as pessoas acham-no antipático ou que não está interessado. Mas é

mesmo dele, apesar de estar a trabalhar isso é algo que quando não está a vontade se nota

muito, o não olhar nos olhos. E depois ta sempre no seu canto de volta dos seus livros de

dinossauros, adora tudo o que diz respeito replicas, filmes, documentários e tudo. Isso e

os legos, faz coisas impressionantes. Mas lá está… anda nisso, ou melhor andava mais

nisso, todo o tempo. E eu não queria que fosse uma pessoa fechada.

Psicóloga: Percebo que para si fosse uma preocupação dado que o outro é importante

para todos nós.

Entrevistada: Muito… E quero que um dia tenho uma mulher, case… mas não é muito

dado. Vamos ver.

Psicóloga: Tudo no seu tempo … E como tem sido para si viver com este diagnóstico?

Entrevistada: Tem sido uma correria, estava desempregada quando ele foi diagnosticado

e desde ai decidi parar mesmo para poder estar totalmente disponível para o levar à

clinica, para o levar ao futebol, coisa que lhe tem feito muito bem, mas lá está convívios

não consegue. Para o acompanhar em casa sobretudo… o meu marido diz-me que mudei

muito…

Psicóloga: E a Madalena acha que mudou?

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Entrevistada: Tenho de lhe dar alguma razão… nós tínhamos uma vida social em conjunto

e agora so ele a tem basicamente, só ele está em convívios com os amigos do trabalho.

Eu não acho jeito deixar o menino nos avós, não gosto de o deixar em casa de amigos

porque sei que ele não gosta…Ele diz que estou a ficar com as características dele e

realmente nesse sentido posso-lhe dar razão.

Psicóloga: E como se tem sentido desde a descoberta do diagnostico? Em termos físicos

e psicológicos.

Entrevistada: Psicologicamente é o cansaço, a exaustão. Como o meu marido diz eu não

desbloqueio, tenho uma rotina que não quebro. Fisicamente esse cansaço fica evidente,

se pensar bem até as enxaquecas surgiram depois disso… pode ter ligação não é?

Psicóloga: A Madalena acha que possam estar ligadas a esse cansaço?

Entrevistada: Pois… já pensei fazer acunpultura, relaxar mais, mas não é fácil.

Psicóloga: É importante refletir sobre como está do modo que refere e do que a pode ter

levado a esse mesmo estado. O que mudou? Desde quando? Porquê?

Entrevistada: Pois… acho que não penso muito no que se refere a mim… sobretudo nestas

alturas em que faz testes… esta é outra fase para o ajudar a concentrar-se…

Psicóloga: Como se sente quanto ao apoio escolar?

Entrevistada: É bom, agora que sabem o que ele tem. Antes não referiam grandes coisas

achavam-no tímido e apesar da distração conseguiam faze-lo fazer as coisas. Mas agora

que sabem o que tem a professora e a psicóloga falam de forma a perceberem como o

ajudar, e que estratégias utilizar, e isso também tem sido muito bom. Ele não tinha amigos,

não conseguia mesmo criar ligação e agora já tem dois. Ainda tem umas crises em que se

isola mais, mas acho que isso sempre vai ter.

Psicóloga: Compreendo...e como lida nesses momentos de crise?

Entrevistada: Tenho paciência! São momentos em que parece muito imaturo e aí tenho

de me lembrar que para ele não é fácil, que tem feito esforço. E tento acalma-lo. Mas as

vezes quem precisa de calma sou eu... Tento perceber o que sente e mostrar-lhe que tudo

se resolve. Ele chegou a ter crises de choro por não ter amigos e toda a gente ter amigos…

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não foi fácil para mim ajuda-lo mas tentei ao máximo explicar que iria ter, teria de se dar

mais a conhecer no recreio, entrar nas brincadeiras… Mostrar que gosto dele e que se ele

se aproximar dos outros também vão gostar dele.

Psicóloga: Acredito que não seja uma situação fácil Madalena, de qualquer modo referiu

que já teve progressos a nível da socialização o que é notório.

Entrevistada: Eu acredito que sim.. e que no resto também irá ter progressos, a psicóloga

disse que eles têm um ritmo próprio e tudo a seu tempo.

Psicóloga: Sem duvida nenhuma… e qual considera ser o seu papel como mãe?

Entrevistada: Este mesmo. Acompanha-lo, ajuda-lo nas tarefas, mostrar-lhe que tudo se

resolve, que pode contar comigo também como amiga dele e que pode falar comigo,

porque ele não fala muito das coisas dele e todos precisamos disso.

Psicóloga: Hum, hum… E quanto ao apoio do seu marido?

Entrevistada: A ele ajuda-o as vezes nas tarefas da escola, mas quando ele começa com

birras ou a distrair-se ele irrita-se, e isso deixa-o com menos vontade de ali estar. As vezes

dão-se bem nisso outras é assim… Eu tenho mais calma para o ajudar mas mesmo assim

o pai muitas vezes ajuda nisso enquanto eu faço o jantar por exemplo. Mas pronto o meu

marido tanto entende que ele tem dificuldades como parece que as vezes as desvaloriza.

E que ele precisa que o leve para sítios e se habitue aos barulhos e a ver pessoas, não tem

noção como isso pode ser intrusivo para ele mesmo sabendo da hipersensibilidade dos

autistas.

Psicóloga: Tem uma visão um pouco diferente da sua quanto ao problema?

Entrevistada: Sim… e discutimos por isso muitas vezes…

Psicóloga: Compreendo. Estas situações são complicadas de gerir… e os familiares têm-

lhe prestado apoio nesse sentido?

Entrevistada: lá está… eles estão longe, os avós e tios vivem em Peniche.. são a família

mais próxima que temos e que sabem. Mas não os procuramos, eu tenho conseguido dar

conta do recado. Mas perguntam por ele, como estão as consultas como está na escola, se

é preciso algo.

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Psicóloga: Hum, hum… e no grupo de amigos costuma procurar mais apoio?

Entrevistada: Sim algum, mais a nível dos filhos deles, quando trazem os filhos para jantar

eles próprios tentam que eles interajam com o meu. E resulta, talvez tambem por ele estar

no espaço dele. Mas já houve situações em que o filho da Marta fez uma birra e ele

começou as voltas na sala por causa do barulho do choro dele lá está, faz-lhe mesmo

confusão.

Psicóloga: Vejo que os amigos estão mais presentes.

Entrevista: Sim estão, e eles próprios me chamam a atenção que deveria tambem sair…

o único convivo que tenho é assim em casa almoços ou jantares e não são assim tantos

porque ando cansada.

Psicóloga: Compreendo... Devia pensar um pouco melhor se o que lhe dizem, quer da

parte do seu marido, quer dos amigos, lhe faz sentido. E tentar perceber do que precisa e

de como gerir não apenas a vida do seu menino, mas igualmente a sua. Tentar encontrar

um ponto de equilíbrio para manter o seu bem-estar, porque tambem ele promove o do

seu menino.

Entrevistada: Sim.. quando o meu marido me diz estas coisas fico irritada, da me a

sensação que não está a dar valor a algo que é preciso. Mas pensando bem pode nem ser

nesse sentido…

Psicóloga: Tire um tempo para refletir como tudo isto tem sido para si e partilhe isso.

Entrevistada: Pois secalhar preciso mesmo de fazer isso, parar para pensar nas minhas

coisas….

Psicóloga: Exato… A Madalena falou-me de alguns receios quanto ao futuro do seu filho

a nível de casar e ter amigos... quer partilhar um pouco melhor comigo como vê o futuro

do seu filho?

Entrevistada: Na escola acredito que consiga estudar.. até onde ele quiser… imagino é

que em trabalhos onde seja preciso o contacto com outras pessoas se atrapalhe mais…

não sei o que vai gostar de estudar mas logo se verá. E eu não gosto muito de pensar no

futuro, não quero pensar que vai ser como é agora porque isto é uma evolução não é?

Psicóloga: A Madalena assim o tem sentido?

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Entrevista: Sim! Já tem amigos, já se concentra melhor comparado com aqueles primeiros

dois anos de escolinha. Até tem notas medianas… melhores que alguns colegas dele! O

acompanhamento que lhe damos tem sido feito para isso mesmo. Agora claro, se tiver

mais a vontade e jeito para interagir com certeza tudo será melhor, é só mais a parte

afetiva que me preocupa, porque ele é muito afetuoso! Mas às vezes não sabe como ter

esse afeto. Não sei se me estou a fazer entender… Gostava que ele casa-se e tivesse

filhos…

Psicóloga: Claro que sim…

Entrevistada: E pronto é isso…

Psicóloga: O que acha que esta vivencia lhe transmitiu?

Entrevistada: Como disse mais paciência…E não sei.. acho que encontrei em mim forças

para enfrentar o desconhecido. Eu pouco sabia sobre este problema e de todas as formas

tentei tornar-me uma expert no assunto! Porque so sabendo do que se trata conseguimos

ajudar não é?

Psicóloga: Sem duvida.

Entrevistada: Então comprei livros, procurei ajuda na escola e na clinica do Dr, de quem

tenho otimas referências, e que por experiencia própria falo que é um excelente

profissional sempre atento. Por outro lado, todas as coisas têm um custo, como sabe o

estado português é uma lástima nestes casos, e sai tudo do nosso bolso. Aprendi a gerir

melhor as finanças, a encontrar forma de que nada falte quando antes nem imaginava ser

possível fazer uma ginástica deste género…Mas… fiquei a pensar… e acho que tambem

me fez mudar. Estar calma para ele e tensa para mim. É isso que me vem agora a cabeça.

Acho que preciso de viver tudo isto sendo o que era.´

Psicóloga: Sendo o que era… pode-me falar um pouco mais disso?

Entrevistada: Sim… eu tento transmitir calma a ele mas no fundo ando stressada com

tudo o que lhe diz respeito, irritada, isolada. Antes fazia bastantes coisas com o grupo de

amigos… e se pensar bem ele sempre foi asperger e acabava por conseguir conciliar…

Psicóloga: Talvez respirar também a sua individualidade, os seus momentos, o que gosta

de novo…

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Entrevistada: É mesmo isso.

Psicóloga: Madalena foi um prazer a ter entrevistado, muito obrigada pela sua

participação neste estudo…

Entrevistada: Eu é que agradeço porque fez-me pensar falar sobre tudo isto.

Psicóloga: Se precisar de alguma coisa estou disponível, irei inclusive enviar-lhe as

informações que tenho sobre Síndrome de Asperger.

Entrevistada: Mais é sempre bem-vinda!

Psicóloga: Então obrigada mais uma vez, tenha um bom fim-de-semana!

Entrevistada: Bom fim-de-semana também para si!

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9.3.3. Caso III

Psicóloga: Olá Patrícia. Gostava que me dissesse algumas informações como por exemplo,

profissão.

Entrevistada: Hum… boa… ham analista de negócios.

Psicóloga: Ok, qual a sua idade e estado civil?

Entrevistada: 45 anos e sou casada.

Psicóloga: Casada… e que idade tem o seu filho?

Entrevistada: 8 anos.

Psicóloga: À quanto tempo teve o diagnóstico?

Entrevistada: O diagnóstico do Diogo foi feito primeiro informalmente a cerca de um

ano e depois o diagnóstico formal com os resultados dos testes foi feito em Julho do ano

passado portanto à 7 ou 8 meses.

Psicóloga: Portanto tinha ele 7 anos…

Entrevistada: Exato.

Psicóloga: Como lhe tinha dito, a entrevista é sobre a experiência de ter um filho com

Síndrome de Asperger, e eu gostava que me falasse um pouco de como é a sua experiencia

de viver com um filho com este síndrome.

Entrevistada: É assim, o Diogo é o terceiro de três filhos, e desde pequenino, portanto

vou contar um pouco do enquadramento da historia do enquadramento do Diogo, desde

pequenino que eu senti que o Diogo era diferente dos irmãos. Não era só uma questão de

ser de ser o mais teimoso, de ser o mais distraído, o Diogo era diferente, tinha algumas

características diferentes dos irmãos Nunca dei muita importância porque era algo que

não, apesar de me preocupar não era algo que me preocupava em excesso. Era o mais

novo… era um pouco agagasado… E fui, apesar de estar sempre desperta para o facto do

Diogo ser diferente, nunca.. nunca achei que tivesse de facto um problema grave, até

aos… 4 anos. Portanto, o Diogo começou a falar muito tarde, começou a falar já com dois

anos e qualquer coisa, aos 4 anos. O Diogo teve uma situação entre mim e o pai, portanto

nós tivemos afastados durante uns meses e nessa altura o Diogo teve um retrocesso brutal.

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Deixou de falar, tinha comportamentos de bebé mesmo e na altura fomos a uma psicóloga,

portanto aconselhados pelo colégio onde ele estava. Fizeram-lhe uma avaliação

psicológica e disseram-me que o Diogo estava basicamente a sentir que toda a gente o

tinha abandonado e esse diagnostico na altura serviu para varias coisas, incluindo para o

mais importante que veio a decidir o futuro, foi para eu e o pai resolvermos os nossos

problemas familiares, porque dissemos que... ok, o que quer que seja que se está a passar

ou que não se passou bem entre nós, não tem importância nenhuma comparado com a

estabilidade do Diogo. Então, voltamos a ter uma vida normal, resolvemos os nossos

problemas, e o Diogo começou a ter acompanhamento psicológico lá no colégio. Tinha o

apoio e a psicóloga do colégio dizia que os testes, não sei que nome, mas os testes que

fez, ou tinham resultados muito bons, ou tinha resultados muito maus…

Psicóloga: A que níveis?

Entrevistada: A níveis cognitivos teve resultados acima da média e havia outros, por

exemplo a nível de maturidade, depois se quiser eu tenho-os posso-lhe mostrar…

Psicóloga: Hum, hum…

Entrevistada: Ainda não os deitei fora, apesar do Dr. Lobo Antunes ter dito para eu deitar

tudo para o lixo. Acho que ainda os tenho lá. Mas pronto, se eu tiver lá os resultados eu

trago. E então, o Diogo este a fazer essa avaliação, e o acompanhamento durante todo

esse ano. No fim desse ano ele mudou de escola, foi fazer a pré- primária para outra escola

e eu tendo em conta o historial do Diogo no ano anterior, disse logo à educadora que ele

tinha tido aquele acompanhamento e que se visse algumas características que precisassem

de mais atenção que falasse comigo, no entanto eu achava que ele estava mais estável.

Mas que se fosse preciso iriamos falar novamente para que ele tivesse acompanhamento

psicológico. No fim desse ano, a professora disse que não sabia se ele estava preparado

para ir para o primeiro ano, por isso achava melhor fazer uma avaliação para ver se em

termos de maturidade está pronto para começar o primeiro ano, portanto o ano que vem.

E eu pensei tudo bem… o Diogo foi então re-avaliado pela própria escola, pelos

psicólogos da escola, que disseram que o Diogo não tinha nenhum problema psicológico,

que teria talvez alguns problemas de imaturidade. Aconselharam-me portanto a ir ter com

uma terceira pessoa, portanto outra psicóloga, que fez o … Voltou a repetir os testes que

tinham sido feitos ao Diogo no outro ano. Ela disse que o Diogo tinha alguns problemas,

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não lhe chamou nada em concreto, disse que tinha falta de atenção, deficit de atenção,

que tinha problemas graves de identificação com a figura materna, portanto eu, que era

uma criança que se sentia portanto desligada, que sentia que o mundo estava contra ele.

Esse diagnóstico veio-nos deixar assim um pouco preocupados com o Diogo porque nós

não sentíamos nada disso. Especialmente a questão de ter a ver algum problema comigo…

Psicóloga: Hum, hum….

Entrevistada: Porque o pilar do Diogo sou eu, para tudo! É a mãe, às vezes é cansativo.

Psicóloga: Exige muito de si portanto…

Entrevistada: Sim. O Diogo é a mãe para tudo… Pronto o Diogo foi para o primeiro

ano, que começou a correr mais ou menos bem, mas o Diogo uma das características que

tem é que necessita muito das pessoas que considera pilares, que são referencia, ele

precisa muito de mimo, de passar a mão pelo pêlo, como se costuma dizer! E a professora

que ele teve no primeiro ano não era assim… era uma pessoa fria, no primeiro dia do

primeiro ano o Diogo foi-lhe dar um beijo coisa que ele estava habituado a fazer com a

outra professora, ela disse logo: “Isto não é o jardim-escola, vai-se sentar não quero

beijos”. Portanto isso fez com que para o Diogo era uma “persona non grata”. Portanto o

Diogo criou uma aversão àquela professora. E até ao fim do primeiro período, o Diogo

não fez nada na escola, literalmente…

Psicóloga: Em termos de notas não teve sucesso?

Entrevistada: Não... em termos de notas teve sucesso, porque no dia dos testes eu pedi-

lhe para fazer e ele fez, mas de resto a professora mandava as fichas para casa a dizer “o

trabalho que o Diogo fez, nada”. Ele escrevia o nome, e mais nada.

Psicóloga: Não investia na escola…

Entrevistada: Não porque ele não achava que valesse a pena porque a professora era má

para ele e criou ali uma grande resistência. O Diogo fez então os 7 anos no fim do primeiro

período e fui à pediatra à consulta de rotina dos 7 anos, e eu disse-lhe que a professora

disse que não sabia o que havia de fazer com ele, que ele não é uma criança normal e que

não sabe o que há-de falar com ele e eu estava preocupada. Então a pediatra disse: “Olhe,

pare de brincar aos psicólogos que é o que tem andado a fazer este tempo todo e vamos

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levá-lo a uma pessoa que lhe vá fazer um diagnóstico como deve ser”. Portanto se lhe

disser que o Diogo tem alguma coisa, muito bem preocupa-se com isso, se disserem que

o Diogo não tem nada tire essa ideia da cabeça e vai ao contrário do que a terceira

psicóloga lhe disse, tirar essa ideia de que é uma má mãe, coisa que a psicóloga anterior

me tinha convencido, que todos os problemas derivavam de mim. Então ela encaminhou-

nos para o Dr. António Lobo Antunes, que viu o Diogo em Fevereiro do ano passado e

ao fim de hora e meia de estarmos lá sentados a falar com ele, digamos eu o meu marido

e o Diogo, ele disse-me ao fim: “Assim que o Diogo entrou eu vi logo o que é que o Diogo

tem. Eu já vi muitos Diogos na minha vida, e posso fazer o diagnóstico só de olhar para

ele”.

Psicóloga: Ele é especialista na área…

Entrevistada: É! E vou usar um palavrão que vai assustar a mãe, e eu pensei cá para

mim, não vai ser nada que eu já não saiba, porque eu dizia muitas vezes “O Diogo está

no mundo dele” (impacto), o Diogo tem um mundo que é só dele. Então ele disse assim

“O seu filho tem autismo mas não é autista” e explicou-me como uma pessoa tem autismo

mas não é autista. Disse-me que o Diogo tem síndrome de Asperger, ou “Asperger”, já

ouvi dizer das duas maneiras e ainda não sei como se diz ainda… Mas não é autista, pelo

que me diz ele aparenta ser uma criança com as capacidades cognitivas todas, portanto

sugeriu que eu fosse fazer os testes todos. Por um lado percebemos que o diagnostico

fazia sentido por outro ficamos surpresos, era algo novo e não tínhamos muita informação

sobre o síndrome de asperger em especifico. Depois começou a ser seguido no PIN onde

fez os testes todos com a Dr. Daniela Nascimento, onde ela me diz que,

independentemente do que o Dr. me tinha dito, ela ia fazer o teste de diagnóstico do Diogo

num espectro largo, portanto faz de conta que não sabe nada, para perceber o que dá.

Então ela fez 5 ou 6 sessões com o Diogo, comigo e com o meu marido fez outras quantas,

depois houve uns testes grandes para eu responder e para o pai responder e para a

professora. Depois daquilo tudo metido lá nas máquinas, lá com os algoritmos que vocês

utilizam, saiu o diagnóstico que confirma que de facto, não há dúvidas, Síndrome de

Asperger com deficit de atenção e hiperatividade, pacote completo! (risos).

Psicóloga: E pode-me dizer como se sentiu quando recebeu esse diagnóstico?

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Entrevistada: Um alívio! Porque aquela ideia de que eu era má mãe saiu-me da cabeça ,

ok… não foi nada que eu tivesse feito, não foi por falta de atenção da minha parte, não

foi por negligencia, pronto não foi por nada…

Psicóloga: Compreendo…

Entrevistada: O Diogo é assim, porque é assim. E não há nada que eu possa fazer para

tirar estas características dele. O que eu posso fazer é aprender a fazer com que ele

aprenda a lidar com elas, para que para ele seja mais fácil e tentar que as pessoas que

lidam com ele diariamente percebam as características dele. Tentar perceber e lidar com

as características do Diogo. Mas que ele vai provavelmente ter algumas destas

características ao longo de toda a vida, vai… E se me perguntarem se eu as mudava,

não… não mudava, porque é assim que eu gosto dele. Com estas características que ele

tem porque… ele é assim! E portanto agora ele está a ser acompanhado semanalmente lá

no PIN, já me falaram duas vezes em medicar o Diogo, e eu não quero medicação… o

meu principio é enquanto não puser em causa ele próprio ou terceiros, pronto vamos

continuar. Porque as notas dele são sempre bom e muito bom, portanto enquanto ele

continuar a dar para os gastos, digamos assim, eu não o quero medicado, porque ele é

assim. Eu tenho, e é por isso que estamos a investir no tratamento que ele está a fazer no

PIN, e fizemos alterações muito drásticas nas nossas vidas para termos mais tempo para

estar com ele essa é a minha forma de conseguirmos ajudar o Diogo. Se virmos que não

há nada a fazer, não há nada que consiga controlar o Diogo então nesse caso eu digo ok

eu desisto …

Psicóloga: Vão então tentar com os vossos recursos primeiro…

Entrevistada: Sim, sim!

Psicóloga: Mas como é para si exatamente viver com um filho com Síndrome de

Asperger?

Entrevistada: Como é que é para mim viver com o Diogo…? O Diogo para mim tem…

as características mais vincadas nele são muito pouca flexibilidade, extremamente rígido,

se ele me disser alguma coisa e eu digo “tá bem Diogo, 5 minutos” o Diogo fica parado

a contar até 300 porque sabe que quando chegar 300 passaram 5 minutos e foi o que eu

disse, portanto não pode ser mais que aquele tempo. Se eu lhe disser “ah este fim-de-

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semana vamos a casa dos avós” e entretanto por algum motivo está a chover, alguém está

doente, os avós saíram e nós não vamos a casa dos avós é um drama, porque eu disse que

íamos aos avós. E depois tem o outro lado, as rotinas… uma rotina que é uma rotina não

se quebra, por motivo nenhum. Ele tem muita dificuldade em entrar numa rotina e depois

tem muita dificuldade em sair delas… Uma historia caricata, à uns seis meses teve um

problema num pé porque cortou-se numa praia, numa pedra, concha, qualquer coisa,

cortou-se no pé, não interessa… e teve de andar a pôr uma pomada durante um mês e nos

primeiros dias para meter a pomada foi uma chatice, porque não queria meter a pomada.

Ao fim do mês quando acabou o pacote, ele diz: “mãe e a pomada?”, eu disse: “Diogo já

não há pomada, já acabou, já não é para pôr mais”- “Então e agora?! Já não é para pôr

mais?! E o pé vai ficar doente!” – “Não Diogo, olha para o teu pé já não tem nada!” -

“Mas é preciso!” – e eu disse: “Diogo não vais andar a meter pomada para o resto da vida,

era para pôr a embalagem e a embalagem já acabou, já não é para pôr mais.” Foram uns

três ou quatro dias que pronto…

Psicóloga: Tudo o que seja rotinas…

Entrevistada: O Diogo tem uma musica que todos os dias tenho de cantar, a mesma à

anos, os irmãos já não podem ouvir a musica, eu já não posso ouvir a musica…

Psicóloga: Mas faz sentido para ele, não é?

Entrevistada: Faz sentido para ele, e nota-se uma grande diferença. Ele está

completamente agitado vai para a cama muito agitado, deita-se… e eu sento-me ao pé

dele, começo a cantar, até posso dizer qual é a musica é aquela das Doce: “Fecha a

porta…” Pronto, assim que eu canto: “Fecha a porta apaga as luzes …” ele encosta-se e

faz assim : (imita uma respiração funda), acalma e às vezes ainda não acabei a musica já

está a dormir. Tem mesmo ali qualquer coisa… O pai está muitas vezes a dizer “Tens de

acabar com a musica” e eu digo “Como acabar com a musica?! Se eu não cantar ele não

dorme!” é que não dorme mesmo e depois não dorme mais ninguém cá em casa. Que

todos os problemas sejam cantar Fecha a porta até aos 70 anos.

Psicóloga: Então mas a Xana, como é que se sente mesmo em termos psicológicos ou

físicos depois do diagnóstico?

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Entrevistada: Como é que me sinto? Hamm… Sinto-me pronta para a batalha.É assim o

Diogo não foi uma gravidez planeada, e eu costumo dizer que o Diogo apareceu na minha

vida para me mostrar que eu sou uma pessoa muito preocupada com horas para cumprir,

coisas arrumadas… portanto, o Diogo veio-me mostrar que tudo o que eu penso que

controlo, não controlo. Portanto, tudo aquilo que eu julgo que está tranquilo, aí dentro

pode haver o caus! E ele é o desafio da minha vida.

Psicóloga: Hum, hum…

Entrevistada: Leva-me a um ponto de exaustão enorme. Ele é muito absorvente… De

uma maneira que os irmãos não são. Mas por outro lado, enche-me o coração de amor de

uma maneira que os outros também não enchem. Porque é extremamente carinhoso, é

muito preocupado, é capaz de estar a ver televisão e do nada, levanta-se, vem a correr ter

comigo dar-me um beijo, assim do nada, não diz nada só assim. Fico assim wow, e faz

isso imensas vezes.

Psicóloga: É muito afectuoso…

Entrevistada: É!

Psicóloga: Consigo, com outras pessoas ou…?

Entrevistada: Não, é só comigo. Comigo, ponto final, é mãe é mãe, é Deus no céu e mãe

na terra (risos). E com as pessoas da família, aquelas pessoas que ele considera o núcleo

dele, sou eu, o pai, os irmãos, se bem que com a irmã tem ali uma relação de amor-odio,

porque “Detesto a Mariana, detesto a Mariana!!” e a seguir é capaz de se agarrar a ela

assim toda encurvada do género larga. Mas pronto… as pessoas que ele considera que

são do núcleo dele, pessoas com quem ele tem os carinhos. As pessoas de fora, de quem

ele não gosta evita muito o contacto, evita olhar nos olhos, tem aqueles estereótipos

próprios das crianças… por exemplo este ano não porque a professora já teve problemas

com crianças com as mesmas características e sabia como lidar, mas por exemplo o ano

passado o Diogo estava completamente isolado. Eu ia-o buscar a escola e ele estava

sentado sozinho numa sala, num canto, porque mais ninguém brincava com ele e aquilo

custava-me horrores. Dava-me vontade de entrar na sala e começar a bater nos miúdos e

acabar no professor, porque agente vê que os adultos também não faziam nada para evitar

aquilo. Mas pronto…

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Psicóloga: Então em termos escolares sente algum suporte derivado à professora já ter

lidado com alguns…

Entrevistada: Sim, sim, acho que tenho muita sorte com a professora que lhe calhou…

Psicóloga: Por estar preparada…

Entrevistada: Sim! Tem … a escola do Diogo é uma escola de referência nacional ou

pelo menos aqui do distrito de Lisboa para crianças com síndromes de aspergers. O Diogo

tem na sala dele três meninos surdos-mudos, as professoras ali estão habituadas a tratar

de crianças diferentes. E o Diogo é uma criança diferente do que está habituada, já teve

muitas crianças com Asperger, diz ela que dos que já lhe passaram pela mão é o

melhorzinho digamos assim. Mas ela sabe as características dele, sabe como lidar com

ele… entretanto já demos entrada com os documentos para ele ter acesso ao artigo 3 não

sei o que…aquele que dá acesso a que ele tenha o estatuto de …

Psicóloga: Criança com necessidades educativas especiais.

Educativas especiais, porque a professora diz que não é por questões cognitivas dele,

porque diz ela que “Quem me dera a mim que metade da turma tivesse metade das

competências que tem o Diogo”, o problema do Diogo é que a meio de um teste desliga,

desliga… portanto ele precisa de necessidades educativas especiais não porque precise

do conteúdo gramatico adequado a ele porque não precisa, ele precisa é de ter mais estudo

e é por isso que estamos a dar entrada para o tal artigo, porque o Diogo muitas vezes

agente vê que ele está desligado, no mundo dele, e que nós estamos a falar e ele não tá

cá. Masse lhe perguntar o que eu disse ele repete exatamente o que eu disse.

Psicóloga: Eles têm os sentidos muito apurados…

Tem, tem…

Psicóloga: Então a sua preocupação a nível da escola é mais com os meninos quando o

isolam um pouco mais?

Entrevistada: É, o que se passa este ano é que como a professora tem esta sensibilidade

isso não está a acontecer, porque a professora obriga-os a brincar com o Diogo, e o Diogo

no outro dia queixou-se que não o deixavam jogar, calhou em conversar com a professora

sobre o assunto, por acaso nem foi em termos de queixinhas, foi “ah ele queixasse é que

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os meninos não jogam a bola com ele” e ela no dia seguinte diz “Porque é que o Diogo

não joga à bola?” e eles “ah porque ele é que não gosta de jogar” – “Não, o Diogo joga,

porque aqui é assim, ou jogam todos ou não joga nenhum” e a partir daí o Diogo já joga

à bola, tem amigos coisa que não tinha, e já me pede ah o não sei quantos pode vir cá a

casa ou eu posso ir a casa dele? Coisa que antes nunca tinha acontecido. Portanto está a

começar a socializar, o que é muito bom…

Psicóloga: Acredito que para si seja muito bom. E em termos familiares, como é que tem

sentido o apoio da sua família e da família do seu marido?

Entrevistada: Então, a minha família e a família do meu marido são muito diferentes...

E a forma de estar nas duas famílias é muito distinta. Quando o diagnostico foi feito ao

Diogo a atitude da minha família foi -ok, o que é que é preciso agente fazer, como é que

vamos lidar com ele? A atitude da família do meu marido foi – Ah mas ele não tem nada,

é uma criança normal, vocês andam a gastar dinheiro em médicos para quê? Ele não tem

nada. Ah… a minha filha também era assim, o meu filho era assim, o teu primo era assim-

não sei o que… era assim. Estas duas formas de estar são muito diferentes. O que faz com

que, enquanto a minha família está sempre integrada em tudo aquilo que se passa, sabe

quando o Diogo tem sessões no PIN, o que é que se faz… Posso dizer que eu comprei

tudo o que há para comprar de livros de Asperger , tenho sete ou oito livros diferentes, eu

li-os, a minha mãe leu, a minha irmã leu-os…

Psicóloga: Todos tentaram estar dentro do assunto…

Entrevistada: Toda a gente, e depois do diagnóstico ter sido feito ao Diogo eu pedi duas

sessões à parte, uma para explicar aos avós e aos tios do Diogo o que é que o Diogo tinha,

como poderiam lidar com o Diogo quando estiverem com ele, e depois outra para os

irmãos. Posso dizer que da família do meu irmão não foi ninguém. E da minha foram

todos.

Psicóloga: E diga-me uma coisa, tinha referido à pouco que tinha tido um problemas com

o seu marido, isso foi na altura em que estavam ainda em diagnostico, a tentar perceber o

que estava a acontecer com o seu filho?

Entrevistada: Não, não, isso foi quando ele tinha uns quatro anos, quando ele foi à

primeira psicóloga.

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Psicóloga: É de facto uma pena que nem todos os familiares apoiem a situação.

Entrevistada: Eu acho que nem é uma questão de apoiar, é que na cabeça deles com o

Diogo não se passa nada, porque acham que o Diogo é uma criança normal e que aquilo

que ele tem é teimosia, e pronto- a tua cunhada também era assim, mas secalhar a minha

cunhada também tem alguma coisa que ninguém lhe diagnosticou, não é? E é um

bocadinho por isso. E o meu marido diz muitas vezes “não vale a pena insistires porque

se eles não veem o problema, nós não vamos estar a incutir um problema onde eles não

vêm, portanto se acham que tá tudo bem então deixa estar, eles tão cá meia dúzia de vezes

no ano portanto...” E depois há outra questão, que é, agente diz que o Diogo tem Síndrome

de Asperger, as pessoas dizem: ah isso é o quê? Agente diz que é uma doença do espectro

autista, o que é que fica retido na altura?

Psicóloga: Autismo…

Entrevistada: Autismo, no dia a seguir já estão a dizer que o filho da Xana é autista e

dois dias depois o filho da Xana já é deficiente, e eu não quero isso, porque já viu o Diogo

e o Diogo é uma criança normal…Tem algumas características quando passa aquele

bocadinho em que descompensa, é o fim do mundo, mas tirando isso é uma criança

normal. E eu não quero que…

Psicóloga: Passem um rótulo…?

Entrevistada: Exatamente, porque basta que ele aprenda a lidar com estas formas de

como descompensa, e ele já aprendeu… Quando ele sente que está descompensado ele

diz “mãe vou para o meu quarto” e vai. E eu espero que daqui a seis ou sete anos quando

o Diogo for adulto que ele já saiba controlar, que quem não saiba que ele não tem

Asperger não fique a saber. Porque quem conhece as características e estão ao pé dele,

topam logo, como eu quando estou ao pé de uma criança com as características eu vejo,

não é? Mas eu espero que daqui a meia dúzia de anos as pessoas que conheçam as

características de Asperger já não as vejam no Diogo, porque ele já aprendeu a lidar com

elas e a reagir, é nisso que estamos a trabalhar, eu e o pai, com a questão do

acompanhamento no PIN e com a escola. E espero que daqui a um, dois, três anos, ele

esteja menos Aspie que agora.

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Psicóloga: E em termos dos seus amigos? Sente que houve alguma diferença após o

diagnóstico?

Entrevistada: Nós não temos muitos amigos porque eu trabalho muitas horas, e então

tenho muito pouco tempo livre, e como tenho muito pouco tempo livre tento estar ao

máximo com eles, com a família. E temos três ou quatro casais que são os amigos da casa

a quem nós dissemos o que se passava, e toda a gente tá… não houve ninguém que eu

visse que se tenha afastado ou que se mostrasse de forma diferente pelo diagnóstico, não.

Ah… houve assim uma situação um pouco estranha quando fomos para casa dos

padrinhos e fizemos um jantar la em casa. E estávamos a mesa e o Diogo estava

completamente, completamente descompensado, porque o arroz tinha ervilhas, e ele

estava doido porque o arroz tinha ervilhas! Ele já estava todo a tremer, e o pai disse

“Diogo levanta-te vai para lá ao teu quarto, acalma-te, quando tiveres calmo volta” e

aquilo para os padrinhos foi… eu vi na cara deles, estavam chocados com o que o pai

estava a dizer, estar a mandar o miúdo embora na hora de jantar, ele foi-se embora e nos

dissemos “calma já vais ver o que se passa”, entretanto servimos as bebidas, o pratinho

dele chegou, passados cinco minutos apareceu o Diogo parecia outro, bem-disposto, a rir,

sentou-se, comeu e não disse nada por causa das ervilhas terem estado… e os padrinhos

viram que o facto de ele ter ido lá dentro, estar aqueles 5 minutos lá dentro, sozinho a

fazer não sabemos o que mas lá esteve, e voltou outro. Portanto, nós já sabemos como

lidar com ele, e por muito, muito que possa parecer, estas atitudes de Diogo, acabou, vai

la dentro apanhar um pouco de ar, respira fundo e volta, funciona porque como costumo

dizer ele faz um re-put ao sistema dele e quando volta está tudo tranquilo. Mas pronto,

estes nossos amigos já perceberam que o Diogo de facto é diferente, que há coisas que

não podem fazer com ele. No verão, também com os padrinhos do Diogo foram com eles

para a praia, o Diogo estava na água e começou a dizer que estava com frio e o padrinho

disse “ok, então vai direito para cima”, e ele foi direitinho para cima passou por cima de

todas as toalhas. E ele ficou assim naquela e depois pensou “não posso dizer estas

coisas…!”

Psicóloga: É literalmente para cima…

Entrevistada: É! Direitinho é direitinho por cima de tudo o que estava pelo caminho. E

o Diogo foi. E ele depois “Diogo não podes” – “mas tu disseste para vir direitinho?” e ele

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“tá bem mas a volta das toalhas!” – “ahhh está bem!”. E pronto o Diogo é isto, é muito

literal.

Psicóloga: Então mas acha que é importante que os amigos estejam a par da situação e

que saibam lidar?

Entrevistada: Sim. Os amigos da casa. Aqueles amigos com quem nos precisamos

conviver…Também para perceberem algumas situações e porque é que apesar de nos não

tentarmos tratar o irmão de forma diferente dos outros irmãos, mas há situações em que

é impossível não tratarmos o Diogo de forma diferente, e porque é que fazemos isso,

porque é que fazemos algumas coisas e somos condescendentes com o Diogo em algumas

coisas e não somos com os irmãos, senão qualquer dia estão-me a dizer que tenho um

filho preferido. Mas não, tenho um filho que me dá um bocadinho mais de trabalho (risos).

Psicóloga: Ok, então e neste momento como tenta lidar com as dificuldades que vão

surgindo?

Entrevistada: Com a alimentação é um problema grande, o Diogo é muito difícil de

provar coisas diferentes, porque ele diz que não gosta e ele para provar alguma coisa tem

que provar por iniciativa dele. Posso dizer que uma coisa que ele come, e eu nunca pensei

que ele comesse é arroz de grelos, porque? Porque um dia eu estava a fazer arroz de grelos

para mim e para o pai e ele perguntou “o que é isso?” e eu “arroz de grelos” e ele percebeu

arroz de grilos e achou piada ao facto de eu estar a comer arroz de grilos. Então pediu-me

e disse “ah este arroz de grilos é bom” e eu “queres mais?” e o irmão “não é arroz de

grilos!!” e eu disse “amor, estavas a dizer que era o que?” e ele “arroz de grilos” e eu “não

filho, não são grilos são grelos” e ele “o que é que são grelos?” e eu “são essas coisas

verdes que ai estão ai dentro” se eu dissesse que eram legumes não comia. E ele “ah está

bem! Mas eu gosto.” E pronto ficou, ainda esta semana fizemos arroz de grelos e ele

comeu. Mas se eu lhe disser que estão ali grelos, ervilhas, feijão verde , seja o que for

leguminosa ele não come.

Psicóloga: Mas essa estratégia para a alimentação é deixar que seja ele a tomar a

iniciativa?

Entrevistada: Sim… sim.

Psicóloga: E para outros problemas que surjam ?

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Entrevistada: Sim, sim. É assim, o Diogo as vezes… por exemplo, o Diogo detesta

português e uns dias como por exemplo hoje traz trabalhos de português como por

exemplo fazer cópias, é uma coisa… hoje estivemos hora e meia para ele escrever seis

frases… e o pai descarta-se logo, porque ao fim de 5 minutos está passado, imaginemos

ao fim de uma hora… e estou ali, então vá qual é a palavra? Blá blá blá… e já sei que

tenho de negociar com ele, que é “ok tens 12 frases, então hoje fazes 6 e amanha fazemos

as outras 6 ” porque a primeira coisa que ele diz é “eu não gosto ” e “é muito grande, é

muito grande, é muito grande, é muito grande!” e não passa dali, mas eu “ta bem mas

olha então tapamos, estás a ver? Afinal é pequenino. Vamos fazer aos bocadinhos” e ele

“então ta bem”. Mas é capaz de passado um bocado voltar a dizer “mas tu já viste que

isto é mesmo grande?” e eu “ta bem mas hoje vais só fazer este bocadinho”, e ele “mas é

muito grande e ela (a professora) mandou isto tudo para eu fazer” e não sei o que e depois

eu não brinco e está ali a remoer, a remoer, a remoer, o tempo todo. E eu “Diogo o tempo

todo que estás com esta conversa toda já tinhas feito a copia” e ele “e tu estás sempre a

dizer-me isso! E tu estás sempre a dizer-me isso” e eu “oh filho mas é a verdade”, e que

horas são? E eu quero jogar wii e já não vou andar de skate e não sei o quê. “Então quanto

mais depressa acabares mais depressa vais andar de skate” e “e tu estás sempre a dizer-

me isso!”

Psicóloga: Como sente por ter de insistir nessas dificuldades?

Entrevistada: É da minha responsabilidade… É assim eu insisto nas coisas que ele tem

mesmo de fazer, não é? Não posso dizer “ah coitadinho, não queres fazer não faças”…

Não! Ele tem de aprender a escrever e eu sei que isto são lutas enormes que eu tenho e

que às vezes me levam à loucura mas eu sei que estou a fazer o meu papel como mãe. Eu

quando este diagnostico foi feito ao Diogo eu tenho possibilidade porque o meu trabalho,

pronto eu tenho isenção de horário, portanto comecei a entrar as 8horas da manha para

sair às 5horas, para ir buscar o Diogo mais cedo, estar mais tempo com ele, dar-lhe mais

atenção, estar com ele mais tempo naquelas coisas básicas do banho, porque antes

chegávamos as 8 e tal era banho, jantar, trabalhos de casa, tudo a correr! Agora continua

a ser banho, jantar, trabalhos de casa mas em vez de ser tudo numa hora é tudo em três

horas, o que quer dizer que eu fico muito mais cansada! Porque estou durante três horas

“Diogo vai tomar banho, vai tomar banho”…

Psicóloga: Portanto, a rotina em si alterou e o cansaço também após o diagnóstico…

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Entrevistada: Sim… até porque durmo menos (risos) durmo menos…porquê? Deito-me

à mesma hora mas levanto-me hora e meia mais cedo que aquilo que me levantava, deito-

me à mesma hora porque não me consigo deitar com as galinhas (risos).

Psicóloga: Então e em termos de futuro, calculo que seja uma coisa que lhe passe muito

pela cabeça, como será…

Entrevistada: O futuro do Diogo?

Psicóloga: Sim… Eu vejo o futuro do Diogo risonho, o Dr. Lobo Antunes da primeira vez

que esteve com ele disse-me que eu ele era como um avião que estava em trajecto daqui

por exemplo para a américa e que vai apanhar uma grande tempestade pelo caminho,

portanto ele vai ter um trajecto um bocado temultuoso, mas que nos cabe a nós garantir

que ele chega lá são e salvo. Pronto, eu sei que ele vai chegar lá são e salvo! Se eu chego

lá com a minha mentalidade toda intacta não sei, mas o meu objetivo neste momento é

tentar afasta-lo da tempestade. Portanto, e estou dedicada, não digo a 100% porque tenho

os meus outros filhos, marido e trabalho mas o meu objetivo de vida é o Diogo e

encaminhar o Diogo. Agora se me perguntam se o Diogo vai ser uma pessoa notável? Eu

quero garantir que lhe dou todas as ferramentas para ele ser uma pessoa calma, garantir

que tenha uma vida feliz, principalmente isso. Agora se vai ser medico, se vai ser

engenheiro, se vai ser pedreiro, não quero saber… quero é que ele seja feliz. De resto...

não…não me preocupo com isso.

Psicóloga: Um futuro risonho então…

Entrevistada: Sim, sim. Porque é assim ele é muito inteligente ele tem o raciocínio

matemático uma coisa brutal e se calhar vai seguir uma área mais ligada às matemáticas

Psicóloga: Ao concreto, têm muito jeito para isso…

Entrevistada: Sim, sim, têm por isso é que ele detesta o português (risos).

Psicóloga: É a sua guerra… (risos)

Entrevistada: É, é! Estou a ouvir coisas lá dentro espero que não esteja a fazer disparates,

mas pronto…

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Psicóloga: Estamos quase a acabar também, gostaria que partilhasse comigo quais sente

serem os maiores medos…

Entrevistada: Os maiores medos, é esta impulsividade que ele tem, que ele faça alguma

coisa que se magoe asserio ou que magoe outra pessoa, ou que como ele é muito distraído

ele passe uma estrada sem ver, que seja atropelado, sem ver, muito, muito medo que

aconteça alguma coisa, nesse sentido porque ele é distraído. E eu pensei que isto com a

idade ia acalmar mas não parece que ele está cada vez pior, e ele é capaz de… ainda esta

semana, ele tem treino, íamos a passar a estrada tive de lhe dar um puxam porque ele ia,

ia passar uma camionete e ele ia passar à estrada… e eu “Diogo!” e ele ficou a olhar para

mim do género “então mas…” “Diogo ia a passar uma camioneta onde é que tu ias?” e

ele “ah não vi! Não vi.” “Então mas filho tens de olhar para um lado, para o outro, ver se

vem se não vem.” E ele pronto“ ah estava distraído” e esse é o meu maior receio que ele

se magoe e que faça alguma coisa porque ele tem uma força muito, muito grande e quando

descompensa aquela dose de adrenalina… ainda na outra vez o irmão disse lhe uma coisa

que o enervou… ah já sei o irmão saiu-lhe no MacDonalds um boneco qualquer e um

boneco de menina ao Diogo, e quando chegamos a casa o André diz: “ai és uma menina”

, aquilo fez um clique no Diogo e o Diogo agarrou nele pelo pescoço de tal maneira que

lhe trancou a traqueia, o irmão deixou de respeitar, e eu não sabia se havia de chamar uma

ambulância para salvar o André, se havia de abanar o Diogo. Olhe foi assim uma cena

surreal, o pai não estava em casa…E ele quando percebeu aquilo que fez ao irmão entrou

em pânico, portanto o que me chamou a atenção nem foi o André, foi o Diogo quando viu

o que estava a fazer ao irmão…

Psicóloga: As chamadas crises que ele costuma ter…com as quais se sente muito mal.

Entrevistada: Exactamente, ficou completamente descompensado a gritar e só dizia

“Desculpa, desculpa, desculpa!”. Quando eu fui ao quarto o irmão estava todo roxo de

ele o ter estado a apertar, ele queria falar comigo e não conseguia, as lagrimas a caírem-

lhe pelos olhos a baixo… e o Diogo a gritar “Desculpa, desculpa, desculpa”. Portanto ele

tem uma força tão grande, quando ele tem estes ataques ele fica com uma força…enorme!

Que eu tenho medo que aquilo que aconteceu com o André aconteça com outra pessoa e

que seja pior e que ele magoe alguém a serio. Porque aquilo depois com o André passou,

apesar do irmão ter ficado com uns vergões no pescoço, mas se isto fosse com outra

criança na escola… Era logo chamada ao conselho diretivo!

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Psicóloga: Mas estão a trabalhar essas situações não é?

Entrevistada: Estamos, estamos, mas como não estou permanentemente com ele não é…

Psicóloga: Pois…

Entrevistada: Mesmo quando estou com ele descontrola quando não estou é mais difícil.

Psicóloga: Mas já tem visto uma evolução?

Entrevistada: Já, já controla-se muito melhor. Porque nós estamos todos a trabalhar,

incluindo os irmãos, tentar evitar as situações que fazem com que o irmão se descontrole.

Psicóloga: E em termos de apoio conjugal? Como tem sentido o suporte do seu marido?

Entrevistada: O suporte… no início quando foi feito o diagnóstico o pai teve um

bocadinho aquela atitude de ‘se eu não souber de nada é porque não existe’, enquanto eu

fui à Fnac ver tudo o que houvesse, queria ler tudo e dar lhe para ler. Ele dizia “há deixa

estar depois leio” portanto, ele nunca quis.. ele mesmo disse “o facto de eu agarrar num

livro para ler sobre o assunto é estar a assumir que tenho um filho com este problema”.

Mas pronto agora passados estes meses todos já lhe passou essa resistência…

Psicóloga: Têm enfrentado os dois diretamente o problema agora…

Entrevistada: Sim, e esta situação do Diogo tem servido para nos juntar muito a nós

como casal e como casal estamos agora como nunca estivemos nestes 15 anos em que

estamos casados.

Psicóloga: Fortaleceu-vos?

Entrevistada: Muito, muito mesmo. E estamos muito alinhados em termos de como é

que as coisas se fazem com o Diogo. Portanto se antes havia muitas situações com o

Diogo em que o pai dizia por dentro estás a fazer tudo mal, agora é muito raro porque

sabemos exatamente o que temos de fazer em diferentes tipos de situações e vice-versa,

portanto estamos muito alinhados na forma de como devemos lidar com o Diogo.

Psicóloga: Então se houver mais algum aspeto que queira realçar, alguma experiência…

Entrevistada: Acho que até já falei de mais! (risos) Eu disse logo que falava muito

(risos).

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Psicóloga: Ok, então a entrevista está terminada, depois, como lhe disse é para uma tese

de mestrado, se quiser assistir à tese tenho todo o gosto em que veja o resultado final.

Entrevistada: Ok, ok tudo bem!

Psicóloga: Obrigada!

Entrevistada: Obrigada!

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9.3.4. Caso IV Psicóloga: Olá Lara*, como está?

Entrevistada: Tudo bem obrigada.

Psicóloga: Como lhe tinha dito, esta é uma entrevista para perceber a experiencia de ter

um filho com Síndrome de Asperger, mas antes gostava que me desse algumas

Psicóloga: informações como a sua idade e profissão.

Entrevistada: A minha idade, 37 anos e sou professora.

Psicóloga: E o seu estado civil?

Entrevistada: Casada.

Psicóloga: Ok, obrigada e quanto ao seu filho que idade tem?

Entrevistada: 6 anos.

Psicóloga: E à quanto tempo foi feito o diagnostico?

Entrevistada: Ora… à cerca de 4 meses

Psicóloga: Ok, obrigada Lara. Então gostaria que me descreve-se o melhor possível como

se sentiu quando recebeu o diagnóstico do seu menino, ou seja à 4 meses.

Entrevistada: Na altura em que a médica falou em asperger não estava nada à espera,

nunca pensei que o meu filho pudesse estar num quadro de autismo, e na altura da

consulta estava sozinha, quis perceber o porquê de falar nisso, trazer o mais possível de

informação que pude. Na altura não tive nenhuma manifestação, digamos de

sentimentos de tristeza nem nada disso, reagi muito firme, muito bem. Mas de facto,

quando regressei, a caminho de casa, no carro, desabei com essa notícia, e mexeu muito

comigo. Senti que na consulta precisava de ouvir com atenção, mas quando sai aquilo

bateu mesmo, e pronto, há momentos em que as coisas estão mais difíceis mas bola

para a frente.

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Psicóloga: Hum, hum… e na altura em que estava no carro como se sentiu?

Entrevistada: Bem, nessa altura chorei, chorei muito, e tive uma mistura de tristeza com

desespero mesmo, porque o meu filho era autista e pouco conhecia sobre, sobretudo

os casos asperger desconhecia., não sabia que existiam, sabia dos casos mais graves de

autistas mas não conhecia esta vertente. E também lhe digo, que da consulta não vim

tão informada quanto isso, porque a medica tinha conhecimento de autismo mas não

especificou o espectro, fui eu que no dia a seguir contactei com a psicóloga e ela dizia

sempre que era asperger, era asperger e de facto, é o que é. Ela é atualmente quem

acompanha o Rodrigo. Aliás, ele teve uma psicóloga durante quase um ano e nunca,

nunca, nunca lhe detetou nada. Mas pronto, neste momento a psicóloga está a trabalhar

com ele as competências sociais e também as questões emocionais e de 15 em 15 dias

faz uma coisa ou outra. Faz também teatro musical, o que o ajuda também na

problemática ideia também da pediatra. Acho que ele neste momento está mesmo a

ser bem acompanhado por pessoas que o querem ajudar, até a professora dele, tem

sido fantástica.

Psicóloga: Sim, são de facto estratégias muito boas para desenvolver as competências

necessárias. Pode partilhar comigo como tem sido para si viver com o diagnóstico?

Entrevistada: Eu senti que o diagnóstico foi importante, quando a médica falou até ela

sentiu que era importante para mim, porque sabendo do diagnóstico eu poderia

entender muita coisa que até ai não entendia, por exemplo a questão da autonomia, eu

que sou muito persistente, ele não desenvolvia e eu tentava ao máximo desenvolve-la.

Quando ele entrou para escola, não conhecia a professora não é, não vinha do

agrupamento, e ela dizia que ele era um menino mimado e não tinha autonomia

nenhuma, mas não, ele precisa de atenção e tem é uma fala abebezada e a questão da

autonomia, que ela não soube lidar, não sabia da problemática. Questões como a do

lanche, o Rodrigo via o lanche e ficava a olhar para ele a perguntar “o que é que eu

faço?”, ele nunca tinha tido a experiencia de levar o lanche para a escola, era algo novo

e ele não sabia gerir, dai que a professora achasse que ele não tinha autonomia e que

queria que andássemos de volta dele a fazer tudo.

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Psicóloga: Compreendo, muitas vezes as características do síndrome são mal

interpretadas…

Entrevistada: Exatamente acho que era isso que estava a acontecer. O que interessa é

que esta professora tem sido de uma entrega total e é muito perspicaz. Ela sempre disse

que ele devia ter alguma coisa, sempre disse que não sabia o que era. Mas um dia ela

reuniu-se ao final do dia com a pediatra, psicóloga, e na altura a terapeuta da fala,

apesar de agora já não ter terapeuta da fala, era só aquela questão da fala abebezada

típica dos meninos com asperger, e que só falava assim em algumas situações e não

sempre. Então a pediatra conseguiu revelar á professora em que medida o meu filho se

enquadrava na problemática do autismo e professora apartir dai este mais atenta,

haaam, para essas questões e percebeu que ele de facto se enquadra.

Psicóloga: Sente então que esse apoio escolar é importante?

Entrevistada: Ah, sim! Super importante. Em termos de professora estou super, super

tranquila, sei que ela faz tudo o que deve ser feito ela ensina de uma maneira

extraordinária. Este ano já começou o teatro e ele teve uma evolução fantástica com a

ajuda da professora, porque antes ele não mostrava nenhum interesse por aquilo que

fazia, era muito demorado a fazer as atividades, muitas vezes ele chorava, e eu via isso

também em casa, quando era para fazer uma nova atividade e nós sabíamos que ele a

conseguia fazer, e ele chorava perante a nossa exigência e bloqueava de forma

exagerada e sofrida, dai que achássemos estranho o porque de ele agir assim, porque

nós não lhe estávamos a bater nem a fazer mal, só a pedir para fazer uma atividade, e

ele não parava de chorar, o choro era um choro normal agora a cara era uma cara

sofrida, para ele era muito grave.

Psicóloga: Compreendo, era um choro pouco ajustado à situação.

Entrevistada: Era! Exagerado. Hoje é o oposto, vem da escola muito feliz, entra no carro,

antigamente tentávamos puxar por ele para dizer algo, para saber quando havia festas

onde ia representar, o que tinha feito, nada. Ou sabia porque a educadora tinha

contacto diário conosco e questionava. Hoje não, hoje entra no carro todo contente, diz

o que fez, explica o que a professora ensinou, está motivado, diz que a professora ensina

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muito bem e aplica as estratégias que a professora ensina. Em casa já é mais relaxado,

parece desleixado mas é aquela característica dele, mas na escola de facto é onde ele

acho que está melhor. Ainda bem que optamos por o meter na escola, e não ficar para

trás, porque apesar dos sinais de imaturidade ele aprende muito bem… tem dificuldades

ao nível da coordenação motora, mas a nível da matemática, português e estudo do

meio aprende muito bem é considerado mesmo pela professora um dos melhores

alunos que tem na sala.

Psicóloga: Vejo que isso a alegra bastante.

Entrevistada: Imenso. A professora tem uma experiencia a ensinar e no ensino especial,

está atenta às dificuldades, ela não sabia o que ele tinha mas sabia detetar as

dificuldades, e sabe-lhe chegar, sabe antecipar o que vai fazer…

Psicóloga: Hum hum... e como a Lara se tem sentido após o diagnostico?

Entrevistada: Pois… isto tem sido quase que uma obsessão minha em perceber o

problema… quero ajudá-lo o mais possível então procuro toda a informação e mais

alguma e isso esgota-me. Porque quero fazer o mais que poder, e depois a questão das

estratégias não é? Uma pessoa todos os dias tem qualquer coisa para fazer com ele fora

de casa, quando estamos em casa também. Não podemos descansar nunca, temos de

estar ao pé dele, o trabalho dele tem de ser todo orientado, senão demora ainda mais

tempo. Se já está uma hora pior seria. No meio disto tudo o menino tem uma

característica que é… o tempo que tem livre ele não brinca, ele não sabe brincar, ou

melhor, ele brinca mas não como gostávamos que brincasse. O que ele mais gosta é ver

televisão, ver filmes da Disney, gosta de ver filmes de menina, com princesas, Cinderela,

Frozen, coisas assim, nada de super-heróis, carros… nunca gostou de ver nada, os outros

vê e revê. E livros... gosta muito de livros, sobre animais, corpo humano, do espaço, são

estes temas que ele mais gosta também na sala de aula. Portanto o interesse dele é este,

quando tem tempo livre se nós não proporcionarmos uma tarefa orientada, porque se

não orientar mos ele não faz, e nem procura fazer nada, fica de volta do tablet e

televisão e livros… isso controlamos mas gostávamos que ele fizesse mais coisas, jogasse

a bola, fizesse legos, puzzles… essas coisas que os outros meninos fazem não é? Faz

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bem… e quando queremos que faça estas atividades de brincar temos de ser nós a

proporcionar esses momentos mas lá está requer que estejamos presentes… dizer

“Pronto, agora vamos fazer um puzzle” e ele faz… ele faz puzzles de 100 peças na idade

dele está muito bem, faz mas quer a ajuda, ele é capaz de fazer sozinho mas prefere que

estejamos lá perto dele. Dai que em relação a pergunta que me colocou, para nós é

muito cansativo! E não é filho único, temos uma filha mais nova, mas é uma grande

ajuda, autónoma e ajuda temos muito tempo para ele. Mas nós não temos nenhum…

para nós é aquele bocadinho depois de o deitar e deixa nos exaustos… Eu temo que

esteja a falar demais…

Psicóloga: Não, Lara, de todo este espaço é destinado a isso mesmo, para que partilhe

comigo a sua experiencia e sentimentos não se preocupe com isso por favor.

Entrevistada: É? Pronto… ok.

Psicóloga: Claro Lara… Imagino que para si seja realmente cansativo nessas condições…

Entrevistada: É mesmo muito..

Psicóloga: O que representa para si ter um filho com este síndrome?

Entrevistada: Deu-me a entender muitas coisas, como a minha exigência… eu exijo

muito também da minha outra filha, mas sei que exijo mais do meu filho porque ele

precisa que puxe por ele. A minha irmã chega a dizer que sou demasiado exigente com

ele, aliás de ser exigente e muito mais... A exigência deles não muda, mas tem de ser

adaptada, ora tenho de ter mais paciência, não castigo tantas vezes, embora continue a

fazer, mas penso o que está por traz daquilo, ou seja nunca deixo de exigir o que acho

que tenho de exigir de um filho, tenho de lhe desenvolver várias competências, embora

saiba que não posso desenvolver todas elas, mas tento ao máximo. Enquanto eu não

sabia o diagnostico dele era mesmo muito exigente, ate a professora perguntava “A Lara

não acha que está a exigir de mais?” mas acho que estou no caminho certo, a psicóloga

diz que sim, a pediatra diz que sim… eu continuo a ser assim. Ele já mostrou que se eu

insistir ele demora muito mas corresponde, por exemplo ao vestir, ele veste-se, sabe-se

vestir, tem preguiça, é muito demorado a fazer as tarefas, mas faz… ele aperta os botões,

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veste-se, a única coisa que não faz é atar os cordões. Já para comer ele come de tudo

porque eu obriguei-o a comer sempre de tudo. Isto essencialmente porque meto tudo

no prato, não posso partir da ideia que não gosta, e espero da reação dele, se provocar

vomito ele não gosta… mas mesmo nessas situações ele voltava a meter no prato. Tipo

lulas… ele não comia a imenso tempo e pensei que me ia mandar uma volta, agora que

estamos numa fase diferente ele tem o direito de não gostar de certas coisas, não gosta

de queijo e camarão , tem direito como nós a não gostar, mas há coisas que ainda não

estão definidas se gosta ou não e eu continuo a colocar no prato, porque uns dias diz

que gosta outros que não gosta, e eu continuo a meter no prato até ver se gosta ou

não… Mas não é só nisso que falo, é também das sequências, comia batata, depois arroz,

depois carne… demorava mais tempo, não misturava, e eu obriguei-o a misturar, claro

que as vezes faz um pouco sequencia mas lá vai misturando. No início quando disse para

misturar as coisas do prato ele comia um pouco de batata depois um pouco de carne e

olhava para mim, do género “o que é que eu como a seguir?”, “Olha Rodrigo comes

outra coisa que não tenhas comido agora!” mas é um sinal…Ainda hoje foi arroz com

feijão e ele come! Outra coisa é isto das comidas misturadas, arroz com qualquer coisa,

tipo arroz de frango, come uma coisa depois outra… mas pronto vai comendo um pouco

de cada de cada vez… porque eu contrario aquilo que tem na cabeça. Por isso digo que

vale a pena batalharmos porque há muitas coisas que mudam, muitas coisas que já

foram conquistadas e nem me lembro, porque de facto ele é capaz, no entanto também

entendo que hajam outros meninos que não o consigam, não sejam capazes, casos mais

complicados… mas ele é portanto vou puxando por ele nesse sentido em tudo é uma

das minhas estratégias para conseguir que ele consiga, insistir, enquanto ver resultados

é assim. E estou sempre atenta a tudo, alguma coisa nova, tento sempre dar a volta…

ainda no outro dia vinha a dar aquela musica dos D.A.M.A. que dizia –vamos alcançar as

nuvens- e ele disse: “Mamã, alcançar as nuvens?” e eu agarrei logo nisso e perguntei o

que entendia por isso, questionei-o e tentei por uma ideia simples para explicar outras

coisas, para explorar…

Psicóloga: Claro, a comunicação nos aspies é entendida de forma literal é importante

descodifica-la quando há sentidos ambivalentes…

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Entrevistada: Isso… e daí que o saber o problema e conhecer o que envolve é muito bom

para nós, porque se formos espevitadas vamos entendendo o que surge. Porque apesar

das terapias, tudo o que for aprendido no momento mais vale… ah, e até porque ele é

muito curioso, e questiona-nos e temos de aproveitar quando questiona, tem memoria

fantástica… por aí.

Psicóloga: Então qual entende ser o seu papel como mãe?

Entrevistada: Mostrar-lhe que não está sozinho, que o amo muito… Apoiar, porque além

de saber as informações todas, ter a teoria nada serve se não passar a pratica e isso é

que é o mais difícil, embora até ache que me esteja a safar bem, não me sinto perdida

como alguns pais se sentem lá no grupo aspies. Tento dedicar o meu tempo todo,

trabalhar as coisas que estão em deficit…

Psicóloga: Trabalhar no sentido de ultrapassar as dificuldades…

Entrevistada: Claro, porque há pais que negam-nas e eu aceito-o mas também não me

sento a sombra da bananeira nem ter pena do meu filho, sinto sim tristeza por situações

que vivenciou e possa vivenciar e o deixe menos feliz. Mas não é pena, sei que não

deverá ter o problema muito avançado, não vejo isso, vejo que as características são

leves, a psicóloga e pediatra também, dentro dos aspies é de forma leve. Elas já

referiram que nós temos sido pais fantásticos, dizem que é graças a nós que ele é como

é. E nós dizemos que também é muito graças a elas! Mas elas dizem que se não

tivéssemos atuado desta forma, secalhar ele tinha mais dificuldades, tinha as

características mais acentuadas porque não somos muito permissivos, hora para comer

é para comer, hora para vestir, estamos lá mas é ele que veste, no trabalho de casa a

mesma coisa, incutir nele as coisas, com ajuda mas orienta-lo para ele ser independente.

Acho que parte das duas partes…

Psicóloga: Sente que é um trabalho conjunto?

Entrevistada: Exactamente, um trabalho entre todos mesmo…

Psicóloga: E como sente o suporte a nível do seu conjugue?

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Entrevistada: Ele no inicio questionava-se se eram diagnostico certo, mas quando viu

que sim apoia-me em tudo, com o menino ajuda onde pode, é um pouco mais

permissivo, mas nas questões de educar tenta ser exigente. Claro que eu é que domino

nesta questão, em todas as casas há alguém que domine, normalmente a mãe.

Enquanto eu fizer as coisas ele deixa-se levar, se for para fazer ele faz, mas sou eu que

lhe passo a informação, acompanho o menino as consultas, disse que era importante ir

a psicóloga e ele foi, agora em Abril também vou ao Dr. Lobo Antunes e gostava que ele

fosse e ele vai, pronto há determinadas situações onde faço questão que ele esteja e ele

está lá e apoia e acompanha, mas de um modo geral é a mãe que tá ali.

Psicóloga: E relativamente aos seus familiares?

Entrevistada: Hum… não sinto muito apoio… sinceramente… é aquela questão, o menino

é um menino que engana bem… se não fossemos nós, quer dizer mais eu, não o pai, não

teria nada, ele não parece ter nada, porque para o pai por ele está sempre tudo bem

não é nada, eu é que percebia que algo não estava bem e queria procurar saber, e ele

sempre disse ok então vai. E portanto, lá está… ele passa bem como um menino que não

tem nada, quem olha para ele não vê nada, depois há varias opiniões… os avós secalhar

até acreditam no diagnostico, quer dizer não é acreditar… até dizem que pode estar

certo mas sempre que é exagero… tenho essa noção, porque as pessoas dizem que

passa, que é pequenino e passa, vou ouvindo muitas vezes…

Psicóloga: Hum, hum …

Entrevistada: Por exemplo os tios , da parte do meu marido há uns que aceitam bem, ok

tem problema estão a tratar, quer dizer há um diagnostico não questionam a veracidade

do diagnostico está a ver?

Psicóloga: Sim, sim…

Entrevistada: Há outras pessoas que também não questionam, mas continuam a afirmar

que parece um menino normal se não tivéssemos dito nada…

Psicóloga: Compreendo, este síndrome até é apelidado de síndrome invisível por essa

mesma questão de não ser algo visto a olho nu.

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Entrevistada: Engraçado… nem sabia mas sim faz sentido, porque todos o dizem e de

facto só estando com ele mais tempo se vê. Por exemplo ele é muito imprevisível e em

algumas situações pergunto se não reparam e eles dizem que não , não reparam… oh

bolas… eu acho que é evidente, ele é um menino chato a brincar, o problema da

socialização, o problema que mais me preocupa, porque é com isso que vai ter de viver

para o resto da vida, é a mais evidente nele e a que mais me preocupa. Há um

afastamento dos colegas, não por parte deles mas porque acho que ele não tem

interesse mesmo por brincar, está mais com as meninas sobretudo as da mesma idade,

mas elas também se saturam de brincar com ele. Há uma situação muito gira, umas duas

meninas mais velhas que gostam muito dele e costumam estar no recreio juntos, e já li

que é costume eles lidarem com amigos mais velhos. Mas para voltar a questão inicial,

a minha irmã que é psicóloga quando eu disse que o menino era asperger ela disse que

eu era doida… ela chegou me a mandar uma mensagem no facebook bastante violenta,

que era eu que estava a criar problemas e isso foi muito complicado para mim, ainda

agora não temos uma relação boa por causa dessa situação, e continua a dizer que o

menino é mimado, atribuía o ele não ser desenrascado a ter sido superprotegido por

mim, e falei disso a psicóloga, e falou-me que não… eu era uma mãe muito dedicada

apenas isso, mas deixava ele fazer as coisas, por isso me custa aceitar o que me disse.

Psicóloga: Imagino que para si seja complicado não ter apoio por parte da sua irmã neste

assunto sendo ela profissional na área.

Entrevistada: Muito… ela trata-me como se fosse maluca mesmo.

Psicóloga: E no que toca aos seus amigos, como tem sido para si?

Entrevistada: Amigos… esses sim, lá está… tenho amigos que o conhecem e os que não

conhecem, e todos eles acreditam no diagnostico dele, engraçado… com eles há espaço

para isso, algo que nunca tinha pensado bem, tenho mais espaço para falar disso com

eles que com a minha própria irmã…

Psicóloga: Sente que a apoiam mais a esse nível…

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Entrevistada: Sim, porque eu sou uma pessoa que como já viu preciso muito de falar… e

nesse nível ajuda muito, estou a vontade com eles, porque como falava demasiado com

a família da minha preocupação começaram a achar que era obcecada.

Psicóloga: Como é para si sentir isso dos seus familiares?

Entrevistada: Para mim é algo muito mau, faz-me sentir incompreendida como se

defendesse algo absurdo mesmo fundamentado pelos psicólogos, pediatras,

professoras…

Psicóloga: Compreendo… E quanto ao futuro do seu filho, quais as suas expectativas?

Entrevistada: Podia não imaginar nada já, mas imagino, eu ouvi da pediatra quando me

falou das questões do meu filho “claro que o seu filho nunca vai estar a frente de um

balcão” mas o nunca não me entrou! …“nunca vai estar a comunicar com alguém em

termos futuros de um emprego” e eu não gostei… na altura falou mas acho que nunca

podemos dizer nunca… ele vai ser o que quiser, o que der certo, pode ou não fazer isso,

é uma coisa em aberto, não quer dizer que vá fazer uma coisa que vá contrariar as

características da síndrome, mas irá com certeza fazer algo que o faça feliz e goste. E lá

está tenho esperança que como a pediatra diga muita coisa se possa trabalhar, e muito

coisa já correu bem, na escola, na atitude em tudo o que faz. Em casa temos de trabalhar

muito e estar ligados a professora e psicóloga mas em tudo o que faz, cumpre, e acima

de tudo, vem satisfeito. Hoje ele vai a uma festa, sabe o que tem de fazer, tem vontade

e está a evoluir com tudo isso. Este ano por exemplo, porque os interesses vao variando,

ele está obsecado pelo corpo humano, e os livros que tem não lhe chegam, faz questões

muito interessado, pede mais livros… e eu não sei se não terá futuro até numa área

dessas, com um curso superior no lado da ciência, mas até pode não acontecer nada

disso… ele tem capacidades, estuda bem, vamos ver… uma coisa ou outra será sempre

bom. Mas convém que eu o faça gostar também das coisas que os outros meninos gostam!

Psicóloga: Entende que será um livro em aberto…

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9.4. Quadros de Analise IPA 9.4.1. Caso I

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104

Comentários Texto Original Unidades de

Significado

Psicológico

Ter um filho com o

síndrome teve

implicações em

termos familiares,

deixando de ter um

segundo filho dada

a energia para que é

precisa para este

filho.

Psicóloga: E tem mais algum filho?

Entrevistada: Não, não só o Ricardo, até porque

concentramos todas as nossas energia nele dado

o problema. Optamos por não ter mais filhos.

Decisão de não ter

mais filhos

Sentimentos de

desamparo e medo,

não sabendo a

quem recorrer por

desconhecer

totalmente o

problema.

Psicóloga: Ok Filipa, gostaria que partilhasse

comigo como se sentiu apos o diagnóstico do seu

filho

Entrevistada: Na altura senti me um pouco

perdida e surpresa porque desconhecia de todo a

existência deste síndrome, ficamos assustados

com o síndrome mas também em como ajuda-lo,

que profissionais consultar, o que fazer,

entretanto é mais tranquilo. Agora já percebo de

onde veem as características dele, coisa que não

entendia.

Desorientação e

medo.

Surpresa

Esclarecimento das

características

Sentido cansaço,

grande

investimento por

parte de toda a

família.

Sentida superação

das dificuldades e

maior tranquilidade

com o passar do

tempo.

De notar

acompanhamento

por psicólogo e

psiquiatra no centro

a que recorre.

Psicóloga: Como é para si viver com este

diagnóstico?

Entrevistada: Neste momento é cansativo…é

muito envolvimento de todos. Os sintomas são

muito pouco visíveis, mas conseguimos dar a

volta às questões que dificultavam mais a vida

dele e agora estamos a viver com mais

tranquilidade que no inicio.

Psicóloga: Ele tem tido algum tipo de

acompanhamento?

Entrevistada: Sim, desde os 6 anos de idade que

é acompanhado por uma psicóloga, agora é

acompanhado por um psicólogo do CADI, duas

vezes por semana mesmo especializado na

síndrome de asperger, sempre foi também

acompanhado por um psiquiatra do CADI.

Cansaço, grande

envolvimento.

Acompanhamento

leva a mais

tranquilidade.

Acompanhamento

recorrente no CADIN.

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105

Mais difícil na

altura em que os

problemas escolares

começaram, que

aquando do

diagnostico, altura

complicada na vida

dela e do filho.

Agora está bem

apoiada

Apoio

escolar leva a

integração no

colégio e

sentimentos de

normalidade

Psicóloga: E como tem sido para si lidar com

todo esse processo, quer em termos psicológicos

quer físicos

Entrevistada: No início, nem tanto na altura de

descobrir o diagnostico, mais quando começou a

ter problemas grandes na escola, quando os

meninos não brincavam com ele, isso

psicologicamente afectou-me bastante. Foi uma

altura muito má nas nossas vidas na minha e da

dele, e fui-me muito a baixo. Mas agora na altura

no colégio tive muito apoio da professora e

mesmo a nível das auxiliares do colégio e tudo…

nunca mais foi incomodado pelos colegas, pelo

contrário conseguiu-se integrar muito bem na

turma. Apartir daí as coisas foram ficando na

faixa da normalidade.

Psicóloga: Sente que o suporte escolar é

importante?

Entrevistada: Sim, muito importante. Encontrar

um sitio na escola que lhe de o apoio que ele

precise, muito importante mesmo.

Inicio difícil de

ultrapassar VS agora

sentimento de apoio.

Apoio e integração –

sentido de

normalização

A nível escolar

procura de suporte

quando sente

dificuldades, a

outros níveis

procura de meios

para o filho

ultrapassar o

problema.

Considera que a

ajuda é crucial e

previne muitas

consequências

Dar suporte, dar

apoio emocional.

Necessidade de ter

uma atitude

paciente para

Psicóloga: Compreendo... quer partilhar comigo

quais as estratégias que costuma utilizar nos

momentos mais complicados?

Entrevistada: Depende muito da situação... Se o

problema derivar da escola é falar com a

professora e ver o que podemos fazer para

ultrapassar a situação. A nível de outras coisas

que não estão relacionadas com a escola é tentar

arranjar um suporte para ele dar a volta a

situação. Porque eles precisam mesmo de ajuda,

senão as consequências podem ser muito más.

Psicóloga: Claro… e para si qual é o seu papel?

Entrevistada: É mesmo ajuda-lo e procurar esse

suporte, essa ajuda que ele precisar. Além de

todo o papel de mãe, que é dar carinho e estar

presente. Além disto é uma responsabilidade

acrescida de ser paciente para o ajudar a

Procura de suporte

escolar

coping ativo

(favorecer-lhe

suporte)

Suporte é crucial para

o desenvolvimento

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106

ajudar nas

dificuldades.

Sente que não há

cura mas há

possibilidade de o

ajudar a lidar com

o síndrome.

ultrapassar as situações. Ultrapassar não no

sentido de ter cura, mas no sentido de aprender a

lidar com isto e dar a volta por cima.

Favorecer o suporte.

Dar apoio emocional.

Manter uma atitude

paciente para

favorecer o

desenvolvimento.

Pai mais presente

em casa, ajudando

nas tarefas

domesticas, e apoio

após o horário

laboral. Por sua vez

a mãe tende a

acompanhar em

consultas e

deslocamentos

Ela tende a

acompanhar o

Ricardo para que o

marido não falte ao

trabalho. Há

suporte contudo

sente que ela

própria tem mais

paciência nas

tarefas do filho.

Os familiares

entenderam

bastante bem,

destacam-se avós

que são a grande

fonte de apoio desde

sempre, estão

próximos.

Os pais não

procuram muito

Psicóloga: E como tem sido para si o suporte por

parte do seu marido, quanto a si?

Entrevistada: O meu marido apoia-me em tudo

que é necessário, embora a nível de apoio do

Ricardo eu tenha-o dado mais a nível de

consultas e tudo mais, mas acaba por me dar

também apoio a mim e cá em casa, nas tarefas

domésticas e com ele, para que seja possível eu

acompanha-lo.

Psicóloga: Diz-me que em termos de consultas e

outros deslocamentos tende a ser mais quem o

acompanha, enquanto que o seu marido está

presente mais em casa dando ai suporto correto?

Entrevistada: Sim! Ele trabalha também, não

podemos ser os dois a deixar de o fazer para ir

com ele, então tendo a ser eu a acompanhar o

Ricardo. Ele em casa puxa por ele nas tarefas que

trás da escola também, mas não há nada como a

paciência da mãe.

Psicóloga: Compreendo, exige muita

persistência...

Entrevistada: Exacto, e com o cansaço as vezes

torna-se difícil.

Psicóloga: E quanto aos familiares, como

entenderam este diagnóstico?

Entrevistada: Muito bem, principalmente por

parte dos avós que sempre ajudaram com o que

fosse, e isso é importante, porque estão muito

próximos e é uma grande fonte de apoio.

Psicóloga: No grupo de amigos sentiu o mesmo

apoio?

Entrevistada: Nós falamos sem problema

nenhum sobre o assunto se ele se proporcionar,

mas não é algo que falemos muito, nem todos

Apoio na lida de casa.

Apoio nas tarefas do

filho em casa.

Apoio presencial em

consultas

Mãe mais paciente,

pai menos paciente

nas tarefas.

Aceitação.

Grande fonte de apoio

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107

apoio no seu grupo

de pares, o assunto

não é tabu, mas só

sabem os mais

próximos, e não é

algo de que falem

recorrentemente.

A procura de apoio

baseia-se mais na

família.

sabem só mesmo os mais próximos. Esses

compreendem mas a nível de apoio não nos

apoiamos tanto neles mas sim mais nos

familiares.

Psicóloga: Quem estão mais presentes...

Exactamente e quem nos podem ajudar mais.

Não é tabu, mas nem

todos sabem.

Maior apoio na

família que nos

amigos.

A mãe acredita que

o filho terá

condições para ser o

que quiser lutando

pelo que quer, dado

que já passou

muitas dificuldades.

Acredita que o

síndrome deixará o

seu filho mais

preparado no

futuro.

Considera que o

filho possa ser após

este

acompanhamento

mais maduro que

outras crianças que

não passaram por

esta situação e

aprendizagens que

teve.

Os medos decaiam

mais sobre a fase

inicial quando não

sabiam se

conseguiriam

tornar o filho

independente.

Neste momento tem

receios semelhantes

aos de outros pais,

como encontrar um

Psicóloga: Compreendo... Quer partilhar comigo

o que pensa a respeito do futuro do seu filho?

Entrevistada: Eu acho que ele vai conseguir ser

tudo o que quiser... Com muita luta e amor.

Porque quem já passou o que ele passou como as

dificuldades a nível da escola... ele é um lutador.

Acho que em termos de futuro este síndrome até

o fez ficar mais preparado para as adversidades

que possa encontrar na vida adulta.

Psicóloga: hum hum...

Entrevistada: Porque talvez tenha mais

maturidade para lidar com os problemas, muitas

crianças com a idade dele não passaram por

muita coisa e frustrações que ele passou, talvez

isso o ajude muito no futuro.

Psicóloga: Faz me todo o sentido o que me diz.

E a nível de receios ?

Entrevistada: Inicialmente o meu receio era que

não conseguisse dar a volta por cima, não

conseguisse ser independente, ter uma

profissão... mas neste momento vejo que não há

que ter esse medo. Ele agora quer ir para a

faculdade, pronto... Quer lutar pelo futuro dele.

Portanto os meus receios agora são semelhantes

aos receios dos pais com filhos sem o síndrome

de asperger... que acabe o curso e não encontre

emprego ou que haja alguma má companhia que

o desvie. enfim acaba por ser preocupações

semelhantes às que os outros pais têm. Antes de

ter o apoio certo tinha receios bastante piores

como o receio de ele não ter um único amigo...

Condições para ter

um futuro promissor

Significado positivo-

Boa preparação para a

vida adulta.

Maior maturidade

para lidar com os

problemas.

Inicialmente:

Não conseguir

adquirir a

independência

Agora:

Semelhantes aos de

pais com filhos sem o

síndrome.

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108

emprego depois do

curso

Receios semelhantes

aos de outros pais.

Receava

inicialmente que o

filho não tivesse

amigos, mas dado o

seu trabalho em

acompanhamento,

esse deixou de ser

um medo, sendo

que o seu filho

adquiriu

competências

estruturando um

grupo de pares.

Psicóloga: Hum, hum... então sente que esses

receios diminuíram consoante o

desenvolvimento que o Ricardo adquiriu pelo

apoio que lhe tem sido prestado a variados

níveis?

Entrevistada: Sim, claro... ele não estaria tão

adaptado se não assim fosse. A nível de amigos

notou-se grandes desenvolvimentos, aliás ele

agora não tem um bom grupo de amigos, tem

vários grupos de amigos.

Antes – não ter vida

social, um grupo de

pares.

Valorização dos

acompanhamentos do

filho como

promotores das

competências sociais

– tranquilização

A entrevistada

salientou a pouca

informação dada

sobre o assunto no

inicio, facto que

assusta os pais.

Essa falta de

informação tem

consequências como

não saber como

trabalhar as

competências

sociais

Apenas o

acompanhamento

certo leva a que

hajam

desenvolvimentos a

este nível.

Psicóloga: Isso são notórios desenvolvimentos...

não sei se tem mais alguma experiencia que

queira partilhar comigo...

Entrevistada: É assim eu acho que o que me falta

mesmo salientar é o facto de, ok que agora já há

mais informação, mas no inicio mesmo assim os

pais ficam um pouco perdidos sem saber o que

fazer e a quem recorrer e isso é um bocado

assustador, falo por mim. E depois é as

consequências que isso pode ter nestas crianças

em termos sociais mesmo antes de serem

acompanhados, como a exclusão na escola... O

Ricardo chegou a acontecer não ter um único

amigo na escola, não ser convidado para as festas

de aniversário, todos os dias lhe baterem nos

recreios, isso é horrível, isso é que é assustador.

Mas apartir do momento em que conseguimos

encontrar a ajuda certa, alguém que colabore

com eles para dar a volta disso, e as coisas

funcionarem... ai já tudo.. é engraçado porque à

medida que se resolve o aspeto socialização, as

dificuldades escolares que possam existir parece

que se dissipam... estando bem socialmente dão

a volta ao resto... Pelo menos com o Ricardo foi

assim, apartir do momento em que fez amigos

deu a volta ao resto , as notas dispararam.

Susto

Falta de informação

-

Exclusão (não

desenvolvimento de

competências sociais)

Acompanhamento

como factor de

desenvolvimento de

competências

Sobrevalorização das

competências sociais,

promotoras de

desenvolvimento

escolar

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109

Socialização parece

ser encarada como

um nível

importante para

haver

desenvolvimento a

nível escolar

Mesmo assim tenho receio que não as consiga

manter pelas suas características ou não consiga

fazer novas amizades no futuro porque ele é um

menino de hábitos lá está….

Receio de

dificuldades a nível

interpessoal no futuro

Muito tempo

dedicado a terapias.

Variados tipos de

sessões, individuais

e com outros

meninos com a

mesma

problemática.

Condição para o

filho ingressar no

colégio foi o ter

acompanhamento

adequado

Na antiga escola do

seu filho a

professora não

investia no seu filho

nem promovia a sua

integração, havendo

sido feito bulling

sem intervir nessa

situação

Condição

primordial para

ingressar no colégio

foi a de ter um bom

acompanhamento,

caso contrário não

colocaria o filho no

colégio.

Psicóloga: Compreendo, penso que está a querer

transmitir que tudo é possível trabalhando a

questão socialização, sendo a dificuldade maior.

Entrevistada: Exacto, foram muito importantes

as terapias, ele tinha 2 horas no CADIN mais

uma ou duas horas, já não me lembro bem, com

a psicóloga que faz o acompanhamento

educacional. Portanto estava muito tempo em

terapia. No CADIN tinha sessões sozinho,

sessões com outros meninos com asperger, foi...

teve muito tempo em terapia. A psicóloga do

CADIN foi impecável, a outra também. Foi uma

das minhas preocupações encontrar um colégio

onde de facto mantivesse o acompanhamento,

porque não queria passar por aquilo que ele já

tinha passado no outro colégio onde esteve.

Psicóloga: Não tinha suporte no outro colégio?

Entrevistada: Não... a professora que lá estava

recusava-se a colaborar com a psicóloga, não

seguia nada do que ela dizia, não fazia nada do

que pedia, dizia que não tinha tempo. Depois no

recreio os meninos batiam-lhe, algo que também

me perturbou muito, e ela não fazia nada. Por

isso quando escolhi um novo colégio, meti como

condição ele vir a ter um bom acompanhamento

caso contrário não o iria inscrever. Este colégio

também me foi aconselhado por uma psicóloga

que me disse que à partida eles teriam

disponibilidade para colaborar nessas situações.

E assim foi... ele foi colocado numa turma da

primaria do 4º ano, em que a professora

colaborou com tudo com a psicóloga, tinha

reuniões com ele, vigiava-o no recreio.

Conseguiu a aceitação dos outros meninos da

Acompanhamento

com várias sessões e

de vários tipos

(individuais e em

grupo)

Antes- Intervenção

nula em situação de

bullying.

Valorização de um

colégio adequado as

suas necessidades

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110

9.4.2. Caso II

Psicóloga

recomendou este

colégio.

Professora do novo

colégio diferenciou-

se da antiga.

Colaborando com a

psicóloga e estando

atenta.

Professora promove

as competências de

destaque de forma a

sentir-se valorizado.

Valoriza a

importância da

psicóloga e do apoio

na escola porque

ambos permitem

ultrapassar as

dificuldades de

interação social

através das

estratégias

partilhadas.

Os comportamentos

desajustados eram

causa do bullying e

sendo trabalhados

no CADIN a

situação melhorou.

Volta a afirmar que

apena é precisa

paciência

sala, e o certo é que funcionou! Ele ficou mais

maduro. A nível oral é muito bom, o pior é na

escrita, e colocou-o a fazer apresentações nas

aulas para impressionar os colegas e valoriza-lo

e o certo é que funcionou, apartir dai as coisas

começaram a correr muito melhor. Por isso é que

eu acho que é tao importante o apoio psicológico

e na escola. Porque um menino que tem

dificuldades de socialização tem mais

dificuldades em interagir e tem de ser ajudado ao

máximo para o conseguir fazer, porque com

pequenos gestos é possível dar ali uma ajuda

importantíssima. Claro que a ajuda no CADIN

foi importante... Haviam coisas simples que não

conseguíamos mudar, por exemplo o

cumprimento do Ricardo era um encontrão no

ombro dos outros, não dizia bom dia... É claro

que isso levava a que as crianças lhe batessem e

isso teve de ser trabalhado com ele. Não foi num

ano nem em dois mas resultou, basta ter

paciência. E sobretudo, o mais importante… dar-

lhe todo o amor para que seja a base para ele se

desenvolver, sem isso. Ele precisa de se sentir

amado, sinto isso… com isso e tempo tudo se

consegue.

Psicóloga: Claro é um trabalho que é

desenvolvido e a seu tempo, no tempo certo, dará

os seus frutos e é verdadeiramente isso que

importa.

Entrevistada: Sem dúvida...

Suporte escolar:

Antes- Fraco suporte

Vs agora- Bom

suporte.

Suporte a nível da

psicóloga- orientadora

Colaboração e

vigiamento por parte

da professora

Promotora de

integração

Valorização do

CADIN

Sentimentos:

Paciência

Valorização do

Suporte escolar

Melhoramento dos

comportamentos

Coping emocional

Expectativas de

sucesso

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111

9.4.3. Caso III

Comentários Texto Original Unidades de

Significado

Psicológico

Durante o

desemprego

Madalena sente

que a melhor opção

será ficar

doméstica de forma

a acompanhar as

necessidades do

filho.

Quando

questionada sobre

o estado civil

revela problemas

conjugais e

possível divorcio já

falado entre ambos.

Sempre foram

sentidas algumas

dúvidas quanto à

relação contudo o

diagnóstico

aumentou essas

duvidas.

Sente que passou

por uma crise

stressante, também

a nível financeiro.

Inúmeras

discussões

inclusive sobre as

dificuldades do

filho.

Psicóloga: Profissão?

Entrevistada: Estive no desemprego desde

que o meu filho teve o diagnóstico e desde

ai por opção sou doméstica, para conseguir

ter maior margem de manobra para

acompanhar o Filipe.

Psicóloga: compreendo…E estado civil?

Entrevistada: Casada…

Psicóloga: Reparei que o disse com alguma

insegurança…

Entrevistada: Sim, estamos numa fase

complicada, falamos em divórcio… não sei.

Psicóloga: E vejo que para si é algo difícil

de falar…

Entrevistada: É… Sabe desde que o Filipe

teve o diagnostico, tudo piorou, já

estávamos a algum tempo com duvidas,

mas desde aí os tempos foram muito

stressantes, são exigidos muitos recursos

financeiros, entramos em discórdia…

Psicóloga: Entram em discórdia…

Entrevistada: Sim, qualquer coisa é razão

para se discutir, até as dificuldades do Filipe

são motivo. Diz que eu o mimo muito e que

assim não vai evoluir porque lhe faço as

vontades todas.

Psicóloga: E o que você acha sobre isso?

Abandono da profissão

Problemas conjugais

Impacto diagnostico:

Stress

Necessidade de

maior gestão de

recursos

financeiros

Discussões

conjugais a nível

das dificuldades

do filho

Despoletamento de

sentimentos de proteção

Comentários Texto Original Unidades de

Significado

Psicológico

Tendência a relatar detalhadamente as questões relacionadas com o filho e não com o impacto na sua própria vivencia. Retrocesso por problemas conjugais (não se refere a um problema do filho nos pais) União conjugal em prol do problema do filho Pré-diagnóstico, descrença que fosse um problema

: Como lhe tinha dito, a entrevista é sobre a

experiência de ter um filho com Síndrome de

Asperger, e eu gostava que me falasse um pouco

de como é a sua experiencia de viver com um

filho com este síndrome.

E: É assim, o Diogo é o terceiro de três filhos, e

desde pequenino, portanto vou contar um pouco

do enquadramento da história do

enquadramento do Diogo, desde pequenino que

eu senti que o Diogo era diferente dos irmãos.

(…)

E fui, apesar de estar sempre desperta para o

facto do Diogo ser diferente, nunca... Nunca

achei que tivesse de facto um problema grave,

até aos… 4 anos. Portanto, o Diogo começou a

falar muito tarde, começou a falar já com dois

anos e qualquer coisa, aos 4 anos. O Diogo teve

uma situação entre mim e o pai, portanto nós

tivemos afastados durante uns meses e nessa

altura o Diogo teve um retrocesso brutal. Deixou

de falar, tinha comportamentos de bebé mesmo

e na altura fomos a uma psicóloga, portanto

aconselhados pelo colégio onde ele estava.

Fizeram-lhe uma avaliação psicológica e

disseram-me que o Diogo estava basicamente a

sentir que toda a gente o tinha abandonado e esse

diagnostico na altura serviu para varias coisas,

incluindo para o mais importante que veio a

decidir o futuro, foi para eu e o pai resolvermos

os nossos problemas familiares, porque

dissemos que... ok, o que quer que seja que se

está a passar ou que não se passou bem entre

Foco no problema do filho Reaproximação conjugal

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112

Marido sente que a

mulher mima o

filho em demasia

ao ceder a algumas

como exemplo à

fuga de contacto

com O outro.

Madalena sente

que deve proteger

o filho dessas

situações que o

incomodam

nomeadamente

pelo barulho.

Psicóloga valida

essa ideia

Entrevistada: Eu acho que não… por

exemplo em termos sociais o Filipe tem

dificuldades e sente-se muito mal mesmo

em shoppings e sítios com muito barulho.

Eu tento-o afastar desses

sítios…Aconselhei-me com a psicóloga e

ela disse-me que não vê problema nisso

desde que socialize no seu meio .

Diagnostico feito

a três anos,

contudo sentidas

algumas

dificuldades no

primeiro ano,

pensando ser

apenas alguma

descoordenação e

inibição com o

outro.

Psicóloga: À quanto tempo receberam o

diagnóstico?

Entrevistada: Cerca de três anos, no

segundo ano da escola, mas logo no

primeiro ano que vimos que algo se

passava, mas pensamos que não passava de

timidez e falta de jeito para certas coisas.

Psicóloga: E isso foi algo sentido pela

professora?

Entrevistada: Não… só nós notávamos isso.

Ela dizia que ele tinha dificuldades mas

nunca falou de nada por ai além…

Esclarecimento e

identificação das

características do filho

Desconhecia a

patologia.

Quando percebeu

ser um espectro

do autismo negou

por não

identificar o filho

como autista

Psicóloga: Estou a entender… Madalena e

como foi para si esse momento do

diagnóstico do seu filho? Como se sentiu?

Entrevistada: Não fazia ideia do que era…

fiquei surpreendida mal ouvi autismo. A

psicóloga da escola disse que ele tinha

características de uma criança com

asperger, não entendi.. e ela disse que era

uma vertente do autismo, e ai assustei-me…

Não identificação

com o

diagnostico de

autismo

aceitação do

diagnostico de

SA

Surpresa

Impacto do diagnóstico 1º diagnostico (embora ainda não consolidado em SA) –reaproximação conjugal

nós, não tem importância nenhuma comparado

com a estabilidade do Diogo. Então, voltamos a

ter uma vida normal, resolvemos os nossos

problemas, e o Diogo começou a ter

acompanhamento psicológico lá no colégio.

Preocupação/não compreensão quanto ao diagnostico da psicóloga Não se identificava com as palavras da psicóloga por ser o pilar do filho para tudo.

E. No fim desse ano, a professora disse que não

sabia se ele estava preparado para ir para o

primeiro ano, por isso achava melhor fazer uma

avaliação para ver se em termos de maturidade

está pronto para começar o primeiro ano,

portanto o ano que vem. E eu pensei tudo bem…

o Diogo foi então re-avaliado pela própria

escola, pelos psicólogos da escola, que disseram

que o Diogo não tinha nenhum problema

psicológico, que teria talvez alguns problemas

de imaturidade. Aconselharam-me portanto a ir

ter com uma terceira pessoa, portanto outra

psicóloga, que fez o … Voltou a repetir os testes

que tinham sido feitos ao Diogo no outro ano.

Ela disse que o Diogo tinha alguns problemas,

não lhe chamou nada em concreto, disse que

tinha falta de atenção, deficit de atenção, que

tinha problemas graves de identificação com a

figura materna, portanto eu, que era uma criança

que se sentia portanto desligada, que sentia que

o mundo estava contra ele. Esse diagnóstico

veio-nos deixar assim um pouco preocupados

com o Diogo porque nós não sentíamos nada

disso. Especialmente a questão de ter a ver

algum problema comigo…

P. Hum, hum….

E. Porque o pilar do Diogo sou eu, para tudo! É

a mãe, às vezes é cansativo.

P. Exige muito de si portanto…

E. Sim. O Diogo é a mãe para tudo…

Dificuldade em estabelecer um diagnóstico correto Diagnósticos diversificados Preocupação após diagnóstico de psicanalista Cansaço Mãe como pilar

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113

Falta de

conhecimento

sobre o quadro

clinico de autismo

assustou a mãe.

Depois de falar

por alto procedeu

à recolha de

informação sobre

o assunto e

marcou consulta,

sendo bem

seguido nessa

clinica

atualmente.

Valorização do

trabalho feito na

clinica em que o

filho é seguido.

Resultados vistos

a nível de

socialização.

Mesmo assim

evita levar o filho

para locais com

muita gente mas

pelo barulho.

Felicidade nestes

progressos a nível

do melhoramento

da relação social

com o Outro

disse que o meu filho não era autista. Tinha

aquela ideia de que uma criança autista mal

fala, se balança… não fazia ideia, depois é

que ela me deu a conhecer o espectro por

alto e em casa fui pesquisar. Nesse dia que

falou comigo deu-me o contacto de uma

clinica, que acompanha casos semelhantes,

onde é agora seguido ainda, e fui a uma

consulta. Mas antes de ir Até hoje está a ser

lá acompanhado. Eu própria o levo e chego

a estar lá com ele. E tem lhe feito muito

bem. Se não fosse isso…

Psicóloga: Sente que o suporte na clinica é

importante?

Entrevistada: Totalmente! Ele trabalha com

a equipa dele todas as dificuldades do Filipe

e tem melhorado na socialização

sobretudo…só que como tem muita

sensibilidade sensorial não o levo para onde

tem muita gente. Mas tem dois grandes

amigos e teve uma namoradinha.

Psicóloga: como é isso para si?

Entrevistada: É uma grande alegria, para

pais normais pode ser estranho mas para

mim ver o meu filho ter amigos e até uma

namoradinha recentemente é importante.

Sempre foi um medo meu que não se

conseguisse dar com outras pessoas. Ele é

muito inseguro, não olha as pessoas, as

pessoas acham-no antipático ou que não

está interessado. Mas é mesmo dele, apesar

de estar a trabalhar isso é algo que quando

não está a vontade se nota muito, o não

Coping ativo-procura de

informação

Procura de

acompanhamento

Pouca informação acerca

do SA

Procura de suporte

instrumental social

Valorização do

acompanhamento na

clinica

Tranquilização nos

progressos a nível social

Dificuldades em se

relacionar

Características como

entrave à aproximação do

Outro

Relata novamente experiencias do filho e das características do filho e não propriamente do impacto que elas têm em si. O filho não estabelece ligações com pessoas que não lhe parecem ser de confiança.

E: Pronto o Diogo foi para o primeiro ano, que

começou a correr mais ou menos bem, mas o

Diogo uma das características que tem é que

necessita muito das pessoas que considera

pilares, que são referencia, ele precisa muito de

mimo, de passar a mão pelo pêlo, como se

costuma dizer! E a professora que ele teve no

primeiro ano não era assim… era uma pessoa

fria, no primeiro dia do primeiro ano o Diogo

foi-lhe dar um beijo coisa que ele estava

habituado a fazer com a outra professora, ela

disse logo: “Isto não é o jardim-escola, vai-se

sentar não quero beijos”. Portanto isso fez com

que para o Diogo era uma “persona non grata”.

Portanto o Diogo criou uma aversão àquela

professora. E até ao fim do primeiro período, o

Diogo não fez nada na escola, literalmente…

Necessidade de ter professora empática

Falta de investimento nas tarefas escolares face à não empatia com a professora na escola, contudo com sucesso escolar. Patricia demonstrou concentrar os seus esforços para entender qual o diagnostico do filho, aquele que lhe faria sentido face ao que conhece do filho. Pediatra aconselha a ir a um bom psicólogo fazer uma boa avaliação.

P: Em termos de notas não teve sucesso?

E: Não... em termos de notas teve sucesso,

porque no dia dos testes eu pedi-lhe para fazer e

ele fez, mas de resto a professora mandava as

fichas para casa a dizer “o trabalho que o Diogo

fez, nada”. Ele escrevia o nome, e mais nada.

P: Não investia na escola…

E: Não porque ele não achava que valesse a

pena porque a professora era má para ele e criou

ali uma grande resistência. O Diogo fez então os

7 anos no fim do primeiro período e fui à

pediatra à consulta de rotina dos 7 anos, e eu

disse-lhe que a professora disse que não sabia o

que havia de fazer com ele, que ele não é uma

criança normal e que não sabe o que há-de falar

com ele e eu estava preocupada. Então a pediatra

disse: “Olhe, pare de brincar aos psicólogos que

é o que tem andado a fazer este tempo todo e

vamos levá-lo a uma pessoa que lhe vá fazer um

Procura do diagnóstico concreto

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114

Mostra que é um

receio que não se

relacione muito

com o Outro pelas

suas

características

Sente que as

características do

síndrome possam

influenciar a

aproximação do

Outro.

Relata que o filho

prefere o seu

espaço e as suas

atividades a sós,

embora já

equilibre melhor

o tempo.

Evidente desejo

de que a nível

emocional o filho

esteja adaptado e

estável de modo a

constituir família.

Marido acha que

ela mudou, e a

mesma afirma

que ele pode ter

alguma razão no

que toca ao nível

social, admitindo

sair menos em

convívios.

Protege o filho de

situações que ele

não gosta.

olhar nos olhos. E depois ta sempre no seu

canto de volta dos seus livros de

dinossauros, adora tudo o que diz respeito

replicas, filmes, documentários e tudo. Isso

e os legos, faz coisas impressionantes. Mas

lá está… anda nisso, ou melhor andava mais

nisso, todo o tempo. E eu não queria que

fosse uma pessoa fechada.

Psicóloga: Percebo que para si fosse uma

preocupação dado que o outro é importante

para todos nós.

Entrevistada: Muito… E quero que um dia

tenho uma mulher, case… mas não é muito

dado. Vamos ver.

Psicóloga: Tudo no seu tempo … E como

tem sido para si viver com este diagnóstico?

Entrevistada: Tem sido uma correria, estava

desempregada quando ele foi diagnosticado

e desde ai decidi parar mesmo para poder

estar totalmente disponível para o levar à

clinica, para o levar ao futebol, coisa que lhe

tem feito muito bem, mas lá está convívios

não consegue. Para o acompanhar em casa

sobretudo… o meu marido diz-me que

mudei muito…

Psicóloga: E a Madalena acha que mudou?

Entrevistada: Tenho de lhe dar alguma

razão… nós tínhamos uma vida social em

conjunto e agora só ele que tem

basicamente, só ele está em convívios com

os amigos do trabalho. Não gosto de o

deixar em casa de amigos porque sei que ele

não gosta…Ele diz que estou a ficar com as

Receio de que seja uma

pessoa fechada

Desejo de normalização a

nível emocional

Sensação de afastamento

social

Afastamento para

acompanhamento do filho

Entendimento de fusão

com características do

filho – afastamento social

Evidentes sentimentos de angustia após o diagnostico da psicanalista consultada, sentindo-se a culpada das caracteristicas do filho.

diagnóstico como deve ser”. Portanto se lhe

disser que o Diogo tem alguma coisa, muito bem

preocupa-se com isso, se disserem que o Diogo

não tem nada tire essa ideia da cabeça e vai ao

contrário do que a terceira psicóloga lhe disse,

tirar essa ideia de que é uma má mãe, coisa que

a psicóloga anterior me tinha convencido, que

todos os problemas derivavam de mim. Então

ela encaminhou-nos para o Dr. António Lobo

Antunes, que viu o Diogo em Fevereiro do ano

passado e ao fim de hora e meia de estarmos lá

sentados a falar com ele, digamos eu o meu

marido e o Diogo, ele disse-me ao fim: “Assim

que o Diogo entrou eu vi logo o que é que o

Diogo tem. Eu já vi muitos Diogos na minha

vida, e posso fazer o diagnóstico só de olhar para

ele”.

Psicóloga: Ele é especialista na área…

Sentimento de ser má mãe

Identificação das características do filho quando explicado o diagnostico de SA Iniciou acompanhamento desde logo, acompanhamento esse profundo, envolvendo os familiares e professora

E: E vou usar um palavrão que vai assustar a

mãe, e eu pensei cá para mim, não vai ser nada

que eu já não saiba, porque eu dizia muitas vezes

“O Diogo está no mundo dele”, o Diogo tem um

mundo que é só dele. Então ele disse assim “O

seu filho tem autismo mas não é autista” e

explicou-me como uma pessoa tem autismo mas

não é autista.

(…)

Por um lado percebemos que o diagnóstico

fazia sentido por outro ficamos surpresos, era

algo novo e não tínhamos muita informação

sobre o síndrome de asperger em especifico.

Depois começou a ser seguido no PIN onde fez

os testes todos com a Dr. Daniela (…) Então ela

Identificação com o diagnóstico de SA Identificação com o diagnóstico Surpresa Pouca informação

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115

Admite que o

afastamento social

do filho pode

levar ao seu.

características dele e realmente nesse

sentido posso-lhe dar razão.

Consentimento da

chamada de atenção do

marido

Sente-se exausta,

sem desbloquear

da rotina que

segue.

Psicosintomatolog

ia evidente pelas

enxaquecas

Associamento de

enxaquecas a face

pós-diagnostico.

Sensação de falta

de tempo para si,

mesmo a nível de

saúde.

Sente que não

pensa muito em

si, sobretudo em

fases que

requerem mais do

filho como a

altura de testes.

Sente apoio

escolar, antes do

Psicóloga: E como se tem sentido desde a

descoberta do diagnostico? Em termos

físicos e psicológicos.

Entrevistada: Psicologicamente é o

cansaço, a exaustão. Como o meu marido

diz eu não desbloqueio, tenho uma rotina

que não quebro e é verdade. Fisicamente

esse cansaço fica evidente, se pensar bem

até as enxaquecas surgiram depois disso…

pode ter ligação não é?

Psicóloga: A Madalena acha que possam

estar ligadas a esse cansaço?

Entrevistada: Pois… já pensei fazer

acupuntura, relaxar mais, mas não é fácil.

Psicóloga: Não é fácil…

Entrevistada: Tempo para isso… ando

sempre a correr. Mas devia pensar nisso eu

sei.

Psicóloga: É importante reflectir sobre

como está do modo que refere e do que a

pode ter levado a esse mesmo estado. O que

mudou? Desde quando? Porquê?

Entrevistada: Pois… acho que não penso

muito no que se refere a mim… sobretudo

nestas alturas em que faz testes… esta é

outra fase para o ajudar a concentrar-se…

Psicóloga: Como se sente quanto ao apoio

escolar?

Rotina

Cansaço

Exaustão

Psicossomática -

enxaquecas

Desinvestimento em si

própria

Desinvestimento em si

Apoio do filho a nível

escolar

Desinvestimento em

relação a si

Sentimento de aceitação do diagnostico baseado na aceitação do filho tal como é. Faz tudo o que poder, e quando não tiver como solucionar de outra forma verá então outros caminhos como o medicamentoso.

fez 5 ou 6 sessões com o Diogo, comigo e com

o meu marido fez outras quantas, depois houve

uns testes grandes para eu responder e para o pai

responder e para a professora. Depois daquilo

tudo metido lá nas máquinas, lá com os

algoritmos que vocês utilizam, saiu o

diagnóstico que confirma que de facto, não há

dúvidas, Síndrome de Asperger com deficit de

atenção e hiperatividade, pacote completo!

P: E pode-me dizer como se sentiu quando

recebeu esse diagnóstico?

E: Um alívio! Porque aquela ideia de que eu era

má mãe saiu-me da cabeça, ok… não foi nada

que eu tivesse feito, não foi por falta de atenção

da minha parte, não foi por negligência, pronto

não foi por nada…

P: Compreendo…

E: O Diogo é assim, porque é assim. E não há

nada que eu possa fazer para tirar estas

características dele. O que eu posso fazer é

aprender a fazer com que ele aprenda a lidar com

elas, para que para ele seja mais fácil e tentar que

as pessoas que lidam com ele diariamente

percebam as características dele. (…) Mas que

ele vai provavelmente ter algumas destas

características ao longo de toda a vida, vai… E

se me perguntarem se eu as mudava, não… não

mudava, porque é assim que eu gosto dele. Com

estas características que ele tem porque… ele é

assim! E portanto agora ele está a ser

acompanhado semanalmente lá no PIN, já me

falaram duas vezes em medicar o Diogo, e eu

não quero medicação… o meu principio é

Procura de acompanhamento especializado Envolvimento do casal no acompanhamento Diagnóstico de hiperatividade Alívio após diagnóstico Dar suporte instrumental para lidar com SA Aceitação

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116

diagnóstico

tentavam ajudar

a ultrapassar as

dificuldades. Após

o diagnóstico

recorrem a

estratégias para

promover o seu

desenvolvimento.

Estratégias a nível

de melhoramento

também das

relações sociais do

seu filho com

outros meninos,

contudo

recorrentes crises

de isolamento.

Revela a

necessidade de ter

paciência para os

momentos de

crise, lembrando

que as suas

atitudes são

consequência das

características do

síndrome e não

imaturidade.

Sente que o tenta

acalmar mas

quem pode

precisar de calma

é ela também.

Presta suporte a

nível emocional e

de forma a

ultrapassar e

resolver as crises

com ele.

Entrevistada: É bom, agora que sabem o que

ele tem. Antes não referiam grandes coisas

achavam-no tímido e apesar da distracção

conseguiam faze-lo fazer as coisas. Mas

agora que sabem o que tem a professora e a

psicóloga falam de forma a perceberem

como o ajudar, e que estratégias utilizar, e

isso também tem sido muito bom. Ele não

tinha amigos, não conseguia mesmo criar

ligação com a ajuda delas, agora já tem dois.

Ainda tem umas crises em que se isola mais,

mas acho que isso sempre vai ter.

Psicóloga: Compreendo...e como lida

nesses momentos de crise?

Entrevistada: Tenho paciência! São

momentos em que parece muito imaturo e

aí tenho de me lembrar que para ele não é

fácil, que tem feito esforço. E tento acalma-

lo. Mas as vezes quem precisa de calma sou

eu... Tento perceber como se sente e o que

sente e mostrar-lhe que tudo se resolve. Ele

chegou a ter crises de choro por não ter

amigos e toda a gente ter amigos… não foi

fácil para mim ajuda-lo mas tentei ao

máximo explicar que iria ter, teria de se dar

mais a conhecer no recreio, entrar nas

brincadeiras. Mostrar que gosto dele e que

se ele se aproximar dos outros também vão

gostar dele.

Centração nas

dificuldades do filho

Apoio escolar positivo

Aliança entre

psicóloga e

professora

Melhoramento da

socialização

Atitude paciente

Apoio emocional

Psicóloga: Acredito que não seja uma

situação fácil Madalena, de qualquer modo

referiu que já teve progressos a nível da

socialização, o que é notório.

Refere alterações do quotidiano para conseguir acompanhar o filho de forma mais presente.

enquanto não puser em causa ele próprio ou

terceiros, pronto vamos continuar. Porque as

notas dele são sempre bom e muito bom,

portanto enquanto ele continuar a dar para os

gastos, digamos assim, eu não o quero

medicado. Eu tenho, e é por isso que estamos a

investir no tratamento que ele está a fazer no

PIN, e fizemos alterações muito drásticas nas

nossas vidas para termos mais tempo para estar

com, essa é a minha forma de conseguirmos

ajudar o Diogo. Se virmos que não há nada a

fazer, não há nada que consiga controlar o Diogo

então nesse caso eu digo ok eu desisto …

Sem adesão a fármacos Alterações no quotidiano familiar

Foca nas características mais inflexíveis, entendimento literal e rotinas, quer ao iniciar uma rotina como a sair dela

P: Mas como é para si exactamente viver com

um filho com Síndrome de Asperger?

E: Como é que é para mim viver com o

Diogo…? O Diogo para mim tem… as

características mais vincadas nele são muito

pouca flexibilidade, extremamente rígido, se ele

me disser alguma coisa e eu digo “tá bem Diogo,

5 minutos” o Diogo fica parado a contar até 300

porque sabe que quando chegar 300 passaram 5

minutos e foi o que eu disse, portanto não pode

ser mais que aquele tempo.

(…)

E depois tem o outro lado, as rotinas… uma

rotina que é uma rotina não se quebra, por

motivo nenhum. Ele tem muita dificuldade em

entrar numa rotina e depois tem muita

dificuldade em sair delas… Uma historia

caricata, à uns seis meses teve um problema num

pé porque cortou-se numa praia, numa pedra,

Inflexibilidade do filho: Entendimento literal Dificuldade em iniciar e sair de rotinas

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117

Sente que o papel

de mãe é apoiar

nas tarefas,

ajudar a

ultrapassar as

dificuldades,

apoio emocional

de modo a que se

sinta avontade

para que fale com

ela sobre as suas

coisas.

O seu cônjuge

ajuda nas tarefas

escolares, contudo

sente que é menos

paciente, levando

a que o filho não

resolva as tarefas

de forma

produtiva como

consigo.

Sente que o

cônjuge entende

as dificuldades,

enquanto que

outras vezes as

desvaloriza e não

as entende.

Entrevistada: Eu acredito que sim. E que no

resto também irá ter progressos, a psicóloga

disse que eles têm um ritmo próprio e tudo

a seu tempo.

Psicóloga: Sem duvida nenhuma… e qual

considera ser o seu papel como mãe?

Entrevistada: Este mesmo. Acompanha-lo,

ajuda-lo nas tarefas, mostrar-lhe que tudo se

resolve, que pode contar comigo também

como amiga dele e que pode falar comigo,

porque ele não fala muito das coisas dele e

todos precisamos disso.

Psicóloga: Hum, hum… E quanto ao apoio

do seu marido?

Entrevistada: A ele ajuda-o as vezes nas

tarefas da escola, mas quando ele começa

com birras ou a distrair-se ele irrita-se, e

isso deixa-o com menos vontade de ali

estar. As vezes dão-se bem nisso outras é

assim… Eu tenho mais calma para o ajudar

mas mesmo assim o pai muitas vezes ajuda

nisso enquanto eu faço o jantar por

exemplo. Mas pronto o meu marido tanto

entende que ele tem dificuldades como

parece que as vezes as desvaloriza. E que

ele precisa que o leve para sítios e se habitue

aos barulhos e a ver pessoas, não tem noção

como isso pode ser intrusivo para ele

mesmo sabendo da hipersensibilidade dos

autistas.

Psicóloga: Tem uma visão um pouco

diferente da sua quanto ao problema?

Apoio nas tarefas

Apoio emocional

Apoio nas tarefas

escolares

Atitude menos

paciente

Marido entende alguns

cuidados excessivos

As rotinas são uma característica difícil de contornar, dado esse facto e o facto de ser algo positivo para o Diogo, algumas das rotinas permanecem, como o cantar da musica.

concha, qualquer coisa, cortou-se no pé, não

interessa… e teve de andar a pôr uma pomada

durante um mês e nos primeiros dias para meter

a pomada foi uma chatice, porque não queria

meter a pomada. Ao fim do mês quando acabou

o pacote, ele diz: “mãe e a pomada?”, eu disse:

“Diogo já não há pomada, já acabou, já não é

para pôr mais”- “Então e agora?! Já não é para

pôr mais?! E o pé vai ficar doente!” – “Não

Diogo, olha para o teu pé já não tem nada!” -

“Mas é preciso!” (…) Foram uns três ou quatro

dias que pronto…

P: Tudo o que seja rotinas…

E: O Diogo tem uma musica que todos os dias

tenho de cantar, a mesma à anos, os irmãos já

não podem ouvir a musica, eu já não posso ouvir

a musica…

P: Mas faz sentido para ele, não é?

E: Faz sentido para ele, e nota-se uma grande

diferença. Ele está completamente agitado vai

para a cama muito agitado, deita-se… e eu

sento-me ao pé dele, começo a cantar, (…) ele

encosta-se e faz assim : (imita uma respiração

funda), acalma e às vezes ainda não acabei a

musica já está a dormir. Tem mesmo ali

qualquer coisa… O pai está muitas vezes a dizer

“Tens de acabar com a musica” e eu digo “Como

acabar com a musica?! Se eu não cantar ele não

dorme!” é que não dorme mesmo e depois não

dorme mais ninguém cá em casa. Que todos os

problemas sejam cantar Fecha a porta até aos 70

anos.

Cansaço da rotina Persistência das rotinas que acalmam o Diogo

Energia virada para o problema e reflecção

P: Então mas a Patrícia, como é que se sente

mesmo em termos psicológicos ou físicos

depois do diagnóstico?

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118

Visões um pouco

diferentes quanto

ao problema do

filho leva a

discussões

conjugais

frequentes.

Familia encontra-

se afastada

fisicamente, mas

preocupada e

disponível para

prestar apoio, não

sendo sentida

necessidade disso

por parte de

Madalena.

Apoio no grupo

de pares,

nomeadamente

para interação

dos filhos dos

amigos com o seu,

em casa.

Situações em que

filhos provocam

crises por

hipersensibilidade

no seu filho.

Amigos estão

mais presentes

fisicamente e

envolvem-se,

chamando a

atenção para a

sua necessidade

de convívio.

Entrevistada: Sim… e discutimos por isso

muitas vezes…

Psicóloga: Compreendo. Estas situações

são complicadas de gerir… e os familiares

têm-lhe prestado apoio nesse sentido?

Entrevistada: lá está… eles estão longe, os

avós e tios vivem em Peniche.. são a família

mais próxima que temos e que sabem. Mas

não os procuramos, eu tenho conseguido

dar conta do recado. Mas perguntam por

ele, como estão as consultas como está na

escola, se é preciso algo.

Psicóloga: Hum, hum… e no grupo de

amigos costuma procurar mais apoio?

Entrevistada: Sim algum, mais a nível dos

filhos deles, quando trazem os filhos para

jantar eles próprios tentam que eles

interajam com o meu. E resulta, talvez

também por ele estar no espaço dele. Mas já

houve situações em que o filho da Marta fez

uma birra e ele começou as voltas na sala

por causa do barulho do choro dele lá está,

faz-lhe mesmo confusão.

Psicóloga: Vejo que os amigos estão mais

presentes.

Entrevista: Sim estão, e eles próprios me

chamam a atenção que deveria também

sair… o único convivo que tenho é assim

em casa almoços ou jantares e não são assim

tantos porque ando cansada.

Psicóloga: Compreendo... Devia pensar um

pouco melhor se o que lhe dizem, quer da

parte do seu marido, quer dos amigos, lhe

Discussões conjugais

Aceitação familiar:

Sem procura de

apoio familiar

mas existe

disponibilidade

da mesma

Sensação de ser capaz de

prestar o apoio necessário

Suporte grupo de pares:

Favorecimento do

campo relacional

em casa

Suporte grupo de pares:

Chamada de atenção para

falta de convívio

sobre a significação do SA na sua vida. Entendimento de que após o diagnóstico tomou mais entendimento sobre a necessidade de perceber que não contra tudo no seu projeto de vida. Encara o filho como o desafio da sua vida. Reforçada a exaustão pela absorvência do seu filho Valoriza as suas características e gestos emotivos do seu filho

E: Como é que me sinto? Hamm… Sinto-me

pronta para a batalha. É assim o Diogo não foi

uma gravidez planeada, e eu costumo dizer que

o Diogo apareceu na minha vida para me

mostrar que eu sou uma pessoa muito

preocupada com horas para cumprir, coisas

arrumadas… portanto, o Diogo veio-me mostrar

que tudo o que eu penso que controlo, não

controlo. Portanto, tudo aquilo que eu julgo que

está tranquilo, aí dentro pode haver o caus! E ele

é o desafio da minha vida.

Psicóloga: Hum, hum…

Entrevistada: Leva-me a um ponto de exaustão

enorme. Ele é muito absorvente… De uma

maneira que os irmãos não são. Mas por outro

lado, enche-me o coração de amor de uma

maneira que os outros também não enchem.

Porque é extremamente carinhoso, é muito

preocupado, é capaz de estar a ver televisão e do

nada, levanta-se, vem a correr ter comigo dar-

me um beijo, assim do nada, não diz nada só

assim. Fico assim wow, e faz isso imensas

vezes.

Energia direccionada para a resolução do problema Perceção de que nem tudo é controlável Filho como um desafio Exaustão Contentamento pela emotividade consigo

P: consigo, com outras pessoas, ou…?

Entrevistada: Não, é só comigo. Comigo, ponto

final, é mãe é mãe, é Deus no céu e mãe na terra.

E com as pessoas da família, aquelas pessoas

que ele considera o núcleo dele, sou eu, o pai, os

irmãos, se bem que com a irmã tem ali uma

relação de amor-ódio, porque “Detesto a

Mariana, detesto a Mariana!!” e a seguir é capaz

de se agarrar a ela assim toda encurvada do

Valorização do seu suporte do suporte do núcleo familiar

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119

Madalena reflecte

sobre a chamada

de atenção do

marido e amigos,

e admite que

possam ter razão,

colocando em

questão se é

mesmo falta de

valor.

Reflecte ainda

pela necessidade

de pensar mais

sobre si.

faz sentido. E tentar perceber do que precisa

e de como gerir não apenas a vida do seu

menino, mas igualmente a sua. Tentar

encontrar um ponto de equilíbrio para

manter o seu bem-estar, porque também ele

promove o do seu menino.

Entrevistada: Sim... Quando o meu marido

me diz estas coisas fico irritada, da me a

sensação que não está a dar valor a algo que

é preciso. Mas pensando bem pode nem ser

nesse sentido…

Psicóloga: Tire um tempo para reflectir

como tudo isto tem sido para si e partilhe

isso.

Entrevistada: Pois secalhar preciso mesmo

de fazer isso, parar para pensar nas minhas

coisas….

Irritação pelas chamadas

de atenção mas

sentimento de razão nelas

Não vê

dificuldades de

maior nos estudos

no futuro. Receia

apenas

dificuldades nas

profissões que

podem envolver o

contacto com o

Outro.

Não gosta de

pensar no futuro

porque sente que

é uma evolução.

Psicóloga: Exacto… A Madalena falou-me

de alguns receios quanto ao futuro do seu

filho a nível de casar e ter amigos... quer

partilhar um pouco melhor comigo como vê

o futuro do seu filho?

Entrevistada: Na escola acredito que

consiga estudar.. Até onde ele quiser…

imagino é que em trabalhos onde seja

preciso o contacto com outras pessoas se

atrapalhe mais… não sei o que vai gostar de

estudar mas logo se verá. E eu não gosto

muito de pensar no futuro, não quero pensar

que vai ser como é agora porque isto é uma

evolução não é?

Imagina desembaraço nos

estudos

Crê na dificuldade em

seguir profissão que

envolva contacto com o

Outro.

Evitamento de focagem do olhar, característico do síndrome expresso sobretudo em pessoas que não gosta. Evidente tristeza relatada pelas consequências nas dificuldades interpessoais do filho, causando isolamento. Revolta sobre os meninos que o isolavam e sobre a professora que não sabia reagir sobre a situação.

género larga. Mas pronto… as pessoas que ele

considera que são do núcleo dele, pessoas com

quem ele tem os carinhos. As pessoas de fora, de

quem ele não gosta evita muito o contacto, evita

olhar nos olhos, tem aqueles estereótipos

próprios das crianças… por exemplo este ano

não porque a professora já teve problemas com

crianças com as mesmas características e sabe

como lidar, mas por exemplo o ano passado o

Diogo estava completamente isolado. Eu ia-o

buscar a escola e ele estava sentado sozinho

numa sala, num canto, porque mais ninguém

brincava com ele e aquilo custava-me horrores.

Dava-me vontade de entrar na sala e começar a

bater nos miúdos e acabar no professor, porque

agente vê que os adultos também não faziam

nada para evitar aquilo. Mas pronto…

Psicóloga: Então em termos escolares sente

algum suporte derivado à professora já ter lidado

com alguns…?

Professora como suporte Tristeza por dificuldades nas relações interpessoais

Tranquilização pelo facto de ter um bom suporte escolar, o qual soluciona as questões que se levantam.

E: É, o que se passa este ano é que como a

professora tem esta sensibilidade isso não está a

acontecer, porque a professora obriga-os a

brincar com o Diogo, e o Diogo no outro dia

queixou-se que não o deixavam jogar, calhou

em conversar com a professora sobre o assunto,

por acaso nem foi em termos de queixinhas, foi

“ah ele queixasse é que os meninos não jogam a

bola com ele” e ela no dia seguinte diz “Porque

é que o Diogo não joga à bola?” e eles “ah

porque ele é que não gosta de jogar” – “Não, o

Suporte Escolar na integração

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120

Sente que haverá

evolução

baseando-se na

evolução já

sentida pelos

acompanhamento

s que o filho tem.

Sente que falta

mesmo a vontade

socialmente para

criar laços

afectivos, sendo

essa a sua

preocupação.

Refere ser muito

afectuoso e que

não sabe

promover esse

afecto.

Com o

diagnostico sente

que aprendeu a

ser mais paciente.

E descobriu a sua

capacidade de

prestar apoio ao

filho através da

recolha de

informação,

procura de

acompanhamento

escolar e em

clinica.

Mostra

valorização sobre

o

acompanhamento

na clinica, sendo

um profissional

atento.

Psicóloga: A Madalena assim o tem

sentido?

Entrevista: Sim! Já tem amigos, já se

concentra melhor comparado com aqueles

primeiros dois anos de escolinha. Até tem

notas medianas… melhores que alguns

colegas dele! O acompanhamento que lhe

damos tem sido feito para isso mesmo.

Agora claro, se tiver mais a vontade e jeito

para interagir com certeza tudo será melhor,

é so mais a parte afectiva que me preocupa,

porque ele é muito afectuoso! Mas às vezes

não sabe como ter esse afecto. Não sei se me

estou a fazer entender…Gostava que ele

casa-se e tivesse filhos…

Psicóloga: Claro que sim…

Entrevistada: E pronto é isso…

Psicóloga: O que acha que esta vivencia lhe

transmitiu?

Entrevistada: Como disse mais

paciência…E não sei.. Acho que encontrei

em mim forças para enfrentar o

desconhecido. Eu pouco sabia sobre este

problema e de todas as formas tentei tornar-

me uma expert no assunto! Porque so

sabendo do que se trata conseguimos ajudar

não é?

Psicóloga: Sem dúvida.

Entrevistada: Então comprei livros,

procurei ajuda na escola e na clinica do Dr,

de quem tenho optimas referências, e que

por experiencia própria falo que é um

excelente profissional sempre atento. Por

Diagnostico com

evolução

Receio de dificuldades a

nível amoroso no futuro

Noção de que tem atitude

mais paciente

Descobriu capacidade de

coping sobre o filho

Valorização do

acompanhamento na

clinica

Diogo joga, porque aqui é assim, ou jogam todos

ou não joga nenhum” e a partir daí o Diogo já

joga à bola, tem amigos coisa que não tinha, e já

me pede ah o não sei quantos pode vir cá a casa

ou eu posso ir a casa dele? Coisa que antes nunca

tinha acontecido. Portanto está a começar a

socializar, o que é muito bom…

Contentamento pelo desenvolvimento das capacidades interpessoais

Diferente aceitação por parte das famílias. Família materna aceita o diagnostico e pretende dar suporte e compreender, por outro lado a família paterna não aceita o diagnostico abordando as características como algo de família. Demostra-se importante o envolvimento familiar para compreensão e actuação.

P: Acredito que para si seja muito bom. E em

termos familiares, como é que tem sentido o

apoio da sua família e da família do seu marido?

E: Então, a minha família e a família do meu

marido são muito diferentes... E a forma de estar

nas duas famílias é muito distinta. Quando o

diagnóstico foi feito ao Diogo a atitude da minha

família foi -ok, o que é que é preciso agente

fazer, como é que vamos lidar com ele? A

atitude da família do meu marido foi – Ah mas

ele não tem nada, é uma criança normal, vocês

andam a gastar dinheiro em médicos para quê?

Ele não tem nada. Ah… a minha filha também

era assim, o meu filho era assim, o teu primo era

assim- não sei o que… era assim. Estas duas

formas de estar são muito diferentes. O que faz

com que, enquanto a minha família está sempre

integrada em tudo aquilo que se passa, sabe

quando o Diogo tem sessões no PIN, o que é que

se faz… Posso dizer que eu comprei tudo o que

há para comprar de livros de Asperger, tenho

sete ou oito livros diferentes, eu li-os, a minha

mãe leu, a minha irmã leu-os…Toda a gente, e

depois do diagnóstico ter sido feito ao Diogo eu

Suporte familiar do lado materno. Negação do diagnóstico por parte da família paterna Envolvimento da família materna no acompanhamento

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121

Desabafo sobre a

inercia por parte

do estado no que

toca ao apoio

financeiro nestes

casos.

Sentimento de

que mudou um

pouco.

Assimetria entre o

que é para o filho

e o que é para si.

Investimento no

filho,

desinvestimento

nela, calma com o

filho, tensa com

ela.

Desejo de viver o

diagnostico sendo

o que era antes

dele.

Stress com o que

não o envolve.

Mais isolada

outro lado, todas as coisas têm um custo,

como sabe o estado português é uma lástima

nestes casos, e sai tudo do nosso bolso.

Aprendi a gerir melhor as finanças, a

encontrar forma de que nada falte quando

antes nem imaginava ser possível fazer uma

ginástica deste género…Mas… fiquei a

pensar… e acho que também me fez mudar.

Estar calma para ele e tensa para mim. É

isso que me vem agora a cabeça. Acho que

preciso de viver tudo isto sendo o que era.

Psicóloga: Sendo o que era… pode-me falar

um pouco mais disso?

Entrevistada: Sim… eu tento transmitir

calma a ele mas no fundo ando stressada

com tudo o que não lhe diz respeito, irritada,

isolada. Antes fazia bastantes coisas com o

grupo de amigos… e se pensar bem ele

sempre foi asperger e acabava por conseguir

conciliar…

Melhoramento da

capacidade de gerir

finança

Sentimento de alteração

da pessoa que era

Desistência de

investimento nos seus

hobbies

pedi duas sessões à parte, uma para explicar aos

avós e aos tios do Diogo o que é que o Diogo

tinha, como poderiam lidar com o Diogo quando

estiverem com ele, e depois outra para os

irmãos. Posso dizer que da família do meu

marido não foi ninguém. E da minha foram

todos.

Falta de suporte da família paterna do filho

Dadas as suas características a família paterna sente que não derivam do SA mas sim de características familiares. Denota ser, tal como referido pela literatura, o síndrome invisível. Relata o estigma que está associado ao SA, por ser uma perturbação do espectro autista. N a verdade o SA não é um síndrome conhecido pela generalidade ao invés do autismo puro, essa falta de conhecimento leva a que as pessoas retenham uma condição mais avançada que a do seu filho

P: É de facto uma pena que nem todos os

familiares apoiem a situação.

E: Eu acho que nem é uma questão de apoiar, é

que na cabeça deles com o Diogo não se passa

nada, porque acham que o Diogo é uma criança

normal e que aquilo que ele tem é teimosia, e

pronto- a tua cunhada também era assim, mas

secalhar a minha cunhada também tem alguma

coisa que ninguém lhe diagnosticou, não é? E é

um bocadinho por isso. E o meu marido diz

muitas vezes “não vale a pena insistires porque

se eles não vêm o problema, nós não vamos estar

a incutir um problema onde eles não vêem,

portanto se acham que tá tudo bem então deixa

estar, eles tão cá meia dúzia de vezes no ano

portanto...” E depois há outra questão, que é,

agente diz que o Diogo tem Síndrome de

Asperger, as pessoas dizem: ah isso é o quê?

Agente diz que é uma doença do espectro

autista, o que é que fica retido na altura?

P: Autismo…

E: Autismo, no dia a seguir já estão a dizer que

o filho da Patrícia* é autista e dois dias depois o

filho da Patrícia* já é deficiente, e eu não quero

isso, porque já viu o Diogo e o Diogo é uma

Família paterna não vê as características do síndrome como um problema Não insistência na aceitação da família paterna Receio do preconceito por ser representado como uma forma de Autismo

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criança normal…Tem algumas características

quando passa aquele bocadinho em que

descompensa, é o fim do mundo, mas tirando

isso é uma criança normal.

O intuito do acompanhamento é diluir as características do filho de forma a lidar com elas e não se notarem aos olhos do Outro.

E: Mas eu espero que daqui a meia dúzia de anos

as pessoas que conheçam as características de

Asperger já não as vejam no Diogo, porque ele

já aprendeu a lidar com elas e a reagir, é nisso

que estamos a trabalhar, eu e o pai, com a

questão do acompanhamento no PIN e com a

escola. E espero que daqui a um, dois, três anos,

ele esteja menos Aspie que agora.

Diluir as características do filho com o acompanhamento / desejo de normalização

Tempo livre é pouco mas dedicado a família e a amigos que intervenham neste contexto familiar em casa e que sabem do diagnóstico do filho A forma de reagir sobre os comportamentos inadequados do filho podem ser entendidos como uma má forma de lidar.

P: E em termos dos seus amigos? Sente que

houve alguma diferença após o diagnóstico?

E: Nós não temos muitos amigos porque eu

trabalho muitas horas, e então tenho muito

pouco tempo livre, e como tenho muito pouco

tempo livre tento estar ao máximo com eles,

com a família. E temos três ou quatro casais que

são os amigos da casa a quem nós dissemos o

que se passava, e toda a gente tá… não houve

ninguém que eu visse que se tenha afastado ou

que se mostrasse de forma diferente pelo

diagnóstico, não. Ah… houve assim uma

situação um pouco estranha (…) estávamos a

mesa e o Diogo estava completamente,

completamente descompensado, porque o arroz

tinha ervilhas, e ele estava doido porque o arroz

tinha ervilhas! Ele já estava todo a tremer, e o

pai disse “Diogo levanta-te vai para lá ao teu

O pouco tempo livre é dedicado a família e amigos do contexto familiar Receio do olhar crítico dos outros quanto ao modo de lidar com as características

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Depois de entenderem as características percebem o que é necessário para tranquilizar o filho, tendo uma boa capacidade de agir sobre as crises relacionadas com o SA.

quarto, acalma-te, quando tiveres calmo volta” e

aquilo para os padrinhos foi… eu vi na cara

deles, estavam chocados com o que o pai estava

a dizer, estar a mandar o miúdo embora na hora

de jantar, ele foi-se embora e nos dissemos

“calma já vais ver o que se passa”, entretanto

servimos as bebidas, o pratinho dele chegou,

passados cinco minutos apareceu o Diogo

parecia outro, bem-disposto, a rir, sentou-se,

comeu. Portanto, nós já sabemos como lidar

com ele, e por muito, muito que possa parecer,

estas atitudes de Diogo, acabou, vai la dentro

apanhar um pouco de ar, respira fundo e volta,

funciona porque como costumo dizer ele faz um

re-put ao sistema dele e quando volta está tudo

tranquilo. Mas pronto, estes nossos amigos já

perceberam que o Diogo de facto é diferente,

que há coisas que não podem fazer com ele. No

verão, também com os padrinhos do Diogo

foram com eles para a praia, o Diogo estava na

água e começou a dizer que estava com frio e o

padrinho disse “ok, então vai direito para cima”,

e ele foi direitinho para cima passou por cima de

todas as toalhas. E ele ficou assim naquela e

depois pensou “não posso dizer estas coisas…!”

Boa adaptação/ resposta às crises relacionadas com o síndrome Amigos estão a entender que têm de agir de forma particular

P: Sente que é importante que os amigos estejam

a par da situação e que saibam lidar?

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Como referido na literatura muitas são as dificuldades a nível da restrição alimentar. A mãe relata que consegue comer coisas diferentes quando é por iniciativa dele.

E: Sim. Os amigos da casa. Aqueles amigos

com quem nos precisamos conviver…Também

para perceberem algumas situações e porque é

que apesar de nos não tentarmos tratar o irmão

de forma diferente dos outros irmãos, mas há

situações em que é impossível não tratarmos o

Diogo de forma diferente, e porque é que

fazemos isso, porque é que fazemos algumas

coisas e somos condescendentes com o Diogo

em algumas coisas e não somos com os irmãos,

senão qualquer dia estão-me a dizer que tenho

um filho preferido. Mas não, tenho um filho que

me dá um bocadinho mais de trabalho.

Psicóloga: Ok, então e neste momento como

tenta lidar com as dificuldades que vão

surgindo?

Entrevistada: Com a alimentação é um problema

grande, o Diogo é muito difícil de provar coisas

diferentes, porque ele diz que não gosta e ele

para provar alguma coisa tem que provar por

iniciativa dele. Posso dizer que uma coisa que

ele come, e eu nunca pensei que ele comesse é

arroz de grelos, porque? Porque um dia eu

estava a fazer arroz de grelos para mim e para o

pai e ele perguntou “o que é isso?” e eu “arroz

de grelos” e ele percebeu arroz de grilos e achou

piada ao facto de eu estar a comer arroz de

grilos. Então pediu-me e disse “ah este arroz de

grilos é bom” e eu “queres mais?” e o irmão

“não é arroz de grilos!!” e eu disse “amor,

estavas a dizer que era o que?” e ele “arroz de

grilos” e eu “não filho, não são grilos são grelos”

Valorização do suporte dos amigos próximos com quem se lida Noção da exigência do filho com SA comparativamente com os outros filhos Dificuldades sobre a restrição alimentar

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e ele “o que é que são grelos?” e eu “são essas

coisas verdes que ai estão ai dentro” se eu

dissesse que eram legumes não comia. E ele “ah

tabem! Mas eu gosto.” E pronto ficou, ainda esta

semana fizemos arroz de grelos e ele comeu.

Mas se eu lhe disser que estão ali grelos,

ervilhas, feijão verde , seja o que for leguminosa

ele não come.

Psicóloga: Mas essa estratégia para a

alimentação é deixar que seja ele a tomar a

iniciativa?

Entrevistada: Sim… sim.

Psicóloga: E para outros problemas que surjam ?

Quando surgem dificuldades a nível escolar, a mãe revela ser um apoio onde há maior persistência, usando como estratégia a negociação para terminar tarefas. Pai menos paciente nos casos que envolvem a necessidade de persistir.

Entrevistada: Sim, sim. É assim, o Diogo as

vezes… por exemplo, o Diogo detesta português

e uns dias como por exemplo hoje traz trabalhos

de português como por exemplo fazer cópias, é

uma coisa… hoje estivemos hora e meia para

ele escrever seis frases… e o pai descarta-se

logo, porque ao fim de 5 minutos está

passado, imaginemos ao fim de uma hora… e

estou ali, então vá qual é a palavra? Blá blá

blá… e já sei que tenho de negociar com ele, que

é “ok tens 12 frases, então hoje fazes 6 e amanha

fazemos as outras 6 ” porque a primeira coisa

que ele diz é “eu não gosto ” e “é muito grande,

é muito grande, é muito grande, é muito

grande!” e não passa dali, mas eu “ta bem mas

olha então tapamos, estás a ver? Afinal é

pequenino. Vamos fazer aos bocadinhos” e ele

“então ta bem”.

Papel maternal de persistência Pai menos paciente Uso da negociação como estratégia

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Focagem nas dificuldades do filho sobre o seu bem-estar. Após o diagnóstico foram necessárias alterações a nível da rotina familiar, que consequentemente provocaram mais cansaço. Aproveitamento do horário para prestar mais apoio ao filho. Admite-se que o futuro será positivo,

P: Como sente por ter de insistir nessas

dificuldades?

E: É da minha responsabilidade... É assim eu

insisto nas coisas que ele tem mesmo de fazer,

não é? Não posso dizer “ah coitadinho, não

queres fazer não faças”… Não! Ele tem de

aprender a escrever e eu sei que isto são lutas

enormes que eu tenho e que às vezes me levam

à loucura mas eu sei que estou a fazer o meu

papel como mãe. Eu quando este diagnostico foi

feito ao Diogo eu tenho possibilidade porque o

meu trabalho, pronto eu tenho isenção de

horário, portanto comecei a entrar as 8horas da

manha para sair às 5horas, para ir buscar o

Diogo mais cedo, estar mais tempo com ele, dar-

lhe mais atenção, estar com ele mais tempo

naquelas coisas básicas do banho, porque antes

chegávamos as 8 e tal era banho, jantar,

trabalhos de casa, tudo a correr! Agora continua

a ser banho, jantar, trabalhos de casa mas em vez

de ser tudo numa hora é tudo em três horas, o

que quer dizer que eu fico muito mais cansada!

(…) até porque durmo menos durmo

menos…porquê? Deito-me à mesma hora mas

levanto-me hora e meia mais cedo que aquilo

que me levantava.

P: Então e em termos de futuro, calculo que seja

uma coisa que lhe passe muito pela cabeça,

como será…

E: (…) eu vejo o futuro do Diogo risonho, o Dr.

Lobo Antunes da primeira vez que esteve com

ele disse-me que eu ele é como um avião que

Sensação de perca do seu bem-estar Alteração da rotina Mais cansaço Encara o futuro positivamente

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contudo pontuado de algumas inconstâncias que cabe aos pais serem bem geridas. Dada a exigência e o envolvimento necessário, é posta em questão a saúde mental necessária para isso.

estava em trajecto daqui por exemplo para a

américa e que vai apanhar uma grande

tempestade pelo caminho, portanto ele vai ter

um trajecto um bocado temultuoso, mas que nos

cabe a nós garantir que ele chega lá são e salvo.

Pronto, eu sei que ele vai chegar lá são e salvo!

E: Se eu chego lá com a minha mentalidade toda

intacta não sei, mas o meu objetivo neste

momento é tentar afasta-lo da tempestade.

Agora se me perguntam se o Diogo vai ser uma

pessoa notável? Eu quero garantir que lhe dou

todas as ferramentas para ele ser uma pessoa

calma, garantir que tenha uma vida feliz,

principalmente isso. Agora se vai ser medico, se

vai ser engenheiro, se vai ser pedreiro, não quero

saber… quero é

que ele seja feliz. De resto... não…não me

preocupo com isso

Responsabilização pela fornecimento de suporte para ultrapassar dificuldades Preocupação com a sua capacidade de resistência à exigência sentida Responsabilização

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128

9.4.4. Caso IV

Medo de magoar os outros e da sua distracção- sofrer um acidente Medo que pela descompensação magoe alguém Relato de situações em contexto familiar que demonstraram descompensação, crises que não foram bem geridas e revelaram atitudes imprevisíveis por parte do Diogo.

P: Estamos quase a acabar também, gostaria que

partilhasse comigo quais sente serem os maiores

medos…

E: Os maiores medos, é esta impulsividade que

ele tem, que ele faça alguma coisa que se magoe

asserio ou que magoe outra pessoa, ou que como

ele é muito distraído ele passe uma estrada sem

ver, que seja atropelado, sem ver, muito, muito

medo que aconteça alguma coisa, nesse sentido

porque ele é distraído.

E: é o meu maior receio que ele se magoe e que

faça alguma coisa porque ele tem uma força

muito, muito grande e quando descompensa

aquela dose de adrenalina… ainda na outra vez

o irmão disse lhe uma coisa que o enervou… ah

já sei o irmão saiu-lhe no MacDonalds um

boneco qualquer e um boneco de menina ao

Diogo, e quando chegamos a casa o André diz:

“ai és uma menina” , aquilo fez um clique no

Diogo e o Diogo agarrou nele pelo pescoço de

tal maneira que lhe trancou a traqueia, o irmão

deixou de respeitar, e eu não sabia se havia de

chamar uma ambulância para salvar o André, se

havia de abanar o Diogo.(…)

E: eu tenho medo que aquilo que aconteceu com

o André aconteça com outra pessoa e que seja

pior e que ele magoe alguém a serio.

Receio quanto à Impulsividade/ distracção Imprevisibilidade do comportamento do filho Medo das crises de descompensação Receio de magoar fisicamente

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129

Marido mostrou-se inicialmente resistente ao diagnóstico, contudo agora aceita. Patrícia* mostrou desde logo forma de enfrentamento do problema. Patrícia* volta a salientar a reaproximação conjugal após o diagnostico, revelando ser esta a melhor fase em 15 anos de casados.

P: E em termos de apoio conjugal? Como tem

sentido o suporte do seu marido?

E: O suporte… no início quando foi feito o

diagnóstico o pai teve um bocadinho aquela

atitude de ‘se eu não souber de nada é porque

não existe’, enquanto eu fui à Fnac ver tudo o

que houvesse, queria ler tudo e dar lhe para ler.

Ele dizia “ deixa estar depois leio” portanto, ele

nunca quis.. ele mesmo disse “o facto de eu

agarrar num livro para ler sobre o assunto é estar

a assumir que tenho um filho com este

problema”. Mas pronto agora passados estes

meses todos já lhe passou essa resistência…

Psicóloga: Têm enfrentado os dois directamente

o problema agora…

Entrevistada: Sim, e esta situação do Diogo

tem servido para nos juntar muito a nós como

casal e como casal estamos agora como nunca

estivemos nestes 15 anos em que estamos

casados.

Psicóloga: Fortaleceu-vos?

Entrevistada: Muito, muito mesmo. E estamos

muito alinhados em termos de como é que as

coisas se fazem com o Diogo.

Procura activa de informação Início do diagnóstico (relutante) Vs Agora (sem resistências) Enfrentamento do problema como casal / Fortalecimento da relação

Comentários Texto Original Unidades de Significado

Psicológico

Factor surpresa

pelo filho estar

num quadro de

autismo, reagiu

firme no momento

e perda de forças

quando as ideias

assentaram,

contudo orientação

para enfrentar o

problema

Entrevistadora: Ok, obrigada Lara. Então

gostaria que me descreve-se o melhor

possível como se sentiu quando recebeu o

diagnóstico do seu menino, ou seja à 4 meses.

Entrevistada: Na altura em que a médica

falou em asperger não estava nada à espera,

nunca pensei que o meu filho pudesse estar

num quadro de autismo, e na altura da

consulta estava sozinha, quis perceber o

porquê de falar nisso, trazer o mais possível

de informação que pude. Na altura não tive

nenhuma manifestação, digamos de

sentimentos de tristeza nem nada disso, reagi

muito firme, muito bem. Mas de facto,

quando regressei, a caminho de casa, no

carro, desabei com essa noticia, e mexeu

muito comigo. Senti que na consulta

precisava de ouvir com atenção, mas quando

sai aquilo bateu mesmo, e pronto, há

momentos em que as coisas estão mais

difíceis mas bola para a frente.

Impacto- surpresa

coping – procura de informação

Bastante tristeza e

desespero pelo

pouco

conhecimento da

patologia

Pouco

esclarecimento em

consulta da

patologia

específica, apenas

relatou autismo no

geral.

Procura de

psicóloga para

acompanhar e

ajudar o filho.

Psicóloga: Hum, hum… e na altura em que

estava no carro como se sentiu?

Entrevistada: Bem, nessa altura chorei,

chorei muito, e tive uma mistura de tristeza

com desespero mesmo, porque o meu filho

era autista e pouco conhecia sobre, sobretudo

os casos asperger desconhecia, não sabia que

existiam, sabia dos casos mais graves de

autistas mas não conhecia esta vertente. E

também lhe digo, que da consulta não vim

tão informada quanto isso, porque a medica

tinha conhecimento de autismo mas não

especificou o espectro, fui eu que no dia a

seguir contactei com a psicóloga e ela dizia

sempre que era asperger, era asperger e de

facto, é o que é. Ela é atualmente quem

acompanha o Rodrigo. Aliás, ele teve uma

psicóloga durante quase um ano e nunca,

nunca, nunca lhe detetou nada. Mas pronto,

neste momento a psicóloga está a trabalhar

com ele as competências sociais e também as

Tristeza e desespero

Pouco esclarecimento - procura

de informação

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130

Feito

acompanhamento

adequado às suas

necessidades.

Sente segurança

por quem

acompanha o filho

neste momento

questões emocionais e de 15 em 15 dias faz

uma coisa ou outra. Faz também teatro

musical, o que o ajuda também na

problemática, ideia também da pediatra.

Acho que ele neste momento está mesmo a

ser bem acompanhado por pessoas que o

querem ajudar, até a professora dele, tem

sido fantástica.

Acompanhamento

- teatro

-pediatra

-professora

-Psicóloga

Segurança

Atribui

importância ao

diagnóstico por ter

um caracter

esclarecedor das

características do

filho que até ai

eram mal

entendidas.

Dificuldade em

lidar com as

características por

não se saber de

onde surgiam

Psicóloga: Pode partilhar comigo como tem

sido para si viver com o diagnóstico?

Entrevistada: Eu senti que o diagnóstico foi

importante, quando a médica falou em

autismo até ela sentiu que era importante

para mim, porque sabendo do diagnóstico eu

poderia entender muita coisa que até ai não

entendia, por exemplo a questão da

autonomia, eu que sou muito persistente, ele

não desenvolvia e eu tentava ao máximo

desenvolve-la. Quando ele entrou para

escola, não conhecia a professora não é, não

vinha do agrupamento, e ela dizia que ele era

um menino mimado e não tinha autonomia

nenhuma, mas não, ele precisa de atenção e

tem é uma fala abebezada e a questão da

autonomia, que ela não soube lidar, não sabia

da problemática. Questões como a do lanche,

o Rodrigo via o lanche e ficava a olhar para

ele a perguntar “o que é que eu faço?”, ele

nunca tinha tido a experiencia de levar o

lanche para a escola, era algo novo e ele não

sabia gerir, dai que a professora achasse que

ele não tinha autonomia e que queria que

andássemos de volta dele a fazer tudo.

Importância do diagnóstico

Entendimento das

características

Professora actual

bastante

empenhada, inicial

reunião com

psicóloga,

terapeuta da fala e

pediatra para

esclarecer o

enquadramento do

menino na

Psicóloga: Compreendo, muitas vezes as

características do síndrome são mal

interpretadas…

Entrevistada: Exactamente acho que era

isso que estava a acontecer. O que interessa é

que esta professora tem sido de uma entrega

total e é muito perspicaz. Ela sempre disse

que ele devia ter alguma coisa, sempre disse

que não sabia o que era. Mas um dia ela

reuniu-se ao final do dia com a pediatra,

psicóloga, e na altura a terapeuta da fala,

apesar de agora já não ter terapeuta da fala,

Valorização do suporte escolar

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131

patologia.

Professora mais

atenta a essas

dificuldades.

era so aquela questão da fala abebezada

típica dos meninos com asperger, e que só

falava assim em algumas situações e não

sempre. Então a pediatra conseguiu revelar á

professora em que medida o meu filho se

enquadrava na problemática do autismo e

professora apartir dai este mais atenta,

haaam, para essas questões e percebeu que

ele de facto se enquadra.

Professora como

bom suporte nas

dificuldades do

filho.

Tranquilização na

questão escolar

dada a professora

ser empenhada no

ensino do filho e

integração em

atividades

Passam a perceber

as dificuldades do

seu filho à

alteração de rotina

como resultado da

frustração e em

sofrimento

anormal para a

situação

Psicóloga: Sente então que esse apoio

escolar é importante?

Entrevistada: Ah, sim! Super importante.

Em termos de professora estou super, super

tranquila, sei que ela faz tudo o que deve ser

feito ela ensina de uma maneira

extraordinária. Este ano já começou o teatro

e ele teve uma evolução fantástica com a

ajuda da professora, porque antes ele não

mostrava nenhum interesse por aquilo que

fazia, era muito demorado a fazer as

atividades, muitas vezes ele chorava, e eu via

isso também em casa, quando era para fazer

uma nova atividade e nós sabíamos que ele a

conseguia fazer, e ele chorava perante a

nossa exigência e bloqueava de forma

exagerada e sofrida, dai que achássemos

estranho o porque de ele agir assim, porque

nós não lhe estávamos a bater nem a fazer

mal, só a pedir para fazer uma atividade, e ele

não parava de chorar, o choro era um choro

normal agora a cara era uma cara sofrida,

para ele era muito grave.

Suporte sentido nível escolar

-sentimento de tranquilização

-atenuamento das dificuldades

do filho

Compreensão da característica

de comportamento

Suporte escolar

propiciou o seu

desenvolvimento

pelas atividades e o

seu filho anda mais

alegre falando das

atividades e

explicando o que

faz, ao contrário

do que fazia antes,

isso parece ter

Psicóloga: Compreendo, era um choro

pouco ajustado à situação.

Entrevistada: Era! Exagerado. Hoje é o

oposto, vem da escola muito feliz, entra no

carro, antigamente tentávamos puxar por ele

para dizer algo, para saber quando havia

festas onde ia representar, o que tinha feito,

nada. Ou sabia porque a educadora tinha

contacto diário conosco e questionava. Hoje

não, hoje entra no carro todo contente, diz o

que fez, explica o que a professora ensinou,

está motivado, diz que a professora ensina

muito bem e aplica as estratégias que a

professora ensina. Em casa já é mais

relaxado, parece desleixado mas é aquela

Desenvolvimento face ao

suporte escolar

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132

grande impacto na

mãe.

Sente que aprende

bem sendo um dos

melhores alunos a

algumas

disciplinas.

característica dele, mas na escola de facto é

onde ele acho que está melhor. Ainda bem

que optamos por o meter na escola, e não

ficar para trás, porque apesar dos sinais de

imaturidade ele aprende muito bem… tem

dificuldades ao nível da coordenação motora,

mas a nível da matemática, português e

estudo do meio aprende muito bem é

considerado mesmo pela professora um dos

melhores alunos que tem na sala.

Valorização das suas

capacidades

Professora atenta

às dificuldades e

com capacidade de

lidar com elas,

realce para a

capacidade de

antecipar sendo

essas uma das

maiores

necessidades para

o desenvolvimento

destas crianças.

Psicóloga: Vejo que isso a alegra bastante.

Entrevistada: Imenso. A professora tem

uma experiencia a ensinar e no ensino

especial, está atenta às dificuldades, ela não

sabia o que ele tinha mas sabia detetar as

dificuldades, e sabe-lhe chegar, sabe

antecipar o que vai fazer…

Valorização e confiança no

trabalho desenvolvido pela

professora

Sente-se esgotada

pela sua obsessão

em compreender

mais sobre SA

para corresponder

às necessidades do

filho

Sentimento de

necessidade de

presença constante

para orientação

Tempo

preenchido, é

necessário em casa

apoiar e estimular

o filho em

determinadas

tarefas.

Psicóloga: Hum hum... E como a Lara se tem

sentido após o diagnóstico?

Entrevistada: Pois… isto tem sido quase

que uma obsessão minha em perceber o

problema… quero ajudá-lo o mais possível

então procuro toda a informação e mais

alguma e isso esgota-me. Porque quero fazer

o mais que poder, e depois a questão das

estratégias não é? Uma pessoa todos os dias

tem qualquer coisa para fazer com ele fora de

casa, quando estamos em casa também. Não

podemos descansar nunca, temos de estar ao

pé dele, o trabalho dele tem de ser todo

orientado, senão demora ainda mais tempo.

Se já está uma hora pior seria. No meio disto

tudo o menino tem uma característica que

é… o tempo que tem livre ele não brinca, ele

não sabe brincar, ou melhor, ele brinca mas

não como gostávamos que brincasse. O que

ele mais gosta é ver televisão, ver filmes da

Disney, gosta de ver filmes de menina, com

princesas, Cinderela, Frozen, coisas assim,

nada de super-heróis, carros… nunca gostou

de ver nada, os outros vê e revê. E livros...

gosta muito de livros, sobre animais, corpo

humano, do espaço, são estes temas que ele

mais gosta também na sala de aula. Portanto

Esgotamento

Foco em compreender SA

Sentimento de necessidade de

presença constante

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133

Preocupação com

o tipo de

brincadeiras, não

comuns, sente

necessidade de o

ensinar a brincar

de acordo com o

esperado e de

forma a

proporcionar

momentos para

desenvolver as

capacidades do

filho

Sentimento de

cansaço ao fazer as

tarefas todas que o

filho precisa,

sentindo ajuda por

parte da filha mais

nova que é

autonoma.

o interesse dele é este, quando tem tempo

livre se nós não proporcionarmos uma tarefa

orientada, porque se não orientar mos ele não

faz, e nem procura fazer nada, fica de volta

do tablet e televisão e livros… isso

controlamos mas gostávamos que ele fizesse

mais coisas, jogasse a bola, fizesse legos,

puzzles… essas coisas que os outros meninos

fazem não é? Faz bem… e quando queremos

que faça estas atividades de brincar temos de

ser nós a proporcionar esses momentos mas

lá está requer que estejamos presentes…

dizer “Pronto, agora vamos fazer um puzzle”

e ele faz… ele faz puzzles de 100 peças na

idade dele está muito bem, faz mas quer a

ajuda, ele é capaz de fazer sozinho mas

prefere que estejamos lá perto dele. Dai que

em relação a pergunta que me colocou, para

nós é muito cansativo! E não é filho único,

temos uma filha mais nova, mas é uma

grande ajuda, autónoma e ajuda temos muito

tempo para ele. Mas nós não temos

nenhum… para nós é aquele bocadinho

depois de o deitar e deixa nos exaustos…

Responsabilização pelo seu

desenvolvimento (tentativa de

normalização)

Cansaço

Exaustão

Reconheceu uma

característica da

sua personalidade-

exigência-

apontada por si e

revista pelos

familiares e

professora

Exigência para os

dois filhos,

contudo exigência

adapatada com

mais paciência

sobre o filho com

SA

Psicóloga: O que representa para si ter um

filho com este síndrome?

Entrevistada: Deu-me a entender muitas

coisas, como a minha exigência… eu exijo

muito também da minha outra filha, mas sei

que exijo mais do meu filho porque ele

precisa que puxe por ele. A minha irmã chega

a dizer que sou demasiado exigente com ele,

aliás de ser exigente e muito mais... A

exigência deles não muda, mas tem de ser

adaptada, ora tenho de ter mais paciência,

não castigo tantas vezes, embora continue a

fazer, mas penso o que está por traz daquilo,

ou seja nunca deixo de exigir o que acho que

tenho de exigir de um filho, tenho de lhe

desenvolver várias competências, embora

saiba que não posso desenvolver todas elas,

mas tento ao máximo. Enquanto eu não sabia

o diagnostico dele era mesmo muito

exigente, ate a professora perguntava “A

Lara não acha que está a exigir de mais?”

mas acho que estou no caminho certo, a

psicóloga diz que sim, a pediatra diz que

sim… eu continuo a ser assim. Ele já mostrou

que se eu insistir ele demora muito mas

Reconhecimento da sua

exigência sobre o filho com SA

Atitude mais paciente.

Valorização da opinião dos

profissionais

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134

Ajuda para

desenvolver

competências e

tarefas do filho

Como algo

entendido por si

como importante

A mãe tenta

contrariar as

questões

alimentares,

selecções e

sequencias que o

filho definiu de

forma a não se

prender a comer

apenas certos

alimentos e de

certa forma,

tentando

contrariar essa

característica do

SA.

corresponde, por exemplo ao vestir, ele

veste-se, sabe-se vestir, tem preguiça, é

muito demorado a fazer as tarefas, mas faz…

ele aperta os botões, veste-se, a única coisa

que não faz é atar os cordões. Já para comer

ele come de tudo porque eu obriguei-o a

comer sempre de tudo. Isto essencialmente

porque meto tudo no prato, não posso partir

da ideia que não gosta, e espero da reacção

dele, se provocar vomito ele não gosta… mas

mesmo nessas situações ele voltava a meter

no prato. Tipo lulas… ele não comia a

imenso tempo e pensei que me ia mandar

uma volta, agora que estamos numa fase

diferente ele tem o direito de não gostar de

certas coisas, não gosta de queijo e camarão,

tem direito como nós a não gostar, mas há

coisas que ainda não estão definidas se gosta

ou não e eu continuo a colocar no prato,

porque uns dias diz que gosta outros que não

gosta, e eu continuo a meter no prato até ver

se gosta ou não… Mas não é só nisso que

falo, é também das sequências, comia batata,

depois arroz, depois carne… demorava mais

tempo, não misturava, e eu obriguei-o a

misturar, claro que as vezes faz um pouco

sequencia mas lá vai misturando. No início

quando disse para misturar as coisas do prato

ele comia um pouco de batata depois um

pouco de carne e olhava para mim, do género

“o que é que eu como a seguir?”, “Olha

Rodrigo comes outra coisa que não tenhas

comido agora!” mas é um sinal…Ainda hoje

foi arroz com feijão e ele come! Outra coisa

é isto das comidas misturadas, arroz com

qualquer coisa, tipo arroz de frango, come

uma coisa depois outra… mas pronto vai

comendo um pouco de cada de cada vez…

porque eu contrario aquilo que tem na

cabeça. Por isso digo que vale a pena

batalharmos porque há muitas coisas que

mudam, muitas coisas que já foram

conquistadas e nem me lembro, porque de

facto ele é capaz, no entanto também entendo

que hajam outros meninos que não o

consigam, não sejam capazes, casos mais

complicados… mas ele é portanto vou

puxando por ele nesse sentido em tudo é

uma das minhas estratégias para conseguir

que ele consiga, insistir, enquanto ver

resultados é assim. E estou sempre atenta a

Apoio nas dificuldades do filho

Tentativa de normalização

Necessidade de estar atenta

Valorização das capacidades do

filho

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Está atenta a todas

as oportunidades

para melhorar o

entendimento do

filho

Refere

importância de se

estar atento às

dificuldades e

explicar ou

descodificar a

situação em si.

tudo, alguma coisa nova, tento sempre dar a

volta… ainda no outro dia vinha a dar aquela

musica dos D.A.M.A. que dizia –vamos

alcançar as nuvens- e ele disse: “Mamã,

alcançar as nuvens?” e eu agarrei logo nisso

e perguntei o que entendia por isso,

questionei-o e tentei por uma ideia simples

para explicar outras coisas, para explorar…

Psicóloga: Claro, a comunicação nos aspies

é entendida de forma literal é importante

descodifica-la quando há sentidos

ambivalentes…

Entrevistada: Isso… e daí que o saber o

problema e conhecer o que envolve é muito

bom para nós, porque se formos espevitadas

vamos entendendo o que surge. Porque

apesar das terapias, tudo o que for aprendido

no momento mais vale… ah, e até porque ele

é muito curioso, e questiona-nos e temos de

aproveitar quando questiona, tem memória

fantástica… por aí.

Toda a informação

que tem do SA é

integrada e

passada a pratica,

isso fá-la não se

sentir perdida

como inicialmente

se sentiu.

Noção de

empregar o tempo

todo no

desenvolvimento

do filho.

Psicóloga: Então qual entende ser o seu

papel como mãe?

Entrevistada: Mostrar-lhe que não está

sozinho, que o amo muito… Apoiar, porque

além de saber as informações todas, ter a

teoria nada serve se não passar a pratica e

isso é que é o mais difícil, embora até ache

que me esteja a safar bem, não me sinto

perdida como alguns pais se sentem lá no

grupo aspies. Tento dedicar o meu tempo

todo, trabalhar as coisas que estão em

deficit…

Coping emocional

Prestar apoio pratico

Sentimentos: orientação quanto

ao problema

Dedicação total

Aceitar o filho

como é, sem sentir

pena, com

perceção de ser um

espectro leve

Noção de bastante

suporte por parte

dos pais e

Psicóloga: Trabalhar no sentido de

ultrapassar as dificuldades…

Entrevistada: Claro, porque há pais que

negam-nas, eu aceito-o mas também não me

sento a sombra da bananeira nem tenho pena

do meu filho, sinto sim tristeza por situações

que vivenciou e possa vivenciar e o deixe

menos feliz. Mas não é pena, sei que não

deverá ter o problema muito avançado, não

vejo isso, vejo que as características são

leves, a psicóloga e pediatra também, dentro

Aceitação do problema

Expectativas positivas dado o

suporte dado

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136

profissionais que

acompanham o

filho leva a

sentimento de

tranquilização face

ao futuro.

Apoio muito

regulado por

pouca

permissividade da

parte dos pais.

Apoio dirigida

para a orientação

dos aspies é de forma leve. Elas já referiram

que nós temos sido pais fantásticos, dizem

que é graças a nós que ele é como é. E nós

dizemos que também é muito graças a elas!

Mas elas dizem que se não tivéssemos

actuado desta forma, secalhar ele tinha mais

dificuldades, tinha as características mais

acentuadas porque não somos muito

permissivos, hora para comer é para comer,

hora para vestir, estamos lá mas é ele que

veste, no trabalho de casa a mesma coisa,

incutir nele as coisas, com ajuda mas orienta-

lo para ele ser independente. Acho que parte

das duas partes…

Pouca permissividade

Promoção da autonomia

Sentimento de

apoio contudo é a

mãe a figura

dominante, tem o

papel mais ativo e

o marido um papel

mais passivo de

apoiar,

acompanhar e

colaborar em algo

falado.

É a mãe que está

mais presente

Falta de apoio

sentido por parte

dos familiares.

Reforço do

sentimento de

passividade por

parte do marido

antes do

diagnostico, como

se não existisse

problema e

Psicóloga: E como sente o suporte a nível do

seu conjugue?

Entrevistada: Ele no início questionava-se

se era o diagnóstico certo, mas quando viu

que sim apoia-me em tudo, com o menino

ajuda onde pode, é um pouco mais

permissivo, mas nas questões de educar tenta

ser exigente. Claro que eu é que domino

nesta questão, em todas as casas há alguém

que domine, normalmente a mãe. Enquanto

eu fizer as coisas ele deixa-se levar, se for

para fazer ele faz, mas sou eu que lhe passo a

informação, acompanho o menino as

consultas, disse que era importante ir a

psicóloga e ele foi, agora em Abril também

vou ao Dr. Lobo Antunes e gostava que ele

fosse e ele vai, pronto há determinadas

situações onde faço questão que ele esteja e

ele está lá e apoia e acompanha, mas de um

modo geral é a mãe que tá ali.

Psicóloga: E relativamente aos seus

familiares?

Entrevistada: Hum… não sinto muito

apoio… sinceramente… é aquela questão, o

menino é um menino que engana bem… se

não fossemos nós, quer dizer mais eu, não o

pai, não teria nada, ele não parece ter nada,

porque para o pai por ele está sempre tudo

bem não é nada, eu é que percebia que algo

não estava bem e queria procurar saber, e ele

sempre disse ok então vai. E portanto, lá

Relutância vs aceitação e apoio

Pai mais permissivo

Mãe papel dominante e ativo

nas questões do SA

Fraco suporte familiar

Desvalorização do diagnóstico

por parte dos avós

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137

insistência da mãe

para perceber o

que se passava.

Crença dos

familiares em que

as características

se dissipavam com

o crescimento

está… ele passa bem como um menino que

não tem nada, quem olha para ele não vê

nada, depois há várias opiniões… os avós

secalhar até acreditam no diagnóstico, quer

dizer não é acreditar… até dizem que pode

estar certo mas sempre que é exagero…

tenho essa noção, porque as pessoas dizem

que passa, que é pequenino e passa, vou

ouvindo muitas vezes…

Refere aceitação

do diagnóstico, isto

é do problema por

parte de alguns

irmãos do marido,

contudo não refere

apoio.

Muito abordada

quanto ao filho

não parecer ter

nada o que vai ao

encontro do

relatado

literariamente

como síndrome

invisível.

Dificuldades dos

outros em verem o

problema no seu

filho.

Mais evidente é a

dificuldade de

socialização e isso

mostra-se uma

preocupação sua

Psicóloga: Hum, hum …

Entrevistada: Por exemplo os tios, da parte

do meu marido há uns que aceitam bem, ok

tem problema estão a tratar, quer dizer há um

diagnostico não questionam a veracidade do

diagnostico está a ver?

Psicóloga: Sim, sim…

Entrevistada: Há outras pessoas que

também não questionam, mas continuam a

afirmar que parece um menino normal se não

tivéssemos dito nada…

Psicóloga: Compreendo, este síndrome até é

apelidado de síndrome invisível por essa

mesma questão de não ser algo visto a olho

nu.

Entrevistada: Engraçado… nem sabia mas

sim faz sentido, porque todos o dizem e de

facto só estando com ele mais tempo se vê.

Por exemplo ele é muito imprevisível e em

algumas situações pergunto se não reparam e

eles dizem que não , não reparam… oh

bolas… eu acho que é evidente, ele é um

menino chato a brincar, o problema da

socialização, o problema que mais me

preocupa, porque é com isso que vai ter de

viver para o resto da vida, é a mais evidente

nele e a que mais me preocupa. Há um

afastamento dos colegas, não por parte deles

mas porque acho que ele não tem interesse

mesmo por brincar, está mais com as

meninas sobretudo as da mesma idade, mas

elas também se saturam de brincar com ele.

Há uma situação muito gira, umas duas

meninas mais velhas que gostam muito dele

e costumam estar no recreio juntos, e já li que

é costume eles lidarem com amigos mais

velhos. Mas para voltar a questão inicial, a

minha irmã que é psicóloga quando eu disse

que o menino era asperger ela disse que eu

era doida… ela chegou me a mandar uma

Aceitação do problema por parte

de alguns irmãos do marido

Dificuldade do outro em ver o

problema

Preocupação acerca da

socialização

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Desvalorização do

diagnóstico por

parte da irmã que

é psicóloga, sendo

agressiva com ela e

afirma estar a

criar problemas,

culpabilizando-a

de o

superproteger,

mimar.

mensagem no facebook bastante violenta,

que era eu que estava a criar problemas e isso

foi muito complicado para mim, ainda agora

não temos uma relação boa por causa dessa

situação, e continua a dizer que o menino é

mimado, atribuía o ele não ser desenrascado

a ter sido superprotegido por mim, e falei

disso a psicóloga, e falou-me que não… eu

era uma mãe muito dedicada apenas isso,

mas deixava ele fazer as coisas, por isso me

custa aceitar o que me disse.

Descredibilização do

diagnóstico por parte da irmã.

Tristeza

Má relação com a irmã após o

diagnóstico

Culpabilização das

características do filho por parte

da irmã, superproteção

Amigos são um

suporte para si,

sente que pode

falar sobre o

assunto ao

contrario de com a

sua irmã

Entendida uma

necessidade de

falar sobre o

assunto com

alguém e é nos

amigos que o

consegue fazer.

Apesar de toda a

validação pelos

profissionais os

familiares não

aceitam o

diagnostico como

verdadeiro e isso

fá-la sentir-se

incompreendida

Psicóloga: Imagino que para si seja

complicado não ter apoio por parte da sua

irmã neste assunto sendo ela profissional na

área.

Entrevistada: Muito… ela trata-me como se

fosse maluca mesmo.

Psicóloga: E no que toca aos seus amigos,

como tem sido para si?

Entrevistada: Amigos… Esses sim, lá

está… tenho amigos que o conhecem e os

que não conhecem, e todos eles acreditam no

diagnostico dele, engraçado… com eles há

espaço para isso, algo que nunca tinha

pensado bem, tenho mais espaço para falar

disso com eles que com a minha própria

irmã…

Psicóloga: Sente que a apoiam mais a esse

nível…

Entrevistada: Sim, porque eu sou uma

pessoa que como já viu preciso muito de

falar… e nesse nível ajuda muito, estou a

vontade com eles, porque como falava

demasiado com a família da minha

preocupação começaram a achar que era

obcecada.

Psicóloga: Como é para si sentir isso dos

seus familiares?

Entrevistada: Para mim é algo muito mau,

faz-me sentir incompreendida como se

defendesse algo absurdo mesmo

fundamentado pelos psicólogos, pediatras,

professoras…

Tristeza pela falta de apoio da

irmã

Aceitação e credibilização do

diagnóstico por parte dos

amigos

Apoio do grupo de pares

Sensação de necessidade de

falar

Acusação de ser obcecada pela

família

Sentimento de incompreensão

pelos familiares

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Aquando o

pediatra remeteu

para o facto do seu

filho não estar em

contacto próximo

com o outro no

mundo

profissional, sentiu

que não seria bem

assim, não o coloca

de parte no futuro.

Acredita nas suas

capacidades para

ser o que quiser.

Acredita melhorar

as características

do filho num

futuro, como

presentemente já

melhorou a vários

níveis

Valorização das

capacidades do

filho adquiridas

pelo seu

interesse/foco

Psicóloga: Compreendo… E quanto ao

futuro do seu filho, quais as suas

expectativas?

Entrevistada: Podia não imaginar nada já,

mas imagino, eu ouvi da pediatra quando me

falou das questões do meu filho “claro que o

seu filho nunca vai estar a frente de um

balcão” mas o nunca não me entrou!

…“nunca vai estar a comunicar com alguém

em termos futuros de um emprego” e eu não

gostei… na altura falou mas acho que nunca

podemos dizer nunca… ele vai ser o que

quiser, o que der certo, pode ou não fazer

isso, é uma coisa em aberto, não quer dizer

que vá fazer uma coisa que vá contrariar as

características da síndrome, mas irá com

certeza fazer algo que o faça feliz e goste. E

lá está tenho esperança que como a pediatra

diga muita coisa se possa trabalhar, e muito

coisa já correu bem, na escola, na atitude em

tudo o que faz. Em casa temos de trabalhar

muito e estar ligados a professora e psicóloga

mas em tudo o que faz, cumpre, e acima de

tudo, vem satisfeito. Hoje ele vai a uma festa,

sabe o que tem de fazer, tem vontade e está a

evoluir com tudo isso. Este ano por exemplo,

porque os interesses vão variando, ele está

obcecado pelo corpo humano, e os livros que

tem não lhe chegam, faz questões muito

interessado, pede mais livros… e eu não sei

se não terá futuro até numa área dessas, com

um curso superior no lado da ciência, mas até

pode não acontecer nada disso… ele tem

capacidades, estuda bem, vamos ver… uma

coisa ou outra será sempre bom. Mas convém

que eu o faça gostar também das coisas que

os outros meninos gostam!

Credibilização nas capacidades

do filho

Noção da necessidade de

trabalho

Tentativa de normalização do

filho

Preocupação com

questões de

bullying, de

momento bullying

comum sobre

Psicóloga: Quanto a receios falou-me da

questão da socialização…

Entrevistada: Sim... As questões de

bullying, de se isolar, porque ele é um miúdo

muito alegre e deixe de ser por isso e que se

aperceba das questões do gozo, seja

Medos: bullying

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9.5. Quadro de temas emergentes IPA

9.5.1. Caso I

Quadro 1

Decisão de não ter mais filhos

Surpresa, desorientação e medo

Falta de informação

Cansaço dado o grande envolvimento

Acompanhamento no CADIN – maior tranquilidade

Início difícil Vs recentemente com suporte

Procura de suporte escolar

Sentimento de integração – sentido de normalização

Suporte prático e apoio emocional

Necessidade de ter atitude paciente

Mãe mais paciente pai menos.

Acompanhamento crucial para o desenvolvimento

Pai como prestador de apoio na lida da casa e tarefas do filho em casa

Família - aceitação e grande fonte de apoio

Grupo de pares sem grande conhecimento – não procuram apoio

Condições para ter um futuro promissor

Boa preparação e maior maturidade para lidar com problemas na para a vida

adulta

Receios - Inicialmente não ter independência e vida social (exclusão)Vs

recentemente receios comuns

Sobrevalorização das competências sociais para desenvolvimento escolar

Vários acompanhamentos e diferentes sessões

Valorização do CADIN e de um colégio adequado

aspetos comuns,

contudo receio que

possa passar a ser

constante.

Entendimento de

que as

características do

SA o podem até

ajudar dado que

não entende bem ,

não pensa muito

nisso.

agredido. Ele já me disse que lhe chamam

caixa-de-óculos… para já o que vejo é

bullying relacionado com coisas tipo nos

miúdos como isso de usar óculos, só não

queria que fosse norma. Quero que ele seja

feliz. Secalhar o facto de ter asperger o ajude

nesse sentido, porque nestas questões parece

não entender bem o porque dos colegas

fazerem essas coisas, acaba por o proteger

não entender, custa no momento mas depois

não pensa. Talvez essa característica agora

me deixe mais descansada.

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Suporte escolar – inicialmente fraco e sem intervenção Vs Atualmente forte e

com integração

Valorização do suporte escolar, psicóloga (sentida como orientadora) e CADIN

Sentiu-se perturbada face ao bullying

9.5.2. Caso II

Quadro 1

Abandono da profissão

Problemas conjugais agravados com o diagnóstico

Stress, susto

Sentimentos de proteção

Diagnostico como esclarecimento

Coping ativo (procura de informação e acompanhamento) instrumental e

emocional

Acompanhamento a consultas

Valorização do acompanhamento – tranquilização pelo progresso de

socialização

Preocupações a nível emocional e profissional ( no contacto com o Outro)

Receio que seja pessoa fechada

Desejo de normalização a nível emocional

Sensação de afastamento social

Consentimento da chamada de atenção do marido

Desinvestimento em si mesma – centração no apoio do filho

Noção de rotina, cansaço, exaustão, queixas psicossomática- enxaquecas)

Suporte escolar positivo

Valorização da aliança entre psicóloga e professora – melhoramento da

socialização

Marido apoia nas tarefas escolares, menos paciente

Marido entende alguns cuidados excessivos

Aceitação familiar, sem procura de apoio

Suporte grupo de pares – favorecimento do campo relacional mãe e filho

Crê num futuro académico positivo mas dificuldades profissionais no contacto

com o Outro

Acredita em dificuldades a nível de criação de laços afectivos (preocupações

afectivas)

Diagnóstico com propensão a evoluir positivamente

Noção de que desenvolveu atitude mais paciente e capacidade de coping sobre

o filho

Valorização do acompanhamento

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Sentimento de alteração do seu Eu

Desistência dos seus hobbies

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9.5.3. Caso III

Quadro 1

Reaproximação conjugal e envolvimento no acompanhamento

Preocupação e não-aceitação do diagnóstico de psicanalista - Sentimento

de ser má mãe

Procura de um diagnóstico correto e acompanhamento especializado

Mãe como pilar

Identificação mas surpresa com o diagnóstico

Pouca informação

Alívio e aceitação do diagnóstico

Fornecer suporte instrumental para lidar com SA

Desinteresse na adesão a fármacos

Alteração do quotidiano familiar – maior cansaço

Rotinas e entendimento literal como características mais trabalhosas.

Persistência de algumas rotinas cansativas em prol do seu bem-estar

Energia direccionada para a resolução do problema – exaustão

Perceção de que nem tudo é controlável

Valorização do seu suporte do suporte do núcleo familiar

Suporte Escolar - integração

Necessidade de ter professora empática

Contentamento pelo desenvolvimento das capacidades interpessoais

Suporte familiar do lado materno Vs falta de suporte família paterna

Envolvimento da família materna no acompanhamento

Negação do diagnóstico por parte da família paterna

Família paterna não vê as características do síndrome como um problema

Receio do preconceito por ser representado como uma forma de Autismo

Desejo de normalização

Pouco do tempo livre dedicado a família e amigos do contexto familiar

Receio do olhar crítico dos outros

Boa adaptação/ resposta às crises relacionadas com o síndrome

Valorização da aceitação e suporte dos amigos próximos

Noção da exigência do filho com SA face aos outros

Dificuldades e tentativa de normalização sobre a restrição alimentar

Papel maternal de persistência e negociação Vs pai menos paciente

Maior valorização da insistência sobre a sensação de perca do seu bem-

estar

Encara futuro positivamente

Responsabilização pelo suporte e desenvolvimento

Receios quanto às suas crises (impulsividade e distracção)

Uso da negociação como estratégia

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Marido Inicio do diagnóstico (relutante) Vs atualmente (sem resistências)

Procura activa de informação

9.5.4. Caso IV

Quadro 1

Sentimentos de surpresa, tristeza, desespero e pouca informação

Acompanhamento adequado - segurança

Importância do diagnóstico como esclarecedor

Valorização do suporte escolar - Sentimento de tranquilização e atenuamento

das dificuldades

Coping ativo, instrumental e emocional.

Valorização do filho

Sentimento de esgotamento - Foco no suporte e compreensão do SA

Responsabilização pelo desenvolvimento –Tentativa de normalização

Necessidade de estar atenta, ser exigente e paciente - Dedicação total

Expectativas positivas dado o suporte

Pouco permissividade - Promoção da autonomia

Suporte conjugal relutância Vs aceitação e apoio

Pai mais permissivo Vs Mãe papel dominante e ativo

Fraco suporte familiar - Descredito do diagnóstico por parte de avós e irmã –

acusação de obsessão

Culpabilização por parte da irmã - tristeza

Sentimento de incompreensão

Credibilização do problema pelos cunhados

Dificuldade do outro em ver o problema

Preocupações a nível da socialização

Suporte do grupo de pares - apoio na necessidade de falar

Valorização das capacidades do filho

Noção de necessidade de trabalho

Receio de bullying