2. modelos matemÁticos de sistemasintranet.deei.fct.ualg.pt/sc/apontamentos/modelos matematicos...

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2. MODELOS MATEMÁTICOS DE SISTEMAS Os Sistemas de Controlo Automático são entidades fundamentais numa sociedade industrializada. Para se introduzir os primeiros conceitos considere-se o Exemplo 2.1. Exemplo 2.1: A regulação da temperatura dum forno pode-se esquematizar, simplificadamente, pela Fig.1.1. potência referência Interior do forno saída Elemento de realimentação _ + actuação potência referência Interior do forno potência referência Interior do forno saída Elemento de realimentação _ + Elemento de realimentação _ + actuação Fig.1.1 – Diagrama de blocos para um sistema de regulação de temperatura de um forno. A partir deste exemplo apresentam-se alguns conceitos: Sistema: conjunto de componentes que interactuando realizam determinada função que não é possível de ser realizada por uma das partes isoladamente. Entrada (de referencia) – sinal de entrada do sistema global, uma ou várias. Saída – saída ou resposta do sistema (uma ou várias). Actuação – sinal de controlo, actua directamente no processo.

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2. MODELOS MATEMÁTICOS DE SISTEMAS

Os Sistemas de Controlo Automático são entidades fundamentais numa sociedade

industrializada.

Para se introduzir os primeiros conceitos considere-se o Exemplo 2.1.

Exemplo 2.1:

A regulação da temperatura dum forno pode-se esquematizar, simplificadamente, pela

Fig.1.1.

potênciareferênciaInterior

do forno

saída

Elemento de realimentação

_+ actuação

potênciareferênciaInterior

do forno

potênciareferênciaInterior

do forno

saída

Elemento de realimentação

_+

Elemento de realimentação

_+ actuação

Fig.1.1 – Diagrama de blocos para um sistema de regulação de temperatura de um forno.

A partir deste exemplo apresentam-se alguns conceitos:

• Sistema: conjunto de componentes que interactuando realizam determinada

função que não é possível de ser realizada por uma das partes isoladamente.

• Entrada (de referencia) – sinal de entrada do sistema global, uma ou várias.

• Saída – saída ou resposta do sistema (uma ou várias).

• Actuação – sinal de controlo, actua directamente no processo.

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João Miguel G. P. B. Lima Capítulo 2 MODELOS MATEMÁTICOS DE SISTEMAS

2

• Sistema em malha aberta: saídas não afectam as entradas não influenciando

assim o desempenho do sistema1.

• Existência de sensores (modificam as entradas como resultado do valor da saída)

Efeito de realimentação

• Sistema de malha fechada: saídas têm efeito nas entradas contribuindo para a

regulação do funcionamento do sistema.

O exemplo acabado de apresentar pode ser estendido às mais diversas áreas do

conhecimento encontradas no quotidiano. É de interesse indiscutível a compreensão,

caracterização e modificação do comportamento dos fenómenos físicos e não só, como

por exemplo:

• Estudo de um canal de comunicação entre um satélite e uma estação terrestre

• Comportamento de um robot

• Evolução do consumo de energia eléctrica numa dada cidade

• Funcionamento de um motor eléctrico

• Reacção química de um processo industrial

• Actividade cerebral humana

• Inflação verificada na economia de determinado país

• Evolução do número de indivíduos num determinado ecossistema

• Resposta de um circuito eléctrico montado no laboratório de Análise de

Circuitos

... ... ...

Então, o controlo de sistemas tem aplicação uniformizada a um grande número de áreas

diversas tais como:

o Engª Electrotécnica

1 Será bom?

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João Miguel G. P. B. Lima Capítulo 2 MODELOS MATEMÁTICOS DE SISTEMAS

3

o Engª Química

o Eng. Aeronáutica

o Eng. Mecânica

o Eng. Ambiente

o Economia

o Politica

o Ecologia

... ... ...

Os Sistema de Controlo facultam o desenvolvimento formal de técnicas analíticas

unificadas que permitem a Concepção de Sistemas dos quais os anteriormente

apresentados são exemplos.

Assim, podem-se apresentar as seguintes etapas principais para a concepção de um

sistema [1]:

1) Especificação: dizer como se quer que o sistema funcione.

2) Modelação: abstracção da realidade física, extracção da informação relevante,

simplificação da realidade física, utilização da linguagem matemática.

3) Análise: objectivo principal da 1ª e maior parte da disciplina; observação e

descrição do comportamento do sistema.

4) Verificação das especificações: Analisado o sistema, será que ele funciona de

acordo com pretendido?

5) Síntese ou projecto: realização ou modificação do sistema com vista ao

funcionamento deste cumprindo as especificações.

EXEMPLOS DE MODELAÇÃO E REPRESENTAÇÃO MATEMÁTICA DE

SISTEMAS

Para se chegar a uma representação uniformizada de sistemas recorre-se à apresentação de

alguns exemplos de sistemas de diferentes naturezas físicas.

A obtenção de modelos matemáticos de sistemas pode seguir duas abordagens diferentes:

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João Miguel G. P. B. Lima Capítulo 2 MODELOS MATEMÁTICOS DE SISTEMAS

4

1. Tradução matemática das leis que governam o sistema.

2. Identificação de sistemas.

Vai ser adoptado o ponto 1, sendo que, as leis que governam cada sistema em estudo

serão apresentadas sem explicação adicional.

Por vezes, o conhecimento que se tem de um dado sistema poderá ser incompleto. Noutros

casos, as leis que o governam poderão conduzir a modelos computacionalmente muito

pesados; ou ainda as suas propriedades poderão variar de um modo imprevisível; em todas

estas situações a abordagem do ponto 1 torna-se inviável, existindo como alternativa aquela

referida no ponto 2. Identificação de sistemas.

Dentro do universo de todos os sistemas que podem ser estudados, esta disciplina debruça-

se apenas sobre os sistemas lineares e invariantes no tempo (SLIT), estes sistemas,

obviamente, verificam o princípio da linearidade e da invariância no tempo, tal como se

define de seguida.

Princípio da linearidade:

Sejam y1 e y2 as saídas de um dado sistema A quando as entradas são respectivamente x1 e

x2. Então, A diz-se linear sse:

1. a entrada 1 2x x x= + faz com que a saída seja 1 2y y y= + .

2. a entrada faz com que a saída seja . 1kx 1ky

Generalizando, verifica-se o princípio da sobreposição. Seja n um número arbitrário de

entradas 1 2, , ... nx x x para as quais o sistema responde com as respectivas n saídas

; então, se a entrada for X uma combinação linear das n entradas, 1 2, , ... ny y y

1 1 2 2 ... n nX k x k x k x= + + + , a saída será Y uma combinação linear, com os mesmos

coeficientes, das respectivas saídas: 1 1 2 2 ... n nY k y k y k y= + + + .

Invariância no tempo:

Um sistema diz-se invariante no tempo quando a relação entre a entrada e a saída é

independente do instante em que se aplica a entrada.

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João Miguel G. P. B. Lima Capítulo 2 MODELOS MATEMÁTICOS DE SISTEMAS

5

Seja a saída do sistema quando à entrada é colocado o sinal ( )y t ( )x t . Então o sistema

será invariante no tempo sse a entrada atrasada ( )0x t t− origina uma saída com igual

atraso: . ( )0y t t−

2.1 SISTEMAS ELÉCTRICOS

Relembra-se que os elementos básicos de um circuito (sistema) eléctrico são a resistência, a

bobine e o condensador.

A análise de sistemas eléctricos recorre às leis que governam estes subsistemas

elementares. O estabelecimento de tais leis recorre às grandezas físicas: intensidade de

corrente eléctrica i que percorre o elemento e tensão v aos terminais do mesmo.

Semelhantemente ao que acontece com outras variáveis de sistemas de outras naturezas, a

corrente i e a tensão v designam-se respectivamente por variável através do elemento e

variável entre terminais do elemento.

O conhecimento das leis físicas que governam os elementos básicos permitem estabelecer

as relações no tempo, e as respectivas transformadas de Laplace, conforme se apresentam

na Tab.2.1.

Esquema

R ( )i t

( )v t

C ( )i t

( )v t

L ( )i t

( )v t

Relação no

tempo ( )( )v t Ri t= ( )( ) di tv t L

dt= ( )( ) dv ti t C

dt=

Transformada

de Laplace ( ) (V s RI s= ) ( ) ( )V s LsI s= ( ) ( )I s CsV s=

Tab.2.1 – Sistemas eléctricos elementares.

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As constantes R, L e C são respectivamente:

R – resistência eléctrica, mede-se em Ohm ( Ω ).

L – indutância da bobine, mede-se em Henry (H).

C – capacidade do condensador, mede-se em Farad (F).

Um sistema eléctrico mais complexo é, por exemplo, obtido interligando os subsistemas

elementares apresentados. Uma análise de tal sistema recorre às leis de Kirchoff:

• Lei de Kirchoff do equilíbrio das tensões: a soma algébrica das quedas das tensões

ao longo de um circuito fechado é nula.

• Lei de Kirchoff do equilíbrio das correntes: a soma algébrica das correntes que

atravessam uma superfície fechada é nula.

2.2 SISTEMAS MECÂNICOS

São considerados 2 tipos de sistemas mecânicos consoante o tipo de movimento executado

pelos seus componentes:

• Sistema mecânico translaccional: os movimentos das componentes fazem-se

segundo um determinado vector.

• Sistema mecânico rotacional: os movimentos das componentes fazem-se em torno

de um determinado eixo de rotação.

A descrição de sistemas mecânicos recorre às leis de Newton, segundo as quais:

• Lei fundamental da dinâmica: A soma das forças que actuam num determinado

corpo é directamente proporcional à aceleração que este adquire.

• Princípio da acção-reacção: Para toda a força de acção aplicada a um corpo

corresponde a uma força de reacção com a mesma direcção e módulo e sentido

contrário.

Como se verá na sequência, as leis acabadas de formular para sistemas mecânicos

translaccionais têm correspondência directa para sistemas mecânicos rotacionais.

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7

2.2.1 Sistemas mecânicos translaccionais

Paralelamente ao que aconteceu com o estudo de sistemas eléctricos, os sistemas mecânicos

vão ser abordados a partir de sub-sistemas básicos: massa, mola e atrito.

A massa é um elemento que armazena energia cinética. O estabelecimento de um modelo

matemático para este elemento recorre à lei fundamental da dinâmica, anteriormente

apresentada.

Suponha-se que uma dada massa, sujeita a uma força ( )f t , desloca-se segundo um eixo X

conforme se ilustra na Fig.1.2.

Fig.1.2 – Massa.

Então, a lei fundamental da dinâmica estabelece a expressão(2.1).

( ) ( )2

2d x t

f t Mdt

= (2.1)

em que:

f a resultante das forças aplicadas, mede-se em Newton [N],

x posição da massa, mede-se em metro [m],

M valor da massa, mede-se em kilograma [Kg].

A mola elástica é um elemento mecânico que armazena energia potencial elástica. De

acordo com a lei de Hooke para uma mola em hélice linear (não deformada) as forças

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aplicadas são directamente proporcionais às variações de comprimento produzidas, a

constante de proporcionalidade, K, denomina-se constante da mola e mede-se em . 1Nm−

A representação esquemática da mola apresenta-se na Fig.1.3.

Fig.1.3 – Mola.

Designando por f a força de restituição da mola, atendendo à lei de Hooke, pode-se

estabelecer o modelo matemático dado pela expressão (2.2).

( ) ( )f t Kx t= − (2.2)

O atrito é a força que se opõe ao movimento de 2 corpos pelo facto de estarem em

contacto. A força de atrito gerada em cada corpo tem sentido oposto ao seu movimento

relativamente ao outro corpo.

Nos sistemas mecânicos o atrito é como a resistência nos sistemas eléctricos, elemento

dissipador de energia, inevitável, mas nem sempre desvantajoso.

Trata-se de um elemento não linear podendo-se considerar dividido em 3 tipos: atrito de

Coulomb, atrito estático e atrito viscoso.

Por questões de simplificação apenas se irá considerar o termo linear do atrito viscoso cuja

representação esquemática se apresenta na Fig.1.4.

O modelo matemático para este elemento mecânico é estabelecido sabendo-se que a força

de atrito desenvolvida é proporcional à velocidade de um corpo relativamente ao outro, em

contacto, conforme a expressão (2.3).

( ) ( )dx tf t B

dt= − (2.3)

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A constante de proporcionalidade B é conhecida por coeficiente de atrito viscoso e mede-se

em . 1Nsm−

Fig.1.4 – Atrito.

Tal como aconteceu com os sistemas eléctricos, sistemas mecânicos mais complexos

obtêm-se por ligação dos sub-sistemas mais simples, como os acabados de apresentar,

considere-se o Exemplo 2.2.

Exemplo 2.2

Considere-se um veículo de massa M que se desloca por acção de uma força f sobre uma

dada superfície, Fig.1.5. A força é aplicada ao veículo por uma mola interposta de

constante K; entre o veículo e a superfície desenvolve-se uma força de atrito de constante

de proporcionalidade B.

Fig.1.5 – Sistema constituído por massa mola e atrito.

Pretende-se determinar um conjunto de equações que descreve o modelo do sistema; para

tal, é comum representá-lo recorrendo aos símbolos elementares, obtendo-se a Fig.1.6.

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Fig.1.6 – Representação do sistema recorrendo aos símbolos.

Tendo em conta o eixo X, seja x2 a posição da massa M e x1 o ponto de aplicação da força

na mola.

A soma das forças aplicadas à massa M é igual a aceleração provocada nesta. Verifica-se

que existem 2 forças aplicadas a esta massa, a força de atrito fa, e a força de restituição da

mola fK dadas pelas expressões (2.4).

( ) ( )2 ,adx t

f t Bdt

= − ( ) ( ) ( )( )1 2kf t K x t x t= − (2.4)

Sabendo-se que a aceleração é dada por ( )2

2d x t

Mdt

, então entrando-se com (2.4) pode-se

estabelecer a equação (2.5).

( ) ( ) ( )( ) ( )22

1 2 2dx t d x t

B K x t x t Mdt dt

− + − = 2

)

(2.5)

Voltando à Fig.1.6 verifica-se que a lei aplicada teve em conta apenas a posição x2 da

massa, existe contudo outro ponto x1 onde é necessário aplicar a lei do equilíbrio para que o

sistema fique completamente caracterizado.

A partir do princípio da acção-reacção a soma das forças que convergem para um ponto

deve-se anular. Assim, para o ponto x1 a força externa f deve equilibrar-se com a força de

restituição da mola fK dada pelas expressões (2.4), pode-se então estabelecer (2.6).

( ) ( ) ( )( 1 2f t K x t x t= − (2.6)

O modelo matemático do sistema em estudo é constituído pelas equações (2.5) e (2.6).

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11

De forma análoga ao que se obteve para os sistemas eléctricos, trata-se de um sistema de 2

equações diferenciais lineares de 2ª ordem de coeficientes constantes com 2 variáveis x1 e

x2. A perturbação externa (força f) pode ser considerada a entrada do sistema e cada uma,

ou ambas, as variáveis x1 e x2 podem ser tomadas como saídas.

Substituindo (2.6) em (2.5) para que nesta última figure f; passando as saídas (variáveis

dependentes) para o 1º membro e colocando-as por ordem decrescente de diferenciação,

(2.5) e (2.6) resultam no sistema (2.7).

( ) ( ) ( )

( ) ( ) ( )

22 2

2

1 21

d x t dx tM B f

dt dt

x t x t f tK

⎧+ =⎪⎪

⎨⎪ − =⎪⎩

t (2.7)

O sistema acabado de estudar ainda é suficientemente simples para que seja necessária uma

metodologia de análise mais estruturada. Contudo, essa metodologia existe e pode ser

particularmente útil para a análise de sistemas mais complexos.

As equações diferenciais que modelam um sistema mecânico podem ser determinadas

recorrendo-se à rede ou circuito mecânico.

Uma rede mecânica é uma representação em rede onde nos ramos figuram os elementos

mecânicos; cada nó corresponde os pontos do sistema sujeitos ao mesmo deslocamento.

Voltando ao exemplo em estudo, Fig.1.6, deduz-se que a rede mecânica deverá ter 3 nós:

nó de referência, x1 e x2.

nó de referência: superfície onde se move o veiculo; corresponde ao referencial em relação

ao qual se definem as posições x1 e x2.

x1: posição do ponto de aplicação da força externa.

x2: posição da massa ou posição da ligação entre a massa e a mola.

Desta forma, a rede mecânica correspondente ao sistema da Fig.1.6 apresenta-se na Fig.1.7.

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12

Fig.1.7 – Rede mecânica para o sistema massa, mola e atrito.

Aplicando a lei do equilíbrio das forças a ambos os nós (x1 e x2), obtêm-se as equações

(2.5) e (2.6).

Neste momento convém fazer o ponto da situação. Foram estudados sistemas físicos de

naturezas diferentes, eléctrica e mecânica, para os quais se obtiveram os respectivos

modelos. Embora diferentes, tais modelos têm em comum o facto de serem:

CONJUNTOS DE EQUAÇÕES DIFERENCIAIS LINEARES DE COEFICIENTES CONSTANTES

Pode-se então colocar as seguintes questões:

• Obtido um modelo para um dado sistema, existirão outros sistemas para os quais

esse modelo seja adequado?

• Se sim, esse(s) outro(s) sistema(s) poderão ser de uma natureza distinta do sistema

inicial?

Como se irá provar na sequência, as respostas a ambas as questões são positivas! Ou seja,

encontrado um modelo para um dado sistema, é possível encontrar outro sistema, de

natureza diferente, que também admita como seu esse modelo. Neste contexto caminha-se

para uma representação de sistemas acima do nível físico facultando um estudo

uniformizado com todas as vantagens que daí resultam.

Até agora apenas se estudaram sistemas de 2 naturezas distintas: eléctrica e mecânica.

Então, sem perda de generalidade, na abordagem que se segue parte-se de cada modelo de

cada componente elementar mecânica, procurando-se a analogia com alguma componente

elementar eléctrica.

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13

Para se iniciar este estudo considere-se a analogia apresentada na Tab.2.2.

Sistema eléctrico Sistema mecânico

Corrente Força

Tab.2.2 – Analogia corrente – força.

Repare-se que ambas as grandezas físicas agem como entradas ou perturbações para os

sistemas respectivos. Tanto a força como a corrente propagam-se através dos elementos,

mecânicos e eléctricos respectivamente, sugerindo semelhante colocação dos respectivos

aparelhos de medida (dinamómetro e amperímetro), em série. Assim, na procura de uma

modelação uniformizada de sistemas assuma-se que o papel da corrente num circuito

eléctrico é análogo ao papel da força num sistema mecânico.

No que toca às potenciais saídas dos sistemas repare-se que a velocidade e a tensão são

grandezas que são medidas em relação a uma referência. Velocidade de um corpo em

relação à terra, tensão num nó de um circuito em relação ao nó de referência; ambas são

grandezas medidas aos terminais dos respectivos elementos, assim pode-se estabelecer a

analogia que se apresenta na Tab.2.3.

Sistema eléctrico Sistema mecânico

Tensão Velocidade

Tab.2.3 – Analogia tensão – velocidade.

Recordem-se os modelos do condensador, Tab.2.1, e da massa, expressão (2.1),

respectivamente: ( )( ) dv ti t Cdt

= e ( )( ) dv tf t Mdt

= †. Assim, assumindo as analogias

estabelecidas nas Tab.2.2 e Tab.2.3 verifica-se que o modelo de uma massa de valor M é

formalmente idêntico ao modelo de um condensador de valor C M= .

† Cuidado! No modelo da massa, v representa a velocidade e não a tensão, como no modelo do condensador.

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14

Considere-se agora os modelos da bobine, Tab.2.1, e da mola, expressão (2.2),

respectivamente: ( )( ) di tv t Ldt

= e ( ) ( )f t Kx t= ‡. Derivando ambos os membros do modelo

da mola obtém-se (2.8).

( ) ( )df t

Kv tdt

= (2.8)

O modelo da bobine pode ser escrito de acordo com (2.9).

( )( ) 1di t v tdt L

= (2.9)

A observação de (2.8) e (2.9) permite estabelecer que o modelo de uma mola de constante

K é formalmente idêntico ao modelo de uma bobina de indutância 1LK

= .

Por último, considerem-se os modelos da resistência, Tab.2.1, e do atrito, expressão (2.3),

respectivamente: e ( ) ( )v t Ri t= ( ) ( ) ( )dx tf t B Bv t

dt= = 2. Reorganizando os termos e

lembrando as analogias das Tab.2.2 e Tab.2.3, conclui-se que o modelo do atrito de

constante B é formalmente idêntico ao modelo de uma resistência de valor 1RB

= .

A análise acabada de fazer considerou a representação temporal dos modelos, semelhante

estudo poderia ter sido feito a partir das respectivas transformadas de Laplace.

Feitas estas analogias, partindo-se da rede mecânica da Fig.1.7, pode-se determinar a rede

eléctrica análoga que se apresenta da Fig.1.8.

‡ A ausência do sinal negativo relativamente ao que se apresenta na expressão (2.2), deve-se ao facto de agora, não se estar a considerar a força de restituição da mola mas sim a força externa que se deve aplicar para que a mola produza um alongamento x.

2 Semelhantemente ao que se passou com a mola, a ausência do sinal negativo deve-se ao facto de agora se considerar não a força de reacção mas sim a força externa para vencer o atrito. Neste caso v representa a velocidade e não a tensão.

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15

L

CR ( )i t

v2 v1L

CR ( )i t

v2 v1

Fig.1.8 – Rede análoga eléctrica para o sistema mecânico massa, mola e atrito da

Fig.1.7.

De acordo com as analogias estabelecidas, impondo-se aos componentes eléctricos os

seguintes valores (2.10):

1

1

RB

LK

C M

(2.10)

obter-se-á um modelo do sistema eléctrico idêntico ao modelo do sistema mecânico do de

partida (2.7). Para se provar tal facto, vai-se analisar o circuito da Fig.1.8 utilizando a lei do

equilíbrio das correntes aplicada aos 2 nós, v2 e v1; obtendo-se as equações (2.11) e (2.12)

respectivamente.

( ) ( ) ( )2 2v t dv tC

R dt+ = i t (2.11)

( )1 2

di tv v L

dt− = (2.12)

Substituindo os valores dos componentes eléctricos de acordo com (2.10), as equações

(2.11) e (2.12) resultam no sistema de equações (2.13).

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João Miguel G. P. B. Lima Capítulo 2 MODELOS MATEMÁTICOS DE SISTEMAS

16

( ) ( ) ( )

( )

22

1 21

dv tBv t M i t

dtdi t

v vK dt

⎧+ =⎪⎪

⎨⎪ − =⎪⎩

(2.13)

Repare-se agora no sistema (2.7); derivando a 2ª equação e lembrando que a velocidade

( ) ( )dx tv t

dt= obtém-se o sistema3 (2.14).

( ) ( ) ( )

( )

22

1 21

dv tBv t M f t

dtdf t

v vK dt

⎧+ =⎪⎪

⎨⎪ − =⎪⎩

(2.14)

Tendo em conta as tabelas de analogias Tab.2.2 (corrente - força) e Tab.2.3 (tensão -

velocidade) conclui-se que os sistemas (2.13) e (2.14) são formalmente idênticos.

Recapitulando, partiu-se de 2 realidades físicas de naturezas distintas obteve-se a

mesma realidade matemática.

2.2.2 Sistemas mecânicos rotacionais

Como referido anteriormente, neste tipo de sistemas as componentes executam movimento

de rotação em torno de um dado eixo.

Existe grande paralelismo relativamente aos sistemas mecânicos translaccionais como se

salienta na Tab.2.4.

3 Para este sistema v representa a velocidade.

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João Miguel G. P. B. Lima Capítulo 2 MODELOS MATEMÁTICOS DE SISTEMAS

17

Sistemas mecânicos translaccionais Sistemas mecânicos rotacionais

Força F Binário T

Posição x Posição angular θ

Velocidade v Velocidade angular ω

Aceleração a Aceleração angular α

Tab.2.4 – Analogias nos sistemas mecânicos, translaccional e rotacional.

A lei de Newton utilizada para a análise de sistemas mecânicos rotacionais escreve-se como

(2.15).

( ) ( )T t J t= α (2.15)

em que:

• T é a resultante dos binários aplicados ao corpo Fig.1.9, mede-se em [N.m],

• é a aceleração angular do corpo4, mede-se em [α 2rad

s ],

• J é o momento de inércia do corpo relativo ao centro de massa, mede-se em

[Kg.m2].

Fig.1.9 – Momento de inércia.

Os 3 elementos fundamentais num sistema rotacional são o momento de inércia, a mola e o

atrito.

4 Recordar que:

2

2

d ddt dtω θ

α = = , sendo ω e θ , a velocidade e aceleração angulares, respectivamente

medidas em rad/s e rad.

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João Miguel G. P. B. Lima Capítulo 2 MODELOS MATEMÁTICOS DE SISTEMAS

18

Os modelos encontrados para estes elementos seguem de perto os correspondentes para os

sistemas translaccionais, tomando as analogias da Tab.2.4 e considerando que, para estes

sistemas, a massa M é substituída pelo momento de inércia J.

Uma mola Fig.1.10 à qual é aplicada uma torção por acção de um binário T, apresenta um

binário de reacção dado por (2.16), proporcional à diferença das posições angulares dos

seus extremos, a constante de proporcionalidade K designa-se por constante da mola e

mede-se em .N mrad .

Fig.1.10 – Mola de torção.

( ) ( )T t K t= θ (2.16)

Por último, o atrito Fig.1.11 que se gera quando 2 corpos estão em contacto provoca um

binário de reacção T, (2.17), que é proporcional à velocidade angular relativa ω de ambos;

a constante de proporcionalidade representa-se por B, designa-se por coeficiente de atrito e

mede-se em . 1. . .N m s rad −

Fig.1.11 – Atrito de rotação.

( ) ( )T t B t= ω (2.17)

Paralelamente às analogias estabelecidas entre as grandezas eléctricas e mecânicas

translaccionais, Tab.2.2 e Tab.2.3, podem-se considerar análogas as grandezas que se

apresentam na Tab.2.5.

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19

Sistema eléctrico Sistema mecânico rotacional

Corrente Binário

Tensão Velocidade angular

Tab.2.5 – Analogias eléctricas - mecânicas rotacionais.

Assumindo as analogias da Tab.2.5, partindo-se dos modelos das componentes elementares

(expressões (2.15), (2.16) e (2.17)) e seguindo-se o raciocínio utilizado nos sistemas

translaccionais, podem-se estabelecer as correspondentes relações de analogia para os

sistemas rotacionais (2.18).

1

1

RB

LK

C J

(2.18)

A análise e modelação de sistemas mais complexos recorrem aos modelos acabados de

definir para os elementos fundamentais mais simples. Para se ilustrar tal análise [2]

considere-se o Exemplo 2.3.

Exemplo 2.3

Considere um sistema rotacional, Fig.1.12, composto por 2 cilindros com momentos de

inércia J1 e J2 que se movimentam sobre uma superfície desenvolvendo-se binários de

reacção cujos coeficientes de atrito são B1 e B2 respectivamente; entre os 2 cilindros gera-se

atrito com coeficiente B3. O sistema é posto em movimento por acção de um binário T.

Fig.1.12 – Sistema rotacional do Exemplo 2.3

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20

3

Pretende-se determinar um conjunto de equações diferenciais que modelem o sistema.

Comece-se por representar a rede mecânica; assim, verifica-se que existe 3 deslocamentos

angulares independentes: . Considerando o nó de referência conclui-se que a

rede mecânica tem 4 nós como se esquematiza na Fig.1.13.

1 2, ,θ θ θ

Fig.1.13 – Rede mecânica do Exemplo 2.3.

Aplicando a lei do equilíbrio dos binários a cada nó e tendo em conta os modelos

elementares, (expressões (2.15), (2.16) e (2.17)), obtêm-se 3 equações (3 nós) a 3

incógnitas, . 1 2, ,θ θ θ3

)

3⎞⎟

2 3

• Nó 1 :θ

(1 1 2T K= θ − θ (2.19)

• Nó 2 :θ

( ) 2 2 21 1 2 1 1 3K J B B•• • • •⎛θ − θ = θ + θ + θ − θ⎜

⎝ ⎠ (2.20)

• Nó 3 :θ

2 3 3 33 2 2B J B Kθ θ θ θ• • •• •⎛ ⎞− = + +⎜ ⎟

⎝ ⎠θ

(2.21)

Reorganizando5 os termos obtém-se o sistema6 (2.22).

5 Incógnitas no 1º membro e variáveis independentes no 2º membro; da esquerda para a direita os termos devem-se dispor por ordem crescente dos índices e ordem decrescente da derivação. 6 Como se verá no seguimento da matéria poderá ser útil apresentar a transformada de Laplace deste sistema na forma matricial.

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21

3( )

( )

1 1 1 2

2 21 1 1 1 3 1 2 3

2 3 33 2 3 2 2 3

0

0

K K T

K J B B K B

B J B B K

•• • •

• •• •

⎧ θ − θ =⎪⎪ θ − θ − + θ − θ + θ =⎨⎪

θ − θ − + θ − θ =⎪⎩

(2.22)

As expressões (2.15) a (2.17) ou alternativamente o sistema (2.22) constituem conjuntos de

equações diferenciais lineares de coeficientes constantes que modelam o sistema mecânico

rotacional em estudo. Conforme já foi provado, existe um sistema eléctrico para o qual este

modelo também serve. Tal sistema eléctrico obtém-se recorrendo às analogias (2.18) e

apresenta-se na Fig.1.14.

L1

C1 R1( )i t

v2v1R3

C2 R2 L2

v3L1

C1 R1( )i t

v2v1R3

C2 R2 L2

v3

Fig.1.14 – Rede eléctrica análoga do Exemplo 2.3.

Se se atribuir aos componentes do circuito da Fig.1.14 os valores: L1=1/K1, C1=J1, R1=1/B1,

L2= 1/K2, C2=J2, R2=1/B2 e R3=1/B3; então o modelo que se obtém7 é idêntico ao sistema

(2.22) desde que se considerem análogas as grandezas físicas da Tab.2.5.

2.3 SISTEMAS TÉRMICOS

Os sistemas térmicos são aqueles que trabalham com o fluxo e armazenamento de calor, a

modelação de tais sistemas recorre aos princípios da termodinâmica. Os sistemas térmicos

surgem como sub-sistemas de enúmeros instrumentos de uso comum, como por exemplo:

7 Faça-se! Revisão de Análise de Circuitos.

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22

forno, frigorífico, sistema de refrigeração de um automóvel, sistema de aquecimento de

água, termómetro, etc.

Os sistemas térmicos são em geral sistemas de parâmetros distribuídos, consequentemente,

as suas discrições matemáticas utilizam de equações diferenciais com derivadas parciais.

Contudo, a abordagem à análise e modelação de sistemas do presente capítulo considera

SLIT de parâmetros concentrados. Assim, o estudo de sistemas térmicos vai considerar

aproximações tais que esses sistemas possam ser modelados por equações diferenciais

lineares de coeficientes constantes, como tem vindo a acontecer com os sistemas

anteriormente estudados. Para que tal hipótese simplificativa possa ser adoptada deve-se

assumir que a temperatura de um corpo é considerada uniforme, esta hipótese é tanto mais

válida quanto menores forem as dimensões do corpo; tratando-se de fluidos (ex: ar, água)

considera-se que se encontram homogeneizados.

O estabelecimento de modelos para este tipo de sistemas resulta da aplicação da lei do

equilíbrio segundo a qual calor adicionado ao sistema é igual ao calor armazenado somado

com o calor dissipado. As variáveis físicas utilizadas na modelação de sistemas térmicos

são:

• temperatura, mede-se em Kelvin [K] ou graus Celsius8 [ºC]. :θ

• q: taxa de variação de fluxo de calor, mede-se em Joule/segundo=Watt [W].

A temperatura de um dado corpo é uma medida da energia térmica nele armazenado.

Designando-se por qi e qo as taxas de variação de fluxo de calor de entrada e saída

respectivamente, a temperatura num determinado instante t, ( ) é dada pela

expressão (2.23).

θ 0t t≥

( ) ( ) ( ) ( )0

01 t

i ot

t t q q dC

θ θ τ= + −∫ τ τ

(2.23)

• C: designa-se por capacidade térmica e mede-se em [J/ºC].

Derivando ambos os membros de (2.23) pode-se estabelecer (2.24).

8 K = ºC+273.15

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23

( ) ( ) ( )i o

d tq t q t C

dtθ

− = (2.24)

A expressão (2.24) relaciona a taxa de variação de temperatura de um corpo com valor

instantâneo do fluxo de calor transmitido ao corpo.

No que se refere ao fluxo de calor entre distintas regiões de um dado corpo podem-se

considerar 3 mecanismos: condução, convexão e radiação. No presente estudo apenas se

vai considerar o fluxo de calor por condução, segundo o qual, o fluxo de calor entre 2

corpos é proporcional à diferença de temperaturas 1θ e 2θ dos mesmos (2.25).

( ) ( ) ( )1 2t tq t

Rθ θ−

= (2.25)

• R: designa-se por resistência térmica do condutor e exprime-se em ºK/W.

As expressões (2.24) e (2.25) constituem os modelos dos elementos básicos de um sistema

térmico, que, juntamente com a lei do equilíbrio anteriormente enunciada permitem

estabelecer os modelos matemáticos de sistemas mais complexos.

Tal como ficou provado na secção 2.2 (recorrendo a exemplos), também para cada modelo

de um dado sistema térmico poder-se-á encontrar um sistema de outra natureza para o qual

tal modelo seja adequado. Desta forma vai-se definir de seguida analogias eléctricas para as

expressões (2.24) e (2.25).

A capacidade térmica de um dado corpo mede a quantidade de calor que esse corpo pode

armazenar; a analogia para com a capacidade eléctrica de um condensador é directa. Assim,

assumindo-se as analogias da Tab.2.6, tendo em conta a relação tensão corrente num

condensador, Tab.2.1, bem como a expressão (2.24) para sistemas térmicos, facilmente se

conclui que as capacidades eléctrica e térmica são análogas podendo-se, inclusivamente,

representar pelo mesmo símbolo.

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24

Sistema eléctrico Sistema térmico

Corrente Fluxo de calor

Tensão Temperatura

Tab.2.6 – Analogias eléctricas - térmicas.

Utilizando os mesmos pressupostos mas tendo em atenção a expressão (2.25) conclui-se

que as resistências eléctrica e térmica são análogas e representáveis pelo mesmo símbolo.

A análise de sistemas térmicos pode então recorrer à representação de uma rede térmica em

que cada nó é um ponto do sistema sujeitos a uma mesma temperatura.

Para se ilustrar a modelação de sistemas térmicos considere-se o Exemplo 2.4.

Exemplo 2.4

Considere-se um termómetro de mercúrio comum em que o mercúrio está envolvido pela

protecção de vidro de capacidade e resistência térmicas Cg e Rg, respectivamente. A

capacidade e resistência térmicas do mercúrio são, respectivamente, Cm e Rm.

Num determinado instante o termómetro é submetido a um fonte de calor à temperatura 0θ ;

pretende-se determinar um conjunto de equações diferenciais que descrevem o sistema.

A análise pretendida pode recorrer à representação da rede térmica (idêntica à análoga

eléctrica). Para tal, considera-se tantos nós quantos os valores independentes de

temperatura, ou seja:

• 0 :θ temperatura da fonte de calor imposta ao sistema.

• sθ : temperatura da superfície da protecção de vidro em contacto com o mercúrio.

• :mθ temperatura do mercúrio.

Sabe-se que a fonte de calor vai aquecer a protecção de vidro condicionada à sua resistência

térmica. O vidro, por sua vez, acumula calor com capacidade térmica C e transmite-o ao

mercúrio. Desta forma, a rede térmica pode-se representar na Fig.1.15.

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25

Rm

Cg0θ

Rg

Cm+−

sθ mθRm

Cg0θ

Rg

Cm+−

sθ mθ

Fig.1.15 – Rede térmica para o termómetro de mercúrio.

A lei de equilíbrio segundo a qual o fluxo de calor adicionado é igual ao calor armazenado,

(2.24), somado com o calor dissipado, (2.25), permite estabelecer 2 equações para os 2 nós

incógnita: sθ e mθ †.

• Nó :sθ

0 g g mgg

g m

CR R

θ θ θθ•− −

= +θ

(2.26)

• Nó :mθ

g mmm

m

CR

θ θθ•−

= (2.27)

Utilizando a convenção anteriormente apresentada5 para arrumação dos termos pode-se

chegar ao sistema de equações diferenciais lineares de coeficientes constantes (2.28).

01 1

0

g

m

mg g

m g m

g mm

m m

CgR R R

CR R

Rθ θθ θ

θ θθ

⎧ ⎛ ⎞+ + − =⎪ ⎜ ⎟⎜ ⎟⎪ ⎝ ⎠⎨

⎪ − − =⎪⎩

(2.28)

† A analogia para com a lei dos nós é total.

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26

O sistema de equações (2.28), ou alternativamente as 2 equações de nós que o antecedem,

constitui o modelo do termómetro de mercúrio em estudo.

2.4 SISTEMAS FLUÍDICOS

Esta secção debruça-se sobre sistemas onde há fluxo de líquidos geralmente

incompressíveis. Estes sistemas podem ser encontrados em processos químicos, actuadores,

motores de alimentação de sistemas de manufactura, etc.

As variáveis relevantes no estudo deste tipo de sistemas vão ser apresentadas

considerando-se o processo de enchimento e escoamento de um determinado reservatório,

Fig.1.16; para que se obtenha um modelo linear vai-se assumir que o escoamento do fluído

é laminar.

Fig.1.16 – Enchimento e escoamento de um reservatório.

A observação da Fig.1.16 mostra que este tipo de sistemas é constituído por 2 classes de

elementos fundamentais: reservatórios onde se verifica a acumulação de fluidos, e válvulas

por onde passam os fluidos de entrada, de saída para o exterior do sistema, ou de ligação

entre reservatórios.

Repare-se que sendo os reservatórios indeformáveis, o volume de fluído acumulado num

dado reservatório depende da área A da secção transversal (constante) e da altura h (nível)

do mesmo; assim, a caracterização de sistemas como o que se apresenta deve ter em conta

as seguintes variáveis:

• h: nível de fluído, mede-se em [m].

• q: caudal, volume de fluido transferido por unidade de tempo, mede-se em [m3/s].

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27

Pode-se dizer que o caudal acumulado num reservatório é directamente proporcional à

derivada do nível de fluido, (2.29), sendo a constante de proporcionalidade a área A.

( ) ( )dh tq t Adt

= (2.29)

Na passagem de fluidos por uma válvula de comunicação entre 2 reservatórios com níveis

h1 e h2, dever-se-á ter em conta a resistência hidráulica R definida como a variação na

diferença de níveis que conduz a uma variação unitária de caudal. Assim, pode-se dizer que

o fluxo através duma válvula de resistência R que liga 2 reservatórios; é directamente

proporcional à diferença de níveis e inversamente proporcional à resistência R, (2.30). A

resistência R mede-se em s/m2.

( ) ( )h tq tR

= (2.30)

Para este tipo de sistemas deve-se ter em conta que o fluido que entra num reservatório é

igual ao fluido que sai somado com o fluido acumulado. Sendo que, o estabelecimento de

modelos para este tipo de sistemas resulta da aplicação desta lei conjuntamente com as

relações (2.29) e (2.30).

Tal como, recorrendo a exemplos, ficou provado na secção 2.2, também para cada modelo

de um dado sistema fluidico poder-se-á encontrar um sistema de outra natureza para o qual

tal modelo seja adequado. Desta forma vai-se definir de seguida analogias eléctricas9 para

as expressões (2.29) e (2.30).

Repare-se que a carga eléctrica acumulada num condensador tem correspondência para

com o fluido acumulado num reservatório. Assim, pode-se considerar que a capacidade

eléctrica C de um condensador é análoga à área A da secção transversal de um reservatório;

semelhante consideração pode-se tomar no que respeita à resistência eléctrica e a

resistência hidráulica de uma válvula.

Assim, assumindo-se as analogias da Tab.2.7, tendo em conta a relação tensão corrente

num condensador, Tab.2.1, bem como a expressão (2.29) para sistemas fluídicos,

9 Lembre-se que muitos textos introdutórios à electricidade recorrem a analogias fluidicas para definir os conceitos.

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28

facilmente se conclui que a capacidade eléctrica é análoga à área A da secção transversal de

um recipiente.

Sistema eléctrico Sistema fluidito

Corrente Caudal

Tensão Altura

Tab.2.7 – Analogias eléctricas - fluidicas.

Utilizando os mesmos pressupostos mas tendo em atenção a expressão (2.30) conclui-se

que as resistências eléctrica e fluidica são análogas e representáveis pelo mesmo símbolo.

A análise de sistemas fluidicos pode então recorrer à representação de uma rede fluidica em

que cada nó é um ponto do sistema sujeitos a um mesmo nível.

Para se ilustrar a modelação de sistemas fluidicos considere-se o Exemplo 2.5.

Exemplo 2.5

Considere o sistema fluídico da Fig.1.17.

Fig.1.17 – Sistema fluidico do Exemplo 2.5

Pretende-se determinar as equações diferenciais que descrevem o sistema.

As incógnitas são os níveis dos 2 reservatórios: h1 e h2. Então a rede fluidica/análoga

eléctrica tem 2 nós.

A análise do sistema pode ser feita directamente aplicando a lei do equilíbrio a cada

reservatório utilizando-se o esquema e respectivos parâmetros da Fig.1.17, ou recorrendo à

rede fluidica/análoga eléctrica.

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29

Nas condições do problema, a rede fluidica/análoga eléctrica está representada na Fig.1.18.

A1=C1iq i≡

R1

A2=C2 R2

1 1h v≡ 2 2h v≡

A1=C1iq i≡

R1

A2=C2 R2

1 1h v≡ 2 2h v≡

Fig.1.18 – Rede fluidica/análoga eléctrica do Exemplo 2.5

As 2 equações linearmente independentes obtêm-se aplicando a lei do equilíbrio a cada nó.

Utilizando os parâmetros do sistema fluidico obtêm-se as expressões (2.31) e (2.32).

• Nó 1 :h

1 211

1i

h hqR

•−= + A h (2.31)

• Nó 2 :h

1 2 222

1 2

h h h A hR R

•−= + (2.32)

Utilizando a convenção anteriormente apresentada5 para arrumação dos termos pode-se

chegar ao sistema de equações diferenciais lineares de coeficientes constantes (2.33).

1

2

1 1 21 1

1 2 21 1 2

1 1

1 1 1 0

iA h h h qR R

h A h hR R R

⎧ + − =⎪⎪⎨ ⎛ ⎞⎪− + + + =⎜ ⎟⎪ ⎝ ⎠⎩

(2.33)

O sistema de equações (2.33), ou alternativamente as 2 equações de nós que o antecedem,

constitui o modelo do sistema em estudo.

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30

Analogamente, pode-se aplicar a lei dos nós à rede da Fig.1.18 com os parâmetros

eléctricos; tendo em conta a tabela de analogias (Tab.2.7) obtém-se7 o modelo (2.33).

2.5 FUNÇÃO DE TRANSFERÊNCIA

Os exemplos estudados até agora, constituem uma pequena amostra da enorme variedade

de situações que podem ser modeladas na perspectiva da teoria dos sistemas, objecto de

estudo da presente disciplina. Tais exemplos debruçaram-se sobre sistemas de natureza

distinta sendo a sua dinâmica definida em tempo contínuo (t).

As secções anteriores tiveram como objectivo a definição de uma representação

uniformizada que possibilite a análise e controlo de sistemas independentemente da sua

natureza. Nesta perspectiva, pode-se generalizar que os SLIT são representados por:

SISTEMAS DE EQUAÇÕES DIFERENCIAIS DE COEFICIENTES CONSTANTES

Assim sendo, a forma uniformizada encontrada para representação de SLIT vai ser utilizada

independentemente da natureza do sistema que a originou. Deste modo, (e sem perda de

generalidade) considere-se um sistema com uma entrada r e uma saída y esquematizado na

Fig.1.19.

r SISTEMA yr SISTEMA y

Fig.1.19 – Sistema com entrada r e saída y.

Sem perda de generalidade, considere-se que o sistema pode ser caracterizado pela equação

diferencial (2.34).

( ) ( 1)0 1 2 1

( ) ( 1)0 1 2 1

( ) ( ) ... ( ) ( ) ( ) ...

( ) ( ) ... ( ) ( ) ( )

n nn n n

m mm m m

a y t a y t a y t a y t a y t

b r t b r t b r t b r t b r t

•• •−

− −

•• •−

− −

+ + + + +

+ + + + +

= (2.34)

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31

=

Calculando-se a transformada de Laplace de ambos os membros tem-se (2.35).

1 20 1 2 1

1 20 1 2 1

( ) ( ) ... ( ) ( ) ( )

( ) ( ) ... ( ) ( ) ( )

n nn n n

m mm m m

a s Y s a s Y s a s Y s a sY s a Y s

b s R s b s R s b s R s b sR s b R s

−− −

−− −

+ + + + +

= + + + + + (2.35)

Nesta fase introduz-se a definição de Função de transferência.

A função de transferência de um SLIT contínuo é a razão entre a transformada de Laplace

da saída e a transformada de Laplace da entrada, considerando-se a hipótese de condições

iniciais nulas.

Para a situação em estudo define-se a função de transferência ( )( )( )

Y sG sR s

= ; entrando-se

com a expressão (2.35) obtém-se (2.36).

( )1 2

0 1 2 11 2

0 1 2 1

...( )( ) ...

m mm m

n nn n

b s b s b s b s bY sG s m

nR s a s a s a s a s a

−− −

−− −

+ + + + += =

+ + + + + (2.36)

Esta forma uniformizada de representação de sistemas permite que sejam feitas algumas

considerações:

• Não depende da evolução da entrada do sistema nem das suas condições iniciais.

• Trata-se de uma função racional complexa de variável complexa.

• Tal como a representação por equações diferenciais, caracteriza completamente um

SLIT do ponto de vista de entrada-saída.

• À ordem n do termo de maior grau do denominador D(s) denomina-se ordem do

SLIT.

• Se para um dado sistema a função de transferência for desconhecida, esta poderá ser

avaliada perturbando o sistema com uma entrada conhecida e estudando a

respectiva saída. A razão das transformadas de Laplace da entrada e da saída

corresponde à função de transferência.

Para se ilustrar a determinação de uma função de transferência, considere-se o Exemplo

2.6.

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João Miguel G. P. B. Lima Capítulo 2 MODELOS MATEMÁTICOS DE SISTEMAS

32

Exemplo 2.6

Considere o sistema fluidico do Exemplo 2.5, Fig.1.17. Assumindo como entrada o caudal

qi e como saída o nível de fluido no reservatório 2, pretende-se determinar a função de

transferência respectiva.

Na secção 2.4 determinou-se a descrição matemática do sistema em causa chegando-se às

equações (2.31) e (2.32), ou alternativamente, ao sistema de equações (2.33).

Pretende-se agora determinar a razão entre as transformadas de Laplace da entrada qi e da

saída h2: 2 ( )( )( )i

H sG sQ s

= .

Na resolução do Exemplo 2.5 chegou-se à conclusão de que o modelo para o sistema em

estudo consiste num sistema de 2 equações a duas incógnitas (h1 e h2); por se tratarem de

equações linearmente independentes, tal sistema é possível e determinado. A função de

transferência que agora se pede resulta da solução do sistema10 (2.33), tomada a

transformada de Laplace de ambas as equações, em ordem à variável h2.

A partir de (2.33) tem-se:

( ) ( ) ( ) ( )

( ) ( ) ( )

1 1 1 21 1

1 2 2 21 1 2

1 1

1 1 1 0

iA sH s H s H s Q sR R

H s A sH s H sR R R

⎧ + − =⎪⎪⎨ ⎛ ⎞⎪− + + +⎜ ⎟⎪ ⎝ ⎠⎩

= (2.37)

O sistema (2.37) pode ser escrito na forma matricial:

( )( )

( )11 1 1

22

1 1 2

1 1

1 1 1 0i

A sR R H s Q s

H sA sR R R

⎡ ⎤+ −⎢ ⎥ ⎡ ⎤ ⎡ ⎤⎢ ⎥ =⎢ ⎥ ⎢ ⎥⎢ ⎥ ⎣ ⎦⎣ ⎦− + +⎢ ⎥⎣ ⎦

(2.38)

Desta forma a solução11 é dada pelo cociente de determinantes (2.39). 2 ( )H s

10 Agora percebe-se a vantagem da regra para organização dos termos5 que conduziu ao sistema (2.33), relativamente às equações (2.31) e (2.32). 11 A resolução do sistema pode recorrer a qualquer outro método.

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33

( )

( )11

12

11 1

21 1

1

1 0

1 1

1 1

iA s Q sR

RH s

A sR R

A s2

1R R R

+

−=

+ −

− + +

(2.39)

Feitas as contas conclui-se (2.40).

( ) ( )( ) ( )

2 22

1 2 1 2 1 2 1 1 2 2 1i

H s RG sQ s A A R R s A R A R A R s

= =+ + + +

(2.40)

A observação do grau do polinómio do denominador de ( )2G s permite concluir que se trata

do um sistema de 2ª ordem.

Seja uma função de transferência genérica ( ) ( )( )

N sG s

D s= . Então, D(s) denomina-se

polinómio característico. As soluções complexas da equação ( ) 0D s = denominam-se

pólos do sistema e as soluções complexas de ( ) 0N s = denominam-se zeros do sistema.

Como se verá na sequência o posicionamento no plano complexo de tais soluções

condiciona o comportamento do sistema.

2.6 SISTEMAS ELECTROMECÂNICOS

O sistema electromecânico que vai ser estudado nesta secção é o motor DC. Tal sistema

pode ser visto como um amplificador de potência tal que, a potência necessária para excitar

o circuito de campo é inferior à potência do circuito de armadura. Desta forma, este motor

serve para ceder energia a uma carga mecânica, utilizando para esse fim a conversão de

energia eléctrica em energia mecânica rotacional.

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34

As características deste tipo de motores faz com que sejam utilizados numa vasta gama de

aplicações tais como: manipuladores, passadeiras para transporte de mercadorias,

equipamentos informáticos tais como comandos de discos ou impressoras, máquinas

ferramenta controladas numericamente etc.

A Fig.1.20 apresenta o esquema electromecânico do motor DC [4].

aV

bV

fi

ai

θ,J B

aV

bV

fi

ai

θ,J B

Fig.1.20 – Motor DC.

Este sistema é constituído por 2 sub-sistemas fundamentais, circuito de campo e circuito de

armadura, definindo-se 2 modos de funcionamento:

• Mantendo a corrente de campo if constante e regulando a tensão aplicada à

armadura.

• Mantendo a corrente de armadura ia constante e regulando a tensão aplicada ao

campo.

O fluxo induzido na armadura é proporcional à corrente de campo (2.41) :

( ) ( )f ft k i tΦ = (2.41)

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35

O binário desenvolvido pelo motor relaciona-se com a corrente da armadura e com o fluxo

de acordo com (2.42).

( ) ( ) ( )1mT t k t i t= Φ a (2.42)

De (2.41) e (2.42) conclui-se que:

( ) ( ) ( )1m f f aT t k k i t i t= (2.43)

A última expressão (2.43) mostra que para que haja uma relação de linearidade deve

verificar-se uma das duas correntes ( ( )fi t ou ( )ai t ) constante, conduzindo

alternativamente a cada modo de funcionamento anteriormente mencionado.

Considere-se o controlo por corrente de campo implicando constante a corrente de

armadura ; então, o binário é proporcional à corrente de campo, (2.44),

designando-se por constante do motor

( )ai t I= a

a1m fk k k I= .

( ) ( )m m fT t k i t= (2.44)

A expressão (2.44) relaciona 2 grandezas físicas de naturezas diferentes: corrente do

circuito de campo e binário desenvolvido pelo motor.

Tratando-se de um controlo por corrente de campo, pretende-se finalmente uma relação12

entre a tensão aplicada ao circuito de campo Vf e a posição angular da carga mecânica θ .

Aplicando a lei do equilíbrio das tensões ao circuito de campo obtém-se, em termos da

transformada de Laplace, (2.45).

( ) ( ) ( )f f f f fV s R I s L sI s= + (2.45)

Do lado do circuito da armadura pode-se dizer que o binário do motor é transferido para a

carga13 Tm=TL . Atendendo aos parâmetros (J e B) da carga obtém-se (2.46).

12 Função de transferência. 13 Corresponde a uma aproximação pois, para além do binário da carga, há a considerar binários devido a perturbações externas que na presente análise se consideram desprezáveis.

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36

( ) ( ) (2mT s Js s Bs sθ θ= + ) (2.46)

Eliminando Tm em (2.44) e (2.46) obtém-se (2.47).

( ) ( ) ( )2m fJs s Bs s k I sθ θ+ = (2.47)

Resolvendo (2.45) em ordem a If e substituindo em (2.47) pode-se chegar à função de

transferência G(s).

( ) ( )( )

m

f

f f

f

kJLs

G sV s RBs s s

J L

θ= =

⎛ ⎞⎛ ⎞+ +⎜ ⎟⎜ ⎟⎜ ⎟⎝ ⎠⎝ ⎠

(2.48)

Considere-se agora o controlo pela armadura. Nestas circunstâncias é a corrente de

campo que se mantém constante, ( )f fi t I= ; a expressão (2.43) pode ser escrita na forma

(2.49).

( ) ( ) 1;m m a m fT t k i t k k k I= = f (2.49)

Pretende-se determinar uma relação12 entre a tensão de armadura Va e a posição angular θ

da carga mecânica.

Nestas circunstâncias o fluxo (2.41), constante, induz na armadura uma força

contra-electromotriz Vb que é proporcional à velocidade angular da carga (2.50).

( ) ( )b bdv t k tdt

θ= (2.50)

Aplicando a lei do equilíbrio das tensões ao circuito da armadura obtém-se (2.51).

( ) ( ) ( ) ( )a a a a a bdv t R i t L i t v tdt

= + + (2.51)

Nesta última equação substituindo pela definição (2.50) e calculando a transformada de

Laplace obtém-se

bv

( )aI s dada por (2.52).

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( ) ( ) ( )a ba

a a

V s k s sI s

R L sθ−

=+

(2.52)

Considere-se agora a transformada de Laplace de (2.49): ( ) ( )m m aT s k I s= . Substituindo

por (2.46) e

mT

aI por (2.52) obtém-se a função de transferência G(s) pretendida.

( ) ( )( ) ( )( )

m

a a a b m

s kG sV s s R L s B Js k kθ

= =+ + +⎡ ⎤⎣ ⎦

(2.53)

Referências

[1] M. I. Ribeiro, Análise de Sistemas Lineares, IST Press.

[2] John J. D'Azzo e Constantine H. Houpis, Linear Control Systems Analysis and

Design, 3ª ed., McGraw-Hill, 1988.

[3] J. Martins de Carvalho, Dynamical Systems and Automatic Control, Prentice Hall,

1993.

[4] Richard C. Dorf and Robert H. Bishop, Modern Control Systems, 7ª ed., Addison

Wesley, 1995.

[5] Katsuhiko Ogata, Modern Control Engineering, 2ª ed., Prentice-Hall, 1990.

[6] Chi-Tsong Chen, Analog and Digital Control Systems Design: Transfer-function,

state-space and algebraic methods, Saunders College Publishing, 1993.

[7] Bahram Shahian, Control Systems Design using Matlab, Prentice-Hall, 1993.

[8] Duane C. Hanselman e Benjamin Kuo, Matlab Tools for Control Systems Analysis

and Design, Prentice-Hall, 1995.