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Kátia Lopes Inácio PAIS NA UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA NEONATAL: PERCEPÇÃO DO AUXILIAR DE ENFERMAGEM. Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Enfermagem da Escola de Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, para obtenção do título de Mestre. Orientadora: Prof. Dra. Ana Lúcia de Lourenzi Bonilha Co-orientadora: Prof. Dra. Dora Lúcia L. de Oliveira Porto Alegre, 2002.

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Kátia Lopes Inácio

PAIS NA UNIDADE

DE TERAPIA INTENSIVA NEONATAL:

PERCEPÇÃO DO AUXILIAR DE ENFERMAGEM.

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em

Enfermagem da Escola de Enfermagem da

Universidade Federal do Rio Grande do Sul, para

obtenção do título de Mestre.

Orientadora: Prof. Dra. Ana Lúcia de Lourenzi Bonilha

Co-orientadora: Prof. Dra. Dora Lúcia L. de Oliveira

Porto Alegre, 2002.

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BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________________________

Prof. Dra. Ana Lúcia de Lourenzi Bonilha (orientadora)

Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS

Prof. Dra. Dora Lúcia Leindes Corrêa de Oliveira (co-orientadora)

Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS

Prof. Dra. Jussara Gue Martini (membro)

Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS

Prof. Dra. Nair Regina Ritter Ribeiro (membro)

Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS

Prof. Dra. Eva Neri Rubin Pedro (membro)

Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS

Porto Alegre, dezembro 2002.

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AGRADECIMENTOS

À Profª. Dra. Ana Lúcia de Lourenzi Bonilha, principal responsável pelo êxito

desta caminhada, pelos conhecimentos partilhados, pela paciência, carinho, atenção e,

especialmente, pela oportunidade singular de convívio e pela cumplicidade e confiança

demonstradas a cada encontro.

À Profª. Dra. Dora Lúcia de Oliveira, co-orientadora deste estudo, pelo estímulo

inicial e pela disponibilidade demonstrada.

Às auxiliares de enfermagem, heroínas e sujeitos deste estudo, por confirmar e

reforçar minha crença de que o trabalho em equipe é possível, e essencial, na busca pelo

cuidado genuíno e humanizado aos recém-nascidos e seus pais.

À colega Márcia Damiana Isoton, pela colaboração indispensável na realização

deste estudo.

À Profª. Maria Luíza Ludwig, pelo estímulo desde o processo de seleção e,

principalmente, por ter propiciado meu contato com a orientadora deste estudo.

Às professoras da Escola de Enfermagem da UFRGS: Cláudia Armellini, Anne

Marie Weisseheimer, Annelise Gonçalves, Virgínia Moretto, Lílian do Espírito Santo e

Denise Tolfo da Silveira, pelos exemplos e apoio constantes.

À acadêmica Cecília Drebes Pedron pela colaboração em momentos “críticos”.

À Profª. Marta Júlia Lopes, pela compreensão em momentos decisivos.

Às colegas e, mais do que isso, amigas, Heloísa Bello e Regina Weisseheimer

pela “presença” percebida mesmo nos momentos de distância.

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Aos colegas da turma de 2000 do curso de mestrado, pelo convívio intenso e

fraterno e pelos momentos de alegria e “desespero” compartilhados.

À Profª. Lísia Mª Fenstenseifer pelo exemplo e estímulo no início de minha

caminhada em busca da formação científica e acadêmica.

À Sra. Marlene, presença simpática na portaria da Escola de Enfermagem, pela

disponibilidade e atenção.

À Enfª. e amiga Sônia Viana, pelo incentivo, compreensão e por muito mais.

À Sirlei Cruz e Júlia Comasseto, companheiras de “batalhas” em território

inóspito, por me fazer acreditar que “sempre é possível” e que “vale a pena” lutar por

nossos objetivos.

Às colegas e amigas Cristiane Barros e Teresinha Perin, pelo incentivo e pela

honra de acompanhá-las em seus projetos.

À amiga Carmen Malmann, pela amizade incondicional e pela “energia”

transmitida a cada abraço.

À amiga Simone Baggio, pelos momentos emocionantes que vivemos, e ainda

viveremos, juntas.

Por fim, um agradecimento muito especial àquelas pessoas vitais para o sucesso

de qualquer obra:

aos meus pais, por serem como são, por estarem a meu lado e compartilhar

intensamente cada momento de minha vida,

ao Paulo, meu amigo, namorado, noivo e futuro marido, pelo incentivo a cada

novo objetivo e pela valorização de cada conquista.

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E o fim de nossa viagem será chegar ao

ponto de onde partimos e conhecê-lo , então, pela

primeira vez.

T. S. Eliot

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RESUMO

Diante do interesse pelo cuidado intensivo neonatal e como integrante da equipe

de enfermagem de uma instituição pertencente ao Sistema Único de Saúde, foi

idealizada e realizada esta pesquisa. Trata-se de um estudo descritivo, do tipo

exploratório desenvolvido a partir de uma abordagem qualitativa que teve como

objetivo conhecer a percepção do auxiliar de enfermagem a respeito da presença dos

pais na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal. Participaram do estudo sete auxiliares

de enfermagem pertencentes à referida Unidade. Para coleta de informações foi

utilizada a técnica de Grupo Focal desenvolvida no decorrer de seis encontros coletivos.

As idéias emergidas foram submetidas à análise de conteúdo segundo Minayo (1993,

1997) e agrupadas constituindo três grandes temas: as atitudes dos profissionais, a

presença dos pais no intensivismo neonatal e a condição do auxiliar de enfermagem no

contexto. Os achados mostraram que os sujeitos da pesquisa reconhecem, na instituição

em que trabalham, os aspectos que a caracterizam como hospital público, sendo capazes

de estabelecer relações entre este ambiente e seu cotidiano de trabalho, na sua relação

como os pais dos bebês e na permanência destes junto aos filhos.

Palavras-chave: Cuidado intensivo neonatal, auxiliar de enfermagem, pais, percepção.

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ABSTRACT

This research has been idealized and made due to interest for the intensive

neonatal care, as a nurse of the staff of an institution from SUS (Sistema Único de

Saúde). It is an exploratory descriptive study, developed from a qualitative approach

and was aimed at knowing what perception the nurse’s aides had about the presence of

parents at the Neonatal Intensive Care Unit. Seven nurse’s aides from the unit

mentioned before took part in the study. In order to collect information, the technique

used was “ Focal Group”, which was developed during six collective meetings. The

ideas arisen from them were submitted to a content analysis according to Minayo

(1993, 1997) and put together into three themes: the professionals’ attitudes, the

presence of parents in the neonatal Intensive Care Unit and the condition of the nurse’s

aide in the context. The results have shown that the subjects of the research recognize -

in the Institution where they work - the aspects that characterize it as a public hospital

and they are able to set up relations of this environment with their daily routine, with

their relationship with the parents as well as with their influence on the parents’ staying

together with their children.

Key-words: intensive neonatal care, nurse’s aids, parents, perception.

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RESUMEN

Frente al interés por el cuidado intensivo neonatal y como integrante del equipo de

enfermería de una instituición que pertenece al Sistema Unico de Salud, fué idealizada y

realizada esta pesquisa. Se trata de un estudio descriptivo, de tipo exploratorio,

desarrollado a partir de un enfoque cualitativo que tiene como objetivo conocer la

percepción de auxiliares de enfermería a respecto de la presencia de los padres en la

unidad de terapia intensiva neonatal. Participaron del estudio siete auxiliares de

enfermería pertenecientes la dicha unidad. Para la colecta de informaciones fué utilizada

la técnica del Grupo Focal, desarrollada en el transcurso de seis reuniones colectivas.

Las ideas surgidas fueron sometidas a análisis de contenido según Minayo (1993, 1997)

y agrupadas constituindo tres grandes temas: la actitud de los profisionales, la presencia

de los padres en el intensivismo neonatal y la condición del auxiliar de enfermería en tal

contexto. Los resultados demostraron que los sujetos de la pesquisa reconocen en la

instituición en que trabajam, los aspectos que la caracteriza como hospital público,

siendo capaces de establecer relaciones entre este ambiente y su cotidiano de trabajo, en

su relación con los padres de los bebés y en la permanencia junto a sus hijos.

Palabras-clave: cuidado intensivo neonatal, auxiliar de enfermería, padres, percepción.

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SUMÁRIO

A

1 INTRODUÇÃO_____________________________________________________11

1.1 O cotidiano de uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal. _______________________ 11

1.2 Um pouco de história sobre a presença dos pais em uma Unidade de Terapia Intensiva

Neonatal ___________________________________________________________________ 15

1.3 Aproximando pais e bebês: algumas propostas de humanização em neonatologia ______21

1.4 Os pais e os auxiliares de enfermagem em uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal:

teorizando sobre esta relação __________________________________________________ 28

1.5 Motivações para o estudo: situando-me como integrante do contexto ________________ 34

2 METODOLOGIA __________________________________________________ 38

2.1 Caracterizando o estudo ___________________________________________________ 38

2.2 O local do estudo _________________________________________________________ 39

2.3A coleta de informações_____________________________________________________43

2.4 Os sujeitos do estudo ______________________________________________________ 46

2.5. Aspectos éticos do estudo __________________________________________________ 48

2.6. A análise das informações__________________________________________________49

3 PERCEBENDO-SE E PERCEBENDO OS PAIS NO INTENSIVISMO

NEONATAL_________________________________________________________52

3.1 As atitudes dos profissionais em hospital público e privado________________________ 52

3.1.1 A diferenciação do cuidado em hospital público e privado________________________54

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3.1.2 A situação dos pais em um hospital "Amigo da Criança"_________________________63

3.2 A presença dos pais na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal_____________________73

3.2.1 As contradições em relação à presença das mães no ambiente de cuidado neonatal____74

3.2.2 A percepção da figura paterna no ambiente de cuidado neonatal__________________92

3.3 Da possessividade à impotência: a condição do auxiliar de enfermagem no ambiente de

cuidado neonatal_____________________________________________________________97

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS________________________________________ 113

REFERÊNCIAS_____________________________________________________ 118

ANEXO ____________________________________________________________122

APÊNDICE ________________________________________________________ 124

124

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1 INTRODUÇÃO

1.1 O Cotidiano de uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal.

O “bip-bip” constante dos monitores, o corre-corre das equipes, o entra e sai de

familiares, a chegada repentina de um bebê, a saída festiva de outro, a presença de uma

mãe amamentando e de outra que chora a piora clínica de seu filho, são cenas que fazem

parte do dia-a-dia de uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal. Nela, profissionais

treinados e capacitados buscam atender aos recém-nascidos usufruindo uma gama de

equipamentos sofisticados. Assim, encontram-se aliados recursos humanos e materiais

em um ambiente altamente tecnológico e especializado.

Para Nascimento e Martins (2000), as Unidades de Tratamento Intensivo, em

geral, possuem características e objetivos próprios, sendo destacados o convívio diário

com situações de risco, a ênfase no conhecimento técnico-científico e no aparato

tecnológico, a presença constante da morte iminente, a ansiedade de pacientes,

familiares e profissionais, a rigidez das rotinas e a presteza e rapidez nos atendimentos

atentando, essencialmente, para as necessidades biológicas do ser humano.

11

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Entre os objetivos específicos de uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal

está a manutenção da vida de bebês prematuros1, com baixo peso ao nascer ou qualquer

problema que inviabilize sua sobrevivência fora deste espaço. O aperfeiçoamento de

técnicas e tratamentos, bem como o desenvolvimento de aparelhos cada vez mais

aprimorados, contribuem para a eficiência deste espaço de cuidado e representam, para

o neonato, a diferença entre adaptar-se ou não à vida extra-uterina. O advento do

surfactante exógeno, por exemplo, viabilizou a respiração em pulmões extremamente

imaturos. Por sua vez, o aperfeiçoamento das incubadoras auxilia os bebês na

manutenção da temperatura corporal e os chamados respiradores artificiais são capazes

de reproduzir com precisão as pressões respiratórias facilitando as trocas gasosas.

Em face desta realidade, é notório, e indispensável, que os profissionais de

saúde precisem estar atualizados para prestar atendimento de qualidade aos recém-

nascidos internados nestas unidades.

De acordo com Trentini e Paim (1999, p.8):

A prática de enfermagem deve acompanhar a acirrada evolução

técnico-científica vigente no mundo, necessita estar em

constante renovação e, para isso, deverá haver comprometimento, principalmente, daqueles profissionais que a

vivenciam em seu cotidiano.

Do mesmo modo, é necessário admitir que o pensamento cartesiano e

mecanicista, característico do modelo biomédico de assistência, se manifesta ao extremo

nas Unidades de Terapia Intensiva (GOMES, 1992).

1 Prematuros: bebês com idade gestacional inferior a 37 semanas (MIURA;

PROCIANOY, 1997).

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Assim, estabelece-se uma dualidade entre o “cuidar”, concebido de acordo com

Waldow (1998) como o ideal moral da enfermagem, e o “fazer” manifestado pela

valorização exacerbada do tecnicismo no atendimento.

Ao mencionar os profissionais que fazem parte do cotidiano de uma Unidade de

Terapia Intensiva Neonatal refiro-me a todos aqueles que, de forma direta ou indireta,

prestam atendimento aos recém-nascidos. As equipes médica e de enfermagem

constituem presenças constantes. No entanto, o caráter multidisciplinar da unidade faz

com que estejam presentes também profissionais de áreas como serviço social,

fisioterapia, psicologia, nutrição entre outros. Além dos técnicos que desempenham

funções importantes como a realização de exames laboratoriais e radiológicos, e

daqueles que mantêm funcionando serviços essenciais como secretaria e higienização.

No contexto desta unidade a equipe de enfermagem possui atribuições bem

definidas. Dela depende, em grande parte, o adequado funcionamento dos equipamentos

aos quais o bebê está vinculado, bem como a manutenção das condições pré-

estabelecidas para o tratamento de cada recém-nascido, garantida graças à característica

de seu trabalho em turnos.

Em meio a este cenário que inclui máquinas quase perfeitas e pessoas quase

sempre muito ocupadas, encontram-se, além dos profissionais e dos recém-nascidos,

outros personagens. São os pais dos bebês que, embora pouco familiarizados com o

ambiente, compartilham os espaços e dedicam-se, a sua maneira, à recuperação de seus

filhos.

É preciso lembrar que, apesar de separados de suas mães logo nas primeiras

horas de vida, os neonatos que necessitam internação em uma Unidade de Terapia

Intensiva Neonatal estão inseridos em uma família a qual, em algumas realidades, está

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resumida à figura materna enquanto, em outras, pode estender-se por gerações. De

qualquer forma, esta família é percebida e, mesmo deslocada em um ambiente pouco

acolhedor, precisa ser estimulada a tomar parte nos cuidados ao bebê contribuindo

assim para seu desenvolvimento saudável.

Reforçando esta idéia Klaus e Kennel (1993) referem que o apego2, assim como

o contato íntimo entre pais e bebê, têm repercussões consideráveis no crescimento e

desenvolvimento do recém-nascido representando, portanto, itens indispensáveis a

serem considerados no cotidiano de cuidado aos recém-nascidos.

Ainda com relação à participação da família no contexto de uma Unidade de

Terapia Intensiva Neonatal, Carvalho (2001,p.33) afirma:

Ao recebermos um recém-nascido para nossos cuidados é

prioritário lembrarmos que ele não existe sem sua mãe e que

esta traz consigo seu companheiro e familiares (...) O bebê tem sua história, que é aquela de seu grupo familiar (...) Assim, é

importante que a equipe de saúde se preocupe e dê atenção às

necessidades da família (...).

Deste modo, considerando relevante o estímulo à presença dos pais junto ao

recém-nascido internado em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal, concordo com

Elsen et al. (1994, p.72) quando referem que:

A família já não pode ser vista apenas como aquela que deve cumprir determinações dos profissionais de saúde, ao se

reconhecer que ela assume a responsabilidade pela saúde de

seus membros, ela precisa ser ouvida (...) e sua participação

deve ser incentivada em todo processo.

2 Apego: manifestação de preocupação, afeto e ligação que fazem com que o adulto se torne

comprometido com a criança sob seus cuidados (KLAUS; KENNEL, 1993).

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1.2 Um pouco de história sobre a presença dos pais em uma Unidade de Terapia

Intensiva Neonatal.

Para melhor elucidar a trajetória de inclusão dos pais na Unidade de Terapia

Intensiva Neonatal, considero adequado relatar como tal processo ocorreu na história do

cuidado pediátrico, visto que a inserção dos pais neste contexto precedeu a do cuidado

neonatal.

De acordo com Collet e Rocha (2000) a aceitação da presença dos pais no

cuidado às crianças hospitalizadas ocorreu de forma diversa na história da Pediatria. Em

nome da prevenção de infecções e da transmissão de doenças, os pais, e demais

familiares, não eram bem-vindos nas unidades de internação pediátricas.

Os mesmos autores referem ainda que o esforço em combater as doenças

infecciosas, contribuiu para a formação de um sistema no interior do ambiente

hospitalar que priorizou o cumprimento rigoroso de técnicas consideradas assépticas,

em detrimento das relações interpessoais, incluindo a interação pais-bebê.

Segundo Lima, Rocha e Scochi (1999, p.31) “(...) até 1930 a assistência de

enfermagem à criança hospitalizada tinha por finalidade prevenir a transmissão de

infecção através do isolamento rigoroso”.

Porém, a partir de estudos realizados por psicólogos, durante as décadas de 50 e

60, identificando os efeitos do afastamento da criança de sua família, os pais

começaram a ser aceitos como visitantes no ambiente hospitalar, por tempo limitado e

predeterminado. Embora a recomendação fosse de presença em tempo integral, os pais

precisavam respeitar regras para permanecerem junto a seus filhos e sujeitar-se aos

horários estabelecidos pela instituição (COLLET; ROCHA, 2000).

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Para Lima, Rocha e Scochi (1999, p.33), “o legado desta forma de assistência,

que afasta a mãe e familiares de um envolvimento com a criança e profissionais, ainda

tem vestígios em nossos dias”.

Esta constatação é reforçada por Carvalho (2001, p.19) ao referir que “as rotinas

existentes quanto às visitas de familiares consideram os interesses administrativos, não

tendo como objeto básico minimizar os problemas da separação da família”.

Entendendo que a família constitui fator crucial no desenvolvimento e/ou

recuperação da criança hospitalizada, considero relevante fazer referência à

promulgação da Lei 8069, que regulamenta o Estatuto da Criança e do Adolescente

(ECA) e dispõe em seu artigo 12 que “(...) os estabelecimentos de saúde devem

proporcionar condições para a permanência, em tempo integral, de um dos pais, ou

responsável, no caso de internação de crianças e adolescentes” (BRASIL, 1991, p.16).

A exemplo do que ocorreu na pediatria, nas Unidades de Terapia Intensiva

Neonatal a presença dos pais sofreu variações, estando estas relacionadas ou não às

diretrizes inclusas no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Klaus e Kennel (1993) apontam um breve histórico a respeito da evolução da

assistência ao recém-nascido conforme segue.

Em 1923 foi criado em Chicago (EUA) o primeiro centro hospitalar para

atendimento a recém-nascidos prematuros. Paralelo a esta criação houve um estímulo às

mães para a manutenção da produção de leite materno, sem, contudo, ser favorecido o

contato destas com os bebês.

Durante as décadas de 40 a 60 as publicações sobre cuidados aos recém-nascidos

continuavam a refletir as tradições do início do século, recomendando apenas o

manuseio essencial dos bebês e mantendo uma política de isolamento que se estendia

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aos pais. Salienta-se que nesta época, no Brasil, os pais de crianças maiores (não recém-

nascidas) passaram a adentrar nas unidades de internação pediátricas uma ou duas vezes

por semana, permanecendo por um tempo máximo de uma hora. O prematuro, por sua

vez, permaneceu intocável e distante, apesar das mudanças no diagnóstico e no manejo

de bebês e crianças, resultantes da introdução de antibióticos e tecnologias inovadoras.

Assim, em nosso país, há alguns anos, os recém-nascidos que necessitavam

atendimento em centros especializados permaneciam isolados de suas famílias por

algum tempo. Os pais estavam submetidos a rigorosos horários de visita, sendo evitados

os contatos físicos em nome da manutenção das condições assépticas necessárias à

recuperação do bebê e já referidas com relação ao cuidado pediátrico. Àqueles que não

podiam estar presentes nos escassos períodos concedidos, restava a barganha por um

horário especial junto à chefia de enfermagem ou a espera pela liberação das atividades

de trabalho nos finais de semana.

De acordo com Collet e Rocha (2000, p.86) “a equipe do hospital rejeitava a

presença dos pais e familiares durante a internação devido ao perigo de transmissão de

doenças”.

Desta forma, para que fosse estabelecido um ambiente considerado “seguro”

aos recém-nascidos, os contatos humanos eram reduzidos àqueles necessários para o seu

tratamento clínico e/ou cirúrgico. As incubadoras eram mantidas fechadas pela maior

parte do tempo e a saída de um bebê para o colo ou para um berço comum era um

processo lento e criterioso. Assim, pais e filhos permaneciam pouco tempo juntos e sua

interação era mínima ficando restrita, na maior parte das vezes, aos episódios de

amamentação natural, quando esta tinha condições de acontecer.

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Cresti e Lapi (1997, p161) constataram em seus estudos que “a dupla mãe-bebê

parece constituir-se unicamente na situação de amamentação ao seio”, caracterizando o

afastamento e limitando ainda mais a presença dos pais junto ao filho.

Do mesmo modo, também os profissionais da unidade não eram estimulados a

tocar nos bebês por mais tempo do que o necessário para a realização de algum

procedimento técnico e o conhecido processo de maternagem3, hoje comum em

berçários, era visto como ato de rebeldia sendo corrigido como tal.

Para Klaus e Fanaroff (1990) as elevadas taxas de morbi-mortalidade de recém-

nascidos hospitalizados favoreceram o estabelecimento de um rigoroso sistema de

isolamento para recém-nascidos com ou sem doença.

Diante desta situação, muitas famílias tiveram contato com seus bebês apenas

após um longo período de recuperação, representado pela necessidade de uso de

equipamentos e cuidados intensivos prestados pelas equipes de saúde, sendo assim

sinônimo de “período de separação”. Considero pertinente descrever o bebê que é

apresentado aos pais durante este período, para isso destaco o que referem Ziegel e

Cranley (1985, p.576) : “(...) o recém-nascido tem, com freqüência, pelo menos uma

infusão venosa, fios ligados para monitorização, sonda endotraqueal acoplada a um

respirador e, na maioria das vezes, permanece confinado a uma incubadora”.

Afora todo afastamento imposto, as mães ainda estavam sujeitas a insinuações

acerca de suas atitudes e muitas delas eram vistas como insensíveis por não

demonstrarem por seus filhos o carinho esperado pela equipe de saúde. Conforme

destaca Carvalho (2001, p.17): “Em muitas situações nota-se que a equipe de saúde não

3 Maternagem: forma de cuidado atribuído à família, especialmente à mãe, que busca suprir as

necessidades do bebê (BRÊTAS; SILVA, 1998).

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percebe e desvaloriza a vulnerabilidade emocional dos pais, exigindo deles atitudes de

afeto, amor, cuidado, (...)”.

Gomes (1992) acrescenta que a equipe de saúde cobra dos pais calma, paciência

e equilíbrio emocional, atitudes que diferem do momento de ansiedade, medo e dúvida

que vivem.

Mas quem pode amar a um desconhecido? Após uma longa separação física, em

que por vezes até mesmo o contato olho-a-olho era dificultado por um opérculo4

colocado sobre os olhos do bebê durante o tratamento por fototerapia, nem todas as

mães e pais conseguiam estabelecer o que hoje conhecemos como vínculo5.

Por outro lado, a introdução de cuidados cada vez mais especializados e,

portanto mais distantes dos realizados pelas mães, desenvolveu nas equipes um

sentimento de posse sobre os recém-nascidos, supervalorizando técnicas e equipamentos

e favorecendo ainda mais a exclusão das famílias do contexto do intensivismo neonatal.

Esta forma de organização do atendimento aponta a intenção do monopólio de

cuidado pelos profissionais. Os pais, por sua vez, sentem-se incompetentes perante a

equipe, melindrando-se diante da necessidade de uma “mãe substituta” o que gera

ciúme e hostilidade (CARVALHO, 2001).

Sobre este aspecto, Callery e Smith, citados por Collet e Rocha (2000)

salientam a importância de se admitir a existência de poder e controle na relação entre

pais e profissionais.

4 Opérculo: tipo de proteção ocular utilizada pelo recém-nascido em tratamento por fototerapia visando a

redução do risco de lesão à retina causada pela luz intensa (nota do autor).

5 Vínculo: é o desenvolvimento de laços emocionais da mãe para com a criança (WHALEY; WONG,

1989).

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Para Domingues et al (1999, p.212), “(...) a assimetria nas relações entre

trabalhadores de saúde e usuários pode contribuir para o surgimento de dominação e

subordinação”. Deste modo, de acordo com a autora, o ambiente de trabalho em saúde

tende a transformar-se em uma “arena”.

Conforme destacam Cresti e Lapi (1997), mediante atitudes como esta, os

profissionais delegam ao hospital a tarefa de substituto aos cuidados maternos

postergando, dificultando ou mesmo impedindo as relações mãe-bebê.

Acrescento a isso o que refere Carvalho (2001) sobre a introdução de novas

tecnologias que, incorporadas aos cuidados ao recém-nascido, transformam o bebê em

objeto e seus pais em meros observadores.

Por fim, ainda com relação ao afastamento entre pais e recém-nascidos, Klaus e

Fanaroff (1990) relatam que o mesmo remonta ao ano de 1896 com a introdução, por

Martin Couney em Berlim, das primeiras incubadoras. Já nesta época, de acordo com os

autores, foram constatadas dificuldades por parte dos médicos em persuadir as mães a

receberem seus filhos na ocasião da alta hospitalar.

Infelizmente (...) algumas mães abandonam bebês cujas

necessidades elas não satisfizeram e pelos quais perderam todo

o interesse. A vida do pequeno foi salva, é verdade, porém não às custas da mãe. Pierrre Budin (in KLAUS; FANAROFF,

1990, p.134)

Cabe lembrar que são indiscutíveis as vantagens advindas a partir do uso das

incubadoras no cuidado aos bebês, especialmente àqueles de baixo peso, prematuros ou

imunodeprimidos. Saliento, porém, que as mesmas podem representar para os pais uma

barreira física que os separa de seus filhos, dificultando a visualização, o toque e até

mesmo a amamentação natural.

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Carvalho (2001) concebe a incubadora como um equipamento simples e de fácil

manuseio que favorece, na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal, condições para a

melhora dos recém-nascidos e possibilita a diminuição de seu fator de risco, mas que

pode, paralelamente, representar uma barreira mecânica significativa. Assim, para

resumir a inserção dos pais no contexto do intensivismo neonatal, considero relevante o

que refere a autora:

A família do recém-nascido de alto-risco encontra-se imbuída

no cotidiano complexo de uma UTI e experencia o estar-junto

com seu filho e com outras pessoas, relacionando-se com a equipe médica, de enfermagem, com outros pais e com os

artefatos tecnológicos que compõe esta unidade. (p.42)

1.3 Aproximando pais e bebês: algumas propostas de humanização em neonatologia.

Humanizar a assistência tem sido um forte ponto de discussão entre os

profissionais que atuam em terapia intensiva. Segundo Nascimento e Martins (2000) a

humanização busca tornar mais harmonioso um ambiente tradicionalmente hostil, frio,

melancólico e repleto de máquinas e aparelhos.

Na intenção de humanizar o atendimento aos recém-nascidos e suas famílias em

um ambiente como o de uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal algumas propostas

têm surgido e sido implantadas nos hospitais. Entretanto, a efetivação de cada uma delas

depende, basicamente, da conscientização e comprometimento das equipes que atendem

o neonato e é partir desta perspectiva que pretendo apresentá-las.

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Para Oliveira citado por Carvalho (2001, p.32):

Humanizar não consiste somente na providência de sistemáticas

ambientais de trabalho, consideradas convencionalmente como

práticas humanizadoras, mas implica sim, em sensibilidade de pessoas para o envolvimento e então, flexibilidade e

singularidade para olhar as situações de enfermagem quando se

trata de mães e recém-nascidos.

A Iniciativa Hospital Amigo da Criança, idealizada pela Organização Mundial

da Saúde (OMS) e pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) no final da

década de 80 e início dos anos 90 busca proteger, promover e apoiar o aleitamento

materno e representa uma das principais propostas de Humanização em Hospitais

Materno-Infantis através do estímulo à amamentação natural.

O objetivo da Iniciativa Hospital Amigo da Criança é mobilizar os funcionários

de Instituições que prestam atendimento à população materno-infantil para que

modifiquem normas e condutas responsáveis pelo desmame precoce interferindo nos

índices de morbi-mortalidade infantil.

Conforme Levin (1999, p.353) “a Iniciativa Hospital Amigo da Criança tem por

objetivo equilibrar o uso da alta tecnologia que substitui muitos processos naturais pelo

uso de aparelhos e artefatos”.

Para receber o Título de Hospital Amigo da Criança as Instituições de saúde

devem seguir os “Dez Passos para o Sucesso do Aleitamento Materno” preconizados

pela Iniciativa e submeter-se à avaliação por técnicos do Ministério da Saúde ligados ao

Programa de Saúde da Criança.

Entre os passos a serem seguidos para obtenção do referido título ressaltam-se

aqueles relacionados ao livre acesso dos pais em Unidades de Internação Neonatal

favorecendo a amamentação em livre demanda. A equipe de saúde deve ser treinada a

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aceitar e estimular a permanência dos pais junto ao filho, enfatizando os cuidados com

as mamas visando à manutenção da lactação. Salienta-se ainda, nesta proposta, a contra-

indicação ao uso de mamadeiras, chupetas e fórmulas artificiais para a alimentação de

recém-nascidos priorizando-se o aleitamento materno.

Com estas características, além da amamentação natural, a Iniciativa Hospital

Amigo da Criança incentiva também o vínculo entre pais e bebês o que estabelece uma

relação mais intensa entre pais e profissionais, uma vez que os primeiros passam a

permanecer mais tempo nas unidades. Assim, a tríade composta por pais, bebês e

profissionais de saúde passa a dividir espaços dentro das Unidades de Neonatologia. De

acordo com Lima, Rocha e Scochi (1999) isto levou à construção de conceitos como

cooperação e parceria; porém o fato de compartilhar saberes, poderes e espaços pode

não ser simples, implicando em mais do que mudanças de discursos, mas sim em

mudanças de atitudes, tanto por parte de pais quanto de profissionais.

Apesar da implementação dos “Dez Passos”, a Iniciativa Hospital Amigo da

Criança não garantiu àqueles recém-nascidos internados em Unidade de Terapia

Intensiva Neonatal um contato mais intenso com seus pais. Por se tratar de um ambiente

imprevisível, muitas vezes os pais precisam permanecer horas sem ter acesso às salas.

Em nome de procedimentos que variam do atendimento a uma parada cárdio-

respiratória à singela troca de fraldas os pais são convidados pelos profissionais a se

retirarem do local.

Carvalho (2001, p.90) corrobora a afirmação acima ao observar que: “(...) muitas

vezes parece que pequenas alterações, quaisquer intercorrências servem para impedir o

contato direto dos pais com seu bebê”.

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Desta forma, os pais cujos bebês não são alimentados ao seio e/ou que não

apresentam condições clínicas para sair das incubadoras continuam a ser mantidos

afastados de seus filhos. Nestes casos a adequação da presença ou não dos pais é

“julgada” pelas equipes que determinam quando e por quanto tempo os pais devem

permanecer na Unidade .

Reforçando esta idéia, Belli (1995) constata que há uma significativa restrição

por parte dos enfermeiros quanto ao tempo destinado à presença da mãe junto ao bebê,

sendo a interferência nas atividades dos profissionais que assistem ao recém-nascido a

principal justificativa.

É possível entender tais atitudes dos profissionais em relação aos pais dos bebês

se levarmos em conta o tempo em que estes foram excluídos dos cuidados a seus filhos.

Os profissionais de saúde, especialmente os da equipe de enfermagem, não habituados a

realizar suas atividades na presença dos pais, contavam com as restrições impostas pelos

horários de visita para mantê-los afastados.

Conforme referem Klaus e Kennell (1993), entende-se que em muitas situações

é difícil à equipe de enfermagem demonstrar entusiasmo com a presença dos familiares,

especialmente quando o trabalho se acumula e o ritmo torna-se mais intenso. Este

aspecto pode ser constatado levando-se em conta o cotidiano peculiar do intensivismo

neonatal em associação ao modelo assistencial tecnicista, vigente na maior parte destes

espaços.

Assim, concordo com Pedroso (2001) quando refere que a equipe de

enfermagem desenvolve suas atividades mais intensamente a partir de uma perspectiva

orientada em tarefas a serem cumpridas do que a partir da identificação e promoção das

necessidades do bebê e sua família.

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Como alternativa para o preenchimento da lacuna existente na Iniciativa

Hospital Amigo da Criança, no que se refere aos neonatos dependentes da assistência

em Unidades de Terapia Intensiva Neonatal, Levin (1999) sugere a Iniciativa Cuidado

Neonatal Humanizado. Para o autor as rotinas das maternidades estão de acordo com a

Iniciativa Hospital Amigo da Criança porém uma Unidade de Terapia Intensiva

Neonatal nesta mesma instituição não atende às mesmas exigências.

Assim, na proposta de Levin (1999) são encontrados Onze Passos a serem

seguidos pelas instituições na busca por melhores condições de atendimento aos recém-

nascidos prematuros ou doentes.

Semelhante à Iniciativa Hospital Amigo da Criança, a Iniciativa Cuidado

Neonatal Humanizado (Levin, 1999), recomenda a presença da mãe junto ao filho por

tempo integral acrescentando o contato pele-a-pele e olho-a-olho precoce bem como a

redução do uso de equipamentos nos cuidados médicos. Prevê ainda o preparo das

equipes para atender mães e bebês sendo capazes de lidar com aspectos psicológicos

desta dupla. Como forma de proporcionar maior suporte emocional à mãe é sugerida a

presença de outros familiares, como avós e outros filhos, durante as internações

prolongadas.

De acordo com a proposta, a presença eventual de outros filhos durante o

período de internação de um recém-nascido é capaz de tranqüilizar a mãe na medida em

que esta sente justificada sua ausência junto aos primeiros. Para os irmãos maiores, por

sua vez, conhecer o motivo que afastou sua mãe de casa pode representar o início de um

relacionamento fraterno tranqüilo.

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Deste modo, para Levin (1999, p.355):

O futuro desenvolvimento da medicina neonatal não pode ser

apenas de alta tecnologia devendo incluir também fatores

humanos. É um direito humano e individual do bebê hospitalizado não somente estar rodeado de aparelhos muito

bons e equipe altamente qualificada como estar com sua mãe e,

de forma ideal, também com seu pai.

Uma outra proposta de humanização em Neonatologia é o “Método Mãe-

Canguru”. Descrito pelo Ministério da Saúde como um tipo de assistência neonatal que

implica em contato pele-a-pele (posição canguru) precoce entre a mãe e o recém-

nascido de baixo peso, esta alternativa prevê maior participação dos pais nos cuidados a

seus filhos (BRASIL, S/D).

As vantagens do uso deste método incluem a intensificação do vínculo mãe-filho

mediante a redução do tempo de separação evitando longos períodos sem estimulação

sensorial. Além de favorecer o aleitamento materno, a maior competência e

autoconfiança dos pais no manuseio de seu filho de baixo peso, o melhor controle

térmico do recém-nascido, a diminuição da infecção e da permanência hospitalar e,

ainda, o melhor relacionamento da família com a equipe de saúde.

Para ser implantado em sua totalidade, o Método Mãe-Canguru deve contemplar

três etapas que variam de acordo com as condições clínicas do bebê, o local de

internação e a disponibilidade e interesse dos pais.

A primeira etapa é realizada na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal enquanto

o recém-nascido não apresenta estabilidade clínica e térmica para deixar a incubadora

por períodos prolongados. Nesta fase a permanência dos pais junto aos filhos deve ser

estimulada pela equipe de saúde sendo aconselhável o fornecimento de alimentação e

facilitado o transporte ao hospital. À semelhança das propostas anteriores, também o

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Método Mãe Canguru promove o aleitamento materno mediante o treinamento das

equipes e orientações às mães.

Na segunda etapa o recém-nascido encontra-se estabilizado clinicamente e

poderá permanecer em sistema de alojamento conjunto contínuo com sua mãe adotando

a posição canguru na maior parte do tempo. Nesta fase, é previsto o retorno da mãe ao

hospital após sua alta hospitalar, o que habitualmente ocorre por volta do quarto dia

pós-parto. Algumas condições são indispensáveis à passagem da díade mãe-bebê para

esta etapa: além da estabilidade clínica e térmica do bebê, este ainda deve apresentar

peso mínimo de 1250g e ganho ponderal diário superior a quinze gramas. As mães

devem manifestar interesse e disponibilidade para desenvolver o método e capacidade

de reconhecer situações de risco do recém-nascido como alterações na coloração da

pele, pausas respiratórias, entre outros. Esta etapa serve como um “estágio” pré-alta

hospitalar da dupla mãe-filho.

A terceira etapa do Método Mãe Canguru é realizada no domicílio e prevê a

manutenção da posição canguru até que a criança determine o contrário. O bebê recebe

alta hospitalar com peso em torno de 1750g e a recusa em permanecer no contato pele-

a-pele geralmente ocorre quando este atinge o termo 6 ou o peso 2000g. Para o

desenvolvimento desta etapa está preconizado pela norma do Ministério da Saúde, o

seguimento ambulatorial semanal sendo indispensável a disponibilidade do serviço em

receber o bebê egresso sem agendamento prévio.

6 Recém-nascido a termo: aquele com idade gestacional compreendida entre 37 e 42 semanas (LEONE;

TRONCHIN, 1996).

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Diante das iniciativas e métodos apresentados, fica evidente que a prioridade das

propostas de humanização do atendimento ao recém-nascido está voltada,

essencialmente, à aproximação entre pais e bebês.

Porém, apesar da flexibilização ou extinção dos horários de visitas e da intensa

busca pela implantação das referidas propostas, alguns pais ainda permanecem

excluídos do cenário de cuidado de seus próprios filhos.

Deste modo, concebendo o período de internação do recém-nascido como um

momento singular para a família e para o neonato, acredito na presença da equipe de

enfermagem, e em particular dos auxiliares, como elo fundamental na interação pais-

bebês. Considero ainda que as atitudes destes profissionais em relação aos pais podem

exercer certa influência sobre o processo de cuidar dos filhos. Por sua dinâmica de

trabalho contínua e pela presença constante junto aos recém-nascidos, acredito que estes

profissionais possam, de algum modo, interferir na intensidade e qualidade das relações

estabelecidas entre pais e filhos durante o período de internação.

1.4 Os Pais e os Auxiliares de Enfermagem em uma Unidade de Terapia Intensiva

Neonatal – teorizando sobre esta relação.

No dia-a-dia de uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal os profissionais da

equipe de saúde alternam-se nos cuidados aos bebês. No entanto, o profissional que

mais se aproxima dos pais é o auxiliar de enfermagem. Em função de sua atividade de

trabalho tipicamente assistencial, é ele quem se encontra à beira do leito, ou melhor

dizendo, da incubadora, a cada visita.

Sendo a Enfermagem uma profissão de cunho essencialmente feminino, as

mulheres predominam nos espaços de cuidado. Acredito que esta predominância nas

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Unidades de Terapia Intensiva Neonatal não ocorra por acaso, uma vez que, social e

culturalmente, a função de cuidar das crianças está reservada às mulheres.

Reforçando esta idéia refere Lopes (in Lopes, Meyer e Waldow 1996, p.57) que:

Para quem sempre se ocupou dos cuidados de saúde no domínio

privado (doméstico), é natural que também conjugue todas as

qualidades para assegurar a predominância no domínio profissional.

Assim, seria natural pensar que as relações entre pais e auxiliares de

enfermagem aconteceriam de forma harmoniosa. A conjugação de objetivos comuns,

com saberes técnicos e capacidades intrínsecas ao gênero poderia ser facilitadora desta

relação.

Para Gonzales, Beck e Denardim (1999), a interação advinda das relações

interpessoais tem como meta auxiliar no enfrentamento de problemas, tão presentes em

ambientes como uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal. Porém, apesar dos

problemas serem comuns a profissionais e pais, parece que aos últimos “só é permitido

sofrer com a doença do filho”, enquanto que aos profissionais de enfermagem cabe a

função precípua de cuidar (GOMES, 1992 p.87).

Collet e Rocha (2000, p.61) questionam “por que as atitudes de resistência

prevalecem quando é comum, na prática diária domiciliar dos pais, realizarem o cuidado

dos filhos?”.

Elsen, citada por Dias (2001), complementa afirmando que a enfermagem está

imbuída da crença de que a família cuida, mas que a ensinamos como cuidar. Deste

modo, segundo a autora, não estamos incluindo a família no cenário de cuidado, mas

sim reproduzindo o atual modelo de atendimento em que os profissionais de saúde são

detentores do “saber cuidar”.

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Assim, concordo com Jonhson e Lindschan citados por Collet e Rocha (2000,

p.57) quando apontam para a necessidade de uma mudança no foco de atenção de

enfermagem o que implica em,

(...) rever o atual paradigma de assistência, no qual os

profissionais de saúde acreditam que sabem o que é melhor para

a criança, de que são especialistas em crianças, para um paradigma de participação, em que os profissionais de saúde,

crianças e famílias trabalhem em conjunto.

Deste modo, entendo que, além das particularidades do modelo de atendimento

vigente, as dificuldades de relacionamento entre os profissionais da equipe de

enfermagem e os pais dos bebês tenham também raízes nas diferenças de

comportamento relativas aos cuidados às crianças existentes entre eles.

De acordo com Pedroso (2001) os profissionais de saúde trazem para o ambiente

de trabalho suas crenças pessoais, além das profissionais, acerca de família e doença e

estas exercem certa influência na maneira como consideram e cuidam das famílias.

A mesma autora refere ainda que:

Ao identificar e compreender as crenças que permeiam o cuidar da família para os profissionais de saúde, pode-se criar

possibilidades que permitam ampliar o foco do cuidado, em

busca da perspectiva de se ver a criança e a família como um

conjunto a ser cuidado. (p.13)

Collet e Rocha (2000) relatam que há fatores que evidenciam as dificuldades

demonstradas pelo enfermeiro em cuidar dos pais, apresentando, freqüentemente,

atitudes negativas em relação a eles. Tais atitudes são percebidas amiúde no trabalho

dos auxiliares de enfermagem, ao tomarem para si cuidados ao bebê que poderiam ser

realizados pelos pais, bem como ao manifestarem o uso de mecanismos de defesa nesta

relação.

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Pitta (1994), relaciona o uso de tais mecanismos para o enfrentamento de

situações de dor, sofrimento e morte. Saliento dentre os mecanismos de defesa citados

pela autora a “despersonalização” e a “negação da importância do individuo” como os

mais presentes nas relações entre os auxiliares de enfermagem e os pais dos bebês.

A despersonalização pode ser percebida no momento em que as mães passam a

ser conhecidas e identificadas através de um jargão unificado – “mãezinhas” – instituído

pelos profissionais que atendem aos bebês. Estes últimos, por sua vez, são identificados

pelo nome ou tratados por apelidos carinhosos, chegando ao extremo de serem

chamados de “filhos”, evidenciando a negação da presença materna e de sua

importância no contexto.

De acordo com Gomes (1992, p.56) “a despersonalização no cuidar é uma

maneira de reprimir e lidar com as ansiedades que o sofrimento de uma criança

desperta”. A autora acrescenta ainda que, ao concentrar sua atenção nos equipamentos

em detrimento dos semblantes amargurados dos pais, os profissionais evitam lidar

diretamente com a impotência, limitações, falhas e mortalidade próprias.

Huerta (1984) observa nos profissionais que atuam em neonatologia, a utilização

de uma “máscara”, necessária pela inabilidade em lidar com os sentimentos e

dificuldades que a presença das mães e das crianças doentes provocam e representam.

Sendo assim, concordo com Gonzales (in Gonzales, Beck e Denardim, 1999,

p.72) quando refere que:

A emoção, dor e sofrimento dos familiares manifestados através

do choro e do desespero, perturbam muito os profissionais de

saúde. Na verdade, parece que os trabalhadores de saúde não sabem lidar com seus sentimentos, até porque não foram

instrumentalizados em suas escolas de formação para tal.

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Diante destas considerações, percebo que o ambiente de uma Unidade de

Terapia Intensiva Neonatal pode ser extremamente estressante àqueles que ali

convivem, seja exercendo suas atividades profissionais, seja acompanhando a

internação de um filho. Penso que um cenário composto por cenas que oscilam entre a

vida e a morte, entre as alegrias advindas do nascimento de um bebê às tristezas

decorrentes de um parto prematuro, pode determinar comportamentos diversos em seus

atores.

Para os pais o estresse constitui uma resposta inevitável à situação de internação

hospitalar do filho. De acordo com Noyes, citado por Collet e Rocha (2000), o estresse

não pode ser eliminado, mas sim minimizado, ajudando-se os pais a encontrarem

estratégias para o enfrentamento dos problemas, deste modo interferindo na relação

entre pais, enfermeiros e crianças tendo, conseqüentemente, reflexos na evolução da

doença.

Deste modo, considero adequada a inferência de Carvalho (2001, p.18), com

relação à condição dos pais diante da internação de um filho:

Geograficamente deslocados, seu trabalho e vida perturbados,

seus ritmos biológicos desordenados, atônitos, ansiosos e

terrivelmente cansados, os pais, no delírio da crise, são simplesmente incapazes de perceber o que está acontecendo.

Contextualizando o estresse nas relações entre profissionais e familiares,

Grüdtner et al. (1999, p.366) referem que:

(...) a interação entre a família e a equipe assistencial é

permeada por alguns fatores estressantes que dificultam a parceria e a convivência dos profissionais de saúde com os

familiares no ambiente hospitalar.

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A partir desta afirmação, as mesmas autoras sugerem que seja feita uma reflexão

acerca dos sentimentos, atitudes, crenças e limites da equipe de enfermagem em busca

de um posicionamento ético pelo bem comum, incluindo as famílias como parceiras em

seu trabalho e desenvolvendo habilidades de relacionamento humano.

Assim, concebendo o auxiliar de enfermagem como o profissional que mais

freqüentemente interage com os pais, reconheço a necessidade de conhecer sua

percepção acerca da presença dos pais junto ao recém-nascido internado em uma

Unidade de Terapia Intensiva Neonatal. Acreditando ainda que esta presença seja

fundamental à recuperação de bebês doentes e ao processo de crescimento de bebês

prematuros ou de baixo peso, bem como reconhecendo que “a relação entre pais e

enfermeiros tem-se mostrado bastante conflituosa” (COLLET; ROCHA, 2000, p.60).

Cabe lembrar que considero aqui, famílias como pais e/ou mães que

acompanham o bebê durante a internação, sendo que, em muitos casos, este conceito

pode ser estendido aos avós ou outras pessoas ligadas ao recém-nascido.

Ao falar da criança enquanto participante no processo de cuidado percebo o

neonato como alguém com capacidades peculiares de relacionamento com outras

pessoas e com o meio ambiente.

Para Carvalho (2001, p.19) “o recém-nascido, considerando sua singularidade,

não é um ser isolado, e o recebimento de visitas significa o início de suas relações com

o mundo fora do hospital”. Acrescenta ainda que, na Unidade de Terapia Intensiva

Neonatal, o recém-nascido de alto-risco é o centro das atenções de toda equipe de saúde,

porém, apesar de todas as intercorrências a que está sujeito, é capaz de manifestar,

mesmo que de forma sutil, seus desejos, necessidades, satisfações, dores e prazeres.

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1.5 Motivações para o estudo: situando-me como integrante do contexto

Minha inserção no contexto do intensivismo neonatal ocorreu há quase sete

anos, quando recém-formada, buscava o primeiro emprego. Ao deparar-me com a

possibilidade de trabalhar junto a recém-nascidos senti-me despreparada. Durante a

graduação não foram muitas as oportunidades de cuidar deste tipo de paciente e, em

minha vida particular, o fato de ser filha única não me possibilitou a experiência de

conviver com irmãos menores. Assim, após algumas horas de reflexão, decidi aceitar a

proposta e vi-me então cuidando de todo o tipo de bebês. Eram prematuros com menos

de 500g que cabiam nas palmas de minhas mãos, recém-nascidos com problemas

congênitos relacionados ao fechamento de folhetos embrionários que deixavam

expostas suas vísceras abdominais, bebês com mal-formações múltiplas que mal podiam

ser reconhecidos por seus pais, além daqueles aparentemente saudáveis, mas que, por

problemas relacionados ao parto ou ao estado de saúde de suas mães, encontravam-se

ali internados. Foi assim que passei a conhecer e me apaixonar pelas pequenas

criaturinhas que habitavam incubadoras e berços a mercê de cuidados especializados.

Logo de início, fui colocada junto a uma colega em uma das salas de alto risco.

As inseguranças foram aos poucos cedendo lugar aos aprendizados e naturalmente

passei a envolver-me com aquele ambiente. Além dos recém-nascidos, que exigiam

cuidados contínuos por parte da equipe de enfermagem, encontravam-se ali seus pais

que, independente do estado de saúde do filho, mostravam-se ansiosos e preocupados

com a sua recuperação. Aprendi que cuidar de um bebê em uma Unidade de Terapia

Intensiva Neonatal envolve mais do que desempenhar com habilidade os procedimentos

técnicos necessários ao seu tratamento. Os cuidados de enfermagem precisam atender os

problemas clínicos e/ou cirúrgicos do recém-nascido, mas considerar também a sua

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necessidade de relação e interação com seus pais. No entanto, o que observei foi que

com a sucessão de intervenções a que os bebês eram submetidos em uma Unidade de

Terapia Intensiva Neonatal, pouco espaço sobrava para estas relações; salvo nos casos

de amamentação natural em que as mães tinham permissão para permanecer mais tempo

junto aos filhos. Esta constatação é reforçada pelo que refere Cresti e Lapi (1997,

p.151):

(...) hospitaliza-se os recém-nascidos prematuros ou que

apresentam problemas ao nascer; a hospitalização é prolongada,

sendo necessárias e mais freqüentes as intervenções técnico-sanitárias exploratórias ou terapêuticas; as mães estão separadas

fisicamente de seus filhos, embora se favoreçam seus contatos e

amamentação natural.

É importante lembrar que na época em que ingressei no hospital os pais ainda

estavam sujeitos a um rigoroso esquema de horário de visitas. Às mães que

amamentavam ao seio era permitida a entrada a cada três horas ficando seu tempo de

permanência limitado ao período em que o bebê estivesse, efetivamente, mamando.

Aquelas cujos bebês ainda não mamavam ao seio obedeciam ao mesmo esquema. Já os

pais tinham apenas duas oportunidades durante o dia para visitar seus filhos, não

havendo adequação de horários os encontros ficavam sujeitos à análise da situação por

parte da enfermeira-chefe da Unidade. Do mesmo modo, a saída de um bebê da

incubadora para mamar era considerada uma medida extrema, estando reservada

àqueles casos em que a amamentação natural era impossível de outra maneira. Assim,

os contatos físicos entre pais e filhos, e mesmo entre profissionais e recém-nascidos,

estavam reduzidos, sendo entendidos como prejudiciais a sua recuperação.

Diante desta realidade, interessei-me, de forma especial, pela necessidade

daquelas pequenas criaturinhas, isoladas em suas incubadoras, em estabelecer contatos

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mais intensos com outros seres humanos e não apenas com equipamentos e mãos

tecnicamente hábeis na realização de procedimentos em sua maioria dolorosos. Reforcei

a crença de que a presença dos pais é um fator importante à recuperação dos bebês e de

que o vínculo estabelecido entre eles naqueles primeiros dias após o nascimento pode

ser decisivo em suas relações futuras.

Assim, ao tomar conhecimento das propostas de humanização da assistência ao

recém-nascido internado em Unidades de Internação Neonatal e Unidades de Terapia

Intensiva Neonatal passei, naturalmente, a integrar os grupos para motivação,

divulgação e implantação das novas atividades, acreditando que a partir delas seria

possível modificar o cenário de cuidado através de mudanças nas atitudes de seus

atores.

No entanto, com o passar do tempo, percebi que as propostas de mudança não

estavam atingindo as atitudes dos profissionais que mantêm contato direto e ininterrupto

com os recém-nascidos, e desta forma, não promoviam alterações significativas no

cenário de cuidado.

É interessante observar que antes da “abertura” da unidade aos familiares por

tempo quase integral, o envolvimento manifestado por alguns profissionais da equipe de

enfermagem em relação aos bebês e seus pais era muito mais evidente. Percebo que

antes da “abertura”, o relacionamento com as famílias não parecia gerar desconfortos

uma vez que sua presença era ocasional e que podia ser dispensada, sem qualquer

constrangimento, em nome dos horários de visita, afixados em locais visíveis e

relembrados a cada entrada na unidade.

Deste modo, apesar das iniciativas em busca da humanização e do esforço

conjunto de profissionais das diversas áreas da saúde, os pais dos bebês ainda

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permaneceram (e permanecem) afastados dos cuidados a seus filhos e, embora sem

horários fixados para visita, continuaram (e continuam) sendo afastados das salas em

nome de procedimentos banais como troca de fraldas, alimentação ou verificação de

sinais vitais.

Reforçando esta idéia Gomes (1992, p.92) afirma que:

O que percebemos nos hospitais, ainda hoje, são pais relegados

a ficarem sozinhos, passarem horas esperando nos corredores,

nos bares, nas imediações do hospital, andando ao léu, para lá e para cá.

Acreditando ser o auxiliar de enfermagem o profissional da equipe de saúde que

mantém maior contato com os pais dos bebês internados em Unidade de Terapia

Intensiva Neonatal sendo, portanto, capaz de interferir em sua presença ou não junto ao

filho, é ele quem constitui o sujeito deste estudo que tem como objetivo: conhecer a

percepção do auxiliar de enfermagem a respeito da presença dos pais de recém-

nascidos internados em uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal.

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2 METODOLOGIA

2.1 Caracterizando o estudo

Trata-se de um estudo descritivo do tipo exploratório, desenvolvido a partir de

uma abordagem de pesquisa qualitativa.

Para Polit e Hungler (1995) a pesquisa qualitativa é descrita como “holística”, na

medida em que se preocupa com os indivíduos e seu ambiente, e “naturalística”, sem

qualquer limitação e controle imposto ao pesquisador. As autoras referem ainda que este

tipo de pesquisa, por estar centrada na realidade dos sujeitos, necessita um mínimo de

estrutura e um máximo de envolvimento do pesquisador, uma vez que busca

compreender os sujeitos do estudo a partir de suas experiências.

Assim, “a imposição de uma estrutura sobre a situação de pesquisa, limita,

necessariamente, a parte das experiências dos sujeitos que será revelada” (POLIT;

HUNGLER , 1995, p.270).

Por sua vez, os estudos descritivos caracterizam-se por exigir do pesquisador

informações anteriores acerca do que deseja pesquisar. Ou seja, é necessário

conhecimento prévio do fenômeno para descrevê-lo com exatidão. A associação do

estudo descritivo ao exploratório, permite a ampliação de tal conhecimento, aumentando

também a experiência do pesquisador (TRIVIÑOS, 1987).

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2.2 O local do estudo

O local escolhido para desenvolver o estudo foi um Hospital Materno- Infantil

de Porto Alegre que presta atendimento exclusivo pelo do Sistema Único de Saúde.

Localizado na área central da cidade o Hospital Presidente Vargas recebe pacientes

procedentes da Grande Porto Alegre e, por se tratar de uma instituição de referência

para o alto risco materno e fetal, acolhe também uma grande demanda oriunda do

interior do Estado.

Especializado no atendimento à mulher e à criança, apresenta áreas restritas

como Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica e Neonatal, Centro Obstétrico e Centro

Cirúrgico, além de Unidades de Internação Pediátrica, Ginecológica, Obstétrica,

Neonatal, Psiquiátrica e de Alojamento Conjunto. Presta ainda atendimento

ambulatorial a gestantes, puérperas, crianças e adolescentes, além de oferecer recursos

como emergência pediátrica e obstétrica, pré-natal, hospital-dia às gestantes de alto-

risco, programas específicos para adolescentes, famílias de recém-nascidos prematuros,

portadores de DST/AIDS entre outros.

Como hospital-escola, conta com os serviços de profissionais das mais variadas

especialidades, bem como com a presença de residentes, doutorandos e estagiários de

medicina, enfermagem, psicologia, serviço social e nutrição.

Cabe ressaltar ainda que a instituição, originalmente fundada como Repartição

Pública Federal e há trinta anos caracterizada pelo atendimento materno-infantil,

apresenta em seus quadros funcionários concursados vinculados primeiramente ao

antigo Instituto Nacional de Previdência Social, passando ao Instituto Nacional de

Assistência e Previdência Social, Instituto Nacional de Securidade Social e,

finalmente, ao Sistema Único de Saúde. No entanto, com a ausência de novos

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concursos, a necessária substituição destes deu-se graças a contratações feitas a partir de

convênio do Governo do Estado com a Fundação Universitária de Gastroenterologia

iniciadas há cerca de oito anos e suspensas desde 1999. Atualmente o hospital conta

também com os serviços de funcionários públicos municipais, uma vez que desde

outubro de 2000 o mesmo encontra-se municipalizado.

Assim, encontra-se diversidade nos regimes e condições de trabalho, mesmo

dentro de funções idênticas, com salários e cargas horária também distintas.

Os profissionais contratados pela Fundação representam quase 70% do efetivo,

enquanto os funcionários públicos federais, que se encontram, principalmente, em

cargos administrativos, estão reduzidos a um número pouco significativo. Já os

funcionários municipais, recentemente inseridos, passam atualmente por uma fase de

adaptação à instituição e ao serviço.

Para atender à crescente necessidade da população materno-infantil que busca

atendimento pelo Sistema Único de Saúde, o hospital vem aumentando gradualmente o

número de leitos oferecidos, especialmente nas áreas em que a procura é intensificada

nos meses de inverno e verão e naquelas onde há carência de leitos na região da Grande

Porto Alegre, como é o caso do atendimento ao recém-nascido doente.

Paralelamente a isso, na busca por condições de trabalho que visem a

humanização da assistência prestada aos clientes, diversos programas vêm sendo

implementados a partir da mobilização de profissionais de todas as áreas, incentivando e

fortalecendo o trabalho de forma interdisciplinar.

Em dezembro de 1999, a instituição conquistou o título de Hospital Amigo da

Criança somando-se a outros hospitais que compartilham a mesma filosofia. A partir

disso o cotidiano de trabalho foi acrescido da preocupação constante com a promoção

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do aleitamento materno. Os pais deixaram de ser considerados visitas e passaram a

participar mais intensamente da recuperação de seus filhos, além de outras mudanças

preconizadas para a obtenção e manutenção desta condição.

Neste contexto a Unidade de Internação Neonatal e de Terapia Intensiva

Neonatal integram-se às demais buscando acolher os recém-nascidos e suas famílias.

Situadas no nono andar do hospital estas duas unidades compartilham espaços ocupando

três salas para cuidados intensivos, duas para cuidados semi-intensivos, uma para

cuidados intermediários, uma para cuidados mínimos e uma sala para admissão dos

recém-nascidos procedentes do Centro Obstétrico, perfazendo um total de cinqüenta e

quatro leitos. Existem ainda no andar salas de apoio para os profissionais que ali

realizam suas atividades como salas de prescrição e estar médico, chefia de

enfermagem, almoxarifado, sala de lanche, vestiários, banheiros e sala de amamentação.

As três salas para atendimento de recém-nascidos de alto-risco, com seis leitos

cada, apresentam-se equipadas com aparelhos sofisticados e de alta precisão exigindo

dos profissionais um alto nível de conhecimento técnico, com constante atualização.

Cabe referir que entendo por recém-nascido de alto risco aquele que, de acordo

com Klaus e Fanaroff (1990, p.46) :

(...) independentemente da idade gestacional ou do peso de

nascimento, tem a existência extra-uterina comprometida por

uma série de fatores (pré-natais ou pós-natais) e que tem necessidade de assistência médica especial.

Nas salas de cuidados semi-intensivos e intermediários encontram-se aqueles

bebês estáveis clinicamente e que não dependem de aparelhos para suporte respiratório.

Integram a sala de cuidados mínimos os recém-nascidos que precisam adquirir

peso suficiente para alta hospitalar, aqueles que aguardam por condições clínicas de

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suas mães para estabelecer o alojamento-conjunto e ainda os bebês cuja tutela está sob a

jurisdição do Estado ou do Município (bebês para adoção).

Na sala de admissão os recém-nascidos permanecem apenas o período

necessário para a realização das rotinas de admissão como medidas antropométricas,

higiene corporal e técnicas relativas à profilaxia de infecções e/ou patologias

congênitas, sendo, logo após, encaminhados para junto de suas mães.

Para atender à demanda de pacientes que diariamente ocupam todos os leitos

disponíveis nas Unidades de Internação Neonatal e de Terapia Intensiva Neonatal, a

equipe de enfermagem representa o maior contingente de pessoal, estando distribuída de

forma harmônica entre os quatro turnos de trabalho. São aproximadamente noventa

auxiliares de enfermagem, dezessete enfermeiras e uma chefia de unidade. Diante de um

quadro funcional tão representativo em relação aos demais profissionais, a enfermagem

ocupa espaços e funções bem definidos. À enfermeira-chefe cabem as atividades de

administração e supervisão da unidade. Às demais enfermeiras estão reservadas as

funções relativas aos cuidados diretos aos recém-nascidos sendo que estas se sobrepõem

àquelas relacionadas à administração e supervisão de pessoal. Aos auxiliares de

enfermagem cabem as tarefas descritas em legislação específica para a categoria,

acrescidas daquelas delegadas pelo profissional enfermeiro. É interessante lembrar que

muitos destes auxiliares possuem qualificação como técnicos de enfermagem, mas que,

no entanto, a instituição não os reconhece como tal.

A equipe de enfermagem está presente em toda unidade. Em número de três a

quatro por turno, as enfermeiras alternam-se no atendimento às salas ficando cada uma

responsável por uma das salas de alto risco. O grupo de auxiliares de enfermagem

encontra-se distribuído de maneira uniforme sendo estabelecido um rodízio mensal

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entre as salas. Deste modo, os auxiliares ora atendem os bebês que necessitam cuidados

intensivos, ora àqueles com cuidados intermediários ou mínimos. Cabe referir que o

número de recém-nascidos designados a cada auxiliar de enfermagem varia de acordo

com a complexidade do cuidado exigido, sendo respeitado o número máximo de três

bebês nas salas de cuidados intensivos e de seis nas demais. Assim, toda a equipe

encontra-se apta a atender aos recém-nascidos, independente do nível de cuidado que

necessitem.

2.3 A coleta de informações

As informações foram coletadas mediante a técnica de Grupo Focal que é

definido por Westphal, Bógus e Faria (1996, p.473) como: “(...) uma técnica de

pesquisa que utiliza sessões grupais como um dos foros facilitadores da expressão de

características psicossociológicas e culturais”. Para os autores, a utilização desta

técnica proporciona a obtenção de informações a partir de discussões em grupo, nas

quais os participantes expressam suas percepções, crenças, valores e atitudes em relação

a um determinado tema. Ressaltam ainda, entre as vantagens da utilização desta

técnica, a maior possibilidade que oferece para o pensamento coletivo em torno de uma

temática que faz parte da vida das pessoas reunidas.

Os grupos focais são compostos, geralmente, por seis a quinze pessoas, sendo

ideal um número compreendido entre oito e dez participantes. No entanto, para Debus

(1997) há uma tendência à formação de grupos menores, com cinco a sete integrantes.

De acordo com o autor, o tamanho do grupo depende dos objetivos estabelecidos pelo

pesquisador. Se a geração de um maior número de idéias for pretendida é aconselhável

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o grupo maior; se o que se busca é o aprofundamento das expressões de cada

participante o grupo menor é mais indicado.

Os integrantes do grupo são escolhidos de acordo com o objetivo do estudo

(amostra intencional) e devem apresentar entre si pelo menos um traço em comum,

relevante para o tema proposto (DALL’AGNOL; CIAMPONE, 1999).

Além dos sujeitos da pesquisa, integram o Grupo Focal o moderador, ou

coordenador, e o observador. Ao moderador cabem as funções de facilitar e estimular o

debate, propondo questões relacionadas ao tema do estudo. O observador auxilia o

moderador na captação das informações emergidas podendo contribuir para a síntese

feita ao final de cada sessão. Também é função do observador a manutenção do

equipamento de gravação bem como o breve registro das falas de cada participante para

facilitar a posterior transcrição (DALL’AGNOL; CIAMPONE, 1999).

Com relação ao tempo de duração de cada sessão grupal, as autoras acima

sugerem o intervalo de 1h30min à 2h como ideal. Neste período consideram que é

possível ao grupo vivenciar as fases de “aquecimento, interação e encerramento” sem

que ocorram fadiga ou intelectualização excessiva do tema, que podem determinar

vieses em relação à temática proposta.

Quanto ao local para realização dos encontros, Debus (1997) preconiza a

privacidade do ambiente, assim como a acessibilidade e comodidade. É necessário,

segundo o autor, que os participantes possam expressar-se sem serem observados por

pessoas alheias ao grupo, dirijam-se ao local sem problemas de deslocamento e que se

sintam confortáveis durante as sessões grupais. É recomendável ainda que os

participantes possam visualizar-se entre si, ficando o coordenador e o observador

incluídos no grupo sem ocuparem posições de destaque.

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Deste modo, considerando as recomendações acima citadas, o Grupo Focal

realizado para coleta de informações no presente estudo foi instituído conforme segue.

O grupo foi constituído por sete auxiliares de enfermagem que exerciam suas

atividades na Unidade de Internação e de Terapia Intensiva Neonatal. Todos possuíam,

portanto, atributos comuns conforme preconizado por Dall’Agnol e Ciampone (1999).

Além dos sujeitos da pesquisa e da coordenadora, representada pela própria

pesquisadora, o grupo contou com a presença de uma observadora. Para este papel foi

convidada uma enfermeira que, tendo trabalhado em Unidade de Terapia Intensiva

Neonatal em outro hospital, possuía, na minha concepção, pré-requisitos para auxiliar

tanto na condução do grupo como na síntese das informações.

Os encontros foram realizados na própria instituição onde os sujeitos da pesquisa

trabalhavam. A princípio foi escolhida uma sala localizada no primeiro andar, mas, por

problemas relativos ao excesso de calor e ruídos externos, a partir do segundo encontro

passamos a ocupar a sala de reuniões da Unidade de Internação Pediátrica localizada no

quarto andar. Tal sala contava com cadeiras estofadas, dispostas em círculo e em

número suficiente para todos participantes, além de mesas auxiliares e aparelho de ar-

condicionado.

Na primeira reunião do grupo foi realizado o chamado “setting ou enquadre

grupal”, momento em que os participantes fizeram os acordos necessários ao

prosseguimento das sessões como horários, número de encontros, intervalos e local

(DALL’AGNOL; CIAMPONE, 1999).

Nesta ocasião foi também desenvolvida uma dinâmica visando à integração do

grupo, assim como foram apresentados os aspectos éticos relativos à pesquisa,

detalhados a seguir.

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Ficou estabelecido o tempo de 1h30mim para os encontros, que foram em

número de seis e aconteceram uma vez por semana, às quartas-feiras pela manhã, no

local determinado e informado previamente pela pesquisadora. Durante todas as sessões

grupais foi oferecido um breve lanche que, consumido no decorrer da reunião, serviu

como objeto de descontração e integração do grupo.

Saliento que cada encontro foi precedido pelo estabelecimento de algumas

questões norteadoras. Ou seja, no primeiro a problemática que instigou o início das

discussões foi o próprio objetivo do estudo. Nos encontros subseqüentes as temáticas

foram encaminhadas a partir dos assuntos que haviam sido abordados pelas próprias

auxiliares na semana anterior.

Cabe referir ainda que todos os encontros foram gravados, contando com o

auxílio da observadora, o que facilitou o registro dos diálogos e permitiu a percepção de

eventuais momentos de silêncio, distrações e desvios do tema.

As fitas foram transcritas logo após cada sessão, possibilitando a elaboração de

uma síntese apresentada ao grupo no encontro subseqüente. Tal procedimento serviu

também para antecipar o processo de análise pela pesquisadora.

Ressalto que, o fato de integrar a equipe de enfermagem do local da pesquisa,

facilitou, sobremaneira, a divulgação da pesquisa e efetivação da coleta de informações.

2.4 Os sujeitos do estudo

Participaram da pesquisa os auxiliares de enfermagem da Unidade de

Neonatologia e de Terapia Intensiva Neonatal que se dispuseram, voluntariamente, a

integrar o estudo. Os auxiliares vinculados à Prefeitura Municipal não foram incluídos

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na amostra devido a seu curto período de inserção na Unidade e, portanto, de interação

com os pais e bebês.

Foi proposto ao grupo de auxiliares a participação na pesquisa, independente do

turno de trabalho por entender que os pais podem estar presentes a qualquer hora do dia

ou da noite. Reconheço, porém, que a maior freqüência de visitas acontece durante o

dia, considerando as facilidades de deslocamento neste período.

A sensibilização e mobilização dos auxiliares de enfermagem para participação

na pesquisa ocorreram a partir da intensa divulgação do objetivo do estudo bem como

de sua metodologia, feita ora individualmente, ora em pequenos grupos.

Após este período de “conquista” do grupo, que perdurou por cerca de vinte

dias, foi afixado, em local acessível, o “convite oficial”. Em anexo foi deixada uma

folha em branco onde os auxiliares interessados em participar da pesquisa passaram a

colocar seus nomes. O convite permaneceu afixado durante sete dias e, ao ser recolhido,

a lista anexa contava com dezenove nomes.

Decorridos mais sete dias, foi marcada a data, horário e local do primeiro

encontro do qual participaram sete auxiliares. Os demais justificaram sua ausência por

problemas de incompatibilidade de horário, já previstos pela pesquisadora.

No grupo estavam representados todos os turnos de trabalho. Cabe salientar que,

tendo as reuniões acontecido durante o turno da manhã, foi necessária uma negociação

junto a chefe de enfermagem do setor, assim como com as demais enfermeiras, para que

os auxiliares que estavam em seu horário de trabalho pudessem participar da pesquisa.

Considerando as características, profissionais e pessoais, de cada integrante, o

grupo estava assim formado: as idades variaram entre vinte e quatro e cinqüenta e seis

anos, o tempo de formação como auxiliar ou técnico de enfermagem encontrou-se entre

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cinco e treze anos e o tempo de serviço no local do estudo oscilou entre quatro e nove

anos.

Deste modo, considero que a amostra, assim composta, pôde ser considerada

representativa do grupo de auxiliares de enfermagem do local onde foi desenvolvida a

pesquisa. Devido à presença de traços comuns entre seus integrantes, como o fato de

trabalharem com recém-nascidos e conforme preconiza a técnica de grupo focal já

referida, e à heterogeneidade entre seus elementos no que se refere à idade, tempo de

serviço e de formação profissional.

2.5 Aspectos éticos do estudo

Para que a pesquisa pudesse ter início alguns trâmites formais precisaram ser

contemplados. Após apreciação e aprovação do projeto por Banca Examinadora junto

ao Programa de Pós-graduação, Mestrado em Enfermagem, da Universidade Federal do

Rio Grande do Sul foi solicitada autorização para o desenvolvimento do estudo na

instituição hospitalar. Para isto o projeto de pesquisa foi encaminhado ao Comitê de

Ética e Pesquisa do Hospital Materno-Infantil Presidente Vargas tendo sido aprovado

segundo as Diretrizes e Normas Regulamentadoras da Pesquisa envolvendo Seres

Humanos – resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (ANEXO A).

Cumpridas as exigências junto às instituições, de ensino e hospitalar, foi então

buscada autorização da enfermeira-chefe da unidade e dos sujeitos da pesquisa.

No primeiro encontro grupal, os sujeitos foram esclarecidos sobre os objetivos

do estudo e sobre a dinâmica do Grupo Focal. Ficou garantido o anonimato nos

registros bem como o uso das informações obtidas apenas para fins de pesquisa.

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Também foi facultada aos participantes a possibilidade de retirar-se do grupo a qualquer

momento de sua execução.

Havendo concordância com os aspectos apresentados, cada sujeito assinou o

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (APÊNDICE A) ficando com uma cópia

sendo outra arquivada com a pesquisadora.

Para garantir o anonimato na redação do relatório final do estudo, os sujeitos

passaram a ser designados por um codinome. O código adotado foi escolhido pelo

próprio grupo e cada participante optou pelo nome de uma flor para representá-lo.

2.6 A Análise das Informações

Em busca dos significados das informações emergidas durante as sessões de

grupo focal, optei pela análise de conteúdo utilizando a técnica de análise temática,

conforme proposta por Minayo (1993).

Para a autora, realizar uma análise temática representa descobrir os núcleos de

significado que integram uma comunicação e cuja presença ou freqüência representem

algum fator para o objetivo analítico buscado.

Assim, a operacionalização da análise temática envolve três etapas:

1. Pré-análise:

Prevê a escolha das informações a serem analisadas e a retomada dos objetivos

iniciais da pesquisa, reformulando-os diante do material coletado. A partir de então são

elaborados indicadores que vão orientar a interpretação final.

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2. Exploração do Material:

Esta etapa consiste basicamente na operacionalização da codificação. Em um

primeiro momento é realizado o recorte do texto em unidades de registro (palavra, frase,

tema...), conforme estabelecido na pré-análise. Após, escolhem-se as regras de

contagem permitindo alguma quantificação das informações. Em terceiro lugar é

realizada a classificação e a agregação dos dados, optando-se pelas categorias teóricas

ou empíricas que indicarão a especificação dos temas.

3. Tratamento dos Resultados Obtidos e Interpretação:

As informações obtidas são colocadas em destaque. A partir daí procura-se

estabelecer relações entre as informações obtidas e os referenciais teóricos do estudo,

respondendo às questões de pesquisa com base em seus objetivos.

Cabe salientar ainda que de acordo com Minayo (1997, p.79) : “(...) o produto

final de uma pesquisa, por mais brilhante que seja, deve ser sempre encarado de forma

provisória e aproximativa”.

Considerando estes pressupostos, a operacionalização da análise das

informações obtidas ao longo dos seis encontros do grupo ocorreu da seguinte forma:

- após a transcrição das fitas foi realizada a leitura repetida dos textos buscando

as idéias centrais que, agrupadas por similaridade, passaram a representar os temas.

Ressalto que, embora cada encontro grupal tenha gerado um pool de

informações distinto, os textos foram examinados em conjunto uma vez que os assuntos

debatidos foram reincidentes.

Determinados os temas e subtemas e tendo selecionado as verbalizações mais

representativas de cada um, passei à análise final; obedecendo ao que recomenda

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Minayo (1997) e estabelecendo um movimento contínuo entre o empírico e o teórico,

entre o concreto e o abstrato, entre o particular e o geral, num movimento dialético

visando o concreto pensado.

Assim, considerando o objetivo do estudo, e a partir das idéias resgatadas a

respeito do ambiente, dos pais dos bebês e de sua própria condição profissional no

contexto, para a análise final as informações obtidas foram agrupadas em três grandes

temas, e relativos subtemas, apresentados aqui e discutidos, em profundidade, a seguir.

1 As atitudes dos profissionais em hospital público e privado.

1.1 A diferenciação do cuidado em hospital público e privado.

1.2 A situação dos pais em um hospital “Amigo da Criança”.

2 A presença dos pais na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal.

2.1 As contradições em relação à presença das mães no ambiente de cuidado

neonatal.

2.2 A percepção da figura paterna no ambiente de cuidado neonatal.

3 Da possessividade à impotência: a condição do auxiliar de enfermagem no

ambiente de cuidado neonatal.

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52

3 PERCEBENDO-SE E PERCEBENDO OS PAIS NO INTENSIVISMO

NEONATAL

Na intenção de contemplar a maior parte das idéias manifestadas pelas auxiliares

de enfermagem no decorrer dos debates no grupo focal, suas concepções foram

agrupadas em três grandes temas. Saliento, porém, que pelo dinamismo característico da

metodologia utilizada para coleta de informações, a divisão em temas não reflete

momentos estanques, nem, tampouco, pretende esgotar as vertentes surgidas durante sua

execução.

3.1 As atitudes dos profissionais em hospital público e privado

Antes de passar a referir e refletir sobre as idéias que geraram este tema é

necessário reforçar algumas colocações a respeito do que considero como ambiente

neste estudo. Conforme já referido em capítulo anterior, o local escolhido para a coleta

de informações foi um hospital que atende exclusivamente ao Sistema Único de Saúde

e, por atender, basicamente, à população de alto-risco materno-infantil buscou e

conquistou o título de Hospital Amigo da Criança. Nele encontra-se inserida, entre

outras, a Unidade de Terapia Intensiva Neonatal que conta com os serviços de

estagiários de diversas áreas, caracterizando assim sua condição de hospital-escola.

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Para Carvalho (2001, p.41):

O ambiente é constituído por todos os seres humanos e as

relações existentes entre eles. É o meio físico, social, educacional, cultural, econômico e político onde o ser humano vive e, portanto, onde a equipe de enfermagem, o recém-

nascido e a família estão inseridos, interagindo dinamicamente,

necessitando ou prestando cuidados.

Desta forma, a concepção de ambiente ultrapassa os limites da Unidade de

Terapia Intensiva Neonatal estendendo-se, não só por todo hospital, como pelo contexto

no qual este está inserido, interligando profissionais de saúde, pacientes e famílias.

Assim, de acordo com Barbosa, citado por Carvalho (2001), é preciso ter-se

consciência de que a assistência plena não se fará apenas dentro do ambiente hospitalar.

Admito, deste modo, a necessidade de que cada profissional de saúde reconheça

a inserção de sua unidade de trabalho no contexto amplo da atenção à saúde, bem como

suas posturas no atendimento aos pacientes e seus familiares.

Na concepção das auxiliares de enfermagem do estudo, a instituição ora é

percebida em sua plenitude, ora de maneira restrita. Ou seja, do mesmo modo que o

grupo identifica no Hospital Presidente Vargas as características alusivas a um hospital

público, com suas inerentes virtudes e deficiências, fazem referências à Unidade de

Terapia Intensiva Neonatal como um espaço isolado de trabalho e de cuidado.

Assim, para melhor ilustrar estas percepções, o tema foi dividido em dois

subtemas que buscam elucidar o ambiente a partir de duas perspectivas: atitudes dos

profissionais e lugar para os pais.

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3.1.1 A diferenciação do cuidado em hospital público e privado: a questão do

ambiente.

Durante os encontros do grupo ficou evidente que as auxiliares de enfermagem

percebem a interferência do ambiente no seu cotidiano de trabalho, bem como em suas

relações com os pais dos bebês.

Ao reconhecer que suas atitudes profissionais sofrem tal influência passam a

questioná-las, extrapolando a condição da instituição como hospital público, conforme

manifesta Jasmim,

(...) qual nossa atitude? É diferente no SUS e no particular? A

gente trata os pais de um hospital particular melhor do que trata

aqui? (...)

Os questionamentos acima retratam a consciência do grupo em distinguir o

cuidado oferecido em um hospital público, daquele proporcionado aos pacientes

internados na rede privada.

A justificativa para tal diferenciação é apontada pelas próprias auxiliares, ao

referirem que, diante das condições de trabalho ora oferecidas pelo Hospital Presidente

Vargas, não vislumbram a possibilidade de proporcionar um atendimento mais

“humano”, especialmente aos pais dos bebês.

(...) pelo fato de estar apertado, faltando gente e a gente não

consegue parar e falar com a mãe (...). Jasmim

A terminologia “estar apertado”, utilizada pela auxiliar, busca evidenciar as

condições de trabalho a que estes profissionais estão submetidos na instituição.

No dia-a-dia da Unidade de Terapia Intensiva Neonatal, a falta de pessoal

mencionada pode ser observada tanto sob ponto de vista numérico quanto de

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competência profissional. Ou seja, por um lado não há auxiliares suficientes para

atender aos recém-nascidos, e por outro, alguns destes profissionais, por serem

inexperientes em suas funções, não apresentam competência técnica para prestar tal

atendimento.

Costenaro (2001, p.82), ao buscar conhecer o tipo de atendimento prestado aos

recém-nascidos em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal, observou que “para alguns

profissionais, este atendimento é considerado bom, no entanto é dificultado pelas

limitações impostas pelo serviço público”.

No entanto, é interessante observar que a desproporção constatada nesta unidade

em particular pode ser estendida ao contexto público de assistência à saúde, onde a

demanda de pessoas que buscam atendimento é, com freqüência, superior à capacidade

de acolhimento.

Diante disso, o grupo identificou dificuldades em realizar suas atividades

cotidianas, como, por exemplo, atender ao binômio mãe-bebê conforme relatam Onze-

horas e Jasmim:

(...) às vezes tu tá vendo que a mãe tá chorando, mas tu não

podes deixar tudo pela metade. Onze-horas

(...) eu não posso fazer nada (pela mãe) porque eu não tenho tempo de fazer nada (...). Jasmim

Alves e Jouclas (1997) advertem que a falta de infra-estrutura mínima para o

desenvolvimento das atividades rotineiras de trabalho, coloca em risco tanto a equipe de

enfermagem, quanto os pacientes por ela atendidos.

Por sua vez, Huerta (1984), ao refletir sobre o comportamento das enfermeiras,

refere que os profissionais tendem a agarrar-se às pressões da instituição para a qual

trabalham no intuito de justificar seus comportamentos.

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A afirmação da autora pode ser evidenciada no que menciona Boca-de-leão ao

observar que nem todas suas atitudes são voluntárias, indicando a distinção entre

“querer e poder”:

(...) a gente não faz melhor porque não consegue, não porque

não quer.

Assim, considerando o contexto que envolve a instituição onde foi realizado o

estudo, a manifestação de Boca-de-leão não gerou surpresa. Por ser referência para o

alto-risco materno e fetal, o Hospital Presidente Vargas recebe, diariamente, gestantes e

bebês oriundos de regiões adjacentes à capital atendendo, desta forma, a um número de

pacientes superior a sua capacidade física e de pessoal.

Hoje mesmo nós vamos ficar com 11 respiradores (bebês em ventilação mecânica), não sei como, mas vamos ficar. Orquídea

Desta forma, no seu cotidiano de trabalho, as auxiliares demonstram perceber

nitidamente as diferenças no atendimento prestado em Instituições públicas e privadas.

Enquanto, em um hospital privado o cuidado oferecido aos recém-nascidos e suas

famílias é mais “personalizado”, no público, devido, especialmente, às desproporções

entre o número de pacientes e de funcionários, o atendimento restringe-se ao “possível”.

Orquídea e Boca-de-leão sustentam a afirmação acima:

Um dos pontos de diferenciação entre o atendimento SUS e o

particular é o número de funcionários por criança. Orquídea

É claro que se tu tiver só uma criança para cuidar o teu

atendimento muda. Orquídea

No particular o auxiliar fica só com uma criança. Boca-de-leão

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Neste contexto, King, citada por Huerta (1984), refere que as atitudes da equipe

hospitalar refletem mais a organização da instituição do que as características pessoais

de cada profissional.

Pedroso (2001, p.9), por sua vez, observa que:

(...) talvez o comportamento dos indivíduos, suas ações,

reflitam não só paradigmas inerentes à profissão ou à própria

filosofia da instituição, mas, acima de tudo, parecem refletir as crenças de cada um em relação ao cuidar e ser cuidado (...).

Diante disso, e a partir das discussões do grupo, pude observar que as atitudes

das auxiliares nem sempre são autênticas, pois, segundo Orquídea,

(...) é o hospital ou a entidade que impõe o nosso

comportamento.

Por outro lado, apesar desta constatação, as auxiliares revelam um

posicionamento crítico sobre seus atos:

(...) aqui tu tem que ter consciência do que tu estás fazendo ou se estás fazendo porque a instituição manda. Boca-de-leão

Deste modo, ao reconhecerem que a assistência prestada nem sempre condiz

com suas convicções pessoais e/ou profissionais e, portanto, atenderem aos recém-

nascidos e suas famílias da forma “imposta” pela instituição, estes profissionais

reproduzem e perpetuam o modelo assistencial vigente.

Sendo assim, o que percebo é que apesar do Hospital Presidente Vargas ser uma

instituição eminentemente pública desde sua criação, além de funcionar como hospital-

escola, e desta forma contribuir para a formação de muitos profissionais de saúde,

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apresenta um modelo assistencial hegemônico, tendo no profissional médico a figura

central e no tecnicismo o fundamento de toda sua dinâmica.

Cabe lembrar que, as peculiaridades das mulheres enquanto gestantes que buscam

atendimento no Hospital Presidente Vargas, também favorecem a preservação deste tipo

de atenção à saúde; visto que, essencialmente, o usuário do Sistema Único de Saúde

manifesta uma atitude passiva diante do atendimento recebido, não questionando a

própria assistência nem mesmo a forma como esta é prestada (NASCIMENTO E

MARTINS, 2000).

Por fim, as auxiliares observaram ainda deficiências nos serviços que servem de

apoio à Unidade de Terapia Intensiva Neonatal.

Eu estou falando em relação a todo tratamento que a mãe

deveria receber e não recebe. (...) coisas simples como o Banco

de Leite que não funciona no fim de semana (...). Orquídea

A alusão de Orquídea ao Banco de Leite, em especial, deve-se ao fato de que a

partir da conquista do titulo de Hospital Amigo da Criança, o estímulo ao aleitamento

materno ter sido insistentemente priorizado. No entanto, devido à descontinuidade no

funcionamento do referido serviço, as auxiliares deparam-se com situações embaraçosas

como, por exemplo, desprezar o leite trazido pela mãe após tê-la orientado sobre a

importância da manutenção da lactação, estimulado a ordenha manual e o correto

acondicionamento do leite em casa para que o bebê pudesse recebê-lo em outro

momento.

Diante disto, é preciso reconhecer que, embora o Hospital Presidente Vargas seja

“Amigo da Criança” e referência para o atendimento de mães e bebês de alto risco, suas

condições estruturais e de pessoal não têm acompanhado a crescente necessidade da

clientela. Uma vez que, conforme já referido, a população atendida provém,

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principalmente, de locais cada vez mais populosos e carentes, como periferia da cidade

e regiões circunvizinhas à Capital.

Fundamentando a constatação de plenitude na ocupação das vagas e recursos

oferecidos, assim como a expectativa de intensificação da procura por atendimento em

instituições públicas em decorrência das condições de vida da população, Gonzales,

Beck e Denardim (1999, p.70) mencionam que:

Os fatores sociais interferem na vida dos homens, possibilitando

que ele tenha uma melhor ou pior qualidade de vida,

dependendo da sociedade em que vive. E quanto menor a qualidade de vida, maior as possibilidades que as pessoas tem

de adoecer e morrer.

Considero relevante mencionar que, entre o grupo de auxiliares do local do

estudo, vários cumpriam dupla jornada de trabalho. Assim, além das circunstâncias

inadequadas da instituição, o trabalho é igualmente prejudicado pelas condições físicas

de alguns profissionais que, exaustos, não atendem às necessidades do serviço,

determinando sobrecarga aos colegas e/ou negligência no cuidado.

Costenaro (2001, p.82) constatou em sua pesquisa que, no ambiente do

intensivismo neonatal, “existem pessoas estressadas, que trabalham demais (...),

reclamando o tempo todo e, conseqüentemente, não conseguindo prestar um

atendimento de qualidade (...)”.

Relembrando o fato de, originalmente, o Hospital Materno Infantil Presidente

Vargas ser uma instituição pública, contando, essencialmente, com os serviços de

funcionários concursados, concordo com Guareschi e Martins (1997, p.430) quando

relatam que:

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É conhecido o fato de que o grande número de trabalhadores

hospitalares, devido aos baixos salários da rede pública,

possuem mais de um emprego. Pelo fato de existir a segurança pessoal neste tipo de serviço, o mesmo está em segundo plano

para o trabalhador, existindo um grande número de licenças e

faltas de funcionários, dificultando a assistência prestada à

criança.

Embora o número de funcionários públicos na instituição encontre-se em franco

declínio devido à inexistência de novos concursos, na prática é possível constatar

diferenças no comprometimento dos profissionais pertencentes aos diferentes regimes

trabalhistas.

Deste modo, tal desigualdade pode ser responsável pela dificuldade de interação

entre os profissionais de uma mesma equipe, determinando sobrecarga de trabalho, bem

como incitando queixas e descontentamentos.

Da mesma forma, Vernier (2002, p.51), ao estudar as reações da equipe de

enfermagem em uma Unidade de Internação Pediátrica, observou que:

O descontentamento da equipe com seu cotidiano de trabalho

ficou evidente em referências constantes à falta de tempo e de

pessoal, conflitos de relacionamento interpessoal dentro da equipe de enfermagem e com outros profissionais e sobrecarga

de trabalho.

Ressalto ainda que, considerando a coexistência, já referida, de diversos regimes

trabalhistas no local do estudo, observa-se que o percentual dos funcionários

contratados sobrepõe-se aos demais. Todavia, embora numericamente representativos,

tais profissionais não possuem prestígio para pleitear melhorias nas suas condições de

trabalho, uma vez que não estão vinculados à União ou ao Município como os demais.

Tal fato é evidenciado pelo impedimento destes em assumir cargos de chefias, o que,

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somado às constatações anteriores, instiga ainda mais seu desconforto ao desenvolver as

atividades cotidianas de trabalho.

Ainda sob o enfoque do ambiente e confrontando os espaços de cuidado público

e privado, as peculiaridades dos pais dos bebês foram observadas e mencionadas pelo

grupo:

No convênio as mães são mais chatas que no SUS, por que no

convênio elas têm maior nível sócio-cultural. Onze-horas

Do mesmo modo, ao constatarem, a partir dos registros, que as gestantes que

procuram atendimento no Hospital Presidente Vargas são, em sua maioria, procedentes

de bairros ou vilas situados nas periferias dos municípios, as auxiliares passaram a

incluí-las em um perfil sócio-econômico e cultural baixo, se comparado às que são

atendidas em outros hospitais.

(...) nosso pessoal é de nível sócio-econômico baixo. Orquídea

(...) a maioria de nossas mães é de baixa renda, tem nível sócio-

cultural baixo. Rosa

As referências acima reportam novamente à discussão a respeito das posturas

adotadas pelos usuários do Sistema Único de Saúde em relação às da rede privada. Ao

considerar “chatas” as mães “de convênio” atribuindo a isto o fato das mesmas

possuírem maior nível sócio-cultural, o grupo pode estar, analogamente, admitindo que

as mães desprovidas de recursos para buscar atendimento em hospitais privados

mostram-se apáticas em relação à assistência recebida por seus filhos. Sendo assim, as

auxiliares consideram que o trabalho junto a estas últimas é mais facilmente realizado,

já que:

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(...) a pior coisa que tem é trabalhar com paciente diferenciado

(...) no particular tu tens que suportar mais e no SUS tu faz ele

se colocar no lugar dele (...) pra mim criança é tudo igual mas os pais são muito mais xaropes. Boca-de-leão

Para Nascimento e Martins (2000), a partir de tais observações, os profissionais

de saúde manifestam a necessidade de exercer, de algum modo, um certo poder sobre a

pessoa que está sob seus cuidados.

Da mesma forma, Corrêa (1998, 299) afirma que, no ambiente hospitalar,

Ainda predomina uma relação na qual o profissional de saúde,

detentor do saber técnico-científico, impõe ao cliente, objeto

deste saber, suas receitas, ordens, cuidados e conselhos. Esta situação valoriza o paciente passivo, o bonzinho.

No entanto, as auxiliares constataram que a passividade mencionada acima é

percebida, principalmente, nos usuários do Sistema Único de Saúde, pois,

(...) no particular o auxiliar fica só com uma criança, se tu ficar

com dois os pais vão perguntar: se os dois chorarem ao mesmo tempo, qual tu vais atender primeiro? Vai deixar o meu

chorando ou o outro chorando? Boca-de-leão

A percepção dos pais, conforme referida pelo grupo, aponta mais uma vez para

as diferenças de comportamento entre os usuários do Sistema Único de Saúde e do

sistema privado diante da atenção recebida. Segundo Nascimento e Martins (2000,

p.207), “em nosso país os usuários do SUS pouco exercem seus direitos”, não

questionando o atendimento recebido e considerando a assistência como “esmola” e não

como dever do Estado.

Jasmim reforça a afirmação acima:

(...) se fosse num hospital particular a mãe ia cobrar a todo custo dele (médico) o que estava sendo feito (...), mas como é

SUS, (...).

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Por fim, no decorrer das discussões do grupo, ficou evidente que as comparações

estabelecidas entre as condições de atendimento aos recém-nascidos e suas famílias nas

esferas pública e privada, têm estreita relação com suas próprias concepções, pois,

segundo Orquídea e Jasmim:

(...) tu não queres ir para um hospital SUS, tu não queres, até

pode ir por necessidade, não tem outra opção, agora se tu

puderes tu vais optar pelo (...) (nomes de outros hospitais) e não para o SUS. Orquídea

(...) eu acho que é mais cobrado (o tipo de atendimento) porque

eu tô pagando, eu mesma faço isso (...). Jasmim

3.1.2 A situação dos pais em um hospital “Amigo da Criança”.

A conquista do título de Hospital Amigo da Criança intensificou a presença dos

pais na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal a partir da extinção dos horários de visita

e do estímulo à presença dos mesmos juntos aos filhos internados.

A partir deste fato, as auxiliares perceberam diferenças na atenção dispensada

aos pais, antes e depois da aquisição do referido título, bem como nas condições

oferecidas pela instituição para a permanência destes junto a seus filhos.

Hospital Amigo da Criança não é só copinho e proibição de

bico, tem que ter lugar para ficar. Azaléia

No Hospital Amigo da Criança o trabalho muda em nome de

um título, mas sem estrutura para mudar. Orquídea

Tem que ter livre acesso (...) não aquele papo de poder entrar a hora que quer, mas aí chega a noite e não tem onde ficar. Boca-

de-leão

A busca pelo título de Hospital Amigo da Criança procura envolver a todos e a

cada um dos profissionais da instituição em torno de uma mesma filosofia. No Hospital

Presidente Vargas este processo não foi diferente. Por aproximadamente um ano a

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instituição se preparou para a avaliação final. Durante este período, além de atender

suas rotinas diárias, as auxiliares precisaram “aprender” a aproximar pais e bebês a

partir, especialmente, do estímulo à lactação. Entretanto, o ritmo frenético da Unidade

de Internação Neonatal, tornou escasso o tempo para que fosse estabelecida a necessária

“tomada de consciência” destes profissionais. Assim, antes que a filosofia da proposta

fosse completamente compreendida pelos auxiliares de enfermagem, os pais passaram a

ocupar espaços na unidade, pois,

A liberação do horário veio antes, devia ter primeiro um

treinamento com os funcionários. Orquídea

Saliento que o treinamento mencionado pela auxiliar não é aquele pelo qual

todos os profissionais da Unidade passaram por ocasião da avaliação para obtenção do

referido título. A carência manifestada é, basicamente, por habilidades nas relações

interpessoais, conforme relata novamente Orquídea:

Essa parte de interação entre mãe e profissional deve haver um treinamento.

Para Gonzales, Beck e Denardim (1999, p.76),

O estabelecimento das relações interpessoais em ambientes fechados e estressantes como a UTI é difícil, tanto para os

profissionais quanto para os pacientes. É importante

dimensionar a competência do enfermeiro não somente no plano técnico, mas também no plano psico-espiritual quando ele

assume suas dificuldades e sentimentos ao lidar com pacientes

graves e que podem morrer.

Do mesmo modo, Pitta (1994) observa que os sentimentos como depressão e

ansiedade, presentes nos pacientes e seus familiares, passam, naturalmente, a ser

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projetados no hospital por meio de seus “elementos de mediação”, ou seja, os

profissionais de saúde.

Assim, além de “aprender” a relacionar-se com as famílias dos recém-nascidos,

os profissionais precisaram “absorver” seus sentimentos e expectativas, confrontando-os

com suas próprias impressões a respeito do ambiente da Unidade de Terapia Intensiva

Neonatal, da doença e da morte.

Desta forma, Pitta (1994) refere que os profissionais, para melhor lidar com

estas situações, utilizam o “distanciamento” e a “negação de sentimentos” como

mecanismos de defesa, refreando o envolvimento e evitando identificações.

A atitude de Onze-horas na presença dos pais dos bebês ilustra a utilização dos

referidos mecanismos:

(...) eu faço o que tenho que fazer e vou para um canto.

Costenaro e Martins (1998, p.57) sustentam a necessidade de adoção de tais

comportamentos ao observarem que, “relacionar-se com os pais de recém-nascidos em

UTI é uma tarefa que gera muitas expectativas, tanto para os pais como para os

profissionais de saúde”.

Para Nascimento e Martins (2000) o fato de alguns profissionais de saúde

realizarem atos “mecânicos” pode demonstrar uma postura defensiva, uma fuga das

ansiedades sentidas por estas pessoas, um modo de não pensar muito sobre tudo o que

acontece em se ambiente de trabalho.

Diante disso, cabe ressaltar que o já referido processo de conquista do Título de

Hospital Amigo da Criança ocorreu há cerca de quatro anos e que as primeiras incursões

dos pais na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal não foram muito “pacíficas”.

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Collet e Rocha (2000, p.56), ao considerarem os movimentos iniciais de

“abertura” das unidades pediátricas aos pais, referem que, “(...) a presença dos pais foi

tolerada mais do que ativamente encorajada (...) abrir as portas para os pais estava

trazendo problemas para a equipe médica e de enfermagem (...)”.

Entretanto, na percepção das auxiliares participantes do estudo, parece que,

atualmente, o problema teve seu foco desviado (ou ampliado), do seu próprio cotidiano

de trabalho junto aos pais, para as condições de permanência destes ao lado dos filhos.

Ou seja, o grupo identifica dificuldades na realização de suas atividades rotineiras de

trabalho decorrentes da “abertura” da unidade aos pais. Todavia, percebe, ao mesmo

tempo, as condições desfavoráveis oferecidas pela instituição para a permanência da

família, mostrando-se sensíveis diante da situação.

Assim, com relação à presença dos pais na Unidade de Terapia Intensiva

Neonatal, Carvalho (2001) indica o reduzido espaço físico como um dos fatores que

afasta a mãe do ambiente e, conseqüentemente, dos cuidados ao bebê.

Gonzales, Beck e Denardim (1999, p.84) corroboram tal apreciação observando

que:

(...) para fortalecer o relacionamento equipe-família-paciente, o

que trás efeitos benéficos para a recuperação deste último, é

importante que a equipe de enfermagem ofereça à família uma estrutura física e administrativa na UTI favorável para contatos

periódicos onde esclarecimentos e informações serão prestados

aos mesmos.

Da mesma forma, Gomes (1992) aponta para a necessidade de um local na

Unidade de Terapia Intensiva Neonatal para acomodar os pais dos recém-nascidos de

risco. Um lugar onde estes pudessem sentar, comer, descansar e compartilhar a solidão

com outros pais.

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No entanto, na concepção das auxiliares de enfermagem, as condições físicas

proporcionadas aos pais pela instituição não favorecem sua permanência.

O ruim daqui é que eles (os pais) não têm um lugar para ir

descansar na madrugada (...) e dizem que não ficam porque não

tem onde ficar (...) eles não vão ficar na rua no inverno, é até inseguro. Boca-de-leão

O grupo também reconhece que, pelas peculiaridades da população atendida no

Hospital Presidente Vargas, a infra-estrutura disponível deveria ser diferenciada, pois,

(...) tem aquele pessoal do interior que vem com ambulância que chega dizendo que vai ficar ali e a enfermeira vai procurar

um lugar no andar para a mãe dormir, às vezes é um homem e

não pode ficar no AC (alojamento conjunto), tem que dormir no banco da recepção deveria ter um quarto com banheiro, cadeira

e água.

Assim, o ambiente específico da Unidade de Terapia Intensiva Neonatal foi

percebido pelo grupo como inadequado às pessoas que ali convivem, e as sugestões

apresentadas para melhoria destas condições incluem recursos modestos como

banheiros e cadeiras.

Diante disto, considero adequado descrever, brevemente, o ambiente de uma das

salas de cuidados intensivos da Unidade de Terapia Intensiva Neonatal do Hospital

Materno Infantil Presidente Vargas.

No capítulo sobre o local do estudo foi mencionada a capacidade de atendimento

em cada uma das três salas de intensivismo, no entanto, não foram discriminados os

aparelhos nem tampouco o número de pessoas que ocupam o local.

Conforme já referido, as salas de cuidados intensivos apresentam, no mínimo,

seis incubadoras, com possibilidade de atender a três bebês em ventilação mecânica

simultaneamente o que reduz, consideravelmente, o espaço para circulação. Durante

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um turno de trabalho permanecem na sala pelo menos duas auxiliares, uma enfermeira e

dois a três pediatras. A todo o momento adentram a sala as equipes do laboratório,

radiologia (acompanhada de seu aparelho “portátil” de RX), lactário, banco de sangue,

serviço social, entre outras. Desta forma, em algumas ocasiões é possível verificar a

presença de até dez pessoas dividindo espaços com os familiares que se esforçam para

aproximar-se dos recém-nascidos.

Sendo assim, diante de um ambiente com espaços tão “disputados”, é

compreensível que os pais manifestem dificuldades em permanecer junto aos filhos.

Todavia, na percepção das auxiliares, a introdução de uma cadeira para a mãe sentar ao

lado da incubadora poderia favorecer sua presença na sala.

Jasmim e Rosa relatam suas percepções a respeito dos sentimentos dos pais

neste ambiente:

Os pais não se sentem bem na UTI por ser um ambiente pesado.

Jasmim

(...) entrar numa UTI deixa as mães assustadas. Rosa

As constatações destas auxiliares de enfermagem reforçam o que refere Carvalho

(2001, p.26): “O ambiente da CTI, tão peculiar para os profissionais de saúde, é

percebido pelos pais como assustador (...)”.

De acordo com a mesma autora, esta percepção dos pais em relação ao ambiente

da Unidade de Terapia Intensiva Neonatal dificulta o reconhecimento do bebê como

seu, podendo, desta forma, ser um dos fatores que os afastam da Unidade e, portanto,

dos cuidados ao filho.

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Assim,

O ambiente da CTI pode ser um dos fatores que mobiliza o

distanciamento físico e emocional dos pais, percebido quando

eles não visitam o filho, não o tocam ou, quando o contato ocorre, é frágil e rápido (CARVALHO, 2001, p.102).

Por outro lado, Cresti e Lapi (1997) constatam que quando o hospital oferece à

mãe um espaço acolhedor e protetor, leva-a a também proteger seu bebê. Para os autores

a estrutura hospitalar, em seu conjunto, pode representar um papel significativo nas

relações mãe-bebê, interpondo-se na qualidade desta interação. Elucidando suas

concepções referem-se à instituição hospitalar como um “envelope”, que contém e

protege a dupla mãe-bebê.

Tais concepções são especialmente relevantes a partir do que observa Boca-de-

leão, a respeito das impressões dos pais sobre os cuidados que o bebê recebe:

(...) para eles é o hospital que está cuidando do filho deles.

Sendo assim, é preciso considerar a hipótese de nem todos os pais estarem

preparados e/ou dispostos a participar dos cuidados de seus filhos.

Para Collet e Rocha (2000, p.58) :

Não se sabe se os pais realmente estão se sentindo preparados

para assumir esta responsabilidade. Indo além, afirmar que os

pais e enfermeiros negociam as funções no hospital

satisfatoriamente é bastante questionável, já que não há um conhecimento mútuo das expectativas de ambos.

Deste modo, na concepção de Azaléia, a intensidade ou freqüência da presença

dos pais no intensivismo neonatal deve depender de sua própria vontade, pois,

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(...) se a mãe deve estar presente ali o tempo todo, eu acho que

isso deve ser perguntado a ela, se ela quer ficar ou não, deve-se

respeitar a vontade dela (...).

Diante das manifestações das auxiliares de enfermagem acerca de suas

percepções sobre o ambiente da Unidade de Terapia Intensiva Neonatal para a

permanência dos pais dos bebês, julguei igualmente relevante conhecer suas impressões

a respeito de seu cotidiano de trabalho neste mesmo espaço. Para isso, durante as

discussões do grupo, foram introduzidas questões que versavam sobre seus sentimentos

com relação à prática assistencial na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal do Hospital

Presidente Vargas.

Assim, durante os encontros, pude escutar opiniões como:

(...) o HPV já é uma fonte de stress para mim, principalmente a

UTI neo. Jasmim

O estresse manifestado pela auxiliar como decorrência do ambiente da

instituição como um todo e, especificamente, da Unidade de Terapia Intensiva Neonatal,

pode estar, paralelamente, revelando características de seu cotidiano de trabalho.

Segundo Menzies, citado por Huerta (1984), os serviços de enfermagem

refletem um grande isolamento entre seus membros em decorrência da falta de apoio ao

indivíduo nos relacionamentos com superiores, colegas e pacientes. Assim, de acordo

com o autor, nos ambientes de trabalho cada um executa seus deveres com uma

percepção mínima dos colegas.

Por sua vez, Alves e Jouclas (1997), ao refletirem sobre o trabalho dos auxiliares

de enfermagem, observam que o mesmo é “sempre emergencial”.

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Deste modo, ao concordar com os autores citados, percebo que, no cotidiano de

trabalho destes profissionais, encontram-se sobrepostos fatores ambientais e

interpessoais, além dos pessoais, impossíveis de serem deslocados; o que pode

contribuir para tornar seu dia-a-dia extremamente desgastante e, por conseguinte, tornar

o trabalho meramente técnico e impessoal.

Assim, no decorrer das discussões em grupo, as auxiliares verbalizaram as

dificuldades referidas anteriormente, fazendo menção, inclusive, a episódios de disputa

como relata Jasmim:

Eu acho que existe competitividade também entre os auxiliares

de enfermagem (...) acho que tem mais competitividade entre os

colegas do que com os pais.

A presença da enfermeira no ambiente de cuidado também gerou manifestações:

Essa parte de competitividade eu acho que tem muito mais de

auxiliar para enfermeira do que de auxiliar para auxiliar ou de

auxiliar para mãe, nada pessoal, mas em relação ao cuidado (...)

eu respeito à hierarquia, mas a enfermeira tem que me provar que está certa. Orquídea

Para melhor analisar a afirmação de Orquídea, julgo necessária uma pequena

explicação sobre o processo de introdução das enfermeiras no local do estudo, pois,

durante o período em que compus a equipe de enfermagem da Unidade de Terapia

Intensiva Neonatal do Hospital Materno Infantil Presidente Vargas, percebi que a

competitividade entre auxiliares e enfermeiros é “histórica”.

Por ocasião de sua criação, a Unidade contava apenas com uma enfermeira que

coordenava um grupo de aproximadamente trinta auxiliares de enfermagem. No entanto,

com a ampliação e modernização do serviço foi necessária a introdução de um número

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maior de profissionais de nível técnico e superior, o que originou alguns desacordos. O

grupo original, já acostumado a trabalhar sem supervisão direta e, portanto, crédulo de

sua auto-suficiência no atendimento a recém-nascidos, não recebeu com entusiasmo os

novos colegas e, especialmente, as novas enfermeiras do setor, chegando ao extremo de

desconsiderar sua presença e competência. A partir disso, teve início um processo

crescente de hostilidade entre auxiliares e enfermeiras, que perdura até o momento,

apesar de serem poucos os profissionais remanescentes à época da abertura da unidade.

Diante disto, considerando as pesquisas já realizadas juntamente às percepções

manifestadas pelos sujeitos do presente estudo, acredito que os aspectos aqui

enfatizados podem ser alguns dos fatores deflagradores do estresse percebido no

ambiente, seja por parte das equipes de saúde, seja pelos pacientes e familiares

atendidos.

É interessante ressaltar que, durante os encontros, algumas auxiliares assumiram,

espontaneamente, uma postura que as distanciou do grande grupo de auxiliares de

enfermagem do Berçário. Ou seja, enquanto expressavam suas opiniões e/ou percepções

a respeito dos assuntos discutidos, estas participantes pareciam não pertencer ao

contexto ou, pelo menos, não apresentar as condutas referidas.

No entanto, tendo participado, intensa e intimamente, do cotidiano de trabalho

no local do estudo e, portanto, reconhecendo as dificuldades por que passam os

profissionais dispostos a realizar suas atividades de uma forma mais “humanizada”;

entendo as posturas destas auxiliares ao desejarem observar o contexto “de fora” e de,

quem sabe, intimamente, não precisar pertencer a ele, submetendo-se às suas, já

referidas, limitações e imposições.

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Cabe ainda referir que, o posicionamento crítico do grupo em relação às

disparidades percebidas nas instituições públicas e privadas não ficou restrito à Unidade

de Terapia Intensiva Neonatal do Hospital Presidente Vargas. Em suas abordagens as

auxiliares demonstraram conhecer a inserção destes locais no contexto geral dos

serviços públicos e manifestaram suas opiniões a respeito, da seguinte forma:

(...) a gente trás toda aquela bagagem de funcionário público,

qualquer coisa que não saia de acordo é porque o hospital é

público, e isso a gente nota até nas escolas públicas, agora melhorou porque diminui o número de funcionários públicos.

Eu quando vim trabalhar aqui fiz questão de vir para dar um

atendimento de qualidade, para melhorar um pouquinho esta

média, pra conversar mais. Temos que tentar reverter este quadro, mas tem gente que ainda nos puxa para trás. No meu

entender, as coisas continuam como antes, apesar de todas as

medidas adotadas – Hospital Amigo da Criança (...). Azaléia

Assim, acredito que na busca por uma relação mais intensa, efetiva e tranqüila

entre pais e profissionais no ambiente do cuidado intensivo neonatal, conforme

postulado pela filosofia da Iniciativa Hospital Amigo da Criança, é essencial que os

auxiliares de enfermagem, bem como as demais equipes, intensifiquem a percepção de

que este espaço, apesar de indispensável ao recém-nascido de alto risco, pode ser, ao

mesmo tempo, desconhecido, hostil e estressante aos familiares e profissionais de saúde.

3.2 A presença dos pais na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal

Na percepção das auxiliares de enfermagem, os pais são importantes ao recém-

nascido e devem fazer parte dos seus cuidados.

No entanto, entre o grupo, não há consenso com relação aos sentimentos

despertados a partir da presença dos pais junto aos filhos na Unidade de Terapia

Intensiva Neonatal.

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Da mesma forma, mães e pais, não são igualmente considerados. Houve uma

nítida distinção entre as figuras materna e paterna durante as discussões no grupo.

Assim, para tornar mais claras as opiniões das auxiliares a respeito da presença

dos pais, o tema foi dividido em dois subtemas que visam contemplar as posições

relativas às mães e aos pais individualmente.

3.2.1 As contradições em relação à presença das mães no ambiente de cuidado

neonatal.

A presença materna foi percebida pelo grupo como necessária ao bebê, mas, ao

mesmo tempo, nem sempre bem-vinda na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal.

Eu acho super-importante ter o pai e a mãe ao lado do bebê.

Rosa

Eu não gosto muito da presença das mães, não neste horário livre (...). Onze-horas

Estas impressões contraditórias permeiam o cotidiano de trabalho dos auxiliares

de enfermagem determinando posturas diferenciadas nestes profissionais.

Dias (2001) observa a existência de uma duplicidade de significados envolvendo

a família e os cuidadores que ora a vêem como aliada, ora como fator complicador.

Da mesma forma, Collet e Rocha (2000) relatam que as enfermeiras valorizam a

presença dos pais e percebem que devem incluí-los no cuidado, entretanto muitas agem

de forma ambígua, aceitando-os ou rejeitando sua presença.

Tais contradições foram evidenciadas pelo grupo ao inferirem que, na mesma

medida em que a mãe acalma o bebê, sua presença perturba as atividades de trabalho.

Eu noto que quando a mãe não aparece eles (os bebês) estão mais estressados. Orquídea

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(...) elas (as mães) ficarem na sala o tempo todo me incomoda.

Margarida

Pedroso (2001), ao pesquisar as crenças da equipe de enfermagem acerca do

cuidado à família em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal, observou que os

profissionais reconhecem a importância da família ao lado do bebê, mas detectou

também que o convívio com os familiares torna difíceis as relações interpessoais.

Diante disso, a expressão “me incomoda”, referida por Margarida, pode ser

compreendida de duas maneiras: a mãe incomoda porque “vigia” o trabalho ou porque,

apesar de presente, “não dá atenção ao filho”, sendo apenas uma presença “figurativa”.

A idéia de que a mãe “só faz número” dentro da Unidade, “não dando atenção ao

filho”, foi evidenciada nas falas de Margarida:

(...) tinham que ficar porque é importante para o bebê, acontece

que elas (as mães) não ficam junto, ficam só fazendo número

dentro da UTI.

(...) a mãe começa a me incomodar porque não está dando bola para o filho (...).

Carvalho (2001, p.102) observa que alguns pais “são lacônicos em sua

expressividade e, geralmente, preferem olhar o filho de longe ou prestar atenção aos

outros bebês internados”.

Em busca de explicações para tais atitudes, Belli (1995) aponta três estágios

pelos quais os pais passam no processo de desenvolvimento do apego. De acordo com a

autora, os primeiros movimentos dos pais em direção aos filhos são cautelosos e o

toque, quando ocorre, é feito apenas com a ponta dos dedos. Após, os pais começam a

expressar sentimentos mediante a compra de roupas e brinquedos e, por último,

começam a visitar os filhos regularmente. Nesta última etapa os pais sentem-se mais

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capacitados a cuidar dos filhos, e realmente o fazem, se lhes for concedida esta

oportunidade.

Por sua vez, Brazelton (1988) também admite a existência de estágios nas

relações iniciais dos pais com os bebês e com o ambiente. Segundo o autor, a princípio,

o interesse dos pais parece estar centrado nas informações médicas, passando, aos

poucos, a focalizar-se nas manipulações do bebê por parte das equipes o que os levará,

em uma etapa mais tardia, a também manipular e estimular o filho.

De acordo com Carvalho (2001), este processo de aproximação entre pais e

filhos pode provocar uma má comunicação equipe-família, levando à perda de controle

e a um relacionamento difícil. Ou seja, a equipe que não possui uma percepção clara da

situação, pode julgar que os pais são “complicados”, oferecendo-lhes um tratamento

agressivo, limitando o diálogo e reduzindo os recursos de interação e comunicação,

indispensáveis para que a família sinta-se inserida no ambiente e no cuidado.

Desta forma, a partir das afirmações acima, observo que as atitudes de

distanciamento, momentâneas ou não, apresentadas pelas mães podem determinar nos

profissionais a falta de estímulo em incluí-las no cuidado, pois,

(...) ela (a mãe) vem ali e olha (o bebê) e eu nem dou bola, se

ela vem ou não vem tanto faz. Onze-horas

Às vezes a gente acha que elas poderiam tratar melhor aquele bebê, e tu puxa, puxa e nada, então eu não estimulo mais, dou

afeto para o bebê e pronto. Margarida

Cresti e Lapi (1997, p.160) perceberam que, por vezes,

(...) a equipe de saúde se identifica demais apenas com o bebê, oferecendo-lhe cuidados adequados, imediatos e afetuosos, mas

negligencia as necessidades particularmente mentais de

dependência e de cuidados da mãe, com quem estabelece uma

relação de oposição. Segue-se, portanto, uma incapacidade de atender, ao mesmo tempo, mãe e filho.

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Do mesmo modo, Pedroso (2001) refere que o profissional de saúde, por

acreditar que é responsável pelo bebê, limita sua perspectiva de cuidado, centrando toda

sua assistência na criança em detrimento de seus pais.

Por outro lado, algumas auxiliares manifestaram compreender as posturas

distantes adotadas pelas mães e às relacionaram às deficiências na orientação recebida

no ambiente hospitalar.

Eu acho que o fato dos pais ficarem o tempo todo na UTI (...)

em roda da incubadora o tempo todo e não tocar nos filhos é

falta de orientação. Jasmim

Desta forma, as auxiliares demonstraram empatia7 com a situação vivenciada

pelas mães que tem seus filhos internados em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal,

manifestando compreensão também por suas atitudes em relação à equipe, bem como

pela freqüência de visitas aos filhos.

(...) esse relacionamento delas com a gente de serem meio

ariscas, não é falta de educação, é que elas não sabem o que está

acontecendo. Rosa

Tu não sabes quantos filhos ela tem em casa, tu não sabes a

história dela, um monte de coisas (...) Boca-de-leão

Para Gonzales, Beck e Denardim (1999) a empatia é o instrumento mais valioso

utilizado pela equipe de enfermagem para a comunicação com seus pacientes.

Por sua vez, Gomes (1992) denomina “solicitude” esta maneira do profissional

se relacionar com os pacientes, permitindo que os mesmos tenham seu ritmo próprio e

amadureçam para compreender as coisas ao seu redor.

7 Empatia é a habilidade de entender o que a outra pessoa experencia e por que ela reage de maneira

peculiar (BOTTEN citado por CARRARO; RANDUZ, 1996, p..51)

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Com relação à importância da orientação aos pais no estímulo de sua

permanência junto aos filhos, Guareschi e Martins (1997, p.421) referem que:

Quando os pais estão devidamente informados sobre a

hospitalização e procedimentos realizados com seus filhos,

estão mais capacitados para superar a experiência da hospitalização, acompanham de perto os filhos e fazem mais

perguntas sobre a doença e sobre os procedimentos.

De acordo com Kurcgant (1991), a orientação e a informação, tranqüilizam o

indivíduo, que, ao ter suas dúvidas esclarecidas, sente-se mais seguro e confiante.

Collet e Rocha (2000) apontam para a necessidade das famílias de crianças

hospitalizadas entenderem o tratamento, os riscos da doença, a expectativa do tempo de

hospitalização, a natureza dos procedimentos e de que forma podem participar do

cuidado.

Para Fischer, citado por Nascimento e Martins (2000), o acesso às informações é

um direito, e tem igual valor que a categoria do direito à vida.

Todavia, o que observo freqüentemente no cotidiano de uma Unidade de Terapia

Intensiva Neonatal é a dificuldade que as mães (e pais) enfrentam ao buscar e receber

informações a respeito da evolução de seus filhos.

Acredito que tais dificuldades podem estar relacionadas ao fato de, no dia-a-dia

destas Unidades, o recém-nascido ser o principal personagem. Assim, as atenções

voltam-se, prioritariamente, a ele sendo diretamente proporcionais às suas necessidades

clínicas, ficando as famílias relegadas ou atendidas mediante esta mesma condição, ou

seja, de coadjuvante no cenário de cuidado.

Do mesmo modo, na percepção das auxiliares de enfermagem, o bebê representa

um papel de destaque no ambiente de cuidado. Porém, o grupo divisou, igualmente, a

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exclusão, bem como a necessária inclusão, das famílias neste contexto, conforme relata

Rosa:

(...) quando elas (as mães) entram ali ninguém conversa com

elas (...) eu não sou muito de conversar, mas o que eu posso

passar para elas eu passo. Só que a gente vê que as coisas não são assim, claro que o bebê que tá ali é o principal, só que tu

tens que ver a mãe, tu não podes separar uma coisa da outra.

Da mesma forma, reconheço que as singularidades do contexto do intensivismo,

que conta com os préstimos de um grande número de profissionais pertencentes às mais

diversas áreas, também dificultam o acesso dos pais às informações, na medida em que

estes últimos perdem a noção de quem é, afinal, o responsável pelo tratamento de seu

filho.

Collet e Rocha (2000), apontam a multiplicidade de profissionais que estão

envolvidos no cuidados das crianças e que, portanto, entram em contato com suas

famílias, como um dos fatores que dificultam a comunicação entre pais e equipes. Para

os autores esta característica do cuidado neonatal, contribui ainda para o afastamento

dos pais, deixando-os mais ou menos inseguros quanto aos cuidados que podem

desenvolver junto a seus filhos.

De acordo com Gomes (1992), por vezes as informações parecem não

verdadeiras aos pais, uma vez que estes, freqüentemente, deparam-se com informações

dúbias, fornecidas por pessoas diferentes.

Por outro lado, Nascimento e Martins (2000, p.204), ao abordarem os

questionamentos da família na Unidade de Terapia Intensiva referem que:

“Muitas vezes, quando a família começa a questionar muito, solicitar mais informações é vista como sujeitos que não

confiam na equipe e que passam a interferir nos cuidados feitos

pela equipe de saúde”.

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A afirmação de Orquídea ilustra a citação anterior:

O problema da informação dos médicos para as mães é que se

elas não procuram é porque não estão interessadas e se

procuram incomodam.

Desta forma, o grupo percebe que os médicos não se mostram solícitos ao

atender às indagações dos pais dos bebês. Acredito que esta constatação possa estar

relacionada ao fato das famílias serem, em sua maioria, desprovidas de pré-requisitos

intelectuais para entender com maior facilidade as informações destes profissionais que,

de forma geral, não dispõe de tempo nem disposição para repetir as orientações.

O fato de tu ver a mãe internada e querendo falar com o médico

para saber a respeito do bebê e o médico não aparece, e quando

aparece ainda parece uma hiena que não sabe dizer nada com nada. Jasmim

Para o cotidiano de trabalho das auxiliares, os questionamentos das mães

representam um transtorno, pois,

As mães fazem perguntas para ti, perguntam para o médico,

qualquer um que entre elas perguntam como é que está o nenê, desde a faxineira elas ficam perguntando, e isso atrapalha.

Onze-horas

Domingues et al. (1999) observam que para a equipe de enfermagem que atua

em Unidade de Terapia Intensiva, atender a todas as necessidades que cada membro da

família necessita é um grande desafio, já que estas variam de um indivíduo para outro e

os profissionais possuem tempo escasso por estarem em constante vigilância ao paciente

crítico.

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Do mesmo modo, Pedroso (2001) constatou em seus estudos com a equipe de

enfermagem de uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal, que a falta de tempo dos

profissionais é um dos fatores que limitam ou até impedem o cuidado às famílias.

Outro fator relevante apontado pelo grupo como obstáculo para a efetivação do

processo de comunicação entre profissionais e familiares é o nível sócio-cultural dos

pais dos bebês.

As diferenças sócio-culturais de nossas mães dificultam as

informações. Onze-horas

(...) a gente fala, mas o QI delas não alcança, não adianta falar termos técnicos, tem que usar termos mais grosseiros e às vezes

não adianta, não entra, é ignorância mesmo. Boca-de-leão

Claro que tudo tem seu nível né, (...) tem pessoas que tem que

falar com uma certa cautela, a gente fala que o nenê tá sujo, as mães falam que ele tá c... mesmo. Orquídea

Lemos e Rossi (2001, p. 349) referem que “a utilização de termos específicos à

determinada cultura pode gerar mal-entendidos e contribuir para a atribuição de

significados diferentes para o médico e para o cliente”.

Da mesma forma, Gomes (1992, p.56), relata as dificuldades das mães em

decodificar o linguajar técnico do médico e assim entender as informações recebidas.

Acrescenta ainda que, “os pais necessitam informações repetidas, freqüentes e

atualizadas sobre as condições e tratamento do filho, de forma que elas possam

entender”.

Assim, entendo que para que ocorra uma adequada comunicação entre equipes e

famílias é necessário, além da disponibilidade em falar e escutar, que este processo seja

permeado por empatia, confiança e respeito.

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Costenaro (2001, p.57) sustenta a observação acima:

A comunicação dos profissionais com os membros da família

do recém-nascido exige clareza, simplicidade e apoio mútuo. A

comunicação deve estar inserida em um clima de empatia em que o profissional demonstra capacidade de escutar.

No entanto, o que observo no contexto da Unidade de Terapia Intensiva

Neonatal do Hospital Presidente Vargas é que fatores como a falta de tempo, decorrente

da sobrecarga de trabalho das equipes, aliados à percepção de que os pais apresentam

dificuldades no entendimento das informações devido às diferenças sócio-culturais,

determinam falhas ou mesmo impedimento das orientações.

Deste modo, concordo com Lemos e Rossi (2001, p.349) quando referem que:

Muitas vezes a informação é fornecida a partir da compreensão

que o profissional tem do processo da doença, mas não é

compreendida pelos clientes e familiares, contribuindo para a manutenção do medo do desconhecido que envolve o dia-a-dia

dos clientes e familiares na CTI.

Da mesma forma, Domingues et al. (1999), mencionam que apesar da busca por

uma assistência holística, o que se observa na prática é a pouca atenção dada às

necessidades psicossociais, principalmente no que diz respeito às famílias.

Com relação ao profissional responsável pelas orientações aos pais Kurcgant

(1991) indica que as informações sobre o estado do paciente, diagnósticos, condições e

necessidades devem ser feitas pelos diferentes profissionais que atuam na unidade. Ao

médico cabem os esclarecimentos sobre o diagnóstico, mas o familiar manifesta

necessidade de falar e saber sobre tudo o que diz respeito ao paciente, o que requer o

envolvimento das demais equipes.

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Domingues et al. (1999) acrescentam que a equipe multiprofissional deve estar

capacitada para esta orientação. Segundo as autoras, cada elemento deverá estar

consciente sobre o desenvolvimento de seu papel no momento de fornecer informações

à família.

Entretanto, em suas discussões, as auxiliares relataram a “preferência” das mães

em receber as informações sobre seus filhos do profissional médico, conforme afirma

Orquídea:

(...) era uma coisa bem simples, mas dentro da ignorância dela,

ela achava que era o médico que deveria dizer, a sorte é que era

um médico legal que foi lá explicou tudo (...).

Do mesmo modo, Belli (1995) observou em sua pesquisa que a maioria das

mães referem o médico como aquele mais indicado para fornecer qualquer informação;

segundo a autora, as mães sentem-se mais seguras ao esclarecer suas dúvidas com este

profissional, por ser ele o centralizador do atendimento ao recém-nascido.

Todavia, apesar da referida “preferência” pelo médico para fornecer as

informações, as mães assumem uma atitude submissa diante deste e dos demais

profissionais da Unidade, conforme a percepção de Orquídea:

As mães nos endeusam com relação aos cuidados do bebê, pois

nós estudamos para isso.

Reforçando esta constatação, Gomes (1992) relata que os pais consideram os

profissionais da Unidade competentes e hábeis no cuidado ao recém-nascido.

De acordo com Dias (2001) as famílias tem a percepção de que a assistência

dentro do hospital deve ser realizada, exclusivamente, pelos profissionais, o que faz

com que muitos deles se afastem do cuidado no ambiente hospitalar.

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Carvalho (2001) menciona que no ambiente da Unidade de Terapia Intensiva

Neonatal, fica difícil aos pais ouvirem que sua presença é importante para o bebê e

atribui tal dificuldade à sensação de incompetência experimentada diante da equipe.

Da mesma forma, Collet e Rocha (2000, p.58) referem que:

(...) a família, percebendo que o enfermeiro encontra-se em uma

posição de poder ou autoridade, pode hesitar em questionar

qualquer recomendação dada ou decisão tomada, tendo em vista o que é melhor para a criança.

Os mesmos autores ainda mencionam que na relação entre pais e equipe de

enfermagem a proporção do poder está a favor dos últimos, uma vez que estes detêm o

controle do território e também das informações.

Apesar disso, as auxiliares participantes do estudo afirmaram estimular as mães

a permanecer na Unidade e participar do cuidado aos filhos.

Eu acho que quando a mãe fica um tempão sem vir ela deve ser estimulada, toca, pega (...) até tiro da incubadora, faço um teatro

para ela ver que é importante e se aproximar mais. Boca-de-

leão

No entanto, Carvalho (2001, p. 105) alerta que “na ansiedade de estimular a

proximidade dos pais com o recém-nascido, a equipe não permite que haja um tempo

para eles se acostumarem com a situação e com a aparência do filho”.

O contraponto apresentado pela autora pode ser evidenciado no que relata

Jasmim:

(...) eu já vi internar de manhã cedo (o bebê) e o médico explicar e ela (a mãe) não assimilar, aí chega de tarde e ela fica

apavorada porque tem um caninho a mais ou a menos, já

querem saber o que aconteceu, aí a gente pergunta: já conversou

com o médico? Elas dizem que sim, mas que não prestaram atenção.

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De acordo com Gomes (1992, p.59):

Os pais percebem que lidar com vários profissionais para

informações sobre o estado de saúde de seus filhos é

complicado, gerando, às vezes, informações inconsistentes. Em outras situações estas informações não são apresentadas no

momento certo ou são muito técnicas ou muito detalhadas para

eles entenderem.

Da mesma forma, Nascimento e Martins (2000) referem que os familiares

devem ter acesso às informações referentes à saúde dos pacientes, seu diagnóstico, bem

como à terapêutica necessária. No entanto, de acordo com as autoras, isto não acontece

muito na prática e “muitas informações são omitidas”.

O episódio vivenciado e relatado por Jasmim confirma as citações acima:

(...) o médico chegou e disse para a mãe que o nenê estava bem

e que só ia fazer alguns exames e se estivesse tudo bem ele iria

sair. A mãe já ficou satisfeita com isso, e logo em seguida ele (o médico) resolveu pedir um raio X por que tinham visto um

sopro no nenê, e isso foi omitido da mãe. Eu, óbvio, fui lá e

avisei a mãe: Olha o teu nenê vai descer para fazer um raio X. E ela me disse: que eu saiba quem faz raio X é porque está com

alguma coisa quebrada, quebraram algum osso do meu nenê?

Olha o nível cultural... Pôxa, se ele tivesse dado a informação

correta desde o início não teria acontecido isso.

A partir do relato de Jasmim é possível resgatar as referências feitas

anteriormente a respeito da distinção no atendimento oferecido às mães usuárias do

Sistema Único de Saúde em relação àquele recebido pelas atendidas em Instituições

privadas.

Segundo Huerta (1984) as famílias sofrem discriminações de diferentes

naturezas, da mesma forma que sua prática de cuidado, em decorrência de fatores

sociais e do baixo nível sócio-cultural.

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Assim, na percepção das auxiliares, a informação foi omitida devido às

condições sócio-culturais da mãe em questão, pois, conforme complementa Jasmim,

(...) como é SUS a gente é obrigada a omitir informações, eles

(os médicos) por sua vez falam aquilo que acham que a mãe vai

entender e essa é a diferença em relação ao SUS, que vem lá de cima, não é só de nós, vem dos médicos, os preceptores falam

pros médicos: não isso não precisa, se der bom a gente nem

fala para a mãe.

Desta forma, as auxiliares demonstram preocupação tanto com a veracidade e

qualidade das informações recebidas, quanto com a assimilação destas orientações, por

acreditarem que estes “detalhes” interferem diretamente na permanência das mães junto

aos filhos.

É necessário relembrar que, na condição de hospital-escola, o Hospital

Presidente Vargas conta com profissionais em formação e recém-formados para prestar

atendimento aos pacientes. Na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal, embora a

entrada destes profissionais seja restrita devido às peculiaridades do setor, a

rotatividade, especialmente de médicos residentes e doutorandos, é extremamente alta.

Da mesma forma, é pertinente ressaltar que, para os residentes, a passagem pelo

Berçário é obrigatória o que torna este período particularmente difícil para aqueles que

não pretendem especializar-se em Neonatologia.

Deste modo, como enfermeira da referida unidade por quase sete anos, pude

observar que a sucessão de grupos de residentes e, mais recentemente, de doutorandos,

tornou a comunicação com os pais um processo lento, embaraçoso e pouco eficaz, o

mesmo acontecendo com a comunicação entre as equipes.

Atribuo este fato às características, já mencionadas, apresentadas pela instituição

no que diz respeito à demanda de atendimentos. Acredito que no período de residência

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médica devam ser priorizadas as situações de ensino e pesquisa, que visem especializar

o profissional na sua área de interesse. No entanto, o que percebo no dia-a-dia destes

“jovens médicos” é que lhes é exigida uma capacidade extraordinária de atender a uma

incessante e crescente demanda de pessoas doentes. Sendo assim, admito que, mesmo

diante de uma “boa dose” de boa-vontade e de profissionalismo por parte destes, e de

tantos outros profissionais, as condições expostas pelo contexto não favoreçam um

atendimento de forma holística e humanizada.

Assim, concordo com Belli (1995, p.206), que ao buscar conhecer os

sentimentos e expectativas das mães de recém-nascidos internados em Unidade de

Terapia Intensiva Neonatal, observou:

A ausência de informações e orientações relatadas por muitas

mães, os obstáculos impostos por normas e rotinas da

instituição que dificultam a interação precoce com o filho recém-nascido, a não possibilidade de cuidar do que lhe

pertence, e, principalmente, a alienação dos profissionais

envolvidos direta ou indiretamente com a assistência ao

binômio, fizeram parte do arsenal utilizado pelos profissionais da equipe para desumanizar a assistência recebida pelas mães

dos bebês.

A impressão de que a mãe vigia o trabalho também foi referida pelas auxiliares

como um fator desagradável no ambiente e para o desenvolvimento de suas atividades.

Não gosto de fazer as coisas com as mães me olhando (...) me sinto vigiada. Margarida

(...) as mães tiram tua liberdade. Onze-horas

(...) a mãe me incomoda porque ela fica olhando meu trabalho. Onze-horas

Ao refletir sobre esta percepção do grupo, observei que a sensação de vigilância

por parte dos pais pode estar igualmente relacionada à falta de orientação. Ou seja, os

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familiares que passam a conviver dentro das Unidades de Terapia Intensiva Neonatal,

não são adequadamente informados a respeito de suas possíveis atribuições junto aos

bebês, ficando, desta forma, absortos pela dinâmica intensa da Unidade, o que inclui as

rotinas da equipe de enfermagem.

Por outro lado, enquanto em algumas ocasiões a mãe não é bem-vinda junto ao

filho, em outras ela “não atrapalha” e “até ajuda” a cuidar dos bebês.

A mim a mãe não incomoda em nada (...) se ela está na minha

frente eu só peço para ela passar para o outro lado, vou

ajeitando as coisas. Orquídea

(...) a mim a mãe não atrapalha, pra mim é indiferente, o que

tiver que ser feito vai ser feito (...) se ela sair ou ficar tanto faz.

Boca-de-leão

Mediante estas verbalizações as auxiliares expressaram sua indiferença com

relação à presença da mãe no ambiente. Tal atitude pode sugerir ainda a sensação de

onipotência do profissional em relação ao recém-nascido, excluindo sua mãe do

contexto, do ambiente e do cuidado. Devido à singularidade deste tema, a

possessividade do profissional pelo bebê será apresentada no item seguinte.

Já ao considerar que as mães “até ajudam”, as auxiliares indicam que dividem

com elas os cuidados aos bebês.

(...) ela até ajuda a cuidar do bebê, eu até prefiro que ela esteja

ali porque está cuidando dele (...). Onze-horas

No entanto, esta divisão ainda é parcial e condicional, conforme complementa

sua fala Onze-horas:

(...) desde que ela não me atrapalhe.

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Orquídea e Jasmim também admitem contar com o auxílio das mães, desta vez

de forma incondicional:

(...) quando tem três bebês chorando e um tem a mãe do lado o

que tu faz? Diz para a mãe agradar ele um pouquinho enquanto

eu vou atender o outro que tá chorando e tá sozinho. Orquídea

Várias vezes eu pedi para as mães segurarem a sonda, trocarem

a fralda, se aliarem no atendimento. O tempo que eu vou perder

segurando a sonda eu posso dar atenção para aquele que tá

chorando num canto e mãe não tá junto. Jasmim

Dias (2001) observa que quando é facultada à família a possibilidade de

trabalhar em parceria com as enfermeiras, compartilhando cuidados simples, estamos

favorecendo tanto a própria família, que se vê participante e útil no processo de cuidado,

quanto os enfermeiros que passam a dispor de mais tempo para outras atividades.

Por outro lado, Lima, Rocha e Scochi (1999) lembram que a partir do momento

que a equipe de enfermagem delega às mães determinadas tarefas junto aos filhos, passa

a estar sujeita ao controle, o qual nem sempre é bem aceito ou compreendido.

Collet e Rocha (2000) acrescentam que os enfermeiros sentem-se em

desvantagens ao compartilhar o conhecimento e as habilidades de enfermagem,

principalmente aqueles que acreditam ser isto uma desvalorização de seu papel. Alertam

que, qualquer mudança existente na estrutura de poder, que delegue mais poder aos pais,

pode ser percebida pelos enfermeiros como uma ameaça.

No entanto, esta situação de poder do enfermeiro é relativa, uma vez que diante

da equipe de saúde ele não detém a maior possibilidade de decisão. Assim, o poder do

enfermeiro “oscila entre sua própria submissão e a submissão aos que dele dependem,

desta forma o poder é exercido ora por uns, ora por outros na medida em que as relações

vão acontecendo” (COLLET; ROCHA, 2000, p.61).

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Martins citado por Nascimento e Martins (2000) verifica que grupos

profissionais desenvolvem diferentes estratégias de poder num hospital de acordo com

os seus recursos de prestígio, saber ou relações sociais.

É interessante observar que para os auxiliares de enfermagem a possibilidade de

exercer algum tipo de poder é remota, uma vez que, dentro da equipe, este profissional

está diretamente subordinado ao enfermeiro. Ampliando o contexto, a equipe médica

também representa, de alguma forma, um agente opressor, na medida em que, muitas

vezes, solicita (ou exige) do auxiliar as informações relativas à evolução do bebê, bem

como as habilidades nos procedimentos necessários para seu atendimento.

Acredito que este “assédio” dos demais profissionais da equipe de saúde sobre

os auxiliares de enfermagem deva-se à presença constante destes últimos junto aos

pacientes. Percebo que, de forma geral, o enfermeiro que atua no cuidado neonatal está

cada vez mais envolvido em atividades administrativas o que acaba por afastá-lo do

atendimento direto aos bebês, salvo em casos de procedimentos considerados como de

sua atribuição exclusiva.

Da mesma forma observo que, embora a Unidade de Terapia Intensiva Neonatal

do Hospital Materno Infantil Presidente Vargas conte com um grupo de dezessete

enfermeiras e uma supervisora, responsável pelas atividades administrativas, os

auxiliares de enfermagem realizam a maior parte dos cuidados diretos aos bebês. Neste

contexto, penso que o afastamento das enfermeiras pode estar relacionado às

dificuldades encontradas por este grupo em trabalhar em equipe; talvez o fato de

“dividir” com os auxiliares o atendimento ao recém-nascido represente, para algumas,

uma desvalorização de sua condição profissional.

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Deste modo, diante das mães dos bebês os auxiliares vislumbram a chance de

estabelecer uma relação de poder que o favoreça. Por sua condição de familiar, a mãe é

concebida como alguém frágil e despreparada para cuidar do filho em situação de

doença. Assim, os profissionais podem passar a considerar as mães “incompetentes”

para atender as necessidades dos filhos enquanto internados, conforme afirmam

Orquídea e Jasmim:

Eu sei o que é melhor para ele (o bebê), mas a mãe sabe do

afeto. Orquídea

(...) o nenê nasce e as primeiras pessoas que vêem o nenê é a gente, antes dos familiares, a gente por ter mais experiência já

sabe o que fazer (...). Jasmim

Por fim, o grupo observou que, além das dificuldades peculiares ao momento em

que vivem, as mães sofrem discriminações seja pelas atitudes junto aos filhos, seja pelas

características pessoais manifestadas ou, novamente, por sua condição sócio-econômica.

As idéias de Jasmim e Orquídea ilustram esta constatação:

Vejo discriminação dos pais dentro da UTI, pela maneira como se vestem, como tratam o bebê, se elas ficam muito ou pouco

tempo (...). Jasmim

(...) normalmente quando as mães não aparecem tu já fica

olhando ela torto, já rotula. Jasmim

Muitas vezes a mãe é de um nível sócio-cultural baixo então as

pessoas rotulam de tigras. Orquídea

Percebo que, na prática, a discriminação identificada pelo grupo se manifesta a

todo instante não só nos limites da Unidade de Terapia Intensiva Neonatal como na de

Internação Neonatal e, ouso inferir que, na instituição como um todo. Observo que,

diante das características, exaustivamente referidas, da população atendida no Hospital

Materno Infantil Presidente Vargas os profissionais de saúde, assim como as demais

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equipes, tendem a estabelecer relações, muitas vezes “cruéis e absurdas” como, “roupa

suja ou rasgada = incapacidade para cuidar do filho”. Ou seja, a situação econômica da

mãe é indicativa da maior ou menor capacidade para cuidar do filho.

Assim, na busca pelo equilíbrio entre o estímulo constante à permanência das

mães, o respeito pelo tempo necessário para sua adaptação à situação de ter um filho

recém-nascido internado, assim como pela sua disposição em participar do cuidado e

pelas suas posturas e saberes individuais, considero adequado o que sugere Carvalho

(2001, p.31) com relação à atuação da equipe de enfermagem:

A equipe de enfermagem, empenhada em oferecer um suporte

tangível à díade mãe-filho, não atua querendo substituí-la

completamente, mas dando-lhe a possibilidade de expressar suas próprias capacidades. Nesta situação a mãe e seu recém-

nascido são cercados pela presença discreta e não intrusiva da

equipe.

Desta forma entendo que seja possível estabelecer com as mães uma relação que

favoreça, prioritariamente, aos bebês, que constituem o elemento mais vulnerável deste

cenário de cuidado; e que, do mesmo modo, “suavize” e estimule o convívio entre

profissionais e familiares.

3.2.2 A percepção da figura paterna no ambiente de cuidado neonatal

Ao longo das discussões em grupo as auxiliares expressaram, de forma clara e

veemente, suas opiniões a respeito da presença das mães junto aos recém-nascidos

internados em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal. No entanto, com relação à figura

paterna, foi necessário estímulo da pesquisadora para que a mesma fosse incluída nos

debates.

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Brazelton e Cramer (1992) reconhecem a exclusão dos pais durante a gestação e

no cuidado dos filhos e observam que a mesma tem raízes profundas em práticas

históricas e culturais muito difundidas.

Da mesma forma, Espírito Santo (2000, p.13) aponta distinções entre as figuras

materna e paterna no decorrer do ciclo gravídico-puerperal observando que:

A sociedade ocidental determinou esteriótipos (...) sendo a mãe

uma figura onipotente e o pai ausente. O processo de gestação,

parto e cuidados com o bebê dizem respeito à mulher. Espera-se do pai um distanciamento e até indiferença com relação a esses

assuntos.

Sendo assim, procurei alcançar a percepção das auxiliares sobre a presença dos

pais junto aos filhos a partir da introdução nas discussões de questões do tipo: “e o pai,

onde entra nessa história?”.

As manifestações do grupo a respeito da figura paterna revelaram que o pai é

percebido como “discriminado e malicioso”.

A “discriminação” dos pais foi enfatizada por Jasmim ao comparar a “aceitação”

da relação mãe-bebê e a “exclusão” da dupla pai-bebê na Unidade de Terapia Intensiva

Neonatal:

Eu acho que o pai é discriminado (...) o pai não pode

(permanecer com o filho) porque não é mãe, porque é mãe-

canguru, porque quem faz a amamentação é a mãe (...).

Brazelton e Cramer (1992) consideram que os pais, durante longo tempo, foram

descritos como ausentes e refratários em expressar emoções. Porém, admitem que tal

descrição pode não ser estritamente verdadeira, embora constatem que, no passado,

muitas crianças tinham a imagem de seus pais como alguém que não se dedicava

explicitamente aos cuidados dos filhos.

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Brêtas e Silva (1998), por sua vez, reconhecem que o amor materno, bem como

outros sentimentos humanos, está sujeito a influências históricas e culturais. Observam,

porém, que esta capacidade de amar não é exclusividade das mulheres, uma vez que os

pais também amam seus filhos. Assim, segundo os autores, há uma paridade dos papéis

materno e paterno no que tange aos cuidados dos filhos.

É interessante ressaltar que a exclusão referida acima não está limitada à figura

paterna. Se uma das justificativas para tal reação do grupo em relação aos pais é a

“utilidade” da mãe junto ao bebê, como por exemplo, no momento da amamentação,

pode-se, perfeitamente, estender a adoção desta mesma atitude diante da presença dos

avós e irmãos que, embora autorizados a entrar na unidade, não são percebidos como

essenciais à recuperação dos bebês.

(...) a avó não pode pegar (o bebê) porque é visita, e o bebê tem

que estar no colo da mãe, não no colo da avó (...). Jasmim

Considerando a situação de amamentação, Ziegel e Cranley (1985, p.443)

referem que “a mãe passa a maior parte do tempo com o bebê e, no momento da

amamentação, sua relação com o filho parece excluir o pai”.

A partir da afirmação acima é possível inferir que a própria mãe pode ser, de

alguma forma, responsável pela exclusão do pai do cenário de cuidado dos filhos. Ao

estabelecer com o filho uma relação estreita, a mãe pode, involuntariamente, afastar o

pai.

No entanto, o grupo observa esta discriminação/exclusão como passível de ser

minimizada a partir da mudança de atitudes dos profissionais, como, por exemplo, pelo

estímulo à participação do pai nos cuidados com o filho:

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(...) eu acho que a discriminação acontece por falta de

orientação, por que se tu estimular aquele pai a ajudar a mãe e a

cuidar do nenê (...) vai acabar esse negócio (...) ele vai tomar gosto pela coisa (...). Jasmim

De acordo com Jasmim, os pais revelam interesse em incorporar-se ao cuidados

do bebê:

Eu já vi pai pedindo para trocar a fralda, fiquei abobada, saí correndo e dei a fralda pra ele na mesma hora, (...).

Já a percepção dos pais como “maliciosos” é expressa por Orquídea:

(...) é uma coisa bem complicada, não sei como explicar a parte

pejorativa, os olhos, o olhar, a malícia dos homens, ele (o pai) desvia visivelmente, tu notas que ele tá mais interessado em

observar aquela mãe que tá amamentando do que o bebê e a

mãe do bebê dele.

Da mesma forma, Boca-de-leão observa o interesse dos pais pelas outras mães,

bem como o constrangimento destas pela presença masculina no ambiente:

O homem fica curioso, principalmente quando tem mães 8 ou

80, com mamas muito grandes ou muito pequenas.

As mães ficam mais inibidas com a presença de homens na

UTI.

As atitudes dos pais, conforme referidas pelas auxiliares, podem estar

diretamente relacionadas às percepções de exclusão e discriminação expostas

anteriormente. Ou seja, na medida em que a figura paterna é concebida como secundária

nos cuidados aos bebês, os pais não recebem a devida atenção por parte dos

profissionais. Deste modo, desorientados com relação a sua postura junto aos filhos, os

pais passam a explorar o ambiente fixando-se em situações que lhe despertam interesse,

como, por exemplo, a nudez parcial das mulheres durante a amamentação.

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Assim, considerando as percepções das auxiliares e para sintetizar a questão da

presença do pai no contexto do intensivismo neonatal, concordo com Ziegel e Cranley

(1985, p.443) quando afirmam que: “Muitas vezes o pai é o membro mais esquecido da

família do recém-nascido”.

Da mesma forma, considero relevante o que referem Brazelton e Cramer (1992,

p. 50) com relação à escassez de estudos a respeito da paternidade:

Pode-se mesmo levantar a possibilidade de que o esquecimento

do papel do pai por parte de tantos estudos, ao longo de tantos

anos durante os quais a atenção dada voltou-se para a díade mãe-filho, tenha sido apenas mais um reflexo da tendência de

excluir o pai da relação entre mãe e filho, tal como se revela nos

estudos históricos e etnológicos.

Por fim, no contexto do estudo, percebo que a questão da presença do pai é

muito peculiar. Talvez, também neste aspecto, as características da população atendida

no Hospital Materno Infantil Presidente Vargas tenham interferência, uma vez que nem

sempre as mães desejam ou podem contar com a presença do pai de seus filhos.

Acrescento ainda que, no decorrer do período em que atuei na instituição pude

perceber o crescente volume de casos encaminhados e acompanhados pelo Serviço

Social do hospital. Diante disso, é possível deduzir que grande parte das famílias de

recém-nascidos internados apresenta alguma dificuldade na manutenção de sua estrutura

que pode, na minha opinião, ser gerada tanto pela presença quanto pela ausência do pai

do bebê.

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3.3 Da possessividade à impotência: a condição do auxiliar de enfermagem no

ambiente de cuidado neonatal.

Neste item pretendo apresentar e refletir sobre as percepções das auxiliares de

enfermagem acerca de sua condição profissional no contexto do intensivismo neonatal.

Conforme mencionado em capítulo anterior, a maior parte do contingente de

pessoal da Unidade de Terapia Intensiva Neonatal é representada pelos auxiliares de

enfermagem. Sendo assim, é inevitável que estes profissionais, ao realizarem suas

atividades diárias, estabeleçam algum tipo de relação com as demais equipes, bem como

com os familiares dos bebês. No entanto, neste ambiente, as relações interpessoais nem

sempre acontecem de forma harmoniosa, seja pelas repercussões que o processo de

doença e internação de um recém-nascido gera na família e nas equipes, seja pelo

despreparo do profissional ao lidar com tais situações.

Gonzales, Beck e Denardim (1999) classificam as dificuldades de

relacionamento entre profissionais e pacientes em dois grupos: as provenientes da

própria pessoa como preocupações, problemas, estados de humor e tendência ao

domínio e poder, e as oriundas do despreparo ou ausência de conhecimento.

Gomes (1992, p.57) acrescenta as especificidades do trabalho com recém-

nascidos às dificuldades mencionadas,

A instabilidade do estado de saúde do recém-nascido leva

também a equipe a vivenciar sentimentos de impotência,

defrontar-se com a realidade de sofrimento e com a incerteza do diagnóstico e prognóstico daquele ser imaturo

Sendo assim, ao concordar com as autoras, admito que não é possível isolar o

profissional que atende ao bebê da pessoa que interage com os pais.

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Diante disso, e a partir das discussões que revelaram as percepções das

auxiliares sobre a presença das mães e dos pais, assim como acerca do ambiente de

cuidado, percebi que o grupo buscava ainda espaço para que as questões relativas a sua

própria condição profissional fossem também desveladas.

Deste modo, durante os dois últimos encontros, as auxiliares foram estimuladas

a estabelecer relações entre as situações vivenciadas pelas famílias e sua condição de

profissional de saúde integrante do contexto.

As expressões do grupo a este respeito versaram em torno de três enfoques:

autonomia, formação profissional e poder. Optei, no entanto, por apresentá-los em

conjunto pela impossibilidade de individualizar aspectos originalmente imbricados.

Acredito que, como integrante da equipe, o auxiliar de enfermagem representa,

além da maioria numérica, a “força motriz” indispensável à dinâmica de qualquer

ambiente de cuidado.

Desta forma, conforme referido anteriormente, além de sua intensa atividade

junto ao recém-nascido, este profissional precisa ainda atender às solicitações das

demais equipes, como, por exemplo, dos enfermeiros, a quem estão diretamente

subordinados, dos médicos que, com freqüência dirigem a eles suas recomendações com

relação aos pacientes e também das famílias, com quem mantém contato estrito.

A gente fica no meio de tudo isso, entre médico, enfermeiro, os

pais e até que nossos pacientes não falam, mas tem as famílias

(...). Boca-de-leão

A percepção das auxiliares de que estão entre as equipes e as famílias é também

evidenciada por Onze-horas:

O auxiliar está no meio de tudo isso, é o “auxiliar-bolinha”.

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Assim, as auxiliares reconhecem que seu trabalho se caracteriza como “meio de

campo” e ao inseri-lo no ambiente de cuidado percebem com mais clareza sua

amplitude e importância na continuidade das atividades diárias dos demais profissionais

da unidade.

Eu acho que várias vezes quando a gente nota que a mãe já está

se indignando porque o médico não veio falar com ela e tu

ainda não teve tempo de dizer para a mãe o que tem no nenê e não o que o nenê tem, por que isso a gente pode dizer (...) e aí a

mãe já está entrando em pânico aí tu dá um jeito e diz que

aquilo é uma sondinha e isso já é o suficiente para ela não sair

quebrando tudo e ir lá na Direção, é um meio de campo que tu faz, a gente acaba dando um jeito. Jasmim

Ciente de sua localização no contexto, o grupo passou a refletir sobre sua

presença, bem como sua atividade, em um ambiente tão peculiar como a Unidade de

Terapia Intensiva Neonatal do Hospital Materno Infantil Presidente Vargas.

Durante as discussões do grupo, foram freqüentes as manifestações a respeito

das condutas dos diversos profissionais em relação aos recém-nascidos e seus pais.

Porém, as auxiliares expressaram com maior veemência seu descontentamento com a

falta de atenção dada aos pais por parte da equipe médica.

(...) e essa é minha indignação em relação a tudo isso o que eu

vejo ali, o pediatra vem e diz para a mãe que o bebê está bem,

só está com um sorinho, e a mãe pergunta pelos pés tortos e ele (o médico) diz que isso a gente vê depois, que isso é o de

menos, para a mãe o pior problema é este e ela até acha bom

que ele se mexe o tempo todo, na verdade ele está

convulsionando e ela não tem nem noção disso. Jasmim

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A indignação do grupo é novamente verbalizada por Jasmim:

Ela (a mãe) quer falar com o médico e a secretária não

conseguiu chamar o médico, ou o médico não veio porque

esqueceu que tem que vir falar com a mãe, tu não agüenta mais ouvir aquela mãe perguntando três, quatro vezes a mesma coisa

– e o médico, não vem? Aí tu explica que ele deve estar

conversando com a mãe de outro bebê, ou tu diz que tem um

nenê mais grave, tu tem que enrolar, que saco tchê, é o teu filho que tá ali.

Convém lembrar que a unidade conta com os serviços de doutorandos,

residentes e médicos contratados, além dos preceptores que permanecem apenas por

ocasião do round médico. Porém, apesar do número de profissionais ser

consideravelmente maior em um hospital escola, como o Hospital Presidente Vargas, do

que em um hospital privado, a atenção dispensada aos pais é percebida pelos auxiliares

como visivelmente diferenciada, o mesmo acontecendo com a qualidade e veracidade

das informações.

O episódio vivenciado e relatado por Boca-de-leão exemplifica esta constatação

ao mesmo tempo em que expressa a sua reação ao fato.

Eu lembro de uma criança que internou na quinta à noite e era

domingo e ninguém tinha vindo falar com a mãe. Aí ela pediu para falar com o médico e começou a chorar ao lado da

incubadora, aí me deu uma coisa e eu fui lá e bati na porta dos

médicos e falei: vem cá vocês vão atender essa mãe ou não? Bem mimosinha assim, porque a mulher tava lá e alguém tinha

que atender.

Mais uma vez é possível estabelecer relações entre o atendimento recebido pelos

pais em hospitais da rede pública e privada. Enquanto os pais em um hospital privado

identificam o profissional responsável pelo bebê buscando e recebendo as informações

de maneira adequada, na instituição pública a notícia sobre as condições de saúde e

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tratamento dos filhos precisa ser “garimpada” entre os diversos profissionais que

circulam constantemente pela Unidade.

Orquídea reforça a afirmação:

Eu canso de ver o médico dizer que não vai atender. Só o que

faltava eu atender ao telefone, vou passar o dia inteiro

atendendo telefone então (...)

No entanto, apesar de considerar o contexto pouco estimulante para o

desempenho de suas atividades profissionais devido às desatenções percebidas, o grupo

manifestou preocupação com a percepção que os familiares tem acerca de sua estrutura

e funcionamento.

Klaus e Kennel (1993, p.236) referem que “considerando-se a intensa pressão

sobre o pessoal de um berçário de terapia intensiva, é impressionante como estas

pessoas tem sido calorosas, receptivas e preocupadas”.

Deste modo, diante do tratamento oferecido aos pais por parte da equipe médica,

as auxiliares manifestaram preocupação em justificar as atitudes destes profissionais e

atenuar as informações fornecidas, pois,

(...) isso depõe contra o hospital e a equipe toda, não pode

chegar de soco. Orquídea

Boca-de-leão sustenta a percepção da colega reforçando a diferenciação da

atitude do auxiliar no contexto:

(...) se não tiver a percepção de enxergar um pouquinho mais

além e também sair largando as patas aí deu né.

Lima, Rocha e Scochi (1999) sustentam a pertinência da observação da auxiliar

comentando que os agentes de saúde, de forma geral, consideram os pais como

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102

receptáculos de informações e ordens, com pouca capacidade de compreender e agir

durante o processo de hospitalização de seus filhos.

A importância de minimizar as dificuldades por que passam os familiares ao

integrarem o cotidiano de uma Unidade de Terapia Intensiva foi mencionada por

Capella, citada por Nascimento e Martins (2000):

Ao se sujeitarem temporariamente à instituição hospitalar os

indivíduos expõem toda sua fragilidade. Nesse momento, se os

profissionais de saúde não aliarem sua competência técnica à competência humanística, a situação vivida por este sujeito

pode ser ainda mais dolorosa.

Desta forma, conscientes e sensíveis às situações a que os pais estão expostos ao

vivenciar o processo de internação de um filho, as auxiliares passaram a descrever suas

atitudes profissionais, salientando seu “desconforto” devido à sensação de impotência

perante as mesmas.

Às vezes tu quer fazer com que a mãe se intere e tu és barrada.

Jasmim

Eu não posso dizer nada e ela (a mãe) não tem noção disso (...).

Jasmim

As afirmações de Jasmim referem-se, especificamente, à conduta das

enfermeiras da unidade que não adotam uma postura uníssona com relação às

atribuições dos auxiliares de enfermagem enquanto profissionais da equipe de saúde.

Cabe referir que, para alguns enfermeiros a “divisão” do cuidado pode

representar uma desvalorização de sua posição dentro da equipe. Assim, na percepção

destes profissionais, delegar tarefas, ou mesmo permitir que os auxiliares realizem

atividades pertinentes a sua própria categoria funcional, pode sugerir alguma

“incapacidade”.

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103

Da mesma forma, percebo que muitos enfermeiros assumem, diante das demais

equipes, pacientes e familiares, uma postura ilibada, mostrando-se impassíveis diante

das mais diversas situações.

Segundo Huerta (1984) as enfermeiras geralmente estão empenhadas em

apresentar a seus clientes e colegas da equipe de saúde uma fachada unidirecional,

congruente com o “esteriótipo” da enfermeira. Para a autora, estas profissionais não

expressam dificuldades ou autenticidades por entenderem que, deste modo, lesariam sua

imagem profissional e não atenderiam às expectativas de seus colegas e das demais

equipes.

Por outro lado, de acordo com Avery (1996), enquanto enfermeiros que atuam

em Neonatologia, devemos zelar pelos nossos sentimentos, dominar nossa ansiedade,

frustração e desencorajamento se quisermos ajudar a nossos pequenos pacientes e a seus

pais. Contudo, não podemos nos defender “endurecendo nossos corações”.

Huerta (1984, p.215) acrescenta que “a enfermeira não comprometida

permanecerá afastada dos problemas de seus pacientes porque estes lhes provocam

sentimentos (...) ela não é uma enfermeira, mas apenas desempenha as funções de uma”.

Sendo assim, no período em que integrei o grupo de enfermeiras da Unidade de

Terapia Intensiva Neonatal do Hospital Presidente Vargas, pude perceber que as

atitudes destas profissionais com relação à sua própria postura, bem como no convívio

com as demais equipes, especialmente com os auxiliares, eram extremamente variáveis.

Deste modo, enquanto para algumas enfermeiras o conhecimento científico,

aliado à técnica, era desejado e valorizado no auxiliar de enfermagem, para outras esta

qualificação era considerada desnecessária tendo em vista a presença, no contexto, do

profissional de nível superior.

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104

Entendo que tais disparidades nas opiniões e condutas das enfermeiras podem

estar relacionadas ao modelo tecnicista que envolve a Unidade e no qual seus

profissionais foram formados. Nesta concepção, a valorização da técnica sobre as

demais atribuições, prestigia os profissionais hábeis, ágeis e portadores de extrema

destreza manual.

Nascimento e Martins (2000, p. 210) lembram que:

Na enfermagem a valorização do profissional sempre foi dada

em relação a sua destreza manual, habilidades em realizar

técnicas com perfeição. Com isso, essas funções eram, na sua totalidade, executadas por auxiliares e técnicos de enfermagem

(os tarefeiros) e nos cursos de formação a técnica era vista

como o principal conhecimento do ensino de enfermagem.

O mesmo autor salienta que, apesar da grande importância atribuída à formação

profissional voltada a atender as reais necessidades da população dentro de um contexto

específico, nas Unidades de Terapia Intensiva ainda encontramos a valorização da

habilidade técnica em detrimento do fator humano.

Remen (1983, p.09) refere que “os seres humanos são mais do que corpos, e

lembra que esta é uma tarefa difícil para os profissionais de saúde, uma vez que não

aprenderam nos bancos universitários a ver a unicidade dos pacientes”.

É interessante observar ainda que, por ocasião da realização do presente estudo,

a maior parte das enfermeiras que atuavam na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal

do Hospital Presidente Vargas teve sua formação original e inserção na área da saúde

como atendente ou auxiliar de enfermagem o que pode, em alguns casos, ter contribuído

para a manutenção do modelo tecnicista e hegemônico devido à falta de estímulo e

autoconfiança destas profissionais para propor mudanças em um contexto há tanto

tempo conhecido e já consolidado.

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105

Reforçando esta idéia Silva e Silva (1998) relatam que valores ou paradigmas

que determinam condutas e comportamentos que reproduzimos sistematicamente

influenciam as ações inerentes ao próprio cuidar, limitando ou favorecendo as posturas

frente às mudanças.

Para Ângelo (1996), qualquer mudança que envolva várias formas de ensinar, de

aprender e de executar o cuidado deve ter início pela alteração do paradigma, pela

transformação de dentro para fora, daquilo que as pessoas pensam para algo que as leve

a agir.

Diante disto, é compreensível que os auxiliares, ao depararem-se com tal

heterogeneidade de percepções e condutas assumidas pelas enfermeiras da unidade,

vacilem ante a realização de algum procedimento específico ou mesmo ao orientar e

estimular os pais a cuidarem dos bebês.

(...) só que a gente também fica naquela, porque como o número

de enfermeiras é grande a gente tem que trabalhar com cada

uma do jeito que ela quer que a gente trabalhe, então tem umas que aceitam tranqüilamente que tu faças o HGT por elas, que tu

aspire o tubo, (...) mas tem umas que se descobrirem que tu

aspiraste o tubo elas te enchem o saco, ou seja o que tu fazes? Jasmim

Por fim, a falta de autonomia mencionada pelo grupo, aliada à percepção de que

assumem uma posição intermediária entre os demais profissionais de saúde e os

familiares dos recém-nascidos é expressa por Orquídea:

A gente faz o intercâmbio, pede para o médico para que a gente

possa dar a informação para a mãe e ela já sai satisfeita.

Orquídea

A afirmação de Orquídea evidencia que, mesmo em face da concepção tecnicista

da assistência e da hegemonia médica ainda presentes na unidade, os auxiliares de

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106

enfermagem buscam outras maneiras de exercer suas atividades. Ao pedir ao médico a

autorização para fornecer informações às mães, o profissional demonstra envolvimento

não só com o bebê que está sob seus cuidados como também com seus pais que passam

a ser alvos de sua atenção.

Neste contexto, Gomes (1992, p.57) refere que “a disponibilidade de

compreender o outro, não necessariamente está vinculada aos embasamentos teóricos e

ao preparo técnico da equipe”.

Para Domingues et al. (1999) é necessário que ocorra uma troca de informações

entre as equipes de saúde para que o grupo como um todo se complemente e assim

ocorra um melhor relacionamento família-equipe.

Nascimento e Martins (2000, p.208) comentam que “a medicina não deve

permanecer hegemônica nas instituições de saúde, as decisões devem ser coletivas”.

Da mesma forma Ângelo (1996) indica que é preciso derrubar defesas, eliminar

a indiferença, tornar-se presente não pela imposição de uma rotina ou, acrescento, pela

adoção de um ou outro modelo assistencial ou prática humanizadora, mas sim por

atitudes de interesse e preocupação genuínas.

Nascimento e Martins (2000, p. 211) complementam afirmando que:

O fato de alguns trabalhadores possuírem maior afinidade por

tal sujeito hospitalizado (...) faz gerar elos fortes entre os

mesmos, sendo isso um ponto positivo. Além do que, percebemos que toda rigidez imposta nos cursos de formação

foi quebrada. Esses sujeitos trabalhadores deixam suas emoções

fluírem espontaneamente, pois são pessoas com sentimentos cuidando de outros seres humanos que muitas vezes encontram-

se em sofrimento.

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107

No entanto é preciso admitir que nem todos profissionais de saúde compartilham

da mesma filosofia e que mesmo dentre as auxiliares de enfermagem participantes do

estudo surgiram algumas divergências.

Embora seja consenso no grupo o fato de que as mães são essenciais durante a

passagem dos recém-nascidos pela Unidade de Terapia Intensiva, para algumas

auxiliares a “divisão” dos cuidados é um pouco mais complicada, pois,

(...) eu olho para ele como se ele fosse meu filho, eu o agrado

como qualquer mãe (...) e quando a mãe está ali eu tento passar

para ela o que o bebê gosta e que eu vou fazer com ele o que ela faria. Orquídea

A afirmação de Orquídea é reforçada por Cresti e Lapi (1997, p. 162), ao

relatarem que a desvalorização das mães pelas enfermeiras é observada quando estas

“parecem querer substituir a mãe real, propondo-se como boas mães”.

Ao refletirem sobre as relações de poder entre pais e profissionais Collet e

Rocha (2000) comentam que no ambiente hospitalar o poder geralmente não está

distribuído de forma harmônica e apontam fatores como território, estresse, ansiedade e

conflitos como indicadores da posição desprivilegiada dos pais. Assim, de acordo com

os autores, o grau de participação destes é influenciado, mais pelas condições e

necessidades dos filhos e pelas atitudes dos enfermeiros, do que pela sua escolha em

particular.

Entretanto, os mesmos autores admitem que “o ambiente hospitalar é território

próprio do enfermeiro que nele trabalha, mas afirmar que somente ele tem o poder de

optar ou não pela negociação do cuidado mostra uma postura autocrática no modelo de

assistência” (COLLET; ROCHA, 2000, p.61).

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108

Diante disso, entendo que as atitudes de poder reveladas no grupo podem

sugerir, além da dificuldade em compartilhar espaços e atividades com os pais, a

intenção de assumir um certo “domínio” sobre o recém-nascido.

Acredito que tal necessidade possa estar relacionada à condição do auxiliar de

enfermagem na equipe de saúde como um profissional detentor de pouca, ou nenhuma,

autonomia. Assim, ao vislumbrar a possibilidade de tomar para si algumas atividades

específicas junto ao bebê, o auxiliar passa a excluir a mãe, tomando-a como um

adversário, desvalorizando suas capacidades e desviando-se dos contatos.

Reforçando estas idéias Grüdtner et al. (1999, p.367) referem que:

Os profissionais em geral que tem uma visão voltada para um

modelo biomédico percebem a família como intrusa, exigente,

que sobrecarrega o serviço já assoberbado. Há outros, porém, que, conhecendo as limitações das regras e rotinas se sentem

despreparados emocionalmente e instrumentalmente e sem

autonomia para lidar com o paciente e seu familiar e adotam

uma atitude de evitamento de contatos.

Gomes (1992) acrescenta que o cuidado prestado por estes profissionais é feito

de forma objetivada, sendo, deste modo, um relacionar onde não se busca a

compreensão do outro, mas um cuidar que domina o outro.

Cresti e Lapi (1997), afirmam que podem ser vários os fatores que conduzem a

esta polarização maciça em um dos membros da dupla mãe-bebê e apontam, como

exemplos, os conflitos relativos à posse e à perda de autoridade, a projeção de seus

próprios sentimentos de inadequação sobre os pais do bebê, as respostas de

contraprojeção da equipe aos sentimentos de rivalidade e de raiva da mãe, entre outros.

O senso de “posse” sobre o recém-nascido que está sob seus cuidados é descrito

por Margarida de forma ainda mais fervorosa:

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(...) é que eu sou muito ciumenta, muito possessiva, então o que

acontece? O bebê é meu, eu que cuido, eu que quero e isso é um

defeito meu. O Pedro é um exemplo, o Pedro é meu, eu que cuido, eu batizei ele porque ele não tinha nome e eu disse para a

mãe: Maria, tu não escolheu um nome para o teu nenê? Ela

disse que não tinha pensado e eu disse: eu já batizei ele, ele é

João agora, até tu escolher o nome ele é João. E eu chamei ele de João até que a vó veio um dia e disse para o médico que

achava que o nome dele era Pedro, até eu conseguir chamar ele

de Pedrinho foi difícil.

É interessante mencionar que o bebê não é “disputado” apenas com a mãe. Entre

as auxiliares também podem ser observadas atitudes de competição pelos cuidados a um

recém-nascido em particular, pois,

(...) eu tenho os meus filhos e as colegas já sabem que aqueles

são meus, eu cuido e já mudo coisas (...) Boca-de-leão

As percepções de Azaléia, Margarida e Jasmim complementam a da colega,

(...) o bebê não é meu é do colega. Azaléia

(...) eu sou muito chata para trabalhar com colega, eu sou chata

para trabalhar com as mães, é meu bebê, sou eu quem cuida, eu

não gosto que mexam. Margarida

(...) existe competitividade entre os auxiliares de enfermagem,

este é meu paciente, não gosto que mexam no meu paciente, se

eu deixei ele daquele jeito e vem alguém e muda eu não gosto. Jasmim

Diante de tais afirmações penso que a competitividade entre os auxiliares de

enfermagem pode estar alicerçada nas suas diferenças de formação profissional e no

tempo de inserção na profissão e na unidade, bem como em sua faixa etária e história de

vida pessoal.

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Em capítulo anterior foi apresentado o “perfil” dos sujeitos participantes do

estudo, e salientado que as particularidades de cada componente imprimiram

heterogeneidade ao grupo como um todo.

No entanto, tal diversidade, almejada pela pesquisadora para enriquecimento das

discussões e, portanto, das informações emergidas do grupo, pode ser analisada, neste

momento, como um fator desencadeante das “rivalidades” observadas no cotidiano de

trabalho dos auxiliares de enfermagem.

Conforme já referido, o grupo foi composto por sete mulheres; destas, quatro

eram mães, duas já avós, uma recém-casada e as demais solteiras e sem filhos.

Sendo assim, no decorrer das discussões pude observar algumas divergências

entre as opiniões destas mulheres e foi interessante verificar que as avós apontaram o

respeito como fator primordial na manutenção de relações amistosas entre os

profissionais da equipe de enfermagem.

(...) isso tem muito do respeito que devemos ter por todos, em

casa, na família, em tudo. Respeitar as condições de tudo, se tu

vai mexer no nenê perguntar para o colega se ele quer que mexa. Assim tu não entra no espaço dos outros. 8

Do mesmo modo, havia no grupo quatro auxiliares que cursavam a faculdade de

enfermagem e também este fato foi deflagrador de discordâncias e rivalidades.

(...) mas me incomoda se eu vejo aquela boca suja e eu não posso falar ou se a veia tá fora e eu penso: não vou nem olhar!

Porque às vezes tem colegas que se ofendem e já falaram que eu

sou assim porque sou acadêmica de enfermagem. 8

Eu já fui rotulada como metida por ver que o nenê tava virado,

tava batendo a cabeça e eu arrumei e disseram: Ah, tu é metida,

então agora para qualquer coisa eu pergunto: posso mexer no teu nenê, posso trocar a fralda?

8

8 Os codinomes não foram mencionados para evitar possíveis identificações (nota da autora).

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111

Por outro lado, acredito que, de forma geral, com relação à formação original

recebida pelas auxiliares, sejam encontradas semelhanças, uma vez que a concepção

tecnicista da assistência à saúde ainda hoje permeia os cursos de formação profissional.

Desta forma, admito que, independentemente de sua idade ou tempo de atuação

como profissional, os auxiliares de enfermagem trazem consigo conceitos comuns, mais

ou menos introjetados, a respeito de saúde, doença, paciente e cuidado.

A respeito da formação dos profissionais de saúde Huerta (1984, p.214) alerta

que:

Enquanto os futuros profissionais integrantes de uma profissão

forem educados em situações e métodos que encorajem a

rigidez e, enquanto ignorarem o ensino de relações humanas, eles continuarão a sofrer frustrações e ansiedades.

Diante disso, compreendo a dificuldade do auxiliar de enfermagem em partilhar

seus parcos “poderes” e espaços com as famílias e mesmo com colegas e demais

profissionais de saúde.

Tendo sido formados, essencialmente, para compor uma equipe conduzida, e às

vezes “comandada”, por outro profissional e estando inserido em um contexto que

preserva a hegemonia médica, os auxiliares de enfermagem, apesar de exercitarem

diariamente sua “crítica” nos corredores e vestiários dos hospitais, nem sempre são

capazes de visualizar a importância e o espaço que ocupam na equipe de saúde.

Justificando esta percepção, Grüdtner et al. (1999, p.368) afirmam que:

Com o pessoal de enfermagem, se faz necessário uma reflexão

sobre seus sentimentos, atitudes, crenças e limites para um posicionamento ético pelo bem comum, disponibilidade para

incluir o outro como parceiro no seu trabalho, e desenvolver

habilidades de relacionamento humano.

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112

Ampliando este enfoque, é possível justificar também a problemática que

envolve a “abertura” da Unidade de Terapia Intensiva Neonatal aos pais dos bebês.

Considero relevante recordar que, embora todas as auxiliares participantes do

estudo tenham sido integradas no processo de conquista do título de Hospital Amigo da

Criança, parece que a mensagem de humanização do cuidado neonatal, a partir do

estímulo à presença dos pais, não foi captada da mesma forma. Entendo que esta

percepção pode justificar algumas das discordâncias nas atitudes em relação aos pais,

não só do grupo em questão, como também das demais equipes envolvidas no cuidado

ao recém-nascido.

Do mesmo modo, observo que a forma como as chamadas “práticas

humanizadoras da assistência” vêm sendo introduzidas nos ambientes de cuidado não

favorecem a conscientização do profissional, necessária para sua rápida efetivação e

indispensável para sua eficiência. Ou seja, muitas vezes são requeridas dos profissionais

novas atitudes diante de “velhas” situações sem, no entanto, ter-lhes sido proporcionado

espaço para discussão e avaliação do melhor caminho para contemplar as propostas e

atingir as metas pré-estabelecidas por outrem.

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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao chegar às últimas páginas desta dissertação foi inevitável vislumbrar o trajeto

percorrido. Da motivação inicial à opção metodológica, culminando com a realização da

pesquisa propriamente dita, todo processo surgiu como um filme.

Assim, considero adequado retomar, neste momento, alguns detalhes que

nortearam e compuseram o estudo, como seu impulso inicial que ocorreu muito antes do

ingresso no curso de Mestrado.

Ao iniciar a trajetória de cuidado aos recém-nascidos iniciei também a relação

com os demais profissionais da equipe de saúde. Como enfermeira recém-formada,

precisei de apoio nos primeiros passos na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal. Na

busca de uma identidade profissional e da segurança necessária para realizar as

atividades de minha competência foi necessário contar com a ajuda de colegas mais

experientes.

No entanto, durante os anos em que integrei a equipe de enfermagem do

Hospital Materno-Infantil Presidente Vargas, o convívio mais intenso ocorreu com os

auxiliares de enfermagem. Talvez isso se deva ao fato de ter recebido deles boa parte

das “instruções iniciais” de como ser enfermeira em um ambiente tão peculiar quanto

aquele em que me encontrava. Neste convívio chamou-me atenção a desproporção entre

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o volume de suas atividades junto aos bebês e a pouca valorização enquanto

profissionais da equipe de enfermagem.

Do mesmo modo, com o passar do tempo, pude também perceber e acompanhar

o sofrimento e a angústia dos pais dos recém-nascidos internados na Unidade de Terapia

Intensiva Neonatal. Assim, a decisão de reunir auxiliares de enfermagem, bebês e pais

em um mesmo estudo foi um processo natural.

Por sua vez, a escolha do Grupo Focal como forma de coleta de informações

também merece destaque. A opção veio minimizar o receio de não obter dos auxiliares

as suas legítimas percepções, e sim as que atendessem às minhas expectativas; uma vez

que, de forma geral, o grupo era conhecedor de minhas opiniões a respeito do tema

central do estudo.

Convém admitir, porém, que, ao iniciar a pesquisa, não julgava obter tantas

idéias. Assim, confesso minha satisfação ao chegar a seu término e verificar que o

auxiliar de enfermagem é capaz de identificar de forma tão clara quanto qualquer outro

profissional, os benefícios e as dificuldades advindas da participação dos pais no

intensivismo neonatal.

Da mesma forma, reforço que a opção por trabalhar com o grupo de auxiliares

de enfermagem demonstra minha convicção de que estes profissionais são capazes de

realizar suas atividades dotados de crítica e competência técnica. Acrescento a esta

certeza a percepção de que as desavenças e dificuldades com relação aos familiares e às

demais equipes, podem ser decorrentes de um contexto tumultuado e desprovido de

expectativas.

Percebo ainda que, mesmo diante da desvalorização profissional e da pouca

autonomia dentro da equipe, o auxiliar de enfermagem luta por espaços de atenção e

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respeito. Ao ser ouvido manifesta que não deseja e nem pode e mais ser considerado um

mero “tarefeiro” na equipe e que, muitas vezes, suas opiniões precisam ser inseridas e

relevadas no contexto.

Admito que parte de tais convicções e percepções tiveram origem nos encontros

grupais, quando as auxiliares puderam refletir sobre suas relações com os pais dos bebês

e expressar opiniões, por vezes, contundentes. Da mesma forma, embora o objetivo

deste estudo não tenha incluído o consenso entre os participantes, pude constatar que, de

forma geral, a percepção do grupo com relação à presença dos pais no intensivismo

neonatal aponta para a importância destes últimos na recuperação dos recém-nascidos

internados.

Deste modo, acredito que as dificuldades inerentes à presença dos pais na

Unidade de Terapia Intensiva Neonatal do Hospital Materno Infantil Presidente Vargas,

mencionadas no decorrer dos encontros, podem ser sublimadas diante da percepção das

auxiliares acerca da necessidade de incentivá-los a cuidarem de seus filhos.

No entanto, tenho consciência de que existe um outro grupo de profissionais,

não participante da pesquisa, que não compartilha as mesmas idéias. Da mesma forma,

reconheço que, mesmo entre o grupo do estudo foi possível verificar, de maneira ora

velada, ora explícita, percepções e atitudes diferentes ou mesmo opostas.

Por isso, reitero a necessidade de analisar o impacto e a interferência das

propostas de humanização nos cenários de cuidado e nas atitudes dos auxiliares de

enfermagem, bem como dos demais profissionais que atuam no intensivismo neonatal.

Acredito que o fato de tais propostas serem idealizadas em espaços distintos

daqueles onde acontece, efetivamente, o cuidado, possa fazer com que as mesmas nem

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116

sempre estejam adequadas a todos os contextos e ambientes, o que pode favorecer a

resistência de alguns profissionais diante das mudanças necessárias.

Sendo assim, talvez o estímulo (ou a permissão) à participação dos profissionais,

ainda na fase de estudo da viabilidade das propostas, tornasse mais suave (e também

mais viável) o processo de implantação prática. Acredito que, ao conhecer a

possibilidade de mudanças em seu cotidiano de trabalho e, em um estágio mais

avançado, reconhecer sua necessidade, o auxiliar de enfermagem terá consciência de

seu espaço profissional e da importância de sua função para a instituição a qual

pertence.

Da mesma forma, convém observar as condutas adotadas por alguns enfermeiros

que, na condição de chefes da equipe de enfermagem, não priorizam o cuidado

humanizado exigindo dos auxiliares o cumprimento de tarefas de forma única e em

tempos e prazos inflexíveis e predeterminados. Entendo que tais posturas ou condutas

podem gerar, na equipe de trabalho, dúvidas a respeito das atitudes a serem tomadas

diante de situações como a divisão de cuidados com os pais dos bebês; além de

contraporem-se às propostas de humanização adotadas pela instituição.

Diante destas contradições torna-se mais facilmente compreensível a

manifestação de uma das auxiliares do grupo descrevendo-se como “bolinha”. Observo

que, se, por um lado, a afirmação foi trazida ao grupo com o intuito de descrever a

percepção da auxiliar em relação à sua condição na equipe de trabalho, por outro, serve

para instigar uma nova reflexão: até que ponto as auxiliares de enfermagem de

determinada Unidade de Terapia Intensiva Neonatal encontram-se ou percebem-se

envolvidas com suas atividades e seu ambiente de trabalho? São elas “bolinhas”

simplesmente lançadas de um lado a outro ao sabor das circunstâncias (ou das chefias)

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117

ou, são “bolinhas” conscientes de sua importância na interface entre equipes, bebês e

famílias? Porém, acredito que para alcançar as respostas a tais questões seja necessária

uma nova pesquisa, versando, especialmente, sobre a autopercepção destes profissionais

em seus contextos específicos.

Enfocando ainda as propostas de humanização do cuidado, questiono a

concessão e manutenção do título de Hospital Amigo da Criança a instituições que

apresentam obstáculos à presença e/ou permanência dos pais, seja pelas dificuldades na

obtenção de informações e a falta de infra-estrutura seja pelo despreparo dos

profissionais para atender às famílias.

Assim, além de apresentar respostas, ao final desta pesquisa, acrescento novas

questões em torno do mesmo tema. No entanto, por terem sido decorrentes da

diversidade de idéias proveniente da utilização do Grupo Focal, acredito que

dificilmente tais questões poderiam ter sido concebidas com tanta autenticidade.

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ANEXO A

PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA DO HOSPITAL MATERNO-INFANTIL

PRESIDENTE VARGAS

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124

APÊNDICE A

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Como aluna do Curso de Mestrado em Enfermagem da Universidade Federal do

Rio Grande do Sul – UFRGS, estou realizando um estudo sobre a percepção do auxiliar

de enfermagem a respeito da presença dos pais de recém-nascidos internados em

Unidade de Tratamento Intensivo Neonatal (UTIN).

Para tanto, solicito sua colaboração, participando das sessões de Grupo Focal

onde serão discutidos assuntos referentes ao tema da pesquisa.

As sessões grupais serão realizadas nas dependências do Hospital onde o(a)

senhor(a) trabalha e os horários serão estabelecidos pelo grupo.

As informações serão coletadas durante as sessões grupais através de gravação

em fitas cassete, para a qual solicito sua autorização. As fitas gravadas serão destruídas

após cinco anos da realização da pesquisa.

Asseguro que seu nome não será divulgado, podendo o(a) senhor(a) desistir de

participar do grupo a qualquer momento de sua realização, e garanto a utilização do

material gravado somente para fins de pesquisa.

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125

Coloco-me à disposição, juntamente com a orientadora deste estudo, Prof. Dra.

Ana Lúcia de Lourenzi Bonilha, para o esclarecimento de eventuais dúvidas, através dos

telefones 3340 0273 , 9947 1023 e 3316 5428.

Informo ainda o endereço e telefone da Comissão de Ética e Pesquisa do

Hospital Materno Infantil Presidente Vargas que aprovou o projeto desta pesquisa – Av

Independência, 661 – 8 andar – Bloco C - Fone 3287 7358.

Agradeço sua colaboração.

Kátia Lopes Inácio – COREN 67800

Endereço: Rua Lasar Segall, 315/401 - Lindóia

Porto Alegre – RS CEP 91060 530

Eu...................................................................................................................declaro estar

ciente da finalidade e condições de realização desta pesquisa e concordo em participar

espontaneamente do grupo.

....................................................................................

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