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Somente grandes propósitosdespertam grandes energias

Nelson Mandela

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Este livro é dedicado a,xx

José Maria Nunes

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título: JOSÉ MARIA NUNESA história de um verdadeiro campeão no esporte e na vida

registro ISBN: 978 85 67657 028texto: Ênio Padilha

ilustrações: Imagens identificadasapresentação: xxx

prefácio: xxxprodução executiva: xxx

capa: xxximagem na capa: xxx

foto na 4ª capa: xxxprojeto gráfico: xxx

revisão gramatical e ortográfica: Bernadete Zuccodiagramação: Márcio Shalinski

revisão editorial: xxxrevisão de provas: Ênio Padilha

fotolitos, impressãoe acabamentos: Gráfica e Editora Pallotti© Copyright e direitos

autorais reservadosna forma da lei para: OitoNoveTrês Editora

www.oitonovetres.com.br

Catalogação na fontePadilha, Ênio, 1958 –

A história de José Maria Nunes, um campeão no esporte e na vida - Ênio Padilha, Balneário Camboriú-SC, 2015. 288p.:il.

Inclui Bibliografia1. Biografia.

I. TítuloCDU: 658-8

Direitos Reservados — Impresso no Brasil — Printed in Brazil

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“Engana-se quem pensa que a história de José Maria Nunes é apenas uma história sobre atletismo. Ele tem uma história muito grande, com fatos importantes, antes de chegar ao atletismo, em 1968. E tem uma história igualmente grande e importante depois de ter deixado o atletismo, em 1989. O atletismo, na verdade, ocupa cerca de 20 anos da sua história. Os outros 45 anos são, para a maioria das pessoas, uma história desconhecida.”

Ênio PadilhaEngenheiro, Professor e autor de livros

Atleta (1976 - 1983)

“José Maria Nunes é um exemplo de vida. Saiu do interior do estado, da roça, para triunfar na capital do estado. Tornou-se conhecido em todo o estado e no Brasil. Mudou a vida de muita gente, inclusive de todos os seus irmãos, aos quais possibilitou acesso aos estudos, mudando completamente o destino deles. Como todo ser humano tinha defeitos, porém suas virtudes superaram em muito os seu defeitos. Tenho por ele muito respeito e um carinho todo especial.”

Otmar Lothar WelshProfessor de Educação Física

Atleta (1977 a 1992) e treinador de atletismo (1981 a 2005)

“Acho que José Maria Nunes foi quem iniciou o processo de valorização do atleta em Santa Catarina. Brigou muito para que o atleta tivesse o mínimo de ajuda. Além de ter sido, na nossa época, o atleta que mais divulgou o nome do nosso estado no Brasil pois estava entre os três principais corredores no Brasil.José Maria Nunes no meu entendimento foi quem revolucionou o atletismo. E poucos sabem do sofrimento e da luta que o Zé teve de enfrentar para chegar onde chegou.”

Paulo Cezar ZimmerProfessor de Educação Física

Atleta (1969 a 1989)

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“Zé Maria teve uma grande influência para que novos atletas de Santa Catarina seguissem a prática das corridas deixando um grande legado de atletas (fundistas) para Santa Catarina.”

José dos SantosProfessor de Educação Física

Atleta (1971 a 1977) e treinador de atletismo (1975 a 1986)

“José Maria Nunes, como atleta, foi excepcional, completamente acima da média. Como treinador fez um excelente trabalho, mas também cometeu grandes equívocos. Como pessoa, nunca me fez mal. Nunca nos entendemos muito bem, por circunstâncias da vida. Mas é uma pessoa que eu respeito e admiro. Merece minhas homenagens.

Deraldo OppaProfessor de Educação Física

Dirigente da FCAt e da Fesporte (1979 até os dias atuais)

“A caracteristica mais relevante do Professor Nunes é o fato de ele, ao longo do tempo ter desenvolvido múltiplas habilidades: atleta excepcional, treinador muito bem sucedido, professor em escolas técnicas, gestor na educação e agora, terapêuta com ótimos resultados. Duas qualidades que ele certamente trouxe da sua experiência como atleta são a disciplina e a persever-ança. Essas qualidades são muito importantes para qualquer atividade, na vida de qualquer pessoa.”

Décio SilvaEngenheiro Mecânico, Administrador e Empresário

Presidente do Conselho de Administração da WEG SA

“Quando eu tinha 12 anos, meu pai faleceu e desde que fui morar com o Nunes em Florianópolis (e depois em Jaraguá do Sul), sentia por ele como se fosse um pai presente, que me ensinou um caminho de honestidade, sinceridade, humildade, vontade de vencer e de fazer o

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melhor pelo próximo, assim como ele me ajudou. De amigo e treinador, somos hoje compadres (ele é padrinho de batismo do meu primeiro filho, Pedro Henrique). Agradeço a ele, pelo que tenho e pelo que eu sou”

João LaurindoProfessor de Educação Física e Agente de Polícia Civil

Ex-atleta

“O maior legado do Nunes foi dar uma seriedade ao atletismo de Santa Catarina. Uma certa profissionalização. O principal defeito dele era a ingenuidade. Era bom demais. Tinha coração demais. É um grande amigo, companheiro nos bons e nos maus momentos. Mais do que treinamento, ele me deu um caminho, uma orientação. E me deu conselhos preciosos que eu me orgulho de ter seguido.”

Evaldo Rosa da SilvaProfessor de Educação Física

Treinador de Atletismo Ex-atleta olímpico

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1946Em 1946 o presidente do Brasil era o General Eurico Gaspar Dutra. Ele tinha sido ministro da guerra no governo de Getulio Vargas. Era o primeiro presidente da chamada Segunda República. Em Santa Catarina, não havia governador. O estado era comandado por um interventor federal, Udo Deeke. E na pequena cidade de Campos Novos, no interior de Santa Catarina, o prefeito, no final de um mandato de 10 anos, era Gasparino Zorzi.A região do meio oeste de Santa Catarina, um lugar de morros ondulados colonizadas por imigrantes italianos, alemães, austríacos e japoneses, era, naquela época, um lugar bem difícil de se viver. As estradas eram muito precárias e quase ninguém tinha energia elétrica em casa, especialmente os que moravam nas regiões agrícolas, onde a grande estrela era o rio Canoas. Este rio, com seus 570 km, nasce entre a Serra da Anta Gorda e a Serra da Boa Vista e corre para o oeste, banhando os municípios de Urubici, Rio Rufino, Otacílio Costa, Correia Pinto, Ponte Alta, São José do Cerrito, Abdon Batista (um pouco antes do qual recebe as águas de seu afluente, o rio Caveiras), Anita Garibaldi e Celso Ramos (onde recebe as águas do rio Inferno Grande). Depois de passar pelo município de Celso Ramos, o Rio Canoas deságua no rio Pelotas e forma o rio Uruguai.Numa das curvas do Canoas situava-se a localidade conhecida, na época, como Serraria Santos Almeida. Pois foi nessa localidade (Serraria Santos Almeida) e alheia a toda a conjuntura descrita acima, que Reasilva conheceu João Maria.Reasilva tinha 19 anos. Nascera por ali mesmo, na localidade de Espinilho, um distrito de Campos Novos.

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Era uma cabocla bonita, recatada, filha de João Cordeiro Matoso dos Santos. Na verdade, era uma das muitas filhas e filhos de João Cordeiro. Ele casou-se com Belina Fagundes, no Rio da Varzea. Depois casou-se com Patrocina dos Santos (mãe de Reasilva). Mas teve mais cinco ou seis mulheres e cerca de 25 filhos, a maioria com amantes. Havia uma lenda de que João Cordeiro tinha um anel, com uma pedra mágica: "uma pedra de cevar mulher"1. Por causa do anel as mulheres eram atraídas para ele. Bobagem! O que ele tinha, certamente, era uma boa conversa e muito, muito dinheiro. Ele tinha muitas terras (era um latifundiário), tinha fazendas de criação de animais era rico (considerado um Coronel).Ele não tinha tantos filhos apenas porque gostava de tê-los. Gostava, isso sim, de fazê-los. Uma vez feitos, não se importava mais com eles. Sua relação com os filhos ia da indiferença a violência (o que era muito comum na época e, principalmente, naquela região, onde as trincheiras da Guerra do Contestado ainda soltavam fumaças.Reasilva nunca estudou. Quando tinha três anos o pai deu a filha para uma mulher, supostamente uma amante2. Esta mulher, uma tal de Angélica, não queria ter recebido essa missão, mas teve de obedecer. E tirava o descontentamento na criança. Assim, Reasilva sofria violência doméstica por parte do pai, que era muito violento, e da madrasta. Vivia apanhando por qualquer motivo. Como praticamente todas as crianças da redondeza, não recebia roupas nem cuidados. Quando chegou na adolescencia, Reasilva só queria uma coisa: fugir daquela vida.João Maria Nunes tinha 20 anos. Filho de João Francisco Nunes (um negro com feições africanas muito bem

1 A tal “pedra de cevar mulher” era uma crendice antiga existente em várias regiões. Um pequeno pedaço de metal que, diziam, dava ao seu proprietário o poder da conquista. A tal pedra (que nada mais era que um pedaço de imã) necessitava ser alimentada com limalha de ferro ou minúsculos pedaços de agulhas para não perder o poder. E havia homens que pagavam muito caro para ter uma dessas. Geralmente homens muito ricos. Por isso a pedra sempre funcionava.

2 O leitor não se assuste. Isso não era incomum na época e na região.9

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definidas, neto de escravos) e de Maria Palmira da Trindade. Seu nome (João Maria) era uma homenagem ao monje, fanático religioso, que liderara rebeldes na sangrenta Guerra do Contestado3 que ocorrera naquela região não fazia muito tempo.João Maria era um homem forte, trabalhador e honesto. Um gigante, na foice, na enxada, no arado, em qualquer lida da roça. Nunca estudou. Viveu e morreu completamente analfabeto, mas sabia fazer contas, conseguia fazer cálculos e se virava como podia nos negócios. João Francisco era um homem muito austero e violento com os filhos. Por esta razão o João Maria, aos 11 anos, fugiu para a fazenda Stefanes, em Campos Novos. Próximo aos rios Inferninho e Inferno Grande. Na época os fazendeiros recebiam essas crianças fugitivas de olho na mão de obra gratuita que teriam. E João Maria ficou, dos 11 até os 22 anos nessa fazenda.Reasilva era amiga das filhas da família Estefanes. Por isso, eventualmente, dormia na casa delas. E foi assim que conheceu João Maria. Achava ele meio “chucro”. Mas era bonitão. E ela queria muito casar e fugir daquela vida.Por isso, um dia, tomou coragem. Quando ele entrou na cozinha, em busca de uma jarra de água, ela pegou na mão dele e foi bem direta:”eu quero me casar contigo”. Ele saiu correndo! (ela tinha razão em dizer que ele era “chucro”).Mas depois se acertaram. Três meses depois já estavam casados. O casamento ocorreu em Ponte Canoas4, um distrito de Campos Novos. E foram morar numa casa doada pelo pai de Reasilva. Esta casinha ficava perto do Rio da Vargem, Campos Novos.

3 A Guerra do Contestado foi um conflito armado entre a população civil e o Exército entre 1912 e 1916, na qual estava em disputa (entre o Paraná e Santa Catarina) uma região rica em erva-mate e madeira. Aconteceram inúmeras batalhas e mais de 8 mil mortos, feridos e desaparecidos.

4 A igreja onde foi realizado o casamento não existe mais.10

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Não ficaram muito tempo. João Maria não se entendia bem com o sogro. O pai de Reasilva, ofereceu a João Maria algumas terras para que eles fizessem a vida. Mas teria de ser “no nome da Reasilva”. João Maria não aceitou. Anos mais tarde Reasilva diria que “não aceitou porque era cabeçudo". Disse que não precisava da ajuda de ninguém.Foram, então, morar num paiol dos Estefanes e, dali pra frente passaram a ser praticamente nômades, trabalhando de fazenda em fazenda, sempre como peão agregado, no regime de meiero5. Fizeram dezenas de mudanças. Voltavam, muitas vezes, para lugares onde já haviam morado antes. As mudanças eram feitas em carroças, puxadas por uma mula. Uma carroça para “as tranqueiras” e outra para os filhos.O primeiro filho veio logo no ano seguinte ao casamento. Aliás, filha: Maria da Luz nasceu no dia 15 de maio de 1947. Era uma criança linda e, como o próprio nome indicava, veio iluminar a casa.Logo Maria da Luz ganharia muitos irmãos. A família de João Maria e Reasilva estava apenas começando.

5 Meiero é o agricultor que planta em terra alheia e divide os resultados com o dono11

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1949Dois anos depois de casados nasceu o segundo filho do casal. Um filho homem! João Maria resolveu dar a ele o nome de um dos monjes do Contestado6: “o menino vai se chamar José Maria”, disse ele aos amigos, todo feliz, no armazém do Espinilho, enquanto bebia um gole de uma cachaça comemorativa.O menino logo virou o Zeca. Era uma criança normal, exceto pelo fato de que não engatinhava. Ficava parado no lugar onde era deixado. Não saia do lugar. Num belo dia, um pouco antes de completar um ano de idade, simplesmente levantou-se e começou a andar. Andava meio atrapalhado, segurando-se nos móveis, caindo algumas vezes… mas não engatinhava. Zeca pulou uma etapa e foi direto pra fase seguinte: andar, de pé.A lembrança mais antiga que está registrada na mente de José Maria foi um fato ocorrido quando ele tinha um pouco menos de dois anos. A família morava em uma casa de chão batido. A mãe trouxe, do campo, alguns ramos de um arbusto chamado de vassoura de mato. Ia fazer uma vassoura. Largou o fardo num canto para cuidar daquilo mais tarde. Curioso, Zequinha foi ver o que era. Do meio do feixe de vassouras saiu uma lagarta escura, conhecida na região como bicha cabeluda. Ele não teve dúvidas: pegou o bicho, com a mão, esmagou... e comeu. Ou melhor: tentou comer. Assim que colocou o bicho na boca, as toxinas liberadas pelo animal começaram seu efeito devastador. Foi uma queimadura terrível! Foi um desespero total de todos na casa. Achavam que o menino iria morrer envenenado.Zeca sempre lembrou deste fato, mas só até o momento em que pôs o bicho na boca e começou a 6 José Maria de Santo Agostinho

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sofrer a queimadura. Daí pra frente a história é contada por sua mãe. Ela conta que, na verdade, conseguiu ver a bicha cabeluda preta na mão do pequeno. Mas correu e chegou à tempo de tirar o bicho antes de ele morder. “O danado já estava abrindo a boca para comer”. Ela tirou o bicho e passou álcool na mão e na boca do menino. Deve ter ardido muito. Talvez, por isso ele tem a memória de que colocou o bicho na boca.Numa outra ocasião, conta Reasilva, uma cobra jararaca pulou de um monte de palha de milho. Zeca tinha cinco ou seis anos, mas enfrentou a cobra, com um pedaço de madeira e acabou matando a danada.A essas alturas (por volta de 1955) João Maria, Reasilva e os filhos já estavam morando nas terras de Júlia Baratieri. A propriedade ficava em uma localidade de Costa de Canoas, no município de Abdon Batista, Meio Oeste de Santa Catarina. João Maria não era mais agregado. Era arrendatário. Dava a terça parte de tudo o que produzia (fumo, milho, arroz, trigo). Zequinha e Maria já tinham outros três irmãozinhos: Sebastião, que nascera em 1951, Helena, em 1953 e Antônio, em 1955.Como era comum, na época, depois de 5 ou seis anos, as crianças já eram aproveitadas nos serviços da roça, ajudando a limpar, carregar os sacos com sementes. Na fazenda da dona Júlia havia a plantação de milho e também os animais: cabras, galinhas, porcos. João Maria fazia canecas com latas de óleo vegetal e cada filho podia tirar o leite de uma cabra para si próprio. Algumas vezes, desajeitados, não amarravam direito as pernas da cabra… o resultado e a choradeira já se pode imaginar.Em outros lugares onde moraram, nem sempre havia conforto ou comida à vontade. Muitas vezes moravam em um paiol, dividindo espaço com animais, dormindo em camas improvisadas com montes de espigas de milho, cobrindo-se com cobertores velhos. Nesses tempos a comida era controlada, Menos na época do

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pinhão. Aí era uma festa. Todo mundo engordava de tanto comer pinhão.João Maria gostava de pescar no rio Canoas. Não tinha equipamento especial, apenas um toquinho de rede, uns caniços feitos de bambu e um espinhel improvisado, com 15 anzóis. O Rio Canoas era generoso. Certa vez (conta Sebastião) João Maria colocou o espinhel na água e amarrou na beirada. Não se deu conta de que um dos anzóis ficou fora dágua, no barranco. Quando foi retirar tinha 14 peixes e uma saracura7.Noutra ocasião, quando tinha seis ou sete anos, Zeca foi pescar com o pai. Geralmente pescavam Mandi, Cará, Jundiá, Cascudo, Traíra… o rio oferecia um cardápio bem variado. Foram com um bote de madeira, tipo bateira. Quando chegaram no local, João Maria apoitou8 o barco com uma pedra grande, numa profundidade de uns 5 metros. Começaram a pescar, mas começou a entrar água no bote e João Maria mandou Zeca esgotar o barco com uma caneca. Fizeram um movimento para inclinar o barco, facilitando para retirar água. O barco inclinou demais e Zeca caiu na água. Não sabia nadar. Nem João Maria. Foi um momento de desespero, mas, num gesto automático, João Maria esticou o braço dentro dágua e agarrou Zeca pelos cabelos trazendo-o para cima.João Maria olhou para o céu e agradeceu. Parecia ser um milagre.O Rio Canoas era, no geral, um aliado dos Nunes. Quando dava enchentes, João Maria pegava os filhos e ia fazer espera nos remansos, espaços formados nas margens cheias do rio, onde não havia correnteza e onde, geralmente, as coisas trazidas pelas águas faziam paradas. Vinham móveis, armários, roupas, porcos (João Maria recolhia os porcos para fazer sabão).

7 Ok… pode ser uma mentirinha de pescador. Mas Tião jura que é verdade.8 parar o barco no meio do rio, com poita - um peso metálico com funções semelhantes a uma

âncora.14

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Numa outra ocasião houve um episódio envolvendo um dos dois bois utilizados na junta para o arado da fazenda. Mimoso era um boi do tipo Zebu, Gaúcho era um boi normal, mas grande e um pouco mais chucro.Depois do trabalho João Maria dava folha de palmeira para os bois comerem e depois eles eram soltos. João Maria mandou Zeca soltar os bois. Zeca foi com uma vara cutucando os bois, mas Gaúcho aparentemente ainda não tinha acabado o jantar e não gostou de ser convidado a se retirar da mesa. Foi pra cima de Zeca, chifrando. Zeca caiu. O boi caiu também, em cima de Zeca. João Maria gelou de susto. O boi ali, quieto, sem se mexer. Por um segundo, João Maria não sabia o que fazer. depois deu um grito, os cachorros pularam no boi e Gaúcho levantou-se. Zeca também, são e salvo. João Maria agradeceu mais uma vez aos céus. Parecia que o filho era um protegido dos deuses.Quando fez sete anos Zeca entrou na escola. Estudava em uma escola isolada que ficava a uns quatro quilômetros de onde morava. Ficou um ano. Mas não completou a primeira série, por causa das frequentes mudanças da família.Três anos depois, em 1958, voltou a frequentar a escola numa localidade chamada Espinilho, município de Campos Novos, cuja professora era dona Maria Noêmia Mesterlin. Numa escola da vila Zeca completou o primeiro ano do primário e fez o segundo. Chegou a frequentar o terceiro, mas não completou. Enquanto cresciam Maria, Zeca, Tião, Helena, e Tonho ganhavam mais irmãos e irmãs: João Francisco nasceu em 1957, Júlio em 1960, Pedro em 1961 e Sérgio em 1963.Em 1961 João Maria foi trabalhar como foguista numa Serraria (Serraria Weiss), que ficava no município de Campos Novos. Ele também cuidava de um Moinho, onde despachava produtos e fazia compras e vendas.Nessa ocasião João Maria conheceu um rapaz, que era genro de Leda Weiss, dona da Serraria. Osvaldo Simi

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(Vadinho) era um descendente de italianos, tinha alguma escolaridade, tinha completado o científico e tinha sido goleiro no Comercial de Joaçaba e do Flamengo de Caxias do Sul9, no Rio Grande do Sul. João Maria e Osvaldo tornaram-se amigos. Tomavam cachaça juntos. E bebiam descontroladamente. Eles sentavam pra conversar e beber. João Maria mandava Zeca ou Tião ir de bicicleta até a venda, que ficava a uns três quilômetros de distância, buscar dois ou três litros de cachaça para eles.Geralmente bebiam dois litros de cachaça, num sábado à tarde. João Maria entrou no alcoolismo, problema do qual somente se livrou muitos anos depois (por volta de 1977).Quando se casaram, João Maria já bebia. Mas Reasilva não sabia. Descobriu depois do casamento. Não foi uma coisa fácil de lidar, mas ela foi acostumando. Naquele período (início dos anos 1960) não havia miséria para a família. João Maria tinha salário. Havia o armazém, ele ainda trabalhava no moinho e, portanto, não faltava a farinha de milho, o feijão e o arroz. E ainda era possível criar uns porcos, galinhas e outros animais de corte.Nessa época, como a escola ficava longe, algumas vezes Zeca saia atrasado de casa e ia correndo. Dava uns seis quilômetros. Chegava tranquilo. Gostava de correr. Muitas vezes, na volta pra casa, também vinha correndo. E chegava muito à frente dos irmãos. Era divertido.Um dia, Vadinho falou para João Maria que o pai dele tinha uma fazenda em Catanduva e que precisava de um peão. Um guri pra cuidar dos bichos e plantar umas coisas. Ficar com eles lá na fazenda. Dava comida e casa pra morar. “Tava pensando nesse teu mais velho, o Zeca”.João Maria confiava plenamente em Vadinho. Eram amigos de verdade. Avaliou que Zeca estaria em boas 9 Fundado em 1935, hoje Sociedade Esportiva e Recreativa Caxias

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mãos. Conversaram um pouco mais e a doação foi feita. Zeca iria, na semana seguinte, para a Fazenda de Sílvio Simi, em Catanduvas. Esse tipo de “doação” era muito comum em famílias numerosas e pobres. Os pais queriam o melhor para os filhos e queriam ter certeza de que não lhes faltaria comida, roupa e um lugar para viver. João Maria acreditava que seu filho estava indo ficar com uma pessoa boa e que teria trabalho para garantir a vida.Zeca tinha, na época, 13 anos.

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1963Silvio Simi era um filho de italianos, tinha quase dois metros. Era um sujeito de poucas palavras e não tratava Zeca como “um filho adotivo”. Era, na verdade, uma relação que, por qualquer parâmetro dos nossos dias seria considerado como trabalho escravo. Zeca ganhava roupas já usadas, e tinha apenas uma muda de roupa melhorzinha, pra ir na vila Vera Cruz (que ficava a uns três quilômetros da sede da fazenda) aos domingos, uma vez por mês.Do Espinilho até Catanduvas é uma viagem de 85 km. Uma distância absurdamente grande para a época. Para se ter uma idéia, nos cinco anos que ficou em Catanduvas, Zeca foi em casa apenas duas vezes. Perdeu totalmente o vínculo com a família. Nasceram irmãos que ele não conhecia.Por volta de 1965 João Maria mandou outro filho, Tião, quatro anos mais novo que Zeca para morar nessa fazenda com Zeca. Tião era um adolescente inconformado (vejam só!). Já tinha tentado fugir de casa uma vez, aos 12 anos, mas o patrão de João Maria, comovido pelo desespero do pai, mandou um empregado atrás dele. Alcançou Tião na rodoviária de Campos Novos. Iria pegar um ônibus, sabe-se lá para onde. Antes, o homem da serraria foi na delegacia e levou com ele um soldado da polícia. Tião, ficou petrificado de medo, claro. E a coisa piorou, porque o delegado, com a maior cara de mau disse que “da próxima vez vou te cobrir de borracha! Quero ver você fugir de novo com as costas bem lanhadas.”Tião voltou pra casa e resolveu que fugir não era uma boa ideia. Pelo menos por enquanto. No ano seguinte foi enviado para a fazenda de Catanduva, com o irmão Zeca.

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Zeca e Tião entenderam-se, por um tempo. Mas tinham temperamentos diferentes (e eram, ambos, adolescentes). Tinham brigas típicas de irmãos, pois Tião não aceitava a autoridade que Zeca achava que tinha. Mesmo assim, Tião ficou um pouco mais de um ano na fazenda. Depois voltou pra casa.O trabalho na fazenda, na verdade, era em regime de escravidão. Não era permitido frequentar escola, não havia nenhum pagamento pelo trabalho, além de uma cama pra dormir e comida para se alimentar. Zeca não ganhava roupas para o trabalho nem calçados. Vivia descalço.Zeca fazia a limpeza da lavoura, com a capinadeira, puxada por um burro. Preparava a terra para a plantação, com um arado (também puxado pelo mesmo burro). Havia um trator que vinha no tempo certo e gradeava e arava a terra. Aí entrava Zeca e o burro para a plantação. A plantação de grama (capim para servir de alimento aos bois e vacas) era terceirizada, mas Zeca tinha de ajudar nesse trabalho também. Também era terceirizado o trabalho de fazer as cercas. A fazenda chegou a ter 800 cabeças de gado. Tinha também porcos, galinhas.Zeca aprendeu a dirigir trator, na marra. Fazia transporte de porcos para Concórdia. Quinze ou vinte porcos, numa Kombi, dirigida pelo próprio Sílvio. Em algumas viagens, quando havia muita chuva, a estrada ficava praticamente intransitável. Era preciso colocar correntes nos pneus da Kombi para seguir viagem.Silvio ficava muito pouco na fazenda. Permanecia quase o tempo todo em Joaçaba. Zeca passou a ficar praticamente sozinho na fazenda, cuidando de tudo. Mais tarde, em 1965 Sílvio adquiriu outras terras que emendou às já existente e sua fazenda encostou na Vila de Vera Cruz, onde já havia energia elétrica. Mudou então a sede da fazenda para lá: a granja dos porcos, a mangueira, o curral e a casa do caseiro.

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Nos primeiros dois anos Zeca só podia ir à Vila de Vera Cruz jogar bola, uma vez por mês. Era liberado da uma da tarde até as cinco da tarde. E tinha de ir e voltar à pé — uns três quilômetros.Até os 16 anos Zeca nunca fazia exigências nem reinvindicava direitos ao patrão, Sílvio. Tinha medo de desobedecer ao pai. Isso seria muito grave. Com certeza iria apanhar do pai. Naquele tempo e naquela região, a obediência ao pai até os dezoito anos era uma coisa sagrada.Vera Cruz, em Catanduvas, era uma região de italianos. O terço, que era rezado todas as semanas e a missa que era realizada a cada três meses, era tudo em italiano.Zeca jogava bola no Flamengo de Vera Cruz. Já tinha subido do time dos aspirantes para o time dos titulares. E era chamado de Pelé, pois era o único negro no grupo (e o rei Pelé já era um fenômeno de popularidade, naquela época). Zeca liderava a meninada nos jogos e era escalado no time principal, apesar da pouca idade.Os italianos, a maioria gremista, diziam que Zeca deveria torcer pelo Internacional, que era um time de pretos (na verdade, na época, o único time de Porto Alegre que aceitava negros em sua equipe).

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1964Os primeiros meses de 1964 foram muito agitados no Brasil. Zeca não entendia muito bem o que estava acontecendo, mas via muita movimentação. Até aviões, coisa raríssima, ele viu passar no céu da fazenda em Catanduva.Silvio Simi estava ligado. O governo do Brasil estava mudando, de forma dramática. Os militares do Exército estavam tomando conta de tudo. Ele tinha ouvido falar em tropas se deslocando e imaginou que toda aquela movimentação e barbárie do tempo da Guerra do Contestado iria acontecer novamente.Foi aí que, numa conversa na vendinha, alguém perguntou se ele tinha a documentação do guri que tava morando com eles lá na fazenda. Não. Não tinha. Zeca não tinha nenhum documento. Nada que pudesse provar quem ele era, onde tinha nascido, de quem era filho… Se o Exército fizesse uma batida seria um problema. Silvio Simi sabia que aquilo era uma coisa importante e mandou Zeca pra casa dos pais para providenciar o documento. Foi só então, com 15 anos completados, que José Maria Nunes ganhou um registro civil10 no Cartório do Distrito de Espinilho

10 Registro de Nascimento número 4.302 do Cartório do Distrito de Espinilho, feito em 18 de julho de 1964.

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1966No final de 1965 e início de 1966, Zeca ouvia muita coisa no rádio, além das notícias sobre os times de futebol do Rio de Janeiro e sobre o Flamengo, que havia sido campeão carioca no ano anterior. Ouvia, também, que o Exército tinha tomado conta do país por causa dos políticos em Brasília e no Rio de Janeiro que estavam brigando demais. Ele não entendia direito aquela coisa. Esse zumzumzum já tinha mais de um ano e não se resolvia. No fim do ano anterior foram criados dois partidos políticos, Arena e MDB. O seu Simi, dono da fazenda estava todo empolgado. Às vezes, quando iam até a vila de Vera Cruz, Zeca percebia que o assunto era o mais importante na rodada de cachaça do balcão da venda. Nas manhãs da fazenda seu primeiro compromisso era com Vicente Leporace11, um radialista paulista que fazia sucesso com o seu programa “O Trabuco”, um informativo que consistia na leitura diária das notícias veiculadas nos principais jornais do país, seguidas de comentários e críticas, geralmente exaltadas, sobre elas. Mas Zeca tinha outras prioridades, quando não estava lidando com galinhas porcos e bois. Nos domingos, Zeca ia para o futebol na vila. Jogava no Flamengo de Vera Cruz. Eventualmente havia a Matinê Domingueira. Nessas ocasiões Zeca, que era muito tímido, quase não dançava. Tinha muito medo de passar vergonha e ser rejeitado para uma dança.Numa dessas tardes de domingo, Zeca conheceu uma morena acaboclada e encantadora. Chamava-se Maria Costa. Era filha de uma família de trabalhadores da fábrica. Era linda, com sua pele acobreada e seus 11 Veja, no site www.josemarianunes.com.br um vídeo com um trecho do programa

“trabuco” de Vicente Leporace.22

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cabelos lisos e compridos. Zeca tinha 16 para 17 anos. Maria Costa devia ter um ano a mais. Zeca dançava, algumas vezes, com essa moça. gostava do seu jeito e da sua companhia. Mas quase não conversavam. Era assim que os namoros começavam, naquela época.Um dia, numa dessas danças, Zeca encheu-se de coragem e perguntou “Posso te levar em casa?”. A resposta veio rápida: “Não! Deus me livre. Meu pai me mata!”“Mas, por que?”“Ele não quer que eu arranje namorado. E ele é muito brabo”Zeca continuou com esperanças. Continuou tirando Maria Costa para dançar nas domingueiras. Até que, noutra ocasião, estava todo animado, pois o Flamengo de Vera Cruz tinha vencido o jogo e ele tinha feito um gol. Perguntou novamente: “Posso te levar em casa?”. A resposta veio rápida, como na vez anterior: “Pode, sim. Hoje pode.”O coração do rapaz disparou, parecia querer sair pela boca. Aquilo era um sonho se realizando. Era bom demais para ser verdade. Combinaram, então, como era de costume, que, quando ela saísse da domingueira ele a seguiria e eles se encontrariam uns 500 metros adiante. Dali ele a acompanharia até em casa. Ele sabia que era só acompanhar mesmo. Nem pegar na mão da moça era comum. Isso só acontecia com “namoro firme” ou noivado marcado.Quase no fim da domingueira, lá por 17h30, Maria Costa saiu do salão e dirigiu-se para a rua. Zeca, que estava atento, saiu logo em seguida. Chegou na rua e Maria estava uns cinquenta metros adiante. Zeca apertou o passo, Maria olhou para trás, ele já estava a uns trinta metros de alcançá-la. Aí aconteceu uma coisa inesperada: a moça começou a correr. Zeca não sabia o que fazer. Pensou em correr atrás dela, mas ela parecia decidida. Corria com a determinação de quem estava

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fugindo de alguma coisa ruim. Por fim, a moça escapou. Fugiu correndo!Zeca foi tomado de uma vergonha e de uma tristeza sem fim. Parecia que o mundo estava desabando sobre a sua cabeça. Não conseguia lidar com aquilo. Ficou ali, parado, feito pateta, por alguns minutos. Depois deu meia volta e caminhou até um armazem de secos e molhados (uma vendinha dessas muito comuns nas vilas da época). Pediu um litro de Cinzano, um vermute de origem italiana muito comum na época. É uma bebida perigosa, porque não tem cor, é meio adocicada e dá a impressão de que não vai deixar ninguém bêbado.A garrafa que Zeca comprou estava quente. E quem já tomou vermute faz ideia do que é isso! E, depois de meia garrafa de Cinzano ele pediu uma garrafa de cerveja. “Hoje eu quero esquecer desse mundo filhadaputa!”Desse ponto em diante o leitor pode fazer ideia da fiasqueira que foi. Zeca bebeu tudo. Chorou. Vomitou. Foi uma coisa horrorosa!Foi carregado por amigos para um quarto nos fundos. Acordou já era quase dez horas da noite. Tava sem camisa, só de calção. “Meu Deus, onde é que eu tô? O que aconteceu?”Apareceu a dona da venda e disse “Rapaz, você passou mal. Bebeu demais. Tava chorando e praguejando. O que é que houve?”Zeca estava muito envergonhado e triste. Não queria contar a história toda. Mas tinha a sensação de que todos já sabiam o que havia acontecido.Pagou a conta e foi embora, caminhando, na escuridão, para sua cama no seu quartinho da fazenda.Nunes e Maria Costa nunca mais se falaram. A razão da fuga desesperada da moça nunca foi esclarecida.

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Para o resto da vida Nunes nunca mais bebeu além da conta. Esse foi o único porre da vida. Um porre de Cinzano com cerveja!

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1967Com 16 anos, Zeca passou a reinvindicar algumas coisa como Calçados e roupas melhores. Ganhou uma bota de borracha, tipo Sete Léguas, Zeca se deu conta de que merecia ganhar um salário. Afinal, o pessoal que trabalha na fábrica de papel e celulose (Sebaldo Kunz), com quem Zeca jogava futebol nos domingos todos ganhavam salário. Os amigos do futebol queriam que ele fosse trabalhar na fábrica, que, na época, já contratava meninos, a partir de 14 anos. Não ganhou o salário pedido, mas ganhou a promessa de que ganharia uma parte da produção. No primeiro ano Zeca ganhou 10 sacas de milho.Zeca não estudava. Mas recebia revistas velhas (Manchete e Fatos&Fotos). Demorava um mês para ler cada uma, pois não tinha capacidade para ler.No rádio da fazenda escutava, todos os dias, A Voz do Brasil.A fazenda tinha apenas um cavalo de montaria. Quando Silvio Simi vinha para recolher o gado, para vacinação ou coisa assim, ele ia à cavalo, Zeca ia à pé, correndo, descalço. No início de 1967, quando Zeca estava fazendo 18 anos, Sílvio Simi começou a se dar conta de que era iminente a perda do seu peão (até então, praticamente um escravo). Ele fez, então, uma proposta interessante: se a produção de milho passasse de 1200 sacas, Zeca ganharia 100 sacas de milho. Era um dinheirão! Seria uma fortuna.Zeca se dedicou com mais diligência no trabalho. Não queria perder aquele “prêmio”. Trabalhou duro na plantação, enfrentou, como sempre, o tempo ruim, o calor escaldante do verão, os ventos terríveis do outono

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e o frio impiedoso do inverno daqueles campos. Mas a produção rendeu e, no fim das contas, a meta das 1200 sacas de milho foi atingida.Nesse ano Zeca se alistou no Exército, em Joaçaba. Era um sonho dele ir para o Exército, onde teria cama, comida, roupa e instrução. Por sorte ele não estava mais em Campos Novos. De lá, sabia-se, o Exército não aceitava ninguém, porque a região tinha a (má) fama de produzir jovens muito rebeldes e violentos (e que odiavam o Exército), certamente ainda uma herança dos conflitos da Guerra do Contestado, algumas décadas antes. Mas, quando chegou a data dos exames havia um obstáculo: um dente estragado. Era uma história antiga: aconteceu quando Zeca tinha uns 15 anos. Uma pequena cárie num dos dentes foi ignorada e cresceu. Virou o que se chamava de "uma panela". Doia muito. O canal estava exposto. E todo mundo dava sugestão de como resolver aquela dor horrível.Primeiro surgiram as sugestões mais comuns: fazer bochecho com cachaça (ou com álcool puro). Ele fez, mas não adiantou muito. Depois, pressionar o buraco no dente com uma cabeça de fósforo. Pingar esmalte de unha no dente (esta ele nem tentou. Não tinha esmalte em casa). Alguém mais corajoso sugeriu pingar óleo de bateria. Garantiu que já tinha feito e funcionou. Outro mandou enfiar alho no buraco no dente e até óleo de freio de caminhão. Zeca não fez nada disso. Optou por uma sugestão que surgiu de um dos amigos do futebol: usar creolina (um líquido desinfetante, composto de óleo de alcatrão mineral ou creosoto e outras substâncias antissépticas e germicidas)12. Era um remédio usado para matar os bichos que infectavam os animais. Tinha um cheiro terrível. Parecia ser uma coisa forte o bastante para atacar aquela dor de dente. E havia creolina em casa. Zeca pegou um palito com algodão

12 Nem é preciso dizer que os cirurgiões-dentistas não recomendam nenhuma das práticas citadas acima.

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numa ponta. Encharcou o algodão com creolina e enfiou no buraco do dente, pressionando bastante. Fez isso várias vezes.Matou o canal. Quase matou a si próprio. E quis amaldiçoar o sujeito que deu a ele a receita. A boca ficou toda infectada, cheia de feridas. Lembrou-se da bicha cabeluda que tentou comer quando tinha dois anos de idade.O dente ficou preto, mas a dor passou depois de alguns dias.O médico do Exército ficou impressionado. "você nunca sente dor no dente?”. "Não senhor. Nunca!"O dente estava preto porque ficou com o canal aberto. Mas não havia mais dor de dente (afinal de contas, o nervo -- e sabe-se lá o que mais -- havia morrido pelo ataque da creolina).Feitos os exames em Joaçaba, restava esperar pelo resultado. Zeca rezava todas as noites para que o resultado fosse positivo. Queria muito ir para o Exército.Num dia de Agosto, em 1967, Sílvio Simi trouxe a notícia de que Zeca foi selecionado e convocado para servir o Exército no ano seguinte, no Batalhão de Porto União. Zeca ficou muito feliz com a notícia. Pela primeira vez ele sentia uma esperança na vida. Uma luz no fim do túnel.Mas Sílvio não compartilhava daquela alegria. Ele perderia seu peão, seu faz-tudo. Ficou bravo e decidiu mandar o peão embora. Zeca achou aquilo muito estranho. Achava que não haveria nenhum problema em ficar na fazenda até dezembro, já que a ida para o Exército seria apenas em janeiro. Mas o patrão estava com cara de poucos amigos e sem muita conversa. Ele tinha de ir embora e pronto, tá acabado.Mas tinha a história das 100 sacas de milho que foram prometidas pelo patrão caso a meta de produção da fazenda (1200 sacas) fosse atingida naquele ano. Zeca tinha alcançado esse objetivo e tinha direito ao prêmio.

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Já tinha planos sobre o que fazer com o dinheiro. Ficou com a pulga atrás da orelha, desconfiando de que o patrão estivesse aprontando alguma coisa com aquela história de mandá-lo embora assim, sem mais nem menos.As sacas de milho eram “em palha”. O milho era estocado num paiol e era pesado em cestos grandes (carregados por dois homens). Despejado no caminhão. Para carregar as 100 sacas seriam necessários dois caminhões.Zeca tinha vendido as suas 100 sacas de milho para o moinho da Família Poier, de Jaborá. Eles viriam com os caminhões deles para buscar o milho vendido. No dia combinado para o carregamento o patrão apareceu. Não estava com boa cara. Zeca entrou em pânico. Um pânico misturado com raiva, diante da iminência de ver seu lucro do ano virar fumaça.Resolveu que iria matar o patrão se ele fizesse qualquer coisa nesse sentido. Havia uma arma na casa (pertencia ao patrão). Era uma Mauser 45 importada e ficava guardada num bau. Zeca foi até lá, pegou a arma e colocou na cinta, nas costas, coberta pela camisa. Estava consumido pelo ódio e preparado para o que desse e viesse. Era coisa muito comum, naquela região, que esse tipo de desavença fosse resolvido assim, no braço, na faca ou na bala.O carregamento seguia. As sacas de milho estavam sendo colocadas nos caminhões. O clima cada vez mais tenso.Quando 60 sacas já estavam carregados o patrão deu um grito: “para! Chegou! Não precisa mais carregar. Vai ser só 60 sacas de milho”. E, apontando para Zeca falou “ele não ficou o ano todo. Não tem razão para receber as 100 sacas de milho. 60 tá muito bom”.O sangue serrano de Zeca ferveu. O patrão estava de costas, a Mauser 45 escondida, debaixo da camisa, engatilhada… “vou matar esse filho da puta!”.

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Num momento de lucidez, a voz do pai, João Maria, fez Zeca recuar. Ouvira o pai dizer centenas de vezes, que “a honra de um homem é não matar e não roubar”. João Maria era um exemplo de honestidade e bom caráter. Não tocava no que não era seu. Isso era sagrado. Zeca lembrou que o pai contava de uma situação, tempos atrás, quando João Maria tinha dezenove pra vinte anos. Tinha feito um negócio com um certo fazendeiro que queria eliminar o seu capataz. O patrão chamou João Maria e outro peão e ofereceu um lote de terra para cada um, para fazer uma emboscada e matar o tal sujeito (isso era muito comum naquelas terras, naquele tempo). João Maria pensou bem e decidiu não fazer o serviço. Mas ficou marcado. Não poderia ficar por ali, como testemunha potencial. O Fazendeiro então deu a João Maria um pelego, um cavalo e a ordem para que desaparecesse daquelas terras. O outro peão, mais tarde, recebeu seu alqueire de terras. E, logo foi, ele próprio, vítima de uma emboscada e acabou morrendo também.Toda essa história passou pela cabeça de Zeca em um segundo. E ele desengatilhou a pistola. Cuspiu no chão e foi embora, com as sessenta sacas de milho, com a consciência tranquila e com uma vida inteira pela frente.

CONTANDO OS DIAS PARA IR SERVIR O EXÉRCITOZeca voltou para casa dos pais, que, a essas alturas moravam, novamente, nas terras de Júlia Baratieri. O pai, João Maria, havia sofrido um acidente na Serraria Weiss. Perdera quatro dedos da mão. Teve direito a uma indenização. Mas foi trapaceado pelo pessoal do INPS e acabou recebendo apenas uma parte do valor que deveria ter recebido. A situação não estava boa. O dinheiro que Zeca havia ganho com a venda das 60 sacas de milho ajudou a melhorar as coisas.Durante os cinco anos que passou na fazenda de Catanduva mais dois irmãos juntaram-se a Maria, Zeca, Tião, Helena, Tonho, João Francisco, Júlio, Pedro e

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Sérgio. Nesse período nasceram Algemiro, em 1965 e Neusa, em 1967.Agora eram em onze irmãos. Muitas bocas para serem alimentadas. Maria já trabalhava de doméstica em uma casa de Campos Novos. Zeca era o mais velho em casa. Tinha de ajudar como podia.Assim, Zeca passou os últimos meses do ano ajudando o pai na lavoura das terras, para garantir que, no ano seguinte, enquanto estivesse fora (no Exército), a colheita pudesse ser melhor.

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1968Zeca saiu de casa, em Campos Novos, no domingo, dia 7 de janeiro. Na segunda-feira teria de pegar o trem em Joaçaba, para Porto União. No domingo ficaria na casa de Leda Weiss (sogra do Vadinho) para não correr o risco de perder a viagem.Dona Leda era uma pessoa muito boa. Recebia muitas pessoas na sua casa em Joaçaba, que já era conhecida como uma espécie de “porto seguro” para muita gente. Quando chegou lá Zeca encontrou outros dois rapazes de outras regiões, que também pediram pouso para dona Leda. Todos eram acolhidos e bem tratados. No fim ela até preparou um frango com farofa para a viagem e fez um potinho com a comida para cada um deles. Na segunda-feira, cedo, os três foram para a estação.A Estrada de Ferro São Paulo - Rio Grande13 atravessava Santa Catarina na região meio oeste. Tinha sido projetada pelo engenheiro João Teixeira Soares14, em 1887. O traçado ligava Itararé (SP) e Santa Maria (RS), com 1.403 km de extensão o que permitiria a conexão, por ferrovia, do Rio de Janeiro à Argentina e ao Uruguai. O trecho que ligava Joaçaba e Porto União fora inaugurado em 1910. Coisa antiga mesmo. Mas muito bem conservada, como praticamente todas as estradas de ferro, na época.Quando o trem chegou, foi que Zeca se deu conta de que que estava participando de uma coisa grande. Praticamente todos os vagões do trem estavam lotados

13 Também conhecida como Ferrovia do Contestado.14 Conhecido no Brasil por construir estradas de ferro admiradas pela sua beleza e ousadia. Foi

o construtor da Estrada de Ferro do Corcovado, no Rio de Janeiro (considerado um "milagre da engenharia") e atuou com Antônio Rebouças na construção da Estrada de ferro Curitiba-Paranaguá aclamada mundialmente como uma das mais fantásticas obras de engenharia do mundo.

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de jovens com o mesmo destino: o Batalhão do Exército de Porto União. A viagem estava atrasada. A saída de Joaçaba estava prevista para onze da manhã, mas só ocorreu às três da tarde. Era pra chegar às seis da tarde em Porto União, chegou onze da noite.A chegada foi uma cena marcante para todos eles: foram recebidos, na estação, por filas de caminhões do Exército, soldados armados, gritos, ordens, chamadas… era um mundo novo que se descortinava. Aquela gritaria era uma novidade para Zeca, acostumado à solidão da fazenda em Catanduvas. Mas ia seguindo o fluxo e acompanhando o que faziam os outros jovens. Logo viu-se em um caminhão, com mais uns 40 rapazes seguindo em direção ao batalhão. Chegaram perto de meia-noite. Foram conduzidos para um salão cheio de mesas e bancos. Iriam receber um lanche antes de dormir.Os cansados rapazes mal fecharam os olhos e já estavam sendo acordados, aos gritos, pelos sargentos. Havia uma rotina de entrada para os soldados que precisava ser cumprida: corte de cabelo, exames médicos, testes de aptidão física e primeiras instruções.Todos ganharam roupas, calçados, escovas de dentes, sabonetes, e outras coisas necessárias à manutenção da higiene e saúde.E uma coisa nova estava acontecendo: Zeca deixava de ser apenas o Zeca. Agora era o Soldado Nunes. Uma nova vida começava para ele. Uma vida com lugar confortável para dormir, comida na mesa três vezes por dia, roupa novas, novos hábitos de higiene, como o banho de chuveiro e escovar os dentes todos os dias.Tomar banho de chuveiro era uma senhora novidade! Até então, Nunes tomava banho no rio ou em gamelas. E, obviamente, não era todo dia. Antes de dormir, o máximo era lavar os pés numa gamela de madeira ou bacia de alumínio toda amassada. Escovar os dentes… bom, a história da creolina dá uma boa ideia de como eram os cuidados com os dentes naquele fim de

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mundo, em Catanduvas. A primeira escova de dentes que Nunes teve na vida foi aquela que veio no kit do Exército: toalhas de banho, chinelo de dedo, botas, botinas, cuecas, meias, fardamento, roupas para os exercícios físicos…O 5º Batalhão de Engenharia de Combate Blindado estava naquele quartel, em Porto União, desde 1949 (uma coincidência com a data de nascimento do Soldado Nunes). Foi criado como 2º Batalhão de Engenharia, em 1908, mas a sua organização, no entanto, só ocorreu em 1913, quando seus efetivos ocuparam o edifício da antiga alfândega da cidade de Paranaguá, PR.Depois de passar por Curitiba, União da Vitória, Palmas, Castro foi, definitivamente instalado em Porto União-SC, onde se encontra até os dias de hoje15.Depois de duas semanas de testes, exercícios e entrevistas Nunes foi, finalmente, incorporado, “incluído no estado efetivo do Batalhão e 2ª Cia E Cmb, visto ter sido julgado apto para o serviço do Exército em revisão de inspeção de saúde a que foi submetido pela JMSGu, tomando o número 481”16. Soldado Nunes. Número 481.Nunes era o único soldado negro entre os duzentos homens dos cinco pelotões da Cia. Não era discriminado por conta disso. Logo recebeu dos colegas o apelido de "neguinho caxias", porque era muito caprichoso: cabeça raspada, barba bem feita, botas brilhando, roupas impecáveis... No princípio ele ficava bravo com o apelido... mas depois entendeu que o apelido não era tão ruim assim.O principal problema que Nunes enfrentou naquelas primeiras semanas no Exército foi a dificuldade de lidar com os comandos da ordem unida. "esquerda e direita se confundiam na minha cabeça". Por isso ele não 15 O excelente livro de Carlos Azevedo, Gláucio Almeida Silva e Eros Sanches conta

detalhadamente, em dois volumes, a história do 5º BECB. Disponível em http://www.youb-lisher.com/p/903485-LIVRO-100-ANOS-DE-HISTORIA-TOMO-1 e http://www.youblisher.com/p/1132242-100-Anos-de-Historia-Tomo-II

16 Transcrito da ficha do Soldado Nunes no 5º BECB34

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conseguia acompanhar o pelotão, nas marchas e exercícios. Ele errava muito. Morria de medo de ser dispensado, o que poderia acontecer naqueles primeiros dois meses.Por sorte arranjou um amigo, descendente de poloneses, chamado Kusko, que foi solidário e resolveu ajudar. Depois do jantar Kusko chamava: "neguinho Caxias, vem cá. Vou te ensinar essas coisas da ordem unida. Pensa comigo: um, dois, três, esquerda, direita" e ia repetindo os gestos e cobrando que Nunes repetisse.Nunes se esforçava. Errou mais algumas vezes, mas Kusko insistia e ele finalmente aprendeu. E escapou da dispensa. Estava no Exército, definitivamente.O soldado Nunes era da 1ª Companhia. Tinha certa dificuldade com os exercícios nas instruções de Educação Física. Não acompanhava as séries de exercício, pelo mesmo problema de entendimento e atenção que atrapalhavam sua vida nas instruções de Ordem Unida. Mas era muito esforçado e contava com a força e a resistência como aliados. Resistia sem dificuldades às marchas, caminhadas e acampamentos da tropa e tinha ainda uma característica inesperada: era muito bom de tiro. Tirava as melhores notas em todas as instruções com armas de fogo.

VACINAS, FUTEBOL E CORRIDASAo longo do ano os soldados receberam várias doses de vacinas contra tifo, varíola, tétano e outras doenças. Ao contrário de outros colegas, que ficavam com febre e fraqueza, Nunes não teve reação negativa a nenhuma delas, apesar de nunca ter sido vacinado antes. A saúde do soldado 481 se mostrava muito boa.Isso era bom, porque Nunes gostava de futebol. Era considerado um fominha de bola. Mas jogava bem, corria muito, e isso chamava a atenção de alguns instrutores e colegas. Entre esses colegas, havia um rapaz, de Joaçaba, Soldado Jurandir, que treinava boxe.

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O armário do soldado Jurandir era vizinho ao do Nunes, o que facilitou a aproximação. Jurandir convidava Nunes para irem pra pista de atletismo, dar voltas, para ajudar na preparação física do boxeador. Lá pela terceira, quarta volta Jurandir dizia “Caxias, eu já tô cansado. Vou parar. Mas você segue”. E Nunes seguia, naquela disputa solitária.O mais interessante é que isso muitas vezes acontecia de noite, depois da janta, com o estômago ainda cheio. Dava 10, 15 voltas, na pista de 400 metros, sozinho.Os primeiros dois meses no quartel era em regime de total isolamento do mundo. Sem saídas nem dispensas. Teve gente que pirou, porque não aguentava aquela prisão. Teve soldado que fugiu. Tiveram de ir buscar em casa, ficava preso. Mas, para o soldado Nunes, a prisão naquele quartel era o paraíso. Não poderia haver coisa melhor: alimentação, cama boa, exercícios físicos e ainda poder ouvir, nos alto-falantes espalhados pelo quartel, as músicas da jovem guarda e outros grandes artistas da época. Nunes era particularmente fascinado por uma música cantada pelo cantor Agnaldo Timóteo (“Quando o trem parar na estação / Eu sentirei no coração / A alegria de chegar”)17. Definitivamente, aqueles dois primeiros meses não foram nenhum problema para Nunes.A casca grossa de calos nos pés e nas mãos, pelo trabalho pesado e insalubre da fazenda, agora estavam descascando tudo. Mãos e pés estavam se desmanchando. Parecia que era uma doença. Mas eram apenas os calos se dissolvendo por conta dos banhos constantes e do uso de calçados. Quando março chegou o Exército promoveu testes com os recrutas para saber a escolaridade e melhorar a instrução. Muitos dos recrutas eram bem alfabetizados. Alguns com ginásio e científico (atual ensino fundamental e ensino médio). Mas alguns (não poucos) como Nunes, eram analfabetos ou tinham baixa

17 “Os Verdes Campos da Minha Terra”, Música de Belmonte e Amaraí, cuja versão, de Geraldo Figueiredo fez muito sucesso na gravação de Agnaldo Timóteo

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escolaridade. Os que queriam podiam sair à noite, para estudar. Foram matriculados numa escola em União da Vitória (cidade vizinha, pertencente ao Paraná). A viatura do Exército levava e trazia todos os soldados estudantes.O teste que Nunes fez indicava que ele tinha um nível de escolaridade (alfabetização) que correspondente ao primeiro ano do primário. Sendo assim, ele poderia recomeçar no segundo ano do primário. Naquele ano de 1968 Nunes completou o segundo ano do primário. Oficialmente, quando saiu do Exército, não era mais analfabeto.Nunes pouco saia do quartel. Nos finais de semana, o máximo de fazia era ir jogar futebol no time do bairro. Nas festas do dia primeiro de maio houve uma bela apresentação do Batalhão. Em função disso, os soldados com bom comportamento ganharam folga. Nunes, por não ter sido dispensado nenhuma vez para nada antes daquela data, ganhou seis dias de dispensa. Voltou a Campos Novos. Foi um acontecimento. Voltou todo bonito, fardado, cheio de pacotes (agora ele ganhava algum dinheiro do Exército e podia comprar presentes pra todo mundo). Foi uma grande festa e alegria para todos. Nesta oportunidade batizou a primeira afilhada, a pequena Simone, filha da irmã mais velha, Maria da Luz.Quando retornou ao quartel, dia 8 de maio, Nunes ficou sabendo que o Sargento Ângelo havia feito uma seleção em todas as companhias para formar a equipe que representaria o Batalhão de Porto União na tradicional Corrida do Facho em Curitiba. Essa corrida é disputada entre batalhões do Exército em um percurso de 10 km onde cada atleta da equipe corre um quilômetro até a entrega do bastão em um revezamento 10 x 1. Jurandir havia feito o teste, mas não foi selecionado. Ele e outro colega, chamado Nevto, chamaram Nunes e disseram: “Neguinho Caxias, por que você não vai correr? Você corre muito, seria passado no teste muito

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fácil. Vai lá. Fala com o Sargento Ângelo. Pede pra fazer o teste.”Nunes fez isso. Procurou o Sargento Ângelo e pediu para fazer o teste. A resposta foi sem muito entusiasmo: “Eu já escolhi os quinze que vão participar do treinamento. Vai lá. faça o teste. Se você for melhor do que um desses quinze você entra na equipe. Mas você vai correr sozinho.”Era uma oportunidade. O Sargento Ângelo foi, caminhando com o Soldado Nunes até o fim da reta oposta da pista, na altura da largada da prova dos 200 metros e deu as instruções: “olha você vai correr daqui até a linha de chegada e mais duas voltas inteiras. Não vá se matar na primeira volta, senão não vai ter força pra outras duas voltas. Está pronto. Vai!” Soprou o apito e bateu o cronômetro.Nunes saiu correndo forte. Só tinha uma coisa em mente: correr o melhor que podia e entrar na equipe para ir a Curitiba participar da Corrida do Facho.Quando completou a primeira volta, o cronômetro marcava 1min12 e o Sargento percebeu que o tempo era forte. Deu um grito “Vai. Vai que está muito bom!”Nunes seguiu no mesmo ritmo o treinador de olho no cronômetro e impressionado com o que estava vendo. Quando Nunes se aproximou da marca de duas voltas o cronômetro ainda não marcava 2min20. O Sargento Ângelo percebeu que o tempo seria excepcional e saiu correndo pela diagonal do campo em direção à linha de chegada, gritando, sempre, “Vai! vai! vai!”… Nunes completou o teste com o tempo de 2min58s. Quatro segundos à frente do melhor classificado no teste feito na semana anterior. Um fenômeno! Nunca ninguém havia feito os 1000 metros em menos de 3 minutos. A equipe ganhava seu campeão.Daquele dia em diante algumas coisas melhoraram muito. Quando o pelotão tinha horário de Educação Física Nunes ia para o treinamento. Os atletas comiam

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uma comidinha diferente (melhor) e tinham outras pequenas regalias.Outras corridas seletivas foram comandadas ainda pelo Sargento Angelo nas semanas seguintes, até que se chegassem aos quinze atletas que, efetivamente seguiram para Curitiba para participar da corrida. Tinham quatro meses para a preparação da equipe. Mas os treinamentos não eram organizados e consistiam, basicamente, em correr, correr e correr. Não havia alongamento, nem aquecimento… nada. Apenas uma coisa era nova. Nunes, agora, era a estrela da Companhia.Nunes descobriu que gostava de correr. Mas sentia muitas dores musculares, porque não sabia correr devagar. Sempre corria em ritmo forte. O treinamento, geralmente era colocar a turma num caminhão, seguir até um determinado ponto, longe do quartel e largava a turma “pra ver quem chega lá na frente”. O caminhão vinha atrás, recolhendo os que desistiam pelo caminho.O calçado era uma conga18 normal. Os pés sofriam muito.Alguns dias antes da corrida o quartel organizou uma corrida de 1000m entre os soldados, com a participação de civis. Nunes chegou em primeiro lugar, com quase 100 metros à frente do segundo. Tornou-se assim, entre o pessoal do batalhão, um favorito absoluto para ganhar em Curitiba.

A CORRIDA DO FACHOA corrida do Facho era (ainda é) uma competição de corrida de revezamento das mais importantes no calendário esportivo militar do Brasil. Foi organizada, pela primeira vez em 1937. Trata-se de um revezamento de 30 km realizada anualmente, no dia do soldado (25 de agosto) nas ruas de Curitiba-PR, com a

18 Conga era um calçado tipo tênis, feito de pano, com solado de borracha branca, lançado em 1959 pela Alpargatas. Com design simples, o modelo foi muito popular até meados dos anos 1980. Pelo seu baixo custo acabou sendo adotado por várias escolas públicas como parte do uniforme.

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participação de equipes que representam as unidades da 5ª Região Militar (Sul)19.Nos anos 1960, a máquina de propaganda do Exército transformou o evento num acontecimento mega importante. Para se ter uma ideia, se um Batalhão quisesse NÃO PARTICIPAR da competição teria de pedir autorização especial ao comando da 5ª RM. E a justificativa tinha de ser muito boa.Em Curitiba o soldado Nunes seria o homem da largada.Partiram dois dias antes da corrida. A viagem de Porto União até Curitiba foi feita de caminhão do Exército adaptado para o transporte dos soldados. O fechamento com lona deixava uns buracos por onde entrava um vento frio. Nunes ficou com medo de pegar “uma gripe”. Mudou de lugar algumas vezes, mas o vento chato não parava. A chegada na capital do Paraná deixou Nunes extasiado. Aqueles prédios enormes, aquelas ruas largas, toda aquela movimentação era uma coisa inesperada. Nunes via aquilo nas fotografias da revista, mas não imaginava que encontrar aquele cenário frente a frente seria tão impactante. Ficaram alojados no Batalhão do Exército, em Curitiba. Assim que chegaram foram almoçar foram avisados de que haveria um treino as quatro horas da tarde, na rua, nas imediações do quartel. Durante o treino Nunes sentiu o corpo pesado. Uma sensação ruim de fraqueza. Era “a gripe”. Na verdade, um resfriado, por causa do vento na viagem. Queixou-se ao treinador. O Sargento Ângelo mandou ele parar o treino e disse pra ele ir dormir mais cedo, à noite. Foi o que ele fez. Logo depois do jantar já estava no seu beliche. Nem participou do bate-papo e dos jogos de baralho que os outros integrantes da equipe fizeram, até que as luzes foram apagadas e todos foram obrigados a fazer silêncio.

19 Desde 1982 a corrida aceita também inscrições de equipes civis.40

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No dia seguinte, quando chegaram na avenida Marechal onde o palanque estava montado para a chegada, Nunes ficou novamente encantado. Tudo parecia tão grandioso. custava a acreditar que ele fazia parte daquilo tudo. Estava ainda saboreando todo aquele cenário quando o Sargento Ângelo deu a ordem para que todos fossem para o aquecimento: correr e fazer alguns exercícios para destravar as pernas. O ambiente estava ficando cada vez mais empolgante.Como já foi dito, Nunes era o primeiro homem da equipe. Responsável pela largada. Havia muita confiança depositada na corrida dele. E ele estava muito concentrado. Mal ouvia a banda que tocava sem parar uma sucessão infinita de marchas militares. Quando o locutor anunciou que seria dada a largada, todos os primeiros corredores se posicionaram perto da linha de largada. Tinha chegado a hora da verdade.Dado o tiro ele disparou na frente. Na metade da corrida estava cinquenta metros do grupo que disputava o segundo lugar.Os primeiros 1000 metros da prova (a parte de Nunes) eram corridos em uma reta. Depois, os outros corredores correriam em volta de quadras. Assim, quando deu a largada, Nunes não sabia como era a linha de chegada. Quando foi chegando perto, vendo aquela multidão e ouvindo o barulho crescente dos gritos da torcida, começou a ficar ao mesmo tempo deslumbrado e confuso. Ficou assustado. Olhava pra trás e não via ninguém. Ficou mais confuso. Será que tinha errado o caminho? Ficou tonto. Reduziu a velocidade. A gritaria aumentou. Não sabia o que fazer. Acabou sendo ultrapassado por dois corredores. Entregou o bastão em terceiro lugar, cinco metros atrás, completamente atordoado.A equipe do batalhão seguiu na disputa de segundo e terceiro lugar durante toda a prova. Nunca havia ficado sequer entre os oito melhores na prova. Acabou em segundo lugar. Um resultado para ser comemorado.

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Mas Nunes não gostou do resultado. Achava que tinha estragado tudo, que a equipe do 5BE poderia ter vencido, que ele, Nunes, não tinha feito a parte dele (ou o que dele se esperava).Voltaram para Porto União e, nos dias seguintes, Nunes andava de cabeça baixa, no batalhão. Estava arrasado. Queria acreditar que não tinha culpa. Mesmo que ele tivesse entregue o bastão na frente o batalhão perderia, pois, nos outros batalhões, tinha até soldado atleta engajado20 só pra participar da corrida. Mas, no final, a sensação era de que a sua participação naquela corrida foi “um fracasso”.Nunes transformou a decepção em estímulo para o treinamento. Começou a se dedicar aos treinos com mais força e vontade. Queria se tornar imbatível e não perder mais nenhuma corrida daquele jeito. Mas ainda era um treinamento sem nenhuma orientação, sem aquecimento, sem alongamento… Era só correr, correr, correr. Algumas vezes dava 30 voltas na pista de 400 metros. Todo mundo ficava impressionado. Nunes ficava, secretamente, orgulhoso.No dia sete de setembro, logo depois do desfile militar, haveria uma competição de atletismo entre civis e militares, na pista de atletismo do Batalhão, com a presença do prefeito e outras autoridades. Era a chance que Nunes tinha de se recuperar.Naquele Dia da Pátria, sábado, 7 de setembro, a história foi, de fato, diferente. Correndo em casa, sem resfriados nem sustos, Nunes se sentia senhor da situação. A pequena arquibancada do estádio do Batalhão estava lotada. Muita gente se espalhava no espaço que cercava a pista de atletismo. Mas o soldado 481 estava transbordando de autoconfiança e venceu, sem dificuldades a corrida dos 800m. Menos de uma hora depois estava novamente na pista para correr os 3000m. Nova vitória brilhante. Mais tarde, no fechamento da festa, foi o último homem da equipe da

20 Termo utilizado entre os militares para designar o alistamento voluntário com o objetivo de se profissionalizar.

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2ª Cia no revezamento 4x400m, fechando um dia de vitórias com uma terceira medalha de ouro. Todo mundo aplaudiu muito.O prefeito de Porto União, Victor Buch Filho foi chamado para entregar as medalhas e começou a alimentar uma ideia que poderia resolver um de seus problemas. Antes de terminar a cerimônia já estava tentando convencer o comandante Christoffel a “emprestar” aqueles jovens atletas do 5º BE para representar Porto União nos Jogos Abertos, que seriam realizados no mês seguinte, em Mafra. Marcaram uma reunião para a segunda-feira, dia 9.Duas semanas depois, no dia 17 de setembro, uma terça-feira, o soldado Nunes estava numa atividade de construção de ponte metálica sobre um lago, nas dependências do próprio quartel, quando ouviu seu número ser chamado: “soldado 481”. Virou a cabeça e viu um cabo, com uma prancheta na mão, imediatamente respondeu, naquele tom militar característico: “Nunes”. O cabo fez um sinal de que ele deveria abandonar o grupo e acompanhá-lo. Nunes obedeceu imediatamente e apressou-se a seguir o cabo, tentando imaginar “que merda eu fiz”. Não fazia ideia do tipo de problema em que estaria metido. O cabo ia parando em outros lugares e chamando outros soldados. Todos respondiam e seguiam o grupo. Aparentemente ninguém sabia o que estava se passando. Pra onde estavam sendo mandados? Estavam todos encrencados? Ou se era uma coisa boa?Foi quando Nunes se deu conta de que todos ali tinham uma coisa em comum: participavam dos treinamentos de atletismo do Batalhão. Parecia ser uma coisa boa. Chegaram ao seu destino: a pista de atletismo. O sargento Ângelo os esperava. Entraram em forma. Eram uns 20 rapazes.O Sargento, com as mãos nas costas começou o pequeno discurso, sem meias palavras: “Os senhores estão aqui porque foram convocados para defender o município de Porto União numa importante competição

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deste estado, os Jogos Abertos de Santa Catarina. Serão dispensados para os treinamentos, nos horários marcados e estarão sob o meu comando nessas atividades. Estamos entendidos?” “Sim, Senhor!” Com certeza ninguém ali estava chateado com a decisão. Pelo contrário. Teriam algumas regalias e até comeriam melhor durante umas quatro ou cinco semanas. Os jogos começariam no dia 19 de outubro.

OS JOGOS ABERTOS DE 1968 - MAFRAA equipe de Atletismo de Porto União foi, no fim das contas, composta pelos soldados do 5BE e mais dois ou três civis que se destacavam na região.A medida que os dias corriam os treinamentos se intensificavam e os soldados iam se dando conta do que significava participar dos Jogos Abertos de Santa Catarina. A competição havia sido criada em Brusque, por um tal de Arthur Schlösser, nove anos antes, em 1960. Tinha ganhado corpo e agora já era o evento esportivo mais importante de Santa Catarina. A cada ano era realizado em uma cidade diferente. Durante uma semana havia jogos de praticamente todas as modalidades esportivas. Tinha Natação, Atletismo, Ciclismo, Ginástica, Basquete, Volei, Futebol de Salão21, Bocha, Bolão, Tiro e Xadrez.A organização da competição ficava por conta de uma Comissão Central Organizadora (CCO) que era uma responsabilidade do município sede22.Até aquele momento os Jogos já haviam sido realizados em Brusque (duas vezes), Florianópolis, Blumenau, Joinville, Porto União, Lages e Joaçaba, no ano anterior. O atletismo havia sido realizado em todas as edições, menos no ano anterior, em Joaçaba, quando, “por determinação do CONSELHO TÉCNICO dos 8ºs JASC foi suspensa, definitivamente a realização da competição de ATLETISMO, dado ao estado impraticável da Pista”23

21 O termo Futsal foi criado muitos anos mais tarde.22 Somente em 1976 o Governo do Estado assumiria a organização dos JASC.23 Conforme consta do Boletim do dia 13/10/1967 dos JASC

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A delegação de Porto União viajou para Mafra num ônibus contratado pela prefeitura. O alojamento foi montado no 5º Regimento de Carros de Combate na cidade vizinha, Rio Negro, que já faz parte do estado do Paraná, mas que é separada de Mafra apenas por pontes sobre o Rio Negro. Esse fenômeno não era novidade para os atletas de Porto União, que também compartilham uma divisa de estado com a cidade de União da Vitória (do Paraná).Um outro fato curioso dos Jogos é que a cidade de Mafra não possuia uma pista de Atletismo. Por isso as competições da modalidade seriam realizadas na pista de atletismo do Batalhão do Exército, em Rio Negro. Assim, pela primeira vez, as medalhas dos Jogos Abertos de Santa Catarina seriam disputadas em território do Paraná24. Nunes estava muito animado. Aquela movimentação de gente, aquela estrutura toda parecia ser uma coisa muito bacana. Não sabia muito bem o que fazer mas achava que era só fazer o que todos estavam fazendo que ficaria tudo bem. O desfile de abertura dos Jogos foi deslumbrante: muita gente bonita! Muita alegria! Um clima de festa muito contagiante. O atletismo começaria no dia seguinte.Quando chegaram no estádio de atletismo, no domingo pela manhã, Nunes ficou impressionado com a quantidade de gente nas arquibancadas e em praticamente todos os espaços de onde se poderia ver a pista. Ele nunca havia visto nada igual. Esse tal de Jogos Abertos era mesmo uma coisa assombrosa.Antes do aquecimento para os 10 mil metros, o Sargento Ângelo puxou Nunes pelo braço e apontou para um atleta magro e franzino: “Aquele ali é o melhor corredor de Santa Catarina. Presta atenção nele. Não deixa ele fugir, senão você não vai mais alcançar, porque ele é muito forte”. Era Valdemar Tiago de Souza.

24 Este fato nunca mais ocorreu, pelo menos até 2015.45

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Tiago tinha então 42 anos, já era um veterano. Mas ainda merecia respeito. O atleta de Blumenau era muito experiente, havia participado de várias edições dos Jogos Abertos e tinha conquistado nada menos que 9 medalhas de ouro25 e alguns recordes. Nos Jogos Abertos de 1966, em Lages (na última vez que o atletismo tinha sido realizado) Tiago foi o campeão nas corridas de 5 mil26 e 10mil metros27.Waldemar Tiago era, de fato, uma lenda no atletismo de Santa Catarina. Tinha começado muito cedo a praticar esportes. Fazia ciclismo, futebol e atletismo, e era muito bom nos três. Quando chegou aos 18 anos optou pelas corridas. Com 27 anos (em 1953) foi vice-campeão do Troféu Brasil de Atletismo. Naquele mesmo ano conquistou o 34º lugar na Corrida Internacional de São Silvestre, em São Paulo, sendo o 3º melhor brasileiro na prova. Um grande feito feito, que só viria a ser superado 20 anos mais tarde.Outro adversário que preocupava o Sargento Ângelo era Sílvio Juvêncio dos Santos28, de Florianópolis. Era 25 Participações de Waldemar Tiago de Souza nos Jogos Abertos de Santa Catarina.

1960 (Brusque) - Não participou1961 (Florianópolis) - 3000 m - (1º)1961 (Florianópolis) - 5000 m - (1º)1962 (Blumenau) - Não participou1963 (Joinville) - Não participou1964 (Porto União) - 1500 m - (1º)1964 (Porto União) - 5000 m - (1º)1964 (Porto União) - 10000 m - (1º)1965 (Brusque) - 5000 m - (1º)1965 (Brusque) - 10000 m - (1º)1966 (Lages) - 5000 m - (1º)1966 (Lages) - 10000 m - (1º)1967 (Joaçaba) - o atletismo foi cancelado.1968 (Mafra) - 10000 m - abandonou a prova1968 (Mafra) - 10000 m - não participou

26 JASC-1966 - 5 MIL METROS1º - Valdemar Tiago de Souza (Blumenau) - 16min37s2º - Sílvio Juvêncio Santos (Florianópolis) - 16min39s3º - Hilário Bomm (Joaçaba) - 17min56s

27 JASC-1966 - 10 MIL METROS1º - Valdemar Tiago de Souza (Blumenau) - 35min09s2º - Sílvio Juvêncio Santos (Florianópolis) - 35min22s3º - José Luis da Luz (Blumenau)

28 Participações de Sílvio Juvêncio dos Santos nos Jogos Abertos de Santa Catarina.1960 (Brusque) - 1500 m - (1º)1960 (Brusque) - 3000 m - (1º)1961 (Florianópolis) - não Participou1962 (Blumenau) - 5000 m - (1º)1962 (Blumenau) - 10000 m - (1º)1963 (Joinville) - 5000 m - (1º)1963 (Joinville) - 10000 m - (1º)

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um sujeito forte, resistente e não era de desistir fácil. Nas duas provas que perdeu para Tiago, dois anos antes, disputou metro a metro até a linha de chegada. Tiago vencera por poucos metros de diferença.E assim, o treinador foi apontando, um a um, os corredores com quem Nunes tinha de se preocupar. “Aquele ali é o Hilário, de Joaçaba, presta atenção”. E apontava outro, “Aquele que vem vindo lá, de camiseta branca, é o José da Luz, de Blumenau. Muito forte. Cuidado!” E depois “Esse outro ali é o Ivo da Silva, de Joaçaba. Abre o olho”. Nunes percebeu que a coisa não iria ser fácil.Para essa primeira prova (10 mil metros) havia cerca de 25 a 30 inscritos. O árbitro do Atletismo, o professor Murilo Barreto, fez a chamada. Foram para a pista. Nunes tinha recebido uma conga nova para a corrida (daquelas com a pontinha branca) e um calção de jogador de futebol de salão, com um forro de nylon que ficava meio apertado. Mas tava todo “bonito” na linha de largada.A corrida começou e o bloco de corredores se ajustou nas suas posições, enquanto Tiago buscava a liderança da prova, seguido de perto por Silvio Juvêncio. Nunes corria na raia 3, logo atrás dos dois líderes e Ivo da Silva. José Luiz juntou-se ao grupo e, depois de umas cinco ou seis voltas o primeiro pelotão estava definido: Sílvio e Tiago disputando a primeira posição, seguidos de perto por Nunes, Ivo e José Luis.Nunes não tinha nenhuma experiência em corridas de pista. Não tinha noção de que as raias mais internas são mais curtas. Em vez de correr atras dos adversários

1964 (Porto União) - não participou1965 (Brusque) - 5000 m - (2º)1965 (Brusque) - 10000 m - (2º)1966 (Lages) - 5000 m - (2º)1966 (Lages) - 10000 m - (2º)1967 (Joaçaba) - o atletismo foi cancelado.1968 (Mafra) - 5000 m - (3º)1968 (Mafra) - 10000 m - (3º)1969 (Joinville) - 5000 m - (3º)1969 (Joinville) - 10000 m - (3º)1970 (Concórdia) - o atletismo foi cancelado.1971 (Rio do Sul) - não participou

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(ou na frente deles) corria no lado (praticamente na raia 3). Mesmo assim, depois de umas dez voltas, percebeu que a coisa estava muito fácil. Resolveu apertar o passo e assumiu a frente do pelotão. Tiago e Sílvio tentaram acompanhar, mas foram ficando para trás. Na 15ª volta já estava uns 5 metros à frente. Na 18ª volta os 42 anos de Tiago finalmente cobraram a conta. Ele teve uma câimbra e abandonou a corrida. Nunes estava quase meia volta à frente de Sílvio Juvêncio.Apesar de estar liderando a prova, Nunes continuava correndo nas raias 2 e 3. E não conseguia entender que significavam os gritos de “vai pra raia um”. Não fazia sentido aquilo. Não sabia o que era a tal de “raia 1”. Estava bem assim. Além disso, ele ficava com medo de bater nas pessoas que estavam à beira da pista (juízes e fiscais). Seguiu em frente e alcançou a linha de chegada em primeiro29, sem ser incomodado pelos demais corredores. Nem se deu conta de que os pés estavam ensanguentados, por causa do estrago feito pela ponta de borracha da Conga nova. Estava feliz demais para se preocupar com aquilo. Havia conquistado uma medalha de ouro dos Jogos Abertos de Santa Catarina. A primeira de muitas.Waldemar Tiago, apesar de ter perdido a prova, não deve ter ficado muito triste, pois, no mesmo dia recebeu a notícia do nascimento do seu filho30. No dia seguinte, para a prova de 5000 metros algumas coisas já estavam diferentes. Nunes tinha cortado, com uma tesoura, o forro de nylon do calção de Futebol de Salão do seu uniforme. E também ajustou um algodão nos pés, para proteger dos efeitos da Conga.Na arquibancada também havia novidade: o prefeito de Porto União, Victor Buch Filho, com toda a família

29 JASC - 1968 - 10 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Porto União2º - Ivo Francisco da Silva - Joaçaba3º - Sílvio Juvêncio Santos - Florianópolis

30 Valdemar Tiago de Souza Filho, nos anos 1990 foi um excelente corredor nas provas de meio fundo em Santa Catarina.

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estava lá. Tinha sido informado de que o Soldado Nunes, do 5ºBE tinha vencido espetacularmente a corrida no dia anterior. E não queria perder a oportunidade de vê-lo vencer mais uma vez e ganhar mais uma medalha para a sua cidade.Outras autoridades e pessoas importantes de Porto União também foram ao estádio. Tinham ouvido sobre campeão que tinha feito sucesso no dia anterior e queriam testemunhar mais uma vitória. Dessa vez Nunes recebeu orientação sobre correr na raia 1. Deram a ele uma metade de laranja pra ele chupar antes da prova. “É bom pra não secar a garganta” estava pronto para mais uma corrida.Dada a largada, Nunes tomou conta da prova. Era o dono da cena. Tiago não apareceu para correr a prova. Ivo Francisco da Silva estava. Acompanhou nas primeiras voltas, mas deixou Nunes escapar logo em seguida. No final da corrida31 o Soldado Nunes tinha se transformado em Zé Maria Nunes. Um grande atleta. Campeão de Santa Catarina.

TORCIDA DISTANTEA mais de 300 km dali, em Concórdia, Tião trabalhava na Construtécnica e tinha como chefe o engenheiro Ney Nunes de Menezes, que gostava de esportes e tinha acesso às informações sobre os Jogos Abertos. Ele veio com a notícia: “teu irmão foi Campeão dos Jogos Abertos. Medalha de Ouro!” e deu os detalhes que tinha sobre o fato. Falou que os Jogos Abertos era uma competição muito importante no estado, que corria gente de todas as cidades, e que ser campeão desses jogos era uma coisa muito importante. “É quase como ganhar uma copa do mundo!” Era um exagero, claro, mas, resguardadas as proporções podia-se dizer que era isso mesmo.

31 JASC - 1968 - 5 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Porto União2º - Ivo Francisco da Silva - Joaçaba3º - Sílvio Juvêncio Santos - Florianópolis

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Tião cuidou de espalhar a notícia, primeiro em Concórdia. Depois em Campos Novos, na primeira oportunidade que teve para ir em casa. A festa foi muito grande. João Maria e Reasilva não entendiam muito bem o que aquilo queria dizer. Mas, pela felicidade do Tião, devia ser coisa boa e o filho, certamente, tinha se tornado importante.Tinha mesmo. Ao retornar dos Jogos Abertos, Zé Maria Nunes recebeu homenagens na cidade. Recebeu uma placa do Exército. E o nome dele citado na ordem do dia do Comandante.Além disso, recebeu a notícias da família. Alguém tinha mandado avisar que Nunes tinha um novo irmãozinho. Mauro havia nascido em setembro. Agora eram doze irmãos.Os resultados de Zé Maria nos Jogos Abertos chamaram atenção dos dirigentes de Florianópolis, que era comandado e liderado por Diamantino Martins e pelo tenente Djalma, entre outros. Havia ainda a influencia de Odir Varela.Ainda em Mafra, durante os Jogos Abertos, um tenente da Aeronáutica chamou Nunes reservadamente e disse: “você não quer sair do Exército e ir para a Aeronáutica?”. Esse capitão da Aeronáutica disse que se Nunes fosse até lá seria bem recebido e poderia fazer os testes para ficar.Além disso, durante os jogos Nunes fez dois amigos que eram soldados da Aeronáutica: Donizete e Pinho32.Havia, na época, ingresso de civis na Aeronáutica, como taifeiro. Nunes estava convencido de que poderia ir para a Aeronáutica. O seu tempo no Exército estava praticamente acabando, sua baixa estava prevista para 15 de novembro. Faltava menos de um mês.No 5BE recebeu convite para engajar. Não quis. Iria para Florianópolis e seria da Aeronáutica.

32 Walfredo Raymundo Pinho, que, mais tarde tornou-se maestro da Banda da PMSC50

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No dia 15 de novembro, prestou o Juramento à Bandeira, numa bonita solenidade militar no Batalhão. E deu baixa do Exército, recebendo o Certificado de Reservista de Primeira Categoria número 123165, Série “A”.Voltou pra Campos Novos. Queria conversar com o pai. Sentia-se na obrigação de pedir a aprovação do pai para o plano de ir para Florianópolis. O pai disse “Meu filho. Segue a tua vida. Só uma coisa que o pai pede: nunca roube nem mate. Seja um homem honesto e não esqueça da tua mãe, do teu pai e dos teus irmãos.”

DESTINO: FLORIANÓPOLISNo dia 22 de novembro, uma sexta-feira. Zé Maria pegou um ônibus, as oito horas da manhã, em Campos Novos. O ônibus passaria por Lages, Bom Retiro, Alfredo Wagner33, Águas Mornas, Santo Amaro da Imperatriz e finalmente, Florianópolis. Chegou por volta de cinco da tarde. No balcão da empresa de ônibus na própria rodoviária Zé Maria pediu para que o atendente ligasse para a Aeronáutica. O rapaz fez a ligação e passou para Zé Maria falar. Ele pegou o fone ao contrário, com o lado do microfone na orelha. Não tinha ideia de como falar naquilo. O rapaz deu as orientações (enquanto outros riam às gargalhadas) e ele acabou falando. Por uma dessas coincidências da vida, do outro lado da linha estava um soldado que esteve nos Jogos Abertos: Soldado Canôa, tinha corrido os 4x400 por Florianópolis. Eles se entenderam logo e o soldado deu as instruções: “desce aí da rodoviária, vai pela Avenida Mauro Ramos até uma praça onde tem um ponto de ônibus. Haverá um ônibus da Aeronáutica. Explica para o motorista que você está autorizado a vir. Eu já vou falar com o Comandante e deixar tudo acertado aqui.”Nunes seguiu as instruções. Quando estava próximo do local, outra coincidência: ele viu um sujeito andando com um boné militar. Parecia familiar. Zé Maria deu 33 Na época, ainda era conhecida como Barracão

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uma corrida e alcançou o rapaz. Era o Soldado Pinho. Outro que também havia participado dos Jogos Abertos. Pinho ficou empolgado ao ver o colega atleta. Levou Zé Maria até no ônibus, conversou com o motorista e já deixou as coisas combinadas. Ao chegar no batalhão da Aeronáutica (na Tapera) com tudo acertado, foi alojado e pode, finalmente, descansar e dormir.Zé Maria ficou dez a quinze dias alojado no quartel da Aeronáutica da Tapera. O teste para entrar na Aeronáutica de fato poderia ser feito. Mas somente no ano seguinte.Um capitão da Aeronáutica, que fazia parte da diretoria da Federação Atlética Catarinense, disse que estavam fazendo um acordo com o presidente da FAC (Odir Varela) para ajudar Zé Maria a encontrar trabalho em Florianópolis. Perguntou: “o que é que você sabe fazer?” Nunes respondeu: “eu sei trabalhar. Não tenho medo de fazer força. Mas não sei ler, não sei escrever. Não sei quase nada! Tenho só o segundo ano do primário. Mas vontade de trabalhar eu tenho” O capitão ficou sensibilizado pela sinceridade do rapaz. Lembrou que outro atleta da equipe de Florianópolis, Silvio Juvêncio, trabalhava como entregador de móveis numa loja, no centro. Pensou em conversar com ele e ver onde poderiam chegar.No dia seguinte o capitão veio com a novidade: “você quer trabalhar numa loja? como carregador de móveis? O seu Odir Varela vai te colocar numa loja aqui da cidade pra trabalhar. Você concorda?” Claro que Zé Maria queria. Carregar móveis seria brincadeira, perto do que fazia na fazenda em Catanduvas.O próprio pessoal da Aeronáutica levou Zé Maria até a loja, onde o próprio Odir Varela era o gerente geral. Ficava no centro de Florianópolis. A Modelar era uma das maiores e mais importantes lojas da cidade. Foi uma das primeiras lojas de crediário de Florianópolis. Uma potência!

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No dia 2 de dezembro, uma segunda-feira, Zé Maria começava uma vida nova. Começava a trabalhar como carregador de móveis na Modelar.Trabalhava o dia todo. Só treinava (na verdade, corria, no sábado e no domingo)Sílvio Juvêncio dos Santos trabalhava na Modelar. Já era mais velho, com seus 27, 28 anos, tinha família, filhos. E também era carregador de móveis. Sílvio, em princípio não via com bons olhos a chegada de um novo atleta para a equipe. Principalmente porque Nunes o havia vencido em Mafra, nos JASC. Os privilégios de atleta teriam de ser, agora, divididos. Mas ele logo superou esse pequeno ciúme inicial, tornaram-se amigos e ajudaram-se muito, principalmente no trabalho. Havia um outro colega de trabalho, Vergilio Jorge, que era árbitro de futebol (figura folclórica da história do futebol catarinense)O pessoal do Seu Odir (o Aloísio Soares era um deles) encontrou uma pensão para ele morar, junto com dois estudantes. A pensão ficava ao lado de onde fica hoje a Carioca Calçados, próximo da esquina entre a rua Vidal Ramos e Deodoro). A vida estava mudando depressa. Tão depressa que, quando viu, o Natal já havia chegado. Como o dinheiro estava curto, passou o Natal e o Ano Novo sozinho em casa.Mas comprou uma camisa nova para o Natal. E, quando se deu conta, já era janeiro.

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1969O Brasil vivia, em 1969, os anos mais duros do regime militar, sob a presidência do Marechal Costa e Silva. Ele havia editado o famigerado AI534 no ano anterior e conduzia o seu governo com mão de ferro. Os militares estavam em toda parte. Nas escolas, no comércio, nos clubes esportivos, na política e na indústria.O governador de Santa Catarina era Ivo Silveira. Ele estava fazendo uma grande reforma na rede de distribuição de energia elétrica no estado, que havia passado a atender de 134 localidades em 1966 para 715 em 1968. Um grande feito. O estado de Santa Catarina, naquela década de 1960, estava experimentando uma fase de grande crescimento. O governador anterior, Celso Ramos, havia criado um conjunto de estruturas importantes para o desenvolvimento do estado: um banco estatal (BESC), uma universidade (UDESC), uma concessionária de energia (CELESC) e um fundo de desenvolvimento (o FUNDEC). Na capital, Florianópolis, o prefeito era Acácio Garibaldi Santiago, último prefeito eleito de Florianópolis (depois o regime militar suspendeu as eleições diretas para prefeitos nas capitais de estados por muitos anos). Acácio introduziu o conceito de planejamento urbano e incentivou a exploração do turismo na cidade. Florianópolis era uma cidade ainda provinciana. O mar vinha até o Mercado Público e Alfândega. Havia apenas uma única ponte, a majestosa Ponte Hercílio Luz. Mas era uma travessia complicada. A ponte estava sendo pavimentada (seu piso, de madeira estava sendo 34 Ato Institucional Número Cinco - Quinto de uma série de decretos emitidos pelo regime

militar brasileiro nos anos 1960 - O AI-5, sobrepondo-se à Constituição de 24 de janeiro de 1967, bem como às constituições estaduais, dava poderes extraordinários ao Presidente da República e suspendia várias garantias constitucionais.

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substituído por asfalto) e essa obra provocava filas imensas e engarrafamentos terríveis. Os carros ficavam parados buzinando sem parar, numa sinfonia de malucos. O aterro da Baia Sul e a Ponte Colombo Salles só seriam construídos nos anos seguintes.Na rua Felipe Schmidt ainda passavam carros. O Calçadão só iria ser construído alguns anos depois. As praias da moda eram Coqueiros, Itaguaçu e Bom Abrigo. Nos fins de semana ficavam lotadas das pessoas mais chiques da cidade. A Eletrosul ainda não havia sido transferida para Florianópolis. A Universidade, inaugurada nove anos antes, ainda era um lugar distante, lá no encontro entre os bairros da Trindade, do Pantanal e da Carvoeira.Florianópolis era uma grande novidade para Zé Maria Nunes. Era uma cidade muito grande. Tudo era longe. Usava-se ônibus para deslocamento dentro da cidade. Nada, nem de longe, lembrava a rotina da fazenda em Jaborá ou do Exército em Porto União.Mas Nunes tinha vindo pra ficar. Não pensava, em momento algum, em voltar para Campos Novos. Morava, definitivamente, em Florianópolis.No início daquele ano recebeu um convite para morar (pagar pensão) na casa de um vendedor da Modelar, de nome Alcir. Esse Alcir morava em Capoeiras, na rua Paula Ramos, uma rua paralela à rua Pascoal Simone (onde hoje funciona o curso de Educação Física da Udesc).Mas havia um problema: o trânsito da Ponte Hercílio Luz. Formavam-se filas imensas. O engarrafamento era infernal. Morar no continente e trabalhar na ilha era muito complicado. E Nunes ficou poucos meses morando em Capoeiras. Logo voltou a morar na ilha. Foi morar numa outra pensão, na Rua Arciprestes Paiva, perto da Catedral. No início de março Nunes teve uma visão que o deixou deslumbrado: os jovens estudantes do Instituto Estadual de Educação. A imagem daqueles meninos e

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meninas de uniforme era, para ele uma visão do paraíso. Ele queria ser aquilo. Queria ser um estudante.Na loja havia uma única pessoa negra. Um oficial da reserva da marinha (os militares da reserva estavam em toda parte). Nunes achou que, por ele ser negro, seria a pessoa certa para ajudar nisso. O Sr. Sílvio era o gerente. “Seu Sílvio. Eu queria voltar a estudar”. O homem perguntou: “Até que ano tu estudou?” Nunes respondeu: “até o segundo ano do primário. Não cheguei a terminar o terceiro ano”. Sílvio foi categórico: “Então não tem jeito. Tu tens que procurar o Mobral”35. Nunes ficou desanimado. Não era isso o que ele queria ouvir.A conversa de Nunes com Sílvio estava sendo ouvida por um ex-seminarista, chamado Gabriel, que era também empregado da loja. Ele saiu e ficou lá fora esperando por Zé Maria. Quando Nunes saiu ele o abordou: “Você disse que quer voltar a estudar. Por que não faz o Madureza?”36 Nunes lembrou que já havia ouvido esta palavra muitas vezes, nos programas de rádio que ouvia na fazenda, em Catanduvas e também quando estava no Exército. Nas propagandas do Instituto Universal Brasileiro esse termo era sempre citado. Parecia ser uma coisa importante.Gabriel explicou que, no Colégio Imaculada Conceição tinha um curso chamado Universus Universidade. “Eles têm o Madureza. Vou te levar lá”. E foram. Gabriel levou Nunes até a secretaria do curso. As aulas já haviam começado, havia uns 10 dias. Nunes se apresentou “Eu gostaria de voltar a estudar”. “Pois não. O senhor estudou até que série?”“Fiz o segundo ano primário”35 O Movimento Brasileiro de Alfabetização — MOBRAL, foi um projeto do governo brasileiro,

criado em 1967 com o objetivo de promover a alfabetização funcional de jovens e adultos, visando "conduzir a pessoa humana a adquirir técnicas de leitura, escrita e cálculo como meio de integrá-la a sua comunidade, permitindo melhores condições de vida".

36 O Madureza era um curso de educação de jovens e adultos, precursor do atual programa de Ensino Supletivo. Foi criado em 1961 e contemplava os atuais ciclos de ensino fundamental (Madureza Ginasial) e de ensino médio (Madureza Colegial). Em 1971, o Curso de Madureza foi substituído pelo Projeto Minerva e, posteriormente, pelo curso Supletivo.

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“Tem um documento pra comprovar?”Não. Não tinha. Quando estudou naquela escola em União da Vitória, Nunes não tinha a menor ideia de que aquilo deveria ser documentado e que ele deveria levar consigo algum papel para se matricular em outra escola. Felizmente, aquele era o menor dos problemas. Nunes recebeu instrução para falar com um dos professores. O professor mandou ele preencher uma ficha com os seus dados.Nunes pegou a ficha numa mão, uma caneta na outra e começou a preencher a ficha. Aí apareceu um problema que antes nunca havia aparecido. Nunes simplesmente não conseguia entender o significado das palavras. Ele leu “NOME” e escreveu o próprio nome ao lado. Depois estava escrito “IDADE”. Ele não sabia qual era a resposta para aquilo. O que significava “idade”, “endereço residencial”, “identidade”, “escolaridade”… simplesmente não sabia como preencher a ficha.O professor se ofereceu para ajudar. “posso preencher pra você”. E foi fazendo as perguntas e preenchendo a ficha. Depois explicou como funcionava o curso: “você vai estudar durante um semestre e depois tem o período das provas, que é feito no Colégio Catarinense”.Somente dois colégios de Santa Catarina faziam o Exame de Madureza: o colégio Pedro II, em Blumenau e o Catarinense em Florianópolis. “Você vai estudar as matérias de História, Geografia, OSPB37, Matemática, Ciências e Português. Se, nas provas, obtiver a nota 7,5 a disciplina será eliminada. Naquelas em que não obtiver a nota, terá de continuar estudando e fazer as provas no fim do semestre seguinte”.Nunes começou a frequentar as aulas, à noite. O professor escrevia a matéria no quadro. Nunes não conseguia acompanhar. Depois de uns 10 dias o 37 Organização Social e Política do Brasil - uma disciplina, proposta por Anísio Teixeira, durante

o governo de João Goulart, em 1962 e que foi incluída na grade curricular do ensino fundamental e ensino médio (na época, primário, ginásio e colégial) em todo o território nacional, até 1993. Também foi chamada de EMC (Educação Moral e Cívica) e, mais tarde - EPB (Estudos de Problemas Brasileiros)

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professor de Português, Luis Pasold, mandou os alunos fazer uma redação. O tema era “falar sobre a Lagoa da Conceição”Quando receberam a redação de volta, Nunes viu que o professor não havia dado nota. Apenas escreveu alguma coisa com a sua caneta vermelha. Nunes perguntou a uma colega, “o que foi que ele escreveu aqui. Eu não consigo entender a letra”. Ela falou: “ele escreveu VENHA CONVERSAR COMIGO. É pra você ir lá conversar com ele”.Nunes foi, tremendo de medo. Achava que tinha feito alguma bobagem, que tinha faltado com o respeito com algum professor… Medo! Um medo típico de criança, apesar de ele já ter quase vinte anos.“Você estudou até quando?” perguntou o professor. “Até o segundo ano, professor” respondeu. “Olha, José Maria” o professor procurou um tom de voz bem calmo, pois percebeu que Nunes estava nervoso. “O seu português não tem a mínima condição. Não é possível entender absolutamente nada do que você escreveu aqui. Eu sinto muito. Mas você vai ter de ir procurar o MOBRAL, para se alfabetizar. Depois é que você poderá vir aqui, para estudar e fazer o exame de Madureza.”Nunes ficou petrificado. Tinha medo de perder aquela oportunidade. Pediu, quase implorou, para que o professor deixasse ele continuar no curso. “eu pago as mensalidades, direitinho, só pra seguir, porque já tem algumas aulas que eu já estou entendendo alguma coisa. O senhor me deixa continuar no curso. Me dá essa chance.”O professor compadeceu-se do jovem e insistente rapaz. Deu a ele alguns conselhos, algumas recomendações e finalizou com uma proposta: “se você, nessas condições, conseguir passar em pelo menos uma matéria, no exame, eu vou cobrar apenas metade da sua mensalidade”.

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Nunes sentiu-se renovado. Daquele dia em diante passou a estudar mais ainda. Não faltava a uma aula, não importava a chuva, o vento ou o cansaço. Reduziu até os treinos nos fins de semana. Só ficava estudando.Seu quarto, da pensão (na rua Arciprestes Paiva, perto da Catedral), era de frente pra rua. Ele via, nos fins de semana, as pessoas na fila do cinema, mas sabia que aquilo ainda não era pra ele. Tinha de continuar estudando. O professor Luiz Pasold confiava nele.No dia das provas, estava nervoso, mas fez os exames, mesmo assim. Algumas semanas depois saiu o resultado. Das seis disciplinas, passou em duas: OSPB (uma matéria que ele já havia estudado nas instruções do Exército) e Geografia, talvez porque ele, ainda que, com muita dificuldade, lia sempre revistas como “O Cruzeiro” e “Manchete”.As notas em Matemática (0,3), História (1,5), Português (0,5) e Ciências (1,0) seriam desanimadoras para qualquer um. Para Nunes, não. Ele estava muito motivado. Sabia que conseguiria. Era só uma questão de tempo, dedicação e força de vontade. Nada disso lhe faltava.Ficou radiante com a aprovação nas duas matérias. Foi uma grande vitória. Tinha agora outro ânimo. Andava na rua se sentindo melhor. Chegava na escola e se sentia um estudante bem sucedido. O professor Luis Pasold cumpriu a promessa e cobrou só metade das mensalidades. E ainda deu um baita elogio.Mas Zé Maria sabia que teria de estudar muito para vencer os desafios que aquelas outras matérias representavam.

A PRIMEIRA VIAGEM DE AVIÃONunes não havia desistido a ideia de ser taifeiro na Aeronáutica. Taifeiro é uma função típica das Forças Armadas no Brasil, estando entre o soldado e o cabo. É, basicamente, um soldado com habilidades diferenciadas e que já entra na organização militar com

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alguma profissão ou tem talento ou habilidade para tal. São os motoristas, cozinheiros, alfaiates, barbeiros, copeiros, mensageiros, ordenanças, comissários de bordo das aeronaves de transporte de passageiros, digitadores, operadores de informação e outras funções que exigem capacidade especial para o desempenho. Nunes estava inscrito para ser taifeiro no restaurante e na cozinha.O teste para os candidatos do sul do Brasil seria feito em Porto Alegre, e o deslocamento, a partir de Florianópolis seria feito em avião da própria FAB. Na verdade, era um avião de carga da aeronáutica. Seria a primeira viagem de avião de Zé Maria. E não foi uma experiência das mais agradáveis. Nem bem havia decolado e o comandante resolveu retornar para o aeroporto, porque havia um problema de pressurização da aeronave. Todos a bordo (a maioria era novato na coisa) ficaram amedrontados. Depois que a viagem foi retomada, nem conseguiram aproveitar o passeio. Mas, no fim, deu tudo certo.Nunes fez o exame mas não foi bem. Teve, claro, as dificuldades típicas de quem não sabia ler nem escrever direito. A esperança de ser taifeiro na Aeronáutica teria de esperar (ou ser esquecida).

A PRIMEIRA CORRIDA EM FLORIANÓPOLISApesar de ter vindo para Florianópolis por ser atleta, Nunes praticamente não treinava atletismo. Todo o seu tempo era tomado pelo trabalho, na Modelar e pelos estudos no curso preparatório para o Madureza Ginasial. Ainda assim, ficou animado quando soube que haveria uma corrida em julho, chamada Volta a Ilha. Sílvio Juvêncio dos Santos, que trabalhava com ele na loja iria participar. Ele treinava muito, todos os dias, saia do trabalho, ia pra casa e ia treinar, enquanto José Maria ia pra escola, estudar. E, apesar de não ter vencido Zé Maria nos Jogos Abertos, no ano anterior, Sílvio era um

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atleta bastante experiente. Já havia participado até da corrida de São Silvestre, em São Paulo.A largada e a chegada da prova era no Clube Barriga Verde dos Oficiais da PM, que ficava próximo da Academia da Polícia Militar, na Trindade. Largava em direção ao centro, pela Lauro Linhares, passava pela Agronômica (Rua Delminda Silveira, Rua Rui Barbosa e Frei Caneca) e seguia para a Av. Mauro Ramos (a Av. Beira Mar não existia ainda), passava pelas curvas do Saco dos limões (Rua Silva Jardim, Rua José Maria da Luz, Jerônimo José Dias e João Mota Espezim) e , subia o morro da Carvoeira (Rua Capitão Romualdo de Barros), passava por dentro da Universidade e voltava a encontrar a Lauro Linhares, até a linha de chegada. Dava um total de 18 quilômetros.Logo no início da corrida Zé Maria apertou o passo e começou a abrir uma boa vantagem sobre os demais competidores. Quando chegou na Carvoeira, olhou pra trás e não viu ninguém. Estava muito à frente, mas havia se desgastado demais. Começou a se sentir mal. Começou a sentir dores nas pernas e um esgotamento físico. Não estava preparado para correr uma prova daquele tamanho. Subiu o morro da carvoeira andando. Olhava pra trás e não via Sílvio. Mas sabia que ele estava vindo. Desceu o morro trotando. Quando chegou na Universidade foi alcançado por Sílvio, que se mantivera num ritmo mais lento porém firme. Nunes voltou a forçar o rítmo, para impedir a passagem do adversário. Tirou, novamente uma certa distância, mas foi novamente alcançado, próximo da Academia Militar. Desespero! Dali até a linha de chegada eram poucos metros. Mas não conseguiu superar a experiência e a estratégia do colega. Acabou em segundo lugar. Foi uma derrota! Na loja, durante aquela semana, não se falava em outra coisa: o Silvio tinha derrotado o campeão dos Jogos Abertos.Nunes já havia perdido demais. Resolveu que não queria mais perder em Santa Catarina. Começou a treinar. De julho até os Jogos Abertos (que seriam em

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Joinville, no mês de outubro) Nunes acordava cinco horas da manhã e ia treinar na rua.Nesse treinamento de rua não havia nenhuma técnica, nenhuma tecnologia, nada. Não havia marcação de tempo (não tinha relógio) nem determinação da exata distância percorrida. Era correr pra lá e correr pra cá.Nos sábados os atletas se reuniam na pista do Quartel do Exército, no Estreito. Nesses dias Nunes recebia instruções do Tenente Djalma ou do Nilton Pereira e corria, geralmente, 25 ou 30 voltas na pista. Também se fazia tiros de 400 metros (porque Nunes fazia parte da equipe que correria o revezamento 4x400m).Algumas vezes eram feitos exercícios físicos de militares, com cordas, pneus e outros artefatos. Era um esforço físico bem grande. Mas haveria de compensar.

JOGOS ABERTOS DE 1969 - JOINVILLENeste período entre agosto e outubro houveram competições (oficiais) de atletismo entre Exército, Marinha, Aeronáutica, Polícia Militar e também civis. Nunes passou a vencer todas essas corridas. Em todas essas corridas Nunes abria uma vantagem considerável sobre Sílvio Juvêncio deixando claro que a disputa, nos Jogos Abertos não seria tão fácil.José Maria Nunes chegou aos Jogos Abertos como grande favorito das provas de fundo e meio fundo. Nem os adversários acreditavam que poderiam vencê-lo. Valdemar Tiago, de Blumenau havia encerrado a sua participação nos Jogos Abertos no ano anterior. ((Nunes5 - o que houve? Por que os tempos são tão ruins e apertados?))Nos Jogos Abertos de Joinville, no estádio do Caxias. José Maria venceu 5 mil metros38 e 10 mil metros39. 38 JASC 1969 - 5 MIL METROS

1º - José Maria Nunes - Florianópolis - 18min41,6s2º - Ivo F. Silva - Joaçaba - 18min46,23º - João Maria Zeppel - Porto União - 18min55,7s

39 JASC 1969 - 10 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Florianópolis - 41min12,2s3º - Ivo F. Silva - Joaçaba (Classificado após Juri de Apelação)2º - Silvio Juvêncio dos Santos - Florianópolis - 41min13,2s

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Como no ano anterior, ele não correu os 1500 metros nos Jogos Abertos nem estava na equipe do revezamento 4x400m. ((Nunes5 - o que houve na prova de 10 mil metros. O tempo é absurdo e o segundo colocado foi sob. julgamento em Juri de apelação))Nunes contava agora com treinamento, experiência (já sabia o que estava fazendo) autoconfiança e o respeito dos adversários. ((continuar…))

OS ESTUDOS E AS CORRIDAS DO FIM DE ANODepois que voltou dos Jogos Abertos, Nunes tinha de seguir treinando por conta de algumas corridas do fim de ano. Mas, antes, teria de voltar sua atenção para os estudos. Fazia algumas semanas que não abria as apostilas e cadernos e teria provas em dezembro. E precisava estar preparado. Assim, seguiu sua rotina de acordar cedo, treinar, trabalhar na entrega de móveis para a Modelar o dia inteiro e depois ir para as aulas, de noite.Na primeira semana de dezembro fez os exames, no Colégio Catarinense. O resultado saiu na semana seguinte: dessa vez passou em Ciências e História. Ficou ainda em Português e Matemática. Mas ele sabia que estava bem encaminhado. As notas nessas duas matérias já estavam mais próximas da nota mínima de aprovação. O ânimo de Nunes foi renovado.Na última semana do ano, a equipe de Florianópolis, com Nunes à frente, participou da grande Corrida da TV Gaúcha, no dia 27 de dezembro. Foram de ônibus para Porto Alegre. Hospedaram-se num hotel muito ruim, no centro da cidade, próximo da rodoviária. A corrida seria de noite e a chegada seria no morro da TV. Nunes correu muito bem, mas ficou em segundo lugar. A prova foi vencida por um atleta gaúcho, Odacir Mendonça de Moura, que o superou na subida do morro e chegou alguns metros na sua frente.Após a corrida foram jantar numa churrascaria. Comeu alguma coisa que não fez bem (acredita que tenha sido

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uma carne de porco, que o organismo não aceitou bem). No dia seguinte pegaram um ônibus ao meio dia para São Paulo. Na viagem passou muito mal: cólicas, vômito, diarréia, enjoo. Foram 14 horas de horror dentro daquele ônibus. Chegaram em SP no dia 30. A corrida seria no dia 31. Correu, mesmo assim. Sentia-se na obrigação de correr. Afinal, a prefeitura estava pagando as suas despesas. Não podia se recusar a correr, mesmo que estivesse muito mal.Ficou em 125º lugar. Uma boa classificação. Mas ainda longe da melhor classificação de um catarinense na história das participações em São Silvestre40. Recebeu um troféu como o melhor atleta do Sul do Brasil. E ganhou do atleta gaúcho que o havia vencido, quatro dias antes.No dia seguinte, estava melhor. Sentia apenas dores fortíssimas na musculatura. À noite teria mais 10 horas de viagem de ônibus até Florianópolis. Aí começaria, pra valer, o ano novo, 1970.

40 Waldemar Tiago de Souza havia ficado em 34º lugar em 1953.64

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1970Em janeiro de 1970 Nunes pegou um ônibus e foi para Campos Novos, visitar a família. Descobriu que, em 1969 tinha nascido mais uma irmãzinha. Inês era agora a caçula da casa. Tinha sete meses. Já ficava sentada no chão, mas ainda não engatinhava. A família não parecia bem. Ou então eram os parâmetros de comparação de Nunes estavam ficando mais refinados. Mas aquela visita não lhe fez bem. Aquela miséria da sua família lhe incomodava muito. Precisava fazer alguma coisa. Ele mandava algum dinheiro, geralmente por Vale Postal dos Correios. O dinheiro era enviado para a irmã, Maria, que depois repassava para o pai, João Maria, pra comprar comida e “coisinhas” para as crianças.Mas aquilo já não parecia mais ser suficiente. De alguma forma Nunes sabia que tinha de fazer alguma coisa. Mas o quê? Ele também não ganhava muito. Tinha apenas atravessado a linha da miséria. Ainda era pobre. Mas já tinha notado que as pessoas que ganhavam melhor eram as que trabalhavam em escritórios ou que eram chefes. E sabia que, pra ser chefe tinha de saber ler e escrever direito. Tinha de ter instrução. Nunes precisava terminar logo seus estudos.Quando retornou a Florianópolis, Nunes resolveu que, além de fazer as aulas de Português e Matemática que ele ainda estava devendo (do Madureza Ginasial) começaria também a fazer as aulas do Madureza Colegial.Não era fácil, porque nas aulas do Madureza colegial era tudo muito mais complexo. Mais difícil de entender. Mas Nunes era aplicado. E não era mais um analfabeto completo. Já tinha entendimento das coisas. Tinha

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dificuldades nas aulas, mas conseguia enfrentar (nem sempre conseguia vencer).Agora Nunes treinava praticamente todos os dias e seguia trabalhando como entregador de móveis na loja da Modelar. Morava, ainda na mesma pensão, perto da Catedral.As vitórias de José Maria em todas as corridas do segundo semestre de 1969 começaram a chamar atenção dos oficiais do 14º Batalhão de Caçadores41, em Florianópolis. Eles estavam fazendo recrutamento de soldados antigos que tivessem bom comportamento, e queriam também formar uma boa equipe de atletismo. Nunes se encaixava muito bem nas duas coisas. Então recebeu uma proposta que foi feita pelos Sargento Teixeira e o Capitão Valporto: voltar a integrar o Exército. Reengajar. Passou algumas semanas fazendo testes, exames físicos e providenciando documentos. Finalmente, no dia 22 de abril de 1970 “foi reincluído no serviço ativo do Exército, no estado efetivo do 14º BC e 1ª Cia de Fuzileiros, tomando o número 925”42. Sentia-se em casa. Estava num ambiente conhecido, com regras que ele entendia bem.Mesmo no Exército, Nunes continuou estudando. Fazia algum esforço adicional para compatibilizar as escalas de serviço. Nunes geralmente pagava seus plantões nos finais de semana (escala vermelha), para poder ter as noites livres e poder ir para a escola. Como ele era uma “celebridade” dentro do batalhão, porque ganhava todas as corridas tinha alguma simpatia dos sargentos e até a admiração de soldados. Muita gente ajudava para que ele conseguisse estudar.Uma outra coisa boa foi que, num dos exames obrigatórios de saúde o cirurgião-dentista que atendia no 14º BC resolveu que iria consertar aquele dente

41 Em 1973, o então 14º Batalhão de Caçadores transformou-se no 63º Batalhão de Infantaria. Em 1986, o 63º BI recebeu a denominação histórica de Batalhão “FERNANDO MACHADO”

42 Transcrito da Folha de Alterações ocorridas durante o tempo em que serviu na 1ª Cia de Fuzileiros do 14ª Batalhão de Caçadores.

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escuro de José Maria. Aquele tratado com creolina lá na fazenda de Catanduvas. O tratamento durou algumas semanas, mas, finalmente, o sorriso do rapaz foi recuperado.Nos horários de Educação Física do seu pelotão Nunes ia pra pista de atletismo, treinar. O treinamento era dado pelo Sargento Teixeira. Nunes corria na pista, corria ao redor do quartel e, eventualmente, fazia treinamentos abertos, pelas ruas do Estreito. Ainda não havia alongamento, aquecimento, etc.No meio do ano, em julho, fez os exames de Madureza. Passou em Matemática do Madureza Ginasial (atual ensino Fundamental) e em História, Geografia, OSPB, do Exame de Madureza Colegial (atual ensino Médio). Ficou devendo Português do Madureza Ginasial e Matemática, Português, Física, Química e Biologia do Exame de Madureza Colegial.

OS JOGOS ABERTOSAo longo de 1970 Nunes participou de diversas corridas, vencendo todas com bastante facilidade. Em maio, no Campeonato de Atletismo promovido em comemoração aos 130 anos da PMSC ele “deu um banho”, vencendo, com tranquilidade, as provas de 3mil, 5mil e 10 mil metros. Em julho, disputou o Troféu Sampaio, novamente com vitórias maiúsculas nos 1500, 3mil e 5mil metros.Mas a competição mais aguardade era, sem dúvida, os Jogos Abertos, previstos para serem realizados em Concórdia no mês de outubro.A equipe de atletismo de Florianópolis treinava na pista do 14º BC, de tal maneira que o tema era muito vivo até mesmo entre os soltados que não faziam parte da equipe. Nunes era favorito para ganhar todas as medalhas de ouro que disputaria (1500m, 5mil, 10mil e revezamento 4x400m). Não havia nenhuma dúvida quanto a isto. Naquele ano, em qualquer prova da qual ele participasse a verdadeira corrida era pelo segundo

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lugar. A medalha de prata era disputada como um grande troféu. Era “o primeiro lugar entre os mortais”.Seguiram para Concórdia na sexta-feira, dia 16 de outubro, em ônibus fretados pela CME de Florianópolis. Passaram quase o dia inteiro viajando. Chegaram na cidade no final da tarde. O clima já era de festa. Muitas outras delegações já estavam na cidade. Só a chuva quebrava um pouco o clima de celebração.O desfile de abertura dos jogos, no sábado pela manhã, foi bastante prejudicado e havia uma dúvida sobre o estado da pista de atletismo e se a competição poderia mesmo ser realizada a partir do domingo, como estava na programação.Não demorou para vir a definição, ainda no sábado: o atletismo foi adiado. Seria realizado a partir de segunda-feira, se o tempo melhorasse. Não melhorou. Choveu muito no domingo, durante todo o dia. E continuou chovendo de noite. Na segunda-feira, pela manhã ninguém tinha dúvidas de que a competição seria, novamente, adiada. Nunes e outros atletas de Florianópolis improvisaram um treinamento nas ruas próximas da escola em que estavam alojados. Depois os atletas foram dispensados para assistir jogos nos ginásios cobertos.A chuva não dava trégua. O tempo melhorava por algumas horas. Todos ficavam esperançosos. Aí, quando se esperava que fosse firmar, vinha novamente a chuva. E foi assim na segunda, na terça e na quarta-feira.Finalmente, no dia 22, quinta-feira, o Boletim dos Jogos Abertos foi emitido com a seguinte mensagem:

“ATENÇÃO: Na abertura desta programação, somos obrigados a comunicar a todas as delegações participantes que, em virtude do mau tempo que continua se fazendo presente aos nossos XIº Jogos Abertos de Santa Catarina, o Conselho Técnico, em

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reunião extraordinária realizada hoje pela manhã, resolveu, de comum acordo com a CCO, cancelar, por serem impraticáveis as condições de disputas nos respectivos locais, as provas de ATLETISMO.Pelo ocorrido, que foge completamente à nossa vontade, apresentamos nossas excusas. C.C.O.”

Era a notícia que ninguém esperava receber, especialmente aqueles que tinham chances de conquistar medalhas. Mas não havia nada que se pudesse fazer. Era pegar o ônibus e retornar para Florianópolis. Sem as medalhas e sem os recordes para os quais estavam preparados para conquistar.

A RECONSTRUÇÃO DO ESTÁDIO E SUAS CONSEQUÊNCIASNo segundo semestre de 1970 houve uma grande reforma no estádio do 14º BC, onde eram realizados as competições e treinamentos de futebol e de atletismo. O campo foi totalmente refeito, com drenagem e replantio do gramado. A pista de atletismo foi totalmente reconstruída, com a recomposição do piso, novas medições e ajustes.O soldado Nunes foi encarregado, pelo capitão Valporto, para ser a pessoa que cuidava de todo o material que seria utilizado na reforma. Nunes ficou, evidentemente, muito empolgado com a tarefa e orgulhoso da responsabilidade. Dedicava-se com muita determinação e diligência. Não queria que nada saísse errado. Todo o material da obra passava pelas suas mãos. Ele viajava para Blumenau e Joinville, para comprar material e decidia o que podia e o que não podia ser utilizado na obra. Em fevereiro do ano seguinte, o comandante do Batalhão, Capitão Valporto, publicou um elogio oficial ao soldado Nunes que, entre outras coisas, mencionava que ele “conduziu-se de maneira exemplar em todas as ocasiões em que lhe era atribuida responsabilidades. Durante a reconstrução do estádio trabalhou na

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compra e controle de material, demonstrando um caráter bem formado, honestidade e zelo no trato com bens da Fazenda Nacional.”

Mas essa responsabilidade resultava em muito trabalho e praticamente não havia tempo para treinar nos horários normais. Nunes fazia isso durante o horário de almoço. Na verdade, substituía o almoço pelos treinos.Um quartel, como o leitor deve imaginar, não é uma colônia de férias. Se você não vai pro rancho na hora do almoço você simplesmente não almoça. Nunes acabava comendo alguma coisa mais tarde. Geralmente, pão (que ele guardava do café da manhã). Isto foi gerando uma fraqueza no organismo do atleta. Ele estava consumindo muita energia (no trabalho e nos treinamentos) mas não estava fazendo a devida reposição.Com o dia da inauguração do estádio se aproximando, o stress foi aumentando. Nunes não queria que nada estivesse fora do lugar. Que tudo estivesse bem resolvido. Sua própria saúde era a última das suas preocupações. Além disso, Nunes ainda tinha os exames de Madureza, cujas aulas ele não deixava de frequentar. Nos primeiros dias de dezembro fez as provas e saiu-se muito bem. Passou, finalmente, em Português do Madureza Ginasial (atual Ensino Fundamental) e ainda passou em Português, História, Geografia, OSPB, Física, Química, Biologia do Exame de Madureza Colegial (atual ensino Médio). Ficou apenas em Matemática. Estava quase chegando lá.Tanto esforço e preocupação, somados à alimentação deficiente cobraram a conta naquela segunda-feira, 7 de dezembro Nunes acordou sentindo uma dor de cabeça forte e uma fraqueza incomum. Mas ele não levou muito à sério. Tinha coisas para fazer. Ajustes finais. A inauguração já estava marcada para a quinta-feira (dia 10).Na terça-feira de manhã a dor de cabeça não tinha sumido. A fraqueza estava mais forte, sentia um pouco de febre, dores no corpo e tosse. Nunes notou que

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havia alguma coisa errada, mas achou que iria passar. Sempre passava.No terceiro dia, quarta-feira, dia 9, Nunes não estava nada bem. tinha vômitos e uma fraqueza insuportável. Começou a vomitar sangue e ficou apavorado. Foi procurar o médico. Levou uma bronca, por não ter procurado ajuda mais cedo. “Você está com pneumonia, rapaz. E, pelo jeito, é pneumonia dupla. Vai morrer, se não cuidar disso agora. Vou te mandar para o Hospital Geral e você vai ficar internado lá, até segunda ordem”.O médico falava enquanto preenchia guias e receitas. Nunes quis resmungar alguma coisa sobre a inauguração do estádio que seria no dia seguinte, mas não tinha forças. foi tomado por uma tristeza imensa. Percebeu que iria passar o dia da inauguração internado num hospital. Na verdade, passou os dez dias seguintes internado. A coisa era mesmo grave. Estava com um quadro de fraqueza geral muito intenso e os dois pulmões infeccionados. Se não fosse submetido a um tratamento rigoroso e repouso absoluto o quadro seria catastrófico.Nunes soube, depois, que a inauguração foi uma festa maravilhosa. Teve uma competição de atletismo. Participaram todos os batalhões de Santa Catarina, a Polícia Militar. Teve pouso de paraquedistas, uma festa e tanto.Nunes ficou de fora da festa. E ficou de fora, também, de todas as corridas de fim de ano. Ficou dois meses sem treinar. Quando retomou as atividades havia uma meta clara: as competições da Olimpíada do Exército, que em 1971 seriam realizadas em Belo Horizonte.

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1971O ano começou bem para José Maria Nunes. Em fevereiro recebeu um elogio do comandante do Batalhão, lido na Ordem do Dia e consignado em boletim. Dizia o seguinte:

“Como soldado auxiliar do DTF, conduziu-se de maneira exemplar em todas as ocasiões em que lhe era atribuida responsabilidades. Durante a reconstrução do estádio trabalhou na compra e controle de material, demonstrando um caráter bem formado, honestidade e zelo no trato com bens da Fazenda Nacional. Dedicado e bom companheiro. Além de auxiliar exemplar, representou o BC em diversas competições, alcançando sempre o primeiro lugar, elevando o nome do Batalhão. Modesto e bom filho. Desejo-lhe felicidades.” Capitão de Infantaria José Aurélio Valporto de Sá.

No início dos anos 1970 os militares, no Brasil, estavam em toda parte. Tinham imenso prestígio e poder. O poder, aliás, era exercido de forma total e, muitas vezes, arbitrária. As Forças Armadas enfrentavam a oposição das elites intelectuais que se opunham ao regime. Mas o governo tinha uma estratégia de propaganda muito eficiente. A população em geral tinha sua opinião manipulada por uma mídia controlada com mão de ferro e por um conjunto de fatos construídos, ou capitalizados pelo regime.Foi nesse contexto que uma competição entre militares do Exército, as Olimpíadas do Exército, ganhou ares de grande acontecimento nacional.

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No ano anterior (em 1970) a primeira Olimpíada do Exército, realizada em Curitiba-PR foi um acontecimento memorável. A Abertura, realizada no Estádio do Curitiba Futebol Clube, com um desfile (militar) das equipes participantes, foi algo espetacular. As equipes formavam grupamentos coloridos, com os atletas envergando seus uniformes esportivos, em uma demonstração de força, disciplina, organização e obediência, mas, ao mesmo tempo, de humanidade e proximidade da população. O povo comprava aquela ideia com ardor patriótico.Às vesperas de uma Copa do Mundo, nada mais natural do que abrir a competição com uma partida de futebol da seleção brasileira. O público delirava de alegria e prazer.O evento em Curitiba foi um sucesso total e a competição de 1971, marcada para Belo Horizonte, prometia ser ainda mais espetacular. Esperava-se algo ainda mais grandioso, com a participação das maiores estrelas do mundo artístico e esportivo do país.O “jingle” radiofônico “Ô ô ô — ô ô ô — Olimpíadas do Exército /todos cantando a uma voz / ô ô ô — ô ô ô — ô ô ô — olimpíadas / do Exército de todos nós”, na voz da de Clara Nunes, uma das maiores cantoras do Brasil, tomava conta das rádios do país inteiro, meses antes da competição começar.Por conta disso, assim que se recuperou, Nunes começou a treinar e se preparar para conseguir a vaga e representar o III Exército em Belo Horizonte. Nesse meio tempo caminho haveria uma competição seletiva. Os Jogos da 5ª Região Militar, que seriam realizadas em Curitiba, em Abril.A competição foi realizada no estádio Durival de Britto (Vila Capanema), do Colorado Esporte Clube43 que tinha uma boa pista de atletismo. Apenas o campeão e o vice da cada prova disputariam a competição nacional.

43 Este clube foi extinto em 1989, quando uniu-se ao Esporte Clube Pinheiros e deu origem ao Paraná Clube.

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Nunes competiu nos 1500m e nos 3000m. Venceu as duas provas com facilidade e garantiu uma das vagas para Belo Horizonte.

EM BELO HORIZONTEA abertura foi realizada no Mineirão, com a presença do Presidente da República, Emílio Garrastazu Médici e, naturalmente, do governador de Minas Gerais, Rondon Pacheco e do prefeito de Belo Horizonte, Osvaldo Pierucetti. Nunes ainda estava no gramado do estádio quando viu entrar em campo nada menos que oito campeões mundiais de Futebol para a partida entre as seleções do Rio de Janeiro (Guanabara) e de Minas Gerais. O jogo acabou empatado em 1 x 1 e o troféu acabou sendo disputado num “pitoresco” par-ou-ímpar, tendo como testemunha o próprio presidente da república. Os cariocas venceram. Foi uma semana de grandes acontecimentos. Todos os dias havia desfile militar nas avenidas de Belo Horizonte. Para o encerramento, foi programado um grande show no Ginásio Mineirinho com astros da música popular brasileira como Wilson Simonal, Elis Regina e Roberto Carlos. As escolas de samba do Salgueiro e da Mangueira “viraram Belo Horizonte de pernas para o ar” conforme noticiou o jornal O Globo. E a festa não se limitava à capital. Até em Contagem, cidade próxima a Belo Horizonte, houve desfile de carros alegóricos em Contagem. O evento todo foi programado para ser uma festa nacional de esporte, arte, gastronomia e turismo, com grande cobertura da imprensa. Vencer uma competição nas Olimpíadas do Exército significaria aparecer na principal vitrine nacional.Para Nunes, aquele era o ponto alto da sua carreira. Nunca havia estado num lugar tão bonito nem numa festa tão grandiosa. O pessoal da 5ª região militar, que conhecia os tempos do atletismo, já sabia que Nunes poderia vencer a sua prova. Nunes queria muito vencer. Havia treinado muito para isso.

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Naquela manhã do dia 7 de junho de 1971, quando entrou na pista, para correr os 3 mil metros, Nunes ficou bastante impressionado. A pista era de barro (saibro) mas era muito bem cuidada. As arquibancadas estavam lotadas com torcedores de todo o Brasil. Ele sabia que seus comandantes estavam ali também. Era uma boa oportunidade de “fazer bonito”.Dado o tiro de largada, Nunes deixou que, nas primeiras cinco voltas, os principais competidores disputassem a liderança da prova. Ficou correndo atrás, sem se perder do primeiro pelotão. Mas ele estava bem. Não se sentia desgastado. A respiração estava boa e não sentia nenhuma dor no corpo. Quando faltavam duas voltas resolveu sair, forçar o ritmo para sentir a reação dos adversários. Não houve reação. Ele disparou na frente e ninguém conseguiu acompanhá-lo. Entrou na última volta numa liderança confortável e acelerou ainda mais a corrida. Cruzou a linha de chegada com boa vantagem.Nunes foi o único atleta do Sul do Brasil a ganhar uma medalha de ouro no atletismo. Nem é preciso dizer que era “a estrela da companhia”. À noite foi convidado pelo capitão para ir jantar. Comeu alguma coisa que não devia. Talvez tenha abusado do tempero da comida mineira. Passou mal à noite e acordou muito fraco. Não tinha condições de correr os 1500 metros. Acabou dispensado da prova pelo treinador.Na viagem de volta, utilizaram um avião comercial, mas os militares (pelas razões já explicadas) entravam antes dos civis. Nunes já estava sentado no avião quando entrou e sentou-se ao lado dele ninguém menos do que o Rei, Roberto Carlos (acompanhado da Nice, sua mulher).Roberto Carlos havia participado, na noite anterior, do grande show do Mineirinho e estava retornando ao Rio de Janeiro. Nunes estava emocionado com o encontro, mas Roberto fez que não notou. Foi muito educado, perguntou se ele havia corrido, se havia ganho medalhas, fez brincadeiras… Muita gente passava ali e

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pedia autógrafos ao cantor. Nunes venceu a vergonha e pediu um autógrafo também. Roberto atendeu e assinou seu cartão do Exército (o crachá da competição). Por muitos anos Nunes teve mais cuidado e carinho com aquele crachá do que com a própria medalha de ouro que havia conquistado.Mas a medalha tinha uma importância muito grande. A vitória de Nunes nas Olimpíadas do Exército o colocou na vitrine. Ele se tornou muito conhecido, muito mais respeitado nos ambientes esportivos e dentro do próprio Batalhão (afinal, tinha sido o único atleta a conquistar uma medalha de ouro para o atletismo do Sul do Brasil.Logo que voltou recebeu a notícia de que havia sido convocado para o Campeonato Brasileiro de Atletismo das Forças Armadas, que seria realizado no Rio de Janeiro em julho. Isso significava que ele iria para o Rio de Janeiro, integrar-se à equipe do Exército Brasileiro e participar dos treinamentos durante quase um mês. E foi.O VI Campeonato de Atletismo das Forças Armadas realizado no Rio, nos dias 7 e 8 de julho de 1971 foi um grande sucesso. Nunes correu a prova de 5000m e ganhou a medalha de prata. O vencedor foi o atleta Carlos Alberto Alves, que era da aeronáutica. Era um “profissional”44 da aeronáutica. A Aeronáutica ganhou o campeonato, pois havia incorporado praticamente todos os grandes atletas civis do país.A medalha na competição garantiu a Nunes a convocação para participar do Campeonato Mundial das Forças Armadas, que seria realizado na Finlândia.Os atletas convocados para o Mundial retornaram aos seus estados e depois retornaram ao Rio de Janeiro, iniciando o treinamento para o campeonato mundial. Nunes chegou ao Centro de Treinamento do Exército no dia 18 de junho e apresentou-se para os treinamentos.

44 Era o que se dizia de atletas que entravam nas forças armadas apenas para treinar atletismo, sem nenhuma outra obrigação militar. Não era o caso do Nunes, que tinha diversas tarefas e obrigações militares no Exército.

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Mas havia um problema a ser contornado: os exames de Madureza Colegial estavam marcadas para o final de junho. Nunes conseguiu uma autorização para retornar a Florianópolis e fazer os exames. Mas teria de “se virar com isso”. Teria de ir até a Rodoviária Grande Rio, para marcar a passagem. Um colega, cabo, que dirigia um caminhão do Exército e teria algumas entregas para fazer ofereceu uma carona. O cabo, no entanto, não tinha autorização para ir, com o caminhão, até a rodoviária. Seu caminho pre-determinado, era outro. Ainda assim, ele disse: “não se preocupe. A gente vai até lá, sem problemas.” E foram. O cabo estacionou o caminhão perto da rodoviária e disse para Nunes “vá rápido. Eu nem devia estar aqui. Se alguém me vê vou tomar uma punição”. Nunes atravessou a rua em passos rápido e foi procurar o guichê da Penha.Mal tinha chegado na fila de espera para ser atendido e foi abordado por dois soldados da PE. A Polícia do Exército era temida porque, naqueles tempos, tinha autonomia para fazer praticamente qualquer coisa. Era extremamente severa, autoritária e, muitas vezes, arbitrária. Nunes estava com o cabelo meio comprido, barba por fazer e o uniforme do 14º BC, de Florianópolis e sem nenhum documento válido. Ele tinha apenas uma identidade civil no bolso (a sua carteira de identidade militar estava vencida. Por isto ele não estava com ela)De onde estava estacionado com o caminhão, o cabo viu os PEs se aproximarem e fazerem a abordagem. E percebeu que alguma coisa estava errada. Quando concluiu que Nunes estava sendo preso, o cabo fugiu com o caminhão, porque não poderia ser identificado. Seria preso também, porque não deveria estar ali.“Sua identidade, por favor” disse um dos PEs. Nunes gelou. Já sabia que não estava bem na foto. Colocou a mão no bolso, tirou a carteira de identidade e entregou ao soldado. Ele olhou e disse:“O senhor é civil. O que está fazendo com essa farda?”

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“Eu não sou civil, não senhor. Sou soldado do 14º BC de Florianópolis. Sou atleta. Estou no Centro de Treinamento do Exército treinando para o Campeonato Mundial”“E por que não está no quartel? Cadê a sua autorização para estar aqui na Rodoviária? Tá fugindo do quê?”“Não tô fugindo de nada não, senhor. Vim comprar passagem para ir fazer o exame de Madureza em Florianópolis”.A essas alturas os guardas da PE já haviam perdido a paciência. A história estava muito mal contada. Pegaram Nunes pelo braço e um deles disse: “você vem com a gente”. E foram.Durante cerca de seis horas (das três da tarde até nove da noite) o caminhão da PE circulou pelas ruas do Rio de Janeiro. Nunes, desesperado, sendo encarado por dois brutamontes da PE. Era um caminhão aberto. O sol e o vento maltratavam o “passageiro”. Nunes, sentado no meio dos dois “carcereiros” sentia-se exposto. Na cabeça dele todas as pessoas na rua sabiam que ele estava preso e estava sendo exibido como um criminoso pelas ruas do Rio de Janeiro. Era um sofrimento sem fim.Por fim, já eram quase nove da noite quando o preso foi recolhido à sede do quartel da PE. O oficial entregou Nunes e foi dizendo “esse cara aqui diz que é atleta, mas desacatou a minha autoridade e tentou fugir”. Nunes retrucou: “o senhor está sendo injusto. Eu não fiz nada disso. Não desacatei ninguém. Muito menos tentei fugir. Eu sou militar. Sou atleta do Exército. Vou participar do campeonato mundial das Forças Armadas.” Ninguém estava mais prestando atenção. O Oficial do dia já havia determinado: Nunes foi recolhido em uma cela de 2 x 2 metros, escura, com um vaso sanitário sem tampa e sem papel. No meio da cela, um banco de madeira. Tiraram dele a farda. Deixaram apenas a camiseta, o calçao e o tênis (mas tiraram os cordões do tênis e do calção).

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Não deram nada para ele comer. A essas alturas a confusão já estava desfeita. Já tinha verificado a história dele e já sabiam que tratava-se, realmente, de um militar. Estavam apenas aguardando alguém da sua unidade que viesse fazer o resgate. Mas, para isso, alguém, lá no Centro de Treinamentos, precisaria ser informado.Nunes não apareceu no alojamento dos atletas. O sargento Conceição, responsável pelo alojamento, ficou preocupado. Deu uma prensa em todo mundo. Só então cabo, motorista do caminhão, resolveu contar: “o Nunes foi preso pela PE”. O pobre cabo, depois, receberia uma punição, por ter conduzido a viatura do Exército num roteiro diferente do determinado em suas ordens. Mas esse era o menor dos problemas naquele momento.O Sargento Conceição pegou uma viatura e correu para a sede da PE. Chegou lá, fez algumas perguntas e localizou o preso. Perguntou: “o que é que houve, soldado?” Nunes contou o que tinha havido. Começou a chorar desesperadamente. O Sargento não queria problemas com a PE. Apenas tirou Nunes dali e o levou de volta ao alojamento. Nunes perdeu as provas do Exame de Madureza. Perdeu seis meses nos seus planos de terminar os estudos. Andava triste e muito contrariado. Foi quando explodiu a briga com um cabo, lançador de dardo, era um gaúcho descendente de alemães, muito racista e vivia pegando no pé do Nunes, principalmente, por causa do episódio da Olimpíada do Exército. Vivia dizendo que “o Nunes se encagaçou pra não correr os 1500m”. Depois do episódio da prisão, o cabo tinha um prato cheio: “negro é assim mesmo. Quando não caga na entrada caga na saída”.O cara não sabia que o negro em questão era lá do meio oeste de Santa Catarina, região do Contestado, uma terra conhecida pela valentia dos seus homens. Nunes deitado na sua cama, deu uma olhada feia para o cabo. O rapaz encarou de volta e falou “Negrinho safado. Te comporta, se não eu vou te dar uns tapas”

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“Você não vai me dar tapa nenhum, filho da puta” Nunes falou já saltando da cama e pegando um dardo que estava no chão. O cabo veio pra cima dele (não percebeu que ele estava com o dardo). Nunes atacou com o dardo em direção ao peito do oponente. Errou o golpe (ou o cabo se esquivou). A ponta do dardo quebrou-se, na parede. Nunes partiu pra cima do Cabo. Foi contido por colegas. Outros colegas, que, até ali apenas observavam, partiram pra cima do cabo. Deram uma dura nele. Ameaçaram espancá-lo se abrisse o bico e relatasse a briga para algum superior. Ali eram todos atletas. A hierarquia era outra. Então este incidente nunca foi relatado oficialmente, porque os sargentos presentes resolveram fazer vistas grossas. Ninguém gostava do cabo gaúcho, que já era “manjado” desde a Olimpíada do Exército. Sabiam que Nunes tinha razão, mas se a briga fosse relatada os dois seriam punidos igualmente.Aquele episódio foi a gota d’água. Nunes já havia perdido completamente a motivação. Ir para a Finlândia, um lugar que ele nem fazia ideia de onde ficava, era uma coisa sem importância. Além do mais, a única coisa que importava era voltar para Florianópolis, voltar a estudar e passar no Supletivo.Foi procurar o superior e pediu para ser dispensado. Disse que estava ficando doente e que não estava aguentando a rotina nos treinamentos.Quando chegou em Florianópolis, o Coronel Zaldir recebeu a ordem de aplicar ao soldado uma punição, ainda por conta da prisão na PE.“O que é que você fez, no Rio, soldado? Aqui está escrito que você foi preso por desacatar a um oficial e que estava fora da sua área de autorização…” Nunes caiu num choro incontido. Sentia-se impotente diante das mentiras que estavam naquele documento. E sentia que não havia como reagir.“Eu estava servindo a minha pátria, senhor”. Nunes falava aos prantos. “fui preso por uma injustiça. Eu

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tinha ido marcar a minha passagem para vir fazer os exames do Madureza. Os caras da PE me prenderam e não aceitaram minhas explicações. Me jogaram numa cela escura… Eu não preciso disso. Eu só queria servir a minha pátria… E eu não sei o que eu posso fazer para provar para o senhor que isso aí é a maior mentira. Eu não fiz nada disso que está escrito. Nunca desacatei nenhum superior, nos três anos que estou no Exército…”O Coronel prestou atenção naquilo e não sabia exatamente o que fazer. Gostava do soldado. Não queria prejudicá-lo. No fundo, sabia que ele estava falando a verdade. Era um bom soldado.Conversou um pouco e deu a ordem: “Vá para a Companhia. Volte para o seu trabalho. Vou ver o que fazer para resolver este problema”Depois que Nunes saiu, o coronel chamou seu ajudante e deu a ordem: “Arquiva isso aqui. Não faça nenhum registro na ficha desse rapaz. Tá resolvido”.De volta a Florianópolis, Nunes estava em casa. Voltou aos treinos. Teria algumas competições regionais pela frente. Participou do Campeonato de Atletismo da Semana do Exército e ganhou, como era de se esperar, os 1500 e os 3000 metros (além de um 2º lugar no revezamento 4x100m). Além disso, venceu também a Corrida Rústica do Dia do Soldado, na distância de 7 km. Começou a se preparar para a competição que já havia conquistado, definitivamente, o seu coração: os Jogos Abertos de Santa Catarina. Ele era bi-campeão, poderia ser tri (como a seleção brasileira de futebol) se o Atletismo dos Jogos no ano anterior, 1970 não tivessem sido cancelados por conta das chuvas.

OS JOGOS ABERTOS DE 1971 - RIO DO SULEm 1971 os jogos foram realizados em Rio do Sul. Havia muita animação na equipe. Nunes havia convencido alguns soldados do Exército para integrar a equipe de

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Florianópolis de Atletismo nos Jogos Abertos: Maneca45, que depois foi jogar no Avaí, era um excelente lançador de dardo e Costa46 jogava volei e corria. Toninho e Balduíno também chegaram a participar, mas fizerm sucesso mesmo mais tarde, como campeões no futebol profissional pelo Avaí.A participação de Nunes nos Jogos Abertos de Rio do Sul foi “um passeio”. Ele honrou o favoritismo absoluto que tinha. Não havia dúvidas de que, nas provas dele, todos os demais corriam pela medalha de prata. Nunes conquistou a medalha de ouro nos 1500m47, no 5 mil48 e nos 10 mil metros49. Nos 10 mil metros chegou quase uma volta à frente do segundo colocado.Depois dos Jogos Abertos, de volta a Florianópolis, as preocupações voltaram-se para as provas do Exame de Madureza. As mesmas que ele perdeu por ter sido preso, no Rio de Janeiro, em julho. Fez as provas em Dezembro e passou em História, Geografia, OSPB, Física, Química, Biologia do Exame de Madureza Colegial (atual ensino Médio). Ficou apenas em Português e Matemática. Faltava pouco.Nunes ainda estava saboreando o resultado dos exames quando o Sargento Teixeira trouxe a novidade: “vamos representar Santa Catarina numa corrida nova que a Gazeta Esportiva criou.” Tratava-se da Corrida de Integração Nacional, que teria representantes de todos os estados. Nunes ficou todo animado. Tinha corrido a São Silvestre, no final de 1969, mas não tinha ido bem, por conta de ter passado mal durante a viagem. Mesmo

45 Manoel Zeferino Batista - ganhou ouro no dardo, com recorde.46 Walter José Costa - ganhou a medalha de prata nos 200m e ouro no revezamento 4x100m47 JASC-1971 - 1500 METROS

1º - José Maria Nunes (Florianópolis) - 4min17,1s2º - Paulo Cezar Zimmer (Florianópolis) - 4min21,2s3º - João Capelletti Batalha (Lages) - 4min22,8s

48 JASC-1971 - 5 MIL METROS1º - José Maria Nunes (Florianópolis) - 16min21,0s2º - Jadir Kieler (Blumenau) - 16min40,9s3º - Carlos Roberto Machado (Brusque) - 16min59,2s

49 JASC-1971 - 10 MIL METROS1º - José Maria Nunes (Florianópolis) - 33min48,0s2º - Jadir Kieler (Blumenau) - 34min40,9s3º - Célio da Rosa Nascimento (Florianópolis) - 35min33,0s

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assim, tinha obtido, na ocasião, a melhor classificação de um atleta do sul do Brasil. Nessa Corrida da Integração Nacional participariam apenas atletas selecionados em cada Estado. Seria uma espécie de Corrida Preliminar, com o objetivo de divulgar a corrida principal. No dia da prova o Jornal A Gazeta Esportiva publicou uma foto de todos os principais atletas, com a seguinte legenda:

“Os Estados de nosso país estão representados na grande noite do pedestrianismo mundial. É um abraço bem brasileiro ao mundo que nos visita com os seus campeões. É o festival que marca um encontro do esportista com as esperanças para o ano que surje”

Nunes achou aquilo muito bonito. Poético! Uma motivação para a corrida, sem dúvida. A prova foi muito disputada, até o oitavo quilômetro. Daí pra frente o pelotão da liderança começou a se definir e a corrida acabou sendo vencida por José Silva, da Aeronáutica. Aliás, praticamente todos os cinco primeiros colocados50 eram militares, do Exército, da Marinha, da Aeronáutica ou de alguma Polícia Militar.

50 CORRIDA DA INTEGRAÇÃO NACIONAL -1971 - 9 MIL METROS1º - José Silva (São Paulo) - 26min26,2s2º - Paulo Roberto da Guia (Guanabara) - 26min37,8s3º - José Maria Nunes (Santa Catarina) - 27min05,4s4º - Luis Cabral de Souza (Rio G. do Norte) - 27min21,2s5º - Ivo Alves da Costa (Guanabara) - 27min37,0s

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1972Quando retornou de São Paulo Nunes tinha direito a um mês de férias do 14º BC. Como fazia praticamente todos os anos, foi nas lojas, comprou roupas e brinquedos para os irmãos menores e foi visitar a família em Campos Novos. Inês, a mais nova, estava com dois anos e meio. Já andava por toda parte. Mauro tinha três anos, Neusa estava fazendo aniversário: cinco anos. Miro tinha sete, Sérgio, 9, já ajudava na roça. Pedro, 11. Júlio, 12 e João Francisco ia fazer 15 anos no mês seguinte, já era um moço, já fazia dois anos estava morando numa fazenda em Curitibanos, nas mesmas condições que ele, Nunes, tinha ido para a fazenda de Catanduvas. Tonho, com 17 anos, já não morava mais em casa fazia tempo, assim como Helena, 19 anos, que tinha arrumado um emprego de doméstica em Campos Novos e Tião, que a essas alturas ninguém sabia ao certo por onde andava (estava trabalhando em alguma construtora, em São Paulo, na obra de alguma estrada, pois era nisso que ele trabalhava. Maria da Luz estava casada, em Campos Novos, e já tinha duas filhas, uma delas, Simone, era afilhada de Nunes e ganharia um presentinho especial. Uma muda de roupa dessas de usar nos domingos, para ir na missa.O pai e a mãe também ganharam presentes, mas a alegria de ter o filho mais velho em casa era o melhor que podia acontecer. Dona Reasilva caprichou nas comidinhas e Seu João Maria contava as novidades para o Zeca (sim, em casa ele ainda era chamado de Zeca. E continuaria assim por mais uns dois ou três anos). E as novidades naquele janeiro de 1972 não eram boas. Nem sempre tinha trabalho e o dinheiro era sempre muito curto para alimentar tantas bocas famintas.

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Nunes gostava de ir visitar a família, mas, depois que chegava lá, ficava muito angustiado com aquilo tudo, a impotência era uma sensação muito ruim. E ele não sabia o que fazer a respeito.Ficou por lá menos de uma semana. Na viagem de volta não pregou o olho. Estava muito triste com aquilo tudo.Em Florianópolis, entregou-se novamente aos treinos e aos estudos. Mais do que nunca, precisava resolver aquilo. Estudar parecia ser uma saída para melhorar de vida e melhorar a vida da sua família.

UMA TURMA DE ESTUDANTES NO QUARTELDurante o ano de 1972 a Divisão de Educação Física da Secretaria da Educação estava organizando um curso de nível médio chamado de Curso Normal de Educação Física. A turma era composta de 30 alunos, metade rapazes e metade moças. No primeiro semestre daquele ano, as aulas de atletismo estava sendo realizadas nas dependências do Batalhão do Exército. Nunes era o soldado designado para atender os alunos e repassar os materiais para as aulas. Isso o deixava próximo aos professores e alunos. Foi nessa ocasião que despertou nele o desejo de fazer um curso de Educação Física. Mas ele precisaria, antes, terminar o segundo grau (atual ensino médio).O curso era de período integral, de tal maneira que os alunos passavam o dia inteiro no quartel. Chegavam cedo, geralmente à tempo de assistir a cerimônia de hasteamento da bandeira, com a execução do Hino Nacional e a leitura da ordem do dia. Aquela formalidade toda era uma coisa que encantava os jovens futuros professores.Foi também, nessa ocasião, que ele conheceu Marisa. Ela era uma das alunas do curso. Mulata, alta, magra, muito bonita, chamava atenção pela desenvoltura nas aulas. Logo Marisa ficou sabendo que Nunes não era um soldado qualquer e o interesse entre eles agora era recíproco. Conversaram algumas vezes, mas a coisa não foi muito além disso. Afinal, os superiores haviam

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dado instruções muito claras que não queriam “gracinhas” dos soldados com as alunas do curso. Qualquer troca de palavras maior do que a necessária para o andamento das aulas poderia ser mal interpretada por um cabo, um sargento ou por um dos professores do curso.

PROPOSTAS PARA SAIR DO EXÉRCITODurante todo o ano anterior, e nesses primeiros meses do ano Nunes tinha recebido propostas para sair do Exército. Em Rio do Sul, durante os Jogos Abertos, tinha sido procurado por um dirigente de Blumenau, com uma proposta para ir correr por lá. A conversa acabou chegando aos ouvidos dos dirigentes de Florianópolis que ficaram com a pulga atrás da orelha. Então resolveram procurar Nunes e fazer a ele uma proposta: ele poderia ser contratado como professor de Educação Física no Instituto Estadual de Educação e ainda poderia ter algumas aulas em escolas do município.“Mas como é que eu posso ser professor, se eu nem terminei meus estudos ainda?”“Não se preocupe com isso agora. Você vai ser um professor contratado. Não precisa ser formado. E você só vai ensinar Atletismo. Disso você entende”De fato, era muito comum, naquele tempo, que professores do primário não tivessem completado ainda o Segundo Grau. O nível de exigência, em termos de formação era muito menor do que nos dias de hoje. Nunes ficou bem interessado.Os dirigentes da CME de Florianópolis, com medo de que Blumenau “desse o bote” antes, começaram a pressionar Nunes. Recorreram ao presidente do Figueirense, o Major Ortiga51 para facilitar as coisas.O figueirense estava se tornando o grande clube de futebol da década de 1970. O Major Ortiga tinha planos interessantes para o clube. Conversou com Nunes e conversou até com os comandantes do 14º BC. Queria 51 José Mauro da Costa Ortiga - um dos mais notáveis presidentes do famoso clube de

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formar um time de atletismo no Figueirense e, para isso, queria recrutar os melhores. Nunes estava no topo da lista.Assim, Nunes decidiu dar baixa do Exército Brasileiro. O Boletim do Batalhão publicou elogio oficial, assinado pelo Comandante do 14º BC, Coronel Zaldir de Lima, nos seguintes termos:

“Por ter sido licenciado das fileiras do Exército, em 21 de abril de 1972, cumpre-me o dever de justiça registrar as qualidades do soldado e cidadão do Exército, Sd. José Maria Nunes. Altamente educado e disciplinado, sempre conscio de suas obrigações, prestou relevantes serviços na reconstrução do estádio, trabalhando aos sábados e feriados, dando de si o máximo até mesmo com o sacrifício de seus estudos. Neste mesmo estádio, que ajudou a construir com suas próprias mãos, pode elevar bem alto a bandeira do nosso glorioso 14º BC, com suas brilhantes vitórias estas que ultrapassavam os limites desta Organização Militar, levando o Sd. Nunes, o nome do 14º BC para fora deste estado, fazendo-o brilhar nas Olimpíadas do Exército e, posteriormente, na Corrida Integração, onde o Sd. Nunes figurou entre os melhores corredores do País, representando Santa Catarina. Exemplos como este devem ser seguidos pelos jovens soldados atletas. Desejando-lhe as maiores felicidades em sua vida civil, asseguro ao Sd. Nunes que seus feitos jamais serão esquecidos e seu nome será o 1º na galeria dos grandes atletas do 14º BC”.

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Nunes, em princípio, não tinha noção de que poderia dar aulas. Por isso não considerou a proposta do IEE e aceitou a proposta do Major Ortiga.O Figueirense tinha duas Lojas Lotéricas em Florianópolis. Uma funcionava no centro da cidade e a outra no continente, perto do ponto final da linha “Canto”. Ortiga ofereceu a Nunes um emprego numa Loja Lotérica (uma das primeiras da cidade) que funcionava próximo do estádio Orlando Scarpelli, no estreito.Nunes começava a trabalhar as 7 horas da manhã e trabalhava até as seis horas da tarde, recebendo as apostas, perfurando os cartões e registrando as cobranças feitas. Comia junto com os jogadores. (mas, quando o time jogava fora de Florianópolis, não tinha comida). Ia para a aula à noite. Morava numa pensão. Na verdade era um quarto, nos fundos da casa de um casal de origem alemã. Nunes morava nessa pensão desde o tempo em que estava no Exército. Treinava durante o intervalo do almoço ou à noite, depois das aulas.Aquilo não tinha jeito. Durou apenas um mês. Nunes procurou a professora Mafalda Spreegman, coordenadora da Educação Física do IEE, e João Aderson flores52 que era o secretário de educação do município e colocou Nei Viegas (o presidente da CME de Florianópolis) na conversa.Eles arrumaram para que Nunes desse aula como professor substituto no IEE e também como professor do município, numa escola do Rio Vermelho. Ia com uma Kombi da prefeitura, duas vezes por semana.Eles prometeram que muitas coisas seriam boas para Nunes em Florianópolis. Em julho iria abrir uma faculdade de Educação Física em Florianópolis (da

52 João Aderson Flores - psicólogo e pedagogo, ex-atleta - era, em 1972, secretário municipal de Educação de Florianópolis. Foi o idealizador do Conselho Municipal de Esportes, quando promoveu a construção do ginásio municipal Carlos Alberto Campos e a realização em Florianópolis dos Jogos Abertos de Santa Catarina pela segunda vez (em 1977).

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Udesc) e ele poderia, quando concluísse o segundo grau, começar a faculdade em Florianópolis.Mesmo depois de sair da Loja Lotérica do Figueirense, Nunes continuava treinando ao meio dia, na pista do 14º BC. Era conhecido do pessoal. Tinha autorização do Sargento Teixeira para usar a pista e os banheiros. A equipe de Florianópolis treinava lá no Sábado.Nunes era o único atleta em Florianópolis (talvez em Santa Catarina) que treinava todos os dias. Tinha conversado muito com os atletas de ponta que encontrava em competições nacionais e aprendeu que eles faziam uma coisa diferente do que se fazia aqui em Santa Catarina: eles treinavam todos os dias. Nunes não tinha um treinador que o orientasse. Treinava sozinho, sem controle de cronômetro nem pessoal externo cantando as voltas. Ainda assim, com essa “nova” maneira de encarar os treinamentos, ele chegou em Itajaí, para os Jogos Abertos daquele ano como favorito absoluto.A equipe de atletismo masculino de Florianópolis era muito forte e Nunes era a grande estrela da equipe, garantindo quatro medalhas de ouro, nos 1500m, 5 mil e 10 mil metros, com requintes de excelência: quebrou o recorde da competição nas quatro provas53.Marisa, aquela mesma que era aluna do curso de Educação Física que tinha aulas no quartel, no início do ano, agora estava trabalhando na arbitragem da competição. Os dois se reencontraram. Iniciaram um

53 JASC-1972 - 1500 METROS1º - José Maria Nunes (Florianópolis) - 4min06,6s (recorde)2º - Jorge Luis da Silva (Florianópolis) - 4min13,3s3º - Bartolomeu Ismael Martins (Itajaí) (tempo não registrado)

JASC-1972 - 5 MIL METROS1º - José Maria Nunes (Florianópolis) - 15min43,0s (recorde)2º - Jorge Luis da Silva (Florianópolis) - 16min15,8s3º - Bartolomeu Ismael Martins (Itajaí) (tempo não registrado)

JASC-1972 - 10 MIL METROS1º - José Maria Nunes (Florianópolis) - 32min13,9s (recorde)2º - Jorge Luis da Silva (Florianópolis) - 36min16,6s3º - Bartolomeu Ismael Martins (Itajaí) (tempo não registrado)

JASC-1972 - REVEZAMENTO 4x400 METROS1º - Florianópolis - 3min34,9s

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namoro. Esse namoro, no entanto, não foi adiante. Não se entenderam direito e romperam um mês depois, já em Florianópolis.Nunes tinha informações de que os grandes atletas faziam preparação final para corridas de São Silvestre em cidades de grande altitude. Tinha lido alguma coisa sobre a preparação dos atletas para os Jogos Olímpicos do México, em 1968, a Copa do Mundo de 1970 e sobre o desempenho de atletas como o colombiano Victor Mora, que treinavam em grandes altitudes.Foi pedir ao João Aderson Flores e ao Nei Viegas (pres. da CME) apoio e patrocínio para que pudesse ir treinar por quatro semanas em São Bento do Sul, no norte do estado. A cidade está situada a 250 km de Florianópolis e tem uma altitude de 839 metros (mas chega a ter 1100 metros, em alguns pontos do município). Tinha, na época, uma população de uns 45 mil habitantes.Nunes era uma personalidade de muita visibilidade e conseguiu o apoio que precisava, não só da CME de Florianópolis como também do Institudo Estadual de Educação, que foi o principal patrocinador da empreitada. Com isto a instituição teria o direito de ver o atleta vestindo o seu uniforme no dia da Corrida. Mas, antes, Nunes tinha pela frente outro desafio. Fazer as provas do supletivo de segundo grau (Madureza Colegial) no Colégio Catarinense. Fez e foi muito bem. Logo depois da prova foi publicado o gabarito. Ele viu que havia acertado mais de 70% das questões. Tinha, finalmente, vencido o Supletivo. Estava pronto para dar o passo seguinte: ir em busca de uma faculdade. Descobriu que em Santos havia uma faculdade e que o vestibular seria em Janeiro. Logo depois da corrida da Integração Nacional, para a qual estava inscrito, agora defendendo as cores do Instituto Estadual de Educação. Podia ir para São Bento do Sul mais tranquilo.

SÃO BENTO DO SULEm São Bento, Nunes ficou num apartamento bom no hotel Stelter, uma majestosa construção antiga (de

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1918). Teria a oportunidade de aprimorar os treinamentos e ainda fazer um bom “retiro espiritual”. Clima e sossego não faltavam.Ricardo Hessel, um amigo esportista de São Bento, levava Nunes de carro até Rio Negrinho, para que ele pudesse voltar correndo. Nunes também aproveitava os morros da cidade para seus treinos. Treinava duas vezes por dia. 9 da manhã e no final da tarde. Mas, na medida que o dia da prova se aproximava, passou a treinar apenas no final da tarde.No tempo que tinha livre, dormia. Também tinha aprendido com um treinador de atletismo, quando participou dos treinamentos no Rio de Janeiro, que “o repouso faz parte do treinamento”.Nunes saiu de São Bento no dia 27 de dezembro. Foi para Florianópolis, pegar dinheiro, deixar bagagens e receber instruções. Pegou um ônibus para São Paulo no dia 28 e chegou em São Paulo na manhã do dia 29. A instcrição não precisava ser feita antecipadamente. Ainda era possível, naquela época, fazer a inscrição quando chegava lá. Além disso, Nunes era uma das estrelas da competição. Afinal, havia sido terceiro lugar no ano anterior. Ele ficou hospedado num hotel barato, próximo da sede do jornal Gazeta Esportiva, promotora da corrida. Nunes tinha uma reserva pessoal de dinheiro, além daquele que havia sido dado pela Prefeitura de Florianópolis. Mas essa reserva era para as despesas que ocorreriam depois do dia 2, quando ele iria fazer o vestibular para a faculdade de Educação Física em Santos.Nunes foi recebido pelo jornalista Júlio Deodoro e foi tratado com todo o respeito que um favorito merece. Julio fez os registros, entregou o material, marcou uma hora para fazerem uma foto com todos os atletas participantes.

A HORA DA VERDADE!

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No dia 31 de dezembro, enquanto aquecia para a corrida, José Maria Nunes não fazia ideia do que aquela noite significaria na sua carreira.Exatamente às 22 horas o secretário municipal de esportes de São Paulo, Paulo Machado de Carvalho54

deu o tiro de largada e romperam na Avenida Paulista. Logo depois começaram a descida da Brigadeiro Luis Antônio (a mesma que, hoje em dia é a última subida antes da reta de chegada — o percurso, naquela época era no sentido oposto). José Venancio, de Brasília assumiu a frente. No meio da Brigadeiro José Luis de Souzam da Guanabara tomou-lhe a frente, perseguido de perto por Luis Caetano, de São Paulo Odacir Mendonça de Moura e José Maria Nunes. Quando chegaram na Avenida São João Nunes assumiu a frente e impôs uma estratégia de força para descolar do grupo. Felizmente deu certo e nenhum deles conseguiu acompanhar. O público começou a se empolgar. Muita gente assistia a corrida, na calçada, com um rádio de pilha grudado no ouvido, acompanhando a narração dos locutores da Rádio Gazeta e da Rádio Bandeirantes. Quando Nunes passava, a gritaria era imensa e os aplausos eram entusiasmados. Ele nunca tinha sentido algo assim, quanto mais corria, mais forças encontrava para correr. Os dois atletas que corriam uns dez metros atrás de José Maria, Luis Fernando Caetano e José Luis dos Santos eram da PM de São Paulo e, por isso contavam com o apoio dos motociclistas batedores (que também eram da PM)55. Nem assim eles conseguiram superar o catarinense. Na subida da Consolação Nunes acelerou ainda mais as passadas. Subiu tranquilo. Quando chegou na Avenida Paulista era o líder absoluto da prova. Correu forte mas com tranquilidade até a linha de chegada, onde foi recebido por aplausos, gritos, foguetes e o som alto das caixas de som inundando a 54 O “Marechal da Vitória” apelido que ganhou por ter sido o chefe da delegação brasileira em

duas Copas do Mundo. Por conta disso, o Estádio do Pacaembu, em São Paulo é batizado com o seu nome.

55 Esta observação foi feita na reportagem do dia seguinte, no jornal A Gazeta Esportiva92

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rua com o seu nome: José Maria Nunes, de Santa Catarina, atleta do Instituto Estadual de Educação, Campeão da 2ª Corrida da Integração Nacional!56

56 CORRIDA DA INTEGRAÇÃO NACIONAL - 19721º - José Maria Nunes - IEE, Santa Catarina - 26min14s2º - José Luis de Souza - PM, Guanabara - 26min36s3º - Luis Fernando Caetano - PM, São Paulo - 26min56s4º - João Marques - PM, São Paulo - 27min04s5º - Odacir Mendonça de Moura - Sogipa, Rio Grande do Sul - 27min17s

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1973Os primeiros raios de sol de 1973 encontraram José Maria Nunes Campeão e feliz. Mas Nunes não tinha noção do que significava a vitória na corrida da Integração. Ficou feliz, é verdade, pelo que tinha acontecido na noite anterior. Mas entendia que apenas tinha cumprido o seu dever. Foi cuidar da vida.“Cuidar da vida”, no caso, significava ir para Santos, fazer o vestibular. Nem ficou para participar do meeting de atletismo que aconteceria no Ibirapuera.Nunes recebeu uma proposta do Sesi de São Paulo (professor Corujeira e professor Asdrubal) para ficar em São Paulo. Pela proposta, Nunes moraria em Santos (onde faria a faculdade), e correria pelo Sesi. Um jornalista do jornal Gazeta Esportiva, que era muito amigo do professor Corujeira, estavam pleiteando até uma bolsa na faculdade. Havia todo um esquema para que José Maria ficasse, definitivamente, em Santos, correndo pelo Sesi de São Paulo.Ao chegar em Santos, foi parar numa pensão, no Canal 2. O vestibular na Faculdade de Educação Física de Santos (hoje integrante da Universidade Metropolitana de Santos57) seria no dia 4 (quinta-feira). Essa escola era muito importante, na época, pois tinha vários alunos famosos, como Pelé, Cláudio e Edu (jogadores do Santos).Quando Nunes estava fazendo as provas físicas foi reconhecido por um dos professores, que fez o maior fuzuê: “olha aqui, gente: temos um ilustre campeão fazendo a nossa prova. Esse rapaz foi campeão na Corrida da Integração, preliminar da São Silvestre no

57 Campus Bandeirante II - FEFIS (Faculdade de Educação Física de Santos)94

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dia de Ano Novo!” Aquilo provocou um ajuntamento e atiçou a curiosidade de todos.Nunes foi muito bem nas provas físicas, naturalmente, Só foi mal na natação (na verdade, quase se afogou na piscina). Mas o vestibular tinha ainda uma prova escrita (de conhecimentos) e uma redação. Nunes até foi bem nas provas de conhecimentos. Mas foi muito mal na redação, cujo tema foi “os pródromos da independência” (Nunes não fazia a menor ideia do que significava a palavra “pródromos”) mas, nessas alturas, não importava mais. O professor que corrigiu a prova, deu uma olhada nos resultados da prova de conhecimentos e nas provas físicas e confirmou, ali mesmo: “Tá aprovado. Esse campeão vai ser do nosso time.”Nunes fcou feliz e sentia-se realizado. Saiu para dar uma caminhada e ver os navios no porto de Santos.

ENQUANTO ISSO…Em Florianópolis, Nei Viegas, João Aderson Flores e Nilton Severo estavam tendo trabalho para localizar José Maria. Sabiam que ele havia vencido a prova mas não tiveram contato com ele até então. E José Maria nem imaginava que eles estivessem se importando com isso.Conversando, os três tiveram a ideia de ligar para o jornal A Gazeta onde, por acaso, alguém sabia o telefone da faculdade de Educação Física de Santos. Na faculdade eles tinham o nome, o endereço e o telefone da pensão onde Nunes estava alojado. E foi assim que ele foi localizado e encontrado.Pelo telefone, Nei Viegas queria saber “Quando você volta para São Paulo?” Nunes respondeu que já tinha terminado as provas em Santos e que voltaria para São Paulo imediatamente. Viegas orientou que ele permanecesse no hotel, em São Paulo, até o dia seguinte. Nós iremos até lá buscar você.

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Nunes não entendeu direito o que significava aquilo. Como assim? Eles vêm me buscar por que? O que foi que eu fiz? O que eles estão planejando?Quando Nei Viegas chegou e viu o tipo do hotel em que Nunes estava hospedado ficou estarrecido. Tratava-se de um hotel de alta rotatividade, onde casais se encontravam para fazer programas sexuais. Aquilo era uma espelunca. Viegas fez que não notou e disse simplemente. Vamos sair daqui agora. Voltaremos de avião, no início da tarde.No voo estava o jogador Oberdan, uma das estrelas do Santos Futebol Clube, provavelmente de férias. Quando chegaram no aeroporto, em Florianópolis, havia uma grande movimentação de imprensa e populares. Nunes concluiu que tratava-se de alguma coisa ligada à presença do jogador. Pediram que Nunes aguardasse uns minutos na sala de desembarque. Oberdan saiu e sua presença, aparentemente, não foi notada. Foi aí que Nei Viegas esclareceu que aquela movimentação toda era, na verdade, para ele, Nunes.Havia muitas faixas de agradecimento e homenagens, da prefeitura, do Instituto Estadual de Educação, da CME… estudantes, bandeiras… as emissoras de rádio transmitindo ao vivo, com suas unidades móveis, uma loucura!Saíram. Deram entrevistas, foram aplaudidos, pegaram um carro da prefeitura e se dirigiram para o centro da cidade.Quando chegaram no Saco dos Limões, havia um carro do Corpo de Bombeiros, com o motor ligado, luzes piscando, sirenes tocando, todo enfeitado com faixas… foi um susto. “O que é isso, meu Deus?” “É pra você, Nunes. Vamos subir!”Subiram… e daí pra frente foi uma festa sem precedentes para um atleta do esporte amador de Florianópolis. Nunes só tinha visto algo semelhante quando Vera Fisher voltou a Santa Catarina, depois de ter sido eleita Miss Brasil, em 1969. Mas parecia que

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tinha muito mais gente agora. O trajeto foi o mesmo: Saco dos limões, Avenida Mauro Ramos, Praça XV de Novembro e chegada na frente do Palácio do governo de Santa Catarina. Nunes seria recebido pelo Governador, Colombo Sales, com coquetel, entrega de placa e fotografias… muitas fotografias.Nunes sentia-se num turbilhão de sentimentos que o impedia de desfrutar o momento. Não se sentia merecedor de tanta festa. Tinha apenas cumprido uma missão, um compromisso. Tinha feito a parte dele. Não achava que o seu feito representava tanta coisa assim.A repercussão na imprensa local foi muito intensa. O fato foi registrado em todos os jornais, foi notícia em todas as emissoras de rádio e na TV. Foi uma coisa realmente grandiosa. Nunes ficou, definitivamente, famoso.Depois desse episódio começou a notar que muita coisa mudou. Ele era atendido diferente, em restaurantes, nas lojas, até no cinema. Todo mundo sabia que ele era um grande campeão.

A FAMÍLIANunes tinha umas economias, um dinheirinho guardado, pois calculava que ficaria uns seis meses sem trabalhar. Com a nova perspectiva e as garantias que tinha, foi na loja Pernambucanas e fez uma grande compra de roupas para todos os irmãos. Mal conseguia lembrar o nome e o tamanho de todos. No dia 10 partiu para Campos Novos, visitar a família, como fazia todos os anos. Pegou o ônibus em Florianópolis. Às 5 horas da manhã, depois de uma noite inteira de uma viagem cansativa, desembarcou, na BR 470, no acesso para Monte Carlo. Aguardou por algum tempo até conseguir uma carona até Dal Pai. Depois pegou outra carona até Monte Carlos, onde chegou por volta de 7h30 da manhã.Perguntou onde morava João Maria Nunes. Disseram que quem poderia dar uma informação era o farmacêutico. Nunes foi até lá e o homem disse: “Ah,

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você é o famoso atleta. Acabei de chegar agora lá da sua casa. Você ganhou mais uma irmanzinha. Sua mãe está bem, não se preocupe”.“Uma irmãzinha? Meu Deus!” Nunes nem sabia que a mãe estava esperando mais um filho. Chegou no dia do nascimento do 14º filho de Reasilva e João Maria: Marisa Nunes, nascida na manhã de 11 de janeiro de 1973.Nunes apressou-se para chegar na casa. O pai, João Maria, estava longe, em uma fazenda da região, numa plantação de pinus.O quadro era deprimente. Uma casa muito pobre, o piso de chão batido, dois quartos para abrigar 12 pessoas. Ambiente sem iluminação, um calor insuportável.Na cosinha uma trempe58 com uma chapa de ferro em cima, com uns pedaços de pau embaixo… uma miséria insuportável.A família o recebeu com festa. Todos felizes com seus presentes. Roupas pra todo mundo.Aquelas imagens não saiam da cabeça de Nunes. Aquilo não podia continuar. Tinha de haver alguma solução. E tinha de ser agora!Ao retornar a Florianópolis Nunes começou a buscar por uma solução para aquele problema. E a solução óbvia parecia ser “trazer a família para perto dele”. Já se sentia em condições de assumir aquele tipo de responsabilidade.Os dirigentes pediram que Nunes não fosse para Santos (fazer faculdade). que ficasse em Florianópolis, que as coisas iriam melhorar muito, e que a Udesc abriria, ainda naquele ano, sua faculdade de Educação Física. Nunes disse que aceitaria a proposta, se eles aceitassem trazer a família de Campos Novos para Florianópolis e dessem um emprego para o pai. Eles

58 Três pedras (ou tijolos), dispostas em triângulo, em que se assenta a panela, ao fogo. 98

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aceitaram a proposta e Nunes ficou à espera que houvesse uma resolução.A solução, no entanto, não veio. A cada semana que passava Nunes pressionava. Pedia respostas mas só recebia evasivas. “Estamos procurando uma solução para o seu problema. Fique tranquilo”. Nunes não estava tranquilo.

REPROVADO NO TESTE FÍSICO PARA O CURSO DE EDUCAÇÃO FÍSICAEm março Nunes faz o vestibular para a primeira turma do curso de Educação Física na UDESC. Havia 162 inscritos, 95 homens e 67 mulheres, concorrendo a 25 para o masculino e outras 25 para o feminino.Os exames físicos foram feitos no hospital da Polícia Militar. Nesse tipo de teste havia um exercício (que, mais tarde foi substituído pelos testes de esteira ou bicicleta ergométrica). Era um exercício acelerador de batimentos cardíacos: o terrível BURPEE, exercício aeróbico criado na década de 1930, pelo fisiologista americano Royal Burpee, utilizado, para testar voluntários para o Exército. Consistia, basicamente, de agachamento, flexão de braços e salto vertical. Nunes, como todos os candidatos, fez uma série de dez exercícios. Logo veio o resultado: reprovado!“Como assim? Por quê?”O médico respondeu, com cara de preocupado, “você tem alguma coisa no coração que não está certa. Precisamos ver isto. Mas, para um curso como o de Educação Física, que envolve muito esforço, é muito arriscado pra você”Nunes ficou apavorado, “não pode ser! Meu coração está ótimo. Eu fiz eletrocardiograma antes de sair do exécito.”“Então vá buscar o seu exame. Quero ver”, disse o médicoNesta época Nunes morava numa casa na Rua Silveira de Souza, próximo ao Hospital da PMSC, com o Ivair

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Deluca, que estudava Engenharia na UFSC, e que também estava fazendo o mesmo vestibular da Udesc. Era pertinho. Nunes foi correndo buscar.Quando Nunes voltou com os exames, Dr. Agostinho já estava acompanhado de outro médico que havia sido chamado para acompanhar o caso. Ao vê-lo, o outro médico reconheceu José Maria e disse, “Ah, bom! Dr. Agostinho, esse moço aí é o José Maria Nunes. Ele é um grande campeão nacional de corridas. Agora está explicado. Ele tem um coração de atleta!”E assim, o médico da UDESC, concordou em aprovar o futuro estudante de Educaçãoo Física, mas recomendou que o caso fosse estudado na Universidade, mais tarde.Analfabeto até os 19 anos, aos 23 Nunes havia sido aprovado no vestibular de duas importantes Universidades. Mas não faria o curso em nenhuma das duas. Por incrível que pareça, havia outros problemas mais urgentes para serem enfrentados.

QUEM TEM FOME TEM PRESSANunes precisava resolver logo o problema da sua família e Florianópolis estava demorando demais para dar uma solução ao caso. Não perceberam que, além de Santos e do Sesi de São Paulo, Blumenau também estava na jogada. Blumenau tinha uma política de carrear atletas de outras cidades, oferecendo empregos, nas indústrias ou outras empresas da cidade.Em abril de 1973 os dirigentes de Blumenau fizeram a Nunes a seguinte proposta: carteira assinada, casa para a família e emprego para o seu pai. O contato foi feito pelo presidente da CME, Sr. Horst Roessel e Vilberto Schurmann59, que era também um dos diretores da CMEA data limite para um atleta se transferir (sem ficar fora dos Jogos Abertos) era o dia 15 de abril. Nunes

59 Que era mais conhecido como Beto Schurmann.100

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precisava se decidir com urgência. Estava cansado de esperar. Decidiu-se por Blumenau.Foi contratado pela Prefeitura Municipal de Blumenau como professor, no dia 12 de abril. Mudou-se imediatamente.A transferência de Nunes para Blumenau causou uma crise política sem precedentes em Florianópolis com acusações (contra Nunes e contra Blumenau) inclusive através da imprensa.Para Florianópolis, perder José Maria Nunes e, pior, perder para Blumenau, significava a certeza de que perderia os Jogos Abertos de São Bento do Sul. Nunes representava três medalhas de ouro garantidas. Seriam três a menos para Florianópolis e três a mais para Blumenau. Um desastre.Matérias em todos os jornais davam manchetes do tipo “Denunciado êxodo atlético de Capital para Blumenau” “IEE e CME desaprovam atitude do Corredor” ou “O melhor fundista do Brasil está descontente com a CME da Capital e com o IEE”. Até deputados iam à tribuna para acusar Blumenau de praticar “amadorismo marrom”.O clima estava tenso, acusações e represálias de todo tipo. Quando soube que Nunes havia decidido ir para Blumenau a direção do IEE resolveu que ele teria de devolver as diária recebidas durante a sua estada em São Paulo, para participar da Corrida da Integração. Nunes devolveu, mas aí o clima azedou de vez. partiu para o contra ataque. Começou a dar entrevistas aos jornais, deixando claro que não teve seu trabalho e seus esforços reconhecidos em Florianópolis, que o IEE e a CME não cumpriram as promessas feitas (principalmente a de trazer a família de Campos Novos) e dando a entender que existiam movimentações ilegítimas de dinheiro nos negócios das duas instituições. Ou, em bom português: “maracutaias”.A estratégia funcionou. As acusações e difamações pelos jornais cessaram. Nunes podia agora se dedicar

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aos treinamentos.

AO TRABALHO. E AOS TREINAMENTOSComeçou a dar aulas na Escola Municipal Vidal Ramos, perto do Sesi. Morava no alojamento da rua Jacob Brickreimer (foi o primeiro atleta a morar no alojamento de Blumenau). Era um alojamento para 15 atletas, com beliches e um banheiro coletivo. Alguns meses depois começou a trabalhar também como professor no Colégio Sagrada Família, uma escola particular onde estudavam os filhos da classe alta de Blumenau.Nunes trabalhava em dois lugares diferentes e ainda tinha os treinamentos. Treinava, geralmente, na pista do Grêmio Esportivo Olímpico. Mas, algumas vezes treinava também nas instalações do clube Vasto Verde. Seria bom ter um carro. Mas Nunes não sabia dirigir. Essa era a primeira providência a tomar. Fez as aulas. Naquela época não havia aulas teóricas, apenas aulas práticas e prova teórica. Para a prova teórica o candidato estudava, basicamente, uma cartilha com os principais sinais de trânsito. Nunes não teve dificuldades na parte prática, pois já tinha alguma experiência na condução de veículos motorizados. Dirigia um pequeno trator na fazenda, em Catanduvas, quando tinha 16 ou 17 anos. Fez as aulas. Fez a prova prática e foi aprovado sem dificuldades. Estava pronto para a prova teórica. Cerca de quarenta pessoas fizeram a prova. Muita gente reprovou. Nunes achou aquilo estranho, pois tinha certeza de ter acertado mais de sete (das dez) questões. Dirigiu-se ao chefe da seção: “senhor, me desculpe. Mas eu quero ver a minha prova. Acho que eu não posso ter sido reprovado”.O homem foi lá no arquivo, buscou a prova, abriu e foi corrigindo… “essa está certa, essa está certa, certo, certo…” no fim, Nunes havia acertado oito das dez questões. Disse, afinal, todo sem graça: “Como é que você apareceu como não aprovado?” Nunes ficou

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olhando pra ele, com cara de “não sei! Responda o senhor.”Depois descobriu que tratava-se de uma falcatrua simples. As pessoas eram reprovadas. Os mais inseguros aceitavam a reprovação e faziam a prova novamente. E pagavam novamente as taxas correspondentes.Percebendo a dificuldade de deslocamento e as perdas de tempo nos ônibus, um dirigente da CME, Vilberto Schurmann, que conhecia alguém na loja Breitkopf Veículos, levou Nunes até lá e já chegou dizendo pro gerente da loja, “olha, me arranja um carro bom e bem barato pra esse campeão aqui, que ele não pode gastar as pernas à toa”. Depois de alguma conversa Nunes saiu da loja com um fusca 1968, muito bem cuidado. E com muitas prestações para pagar.O Campeonato Catarinense de Atletismo, realizado em Blumenau, no início de julho de 1973 seria o primeiro encontro de Nunes com seus antigos companheiros de equipe. Nunes surpreendeu ao não participar da corrida dos 10 mil metros. Em vez disso, correu os 800, os 1500 e os 5 mil metros. Não só venceu as três provas como estabeleceu novo recorde para uma prova da qual não era especialista: os 800 metros. Era muito difícil tê-lo como adversário nas pistas60.Outro reforço importante que Blumenau ganhava com a vinda de José Maria Nunes era o atleta Jorge Luis da Silva. Ele havia iniciado a prática de atletismo no Exército, junto com Nunes. Sempre foi um admirador e

60 CAMPEONATO ESTADUAL - 1973 - 800 METROS1º - José Maria Nunes - Olímpico - 1min56,1s2º - Jorge Luis da Silva - Blumenau3º - José Augusto Caglioni - Joinville

CAMPEONATO ESTADUAL - 1973 - 1500 METROS1º - José Maria Nunes - Blumenau - 4min02,3s2º - Jorge Luis da Silva - Blumenau3º - José Augusto Caglioni - Joinville

CAMPEONATO ESTADUAL - 1973 - 5 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Blumenau - 15min15,5s2º - Jorge Luis da Silva - Blumenau3º - Agenor Cunha - Joinville

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seguidor de José Maria. E tinha ganho medalhas nos Jogos Abertos do ano anterior, em Itajaí. Nunes convidou Jorge Luis para acompanhá-lo na ida para Blumenau. Jorge Luis não contou até três. Foi o primeiro de muitos atletas que seguiriam Nunes nessa nova empreitada.O curso de Educação Física da Udesc, em Florianópolis, não havia começado ainda. A primeira turma só teria aulas a partir do segundo semestre. Mas Nunes (e todos os demais aprovados no vestibular, em março) havia feito sua matrícula e era, para todos os efeitos, um universitário. Um desses efeitos era poder participar dos Jogos Universitários estaduais e nacionais. E ele, naturalmente, participou.Venceu as competições em Santa Catarina (1500, 5 mil e 10 mil) e foi participar dos JUBs, em Belém, no Pará, no mês de julho, onde obteve novo sucesso61.Em setembro participou do Zonal Sul de Atletismo (Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul) organizado pelo Comitê Olímpico Brasileiro. Venceu a prova dos 10 mil metros62.Assim, Nunes chegou em São Bento do Sul, para os Jogos Abertos de 1973, com status de atleta mais importante da competição. As arquibancadas ficavam lotadas para vê-lo correr. Ninguém queria perder a oportunidade de ver a história ocorrer diante dos seus olhos. E ele não decepcionou. Correu os 1500, 5 mil e 10 mil metros obtendo as três medalhas de ouro63.

61 JUBs-1973 - 10 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Santa Catarina2º - Elói Rodrigues - São Paulo3º - Laudy Mendes - Goiás

62 CAMPEONATO ZONAL SUL - COB - 1973 - 10 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Santa Catarina - 31min43,3s2º - Odacir Moura - Rio Grande do Sul - 33min42,1s2º - Jorge Luis da Silva - Santa Catarina - 33min58,8

63 JASC-1973 - 1500 METROS1º - José Maria Nunes - Blumenau - 4min11,2s2º - Jorge Luiz da Silva - Blumenau - 4min11,3s3º - Antônio celso Silveira - Rio do Sul - 4min17,1s

JASC-1973 - 5 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Blumenau - 16min??,2s2º - José dos Santos - Blumenau - 16min49,1s

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O resultado obtido no Zonal Sul do COB, em julho classificou Nunes para participar do Troféu COB de Atletismo, organizado pelo Comitê Olímpico Brasileiro, em novembro daquele ano, e que foi realizado em São Paulo, na pista do Clube Pinheiros. Nunes participou da prova dos 10 mil metros64 e venceu novamente.No início de dezembro, depois de uma acalorada e difícil negociação com a Federação Atlética Catarinense e com a CME de Blumenau, José Maria Nunes partiu, acompanhado de outros dois atletas, Jorge Luis da Silva e José dos Santos, para São Bento do Sul, repetindo o que havia feito no ano anterior, reforçando os treinamentos finais para competir em São Paulo no dia 31 de dezembro. Mas agora seria na corrida principal: a corrida de São Silvestre. Seria a segunda participação dele na prova (já havia corrido a São Silvestre no final de 1969). Mas agora era pra valer. Nunes estava muito melhor preparado.Jorge Luis e Santos iriam participar da Corrida da Integração Nacional. Tinham a seu favor uma arma secreta: os treinamentos e a experiência de José Maria Nunes.Além disso, Jorge Luis havia competido no ano anterior, ficou em 8º lugar. Tinha, ele próprio uma boa experiência para utilizar na prova. Jorge Luis correu muito bem. Venceu a prova com o tempo de 26min49s (teria ficado em terceiro na corrida do ano anterior) superando outros 179 participantes de todos os estados brasileiros. José dos Santos, com apenas 20 anos mas com a “moral” de ser o vice-campeão dos Jogos Abertos daquele ano, não fez feio.

3º - Antônio Celso Silveira - Rio do Sul -

JASC-1973 - 10 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Blumenau - 33min15,2s2º - José dos Santos - Blumenau - 34min26,53º - Ademir Rosa - Florianópolis - 35min08,4

64 TROFÉU COB DE ATLETISMO - 1973 - 10 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Santa Catarina - 32min05,2s2º - Carlos Alberto Alves - Guanabara - 32min29,6s2º - Jeferson Estevan dos Santos - Alagoas - 32min51,0

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Ficou em 10º lugar. Só não saiu-se melhor (segundo o jornal A Gazeta Esportiva) por falta de experiência: disparou na frente logo depois da largada, acompanhando o primeiro grupo, perdendo-se no decorrer da prova.Isso tudo aconteceu entre 22 e 23 horas. Quando faltavam pouco menos de meia hora para a meia-noite foi dada a largada para a Corrida de São Silvestre. Nunes correu muito bem. Ficou em 20º mas foi o 2º entre os brasileiros. José Romão, o melhor brasileiro, ficou na 11ª classificação65.Como no ano anterior, foram todos recebidos com festa em Santa Catarina. Novamente o caminhão dos bombeiros foi acionado. Só que agora eram três os atletas recepcionados. Todos com a impagável sensação do dever cumprido.

65 CORRIDA DE SÃO SILVESTRE - 19731º - Victor Mora - Colâmbia - 23min25,2s2º - Rafael Palomares - México - 23min48,2s3º - Carlos Lopes - Portugal - 23min50,4s4º - Rafael Peres - Costa Rica - 23min53,8s5º - Lasse Viren - Finlandia - 23min54,6s (Campeão olímpico no ano anterior, 1972)11º - José Romão - Brasil, SP20º - José Maria Nunes - Brasil, SC

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1974Em janeiro de 1974 Nunes participou, em Florianópolis, do Curso de Treinamento Desportivo (30 horas), organizado pela Secretaria de Educação e Cultura de Santa Catarina e ministrado pelo professor Carlos Alvarez Del Villar.Passadas as comemorações pela participação na São Silvestre, Nunes estava em Florianópolis, à passeio, visitando amigos e aproveitando os poucos dias de férias que teria. Nesses dia, gostava de ir às praias do norte da ilha para treinar. Num desses domingos estava em Jurerê e encontrou o jovem corredor Paulo Zimmer. Não eram amigos, mas Nunes já o conhecia, pois ele, apesar da pouca idade (tinha, então, 19 anos) já participava de muitas competições. Inclusive dos Jogos Abertos (em 1971).Nunes convidou Paulo para “dar uma corridinha, ida e volta até o Forte São José”. Paulo topou, claro! Era a chance de correr com um grande ídolo. Ficou todo empolgado. Nunes manteve um ritmo normal durante a ida (uns 4 km) e resolveu forçar um pouco na volta. Mas Zimmer estava muito entusiasmado e não afrouxou. Segurou no peito e correu junto o quanto deu. Nunes apertou ainda mais o passo. Chegou na frente, claro, mas Paulo Zimmer quase que conseguiu chegar junto. Queria impressionar o campeão. Conseguiu.Conversa vai, conversa vem, Nunes convidou Zimmer para ir para Blumenau. Disse que conversaria com os pais dele, se fosse necessário. E fez isso. Naquela mesma semana conversou com os pais de Zimmer e, no dia 28 de Janeiro de 1974, Blumenau ganhava um dos maiores atletas que a sua equipe de atletismo já teve.

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Zimer tinha, então, 19 anos. Com 16 anos havia começado a treinar atletismo, no Instituto Estadual de Educação, com o professor Nilton Pereira (Dedeco). Já havia participado de diversas competições escolares, sempre com ótimos resultados, tendo, inclusive, duas participações nos Jogos Estudantis Brasileiro: Curitiba, 1970, 5º lugar nos 1500 metros e Belo Horizonte, 1971, 2º lugar nos 1500 e 3000 metros. Já era um atleta razoavelmente experiente.Lá começou a trabalhar numa companhia de seguros e treinava a noite junto com o Nunes e sua equipe. Em maio deste ano foi convidado a dar aulas na Escola Estadual Celso Ramos no bairro Garcia.Naquele ano de 1974 Zimmer morou no alojamento da CME. Mas no final daquele ano Nunes o convidou para morar na casa que tinha alugado para a família que tinha vindo de Campos Novos.Mas, espere… essa parte da história não foi contada ainda.

FAMÍLIA!No início de 1974 Blumenau, finalmente, cumpre a promessa de trazer a família de Nunes. Arrumaram uma casa, grande. Nunes mobiliou a casa, com móveis comprados no crediário da loja Hermes Macedo.No dia 15 de janeiro Nunes foi para Campos Novos para buscar a família. Novamente o pai, João Maria, estava numa fazenda da região, plantando pinus. Voltaria no dia seguinte. Nunes disse para a mãe: “estou levando vocês para morar comigo em Blumenau. Temos uma casa grande, bonita, com luz elétrica, fogão a gás, camas, cobertores… vocês vão gostar. Além disso, essas crianças precisam ir pra escola. Precisam estudar…”O pai, em princípio, não aceitou. Disse “o que é que eu vou fazer lá. Não tem emprego pra mim. vou viver do quê?” Mas a mãe disse, simplesmente: “eu não quero

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mais que os meus filhos passem fome. Eu vou contigo, meu filho. Se o pai não quiser ir, ele fica. Pronto.”Nunes tinha um Fusca 1968, em bom estado (aquele, comprado na loja Breitkopf). Vieram em 8 pessoas no carro: Além de Nunes, dirigindo, vieram a mãe e os irmãos Marisa, Inês, Mauro, Miro, Neusa e Sérgio. Tudo isso, sem cinto de segurança. E sem Polícia Rodoviária Federal para impedir o excesso de pessoas e bagagens. O resto da mudança foi posta em sacos e vieram de ônibus, dois dias depois (O pai, João Maria, e os irmãos Helena, Julio e João).Só não vieram para Blumenau Maria (que já estava casada, em Campos Novos) o Antônio (que já tinha emprego na cidade, estava trabalhando com um compadre de João Maria) e o Sebastião (que trabalhava na Imaribo, uma empresa madeireira em Monte Carlo, cidade próxima de Campos Novos).A casa ficava na rua Pastor Osvaldo Hesse (número 253) perto de onde era o campo do Palmeiras.Ao chegarem, as crianças ficaram por um tempo brincando com os interruptores de luz. Nunca tinham visto aquilo. Era divertido acender e apagar as luzes sem parar66.Neusa, então com 7 anos, lembra que a casa era bonita e grande, com seus dois pavimentos. O terreno era muito grande, com bastante pés de goiaba, Para as crianças era uma festa, por todos moravam juntos. E tinha banheiro dentro de casa, tinha chuveiro, ganharam roupas novas. Era tudo muito bom.Nenhum deles tinha noção de usar cuecas, calcinhas, pijamas, escova de dentes… tudo era novidade. Em Campos Novos não tinha luz elétrica. Tomava-se banho de bacia, gamela, tanque. Agora tinha banho de chuveiro, com água quente. Isso era uma coisa formidável.

66 Quando viu a mesma cena acontecer no filme “Dois Filhos de Francisco” Nunes chegou a ficar emocionado.

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Logo a Helena foi trabalhar como empregada doméstica numa casa em Blumenau.As crianças maiores foram matriculadas na escola. Em março já estavam em aula, com seus uniformes, suas pastas, livros e cadernos.Quanto ao prometido emprego para o pai de Nunes, depois de quatro ou cinco meses enrolando, o dirigente da CME disse “infelizmente não podemos arrumar uma vaga para o seu pai, porque o sistema da prefeitura não permite contratar duas pessoas da mesma família, e bla-bla-blá”. Nunes não acreditou naquilo. Achava que faltou mesmo foi boa vontade e honra na palavra empenhada.Mas tinha uma pessoa, o seu Joca, que trabalhava no Banco do Brasil e tinha uma padaria. Ele era fã de Nunes e conhecia as dificuldades. Resolveu ajudar. Deu emprego para João Maria e também para o irmão, João Francisco.João Francisco trabalhou ali umas duas semanas, desentendeu-se com o padeiro e foi embora. Mas João Maria ficou por muito tempo. Tornou-se um padeiro qualificado e trabalhou nessa empresa por muito tempo, até 1977.

O ATLETISMO DE BLUMENAU SE REFORÇADesde 1971 Blumenau tinha como seu principal técnico de Atletismo o professor Edgar Campos, que tinha vindo de São Paulo. Nunes agora dava aulas no bairro Escola Agrícola, na Escola Municipal Lúcio Esteves. E continuava como professor do Sagrada Família. Trabalhava durante o dia e treinava de noite ou de madrugada. Por isso tinha dificuldade para treinar com o professor Edgar Campos. E, por ser o único que treinava à noite, foi se tornando uma opção de orientação técnica para outros atletas que também só poderiam treinar à noite. Era o caso de Paulo Zimmer, José dos Santos, Jorge Luiz e do próprio João Francisco, que também tinha se tornado corredor.

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O fato de Nunes não treinar com os outros atletas, aliado ao fato de que ele carregava consigo a atenção de outros atletas importantes de Blumenau acabou gerando algum ciúme e potenciais desavenças com o recém-contratado professor (que era, no fim das contas, um sujeito bacana. Só não estava acostumado com esse tipo de descontrole hierárquico). Eles se desentenderam, por um tempo, mas depois tornaram-se amigos.

JOINVILLE NA PARADANo início de 1974 José dos Santos, que era uma das grandes promessas do atletismo de Blumenau, recebeu uma proposta irrecusável da sua cidade natal, Rio do Sul.Santos fazia parte do chamado “Grupo do Nunes”. Ele tinha 21 anos e morava com a família, em Blumenau, desde os oito anos de idade. Com 15 anos começou a praticar atletismo estimulado pela lenda do atletismo, Waldemar Tiago, que, naquela época dominava as corridas de resistência no estado de Santa Catarina. Em 1971 começou a treinar na equipe de atletismo do Amazonas Esporte Clube, em Blumenau, sob os cuidados do técnico Edgar Campos. Nesse período já participava de competições estaduais, inclusive os Jogos Abertos. Mas, principalmente, corria as provas de ruas.No ano anterior conseguiu seus melhores resultados nos Jogos Abertos, em São Bento do Sul conquistando as medalhas de prata nas provas de 5 e 10 mil metros, perdendo apenas para José Maria Nunes (o que o tornava, aos olhos de todos, como “o vencedor entre os mortais”)Santos recebeu de Rio do Sul a proposta de um bom salário e um cargo de confiança na prefeitura. Santos aceitou a proposta e transferiu-se para Rio do Sul, onde, com Haroldo Shunke, liderou uma das melhores equipes de atletismo de Santa Catarina na década de 1970, acumulando as funções de atleta e treinador,

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revelando nomes como Margit Weiss, Marília Seifert, Charles Lima e Ieda Juppa, todos grandes campeões catarinenses e brasileiros nos anos seguintes67.Depois dessa lamentável perda pode-se imaginar a apreensão que tomou conta dos dirigentes de Blumenau quando viram, no jornal, o resultado do Vestibular para a Faculdade de Educação Física de Joinville. No meio da lista aparecia o nome de José Maria Nunes.Seria um homônimo? Não. Alguns telefonemas depois e já estava confirmado. Era o mesmo Nunes de Blumenau (ou seria de Joinville). Nunes, de fato, fizera o vestibular para a faculdade de Joinville. Os dirigentes ficaram perplexos. Afinal de contas, haviam cumprido o contrato com Nunes e tinham ajustado os valores, conforme o que haviam combinado. O que estava acontecendo?Foram procurar Nunes. “O que está acontecendo, professor? Vai nos deixar? Vai pra Joinville?”Em princípio Nunes estranhou aquelas perguntas, depois se deu conta da confusão. Não achou que fosse necessário avisar o pessoal de Blumenau sobre o que havia decidido. Mas resolveu tranquilizar o dirigente da CME. O que aconteceu foi o seguinte: Nunes decidiu não fazer o curso de Educação Física da Udesc. Era totalmente inviável fazer as aulas em Florianópolis morando em Blumenau. E em Blumenau não havia ainda um curso de Educação Física. Então Nunes resolveu que faria o curso em Joinville. Mas continuaria morando e sendo atleta de Blumenau. Não via nenhum problema nisso. Sabia de muita gente que ia, todos os dias, até Joinville para frequentar a faculdade.Foi um alívio para o dirigente, mas o quiprocó68 já estava feito. A imprensa já estava especulando. Era preciso esclarecer (e tranquilizar) a todos. Nunes não se 67 Em 1975, quando eu comecei a participar do atletismo, em Rio do Sul, Santos foi o meu

primeiro treinador. Era um líder, carismático e responsável. Não havia quem não gostasse dele. Tirava leite de pedra na pista do Estádio Municipal.

68 Quid pro quo é uma expressão latina que significa "tomar uma coisa por outra”. Uma confusão ou engano.

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importou em dar entrevistas para os jornais e para as emissoras de rádio da cidade. Afinal, ele era uma figura pública e sabia disso.Nas entrevistas fazia questão de enaltecer o trabalho sério que se fazia em Blumenau e o fato de que a CME estava cumprindo tudo o que eles haviam combinado.As aulas no curso de Educação Física em Joinville, começaram já nas semanas seguintes. Nunes ia de carro, todos os dias. Tinha três colegas que também faziam o curso em Joinville e dividiam as despesas das viagens: Armando (um professor de Handebol), Taná (jogador de basquete) e Rauly Amorim, um atleta do atletismo.O trecho era complicado: ia até Itajaí, pela Rodovia Jorge Lacerda, passando por Gaspar e Ilhota (não havia ainda a possibilidade de ir por Massaranduba nem pela BR 470. Era tudo estrada de chão. demorava muito mais). A saída, todos os dias, era por volta de seis da manhã e estavam de volta às 14 horas. Ia para o trabalho, dar aulas e treinava tarde da noite na rua.Frequentou algumas semanas e desistiu, depois de um acidente na estrada, sem vítimas. Nunes dormiu ao volante. Seis e meia da manhã. acordou com o barulho do assoalho do carro batendo nas pedras. conseguiu retornar para a estrada. Os colegas nem notaram. Estavam igualmente, ferrados no sono. Naquele dia Nunes resolveu que desistiria do curso. Emprestou o carro para que os amigos pudessem continuar a empreitada. Menos de um mês depois fundiram o motor do carro. Aquilo, definitivamente, não era uma boa ideia.

QUESTÕES PESSOAIS E FAMILIARESNuma ida de Nunes à sede da Secretaria da Educação do Município a secretária avisou que tinha uma moça procurando por ele. Ela estava por ali em algum lugar. Nunes logo encontrou a moça. Era Marisa. Tinha se transferido para Blumenau. Tinha arrumado um

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trabalho na Prefeitura. Ficaram por ali, conversando. Nunes contou que tinha trazido a família para Blumenau. Estavam todos bem… E convidou a moça para conhecer a casa nova.Marisa não se fez de rogada. Foi até lá conheceu todo mundo, tornou-se amiga da família e até, eventualmente, dava aulas de reforço para os menores que estavam tendo dificuldades na escola.Alguns meses depois que a família tinha se mudado de Campos Novos para Blumenau Sebastião apareceu. Estava buscando “mudar de vida” na cidade grande. Foi bem recebido, pois os irmãos gostavam muito dele, por causa do seu jeito divertido. Nunes conseguiu emprego para ele, na Sulfabril, através de um amigo (fã) que era gerente na empresa. Tião trabalhava bem, mas tinha um sonho: ser jogador de futebol. Queria treinar. Para isso teria de sair mais cedo do trabalho todos os dias. Começaram os desentendimentos com o chefe.O amigo veio se queixar com Nunes: “o que é que eu faço com o teu irmão? Ele quer é ser jogador de futebol” Nunes disse, simplesmente: “Ele é meu irmão, mas é ele que sabe da vida dele. A gente agradece pela oportunidade que o senhor deu a ele, mas pode se entender com ele como o senhor achar que é certo.” Tião saiu da Sulfabril.Mas, nessa altura do campeonato, Sebastião já tinha arrumado uma namorada na Sulfabril e depois de um tempo a trouxe para morar com ele na casa da família, em Blumenau. Aí surgiu uma oportunidade de ele trabalhar na Sucam69. Parecia ser uma boa coisa. Tião, se ajustou bem no novo trabalho. Ficou lá por um bom tempo da Sucam. Em 1980 foi trabalhar na empresa Aramifício Blumenauense. Tornou-se pintor de metais e trabalhou nessa empresa até se aposentar. Esta empresa, aliás, pertencia a Heinz Groh, um grande fã de esportes e amigo de José Maria. Ele deu emprego para diversos irmãos dele: além de Tião, trabalharam

69 Superintendência de Campanhas de Saúde Pública - um antigo órgão do governo federal, hoje foi substituída pela FUNASA - Fundação Nacional da Saúde.

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no Aramifício Blumenauense João Francisco, Sérgio e Pedro. No segundo semestre de 1974, apareceu outro irmão, o Tonho. Tinha roubado a mulher de um cara em Campos Novos. O marido voltou mais cedo de uma viagem e pegou Tonho no flagra. Ficou furioso, claro. Arrombou uma janela com um revolver na mão. Mas Tonho foi mais rápido, pegou o sujeito pelo braço e puxou para dentro de casa, com arma e tudo. Quebrou algumas costelas do homem e então pegou o carro, o revolver e a mulher do cara e fugiu para Blumenau.A mulher, casada, mãe de três filhos, se engraçou pelo Tonho e topou a aventura. Chegou e foi ficando. Nunes o recebeu, claro, como já tinha recebido todos os outros irmãos. Depois de dois meses a mulher caiu na real. Bateu a saudade dos filhos e resolveu voltar para o marido. Tonho ficou.Em 1974 Nunes não era o treinador de atletismo de Blumenau. Tinha apenas alguma influência sobre as pessoas que efetivamente decidiam as coisas: Beto Shirman, Ramiro Rudger e o Administrador, Rodrigues. O contato de Nunes era mais com o Rodrigues.Nunes, geralmente, conversava com os atletas (usando o seu potencial de ídolo, campeão…) e convencia o atleta a optar por Blumenau. Depois a negociação era conduzida por Rodrigues. Naquele período vieram para Blumenau muitos talentos do atletismo, como Renato da Silva (O Renatão, de Itajaí), Márcia Xavier da Silva (de Florianópolis)

UMA OPORTUNIDADE DE OUROEm maio daquele ano Nunes participou da Primeira edição da Competição Atlética Dia da Indústria, em São Paulo. Correu a prova dos 3 mil metros e venceu, com a marca de 8min31s70. Alguns dias depois recebeu uma carta do professor Armando Corujeira, diretor do Grêmio Esportivo do Sesi, convidando para que ele se 70 Nesta prova Nunes ganhou uma pequena medalha de ouro (ouro mesmo! 18 quilates). Mas

a medalha acabou desaparecendo, tempos depois.115

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transferisse para São Paulo, “com emprego acertado”. Era uma oferta realmente concreta e muito boa: ser professor com 40 horas, no Sesi, fazer a faculdade em Santos e passar a competir pela equipe no Campeonato Paulista e outras competições pelo Brasil e no mundo.Ao receber a carta, Nunes ficou muito feliz, pelo reconhecimento. Mas, ao mesmo tempo, muito angustiado. Tinha acabado de trazer a família para Blumenau. Não poderia nem pensar em levá-los com ele para São Paulo. Se eles ficassem em Blumenau, sem a sua presença (mesmo que ele continuasse a ajudar financeiramente) seria o fim. Tinha medo que alguns irmãos caíssem na marginalidade ou que a irmãs se perdessem. Pensava no desespero da mãe e do pai, tendo que lidar sozinhos com uma situação assim, numa cidade tão grande como Blumenau. Se fosse para isso, melhor seria tê-los deixado em Campos Novos. Nunes não queria carregar consigo a responsabilidade pelo que aconteceria com a família se ele fosse para São Paulo. Ficou por uma semana remoendo aquilo, até que, finalmente, decidiu-se. Escreveu uma carta de resposta ao professor Corujeira. Agradeceu pela oportunidade, explicou a situação e disse que permaneceria em Blumenau. Nesse tempo Nunes dava treinamento de Atletismo e de outros esportes para os alunos das escolas, tanto no Sagrada Família quanto nas escolas municipais. E isso fez Nunes tomar gosto pela ideia de se tornar treinador de atletismo. Nessa época ela já trabalhava no sentido de fortalecer as equipes nas quais trabalhava e convencia a escola a conceder bolsas de estudo para os melhores atletas. Maria Helenice Franco, por exemplo, foi estudar no Sagrada Família, por influência de Nunes, que estava montando uma equipe forte para o atletismo da escola. Ela tornou-se, mais tarde, uma das maiores atletas de Santa Catarina, tendo permanecido no Atletismo por mais de 14 anos, conquistando centenas de troféus e medalhas.

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Mas em Blumenau não existiam competições que justificassem os esforços e treinamentos dos alunos. Eles teriam de esperar até estarem aptos para disputar vagas nas equipes adultas para disputar competições estaduais ou os Jogos Abertos. Foi aí que surgiu a idéia de organizar uma competição que pudesse movimentar alunos e professores para o esporte na cidade.

OS JOGOS ESTUDANTIS DA PRIMAVERABlumenau já tinha uma tradição no esporte amador e isso ajudava a tornar uma ideia como essa realidade. Porém, apesar das vitórias nos Jogos Abertos, Blumenau não tinha uma competição na cidade com o potencial de revelar atletas. As estratégias dos dirigentes esportivos da cidade eram (1) trazer atletas de outras cidades e oferecer empregos na indústria pujante da cidade; (2) aproveitar o fato de que muitos estudantes das cidades da região, num raio de mais de 100 km, vinham para Blumenau para fazer o Colegial (atual ensino médio). Havia ali um enorme potencial de bons atletas. (3) investir nas modalidades menos conhecidas e nas equipes femininas71

Quando Nunes trabalhava no Instituto Estadual de Educação, em Florianópolis, havia um festival interno de Jogos, onde os alunos, divididos por turmas, competiam entre si, disputando em diversas modalidades.Nunes procurou a irmã Lurdes Siebert, que era a diretora do Colégio Sagrada Família, em Blumenau e apresentou a ela a ideia de organizar e promover algo semelhante no colégio.Porém, o Instituto Estadual de Educação tinha, na época, mais de 8 mil alunos. O Colégio Sagrada Família não chegava nem a mil. Então, para que a coisa ficasse mais “divertida” seria interessante permitir a participação de outras escolas do município.

71 Esta terceira estratégia foi declarada por Lorival Beckhauser numa entrevista concedida ao programa Nossa Gente, da TVL de Blumenau em 05/05/2014 - disponível em https://www.youtube.com/watch?v=qrXBoNIYBBY

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A diretora achou a ideia interessante e deu carta branca para Nunes. Ele poderia ir atrás do que fosse necessário para fazer os jogos.Naquele ano tinha sido criado, em Blumenau, o Departamento de Educação Física da Prefeitura. Apesar do nome, não era uma repartição do município. Não representava um cargo na administração municipal. Era, na verdade, uma espécie de “associação de professores” formado pelos profissionais da área, e era onde discutiam e deliberavam sobre coisas da profissão. Nunes foi o primeiro coordenador do Departamento.Zimmer, que já dava aulas no município e, nessa época, morava na casa do Nunes, foi o primeiro convidado para participar da equipe que organizaria o regulamento dos jogos. Nunes convidou ainda Ingrid Rossel, Armando Gonçalves, Sonia Vera Klein, e outros professores para uma reunião no Grêmio Esportivo Olimpico para discutir e elaborar o Regulamento dos Jogos. Todos os professores apoiaram a iniciativa. Não houve resistência por parte de nenhum dos professores.Mas uma pessoa teve uma participação expressiva na logística do trabalho: o radialista Osmar Laschenwisk, da Radio Blumenau.Ficou acertado entre Nunes e a irmã Lourdes Siebert, diretora do Colégio Sagrada Família, que os jogos seriam realizados pela instituição, com o apoio dos professores de outras escolas e patrocínios que seriam obtidos pelo amigo Osmar Laschewitz, diretor da Rádio Blumenau.A diretora relatou que o colégio não dispunha dos recursos para realizar os jogos. O diretor da rádio se dispôs a arcar com as despesas das premiações.Osmar Laschewits correu atrás de patrocinadores e fez um belíssimo trabalho. Conseguiu não só os patrocínios para os troféus e medalhas da competição como também os patrocínios para a cobertura jornalística do

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evento. Assim, aquela primeira edição dos Jogos Estudantis da Primavera de Blumenau teve cobertura total da Rádio Blumenau e isso foi muito importante para o sucesso do evento.A primeira edição dos Jogos Estudantis da Primavera aconteceu, afinal, entre os dias 14 a 21 de setembro, com a participação de mais de 500 alunos/atletas de 15 escolas (particulares, municipais e estaduais).O belíssimo desfile de abertura dos jogos foi realizado na pista de atletismo do estádio do Grêmio Esportivo Olímpico. Durante a cerimônia de abertura uma das escolas participantes72 ofereceu ao professor José Maria Nunes um lindo buquê de flores e uma placa com o desenho de um atleta, uma tocha olímpica e os dizeres: “a j.m. nunes”.Nunes, ainda na pista exibiu orgulhoso aquela demonstração de reconhecimento e admiração. Esse gesto foi clicado por um jornalista e a foto ficou famosa. Aparece em praticamente todas as matérias jornalísticas onde se faz o registro da primeira edição dos Jogos Estudantis da Primavera de Blumenau.Essa competição teve um impacto tão grande na cidade que a Secretaria de Educação, na época comandada por Ingo Fischer, que também era um dos diretores da CME, incluiu esses jogos no calendário escolar do município. A partir da segunda edição a organização foi assumida pela Comissão Municipal de Esportes e os Jogos Estudantis da Primavera nunca mais deixaram de ser realizados. Chegou a ter a participação de mais de oito mil crianças entre 12 e 15 anos, numa única edição. Os Jogos da Primavera revelaram centenas de bons atletas, inclusive atletas olímpicos como Sérgio Galdino e Ana Moser. Muitas crianças de Blumenau, com seus 10, 11 anos têm o sonho de participar dos JEPB.Nos primeiros Jogos Estudantis da Primavera de Blumenau Nunes atuou ainda como técnico da equipe 72 Escola Estadual Carlos Techentin, cuja diretora era Neusa Salome, esposa do professor

Edgar Arruda Salomé119

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de Handebol do Colégio Sagrada Família.

JOGOS ABERTOS - CRICIÚMAAinda sob a euforia do sucesso obtido com os Jogos da Primavera, Nunes retomou os treinamentos finais para participar dos Jogos Abertos de Santa Catarina, que nesse ano seriam realizados em CriciúmaNovamente Nunes correu e venceu suas três provas. Novamente bateu o recorde nas três corridas.

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Mas, nos Jogos Abertos de 1974 um fato importante aconteceu: pela primeira vez em 7 anos (desde 1968) a hegemonia de Nunes foi ameaçada. Foi na prova dos 1500m. O autor da façanha foi Jorge Luis da Silva, que vinha treinando forte e planejando o bote. Assim que a corrida foi iniciada Jorge se posicionou na frente e forçou o ritmo da prova. Nunes foi pra disputa, mas Jorge resistiu. Entraram na última volta emparelhados. E Jorge avançou, entrou na curva com 5 ou 6 metros de vantagem. Nunes não era de se entregar e foi buscar forças sabe Deus onde. Alcançou o adversário na

entrada da reta. Jorge resistiu. Também não iria se entregar tão facilmente. Disputaram, lado a lado, aqueles intermináveis últimos 100 metros. Nunes chegou menos de meio metro na frente. Mas o tempo marcado para os dois atletas foi o mesmo, e os dois quebraram o recorde anterior da prova73. Para a imensa

73 JASC-1974 - 1500 METROS1º - José Maria Nunes - Blumenau - 4min01,4s (Recorde)2º - Jorge Luiz da Silva - Blumenau - 4min01,4s (Recorde)3º - Argel Souza - São Bento do Sul - 4min06,4s

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torcida presente ao estádio, aquela foi, sem dúvida, a corrida mais espetacular do dia.Nas outras duas corridas, pelo menos, a dificuldade não foi tão grande. Nunes venceu os 5 mil e os 10 mil metros74 e manteve intacta a posição de “numero um” nas pistas. E ainda ganhou uma quarta medalha de ouro no revezamento 4x400 metros75.Figura 1974_01 - Jorge Luis e José Maria Nunes disputam metro a metros a reta final dos 1500m nos JASC de 1974 (Criciúma) Depois que retornou dos Jogos Abertos José Maria Nunes foi alvo de inúmeras homenagens de políticos, empresários e associações de classe. Uma dessas homenagens, no entanto foi a mais tocante para o jovem professor Nunes: os alunos da 6ª série do Colégio Sagrada Família fizeram, eles próprios, numa folha de papel A4, um Diploma, com os seguintes dizeres:

“Professor José Maria Nunes, por seu excelente desempenho no JASC, nós lhe oferecemos o diploma de Excelente Atleta”.

Nunes guardou aquele “troféu” junto a suas medalhas mais preciosas.Nada disso, no entanto, parecia ser suficiente para que Nunes conseguisse seus objetivos de garantir qualidade de vida para os atletas. No final do ano ele se envolveu numa disputa polêmica com o Grêmio Esportivo Olímpico. Havia uma demanda antiga para que os atletas pudessem utilizar a piscina do clube. Afinal, se eram bons o bastante para representar o clube em competições no estado e até fora dele, tinham o direito de usufruir dos benefícios dos sócios, não é verdade?

74 JASC-1974 - 5 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Blumenau - 15min01,0s (Recorde)2º - Antônio Celso Silveira - Rio do Sul - 15min42,6s (Recorde)3º - Paulo Cezar Zimmer - Blumenau - 16min20,7s

JASC-1974 - 10 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Blumenau - 31min07,6s (Recorde)2º - Antônio Celso Silveira - Rio do Sul - 33min10,4s3º - Paulo Cezar Zimmer - Blumenau - 33min29,0s

75 JASC-1974 - REVEZAMENTO 4X400 METROS1º - Miguel Raimundi, José Maria, Renato Silva e Jorge Luis - Blumenau - 3min29,2s 2º - Odilon, Eli, Bruno e Jonas - Curitibanos - 3min30,8s3º - Alberto, Delman, Jandir e Benedito - Florianópolis - 3min32,4s

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Não. Não era. Pelo menos os diretores do clube não pensavam assim. Primeiro o uso da piscina pelo clube era simplesmente proibido. Ponto. Depois de muita discussão, foi autorizado o uso da piscina pelos atletas, mas estipularam um horário específico: entre 18 e 19 horas. Nunes se revoltou. Anunciou que não iria correr a São Silvestre. Disse mais: disse que não vestiria a camisa do clube na competição. Mas, como não era bobo, incluiu um adendo à sua ameaça, publicada pelos jornais: “Não sei se vou correr com a camisa do Olímpico de Blumenau, porque não estou ganhando nada pra fazer propaganda pra essa gente. De uma coisa tenha certeza: se eu não participar desta São Silvestre, nunca mais vestirei uma camisa dessas entidades, nem a peso de ouro”. Os jornais, por conta própria, acrescentaram que Nunes não queria, nunca mais, representar a CME.Ao ler aquilo os dirigentes entenderam que a coisa tinha ficado séria. Era preciso resolver ou controlar aquela situação. Nunes alegava que estava havendo um comportamento racista76 por parte do clube.Só no dia 18, quatro dias antes da seletiva da São Silvestre, em São Paulo, é que houve uma reunião entre a CME e Nunes para resolver definitivamente o inbroglio. Depois dessa reunião Nunes esclareceu: “não há nada de minha parte contra a CME e acredito que foi até um mal entendido por parte da imprensa falada e escrita. Eu conversei com eles hoje e faço questão de, caso conseguir um troféu ou medalha, entregá-lo à CME. Quanto ao Clube, ninguém me procurou e repito, que não mais vestirei a camisa deles em competições, daqui pra frente”.

SÃO SILVESTREPartiu para São Paulo. No dia 22 ficou em terceiro na seletiva da São Silvestre (o que garantia uma posição

76 Naquele tempo, no Brasil, Racismo não era crime. De modo que esse tipo de acusação não gerava nenhuma consequência. Ninguém iria investigar.

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no pelotão de elite no dia da prova). Correu com a camiseta da CME. Depois da corrida, permaneceu em São Paulo para finalizar os treinamentos.Nunes correu a São Silvestre muito bem. Melhorou a sua classificação em relação ao ano anterior. Ficou em 18º lugar no geral e foi o terceiro melhor brasileiro na corrida77.Por ocasião da São Silvestre, vários eventos paralelos são realizados, como cursos, palestras, seminários e outras atividades. Naquele ano, assim como em todos os outros, Nunes participou dos seminários promovidos pela Sociedade Paulista de Medicina Esportiva, geralmente com a presença e participação de atletas e treinadores de diversos países.

77 CORRIDA DE SÃO SILVESTRE - 19741º - Rafael Peres - Costa Rica - 23min58,0s2º - Rafael Palomares - México - 24min01,0s3º - Detlef Uhlemann - Alemanha - 24min06,4s4º - Jairo Correia - Colâmbia - 24min12,6s5º - Leon Schots - Belgica - 24min16,2s6º - José Romão - Brasil, SP - 24min22,0s12º - Eloy Rodrigues Schleder - Brasil, SP - 24min47,0s18º - José Maria Nunes - Brasil, SC - 25min09,0s

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1975No início de 1975 Nunes fez o temido vestibular da ACAFE para a primeira turma do recém-criado curso de Educação Física da FURB78. Passou, matriculou-se e estava presente na primeira aula, que foi realizada no dia 3 de março, uma segunda-feira. Na sala de aula, além de José Maria Nunes, outros dois alunos famosos: Paulo César Zimmer e Antônio Celso Silveira. Isto dava ao curso da FURB uma condição no mínimo rara: na mesma sala de aula estavam a medalha de ouro, de prata e de bronze dos Jogos Abertos do ano anterior.O fato só não era mais sensacional porque, na verdade, a maioria dos alunos daquele curso eram atletas, do volei, handebol, basquete, natação, atletismo e até do futebol profissional. Faziam parte daquela turma, além dos já mencionados a atleta Ingrid Roessel, multicampeã de diversas modalidades (Handebol, Volei, Saltos Ornamentais, Atletismo…), Liege Nunes de Abreu, campeã do Atletismo, Max Preis, um veterano ex-jogador do Grêmio Esportivo Olímpico e o goleiro do Palmeiras, clube de futebol profissional de Blumenau, na época. Os professores, por sua vez, liderados por Lorival Beckhauser (diretor do curso) eram todos treinadores das equipes de Blumenau que participavam dos Jogos Abertos. Isto tornava aquela turma muito especial e todos, de uma forma ou de outra, foram beneficiados: os alunos, os professores e a própria instituição, com a projeção que o curso obteve na sociedade, em função dos alunos ilustres.Nunes já conhecia Antônio Celso Silveira das competições. Era um atleta muito promissor. José dos Santos, que agora era um dos treinadores da equipe de 78 Fundação Universidade Regional de Blumenau -

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Rio do Sul, já havia falado muito dele para Nunes. Logo Nunes e Celso se tornaram amigos.Celso estava com 19 anos, tinha começado a correr nas competições internas do Colégio dom Bosco, em Rio do Sul, participou das Olimpíadas Estudantis da cidade e acabou integrando a forte equipe principal de Rio do Sul nos Jogos Abertos de São Bento do Sul, em 1973, onde ganhou sua primeira medalha (de bronze nos 5 mil metros) já na sua primeira participação. Melhorou o desempenho no ano seguinte, em Criciúma: faturou a prata nos 5 e nos 10 mil, superando o recorde anterior nos 5 mil metros. Só não se tornou recordista porque a prova foi vencida por José Maria Nunes. Mas era, para todos os efeitos, como se dizia na época, “o campeão entre os mortais”. Santa Catarina ainda iria ouvir falar muito dele.Não havia possibilidade de Celso se transferir para Blumenau, pois as condições oferecidas por Rio do Sul eram muito boas. Além disso, Celso era de uma família financeiramente estável que poderia bancar seus estudos em Blumenau sem maiores sacrifícios. Nunes sabia disso e nem fez esforços nesse sentido, mas convidou o jovem atleta para participar dos treinamentos com o time de fundistas Blumenau. Celso aceitou e passou a integrar o grupo, com Zimmer, Pompéia, João Francisco, Jorge Luis, Nunes e outros corredores.Na casa de José Maria Nunes, em Blumenau moraram diversos atletas, que iam e vinham, como era o caso de Paulo Cezar Zimmer que, como já foi dito, desde o início do ano passou a morar com eles. E até quem não era atleta, como era o caso de Francisco Reinert, chamado de Chiquinho.Francisco Reinert fazia parte da primeira turma de Educação Física da Furb. Era de Luiz Alves e tinha 17 anos. Tinha um emprego temporário como servente de safreiro, na Souza Cruz, mas, com o fim da safra de fumo, o contrato de seis meses tinha sido encerrado. Chiquinho morava numa pensão, mas já estava

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devendo três meses. Quase no fim do primeiro semestre da faculdade, numa conversa com José Maria, num intervalo entre as aulas Chico falou “olha, Zé Maria, eu vou ter que desistir da faculdade. Lamento muito, mas não tem como continuar com essa situação. Não tem como pagar a pensão e pagar a faculdade.” Zé Maria ficou pensativo por alguns segundos e depois falou, decidido: “Não. De jeito nenhum. Você não vai parar o curso, não. Você é um bom aluno, um aluno dedicado, e vai ser um grande profissional. Você não vai desistir, não. Fica tranquilo. Termina o semestre que nós vamos ver isso aí”Chico confiou e seguiu, na faculdade até terminar o primeiro semestre. Num dos últimos dias de aula do primeiro semestre Nunes chegou na aula e disse “Chiquinho, tu vai morar lá na minha casa. E, enquanto a gente puder segurar a gente segura, até você conseguir uma coisa melhor”Chico foi morar na casa dele. 40 anos depois, Chico Reinert relembra o episódio.

“Não sei qual foi o remanejamento que ele fez, porque a família dele era numerosa. Ele dividia o quarto dele comigo. Dividia a comida dele. Dividia o Ovomaltine que ele tomava para reforçar a alimentação de atleta. Fico emocionado só de lembrar. Aquilo, com certeza, quebrava o conforto dele, as rotinas dele. E ele era muito disciplinado. Levantava muito cedo, para treinar antes da faculdade. Eu morei lá por uns seis meses. Aí recebi uma oportunidade para dar aulas numa escola em Luis Alves e as coisas começaram a melhorar. Ia e voltava de Blumenau para Luis Alves todos os dias, até concluir a faculdade, em 1978.Se não fosse a mão estendida do Zé Maria Nunes é muito provável eu nunca teria sido um professor de Educação Física e ter tido uma carreira profissional de trinta e poucos anos. Devo isso a ele”

Uma curiosidade: Chico Reinert era um bom corredor. Em qualquer outra circunstância poderia ter se destacado, mas “deu azar” e não conseguia ser nem um dos três melhores da sua sala de aula (já que estudava com Nunes, Celso e Zimmer). Chico conta que, em 1975, nos Jogos Universitários de Santa Catarina, realizados na pista da Universidade Federal,

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ele foi escalado como coelho79 na prova dos 1500 metros. Só que o pessoal da FURB fez chegar aos ouvidos de José Augusto Caglioni, de Jaraguá do Sul (mas correndo por Joinville) que Chiquinho era muito bom, que ele era uma grande e perigosa revelação do atletismo e que ele venceria os 1500 metros. Na hora da prova Chiquinho partiu num ritmo super forte e Caglioni danou-se a correr atrás dele, enquanto Nunes e Zimmer mantinham uma distância segura e um ritmo normal para a prova. Depois da metade da corrida os dois atletas da Furb aceleraram o passo e alcançaram os dois ponteiros, que já estavam esgotados. Chiquinho fez o que estava previsto: abandonou a prova. Caglioni ficou perplexo. Percebeu a estratégia. Mas já era tarde. Viu sua chance de vencer a corrida virar fumaça e estava tão quebrado que quase perdeu até o terceiro lugar. Nunes e Zimmer comemoraram a vitória com Chiquinho, enquanto Caglioni, furioso, queria esganá-los80.

CORRIDAS E VITÓRIAS. A ROTINA CONTINUANunes começou o ano vencendo várias corridas importantes, como a tradicional Corrida 28 de Janeiro, em comemoração ao aniversário de Apucarana e a Corrida de Tiradentes, em Ponta Grossa além de outras corridas menos famosas, mas algumas delas, disputadas em nível bem alto, como as corridas de Farroupilha, de Rio do Sul e várias outras no estado de Santa Catarina, no Paraná e no Rio Grande do Sul.Os treinamentos eram fortes e diários. E os resultados apareciam. Nunes venceu todas as corridas que participou em Santa Catarina, em 1975, incluíndo os Jogos Universitários, o Campeonato Estadual e a competição mais importante de todas: os Jogos Abertos de Santa Catarina.79 Aquele atleta que não tem intenção de disputar a prova pra valer e sim de propor um ritmo

forte para a corrida e completar apenas metade do percurso80 Caglioni, claro, era um sujeito educado. Absorveu a derrota com seu natural espírito

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Escaldado com o susto do ano anterior (na prova dos 1500m). Nunes agora estava mais atento aos movimentos de Jorge Luis.Como havia muitos inscritos em praticamente todas as provas, algumas tiveram que ser decididas por tempo. Mas, por razões que este autor não conseguiu descobrir, em vez de colocar todos os favoritos na mesma bateria, a organização do campeonato resolveu separá-los. Assim, Jorge Luis correu a primeira bateria, vencendo, com 4min04,2s, José Maria Nunes venceu a segunda bateria, com 3min59,9s (estabelecendo novo recorde) e Antônio Celso Silveira ganhou a terceira, com 4min05,3s. No final o resultado foi que as três medalhas foram ganhas pelos vencedores de cada uma das baterias81.Nos 5 mil82 e nos 10 mil metros83, obteve vitórias razoavelmente tranquilas, embora os dois adversários tinham melhorado suas próprias marcas em relação ao ano anterior.

OPORTUNIDADES PERDIDASNunes era um dos atletas brasileiros que iriam para a Alemanha participar do Estágio oferecido naquele ano pelo governo Alemão, em Mainz. De Santa Catarina foram as atletas Mara Fuhrmann e Marília Seifert e ainda os professores Jipe Alves de Oliveira e Celso Teixeira.Mas Nunes fraturou a mão e não pode ir. Ficou quatro meses com gesso, porque sofreu um acidente durante

81 JASC-1975 - 1500 METROS1º - José Maria Nunes - Blumenau - 3min59,9s (Recorde)2º - Jorge Luis da Silva - Blumenau - 4min04,1s3º - Antônio Celso Silveira - Rio do Sul - 4min05,7s

82 JASC-1975 - 5 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Blumenau - 15min08,4s2º - Paulo Cezar Zimmer - Blumenau - 15min24,4s 3º - Antônio Celso Silveira - Rio do Sul - 15min32,8s

83 JASC-1975 - 10 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Blumenau - 31min01,8s (Recorde)2º - Antônio Celso Silveira - Rio do Sul - 31min46,6s3º - Paulo Cezar Zimmer - Blumenau - 32min03,6s

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uma aula de basquete. Numa jogada boba, tomou um tranco, caiu sobre a mão e quebrou o osso escafóide84 .Nunes tinha acabado de retornar dos Jogos Abertos de Blumenau. Foi para esta aula justamente porque não queria perder mais nenhuma aula pois existia a possibilidade de ir para a Alemanha.Pela primeira vez, desde 1970, Nunes não foi para a São Silvestre (na verdade, não participou de nenhuma das corridas de fim e início de ano). Um dirigente da CME de Blumenau chegou a insistir para que ele tirasse o gesso para correr na prova 28 de Janeiro, em Apucarana, mas Nunes se recusou.A essas alturas, a relação com Blumenau já não andava bem. E Florianópolis já estava adiantando as negociações para trazer Nunes de volta. Principalmente porque a ida de Nunes para Blumenau havia quebrado a performance da equipe de Florianópolis. Porque alguns atletas de Florianópolis também haviam seguido os passos do Nunes em direção a Blumenau. Os três melhores atletas do fundo e meio fundo de Blumenau tinham origem no atletismo de Florianópolis: José Maria Nunes, Paulo Cesar Zimmer e Jorge Luis da Silva.

CURSOS E SEMINÁRIOS SOBRE COMPORTAMENTO HUMANONaquele fim de ano Nunes participou de uma imersão, num curso de Criatividade Comunitária, realizado no Colégio da Divina Providência, em Florianópolis. O curso, ministrado por padres e freiras, durava uma semana inteira, com todos os participantes enclausurados nas dependências da escola. Nunes teve aprendizados importantíssimos naquele curso, que seriam postos em prática na sua carreira de treinador de atletismo.Depois disso, ao longo de toda a sua carreira como treinador, além dos muitos cursos que Nunes fez sobre 84 O escafoide é um dos oito ossos que formam o carpo (os ossos da mão). Trata-se de um

osso muito importante para a articulação da mão. Cerca de 60% nessa região da mão se dá justamente com esse osso. Sua fratura demanda uma recuperação muito lenta por ser um osso com muito pouca irrigação.

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técnicas de treinamento desportivo, ele, sempre que tinha oportunidade, fazia cursos ou participava de seminários sobre Psicologia, Comportamento Humano e Educação. Também lia muitos artigos em revistas e até livros sobre o tema. A relação que mantinha com a sua família exigia dele um entendimento sobre coisas que escapavam ao senso comum. Em 1974, Nunes admitiria, mais tarde, ele ainda não tinha desenvolvido completamente a capacidade de interpretar textos, o que ele procurou desenvolver nos anos seguintes.

FAMÍLIADona Reasilva estava tendo dificuldade para se adaptar na cidade. Houve um acidente na rua onde eles moravam. Uma criança foi atropelada e morreu. Reasilva ficou muito traumatizada com aquilo. Queria voltar para Campos Novos. Estava ficando doente com aquilo.Ela tinha ouvido falar de uma enchente grande que aconteceu em Blumenau, em 1973, um pouco antes de ela se mudar para a cidade. Aí, em 1974 houve outra grande enchente em Santa Catarina que atingiu principalmente as cidades do Vale do Rio Tubarão, no Sul. Foi a maior enchente da história de Santa Catarina, em termos de número de vítimas: 199 mortos e 65 mil desabrigados. Blumenau não foi atingida. Mas havia sofrido com a grande enchente no ano anterior e as emissoras de rádio fizeram a cobertura da enchente de Tubarão com um certo sensacionalismo sobre as perspectivas para a cidade de Blumenau. Aquilo deixava Reasilva muito nervosa e preocupada, pois sabia que a casa onde moravam estava sujeita a enchentes. Nada aconteceu em 1974. Mas, nos primeiros dias de outubro de 1975 a coisa ficou muito feia. O Rio Itajaí Açu subiu 12,63m e fez um grande estrago. Era a maior enchente de Blumenau desde 1911 (mais de 60 anos). A água chegou muito rapidamente. Por sorte a casa

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tinha dois pavimentos, mas a família acabou ficando ilhada na parte de cima.Foi tudo muito rápido. A água subindo, subindo. Só os pequenos estavam em casa, com a mãe. Os homens adultos já tinham saído para trabalhar. Não dava pra fazer muita coisa. Os vizinhos acudiram. ajudaram a salvar alguns móveis o que deu pra levar para o pavimento superior (fogão, geladeira, TV). A maioria das camas já estavam em cima.Aquilo foi a gota d’água para Reasilva. Logo depois daquela enchente, Reasilva voltou para Campos Novos. Sérgio, Mauro e Marisa foram com a Mãe para a casa da Maria filha mais velha. Nunes deixou a mãe ir embora, mas ficou interiormente arrasado.Mas as coisas também não estavam boas na casa da filha mais velha. E absorver as despesas de mais cinco pessoas era pesado para a família, que já enfrentava as suas próprias dificuldades. Aos poucos Reasilva foi se dando conta disso. Nunes ajudava como podia, mas queria que a mãe voltasse para Blumenau, principalmente para que as crianças pudessem voltar a estudar. Nunes prometeu à mãe que iria encontrar uma nova casa. Ela disse que voltaria. No final das contas, depois de quase dois anos em Blumenau Reasilva já havia também se acostumado com alguns benefícios de morar na cidade.Nunes, então, passou a procurar por uma casa que ficasse mais no interior, longe do trânsito urbano e fora do perigo de enchentes. Havia, na equipe de atletismo uma moça, chamada Eli Martins. Ela soube da busca de Nunes e conversou com o pai, pois sabia que havia uma casa da família que estava desocupada, no Bairro Escola Agrícola. Era exatamente o que Nunes procurava. Alugou a casa e foi buscar a mãe e os irmãos.Mudaram-se, todos, para a nova casa. Era o início de 1976

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1976Nos primeiros meses de 1976 Nunes estava afastado dos treinamentos e das corridas, por conta de ter quebrado a mão. Depois de resolvido retorno da mãe e dos irmãos para Blumenau, ele precisava lidar com outras questões pessoais.Nunes e Marisa não estavam namorando, mas, devido à presença constante dela na casa da família (muitas vezes, como já foi dito, ajudando com os deveres de casa das crianças maiores) os dois acabavam tendo recaídas. Mas nunca se entendiam completamente, à ponto de estabelecer um “namoro firme”.Além disso, Nunes estava “de olho” na irmã da Eli Martins, cuja família era proprietária da casa onde ele morava com a família, no bairro Escola Agrícola. O nome da moça era Elvira.Elvira Maria tinha 25 anos e uma história de vida sensacional. Nasceu em Boitexburgo, uma localidade a 40 quilômetros de Major Gersino, município do interior mas que pertence à região da Grande Florianópolis. Quando Elvira tinha um ano de idade a família mudou-se para uma propriedade agrícola, numa localidade chamada Barrinha, em Presidente Nereu.A mãe, Matilde e o pai, José Martins, tiveram 12 filhos e sonhavam dar a eles estudo para que fossem “alguém na vida”. Naquela época, um caminho para obter estudo eram os seminários e conventos. Quatro irmãos de Elvira (Salézio, Célio, Edit e Eli) foram para colégios de freiras ou de padres. Elvira seguiu o mesmo caminho. O interessante é que eles acabaram trazendo a educação para dentro de casa, ensinando e estimulando os outros irmãos para os estudos.

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Com 13 anos ela foi para o Colégio Maria Auxiliadora, de Rio do Sul, um internato católico onde permaneceu por 4 anos. Depois seguiu seus estudos religiosos. Foi para um convento no Alto do Ipiranga, em São Paulo, depois noutro convento, ainda em São Paulo, no Alto da Lapa, onde se formou freira, em 1970. O segundo ano do noviciado foi em São José dos Campos, em São Paulo e depois São Luiz Gonzaga, na região das Missões, Rio Grande do Sul.Em 1972 Elvira deixou o hábito. foi trabalhar como datilógrafa no recém lançado Jornal de Santa Catarina. Elvira fez um curso de um ano de Secretária bilíngue na FURB além de aulas de laboratório de Inglês. Era, em resumo, uma moça “cheia dos predicados”.A irmã dela, Eli, que praticava atletismo, sempre falava, em casa, de um grande atleta que fazia parte da equipe. Dizia que Elvira deveria conhecê-lo. Elvira já o havia visto no ônibus, de braço engessado, no final de 1975. Mas Elvira e Nunes acabaram se conhecendo por uma razão bem típica da época: como moravam na casa que pertencia ao pai de Elvira, Nunes conhecia alguns dos irmãos dela. Tornaram-se amigos. Um deles geralmente gravava músicas em fitas k7 para Nunes (isso era uma coisa muito comum na época. O toca-fitas k7 era a última palavra em tecnologia embarcada nos automóveis).Elvira, que também estava de olho no rapaz, costumava esconder essas fitas para que ela própria pudesse entregar ao Nunes, quando ele viesse buscar. Certa ocasião Nunes “esqueceu” uma blusa (um agasalho esportivo) na casa de Elvira. Elvira, naturalmente, guardou longe dos olhos dos irmãos, para que fosse ela a entregar a ele. E assim, de fita k7 em fita k7, de blusas esquecidas em blusas esquecidas, começaram a conversar. Até que, num domingo, 11 de abril de 1976, dia do aniversário do Nunes, os atletas resolveram fazer uma festinha na casa dele. Nunes foi então até a casa do Sr. Martins para convidar a Eli, que era uma das atletas da

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equipe, destacando que o convite era pra “você e suas irmãs”.Elvira tinha, naquele domingo, um almoço na casa da sua irmã mais velha e fez-se de desinteressada: “se eu voltar à tempo de ir com vocês eu vou”. Claro que voltou à tempo. As irmãs esperaram e, lá por 16 horas foram, todas, para a festa do atletismo na caso do Nunes.Dançaram, conversaram… e começaram a namorar, embora nunca tenham oficializado a relação de namoro, até o dia que resolveram casar.Mas o vai e vem do “namoro” de Nunes com Marisa acabou gerando um resultado inesperado. No final de maio Marisa procurou por Nunes e anunciou que estava grávida. Nunes ficou muito transtornado. Não queria acreditar naquilo. A ideia de ser pai não o desagradava mas não queria que fosse agora, nem naquelas circunstâncias.Relutou em assumir a paternidade. E aquele fato certamente foi um fator decisivo para que Nunes aceitasse a proposta (que já estava em discussão desde fevereiro) de voltar a correr por Florianópolis.

UMA PRIMEIRA EXPERIÊNCIA NA POLÍTICADesde o ano anterior, 1974, a Câmara de Vereadores de Blumenau tinha um programa de Estágio Legislativo, que consistia, basicamente, em permitir que cidadãos comuns, convidados, participassem das atividades do legislativo municipal, para conhecer o funcionamento da Câmara e o processo de produção das Leis Municipais. José Maria Nunes foi convidado, pelo diretor da Câmara, Roberto Diniz Saut, para ser estagiário, no período de maio e junho. Ficou muito feliz com o convite. Teria de participar, efetivamente, de 4 ou 5 sessões da câmara, mas isso não seria problema. No final, saiu-se muito bem. Teve até uma indicação aprovada, para que a mesa da casa tomasse as

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necessárias providências junto ao executivo “no sentido de se irrigar a Rua Benjamim Constant em toda a sua extensão, ligando as localidades do Bairro do Asilo, Escola Agrícola e parte do Bairro da Vila Nova, mormente no período matutino, às 11 horas e (vespertino) às 17 horas, horário que coincide com a saída dos estudantes da Escola Básica Lúcio Esteves e Escola Básica Victor Hering”A indicação foi aprovada. E, no fim a prefeitura, depois de acionada, atendeu a reinvindicação. Nunes sentiu o gostinho de ser responsável por um serviço prestado pela política à sociedade. Aquela pequena vitória virou uma semente dentro dele. Quem sabe, mais tarde, ele não poderia tornar-se um político e fazer isso mais vezes?

DE VOLTA PARA FLORIANÓPOLISEm abril de 1976 Nunes recebeu a proposta definitiva para retornar a Florianópolis e assumir, como treinador, a equipe da capital. A proposta partiu de Ney Viegas (Presidente do CME) e do João Aderson Flores (secretário da educação do Município). Mas havia um problema: as regras de participação para os Jogos Abertos haviam mudado naquele ano. Em 1976 o Governo de Santa Catarina (através da Secretaria de Educação) assumiu a organização dos Jogos Abertos. Algumas transformações relevantes foram estabelecidas duas delas foram as grandes novidades. A primeira era que os Jogos daquele ano (em Tubarão) seriam precedidos de disputas classificatórias regionais (os Jogos Abertos Regionais de Santa Catarina). No caso específico de Santa Catarina, foram estabelecidos índices para cada uma das provas. Assim, só poderiam participar dos Jogos, em Tubarão, os atletas que tivessem alcançado aqueles índices estabelecidos (ou então, caso o índice não fosse estabelecido, estariam classificados os 12 melhores resultados em cada prova). Esta novidade não importava para Nunes. Afinal, os índices nas provas que

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ele disputava eram muito abaixo do que ele conseguiria fazer em qualquer treino.A segunda novidade era importante: os atletas que se transferissem de uma cidade para outra (ou que viessem de outro estado) teriam de ficar num estágio probatório de 14 meses antes de poder competir nos Jogos Abertos. Isto significava, basicamente, que, se Nunes se transferisse para Florianópolis teria de abrir mão de participar dos Jogos Abertos daquele ano.No fim, as perspectivas que Nunes tinha quanto ao seu retorno ao atletismo de Florianópolis falaram mais alto. Nunes Voltou.Antes de se mudar para Florianópolis, sugeriu ao Colégio Sagrada Família que contratasse Antônio Celso Silveira no lugar dele, para as aulas de Educação Física. Celso foi contratado e, além disso, foi convidado por Nunes para morar na casa da família dele, no bairro Escola Agrícola. Durante todo o ano anterior Celso viajava de ônibus todos os dias de Rio do Sul até Blumenau (cerca de 100 km) para fazer a faculdade na FURB e para treinar atletismo. Agora isto ficaria mais fácil.

FLORIANÓPOLIS ESTAVA SE TRANSFORMANDOEm 1976 Florianópolis estava em festa. Estava completando 250 anos de sua elevação a Vila. Tinha cerca de 170 mil habitantes. A maioria ainda descendentes dos colonos açorianos que chegaram à ilha ainda no século XVIII. A cidade se desenvolvia em ritmo acelerado. Já contava agora com uma segunda ponte (Colombo Salles) ligando a ilha ao continente. O imenso aterro, na Baia Sul já estava pronto, embora não houvesse nada nele, além das vias de acesso à nova ponte.A cidade era calma e aprazível. Um verdadeiro paraíso, que ainda não havia sido descoberto. A Eletrosul, por exemplo que foi um importante fator de desenvolvimento da cidade, naquela década, ainda nem iniciado a construção da sua sede atual (que só foi

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inaugurada em 1978). A UFSC, embora fosse uma excelente universidade, ainda não tinha a sua reputação reconhecida e ainda não havia sofrido o afluxo das centenas de professores oriundos do Rio de Janeiro e São Paulo, o que somente ocorreria na década seguinte.As praias do Norte e do Sul da ilha estavam começando a serem descobertas e substituiriam as praias do continente (Coqueiros, Itaguaçu e Bom Abrigo) como points da moda.O prefeito Esperidião Amim85 tinha uma visão para a cidade. Queria vê-la despontar para o Brasil como um grande centro de Cultura e Esporte e Turismo. Era aí que Nunes entrava. Ele deveria ser um dos vetores do desenvolvimento do esporte na cidade.Nunes mudou-se para Florianópolis no início de agosto de 1976. Morou por algumas semanas na casa dos irmãos do amigo Miguel Raymundi, na Trindade. Depois Alugou uma casa, em Barreiros e trouxe, para morar com ele os irmãos João Francisco (19 anos) e Julio (16 anos).Os demais (Antônio, Pedro, Miro, Neusa, Mauro, Inez e Marisa) ficaram em Blumenau com o pai e a mãe. Nunes continuaria a cuidar das despesas da família toda, em Blumenau.Nunes voltou a ser professor do Instituto Estadual de Educação, com 40 horas e na Prefeitura, 20 horas. Mais tarde, as 20 horas do município foram substituídos por um cargo administrativo, na estrutura de esportes da Prefeitura.Agora ele era, oficialmente, treinador da equipe de Florianópolis. Tinha de se preocupar com isso também. Nos primeiros meses a situação era dura. Os treinamentos eram realizados na pista do Exército (63º BI) e numa pista pequena que havia no Instituto Estadual de Educação.

85 Nomeado, no ano anterior, pelo governador do estado, Antônio Carlos Konder Reis.138

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O Jornal Gazeta Esportiva publicou os relatórios dos professores que tinham ido para Mainz na Alemanha, para participar do Estágio oferecido pelo governo da Alemanha. Nunes comprava os jornais e lia com muito interesse. Fazia cadernos com os recortes e utilizava aqueles ensinamentos nos seus próprios treinamentos e no treinamento de outros atletas. Pode-se dizer, assim, que os relatórios do Estágio de Mainz, feito pelos professores — entre eles os catarinenses Jipe Alves de Oliveira e Celso Teixeira — foi a primeira literatura de treinamento utilizada pelo treinador José Maria Nunes.Mas ainda tinha de se preocupar com a sua própria forma física. Mesmo que estivesse impedido de participar dos Jogos Abertos daquele ano, tinha ainda as corridas de rua e o Campeonato Estadual, que, naquele ano, ganhou uma importância muito grande, pois, para a maioria dos atletas, era uma das principais etapas de classificação para os Jogos Abertos. E lá Nunes teria de enfrentar uma novidade no mundo das corridas de Santa Catarina: Carlos Augusto Rodrigues, o Pompéia.

POMPÉIA!Pompéia era, acima de qualquer coisa, um cara legal! Um sujeito simples do qual todo mundo gostava. Era de Blumenau, esteve no Exército e descobriu o atletismo. Depois veio treinar com Nunes, no Olímpico. Desenvolveu-se muito bem. Era um talento e tanto.Logo que Nunes saiu de Blumenau os treinadores começaram a estimular Pompéia para que ele se tornasse o substituto de Nunes.No final de agosto aconteceu uma corrida em Blumenau, em homenagem à Semana do Exército. Nunes estava ainda lidando com os processos de adaptação da mudança para Florianópolis. Jogou basquete durante a aula na faculdade, pela manhã, deu aula à tarde e foi para Blumenau, chegando lá no início da noite participar da corrida. Não contava com a preparação e a motivação de Pompéia.

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O novato abriu uma grande frente de mais de 50 metros na primeira das duas voltas da corrida. Na segunda volta Nunes tentou reagir mas já era tarde. Não estava motivado para isso. Não imaginava que uma derrota numa corrida de menor importância pudesse ter uma repercussão tão forte. Ficou em segundo lugar na corrida.O locutor da prova, no altofalante foi à loucura. “Grande Pompéia! É o maior atleta de Santa Catarina. Acabou com a fama do Nunes. Temos um novo Campeão!” Pompéia, feliz mas, ainda meio sem jeito, só queria comemorar a vitória.A emissoras de rádio e os jornais, nos dias seguintes, cuidaram de fazer um grande alarde sobre o fato: “Acabou a era Nunes”, “Nunes não é mais o mesmo!”, “José Maria Nunes está acabado!”, “Pompéia é o novo rei das corridas em Santa Catarina”.Era cedo demais para isso tudo. Nunes sabia. Pompéia não sabia. E acabou acreditando naquele fuzuê todo.

CAMPEONATO ESTADUAL DE ATLETISMONo final de setembro (dias 25 e 26) foi realizado em Joinville (no estádio do América Futebol Clube) o Campeonato Estadual de Atletismo.A estrela do evento, evidentemente, era Pompéia. Era o alvo de todos os holofotes e objeto de toda a atenção. A repercussão obtida com a vitória da corrida do mês anterior deixou muita gente empolgada. Minutos antes da corrida dos 10 mil metros, com os atletas já dentro da pista, Nunes foi até Pompéia e estendeu a mão para cumprimentá-lo. Pompéia parecia confiante. Deu a mão e disse um educado “boa sorte, Nunes” sem muita convicção. Nisso, ouviu-se, lá de fora do alambrado a potente voz do treinador, Edgar: “Menino! faz a tua corrida. Não dá bola pra ninguém. Faz a tua corrida!” Nunes sabia que aquilo, mais do que um incentivo para Pompéia era uma provocação para ele, Nunes. Mas não se abalou.

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Dado o tiro de largada, formou-se logo um pelotão na frente formado por cinco ou seis corredores. Logo na segunda volta Nunes e Pompéia descolaram do pelotão e, em seguida, Pompéia assumiu a frente e começou a abrir distância. Nunes ouvia os gritos do treinador do adversário: “Excelente, Pompéia! 1e8.”. Na volta seguinte, “Excelente! 1e7.” Nunes sabia que aquilo era tudo, menos “excelente!”. Aquilo era um ritmo suicida eles deveriam estar correndo a 1e12 ou 1e14 para fazer uma marca muito boa. Com 1e8 aquilo não ia acabar bem. Tratou de baixar o ritmo da corrida. Pompéia disparou na frente. Em quatro ou cinco voltas abriu quase 80 metros de frente. Aí a loucura dos 1e7 e 1e8 começou a cobrar a conta. Pompéia começou a perder velocidade e deu uma olhada pra trás. Aquilo foi a senha para Nunes apertar o ritmo e começar o ataque, para desespero do treinador que gritava, em vão, palavras de incentivo. Em menos de uma volta Nunes tirou praticamente toda a diferença. Encostou, mantendo o ritmo forte e falou “Vamo lá, Pompéia. Faz a tua corrida. Não dá bola pra ninguém”. E avançou, num ritmo forte. Pompéia tentou um último esforço, mas não aguentou. Uma volta depois Nunes apenas viu que seu principal opositor estava parado na raia externa da pista. Pompéia passou mal e não conseguiu terminar a prova.Nunes venceu a corrida, com uma volta inteira de vantagem sobre o segundo colocado. Depois venceu também as provas de 1500m e 5 mil metros86. E os

86 CAMPEONATO ESTADUAL - 1976 - 1500 METROS1º - José Maria Nunes - Florianópolis - 4min03,6s2º - Jorge Luis da Silva - Blumenau - 4min04,9s3º - Elói Menestrina - Joinville - 4min05,2s

CAMPEONATO ESTADUAL - 1976 - 5 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Florianópolis - 15min07,8s2º - Carlos Augusto Rodrigues - Blumenau - 15min10,6s3º - Paulo Cezar Zimmer - Blumenau - 15min25,1s

CAMPEONATO ESTADUAL - 1976 - 10 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Blumenau - 31min35,6s2º - Rogério Martins - Joinville - 32min57,6s3º - Mauro Souza - Lages - 33min42,2s

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jornalistas se deram conta de que, por mais algum tempo, José Maria Nunes ainda seria a fonte das melhores notícias nas corridas de fundo em Santa Catarina.

OS JOGOS ABERTOS DE 1976Pompéia não se abalou com as derrotas. Foi muito bem nos Jogos Abertos de Tubarão, vencendo as corridas dos 5 e 10 mil metros87. Jorge Luis venceu os 1500 metros88.O atletismo de Florianópolis, no geral, foi muito mal. Ficou em 4º lugar no masculino e em 5º lugar no Feminino89. Havia muita coisa para ser feita.Nunes voltou para Florianópolis com uma ideia fixa. Transformar a equipe de Florianópolis numa equipe competitiva. Para isso, sabia que teria alguns dragões para serem enfrentados. O principal deles era algo que tinha aprendido em Blumenau e precisava implementar em Florianópolis: um senso maior de “profissionalismo” para a equipe.Os treinamentos não foram interrompidos logo depois dos Jogos Abertos (como ocorria todos os anos). A

87JASC - 1976 - 5 MIL METROS1º - Carlos Augusto Rodrigues - Blumenau - 15min25,2s2º - Paulo Cezar Zimmer - Blumenau - 15min30,0s3º - Ademir Rosa - Florianópolis - 15min34,0s

JASC - 1976 - 10 MIL METROS1º - Carlos Augusto Rodrigues - Blumenau - 32min13,8s2º - Paulo Cezar Zimmer - Blumenau - 32min58,6s3º - Rogério Martins - Joinville - 33min16,4s

88 JASC - 1976 - 1500 METROS1º - Jorge Luis da Silva - Blumenau - 4min06,6s2º - Paulo Cesar Zimmer - Blumenau - 4min06,6s3º - Elói Menestrina - Joinville - 4min08,8s

89 JASC - 1976 - GERAL - ATLETISMO MASCULINO1º lugar - Joinville - 176 pontos2º lugar - Blumenau - 124 pontos3º lugar - Criciúma - 91 pontos4º lugar - Florianópolis - 54 pontos5º lugar - Curitibanos - 46 pontos

JASC - 1976 - GERAL - ATLETISMO FEMININO1º lugar - Joinville - 135 pontos2º lugar - Criciúma - 85 pontos3º lugar - Blumenau - 82 pontos4º lugar - Rio do Sul - 65 pontos5º lugar - Florianópolis - 45 pontos

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equipe continuou ativa, nas pistas do 63 BI e do IEE.Os corredores de fundo, principalmente, ainda teriam as provas de fim de ano (Volta Universitária, em São Paulo, São Silvestre, Corrida de Reis, Apucarana…) de maneira que os treinos continuavam em grande intensidadeNum desses dias João Aderson tinha ido assistir a um treino na pista do Exército, no Estreito. Depois que os atletas foram embora ele e Nunes ficaram conversando. Aderson perguntou “O que podemos fazer para que Florianópolis vença o atletismo dos Jogos Abertos do ano que vem?” Nunes respondeu “olha, não é possível, para um atleta, estudar, trabalhar e treinar forte. A solução é encontrar uma maneira de permitir que ele não tenha de trabalhar e possa se dedicar apenas a estudar e treinar”“E como poderíamos fazer isso?”“Só tem uma maneira: é dar aos atletas uma espécie de salário que permita a ele ter uma vida normal, sem ter de trabalhar.” e continuou: “tem um Plano Nacional da Educação Física que prevê algumas possibilidades nesse sentido. É possível usar dinheiro da secretaria da educação para financiar e apoiar o esporte.”João Aderson gostou da ideia. Disse que iria estudar aquilo com carinho e falar com o prefeito Esperidião Amim. Estava lançada a semente do que viria a ser uma das mais importantes revoluções no esporte amador de Santa Catarina: a bolsa atleta, uma remuneração fixa fornecida para os atletas com desempenho satisfatório nas competições e na escola. Ao longo das décadas seguintes a bolsa atleta, adotada também em muitas outras cidades de Santa Catarina e do Brasil, ajudou milhares de atletas a se manterem no esporte e alcançarem seus objetivos de vida, como cidadãos, concluíndo seus estudos.No final de 1976 um grupo de atletas de Florianópolis foram fazer a preparação final para a São Silvestre em São Joaquim, na serra catarinense. O grupo liderado por

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José Maria Nunes era formado por Paulo Paulino Machado (com a esposa) João Francisco Nunes e Célia Goedert. Ficaram 25 dias.Naquela virada de ano Nunes teve mais uma excelente participação na Corrida Internacional de São Silvestre, em São Paulo, onde obteve o 18º lugar sendo o 2º melhor brasileiro na prova90. Seu amigo, Paulo Cesar Zimmer venceu a Corrida de Integração Nacional (a mesma que Nunes havia vencido em 1972 e Jorge Luis em 1973). Santa Catarina já era considerada uma potência esportiva nas corridas de fundo no Brasil.

FAMÍLIA! Depois que José Maria saiu de Blumenau, o pai, João Maria recebeu uma proposta de um fazendeiro de Campos Novos que tinha uma fazenda no Poço Grande, uma localidade na região entre Joinville e Guaramirim. A proposta era de ele ir pra lá com a família e ser o caseiro. João Maria aceitou a proposta e foi, com a família toda. Como era de se esperar, isso não foi um bom negócio.Além do mais, naquele segundo semestre de 1976 a família foi surpreendida com mais uma gravidez: dona Reasilva estava esperando o seu 15º filho. Marisa, a mais nova, tinha 4 anos. Maria, a mais velha, tinha 30. Entre as duas, 9 meninos (José Maria, Sebastião, Antônio, João Francisco, Júlio, Pedro, Sérgio e Algemiro) e 3 meninas (Helena, Neusa e Inês).

90 CORRIDA DE SÃO SILVESTRE - 19761º - Edmundo Warmke Bravo - Chile2º - Franco Fava - Itália3º - Luis Hernandez - Mexico4º - Marcos Byfell - Suiça5º - Rik Schoots - Suiça10º - Eloy Rodrigues Schleder - Brasil18º - José Maria Nunes - Brasil23º - José Romão Andrade Silva - Brasil

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1977No final de 1976 Marisa voltou a morar em Florianópolis. O nascimento do bebê estava previsto para fevereiro. Luciano nasceu no dia 12 de fevereiro de 1977. Nunes tinha sentimentos bastante confusos sobre aquela situação. Gostava da ideia de ter um filho, mas não gostava daquela circunstância. Passou a ajudar financeiramente, mas não assumiu prontamente a paternidade, o que só ocorreu algum tempo depois.Elvira, que era a namorada de Nunes, sabia da história toda. E sabia também de outras tantas namoradas que Nunes tivera, em Blumenau e em Florianópolis. Mas era (como sempre foi) muito compreensiva e paciente. O passado era o passado.Além do mais, já estava decidido que Nunes adotaria, desde o nascimento, o novo irmãozinho que estava à caminho. O menino nasceu prematuro, na Maternidade Darci Vargas, em Joinville. Era o primeiro dos 15 filhos de Reasilva que nascia em um hospital. Todos os outros nasceram em casa, em Campos Novos, pelas mãos das parteiras das redondezas.Mas este último nasceu muito fraquinho, no dia 20 de fevereiro. Logo ficou muito doente. Nem chegou a sair do hospital. Infelizmente, morreu antes de ser conhecido pelos irmãos. Seu nome era Sílvio.Esta notícia deixou todos muito tristes e preocupados com a saúde de Reasilva, que já não andava bem.

BOLA PRA FRENTEAlém dessas questões familiares e também da participação dele e da equipe nas na Corrida de Reis, em Brasília e da 28 de Janeiro, em Apucarana (2º lugar), aquele início de ano trazia também um outro

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problema importante para ser resolvido. A equipe de Atletismo estava crescendo. E não havia uma boa pista de atletismo para os treinamentos em Florianópolis. Nunes conhecia um oficial que era dentista na Marinha. Através dele Nunes chegou ao Comandante Quintieri, da Escola de Aprendizes Marinheiros. O filho do comandante, Luiz Quintiere, era um rapaz de 16 ou 17 anos que queria treinar atletismo (Acabou sendo, mais tarde, um bom atleta, nas corridas de velocidade e no salto em distância). Isso foi um fator que facilitou a deliberação no sentido de permitir que a pista da Escola de Aprendizes Marinheiros de Florianópolis fosse utilizada para os treinamentos da equipe de Florianópolis.Os atletas ganhariam uma carteirinha especial, emitida pela Marinha, sem a qual não era permitido o acesso à pista. Com uma pista para treinar e o sistema de Bolsas funcionando, Nunes foi, aos poucos ajustando a equipe, trazendo de volta atletas que haviam abandonado o esporte na capital e convidando alguns talentos no interior do estado. Foi o caso de Antônio Celso Silveira, que era atleta de Rio do Sul mas morava e estudava em Blumenau. Nunes convidou Celso para se transferir para Florianópolis. Ganharia uma bolsa, concluiria seu curso de Educação Física na Udesc e daria aulas em escolas do município. Celso aceitou a oferta e veio morar na casa que Nunes havia alugado para morar, com o irmão, em Barreiros. Agora, além dele e dos irmãos, João Francisco, Julio e Sérgio, moravam na casa o atleta Celso Silveira, recém-transferido para Florianópolis, o Massagista Pirulito91 e, mais tarde, eu, Ênio Padilha.

UMA NOTA AUTOBIOGRÁFICANesse ponto da história, tomo a liberdade de incluir no texto uma pequena nota autobiográfica. Julgue o leitor,

91 Antônio Roberto Medeiros, era massagista da CME de Florianópolis e atendia o atletismo mas também outras modalidades, especialmente o Futsal.

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se ela é pertinente e se acrescenta alguma coisa à história que está sendo contada.Em fevereiro de 1977, com 18 anos recém-completados, resolvi sair de casa. Sair de Rio do Sul, tentar a vida em uma cidade maior. A empresa na qual eu havia trabalhado nos últimos três anos estava em processo de falência. Meu salário estava atrasado fazia quatro meses. Eu estava muito desanimado e queria (precisava de) novos ares.Escolhi Florianópolis por várias razões, mas a principal é que eu tinha onde morar. Um amigo havia morado na nossa casa durante os dois anos anteriores, enquanto trabalhava em Rio do Sul. Então não seria complicado eu morar na casa dele por algum tempo, até acertar as coisas na nova cidade. Cheguei no último dia de fevereiro. Fui pra casa do meu amigo, que morava no Morro do Mocotó, logo depois da Cabeça do Santo, perto do Hospital de Caridade. Me instalei como pude. Tinha praticamente nenhuma bagagem (e muito pouco dinheiro). Dormia no sofá da sala. O movimento na casa era grande. Então eu dormia tarde e acordava cedo. Na casa, pequena, morava o meu amigo, a mulher dele, dois filhos pequenos, a mãe dele e um irmão (e, eventualmente, a namorada do irmão). Antes do final da primeira semana eu já tinha notado que a coisa não seria fácil. Não havia privacidade nenhuma. E os dois irmãos nem sempre se entendiam direito. Coisas de família.Gastei as duas primeiras semanas de março tentando me ajeitar. Procurei emprego, sem sucesso. Estava desorientado. E muito desanimado. Não queria voltar para Rio do Sul. Mas a coisa estava ficando difícil. O clima estava pesado na casa do meu amigo. Ele estava sendo pressionado pela mãe, pela mulher e pelo irmão, por causa da decisão de ter colocado um estranho para morar ali. Fiz contatos com a empresa na qual eu trabalhara em Rio do Sul, na esperança de receber algum dinheiro dos salários atrasados. Recebi (de uma fonte segura) a informação de que não iria receber

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nada tão cedo. Que eles iriam resolver primeiro o caso dos que estavam por perto, esmurrando os portões diariamente. As minhas opções eram voltar pra Rio do Sul e me juntar aos que pressionavam para receber os atrasados (com pouquíssimas chances de sucesso) ou “seguir a vida e entregar pra Deus” como me disse a minha fonte. Resolvi seguir a vida.No sábado, dia 19 de março fui até a Trindade, na casa onde morava um amigo da equipe de atletismo de Rio do Sul, Miguel Raymundi. Estávamos conversando quando chegou o professor José Maria Nunes. Eu já o conhecia de algumas competições. Até já tinha corrido com ele. Mas nunca havíamos sido apresentados pessoalmente. Miguel fez as honras. Ele apertou a minha mão, perguntou alguma coisa, foi muito amável. Eu estava encantado. Estava conversando com um grande ídolo. Uma pessoa que eu só via nas fotografias dos jornais. Uma pessoa que era o assunto nas conversas entre os atletas. O cara que a gente ficava olhando, da arquibancada, tentando entender como ele fazia aquilo.Eu já era atleta. Nos dois anos anteriores era da equipe de Rio do Sul. Tinha tido uma participação inexpressiva nos Jogos Abertos de Tubarão, no ano anterior, mas, em novembro tinha vencido a seletiva de Santa Catarina para os Jogos Estudantis Brasileiros e batido o recorde dos 1500m para juvenis (com 4min16s). E fiquei em 9º lugar nos JEBs, realizados em Porto Alegre. De qualquer forma, aquilo não era significativo para entrar na equipe de Florianópolis, que tinha, na época, pelo menos uns cinco ou seis atletas bem melhores do que eu (o próprio José Maria Nunes, seu irmão, João Francisco, Sebastião Iberes Lopes de Melo92, Valdomiro Livramento Neto, Paulo Roberto Vieira, Ademir da Rosa, Nereu Pereira Filho, entre outros). Nunes estava ali para conversar com Miguel, que era uma estrela do atletismo e para rever os amigos, com os quais havia

92 Cirurgião Dentista e Professor de Educação Física. Mais tarde chegou a ser Reitor da UDESC.148

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morado, nas primeiras semanas do seu retorno, no ano anterior.Eu perguntei se eu poderia treinar com eles na equipe de Florianópolis. Ele explicou que a prefeitura pagava uma bolsa para alguns atletas, mas que, no meu caso seria muito difícil (por que eu não tinha nenhum resultado expressivo). Mas eu poderia, sim, treinar com eles, na pista da Marinha. Os treinos eram todos os dias de manhã e à tarde.Na segunda-feira, oito horas da manhã eu estava lá, com meu material, pronto pra correr. Nunes chegou, distribuiu tarefas para os atletas e me incluiu num grupo para fazer um trabalho de base. Corridas ao redor da pista. Depois do treino veio conversar comigo. Acho que o Miguel deve ter falado pra ele sobre a minha situação. Perguntou se eu já estava estudando. Eu respondi que não. Que não tinha conseguido vaga em nenhuma escola. Perguntou onde eu estava morando. Contei pra ele, rapidamente, a minha situação. Eu estava desesperado, quase chorando. Mas ele estava muito amável. E prometeu que iria conversar com “umas pessoas”. No dia seguinte, no final do treino, ele me chamou, e disse: “Padilha, eu vou fazer um negócio com você. Você pode pegar as suas coisas e pode vir morar lá na minha casa. Eu consegui, com um amigo meu, que é diretor um colégio Aderbal Ramos da Silva, aqui no Estreito, uma vaga pra você estudar. Você vai começar a estudar ainda hoje. Tem de se esforçar, porque já perdeu praticamente um mês de aula. Mas você é um rapaz inteligente e vai conseguir.”“Infelizmente, não posso conseguir uma bolsa de atleta pra você na Prefeitura de Florianópolis, mas você vai, a partir de amanhã, procurar um emprego. Enquanto não encontrar um emprego, pode ficar lá em casa, sem problemas. E vai estudar, que isso é o mais importante.”

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Era uma coisa difícil de acreditar! Foi a primeira coisa boa que me aconteceu em Florianópolis em quase um mês. Finalmente eu teria um lugar pra ficar. E poderia voltar a estudar.Fiz o que ele disse. Me mudei no mesmo dia. Fui no colégio à noite, levei meus documentos, fiz a minha matrícula e já fiquei para as aulas do dia. Quando cheguei em casa à noite Nunes estava me esperando, com umas folhas de jornais que ele tinha conseguido. Era a página de empregos. Me mostrou como procurar: “vai nesses lugares amanhã. Quem sabe aparece uma coisa boa”.No dia seguinte, cedo, saí para procurar emprego. Mas agora eu estava muito mais animado e seguro. Funcionou: consegui um emprego em dois dias, antes do final daquela semana eu estava trabalhando num escritório, no último andar do Edifício Comasa, na Rua Felipe Schmidt. Depois do segundo salário eu pude começar a ajudar com a minha parte no aluguel e nas despesas da casa. Estava com a vida muito bem encaminhada. E minha amizade com José Maria Nunes estava apenas começando.José Maria não tinha nenhuma motivação oportunista ou interesseira para me ajudar. Eu não era um atleta de ponta. Não era, sequer, um atleta promissor. E ele tinha, na sua equipe, vários corredores melhores do que eu. Além disso, não havia entre nós uma amizade antiga ou qualquer tipo de vínculo. Eu não era da família dele. Não havia nada.Mas ele olhou nos meus olhos e viu alguma coisa. Viu uma possibilidade. Viu um futuro. E sentiu-se, de alguma forma, responsável por aquilo. Achou que deveria ajudar de alguma forma. Isso era José Maria Nunes.E eu viria a descobrir, nos anos seguintes, que ele fazia isso, desse jeito, com muita gente. Muitos anos depois, Elvira faria, pra mim, a melhor definição dessa característica de José Maria: “ele tem

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amor compassivo. Ele se identifica com o problema do outro e quer ajudar. Assume como sua aquela dor. É o jeito dele. Talvez isso seja uma qualidade. Talvez seja um defeito. Nunca saberemos!”

A EQUIPE DE ATLETISMO DE FLORIANÓPOLIS Naquele primeiro semestre de 1977 a pista de atletismo da Escola de Aprendizes Marinheiros foi reformada para receber os treinamentos da equipe de Florianópolis. A prefeitura forneceu os materiais e a reforma foi feita pela própria Marinha. Isto foi muito importante, porque, em outubro, na última hora, a pista da Universidade Federal, que deveria receber a competição dos JASC não pode ser utilizada. O atletismo dos JASC em 1977 acabou sendo realizado na EAM.Nunes não concordava com a maneira como o atletismo era conduzido pelas pessoas que comandaram o esporte em Florianóplis até então e impos ao presidente da CME uma condição extrema: não queria saber dessas pessoas interferindo no comando da equipe. Na opinião de Nunes, os dirigentes e treinadores não levavam o esporte com a devida seriedade. Não havia concentração. Permitiam que os atletas bebessem e fumassem e participassem de festas, até mesmo nas viagens de competição. Essa visão talvez fosse exagerada, mas foi assumida pelos dirigentes da CME, que deram a Nunes uma espécie de “carta branca”.Iniciava-se ali um período em que José Maria Nunes, como treinador, deteve imenso poder na equipe de atletismo de Florianópolis. Nunes estava muito prestigiado e venceu essa batalha. Mas isso lhe custaria incômodos por muitos anos. em parte por não ser totalmente compreendido por alguns professores, treinadores e dirigentes de Florianópolis, em parte porque ele próprio não tinha uma compreensão plena de como funcionavam as coisas naquele nível de atividade e, muitas vezes, não tinha a necessária habilidade política para conduzir suas determinações.

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A criação da Bolsa Esporte, foi uma aposta importante e que produziu milhares de resultados, ao longo de muitos anos. Florianópolis começou, a partir de 1977, a exportar esse modelo de gestão no atletismo que se alastrou para o esporte em geral.Antes de 1977 o Atletismo de SC vivia de talentos individuais e vitórias eventuais. A organização e a disciplina impostas por José Maria Nunes mudou isso e, no início da década de 1980 a equipe de atletismo de Florianópolis era uma das grandes forças do atletismo brasileiro.Foram descobertos alguns grandes atletas naquele período de três anos, de 1977 até 1979. Alguns foram efetivamente descobertos por José Maria Nunes. Outros já praticavam atletismo, mas obtiveram seus melhores resultados no período em que começaram a treinar com Nunes.Alguns exemplos são Márcia Xavier da Silva, Evaldo Rosa da Silva, Vera Lúcia e Vera Regina Linhares, Ana Maria Silva, Célia Regina Goedert, Nelly Alice de Sousa, Márcia Rosa da Silva, Paulo Roberto Vieira e Edison Benites Pedelhes. Além disso, integraram-se à equipe atletas importantes e talentosos, como Paulo Paulino Machado, Edson Anery Vieira, Waldomiro Livramento Neto, Charles Lima, Ieda Regina Juppa, e outros. Alguns outros atletas de Florianópolis treinavam na UFSC, com os professores Markus Vinícius Nahas, Villibaldo José Neckel, Édio Luiz Petroski e também com a professora Alva Neves Pessi. Mas havia uma determinação de que a escalação para a participação nos Jogos Abertos seria definida através de uma competição seletiva que seria coordenada pelo professor Nunes.

EVALDO ROSA DA SILVANuma tarde de treinos normais Nunes estava trabalhando na pista da Escola de Aprendizes, conduzindo o treinamento dos seus atletas. No campo de futebol acontecia um jogo entre aprendizes

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marinheiros. Nunes se distraia acompanhando alguns lances do jogo quando viu uma bola lançada do meio campo para o atacante. Mas o lateral defensor estava melhor posicionado e parecia que iria dominar a bola com facilidade. Parecia! O atacante disparou como uma flexa. Passou muito facilmente pelo defensor e tomou a bola na frente, partindo para o gol. O goleiro defendeu. Mas Nunes ficou impressionado com a velocidade do rapaz. Ficou prestando atenção no jogo, e a cena se repetiu mais duas ou três vezes: a bola era lançada, o atacante partia, cinco ou seis metros atrás do zagueiro. Chegava na frente, sempre, dominava a bola com facilidade.No final do jogo Nunes se aproximou do jogador: “escuta, meu rapaz, você corre muito bem. Parabéns. Não queres fazer um teste na nossa equipe de atletismo?” A resposta foi rápida: “Quero, sim. Quando?”O que Nunes não sabia é que o jovem marinheiro jogador, assim como muitos dos seus companheiros, viviam de olho nas meninas do atletismo. Entrar para a equipe era praticamente um “sonho de consumo” da rapaziada. E o Aprendiz de Marinheiro Evaldo estava agora muito próximo de alcançar esse objetivo.No dia seguinte Evaldo não foi jogar futebol. Apresentou-se para treinar atletismo. Fez o aquecimento junto com o pessoal veterano. Estava prestes a se tornar conhecido em Santa Catarina e, mais tarde, no Brasil.O aprendiz de marinheiro Evaldo Rosa da Silva era gaúcho, de Bagé. Tinha 19 anos. Estava na escola desde o ano anterior.Nunes conseguiu do comando da escola que ele fosse dispensado das atividades de Educação física, para se dedicar ao atletismo e se preparar para os Jogos Abertos que seriam disputados em outubro.Evaldo venceu os 400 metros nos JASC de 1977 e ganhou a medalha de prata nos 200 metros (era quase

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impossível, para um novato, desbancar o grande Lauro Holzapfel nas provas de 100 e 200 metros, onde ele já era imbatível havia uns três anos).Nos anos seguintes Evaldo seguiu colecionando medalhas de ouro nos Jogos Abertos. Ganhou medalha de ouro no Campeonato Mundial da Forças Armadas, em 1980 (revezamento 4x400m) e medalha de prata nos Jogos Pan Americanos de 1983 (revezamento 4x400m). Chegou a ser convocado e correr os 400 metros nos Jogos Olímpicos em Los Angeles, 1984. Teve uma carreira de atleta brilhante. Seu recorde dos 400 metros (47,0s - pista de carvão - Jaraguá do Sul), obtido nos Jogos Abertos de Santa Catarina, em 1980, completou 35 anos em 2015 sem que ninguém o tivesse superado.Evaldo foi uma das muitas descobertas do treinador José Maria Nunes. As histórias variam muito pouco, mas estão todas lá, nos registros dos campeonatos estaduais, dos Jogos Abertos e das mais importantes corridas de rua do Brasil.Em 1977 Nunes tornou-se, definitivamente, treinador. Havia um grupo enorme de atletas, de todas as idades que faziam parte da equipe de Florianópolis. Nunes já não podia treinar nos horários convencionais, por isto acordava 5 horas da manhã para correr e fazer os seus exercícios. As 8 da manhã já estava pronto para dar treinamento aos seus atletas; Ele achava que o salário que ele ganhava do Instituto Estadual de Educação e da Prefeitura de Florianópolis era exclusivamente por ser atleta. Não achava que a sua função de treinador valesse um salário. Por isso se desdobrava nos próprios treinamentos, custasse o sacrifício que custasse.Nunes tinha a ambição de ser campeão dos Jogos Abertos, também como treinador. Tinha observado muitos erros na condução de outras equipes. O principal desses erros era a falta de condições para que os atletas pudessem treinar. Ele entendia que era função do treinador fazer gestões junto aos dirigentes no sentido de facilitar a vida dos atletas. ficava

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incomodado com a aparente apatia dos treinadores com essas questões.Do ponto de vista técnico, Nunes também identificava algumas deficiências. A leitura dos relatórios de Mainz93

dava a Nunes uma visão de que algumas técnicas de treinamento em uso nas equipes de Santa Catarina poderiam estar erradas ou ultrapassadas. Por exemplo: não era comum dar treinamento de resistência para os velocistas (nem mesmo no início das temporadas). Aliás, o trabalho de base era muito negligenciado por praticamente todos os treinadores. Isso somente começou na segunda metade da década de 1970.

OS JOGOS ABERTOS DE 1977Em outubro de 1977 Florianópolis ferveu. Havia uma movimentação enorme jornalistas de todo o estado, uma multidão de atletas, árbitros, estudantes de Educação Física de todas as escolas. Aquilo chamou a atenção de um jovem gaúcho de Santana do Livramento, recém chegado em na cidade. Deraldo Oppa tinha apenas 17 anos e estava no terceiro ano do segundo grau94. Na cidade de onde ele vinha existiam dois esportes: futebol e basquete. Ele não era tão bom no futebol, por isto jogava basquete, mas gostava de esportes em geral.Atraído por aquele movimento todo Deraldo foi ver a abertura dos Jogos Abertos, no estádio Orlando Scarpeli. Duas personalidades chamaram atenção: José Maria Nunes (que carregou a tocha olímpica, ao lado da atleta Célia Goedert) e Milton Carlos Dellagiustina, um ciclista excepcional, grande campeão nos anos 1970 e 80, que fez o juramento dos atletas.Na quarta-feira, dia 26, pela manhã, Deraldo estava no estádio da Escola de Aprendizes Marinheiros para ver o Atletismo. Ficou maravilhado com a competição. E viu, pela primeira vez, José Maria correr. Era o dia da prova dos 5 mil metros.

93 Citado na página xx94 Atualmente, Ensino Médio

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Nunes estava muito preocupado. Zimmer estava muito bem. Fisicamente os dois estavam muito equilibrados. A única coisa que Nunes tinha a seu favor era a experiência. Depois do tiro de largada Nunes seguiu sua corrida, impondo um ritmo forte, como fazia sempre. Mas logo sentiu que o corpo não acompanhava a vontade. As pernas sofriam. Começou a sentir que teria problemas. Resolveu ser mais cauteloso. Deixou que Zimmer assumisse a liderança da prova e ficou na segunda posição. Zimmer correu forte, tentou impor um ritmo que liquidasse a possibilidade de reação final (sabia que nisso Nunes era mais forte). A medida que a prova se desenrolava a ideia de que poderia perder a prova ia aumentando em Nunes. Zimmer não dava mostras de que fraquejava. Entraram na última volta com Zimmer à frente. Na reta oposta Nunes emparelhou. Na entrada dos 200m acelerou e avançou uns cinco metros. Parecia que a corrida estava ganha. Mas o barulho das passadas do adversário não diminuia, a torcida gritava, Nunes sentia que Zimmer estava vindo pra cima Faltavam ainda cem metros, acelerou, Zimmer diminuiu a distância, a dor nas pernas cada vez mais forte, o peito parecia querer explodir buscou as últimas energias, olhou para o lado, faltavam dez metros… a linha de chegada finalmente passou por debaixo dos seus pés. Nunes venceu mais uma corrida dos Jogos Abertos95. Mas nunca havia tido tanta dificuldade para superar um adversário numa prova de longa distância.Ajoelhou-se na pista. Agradeceu a Deus. Escapou por pouco!Na plateia, Deraldo e mais cerca de 1500 pessoas aplaudiam o esforço dos dois atletas e o espetáculo que ofereceram ao público. Afinal. Os dois haviam acabado de quebrar o recorde dos Jogos (o terceiro colocado, Carlos Augusto Rodrigues, o Pompéia, também quebrou o recorde anterior naquela prova).95 JASC - 1977 - 5 MIL METROS

1º - José Maria Nunes - Florianópolis - 14min49,2s (recorde)2º - Paulo Cezar Zimmer - Blumenau - 14min55,4s (recorde)3º - Carlos Augusto Rodrigues - Blumenau - 15min16,6s (recorde)

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Zimmer estava muito bem nos JASC de 1977. No dia seguinte venceu os 1500 metros96, tornando-se, assim, o primeiro a vencer José Maria Nunes numa corrida dos Jogos Abertos. Os dois quebraram o recorde da prova. Pela primeira vez Nunes foi ao pódio dos Jogos Abertos em uma prova individual e não estava no degrau mais alto. Paulo Cesar Zimer estava sendo recompensado por muitos anos de trabalho e uma perseguição implacável.Assim, a prova dos 10 mil metros, marcada para o último dia do atletismo nos Jogos Abertos foi considerada como um “tira-teima”. Deu Nunes97. As 25 voltas da prova foram disputadas sem trégua por José Maria, Zimmer e Pompéia. Somente na última volta Nunes conseguiu se livrar da perseguição dos dois oponentes. José Maria saia daqueles Jogos Abertos no lucro. Mas já sabia que nunca mais teria vida fácil. Aquele tempo em que todos os demais competidores corriam pela medalha de prata tinha ficado, definitivamente para trás. Em 1977 Nunes começou, efetivamente, a disputar as provas dos Jogos Abertos de Santa Catarina.Aqueles Jogos Abertos tiveram um impacto no jovem Deraldo Oppa. Em janeiro de 1978 fez o vestibular para Educação Física e ingressou na UFSC. Desde a primeira fase da faculdade os alunos da Federal, sob o comando de Wilibaldo Nekel, eram postos para trabalhar nas competições de atletismo. Deraldo logo se apaixonou por aquilo. Formou-se em Educação Física, na UFSC, em dezembro de 1980. Deraldo teve excelentes professores: Alva Pessi, Willibaldo, Murilo, Pisani, de SP, Osni Muller, de Brusque (o chico Muller) e ainda teve um português radicado em Santa Catarina, José Clemente Gonçalves. Assim que se formou, fez 96 JASC - 1977 - 1500 METROS

1º - Paulo Cezar Zimmer - Blumenau - 3min57,2s (recorde)2º - José Maria Nunes - Florianópolis - 3min59,3s (recorde)3º - Jorge Luis da Silva - Blumenau - 4min05,2s

97 JASC - 1977 - 10 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Florianópolis - 31min36,3s (recorde)2º - Paulo Cezar Zimmer - Blumenau - 31min44,4s (recorde)3º - Carlos Augusto Rodrigues - Blumenau - 31min47,8s (recorde)

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concurso para professor, no Colégio de Aplicação da UFSC. É lá que a história de José Maria Nunes irá se reencontrar com a do Professor Deraldo, daqui a alguns anos…

A COMPETIÇÃO POR EQUIPESMesmo antes de serem iniciados os Jogos Abertos, Nunes já sabia que a competição por equipes não estava fácil. A equipe de atletismo masculino de Florianópolis ainda não estava pronta para ser campeã. Ficaria, na melhor das hipóteses, com o segundo lugar98. Mas a equipe feminina poderia ganhar. E Nunes tinha muitas esperanças. Fazia contas e calculava cada ponto de cada uma das suas atletas. Ganhar aquele troféu seria um passo importante para outras conquistas. Mas já andava desconfiado com a dificuldade de contato e comunicação com uma de suas mais importantes atletas das provas de velocidade e revezamentos. Marcia Rosa andava arredia. Apesar de ter sido atleta de Florianópolis (com bolsa atleta) durante praticamente todo o ano, foi convencida a transferir-se para a equipe de Blumenau. Nunes ficou muito abalado com aquele acontecimento. Aquilo praticamente liquidava qualquer chance de vencer no feminino99.Pra fechar o ano com chave de ouro, no final de dezembro José Maria foi para São Paulo participar, pela 5ª vez, da Corrida Internacional São Silvestre 1977 conquistando o 15º lugar, sendo o 2º melhor brasileiro na prova.Estava pronto para 1978.

98 JASC - 1977 - GERAL - ATLETISMO MASCULINO1º lugar - Joinville - 230 pontos2º lugar - Florianópolis - 181 pontos3º lugar - Blumenau - 112 pontos4º lugar - Criciúma - 85 pontos5º lugar - Lages - 33 pontos

99 JASC - 1977 - GERAL - ATLETISMO FEMININO1º lugar - Joinville - 138 pontos2º lugar - Florianópolis - 128 pontos3º lugar - Blumenau - 119 pontos4º lugar - Chapecó - 65 pontos5º lugar - Criciúma - 33 pontos

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1978Participou da Corrida de Reis, em Brasília - o certificado não diz qual foi a classificação ((Nunes5))Participou da Corrida 28 de Janeiro, em Apucarana (1º lugar)José Maria Nunes e Elvira Maria Martins casaram-se em maio de 1978. A cerimônia e a festa foi realizado no salao da igreja em Guamiranga, localidade de Guaramirim, próxima ao Poço Grande, onde os familiares de Nunes moravam.Os dois entraram na igreja de mãos dadas. Foi uma festa bem simples. Foram convidados, além dos familiares de Elvira e Nunes, alguns atletas de Florianópolis e Blumenau. A festa foi grande. Teve até um jogo de futebol, família Martins x família Nunes. Eram duas famílias bem numerosas. Dava tranquilamente um time de futebol em cada uma.Quando casaram, Nunes morava na Rua Tupinambá, no Estreito, com Júlio, que permaneceu morando com o casal até agosto. Em agosto Júlio foi morar numa outra casa com João Francisco e outros atletas. Inês, com 8 anos, veio morar na casa dos dois. No início do ano seguinte viriam Neuza (12 anos), e Marisa (5 anos). Assim, menos de um ano antes de completar um ano de casados, Nunes e Elvira já tinham em casa três irmãos pequenos de José Maria. Todos se perguntavam “o que a levou Elvira a aceitar que os irmãos menores do Nunes fossem morar com eles, já no início do casamento?”Elvira explica que, quando era freira, lá em São Luis Gonzaga, Rio Grande do Sul, teve um sonho em que uma espécie de anjo disse a ela “Elvira. O teu lugar não é aqui. Você vai cuidar de um grupo menor”. Ela não entendeu o que aquilo poderia significar. Mas o sonho

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era uma dessas coisas tão vívidas que parecia ter acontecido de verdade. Quando conheceu Nunes e ele falava sempre na necessidade de proteger e ajudar os irmãos menores, ela começou a pensar no sonho que tivera e concluiu: chegou a hora. Este é o pequeno grupo que eu posso ajudar.Hoje, adultos com suas profissões bem resolvidas e já com suas próprias famílias, todos os irmãos de José Maria Nunes têm total adoração por Elvira. Todas as manifestações deles em relação a ela são de, no mínimo, reverência total: “não pode haver no mundo uma pessoa tão boa quanto Elvira. Ela foi a pessoa, de fora da nossa família, que mais ajudou a todos nós e seremos eternamente agradecidos por isso.”Antes de casarem, Nunes e Elvira estabeleceram uma estratégia quanto aos irmãos mais novos dele. Iriam cuidar deles e dar estudos a eles para que eles se tornassem independentes e que deixassem de precisar de ajuda e sustento a vida toda. Somente em 1983 Nunes ganhou definitivamente, da justiça, a guarda dos irmãos menores. Nesta época cinco dos irmãos de Nunes moravam com ele em sua casa no Saco dos Limões, em Florianópolis: Algemiro (18 anos), Neusa (16), Mauro (14), Inês (13) e Mariza (10).Mas, voltemos para 1978. No início daquele ano (antes do casamento, portanto) Elvira havia passado no vestibular para a turma do primeiro semestre de Letras/Inglês da UFSC. Como o casamento (e a mudança de Blumenau para Florianópolis) estava marcado para maio, conseguiu trocar com uma aluna que havia sido aprovada para o segundo semestre. E assim, iniciou o curso em agosto.O fato de Elvira ir para a aula todos os dias dava a Neusa, a irmã de 11 anos de Nunes, uma oportunidade inesperada: aprender a cozinhar.Em casa a mãe não deixava Neusa cozinhar, por que ela era canhota. E existia a superstição de que “o canhoto faz a comida desandar”. Por isso nao aprendia

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a fazer nenhum dos serviços dométicos. Reasilva dizia “não vem aqui nas panelas, porque você vai mexer ao contrário”. E assim, Neusa chegou àquela idade sem ter aprendido a fazer um arroz ou um bife. Mas agora tinha chegado a vez dela. E nem é preciso dizer aqui que o arroz muitas vezes queimou (ou ficou cru) e que o bife tinha alguma semelhança com sola de sapato. Mas Elvira era paciente e foi ensinando as coisas. Nos fins de semana pegava um caderno de receitas e faziam algumas experiências gastronômicas.Em 1979 Neuza fez (repetiu) a quarta série do primário (no Colégio Antônio Peixoto), porque não tinha base para ir para a quinta série. No ano seguinte, 1980 começou a quinta série no IEE, onde estudou até o final do segundo grau. Neusa morou na casa de Elvira e Nunes até sair, para casar, em 1993, com 26 anos.

FORMATURA EM EDUCAÇÃO FÍSICAO segundo fato importante de 1978 foi a formatura na UDESC.

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Em 1973 Nunes fez o vestibular no curso da Faculdade de Educação Física de Santos. Passou, mas foi convencido pelos dirigentes de Florianópolis a desistir da ideia e estudar em Florianópolis. Fez o vestibular da Udesc em março daquele ano, foi aprovado para a primeira turma. Chegou a se matricular no curso, que começaria em julho, mas transferiu-se para Blumenau e acabou não iniciando. No início de 1974 fez novo vestibular para o curso da Univille. Chegou a frequentar algumas semanas de aula, mas os quase 100 km que separavam Blumenau de Joinville foram um obstáculo intransponível. Assim, em 1975 Nunes iniciou, efetivamente, o curso de Educação Física, integrando a primeira turma da FURB. Transferiu-se para a Udesc no ano seguinte e agora estava ali, diante da família, dos

amigos e dos professores, obtendo uma das mais importantes conquistas da sua vida: um diploma de curso superior.Tornava-se, ali o primeiro Nunes a terminar uma faculdade. Não pretendia parar por ali. Ainda queria estudar mais.

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Em setembro (5 a 9) foi o técnico da equipe de Santa Catarina nos JEBs em Curitiba-PR

A CASA EM PALHOÇAalém de casar e formar-se na faculdade, em 1978 Nunes ainda conseguiu uma terceira conquista importante: adquiriu uma casa própria. Ele ouviu, na televisão, uma propaganda de um conjunto habitacional popular em Palhoça, próximo à BR 101. O valor do terreno e da casa poderia ser totalmente financiado pela APESC100, uma Caderneta de Poupança do Estado de Santa Catarina. Havia mais de 500 casas sendo construídas no Conjunto. Nunes interessou-se. Foi visitar o loteamento e encantou-se por uma casa de 45 metros quadrados num terreno de 360 metros quadrados. Fechou o negócio. A casa seria entregue em 1979. A intenção de Nunes era fazer um investimento num imóvel que pudesse ser utilizado pelos irmãos, mais tarde.Logo que a casa ficou pronta Nunes alugou o imóvel para um professor/poeta do IEE, chamado Oswaldo, que pagaria apenas o valor da prestação, que era bem baixo. Muito abaixo dos valores normais de aluguel naquela região.Oswaldo, no entanto, não só não pagou as prestações como saiu da casa e sublocou para terceiros. Uma família de sem tetos.No início de 1980, numa das suas idas à FME, o professor Viegas chamou Nunes ao seu escritório. “Professor, o senhor está com algum problema com a justiça!”“Não, que eu saiba”, respondeu nunes, já preocupado com aquele tipo de pergunta. “Por quê?”“Tem algum imóvel? Alguma coisa irregular em seu nome?”

100 Associação de Poupança e Empréstimo de Santa Catarina. Pertencia ao Governo de Santa Catarina. Mais tarde foi adquirida pelo Bamerindus.

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“Não. Quer dizer, tenho sim, uma casa financiada, lá em Palhoça. Mas está tudo em dia”“Não está não, professor. Tem uma conta grande aqui, que já está no cartório? Estou vendo aqui, no jornal”Nunes chegou mais perto. Era isso mesmo. O jornal daquele dia tinha uma comunicação oficial do cartório local. Uma citação de diversos devedores, por conta de atrasos em pagamentos que já estavam em fase de protestos.A sede da CME ficava praticamente no outro lado da rua do dito cartório. Nunes saiu dali e foi ver a situação. Chegando lá teve a sorte de que o tabelião o conhecia e era seu fã. Nunes explicou exatamente qual era a situação. Ele foi muito camarada. “Vamos fazer o seguinte, Zé. Eu seguro aqui. Não mando adiante este protesto. Você vai no banco, faz a negociação, pega um novo carnê, começa o pagamento dos atrasados e mantém as prestações normais em dia. Daqui a pouco está tudo zerado”No mesmo dia Nunes foi até a casa, em Palhoça e encontrou um fulano, com sua família, morando na casa. Nunes apresentou-se, como proprietário, explicou a situação e informou que a pessoa deveria deixar o imóvel. O homem, bem atrevido, disse “não é bem assim, não. Eu só vou sair daqui por ordem da pessoa que me colocou aqui!”No dia seguinte, uma terça-feira, Nunes botou no carro um arremessador de peso, da equipe de atletismo e mais dois irmãos: João e Tonho. Os três parecendo armários, com cara de perigosos. Chegaram na casa, bateram na porta e o homem atendeu. Surpreendeu-se com a visita e pareceu estar assustado com o tamanho dos acompanhantes de Nunes, que foi logo dizendo, “Boa noite. Essa casa é sua?”“Não. A casa não é minha” ele respondeu, tentando fingir alguma autoconfiança.Nunes então mostrou ao homem alguns papeis e disse “Essa casa é minha. Aqui estão todos os documentos”.

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E continuou, sem deixar que o outro se explicasse, “E eu não quero que aconteça nada nesta casa, nem com o senhor.” e acrescentou, “na quinta-feira de manhã eu voltarei aqui e vou pegar a chave da casa aqui no vizinho. E não vai ter mais ninguém dentro da casa, certo?”Tonho, que era o maior dos três aproximou-se do homem e deu dois tapas nas costas, com bastante força e perguntou “Entendido, companheiro?”“Entendi, sim. Vocês não se preocupem. Foi um mal entendido. Eu pensei que a casa era do Osvaldo…”Nunes e seus escudeiros foram embora. Nunes voltou na quinta-feira e a casa já estava desocupada. Mas estava virada num chiqueiro. Parecia ter sido habitada por cães de rua.Logo em seguida o pai de Nunes, João Maria, sofreu um derrame, no sítio em que morava. Por uma coincidência feliz, a casa estava livre e desocupada e Nunes pode trazer a família para morar na casa.

O ATLETISMO DE SANTA CATARINAEm 1978 foi criada a Federação Catarinense de Atletismo, desmembrada da Federação Atlética Catarinense — FAC. O primeiro presidente foi o Deputado Júlio César, tendo como vice o sr. Nilton Pereira (o Dedeco) que, na prática, era quem tocava a Federação. A professora Alva Neves Pessi participou da fundação e foi quem fez a conexão dos seus alunos com a federação. Deraldo foi um desses alunos. A ligação foi sólida. Dura há quase quatro décadas. Ele é um dos diretores com a maior preocupação com os registros históricos da instituição. Infelizmente, todos os documentos da FAC se perderam em um grande incêndio que ocorreu no final da década de 1970 e praticamente todos os registros do Atletismo se perderam. Os documentos de todas as competições de atletismo realizadas em SC a partir de 1978 estão guardados nos arquivos da CBAt - Confederação Brasileira de Atletismo.

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OS JOGOS ABERTOS DE 1978 - CAÇADORNaquele ano de 1978 Nunes seguiu sua rotina de corridas e vitória. Assustado com o que ocorrera no ano anterior, quando foi derrotado, pela primeira vez (por Paulo Zimmer), Nunes tratou de se preparar muito bem para os Jogos abertos, que aconteceu em Caçador. Chegou à competição “na ponta dos cascos”, como diria o saudoso professor Jipe Alves de Oliveira.Venceu os 1500 metros, quebrando o recorde estabelecido no ano anterior por Paulo Zimer. Importante observar que, se não estivesse preparado, teria perdido novamente, pois o próprio Zimmer, mesmo em 2º lugar, quebrou, também, a marca do ano anterior101.No dia anterior Nunes já havia vencido os 5 mil metros102 e no dia seguinte venceria também os 10 mil metros103, novamente com a quebra dos recordes estabelecidos no ano anterior. Nunes completava ali onze anos seguidos sem perder nas provas de 5 mil e 10 mil metros dos Jogos Abertos. Na competição por equipes, finalmente Nunes poderia comemorar um título importante como treinador. A equipe feminina conquistou, com larga vantagem, o troféu de campeã dos Jogos Abertos104. O time masculino ainda teria de esperar mais tempo para conquistar o desejado primeiro lugar. Mas a repetição

101 JASC - 1978 - 1500 METROS1º - José Maria Nunes - Florianópolis - 3min54,1s (recorde)2º - Paulo Cezar Zimmer - Blumenau - 3min57,0s (recorde)3º - Jose Antônio de Souza - Joinville - 4min04,3s

102 JASC - 1978 - 5 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Florianópolis - 14min51,4s2º - Paulo Cezar Zimmer - Blumenau - 15min12,1s3º - Antônio Celso Silveira - Florianópolis - 15min29,9s

103 JASC - 1978 - 10 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Florianópolis - 31min03,2s (recorde)2º - Paulo Cezar Zimmer - Blumenau - 31min13,7s (recorde)3º - Antônio Celso Silveira - Florianópolis - 32min51,8s

104 JASC - 1978 - GERAL - ATLETISMO FEMININO1º lugar - Florianópolis - 151 pontos2º lugar - Blumenau - 82 pontos3º lugar - Joinville - 70 pontos4º lugar - Chapecó - 42 pontos5º lugar - Caçador - 32 pontos

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do segundo lugar105 na pontuação geral não era, de jeito nenhum, um mau resultado. A carreira do treinador José Maria Nunes estava avançando. xpto

SÃO SILVESTREEm 60% do tempo correu entre os seis primeiros. Quando estavam na subida da Consolação começou uma chuva muito forte. Um temporal. Isto atrapalho muita gente. Mesmo assim chegou em 10º lugar e foi o 2º melhor Brasileiro na prova. Uma excelente classificação, para fechar um ano que não tinha sito dão bom assim.

105 JASC - 1978 - GERAL - ATLETISMO MASCULINO1º lugar - Joinville - 209 pontos2º lugar - Florianópolis - 157 pontos3º lugar - Blumenau - 095 pontos4º lugar - Lages - 26 pontos5º lugar - Itajaí - 23 pontos

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1979((Nunes5 - A vitória na corrida de Reis pode ter sido aqui - tinha acabado de fazer a melhor participação na SS))Foi o Coordenador Civil da Colônia de Férias da Escola de Aprendizes Marinheiros (8 a 26 de janeiro). O Comandante ainda era Sérgio Cruz quintiere.Mesmo assim, no dia 4 de fevereiro Nunes participou da 1ª Maratona da Cebola, em Ituporanga. Na verdade era uma corrida de 12.500 metros106, que, naquele ano teve a participação de 44 atletas. Nunes ficou em 2º lugar. A prova foi vencida por Antônio Celso Silveira107

21 de abril Corrida de Ponta Grossa - 2º lugar

Em 1979 o pai, a mãe e alguns irmãos de Nunes que estavam na fazenda em Poço Grande estavam, novamente, com dificuldades materiais. Aquilo preocupava Nunes que andava procurando uma solução. Acabou resolvendo com a ajuda de um amigo, o Professor Arruda, que tinha um sítio em Três Riachos, Biguaçu. Ele arrumou um trabalho para João Maria como caseiro no sítio e daria salário e registro em carteira profissional. Nunes achou uma boa ideia e conseguiu fazer a mudança da família. Agora tinham, pelo menos, a proteção do Sistema de Saúde do INSS.Ainda em 1979 o pai, João Maria sofreu um derrame (AVC). Depois, durante o processo de recuperação

106 Era comum, naquela época, as pessoas chamarem de “maratona” qualquer corrida de rua com mais de 5 mil metros

107 MARATONA DA CEBOLA - 1979 (12.500m)1º - Antônio Celso Silveira - Florianópolis - 39min41s2º - José Maria Nunes - Florianópolis - 40min37s3º - Valmor José Bitencourt - Joinville - 42min55s4º - Jorge Antônio Souza do IEE5º - Alcides Freiberg - Presidente Getúlio

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Nunes achou melhor trazê-los para morar na casa da Palhoça.Em setembro Nunes correu a 1ª Meia Maratona da Independência em São Paulo. Correu muito bem. liderou boa parte da prova. Mas terminou em 5º lugar com uma marca ainda muito boa: 1h7min,35. Edson Bergara venceu a prova. ((confirmar))

O ACIDENTE DOMÉSTICO COM A CADEIRA((Nunes diz que este episódio ocorreu no primeiro dia do vestibular da UFSC. Ele estava fazendo a prova para medicina. - Elvira diz: Morávamos no estreito Rua Tupinambá. Casamos em em 1978, o Jo nasceu em 1980. Saímos de lá acho que o Jo tinha 8 meses. Foi nesse intervalo. Mas a data precisa não sei.)) No início de janeiro de 1979 Nunes estava sentado numa cadeira, em casa. Fez um movimento para trás e a cadeira caiu. Ele não conseguia se levantar. Sentia-se sem forças nos braços e nas pernas. Foi auxiliado pela esposa, Elvira e pela cunhada, Eli. Sentia uma dor muito aguda. Ficou preocupado. Todos ficaram muito preocupados. Depois de alguns minutos decidiu ir procurar um médico. Entrou no carro e seguiu até o hospital. Elvira foi junto, mas Nunes foi dirigindo. Quando cheggaram no hospital ele não conseguia mais sair do carro. A perna esquerda estava paralizada. Foi um susto. Teve de ser ajudado pelos atendentes do pronto-socorro. Fizeram os exames. Nunes ficou em observação por algumas horas mas voltou pra casa no mesmo dia.Parecia ser um incidente sem maiores consequências, mas a conta viria, alguns anos mais tarde.Naquele período Nunes procurou por um amigo médico muito conhecido na cidade, e que era especialista em algumas técnicas orientais: Rômulo Coutinho de Azevedo. O médico fez um atendimento especializado com uso de massagens e acumpuntura. Nunes

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recuperou-se em duas ou três semanas. E descobriu os benefícios da acumpuntura.Nunes e Rômulo já se conheciam desde 1975, quando foram apresentados por um amigo comum, num evento, uma palestra com o Antropólogo Darcy Ribeiro, que ocorreu na sede da Arquidiocese de Florianópolis, em 1975. No final do tratamento, não aceitou que Nunes pagasse, de jeito nenhum. Rômulo tornou-se um grande amigo e conselheiro, tanto nas questões de saúde quanto na visão social e política. Depois desse episódio da queda da cadeira ficaram ainda mais próximos, até a data trágica do acidente da Transbrasil108. Nunes ficou devastado com a perda do amigo. Na verdade, a cidade inteira parecia sentir o mesmo.Ainda no início de 1979, Elvira estava grávida. As espectativas eram grandes. Já estava indo para o terceiro mês. Mas, no dia das mães, em 1979, ela começou a sentir dores e teve sangramentos. Correram para o hospital, mas não havia nada que se pudesse fazer. Foi uma tristeza imensa para todos, inclusive os amigos, que estavam na maior torcida.Definitivamente, aquele ano não estava começando bem.

REFORÇOS NA EQUIPE DE ATLETISMONo inicio do ano a comissão técnica da equipe de Florianópolis foi reforçada pela chegada de Roberto Amestoy. Formado em Educação Física no Uruguai, veio para o Brasil, e foi contratado pela Prefeitura de florianópolis. Virou uma espécie de auxiliar técnico, preparador físico e treinador de provas técnicas como salto com vara e barreiras.Nas pistas haveria uma novidade importante. E tudo começou quando, no início do ano Nunes foi na secretaria na UCRE109 para ver o resultado de uma 108 O médico morreu no acidente do voo 303 da Transbrasil em Florianópolis (mais

precisamente, no Morro da Virgínia, em Ratones, no interior da Ilha), no dia 12 de abril de 1980.

109 Unidade de Coordenação Regional de Educação170

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competição infantil de atletismo. Nos resultados aparecia o nome de uma menina que tinha feito alguns resultados que pareciam interessantes.Quando chegou na Escola de Aprendizes para o treinamento daquele dia, Nunes perguntou para os atletas “alguém conhece essa menina, Silvana Pereira, que estuda aqui, no Barreiros Filho?”Um dos atletas, chamado Humberto, disse “é minha sobrinha! O que é que tem ela?”. Ele falava com aquele carregado sotaque manezinho.Nunes continuou: “Ela participou de uma competição infantil e foi muito bem. Ganhou a prova dela com um tempo muito bom”.“Sim, eu vi. Eu tava lá. A magrela é muito fera!”“É o tipo de talento que a gente precisa aqui na equipe”“O-lhó-lhó. Quéx que ela venha treinar aqui com a gente? Eu mando ela vir amanhã mesmo” completou Humberto, todo feliz.Nunes gostou da novidade e ficou torcendo que a promessa do rapaz fosse pra valer. E, de fato, no dia seguinte, quando Nunes chegou na pista da Marinha para dar o treinamento, aquela menina franzina estava lá, sentada na escada, esperando para conversar com o professor. Nunes estava diante de uma das maiores atletas que passou pela equipe de Florianópolis. Silvana teve uma carreira longa e cheia de resultados fantásticos, em Santa Catarina, no Brasil e no exterior.

TÉCNICO DE ATLETISMO NOS JEBsDepois das competições estaduais juvenis, José Maria Nunes foi convocado para ser o técnico da equipe de Santa Catarina nos Jogos Escolares Brasileiros (JEBs) que seriam realizados em Brasília, naquele ano. O professor Rauly Amorim, de Caçador (o mesmo que, em 1974, dividia a carona no carro para Joinville para fazer a Faculdade de Educação Física) foi o técnico auxiliar, pois tinha três atletas importantes integrando a equipe.

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a participação de Santa Catarina nos JEBs foi um sucesso. Pela primeira vez na história, conquistou 8 medalhas de ouro e o segundo lugar na classificação geral. Os destaques daquela equipe eram Nelly Alice de Souza, Silvana Pereira, Charles Lima, Shirley e Denise Kobuszewski, Maria Bernadete, Maria Ledaci Visloski, Nádia Cristina Valentini, Paulo Castilho.

CAMPEONATO ESTADUAL E JOGOS ABERTOSNo dia 28 de agosto de 1979 o jornal Diário Catarinense110 apresentava uma matéria de página inteira com o seguinte título:

“Estadual de Atletismo em Rio do Sul — Uma surpresa: Zé Maria Nunes perdeu os 10 mil”

E seguia-se a matéria, muito bem escrita111 pelo reporter destacado para fazer a cobertura da competição:

“Após 12 anos de vitórias consecutivas em Santa Catarina, José Maria Nunes, o mais conhecido corredor do Estado, perdeu a prova de 10.000 metros disputada no Campeonato Catarinense de Atletismo, realizado na cidade de Rio do Sul, neste final de semana.O vencedor foi Paulo Cesar Zimmer, da Hering de Blumenau, que bateu o recorde catarinense para a prova, com a marca de 30min05,8s uma das melhores do certame.O técnico de Blumenau, Ivo da Silva salientou que ‘o Zimmer é um atleta muito dedicado e tem treinado muito visando as competições que estão próximas (Campeonato Brasileiro e Jogos Abertos). Ele é o único atleta da equipe que treina sozinho, pois é um corredor com conhecimentos suficientes para fazer auto-treinamento”

A matéria seguia com outras considerações e com os resultados das outras provas e, mais adiante, relata o resultado da prova dos 5 mil metros:

“José Maria Nunes, apesar de ter perdido os 10 mil metros, continua em excelente forma. Nunes venceu os 5 mil metros, com 14min39,2s, novo recorde de Santa catarina, e, mesmo chegando em 2º lugar nos 10 mil metros bateu o recorde anterior (dele) com 30min29,5s”

Aqueles resultados deixaram Nunes realmente preocupados, pois ele sabia que estava em excelente

110 Jornal da Rede Diários Associados. Funcionou em Florianópolis até 1981111 É uma brincadeira: em 1979 eu (Ênio Padilha) trabalhava como reporter e redator do Jornal

Diário Catarinense. Eu estive no Campeonato Catarinense (3º lugar nos 1500m) e escrevi a matéria.

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forma física. Tanto que havia quebrado o recorde nas duas provas que disputou. Se, ainda assim, tinha sido superado por Zimmer, era melhor botar as barbas de molho. Os Jogos Abertos de Santa catarina em 1979 seriam disputados em Blumenau, a casa de Zimmer.Seria uma parada duríssima. E foi.Paulo Cesar Zimer venceu os 1500 metros112, os 5 mil metros113 e os 10 mil metros114. Correu muito bem. Só teve alguma dificuldade nos 1500 metros, quando sofreu o assédio de Celso Silveira até os últimos metros da prova. Nos 5 e nos 10 mil a vitória foi bem tranquila, fruto da sua estratégia e de anos de estudo das táticas do adversário. Mas ele foi muito educado nas entrevistas que deu, especialmente quando algum reporter o provocava para que ele reproduzisse o comentário geral de que Nunes não teria corrido os 10 mil metros por covardia. Aos jornais Zimmer declarou que

“O Zé não quis correr por três motivos: atualmente ele é treinador e tem uma responsabilidade muito grande com seus atletas, não podendo se dedicar muito aos treinamentos; Sei também que ele teve alguns problemas familiares; Finalmente, ele não quis perder a hegemonia dos 10 mil metros, o que foi uma pena, pois tenho certeza que o venceria. Já o bati nos 10 mil metros este ano, no Campeonato Estadual e agora não seria diferente.”115

Zimmer estava certo. Nunes correu apenas a prova dos 5 mil metros, no primeiro dia da competição. Quando percebeu que as suas piores previsões estavam se confirmando decidiu não correr os 1500 metros nem os 10 mil metros. Capitulou. Confrontado pelos jornalistas com a declaração de Zimmer, Nunes concordou e confirmou as palavras do seu maior rival.112 JASC - 1979 - 1500 METROS

1º - Paulo Cezar Zimmer - Blumenau - 3min57,4s2º - Antônio Celso Silveira - Florianópolis - 3min57,5s3º - Carlos Augusto Rodrigues - Blumenau - 3min59,6s

113 JASC - 1979 - 5 MIL METROS1º - Paulo Cezar Zimmer - Blumenau - 14min34,1s (recorde)2º - Antônio Celso Silveira - Florianópolis - 14min58,6s3º - José Maria Nunes - Florianópolis - 15min13,0s

114 JASC - 1979 - 10 MIL METROS1º - Paulo Cezar Zimmer - Blumenau - 31min10,0s2º - Antônio Celso Silveira - Florianópolis - 32min38,2s3º - José Antônio de Souza - Joinville - 33min33,4s

115 Jornal O Estado - 23/10/1979173

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“Desisti dos 10 mil metros porque não me senti bem atleticamente. Quando um atleta não está bem fisicamente, não deve forçar a natureza. Não deve nem pisar na pista”116

E, por isso, muita gente começou a dizer que a era José Maria Nunes tinha sido encerrada. Parecia mesmo que não havia mais nada a fazer. Daquele mato não sairia mais nenhum coelho. O tempo diria se as pessoas tinham razão ou não.Naquele momento era importante cuidar dos resultados das equipes. Vencer Blumenau em casa era uma missão quase impossível, mas Nunes tinha esperanças.Para azar do treinador, naquele ano, aconteceu um dos erros de arbitragem mais escandalosos da história da competição. Dois jornais da época, um de Blumenau e outro de Florianópolis relatam o lastimável fato. Num deles o relato foi o seguinte:

ARBITRAGEM OU ARBITRARIEDADE?A desclassificação da equipe de revezamento 4x400 metros

masculino de Florianópolis foi tida pela maioria dos atletas como vergonhosa. Os juízes alegaram que o atleta Edson Aneri Vieira teria recebido o bastão antes de entrar na zona de passagem, o que não era confirmado pelos atletas, que afirmavam ter feito a passagem correta do bastão.

Aposlongos debates em torno do assunto, foi apresentada uma fotografia, feita por um fotogrfo que estava cobrindo a competição, na qual estava clara a posição regular do atleta florianopolitano. Apesar disso a comissão julgadora preferiu acatar a decisão do Juiz, alegando que a fotografia não era prova suficiente.

José Maria Nunes, técnico de Florianópolis, mostrou-se bastante irritado com a decisão dos juízes, afirmando que “seria bem melhor se a competição de atletismo fosse disputada dentro da pista”117

No final Blumenau venceu o atletismo por equipes, tanto no Masculino118 quanto no feminino119. Ainda não 116 Jornal de Santa Catarina - 23/10/1979117 Jornal Diário Catarinense - 23/10/1979118 JASC - 1979 - GERAL - ATLETISMO MASCULINO

1º lugar - Blumenau - 191 pontos2º lugar - Florianópolis - 139 pontos3º lugar - Joinville - 113 pontos4º lugar - Lages - 31 pontos5º lugar - Brusque - 20 pontos

119 JASC - 1978 - GERAL - ATLETISMO FEMININO1º lugar - Blumenau - 169 pontos2º lugar - Florianópolis - 113 pontos3º lugar - Joinville - 33 pontos4º lugar - Caçador - 27 pontos 5º lugar - Chapecó - 24 pontos

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seria dessa vez que Nunes teria os dois troféus para comemorar.Os Jogos Abertos de Blumenau, para Nunes, não tiveram, definitivamente, um saldo positivo. A equipe masculina não conseguiu vencer, a feminina perdeu o título e ele, pessoalmente, foi derrotado na pista.Restou apenas o registro de que seus recordes nos 1500 metros e nos 10 mil metros não foram superados.

MEIA MARATONA DA INDEPENDÊNCIANo dia 15 de Novembro o Jornal A Gazeta, organizou uma meia maratona a que deu o nome de Minimaratona da Independência (curioso nome, já que a prova se realizou no dia da República. A prova foi muito bem promovida e praticamente todos os grandes corredores do Brasil participaram. José Maria Nunes liderou boa parte da prova, mas foi superado nos últimos quilômetros e ficou em quinto lugar. No ano seguinte a mesma prova seria realizada no dia 5 de setembro.

SÃO SILVESTRE DE 1979Em dezembro um grupo de atletas de Florianópolis (José Maria Nunes, Silvana Pereira e Antônio Celso Silveira) preparou-se, em São Bento do Sul, para participar da Corrida Internacional de São Silvestre.A corrida de Silvana Pereira foi excelente. Com apenas 14 anos ela enfrentou grandes atletas internacionais e ficou em 3º lugar na classificação geral, sendo a melhor brasileira na prova. Um resultado sensacional.José Maria Nunes também foi bem na prova masculina. O resultado não superou o ano anterior, mas ele ficou em 20º lugar na classificação geral e foi o 5º melhor brasileiro na prova.Seis dias depois estava em Brasília, para a corrida de Reis. Nunes foi o 3º colocado.Quem sabe 1980 fosse melhor.

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1980((Nunes5 - O jornal O Estado faz uma cobertura da chegada de Silvana e fala da corrida, mas não menciona a sua participação em Brasília. Depois, no dia 16 de janeiro, numa matéria sobre a visita ao governador, fala que Nunes ficou em Terceiro em Brasília)) Logo depois de correr a São Silvestre, José Maria viajou para Brasília para participar da Corrida de Reis, que seria realizada no dia 6 de janeiro de 1980. Seu principal adversário seria o paulista Edson Bergara. Os dois disputaram a prova metro a metro. Nenhum dos dois permitiu que o outro escapasse. Quando entraram na reta final (faltando ainda cerca de mil metros para a chegada), Nunes perdeu-se no ritmo e acabou ficando um pouco para trás. Recuperou o folego e foi atrás do adversário. Quando chegou próximo, faltando uns trezentos metros para a chegada, nunes percebeu que Bergara não sabia que ele estava ali, tão perto. Havia muito barulho da torcida e ele não conseguia ouvir os passos. Virou-se para a direita e Nunes deslocou-se para a esquerda. Bergara virou-se para a esquerda e Nunes foi para a direita. Faltando uns quarenta metros, os gritos da torcida aumentaram. Era por causa da chegada de Nunes. Mas Bergara pensou que fosse por causa dele. Certo de que estava sozinho nos metros finais da corrida, reduziu o ritmo e ensaiou uma comemoração da vitória. Quando se deu conta, Nunes já havia ultrapassado, como um ônibus lotado, sem possibilidade de reação. Nunes venceu a corrida de forma espetacular, nos últimos 10 metros da prova.Corrida de Apucarana - 4º lugarParticipou em Ponta Grossa ((o certificado não diz a classificação))

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Ieda Regina Juppa era, no final de 1979, uma atleta promissora. Ela surgiu na equipe de Rio do Sul, em 1976 e competiu pela primeira vez nos Jogos Abertos em Florianópolis, 1977, assombrando a todos com resultados muito bons. Ganhou medalha de bronze nos 1500m, com apenas 13 anos recém-completados. Nos dois anos seguintes, 1978 e 79, por alguma razão, seus resultados não foram bons. Atravessou todo aquele período enfrentando problemas físicos. Seus resultados nos Jogos Abertos foram muito fracos. Nem chegou às finais das provas que disputou.No início de 1980, Nunes fez o convite para que ela se transferisse para a equipe de Florianópolis. Ieda tinha 15 anos e tinha acabado de concluir o primeiro grau (ensino fundamental). A negociação com a família foi muito difícil e demorada. A mãe dela não queria deixar. Na verdade (Ieda contou anos mais tarde) no fim das contas, a mãe só permitiu que ela fosse para Florianópolis porque tinha certeza de que ela não resistiria e voltaria para Rio do Sul em menos de três meses. Não voltou.Nos cinco anos seguintes Ieda se converteria numa das grandes estrelas da equipe de Florianópolis. Foi campeã brasileira, campeã sul americana e campeã de muitas corridas de rua, dividindo a cena com outras duas atletas sensacionais: Silvana Pereira (que já era uma atleta forte na equipe de Florianópolis, quando Ieda chegou) e Mara Cristina Lemos de Andrade (que ainda estava por ser descoberta).Mara Cristina surgiria naquele ano de 1980. Estudava na Fucabem (Fundação Catarinense do Bem Estar do Menor). Um professor de lá trouxe a informação para Nunes de que tinha uma menina que poderia ser uma boa atleta. Estava inscrita nos Jogos Escolares Municipais de Florianópolis. Sugeriu que Nunes ficasse de olho. Nunes foi ver a competição e “ficar de olho na menina”. A primeira impressão não era nada boa. Mara era franzina, magrinha, com os dentes completamente

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estragados. Mas ganhou a sua corrida e ganhou com muita facilidade. Parecia ter nascido para correr.Um dentista, fã de esportes, que atendia o pessoal do atletismo e também atendia no Posto de Saúde no Saco dos Limões foi quem fez (sem cobrar nada) todo o tratamento dentário da Mara. Restauração total! O cirurgião dentista já alertava, na época, que infecções dentárias poderiam agravar as consequências de qualquer lesão muscular e que, com um dente inflamado, se o atleta fizesse um grande esforço estaria correndo o risco de que as bactérias causadoras da infecção se espalhassem pela corrente sanguínea, causando problemas graves. ((Ana Clara - confere?))Mara gostava de futebol, no início tinha pouca disciplina. Era considerada “um guri” na turma. Desbocada e atrevida, ninguém “tirava farinha” com ela. Com uma presença de espírito intensa, não deixava ninguém sem uma resposta (muitas vezes, malcriada). E, talvez por tudo isso, todos amavam a Marinha! Era paparicada por todos, sem exceção. Isso, às vezes, deixava ela ainda mais “folgada”.Em 1979 e 1980 aconteceu, no Brasil, um grande projeto mundial da Coca-Cola: o Pentatlo Nacional. Uma das condições para a participação nesse projeto era justamente o atleta ser desconhecido. Não ser registrado em nenhuma federação esportiva. Nunes era o Coordenador do Projeto em Santa Catarina. Ele sugeriu que o professor inscrevesse Mara Cristina no Pentatlo Nacional e ela foi muito bem. Venceu as seletivas de Santa Catarina e classificou-se para disputar a final nacional, no Rio de Janeiro.No início Mara era imbatível na sua categoria (infantil). Por isso ela, muitas vezes, não era motivada para o treinamento. Mesmo nas categorias imediatamente acima (menores e juvenil) ela era muito forte. Nunes então começou a permitir que mara participasse em competições mais fortes, para que ela, conforme Nunes declarou a um jornal, na época, “possa sentir algum

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grau de dificuldade que, indiretamente a obrigue a buscar maior garra e vontade de treinar”.Funcionou. Daí pra frente Mara não parou mais. Por 16 anos correu muito. Foi 13ª na São Silvestre, em 1982, medalha de bronze na Copa América (1989) e campeão sul americana dos 800 metros (1989). Viajou pelo mundo, conheceu a Europa, a América do Sul e praticamente o Brasil inteiro.

UMA CURIOSIDADE: É SOBRE HIDRATAÇÃOAté o final da década de 1970, em Santa Catarina, ninguém bebia água durante os treinamentos ou competições. Acreditava-se que não poderia beber água se o corpo estivesse muito quente. Poderia haver algum tipo de choque térmico.A hidratação durante os treinamentos e competições começou em SC no início dos anos 1980, quando começaram a aparecer por aqui atletas de São Paulo e do Rio de Janeiro. Antes disso, atletas de fundo corriam 12, 15 ou 20 quilômetros, na pista ou na rua, sem beber uma gota de água. Nunes chegou a ter um cálculo renal por volta de 1984. Tinha dores terríveis. Não conseguia treinar. Doia pernas, doia os testículos. Fizeram exames, com sondas. As dores eram intensas. O médico receitou remédios que era receitado para pacientes de câncer.Um dia, com uma crise muito forte. Tomou um relaxante muscular. Naquele dia foi no evento de lançamento do livro “E agora companheiro” Carlione Jr, na beira mar. Pediu um suco de laranja. Quando o suco “bateu no estômago” Nunes sentiu como se tivesse tomado um choque elétrico na bexiga. Correu para o banheiro. O relaxante muscular fez o seu efeito e a pedrinha desceu. Foi uma dor terrível, mas Nunes melhorou daquilo.Depois disso Nunes desconfiou que tivera pedra nos rins lendo livros de homeopatia. Encontrou a coincidência de sintomas (dores no estômago + dores

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nos testículos). Voltou ao médico para confirmar e, de fato, sua conclusão estava correta.

UM LUGAR PARA A EQUIPE TREINARNo segundo semestre de 1979 manter os treinos na pista da EAM começou a ficar complicado. Com a saída do Comandante Quintiere o novo Comandante começou a impor muitas exigências para que os atletas utilizassem as instalações da Escola. Os atletas começaram a ficar revoltados. Não podiam mais circular, usar o ginásio, usar a praia, usar a grama… em certas ocasiões não se podia nem usar a própria pista. Nunes foi então em busca de alternativas. Assim, já no primeiro semestre de 1980 os treinamentos foram realizados na pista da Escola Tecnica Federal de Santa Catarina. No início de 1980 houve eleição na para reitor da UFSC. foi eleito o professor Ernani Bayer, que escolheu para diretor do Centro de Desportos (CDS) o professor Luis Pegoraro, tinha sido sargento no Exército, em Florianópolis, no início dos anos 1970. Conhecia Nunes muito bem. E gostava dele. Pegoraro e Ernany Bayer entendiam que já era hora de Nunes ter uma oportunidade de fazer um trabalho na Universidade Federal.Assim, em julho, a equipe de Atletismo de Florianópolis começa a realizar seus treinamentos na pista da UFSC.Os atletas da equipe passaram a ter direito de usar o Restaurante Universitário.Naquele segundo semestre de 1980, por decisão do Reitor da UFSC, Ernani Bayer e do Diretor do Centro de Desportos, Luiz Pegoraro, seis professores/treinadores foram contratados pela UFSC para atender o Clube Universitário: José Maria Nunes (atletismo), Jorge Menezes (natação), Evair DeLucca (handebol), Ênio Stazak (volei), Virgínia Zanini (Esinde) e Roberto Amestoy (atletismo). Eles passaram a receber salários da Universidade mas aquela situação precisaria ser regularizada mais tarde.

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A mudança da equipe de atletismo para a pista da Universidade acabou acirrando ainda mais alguns problemas que Nunes já tinha com os professores e treinadores do Clube Universitário. O problema era antigo, provavelmente já vinha desde 1976, quando Nunes retornou para Florianópolis e assumiu, com mão de ferro, o treinamento das equipes de atletismo, cortando muito espaço que antes era ocupado pelos professores e treinadores da Universidade.Nunes não era fácil! Tinha uma personalidade complexa. Era teimoso e centralizador. Mas produzia resultados e isso garantia a ele cada vez mais espaços, responsabilidades e poder. Ele havia conquistado um suporte político e de mídia que o permitia lidar com aquela situação na base da “mão pesada”.Num determinado período, no início dos anos 1980, Nunes chegou a comandar três equipes que disputavam o campeonato de Atletismo de Santa Catarina (Clube Universitário, Associação Atlética Acadêmica e ADIEE). Os outros professores e técnicos reclamavam que Nunes poderia ter aberto mais o comando e permitido a participação de outras pessoas ou grupos. Mas o gênio dele era muito forte. Isso causava muitas disputas (algumas delas desnecessárias).Os professores da UFSC representavam um conhecimento acadêmico que poderia ser muito útil para Nunes e para a equipe. Mas Nunes certamente não se sentia seguro para lidar com aquela situação. Sentia-se, permanentemente ameaçado.Nunes vinha do mundo do atletismo, onde ele treinava, corria ganhava e recebia a medalha. Era um campeão e dependia apenas de si próprio. Nas pistas de corrida a sua superioridade não era, jamais, questionada. Por alguma razão Nunes achava que, no resto do mundo, as coisas deveriam, também, ser simples assim. Bastaria fazer a sua parte e o reconhecimento viria naturalmente. Bastaria, por exemplo, ser um professor honesto e competente e todos reconheceriam e dariam

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a ele os cargos, as funções e todos os benefícios e privilégios da competência.Mas não era assim. Na relação com o grupo do Centro de Desportos da Universidade Federal de Santa Catarina, por exemplo, existiam regras que ele (Nunes) primeiro, não conhecia e, segundo, não aceitava.Não aceitava, por exemplo, que, além de ser competente tinha de ser político, colaborativo, menos agressivo e mostrar-se menos perigoso.O outro lado (os professores da UFSC) por sua vez, também nunca procurou o entendimento através de negociação e conversa. Era um grupo de pessoas inteligentes e articuladas. Sabiam como conduzir suas estratégias. Uma hora conseguiriam minar a situação de Nunes.

OS BONS RESULTADOS VOLTARAMEm maio de 1980 ocorreu, em Porto Alegre, a primeira edição dos Jogos Abertos Sul Brasileiros). Nunes estava muito bem. Mas, em função do fraco desempenho nos Jogos Abertos do ano anterior, ele foi como atleta reserva.No 5000 metros Nunes participou como atleta avulso (não contava pontos para a equipe nem concorria a medalha). Correu metade da prova na frente do primeiro pelotão. Mas aliviou o passo na segunda metade da prova, fazendo praticamente um treino regenerativo. Ainda assim, concluiu a prova em quarto lugar.Mas, para alguns dirigentes do atletismo, da época, Nunes estava muito mal e o quarto lugar obtido na prova era o reflexo da sua má fase. Dois deles estavam conversando no vestiário (sem saber que Nunes estava no banheiro, ouvindo tudo) “o Zé Maria tá acabado”, disse um deles. O outro, chefe da delegação, completou “é preciso agora investir em coisa nova porque desse mato aí não sai mais coelho”.

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Nunes ouviu aquilo e ficou, naturalmente, muito magoado. E motivado. Começou a planejar a sua “resposta” para a prova do dia seguinte: os 10 mil metros. Coincidiu de Paulo Zimmer não poder correr (porque sentiu-se mal na noite anterior). Nunes foi então inscrito como atleta oficial (com direito a medalha, se ficasse entre os três primeiros). Nunes correu os primeiros 5 mil metros em 14min49s, marca melhor do que a que ele havia feito no dia anterior. E venceu a prova com 30min02s, quebrando mais uma vez, o recorde de Santa Catarina (e sul brasileiro) para a prova.Ao sair da pista Nunes procurou, com o olhar os dois dirigentes na arquibancada. Eles certamente não entenderam o que significava aquele olhar de sarcasmo e desprezo, mas se aquilo pudesse ser traduzido em palavras, seria algo como “segurem a onda aí, vocês dois. Eu ainda tenho alguma lenha pra queimar antes de ser substituído” Ou então algo mais debochado como “E aí? Gostaram do coelho que acabou de sair desse mato? Garanto que tem mais de onde veio este.”Algumas semanas depois um coelho de grande porte sairia desse mato, em São Paulo, no Troféu Brasil de Atletismo.Estádio do Ibirapuera, São Paulo, 23 de maio de 1980, corrida dos 10 mil metros. Dada a largada, o primeiro pelotão se formou e era liderado por Edson Bergara, José João da Silva, Cláudio Ribeiro e Elói Rodrigues Schleder. Nunes fazia parte desse primeiro pelotão, mas não buscou a liderança da corrida. Quando faltavam três mil metros Nunes percebeu que tinha chance de conquistar uma medalha. Pensou “vou ser terceiro nessa corrida. Não posso largar os líderes.” E encostou nos ponteiros e começou a forçar um pouco o ritmo da prova. Faltando três voltas Nunes assumiu a terceira posição. Percebeu que não seria mais incomodado pelo quarto colocado. Daí pra frente seria dalí pra cima. Foi pra cima do segundo colocado, Edson Bergara. Quando

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entraram na penúltima volta, Nunes já estava na segunda colocação. Bergara reagiu por alguns metros, mas não resistiu. Nunes partiu pra cima do lider, Elói Rodrigues Schleder.Elói abriu a última volta quinze metros à frente, mas Nunes sentia que dava pra enfrentar. percebia que a distância ia diminuindo lentamente. Percebia que Elói não fazia movimentos de se libertar da perseguição. Ninguém mais disputava com Nunes aquela medalha de prata. Faltando trezentos metros ele resolveu partir pra cima com todas as forças. Na entrada da curva dos 200m já estava ultrapassando. Fez a última volta em 59s50 entrou na reta final com a certeza da vitória. A arquibancada do Estádio de Atletismo do Ibirapuera (lotada) aplaudia de pé o campeão. Naquele início de noite, ao cruzar a linha, José Maria Nunes tornou-se o novo campeão e dono da melhor marca do ano nos 10 mil metros com 29min42s (ficou 42 segundos do índice para os Jogos Olímpicos) A equipe de Florianópolis (ADIEE) ficou em 4º lugar na classificação geral.

O PRIMEIRO FILHO DE ELVIRA E NUNES11 de julho de 1980 - Nasceu Jossinei Nunes, uma conquista e tanto, num ano cheio de acontecimentos bons. O menino nasceu forte e logo se mostraria muito inteligente e simpático. Depois que cresceu e começou a andar, ia com Nunes algumas vezes para os treinos, na pista da Universidade. Era paparicado por todos os atletas.

NOS JOGOS ABERTOS, UMA SEMANA PERFEITA.No início de 1979 Antônio Celso Silveira recebeu uma excelente proposta da Associação Atletica Tupy e da CME de Joinville. Florianópolis não poderia cobrir aquela proposta sem criar problemas internos na equipe. Assim, Celso foi para Joinville. Nunes não gostou. Sentiu-se traído. Não era pra tanto. Celso, como atleta e como profissional de

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Educação Física tinha todo o direito de buscar o que fosse melhor para ele. Ainda assim, ficaram com relações extremecidas durante algum tempo.O treinador de Joinville capitalizou essa situação para pilhar o atleta nas competições. E Celso estava, realmente, tendo um ano muito bom.Porém, com os resultados que Nunes vinha obtendo em 1980 (tinha acabado de bater o recorde brasileiro dos 10 mil metros e estava tendo um bom ano nas competições que disputava) parece estranho dizer que, na prova de 5000 mil metros dos Jogos Abertos, disputados em Jaraguá do Sul, ele não entrou como o favorito. Havia uma movimentação construída, em grande parte, pelas bravatas do treinador da equipe de Joinville, dando conta de que Antônio Celso Silveira seria o campeão (com folga!) de todas as provas que disputaria naqueles JASC. Muita gente acreditou. O próprio atleta (Celso) acabou convencido disso.Quando os primeiros atletas começaram o aquecimento para a prova dos 5 mil metros um clima de apreensão tomou conta do ambiente. Era sabido que a briga seria forte. Nunes, Celso, Zimmer e Pompéia fizeram aquecimento em locais separados. Não estavam muito a fim de urbanidades. O clima era de disputa total.A fila de atletas que entrou naquela pista mostrava o que seria a prova. Além dos quatro principais, havia ainda José Antônio de Souza e Nelson Mafra, de Joinville, Leonardo Estácio, de Blumenau e um novato, de Chapecó, Johni Régis Pazin. Nem todos tinham chances de vencer, mas qualquer um deles poderia conseguir um pódium.Celso correu forte a prova inteira. Desde a primeira volta aumentou sistematicamente a distância entre ele e o segundo pelotão, formado por Nunes, Zimmer e Pompéia. Quando chegaram à metade da prova Celso estava cerca de 150 metros à frente de todos. Para um atleta daquele nível, não havia como perder. O Treinador de Joinville gritava colado ao alambrado,

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como se quisesse assumir para si o mérito por aquele resultado.Mas Nunes estava bem e seguro do que estava fazendo. Do lado de fora da pista alguém estava cantando as voltas e ele sabia que o ritmo que ele estava fazendo era muito forte. Portanto, sabia que o ritmo de Celso era suicida. Celso estava cometendo o mesmo erro cometido por Pompéia no campeonato estadual de 1976. E a conta já começaria a ser cobrada.Celso começou a perder velocidade. Nunes descolou-se dos outros dois adversários e começou a se aproximar. A cada volta a distância diminuia mais e mais. A torcida, na arquibancada do estádio do Baependi aumentou o volume. Eram gritos de incentivos para o atleta de Joinville e também gritos para José Maria Nunes. Entraram na última volta com Celso ainda na frente, buscando energias nas profundezas dos seus limites. Nunes, implacável, continuou se aproximando e fez a ultrapassagem na entrada da reta de chegada.O treinador de Joinville já não gritava mais. Os atletas e torcedores de Florianópolis esplodiram numa comemoração que parecia um gol. Era um gol. Um golaço! Nunes acabava de recuperar ganhar sua posição nos 5 mil metros. Ganhava ali a sua 11ª medalha de ouro na prova. Em treze (desde 1968) aquela era a 12ª participação na prova120.Pompéia havia também se descolado de Zimmer e acabou faturando a medalha de bronze121.Celso deu o troco no dia seguinte. Venceu os 1500m com relativa facilidade122. Nunes ficou em segundo e

120 Não houve atletismo nos Jogos Abertos de 1970, em Concórdia. E Nunes perdera os 5 mil metros para Zimmer e Celso, em 1979, em Blumenau

121 JASC - 1980 - 5 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Florianópolis - 14min49,0s 2º - Antônio Celso Silveira - Joinville - 14min52,0s3º - Carlos Augusto Rodrigues - Blumenau - 15min02,9s

122 JASC - 1980 - 1500 METROS1º - Antônio Celso Silveira - Joinville - 3min54,7s2º - José Maria Nunes - Florianópolis - 4min00,0s3º - Hilário Holzapfel - Joinville - 4min01,1s

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Zimmer foi novamente surpreendido, dessa vez por um novato: Hilário Holzapfel123.Novamente o “tira-teima” ficou para os 10 mil metros, no último dia da competição. Deu Nunes. Embora a prova tenha sido bem disputada até mais ou menos dois terços do percurso, quando faltavam uns 2 mil metros Nunes livrou-se do grupo e partiu para uma vitória tranquila124, com cerca de 150 metros de vantagem sobre o segundo colocado, Paulo Cesar Zimer e com mais de uma volta de vantagem sobre Celso Silveira.José Maria Nunes ainda tinha alguma lenha pra queimar. E continuava invicto na prova dos 10 mil metros dos Jogos Abertos. Em 13 anos Nunes participou de 11 edições125 e venceu todas as vezes que participou.Um recorde quebrado naquele ano entraria para história dos Jogos Abertos: Evaldo Rosa da Silva, o marinheiro descoberto por Nunes durante um jogo de futebol, em 1977 venceu a prova dos 400 metros rasos com a marca de 47,0s. Este recorde dos Jogos Abertos não foi batido até a edição dos JASC de 2015, completando, assim, 35 anos sem ser quebrado.Na entrevista que eu fiz com Evaldo, para este livro, em 2016, ele disse que seu maior sonho, como treinador de atletismo, seria poder treinar um atleta que fosse capaz de quebrar este recorde. Na competição por equipes, finalmente, aconteceu o que Nunes estava perseguindo desde 1977. A vitoria na

123 Hilário, que era irmão da “lenda” Lauro Holzapfel, tornou-se, mais tarde, um grande campeão dos 800 e 1500 metros nos Jogos Abertos

124 JASC - 1980 - 10 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Florianópolis - 32min29,2s2º - Paulo Cezar Zimmer - Blumenau - 33min02,2s3º - Antônio Celso Silveira - Joinville - 34min14,0s

125 Não houve Atletismo nos Jogos Abertos de 1970, em Concórdia e Nunes não participou da prova em 1979, em Blumenau.

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competição geral, tanto no masculino126 quanto no feminino127.Desde o início Nunes sabia que a disputa, especialmente no masculino, seria ponto a ponto. Ele procurava motivar cada um dos atletas a obter o melhor resultado possível, mesmo que esse resultado fosse um sexto lugar. “Cada pontinho vai fazer diferença!”. No segundo dia de competição anunciou que iria participar dos 1500 metros, mesmo sabendo que tinha poucas chances de vencer (ele realmente não estava bem nas distâncias mais curtas). Aquilo chamou à responsabilidade alguns atletas veteranos e todos deram tudo de si.No terceiro dia, quando Nunes entrou no estádio para correr os 10 mil metros, passou pela caixa de areia onde estava sendo realizado o Salto Triplo. Seu atleta e amigo Chico128 disse, “Ei, Zé. Corre tranquilo. Eu ganhei o Triplo. O Jesus está em sexto e a nossa menininha Aline129 ficou em segundo no salto em distância.Nunes sabia que a equipe, para ser campeã dos Jogos Abertos precisava apenas ganhar os revezamentos 4x100m masculino e 4x400m e os 10 mil. Não era tarefa impossível e todo mundo estava fazendo a sua parte. Aquilo foi, de fato, uma vitória da equipe. A diferença final (no masculino) foi de apenas 3 pontos.Ao vencer, como treinador, os dois troféus do atletismo dos Jogos Abertos José Maria Nunes estabelecia para si próprio e para Florianópolis, mais um feito inédito: pela primeira vez na história do atletismo de Santa Catarina 126 JASC - 1980 - GERAL - ATLETISMO MASCULINO

1º lugar - Florianópolis - 188 pontos2º lugar - Joinville - 185 pontos3º lugar - Blumenau - 150 pontos4º lugar - Brusque - 39 pontos5º lugar - Lages - 12 pontos

127 JASC - 1980 - GERAL - ATLETISMO FEMININO1º lugar - Florianópolis - 150 pontos2º lugar - Blumenau - 138 pontos3º lugar - Caçador - 28 pontos 4º lugar - Joinville - 27 pontos5º lugar - Concórdia - 25 pontos

128 Francisco de Oliveira Neto - saltador em distância e triplo. Foi muitas vezes campeão dos Jogos Abertos de Santa Catarina.

129 Aline Figueiredo - corredora de velocidade e saltadora em distância188

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a mesma equipe de atletismo venceria todas as competições disputadas no estado, em todas as categorias: Campeão Estadual na categoria Menores (masculino e feminino); Campeão Estadual na categoria Juvenil (masculino e feminino); Campeão Estadual na categoria Adulto (masculino e feminino) e agora, Campeão dos Jogos Abertos de Santa Catarina (masculino e feminino). Era um feito e tanto.

LISBOA, DE PASSAGEM E ANGOLA, PARA CORRERPelos resultados obtidos em 1980 José Maria Nunes e Edson Bergara foram selecionados, pela Confederação Brasileira de Atletismo, para participar da Corrida de São Silvestre de Angola, que seria realizada em Luanda, no dia 31 de dezembro de 1980.Além dos dois atletas, fazia parte da delegação brasileira o professor Armando Corujeira, do Sesi de São Paulo.A saída do Brasil foi marcada para o dia 28 de dezembro. Teriam de ir até Lisboa para obter visto de entrada em Angola. O país africano não tinha representação no Brasil.Nunes nunca tinha viajado para fora do país. E não tinha atinado para o fato de que, na Europa, em dezembro, é inverno. No aeroporto, ainda no Brasil, percebeu que muitas pessoas estavam embarcando com pesados casacos pendurados no braço. Achou aquilo muito estranho. E pensou com com os botões de sua camisa de mangas curtas “Esse pessoal parece ser louco!”Quando o avião iniciou a aproximação em Lisboa o comandante deu algumas informações sobre o tempo em Portugal e mencionou que a temperatura local era de três graus centígrados. Nunes achou que havia entendido errado. Perguntou ao professor Corujeira “o que foi que ele disse? Quantos graus tá em Lisboa?”O professor deu uma boa olhada nas mangas de de camisa do seu atleta e caiu na real de que tinham um

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problema. “Tá bem frio”, limitou-se a dizer. “Tá muito frio!”Chegaram em Lisboa no dia 29 pela manhã. Temperatura de 3 graus. Dentro do aeroporto ainda havia alguma calefação. Mas o aquecimento elevava a temperatura para suportáveis 10 ou 12 graus, o que ainda era muito frio. Mas o problema maior estaria lá fora do aeroporto. A primeira coisa a fazer era correr para uma loja e comprar um casaco. Por sorte Nunes não pegou um resfriado. Seguiu viagem com a saúde intacta.Passaram o dia em Lisboa. Foram até o consulado de Angola para obter os vistos nos passaportes. Depois pegaram um taxi e foram conhecer alguns pontos turísticos da cidade na região em que os descobridores partiram para as suas grandes viagens.Nunes ficou particularmente surpreso com um incidente em que uma senhora, portuguesa, puxou pelo braço o professor Corujeira, que estava atravessando a rua, enquanto o sinal estava vermelho (não havia carro passando). Ouviu a velha xingar: “só podria ser brasileiro!”No voo de Lisboa para Angola Nunes estava todo encasacado. E foi, novamente, surpreendido. Quando o avião se aproximou do aeroporto o vcomandante informou que “o tempo está bom e a temperatura local está em 32 graus”. Nunes pensou: “que coisa louca esse negócio do clima nos países!” Pelo menos agora o problema era mais fácil de ser resolvido.Em Angola foram muito bem recebidos, alojados num dos melhores hoteis da cidade, tratados como estrelas internacionais. No mesmo hotel estavam hospedados oficiais militares de Cuba e de Moçambique, que apoiavam o processo político pelo qual passava Angola naquele momento.Angola tornara-se independente de Portugal 5 anos antes, em 11 de novembro de 1975, mas logo entrou em uma disputa entre as diversas correntes

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nacionalistas que disputavam o poder, com o apoio de paises liderados pela União Soviética ou pelos Estados Unidos. O primeiro presidente de Angola, Agostinho Neto havia morrido um ano antes, em setembro de 1979. O presidente Atual era José Eduardo dos Santos, um engenheiro, chefe militar e lider do MPLA130, partido de orientação comunista. Depois de 1980 muita gente deixou o país, a economia degringolou, as instalações estavam destruídas pela guerra civil. O país vivia sob a permanente ameaça de um ataque das forças do Aparthaid da Africa do Sul (o que acabou acontecendo, em 1982). Somente em 1992, dezesseis anos depois da indepenência, Angola teria sua primeira eleição livre. O resultado dessa eleição, no entanto, não foi aceito por uma das partes e a guerra civil continuou, agora ainda mais violenta, com milhares de mortos. Em quatro de abril de 2002, finalmente, a paz chegou para os Angolanos.Nunes e seus companheiros chegaram em Luanda na manhã do dia 30 de dezembro de 1980. Teriam o dia inteiro e o dia seguinte para se recuperarem da viagem e estarem prontos para a corrida, que seria um pouco antes da meia noite do dia 31.A corrida foi vencida pelo etíope Girma Berhanu131 com a marca de 25min34s2. Nunes ficou em 7º lugar. ((Cristi Worn Watari - verificar nos jornais da época a classificação geral, inclusive do Edson Bergara))No dia 2 de janeiro, à noite, aconteceu uma competição na pista de atletismo do estádio. Naquela ocasião ocorreu um incidente curioso (pra não dizer assustador): num determinado momento da competição tiros foram dsparados de um prédio próximo em direção às arquibancadas do estádio, provocando uma grande confusão e correria. Apesar do susto, logo em seguida tudo voltou ao normal e a competição foi reiniciada. Para os dois brasileiros, evidentemente, aquilo parecia bizarro.130 Movimento Popular de Libertação de Angola que disputou o poder em Angola por 27 anos

(até 2002) com a UNITA e com a FNLA131 Foi campeão mundial de

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Nessa competição Nunes correu a prova de 5 mil metros. A prova foi disputadíssima. Nove atletas entraram na reta final com possibilidade de vencer a prova. Nunes ficou em quinto lugar, com o excelente tempo de 14min30s, uma marca que, na época, permitiria disputar e até vencer o Troféu Brasil de Atletismo.No dia 5 de janeiro deixaram Luanda, novamente com destino a Lisboa. De lá para o Rio de Janeiro, no dia 6.Na decolagem, de Lisboa para o Rio, um susto: o avião teve um pneu furado no momento em que acelerava na pista para decolar. Foi um pavor geral, pois o avião pareceu estar completamente desgovernado (não estava, claro. O piloto foi muito eficiente. Mas, para viajantes novatos, aquilo parecia o fim do mundo). Assim, o voo que deveria ter saído de Portugal as onze horas da noite de 6 de janeiro, saiu somente as seis horas da manhã do dia seguinte.Como os atletas brasileiros ficaram na sala VIP, enquanto aguardavam o reembarque, Nunes acabou por conhecer parte da tripulação da TAP, inclusive o comandante. Durante o voo de volta, foi convidado a visitar a cabine do piloto (naquela época isso era uma prática bem comum). Durante a conversa nunes quis tirar uma dúvida. Havia percebido que as aeromoças começavam a servir as refeições no avião seguindo uma ordem muito esquisita, que parecia aleatória. Serviam a um grupo de pessoas depois serviam outras. Não seguiam uma linha reta, dentro do avião. Nunes ficou atento àquilo, mas não conseguiu entender qual era a lógica. O piloto esclareceu: “Você não prestou atenção. É que primeiro nós servimos as pessoas onde tem crianças. Depois nós servimos onde tem idosos. É uma questão de cuidado com o futuro e respeito com o passado!”Foi uma lição que Nunes guardou com carinho na memória: “Cuidado com as crianças. Respeito com os idosos”

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1981Ficou em 3º na Corrida de Apucarana, em janeiroNunes venceu a corrida de Ponta Grossa, em abrilNo início de 1981 Nunes já tinha em casa os quatro irmãos menores: Neusa (14 anos), Mauro (12 anos), Inês (11 anos) e Mariza (7 anos). Em janeiro a família mudou da Rua Tupinambá para uma casa maior, na rua João Medeiros Jr, no Saco dos Limões. Nunes então Convidou Padilha para morar na casa da família, com o acordo de que ele ajudasse as crianças com as questões de escola. Padilha era um estudante de engenharia que, apesar de esforçado, nunca foi um atleta de ponta. Não era um grande campeão dos Jogos Abertos. Apesar disso, Nunes o mantinha na equipe, por que ele era uma espécie de secretario da equipe. Organizava a documentação, dava orientações administrativas aos atletas mais novos, providenciava as inscrições nas competições, escrevia press releases132 para a imprensa, organizava os recortes de jornais, escrevia ofícios e fazia outros trabalhos que envolviam burocracia, arquivamentos ou documentações.Padilha morou na casa de Elvira e Nunes durante todo o todo o ano de 1981. No início de 1982 ele e Nunes entraram num acordo, porque Nunes tinha um outro problema para resolver: três atletas (meninas) trazidas do interior do estado para competir por Florianópolis estavam tendo problemas de adaptação nos lugares onde moravam e Nunes achava que se as trouxesse para um ambiente mais acolhedor (como a sua própria casa) a coisa poderia ser contornada. E assim foi feito. Padilha então saiu da casa, mas continuou a frequentar 132 Notas informativas, em linguagem jornalistica, dando conta dos resultados das

competições que a equipe participava. O objetivo era justamente obter a publicação nos jornais ou nas emissoras de rádio e TV (o que, quase sempre acontecia)

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as formidáveis paneladas de chá com leite e pão feitos pela Elvira.Durante os cinco primeiros anos de casados Elvira e Nunes podiam contar nos dedos (de uma única mão) os dias que fizeram uma refeição em casa, sem ninguém de fora, fosse, um parente, um atleta ou um convidado qualquer.

Naquele ano a equipe de atletismo ganhou um reforço de peso, Otmar Lothar Welsh transferiu-se de Blumenau para florianópolis, não apenas como atleta, mas também (e principalmente) para assumir a equipe de arremessadores de Florianópolis.Otmar era paranaense, tinha, na época, pouco mais de 23 anos. Filho de imigrantes alemães, praticava esportes desde os 16 anos, quando começou a jogar basquete na escola. Depois treinou Volei, Handebol e participava dos Jogos colegiais do Paraná e Jogos abertos do Paraná. Aos 19 mudou para Curitiba, onde foi descoberto para o Atletismo pelo técnico Aristides Junqueira (nunca treinou com ele. Mas foi apresentado por ele ao técnico Ivo da Silva, com quem começou a treinar, em 1977. Já em 1978 o prof, Ivo mudou-se para Blumenau e o convidou para ir junto e lá foi o alemãozão. Fez a faculdade de Educação Física na Furb (formou-se em 1980) e, em 1981 iniciou a minha carreira de técnico, na equipe de Blumenau. Três meses depois recebeu o convite de José Maria para ir treinar os arremessadores e lançadores de Florianópolis.Otmar trouxe uma qualidade extra para a equipe e a área de lançamentos e arremessos começou a revelar valores e produzir bons resultados. Ele atuou como treinador durante 34 anos. Treinou atletas importantes

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no cenário do atletismo brasileiro, como Mônica Rocha133, Amélia Moreira134 e Rodolfo Rogério Hass135.A equipe comandada por Nunes, em 1981, já contava com os trabalho de outros dois professores, que tinham funções de auxiliares técnicos: Jipe Alves de Oliveira e Oscar César Grando.Também foi nessa época que a equipe de Florianópolis ganhou um novo reforço, com a chegada de Jolmerson de Carvalho, que veio do Rio de Janeiro. Era um atleta de altíssimo rendimento e integrou-se muitobem à equipe, sendo atleta e treinador de provas com barreiras, sua especialidade.

Em 1981 aconteceram muitas coisas, mas um incidente, certamente, foi inesquecível: o caso do atleta Félix.Luis Carlos Felix dos Santos era um policial de SP. Fazia parte da ROTA136 e era atleta na prova do Decatlo. Nunes queria formar uma super equipe de atletismo em Florianpopolis e fazia convites para diversos atletas brasileiros de alto nível. Felix foi um deles. Felix era estudante de Educação Física em São Paulo. Parecia uma boa escolha.Felix participou dos Jogos Abertos em Jaraguá do Sul (1980) e deveria ter participado em Lages (1981). Mas era bastante indisciplinado. Pegava licença e ia para São Paulo (eventualmente para o Rio de Janeiro, onde tinha uma namorada). Dizia que ia resolver problemas de família, ficava semanas sem retornar.Num determinado momento Nunes achou que não deveria mais mantê-lo na equipe. Felix foi dispensado da equipe de atletismo. Ele queria ser nomeado 133 Penta campeã brasileira e bi campeã sulamericana de lançamento de dardo134 campeã sul america de lançamento do disco135 campeão sulamericano da prova 3 mil steeplechase com obstáculos tempo 9.01 min136 Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar é uma modalidade de policiamento do 1º Batalhão de

Policiamento de Choque e uma tropa reserva do Comando Geral da Polícia Militar do Estado de São Paulo.

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professor no IEE. Queria as 40 horas como professor no IEE mas cedido para a equipe de atletismo. Nunes não cedeu, bateram boca, e Félix desapareceu. Disseram que ele tinha voltado para São Paulo.Encontraram-se durante uma disputa do Troféu Brasil em São Paulo. Ou melhor dizendo: Félix encontrou Nunes. José Maria ouviu uma voz atrás de si, “você não resolveu o meu problema ainda. Você é um safado”. Reconheceu a voz. Virou deu de cara com Felix, já preparando um soco que o atingiu em cheio. Nunes caiu no chão, sem possibilidade de reagir. foi socorrido por outros atletas presentes.Felix foi punido. Banido do Atletismo. Felix não teve aliados nessa.Dois ou três anos depois, em 1984, Nunes estavanovamente em São Paulo, desta vez num ginásio assistindo a uma partida de basquete. De repente percebeu que Felix estava sentado na posição justamente atrás da sua. Nunes sentiu congelar dentro de si até a última gota de sangue. Pensou. Estou morto! Depois lembrou que não estava sozinho. Otmar Lothar Welsch e Oscar Grando (atletas de lançamentos e arremessos fortíssimos) estavam com ele no ginásio. E, a essas alturas, já estavam encarando Felix, com olhares nada amistosos. Mas Felix não estava atrás de confusão. Disse, apenas “Eu sei que eu passei de todos os limites. Queria te pedir desculpas. Eu não quero te matar.” Nunes, ainda atordoado, disse “Você não tem que pedir desculpas pra mim. Você tem de pedir desculpas aos atletas que estavam presentes naquela coisa horrível.” A conversa não avançou muito. Felix se desculpou mais uma vez e foi embora. Nunca mais foi visto.Em julho de 1981 a equipe adulta do IEE foi transferida para o clube Universitário, através de um acordo das duas instituições. Na época um dos principais benefícios para a equipe foi a autorização dada a todos os atletas (unversitários ou não) para fazer as refeições no Restaurante Universitário.

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Entre 6 e 17 de julho de 1981 participa, no Rio de Janeiro, do curso de Atletismo da Solidariedade Olímpica, promovido pelo Comitê Olímpico Brasileiro137.

JOGOS ABERTOS - LAGESEm 1981 os Jogos Abertos de Santa Catarina foram realizados em Caçador. A equipe de Florianópolis tinha perdido alguns atletas. Estava um tanto complicado vencer por equipe, mas ainda havia esperanças.Nunes estava bem preparado fisicamente e participou das três provas tradicionais. Mas, nos 1500 metros138 foi surpreendido por um atleta oriundo do Rio Grande do Sul (mas que já tinha participado dos Jogos no ano anterior, por Joinville). Paulo Ricardo Ferrugem havia se transferido para Lages e venceu a corrida nos metros finais. Nunes ficou com a medalha de prata.No dia anterior Nunes havia vencido, com certa facilidade, a prova dos 5 mil metros139 num duelo com os adversários tradicionais, Celso e Zimmer.

MOMENTO PARA A HISTÓRIANa tarde do dia 19 de outubro de 1981 um fato histórico do atletismo de Santa Catarina ocorreu, sem que ninguém tivesse se dado conta. Nem o próprio Nunes.Tudo bem. Ninguém tinha mesmo como adivinhar, mas, quando José Maria Nunes cruzou a linha de chegada na corrida dos 10 mil metros140, à frente de José Antônio de Souza e Antônio Celso Silveira, estava conquistando a 137 Na época, Comitê Olímpico Nacional138 JASC - 1981 - 1500 METROS

1º - Paulo Ricardo Ferrugem - Lages - 3min55,5s2º - José Maria Nunes - Florianópolis - 3min57,4s3º - Almir Ghifforn - Joinville - 3min59,7s(Zimmer ficou em 6º, Pompéia em 7º)

139 JASC - 1981 - 5 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Florianópolis - 15min02,7s 2º - Antônio Celso Silveira - Joinville - 15min11,5s3º - Paulo Cesar Zimmer - Blumenau - 15min17,3s

140 JASC - 1981 - 10 MIL METROS1º - José Maria Nunes - Florianópolis - 31min11,6s2º - José Antônio de Souza - Joinville - 31min21,6s3º - Antônio Celso Silveira - Joinville - 31min34,0s4º - Paulo Cesar Zimmer - Blumenau - 32min02,5s

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última das suas 35 medalhas conquistadas na sua espetacular passagem pela história dos Jogos Abertos de Santa Catarina.Foram 30 medalhas de ouro, 4 de prata e 1 de bronze.Quebrou 13 vezes o recorde de alguma prova dos Jogos Abertos de Santa Catarina: 4 vezes nos 1500m, 3 vezes nos 5 mil metros, 5 vezes nos 10 mil metros e uma vez no revezamento 4x400m. E, naquele momento, ainda era o detentor do recorde dos 10 mil metros, com 31min03,2s141 e nos 1500 metros, com 3min54,1s142.Mas a história do atleta José Maria Nunes nos Jogos Abertos ainda não estava sendo encerrada. Ainda haveria alguns capítulos para serem escritos. Apenas a conta dos números superlativos estava sendo encerrada.

NA COMPETIÇAO POR EQUIPESPor equipes Florianópolis manteve-se como a segunda maior força, tanto na classificação geral do masculino143

quanto na classificação geral do feminino144. Mas Nunes, o treinador, queria mais.27 de Novembro - Conclui o curso de Especialização em Educação Física ((Nunes5 - o que significou isso))

141 Esta marca foi batida no ano seguinte (1982) pelo atleta Antônio Celso Silveira, de Joinville (30min23,5s)

142 Este recorde somente foi quebrado nos Jogos Abertos de 1986, em Joinville, pelo atleta Gilson Wiggers (3min53,3s)

143 JASC - 1981 - GERAL - ATLETISMO MASCULINO1º lugar - Joinville - 182 pontos2º lugar - Florianópolis - 160 pontos3º lugar - Blumenau - 130 pontos4º lugar - Brusque - 49 pontos5º lugar - Lages - 24 pontos

144 JASC - 1981 - GERAL - ATLETISMO FEMININO1º lugar - Blumenau - 169 pontos2º lugar - Florianópolis - 137 pontos3º lugar - Joinville - 60 pontos4º lugar - Jaraguá do Sul - 21 pontos 5º lugar - Brusque - 13 pontos

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1982Depois de correr a São Silvestre no dia 31 de dezembro ((Nunes5 - Não houve nenhum registro dessa participação)), Nunes foi para o Rio de Janeiro, para participar, no dia 4 de janeiro, da Corrida Leblon-Leme, Rio de Janeiro. Ocorreu um contratempo com consequências no resultado da prova. A pessoa designada pelo Filé ((Nunes5 - diretor geral do evento)) que deveria levar Nunes do hotel para o local da corrida acabou chegando muito atrasada. Quando Nunes finalmente chegou à linha de partida os competidores já tinham acabado de largar. Estavam a uns 200 ou 300 metros à frente. Nunes, sem aquecimento, saiu atrás da multidão de corredores. Conseguiu um ótimo 11º lugar. Mas ficou muito aborrecido com a organização do evento.No dia 7 de janeiro estava em Brasília para correr a tradicional Corrida de Reis145. Silvana Pereira foi a campeã no Feminino.Em fevereiro venceu a Corrida da Cebola, em Ituporanga. ((verificar resultados))4º lugar em Apucarana1º em Ponta GrossaNunes já havia se consagrado como um treinador de sucesso. A quantidade de talentos descobertos por ele era muito grande. Evaldo Rosa da Silva treinava agora no Rio de Janeiro, no CEFAN e estava à caminho de se tornar um atleta olímpico146. Silvana Pereira já era uma 145 CORRIDA DE REIS - BRASÍLIA - 1982

1º Eloi Rodrigues Schedler2º João da Mata3º Abelardo Neves da Costa4º José Maria Nunes5º Luis Carlos Gomes

146 Participou dos Jogos Olímpicos de Los Angeles, em 1984.199

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das melhores corredoras de fundo do Brasil, Mara Cristina era praticamente imbatível nas sua categoria, Erasmo Marcelo Damiani, Nelly Alice de Souza e Alexandre Fernandez Vaz despontavam como grandes nomes.Novos talentos revelados, nos anos 1980:Evaldo hoffman (não seria Effting)Mário Gabriel dos Reis (47,1s nos 400m)Aline Figueiredo era atleta da Esinde que veio para a equipe principal e obteve os melhores resultados.

Além disso ainda havia os atletas que vinham de outras cidades e atingiam grandes marcas quando chegavam a Florianópolis e começavam a treinar com Nunes.Charles Lima era um bom exemplo. Ele surgiu em Rio do Sul, em 1975. Era da primeira geração de atletas descobertos por José dos Santos. Competiu nos JEBs, em Brasília e fez uma marca muito boa. Tornou-se um atleta visado pelas grandes equipes. Florianópolis venceu a parada (porque tinha praia — e Charles adorava surfar). Mudou-se para Florianópolis em 1978. Em 1979 atingiu sua melhor marca, novamente nos Jogos Escolares Brasileiros. Ficou em terceiro lugar na prova dos 800 metros e estabeleceu o recorde catarinense (adulto!) com 1min54,0s.Quando foi entrevistado, por um jornal, depois de retornar de Brasília, Charles disse que ficou bastante satisfeito com o seu resultado, principalmente porque “o campeão é o recordista mundial estudantil”. O campeão ao qual ele se referia era ninguém menos que Joaquim Cruz147. E o vice-campeão foi o não menos fenomenal José Luis Barbosa148. Charles Lima, era um atleta exuberante e muito querido na equipe149.

147 Campeão nos Jogos Olímpicos de Los Angeles, 1984.148 Zequinha barbosa também foi um grande atleta. Um dos seis melhores corredores do

mundo no início dos anos 1980.149 Charles Lima morreu em 2015, vítima de câncer.

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E havia outros: Jair Ventura, Walmir de Carvalho, Felinto Pacheco Neto, Sandro Renato de Araújo, Célio Brasil, Hilário Bartelt, Ricardo Wagner Sandri, Aderbal Morelli Jr, ((Nunes5 - outros nomes dessa época))

ELVIRA, PROFESSORAElvira concluiu com louvor o curso de Letras - Inglês da UFSC. Foi a melhor aluna. Ganhou medalha de Mérito Acadêmico, um fato que foi muito comemorado.Logo em seguida passou a dar aulas de inglês numa escola municipal da Tapera. Mais tarde, lecionou no Instituto Estadual de Educação. Em 1984 fez concurso para A Escola Leonor de Barros no Itacorubi. Pra variar, tirou o 1º lugar naquele concurso. Elvira atuou durante 10 anos como professora.No dia do jogo Brasil x Polônia, da Copa do Mundo, fez prova prática do concurso para a UFSC - aula prática de atletismo. Nunes foi aprovado e passou a ser professor no Colégio de aplicação. ((Nunes4 - confirmar. Ver a cronologia onde mostra 1981 como o ano que começa a dar aula no CA da UFSC))

JOGOS ABERTOS - ITAJAÍÀquelas alturas, com 34 anos, Nunes não corria mais provas curtas. Desde 1978, quando vencera os 1500 metros pela última vez, em Caçador, Nunes vinha acumulando derrotas em todas as disputas nessa prova. Além do mais, novos nomes como Paulo Ferrugem e Hilário Holzapfel mostravam cada vez mais que os 1500m tinha se transformado numa prova de especialista em “velocidade prolongada”. Não era mais uma prova para quem corria as provas de fundo. (nos “bons tempos” um fundista, como Nunes poderia correr até os 800 metros150). Agora os tempos eram outros e Nunes viu, da arquibancada o joinvillense Hilário vencer os 1500 metros151. Celso foi o terceiro, Zimmer ficou em 150 Em 1973, no Campeonato Estadual, Nunes correu os 800 metros e foi o campeão, com

uma boa marca: 1min56,1s151 JASC - 1982 - 1500 METROS

1º - Hilário Holzapfel - Joinville - 3min56,0s2º - Cosme do Nascimento - Joinville - 3min56,6s

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6º, Pompéia em 7º. Realmente, os tempos eram outros. O relógio estava batendo pra todo mundo. Mas o recorde que Nunes estabelecera para a prova em 1978 continuava sem ser batido e resistiria ainda por mais quatro anos. Seria quebrado somente nos Jogos Abertos de 1986, em Joinville, pelo atleta Gilson Wiggers (3min53,3s).No dia anterior, Nunes havia cometido um de seus mais grosseiros erros de avaliação e de estratégia, ao entrar na pista para correr os 5 mil metros, acreditando piamente que poderia vencer a prova. Perdeu de forma dramática.Dois dias antes da prova ele estava na Cidade do México, onde tinha ido participar de um “Curso Internacional de Nível Médio para Professores de Educação Física e Treinadores Desportivos”, um evento da Organização dos Estados Americanos, da Solidariedade Panamericana e do Comitê Olímpico Mexicano. Nunes estava bem fisicamente. Tinha mantido, no México, o seu programa de treinamentos. Tinha feito uma corrida de 5 mil metros com atletas locais e a participação de um colombiano e fez a boa marca de 14min18s. Estava animado.Saiu do México (uma altitude de 2200 metros), na quinta-feira. O voo seguiria por Miami, EUA, onde ele ficou mais de seis horas esperando a conexão para o Brasil. No Brasil (no Galeão) aguardou mais cinco horas. Desembarcou na sexta-feira à tarde em Florianópolis, depois de 23 horas entre voos e aeroportos. Estivera no México durante 25 dias e, por isso, havia um fuso horário de 4 horas para ser reajustado no relógio biológico. Contra todas essas adversidades Nunes decidiu correr. Não dimensionou o tamanho do estrago que a viagem tinha feito no seu organismo. No sábado pela manhã estava na linha de partida para os 5 mil metros. Definitivamente, não foi uma decisão inteligente. E ele descobriu isso antes mesmo de

3º - Antônio Celso Silveira - Joinville - 4min00,6s202

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completar os primeiros mil metros da prova. Arrastou-se até o final. Ficou em 6º lugar.Antônio Celso Silveira, que não tinha nada a ver com isso, finalmente ganhava a sua sonhada medalha de ouro numa prova de fundo dos Jogos Abertos152. Naqueles Jogos Abertos de Itajaí Celso ainda correria os 10 mil metros153, estabelecendo novo recorde para a prova. Depois do péssimo resultado da corrida dos 5 mil metros Nunes acreditou que poderia correr melhor nos 10 mil. Não correu. Depois da metade da prova começou a sofrer muito. O corpo todo estava travando. Não quis desistir da prova. Não fazia isto. Mas, por muito pouco não tomou um capote do vencedor da prova. No mesmo dia Celso correu (e venceu) a prova experimental dos 3000 metros steeplechase, que foi realizada pela primeira vez naquela edição dos Jogos. Ele fez o tempo de 9min31,6s. Como a prova não estava originalmente prevista na programação da competição, não contou pontos para o troféu por equipes. Mas os vencedores receberam suas medalhas.Na competição por equipe, como nos anos anteriores, a equipe de Nunes ficou em segundo lugar na

152 JASC - 1982 - 5 MIL METROS1º - Antônio Celso Silveira - Joinville - 14min39,5s2º - José Antônio de Souza - Joinville - 14min56,9s 3º - Paulo Cesar Zimmer - Blumenau - 14min57,3s 4º - Carlos Augusto Rodrigues - Blumenau - 15min11,2s 5º - Nereu Pereira Filho - Florianópolis - 15min26,3s 6º - José Maria Nunes - Florianópolis - 15min30,0s

153 JASC - 1982 - 10 MIL METROS1º - Antônio Celso Silveira - Joinville - 30min23,5s (recorde)2º - Carlos Augusto Rodrigues - Blumenau - 31min24,6s 3º - Paulo Cesar Zimmer - Blumenau - 31min26,7s4º - José Maria Nunes - Florianópolis - 32min40,5s5º - Nereu Pereira Filho - Florianópolis - 32min42,3s6º - Johni Régis Pazzin - Chapecó - 32min54,3s

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classificação geral - masculino154 e também na classificação geral - feminino155.Como treinador, por sinal, Nunes ia bem. Sua equipe, principalmente sua equipe de corredores de fundo, despontava em todas as competições. Silvana, Ieda, Mara, ((Nunes4 - outras meninas nas corridas de fundo)). No time masculino tinha o próprio Nunes, seu irmão Júlio, Nereu Pereira Filho, Edison Luiz Benitez Pedelhes ((Nunes4 - quem mais?))

154 JASC - 1981 - GERAL - ATLETISMO MASCULINO1º lugar - Joinville - 244 pontos2º lugar - Florianópolis - 164 pontos3º lugar - Blumenau - 121 pontos4º lugar - Jaraguá do Sul - 14 pontos5º lugar - Criciúma - 12 pontos

155 JASC - 1981 - GERAL - ATLETISMO FEMININO1º lugar - Blumenau - 181 pontos2º lugar - Florianópolis - 153 pontos3º lugar - Joinville - 83 pontos4º lugar - Jaraguá do Sul - 28 pontos 5º lugar - Itajaí - 12 pontos

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19831983 começou muito bem. Mas demorou muito para acabar. Durou quase cinco anos e não acabou bem. Já explico.Em junho quando foi realizado o Campeonato Catarinense em Florianópolis ainda não se sabia, evidentemente, que os Jogos Abertos daquele ano seriam cancelados por conta das enchentes que assolaram o estado. Mas, se aquele campeonato serve de parâmetro, pode-se dizer, no mínimo, que Florianópolis iria se sair muito bem.O Clube Universitário foi o campeão no masculino com larga folga. E no feminino a ADIEE foi vice campeã, mas é preciso considerar que a equipe deixou de contar com quatro importantes atletas (Silvana Pereira, Ieda Juppa, Aline Figueiredo e Mônica Rocha, esta última era treinada por Otmar Welsh) que não puderam participar do segundo dia da competição, porque viajaram, com Nunes, que era um dos técnicos da seleção Brasileira, para Medelin, na Colômbia, onde participariam do Campeonato Sulamericano Juvenil. Completavam o grupo de catarinenses naquela seleção brasileira os atletas Erasmo Damiani, também de Florianópolis e Josiani Gambi, de Joinville.Naquele Sulamericano o Brasil conquistou o título de campeão e os atletas de Florianópolis tiveram ótimos resultados. Aline Figueiredo ganhou três medalhas de ouro (Salto em distância e revezamentos 4x100 e 4x400m); Ieda Juppa venceu os 3000m e ficou em 2º nos 1500m; Silvana Pereira ficou em 2º nos 3000m e em 4º nos 1500m; Erasmo Damiani ficou com o ouro no revezamento 4x400m e Mônica Rocha ficou com a prata no lançamento do dardo. A imprensa Brasileira (e

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particularmente a de Santa Catarina) festejou muito aquelas conquistas.No final daquele mês (junho de 1983) Florianópolis mandaria a maior equipe que já havia defendido a ilha numa edição do Troféu Brasil de Atletismo, em São Paulo. 15 atletas do Clube Universitário e 10 atletas da ADIEE.Foi uma competição muito disputada, pois era seletiva para os Jogos Panamericanos. Em termos individuais, o maior destaque de Florianópolis foi de Ieda Regina Juppa, atleta ainda juvenil que venceu os 1500 e os 3000 metros, tendo estabelecido novo recorde sulamericano juvenil para os 1500m. Monica Medeiros venceu, no lançamento do dardo, Silvana Pereira foi prata nos 1500 e bronze nos 3000 metros. No masculino, Jolmerson de Carvalho ficou em 3º nos 400 metros com barreiras e compôs, com Edson Anery, Erasmo Damiani e Evaldo Rosa da Silva, o revezamento 4x400m masculino que conquistou a medalha de prata de forma espetacular. Foi uma das provas mais emocionantes daquele Troféu Brasil.Desde que assumira a equipe, em 1977 os resultados nas pistas e nas corridas de rua só melhoraram. Nunes tinha se preparado tecnicamente e havia se transformado num treinador muito competente. Nos últimos três anos, as suas equipes de todas as categorias estavam vencendo praticamente todas as competições disputadas.

TEMPESTADE NO HORIZONTEOs resultados exuberantes obtidos pelos atletas de Florianópolis nas competições, no entanto, não refletiam a fervura interna da equipe.Quando Nunes voltou para Florianópolis, em 1976, vindo de Blumenau, chegou com uma condição excepcionalmente positiva. Era um campeão, um vitorioso e com propostas para trabalhar onde quisesse. Ao chegar em Florianópolis, teve moral para impor certas condições de trabalhar, por conta,

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principalmente, do que representava, por seu desempenho de atleta. Estabeleceu-se numa determinada posição que o seu trabalho realizado, nos anos seguintes, conseguiu sustentar. Os resultados obtidos por Nunes em Florianópolis, como atleta e como treinador consolidaram o prestígio que ele havia conquistado antes mesmo de chegar. A equipe de Florianópolis, que não ganhava praticamente nada até 1976 passou a disputar o primeiro lugar em todas as competições de que participou. Em todas as categorias. E mais: transformou essa equipe numa equipe forte em nível nacional. Portanto, de 1977 até 1983 o gráfico do prestígio profissional de José Maria Nunes em Florianópolis só fez subir e subir e subir.Nesse período Nunes tinha, eventualmente, problemas com outros treinadores, principalmente com o pessoal da UFSC. Esses problemas eram derivados de visões diferentes. José Maria e o pessoal da UFSC tinham objetivos e visões completamente diferentes sobre o atletismo e sobre métodos de treinamento e direção de grupos. E nunca houve, de nenhuma das partes, disposição para o diálogo franco. Simplesmente cada um defendia com unhas e dentes a sua própria visão. Ao contrário de Nunes, o pessoal da UFSC era articulado e tinha estratégias inteligentes de ataque e contra-ataqueAté 1983 Nunes sustentou suas posições no (justo e merecido) prestígio que havia conquistado. Nunes tinha posições consolidadas. Suas decisões eram apoiadas pelos dirigentes da Prefeitura e até mesmo pelos dirigentes da própria Universidade. Nunes era poderoso porque seu trabalho, que era realmente bom, aparecia.Em 1983, no entanto, uma série de mudanças começaram a acontecer ou a serem observadas. A primeira delas é que Nunes já não era um campeão nas pistas. tinha sofrido uma derrota nos Jogos de Itajaí e, como não houve Jogos Abertos naquele ano, não houve

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a oportunidade da recuperação. E 1984 seria tarde demais.Uma segunda situação, inusitada, pra dizer o mínimo, era que no segundo semestre de 1983, uma das estrelas da equipe, Ieda Juppa, apesar dos excelentes resultados que estava obtendo (estava no auge da carreira e era recordista sulamericana dos 1500m) estava perdendo o estímulo para os treinamentos e para as competições. Estava, talvez, enfrentando uma espécie de depressão. Mas aquilo estava gerando desentendimentos com o treinador o que resultou no seu abandono total do atletismo no final daquele ano.Uma terceira coisa foi um um problema enfrentado como técnico: pela primeira vez, desde que Nunes assumira a equipe, em 1976, um atleta (não professor de educação física) optava por treinar sozinho. No início do ano, Ênio Padilha156 (que corria os 800 e os 1500 metros) alegando que não estava recebendo atenção do técnico aos seus treinamentos, procurou Nunes pressionando por um treinamento mais adequado. Nunes não gostou da abordagem (que foi mesmo feita de forma muito direta e dura) e deu um ultimato do tipo “se não estiver satisfeito então vá procurar outro técnico ou treinar sozinho”. Padilha decidiu treinar por conta própria.Nunes (e, verdade seja dita, praticamente todos, inclusive amigos próximos de Padilha) acreditavam que aquilo era uma loucura. Que os resultados de Padilha só iriam piorar). E, de fato, nos primeiros dois meses, houve uma queda no rendimento. Mas, em seguida, e contra todos os prognósticos, os resultados começaram a aparecer e Padilha, cujas marcas nos quatro anos anteriores estavam paradas na faixa de 1min57s a 1min58s, conseguiu, no Troféu Brasil daquele ano, a boa marca de 1min54,2s157.

156 Este episódio, envolvendo o autor, está sendo contado aqui porque o próprio Nunes reconhece ter sido um fato importante e que desencadeou uma série de outros casos semelhantes daquele período.

157 Foi a melhor marca do ano para os 800 metros, em Santa Catarina208

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Naquele ano de 1983 estavam ocorrendo diversos focos de desentendimentos entre os atletas e a comissão técnica. Aquilo estava ficando difícil de ser controlado. A atitude tomada e sustentada por Padilha (e, principalmente, os resultados obtidos nas competições) estavam pruduzindo efeitos em muitos outros atletas. A maneira como Nunes estava reagindo àquela situação, provocou em outros atletas um certo desconforto e muita gente começou a cogitar abandonar as orientações técnicas de Nunes. O treinador achava que Padilha estava por trás daquilo tudo. Que ele era o articulador daquela rebelião que se formava. Nunes tratava Padilha como um líder de motim. Não era. As articulações para esvasiar o poder de Nunes estavam sendo feitas por outras pessoas, em outros lugares. Mas aquilo era apenas o esgotamento natural de uma fórmula que, de uma forma ou de outra haveria de se esgotar, cedo ou tarde.No final daquele ano, apesar de os resultados dos atletas continuarem excelentes, a situação na equipe havia chegado num ponto difícil. Aquilo era uma situação completamente nova para Nunes. Ele estava começando a perder o controle sobre o grupo. Era preciso reagir. Assim, num belo dia, todos foram informados de que haveria uma importante reunião na equipe de atletismo.Naquela reunião foi apresentada uma lista de dispensa de um grupo de dez ou 12 atletas (Ênio Padilha, Milton Castro, Alair Salvadego, Hilario Bartelt, Nei Berckembrock, Pompéia, Antônio Rita, Edson Anery entre outros). Nos jornais do dia seguinte o nome dos atletas não aparecia, mas havia uma declaração, atribuída a Nunes de que estava sendo feita "uma limpeza" na equipe. Os atletas que estavam na lista ficaram furiosos com o termo utilizado.Logo em seguida foi marcada outra reunião, agora apenas com José Maria Nunes, os atletas dispensados e os outros técnicos. Otmar questionou o porquê das dispensas, pois elas incluiam, por exemplo, Alair

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Salvadego, que era atleta que treinava com ele (Otmar) e era, na época, vice campeã brasileira. Nunes não deu os motivos convincentes. Os dois se desentenderam e Otmar ficou no lado dos atletas dispensados. O grupo pediu uma reunião com o Ney Niegas, superintendente da CME. A reunião foi marcada e todos foram até lá, mas, depois de uma longa espera, receberam o comunicado que Ney Viegas estava em Brasília e que, portanto, a reunião não aconteceria. Nunca se soube se era isso mesmo ou se foi apenas uma desculpa do dirigente.Passaram-se alguns dias, os ânimos foram se acalmando e, no fim, os atletas que haviam sido dispensados acabaram sendo readmitidos na equipe, como se nada tivesse acontecido (menos Padilha, que foi, definitivamente, excluído da lista das bolsas da prefeitura, o que, na prática, o impediria de continuar praticando atletismo).Logo depois Alair recebeu uma proposta da Gama Filho e foi embora para o Rio de Janeiro. Outros atletas, mesmo depois de readmitidos procuraram outros caminhos em outras equipes do estado. O clima, na equipe já estava, definitivamente, prejudicado. E a relação entre Nunes e Otmar permaneceria muito ruim por muitos anos.A convicção de Nunes de que Padilha era um “inimigo” só foi desfeita em 1986, quando, Padilha formou-se engenheiro, na UFSC, e foi, pessoalmente, na casa de Nunes levar o convite para ele, Elvira e família. Na ocasião Padilha falou, que, se dispusesse de apenas um convite para a sua formatura esse convite certamente seria endereçado ao Nunes, pois reconhecia a importância imensa de toda a ajuda e proteção que havia recebido do treinador e amigo. Padilha sempre deu a Nunes o crédito de principal responsável pelo sucesso pessoal que ele obteve na sua passagem de 10 anos por Florianópolis. Nunes ficou emocionado e surpreso (enquanto Elvira, que sempre entendera perfeitamente a situação, olhava para Zé Maria com

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cara de “eu não te dizia isso, Nunes?). Depois disso Padilha e José voltaram a ser grandes amigos, como sempre foram, até 1983.Outra coisa importante para ser salientada é que, naquele ano de 1983, profundas mudanças políticas estavam sendo iniciadas em Florianópolis. Em abril daquele ano Cláudio Ávila da Silva assumiu a prefeitura, nomeado pelo Governador do Estado, Esperidião Amim. Daí pra frente, e até 1986, quando Edison Andrino assumiu, como prefeito eleito pelo voto popular, Florianópolis teve diversas trocas de prefeito (e, com isso, mudava também toda a estrutura de gestão do esporte), fragilizando cada vez mais os laços de Nunes com a administração municipal. Nunes perdeu as estruturas que, durante 7 anos, sustentavam as decisões que ele tomava. Teve de recuar em muitas coisas e acabou perdendo espaços importantes na direção do atletismo de Florianópolis.Nunes perdeu o controle sobre a distribuição das bolsas para atletas na equipe. Embora ainda pudesse indicar atletas para compor a equipe, o valor total das bolsas tinha de ser dividido entre atletas que treinavam com ele e com outros atletas (e até “atletas”) que treinavam com outros treinadores. E assim, foi perdendo, sistematicamente o controle das equipes.

PROFESSOR EM FORMAÇÃONo dia 9 de julho de 1984 formou-se em Pedagogia pela Udesc ((Nunes5 - quais foram as motivações para fazer o curso? Quais foram as contribuições desse curso para o seu trabalho))((Nunes5 - Quando começou Administração Escolar? Quando terminou? Por que?))

OS JASC DE 1983, 84 e 85Os Jogos Abertos de 1983, como já foi dito, foram cancelados, por causa das enchentes que assolaram Santa Catarina naquele ano. Mas a equipe de Florianópolis estava muito bem e a participação no

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Campeonato Catarinense, no Sulamericano e no Troféu Brasil, em São Paulo deu uma boa ideia disso.No ano seguinte, 1984 os jogos foram realizados em Concórdia158 e, pela primeira vez, desde 1968, Nunes não participou como atleta dos Jogos Abertos, por decisão própria159. Aqueles dois resultados negativos nos Jogos Abertos de Itajaí, em 1982, deixaram Nunes muito abalado por algum tempo. Perdeu o ânimo para os treinamentos. Perdeu a confiança. Mais tarde ele admitiria a amigos que aquelas duas derrotas, da maneira como aconteceram (por erros de avaliação e de estratégia) anteciparam a sua saída das pistas — ou, pelo menos, dos Jogos Abertos, uma vez que, por algum tempo Nunes ainda correu algumas provas de rua.Em 1985, no entanto, José Maria Nunes voltou a participar de uma prova de atletismo nos Jogos Abertos. Ao contrário do que ocorrera em Itajaí, em 1982, Nunes não tinha ilusões de que venceria a corrida. Queria apenas somar pontos para a disputa do troféu por equipe. Nunes correu os 3 mil metros steeplechase160 e ficou em 4º lugar161. A prova foi vencida por Edison 158 JASC-1984 - CONCÓRDIA - GERAL - MASCULINO

1º lugar - Florianópolis - 242 pontos2º lugar - Blumenau - 154 pontos3º lugar - Joinville - 112 pontos4º lugar - Jaraguá do Sul - 40 pontos5º lugar - Lages - 26 pontos

JASC-1984 - CONCÓRDIA - GERAL - FEMININO1º lugar - Blumenau - 178 pontos2º lugar - Florianópolis - 170 pontos3º lugar - Jaraguá do Sul - 48 pontos4º lugar - Timbó - 44 pontos5º lugar - Araranguá - 19 pontos

159 Em 1976 ele também não participou, mas foi porque cumpria o estágio probatório pela transferência de Blumenau para Florianópolis.

160 JASC - 1985 - BRUSQUE - 3 MIL METROS STEEPLECHASE1º - Edison Benitez Pedelhes - Rio d Sul - 10min02,8s2º - Nilton Cesar Chaves - Blumenau - 10min14,1s3º - Vivaldo Farias Oliveira - Florianópolis - 10min16,7s4º - José Maria Nunes - Florianópolis - 10min32,3s5º - Jerry Edson da Costa - Blumenau - 11min29,7s6º - Joris Pazin - Chapecó - não completou7º - Edson E. Martins - Joinville - não completou

161 Aqueles pontos, de alguma forma, ajudaram a equipe a ser campeãJASC-1985 - BRUSQUE - GERAL - MASCULINO1º lugar - Florianópolis - 157 pontos2º lugar - Blumenau - 146 pontos3º lugar - Joinville - 124 pontos4º lugar - Jaraguá do Sul - 30 pontos5º lugar - Criciúma - 28 pontos

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Benites Pedelhes. Foi, de certa forma, um alento para Nunes saber que o vencedor da sua última corrida nos Jogos Abertos de Santa Catarina foi um amigo e um atleta que ele mesmo havia revelado, nas pistas da Escola de Aprendizes Marinheiros, em 1979.Benites, assim como Evaldo, veio do Rio Grande do Sul para a Marinha. Mas, ao contrário de Evaldo, que permaneceu na Marinha por dez anos, Benites decidiu sair e fazer o curso de Educação Física da Udesc. Formou-se em 1983. Aguardou uns meses por alguma oportunidade em Florianópolis mas isso não aconteceu. Então resolveu ir para Rio do Sul. Casou com Ieda Juppa, com quem teve dois filhos. Tornou-se um professor brilhante e um atleta excelente162.

TREINADORComo treinador, no entanto, Nunes continuava a investir na sua formação. Em dezembro de 1983 participou, no Rio de Janeiro, do curso para Técnicos de Atletismo da IAAF, com 60 horas, obtendo o 26º lugar entre cerca de 90 técnicos participantes.

JASC-1985 - BRUSQUE - GERAL - FEMININO1º lugar - Blumenau - 157 pontos2º lugar - Florianópolis - 66 pontos3º lugar - Timbó - 38 pontos4º lugar - Araranguá - 37 pontos5º lugar - Joinville - 34 pontos

162 Correu a Maratona de Blumenau em 2h20min213

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Outro evento gratificante: quando os atletas participavam dos Jogos Estudantis Brasileiros, eles respondiam a uma pesquisa. E uma das perguntas que fazia parte do questionário era “quem é o seu treinador”. O nome de Nunes aparecia muitas vezes entre os atletas que disputavam medalhas. Por isso ele foi convidado para participar desse grande encontro com treinadores de todo o Brasil, na cidade de Lavras em maio de 1986. Foi o 1º Encontro Nacional de Busca e Desenvolvimento do Talento Desportivo, um evento

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que reuniu os melhores treinadores do país (de diversas modalidades esportivas) e que deu a Nunes uma grande oportunidade de aprender ainda mais.

O FIM DO CLUBE UNIVERSITÁRIOEm 1986 o Clube Universitário encerrou suas atividades deixando como legado (além de muitos títulos conquistados e a divulgação da UFSC no Brasil inteiro) um problema administrativo para ser resolvido: o que fazer com aqueles seis professores que haviam sido contratados pelo Centro de Desportos em 1980? Como

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acomodá-los na estrutura da Universidade. Esses professores tinham vínculo com a UFSC, mas não tinham feito concurso. Não haviam passado pelo processo normal de contratação. Alguns não tinham nem graduação concluída.A Universidade precisava se livrar do problema criado em 1980 quando contratou os seis professores para o Clube Universitário. Mas não conseguia encontrar uma solução. Eles foram contratados em uma situação e depois quiseram (a própria Universidade queria) transformar aquilo em outra situação bem diferente. A solução adotada foi a seguinte: efetivaram todos como professores de primeiro e segundo grau, lotados no Colégio de Aplicação.Nessa época, Deraldo era subcoordenador de Educação Física do Colégio de Aplicação. O processo caiu na mão dele. Era um problema! Ele, então, reuniu o grupo de professores que já trabalhava no Colégio de Aplicação havia anos. Na época eram uns dez professores, efetivos, concursados. A conclusão manifestada pelo grupo de professores era de que não havia a mínima condição de absorver os seis professores/treinadores, principalmente porque muitos ali não tinham a devida qualificação. Não havia nenhum problema contra qualquer um dos professores, individualmente.De qualquer forma, dos seis professores, quatro deles declinaram. Disseram que não pretendiam ficar no Colégio de Aplicação, para alívio do Deraldo. Dos outros três, Roberto Amestoy163, entrou na justiça para garantir os seus direitos, a professora Virgínia Zanini ficou na Esinde (Uma escolinha de esportes da UFSC), e o professor José Maria foi para o Colégio de Aplicação, em regime de dedicação exclusiva.Assim, Nunes chegou no Colégio de Aplicação numa situação de quem já havia sido rejeitado várias vezes. Mas não era nada pessoal. Não era Nunes o único

163 Professor de Educação Física uruguaio Roberto Daniel Amestoy, naturalizado brasileiro e professor da UFSC, depois tornou-se fisioterapeuta. Foi trazido por Nunes para Florianópolis em 1979.

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rejeitado. Era o conjunto dos seis professores que eram rejeitados pelo grupo dos professores do Colégio. Além do mais, Nunes considerava Deraldo como um inimigo, por fazer parte do “time do Willibaldo”. E achava que estava sendo perseguido, embora não haja nenhuma evidência nesse sentido. O que havia eram os problemas normais de cobranças naturais em um tipo de serviço no qual Nunes não estava acostumado a lidar. Passou mais de 15 anos dando treinamento de atletismo e se aprimorando naquilo. Porém, aquele conhecimento acumulado não tinha muita utilidade para dar aulas em turmas de “não atletas” numa escola convencional.Nesse tempo Nunes deixou o trabalho com a Prefeitura de Florianópolis e também pediu licença sem vencimentos no Instituto Estadual de Educação164, ficando com a dedicação exclusiva para a UFSC. Dessa maneira, só treinavam com Nunes os alunos do Colégio de Aplicação.Mas havia alguns outros atletas que permaneceriam treinando com nunes, por conta própria.

A POLÍTICA ENTRA NA VIDA DE JOSÉ MARIANo ano de 1985 um fato, aparentemente corriqueiro, poderia trazer mudanças significativas na vida de José Maria Nunes. Leonel Brizola tinha uma visita marcada para Florianópolis. Nunes sempre foi admirador do político que, naquela época era governador do Rio de Janeiro, mas que já se movimentava no sentido de ser candidato a presidente da república na próxima oportunidade. Nunes incluiu-se no grupo que faria a recepção a político famoso na visita que ele faria ao Morro da Mariquinha, comunidade próxima ao morro da caixa, na capital.Logo depois desse evento Nunes foi procurado por Manoel Dias, político catarinense, um dos fundadores

164 A saída definitiva do Instituto Estadual de Educação se deu em 19 de março de 1993 quando foi publicada no Diário Oficial do Estado de SC a portaria de exoneração de José Maria Nunes.

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do PDT. Ele queria fazer um convite. Um convite para José Maria Nunes filiar-se ao PDT. Manoel Dias disse “Nunes, você é uma pessoa muito conhecida. É um exemplo para a sociedade. É de gente assim que o nosso partido precisa, porque você representa os nossos valores, etc, etc, etc…” Enfim, tornaram amigos. Nunes filiou-se ao PDT. Achava que entrar na política poderia reverter as coisas que ele entendia que estavam erradas. As sacanagens, os apadrinhamentos, as falcatruas…Naquele ano de 1985 haveria, em todo o Brasil, eleições diretas para prefeitos das capitais de estado. O candidato do governo era o Francisco de Assis Filho, concorrendo contra o azarão, Edison Andrino. Nunes envolveu-se naquela eleição. O seu partido, PDT, era aliado de Andrino. Ele participou de reuniões, fez campanha, visitou casas, enfim. Estava na linha de frente da ação. Até o último dia da campanha todas as pesquisas davam larga e folgada vantagem para o candidato Francisco de Assis Filho. Mas Andrino acabou vencendo aquela eleição, num episódio típico de “voto moita”165, tornando-se o primeiro prefeito de Florianópolis do período pós regime militar.Nunes gostou muito daquela experiência e ficou particularmente empolgado com a vitória do seu grupo político. Aquilo parecia uma coisa muito boa. Os resultados apareciam. Agora haveria um caminho no qual ele poderia depositar suas esperanças: a política.

HORA DA VERDADEEm de abril de 1986 Edison Andrino assume a prefeitura de Florianópolis (eleito no ano anterior). Andrino já conhecia e gostava de José Maria Nunes. Já haviam conversado algumas vezes e sabia que ele tinha trabalhado muito na campanha. De sorte que o nome de Nunes foi lembrado e indicado para ser Superintendente da Fundação Municipal de Esportes.165 Tipo de eleiçao em que muitos eleitores (ligados à administração municipal) declaram voto

a um candidato (da situação), distribuem santinhos, usam camisetas, fazem boca de urna… mas acabam votando, em massa, no candidato da oposição.

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Nunes ficou animado com a ideia. Convidou pessoas para fazer parte da empreitada. Desenhou a equipe de trabalho. Fez Planos.Quando a notícia começou a circular e se soube que o nome de José Maria Nunes estava sendo considerado para aquele cargo ser o presidente da FME houve uma certa movimentação. Nunes tinha muitos fãs e admiradores no meio esportivo. Mas também tinha adversários. Pessoas que não concordavam com as práticas administrativas nem com a filosofia geral de trabalho de Nunes. Havia claras divergências entre os dois grupos sobre a condução do esporte em Florianópolis. Essas pessoas alegavam que Nunes não seria a pessoa ideal. E prepararam um documento e procuraram Rogério Queiroz, que era o secretário de Cultura do Município para garantir que Nunes não assumisse o cargo. Funcionou. Outra pessoa acabou sendo escolhida. Aldo Matos, que já estava trabalhando com a FME desde 1980 em cargos auxiliares. Esse processo de nomeação e desnomeação durou menos de uma semana. Nem chegou a se tornar oficial.Ao saber que havia sido destituído, antes mesmo de ser nomeado oficialmente, Nunes ficou furioso. Foi até a secretaria de Cultura conversar com Rogério Queiroz. “Tenho direito de saber o que aconteceu”, disse. “Eu não fui pedir o cargo. Você me nomeou por que quis. Como foi que deu pra trás?”Rogério se defendeu. “De fato, Nunes, você era a nossa primeira escolha. O próprio prefeito sugeriu o seu nome. Mas a gente tem de conversar com todo mundo. Você tem de entender, que o seu nome enfrentou muitas resistências, em virtude das divergências que você tem com Fulano, Beltrano e Cicrano… Foi isso o que aconteceu)Aquele episódio deixou Nunes arrasado. Foi a primeira grande decepção de Nunes na política. Infelizmente, outras ainda estavam por vir.

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Júnior nasce, em 06 de abril de 1987 - Nunes morava já na casa do Itacorubi.

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1988Muita coisa aconteceu entre 1983 e 1987. Nunes, agora, era filiado ao PDT e vice presidente da executiva municipal. O presidente era o Advogado Evilásio Caon.Grando e Viegas ((Nunes5 - Sérgio Grando, Fernando Viegas?)) eram candidatos pelo PDT à prefeitura de Florianópolis. Esperidião Amin (tendo como vice Bulcão Viana) era o candidato do PDS (candidatura de oposição).Depois de muito refletir Nunes aceitou ser candidato a vereador pelo PDT. Acreditava que seria eleito. Acreditava que a sua imagem, os milhares de fãs e amigos, ex alunos ex-atletas… não tinha como dar errado.Acampanha não teve planejamento, nem organização, nem estratégia. Era organizada pelo próprio partido. E (para o partido) não interessava quem fosse eleito, desde que os votos fossem para o PDT. Não houve grande financiamento para a campanha. Do partido Nunes ganhou apenas os “santinhos” e gastou, do próprio bolso, o que foi necessário. Foi, evidentemente, uma campanha espartana. Mas, no final das contas, teve um custo e sobraram contas para pagar depois das eleições.Uma semana antes da eleição Nunes acreditava que poderia ganhar uns 500 votos e que esse número de votos poderia fazê-lo vereador em Florianópolis. Todos estimulavam, na base do “Vamo lá, professor!” Nunguém disse qualquer coisa em tom de alerta, do tipo “Olha, está difícil. A campanha não vai bem. Não vai ser fácil chegar aos 500 votos”. Pelo contrário. Parecia que todos acreditavam plenamente no sucesso daquela empreitada.

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Nunes licenciou-se do trabalho no Colégio de Aplicação e gastava praticamente todos dias com seu fusquinha166. Passava nas casas, entregava santinhos, apresentava-se. Fazia o que muitos candidatos faziam. Mas não fazia o que alguns candidatos faziam (pagar combustível, contas de luz, contas de água, remédio, passagens de ônibus…). Nunes não estava se dando conta de que, em períodos eleitorais, especialmente nas eleições municipais, uma parte expressiva da população costuma ficar muito aberta a pequenas corrupções. Um saco de cimento aqui, uma carrada de areia ali, a quitação de uma conta atrasada acolá… Tem muita gente que espera pelo período eleitoral para receber propostas desonestas dos seus candidatos.Além disso, Nunes não se preocupou com a contabilidade de votos. Os irmãos, por exemplo, não votavam em Florianópolis. Nunes não teve a preocupação de transferir votos de Palhoça para Florianópolis.No fim, obteve 321 votos. Foi o 4º mais votado no partido. Mas isso estava longe de ser suficiente. Precisava de, pelo menos, 610 votos.Não foi um bom resultado. Longe disso. Aquela votação foi uma derrota lamentável. Nunes ficou muito arrasado. Passou dias e dias tentando entender o que aquilo significava. Onde estavam as pessoas que tanto o admiravam? Onde estavam seus fãs? Onde tinham ido parar as centenas de ex-alunos, ex-atletas, colegas, amigos?Digerir aquela derrota levou algum tempo.

TREINADOR “AVULSO”Durante 10 anos (entre 1977 e 1986) o atletismo de Florianópolis foi, praticamente todos os anos, campeão ou vice.Mas, entre 1983 e 1987, apesar de a equipe de atletismo de Florianópolis manter o status de candidata

166 Pegou emprestado o fusquinha do Tião para “gastar” durante a campanha.222

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permanente a vitórias e títulos nas pistas, Nunes viu sua condição e prestígio como treinador e dirigente do atletismo cair de forma lenta e gradual. Se em 1983 ele detinha todo o poder, prestígio e apoio às suas decisões, em 1987 a coisa já estava insustentável. E assim, depois de cinco anos de lutas contra adversários reais e moinhos de vento, José Maria Nunes, finalmente, deixou de ser técnico da equipe de Florianópolis. Evidentemente ele não se conformava com aquela situação. Não considerava justo o que tinha acontecido com ele. Alguns dos seus adversários daquela época admitiram em entrevistas para este livro que, de fato, pode ter havido excessos nos dois lados. Que pode ter havido má vontade e falta de disposição para o diálogo. Que muitos problemas eram apenas fantasmas do passado que impediam o entendimento em questões simples. Faltou conversa! Faltou compreensão. Faltou boa vontade aos dois lados do combate.Mas Nunes ainda tinha muitos atletas bons que confiavam no seu trabalho e preferiam continuar treinando com ele. Assim, mesmo sem ser contratado por nenhuma prefeitura do estado, Nunes (que trabalhava no Colégio de Aplicação da UFSC e depois na Escola Técnica Federal de Santa Catarina) nos seus horários livres seguiu dando treinamento para diversos atletas que competiam por diversos municipios e clubes, nos campeonatos estaduais, nas corridas de rua e nos Jogos Abertos. Na prática, o que aconteceu foi que Nunes estimulou os atletas sobre os quais ele tinha influência para que abandonassem a equipe de Florianópolis, esvaziando seus resultados. Era uma forma de retaliação que ele fazia contra as injustiças de que se julgava vítima. Mas o importante era que, com isto, Florianópolis perdeu posições no Atletismo em várias competições, inclusive nos Jogos Abertos167.

167 Em 1992 Florianópolis ganhou apenas uma medalha de ouro Atletismo dos Jogos Abertos. E, ainda assim, com uma ex-atleta do Nunes, Mara Cristina de Andrade, nos 800m.As equipes ficaram em 4º lugar no masculino (42 pontos, contra 2003 do vencedor, Concórdia) e 4º lugar no feminino (52 pontos contra 180 do vencedor, Chapecó).

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Nesse período Nunes também conduziu a negociação com a Unimed para o patrocínio da instituição para a ADIEE, da qual a atleta Silvana Pereira era a maior beneficiada. Este foi o primeiro contrato de patrocínio esportivo da Unimed no Brasil. Durou alguns anos e serviu de exemplo e base para patrocínio de outras equipes e atletas em outros lugares do Brasil. Ele ajudou a criar Circuito Unimed e Circuito IBM de Corridas de Rua que foram os primeiros circuitos de corrida de Santa Catarina.E foi, também, o Coordenador Geral da 1ª Maratona Catarinense de Pessoas Portadoras de Deficiência, que aconteceu em florianópolis, no dia 28 de agosto de 1988 ((Nunes5 - desenvolver))Enquanto trabalhou no Colégio de aplicação da UFSC, fez parte de uma comissão para o controle do Uso Indevido de Drogas na Universidade. Por conta das suas posições frontalmente contra e sua defesa do combate implacável aos traficantes que atuavam na Universidade, Nunes chegou a receber telefonemas anônimos com ameaças (nunca identificou a origem): “Zé Maria, cuida do teu atletismo. Não se preocupa com droga. Isso não é pra ti. Nem pra tua família”. Mas não esmoreceu, até cumprir o seu tempo como membro da comissão.Continuou participando de cursos e seminários. Entre 5 e 20 de dezembro de 1989 participou do curso Internacional de Atualização para Técnicos de Atletismo, (120 horas) promovido pela CBAt em Manaus, mesmo não estando mais (oficialmente) à frente de nenhuma grande equipe de Santa Catarina.

ABAIXO, os resultados da competição por equipes no atletismo dos Jogos Abertos de Santa Catarina, entre 1986 e 1992, completa o painel que este livro apresenta a partir de 1976 e dá uma ideia da evolução das equipes naquele periodo.JASC-1986 - JOINVILLE - GERAL - MASCULINO ((os resultados abaixo são de 85)1º lugar - Florianópolis - 157 pontos

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2º lugar - Blumenau - 146 pontos3º lugar - Joinville - 124 pontos4º lugar - Jaraguá do Sul - 30 pontos5º lugar - Criciúma - 28 pontos

JASC-1986 - JOINVILLE - GERAL - FEMININO1º lugar - Blumenau - 157 pontos2º lugar - Florianópolis - 66 pontos3º lugar - Timbó - 38 pontos4º lugar - Araranguá - 37 pontos5º lugar - Joinville - 34 pontos

JASC-1987 - CRICIÚMA - GERAL - MASCULINO1º lugar - Concórdia - 205 pontos2º lugar - Blumenau - 132 pontos3º lugar - Florianópolis - 78 pontos4º lugar - Criciúma - 76 pontos5º lugar - Joinville - 61 pontos

JASC-1987 - CRICIÚMA - GERAL - FEMININO1º lugar - Blumenau - 167 pontos2º lugar - Criciúma - 107 pontos3º lugar - Concórdia - 96 pontos4º lugar - Florianópolis - 93 pontos5º lugar - Timbó - 31 pontos

JASC-1988 - JOAÇABA - GERAL - MASCULINO1º lugar - Blumenau - 179 pontos2º lugar - Concórdia - 157 pontos3º lugar - Florianópolis - 128 pontos4º lugar - Criciúma - 77 pontos5º lugar - Joinville - 41 pontos

JASC-1988 - JOAÇABA - GERAL - FEMININO1º lugar - Blumenau - 166,5 pontos2º lugar - Florianópolis - 101 pontos3º lugar - Criciúma - 91 pontos4º lugar - Concórdia - 72 pontos5º lugar - Araranguá - 20 pontos

JASC-1989 - JOAÇABA - GERAL - MASCULINO1º lugar - Concórdia - 137 pontos2º lugar - Florianópolis - 114 pontos3º lugar - Blumenau - 106 pontos4º lugar - Rio do Sul - 93 pontos5º lugar - Criciúma - 54 pontos

JASC-1989 - JOAÇABA - GERAL - FEMININO1º lugar - Rio do Sul - 100 pontos2º lugar - Florianópolis - 98 pontos3º lugar - Concórdia - 90 pontos4º lugar - Blumenau - 70 pontos5º lugar - Criciúma - 38 pontos

JASC-1990 - BLUMENAU - GERAL - MASCULINO ((resultados abaixo são de 1989))1º lugar - Concórdia - 137 pontos2º lugar - Florianópolis - 114 pontos3º lugar - Blumenau - 106 pontos4º lugar - Rio do Sul - 93 pontos5º lugar - Criciúma - 54 pontos

JASC-1990 - BLUMENAU - GERAL - FEMININO1º lugar - Rio do Sul - 100 pontos2º lugar - Florianópolis - 98 pontos3º lugar - Concórdia - 90 pontos4º lugar - Blumenau - 70 pontos

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5º lugar - Criciúma - 38 pontos

JASC-1991 - CHAPECÓ - GERAL - MASCULINO1º lugar - Concórdia - 232 pontos2º lugar - Joinville - 125 pontos3º lugar - Blumenau - 92 pontos4º lugar - Florianópolis - 70 pontos5º lugar - Chapecó - 42 pontos

JASC-1991 - CHAPECÓ - GERAL - FEMININO1º lugar - Chapecó - 194 pontos2º lugar - Concórdia - 193 pontos3º lugar - Florianópolis - 57 pontos4º lugar - Blumenau - 44 pontos5º lugar - Joinville - 43 pontos

JASC-1992 - JOINVILLE - GERAL - MASCULINO1º lugar - Concórdia - 203,5 pontos2º lugar - Joinville - 203,5 pontos3º lugar - Blumenau - 97,5 pontos4º lugar - Florianópolis - 42 pontos5º lugar - Campos Novos - 27 pontos

JASC-1992 - JOINVILLE - GERAL - FEMININO1º lugar - Chapecó - 180,5 pontos2º lugar - Joinville - 129 pontos3º lugar - Concórdia - 112 pontos4º lugar - Florianópolis - 52 pontos5º lugar - Blumenau - 37,5 pontos

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1990No final de 1990 Vanderlei dos Santos, professor na ETFSC convidou Nunes para dar aulas e organizar a equipe de atletismo de lá. O então Diretor geral, professor Alfeu encampou a ideia. O Colégio de Aplicação aceitou e a transferência se efetivou como professor na Escola Técnica Federal de Santa Catarina.Seguiu treinando atletas na pista da UFSC e passou a organizar a equipe de Palhoça. Não cobrava nada. Era apenas uma forma de lutar contra os seus oponentes na Prefeitura de Florianópolis. Os atletas que treinavam com Nunes competiam pelo IEE nos campeonatos estaduais e por Palhoça nos Jogos Abertos de Santa Catarina. Alguns desses atletas, eram Marcelo Arenhart (Salto em Altura), Alexandre Leite168 (400 metros) e Jair VenturaNunes ainda trabalhou como professor, fazendo trabalho social, com idosos, usuários de drogasNaquele período Nunes havia começado a atuar também como preparador físico de tênis e personal treiner, tendo entre outros clientes o Fernando Marcondes de Mattos (à época, secretário da Fazenda de SC), importante economista e político de SC, então com 52 anos, que passou de 79 para 70kg e acabou participando da Corrida de São Silvestre, de 1991 (com a média de 5min15 por km). A participação dele na corrida rendeu algumas aparições na mídia, inclusive televisão.Quando começou a treinar com Nunes o problema de Marcondes era descontrole sobre o ritmo de corrida. Saia muito forte e não aguentava o ritmo. Mas era muito dedicado. Treinava todos os dias. Chegou a subir

168 Campeão dos 400m por Palhoça227

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o Morro da Cruz em várias ocasiões. Metade da subida correndo, a outra metade andando. Em uma ocasião, num treinamento excepcional, foram da casa dele, na Beira Mar até o Costão do Santinho (cerca de 34 km).

MAIS UMA AVENTURA NA POLÍTICAEm 1992 o professor Nunes concorre a vereador, nas eleições municipais, pelo PDT. O partido não tinha candidato próprio para prefeito de Florianópolis. Apoiou o candidato do PCdoB, Sérgio Grando, tendo como vice Afrânio Boprê.Grando venceu a eleição. Nunes fez 365 votos. Mais votos do que na primeira tentativa, em 1988. Mas ainda insuficiente para ser eleito. Novamente, sem investimentos, sem cabos eleitorais, sem bandeiras na rua… Nada. Ficou em 7º lugar na listagem do partido, que elegeu 3 vereadores.Nessa segunda eleição Nunes já estava mais tarimbado. Mais calejado. Menos inocente. Mas isso não o impediu de cometer ainda alguns erros de avaliação. Achava, por exemplo, que conquistaria um número superior ao dobro da votação conseguida na eleição de 1988 (tinha conseguido 321 votos). Acreditava que faria algo em torno de 650 votos. Acreditava que o seu nome, a sua imagem e a sua história de atleta e de treinador poderia fazer a diferença numa eleição geral.Mas Nunes estava havia algum tempo fora dos holofotes. Havia mais de dez anos que deixara de participar de corridas e ganhar medalhas e troféus. Como treinador de atletismo também já fazia algum tempo que estava fora das disputas importantes e de grande visibilidade.A eleição de determinados candidatos patrocinados por empresas, famílias ou grupos fez Nunes perder um pouco da inocência e perceber que o jogo era outro. Que ele ainda não havia entendido completamente as

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regras que incluem dinheiro, oportunismo, falsidade, traições, etc.No entanto, entre 1988 e 1992, Nunes esteve envolvido em diversas atividades sociais. Organizava a Associação de Corredores de Rua, trabalhava em entidades sociais, ajudou a organizar a corrida contra o tabagismo (precursora da Comissão Estadual AntiFumo) Participou de campanhas de prevenção a AIDS e outras coisas do gênero. Também dava palestras nas aulas de sociologia do Colégio Bardall.Nunes utilizou apenas 5 mil santinhos, fornecidos pelo partido. Não achou necessário fazer mais do que aquilo. Ganhou, de uma empresa (cujo proprietário era um amigo, ex-atleta), 200 camisetas para a campanha. Mas as camisetas foram roubadas de dentro do carro, num incidente curioso: o ladrão não levou equipamento de som, não pegou dinheiro (algumas notas, o equivalente a 100 dólares) não pegou mais nada. Apenas as camisetas da campanha. As camisetas apareceram num desfile de sete de setembro, no ano seguinte: Nunes viu uma mulher, com seus dois filhos, todos estavam vendo o desfile e usando as tais camisetas…

UM SONHO LOGO ALIDezembro de 1992, logo depois das eleições começou em clima de negociações em torno dos cargos e funções da nova administração municipal. Sérgio Grando vencera as eleições e o PDT havia feito três vereadores. Nunes ainda era o vice-presidente do partido.Numa quarta-feira foi realizada uma reunião, na casa do prefeito eleito, Sérgio Grando, no Estreito, onde Grando afirmou que “a fundação deve ser do Professor Nunes”. Nunes finalmente realizaria um grande e antigo sonho: ser o superintendente da Fundação Municipal de Esportes. Não cabia em si de felicidade. Saiu anunciando o fato, convidando os amigos para a posse.No dia seguinte haveria um evento, no Centro Agrotécnico da UFSC, programado para ser a

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apresentação dos secretários e diretores de secretarias. Nesta reunião seriam discutidas as primeiras ações do novo governo. Nunes passou aquela noite preparando a sua apresentação de planos e metas para a Fundação.Porém, Neste curtíssimo tempo de menos de 24 horas houve uma reviravolta. Motivados por ajustes políticos Sérgio Grando e Manoel Dias fizeram uma manobra e entregaram a FME para o PCdoB. Quando Nunes chegou para o evento, na quinta-feira, foi recebido por Sérgio Grando, ainda na porta. “Nunes, infelizmente você não vai participar da reunião de hoje. O Manoel Dias não te falou?” “Falou o quê? Não tô entendendo”“A Fundação teve de ser dada para o PCdoB, Nunes. Eles participaram da aliança e não tiveram nenhum cargo. Isso é uma coisa que está acima da nossa decisão. A gente vai ver uma outra coisa pra você, Nunes. Fica tranquilo.”Mas Nunes não queria outra coisa. Outro cargo não interessava. A única possibilidade que ele via de poder fazer alguma coisa pelo atletismo, naquele momento, seria como Superintendente da FME.O cargo havia sido dado a Luiz Henrique da Costa, um político filiado PCdoB, sem nenhuma história com o esporte.Nunes não sabia como lidar com aquela situação. Não se conformava em não ter nenhum dos seus esforços recompensados. Sentia-se traído pelas pessoas sobre as quais havia depositado total confiança. Questinou a importância dos seus resultados como atleta e como treinador. Nada valia nada. Absolutamente nada! O esforço na campanha. Os custos pessoais que havia assumido, as contas que pagou do próprio bolso. Nada, nada, nada!Foi uma situação terrível, ridícula, vexatória. Nunes jurou que nunca mais se envolveria em política. Nunes

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fechou-se, completamente. Não conversou com ninguém durante vários dias. Fez um balanço da sua vida desde que chegou em Florianópolis, no final de 1968. As dificuldades daquele primeiro ano, trabalhando como carregador de móveis na Modelar; os dois anos que passou no Exército, os títulos conquistados naquela época; a superação no supletivo (Madureza Ginasial e Colegial), os quatro vestibulares que ele fez e passou (Santos, Udesc, Joinville e Furb); a formatura em Educação Física, a faculdade de Administração Escolar, a Faculdade de Pedagogia, a pós graduação em Educação Física, os inúmeros cursos que fez, os seminários de que participou…Nunes pensou na família. Na mãe, nos irmãos, no progresso que eles tiveram. Todos estavam bem. Nenhum deles se perdeu para a droga nem para a marginalidade. Todos estudaram, todos trabalhavam e podiam se sustentar (conforme ele e Elvira planejaram 15 anos antes). Pensou no período de ascenção como atleta e treinador: foram quase dez anos subindo sempre. Depois vieram os problemas com os dirigentes, com os outros treinadores e até com alguns dos seus próprios atletas. Nunes não via reconhecimento para seus esforços.Veio a política, e com ela, a esperança de um novo caminho por onde muitas coisas poderiam ser enfrentadas e resolvidas. Mas a política também o havia traído. Três vezes. Nunes estava muito desiludido. Desiludido com o atletismo, desiludido com o esporte em geral e, acima de tudo, desiludido com a política.No fim, tomou uma decisão radical: iria embora de Florianópolis e abandonaria o Atletismo, definitivamente.

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1993Elvira nunca gostou da participação de Nunes na política. Mas ajudava como podia. Se era um sonho dele. Ela fez o que podia para que desse certo.Em cada campanha sobravam contas a pagar. Os políticos sempre diziam que podia fazer santinho, podia confeccionar camisetas. Podia tudo! Depois que passava a eleição, ninguém mais dava as caras pra pagar as contas.Depois do desastre que foi a primeira campanha, Elvira foi contra a participação de Nunes na segunda, de 1992. Nunes negociou “me deixa tentar mais essa vez. Vai dar certo. Se não der certo dessa vez, eu nunca mais ponho meus pés numa reunião política. Juro!”Combinaram, então, que se ele perdesse a eleição e não fosse nomeado para a FME aceitaria ir para Jaraguá do Sul.Jaraguá do Sul era uma história que já estava sendo discutido fazia uns dois anos, pois dois irmãos de Elvira (Salézio e Célio) que eram empresários e moravam em Blumenau, estavam investindo na compra de algumas salas comerciais em Jaraguá do Sul. Iriam abrir lojas para vender produtos da fábrica que mantinham em Blumenau.A mãe de Elvira, dona Matilde, sempre quis que ela morasse mais perto, e sempre pedia isso para Salézio, que era proprietário de uma fábrica de roupas, “meu filho, quando puder, traz a Elvira para morar mais perto da gente”. Eles sabiam que ela, sozinha não viria, nem pra Blumenau nem pra Jaraguá do sul. Começaram a conversar com Nunes, tentando convencê-lo. Mas Nunes ainda tinha grandes esperanças na política. Isso

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atrasou um pouco a decisão. Agora, depois da decepção de 1992, a hora havia chegado.Elvira queria mudar de profissão, embora gostasse de ser professora. Queria, talvez, manter laços mais fortes com a família. Os irmão tinham feito propostas interessantes para que ela fosse para Jaraguá do Sul, para trabalhar na empresa do irmão. Agora uma solução estava à vista. Quem sabe não valeria o dito popular: “há males que vem para o bem.”

A Kili (empresa textil de Salézio, irmão de Elvira) teria uma loja num Centro Comercial próximo da WEG. Mas a Pacífico Sul, empresa de outro irmão de Elvira (Célio) também tinha uma loja em Jaraguá do Sul. Elvira poderia trabalhar em qualquer uma delas.Nunes avaliou que, se fosse transferido para a Escola Agrícola de Araquari, que era da UFSC169 poderia morar em Jaraguá do Sul (já que a distância170 não seria um grande problema). Ele era muito amigo do Professor Alfeu Hermenegildo, Diretor Geral da Escola Técnica Federal. Foi procurar por ele e abriu o jogo: “professor, eu não aguento mais Florianópolis. Eu gostaria de me transferir para e escola Agrícola de Araquari. A família da minha mulher tem negócios em Jaraguá do Sul e nós podemos morar lá. Eu vou todos os dias até Araquari dar aulas ou treinos, sem problemas.”O professor Alfeu viu ali uma oportunidade. O Programa de Expansão e Melhoria do Ensino Técnico, criado pelo Governo Federal (Itamar Franco), atribuiu à Escola Técnica Federal de Santa Catarina a tarefa de implantar unidades de ensino descentralizadas em cidades do interior do estado. Esse trabalho culminou em 1998 quando foi criado o Sistema ETF/SC, constituído por três unidades de ensino: Florianópolis, São José e Jaraguá do Sul, mais a Gerência Educacional de Saúde de Joinville.

169 As escolas Técnicas não eram autônomas. Pertenciam à administração das Universidades Federais

170 Cerca de 38 km.234

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Depois de alguns dias o professor Alfeu deu sua resposta “professor Nunes. Gosto muito do Senhor. Mas não vou lhe dar a transferência”Nunes gelou. Pensou “agora acabou meu casamento!” À essas alturas Elvira já estava determinada a não ficar em Florianópolis de jeito nenhum, por muitos motivos. Principalmente por conta das coisas que haviam acontecido depois do envolvimento de Nunes na política.Ainda perplexo, Nunes ouviu Alfeu continuar: “Professor, eu vou lhe ceder para Araquari, com ônus aqui para Florianópolis. Porque eu quero que o senhor permaneça nos quadros da Escola Técnica Federal. Quando chegar a hora, quero que o senhor vá trabalhar conosco na montagem da Escola Técnica de Jaraguá do Sul”Nunes não sabia ainda, mas estava em vias de ser aprovada a criação de uma unidade da Escola Técnica Federal em Jaraguá do Sul. O professor Hermenegildo então lhe deixou a par de como a coisa já estava bastante adiantada. Era praticamente fato consumado. Mas faltavam alguns detalhes e acertos.A Escola Técnica de Jaraguá do Sul faria parte da estrutura da Escola Técnica de Florianópolis e, por isso seria importante ter alguém que já estivesse morando em Jaraguá do Sul cuidando pessoalmente de tudo, quando a coisa começasse, pra valer.Aquilo deixou Nunes muito feliz e entusiasmado. Uma boa notícia, finalmente! Além de tudo, seria possível compatibilizar os horários de tal maneira que iria de Jaraguá do Sul para Araquari nas tardes e noites.Assim, Em 1993 Elvira pediu licença não remunerada para dedicar-se ao trabalho com os irmãos em Jaraguá do Sul. E, no dia 19 de março de 1993 Foi publicada no Diário Oficial do Estado de SC a portaria de exoneração de José Maria Nunes da condição de professor do Instituto Estadual de Educação. Nunes já não era professor do Instituto. Havia solicitado licença sem

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vencimentos em 1987, quando optou pela dedicação exclusiva ao trabalho no Colégio de aplicação.Quando Nunes foi morar em Jaraguá do Sul a única da família que ainda morava com eles era Neuza. Mas ela estava noiva e iria casar em breve. Então, quando Nunes foi para Jaraguá, Neuza foi morar com a mãe até o casamento que ocorreu meses depois.Nunes foi para Jaraguá do Sul em março, ficou uns dias num hotel e, em seguida, alugou um apartamento no Edifício Masurech. Moraram nesse apartamento até setembro, quando mudaram para a casa que haviam comprado, na rua João Planischek.Enquanto aguardava a inauguração a loja da Kili no Centro Comercial CEPROM, que estava sendo construído, próximo à WEG II, Elvira foi trabalhar na loja da Pacífico Sul que ficava no Portal de Jaraguá. Nunes ia para Araquari todos os dias.((Jossinei. Como foi a mudança para Jaraguá do Sul. Como você e seus irmão reagiram àquilo?))

O CHAMADO E A MISSÃOTudo corria perfeitamente bem. Nunes estava perfeitamente ajustado com as aulas em Araquari. Todos gostavam dele e ele gostava de todo mundo. A vida parecia estar voltando para os eixos. Mas. num dia de abril de 1994, Nunes recebeu, em Araquari, o aviso de que estava sendo chamado em Florianópolis para uma reunião na Escola Técnica Federal. Ficou momentaneamente em pânico. Não queria voltar para a capital. Já estava com as coisas muito bem arranjadas em Jaraguá do Sul. Gostava do trabalho em Araquari. Gostava de morar em Jaraguá do Sul. Os filhos já estavam ajustados em escolas da cidade. Elvira já estava perfeitamente adaptada no novo trabalho. Não era uma boa hora para mudanças.Seguiu para Florianópolis imaginando mil possibilidades e as reações que teria, para poder preservar sua situação. Chegou na Escola Técnica e foi recebido pelo

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professor Alfeu Hermenegildo, que já foi logo dizendo, com seu jeitão despachado: “Professor, Nunes. O senhor quer trabalhar conosco em Jaraguá do Sul?”“Quero, claro”, respondeu, aliviado José Maria. Alfeu continuou: “é o seguinte: nós vamos abrir em Jaraguá do Sul uma unidade descentralizada, como já existe em São José. É uma forma de criar um fato consumado e acelerar a criação da Escola Técnica lá.”“E é o seguinte:” continuou o professor Alfeu “O senhor não vai ser professor. O senhor vai ser o nosso DIRETOR!”. Alfeu falou assim mesmo, como se todas as letras estivessem em maúsculas.Nunes ficou perplexo (e muito feliz, claro). Nem lembra se disse sim. Se aceitou, formalmente ou se a sua cara de alegria foi a resposta que o Professor Alfeu tomou como um sim. Naquele momento Nunes se deu conta de que militou por anos e anos em partidos de esquerda e, finalmente, um reconhecimento ao seu trabalho vinha de uma liderança do PFL, um partido de direita.(((Alfeu, certamente pretendia alçar voos mais altos (talvez ser candidato a deputado estadual ou coisa assim) e sabia que seria bom ter simpatizantes em toda parte.)))Pelo acordo proposto pelo governo federal, os municípios beneficiados teriam de ceder as instalações. Jaraguá do Sul estava fechando o CEDUP, um Centro de Educação Profissionalizante do governo do Estado. Houve algumas negociações e o governo do estado de SC aceitou ceder as instalações do Cedup para a criação da futura Escola Técnica. O processo foi oficializado no final de abril de 1993, quando a doação foi publicada no Diário Oficial.No mês de maio o Ministro da Educação esteve em Brusque. Na ocasião, entre outras coisas, ele iria assinar as portarias ministeriais criando as unidades para aquelas cidades onde as doações já haviam sido concretizadas. O professor Alfeu determinou que Nunes

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estivesse presente, para prestigiar o evento e manter-se informado de tudo. Depois que o ministro assinou a portaria, Nunes aproximou-se, pegou o documento assinado, da mão do ministro, e conseguiu uma cópia da portaria para levar consigo para Jaraguá do Sul e, posteriormente, para Florianópolis. Aquilo era uma “medalha. Um“troféu”.Quando a portaria foi publicada no diário oficial, o professor Alfeu disse, “Professor Nunes, a coisa agora está nas suas mãos. Nós confiamos no seu talento e na sua capacidade. Nos dê uma grande Escola Técnica!”Nunes tinha um handicap, que era o fato de ter se formado em Administração Escolar. Os conhecimentos obtidos na faculdade finalmente seriam muito úteis. E o professor Alfeu contava muito com isto, assim como contava que a marca “José Maria Nunes” haveria de abrir portas na comunidade de Jaraguá do Sul.

COLOCANDO A CASA EM PÉCom a portaria em mãos, Nunes começou a peregrinação em busca de obter a estrutura mínima para que a escola se tornasse uma realidade. Já tinha o espaço físico. Faltavam três coisas: equipamentos, professores e alunos.A previsão de início de atividades era para julho daquele ano. Nunes tinha pouco menos de três meses.A primeira coisa que Nunes fez foi buscar uma reunião com Vicente Donini, então presidente da Associação Comercial e Industrial de Jaraguá do Sul, que era a instituição mais forte da região, com poder econômico e político superior até a certos órgãos de governos. Donini recebeu Nunes muito bem. Ele já estava perfeitamente inteirado do assunto. O tema “Escola Técnica” era recorrente nas reuniões da ACIJS. Donini já tinha feito muitas visitas à Escola Técnica Federal, em Florianópolis e tinha acompanhado de perto as tramitações que resultaram na doação do imóvel do Estado para a Federação.

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Donini era um lutador incansável pelo ensino técnico. Tinha dois filhos (Giorgio e Giuliano) egressos da Escola Técnica federal do Paraná. Sabia muito bem do que estava falando.Além disso, Donini tinha sido um praticante de esportes e frequentador de Jogos Abertos de Santa Catarina. Conhecia, ou melhor já tinha visto e ouvido muitas coisas sobre Nunes. Sabia que ele tinha sido um atleta de ponta, altamente competitivo. Mas nunca tivera, antes, a oportunidade de um encontro pessoal. Aquela visita propiciava essa oportunidade.Assim, do seu jeito objetivo, logo que terminaram as apresentações Donini foi direto ao ponto e perguntou simplesmente, “Professor Nunes, do que é que você precisa para fazer a escola funcionar?”Nunes percebeu que tinha de ser claro e objetivo. Então respondeu, “Seu, Vicente, eu preciso de duas coisas: primeiro, preciso lançar um panfleto, para ser distribuído nas escolas, com o objetivo de convidar alunos e montar a primeira turma para o cursoDonini aprovou a impressão dos panfletos de divulgação da nova Escola Técnica. Foram impressos cerca de 15 mil. Nunes foi, com seu próprio carro, de escola em escola, divulgando o novo curso.O segundo pedido feito para Vicente Donini foi que ele usasse o prestígio da ACIJS e o dele próprio (como empresário de sucesso) para ajudar a convencer a prefeitura a ceder os professores para o primeiro semestre, uma vez que a Escola Técnica Federal de Jaraguá do Sul ainda não tinha quadros próprios. Donini também ajudou como pode nesse pleito.Nunes talvez pudesse até ter pedido mais coisas se tivesse noção do nível de comprometimento de Vicente Donini com aquela causa. Para Donini o ensino básico e o profissionalizante deveriam estar no topo das atenções dos governantes. Foi por insistência dele, acompanhado dos Presidentes das ACI’s de Blumenau, Brusque, Joinville e São Bento do Sul, tinha visitado

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recentemente a Câmara de Artes e Ofícios de Munique e Alta Baviera, escola profissionalizante de excelência, para conhecer o modelo de ensino e tinha conseguido firmar convênio para implementá-lo nas respectivas ACI’s de forma exitosa.De qualquer forma, Nunes conseguiu o que queria e precisava da ACIJS, naquele momento. A segunda pessoa a ser procurada foi Décio Silva, Diretor da WEG, grande fabricante mundial de motores elétricos e outros produtos eletrotécnicos. Décio também foi muito receptivo. Lembrou de alguns anos antes (final dos anos 1970), quando era estudante de Engenharia Mecânica na UFSC. Décio era atleta (jogava futebol) e acompanhava com atenção e interesse os resultados dos Jogos Abertos. Nunes era uma estrela naquele universo esportivo. Ter a oportunidade de, finalmente, conhecer aquela “celebridade” foi um prazer para o ocupado dirigente empresarial.Nunes relatou que tinha as salas de aula, mas não tinha os equipamentos para fazer a escola funcionar. Além disso, tinha um grande problema. A instituição que funcionara no local até que o prédio fosse assumido pela Escola Técnica não estava pagando as contas de energia elétrica. E havia a possibilidade de a CELESC cortar a ligação. Isto era preocupante. Décio se comprometeu a tratar disso. Iria conversar com os diretores regionais da Celesc e resolveria isso. De fato, resolveu. A luz nunca foi cortada.A WEG, empresa dirigida por Décio, tem um histórico de amor pelo ensino técnico. No final dos anos 1960 os três fundadores fizeram uma viagem a Alemanha onde foram participar de uma feira e visitaram uma grande fábrica. Num determinado departamento viram uns meninos bem novinhos trabalhando em bancadas com peças mecânicas. Ficaram curiosos. “Quem são esses? que departamento é esse aqui?”Foi aí que os alemães explicaram que aquilo ali era uma unidade de ensino técnico. Que uma empresa precisa

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criar o seu próprio celeiro de profissionais.Os três voltaram encantados com a ideia. e não sossegaram enquanto não criaram o Centro de Treinamento da WEG (conhecido como “a Escolinha da WEG”) onde alunos do final do ensino fundamental e início do Ensino Médio começam a aprender uma profissão técnica. O próprio Décio foi aluno, assim como milhares de empregados da própria WEG e muitos empresários e industriais da região de Jaraguá do Sul.A Escolinha da WEG (o CentroWEG) foi fundado em 1968. Em 2016 tinha 265 alunos. De 1968 até 2015 formou 3.350 alunos. Logo depois de cada formatura é normal que 98% dos egressos sejam contratados pela empresa. Desses 3.350 egressos, 52% permanecem na WEG até hoje. E, desses, 8% viraram gestores e 37% tornaram-se analistas, projetistas ou outros cargos técnicos. Numeros impressionantes, sem dúvida.Décio, portanto, era mais um que sabia bem do que se tratava quando foi procurado por Nunes. Numa das muitas conversas que tiveram depois disso Décio sugeriu que a formatação do curso levasse em conta as questões típicas do trabalhador de Jaraguá do Sul, inclusive os horários dos turnos de atividades nas fábricas. Assim, depois de analisar muito bem esses parâmetros, Nunes concluiu que deveria haver duas turmas, uma de tarde e outra de noite.Além da questão da conta de energia elétrica Décio contribuiu, também, com móveis (mesas e carteiras) para a montagem da primeira sala de aula, o que permitia que fosse montada as primeiras duas turmas (vespertino e noturno) do primeiro ano (na verdade, primeiro semestre).Mais tarde, e ao longo de muitos anos, a WEG continuou colaborando com a Escola Técnica, fazendo doações de equipamentos e até mesmo de laboratórios completos para os cursos de Textil ou de Mecânica.A luta pela Escola Técnica em Jaraguá do Sul vinha de muitos anos. E, mesmo depois de a escola estar

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instalada os empresários locais buscaram formas de expansão da coisa. Numa ocasião, em 1997 o ministro da Educação de Fernando Henrique Cardoso, Paulo Renado de Souza recebeu, em Brasília, o prefeito de Jaraguá do Sul, Geraldo Werninghaus, acompanhado de Vicente Donini, Décio Silva e outros empresários que foram solicitar mais investimentos no ensino técnico em Jaraguá do Sul.Paulo Renato então falou de um novo plano de escolas técnicas comunitárias onde o governo entra com as instalações e a sociedade entra com a organização e a gestão. A escola não seria pública, mas, em função desse modelo de investimento do governo, um percentual considerável dos alunos deveriam ter bolsa integral.O resultado, em Jaraguá do Sul foi a instalação da Politécnica Geraldo Werninghaus. O governo federal entrou com o aporte de ativos fixos e as organizações sociais da comunidade cuidavam da gestão e direção.Para dirigir essa nova instituição foi chamado o professor Alfeu Ermenegildo, que tinha sido diretor Geral da escola Técnica Federal de Santa Catarina, em Florianópolis e que já estava aposentado.Mais tarde, a Politécnica passou a integrar o IFSC compondo o segundo campus de Jaraguá do Sul, mantendo o nome Geraldo Werninghaus.

A terceira investida de Nunes foi a Prefeitura de Jaraguá do Sul, que teve uma participação muito especial. O prefeito, na época, era Durval Vasel.O pedido de Nunes era inusitado: precisava de professores! A Escola técnica não tinha professores. A formação de quadros era um processo que dependia de certa burocracia e, naquele primeiro momento a escola não dispunha de um único professor. O professor Alfeu sugeriu que Nunes buscasse convênios com prefeituras ou com o governo do estado. O que fosse possível. Nunes pediu os professores ao prefeito Vasel.

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Vasel atendeu o pedido. Era uma coisa boa para a cidade. A prefeitura recebia esse tipo de demanda por parte dos empresários. E a quantidade de empresas no município com demanda por mão de obra técnica qualificada era muito grande. A Escola Técnica Federal era algo que precisava receber incentivos. Os professores e funcionários foram cedidos pela prefeitura nun convênio com duração prevista para um semestre. Eram professores das disciplinas de Matemática, de Física, de Química, Português, Inglês, História, Geografia. Nunes assumiu as aulas de Religião e de Filosofia. A prefeitura cedeu ainda dois funcionários para atuarem na secretaria da escola.Nunes estava se sentindo em casa na Escola Técnica Federal. Estava numa cidade onde a cultura do ensino técnico tinha mais de vinte anos e estava bem fortalecido pelos resultados. E contava com o apoio de muita gente, além de um bom time de professores e auxiliares.No início de 1995 Escola Técnica (de Florianópolis) já forneceu móveis, materiais e equipamentos para a montagem das salas de aula necessárias para a abertura da segunda turma. Nesse período houve, também, a troca do diretor geral da ETFSC. O professor Alfeu foi substituído pela professora Solir de Carvalho. Nessa mudança o concurso para preenchimento de vagas para professores e outros quadros da Escola de Jaraguá do Sul simplesmente não foi realizado. A ETFSC, então, abriu concurso emergencial para contratação de professores em caráter temporário. Alguns dos professores da prefeitura se interessaram por essas vagas. Uma dessas foi a professora Eliane, que mais tarde foi Diretora de Ensino da escola. As vagas de Jaraguá do Sul também tiveram o interesse de professores que haviam feito concurso para trabalhar em Florianópolis ou em outras unidades da ETFSC mas que ainda não haviam sido contrtados. E assim, depois de dois ou três anos o quadro estava completo.

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Nunes criou, logo que a escola começou a funcionar, a Associação de alunos e Professores. Um dos objetivos era fazer a manutenção de coisas triviais, como papel higiênico, serviços de limpeza, segurança.Na avaliação geral de Décio Silva, aquele jeito simples de ser do professor Nunes ajudou Nunes a conquistar espaçosUm incidente ocorrido no final das férias de verão, no início de 1995, dá uma ideia de como a Escola Técnica Federal já estava integrada nos interesses da cidade. O local foi vítima de ladrões. Numa determinada noite invadiram a escola e roubaram uma máquina de escrever, um aparelho de vídeo-k7 e um aparelho de TV.Nunes foi nas emissoras locais de rádio (Rádio Brasil Novo e Rádio Jaraguá), relatou o fato e fez um apelo à consciência dos ladrões e receptadores: “a pessoa que fez isso, ou as pessoas que de alguma forma contribuiram para isso, por exemplo, receptando o material roubado, estão tirando dos estudantes, muitos deles pobres, a possibilidade de ter aula, de obter formação e de ter alguma oportunidade de melhorar a vida”Dois dias depois Nunes recebeu um telefonema anônimo de uma pessoa que disse “Olha: se você não comunicar para a polícia, pode vir buscar o equipamento, em tal lugar, assim e assim…” Nunes foi. Encontrou uma pessoa de carro e recebeu todo o material de volta.Depois desse episódio Nunes pediu que João Laurindo passasse a dormir na Escola técnica, como uma espécie de vigia.João Laurindo era um jovem atleta de Tubarão que treinava e morava com Nunes em Florianópolis e agora tinha ido morar em Jaraguá do Sul, para continuar treinando com ele. Era, na verdade, mais um dos muitos casos de pessoas que foram “adotados” por Nunes e ajudados por ele por longos períodos da vida.

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Ficou em Jaraguá do Sul por algum tempo. Iniciou a faculdade de Educação Física (que concluiu em Criciúma) e seguiu uma vida bem sucedida.Mas ainda lembra das noites que dormiu num colchão, no piso de uma sala de aula da Escola Técnica Federal, fazendo o papel de “segurança” contra os vândalos e ladrões.Nunes permaneceu como diretor da Escola Técnica Federal de Jaraguá do Sul até junho de 1997, quando foi substituído pelo professor Edilson Bóries Tarachucky (formado pelo CTIC, no Rio de Janeiro), que já era um dos professores do quadro da ETFSC de Jaraguá. Nunes ainda seguiu na escola, por mais seis meses, como professor de Filosofia e de Religião, enquanto aguardava o processo de aposentadoria por tempo de serviço.Aquele foi, sem dúvida, um dos trabalhos mais importantes e mais bem sucedidos que Nunes teve na sua carreira profissional. A Escola Técnica Federal, hoje IFSC, trouxe muita coisa boa para a cidade de Jaraguá do Sul. Em pouco mais de 20 anos tem hoje um legado de mais de 5000 formados no ensino técnico na região. Pessoas importantes, em cargos importantes da cidade são egressos do IFSC.

A MORTE DO PAIJoão Maria, o pai de José Maria, morreu em 1995. Ele havia tido um AVC em 1979. Foi quando Nunes trouxe a família do sítio do professor Arruda para a casa de Palhoça. João Maria nunca se recuperou muito bem. Mas seguiu com uma vida tranquila. Acordava cedo, tomava seu café “serrano” sempre com um salgado de preferencia uma carne frita feita pela mulher, Reasilva. E depois passava boa parte do dia na frente de casa olhando quem passava, conversando com um e com outro amigo, tomando seu chimarrão. Adorava quando encontrava um amigo disposto a ouvir os causos de quando ele era mais novo “lá em Campos Novos”.

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Conseguia mexer os braços e pernas, mas nao tinha mais força principalmente nos braços e nas mãos. Não teve sequelas na fala, mas perdeu forças nas pernas. Andava pouco e não podia ficar muito tempo em pé. A vida, assim, durou mais uns 15 anos. Veio a falecer em 29 de outubro de 1995. Deu tempo de ver todos os seus filhos se tornarem adultos. Todos saudáveis e todos honestos. Os mais novos foram os que mais sentiram com a morte do pai. Justamente porque, por caminhos tortos, foram os que tiveram a oportunidade de conviver com ele por mais tempo.Na ocasião Nunes teve licença da Escola Técnica e foi ajudar Sebastião, que estava cuidando de todos os assuntos.

ACADEMIA LIFE - UMA AVENTURA EMPREENDEDORAAs lojas da Kyly e da Pacífico Sul de Jaraguá do Sul faziam parte de um boom de lojas de fábrica que existiam em grandes centros comerciais de Brusque e Jaraguá do Sul, no final dos anos 1980 e início dos anos 1990.Em 1990, logo que chegou à presidência da república Fernando Collor lançou mão de um ambicioso programa de abertura de sua economia capitaneado pela redução de barreiras e tarifas de importação. Aquelas medidas econômicas causaram profundas alterações na indústria textil brasileiras. Muitas empresas quebraram outras tiveram de promover reestruturações. No caso da Kyly e da Pacífico Sul, não houve quebra, mas as empresas resolveram, depois de algum tempo, encerraras as lojas de Jaraguá do Sul.Nunes e Elvira já estavam prestando atenção em outras possibilidades e Salézio Martins, dono da Kyly e irmão da Elvira, manifestou interesse em fazer algum negócio com Nunes, em Jaraguá do Sul.Nunes avaliou que havia poucas academias de ginástica em Jaraguá do Sul com piscinas para treinamento. Ele comparava com o número de academias que existiam

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em Florianópolis. E só uma delas tinha natação. Propôs o negócio para o cunhado. Salézio topou.Mas tinha um problema. Nunes tinha seus compromissos com a Escola Técnica, que eram a sua prioridade. Nunes tinha as manhãs livres (uma vez que o seu trabalho na Escola Técnica ocupava suas tardes e noites). Podia, portanto, dar algum atendimento, dar algumas aulas e, naturalmente, emprestar a ainda prestigiada marca pessoal “José Maria Nunes” para o sucesso do empreendimento. Mas a sociedade empresarial, no fim das contas, teria de ser feita (e foi) entre Envira e Salézio.Nunes procurou um lugar e descobriu uma casa à venda, onde já havia uma piscina. O cunhado então comprou a casa. Iniciou-se uma reforma, uma empresa foi contratada para fazer a cobertura da piscina pequena e a academia ficou pronta para começar a funcionar em julho de 1995.Em março de 1996 foi inaugurada a nova piscina. Era a primeira piscina de lona de Jaraguá do Sul. Tinha quatro raias de 25m e duas de 12,5m. Uma beleza! E era aquecida a gás, com equipamentos importados de última geração. O público de usuários da academia aumentou consideravelmente.Como a piscina era aquecida e Nunes ficou sabendo que alguns atletas da Fundação Municipal de Esportes tinham dificuldades para treinar — especialmente nos meses mais frios, Nunes cedia a piscina para o treinamento deles. Não havia nenhuma contrapartida especial nem convênio convênio firmado com a FME ou com a Prefeitura. Era apenas o “jeito José Maria Nunes de ser” se manifestando.Nos primeiros meses (1995 e 96) a academia teve um bom funcionamento e excelente resultado, muito em função do efeito novidade. Mas, no fim das contas, no decorrer dos anos a Academia Life nunca foi totalmente lucrativa.

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A academia funcionava com bom movimento em março, abril, maio. Depois o movimento diminuia em junho, julho e agosto, por causa do frio. O movimento volta forte em setembro, outubro e novembro, mas para novamente em dezembro (por conta de que as pessoas têm outros afazeres). E, em janeiro e fevereiro muita gente (do público de interesse da academia) estava em férias ou em outras atividades. Portanto, o que dava de resultado positivo nos meses de alta acabava servido apenas para cobrir o vermelho dos meses de baixa. No fim, o máximo que se conseguia era um zero-a-zero.Depois de dois anos Salézio deixou de ser sócio. Nunes se aposentou da Escola Técnica e então passou a trabalhar mais intensamente no novo negócio. Mesmo assim, o negócio da Academia não properou e ela foi definitivamente fechada em 2001.

A PRIMEIRA MARATONADurante o período em que foi diretor na Escola Técnica, Nunes sofria com dores nas costas. Tinha praticamente parado de correr e essas dores são típicas de atletas de alto rendimento quando deixam de treinar forte.Desde aquele acidente doméstico que Nunes sobreu em 1979, quando caiu da cadeira, ele passou a enfrentar essas terríveis dores nas pernas e nas costas. Os seus últimos anos como atleta foram de intenso sofrimento. Depois que ele deixou de competir nos Jogos Abertos e nas corridas mais fortes, ele ainda continuou correndo até por volta dos 42 anos (1991). Mas, naquele período ele já sofria muito. Quando parava de correr por três dias não sentia mais as dores nas pernas. E médico nenhum conseguia fazer um diagnóstico conclusivo. Muitas vezes acordava, duas ou três horas depois de ter dormido, com dores nas costas e nas pernas. Tinha de levantar e fazer alguns exercícios, pra poder voltar a dormir. Nessa época Nunes passou a prestar atenção em todo tipo de solução possível para aquele problema. Ficou

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atento a todas as terapias alternativas que existiam. Em 1995 Nunes foi a Florianópolis para um compromisso na Escola Técnica. Passou por uma rua, no Estreito, e viu uma placa escrito. “ALCIR - Massagens Terapêuticas”. Pensou: será que é o mesmo Alcir que me atendia há uns vinte anos, quando eu era atleta? Nunes resolveu parar para pedir alguma informação. Foi recebido pelo profissional que abriu um sorriso e uma fala mansa, típica dos espiritualistas: “Zé Maria, meu amigo! Tudo bem contigo? Lembra, 1975, quando eu te atendia? Lá perto do Colégio Catarinense? Estava com saudade de você, queria tanto conversar contigo, e agora Deus coloca você no meu caminho… Como vai, meu amigo?” Botou a mão no ombro de José Maria e perguntou “você está com dor nessa sua coluna, não está?”Nunes relatou suas queixas. Alcir ouviu tudo, pacientemente e depois disse “Fique tranquilo. Já vamos resolver isso. Senta aí nesse banquinho”. Fez algumas manobras, torções e depois colocou alguns instrumentos nas costas de Nunes.Puxa daqui, torce pra lá… plac, pléc, pronto! “descansa três dias. Depois pode voltar a correr. Você vai correr uma maratona!”De fato. Nunes ficou em repouso por três dias. Sentia-se melhor a cada dia. No quarto dia voltou a treinar e, por um bom tempo, não voltou mais a ser importunado pelas dores fortes. Nunes tivera, ali, seu primeiro contato com a Quiropraxia.Nunes queria, realmente, correr uma maratona. Era um dos poucos desafios que ele não havia enfrentado no atletismo. Mas, antes, ele não conseguia treinar por causa das dores. E, além disso ele tinha horários de trabalho muito severos. Na academia, chegava super cedo, para limpar a piscina e outros trabalhos e depois tinha de cuidar da Escola Técnica.Mas voltou a treinar e preparou-se, muito rapidamente, para aquele desafio. E assim, no dia 30 de julho de

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1995, com 46 anos de idade, José Maria Nunes correu sua primeira maratona. Foi a Maratona Internacional de Blumenau. Quando começou a se preparar Nunes estava com 74 kg (seu peso normal, quando atleta era de 65 kg ). Conseguiu perder dois quilos, chegou a 72 kg. Quando foi fazer a inscrição na corrida perguntaram em que faixa de tempo ele achava que correria. Ele respondeu “entre 2h45min e 2h47min”. Correu um pouco melhor do que a previsão: fez os 42,195 km em 2h44min53s (com um ritmo médio de 3min54s por km). Foi o 147º classificado no geral e 6º na sua categoria (45 a 49 anos). Um resultado excelente, especialmente para quem, à menos de um ano, praticamente não conseguia mais correr, por causa das dores na coluna.Depois desse episódio Nunes começou a se interessar pelas terapias alternativas. Já em fevereiro do ano seguinte (1996) participou, em Joinville, do “1º Congresso brasileiro de Massoterapia - A saúde pelo toque”. Ficou impressionado com o que aprendeu em apenas 3 dias de contato com aqueles profissionais experientes de todo o país. Depois daquilo começou a procurar e participar desses eventos.Em 1997 participou de um Seminário Sulbrasileiro de Terapias Alternativas, com a participação de mais de 500 profissionais. O evento foi realizado na Expoville, em função do grande número de participantes.Nunes continuou a fazer visitas ao seu amigo Alcir, em Florianópolis. Sentia-se melhor, depois das massagens que ele fazia. E Alcir sempre insistia “Nunes, está na hora de você começar a atuar. Trabalhar com as suas mãos.” Aquela frase era uma semente, germinando na cabeça de Nunes.Depois de participar de alguns seminários e palestras, e estimulado pelo incentivo do amigo Alcir, chegou à conclusão de que poderia se dedicar a esse tipo de trabalho, especialmente na área de massagens. Nunes passou a fazer massagens em esportistas, com técnicas e manobras variadas. Era alguma coisa próxima do que

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se poderia chamar de quiropratia. Mas Nunes, aos 48 anos, ainda tinha muito o que aprender.

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1998Em 1998 Nunes foi, novamente, picado pelo Aedes Politicus, o mosquito da política. Recebeu uma ligação de Esperidião Amin, de Brasília. O então senador pediu que ele se filiasse ao PP em Jaraguá do Sul, pois ele seria candidato a governador e que Nunes certamente participaria do governo dele.Esperidião sempre foi muito convincente. E Nunes sempre gostou muito dele. Tivera um trabalho com Esperidião Amim, no passado, quando ele era prefeito de Florianópolis. Nunes acreditava e confiava nele.Numa sexta-feira, em 1998 foi a uma reunião do PP. Foi muito bem recebido. Os integrantes queriam incluir José Maria na executiva do Diretório Municipal. Nunes recusou. Disse que queria ficar apenas no Diretório e trabalhar no que fosse possível.E assim foi. Nunes ia algumas vezes a Florianópolis, participar de reuniões. Ajudou na construção do projeto de Educação. No geral, como das vezes anteriores, Nunes trabalhou muito e investiu algum dinheiro do próprio bolso na campanha, em viagens e outras despesas.Veio a eleição. Esperidião Amim foi eleito. Mas as esperanças de Nunes de que seria integrado de alguma forma ao governo nunca se concretizaram. Era, na prática, mais uma decepção política.Em 1999 Zé Maria foi convidado por um grupo de dissidentes do PP par formar o PPS e Jaraguá do Sul. O presidente do Diretório Municipal era João Gomes da Cruz, o João do Táxi171. Nunes Filiou-se no PPS e foi vice-presidente do diretório do partido no município.171 Em 2003 João do Taxi mudou-se para a cidade de Ribamar Fiquene, no Maranhão, onde,

usando o apelido de João Lousa, elegeu-se vereador várias vezes. Ver http://oprogressonet.-com/politica/preso-vereador-que-nao-pagou-pensao-alimenticia/26981.html

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Em 2000 Nunes foi convencido pelos colegas a ser candidato a vereador em Jaraguá do Sul172. Apoiou o movimento para que o seu partido, PPS fizesse coligação e apoiasse a candidatura de Cecília Konel e aquela proposta foi a que venceu.As pesquisas internas do partido indicavam que Nunes estava bem posicionado entre os eleitores. Um empresário chamou Nunes (que era vice presidente do PPS) e disse “professor, está muito difícil para o Passold vencer, e nós queremos lhe fazer uma proposta: o senhor não desiste da sua candidatura, nós pagamos todas as suas despesas. Quando faltar 10 dias, o senhor sobe no nosso palanque e declara que não apoia mais a Cecília. Mas vai para a eleição. Depois da eleição haverá compensações. O senhor poderá ser um bom secretário para o município”Nunes respondeu “Meu amigo. Eu fui professor das suas filhas e dos seus sobrinhos. Se um dia as suas filhas ou os seus sobrinhos me encontrarem na rua, eu tendo feito uma coisa dessas, o que eles vão dizer de mim? Vão dizer que eu me vendo. Eu não quero isso pra mim. Quero andar em linha reta nesta cidade. Sendo assim, eu prefiro perder a eleição do que fazer o que o senhor está me pedindo. Nossa amizade continha. Esse assunto morre aqui. Mas não vai ter acordo nesses termos”Cinco dias depois a candidatura de José Maria Nunes foi questionada na Justiça eleitoral, sob a alegação de que ele tinha dupla filiação partidária. Aquilo não era verdade (como se comprovou mais tarde) mas, mesmo assim, a sua candidatura foi cassada pela juiza.O advogado do partido demorou muito para entrar com o recurso. Depois que o recurso foi para Florianópolis, alguém pediu vistas. Haveria mais 15 dias de prazo. No final o julgamento foi 7 x 0 pró Nunes. Mas o processo já havia feito seu estrago, consumindo mais de 60 dos 172 Nota do autor: foi nesta ocasião, numa reunião na casa de uma jornalista, em Jaraguá do

Sul, que surgiu a ideia de escrever a biografia de José Maria Nunes. Eu comecei a juntar informações para fazer um breve currículo para um Jornalzinho da campanha. Então percebi a quantidade de informações valiosas e de histórias interessantes para serem contadas.

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90 dias de campanha que Nunes teria. A candidatura, afinal, foi liberada no dia 6 de setembro. A campanha seria encerrada no dia 27.Foi um sufoco. Nunes mandou refazer os “santinhos” já que os que foram produzidos pelo partido vieram com erros de português. Nunes não tinha um comitê. Durante aquele período de campanha suspensa, alguns amigos ou conhecidos de Nunes que já estavam colocando em suas casas as placas de divulgação da candidatura dele foram abordados por outras pessoas do partido, mostrando o documento da justiça eleitoral, e dizendo que não adiantava deixar placas do José Maria Nunes, porque a candidatura dele estava impugnada. E aí negociavam a troca pela placa de outro candidato. Só quando faltavam duas semanas para a eleição Nunes foi alertado. Um amigo disse “professor, o senhor está fazendo campanha, mas esteve aqui ontem uma pessoa que disse que a sua candidatura foi impugnada. Mostrou um documento e tudo.” Nunes foi no diretório, exigiu providências e o “fogo amigo” foi encerrado. Naquelas eleições de 2000 o PPS, por 29 votos, não conseguiu eleger um vereador. O mais votado foi o presidente da executiva municipal, João do Taxi, que obteve 720 votos. O segundo foi Vicentino, com 341 votos. Nunes fez 331 votos e foi o terceiro mais votado do PPS no município.Logo depois das eleições de 2000 Nunes se desfiliou do PPS e permaneceu longe da política por muitos anos. Mas, em 2011 foi convidado por alguns líderes locais e filiou-se ao Partido dos Trabalhadores, PT. O grupo queria alguém que pudesse ser pré candidato a Prefeito. Nunes ficou entusiasmado com a ideia. Colocou-se “à disposição do partido”.Mas, em 2012, quando a campanha já estava se avisinhando, esse mesmo grupo decidiu que era mais negócio apoiar o candidato do PP, Dieter Janssen. Ofereceram a Nunes a possibilidade de ser candidato a

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vereador. Nunes não quis. Fora convidado para ser pré candidato a prefeito. A disputa da eleição para vereador não interessava mais.No final das contas Dieter Janssen foi eleito, com o apoio do PT.Mas a insistência de Nunes em participar de campanhas políticas já tinha feito estragos até mesmo no seu casamento. Elvira, como já foi dito, nunca concordou com aquilo. Ajudou como pode nas campanhas, principalmente em Florianópolis, mas achava um absurdo que ele ainda acreditasse naquela gente. Aquilo era, frequentemente, motivo para discussões e desentendimentos.Naturalmente o casamento de Nunes e Elvira tinha outros problemas e eles resolveram se separar, no final de 2001. Mas ficaram separados por um curto período de menos de um ano. Retomaram o casamento em outubro de 2002 e mudaram-se para Balneário Camboriú. Mas já chegaremos lá.

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2001Em maio de 1999 Nunes tinha recém-completado 50 anos. Era uma sexta-feira e ele estava retornando de uma reunião política, e ouviu uma chamada no Jornal da Globo: “veja a seguir - de cada 10 brasileiros 7 têm problemas de coluna”. Nunes ficou atento e aguardou a reportagem, que incluia uma entrevista na bancada com o Médico Matheus de Sousa173. A matéria tratava de pessoas que haviam sido tratadas com a técnica da Quiropraxia, uma ciência que já existia havia mais de 100 anos nos EUA e estava começando a crescer no Brasil. No final, o entrevistado forneceu um número de telefone para contato da Associação Brasileira de Quiropratia e Nunes gravou o número na cabeça.Na segunda-feira passou o dia inteiro tentando ligar para aquele número. Dava ocupado o tempo inteiro. No dia seguinte Nunes resolveu ligar bem cedo, cinco pras oito da manhã. Foi atendido por uma mulher. Nunes identificou-se, disse ter visto a matéria no Jornal da Globo e que estava interessado no assunto. “Sim”, disse a mulher no outro lado da linha, “o senhor está interessado em cursos ou o senhor quer um atendimento de Quiropratia com o professor Matheus de Souza?” Nunes estava interessado no tratamento, mas, diante dessa possibilidade, não pestanejou. Respondeu de pronto: “Eu gostaria, sim, de fazer um curso”. “Pois não. Os cursos têm duração de 13 meses, com aulas em um final de semana por mês. No final é necessário fazer e apresentar uma monografia. Nós temos uma turma começando no sábado da próxima semana. Já temos oitenta candidatos. Estamos 173 Um vídeo com esta matéria do Jornal da Globo (11 minutos) pode ser visto em https://

www.youtube.com/watch?v=HGIsqUpfeJ4256

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analisando os curriculos de todos. Eu vou lhe mandar um Fax, o senhor preenche com os seus dados. Nós vamos escolher 50 pessoas”Na academia não havia aparelho de fax. Nunes deu o número da Associação Comercial e Industrial (muita gente fazia isto) e correu pra lá para receber as informações. Recebeu, preencheu os formulários, anexou seu currículo e enviou de volta.Agora era aguardar. Passaram-se nove dias. Na quinta-feira da semana seguinte Nunes recebe um telefonema: “Sr. Nunes. O seu currículo foi aprovado. O curso começa neste sábado, no endereço tal e tal…”Não havia mais passagem de ônibus de Jaraguá do Sul para São Paulo. Nunes não teve dúvidas. Na sexta-feira ao meio dia pegou um ônibus até Curitiba e depois de Curitiba até São Paulo. Chegou na manhã de sábado e foi direto para o local do curso.Identificou-se muito com as matérias ministradas. Parecia que já havia estudado aquilo antes. Provavelmente era apenas o seu entusiasmo e interesse que tornavam o estudo facilitado. O tempo passou voando. Nunes se apresentava como voluntário para qualquer demonstração de manobras. Na sua avaliação, ao ser objeto da manobra, Nunes aprendia mais ainda.As aulas eram bem puxadas. Aulas teóricas e práticas durante todo o tempo. No sábado, o dia todo e no domingo até meio dia.Nos primeiros meses do curso as despesas eram grandes e o custo de fazer o curso era bem expressivo. Mas, depois da metade do curso Nunes já fazia atendimentos de Quiropraxia, com os conhecimentos adquiridos. Com o dinheiro que ganhava com esses serviços podia tranquilamente ir de carro até Curitiba, na sexta-feira a tarde. Deixava o carro no estacionamento da Rodoviária, pegava um ônibus para São Paulo, chegava por volta de meia noite. Dava

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tempo pra dormir no hotel e estar descansado para o curso no sábado de manhã.No domingo pegava ônibus em SP no início da tarde, até Curitiba. Pegava o carro e nove, dez horas da noite já estava em Jaraguá do Sul.Assim, o próprio conhecimento obtido no curso já estava bancando todas as despesas, incluindo as mensalidades.Em maio de 2000 Nunes concluiu o curso de Quiropraxia do Dr. Matheus de Souza. Estava pronto para seguir naquela nova carreira que havia descoberto pra si. Durante o tempo em que fazia o curso de Quiropraxia em São Paulo, Nunes teve a ideia de oferecer os seus serviços para empresas. E a primeira empresa na qual ele trabalhou foi a Malwee. Em novembro de 1999 o empresário Wander Weegue havia sofrido um grave acidente com seu jetsky ferindo a coluna cervical. Foi socorrido e recebeu os devidos tratamentos. Alguns meses depois já estava bom (o bastante) para seguir com seus trabalhos normais. Mas ainda não conseguia fazer exercícios físicos e sofria com algumas dores na coluna e nas pernas. Através de um amigo, Renato Rau, procurou por José Maria Nunes que se tornou seu Personal Treiner. Depois Nunes começou a prestar seus serviços na empresa e atender os funcionários. Esse trabalho durou até 2004Nessa época Nunes já atendia diversas empresas em várias cidades, como Blumenau, Timbó, Balneário Camboriú e Jaraguá do Sul.Nunes continuava seu processo de aprendizagem e aperfeiçoamento na sua nova profissão. Em 2002 começou um curso de Formação em Massoterapia (600 horas) na Escola Ciem Sahb. O curso foi concluído em agosto de 2003. Em 2006 submeteu-se a Avaliação Piloto da Quiropratica no Brasil (IBCE - International Board of Chiropratic Examiners) com aprovação sem restrições.

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Em 2002, quando já tinha residência em Balneário Camboriú, Nunes começou a atender em Jaraguá do Sul, em um espaço na rua Antônio Carlos Ferreira, na Clínica União do Ser que pertencia a Laurita Brasil174. Esta relação durou até o final de 2002.No ano seguinte, como o número de clientes começou a aumentar, Nunes alugou uma sala e passou a atender em clínica própria, na Rua Reinoldo Rau. Deu ao seu novo espaço o nome Life Center. Depois descobriu-se que aquele nome já estava registrado, e então a empresa teve de trocar o nome para Jaraguá Life e, mais tarde, Top Life - na 25 de julho

UM CASAMENTO DE 32 ANOS E MUITOS FRUTOSDepois que retomaram o casamento, em 2002, Elvira e Nunes tiveram novas oportunidades. Os filhos já estavam crescidos, mas ainda demandavam atenção e alguns cuidados. Eles moravam em Balneário Camboriú, mas Nunes trabalhava praticamente a semana inteira em outras cidades. Sua dedicação excessiva ao trabalho era uma das coisas que desagradavam Elvira. Os desentendimentos retornaram depois de uns sete ou oito anos. Até que, em 2011 concluiram pela separação amigável e o posterior divórcio.Nunes e Elvira seguiram suas vidas. Os dois assumiram novos relacionamentos e estão casados (e felizes) nos dias de hoje.Com a separação (agora definitiva) no casamento com Elvira, Nunes resolve vender a casa de Palhoça para fazer ajustes no patrimônio da família.Dona Reasilva foi morar com a irmã do Nunes, Helena, que morava em Guaramirim, no norte do estado. Em seis meses dona Reasilva quase morreu. Entrou em depressão, emagreceu oito quilos. Não conseguia se adaptar. Estava muito acostumada com Palhoça, onde já conhecia todo mundo e sabia onde tudo acontecia. Como a casa ainda não havia sido vendida, Nunes 174 https://www.facebook.com/clinicauniaodoser

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resolveu fazer um arranjo no acordo com Elvira, de tal maneira que a casa de Palhoça permanecia com ele. Então tirou a casa da imobiliária e trouxe dona Reasilva de volta.

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2004Em 2004 Nunes continuava morando em Balneário Camboriú, mas atendia seus clientes em Blumenau, Timbó e Jaraguá do Sul, que era onde estavam a maioria deles. Nunes tinha, já na época, muito trabalho em Jaraguá do Sul, na sua clínica da Rua Reinoldo Rau.Num dos curso que foi fazer em São Paulo e conheceu um médico que era cardiologista e anestesista. Ele fez um concurso para Jaraguá do Sul, em 2003. Passou. E propôs uma sociedade com Nunes para a abertura de uma Clínica de Recuperação Cardiológica.Nunes ficou entusiasmado com a ideia, ainda que, na prática na sociedade proposta, o investimento patrimonial era praticamente todo dele, Nunes. Encontrou um bom imóvel na Rua 25 de Julho (no Bairro Vila Nova). Fez um grande investimento para montar uma estrutura de clínica médica, quadra de tênis coberta, Quadra de Squash, Piscina.Mas o tal médico ficou apenas alguns meses na cidade. A mulher não se adaptou e ele preferiu retornar para São Paulo. Como não havia contrato assinado (era apenas um acordo de parceria entre os dois profissionais) não havia como obrigar o médico a ficar mais tempo. Nunes tentou substituir o médico por outro cardiologista de Jaraguá do Sul, mas não obteve sucesso. Os médicos não tinham nenhum interesse naquele modelo de negócio. Por outro lado, por estar psicologicamente traumatizado, Nunes se recusava a considerar a ideia de buscar um profissional de outra cidade.Assim, o empreendimento durou de março de 2004 até julho de 2005. Nunes não queria encerrar a empresa imediatamente porque sentia-se compromissado com

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as pessoas que ainda trabalhavam ali. 6 empregados (entre professores, atendentes e pessoal de limpeza). No fim, Nunes tomou a decisão de encerrar a empresa, demitir o pessoal e fazer todos os acertos. Felizmente não havia salários atrasados. Mas havia fundo de garantia, multas e outras indenizações.Nunes vendeu para o professor Cleber a parte da piscinas. E a outra parte (quadra de squash, e quadra de tênis) ninguém quis assumir. Ficou lá. foi devolvido para o proprietário, que aceitou os termos da rescisão do contrato.Nunes manteve apenas um consultório de Quiropraxia, na 25 de julho e continuou atendendo pacientes em Blumenau, Timbó, Balneário Camboriú, Florianópolis e Jaraguá do Sul.Em 2006 mudou seu consultório de Jaraguá do Sul para a rua Epitácio Pessoa e, logo em seguida encontrou, finalmente, um lugar perfeito para a sua clínica: o endereço atual, na rua Felipe Shimidt.Nessa clínica Nunes mantém um caderno de mensagens dos seus pacientes que é conhecido como “o livro azul”. Nesse livro cada paciente pode, se quiser, registrar sua experiência com o tratamento de Quiropraxia e com o atendimento do Professor Nunes.Nunes trata aquele livro como um quadro de medalhas e troféus. A cada novo depoimento mais e mais ele se orgulha e tem certeza de que escolheu um caminho correto de utilizar sua energia e seu potencial depois da merecida aposentadoria como professor.((Nunes5 - onde e como está a Marisa? qual é a sua relação com ela?))((Nunes5 - ela não poderá contestar alguma coisa do que está escrito no livro?))((Nunes5 - a partir de que momento((Nunes5 - como deve ser apresentada a Nanci?))

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((Jossinei - data de nascimento da Elvira))

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2016COM A PALAVRA, JOSÉ MARIA NUNESDuas pessoas especiais. Meu Pai e Minha MãeOs quatro filhos, que o escolheramElvira — gratidão por ter tido a capacidade de entender e aceitar o tipo de casamento que foi proposto em 1978. Aceitar que as crianças fossem parte do pacote do casamento e seguir, suportando todo o processo até que cada um deles saisse da casa. Não existe pagamento possível para isto. Se não deu certo na vida afetiva. Se houve falhas nesse sentido, não foram propositais.Quando casamos ela já sabia. Eu já estava com meus irmãos havia 4 anos. Desde 1974 eu os criava e sustentava. E isso não seria mudado. Eu deixei para trás outras possibilidades de casamento porque essa questão não foi aceita. Eu disse a ela que preferia ficar solteiro, mas não abria mão de criar, educar e orientar cada um dos irmãos que estavam sob minha guarda. Ela entendeu isto e assumiu comigo essa missão. Nosso casamento, desde o início, foi a sociedade de duas pessoas que poderiam fazer bem a um grupo de pessoas.Nós nunca tivemos grandes discussões (a não ser por causa da minha obsessão com a política). O sucesso de nossos filhos e dos meus irmãos é uma grande vitória do nosso casamento. E eu devo a ela esta vitória na minha vida.

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Personagens desta história.Ao concluir este livro, em fevereiro de 2016, procurei saber o que aconteceu e como estão algumas pessoas que participaram de forma direta ou indireta desta trajetória. Aqui estão175:João Maria Nunes, o pai de José Maria Nunes teve um AVC em 1979. Foi quando Nunes trouxe a família do sítio do professor Arruda para a casa de Palhoça. João Maria nunca se recuperou muito bem. Mas viveu ainda por mais 15 anos. Faleceu em 29 de outubro de 1995. Deu tempo de ver todos os seus filhos se tornarem adultos. Todos saudáveis e todos honestos, como era o seu sonho.Reasilva Nunes, a mãe de Nunes vive bem e saudável na casa de Palhoça. Frequenta clube de idosos e gosta muito de dançar. Foi uma das entrevistadas para este livro.Maria da Luz Nunes. Nunes não teve nenhuma influência na vida da irmã, dois anos mais velha pois ela já estava casada quando ele foi para o exército, em 1968. Mesmo assim, eles sempre se deram muito bem. Nunes foi o padrinho da primeira filha da irmã. Maria tem quatro filhas e três netos. Mora em Doutor Pedrinho, perto de Timbó. O marido é Funcionário público aposentado da FATMA. Trabalhava em uma reserva de Sassafrás em Doutor Pedrinho.Sebastião Nunes. Irmão, dois anos mais novo. É um pintor Metalúrgico aposentado, mora em Blumenau, é casado com Florência Nunes e tem dois filhos (homens). Terá o primeiro neto em 2016. Helena Nunes da Silva. Irmã, quatro anos mais nova. Zeladora aposentada e pensionista. Helena veio com a família para Blumenau em 1974, mas logo arrumou um emprego (na casa de duas dentistas) e nem chegou a morar com eles em nenhuma das duas casas. 175 Por ordem “mais ou menos” cronológica de entrada na história

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Aposentou-se depois de trabalhar por alguns anos numa fazenda da WEG. Mora em Guaramirim, é viúva, tem um filho, uma filha e dois netos.Antônio Nunes. Irmão, seis anos mais novo. Tornou-se chefe de cozinha e está aposentado. Mora em florianópolis (na Barra da Lagoa). É Casado e tem uma filha.João Francisco Nunes. Irmão, oito anos mais novo. Fornou-se professor de Educação Física e tornou-se um treinador de Atletismo de excelentes resultados, com diversas convocações de atletas para competições internacionais. Ele também foi treinador da seleção brasileira em diversos campeonatos sul americanos e mundiais nas categorias menores e juvenil. Trabalha com treinamento para deficientes físicos, em Balneário Camboriú. Mora em Penha, é casado com a ex-atleta Irene Buss e tem uma filha e um filho e uma neta.Júlio Nunes. Irmão, onze anos mais novo. Foi atleta no final dos anos 1980, com participação nos Jogos Abertos, pela equipe de Florianópolis. É técnico de informática, Mora em Criciúma. É casado, e tem dois filhos.Pedro Nunes. Irmão, doze anos mais novo. Trabalha na construção Civil. Mora em Palhoça. Não é casado nem tem filhos e, “dizem” é o “xodó da mãe”.Sérgio Nunes. Irmão, quatorze anos mais novo. Policial Militar aposentado. Mora em Tijucas. É casado (duas vezes) e tem um filho e três netos.Algemiro Nunes. Irmão, dezesseis anos mais novo. É Restaurador de móveis. Mora em Palhoça. É casado e tem um filho.Neuza Aparecida Nunes. Irmã, dezessete anos mais nova. É formada em Pedagogia e trabalha com educação infantil. Mora em Palhoça. É divorciada e tem um filho e uma filha.

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Mauro Nunes. Irmão, dezenove anos mais novo. É Pintor e restaurador de móveis. Mora em Palhoça. É casado e tem um filho.Inês Nunes. Irmã, vinte anos mais nova. É diarista. Mora em Palhoça. É casada, tem dois filhos e uma filha.Marisa Aparecida Nunes. Irmã, vinte e quatro anos mais nova. É diarista. Mora nos Ingleses, em Florianópolis. É casada (duas vezes) e tem três filhos.Silvio Sime. O dono da fazenda em que Nunes trabalhou entre 1963 e 1967 … ((Nunes5 - sabe dele?))Waldemar Tiago de Souza. O atleta campeão dos Jogos Abertos antes de Nunes entrar em cena no atletismo de Santa Catarina deixou de competir nos Jogos Abertos, mas seguiu correndo, nas categorias de veteranos e estimulando filhos, genros, noras, sobrinhos e netos para o esporte. Ele teve 16 filhos (10 homens e 6 mulheres). Quatorze se tornaram atletas. Teve 14 genros e noras sendo que três se tornaram atletas. Teve 26 netos sendo que 6 se tornaram atletas. E, 15 bisnetos. Até 2016 nenhum atleta. Mas, naquela família, isso é só uma questão de tempo. Sua família mantém até hoje a Associação Recreativa e Esportiva Tiago, com uma belíssima sede, em Blumenau.José dos Santos no período em que foi treinador de atletismo, em Rio do Sul, revelou grandes talentos, entre os quais se destacam Ieda Regina Juppa, Charles Westphalen Lima, Margit Weiss, Marília Seifert e Luciano Jurk (que, mais tarde, assumiu como técnico da equipe de atletismo de Rio do Sul). Em 1985 encerrou a carreira como atleta e técnico. No ano seguinte voltou para Blumenau, onde concluiu o curso de Educação Física na FURB (1986) e foi professor no Colégio Estadual Pedro II e depois no Colégio Sagrada Familia. Aposentado desde 2008, mora num sítio e (como terapia ocupacional) faz restaurações de peças rústicas e antigas.

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Paulo Cesar Zimmer teve uma carreira de atleta formidável. Ganhou muitas medalhas nos Jogos Abertos e muitos troféus e medalhas nas principais corridas de rua do Brasil. Depois de aposentado retornou a Florianópolis onde…Antônio Celso Silveira participou dos Jogos Abertos de Santa Catarina até 1985 e teve, em 1983, grandes resultados na Maratona, vencendo em São Paulo e conquistando o 6º lugar em Seul (Coreia do Sul) com 2h19min39s (recorde brasileiro). Atualmente é professor de Educação Física aposentado e mora em Rio do Sul.João Aderson Flores. O dirigente esportivo que era o presidente da CME de Florianópolis em 1976, quando Nunes retornou à capital, dedicou grande parte da sua vida à educação e atualmente atua como Coach e como Psicólogo do Esporte, atuando, entre outras coisas, nos cursos de formação de árbitros da Federação Catarinense de Futebol.Luciano Nunes, o primeiro filho de José Maria Nunes, com (Marisa…((Nunes5)), Mora com uma pessoa, no Estreito, em Florianópolis. Passou por 4 faculdades. Decidiu-se por Educação Física. É casado com a neta do jornalista Hugo Silveira Neto.É DJ. Faz festas e eventos. E montou uma emissora de rádio alternativa. Morou por dois anos com Nunes, em Jaraguá do Sul em 1994 e 95 (tinha 16 para 17). Tinha 18 anos. Fazia o ensino médio. Ele pediu para morar um tempo com o pai.

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Cronologia1925, 20 de outubroJoão Maria Nunes nasce, em Goiabeiras, Costa do Canoas, município de Campos Novos, filho de Felisberto Nunes e Maria Trindade Nunes1927, 20 de janeiroReasilva Cordeiro Nunes nasce, em Espinilho (distrito de Campos ElviraNovos), filha de João Cordeiro Matoso dos Santos e Patrocina dos Santos1946, 10 de junhoJoão Maria Nunes e Reasilva Cordeiro se casam em Ponte Canoas, Campos Novos. Eles se casam três meses depois e vão morar em Rio da Vargem e se tornam agregados de família Estefanes1949, 11 de abril.José Maria Nunes, nasce em Campos Novos, na localidade de Espinilho.1950. 10 de setembroNasce Elvira Maria1953.João Maria, Reasilva e os filhos foram morar nas terras de uma mulher — dona Júlia — em uma localidade de Costa de Canoas, no município de Abdon Batista, Meio Oeste de Santa Catarina1957.João Maria, Reasilva e os filhos voltam a serem agregados em uma fazenda do Rio da Vargem, hoje município de Vargem.1963, 10 de janeiro Com 13 anos de idade deixou sua terra natal e foi morar em Catanduvas, para trabalhar com um fazendeiro em troca de roupas e comida.1964, 18 de julho

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Foi realizado o seu registro civil. Livro número 17, folha V.185, Registro de Nascimento número 4302 no Cartório de Registro Civil do Distrito de Espinílho - Município de Campos Novos. Declarante: o pai.1967, 20 de agosto Recebe a confirmação de que está convocado para servir o Exército Brasileiro, em Porto União1967, 20 de setembroSaiu da Fazenda em Jaborá. Voltou a morar na casa dos pais. Os pais, à esse tempo moravam na casa da Dona Julia, em Campos Novos, na extinta Serraria Santos Almeida, terras do avô materno.1968, 08 de janeiroViajou, de trem, para Porto União, para servir o Exército. Ficou no quartel em exames e documentação. Foi oficialmente admitido no dia 15 de janeiro.1968Ao longo do ano, participou das atividades de treinamento e instrução militar e recebeu cuidados médicos e vacinas (provavelmente nunca havia sido vacinado antes).1968, outubroParticipou pela primeira vez dos Jogos Abertos de Santa Catarina, realizado na cidade de Mafra. Venceu as provas de 5 milm e 10 mil metros (35min04,0). Tornou-se a sensação daqueles Jogos.1968, 15 de novembroEncerrado seu tempo no serviço militar obrigatório1968, 22 de novembroMudou-se para Florianópolis. Começou a trabalhar na Modelar Magazine, importante loja de móveis de Florianpopolis.1969, marçoInicia os estudos no Madureza Ginasial.1969, maio

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Faz a sua primeira viagem de avião, num voo da Aeronáutica de Florianópolis para Porto Alegre.1969, junhoFaz as provas do Exame de Madureza Ginasial. É aprovado em OSPB e Geografia.1969, julhoParticipa da Corrida de Volta a Ilha em Florianópolis. Fica em segundo lugar, perdendo para Sílvio Juvêncio dos Santos1969, outubroParticipa dos Jogos Abertos de Santa Catarina, em Joinville. Vence os 5 mil metros (18min41,6) e os 10 mil metros (41min12,2).1969, dezembroFaz as provas do Madureza Ginasial e é aprovado em Ciências e História1969, dezembroParticipa da Corrida da TV Gaúcha, em Porto Alegre (2º lugar) e da São Silvestre, em São Paulo (125º lugar).1970, 22 de abrilRetornou ao Exército Brasileiro. 1ª Cia de Fuzileiros, 14º Batalhão de Caçadores176.1970, 4 de maioParticipou da competição comemorativa do 130º aniversãrio da PMSC. Venceu as provas de 3000m, 5 mil metros e 10 mil metros.1970, 16 de julhoParticipou da competição “Troféu Sampaio”. Venceu as provas de 1500 metros, 3000m e 5 mil metros.1970, junhoFez provas de Madureza. Passou em Matemática do Madureza Ginasial e ainda passou em História, Geografia, OSPB, do Exame de Madureza Colegial (atual ensino Médio)1970, 24 de julho176 Em 1973, o então 14º Batalhão de Caçadores transformou-se no 63º Batalhão de Infantaria

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Transferido da 1ª Cia FZO para a Ptr Pesados.1970, outubroAs provas do Atletismo dos Jogos Abertos de Santa Catarina, em Concórdia não ocorreram, por conta de ter chovido durante os oito dias da Competição.1970, 04 de dezembroFez os exames de Madureza novamente. Passou em Português do Madureza Ginasial. Passou, também, em Português, História, Geografia, OSPB, Física, Química, Biologia do Exame de Madureza Colegial (atual ensino Médio). Ficou apenas em Matemática.1970, 09 de dezembroFoi internado no Hospital Geral (UGuF) e teve alta no dia 18 de dezembro.1971, 17 de fevereiroRecebe elogio no Boletim do Batalhão, assinado pelo comandante, Capitão de Infantaria José Aurélio Valporto de Sá.1971, 19 a 27 de abrilParticipa, em Curitiba, dos Jogos da 5ª RM e 5ª DI 1971, 03 a 13 de junhoParticipa da Olimpíada do Exército Brasileiro em Belo Horizonte, integrando a equipe do III Exército. Vence a prova dos 3000m, com 9min07,3s.1971, 17 de junhoSegue para o Rio de Janeiro. Integra-se à equipe do Exército Brasileiro1971, 07 e 08 de julhoParticipa, no Rio de Janeiro, dos VI Campeonto de Atletismo das Forças Armadas. Classifica-se em segundo lugar nos 5 mil metros e participa de outra prova ((Nunes5 - ?)). 1971, 09 de julhoÉ convocado para integrar a equipe brasileira no Campeonato Mundial das Forças Armadas, a ser realizado na Finlândia1971, julho

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É preso, no Rio de Janeiro, pela Polícia do Exército, suspeito de ser subversivo.1971, julhoEnvolve-se em uma briga com um colega de equipe no alojamento do Exécito. Pede dispensa da equipe e retorna para Santa Catarina1971, agostoParticipa dos Jogos da Semana do Exército, em Florianópolis. Vence as provas de 1500 metros e 3000m. Vence também a corrida de rua, 7000m.1971, marçoConhece Marisa, estudante do curso técnico de Educação Física, cujas aulas eram realizadas nas dependências do EB1971, setembroNunes convence colegas, soldados do exercito, para integrar a equipe de Florianópolis de Atletismo nos Jogos Abertos: Maneca, Costa e Toninho.1971, outubroParticipa dos Jogos Abertos de Santa Catarina, em Rio do Sul. Vence os 1500 metros (4min16,1), os 5 mil metros (16min21,0) e os 10 mil metros (33min48,0)1971, 31 de dezembroFez as provas do Exame de Madureza. Passou em História, Geografia, OSPB, Física, Química, Biologia do Exame de Madureza Colegial (atual ensino Médio). Ficou apenas em Português e Matemática.1971, 31 de dezembroParticipa da Corrida da Integração Nacional, em SP. Classifica-se em terceiro lugar.1972, 3 de abrilFoi convocado para integrar a equipe de atletismo do III Exército1972, 21 de abrilDeu baixa do Exército Brasileiro. O Boletim do Batalhão publicou elogio oficial, assinado pelo Comandante do

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14º BC.1972, maioTrabalha numa casa lotérica do Figueirense Futebol Clube, no estreito.1972, julhoÉ contratado como professor substituto de Educação Física, no Instituto Estadual de Educação.1972, julhoConcluiu, finalmente, o Supletivo1972, outubroParticipa dos Jogos Abertos de Santa Catarina, em Itajaí. Vence os 1500 metros (4min06,6), os 5 mil metros (15min43,0) e os 10 mil metros (32min13,9)1972, novembroNunes vai para São Bento do Sul, finalizar a preparação para correr a Integração, em São Paulo1972, 31 de dezembroÉ campeão da Corrida da Integração Nacional, em SP. 1973, 4 de janeiroPassa no vestibular para a Faculdade de Educação Física de Santos.1973, 9 de janeiroÉ recebido com festa em Florianópolis, pela vitória em São Paulo. Houve desfile em carro do Corpo de Bombeiros e recepção no Palácio do Governador.1973, marçoFez vestibular e matriculou-se na primeira turma do curso de Educação Física da Udesc.1973, abrilPassou a morar em Blumenau pela oferta de melhores condições de trabalho e de treinamento1973, abrilComeça a dar aulas em uma escola do município, em Blumenau: Escola Municipal Vidal Ramos.

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1973, junhoTira a carteira de habilitação1973, junhoCompra seu primeiro carro. Um Fusca 19681973, outubroParticipa dos Jogos Abertos de Santa Catarina, em São Bento do Sul. Vence os 1500 metros (4min11,2), os 5 mil metros (16min00,2) e os 10 mil metros (33min15,2)1973, dezembroParticipou da São Silvestre. Fica em 20º lugar - 3º Brasileiro.1974, janeiroTrouxe para Blumenau a família que estava morando em um sítio de Monte Carlos, Campos Novos1974, marçoInicia as aulas no curso de Educação Física em Joinville.1974, marçoÉ transferido, como professor, para outra escola do município, em Blumenau: Escola Municipal Lúcio Esteves.1974, marçoComeça a dar aulas no Colégio Sagrada Família, em Blumenau.1974, maioQuase sofre acidente na estrada, devido a esgotamento físico. desiste da faculdade de Joinville1974, 14 de setembroOcorre a primeira edição dos Jogos Estudantis da Primavera, criação de José Maria Nunes e Osmar Laschewitz, com o apoio do Colégio Sagrada Família.1974, outubroParticipa dos Jogos Abertos de Santa Catarina, em Criciúma. Vence os 1500 metros (4min01,4), os 5 mil metros (15min01,0), os 10 mil metros (31min07,6) e o

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revezamento 4x400m (3min29,2 - com Jorge Luis da Silva, Miguel Angelo Raymundi e Renato José da Silva)1974, dezembroParticipou da São Silvestre. Ficou em 18º lugar, sendo o 3º brasileiro1975, fevereiroFaz vestibular da ACAFE e começa a estudar no curso de Educação Física da Furb, em Blumenau. Primeira turma.1975, maioParticipa de uma corrida (em homenagem ao centenário da colonização italiana no Brasil). Nessa viagem contraiu caxumba. Foi internado por diversos dias, em coma1975, outubroParticipa dos Jogos Abertos de Santa Catarina, em Chapecó. Vence os 1500 metros (3min59,9), os 5 mil metros (15min08,4) e os 10 mil metros (31min01,8)1975, dezembroNão participou da São Silvestre porque tinha quebrado a mão.1976, marçoComeçam desentendimentos entre Nunes e CME de Blumenau, por diversos motivos1976, 11 de abrilConhece Elvira Maria Martins, no dia da sua festa de aniversário, em casa.1976, julhoTransfere-se de Blumenau para Florianópolis. Como as regras do estágio haviam sido modificadas, fica impedido de participar (como atleta) dos Jogos Abertos de Santa Catarina de 1976, que foram realizados em Tubarão. Nunes participa apenas como treinador. É a sua estréia nessa nova área1976

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Retornou para Florianópolis aceitando o convite para ser o técnico de atletismo da capital.1976, outubroParticipa dos Jogos Abertos de Santa Catarina, em Tubarão, pela primeira vez como treinador, da equipe de Florianópolis.1976, novembroNunes inicia conversações com João Anderson Flores, para a criação da Bolsa Atleta

1976, dezembroParticipou da São Silvestre. Ficou em 18º lugar, sendo o 2º brasileiro1977, janeiroFoi criada a bolsa esporte na CME de Florianópolis.1977, 12 de fevereiroNasce Luciano, seu primeiro filho, em Florianópolis ((Nunes5 - nome completo de Marisa))1977, outubroParticipa dos Jogos Abertos de Santa Catarina, em Florianópolis. Vence os 5 mil metros (14min49,2) e os 10 mil metros (31min36,3); Fica em 2º nos 1500 metros (3min59,3)1977, dezembroParticipou da São Silvestre. Ficou em 15º sendo o 2º brasileiro1978, maioCasou-se com Elvira Maria Martins.1978, 16 de julhoForma-se em Educação Física pela Udesc (Florianópolis)1978, outubroParticipa dos Jogos Abertos de Santa Catarina, em Caçador. Vence os 1500 metros (3min54,1), os 5 mil metros (14min51,4) e os 10 mil metros (31min03,2)

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1978, 31 de dezembroParticipa da Corrida Internacional de São Silvestre. Classifica-se em 10º lugar e foi o 2º melhor brasileiro.1979, janeiroTem um acidente doméstico com uma cadeira e passa a sofrer com um problema crônico de coluna.1979, marçoInicia o curso de Pedagogia na Udesc1979, outubroParticipa dos Jogos Abertos de Santa Catarina, em Blumenau. Fica em 3º lugar nos 5 mil metros (15min13,0). Foi sua primeira derrota em competições de Jogos Abertos de SC. Não participa dos 1500 metros nem dos 5 mil metros.1979, 31 de dezembroParticipa da Corrida Internacional de São Silvestre. Classifica-se em 20º lugar e foi o 5º melhor brasileiro.1980, 6 de janeiroÉ campeão da Corrida de Reis, em Brasília, vencendo Edson Bergara nos últimos dez metros da prova. ((Nunes5 - nesta prova ficou em 3º)1980, janeiroA equipe de atletismo de Florianópolis começa a realizar seus treinamentos na pista da ETFSC. Em julho os treinamentos são transferidos para a pista da UFSC. 1980, marçoInicia na Udesc curso de especialização (Latu Sensu) em Educação Física1980, maioParticipa dos Jogos Abertos do Sul, em Porto Alegre. Vence os 10 mil metros. Fica em 2º no 5 mil metros.1980, julhoÉ contratado pelo Clube Universitário como treinador de atletismo.1980, 11 de julho

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Nasce o primeiro filho do casamento de Nunes com Elvira Maria: Jossinei Nunes.1980, outubroParticipa dos Jogos Abertos de Santa Catarina, em Jaraguá do Sul. Vence os 5 mil metros (14min49,0) e os 10 mil metros (32min29,2); Fica em 2º os 1500 metros (4min00,0)1980, 23 de maioVence os 10 mil metros no Troféu Brasil de Atletismo, em São Paulo. 1980, 26 de dezembroViaja para Lisboa (Portugal) e Luanda (Angola) onde participa da Corrida de São Silvestre de Angola, no dia 31 de dezembro. Classifica-se em 7º lugar.1981, outubroParticipa dos Jogos Abertos de Santa Catarina, em Lages. Vende os 5 mil metros (15min02,7) e os 10 mil metros (31min11,6); Fica em 2º nos 1500 metros (3min57,4)1981, 31 de dezembroParticipa da Corrida Internacional de São Silvestre. ((Nunes5 - não há notícia nenhuma sobre esta participação))1982, julhoNo dia do jogo Brasil x Polônia, da Copa do Mundo, fez prova prática do concurso para a UFSC - aula prática de atletismo. Nunes foi aprovado e passou a ser professor no Colégio de aplicação. ((Nunes5 - confirmar))1982, outubroParticipou dos Jogos Abertos de Santa Catarina, em Itajaí. Ficou em 6º lugar no 5 mil e em 4º lugar nos 10 mil metros. Pela primeira vez, desde 1968, não ganha medalha numa edição dos Jogos Abertos de Santa Catarina da qual participa.1983, 23 de setembroNasce o segundo filho (na verdade, filha) do casamento de Nunes com Elvira Maria: Jossiane Nunes.

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1983, outubroA edição dos Jogos Abertos de Santa Catarina, programada para Brusque, foi cancelada em função das enchentes daquele ano.1984, 09 de julhoForma-se em Pedagogia - pela Udesc (Florianópolis)1984, outubroParticipa dos Jogos Abertos de Santa Catarina, em Concórdia, como treinador da equipe de Florianópolis.1985, outubroParticipa dos Jogos Abertos de Santa Catarina, em Brusque. Fica em 4º lugar na prova de 3000 com obstáculos.1986, outubroParticipa dos Jogos Abertos de Santa Catarina, em Joinville, como treinador da equipe de Florianópolis.1987, 06 de abrilNasce o terceiro filho do casamento de Nunes com Elvira Maria: José Maria Nunes Jr.1987, dezembroAssina, com a Unimed, o primeiro contrato de patrocínio esportivo da Unimed no Brasil ((Nunes5 - isso não ocorreu antes?))1988, outubroParticipa dos Jogos Abertos de Santa Catarina, em Criciúma, como treinador da equipe de Florianópolis ((certeza de que participou, até em 1988))1988, novembroÉ candidato a verador, pelo PDT, nas eleições municipais de Florianópolis. Obtem 321 votos. Não é eleito.1990, marçoObtém a transferência do Colégio de Aplicação da UFSC para a Escola Técnica Federal de SC

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1990, maioIniciou a trabalhar como personal trainer1992, novembroÉ candidato a verador, pelo PDT, nas eleições municipais de Florianópolis. Obtem 365 votos. Não é eleito.1992, dezembroÉ indicado para ser o Presidente da Fundação Municipal de Esportes de Florianópolis, pelo prefeito eleito Sérgio Grando. Uma manobra política de última hora muda tudo e o cargo é dado a Luiz Henrique da Costa, político filiado ao PCdoB. Este episódio leva Nunes a decidir mudar-se de Florianópolis para outra cidade.1993, janeiroSolicita transferência para a Escola Técnica Federal em Araquari, com o objetivo de morar em Jaraguá do Sul.1993, 9 de marçoÉ cedido para a Escola Técnica Federal em Araquari, mas ainda mantém o vínculo institucional com a Escola Técnica Federal de Santa Catarina, de Florianópolis. Muda-se para Jaraguá do Sul. Passa a atuar como Orientador Educacional no Colégio Agrícola de Araquari1994, abrilÉ nomeado Diretor Administrativo da Escola Técnica Federal de Jaraguá do Sul (hoje, IFSC). Iniciou a implantação da Escola.1994, agostoA Escola Técnica Federal de Jaraguá do Sul abre sua primeira turma.1995, fevereiroA Escola Técnica Federal foi roubada. Os materiais e equipamentos foram devolvidos dois dias depois de um apelo de Nunes nas emissoras de rádio.1995, 30 de julho

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Correu sua primeira maratona, em Blumenau. Fez o tempo de 2h44min53s1995, julhoA Academia Top Life começa a funcionar, com uma piscina pequena e uma sala de ginástica1996, janeiroA Academia Top Life inaugura a piscina semi-olímpica com aquecimento.1996, dezembroÉ desfeita a sociedade entre Elvira e Salézio na Academia. A academia ganha o nome de Jaraguá Life.1997, janeiroUma chuva forte provoca uma enchurrada que arrasa a piscina grande, na Academia o processo de restauração demora três meses. 1997, junhoDeixa a direção da Escola Técnica Federal em Jaraguá do Sul, assume aulas de Filosofia e religião enquanto aguarda a tramitação do processo regular de aposentadoria.1997, outubroAposenta-se como Professor da Escola Técnica Federal em Jaraguá do Sul1997, outubroPassa a se dedicar integralmente ao serviço da Jaraguá Life Academia, como personal trainer e massagista.1998, fevereiroAtendendo pedido de Esperidião Amim, filia-se ao PP, integra-se ao Diretório Municipal de Jaraguá do Sul e trabalha pela eleição do Governador de SC1999, maioInicia o curso de Quiropraxia do Dr. Matheus de Souza - Ibraqui - em São Paulo.

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2000, maioConcluiu o curso de Quiropraxia do Dr. Matheus de Souza - Ibraqui - em São Paulo.2000, outubroParticipou da sua terceira campanha política, como candidato a vereador em Jaragua do sul, pelo PP. Obteve 331 votos. Não foi eleito.2001, outubroNunes e Elvira Maria separam-se.2001, janeiroA sociedade da Academia foi encerrada.2002, outubroElvira Maria e Nunes retomou o casamento - Mudam-se para Balneário Camboriú.2002Trabalhou como Quiropraxista na Clínica União do Ser, na rua Antônio Carlos Ferreira, Jaraguá do Sul. E atuava em diversas cidades da região em contrato com Empresas Industriais. 2003Alugou uma sala e passou atender em Clínica Própria, na rua Reinoldo Rau, Jaraguá do Sul2004Instala uma Clínica de Recuperação Cardiológica, na rua 25 de julho, em Jaraguá do Sul, em associação com um médico de São Paulo que havia se transferido para Jaraguá do Sul. Quatro meses depois o médico retornou a São Paulo. 2005, junhoEncerra as atividades da Clínica da rua 25 de julho.2005, 5 de agostoEncerra as atividades na empresa Malwee2006

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Inicia as atividades na Clínica própria da Epitácio Pessoa. Alguns meses depois muda-se para o endereço atual, na Rua Felipe Schmidt, 96 - Jaraguá do Sul.2010Nunes e Elvira Maria separam-se, definitivamente.2011Inicia novo relacionamento com Nanci Girolla2014, outubroRecebe homenagem nos Jogos Abertos de Santa Catarina, como o atleta (masculino) com maior número de medalhas conquistadas na história dos JASC.

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AGRADECIMENTOSForam entrevistados e tiveram contribuiram de forma expressiva com o trabalho de pesquisa para este livro as seguintes pessoas:• Neusa Aparecida Nunes• Sebastião Nunes• João Francisco Nunes• Elvira Maria Nunes• Reasilva Nunes• Deraldo Oppa• Paulo Cezar Zimmer• Antônio Celso Silveira• José dos Santos• Otmar Lothar Welsh• Esperidião Amim Helou Filho• Décio Silva• Vicente Donini• Lúcia Maria Loch Goes• Margit Weise• Ieda Regina Juppa• Mara Cristina Lemos de Andrade• Evaldo Rosa da Silva• Margit Weise• Otávio Rosenbrok Jr• Hilário Henrique Bartelt• Sebastião Lauro Nau• Maria Elenice Franco• xx• xx

Devo agradecer às pessoas que, nas entrevistas, abriram seus corações e se esforçaram para relembrar fatos, alguns nem tão agradáveis. E que confiaram seus depoimentos a este autor, mesmo sabendo que, em alguns casos, o que estava sendo revelado tinha potencial para produzir mal estar, mal entendidos e mesmo intrigas, confusões, brigas e retaliações.Nem tudo o que havia para ser lembrado eram boas recordações. Fico feliz que essas pessoas tenham feito esse sacrifício para ajudar a minha pesquisa.Agradeço a Áurea Loch e Clara Padilha pelo trabalho que tiveram de ler os originais várias vezes ao longo da jornada para apontar pequenas e grandes incorreções. Grande parte clareza das informações desse livro se deve ao trabalho delas.

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IMPORTANTE: o autor, Ênio Padilha, bem como a OitoNoveTrês Editora empreenderam todos os esforços para obter autorização de uso e informações necessárias para atribuir corretamente os créditos legítimos das imagens utilizadas neste livro. Eventuais correções serão efetuadas imediatamente mediante simples comunicação dos tiltulares desses direitos. Pedimos a gentileza de entrarem contato através do e-mail [email protected] ou pelo telefone 47-3361-7555

Esta obra foi composta emAdobe Garamond e Verdanae impressa em offset pelaGráfica e Editora Pallotti

sobre papel Polen Bold 90gem novembro de 2015

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((Nunes5 - documento de guarda))

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