xavier, Ângela barreto; hespanha, antônio manuel. a representação da sociedade e do poder

Upload: j000costa

Post on 03-Jun-2018

219 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    1/36

    1- H ISTRIA DEPOR TUGA LDlREC O DE JO S M ATIO SO

    QUARTO VOLUMEO ANTIGO REGIME (r620-r807)COORDENADOR:Prof. Doutor Antnio Manuel Hespanha

    AUTORES:Dr. Pedra CardirnDr. Antnio Cames GouveiaProf. Doutor Antnio Manuel HespanhaDr. Nuno Gonalo Freitas MonteroDr. Maria Catarina SantosDr. Jos Vicente SerroDr. o Ana Cristina Nogueira da SilvaDr. Jos Manuel SubtilDr. ngela Barreto Xavier

    1 1 1 I I I I l / l 1 1I J l l I I I j l l 1 1 / 16..:.54 ':.'686EDITORIAL ESTAMPA

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    2/36

    . .. I I. ' ,

    PARADIGMAS POLTICOS E TRADIESLITERRIASANTES DE INICIAR A EXPOSI.:i.O dos equilbrios concretos. na sociedade

    portuguesa dos sculos XVlJ e XVIII. dos vrios poderes em presena, tildedicar alguma arcnro aos modelos mentais com que essas9ciedade se.~E. .e(':.n.dell ;1 si rn esrn a e a - p : i r ti r ds quais grupos distintos traaram assllasest~;ttgi3s polticas. . .... '.EnriqueedOitradicional perspectiva de biogr afia intelectual da hist-ria das ideias polticas pretende-se. hoje, averiguar sobre as categorias men-tais profundas - [armas de ver. de nomear, de classificar e h i erarqui z ar -que precedem e condicionam a produo intelectual dos autores indivi-duais e, por outro lado. sobre os condicionamentos mentais e conjunturais.que entorrnarn o modo de recepo social desses autores e das suas obras.A dinmica das propostas polticas que podemos encontrar nestes .dois s-culos vive de tudo isto._Y__E:lJsj9._en~te,doi5 .modelos muito profundos de apreenso dos tenrne-,n9s.~ocicais ~UlTI tradicional. qU::',~2 :lfebea sociedade .corno

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    3/36

    I A sociedade moderna con cebia- seC 1 si mesma com o um corpo.A sua constituio proviria. talcomo o do corpo, d.i natureza.A vontade. quer do rei, quer dossb dicos reunidos, n o J poderiaalterar. Os diversos rg:ios so ciais(farn il ias. Igreja, cornunid.rdcs.grupos profissionais) teriam. calcomo os rgos do corpo, umaextensa ca pa cid ade de aU[Q--regubmcnt:,o, Estaconstituio podia ser lida nacradiio, 11:1 hist ria, tal comoconsrirui o do corpo el e ca dahomem pode SCf lida, na 5\1:1histria clnica u , A poltica era,ento, um saber gmco damedicina. pelo q~c as imagenstiradas 11JS obras dos mdicos cdos tisionomiscJs fecundavam.con t inua mcritc. a reflexo sobresociedade. Na grJvura. ilustra codo livro de G. B, Dclla Porra,D e I /a fisioll(ll/:ill ddl'lIll1l1C> (cd. eleIIO.BN, Lisboa), obra lla quaise rcorizavam :1S rclacs entre oaspecto tsico c o rcrnpcrurncnro.FOTO: BN. Lisboa,

    A ARQurTECTURA DOS PODERESdo Conipcnd io his trico da Ullivcrsi'dl1dc d e Co im bm (1770), dos Es ta u u o s d aUI/il1t'l'sidl1dc (1772.) Oll de juristas como Antnio B. Elescano de AragoMorais iDcmcni usot ierno .. , , Lisboa, [785) ou P:Is(oJI de Mclo (Inst ilIlCi ollcsiu r is l1 lis (c cr im inn lis } IIlsicilIl i, Lisboa, 1789] tpica deste corte.Esta scpar ao do universo das leituras e a progressivJ hcgc rnoniz aco docampo ela pro.luco da dou trina poltica pelo moderno vai ser dccisi VJ,pois, por um lado , reduz ao silncio c ao esquecimento o formidvel apare-lho tradicional de produo de ideias (citas sobre a sociedade e o Poder e,por outro, institui o moderno numa tambm for rni d vcl mquina de pro-duo e difuso ele esquemas de compreenso c de raciocnio sobre os tcn-menos sociais e polticos.[V ias, se estes acontecimentos no mundo dos esquemas mentais e dos apa-relhos in stirucion ais e discursivos que os produzem S30 importantes, tam-bm o seu contexto no discursivo o ,Neste plano, insiste-se usualmente na fora dctcr rn inante dos fJctores so-ciais e econmicos na gest.150 e difuso das doutrinas sociais e polticas.rcndcndo-s c a apro xirnar o par adig ma moderno, geomtrico, jusracionalisrada s aspiraes de certos es tratos burgueses, capitalistas e progressistas; eassociando o corporativisrno s foras conservadoras dn sociedade, Em con-Uapartida, aquI, :J .. ,1l}~~li~eo contexto no dlSCIHSIVOincidir sobre a lmpor-rncia conforll1;)dQ a_.qu~ ~i\;{ram ccrts cirCUIlSt3I1Ci,lSdo ambiente poltico 110', / ..surgimento. fortuna ou Iriil:ii 'de deter minadas idelas. Destacam-se. cori-'Ctanlcnt'e;osEl'os-p'lticos ,da Restaurao, a crise de r667 c: o atentado i ic?_ntrat~],?;-C:~:~brligcnd6' ~n~Scis 'os'sc os, a censur; inquisirorial epolii:i(j:~.~~..1]c:() no? p~rr;l:\lnci~1 at ao terceiro quartel do sculo XVIII da'roemJurdio c in st itucion al xio Ai1tigci8::gi,rI},c.,a~a um destes factosioiJlIn~;mbicntcpolrico Favo r.ivcl ao desenvolvimento decerras doutri-.nas e, em contrnparjjdn. inibitrio de outras.Passemos, primeiro. a uma breve descrio dos dois gr:tndes pa r adig maspolticos da poca moderna - o co rpora rivisra e o individualista.

    A CONCEPO CORPORATIVA DASOCIEDADEEM TRABALHOS ,\NTEIllORES (norncadamcnrc Hespanh a, [989J, GIp. I[,n. I) foi sintetizado, de forme vlida, 0l2aradigmJ cor po ra tivo. Nos par-grafos seguintes retoma-se, sinteticamente, essa c'xpO'sio,'O pensamentO social e poltico medieval dominado pela ideia da exis--tncia de uma ordem univcrsalfcsmos). abrangendo os homens c 3S coi-sas, que orientava rodas :15 criaturas para um objcctivo ltimo, que o pensa-mcnro cristo identificava com o prprio Criado '. Assim, tanro o mundotsico como o mundo humano noernrnexplicvcis sem a referncia a essefim que os transcendia, a esse t cl o s , a eSS:1causa fir.l~1(para utilizar uma irn-pressiv.i forrnulaco ela filosofJ;ristotlic;;J;~--q-e os transformava apenas

    na Cace visvel de uma realidade rnais global, cujo (re)conhecimemo era in-dispensvel como fundamento de qualquer proposta poltica . POI' isso tevecnro r.mto cxiro um texto do Dio e s to , que definia a prudncia do direito(que, cnto , desempenhava o papel de reoria poltica) C0l110 urna ci nciado justo c do injusto, baseada no conhecimento das coisas divinas L hurn a-nas (dil1il/(//' oll atqin: ltIl I// O /la flol l rCi'1/11 no ti tia , iusti atque in nist] scicu t ia , Oi-SCSI(1, I, I, 10,2),Por ourr o lado, J unidade dos objectivos da CrIao no exigia que 3S CUl1-cs de cada uma das panes cio todo 113 consecuo desses objeccivo s tosseidntica s outras, Pelo contrario, o, pensamento medieval sempre se mantevefirmemente ag3rrado i idcia de gue cada parte do todo cooperava de formadiference 113 realizao do destino'csmico Por outras palavras, a unidadeda,criJc)o eLI urna unidade' de6rdenao>l (1Illilas o rd iuis, totuu: univcrsolc~;~

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    4/36

    A REPRESENTAO DA SOCIEDADE E DO PODERLigada a esta, a idcia de indispensabilidade de todos os rgos da socieda-de e.logo, da impossibilidade de um poder poltico s irnples. purol), nopartilhado. To monstruoso corno um corpo que se~rflizisse CJ bca, seriaum'iiociedade, em que todo o poder estivesse concentrado no soberano.O Poder era, porll:l.t.~lE~za.,(ep:J.Ctido;e, numa sociedade bem governada,esta partilha natural deveria .. raduzir-se na autonomia poltico-jurdica (ivris-

    diciio) dos corpos sociais. emboraestautonomia no devessedestruir a sua'rr iUlnuj~; l~~I(iJlereTJli,ord , di. iVsiiio IlQ wrae) - entre a cabea e amo deve existir o ombro e o brao, entre o soberano e os oficiais executi-vos devem existir instncias interrndias. A funo da cabea [ ca p u t} no ,pois, a de destruir a autonomia de cada corpo social {paniun: corporis operatiopropria), mas a de, por um lado, representar externamente a unidade docorpo e, por outro, manter a harmonia entre todos os seus membros, atri-buindo a cada um aquilo que lhe prprio ( i l / 5 5l1 l/ll c u iq u e t ri bu e nd i] , garan-tindo a cada qual o seu estatura (foro, direito, privilgio}; numa pa-lavra, realizando a justia. E assim que.a realizao da justia - finalidadeque os juristJ.s e polir logos rardomcdicvais e prirnomodcrnos consideramcomo o primeiro ou at o nico fim,g,pqdqpoltico - se acaba por COI1-fqn.l.i.r.,c9m a manurenoria 'rcl.el:TI.social e pol tica objccrivarnente estabe-lecida. ...--Por outro lado, faz parte deste patrimnio doutrinal a idcia, j antescsbo ada, de que cada corpo social, como (;J,da g,ocprporal, tem a suaprpriafuno (offi'dilli),de'ri6do Cj\ e~ac_ada corpo deve ser conferida a'al ,t9_ri'?IT1ianecesstia para que apossa. desempenhar [ d e I J e l ( . . . ) q u i i h e tin SIlO g ra d tl d C lJ il a ll 1 l iabere d i sp o s it ion em et opera t i onem; Pralomeu de Luca,

    officium Regis, ofncium Capitis.

    EM'BLEMA XIII .En Caput: bLCOp(fi: xj0 lu s N tu r a locecuit;Et to to jCJlu s corpete taus in.cJl.Sic Caput Impe.r f~ Populi cui. corpus obedit,Gujtttt pro cunciis , ypicit, audit, det,

    , :

    A funo do rei e a funo dacabea I) (Francisco AntnioMoracs de Campos, Prncipeperfe ito , Bib, Nac. do Rio deJaneiro. [790). A obra de que seextraiu esta gravura constitui umexemplo (j bastante tardio) deum gnero muito popular daliteratura poltica moderna. Talcorno nos antigos hierglifos, pormeio de um desenho exprimia-seum conceito, neste caso dapoltica. Aqui ':.xprime-~e _a idciade que 3 funo do rei c afuno da cabea. Ele constitui aparte sensitiva da repblica,residindo no resto do corpoapenas o sentido mais rude eimediato do cacto. Ao rei cabe,portanto, garantir a harmonia dotodo e zelar pela sua conservao.Mas no lhe cabe, emcontra partida. chamar a si todasas [unes dos membros.Embora, progressivamente. se vdando cada vez mais destaque : ifuno da cabea, esta metforasempre apontou para umaconcepo limitada do poderrgio que. DI como a cabea,acenes rcorcscnra simbolicamenteo corpo, 'no o podendo, noentanto. substituir nas suasfunes.

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    5/36

    tII1IIli ',

    o -:ounrar:s:no 2:..scc~:.~:.:.:;;:.-a nmCa t1d , estabeleceu- - = ~ ~. 5 c - = :.:rr~a cconsrruo d a -:~::-:-:::?::::::::a e juridica. em que,_. :::: ' :::12 2:r: icid funC ::im C iltJ .i

    ~:~~~:~~~~~~=~~~JL 2- _ = - : . . : : = ::':;::-0

    ::::1 iJ.r1 j . .1ascirumtc da

    A ARQUITECTVRA DOS PODERES

    o f''g . orinci .. vol. n, P: 231. A esta ideia de autonomia funcional dos COf-pos anda iz ada, como se v, J ideia de autcgoverno, que o pensamento ju-ridi medieval designou por iurisdict io e 113 qual englobou o poder de Cncrleis e estatutos (po leS aS lc : a c s ta tu ta condcndi) , de constituir magistrados (po-tes tas m ,.:, .:isirr1l l S cou sti tuend i ) e. de um modo mais geral, de julgar os confli-tos {pa i '-Ia s iu s d iccnd i) e de emitir comandos (p ot es to s p ra e ce pt iv a },Por fim, saliente-se a idcia do carctcr natural da constituio social. Da-qui decorre a natureza indisponvel das leis fundamentais (a constituio)de uma sociedade (de uni reino), pois estas dependem to pouco da vontadecomo J fisiologia do corpo humano OLl a ordem da Natureza. Como escre-vc Manuel Rodriguc5 Lcito, pelos meados do sculo XVII { Tr a ta d o a /w ly tic oc ap ologe1i((J. publicado em 1715), h-de haver leis, que presidem aos ho-mem. que isto dar a presidncia J Deus; no ho-de presidir os homenscom seu arbtrio lei, c razo, que isto dar a ,Presidncia s feras, cobi-ca, J ira e s paixes, como disse risttcles . E certo que soberano ..~_Ys-salos podem temporariamente afastar-se das 1~l.siNtllras--Clec)raenao so-~ ~ Lpela tirania 011 pela rC. .ClIlI.~l)dn:ts9JIlauboVernQ,- contra O qual asprprias pedras c1amar3o ,- (sclnpre um episdio poltico passageiro. O quecipovos jpodcro .~.eleger - emborackocorclo, tambm, com caracre-rs-tic:is ' objccrivas d ~ s : a ; : ; ; 1 5 naes - as formas de governo. A monarquia,. aristocracia, a democracia ou qualquer forma de governo misto, prove-mente do cruzamento destes 'regimes-tipo referidos por Aristtelcs. Comopdrncxplicirare -adaptar s condies de cada comunidade, atravs do di-reiro civil (ius civi e, isto , do direito da cidade). os princpios jurdicos de-correntes da natureza das sociedades humanas (in s n at ur alc ), Mas a cqnsti-cuio natural conserva-se sempre CO[11.9:.Llmcritrio superior para aferir Jlegitimidade do direito estabelecido pelo Poder, sendo to vigente e positivocomo este. Nestes tcrrnos..o direito ~ todo ele, mas sobretudo o natural e>desempenha uma funo con ~;tit~c~onaL Impe-se a todo o poder. No po-.de o~l,.plQ.rnel1os,.l1o.devLseLalter:PO: E isto porque se funda nos prin-cpios necessrios de toda a convivncia humana lalfectio societatis J - . Enoporque se fundamente nU\11pacto primitivo, ou um pacto histrico estabe-J.ecido;por( ;{emplo,ern.cortes, cornosupemos .historiadores .que ...obre-valorizam~o:~(Pa.

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    6/36

    A REPRESENTAAo DA SOCIEDADE E DO PODER

    ~-~. : ... 2 i > : L 1 O A N N I S .J ,-iJ~)arJ.

    A TVRRE CP EMA TAo R D I N I S PR AE D I C A T O R V MSABINENSIS EPISCOPl

    oAe .r. ' :8 . . . E. 'PR..r.ES'l3IT E R [ C ARDI NALISdoilO r tj, cm;n:n fom IJuL r p o n ri f i c i J ac fo cro f tn i l.lJ )o lat:,h

    mtrrprrtu .: ..r c ;Q lf l i j1 Im i .

    ,\ C l P R [ M v M V O L V M E N C A V S A R V M

    - ; ; : / 0 .- : r ~ . D o C T ~ ~~~: S C e : : t ~ ~ E u : . TA n,1 I. c~,;;[L-9.. ;id ':Jrr b ., fJ11rtTTU noJ lra ,d iti,nc pnJ7i/rrim'u -ut longe onmd. tir-ru..J~: 'chc im prcfiJ tn lJ . ,- , pr rub rc nL for i/c 'gnrf crt ''

    cum atPUI ,x tm ptAnbJ lJ contulrrit ,Acccfs ic prretc r ea lndcx locuptcufsimus:

    sies meramente especulativasquanto ao ser da sociedade: trata-se, antes,de proposies doglTlt ~as~_qe pressupemuma verdade e se destinam 3modelar normativamenrea-sociedade. Atravs delas, e das regras concretas'acerca do governo' da cidade que delas continuamente se desentranha, aimagem corporativa insritucionaliza-sc, transformando-se numa mqu ina dereproduo de smbolos, mas, mais do que isso, de permanente acrualiz aodesses smbolos em normas jurdicas efcctivas e, logo, em resultados pr ti-co-institucicnais. Resultados estes que, por sua vez, de novo recorrem aoesquema rer ico-dogrnrico para se legitimarem, num permaneme e inter-minvel jogo de reflexos.

    o PARADIGMA INDIVIDUALISTAEMBORA SE LHE POSSAM ENCONTRAR antecedentes mais recuados (oposioentre esticos e aristotlicos. entre agusrinianismo e rornisrno). a genealogiamaisdirectad~paradigma individualista deve buscar-se na escolsrica fran-ciscana quarroccncista (Duns Scotto. 1266-130E, e Guilherme dOccam,

    1300-C. 1350). com ela - e com uma clebre querela filosfica, a questodosuniversais - que se pe em ~~4yil_a_5eno.legtimo,nJ compreen-so da sociedade. partir do indivduo e no dos grupos. Na verdade, passoua entender-se que aqueles atributos ou qualidades que se predicam dos indi-vduos (ser paler famlias, ser escolar, ser plebeu) e que descrevem as relaessociais em que estes esto integrados no so qualidades incorporadas na suaessncia, n50 S30 coisas sem a considerao das quais a sua natureza nopudesse ser integralmente apreendida - como queriam os realistas. Antessendo meros nomes 1). externos ~ essncia, e que, portanto, podem ser dei-xados de lado na considerao desta. Se o fizermos, obtemos uma srie deindivduos nus.', incar acrer sticos. iricer mur vcis , absrracros , gerais,iguais. Verdadeiros tomos de uma sociedade que, esquecidas as tais quali-dades tornadas descarr vcis. podia tambm ser esquecida na teoria social epoltica.Estava quase criado, P Q : ' ~~.a discusso aparentemente to absrrarra , ummodelo intelectual que iria presidir a roda a rcflexo social durante. pelolT)enos.:s.dois ltimos sculos - O indivduo. absrracro e igual -. aomesmo tempo quedesaparecia 1 do proscnio 35 pessoas concretas. liga-das essencialmente urnas js outras por vnculos naturais c, com das, dcsa-pareciam o s grupos c J xocicdade.Para se completar ;J rcvoluco intcicccual da rcoria poltica moderna staltava desligar -;j sociedade de C :l cr realidade mcrafisica. laicizando a

    Embora castclhano, Suarez viveem Coirnbra desde 1596, onde.incorporando influncias diversas- algumas de lentes pormgucses.como Francisco Rodrigucs eFrancisco Dias -, ensina (desde1601) e publica (em /612) o seufamoso tratado D~ legibJ15 ac De ofe gisla core. Com dinheiro daUnivcr sidadc, adquire umaprecivel conjunto de livrosjurdicos, que detm emusufruto, enquanto vive emCoimbra. Um deles oreproduzido na gravura queostenta no rosto um ex libvi smanuscrito do famoso telogo( Da livraria do P.' Ooarcs.Colgio de Jesus, Co imbra .).(Biblioteca do autor.)

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    7/36

    A ARQUITECTUHA DOS PODERES

    i

    teoria social e libertando o indivduo de quaisquer limitaes transcendeu-rcs, Essa revoluo levou-a a cabo um novo enrcndimcnro das relaes en-tre o Criador e as criaturas. A tcologia tcrnisra, sobretudo atravs da teoria'das causas segundas - ao insistir na relativa autonomia e estabilidade daordem da criao (das GIUSaS segundas em relao ao Criador. a causaprirneira) - garantira uma certa auronornia da Natureza em face da graae. conseguentemcnte. do saber temporal em face da f. Mas foi. paradoxal-'rneme. uma recada no tidesmo. na concepo de urna completa dependn-cia do homem c do Mundo em relao vontade absoluta c livre de Deus.que levou a uma plena la icizao da teoria social. Se Deus se move por im-pulsos ( teo ria do unpetus, de raiz cs t ica), se os seus d?sgni.Qs s;'.o,insondi-,v,~.i.?,_.noresta outro remdio seno tentarcorripfcuder (racional menre oupor observao crnprica) a-ordem do MUflLq..l1s_suas.r:nal}if~.~g.es pura-mente ~xt.exna~, como se Deus no existisse, separando rigorosamente asverdades da f das aquisies inrelecruais. E justamente esta lnicizao da teoriasociaL::-7~ le\l.4~.,;.~a~g p( )10 _P,~.QS,~.lIV;.n~2.llrt9.it~., 8Ji~ ;(U ;k~,e,H.C:trcio, aHobbes - que a liberta de todas as anteriores hipotecas reologia moral.d6~iesmo passo queIibftasindividuos de todosos vnculos ernrclao aoutra coisague no-scjarn as suas evidncias,racionaisc ..os -scusjmpulsosnaturais. reconhecidos por uma longa tradio antropolgica de raiz csrica[ e L 'I' .. ~ ., 1/1 od QlliS q/lC o I , un ciarn col pOl 'is sui [ecent, jure [ec isse cxisliIllClllI'j)(comi dera-se feira de acordo com o direito tudo aquilo que algum faz emdefesa do seu corpo). Dioesto. I. r . 3].Esta laiciza o u a teoria social e colocao no seu centro do indivduo.geral e igual. livre e sujeito a impulsos naturais, tem consequncias centraispara a compreenso do Poder. A partir daqui, este no pode mais ser ridocomo fundado numa ordem objccriva das coisas; vai ser concebido como'fundado na vontade .. Numa ou noutra de duas.perspectivas. Oq;na vou-I~ pde soberana.d.:[)el.~s, manifestadanaTerra, tambm soberanamente, peloseU-lu'gar...:rerlcnte': orirl1ipe' (providcncialismo, direirodivino dos reis). 'Ou pela vontade dos homens que, levados oupelosperigos ..e insegurana., da sociedade natural ou pelo desejo de rnaxirnizar a felicidade e o bem-estar.instituem r- poruirn: acordo de vontades,.:P.QLUm,,,,p,acto, a sociedade civil{contratualisrno): A vontade (e no um equilbrio - ra ti o - preestabclcci-do) . tambm, aorige11 ,():.~direi'to. Guilherme dOccarn descrevera-o oucomo o que 'Deus cscabelcccu nas Escrituras. ou como o que decorre racio-nalmente de algum pacto. E . laiciz ada a teoria jurdica, R ouss ea u definir ale i Como u ne d clarat ion publique ct solcrnnelle de Ia vo lo nt gnrale surun objecr dintcrt cornmun (Lct tre s trit es de Ia 1I101lWg1lC. vol. 1. p. } .Peranrecste volunrarismo cedem rodas as limitaes decorrentes de umaordem superior J vonradeIordcrn natural ou sobrenatural). l\ constituio eo direito tornam-se disponveis e a sua legitimidade niio pode ser questiona-da em nome de algum critrio nor marivo de mais alta hierarquia. Daqui seextrai (na perspectiva providcncialista) que Deus po de enviar tiranos paragovernar os homens (pecadores. empedernidos), aos qua is estes devem.

    apesar de tudo, obedecer. Extrai-se tambm que as leis fundamentais, comotodos os pactos. SJO disponveis. isto . flCtvcis c alterveis pelos homensnum dado momento histr ico. E. finalmente. que rodo o direito positivo,bem C01110 todas as convenes. enquanto produto dirccro ou indirccro dej.1acc.Qs._so justos. O que: corno' logo se v . .: o fundarncn ro do modernoindividualismo.Note-se. no ent auro, que ;i :idei:lde ump3C'tOna origem das sociedadescivisnoera estranha :. teoria pohricat radicional+S-que ..estepacto apenasdetin1a:l forma de gO\TF-no '(qucAristttlts'considcrara rnurvcl). n50'j.aforma dep qfl c.r.,--E ._ iT '~CSmO .aquelavuma-vezestabelecida. consolidava-se emdireitos adquiridos t ium=radicata ) impossiveis-denlterar. E note-se. por ou-tro lado. que JgU;-J1J CO,Te,][C menos radical do pens;J1lenro poltico indivi-dualista (norncada men tc Sarn ucl Pufcndorf, 1632-1(49) procurou temperaro volunrar ismo corn JlgllJ S ingredientcs objcctivistas, considerando que.urna vez instituda J sociedade civil. J prpria natureza desta impe aos i;-J-divduos direitos ~ue. ?O .sso que so - direitos-deveres (l:Oiriaj -. eSCJ-pam JO arbicri ';] vontade; como lhe escapam aquelas normas qu' nc m

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    8/36

    A REPRESENTAO 01\ SOCIEDADE E DO PODER

    i ,

    parte da natureza mesma de urna sociedade (como as que definem o que c oPoder e quais so as relaes entre principe e sbditos).Para alm destes pontos comuns. O parndigrna individualista e voluntaris-ta na coriccpcoda sociedadeedo _P~_clSr.dcsdobra-sc:cm,.ccrtas correntes ti-.picas. f . .''Por u rn lado.ino providcncialisrno , que concebe o Poder como produ-to da livre vontade de Deus_~c~:;.:t:.rc:i~,~claa Terra pelas dinastias reinantes,-Qllc:lssim er:Ti-r'e \ ; e s r e E l i - c l e uma clignidace quase sagrada; 'que as aurorizn-va-rio.cs a exercer. llrlpodCi-''(emporal ilimitado; -rnas-ainda a rutclar.vasprprias igrejas l1ai:i6ni5'(gii'c~nism.9), A sua expresso mais caractcrfstica a do pensamentciJ.b501~ltist-;i'TrJncs (jacques-Benigne Bossuet [1627--1 704] . Politinuc tirc de l'Ecriture Saillle, 1709; Cardin Lc Bret [1 5S 8- 165 S ],De Ia souve ra ine t du n>i, de SO/ l do ni a inc e t de sa COIO'OlIl1C, 'j32; Armand-Jeandu Plessis. cardeal de Richclieu [1585-1642], M ni o ire s , niaximcs ri pnpic r sd'lac. Tcsla/IJCUI jJt1 / i r i q l lc ), mas aparece tambm numa clebre obra de Jai-me I de Inglaterra (r 566- r (25), The (m e law oIJi-ce monarclties, 1598; Basili-lion da ron (1599). J que Francisco Suarcz ( r 548- r 6 f7) respondeu. do lido do,pensa m cnro poltico tradicional (De(l'IIsiv Jid cathotiou: .. Coirnbra, 1 < i 1 J)~,. -, Por outro lado. no contr arualisrnoabsolutjsta. ..que concebe o pacto so-cial como transtcrilldi:l,-p:i:r;i--9S.govcrnanrestodos os- poderes dos cidados, ecorno definitivo . Esgotando-se os direitos naturais naqueles transfcr idos cQ$C:i,,?t:.rec(:ilccendo outra tome vlida de obrigaes (nomeadamente. a re-ligio), o soberano ficava, ento, livre de qualquer sujeio (a no ser a demanter a- forma geral e nh.rracta dos comandos, o que distinguiria o seu go-verno da arbitrariedade do governo desptico). O nome exemplar , aqui,Tho rn as Hobbcs (1588-1679, Leviatlian ... , 165 T ), numa verso em que oatesmo prtico foi limado c em qUE, apesar de tudo. subsistel11'o.fficia in-derrog:veis, mas em que o absolutismo mantido; daqui se aproximatambm Sarnucl Pufendorf (De o fficio l ioniinis ri civis prout ips pr o cs cr ibu ntu rlege naturali, 1(73) que, por isso, se torna a cartil ha dos regimes absolutoseuropeus,Por fim, neste quadro apenas sinptico,o contratualisrno liberal . pJra, o qual o contedo do contrato social estaria limitado pela natureza mesma.dos seus objcccivos - instaurar uma ordem social c poltica maximizadora'dos instintos hcdonistas dos homens. pelo que os direitos naturais permane-cerram eficazes mesmo depois de instaurada a sociedade civil. mantendo osindivduos rhr. suprcrnc power to reverso _or alter thc Icgislarivc, when}hey find chc lcgislative act conrr'y::to_ 'thc-chrust reposcd in rhern Oohn'Lo 'c kc :--O ll cil'il,t(ll'crllilll/IC(690;'XIll), Por aqui alinham, alm de J. Locke(1632-1704), J. -J, Rousscau (1712-1778):--. ..'

    o CORPORATIVISMO DA SEGUNDAESCOLSTICAEM ESPANHA. EM I?ORTUGAl E N/I ITAuA, circunstncias varias de naturezaeS frtu-~;r~-onjunrurai promoveram uma mais longa sobrevivncia do pensa-mel~f6j)Ql(iii:9 ~co~por~ti VO, Facrorcs esses que - mais do que o prcdorn -1 1 1 6 de um estilo n : como querem alguns (que. de resto, parecem CqUI-.vocar-sc pr ofundarr.cnrc quanto ao que seria o barroco no pensamentopoltico') - cxplica rn o franco-preriominiodo corporativisrno at aos mca-dos do sculo XVJ . .. .. .. ..A estreita vinculao do pensamento poltico seisccntista portugus sconcepes corporarivas na sociedade foi j rcalada por Martirn de Albu-querguc e Lus Reis Torgal '. 'este texto, retomam-se JS suas concluses noqucrcspcira JO sculo X:I, procurando-se detalhar um pouco mais a evolu-o dos perodos joan.no e joscfino.A.idciad.:l~.1l1edia;;o popular de longe, ;1 mais comum na literatura P.9-Iftic;t .ponugu~sa~

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    9/36

    . ,I ,. . . )01 \

    [> O ca r ictcr regulado do Poderna so cied.ide do Antigo Regimeexprime-se por uma srie deaforismos que sublinham a cstriradependncia do rei em relao lei. A frmula princeps a l e g ib ll s.ollllllS (o prncipe est excuso daobedincia lei) no libertava orei dos Iigames da lei divina c-natural; c. corno esta ltimacontinha o preceito de que pnctaS W I I s c r l l a u d a (os pactos devem sercumpridos). acabava por seentender que n.10 era nem justonem honesto que o rei faltasse palavra dada, num pacto ounuma dcclarao solene como alei (Francisco Antnio Moracs deCampos, Principe perjcito, Bib.Nac. Rio de Janeiro. 1790).

    Fronrispicio do l ud e x p er f e c t l ls , deTorn de Vclasco, 1652. TambmJ imagem da Justia e dos juizesmodela roda a reflexo sobre oGoverno e os governantes. Nasua misso de manter a ordemestabelecida, de dar J cada um',oseu (iu s SIIHJ1 C I I iq H e tribucrc v. o rei. antes de tudo. um juiz. O reiperfeito um juiz perfeito. Peloque li rcrn rura como a que sereproduz s aparentemente deixade se relacionar estreitamentecom a literatura poltica.

    D.D-CAtll\H ..JS I.VAiu.rDE VELAS'CQ,RfGLE 5ANcre FIDE. I ChNCGLLAR.1}J,__ ~VJ.~~A :l,~~t::J;tw.TOP.1.S.:

    rVDEX PERFECTVSr 5 yt)l: IVDiCE [Til F;:CTOCHl\.[STO ESVDOMINO NOSTROV N I C E P r: F..F E C T 0,

    ,: .1:. ~;~~.~;~f.O\ \VD11~_-.......,t.o-.f_:'}...o~_-.'':''~..,

    J .f; C ; ; . . : . z . C W :z. -e . : . I , ...,. ,w ,(4)'

    A AfiQUiTECTURA DOS PODERES

    partir de uma lei rgii (J que j5 se referiam conhecidas fontes romanas, Di-. este , I, 4, I)estabe t:cid; por um panos.Na doutrina polirica portuguesa. o. principio da origem pactcia do Podert:stvi,10d\rii~ subordinado ao principio hereditrio ( Os povos dos Rei-nosdePrtugalcdos Algz'vesro podem eleger Rei enquanto houver pa-rente algum que descenda do sangue' Real [... l u Ai lega c5 de direito r ..j porpa r te d a Senho ra Dona Ca ta rina ... , 158 I, apu d Torgai, 19S I,vol. I,P: 262).Mas. por sua vez - e aqui reside a vincula o tradici onal deste ponto devista -, o princpi_~_(I~_~tJS:c S~()~~t~ subordinado ao bem comum, pcrrni-til99. ..quer '0' fastamento de herdeiros que n o tenham as panes nccess-rias (como acontecer COIll D. Afonso VI) , quer. do rei que governe m-al ,pois, como escreve Joo Salgado de Arajo, CD Ia su ccs i n de un Rey no ,se considera Ia uril id ad de 10 vas al los. y no el provccho particular de 13 pcr-so n a dei Rey que sucede, porque e l Rey no se e li g c para s, ni para suprovecho, sino para cl proco munal dei Rcyno [ ... 1 ) ) (Lc)' re g ia ... ; cit.,fl . 107 v.].Por isso - a inda que este pacto no tosse in voc vel pelos sbdir os, nopno-'do direito civil. para obter sa tisfa o judicial dos deveres do rei. como.defendiam os rnonarcrnacos e como foi praticado. em ln gl arc rra, ;]0 trazer:o rei a julgamento do P ar larncnco, sempre: ficava aos povos - parJ. alm dodireitO de exigirem do rei, inc lu siva mente em juizo, o respeito '9g? ,~i-i: ~iiqlli.sTiiq5rpac'ros'''sbsequen tes ( ( ,

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    10/36

    A REPRESENTAAo DA SOCIEDADE E DO PODER

    P nre to lrgj, qu fqnis ltgem tule ris , Re-gulll Tribullal.

    Principis 1 1 1 l j n i / . Pr in ccps P re te riu a rma.Dirna T i : . , / , i n ( J Toce n o t a t a capit,

    Hoc.f .fs R i ; 7 J em , r=Ncb/s /ltcl'Cjcrro.sil mU7 iS [11 NOjti'l1l1l pIK[W lIf'1ligc [ ,rput .F i rmius b a ud a tir e}', P rin cr ps j cr (( iu r a p11l,:rbl.Q ,m d um tcfv.bd is / r g i b l l s ipJi: tuis,

    LM'BLEMA LXllI .I fl e A th (. n~& > faderct tol ' 4uLc,. '. 'Provcde C Lr cwn pr a p rlU m Tribunal,C r J l 1 f c i a s ulci s SophiJ :.7Jolcbcr . t

    , ingm Mufos, ,Ncm pc ubi l c J G S pl pode o Re yno [.. ,] tirnr-lhc o governo, quando assim for neces-'sario paLl a SUl couscfvao, e dcfcnso natural, mas no pode eximir-se,nem limitar a obcdicncia que deve aos Reys, seria s para mesmo fim da.dcfcnso natural (i/lid., p. 234). Q,uvoto de Nuno da Cunha- muito es-clareccdor do estado da doutrina poltica da poca. Por um acl.o,irIsiste-seainda - gnC9.9pro\i idencialismoj largarnel1te doninantell j:Lc[1t[odaEuropa - l1a.origem. J,J.J.crcia.do Podere nos direitosnparlamenraresu que dJadvinharn. M Js, opor outroIado. to mam-scdistncias-ern relao:l~, TI.0nar-cmacos e,l)q.,~?2;.de Portugal; aos partidrios do governomis[Q>Qua1toJOS primeiros, reflltJ-g: que, salvo nos casosd o pactooriginal ter 'institLl-do 1I111goverI1o misto, os parlamentos possam normalmente limitar os'po-dcrl'5.,do .c n;i.,Muito menos, dep-Ia e julg;i..:lo, como o tinham feito os In-glcs~s, r uj o exemplo expressamente citado. Quanto aos segundgs,reconhece-se que a monarquia portuguesa pura e que, portanto, os. ]30-deres.da5.cortesn05opt:rmaner:te~(iH,J qll).mas apenas potenciais (n ha-iw), para os casgs. de tira[li:'Seja como for, J concepo corporativa com ;J SU;J referncia a uma or-dem natural I) de governo e aos deveres rgios da decorreriresvintroduziairnporrantcs l imitaes ao poder.real, advindo da imporrantesc'Oni~Ll'n-cias jurdicas e instituciona is. De facro, urna vez que a doutrina cor por ativado poder estabelecia como ncleo dos deveres do rei o rcspitriajusria,

    129

    . O Tribunal dos Reys, sabio chrilhnnrc (Francisco AntnioMoracs de Campos. Prncipeperfeito, 1790). Porque asScicncias todas de igual sorte, IDia as maos entre si, e todastecem, / Hurn discreto direitoinda mais forte. Este emblema- e, sobretudo, a legenda que oacompanha - destaca a relaoestreita que deve existir entre odireito e a sapincia. Na verdade,decorrendo o direito da naturezadas coisas, de nutre-sepermanentemente do saber,objcctivo, baseado na observaoc' na prtica. sobre as mesmascoisas,

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    11/36

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    12/36

    A REPRESENTAAO DA SOCIEDADE E DO PODERComo a consriruico radica na natureza da sociedade e esta 5C observana tradio, o estado algo de natural e tradicional, objcctivado nu-ma possen. ou seja, num direito, adquirido pelo tempo, a um reconheci-mento pblico de um cerro estatuto. ' ,,-'Este estatuto comportava certos direitos, mas tambm certos deveres. E,sobretudo. uma obrigao de assumir em tudo uma atitude social corres-pondente ao :'5t;j,do. atitude que a teoria moral da poca definia comovhon-ra ,,'(Jio ti i-)l ., Por oposio ~ virtude (virtus) - disposio puramente irire~'rior -, tratava-se de uma disposio externa, de se comportar de formaconveniente s _regras .sociais do seu estado.' . ,Na sUa-formo mais difundida, a aura-representao da sociedade ~edievalc moderna via-a. como se sabe, como dividida em trs estados: clero, no-breza e povo (O rd enaes -a fo ll s i/la s, I, 63, pr.: [... ] defensores so um dostrs estados que Deus quiz per que se mantivesse o mundo, ca assi como osque rogam pelo povo chamam oradores, e aos que lavram a terra, per que

    os homens ho de viver e se mantm so ditos manrcnedorcs, e os que hode defender s50 cha rn ados dcfcnsores). Mas a estrutura estatutria era mui-to mais complicada na sociedade moderna.Desde logo, tende-se a distinguir, dentro do povo. os estados limpos(como o dos letrados. lavradores, militares) dos estados vis (como os ofi-ciais mecnicos ou ar tesos). este o sentidodaclassificao de um juristasciscentista portugus, Melchior Febo (sculo XVl)- t r ipticem in nobilitatcstatum, altenn uo bi lcm , nicchanicum, artlfi'iliq i'ie 5ede ri lllrilllll altcrum, ultinnunpr viiegia lo ru /II, qu i niilit ia e , ve i ar te a so rd ida m une ribu s exim antu r . [no que res-peita nobreza (secular), existem trs estados: mil, o nobre, outro, o mec-nico e arteso. o ltimo, o dos privilegiados. que, pela milcia ou pela arte,se libertam das profisses srdidas]. Tambm progressivamente, este estadopopular intermdio entre a nobreza e as profisses vis - estado do meio ,privilcgiados , nobreza simples - vai sendo assimilado nobreza e, noseio desta, vai-se construindo um novo conceito diferenciador, o de ('fidal-guia, ou mesmo. mais tarde e por influencia espanhola, o de grandeza(Monteiro, 1987) f}.Esta extenso do estado da nobreza (Hespanha. [989a, pp. 274 e segs.) - esua consequente pulverizao por classificaes.suplernentares --:-:-fica mani-festa ao ler tratados da poca .sobrc.a.natureaa do 'estado nobre ' , A. reco-lhendo classificaes anteriores (A risr reles, B rtolc) e adaptando-as a anti-gas classificaes das fontes portuguesas, distingue-se nobreza natural enobreza po ltica (ibid ., n . .200 e segs). Na primeira, incluem-se o prncipe,os nobres ilustres (correspondentes aos titulares e fidalgos de solar;cf O rdenae s fi1p ina s , v, 92-120), os nobres matriculados nos livros da no-breza (cfidalgos rasos; cf Ordenaes fi1 ipina s , n, n, 9; I, 48,15; m, 29; 11I,59, [5 e V, 120); os nobres por fama imernorial (O rd en aes [ilipinos, lI, ll,7-8); aqueles cujo pai era nobre (Ordenaes fili pit ta s , v, 92). Neste caso, apertena ao estatuto decorre da natureza das coisas e prova-se pelos diversosmodos de manifestao da tradio (desde a prtica de acres que competemaos nobres at fama comum e firme, ibid. , n . .209 e scgs.), eventualmen-te ratificada por 3C[O Jurdico forrnal (como a sentena). Como natural. estanobreza . tambm. gencrunva , ou seja, transmissvel por gerao. J anobreza poltica decorre, no da natureza, mas de normas de direito posi-tivo, dos costumes da cidade (n. 26.1-e segs.). Deste cipo a nobreza que seobtm pela cincia, pela rnilcia', pelo exerccio de certos ofcios., peloprivilgio e pelo decurso do ternpo .Tambm estado do clero (Hespanha, 1989a, pp. 257 e segs.) se estendeprogressiv;;mence. embora em muito menor grau do que o da nobreza. Paraalm dos clrigos de ordens maiores, gozavam do estaruto eclesistico clri-gos de ordens menores (censurados e de hbito, servindo ofcios ec lesi sc i-COSi'): Ordenaces jlipuas. [I. 1,4; n, 1,27) (Manuel Alvares Pegas, Commen-fa ri a ui O rd ino tione s Regn PorlUga ll ia e, Lisboa, 1669- [7 59, tom. 8, p. 281,n. 3 c seg s.), os cavaleiros das ordens militares de Cristo. Sanr'Iag o e A vis(O rde tla e s flipillas, I. 12), desde que tivessem cornenda ou teria de g e semantivessem; ou 05 Cavaleiros da Ordem de Malta (lei de 18 de Setembrode r602 e 6 de Dcaernbro de 1612). Mas, para alm disto, no poucos lei-

    1

    o doutor Antnio de' Sousa deMaccdo (m. 1682), jurista e:diplomata, o autor de umainteressante obra sobre asqualidades do jurista (Pe rfw t/ Jdocto r i/I i)lIaCllmq lle sci e u tia ,nia xime in jure canonico, et civile,Londres. 1643), um verdadeirocompndio da auto-rcprcscnraodos juristas, contendo normasque vo da alimenrao evesturio at s leituras (Bancode Portugal. cota: : : ' . : : ' . . 7 1 ) .li) Banco de Portugal, Lisboa.FOTO: A_ SEQUEm .

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    13/36

    A ARQUITECTURA DOS PODERES

    C O RP O R ISIVR IS CANONIC Irostss jg/JVS

    G:iATIANIDISC O RD_ '\NTIV~l CA:m,-Y :- 'I'DECRETVM

    A COHRECTORI[1\,S RU~I/l.l\ISt.ucrtcxmvs xovrs \', ,,I tA I.n n r s

    C1ITJCII, u it r o e r c r s ClIlIOSOlOlilCl1~ 1;1 .\rlIH>

    D . A coroa no dominava umaboa pane do prprio direitovigente: um exemplo tpico disco constitudo pelo direitocannico. Na imagem. o C 'P 'iu r is cnnoniri (ed. de Hallc, 17n),'coleco cann ica do direito da19n:ja, compilada entre ossculos XII e xv. Vigorou

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    14/36

    a A REPRESENTAO DA SOCIEDADE E DO PODER

    outros observem as Leys. e desajusrarsc clee dJ.5 da razo, hc querer hl1IDbruto formar homens, ib id .] e pela medida da prudncia ( :I Prudencia (... )Princczn das virtudes. ib id . p.]. G.'.pr:iIKip-~:i,fi~9.,.c_o.rno~8l?J:ig~,:h=l,;,

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    15/36

    : _ \/ ; ' : '' ' : ' : ' ' : : ; ~ J ' ~ , . ; : ; ' . { : : ~ ~ ~ ~ . ~ ; : . 1: ; 11.] : .J ; :~ '~~ J i ~ l a:;' L. ~l; .;a:11I ',:t:: ',;'''. ;t:. r: :~'::. ;.~_G.;:;rl~:i'.:.I :1':.: r;:h:'r ..2 - , ~ : ~ ~ l ~ : : ~ g : ~ : ; ; ~ ; : : ; ' : ; ; : ~ ~ , : r ~ ~ : : ; , : ~ : : ~. : ~ ~ : ~ , ~ : ~ : ~ : ~

    ~~ ~ : ~: , ~ : :~ '~ ~ '\ ; : ~;, '; ' ,' :~ .~ ;~ ~ ~ : : ~ : ~ ; ;: ~ .~l ~ ~ I I : ,' ; 1lt ~ U~ l~ ; : ;~ ~ ~ ; : ~; r . : : ~: : ; ; : ~ : ~ :. : : : : : ~ : , . : , : : : ; ~ : : '; i : : : : ~ r ' : ; ~ : ; ~ ; : ~ : ' I : : :\ t

    l~fJ /fllfl ; ;JI .IIII,rc. t;i:;1 7/'j li:,. :J\.::tl l.l;~llll.Illiti.{.ilr.outLlII\.:.: f \:l({U.J \\.,jul~t:\~ll~11I~\J11Uh}ll' tllb'h:II,:I h. I~I~I1p: .l:(qll:1 1:lll h::~::;,,-l.dli-I'I\I'.ll.:n:' .dH:4101 nc.t Irdcrc n \:\IIn ~tJ q1I. rrt-h, ..:Jc . . ~ Iunv prtl\h:I~i.\ rir ,ijllln:1r111U. .It,J :;IU'm\l.1fUll\l n : r u : ; : t ' ; ' : . : . ~ ~ : ~ ~ / ; . ': , ~ l ; ~ : ; ; ~ ~ ; :II1~1'1 1~II:I.l.

    11.1'''lli; l .h. '..I .. ,j).I;,intlln.I~,lunlo.mo,iJ~ ,ji..:it~I:.Vuo modo cum i.I.q' C':~.1'l:f;r~III\tIIl'..I1: h,m\HII ~'Il. I\1S.:I'l1U:: v IU:,II,I'II: ' : i ' , t ~ ;r ' - : ; , I , L ~ ~~ ' : , ' ; i : ~ l1~II'I,I,~~':~,I::I[;~ \ H< ~ ~ ~, ' , i : i : : ~ : : : ~ :~~~: ;.1 : '1 , , :1 1 . 1 11 11 W:\III.\tl.lIltIJ.II:-h\l:.I:IIlIII. i\.t ' l;'

    Fragmento I 1 / / I~ S populi doDigl'Slt> (D., I. :1, l)). Foi combase nesta lei que os juristaslegitimaram a cx istncia dedirciros prprios de cada reino.para alm do, ou em oposio.ao direito natural e comum (doimprio) e. com isto.possibilitaram o dcscnvolvimcnrode um saber jurdico fundado nale gislao e na prtica dostribunais de cada reino.

    I> ,.. equiparao do prncipe aopastOr (e , por cxrcnso. ao BomPastor) cc ntrnl no imaginriopolirico moderno. Mais do qlleno temor, o governo daRepblica funda-se no amor eexerce-se pela brandura. Nostinais do sculo x vnr sublinha-se,no entr nto , a funo dirigente dorei, embora este a deva exercerde forrr:J suave e pastoral..0cevo o rebanho; oPrncipe. o pastor; o ccptro. avara. Por isso. que o Rei=?Jscencc. dirija c veja(Fr ancisco Antnio Moraes deCampos. Princip c [wjlO, Bib.:-;;:c. Rio de janeiro, 1790).

    A ARQurTECTURA DOS PODERES

    No en tanto. J arcnu ao da pclrnica anti-habsbrg ica e o progresso dasinfluencias das correntes mais modernas do pensamento poltico (seja . darazo de Estado ca t li ca espanhola e ital iana, seja da poltica crist fran-cesa) vrn vul ga rizar as referncias a uma poltica catl ica. No terceiroquartel do sculo XVII. Jacinto de Deus v a sua Brac ri/g ia de prncipe s (Lis-boa. 1671) de fini da por um dos censores como obra de d outrina poltica.poltica catlica. Trata-se, na verdade. de um texto de transio. em que. ar~r de frmulas de acordes absolutistas, como a cornparaco do prncipe aoSol - invocando a sabedoria gn srica dos hierglifos egpcios. em que oSol era o smbolo dos reis (p. 96) -r= ou a in sisrn cia na im portncia da famae da reputao. s e : segue dizendo. maneira tradicional, que a repblica no~ para o rei, mas este p:tra a repblica (p. 275). ou que a fama. & a cons-ciencia so as azas com que voa a soberania (p. 2 -1 - .1 ) . O mesmo se poderiadizer da Poltca prcd ic.ive l (1693). de Frei Manuel dos Anjos.

    o PENSAMENTO POLTICO CURIALISTAEM TODO o C:\SO. IMPORTA DIZER que dlW:.I],~~IT1CI?.ro:p.ClF.tiC:Qa Contra--Rcforrn a fazia. tam~~n.~p'aneuma()l .EaE9ii~,t,c).que.l.loj~ classi fica ra mosdcsen(i; integrista ;: protagonizada pelo ~rdeal Roberro Bcl lnr rn io

    (1542-1621 , De 5/( /11 /)/0 {J() J//(ficc. 1586. e Tractatus til' Pll/I'S(,lIC sununi pO llri/hisin icbu, tcm po ro lbu s , 1(10), '.CJ..~s.jfirnlaVa urnasupremacia dCl:p;Jp.a.Q.Qobreospcderesre ..mp9r~i.s: aliccr~ada;~doutrinade que era o vigrio dcCrisroq < : n - i -mediava a ouirga do Poder aos prncipes (pO(I'S{(/S d Dco pC/ Pa-p,ll i)2~ . Asa rtcep_~qemrPortugal foi. porm, muito ..dificultada pela iu-fluucia do rcgalisrnoibrico (Francisco Salgado de Sorno za, Tratuuus de rc-~ ~ la plorwi,,/Ic ... I

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    16/36

    A REPRESENTAAo DA SOCIEDADE E DO PODER

    o ABSOLUTISMO PROVIDENCIALISTAo TEMA DO AIlSOLUTISMO conhecido da literatura pro videncialista doabsolutismo francs. Bossuct escreve que Deus goven'tods o s povos,darido-lhcs a codos os seus reis. Os Prncipes so ministros de Deus para obem: so sagrados pelo seu ofcio como representantes da lVbjescade divina,depurados pela sua providncia para a execuo dos seus desgnios (Politi-qu c lirr de l'Ecriiure Sainte, 1709). Era a tese da origem divina imediata eloPoder, curro-cir cuitando quer a mediao popular, defendida por monarc-macas e por Jesutas (mediante to nsi lio mil e lec tio u e hu m ana , cardeal Bellarrni-no), .guer..a mediao papal .purantco sculo.:.X'yII, ..a. influncia do. pensamento absolutista francs emPortugal'parece Ser muito pequena, reduzindo-se pratica mente a Manuel Fer-nandcs Vila Real (EI po lt ico cnsti a no , Parnplona, 1641, Paris, 1642 c AntnioHcnriqucs Gomes (Po lit ica a ngelica , Ruo, [647), a quem mesmo D. FranciscoManuel de Meio chama, signficarivarnenre. portugueses enxertados em ga-los (Torgal, 191)1, vai. I. pp. 208 e segs.). Assim, o primeiro - num passoque a lnquisico condenou - considera os desacatos pessoa do rei mais nc-ccssitados de castigo do que os desacatos rcligio (Torgal, 198 I, vol. 11 ,p. 220). Mas o providt;:l1sialisn1{:J' das correntes sebastianistas - nomeada-mente o do padre Anto,~io\/i~ir3' '=-~aodeixade favorecer; afir ial, a ideia' de. que no rei cnus .dinastias deps Deus uma funo escarolgica.orevelvel.pelo.eS[tld~d ..~lIi:ai~~~~i)f.~qt~s.,_(li,tc:.~.~.~~raproftlcaecabalstica. manipulaes.nu-ll1ricas,etc:). . ... . .. .

    '-N-s&ulo seguinte. UIll providcncialismo deste tipo continuava a vicejar.Logo no incio de Setecentos, Sebastio Pachcco Varcla, um monge asceta preco-cemente morro. aproveita algunsconci'os-muscis'c aritmticos para propor:10 prncipe (D. Jos) cnsinamcntos de poltica . Parte de um tpico correntena literatura conccptisra - O da proximidade entre J msica e a poltica -.explorado com a aguc.h:za tpica da poca. A poltica em causa a virtuosa(p. (I). ou carholica (a que se refere o ttulo), atacando-se duramente Maquia-vcl e os athcisras praticos - e mesmo Tcito. imitador de tiranos (p. 345).Mas o providcncialisrno que repassa toda a obra - e que chega aos conheci-dos extremos da teoria csotrica dos nmeros, descobrindo nas datas, por ma-nipulaes aritmticas. significaes ocultas (v . g., p. 40-,P) - refora a rligrii-dadc do rei, escolhido por Deus. Ele no apenas o Sol d a Magesrade(p. 1); tambm o Desejado (p. '1-7).

    \l Povo sem Rcy, hc semPastor rebanho (FranciscoAntnio Moraes de Campos.Principe pe rfeito . BibI. Nac. Riode Janeiro, 1790). A oposioentre a lei cega da natureza(abelhas). a desordem anrquica(gafanhotos) e a ordem dassociedades humanas. sob Ogoverno da lei temperada pelogoverno poltico (rei) constitui Omote deste emblema ,

    HOlntl lLLlllRegilllenDeos pofci ti Lx Icx Gi CX, uni 11011clt Rcx ,

    EM'BLElvfAXI. EM'BLE.MA XX.0Ji.l Grex} Suni ham inc):Paflo r~C;lCilill5 almus.n papas Numen p o J i u l< 2 t, =e=dccct;Q E i rcgi t , fpa fci t lrfortalc5,Numinis tnftar8 gmlt;, haud abra, qui reg a, aptus ;rlt . . ,G,(X papullls,Princ~ps Paj tor,Sctplrum fi: bacillus.Rcx .erga paf la t, d ir igaL , at quc re i7t.

    D'j 'pcr rlil (d Ia prf

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    17/36

    o car.irtcr pnstor a cio poderreal rem l..Ii11J traduco ccnu:a crudiversos CLTlt11011iJi5~ queinculcam a idc ia de quc reinar um servio e de qlC ao reicompctL' sobrc mdo defes;] dospobres c dos m iscr vcis. Porisso. o rribunal real': o toroprivilegiado dos pobres. dasvivas t , dos rniscr.ivcis.1). jo.io V na ccrimnia dolava-ps (C( t ()S\.) ,ili C.\'jJ{1.';(ljl1 dt'do (HII/C'1l rl.\ c obra s fl . 'fc lfi l 'LT S H is tr iu d e Ld',,. csr. I,~.DN.Lisboa. cora: DA Co :-Iv.),FOTO: BN. Lisboa.

    \ Dur.uitc o ~l:rlllo li:VrI houveduas u-ntat ivas dc instaurar emPorruual modelos muis .iccivos degoveriio. llue rc voluci ona sscrn.sob o impulso do poder dacoroa. ;1 constituio do reino co seu viver habitual. Uma delasfoi J do conde-duque de Olivarcs(l21-I40); outra. a deD. Afonso V. apoiado nu condede Castelo Melhor (IM2-16~);qualquer delas t Jlholl.' tendo-sen:gress;1do a \I m governo baseadono primado da ordem rradicional

    . C nos modelos jusricialistas.Na toco: Conde-duque deOlivarcs. por Vel izqucz (Nov.iIorquc, Thc Hispanic Socicr y 01Amcricn).

    A ARQUITECTURf'. os PODERES

    A tJ . .. l1rJrr . xr..\l'l\f~ ;'\1 'C\':'; Tn ,\\~~.IJH,,,i.L R~:vDO.\\ J O Jl (lI'ISTu j)f.I lIUI ;AJ. .J : Y - - .1 . . .. - . . r-...,L J-..r-.~A.I........ J .. . . - - . . .J ... _ ,. - - . . ; ., _ _ - .~ ~~ ~. . . . : . ...._ .... . _ .... ..... .. ..._ ~ / .. .~ti r - . L . . i r J . J . . o . i

    SENHOR . ,~.C~~

    Jlilio de Mcllo de Cusrr o. uurn elogio feito a Lu s Como F01ix, o au t o r deum a verso de Tcito (T.ic;f(1 p HU,IJlCZ. Lisboa. 1715:>' chega a COI11prar oprncipe divindade. atirmando, simultaneamente. a sua cornplcra autonomiado JUzo humano: So 05 Priucipc divindades humanas: inrcutar pl':leer~r--lhcsas rcsoluccs, parece que hc cscrupuliz.ir-lhes os artriburos 1 . . . 1 s nasce-ro p3ra ser julgados do A lrissimo, & parece hum a espcie de hous.idia. COJ11cirrunsraucias de sacrilcgio, quereqllOs dcrogar C0111J censura, os privilcg:osque Ihes dco o Cco C0l110 nascirncnro. [lnurnerado] Tambm o juriSLl DiogoGuerreiro C:1I11Jcho de Aboim. apesar de autor de uma obra de polric.i (< < v 'r-dadcira bastante tradicional ( E s C t , Jn moral. po litica, chri s t , [uridic, Li..bo.; Oc-cidcntal, 1773. pp. 21)-30), pela mesma medida da piedade, se recusa J dissertarsobre JS virtudes dos prncipes, :10 mesmo tempo que decora os reis com ocprcro de liVicc Dcoscs 11:1terra .(p. 2J), 05 declara de roda a lcv hi manaizcnros, so [cvs vivas, c tazcrn entre os homens a tigura de ])COS', (p. .j.,'). Em1750, Filipe de Oliveira. numa Om.iojil/ll.'lm' pnllL:~yr;((/. /' ; s/(1 r;[

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    18/36

    A REPRESENTAO DA SOCIEDADE E DO PODER

    mio de: F~,ri~ insiste. dizendo que -no lu duvida, que os Reys sam Se mi-dcoscs na rcrru. e Vicercgentcs o Supremo Ornnipotcnrc. e por isso lhcstorna a competir o nome de Divindades (p. (1)0 Deste modo. participan-do cl lcs no Sl:O StT humano hu rna grande parte dos Attributos Divinoso queprovem de Dcos da sua independente simplicidade. podemos dizer. que e1-les por virtude da SUJ simples. e indcpcndcnrc absrracco. sarn puros. sarnpertcvros. su m unires. SJm hurn na csscncia , e rnuyros nos applauzos [ o o 01 esarn J maneira de Dcos sirn plicissunos Revs completos 1 1 (p. (9)0 110 que pa-rcce Ser uma clara relao com o rema bodiniano da indivisibilidadc da 50-berania. E. ;1 propsito de outra crtica. termina Damio de Faria com aafirrnac.io de quc os reis usam Imagens de Deus. Delegados do seo poder,Legisladores supremos por participaco da authoridade Divina, Vicc Dcosesna cerra. com pleno. absoluto: e disporico domnio; no oficio de governarsemelhantes :10 mesmo Dco s. e que rcprezenram nos seos Estados a Digni-dadc de Ponrificcs (p. 3/).

    Enfim. Trata-se do pr0t:r:1I11a completo do absolutismo providcncial isra creg~lista d.i corte franccs.i. sugerindo leituras desse quadrantc. indiciadas. deresto. por :J guns galicisruos que o censor :1Il0tOLl ( llIontar ao rrono i. E.na verdade .. o csrndalo docensor c justificado. Pois uma rpida cxplor acoda literatura cong011erc da C -pO C l (I'o g o. elogios e oraes ac admicas ou f-ncbrcs ;1 Do )030 V) mostra que as torrnulacs de Dumio de Faria destoa-vam do habitual. em que comparao do rei com o Solou com J divindn-de se prc tcr ia LIma sua consagrao C0l110 heri (tpico vulgarizado comC/I neille)l'o

    O atcn tad oxon tr a Do Jos (175::\) vem propiciar o cxaccrba mcnto do n:-gal ismo. A pessoa do monarca sacralizuda c qualquer cricu OLIatentadoqlH: lhe sejam dirigidos sn considerados su crlcgos . Em 1700, B r az jos Re-bcllo Leite rctcrc-s c em termos durssimos a qualquer nrro menos respeito-so da pessoa do monarc.r'. Para ele. uo Vassallo no pertence indagar [000quando o seu vIOl1arCJ l11JnJa pr em prtica este, ou aqucll c sy stcrna (p, :i)o Assim, 11~() SOl11l'lHCos que obram. mas os que proferirem pala vracontra a sagr::da PCSSOJ do Rei. incorrem L'J11culpa grave, e se lhe p dc, se-gundo as leis ['atriJso .plic.ir de JIgul11 modo :J pena at J de morte (p. 1) )0Sgniticatinlllclltl . J or.ico toi stlspenSJ por ter sido considcr.ida injuriosaparJ a ulra nobrczn.Apesar destas manitcsruc c s (embora sujeitas, como vit11os.~):ontestao.Sl1ti~~CIHel11l'IHCot-irre PAr;1'090roig\D;lr;\sua SUSP

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    19/36

    o CARCTERABSOLUTO DO PODER

    I o CARAcTER PURODA MONARQUIA

    A ARQUITECTURA DOS PODERES

    .pdreclesistico (O sa cerdotiwlI) e, em certa medida. prolougava e rematavauma corrente de pensamento regalista que j vinha elo sculo x VIl, como vi-mos.A.,_~.eiwnda,ie..pendorjurisdcista;ocupavJ,,:sedas;.r.d;les entre a -co-roa e 6 '5 .9.utras ,corpospqltios.jD.Qmpd.;}Q:1~I.1J.~;.as ...cortes). Por ora.. nestasdC ad;~ 'de 5~-~' 6ci;'esta segunda vertent~' apareceuinda como menor. em-bora possa consrituir um eco, residual e j longnquo, das polrnicas consri-tucionais sobre as relaes entre o rei e as corres durante a rcgcncia e reina-do de D. Pedra 1 1 .Mas o mais caractcristico da teoria poltica pornbalina e ps-pornbalina oirriaginriopoltico que subjaz s suas propostas mais imediatas. Ou seja. omodo novo como ela entende a sociedade e o Poder, ambos concebidos comoprodutos menores de uma ordem objectiva posta directarncnrc por Deus doque do jogo, pactcio ou no. dos mpetos individuais. J nos orup.imos dJSraizes filosficas do paradigrna individualista. Mas, no contexto portugus. Jsua sbita e clamorosa fortuna no pode ser desligada nem dos contextos pr-tico-polticos, nem da insero deste paradigrna dourrinal no centro do~ aparc-lhos de reproduo ideolgica do pombalismo, nOmCJda111CIltC J universidade.Os primeiros explicam a sua recepo: os segundos, ;l SUJ difuso fulgur:lIitecomo ideologia social e poltica.

    o PRIMEIRO OESTES CONTEXTOS constitudo pelas tenscs entre o podertemporal c o poder espiritual nos primeiros anos do reinado josefino. Comorefere Sil va Dias, a defesa da autonomia da: coroa face j Igreja supe que serejeite uma concepo sacral dasociedade, isto , a ViS30 da sociedade civil imagem e semelhana da sociedade eclesistica f .1 a viso do Estado co-mo brao secular da Igreja, Mas a secularizao da sociedade temporal ape-nas era possvel se, ao conceber esta, se prescindisse da idcia de que elaconstitua uma ordem da criao e, logo, um todo originariamente org:mi-co. Postas as coisas nestes termos, foi fcil extrair as coriscquncias polticasdesejadas quanto srelaes entre o sacerdotiuni e o imperiuni. nomcadarncnrc-isii' dos reis, no temporal, em relao ao papa (Dias, 19Hz, p. - + ' .al. g) e o reconhecimento de um poder real de tutela temporal sobre a reli-gi50 e a Igreja (lbid ., P .4H , al, h) .

    f' ,, ' O_t;(b,g~p;;f:br,pJ.191HgimE9JlE.I'y jfe,,,J?.r:i.mcia g rand:_l2.:~l ifestas~.o_.iit_s.r.:ia.p em POrtl1gaI7destac;nov:ac6nce'poj?l~ica4(~;'irisCre-se~airet2 pr irnaria-; imen te'ffi':p6ImicJnfippJs,~ d efne-nq, i'i~~~'l ~-q~ i-~;re.r{;;(obe r an o,:':ungido'de;DeuTodo~Poderoso;jrnerl.i;.tm,,,JiJl_a.,ciyinaomnipotncia:-.

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    20/36

    - - - - . . .----A REPRESENTAAO DA SOCIEDI\DE E DO PODER

    . . .

    t : ; : : : ''''1 .3 iAI ;eowtiil'llP __

    IUmJ vez que sobre osprincipais filsofosindividualistas e sccularizndoresdo Poder c da sociedadecontinuavam a irnpcndcr fortessuspeitas de fundotico-religioso. J divulgao dasua doutrina no meiouniversitrio portugus foiobra de autores mais tardios,compcndir ios c divulgadores.dcsignadarncnrc alemes. Deentre estes, saliente-se ain fluncia, em Portugal. deJ . G. I-Ieineccius (1681-1741),autor de vrias sncesesur ilizadas no ensinouniversitrio do direito. Nagravura, grupo csculr ric o daVia Latina, na Universidadede Coimbra,' alusivo reformade '77~.FOTO: V ARELA PkURTO.

    V Um novo paradigrnn degoverno aberto pelopensamento individualista cconrratualisra, provindo doCentro e Norte da Europa, nasegunda metade dosculo XVII. Em Portugal,porm, as suas influncias nose fazem sentir antes doltimo quartel do sculo XVIII,quando a tradio cultural daSegunda Escolsrica postergada pela polticacultural do pombalismo. Nagravura, tronrispcio daDe du c o ch rono lo gica e nn o lvtica(1768). repositrio da teoriapoltica do absolurisrnoilurninisra portugus.DEDU OCHRONOLOGICA, E ANALYTlC.-\.

    l' ,( R '1' E I I II ~ir E I R A.]'tI ql (: m.:n'fC'lIio 1,,4 f . Ccllin icri: .~: t~\J .. h'''1I 1,b~J.lt}n:~ J~ .\~'> t3 ;:ui.1> lrl. ::II:u. 'j , , C ' < tt.,,.,,,.)., .Jtl:J~ oG~~fI10 u SmlYIf -te,. 1). J.'~ IH l~ I r :r.:e, : I . r -t ~ ~ . : ,: :~~'~~:.'~ ',eO~~> l; r ;::I~~~ i,~:~ ;:; ~,~~ ~ 1 r .~ ~ : 1

    t Sr''':n . jf~ UJ ihJI:r fl rC nlen lc 1~.LJ.J Jcf..t'l.ee - .1tw ..,oeJIc:)ltp ltlIIlC(

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    21/36

    '_I'

    o CARAcTERUNO DO PODER

    A ARQUITECTURA DOS PODERES

    com maior simplificao, com o conjunto das doutrinas monarcrnacas ~ ti-vorvcl jiideia de urnaordem sociopoliticariann'l e;-prc3Io.ao corpora-~vis~ poltico.No plano constitucional, a po lrn ica anricorpo rativ.i tende a insistir. nocontexto scteccntista. em dois tpicos. Por um lado, 110dos direitos de COIl-quista. legitimados pelo estado inicial de guerra (justa) de todos contra tO-dos e que gerav:Jm direitos de propriedade. r ransmissvcis por sucesso den-tro das dinastias. Por outro lado, n a ideia de um pacto originrio global(isto . incluindo nJO s a forma, mas tambm os objecrivos imediatos e l-timos do governo), absoluto (isto no sujeito a quaisquer limites contra osquais :1 rJzJO nada pudesse - 1', g derivados da razo ou da justia) e irrc-~givel. Em qualquer dos casos, estarnos perante uma completa desvalori-zao da idcia de urna ordem pr eestabelccida da criao c per:ll1te ;l tunda-mentao dos vnculos sociais na vontade. No primeiro caso. na vontadelivre e absoluta de um soberano, que - em virtude da vontade de Deus -rege o reino como c oi sa c on qu is ta da e SU:J,No segundo CJSO. n a vo nta de delI~Jej pOSlO i frente do reino em virtude de um p~1Cto originar iamente es-tabelecido entre OSpOVOS c rujas prerrogativas de governo forJI11 estabeleci-das pela vontade dos pactuantes.-No caso da Dcdl/C( {l(hr{lll(llt).~ica. todaacstratgiaanricorporativisrJ' s c,di. : ig< ,.; lprovar quea mon-arquia pore,uguesa eraurna monarquia .puravcons-tituda porterrtriosCoriqisradsem-'gerfajusta. .tundada por dOJ50:(dcAfonso VI de Leo a D. Henrique). -transmitidaporsuccsso' e em que ro-dos os poderes residiam pura esobrnrnnte-no rci'i(Dedilliiill dlr(llll)ltl.~ic

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    22/36

    A REPRESENTAO DA SOCIEDADE E DO PODtR

    . :ipsoluto;'o'crscja;O'iocerceJdopelos privilgios (isto d irigir c moderarindistintamente todos os membros dos seus corpos polticos): iii) tornae os3parc1l19_s,_EUtj~9::aq.l]li.rsgJi.Y-s em insrrumentosdisponveis da vontadepol rica central (isto deputar as pessoas que lhe parecem mais prpriaspara cxerr irare m 1105diferentes ministrios): iv)definir um ncleo durode poderes ,if1~,c.?ariveis,dapesspa do rei,

    E M B O RA ,NAo ESTEJA ESTUD.-\DJ\ a rcsisrncia oferecida pelos aparelhos jur-dicos e polticos primeira dcada do governo de Pombal, provvel quecedo tenha ficado claro que, sem uma profunda reforma constitucional rela-tiva est r ut ur a da ordem jurdica, nenhuma outra reforma podia ser feita.Na verdade. o direito constitua. na ordem constitucional corporariva, umaordem obj ccriva, definida por urna tradio norrnativa (i115COI/lIlfHlIt:, (ljliniocontnuutis, praxst ica) que cscapJva ao controle dos monarcas, ou pOl' serde origem dour rina l ou por decorrer da s prticas invctcradas dos rribunais .Por outro lado, ;1 lei g;er:ll JificilllH:ntc prevalecia sobre: :J norma especial(p rivilg io gcr;ll) e no prejudicava, de todo, o privilgio especial. quc seincorporava, como urna coisa. 110 patrimnio do seu detentor e que, assim,passava ~ gozar da pr orccco de rodos osfncisjuridicosF judicirios queprotegiam os direitos adq uiridos. (H cspan ha, t 1)89a. pp . 392 c scgs.)O car.icrcr central da legis J.io dgia na ordcnaoria sociedade declara-do por Pasco al de Mclo Frcirc, o principal intrprete. no campo do direito,das novas idcias polticas log:' \10 incio das suas lustitutioucs iuris civilis lusi-te m i. Depois de se referir ao direito slIprelTio'aC;--llllpcrancc' d'fazcrtu'do o~fos~,t;_I].cc:~ss;rio pa raguranrir J segurJlla interna e externa cios cidadose_,o seu bem-estar (vo l. r, pp. 1-2), enumera C01110 primeira prerrogativa aconrida :I potest as l cyisint oria: 1 - -. ] pois se no fosse direito do Prncipt' fazer,'se'~illld_o'o~:;;f.g arbtrio, as leis a cujas normas as accsdos sbdiros se de-Va~~ollforrr.ar~d'Cqc'm'd-o' 05 poderia dirigir c harmonizar rodas as coi-sas COI11a utilidade da Repblica? Daque o poder de fazer leis Sl :P um di-reito m ajes ttico e nunca possa faltar ;11] Supremo lmpcrnnte da Repblica(vo l. r. pp, 1-3).Afirmao que contrariava as pretensas atribuies legislativas quer dascones, quer dos conselhos crribunais p~ibtil1os(ibid., r . :,]co'ii1eslclsedigJ, e com maioria de razo. dosTribunais do Reino. que, de algulll mo-do, se subrogararn no lugar dJS cortes e i. E, por outro lado. contrariava Jidcia, corrente entre os juristas, de que :l lei doreinoestava subordinada ;:lOapenas lei divina, mas tambm nuio iuris, ou seja, :IaS princpios tunda-mentais do direito comum, entendido como IIraz50 escrita (rati sctipta],No plano da po ltica do direito, qualquer destes pontos era fuudamenrnl.Com o primeiro, dencgava-se valor de lei a qualquer costume Oll praxe de-julgar em vigOr nos tribunais, tal C0l110 ji fizera, :It certo pomo, J Le i daBoa Razo, de 18 de Agosto de [769, ao restringir :1 relevncia desses costu-mes aos que estivessem ratificados em assentos da Casa da Suplicao ( [4).Com o segundo, impedia-se J contnua usura do direito legislado pla invo-cao dos princpios eventualmente contraditrios do direito civil e canrii-C045 . E, de facto, a mcsrn a lei de 1769, alm de revogar a autoridade seculardo direito ca n nico ( 12). diminura tambm drasticamente :1 do direito ro-mano, reafirmando, por um lado. o seu carctcr I11C[J,l1ente supletivo e,por outro, subordinando J auroridade cxtrnscca. dos seus textos autori-dade intr nsccn da bOJ rnz o em que fossem fundados ( 9 ) 4 [MAS A REDU,:;;O DO DtREtTD ,~ LE[ e J concepo desta como um direitomajcstric o irn plicavarn ainda urna nova relao entre a norma geral, a ncr-ma especial e o privilgio. Por um la(LO_._~Ln :.nl~ge~al , escrita (scl., .t lei),impe-se agora_,:l, t()GJS as.norrnas consuctudin.ir ins e locais. O princpio deqlle-t; direito pode surgir sem ~ forma escrita,' pois' os costumes diuturnos,aprovados pelo consenso dos mentes se equiparam lei (fI/SI. jIlS1., vol. I,pp. 2-9)47, aparece JgOf3 subvertido por outro, prprio dos rcgi mcs mon.ir-quicos: Na verdade. IUS Monar-quias. se houver leis escritas em coutr.i rio

    A UNIDADEE DtSPONlBlLlOADEDO DIREITO

    A DERROGAnILlDAOEDOS PRIV[LGIOSE DOS DIREITOSDOS PARTICULARES

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    23/36

    Na segunda metade dosculo XVIII, u ma pliade dejuristas formados no espirito dareforma univcrsicria de 1771.empreendem urna profundareforma das concepes sobre opoder, o direito e J justia,influenciada pelo jusrucionalisrnoeuropeu dos finais do sculo XVIi.O principal deles Pascoal Josde Meio Freire dos Reis(1738-1798). na gravura (Bancode Portugal, cota: 13.4).si srcmanz ador das novas idcia s.tanto sob forma rnanua listica(fmlillltiO/lCJ iuris civilis (ricriminalis] lusitani, 1789- I794),como sob a forma de projecrosde reforma iegislariva (projccrodo Novo Cdigo).' Banco de Portugal, Lisboa.FOTO: A. SEQUEm .

    A UNIDADEE DISPONlllILlDi\DE

    DOS APARELHOSPOLTICO-ADMINISTRATIVOS

    A ARQUlTECTUnA DOS PODERES

    [estes ccstumes l uo valem. (Meio. 1789, vol. I, pp. t_y 'S .) Por m::.~ .::.-do, refora-se a interpretao de que as normas locais (posturas) r:r; ::;_.:obedecer, na forma c no funda, lei geral (Mclo, l7f;9, vol. i. pp. r-'. :::...por fim, introduzem-se fi ssu r as no princpio da absoluta intangibilid o:: = : :: : Jiivlglos. . .~EsteE~ E?iQ_g.~\lJTla P.c, cs:ntr~J..no~apt:nas. do modelo terico ~ci.::::::-'J1a(chsocieclade e de poder, mas tambm das .est ra rgia s jurdicas de defe -- -j't;iTi'iqiilj.QIi:.A~t,1L~9_.que, in'esi11oP-isco':iTdcMelo, continua = ; ; ~ . : -p1:lr W~~..~ .~.direito (Meio 1789, vol. I, p p. 1-5). Mas logo acrescenta que apenas o ~L.pode cons_ci_[Ui~,modificar e rcvogaLJ~lls.prlvilgios (ihid .), e q e me-s:-::::os dos eclesisticos e os dos. nobres podem e devem ser revogados, S:: ~:-.-nar iarem o bem oblico e?.Apesar de herd~iro .'de'-ul1dtitrii1:i' 'j(iTdicafavor:vel. JOS 'direi o--~:privilegiados, P:lsCOJI de. Meio procede a uma desconstitucionaliz aco s ~adireitos particulares que,'3 partir daqui, deixam de limitar O rei, fica . ::;:1-ccs merc dos seus juizos .dc oportunidade. O que Meio Frcirc cscrcv .: sobre a irrclcvncia do jur amcnro rgio de manter 05 foros do reino L' so~~c' ::radical diferena en tre os pr ivi lp ios c as leis tundamenrais (lIlSiiIWitll1C> ;:'r',ci v.; vol. li. pp. 2-:;, nota in Ji lle ) um claro sinal disso m csrno. E urna -:i;:-da vista de olhos pela legis J:io da segunda metade de Setecentos : .mente revela formulaes radicais sobre a irrclcvncia dos privilgios' I. Gfacto de os privilgios (e, mais crn geral, 05 direitos dos particulares) csrz-rem, agor:J, fundados, no numa ordem jurdica natural e objec iva. r:.;J5num direito vo lun tr io de origem leg islativa, faz com que tambm . co-traquccarn algumas das suas gUJnrias jurdico-jlldici:ri:1s. N~o d .vc: .osdeixar p:lssar crn claro o significado profundo desta mudana. No se t:-:: :t: ;.de facto, de um mero rca r ranjo tcnico das cornpcrnc ia s para conhecerrecursos. Trata-se, antes, de um sinto m a de uma mud an a profunda C Omodelo das rclacs cn tr c os particulares e o poder ce n t r al. At Jq u :. sdifcrcndos entre J vontade ela coroa e os intcr csscs dos pn rricula rcs C~:l::;encarados como quaisquer outros difcrendos entre par ticu la rcs e rcso.vi-dos pelas vias jur isdicionais comuns, com meios jurisd icionais tam:Jr:;comuns. , A partir de agora, esta equiparaco do Estado aos particulares cc,-na-se indecente (como diz :1 lei) e substitui-se o recurso Judicial por u ..pedido de rcaprcc ia o ao rgo autor do acto contestado: por ourr as palc-v ras - e para utilizar uma linguagem de hoje - substitui-se uma via -0;-:-ccncios a, por UIl1 recurso gracioso. Ou seja, ao modelo jur isdicioi alisrasubstitui-se o modelo adrn inistr ativo , nas relaes entre o Escada c 05particular cs.

    fINALMENTE, :\ [DElA DE UNIDADE suporta um entendimento diverso l:a ~.:-lao entre o soberano e os aparelhos politico-ad minisrr at ivos da coroa ... l;-tes. como j: se tem dito. J administrao central cst ava o rganiz ada de acor-do com um modelo polissiuodnl.: em que cada conselho 01I tr ibunul (m:Jsmesmo cada magistrado) podia o,por ao rei. de forma pro ticarncncc incon-rorn.ivel por este, as suas prprias competncias. Pois se entendia. SC2:uildourna tradi o que ia de um clebre tCXCOdo D(f~SI() IDi.t;cs/(l. I. 2. 3 (I . deim pc riv) 1 prpria obra de Jean Bodin, que a jurisdio dos verdadeiros 1l2-gistrados ( Les vrais officicrs, como diz Bodin) radicava na narurcz a daordem poltica e no na dis cr iciona rid a de do rei (Hc s pa nh . 11)89:1,pp. 4 r S c segs.). A m o na rqu ia no tinha, por canro, sobre o seu prprioaparelho poltico seno aquele mesmo poder de superviso de que gozavasobre os poderes alheios. E, por. isso, com razo se lhe aplicou j~ o cpitcrode uma monarquia dcsccrcb rada (jairne Viccns Vives).Agora, em conrrapartida, da ideia de unidade do Poder podem tirar-se.neste plano, consequncias de todo opostas. Que OS Magistrados de qualquerqualidade, ou considerados em particular, ou em cornrnurn , assim como asRelaes, e Tribunais, no tm alguma jurisdio propria. m:1S to da hc doSumrno Irnperantc, e em conscquncia sujeita suprem:1 jurisdio do mesmo

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    24/36

    A REPRESENTAO DA SOClEDADE E DO PODERIrn pcrante e que a pezar das aladas dos Magistrados do mesmo lm pcran-te. sempre fica salvo recurso ao Principe ordinria. c cxtraor dinar iarnentc[Sarupaio , 1793. vol. I. p. 190. n . y )J. Em vez de decorrer. COI,10 ante-riormente sucedia. de uma estrutura natur al menrc orgnica. a existnciade diferentes magistrados expl ica-se. agora. pela delegao de um direitornajesttico em alguns dos seus vassallos; isto he. o direito de constituirMagistrados (i b id . pp. [89-[90).Corol:rio desta mesma idc ia o princpio de que os cargos da repblica na-da mais so do que hurna comisso simples, e precaria do Prinripe para exer-cer nesta. ou naqueila EStao resrricra. e toralrncnte dependente do seu bom,ou mo servio, ou para se conservar. ou ser dclla expulso (lei de 23 de Ou-tubro de 1770, Antnio Delgado da Silva, Co/le co Ch . d e Legislao . p. 5065~.Embora isto fosse mais pacifico em face do direito anterior. m esrno ca-rcrer delegado tinham as jurisdies e direitos dos donarrios. pois tm ajurisdio dada ou dO:Jd:J pelo Rei. de quem deriva rodo o imprio e poder.exer ccndo-n em nome dele ( ibi d .) . Mais tarde, em 19 de Julho de 1790. alei vem restringir mais ainda estes poderes.

    _A QUESTO DOS PODERES SEt\HORJ.-\IS leva di recta menre ltima ilao doprincpio da unidade do Poder - da constituio de um ncleo duro depoderes inscparveis da pessoa do monarca. De um de les j se falou - a po-tes tas le si sl'lf or ia .Ao co nr r ir io da viso cl ssica dos regalia (decorrente das carac rer sticas doregime fe udal). fundados nos dados particulares da consriru i o de cada rei-no, agora. do que se tra ta de ligar intimamente a ideia de direitos reais ideia da unidade do Poder. DJ que Antnio Ribeiro dos Santos distinga,cuidadosamente. J nova da antiga concepo dos direitos do rei: Direitosrcacs ou m ajcsraricos [... 1 . ou so os direitos gcraes. que emanam da nature-za da sociedade civil. e do supremo poder. que nella ha : ou so os direitosparticulares. que provm da constituio fundamental do reino .'J Os pri-meiros so definidos. a partir da prpria idcia de majestade ou soberania(i bi d . p. 25), pelo direito pblico universal ou pelo direito pblico constitu-cional (isto . pela ccn srit ui o fundarnenra l do reino). Os segundos, quedecorrem do direito pub lico purJmemc civil . englobam os direitos feu-dais. fiscais e tributrios que se deviam aos prncipes. n50 tanto em razo damajestade. que por sua mesma narurez a necessariamente os exigisse, comode senhorio feudal (i bi d .. p. 7 )34.Se os direitos reais decorrem da majestade. j se entende que, uns. nuncapossam ser separados da pessoa do rei;;; que, outros. se presumam na suarirularidade, salvo concesso expressa (Melo, 1789. vol. li. pp. 2-42). E que,todos. ainda que concedidos, nunca saiam. essencialmente. da esfera de prerro-gativas do soberano. E o que explica Pascoal de MeIo nas lnstinuiones: tiAjurisdio no prpria dos senhores. que apenas a tm do rei; nisto se dis-tinguem essencialmente JS jurisdies rgia e feudal (Heincccius, Eletnentajuris .~ I'mr, l/Iici. vol. 11[. p. I). no que se distingue, nomeadamente, dajurisdi-o feudal. Daqui decorre que Jpenas se pode exercer em nome do rei e deacordo com o seu a rbrrio e de tJI modo que ele a possa lirn irar ou revogar[... ] (fI /51 . ri r' .. voI. li. p . .1-39) [No mesmo sentido, V. Sarnpaio, Pre lecesde direito p atri, f.Jilll li( l l' [ 't l tim l,rr .. . Coirnbra, 1793, vol. tu, tom. 45,p. 169. 11. 1 1 ) 1 . Por outro lado. defende-se agora. contra a doutrina ante-rior, qlle o rei pode sempre revogar as concesses destes poderes. mesmofeitas por conrrarc. pois o regime da irrcvogabilidade conrratual de direitocomum no vigora quando os contratos tm por objecto direitos pblicos eda coroa do reino.

    A CONCENTIlA,>.O DOS PODERES num centro I1JCO - aquilo a que j setem chal1ndo a scparao entre o Estado e a sociedade civil (agora reduzidaa um conjunto de indivduos privados de poder de imprio) - foi. comovimos. o e lcmcnro estratgico do paradigrna poltico individualista. Estaconcentrao vinha, no entanto. criar problemas novos nJS relaes entre os

    I ,--,

    'V As prerrogativas da coroa(direitos reais. res al ia) estavamenumeradas nas Orde naes (n,:'.6). No entanto. esta lista eracasustica, fundada na tradio eno numa definio rigorosa euniversal. decorrente do conceitode poder real. Os direitos reaispodiam ser concedidos pordoao rgia, com excepodaqueles que eram sinal desuprema jurisdio, como asuprema justia. a cunhagem demoeda. a reunio de cortes ou detribunal coleccivo ( relao). Nafigura. as armas reais (Capela daUniversidade de Coirnbra),

    As PRERROGATIVASPOLTICAS ffiRENUNCIA VElS00 CENTRO

    Os LlhUTES DO PODER

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    25/36

    Rosto das [nstitutiones iuriscriminas Iusitani (179-1), dePasconl Jos de Mclo Fr circ dosReis. Obra de ruprura. aslnstiuuioncs reflccrcm menos odireito praticado nos tinais doAntigo Regime do que antecipamas perspectivas que dominaro odireito portugus (neste caso. odireito pcnnl] at aos meados dosculo XiX.FOTO:BN. Lisboa.

    PASCHALIS JOSEPHIMSLLll FR.EIR.l

    ,ACAD. RBa.SC[&NT. OLEUP. so ctz,u r I\,J: .C:; ; Q I;QU ll n JU 1II OJ lO CX UJ lt c o u.t .C il

    .. COUJ>G ..u:. ,' ~': ..rr rowo~ COH[ J~c:t1t~ ..u::.t.~ ......V;oJU I'1J tp.onuOJUl uurn: . .::;-~_~;o.~~ :~ . ~:.~:i~~)'(E-_INSTITU,Tlp,Ny;;r\:L.cc'JURIS CR1MINtrs1.'Us'trNI

    .)CSSU ::.:~.~~:~.}~+~.~.::~ .~~~~Ll n Eil 61 N-G lT-t..ARI s,

    ....) r.

    OLrsrpONEsx TYr..G[L-\PHTA ~tts ACi\O J.lTA&IC IX J l~ :~ :~~:~J ;e~ :' I I JU.{Zi~l11 rM c ..-< - c .; . . . . i l i. c. .Ji tn . E u .o < J..

    . . e t: WfUl LU . . ...

    A ARQUiTECTURjI. DOS PODERES

    particulares e O Poder, nomeadamente. rio plano dos lirnitcs do Poder e d. igarantia dos direitos dos particulares.A terceira fase de re flex o poltica scrccc nr isrn . situada nas ltimas dc ca-das do sculo. entre a rcs saca do despotismo pcmb.ilino c as comoes daRevoluo Francesa, dedica-se sobretudo ;l esta questo. discutindo-a ;1 pro-psito do conceito de leis tundamcnrais. dos direitos dos \'J5s:l10s e dopapel das cones.Cousequcnte com o 110VO par.idigma polrico, Antnio Ribeiro dos 5:111-t05 rejeita es rn reduo dos direitos polticos aos direitos parti cul ares 11:1SU:lcrtica ao pb.110 do N,1(I[1 Ctdi,~llde Pascoul de Meio: No titulo I desteCodigo se enurici o cenas e determinados direitos. que cornpcccm :105vaS5211os: mas olhando para os Titulas desta obra, persuado-me: I. que osvassallos se considera vo nella em diverso pOIHO de vista. iS[Q C : . comoparticulares, e no com corpo da ilao: 2. que s se rracrou dos direitos.que tem cada um dcllcs em particular em razo de seus servios feitos j, Co-roa. e no dos que tem rodos os vassallos em ger:d em razo das leis fund.i-mencacs. esrillos. foros, usos e costumes de nossos reinos . ,,;7 Feita vst.t Liis-rinco. j.i se entende que proponha que, logo no inicio do ((.idi~o, ii~lIreum artigo em que apaream expressamente cnurncr.idos os direitos. t'P[(lS.liberdades c privilgios dos Vussallos como corpo de nno. bc m co mo ;;sua tora e effciros e os meios lcgrimos de o, ..t:lZer valer pcr:lllte clks[os prncipes] ( ib id ., p. 22)5'.Em resumo: pode dizer-se que Pascoal de MeIo ainda 1150 tinha dcscnvol-vida uma teoria csratalisra dos direir- de rcsistcncia e. por isso, ainda Se'socorre da anrcr ior construo pri vansra dos direitos par ricuiarcs (01110 illr,1quaes ita , fora da qual nada existe que se possa configurar como direito dosvassalos em rclaco ao irnperante. S que, como rranspar ccc do conju: to daobra do prprio Pascoal de Mclo, o paradigma pol irico-corpo rari vo que su-pOltJva esta construo se encontrava j subvertido. Como vimos. de pr-prio se recusa J considerar. por exemplo, :1 jurisdio c privilgios tios rri-bunais, dos oficiais ou dos donarrios como direitos radica dos opouv -is aoPoder da coroa. A prpria pr opricdadc Se encontra, 11:\sua cbr a. scri.in ei tecomprimida pela conccpo de um direito eminente do soberano sobre (reino: . E, por isso, a SUJ construo envolve :1conrradico de fJZcr repol;-sar o direito de resistncia sobre uns direitos quc, na verdade. se revelam ...no o serem. lsro condu-Io a ur na concepo absoluta do Poder - que dopt;.mais por razes de oportunidade poltica (o cxcm p lo da Fr anca') do que'por convico rc ric a' -, em que as nicas lim irucs do Poder - Ljue \1distinguem. portanto. do despotismo e da rir .m ia - so a humanidade c tlamor do sober ano . o cartictcr vinculado (ao bem da repblica) dos seus di-reitos e J gCller~lidade da justia e da lei. Ji a s.ilvag uarda dos pr ivi l gi os. orespeito da propriedade e a liberdade natural e civil dos vassulos CS[JO su-bordinados ao interesse da causa pblica e JO bem univ ersal da sl1Ciet1 :1L '(.r(CS JllSI,l qrr c dell .. . , p. 99 ), ,2 .1 ,-'. Em contr aparrida. Ribeiro dos Santos. csran-do consciente da radical separao entre direitos poliricos c direitos priva-dos. filiando-sc, a partir de certa alru ra' , noutra subcorrcnrc dour riua]'do jusna rura lis rrio, j; Se v obrigad o J construir um .irscnul de di reitos pol-ticos de resistncia, fundados nas leis fundament ais.Eis outro conceito. este de leis tundamcntuis , chave do novo paradi 1l:1poltico. O conceito de lei fUIlda1l1entJl rem como ncleo :1 idci> de Ljue :1constituio da sociedade rcpousa num neto de vonradc. numa lei, c n.io nu-nu disposio da Natu rcz av numa ratio, cstruturant c do paradigrnc corpora-rivo'. Uns juristas derivaro esta idcia de uma constituico vo lunr.ir i.i doconceito his~rico de lcx rcxia, a deciso popular quc, na primitiva monur-quia rornana, teria investido o rei nos SeUS podcres' . Outros. das cxpcrin-cias pac tis ras medievais L prirnornodcrnas (como vimos. no plano m ais pro-priarucnrc do ur rina l, a Segunda Escol isrica veio rcvu lor iza r ~l idcin de pactona cxp lica co ela origem do poder poltico em concreto).A polmica sc rec cnrisr a sobre as leis fundamentais gira. basicamente. emramo LlJ existncia e contedo deste pacto his t r-ico na monar qu ia portu-guesa. j que. fiis ao preceito conrrarualista de que pilarl .;u1I1 scn-vnutu. 'QSabsoluristas nunca negaralll o car.ictcr vinculativo de tais leis, a existirem.

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    26/36

    A REPRESENTAAo DA SOCIEDADE E 00 PODER

    como uiud a tund.ir.uu no seu respeito ;} di srin co entre governo absoluto egoverno desptico. A D cd ll( '; (Ir/'(llllll ,~j(tl idc nrifica como tais ;1S leis deLarncgo sobre a forma de g overuo (mon.ir quico) e o regime da sucesso(vol. I. 597, 601 L' 7:i), dcfi nindo este estatuto como lei fundamental.firme, perptua e ral . que nem os sem rgios sucessores pudessem altcrri-la ( 676-677). Pascoal de i\klo COIllCl;;1 por ncgar qualquer par r icipaco dopovo na rr an s l.rco do Po dcr par:l os reis, j que a monarquia ponuguesa re-ria tido or igcm na conquista c sucesso: em todo o caso (at porque o pr-prio Suurez ri nh a conceituado ;J conquista como lima torrna de pacto). pro-cura limitar 'esse pacto .idvcuticio (isto , as leis fundamentais) s normassobre ;1 SlICe'SSJO do reino das Corres de' Lamcuo L' das Corres de L isboa dc1698 (lei de I: de Abril. qu

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    27/36

    ~~~~~~ - - . .- - - . . . .~

    PROCESSOCER[MON[AL

    A ARQUITECTURA DOS PODERES

    -se. murro simplesmente. de constatar que os critrios do p:lrlamenrusr.:aoiroccntista Oll accual no so pertinentes para entender a lgica e o sen:':::do tuncionurncnro dessas reunies.Sign ific acivo menrc. a base jur dico-constirucional das corres de Por tug cpermaneceu. ao iongo da sua existncia. razoavelmente imprecisa. se; = 1 t : eisso parecesse pn:ocupar os contemporneos. Q papel e atribuies hcrciacasdas cones medievais. reacrualizadas em alguns aspectos pontuais. :15,0 ;:0-n hcccra m nenhuma altcraco de fundo. acomodando-se ao apnrcrirnen: denovos rgos e instituies no quadro do aparelho adrniuistrativo da cor :1portuguesa, e o seu fu ncionamen to e competncias continuaram a ler comoprincipal referncia a memria dos estilos praticados ao longo do perodorned icva l .Q poder de convocarria continuou a pertencer ao monarca. o qual de :.-dia quando era conveniente a sua realizao. sendo tambm ele quem ajui-zava sobre o momento de encerramento das cortes. Fixava o momento derealizao. determinava o terna ou temas centrais da co nvo car ria. decidia olocal para :1 rcalizaco da reunio. definia ;J margem de poder que deveria sercarregado pelos procuradores e indica va quais 3S questes J serem discutidasnas rcunics . Entendia-se que certas questes dcvcr iom ser resolvidas emcortes - acla rn ao do novo rei. juramento do prncipe herdeiro. lana-mento de 110VOStriburos, quebra da moeda, erc.: o que. em determinadasconjunturas. constitua um relativo limite ao arb trio do monarca. Po-.rrn , estas limitaes impostas pela reunio dos trs estados J . autoridadecb rei nunca foram expresso unvoca de todos os participantes. antes csti-ver a rn ao servio de aproveitamentos eonjunturais por parte de grupos oufaces rivais, os quais. perante o no cumprimento de alguma destas - aindaque pouco estveis - normas. trocavarn. acusacs de inconsrirucionalida-de . isro . de desrespeito pelos estilos c costumes lundarnenrais do reino.Tratava-se. afinal, de Uil13 expresso do constitucionulis mc corporarivo. noqual DdJ corpo da sociedade defendia os seus interesses particulares. colo-cando. valendo-se disso. rcstr iccs actividade govefl1arivJ da coroa. Des-ses momentos de polrnica, o papel das cones saia habitualmente valoriz ado- a imagem dos rr s estados era. de resto, ref lex o dessa estrutura corpora-riva - e o seu potencial lcgirimador incrcrnentado.Ao courr.i r io de Costela. onde desde 1539 :tpenas o br aco dos povos esta-VJ presente. as COrtes de Portug a l mantiveram J il1:1,':t'I11os trs estadosreunidos _. dera. nobreza L povo - corno rcprcscnr.i.io (isto L:. como n1:1-nilcst:JJO publica) do reino. Rcpr cscntar :1sociedade cor por ativa ;1 p.irt ir dO ISUJ partio runcional cons tituia UI11dos expedientes rnuis correntes da pr o-pria mundividcncia da poca. se bem que este esquema n.io esgOt:1SSL' :15possibilidades de rcprcscnroco. QU[r2S ocasies havia eI11 que as propostasde rcprcscnrao cr arn bem diferentes e onde a preSL'na de outros grupossociais encontrava expresso mais ctcctiva. Afinal. O esquema rr iparrido pa-tente nJS cones. herana da sociedade medieval. mal contemplava os co-mercianrcs. os juristas ou outras novas realidades socioprofissionais da pocamoderna. os qunis Ci1COnrraV::lITIum lugar activo em outros eventos pbli-cos. C0l110 era o caso das entradas. rgias. da quebra dos escudos. dosfunerais rgios. das procisses. ctc.

    A TfiADIAo O.A CONVOC.ATRI.'-. dos trs estados impunha 11m determina-do esoucrna ele presenas e ausncias. Por um lado. entendia-se que 3 panemclho'rn de cad; estado era suficiente para corporizar esse mesmo estado c ta-zcr ouvir : J sua \OZ. Nessa ordem de ideias, no estado do clero cinha m tr a-dicionalrncnrc assento os arcebispos. bispos. cabidos, mestres de ordens mi-litares e reitores das universidades. Para o estado da nobreza, era convocadoa grande nobreza titulada, alm de outra nobreza mdia. destacando-se. cn-tre eles. os alcaides-rnores. E no brao do povo encontravam-se os procu-radores. .nviados pelas cidades e vilas com assento em corres e sados.segundo rr: mos rado recentes estudos proso pogr fico s. das oligarqui:1slocais (Thorn sono 19'9. e Silva. 1983) .A .. respeito d esses procuradores. a dccerrninao regia estipulava que dois

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    28/36

    az -A REPRESENTi\Ao DA SOCIEDADE E DO PODER

    PLANTA DA ~ALA EM ~E S. MAGI'.STADE FE.:cAS CORTE.S

    L.:.:=-=-~-'.__ - '-_-'-...J_JG;..,;..r~ ,..- c _ ,. .

    {'.~ ....J(.r-... , \ ~ ,_o

    IZ:;:;. F~. L ,. . ;. . .- , , ;' : ' I . ' , ) , . ~?-~ lfo-,--u.;;....,3~ r = - '- j - , - ~ ~ = - - - : : : ; ; - ~ - , - ; - - ,- . J 1 ' J ; ~ ; ~ ; : . : - :~ ~ ~ - -- . -' .-- ' ~ - - ~ - u - -. s . - . - . . . . 0 - ~ ~ - . . J 3 PF:u;;;x:: ..z;~I , ; . . . . . T_,_.~.~,I

    1 1 :x;:~,. ~J I A:' .1-1... P U O J. I-i p .I..w :;..) ':g;;:L,,; ..J~J rtL .C;;J;..........,,~3

    ICO*. F . . - .. :U ;;:;;. Il~ .....C+x-;.. 1kF iLC_L.~. 1153-' o;;;;:~.t5F?F. J f Z L ~ 'l

    ,,:.

    ~~J,I; -'4~,~m . . . 1 ' - . 1 . . 1L C .7.l1B_.. ..I~;'. II l/i1. J. c.~,. r_r. : tJ ~..-;:-c;-;--;.-----,--,-.-, 1~I. A-. .t. : : : J JI U l . )/' 1&. ..tlt 'u, 1 - - 1p.-;-~iiDJ.. , ';r l .1 ~. q1 i F . U.': ~f C + J ' > - o . . . P O b W l f r J ; ; : . ? l~ P-;~. &;:;;;, 11 : J J l . 'j : . .n~l.. ~I P 1L .. 5~ L 1~_. 1'>,..J.J.

    1 ..;7

    .-;

    PI:lIl[;J da salu de rCUIlIJO dascorres (sculo XVII. Bib. NJc. deLisboa. [~ES lJ() A). As cortes.com o rei. ror na va m visvel(rcpn:senrav:lm. neste sentidomais do que em qualquer outro)o corpo da Repbl ica : Jccnouratia da sua rcunio. emqUl: o s IU~Jres de cadapar ricipanrc esta varn marcadospe la tr adio. visava tornar aindamais eficaz essa publicirao deum corno alis invisvel( 1 1 ms cico).FOTO: BN, Lisboa.

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    29/36

    A ARQUITECTUJ1i\ DOS PODERES

    I1IIIIIIjj~

    4

    homens deveriam ser eleitos enrre os melhores dc uma dcrcr minnda 10 -calidadc. Porm. esta clcico tem de ser vista i luz das prticas elcctivastradicionais. onde at o prprio sentido do termo cr a outro. significandc.antes ele mais, sclcco, mediante canais e prticas ancestrais de escolha.110 seio da comunidade local. A escolha de um indivduo para estar pr escnrcnas cortes passa va , assim. pelos mecanismos locais de scleco. previamenteexistentes. c activados. no s pJrJ a escolha do procurador. seno const.m-temente, cuda vez que a comunidade er a confrontada C0111 a necessidade deescolher entre os seus membros uns poucos quc melhor fizessem ouvir ~1sua voz.Para todos os participantes, o momento de maior intensidade crnotiva esimblica de cada evento de cortes devia ser J ccrirnnia de aberrura , sem-pre mar cada por uma solenidade quc a transformava num momento mpar.no s para os que a ela assistiam. mas tambm para todos os que liam ou ou- viam ler 3S descries impressas, sempre aparccidas meses depois do aconteci-11;'11(0.Alm disso. o cerimonial da abertura solene das corres visava apre-:,clltJr o rei em majestade. {vIJS rodo o t:1USCO e pompa preseIHes. mais doqm: expresso de lima auroridudc omnipotcnre c segura de si. era ames o si-11.11de um poder db il, com margcns de acruuco mal definidas, :1 svrnc--lhan ca de qualquer monarquia do Anl:igo Rcgirnc, assente nurr ap arelho dead m in isr raco com enormes carncias em termos de instrumentos de gover-nacao.O proSr;lIl1:l da ubcrruru solene era aquele que mais demorada prcparnc.iomotivava. ocupando a tempo inteiro urna equipa de v rios c:i~ciais da coroa.Os gestos do cerimonial praticado em ocasies anteriores eram rcactualiza-dos em cada rcunio de cones. Por um lado. havia que repetir o torrnul.i-rio. O que l1JVa J testa um sentido quase d l : ; . i 1'11a muitos dos participantescom experincia de .mtcr iorcs rcunies: mas. ao mesmo tempo, eram inrro-Juzidas pequenas alteraes. por vezes muito subtis para o observador dehoje. mas decisivas parJ os participantes de ento. para quem tais altcr aceseram como que ;1 traduo visivcl do contexto confliruul em que se desen-rolava CJdJ nova reunio de corres. o C:'lSO da oraco de proposio J:1Scorres . que. para alm de integrar cada seSS30 numa scquncia de reunies- remontando ;105 primrdios do reino. cxprcss io metafrica da solidaric-da de que sempre existiu entre ~IS v.irias partes que compunham a cornunida-de -. visava igualmente distinguir CSS3 reunio das anteriores. especificando Llmotivo da convccarria dos rrcs estudos e, deste modo. conferindo a G(L1sesso UI11 c.ir.icrcr particular. Alm disso. essa oraco. estava. em termosformais e de contedo, muito prxima do discurso de tipo parcntico. in-troduzindo numa ccr imniu ele raiz profana um clcmcnro decididamente i-rrgico c providcncialisra. A scqucncin de anteriores reunies de cones cru,desta vez. integrada numa evoluo cscacolg ica, no decurso da qual o rei-no. mediante as reunies alHCS efectu adas , ia a perfcico a n do-se e realizandocomo unidade orgnica. aspirando. como ltimo destino. J urna unidademstica. Este recrudescer mstico era acompanhado pela convico de que areunio de cones. isto . do corpo mstico do reino. concorria pJrJ con-quistar o t'avor divino e. logo. .intluir no curso dos acontecimentos.Finalmente. a escolha da individualidade para proferir essa oraco escavalonge de ser inocente. pois era reflexo fiel dos microcontlitos entre ;15 vriasparcialidades em luta, e que constituam o grupo dominante em termos po-lticos.Mas ns ,l'UIlIOCS de cortes eram rambrn aproveitadas pelos participantespJrJ apn:sclH:r rode o ripa de :lgravos c de queixas que considerassem PLT-tincntcs. O chamado direito de peti o existia desde tempos irnemoriais.apoiado na 'C:io de que rodas J S peties LTal11lidas pelo rei durante J rcu-nio dos trs estados. podendo. deste modo. os procuradores receber dircc-tamCI,tc a resposta do monarca./\ . ar ribuio social dessa massa documental . corno seria de esperar.corn p le xa . problem:tica7.,. A esse respeito possumos apenas indcios va-gos: sabe-se que o protesto 10c .1I sorria. : 1 partida. uma sria filcr agcrn. de-corr enrc da disrr ibuio social da capacidade de ler e do: escrever e do modode difuso das noticias a nvel local. De qualquer modo. alguma forma de

  • 8/12/2019 XAVIER, ngela Barreto; HESPANHA, Antnio Manuel. A representao da sociedade e do poder

    30/36

    A llEPRESENTAO DA SOCIEDADE E DO PODER

    grupo dOm IlJIHC LJuc ro nr r olas s c os CJI1J.is de co municaco COIll o ce ntroterra sempre i1tlul1cia dcter m inantc 110 cntor rnar do discurso peticionrio.Assim. ;\ pcrico CL1 U11J. eS~lccit' de CJ.IlJI de expresso d.: prorcsro. for m a.rutorizadn pela (0[0;1. ;\ qual reconhecia o poder rcr apurico que poderia terU I11; 1 sesso de corres. O exemplo ilustrativo dCSlC acro era o do pu ique ou-v ia os Sl'US filhos. U l11J imagem cxt rcmarncntc rccor re nrc lUlitc r.uur a chpoca.Do ponto ele- \'i5[;1 de todos os que aprCSell t.1 \ an1 cais pcticcs, i\ simplesoportunidade de tizer ouvir us SUJS queixas constitua U l11 decisivo ekl11eIHOpa ra :1juizJ.r sobre a qualidade di1 clorn inaco exe rcido pelo soberano. , 1 \ irna -