· web viewo eminente jurista italiano gustavo zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da...

32
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4 GRUPO I - CLASSE II - Plenário TC-007.527/2014-4 Natureza: Solicitação do Congresso Nacional Unidade: Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) Interessada: Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados Advogado constituído nos autos: não há SUMÁRIO: SOLICITAÇÃO DO CONGRESSO NACIONAL. OPERAÇÕES DE CRÉDITO ENTRE O BNDES E EMPRESAS DO GRUPO JBS/FRIBOI. AUTORIZAÇÃO PARA REALIZAÇÃO DE AUDITORIA DE CONFORMIDADE. NÃO FORNECIMENTO, PELO BNDES, DE PARTE DAS INFORMAÇÕES REQUERIDAS PELO TRIBUNAL. SOLICITAÇÃO DE PRORROGAÇÃO DE PRAZO PARA CONCLUSÃO DA AUDITORIA. AUTORIZAÇÃO. DETERMINAÇÕES. CIÊNCIA À CFFC. RELATÓRIO Adoto, como relatório, o pronunciamento da SecexEstataisRJ (peça 33). “1. Trata-se de Solicitação do Congresso Nacional, de iniciativa da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados, por meio da qual se solicita a realização de fiscalização ‘nas operações de crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES em relação às empresas do Grupo JBS/Friboi, propiciando o esclarecimento sobre os aspectos financeiros da operação, critérios utilizados na escolha das empresas do setor e vantagens sociais dessa’ (peça 1, p. 1). 2. Ao apreciar preliminarmente o feito, este Tribunal se manifestou, por intermédio do Acórdão 1398/2014 - TCU - Plenário, no seguinte sentido (peça 8): 9.1. conhecer da presente solicitação com fundamento nos arts. 1º, inciso II e 38, inciso I, da Lei 8.443/92 e art. 232, inciso III, do Regimento Interno/TCU; 9.2. determinar à SecexEstataisRJ que: 1

Upload: others

Post on 28-Dec-2019

0 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

GRUPO I - CLASSE II - PlenárioTC-007.527/2014-4 Natureza: Solicitação do Congresso NacionalUnidade: Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES)Interessada: Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos DeputadosAdvogado constituído nos autos: não há

SUMÁRIO: SOLICITAÇÃO DO CONGRESSO NACIONAL. OPERAÇÕES DE CRÉDITO ENTRE O BNDES E EMPRESAS DO GRUPO JBS/FRIBOI. AUTORIZAÇÃO PARA REALIZAÇÃO DE AUDITORIA DE CONFORMIDADE. NÃO FORNECIMENTO, PELO BNDES, DE PARTE DAS INFORMAÇÕES REQUERIDAS PELO TRIBUNAL. SOLICITAÇÃO DE PRORROGAÇÃO DE PRAZO PARA CONCLUSÃO DA AUDITORIA. AUTORIZAÇÃO. DETERMINAÇÕES. CIÊNCIA À CFFC.

RELATÓRIO

Adoto, como relatório, o pronunciamento da SecexEstataisRJ (peça 33).

“1. Trata-se de Solicitação do Congresso Nacional, de iniciativa da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados, por meio da qual se solicita a realização de fiscalização ‘nas operações de crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES em relação às empresas do Grupo JBS/Friboi, propiciando o esclarecimento sobre os aspectos financeiros da operação, critérios utilizados na escolha das empresas do setor e vantagens sociais dessa’ (peça 1, p. 1).

2. Ao apreciar preliminarmente o feito, este Tribunal se manifestou, por intermédio do Acórdão 1398/2014 - TCU - Plenário, no seguinte sentido (peça 8):

9.1. conhecer da presente solicitação com fundamento nos arts. 1º, inciso II e 38, inciso I, da Lei 8.443/92 e art. 232, inciso III, do Regimento Interno/TCU;

9.2. determinar à SecexEstataisRJ que:9.2.1. realize e conclua, no prazo de noventa dias, auditoria de conformidade, nos termos

do art. 38, inciso I, da Lei 8.443/1992 c/c o art. 239, inciso I, do Regimento Interno do TCU, junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e BNDES Participações S.A. (BNDESPar), com o objetivo de examinar as operações de crédito e transações financeiras efetivadas com o grupo JBS/Friboi, os critérios utilizados para a escolha da empresa beneficiada, as vantagens sociais advindas dessas operações, o cumprimento das cláusulas contratuais firmadas entre as partes, em especial dos termos referentes a aplicação de multas, a aquisição de debêntures e eventual prejuízo sofrido pelo banco com a troca desses debêntures por posição acionária da empresa frigorífica;

9.2.2. caso venha a encontrar óbices ao desempenho integral de suas atividades sob a alegação de sigilo bancário, represente de imediato ao Relator sobre essa ocorrência, para fins do exato cumprimento da deliberação deste Tribunal;

9.3. encaminhar ao Presidente da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados cópia do presente acórdão, acompanhado das peças que o fundamentam,

1

Page 2:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

informando-lhe que, tão logo sejam concluídos os trabalhos de fiscalização, ser-lhe-á dado conhecimento dos resultados e das medidas adotadas pelo Tribunal.

3. Como se depreende do acórdão supramencionado, o prazo estipulado para finalização dos trabalhos de auditoria determinados por esta Egrégia Corte de Contas deveria ser de noventa dias a partir do referido decisum, ocorrido em 28/5/2014.

4. Todavia, a equipe de auditoria, desde a emissão do primeiro ofício de requisição (peça 17), datado de 7/7/2014, tem encontrado dificuldades no acesso à documentação requerida ao BNDES. Primeiramente, porque nem todos os documentos têm sido enviados para a apreciação da equipe e, em segundo lugar, porque mesmo na documentação remetida há importantes informações sendo tarjadas, necessárias ao alcance dos objetivos da presente auditoria, sob alegação de sigilo bancário e/ou empresarial.

5. Além disso, há considerável demora no envio dos documentos disponibilizados, tendo em vista que o banco realiza análise prévia de toda a documentação existente, para a realização do referido tarjamento.

6. O titular da unidade, em conjunto com o supervisor da fiscalização, Diretor da 3ª DT, e a equipe têm procurado realizar reuniões com as áreas do banco detentoras das informações e até com o chefe de gabinete da presidência do BNDES, visando a encontrar uma saída rápida e amigável para o impasse em comento, de maneira a evitar a medida determinada no item 9.2.2 do Acórdão 1398/2014 - TCU - Plenário, haja vista a elaboração de representação ao Exmº Sr. Ministro-Relator poder acarretar ainda mais atrasos aos trabalhos de auditoria.

7. Os referidos encontros redundaram em redução significativa das tarjas apostas e em maior acesso a documentos. No entanto, o banco ainda alega não poder fornecer à equipe os dados referentes ao rating de crédito, saldo devedor das operações de crédito e situação cadastral no BNDES do Grupo JBS/Friboi, sob alegação de sigilo bancário.

8. A ausência dessas informações, a princípio, permitiria a realização parcial da auditoria, prejudicando, todavia, a apreciação do risco do vultoso investimento da BNDESPar no Grupo JBS/Friboi, que monta mais de R$ 8 bilhões. Afinal, a avaliação do próprio BNDES sobre a credibilidade, solvência e adimplência do grupo é uma informação bastante valiosa para a equipe aferir se foi temerária ou não a expressiva participação do BNDESPar no referido grupo empresarial.

9. Ademais, o dado referente à adimplência, também supostamente protegido por sigilo bancário, é de fundamental importância para a equipe, pois há vedação contratual e normativa para liberação de recursos, aquisição de debêntures ou participação acionária em empresas inadimplentes com o Sistema BNDES.

10. Logo, a ausência da referida informação impede que a equipe conclua pela desconformidade de qualquer transação realizada com o Grupo JBS/Friboi em razão da existência de algum débito não quitado com o BNDES.

11. No que tange ao sigilo empresarial, o banco tarjou a estratégia de hedge do Grupo JBS/Friboi. A despeito de entendermos não poder ser oposto sigilo empresarial ao TCU, mas apenas transferi-lo, em análise preliminar, a proteção do grupo contra oscilações inesperadas de preços não seria relevante para o trabalho, pois o cerne da auditoria seria a relação entre o BNDES e o conglomerado e não entre este e o mercado.

12. Com base no exposto, o impasse quanto ao acesso às informações necessárias ao deslinde da presente auditoria redundou em atrasos não imputáveis à equipe de auditoria responsável pela fiscalização.

13. Sendo assim, solicitamos ao Exmº Sr. Ministro-Relator a adoção das seguintes medidas:

2

Page 3:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

a) prorrogação em quarenta e cinco dias do prazo estabelecido pelo item 9.2.1 do Acórdão 1398/2014 - TCU - Plenário, nos termos do art. 15, § 2º, da Resolução TCU 215/2008; e

b) determinação ao BNDES para que disponibilize, no prazo de até 5 (cinco) dias, os documentos solicitados nos Ofícios de Requisição 1 (peça 17), 2 (peça 18), 3 (peça 29), 6 (peça 30) e 7 (peça 31), bem como nos demais ofícios futuros, referentes às operações realizadas entre o BNDES e o Grupo JBS/Friboi (Registro Fiscalis 423/2014), sem a aposição de qualquer tarja nos textos da referida documentação, art. 245, inciso II, do Regimento Interno do Tribunal de Contas da União.”

É o relatório.

VOTO

Em análise o pronunciamento da SecexEstataisRJ, exarado nestes autos de auditoria, tendo por objeto as operações de crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) ao Grupo JBS/Friboi, realizada por solicitação oriunda da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados. No referido pronunciamento, transcrito no relatório precedente, a unidade técnica requer prorrogação do prazo concedido por meio do subitem 9.2.1 do Acórdão 1398/2014-TCU-Plenário, por mais 45 dias, para conclusão dos trabalhos de fiscalização. Ao mesmo tempo, relata as dificuldades de obtenção das informações requeridas ao BNDES, sendo essa a razão para a não finalização da auditoria no prazo originalmente estabelecido. Conforme relatado pela equipe de auditoria, nem todos os documentos requeridos têm sido enviados para a apreciação da equipe. Mesmo na documentação remetida há importantes informações sendo tarjadas, sob alegação de sigilo bancário e/ou empresarial. Além disso, tem havido demora na remessa de informações. Em que pese a SecexEstataisRJ ter conseguido minorar as dificuldades impostas pelo BNDES, por meio de realização de reuniões com representantes do banco, ainda há pendências de fornecimento de dados importantes para a conclusão da fiscalização. Essa tentativa de solução negociada para os entraves encontrados é a razão alegada pela unidade técnica para não ter adotado a providência estipulada no subitem 9.2.2 do acórdão que determinou a realização da auditoria, consistente na representação ao Relator sobre eventual ocorrência de óbices à auditoria, sob a alegação de sigilo bancário. No entender da SecexEstataisRJ, a elaboração de representação poderia acarretar ainda mais atrasos aos trabalhos de auditoria. Além da solicitação de prorrogação de prazo para conclusão da auditoria, a unidade técnica propõe a prolação de determinação ao BNDES para que disponibilize os documentos já solicitados, bem como aqueles requeridos em eventuais ofícios futuros, sem a aposição de qualquer tarja nos textos da referida documentação. Ante as informações prestadas, é forçoso admitir que a determinação proposta é a medida mais apropriada, no momento, para a solução dos entraves encontrados pela equipe de fiscalização. Considero pertinente, contudo, além de fazer a determinação proposta, alertar o BNDES que eventual não atendimento poderá sujeitar os responsáveis à multa constante do art. 58, inciso VI, da Lei 8.443/1992, além da adoção da medida acautelatória prevista no art. 44 da mesma lei. 7. A dificuldade apontada pela equipe de auditoria está evidenciada nas peças constantes dos autos. Em 07/07/2014, por meio do Ofício de Requisição 1-423/2014 (peça 17), houve a primeira solicitação de informações ao BNDES. Esse ofício foi reiterado pelo de nº 2-423/2014, de 10/07/2014 (peça 18). Em seguida houve o fornecimento parcial das informações requeridas, com aposição de tarjas em partes consideradas essenciais para os trabalhos de fiscalização. Ante essa situação, por meio do Ofício de requisição 3-423/2014, de 22/07/2014 (peça 29) foi reiterada a necessidade de disponibilização de todos os documentos já solicitados, além de requerer novos documentos. Esse ofício foi reiterado pelo de nº 6-423/2014, de 06/08/2014 (peça 30).

3

Page 4:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

8. Verifica-se, portanto, que passados cerca de dois meses desde a requisição inicial, partes importantes das informações requeridas ainda não foram fornecidas ao Tribunal.9. Cabe destacar aqui que essa mesma situação de negativa de fornecimento de informações, por parte do BNDES, sob a alegação de sigilo bancário já ocorreu em outras fiscalizações realizadas pelo Tribunal. Trata-se, portanto, de prática reiterada daquela entidade, o que tem trazido muitas dificuldades à atuação desta Corte de Contas. 10. Uma destas fiscalizações é a auditoria autuada no TC-007.481/2014-4, tendo por objeto a análise dos critérios utilizados pelo BNDES para alocação de recursos entre as suas diversas áreas de atuação, sua distribuição entre os postulantes de apoio financeiro e sua aderência às políticas públicas governamentais. Naquela fiscalização, embora atualmente tenha havido acordo acerca do fornecimento das informações requeridas pelo Tribunal, houve, inicialmente, dificuldades em relação à obtenção de informações requeridas pela equipe de auditoria.11. Caso mais evidente desse obstáculo imposto pelo BNDES ocorreu na auditoria de conformidade autuada no TC-018.337/2013-9, com o objetivo de avaliar os procedimentos e as normas empregados pelo BNDES para a análise do custo inicial dos projetos submetidos à aprovação daquele banco público. Ante as dificuldades de obtenção das informações necessárias à conclusão dos trabalhos de fiscalização naquele processo, a equipe de auditoria formulou representação (TC-024.832/2013-8) relatando os entraves impostos à atuação do Tribunal. 12. Antes de me manifestar sobre os fatos noticiados na mencionada representação, solicitei ao Ministério Público junto ao TCU é à Consultoria Jurídica deste Tribunal pareceres acerca da natureza pública das informações solicitadas na auditoria e de sua eventual não inclusão entre aquelas abrigadas pelas regras referentes ao sigilo bancário em razão dessa natureza.13. O MP/TCU se manifestou pela inexistência do sigilo bancário, por meio do parecer à peça 16 daqueles autos de representação, nos seguintes termos:

“Trata-se de representação de equipe de auditoria da Secretaria de Controle Externo da Administração Indireta do Rio de Janeiro, dando conta da recusa do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES em fornecer informações necessárias para a realização de auditoria de conformidade – TC nº 018.337/2013-9 – com o objetivo de avaliar os procedimentos e as normas empregados pelo BNDES para a análise do custo inicial dos projetos submetidos à aprovação daquele banco público.2. Registre-se que a fonte de financiamento dos projetos de investimento aprovados pelo BNDES é oriunda de recursos públicos transferidos pelo Tesouro Nacional ao BNDES, pela via de empréstimos. Segundo o levantamento realizado durante a fase de planejamento, o Tesouro Nacional emprestou ao BNDES, aproximadamente, R$ 340 bilhões (R$ 339.410.475.847,30), considerando-se o saldo atual (posição de julho de 2013), em que já houve pagamento de amortização do principal e de serviço da dívida (juros) pelo BNDES ao Tesouro. Em valores nominais, o montante chegaria a cerca de R$ 350 bilhões.3. Assim, de acordo com a unidade técnica, caso o custo inicial dos empreendimentos a serem financiados pelo BNDES seja sobreavaliado, “haveria risco de que recursos do Banco e do Tesouro sejam alocados, desnecessariamente, para alguns projetos, em detrimento de vários outros, além do risco do patrocínio à corrupção e ao desvio de recursos. Haveria, portanto, o risco de ineficiência alocativa de recursos destinados à regulação do crédito de longo prazo na economia brasileira. (...) Considerando-se que os recursos são emprestados a taxas muito inferiores às praticadas pelas demais instituições financeiras privadas, haveria o risco de incentivo a que os postulantes ao crédito pretendessem tomar todo o montante que possam levantar no BNDES, independentemente da estrita aderência aos custos dos projetos formalmente financiados”.4. Conforme descrito pela equipe de fiscalização, o objeto do controle consiste em mapear, em uma amostra de projetos financiados pelo Banco, selecionada por critérios de materialidade, relevância e risco, os procedimentos e normas empregados para a análise do custo inicial dos projetos submetidos à aprovação do BNDES, sob o aspecto da eficiência, principalmente, da aderência dos custos propostos aos montantes desembolsados.

4

Page 5:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

5. Para dar cumprimento à fiscalização, a equipe de auditoria expediu, em 16 de agosto de 2013, ofício de requisição solicitando os seguintes documentos e premissas utilizados pelo Banco nas fases de análise, de contratação e de acompanhamento que subsidiaram as operações de crédito para dois empreendimentos relativos a execução de uma linha de transmissão de energia e a execução de uma estrutura portuária:a) Fase de análise econômico-financeira:

i. quadro de Usos e Fontes;ii. relatório de Análise;iii. premissas e as fontes de informações (indicadores, publicações, sites especializados e base de

dados referenciais) que foram utilizadas para se verificar a razoabilidade do orçamento apresentado;iv. procedimentos adotados para ajustar essas fontes de informações ao caso em concreto; ev. análise da capacidade de pagamento do postulante e do empreendimento.

b) Fase de monitoramento e de acompanhamento:i. procedimentos e documentos utilizados para se verificar os gastos do empreendimento; eii. metodologia utilizada para a definição da amostra que vise comprovar a execução financeira do

projeto, bem como, os documentos e os procedimentos que foram analisados nessa amostra.6. O BNDES, por intermédio de seu Departamento de Auditoria, inicialmente remeteu à equipe de auditoria documentos com diversas partes tarjadas de preto (peças 2/9). Após solicitação da equipe para que apresentasse os documentos enviados integralmente, sem a oposição de tarjas (peça 10), o BNDES formalizou sua recusa em fornecer os elementos solicitados, afirmando, em síntese, que estaria impedido de entregar informações protegidas pelo sigilo bancário ao Tribunal, em razão dessa Corte não constar do rol de instituições autorizadas a decretar sua quebra, conforme disciplina a Lei Complementar nº 105/2001.7. Em sua manifestação constante da peça 12, a unidade técnica considera que a atitude institucional do BNDES é injustificada e sem fundamento legal, em razão de que, dada a presença de recursos públicos envolvidos nos financiamentos, “o regime jurídico aplicável a esses financiamentos é o regime de direito público, presidido pelos princípios constitucionais da publicidade, da moralidade, da impessoalidade e da eficiência. Assim sendo, cuidar-se-ia de uma hipótese de não-incidência da lei complementar 105/2001 ao objeto fiscalizado”.8. Ao final, propõe, entre a adoção de outras medidas, que o Tribunal fixe ao Presidente do BNDES prazo para a apresentação das informações e documentos requeridos, sob pena de lhe ser aplicada a multa prevista no art. 58 da Lei nº 8.443/92 e que o Tribunal firme o entendimento de que “a documentação referente aos projetos financiados com recursos emprestados pelo Tesouro Nacional, por meio da emissão direta de títulos públicos, que trazem implícito um subsídio creditício, à luz dos princípios constitucionais da eficiência, da publicidade, da moralidade, além do princípio administrativo da economicidade, não poderá ser sonegada às equipes de fiscalização do Tribunal, designadas para o cumprimento das competências constitucionais insculpidas nos arts. 70 e 71 da Constituição Federal”.9. Por meio do despacho constante à peça 15, Vossa Excelência solicitou a manifestação do MP/TCU a respeito das questões tratadas na presente representação, em especial a questão da natureza pública das informações solicitadas e de sua eventual não inclusão entre aquelas abrigadas pelas regras referentes ao sigilo bancário em razão dessa natureza.

II

10. A questão tratada nos autos não é nova no Tribunal. Tem sido recorrente a recusa, por variadas entidades sujeitas à jurisdição do TCU, financeiras ou não, da apresentação de informações e documentos a este Tribunal sob a alegação de que esses elementos estariam protegidos por sigilo, seja bancário, fiscal, comercial ou industrial.11. Desta feita, é o BNDES que alega a incidência do sigilo bancário para negar informações ao Tribunal, informações estas que são imprescindíveis ao TCU para o exercício de suas competências constitucionais de fiscalizar a aplicação de recursos públicos.12. A questão que se coloca nos presentes autos é se as informações relativas a financiamentos públicos para execução de obras públicas executadas sob abrigo de concessão de serviços ou obras públicas são consideradas de natureza pública e se tais informações estão incluídas entre aquelas abrigadas pelas regras referentes ao sigilo bancário, em razão dessa natureza.

5

Page 6:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

III

A QUESTÃO DO SIGILO BANCÁRIO

13. É majoritário na doutrina e na jurisprudência, inclusive do STF, o entendimento de que o sigilo bancário possui natureza constitucional, fazendo parte dos direitos e garantias fundamentais listados no art. 5º da CF/88, seja porque seria uma decorrência natural do direito à intimidade e à vida privada, assegurados no inciso X, seja por estar inserido no conceito de dados a que se refere o inciso XII.14. Da leitura dos dispositivos constitucionais citados, percebe-se que o núcleo de proteção do sigilo bancário abrange a proteção da privacidade e a intimidade dos cidadãos em geral, ou seja, o sigilo bancário protege interesses privados, mais especificamente a intimidade financeira das pessoas. 15. Ao discorrer sobre o alcance da norma constitucional inscrita nos incisos X e XII do art. 5º, o Ministro Celso de Melo assim se pronunciou (MS 22.801/DF):

“a transposição arbitrária, para o domínio público, de questões meramente pessoais, sem qualquer reflexo no plano dos interesses sociais, tem o significado de grave transgressão ao postulado constitucional que protege o direito à intimidade (MS 23.669-MC/DF, Rel. MIn. Celso de Melo, v.g), pois este, na abrangência de seu alcance, representa o ‘direito de excluir, do conhecimento de terceiros, aquilo que diz respeito ao modo de ser da vida privada’ (HANNAH ARENDT).” 16. Não obstante a relevância do direito ao sigilo bancário, também é pacífica na doutrina e na jurisprudência do STF o entendimento de que o sigilo bancário é um direito individual não absoluto, podendo ser rompido em casos especiais onde há prevalência do interesse público. Nesse contexto, insere-se a Lei Complementar nº 105/2001, que entrega apenas ao Poder Judiciário e ao Poder Legislativo Federal (Senado, Câmara e Comissões Parlamentares de Inquérito) a prerrogativa de impor a quebra do sigilo bancário.17. O Supremo Tribunal Federal, em diversas oportunidades, tem garantido a negativa de informações requisitadas pelo TCU, sob o fundamento de que não foi ele incluído pelo legislador no rol daqueles que podem ordenar a quebra de sigilo bancário. 18. Veja-se, a propósito, o entendimento adotado pelo Pleno no julgamento do Mandado de Segurança 22.801 (Rel. Min. Menezes Direito, DJE-047 de 14.03.2008), quando a Suprema Corte concedeu Mandado de Segurança impetrado pelo Banco Central do Brasil – BACEN contra ato do TCU que, ao proceder à auditoria na prestação de contas do BACEN, determinara-lhe que fosse disponibilizado o acesso às transações do Sistema de Informações do Banco Central – SISBACEN. 19. Da leitura atenta do Relatório e dos Votos dos Ministros no citado MS-22801, percebe-se que a amplitude da solicitação efetuada pelo TCU, de acesso irrestrito ao sistema SISBACEN, seria um dos principais motivadores para a negativa do pedido. A reprovação da solicitação do TCU fica clara quando o Ministro Carlos Brito afirma que a insurgência se dá contra a amplitude investigatória que alcançaria uma dimensão fora de qualquer processo em especial, ou seja, seria uma investigação lato sensu inespecífica. Percebe-se que, com o acesso irrestrito ao sistema SISBACEN, existiria a possibilidade de o Tribunal devassar o sigilo bancário de pessoas físicas e jurídicas, indistintamente e independentemente de recursos públicos envolvidos. 20. Em outra situação (MS-22934), o STF também reconheceu a incidência do sigilo bancário quando o TCU tentou acesso a registros contábeis relativos às aplicações em Depósitos Interfinanceiros – DI efetuados pelo Banco do Brasil. A tese, ao final vencedora, foi que as informações requisitadas pelo TCU estariam cobertas pelo sigilo bancário, não podendo, por conseguinte, serem prestadas, haja vista que os depósitos interfinanceiros são realizados com recursos privados.21. Nos citados precedentes, percebe-se o caráter genérico das requisições do Tribunal, que possibilitariam, ao menos em tese, o acesso a transações financeiras de pessoas, independentemente da natureza pública de recursos envolvidos, abrangendo até mesmo recursos de natureza privada. Tais fatos caracterizariam verdadeira devassa na intimidade e vida privada das pessoas.

IV

SIGILO BANCÁRIO X NATUREZA PÚBLICA DAS INFORMAÇÕES

6

Page 7:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

22. O eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera:

“O caso não pode compreender-se juridicamente senão por referência à norma e esta por referência àquele, pois não é só o caso que deve orientar-se pela norma, mas também a norma que deve orientar-se para o caso.

(...)Segundo a concepção prática do direito, a interpretação jurídica é a busca da norma adequada

tanto ao caso quanto ao ordenamento1.” (destaques acrescidos)23. Em suma, o caráter prático do direito exige que a jurisprudência volte-se não só ao texto legal, mas também à realidade, uma vez que a interpretação da norma pressupõe o conhecimento do caso.24. Adoto aqui a premissa de que a norma está vinculada a determinado substrato fático. Por isso, a sua interpretação na solução de determinado problema deve levar em conta não só o texto, mas também o âmbito da norma (fatos da realidade a serem regulados). 25. Nessa linha, compõe o âmbito de aplicação da norma em questão uma determinada situação concreta a que ela se aplica. Considerando que a estrutura da norma inclui também um pedaço da realidade que ela pretende regular, se este substrato fático não está presente, a norma não se aplica.26. Objetivamente, a incidência da Lei Complementar nº 105/2001 a este caso em exame exigiria que estivessem configurados os pressupostos necessários para a sua validade, ou seja, a proteção da privacidade e a intimidade dos cidadãos em geral, mais especificamente a intimidade financeira das pessoas. Vale dizer, a intimidade financeira das pessoas quando operando com recursos eminentemente privados.27. Com estas premissas fixadas, defendo a tese de que as informações sobre operações financeiras que envolvam recursos públicos não estão abrangidas entre aquelas protegidas pelo sigilo bancário a que alude a Lei Complementar nº 105/2001, visto que operações dessa espécie estão submetidas aos princípios da administração pública insculpidos no art. 37 da Constituição Federal. Em tais situações, é prerrogativa constitucional do Tribunal o acesso a informações relacionadas a operações financiadas com recursos públicos. Tal acesso independe de autorização judiciária ou legislativa.28. O acesso aos dados e informações ora defendido não se trata, por óbvio, de o Tribunal exercer, por autoridade própria, o poder de afastar o caráter sigiloso de determinados dados, informações e registros, visto que não detém tal competência. Apenas está-se a dizer que a atuação do Tribunal, neste caso, se dá em uma zona de não incidência do direito ao sigilo bancário por força da natureza pública dos recursos envolvidos. 29. Na hipótese de, no curso de fiscalizações, de forma motivada e para proteger o interesse público, o Tribunal ter necessidade de informações bancárias de natureza privada de pessoas físicas ou jurídicas, deve se submeter ao que dispõe a Lei Complementar nº 105/2001. Ou seja, para devassar dados bancários privados das pessoas, há necessidade de prévia autorização judicial ou legislativa, nos termos da citada Lei Complementar.30. Observo que quando o Supremo Tribunal Federal se deparou com a situação em que se discutia o acesso a informações bancárias que envolviam a aplicação de recursos públicos o entendimento adotado foi exatamente o que ora exponho.31. A propósito, a unidade técnica traz o julgamento do Mandado de Segurança 21729-DF, em que foi vencedora a tese de que não cabe opor sigilo bancário frente à concessão de empréstimos, subsidiados pelo Tesouro Nacional. Na ocasião, discutiu-se a incidência ou não do sigilo bancário quando o Ministério Público Federal solicitou informações ao Banco do Brasil S/A sobre concessão de empréstimos, subsidiados pelo Tesouro Nacional.32. Ao fundamentar sua posição a favor da não incidência do sigilo bancário naquele caso, o Ministro Otávio Galotti demonstrou que não se pretendia devassar contas particulares. Naquela situação, não se trataria propriamente de quebra de um sigilo, tendo em vista que as operações com dinheiro público estão

1 El caso no puede comprenderse jurídicamente si no es por referencia a la norma y ésta por referencia a aquél, pues no es solo el caso el que debe orientarse por la norma, sino también la norma que debe orientarse al caso. (...) Según la concepción práctica del derecho, en cambio, la interpretación jurídica es la búsqueda de la norma adecuada tanto al caso como al ordenamiento. (traduzido de ZAGREBELSKI, Gustavo. El derecho ductil. Ley, derechos y justicia. Tradución de Marina Goscón. Madrid: Trotta, 1995).

7

Page 8:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

imunes de sigilo, por sua própria natureza. Ao contrário, as operações com dinheiro público estão sujeitas aos princípios do art. 37 da CF.33. Por esclarecedor, transcrevo o seguinte trecho da instrução da unidade técnica:

“Desse Acórdão, alguns subsídios podem ser extraídos para a análise presente. Por analogia ao Banco do Brasil, o BNDES também é instituição financeira executora de política creditícia e financeira do Governo Federal. O objeto da auditoria versa, exatamente, sobre um aspecto da execução da política creditícia do Governo Federal, empreendida com recursos repassados diretamente pelo Tesouro Nacional. Não compreende recursos próprios do Banco estatal. Com efeito, o objeto desta auditoria visa a análise de um subsídio creditício, implícito na aplicação dos recursos do Tesouro, emprestados ao BNDES. Naquele caso, as informações versavam sobre nomes de beneficiários de empréstimos concedidos pela instituição, com recursos subsidiados pelo erário federal. Segundo o entendimento do Supremo, ‘os empréstimos concedidos eram verdadeiros financiamentos públicos, porquanto o Banco do Brasil os realizou na condição de executor da política creditícia e financeira do Governo Federal, que deliberou sobre sua concessão e ainda se comprometeu a proceder à equalização da taxa de juros’. Ora, esse é, precisamente, o caso da fiscalização sobre o BNDES. Com efeito, o objeto da auditoria abrange tão-somente operações ativas cuja fonte de recursos adveio diretamente do Tesouro Nacional. E, conforme vimos, exaustivamente, tais operações de financiamento embutem um inequívoco subsídio creditício, concedido pelo Tesouro Nacional. Consequentemente, dois dos pressupostos autorizadores da permissão de acesso, constantes dessas razões de decidir, também estão presentes no caso da fiscalização em curso sobre o BNDES.”

V

O ACESSO DE INFORMAÇÕES SIGILOSAS PELO TCU

34. Fixadas as bases da não incidência da Lei Complementar nº105/2011 em casos que se referem a aplicação de recursos públicos, visto que tais informações seriam de natureza pública, cabe-nos registrar que a natureza pública das informações não significa, de forma automática, como a primeira vista possa parecer, que se tratam de informações públicas.35. Inobstante a essencialidade do direito de acesso a informações por parte da sociedade na consolidação da democracia, no exercício da cidadania e como instrumento de combate à corrupção, forçoso é reconhecer que devem ser estabelecidos de forma clara os limites e possibilidades do sigilo, notadamente quando se referem a informações imprescindíveis à segurança da sociedade e do Estado.36. É nesse contexto que existem leis específicas que regulam diversos sigilos como o fiscal, comercial, bancário, entre outros. 37. Entretanto, podemos afirmar que a Lei nº 12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação – LAI) inaugurou um novo patamar nas relações entre a Administração Pública e a Sociedade, no que diz respeito à publicidade das informações de natureza pública. 38. Ao mesmo tempo em que estabeleceu a publicidade como preceito geral e o sigilo como exceção, disciplinou de forma clara os critérios de restrição de acesso à informação. Assim, as informações em poder dos órgãos e entidades públicas, observado o seu teor e em razão de sua imprescindibilidade à segurança da sociedade ou do Estado, poderão ter acesso público irrestrito ou serem classificadas como ultrassecretas, secretas ou reservadas. 39. Note-se que a informação classificada como ultrassecreta, secreta ou reservada não deixa de ser uma informação de natureza pública, mas por conta de seu conteúdo recebe uma restrição no acesso, devendo, a partir de então, receber mecanismos de proteção com vistas a controlar o seu acesso e divulgação.40. Observo que mesmo em tais hipóteses, tendo em vista sua missão de natureza constitucional de controlar a Administração Pública para contribuir com seu aperfeiçoamento sempre em benefício da sociedade, o Tribunal mantém suas prerrogativas de acesso irrestrito a informações necessárias para o exercício de sua jurisdição.41. Neste contexto, tramita neste Tribunal questões altamente relevantes aos interesses da nação e imprescindíveis à segurança da sociedade e do Estado, a exemplos de fiscalizações sigilosas tendo como objeto a construção do primeiro submarino nuclear brasileiro, aquisição de caças para a força aérea

8

Page 9:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

brasileira, construção de refinarias e plataformas de petróleo, entre tantos outros temas sensíveis fiscalizados e acompanhados pelo Tribunal.42. No caso em análise, cuida-se de um órgão público (BNDES), repassando financiamentos públicos para execução de obras públicas executadas sob abrigo de concessão de serviços ou obras públicas. Entendo que, em tais condições, as operações realizadas atraem todo tipo de controle inerente à Administração Pública. Na hipótese de o BNDES considerar que existem informações que mereçam um tratamento sigiloso quanto a sua divulgação, é suficiente informar essa condição que o Tribunal dará o tratamento adequado para garantir a segurança da informação.43. Reafirmo que não se cuida neste caso concreto de hipótese em que o TCU precise de autorização para quebra de sigilo bancário, reconhecido o fato de que, para tal, teria que recorrer ao Judiciário ou ao Poder Legislativo. In casu, considero que não há quebra de sigilo, dada a natureza pública das informações.

VI

DAS INFORMAÇÕES RECUSADAS PELO BNDES

44. Como informa a unidade técnica, dentre as informações tarjadas pelo BNDES constam informações relativas ao valor total do investimento, aos principais gastos realizados, ao total dos gastos acumulados no período, ao percentual desses gastos sobre o total do financiamento, à síntese do quadro de usos e fontes, ao número de liberações, às respectivas datas das liberações de recursos e aos respectivos montantes liberados.45. Da forma como foram prestadas as informações, o Tribunal está impossibilitado de verificar a “validade dos procedimentos adotados para garantir que os elementos comprobatórios apresentados pelo tomador do financiamento são vinculados ao empreendimento. Impedem, ademais, a verificação de que possuem aderência com o objeto financiado, de maneira a caracterizar os valores aplicados e, por consequência, justificar as parcelas liberadas pelo Banco. O grau de restrição das informações fornecidas é tão elevado que não permite sequer avaliar se os procedimentos que visariam a garantir a aplicação dos recursos financiados pelo BNDES foram efetivamente realizados”.46. Da simples análise das informações que foram solicitadas ao BNDES, percebe-se que na presente fiscalização o que se busca é avaliar os procedimentos internos do banco na avaliação e concessão de seus empréstimos. Em nenhum momento o Tribunal busca violar a intimidade e a privacidade dos clientes do banco.47. Obviamente que, no decorrer da fiscalização, eventualmente o Tribunal poderá ter contato com informações específicas das pessoas, que voluntariamente optaram por receber financiamentos públicos. Entretanto, esse é um efeito indireto a que se expõem aqueles que estão dispostos a transacionar com o poder público. Ademais, como dito anteriormente, o TCU tem meios de garantir a segurança de informações consideradas sigilosas. 48. Recentemente, no âmbito de uma fiscalização no BNDES com objetivo de apurar indícios de favorecimentos indevidos e de superfaturamento no custo das embarcações financiadas com recursos do Fundo da Marinha Mercante – FMM, o TCU se manifestou por meio do Acórdão nº 715/2010-Plenário, no seguinte sentido:

“1. As disposições constitucionais atinentes ao sigilo bancário devem ser harmonizadas com as normas também de estatura constitucional referentes ao exercício do controle externo.

2. A não apresentação das informações mínimas necessárias à apuração de irregularidades na gestão de recursos públicos representa óbice ao exercício da competência constitucional deste Tribunal de realizar o controle externo em auxílio ao Congresso Nacional.

3. As pessoas que optam por celebrar contratos ou realizar operações financeiras com a Administração Pública Indireta se submetem a um regime de natureza pública, sujeitando-se, por conseguinte, aos controles atinentes à espécie, entre eles o controle externo a cargo deste Tribunal.”

VII

49. Com estas considerações, este representante do MP/TCU manifesta-se de acordo com a proposta de encaminhamento da unidade técnica constante das p. 28-29, peça 12, no sentido de que o Tribunal, entre

9

Page 10:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

outras medidas, fixe o prazo improrrogável de cinco dias ao Presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), para que apresente a este Tribunal as informações requeridas no Ofício 4-458/2013-TCU/SecexEstataisRJ, alertando-o de que o não cumprimento dessa exigência no prazo determinado poderá ensejar a aplicação das medidas previstas nos arts. 42, § 2º, e 44 da Lei nº 8.443/92.”

14. A Consultoria Jurídica, naquela ocasião, também se manifestou pela inexistência do sigilo bancário, conforme parecer à peça 18 do TC-024.832/2013-8, verbis:

“I - INTRODUÇÃOReferem-se os autos a representação de equipe de auditoria do TCU, na qual é noticiada a

recusa do BNDES em fornecer informações sob a alegação de sigilo bancário.O Relator, Exmo. Ministro-substituto Augusto Sherman, solicitou a manifestação do

Ministério Público junto ao TCU acerca das questões tratadas na representação, “em especial a questão da natureza pública das informações solicitadas e de sua eventual não inclusão entre aquelas abrigadas pelas regras referentes ao sigilo bancário em razão dessa natureza”.

O MP/TCU apresentou parecer, no qual manifestou-se “de acordo com a proposta de encaminhamento da unidade técnica constante das p. 28-29, peça 12, no sentido de que o Tribunal, entre outras medidas, fixe o prazo improrrogável de cinco dias ao Presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), para que apresente a este Tribunal as informações requeridas no Ofício 4-458/2013-TCU/SecexEstataisRJ, alertando-o de que o não cumprimento dessa exigência no prazo determinado poderá ensejar a aplicação das medidas previstas nos arts. 42, § 2º, e 44 da Lei nº 8.443/1992”.

Remetidos os autos ao Gabinete do Relator, foi solicitada análise da questão a esta Conjur, em especial, “considerando que se trata de informações relativas a financiamentos públicos para execução de obras públicas executadas ao abrigo de concessão de serviços ou obras públicas, solicito seja incluída, entre todos os aspectos relacionados à matéria que serão analisados por essa unidade, a questão da natureza pública das informações solicitadas e de sua eventual não inclusão entre aquelas abrigadas pelo sigilo bancário em razão dessa natureza”.

II - ANÁLISEA questão em discussão reside na análise da licitude da recusa do BNDES de fornecimento

de informações ao TCU, relativas a operações de financiamento com recursos oriundos do Tesouro Nacional.

A motivação utilizada pelo BNDES basicamente consiste na oposição do sigilo bancário, e em razão de o TCU não estar explicitado na Lei Complementar nº 105/2001 como legitimado para requisitar tais informações.

O sigilo bancário consiste em manifestação do princípio constitucional de proteção à intimidade. Em regra, há previsão de reserva de jurisdição para a vulneração desse sigilo, entretanto, há exceções.

Atualmente, a matéria encontra-se normatizada na Lei Complementar nº 105/2001. Esse diploma legislativo possibilitou que, além do Poder Judiciário, tivessem acesso a dados acobertados com o sigilo bancário, o Poder Legislativo Federal, assim, como as Comissões Parlamentares de Inquérito – CPIs:

Art. 4o O Banco Central do Brasil e a Comissão de Valores Mobiliários, nas áreas de suas atribuições, e as instituições financeiras fornecerão ao Poder Legislativo Federal as informações e os documentos sigilosos que, fundamentadamente, se fizerem necessários ao exercício de suas respectivas competências constitucionais e legais.§ 1o As comissões parlamentares de inquérito, no exercício de sua competência constitucional e legal de ampla investigação, obterão as informações e documentos sigilosos de que necessitarem, diretamente das instituições financeiras, ou por intermédio do Banco Central do Brasil ou da Comissão de Valores Mobiliários.

10

Page 11:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

§ 2o As solicitações de que trata este artigo deverão ser previamente aprovadas pelo Plenário da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, ou do plenário de suas respectivas comissões parlamentares de inquérito.

Em atenção ao princípio federativo, esse rol foi ampliado por construção pretoriana com a inclusão das CPIs de Assembléias Legislativas:

EMENTA: AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA. MANDADO DE SEGURANÇA. QUEBRA DE SIGILO DE DADOS BANCÁRIOS DETERMINADA POR COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO DE ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA. RECUSA DE SEU CUMPRIMENTO PELO BANCO CENTRAL DO BRASIL. LEI COMPLEMENTAR 105/2001. Potencial conflito federativo (cf. ACO 730-QO). Federação. Inteligência. Observância obrigatória, pelos estados-membros, de aspectos fundamentais decorrentes do princípio da separação de poderes previsto na Constituição federal de 1988. Função fiscalizadora exercida pelo Poder Legislativo. Mecanismo essencial do sistema de checks-and-counterchecks adotado pela Constituição federal de 1988. Vedação da utilização desse mecanismo de controle pelos órgãos legislativos dos estados-membros. Impossibilidade. Violação do equilíbrio federativo e da separação de Poderes. Poderes de CPI estadual: ainda que seja omissa a Lei Complementar 105/2001, podem essas comissões estaduais requerer quebra de sigilo de dados bancários, com base no art. 58, § 3º, da Constituição. Mandado de segurança conhecido e parcialmente provido.

(ACO 730, Relator(a):  Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, julgado em 22/09/2004, DJ 11-11-2005 PP-00005 EMENT VOL-02213-01 PP-00020)

A questão da possibilidade de o TCU ter acesso a dados acobertados pelo sigilo bancário já foi objeto de análise pelo STF em duas oportunidades. Tanto no MS 22.801, quanto no MS 22.934, o Plenário do STF decidiu que, pelo fato de o TCU não constar do rol previsto na já citada Lei Complementar nº 105/2001, seria inviável franquear o acesso a dados sigilosos à Corte de Contas. Seguem as transcrições das ementas:

EMENTA Mandado de Segurança. Tribunal de Contas da União. Banco Central do Brasil. Operações financeiras. Sigilo.

1. A Lei Complementar nº 105, de 10/1/01, não conferiu ao Tribunal de Contas da União poderes para determinar a quebra do sigilo bancário de dados constantes do Banco Central do Brasil. O legislador conferiu esses poderes ao Poder Judiciário (art. 3º), ao Poder Legislativo Federal (art. 4º), bem como às Comissões Parlamentares de Inquérito, após prévia aprovação do pedido pelo Plenário da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do plenário de suas respectivas comissões parlamentares de inquérito (§§ 1º e 2º do art. 4º).

2. Embora as atividades do TCU, por sua natureza, verificação de contas e até mesmo o julgamento das contas das pessoas enumeradas no artigo 71, II, da Constituição Federal, justifiquem a eventual quebra de sigilo, não houve essa determinação na lei específica que tratou do tema, não cabendo a interpretação extensiva, mormente porque há princípio constitucional que protege a intimidade e a vida privada, art. 5º, X, da Constituição Federal, no qual está inserida a garantia ao sigilo bancário.

3. Ordem concedida para afastar as determinações do acórdão nº 72/96 - TCU - 2ª Câmara (fl. 31), bem como as penalidades impostas ao impetrante no Acórdão nº 54/97 - TCU - Plenário.

(MS 22801, Relator(a):  Min. MENEZES DIREITO, Tribunal Pleno, julgado em 17/12/2007, DJe-047 DIVULG 13-03-2008 PUBLIC 14-03-2008 EMENT VOL-02311-01 PP-00167 RTJ VOL-00205-01 PP-00161 LEXSTF v. 30, n. 356, 2008, p. 488-517)

11

Page 12:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. SEGURANÇA CONCEDIDA. O Tribunal de Contas da União, a despeito da relevância das suas funções, não está autorizado a requisitar informações que importem a quebra de sigilo bancário, por não figurar dentre aqueles a quem o legislador conferiu essa possibilidade, nos termos do art. 38 da Lei 4.595/1964, revogado pela Lei Complementar 105/2001. Não há como admitir-se interpretação extensiva, por tal implicar restrição a direito fundamental positivado no art. 5º, X, da Constituição. Precedente do Pleno (MS 22801, rel. min. Menezes Direito, DJe-047 de 14.03.2008.) Ordem concedida.

(MS 22934, Relator(a):  Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 17/04/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-090 DIVULG 08-05-2012 PUBLIC 09-05-2012)

Observe-se que o relator do MS 22.801, Ministro Menezes Direito, asseverou que a atividade do TCU, de julgamento de contas, justificaria a quebra do sigilo. Entretanto, como não houve menção explícita à Corte de Contas na Lei Complementar nº 105/2001, não haveria possibilidade de atribuir tal faculdade ao TCU.

Acrescente-se que a Receita Federal do Brasil também já teve pronunciamentos desfavoráveis no âmbito do STF em relação à quebra de sigilo bancário:

SIGILO DE DADOS – AFASTAMENTO. Conforme disposto no inciso XII do artigo 5º da Constituição Federal, a regra é a privacidade quanto à correspondência, às comunicações telegráficas, aos dados e às comunicações, ficando a exceção – a quebra do sigilo – submetida ao crivo de órgão equidistante – o Judiciário – e, mesmo assim, para efeito de investigação criminal ou instrução processual penal. SIGILO DE DADOS BANCÁRIOS – RECEITA FEDERAL. Conflita com a Carta da República norma legal atribuindo à Receita Federal – parte na relação jurídico-tributária – o afastamento do sigilo de dados relativos ao contribuinte.

(RE 389808, Relator(a):  Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 15/12/2010, DJe-086 DIVULG 09-05-2011 PUBLIC 10-05-2011 EMENT VOL-02518-01 PP-00218 RTJ VOL-00220- PP-00540)

Especificamente em relação ao acesso do fisco à movimentação bancária de contribuintes, sem prévia autorização judicial, a questão teve repercussão geral reconhecida no RE 601.314:

EMENTA: CONSTITUCIONAL. SIGILO BANCÁRIO. FORNECIMENTO DE INFORMAÇÕES SOBRE MOVIMENTAÇÃO BANCÁRIA DE CONTRIBUINTES, PELAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS, DIRETAMENTE AO FISCO, SEM PRÉVIA AUTORIZAÇÃO JUDICIAL (LEI COMPLEMENTAR 105/2001). POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA LEI 10.174/2001 PARA APURAÇÃO DE CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS REFERENTES A EXERCÍCIOS ANTERIORES AO DE SUA VIGÊNCIA. RELEVÂNCIA JURÍDICA DA QUESTÃO CONSTITUCIONAL. EXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.

(RE 601314 RG, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, julgado em 22/10/2009, DJe-218 DIVULG 19-11-2009 PUBLIC 20-11-2009 EMENT VOL-02383-07 PP-01422 )

Do exposto, a regra geral é a de que o TCU não possui autorização normativa para acessar dados acobertados pelo sigilo bancário, em que pese a sua atividade de julgamento de contas justificar tal acesso. A razão encontra-se na ausência de explicitação da Corte de Contas no rol dos legitimados para quebrar o sigilo bancário previsto na Lei Complementar nº 105/2001.

12

Page 13:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

Assentada a regra geral, cabe indagar se o caso concreto amolda-se a essa conclusão ou se é viável utilizar-se da técnica do distinguishing, ou seja, se a situação sob análise possui alguma peculiaridade que inviabilize sua subsunção à mencionada regra geral.

No caso concreto, a fiscalização possui como escopo “a aplicação dos recursos repassados pelo Tesouro Nacional ao BNDES” (peça 12). Esses recursos são utilizados pelo BNDES para financiar o desenvolvimento de políticas públicas de infraestrutura.

Acrescente-se que não se trata de operações similares às encontradas no mercado bancário, pois “os recursos utilizados pelo BNDES nas operações ativas ora auditadas embutem subsídio creditício. Logo, há subvenção implícita nessa modalidade de recursos públicos federais” (peça 12).

Assentadas essa premissas, observa-se que o caso concreto assemelha-se ao tratado pelo Plenário do STF no MS 21.729:

EMENTA: - Mandado de Segurança. Sigilo bancário. Instituição financeira executora de política creditícia e financeira do Governo Federal. Legitimidade do Ministério Público para requisitar informações e documentos destinados a instruir procedimentos administrativos de sua competência. 2. Solicitação de informações, pelo Ministério Público Federal ao Banco do Brasil S/A, sobre concessão de empréstimos, subsidiados pelo Tesouro Nacional, com base em plano de governo, a empresas do setor sucroalcooleiro. 3. Alegação do Banco impetrante de não poder informar os beneficiários dos aludidos empréstimos, por estarem protegidos pelo sigilo bancário, previsto no art. 38 da Lei nº 4.595/1964, e, ainda, ao entendimento de que dirigente do Banco do Brasil S/A não é autoridade, para efeito do art. 8º, da LC nº 75/1993. 4. O poder de investigação do Estado é dirigido a coibir atividades afrontosas à ordem jurídica e a garantia do sigilo bancário não se estende às atividades ilícitas. A ordem jurídica confere explicitamente poderes amplos de investigação ao Ministério Público - art. 129, incisos VI, VIII, da Constituição Federal, e art. 8º, incisos II e IV, e § 2º, da Lei Complementar nº 75/1993. 5. Não cabe ao Banco do Brasil negar, ao Ministério Público, informações sobre nomes de beneficiários de empréstimos concedidos pela instituição, com recursos subsidiados pelo erário federal, sob invocação do sigilo bancário, em se tratando de requisição de informações e documentos para instruir procedimento administrativo instaurado em defesa do patrimônio público. Princípio da publicidade, ut art. 37 da Constituição. 6. No caso concreto, os empréstimos concedidos eram verdadeiros financiamentos públicos, porquanto o Banco do Brasil os realizou na condição de executor da política creditícia e financeira do Governo Federal, que deliberou sobre sua concessão e ainda se comprometeu a proceder à equalização da taxa de juros, sob a forma de subvenção econômica ao setor produtivo, de acordo com a Lei nº 8.427/1992. 7. Mandado de segurança indeferido.

(MS 21729, Relator(a):  Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão:  Min. NÉRI DA SILVEIRA, Tribunal Pleno, julgado em 05/10/1995, DJ 19-10-2001 PP-00033 EMENT VOL-02048-01 PP-00067 RTJ VOL-00179 PP-00225)

Nesse precedente, analisou-se a possibilidade de o Ministério Público ter acesso a dados de operações de financiamento efetivadas pelo Banco do Brasil, subsidiadas pelo Tesouro Nacional. Decidiu o Plenário do STF que, nesse caso específico, no qual haveria a implementação de uma política pública por meio de recursos subsidiados, o poder de investigação do Ministério Público não poderia ser tolhido por invocação ao sigilo bancário.

Conquanto seja um precedente de 1995 e tomado por maioria apertada (com cinco votos vencidos), ele expressou o entendimento do STF sobre a questão.

Acredita-se que a situação sob análise assemelha-se ao caso do MS 21.729. Trata-se de operações de crédito, efetivadas por entidade da Administração indireta, subsidiadas pelo Tesouro nacional e voltadas à consecução de políticas públicas. Do exposto, devem ser adotadas as mesmas conclusões, quais sejam, o afastamento da cláusula de reserva de jurisdição para a obtenção dos dados das operações de crédito pelos órgãos de fiscalização.

13

Page 14:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

III - PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO

Em face do exposto, esta Consultoria Jurídica alinha-se ao entendimento da unidade técnica e do Ministério Público junto ao TCU, no sentido da viabilidade jurídica do acesso aos dados relacionados às operações de crédito com taxas subsidiadas do BNDES com recursos oriundos do Tesouro Nacional.”

15. Naquele processo de representação foi prolatado o Acórdão 3693/2013-TCU-Plenário, em cuja Proposta de Deliberação, a par dos pareceres do MP/TCU e da Consultoria Jurídica, teci as seguintes considerações acerca da questão em foco:

“11. Frente a essa persistente recusa, já havia solicitado à equipe de auditoria que analisasse minuciosamente o problema. A análise apresentada encontra-se transcrita no relatório precedente, pelo que abstenho-me de repeti-la. Gostaria, entretanto, de destacar suas conclusões, com as quais concordo, no sentido de que:

a) os recursos fiscalizados são públicos, visto que os financiamentos foram operados por meio de recursos transferidos pelo Tesouro Nacional ao BNDES, pela via de empréstimos;

b) os beneficiários dos referidos financiamentos são também beneficiários de subvenção econômica sob a forma de subsídio creditício implícito, pois, ao emprestar recursos ao BNDES, o Tesouro entrega ao banco uma carteira de títulos públicos, havendo uma diferença entre a remuneração que o Tesouro paga ao BNDES pelos títulos que emite e a remuneração contratual que o Tesouro recebe do BNDES pelos empréstimos recebidos;

c) o regime jurídico aplicável a esses financiamentos é o regime de direito público, presidido pelos princípios constitucionais da publicidade, da moralidade, da impessoalidade e da eficiência, o que determina a não incidência da Lei Complementar 105/2001 ao objeto fiscalizado.12. Em pronunciamento por mim solicitado, o eminente Procurador-Geral do Ministério Público junto ao TCU, Dr. Paulo Soares Bugarin, endossou as conclusões da equipe nos seguintes termos:

a) a incidência da Lei Complementar 105/2001 neste caso exigiria que estivessem configurados os pressupostos necessários para a sua aplicação, ou seja, a proteção da privacidade e da intimidade dos cidadãos em geral, mais especificamente a intimidade financeira das pessoas, considerada válida quando operando com recursos exclusivamente privados;

b) as informações sobre operações financeiras que envolvam recursos públicos não estão incluídas entre aquelas protegidas pelo sigilo bancário a que alude a Lei Complementar 105/2001, visto que operações dessa espécie estão submetidas aos princípios da administração pública insculpidos no art. 37 da Constituição Federal, por força da natureza pública dos recursos envolvidos;

c) no MS 2179-DF, conforme apontado pela unidade técnica, foi vencedora a tese de que não cabe opor sigilo bancário frente à concessão de empréstimos subsidiados pelo Tesouro Nacional;

d) é prerrogativa constitucional do TCU o acesso a informações relacionadas a operações financiadas com recursos públicos, independentemente de autorização judiciária ou legislativa.13. No mesmo sentido, opinou o Consultor Jurídico desta Corte, Dr. Sandro Granjeiro Leite, segundo a qual o caso em tela assemelha-se àquele tratado no MS 21.729, ficando afastado o sigilo bancário, uma vez que as operações de crédito foram efetivadas por entidade da Administração indireta, subsidiadas pelo Tesouro nacional e voltadas à consecução de políticas públicas. 14. Como proposta de encaminhamento, a Secex/Estatais, o MP/TCU e a Conjur manifestaram-se por:

a) fixar ao Sr. Luciano Galvão Coutinho, Presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o prazo improrrogável de cinco dias para que apresente a este Tribunal as informações requeridas;

b) comunicar ao Sr. Ministro de Estado do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior a deliberação a ser adotada;

c) firmar o entendimento de que a documentação referente aos projetos financiados com recursos emprestados pelo Tesouro Nacional, por meio da emissão direta de títulos públicos, que trazem implícito um subsídio creditício, à luz dos princípios constitucionais da eficiência, da publicidade, da moralidade, além do princípio administrativo da economicidade, não poderá ser sonegada às equipes de fiscalização

14

Page 15:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

do Tribunal, designadas para o cumprimento das competências constitucionais insculpidas nos arts. 70 e 71 da Constituição Federal;

d) solicitar ao Presidente do BNDES que, caso julgue necessário, aponte, entre os elementos encaminhados por força da medida acima, aqueles aos quais entenda deva ser dado tratamento sigiloso no âmbito deste Tribunal.”

16. Cabe ainda acrescentar que as questões tratadas nestes autos já foram objeto também de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público Federal contra o BNDES, objetivando a condenação do réu na “obrigação de fazer, consistente em tornar públicas, nos termos da Lei nº 12527/2012, todas as atividades de financiamento e apoio a programas, projetos, obras e serviços de entes públicos ou privados, que envolvam recursos públicos, realizadas por si ou por intermédio de outras pessoas jurídicas por ele instituídas (...)”. Naquela ação, autuada no Processo 60.410-24.2012.4.01.3400, a Juíza Federal Adverci Rates Mendes de Abreu proferiu sentença, na qual julgou procedente o pedido, nos seguintes termos:

“O BNDES, empresa pública federal, é destinado ao exercício de atividades bancárias e operações financeiras, com apoio financeiro a entidade públicas e privadas, constituído por recursos públicos e, conforme se depreende de seu sítio eletrônico – www.bndes.gov.br -, tem por finalidade a concessão de estímulos aos particulares para o desenvolvimento de projetos que contribuam para o desenvolvimento social, cultural e tecnológico, verbis:

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), empresa pública federal, é hoje o principal instrumento de financiamento de longo prazo para a realização de investimentos em todos os segmentos da economia, em uma política que inclui as dimensões social, regional e ambiental.

Desde a sua fundação, em 1952, o BNDES se destaca no apoio à agricultura, indústria, infraestrutura e comércio e serviços, oferecendo condições especiais para micro, pequenas e médias empresas. O Banco também vem implementando linhas de investimentos sociais, direcionados para educação e saúde, agricultura familiar, saneamento básico e transporte urbano.

O apoio do BNDES se dá por meio de financiamentos a projetos de investimentos, aquisição de equipamentos e exportação de bens e serviços. Além disso, o Banco atua no fortalecimento da estrutura de capital das empresas privadas e destina financiamentos não reembolsáveis a projetos que contribuam para o desenvolvimento social, cultural e tecnológico.

Portanto, ao contrário das demais instituições financeiras, o BNDES não visa aferir lucro nas suas operações, mas atingir interesses públicos relacionados, com investimentos em todos os segmentos da economia.

Dessa forma, em que pese sua natureza jurídica de direito privado, é empresa pública federal e está sujeito ao regime jurídico administrativo e às regras de direito público, dentre as quais a lei 12.527/2001 – lei de acesso à informação - editada com a finalidade de se consolidar o princípio da transparência no âmbito da administração pública direta e indireta, sujeitando também a estas mesmas regras as entidades privadas que com ele contratar.

A propósito, transcrevo os arts. 1º, 2º e 3º da lei 12.527/2011:

Art. 1º Esta Lei dispõe sobre os procedimentos a serem observados pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, com o fim de garantir o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do art. 5º, no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição Federal.Parágrafo único. Subordinam-se ao regime desta Lei:I - os órgãos públicos integrantes da administração direta dos Poderes Executivo, Legislativo, incluindo as Cortes de Contas, e Judiciário e do Ministério Público;II - as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

15

Page 16:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

Art. 2º Aplicam-se as disposições desta Lei, no que couber, às entidades privadas sem fins lucrativos que recebam, para realização de ações de interesse público, recursos públicos diretamente do orçamento ou mediante subvenções sociais, contrato de gestão, termo de parceria, convênios, acordo, ajustes ou outros instrumentos congêneres.Parágrafo único. A publicidade a que estão submetidas as entidades citadas no caput refere-se à parcela dos recursos públicos recebidos e à sua destinação, sem prejuízo das prestações de contas a que estejam legalmente obrigadas.Art. 3º Os procedimentos previstos nesta Lei destinam-se a assegurar o direito fundamental de acesso à informação e devem ser executados em conformidade com os princípios básicos da administração pública e com as seguintes diretrizes:I - observância da publicidade como preceito geral e do sigilo como exceção;II - divulgação de informações de interesse público, independentemente de solicitações;III - utilização de meios de comunicação viabilizados pela tecnologia da informação;IV - fomento ao desenvolvimento da cultura de transparência na administração pública;V - desenvolvimento do controle social da administração pública.

Ocorre que, o réu entende que em face do que dispõe o art. 22 da lei 12.527/2011, assim como o § 1º do art. 5º e art. 6º do decreto nº 7.724/2012 que a regulamenta, não está obrigado, ao contrário, está impedido, de divulgar dados das operações financeiras realizadas com instituições privadas.

A propósito, transcrevo os referidos dispositivos, verbis:

Lei 12.527/2011Art. 22 - O disposto nesta Lei não exclui as demais hipóteses legais de sigilo e de segredo de justiça nem as hipóteses de segredo industrial decorrentes da exploração direta de atividade econômica pelo Estado ou por pessoa física ou entidade privada que tenha qualquer vínculo com o poder público.

Decreto 7.724/2012Art. 5º Sujeitam-se ao disposto neste Decreto os órgãos da administração direta, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União.§ 1º A divulgação de informações de empresas públicas, sociedade de economia mista e demais entidades controladas pela União que atuem em regime de concorrência, sujeitas ao disposto no art. 173 da Constituição, estará submetida às normas pertinentes da Comissão de Valores Mobiliários, a fim de assegurar sua competitividade, governança corporativa e, quando houver, os interesses de acionistas minoritários.§ 2º Não se sujeitam ao disposto neste Decreto as informações relativas à atividade empresarial de pessoas físicas ou jurídicas de direito privado obtidas pelo Banco Central do Brasil, pelas agências reguladoras ou por outros órgãos ou entidades no exercício de atividade de controle, regulação e supervisão da atividade econômica cuja divulgação possa representar vantagem competitiva a outros agentes econômicos.Art. 6º O acesso à informação disciplinado neste Decreto não se aplica: I - às hipóteses de sigilo previstas na legislação, como fiscal, bancário, de operações e serviços no mercado de capitais, comercial, profissional, industrial e segredo de justiça; eII - às informações referentes a projetos de pesquisa e desenvolvimento científicos ou tecnológicos cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado, na forma do §1º do art. 7º da Lei no 12.527, de 2011.

Entendo que a exceção constante do art. 22, ora transcrito, não abarca o BNDES, uma vez que as atividades de fomento estatal, ainda que decorrentes de contratos com empresas privadas, não constituem exploração direta de atividade econômica pelo Estado, e, ainda, que a divulgação de todos os dados das operações realizadas com empresas privadas não viola os princípios que garantem o sigilo fiscal e bancário destas.

De fato, é indevida a inserção das operações do BNDES em empresas privadas no âmbito da exceção feita pela lei 12.527/2011 (art. 22) e seu decreto regulamentador (§ 1º do art. 5º e art. 6º), uma

16

Page 17:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

vez que ao contratar com o poder público, tais empresas se sujeitam às regras de direito público, e, portanto, à lei da transparência.

Dessa forma, não pode o réu, com fundamentado na LC 105/2011, que dispõe sobre o sigilo das operações de instituições financeiras, se esquivar de inserir suas operações no âmbito de incidência da lei da transparência.

Assim, revendo meu posicionamento adotado quando do exame preliminar do feito, constato que o BNDES se sujeita, de forma direta, à lei 12.527/2011, o que significa que merece provimento o pedido do autor na condenação do réu na obrigação de fazer, consistente em tornar públicas, nos termos da Lei nº 12527/2012, todas as atividades de financiamento e apoio a programas, projetos, obras e serviços de entes públicos ou privados, que envolvam recursos públicos, realizadas por si ou por intermédio de outras pessoas jurídicas por ele instituídas.

Ademais, em face dos amplos poderes de investigação conferidos ao Ministério Público - art. 129, incisos VI, VIII, da Constituição Federal, e art. 8º, incisos II e IV, e § 2º, da Lei Complementar nº 75/1993 -, e levando-se em consideração que o BNDES é uma empresa pública federal, que gerencia recursos públicos, é patente que o autor tem direito de acesso às informações que forem solicitadas ao réu em procedimento de sua competência.

Conforme demonstrado na petição inicial, o Supremo Tribunal Federal já decidiu que não cabe às instituições financeiras opor sigilo bancário ao Ministério Público quando se trate de contas públicas.

Nesse sentido, verbis:

EMENTA: - Mandado de Segurança. Sigilo bancário. Instituição financeira executora de política creditícia e financeira do Governo Federal. Legitimidade do Ministério Público para requisitar informações e documentos destinados a instruir procedimentos administrativos de sua competência.2. Solicitação de informações, pelo Ministério Público Federal ao Banco do Brasil S/A, sobre concessão de empréstimos, subsidiados pelo Tesouro Nacional, com base em plano de governo, a empresas do setor sucroalcooleiro.3. Alegação do Banco impetrante de não poder informar os beneficiários dos aludidos empréstimos, por estarem protegidos pelo sigilo bancário, previsto no art. 38 da Lei nº 4.595/1964, e, ainda, ao entendimento de que dirigente do Banco do Brasil S/A não é autoridade, para efeito do art. 8º, da LC nº 75/1993.4. O poder de investigação do Estado é dirigido a coibir atividades afrontosas à ordem jurídica e a garantia do sigilo bancário não se estende às atividades ilícitas. A ordem jurídica confere explicitamente poderes amplos de investigação ao Ministério Público - art. 129, incisos VI, VIII, daConstituição Federal, e art. 8º, incisos II e IV, e § 2º, da Lei Complementar nº 75/1993.5. Não cabe ao Banco do Brasil negar, ao Ministério Público, informações sobre nomes de beneficiários de empréstimos concedidos pela instituição, com recursos subsidiados pelo erário federal, sob invocação do sigilo bancário, em se tratando de requisição de informações e documentos para instruir procedimento administrativo instaurado em defesa do patrimônio público. Princípio da publicidade, ut art. 37 da Constituição.6. No caso concreto, os empréstimos concedidos eram verdadeiros financiamentos públicos, porquanto o Banco do Brasil os realizou na condição de executor da política creditícia e financeira do Governo Federal, que deliberou sobre sua concessão e ainda se comprometeu a proceder à equalização da taxa de juros, sob a forma de subvenção econômica ao setor produtivo, de acordo com a Lei nº 8.427/1992.7. Mandado de segurança indeferido.(MS 21729, MARCO AURÉLIO, STF.)

Ante o exposto:

1) JULGO EXTINTO O PROCESSO sem exame do mérito em relação ao pedido de condenação do réu na obrigação de repassar à Controladoria-Geral da União e ao Tribunal de Contas da União as informações que lhe forem requisitadas, em procedimentos de suas competências, nos termos do art. 267, VI, do CPC.

17

Page 18:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

2) JULGO PROCEDENTE O PEDIDO para condenar o réu na obrigação de fazer, consistente em tornar públicas, nos termos da Lei nº 12527/2012, todas as atividades de financiamento e apoio a programas, projetos, obras e serviços de entes públicos ou privados, que envolvam recursos públicos, realizadas por si ou por intermédio de outras pessoas jurídicas por ele instituídas, a exemplo da BNDESPAR, relativas aos últimos 10 anos, além das que vierem a ser realizadas doravante, discriminando-lhes os destinatários, a modalidade de apoio financeiro concedido e sua justificativa (empréstimo direto, empréstimo intermediado por terceiro, subscrição de valores mobiliários, entre outras), os montantes financeiros empregados, os prazos do investimento, o grau de risco do investimento, as taxas de juros empregadas, os valores de aquisição de ações, a forma de captação do recurso utilizado, as garantias exigidas, os critérios ou justificativas de indeferimento de eventuais pedidos de apoio financeiro, a compatibilidade do apoio concedido com as linhas de investimento do Banco), disponibilizando-as integralmente em seu sítio eletrônico, bem como para declarar a ilegalidade dada à interpretação ao disposto no art. 5º, § 1º, do Decreto nº 7.724/2012, que retirar o BNDES e sua subsidiária integrar BNDESPAR do âmbito de incidência da lei nº 12.527/2011, e condenar o réu na obrigação de repassar ao Ministério Público Federal as informações que lhe forem requisitadas, em procedimentos de suas competências, sobre operações de apoio e/ou financiamento (sob quaisquer modalidades), realizadas por si ou por sua subsidiária – a DBNDESPAR – a quaisquer entidades públicas ou privadas, sem que seja oposto a tais órgãos de controle o óbice do sigilo bancário, independentemente de ordem judicial.”

17. A situação do presente processo não é diferente daquelas outras, de maneira que são plenamente válidos os argumentos que afastam a incidência, no caso, de sigilo bancário que pudesse impedir a entrega das informações ao TCU. 18. Quero apenas destacar a obstrução à competência constitucional deste Tribunal, como órgão de controle externo, de verificar a conformidade e a eficiência na aplicação de vultosos recursos públicos por parte dos gestores do BNDES. No caso, os recursos aplicados são públicos, a empresa aplicadora é pública e a política orientadora é pública. Nessa hipótese, tanto o STF quanto a primeira instância da Justiça Federal se manifestaram sobre a publicidade das informações.19. Desse modo, resta injustificada a indevida obstrução à ação fiscalizatória desta Casa, solicitada pela Câmara dos Deputados.20. Feitas essas considerações acerca da proposta de determinação formulada pela SecexEstataisRJ, resta também conceder o prazo solicitado para a conclusão da auditoria. Todavia, entendo caber determinar à equipe de auditoria que, caso transcorra o prazo concedido ao BNDES sem que haja o fornecimento das informações requeridas, instrua o processo dando conta dessa ocorrência, encaminhando-o, em seguida, ao meu Gabinete.

Ante o exposto, manifesto-me por que o Tribunal aprove o acórdão que ora submeto à apreciação deste Colegiado.

TCU, Sala das Sessões Ministro Luciano Brandão Alves de Souza, em 17 de setembro de 2014.

AUGUSTO SHERMAN CAVALCANTI

Relator

ACÓRDÃO Nº 2462/2014 - TCU - Plenário

18

Page 19:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

1. Processo TC-007.527/2014-4 2. Grupo: I - Classe: II - Assunto: - Solicitação do Congresso Nacional.3. Interessada: Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados.4. Unidade: Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).5. Relator: Ministro-Substituto Augusto Sherman Cavalcanti.6. Representante do Ministério Público: não atuou.7. Unidade técnica: SecexEstataisRJ.8. Advogado constituído nos autos: não há.

9. Acórdão:VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Solicitação do Congresso Nacional, formulada

pelo presidente da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados (CFFC), em que encaminha ao Tribunal a Proposta de Fiscalização e Controle - PFC 33/2011, requerendo a realização de fiscalização nas operações de crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) às empresas do Grupo JBS/Friboi,

ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão de Plenário, ante as razões expostas pelo Relator, em:

9.1. prorrogar, por quarenta e cinco dias, o prazo concedido por meio do subitem 9.2.1 do Acórdão 1398/2014-TCU-Plenário;

9.2. determinar ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) que disponibilize, no prazo de cinco dias, os documentos solicitados por meio dos Ofícios de Requisição 1 (peça 17), 2 (peça 18), 3 (peça 29), 6 (peça 30) e 7 (peça 31), bem como em eventuais ofícios futuros, referentes às operações realizadas entre o BNDES e o Grupo JBS/Friboi, sem a aposição de qualquer tarja nos textos da referida documentação, em atendimento ao disposto no art. 245, inciso II, do Regimento Interno do Tribunal de Contas da União;

9.3. alertar o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social que o não atendimento à determinação do subitem 9.2 deste Acórdão poderá sujeitar os responsáveis à multa prevista no art. 58, inciso VI, da Lei 8.443/1992, além da adoção da medida acautelatória prevista no art. 44 da mesma lei;

9.4. determinar à SecexEstataisRJ que, caso transcorra o prazo concedido ao BNDES sem que haja o fornecimento das informações requeridas, instrua o processo, indicando os agentes responsáveis pela negativa de informação, encaminhando-o imediatamente ao gabinete do Relator; e

9.5. dar ciência desta deliberação ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social e à Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados, informando a esta última que os atrasos na conclusão da auditoria solicitada decorrem da não disponibilização, por parte do BNDES, até o momento, de informações essenciais à conclusão dos trabalhos de fiscalização.

10. Ata n° 36/2014 – Plenário.11. Data da Sessão: 17/9/2014 – Ordinária.12. Código eletrônico para localização na página do TCU na Internet: AC-2462-36/14-P.13. Especificação do quorum: 13.1. Ministros presentes: Augusto Nardes (Presidente), Benjamin Zymler, Aroldo Cedraz, Raimundo Carreiro, José Múcio Monteiro e Bruno Dantas.13.2. Ministros-Substitutos convocados: Augusto Sherman Cavalcanti (Relator) e Marcos Bemquerer Costa.

19

Page 20:  · Web viewO eminente jurista italiano Gustavo Zagrebelsky, ao ressaltar o caráter prático da interpretação, assevera: “O caso não pode compreender-se juridicamente senão

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 007.527/2014-4

13.3. Ministros-Substitutos presentes: André Luís de Carvalho e Weder de Oliveira.

(Assinado Eletronicamente)JOÃO AUGUSTO RIBEIRO NARDES

(Assinado Eletronicamente)AUGUSTO SHERMAN CAVALCANTI

Presidente Relator

Fui presente:

(Assinado Eletronicamente)LUCAS ROCHA FURTADO

Procurador-Geral, em exercício

20