web 2.0 - literatura infantil juvenil e comunidades interpretativas

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Artigo sobre web, comunidades interpretativas e literatura infantil e juvenil

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  • Caderno Seminal Digital, ano 21, n 23, v. 1 (JAN-JUN/2015) e-ISSN 1806-9142

    DOI: http://dx.doi.org/10.12957/cadsem.2015.14668 40

    WEB 2.0: LITERATURA INFANTIL / JUVENIL E COMUNIDADES INTERPRETATIVAS

    Fernando Azevedo (UM) ngela Bala (UE)

    Glria Bastos (UAb)

    Resumo: Este artigo discute como a web potencia a leitura de literatura infantil/juvenil e promove a criao/partilha entre comunidades interpretativas. Problematizamos o lugar desta matriz literria na Academia, o papel da social web na formao literria e cultural dos jovens e o desafio da web na configurao de novos pblicos leitores.Palavras-chave: Web2.0, Leitura, Literatura Infantil/Juvenil, Comunidades Interpretativas, Formao de leitores.

    Abstract: This article discusses how the web enhances the reading of childrens literature / young adult literature and promotes the creation/sharing between interpretative communities. It problematizes the place of this literary matrix at the Academy, the role of the social web in literary and cultural education of young people and the web challenge in new readerships.Key-words: Web2.0, Reading, Childrens literature/Young adult literature, interpretative communities, readers development.

    O QUE NOS DIZEM OS TERICOS DA ACADEMIA?

    A literatura infantil/juvenil tem sido, desde sempre,

    objeto de elevada controvrsia. So, com efeito, vrios os

    investigadores que sublinham as dificuldades de definio

    conceptual (GRIFFITH; FREY, 1992), bem como a ambiguidade

    dos termos utilizados (HUNT, 1992) ou a relao dos mesmos

    com determinados cdigos culturais historicamente variveis

    (NIKOLAJEVA, 1995). Se, no passado, no lhe era reconhecida

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    voz e relevncia enquanto objeto especfico para um certo

    pblico leitor (as crianas) (SHAVIT, 2003), a Academia s

    muito recentemente a reconheceu como espao efetivo

    para a iniciao dos mais novos cultura literria. Todavia,

    pela sua relao de dilogo ntimo com uma importante

    dimenso modelizadora dos realia j que se trata de, pelos

    seus textos, iniciar a criana no conhecimento da literatura

    , ela tem sido, em determinados momentos, lida luz de

    um projeto formativo, com o risco de exaurimento da sua

    natureza intrinsecamente polissmica e plurissignificativa.

    Deste modo, o grande desafio para a comunidade educativa,

    aquela que privilegiadamente trabalha com a literatura

    infantil/juvenil, entender que esta matriz literria encerra

    uma funo formativa, mas tambm uma funo ldica. E

    este um casamento que nem sempre compreendido ou

    tem um final feliz. A natureza intrinsecamente polissmica e

    plurissignificativa da literatura infantil/juvenil implica que a

    sua leitura, luz de um projeto formativo, seja feita de modo

    a que, de uma maneira ldica, haja uma exegese do texto e

    dos valores que ele sempre encerra.

    Perry Nodelman (2008, p.2-5), numa obra na qual busca

    dilucidar o conceito de literatura infantil, socorrendo-se

    para o efeito, de um conjunto de obras publicadas nos

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    ltimos 200 anos, e relativamente s quais as comunidades

    interpretativas no tm dvidas em as considerar como

    integrando esse corpus, defende que a noo de literatura

    infantil depende muito no s daquilo que os leitores

    consideram como pertencente a esse mbito, como

    tambm da deciso dos editores e, sob o ponto de vista do

    emissor, da sua ligao a um projecto ou a uma inteno

    educativa. Mas, de forma pertinente, no deixa de sublinhar

    que childrens literature is not so much what children read

    as what producers hope children will read (NODELMAN,

    2008, p.4). Ponto de vista idntico tambm o expresso

    por John Rowe Townsend (1980, p.197) quando afirma que

    a deciso depende muito mais dos editores do que dos

    seus potenciais leitores. Na verdade, o mercado editorial

    parece ter descoberto, na edio de texto para crianas e

    jovens, nomeadamente de literatura infantil/juvenil, um

    enorme filo. Autores que escrevem para os mais novos,

    autores que at h pouco tempo se dedicavam apenas

    literatura para adultos, ilustradores, figuras pblicas das

    mais diversas reas publicam livros que so catalogados

    como livros de literatura infantil/juvenil. No cabendo,

    neste mbito, uma reflexo sobre a eventual qualidade

    destes textos, o que queremos evidenciar a existncia de

    um mercado, em redor da literatura infantil/juvenil que,

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    em Portugal, pelo menos, tem poucas instncias a regul-

    lo, o que exige dos mediadores de leitura um olhar cada vez

    mais atento, crtico e competente.

    No obstante estas consideraes, hoje reconhecido

    literatura infantil/juvenil um relevante papel na formao

    dos leitores mais jovens e no seu acesso ao conhecimento

    da Cultura e da Literatura.

    Tendo necessidade de agradar, simultaneamente, a

    dois pblicos leitores diferenciados (os adultos, primeiros

    mediadores do texto, e as crianas, destinatrio secundrio

    desses textos), os seus textos apresentam uma natureza

    ambivalente, ao preverem dois tipos de leitores-modelo

    (SHAVIT, 2003).

    Ana Maria Machado e Graciela Montes (2003, p.91)

    sublinham que a literatura infantil aquela que (...)

    puede ser leda tambin por los nios, y no exclusivamente

    por los nios. Entonces, seria la literatura que incluye

    a los nios y no la que excluye a los adultos. De facto,

    a constituio do corpus da literatura para a infncia e

    a juventude singular e vai desde, como referimos j

    anteriormente, os textos que os editores identificam

    como tal, passando pelos textos aos quais os autores

    atriburam essa designao, at aos textos que pertencem

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    designada literatura anexada (CERVERA, 1992), ou seja,

    textos que integravam a literatura para adultos, mas que

    o pblico mais jovem tomou como seus.

    Deste modo, a presena da literatura infantil/juvenil

    na sociedade, e nas instncias educativas em particular,

    e o seu reconhecimento pela Academia como sendo

    uma mais-valia para a entrada das crianas na leitura do

    mundo, so uma realidade.

    O QUE NOS DIZ A SOCIAL WEB ACERCA DA LITERATURA INFANTIL/JUVENIL?

    A internet imps um novo paradigma nas relaes

    comunicativas. Vivemos hoje sob o signo das geraes

    hiperconectadas (OTERO, 2014), no mbito das quais o

    leitor frequentemente o construtor de conhecimento,

    que divulga, para os seus pares, atravs da social web.

    Gemma Lluch e Sandra Snchez (2013) explicitam que

    o sculo XXI criou novos cenrios para a leitura, o mais

    importante dos quais aquele que possibilita estabelecer

    uma comunicao direta entre os que escrevem ou fazem

    livros e os que os lem. O espao web proporcionou

    criana e ao jovem tambm novas formas de comunicar

    com todos os leitores de uma mesma obra. A partilha,

    nesta comunidade de leitores virtuais de formas de

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    interpretao, mas igualmente da construo de

    significados individuais, cada vez mais uma realidade.

    No caso concreto da leitura e da literatura infantil/juvenil,

    o espao web, com a multiplicao de uma srie de pdias

    (a que se associam blogues, salas de chat e outros espaos),

    no apenas se deslocalizou do espao tradicional da escola,

    como tambm prescindiu da figura tutelar do mediador,

    aproximando o livro dos seus leitores (SNCHEZ GARCA;

    LLUCH CRESPO; DEL RO TOLEDO, 2013), aspetos que,

    complementarmente, contriburam para uma vulgarizao e

    homogeneizao dos traos e caractersticas desta literatura.

    Cada vez mais no espao web se multiplicam e se sofisticam

    as diversas pdias, nomeadamente relacionadas com a

    literatura infantil/juvenil, revelando no s a popularidade

    dessa literatura, mas tambm a forma integrada como hoje

    as crianas e os jovens vivem as experincias de leitura,

    conjugando o livro impresso e as ferramentas da social web.

    Vejamos o caso da Potterpdia. Resultante do fenmeno

    comercial de Harry Potter, a Potterpdia surge nas mais

    diversas lnguas, atestando no s o sucesso global da obra

    de J.K. Rowlling, mas tambm abrindo a possibilidade de

    partilha entre leitores de todo o mundo. A Potterpdia

    italiana, por exemplo, recria graficamente a ambincia

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    pressentida na saga e coloca disposio dos leitores um

    enorme manancial de informaes sobre as personagens,

    sobre o tempo, sobre as mais diversas curiosidades, no

    faltando mltiplas citaes das diversas obras.

    Os autores portugueses tambm se renderam ao espao

    web, como forma de comunicar com os seus leitores.

    Centremo-nos na pgina da coleo Os Primos, da autoria de

    Mafalda Moutinho. Para alm das mais variadas informaes

    sobre a autora, as personagens, as aventuras, os vdeos de

    divulgao das obras, esta pgina apresenta um Clube de

    Fs, onde os leitores partilham as suas emoes.

    A coleo 7 Irmos, assinada por Margarida Fonseca

    Santos e Maria Joo Lopo de Carvalho, tem associada um blog

    e uma pgina no facebook, onde mais uma vez os leitores

    partilham as suas leituras e as suas opinies sobre os vrios

    volumes da srie. No blog sucedem-se diversas estratgias

    de marketing ligadas a outras tantas estratgias de promoo

    da leitura dos livros da coleo junto dos jovens leitores.

    O blog apresenta vrias hiperligaes que do resposta

    s estratgias referidas anteriormente. Na hiperligao

    Afinal, o que esta coleo?, os leitores encontram uma

    apresentao detalhada da srie e dos temas de cada livro;

    na hiperligao Todos os livros capas e sinopses, surgem

    links para as capas e sinopses de todas as obras da srie.

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    Na hiperligao Os finais dos primeiros livros, os

    jovens leitores podem encontrar o final de cada um dos

    volumes da srie, o que lhes permitir continuar a leitura

    do nmero seguinte, situando-se e compreendendo

    perfeitamente a intriga. Parece-nos que esta prtica se

    revelar uma tima estratgia, no s para promover a

    leitura dos livros (o leitor no necessitar obrigatoriamente

    de ler, de imediato, o volume anterior, para compreender

    a ao), mas tambm para promover a sua venda. Alis,

    atravs do blog possvel adquirir os livros da srie, e

    esta compra pode ser tambm potenciada pelo facto

    do blog apresentar o selo do Plano Nacional de Leitura,

    smbolo de qualidade das obras na sociedade portuguesa.

    As estratgias de marketing reconhecem-se igualmente

    na possibilidade do leitor ler o 1 captulo de cada volume

    e envi-lo a um amigo, numa partilha de leituras to

    valorizada e to importante na formao de leitores. O

    marketing e a promoo da leitura andam, deste modo, de

    mos dadas, potenciados pelo espao da web. Os leitores

    mais novos aderem com facilidade a estas ferramentas

    que lhes permitem igualmente dialogar, de forma fcil

    e rpida, com os autores das obras. Na hiperligao do

    blog Os finais dos primeiros livros, registamos, numa

    entrada, este dilogo:

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    Annimo: 30 de Julho de 2013 s 23:16

    Mas o 7 e 8 livro, dizem para virmos a este blog para ver o resto a histria!!!

    7 Irmos: 31 de Julho de 2013 s 10:13

    Tens toda a razo, faltava o fim do 7, j actualizmos. Mas o 8 apenas diz para virem aqui saber mais sobre os 7 irmos, ok? Ora v l bem.

    Obrigada pela ajuda, um beijinho da Margarida e da Maria Joo. ( h t t p : // 7 i r m a o s l i v r o s . b l o g s p o t .pt/2013/07/os-finais-dos-primeiros-livros.html)

    Por fim, o blog tem a hiperligao Faz-te nosso amigo

    no facebook, uma clara evidncia de como os mais novos

    vivem hiperconectados. Da mesma forma, parece-nos que

    os autores tambm se movem, apreciam e so motivados

    pelas partilhas com os seus leitores, agora apenas distncia

    de um clique, solicitando mesmo a sua opinio para a

    construo das obras, que registamos nestes comentrios:

    Vera Gomes: 18/8 s 5:05

    Nunca mais sai o prximo livro? E as novas capas?

    Margarida Fonseca Santos: 4/9 s 10:49

    Nova capa para o livro 4, Maria atravessa o Atlntico que acham? Ilustrao de Miguel Gabriel

    (https://www.facebook.com/7irmaos/timeline?ref=page_internal)

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    O espao web potenciou sobremaneira aquilo que Cludia

    Sousa Pereira (2007) denominou como reconfigurao de

    novos tempos para a infncia, que consistem no contacto

    com objectos culturais que parecem misturar, de forma

    incompreensvel para os adultos, o ldico e a leitura (PEREIRA,

    2007, p.66). A literatura infantil e juvenil no foge a esta lgica

    da comunicao de massas, virtual, onde blogs, jogos de

    computador, filmes no youtube, que gravitam em torno da

    obra literria, so avidamente consumidos pelos mais novos.

    Assim, tal como Unsworth (2008), podemos tambm referir

    que se verificam aqui complementaridades sinergticas,

    na medida em que os mundos narrativos dos livros para

    crianas e jovens so ampliados e reconfigurados de diversas

    formas nos mdia. Tambm exemplo paradigmtico destas

    sinergias foi o da srie Dirio de Sofia (de Marta Gomes e

    Nuno Bernardo) que teve o seu incio na web e s depois

    viria a assumir a forma de livro impresso, com um sucesso

    assinalvel que foi a seguir aproveitado pelos canais televisivos

    e com impacto a nvel internacional. Dos mesmos autores, a

    coleo de aventuras Bia & Fred (trs volumes editados em

    2007), estabelecia uma relao direta entre a leitura e um site

    na internet (entretanto desactivado com o fim da coleo):

    o livro ia apresentando pistas para os leitores utilizarem no

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    site como forma de descobrir os enigmas propostos. Estas

    vrias situaes corporizam, de forma clara, o conceito de

    dynamic hybrid book proposto por Dresang (2008), em

    que os princpios de interactividade, conectividade e acesso,

    que ela coloca como principais linhas de fora para os livros

    e a leitura na era digital, surgem amplamente assumidos. As

    relaes entre o impresso e o digital, entre o offline/online,

    tm-se, de facto, complexificado, influenciando a forma

    como os jovens leitores se relacionam com a literatura.

    OS DESAFIOS DA WEB 2.0 NA CONFIGURAO DE NOVOS PBLICOS LEITORES

    Investigaes desenvolvidas em Espanha com

    adolescentes (MARTN-BARBERO, 2011, LLUCH Y ACOSTA,

    2012) enfatizam a satisfao dos participantes em tornarem-

    se atores do prprio discurso, ao poderem comunicar uns

    com os outros graas s ferramentas tecnolgicas em espao

    web. Outros estudos demonstram que navegar na internet

    uma atividade autnoma para os menores, com uma escassa

    mediao adulta (BRINGU Y SBADA, 2011).

    Do ponto de vista da leitura e da criao de pblicos leitores,

    as possibilidades criadas pela web trouxeram novas dinmicas

    que importa ter em ateno. Um dos principais aspetos

    relaciona-se com as mltiplas oportunidades que so criadas

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    para se interagir com a literatura, nomeadamente atravs

    da dimenso multimodal dos textos, que tem vindo a ser

    aperfeioada. O hipertexto e o hipermdia criam situaes de

    leitura diversificadas: ilustraes animadas, possibilidade de

    dar voz s personagens ou de selecionar trechos de msica

    que acompanham a narrativa so algumas das hipteses que

    vrios produtos trouxeram para a leitura. Naturalmente que

    as possibilidades interpretativas so ampliadas, por esta via,

    para outras dimenses de sinal mais ou menos positivo que

    o texto em papel no permitiria (UNSWORTH, 2003). Se, por

    um lado, a crtica de convite disperso, que frequentemente

    apontada ao hipertexto, pode ser um problema, por

    outro lado no se pode negar a abertura compreensiva e

    interpretativa destes novos contextos de leitura. Contextos

    que ao conferirem ao leitor um papel mais ativo, numa

    interao mais direta e imediata com o texto, se aproximam,

    em certa medida, do jogo electrnico.

    Vrios exemplos comprovam que no se trata j

    de apenas ler uma histria/um livro, mas de interagir

    ativamente com ela de diferentes formas. Como atrs se

    referiu, o entusiasmo com a srie Harry Potter deu origem

    a uma mirade de websites em redor da obra (listadas na

    pgina oficial da autora), localizadas nas mais diversas

    latitudes e em diferentes lnguas, revelando o interesse e

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    o envolvimento dos leitores. O ciberespao proporciona

    assim um palco privilegiado para a reinveno de

    tradicionais formas de interao com a obra (por exemplo,

    o comentrio crtico, mais ou menos impressivo), mas,

    sobretudo, para a partilha de ideias numa escala muito

    mais alargada. A possibilidade de muitos poderem falar

    para muitos, comunicando os seus pontos de vista e lendo

    os de outros, por vezes do outro lado do mundo, permitem

    esta construo de comunidades de partilha (e porque no,

    de aprendizagem?) erguendo de uma forma cooperativa

    mltiplas leituras sobre a obra.

    Por outro lado, tal como Beagley (2012) refere, este novo

    contexto desafia os conceitos de autor, leitor, crtico:

    The suddenly ubiquitous social media engendered by Web 2.0, typified by Youtube, Facebook, Twitter, personal blogs and so on, has not just given new tools for expression and open up vast new audiences. Its democratization of the act of creating a text, and presenting it to a wide audience, challenges to the core our long-held definitions of the author, the reader, the critic, the text and, particularly our traditions of learned discourse. (BEAGLEY,2012, s/p)

    Esta situao coloca desafios interessantes, a estes

    vrios intervenientes, na medida em que os discursos

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    sobre as obras multiplicam-se e cruzam-se, no espao

    digital. As comunidades interpretativas so agora mais

    fludas (por exemplo, nos vrios intervenientes que vo

    entrando e saindo da rede), mas tambm geradoras

    de afinidades mais fortes, que facilmente identificamos

    quando visitamos esses espaos de dilogo e de partilha

    entre os jovens.

    CONCLUSES

    Neste artigo, procurmos discutir a forma como o espao

    web pode promover a leitura de literatura infantil e juvenil

    e potencia a criao e a partilha destas leituras em diversas

    comunidades interpretativas. Num primeiro momento,

    problematizmos o lugar da literatura infantil e juvenil na

    Academia, tendo em conta a longa histria e o extenso

    caminho trilhado por esta matriz literria, at ser reconhecida

    como sendo fundamental na formao das crianas e dos

    jovens e na sua entrada no mundo da Literatura e da Cultura.

    Em seguida, tentmos compreender como a social web

    pode ter um papel relevante na configurao de novos

    pblicos leitores. De facto, se por um lado assistimos

    dispensa do mediador de leitura tradicional, por outro

    deparamo-nos com uma aproximao real e efetiva entre

    os autores e os seus leitores, manifestada num dilogo

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    entre ambos, possibilitado pelas inmeras ferramentas

    do ciberespao. De algum modo, o mediador de leitura

    tradicional agora substitudo pelo autor e por uma eficaz

    partilha de leituras entre os jovens leitores e entre estes e os

    autores. tambm notria a forma como os prprios autores

    procuram agora ir ao encontro dos novos espaos onde

    os jovens leitores vivem. Na verdade, nas salas de chats,

    blogues, pginas no facebook, todos estes intervenientes

    trocam opinies, emoes, afetos, que certamente impelem

    para outras profcuas leituras.

    Estas ferramentas, pela sua interatividade, abrem a porta

    a novos pblicos leitores que se por um lado saltam de

    aplicao em aplicao, por outro acedem mais facilmente

    literatura, pelo apelo do hipertexto e do hipermdia. Em

    simultneo, o contexto interativo da web 2.0, alimentado

    por esta motivao dos mais jovens, nativos digitais, para

    a comunicao online com os seus pares, faz com que a

    dimenso social da leitura assuma hoje um valor redobrado.

    Dificilmente se poder negar a importncia que estas

    comunidades literrias podem ter no incremento da leitura,

    criando sinergias entre os ambientes impresso e digital.

    Assistimos, atualmente, disseminao do fenmeno

    literrio numa escala global, acompanhada pelo uso

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    abundante das redes sociais, que enriquecem as ligaes

    entre livros e leitores. E a literatura para crianas e jovens

    tem igualmente aproveitado as dinmicas que se tm

    estabelecido no mundo digital.

    REFERNCIAS:

    Beagley, D. (2012). Blurring the Boundaries: the changing i-discourse of

    childrens literature, The Looking Glass: New Perspectives on Childrens

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    Fernando Azevedo docente do Instituto de Educao da Universidade do Minho, onde o responsvel pela regncia de unidades curriculares de ps-graduao nas reas da Literatura Infantil e Juvenil e Formao de Leitores. Doutor em Cincias da Literatura e membro do Centro de Investigao em Estudos da Criana (CIEC), integrando igualmente o Observatrio de Literatura Infanto-Juvenil (OBLIJ) e a Rede Internacional de Universidades Leitoras (RIUL). Pertence Comisso de Especialistas do Plano Nacional de Leitura. Possui obras publicadas nos domnios da hermenutica textual, literatura infantil e formao de leitores.

    ngela Bala Professora Auxiliar no Departamento de Pedagogia e Educao da Universidade de vora. Licenciada em Lnguas e Literaturas Modernas - Estudos Portugueses, pela Universidade Nova de Lisboa e Doutorada em Cincias da Educao pela Universidade de vora. Em 2010, foi Professora Visitante na Universidade Estadual Paulista, So Paulo, Brasil. Coordenadora, em Portugal, da Rede Internacional de Universidades Leitoras (RIUL). Orienta trabalhos acadmicos e publica nas reas do Ensino da Lngua Materna, Literatura Infantil e Bibliotecas Escolares.

    Glria Bastos Professora no Departamento de Educao e Ensino a Distncia, na Universidade Aberta. Tem o Doutoramento em Estudos Portugueses, com uma tese sobre o teatro para crianas. Coordena o Curso de Mestrado em Gesto da Informao e Bibliotecas Escolares. Pertence ao Conselho Cientfico do Plano Nacional de Leitura e co-autora dos novos Programas de Portugus para o Ensino Bsico (2009).

    Recebido em 23 de janeiro de 2015.Aprovado em 16 de abril de 2015.