voltados para o senhor

Upload: jose-grillo

Post on 06-Apr-2018

222 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    1/35

    VVOOLLTTAADDOOSS PPAARRAA OO SSEENNHHOORR!!

    Por Monsenhor Klaus Gamber

    Fundador do Instituto Litrgico de Ratisbona

    Trad uzido por Lus Augusto Rodrigues Dom ingues (Teresina , PI 2008)

    TRADUONO REVISADA

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    2/35

    2

    PREFCIO DA EDIO VIRTUAL

    Que alegria tenho em terminar a traduo desta bela obra do Monsenhor Klaus Gamber!Agradeo a Deus a oportunidade esperada de colaborar para uma maior compreenso do Esprito

    da Liturgia entre meus amigos, entre o clero da Arquidiocese de Teresina, e entre os catlicos brasileiros,em cujos computadores possa posteriormente chegar este humilde trabalho, pela Web.

    Reconheo a simplicidade e a pobreza dos meus esforos, tendo em vista meu conhecimento

    informal do espanhol e do italiano e a falta de permisso, no que diz respeito aos direitos autorais.Confesso que no quis me dar ao trabalho de procurar a empresa ou pessoa jurdica detentora dos direitosdesta obra, cujo original mais prximo o francs. A verso espanhola1 e italiana2, at onde possoconstatar, so apenas tradues livres da francesa3. Foram essas que segui para esta presente edio4.

    Nunca participei da Eucaristia estando o sacerdote na mesma orientao dos fiis. E at poderiadizer que foi esse desejo que me impulsionou a estudar a questo e dar minha colaborao traduzindo aobra de Mons. Klaus Gamber.

    Infelizmente h muita desinformao e muito preconceito. Prevalece no Brasil o pensamento demuitos liturgistas que, em suas grandes idias, ferem princpios e instrues bsicas emanadas pelosdocumentos da Santa S. Posso dizer que certos princpios teolgicos so feridos ou diminudos pelainterpretao de alguns. Por exemplo: a comunho de joelhos melhor expressa a f na presena real do

    Senhor no Santssimo Sacramento. Assim a Liturgia cumpre o papel de lugar privilegiado da profisso def, pelos sinais. H quem diga que numa ceia ningum come ajoelhado, e que s crianas recebem o alimento naboca. Veja-se que ideologia est por trs dessas expresses. Uma viso simplista da Eucaristia como ceia enenhuma meno presena real do Senhor. No digo que o autor duvide da presena substancial deCristo, mas sua idia no professa a f como deve.

    Para estes e para os que vivem de experincias, exaltando a criatividade, como se a Celebraofosse incapaz de dizer algo por si mesma, eu apenas repito o que foi dito na Exortao Apostlica ps-sinodal Sacramentum Caritatis:

    (...) O primeiro modo de favorecer a participao do povo de Deus no rito sagrado a condignacelebrao do mesmo; a arte da celebrao a melhor condio para a participao ativa (actuosa

    participatio). (...)

    A simplicidade dos gestos e a sobriedade dos sinais, situados na ordem e nos momentosprevistos, comunicam e cativam mais do que o artificialismo de adies inoportunas. A ateno e aobedincia estrutura prpria do rito, ao mesmo tempo que exprimem a conscincia do carter de domda Eucaristia, manifestam a vontade que o ministro tem de acolher, com dcil gratido, esse dominefvel. (...)

    Quando a reforma dava os primeiros passos, aconteceu s vezes no se perceber com suficienteclareza a relao intrnseca entre a Santa Missa e a adorao do Santssimo Sacramento; uma objeoento em voga, por exemplo, partia da idia que o po eucarstico nos fora dado no para sercontemplado, mas comido. Ora, tal contraposio, vista luz da experincia de orao da Igreja, aparecerealmente destituda de qualquer fundamento; j Santo Agostinho dissera: Nemo autem illam carnemmanducat, nisi prius adoraverit; (...) peccemus non adorando ningum come esta carne, sem antes a

    adorar; (...) pecaramos se no a adorssemos. De fato, na Eucaristia, o Filho de Deus vem ao nossoencontro e deseja unir-Se conosco; a adorao eucarstica apenas o prolongamento visvel dacelebrao eucarstica, a qual, em si mesma, o maior ato de adorao da Igreja: receber a Eucaristiasignifica colocar-se em atitude de adorao d'Aquele que comungamos. Precisamente assim, e apenasassim, que nos tornamos um s com Ele e, de algum modo, saboreamos antecipadamente a beleza daliturgia celeste (Exort. Apost. Sacramentum Caritatis, 38.40.66).

    Muita bondade ser da parte de qualquer pessoa, corrigir-me acerca da traduo ou doscomentrios que pus junto das imagens. Tive dificuldades principalmente em termos prprios daarquitetura, no encontrando paralelos no portugus.

    1Disponvelemhttp://www.unavocesevilla.info/vueltoshaciaelsenor.pdf ehttp://cruxetlibris.blogspot.com/2008/01/vueltos

    hacia

    el

    seor

    monseor

    kaus.html

    2Disponvelemhttp://www.unavox.it/ArtDiversi/div016.htm ehttp://www.unavox.it/ArtDiversi/div017.htm 3Conseguiotextoem26/05/08,pormnooencontromaisnaWeb.PensoqueoencontreinositedaCongregaoparao

    Clero(http://www.clerus.org ).4Certamentenotenholigaoalgumacomossitesdosquaisconseguiasversesqueutilizeiparaestatraduo.

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    3/35

    3

    Meu pensamento que, onde a cadeira do celebrante est ao fundo do presbitrio, ao centro, e oaltar separado da parede, que a Liturgia Eucarstica seja celebrada estando o celebrante na mesmaorientao do povo. notvel que na maioria das igrejas que assim esto dispostas h lugar na frente doaltar. As nicas mudanas necessrias seriam dos objetos (como os vasos sagrados), que deveriam mudarde lado para que possam ser apresentados pela direita do sacerdote. Que haja no mnio dois castiais comvelas sobre o altar e uma imagem de Jesus crucificado sobre ele.

    Os momentos em que a atual Instruo Geral sobre o Missal Romano (IGMR) fala sobre a orientao docelebrante so5:

    - Volta-se para o povo para a saudao inicial, entendendo-se provavelmente os ritos iniciais porcompleto, estando o celebrante na cadeira, e no junto do altar (n. 124);

    - Inclina-se diante do altar para antes da proclamao do Evangelho (o ideal ser pela frente, aindamais se l tiver sido deposto o Evangelirio no incio da Missa, caso este seja usado) (n. 132);

    - Volta-se para o povo para convidar: Orai, irmos e irms (n. 146);- Volta-se para o povo para anunciar: A paz do Senhor esteja sempre convosco (n. 154);- Volta-se para o povo para dizer: Felizes os convidados (n. 157);- Volta-se para o altar, reza as oraes preparatrias e comunga (n. 158);- Volta-se para o povo para dizer Oremos antes da Orao depois da comunho, podendo-se

    entender que a reza tambm de frente para o povo, j que pode estar junto cadeira (n. 165);- Sada o povo, abenoa-o e despede-o, ficando subentendido estar de frente para o povo, junto

    cadeira (nn. 167-168);O altar seja construdo afastado da parede, a fim de ser facilmente circundado e nele se possa

    celebrar de frente para o povo, o que convm fazer em toda parte onde for possvel (n. 299). Esta arecomendao da Instruo, no sendo obrigatria.

    O melhor, ao meu ver, que o sacerdote esteja ao altar, na mesma orientao da assemblia, nosmomentos no citados acima onde deve se voltar para o povo, ou seja:

    - Logo ao chegar, para saud-lo com a inclinao, o beijo e a incensao;- Para a inclinao ao rezar a orao para antes da proclamao do Evangelho;- Durante a preparao das oferendas;- Durante a Orao sobre as oferendas;

    - Durante toda a Orao Eucarstica: desde o Prefcio at a doxologia;- Durante o Rito da Comunho (da Orao do Senhor at a orao pela paz);- Durante a Frao do Po;- Durante as oraes que o preparam para a comunho, e a comunho propriamente;- Durante a consumao do preciosssimo Sangue restante ou de partculas do Corpo do Senhor que

    no possam ir para o tabernculo, por algum motivo;- Durante a recolha dos fragmentos e a purificao dos vasos sagrados (a no ser que seja feita na

    credncia);- Ao beijar novamente o altar e deix-lo, ao fim da ao sagrada.

    Por fim, peo a Deus a bno para este trabalho, a fim de que cresam bons frutos para uma

    verdadeira participao e espiritualidade litrgicas. Que todos os que entrarem em contato com esta obra,no minha, mas do Mons. Klaus Gamber, possam cada vez mais compreender que a Eucaristia celebrada emcomunho com toda a Igreja, tanto celeste como terrestre (IGMR, n. 79).

    VENI DOMINE IESV

    Teresina, Piau, 20 de novembro de 2008Advento, ANO B

    Lus Augusto Rodrigues [email protected]

    5Osnmerostomamporbasea3ediotpicajpublicadaemportuguspeloFr.AlbertoBekchaser(pelaEd.Vozes)e

    disponvelnaWebemhttp://www.presbiteros.com.br/Liturgia/MissalRomano.htm .

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    4/35

    4

    PREFCIO

    edio francesa

    (Pelo [ento] Cardeal Joseph Ratzinger)

    Depois de nos terem dado uma edio francesa de Die reform der Rmischen Liturgie, os monges de

    Barroux publicam agora em francs uma segunda obra do grande liturgista Klaus Gamber, Zum Herrnhin, sobre a orientao da Igreja e do Altar. Os argumentos histricos abordados pelo autor, sefundamentam num profundo estudo das fontes, que ele mesmo realizou. Concordam com os resultados degrandes sbios como F. J. Dlger, J. Braun, J. A. Jungmann, Erik Peterson, Cyrille Vogel, o Revmo. Pe.Bouyer, apenas para citar alguns nomes eminentes.

    Porm o que d importncia a este livro sobretudo o substrato teolgico, posto em dia por essessbios investigadores. A orientao da orao comum a sacerdotes e fiis (cuja forma simblica erageralmente em direo ao leste/oriente, quer dizer, ao sol que se eleva), era concebida como um olharlanado ao Senhor, ao verdadeiro sol. H na liturgia uma antecipao de seu regresso: sacerdotes e fiis voao seu encontro. Esta orientao da orao expressa no carter teocntrico da liturgia obedece exortao:

    Voltemo-nos para o Senhor6.

    Esta monio, esta chamada, dirige-se a todos ns, e mostra, indo alm de seu aspecto litrgico,como faz falta que toda a Igreja viva e atue para corresponder mensagem do Senhor.

    Roma, 18 de novembro de 1992

    Joseph Cardeal Ratzinger

    6NT.ConhecidanolatimcomoConversiadDominum!

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    5/35

    5

    NDICE

    PRLOGO - A edificao das igrejas e a orao rumo ao Oriente ....................................................................... 6O ALTAR E O SANTURIO ONTEM E HOJE ....................................................................................................... 7O ALTAR DE FRENTE PARA O POVO Perguntas e respostas......................................................................... 13

    PRIMEIRA PERGUNTA - Qual era a situao na Igreja primitiva? No estavam os fiis com o presidente sentados

    mesa do Senhor? .................................................................................................................................................. 14SEGUNDA PERGUNTA - Como podemos nos opor aos modernos altares voltados para o povo se foramprescritos pelo Conclio e praticamente foram introduzidos no mundo inteiro? .................................................. 15TERCEIRA PERGUNTA - Na idade mdia no havia um altar destinado ao povo, alm do altar mor, comohoje em dia?........................................................................................................................................................... 16QUARTA PERGUNTA - No Manual de Liturgia para o plpito, a escola e a casa (Handbuch derLiturgie fr Kanzel, Schule und Haus) do Pe. Alfons Neugart (1926), se l: Nas baslicas da igreja primitiva, oaltar estava colocado no meio da abside do coro e o sacerdote celebrante se colocava atrs deste, de frente para o

    povo. No havia cruz nem velas sobre o altar. As cadeiras para o bispo e os eclesisticos estavam colocadas aoredor da parede. Posteriormente o altar foi colocado junto parede, tal e como encontramos em nossos dias. Istoest certo?.............................................................................................................................................................. 17

    QUINTA PERGUNTA - O papa no celebra desde tempos imemoriveis de frente para o povo, e no existe emSo Pedro de Roma um altar separado elevado sobre um pdio, como na maior parte das igrejas modernas? ..... 18SEXTA PERGUNTA - Por acaso era bom que o sacerdote rezasse voltado para a parede? No melhor que rezevoltado para a assemblia? .................................................................................................................................... 19STIMA PERGUNTA - Certamente no h estudos, como o do professor Otto Nussbaum, muito conhecido,nos quais se demonstrou cientificamente que desde os tempos mais antigos houve celebraes de frente para o

    povo, e que estas eram as mais antigas? ................................................................................................................ 20OITAVA PERGUNTA - Quando o sacerdote se colocava detrs do altar nas igrejas que tm sua abside emdireo ao ocidente, como So Pedro de Roma, no era isso uma celebrao de frente para o povo? ................ 20NONA PERGUNTA - Qual era a posio do sacerdote e dos fiis nas igrejas nas quais a abside estava emdireo ao Oriente, que como se sabe, constituam a maioria dos antigos santurios? ......................................... 24

    DCIMA PERGUNTA - Porm o fato de que nas antigas baslicas romanas o altar e a abside pudessem seencontrar em quaisquer direes uma contradio com a afirmao de que nas origens se rezou sempre voltadopara o Leste e que conseqentemente as igrejas fossem orientadas. Como se explica? ..................................... 24DCIMA PRIMEIRA PERGUNTA - Tudo isto muito bonito, mas no necessrio contar que o homemmoderno incapaz de compreender que seja necessrio voltar-se para o oriente para rezar? O sol nascente notem para o homem atual a fora simblica que tinha para o homem da antigidade e que ainda hoje tem para osmediterrneos, que recebem o sol com mais intensidade que os homens do norte. Para os cristos de hoje o que importante a comunho da mesa eucarstica. ................................................................................................... 26DCIMA SEGUNDA PERGUNTA - Por que o carter sacrifical da Missa menos claramente expressado,como se afirma, se o sacerdote est de frente para o povo? .................................................................................... 27CONCLUSO ..................................................................................................................................................... 28

    EPLOGO....................................................................................................................................................................... 30EM MEMRIA DE KLAUS GAMBER ............................................................................................................ 30UM CAMINHO A SEGUIR .............................................................................................................................. 30PARA UM MAIOR CONHECIMENTO ......................................................................................................... 31

    BIBLIOGRAFIA ............................................................................................................................................................ 34APNDICE DO TRADUTOR ..................................................................................................................................... 35

    A ORAO VOLTADA PARA O ORIENTE ................................................................................................ 35

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    6/35

    6

    PRLOGO

    A edificao das igrejas e a orao rumo ao Oriente

    Temos um altar, do qual no podem comer os que servem no tabernculo (Hb 13,10)

    O altar se refere sempre a um sacrifcio oferecido por um sacerdote. Altar, sacerdote e sacrifcio

    falam a uma s voz, como o dizia So Joo Crisstomo: Ningum pode ser sacerdote sem sacrifcio [1].Como os protestantes rechaam expressamente o sacrifcio da missa e o sacerdote do padre, tambm notm necessidade, propriamente falando, de altar.

    Em todas as religies antigas, o sacerdote, como sacrificador, escolhido entre os homens (Hb 5,1), sesitua diante do altar e diante do santurio (que a representao de Deus). De igual forma, os que assistem celebrao do sacrifcio se aproximam do altar, a fim de estar em comunho com este, pelas mos dosacerdote sacrificador, como escreveu So Paulo: Os que comem das vtimas no esto em comunho como altar? (1Cor 10,8).

    No transcurso desses ltimos vinte anos, operou-se uma mudana em nossa concepo de sacrifcio.Pessoalmente, creio que a introduo de altares de frente para o povo e a celebrao voltada para este

    muito mais grave e causador de problemas para a evoluo futura que o novo Missal. Porque na base destanova colocao do sacerdote em relao ao altar e sem dvida alguma trata-se de uma inovao e no deum retorno a um costume da Igreja primitiva h uma nova concepo da Missa, que faz dela umacomunidade do banquete eucarstico.

    Tudo o que tinha primazia at agora, a venerao cultual e a adorao a Deus, assim como o cartersacrifical da celebrao, considerada como representao mstica e atualizao da morte e ressurreio doSenhor, passa a um segundo plano. O mesmo acontece com a relao entre o sacrifcio de Cristo e o nossosacrifcio de po e vinho que apenas aparece.7 Dessa questo se tratou em nosso opsculo Das opfer derKirche (O sacrifcio da Igreja).

    No sou dos que pensam que as formas do altar, tal como se tinham constitudo no curso dos

    ltimos sculos, e se tinham conservado at o Conclio Vaticano II, no podem ser mudadas. Pelo contrrio,gostaria de que se voltasse a formas simples, tal como habitualmente estavam em uso no primeiro milnio,tanto na Igreja Oriental, como na Igreja Ocidental (e ainda hoje no Oriente); formas que colocavam emrelevo o carter do altar cristo, lugar do sacrifcio da Nova Aliana.

    A necessidade de expor em detalhes, porm de uma forma compreensvel a todos, o problemacriado pelos altares modernos voltados para o povo , assim como do celebrante de frente para a assemblia,me surgiu lendo as numerosas cartas dos leitores publicadas no ano passado, durante muitos meses, noDeutsche Tagespost. Estas cartas provam que no que concerne evoluo histrica do altar, muitas coisasficam confusas, e que muitos erros, sobretudo referentes aos primeiros tempos da Igreja, parecem estarancorados ao esprito das pessoas. Por causa de tudo isso decidi firmemente levar em conta as perguntas

    propostas pelos leitores em suas cartas.

    Klaus Gamber Pentecostes de 1987

    7NT.Nooriginal:LomismolarelacinentreelsacrificiodeCristoynuestrosacrificiodepanyvinoapenasaparece.

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    7/35

    7

    O ALTAR E O SANTURIO ONTEM E HOJE

    Quero vos contemplar no santurio, para ver vosso poder e vossa glria. (Sl 62,3)

    ...ao despertar, saciar-me-ei com a viso de vosso ser. (Sl 16,15)

    Estas palavras do salmista dizem bem o que era a participao interior dos fiis da Antiga Alianaentrando no templo de Jerusalm. De certo modo no so outra coisa se no a orao de Moiss pedindo aDeus que pudesse contemplar sua face (cf. Ex 33,11-23). Porm, assim como Moiss s viu a Iahweh pelascostas, igualmente o fiel israelita no via nada mais que o santurio de Deus, e se no pertencia castasacerdotal, somente seu exterior.

    O visitante da casa de Deus (Domus Dei) crist devia expressar o mesmo desejo do salmista, o de vera glria de Deus e sentir seu poder, tal como aparece no decorrer da Missa, atravs dos ritos e dasrepresentaes. Contemplamos o Senhor oculto sob as espcies eucarsticas, pois nesta terra no nos concedido ver a face de Deus sem morrer (cf. Ex 33,20).

    Orgenes nos recorda que: certo que os poderes anglicos tomar parte na assemblia dos fiis, eque a virtude de nosso Senhor e Salvador est ali presente, assim como as almas dos santos [2]. E o poeta

    srio Balay declara: A fim de que sobre a terra se possa encontrar (o Senhor), ele construiu para si umacasa entre os mortais e edificou altares... para que a Igreja obtenha a vida. Que ningum se engane: o Reique habita aqui! Aproximemo-nos do Templo para o contemplar! [3]

    A fim de ver um pouco do poder e da glria de Deus e para viv-la na liturgia, os homens, notranscurso dos sculos passados, edificaram igrejas e catedrais e as dotaram do melhor que podiam.Aceitaram que seus templos, enquanto morada de Deus, fossem suntuosos, ainda que muitas vezes elesmesmos vivessem na maior misria. Por acaso no era o seu santurio? O bem comum era por causa dele.Estava bem para todos.8

    Jamais se construram tantas igrejas novas como nos anos seguintes segunda guerra mundial. Amaioria delas so construes puramente utilitrias, nas quais se renunciou voluntariamente fazer umaobra de arte, ainda que freqentemente tenham custado milhes. Do ponto de vista tcnico no falta nada:se beneficiam de uma excelente acstica e de perfeita ventilao, bem iluminadas e facilmente aquecveis.De todos os lados se pode ver o altar.

    No obstante, essas Igrejas no so casas de Deus em sentido prprio, no so um espao sagrado,um templo do Senhor aonde seja agradvel ir para adorar a Deus e lhe expressar nossas necessidades. Sosalas de reunio aonde no se vai fora dos momentos dos ofcios. Assim como brincam com ossilos/depsitos de habitaes ou os armazns para humanos, como so os edifcios dos bairros deperiferia, a estas igrejas, em linguagem popular, s vezes se chama silos/depsitos de almas ouarmazns do pater noster.

    Outras igrejas tm sido expressamente concebidas como obra de arte, como a capela de peregrinosde Ronchamp. O clebre arquiteto Le Corbusier, que era agnstico, conseguiu uma obra mestra daarquitetura. Porm no uma Igreja. Pode at ser que seja um lugar de orao que predisponha meditao,mas no passa disso.

    Desde ento, o modelo da capela de Ronchamp foi imitado e a construo de Igrejas se converteunum terreno de experincias, de onde se desabafava o subjetivismo dos arquitetos. Isto se tornou cada vezmais fcil quando se imps o princpio segundo o qual j no existiria um espao sagrado em oposioao mundo profano.

    Os novos edifcios se converteram assim em smbolos de nossos tempos, e igualmente em sinal dadecomposio das normas existentes e em imagem de tudo o que catico no universo contemporneo.Todavia9, um lugar dedicado ao culto tem suas prprias leis, que no se submetem nem moda nem smudanas dos tempos. Como no Templo de Jerusalm, Deus habita nele de forma particular. E aqui quese rende culto a Deus.

    8NT.Nooriginal:Porelloerasubiencomn.9NT.Nooriginal:Ahorabien

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    8/35

    8

    H que se acrescentar a isso igualmente o seguinte: hoje as bases espirituais e teolgicas falham. A vidapblica, em sua maior parte, foi secularizada. Desgraadamente as Igrejas crists j no constituem mais afora principal da sociedade ocidental. Os arquitetos sem problema constroem hoje como se nada tivessemudado, enquanto no faltar dinheiro. Os gigantescos centros paroquiais que se edificam nos bairrosperifricos daro a impresso de que a igreja continua sendo o grande m que atrai os homens.

    No futuro isto levar construo de edifcios simples, relativamente limitados, que, se no sedistinguem em nada por seu aspecto exterior, apresentaro em seu interior um acomodamento de boaqualidade, inteiramente orientados para seu fim cultual. De maneira anloga, a baslica da Igreja primitiva

    pouco se distinguia dos demais edifcios da estrada quanto construo, porm sem dvida pelasuntuosidade de suas cortinas e lmpadas, e sobretudo pela rica ornamentao do altar e do santurio, ointerior constitua um marco digno do mistrio que nela tinha lugar.

    Nas novas igrejas, a disposio do santurio tem sido objeto de diferentes solues. Enquanto quenas Igrejas construdas entre as duas guerras existiam vrios degraus para se subir ao altar, que apareciaem uma plataforma mais elevada, hoje ele est sobre um pdio ilhado (em alemo Altarinsel, ou pequenailha do altar) colocado o mais prximo possvel dos fiis.

    O centro deste pdio est constitudo por uma mesa de altar (mensa), geralmente de grandesdimenses e desprovida de toda a ornamentao. Ao lado se encontra um ambo de pedra como o altar, e,atrs, trs assentos (acolchoados) ou mais para o celebrante e seus assistentes. Por ltimo, sozinho, emalguma parte da parede vazia10 da abside, o sacrrio. O crucifixo, para o qual se dirigiam at ento osolhares dos que rezavam, quase sempre falta ou ento se encontra de tamanho pequeno sobre o altar. Esteltimo leva, ao lado do inevitvel ramo de flores, alguns castiais reunidos em forma de buqu, ou se soos de grande tamanho, so colocados diretamente no cho, ao redor do altar.

    Pelo contrrio, as igrejas ortodoxas do Oriente se constroem hoje da mesma maneira h mais de milanos, e so adornadas com pinturas e cones. Trata-se aqui de uma arte tpica, qual tanto o arquitetoquanto o artista esto ligados ao typosou modelo tradicional, sem que este seja sempre uniforme.

    No Ocidente tambm, segundo a tradio comum ao Oriente, era essencial que o santurio estivesseseparado do espao reservado aos fiis, como jem Jerusalm o santurio do resto dos edifcios do Templo.O to trado princpio de nossos dias, segundo o qual o altar deve ser o centro, falso no referente sualocalizao.

    O altar o centro da ao sagrada: sobre ele, no curso da celebrao da Missa, repousa o cordeiroimolado do Apocalipse (5,6). Por isso Santa Hidelbranda de Bingen chama o altar de a mesadispensadora da vida e acrescenta: Quando o sacerdote... se aproxima do altar para celebrar os santos mistrios,um resplendor de luz aparece logo no cu. Os anjos descem, a luz rodeia o altar... e os espritos celestes se inclinam vista do servio divino [4].

    A separao estrita entre o santurio e a nave apareceu na poca em que as multides comearam aaderir em massa Igreja, ou seja, por volta do ano 300 no mximo. Ento se construram barreiras ao redordo coro e se colocaram cortinas, uma rodeando o baldaquino do altar, outra na prguladas varandas docoro, prgula que nas igrejas pequenas se reduzia a um simples travesso de madeira (cf. fig. 1). Tudo istoporque se pensava que o mistrio celebrado no altar devia ser preservado, no se expondo diretamente aosolhares dos homens.

    10NT.Nooriginal:...murodesnudo...

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    9/35

    9

    Fig. 1 Veliko Timovo (Bulgria) sc. VI. Altar e barreira do coro. A prgula no est representada.

    A iconostase bizantina no outra coisa se no uma extenso dessas barreiras do coro (cancelli) daIgreja primitiva. A iconostase tem normalmente trs portas, como as cancelas construdas no tempo doimperador Justiniano (565) na igreja de Santa Sofia de Constantinopla, dotada j, como em geral nos

    sculos seguintes, de representaes de Cristo ou de Maria, anjos, profetas e apstolos. O clebre cone deCristo, no mosteiro do monte Sinai, data da mesma poca. Deve provir, tendo em conta suas dimenses 84cm de altura de uma das antigas iconostases. Os cones se colocavam, e se colocam, parte entre ascolunas da prgula e parte em cima destas como no caso da deisis (Cristo entre Maria e Joo Batista).

    Na igreja do Ocidente, as cortinas (vela), que se usavam desde as origens na ornamentao do altar eas barreiras do coro, no deixaram de ser usadas nas igrejas at a poca barroca, onde tudo estavaorganizado para a vista/viso e a claridade. Assim encontramos no sacramentrio de Angulema (por voltado ano 800), ao final das frmulas de consagrao de uma igreja, a seguinte rubrica: Depois se recobrem osaltares (com as toalhas) e se penduram as cortinas do templo (vela templi) [5]. O mesmo no rito de consagraodas igrejas do sacramentrio de Drogn (sc. IX) se fala de um velum suspenso entre a nave e o altar (interaedem et altare) [5]. Porm o que importa que voltemos a ter respeito pelo altar.

    Tanto na Igreja do Oriente como na do Ocidente, existe o costume de que o sacerdote que seaproxima ao altar se incline profundamente diante dele. No livro do xodo (29,37) se l a propsito do altardo tabernculo: tudo o que o tocar ser consagrado. O mesmo Jesus declara Cegos! Qual o maior: a oferta ouo altar que santifica a oferta? (Mt 23,19) e tambm que no se deve depositar no altar nenhuma oferenda seno depois de se ter reconciliado com o irmo (cf. Mt 5,23-24).

    A oferenda do sacrifcio da Nova Aliana fez com que o altar se convertesse no trono de Deus. Peloque So Joo Crisstomo adverte a seus leitores: Pense no que far entrando aqui. Trema de antemo. Porqueaquele que to somente percebe o trono (vazio!) do Rei, estremece em seu corao ao esperar a chegada do Rei [6]

    Na Igreja primitiva, e tambm posteriormente, pendia do baldaquino do altar, alm da lmpadacircular, um recipiente de ouro e prata, geralmente em forma de pomba, onde se guardava a eucaristia(para a comunho dos enfermos). Para esta finalidade muitas vezes tambm se fazia um cofre que, como aArca da Aliana da Antiga Aliana (arca), era feito de madeira de accia recoberta de panos de ouro ouprata (cf. Ex 37,1-9). Se conserva em Coire um belo exemplar do sc. VIII. O cibrio dourado do imperadorArnoul, antigamente em Santo Emmeran de Ratisbona e atualmente em Munique, data do sc. IX. Comsuas quatro pequenas colunas se assemelha muito ao artophorion (tabernculo) que hoje se encontra sobreo altar das igrejas bizantinas.

    Estes receptculos estavam sempre colocados sobre o altar ou em um nicho colocado em sua parteposterior. O tabernculo metlico da poca moderna se origina aqui. No sc. XIII, Guilherme Durand emseu Rationale divinorum officiorum ou Manual para os ofcios divinos, fala da instalao de uma arca(tabernculo) em cima do altar, dentro da qual se depositam conjuntamente o corpo do Senhor e asrelquias dos santos [7]. Pelo contrrio, a conservao do po eucarstico em um tabernculo, situado naparede esquerda do coro, mais recente e era habitual sobretudo na poca gtica. A conservao sobre oaltar em todo caso muito encontrada. Nada se pode objetar a esta conservao da santa eucaristia emoutro lugar da Igreja, contanto que seja digno.

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    10/35

    10

    Na abside, onde se encontrava o trono do bispo e as cadeiras dos sacerdotes, em sua parte superiorat o sc. V como testemunha Nilo de Ancila (430) [8] no se representava nada mais que a cruz outambm como se pode ver em algum mosaico romano, alm da cruz, Cristo ensinando rodeado pelosApstolos. Depois, mais tarde, at a poca gtica, em quase todo o Ocidente, Cristo sentado em seu trono,dentro de uma amndoa, sobre o arco-ris, rodeado pelos quatro animais do Apocalipse (4,6-8) e poranjos; na parte inferior a Me de Deus, os Apstolos e outros santos, representando a assemblia celeste.Durante a celebrao da Eucaristia, os fiis ao contemplar a imagem de Cristo sobre seu trono do cu, osentiam assim igualmente entre eles. No bastava recordar as palavras do Senhor: onde dois ou trs estoreunidos em meu nome, a estou eu no meio deles. (Mt 18,20), era necessrio express-la de maneira sensvel,precisamente por uma imagem.

    A parede da abside totalmente vazia11, como se encontra em muitas igrejas modernas, era em outrotempo algo inconcebvel. Quando se terminava uma nova construo, era precisamente essa parede aprimeira que se decorava com mosaicos ou pinturas, e s depois se fazia com outras paredes. Recorde-seaqui dos magnficos mosaicos da Baslica de Ravena e das catedrais de Veneza, Torcello e Parenzo (cf. fig.2). Enquanto as pinturas da abside tinham sobretudo um carter cultual, pois evocavam a presena doSenhor, sentado em seu trono, soberano sobre a assemblia, as pinturas da nave, com suas cenas tiradas doAntigo e do Novo Testamento tinham, segundo o pensamento ocidental, como primeiro efeito, um fimdidtico. Estavam destinadas a ensinar aos fiis as realidades divinas.

    Fig. 2 Santurio (parte superior) da Catedral de Parenzo (Istria), sc. VI(desenho de Jupp Palm)

    Pelo contrrio, o Oriente bizantino v antes de tudo uma atualizao dos mistrios da salvaonessas representaes. O mesmo que os numerosos retratos dos Santos ao longo dos pilares e paredeslaterais, simbolizando a presena da assemblia celeste ou a ao de unir-se a eles (cf. Hb 12,22-24).

    Por isso o interior da igreja ortodoxa se converte em um lugar onde e juntam o passado, o presente eo futuro, onde a eternidade (o hodie, o hoje, palavra pela qual comeam numerosos cantos solenes)aparece, onde o cu e a terra se unem.

    11NT.Nooriginal:Ummurodeabsidetotalmentedesnudo...

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    11/35

    11

    Fig. 3 Igreja do convento de Nerezi, prximo a Skopie (Macednia)

    Nas igrejas ocidentais, j o vimos, o olhar dos participantes se dirigia representao do Filho deDeus transfigurado, assim como cruz, sinal de nossa salvao. A cruz sobretudo era considerada um sinalde vitria, o sinal do Filho do Homem voltando no fim dos tempos (Mt 24,30), e, por isso, era adornadacom ouro e pedras preciosas. Era colocada atrs do altar e, at a poca romnica, no trazia o corpo deCristo.

    Somente mais tarde iniciou o costume de pintar na Cruz a imagem do Crucificado ou de fix-la emforma de representao sobre esmalte, porm ainda no como um Cristo de dor ou morrendo entre atrozessofrimentos, mas como o que venceu a morte ou como sumo sacerdote. A representao plstica de umcorpo martirizado, tal como se tornou comum no Ocidente, a princpio se rechaa no Oriente, porque sepensa que ressalta demais o aspecto fsico ou humano.

    Como a representao do Filho de Deus na abside em glria e a cruz acima ou em cima do altar soelementos essenciais da decorao do santurio, segundo a concepo tradicional, jamais se ps em dvidaque o olhar do sacerdote celebrante devia se dirigir cruz e representao de Cristo transfigurado, e noaos fiis que participavam da celebrao, como atualmente o caso na celebrao versus populum (de frentepara o povo).

    Sem dvida, poucas igrejas modernas tem tal ponto de referncia. Parece que em geral os artistas

    temem introduzir obras plsticas nas igrejas. Isto se deve aos conflitos interiores que perturbam12 o homemmoderno e que o impedem de criar uma arte sacra. Definitivamente o que falta a tradio, nas igrejas doOriente, no cessou de impregnar at hoje em dia o desenvolvimento do culto, a arquitetura das igrejas e aarte litrgica.

    Na ortodoxia, o artista tem por misso principal representar o mistrio da salvao, tal como sedescreve nas Sagradas Escrituras e foi transmitido pela Tradio, delimitao esta que o preserva dasarbitrariedades, com freqncia tremendas, que podemos encontrar na arte sacra contempornea, sem quepor isso ele esteja demasiadamente limitado em sua realizao artstica.Enquanto isso no Ocidente (ao contrrio do que aconteceu no Oriente), a disposio do santurio e dosaltares sofreu mudanas em diversas ocasies ao longo dos sculos (ao fim da poca romnica, e sobretudona poca gtica, os altares foram dotados de retbulos, o que finalmente trouxe a apario dos altares

    12NT.Nooriginal:desgarran

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    12/35

    12

    barrocos, to tpicos pela sua altura). No se pode negar que em nossos dias se produziu, neste aspecto,uma nova mudana, de ordem fundamental, aps o Conclio Vaticano II.

    Assim, depois do Conclio, em muitos lugares, se suprimiu a mesa da comunho, que restava daantiga barreira do coro, e se colocou, diante do altar mor, outro altar destinado celebrao de frente parao povo. E se colocaram microfones por toda parte, no altar, nas cadeiras, no ambo! J o antigo plpito no mais utilizado.

    Procedeu-se a esta nova disposio do santurio com uma extraordinria unanimidade em quasetodo o mundo. Enquanto nas igrejas antigas o (novo) altar de frente para o povo, as cadeiras e o ambo

    foram concebidos como objetos mveis, podendo em todo momento ser transladados, nos edifciosrenovados ou de nova construo esta disposio definitiva em funo da nova organizao que se crmoderna.

    Conserva-se a eucaristia em um tabernculo numa parede (no meio da parede de fundo ou naparede lateral esquerda). O novo altar de frente para o povo de pedra, de modo que muitas vezes suadisposio s permite a celebrao versus populum. As cadeiras tambm de pedra, bem como o ambo.Tudo com uma aparncia macia e de um estilo freqentemente duvidoso e, em todo caso, sem nenhumarelao com a tradio.

    Ora, indagando os sculos passados teramos realmente bastantes modelos capazes de nos daridias para esta organizao, em particular do altar.

    E. A. Lengeling exps as Tendncias da construo de igrejas catlicas na Alemanha segundo asdecises do Conclio Vaticano II (Tendenzen des deutschen Katholischen kirchenbaus aufgrund der Beschlsse desII. Vatikanischen Konzils) em um artigo com este ttulo no Liturgisces Jahrbuch de 1967. As tendncias que alise expunham foram, porm, impostas de maneira quase unnime. Porm, no se tratou seriamente defundamentar historicamente esta nova disposio, com exceo do estudo de Otto Nussbaum, do qualfalaremos adiante.

    Para terminar, uma palavra a mais sobre as celebraes eucarsticas com multides ao ar livre.Nestas manifestaes muitos sentem uma tremenda preocupao13, sobretudo por causa da maneira comque se distribui a comunho s pessoas.

    No esqueamos: verdade que Jesus Cristo pregava para grandes multides, que facilmentechegavam a milhares de pessoas (cf. Mt 14,21), sem dvida, porm, no instituiu a Santa Eucaristia na

    presena das massas humanas, e sim no crculo restrito de seus apstolos.Foi parecer de toda a cristandade que a Missa, esse sacrifcio que une o cu e a terra, no podia sercelebrado se no em locais sagrados preparados para tal. Recorda-se que o cordeiro pascal dos judeus spodia ser consumido sob um teto e no ao ar livre (cf. Ex 12,46).

    necessrio pensar ainda que a preparao e a consagrao de hstias necessrias para a comunhode milhares, e at mesmo de um milho de pessoas, ocasiona vrias dificuldades.Parece que, por razes de princpio, no se quer renunciar participao dos fiis na comunho aindaque isto seja a soluo mais simples , porque, partindo do carter de ceia prprio da missa, pensa-se, semrazo, que a recepo da comunho necessria para se poder participar de qualquer missa.

    Porm o que de todo incompreensvel que se celebrem Missas ao ar livre quando se dispem deigrejas amplas. Isso vai contra uma tradio da Igreja de quase 2000 anos e tambm contra a mesma

    natureza da Santa Missa, que tem sido sempre considerada um sacrifcio e a realizao de um mistrio.Para celebrar o mistrio da F, deveramos nos guardar dentro dos muros de nossas igrejas, protetores,guardas do mistrio. A santidade do lugar nos leva a tomar uma boa atitude diante do sagrado, quesomente se revela aos que se aproximam com respeito.

    13NT.Nooriginal:unaverdaderapesadilla

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    13/35

    13

    O ALTAR DE FRENTE PARA O POVO

    Perguntas e respostas

    Adiantou-se outro anjo e ps-se junto ao altar, com um turbulo de ouro na mo. Foram-lhedados muitos perfumes, para que os oferecesse com as oraes de todos os santos no altar de

    ouro, que est adiante do trono. (Ap 8,3)

    Segundo a concepo da carta aos Hebreus, o templo terrestre de Jerusalm e seu altar so aimagem do santurio que est no cu e no qual Cristo, sumo e eterno sacerdote, entrou (cf. Hb 9,24).

    A liturgia celeste e a terrestre no so mais que uma apenas. Segundo a passagem do Apocalipsecitado acima junto ao ttulo do captulo, um anjo se encontra diante do altar de ouro do cu, com umturbulo de ouro nas mos, para oferecer as oraes dos fiis ante a face de Deus. Nossa oferta terrena no tampouco totalmente aceita diante de Deus se no levada pela mo do anjo ao altar do cu 14, como se dizno Cnon da Missa romana.

    A idia segundo a qual o altar terreno era imagem do modelo15 celestial diante do trono de Deusdeterminou sua disposio e a posio do sacerdote diante dele: o anjo com o turbulo de ouro est diante doaltar, como temos lido. Alm disso, as prescries que Deus deu a Moiss (cf. Ex 30,1-8) tambm tiveram

    um papel importante.Eram necessrias estas observaes preliminares para que se compreenda quanto tem mudado as

    atuais concepes relativas ao altar. Essas mudanas no foram efetuadas bruscamente, mas em pequenospassos, pouco a pouco. Tudo comeou muitos anos antes do Conclio Vaticano II.

    Nas Richtlinien fr die Gestaltung des Gotteshauses aus dem Geist der rmischen Liturgie (Instrues paraa disposio das Igrejas no esprito da Liturgia romana) de 1949, Theodor Klauser adianta que: Certossinais fazem prever que, nas Igrejas do futuro, o sacerdote se colocar como em algum tempo por trs doaltar e celebrar de frente para o povo, como ainda se faz hoje em certas baslicas romanas. O desejo, que sepercebe por toda parte, de se ver mais claramente expressa a comunidade da mesa eucarstica, parece exigiresta soluo (n 8)

    O que Klauser apresentava ento como desejvel chegou a ser, como sabemos, a norma em quasetodas as partes. Pensa-se que se recuperou um costume da cristandade primitiva, porm se pode provarcom certeza que jamais houve celebraes versus populum (de frente para o povo) nem na Igreja do Orientenem na do Ocidente, como demonstraro claramente as explicaes seguintes. Todos, pelo contrrio,sempre se voltavam juntos para o oriente para rezar, ad Dominum (ao Senhor).

    A idia de um face a face entre o sacerdote e a assemblia na Missa remonta a Martinho Lutero quefazia notar no seu opsculo Deutsche Messe und Ordnung des Gottesdienstes (A Missa alem e a ordem doculto divino) de 1526, no comeo do captulo O Domingo para os leigos: Conservaremos os paramentossacerdotais, o altar e as velas at que se acabem ou at que achemos conveniente mud-los. Todavia,deixaremos que outros que queiram fazer diferente o faam. Porm, na verdadeira missa, entre verdadeiroscristos, ser necessrio que o altar no fique como est e que o sacerdote se volte sempre para o povo,como sem dvida fez Cristo durante a ceia. Isto, porm, pode esperar.

    Eis que o momento esperado chegou...Para justificar a mudana de posio do celebrante em relao ao altar, o Reformador se referia

    situao de Cristo durante a ltima Ceia. Com efeito, [Lutero] tinha diante dos olhos as representaescomuns da poca: Jesus est de p ou sentado ao centro de uma grande mesa e os apstolos o rodeiam, direita e esquerda.

    Porm, ser que Jesus realmente ocupava esta posio?Certamente no, pois teria contrariado os costumes domsticos da poca.No tempo de Jesus, e em alguns sculos mais tarde, usava-se uma mesa redonda ou uma mesa em

    forma de sigma (em semicrculo). A parte dianteira ficava livre para permitir servir os diferentes pratos. Osconvidados estavam sentados ou deitados por trs da mesa semicircular. Para isso usavam uma espcie de

    14NT.NooriginaldoOrdinriodaMissa:Supplicesterogamus,omnipotensDeus,jubehcperferripermanussanctiAngelituiin

    sublimealtaretuum,inconspectudivinmajestatistu15

    NT.Nooriginal:arquetipo

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    14/35

    14

    sof ou um banco, em forma de sigma. O lugar de honra no estava, como se poderia pensar, no centro,mas direita (in cornu dextro). O segundo lugar de honra estava frente.

    Esta disposio dos assentos se encontra constantemente nas mais antigas representaes da Ceia de Jesus e permanece at o corao da idade mdia. O Senhor est sempre, sentado ou reclinado, no ladodireito da mesa (cf. fig. 4). Foi pelo sc. XIII que se comeou a impor outro tipo de representao: colocam

    Jesus por trs da mesa e em meio aos Apstolos, que o rodeiam. Esta a imagem que Lutero tinha diantedos olhos.

    Esta representao tem, com efeito, toda a aparncia de uma celebrao versus populum. Na

    realidade, porm, no tem nada de parecido, posto que o povo, para quem o Senhor se deveria tervoltado, estava ausente, como se sabe, do cenculo. O que tira todo o valor da argumentao de Lutero. Poroutro lado, segundo o que sabemos, este jamais exigiu que e celebrasse voltado para a assemblia. Entre ascomunidades protestantes, somente os Reformados adotaram o costume de o fazer.

    Fig. 4 Mosaico em Santo Apolinrio Novo (Ravena), sc. V: A ceia

    PRIMEIRA PERGUNTA

    Qual era a situao na Igreja primitiva?No estavam os fiis com o presidente sentados mesa do Senhor?

    Aqui conveniente distinguir bem entre a celebrao do GAPE (refeio fraternal) e a daEUCARISTIA, que primitivamente se fazia logo aps o gape, e mais tarde antes deste. Trateidetalhadamente desta questo no meu livro Beracha16.Nos primeiros sculos, quando o nmero de membros da comunidade era ainda restrito, se conservou amesma disposio dos assentos da ltima Ceia, tanto mais porque correspondia aos costumes da poca.Muitas igrejas domsticas da Igreja primitiva, cujos restos se encontraram nas regies alpinas, provam-noclaramente. No centro de uma habitao relativamente pequena (pouco mais de 5 x 12,5m) se encontra umbanco de pedra semicircular com capacidade de 15 ou 20 pessoas [9].

    Nos povos em que o nmero de fiis era mais elevado, era necessrio acrescentar mesascomplementares. O bispo e os presbteros se sentavam em uma delas e os fieis nas outras, separadoshomens e mulheres. Na carta aos Glatas (2,11-12), o apstolo Paulo reprova que Pedro se sentasse com os

    judeus convertidos, separado dos pagos convertidos.Enquanto para a ceia comum, o gape, estavam sentados nas mesas, para a celebrao eucarstica se

    levantavam e se colocavam atrs do celebrante que permanecia diante do altar, como o prescreveexpressamente a Didasclia dos Apstolos, uma instruo dos sc. II-III, que exige que se voltemestritamente para o Oriente [10].

    16NT.LeiaseBeracdohebraicoBerakah.

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    15/35

    15

    Com os desenvolvimentos posteriores, uma vez suprimida a refeio fraterna (por volta do sc. IV),desapareceram as mesas. Logo os fiis se sentaram em bancos dispostos ao longo das paredes da Igreja. Amesa do altar, que antes era de madeira, se converteu em um altar de pedra.

    SEGUNDA PERGUNTA

    Como podemos nos opor aos modernos altares voltados para o povo se foram prescritos pelo Conclio epraticamente foram introduzidos no mundo inteiro?

    Em vo se buscar na Constituio sobre a Sagrada Liturgia, promulgada pelo Conclio Vaticano II,uma prescrio que exija celebrar a Santa Missa de frente para o povo. J em 1947 o Papa Pio XII ressaltavaem sua encclica Mediator Dei (n 49) o quanto estava equivocado quem quisesse fazer o altar voltar suaantiga forma de mensa (mesa). At o Conclio a celebrao de frente para o povo no estava autorizada(adiante se ver o caso particular de certas baslicas romanas). Estava, todavia, tolerada implicitamente poralguns bispos, sobretudo para Missas com jovens.

    Entre ns, na Alemanha, a nova posio do sacerdote fez sua apario com a Jugendbewegung(Movimento da Juventude) nos anos 20, quando comearam as celebraes eucarsticas em pequenosgrupos, tendo como precursor Romano Guardini com suas missas no Castelo de Rothenfels. O movimentolitrgico difundiu este costume, principalmente com Pius Parsch, que acomodou, neste sentido para sua

    parquia litrgica, uma pequena igreja romnica (Santa Gertrudes) em Klosterneuburg, perto de Viena.Finalmente, estes esforos foram aprovados pela Instruo Inter oecumenici, de 1964, da Congregao dosRitos, que conseqentemente inspirou o novo Missal. Ali se prescreve (para as novas construes): aceitvel construir o altar mor afastado da parede, a fim de ser facilmente circundado e nele se possacelebrar de frente para o povo. E ocupe um lugar que seja de fato o centro para onde espontaneamente sevolte a ateno de toda a assemblia dos fiis (n 91).

    Desgraadamente verdade que os novos altares voltados para o povo foram construdos por todoo mundo, ao menos esta parece ser a forma corrente na Igreja Catlica Romana. Todavia, propriamentefalando, no se pode dizer que estejam prescritos.

    Nas Igrejas ortodoxas do Oriente, onde hoje existem milhes de cristos, continua-se a respeitar ocostume da Igreja primitiva, segundo o qual o sacerdote que celebra o Santo Sacrifcio est voltado, com osfiis, para a abside. Esta atitude vale tanto para as Igrejas de rito bizantino (gregas, russas, blgaras,srvias, etc.) como para as chamadas de rito oriental antigo (armnia, siraca, copta).

    Que o altar deva estar separado da parede a fim de ser facilmente circundado outra questo.Esta exigncia da Congregao dos Ritos est totalmente de acordo com a tradio (o pontifical romanotradicional, no captulo Sobre a dedicao das Igrejas, exige expressamente que o altar no esteja fixo parede, paraque se possa dar a volta por todos os lados a fim de cumprir convenientemente os ritos da consagrao. O Missal deSo Pio V (edio de 1962), por outro lado indica a maneira como a incensao deve ser feita com este tipo de altares.

    Ao contrrio do que se pode normalmente crer, o altar assim disposto est perfeitamente de acordo com a tradio,ainda que a partir da baixa idade mdia se tenha preferido normalmente fix-lo parede) .

    Durante mais de dez sculos, como at em nossos dias nas igrejas ortodoxas do Oriente, o altarpermaneceu desprovidos de superestruturas. Uma mudana se produziu na poca gtica com a apariodos retbulos. Estes tinham em parte a mesma misso das pinturas da abside e das paredes da igreja,representando as diferentes etapas da salvao, desde a Anunciao d Anjo at a Asceno do Senhor.Enquanto nas igrejas pequenas os altares estavam junto parede da abside, nas grandes, como se viu,freqentemente estavam colocados, at a poca gtica, no meio do santurio. Ento se podia dar a volta aoredor enquanto se incensava, como se diz no Sl 25: Lavo na inocncia minhas mos e rodeio o teu altar, Senhor,

    para fazer ressoar vozes de louvor e para narrar todas as tuas maravilhas.Para ressaltar a santidade do altar, ao menos nas igrejas maiores, havia sobre este um baldaquino

    precioso sustentado por quatro colunas. Fixavam-se nos quatro lados. Indubitavelmente faziam referncias cortinas do Templo de Jerusalm, que separavam o Santo dos Santos (Sancta Sanctorum) do santurio, talcomo Deus prescreveu a Moiss: Fars um vu de prpura violeta, de prpura escarlate, de carmesim e de

    linho retorcido, sobre o qual sero artisticamente bordados querubins. Suspend-lo-s sobre quatro colunasde madeira de accia revestidas de ouro, com pregos de ouro, sobre quatro pedestais de prata. Colocars ovu debaixo dos colchetes, e ali, atrs do vu, que colocars a arca da aliana. Esse vu servir paraseparar o santo do santo dos santos (Ex 26,31-33).

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    16/35

    16

    No rito bizantino, como temos visto, a Iconostase serve para fazer esta separao. Porm, segundo aconcepo ortodoxa, esta com seus cones representa tambm a Ecclesia caelestis (a Igreja celeste), quecelebra tambm com os fiis, razo pela qual no deve ser considerado apenas um objeto de separao mastambm de contemplao para os que participam da celebrao.

    Em outros ritos orientais no bizantinos, a Iconostase no usada. Em seu lugar, como no ritoarmnio, encontramos duas cortinas: uma pequena diante do altar e uma grande escondendo todo o coroaos olhos dos fiis durante determinados momentos da liturgia da Missa. Delas So Joo Crisstomo diz:Quando tu vires as cortinas se fecharem, pensa, ento, que o cu se abre nas alturas e que os anjos descem [11].

    Segundo o testemunho de Guilherme Durand, estas cortinas se utilizaram igualmente no Ocidenteat a metade da idade mdia. Fala de trs velos: um recebe as oferendas do sacrifcio, o segundo rodeia oaltar e o terceiro velum est suspenso diante do coro [12].

    Enquanto que no princpio a Igreja, dentro do possvel, ocultava o altar, rodeando-o de tecidospreciosos e tapetes, eis aqui que hoje este altar se encontra, vazio17, no meio da nave, exposto a todos osolhares. Por acaso sua santidade, como lugar onde se oferece o sacrifcio, est mais ressaltada desta forma?Seguramente no. Ao menos que se queira contra toda a tradio consider-lo uma mesa de uma sala de

    jantar e coloc-lo assim bem exposto.Ento, certamente, no posso fazer nada mais que aceitar...Porm, neste caso, no se trataria de fazer presente aqui na terra o mundo celeste, mas sim o homem

    e seu universo. O universo de Deus, de seus anjos e santos, fica de lado, pois apenas toca o nosso. Pode serque, apesar de tudo, se interessem por um homem chamado Jesus e por certas passagens cuidadosamenteescolhidos de seu Evangelho!

    TERCEIRA PERGUNTA

    Na idade mdia no havia um altar destinado ao povo, alm do altar mor, como hoje em dia?

    Isto certo na medida em que nas igrejas Catedrais e nos mosteiros havia, por regra geral, desde ofim da poca romnica, um altar destinado ao povo, colocado diante do jub18, que era uma espcie declausura do coro, porm um pouco mais alto que o das igrejas primitivas, com duas entradas, que davamao coro dos cnegos ou dos monges, os quais assim estavam separados do resto da igreja. Por causa daCruz colocada em cima deste altar ou mais exatamente no jub, conhecia-se este altar como o altar dacruz.

    Sobre este altar, nestas igrejas, se celebrava a Missa para o povo (porm de costas para o povo).Assim toda Missa destinada a uma assistncia numerosa, como as missas solenes de funerais ou, em umaigreja Catedral, a Missa de coroao de um soberano (cf. fig. 5). A pregao se fazia do plpito. Somente asmissas conventuais (solenes) se celebravam no altar mor, no coro.

    Fig. 5 Coroao da segunda esposa do imperador Fernando II, diante dojubda catedral de Ratisbona (inciso em couro de 1630)

    17NT.Nooriginal:desnudo

    18NT.Noespanhol:verja;noitalianoefrancs:jub;espciedegalerianaentradadocorodeumaigreja

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    17/35

    17

    A funo dojubno era, pois, ser uma barreira entre o clero e o povo e tambm por isso no deveser comparada iconostase bizantina mas estava destinada a criar para os cnegos ou para os monges umespao onde se pudessem acontecer sem perturbaes as funes litrgicas do coro (Liturgia das Horas eMissa conventual). Por razes tanto litrgicas quanto arquitetnicas foi totalmente sem razo fazerdesaparecer o jube o altar da cruz. Tal foi o caso da Alemanha em quase todas as partes, na poca doIluminismo, seguindo ordens das autoridades seculares [13].

    Da mesma forma que ento se deram importantes modificaes arquitetnicas no interior dasigrejas era necessrio que os fiis tivessem viso direta sobre o altar mor hoje, depois do Conclio, quase

    todas as antigas igrejas foram retocadas pelos trabalhos de reforma (renovao)19.Quem percorre hoje o mundo e visita as igrejas, descobre as solues mais singulares na disposio

    do santurio. Na Itlia, sobretudo, quando foi possvel, os altares barrocos foram despojados de sua mesa,substituindo-a pelos assentos do celebrante e dos assistentes. Pensamos que seja a menos feliz das solues,posto que o retbulo perde assim sua antiga referncia ao sacrifcio eucarstico e se v degradado,rebaixado at o ponto de servir de encosto para os assentos dos sacerdotes.

    Na maior parte dos casos, o antigo altar mor com seu tabernculo s serve para conservar oSantssimo. necessrio se conformar que o sacerdote que se encontra ao altar, voltado para o povo, fiqueconstantemente de costas para o tabernculo, para onde, h pouco tempo, se dirigiam os olhos dos fiisquando rezavam. Em outras ocasies, o coro paroquial se colocava nos degraus do altar mor, e os cantores,de costas para o tabernculo, serviam-se da mesa do altar para depositar nela seus diversos acessrios.

    Pela mesma razo, quando as consideraes artsticas o permitiam, suprimiu-se o altar mor paraconservar o Santssimo em um tabernculo lateral, na parede. Imediatamente surgiu uma pergunta: Comoocupar o espao da abside que ficou vazio? Apareceram vrias solues. Com freqncia se instalou orgo e sua caixa decorativa, ou ento, na maioria das vezes, o coro paroquial, ou simplesmente sesuspendeu da parede da abside o antigo retbulo do altar ou um tapete valioso, a maneira de ornamento.

    De todo modo nenhuma dessas solues satisfatria, pois ao instalar um novo altar, junto umaaparncia muito modesta, est o fazer desaparecer o centro de gravidade espacial que constitua o altar moraos olhos do arquiteto que concebeu a igreja. Sem dvida alguma, A. Lorenzer tem razo quando escreve:O significado do altar forma parte integrante da igreja, ... e o deslocamento deste centro de gravidadeespacial obrigaria a uma distribuio totalmente nova [14].

    Isto se evidencia de uma maneira impressionante nas grandes igrejas, como por exemplo na catedralde Speyer20, onde os olhares dos que entravam se dirigiam imediatamente para o antigo altar mor, coroadopelo seu baldaquino. Hoje flutua no vazio. A nova mesa do altar, instalada no coro, no obstante suasdimenses e sua altura, apenas se faz visvel e o altar, voltado para o povo, uns degraus mais abaixo, nochega a ser um centro de gravidade espacial.

    QUARTA PERGUNTA

    No Manual de Liturgia para o plpito, a escola e a casa (Handbuch derLiturgie fr Kanzel, Schule und Haus) do Pe. Alfons Neugart (1926), se l: Nas baslicas da igreja

    primitiva, o altar estava colocado no meio da abside do coro e o sacerdote celebrante se colocava atrsdeste, de frente para o povo. No havia cruz nem velas sobre o altar. As cadeiras para o bispo e os

    eclesisticos estavam colocadas ao redor da parede. Posteriormente o altar foi colocado junto parede,tal e como encontramos em nossos dias. Isto est certo?

    O que exato que, durante os primeiros sculos, as cadeiras do bispo e dos sacerdotes secolocavam ao longo da parede da abside e no nas laterais. Nos territrios gregos, freqentemente estavamsobre vrios degraus, a fim de que o bispo pudesse ser visto por todos e melhor ouvido quando da, de suasede, pronunciava seu sermo. A sede central se reservava sempre ao Bispo, como ainda hoje no Oriente.

    Tambm certo que originariamente no se colocavam no altar cruzes, velas, atril para o Missal,mas somente o clice e a patena com as oferendas. Isto se pode comprovar pelas pinturas e miniaturasmedievais da Missa. Porm existia sim, at uma poca recente, o costume de adornar com flores o cho da

    igreja. Jamais se adornava com flores o altar.

    19NT.Aversoitalianausaotermoaggiornamento

    20NT.AversoitalianatrazSpiraeaespanholaSpire

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    18/35

    18

    Como regra geral os altares eram pequenos, com uma superfcie que raramente ultrapassava 1m.No claustro de Ratisbona existe, por exemplo, um pequeno altar de pedra macia, que remonta a umapoca muito antiga. Todavia tambm se encontra na antiga catedral um altar enorme (de 2,10m X 1,40m)que possivelmente data do sc. V, representando uma confisso, ou seja, formava parte do sepulcro deum mrtir. Da vem seu enorme tamanho [15]. A pequena superfcie, da maioria dos altares, s deixavaespao para as oferendas do po e do vinho. Esta caracterstica precisamente servia para ressaltar o cartersacrifical da Missa, como nos sacrifcios dos judeus e dos pagos: somente as oferendas propriamente ditastinham lugar sobre o altar.

    Os altares em forma de mesas de grandes dimenses eram raros na antigidade. Porm, comooutros que temos citado, tambm estes eram ricamente adornados com tecidos preciosos, que caam pelosquatro lados at o cho, de modo que a mesa que cobriam no aparecia como tal. Mais tarde, em muitoslugares, ps-se no lado anterior dos altares um tapete de tecido21, madeira ou metal, ricamente adornado.Porm no se pode afirmar que o carter de ceia da Missa pudesse ser manifestado pelos altares em formade mesa.

    Mais adiante falaremos, com detalhe, da posio do sacerdote ao altar nos tempos da igrejaprimitiva. Somente citaremos aqui o que escreveu na revista Deer Seelsorger, em 1967, pouco depois doencerramento do Conclio Vaticano II, o Pe. Josef A. Jungmann, autor da conhecida obra Missarumsollemnia: A afirmao, normalmente to repetida, de que o altar da igreja primitiva supunha sempre queo sacerdote estava voltado para o povo, se comprova que uma lenda.

    Jungman, ademais, nos adverte contra o perigo, se se aconselha o altar voltado para o povo, defazer disto uma exigncia absoluta e, finalmente, uma moda qual nos submetamos sem refletir.Segundo ele, a principal razo desta recomendao de celebrar de frente para o povo a seguinte: Existeem nossos dias a tendncia de enfatizar exclusivamente o carter de ceia da Eucaristia.

    De sua parte o prprio Cardeal Ratzinger, nestes ltimos anos, nos chama a ateno cada vez commais freqncia contra o perigo de considerar a liturgia somente sob o aspecto de comida fraternal [16].

    QUINTA PERGUNTA

    O papa no celebra desde tempos imemoriveis de frente para o povo, e no existe em So Pedro deRoma um altar separado elevado sobre um pdio, como na maior parte das igrejas modernas?

    Pareceria exato que a idia de um altar central, separado sobre um pdio estivesse de certa formaprefigurada na igreja barroca de So Pedro (mas no na igreja constantiniana que a precedeu): o altarpapal, ligeiramente elevado, se encontra separado no meio da igreja, debaixo da cpula central, suspendidasobre a confisso e a tumba do Prncipe dos Apstolos; facilmente visvel desde a nave como desde osdois braos do transepto.

    Os que anteriormente tivessem presenciado uma missa papal teriam dado conta que o Papa no secoloca diante do altar, como no resto da cristandade, mas atrs deste. Alguns liturgistasinconsideradamente tiraram a concluso de que aqui se tinha conservado a posio de frente para o povo,que o celebrante teve na igreja primitiva.

    Porm, como j vamos demonstrar, trata-se da orientao da orao, pois a igreja de So Pedro notem o abside orientado para o leste, como na maioria das antigas igrejas, mas para o oeste.Sem dvida, como o mostram as fotografias tomadas antes de Paulo VI, que logo empreendeu a

    transformao do altar papal, os fiis presentes apenas podiam perceber a figura do papa, devido senormes dimenses da cruz e dos castiais do altar. Por isso no se pode falar de uma celebrao versus

    populum propriamente dita. No se trata tambm de um privilgio do Papa, como se afirmou. Existe, comefeito, outras igrejas em Roma nas quais a abside est orientada ao ocidente e onde o celebrante estigualmente colocado atrs do altar.

    Nas igrejas modernas, construdas aps o Conclio Vaticano II, normalmente se encontra, como emSo Pedro de Roma, um altar separado sobre um pdio, porm falta o baldaquino que o coroa. Como setrata de um pdio separado no meio da Igreja, desprovido de qualquer orientao, normalmente rodeado

    de bancos para os fiis, difcil encontrar um lugar adequado para a cruz do altar, da qual j temos expostomais acima a funo de ponto de referncia, cruz que sempre exigida pelas novas regras litrgicas. Na

    21NT.Nooriginalalfombradetela

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    19/35

    19

    Instruo Geral do novo Missal se pode ler: Haja tambm sobre o altar ou perto dele uma cruz com aimagem do Cristo crucificado que seja bem visvel para o povo reunido. Convm que tal cruz que servepara recordar aos fiis a paixo salutar do Senhor, permanea junto ao altar tambm fora das celebraeslitrgicas. (308)22

    Este era o caso do altar da cruz medieval (colocado diante dojubque separava o coro doantecoro), porm j no o , pois para satisfazer essa prescrio de qualquer forma se acabacolocando apenas uma cruzinha no altar ou suspensa sobre ele.

    SEXTA PERGUNTA

    Por acaso era bom que o sacerdote rezasse voltado para a parede? No melhor que reze voltado para aassemblia?

    Enquanto o sacerdote se coloca na frente do altar, ele no reza em direo a uma parede, masconjuntamente reza com todos em direo ao Senhor, tanto mais porque o que importava at agora no eraformar uma comunidade, mas render culto a Deus por intermdio do sacerdote, representante dosparticipantes e unido a eles.

    Por isto, falando da direo da orao, Santo Agostinho, bispo de Hipona, escreve: Quando nos

    levantamos para orar, voltamo-nos para o Oriente (ad orientem convertimur) de onde o cu se levanta. Noque Deus s se encontre ali, ou que tenha abandonado as outras regies da terra... mas para exortar oesprito a se voltar para uma natureza superior, ou seja, a Deus [17].

    Isto explica porque os fiis, depois do sermo, se levantavam de seus assentos para a orao, queseguia, e se voltavam para o oriente. Santo Agostinho os convidada para isso freqentemente ao terminarseus sermes, utilizando, maneira de frase j consagrada, as palavras: Conversi ad Dominum(voltadospara o Senhor!23).

    Aqui se pode evocar uma palavra de So Paulo. Consciente de que todo o tempo que passamos nocorpo um exlio longe do Senhor. Andamos na f e no na viso , ele deseja estar ausente deste corpo para irhabitar junto do Senhor (ad Dominum) (2Cor 5,6-8).

    Assim, pois, voltar-se para o Senhor e olhar para o Oriente, para a Igreja primitiva era uma nica e mesma

    coisa. Em sua obra fundamental Sol Salutis (1920), Joseph Dlger diz que est convencido de que aresposta da assemblia Habemus ad Dominum(Ns os temos para o Senhor24), para o convite do sacerdoteSursum corda (Coraes ao alto!), significava que se voltavam para o Oriente, para o Senhor (pg. 256).

    A este respeito Dlger observa que certas liturgias orientais procedem expressamente a este convitepor uma chamada do dicono antes da orao eucarstica (pg. 251). Este o caso da anfora copta de SoBaslio que comea assim: Aproximai-vos, vs os homens, levantai-vos com respeito e olhai para oOriente; e da anfora de So Marcos, donde uma exortao anloga (Olhai para o Oriente!) se diz nomeio da orao eucarstica, justo antes da transio que leva ao Sanctus.

    Na breve descrio litrgica do segundo livro das Constituies apostlicas, que so instrues do sc.IV, est mencionado igualmente que necessrio colocar-se de p para e rezar e voltar-se para o Oriente

    [18]. O livro oitavo nos d o apelo do dicono: Ponde-vos de p para o Senhor! [19]. Como se v, aquitambm h um paralelismo entre o olhar para o Oriente e o voltar-se para o Senhor.

    O costume de rezar em direo ao sol nascente imemorial, como igualmente h demonstradoDlger, e encontrado tanto entre judeus como entre romanos. Por isso o romano Vitrubio, em seu tratadosobre arquitetura, escreve: Os templos dos deuses devem estar orientados de tal forma que (...) a imagemque se encontra dentro do templo olhe para o poente, para que os que vo fazer sacrifcios estejam voltadospara o Oriente e para a imagem, e assim ao fazer suas oraes vejam todo o conjunto, o templo e a parte docu que est ao nascente, e que as esttuas paream levantar-se com o sol para olhar para os que rezamdurante os sacrifcios [20].

    Para Tertuliano (por volta do ano 200 d. C.) a orao voltada para o Oriente era uma coisa evidente.Em seu livreto Apologtica, menciona que os cristos rezam em direo ao sol nascente (c. 16). Esta

    22Ooriginalcitadasegundaediotpica.Acitaodapresenteediodaterceiraediotpica,de2002.

    23NT.Apenasumlembrete:ConversiadDominumafrasequedorigemaottulodestaobradeKlausGamber.

    24NT.NoMissalRomanoutilizadonoBrasil,aexpressofoitraduzidacomoOnossocoraoestemDeus!

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    20/35

    20

    orientao da orao foi assinalada prontamente nas casas por meio de uma cruz na parede. Foi encontradauma cruz na parte superior de uma casa de Herculanum, sepultada quando da erupo do Vesvio em 79d. C. [21].

    STIMA PERGUNTA

    Certamente no h estudos, como o do professor Otto Nussbaum, muito conhecido, nos quais sedemonstrou cientificamente que desde os tempos mais antigos houve celebraes de frente para o povo,

    e que estas eram as mais antigas?

    Em seu estudo de grande amplitude Der Standorf des Liturgen am christlichen Altar (O lugar docelebrante no altar cristo), publicado em 1965, Nussbaum escreve: Quando apareceram os edifciosdedicados ao culto propriamente dito, no havia nenhuma regra estrita fixando de que lado do altar deviase colocar o celebrante. Podia bem situar-se diante ou detrs do altar (P. 408). Ele pensa que a celebraode frente para o povo foi a preferida at o sculo VI.

    No obstante Nussbaum no distingue suficientemente entre as igrejas que tm abside ao leste dasque o tm ao oeste, e por conseguinte a entrada ao leste. So quase exclusivamente as baslicas do sculo IVas que apresentam esta ltima orientao, e especialmente aquelas que foram construdas pelo imperadorConstantino e sua me, Helena, como por exemplo a Igreja de So Pedro de Roma.

    Porm desde o comeo do sc. V, So Paulino de Nola indica que o habitual (usitatior) o abside aoleste [22]. De fato, h baslicas que tm sua entrada ao leste, sobretudo em Roma e na frica do Norte,enquanto no Oriente so relativamente raras (em Tiro e em Antioquia).

    A entrada ao Oriente (baslicas constantinianas) imitava a disposio do Templo de Jerusalm (cf.Ez 8,16) assim como alguns templos da antigidade, cujas portas abertas deixavam penetrar a luz do solnascente, fazendo resplandecer no interior a esttua do deus.

    Nas baslicas crists que tinham sua entrada ao leste, o celebrante estava obrigado, normalmente, ase colocar diante da face posterior do altar a fim de estar voltado para o Oriente no momento da ofertado Santo Sacrifcio, enquanto que, nas igrejas que tinham o abside ao leste, se colocava diante do altar(ante altare) dando por conseguinte as costas assemblia.

    Pelo fato de, em algumas destas ltimas baslicas, existir lugar para o celebrante atrs do altar, svezes se deduziu que este se colocava neste lugar e que ento estava voltado para o povo, sobretudoquando existia no fundo da abside um banco para os sacerdotes com um local para o bispo.

    Entretanto, esta uma concluso manifestadamente errnea que Nussbaum, por outra parte,adotou - , como se pode demonstrar de maneira irrefutvel com a ajuda dos resultados das escavaesarqueolgicas [23]. Se no, por que se teriam construdo estas Igrejas exatamente em direo ao leste?

    OITAVA PERGUNTA

    Quando o sacerdote se colocava detrs do altar nas igrejas que tm sua abside em direo ao ocidente,como So Pedro de Roma, no era isso uma celebrao de frente para o povo?

    No! Com efeito, durante a orao eucarstica (canon missae), no s o celebrante mas tambm osfiis se voltavam para o Oriente. Como o fez observar So Joo Crisstomo [24], nos primeiros tempos osfiis estendiam suas mos para rezar junto com o sacerdote (cf. fig. 9, p. 46).

    Todos olhavam em direo s portas abertas da igreja, por onde penetrava a luz do sol nascente,smbolo de Cristo ressuscitado, que volta. Deixando de lado a venerao particular que o construtor destasBaslicas, o imperador Constantino, tinha pelo Sol nascente, uma passagem do profeta Ezequiel (43,1)tambm influenciou de maneira especial: Fui ento conduzido ao prtico oriental, e eis que a glria doDeus de Israel chegava do oriente, com rudo semelhante ao rudo das muitas guas, enquanto a terraresplandecia com seu claro. Assim estando abertas as portas da Baslica ao oriente, se esperava queCristo viesse a participar na celebrao da Eucaristia, da mesma maneira que depois de sua ressurreio eleapareceu vrias vezes aos seus discpulos enquanto comiam (Lc 24,36-49; Jo 21; At 1,4).

    Originariamente os fiis, separadas as mulheres dos homens, permaneciam no na nave central,mas nas naves laterais (esta afirmao, que corre o risco de surpreender o leitor desavisado, certamente est

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    21/35

    21

    totalmente fundamentada. A ttulo de exemplo reproduzimos um croqui da igreja de So Clemente deRoma.

    O espao central diante do altar estava ocupado pela schola cantorum (recinto reservado aoscantores), os fiis se colocavam nas naves laterais. Esta disposio est testemunhada por numerososdocumentos. Notemos todavia uma hiptese diferente que se deve ao professor Cyrile Vogel, que no casode uma baslica, na qual os fiis estivessem na nave central, pensa que em Roma, at a metade do sc. V, aconversio ad orientem (voltar-se para o oriente), que implicava uma aversio a mensa (dar as costas para amesa [do altar]), no era ou deixou de ser um costume entre os fiis (A orientao para o leste docelebrante e dos fiis, durante a celebrao eucarstica publicado em LOrient syrien, vol. IX, 1964, p. 29)),que nas grandes baslicas podiam ser at seis (as de So Joo de Latro e So Pedro de Roma s tmquatro). O colocar-se nas naves laterais corresponde ao sentar-se ao longo das paredes laterais nas igrejaspequenas da cristandade primitiva. Este costume subsiste ainda nas igrejas do Oriente. A nave ou o espao

    central abaixo da cpula fica livre para as funes do culto. Os fiis de mais idade se situavam nos assentos(stasidien) ao longo das paredes da Igrejas, e nas naves laterais o resto dos assistentes do ofcio, de p. NoOriente, a posio de p, e no de joelhos, como antes entre ns, a atitude corporal mais conveniente participao litrgica, atitude que ademais exige uma grande disciplina fsica, sobretudo durante aosofcios religiosos mais longos.

    Como o mostram certas escavaes e as representaes (cf. fig. 6) nas baslicas constantinianas enorte-africanas o altar estava prximo ao centro da nave. Era rodeado pelos quatro lados com uma grade e,por via de regra, era coberto com um baldaquino.

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    22/35

    22

    Fig. 6 - Mosaico de Tabarca, frica do Norte (sc. IV): Ecclesia mater. Segundo o Dicionrio de arqueologia crist e de liturgia, de

    Dom Cabrol e Dom Leclercq, IV, 2, tav. entre as colunas 2232-2233, artigo: glise). O altar est no meio da nave.

    O coro (schola cantorum) se colocava de frente para o celebrante. Nas igrejas de Ravena, todas elasorientadas em direo ao leste, se conservou durante muito tempo esta posio do altar e da schola no meioda nave central, de que existem testemunhos at o sc. VIII [25]. (Sempre a ttulo de exemplo, reproduzimos a

    planta da igreja de Sabratha, na Lbia.

    O celebrante, voltado para o leste, se coloca de costas para a abside e de frente para as portas da igreja. Os fiisno esto colocados diante do sacerdote (v-se que tampouco havia lugar), mas nas naves laterais. Eles, como ocelebrante, no tinham dificuldade em se voltar para o leste).

    Na igreja constantiniana de So Pedro de Roma, o altar no se encontrava sobre a tumba doApstolo, ao contrrio do que se pode crer, mas um pouco mais ao centro da nave. Sobre o lugar em queestava enterrado o Prncipe dos Apstolos havia uma memoria sem altar, um baldaquino sustentado porcolunas, como mostra a antiqssima representao do pequeno cofre de marfim de Pola (cf. fig. 7). Asuposio com freqncia aduzida de que teria havido em outro tempo um altar maior imvel ali por ondeentravam e saam os peregrinos que visitavam a tumba do Apstolo no pde ser provada.

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    23/35

    23

    Fig. 7 - Abside da antiga igreja de So Pedro, em Roma, antes de sua reconstruo sob o papa So Gregrio Magno. (Reconstruo

    com base na pequena placa de marfim de Pola).

    Posto que, nas baslicas que tinham sua abside em direo ao Ocidente e o altar no meio da nave, osfiis, como vimos, se colocavam nas naves laterais (entre as colunas das quais pendiam cortinas, que seabriam durante a Missa), de fato no voltavam as costas ao altar, coisa que em todo caso seria impensvel,pelo respeito que se tinha santidade do altar. Sem dvida, podiam voltar-se sem dificuldade para oOriente (em direo entrada) com uma ligeira rotao do corpo.

    Mesmo no caso inverossmil de que, durante a orao eucarstica, os fiis no estivessem olhandopara a entrada e sim para o altar, no existiu um cara a cara com o sacerdote, pois o altar, como temos dito,estava ocultado pelas cortinas, na antigidade, durante este perodo da mesma.

    A partir da idade mdia, o altar destas baslicas foi deslocado para a abside. Na igreja de So Pedroisto se fez, como se sabe, por volta de 600, sob o papa So Gregrio Magno, quem ao mesmo tempoempreendeu importantes modificaes no coro e instalou uma cripta circular, para que os peregrinospudessem chegar livremente tumba do Apstolo, sem ter que penetrar no presbitrio (cf. fig. 8).

    Fig. 8 - Reconstruo (segundo Rohault de Fleury, La messe, II, Confessions, tav. CXXXI) do altar de So Pedro, em Roma, sob opapa So Gregrio Magno (600). Diante do altar com baldaquino uma espcie de iconostase.

    Mais adiante, pouco a pouco, o povo se colocou na nave central. Em uma poca (impossvel hoje de

    determinar) onde os assistentes deixaram de se voltar para o Oriente para permanecer voltados para oaltar, nas baslicas constantinianas, se chegou a uma espcie de celebrao de frente para o povo.

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    24/35

    24

    NONA PERGUNTA

    Qual era a posio do sacerdote e dos fiis nas igrejas nas quais a abside estava em direo ao Oriente,que como se sabe, constituam a maioria dos antigos santurios?

    Nas baslicas que tinham vrias naves laterais e a abside em direo ao oriente, os assistentes Missa se situavam a princpio nas naves laterais, assim como na parte traseira da nave central. Formavamuma espcie de semicrculo aberto ao Oriente e no ponto de convergncia se colocava o celebrante (no

    centro do crculo inteiro virtual).Diferentemente, nas baslicas que tinham a abside em direo ao ocidente, o sacerdote, assim como

    os clrigos e cantores que o rodeavam, se colocavam no ponto central deste semicrculo.Quando posteriormente os fiis comearam a ocupar a nave central e se colocaram assim dispostos

    como em uma espcie de coluna militar, algo dinmico apareceu que assemelhava coluna do povo deDeus em marcha atravs do deserto rumo terra prometida. Sua posio para o leste indicava o objetivo dacoluna, o Paraso perdido que sempre se buscava ao Oriente (cf. Gn 2,8). O celebrante e seus assistentesformavam a cabea desta coluna.

    A disposio inicial, que consistia em um semicrculo aberto, resultava ao contrrio de um princpioesttico: a espera do Senhor, que havia subido aos cus para o leste (cf. Sl 67,33-34; Zc 14,4) e que dali regressaria(cf. Mt 24,27, At 1,11). Quando se espera uma personalidade importante, se rompem as filas para formar um

    semicrculo, a fim de acolher o hspede de honra em seu centro. So Joo Damasceno escreve: Em suaAscenso, se elevou para o Oriente e desta forma foi adorado por seus Apstolos, e assim regressar, da mesmamaneira que o viram subir ao cu, como o mesmo Senhor o disse: como o relmpago que salta do oriente ebrilha at o ocidente, assim ser a vinda do Filho do Homem (Mt 24,27). Eis porque o esperamos e o adoramosvoltados para o oriente. Eis aqui uma tradio no escrita dos Apstolos [26]

    A partir desta idia se representou em numerosas igrejas, desde o sc. VI, aproximadamente pensa-se nas pinturas desta poca em Bawit (Egito) a Ascenso do Senhor abaixo da abbada principal daabside: na parte superior da imagem, Cristo glorioso levado pelos anjos; na parte inferior Mariarepresentando a Igreja, em atitude orante com as mos estendidas para o cu e, sua esquerda e direita, osApstolos. Esta pintura representava ao mesmo tempo a Glorificao de Jesus no cu e sua segundaparusia segundo a palavra dos anjos aos apstolos quando da Ascenso: Esse Jesus que acaba de vos serarrebatado para o cu voltar do mesmo modo que o vistes subir para o cu (At 1,11) [27].

    Mais tarde, nas pinturas de absides ocidentais, Cristo em seu trono foi destacado desta composioe se converteu em Majestas Domini rodeado dos smbolos dos quatro evangelistas na pintura da absidetpica da arte romnica. No oriente bizantino ou se pintou o Senhor em sua glria como Pantocrator abaixoda abbada principal da abside ou se colocou no conjunto da Ascenso, abaixo da cpula superior do altar.Em quase todos os casos, se dispensa a Me de Deus nestas composies, reservando-a para aornamentao da abside (cf. fig. 2).

    Uma passagem do Apocalipse deve ter influenciado para determinar o lugar central da abside, que destinado a Maria: Abriu-se o templo de Deus no cu e apareceu, no seu templo, a arca da aliana(destinado como temos visto para guardar a Eucaristia sobre o altar). Apareceu em seguida um grande

    sinal no cu: uma Mulher revestida do sol, a lua debaixo dos seus ps e na cabea uma coroa de dozeestrelas (Ap 11,19a.12,1).Note-se aqui a relao entre Maria-Igreja e Arca da Aliana, mas tambm o fato de que o vu do templo

    ou seja, do santurio que este cobre s se abria em determinadas circunstncias. O mistrio, o tremendum,exige algo que hoje se esquece facilmente estar oculto, de onde nascia o desejo de v-lo descobrir-se.

    O apstolo So Paulo escreve: Hoje vemos como por um espelho, confusamente; mas entoveremos face a face (1Cor 13,12a). Olhar rumo ao leste no s significava olhar para o Senhortransfigurado nos cus e regressando ao fim dos tempos, mas tambm o desejo da ltima manifestao, darevelao da glria futura.

    DCIMA PERGUNTA

    Porm o fato de que nas antigas baslicas romanas o altar e a abside pudessem se encontrar emquaisquer direes uma contradio com a afirmao de que nas origens se rezou sempre voltado para

    o Leste e que conseqentemente as igrejas fossem orientadas. Como se explica?

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    25/35

    25

    Trata-se ou de igrejas construdas sobre materiais de construes que j existiam na antigidade, ou

    das que, devido a condies locais, no permitiam uma exata orientao leste-oeste, o que no impedia quetanto o sacerdote como os fiis se voltassem para o Oriente para a orao e o sacrifcio, como era costumehabitual entre os cristos.

    Assim, por exemplo, a clebre igreja de So Clemente de Roma, que foi edificada sobre antigasconstrues, tem a entrada a sudeste. Esta a razo pela qual o celebrante tem seu lugar atrs do altar.Ademais, celebrar diante dele no seria possvel devido disposio dos espaos. Para olhar para o Oriente

    durante o Santo Sacrifcio suficiente que o sacerdote gire ligeiramente o corpo para essa direo. Omesmo acontece para os fiis situados nas laterais. Em So Clemente se utiliza a nave para a schola. Nelase podem ver dois ambes para a leitura da epstola, o gradual e o evangelho.

    Em seu livro Le rite e lhomme, Louis Bouyer escreve: A idia de que a baslica romana era a formaideal de uma igreja crist, porque permitia uma celebrao onde sacerdotes e fiis estivessem face a face, um completo contra-senso. Seria a ltima coisa na qual teriam pensado nossos antepassados (p. 241).

    De qualquer maneira, como temos visto, a estrita orientao das igrejas, tal como se encontra apartir dos sc. IV e V, no teria sentido, se no houvesse relao com a orientao da orao.

    Para corroborar a opinio segundo a qual o altar propriamente dito (e a cruz que est sobre ele)seria o ponto de referncia para o qual se voltariam os fiis, e que, de forma ideal, deveriam rodear, se cita amaneira de exemplo a expresso do memento dos vivos do cnon da Missa: et omnium circumstantium (ede todos os que circundam este altar). preciso deixar claro, no que diz respeito significao filolgicadesta expresso, que circumstantes designa globalmente as pessoas presentes e no somente aqueles queformam um crculo ao redor de algo. De fato, nos escritos da poca no se conhece nenhum exemplo emque os fiis fizessem um crculo ao redor do altar durante a celebrao da Missa. De qualquer forma noseria possvel, pois naquela poca, como ainda hoje entre os orientais, os leigos no tinham direito a entrarno santurio.

    O respeito no se desenvolve se no onde est animado por atitudes externas e, se necessrio, porproibies destinadas a evitar profanaes. Por exemplo, se um sacristo pode apoiar sem escrpulos umacadeira ou escada sobre o altar para colocar no alto atrs do altar candelabros ou flores, a santidade do altar profanada grosseiramente. Estas atitudes so inimaginveis nas igrejas do Oriente.

    Pelo contrrio, a expresso et omnium circumstantium pode induzir os fiis a tomar uma atituderespeitosa durante a oblao do Santo Sacrifcio, a saber, de ps, cheios de respeito (cf. fig. 9). Porm hojeem dia estas pessoas presentes se transformam facilmente em pessoas sentadas (confortavelmente) emseus assentos, ao que contribui a presena de simples cadeiras nas igrejas, que incitam a nos acomodarmos.Certamente mudar a maneira moderna de ver este aspecto no ser fcil. Porm, no se esquea que aatitude de ps a atitude litrgica por excelncia, que ademais favorece o esprito comunitrio.

    Fig. 9 Baslica de So Marcos, Veneza, mosaico que representa a Missa pela inveno (=encontro) das relquias do santo (sc, XII-XIII).

  • 8/3/2019 Voltados Para o Senhor

    26/35

    26

    DCIMA PRIMEIRA PERGUNTA

    Tudo isto muito bonito, mas no necessrio contar que o homem moderno incapaz de compreenderque seja necessrio voltar-se para o oriente para rezar? O sol nascente no tem para o homem atual afora simblica que tinha para o homem da antigidade e que ainda hoje tem para os mediterrneos,que recebem o sol com mais intensidade que os homens do norte. Para os cristos de hoje o que

    importante a comunho da mesa eucarstica.

    Se o homem moderno no presta grande ateno direo exata em que reza o que continuam afazer os muulmanos que se voltam para Meca e os judeus que se orientam para Jerusalm deveria semdvida compreender o significado que reveste o fato de que o sacerdote e a assemblia rezem juntamentena mesma direo. De qualquer forma, o costume de que todos os presentes estejam orientados, todos

    juntos, para o Senhor, atemporal e tem, mesmo hoje, todo o seu sentido. Junto ao aspecto teolgico do face a face do sacerdote e da assemblia durante a celebrao do

    sacrifcio eucarstico, convm evocar aqui igualmente os problemas de ordem sociolgica, que foram postosem evidncia na comunidade da mesa eucarstica.

    O professor W. Siebel, no opsculo entitulado Liturgie als Angebot (A liturgia venda?), pensa queo sacerdote voltado para o povo se pode considerar como o smbolo mais perfeito do novo esprito da liturgia.E acrescenta: o costume em uso at h pouco fazia o sacerdote parecer chefe e representante da comunidade, que fala

    a Deus em nome dela, como Moiss no Sinai: a comunidade dirige uma mensagem a Deus (orao, adorao, sacrifcio)e o sacerdote, como chefe, transmite esta mensagem e Deus a recebe.

    Com a prtica moderna, continua Siebel, o sacerdote olhando para o povo praticamente j noaparece como representante da comunidade, mas apenas como um ator que, em todo caso na parte central da Missa,representa o papel de Deus, um pouco como em Oberammergau ou outras representaes da Paixo. E conclui:todavia se nessa nova maneira o sacerdote se converte num ator, encarregado de interpretar Cristo em seu cenrio,ento Cristo e o sacerdote parecem, por causa desta restituio teatral da ceia, identificar-se um com o outro demaneira um tanto inaceitvel.

    Siebel explica assim a boa vontade com a qual quase todos os sacerdotes adotaram a celebraoversus populum: a desorientao considervel e a solido dos sacerdotes fez-lhes buscar novos motivos onde apoiarseu comportamento. Entre estes o suporte emocional, a comunidade reunida diante do sacerdote e que o procura.

    Porm imediatamente brota da uma nova dependncia: a do ator diante do seu pblico.O mesmo, K. G. Rey declara em seu estudo Puberttserscheinungen in der katholischen Kirche

    (Manifestaes pberes25 na Igreja catlica): at ento o sacerdote oferecia o sacrifcio como intermedirioannimo, como cabea da comunidade, voltado para Deus e no para o povo, em nome de todos e comtodos; as oraes que recitava lhes eram prescritas... hoje em dia este sacerdote vem ao nosso encontrocomo um homem, com suas particularidades humanas, seu estilo de vida pessoal e seu olhar voltado parans. Para muitos sacerdote uma tentao, contra a qual no so capazes de lutar, a de vender sua prpriapersonalidade. Alguns sabem, com maior ou menor astcia, explorar a situao em seu proveito. Suasatitudes, sua mmica, seus gestos, todo o seu comportamento atrai os olhares sobre eles por suas repetidasobservaes, diretivas e tambm pelas suas palavras de acolhida ou de despedida... O xito que assimconseguem constitui para eles a medida de seus poderes e conseqentemente a norma de sua segurana.

    Em sua obra Liturgie als Angebot, Siebel declara todavia, a propsito do desejo de Klauser citadomais acima, de ver mais claramente expressada a comunidade da mesa eucarstica pela celebrao versus

    populum: A reunio da assemblia ao redor da mesa da Ceia (desejada por Klauser) apenas pode contribuir parareforar a conscincia comunitria. Com efeito, somente o celebrante se encontra diante da mesa e, alm disso, de p.Os outros participantes do gape esto sentados mais ou menos longe na sala do espetculo .

    Ainda mais, segundo Siebel: Como regra geral, a mesa est posta longe dos fiis, sobre um estrado, demaneira que no possvel fazer reviver os estreitos laos que existiam na sala onde ocorreu a Ceia. O sacerdote queinterpreta seu papel voltado para o povo dificilmente consegue deixar de dar a impresso de representar um

    personagem que, com toda cortesia, tem alguma coisa a nos propor. Para diminuir esta impresso cuidou-se