upps e educação – possíveis impactos da implantação das

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇAO EM EDUCAÇÃO UPPs e educação possíveis impactos da implantação das Unidades de Polícia Pacificadora na segregação escolar Karina Riehl de Souza Almeida Rio de Janeiro Setembro/2014

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Page 1: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇAO EM EDUCAÇÃO

UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

Unidades de Polícia Pacificadora na segregação escolar

Karina Riehl de Souza Almeida

Rio de Janeiro

Setembro/2014

Page 2: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

Karina Riehl de Souza Almeida

UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

Unidades de Polícia Pacificadora na segregação escolar

Dissertação de Mestrado apresentada ao

Programa de Pós-Graduação em

Educação, como requisito parcial para a

obtenção do título de Mestre em

Educação da Universidade Federal do

Rio de Janeiro.

Orientador: Profº Drº Marcio da Costa

Rio de Janeiro

Setembro/2014

Page 3: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

AGRADECIMENTOS

A minha formação acadêmica e a realização deste mestrado foi possível porque

tive a companhia e ajuda de muitas pessoas. Agradeço aos meus pais e meu irmão por

me apoiarem e acreditarem em mim mais do que eu mesma, obrigada!

Ao meu namorado, Erikson Santos, agradeço por dividir comigo as alegrias e

também as tristezas do caminho. Obrigada pelos incentivos diários, sem eles eu nunca

teria chegado até aqui.

Agradeço ao meu orientador, Prof°. Drº. Marcio da Costa, por aceitar meu

ingresso no grupo de pesquisa em 2007, possibilitando que minha formação acadêmica

se tornasse mais enriquecedora e científica.

Agradeço a Profª. Drª. Mariane Koslinski, o Profº. Drº. Rodrigo Rosistolato e a

Profª. Drª. Ana Prado pelas ajudas e orientações. Obrigado por me acolherem e

permitirem trabalhar com vocês.

Não poderia deixar de agradecer aos integrantes do grupo de pesquisa pelas

oportunidades de aprendizagem em diversos momentos, vocês foram fundamentais na

minha formação. Agradeço em especial a: Iris Medeiros, Mayara Tavares, Fabiano

Cabral, Clotilde Saavedra, Felipe Lopes, Robert Segal e Karina Carrasqueira.

Ao amigo André Regis agradeço pela amizade, conversas, esclarecimentos de

dúvidas e incentivos.

Agradeço em espacial a Eduardo Ribeiro, que além da ajuda com a elaboração

dos bancos de dados, transmitiu seus ensinamentos, esclarecendo dúvidas e oferecendo

sugestões e soluções para os problemas encontrados. Obrigada pela paciência e

amizade.

Não poderia esquecer de agradecer, e muito, à amiga Amanda Moreira.

Continuo afirmando que por mais que as diferenças entre nós sejam cada vez mais

visíveis, mais nos tornamos amigas e parceiras, nos respeitando e nos dando muito bem!

Obrigada pelas conversas, pelos conselhos, pelo apoio, carinho e incentivo constante.

Definitivamente, ter você como companhia no mestrado foi fundamental.

Esta dissertação representa do encerramento importante de uma etapa da minha

vida e algumas pessoas foram fundamentais nessa trajetória, não só no âmbito

acadêmico, mas também fora dele, pois, sempre me dedicaram apoio, carinho, amizade

e inspiração. Meu sincero obrigada por estarem sempre ao meu lado.

Page 4: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

Agradeço à Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, pelo acesso aos

dados que permitiram esse trabalho e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de

Nível Superior (CAPES) pelos dois anos de bolsa científica.

Page 5: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

A injustiça vem do asfalto pra favela

Há discriminação à vera

Chegam em cartão postal

Em outdoor a burguesia nos revela

Que o pobre da favela tem instinto marginal

E o meu povo quando desce pro trabalho

Pede a Deus que o proteja

Dessa gente ilegal, doutor

Que nos maltrata e que finge não saber

Que a guerra na favela é um problema social

Eu não sou marginal

(Igualdade - Moleque Dolores)

Page 6: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

6

LISTA DE SIGLAS E ABREVIAÇÕES

LaPOpE Laboratório de Pesquisa sobre Oportunidades Educacionais

CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CNPQ Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

FAPERJ Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro.

UPP Unidade de Polícia Pacificadora

SERFHA Serviço Especial de Recuperação das Favelas e Habitações Anti-Higiênicas

COHAB-GB Cooperativa de Habitação Popular do Estado da Guanabara

CODESCO Companhia de Desenvolvimento de Comunidades

AI-5 Ato Institucional Número Cinco

SMDS Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social

Unicef Fundo das Nações Unidas para a Infância

Proface

Programa de Favelas da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de

Janeiro

CEDAE Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro

Comlurb Companhia Municipal de Limpeza Urbana

PDDCRJ Plano Diretor da Cidade do Rio de Janeiro

ACRJ Associação Comercial do Rio de Janeiro

FIRJAN Federação das Indústrias

PECRJ Plano Estratégico da Cidade do Rio de Janeiro

GEAP Grupo Executivo de Assentamento Populares

BID Banco Interamericano de Desenvolvimento

PAC Programa de Aceleração do Crescimento

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

BOPE Batalhão de Operações Policiais Especiais

BPChoque Batalhão de Polícia de Choque

CPA Comandos de Policiamento de Áreas

PPC Posto de Policiamento Comunitário

DPO Destacamento de Policiamento Ostensivo

GAPE Grupamento de Aplicação Prático Escolar

DETRANRJ Departamento de Trânsito do Estado do Rio de Janeiro

FAETEC Fundação de Amparo à Escola Técnica

CCDCS Centro Comunitário de Defesa da Cidadania

ONG Organizações Não Governamentais

GPAE Policiamento em Áreas Especiais

IDEB Índice de Desenvolvimento da Educação Básica

PBP Prova Brasil Padronizada

SME Secretaria Municipal de Educação

NIS Número de Inscrição Social

CEP Código de Endereçamento Postal

GS Segregation Index/ Gorard Segregation

SR Segregation Ratio

Page 7: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

7

CNEFE Banco de Cadastro Nacional de Endereços para Fins Estatísticos

LAT Latitude

LONG Longitude

GE Google Earth

PEJA Projeto de Educação de Jovens e Adultos

Page 8: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

8

LISTA DE GRÁFICOS, TABELAS, FLUXOGRAMA E MAPAS

Gráfico 1: Taxas de Homicídio (por 100mil) na população total no Estado e Capital

(1989 à 2007)

Gráfico 2: Crescimento populacional cidade/ favela (1991 – 2011)

Gráfico 3 : Perfil dos alunos com informação na variável “escolaridade materna” –

2008 a 2012

Gráfico 4: Perfil dos alunos com informação na variável “Cor” – 2008 a 2012

Gráfico 5: Distribuição da amostra bairro e favela

Gráfico 6: Desvio-padrão da Prova Brasil Padronizada (0 a 10) 5º e 9º ano, segundo a

distância escola-favela, 2005 a 2011

Gráfico 7: Média da Prova Brasil Padronizada no 5° ano

Gráfico 8: Média da Prova Brasil Padronizada no 9° ano

Gráfico 9: Média da Prova Rio de Língua Portuguesa - 3° ano

Gráfico 10: Média da Prova Rio de Matemática - 3° ano

Gráfico 11: Média da Prova Rio de Língua Portuguesa - 7° ano

Gráfico 12: Média da Prova Rio de Matemática - 7° ano

Gráfico 13: Percentual de alunos que tem NIS

Gráfico 14: Percentual de alunos de cor branca, preta e parda – Escolas até 100m de

favela(s)

Gráfico 15: Percentual de alunos de cor branca, preta e parda – Escolas a mais de

100m de favela(s)

Gráfico 16: Percentual de escolaridade materna baixa

Gráfico 17: Percentual de alunos que moram em favela

Gráfico 18: Percentual de alunos que moram em favela ou não- Escola 128

Gráfico 19: Percentual de alunos que moram em favela ou não – Escola 118

Gráfico 20: Percentual de alunos que moram em favela ou não – Escola 126

Gráfico 21: Índice de Segregação 2008 à 2012

Gráfico 22: Índices de Segregação no 1° segmento

Gráfico 23: Porcentagem dos alunos que levam até 30 minutos no deslocamento casa-

escola - 1°segmento

Gráfico 24: Porcentagem dos alunos que levam até 30 minutos no deslocamento casa-

escola- 2°segmento

Page 9: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

9

Gráfico 25: Regressão logística para chance (%) de matrícula em escola com baixo SR

em 2008 (todas as escolas)

Gráfico 26 : Regressão logística para chance (%) de matrícula em escola com baixo

SR em 2008 (escolas com SR mais alto ou mais baixo)

Tabela 1: Ordenamento por taxa de homicídios na população total

Tabela 2: Quantidade alunos nas escolas e nas turmas

Tabela 3: Percentual de missing – variável “escolaridade materna”

Tabela 4: Percentual de missing dos dados – variável “cor”

Tabela 5: Quantidade de escolas municipais por segmento – 2012.

Tabela 6: Quantidade de escolas a mais de 100m de favela(s) –2012

Tabela 7: Quantidade de escolas até 100m de favela(s) –2012

Tabela 8: Percentual de missing referente à variável estudada

MAPA 1 – Distribuição das favelas na cidade do Rio de Janeiro

MAPA 2– Implementação das UPPs

MAPA 3 – Localização das escolas na Grande Tijuca

MAPA 4 – Região da Grande Tijuca

Fluxograma 1: Processos de geocodificação

Page 10: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

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RESUMO

ALMEIDA, K. R. S. UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

Unidades de Polícia Pacificadora na segregação escolar. 2014. Dissertação (Mestrado

em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do

Rio de Janeiro, 2014.

A proposta desta dissertação é investigar implicações que a nova política de

segurança pública do Governo do Estado do Rio de Janeiro pode ter no aspecto das

oportunidades escolares e da composição discente das escolas municipais de uma região

da cidade. Atrelando a discussão sobre a organização social do território carioca à nova

política de segurança do Estado, e como essas impactam o sistema público educacional,

a questão a ser respondida nesse estudo é: houve mudança na composição

socioeconômica do alunado das escolas a partir da implantação das UPPs?

O objetivo é observar possíveis mudanças de padrão quanto à alocação de alunos

nas escolas públicas municipais, associada à implantação das Unidades de Polícia

Pacificadora - UPPs. A hipótese é que a implantação das UPPs pode impactar a

composição socioeconômica das escolas e que, assim, as escolas tenderiam a ter seu

corpo discente mais heterogêneo. Os alunos residentes em áreas de favelas passariam a

ter maior acesso às escolas localizadas fora das favelas e/ou das áreas que sofriam

domínio dos traficantes de drogas ou milicianos, seja pela redução em processos de

estigmatização, seja pelo aumento na mobilidade dos residentes em áreas antes

controladas pelo crime organizado.

A metodologia adotada implica no tratamento de dados em grande escala,

incluindo o georreferenciamento residencial de uma amostra de alunos, e conta,

predominantemente, com estatística descritiva como recurso para análise dos dados. Foi

escolhida uma série histórica cobrindo o ano de 2008 ao ano de 2012. A região

pesquisada é a Grande Tijuca, na zona norte da cidade. Todas as escolas dessa região

que atendam o 1° 5° 6° e 9° ano, fazem parte da amostra do estudo.

As análises sugerem um efeito discreto, na direção prevista, mas considerem-se

as inúmeras limitações técnicas devidas ao caráter recente do Programa em foco e a

tratar-se de um estudo ainda exploratório, demandando desenhos mais robustos para

afirmação e, sobretudo, maior maturação da experiência de forma a proporcionar maior

segurança na afirmação de resultados.

Palavras-chave: segregação territorial; Unidade de Policia Pacificadora; UPP;

composição social; oportunidades educacionais.

Page 11: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

11

ABSTRACT

ALMEIDA, K. R. S. UPPs and education – possible impacts of the implementation of

the Police Pacification Units in school segregation. 2014. Dissertation (Master of

Education) – Postgraduate Program in Education, Federal University of Rio de Janeiro,

2014.

The proposal of this dissertation is to investigate the implication the new policy

of public security of Rio de Janeiro government can have on the aspects of the scholar

opportunities and about the municipal public schools students composition. Tying the

discussion about the social organization of the city territory to the state new public

security policy and how it impacts in the educational public system, the question to be

answered through this study is: has there been any change in the students

socioeconomic composition from the UPPs deployment?

The objective is to observe possible changes in the municipal public schools

students allocation standard, associated to the Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs)

deployment. The hypothesis is that the UPPs deployment can impact in the

socioeconomic schools composition and, so, the schools would have the trend to have

its student composition more heterogeneous. The students who live in slam areas would

start to have more access to schools out of the slams and/or to schools which were one

day under the dealers or “milicianos”’ domain, or by the reduction in the process of

stigmatization, or by the dwellers mobility increase in areas controlled by the organized

crime before.

The methodology adopted implies on the data treatment in large scale, including

the residential georeferencing of a sample of students and counts on a descriptive

treatment predominantly as a resource for the data analysis. A historical series from

2008 to 2012 was chosen. The region researched is Grande Tijuca, in the north area of

the city. All the schools in this region which have classes of 1st, 5

th, 6

th and 9

th series

take part in this sample of the study.

The analysis suggests a discrete effect in the forecasted direction but several

technical limitations are to be considered due to the recent character of the Program in

focus and of being a still exploratory study, demanding more robust draws for statement

and especially more maturation of the experiment so that to offer more assurance in the

results statements.

Key words: racial segregation; Unidade de Polícia Pacificadora; UPP; Social

composition; educational oportunities

Page 12: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

12

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

O presente estudo se propõe a investigar as implicações potenciais que a política

recente de segurança pública do Governo do Estado do Rio de Janeiro pode ter em um

aspecto da segregação social. Mais especificamente, este trabalho pretende analisar o

aspecto da segregação que abrange as oportunidades escolares e a composição

socioeconômica das escolas de uma determinada região da cidade.

Esta dissertação é oriunda de projeto de pesquisa desenvolvido pelo Laboratório

de Pesquisa em Oportunidades Educacionais - LaPOpE, que investiga como os aspectos

das desigualdades sociais se relacionam com a estrutura de distribuição de

oportunidades educacionais, analisando os processos de distribuição de alunos com

diversos perfis socioeconômicos e educacionais entre as escolas públicas da rede

municipal da cidade do Rio de Janeiro. O projeto é financiado pela Coordenação de

Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, pelo Conselho Nacional de

Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPQ e pela Fundação de Amparo à

Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro – FAPERJ, e está incluso no âmbito do

“Observatório Educação e Cidade: desigualdades de oportunidades educacionais e

dimensões da alfabetização básica no Estado do Rio de Janeiro”.

Nos estudos da Sociologia da Educação e da Sociologia Urbana, as

desigualdades de oportunidades escolares atreladas à organização social do território

têm se mostrado um importante objeto de estudo1, uma vez que o capital econômico,

social e cultural dos alunos tem influência reconhecida sobre oportunidades, trajetórias e

desempenhos escolares. A localização espacial, ou seja, o território em que residem e/ou

estudam os alunos, vem ganhando destaque por apresentar características que impactam

direta ou indiretamente suas vidas escolares2.

Atrelado ao fator da organização social do território e com as iniciativas de

novas políticas de segurança, buscamos compreender, em parte, como essa relação pode

interferir na composição do corpo discente das instituições escolares. Em 2008, o

Governo do Estado do Rio de Janeiro, através de sua Secretaria de Segurança Pública,

propôs um novo modelo de segurança e policiamento, nomeado de Unidade de Polícia

1 As pesquisas pioneiras realizadas por professores do departamento de Sociologia da Universidade de

Chicago nos anos de 1920 constituiu o que, hoje é conhecido como “Escola de Chicago”. Os estudos

tinham abordagens microssociológicas e etnográficas e tinham a cidade de Chicago como objeto de

exploração (HEINRICH, 2006). 2 Ver estudos Ribeiro e Koslinski (2009); Costa e Nogueira (2009); Koslinski, Lasmar e Alves (2012);

Koslinski e Alves (2012); Costa e Koslinski (2011; 2012)

Page 13: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

13

Pacificadora - UPP. A proposta é a ocupação permanente das favelas com uma unidade

policial, desenvolvendo uma estratégia de aproximação entre a população e a polícia, a

inclusão de políticas sociais, retomada dos direitos e acessos a serviços e a incorporação

das favelas e dos seus moradores como parte pertencente à cidade (FLEURY, 2012).

Muito tem se discutido na mídia3 sobre a temática de retomada da segurança e os

benefícios econômicos que o projeto das UPPs trouxe à capital fluminense (CANO et

al, 2012). A implementação das UPPs não tem, declaradamente, por objetivo acabar

com o tráfico de drogas nas favelas ocupadas4. As metas e os impactos almejados pelo

Governo do Estado são a retomada de territórios antes dominados por facções

criminosas, a redução dos conflitos e disputas armadas por pontos de venda drogas entre

facções diferentes, assim como a diminuição da violência e número de mortes devido às

incursões e operações policiais pontuais. Supõe-se, também, a integração das favelas à

cidade formal, com a entrada e a expansão dos serviços públicos e da iniciativa privada,

a formalização das atividades econômicas e dos serviços, assim como o direito de ir e

vir dos moradores.

Os estudos que abordam a cidade do Rio de Janeiro nessa temática, apontam que

os traços característicos da organização social e urbana da cidade configuram uma

organização territorial chamada de “modelo carioca de segregação social”, que se

caracteriza por apresentar combinação entre distância social com a significativa

proximidade geográfica das diferentes camadas sociais (RIBEIRO; KOSLINSKI, 2009;

ALVES et al, 2008).

A presença das favelas distribuídas pela cidade é a expressão mais visível desse

modelo carioca de separação entre a favela e a cidade, com uma perceptível distância

material e simbólica. Nessa perspectiva Ribeiro e Koslinski (2009) argumentam que se

por um lado a presença das favelas nos bairros abastados aproxima os grupos, classes

sociais e os bens urbanos no território, por outro, hierarquizam suas práticas de

interações e filtra o acesso aos bens urbanos através de mecanismos políticos,

institucionais e simbólicos que separam favela e cidade. Deste modo, na cidade do Rio

3http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,prisao-de-nem-e-maior-cartada-em-pacificacao-diz-wall-

street-journal,797431,0.htm Acessado 26/06/2013

http://oglobo.globo.com/rio/segundo-pesquisa-de-percepcao-do-rio-como-vamos-sensacao-de-seguranca-

aumenta-entre-cariocas-2787839 Acessado 26/06/2013

http://www.conversaafiada.com.br/economia/2010/12/19/%E2%80%9Cbancos-privados-tambem-sobem-

os-morros-com-upps%E2%80%9D/ Acessado 26/06/2013 4http://www.upprj.com/index.php/faq Acessado 26/06/2013

http://noticias.terra.com.br/brasil/policia/acabar-com-o-trafico-de-drogas-e-uma-utopia-diz-

beltrame,e55b169a8c59b310VgnVCM20000099cceb0aRCRD.html Acessado 26/06/2013

Page 14: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

14

de Janeiro como outras cidades do Brasil e do mundo, é possível observar uma relação

diferenciada entre o espaço urbano – cidade vs favela – e o espaço social, “havendo

defasagem entre a estrutura urbana e a hierarquia social” (ALVES et al, 2010, pág. 68).

No âmbito educacional, a rede de ensino público proporciona acesso

diferenciado aos alunos, tornando o território um condicionante das oportunidades

educacionais. Tendencialmente, os “mais pobres frequentam as piores escolas, o que

geralmente é determinado pela localização do domicílio e do próprio estabelecimento de

ensino” (ALVES, et al, 2010, pág. 68). Segundo Burgos (2009) o prestígio das escolas é

muitas vezes determinado pela localização da residência do aluno e/ou do próprio lugar

de instalação do estabelecimento escolar.

A segregação territorial pode diferenciar as escolas, funcionários e alunos,

impondo limites no que tange ao trabalho pedagógico e ao processo de socialização.

Burgos (2009)5 argumenta que a instituição escolar tende a ter como principal público

os moradores do bairro/região em que está localizada, portanto, sendo os moradores

isolados socialmente, simbolicamente e territorialmente, a escola pode vir a funcionar

sob o princípio organizacional, pedagógico e institucional de encapsulamento, o que

corroboraria a distância social e a reprodução da situação de segregação territorial já

existente na cidade. Isso, que poderia ser associado com uma espécie de tracking6

informal, reforçando as desigualdades já existentes, uma vez que aqueles que têm

prejuízos quanto às características de origem são agrupados em estabelecimentos

igualmente deficientes, o que leva a uma “baixa heterogeneidade social na composição

social das escolas” (BURGOS, 2009, pág. 68).

Atrelando a discussão sobre a organização social do território carioca à nova

política de segurança do Estado e como essas impactam o sistema educacional, mais

especificamente a rede pública de ensino, uma questão foi formulada para o

desenvolvimento desse estudo: houve mudança na composição socioeconômica e

espacial do alunado das escolas a partir da implantação das UPPs?

O objetivo da dissertação é observar as possíveis mudanças de padrão quanto às

oportunidades de alocação de alunos nas escolas públicas municipais, associadas à nova

política de segurança proposta pelo governo do Estado.

5 A cidade do Rio de Janeiro existe livre acesso as escolas ou ausência de barreiras geográficas. 6 Tracking é a separação dos alunos, em geral bastante precoce, direcionando-os a currículos e trajetórias

bastante diferenciados, em geral de corte profissional ou acadêmico. Ainda que o critério de distinção

para encaminhamento a um tracking seja, em geral, referido ao desempenho acadêmico, essa não é a

única forma.

Page 15: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

15

O presente estudo parte do pressuposto de que a implementação das UPPs pode

impactar a composição socioeconômica e espacial das escolas. Isso é, com a execução

do novo modelo de segurança, as escolas tenderiam a ter o seu corpo discente mais

heterogêneo. Já que, os alunos residentes de áreas de favela, provavelmente, passariam a

ter acesso às escolas localizadas fora das favelas e/ou das áreas que sofrem domínio dos

traficantes de drogas ou milicianos. Haveria, também, mudança no comportamento das

gestões escolares quanto ao estereótipo dos alunos favelados, pela redução da

associação imediata à violência e ao tráfico de drogas.

Podemos supor que antes da presença das UPPs, alunos moradores de favela

eram concentrados em determinadas escolas sob a justificativa de que a violência e as

“normas” impostas pelos grupos que controlavam o território dificultavam a mobilidade

para outras escolas e por isso ocorreria a concentração de determinados alunos em

estabelecimentos de ensino específicos.

Almeida e Borges (2005) informam que o tráfico de drogas na cidade do Rio de

Janeiro estava cada vez mais presente nos estabelecimentos de ensino e que a rivalidade

entre as facções criminosas da cidade estava mais presente nos pátios e arredores das

escolas7. Em outro estudo Ribeiro (2009) faz um comparativo sobre a relação entre

escola e favela nos anos de 1950 e nos anos 2000, relata que nos dois momentos

estudados as representações feitas pelos professores sobre a favela e seus moradores são

análogas quanto a um lugar que predominava e predomina a pobreza, promiscuidade,

violência e desestruturação familiar. Entretanto, nos anos 2000 a autora ressalta que a

percepção dos professores sobre violência é mais acentuada nas favelas em que há

tráfico de drogas, o que ocasiona uma “ideia de que a violência presente nesses locais

traria implicações sobre postura dos alunos” (Idem, pág.207).

Entretanto, com a retomada do território por parte da força policial e depois com

o policiamento ostensivo e permanente, o Estado retorna ao território onde já não mais

se fazia presente, ampliando a livre circulação de pessoas. Poderíamos supor que com a

implementação das UPPs os alunos moradores de favelas passariam a ter maiores

chances de escolherem e de acessarem as vagas em diferentes escolas distribuídas pelo

território carioca. Por outro lado, com a retomada do território por parte do Estado

algumas escolas menos “acessíveis” passariam a “permitir” o acesso dos alunos

7 Os autores relatam uma situação que ocorreu com um adolescente de 14 anos, que por causa de um boné

vermelho – a cor da facção rival – foi espancado em frente à escola. O aluno foi identificado como

morador de uma favela dominada pela facção criminosa rival.

Page 16: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

16

moradores de favelas, já que estes não estariam mais atrelados à imagem do traficante

e/ou da violência.

Há, ainda, a possibilidade de que a redução do poder do tráfico armado tenha

diluído o fenômeno da identificação de algumas escolas com as facções que detinham

controle sobre os territórios em que se situam, o que pode proporcionar alguma mistura

entre alunos de favelas sob controle de diferentes facções.

Essas são possibilidades analíticas, mas é forçoso reconhecer que ao menos um

efeito em sentido oposto também pode ocorrer: não mais submetidos a um cotidiano de

muita violência e poder do crime organizado, estudantes passariam a não ter mais razões

para buscar escolas fora de suas áreas de residência. É possível que ambos os

movimentos ocorram, mas nesse trabalho, dadas as limitações do alcance e do tempo

disponível, essa hipótese não pode ser testada, ainda que haja informações para que um

modelo analítico específico para esse fim venha a ser montado (RIBEIRO, tese em

andamento).

Nesta dissertação a metodologia adotada implica no tratamento de dados

referentes ao alunado de uma região da cidade e contará com descrições gerais como

recurso para tentar detectar as possíveis alterações no quadro das escolas em foco.

Como a intenção é observar os possíveis impactos que a implementação das UPPs teve

sobre o público escolar, foi escolhida uma série histórica cobrindo o ano de 2008 ao ano

de 2012. A região pesquisada será a Grande Tijuca8, na zona norte da cidade. Todas as

escolas dessa região que atendam o 1° 5° 6° e 9° ano, farão parte da amostra do estudo.

A escolha dessas séries se deu por força de limitações operacionais no geocodificação

dos estudantes. É inevitável a escolha de uma amostra de alunos, de forma a evitar o

esforço de geocodificação de todos os estudantes. As séries iniciais e finais de cada

segmento foram escolhidas por permitirem observarmos alunos de idades bem

diferentes – o que implica em autonomia de deslocamento diferente – com trajetórias

escolares distintas – por conta das diferenças de probabilidade para atraso escolar.

8 Os bairros que integram a área da Grande Tijuca são: Praça da Bandeira, Tijuca, Alto da Boa Vista,

Maracanã, Vila Isabel, Grajaú e Andaraí.

Page 17: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

17

1. AS FAVELAS DO RIO DE JANEIRO

Nesse capítulo propomos apresentar e discutir um pouco do cenário das favelas

cariocas. De uma maneira geral, o foco é expor como o termo favela foi introduzindo no

vocabulário social para determinar um espaço da cidade; como ocorreram as principais

intervenções político-administrativas nesses espaços ao longo das décadas; e como as

favelas tornaram-se referências de espaços socialmente violentos e empobrecidos;

sempre buscando um panorama com o lugar que a educação ocupou em cada momento.

Uma característica peculiar da cidade do Rio de Janeiro é que, durante a constituição

de uma grande cidade, no processo de organização dos espaços residenciais, não

ocorreu o isolamento espacial dos grupos e das classes sociais. Nos Estados Unidos, o

“modelo clássico” de separação residencial e social é caracterizado por subúrbios

abastados e “inner-cities” empobrecidas e bastante violentas. Já em algumas metrópoles

europeias a ocupação dos setores mais centrais é feita por camadas médias e grupos

abastados, em contraste com os subúrbios que são ocupados pelas camadas mais pobres

da sociedade (ALVES et al, 2008).

Entretanto, no Rio de Janeiro, no interior dos espaços dominados pelas classes mais

abastadas, há a presença das favelas, o que determina a proximidade geográfica de

diferentes classes sociais, mas não determina que ocorra uma aproximação social. Isso

é, ocorre geograficamente uma aproximação das classes sociais, fazendo com que exista

convívio social em diversas relações, principalmente as trabalhistas, todavia conserva-se

uma distância social entre as classes.

Podemos verificar a partir do Mapa 1 como as favelas estão distribuídas por todos

os bairros cariocas, mesmo nos bairros onde se concentram as classes mais abastadas da

população.

Page 18: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

18

MAPA 1 – Distribuição das favelas na cidade do Rio de Janeiro

Legenda: Limite do Município do Rio de Janeiro; Limite dos Bairros; Limite das Favelas.

O surgimento das favelas é parte do processo de expansão das grandes cidades

metropolitanas e de seu entorno. Lago (2000) associa o aparecimento das favelas por

todo tecido metropolitano do Rio de Janeiro à dinâmica imobiliária, à crise do mercado

formal de trabalho e à mobilidade residencial no espaço urbano, já que as favelas, os

loteamentos irregulares e os outros tipos de assentamentos nas áreas abastadas da cidade

são alternativas que se apresentam para a população de baixa renda como oportunidades

de acesso a mercados e a serviços públicos. A presença das favelas nessas áreas da

cidade é vantajosa tanto para os moradores desses espaços, pois permite que eles

tenham acesso aos equipamentos e serviços urbanos (ALVES et al, 2008), quanto para

os moradores dos condomínios e casas abastadas, já que esses passam a ter acesso a

mão de obra mais barata. Tais análises podem ser contrapostas a outras, que não se

aferrem a uma suposta racionalidade econômica da alternativa favela, mas interpreta tal

processo sob perspectiva sociológica, buscando atores, suas articulações, seus jogos

políticos, estratégias, redes de alianças. O slogan consagrado em determinadas

abordagens: “favela não é problema, é solução9” em alguma medida, se esquiva de

discutir a imensa expansão da área e da população favelada em cidades brasileiras sob a

9 Essa frase é usualmente atribuída a Darcy Ribeiro, como vice-governador do Rio de Janeiro, mas não

conseguimos atestar a veracidade dessa informação. (http://www.sonoticias.com.br/coluna/estado-

incompetente ; http://inutilopiniao.blogspot.com.br/2010/05/favela-nao-e-problema-e-solucao.html ;

http://veja.abril.com.br/170310/engolidos-pela-favela-p-094.shtml)

Page 19: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

19

influência de populismos que tiveram espaço no país com a redemocratização dos anos

80.

Assim, alegasse que a expansão das favelas no Rio de Janeiro aconteceu com a

redemocratização, quando políticos, como Leonel Brizola, legalizaram as ocupações de

áreas indevidas, criando um programa em que repassava os lotes irregulares a valores

simbólicos, tornando os moradores em proprietários definitivos e com direitos legais

(CAVALLIERI, apud BURGOS, 2006). Burgos (2006) apresenta que no primeiro

governo de Leonel Brizola, em 1983 à 1987, foi desenvolvida uma agenda social

especialmente voltada para as favelas do Rio de Janeiro. Foi nesse período que houve

uma maior expansão das favelas na cidade, uma vez que como o ingresso da polícia nas

favelas foi proibido pelo governo do Estado, ficou mais difícil conter e proibir as

invasões e ocupações de áreas indevidas.

1.1 As intervenções urbanísticas nas favelas cariocas

A definição utilizada por urbanistas para “favela” é a mesma empregada para

"aglomerado subnormal"10

, tratando-se de um conjunto constituído por, no mínimo,

cinquenta e uma unidades habitacionais (barracos, casas de alvenaria), ocupando ou

tendo ocupado, até período recente, terreno de propriedade alheia (pública ou

particular), dispostas, em geral, de forma desordenada e densa, tendo sua urbanização

disposta fora dos padrões vigentes (com vias de circulação estreitas e de alinhamento

irregular), e carentes, em sua maioria, de serviços públicos e essenciais (água, esgoto,

iluminação, etc.). Entretanto, favela é uma categoria polissêmica que agrega diversos

tipos de habitação, mesmo aquelas que têm saneamento básico e são legalmente

estabelecidas. Outras são reconhecidas mesmo quando sua estrutura é num prédio11

.

Sagmacs (1960) (apud VALLADARES, 2000) explica que a palavra “favela”

tem seu uso e popularização no Rio de Janeiro a partir da Guerra de Canudos (1896 à

1897). Na cidade baiana de Canudos havia um monte com esse nome, assim, um morro

localizado na zona central da cidade do Rio de Janeiro, recebeu esse nome e passou a

ser habitado por sobreviventes dessa mesma guerra.

10

O IBGE e os urbanistas definem “favela” como “aglomerado subnormal”, prefiro utilizar o termo

“favela”, por julgá-lo menos pejorativo. Mas, “aglomerado subnormal” pode ser também utilizado para

nomear loteamentos, conjuntos habitacionais, além das favelas, como são tipicamente conhecidos alguns

espaços cariocas. 11

Exemplo são as favelas do Amarelinho localizada em Acari, e a favela Alto Simão em Vila Isabel.

Page 20: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

20

No modelo carioca, as favelas têm sua localização, predominantemente, em

morros. Todavia, existem muitas favelas em áreas planas, em sua maioria localizadas na

Zona Oeste da cidade. As habitações típicas são de madeira ou alvenaria, dispondo de

infraestrutura e serviços deficientes, como características principais. Desde seu

surgimento nas paisagens cariocas as favelas foram problematizadas, entretanto,

ganharam maior destaque a partir dos anos de 1930 quando passaram a ser questionadas

por médicos, jornalistas, arquitetos e engenheiros como um espaço de proliferação de

doenças e epidemias e, principalmente, como “uma patologia social que precisava ser

combatida” (VALLADARES, 2000, pág.14). A partir desse momento, as favelas se

transformaram em objeto de análises e espaço de intervenções.

Em 1937 o Código de Obras da prefeitura carioca previa a eliminação das

favelas existentes e o embargo de construções de novas favelas. No início da década de

1940 o modelo do projeto de retirada das favelas das paisagens cariocas ganhou novos

ares, o objetivo era transferir sua população para alojamentos temporários, enquanto se

construiriam nos locais das favelas as casas definitivas, de alvenaria, para a população

que lá já morava. “Foram destruídas quatro favelas, sendo 8.000 pessoas transferidas

para Parques Proletários. [...] Anos mais tarde esses Parques Proletários passaram a ser

considerados favelas” (VALLADARES, 1980, pág. 23).

A divulgação dos problemas das favelas pelo poder público e pela mídia não se

deu por uma demanda dos moradores desses espaços, mas sim, pelo incomodo que as

favelas causavam ao cenário urbano da cidade. Por isso, a demanda pela criação do

programa dos Parques Proletários, que tinha como um dos objetivos principais a

resolução dos problemas das condições insalubres desses espaços, além de permitir a

expansão de novas áreas urbana na cidade (BURGOS, 2006).

Em 1946 com um acordo entre a Prefeitura da cidade e Arquidiocese fundou-se

a Fundação Leão XIII, que tinha como objetivo a recuperação das áreas das favelas,

além da implementação de serviços básicos nesses espaços. Criou-se o Centro de Ação

Social, com ambulatórios e escolas. Entre os anos de 1947-1954 a Fundação autuou em

trinta e quatro favelas cariocas. Em algumas delas sua participação era na provisão de

estrutura básica como: água, luz, asfalto e esgoto, antecedendo a urbanização desses

espaços. Nessa mesma perspectiva de recuperação e melhoria nas favelas, a

Arquidiocese fundou em 1955 a Cruzada São Sebastião, que arrecadou fundos e

realizou melhorias de serviços básicos em doze favelas.

Page 21: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

21

Em síntese, até 1960 houve disputas e conflitos quanto ao planejamento e

definição do que fazer com as favelas e sua mazela – a pobreza. As intervenções das

organizações públicas e privadas tinham como tendência duas ações: a extinção ou a

introdução de melhorias nas favelas. Entretanto, como ressalta Valladares (1980),

nenhuma dessas ações se concretizou plenamente, não havendo chegado nem a uma

solução para melhorias nas favelas, nem a sua extinção das paisagens cariocas.

Todavia é a partir da década de 1960 que se institui nova forma de tratamento

das favelas. No ano de 1960 o Serviço Especial de Recuperação das Favelas e Habitações

Anti-Higiênicas - SERFHA, que foi criado em 1956, sofre uma reestruturação, e torna-se

o primeiro programa oficial do governo estadual voltado para a urbanização das favelas.

Este programa era vinculado a Coordenação de Serviços Sociais. Em 1961, criam-se

com o aporte desse programa, as Associações de Moradores nas favelas da cidade.

Em 1962 foi criado a Cooperativa de Habitação Popular do Estado da Guanabara -

COHAB-GB, uma companhia dedicada à remoção de famílias moradoras de favelas. O

objetivo era extinguir as favelas e transferir suas populações para outros locais.

Construíram-se assim, as Vilas Kennedy em Senador Camará, Aliança em Bangu, e

Esperança em Vigário Geral, onde foram alocados os moradores de doze favelas da

cidade, e em 1966 foi ocupada a Cidade de Deus em Jacarepaguá (VALLADARES,

1980). Entretanto, essa remoção não ocorreu de forma pacifica. Os moradores das

favelas criaram resistência e criticaram a remoção, devido ao deslocamento do local de

moradia para áreas distantes dos locais de trabalho, à pouca e ineficiente oferta de

transporte, à ruptura dos laços de sociabilidade desenvolvidos na favela de origem e à

péssima qualidade das casas oferecidas pelo poder público (BURGOS, 2006).

Enquanto a COHAB-GB desenvolvia suas ações de remoção da população das

favelas, a Companhia de Desenvolvimento de Comunidades - CODESCO, criada em 1968,

pelo então prefeito Negrão de Lima, representava uma alternativa à remoção das

favelas, a urbanização das mesmas, através de melhoramentos em infraestrutura básica e

de serviço. Essa imprecisão quanto ao futuro das favelas é descrita por Valladares

(1980) como um cenário político em que as favelas desempenham um papel importante.

As favelas tornaram-se um “campo fértil para a demagogia política, facilitada,

ainda, [...] por suas próprias características físicas” (VALLADARES, 1980, pág. 26). A

favela era facilmente identificada como habitada por um certo tipo de eleitor com

problemas urbanos já conhecidos. O clientelismo político encontrou ali terreno fértil

para proliferar. Somado a esse cenário, o Estado era omisso, raramente realizando e

Page 22: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

22

dando continuidade aos projetos de melhorias relacionados às favelas, o que

proporcionou a busca dos moradores das favelas aos políticos que lá estavam presentes.

Os favores iam desde bicas de água e material de construção e favores pessoais –

empregos, vagas em escolas e hospitais.

Os políticos tornaram-se verdadeiros intermediários entre a população local e

o ‘mundo de fora’, de onde provinham os recursos e os serviços. Estabelecia-

se nitidamente relação de troca entre voto e o favor obtido (VALLADARES

1980, pág.27).

Por outro lado, os moradores também tinham interesse na atuação dos políticos,

pois sabiam que ao utilizar a favela como espaço para barganhar, esses eles a

defenderiam de programas de remoção, na medida em que os seus interesses fossem

alcançados. Muitos desses políticos, no decorrer de suas campanhas, tornaram-se

figuras influentes dentro das favelas, e passaram a fornecer materiais de obras para

“reconstrução ou construção de barracos, ou indicando áreas desocupadas passíveis de

serem invadidas, o que favoreceu a implementação de novas favelas ou o

desenvolvimento das já existentes” (VALLADARES, 1980, pág. 27).

Com a criação, em 1961, das Associações de Moradores, os políticos e os

moradores das favelas foram beneficiados, pois a entidade possibilitou a legitimação de

lideranças locais (VALLADARES, 1980). Por outro lado, as lideranças das Associações

utilizavam-se dos apoios políticos em busca de benefícios para os moradores e para as

infraestruturas das favelas.

Com o golpe militar de 1964, o governo do Estado assina em 1968, já no

contexto do Ato Institucional número cinco - AI-5, o decreto E, n° 3.300, que estabelece

as associações de moradores como representantes dos interesses comunitários perante o

governo do Estado, “subvertendo o papel das associações, que de representante dos

moradores passam a fazer as vezes do poder público na favela” (BURGOS, 2006, pág.

35). A realidade é que desde a sua criação as associações de moradores, serviram como

ligação entre o governo – o mundo exterior – e o poder local.

Também na década de 1960, a cidade do Rio de Janeiro deixava de ser Distrito

Federal para se tornar o mais novo estado da Federação Brasileira, o Estado da

Guanabara. O princípio básico da administração pública era a descentralização e, assim,

foram criadas a Secretaria de Serviços Sociais e a Secretaria de Serviços Sociais

Regionais (SANTOS, 2007). A política de ação da Secretaria de Serviço Social era

centrada na assistência social e na remoção das favelas, tendo assim, uma concentração

Page 23: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

23

dos trabalhos nessas áreas. Santos (2007) observa que ao mesmo tempo em que as

favelas eram vistas como espaços “clandestinos”, pois, não eram reconhecidos como

parte do Estado da Guanabara, era nesses espaços que concentravam-se as atuações de

trabalho da Secretaria de Serviços Sociais. “Esta contradição reforçava uma ação

ambígua e paliativa prestada por parte do poder público, evidenciando ‘a ausência de

direitos sociais’” (idem, pág.31).

Em 1975 ocorreu no Rio de Janeiro a fusão do Estado da Guanabara com o

Estado do Rio de Janeiro. Com essa nova composição administrativa ocorreu uma nova

organização político-administrativa do Estado do Rio de Janeiro, na qual, a

problemática do Bem Estar Social, passou a ser de responsabilidade do Governo

Estadual. Criou-se então, um Conselho com os Secretários de Estado sob a presidência

do Governador, e eram discutidas as ações no campo econômico e social (SANTOS,

2007). Nesse cenário a Fundação Leão XIII atuava como executor da política social

através dos programas de Assistência Social em Geral e Assistência Comunitária, que

visavam atender a população mais carente do Rio de Janeiro.

Em 1979 o então prefeito, Israel Klabin, nomeado pelo governador Chagas

Freitas criou a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social - SMDS, com o

objetivo de desenvolver serviços assistenciais nas favelas da cidade. A proposta de

criação da SMDS foi estabelecida a partir de uma negociação entre prefeitura e o Fundo

das Nações Unidas para a Infância - Unicef, o que resultou na elaboração do documento

“Propostas para ação nas favelas cariocas”, o qual prevê intervenções nos espaços das

favelas por programas nas áreas de educação, saneamento, saúde e legalização da

propriedade. Também foi organizado pela mesma gestão política, um Cadastro das

Favelas da Cidade do Rio de Janeiro, que daria suporte às ações da SMDS, uma vez que

o objetivo era que o cadastro subsidiasse a organização de políticas públicas nesses

espaços (BURGOS, 2006). A favela ganhou reconhecimento por parte do poder público

quanto ao direito à urbanização, o que possibilitaria a realização de obras, antes só

permitidas e realizadas em espaços públicos ou em áreas de fácil acesso (SANTOS,

2007).

Com a eleição de Leonel Brizola, em 1982, a governador do Estado e com a

estrutura administrativa municipal atrelada ao Estado, o programa desenvolvido pela

SMDS ficou comprometido e dispondo de poucos recursos públicos financeiros, já que,

o novo governo considerava a proposta “tecnocrática, além de ser tomada como uma

ingerência externa em problemas brasileiros” (BURGOS, 2006, pág.46).

Page 24: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

24

Entretanto, o governo de Brizola desenvolveu uma agenda social voltada para as

favelas do Rio de Janeiro. O Programa de Favelas da Companhia Estadual de Águas e

Esgotos do Rio de Janeiro – Proface, através da Companhia Estadual de Águas e

Esgotos do Rio de Janeiro– CEDAE, implementou sistema de água e esgoto em cerca

de sessenta favelas, incorporando-as à rede dos seus bairros; a Companhia Municipal de

Limpeza Urbana– Comlurb passou a atuar na coleta de lixo nas favelas depois da

compra de micro-tratores adaptados às condições do terreno; a Comissão Municipal de

Energia iniciou um programa de instalação de iluminação pública nas favelas; e o

Programa Cada Família um Lote, iniciou a regularização da propriedade nas áreas das

favelas (BURGOS, 2006).

No ano de 1985 o cenário político-administrativo do país muda com as eleições

para prefeito das capitais dos estados. Ocorre a cisão entre prefeituras das capitais e

governos dos estados, dando mais autonomia aos prefeitos e fazendo com que os

mesmos se tornem mais próximos dos problemas da população. É na gestão de

Saturnino Braga, entre 1986 à 1988, que se formula o “Programa Quinquenal de

Urbanização das Favelas e Loteamentos Irregulares do Município do Rio de Janeiro”, o

qual enfatiza a necessidade de integrar as favelas à cidade, através da transformação das

favelas em bairros populares (BURGOS, 2006). Entretanto, é apenas em 1992, na

gestão do prefeito Marcelo Alencar, que a ideia de um programa global de integração

das favelas à cidade, é consolidada através do Projeto de Lei Complementar nº16, de 04

de junho de 199212

, que instituiu o Plano Diretor da Cidade do Rio de Janeiro - PDCRJ,

que definia “o problema favela como uma questão municipal, fundamental para o futuro

da cidade” 13

(BURGOS, 2006, pág.49).

12

Ver: http://cm-rio-de-janeiro.jusbrasil.com.br/legislacao/287415/lei-complementar-16-92 13

O Projeto de Lei Complementar nº16, de 04 de junho de 1992 no Art. 6º define os objetivos do Plano

Diretor Decenal da Cidade do Rio de Janeiro:

I - propiciar ao conjunto da população melhores condições de acesso à terra, à habitação, ao trabalho, aos

transportes e aos equipamentos e serviços urbanos;

II - ordenar o crescimento das diversas áreas da Cidade, compatibilizando-o com o saneamento básico, o

sistema viário e de transportes e os demais equipamentos e serviços urbanos;

III - promover a descentralização da gestão dos serviços públicos municipais;

IV - promover a distribuição justa e equilibrada da infra-estrutura e dos serviços públicos, repartindo as

vantagens e ônus decorrentes da urbanização;

V - compatibilizar o desenvolvimento urbano com a proteção do meio ambiente pela utilização racional

do patrimônio natural, cultural e construído, sua conservação, recuperação e revitalização;

VI - estimular a população para a defesa dos interesses coletivos, reforçando o sentimento de cidadania e

proporcionando o reencontro do habitante com a Cidade;

VII - estabelecer mecanismos de participação da comunidade no planejamento urbano e na fiscalização

de sua execução;

VIII - promover o cumprimento da função social da propriedade urbana.

Page 25: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

25

O PDCRJ também garantia a participação da população em todas as etapas do

processo de planejamento, assim como o amplo acesso às informações14

. Entretanto,

estas garantias eram vistas pelo governo como um empecilho, que tendia a inviabilizar

as ações do poder público. Houve também por parte da sociedade civil, mais

especificamente por parte da população moradora de favelas, pouca demanda

organizada quanto a participação nas etapas do processo de planejamento (PIRES, 2010;

BURGOS, 2006). Assim, em 1993, já na gestão do prefeito César Maia, a Prefeitura da

Cidade do Rio de Janeiro promoveu um acordo com a Associação Comercial do Rio de

Janeiro - ACRJ e Federação das Indústrias - FIRJAN, para a implementação do Plano

Estratégico da Cidade do Rio de Janeiro – PECRJ. Deste modo, o PECRJ passou a ser

uma contraposição ao papel regulador da sociedade civil organizada, do Estado e do

PDCRJ (PIRES, 2010).

Nessa mesma gestão cria-se o Grupo Executivo de Assentamento Populares -

GEAP, que propõe seis programas na área de política habitacional. São eles: (1) o

programa de Regularização de Loteamento, que visava a regulamentação urbanística e a

construção de infraestrutura; (2) o programa de Regularização Fundiária e Titulação,

que visava a regulamentação dos títulos de propriedades ; (3) o programa Novas

Alternativas, Vilas e Cortiços, que visava a ocupação das áreas livres existentes na

cidade, mas que já dispunham de infraestrutura, e a recuperação de vilas e cortiços

localizados no centro da cidade; (4) o programa Morar Carioca, que visava a melhoria e

a integração à cidade de assentamentos precários e informais, através da implantação de

um sistema de manutenção e conservação das obras. Outra iniciativa do programa era

garantir o acesso à moradia em áreas de interesse da classe média através de Cartas de

Credito; (5) o programa Morar Sem Riscos, que visava o reassentamento de famílias

que moravam em áreas de riscos; e (6) o programa Favela-Bairro, que visava a

implementação de infraestrutura e serviços sociais básicos, a regularização desses

espaços e integrá-lo à cidade (BURGOS, 2006).

14

Lei Complementar nº16, de 04 de junho de 1992, artigo12, §1.

Art. 12 - E garantida a participação da população em todas as etapas do processo de planejamento, pelo

amplo acesso às informações, assim como à elaboração, implementação e avaliação de planos, projetos e

programas de desenvolvimento urbano, de caráter geral, regional ou local, mediante a exposição de

problemas e de propostas de soluções.

§ 1º - A participação da população é assegurada pela representação de entidades e associações

comunitárias em grupos de trabalho, comissões e órgãos colegiados, provisórios ou permanentes.

Page 26: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

26

Um dos programas com mais notoriedade midiática, social e política do GEAP

foi o programa Favela-Bairro que tinha a proposta de construir ou complementar a

estrutura urbana das favelas e oferecer as condições para a integração da favela como

bairro da cidade. Seus pressupostos eram definidos na tentativa de ocorrer o mínimo de

reassentamento de famílias moradoras desses espaços, e ter a participação dos

moradores nas obras do programa.

Em janeiro de 1994, começam os trabalhos na realização do Programa Favela-

Bairro. A primeira medida foi a seleção das favelas que receberiam o programa, nesse

caso, as favelas consideradas de porte médio, com 500 a 2.500 domicílios. Depois de

delimitado esse universo, construiu-se um índice que distribuiu as favelas quanto ao

maior ou menor grau de dificuldade de se concluir a sua urbanização (BURGOS, 2006).

O financiamento do programa ocorreu a partir de uma parceria entre Prefeitura e

o Banco Interamericano de Desenvolvimento–BID, firmado em 1995 e renovado em

2000. Na fase inicial do programa atendeu-se a 15 comunidades15

da cidade. Em 2006,

esse número já tinha ultrapassado 143 comunidades, beneficiando 62 mil moradores.

As principais intervenções do programa foram de saneamento básico, sistema de

drenagem, sistema viário, canalização de rios, iluminação pública, coleta de lixo,

construção de creches, construção de equipamentos esportivos, construção de passarelas

ou pontes, entre outras (MENDES, 2006).

No início de 2007, o governo federal, no primeiro mandato do presidente da

república Luiz Inácio Lula da Silva16

, anunciou o Programa de Aceleração do

Crescimento - PAC, que tinha como objetivo promover a execução de grandes obras de

infraestrutura social, urbana, logística e energética do país, colaborando para o seu

desenvolvimento acelerado e sustentável (DOMINGUES et al, 2009). Contribuiu

também para o aumento da oferta de empregos nas áreas relacionadas ao projeto, e na

geração de renda, além de elevar o investimento público e privado em obras de

infraestrutura. Os seis eixos do programa são: (1) Investimento em Infraestrutura; (2)

Estímulo ao Crédito e ao Financiamento; (3) Melhora do Ambiente de Investimento; (4)

Desoneração e Administração Tributária; (5) Medidas Fiscais de Longo Prazo; (6)

Consistência fiscal (TRINDADE, 2009).

15

Parque Royal, Canal da Tachas/Vila Amizade, Parque Proletário do Grotão, Serrinha, Ladeira dos

Funcionários, Caminho do Job, Morro dos Prazeres/Escondidinho, Morro da Fé, Vila

Candido/Guarapes/Cerro-Corá, Chácara de Dell Castilho, Mata Machado, Morro União, Três Pontes,

Conjunto Residencial Fernão Cardin e Andaraí/Jamelão. 16

O primeiro mandato do então presidente foi de 1º de janeiro de 2003 a 31 de dezembro de 2006, e o

segundo mandato foi de 1º de janeiro de 2007 a 31 de dezembro de 2010.

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27

Nessa perspectiva, a cidade do Rio de Janeiro foi beneficiada também quanto à

urbanização e moradia, principalmente nas áreas de favela. Foi lançado como

subprojeto do PAC, o programa Minha Casa, Minha Vida, em 2009, que tem como

objetivo promover a construção e o financiamento de casas para famílias com renda

bruta salarial de até R$ 5.000,00 por mês. O primeiro condomínio do programa foi

inaugurado na cidade no bairro de Senador Camará17

, mas hoje já existem condomínios

nos bairros da Mangueira, Triagem, Bangu, etc. Além de obras no que tange a

mobilidade urbana, como o teleférico do Complexo do Alemão e a passarela projetada

por Oscar Niemeyer na entrada da Rocinha permitindo o acesso mais fácil dos

moradores até o complexo esportivo, também obra do programa18

.

Em julho de 2010, na gestão do prefeito Eduardo Paes, foi lançado o programa

Morar Carioca, que tem objetivo de promover a integração urbana e social da favela

com a cidade do Rio de Janeiro até o ano de 2020. O programa é baseado nas metas e

objetivos do programa antecessor, o Favela-Bairro. Já ocorreram obras de infraestrutura

nas favelas da Providência, Babilônia, Jacarezinho, de acordo com a Secretaria

Municipal de Habitação19

.

1.2 As favelas e a criminalidade

A cidade do Rio de Janeiro tem uma organização geográfica bastante peculiar.

Davidovich (1999) aponta que o município tem um perfil territorial específico devido à

sua centralização e concentração de população, atividades e recursos. As favelas

impõem-se não apenas na paisagem urbana, mas também na vida social, cultural e

política da cidade. Desde o aparecimento da venda de drogas no varejo e seu consumo,

a favela passou a ter associação direta com o comércio de entorpecentes, passando a ser

vista pelo pela sociedade como um espaço de violência e estigmatizado.

Nos anos de 1950 e 1960, ainda que com pouca organização, sofisticação e

infraestrutura a distribuição da maconha na capital fluminense “tinha sua base nas

favelas e a droga era vendida geralmente à uma clientela local pelos membros da

comunidade” (DOWDNEY, 2003, pág.61). Com o crescimento da demanda da classe

17

http://oglobo.globo.com/rio/minha-casa-minha-vida-enfrenta-problemas-como-contas-nao-pagas-

puxadinhos-trafico-11302923 - Visto em 12/03/2014 18

http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2010/06/passarela-feita-por-niemeyer-para-rocinha-e-

inaugurada.html - Visto em 12/03/2014 19

http://www.rio.rj.gov.br/web/smh/exibeconteudo?article-id=1451251 – Visto em 12/03/2014

Page 28: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

28

média por cocaína, no início dos anos 1980, a estrutura de varejo de drogas com os

pontos de vendas nas favelas foi aprimorada pelas facções criminosas.

Neste cenário, as favelas tornaram-se territórios estratégicos nos quais a venda

de drogas estaria protegida das disputas com facções rivais e das incursões policiais.

Favorecendo, também, a possibilidade de domínio sociopolítico dos traficantes sobre a

comunidade. Nos dois casos, os objetivos econômicos são facilitados (DOWDNEY,

2003).

Nos estudos sobre favela, tráfico de drogas, crime organizado e territorialização,

pode-se caracterizar quatro fases cronológicas dessa problemática e seu início na capital

da cidade: a) 1950: maconha; b) 1970: jogo do bicho; c) 1980: cocaína e o Comando

Vermelho; d) 1990 e 2000: guerra entre facções e a instauração das milícias (Dowdney,

2003). Essa breve cronologia serve como um dos elementos para entendermos como a

favela e os seus moradores adquiriram um perfil estigmatizado e, muitas vezes,

rejeitado, pela sociedade.

a) 1950: maconha

Nos anos de 1950 o varejo de drogas ilegais instala-se na cidade do Rio de

Janeiro para atender a demanda das favelas pela maconha, que tinha sua distribuição

feita de forma independente da cocaína, droga, comumente, consumida pela elite.

Dowdney (2003) ressalta que a maconha consumida na cidade do Rio de Janeiro era

basicamente cultivada no Nordeste do país e era de consumo dos moradores das favelas,

dos prisioneiros e de algumas áreas de prostituição da cidade.

Sua distribuição era relativamente organizada, com uma estrutura não-

sofisticada, pois, embora os membros dessa estrutura andassem armados, utilizavam, no

máximo revólveres calibre 38, mas que camuflavam da vista dos moradores da

comunidade. Esses traficantes armavam-se para se proteger. Entretanto não eram

organizados quanto ao patrulhamento e vigilância dos seus membros e na defesa do

território que dominavam. O autor também destaca que “apesar das diferenças de escala,

de estrutura e de importância para a cidade, as origens do uso das favelas por facções

territorialmente organizadas com pontos de venda estratégicos e possíveis de serem

defendidos” (DOWDNEY, 2003, pág.23) podem ser encontradas desde essa década.

Page 29: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

29

b) 1970: jogo do bicho

O controle de pontos e áreas de “jogo do bicho” no Rio de Janeiro, desde a

década de 1940, foi um fator importante para a representação social da violência na

cidade, estabelecendo ligação entre mercado ilícito e corrupção policial. Os jogos de

azar não conviviam pacificamente com os traficantes de drogas, muitas vezes havendo

disputas entre os dois segmentos, por controle de territórios.

A estrutura desse mercado clandestino de jogos e corrupção permaneceu

segmentada em territórios rivais até o final dos anos de 1970, quando uma aliança

estável entre os principais bicheiros da cidade, instituiu a chamada “cúpula do jogo do

bicho”, organizando-se, legitimamente, através da fundação da Liga das Escolas de

Samba, e passando a administrar os desfiles das escolas de samba do carnaval carioca

(MISSE, 2007). O “jogo do bicho” era semelhante a uma loteria federal, entretanto, era

considerado uma contravenção pela legislação penal brasileira, de acordo com o artigo

58 da Lei de Contravenções Penais20

.

O jogo tinha sua estrutura constituída de vários pontos de venda - “pontos do

jogo do bicho” - que contava com a presença de um “apontador”. Assim, o apostador

procurava o “apontador” para fazer seu jogo. Os “pontos do jogo do bicho” eram em

lojas ou em vias públicas, como camelôs. O “apontador” recebia comissão sobre os

jogos que apontava e sobre os prêmios sorteados em seu ponto (MISSE, 2007). O

“banqueiro” ou “dono” era quem controlava um “território”, onde atuavam “seus”

“apontadores” e pistoleiros. Ele era quem pagava o prêmio e recebia o dinheiro das

apostas, e foram eles que se tornaram presidentes ou patronos das agremiações de

samba, após a criação da Liga das Escolas de Samba (MISSE, 2007).

Misse (2007) afirma que a articulação e dominação da rede social do “jogo do

bicho” e a política local transformaram os “banqueiros” do jogo, seus “apontadores” e

clientes “numa organização semelhante à máfia norte-americana do jogo, ainda que em

bem menores proporções” (idem, pág.142).

É necessário ressaltar que o “jogo do bicho” ainda é presente na realidade do

país, logo na realidade do Rio de Janeiro também. Contudo, hoje para a justiça

brasileira, o crime é de lavagem de dinheiro, com penalidades que vão desde reclusão,

em regime fechado ou semiaberto, como a multa21

, e os “bicheiros” ou “banqueiros”

20

Decreto-lei 3 688, de 3 de outubro de 1941 21

Decreto- lei nº 12.683, de 9 de julho de 2012.

Page 30: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

30

passaram desde então a dividir e se submeter ao poder dos grupos organizados

vendedores de drogas.

c) 1980: cocaína e o Comando Vermelho

No começo dos anos de 1980 a comercialização da cocaína em grande

quantidade, fez a capital do Rio de Janeiro passar por transformações, em grande parte,

devido ao lucro imediato da droga (DOWDNEY, 2003). O mercado varejista da droga

foi reestruturado, expandindo sua organização e o uso da violência como instrumento de

dominação. A finalidade era “alcançar metas econômicas e manter a disciplina interna”

(idem, pág.21).

A lucratividade da venda da cocaína resultou na militarização excessiva dos

grupos armados, para controlar e defender os pontos de venda. Mais tarde, passaram a

ser as favelas como um todo – e seus moradores - onde se localizavam esses pontos. A

escalada da violência armada determinada pela “organização sistemática do mercado de

droga a varejo no Rio de Janeiro” (DOWDNEY, 2003, pág.25), fez surgir nas prisões a

primeira facção de droga - o Comando Vermelho.

A criação do Comando Vermelho foi resultante da Lei de Segurança Nacional22

,

de 1969, que foi uma resposta ao número crescente de assaltos a bancos e a instituições

financeiras por grupos de oposição ao regime militar, para financiar atividades

revolucionárias. Deste modo, de 1969 à 1976, prisioneiros políticos e prisioneiros

comuns compartilharam algumas prisões de segurança máxima, inclusive a Cândido

Mendes, na Ilha Grande.

O Presídio Cândido Mendes ocupava cinquenta dos cento e vinte quilômetros

quadrados da Ilha Grande. Lá, residiam quatorze mil pessoas – inclusive os condenados.

De um lado, as casas milionárias de veraneio, do outro, o “Caldeirão do Diabo” - como

ficou conhecido o presídio. No meio, vilas humildes de pescadores que já habitavam a

ilha antes da construção da cadeia (AMORIM, 2011).

Na Galeria B, também conhecida como Galeria da Lei de Segurança Nacional,

juntaram-se homens condenados por atividades revolucionárias e presos comuns. O

governo militar tentou despolitizar as ações armadas dos grupos contrários ao regime,

tratando-as como “simples banditismo comum” (AMORIM, 2011, pág.58). A influência

educativa dos prisioneiros políticos sobre presos de crimes comuns gerou noções de

22

Artigo 27 do decreto-lei 898 de 1969.

Page 31: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

31

organização de grupos e de reciprocidade (AMORIM, 2011). Assim, alguns presos por

assalto a banco criaram um grupo, no ano 1979 que viria a ser conhecido por Falange

Vermelha e, depois, Comando Vermelho.

A Falange Vermelha responsabilizou-se pela proteção do grupo e pela

dominação da população carcerária, assim como por obter direitos dentro do sistema

penitenciário (DOWDNEY, 2003). Entretanto, “sua importância real na estrutura

criminosa da cidade surgiu quando seus membros perceberam que sua organização, no

interior da prisão, poderia ser utilizada para organizar o crime do lado de fora”

(DOWDNEY, 2003, pág.25).

No fim dos anos 70, os membros presos do Comando Vermelho começaram a

organizar as atividades criminais no Rio de Janeiro. Isso coincidiu com a chegada da

cocaína, trazida da Bolívia, do Peru e da Colômbia a cidade do Rio de Janeiro para

exportação aos países Europeus e para consumo local. Assaltantes de bancos

pertencentes ao Comando Vermelho perceberam os lucros que podiam ser obtidos com

a venda de cocaína. Assim, “realizaram alguns assaltos a bancos e sequestros para

financiar um movimento organizado rumo ao negócio do varejo de drogas”

(DOWDNEY, 2003, pág. 26).

De uma maneira simplista, podemos imaginar que os presos políticos

“ensinaram” aos presos comuns que eles investiam o dinheiro conseguido nos assaltos a

bancos e a instituições financeiras na compra de dólares e de ações na bolsa de valores,

para financiar as ações contra o governo. Os presos comuns que entenderam a lógica

implementada pelos presos políticos passaram a investir o dinheiro conseguido, na

compra de cocaína, armas e imóveis.

Entretanto como Amorim (2011) ressalta, o crime organizado foi além do que a

luta revolucionária tinha conseguido ir nos anos de 1970, tanto no que se refere à

infraestrutura quanto à disciplina e organização interna.

O bandido comum conseguiu romper o isolamento social que atormentava os

grupos guerrilheiros, desenvolvendo laços de confiança com a população

carente. [...] contam com a colaboração – ou pelo menos o silêncio- que os

protege (AMORIM, 2011, pág. 91).

Nos anos de 1983 a 1986 o Comando Vermelho definiu sua geografia de

atuação, expandindo as tradicionais bocas-de-fumo com venda de maconha, para um

comércio varejista da cocaína nas favelas cariocas. Seus membros começaram a

Page 32: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

32

organizar a si mesmo e aos territórios das favelas que dominavam, dentro de uma

estrutura de apoio recíproco e hierárquico, com o objetivo central de proteger os pontos

de venda de drogas e para se defender das incursões policiais ou dos ataques de

“neutros”23

(DOWDNEY, 2003). E é nesse período também que a polícia é proibida

pelo governador do Estado, Leonel Brizola, 1983 à 1987, a fazer intervenções armadas

nas favelas. A proposta de Brizola era desenvolver nas favelas cariocas uma política de

direitos humanos, baseada no respeito aos direitos civis dos moradores das favelas

(BURGOS, 2006). Com isso o crime organizado cresceu, equipou-se e organizou-se,

uma vez que não tinham mais que enfrentar a polícia de modo decorrente.

Na segunda metade da década de 1980 alguns membros importantes do

Comando Vermelho estavam mortos e havia rivalidade crescente entre os traficantes-

chefes do Comando (DOWDNEY, 2003; AMORIM, 2011). A disputa pelo controle

territorial e a disputa interna entre eles fez com que a facção se fragmentasse e torna-se

cada vez mais violenta.

Deste modo, outras facções foram fundadas a partir de discordâncias internas no

Comando Vermelho, são elas: o Terceiro Comando, o Comando Vermelho Jovem e os

Amigos dos Amigos. Como resultado dessa fragmentação “criou-se uma subcultura

militarizada dentro das favelas do Rio de Janeiro, com grupos fortemente armados em

combate intermitente, mas regular” (DOWDNEY, 2003, pág. 29). Esses confrontos

armados entre as facções rivais e contra as incursões policiais tornaram-se rotineiros,

proporcionando aos traficantes de drogas um aumento do seu poder bélico.

d) 1990 e 2000: guerra entre facções e a instauração das milícias

É durante os anos 1990 que a cidade ganha destaque na agenda pública no Brasil

no que diz respeito ao aumento da violência urbana e o crime de associação para o

tráfico de drogas (WILLADINO et al, 2011). A imagem da favela e dos seus moradores

se vinculou ao tráfico de drogas, o que fez uma representação do território não apenas

de moradia de pessoas pobres, mas agora de um território violento e de seus moradores

sendo cúmplices dos traficantes de drogas por viverem sob a “lei” instituída pelos

traficantes e não mais sob as leis que regem o país (LEITE, 2008).

A ineficiência do Estado – não é descartável a possível tolerância ou

cumplicidade de agentes públicos – proporcionou que grupos de criminosos armados,

23

“Neutros” são alguns grupos armados não-alinhados como uma facção, entretanto, também com base

em favelas. (DOWDNEY, 2003)

Page 33: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

33

vinculados ao tráfico de drogas, detivessem o domínio territorial. Organizados, esses

grupos passaram a disputar entre si esses territórios que eram fundamentais para

atividade de venda de drogas. Deste modo, aumentaram as disputas armadas entre

grupos de criminosos por controle de território, aumentou o confronto entre a polícia e

esses grupos, houve a difusão do uso de armas de alto calibre e, com isso, a

naturalização da violência (WILLADINO et al, 2011).

As milícias, que se organizaram nas primeiras favelas cariocas a partir da década

de 1990, passaram a ter notoriedade e a se estabilizarem a partir dos anos 2000. As

milícias são compostas por agentes e ex-agentes armados do Estado - policiais,

bombeiros, agentes penitenciários. Com o slogan da “proteção e segurança”, esse grupo

passou a lucrar com o controle monopolista de diversas atividades econômicas

exercidas nas favelas (CANO; DUARTE, 2012).

As milícias assumem para si a função de “proteger” e dar “segurança” em

favelas, supostamente ameaçadas por traficantes. Entretanto, como são militares e/ou

ex-militares utilizam do monopólio da violência garantida pelo Estado, que lhes

forneceu treinamento e armas, para fazer desse serviço de “proteção e segurança” um

lucrativo empreendimento. Os grupos passam, então, a controlar e a cobrar pelas

atividades, também, oferecidas nas favelas, como por exemplo, venda de gás; transporte

alternativo; serviço clandestino de televisão a cabo e de instalação de luz; etc..

A “fórmula” que transformava as milícias em um negócio lucrativo era

constituída pelas taxas de “proteção e segurança”, somada ao monopólio das atividades

de comércio e serviços, mais o assistencialismo (ZALUAR; CONCEIÇÃO, 2007).

Igualmente, somado a essa “fórmula” estava o controle do território, que passa a ser

dominado militarmente, e a participação, legitimada, de integrantes das milícias nos

Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário (ZALUAR; CONCEIÇÃO, 2007; CANO;

DUARTE, 2012).

Assim, que tomaram notoriedade na mídia, as milícias foram defendidas por

alguns agentes públicos, já que, elas foram consideradas “uma reação dos moradores

destas regiões contra a criminalidade ou, quando menos, como um ‘mal menor’ em

comparação com o narcotráfico. [...] grupos como ‘autodefesa comunitária’” (CANO;

DUARTE, 2012, pág.13). Deste modo, as milícias foram recebendo “legitimidade” e

em 2005, 42 favelas da cidade já estavam sob seus domínios (SANTOS, 2007). Do

outro lado, entretanto, diversos setores criticaram a extorsão praticada pelas milícias

contra os moradores das favelas, que igualavam estes grupos às organizações criminosas

Page 34: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

34

de venda de drogas, e o número de homicídio e assaltos nessas áreas não foram

reduzidos substantivamente24

.

Com o apelo da população e da mídia, o Estado reagiu a essa violência que se

tornou constante na cidade com “métodos tradicionalmente utilizados para lidar com

problemas decorrentes da fragilidade social e política brasileira: o uso da força.”

(WILLADINO et al, 2011, p.152). Associado à violência ainda havia o antigo problema

da prática de corrupção e do uso arbitrário e ilegítimo da autoridade. Entretanto, as

sucessivas administrações públicas que buscavam combater a criminalidade através de

enfrentamentos armados entre policiais e traficantes, fizeram com que a taxa de

homicídios da capital ficasse entre as mais altas do país.

Gráfico 1: Taxas de Homicídio (por 100mil) na população total no Estado e Capital

(1989 à 2007)

Fonte: Mapa da Violência

O gráfico 1 apresenta os dados de homicídios por 100 mil habitantes no Estado e

na Capital entre os anos de 1989 à 2007. Apesar de se observar queda da taxa de

homicídios em determinados períodos, tanto o Estado quanto a Capital da cidade do Rio

24

http://noticias.r7.com/rio-de-janeiro/noticias/areas-controladas-por-milicias-concentram-homicidios-no-

rio-20501129.html - Visto em 12/03/2014

http://oglobo.globo.com/rio/numero-de-desaparecidos-subiu-em-areas-dominadas-por-milicias-revela-

pesquisa-6279192 - Visto em 12/03/2014

0

10

20

30

40

50

60

70

80

1989

1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

Estado

Capital

Page 35: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

35

de Janeiro ocupavam as primeiras posições do ranking quando comparados com outros

Estados e Capitais do país, como mostra a tabela 1.

Tabela 1: Ordenamento por taxa de homicídios na população total

1989 1998 2000

Estado 4° 3° 1°

Capital 16° 5° 4°

Page 36: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

36

2. UNIDADE DE POLÍCIA PACIFICADORA – UPP

Os dados divulgados do Censo 2010 contabilizam 1.332 favelas no estado do

Rio de Janeiro, sendo que 763 somente na cidade25

. Ainda segundo o IBGE,

aproximadamente 6,3 milhões de pessoas viviam na capital fluminense sendo que 1,4

milhões de viviam em favelas, o que representa aproximadamente 22% dos habitantes

da cidade do Rio de Janeiro.

Gráfico 2: Crescimento populacional cidade/ favela (1991 – 2010)

Dados do IBGE/2010.

O gráfico apresenta que a cidade teve em vinte anos um aumento populacional

de 57,9% de população residente em áreas de favelas, enquanto nas outras áreas da

cidade esse aumento foi de 15,5%. Isso significa que a população moradora das áreas de

favela cresceu mais de três vezes seu número comparado a outras áreas da cidade.

A cidade que apresentava números elevados de violência urbana, o processo de

ocupação de territórios por uma forma de “poder paralelo”, liderados por traficantes e,

mais recentemente, por milicianos, que não reconheciam o Estado nem suas instituições

de poder, além de subjugar os cidadãos, proporcionaram que a gestão do governado

Sérgio Cabral, eleito em 2007 para o primeiro mandato e reeleito em 2010, para o

segundo mandato, desenvolvesse uma política pública na área de segurança, objetivando

25

http://oglobo.globo.com/pais/rio-a-cidade-com-maior-populacao-em-favelas-do-brasil-3489272.

Acessado em: 16/04/2013

15,5

57,9

0

10

20

30

40

50

60

70

Cidade Favela

Page 37: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

37

a retomada e manutenção da presença do Estado nestas áreas subjugadas. Assim,

delineia-se o projeto das UPPs.

Sem dúvida, o Rio de Janeiro é o primeiro estado a vir à mente quando o

assunto é favela. Numa cidade como mais de mil [favelas], o tema segurança

torna-se assunto diário e sempre dramático. No final de 2008 implementamos

o projeto UPP que recebe forte apoio da mídia e da sociedade. A ideia é

simples. Recuperar para o Estado territórios empobrecidos e dominados por

grupos criminosos armados. Tais grupos, na disputa de espaço com seus

rivais, entraram numa corrida armamentista nas últimas décadas, uma disputa

particular na qual o fuzil reina absoluto. Decidimos então pôr em prática uma

nova ferramenta para acabar com os confrontos: as UPPs. Ocupamos quatro

comunidades em bairros distintos em caráter definitivo. Há uma tremenda

dívida social que vem desde a colonização destas terras. A maioria é de

negro, pardos, mulatos e pobres e muito pobres. Carências tão grandes que é

preciso ajudá-los a pedir, pois lhes é difícil até priorizar as emergências.

Podemos traduzir as causas da violência de diversas formas: desigualdade,

falta de educação, corrupção, falta de assistência, falta de planejamento das

cidades, enfim, inúmeras possibilidades. No Rio, o projeto no qual apostamos

é a UPP e estamos aprendendo com os resultados. Sai o tráfico e entra a

polícia definitivamente. Como tenho repetido sempre que sou interpelado: ou

a sociedade abraça e acolhe estas áreas ou nada vai mudar de fato.

(BELTRAME, Secretário de Segurança do Rio de Janeiro, 2009, pág.1)

2.1 O projeto da UPP

O Governo do Estado do Rio de Janeiro começa em janeiro de 200926

a desenhar

o projeto da UPP, a partir da experiência piloto na favela Santa Marta, iniciada no dia

19 de dezembro de 2008, na Zona Sul da cidade. A força de segurança do Estado, a

polícia, ao invés de fazer incursões periodicamente, estabeleceria uma base policial

dentro da comunidade, com o objetivo de recuperar territórios ocupados há décadas por

traficantes e milicianos, diminuindo os confrontos armados. O contingente policial seria

composto por policiais recém-formados, com a intenção de promover uma política de

aproximação entre a população e instituição policial, embasada nos princípios da polícia

de proximidade. Essa é uma filosofia de estratégia organizacional fundamentada na

parceria entre a população e as instituições da área de segurança pública, sendo o seu

26

Decreto-lei n°. 41.650 de 21 de janeiro de 2009. E o Decreto-lei n°. 41.653 de 22 de janeiro de 2009.

Page 38: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

38

objetivo principal, o vínculo estabelecido através do diálogo e respeito mútuo. Polícia e

moradores devem trabalhar juntos para identificar e solucionar problemas como crimes;

tráfico de drogas; desordens; etc., visando melhorar a qualidade de vida na área, e

aumentando a interlocução e favorecendo o surgimento de lideranças comunitárias27

. A

premissa é que os moradores devem exercer um papel mais ativo na segurança e assim a

polícia não arca sozinha com a responsabilidade (RODRIGUES, 2011).

A partir de então, já foram instaladas trinta e sete unidades de Polícia

Pacificadora em mais de quarenta e oito favelas cariocas28

. Essa experiência vem sendo

avaliada pelo poder público, pela mídia e por parte da sociedade carioca e brasileira

como uma iniciativa de sucesso. As pesquisas de opinião pública mostram apoio social

e a participação, engajada, da iniciativa privada, pela primeira vez, num projeto desta

natureza. Os dados divulgados até hoje, apresentam a forte redução dos confrontos

armados e da perda do domínio do território por parte dos grupos armados

(RODRIGUES, 2011; CANO et al, 2012).

27

Site da UPP. http://www.upprj.com/index.php/o_que_e_upp - Acessado em: 16/04/2013. 28

Favelas onde Unidades de Polícia Pacificadora já foram instaladas: Zona Sul - Santa Marta (Instalação:

19.12.2008); Babilônia e Chapéu Mangueira (Instalação: 10.06.2009); Pavão-Pavãozinho e Cantagalo

(Instalação: 23.12.2009); Tabajaras e Cabritos (Instalação: 14.01.2010); Escondidinho e Prazeres (Instalação:

25.02.2011); Rocinha (Instalação: 20.09.2012); Vidigal (Instalação: 18.01.2012); Cerro-Corá (Instalação:

03.06.2013) Zona Norte - Borel (Instalação: 07.06.2010); Formiga (Instalação: 01.07.2010); Andaraí

(Instalação: 28.07.2010); Salgueiro (Instalação:17.09.2010); Turano (Instalação: 30.10.2010); São João, Matriz

e Quieto (Instalação: 31.01.2011); Macacos (Instalação: 30.11.2011); Mangueira (Instalação: 03.11.2011);

Nova Brasília (Instalação: 18.04.2012); Fazendinha (Instalação: 18.04.2012); Adeus e Baiana (Instalação:

11.05.2012); Alemão (Instalação: 30.05.2012); Chatuba (Instalação: 27.06.2012); Fé e Sereno (Instalação:

27.06.2012); Parque Proletário (Instalação: 28.08.2012); Vila Cruzeiro (Instalação: 28.08.2012); Jacarezinho

(Instalação: 16.01.2013); Manguinhos (Instalação: 16.01.2013); Barreira do Vasco e Tuiuti (Instalação:

12.04.2013); Caju (Instalação: 12.04.2013); Arará e Mandela (Instalação: 06.09.2013); Lins (Instalação:

02.12.2013); Camarista Méier (Instalação: 02.12.2013) Zona Oeste - Cidade de Deus (Instalação: 16.02.2009);

Batan (Instalação: 18.02.2009) Centro – Providência (Instalação: 26.04.2010); Coroa, Fallet e Fogueteiro

(Instalação: 25.02.2011); São Carlos (Instalação: 17.05.2011) Baixada Fluminense- Complexo da

Mangueirinha (Instalação: 07.02.2014).

Page 39: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

39

MAPA 2– Implementação das UPPs

O projeto das UPPs é estruturado, legalmente, por normativas composta por

alguns decretos29

. O primeiro decreto, do ano de 2009, cria a UPP incluída na estrutura

da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro. O segundo decreto, do mesmo ano,

estipula o pagamento de uma gratificação salarial de 500,00 reais mensais para todos os

policiais lotadas nas UPPs. Já o decreto de janeiro de 2011, avança quanto a objetivos,

implementação das unidades, e formação dos policiais que irão atuar nas unidades

(CANO et al, 2012).

No artigo 1°, do decreto nº 42.787 de 06 de Janeiro de 2011, é elucidado o

objetivo principal do programa de segurança pública proposto pela gestão política

vigente, ressaltando as ações que visam “à pacificação e à preservação da ordem

pública, destinam-se a aplicar a filosofia de polícia de proximidade nas áreas

designadas para sua atuação”.

29

Decreto-lei nº. 41.650, de 21 de janeiro de 2009 do Rio de Janeiro; Decreto-lei nº. 41.653, de 22 de

janeiro de 2009 do Rio de Janeiro; Decreto-lei nº. 42.787, de 6 de janeiro de 2011 do Rio de Janeiro;

Decreto-lei nº 5890, de 14 de janeiro de 2011 do Rio de Janeiro; Decreto-lei nº 6096, de 28 de novembro

de 2011 do Rio de Janeiro; Decreto-lei nº 6186, de 28 de março de 2012 do Rio de Janeiro; Decreto-lei nº

6292, de 09 de julho de 2012 do Rio de Janeiro; Decreto-lei nº 6485, de 09 de julho de 2013 do Rio de

Janeiro.

Page 40: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

40

No mesmo decreto é esclarecido no artigo 6º (§ 2º) a formação especial dos

policiais alocados nas UPPs, reforçando que essa formação deve ter ênfase em

Direitos Humanos e nos princípios de polícia comunitária, além de ressaltar a

obrigatoriedade dos policiais serem recém-formados na academia de polícia. Em abril

de 2013, o programa contava com efetivo de 8.431 policiais. Em fevereiro de 2014,

esse efetivo atingiu o número de 9.293 policiais e deve chegar a 12,5 mil até o final do

ano de 2014, atendendo mais de um milhão e meio de pessoas nas áreas pacificadas30

.

No artigo 2º do decreto, de 2011, são explicitadas as etapas de implementação

das unidades pacificadoras, são elas:

1°Intervenção tática - ocorrem ações táticas, preferencialmente pelo Batalhão de

Operações Policiais Especiais - BOPE, pelo Batalhão de Polícia de Choque -

BPChoque e por efetivos deslocados dos Comandos de Policiamento de Áreas - CPA,

com o objetivo de recuperarem o controle territorial das favelas dominadas pelo crime

organizado – traficantes de drogas e/ou milícia.

2°Estabilização - período em que são intercaladas as ações de intervenção tática e

as ações de cerco da área delimitada, antecedendo o momento da implementação da

futura UPP. Nessa etapa já ocorre patrulhamento policial.

3° Implantação da UPP – momento em que ocorre a chegada efetiva dos policiais

militares capacitados, de acordo com a filosofia do programa, na favela determinada

pela Secretaria de Segurança. Inicia-se a preparação para a chegada de outros

serviços públicos e privados que possibilitem a reintegração desse território e de seus

moradores, a cidade e a sociedade democrática.

4° Avaliação e monitoramento – período em que as ações da polícia pacificadora e as

ações dos outros atores, prestadores de serviços públicos e privados, passam a ser

avaliados sistematicamente, com o objetivo, aprimoramentos do programa. Essa

etapa não foi plenamente implementada por enquanto.

No projeto também é debatido o que ocorrerá com o tráfico de drogas e a

ostentação de aramas por traficantes para impor domínio aos moradores das favelas.

Tanto para a Secretaria de Segurança do Estado como para os capitães responsáveis

pelas unidades instaladas, “almejar o fim do tráfico de drogas nas favelas seria utópico”

(MATTAR et al, 2010, pág. 77). Para os envolvidos tanto no desenho como na

implementação do projeto, as UPPs não têm como objetivo acabar com o trafico de

30

http://www.upprj.com/index.php/historico Acessado em: 16/04/2013

Page 41: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

41

drogas nas favelas, mas sim, minimiza-los ou leva-los a níveis mais aceitáveis. “Existe

tráfico em vários países do mundo, onde a polícia ganha bem, é totalmente aparelhada e

tem apoio da sociedade” (MATTAR et al, 2010, pág. 77). A busca é pela diminuição do

arsenal de armas em poder dos traficantes.

Todavia o projeto das UPPs não é uma experiência de inovação quanto a

policiamento permanente em favela no Rio de Janeiro. No início da década de 1980

surgiram no Estado as primeiras tentativas de implementação de uma política de

policiamento comunitário. O decreto n.º 913 de 27 de outubro de 198231

, determinava a

função do Posto de Policiamento Comunitário –PPC e do Destacamento de

Policiamento Ostensivo – DPO, que seria basicamente o policiamento ostensivo em

locais de difícil acesso e/ou locais de grande concentração populacional, como as

favelas e conjuntos habitacionais, sempre tendo a instituição da Policia Militar

representada por uma equipe de policiais permanentes nesses locais.

Em 1991, durante o segundo mandato do governador Leonel Brizola, foi

implementado o Grupamento de Aplicação Prático Escolar – GAPE, na favela da

Providência, que se situa na zona portuária da cidade. Era um programa que tinha por

objetivo prover segurança pública dentro das favelas cariocas, através da presença

constante da polícia na favela. Os policias envolvidos eram, em sua maioria, novos

recrutas que tinham sido especificamente treinados na metodologia de policiamento

comunitário (MISSE, 2010; RODRIGUES, 2011).

Em 1999, no governo de Anthony Garotinho, ocorreu uma nova tentativa,

denominada “Mutirão da Paz”, que foi implementada na favela da Vila Pereira da Silva,

o Pereirão, em Laranjeiras, na Zona Sul da cidade. O projeto “Mutirão” tinha como

objetivo a atuação da polícia na demanda dos moradores da favela, além de uma

integração com as secretarias de Trabalho; Educação; Saúde; Justiça; Meio Ambiente;

Ação Social; Esporte e Lazer; como a Defensoria Pública; o Departamento de Trânsito

do Estado do Rio de Janeiro- DETRANRJ; a Fundação de Amparo à Escola Técnica-

FAETEC; Centro Comunitário de Defesa da Cidadania – CCDCS; e com a sociedade

civil, através da ONG Viva Rio e Associação de Moradores de Laranjeiras. Entretanto,

essa iniciativa só durou dez meses quando o idealizador do projeto foi exonerado do seu

cargo na Secretaria de Segurança Pública do Estado (MISSE, 2010; RODRIGUES,

2011).

31

Modifica diretriz geral de operações do Decreto n.º 913, de 30 de setembro de 1976 do Rio de Janeiro.

Page 42: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

42

Inspirado nesses projetos, foi formulado no ano de 2000 o projeto Grupamento

de Policiamento em Áreas Especiais– GPAE, que também tinha por objetivo também o

policiamento comunitário nas favelas cariocas, inspirado na “filosofia” de polícia de

proximidade, esses pressupostos sugerem uma nova estratégia de abordagem policial

nas favelas, essencialmente preventiva e embasada no diálogo e respeito mútuo. Nesse

sentido, foi fundado visando a participação dos moradores das favelas, o Conselho de

Entidades e Lideranças Comunitárias, para dar suporte ao planejamento de segurança

local. Até 2002 apenas quatro grupamentos foram instalados na região metropolitana da

cidade: nas favelas do Cantagalo/Pavão/Pavãozinho; na favela do Cavalão, em Niterói;

nas favelas da Formiga/Chácara do Céu/Casa Branca, na Tijuca; e na Vila Cruzeiro, na

Penha (MISSE, 2010).

Desde o começo da implantação dos GPAEs ocorreram eventos conturbados de

confronto entre a polícia e os moradores das favelas. Em comum, as áreas que

receberam o projeto tinham elevada taxa de homicídios. Os policiais que foram

selecionados para trabalhar no projeto foram voluntários, isso é, já faziam parte da

corporação e se candidataram para lá trabalhar. Apesar dos cuidados na seleção dos

perfis e com o treinamento do efetivo, no primeiro ano de atuação do GPAE, cerca de

70% dos policiais foram transferidos por desvios de conduta (MISSE, 2010;

RODRIGUES, 2011). O GPAE foi, também, um modelo de polícia de proximidade, que

inicialmente despertou na sociedade carioca a esperança de ver os problemas de

violência das favelas resolvidos, mas que acabou esvaziado.

Entretanto, pesquisas que ocorreram nesses projetos que antecederam o projeto

das UPPs apontaram que o fato de manter os mesmos policiais alocados nos mesmos

lugares assegurava o “controle social mútuo por meio do qual tanto os policiais quanto

os moradores se reconhecem individualmente ao invés de se relacionar por meio de

categorias genéricas, com frequência, estereotipadas” (CANO et al, 2012, pág. 21).

Para o professor Luiz Eduardo Soares, ex-subsecretário de Segurança e

Coordenador de Segurança, Justiça e Cidadania, do Estado do Rio de Janeiro, entre

janeiro de 1999 e março de 2000, no governo de Anthony Garotinho, a diferença entre o

projeto da UPP para os outros projetos que, também, visavam a lógica da polícia de

proximidade nas favelas, é o grau de apoio e empenho por parte do governo. Para o

mesmo, no governo de Sérgio Cabral ocorre apoio e empenho quanto à elaboração,

implementação e suporte técnico-financeiro para o projeto. O governador acredita na

Page 43: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

43

concepção, prática, ganhos e sucesso das UPPs32

, em seu discurso logo após sua

reeleição, em 2010, o mesmo anunciava que,

A mãe de todas as prioridades continuará a ser a segurança. Sem ela, as

outras políticas públicas sofrem. Creches, hospitais, escolas, sofrem sem

segurança. Quero reafirmar que, em 2014, nenhuma comunidade do Rio

estará mais sobre o controle territorial dos marginais. As UPPs trouxeram

melhorias não apenas na vida daqueles que foram libertados do domínio do

tráfico, mas também para o entorno destas comunidades33

Percebe-se que a proposta de governo continua sendo a segurança pública com o

objetivo de recuperar territórios e reprimir a força violenta de grupos de traficantes nas

favelas e bairros periféricos, fazendo com que o Estado se torne presente em lugares

onde já não era mais. A análise de Luiz Eduardo Soares parece não atentar para uma

característica da nova política: o ingresso de uma grande força policial-militar nos

espaços de favela, desalojando ou provocando a real perda de controle territorial por

parte do crime organizado.

***

No dia 25 de julho de 2010 o jornal “O Dia” publica uma matéria intitulada “Um

salto de qualidade na educação”34

em que diz observar como a política de pacificação

das favelas cariocas teve impacto no ensino das escolas públicas nas áreas que têm

UPPs. A equipe de reportagem passou três meses entrevistando diretores, alunos e pais

de alunos, de dez escolas municipais de áreas que já estavam pacificadas. A matéria

jornalística também apresenta os dados do IDEB, das dez escolas, afirmando que dentre

essas oito já atingiram ou ultrapassaram as metas do Ministério da Educação, e que

algumas, a frequência por parte dos alunos quase dobrou. É possível ler o depoimento

de algumas diretoras dessas dez escolas, todas elas exaltando o aspecto positivo da UPP

no cotidiano da favela e com isso impactando diretamente o funcionamento da escola.

Para elas, de maneira geral, os professores não precisam mais disputar com o tráfico e

nem mais com a violência como a de tiroteios e mortes.

32

Entrevista de Luiz Eduardo Soares a René Ruschel (em 1 de dezembro de 2011)

http://www.luizeduardosoares.com/?p=854 - Acessada 23/03/2014 33

Discurso de Sérgio Cabral após ser reeleito ao governo do Estado do Rio de Janeiro. Cf. BRUNO,

Cássio; CABALLERO, Miguel. Reeleito, Cabral anuncia mais UPPs. O Globo, Caderno O País, segunda-

feira, 04/10/2010, p. 22. 34

http://odia.terra.com.br/portal/educacao/html/2010/7/um_salto_de_qualidade_na_educacao_98601.html

Acessado em 20/05/2014

Page 44: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

44

Monteiro e Rocha (2011) apresentam um estudo em que analisam o efeito causal

da violência no desempenho escolar de alunos da rede pública, medido através dos

conflitos armados entre traficantes e das notas na Prova Brasil. Os autores buscam

analisar o efeito sobre o desempenho escolar gerado pela violência – confrontos

armados – e não pelas características socioeconômicas dos alunos. Os resultados

indicam que alunos de escolas expostas a esse tipo de violência têm notas mais baixas

nos exames de matemática. Assim, quanto mais próxima dos territórios que apresentam

intensidade de conflitos maior o efeito negativo dessa violência nas notas da Prova

Brasil de matemática, e o efeito diminui com a distância entre a escola e o local de

conflito. O estudo evidenciou também, que os conflitos armados estão

significativamente associados com o abandono e a falta dos professores as escolas, e

com o fechamento “temporário” das escolas – suspenção de aula. Os autores não

analisam nenhum efeito direto das UPPs sobre a educação, buscando apenas o efeito da

diminuição de conflitos armados em volta das escolas, como uma medida específica de

violência, sobre as notas da Prova Brasil de matemática dos alunos que nelas estudam.

Em Butelli (2012) são verificadas mudanças de curto prazo na performance

escolar relacionando à implantação das UPPs, utilizando as notas de exames bimestrais

aplicados pela própria rede municipal de educação. O estudo aponta que o desempenho

nas provas bimestrais dos alunos, particularmente os que cursavam a 5ª e 6ª séries, é

afetado positivamente com a implementação das UPPs. Aponta também os efeitos

imediatos da percepção da redução da violência, o que implica na diminuição de faltas e

abandono por parte dos professores.

No estudo realizado por Burgos et al (2013) buscou-se analisar, através de

entrevistas, as percepções dos moradores quanto ao efeito das UPPs e o impacto das

mesmas no cotidiano da favela. O artigo apresenta que a principal mudança observada

pelos moradores no cotidiano é em relação à diminuição dos confrontos armados. Para

os autores, a diminuição dos confrontos armados é o principal ponto de “aceitação” das

UPPs pelos moradores das favelas. A expulsão do tráfico como centro de poder das

favelas possibilitou a “redefinição de trajetórias por parte daqueles que tinham uma

participação mais secundária no tráfico e que até por falta de alternativa tiveram que

permanecer na favela, buscando no estudo ou no trabalho novas formas de

sobrevivência” (BURGOS et al, 2013, pág 70). Neste caso, houve uma transformação

nessas trajetórias a partir do efeito simbólico.

Page 45: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

45

Entretanto, a “aceitação” não significa ausência problemas entre moradores e

policiais das UPPs. Uma das maiores reclamação apresentada no estudo foi o

cancelamento de certas atividades de lazer, em especial o baile funk. Também é

possível observar no estudo que com a chegada das UPPs a capacidade dos moradores

para reivindicar melhorias é “potencializada”. Isso é, com a chegada da UPP houve

oportunidades para transformar e retomar a identidade cidadã da favela.

Outro aspecto importante do efeito UPP que o estudo observou refere-se ao

mercado imobiliário, com a implementação do projeto houve uma grande valorização

dos imóveis nas favelas e do seu entorno. Houve também ações voltadas para a

regularização dos serviços públicos como acesso à água e à energia elétrica35

, e a

eventual necessidade de se pagar o Imposto Predial. Os moradores ressaltaram um

sentimento dúbio, uma vez que, reconhecem que esse processo tende a fortalecer a

identidade cidadã, integrando a favela e seus moradores à cidade, mas por outro lado,

temem o aumento das despesas e que com isso não consigam permanecer no local,

levando à mudança do local de residência.

Com base nesses estudos percebemos que as UPPs, aparentemente, têm impacto

no cotidiano das favelas e do seu entorno, e assim podemos pensar em como esses

estudos nos ajudam a ponderar o impacto dentro das escolas, quanto a composição do

alunado.

35

Ver estudo Cunha e Mello (2011) “Novos conflitos na cidade: A UPP e o processo de urbanização na

favela.”

Page 46: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

46

3. SEGREGAÇÃO URBANA E SEGREGAÇÃO ESCOLAR

Nesse capítulo iremos discutir como ocorre a segregação urbana, e como o seu

arranjo possibilitaria o acesso de alunos de origem social desfavorecida a oportunidades

escolares vantajosas. Contudo, antecedendo a esse objetivo iremos explicar a diferença

entre segregação e segmentação, tentando abranger, também, os aspectos da

diferenciação da segregação urbana e da segmentação urbana, uma vez que, organização

territorial está intimamente vinculada a fragmentação social da população.

Na dinâmica da produção de espaços na cidade, os lugares vão se diferenciando

e produzindo uma segregação residencial e social cujos efeitos devem ser

compreendidos, para que nesse sentido, o entendimento das consequências de um

território autossegregado possa ajudar na compreensão das implicações que o mesmo

impõe à educação (RIBEIRO; KOSLINSKI, 2009).

Em suma, os processos de segregação urbana influenciariam o desempenho, a

trajetória educacional e as oportunidades escolares de estudantes. A ideia é que

características da organização do território pode muitas vezes aumentar ou diminuir a

segregação entre as escolas.

***

Os estudos no campo da Sociologia da Educação tiveram um grande progresso

na década de 1960, que culminou na divulgação dos resultados do Relatório Coleman

nos Estados Unidos. O estudo empírico resultou nas teses de que: (a) o desempenho

escolar estava fortemente associado à origem socioeconômica dos alunos; (b) a

qualidade da escola não estava diretamente associada a quantidade de insumos

escolares; (c) alunos com backgrounds diferentes quando frequentavam escolas com

composição social heterogênea apresentavam desempenhos bastante variados

(COLEMAN, 2008).

As evidências encontradas apontaram que a composição social do meio escolar e

o background familiar eram os aspectos que mais fortemente apareciam correlacionados

com o sucesso no desempenho escolar dos alunos. Esses achados, que culminaram na

elaboração do relatório, repercutiram com a afirmativa de que “a escola não faz

diferença”. Entretanto, por mais que o Relatório sobre “Igualdade de Oportunidades

Educacionais”, realizado por James Coleman, tenha sido tão frustrante quanto ao papel

da escola na vida dos alunos, foi de suma importância para a formulação de políticas

públicas que vislumbravam heterogeneidade dentro das escolas. Madaus et al (2008)

Page 47: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

47

apontam que essas descobertas forneceram um fundamento lógico para a política de

dessegregação, incluindo o transporte coletivo para todos os alunos (bussing), que

foram desenvolvidas nos Estados Unidos no começo da década de 1970.

A conclusão de que a composição social da escola interfere no desempenho

acadêmico dos alunos oriundos de meios desfavorecidos fez com que o meio acadêmico

norte-americano passasse a acreditar “que o desempenho do aluno está profundamente

relacionado com as aspirações e background dos outros alunos da escola.”

(COLEMAN, 2008, p.31). Deste modo, os pares têm efeitos nas trajetórias escolares; a

heterogeneidade no ambiente escolar é positiva para os alunos de classes populares.

As críticas subsequentes aos achados do Relatório Coleman culminaram numa

sequência importante de estudos que não só se preocupavam em relativizar a conclusão

de que “a escola não importa”, mas, sobretudo, consideravam os processos de

aprendizagem (ALVES; SOARES, 2007). Contrapondo-se à ideia de que a escola não

impacta a vida escolar do aluno, esses novos estudos buscavam enfatizar que “as

diferenças nos resultados escolares não devem ser buscados apenas na família e no

contexto extra-escolar do aluno” (SOARES, 2009, p.8).

Os resultados apresentados nessas novas pesquisas fizeram com que a

Sociologia da Educação se interessasse pela temática do chamado “efeito-escola” e

“eficácia escolar” para melhor compreender como os estabelecimentos escolares

poderiam reduzir ou ampliar os efeitos das desigualdades sociais dos alunos durante a

sua trajetória escolar. Foram esses estudos, preocupados com a “caixa-preta” do

estabelecimento escolar, que atentaram para a importância da escola na mobilidade

social dos alunos menos favorecidos, apresentando resultados sugestivos de que os

estabelecimentos escolares como organizações institucionais poderiam reduzir a

influência que a origem socioeconômica dos alunos tem sobre o seu desempenho

escolar (SOARES, 2009).

Já no início dos anos de 1990 ocorre o ressurgimento de uma geração de estudos

do campo sociológico que passou a abordar a Sociologia da Educação relacionada à

Sociologia Urbana, retomando a tradição criada pelos famosos estudos da chamada

Escola de Chicago. Essa, que desenvolveu estudos nas décadas de 1920 e 1930, aliando

nomes como Robert Park, Roderick McKenzie, Louis Wirth e outros, recebe esse nome

por ser a cidade de Chicago o “laboratório” dos estudos e por que seus fundadores eram

professores da Universidade de Chicago do departamento de Sociologia (FREITAG,

Page 48: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

48

2006). Os estudos tinham “enfoque microssociológico, tendo a cidade por objeto de

observação” (HEINRICH, 2006, pág. 40).

Sobrevém uma retomada do debate sobre a relação entre território e desempenho

escolar, na tentativa de compreender como a organização territorial pode influenciar a

estrutura de acesso a oportunidades escolares, impactando diretamente na reprodução

das desigualdades sociais. A reflexão sobre o efeito do lugar de moradia ganha

destaque, novamente, no âmbito acadêmico, uma vez que a finalidade é entender qual o

papel desempenhado por instituições sociais e o território, e como eles se relacionam.

Com maior destaque na literatura americana, o conceito de “efeito vizinhança”

foi difundido para explicar as tomadas de decisões – individuais ou coletivas - e o

contexto sócio-espacial em que vive determinado grupo, e como tal efeito é percebido

em diversos aspectos da vida dos indivíduos (CHRISTÓVÃO et al, 2008).

A partir de duas teorias, o conceito de “efeito vizinhança” foi estruturado: (i)

teoria de isolamento social, em que um grupo de indivíduos marginalizados, seja por

questões de cor, religião, condições econômicas, etc., se isolam - geograficamente e/ou

redes sociais fechadas – da sociedade; e (ii) teoria de desorganização social, quando a

comunidade local não consegue promover valores comuns aos seus integrantes,

passando a existir um enfraquecimento dos valores coletivos do grupo no

comportamento individual. Em suma, as duas teorias ressaltam quanto uma vizinhança

pobre pode ser prejudicial ao indivíduo, ocasionando situações socialmente indesejadas.

Christóvão et al (2008) apontam que Wilson (1987) foi precursor dos estudos

sobre “efeito-vizinhança”, investigando como uma vizinhança pobre poderia afetar as

oportunidades na vida de indivíduo. A partir do dos guetos norte-americanos o autor

conseguiu observar que o efeito da concentração da pobreza numa vizinhança pobre,

aumenta a probabilidade de fatores como desemprego, evasão escolar, envolvimento

com crimes e gravidez precoce.

As pesquisas que sucederam este trabalho buscavam testar os efeitos da

vizinhança sobre estes fatores. Christóvão et al (2008) destacam Wacquant (1996,

2001, 2004) sociólogo que também estuda guetos norte-americanos e como o “efeito-

vizinhança” afeta as oportunidades desses moradores, argumenta que na escola ocorrem

princípios de organização pedagógica e institucional que distancia mais os alunos

moradores desses guetos dos alunos que não pertencem a ele, o que reproduz uma

situação de baixa expectativa social, tanto nos planos objetivos, como mobilidade

Page 49: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

49

social, como nos planos subjetivos, como cidadão integrante da sociedade

(CHRISTÓVÃO et al, 2008).

Já, para Christóvão et al (2008) foi Small (2001, 2004) através de um estudo de

caso de Villa Victoria, em Boston, buscou analisar como uma vizinhança pobre poderia

afetar o capital social dos indivíduos. Já que escolhas, anseios e preferências podem

resultar de tomada de decisões, as famílias que dispõem de certos valores e informações

podem ter acesso a mais alternativas de escolhas e optar pela que consideram a melhor.

O capital social seria suas redes de contato para obter essas diferentes alternativas de

informações, uma vez que, as relações sociais estabelecidas pelos indivíduos podem ser

a forma de se obter recursos para desenvolver estratégias de mobilização de benefícios e

informações.

De modo geral, tais estudos sobre “efeito-vizinhança” serviram para indicar que:

(a) a vizinhança afeta as chances na vida do indivíduo; (b) a vizinhança afeta as

oportunidades de escolhas durante a infância e adolescência; (c) os efeitos da família

afetam mais que os efeitos da vizinhança; (d) as redes sociais, que muitas vezes estão

relacionadas à vizinhança, por vezes as transcendem, tornando-se decisivas

(CHRISTÓVÃO et al, 2008).

A organização territorial pode ser uma variável que tende a desencadear vários

mecanismos efetivos de bloqueio do acesso a estruturas de oportunidades fornecidas

pelo Estado, pelo mercado e pela sociedade civil. Nessa perspectiva, precisa-se entender

como ocorre a segmentação e a segregação territorial, e como essas afetam as

oportunidades escolares.

A segmentação territorial é a distribuição desigual das condições de acesso

gerada pelo sistema de transportes, isso é, a capacidade de mobilidade das pessoas no

território metropolitano. Muitas vezes a oferta de mobilidade é afetada em razão da

escassez de transportes públicos disponíveis, ou em razão da alteração do preço das

passagens para que ocorra o deslocamento (RIBEIRO, 2008).

O fenômeno da segmentação nas metrópoles brasileiras, mais especificamente

na cidade do Rio de Janeiro, é interessante de se observar, pois apresenta um cenário

com grande concentração de oferta de emprego nas áreas centrais, ao mesmo tempo em

que, devido ao aumento de preço das habitações faz com que cresça a população

moradora das áreas de periferias e subúrbio, o que acaba por gerar um sistema

insatisfatório de transportes coletivos, proporcionando a expansão dos chamados

Page 50: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

50

“transportes alternativos” ou “transportes clandestinos”, e da capacidade de regulação

tarifaria dos agentes prestadores deste serviço (RIBEIRO et al, 2008).

Kaztman (2008) aponta que a segmentação implica em barreiras de acesso às

oportunidades, uma vez que, a dificuldade de mobilidade implica em disponibilidade de

tempo e de dinheiro, além de constituir uma barreira quanto a acesso de oportunidades,

isso é, a emprego, a informações, a contatos pessoais.

Em resumo, podemos entender que a segmentação territorial são as condições

que regulam o acesso a oportunidades e as dificuldades de deslocamento (mobilidade)

devido à estrutura de transporte da cidade. Em contrapartida, a segregação territorial

seria a organização quanto às disposições dos grupos sociais no território.

Na capital fluminense o território se organiza a partir de distâncias e oposições

simbólicas dos grupos sociais. O espaço social é caracterizado pela autosegregação das

camadas superiores da estrutura social, isso é, por mais que tenhamos distâncias físicas

ínfimas quanto a organização do territorial, assim classes com maior poder aquisitivo

convivendo no mesmo espaço físico com classes populares, é notável a segregação

social dos grupos. É fácil identificar a diferença de localização de um grupo em relação

ao outro no espaço social.

3.1 Segregação escolar e território na cidade do Rio de Janeiro

Na cidade do Rio de Janeiro as oportunidades educacionais estão distribuídas de

maneira singular, uma vez que, a relação entre o espaço urbano e o espaço social não

“dialogam” de forma equivalente, existindo diferença entre a estrutura física urbana e a

hierarquia social. Há no interior dos espaços que concentram as classes mais abastadas,

espaços geográficos para as classes populares, gerando assim, uma proximidade física

de grupos que ocupam posições sociais distintas (RIBEIRO, 1996).

A organização territorial da capital fluminense pode ser um condicionante ativo

das oportunidades educacionais. Uma vez que a disposição geográfica pode moldar as

escolhas das famílias e da gestão escolar, produzindo um sistema educacional

estratificado, com a composição social das escolas cada vez mais homogêneas,

concentrando os alunos pobres nas piores escolas e não convivendo com outro tipo de

realidade a não ser a sua. No cenário da cidade esse acontecimento é determinando

muitas vezes pela localização tanto da residência do aluno quanto do próprio

estabelecimento escolar. Essa separação reforçaria as desigualdades já existentes, já que

Page 51: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

51

os discentes com déficit social são agrupados em escolas igualmente deficientes

(ALVES et al, 2010; BURGOS, 2009).

Segundo Burgos (2009) o prestígio das escolas é muitas vezes determinado pela

localização da residência do aluno e/ou do próprio lugar de instalação do

estabelecimento escolar

Considerando que a maioria das escolas públicas de ensino fundamental

recruta seus alunos no próprio território onde está instalada, o lugar simbólico

da escola – tão importante para determinar o alcance de seu papel

institucional - passa a ficar atrelado ao status do território no mapa de

prestígio sócioespacial das cidades. Donde se conclui que um território

segregado por razões econômicas e/ou culturais, tende a segregar a escola

que o atende, marcando negativamente seus alunos, professores e

funcionários, e impondo consequências de enorme significado tanto para o

trabalho de instrução quanto para o de socialização. (Id., 2009, pág. 3)

Deste modo, a segregação territorial diferencia as escolas, funcionários e alunos,

impondo limites no que tange ao trabalho pedagógico e ao processo de socialização. O

autor também argumenta que a instituição escolar tende a ter como principal público os

moradores do bairro/região em que está localizada. Portanto, sendo os moradores

isolados socialmente, simbolicamente e territorialmente, a escola tende a funcionar sob

o princípio organizacional, pedagógico e institucional, de encapsulamento e

estigmatização, o que contribuiria para a distância social e para a reprodução da situação

de segregação territorial já existente na cidade.

A população carioca dispõe através da mídia e da própria secretaria municipal de

Educação, de sinais de classificação hierárquica das escolas públicas – IDEB, Prova

Brasil, Prova Rio – e os utiliza na busca por estabelecimento de ensino para seus filhos.

No entanto, como Costa et al (2010) apontam estes sinais disponibilizados para tal

classificação hierárquica das escolas não são inequívocos. As gestões escolares e as

administrações educacionais de nível intermediário – Conselhos Regionais de educação

(CRE) – não apenas regem a demanda discente, elas participam ativamente do processo

de matrícula, moldando a oferta e limitando as possibilidades de escolha e acesso dos

responsáveis36

.

Nessa perspectiva, o trabalho de Bruel (2014) analisa a política de matrícula do

referido município. O estudo indica que cada CRE possui autonomia para definir se as

escolas devem pedir às famílias que indiquem os estabelecimentos de ensino de

36

Ver dissertação de Carvalho (2014) “Segregação escolar e a burocracia educacional: uma análise da

composição do alunado nas escolas municipais do Rio de Janeiro”. E dissertação de Moreira (2014)

“Escolha e acesso às escolas municipais do Rio de Janeiro: um exercício de navegação social”

Page 52: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

52

preferência ou se as próprias instituições – as escolas e as CREs – são as que definirão

o estabelecimento de ensino de destino dos estudantes. A autora evidencia que ambas as

situações estão amparadas por regulamentação de normas de matrícula, entretanto,

produzem efeitos diferentes. Enquanto, em uma das situações os pais têm maior poder

de decisão sobre a vida escolar dos filhos, na outra situação é burocracia educacional

que assumem esse poder de decisão sobre qual estabelecimento escolar de destino.

A matrícula online foi inserida no contexto municipal de educação pública a

partir de 2010. Entretanto, houve muitas solicitações pelas famílias por matrículas em

escolas onde não haviam vagas. Por esse motivo, a partir de 2011 a SME restringiu a

escolha dos responsáveis às escolas que de fato possuíam vagas. Entretanto, em 2013 a

administração municipal estabeleceu que todas as instituições deveriam oferecer pelo

menos uma vaga para cada ano/série e turno que a escola possuía, mesmo que isso

implicasse permanecer com alunos excedentes em algumas turmas37

(BRUEL, 2014).

A busca por vagas nas escolas municipais através da matrícula online é

realizada, desde 2011, em dois momentos. O primeiro momento ocorre no final do ano

letivo e o segundo momento no início do ano seguinte, antes das aulas começarem. Os

dois momentos apresentam diferenças em relação aos critérios de alocação e

disponibilidade de vagas nos estabelecimentos escolares.

No primeiro momento de matrícula online os pais ou responsáveis devem

cadastrar no site da SME, além de informações sobre o aluno, um conjunto de no

mínimo três e no máximo cinco opções de escolas, por ordem de preferência38

. Em

seguida, uma vez feito o atendimento aos alunos que se enquadram nas prioridades

legais39

, a distribuição das vagas ocorrem de forma aleatória, por sorteio, sem

considerar a ordem de inscrição realizada pela internet. Além das prioridades

estabelecidas, também considera-se a distância entre a residência do aluno, a escola

atual e a escola escolhida pela família. Feita a distribuição das vagas, as famílias

recebem a confirmação da vaga em que foram alocados pela SME. O resultado é

enviado para os pais por meio de carta, e-mail e/ou mensagem de texto pelo celular,

além de ser disponibilizado no próprio site da SME. As famílias devem, em seguida,

37

Portaria E/SUBG/CP Nº 28, DE 09 DE OUTUBRO DE 2012, 38

Para os anos de 2010 e 2013, os pais poderiam escolher qualquer um dos estabelecimentos de ensino da

rede municipal, pois todos estavam disponíveis para receber solicitações de matrícula, diferente dos anos

2011 e 2012 cujas opções eram limitadas às escolas que possuíam vagas disponíveis. 39

Descritas na Portaria E/SUBG/CP Nº 28, DE 09 DE OUTUBRO DE 2012.

Page 53: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

53

realizar a matrícula na escola em que foram alocados dentro de um prazo determinado

pela SME (BRUEL, 2014).

O segundo momento da matrícula online é realizado início do ano letivo, antes

das aulas começarem, e destina-se as famílias que perderam o prazo do primeiro

momento de inscrição online, ou para as famílias que não foram alocadas nas escolas

escolhidas ou que não confirmaram a matrícula realizada no primeiro momento.

Contudo, os critérios de alocação e disponibilidade de vagas apresentam algumas

mudanças, são disponibilizadas como opção de escolha apenas as escolas que de fato

possuem vagas. E diferente do primeiro momento de inscrição, as famílias indicam

apenas uma opção de escola que imediatamente é retirada do banco de vagas e fica

reservada para a família que a solicitou. A distribuição das vagas não ocorre de forma

aleatória e a ordem de inscrição faz a diferença nesse momento (BRUEL, 2014).

Após os dois momentos de matrícula online, os pais podem buscar por

transferências internas nas escolas desejadas durante todo ano letivo. Isto é, os

responsáveis que não conseguiram vaga pelo sistema informatizado ou que não

participaram destes momentos por algum motivo, podem procurar vagas escolares indo

direto às escolas desejadas ou, ainda, podem recorrer à CRE, as direções das escolas,

nessa fase, efetuam diretamente as matrículas na própria escola. Pode-se tentar também,

ao longo do ano escolar, diretamente nas escolas a verificação de vagas ociosas e assim,

realizar a transferência do seu dependente da escola onde estava para esta escola.

A regulamentação para a matrícula escolar define-se, sistematicamente, em

quatro momentos (BRUEL, 2014; MOREIRA, 2014). Sendo o primeiro a “primeira

matrícula ou matrícula online” que é o período específico destinado aos alunos novos na

rede, aqueles que nunca estudaram em escolas municipais. Neste caso, a matrícula é

realizada pela internet num período específico e determinado pela SME ou direto na

escola desejada, após o período de matrícula online.

O segundo é conhecido como “renovação automática” que é o período

específico destinado aos alunos que já fazem parte da rede e que continuarão a estudar

na escola que estão matriculados. Ao final do ano letivo a matrícula do aluno é renovada

automaticamente bastando a escola oferecer a série/ano seguinte.

O terceiro momento é conhecido como “remanejamento” e ocorre quando a

escola não oferece o segmento seguinte, sendo necessário remanejar/transferir os alunos

em bloco para outra escola que ofereça o próximo segmento. Esse momento é

caracterizado por transferir os alunos em blocos para escolas “conveniadas”. Caso o

Page 54: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

54

responsável, por algum motivo, não queira que seu dependente estude na escola

sugerida no remanejamento, ele pode optar por outra escola através da matrícula online

ou pode buscar vaga direto na escola que deseja fora do prazo de matrícula online.

E o quarto e último momento é o de “transferências internas” sendo o único

momento que pode ocorrer durante todo o ano letivo para alunos que desejam fazer

transferências para escolas da rede municipal. Esse momento pode ser realizado online

num período específico e determinado pela SME ou direto nas escolas desejadas, após o

período específico de matrícula.

Com esses “quatro momentos” podemos observar que o processo de matrícula é

minimamente regulado, com regras e procedimentos formais estabelecidos. Porém,

vemos que em todas as etapas é permitida a procura por vagas escolares direto na

instituição escolar. A atuação da direção escolar, na distribuição de vagas escolares, vai

além das regras formais, a própria lei abre “brechas” para práticas não republicanas ao

permitir que a direção escolar exerça um domínio pessoal e arbitrário no acesso dos

alunos às escolas que elas administram. A regulamentação da Portaria E/SUBG/CP Nº

28, DE 09 DE OUTUBRO DE 2012 assegura que “as diretoras tenham maior poder

diante da distribuição de vagas escolares, mantendo e ampliando o poder institucional”

(MOREIRA, 2014, pág.58).

Existem evidências (COSTA; KOSLINSKI, 2009; COSTA et al, 2010;

ALMEIDA, 2011; CARVALHO, 2011) de que as escolas “selecionam” seus alunos,

uma vez que, a burocracia escolar dispõe de recursos para conduzir o ingresso de alunos

nas escolas, seja por seleção direta de vagas, seja através do remanejamento. Isso pode

ser uma importante explicação de porque de algumas escolas tenham tão poucos alunos

moradores de favela no seu quadro discente em comparação com outras escolas.

No estudo realizado por Costa et al (2010), os autores apontaram que “através de

simples visita às escolas, observa-se ausência de aleatoriedade. As escolas tendem a

uma certa homogeneidade socioeconômica” (Id., pág. 13 e14). Já o estudo de Alves et al

(2010) buscou ilustrar os efeitos das escolhas das famílias por escolas. Os resultados

indicaram que as famílias que buscaram escolas com qualidade relativa melhor para

seus dependentes, mesmo estes estabelecimentos sendo distantes do local de sua

residência, obtiveram efeitos positivos quanto à aprendizagem em comparação as

famílias que optaram por matricularem seus filhos numa escola próxima a sua

residência sem considerarem como fator principal a qualidade relativa da escola. A

partir desses resultados, podemos perceber que o território pode ser um condicionante

Page 55: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

55

na estratificação escolar, isso é, na disposição das oportunidades escolares, mas, a

capacidade de resistência e de adaptação dos atores - nesse caso as famílias - também

deve ser avaliada e considerada.

Page 56: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

56

4. METODOLOGIA

O desenho da pesquisa se baseia na ideia de que é possível a ocorrência de

alterações na composição socioespacial e socioeconômica nas escolas da região

estudada. Para tal, será acompanhada a evolução dos indicadores educacionais e sociais

dessas escolas antes e depois da implantação das UPPs. Entretanto, temos uma

dificuldade operacional, pois não dispomos de uma série histórica longa. Não se trata de

um estudo longitudinal, posto que limites de tempo e operacionais impõem que as

escolas sejam tomadas como unidade básica de análise, não os alunos.

O recorte do estudo será a Grande Tijuca. Os bairros que integram essa área são:

Praça da Bandeira, Tijuca, Alto da Boa Vista, Maracanã, Vila Isabel, Grajaú e Andaraí.

São importantes bairros localizados na zona norte da cidade do Rio de Janeiro. A

escolha dessa área é devida a apresentação de características propícias para a realização

do estudo, já que, tem sua organização socioespacial bem delimitada em termos de

favelas e áreas de urbanização regular. Além disso, a Grande Tijuca tem grande

concentração de favelas, mas também contrastes marcantes com a população “do

asfalto”.

Os anos estudados serão de 2008 à 2012, pois, em 2010 houve a implementação das

UPPs na região da Grande Tijuca sendo esse o ano “marco” para o estudo. Optamos

por analisar os dois anos anteriores a essa implementação e os dois anos posteriores,

para poder observar se há alguma tendência de mudanças significativas na composição

das escolas sob influência potencial de tal política. A adoção de uma série histórica

curta se deve a que os dados disponíveis, a partir de dados de cadastro da Secretaria

Municipal de Educação do Rio de Janeiro, tem qualidade bem inferior conforme se

retrocede no tempo. Por outro lado, não seria possível trabalhar apenas com dados do

período após a implantação das UPPs, desde que estes não registrariam mudanças que já

estivessem ocorrendo no fenômeno estudado. O desenho geral se inspira na ideia de

séries temporais interrompidas, ainda que uma série curta apresente inevitáveis

problemas.

Os alunos a serem estudados são os do 1°, 5°, 6° e 9° ano do ciclo básico. A

pretensão com tais séries foi a de tomar estudantes com trajetórias escolares distintas,

idades bem variáveis, cobrindo os dois segmentos do ensino fundamental e,

potencialmente, apresentando autonomia de deslocamentos espaciais bem variadas.

Como a hipótese testada trata de mudanças na composição de escolas, essa condição de

Page 57: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

57

mobilidade espacial pode ser um dos fatores associados. Um tratamento mais preciso

para nossa análise exigiria que todos os estudantes municipais moradores das favelas da

região fossem incorporados às análises. Todavia, isso exigiria a geocodificação de todos

os alunos do município que, ao longo dos cinco anos, apresentassem registro de

endereço que sugerisse residência na área em foco. Essa localização deveria ser, então,

confirmada por meio de geocodificação, o que implicaria em capacidade operacional

bem acima da disponível para o alcance de uma dissertação. Portanto, a amostra incluiu

apenas os alunos das escolas da região, mesmo que moradores de áreas fora da mesma,

mas não os moradores da região que estudam fora dela.

Iremos trabalhar com duas bases de dados, a primeira está disponibilizada no site do

Inep e contém informações sobre o desempenho das escolas medido através da

avaliação externa - Prova Brasil- e sobre o perfil socioeconômico dos alunos.

Entretanto, para esse estudo foram utilizadas, apenas, as notas dessa Prova Brasil, uma

vez que, o sistema apresenta dados apenas dos alunos presentes na data e nas séries do

teste. A partir desse banco, foram construídas as variáveis sobre a Prova Brasil

Padronizada para uma escola de 0 a 10 - PBP, para a prova de língua portuguesa e

matemática dos anos de 2005, 2007, 2009 e 2011. Tais medidas não compõem o foco

central desse estudo, dedicado a observar possíveis alterações composicionais nas

escolas, mas ajudam a ilustrar um panorama geral de impactos potenciais das UPPs. A

segunda base de dados é da Secretaria Municipal de Educação - SME e é composta por

informações relevantes como: i) cadastro de alunos e características das famílias; ii)

alocação e movimentação educacional dos alunos; iii) características das escolas.

Nossa expectativa na realização do trabalho analítico é investigar se houve

mudanças na composição socioespacial e socioeconômica dos alunos das escolas da

região estudada. Testaremos a evolução dos indicadores de composição das escolas e do

território - favela e não favela. Nessa etapa, usaremos o recurso operacional de

geocodificação40

da residência dos estudantes. Utilizando a estatística descritiva para

cada ano e para cada escola para analisarmos as possíveis mudanças do corpo discente

de cada estabelecimento ao longo de cada ano.

A ideia geral é verificar se há impacto das UPPs em processos de segregação -

aqui entendida como a distribuição desigual de alunos com características semelhantes

em diferentes escolas - e se tal impacto pode ser observado através de alguns

40

Geocodificação pode ser definida como a associação de coordenadas geográficas a dados geográficos

em forma textual como endereços e CEPs. Utilizamos como recurso o software ArcGIS.

Page 58: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

58

indicadores simples, mas expressivos de diferenças categóricas em meio ao alunado.

Para o cálculo de alguns índices de segregação, há necessidade de dicotomizar as

variáveis.

Recorremos a quatro variáveis que podem indicar tais diferenças e, portanto,

tendências no processo de segregação: 1) Pobreza, medida através da existência de

Número de Inscrição Social (NIS) entre as informações dos alunos41

; 2) cor; 3)

educação da mãe; 4) local de moradia.

A variável utilizada para medir a situação de pobreza dos alunos foi uma proxy,

o registro social nacional (NIS - Número de Inscrição Social). Os alunos ou

responsáveis que têm esse registro tendem a ser aqueles que recebem ou receberam

algum beneficio através de programa de transferência de renda do poder público42

. A

variável cor é colhida conforme as categorias do IBGE e foi, para algumas análises,

recodificada em duas variáveis dicotômicas: 1) alunos pretos ou não, 2) alunos brancos

ou não43

. Em relação ao indicador “educação dos responsáveis”, utilizando a variável

‘escolaridade da mãe’, duas foram as dicotomizações adotadas, quando necessário: 1)

até ensino fundamental completo, ou mais; e 2) até ensino médio completo, ou mais. Já

as informações do “local de moradia” foram dicotomizadas segundo o critério de

residência ou não em favela. A partir dessas variáveis construímos também os índices

Segregation Index (GS) e Segregation Ratio (SR)44

.

41

Há uma variável nos bancos da SME aos quais tivemos acesso que permitiria identificar se o aluno é

beneficiário de alguma bolsa do tipo Bolsa Família ou Bolsa Família Carioca. Esse será nosso indicador

de condição de pobreza. Contudo, a condição de beneficiário será aferida pela existência de informação

acerca do NIS de aluno e sua mãe/responsável no banco. Tal informação é um indicador mais seguro

acerca da condição de beneficiário de programa de transferência de renda, dados alguns problemas com o

preenchimento das informações diretas sobre a concessão de bolsa. Há limites, pois alunos podem entrar e

sair dessa condição de “bolsistas”, o que não deve ser acompanhado do registro de alterações no cadastro

dos alunos. Assim, é provável que tenhamos casos de falso positivo entre os alunos identificados como

“pobres”, ou bolsistas, em um ou outro ano. Não há como contornar tal problema, mas é possível afirmar

que não há falsos negativos. Todos os alunos que são ou foram bolsistas em algum momento,

inevitavelmente têm seus NIS registrados no sistema. 42

Desde 1990, o Governo Federal do Brasil, juntamente com as administrações estaduais e municipais,

implementou uma série de políticas sociais, na tentativa de diminuir a pobreza. Estas políticas têm como

uma das ações a transferência de dinheiro para as famílias em situação de pobreza. 43

A diferença está no agrupamento dos alunos pardos, maioria da amostra, junto aos brancos, ou junto

aos pretos. Indígenas e amarelos, também segundo a categorização do IBGE, apresentam percentuais

desprezíveis. 44

As estratégias de organização e análise dos dados dos estudantes, conforme princípios dicotômicos,

geradores de índices simples de segregação, replicam procedimentos adotados na tese de Tiago Lisboa

Bartholo “School Segregation in Public Schools of Rio de Janeiro: Causes and Consequences”, 2014,

também integrante de nosso grupo de pesquisa.

Page 59: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

59

4.1 Os índices: Segregation Index (GS) e Segregation Ratio (SR)

Os índices de segregação expostos por Gorad, Taylor e Fitz, (2003): Segregation

Index (GS)45

e Segregation Ratio (SR) foram desenvolvidos para medir segregação

como a distribuição desigual de alunos com características semelhantes entre escolas

diferentes. Os dois índices foram formulados em meio a debates sobre como diferentes

grupos sociais ou étnicos eram distribuídos na região do estudo, nesse caso na

Inglaterra, e se havia evidências de que esses grupos sofriam segregação.

O índice GS foi construído para medir segregação a partir das diferenças entre

cada indivíduo observado, em um conjunto de escolas. O índice GS calcula que

percentual de alunos deveria ser transferido em um conjunto de escolas, de modo que

houvesse equilíbrio entre as escolas em termos de uma característica específica do

alunado. Tal índice só tem significado para grupos de escolas. Não resulta, portanto, em

um índice referente a uma escola específica, dado que ele indica qual o percentual exato

de alunos que precisariam trocar de escola, no conjunto observado, para que o sistema

apresentasse uma segregação igual a zero, hipotética e virtualmente impossível de ser

observada em termos reais. O indicador é especialmente útil para permitir observar as

tendências ao longo do tempo, referidas a um padrão “ouro”, hipotético. Por exemplo:

(...) um sistema de ensino com 2 escolas e 200 alunos, divididos em número

igual entre eles. Se a escola "A" tinha apenas meninos (100 alunos) e da

escola "B" apenas meninas (também 100 cem), seria possível argumentar que

este sistema de ensino teve total segregação por sexo. É importante notar que,

se 20 meninos da escola "A" simplesmente deixarem a escola, ainda teríamos

total segregação por sexo. (BARTHOLO, 2013, pág.11)

Com o GS pode-se gerar índices de segregação para qualquer característica

tomada dicotomicamente e, nesse estudo, foram consideradas as anteriormente

descritas. A partir dele faremos uma análise de tendências ao longo do tempo de 2008 à

2012. Sua fórmula pode ser descrita como (GORARD; TAYLOR; FITZ, 2003):

GS = 0.5 * {Σ │ Fi / F - Ti / T │}

45

Este índice foi criado pelo primeiro autor, em meio a embates e polêmicas acerca da identificação dos

processos de segregação no Reino Unido. Acabou sendo batizado com seu nome, Gorard Segregation

Index, GSI, ou simplesmente GS.

Page 60: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

60

1) "Fi" é o número de alunos potencialmente desfavorecidos na escola i, onde i varia de

1 ao número de escolas;

2) "F" é o número total dos alunos potencialmente carentes em escolas públicas

municipais do Rio de Janeiro;

3) "Ti" é o número total de alunos na escola i, onde i varia de 1 até o número de escolas,

4) "T" É o número total de alunos nas escolas públicas municipais do Rio de Janeiro.

Em contrapartida, o índice SR representa uma tendência de segregação entre as

escolas em um ano específico. Ele resulta em um escore para cada escola, variando

potencialmente entre 0 e infinito, com o valor 1 representando uma distribuição perfeita

de alunos com a característica em foco entre as escolas do conjunto analisado. Contudo,

uma característica particular dessa medida é que o SR de uma escola é mutuamente

determinado pelos níveis relativos de segregação de outras escolas (Bartholo, 2013).

Sua fórmula pode ser descrita como (Gorard; Taylor; Fitz, 2003)46

:

SR = (Fi / F) / (Ti / T)

1) "Fi" é o número de alunos potencialmente desfavorecidos na escola i, onde i varia de

1 ao número de escolas;

2) "F" é o número total dos alunos potencialmente carentes em escolas públicas

municipais do Rio de Janeiro;

3) "Ti" é o número total de alunos na escola i, onde i varia de 1 até o número de escolas,

4) "T" É o número total de alunos nas escolas públicas municipais do Rio de Janeiro.

Tanto o SR quanto o GS, portanto, auxiliam a registrar a ocorrência do

fenômeno da segregação e aspectos de sua evolução. São medidas simples, que não

demandam estatística sofisticada, mas adequadas ao tratamento das diferenças de

oportunidades quanto a características discretas da população.

46

Em outros termos, o SR não pode ser usado para comparações ao longo do tempo, dado que não é

invariante, sendo afetado por alterações na proporção do indicador para o conjunto das escolas. Para

discussão técnica sobre indicadores de segregação, ver Gorard, S (2009) e Gorard, S., & Taylor, C. (2002)

Page 61: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

61

4.2 Geocodificação

O termo geocodificação pode ser definido como a associação de coordenadas

geográficas a dados geográficos em forma textual como endereços, enquanto o termo

georreferenciamento significa a localização de objetos geográficos em um sistema de

coordenadas com dado sistema de referência47

.

O objetivo do processo de geocodificação48

no estudo é localizar os endereços

dos alunos da região estudada com a maior exatidão espacial possível, o que implica,

numa localização com o endereço completo, isto é, considerando o nome e o tipo do

logradouro, assim como seu número de porta. Entretanto, os endereços localizados nas

favelas, são os mais difíceis de serem localizados, devido a falta de dados nos bancos

disponíveis, assim, muitas vezes localizamos a favela que o aluno mora e não o local

exato, isto é, seu endereço completo com logradouro e número de porta.

O processo de geocodificação adotado no trabalho consiste de três etapas: (1)

Autogeocoder; (2) Geocodificação manual; (3) Banco de Cadastro Nacional de

Endereços para Fins Estatísticos- CNEFE. Depois de cada etapa os endereços achados

são separados e colocados em uma pasta e os endereços que não foram encontrados

entram na etapa seguinte até se esgotar a possibilidade de encontrá-los.

Fluxograma 1: Processos de geocodificação

47

Algumas etapas desse trabalho foram baseadas no manual interno de geocodificação do projeto

“Observatório de Educação e Cidade” desenvolvido pelos pesquisadores Caio Victer e Wolfram Lange

(2011). 48

Nessa etapa do trabalho pude contar com a ajuda e colaboração dos bolsistas de iniciação científica do

projeto “Observatório de Educação e Cidade”.

Page 62: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

62

4.2.1 Autogeocoder

O AutoGeoCoder é um programa que utiliza tabelas em formato Excel 1997-

2003 e Excel 2007 (*.xls) para executar a busca das coordenadas geográficas de acordo

com os propriedades que a tabela contém como endereço, bairro, cep, cidade, estado,

etc. O programa busca os dados geográficos de maneira automática consultando o

mesmo banco de dados geográficos do Google Earth/Google Maps, por isso necessita

que o computador que esteja realizado o trabalho fique conectado a internet.

4.2.2 Geocodificação manual

A principal ferramenta da geocodificação manual é o Google Earth (GE). Nessa

tentativa o objetivo também é geocodificar por rua e número, mas se não for encontrado

o número também pode-se geocodificar por rua/CEP e só rua ou só CEP. Muitas vezes

o grupo utilizou o “Street View”, um recurso do GE que permite explorar lugares

através de imagens panorâmicas, em 360°, no nível da rua.

Nessa etapa o grupo procurou os endereços não encontrados pelo AutoGeoCoder,

um a um. Copiando e cole o endereço da tabela no campo de busca do GE. Por

exemplo, o endereço a ser geocodificado é: RUA HADDOCK LOBO, 300, Tijuca, Rio

de Janeiro. Se o GE achou diretamente o endereço e visualizou o ponto encontrado no

mapa, basta tomar as coordenadas do endereço achado.

4.2.3 Banco de Cadastro Nacional de Endereços para Fins Estatísticos- CNEFE

Nessa última etapa do trabalho, a principal ferramenta é o Banco de Cadastro

Nacional de Endereços para Fins Estatísticos - CNEFE do IBGE, juntamente com a

base dos Setores Censitários do Censo 2010 do IBGE e o Google Earth (GE).

Setor Censitário é unidade territorial de coleta das operações censitárias,

definido pelo IBGE, com limites físicos identificados, em áreas contínuas e respeitando

a divisão político-administrativa do Brasil. O setor censitário é a menor unidade

territorial, com limites físicos identificáveis em campo, com dimensão adequada à

Page 63: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

63

operação de pesquisas e cujo conjunto esgota a totalidade do Território Nacional, o que

permite assegurar a plena cobertura do país49

.

Nessa terceira etapa o objetivo é geocodificar por área, mais especificamente

observar se o setor censitário se refere a uma área de favela. Para isso utilizamos uma

base de dados juntado as informações da base do CNEFE como a da base dos Setores

Censitários de todo o município do Rio de Janeiro.

Quando o banco encontra o endereço pedido, acompanhado dessa informação vêm

outras informações como: código de área de ponderação, bairro, cep, código do

município, código de geocodificação, etc. E a variável que fornece o código de

geocodificação é a que é referente ao setor censitário do endereço procurado.

Após essa procura abrimos o GE com as delimitações de todos os Setores

Censitários do município do Rio de Janeiro50

. E com o número do código de

geocodificação da base de dados, copiado, o GE automaticamente aponta no mapa o

setor referente aquele endereço. É importante ressaltar que a maioria dos endereços

buscados nessa etapa eram referentes a favelas.

4.3 Problemas encontrados e dados missing

O primeiro problema detectado no tratamento dos bancos de dados se refere a

uma certa instabilidade nas informações referentes a algumas escolas da região

estudada. Ao longo dos recortes nos bancos de dados para que pudéssemos obter quais

escolas estudaríamos e depois quais alunos dessas escolas fariam parte da nossa

amostra, percebemos alguns problemas em relação a quantidade de alunos em sete

escolas, nas turmas do 1º ano do ciclo. A tabela abaixo apresenta o número de alunos

em cada escola “problemática” nos cincos anos estudados.

49

http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/defaulttab_agregado.shtm - Visto em setembro de

2014. 50

Essa base eu consegui com o pesquisador Eduardo Ribeiro da UERJ, a quem gostaria de agradecer pela

ajuda e suporte técnico no trabalho de geocodificação.

Page 64: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

64

Tabela 2: Quantidade alunos nas escolas e nas turmas

Escola

2008 2009 2010 2011 2012 Quantidade de turmas no 1º ano

ano

ano

ano

ano

ano nas escolas

120 23 20 21 13 57

● 2 turmas de 1º ano em 2008

● 3 turmas de 1º ano em 2009

● 3 turmas de 1º ano em 2010

● 3 turmas de 1º ano em 2011

● 2 turmas de 1º ano em 2012

129 20 20 18 27 16 ● 2008 à 2012 uma turma de 1ºano

130 19 28 27 16 16

● 1 turmas de 1º ano em 2008

● 3 turmas de 1º ano em 2009

● 2 turmas de 1º ano em 2010

● 1 turmas de 1º ano em 2011

● 1 turmas de 1º ano em 2012

131 21 21 22 11 19

● 1 turmas de 1º ano em 2008

● 3 turmas de 1º ano em 2009

● 2 turmas de 1º ano em 2010

● 1 turmas de 1º ano em 2011

● 1 turmas de 1º ano em 2012

144 18 20 13 11 45 ● 2008 à 2012 uma turma de 1ºano

156 27 20 21 9 72

● 3turmas de 1º ano em 2008

● 3 turmas de 1º ano em 2009

● 3 turmas de 1º ano em 2010

● 2 turmas de 1º ano em 2011

● 3 turmas de 1º ano em 2012

158 23 20 13 8 27 ● 2008 à 2012 uma turma de 1ºano

Na escola 120 nos anos de 2008 à 2010 e nas escolas 130 e 131 nos anos de

2009 e 2010, a quantidade de alunos é considerada baixa para a quantidade de turmas

registradas, entretanto esses números equivalem ao total de alunos nas escolas e na série

do 1º ano do ensino fundamental disponibilizado no cadastro do banco de dados da

SME. O número de turmas apontado no sistema pode estar errado, podendo ser menor.

Já nas escolas 129 no ano de 2012 e na escola 130 nos anos de 2011 e 2012, o

número de alunos é considerado baixo, mas não insuficiente para abrir uma turma numa

escola. A explicação pode ser também algum erro no preenchimento de tal informação

no sistema do banco de dados da SME, ou o remanejamento desses alunos que

poderiam compor “turmas de projetos”.

Uma última razão para a instabilidade apresentada nessas escolas seria de ordem

demográfica. Dada a demanda decrescente nas séries iniciais, é plausível imaginar que

Page 65: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

65

algumas escolas enfrentem oscilações e haja remanejamento entre turmas de escolas das

mesmas regiões.

Em relação aos dados missing das variáveis utilizadas, não há problemas quanto

às variáveis “tem NIS” e “morar ou não em favela”. Nessas duas, pela própria

arquitetura de construção da amostra, não há a possibilidade de ocorrência de dados

faltantes. O registro do NIS, quando existe, significa que o estudante foi ou é

beneficiário de algum programa de transferência condicional de renda. Na inexistência

dessa informação, assume-se que não é beneficiário. A amostra de alunos incluídos no

processamento se restringiu a aqueles que possuíam algum registro de endereço em seu

cadastro, o que afasta a possibilidade de missing na amostra e vem a ser a quase

totalidade dos casos.

Entretanto, encontramos missing nas variáveis “cor do aluno” e “escolaridade da

mãe”. Os missing vão diminuindo conforme os anos passam, isso é, ocorre uma melhora

quanto ao preenchimento dos dados ao longo dos anos. Em seu estudo que analisou os

padrões de segregação da rede municipal do Rio de Janeiro, Bartholo (2014) indicou

que os casos de dados missing não estão distribuídos aleatoriamente nesses bancos de

dados, há uma maior proporção de alunos em potencial desvantagem dentro do grupo de

missing. De acordo com o autor, a maior parte dos alunos que não apresentam

informação sobre escolaridade dos pais é constituído por alunos de cor preta, por

exemplo, ou é beneficiária de programa de transferência de renda..

Em nosso caso, existe maior concentração de dados missing na variável

“escolaridade materna”, apesar de irem diminuindo ao longo dos cinco anos estudados,

como mostra a tabela 8. Deste modo, decidimos fazer um cruzamento entre essa

variável e as variáveis “morar ou não em favela”; “ter NIS” e “ser preto ou não” para

ver qual o perfil dos alunos, ao longo dos anos que não tem informação quanto a

escolaridade da mãe. Tal procedimento é indispensável pois, como a proporção de

missing cai consideravelmente com o tempo, novos casos vão sendo integrados à análise

e esses podem inserir um viés de seleção não desprezível, ameaçando a interpretação de

resultados encontrados.

Tabela 3: Percentual de missing – variável “escolaridade materna”

2008 2009 2010 2011 2012

23% 21% 18% 16% 15%

Page 66: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

66

Gráfico 3 : Perfil dos alunos com informação na variável “escolaridade materna” –

2008 a 2012

Os gráfico 3 apresenta a variação no tempo da associação entre alunos com

informação acerca da escolaridade da mãe e outras características com a informação

existente. Ele revela que, com o forte incremento na informação sobre escolaridade, não

há alteração substantiva nas proporções dos alunos de cor preta ou residentes em favela.

Apenas um crescimento de cinco pontos percentuais se observa para alunos com NIS,

de 2011 para 2012, o que deve ser explicado pelo crescimento dos programas de

transferência condicional de renda, não estando, portanto, associado com o aumento do

número de indivíduos com informações mais completas. De certa forma, afasta-se o

risco de termos progressivamente mais alunos incluídos, para essa amostra, em

condições de desvantagem, nos modelos de análise multivariada.

Os dados missing referente à variável cor, também foram calculados,

considerando os casos em branco, isso é, que não constavam resposta e os casos que

continham a informação “não declarado”, como sendo dados missing. Assim, como na

variável “escolaridade materna”, na variável cor os dados missing vão diminuindo ao

longo dos cinco anos, como a tabela 7 apresenta.

Tabela 4: Percentual de missing dos dados – variável “cor”

2008 2009 2010 2011 2012

8,4% 8% 7,4% 6,3% 5,9%

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

2008 2009 2010 2011 2012

Alunos pretos Alunos que moram em favela Alunos que tem NIS

Page 67: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

67

Gráfico 4: Perfil dos alunos com informação na variável “Cor” – 2008 a 2012

Da mesma forma como na análise de missing para a “escolaridade da mãe”, nossa

principal variável de interesse, a residência em favela, não parece alterada pela inclusão

de mais informações sobre a cor dos alunos. A elevação da proporção de indivíduos

com informação do NIS pode ter a mesma interpretação anterior e a queda na proporção

de mães com baixa escolaridade pode estar associada a uma elevação tendencial na

escolaridade geral da população, ou a uma mudança no perfil dos residentes da região,

mas em sentido inverso ao anterior. Apesar de maior proporção de pessoas com NIS,

mais pessoas adultas com escolaridade mais elevada passam a constar de nossa amostra,

o que pode indicar mudanças no perfil dos moradores da região, o que pode, também,

estar associado a mudanças no mercado imobiliário - um possível efeito das UPPs51

.

51

http://oglobo.globo.com/rio/efeito-upp-na-valorizacao-de-imoveis-chega-15-11021226 ;

http://www.upprj.com/index.php/acontece/acontece-selecionado/proprietarios-de-imoveis-em-areas-com-

upp-estaeo-rindo-a-toa-com-a-valoriza/ - Visitado em setembro de 2014.

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

2008 2009 2010 2011 2012

Tem NIS

Mora em favela

Baixa escolaridade

materna

Page 68: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

68

5. ANÁLISES DE COMPOSIÇÃO SOCIAL DAS ESCOLAS

Este capítulo analisa as possíveis mudanças na composição socioeconômica e

espacial do alunado nas escolas a partir da implantação das UPPs. O objetivo é observar

se ocorre mudança de padrão quanto à alocação de alunos nas escolas estudadas, assim,

vamos considerar uma série histórica cobrindo o ano de 2008 ao ano de 2012. A

hipótese é que a implementação das UPPs pode ter impactado a composição discente

das escolas. Deste modo, as escolas tenderiam a ter seu corpo discente mais

heterogêneo, isso é, os alunos residentes em áreas de favelas passariam a ter maior

acesso às escolas localizadas fora das favelas e/ou das áreas que sofriam domínio dos

traficantes de drogas ou milicianos. Destacamos que há sempre a hipótese alternativa de

que as UPPs tenham favorecido a um fenômeno oposto ao de nossa hipótese principal:

alunos das áreas estudadas, sob influência das UPPs passariam a ter menos razões para

se deslocarem em busca de escolas fora de seu contexto imediato de residência, dado

que o “esfriamento” desses ambientes reduziria a busca por espaços mais tranquilos.

Para testar essa hipótese, seriam necessários procedimentos analíticos que não estavam

ao alcance no tempo disponível para o desenvolvimento dessa dissertação. Por exemplo,

seria possível observar os movimentos de estudantes de áreas de favela estudando

distante de suas residências para as escolas próximas de suas residências, o que exigiria

um tratamento longitudinal ao nível dos estudantes.

5.1 As escolas

A rede municipal de educação é constituída por cerca de mil e trezentas escolas,

sendo aproximadamente mil as que oferecem o Ensino Fundamental. A população anual

de alunos é de cerca de oitocentos mil, considerando todos os níveis, da creche, até a

educação de jovens e adultos. Em 2013, 1004 escolas ofertaram o Ensino Fundamental

– 1° ao 9° ano – totalizando cerca de 647 mil crianças e adolescente atendidos nas

escolas municipais (Guia da Matrícula, 2014).

A região da Grande Tijuca foi escolhida para o estudo, pois é contemplada por um

número significativo de escolas municipais distribuídas nas favelas e no asfalto –

quarenta e seis52

escolas municipais que oferecem o 1° e o 2° segmento do ensino

52

Entretanto, tivemos que retirar uma escola do nosso universo, pois a mesma apresentava, a partir da

base da SME, números insignificantes de alunos nos cinco anos estudados. 2008 (1º ano = 6 / 5º ano= 9);

Page 69: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

69

fundamental – e por apresentar uma demanda significativa – 36.679 mil53

– de alunos

em idade escolar54

. A presença de número expressivo de favelas em uma região de

classe média, supúnhamos, asseguraria a observação de contrastes.

Tabela 5: Quantidade de escolas municipais por segmento – 2012.

Apenas 1º

segmento

Apenas 2º

segmento

1º e 2º

segmentos

Total de

escolas

22 7 16 45

Em primeiro lugar, dividimos as escolas de acordo com sua localização territorial,

isso é, em um grupo de até 100 metros de favela(s) e outro a mais de 100 metros de

favela(s). Depois, dividimos dentro desses grupos as escolas por segmento que

oferecem. Esse critério adotado para distinguir a localização das escolas é um tanto

arbitrário, pois sabemos que uma escola que se localiza a uma distância até 100 metros

de uma favela não significa que esteja, necessariamente, sob influência direta dessa

favela, ou que seus alunos sejam oriundos dessa favela. Entretanto, trata-se de uma

primeira abordagem, supondo um efeito territorial difuso. Já, a distinção entre

segmentos pode ser relevante, pois supõe diferenças na autonomia de mobilidade

espacial dos alunos.

2009 (1º ano = 6 / 5º ano= 12); 2010(1º ano = 3 / 5º ano=5); 2011 (1º ano = 1 / 5º ano= 4); 2012 (1º ano =

17 / 5º ano= 2) 53

Dados Censo 2010 http://www.censo2010.ibge.gov.br/apps/areaponderacao/index.html Acessado:

24/06/2014 54

Idade escolar aqui é considerado de 5 a 14 anos.

Page 70: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

70

Mapa 4 – Localização das escolas na Grande Tijuca55

Tabela 6: Quantidade de escolas a mais de 100m de favela(s) –2012

Apenas 1º

segmento

Apenas 2º

segmento

1º e 2º

segmentos

Total de

escolas

13 5 16 34

Tabela 7: Quantidade de escolas até 100m de favela(s) –2012

Apenas 1º

segmento

Apenas 2º

segmento

1º e 2º

segmentos

Total de

escolas

9 2 0 11

É possível observar que a maioria das escolas que se localizam até 100 metros

de favelas atendem apenas ao 1º segmento da educação básica. Já as escolas um pouco

55

Não foi possível, nesse mapa, destacar as áreas não habitadas, no caso, as regiões de mata e montanha,

o que reduziria consideravelmente a impressão de que a área urbanizada ocupada pelos bairros, o

“asfalto”, é muito maior que a ocupada pelas favelas.

Page 71: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

71

mais afastadas das favelas são mais diversas quanto à oferta escolar, provavelmente

expressando o histórico de ocupação urbana mais antiga. Contudo, não se deve

desprezar que, conforme o gráfico 5 demonstra, para todos os anos de nosso estudo as

amostras de alunos das escolas municipais da região sempre apresentaram mais de 60%

de alunos residentes em favelas. A proporção de alunos residentes em favelas,

considerando também os residentes fora da região da Grande Tijuca, onde se localizam

as escolas estudadas, se mantém estável ao longo dos anos.

Gráfico 5: Distribuição da amostra bairro e favela

Uma das maneiras de analisar o quanto o grupo de escolas, dividido de acordo

com a localização e o segmento escolar que atendem, é heterogêneo em relação a

alguma característica, é considerar o valor de suas medidas de dispersão. Essa é uma

forma de verificar como os alunos estão distribuídos. Como ponto de partida para

observarmos a heterogeneidade dos alunos nas escolas mais próximas ou mais afastadas

das favelas, optou-se por indicadores de desempenho. Apesar de não estar em foco em

nosso estudo, por exigir outras abordagens mais complexas para supostos efeitos entre

implantação de UPPs e alterações no desempenho escolar, é interessante apresentar

alguns resultados simples nesse nível, para efeito de ilustração do contexto.

Utilizamos as notas da Prova Brasil Padronizada (PBP) do 1º e 2º segmento.

Esta variável refere-se ao desempenho escolar dos alunos medido pela média

padronizada da Prova Brasil nos anos de 2005, 2007, 2009 e 2011. Segundo o site do

50%

26%

54%

25%

52%

26%

52%

26%

53%

25%

16%

7%

15%

6%

15%

7%

15%

7%

14%

7%

Favela Não

Favela

Favela Não

Favela

Favela Não

Favela

Favela Não

Favela

Favela Não

Favela

2008 2009 2010 2011 2012

Tijuca Não Tijuca

Page 72: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

72

Ministério da Educação (MEC)56

a Prova Brasil tem o objetivo de avaliar a qualidade

do ensino oferecido pelo sistema educacional brasileiro a partir de testes padronizados e

questionários socioeconômicos. Além de realizarem as provas de língua portuguesa

(com foco na leitura) e matemática (com foco na resolução de problemas), os alunos

também respondem a um questionário socioeconômico sobre fatores de contexto que

podem estar associados ao desempenho. Entretanto, estes fatores não costumam ser

analisados ao se avaliar a nota da escola.

O gráfico 6 representa o desvio-padrão das notas da Prova Brasil Padronizada do

1º e 2º segmento, separadamente por grupo de escolas que se localizam até 100 ou a

mais de 100 metros de favelas. Como se observa, as escolas mais próximas das favelas

são mais homogêneas, quanto ao desempenho de seus alunos nesse teste57

. Mais

homogêneas e com desempenho médio mais baixo.

Gráfico 6: Desvio-padrão da Prova Brasil Padronizada (0 a 10) 5º e 9º ano,

segundo a distância escola-favela, 2005 a 2011

Nos gráficos 7 e 8 utilizamos a série histórica das médias das notas da PBP e

podemos perceber que houve uma tendência de elevação das médias para os dois grupos

de escolas. Entretanto, no gráfico referente ao 9° ano, as escolas que se localizam mais

próximas de favelas tiveram média semelhante às escolas a mais de 100 metros de

56

http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=210&Itemid=324

Acessado: 09/09/2014. 57

O desvio-padrão das escolas de 9º ano que ficam a menos de 100 metros das favelas, nesse caso, não

deve ser considerado, pois tratam-se, a partir de 2007, de apenas duas escolas nessa condição. Em 2005,

era apenas uma.

0

0,2

0,4

0,6

0,8

1

1,2

1,4

1,6

Escola até 100 m de

favela

Escolas mais de 100

metros de favela

Page 73: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

73

favela(s) no ano de 2011. Como se tratam de apenas duas escolas naquela condição,

esse resultado não pode ser considerado como fruto de algum processo no escopo dessa

análise.

Gráfico 7: Média da Prova Brasil Padronizada no 5° ano

Gráfico 8: Média da Prova Brasil Padronizada no 9° ano

Nos gráficos 9, 10, 11 e 12, utilizamos a série histórica das médias das notas da

Prova Rio (2009, 2010, 2011 e 2012) dividida por segmento, utilizando o 3°ano como

representante do 1° segmento e o 7°ano como representante do 2° segmento, e por área

de conhecimento – Português e Matemática.

0

1

2

3

4

5

6

7

2005 2007 2009 2011

Escolas até 100m de

favela(s)

Escolas a mais de

100m de favela(s)

0

1

2

3

4

5

6

7

2005 2007 2009 2011

Escolas até 100m de

favela(s)

Escolas a mais de

100m de favela(s)

Page 74: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

74

Gráfico 9: Média da Prova Rio de Língua Portuguesa - 3° ano

Gráfico 10: Média da Prova Rio de Matemática - 3° ano

110

120

130

140

150

160

170

180

190

2009 2010 2011 2012

Escolas até 100mfavela(s)

Escolas a mais de100m favela(s)

110

120

130

140

150

160

170

180

190

2009 2010 2011 2012

Escolas até 100mfavela(s)

Escolas a mais de100m favela(s)

Page 75: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

75

Gráfico 11: Média da Prova Rio de Língua Portuguesa - 7° ano

Gráfico 12: Média da Prova Rio de Matemática - 7° ano

Os resultados não parecem sugerir algum padrão nítido seja das diferenças entre

os dois grupos, seja ao longo do tempo. Isso pode ser decorrente de uma instabilidade

ainda existente na Prova Rio, com menos acúmulo de experiência que a Prova Brasil, a

qual deriva diretamente do SAEB.

O percentual de alunos que tem NIS, também foi calculado, uma vez que, essa

variável é utilizada para medir a pobreza dos alunos e sua família, já que ter o número

de inscrição social é necessário para que o aluno tenha acesso a programas de

180

190

200

210

220

230

240

2009 2010 2011 2012

Escolas até 100mfavela(s)

Escolas a mais de100m favela(s)

180

190

200

210

220

230

240

2009 2010 2011 2012

Escolas até 100mfavela(s)

Escolas a mais de100m favela(s)

Page 76: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

76

assistência como: Bolsa Família, Cartão Família Carioca, etc. Essa variável é utilizada

como um indicador de pobreza.

Gráfico 13: Percentual de alunos que tem NIS

É possível observar que as escolas localizadas em até 100 metros de favela(s)

têm percentual maior de alunos que tem NIS, provavelmente participando de algum

projeto assistencial, do que as escolas localizadas a mais de 100 metros de favela(s).

Uma explicação razoável para a ampliação do percentual total no ano de 2012 é o

aumento do número total de famílias atendidas pelo programa. Desde que começou, em

2003, o programa Bolsa Família cresceu de 6,5 milhões de famílias assistidas para 14,1

milhões em 2013, considerando todo o país. O governo estima que mais de meio milhão

de famílias serão incluídas em 2014. Estes números indicam que cerca de 25% de toda a

população é assistida pelo programa, e que o aumento do número total de beneficiários

foi acompanhado pelo crescimento econômico e os baixos índices de desemprego.

Dados indicam que em 2013 o programa Bolsa Família assistia 242.926 famílias no

município do Rio de Janeiro (BARTHOLO, 2014).

Calculamos, também, a distribuição de cor dos alunos, para os três principais

grupos: brancos, pardos e pretos. Optamos por analisar a categoria cor dessa forma, uma

vez que, como destacado pelos autores Silva e Hasenbalg (1990) no estudo sobre raça e

oportunidades educacionais no Brasil, os estudantes pertos e pardos têm suas trajetórias

educacionais expostas a desvantagens vinculadas especificamente à sua origem racial,

48% 46% 43% 44%

51%

23% 23% 23% 24% 27%

0%

20%

40%

60%

2008 2009 2010 2011 2012

Escola até 100 m de favela Escolas mais de 100 metros de favela

Page 77: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

77

mas que não seria adequado fundir as categorias preto e pardo, dadas relevantes

diferenças em suas características socioeconômicas – e educacionais.

É possível observar que as escolas que se localizam até 100 metros de favela(s)

têm mais de 70% do seu público discente da cor preta e parda, contrastando com as

escolas que se localizam a mais de 100 metros de favela(s) que tem pouco mais de 50%

do seu público declarados dessa cor. Esse cenário não varia muito durante os anos

estudados.

Gráfico 14: Percentual de alunos de cor branca, preta e parda – Escolas até 100m

de favela(s)

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

2008 2009 2010 2011 2012

Branca Preta Parda

Page 78: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

78

Gráfico 15: Percentual de alunos de cor branca, preta e parda – Escolas a mais de

100m de favela(s)

Em relação à variável escolaridade materna, dividimos em alta e baixa, sendo

baixa, mães que são analfabetas, que tem primeiro grau completo e incompleto, e alta,

mães que tem segundo grau e ensino superior. O banco de dados não especifica se as

mães que declararam segundo grau e ensino superior concluíram ou não essas

modalidades de ensino.

É possível observar que o maior percentual de mães com escolaridade mais

baixa é encontrado no grupo de escolas que se localizam até 100 metros de favela(s).

Entretanto, nos dois grupos de escolas esse percentual não varia ao longo dos cinco

anos. A literatura nacional apresenta que o desempenho médio dos alunos está

diretamente relacionado com a escolaridade dos pais, além das chances do aluno

concluir o ensino básico aumentam quanto mais sua família for escolarizada.

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

2008 2009 2010 2011 2012

Branca Preta Parda

Page 79: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

79

Gráfico 16: Percentual de escolaridade materna baixa

Para observar o cenário do nosso estudo, calculamos o percentual de alunos que

moram em favelas, dividindo as escolas em até 100m de favela(s) e a mais de 100

metros de favela(s), entretanto, não separamos os segmentos. É possível perceber que a

distribuição ao longo dos anos permanece estável. Isso pode indicar que em relação a

escolha e acesso de alunos moradores de favelas em escolas de asfalto não foi

impactada pela implementação das UPPs.

Gráfico 17: Percentual de alunos que moram em favela

Entretanto, em algumas escolas é possível perceber a mudança na composição

do alunado em relação ao lugar em que residem. No gráfico 18, nota-se que a escola

89% 90% 88% 88% 86%

69% 69% 69% 65% 66%

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

100%

2008 2009 2010 2011 2012

Escolas até 100 de favela(s) Escolas a mais de 100 de favela(s)

90% 91% 89% 91% 90%

58% 62%

57% 59% 62%

0%

20%

40%

60%

80%

100%

2008 2009 2010 2011 2012

Escola até 100 m de favela Escolas mais de 100 metros de favela

Page 80: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

80

passou a ter mais alunos moradores de favela. Essa escola faz parte do grupo de escolas

que se localizam a mais de 100 metros de favela(s).

Gráfico 18: Percentual de alunos que moram em favela ou não - Escola 128

Gráfico 19: Percentual de alunos que moram em favela ou não – Escola 118

Já no gráfico 19 que descreve o cenário da escola 118, ocorreu o contrário, a

escola passou a ter menos alunos não moradores de favela na sua composição discente.

Isso é, se tornou mais ainda o que consideramos como “escola de alunos favelados”,

ainda que a mesma se localize a mais de 100 metros de favela(s).

16% 18% 19%

27%

35%

84% 82% 81%

73%

65%

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

2008 2009 2010 2011 2012

Sim Não

72% 71% 71% 74%

83%

28% 29% 29% 26%

17%

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

2008 2009 2010 2011 2012

Sim Não

Page 81: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

81

No gráfico 20 é possível observar que mesmo a escola se localizando em até 100

metros de favela(s), a mesma passou a receber mais alunos que não moram em favelas.

Gráfico 20: Percentual de alunos que moram em favela ou não – Escola 126

5.2 Segregação geral na região

Neste procedimento analítico, passamos a não mais distinguir as escolas por

distância das favelas, mas tratamos todas as escolas da região, em conjunto. Utilizamos

o índice GS que é uma medida precisa para pensar no nível de segregação da unidade de

análise em questão (escolas).

Calculamos esse índice considerando todas as escolas estudadas e para todos os

cinco anos, com objetivo de verificar a porcentagem de alunos que deveriam ser

transferidos para outra escola para que o grupo de escolas estudadas ficasse mais

próximo de uma distribuição equilibrada de alunos que moram em favela. A equação

para realização deste cálculo é a que foi apresentada anteriormente:

GS= 0,5 (∑ |Fi/F - Ti/T|)

Para o cálculo do GS das escolas, incluímos todos os alunos, em que (Fi)

representa o número de alunos que moram em favela na escola i; (Ti) representa o

número total de alunos na escola i; (F) representa o número total de alunos que moram

em favela em todas as escolas estudadas; e (T) representa o número total alunos em

todas as escolas estudadas.

96% 100% 89% 91% 93%

4% 0%

11% 9% 7%

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

100%

2008 2009 2010 2011 2012

Sim Não

Page 82: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

82

O gráfico 21 apresenta o GS das escolas estudadas referente a características do

alunado como: ter NIS; morar em favela; mães com escolaridade baixa e cor preta.

Gráfico 21: Índice de Segregação 2008 à 2012

O primeiro comentário diz respeito a um dado que pode parecer surpreendente.

O “fator favela” surge como o de menor impacto na segregação, comparado aos demais.

É necessário, porém, lembrar que, pelo próprio método de cálculo, o GS é afetado pela

proporção de pessoas em desvantagem para o fator em foco. Assim, o fato de mais de

60% dos alunos serem residentes em favelas faz com que sua distribuição seja

tendencialmente mais homogênea que, por exemplo, a distribuição dos alunos de cor

preta, que estão em bem menor proporção na amostra. De qualquer forma, nessa análise

ainda descritiva, a residência em favela se mostrou o fator mais fraco de segregação nas

escolas em foco, mesmo considerando a escolaridade baixa de mães, algo com também

elevada proporção na amostra. Observa-se alguma flutuação no GS, mais para baixo,

mas nada que possa ser registrado como uma tendência clara a redução na segregação.

Os dados apresentados sugerem que, de maneira geral, não existe uma grande

variação na porcentagem de alunos nas características analisadas, que deveriam trocar

de escola para que o grupo de escolas estudado fosse mais equânime. Contudo, esse

indicador já era especialmente baixo, considerando padrões internacionais, ou mesmo o

conjunto do município do Rio de Janeiro, quando calculado para outras variáveis, como

cor, escolaridade dos responsáveis, pobreza ou atraso escolar.

0%

5%

10%

15%

20%

25%

2008 2009 2010 2011 2012

NIS Cor preta Favela Escolaridade baixa

Page 83: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

83

Certamente, os indicadores de segregação se elevariam, caso todas as escolas

fossem incluídas no cálculo do índice de segregação, isso é, escolas da rede municipal,

escolas da rede privada e escolas da rede federal. Os dados do Censo Escolar indicam

que 25% dos estudantes que estudam no ensino fundamental regular da cidade do Rio

de Janeiro estão em escolas privadas (ALVES et al, 2010). Certamente, dada forte

presença de uma população com maior renda na região, esse percentual deve ser bem

mais elevado,

Calculamos também o GS separadamente por segmento como o gráfico Y

apresenta. O GS um pouco mais elevado no primeiro segmento é esperado. Trata-se de

fenômeno estatístico. O número menor de escolas de segundo segmento torna quase

inevitável que os alunos desse segmento estejam mais “misturados”.

Gráfico 22: Índices de Segregação no 1° segmento

Uma explicação para esse cenário descrito no gráfico 22 é que estima-se que em

torno de 80% dos alunos de 1° segmento da rede pública de ensino do Rio de Janeiro

moram até 1 km de suas escolas (ALVES et al., 2010). Estudos sobre a influência da

vizinhança na escola ressaltam que o local em que a escola está localizada pode ser um

dos fatores que influenciam a composição do seu corpo discente, já que, as escolas

tendem a receber alunos que residem próximos a ela (SKYES, 2011; BURGOS, 2009).

Deste modo, os alunos que moram em favela tende a estar concentrados nas escolas

localizadas mais próximas das favelas.

0%

5%

10%

15%

20%

25%

2008 2009 2010 2011 2012

NIS Favela Escolaridade materna Cor preta

Page 84: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

84

Carvalho (2014) analisa o impacto que a segregação residencial pode ter sobre a

distribuição de alunos entre um grupo de escolas, a partir de decisões burocráticas. A

autora aponta duas explicações para a segregação encontrada, uma é que os pais tendem

a matricular seus filhos em escolas mais próximas, e isso tem impacto na distribuição de

alunos. A outra explicação refere-se à possibilidade dos diretores das escolas evitarem

selecionar alunos residentes de em áreas de mais pobres.

Para verificar como ocorre essa aproximação casa-escola, utilizamos a variável

disponível no banco de dados da SME que é “tempo de deslocamento entre casa e a

escola”. Consideramos a média dos alunos que levam até 30 minutos nesse

deslocamento, separando por segmento e, também, por localização da escola, dividindo

as escolas em dois grupos: I- Escolas localizadas a mais de 100 metros de favela(s); II-

Escolas localizadas até 100 metros de favela(s). Essa variável apresenta problemas

quantos aos dados missing, sendo eles 18% no ano de 2008, diminuindo ao longo dos

outros anos e chegando em 2012 com um percentual de 12%, como a tabela 8 apresenta.

Tabela 8: Percentual de missing referente à variável estudada

2008 2009 2010 2011 2012

18% 17% 15% 14% 12%

Gráfico 23: Porcentagem dos alunos que levam até 30 minutos no deslocamento

casa-escola - 1°segmento

49% 49% 48% 43%

49% 49% 49% 49% 44%

48%

0%

20%

40%

60%

2008 2009 2010 2011 2012

Escola até 100 m de favela Escolas mais de 100 metros de favela

Page 85: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

85

Gráfico 24: Porcentagem dos alunos que levam até 30 minutos no deslocamento

casa-escola- 2°segmento

Observa-se que nos dois segmentos a proporção de alunos que mora até 30

minutos da escola é semelhante. Isso é, em ambos os segmentos há mais de 40% dos

alunos, tanto no grupo de escolas a mais de 100 metros de favela(s) quanto no grupo das

escolas localizadas até 100 metros de favela(s), residindo próximo à escola,

confirmando os estudos anteriores (SKYES, 2011; BURGOS, 2009; CARVALHO,

2014).

5.3 Análise das tendências de segregação – um modelo multivariado

Calculamos o índice SR que representa um indicador de segregação entre todas

as escolas estudadas a cada ano. Esse índice não é muito adequado a estudos

longitudinais, por ser afetado pela variação na quantidade geral e proporção de alunos

em desvantagem. O índice indica, com valor 1, a distribuição perfeita de alunos com

uma determinada característica entre as escolas do conjunto analisado. A sua resultante

é um escore para cada escola, variando entre 0 e infinito.

Num primeiro momento, calculamos esse índice para todas as escolas estudadas

no ano de 2008, com objetivo de verificar quais escolas apresentavam índices com

maior discrepância referente à variável “morar ou não em favela”. A equação para

realização deste cálculo é a que foi apresentada anteriormente:

R = (Fi / F) / (Ti / T)

Para o cálculo do SR das escolas, incluímos todos os alunos, em que (Fi)

representa o número de alunos que moram em favela na escola i; (Ti) representa o

49% 49% 48% 43%

49% 49% 49% 49% 44%

48%

0%

20%

40%

60%

2008 2009 2010 2011 2012

Escola até 100 m de favela Escolas mais de 100 metros de favela

Page 86: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

86

número total de alunos na escola i; (F) representa o número total de alunos que moram

em favela em todas as escolas estudadas; e (T) representa o número total alunos em

todas as escolas estudadas.

As escolas que apresentaram índices variando até 0,55 (um desvio-padrão abaixo

da média geral, sempre igual a 1) foram escolhidas como as que apresentaram menor

concentração de alunos moradores de favela no ano de 2008. A partir dessa

identificação das escolas mais segregadas quanto à menor presença de alunos favelados,

fizemos regressões logísticas com todos os cinco anos estudados, estimando as razões

de chance para cada um dos fatores de desvantagem, quanto à presença nessas escolas.

Explicando de outra forma, a partir da definição de escolas com menor

proporção relativa de alunos favelados para o ano-base de 2008, passamos a tentar

observar quais as chances de um aluno favelado ingressar nessas escolas, nos anos

subsequentes, controlando por outros fatores reconhecidos de desvantagem.

Uma possível objeção a esse procedimento seria que poderia ter havido alguma

alteração em quais escolas receberiam menores proporções de favelados, com o SR

mais baixo se “deslocando” para outras. Se isso fosse verificado, a definição da linha de

base, em 2008, das escolas mais segregadas imporia o risco de que a redução da força

segregadora da residência em favela indicasse não uma redução real do fenômeno, mas

uma espécie de causalidade espúria. A forma de controle adotada para essa ameaça foi o

cálculo da matriz de correlações (rho de Spearman) entre as posições das escolas em um

ranking do SR. Esse cálculo mostrou que as posições relativas das escolas, comparadas

quanto a seu SR referente à condição de moradia em favela, é extremamente estável, de

2008 a 2012 (rho sempre superior a 0.9). Isso é, as escolas com maiores índices de

segregação foram basicamente as mesmas ao longo do período. A mesma matriz de

correlações, calculada para as três outras variáveis indicadoras de desvantagem, mostrou

tendência menos estável, ainda que sempre com coeficientes também elevados, como

esperado.

Dois modelos comparativos foram adotados. No primeiro, as escolas com SR

mais baixo foram confrontadas com as demais. No segundo, foram isoladas as escolas

de SR mais baixo e confrontadas com as de SR mais alto, ou seja, as com menores e

maiores proporções relativas de alunos favelados em 2008. A ideia foi, no segundo

procedimento, maximizar os efeitos das condições de desvantagem, comparando apenas

as escolas mais e menos segregadas, nove em cada grupo.

Page 87: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

87

Gráfico 25: Regressão logística para chance (%) de matrícula em escola com baixo

SR em 2008 (todas as escolas)

Escolaridade da mãe: ordinal crescente (1 a 5); Cor: preta

Gráfico 26 : Regressão logística para chance (%) de matrícula em escola com baixo

SR em 2008 (escolas com SR mais alto ou mais baixo)

Esses modelos multivariados alimentam alguma “esperança” para a hipótese

inicial da pesquisa e parecem justificar o interesse em um estudo dessa natureza, como

-350,00

-300,00

-250,00

-200,00

-150,00

-100,00

-50,00

0,00

50,00

100,00

150,00

2008 2009 2010 2011 2012

Ter_NIS Morar em favela Cor (preta) Baixa escolaridade materna

-2500

-2000

-1500

-1000

-500

0

500

2008 2009 2010 2011 2012

Ter_NIS Morar em favela Cor (preta) Baixa escolaridade materna

Page 88: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

88

um ensaio para futuros estudos mais robustos. Nos gráficos 25 e 26, as razões de chance

já estão convertidas para percentuais. Todos os coeficientes apresentados são

significativos (p<0,001). Assim, observa-se uma discreta redução na desvantagem dos

alunos favelados para matrícula nas escolas mais seletivas quanto a essa condição, no

ano base de 2008. Ainda que, como previsto, a probabilidade relativa de um aluno

residente em favela estar matriculado em uma escola com baixa presença de outros

alunos favelados, seja sempre inferior à dos demais fatores, a força “negativa” dessa

variável vai se reduzindo, com uma tendência diferente das variáveis associadas à cor

ou escolaridade da mãe.

A comparação com essas duas variáveis é mais pertinente que a comparação

com a variável que indica a presença do NIS no registro do aluno, já que, como

mencionado e demonstrado, o percentual de alunos com NIS cresce consideravelmente

nesse período. As causas são duas: os programas que exigem tal registro se alastram

pelo país e no Rio de Janeiro; e o registro do NIS tem um caráter cumulativo. Uma vez

inserido no sistema de informações, tal registro não é mais é apagado. Assim, mesmo

que deixe de ser beneficiário de programa, o registro do NIS permanece. Com um

número fortemente crescente, o NIS, inevitavelmente, enfraquece enquanto marcador de

um fator de segregação. Já, as variáveis indicativas de residência em favela,

escolaridade de mãe e cor, permanecem estáveis em suas proporções de valores

indicativos de desvantagem, mesmo que reduzidas quanto ao número de informações

ausentes. Por isso, pode-se considerar a bem discreta tendência à redução da

desvantagem relativa para matrícula de alunos favelados em escolas mais “exclusivas”,

detectada em um modelo multivariado, com controles para outros fatores importantes de

desvantagem como uma possível consequência de alterações introduzidas a partir das

UPPs, sobretudo porque essa tendência se manifesta após a o evento de criação das

mesmas.

Page 89: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

89

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os dados apresentados nessa dissertação buscaram contribuir para o debate

sobre as implicações do programa das UPPs e as oportunidades educacionais no sistema

de ensino municipal no Rio de Janeiro. Por ser uma política de segurança relativamente

recente e considerando as inúmeras limitações técnicas de um estudo ainda exploratório,

os dados sugerem cautela aos serem analisados. Entretanto, percebe-se um possível

efeito, ainda que bem discreto, quanto aos impactos das UPPs nas escolas, tornando o

grupo de escolas localizadas a mais de 100 metros de favela(s) um pouco mais

heterogêneas, quanto ao seu corpo discente, no ano de 2012 quando comparadas no ano

de 2008.

Há uma ameaça à nossa hipótese, já que, a partir de 2010, coincidindo com a

implantação das UPPs, a SME inaugurou um programa com potenciais efeitos

dessegregadores: a matrícula online, com escolha dos pais e aleatorização de parte da

distribuição das vagas entre as escolas. Se esse programa tem, de fato efeito

dessegregador concorrente com um possível impacto das UPPs, tal tendência deveria se

manifestar em todos os indicadores de potencial desvantagem, o que não se manifestou.

Existe, também, o fato, de o desenho desse programa de matrícula online ser mais

efetivo a partir de 2012/2013, o que excede o período aqui estudado.

Assim, as análises de modelo multivariado feitas nesta dissertação indicaram

que, de maneira geral, houve uma discreta tendência à redução da desvantagem relativa

para matrícula de alunos favelados em escolas que, em 2008, eram consideradas mais

“exclusivas”/ “seletivas” para esse público. Essa consideração é plausível, uma vez que

controlam-se os outros fatores importantes de desvantagem, que não deveriam ser

afetados diante de alterações introduzidas a partir das UPPs.

Como possíveis estudos subsequentes demanda-se a observação de série

histórica mais longa e desenho longitudinal, em nível de alunos, analisando não só

aqueles matriculados nas escolas da região, mas também os moradores da área, e

comparando áreas com UPPs e áreas que não foram pacificadas. Já que, os dados

explorados ficaram restritos a uma região específica da cidade, não podendo ser

generalizados. Todavia, o resultado encontrado é estimulante para aguçar pesquisas

educacionais que vão além da escola e alunos, observando com políticas públicas

externas também podem impactar as oportunidades educacionais e o cotidiano escolar.

Page 90: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

90

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Page 95: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

95

ANEXOS

Page 96: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

96

DESCRIÇÕES DO CAMPO - A GRANDE TIJUCA

A Grande Tijuca compreende os bairros da Tijuca, Praça da Bandeira, Alto da

Boa Vista, Grajaú, Andaraí, Vila Isabel e Maracanã, com 371.120 mil moradores

residentes58

. No começo do século XX, após obras de drenagem e saneamento, foi

iniciada a configuração espacial urbana que, atualmente, corresponde a esses bairros

(SANTOS et al, 2003).

MAPA 4 – Região da Grande Tijuca

TIJUCA

O nome Tijuca é uma definição da paisagem física que nos remete à natureza.

Os indígenas cunharam o termo “ti’yug” para descrever áreas com acumulação de

“líquido podre, lama” (SANTOS et al, 2003).

No início do século XVIII, a população urbana que habitava a parte central

Cidade do Rio de Janeiro, realizava passeios até a serra da Tijuca, assim, no início do

século XIX, a região da Tijuca passou a ser ocupada por uma população de hábitos

urbanos que aos poucos foi transformando suas casas de campo em residências

permanentes. No ano de 1812 ocorreu uma intensa ocupação da área e, a partir de 1818,

o governo começou a tomar medidas para coibir o desmatamento.

No início do século XX, os morros do bairro da Tijuca começam a ser ocupados,

surgindo as primeiras favelas Salgueiro, Borel e Formiga.

58

Dados do Censo 2010 - IBGE.

Page 97: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

97

A partir dos anos 1930 e 1940 a Tijuca começou a ser ocupada por uma classe

média com valores tradicionais e conservadores, destacando-se dos demais bairros da

Zona Norte por seu passado aristocrático, cujo extremo de identidade coletiva levou a

população a criar o uso da expressão “tijucanos”, que não encontra equivalente em

nenhum outro bairro da cidade até hoje (IPP, 2014).

Salgueiro

O morro que inicialmente foi denominado de “Morro dos Trapicheiros”

começou ocupação por volta de 1885, com escravos fugidos de propriedades existentes

no Alto da Boa Vista. No entanto, somente a partir de 1901, a ocupação se consolidou,

com os migrantes do interior do estado e do Nordeste do país (CUNHA ET AL, 2006).

A origem do nome Salgueiro advém de um português chamado Domingos Alves

Salgueiro, que, no início do século XX, era proprietário de uma fábrica de conservas

que existia na rua dos Araújos. Entretanto, antes de ter a fábrica, ele cultivava café e

havia construído alguns barracões para os escravos. Com a abolição da escravatura, os

escravos libertos passaram a alugar os barracões para morar (CUNHA et al, 2006).

Borel

A favela do Borel, tem sua entrada localizada na rua São Miguel, uma principais

vias de acesso entre a Tijuca e o Alto da Boa Vista. É uma das comunidades mais

antigas da região da Grande Tijuca e começou a ser habitada ainda em 1921.

A origem do nome da comunidade vem da marca de cigarro da antiga Fábrica de

Fumos e Rapé de Borel & Cia, que funcionava no mesmo morro que existia a favela.

Essa marca de cigarro trazia um pavão-real azul e amarelo-ouro estampado no maço,

que acabou virando o símbolo de uma das mais tradicionais escolas de samba da região,

a Unidos da Tijuca, fundada na rua São Miguel, em 31 de dezembro de 1931 (CUNHA

et al, 2006).

Formiga

O morro foi inicialmente ocupado por imigrantes de Portugal e da Alemanha em

1911, mas essa ocupação foi intensificada a partir de um loteamento que se estendeu

pelas encostas, principalmente entre as décadas de 1940 e 1960. Com o loteamento, a

área começou a ser urbanizada pela prefeitura, entretanto os trabalhadores contratados

Page 98: UPPs e educação – possíveis impactos da implantação das

98

para fazer as obras de calçamento acabaram se encantando pela vista do morro e lá

decidiram construir suas próprias casas (CUNHA et al, 2006).

Cunha et al (2006) num estudo realizado sobre as Histórias de favelas da Grande

Tijuca narra que a origem do nome do “Morro da Formiga” tem várias histórias, mas

que a mais contada pelos antigos moradores é que o surgimento desse nome se deve a

época em que a Prefeitura abriu as ruas 2 e 3, quando então houve uma proliferação de

formigas no morro, aparecendo grande quantidades de formigueiros. Deste modo, os

funcionários da Prefeitura que tentavam solucionar o problema diziam que, quando para

lá se dirigiam, iam para o “morro das formigas”.

PRAÇA DA BANDEIRA

Em 1853 foi construído o antigo Matadouro da Cidade. Evoluindo em volta do

matadouro público, a Praça da Bandeira, conhecida inicialmente como Largo do

Matadouro, tornou-se o cerne para o adensamento dos bairros adjacentes, pois, passava

por ali o caminho para se chegar ao bairro de São Cristóvão (IPP, 2014).

O bairro foi urbanizado no início do século XX, após transferência do Matadouro, em

1881, para a antiga fazenda dos Jesuítas, em Santa Cruz, na Zona Oeste da cidade

(Santos et al, 2003). Outro fator que impulsionou a evolução do bairro foi a

proximidade com os bairros do Estácio e Cidade Nova, dois bairros centrais que

sofreram acentuada ocupação a partir da chegada de D. João VI (IPP, 2014).

ALTO DA BOA VISTA

O nome do bairro Alto da Boa Vista tem origem na bela paisagem que se admira

das suas encostas. Entretanto com as plantações de café que desmataram os morros e

alteraram a vazão de rios da região, influindo no abastecimento dos bairros da planície,

D. Pedro II determinou o reflorestamento de toda área em 1861. Após o plantio de cerca

de 100.000 mudas de árvores, nascia o maior parque urbano do mundo.

Depois de ocupado por alguns hotéis e tendo abrigado residência de alguns

membros da elite, o bairro consolidou-se como parque urbano e suas florestas são

objetos de permanente esforço para sua preservação, incluindo a Floresta da Tijuca, no

bairro se situam dois setores do Parque Nacional da Tijuca (IPP, 2014).

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GRAJAÚ

Em indígena, “uirá-ya-hú”, ou a corruptela “grajahú”, em alusão ao formato da

Pedra de mesmo nome, semelhante ao cesto que os índios usavam para levar as aves

caçadas vivas.

Na década de 1920, iniciou-se a urbanização de toda a região, abrindo as ruas do

aprazível bairro, centralizado pela Praça Edmundo Rego.

Destaca-se, no bairro tradicionalmente residencial, o Parque Estadual do Grajaú, muito

procurado por praticantes do montanhismo. O Parque tem 550.000 metros quadrados

dos quais 30.000 são destinados ao lazer da comunidade (IPP, 2014).

ANDARAÍ

O nome do bairro do Andaraí pode ter procedência no antigo nome do rio Joana,

que se chamava ANDARA-HY AÇU, ou “rio Grande dos Morcegos”, ou no Pico do

Andaraí, cuja tradução do tupi para o português seria “empinado para cima”.

Em meados do século XIX, concentrando algumas fábricas surgiram as

primeiras vilas operárias e favelas - Arrelia (1891), Morro do Andaraí (1930) - na área,

em torno das ruas Leopoldo e Barão de Mesquita. (SANTOS, 2003; IPP, 2014)

VILA ISABEL

Todas as terras de Vila Isabel eram da Fazenda do Macaco, limitada pelo Rio

Joana, pelo Caminho do Cabuçu (atual rua Barão do Bom Retiro) e pela Serra do

Engenho Novo. Dom Pedro I a presenteou à Imperatriz D. Amélia de Beauharnais,

Duquesa de Bragança, sendo freqüentes os passeios do casal ao local. Com a volta de

Dom Pedro a Portugal, a fazenda ficou abandonada, sendo atingida pela epidemia de

cólera meados do século XIX.

O Barão João Batista de Viana Drummond, reconhecendo o potencial comercial

da área, procurou o Ministro do Império, Conselheiro João Alfredo Corrêa de Oliveira,

solicitando permissão para estabelecer uma linha de ferro-carril ligando a Fazenda do

Macaco ao Centro da Cidade. Em 1872, o Barão de Drummond comprou a fazenda e

fundou em sociedade com o Visconde de Silva, o Barão de São Francisco Filho,

Bezerra de Menezes e Temístocles Petrocochino a “Companhia Arquitetônica de Villa

Izabel” para a promoção de loteamento. Assim, em 1873, nascia o primeiro bairro

planejado da cidade. Com treze ruas projetadas, uma grande avenida arborizada, o

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“Boulevard” 28 de Setembro e uma praça central, a Sete de Março - atual Barão de

Drummond. O nome “Villa Izabel” é em homenagem à Princesa Isabel.

Entre 1873 e 1875, a Companhia Ferro-Carril de Vila Isabel estendeu as linhas

de bonde para Vila Isabel, inicialmente de tração animal. Em 1909, foi inaugurada a

Estação de Bondes de Vila Isabel, já com tração elétrica. Também abrigou uma das

fábricas mais antigas da Cidade, a Companhia de Fiação e Tecidos Confiança,

desativada em 1964 (IPP, 2014)

MARACANÃ

O nome do bairro do Maracanã é oriundo dos indígenas e significa “Papagaio”.

O bairro apresenta aspecto peculiar, uma vez que seu adensamento populacional,

desenvolvimento urbano e processo de verticalização foram condicionados pelo leito do

rio que dá origem ao seu nome.

O bairro que hoje tem como marco arquitetônico o estádio de futebol Jornalista

Mário Filho, mais conhecido como “Maracanã” ou “Maraca”, construído em 1950 para

a Copa do Mundo, na área do antigo hipódromo Derby Clube.

No local da antiga favela do “Esqueleto”, removida na década de 1960, foi construído o

“Campus” da atual Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ (IPP, 2014)