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UNIVERSIDADE DO CONTESTADO - UnC CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE CANOINHAS MESTRADO EM DESENVOLVIMENTO REGIONAL ANTONIO DIAS MAFRA ACONTECEU NOS ERVAIS: A DISPUTA TERRITORIAL ENTRE PARANÁ E SANTA CATARINA PELA EXPLORAÇÃO DA ERVA-MATE – REGIÃO SUL DO VALE DO RIO NEGRO CANOINHAS 2008

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UNIVERSIDADE DO CONTESTADO - UnC CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE CANOINHAS

MESTRADO EM DESENVOLVIMENTO REGIONAL

ANTONIO DIAS MAFRA

ACONTECEU NOS ERVAIS: A DISPUTA TERRITORIAL ENTRE PARANÁ E SANTA CATARINA PELA

EXPLORAÇÃO DA ERVA-MATE – REGIÃO SUL DO VALE DO RIO NEGRO

CANOINHAS 2008

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ANTONIO DIAS MAFRA

ACONTECEU NOS ERVAIS: A DISPUTA TERRITORIAL ENTRE PARANÁ E SANTA CATARINA PELA

EXPLORAÇÃO DA ERVA-MATE – REGIÃO SUL DO VALE DO RIO NEGRO Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional da Universidade do Contestado - UnC – Campus Canoinhas – SC, como requisito para a obtenção do título de Mestre em Desenvolvimento Regional sob orientação do Prof. Doutor Sandino Hoff

CANOINHAS 2008

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ACONTECEU NOS ERVAIS: A DISPUTA TERRITORIAL ENTRE PARANÁ E SANTA CATARINA PELA

EXPLORAÇÃO DA ERVA-MATE – REGIÃO SUL DO VALE DO RIO NEGRO

ANTONIO DIAS MAFRA

Esta dissertação foi submetida ao processo de avaliação pela Banca Examinadora para a obtenção do Título de,

Mestre em Desenvolvimento Regional

E aprovada na sua versão final em ..../...../ 2008, atendendo às normas da legislação vigente da Universidade do Contestado e Coordenação do Curso de Mestrado.

____________________________________________ Nome do Coordenador do Curso

BANCA EXAMINADORA:

_________________________________ Nome do Presidente

_________________________________ Membro

____________________________ ____________________________ Membro Membro suplente

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DEDICO

À minha esposa Liane, companheira de todas as horas,

Aos meus filhos, Poliane, Kleber, Rainer e Leo.

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AGRADECIMENTO

Ao professor Orientador Dr. Sandino Hoff, pelo incentivo para realizar este trabalho Agradeço suas orientações e sugestões. Aos professores co-orientadores, Dra. Maria da Salete Sachweh, e prof. Dr. Walter Marcos Knaesel Birkner pelo auxílio prestado no desenvolvimento da dissertação. À Direção da Universidade do Contestado, Campus Mafra/RioNegrinho/ Papanduva, pelo incentivo e apoio financeiro.

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EPÍGRAFE

Ou entreguem à Sta. Catharina o território que lhe pertence, ou acabem de uma vez com a província, cedendo ao Paraná a parte que ambiciona, e dando à do Rio Grande do Sul o território restante...” Jornal “Regeneração”, órgão liberal do Desterro, em 1882, criticando que pouco a pouco vai se operando no nosso território de elementos do Paraná. (FICKER, 1973, p. 212)

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RESUMO

Aconteceu nos ervais – a disputa territorial entre Paraná e Santa Catarina pela exploração da erva-mate é uma pesquisa motivada pela importância da erva-mate que já era utilizada pelos índios. Fazia parte de sua alimentação e foi apropriada pelos Padres Jesuítas como mercadoria e passou a ser consumida pelos colonizadores europeus em toda a região sul do Brasil e países limítrofes, como Argentina, Uruguai, Paraguai e Chile. No início do século XIX, inicia a sua produção em larga escala no Paraná. A região ao sul do rio Negro, desde 1749, território legal de Santa Catarina, coberta de ervais, foi sendo ocupada por ervateiros paranaenses. O objetivo desta pesquisa foi analisar a exploração catarinense da erva-mate a partir de meados do século XIX, na região sul do vale do rio Negro, sua importância econômica e geradora de conflitos na disputa territorial entre o Paraná e Santa Catarina. Para isso, foram utilizadas fontes secundárias e fontes primárias. Ao analisar as fontes, constatou-se que o Paraná dominava a produção de erva-mate no Brasil, quando, em meados do século XIX, a Sociedade Colonizadora de Hamburgo implantou a Colônia Dona Francisca, atual Joinville no litoral norte de Santa Catarina. Com o apoio do Governo Federal, foi construída uma rodovia para ligar a sede da Colônia à vila de Rio Negro. Quando a rodovia atingiu o Planalto Norte Catarinense, a Sociedade instalou, às margens do rio São Bento, no ano de 1873, uma Colônia Agrícola. O Governo do Paraná, para garantir a posse dos ervais, concedeu títulos de propriedade a colonos paranaenses, iniciando uma disputa chamada de questão do Contestado, uma luta pela terra e pelos ervais entre as duas Províncias, entre colonos paranaenses e imigrantes. A Câmara Municipal de Rio Negro monopolizou a exploração de erva-mate em toda a área do Município, prejudicando os ervateiros autônomos. O Paraná para dificultar o comércio ervateiro, criou barreiras fiscais em vários pontos da Estrada Dona Francisca. A situação se complicou de forma definitiva para todos os trabalhadores autônomos da erva-mate, no ano de 1890. Nesse ano, foi criada em Joinville a Companhia Industrial Catarinense, com monopólio federal de exploração dos ervais em todo o Planalto de Santa Catarina. A erva-mate era transportada para o beneficiamento final em Joinville, por via fluvial, até o porto de Rio Negro e por carroções pela Estrada Dona Francisca. A navegação fluvial e os carroções perderam espaço a partir de 1913, quando passou a ser transportada por trem. Quando a concorrência prejudicou o comércio, o governo do Paraná criou barreiras fiscais, deixando a população ao sul do rio Negro revoltada. A situação criou tensões e choques nas fronteiras e clima de animosidade entre paranaenses e catarinenses. Os dados manuseados deixaram evidente que a erva-mate foi a responsável pelo desenvolvimento regional no século XIX na região ao sul do rio Negro, até por volta de 1930, pelo conflito territorial entre Paraná e Santa Catarina e pela desapropriação dos sertanejos ervateiros. Ao longo de todo o século XX manteve-se como importante produto da indústria extrativa vegetal, sendo uma riqueza florestal que pode ser ainda melhor aproveitada.

PALAVRAS-CHAVE: erva-mate, disputa territorial, Paraná, Santa Catarina, região ao

sul do rio Negro.

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EL RESUMEN

Sucedió en los arboles de hierba mate la disputa territorial entre Paraná y Santa Catarina por la exploración de la hierba mate, esa investigación fue motivada porque la hierba mate era utilizada por los indios como parte de su alimentación y fue apropiado por los sacerdotes Jesuitas como mercadería y pasó a ser consumida por los colonizadores europeos en toda la región sur de Brasil y de países limítrofes, como la Argentina, Uruguay y Chile. Al principio del siglo XIX inicia su industrialización en Paraná. La región sur del Río Negro, desde 1749, era el territorio legal de Santa Catarina, cubierta de arboles de Hierba Mate, fue siendo ocupada por hierbateros paranaenses. El objetivo de esta investigación fue analizar la exploración catarinense de hierba mate desde meados del siglo XIX, en la región sur del valle del río Negro, su importancia económica y generación de conflictos en la disputa territorial entre Paraná y Santa Catarina. Para eso fueron utilizadas fuentes secundarias y fuentes primarias. Al analizar las fuentes, fue evidenciada que Paraná dominó la producción hierba mate en Brasil, cuando en meados del siglo XIX la Sociedad de Colonización de Hamburgo, instaló la colonia de Dona Francisca , actual Joinville en el norte de la costa de Santa Catarina. Con la ayuda del Gobierno Federal, una carretera fue construida para atar las jefaturas de la colonia a la villa del Río Negro. Cuando la carretera alcanzó el norte catarinense, la sociedad instalada a la orilla del rio São Bento, en el año de 1873, una colonia agrícola. El gobierno de Paraná, para garantizar la propiedad de los arboles de Hierba-Mate, concedió títulos de propiedad a los colonos paranaenses, iniciando un conflicto llamado de cuestión del Contestado, una lucha por las tierra y por los arboles de Hierba-Mate entre las dos provincias, entre colonos paranaenses y inmigrantes. El consejo de la ciudad de Río Negro monopolizó la exploración de hierba-mate en toda el área de la ciudad, perjudicando los hierbateros independientes. Paraná disputar el comercio hierbatero, creó barreras fiscales en varios puntos de la Carretera Dona Francisca. La situación se complicó de forma definitiva para todos los trabajadores autónomos de hierba mate, en el año de 1890. En este año crearon a la Compañía Industrial Catarinense en Joinville, como monopolio federal de la exploración de los arboles de Hierba-Mate en todo el planalto de Santa Catarina.La hierba-mate fue llevada para la mejora final en Joinville, por vía fluvial hasta el puerto del Río Negro y por carroces por la Carretera Dona Francisca. La navegación fluvial y los carroces habían perdido el espacio a partir de 1913, cuando pasó para ser transportada en tren. Cuando la competencia perjuicio el comercio, el gobierno de Paraná, creó barreras fiscales, dejando la población al sur del Rio Negro rebelado. Esta situación resultó en tenciones y choques en las fronteras y el clima de la animosidad entre los paranaenses y los catarinenses. Los datos manoseados dejaron evidentes que hierba mate fue la responsable por el desarrollo regional en el siglo XIX en la región al sur del Rio Negro, hasta por la vuelta de 1930, por el conflicto territorial entre Paraná y Santa Catarina y por la desapropiación de los trabajadores de la hierba mate. A lo largo de todo el siglo XX se mantuvo como importante producto de la industria extractiva vegetal, siendo un abundancia de bosque que todavía puede ser mejora aprovechada.

PALABRA-CLAVE: hierba-mate, conflicto, Paraná, Santa Catarina, región al sur del

Río Negro.

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Empresas ervateiras em atividade entre os anos de 1900 e 1903..........43

Quadro 2 – Importância da erva-mate em relação à madeira. Dados desde 1892

até o ano de 1938, em valores ...............................................................92

Quadro 3 – Evolução da produção Argentina de erva-mate .....................................97

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................12

2 ACONTECEU NOS ERVAIS: A HISTÓRIA DA EXPLORAÇÃO EC ONÔMICA

DAS TERRAS E DA ERVA-MATE, REALIZADA PELAS COMPANHI AS

CATARINENESES ...................................... .........................................................20

2.1 A ERVA-MATE – ASPECTOS HISTÓRICOS .....................................................26

2.1.1 A Erva-mate no Paraná....................................................................................31

2.1.2 O Sertanejo Ervateiro do Sul do Vale do Rio Negro.........................................33

2.1.3 A Erva-mate em Santa Catarina.......................................................................38

3 A OCUPAÇÃO E O USO DO SOLO E DOS ERVAIS NA REGIÃO

CONTESTADA ......................................... ............................................................46

3.1 FUNDAÇÃO DA COLÔNIA DONA FRANCISCA ................................................51

3.2 FUNDAÇÃO DE RIO NEGRO.............................................................................54

3.3 O PARANÁ AVANÇA SOBRE OS ERVAIS CATARINENSES............................56

3.4 PARANAENSES OCUPAM O SUL DO RIO NEGRO .........................................57

3.5 REAÇÃO CATARINENSE – FUNDAÇÃO DE SÃO BENTO, UMA COLÔNIA DE

IMIGRANTES EM TERRITÓRIO CONTESTADO.................................................59

3.6 CRIAÇÃO DE POVOAÇÕES AO SUL DO RIO NEGRO ....................................63

4 SANTA CATARINA ENTRA NA DISPUTA ECONÔMICA DO MATE COM A

COMPANHIA INDUSTRIAL CATARINENSE................... ....................................69

4.1 O TRANSPORTE DA ERVA-MATE ....................................................................73

4.2 A NAVEGAÇÃO PELO RIO NEGRO ..................................................................74

4.3 SÃO BENTO WAGEN - (CARROÇÕES DE SÃO BENTO).................................77

4.4 A FERROVIA E A ERVA-MATE ..........................................................................79

5 A ECONOMIA ERVATEIRA – SÉCULO XIX e XX ........... .....................................83

5.1 CANOINHAS SE TORNA OURO VERDE...........................................................87

5.2 ERVA-MATE OU MADEIRA – EIS UMA QUESTÃO...........................................90

5.3 A QUEDA NA PROCURA DA ERVA-MATE........................................................95

6 A INSTALAÇÃO DE BARREIRAS FISCAIS E O SIGNIFICADO DOS

CONFLITOS .........................................................................................................98

6.1 O PARANÁ INSTALA BARREIRAS FISCAIS ENTRE JOINVILLE E SÃO

BENTO..................................................................................................................98

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6.2 O PARANÁ INSTALA BARREIRA ENTRE SÃO BENTO E RIO NEGRO.........107

6.3 PARANAENSES FECHAM RUAS E PRENDEM POLICIAIS EM SÃO BENTO110

6.4 INVASÕES E NOVAS BARREIRAS FISCAIS...................................................111

6.5 SANTA CATARINA ABRE UM CAMINHO PARALELO A ESTRADA DONA

FRANCISCA .......................................................................................................113

6.6 O PARANÁ FECHA A FRONTEIRA AO NORTE DE SÃO BENTO ..................116

6.7 SÃO BENTO – CAPITAL DE SANTA CATARINA.............................................118

6.8 PRISÃO DO VAPOR MINUANO E DESTRUIÇÃO DE PONTES: TENSÃO

NA FRONTEIRA .................................................................................................119

7 CONCLUSÃO ........................................ ..............................................................127

REFERÊNCIAS.......................................................................................................130

DOCUMENTOS ......................................................................................................138

ANEXOS .................................................................................................................139

ANEXO A – MAPA DE SANTA CATARINA – 1737 ................................................140

ANEXO B – MAPA DE SANTA CATARINA – 1872 ................................................141

ANEXO C – MAPA DE SANTA CATARINA – 1907 ................................................142

ANEXO D – MAPA DE SANTA CATARINA – REGIÕES CONTESTADAS ............143

ANEXO E – MAPA DA REGIÃO CONSTESTADA – 1911......................................144

ANEXO F – MAPA DA ESTRADA DONA FRANCISCA E DA REGIÃO DE SÃO

BENTO................................................................................................................145

ANEXO G – MAPA DE SÃO BENTO – 2º. DISTRITO DA COLONIA DONA

FRANCISCA .......................................................................................................146

ANEXO H – ERVAIS EM SANTA CATARINA.........................................................147

ANEXO I– TRANSPORTE DE ERVA-MATE EM TROPAS PARA JOINVILLE.......148

ANEXO J – CARROÇÕES DE TRANSPORTE DE ERVA-MATE – SÃO BENTO

WAGEN ..............................................................................................................149

ANEXO K – RÓTULO DE EMBALAGENS DE ERVA-MATE ..................................150

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1 INTRODUÇÃO

A erva-mate foi a atividade econômica extrativa mais importante para o sul do

vale do Rio Negro no final do século XIX e no início do século XX. A escolha do título

“aconteceu nos ervais”1 foi para resgatar uma parte importante da história da

colonização de uma área do Planalto Norte de Santa Catarina, o vale ao sul do rio

Negro, uma região coberta pela erva-mate. A ocupação efetiva da região não foi

pacífica, pois o Paraná tinha interesse nos lucros gerados pela economia ervateira.

Para participar dessa atividade lucrativa e concretizar a ocupação territorial, Santa

Catarina utilizou-se de duas estratégias: a construção da estrada Dona Francisca e a

fundação da Colônia Agrícola São Bento. Com esses dois empreendimentos,

empresários e agricultores vindos de Joinville, puderam entrar nos ervais e disputar

a matéria prima abundante na região, a erva-mate.

A erva-mate foi a atividade econômica extrativa mais importante para o sul do

vale do Rio Negro no final do século XIX e no início do século XX. Nessa região ela

foi o motivo da disputa territorial pelos ervais, entre os estados do Paraná e Santa

1Aconteceu nos ervais... “ – o título desta dissertação surgiu precisamente em 25 de agosto de 2007, quando participávamos da Jornada Cultural História do Paraná, na cidade de Rio Negro. Nesse dia ocorreu o lançamento do livro de José Carlos Veiga Lopes, “Aconteceu nos Pinhais: subsídios para a história dos municípios do Paraná: tradicional do Planalto”. O título foi tão sugestivo que resolvemos adaptá-lo a esta pesquisa para “Aconteceu nos ervais : A disputa Territorial entre Paraná e Santa Catarina pela exploração da erva-mate – região sul do vale do rio Negro”

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Catarina, o que se denominou a Questão do Contestado2.

Este estudo tem por objeto a análise da história da exploração da erva-mate

em território catarinense a partir de meados do século XIX, especificamente, na

região sul do vale do rio Negro, sob a dimensão de que este fator econômico fez a

mediação na disputa territorial eclodida entre Paraná e Santa Catarina. Dessa forma,

a investigação tem por objeto a sistematização e a análise da história do

2 Questão do Contestado – Uma dificuldade enfrentada pelo estudioso é discernir os conceitos Questão do Contestado e Guerra do Contestado . Para o senso comum, ambos os conceitos podem ter o mesmo significado, mas para uma pesquisa acadêmica há necessidade de uma melhor definição. Uma das metas do autor foi procurar deixar evidente para o leitor que houve uma disputa territorial interestadual e que essa disputa levou a uma guerra. Tomou-se o cuidado de não confundir os conceitos, pois muitas vezes os conceitos embaraçam e iludem o historiador que, de forma desavisada, os utilizam mal, passando a idéia de que ambos os fatos são iguais. (VEYNE, 1995, p. 66).Os conceitos utilizados nesta pesquisa, foram buscados em fontes secundárias e fontes primárias. Contestado é um termo que nos últimos anos renasceu como sinônimo de uma luta de homens pobres do interior de Santa Catarina, que se levantaram contra as forças de segurança dos Estados do Paraná e Santa Catarina, grupos armados pelos proprietários de terras e o próprio exército nacional. É com esse sentido que o fato está sendo amplamente utilizado nos meios acadêmicos. Contestado também foi um termo emprestado para uma das maiores Universidades de Santa Catarina, a Universidade do Contestado - UnC, com aérea de abrangência em toda a região onde se desenvolveu a Guerra e extrapolando inclusive esse território. A Universidade, para destacar a importância do fato histórico para região do Planalto de Santa Catarina, criou, inclusive, uma disciplina acadêmica, “História do Contestado”. A maioria dos trabalhos de pesquisa na academia, estão dando a maior ênfase ao resgate de aspectos ligados a Guerra em si. A questão territorial interestadual, até pela existência de vários campi na fronteira com o Paraná, é deixada de lado ou tratada superficialmente. Os conceitos utilizados neste trabalho são os seguintes: a) Verbo contestar: das várias definições encontradas no Dicionário, destacamos como as mais apropriadas para definir o presente objeto: contrariar, contradizer, impugnar, replicar... (DICIONÁRIO AURÉLIO, 1993, p. 273). Em 1850, em seção no senado, foi apresentado um projeto para a criação da Província do Paraná, mas sem indicação dos limites entre Paraná e Santa Catarina. Ficou estabelecido que fazia divisa oeste com Corrientes, (Argentina), com o Paraguai, e no lado sul confina só com Santa Catarina. Diante da imprecisão do projeto, o Senador Carneiro de Leão do Paraná, segundo Mafra, (2002, p. 418) assim se expressou: “Há contestação a respeito” o que foi aparteado pelo Senador Vergueiro: “Si há contestação , avenham-se lá... ”O termo contestar com o significado que se conhece, já foi utilizado na criação do Paraná e foram os paranaenses quem mais o utilizou para se referir à disputa territorial com Santa Catarina. Para o Contador da Tesouraria da Província do Paraná, 08 de janeiro 1876, o registro fiscal de Encruzilhada estava em território do Paraná, e, conforme transcrição de documentos, realizada por Medeiros: Marchiorato (1992, p. 7) “em território do qual estava de posse nunca contestada antes do decreto 3378 de 16 de janeiro de 1865”. A Questão do Contestado na prática, foram ações contrariadas ora pelo Paraná, ora por Santa Catarina. Cada um procurava contradizer o ponto de vista do outro, impugnar e replicar a decisão do outro, sobre as ações tomadas no território em questão. b) Contestado : Contraditado, Negado, - Uma Província contraditava a ação da outra, negando-lhe o direito de exercer soberania sobre seus atos administrativos, políticos e econômico. c) Contestação: ato de Contestar. A vinda de imigrantes para colonizar o Planalto norte de Santa Catarina gerou a contestação por parte do Paraná. d) Guerra do Contestado: Conflito armado em que se envolveram tropas do Paraná, de Santa Catarina e Forças Federais - 1912 a 1915, contra grupos de sertanejos fanatizados. Como os combates ocorreram basicamente em território catarinense, quem mais perdeu, pagando uma conta excessivamente alta foram as pessoas pobres e humildes que habitavam a região central do planalto catarinense. O termo Guerra do Contestado foi uma apropriação do termo original que significava a contestação territorial e por isso será utiizado Guerra no Contestado ao se referir ao conflito armado. e) Questão do Contestado – O conceito será utilizado para designar todas as ações políticas, administrativas, econômicas e territoriais, em que estiverem envolvidos interesses dos atuais estados do Paraná e Santa Catarina, até 1916.

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desenvolvimento da erva-mate, contribuindo, assim, para o entendimento desse

fenômeno econômico e social que foi o fator de desenvolvimento regional, durante

décadas. O corte espacial da pesquisa é a região do Planalto Norte do estado de

Santa Catarina, região ao sul do rio Negro. O recorte temporal vai da metade do

século XIX até as primeiras décadas do século XX. Pretende também, entender

como se desenvolveu a atividade ervateira no vale ao sul do rio Negro; como os

conflitos locais foram motivos da Guerra no Contestado; qual a viabilidade

econômica da erva-mate na atualidade nessa região.

Empresários do Paraná, que desde meados do século XIX exploravam a

erva-mate em território contestado, se confrontaram com a Companhia Industrial

Catarinense, com sede em Joinville. Essa empresa buscava sua matéria-prima no

Planalto e construiu filial em São Bento do Sul. Os conflitos se tornaram constantes

porque a erva-mate adquiriu o status de principal produto de exportação regional.

Padis (1981, p. 57) entende por Paraná também a região, contestada pelos dois

estados. Escreve: “É interessante notar que, em 1902, o mate participou com cerca

de 3 por cento do valor total das exportações brasileiras”. O procedimento

investigativo, ganha força com o fato de que, no final do século XIX, Santa Catarina

entrou na disputa pelo mercado do produto, com a instalação de engenhos de erva-

mate em Joinville e iniciou a ocupação ao sul do vale do rio Negro.

A região dos ervais, neste recorte espacial da pesquisa, localiza-se de Campo

Alegre a Canoinhas, que foi a principal fornecedora de matéria-prima para a

fabricação do mate. Primeiramente, para os portos do Paraná; posteriormente, para

a região de Joinville.

Enquanto o estado do Paraná dispunha de estradas e de rios navegáveis

para escoar o produto, Santa Catarina não tinha acesso à região. Com o projeto

federal de construção da estrada Dona Francisca, ligando o litoral catarinense com a

vila de Rio Negro3, Santa Catarina pode decisivamente tomar posse dos ervais

dessa rica região. A única área, até então efetivamente povoada, era a vila de Rio

Negro que na parte sul, hoje constitui a cidade de Mafra. O lócus da investigação

não teria possibilidade de desenvolver-se se não tivesse um centro escoador da 3 Rio Negro – Para evitar confusão entre o rio e a cidade de Rio Negro, adotou-se a seguinte metodologia: quando no texto for grafado com letra minúscula, rio Negro, refere-se ao rio, acidente geográfico, nome comum aos cursos de água com volume razoável. Quando rio for grafado com letra maiúscula, refere-se ao município de Rio Negro. Rio Negro já tinha essa denominação em tupi-guarani. Unaí – una = escuro, negro e í = rio. I é comum em Iguaçu, rio Grande, Itajaí = rio que corre sobre pedras etc. (Ver EHLKE, 1973)

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erva-mate, com capitalistas internacionais a industrializar e a comercializar o mate.

Esse centro era Joinville e o porto de São Francisco.

Seguindo a estrada, partindo do litoral, a oitenta quilômetros de Joinville foi

fundada a colônia agrícola São Bento, dentro da região dos ervais explorados pelos

paranaenses. O Paraná reagiu, distribuiu títulos de propriedades a colonos

brasileiros, desenvolveu a Colônia Lucena, atual Itaiópolis e outras povoações. Criou

barreiras fiscais ao longo dos caminhos de acesso a Santa Catarina, com a

finalidade de arrecadar os impostos e impedir que a erva-mate fosse transferida para

os engenhos de Joinville. Pelas fontes pesquisadas, pode-se concluir que a disputa

territorial entre os dois estados desencadeou conflitos localizados; e, no decorrer dos

conflitos intermitentes, os governantes de ambos os estados faziam ameaças de

guerra interestadual.

A questão do conflito entre monopólios paranaenses e catarinenses no

Planalto Norte indica a criação e o desenvolvimento de poderosas empresas em

ambos os estados. Em Joinville, duas empresas monopólicas4 adquiriram

potencialidades para competir no mercado. A primeira, a Sociedade Colonizadora,

conseguiu a concessão da região para implantar a colonização; implícito estava a

perda das terras por parte dos sertanejos, donos das terras conforme a Lei da Terra

de 1850. A colonização da área gerou um descontentamento por parte dos

sertanejos que, dessa forma, foram expropriados de suas terras. A segunda

empresa, criada em Joinville, foi a Companhia Industrial Catarinense, que recebeu

do Governo Federal a concessão de todos os ervais existentes no Estado de Santa

Catarina. No Planalto Norte, a Companhia Industrial estabeleceu-se em São Bento,

em meio aos ervais. Os sertanejos, expropriados de suas terras, também foram

expropriados de seus ervais, convertendo-se em trabalhadores assalariados, o que

se considera a subsunção do trabalhador ao capital.

4 Empresa Monopólica – Segundo Gastaldi (2001, p. 219), “O monopólio subentende atividade lucrativa de um individuo ou de uma entidade, que determinam unilateralmente os preços e os impõem no mercado de procura”. Ao sul do vale do rio Negro, duas empresas monopólicas receberam esse benefício, conseguiram junto ao Governo Federal o direito de exploração exclusiva - a Sociedade Colonizadora de 1849, em Hamburgo, e a Companhia Industrial Catarinense, ambas com sede em Joinville. A primeira dedicou-se a colonização da região de Joinville e São Bento, conseguiu junto ao governo federal o direito de colonização com venda de terras a imigrantes europeus nessas áreas. A segunda conseguiu, também, o monopólio da exploração da erva-mate em todo o planalto norte e no Estado de Santa Catarina. O monopólio sempre significa uma absorção total dos lotes coloniais por parte da primeira e da produção e da venda no caso da erva-mate na região

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A exploração da erva e a disputa territorial se agravou a partir de 1870, há

mais de quarenta anos antes da Guerra do Contestado. Nesse período, ocorreu a

consolidação do capital, mediante a instalação das duas grandes empresas,

concessionárias das terras e dos ervais. Neste espaço, controlaram o processo

produtivo da erva-mate e lotearam a região para vender as terras a imigrantes

europeus. Os antigos moradores da região, os sertanejos, foram expropriados das

suas terras e explorados pelos que os submeteram ao trabalho assalariado da

Companhia Industrial, pois, historicamente, esta é a primeira tarefa da empresa

capitalista: expropriar os trabalhadores de seus meios de produção. Sem ervais e

sem terras, muitos trabalhadores assalariaram-se e outros foram para o interior do

Planalto onde foram organizados os redutos.

Definiu-se, assim, o problema: A análise da exploração da erva-mate em

território catarinense a partir de meados do século XIX, especificamente, na região

sul do vale do rio Negro e a análise deste fator econômico enquanto motivo social da

eclosão de conflitos e da disputa territorial entre Paraná e Santa Catarina.

A pesquisa tem como objetivo geral analisar a exploração catarinense da

erva-mate a partir de meados do século XIX, na região sul do vale do rio Negro, sua

importância econômica e geradora dos conflitos pela disputa territorial entre Paraná

e Santa Catarina.

Para atingir o objetivo geral, foi realizado um dimensionamento do

desenvolvimento histórico da economia ervateira como foco de conflitos e da disputa

territorial entre os dois estados, com os seguintes objetivos específicos:

1. Investigar a exploração da erva-mate na região como fator de disputa entre

os estados do Paraná e de Santa Catarina e como uma das causas

remotas da Guerra no Contestado.

2. Analisar a ocupação e o uso do solo na região do sul do Vale do Rio Negro

por parte dos sertanejos, da colonização e das companhias ervateiras.

3. Analisar a exploração econômica da erva-mate por parte dos catarinenses,

após a ocupação da região sul do vale do rio Negro pelos paranaenses.

Para encaminhar a investigação, foram realizadas pesquisas bibliográficas,

em livros disponíveis na biblioteca da Universidade do Contestado - UnC, biblioteca

pública de São Bento do Sul e na biblioteca particular do autor. Pesquisaram-se

também teses e dissertações sobre o assunto, documentos originais no Arquivo

Histórico do Paraná, no Arquivo Público de São Bento do Sul, no Arquivo Público de

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Santa Catarina, em Florianópolis, no Cartório de Registro de Imóveis de Canoinhas,

fontes fornecidas por sites, jornais e revistas.

Primeiramente, buscou-se identificar os principais produtos de exportação de

Santa Catarina no final do século XIX e início do século XX. Em seguida, foram

identificados os documentos que abordam o conflito econômico e territorial entre

Paraná e Santa Catarina. Selecionaram-se, também, os documentos que se referem

ao conflito territorial entre Paraná e Santa Catarina pela disputa da erva-mate.

Posteriormente, se passou a identificar em teses e livros, jornais e revistas,

documentos que comprovam que a erva-mate na região ao sul do rio Negro ainda

tem viabilidade econômica através do agronegócio, com múltiplos aproveitamentos.

Havia a riqueza econômica gerada pelo extrativismo vegetal na região ao sul

do vale do rio Negro, a erva-mate, disputada por paranaenses e catarinenses.

Viviam ali pessoas simples e humildes que dependiam da extração da erva-mate

para sobreviver.

O sertanejo morador do interior de Santa Catarina, pessoa de hábito simples,

durante muitos anos extraía e produzia a erva-mate para seu próprio consumo e

para eventual venda, como forma de biscate. O mercado era reduzido, pois todos

tinham possibilidade de produzir erva e o processo de produção era conhecido pelo

homem do interior. Os ervais catarinenses ao sul do rio Negro despertaram interesse

dos empresários do mate, quando começam a surgir empresas exportadoras no

Paraná, e mais tarde também em Santa Catarina.

A erva-mate passou a ser uma atividade econômica tratada como uma

questão de Estado. O governo interferia na sua produção, bem como controlava sua

exploração em áreas consideradas terras devolutas. Um exemplo que merece

destaque ocorreu na Câmara Municipal de Rio Negro, na Província do Paraná.

Rio Negro era um Município que abrangia uma grande área no sul do Paraná

e norte de Santa Catarina, cujos limites atingiam os atuais municípios de São José

dos Pinhais, Lapa e São Mateus, no Paraná, e São Bento, pela Serra Geral até o rio

Canoinhas, em Santa Catarina.

Os limites eram contestados por Santa Catarina, mas como os catarinenses

não haviam tomado posse efetiva, a região ficou abandonada. A situação começou a

mudar e os interesses começaram a ser despertados, quando o Paraná auferiu

lucros com o comércio da erva-mate, fato este que chamou a atenção do governo

catarinense.

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18

Com a criação da Colônia Dona Francisca, em 1851, atual Joinville, e o início

da produção da erva-mate naquela colônia, o governo catarinense, realizou gestões

junto ao governo imperial para abrir uma estrada de rodagem ligando Joinville a Rio

Negro, ou seja, com ponto terminal no centro dos ervais catarinenses.

A relevância acadêmica da pesquisa é o resgate da história econômica da

região ao sul do rio Negro, com destaque para a erva-mate, que, de forma direta,

levou a um conflito de terras entre Paraná e Santa Catarina, a questão do

Contestado. De forma indireta, toda uma região foi levada à predisposição para uma

guerra ou um conflito bélico, conhecido como Guerra do Contestado. A pesquisa

visou, também, a mostrar como os ânimos foram se exaltando ao longo dos anos,

por provocações recíprocas, ora por parte do Paraná, ora por parte de Santa

Catarina, bem como as medidas administrativas que iam sendo tomadas pelo

Paraná ao longo das fronteiras, e que foram, aos poucos, levando os empresários,

coronéis, e seus capangas e pessoas humildes para o confronto armado.

A extração da erva-mate para consumo e pequenas vendas que durante

longos anos era uma atividade livre e ajudava o sertanejo a ganhar algum dinheiro,

quando passou a ser produto de exportação, tornou-se caro. Então o controle do

processo passou para as mãos de empresários poderosos que a utilizaram como

instrumento de barganha junto aos governos estaduais e municipais. Conhecer

parte da história econômica do mate é resgatar a importância econômica desse

produto como fator de desenvolvimento da região ao sul do rio Negro, sem perder a

perspectiva de que a erva-mate contribuiu para concentrar a riqueza nas mãos de

poucos e espoliou os pobres sertanejos que não tinham título de propriedade de

suas terras e tiveram que entregar seus ervais para os poderosos empresários do

mate. Vistos por esta perspectiva, a erva-mate foi uma importante causa remota da

Guerra do Contestado.

A pesquisa contribuirá para o desenvolvimento intelectual; à medida que se

conheceu novos documentos, novos locais; desenvolvimento cultural, - novas

culturas, diferentes visões de mundo; desenvolvimento social, à medida que resgata

fatos novos, com novos personagens, criando laços interativos. Contribuirá para o

aprimoramento de um método de pesquisa em história econômica regional, pautada

em características da economia do setor primário, a economia ervateira.

Como relevância econômica, a pesquisa resgatou dados importantes que

mostram o potencial da economia ervateira como fator de desenvolvimento regional.

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A pesquisa também demonstra que a ocupação, e o uso do solo, ocorreram em

forma de concessão de terras e dos ervais para companhias monopólicas,

resultando na expropriação dos habitantes que há décadas residiam na área. Isso

gerou conflitos sociais.

A pesquisa foi estruturada em três estágios, ou partes que correspondem as

três idéias básicas contidas na dissertação, seguindo-se a ordem dada pelos

objetivos específicos.

A conclusão molda-se no fato de que a história do desenvolvimento da região

foi uma história de conflitos, que organizou a economia em forma de expropriações e

de exploração social. O novo desenvolvimento regional pode ser reorganizado em

termos atuais, não em forma de puro extrativismo, mas com parâmetros econômicos

diferenciados, utilizando-se tecnologia de cultivo. A erva-mate, ainda hoje, é uma

importante atividade econômica, consumida pelos apreciadores do chimarrão, que,

no entanto, poderia ter um valor agregado maior se suas essências fossem bem

utilizadas.

A erva-mate, que é preparada quase que exclusivamente para o chimarrão e

o chá, pode também ter outras aplicações, como pasta dental, sabonetes, shampoo,

perfumes, tintas, além de fornecer produtos químicos para a indústria, como a

cafeína.

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2 ACONTECEU NOS ERVAIS: A HISTÓRIA DA EXPLORAÇÃO EC ONÔMICA DAS TERRAS E DA ERVA-MATE, REALIZADA PELAS COMPANHI AS CATARINENESES

A pesquisa bibliográfica e de campo, tendo como objetivo de investigação,

analisar a extração, a industrialização e a exportação da erva-mate, relacionando-as

ao processo de conflitos e de motivos da Guerra no Contestado, procura verificar

sua importância econômica para a história do desenvolvimento regional, apontando

perspectivas econômicas futuras. Nesse sentido, procurou-se reconstituir a história

da exploração econômica da erva-mate pelos paranaenses e, posteriormente, pelas

companhias catarinenses.

A região sul do vale do rio Negro, delimitada para esta pesquisa, está

localizada no planalto norte de Santa Catarina, e abrange a área de Campo Alegre

até Canoinhas e municípios localizados ao norte da serra Geral, onde a maioria dos

riachos é tributária do rio Negro. O vale ao sul do rio Negro é uma área com poucos

campos, mas com matas densas de araucária, imbuia e onde reinava, soberana, a

erva-mate. Descrevendo a região, Machado (2004, p.133), informa que “[...] em

divisa com o Paraná, nos vales dos rios, Negro e Iguaçu, é a região onde se

localizava a maior quantidade de ervais nativos”. No Planalto Catarinense a erva

mate era encontrada na zona dos pinhais, associada ao pinheiro e à imbuia e

segundo Reitz, citado por Mafra, (1973, p. 28) “os maiores ervais se encontraram na

região dos imbuiais, desde Campo Alegre até Xanxerê”.

Sua exploração econômica nessa região, no entanto, ocorreu somente no

início do século XIX, quando o Paraná instalou os primeiros engenhos de

beneficiamento. Santa Catarina entrou no negócio a partir de meados do século XIX.

Os governantes da Província de Santa Catarina, daquele período, estavam

mais voltados para o povoamento e desenvolvimento litorâneo, e não se

interessaram pelas riquezas vegetais do planalto norte, permitindo que a erva-mate

fosse explorada por paranaenses.

Quando o engenheiro Augusto Wunderwald, vindo de Joinville, cruzou a

região do rio São Bento, em 1865, para demarcar o traçado da futura estrada Dona

Francisca, para ligar São Francisco do Sul ao planalto, e segundo Ficker (1973 p.

32), “encontrou uma estância com casa de madeira e mais adiante em direção a Rio

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Negro, moradores espalhados pelos campos, ocupados em fazer mate”. Esses

moradores tinham vindo do Paraná em busca da erva-mate catarinense.

Enquanto Santa Catarina não contestava, os paranaenses tomavam posse

das terras na região que eles chamavam do “Sertão de Curitiba”5. A ocupação do

planalto catarinense por paranaenses se intensificou após a criação da Província do

Paraná, pela Lei 704 de 29/08/1853. Seu território abrangia os limites da 5a.

Comarca na Província de São Paulo.

Os paranaenses defendiam que a fronteira ao sul da nova Província, pelo

planalto, era o Rio Grande do Sul, pois foram paulistas e paranaenses que abriram

o caminho das tropas em 1730, assim como o caminho que ligava Campos Novos

a Curitibanos, em 1844.

No litoral de Santa Catarina, em 1851, foi fundada a Colônia Dona Francisca,

por colonos alemães, suíços e noruegueses, dando origem à cidade de Joinville. Em

1858, iniciou-se a construção de uma estrada para ligar a Colônia litorânea ao centro

dos ervais.

Sobre a importância dessa estrada, Almeida (1978, p 120) afirma que: “foi

esta estrada a chave para a evolução de Joinville”.

O Governo do Paraná, por sua vez, instalou uma “barreira fiscal”6 para

cobrança de impostos de mercadoria em trânsito na localidade de Ambrósios, no

Município de São José dos Pinhais, por onde a estrada deveria passar conforme o

projeto original.

Com a mudança do ponto final para Rio Negro, o Paraná transferiu o posto

fiscal para as margens da nova rodovia, no local denominado Encruzilhada, no ano

de 1868. Conforme Ficker (1973 p.28), “A Presidência do Paraná transferiu para

Encruzilhada – em plena mata virgem – a estação fiscal de Ambrósios”. O posto

estava localizado no planalto, a 26 quilômetros ao sul do rio Negro, em território

5 Sertão de Curitiba – segundo Lemos, (1977, p. 69), era a região compreendida entre os rios Iguaçu e Uruguai e não era outra senão o planalto, na sua maioria catarinense. Depois da abertura da Estrada das Tropas, o “Sertão de Curitiba”, passou a ser chamado “Campos de Curitiba” ou “Campos Curitibanos”. 6 Barreira fiscal ou posto fiscal,- são pontos definidos na fronteira entre os Estados, onde são fiscalizadas as mercadorias em trânsito para conferir se foi pago ou descriminado o imposto de circulação de mercadoria, definido para cada tipo de produto. Segundo Ficker, (1973, p. 35) “O Paraná instalou no lugar Encruzilhada a estação fiscal para cobrança do imposto sobre gado, transferida do Campo dos Ambrósios”. O grande problema ocorrido na região ao sul do rio Negro, no final do século XIX e início do século XX, é que o Paraná instalou várias barreiras a alguns quilômetros dentro do território catarinense, para cobrar impostos de mercadorias procedentes de Santa Catarina, que se destinavam a consumidores catarinenses, e, portanto, isentas de impostos interestaduais.

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pertencente a Santa Catarina. Com a instalação do posto fiscal em território ao sul

do rio Negro, o Paraná fixou jurisdição no atual Município de Campo Alegre – SC, no

Planalto Norte de Santa Catarina.

A Sociedade Colonizadora7 de Joinville, no meio dos ervais, no ano de 1873,

fundou a Colônia Agrícola São Bento, com imigrantes austríacos, poloneses e

alemães, numa área a oeste de Campo Alegre e às margens do rio São Bento,

quatro quilômetros distantes da estrada em construção, no planalto norte de Santa

Catarina.

Alegando que São Bento estava em seu território, se antecipou e, conforme

Ficker, (1973 p.68 ) “A Presidência da Província do Paraná já começou a vender

terras na margem esquerda do Rio Negro e mesmo dentro dos terrenos pelo

Governo foram postos à disposição da Sociedade Colonizadora”. Entregou títulos de

propriedade de terras aos colonos brasileiros residentes na região e, com isso, o

Paraná estava estabelecendo o uti possidetis8 sobre o território ao sul do vale do Rio

Negro.

Essa ação gerou protestos dos imigrantes, dos dirigentes da Cia Colonizadora

e do governo de Santa Catarina. Os terrenos que os imigrantes adquiriram

7 Sociedade Colonizadora de 1849 em Hamburgo – Fundada no ano de 1849 em Hamburgo, na Alemanha, pelo Senador Schroeder, era uma empresa por ações chamada de Sociedade Colonizadora de 1849, em Hamburgo. (Colonisations-Verein von 1849 in Hamburg). O objetivo da Sociedade era a colonização em grande escala, fixando 1 500 colonos, fornecendo, acomodação e sustento aos imigrantes durante dois anos, construção de igrejas e escolas, etc... Segundo Ficker, (1973, p. 15) “O primeiro passo dado por essa iniciativa foi enviar um engenheiro ao Rio de Janeiro para obter numerosos privilégios do Governo Imperial do Brasil, como isenção de taxas aduaneiras, isenção de impostos, proibição de negociatas com escravos etc., que foram concedidos conforme o Decreto Imperial de 15 de maio de 1850. Por esse Decreto, foram colocados à disposição da Sociedade Colonizadora 8 léguas quadradas em área pertencente à princesa Dona Francisca, na atual Joinville. Segundo Ficker (1973, p.9) “A Colônia Dona Francisca empreendimento privado da Sociedade Colonizadora de 1849 em Hamburgo, tiveram origem diversas colônias filiais. Em busca de novas terras para a lavoura, em conseqüência do afluxo de novos contingentes de imigrantes, a Direção da Colônia Dona Francisca procurava expandir as áreas originais de colonização”. A Sociedade Colonizadora era um empreendimento colonial, dirigido por um político alemão Senador Schroeder, que procurava por esses meios, benefícios públicos. Foi usando dessa influência que a empresa solicitou 247 quilômetros quadrados no Planalto e conseguiu em 14 de julho de 1869, do Ministério da Agricultura, autorização para utilização das terras além da Serra de São Miguel, para estabelecer novos imigrantes. A Colônia Agrícola São Bento, fundada em 1873, era a parte Planaltina da Colônia Dona Francisca, com sede em Joinville, filial da Sociedade Colonizadora de 1849 em Hamburgo. A venda das terras coloniais nessas áreas era seu monopólio. 8 Uti possidetis = Conforme Abreu (1963, p. 196) “[...] ficaria cada parte com o que atualmente possuísse”. Mas, segundo o Dicionário Aurélio, p. 1434, a grafia correta é Uti Possi de tis que significa “como possuis”. “Fórmula diplomática que estabelece o direto dum país a um território, direito esse, fundamentado na ocupação efetiva e prolongada, e independente de qualquer outro título”. O Paraná ao ocupar o território ao sul do rio Negro, reclamava o direito a sua posse definitiva, por ter ocupado efetivamente o território e Santa Catarina apesar do título legal de 1749, não ter ocupado a região e portanto não tinha o direito de posse.

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encontravam-se cobertos de ervais, e estes logo se iniciaram na atividade ervateira,

que passou a complementar a agrícola.

No final do século XIX, a erva-mate se tornou o principal produto de

exportação catarinense e assim foi por longos anos. Segundo Bossle (1988, p. 95),

“Até o ano de 1932 continuou sendo o principal produto, entrando em crise a partir

de 1933, quando a madeira se consolidou como o principal produto de exportação

de Santa Catarina”.

A exportação da erva-mate para chimarrão entrou em crise no final da década

de 1930, quando a Argentina tornou-se produtora e exportadora. A partir desse

período, engenhos foram fechados e muitos empresários mudaram de ramo de

negócio. Os que continuam na atividade ervateira sabem que o setor necessita de

maior incentivo do Governo, para que possam resgatar um produto importante para

o desenvolvimento regional no vale ao sul do rio Negro.

O planalto norte de Santa Catarina, no século XIX, era uma região onde os

catarinenses estavam ausentes, e os paranaenses ocupavam os campos de Lages,

com fazendas de criação de gado e, posteriormente, com sertanejos, que

exploravam a erva-mate. Sem vilas, desde o alto da serra do mar, nos limites da

Serra Geral, todo o vale ao sul do rio Negro era território catarinense de direito,

segundo a lei que criou a “Ouvidoria”9 de Santa Catarina em 1749, mas paranaense

de fato, pela ocupação e pelo uso.

A região ao sul do rio Negro, área rica em matas nativas, onde havia

abundância de madeira e erva-mate, despertou o interesse do Paraná. Santa

Catarina, uma economia litorânea, onde estavam localizadas as principais cidades e

as principias áreas de colonização européia, não explorava economicamente a erva-

mate no planalto. O Paraná tinha sua base produtora no planalto, onde era criado

gado e eram extraídos a madeira e a erva-mate. A erva-mate, no final do século

XIX, passou a ser o seu principal produto de exportação e o responsável pelo

desenvolvimento da região ao sul do rio Negro.

9 Ouvidoria = Comarca Judiciária. Santa Catarina passou a ser sede de comarca ou ouvidoria em junho de 1749, separada de Paranaguá, criada pela carta régia de 20 de setembro, demarcando os seguintes limites de jurisdição: ao norte, pela barra austral do rio São Francisco, pelo Cubatão do mesmo rio, pelo rio Negro que se mete no grande rio de Curitiba e ao sul, nos montes que deságuam para a lagoa Imerí. (CABRAL, 1969, p. 63). A Ouvidoria funcionou com sede em Desterro até 1812, quando foi transferida para Porto Alegre, ficando extinta a ouvidoria de Santa Catarina. Em 1821 foi restabelecida a ouvidoria de Santa Catarina, com sede em Desterro e com jurisdição sobre Desterro, Laguna, no litoral e Lages, no Planalto, sendo nomeado o primeiro ouvidor Dr. Manoel José de Albuquerque.

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Queiroz (1981, p. 64), no capítulo III, destaca a importância da questão de

limites, e, ao enfocar a economia regional deu destaque à madeira, a estrada de

ferro e a situação de miséria do sertanejo10. Não destacou que a erva-mate foi uma

das causas do agravamento da questão de limites, a partir da fundação de São

Bento, base estratégica catarinense de resistência às pretensões do Paraná.

Com a entrada dos empresários da erva-mate na região para a produção em

larga escala, o sertanejo ervateiro foi espoliado de seu direito de produzir para

consumo próprio e para trocar com os comerciantes, por produtos vitais para ele e

sua família. O sertanejo começou a ficar miserável quando teve que deixar o

extrativismo da erva-mate para o consumo próprio e para pequenas vendas, para se

subsumir aos empresários do mate. Expropriado das terras, sem condições de

explorar a erva-mate, foi se desqualificando, entrando para as irmandades religiosas.

Analisando a situação dos sertanejos, as elites e os fazendeiros fornecem os

argumentos para Cabral (1968, p. 280) que os considera como:

fanáticos, pessoas pobres, sem escolaridades, sem assistência religiosa, segregadas, escondendo suas misérias nas canhadas das serras, caçando, plantando e do corte da congonha (erva-mate), que vendiam aos ervateiros para comprar sal, pólvora, querosene [...].

A erva-mate ou congonha fornecia o recurso excedente necessário para o

sertanejo adquirir os produtos essenciais à sobrevivência das famílias no interior.

Sem a erva, ao sertanejo que já era pobre e abandonado, só restou a alternativa de

ir para os redutos e se tornar fanático.

Em “Lideranças do Contestado” Machado (2004, p. 337), destaca o papel das

lideranças sertanejas, dos políticos, fazendeiros e coronéis. Contesta o termo Guerra

do Contestado, preferindo denominar de Guerra no Contestado, ou seja, uma guerra

que ocorreu em território contestado por várias razões. 10 Sertanejo - definido pelo Dicionário Aurélio, (p. 1293), como indivíduo habitante do sertão. Podendo também ser definido como rústico, agreste, rude, caipira. Preferiu-se usar o termo sertanejo, e não caboclo, pois, segundo o mesmo autor (p, 242), este é originário do tupi Kari ‘boka, definido como descendente do índio com o branco (carijó). Thomé (2004, p. 14) chama o “habitante majoritário da região do Contestado de “caboclo pardo” pelas suas raízes étnico-culturais luso brasileiras e mescla destas com a índia, a negra e seus descendentes”. Em “O Homem do Contestado”, Schüler Sobrinho contesta a origem luso-brasileira dos caboclos guerreiros do Contestado, mostrando uma série de evidências de que eles eram, na realidade, descendentes dos mouros espanhóis e que entraram na região através das missões espanholas. Mas, sem entrar no mérito, a preferência pelo termo sertanejo neste trabalho, prende-se ao fato de que os primeiros habitantes brasileiros, os sertanejos de São Bento não eram caboclos das margens do rio do Peixe, mas descendentes de açorianos procedentes da região de Morretes, onde estavam localizadas as primeiros engenhos de erva-mate do Paraná.

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O autor salienta que a disputa de limites entre Santa Catarina e Paraná foi

intensa no planalto norte, onde estavam situadas as principais reservas nativas de

erva-mate, envolvendo comerciantes, fabricantes e exportadores do mate, chefes

políticos locais, mas justifica que não foi uma guerra entre os Estados do Paraná e

Santa Catarina, com o qual não há concordância. É importante não esquecer que a

guerra do Contestado iniciou de fato, no combate de Irani, liderado por João

Gualberto, comandante militar do Paraná, atacando e matando “sertanejos

catarinenses” que haviam “invadido território do Paraná”, para garantir o Uti Possi de

tis catarinense. Segundo Cabral, (1968, p. 285) “O Paraná reagiu dentro de um

único pensamento: expulsar os intrusos, tidos por agentes de outro Estado”.

Portanto, para o governo do Paraná, houve uma invasão ao seu território e era

necessária uma ação enérgica para expulsar o invasor, e de fato iniciou uma guerra

interestadual.

Um ponto importante a ser destacado no trabalho de Machado (2004), é o

reconhecimento de que um dos primeiros conflitos bélicos da questão do Contestado

ocorreu em São Bento, em 1909.

No seu livro, “Da cidade santa à corte celeste – memória de sertanejos e a

guerra do Contestado”, Valentini (2000) salienta que a chegada de poderosas forças

econômicas, relacionadas à expansão capitalista do início do século é fato decisivo

na deflagração da crise que levou à luta armada. Relaciona entre as forças

econômicas: a construção da ferrovia, a exploração comercial da madeira e a

colonização da região, o que levou o sertanejo a uma progressiva marginalização.

No texto (idem, 2000, p. 37) esclarece que a erva-mate se tornou um produto

valorizado, e que os donos das terras passaram a fazê-la com seus peões e a coibir

a entrada de alheios, confirmando o que já havia sido afirmado anteriormente, o

sertanejo que antes colhia erva-mate à vontade em terras devolutas, agora passou a

produzir não mais para ele, mas para o dono do erval.

Continuando, o autor destacou que a erva-mate rendeu lucro aos coronéis

fazendeiros que eram os donos das terras, aos comerciantes, intermediários

fornecedores aos caboclos ervateiros, os bodegueiros das vilas, industriais do mate,

principalmente de Joinville e Curitiba, e aos governos estaduais com os impostos

cobrados. Reconheceu que a proibição de extração da erva-mate foi prejudicial ao

sertanejo. (VALENTINI, 2000)

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Analisando pontos de vista defendidos pelos autores citados, fica claro que a

disputa territorial do Contestado foi também econômica pela erva-mate, e se

intensificou a partir da abertura da estrada Dona Francisca, ligando o litoral com o

planalto e com a criação da colônia agrícola São Bento em 1873.

A erva-mate, do final do século XIX até a década de 1930, foi o principal

produto de exportação do Paraná e de Santa Catarina. Embora perdendo a primazia

econômica, a produção da erva-mate para chimarrão continua nos dias atuais

2.1 A ERVA-MATE – ASPECTOS HISTÓRICOS

A erva-mate está distribuída por uma área geográfica que abrange no Brasil,

os estados do Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Mato Grosso do Sul. Na

Argentina, nas províncias de Missiones, Corrientes e Tucumã, No Paraguai, em

áreas localizadas no vale do rio Paraguai.

Segundo Linhares, (1969, p. 23), a erva-mate já era utilizada na América do

Sul pré-colonial, “pelos índios Guarani, que habitavam o vale dos rios Paraná,

Uruguai e Paraguai”. Esses mesmos índios devem ter realizado comércio com as

tribos vizinhas e mesmo através do “peabiru”11, com habitantes de várias tribos que

habitavam os Andes, conforme Reitz, citado por Mafra, (1993, p. 28), “nos túmulos

pré-colombianos escavados e aberto no Peru, foram encontrados folhas de erva-

mate ao lado de alimentos e objetos, o que, sem dúvida, prova o seu uso entre os

Incas”.

O processo de produção era de conhecimento indígena, fazia parte da sua

cultura, foi apropriado pelos padres jesuítas, que mantiveram sigilo desse processo

11 Peabiru – Caminho indígena pré-colombiano com ponto terminal em São Vicente, no Litoral de São Paulo, o tronco principal, adentrando pelo interior do Brasil, passando por São Paulo, Castro, Pitanga, Guairá, Porto Casado, Corumbá, Potosí, La Paz, Cuzco, Machu Pichu e Arequipa. Em Santa Catarina, possuía ramificações secundárias para São Francisco do Sul, Florianópolis. Uma ramificação era a mesma que mais tarde foi usada pelos tropeiros, e passava por Lages, de onde bifurcava com um caminho para Laguna e outro para o interior de rio Grande do Sul. Da região de Guarapuava descia um caminho secundário, passando por Campo Erê, Mondai, na direção ao vale do Uruguai. (Conforme Galdino, os Incas no Brasil, Editora Estrada real, 2003, publicado no jornal A Notícia, Anexo, p. c 3, de 31 ago. 2003. Foi por esse caminho que Dom Álvar Nuñes Cabeza de Vaca, em novembro de 1541, vindo de Florianópolis, cruzou com sua comitiva por São Bento do Sul, na sua jornada por terra para chegar ao Paraguai em 11 de março de 1542. (Ehlke, 1973, p.56)

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abril, por longo tempo. Os padres ao manter para si esse conhecimento, obtiveram

com ele lucro, praticando um “capitalismo sagrado”12.

Era tomada em cuia, chamada de “mati”, dando origem ao termo erva-mate,

ou seja, a erva para ser sorvida em cuia.

Em estudo sobre a viabilidade econômica do mate em reflorestamento,

Malinovski (2006, p. 261) informa que existem “cerca de 600 espécies representam

a família Aqüifoliáceas, das quais 60 ocorrem no Brasil”. No sul do Brasil é colhida

da espécie Ilex Paraguariensis, mas também é conhecida por vários nomes, como

erva-mate, orelha de burro, congonha, que deriva de congoin, que em guarani

significa o que alimenta, o que sustenta.

Segundo Almeida, (1979, p. 8) “A erva-mate genuína é uma árvore que chega

à altura de oito metros, tendo o porte de uma laranjeira, o tronco pardo-cinzento e as

folhas ascendentes mais ou menos horizontais”.

Conhecida também como erva do Paraguai, o seu uso é uma herança da

cultura indígena guarani, que conquistou a sociedade colonial. No início da

colonização, sofreu rejeição pelos padres jesuítas, que atribuíam a ela poderes de

regeneração e recuperação do cansaço e foi por isso a chamaram de erva do diabo.

Como os padres não conseguiram erradicar o hábito de consumo da erva-mate entre

os índios, quando criaram as missões ou reduções, transformaram a erva-mate em

produto de exportação, “um produto sagrado”.

Nas missões dos jesuítas se desenvolvia a fabricação da erva-mate tostada e moída da qual se retiravam os pequenos paus, coisas que os índios que serviam aos espanhóis jamais fizeram e, desta forma, a erva jesuítica alcançava no mercado preços que oscilavam três a quatro vezes mais. (ALMEIDA, 1979, p. 05)

O mate preparado pelos padres jesuítas nas missões, ganhou a preferência

nos mercados da região do Prata, além dos Andes, em Potosí, no Chile e no Peru.

Foi através dos padres jesuítas que o mate, hábito alimentar indígena, saiu das

reduções e entrou nos lares dos europeus colonizadores.

12 Capitalismo Sagrado – prática capitalista utilizada pelos padres jesuítas nas missões da América. Consistia em desenvolver atividades missioneiras com práticas capitalistas de produção de mercadorias para serem exportadas, com grandes lucros para a Ordem dos Jesuítas. Essa prática não era bem vista pelas autoridades portuguesas e mesmo as espanholas, por estarem isentas de impostos, e foi uma das causas da expulsão dos Jesuítas da América Latina.

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Os padres exploraram o comércio e a exportação do mate, o seu cultivo, o

seu preparo e sua extração por mais de um século e meio. Eles não se contentaram

apenas em explorar os ervais nativos dos vales dos rios Uruguai, Paraná e Paraguai.

Fizeram grandes ervais reflorestados. Com base em relatórios de autoridades

espanholas, Linhares, (1969, p. 45), sustenta “que nos 7 Povos das Missões,

situados à margem esquerda do rio Uruguai, no atual território do Rio Grande do Sul,

havia 200 mil árvores de erva plantadas e avaliadas em um milhão de pesos”.

A produção dos Jesuítas iniciou em 1610 e, para todo o processo produtivo

da erva, eles exploravam a mão-de-obra do índio, a quem Linhares, (1969, p. 39),

chama de “Pobre presa, caída nas armadilhas da civilização mecânica, selvagens da

floresta de ouro verde, meigas e impotentes vítimas”. A exploração dos índios por

parte dos padres, os lucros gerados pela venda, podem ter colaborado para a saída

forçada da Companhia de Jesus das terras americanas no ano 1768. Nesse caso, a

erva-mate estava no centro de um conflito entre a Companhia de Jesus e os

governos da Espanha e de Portugal.

A erva-mate era um produto que alcançava no mercado externo preço alto. A

saída dos padres e o abandono da atividade ervateira deram à Companhia de Jesus

grandes prejuízos. Para se ter uma idéia do valor da erva pronta é importante

recorrer a Linhares (1969, p. 45), quando afirma: “Lembre-se que o preço comum da

erva no Paraguai era 4 reais. (Nota – real era moeda da época colonial). Por uma

vaca davam-se três arrobas”.

Ou seja, uma vaca naquela época equivalia ao preço de 45 quilos de erva

pronta. Pelo valor equiparado de uma vaca atualmente, não é necessário ser

especialista em economia, para concluir que o preço praticado na época era superior

a R$ 10,00 (dez reais), por quilo da erva pronta para consumo.

Com a saída dos Jesuítas da América do Sul, a atividade ervateira se

desarticulou e a burocracia espanhola não conseguiu reorganizar o monopólio da

erva-mate que antes pertencia aos padres. No Brasil, o produto era consumido, mas

não fabricado, importava-se erva-mate do Paraguai.

Com a independência do Paraguai, conforme afirmação de Bandeira, (1998,

p. 79), o governo de “José Gaspar Rodriguez de Francia monopoliza a exportação

de erva-mate, madeira e tabaco, a partir de 1810. No comércio com o Brasil, os

paraguaios trocavam erva-mate por armas e munições”.

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Esse fato é relevante, pois mais tarde os paraguaios, durante a guerra,

matavam brasileiros com armas fornecidas pelo Brasil em troca de erva-mate.

Nas terras cobertas com extensos bosques, ervais e pastagens, o estado

paraguaio arrendava aos camponeses ou explorava diretamente com o emprego de

escravos e o trabalho forçado dos detentos. Nesse sistema, foram organizadas mais

de 175 Estâncias da Pátria, para produzir e fornecer produtos para a população e

para o exército.

Com o fechamento do comércio paraguaio ao exterior, ditado pelo monopólio

estatal, o Paraguai entrou em crise. Mais tarde, para voltar a crescer, teve que abrir

seus portos fluviais para reconquistar os mercados da erva-mate, madeira e tabaco,

localizados principalmente na bacia do rio da Prata.

Com a morte de Francia em 1840 o Paraguai passou a ser governado por

Carlos Antonio López, que reorientou o comércio internacional buscando tecnologia

externa nos Estados Unidos e na Europa. Com essa investida internacional,

conseguiu transferir tecnologia, imigrantes e investimentos europeus para

modernizar o Paraguai. Esse país entrou na era da industrialização, construindo

fábricas de navios, armas, e melhorou o cultivo do tabaco, algodão, cana-de-açúcar.

Foram instaladas várias fábricas de erva-mate. Segundo Bandeira, (1998, p. 81),

“Instalou fábricas de pólvora, enxofre, louças e outras manufaturas e melhorou a

elaboração da erva-mate [...]”.

O seu filho e novo governante paraguaio, Francisco Solano López, manteve o

monopólio e tinha como principais fontes de recursos a comercialização de erva-

mate, do tabaco, da madeira e do arrendamento de terras.

Brasil e Paraguai mantinham até então boas relações diplomáticas. Lutaram

juntos na batalha de Caseros, onde derrotaram o governante argentino João M.

Rosas e abriram o rio da Prata para o comércio internacional.

As desavenças que surgiram depois da guerra contra Rosas foram

alimentadas pela concorrência dos produtos de exportação, nos mercados da Bacia

do Prata, cuja hegemonia o Paraguai e o Império do Brasil passaram a disputar.

Com a abertura dos portos, a partir de 1853, o Paraguai expandiu as

exportações da erva-mate, que era a sua principal fonte de divisa, o que levou o

governante paranaense a advertir as autoridades brasileiras.

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Zacarias de Góes e Vasconcelos, (primeiro) presidente da Província do Paraná, adverte as autoridades brasileiras, sobre a “temível concorrência” da erva paraguaia, mais barata e de melhor qualidade, nos mercados de Buenos Aires e Montevidéu, que até então os produtos brasileiros praticamente dominaram. (BANDEIRA, 1998, p.111)

A concorrência entre a erva-mate paraguaia e a brasileira foi benéfica para os

consumidores, pois baixou o seu preço, mas prejudicou os produtores. O Paraguai

foi o mais prejudicado e inclusive Francisco Solano Lopes, presidente daquele país e

que era também um dos maiores produtores de erva-mate.

A crise provocada pelo mate levou os dois países à tensão diplomática e,

como Bandeira (1998, p. 112), afirmou:

Era inevitável que as tensões entre o Paraguai e o Império do Brasil se reacendessem, tanto mais quanto outros acontecimentos sobrevieram, concorrendo para exacerbar, interna e externamente, as posições em todos os países da Bacia do Prata.

A erva-mate foi uma das causas da Guerra do Paraguai13 e nela se

envolveram os produtores do Brasil e Paraguai e os comerciantes representantes

dos mercados consumidores da Argentina e do Uruguai. Foi responsável pelo

segundo conflito na América do Sul. O primeiro foi o que, levou a expulsão dos

Jesuítas.

Durante a guerra, o mercado para a erva-mate brasileira abriu-se na

Argentina. Enquanto isso, os soldados brasileiros, na frente de luta, passavam

necessidades, como foram descritas pelo general Francisco da Rocha Calado,

conforme Costa (1995, p. 43), “Fui então testemunha durante um período de 22 dias,

de que nosso exército alimentava-se quase que exclusivamente do mate que

colhíamos nos ervais, pois a falta de víveres não nos permitia longos repousos.”

Ao término da guerra, o Brasil incorporou ao seu território vastos ervais

paraguaios, apossou-se de todo o alto Paraná, exterminando a concorrência vizinha.

Na opinião de Linhares, (1969), “coube-lhe por direito de conquista, incorporar ao

13 Guerra do Paraguai - Guerra do Paraguai – O livro Historia da Sociedade Brasileira, utilizado para o ensino médio (ALENCAR, 1994), informa que “A paz entre o Brasil e Paraguai foi assinada em 1872, apesar de muitas divergências surgidas entre os aliados quanto a questões de limites e posse de regiões, como foi o caso do Chaco, com a Argentina”. Nem nesse livro e nem nos demais são encontradas referências sobre a apropriação dos ervais paraguaios pelos brasileiros. A Historiografia tradicional prefere amenizar a questão, afirmando que a guerra do Paraguai foi a mais sangrenta guerra travada na América Latina e que o Paraguai estava arruinado, o império perdeu cem mil homens, e que, devido às despesas de guerra, teve que fazer empréstimos na Inglaterra....

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seu território a área mais rica dos ervatais do Paraguai, liquidando-lhe com a guerra,

a hegemonia no mercado da Bacia do Rio da Prata”.

Com a liquidação da concorrência da erva-mate paraguaia, o Brasil precisou

se estruturar para poder atender o mercado consumidor externo. O Paraná ampliou

sua base produtiva, buscando inclusive matéria-prima ao sul do rio Negro, em

território de Santa Catarina, que até então não tinha se preocupado com a economia

ervateira. O interesse dos catarinenses pela erva só se concretizou com a

construção da estrada Dona Francisca. Por essa estrada, vinha a matéria-prima do

Planalto, ao sul do rio Negro, para disputar o mercado ervateiro com o Paraná,

acirrando a questão de limites pela disputa da mesma área pelas duas Províncias.

2.1.1 A Erva-mate no Paraná

No Paraná estava localizada a missão dos Padres Jesuítas de Guairá com

tribos indígenas espalhadas por quase todo o território daquele Estado. Segundo

dados publicados pelo “Parque Histórico do Mate”, órgão do governo do Paraná,

(disponível em www.pr.gov.br/phmate/consumo-06/05/07), dos quais resumiu-se o

que segue: Desde 1550 até 1632, a extração de erva-mate era a atividade

econômica mais importante da Província Del Guairá, território que abrangia o

Planalto do Paraná, onde foram fundadas as cidades de Ciudade Real na foz do rio

Piquiri, Tambo, nas nascentes de Piqueri e Vila Rica, próxima às nascentes do rio

Ivaí. Foram fundadas, também, 15 reduções jesuíticas: no vale do rio

Paranapanema: São Miguel, Nossa Senhora de Encarnacion, São Francisco Xavier,

São José, Santo Inácio, Loreto; No vale do rio Ivaí: Santo Antonio, São Tomás dos

Anjos, São Paulo do Ivaí, Jesus Maria; No vale do Rio Piquirí: Nossa Senhora dos

Guanhanhos, Concepción, Ermida de Santa Maria14. Ficava fora da Província de

Guairá apenas a região da serra do mar e litoral.

Com a desorganização do monopólio comercial dos jesuítas, o governo de

Portugal atendeu pedido de Rafael Pires Pardinho, ouvidor geral do Brasil Meridional 14 Santa Maria – A missão dos padres Jesuítas de Guairá compreendia praticamente todo o Planalto do Paraná, ficando excluída apenas o território litorâneo. Portanto, toda a área ao norte do rio Negro e rio Iguaçu era território missioneiro, local de exploração da erva-mate. Se os missioneiros não consideravam o rio Iguaçu como divisa interestadual é possível que em toda a região do planalto norte de Santa Catarina a erva-mate tenha sido explorada pelos padres jesuítas.

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e autorizou as populações localizadas no sul do Brasil a comerciarem livremente a

erva-mate com a Colônia Sacramento e com Buenos Aires.

Segundo Waschowicz (1988, p. 127), “Portugal sugeriu então às populações

de Paranaguá e Curitiba que levassem ao Prata, madeiras, cal de ostras, telhas,

tijolos e sobretudo a congonha (erva-mate)”.

A exportação de erva-mate enfrentou dificuldades no início do século XIX. No

ano de 1831, as exportações brasileiras de erva-mate representavam apenas 0,3%

do total das mercadorias exportadas. Porém, no ano de 1850, a exportação desse

produto passou a representar 1,3%.

A erva financiou a criação da Província do Paraná em 1853, financiou

também as artes, a literatura e a educação superior, como informa Linhares, (1969,

p. 202) “a Biblioteca Pública do Paraná em 1880 possuía cerca de 2 000 volumes.

Em 1912, em plena ascensão da economia do mate, fundou-se em Curitiba, a

universidade”. Também abriu o caminho de Curitiba com o litoral pela estrada de

ferro Curitiba a Paranaguá. Foi também responsável pela abertura da estrada de

rodagem conhecida como Estrada da Graciosa.

Com o fechamento do mercado paraguaio em 1813, por Francia, ficou

proibida a exportação da erva-mate para os mercados do Rio da Prata. Segundo

Wachowicz (1988, p. 127), “os comerciantes argentinos, desesperados para

conseguir matéria prima, apelaram para outras regiões capazes de abastecê-las”.

Sabedores de que os planaltos do Paraná, Santa Catarina e parte do Rio Grande do

Sul possuíam grandes áreas de ervais nativos, os argentinos vieram em busca da

erva-mate. Um dos comerciantes, Francisco Alzagaray se empenha em solucionar o

problema de abastecimento para a região do Rio da Prata.

Chegando a Paranaguá em 1820, percebeu logo no início que os paranaenses nada entendiam de erva-mate. Ensinou-lhes o fabrico, o beneficiamento e a maneira de acondicionamento em surrões de couro. Os paranaenses somente conheciam o consumo do mate com água fria, o tererê dos índios. (WACHOWICZ, 1988, p. 127)

Com a participação de comerciantes argentinos, o Paraná, se transformou na

terra do mate, chegando esse produto a representar 85% do montante da

exportação da Província.

Em 1843 a erva-mate ocupava dois terços do capital paranaense, e que, em nome dessa riqueza, a Câmara de Paranaguá pedia, naquele tempo, ao

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Presidente da Província de São Paulo, a emancipação da sua quinta comarca. (RIESEMBERG, 1947, p. 207)

Portanto, a criação da Província do Paraná foi liderada pelos produtores de

erva-mate e não por fazendeiros do gado ou pelos madeireiros.

À medida que o consumo aumentava, cidades iam surgindo e crescendo com

o mate. Temístocles Linhares, em sua obra História Econômica do Mate, publicada

em 1969, na página 161, destaca que, “o mate era para o Paraná o mesmo que o

café para São Paulo ou a borracha para os estados amazônicos. Tudo girava em

torno dele, pelo menos até os cinco primeiros lustros deste século”.

Em 1853, quando foi criada a Província, havia no Paraná 90 engenhos que

forneciam erva-mate para os seguintes mercados, conforme Wachowicz (1988, p.

128), “Buenos Aires, Montevidéu, Valparaíso no Chile e Rio de Janeiro. A sua

importância econômica, na condição de principal produto paranaense, ultrapassou

o período provincial e, até a década de 1920, foi o esteio da economia do Paraná”.

Conforme os autores, Capri e Olivero (1923, p. 79), na década de 1920, o

Paraná possuía 52 municípios. Desses, 32 tinham sua economia dependente da

erva-mate.

Enquanto o Paraná progredia com o mate, conseguindo os recursos

suficientes para se tornar Província autônoma, se separando de São Paulo em 1853,

Santa Catarina, possuidora de amplos ervais, não tinha entrado no negócio do mate

de forma efetiva, até a fundação de São Bento, em 1873 com a vinda de imigrantes

europeus. Mas não foram os imigrantes que iniciaram a exploração da erva-mate,

pois os fundadores de São Bento também não entendiam nada de erva. Esse

trabalho era feito pelo sertanejo ervateiro, aqueles que desde 1820 entravam no

sertão para cortar erva-mate que era levada para Paranaguá, Antonina e Morretes.

2.1.2 O Sertanejo Ervateiro do Sul do Vale do Rio Negro

No sertão do planalto norte catarinense, a erva-mate era um produto já

conhecido, consumido e comercializado pelo sertanejo que habitava a região

campeira e por aqueles que residiam ao longo do caminho das tropas. O sertanejo

herdou esse hábito dos índios guaranis ou carijós. Ele foi difundido entre os

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colonizadores pelos padres jesuítas, e a erva, foi por longos anos, produzida de

forma primitiva. O processo se iniciava com corte na mata, em seguida a erva era

sapecada, secada no carijo ou no barbaquá, quebrada com facão de madeira e mais

tarde na cancha até reduzi-la a pó. Segundo Queiroz (1981, p. 31), “a princípio, o

corte e o preparo não tinham caráter comercial, uma vez que o produto se destinava

ao consumo doméstico”. Produzir erva-mate para o sertanejo do planalto central

catarinense era uma cultura, fazia parte de um complexo conhecimento herdado dos

indígenas e do seu hábito alimentar.

Os colonizadores, residentes no litoral do Paraná, descendentes de açorianos

que vieram para a região em meados do século XVIII, desconheciam a erva-mate.

Em 1820, o argentino Alzagaray ensinou aos paranaenses o fabrico, o

beneficiamento e a maneira de acondicionamento em bolsas de couro, chamadas de

surrões.

Foram esses descendentes de açorianos com pouco ou nenhum contato com

os índios, que aprenderam o processo de fabricar erva-mate no modelo argentino

para exportação. Foram eles que subiram a serra do Mar e se embrenharam nos

sertões de Campo Alegre e São Bento, Rio Negro, para levar erva para o litoral,

onde era beneficiada nos engenhos de Paranaguá e Morretes.

Analisando os trabalhadores do mate, que buscavam abrir novos ervais

juntamente com sua família, ao norte e ao sul dos rios Negro e Iguaçu, Queirós

(1981, p. 32) afirma que eles eram “escravizados pelos ervais que descobriam”.

A região do vale do rio Negro, nas proximidades da Serra do Mar, era pouco

habitada, mas não desconhecida. No ano de 1831, o governador de São Paulo

informou por ofício da Câmara, que tinha um importante aviso, Ehlke (1973, p. 164),

“sobre o caminho que vinha da Laguna pela praia até o rio São Francisco e deste,

pelos campos de Ambrósios, para a vila de Curitiba.”

O caminho entre o litoral catarinense e Curitiba passava por campos

contíguos aos campos de Quiriri em Campo Alegre, aliás esses campos de belas

paisagens devem ser a origem do nome da localidade. Mas esse caminho segundo

o mesmo autor, destinava-se a ir ao registro de gado e cavalgaduras, no caminho

que vinha de Viamão a Sorocaba, e que se tornou conhecido como caminho das

Tropas. O caminho que ligava a povoação a São Francisco ao sertão de Curitiba,

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por terra, passava na região de Três Barras15, próxima a Baía da Babitonga, e ligava

também Paranaguá, que era sede da Ouvidoria. (EHLKE, 1973)

Eram por esses caminhos que margeavam o norte do rio Negro, por onde

subiram os açorianos do litoral, habitantes de Morretes e Paranaguá para buscar a

erva-mate no sertão de Santa Catarina e Paraná. O primeiro grupo de açorianos que

habitou o planalto, às margens do rio Negro, foi mandado pelo governador de São

Paulo, Conde de Parma. Eram 50 casais que foram encaminhados para a localidade

de Rio Negro.

Em 1840 um novo grupo de famílias litorâneas, realizou uma migração

espontânea, subindo ao Planalto, colonizando a região de Agudos do Sul e Pien.

Eram esses os sertanejos que habitavam a região e não o caboclo pardo das

margens do rio do Peixe ou do Uruguai, descendente de brancos com índios

referidos por Thomé (1981, p. 54), “O caboclo, morador na região do Contestado, ao

contrário do que já se afirmou, teve contato direto com os Gê até recentemente, e o

sangue que corre em suas veias é mesclado”.

Esses sertanejos, para Schüler, (2001, p. 211) eram descendentes de árabes,

transformados em “homem do Contestado”: “[...] o árabe, agora caboclo, para o

homem da cor de pinhão, para o homem do Contestado, para o verdadeiro e

legítimo dono daquelas terras”. Para Schüler, o homem do Contestado não era

descendente apenas dos bandeirantes, dos caipiras do interior paulista, mas dos

árabes.

O caboclo do interior falava mal o português, com resquícios da língua geral,

conhecida como “nheengatu”. Segundo Martins (2003), O “nheengatu”16 foi

desenvolvido pelos jesuítas nos séculos XVI e XVII, com base no vocabulário e na 15 Três Barras – Estrada Três Barras, tinha o seu ponto terminal no canal do rio de Três Barras, ou rio de São Francisco, que, em seu prolongamento ia culminar na Baia de Babitonga em São Francisco do Sul. Segundo Ehlke (1973, p. 160), “chamava-se propriamente Estrada Três Barras ou Caminho de Ambrósios a uma via de comunicação existente no passado, pondo em ligação, no princípio, o litoral catarinense, desde Laguna até o então chamado Rio de São Francisco, e, por este, desde o canal das Três Barras até a Serra do Mar, depois da qual, pelo extremo-norte de Campo Alegre, em Santa Catarina, varava os Campos de Ambrósios em direitura a São José dos Pinhais, e desta a Curitiba, ambos no Paraná”. 16 nheengatu- a língua proibida ou língua geral é a verdadeira língua nacional, a língua do caipira ou do caboclo. Foi desenvolvida pelos padres Jesuítas nos séculos XVI e XVII, com base no vocabulário e na pronúncia tupi, que era a língua das tribos da costa, tendo como referência a gramática da língua portuguesa, enriquecida com palavras portuguesas e espanholas. A língua geral foi usada correntemente pelos brasileiros de origem ibérica, como língua de conversação cotidiana, até o século XVIII, quando foi proibida pelo rei de Portugal, mesmo assim continuou sendo falada. Os índios da costa tinham grande dificuldade de pronunciar as letras como “l” e o “r” especialmente na finalização das palavras. Essas letras suprimidas deram origem a “quintá”, “animá”, “falá”, “dizê” e as consoantes dobradas - “lh” como orelha – “orêia”, colher – “cuié”, olho – “zóio”, etc.

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pronúncia Tupi, língua das tribos da costa, tendo como referência a gramática da

língua portuguesa e espanhola.

No Brasil, o “nheengatu” foi usado como língua geral pelos descendentes de

ibéricos até o século XVIII, quando foi proibida pelo rei de Portugal, mas ainda se

mantém no interior do Brasil, palavras remanescentes do dialeto caipira. Isso pode

ter influenciado o distanciamento entre o sertanejo e as outras classes sociais, pois a

língua portuguesa era a língua das autoridades, dos senhores de engenho e dos

escravos. Os sertanejos ou caipiras, com sua língua mista, tinham dificuldades de

comunicação com esses segmentos.

O ibérico das entradas e das bandeiras, dos exploradores que chegavam à bendita terra contestada pelo litoral atlântico e pelos rios, selvas e montes, faxinais, campos e coxilhas, apresentavam a mesma sociologia, e psicologia, ou seja, a do beduíno. (SCHÜLER, 2001, p. 212)

Para Schüler, o caboclo pardo do Contestado era descendente dos árabes ou

mouros, que habitaram por mais de mil anos a Península Ibérica, e que, após serem

derrotados pelos espanhóis, muitos vieram para a América para participar do

processo de expropriação dos bens e riquezas indígenas. No novo mundo, os

mouros ou árabes se integraram na nova sociedade, miscigenando-se com índios,

negros e brancos.

Pelos dados levantados, pode-se afirmar que o sertanejo residente ao sul do

rio Negro, desde a serra do Mar até o caminho das Tropas, era predominantemente

descendente de açorianos que vieram para o litoral do Paraná e Santa Catarina em

meados do século XVIII.

O termo caboclo foi muito usado na literatura sobre a colonização,

principalmente no oeste catarinense, onde ocorreram conflitos de terra entre as

empresas colonizadoras e colonos brasileiros expropriados. Na região de São Bento,

o termo usado para designar os nativos eram “nacionais”, conforme Vasconcelos e

Pfeiffer (1991, p. 142), na colonização de São Bento, “os nacionais não ficaram

ausentes”.

Na área de imigração alemã do planalto norte, o conflito ocorreu entre o

governo do Paraná e a Sociedade Colonizadora e, em menor escala, entre os

habitantes locais e os imigrantes. Em pequena escala, houve conflito entre os

diferentes grupos étnicos localizados nessa região, que não puderam ser evitados,

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numa região onde os europeus se consideravam pioneiros e os sertanejos se

declaravam antigos proprietários das terras. Passada essa fase inicial, houve

simbiose étnica, com ocorrência de casamentos entre os imigrantes europeus com

brasileiros proprietários residentes nas proximidades. Outro fator importante foi o

econômico, pois o comércio de gêneros alimentícios e o da erva-mate era liderado

por luso-brasileiros, de quem os colonos imigrantes dependiam. Vasconcellos e

Pfeiffer (1991, p. 142), citam os principais líderes nacionais no início da colonização

de São Bento: “José Elias Moreira, Antonio dos Santos Siqueira, Francisco Antonio

Maximiano, Leonardo Ribeiro, Antonio Colasso, Família Fragoso, e os chefes

políticos Francisco Bueno Franco e João Filgueiras de Camargo”.

Eram esses sertanejos moradores e ervateiros paranaenses a quem o

argentino Alzagaray no ano de 1820, se referiu ao afirmar que não entendiam nada

de erva-mate. Muitos deles eram alfabetizados e se tornaram proprietários de terras

e líderes políticos. Eles não tinham o conhecimento, ou a cultura indígena ervateira

do homem do Contestado. Por isso, tiveram que aprender as técnicas de fabricação

da erva-mate no modelo argentino e aprenderam muito bem, pois logo se tornaram

donos de engenhos, e muitos deles participaram como sócios da maior empresa de

erva-mate de Santa Catarina, a Companhia Industrial Catarinense, com sede em

Joinville. Dentre os principais sócios estão os luso-brasileiros citados por Almeida,

(1979, p.26), José Celestino de Oliveira, Loyola, Antonio Augusto Ribeiro, Antonio S.

Nóbrega, Freitas Valle e Abdon Baptista entre outros.

Quando os empresários dominaram os ervais, pode-se afirmar que a erva-

mate foi a responsável pelo empobrecimento das pessoas humildes, que perderam a

sua liberdade econômica, ficando na dependência dos donos do capital,

paranaenses e catarinenses.

Os trabalhadores do mate estavam sujeitos à imposição dos senhores de

engenhos de soque e Queiroz, (1981, p. 32), informa que: “[...] eram escravizados

pelos ervais que descobriam... avançando para oeste ou para o sul, onde

encontravam erval em ser, ali, na densa floresta bruta, acampavam com a família

debaixo de árvores”. Erval em ser era o nativo, dentro da mata fechada, ainda sem

acessos.

A erva-mate mal dava para mantê-los. Nesse sentido, a erva-mate foi

geradora de pobres e miseráveis no planalto catarinense, e uma das causas da

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guerra do Contestado, pois para o sertanejo a sua única esperança era um milagre

do “São João Maria”.

Mas é importante lembrar que a exploração da erva e dos sertanejos se

agrava a partir de 1870, mais de quarenta anos antes da Guerra do Contestado.

2.1.3 A Erva-mate em Santa Catarina

Em meados do século XIX, o Paraná já estava com sua economia ervateira

consolidada. Santa Catarina despertou mais tarde para a economia ervateira. Até

meados do século XIX, conforme Bossle (1988, p. 26), tinha sua base econômica na

produção da farinha de mandioca.

O governador Severo do Amorim, no ano de 1849, em pronunciamento na

Assembléia Legislativa, fez um relatório aos deputados sobre o potencial ervateiro

dos sertões e campos de Lages, onde afirmou:

A erva-mate, ramo considerável de exportação em Paranaguá, bem vizinha de nosso limite, de que abundam os campos e sertões de Lages, tem estado em perfeito abandono; ao mesmo tempo em que um ou outro no distrito desta vila o prepara, acha pronto comprador, que a exporta para o Rio Grande do Sul. (ALMEIDA, 1979, p. 11)

O governador catarinense estava preocupado por que a vizinha Província do

Paraná, obtinha lucros com a exportação de erva-mate, enquanto que em Santa

Catarina não havia interesse dos fazendeiros em investir na exploração. O

governador informa que os pequenos produtores conseguiam logo vender seu

produto no Rio Grande do Sul.

O primeiro centro produtor de erva-mate catarinense estava localizado nas

proximidades de Florianópolis, na colônia Angelina, que começou a produzir para o

mercado interno a partir de 1862, iniciando a exportação no ano de 1865. Recebia a

erva-mate do planalto de Lages, segundo Almeida (1978, p. 12), “A produção de

Angelina desaparecera em 1874, por falta de via de comunicação para escoar o

produto”.

Dentre os principais produtos exportados pelo Estado de Santa Catarina, a

erva-mate não constava da pauta de exportação no período de 1854 a 1855.

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Os primeiros registros da exportação da erva no Estado ocorrem na segunda

metade do século XIX. Segundo Bossle (1988), “No período de 1880 a 1886 a erva-

mate já era o segundo produto exportado, representado 18,75% do valor total, só

perdendo para a madeira (20,83%)”.

Enquanto isso, o Paraná se consagrou como exportador da erva-mate, que

era o “ouro-verde” responsável por seu desenvolvimento no século XIX e parte do

século XX. A posse das reservas de ervais era uma causa pela qual valia a pena

lutar, tanto nos tribunais, como no campo de batalha, conforme ameaça feita a Santa

Catarina.

A erva-mate mudou a situação econômica do Estado de Santa Catarina, pois

no relatório do Presidente da Província, encaminhado à Assembléia Legislativa em

1886, a erva-mate ocupava o segundo lugar entre os produtos exportados.

Segundo Bossle (1988, p. 27), “[...] a farinha de mandioca paulatinamente vai

perdendo sua colocação para novos competidores que ocupam seu espaço como é

o caso da banha, madeira e erva-mate, produtos semimanufaturados”.

No relatório apresentado pela Colônia Dona Francisca, sobre a

industrialização em Joinville, no ano de 1862 não consta nenhum engenho de erva-

mate. Esses engenhos só foram construídos na década de 1970.

Com a construção da Estrada Dona Francisca, os comerciantes de Joinville

foram se familiarizando com o comércio da erva-mate e foram aprendendo a ganhar

dinheiro com essa mercadoria, ganhavam na compra da erva e na venda dos

produtos de seus negócios.

Industriais do mate, vindos de Morretes, Paraná, se instalam em Joinville

onde no ano de 1877, já estavam funcionando três engenhos. A matéria-prima semi-

elaborada vinha do planalto no lombo de burros pela estrada Dona Francisca, ainda

em construção.

A situação mudou quando Ernesto Canac, representante comercial de

importante firma de Buenos Aires, especializada em comércio de erva-mate, se

radicou em Joinville e se interessou pela industrialização do mate.

[...] idealizou uma entidade capaz de monopolizar não só a exportação da erva-mate como também das mercadorias importadas e aliando-se a pessoas idôneas no assunto, dando nova feição àquela mercancia, conseguiram rendosa fonte de lucros. Fundou-se a Companhia Industrial, cuja existência si não monopolizou, pelos menos preponderou de forma marcante no comércio de Joinville. (OLIVEIRA, 1951, p. 125)

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Canac fundou, em 1890, uma empresa em Quitandinha, no Estado do

Paraná. Da fábrica de Quitandinha, que na época era chamada de Cerro Negro, a

erva era transportada por caminho de cargueiros, no lombo de burros, para a

localidade de Lençol, onde a Companhia Industrial Catarinense montou uma filial. O

comerciante de Lençol e depois de Rio Negrinho, Domingos Tabalipa, montou um

comércio para fornecer erva-mate para a firma Companhia Industrial. (TABALIPA,

1975, p. 7)

A erva-mate continuou sendo o carro chefe da economia de Joinville até a

década de 1920, quando o poder econômico estava ainda nas mãos dos luso-

brasileiros ligados à atividade ervateira.

As famílias paranaenses residentes ao norte do rio Negro, também

complementavam as suas economias com a extração da erva-mate. Durante os

meses de maio a setembro, quando a agricultura quase nada produzia devido ao

inverno, gerava excedentes para os agricultores e suas famílias e também para

aqueles que só viviam do trabalho nos ervais. Lopes (2007, p 625) afirma que

moravam ao norte do rio Negro, no atual Município de Pien, as famílias: Fragoso,

Cavalheiro, Ferreira, Prestes, Lima, Lisboa, Machado, Vaz, Siqueira, Santos,

Rodrigues, Crispim, Vieira, Esteves, Carneiro, Encarnação, Nunes, Soares, Cabral,

Castro, Barbosa, Nascimento, Souza, Martins, Pacheco Lima, Bastos, Nunes,

Rocha, Almeida.

A partir de 1870, com a Lei Municipal que proibia a exploração da erva em

terras devolutas sem autorização da Câmara Municipal, as famílias que dependiam

do mate para sobreviver tiveram que se submeter aos empresários do mate. Com

referência aos municípios da fronteira ao norte do rio Negro, no sul do Paraná, e

exploravam er-mate, Lopes (2007, p. 8), informa que em:

Agudos do Sul – O povoamento da região foi ocasionado pela presença de caívas e de ervais; 2. Em Pien, José João, registrou em 24 de maio de 1856 uns terrenos de lavrar e ervais no lugar denominado Ribeirão do Pien, cujas terras de lavrar e ervais houve por posse feita havia dez anos [...]; 3. Quitandinha: Em 23 de abril de 1856 José Joaquim de Lacerda cadastrou terreno nos dois lados do Rio da Várzea. Terreno de matos e ervais e capoeiras de outro lado do Rio da Várzea (margem esquerda), encostado no terreno de Bento Pereira no lugar Areia Branca. [...] 4. São Mateus do Sul – No cadastro de terras oriundos da Lei de 1850 já havia vários proprietários na região, destacamos alguns. Francisco de Paula Faria, onde está atualmente a sede do município de São Mateus do Sul, disse que era possuidor havia seis anos mais ou menos, por compra e posse, de um sítio no lugar Turvo, com ervais, faxinais, logradouros e matos de plantar [...].

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A região de Porto União desde Canoinhas às margens dos rios Timbó e

Paciência, também foram áreas de produção de erva-mate. As fábricas de

beneficiamento estavam localizadas em União da Vitória. Inicialmente o produto era

despachado por vapores e após a implantação da rede ferroviária, por trem.

Durante o mês de setembro de 1916, foram exportados de União da Vitória, 15 vagões de erva-mate, contendo 2.900 sacos, pesando líquido 210.861 quilogramas. Fizeram o despacho dessas ervas os industriais, Francisco Machado, Henrique H Gomm e Leopoldo Castilho. (SILVA, 1933, p. 136)

Em Santa Catarina, houve uma tentativa de produção de erva-mate no ano de

1862, em Angelina, no caminho de Florianópolis a Lages. Outra experiência ocorreu

em Blumenau em 1898, com matéria-prima trazida de Curitibanos. Este engenho era

de propriedade do Senhor Barroso, que veio do Rio de Janeiro. Segundo Tabalipa,

(1975, p. 350), “o transporte era feito no lombo de burros e mais ainda que aquela

zona é de pouca erva-mate”.

Segundo Almeida (1979,p.29), “as indústrias de Joinville, tinham filiais no

planalto catarinense, como em São Bento”. Foram criadas também filiais, nas

cidades de Rio Negro e Antonina, no Paraná.

O porto de São Francisco era o exportador da erva-mate produzida no

planalto norte catarinense, e também da erva produzida na região de São Mateus do

Sul, Lapa e São José dos Pinhais, no Paraná.

Toda a região ao sul do rio Negro teve sua economia ligada à erva-mate,

como comprovam os autores de historias regionais:

Em seu livro “Subsídios para história de Campo Alegre”, Herbst (1994, p. 20)

destaca a importância da ”época áurea da erva mate para a região”. Em Campo

Alegre foi instalado por empresários do Paraná um dos primeiros engenhos de erva-

mate do Planalto Catarinense, de propriedade do curitibano Brigadeiro Manoel de

Oliveira Franco.

Em São Bento do Sul, havia um engenho localizado no cruzamento da

Estrada Dona Francisca com o caminho Argolo no atual bairro de Oxford, e outro no

caminho para Rio Negrinho, na localidade de Lençol.

Um fato trágico aconteceu com o primeiro engenho de erva-mate em Oxford,

no município de São Bento descrito por Ficker (1973. p. 181), “[...] em 10 de janeiro

de 1881 um grande incêndio devorou o engenho pertencente aos Senhores Álvaro

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Nóbrega e Canac, consumindo as instalações e 225 barricas de mate

confeccionados”.

A Companhia Industrial Catarinense, com sede em Joinville a partir de 1891,

incentivou a exploração da erva-mate ao sul do rio Negro, onde o preço do frete pela

estrada Dona Francisca era compensador e no final dava bons lucros aos

produtores. A colônia agrícola São Bento se tornou a colônia da erva-mate.

Conforme o relatório da Câmara enviado ao governo Provincial, no ano de 1894, em

São Bento estavam em atividade três engenhos de erva-mate e produziam conforme

Ficker (1973, p. 323) “90.000 arrobas no valor de 445:000$000”.

Nesse ano de 1894, São Bento produziu quase um terço da erva-mate

exportada por Santa Catarina, que, naquele ano, conforme Almeida (1979),

“exportou erva no valor de 1.327:900$740”

A participação da erva-mate na renda de São Bento, em valores,em 1894,

representava 43,12%.

São Bento nasceu e cresceu tendo sua economia ligada à erva-mate. Almeida

(1979, p. 27), relacionou, no ano de 1899 a 1904, onze empresas ervateiras em

atividade. Em pesquisa realizada em outros livros no Arquivo Histórico de São Bento

do Sul, no livro de lançamento especial de compra e venda, instituído pela lei n. 10

de 1900 (ano 1900 – livro 168 e ano de 1903 - livro 169), foram encontrados outros

dados:

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NOME DO CONTRIBUINTE DO IMPOSTO LOCALIZAÇÃO 1900 1903 Joaquim Antonio de Castilho Rio Preto X Viúva Neumann Est. D. Francisca X Ignácio Fischer Oxford X X Companhia Industrial –Matriz Joinville Oxford X José Pilz Est. Banhados X Joaquim Quintiliano de Oliveira Sertão X José Streit Est. Lago X X Francisco Gery Kaminsky Lençol X X Emigdio Affonso Ayres Cubas Rio Preto X X Companhia Industrial –Matriz Joinville Lençol X X Carlos Stüber Lençol X X Alfredo Pinto de Oliveira Est. D. Francisca.. X X Domingos Victorino Tabalipa Encruzilhada X X Fischer, Wordell e Cia Est. D. Francisca X Antonio Francisco Caldeira Encruzilhada X X Carlos Urban e Cia Mato Preto X X Luiz Wolf Mato Preto X X João Wordell Mato Preto X X Henrique Hussmann Vila X Pedro Carvalho da Silva Rio Preto X Francisco da Silva Sinks Lençol X João do Norte Mato Preto X Chrysanto Gonçalves de França Mato Preto --- X Luis Schüller Mato Preto --- X Luis Schüller Oxford --- X Maximiliano Wagner Est.D.Francisca. --- X Olsen & Ritzmann17 Lençol --- X Nilton Celestino de Oliveira Mato Preto --- X José Brandt Est. D. Francisca. --- X Quadro 1 - Empresas ervateiras em atividade entre os anos de 1900 e 1903 Fonte: Arquivo Histórico de São Bento do Sul 17 Olsen & Ritzmann – No Livro de Registros de Impostos no Arquivo Histórico de São Bento do Sul consta que no ano de 1903 foi aberta em Lençol, no município de São Bento do Sul, a empresa Olsen & Ritzmann, ligada à erva-mate. Bernardo Olsen era um respeitado empresário, com comércio de secos e molhados, açougue na localidade de Lençol. Juntamente com seu cunhado Luís Ritzmann, fundaram a empresa de erva-mate e expandiram seus negócios para Rio Negrinho. Ritzmann vendeu seu negócio para seu irmão em 1909. Após o término da guerra do Contestado, Bernardo Olsen adquiriu grande área de terra e instalou a colônia agrícola São Bernardo, hoje Marcilio Dias. Atuando como exportador de erva-mate, mais tarde fundou também uma serraria e em 1919 inaugurou o barco Elfrida, que transportava erva-mate de Major Vieira até o porto de Marcilio Dias, de onde era exportado pelo trem. Existe divergência sobre o ano em que Bernardo Olsen fixou residência em Marcilio Dias. Em pesquisa realizada no Arquivo Histórico de São Bento levantou-se o que segue sobre Bernardo Olsen: Em 1917 – Em São Bento: possuía negócio com bebidas na localidade de Lençol. Negócio com venda de munições na localidade de Estrada do Lago; Negócio com drogaria na localidade de Ponte dos Vieiras. Nesse mesmo ano instalou em Rio Negrinho: Negócio com bebidas e restaurante; Em 1918 – Em São Bento: Vendeu os negócios e ficou só com os terrenos; Nesse mesmo ano, em Rio Negrinho, continuou com negócio de venda de bebidas e de munições; Em 1919 – Em São Bento: não tinha mais comércio, só terrenos; Em Rio Negrinho nesse mesmo ano, mantinha comércio com bebidas e munições; Em 1920 – Em São Bento só mantinha terrenos: Em Rio Negrinho nesse mesmo ano: comércio com bebidas e munições. Como os bens de Rio Negrinho eram administrados por seus filhos, pode-se afirmar com certeza que foi no ano de 1918 que Bernardo Olsen mudou residência para Marcilio Dias e não antes. Outro fato foi o início das vendas dos lotes nessa localidade, somente em março de 1919, quando vendeu o lote colonial no. 17, medindo dez alqueires e uma quarta, escriturado em 09/03/1919; fazendo divisa com lotes de Bernardo Olsen, com frente para a Estrada Rodolfo e nos fundos com o de Augusto Noemberg, adquirido por Francisco Stöebel e vendido por Bernardo e Maria Olsen. Ficou registrada também a autorização da abertura de uma estrada pelos lotes 37 a 42.

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Portanto, no ano de 1900, havia em São Bento do Sul vinte e duas empresas

ligadas ao mate. No ano de 1903 houve fechamento, incorporação e abertura de

outras, restando, nesse ano, dezenove em atividade.

Rio Negrinho, que estava localizada dentro da fazenda do Brigadeiro Franco,

tinha a sua erva transportada para o Paraná. A partir de 1910, com a construção da

Estrada de Ferro, começam também a abertura de áreas para colonização a oeste

de São Bento do Sul. Da erva-mate produzida em Rio Negrinho, parte era

beneficiada no Paraná ou nos engenhos de Lençol.

A erva-mate foi importante também no Município de Mafra. O autor da obra

sobre o cinqüentenário da cidade, assim escreveu:

Mafra nasceu sob o signo da erva mate. Suas matas retratam a beleza e a imponência dos pinheiros num colorido verde dos ervais. É um dos municípios maiores produtores de erva-mate. Quando instalado, em 1917, reunia entre os chamados “bodegueiros” e pequenos negociantes, um reduzido número de 16 casas de comércio, entretanto já possuía 20 fábricas de barricas de madeira, recipiente indispensável, na época, para a exportação da erva chimarrão. (DEQUECH, 1967, p. 58)

Conforme a pesquisa efetivada, as grandes fábricas de erva se localizaram no

atual município de Rio Negro, enquanto que as fábricas de embalagens (barricas) se

localizavam ao sul do rio Negro, no atual município de Mafra. Após 1917 também se

instalaram em Mafra grandes fábricas de erva-mate.

Canoinhas tem a sua história ligada à erva-mate. Francisco de Paula Pereira,

considerado o fundador da cidade, residia em São Bento do Sul e era também ligado

à atividade ervateira.

Na história de São Bento consta que, em 1882, o agricultor Alberto

Malchitzky, residente no local denominado Cruzeiro, às margens da SC 301,

comunicou à Câmara Municipal de São Bento que cedeu parte de seu terreno para

abertura de um caminho para que seus vizinhos pudessem ter acesso à estrada

Dona Francisca. O agricultor estava se referindo, conforme Ficker (1973, p. 220), “ao

Francisco de Paula Pereira, Francisco Maximiano e os seus agregados, bem como

todo o povo que mora do outro lado do rio Negro e que vem procurar São Bento

para fazer os seus negócios com erva-mate.” Portanto, o caminho aberto ligando a

Estrada Dona Francisca ao rio Negro era para o escoamento da erva-mate.

Nas matas da região de Canoinhas havia erva-mate em abundância e essa

riqueza também despertou o interesse do Paraná. O nome original, Santa Cruz de

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Canoinhas, foi inclusive mudado no ano de 1923, para “Ouro Verde”, em

homenagem à sua maior riqueza de exportação.

As principais indústrias do município são as extrativas vegetais da erva-mate e de madeira. [...] há imensa população empregada no corte, amontoamento, sapecamento, quebramento, enfeixamento, encarijamento, seca, malhamento ou cancheamento, pesagem e ensacamento da erva-mate. (SILVA, 1941, p. 44)

A questão de limites entre Paraná e Santa Catarina, no interior de Canoinhas,

nos vales do rio Paciência e Rio Timbó, levou à divergência entre criadores de gado

e os pequenos lavradores ervateiros.

[...] caboclos, pequenos agricultores e ervateiros não podiam mais trabalhar na região: os seus ervais outrora zelados e produtivos, hoje abandonados, o matagal matando, a criação morrendo à míngua, as suas roças, à criações dos protegidos do Paraná. (MACHADO, 2004, p 130)

Itaiópolis, antiga Colônia Lucena, foi fundada pelo Governo Federal e cedida à

administração do Paraná, localizada em pleno território Contestado.

No livro, Colônia Lucena - Crônica dos imigrantes poloneses, está escrito o

seguinte depoimento de um imigrante polonês:

Todo ano temos que implorar aos compradores para que adquiram, por amor de Deus, o milho, o feijão, o trigo, e o centeio. A erva-mate oferecia o melhor rendimento, entre os demais. Durante anos manteve um preço compensador. (RODYCZ, 2002, p 421)

Para Tabalipa (1975, p. 352), ex-prefeito de Papanduva: “O Paraná e Santa

Catarina sempre foram os pioneiros da exportação da erva. Todas as pessoas que

conheci de São Bento à Serra do Espigão, até Porto União, só falavam na erva-

mate”.

Três Barras teve o povoamento inicial a partir de 1882, com a autorização

imperial para o Coronel Amazonas Marcondes explorar a navegação fluvial dos rios

Negro, Iguaçu e seus afluentes para promover, entre outras atividades econômicas,

a extração da erva-mate.

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3 A OCUPAÇÃO E O USO DO SOLO E DOS ERVAIS NA REGIÃO C ONTESTADA

A erva-mate constituiu-se em uma das principais riquezas econômicas do

planalto norte de Santa Catarina e sul do Paraná, e, a partir da segunda metade do

século XIX teve um importante papel no acirramento da disputa territorial pela

região, entre as então Províncias do Paraná e Santa Catarina.

A região ao sul do rio Negro tornou-se conhecida no início do século XVIII

quando foi aberto o caminho das tropas. Os poucos habitantes residentes no

planalto norte catarinense se localizaram nas margens desse caminho, que ligava os

campos do Rio Grande do Sul à Sorocaba em São Paulo, onde foram sendo

instaladas fazendas de criação de gado e pontos de abastecimento para as tropas.

Segundo Straforini (2001, p.28), “os tropeiros preocupavam-se em formar

pousos logo após a travessia dos rios, quando estes eram geralmente seguidos por

grandes pastos”.

Os locais de parada das tropas deram origem a futuros povoados e vilas no

sentido norte sul. No planalto norte, da Serra do Mar de leste para oeste, até as

proximidades de Rio Negro, não havia povoações e não foram localizados

proprietários residentes. No entanto, o engenheiro Carl Pabst, que no ano de 1855

fixou definitivamente o traçado da futura estrada e estabeleceu o rumo no planalto

da estrada Dona Francisca, em direção a rio Negro, realizou importante registro em

seu caderno de campo. Os dados foram citados por Ficker (1973, p. 20) “cujos

donos brasileiros dedicam-se um pouco à agricultura e à criação, tendo quanto

chegue para o próprio sustento e mormente se empregam na colheita de congonha

(erva-mate)”.

Esses trabalhadores eram paranaenses que cruzaram o rio Negro e vinham

buscar em território catarinense a erva que era vendida para beneficiamento e

exportação pelo Paraná.

Como Santa Catarina não tomou posse, a região foi sendo ocupada por

paranaenses, cortadores de erva-mate, agricultores e, mais tarde, empresários que

entraram no território, garantindo o Uti Possi de tis da região ao sul do rio Negro.

Santa Catarina contestava a ocupação dos paranaenses, alegando que o

território ao sul dos rios Negro e Iguaçu lhe pertencia. Defendia seus direitos

segundo Mafra (2002, p.103), baseados na “Carta Régia de 20 de junho de 1749

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que criou a Ouvidoria de Santa Catarina, - separou da Comarca de Paranaguá, com

limite - norte pela barra Austral do rio São Francisco, pelo Cubatão do mesmo rio

pelo rio Negro que se mete no grande rio de Curitiba...”.

Os territórios da Vila e do termo de Lages foram incorporados, pelo Alvará

Imperial de 09 de setembro de 1820 a Santa Catarina, e conforme Mafra (2002, p.

342), [...] “limitados ao norte pelo rio São Francisco ou Saí, rio Negro e Iguaçu...”.

cujos limites não eram reconhecidos pelo Paraná.

A Constituição Imperial de 1824 ratificou as linhas divisórias e transformou as

antigas capitanias em Províncias, na forma que se achavam. Para Mafra,

Foi com os limites incontestáveis e incontestados do Saí Guaçú, Rio Negro e Iguaçú ano norte, do Mampituba, Pelotas e Uruguay ao sul, do Pepery e Santo Antonio a oeste, que a província de Santa Catarina prestou juramento à Carta Constitucional do Império. (2002, p. 347)

Para dirimir quaisquer dúvidas, o deputado catarinense Dr. Joaquim Augusto

do Livramento apresentou um projeto de lei em que fixava os seguintes limites de

Santa Catarina, em 12 de junho de 1854:

Art. 1º.: As divisas entre as Províncias de Santa Catarina e Rio Grande do Sul são os rios Mampituba e arroio das Contas, o rio Pelotas e Uruguai; e entre aquela Província e a do Paraná, são o rio Saí Grande, e rio Negro e aquele em que ele deságua. (CABRAL, 1968, p.296).

Como não houve entendimento sobre a fronteira norte de Santa Catarina e o

governo do Paraná se mostrou irredutível na defesa do Uti Possi de tis, as

discussões entre parlamentares das duas Províncias chegaram ao Ministério do

Império. O Gabinete Imperial, para amenizar o clima tenso entre as duas bancadas,

publicou o Decreto n. 3.378, de 16/01/1865. Os limites entre as duas Províncias

foram então fixados provisoriamente, conforme Cabral (1968, p. 297), “pelo rio Saí

Guaçu, Serra do Mar e rio Marombas, desde as suas vertentes, até o rio Canoas e

por este até o Uruguai.”

Com isso, o Governo Federal reconhecia provisoriamente o Uti Possi de tis do

Paraná sobre os Campos de Palmas, Campos Novos e parte de Curitibanos e sobre

toda a região do vale do rio Negro. Campo Alegre, São Bento do Sul, Rio Negrinho,

Mafra para oeste eram territórios do Paraná. Para Santa Catarina, restou o litoral e,

no planalto, a Vila de Lages e a área de sua abrangência.

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As discussões sobre a soberania territorial ao sul do rio Negro continuavam,

mas dependiam do poder legislativo federal, que não votava uma lei definindo as

fronteiras entre as duas Províncias do Império. Enquanto isso, a posse da região

continuava sendo disputada e contestada, ora pelo Paraná, ora por Santa Catarina.

Levas de imigrantes continuavam chegando da Europa para Joinville e

faltaram terras para os novos colonos. A Cia Colonizadora adquiriu, do governo

federal áreas de terras devolutas no planalto, ao sul do rio Negro, no vale do rio São

Bento, para iniciar um novo núcleo de colonização.

Com a colonização de São Bento, iniciou-se um período de disputas, de

intrigas, de ameaças e em várias oportunidades os conflitos de interesses, quase

levaram as duas Províncias a deflagrarem a guerra.

Os governos das duas províncias tentam provar o seu direito sobre a região,

com trocas de ofícios, extrapolam as normas da diplomacia, com ameaças

recíprocas. Enquanto os governos não chegam a uma conclusão, o clima entre

colonos imigrantes e colonos brasileiros originários do Paraná tornou-se tenso.

O interesse paranaense na disputa territorial na região de São Bento era pela

principal riqueza extrativa, a erva-mate, pois os colonos do Paraná, em sua maioria,

ocuparam as áreas de terras cobertas com floresta. As áreas de campestres ou de

mata rala não lhes era interessante. A área onde os paranaenses se fixaram foi

chamada pelos imigrantes de Mato Preto.

A abertura de um caminho roçado pela mata para a construção da futura

estrada Dona Francisca, ou estrada da Serra, possibilitou que o primeiro grupo de

viajantes no lombo de mulas, descesse para o litoral. O primeiro produto de troca

entre colonos do planalto com os comerciantes do litoral, após a abertura da picada

por onde a estrada seria construída, foi erva-mate. Chegaram a Joinville em 31 de

maio de 1865, os tropeiros:

Com uma tropa de bestas, conduzindo erva-mate e voltando no dia seguinte com uma carga de couro curtido na indústria do Sr. Jacob Richlin. Abriu-se nessa data a via de comunicação para viajantes e para o comércio. (FICKER, 1965, p. 242)

Em pouco tempo, Joinville se transformou num centro industrial e exportador

de erva-mate. Foram instalados três engenhos de erva-mate, no ano de 1877, por

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iniciativa de Antonio Sinke, que transferiu seu empreendimento de Morretes, no

Paraná, para Joinville.

A erva-mate se transformou também em atividade econômica para os recém-

chegados colonos de São Bento, que tinham mercado para a erva-mate nativa de

seus terrenos.

O fato foi destacado por Ammon18 (1923) que afirmou: “os moradores de São

Bento encontraram o recurso de colher a erva-mate que cresce sem cultivo nos seus

terrenos. Com a nova indústria muitos oficiais (o autor não definiu quem eram os

oficiais), encontraram onde ganhar dinheiro”.

São Bento se transformou em fornecedor de matéria-prima para os engenhos

de Joinville.

A data de 24 de junho de 1877 foi importante para São Bento.

Chegou a Joinville a primeira carroça carregada de erva-mate, cobrindo a distância de mais de 80 quilômetros em um dia e meio de caminhada. Ao comércio e à industria foi aberto com ligação entre o planalto e o litoral, em caminho carroçável, uma nova era de progresso (FICKER, 1973, p. 110)

A estrada Dona Francisca nasce como a estrada do mate, dando aos

empresários de Joinville a oportunidade de obter matéria prima para a suas

indústrias. Inicia a partir dessa data a efetiva industrialização da erva-mate em

Joinville. Mas quem realmente ganhava dinheiro com a erva-mate não eram os

colonos imigrantes ou os paranaenses residentes na região, eles ficavam com o

serviço pesado. O comércio de erva-mate em Santa Catarina segundo Ficker (1973,

p. 227), “Era controlado por abastados proprietários dos engenhos de mate, da

indústria ervateira de Joinville e, ricos comerciantes, que ganhavam com a

exportação do produto”.

18 Wolfgang Ammon - nascido em 03 de março de 1859, em Eberwald, Província de Brandenburg, Alemanha. Emigrou para o Brasil em 1880, e instalou comércio de erva-mate no interior de Campo Alegre. Em janeiro de 1894, quando aconteceu a Batalha de Tijucas, durante a revolução Federalista, os feridos são transportados até sua casa comercial, onde são tratados. Em 1895 tornou-se Juiz de Paz e mais tarde Presidente do Conselho Municipal de Campo Alegre. Afasta-se da política e dedica-se ao comércio de importação e exportação. Deixou escritos 107 trabalhos literários entre romances, contos, novelas e outros, além de 60 poesias. Escrevia para jornais da Alemanha e reportagens para os imigrantes do interior do Brasil. Fixou residência em São Bento, na rua central que hoje leva seu nome, e em sua casa funciona uma hospedagem de retiro da comunidade evangélica luterana, em frente a atual Caixa Econômica. (SOARES, 1992, p. 91, 92). Wolfgang Ammon era proprietário de ervais cujas terras se localizavam entre Marcilio Dias e Taunay, conforme registro de imóveis de Canoinhas, pesquisado pelo autor deste trabalho.

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Os empresários do Paraná fizeram pressão sobre o seu governo, para baixar

os impostos e justificaram o seu pedido, alegando que Santa Catarina é forte

competidora do Paraná. Medeiros; Marchiorato (1992, p. 40 e 50) afirmam que o

Inspetor de Rendas do Paraná pede providências ao Governador Dr. Rodrigo

Octavio de Oliveira Menezes, mandando instalar a Barreira fiscal de Rio Preto, pois

Santa Catarina não cobra impostos sobre a erva-mate e os produtores do Paraná

são obrigados a pagar “Além de Taxas do pedágio de 40% do dízimo e as

contribuições municipais”

Santa Catarina tem atualmente em ativo movimento, seis fábricas e seguindo assim brevemente terá o duplo. Os fabricantes do Paraná que desejarem continuar em tal negócio serão obrigados a transladar-se para Santa Catarina para não ficarem arruinados. (FICKER, 1973, p. 219)

Para controlar parcela importante dos ervais, Santa Catarina criou, em 1883,

o Município de São Bento, com limites pela serra do Mar, Serra Geral, rio Preto e rio

Negro. Com essa medida Santa Catarina consolida o domínio político e

administrativo sobre uma estratégica região ervateira do planalto norte.

Após a criação do Município, o Paraná deixou de interferir em São Bento, mas

continuou mantendo postos fiscais nas fronteiras interestaduais. Os conflitos na

região ao sul do Rio Negro, cresciam ou diminuíam conforme o preço ou a procura

pelo produto oscilava.

A contestação verbal e pela imprensa chegou ao limite e a situação tornou-se

crítica, quando em 1909, Aleixo Gonçalves19, com um grupo de trabalhadores,

destruiu o posto fiscal paranaense de Rio Preto, fato citado por Machado (2004),

“sendo por isso tratado como herói pela imprensa de Joinville e Florianópolis”.

19 Aleixo Gonçalves de Lima – Capitão da Guarda Nacional, antigo maragato rico proprietário de terras em Rio Negro, produtor de erva-mate. A frente de “ 500 homens e auxiliado pela polícia catarinense, transpôs o rio Preto e invadiu o território do Paraná, proclamando que visava impedir a cobrança dos impostos estaduais. Fez retirarem-se dali os funcionários do fisco e um pequeno destacamento policial. A façanha teve mais caráter de um protesto. Poucos dias depois o chefe de polícia do Paraná, à frente de um grande destacamento, restabeleceu as barreiras e deixou no local uma guarnição suficiente. Três meses mais tarde o Capitão Aleixo foi recebido festivamente em Joinville. Carros foram esperá-lo nos arredores da cidade e o acompanharam ao hotel. À noite recebeu manifestações de grande número de pessoas, acompanhadas de uma banda de música. Houve passeata pelas ruas da cidade ao espocar de foguetes e sob entusiásticas vivas. Aleixo era apresentado como uma espécie de herói que à frente de um grupo revoltado contra as odiadas barreiras paranaenses, afugentara a força policial daquele Estado que as guarnecia”. (Jornal Rep. 27-11-1909) citado por Queiroz, 1981, p. 69)

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3.1 FUNDAÇÃO DA COLÔNIA DONA FRANCISCA

Os primeiros colonos imigrantes europeus que chegaram para fundar

Joinville, vieram por conta da Sociedade Colonizadora Hamburguesa de 1849, em 9

de março de 1851. Segundo Ficker (1965), dos pioneiros, em número de 125, a

maioria era composta de suíços, 61 eram noruegueses e os demais alemães. Dentre

esses imigrantes, muitos eram lavradores, mas havia também outros profissionais. A

colônia, no início, teve desenvolvimento lento, mas com a vinda cada vez maior de

novos imigrantes, o desempenho melhorou e por isso em 1857, os representantes

dos proprietários da Colônia pediram ao Presidente da Província que a povoação

fosse elevada a Vila, pois já tinha colonos naturalizados em número suficiente para

participar de processo eleitoral.

A participação política dos habitantes de Joinvile despertou o interesse das

autoridades, pois já no ano seguinte, em 1858, o governo federal chamou para a

Corte, no Rio de Janeiro, o Diretor da Colônia Dona Francisca, e representante do

Príncipe de Joinville, o francês Sr. Léonce Aubé. No seu retorno da Corte, foi

convocado a uma audiência com o Presidente Coutinho, da Província de Santa

Catarina. Nessa audiência na capital Desterro,

Ficou assentada e contratada uma das maiores obras da Colônia Dona Francisca: a construção da ‘Estrada da Serra’, ou ‘Estrada Dona Francisca’, como foi chamada mais tarde, ligando o litoral do Município de São Francisco com o Planalto de Curitiba (FICKER, 1965, p. 192)

Os primeiros engenheiros, que partiram de Joinville para fazer o

reconhecimento do planalto, com o objetivo de estabelecer o traçado da futura

estrada Dona Francisca, tomam contato com a atividade ervateira.

O engenheiro Carl Pabst, que já havia feito uma viagem de estudo do trajeto

em 1855, encontrou, nas proximidades de Rio Negro, casa de brasileiros. Deixou

registrado em seu diário que esses brasileiros praticavam agricultura de subsistência

e criavam animais domésticos para seu próprio consumo. A atividade que dava

maior rendimento era a colheita das folhas de congonha (erva-mate). Essas folhas

eram encaminhada dentro de jacás, para beneficiamento na cidade de Morretes, no

litoral do Paraná. Para justificar a importância da futura estrada Dona Francisca para

os produtores do mate, fez a seguinte consideração, conforme Ficker, (1973, p. 20):

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“Para chegarem a esse mercado, gastam os habitantes de Rio Negro 6 a 8 dias de

viagem; pela nova estrada a ser feita, podiam chegar a Joinville e o porto de São

Francisco em metade do tempo”

É importante a informação desse engenheiro, pois fica claro que os brasileiros

residentes ao sul do rio Negro, em território catarinense, já exploravam a erva-mate

em meados do século XIX, tendo nela a principal fonte de renda. A observação do

engenheiro de que a nova estrada reduziria o tempo de transporte do produtor para

o porto, realmente se concretizou e foi um fator decisivo para que Santa Catarina

pudesse disputar com o Paraná o rendoso negócio da erva-mate.

A região de Campo Alegre, São Bento do Sul e Rio Negrinho, isolada do

litoral e do caminho das tropas, recebia uma rodovia de acesso aos ervais, a futura

Estrada Dona Francisca. A construção da estrada trouxe preocupação aos

empresários paranaenses e, antevendo a concorrência catarinense, transferiram

seus engenhos do Paraná para Joinville.

[...] industriais e exportadores de mate do sul do Paraná já afeitos ao preparo e comercio da ‘Havea brasiliensis’ terem percebido que a Estrada Dona Francisca encurtava sensivelmente as distâncias do porto de embarque. [...] Vieram para Joinvile Antonio Sinke, Loyola, Corrêa, Celestino de Oliveira e outros estabelecer seus engenhos em Joinville a e casas de despacho em São Francisco do Sul. (OLIVEIRA, 1951, p. 122)

Começa aí uma disputa interessante entre os industriais paranaenses da

erva-mate. Surgem dois grupos de empresários: os paranaenses que se radicaram

em Santa Catarina começam a fazer concorrência aos industriais paranaenses que

permaneciam radicados no Paraná.

O traçado da estrada Dona Francisca foi definido no ano de 1855, fixando o

povoado de Rio Negro como destino final. No ano seguinte, o engenheiro militar

imperial João de Souza Melo Alvim percorreu a picada e aprovou o traçado. Ficou

então acertada a contratação da estrada Dona Francisca por conta do governo

imperial, sob a supervisão da direção da Colônia Dona Francisca. Durante a guerra

do Paraguai, que durou de 1864 a 1870, as obras da estrada sofreram interrupções.

O Paraná queria que a estrada ligasse o litoral de Santa Catarina com

Curitiba. Nesse sentido, nomeou um engenheiro da Presidência do Paraná para

conversar com os diretores da Colônia Dona Francisca. Assim, conforme Ficker

(1973), “em 31 de maio 1865 chegou o Barão von Holleben, sua esposa e filhinha”.

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Sua visita tinha a finalidade de convencer os dirigentes da Colônia Dona Francisca,

a desviar o traçado da estrada diretamente para Curitiba. O governo do Paraná

percebeu a invasão catarinense ao planalto ervateiro e era necessário preservar a

fonte de matéria-prima para suas indústrias. Era a questão territorial do Contestado

em gestação.

Ficker (1973, p. 26) confirma que “o fato não agradou o comércio do Paraná

que esperava controlar o escoamento das riquezas da Província, a erva-mate e o

gado, através de uma ligação com Curitiba.”

Enquanto o Paraná tentava convencer o governo Imperial a desviar o traçado

da estrada de Rio Negro para Curitiba, chegou do planalto, em 31 de maio do ano

de 1865, a primeira tropa de mulas carregada de erva-mate. Era a estrada Dona

Francisca ensaiando a sua vocação, de futura “estrada do mate” e justificando o

medo do governo do Paraná.

Com a decisão oficial do governo Imperial, em 1867, fixando o ponto terminal

da estrada a vila de rio Negro, o Paraná reagiu e colocou na localidade de

Encruzilhada uma barreira fiscal para cobrar impostos das mercadorias em trânsito.

Fato que Mafra (2002, p. 529), assim descreveu:

No intuito ainda de futuramente alegar, como sempre, ocupação e posse, transferiu em 1868, para a Encruzilhada em plena mata virgem, a Estação dos Ambrósios, a 26 quilômetros da margem esquerda do rio Negro (como confessa o Presidente do Paraná em ofício de 11 de março de 1876) em território nunca à Santa Catarina contestado.

Nessa barreira ou posto fiscal, conforme denominações da época, o Paraná

cobrava imposto sobre as mercadorias vindas de Joinville para a região de São

Bento, nesse caso, mercadorias vindas de Santa Catarina e que entravam no

Paraná. Cobrava também impostos sobre mercadorias, principalmente gado vivo,

couro e erva-mate, que saíam do Paraná e entravam em Santa Catarina. O alto da

Serra do Mar se tornou a divisa entre o Paraná e Santa Catarina.

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3.2 FUNDAÇÃO DE RIO NEGRO

Por pedido do Governador de São Paulo, Francisco Souza e Faria partiu de

Viamão no Rio Grande do Sul, atravessou o planalto catarinense cruzou o rio Negro,

onde hoje está localizada a cidade com o mesmo nome, no Sul do Paraná, e chegou

a Curitiba no ano de 1731. Segundo Straforini (2001, p. 28), “Estava aberto o

“Caminho das Tropas”20, estabelecendo-se a ligação do Rio Grande do Sul com

Curitiba e incorporando ao antigo trecho Sorocaba-Curitiba”.

Para cobrar imposto sobre as tropas de mulas e gado que passavam por esse

caminho, o Governo da Província de São Paulo, estabeleceu, às margens do rio

Negro, que separa as atuais cidades de Rio Negro no Paraná, e Mafra em Santa

Catarina, um registro fiscal, conhecido como Sertão da Mata ou Mata do Sertão.

A localidade às margens do rio Negro tornou-se importante para a economia

de São Paulo, que tinha nos tributos do gado e mulas, uma grande e importante

fonte de receita. Por isso, o governador, visando a colonizar as margens do

caminho, autorizou em 1816, a vinda de colonos açorianos para a região.

Para dar maior estabilidade à localidade, D. Francisco Mascarenha, o Conde de Palma, governador da capitania de São Paulo, autorizou o estabelecimento de cinqüenta casais de portugueses açorianos, que vieram do Porto de Cima (Morretes). (FERREIRA, 1996, p. 580):

O autor da Revista do Cinqüentenário do Município de Mafra, Dequech,

(1967, p. 5), no entanto, atribui a fundação de Rio Negro ao Barão de Antonina, que

segundo ele, mandou erguer no ano de 1828 a Capela da Mata, sob a invocação do

Senhor Bom Jesus da Coluna. Sob a interferência do mesmo Barão, em 1829

vieram para a região os imigrantes alemães.

Com essas levas de povoadores, Rio Negro se transformou num importante

núcleo colonial, ocupando uma posição estratégica, localizado às margens do

20 Caminho das Tropas – Foi o caminho aberto ligando Viamão no rio Grande do Sul a Curitiba passando por Rio Negro, e seguindo o roteiro oeste, ligando Campo Largo, Itararé e Sorocaba. Sobre a chegada do primeiro abridor (o termo utilizado no documento era esse mesmo), do caminho, consta o seguinte relato. “A câmara de Curitiba registrou a chegada do Sargento Mor Francisco de Souza e Faria, o qual veio da abertura do caminho do rio Grande de São Pedro, aos dezenove dias do mês de setembro, de mil setecentos e trinta e um anos, nesta vila de Curitiba.” (EHLKE, 1973, p. 141).

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caminho das tropas, às margens de um rio navegável e no centro dos ervais do

Paraná.

As autoridades paranaenses e os empresários do mate percebendo a

movimentação dos catarinenses, abrindo uma estrada dentro da zona ervateira que

abrangia a região de Campo Alegre, São Bento e Rio Negrinho, trataram de garantir

a posse da área do rio Preto até o rio Canoinhas, ao sul do rio Negro.

A Assembléia Provincial do Paraná, pela Lei 219, de 02 de abril de 1870,

elevou à categoria de vila, a freguesia de Rio Negro. A Instalação deu-se em 15 de

novembro de 1870. Os limites ao sul do rio Negro, na área hoje catarinense: a oeste

o rio Canoinhas, ao Sul a Serra Geral e a oeste o Ribeirão do Turvo, desde a sua

embocadura até a sua nascente - que hoje corta a cidade de Campo Alegre. Assim,

a área que abrangia parte de Campo Alegre até as nascentes do rio Canoinhas era

território do Município de Rio Negro. Com a instalação da Câmara em 15 de

novembro de 1870, o projeto de posturas da Câmara determinava o aforamento e

arrendamento dos ervais de propriedade do Governo Municipal.

Figura 1 – MAPA DE RIO NEGRO – Limites da Vila de Rio Negro, criada pela Lei 219 de 02 de abril de 1870, com território ao norte e ao sul do rio Negro. Ao sul do Rio Negro, Santa Catarina contestava a expropriação dessas terras pelo Paraná.

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O Município catarinense de Mafra, até o ano de 1917, pertencia ao Município

de Rio Negro, e obedecia à mesma legislação. O autor da revista sobre o

cinqüentenário de Mafra relata que:

A Câmara loteava suas terras no rocio da Vila, ou melhor cedia por aforamento a quem solicitasse, mediante certas exigências de uso e de taxas, entretanto respeitada a área do perímetro urbano da margem esquerda, a área limítrofe, não era oferecida a quem a requeresse, da forma como era as da margem direita que imediatamente reuniu grande número de pequenos proprietários e agricultores. (DEQUECH, 1967, p. 7)

A Câmara controlava a atividade ervateira no Município de Rio Negro,

confirmando-se a suspeita de que no Paraná, a erva-mate era tratada como questão

de Estado. A riqueza da erva-mate transformou a vila de Rio Negro num centro

econômico, produtor e exportador. A erva-mate já na década de 1850 representava

85% das exportações da Província. Aqueceu a economia e segundo Corrêa, (2006,

p. 23) constituiu uma nova elite local “influentes atores no poder político do Paraná

Imperial”. Com isso pode-se afirmar concluir que se tornou fácil utilizar o público em

benefício do privado.

A futura Colônia Agrícola São Bento, fundada em 1873, foi contestada pelo

Paraná, alegando que ela se localizava em território de Rio Negro.

Ciente da sua imprevidência, a direção da Colônia Dona Francisca, em 30 de

setembro de 1873, encaminhou um ofício à Câmara Municipal de Rio Negro,

informando que em 20 de setembro mandou para o Vale do Rio Negro, entre os rios,

Negrinho e rio São Bento para fundar a nova Colônia Agrícola São Bento, (Ficker,

1973, p. 49), “os primeiros 70 pais de famílias dos emigrantes recém-chegados para

as terras devolutas”.

3.3 O PARANÁ AVANÇA SOBRE OS ERVAIS CATARINENSES.

A erva-mate segundo Riesemberg (1947, p. 207), “figurou por muitos anos,

em segundo lugar na balança comercial da exportação nacional”. Como a erva-mate

chegou a ser responsável por 2/3 da exportação do Paraná, pode-se avaliar o

poderio econômico dos empresários do mate e a sua força política para postergar,

por longos anos, a solução da questão territorial entre Paraná e Santa Catarina.

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Sem dúvida foram eles que possibilitaram a instalação gradativa de sertanejos, para

explorar o produto dos ervais catarinenses.

O engenheiro Augusto Wunderwald, contratado pela Sociedade Colonizadora,

fez três expedições ao planalto para demarcar a picada por onde seria construída a

estrada Dona Francisca. Na expedição de 1854, relatou que não encontrou vestígios

de moradores. Na expedição de 1858, relatou a existência de uma casa de caçador

de antas, habitada por mulheres e crianças. Na terceira expedição no ano de 1865,

já havia no Planalto, picadas abertas e alguns ranchos mas não encontrou

moradores. Conforme Ficker (1973, p. 34): “[...] mas na direção de Rio Negro e no

Campo Jararaca, o engenheiro encontrou uma casa que pertencia a um certo

“Maneco Franco”, morador de Curitiba.”21

Além da casa de Maneco Franco, registrou a presença de trabalhadores na

direção de Rio Negro ocupados em fazer mate.

3.4 PARANAENSES OCUPAM O SUL DO RIO NEGRO

Com base nos relatórios dos engenheiros que demarcaram o trajeto da nova

estrada ligando o litoral ao planalto, nos quais informam que a área era desabitada,

a Sociedade Colonizadora de Hamburgo requereu junto ao Governo Federal áreas

de terras devolutas para iniciar a Colônia Agrícola São Bento, vendendo lotes

coloniais aos imigrantes europeus. Sua atividade tinha apoio na Lei de Terras

aprovada de 1850, e que, segundo Piazza, (1994, p. 133) “dispunha sobre as terras

21 Maneco Franco – Manoel de Oliveira Franco, ou simplesmente Brigadeiro Franco, é homenageado com a denominação de uma importante rua no centro de Curitiba. Nas pesquisas realizadas no Arquivo Paranaense, foram levantados vários terrenos de sua propriedade ao sul do rio Negro: 1- no Município de Campo Alegre, na localidade de Encruzilhada, em cujo terreno o Paraná instalou a barreira fiscal de Encruzilhada. Neste local também foi instalado no final do século XIX, um engenho de erva-mate de sua propriedade. 2 - registro de terras entre Campo Alegre e São Bento no local denominado Jararaca; 3 - a área que mais causou problemas, foi a localizada a oeste do rio São Bento, onde a Sociedade Colonizadora de Hamburgo, vendeu vários lotes para imigrantes europeus, sem saber que a área tinha dono desde 1854 e que abrangia a área de todo o atual município de Rio Negrinho e parte do atual município de São Bento do Sul. O Brigadeiro Franco faleceu na década de 1870, mas seu genro Bento dos Santos Martins ganhou vários processos contra a Sociedade Colonizadora de Joinville por ter invadido a área de seu finado sogro. Ficker (1973, p. 151) informa que o processo contra Bento Martins foi julgado improcedente... e Bento Martins processou os colonos, que foram condenados pelo Juiz de Joinville. ”O Diretor da Colônia Dona Francisca queixava-se conforme Ficker (1973, p. 152) [...] como genro do Brigadeiro Manoel de Oliveira Franco acha-se Bento Martins bem protegido...”.

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devolutas no Império e determinava a sua medição, demarcação e utilização em

colonização”. O Governo visava, com essa lei regulamentar a atividade agrícola no

Brasil, incentivando expansão da pequena propriedade produtora de alimentos.

Os habitantes nacionais encontrados pelos engenheiros a partir de 1865

vieram do norte do rio Negro. O governo do Paraná vendeu áreas na região de São

Bento ao sul do rio Negro, e emitiu título de propriedade provisória a paranaenses.

Muitos ficaram residindo na região.

Havia ranchos erguidos às margens do Rio Negro, na direção de Campo

Alegre e, nos Campos de Jararaca, havia uma casa pertencente ao Brigadeiro

Franco, residente em Curitiba, que era também proprietário de terras em São Miguel

no atual município de Campo Alegre e de toda a área do atual município de Rio

Negrinho e de parte do município de São Bento.

Apesar dos protestos da Sociedade Colonizadora, uma área que pertencia ao

Brigadeiro Franco foi legalizada para seu genro Bento Martins. Os engenheiros que

demarcaram a área de colonização em São Bento desconheciam que as terras

localizadas a oeste do rio São Bento, pertenciam ao Brigadeiro Franco, com divisas

pelo rio Negro, Serra Geral e pelo rio Preto. Portanto, o projeto da Colônia Agrícola

São Bento estava quase um terço em cima de terra de um dos maiores empresários

do Paraná, com escritura legal, com posse desde 02 de julho de 1849. Para

negociar essas terras, a Cia Colonizadora teve que indenizar os seus herdeiros,

legítimos proprietários.

O governo do Paraná, através de seus agentes, facilitou a ocupação dos

ervais por colonos e ervateiros daquela Província. Vendeu e legalizou terras em São

Bento, em 1872, a Francisco Antonio Maximiano e a Antonio dos Santos Siqueira.

Inúmeras outras famílias habitavam a região de Fragosos e a maioria da

região de Campo Alegre e áreas do planalto catarinense ao sul do rio Negro, já

estavam de posse efetiva de paranaenses, quando Santa Catarina resolveu

conquistar a região a partir da segunda metade do século XIX.

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3.5 REAÇÃO CATARINENSE – FUNDAÇÃO DE SÃO BENTO, UMA COLÔNIA DE IMIGRANTES EM TERRITÓRIO CONTESTADO

A história da região do sul do Rio Negro, no passado coberta por ervais, é

pouco conhecida, e por isso, pouco divulgada. Na historiografia catarinense, a área

geográfica, onde se localizam os municípios de Campo Alegre, São Bento e Rio

Negrinho não é reconhecida como território Contestado.

Território Contestado é toda a ampla área geográfica no tempo presente, integrante das regiões Sul e Sudoeste do Estado do Paraná, e do Norte e Oeste do Estado de Santa Catarina, que foi objeto de limites: ao Norte, os rio Negro e Iguaçu; ao Sul, os rio Canoas e Uruguai: a Leste, inicialmente pela Serra Geral e depois pelo rio Canoinhas, o rio Timbó, o rio do Peixe, e o rio Marombas; e a este, a fronteira do Brasil com a Argentina. (THOMÉ, 2004, p. 13)

Esta pesquisa mostra que a região de Campo Alegre, São Bento e Rio

Negrinho, foi onde a questão territorial entre Paraná e Santa Catarina se agravou,

havendo inclusive ameaças de guerra, de forma verbal e por escrito. Por ser uma

área geográfica onde ocorreu a questão de limites entre o Paraná e Santa Catarina,

é um território Contestado, apesar do Contador da Tesouraria Provincial do Paraná,

afirmar, em 8 de janeiro de 1876, segundo Medeiros; Marchiorato (1992, p. 6), que a

barreira de Encruzilhada “estava em território de posse nunca contestada”. Houve

uma acirrada disputa territorial, inclusive com ameaças de morte. As batalhas da

Guerra do Contestado, (1912-1916), ocorreram próximas da fronteira de São Bento

com Itaiópolis, onde Antonio Tavares montou o seu reduto.

O inspetor Joaquim de Almeida Faria Sobrinho, da Fazenda Provincial, em

ofício ao Presidente da Província do Paraná, Dr. Adolpho Lamenha Lins, em 7 de

março de 1876, conforme a Medeiros:Marchiorato, (1992, p. 12), assim se referiu à

Província de Santa Catarina: “Sua contestação apareceu depois da promulgação do

Decreto n. 3378 de 16 de janeiro de 1865, que, tomando por base nossa posse

assinalou a Serra do Mar como limite entre o Paraná e aquela Província”.

O limite a leste do território contestado é a Serra do Mar, que foi cortada pela

estrada Dona Francisca, origem da contestação entre Paraná e Santa Catarina ao

sul do rio Negro, e não a Serra Geral.

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A disputa territorial, também conhecida como “questão do contestado” foi se

agravando com o passar dos anos. Os sertanejos foram expulsos dos ervais, e, se

quisessem ficar, tinham que se sujeitar a trabalhar em regime de semi-escravidão

para os empresários do mate. Os que não se sujeitaram, afastaram-se dos ervais do

vale do rio Negro e foram se agrupar em redutos na região de Curitibanos, onde os

ervais não eram tão densos, onde a disputa dos empresários não era ainda tão

grande. A situação, segundo Ribas (2004), “fugiu do controle das autoridades, a

partir de 1912, quando a questão limítrofe, se confundiu com o movimento dos

fanáticos seguidores do suposto monge José Maria, elemento que se fixou neste

território.”

Quando a estrada Dona Francisca alcançou o alto da Serra do Mar, a

Diretoria da Colônia Dona Francisca, com sede em Joinville, solicitou autorização ao

Governo Federal para comprar uma área de terras devolutas no planalto, a fim de

ampliar a área colonial. Segundo Ficker (1973, p. 177), “Em 1865 foi assinado com o

Governo Imperial, em 18 de abril, concedendo 247 quilômetros quadrados de terras

ao longo da estrada Dona Francisca”.

Inicialmente, demarcou-se uma área na região de São Miguel, próximo a

Campo Alegre. Os primeiros colonos que ocuparam a região tiveram que desistir

dela, pois o subsolo é formado por caulim, portanto imprópria para a agricultura. A

Direção da Colônia então mandou demarcar uma área mais para oeste, às margens

do riacho conhecido como rio São Bento, onde instalou a sede da nova “Colônia

Agrícola São Bento”.

Mesmo sabendo que a área estava sob a jurisdição da vila de Rio Negro,

Paraná, foram mandados 70 colonos para a região, que tomaram posse dos seus

lotes em 23 de setembro de 1873.

A Direção da Colônia Dona Francisca foi imprevidente mandando colonos

europeus para uma área contestada. Este fato foi comunicado por ofício à Câmara

de Vereadores de Rio Negro, em 30 de setembro de 1873. Analisando a atitude da

Direção, Ficker (1973, p. 49) comentou: “Temos a impressão que este ofício não

agradou muito os Vereadores da Câmara Municipal de Rio Negro da Província do

Paraná”.

A reação do Paraná não tardou a acontecer. Enquanto os colonos europeus

iam sendo instalados em lotes demarcados, autoridades do Paraná continuavam

entregando títulos de posse a colonos daquela Província. Dentre os novos colonos

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brasileiros que receberam terras, pode-se citar Antonio dos Santos, Joaquim Pinto

de Oliveira, Antonio Pereira de Lima.

Indignado com a situação, o diretor da Colônia Dona Francisca, enviou ofício

ao Presidente da Província de Santa Catarina em 17 de março de 1874,

denunciando que colonos do Paraná, que ele chamou de intrusos, estavam fazendo

roças em terras de colonos europeus.

Parte do ofício foi transcrito por Ficker (1973, p.74), “Temos todos os motivos

para supor que alguns destes intrusos, receberam instrução da Província do Paraná,

para invadir lotes da Colônia São Bento e fazer ali suas roças”

Como a questão de limites deveria ser resolvida entre as duas Províncias, a

Sociedade Colonizadora de 1849 em Hamburgo, apesar de ter comprado as terras

do Governo Federal como devolutas, não podia tomar posse de vasta área ao sul do

rio Negro, pois a mesma tinha sido vendida a colonos paranaenses pelo governo do

Paraná, então tinham sido vendidas duas vezes. A área de terra adquirida pela

Sociedade, era em forma quadrada, fazendo divisas a leste, com a fazenda de

Francisco Teixeira de Freitas, na serrinha Gatz; ao sul com as terras do Conde D’Eu,

no divisor das águas do rio Itapocú; a oeste com as terras do Brigadeiro Franco; ao

norte com o rio Negro e foz do rio São Bento. Dentro dessas terras, havia duas

fazendas já legalizadas no Paraná, a de Francisco Antonio Maximiano e de Antonio

dos Santos Siqueira. Mas havia moradores que receberam título de propriedade

provisório do Paraná, e que não tinham ainda escrituras registradas.

O interessante é que o Diretor da Colônia Dona Francisca sem conhecer a

região, estabeleceu por ofício de 10 de agosto de 1868, os limites dos 247

quilômetros quadrados requeridos ao governo federal. Estes foram descritos por

Ficker, (1973, p. 29)

[…] que estas terras sejam limitadas ao Norte pelo declive setentrional da serra de São Miguel, (nome regional dado à Serra do Mar), ao Leste pelas terras S. A. R., o Príncipe de Joinville, e ao Sul pelo Rio Itapocú e a Oeste até a estrada que conduz a Colônia Rio Negro à Lages.

Por esta demarcação, a área de terra requerida pela Direção da Colônia

abrangia uma enorme região do Planalto Norte, desde a serra do Mar até o caminho

das Tropas, onde poderiam ser demarcadas algumas dezenas de áreas, do

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tamanho da requerida. Isso mostra claramente a confusão que a Sociedade

Colonizadora, criou no Planalto, ao sul do rio Negro.

São Bento era um projeto imobiliário capitalista internacional, da Sociedade

Colonizadora de 1849 em Hamburgo, na Alemanha. Essa empresa desenvolvia

várias atividades, como o transporte de mercadorias, de imigrantes, venda de terras,

de gêneros alimentícios, ferramentas e máquinas. Os brasileiros que residiam na

área, chamados de intrusos que não possuíam título de posse definitivo, fornecido

pelo Governo do Paraná, foram expulsos de suas terras para que o projeto de

colonização pudesse se concretizar.

A Direção era responsável pela administração da Colônia Dona Francisca em

Joinville, e da Colônia Agrícola São Bento, às margens do rio São Bento, no Planalto

Norte. Para minimizar o problema e não entrar em confronto com o Paraná, deixou

de vender lotes na área ocupada por paranaenses, concentrou a venda de lotes em

terrenos ao sul da estrada Dona Francisca, onde hoje se encontra a cidade de São

Bento do Sul e aguardou a negociação de limites entre os Governantes das duas

Províncias do Império.

Após muitas gestões entre o Governo de Santa Catarina e Direção da Colônia

Dona Francisca, o Governo do Paraná, reconhecendo a propriedade da Sociedade

Colonizadora, das terras adquiridas do Governo Federal, fez acordo com os colonos

brasileiros, fornecendo-lhes outras áreas. A maioria aceitou, mas outros resolveram

permanecer na região, e continuaram residindo entre o rio Negro e a Colônia São

Bento. Outros deixaram a região, como foi o caso de Francisco de Paula Pereira,

que foi residir às margens do rio Canoinhas.

A presença de colonos brasileiros foi importante para os colonos europeus,

ajudando na derrubada da mata e preparação da roça e mais tarde na produção do

mate. Essa simbiose entre o colono brasileiro e o europeu no início da colonização

foi destacada por Ficker, (1973) autor do livro São Bento do Sul - subsídios para sua

história. Ele afirma que: “Sempre havia um intenso intercâmbio entre colono e

caboclo, principalmente em produtos naturais, peles, fumo, mate, gado bovino e

eqüino, em troca das necessidades do caboclo em produtos manufaturados”.

Conforme o autor supracitado, os brasileiros vendiam aos colonos produtos

naturais, entre eles o mate. Ou seja, o mate foi consumido pelos colonos europeus

desde o início da colonização dessa região.

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A erva-mate, desde o início da colonização de São Bento, a partir de 1873,

era um produto conhecido e negociado por nacionais e imigrantes. Os nacionais

como produtores e consumidores e os imigrantes no início como consumidores. Mas

logo se integram na produção, como relatou um dos primeiros imigrantes de São

Bento, em uma crônica, que no ano de 1877 foi instalada uma indústria de erva-

mate em Joinville. Ammon, (1923, p. 26) afirma que “Com a introdução da indústria

da erva-mate na Colônia Dona Francisca, os moradores de São Bento encontrarão o

recurso de colher a erva-mate que cresce sem cultivo nos seus terrenos”.

A matéria-prima para a indústria de erva-mate de Joinville, vinha do planalto,

principalmente de São Bento, onde os terrenos dos imigrantes eram cobertos de

ervais nativos.

3.6 CRIAÇÃO DE POVOAÇÕES AO SUL DO RIO NEGRO

A região ao Sul do rio Negro era habitada por sertanejos que ocupavam as

margens do caminho das tropas e dos rios que cortam a região, cultivando produtos

agrícolas para sua subsistência, criando pequenos animais e extraindo e produzindo

erva-mate em terras devolutas, em sua maioria vindos do interior do Paraná. Com a

atitude da câmara de Rio Negro criando uma lei para controlar a extração da erva-

mate em sua jurisdição, e mais tarde com a concessão recebida pela Cia. Industrial

Catarinense para explorar os ervais em praticamente toda Santa Catarina,

inviabilizou a subsistência dos sertanejos ervateiros. Explorar erva-mate em território

devoluto era proibido para eles. Outro agravante ocorreu quando o Governo Federal

republicano disponibilizou as terras devolutas para que os Estados pudessem

realizar a colonização, preferencialmente com estrangeiros que podiam pagar a

terra, expulsando definitivamente os sertanejos de seu habitat.

No final do século XIX, a passagem das terras devolutas para a competência dos Estados, deu margem ao despejo de posseiros que viviam nos confins da região contestada e se viram sem terra, sem emprego ou sem fonte de subsistência, tornando-se presas fáceis de alguém que lhes descortinasse as chances de uma vida melhor. (RIBAS, 2004)

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Ao Sul do vale do rio Negro, o primeiro Governo Republicano autorizou a

fundação, em 1891, de uma colônia federal agrícola, chamada Colônia Lucena22,

com predominância de colonos poloneses e alguns de origem alemã. O novo

governo assumiu os compromissos de colonização firmados pela Monarquia.

Aumentou a fiscalização federal sobre as colônias de imigrantes, e regularizou a

criação de novas colônias. Segundo Cabral (1968, p.307), “em 1895 o governo

passou para o Estado do Paraná, os encargos da mesma desistindo dos serviços de

colonização da zona”.

Como a colônia Lucena estava localizada em território da vila de Rio Negro, o

Paraná assumiu a sua administração.

Os primeiros lotes demarcados foram de imediato ocupados. Segundo Piazza

(1994, p 240), no ano de 1895, “achavam-se ocupados todos os lotes até então

vagos e foram medidos mais duzentos lotes que incontinenti foram ocupados por

colonos de origem polonesa, como os anteriores”.

Devido ao seu rápido crescimento, o governo do Paraná em fevereiro de

1896, criou o Município de Itaiópolis separado do município de Rio Negro.

No livro Colônia Lucena – Itaiópolis, organizado por Rodycz (2002), estão

citadas por Romão Wachowicz, as memórias do colono, e imigrante polonês

Koscianski. Ele lamenta que havia dificuldades em conseguir dinheiro com a

agricultura, (plantava milho, feijão, trigo e centeio), por falta de compradores. Para

esse imigrante e para os demais, a verdadeira fonte de renda era a erva-mate.

Sobre a erva-mate Koscianski fez a seguinte afirmação: Rodicz (2002, p. 421): “A

erva-mate oferecia o melhor rendimento, entre os demais. Durante anos manteve um

preço compensador. Nessa época, comprei 30 alqueires de terra com o pensamento

de colonizá-los com erva-mate”.

22 Colônia Lucena, atualmente Itaiópolis, foi criada como uma Colônia Federal em 1890, na região em que nascem os rios São João, Lança, Rio Negrinho, São Lourenço, Preto, entre outros. Anteriormente, ainda sob a jurisdição paranaense, as paragens tinham sido ocupadas, ao que se conta, pelas famílias de João Reichardt, José Wergenonski e João Becker. Os primeiros colonos chegaram em 1891 e eram de nacionalidade inglesa, ex-trabalhadores das fábricas de Londres, acrescidos de alguns polacos e russos. Em 1895 o governo passou para o Estado do Paraná os encargos da mesma, desistindo dos serviços de colonização da zona. Sob a direção do Estado foram encaminhados para o núcleo algumas famílias rutenas, idas de São Paulo e já afeitas à vida agrícola Dois anos mais tarde, uma nova remessa se fez, contando-se também elementos de origem polonesa. Além desses, pela mesma época se localizaram em Lucena muitos alemães que haviam saído de São Bento, aumentando, assim, a sua população. Em 1909, foi emancipada, passando depois para a jurisdição catarinense, e vindo a constituir o Município de Itaiópolis, em 1918, criado pela lei n. 1 220, de 28 de novembro, desmembrando-se de Mafra. (CABRAL, 1968, p.308, 308)

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Assim como outras regiões ao sul do rio Negro, também Itaiópolis, os

agricultores tinham na erva-mate uma fonte de renda suplementar à agricultura.

O Paraná fez do Município de Rio Negro, criado em 1870, o centro irradiador

da colonização nas duas margens do rio Negro. Segundo Cabral (1968, p. 307), “O

movimento colonizador prosseguiu, tendo sido encaminhados para a zona, em 1877,

os primeiros romenos de língua alemã - bucovinos, seguidos, em 1891, de

poloneses e, em 1895, de russos e rutenos”.

Além de Lucena, foram fundadas também as povoações de Papanduva e

Três Barras. A primeira se localizava às margens do caminho das Tropas, servia

como pouso de tropeiros e ali também foi instalada uma missão para catequizar os

índios Xokleng, a Missão de São Tomás de Papanduva, a mando do governo

federal, em 1877. Papanduva também era coberta de ervais, segundo informações

do ex-prefeito Juvino Tabalipa, (1975). Três Barras pertencia, até o final da Guerra

do Contestado, ao Estado do Paraná. A área era a “Sesmaria das Três Barras”,

registrada legalmente na Paróquia de Palmeira- PR, para a família Pacheco.

Localizada às margens do rio Negro e próxima à foz do rio Canoinhas, era um

importante centro ervateiro e madeireiro e, mais tarde, foi sede da serraria Lumber.

O povoamento da região de Três Barras ocorreu devido à grande quantidade

de erva-mate existente na região.

O povoamento do atual município verificou-se a partir de 1882, quando o Coronel Amazonas Marcondes obteve do governo imperial (leia-se D. Pedro II), a concessão para explorar o transporte fluvial dos rios Iguaçu, Negro e seus afluentes, com a finalidade específica de promover a extração da erva-mate nos seus respectivos vales. (MACHADO, 1986, p 3)

O Coronel Amazonas Marcondes era um grande empresário e político do

Paraná e foi pioneiro na navegação pelo rio Iguaçu, Negro e seus afluentes. Os

barcos de Marcondes podem ter transportado erva-mate através do rio Canoinhas.

A partir de União da Vitória, os paranaenses fundaram as localidades de

Valões, hoje Irineópolis, Poço Preto e Vila Nova de Timbó. Essa última localidade foi

incorporada a União da Vitória.

Conforme Silva (1933, p. 111), “A Lei. N. 1350, de 16 de abril de 1913, cria o

Distrito de Timbó, no município de União da Vitória”.

Nos vales do rio Timbó e rio Paciência, entre Canoinhas e Porto União, houve

acirrada disputa de terras entre grandes empresários e fazendeiros do Paraná e os

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pequenos criadores, lavradores, e ervateiros que não puderam mais trabalhar na

região.

Enquanto o Paraná ocupava as terras devolutas ao sul dos rios Negro e

Iguaçu, Canoinhas se isolava como localidade catarinense, mas o seu mercado

consumidor de erva-mate estava no Paraná.

Santa Catarina criou oficialmente uma localidade catarinense dentro do

município de Rio Negro. Segundo Ficker (1973, p. 164), “Santa Catarina, através da

Assembléia Provincial, aprovou a Lei n. 875 de 05 de março de 1880,

desmembrando de São Bento, o território compreendido pela margem esquerda do

rio Preto, denominado de São Lourenço23.

São Lourenço está situado ao sul do rio Negro, às margens do caminho das

Tropas e fazia parte do Município de Rio Negro. Atualmente é uma localidade

pertencente ao Município de Mafra. Essa medida desagradou os governantes do

Paraná.

Ainda no mês de março, o coletor da Vila de Rio Negro, João Bley informou

ao Inspetor de impostos da Província do Paraná Alfredo Caetano Munhoz, que o

comerciante joinvilense José Elias Moreira se instalou com casa de negócios em

São Lourenço, a 8 quilômetros do centro desta vila. Intimado a pagar os impostos

23 São Lourenço – localidade a oeste da cidade de Mafra, no antigo caminho que ligava Mafra a Canoinhas, ao sul do rio Negro. A nova estrada asfaltada isolou a vila. No passado a Vila era muito importante, pois localizava-se às margens do caminho das tropas, e era a última parada antes da tropa cruzar o rio Negro. Na história encontramos referência sobre São Lourenço em Ehlke, (1973, p. 139): o Sargento-mor Francisco de Souza e Faria recebeu do governador de São Paulo Caldeira Pimentel, a missão de abrir um caminho que ligasse a Capitania de São Paulo aos Campos de Curitiba. Com 35 pessoas entre índios e brancos, iniciou a abertura do caminho em Araranguá, no sitio Conventos. Cruzou o planalto catarinense, a Serra do Espigão, cruzou o rio Canoinhas, e na região onde denominou o rio São João, seguiu por campos e matos até outro rio que ele chamou de São Lourenço, com largura de 20 braças e passando esse seguiu por campos e restingas, até outro rio, que por muito negro e fundo lhe chamam de rio Una, (Rio Negro), nele fez alguns pastos, e deixou uma boa canoa de pinheiro, e só nele achou indícios de gente. Seguindo em frente chegou em Curitiba, no dia de Nossa Senhora da Luz, no ano de 1730. Outra referência também citada por Ehlke, (1973, p. 153), remete ao roteiro do sul, de 1745, do Brigadeiro José Custódio de Sá e Faria o qual ele descreve que, em 15 de novembro, entraram no mato de São Lourenço, onde pernoitaram junto ao arroio que deságua no rio Negro. Por estar localizado num ponto estratégico, às margens do Caminho das Tropas, importante ligação com o sul do Brasil, segundo o autor supra-citado (1973, p. 148) “Durante a revolta dos Farrapos, no Rio Grande do Sul, veio de São Paulo igualmente uma força do Exército do Batalhão de Montanhas (em 1835), que acampou no lugar denominado São Lourenço, ao sul do Rio Negro, onde existia uma construção pertencente ao Governo, destinada a acomodar os trabalhadores da Estrada da Mata, ali permanecendo até o ano de 1845”. A construção a que o autor se refere está citada na revista do Cinqüentenário do Município de Mafra como sendo construída pelo Barão de Antonina quando no início século XIX retificou trechos da estrada das Tropas e chamava-se abarracamento de São Lourenço. Com a construção da estrada Dona Francisca, cresceu a importância estratégica da Vila, pois por ela passavam pessoas e mercadorias no sentido norte e sul e leste e oeste.

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municipais em Rio Negro, alegou que os havia pago em Joinville. O coletor faz o

seguinte registro:

Pelo conhecimento que apresentou-me vê-se que o dito indivíduo só pagou lá a 3a. e a 2a., que se refere a taverna no entanto ele tem fazendas, molhados ferragens e armas de fogo, que não podem ser classificada naquela classe (MEDEIROS, 1992, p. 66).

A venda de armas de fogo pelo comércio de José Elias Moreira, denunciado

pelo Paraná, abre a possibilidade de se suspeitar que os comerciantes de erva-mate

de Joinville também introduziram armas de fogo na região do Contestado, que mais

tarde foram utilizadas na guerra.

Enquanto os paranaenses colonizam quase todo o Planalto, garantindo o uti

possidetis na questão de limites, desde o rio Preto, na divisa do atual município de

Rio Negrinho com Mafra, até a divisa com a Argentina, os catarinenses, ao fundar

São Bento em 1873, cravaram uma cunha numa parte importante do território

pretendido pelo Paraná.

A partir de São Bento, os catarinenses ajudaram a fundar a povoação de

Canoinhas, transformada em distrito de Curitibanos, no ano de 1902. Apesar de a

sede possuir apenas 60 casas, foi elevada a município em 12 de setembro de 1911.

A erva-mate foi por um grande fator de atração de trabalhadores dos ervais para

essa região coberta de pinheiros, imbuías e ervais. A partir de 1874, Manoel

Gonçalves da Rosa foi autorizado pela Assembléia Legislativa Provincial de Santa

Catarina, a navegar pelo rio Negro e seus afluentes.

Amazonas Marcondes inicia a navegação em Três Barras 1883, Silva (1941,

p. 20) descreve que “Por muito tempo, quase que foi a única atividade dos

canoinhenses. Preços compensadores, a erva-mate representava riqueza e

prosperidade”. De Canoinhas por via fluvial e erva-mate era direcionada para

Curitiba, via rio Iguaçu e para Joinvile, via rio Negro. De Rio Negro a erva-mate era

transportada por carroças para Joinville. Nesse trajeto ocorriam as discussões com

os fiscais dos postos do Paraná pela cobrança de impostos da erva-mate

catarinense. Em 1909, semanas após Aleixo Gonçalves ter atacado o posto fiscal de

Rio Preto, na divisa de Mafra com Rio Negrinho, os fiscais do Paraná prenderam

cerca de 20 carroças de erva mate de propriedade do Coronel Bernardo Olsen. Essa

erva estava sendo transportada de Canoinhas, via porto de Rio Negro. Portanto,

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mesmo antes de ser reconhecida como Município em 1911, a economia local já

dependia da exploração da erva-mate. Canoinhas se tornou a segunda cunha

catarinense, cravada dentro do território pretendido pelo Paraná.

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4 SANTA CATARINA ENTRA NA DISPUTA ECONÔMICA DO MATE COM A COMPANHIA INDUSTRIAL CATARINENSE

Em final de 1890, as grandes empresas de erva-mate de Joinville, conforme

Almeida (1979, p. 29) eram: “Abdon Baptista & Oscar, Augusto Ribeiro & Procópio,

Oliveira & Genro, Ernesto Canac & Cia, Mira & Ribeiro e F. Kaminsky & Cia”. Nesse

ano se uniram e fundaram a Companhia Industrial Catarinense. Essa empresa se

tornou a maior exportadora de erva-mate de Santa Catarina. Participavam do grupo

ainda as filiais de São Bento, das empresas Augusto Ribeiro & Procópio, Oliveira &

Genro, Ernesto Canac & Cia e Mira & Ribeiro.

A nova empresa solicitou e foi autorizada a funcionar através do Decreto

Federal n. 1273, de 10/01/1891. A Companhia era dirigida por empresários que

eram, ao mesmo tempo, líderes políticos na região e no Estado: Abdon Baptista,

Ernesto Canac e Procópio Gomes de Oliveira, todos eles comandaram a política de

Joinville, seja como presidente da Câmara Municipal ou como superintendentes

(prefeitos), deputados e mesmo vice-governador do Estado.

Ainda no ano de 1890, a Câmara Municipal de São Bento, no mês de

dezembro, por unanimidade, concedeu à Companhia Industrial Catarinense de

Joinville, a permissão para explorar erva-mate em terrenos devolutos dos atuais

municípios de São Bento do Sul e Rio Negrinho e Campo Alegre. Segundo Ficker

(1973, p.291) “A intendência Municipal (de São Bento), em sessão de 6 de

dezembro, resolveu, unânime, apoiar a petição e oficiar nesse sentido ao

Governador”.

A Companhia Industrial, também conseguiu permissão para explorar erva-

mate, por um período de 20 anos, conforme Almeida (1979, p. 30), “em terrenos

devolutos dos municípios de São Bento do Sul, Blumenau, Curitibanos, Campos

Novos, Tubarão, Lages e São Joaquim”.

Os empresários do mate catarinense, segundo Oliveira (1997, p. 30)

constituíam:

A classe comercial, detentora de recursos financeiros, influenciava a vida econômica (pela ampliação de seus negócios: serrarias, engenhos do mate, filiais), liderava a política local, unia interesses e dirigia suas iniciativas para a instalação de infra-estruturas básicas, a exemplo da água encanada, construção da estrada de ferro, instalação de luz elétrica e telefone.

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A classe empresarial da erva-mate catarinense, participava ativamente da

política e usava o público em benefício do privado. Para isso utilizava o Estado, a

serviço dos empreendedores. O Estado por sua vez, mobiliza-se para criar as

condições para que a sociedade fosse submetida ao mercado. Com isso gerou-se

um novo sistema social, onde todos os indivíduos se tornaram uma engrenagem que

era de fato uma máquina, para qual o homem estava condenado a servir. (POLANYI,

1944)

O Decreto Federal de 1891, praticamente encerrou a atividade extrativista

autônoma dos sertanejos em áreas devolutas. A eles restavam poucas alternativas,

ou trabalhavam para a Companhia Industrial ou para os seus braços terceirizados

formados por pequenos fabricantes de erva-mate. Estes estavam espalhados por

toda a região e preparavam a erva-mate cancheada, ou seja, pelo processo primitivo

e recebia o beneficiamento final nos engenhos em Joinville ou em São Bento. Quem

não aceitasse trabalhar nas condições impostas, abandonava a atividade ervateira.

Quem primeiro desapropriou os sertanejos catarinenses foram os

empresários do mate de Joinville, de São Bento, do Paraná e não os da madeira ou

da ferrovia.

Os engenhos de beneficiamento de erva-mate nessa época em São Bento,

pertenciam à Companhia Industrial Catarinense com sede em Joinville, portanto

todos os comerciantes do mate e os agricultores, dependiam dela para continuar os

seus negócios. Além da erva-mate, a Companhia atuava também com o comércio de

mercadorias. Tabalipa, (1979, p.5) relata que Domingos Tabalipa, um empresário do

mate em São Bento, no ano de 1898 montou uma casa de comércio em Lucena, fez

“suas compras na firma Companhia Industrial de Joinville”. Instalou central de

fornecimento de mercadorias por atacado, para abastecer o comércio de secos e

molhados em vários locais, trocando manufaturas e alimentos por erva. Em pouco

tempo dominou o comércio de todo o planalto ao sul do rio Negro e parte do sul do

Paraná em Quitandinha e Rio Negro. Como um polvo, foi estendendo seus

tentáculos, e aos poucos, monopolizando a produção e comércio da erva-mate no

planalto:

Possuía um raio de ação bastante grande, pois possuía quatro armazéns-depósito no estado do Paraná: Rio Negro, Antonina, Morretes e Paranaguá; Em Santa Catarina seis: Porto União, Lucena, Oxford, Lençol, Campo Alegre e São Bento do Sul (ALMEIDA, 1979, p. 33)

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Uma filial estava localizada em Oxford no bairro do mesmo nome. Outra filial

estava localizada no bairro Lençol, próximo ao trevo entre São Bento do Sul e Rio

Negrinho. A terceira, localizada no cruzamento da estrada Dona Francisca com a

estrada do Cruzeiro.

Nesses locais, o mate era processado e levado para Joinville, onde era

embalado e exportado. Além do mate, a Companhia Industrial comprava dos colonos

os produtos coloniais em troca de manufaturas nacionais e importadas.

No ano de 1892, adquiriu a filial do Banco Industrial e Construtor do Paraná,

para prover a região dos recursos financeiros necessários para o desenvolvimento

econômico regional. No ano seguinte, 1893, montou uma filial em Bueno Aires,

utilizando como matéria-prima a erva-mate produzida no Rio Grande do Sul.

Após quinze anos de atividades, a Companhia encerrou suas atividades em

1906.

Com a dissolução da Companhia Industrial Catarinense, os principais sócios

continuaram na atividade de forma independente. Isso aconteceu com o principal

acionista, Procópio Gomes de Oliveira, Carlos Hoepke & Cia, A Baptista Oscar &

Cia, Francisco Bueno Franco, Luiz Brockmann, Etienne Douat, Ernesto Mendel,

Rosa Gomes de Mira, Mario Lobo, Antonio Augusto Ribeiro, mais 22 acionistas

menores, entre eles João Wiese, que instalou mais tarde uma empresa de erva-

mate em São Bento.

Segundo Almeida, (1979, p.79) Ernesto Canac, se tornou banqueiro no

Paraná e vendeu as ações para Carlos Hoepke & Cia., que deu “Início da

dominação comercial no norte de Santa Catarina”.

A erva-mate continuou sendo o produto mais importante para a economia da

região ao sul do rio Negro. Isso pode ser comprovado, pois os sócios da Companhia

Industrial criaram novas empresas e continuaram na atividade ervateira, após a sua

extinção. Almeida (1979, p. 79) destaca os novos grandes empresários do mate de

Joinville: “Hans Jordan, Otto Gerken, Luiz Brockmann, Francisco Bueno Franco e

Bernardo Stamm”.

A Baptista e Oscar instalou uma empresa para produção e comercialização

de erva-mate em Rio Negro, no estado do Paraná, aproveitando os ervais ao norte

do rio Negro.

Embora a principal atividade fosse montar engenhos para a fabricação e

armazéns para depósito da erva, houve empresários que adquiriam terras cobertas

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de matas e formaram seus próprios ervais ao sul do rio Negro. Em pesquisa

realizada no Cartório de Registro de Imóveis de Canoinhas, foram encontrados

registros dessas terras. A empresa, A Baptista & Oscar, tornou-se proprietária de

uma área localizada entre Taunay e Marcilio Dias; Wolfgang Ammon, empresário do

mate em Campo Alegre e São Bento do Sul, também comprou uma área próxima à

localidade de Taunay. Bernardo Olsen, empresário da erva-mate, adquiriu as terras

do Distrito de Marcilio Dias e parte da região da localidade de Parado. Anteriormente

tinha seu comércio em Lençol, bairro de São Bento do Sul. Mais tarde montou

negócios também em Rio Negrinho. Em Marcilio Dias, fundou a Colônia São

Bernardo, com atividade comercial, ervateira e imobiliária. Comprava erva-mate dos

produtores locais e exportava pela ferrovia para Joinville ou Curitiba. Buscava erva-

mate em Major Vieira que era transportada pelo rio Canoinhas até o porto fluvial às

margens do rio Canoinhas, em Marcilio Dias, de onde era exportada pelo trem.

Os empresários ligados ao mate também se tornaram importantes líderes

políticos. Em Joinville foram presidentes da Câmara Municipal, Ernesto Canac e Dr.

Abdon Baptista. No Álbum Histórico do Centenário de Joinville, Torrens (1923, p. 76)

assevera que ocuparam a Superintendência Municipal, os seguintes empresários do

Mate: “Procópio Gomes de Oliveira, foi prefeito da cidade de 1903 a 1906; retornou

à Prefeitura de 1911 a 1914; Dr. Abdon Baptista, de 1915 a 1921; Dr. Marinho de

Souza Lobo de 1922 a 1926”

Soares (1992), na obra, São Bento do Sul, sua história, seus documentos,

relaciona os governantes municipais desde a primeira Câmara em 1883. Nela, está

claro que houve um período da hegemonia dos empresários do mate na

administração municipal. A Cia. Industrial também controlava a política e um dos

seus fundadores Francisco Gery Kaminsky, foi eleito presidente da Câmara em

1890; na Câmara de 1891, foram eleitos os ervateiros Francisco Antonio Maximiano,

Líbero Guimarães, Agostinho Ribeiro da Silva e Francisco G. Kaminsky. Para a

Câmara de 1892, foram eleitos os ervateiros, Olimpio Nóbrega de Oliveira e Jorge

Schlemm. Para a Câmara para o período 1894, foram eleitos os ervateiros Bernardo

Olsen e Carlos Urban. Na eleição de 1895 para o período até 1899, foram eleitos os

ervateiros Francisco Bueno Franco, Bernardo Olsen, Jorge Schlemm, Carlos Urban,

João Wiese.

Para o período de 1899 a 1902, os ervateiros dominaram a política em São

Bento. Para Superintendente (Prefeito), foi eleito Manoel Gomes Tavares, primo da

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esposa do Dr. Abdon Baptista, e os empresários do mate, João Wordell, Alfredo

Pinto de Oliveira, Ignácio Fischer, Antonio Francisco Caldeira.

Para o período de 1903 a 1907, os produtores de mate conseguiram eleger:

Manoel Gomes Tavares para Superintendente (Prefeito); Francisco da Silva Sinks –

presidente da Câmara; Carlos Urban, João Wordell, Antonio Francisco Caldeira e

Ignácio Fischer.

Para o quadriênio de 1907 a 1911, foi reeleito para o terceiro mandato o

Superintendente (Prefeito) Manoel Gomes Tavares, mas os empresários do mate

conseguiram eleger apenas João Wordell e Ignácio Fischer.

Para o período seguinte, 1911 a 1914, Manoel Gomes Tavares foi reeleito

para um quarto mandato juntamente com os ervateiros Vitor Celestino de Oliveira,

João Wiese e Maximiliano Wagner.

Para o quadriênio 1915 a 1918, foi eleito o Superintendente (Prefeito), Luiz de

Vasconcellos. Os empresários do mate conseguiram eleger apenas Bernardo Olsen

e Maximiliano Wagner. Esta foi a última eleição que Bernardo Olsen participou em

São Bento, mudando-se mais tarde para o distrito de Marcilio Dias, no município de

Canoinhas.

O eixo econômico do mate deixou a região de Campo Alegre, São Bento e

Rio Negrinho e, com o fim da questão do Contestado em 1917, foi aberta a maior

reserva de ervais de Santa Catarina, na região de Mafra, Canoinhas e Porto União.

Em Campo Alegre, o mate também influenciou a administração municipal. O

primeiro Superintendente eleito, em 1897, foi Francisco Bueno Franco, um dos

fundadores da Companhia Industrial Catarinense, que governou o Município até

1902. Para o período de 1906 a 1910, novamente Francisco Bueno Franco venceu

as eleições para Superintendente.

4.1 O TRANSPORTE DA ERVA-MATE

Transportar a erva-mate do sertão ao sul do vale do Rio Negro com

segurança e com preço baixo era vital para o sucesso econômico da atividade

ervateira. Quem conseguisse fazer chegar o produto ao mercado consumidor pelo

menor preço, conquistaria esse mercado. A dificuldade de transportar a matéria-

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prima, para as indústrias de beneficiamento no litoral, foi descrita pelo engenheiro

Carl Pabst. A erva-mate colhida pelos brasileiros na região de Mafra, no ano de

1855, era transportada dentro de jacá de taquara, pendurados um de cada lado no

lombo das mulas, para ser beneficiada em Morretes, no litoral do Paraná.

Em 1865, desceu pela picada da futura estrada Dona Francisca, a primeira

tropa levando erva-mate para ser trocada por mercadorias manufaturadas em

Joinville. Os jacás ou cestos feitos de taquara tinham o inconveniente de em dia de

chuva, molhar a erva.

Foi criado então o surrão, bolsa de couro de gado bovino, que eram

amarradas no lombo das mulas, uma de cada lado. O surrão tinha a vantagem de

ser impermeável e podia ser reutilizado em várias viagens.

Levar a erva no lombo de burros para Paranaguá e Morretes, via Curitiba,

encarecia muito o preço final do produto. A estrada, por outro lado, encurtava a

distância e facilitava o escoamento para o porto de São Francisco. Essa nova via,

privava o Paraná do imposto de exportação da erva, uma das principais fontes de

renda daquela Província.

4.2 A NAVEGAÇÃO PELO RIO NEGRO

O rio Negro já era conhecido pelo menos em sua foz, por várias expedições

que cruzaram pela região. Em 1871, o governo do Paraná deu concessão para a

navegação pelo rio Iguaçu ao brigadeiro Manoel de Oliveira Franco. Mas não se

conhece a empresa que o brigadeiro criou e nem o itinerário de suas embarcações.

Em documentos avulsos de 1874 a 1925 a Assembléia Legislativa publicou

em (2001, p. 9), que a Assembléia Legislativa Provincial de Santa Catarina, através

do Decreto n. 24 de 1874, concedeu privilégio exclusivo, por 20 anos, a Manoel

Gonçalves da Rosa, para organizar a navegação a vapor dos rios Negro e Iguaçu,

divisa com a Província do Paraná. A erva-mate produzida às margens desses rios e

seus tributários, inclusos o rio Canoinhas, São João, São Lourenço, Paciência e

Timbó puderam ser transportados para a vila de Rio Negro.

Os empresários do Paraná buscaram e encontraram a solução para o

transporte barato e em grandes volumes. Amazonas Marcondes conseguiu do

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governo imperial em 1879 a concessão, segundo Reisembeg (1973, p. 45), “[...] para

estabelecer, por si ou por meio de uma companhia, uma linha de navegação a vapor

desde o porto denominado Caia-Canga até Porto União”.

Na justificativa para conseguir a concessão, Marcondes informou ao Governo

Imperial que o custo de um cargueiro com oito arrobas de erva de erva-mate, da

localidade de Palmeira até o porto de União da Vitória, conduzido nas costa de

animais tinha o preço de R$ 10$000 no mínimo e que se essa erva fosse

transportada pelo vapor, o preço seria de R$ 2$000 a R$ 4$000.

No dia 17 de dezembro de 1882, no estaleiro de Caia-Canga, (hoje Porto

Amazonas), o empresário Amazonas de Araújo Marcondes, lançou às águas do rio

Iguaçu, o barco a vapor “Cruzeiro”. Do rio Iguaçu, o empresário ampliou seu projeto

logístico para o transporte da erva-mate, e no ano de 1883 com a presença de

autoridades estaduais do Paraná e municipais de Rio Negro, foi inaugurada a linha

de vapor ligando União da Vitória a Rio Negro, e o rio Iguaçu e rio Negro e seus

afluentes. Como o rio Canoinhas é afluente do Rio Negro, os barcos de Amazonas

Marcondes devem ter navegado por esse rio.

O fato foi descrito por Reisemberg (1947, p. 207), ao afirmar que: “Das

barrancas do Iguaçu, do Potinga, do rio Negro, do Timbó, o ouro verde vinha, mil

vezes mais fácil do que antes, mil vezes mais abundante do que nunca, para os

engenhos de soque do Campo Largo e Curitiba.”

Autoridades de Rio Negro vigiavam e defendiam os interesses dos

empresários do Paraná, como o fato citado por Machado (2004, p. 128), ocorrido

no ano de 1893, com um empresário de Joinville que “[...] queixava-se de que o

vapor Minuano e duas chatas de madeira de sua propriedade haviam sido

apreendidas por um tenente e praças armados do Corpo de Segurança do Estado

do Paraná”.

A implantação de uma linha de barcos a vapor para Curitiba, atendeu o

interesse dos empresários e autoridades do Paraná, que estavam preocupados com

o desvio da erva-mate para o porto de São Francisco do Sul. A navegação fluvial foi

o importante meio de transporte para a erva-mate, para a colonização ribeirinha,

tanto no vale do rio Negro como no vale do rio Iguaçu e seus afluentes.

Outros empresários passaram a investir no transporte fluvial. No ano de 1896

a empresa de navegação “Cruzeiro”, constituída em Joinville, inaugurou sua sede

em Rio Negro. Suas embarcações faziam o mesmo percurso dos barcos dos

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empresários paranaenses pelo rio Iguaçu, rio Negro e seus afluentes. Como

navegavam com bandeira de Santa Catarina, seus barcos foram impedidos de

navegar, pois o Paraná considerava que esses rios corriam dentro de seu território.

As embarcações de Amazonas Marcondes foram adquiridas em 1897 por

Arthur de Paula e Souza que montou a sua empresa com sede na fazenda Santa

Leocádia. Estava ligado aos empresários do mate do Paraná e defendeu que o

Paraná devia criar uma base administrativa e política em território ao sul do rio

Iguaçu e, segundo Machado, (2004, p. 136), foi ele que teve a “iniciativa de criação

do município de Vila Nova do Timbó”.

Durante a guerra do Contestado, Arthur de Paula e Souza foi assassinado em

junho de 1914. Seu corpo foi queimado junto com a sede de sua fazenda. Segundo

Queiroz (1981, p. 175) “Os jagunços levam o corpo do coronel, depositam-no na

sede da fazenda e tocam fogo nesta. A casa ardeu totalmente”.

Em conferência para homenagear os 90 anos de navegação a vapor no rio

Iguaçu e rio Negro, Reisemberg (1973, p.45) informa que o vapor “Cruzeiro”, de

Artur de Paula Souza foi “mais tarde incorporado ao Lloid Paranaense”.

A capacidade de carga dos barcos que navegavam pelos rios da região foi

descrita por Reisemberg (1973, p. 54), “Os maiores levavam no seu bojo 800 sacos

de erva-mate e cada uma das lanchas que eram arrastadas, levavam 300, elevando-

se pois a capacidade de carga para 1.400 sacas, que totalizavam 5.600 arrobas”.

Em Canoinhas também havia uma empresa que operava no Rio Canoinhas,

descrita por Kormann (1990, p. 22). “Bernardo Olsen inaugurou o barco Elfrida”. O

barco Elfrida fazia o transporte de erva-mate de Major Vieira para Marcilio Dias24.

Era movido por motor a gasolina e não a vapor como a maioria dos barcos que

24 Marcilio Dias - A ferrovia – por que passou por Marcilio Dias? O projeto original previa que a Estrada de Ferro seguiria em linha reta de três Barras para Canoinhas e de lá para Porto União. Um incidente com os trabalhadores envolveu o empreiteiro e o delegado de Canoinhas. Um engenheiro americano discutiu com o delegado e também foi ameaçado de prisão. Segundo Stulzer, (1982), “O valente americano pegou o chapéu e saiu: Vou embora! Canoinhas vai se arrepender. E assim aconteceu que a estrada de ferro não passasse por terrenos firmes, mas por banhados a seis quilômetros da vila. O americano não pode deslocar a estação mais longe. A mudança do roteiro de Canoinhas para Marcilio Dias foi prejudicial ao seu desenvolvimento. Somente em 1930 é que foi inaugurada a estação de Canoinhas, após a construção de um ramal ferroviário. A estação de Marcilio Dias chamou-se Estação de Canoinhas, porque a vila chamava-se Santa Cruz de Canoinhas. A mudança para Estação de Marcilio Dias, em homenagem ao marinheiro herói da guerra do Paraguai, deve ter ocorrido na ditadura de getulista em 1937. Germano Wagenfür, inspetor escolar, inspecionou a escola particular de Marcilio Dias, em 29 de abril de 1838, e na sua ata ficou registrada “Escola Particular São Bernardo, de Marcilio Dias, n o Município de Canoinhas ”

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navegavam pelos rios Negro, Iguaçu e seus afluentes sendo lançado à água no ano

de 1919.

A navegação com pequenos barcos foi importante para o desenvolvimento

regional ao sul e ao norte do rio Negro e às margens do rio Iguaçu. Reisemberg

(1947, p. 207), afirma que “São Mateus do Sul, Fluviópolis, Canoinhas e Porto União

da Vitória, e todos os povoados que lá floresceram, foram o seu eco, transformando-

se em cidade”.

A navegação teve queda com a ligação ferroviária de São Francisco do Sul a

Porto União, perdendo principalmente o transporte de passageiros e o correio.

Continuou porém transportando erva-mate e madeira até a década de 1950 quando

foi substituído pelo transporte rodoviário.

Sobre a navegação pelo rio Canoinhas, Silva (1941, p.51) assim escreveu:

Sendo o rio Canoinhas navegável até 20 quilômetros acima da cidade, por ele, e depois pelo Rio Negro, primeira via de comunicação com Mafra e Rio Negro, se fez todo o seu comércio inicial. Lanchas de construção apropriadas à navegação fluvial faziam esse transporte com regularidade. À navegação fluvial muito devem o progresso e a formação do Município de Canoinhas. Atraídos pela erva-mate e madeiras, os primeiros colonizadores serviam-se do rio como via de comunicação natural.

Muito antes da fundação da Vila de Canoinhas, a partir de 1874, pelo rio

Canoinhas a erva-mate era transportada por barcos do empresário catarinense

Manoel Gonçalves da Rosa. A partir de 1882, comerciantes do Paraná entram na

disputa do transporte da erva, transformando o rio Canoinhas numa artéria do

comércio ervateiro dessa região.

4.3 SÃO BENTO WAGEN - (CARROÇÕES DE SÃO BENTO)

O transporte da erva-mate era feito inicialmente, nos primitivos caminhos e

picadas, por tropas, utilizando-se o lombo dos animais cargueiros. O custo do frete

era um componente econômico importante, sendo decisivo, como vantagem

competitiva entre agentes econômicos. A vereda aberta no mato pelos engenheiros

e seus ajudantes, por onde futuramente seria construída a estrada Dona Francisca,

passou a ser utilizada pelos tropeiros, que, com suas tropas, em fila indiana,

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carregadas de bolsas de erva mate (cargueiros) desciam e subiam a serra mesmo

durante sua construção. A estrada Dona Francisca foi concluída em 1888, ligando

Joinville a Rio Negro, se transformando na “Estrada do Mate”. Mas a chegada da

estrada em cima da serra, no planalto, foi comemorado em Joinville:

O dia 31 de maio de 1865 é de real importância para a história da Estrada da Serra e para o norte-catarinense: chegou, às três horas da tarde, à vila de Joinville, o primeiro grupo de viajantes a cavalo, que desceram as vertentes da Serra Geral pela Estrada Dona Francisca, com uma tropa de bestas conduzindo erva-mate e voltando no dia seguinte com uma carga de couro curtido na indústria do Sr. Jacob Richlin, de Joinville. Abriu-se, nessa data, a via de comunicação para viajantes e para o comércio. (FICKER, 1965, p. 241)

O trecho de Joinville até São Bento havia sido concluído no ano de 1877.

Inicia-se uma nova etapa de prosperidade e progresso para essa região. Começa

uma fase que mudou a paisagem da região por várias décadas: são os carroções

transportando erva-mate. Joinville se torna o grande centro fornecedor de

mercadorias para o planalto, de onde recebia a erva-mate, que era exportada e

transformada na principal fonte de renda. Sobre o movimento das carroças pela

estrada Dona Francisca, o cronista assim escreveu:

E lá da serra vieram então de regresso as carroças típicas, de quatro rodas e com toldas brancas puxadas com 6 cavalos. Elas também tinham levado os imigrantes e seus pertences serra acima e voltavam com pesada carga, muito preciosa, e principalmente a erva mate, o ‘ouro verde’ do Brasil naquele tempo. (OLIVEIRA, 1951, p. 88)

Os carroceiros, ao anoitecer, juntavam suas carroças em forma de um

quadrado fechado, em defesa contra possível ataque dos índios e na área interna

faziam suas fogueiras, ao redor da quais corria a cuia de chimarrão e colocava em

dia a conversa.

No planalto, onde a indústria básica era a erva-mate, o transporte dependia

dos preços cobrados pelos carroceiros. No ano de 1882, alegando alto preço do

milho, estrada mal conservada e perigo de ataque dos índios, os “carroceiros de São

Bento”, declararam formalmente greve.

[...] Os carroceiros formavam um verdadeiro sindicato e no auge da conjuntura da erva-mate, quando mais de 900 carroções movimentara a Estrada Dona Francisca num constante vai-e-vem, o comércio ervateiro dependia da exigência dos preços cobrados pelos carroceiros. Mais de uma

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vez o comércio e a exportação do mate ficou seriamente prejudicados com a greve formalmente declarada pela classe dos proprietários das “carroças de São Bento, como eram chamadas pelo povo. (FICKER, 1973, p. 209)

O que eles buscavam na realidade eram preços melhores para o frete, pois

tinham consciência dos lucros que a erva-mate gerava, principalmente para os

industriais e para os exportadores.

Com a conclusão da estrada, no ano de 1888, a erva-mate da região de

Mafra, Canoinhas e interior do Paraná passou a ser transportada para o porto de

São Francisco, nos grandes carroções, chamados carinhosamente pelos joinvilenses

de “São Bento Wagen”. Eram enormes carroças tracionadas por quatro, seis,

havendo algumas, com até oito cavalos, cobertas por uma tolda de lona, para

proteger a mercadoria da chuva. A partir de 1913, a carga pesada como erva-mate

e madeira, passou a ser transportadas por trem. Cargas leves ainda continuaram

sendo transportadas até a década de 1950, quando os caminhões liquidaram com a

atividade dos carroceiros de cargas.

O transporte fluvial era concorrido e na afirmação de Machado (2004, p. 128),

“Muitos conflitos entre comerciantes catarinenses e paranaenses, que concorriam

pelo transporte fluvial da erva-mate e outras mercadorias nos rio Negro e Iguaçu,

serviram de pretexto para acirrar a questão dos limites entre os dois estados”.

4.4 A FERROVIA E A ERVA-MATE

Na região de Canoinhas, segundo Silva (1941, p. 18), “o objetivo inicial das

correntes de povoamento foi a exploração da erva-mate”. Isso demonstra que ela foi

a primeira riqueza que atraiu colonizadores, criando o primeiro ciclo de

desenvolvimento regional, o ciclo da erva-mate. Essa foi a riqueza responsável

também pela construção da estrada de ferro ligando São Francisco a Porto União, e

não a madeira como será demonstrado a seguir.

No ano de 1883, houve mobilização dos empresários do mate de Joinville

para a construção do ramal, que somente iniciou em 1904:

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O surto de progresso que a erva-mate proporcionou, trouxe como reflexo o interesse da aplicação de capital estrangeiro na Província, com construção de uma estrada de ferro que ligasse São Francisco do Sul com Rio Negro, para abrir novos horizontes ao comércio e à exportação do produto. Apareceu como concessionário um francês, Visconde de Goussencourt, porém a grande expectativa da população em torno deste empreendimento acabou melancolicamente sem que a construção da estrada de ferro fosse iniciada dentro do prazo estipulado na concessão. (FICKER, 1973, p. 238)

Em julho de 1884, o engenheiro Leite Ribeiro traçou o primeiro plano de

construção do trecho São Francisco até Hansa Humboldt, hoje Corupá. No final do

Império obras públicas foram paralisadas. Com a Proclamação da República, as

obras ferroviárias foram retomadas e, em 1892, uma comissão de engenheiros

escolheu o local para dar inicio a construção da linha férrea. A revolta da Armada e a

Revolução Federalista de 1893 paralisaram essas obras.

A ferrovia se concretizou, conforme Thomé (1980, p. 84), “em 1901, quando a

Companhia Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande, solicitou ao governo concessão

para implantar outro ramal, partindo de União da Vitória rumo ao litoral”

Após estudos, o governo uniu os ramais projetados e criou por Decreto no

ano de 1902, a Estrada de Ferro São Francisco a Foz do Iguaçu como concessão da

Companhia de Estrada de Ferro São Paulo – Rio Grande.

O primeiro trecho foi inaugurado pelo Presidente Afonso Pena, em agosto de

1906, o que veio facilitar o transporte da erva-mate fabricada em Joinville para o

porto de São Francisco. Na recepção ao presidente, na Estação Ferroviária de

Joinville, estavam as principais autoridades da região, com destaque para os

ervateiros, citados por Ficker, (1965, p. 396): “Superintendente (Prefeito): Procópio

Gomes de Oliveira, o maior acionista da Cia Industrial; o Dr. Abdon Baptista, Vice-

Governador eleito; Henrique Jordan; Canac; Urban; Alexandre Schlemm entre

outros”.

O governo federal aprovou pelo Decreto n. 5 280, de 9 de agosto de 1904, os

estudos para continuidade do trecho de São Francisco a São Bento no alto da Serra

do Mar.

De Joinville, o projeto ferroviário seguiu em direção a Rio Negro, e enfrentou

dificuldades para atravessar a Serra, devido à quantidade de cortes e túneis

escavados na rocha. O trecho de Joinville a São Bento somente ficou pronto em 1º.

de abril de 1913, quando a previsão era para 1907.

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Na importante obra sobre a Guerra do Contestado, - Messianismo e Conflito

Social -, Maurício Vinhas de Queiroz, (1981, p.74) descrevendo a Lumber, que

montou uma grande serraria em Três Barras fez a seguinte afirmação: “Encarregou-

se também a Brazil Railway de construir uma estrada de ferro entre União da Vitória

e São Francisco, no litoral catarinense. Por ela começou a descer a madeira

destinada à exportação…”. O autor defende o ponto de vista de que a construção do

Ramal São Francisco a Porto União foi um projeto do Sindicato Farquar, para tirar a

madeira do planalto para o porto de São Francisco. É importante se observar que

Farquar adquiriu o controle acionário da ferrovia através da Brazil Raiway Company,

somente em 1906, quando o projeto já estava em execução. Nessa data, parte do

ramal já havia sido inaugurado e o restante do trecho continuava em construção

rumo a Foz do Iguaçu. A grande serraria da Lumber foi organizada mais tarde, como

conseqüência da construção do ramal e não como causa. Isso pode ser comprovado

por Thomé:

Em Miami (USA), no ano de 1909, o Sindicato Farquar organizou a Southern Brazil Lumber na Colonization Campany para desenvolver os serviços de colonização das terras ao longo da estrada de ferro, e para explorar os grandes pinhais existente na região dos vales dos rio Negro, Iguaçu, Timbó, do Peixe e Canoinhas dentre os principais que atravessam a zona contestada por Santa Catarina [...] (THOMÉ, 1980, p. 100)

O ramal ferroviário ligando São Francisco a União da Vitória, teve o trecho até

Marcilio Dias inaugurado em 1913.

No ano de 1911 foi construída em Três Barras a Companhia Lumber, que se

transformaria na maior serraria do Brasil, aproveitando o trem para escoar sua

produção, a partir de 1913. A estrada de ferro desviou a Vila de Canoinhas e foi

direcionada para as margens dos banhados que margeiam os rios Canoinhas, Negro

e Iguaçu e o restante do ramal, de Marcilio Dias a Porto União foi inaugurado

somente no ano de 1917. Percorrendo a região ervateira ao sul do rio Negro e

Iguaçu, o trem foi o mais importante meio de transporte que propiciou o rápido

desenvolvimento regional. Teve um papel decisivo para a exportação com

competitividade, da erva-mate do norte catarinense e mais tarde da madeira.

Empresas de Joinville vieram se instalar na região e empresas locais cresceram com

a facilidade de transporte.

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No ano de 1930, foi construído o ramal ferroviário, ligando a cidade de

Canoinhas à estação de Marcilio Dias. Iniciava-se um novo período econômico na

região, uma nova fase do desenvolvimento regional, o ciclo da exploração da

madeira. Mas o ciclo econômico da erva-mate, que iniciou em fins do século XIX,

continuou sendo importante ainda por vários anos.

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5 A ECONOMIA ERVATEIRA – SÉCULO XIX e XX

A erva-mate no século XIX e XX foi o verdadeiro carro chefe da economia do

Paraná e do Planalto norte de Santa Catarina. Foi responsável pelo surgimento de

vilas e povoados onde antes era apenas sertão. Fez surgir fábricas de erva-mate,

armazéns, rodovias, hidrovias, vilas e cidades. O governador do Paraná, Dr. Munhoz

da Rocha, assim definiu a importância da erva-mate para a sua Província:

Esta preciosa ilex tem sido o grande bem do Paraná. Em verdade a erva constitui a coluna de ouro da nossa riqueza econômica; dela emanam as nossas principais fontes de renda; nela assenta todo engrandecimento, a prosperidade do Paraná (CAPRI; OLIVERO, 1923, p. 38)

No Paraná, criou-se uma elite dirigente dona de fortunas trazidas pela

atividade ervateira. Foi também responsável pela divisão política em liberais,

liderados pelos fazendeiros de Palmas e dos Campos Gerais e os conservadores,

chefiados pelos ervateiros. Criou uma nobreza política, citada por Corrêa (2006, p.

25), ”como os dois mais poderosos exportadores da Província: O Visconde de

Nácar, representantes das oligarquias do litoral paranaense e Ildefonso Correia,

futuro Barão do Serro Azul”. Enquanto os ervateiros conservadores defendiam a

exportação do mate, os liberais, fazendeiros de gado, tinham sua produção voltada

para o mercado interno. Em Santa Catarina, a erva-mate criou divisões políticas

entre os fazendeiros pecuaristas, liderados pela família Ramos, e os ervateiros

liderados por Abdon Baptista.

Por ser uma atividade extrativista com abundância de matéria-prima, os lucros

gerados pela atividade ervateira foram em sua maioria, desviados para outros

empreendimentos, como construção de mansões em Curitiba, Joinville, ou então

para o comércio e a navegação. Não houve preocupação com reflorestamento e

nem com melhoramentos técnicos para aumento de qualidade e produtividade. No

século XIX, o Paraná se transformou em uma potência industrial do mate. Do livro

“Carroções e Outras Histórias”, conforme Bach (2005, p.244), foram relacionados os

principais engenhos do Paraná no final do século XIX e início do século XX.

1. Hervateira Guimarães & Cia – Rua XV de Novembro n. 161 a 165 em

Curitiba. Fundada em 1830 por Manoel Antonio Guimarães (Visconde de

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Nácar). Em 1890, foi fundada a firma Guimarães & Cia, com matriz em

Curitiba e filiais em Paranaguá, Antonina e São Francisco do Sul. A

produção anual dessa empresa era de 5.500.000 quilos.

2. Hervateira Americana, fundada por David Carneiro, situada na rua

Comendador Araújo. Além da erva, produzia barricas, caixas de pinho,

caixas de papelão e pacotes de papel para acondicionar erva-mate. Era o

maior engenho do Paraná, produzindo 9 000.000 quilos de erva para

chimarrão e 1.500.000 pacotes de mate real. Davi Carneiro se tornou

conhecido como o “Rei do Mate”.

3. Fábrica Fontana de Beneficiar Erva-mate. Fundada em 1834, por Francisco

Fontana em Curitiba. Produção anual de 3.000.000 quilos.

4. Engenho Macedo & Filhos - Fundada em 1840, na rua Santos Andrade,

com sede e engenho em Porto de Cima. Possuía também dois armazéns

em Antonina.

5. Engenho de Erva-Mate Iguassú - fundado em 1852, à avenida Batel, 11 a

15 em Curitiba, por Boaventura R. de Azevedo e Edgar Linhares. Produção

anual de 4. 000.000 quilos.

6. Fabrica Tibagy-Ildefonso – de Ildefonso Pereira Correia o (Barão do Serro

Azul). Localizada na avenida João Gualberto, 29. Bairro da Glória.

7. Engenho Xavier de Miranda & Cia – Rua Brigadeiro Franco, 76 – Curitiba.

Produtor da erva-mate “Guilherme”.

8. Fábrica Santa Graça – Viúva de Manoel de Macedo. Fábricas em Curitiba e

Ponta Grossa. Produção anual de 9.000.000 quilos.

9. Ascanio Miró – Rua Lamenha Lins – Curitiba. Fundada em 1890. Produção

anual de 3. 600.000 quilos.

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10. Fábrica Santa Maria – de viúva Correia, fundada em 1893 em Curitiba.

Produção 3.000.000 quilos.

As principais fábricas de erva-mate do Paraná, no final do Século XIX

produziam quase 40 mil toneladas, em sua maioria para exportação. Pelos números

pode-se avaliar a dimensão e a importância da produção ervateira para o Paraná e o

interesse desses industriais em continuar recebendo matéria-prima dos ervais

catarinenses.

No século XX, a expansão continuou com o surgimento de novas indústrias

em Curitiba e em outras regiões do Estado. Beneficiadas com as facilidades de

transporte ferroviário e fluvial, o foco de expansão da indústria ervateira se desloca

para as margens do rio Negro e Iguaçu, surgindo fábricas na Vila de Rio Negro

algumas com filial em Mafra. Do livro Carroções e outras história de Bach (2005, p.

246 a 252), foram relacionadas algumas fábricas que surgiram na região, no século

XX:

1. Fábrica Leão Junior - Fundada em 1901 em Ponta Grossa. Em 1912

com a compra do moinho Tibagy, a sede foi transferida para Curitiba.

2. Engenho São Bernardo, fundado por Bernardo Moreira em Morretes.

3. Meirelles, Souza & Cia, engenho de erva-mate fundado em Antonina.

4. Fábrica Mäder – fundada por Nicolau Mäder em 1898 em Rio Negro. Em

1907 foi transferida para Curitiba, na avenida João Negrão. Processava

3.000.000 quilos.

5. Engenho J. Cima & Cia, fundado em 1912 por José Cima, na rua Ratclif,

98 em Curitiba, com filial em União da Vitória.

6. Hervateira Pontagrossense, fundada em 1923, em Ponta Grossa, pelo

Coronel José Pompeo, estabelecidana rua Conselheiro Barradas.

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7. Engenho Palmas, da firma Freitas & Cia, à rua XV de novembro em

Palmeira. Foi fundada pelo Coronel Domingos Theodorico de Freitas.

8. Henrique Jordan & Cia. Engenho de erva-mate São João, em Rio Negro.

Produção anual de 3. 600.000 quilos.

9. Emilio von Lisingen & Cia. Engenho em Rio Negro, fundado em 1908.

10. Fábrica de Beneficiar Herva-Matte Bom Jesus. Fundada em 1893, por

Miguel José Grein, em Rio Negro. Produção anual de 1. 200.000 quilos.

11. Engenho Santo Antonio da Lapa, fundado por José Lacerda, Lapa, PR.

12. Agenor & Cia, fundada em 1917, compradora em larga escala de erva-

mate em São Mateus do Sul.

13. Engenho Glória, fundado por Leopoldo de Almeida e Porte, em rio Negro.

14. Engenho São Bernardo, localizado entre as estações de rio Negro e

Mafra. Possuía um ramal ferroviário próprio. Foi fundado em 1922 por

Manoel Severiano Maia. Em 1923, foi adquirido por Bernardo Stamm e

José Dias Barretos. Produção anual de 2. 500.000 quilos.

15. Ervateira Brasil, fundada em 1912, na rua Dr. Collares em Ponta Grossa.

Produção anual de 3. 000.000 quilos.

16. A Meirelles & Cia, fundada por Antonio Meireles em Piraquara. Grandes

armazéns, depósitos de erva-mate e fábrica de barricas, com produção de

15 mil barricas ao mês.

17. Engenho Teixeira Soares, fundado em 1906 em Teixeira Soares.

Fabricava cinco mil barricas por mês e 1.800.000 quilos de erva-mate.

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18. Mulinari & Gubert, fundada em 1913, no quilometro 66 da linha São

Paulo-Rio Grande em Teixeira Soares. Produção anual de 75 000 quilos.

19. Fabrica São Bernardo, fundado em 1915, por Alberto do Amaral Wolff em

São Mateus do Sul, fabricantes da erva da marca periquito.

20. Em Mafra, foi instalada a filial da empresa H. Jordan & Cia, com o

engenho de erva-mate Flora.

21. Emilio von Lisingen & Cia. Engenho em Mafra (filial de Rio Negro),

fundado em 1918.

Os empresários do mate de Mafra, após 1917, com a assinatura do acordo de

limites entre Paraná e Santa Catarina, se organizam para usufruir dos benefícios

trazidos pela atividade. A Câmara Municipal aprovou o código de posturas

municipais, com incentivo à limpeza dos ervais; fixou gratificação ao produtor que

cultivasse mil pés ou mais de erva num prazo de 5 anos; fixou multa para quem

cortasse a erva nos meses de outubro a abril e com menos de 4 anos desde a última

poda.

O envolvimento empresarial com a erva-mate era tão grande, que em 1917

havia em Mafra, 16 casas comerciais e 20 fábricas de barricas para acondicionar

erva-mate. No ano de 1922 exploravam o ramo de erva-mate as seguintes

empresas:

Eugenio La Maison, H. Douat & Cia, Walfrido Almeida, B. Celestino de Oliveira, A. Baptista & Cia, Pedro Adélio & Cia, J. Procopiack & Irmão, E. von Linsingen, Leopoldo de Almeida, H. Jordan & Cia, José Severiano Maia, Hipólito Moreira e S. H. Fabril Ltda. Nesse ano de 1922 Mafra tinha cerca de 300 produtores de erva-mate. (DEQUECH, 1977, p 58)

5.1 CANOINHAS SE TORNA OURO VERDE

A exploração da erva-mate na região de Canoinhas no início do século XIX

era realizada pelos paranaenses que cruzavam os rio Negro e Iguaçu, em busca do

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produto. Na segunda metade desse século, a erva era exportada pelos rios. Com a

construção da Estrada Dona Francisca, a erva era produzida e exportada para o

porto fluvial de Rio Negro de onde era embarcada nos carroções para Joinville. Com

a construção de estrada carroçável e da estrada de ferro, Canoinhas e região se

transformam em grande centro fornecedor de erva-mate.

A região de Canoinhas, pelo tipo de solo e clima, é propícia ao

desenvolvimento da erva-mate. É uma árvore de porte médio, que cresce sob a

sombra dos pinheiros, imbuias, canelas e bracatingas, em forma consorciada com

outras espécies vegetais. A abundância de erva atraiu Francisco de Paula Pereira e

seus amigos, que, de São Bento do Sul, saíram para colonizar a região de

Canoinhas no final do século XIX. A atividade ervateira foi beneficiada pela

existência de rios navegáveis, que favoreceu o escoamento da produção para

outros centros, como Rio Negro ou Curitiba.

A ferrovia foi decisiva para transformar a Vila de Santa Cruz de Canoinhas, no

maior produtor catarinense da erva-mate. O município recebeu a denominação de

Ouro Verde, em 1923, pela lei 1424, de 23 de agosto, devido à importância

econômica da erva-mate para o desenvolvimento regional. Segundo Silva (1941, p.

19), “o nome Ouro Verde foi sugerido pela erva-mate, uma das maiores fontes de

riqueza do município”.

A erva-mate foi o fator de atração, que trouxe para Marcílio Dias Bernardo

Olsen, juntamente com dezenas de empreendedores que migraram para esta

região.

Na busca da primazia econômica, não há dúvida de que a erva-mate já era

produzida e exportada pela região desde meados do século XIX, transportada pelo

rio.

A madeira entra na pauta da exportação mais tarde, com a construção da

ferrovia em 1913 e dos ramais da Lumber para dentro da floresta que em 1912,

conforme Queiros, (1981, p. 74) “já se estendia por trinta quilômetros”. Para retirar a

madeira de dentro da mata era necessária a construção de estradas que deveriam

conduzir para dentro dos pinheirais e imbuiais. Construir estrada não era uma tarefa

fácil. Isso pode ser comprovado, pois no ano de 1913, o comerciante de Joinville

Olímpio Nóbrega de Oliveira, em carta ao governador de Santa Catarina, segundo

Machado, (2004, p. 129) ”afirma que era de fundamental importância a conclusão da

construção de um trecho de 5 quilômetros de estrada de rodagem que ligava a Vila

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de Canoinhas, à estação da estrada de ferro do mesmo nome...”. Além da questão

do escoamento, as pequenas madeireiras enfrentava forte concorrência da Lumber.

A situação da atividade madeireira, na década de 1940, foi descrita por Silva (1941,

p. 21), “As estradas se fizeram para o seu escoamento. Uma população imensa se

emprega nas serrarias, nos pinheirais, no transporte e no beneficiamento da

madeira”.

Com a crise na exportação da erva-mate a partir da década de1930 a madeira

se mostrou uma alternativa econômica importante e na década seguinte assumiu a

liderança econômica na região.

Conforme Silva (1941, p. 45), “Em 1940, havia em Canoinhas 62 serrarias,

sendo 54 de madeiras em geral, 5 para fabricação de caixas e 3 laminadoras.”

Na década de 1940, o Governo Federal encampou e depois fechou a Lumber,

deixando vantagens competitivas para as pequenas serrarias. Isso motivou a

instalação de serrarias e empresas madeireiras em vários pontos do município. Não

é propósito fazer um estudo sobre as empresas madeireiras no sul do vale do rio

Negro e em Canoinhas, mas confirmar que o primeiro ciclo econômico da região ao

sul do vale do rio Negro, foi a erva-mate, que, mais tarde foi substituído pelo da

madeira.

Por vários anos consecutivos, quase a metade da erva-mate produzida em

Santa Catarina era originária de Canoinhas. No ano de 1939, atingiu a participação

de 56,91% da produção total de Santa Catarina (SILVA, 1941, p. 45).

A produção de erva-mate envolvia vários processos desde o corte até o

ensacamento. Isso exigia um elevado número de trabalhadores, que vinham de

várias regiões de Santa Catarina e mesmo do sul do Paraná, principalmente na

época da safra, nos meses de maio até setembro.

Os trabalhadores especialistas na produção da erva-mate eram os brasileiros,

ou luso-brasileiros como também eram chamados. Os imigrantes, no entanto, não

demoraram muito para se especializarem na atividade. Sobre a contribuição dos

trabalhadores dos ervais, descendentes de imigrantes europeus que colonizaram a

região, pode-se citar o que segue:

Poderíamos citar o caso dos alemães de Canoinhas, Campo Alegre, São Bento, em Santa Catarina, ou o dos ucranianos de Prudentópolis, o dos poloneses das localidades que margeiam o Iguaçu e seus fluentes como o Potinga, no Paraná. Nas zonas mais contagiadas pela imigração, tanto de um como de outro Estado, o fenômeno se mostrava sempre igual. O mate

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exercia logo a sua atração e contribuía para maior abrandamento da colonização, no sentido de sua adaptação. (LINHARES, 1969, p.200)

Como aconteceu na região de São Bento, também na região de Canoinhas, o

imigrante europeu pôde se beneficiar do desenvolvimento e da prosperidade da

erva-mate. Os que não conseguiram as benesses do progresso, ficaram sujeitos às

dificuldades e as condições precárias de nutrição e assistência, impostos aos

trabalhadores braçais responsáveis pelas primeiras etapas da produção do mate.

5.2 ERVA-MATE OU MADEIRA ? – EIS UMA QUESTÃO

A economia catarinense, conforme dados selecionados a partir de

informações de Bossle (1988, p. 26), na segunda metade do século XIX até meados

do século XX, passou por alterações. A agricultura, que liderava a exportação, foi

perdendo espaço para o extrativismo. A farinha de mandioca durante anos foi líder

na exportação catarinense, representando 48,4% do total, no período de 1854 a

1855; os minerais 23,80 %; o arroz 7,40%; o couro 3,20%, seguidos pela

aguardente, café entre outros. É importante lembrar que, nesse período, está

iniciando a colonização européia no vale do Itajaí e em vários pontos do litoral

catarinense, havendo a necessidade de derrubada da madeira para implantarem-se

as roças. A madeira, nesse período tinha uma participação de 14% na economia

catarinense.

No período de 1880 a 1886, a madeira passou a ser o principal produto de

exportação de Santa Catarina, quando representava 20,83%; vindo em segundo

lugar a erva-mate, 18,75%; a farinha de mandioca, 15,32%; arroz, 12,90%; couros,

7,84%, seguidos de outros produtos como açúcar, banha, manteiga, charutos,

aguardente, tapioca, café, feijão, milho, toucinho, fumo. Coincide com a

consolidação dos pólos de imigração no Estado, a limpeza das terras para a

implantação das roças no sul, vale do Itajaí e litoral norte.

Com a abertura da estrada Dona Francisca a partir da década de 1870, a

erva-mate começa a participar da pauta de exportação catarinense. A madeira foi o

principal produto até 1893, quando a liderança passa para a erva-mate, que só foi

superada novamente pela madeira na década de 1930. Mas é importante lembrar

Page 91: UNIVERSIDADE DO CONTESTADO - UnC CAMPUS

91

que a exportação da madeira da região ao sul do rio Negro ainda não era

representativa. A madeira, no início do século XX, era utilizada principalmente para

dormentes que eram usados na construção da ferrovia e não para exportação.

Para comprovar a afirmação, foi transcrito abaixo o quadro de exportação de

erva-mate e madeira em Santa Catarina em valores. O período selecionado foi

quando a erva-mate e a madeira concorriam, de 1892 a 1938. Pelos números

levantados por Bossle (1988, p. 142 e 143), pode-se afirmar que a erva-mate, a

partir do final do século XIX até o inicio da década de 1930, liderou a exportação

catarinense. Enquanto a erva-mate teve uma produção e exportação em

crescimento regular a partir de 1893, com uma média anual de acima de mil contos

de réis, a madeira alcançava em torno de 500 contos de réis, como média anual.

Com o término da questão do Contestado e a incorporação de todo o território ao sul

do rio Negro e Iguaçu, em 1917, a produção cresceu e a participação da erva-mate

na exportação elevou o valor, atingindo quatro mil contos de réis enquanto que a

madeira, nesse ano, atingiu a marca de mil contos de réis. Mas em 1919 o valor

exportado da erva mate, triplicou em relação à exportação da madeira.

De 1924 a 1928 houve queda na exportação, e o setor ervateiro entra em

crise. Nesse período a madeira superou temporariamente a erva-mate. Em 1929,

novamente a erva-mate voltou à liderança, que conservou até 1933. A partir dessa

data foi superada pela concorrência argentina e perdeu a liderança de forma quase

que definitiva para a madeira.

O quadro abaixo mostra a produção da erva-mate e madeira, com dados de

1892 até o ano de 1938, em valores (mil réis).

Page 92: UNIVERSIDADE DO CONTESTADO - UnC CAMPUS

92

ANOS ERVA-MATE (Em mil reis) MADEIRAS (Em mil reis) 1892 1893 1894 1895 1896 1897 1898 1899 1900 1901 1902 1903 1904 1905 1906 1907 1908 1909 1910 1912 1913 1914 1915 1916 1917 1918 1919 1920 1921 1922 1923 1924 1925 1926 1927 1928 1929 1930 1931 1932 1933 1934 1935 1936 1937 1938

621:190$000 1.327:900$000 1.540:155$000 1.334:364$000 2.045:586$000 2.044:395$000 2.188:761$000 2.308:877$000 1.921:724$000 2.022:130$000 1.428:257$000 1.378:030$000 1.338:722$000 1.467:044$000 1.444:401$000 1479:030$000 1.567:960$000 1.286:834$000 1.287:784$000 1.164:589$000 982:239$000

1.168:017$000 985:222$000

1.491:046$000 4.042:542$000 3.645:876$000 9.420:967$000 6.860338$000 4.978:055$000 6.860:338$000 7.047:680$000 7.553:695$000 6.471:063$000

- - -

13.456:788$000 14.639:553$000 15.496:797$000 15.444:087$000 10.507:180$000 7.914:383$000 4.127:828$000 8.988:770$000 9.859:612$000 9.174:611$000

750:446$000 438:270$000 475:443$000 621:413$000 543:892$000 548:476$000 597:534$000 189:094$000 279:641$000 363:6324000 373:885$000 524:1724000 503:715$000 756:170$000 876:025$000 770:743$000 701:044$000 626:402$000 688:858$000 877:805$000 854:511$000 482:782$000 333:152$000 555.756$000

1.138:934$000 2.767:653$000 3.152:336$000 3.954:357$000 3.075:129$000 5.108:980$000 6.535:987$000 11.624:000$000 11.922:000$000 7.097:000$000 7.197:000$000 12.245:000$000 12.541:387$000 7.843:611$000 8.003:449$000 9:295:197$000 11.688:390$000 13.002:707$000 15.410:238$000 1.235:505$000 31.984:047$000 38.706:316$000

Quadro 2 – Importância da erva-mate em relação à madeira. Dados desde 1892 até o ano de 1938, em valores Fonte: BOSSLE, (1988, p. 142 e 143).

Os dados supracitados acima, mostram a realidade econômica do setor

ervateiro e madeireiro em Santa Catarina, no período delimitado e levam às

seguintes considerações:

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93

a) A Estrada Dona Francisca, teve sua construção iniciada em 1855, chegou

à Vila de São Bento do Sul, no ano de 1877, incorporando à economia ao

catarinense a região dos ervais ao sul do rio Negro, que antes era matéria-

prima exclusiva dos paranaenses.

b) Com a fundação de São Bento, os imigrantes europeus tomam contato

com a atividade ervateira, principalmente após 1877, quando a Estrada

Dona Francisca foi aberta até São Bento. Nesse ano, em Joinville, foi

instalada um engenho erva-mate. Estava aberta a região dos ervais e a

economia recebe um incremento, com a entrada da erva-mate na pauta

de exportação de Santa Catarina.

c) Quando a Estrada Dona Francisca foi aberta até a Vila de Rio Negro, em

final da década de 1880, houve um crescimento substancial nas

exportações da erva-mate. Fazendo-se um comparativo, constata-se que

no ano de 1893, o valor da exportação da madeira representava um terço

do valor da exportação da erva-mate;

d) A região ervateira ao sul do vale do rio Negro se integra como o centro

fornecedor. Isso pode ser comprovado, pois no ano de 1894, somente São

Bento do Sul, segundo Ficker (1973 p. 323) “[...] exportou nesse ano

445:000$000. Santa Catarina, nesse mesmo ano, exportou 1.540:155

$000”. Por outro lado, nesse mesmo ano a exportação da madeira por

Santa Catarina foi de 475:443$000. Em São Bento, onde a madeira estava

sendo derrubada para implantação das roças dos colonos imigrantes,

exportou em 1894 no valor de 48:000$000, ou seja, a exportação da

madeira representava em torno de 10% da erva-mate.

e) Durante o período da guerra do Contestado (1912 a 1916), a exploração da

erva-mate não teve queda substancial, pois os sertanejos revoltados foram

confinados à região mais ao sul dos ervais do vale do rio Negro. As lutas se

concentraram distante da região produtora de Campo Alegre, São Bento do

Sul, e Mafra, de modo que a guerra pouco afetou a atividade ervateira,

havendo pequena queda na produção nos anos de 1913 e 1915.

f) Com o término da guerra do Contestado, houve a expansão ervateira para

o oeste, na região antes em conflito, incorporando-se os ervais de Três

Barras, Canoinhas e Porto União. A exportação de erva-mate triplicou em

valor a partir de 1917.

Page 94: UNIVERSIDADE DO CONTESTADO - UnC CAMPUS

94

g) A atividade madeireira sofreu queda acentuada nos anos de 1914, 1915 e

1916, com a guerra na Europa e com a guerra do Contestado, crescendo a

partir do ano de 1917, quando duplicou o valor da madeira exportada.

h) Enquanto outras regiões do Estado de Santa Catarina sofreram com a

queda das exportações da erva-mate, devido à concorrência Argentina a

partir de 1930, mudando inclusive para outras atividades, como foi o caso

de São Bento do Sul e Rio Negrinho, que optaram pela industrialização.

Canoinhas tornou-se a principal produtora de erva-mate de Santa Catarina,

e em 1923 passou a chamar-se Ouro Verde. BOSSLE, (1988, p. 142 e 143)

A safra catarinense teve quedas significativas nos últimos anos, passando de

71.642 toneladas em 2002, 68.393 toneladas em 2003; 66.078 toneladas em 2004 e

61.635 em 2005 caindo para 41.833 em 2006.

Três Barras vai se tornar exportadora de madeira a partir de 1911, quando a

serraria Lumber entrou em operação. Mas o salto econômico regional, foi dado a

partir de 1913, com a inauguração da ferrovia. O trem fez surgirem serrarias às

margens da ferrovia. Atraiu empresários, como Bernardo Olsen, que, em 25 de

março de 1926, inaugurou uma serraria em Marcílio Dias, ao lado da estação

ferroviária.

A erva-mate foi também responsável pela fixação de famílias no interior do

município, onde foram abertas estradas. A madeira começou a despertar interesse

econômico, mesmo que a exportação tivesse uma queda em 1926 e 1927, mas

recuperou-se bem em 1928.

O setor atraiu empresários para a região, e no ano de 1940 havia ainda em

Canoinhas cerca de 4 milhões e trezentos mil pinheiros em pé com altura média de

13 metros com mais ou menos 16 polegadas.

Em 1940 conforme Silva (1940, p. 45), havia em Canoinhas: “62 serrarias,

sendo 54 de madeiras em geral, 5 para a fabricação de caixas e 3 laminadoras. A

principal é a ‘Southern Brazil Lumber and Colonization Company – Incorporada’, que

é de primeira ordem”.

A empresa tinha sua sede em Três Barras, e empregava cerca de 1.000

operários. A Lumber foi incorporada ao patrimônio nacional em 1940, quando

venceu o contrato de 50 anos, e, segundo Thomé (1980, p. 106), “Getulio Vargas

promoveu então a encampação de todos os bens da Lumber, junto com as demais

Page 95: UNIVERSIDADE DO CONTESTADO - UnC CAMPUS

95

empresas de Farquar”. O encerramento das atividades da Lumber contribuiu para

que surgissem pequenas serrarias em vários pontos do Município, substituindo em

muitos casos a atividade ervateira.

5.3 A QUEDA NA PROCURA DA ERVA-MATE

A crise atingiu o setor ervateiro na década de 1930 e teve como principal

motivo a crise econômica que assolou o mundo ocidental, com a queda da Bolsa

de Valores de Nova York. Segundo Tabalipa, (1979, p. 5), com a crise de 1929, “o

preço da erva-mate que em 1928 era de 20$000 vinte mil réis, em 1929 baixou para

3$000, três mil réis”. Essa crise atingiu todo o comércio dos países periféricos aos

grandes centros econômicos e financeiros. Por outro lado, a erva-mate brasileira era

produzida em forma extrativista, num sistema tradicional de poda que praticamente

destruía a árvore, que tinha quase todos os seus galhos cortados. Para a completa

regeneração, eram necessários 3 a 4 anos, mas havia também outros problemas.

Estando as árvores dispersas na mata, os ervateiros perdiam muito tempo carregando os galhos de distâncias cada vez maiores, do local onde era realizado, o sapecamento e o enfardamento para ser transportada ao carijó onde era feita a secagem. Todo o processo era manual e exigia um bom número de trabalhadores, o que encarecia todo o processo produtivo. A Argentina, por ser grande consumidora e ter poucas reservas nativas, investiu no reflorestamento, produzindo a sua própria erva e o Brasil perdeu o seu maior comprador. (LINHARES, 1969, p. 289)

A Argentina, maior comprador da erva brasileira, a partir do inicio do século

XX, iniciou com sucesso o cultivo da erva-mate. O parque fabril argentino exigia que

o Brasil vendesse a erva, semi-elaborada, conhecida como cancheada, de preço

menor. Como o Brasil queria vender apenas a erva-mate pronta para o consumo, os

argentinos resolveram investir no plantio, produzindo assim a própria matéria-prima.

Segundo Costa (1995, p. 48):

Data precisamente de 1903 o início do cultivo na Argentina por esse sistema, cujas plantações já atingiam 18 milhões de unidades em 1926, quando o governo da Província estabeleceu acelerar a formação de novos ervais, que todas as terras aforadas no Território de Missões deveriam se destinar obrigatoriamente, pelo menos na metade da superfície, ao cultivo

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96

do mate, com o que se obteve o plantio de mais de 48 milhões de pés até 1935. (COSTA, 1995, p. 48)

Em sistema de reflorestamento, o processo de produção era mais

concentrado e os argentinos extraiam dos pés apenas as folhas e os ramos, não

destruindo os galhos, com isso podiam ter uma safra anual das mesmas árvores.

Isso representava maior produtividade por árvore, preços menores para o

consumidor e concorrência com a erva-mate brasileira. Os argentinos têm outro

sistema produtivo, mais racional que o brasileiro.

É certo que a maioria das podas é feita a tesouras. A rigor não se pode falar em poda, mas em corte. [...] há quem diga com razão que desbaste mais racional daria maior rendimento, pelo menos uma colheita a cada dois anos, ou até anualmente com se faz em Missiones. (LINHARES, 1969, p. 289)

Há mais de cem anos que os argentinos fazem o manejo racional, com

tecnologia para a produção da erva-mate, enquanto que no Brasil e especificamente

na região ao sul do rio Negro a erva-mate explorada ainda é basicamente a nativa,

com poucas árvores por hectare, para ser usada no chimarrão ou no chá. Se

houvesse um reflorestamento em sistema de adensamento racional, obedecendo às

normas da legislação vigente dos órgãos ambientais, em muitas áreas o número de

árvores do erval poderia dobrar, aumentando a produtividade sem perda de

qualidade da erva. A erva-mate nativa da região ao sul do rio Negro possui um sabor

característico, um diferencial de qualidade que deve ser preservado. Quem quiser

produzir erva-mate para extração de alcalóides e outros sub-produtos, o

reflorestamento de forma pura seria uma boa alternativa. Detalhes sobre o manejo

sustentável da erva-mate podem ser obtidos na Universidade do Contestado –

Campus Canoinhas, na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - EMBRAPA,

no escritório regional da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de

Santa Catarina - EPAGRI na mesma cidade e na Universidade Federal de Santa

Catarina, em Florianópolis..

Com o cultivo da erva-mate, e com a introdução de técnicas de colheita e

preparo, a produção Argentina de erva-mate apresentou a seguinte evolução:

Page 97: UNIVERSIDADE DO CONTESTADO - UnC CAMPUS

97

ANO QUANTIDADE 1910 1920 1925 1930 1935 1937 1938

910.000 quilos 2.900.000 quilos 10.000.000 quilos 38.500.000 quilos 75.000.000 quilos

106.330.000 quilos 120.000.000 quilos

Quadro 3 – Evolução da produção Argentina de erva-mate Fonte: Costa, (1995, p. 49)

Com sua produção, a Argentina se tornou auto-suficiente e também

exportadora de erva-mate. Além de não comprar mais a erva-mate brasileira, se

tornou seu mais direto concorrente. A partir da década de 1930, o setor exportador

ervateiro entrou em crise e não conseguiu mais sair dela. As facilidades

proporcionadas pelo extrativismo, acomodou os agentes econômicos e isso foi

prejudicial para o agronegócio da erva-mate, pois não levou os empresários a

buscarem alternativas de produção e consumo.

Na região ao sul do rio Negro, a produção está concentrada na erva-mate

para chimarrão. Como a erva para chimarrão é um produto no qual há muitos

produtores produzindo de forma igual, a vantagem competitiva, o diferencial, é a

aplicação de tecnologia.

A principal produtora de erva-mate na região ainda é Canoinhas. O jornal A

Notícia de Joinville, (27/08/2007) publicou uma entrevista com um empresário do

mate, e ele afirma que, nos últimos anos, houve aumento de custos de produção,

mas não aumentou o consumo. Segundo informou, a cultura (da erva-mate), já foi o

carro chefe da arrecadação de tributos para a cidade de Canoinhas; hoje representa

apenas 2% do volume. Outras causas apontadas foram o aumento dos custos, que

cresceram pela alta do preço dos insumos e por causa dos impostos que incidem

sobre a erva-mate.

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6 A INSTALAÇÃO DE BARREIRAS FISCAIS E O SIGNIFICADO DOS CONFLITOS

6.1 O PARANÁ INSTALA BARREIRAS FISCAIS ENTRE JOINVILLE E SÃO BENTO

Para conter o fluxo de erva-mate para o porto de São Francisco, pela Estrada

Dona Francisca que passou a concorrer com a Estrada da Graciosa, ligação de

Curitiba ao litoral do Paraná, onde estavam localizados os portos de Antonina e

Paranaguá, o governo do Paraná criou várias barreiras fiscais. A erva-mate

produzida em Santa Catarina, nos vale do rio Negro e Iguaçu, por estar mais

próxima do porto de embarque e pagar imposto menor para o Estado, era mais

barata que a erva produzida pelo Paraná, que percorria maior distância para o

embarque e sofria uma taxação de impostos que os empresários do mate

consideravam alto. Assim e produtores do sul do Paraná começaram a vender erva-

mate para Joinville.

A criação das barreiras fiscais visava também a sobretaxar a erva-mate

catarinense para que ela se tornasse mais cara que a erva-mate produzida no

Paraná. O projeto rodoviário catarinense, construindo uma estrada para os ervais,

estava dando prejuízo ao Paraná. A questão do Contestado, não era mais só uma

disputa territorial, mas era também uma disputa econômica entre os ervateiros.

Quando a estrada Dona Francisca atingiu o Planalto Norte de Santa Catarina,

o governo federal definiu, em 1867, que o ponto terminal seria Rio Negro e não

Curitiba.

O governo do Paraná acreditava que a Estrada Dona Francisca ligaria

Joinville a Curitiba, cruzando o distrito de Ambrósios, ao sul da Vila de São José

dos Pinhais, e instalou, em 1854, uma barreira fiscal para cobrar impostos de

mercadorias em trânsito.

Assim que soube da notícia, conforme Mafra (2002, p. 562), “[...] a

administração do Paraná em 1868, transferiu (a barreira fiscal) para Encruzilhada”.

A transferência foi realizada no mês de junho e cobrava os seguintes

impostos: dízimo dos produtos da lavoura e indústria (3% sobre manufaturados e 8%

sobre os não manufaturados); imposto sobre gado de consumo, taxa itinerária de

400 réis por animal carregado e 200 réis por animal solto.

Page 99: UNIVERSIDADE DO CONTESTADO - UnC CAMPUS

99

O registro de Encruzilhada é situado aproximadamente a 26 quilômetros da margem esquerda do rio Negro que tem seu curso dentro de território desta Província, território do qual estava de posse nunca contestada antes do Dec. N. 3378 de 16 de janeiro de 1865. (MEDEIROS; MARCHIORATO, 1992, p. 6)

O Paraná considerava o rio Negro um rio paranaense, que corria apenas

dentro do seu território e não era um rio de fronteira. Pelo Uti Possi de tis

estabelecido pelo Decreto de 1865, o limite do Paraná com Santa Catarina ficou

provisoriamente estabelecido pela Serra do Mar. Este é um importante documento

pois utiliza o termo de posse nunca “contestada”, termo este que vai se generalizar

com sinônimo de luta pela posse da terra entre as duas Províncias.

A barreira fiscal foi transferida para o local chamado Encruzilhada a 26

quilômetros ao sul do rio Negro, em território que Santa Catarina considerava seu e

por isso contestou. O engenheiro construtor da estrada, Étiene Douat, conforme

Ficker (1973, p 92), “alegando ordem superior mudou o traçado da estrada mais

para o norte, passando longe da barreira fiscal de Encruzilhada”.

Com essa medida, o engenheiro anulou a barreira fiscal de Encruzilhada, mas

o Paraná não se conformou e periodicamente mandava suas tropas para obrigar os

colonos a desviar o trânsito e passar pelo seu posto fiscal.

O procurador fiscal do Paraná, Dr. João José Pedrosa, diante do protesto de

Santa Catarina pela instalação da barreira fiscal, assim ameaçou:

Se a província de Santa Catarina deseja alargar o seu território à custa do nosso, seja por vaidade ou simplesmente bairrismo, seja para adquirir novos elementos de riqueza que lhe faltem. Pode fazê-lo dentro da órbita da lei, reclamando perante o poder legislativo do império, mas nunca por uma espécie de conquista, pela ameaça e pela força, porque seria isso um crime que nada adiantaria às suas pretensões. (idem, 1992, p. 11)

O inspetor de tributos da Província do Paraná em ofício ao Presidente da

Província do Paraná, Dr. Adolpho Lamenha Lins, chama a atenção de que Santa

Catarina não pode ingerir nos negócios do Paraná e muito menos desrespeitar as

suas leis, e fez a seguinte afirmação, que foi transcrita por Medeiros; Marchiorato,

(1992, p. 14): “Não são o Paraná e Ela, dois Estados soberanos que tenham a

recear ataques a sua integridade territorial de modo a mover-se uma luta de honra

entre ambas”.

O Governo do Paraná ameaçou partir para a luta se necessário fosse para

garantir a integridade territorial que julgava de seu direito.

Page 100: UNIVERSIDADE DO CONTESTADO - UnC CAMPUS

100

Diante dessa situação, o coletor de rendas provinciais de Joinville, Anacleto

Ladislao Ribeiro, encaminhou um relatório ao Inspetor da Tesouraria Provincial de

Santa Catarina, pelo qual informa que a Província do Paraná, reclama que o núcleo

colonial de São Bento, cujos terrenos foram comprados ao governo imperial,

pertençam a ela. Sobre o caso o coletor de Joinville, assim se manifestou, segundo

Medeiros; Marchiorato (1992, p. 16), “Vossa Senhoria não ignora que a Província do

Paraná quer apossar-se de todo o território compreendido pela margem esquerda

do rio Negro”.

Quando os moradores se recusaram a pagar, eram multados e cobrados

judicialmente pelas autoridades paranaenses. O inspetor mostra sua preocupação

com a situação e alerta que em breve poderá haver um sério conflito entre os

moradores de São Bento e os empregados do posto fiscal, e pede a intercessão do

governante catarinense para solucionar a questão de limites entre as duas

Províncias.

O inspetor de renda da Província de Santa Catarina, José Delfino do Santos

diante do relatório do coletor de Joinville, informa ao Presidente da Província, João

Capistrano Bandeira de Mello Filho, em 11 de abril de 1876, conforme transcrição do

documento feita por Medeiros; Marchiorato (1992, p. 18), “que a situação é

vexatória que estão sujeitos os moradores aquem do rio Negro e os da nova colônia

de São Bento, com as exigências das autoridades fiscais da Província do Paraná”.

O inspetor argumentou que, enquanto o governo imperial não solucionasse a

questão de limites entre as duas Províncias, uma parte da população estaria

sofrendo.

O Presidente da Província de Santa Catarina, através do ofício de 11 de maio

de 1876, contesta o estabelecimento de registro ou barreira fiscal em Encruzilhada,

em território catarinense. Nega que haja posse antiqüíssima do Paraná, lembrando

que a divisa entre as Províncias é pelo rio Negro, conforme a carta régia de 20 de

novembro de 1749, que criou a Ouvidoria de Santa Catarina. Segundo o Presidente

a carta régia estabeleceu os limites pelo rio Negro e pelo grande rio de Curitiba (rio

Iguaçu), pelo de 9 de setembro de 1820, que incorporou a vila de Lages para Santa

Catarina.

Lembrou que, pelo ato de demarcação de maio de 1871, foi confirmado o rio

Saí Guaçu como limite, pelas Câmaras de Guaratuba e São Francisco. Questionou o

fato de que se a Província do Paraná criou a barreira fiscal em 1854, por que ela só

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foi instalada na Encruzilhada em 1868, três anos depois que o governo imperial

mandou respeitar o Uti Possi de tis através do aviso de 21 de outubro de 1865.

O Presidente da Província de Santa Catarina, Bandeira de Mello não se

mostrou intimidado com as ameaças de guerra do Paraná e declarou que se fosse

necessário poderia mover uma luta de honra entre ambos.

Se a Província do Paraná sente-se agravada com o ‘uti possidetis’ deverá recorrer ao poder competente, porém, nunca usar dos meios ultimamente empregados que tendem a acoroçoar os conflitos e a irritar os ânimos dos habitantes dos territórios limítrofes. Não são e nem era preciso que Vossa Excelência dissesse que Santa Catarina e o Paraná são dois Estados soberanos que tenham que recear ataques a sua integridade territorial, de modo a mover-se uma luta de honra entre ambos. (idem, 1992, p. 22).

O Presidente catarinense refere-se aos impostos que foram criados por lei do

Paraná, que ofendem os direitos e interesses dos habitantes do Município de

Joinville, ao qual pertence o núcleo colonial de São Bento. Classifica como de

vexatórios os impostos cobrados no registro fiscal de Encruzilhada. Indignado o

governante catarinense reclama dos preços dos impostos cobrados e pede que

sejam respeitadas as leis do país:

Imposto de R$ 21$000 por rês morta para consumo: R$ 3$000 por cabeça de gado exportado; taxa itinerária de R$ 400; por animal carregado R$ 200. sobre os produtos da lavoura e industria, 3% sobre o valor dos manufaturados e 8% sobre os não manufaturados. (idem, 1992, p. 23)

A erva-mate cancheada, que era a matéria-prima para os engenhos de soque

de Joinville, pagava um imposto bastante elevado para o Paraná, na ordem de 8%.

O Presidente do Paraná cobrou informações do Inspetor da Tesouraria sobre

os dados do ofício do chefe de Governo Catarinense. O Inspetor alegou que a

reclamação do governo catarinense é uma simples reprodução das anteriores. O

que seria necessário era discriminar os territórios das duas províncias. Lembrou que

quem primeiro ocupou de fato a região ao sul do rio Negro foram os paranaenses,

quando a região ainda era a 5ª. Comarca de São Paulo, foi criada, pela Lei 17 de 28

de fevereiro de 1838, a freguesia de Rio Negro e o povoado de São Lourenço,

portanto ocupando-se o norte e o sul do rio Negro. Enquanto a questão de limite

estiver indefinida, cabe aos governos de ambas as Províncias zelar pela paz e a

manutenção da ordem pública.

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O Presidente do Paraná Lamenha Lins justificou ao governante de Santa

Catarina, que a cobrança de impostos, cujos valores foram contestados, estava de

acordo com a lei paranaense e que toda a região ao Sul do Rio Negro era território

do Paraná, enquanto o governo Imperial não discriminasse a fronteira entre as duas

províncias. O Governador paranaense assim se posicionou:

Enquanto a sua decisão não for proferida estamos seguros de que o Governo de Santa Catarina com o critério e a devida solicitude pela manutenção da ordem pública, providenciará para que cessem quaisquer provocações, evitando-se conflitos com nossas autoridade e os nossos funcionários já constituídos. É este o único alvitre a ser tomado. (idem, 1992, p. 27)

O Presidente de Santa Catarina, Bandeira de Mello, ciente de que as

autoridades paranaenses estavam tentando ganhar tempo, através de ofício de 12

de maio de 1876, invocou novamente que cessasse a cobrança de impostos e

lembrou que Colônia Dona Francisca, estabeleceu um núcleo às margens do Rio

São Bento, em terrenos comprados do governo imperial, mas o Paraná estava

criando problemas para a prosperidade da nova colônia.

Presidente da Província de Santa Catarina, João Capistrano Bandeira de

Mello Filho, invocou novamente a atenção do Presidente da Província do Paraná,

Adolpho Lamenha Lins,

[…] para tão momentoso assunto a fim de prevenir conflitos que podem resultar do sistema adotado por essa Província que pretende por semelhante forma constituir direito de posse a terrenos que lhe não pertence, vou ainda mais uma vez rogar a Vossa Excelência a expedições das necessárias ordens às autoridades dessa Província para que cessem semelhantes abusos”. (idem, 1992, p. 29 )

Diante da posição tomada pelo governante catarinense, o chefe do executivo

do Paraná solicitou auxílio ao poder judiciário para preparar um relatório sobre a real

situação, pois estava havendo contradições nas informações. As remetidas pelos

funcionários da arrecadação de impostos não coincidiam com as enviadas pelo

governo catarinense. Em comissão, o Juiz de Direito da Comarca de Curitiba,

Agostinho Ermelino de Leão, recolheu as informações ao sul do rio Negro, e de

posse dos dados, elaborou um importante relatório que foi entregue ao Presidente

da Província, através de ofício de 8 de julho de 1876.

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103

As informações colhidas põem patente o plano que há de apossar-se a Província de Santa Catarina de uma parte importante do território desta Província, sendo hoje eficazmente ajudada por colonos estabelecidos na Colônia de São Bento e por estrangeiros que ali dirigem o serviço da viação por conta do governo (idem, 1992, p. 30).

O Juiz deixou claro, primeiro, que Santa Catarina tinha plano para tomar

posse de território pretendido pelo Paraná. Em segundo lugar, deixou claro que

para conseguir atingir seus objetivos, Santa Catarina estava usando os colonos de

São Bento e os empregados da estrada Dona Francisca. Era a questão de limites

se agravando e Santa Catarina estava se preparando para cravar uma cunha nas

pretensões territoriais do Paraná.

O Juiz também mencionou que o engenheiro da estrada, mandou construir

um desvio passando longe do posto fiscal de Encruzilhada. Com isso praticamente

inutilizou o posto de cobrança e que o encarregado das obras da construção da

estrada, Guilherme Englk, sempre que podia reunia todos os trabalhadores para

fazer uma demonstração de força. No final de maio do ano de 1876, reuniu um

grupo de 150 pessoas, entre trabalhadores da estrada e colonos imigrantes, cercou

a agência fiscal e ordenou ao agente da Encruzilhada segundo Medeiros;

Marchiorato (1992, p. 32): “que era preciso fazer retirar as duas placas colocadas no

desvio, deixando o povo passar livremente sem pagamento de imposto algum.”

O Juiz informou que a Colônia São Bento, localizada dentro da Província do

Paraná, fora elevada por Santa Catarina à categoria de Freguesia, tendo por divisa o

rio Negro, onde ele encontrou autoridades nomeadas pelo governo de Santa

Catarina. Havia inspetores de quarteirão que obedeciam às autoridades do Paraná e

outros que só atendiam às autoridades de São Francisco. Na opinião do Juiz, a

colônia São Bento estava em desordem. Santa Catarina aliciava o povo com

promessas inauditas que o Paraná nunca poderia ofertar. Agostinho Ermelino de

Leão, segundo Medeiros; Marchirato (1992, p. 33), ficou indignado em saber que

“para mais confundir a questão de limites, na Comarca de São Francisco,

ultimamente qualificaram jurados, habitantes desta Comarca e da Comarca da Lapa

com o fim único de ter argumento em seu favor.”

Se as autoridades constituídas já estavam confusas com a indefinição dos

limites territoriais entre as duas Províncias, imagine a situação dos colonos que

compraram terras mas, não puderam receber as escrituras.

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A questão de limites deixou a população ao sul do rio Negro em situação de

revolta e os conflitos previstos nos ofícios das autoridades de fato ocorreram. O

Inspetor da Tesouraria da Província do Paraná, Joaquim de Almeida Faria Sobrinho

comunicou em data de 12 de julho de 1876, ao Presidente Adolpho Lamenha Lins,

conforme Medeiros; Marchiorato (1992, p. 34): que “o agente fiscal (de

Encruzilhada), de nossa Província, no mencionado registro tem sido vítima de

inqualificáveis violências, movidas pelas próprias autoridades da Província de Santa

Catarina”.

Para comprovar as denúncias, o Inspetor mandou o primeiro escriturário para

o registro de Encruzilhada para detalhar as ocorrências. Segundo suas informações,

os fatos foram todos originados por pessoas estrangeiras, ocupadas no serviço da

estrada que estava sendo construída pela Província de Santa Catarina, para dar

acesso à colônia São Bento. Para o escriturário Jacintho Manoel da Cunha, citado

por Medeiros; Marchiorato (1992, p. 35) “Essa colônia acha-se situada em terreno

pertencente a esta Província, pois que dela ao cimo da Serra do Mar, limites

provisórios que dividem esta Província com a de Santa Catarina, ainda se poderá

medir um espaço superior a três léguas”.

Para o representante do governo do Paraná, a divisa territorial entre Paraná e

Santa Catarina era a Serra do Mar e, nesse caso, o posto fiscal e a Colônia São

Bento estavam de forma incontestável em território paranaense.

Jacintho Manoel da Cunha, também denunciou que os trabalhadores da

estrada vinham forçar a passagem de tropeiros colocados à sua proteção, sem

pagar os devidos impostos. Denunciou que o próprio Juiz de Direito de São

Francisco em pessoa veio forçar o registro de Encruzilhada a dar passagem livre, a

tropeiros que se negavam a pagar imposto, obrigando o funcionário a assinar guia

de passagem livre, a diversos tropeiros. Segundo esse escriturário, citado por

Medeiros; Marchiorato, (1992, p. 36), no dia 28 de junho último “foi o registro forçado

por um grupo de nacionais e um muito maior número de estrangeiros, superior a

cem pessoas, a dar passagem livre a tropeiro que se furtava ao pagamento do

respectivo imposto”.

Informou também que o fazendeiro paranaense Francisco Teixeira de Freitas,

que era proprietário de uma fazenda localizada a leste da Colônia São Bento,

aceitou ser nomeado subdelegado pelas autoridades de Santa Catarina.

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105

Concluindo o seu relatório, reafirmou que São Bento estava dentro da

Província do Paraná. Os colonos estrangeiros e nacionais, têm desrespeitado as

nossas leis fiscais, chegando o seu arrojo ao ponto de dar viva a Santa Catarina e

morra o Paraná”.

A casa do registro de Encruzilhada estava localizada nas proximidades de

Campo Alegre, no trajeto original da estrada Dona Francisca, mas quando o Paraná

autorizou a cobrança de impostos, o engenheiro desviou o traçado da estrada. A

falta de conservação desse desvio chamou a atenção do escriturário. Ele reclamou

das condições precárias da estrada que dava acesso à casa de registro, contígua à

casa do finado Brigadeiro Franco (idem, 1992, p. 38).

Essa informação é importante, pois a estrada Dona Francisca estava cortando

as terras do finado Brigadeiro Manoel de Oliveira Franco, que foi um dos maiores

empresários e políticos do Paraná. Nesse local, seu filho montou, mais tarde, um

grande engenho de erva-mate.

O funcionário da tesouraria da Província do Paraná lamentou que o posto

fiscal não estava mais sendo utilizado por falta de mais funcionários para cobrança

de imposto e de praças para coagir os viandantes a pagarem. Segundo ele o posto

recebia apenas de quem pagava espontaneamente e os que se recusavam a pagar,

o funcionário apenas tomava o nome dos infratores. Ou seja, o posto não cumpria

mais a sua finalidade. A ação dos nacionais e dos imigrantes residentes ao sul do

Rio Negro contra o posto fiscal de Encruzilhada deram resultado positivo, o que

obrigou o governo do Paraná a desativá-lo.

O Presidente da Província solicitou, e a Tesouraria Provincial do Paraná,

através do Inspetor Francisco Alves Guimarães, fez novo histórico sobre situação de

suas pretensas áreas ao sul do vale do Rio Negro. Sua informação foi citada por

Medeiros; Marchiorato (1992, p. 49): “A estrada geral em construção que partindo do

Termo de Joinville, na Província de Santa Catarina, atravessa pelos Municípios de

São José dos Pinhais e do Rio Negro.”

Para o Inspetor de rendas, a Estrada Dona Francisca atravessava o Município

de São José dos Pinhais, (que corresponde hoje ao atual Município de Campo

Alegre) e também o Município de Rio Negro, no trecho (que corresponde ao atual

Município de São Bento e áreas para oeste, até o rio Preto).

O inspetor informou, também, que a estrada foi desviada para não passar

pelo posto fiscal de Encruzilhada, ficando esta inutilizada. Lembra que pela Lei 466,

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de 17 de abril de 1876, a Tesouraria do Paraná foi autorizada a mudar a estação de

lugar, mas que até agora nada fora feito.

Disto resulta, além do prejuízo de uma porção avultada da nossa renda, o desvio do comércio desta Província, o que já motiva sérios reclamos por parte dos comerciantes do nosso principal ramo de exportação a erva-mate, cujos beneficiadores não podem concorrer com os de Santa Catarina que obtém esse produto sem o ônus de qualquer imposto, quando os desta suportam, além das taxas do pedágio a de 40% do dízimo e as contribuições municipais. (idem, 1992, p. 50)

O inspetor da Tesouraria do Paraná foi bem realista quanto aos prejuízos que

estavam sofrendo os produtores de erva-mate do Paraná. É importante lembrar que

em 1877, foi inaugurado um engenho de erva-mate em Joinville, utilizando a

matéria-prima do vale do rio Negro, fazendo concorrência direta aos produtores do

Paraná. Para diminuir os prejuízos, o Inspetor pede que seja construída uma nova

barreira em outro local. O Governo do Paraná autorizou a construção uma nova

barreira fiscal, mais próxima à Serra do Mar, no local denominado Rancho do

Buraco. O Paraná deslocou para o local uma força policial de vinte praças,

acompanhada de um coletor de rendas, para estabelecer a barreira. Ao chegar ao

local, os policiais tomaram as armas dos trabalhadores da estrada Dona Francisca,

que necessitavam delas para sua defesa, frente aos índios e feras.

O Presidente da Província de Santa Catarina, ao receber o telegrama de

Joinville, informando da situação, mandou com urgência um telegrama ao Presidente

da Província do Paraná, pedindo a suspensão dos trabalhos. O governante

paranaense ordenou a suspensão imediata da construção da barreira e a retirada do

local, do funcionário da Fazenda e os policiais.

O Coletor, após retornar a Curitiba, enviou um ofício ao Inspetor do Tesouro

Provincial do Paraná, no qual relatou que estava cumprindo sua missão, quando

chegou o subdelegado de São Bento, informando que grupos de pessoas estavam

dispostos a interceptar a arrecadação, repelir os empregados e destruir o

estabelecimento. Estava no aguardo de instruções superiores para iniciar a

arrecadação, quando recebeu, por um mensageiro, a Portaria determinando que

sustasse qualquer trabalho, o que foi feito de imediato.

O seu depoimento é esclarecedor sobre o que do fato estava ocorrendo, e o

motivo da insistência do Paraná em levantar a barreira fiscal de Rancho do Buraco,

no alto da Serra do Mar.

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Antes de concluir esta minha sucinta, porém fiel exposição, devo em abono da verdade, declarar que para melhor avaliar-se o enorme prejuízo na arrecadação das rendas da nossa Província com a extinção daquela barreira, basta vermos que no ponto escolhido para o seu estabelecimento, passam diariamente tropas em número muito considerável sem falar no trajeto de carroças em não pequena escala. (idem, 1992, p. 55)

Esse fato repercutiu na Assembléia Legislativa de Santa Catarina, onde o

deputado Pedro José de Souza Lobo assim se referiu ao funcionário do Paraná que

foi enviado para montar o posto fiscal no local chamado de Rancho do Buraco, no

alto da Serra, as margens da Estrada Dona Francisca

Este empregado, com soldados e capangas apossaram-se do terreno de Sua Alteza e Senhora Dona Francisca que escolheram para barreira e deliberaram, depois de ter descido até 32 quilômetros, criar a barreira do Rancho do Buraco e se não fosse a atitude que tomaram as autoridades de Joinville, teríamos de lamentar o derramamento de sangue, porque o povo não está mais disposto a levar por meios pacíficos as provocações do Paraná. (FICKER, 1973, p. 165)

A Estrada Dona Francisca estava sendo um corredor de erva-mate e também

de tropas que desciam para o litoral abastecendo o mercado catarinense e

possivelmente também o paranaense, sem cruzar pelas barreiras fiscais instaladas

no planalto.

6.2 O PARANÁ INSTALA BARREIRA ENTRE SÃO BENTO E RIO NEGRO

Pela ineficiência do posto de Encruzilhada, a Tesouraria Provincial do Paraná

resolveu criar a agência do registro de Rio Negro no lugar denominado Rio Preto e

para isso, solicitou autorização ao Presidente da Província. O agente fiscal de Rio

Negro informou que diversas tropas de gado vindas das Províncias de Santa

Catarina e do Rio Grande do Sul e mesmo da margem esquerda desta vila (ou seja

o sul do rio Negro), que conduzem gado para a Colônia Dona Francisca e para o

litoral do Paraná, desviam este posto de Rio Negro. Passam pela estrada Dona

Francisca sem pagar imposto algum, pois desviam também o posto de Encruzilhada.

Em vista dessa situação, o administrador do Posto de Rio Negro, Mathias Taborda

Ribas assim se posicionou:

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Tomo a liberdade de lembrar a Vossa Senhoria que é de grande necessidade a criação de uma agência, estacionada no lugar denominado Rio Preto, neste município, único lugar que me parece prestar-se com vantagem; ficando assim acutelados os prejuízos que a Província anualmente sofre. (MEDEIROS; MARCHIORATO,1992, p. 41)

Da região de Rio Negro pelo caminho aberto para a construção da Estrada

Dona Francisca, a erva-mate estava sendo desviada para o porto de São Francisco.

Para atender aos reclamos dos empresários do mate do Paraná que estavam sendo

prejudicados com a concorrência catarinense, em março de 1877 o Governador do

Paraná, Adolpho Lamenha Lins, mandou criar uma barreira fiscal no local

denominado Rio Preto, às margens do rio que hoje faz a divisa entre os municípios

de Mafra e Rio Negrinho. De imediato o governo de Santa Catarina protestou.

Para justificar a criação da barreira, o administrador de Rio Negro fez as

seguintes ponderações às autoridades daquela Província: 1. As autoridades

catarinenses inutilizaram a barreira da Encruzilhada, cujos rendimentos exauriram-se

inteiramente; 2. Hoje ameaçam por fatos a inauguração da barreira do Rio Preto; 3.

Sem as duas barreiras, o prejuízo será de em torno de 12 contos de réis anuais; 4.

Transfere-se o comércio dos municípios de Rio Negro e de Lapa para o litoral de

Santa Catarina, desviando do Paraná.

O Tesoureiro Provincial solicitou ao novo Presidente da Província do Paraná,

Dr. Rodrigo Octavio de Oliveira Menezes:

[...] providências perante o governo central ou junto da Presidência de Santa Catarina para que seja respeitada o ‘uti possidetis’ e o direito de percepção de impostos que desde muitos anos foram cobrados sem a mínima contestação. (MEDEIROS; MARCHIORATO,1992, p. 43)

O administrador do registro de Rio Negro, para poder cumprir com os termos

da portaria de criação do registro, solicitou a vinda de um destacamento de pelo

menos dez policiais, chamados na época de praças, para enfrentar os índios que

continuam a trilhar as margens do rio Preto e também para obstar as ameaças que

fazem as autoridades de Joinville, auxiliadas pelas de São Bento, de expulsarem por

meio da força o empregado encarregado da arrecadação. O Administrador informou

ao Inspetor da Tesouraria Provincial do Paraná que:

Há um mês mais ou menos, aquem do rio Preto, duas léguas desta vila, veio o subdelegado da Colônia São Bento acompanhado de soldados e oficial de justiça, proceder o corpo de delito no desmancho da construção

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de uma ponte sobre o Rio Negrinho, chamando inspetores de quarteirão e mais pessoas deste distrito sem previa comunicação às autoridades desta comarca. Estou bem informado de que o Juiz Municipal da dita comarca de São Francisco, a todo o transe pretende expelir o empregado que por esta Província vá fazer a arrecadação de direitos em qualquer ponto da estrada que liga aquela Colônia com esta vila. (MEDEIROS; MACHIORATO 1992, p. 44)

Diante da negativa do governo do Paraná de fechar o posto fiscal de Rio

Preto, o governo de Santa Catarina resolveu apelar ao Ministério dos Negócios da

Agricultura e Obras Públicas, para que fosse nomeado um juiz competente para

medir os terrenos contestados. O Ministério respondeu que deveria ser nomeado em

comum acordo, entre Santa Catarina e Paraná, para “evitar os males conseqüentes

da propriedade duvidosa”, um engenheiro investido das funções de Juiz Comissário.

O Juiz nomeado, depois de examinar e julgar os respectivos autos de medição, os

enviaria à Presidência que fosse designada pelo Ministério, observando-se os limites

marcados no Decreto n. 3378, de 16 de janeiro de 1865.

Acontece que, pelos limites provisórios de 1865, o Paraná era dono de todo o

Planalto catarinense, com exceção de Lages e áreas de sua jurisdição. O sul do vale

do rio Negro continuava Uti Possi de tis do Paraná. O Presidente da Província de

Santa Catarina contestou e o ministério, após novo estudo, mudou a linha divisória e

comunicou aos governos provinciais.

O ministério da Agricultura, em ofício de 14 de janeiro de 1879 ao novo

Presidente da Província de Santa Catarina, informou que, antes de iniciar as

medições na zona litigiosa entre as duas Províncias, se declare que:

a linha divisória para os efeitos daquele aviso, não é o rio Marombas como resolveu o decreto n. 3378 de 16 de janeiro de 1865, a que faz alusão aquele ato do governo, mas os rios do Peixe e Goio-En, cujo território nunca foi contestado e em cuja posse tem constantemente estado essa Província”. (MEDEIROS; MARCHIORATO,1992, p. 48)

E finaliza afirmando que quem deve resolver as questões de limites

pendentes entre as duas Províncias é o poder legislativo. Esse ministério apresenta

apenas uma proposta provisória com a intenção de legalizar as medições realizadas

pelos juízes comissários.

Ao fixar a linha divisória pelo rio do Peixe, o Ministério da Agricultura

praticamente anulou o Uti Possi de tis do Paraná sobre todo o vale do rio Negro e

parte do vale do Iguaçu, mas, como o Ministério não tinha poder decisório, poder

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esse que cabia ao legislativo provincial, quem não aceitou a nova situação foi a

Província do Paraná, que voltou a reclamar seus direitos.

6.3 PARANAENSES FECHAM RUAS E PRENDEM POLICIAIS EM SÃO BENTO

Inconformados com o fechamento das barreiras fiscais de Encruzilhada e

Rancho do Buraco, no trajeto de São Bento ao alto da Serra do Mar, autoridades

paranaense tomam outras medidas que acirram os ânimos na região de São Bento.

Em outubro de 1879, o governante catarinense, Dr. Antonio de Almeida

Oliveira, recebeu da secretaria de Polícia do Estado a informação de que, em São

Bento, um caminho público foi obstruído por habitantes do Paraná. O Presidente

cobrou informações do governante do Paraná, Dr. Manoel Pinto de Souza Dantas

Filho sobre o ocorrido. Este solicitou esclarecimentos ao Secretário de Polícia da sua

Província. O Secretário argüiu o subdelegado de Rio Negro e este respondeu que o

caminho fechado não se encontrava em Santa Catarina, mas em São Bento,

localizado dentro do território do Paraná. O caminho fora fechado porque tropeiros

catarinenses estavam cruzando as roças dos colonos paranaenses.

O subdelegado de São Bento pediu autorização ao delegado de Polícia de

Joinville para abrir o caminho à força. O delegado, em resposta, afirmou que a

Polícia não era autoridade competente para decidir se o caminho ao qual se referia o

seu ofício era de serventia pública ou não. Essa autoridade era o juiz municipal. Era

ele quem ia determinar o que a polícia deve fazer. Depois de troca de

correspondência entre as autoridades das duas províncias, o caminho, localizado no

interior do atual Município de Campo Alegre, foi reaberto

Em 13 de março de 1880, o novo governante do Paraná, Dr. Manoel Pinto de

Souza Dantas Filho, necessitando se inteirar das questões de limites, solicitou

informações ao inspetor da Fazenda da Província do Paraná, o qual se referiu

Medeiros; Marchiorato: “rogo a Vossa Excelência que se digne de mandar informe,

a vista do que constar na Secretaria dessa Presidência sobre a questão de limites

com Santa Catarina”. (1992, p. 65)

No mês de maio do mesmo ano, chegou notícia que revoltou os são-

bentenses. Autoridades do Paraná prenderam o oficial de justiça e dois soldados

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policiais de São Bento, levando-os de São Lourenço onde exerciam seus ofícios,

para a prisão no Paraná. Depois de contestações das autoridades catarinenses e

meses de prisão, eles foram liberados.

6.4 INVASÕES E NOVAS BARREIRAS FISCAIS

No início do ano de 1881, o colono paranaense Bento dos Santos Martins

invadiu terras dos colonos de São Bento. O diretor da Colônia Dona Francisca, de

Joinville, mandou ofício ao Presidente da Província de Santa Catarina, reclamando

medidas contra as autoridades de São Bento que protegeram, abertamente, o roubo

de erva-mate em terrenos de colonos estabelecidos. A economia ervateira estava

em franca expansão, mas era liderada por empresários nacionais.

[...] Joinville, em 1881, encontrava-se a caminho da formação de uma classe empresarial, com a industrialização da erva-mate. Porém a indústria, a colheita, o transporte e a exportação deste ramo de negócio encontrava-se, quase exclusivamente, em mão de brasileiros, que também dominavam a política. (FICKER, 1973, p.202)

Com a estrada Dona Francisca avançando em direção a Rio Negro, a erva-

mate que abastecia os engenhos de Joinville estava vindo cada vez mais do Oeste

da Serra do Mar e isso incomodou os empresários do mate do Paraná. Atendendo

seus reclames, o governo do Paraná, no mês de junho de 1882, instalou em São

Lourenço (na parte Oeste do atual Município de Mafra) mais um posto fiscal.

Os comerciantes não ainda não estavam habituados com o posto fiscal de

São Lourenço, quando notícias advindas do Paraná informavam que o governo

daquela Província, criou um novo porto fiscal no Ribeirão da Lança. (do lado da

atual cidade de Mafra). Para garantir a integridade física e profissional do cobrador

de impostos desse posto, foram enviados 15 soldados. Em São Bento a população

se revolta e o cronista denunciou:

Sob a defesa das baionetas os empregados do posto fiscal cobrarão de hora em diante 3$000 de cada carregamento de erva-mate que passar o ribeirão. A povoação de São Bento ameaça expulsar os paranaenses a força com o fez na Encruzilhada. (AMMON, 1923, p. 38).

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Na Corte do Rio de Janeiro, perante a Assembléia, o deputado catarinense

Alfredo de Escragnolle Taunay criticou as medidas tomadas pelo Paraná,

precipitadas até, porque estavam sendo realizados estudos por uma comissão de

engenheiros, encarregada do levantamento de toda a zona contestada. Entre as

medidas criticadas pelo parlamentar, pode-se destacar: 1. Criação de uma agência

fiscal em Ribeirão da Lança, - zona litigiosa; 2. Mudança do registro fiscal de

Encruzilhada para o Rancho dos Buracos, em terreno de Santa Catarina, nunca

contestado pelo Paraná. 3. Elevação de São Lourenço – zona litigiosa - em distrito

eleitoral; 4. Autorização à Presidência, a fim de criar, em ambas as margens do rio

Negro, agências para arrecadação de impostos. (FICKER, 1973, p. 226)

Enquanto Taunay defendia os interesses de Santa Catarina na Corte, no Rio

de Janeiro, os empresários de Joinville, em 31 de janeiro de 1883, publicaram um

artigo nos jornais, do qual foram destacados alguns parágrafos. Ficker (1973, p 227),

“A lei do Paraná – a atual Assembléia do Paraná criando o imposto de 3$000 réis

por cargueiro de erva-mate, que daquela província vier para esta, tributou tal produto

com um absurdo imposto, maior de 50 por cento, sobre o seu valor”.

As críticas dos empresários foram contundentes contra os deputados

paranaenses que não taxaram a erva em rama exportada pelo Paraná para o rio da

Prata e taxaram por um valor maior a erva catarinense. Denunciaram que a taxação

sobre a erva-mate paranaense era menor e fizeram uma acusação que esclarece o

que estava por trás da questão territorial, ou seja, o que os paranaenses queriam

não era terra e nem madeira, queriam era a erva-mate catarinense.

Esses legisladores, que são aqueles próprios negociantes, essencialmente suspeitos e pessoalmente interessados em que do Paraná não venha erva alguma para esta província, afim de que possam comprar a maior porção possível e a preço que a abundância estabelecer, entenderão que só conseguirão isso, mediante o imposto de 3$000 réis por cargueiro. (FICKER, 1973, p. 228)

A questão dos impostos intrigava ainda mais os empresários catarinenses, os

quais lembram que um cargueiro de erva produz quatro arrobas. Um cargueiro

equivale a 60 quilos de erva beneficiada. Essas arrobas pagam ao Paraná 4% de

exportação ou 396 réis segundo a pauta. Para não pagar esse imposto, os

produtores do sul do vale do rio Negro teriam que levar a sua erva para Curitiba,

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numa viagem que durava 10 dias, quando poderiam vendê-la em São Bento e

voltando no mesmo dia para casa.

Isso teve duas conseqüências – o porto de São Francisco reduziu a

exportação; a região de Mafra a Canoinhas, Itaiópolis, Papanduva, Major Vieira

precisavam mandar sua erva-mate para Curitiba ou então pagavam pesados tributos

ao Paraná para cruzar pelas barreiras fiscais.

6.5 SANTA CATARINA ABRE UM CAMINHO PARALELO A ESTRADA DONA FRANCISCA

Por sugestão dos empresários, o Governo de Santa Catarina construiu um

desvio, caminho secundário de acesso aos ervais, deixando inutilizadas as barreiras

fiscais do Paraná. Em junho, o Presidente da Província de Santa Catarina, Carlos

de Faria Souto, autorizou a construção de um caminho de cargueiros com início na

serra de São Miguel, distrito de São Bento, para encontrar o caminho que dos

Curitibanos se dirige ao Corisco (Caminho das Tropas), ligando a Estrada Dona

Francisca aos ervais da margem esquerda do rio Negro.

Com essa medida o governo de Santa Catarina estava buscando uma

alternativa para fugir da fiscalização intensa do Paraná. O caminho aberto ligando

São Bento a Corisco (atual Santa Cecília), integrou ao sistema produtivo do mate o

interior dos atuais municípios de Rio Negrinho, Itaiópolis (Moema) e Santa Cecília

onde são-bentenses foram residir.

Nesse mesmo ano, o Presidente da Província de Santa Catarina, realizou

mais um ato polêmico de provocação ao Paraná. São Lourenço em 5 de maio de

1880, foi elevado à categoria de freguesia, denominação oficial de época para

povoação, passava agora a ser também sede de um novo distrito policial. Foram

nomeados os senhores Laurindo Joaquim Bello como subdelegado, José Elias

Moreira e João Sauer Sobrinho como suplentes. É importante lembrar que, no ano

anterior, o Paraná tinha elevado São Lourenço à categoria de distrito policial. A

confusão estava formada, polícias de duas Províncias diferentes atuando na mesma

localidade.

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114

Para definir a jurisdição, o Ministério da Agricultura nomeou dois engenheiros

com duas turmas de trabalhadores, que percorreram a região contestada para

discriminar as terras e apresentar um relatório. Uma turma estava a cargo do

engenheiro Major Alfredo Ernesto Jacques Ouriques e a outra do engenheiro Diogo

Rodrigues de Vasconcelos, que trabalhou de Rio Negro até a Serra Geral. A

comissão apresentou, em julho de 1883, um relatório ao Presidente do Paraná, Dr.

Carlos de Carvalho, do trecho por eles percorrido. A comissão informou que nada

podia opinar sobre a questão de limites, apenas se comprometeu em apresentar um

relatório técnico. Criticou a forma como a questão de limites estava sendo tratada

pelas autoridades políticas das duas Províncias.

No terreno da chicana interminável e muito explorado onde, infelizmente, até hoje a tem mantido a improfícua discussão de velhos alvarás e adaptação imprópria do “uti possidetis”, nunca se poderá chegar a uma solução definitiva. Dessa discussão só pode nascer e só tem nascido a exacerbação dos ânimos. O passado o tem mostrado. [...] urge transferir a discussão do campo das controvérsias para o terreno firme e positivo da engenharia. (FICKER, 1973, p. 232).

Do extenso relatório entregue ao governante paranaense, foram sintetizadas

idéias e retirados tópicos que retratam a confusão territorial reinante ao sul do vale

do rio Negro, do Caminho das Tropas até a Serra do Mar.

O ponto de partida do trabalho do engenheiro e sua turma de trabalhadores,

foi a igreja em construção na vila de Rio Negro. Foram formadas duas turmas de

trabalhadores, uma que seguiu pelas terras banhadas pelo rio Negro até as suas

vertente e uma outra que seguiu pela estrada de São Bento e a confluência desses

rios. Relacionou os moradores até o rio Preto e nas terras banhadas por esse rio

encontrou o caos, por existirem terras pertencentes ao Conde D’Eu, com linhas

sobre terras de Serafim e João Cândido e sobre as terras do Brigadeiro Franco,

portanto, terras que pertenciam a três donos. Relacionou todos os rios e riachos

desde Rio Negro até São Bento e os habitantes das margens de cada uma.

Enquanto o Paraná acompanhava o trabalho de discriminação das terras

pelos engenheiros do Ministério da Agricultura, o Governo de Santa Catarina, pela

Lei Provincial n. 1030, de 21 de maio de 1883, transformou a Freguesia de São

Bento em vila, dando-lhe a emancipação política, desmembrando das terras de

Joinville, com os mesmos limites anteriores, de São Miguel até o rio Preto.

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O novo Presidente da Província de Santa Catarina, José Lustosa da Cunha

Paranaguá, em outubro de 1884, fez uma visita oficial a São Bento. Fez questão de

ir pessoalmente visitar o posto fiscal de Ribeirão da Lança, onde constatou a

existência desse posto do Paraná e se inteirou da inconveniência da cobrança de

um imposto interprovincial, em terras contestadas, na margem esquerda do rio

Negro. Essa visita foi importante para o povo de São Bento, pois veio confirmar a

existência de um posto fiscal que estava reduzindo as suas atividades econômicas.

Segundo Ficker (1973, p. 246), “Como se vê, foi de boa vontade a viagem de

inspeção do Presidente da Província e a vistoria do local do posto fiscal, que tanto

tinha contribuído para agitar a opinião pública, na célebre questão dos limites”.

No ano de 1885, foi construída uma estrada ligando a vila de São Bento ao

povoado de Fragosos. Esta estrada parte do km 83 da estrada Dona Francisca e vai

terminar no povoado, às margens do rio Negro, onde residiam importantes criadores

de gado e lavradores que vinham comerciar com o povo de São Bento. O Caminho

de Fragosos para Curitiba já existia e com esta estrada, São Bento estava ligado

também a Curitiba, mas logo o Paraná iria instalar ali um posto fiscal.

O ano de 1887 foi politicamente agitado. O partido Republicano e o

movimento abolicionista agitam a região. Em São Bento, criou-se o Partido

Republicano e que na eleição de agosto daquele ano, elegeu todos os vereadores

desse partido. Ficker (1973, p. 279) afirma que “São Bento orgulhou-se de ser a

primeira Câmara Municipal puramente Republicana no Brasil”. Isso mostra o espírito

de oposição dos são-bentenses, em relação à Monarquia, elegendo uma Câmara

Municipal Republicana, dois anos antes da Proclamação da República. Os são-

bentenses, também se integram na luta pela libertação dos escravos. Escravos de

fazendeiros do distrito de Campo Alegre, aos poucos, foram sendo libertados.

A Proclamação da República foi festejada em São Bento, já que possuía uma

câmara republicana em plena monarquia. Criou-se uma comissão de políticos para

cuidar da ordem pública e da administração do município. Conforme Ammon (1923,

p. 44), “Grandes festejos que duraram três dias e arrancaram entusiasmo enorme,

tiveram lugar nas colônias de São Bento e Campo Alegre, por ocasião da

Proclamação da República. Nessas acabaram-se os foguetes e as bebidas.”

O sucesso econômico era o comércio de erva-mate. Surgiram centros de

vendas em São Miguel, Papanduva (em Campo Alegre), Lageado, Jararaca,

Campestre, Rio Vermelho, todas elas localidades distantes do centro de São Bento.

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Mas o governo republicano do Paraná tinha outros interesses e também

começou a agir. Em junho, no caminho dos Fragosos, principal escoadouro da erva-

mate do sul do Paraná para a estrada Dona Francisca, foi criada uma barreira fiscal

para cobrar impostos. Os soldados do Paraná responsáveis por cuidar da ponte,

invadiram casas dos moradores da região e cometeram atos de pilhagem, roubos.

Em Joinville, os empresários do mate reuniram-se e mandaram ofícios de

protestos ao Governador Lauro Müller, exigindo uma solução para a questão do

Contestado. Segundo eles, citados por Ficker (1973, p. 289) “[...] quase toda a erva-

mate da vasta região entre Lapa, Rio Negro, Canoinhas, São Bento e Campo

Alegre, eram comercializados por firmas de Joinville”.

O novo dirigente do estado, Lauro Muller, veio a São Bento para se informar

pessoalmente das contínuas questões de limites com o Paraná.

Enquanto o governador se reuniu com o superintendente na Vila de São

Bento, os moradores da localidade de Fragosos se armaram para invadir o posto

fiscal, somente não havendo mortes porque as pessoas da barreira fugiram,

inclusive os soldados. O ataque a Fragosos repercutiu negativamente no governo do

Paraná.

6.6 O PARANÁ FECHA A FRONTEIRA AO NORTE DE SÃO BENTO

Em represália ou por coincidência, o Paraná reativou os antigos postos fiscais

e criou novos, no Ribeirão da Lança, na ponte de Fragosos, no lugarejo de Fragosos

de Cima, na ponte de Francisco Teixeira de Freitas, no caminho de Ambrósios e na

estrada Campestre, todos defendidos por policiais.

Com a instalação dessas novas barreiras fiscais, o Paraná trancou toda a

fronteira com Santa Catarina, na região de Campo Alegre e São Bento.

A situação se agravou, o que levou o governador do Paraná Américo Lobo a

armar fortemente todos os postos fiscais, enviando tropas para conter a “agressão

dos catarinenses”. A região ficou em pé de guerra. No Rio de Janeiro, políticos,

empresários e autoridades de Santa Catarina reuniram-se com o Marechal Deodoro

para tratar da situação. Conforme Ficker (1973, p. 290), “O chefe de policia do

Desterro dirigiu-se com sua comitiva a São Bento e visitou os postos fiscais. Em

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grandes manchetes, a imprensa, no país inteiro, comentava a guerra entre Paraná e

Santa Catarina”. A invasão ao posto fiscal de Fragosos também foi mencionada por

Ammon, que reproduziu informações dos jornais da época,

[...] temos agora, aqui em São Bento uma revolução, cujo fim talvez seja de uma importância incalculável, embora o princípio seja insignificante. O Paraná cinge-se com muralhas chinesas e procura criar um dique insuperável à viação com o Estado vizinho. Barreiras e mais barreiras [...] (AMMON, 1923, p. 47)

A atitude do Paraná revoltou não apenas os moradores do sul do rio Negro,

mas também os paranaenses que residiam ao norte do rio Negro que tinham em

São Bento o seu centro comercial. Além de não terem acesso a alimentos e

armarinhos, também não podiam vender a erva-mate.

O Governador do Paraná foi chamado ao Ministério do Interior, em 29 de

junho de 1890, para dar explicações de seus atos e exonerou-se do cargo. A paz,

pelo menos temporariamente, voltou à fronteira.

O novo governador do Paraná, Major Serzedello Correia, reuniu-se com o

Governador Lauro Muller e ficou acertada a extinção das barreiras. Segundo Ficker

(1973, p. 290), “Em princípios de setembro a imprensa anunciava com grande

alegria que as estações fiscais e os postos de alfândega na fronteira, foram

derrubados, voltando à normalidade o comércio entre os dois estados”.

No final de 1890 foi fundada em Joinville a Sociedade Industrial Catarinense,

empresa de erva-mate, largamente beneficiada por isenções de impostos e tributos

estaduais. Os principais acionistas, Ernesto Canac, Abdon Baptista e Procópio

Gomes de Oliveira, estadistas no comércio da erva-mate no norte catarinense,

influenciaram a queda do Governador do Paraná Américo Lobo, devido as suas

gestões enérgicas junto ao Ministério do Interior.

Com o fim das barreiras fiscais entre os dois estados o comércio se

intensificou e a paz voltou a reinar na região ao sul do rio Negro. Comerciantes de

São Bento e Rio Negro organizaram um encontro de confraternização e foram

recebidos em Lençol, pelos empresários do mate de São Bento, Agostinho Ribeiro

da Silva, Mario Lobo, João Filgueiras de Camargo e Brazilio Celestino da Silva, com

uma banda de música. Após o almoço os convidados foram acomodados nos hotéis

de Oxford e no dia seguinte foram ao centro de São Bento para assistir a uma peça

teatral. Sobre essas iniciativas dos comerciantes de São Bento, visando a iniciar

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negócios com o Estado vizinho, Ficker (1973, p 306), assim descreveu: “Sob as mais

gratas impressões, partiram os rio-negrenses no dia 17, deixando de si agradáveis

recordações aos habitantes de São Bento, que estiveram com eles em três dias de

verdadeiras festas”

É um período favorável à prosperidade econômica regional, com a

intensificação do comércio da erva-mate, dos produtos agrícolas e manufaturados.

Mas a paz não durou muito, pois logo a região foi sacudida pela Revolução

Federalista.

6.7 SÃO BENTO – CAPITAL DE SANTA CATARINA

A Revolução Federalista, no segundo semestre de 1893 atingiu a região de

São Bento. Em novembro desse ano, os revoltosos, partindo de Joinville subiram a

serra em direção a São Bento. Foi nomeado oficial comandante da Guarda Nacional

o Sr. João Filgueiras de Camargo e mais ou menos 120 homens vieram à sede

colonial para receberem armas e instruções. Do Paraná, o General de brigada

Francisco de Paula Argollo, comandante do 5º. Distrito Militar, chegou com uma forte

companhia em São Bento no dia 10 de novembro.

Em 11 de novembro de 1893, tendo em vista que Desterro, capital de Santa

Catarina, estava tomada pelos revolucionários federalistas, Argollo proclamou São

Bento capital provisória de Santa Catarina, assumindo o governo. Junto com ele se

encontravam Frederico Schmidt, major e administrador da munição; Lauro Müller,

major, deputado federal, que fazia a ligação entre a vanguarda e o Governo

Federal; Hercílio Luz, engenheiro técnico. A instalação do governo provisório em

São Bento foi assim descrito por Pauli (1976, p.175):

A instalação de um governo legal em território catarinense, com o respectivo governador, era o motivo da aparatosa concentração de autoridades republicanas deste Estado na expedição do General Argolo. São Bento, primeiro município do planalto norte catarinense e no caminho para o mar, foi escolhido para o objetivo de servir como Capital provisória desse novo Governo, oposto àquele do Tenente Machado, de Desterro.

No dia seguinte, ciente de que os revolucionários estavam próximos à entrada

da cidade, Argollo retirou-se, destruindo as pontes que encontrou pelo caminho. As

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119

autoridades nomeadas por ele retornaram junto e se refugiaram em Rio Negro,

marchando mais tarde para Lapa.

O general revolucionário federalista Piragibe, vindo de Joinville, entrou em

São Bento e a população teve que optar ou a favor ou contra os revolucionários. O

comandante da guarda nacional aderiu aos revoltosos. Segundo Ficker, (1973, p.

315) “O novo governo municipal Federalista, requisitou sem quaisquer formalidades

cavalos, gado, viaturas e muitas vezes os próprios proprietários eram obrigados a

prestar serviços como condutores”.

Os revoltosos retornaram para Campo Alegre e de lá se dirigiram para atacar

Tijucas, no Sul do Paraná. Após tomarem aquela localidade, os federalistas

realizaram o épico cerco da Lapa.

Os prejuízos na agricultura e na produção de erva-mate foram enormes. Mais

de 100 carroças tiveram que transportar a tropa e materiais para os revoltosos.

Durante mais de dois meses, os colonos ficaram sem carroças e sem os cavalos.

No cerco de Tijucas e no cerco da Lapa encontravam-se carroças de São Bento.

Segundo Ammon (1923, p. 55), “O prejuízo que São Bento teve, direta ou

indiretamente, foi calculado em Rs 500:000$000”.

Após a revolução federalista ter se extinguido e cada comunidade ter curado

as cicatrizes do conflito, houve um período de relativa tranqüilidade para o comércio

e a indústria na região ao sul do rio Negro.

6.8 PRISÃO DO VAPOR MINUANO E DESTRUIÇÃO DE PONTES: TENSÃO NA FRONTEIRA

Um fato que quase passou despercebido à população de São Bento foi a

prisão do vapor Minuano e dois barcos que eram rebocados, de propriedade do

empresário e industrial do mate de Joinville, Procópio Gomes de Oliveira. Por estar

navegando com bandeira de Santa Catarina, foi proibido de navegar pelo rio Negro e

Iguaçu, rios do Paraná. Como ele continuou navegando, o vapor Minuano e suas

lanchas foram apreendidas por força armada, liderada pelo Prefeito, Juiz e policiais

de Rio Negro.

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[…] a ‘Empresa de Navegação’, mantida pelo Sr. Procópio Gomes de Oliveira, de Joinville, com tráfego fluvial nos rios Negro e Iguaçu, entre os Estados de Santa Catarina e Paraná.Como não foi atendida a proibição, a intendência de Rio Negro, a mando e em nome do Governador do Paraná fez apreender com força armada o vaporzinho Minuano e as lanchas que faziam a navegação subvencionada pelo governo de Santa Catarina. (FICKER, 1973, p. 330)

Em 1896, depois de vários anos em que as barreiras fiscais no Paraná não

mais funcionavam, voltaram a funcionar. Conforme Ammon (1923, p. 64), “Consta

que a Câmara Municipal de Rio Negro tenciona organizar uma barreira de impostos

à margem esquerda do Rio Negro, a fim de poder usufruir os impostos da erva-mate

que passar”.

Em julho de 1896, São Bento foi surpreendido com a notícia de que a Câmara

Municipal de Rio Negro mandou destruir as pontes na estrada que ia a São

Lourenço, as quais foram construídas com dinheiro catarinense.

[...] informou ao Comandante da Força do Corpo de Segurança de Santa Catarina, que paranaenses de Rio Negro, destruíram e queimaram todas as pontes existentes na estrada de São Lourenço [...] Consta também que pretendem colocar barreiras fiscais no ribeirão da Lança e ou Rio Preto (FICKER, 1973, p. 329).

A destruição das pontes em São Lourenço impedia o livre comércio da erva-

mate e alimentos da região de Mafra, Três Barras, Canoinhas com o litoral

catarinense, deixou a população com os ânimos exaltados. Ficker (1973, p. 332)

assim relata o fato: “uma crescente onda de ódio, de agitação, de provocações

publicadas nos jornais e só faltava uma faísca para explodir a luta armada entre os

dois Estados”.

Telegramas de autoridades e empresários de Joinville foram distribuídos para

vários órgãos de imprensa, protestando energicamente contra a destruição das

pontes por parte do Paraná e responsabilizando o Governo daquele Estado pelos

conflitos e conseqüências que viessem a ocorrer. Como resultado imediato, o

Governador tomou as providências necessárias. Sobre o ocorrido, o cronista de São

Bento, Ammon (1923, p. 65) relata que: “O governador de Santa Catarina, Dr.

Hercílio Luz, mandou imediatamente, 50 soldados da polícia, sob o comando do

major Gastão Cotrim, a São Bento e São Lourenço, a fim de vigiar a reconstrução

das pontes”.

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O telegrama que os joinvilenses enviaram para a imprensa deu resultado.

Além de denunciar a invasão do Paraná em território catarinense, exigia liberdade

de trânsito e responsabilizava o governo do Paraná pelos conflitos e pelas vítimas

que houvesse. Assinaram o telegrama, conforme relata Ficker (1973, p. 330), “Sr,

Boehm, Mario Lobo, A Baptista, F. Bruestlein, Procópio Gomes de Oliveira, A

Baptista & Oscar, Companhia Industrial Catarinense, Antonio José Ribeiro e muitos

outros”.

Jornais publicavam que os povoadores das fronteiras, ameaçavam romper

uma guerra entre Paraná e Santa Catarina. A imprensa nacional até o norte,

ocupava-se com os acontecimentos ameaçadores no território da fronteira

catarinense.

Um jornal de Curitiba estampava em manchete, “Guerra entre Santa Catarina

e Paraná”. Nas proximidades de Rio Negro, apareceram bandos armados que

declararam que o território de São Bento até Rio Negro, era território pertencente a

Santa Catarina. Lapa e Rio Negro pediram socorro ao governador do Paraná, que

tomou providências imediatas e enviou reforço para a região. Segundo Ficker (1973,

332), “[...] em Rio Negro encontrava-se estacionada desde o dia 9 de agosto as

forças totais do Corpo Policial do Estado do Paraná, inclusive a Banda de Música do

batalhão”.

O cronista de São Bento também narra esse acontecimento, acrescentando

que o governador tudo queria fazer para conquistar o direito do Paraná.

Ontem, às duas horas da tarde, seguiu um comboio extraordinário de 100 soldados policiais com armamentos de campanha de Curitiba a Rio Negro. Na estação encontrou-se o governador e uma grande multidão. Todos demonstraram exasperação suprema. O governador declarou querer tudo para fazer com que o Paraná consiga o seu direito. De Palmas, Lapa, Rio Negro e Guarapuava, vieram telegramas onde o povo se oferecia para a defesa. (AMMON, 1923, p. 66)

O governador Hercílio Luz, visando evitar um confronto com o Paraná,

ordenou ao Major Cotrim a retirada da força policial de São Lourenço para São

Bento onde aguardou novas ordens. Assim que a força policial de Santa Catarina

retirou-se de São Lourenço, a ponte foi novamente destruída e incendiada por

ordem da Câmara de Rio Negro. O Major telegrafou ao Governador, que mandou

embarcar para São Bento um pelotão com 169 soldados. Com a chegada de um

contingente maior de soldados para reconstruir as pontes, o governador do Paraná

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mandou retirar seu corpo policial de Rio Negro, ficando apenas dez soldados. Com

essa atitude o governador paranaense garantiu a paz entre os dois Estados, mas

prejudicou-se politicamente, pois a população de Curitiba aguardava uma decisão

mais enérgica e ficou decepcionada.

Consta que entre os vociferadores curitibanos há grande sublevação contra o governador. Ele foi acusado de covardia e traição e isso foi lançado não só no rosto seu, como também no dos representantes paranaenses no congresso, que se deixaram burlar por Lauro Muller. (AMMON, 1923, p. 68)

Após a reconstrução das pontes e a aparente calma na fronteira, o Major

Cotrim retirou-se e deixou sete soldados e um alferes protegendo o posto fiscal de

Ribeirão da Lança. Com poucos soldados catarinenses guarnecendo o posto, em

novembro, mais de cem soldados do Paraná prenderam o destacamento policial

catarinense no Ribeirão da Lança. Os jornais denunciavam que o destacamento

catarinense, composto por vinte e sete praças, foi preso e desarmado por um corpo

de polícia do Paraná, composto por duzentos e trinta homens.

Foi deslocada para o planalto uma força policial de Joinville e foram enviados

telegramas de protestos à imprensa e às autoridades federais no Rio de Janeiro. A

população e o comércio não tiveram o descanso necessário para um trabalho

produtivo, todos estavam prontos para entrar em conflito.

O governo central novamente interferiu e chamou a atenção do governo do

Paraná para a gravidade da situação. A fiscalização na barreira foi suspensa,

libertaram-se os policiais, e o governante paranaense apresentou um pedido de

desculpas e devolveu o armamento.

Apesar do acordo de livre comércio entre os dois estados, o Paraná, em 1897

organizou um novo posto fiscal no Ribeirão da Lança. Carroceiros de São Bento que

buscavam erva-mate da região de Canoinhas, por não estarem sabendo e sem

dinheiro para pagar impostos, ficaram presos no posto fiscal e logo houve discussão

entre carroceiros e funcionários. Dessa discussão surgiu uma briga em que entraram

em luta mais carroceiros e as forças policiais de Rio Negro. Houve tiroteio e dois

carroceiros foram feridos. A Câmara de São Bento, ao saber do ocorrido, enviou

telegrama de protestos ao Governador catarinense, que comunicou o fato ao

Presidente da República, Prudente de Morais, o qual solicitou esclarecimentos ao

governador do Paraná. Este informou que, em virtude da contínua introdução de

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produtos clandestinos pelos catarinenses, sem o pagamento de impostos, viu-se

obrigado a estabelecer novamente postos fiscais entre os dois Estados, mas sem a

intenção de perturbar a paz existente.

Segundo Ficker (1973, p. 338), “A São Bento chegou a notícia que além de 3

carroceiros presos, falecera R. Stiegler com um tiro na barriga e que Georg

Schroeder, também baleado encontrava-se em estado desesperador”.

Essa notícia provocou revolta na população de São Bento, que pediu

providências urgentes ao governo do Estado.

O Governador comunicou à Câmara de São Bento, que o Presidente da

República

[...] havia interditado estritamente a cobrança de tributação alfandegária interestadual até a solução definitiva da Questão de Limites. Realmente, a 27 de abril a imprensa noticiava a suspensão da cobrança sobre a erva-mate e outros produtos na divisa com o Paraná. (FICKER, 1973, p.338)

Os comerciantes de São Bento não acreditaram nas promessas do

Governador e acompanhados pelo promotor público, formando um grupo de 20

pessoas entre comerciantes e carroceiros, armados, foram ao Ribeirão da Lança

para por em fuga os funcionários e fiscais do Paraná. Ao chegar ao local, o posto já

estava abandonado e a Guerra do Contestado não pode iniciar nessa oportunidade.

Para libertar os carroceiros presos, foi realizada uma campanha para angariar

fundos, e pagar a caução exigida pelo juiz de Direito de Rio Negro.

Em 1º de novembro de 1897, ocorreu um fato inusitado, começou uma greve

de carroceiros de São Bento exigindo aumento do preço do frete. Oitenta e sete

carroceiros paralisaram e ameaçaram levar a greve adiante e juntar mais

companheiros. A alegação era a falta de segurança e o péssimo estado de

conservação da estrada Dona Francisca. O que eles queriam na realidade era

cobrar mais pelo frete, pois tinham consciência do lucro que o comércio da erva

mate proporcionava aos industriais e comerciantes. Ao conseguir o aumento do

preço do frete, encerraram a greve.

Nas eleições municipais de novembro de 1898, foi eleito superintendente

(Prefeito) municipal de São Bento Manoel Gomes Tavares, que venceu um

candidato de origem alemã. Tavares inicia um período em que os coronéis do mate

de Joinville vão estendendo seu domínio político no Planalto. Tavares era primo da

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esposa do Dr. Abdon Baptista e se tornou seu homem de confiança em São Bento.

Era um bom administrador público e hábil políticos, sendo reeleito sucessivas vezes,

governou São Bento até 1913, sendo sua administração elogiada até por jornais da

Alemanha.

Ao assumir o governo municipal, apresentou às autoridades estaduais um

relatório da situação em que se encontrava São Bento, o qual demonstra que no

início de 1899, havia em São Bento três engenhos de fabricar erva-mate e sete

oficinas para fabricar barricas.

Nesse mesmo ano, o governador Felipe Schmidt informou ao superintendente

Manoel Tavares que o Paraná estava vendendo terras devolutas na zona entre o Rio

Preto e rio Canoinhas, território que não era contestado e sim invadido, pois o

Paraná, pelo acordo de 1895, nada podia vender e nem legitimar na zona

contestada, no Município de São Bento. Informou ainda que estava enviando uma

comissão de engenheiros para investigar in loco a venda de terras de São Bento.

No final do século XIX, a lavoura e a pecuária em São Bento foi sendo

substituída pelo artesanato e pequenas indústrias caseiras, e mais tarde por

indústrias maiores e pelo comércio. À medida que a estrada Dona Francisca

avançava em direção a oeste de Santa Catarina, famílias são-bentenses se

mudaram para a região de Mafra, Itaiópolis, Canoinhas e mesmo para o Paraná.

Dentre as várias causas da migração, pode-se afirmar que as terras coloniais de São

Bento se esgotaram rapidamente e novas áreas de colonização e novos ervais

foram sendo abertos.

Em 1904, no dia 06 de junho, o Supremo Tribunal, depois de longo processo

deu a sentença favorável a Santa Catarina, definindo o rio Negro e o rio Iguaçu

como fronteira. A notícia foi recebida com muita festa, pois era aguardada por vários

anos. Em São Bento as festividades duraram vários dias. O Paraná recorreu da

sentença e os ânimos voltaram a se exaltar na região contestada.

Em 1905, uma força policial foi formada pelo Juiz de União da Vitória com

cerca de 400 policiais e voluntários e, a pretexto de prender criminosos escondidos

nas matas e protegidos pelas autoridades catarinenses, invadiram o vale do rio

Timbó e tomaram posse da região.

O motivo imediato para a formação da expedição foi o boato dando conta de que o coronel Demétrio Ramos investiria contra a cidade de União da Vitória, com uma milícia de 500 homens montada com a colaboração de

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comerciante de erva-mate de Canoinhas e do próprio governo catarinense. (MACHADO, 2004, p. 131)

Parte dessa força invadiu Canoinhas, prendeu o Juiz e o escrivão de polícia

que foram levados presos para Curitiba onde foram torturados. Após intervenção do

governador de Santa Catarina, a região foi ocupada por força federal, mas os

paranaenses continuaram na região e criaram o distrito de Timbó.

A erva-mate produzida em Canoinhas, Major Vieira, Papanduva, Colônia

Lucena (Itaiópolis), Três Barras, Mafra, ao sul do Paraná, em sua maioria, era

transportada para São Francisco.

O comércio da erva-mate e de outras mercadorias continuava sendo

prejudicado pelos impostos que o governo do Paraná cobrava no posto fiscal de Rio

Preto, na divisa dos atuais municípios de Mafra e Rio Negrinho que na época

pertencia ao município de São Bento. Conforme o jornal Gazeta de São Bento

(05.09.1909): o empresário do mate de Joinville Olimpio de Oliveira, reuniu trinta e

tantos homens armados de pistolas e espadas e se dirigiram para o posto fiscal de

Rio Preto para expulsar os paranaenses. Como o posto estava guarnecido por

policiais e civis, o grupo retornou a Joinville, sem atacar.

O Supremo Tribunal Federal manteve as sentenças favoráveis a Santa

Catarina. Como o Paraná insistia em manter o posto, a população se revoltou. O

posto foi destruído em 1909, por ação da população da região.

Em 1909, Aleixo Gonçalves de Lima, radicado na região de São Bento, defensor da causa catarinense contra as barreiras paranaenses ao sul do rio Negro, liderou um grupo de caboclos e atacou o posto fiscal paranaense em Rio Preto, localizado às margens da BR 280, na divisa dos atuais municípios de Rio Negrinho e Mafra. Por esse feito foi tratado como herói catarinense pela imprensa de Joinville e Florianópolis. (MACHADO, 2004, p. 130)

O Governo Federal enviou uma força militar para a região para garantir a

ordem, mas, um mês após o ataque ao posto pelo Coronel Aleixo Gonçalves de

Lima, o Jornal Gazeta do Povo de São Bento denunciava que: “em 31 de outubro de

1909, foram aprisionadas 20 e tantas carradas de erva-mate do Senhor Coronel

Bernardo Olsen”. A carga de erva-mate estava sendo transportada de Canoinhas

para São Bento.

Os postos fiscais do Paraná ao sul do rio Negro, dentro de território de Santa

Catarina, só foram retirados definitivamente em 1917, quando houve o acordo de

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limites e definiu o rio Negro como divisa interestadual. Até essa data, os

comerciantes catarinenses tiveram que conviver com a bitributação, ou seja,

pagavam impostos para o Paraná e para Santa Catarina.

Para São Bento, o agravamento da questão de limites foi prejudicial, pois

empreendedores, devido à situação de insegurança reinante, deixaram de investir

na região. Outros seguiram a “onda verde” que foi sendo aberta após 1917, com o

acordo de limites. Em São Bento, houve um esvaziamento populacional no início do

século XX. Segundo Ammon (1923, p. 115): “Havia em São Bento em 1899, 49

casas de negócios e 3 engenhos de erva-mate”. Em 1920 existiam apenas 30 casas

de negócios e nenhum engenho de erva-mate.

A cidade de São Bento, (Idem, p. 115), no ano de 1922, possuía 170 casas

residenciais e menos de mil habitantes. Essa situação vai perdurar por longos anos,

pois em 1940 a população ainda era de 1.522 habitantes e em 1950 de 2.712

habitantes. Pode-se afirmar que nos moldes norte-americano, esta foi a época do

“Far West”: para eles a busca do ouro no distante Oeste; no caso de São Bento foi

a grande marcha para Oeste em busca do “Ouro Verde” da erva-mate.

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7 CONCLUSÃO

A pesquisa procurou resgatar a história da exploração catarinense da erva-

mate, a partir de meados do século XIX ao início do século XX, na região sul do vale

do rio Negro, tendo fornecido dados para confirmar a importância da economia

ervateira para a região e sua influência na geração dos conflitos pela disputa

territorial entre Paraná e Santa Catarina.

Os empresários da erva-mate do Paraná tinham a região como fonte de

abastecimento de matéria-prima desde 1820, e sertanejos paranaenses ocuparam o

do vale do rio Negro. Em meados do século XIX inicia-se a exploração econômica da

erva-mate por parte dos catarinenses, que entram na região, ao sul do Rio Negro,

com a Estrada Dona Francisca, com a Sociedade Colonizadora de Hamburgo e

empresas ervateiras que já entraram na região com concessão de monopólios

conseguidos junto ao governo federal. Para consolidar a posse do Planalto Norte de

Santa Catarina, foi fundada, em 1873, dentro dos ervais, a Colônia Agrícola São

Bento, financiada por capital externo. Era um empreendimento capitalista alemão

que trazia imigrantes europeus e vendia terras para eles.

Os sertanejos viviam na região, onde tiravam a sua subsistência e colhiam

erva-mate para os empresários do Paraná, que enviavam o produto para os portos

de Paranaguá e Antonina. Com a entrada dos empresários alemães e os do mate

de Joinville, os sertanejos residentes na região dos ervais, ao sul do rio Negro,

tiveram que se submeter a esses empresários. Isso gerou conflitos, que se somaram

aos que motivaram a eclosão da guerra sertaneja do Contestado.

As empresas exportadoras de erva-mate de Joinvile, propriedade de luso-

brasileiros, se beneficiavam do governo, com concessão de monopólio e isenção de

impostos. Elas foram responsáveis pelo desenvolvimento do comércio de erva-mate,

de gêneros alimentícios na região, pela construção de estradas de rodagem,

navegação fluvial pelo rio Negro e Iguaçu e seus afluentes, construção da estrada

de Ferro a partir do porto de São Francisco, cujo primeiro trecho ligando a Joinville

foi inaugurado em 1906.

A erva-mate que era explorada nas terras devolutas ao sul do rio Negro, onde

o sertanejo buscava sua renda, no final do século XIX, foi substituída pela erva do

latifundiário e das grandes empresas, e, mais tarde, com a colonização de toda a

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128

região, pela da pequena propriedade. Com o fim da Guerra do Contestado, a partir

de 1917, toda a região foi loteada para a colonização, seguindo o modelo implantado

em São Bento, com lotes em torno de 25 a 30 hectares para o desenvolvimento da

agricultura familiar. No início, a extração de madeira e erva-mate conviviam com a

agricultura e pecuária de subsistência.

Com a queda do preço da erva, muitos agricultores preferiram derrubar o

erval, transformando-o em roça. Mas com a queda dos preços dos produtos

agrícolas, muitos abandonaram a agricultura e foram em busca de emprego nas

cidades, provocando o êxodo rural.

A erva-mate, no final do século XIX e início do século XX foi responsável pelo

mais importante ciclo econômico do norte de Santa Catarina e Sul do Paraná e pelo

desenvolvimento regional. Com a concorrência argentina, a partir da década de

1930, muitos ervais deram lugar à agricultura de milho e mais recentemente de soja,

que apresentam melhor rentabilidade. Mas nem todos os agricultores abandonaram

a atividade ervateira. Na região do vale do rio Negro os produtores se acomodaram

devido à existência de grandes ervais nativos, que oferecem maior preço e não

investiram em melhoramento de seus ervais. Essa é a situação em que se encontra

a maioria dos produtores da região desde Campo Alegre até Porto União.

A história do desenvolvimento da região, tendo como parte importante a

extração e a industrialização da erva-mate – aspectos históricos do passado -, não

pode deixar de ver que o passado sequer é passado e que está posto, em novos

parâmetros econômicos, para o presente. Assim, o desenvolvimento atual da região

em estudo poderá ser retomado pelo cultivo da erva-mate, que continua sendo um

importante produto para o desenvolvimento regional, tanto no setor econômico como

ambiental. O consumo maior da erva-mate continua sendo para o chimarrão e chá.

Nesses casos, a matéria-prima é subutilizada, e a forma de produzir não evoluiu.

O processo produtivo da erva-mate está carente de um choque de tecnologia

para melhorar a qualidade, aumentar o consumo, e para voltar a ser, o “ouro verde”.

É preciso deixar o extrativismo predatório para que a erva-mate possa receber um

tratamento científico em todo o seu ciclo, com tecnologia sustentável.

Para ofertar novos sabores e agradar aos consumidores, foram acrescidos os

compostos de erva-mate. Existem, no mercado, compostos com os seguintes

vegetais: camomila, erva-cidreira, carqueja e erva-doce. Outros produtos que estão

sendo testados para serem adicionados: anis, capim limão, laranja, hortelã, melissa.

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129

Pesquisas em andamento abrem perspectivas potenciais no que diz respeito ao

consumo de bebidas que vão além do chimarrão, como chás, com possibilidades de

exportação para a Ásia, principalmente China, em função do hábito do consumidor

chinês de beber chá diariamente. Há também mercado para sucos, refrigerantes,

cervejas e bebidas energéticas, além de outros produtos derivados na

industrialização alimentícia, como corante natural e conservante, higiene e limpeza,

como bactericidas, esterilizante, higiene pessoal, perfumes, desodorantes,

cosméticos, hidratantes, sabonetes, tinturas para cabelos; medicamentos

farmacêuticos, cafeína e ainda produção de remédios diuréticos para hipertensão,

bronquite e pneumonia. É necessário introduzir no processo de produção o conceito

de tecnologia limpa, com redução ou eliminação dos resíduos do processamento,

como forma de resgatar a nobreza de uma essência vegetal que no passado já foi

denominado ouro verde. A erva-mate se constituiu em um agronegócio e o

desenvolvimento regional será beneficiado com a retomada da sua exploração

racional.

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ANEXOS

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ANEXO A – MAPA DE SANTA CATARINA – 1737

Mapa ou carta 4. É atribuído ao R.P.M. Diogo Soares, datado aproximadamente de 1737. Além da ilha e costa de Santa Catarina, figura nele o traçado do caminho do Sertão ou Estrada das Tropas. À esquerda está a descrição dos principais pontos registrados no mapa, entre eles destacam-se o Pouso dos Curitibanos (atual cidade de Curitibanos), Serra do Espigão, e, mais adiante o rio Jopeba, também descrito como Pouso das Canoas (atual rio Canoinhas); mais adiante, cachoeiras do rio Itajaí, (também conhecido hoje como rio Hercílio), Mato de São Lourenço (atual município de Mafra) e em seguida cruzou o rio Negro e duas léguas adiante chegou a Campo do Tenente no Paraná. Este mapa é muito importante pois mostra que o Planalto de Santa Catarina já era conhecido e constava de mapas oficiais desde o século XVIII. (Mapa – LEMOS, Zélia de Andrade. Curitibanos na História do Contestado. Florianópolis: Edição do Governo do Estado de SC, 1977, p. 211).

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ANEXO B – MAPA DE SANTA CATARINA – 1872

Mapa de Santa Catarina do ano de 1872, destacando os Municípios de São Francisco, Joinville, Itajaí, Tijucas, São Miguel, Desterro (Florianópolis), São José, Laguna e Tubarão e no interior (planalto), Lages. A fronteira oeste era pelo rio Canoas e o território de Lages, do qual Curitibanos e Canoinhas eram integrantes. Ao norte, e a oeste de Curitibanos, está intercalado o território paranaense, onde estão localizados os atuais municípios de Mafra, Itaiópolis, Três Barras e Papanduva. Nesse período, a região de São Bento e Campo Alegre e Rio Negrinho ainda estão integrados a Joinville. Nessa área, a partir de 1873, começa a se agravar a questão do Contestado – disputa territorial entre Santa Catarina e Paraná, com a criação da Colônia Agrícola São Bento. (Mapa: – PIAZZA, Walter F. Atlas Histórico de Santa Catarina. Secretaria de Educação de SC, 1971)

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ANEXO C – MAPA DE SANTA CATARINA – 1907

O Mapa da Divisão Administrativa de Santa Catarina, no ano de 1907, obedecia em linhas gerais o Decreto Federal de 1865 – Decreto n. 3.378, de 16 de janeiro e que tinha a seguinte redação, conforme Cabral, 1968, p. 297: “Os limites entre as Províncias do Paraná e Santa Catarina são provisoriamente fixados pelo rio Saí-Guaçu, Serra do Mar e rio Marombas, desde a sua vertente até o das Canoas e por este até o Uruguai”. Por esse Mapa, estavam dentro do território Contestado os atuais territórios ao sul do rio Negro, de leste para oeste: Campo Alegre, São Bento do Sul, Rio Negrinho, Mafra, Itaiópolis, Santa Terezinha, Papanduva, Monte Castelo , Major Vieira, e Canoinhas. Também estavam dentro do território contestado os municípios ao sul do Iguaçu: Parte de Canoinhas, Bela Vista do Toldo, Irineópolis, Porto União, Timbó Grande e Matos Costa. (Mapa: – PIAZZA, Walter F. Atlas Histórico de Santa Catarina. Secretaria de Educação de SC, 1971)

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ANEXO D – MAPA DE SANTA CATARINA

Mapa com destaque para o Estado de Santa Catarina no final do século XIX. A leste, o litoral e parte do planalto, reconhecido pelo Paraná como território catarinense, pelo Decreto n. 3.378, de 16 de janeiro de 1865. Na parte central, está destacado o território pretendido pelo Paraná – questão territorial do Contestado. Na parte oeste está localizado o território pretendido pela Argentina, a questão de Misiones ou Palmas. O território contestado era uma área era coberta em sua maioria por pinheiro, imbuia e, principalmente, erva-mate. (Mapa: – PIAZZA, Walter F. Atlas Histórico de Santa Catarina. Secretaria de Educação de SC, 1971)

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ANEXO E – MAPA DA REGIÃO CONSTESTADA – 1911

Mapa organizado em 1911 pelo historiador paranaense Romário Martins, para servir

nos estudos da questão de limites entre Paraná e Santa Catarina. O território

catarinense correspondia ao litoral e os campos de Lages. Na parte central, da Serra

do Mar ao rio do Peixe, era considerada área invadida pelos catarinenses. Ou seja,

os territórios de Campo Alegre, São Bento do Sul, Rio Negrinho e todos os demais,

situados ao sul do rio Negro e do Rio Iguaçu eram considerados territórios invadidos

por Santa Catarina. A região oeste era território do Paraná, mas era um território

pretendido por Santa Catarina.

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ANEXO F – MAPA DA ESTRADA DONA FRANCISCA

Mapa da Região de São Bento do ano de 1873, mostrando o Local onde seria instalada a sede da Colônia Agrícola São Bento, pelo Cia Colonizadora de Joinville. Destaque para o traçado da Estrada Dona Francisca, em construção. Entre a Serra e o Campo de São Miguel, está destacada a barreira fiscal de Encruzilhada. Com a colonização de São Bento, Santa Catarina iniciou a ocupação do litoral norte numa importante reserva de erva-mate, que já estava sendo explorada pelo Paraná. Com esse fato, houve reações e iniciou uma série de atividades que vão ser contestadas, ora pelo Paraná, ora por Santa Catarina. Mapa publicado em (FICKER, Carlos. São Bento do Sul – subsídios para a sua história. Joinville: Ed. Ipiranga. 1973).

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ANEXO G – MAPA DE SÃO BENTO – 2º. DISTRITO DA COLON IA DONA

FRANCISCA

Mapa das terras da Sociedade Colonizadora de 1849, cujo original se encontra na Secretaria de Agricultura do Estado de Santa Catarina, em Florianópolis. Copiado pelo autor em 12/11/2004. Nesse mapa estão destacados dois lotes de terra de paranaenses dentro da colônia agrícola São Bento, o de Antonio dos Santos Siqueira e Francisco Antonio Maximiano. A leste da colônia, as terras eram de propriedade do paranaense Francisco Teixeira de Freitas. A oeste, consta neste mapa como terras devolutas, na realidade era propriedade de outro paranaense, o Brigadeiro Franco, conforme consta do livro de Ficker (1973, p. 156), onde foi publicada uma cópia do ano de 1879. Este Mapa é a prova de que a Cia Colonizadora vendeu terras a colonos imigrantes, em território com áreas já legalizadas por paranaenses.

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ANEXO H – ERVAIS EM SANTA CATARINA

Segundo Linhares (1969, p. 145), os ervais se situam em toda a extensão limítrofe com o Paraná, onde avultam como municípios ervateiros, por excelência, sem falar de Joaçaba ou na chamada zona de Chapecó, Canoinhas, Campo Alegre e Mafra. Uma grande parte da região contestada, hoje incorporada a Santa Catarina. Segundo o mesmo autor (p. 136), o médico francês Avé-Lallemant, que viajou pela região sul do Brasil em 1858, escreveu: “... a senha, era esta: mate, mate e mais mate. Distritos inteiros, províncias inteiras, onde a gente despertava com o mate, madraceava (nota = levar o dia na preguiça) o dia com o mate e com o mate adormecia ... o mate é a saudação da chegada, o símbolo da hospitalidade, o sinal da reconciliação. (Foto do Arquivo particular da acadêmica de História – UnC Campus Mafra, Cínthia Maria Cordeiro)

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ANEXO I– TRANSPORTE DE ERVA-MATE EM TROPAS PARA JOI NVILLE

Tropa de mulas transportando erva-mate em surrões, que eram enormes bolsas de couro, contendo 60 ou mais quilos de mate. A erva produzida no planalto vinha de São Mateus do Sul, Rio Negro, Lapa e era transportada do Planalto para Joinville no lombo de burros. Na viagem de retorno, os tropeiros carregavam produtos da Colônia Dona Francisca, como açúcar, aguardente, café, farinha de mandioca, ferramentas, que eram vendidos no planalto. Com a construção da Estrada Dona Francisca, as tropas cederam lugar para os carroções. (Foto publicada na edição do Centenário de Joinville, - Joinville em 1906 – autor Plácido Olympio de Oliveira, Joinville, 1951, p. 119)

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ANEXO J – CARROÇÕES DE TRANSPORTE DE ERVA-MATE – SÃ O BENTO

WAGEN

Quando a estrada Dona Francisca chegou a São Bento, em 1877, o transporte por mula foi substituído pelos carroções puxados por 4, 6 animais, e carregavam até duas toneladas de erva-mate. Os carroceiros formavam comboios para se protegerem dos índios e criaram pontos de paradas próximo a riachos onde davam água aos animais, e faziam os seus pousos. Os carroceiros formaram um sindicato para fixar, garantir e uniformizar o preço do frete. (Foto publicada na edição do Centenário de Joinville, A Estrada Dona Francisca – autor H. Bachl, Joinville, 1951, p. 87)

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ANEXO K – RÓTULO DE EMBALAGENS DE ERVA-MATE

Rótulos como este eram utilizados para identificar o produtor da erva-mate. Eram colados nas barricas e também nas latas utilizadas para embalar a erva-mate, principalmente a de exportação. (Arquivo de Antonio Dias Mafra)