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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE LETRAS

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA

OS EX-VOTOS PROTO-HISTÓRICOS DO CASTELO DE ALCÁCER

DO SAL

Esmeralda Helena Pires Gomes

Mestrado em Arqueologia

Dissertação orientada pela Prof. Doutora Ana Margarida Arruda

VOL. I

2008

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Resumo:

Para a construção da Pousada D. Afonso II aproveitando as ruínas do Convento de

Nossa Senhora de Aracaeli, em Alcácer do Sal, o IPPAR (Instituto Português do

Património Arquitectónico) levou a cabo escavações, que decorreram entre 1993 e

1997. Durante os trabalhos arqueológicos, foi posta a descoberto uma edificação, que,

pelas suas características e espólio exumado, foi identificada como um lugar de culto.

Nesse santuário, foi exumado um importante conjunto de estatuetas de bronze. Esses

pequenos objectos representam figuras humanas e figuras de animais. As figuras

humanas representam guerreiros (com escudo redondo numa mão e a provável adaga na

outra mão) e orantes (personificação do penitente que pede ou agradece à divindade,

tendo os braços erguidos em gesto de oração; a maioria estão nus e de sexo erecto). As

imagens de animais representam grandes herbívoros, nomeadamente equídeos (cavalo

ou burro), alguns bovinos (vaca, boi ou touro) e, excepcionalmente, uma única

representa de cão. Pelas suas características são atribuíveis à II ª Idade do Ferro (V/IV

antes de Cristo). No mesmo local, foram também recolhidas estatuetas de terracota e

outros objectos correlacionáveis com a actividade religiosa do mesmo período, que se

enquadram igualmente neste estudo.

No presente trabalho, procura-se realizar uma descrição detalhada das peças votivas

provenientes do castelo de Alcácer do Sal, assim como de outras com características

semelhantes atribuíveis a Alcácer do Sal ou de proveniência desconhecida, que se

encontram em distintas colecções museológicas. Estabelecem-se considerandos de

diversa natureza quanto à interpretação e contextualização das peças.

Palavra-chave: Alcácer do Sal, estatuetas votivas, religião, santuário, arqueologia.

Abstract:

In order to build the Pousada D. Afonso II reassembling the ruins of the Convento de

Aracaeli (convent), in Alcácer do Sal, the IPPAR (governmental institution for the

architectonic patrimony) undertook excavations since the year 1993 until 1997. During

the archaeological survey a building was uncovered. Its characteristics and the collected

remains allowed to identify it as a religious place. An important assemblage of bronze

statuettes was recovered in this sanctuary. These objects are human and animal figures.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

The human figures represent warriors (with the shield bared in one hand and probably a

dagger in the other) and worshipers (personification of the penitent that pleads or thanks

the deity, with the arms raised in praying gesture; most of them are naked and show

sexual erection). The animal representations include large herbivores, namely equids

(horse or donkey), some bovines (caw, ox or bull) and, exceptionally, a single

representation of dog. According to their characteristics, they are ascribed to the IInd

Iron Age (V/IV centuries B.C.). This study comprises, as well, some statuettes of

terracotta and other objects related with religious activity of that period also collected in

the same area.

A detailed description of the votive objects from the Alcácer do Sal Castle is aimed in

this work, as well as of other similar objects allegedly from Alcácer do Sal or of

unknown provenience, that are kept in diverse museum collections. Some

considerations are established concerning several issues related to the interpretation and

contextualization of the focused objects.

Key-words: Alcácer do Sal, votive statuettes, religion, sanctuary, archaeology.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Agradecimentos

Agradeço em primeiro lugar à Professora Ana Margarida Arruda, minha Orientadora,

por ter estado sempre disponível, respondendo a todas as minhas solicitações durante a

elaboração deste trabalho e pela confiança que depositou em mim.

Ao Professor João Luís Cardoso pelo incentivo, ao Professor Carlos Fabião pelos

ensinamentos prestados e ao Professor Amílcar Guerra pelas suas aulas, o seu apoio e a

sua gentileza.

A Frederico Tátá Regala, pela paciência que teve para me aturar nas alturas de

desespero e na releitura do todo o texto.

Aos vários amigos incansáveis a quem me considero grata: Vanessa Gaspar, Milene Gil,

Margarida Santos, Marisol Ferreira, Maria João Sousa, João Pimenta, Henrique Calé e à

equipa de arqueologia da Câmara de Alcácer do Sal.

À Susana Rosado que desenhou as peças e ao Marco Calado que desenhou os perfis.

Ao Centro de Arqueologia de Almada, mais concretamente a Luís Barros, Jorge Raposo

e Ana Luísa Duarte.

À Biblioteca Nacional de Lisboa, nomeadamente à Dra. Lígia Martins e Dra. Maria

Helena Arjones, pela prontidão com que me receberam e por todo o apoio que me

prestaram.

Não esqueço também a instituição à qual pertenci e que me permitiu o acesso aos

materiais, à qual eu agradeço: IPPAR - Instituto Português do Património

Arquitectónico, em particular ao Dr. Calado, Dr. Paulo Pereira, Dr. Summavielle,

Arquitecto Marreiros, Arquitecto Flávio Lopes, Arquitecto Lacerda, Arquitecto Mimoso

e ao Dr. Suromenho.

Nota: muitos mais merecem os meus agradecimentos, mas não os poderia colocar a

todos sob o risco de esquecer alguém.

A todos o meu muito obrigada.

Aos meus pais, ao meu filho e aos meus irmãos

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Volume I

I – Introdução

1.1 - O objecto de estudo e o objectivo do estudo

1.2 - A Idade do Ferro em Alcácer do Sal (Necrópole do Olival, S. Francisco, Os

Depósitos, Convento de Aracaeli, Abul)

1.3 - O espaço geográfico e os recursos naturais

II - Enquadramento arqueológico

2.1 – O Povoado

2.2 - A intervenção arqueológica no Convento de Aracaeli no Castelo de Alcácer do Sal

2.3 – Contextualização arqueológica – O Edifício religioso

III - As peças

3.1 – Peças metálicas

3.1.1 – Orantes

3.1.2 – Guerreiros

3.1.3 – Zoomorfos

3.1.4 – Pesos

3.1.5 – Thymiaterion

3.1.6 – Composição e fabrico

3.2 – Peças de cerâmica

3.2.1 - Cabeça com barrete frígio

3.2.2 – Estatueta de Ganimedes

IV – Interpretação dos artefactos

4.1 – Cronologia e integração no mundo mediterrâneo

4.2 – Cogitações sobre a função dos ex-votos

4.3 – Considerandos sobre o Templo

V - Catálogo dos ex-votos

VI – Comentários finais e Conclusões

Volume II – Anexos

Anexo 1 – Bibliografia

Anexo 2 – Cartografia

Anexo 3 – Figuras

Anexo 4 – Documentação gráfica de paralelos

Anexo 5 - Estampas

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

I – Introdução

Defendem alguns investigadores, com base nos textos antigos, que o Ocidente

Peninsular, entre o estuário do Tejo e o Cabo de S. Vicente, seria habitado com toda a

probabilidade pelos Cinetes ou Cónios, igualmente designados Kynesioi pelos gregos. A

presença meridional deste povo seria inclusivamente referida por autores antigos, como

Heródoto (século V a.C.) e Hecateu de Mileto (500 anos a.C.). No que respeita a

Alcácer do Sal, os relatos produzidos por geógrafos e viajantes sobre o respectivo

núcleo urbano proto-histórico são manifestamente insuficientes, restando-nos, como

elemento fundamental para a compreensão dessas épocas remotas, os dados

proporcionados pela Arqueologia.

O nome pré-romano da cidade de Alcácer do Sal poderá ter sido “Beuipo” ou “Peuipo”.

Este nome surge da leitura da legenda que figura nos reversos das moedas, realizada por

António Faria. Segundo este investigador, os numismas exibem o nome indígena de

Alcácer do Sal se aí tiverem sido emitidos. Os caracteres que compõem a legenda destas

moedas poderão pertencer ao semi-silabário meridional. A terminação em ipo denuncia

uma ascendência turdetana, o que parece ser confirmado pelos nomes gravados nas

moedas que também surgem na Turdetânia/Andaluzia. (vide anexos 2.1, 2.2 e 2.3)

O padrão de assentamento das colónias fenícias do ocidente ajusta-se, num primeiro

momento, às necessidades de assegurar o controlo das rotas dos metais. A composição

social de tais enclaves responde a uma migração de população oriental que traz consigo

uma civilização dita urbana. O tráfico dos metais foi a actividade dominante, pelo

menos nos primeiros séculos, passando depois a actividade económica a englobar outras

vertentes, entre as quais a indústria de salga de peixe.

O colapso do comércio dos metais hispanos em meados do século VI a.C. pressupunha

o desaparecimento de alguns dos enclaves fenícios da costa mediterrânea. Gadir

subsistiu a esse colapso, iniciando um dos períodos mais florescentes que abrangerá os

séculos V-III a.C. A razão desse arranque estaria relacionada com o controlo da

produção pesqueira e das salinas do litoral, assim como com a continuação do comércio

do estanho atlântico. Esta cidade controlaria ambos os sectores em regime de monopólio

e estaria relacionada com o resto dos enclaves costeiros produtores de sal e garum.

Gadir possuía uma organização forte do ponto de vista mercantil, que se erguia como

porto comercializador e eixo de exportação dos mercados do Sudoeste, mas também

estendia os seus ramais para o interior. Os locais de apoio terra adentro seriam velhos

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

núcleos de ascendência maioritariamente oriental, com tradição e relações ininterruptas,

que actuariam como pontos de distribuição para o norte. E é neste panorama de

dependência que se enquadra a cidade de Bevipo, com o seu comércio, trocas de

produtos, de ideias e integração religiosa.

1.1 - O objecto de estudo e o objectivo do estudo

O trabalho que se realizou consiste no estudo de um importante conjunto de figurinhas

de bronze, umas zoomórficas e outras antropomórficas, os pesos, o timiaterio e as

estatuetas em terracota. As estatuetas de bronze podem ser agrupadas em três tipos: os

guerreiros, os orantes; as representações de animais quadrúpedes.

As figurinhas de bronze são peças únicas e de grande valor simbólico religioso-cultural.

Perante a sua raridade, e não existindo um estudo muito aprofundado, sobretudo em

Portugal, onde os estudos escasseiam sobre esta matéria, considerámos pertinente

promover a divulgação destas peças e o seu estudo.

Com este trabalho, pretende-se contextualizar as peças a nível cultural e cronológico,

procurando estabelecer os paralelos com o mundo Hispânico ou mesmo Púnico, e o

porquê da sua existência.

Seria útil averiguar o seu método de fabrico e a sua constituição metálica, para melhor

poder enquadrar ou comparar estas peças com as suas congéneres. Para o efeito, teria

que se proceder a análises laboratoriais que permitissem verificar os constituintes

metálicos e respectivas proporções. Com os dados procedentes das análises, poderíamos

ainda averiguar a qualidade do fabrico.

Porém, não foi possível analisar as peças no ITN – Instituto Tecnológico Nuclear, por

dificuldades técnicas e de disponibilidade das entidades envolvidas, e devido ao tipo de

tratamento de conservação a que as peças foram submetidas.

As outras peças abrangidas por este estudo são duas estatuetas de terracota. De uma

destas conservou-se apenas a cabeça que poderá representar o Átis, jovem pastor da

Frigia. A outra peça é inédita em Portugal. Trata-se de uma estatueta de terracota com a

figura de uma águia que carrega uma figura humana nas suas garras.

Tal com sucede com as peças anteriores, o estudo vai incidir na sua cronologia,

contextualização, aspectos religiosos, os paralelos no mundo clássico e a confrontação

com as informações existentes na bibliografia específica.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Depois proceder-se-á a elaboração de um mapa de distribuição das proveniências destas

peças no Alentejo. As peças serão estudadas individualmente, os objectos metálicos em

primeiro lugar e depois as terracotas. O espólio metálico será subdividido em orantes,

guerreiros, zoomorfos, antropomórficos, o timiaterio e os pesos.

O espólio cerâmico é menos complexo, pois é representado apenas por duas peças de

terracota.

O estudo vai abranger também peças avulsas encontradas em Alcácer, que se encontram

guardadas no Museu Pedro Nunes e na Biblioteca Nacional de Lisboa. Não foi possível

ter acesso às peças do Museu de Évora, por se encontrarem em tratamento no Museu de

Conímbriga, nem às peças que estão depositadas no Museu Nacional de Arqueologia,

por dificuldades de natureza burocrática.

Segundo alguns autores, o ritual de oferecer um ex-voto encontra paralelo na Etrúria,

Roma e Grécia Arcaica, onde se ofereciam elmos, escudos, etc. No entanto, os ex-votos

de bronze eram fabricados com o método da cera fundida, técnica introduzida pelos

fenícios. É provável que os artesãos indígenas tenham aprendido esta técnica com os

colonizadores fenícios ou púnicos.

1.2 – A Idade do Ferro em Alcácer do Sal (Necrópole do Olival, Necróple de S.

Francisco, Os Depósitos, Convento de Aracaeli, Abul)

Necrópole do Olival do Senhor dos Mártires

Necrópole de S. Francisco

Depósitos

Fórum

Convento de Nossa Senhora de Aracaeli

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

O rio Sado desagua no Atlântico e isso fez dele uma importante via de acesso aos

territórios do interior alentejano. É através desta “estrada” marítima que muitos povos,

conhecimentos e bens, chegaram à cidade que hoje se chama Alcácer do Sal.

Chegaram os fenícios e com eles todo um comércio de bens exóticos, que iram encantar

os indígenas, trazem novos métodos de construção civil, novas técnicas de fabrico de

cerâmicas como a introdução do torno, e diferentes conceitos religiosos e cultos

funerários.

Alcácer foi uma encruzilhada de povos oriundos do Mediterrâneo que vieram

enriquecer este local, dando-lhe um estatuto de “cidade” comercial e marítima.

1.2.1 - Necrópole do Olival do Senhor dos Mártires

A principal necrópole relacionada com o povoado da Idade do Ferro localiza-se no

Olival do Senhor dos Mártires, a cerca de 500 metros para poente do Castelo de Alcácer

do Sal. O respectivo estudo integrado permite um conhecimento mais abrangente sobre

o jogo das influências culturais externas que moldaram as gentes desta região no

período em apreço.

Em Dezembro de 1874, na sequência de trabalhos de lavoura, foram acidentalmente

postos a descoberto alguns vestígios funerários no local. De entre os materiais

recolhidos, são referidas urnas de várias dimensões contendo cinzas, vasos gregos

ricamente decorados, elementos da roda de um carro, lanças de ferro, espadas de

antenas, falcatas, soliferrea (lanças) e xorcas com sanguessugas de bronze (adorno

compósito usado ao pescoço). Mais tarde, em 1894, durante trabalhos de remoção de

terras realizados a Norte da Igreja do Senhor dos Mártires, novos objectos

arqueológicos viriam enriquecer o espólio até então recolhido. Passados cerca de

cinquenta anos sobre a data das primeiras descobertas, foram aí levadas a efeito, pelo

Professor Vergílio Correia, uma série de importantes escavações arqueológicas que

decorreram entre Fevereiro de 1925 e Abril de 1927. As sepulturas então escavadas

reflectem a existência de diferentes formas de enterramento que este investigador

agrupou em quatro tipos distintos, traduzindo aparentemente hábitos culturais

específicos1. Desde aquela intervenção, o terreno em que as mesmas se encontravam

sofreu alterações significativas, tendo sido destruídas pela lavoura as sepulturas mais

1 Correia 1972

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

superficiais, ficando preservada apenas parte das que foram cavadas na rocha, de

formato rectangular, localizadas nos níveis mais profundos.

Outras sepulturas deste tipo viriam a ser postas a descoberto durante as escavações

realizadas por Cavaleiro Paixão em finais dos anos 602 e, mais recentemente, em

1979/803, correspondendo estas, seguramente, ao mais antigo momento de ocupação

sidérica do núcleo urbano. Foram referenciados, durante estas escavações, numerosos

objectos, nomeadamente: lâminas de lança e respectivos contos, falcatas, facas

afalcatadas, soliferrea, xorcas com sanguessugas de bronze, fivelas de cinturão e pratos

de engobe vermelho. Foram igualmente exumados vestígios de elementos de rodas de

carros, que poderiam ter sido concebidos precisamente para esse fim funerário.

Ocasionalmente, surgiram escaravelhos sagrados egípcios. Estas peças simbolizam a

divindade egípcia solar Khepra (“aquele” que surge). Representa o amanhecer (Jepre), a

vida, a ressurreição. No antigo Egipto, o escaravelho era colocado sobre o peito do

defunto, no lugar do coração, para o proteger perante o tribunal de Osíris (juiz dos

mortos).

1.2.2 – A necrópole de São Francisco

Recentemente4, foi identificada uma outra necrópole com níveis da Idade do Ferro, no

Bairro de São Francisco, cerca de uma centena de metros a Norte do Castelo de Alcácer

do Sal. Nesse local surgiram, ao nível superficial, fragmentos de cerâmica romana,

grega e orientalizante.

A necrópole fica na área de protecção adjacente ao convento, com o mesmo nome, mas

mais conhecido por Convento de Santo António e que é Monumento Nacional.

Em 1991 (segundo Faria†), durante as obras de expansão do bairro de S. Francisco, terá

sido recolhido espólio da Idade do Ferro e do Período Romano. Os materiais recolhidos

são constituídos por urnas pintadas, unguentários, cerâmica campaniense, terra sigillata

itálica, sudgálica (alguma marmoreada) e hispânica, estando armazenados no Museu

Municipal Pedro Nunes e a aguardar estudo.

Mais tarde, entre 23 de Novembro de 1999 e 4 de Janeiro de 2000, novos trabalhos

foram realizados aí. Mas desta vez com o propósito de averiguar a extensão da

necrópole, pois o Ministério da Saúde pretendia construir no lugar um Centro de Saúde.

2 Paixão 1970 3 Paixão 1983 4 Informação prestada por Marisol Ferreira

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Os trabalhos arqueológicos tiveram como responsável João Carlos Faria e como

consultor científico o Dr. António Cavaleiro Paixão, do ex-IPPAR.

O responsável pela intervenção realizou catorze sondagens de forma a melhor avaliar a

dimensão do cemitério. Em algumas dessas sondagens, verificou-se a existência de

materiais do Período Romano, tais como cerâmica comum, fragmentos de ânforas, terra

sigillata itálica e sudgálica, pesos de tear, lucernas e vidros, e algum espólio da Idade do

Ferro, como por exemplo, três urnas cinerárias (sendo uma de pequenas dimensões),

três fusaiolas e cerâmica ática. Nenhum deste espólio terá sido recolhido, ficando in situ

no terreno.

Os trabalhos não aprofundaram muito no terreno, não sendo possível averiguar a

dimensão real da extensão da necrópole da Idade do Ferro.

1.2.3 – Castelo de Alcácer do Sal

O Castelo de Alcácer do Sal tem vindo, desde 1976, a ser explorado a nível

arqueológico, em sítios como “os Depósitos”, o Fórum e o Convento de Aracaeli.

Fotografia aérea, voo 1996, Serviço Cartográfico do Exército Convento de Nossa Senhora de Aracaeli - Fórum - Depósitos

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

1.2.3.1 - Os Depósitos

No ano de 1976, as obras para a construção de um depósito de água, efectuadas pela

Câmara Municipal, levam à destruição de estratos arqueológicos, compreendidos entre a

Idade do Ferro e o Período Moderno. O MAEDS (Museu de Arqueologia e Etnografia

Distrital de Setúbal) efectuou uma intervenção de emergência na área, que foi

coordenada por Carlos Tavares da Silva. Os trabalhos incluíram a crivagem das terras e

o registo das estruturas postas a descoberto. Através dos dados obtidos, verificou-se que

a área do Castelo seria habitada desde o século VII a.C.

Perante estes factos e a importância dos testemunhos, particularmente ao nível da Idade

do Ferro, novas intervenções foram agendadas. Nos meses de Setembro e Outubro de

1979, procedeu-se a escavações arqueológicas no local e confirmou-se a existência de

níveis da Idade do Ferro, desde o século VII a.C. até ao século I a.C., revelando ligações

ao mundo Mediterrânico Oriental.

Segundo Silva et al. (1980-81), as escavações arqueológicas nos estuários do Sado e do

Tejo têm vindo a revelar importantes testemunhos da presença fenícia que caracterizam

o processo de interacção entre as populações autóctones do Bronze Final e os

navegadores/comerciantes fenícios do Ocidente.

Este processo terá tido início no final do século VIII a.C. (cronologia tradicional),

atingindo o seu apogeu no século VII a.C. e na centúria seguinte.

Segundo Carlos Tavares da Silva, em meados do século VII a.C., os Fenícios terão

fundado uma feitoria em Abul, no estuário do Sado, e no final do século instalar-se-iam

em Alcácer. Esta localização, numa zona mais a montante do estuário, permitia o

controlo do acesso ao mar e a regiões do interior.

1.2.3.2 – O Fórum

Nos anos 805, perto da igreja de Santa Maria do Castelo e do Convento de Nossa

Senhora de Aracaeli, entre o troço ocidental da rua e o situado a nascente, foram

descobertas estruturas de época romana identificadas como um edifício público,

designado como o forum. Trata-se de uma construção com cella de planta rectangular,

com uma grande entrada e cabeceira em ábside. As paredes são revestidas por opus

signinum e finas placas de mármore. Do lado sul da cella, encontra-se uma grande

5 Faria 2002

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

muralha de sustentação das terras. Esta muralha poderia ter funcionado também como o

paredão de protecção de cidade. Nenhum estudo veio demonstrar a existência de vestígios da Idade do Ferro neste sítio.

No entanto, recentemente e devido a remodelações no Museu Pedro Nunes, na

desmontagem da exposição permanente, nas arrumações de contentores e das fichas de

espólio, verificou-se a existência de um ex-voto de bronze, correlacionável com a Idade

do Ferro, proveniente deste local.

1.2.3.3 – O Convento de Nossa Senhora de Aracaeli

O Convento de Nossa Senhora de Aracaeli localiza-se no topo da colina, dentro do

Castelo de Alcácer, do lado Poente.

As intervenções no Convento de Aracaeli decorreram entre 1993 e 1997, na sequência

de uma decisão da Secretaria de Estado do Comércio e Turismo de reabilitar as ruínas

do Convento, convertendo-o em Pousada. Para esse efeito era necessário proceder a

intervenções arqueológicas, até porque este Convento está integrado no Castelo que é

Monumento Nacional desde 1910 (Decreto de 16 de Junho). No processo estiveram

envolvidos: o IPPAR – Instituto Português do Património Arquitectónico, a ENATUR –

Empresa Nacional de Turismo, S. A. e a CMAS – Câmara Municipal de Alcácer do Sal.

São abundantes os materiais cerâmicos da Idade do Ferro recolhidos no decurso da

intervenção arqueológica, os quais reflectem igualmente influências orientalizantes. A

par da cerâmica de fabrico manual, verifica-se a existência da cerâmica feita a torno (de

engobe vermelho, cinzenta-fina, policroma de bandas e ânforas fenícias).

A influência púnica (séculos IV a III a.C.) é também amplamente demonstrada através

da presença de ânforas ibero-púnicas e de cerâmica revestida por aguada vermelha,

sobretudo os chamados “pratos de pescado”. Surgem também numerosos fragmentos de

cerâmica ática. Na transição para o Período Romano (séculos II e I a.C.), predomina

ainda a cerâmica púnica e/ou ibero-púnica. A cerâmica comum, a cinzenta e a pintada,

está na continuidade das anteriormente produzidas.

Para além dos recipientes cerâmicos, as escavações arqueológicas permitiram recolher

diversos outros objectos produzidos no âmbito da Idade do Ferro, sendo de destacar as

estatuetas de terracota e de bronze, alguns adornos e amuletos, fragmentos de anforiscos

de vidro, diversos cossoiros e moedas.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

1.2.4 – Abul

O sítio arqueológico de Abul localiza-se numa pequena elevação, na margem direita do

rio Sado, entre Alcácer, Setúbal e Tróia.

As escavações foram dirigidas por Françoise Mayet e Carlos Tavares da Silva6 e

permitiram pôr a descoberto um edifício da Idade do Ferro, com sucessivas

remodelações.

Foi nesse pequeno esporão que se ergueu uma edificação quadrangular na 1ª metade do

século VII a.C.

Trata-se de um edifício de planta rectangular, que é limitado, por um muro, ao qual foi

adossada uma série de compartimentos rectangulares em redor de um pátio central,

também de planta rectangular, e que não era coberto. Os compartimentos eram

pavimentados com argila vermelha e areia, mais ou menos compactada, e o pátio com

calcário moído. No centro deste pátio, foi identificada uma estrutura sub-quadrangular,

que continha cinzas, sendo interpretada como um altar. A existência de um altar, de

pavimentos de argila pintada de vermelho e de um fosso remete este complexo para um

lugar de culto.

1.3 - O espaço geográfico/Recursos Naturais

O povoado de Bevipo situa-se no topo da colina a uma altitude de 62 metros, na margem

norte do rio Sado.

6 Mayet & Silva 2001

13

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

A localização geográfica deste centro urbano assume, indubitavelmente, um papel

relevante em todo o processo de povoamento e desenvolvimento das comunidades

humanas que aí se foram instalando. A facilidade de defesa proporcionada pelo relevo e

a presença de um curso de água navegável até ao Atlântico foram factores essenciais

para a sua prosperidade.

O litoral atlântico e o mediterrâneo andaluz apresentam condições para o

estabelecimento de salinas. Estas seriam já exploradas pelos primeiros colonizadores.

Os habitantes do interior, com uma dieta de base cerealífera, teriam a necessidade de

sal, já que este é um complemento indispensável de uma alimentação pobre em

potássio, como a que proporcionam os cereais. O sal tornar-se-ia, assim, num produto

de primeira categoria nas transacções comerciais. Esta substância converteu-se em

moeda de troca no mundo antigo, particularmente no comércio dos minerais do interior.

O Baixo Sado oferece condições naturais para a exploração do sal marinho, recurso de

grande importância, quer como condimento quer para a conservação de alimentos.

A origem da indústria de salga de peixe no Mediterrâneo Ocidental relacionava-se com

os inícios da colonização, no entanto o seu período mais florescente situou-se entre os

séculos V-III a.C.

Instituto Geográfico e Cadastral (Carta de Portugal à escala 1/200 000)

14

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

É provável que em Beuipo, na Idade do Ferro, se procedesse já a esta actividade, pois a

proximidade com o oceano e a amplitude do estuário permitiram a realização de

actividades profícuas como a pesca e a produção de sal.

Em relação à pesca, a sua relevância é sugerida pelos cunhos de moedas pré-romanas

(com atuns), desconhecendo-se, no entanto, se terá sofrido intensificação em época

romana.

Também a agricultura, o pastoreio e a tecelagem foram actividades relevantes das

populações que neste local se implantaram e floresceram.

Ao nível da agricultura, é de referir a relevância das produções cerealífera e vinícola.

Políbio já havia gabado, no século II a.C., a importância do trigo e do vinho nesta

região, facto que se pode relacionar com as espigas e ramos que aparecem em moedas,

cujos cunhos são atribuídos a esta cidade.

A actividade pecuária, particularmente a criação de gado bovino, ovino e caprino, era

também importante numa área tão propícia à pastorícia. Segundo Estabão (III,2,6), os

salacianos fabricavam tecidos ligeiros à base de lã. Aliás, das escavações na área do

Castelo provieram vários pesos de tear, e fusaiolas, o que confirma a actividade têxtil

neste sítio.

A possibilidade de realizar uma exploração produtiva dos recursos naturais aliada à

facilidade de contacto e transporte proporcionada pelo rio foram os principais agentes

impulsionadores. Trata-se de um promontório defensável, cuja colina se debruça em

direcção às águas do Rio Sado. Este importante curso de água constituiu uma eficaz via

de comunicação, que permitia ligar as terras do interior ao Atlântico. No seu leito,

navegaram diversas embarcações que levavam as produções locais e traziam produtos

exógenos diversos, por vezes de territórios distantes. Assim, este ponto tornou-se um

fulcro para o entrecruzamento de diferentes culturas e etnias, sede de confronto entre

religiões, modos de vida, idiomas, etc.

II – Enquadramento arqueológico

2.1 - O Povoado

O povoado ocupa uma posição dominante sobre o rio Callipus (Sado), erguendo-se num

local pouco afastado do estuário, de fácil acesso à navegação marítima, e, portanto, aos

contactos com outros povos. Foi um dos mais importantes povoados pré-romanos do

litoral atlântico, como se pode verificar através dos testemunhos exumados tanto no

local como na correspondente necrópole. Na realidade, as escavações arqueológicas na

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

área do castelo permitiram colocar a descoberto parte de um arruamento e um

significativo complexo de estruturas arquitectónicas deste período. Existe alguma

heterogeneidade na distribuição dos espaços, sendo de salientar que, a par de

construções modestas, surgem edifícios de razoável amplitude com várias divisões.

Segundo os estudos realizados em diversos povoados coevos de Beuipo, na Península

Ibérica, as estruturas urbanas da Idade do Ferro integravam casas de unidades simples

ou compostas por várias divisões. As simples, destinadas ao uso habitacional ou de

armazenamento, consistiam em recintos independentes, normalmente de reduzidas

dimensões. Porém, um conjunto destes recintos poderia pertencer a uma só unidade

familiar, assumindo cada um destes a função de uma das dependências da casa. Neste

caso, a rua adquiria a qualidade de acesso e comunicação entre as diferentes divisões de

uma única habitação e passaria a formar parte do espaço doméstico. As casas com

divisões podiam inclusivamente ter piso superior. São construções ortogonais,

quadrangulares ou rectangulares, que seguem modelos arquitectónicos orientais. Os

alicerces são de alvenaria, utilizando habitualmente a pedra local. As pedras,

irregulares, são colocadas em fiadas. As de grande e médio calibre constituem as

paredes, e as pequenas encaixam entre as outras e compõem o miolo do muro. A

argamassa que liga as pedras entre si e que preenche os interstícios é de natureza

argilosa. O adobe e a taipa eram também amplamente utilizados na construção em

povoados deste período, sendo comuns as edificações em que apenas os alicerces são

concebidos com pedras. A cobertura fazia-se, provavelmente, com colmo.

As paredes das casas eram rebocadas com uma capa de barro e um revestimento de

estuque à base de cal. Em alguns povoados, foi possível verificar a existência de

decoração mural elaborada consoante as posses e o gosto do ocupante, sendo os motivos

decorativos normalmente semelhantes aos aplicados nas cerâmicas da mesma época. As

portas de acesso à rua encontram-se num plano mais elevado que o do arruamento,

fazendo-se o acesso através de degraus instalados no exterior. Os pisos das habitações

podiam ser os solos naturais calcados ou batidos, mas alguns encontram-se

pavimentados. Existem pavimentos de diferentes tipos, uns concebidos com argamassas

à base de argila ou de cal, outros empedrados ou lajeados.

As estruturas de combustão ocupariam o espaço central da habitação. Por vezes o

braseiro fazia-se directamente sobre o piso, mas existem lareiras melhor preparadas,

delimitadas com pedras ou lajes.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

As construções da Idade do Ferro de Alcácer do Sal seguem, de um modo geral, os

padrões construtivos descritos, que em regra se repetem nos vários núcleos urbanos da

época. No entanto, o grau de destruição e de descaracterização é muito significativo

neste local, devido ao intensivo reaproveitamento dos espaços e dos próprios materiais

de construção em épocas subsequentes. É de destacar, neste caso, a existência de um

importante edifício que, pelas suas dimensões e configuração, assume as características

de um templo, cujas estruturas foram aliás reaproveitadas para a construção de um

santuário de época romana, formando-se assim um curioso imbricado arquitectónico

pré-romano e romano. (vide anexos 2.4 e 5.1)

Fotografia das estruturas do povoado, arquivo do IPPAR

2.2 – A intervenção arqueológica no Castelo de Alcácer do Sal (vide anexo 2.5)

A Secretaria de Estado do Comércio e Turismo decidiu adaptar o Convento de Aracaeli

em Pousada, segundo o projecto de reconversão de edifícios históricos em pousadas de

turismo. Estiveram envolvidos neste processo os serviços centrais do Instituto Português

do Património Arquitectónico e Arqueológico - IPPAR, a Direcção Regional de Évora,

a Câmara Municipal de Alcácer do Sal – CMAS e a Enatur.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Este Convento localiza-se dentro do Castelo de Alcácer, Monumento Nacional

classificado desde 1910, que estava votado ao abandono desde a extinção das Ordens

religiosas em 1834 por D. Pedro IV.

A intervenção arqueológica ocorreu entre 1993 e 1997 e desenvolveu-se na área da

implantação do edifício religioso. As escavações adoptaram um carácter de intervenção

de emergência e processaram-se em articulação com as obras de construção civil. Os

trabalhos tiveram a direcção geral dos trabalhos da responsabilidade do Dr. António

Cavaleiro Paixão – do IPPAR e contaram com a colaboração do Dr. João Carlos Faria,

da CMAS.

Foi implantada uma quadrícula e foram estabelecidos sectores de escavação definidos

por letras, dentro de duas principais áreas: o espaço ocupado pelo edifício conventual e

o espaço exterior, compreendido dentro dos limites da cerca que rodeia a área de

implantação deste edifício religioso.

Foram subdivididos os espaços em Coro Baixo, corredor Norte-Sul, Refeitório, Sala do

Capítulo, Santuário, Claustro - recinto a céu aberto e Claustro - arcaria periférica.

Foram delineados catorze quadrados de 9x9 metros tendo todos ele sido escavados até

ao nível estéril, cuja profundidade variava consoante o declive natural do terreno que

pendia simultaneamente para Norte e para Poente. Os trabalhos arqueológicos

realizados nesta área viriam a demonstrar que o terreno se encontrava fortemente

revolvido e que faltavam porções significativas às estruturas arqueológicas. O

revolvimento deve-se não só à presença muçulmana, como às obras de ampliação do

convento e também ao continuado reaproveitamento de pedra para a construção. Retirar

pedra das construções anteriores é uma prática que, em Alcácer, ascende ao período

romano7. A construção de silos na rocha para armazenamento de viveres, como também

a abertura de buracos para os detritos, acarretou com frequência a destruição de

estruturas. Até recentemente (pelo menos até aos anos quarenta) era promovida a venda

de pedra do castelo para construção.

De entre os testemunhos que surgiram, releva-se a presença de um recinto de alvenaria

que, pela suas características arquitectónicas e pelos materiais que continha, foi

interpretado como edifício de natureza religiosa. No interior desse espaço, surgiu um

poço de formato quadrangular, que continha no fundo uma placa de chumbo (tabella

defixiones) com uma inscrição em latim em ambas as faces. Num dos corredores de

7 Prova dessa prática é a existência de duas mós da Idade do Ferro integradas que na calçada.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

acesso ao interior da construção, a norte, e numa plataforma adossada à parede norte

surgiu um conjunto de oferendas. Este conjunto de estruturas foi denominado santuário

romano.

A escavação prosseguiu para Oeste, para o claustro, em busca de estruturas que

pudessem estar associadas ao santuário, verificando-se não existirem quaisquer

vestígios, segundo os responsáveis8.

Na área do claustro, a Sul, foi detectado um poço muçulmano. Nesta área foram

atingidos os níveis da Idade do Ferro, com estratigrafia natural bem definida, onde se

recolheu abundante espólio cerâmico. Imediatamente por baixo destes níveis

encontraram-se materiais atribuíveis ao Neolítico Final9.

Ainda a oeste do santuário, surgiu uma calçada da Idade do Ferro, com dois níveis de

construção, que confinava com duas paredes da mesma época. A sul da calçada, a um

nível ligeiramente mais profundo que os muros que a ladeiam, surgiu um conjunto de

ex-votos, numa camada que foi interpretada como aterro. As figuras estavam

concentradas numa área restrita de 2x2 metros, excepto duas delas que foram

encontradas em locais distintos, mais concretamente em níveis interpretados como de

habitação, relativamente afastados do principal núcleo de deposição.

2.3 – Contextualização arqueológica – Edifício religioso

Por terem existido outras intervenções arqueológicas em distintas áreas do Castelo, já se

previa que sob o convento (no ponto mais alto da colina) existissem vestígios de

natureza arqueológica, e a existência de testemunhos muito antigos. De facto, as

escavações vieram a confirmar essa ideia.

Com efeito, o povoamento da colina onde assentam o castelo e o convento remonta,

pelo menos, ao século VII a.C., ocupando uma área de dimensões consideráveis.

Segundo os responsáveis da intervenção10, os trabalhos arqueológicos realizados

permitiram verificar que a maior parte dos terrenos escavados que se situavam na área

do convento propriamente dito apresentaram uma leitura arqueológica descontínua,

integrando, no respeitante a algumas épocas, poucos materiais arqueológicos.

Ainda segundo os responsáveis, a natureza dos próprios trabalhos, levados a cabo em

regime preventivo na primeira fase, mas, numa segunda, acompanhando os trabalhos de

8 Paixão & Faria 1996 9 Idem 10Idem

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

construção civil que vieram a efectuar-se, impuseram exigências em tudo semelhantes

às das intervenções arqueológicas de emergência em meio urbano. Referem que os

achados terão sido efectuados no quadro de escavações efectuadas numa zona com

reduzida espessura ou potência estratigráfica, por isso, apenas se obteve uma definição

mais consistente das camadas arqueológicas em áreas pontuais do recinto escavado. No

entanto, é significativa a densidade de estruturas sobrepostas, sobretudo paredes que se

cortam, entrecruzam, e interrompem, demonstrando a importância do local como um

dos núcleos fundamentais das sucessivas operações de ocupação ao longo do tempo.

Assim, na área intervencionada do Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, sob a área

do claustro, encontraram-se vestígios de muros da época medieval assentes,

parcialmente, em paredes da época romana. Estas, por sua vez, sobrepõem-se a

estruturas pré-existentes, datáveis da Idade do Ferro.

As estruturas da Idade do Ferro ladeiam um arruamento com a largura média de 3,50 m

que parece ter sido concebido já na fase inicial de urbanização do povoado. O

arruamento desenvolve-se no sentido NE/SW. Posto a descoberto numa extensão de

cerca de 50 m, continuaria a ser utilizado nos inícios da ocupação romana do local,

altura em que foi pavimentado e provido de uma vala de esgotos (Paixão & Faria 1996).

Foram ainda aí detectadas as ruínas de um santuário da época romana, cujas estruturas

imbricam num conjunto arquitectónico pré-romano, extremamente raro e com

informação arqueológica bastante rica. (vide anexo 5.2)

A escavação arqueológica no Castelo de Alcácer do Sal realizou-se por camadas

artificiais sendo registadas as cotas de topo e da base de cada camada, correspondendo a

valores do eixo Z (cotas absolutas). Nas etiquetas de campo associadas aos materiais

recolhidos, não há geralmente referência às camadas naturais, daí que, no mesmo

intervalo de Z coexistem frequentemente cerâmicas de cronologias diferentes,

verificando-se elevados índices de mistura.

Na área do santuário, foram encontradas duas terracotas, uma estatueta com a figura de

uma águia que carrega uma figura humana nas suas garras e uma cabeça. Ainda neste

local surgiu um importante conjunto de figurinhas de bronze, umas zoomórficas e outras

antropomórficas que, pelas suas características e contextualização estratigráfica, são

atribuíveis aos finais do século V a.C., inícios do século IV a.C. De entre os adornos e

amuletos, a mais notável peça descoberta, igualmente na área do santuário, é um talismã

egípcio de osso esculpido que mede apenas 14 mm de comprimento. Uma das faces

exibe a representação do olho de Horus, deus egípcio, filho de Osíris e de Ísis,

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

caracterizado como divindade protectora e fonte de

vida. Na face oposta, encontra-se a figura de um

quadrúpede ungulado, provavelmente o boi Ápis ou

a vaca Hathor. Este artefacto constitui mais um

admirável testemunho dos contactos com os povos

do Mediterrâneo Oriental possibilitados pelas rotas

comerciais fenícias.

As paredes do “santuário” são constituídas por muros construídos com pedra aglutinada

por argila, as maiores nas laterais e as mais pequenas no interior. Estas estão sob os

muros romanos, no entanto alguns deles foram reaproveitados para a construção do

santuário romano. Não se evidenciam vestígios de rebocos devido ao aproveitamento

em época posterior. É provável que tivesse um pátio a céu aberto, com altar e um

receptáculo para conter água. Existe um pequeno tanque, impermeabilizado, adossado à

parede sul do pátio romano, que pela sua construção poderá ser da Idade do Ferro, pois

foi fabricado com pedra miúda e argila. A este espaço sagrado estão associadas várias

salas, algumas das quais de formato rectangular alongado, que podem ser interpretadas

como armazéns.

É provável que existisse outro lugar sacro, localizado a norte, do outro lado da calçada.

Nesse lugar, foram encontrados dois ex-votos de bronze, um representando um

guerreiro, outro um membro inferior.

No sector “L”, no interior do claustro, existe uma

estrutura de forma rectangular, interpretada como

lareira doméstica, mas que poderá ser um altar em

forma de lingote cipriota, pois são visíveis dois muros,

um a sul, adossado a uma parede no sentido norte-sul, e

outro a oeste, adjacente a outra parede no sentido este-

oeste, e ao qual encosta um pavimento de cor ocre ou

esbranquiçado, com vestígios de fogo. (vide anexo 5.3)

Fotografia de lareira

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

III - As peças

Numa zona relacionável com um lugar de culto, apareceram vários objectos de carácter

votivo11e outros de carácter mágico12/protector. São objectos de bronze, pequenas

figurinhas que retratam pessoas e animais, e peças de terracota, que representam a

divindade Átis e o Ganimedes, dois jovens troianos, disputados por deuses devido à sua

beleza. Estes objectos de culto surgiram em áreas específicas. A maioria dos ex-votos

surgiram no sector “L”, os outros estão distribuídos pelos sectores “I”, “B” e “N”. As

terracotas foram exumadas no sector “E”.

3.1 – Peças metálicas (vide anexos 2.6, 2.7, 2.8 e 5.4)

No santuário surgiu um importante conjunto de figurinhas de bronze, umas zoomórficas

e outras antropomórficas, que, pelas suas características e contextualização

estratigráfica, são atribuíveis aos finais do século V a.C., inícios do século IV antes de

Cristo.

Estas estatuetas podem ser agrupadas em três tipos: os guerreiros, os orantes e as

representações de animais quadrúpedes. Quanto às imagens zoomórficas, representam

grandes herbívoros, nomeadamente um equídeo, um canídeo e alguns bovídeos.

Os ex-votos de bronze que foram descobertos distribuem-se por dez orantes, sendo oito

masculinos e dois femininos, dois

guerreiros, oito representações

zoomórficas (cinco bovinos, dois

equídeos e um canídeo), três partes

do corpo humano (um braço, uma

perna e um pé), dois pesos e parte de

um incensário.

11 Voto ou promessa feita deliberada e livremen12 De carácter sobrenatural

Quantidades percentuais dos ex-votos de bronze por categorias

Guerreiros8%

Orantes37%

Zoomórficos31%

Pé4%

Perna4%

Incensário4%

Pesos8%

Braço4%

te à divindade, súplica feita ao deus

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3.1.1 – Orantes

Orante é aquela pessoa que quando se desloca ao santuário e que, adoptando uma

atitude de saudação, de imploração, de humildade e de respeito, se dirige à divindade13.

Podem adoptar diversas posições, os braços caídos ao largo do corpo, apoiados com as

mãos na cintura ou adiantados com as palmas das mãos viradas para cima, braços

ligeiramente afastados e levantados para cima com as mãos ao nível da cabeça, ou tendo

as mãos no peito.

Os ex-votos masculinos dividem-se em orantes e ofertantes. Os ofertantes, em número

de dois, apresentam-se em posição de oferta, de pé, com o braço direito flectido e virado

para a divindade, provavelmente presenteando algo. O braço esquerdo apresenta-se

caído, acompanhando a perna em uma das peças, enquanto que na outra o braço está

colocado sobre o peito.

Os orantes estão representados por seis figuras de bronze, quatro indivíduos masculinos

e dois femininos, estando todos de pé, de pernas afastadas e de braços erguidos para o

céu.

3.1.2 – Guerreiros

O guerreiro é uma pessoa geralmente do sexo masculino, que combate em guerras. A

sua importância nas sociedades da Idade do Ferro levou a que fosse representado sob a

forma de estátuas, estelas ou, como é o caso, de figurinhas de bronze.

São dois os guerreiros de bronze de Alcácer do Sal. Apresentam no braço esquerdo, que

está estendido, um escudo redondo e, no braço direito, também estendido, existiria uma

adaga ou espada. Apresentam-se de pé, estando um destes nu da cintura para baixo e o

outro aparenta estar vestido.

3.1.3 – Zoomorfos

Os animais são representados por quatro estatuetas de boi ou vaca (sendo uma delas a

representação apenas da cabeça), um cavalo, um burro e um cão. Estas figuras ilustram

a importância que estes animais tinham para a sociedade em geral e para o indivíduo em

particular, pois do gado dependia a sua sobrevivência, para o transporte de mercadorias

e de pessoas, para o trabalho de lavoura, alimentação, vigilância e guardaria.

13 Nicolini 1968

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Bovinos

O Boi – a Vaca

O Bos primigenuis Bojanus,1827 (ou boi selvagem) foi domesticado durante o

Neolítico, dando origem ao Bos taurus L., 1758, que é hoje o boi doméstico. A espécie

selvagem continuou porém a existir até à Pré-História recente na Península Ibérica, ou

mesmo até ao período Proto-Histórico.

Não se sabe ao certo quando foi extinto o auroque no território actualmente português

ou na Península Ibérica. Vestígios deste animal surgiram no Calcolítico, no povoado

fortificado do Zambujal (Torres Vedras), na Sé de Lisboa em contextos da Iª Idade do

Ferro14, assim como em Espanha, em Salamanca, na Extremadura Espanhola e no vale

do Guadalquivir.

Os últimos exemplares de Auroque foram mortos na Polónia no século XVII (1628)15.

Para além do aproveitamento da sua carne e

do leite, era usado em trabalhos pesados,

como animal de tracção, na utilização do

arado, na abertura de trilhos e no transporte

de mercadorias. Deste animal aproveita-se

ainda o sangue, o couro, o excremento, e

alguns ossos e o corno, sendo também

utilizado para desporto e distracção. O

auroque terá sido domesticado durante o

Neolítico no Próximo Oriente e provavelmen

aparecimento das primeiras raças de bois dom

ainda durante muito tempo, podendo até ter

espécies (a doméstica e a selvagem)16.

Os mais antigos vestígios do boi doméstico en

Antigo, na Gruta do Caldeirão17. O uso do bo

começado no Neolítico Final18.

A domesticação dos bovinos terá sofrido ao lon

tarefas impostas pelo homem. O homem pri

14Cardoso 2004 15Guintard 1994 16 Idem 17Rowley-Conwy 1992 18Cardoso 1995

O Auroque de Augsbourg, ilustração datada de 1525. Segundo Guintard, 1994.

te em outros lugares, o que levou ao

ésticos. Estes e o auroque coexistiram

ocorrido cruzamentos entre estas duas

contrados em Portugal são do Neolítico

i como força motriz na agricultura terá

go do tempo alterações, adaptando-se às

vilegiou a reprodução de animais mais

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

produtivos, principalmente para a obtenção de carne19 e leite, assim como animal de

carga, de arado ou de transporte20.

A admiração pela força do touro bravo levou o Homem a tomá-lo como exemplo.

A ordenha terá sido praticada desde muito cedo e o leite de vaca foi o de mais largo

consumo, apesar de os leites de ovelha e de cabra também serem muito utilizados.

Plínio refere que o leite de camela é o mais doce e que povos costumavam misturar

farinha de milho-miúdo com leite de mula ou com sangue extraído da veia da perna do

cavalo. Heródoto refere que o leite de mula era desnatado e que os povos apreciavam

sobretudo a nata.

Do leite obtinha-se a manteiga, o leite fermentado (a coalhada)

e o queijo.

Fonte: Bicharada.net

Segundo Columela, o leite fermentado podia ser consumido

sob três formas distintas: oxygala, bastante sólido, que era

salgado; o melca, mais fluido, diluído com vinagre em

ebulição; e schiston, invento dos médicos contemporâneos de

Plínio, que por si só era um prato e que figura na obra de Apício, que aconselha a

consumi-lo com pimenta, liquamen ou sal, azeite e semente de coentros.

O fabrico de queijo era um meio prático de conservar o leite

em excesso que não pudesse ser distribuído ou consumido ou o

leite proveniente de animais em pastagens de Verão distantes

do aldeamento. Foi utilizado para oferendas funerárias no

Egipto, assim como na Mesopotâmia, para oferendas religiosas

pelos Hititas. Fonte: Bicharada.net Os pratos nos quais era utilizado leite ou queijo tiveram grande

apreço entre os Gregos - segundo Homero, existia um preparado de farinha de cevada,

mel, vinho e queijo de cabra ralado. Em época romana, existiam queijos fumados,

frescos ou curados que contituíam importante ingrediente de bolos e dos pães.

19 Segundo Cardoso (2000) os restos de boi doméstico encontrados em Santarém, na Quinta do Almaraz (Almada), em Abul (Alcácer do Sal), no Castelo de Alcácer do Sal e na Rocha Branca (Silves), demonstram que era a espécie mais abundante em relação às outras ao nível da dieta alimentar. Talvez indique o aumento do gado bovino sobre as outras espécies domésticas e selvagens, indicando uma tendência para formas de alimentação (como os churrascos) mais estáveis e melhor organizáveis. Isso levaria que, ao longo do ano, um grupo humano se dedicasse à pastorícia do gado bovino. A presença de boi doméstico deve-se, também, ao facto de terem existido as condições próprias na região, como as pastagens, na área adjacente do povoado. 20Regala 2007

25

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

A importância do gado bovino

A domesticação21 originou uma alteração na economia do mundo antigo. Houve a

necessidade de seleccionar solos e terrenos para pastos e forragens para criação de gado.

Estes animais são aproveitados para a tracção de veículos (carroças) e para transporte de

cargas pesadas. Posteriormente, as carroças ou carros passam a ser puxados pelo cavalo,

mais veloz e ligeiro, relegando-se o boi para um transporte de cariz mais lento e pesado.

A sua carne era um produto de consumo para as classes mais afortunadas e para os

deuses (através de oferendas). A sua pele era aproveitada para o vestuário, calçado,

revestimentos e muitos outros fins.

O corno era também um material muito apreciado para o fabrico de objectos diversos,

sendo exemplo os adornos de tiara e coroas das divindades orientais. Os cornos afiados

tornaram-se emblemas de elite, sendo envergados nos capacetes militares como símbolo

de valor e arrojo em combate.

O esterco produzido por estes animais servia como fertilizante, combustível e podia até

mesmo ser utilizado para a produção de revestimentos para as paredes de casas22.

A importância económica do gado bovino reflectia-se no seu elevado preço, sendo

também dispendiosa a criação. Assim, esta espécie tornou-se um símbolo de riqueza e

de ascensão social. Os bovinos eram usados como recompensa ou dádiva entre os

poderosos, por vezes exigidos como imposto ou tributo. Com o hábito estes animais

foram transformados numa unidade de referência e em moeda não metálica. Devido à

dificuldade gerada pelo facto de serem indivisíveis, começou-se por utilizar pesados

lingotes de bronze ou cobre cujo peso estava relacionado com o valor económico

atribuído ao boi. Por esse motivo, estes lingotes eram produzidos com a forma da pele

do touro estendida.

Os produtos da terra e os animais foram as matérias-primas das oferendas religiosas. A

sagrada missão reservada ao touro foi a de servir como elemento de troca, tributo e

oferenda do devoto para os deuses, convertendo-se num símbolo do dom da fertilidade e

num apreciado alimento nas cerimónias rituais, onde o seu sangue era muito

importante.

Neste contexto, as figuras de bovinos de bronze que eram colocadas no santuário podem

assumir interpretações diversas adiante discutidas.

21Chaix & Méniel 2001 22Idem

26

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Equídeos (cavalo, burro)

O Cavalo (Equus caballus L., 1758)

Fonte: Imagen Horse_hjerl_hede_2004_ubt.jpeg_ficheiros.

O cavalo, tal como outros animais, foi objecto de uma intensa exploração como fonte de

alimento23 e devido, provavelmente, às

qualidades nutricionais da sua carne foi

integrado no universo doméstico. Terá sido

caçado primeiro pela sua carne e só mais tarde

adoptado como animal de montaria e de carga24.

Para a sua domesticação havia a necessidade de

capturar o animal vivo e guardá-lo vivo, fosse

como animal de carne ou de montaria.

A utilização do cavalo para a montaria, para o

transporte de cargas e para as deslocações

rápidas implicaria uma tradição de criação de gado.

As modificações das relações entre os homens e o despontar de novas necessidades

levam a uma hierarquização social que é bem visível pelo o aumento do cavalo no

contexto das sociedades. A modificação de noção e da utilização do cavalo que

intervém num contexto de mudanças a nível social e económico e do aparecimento de

vastas redes de trocas supra-regionais, levam a compreender as vantagens que

representa o domínio da potência e da rapidez deste animal.

Na Idade do Ferro, as práticas religiosas implicando animais revestem-se de diversas

formas. Os animais podiam ser incluídos em ritos funerários nas necrópoles, podiam ser

sacrificados nos santuários ou constituir oferendas que eram depositadas em

circunstâncias mais ou menos explícitas e em sítios mais ou menos isolados25.

O consumo da carne de cavalo assume um estatuto particular, praticando-se em algumas

comunidades, mas não em outras. O cavalo distingue-se de outros animais de consumo,

não fazendo parte das oferendas alimentares depositadas nas sepulturas, nem na ementa

dos banquetes que aconteciam nos santuários. A sua implicação nas práticas rituais

reveste formas específicas que ele partilha com o homem26. A cumplicidade do trabalho

efectuado em comum durante uma vida de labuta faz com que estes animais gozassem

de uma consideração particular. 23Arbogast & alguns 2002 24 Idem 25 Idem 26 Idem

27

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Sacrifícios em santuários têm um carácter guerreiro. As éguas, não sendo consideradas

como montadas de guerreiro, não têm lugar no culto do guerreiro, assim como os

cordeiros27.

A criação de animais no Final da Idade do Bronze traduz-se por um aumento sensível

dos efectivos equinos. O cavalo é desde logo objecto de uma exploração diversificada.

A utilização da energia e do prestígio que confere sem dúvida a detenção destes animais

não excluem o seu consumo, quer se tratasse duma utilização de animais idosos ou de

uma exploração de potros mais especificamente destinados ao consumo da carne.

A representação do cavalo reflecte o papel importante que ele joga na vida quotidiana,

no campo dos transportes e na reprodução, mais que na alimentação. Porque é nas

deslocações e nos transportes, devido à sua rapidez e à sua potência que o cavalo revela

verdadeiramente as suas vantagens28.

A domesticação do cavalo é encarada como uma extensão da influência ou autoridade

do homem sobre os seres vivos.

Um dos primeiros serviços ao qual o cavalo estaria destinado faria uso da sua

velocidade para assegurar ou aumentar o controlo de outros animais selvagens ou

domésticos29. Terão sido utilizados, também, para a caça a outros cavalos.

Sem a mestria da equitação, não se pode conceber a criação do gado cavalar. Com esta

habilidade aumentava a eficácia dos pastores para cuidar dos seus rebanhos, na guarda e

na organização do gado ou ao caçador na perseguição da caça. O cavalo representa

assim um instrumento de dominação sobre os outros animais. Estabeleceu-se uma

hierarquia entre o homem e o cavalo por um lado mas, também, entre este “par” e as

outras espécies, como auxiliar do homem para a condução de rebanhos, ou parceiro de

caça (o cão também tem este papel)30.

O Burro (Equus asinus L., 1758)

Fonte: Burro_domestico.html

Mamífero menos corpulento que o cavalo, tem a

cabeça mais volumosa e orelhas muito

desenvolvidas, de cauda nua na sua inserção e que

termina por um tufo de crinas. A sua pelagem é

27 Arbogast & alguns 2002 28 Idem 29 Idem 30 Idem

28

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geralmente cinzenta. A vista, o ouvido e o olfacto são mais apurados que os do cavalo.

A sua domesticação deu-se no Egipto e era utilizado como besta de carga para

caravanas. Durante a 5ª dinastia (2500-2340 a.C.), o burro era representado com essa

função e, da mesma época, constam os primeiros censos patrimoniais de asnos. Nesta

altura havia mercadores Assírios que traficavam/negociavam burros entre os Hititas e a

Mesopotâmia31. (existe um estandarte muito famoso de Ur, onde aparecem burros como

animal de tracção, datado do 3º milénio a.C.32).

Fonte: Burro_selvagem.html

O burro selvagem cruzado com o doméstico

produz híbridos totalmente férteis. Teve um

grande aproveitamento para a produção de mulas

(cruzamento entre um burro e uma égua), que

ocuparam um lugar de primeira ordem nas

actividades económicas nos períodos antigos33.

Dos cruzamentos entre cavalo e burra nascem

machos, que tiveram menos sucesso. Ambos os

tipos de cruzamento se praticaram na Antiguidade

como demonstram algumas pinturas e baixos-relevos no Egipto por volta de 1400 a.C.

(os machos) e na Assíria, as mulas por volta de 800 a.C. Tal implica que para existirem

estes cruzamentos, o homem tinha que já ter domesticado o cavalo e o burro, e que essa

domesticação seria antiga, já então.

Segundo Columela, logo que o burro macho nascia, ele era colocado a mamar na égua,

o que facilitava depois o seu cruzamento quando adulto34.

No Egipto, o burro aparece puxando o arado.

O gado asinino35 foi sempre importante e necessário aos trabalhos do campo e da

quinta. As tarefas dadas ao burro foram sempre as mais duras; serviam para lavrar os

terrenos, puxar as pesadas carroças ou fazer girar as noras para obter a água dos poços.

Não só puxavam as carroças como ainda transportavam os donos, transportavam cargas

31 Bernis 2001 32Idem: 154 33 Arbogast & alguns 2002 34 Bernis 2001 35 Existem restos de equus asinus na Quinta do Almaraz e na Rocha Branca, em Portugal e no Cabezo de San Pedro e no Cerro de la Tortuga, em Espanha. Estes ossos indicam que terão sido consumidos, pois têm marcas de terem sido comidos, provavelmente em cozidos, poupando-os à fracturação que decorria do churrasco, segundo Cardoso (1993). Segundo Cardoso (2000) o burro é considerado como de introdução fenícia na Península Ibérica e que a sua ocorrência em território potuguês vem estender a distribuição da espécie, em época centrada no século VI a. C.

29

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pesadas no dorso que incluíam os próprios donos. Eram os animais de carga da

população e dos agricultores com menos posses, sendo considerado o “cavalo” do

pobre.

Canídeos

O Cão (Canis familiaris L., 1758)

O lobo, Canis lupus, animal selvagem, é um canídeo moldável que prosperou, e que

ainda prospera, tanto na tundra, no bosque, na estepe ou no semi-deserto.

Competidor ou associado ao homem caçador teve que

contactar frequentemente com o homem durante o

Paleolítico36, altura em que se teria dado a sua

domesticação, existindo restos de cão domesticado no

Mesolítico português37. Assim, o cão é o mais antigo

animal doméstico38.

Fonte: www.bragancanet.pt/patrimonio/faunalobo.ht

O cão também terá servido não só como auxiliar na

caça e como cão de guarda, como também de alimento,

existindo evidências de consumo de cão na Idade do

Ferro em território português39, segundo João Luís

Cardoso40. Também no Egipto os cães podiam ser seleccionados para a

caça e outros para alimento.

Fonte: povodebaha.blogspot.com/2008/06/o-dia-da-raa.html

Soyer (1853) refere que os Gregos consumiam carne de cão e que a

consideravam boa, pelo menos essa era a opinião de Hipócrates, que

este quadrúpede constituía alimento são e ao mesmo tempo leve.

36 Bernis 2001 37 Cardoso 2007:174-175. 38 Bernis 2001 39 Presença de restos de cão na Rocha Branca. Era um cão de pequeno tamanho, utilizado na guarda de rebanhos como também na alimentação, um golpe numa vértebra denuncia o seu aproveitamento culinário e que esta prática era conhecida dos fenícios, segundo Cardoso (2000). Foram encontrados ossos de canídeo em Ascalón no Próximo Oriente; em Sant’ Antioco na Sardenha; em Lixus no Norte de África; San Ginés em Ibiza, em Cartagena, Castillo de Doña Blanca, Toscanos, Huelva (La Joya e Cerro de la Tortuga), Cádiz, em Espanha; na Quinta do Almaraz e no depósito votivo do Garvão, em Portugal, demonstrando a diversidade de rituais, desde indivíduos mortos naturalmente e enterrados com cuidado, até animais consumidos, procedentes tanto de contextos sacros e funerários como de habitação. Cães sacrificados e oferecidos à divindade em diferentes contextos e com diversos significados, sacrifícios funerários e propiciatórios, segundo Niveau (2004). 40 Cardoso & Gomes 1997

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Os Romanos (ainda segundo Soyer), apreciavam a carne de cão e preparavam-na da

mesma forma que a lebre, cujo paladar consideravam semelhante.

A domesticação

Em grande parte dos mamíferos domésticos, os nascimentos dão mais ou menos tantos

machos como fêmeas, mas um desequilíbrio é produzido pelo o homem, tendo em vista

uma maior produtividade41.

Para as espécies de consumo de carne, nota-se uma forte proporção de fêmeas em

relação aos machos. Estas, na realidade, fornecendo produtos clássicos como a carne, a

gordura, o sangue, a pele, a lã, e o fertilizante proporcionam também o leite e as crias.

Na realidade, no caso dos bovinos (como também nos caprinos), basta um só macho

para assegurar a sobrevivência de uma manada ou de um rebanho com uns oitenta

animais. Portanto, o mais habitual é existirem mais fêmeas, devido à sua versatilidade.

Tudo do animal era aproveitado e para isso havia a necessidade de se encontrar as

condições adequadas para tratar as matérias orgânicas. Ter um espaço para a secagem

com forte circulação de ar ou um abrigo para usar a imersão e longe da corrente de ar.

O sangue era aproveitado para rituais e pinturas. O leite utilizado para a alimentação,

queijos e seus derivados. Servia para amamentar as crias humanas42.

A gordura era aproveitada como óleo para as lamparinas. A carência de vitamina A nos

humanos pode levar a graves doenças, como as lesões da córnea ocular ou a “cegueira

nocturna”, que é a incapacidade de ver com luz fraca. Para tratar essas doenças,

recorria-se ao fígado de boi, que tinha efeito rápido (segundo o Papiro de Eber, de 1600

a.C., ou segundo Hipócrates e Galeno). Hipócrates aconselhava que em caso de cegueira

nocturna se devia comer fígado de boi com mel43.

As matérias moles, os pelos, o corno, a lã, os tendões, vísceras, os excrementos eram

utilizados pelo homem para vários fins.

O osso foi utilizado para fabrico de artefactos, e a medula óssea/tutano para

alimentação. A pele era usada para vários fins, para confeccionar roupa, e com fins

rituais. A lã foi um produto que jogou um grande papel no desenvolvimento das

sociedades humanas.

41 Chaix & Méniel 2001 42 Idem 43 Idem

31

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Na Idade do Ferro, o corno era usado para o fabrico de diversos objectos, como copos

de lanternas, cornos para beber, cabos de facas, pentes, botões, etc.

A utilização dos tendões já vinha desde o Paleolítico Superior, para fazer cordas. Os

intestinos de animais foram usados para a confecção de cordas de arco, e também a

bexiga, para enchidos, para a conservação da carne ou para comer44.

3.1.4 – Pesos (vide anexos 4.3)

Segundo Garcia-Bellido (2003), os pesos constituíam, provavelmente, um valor

monetário e de sacralidade. É devido a estas funções e características que os pesos eram

oferecidos à divindade, ficando ao seu cuidado como garante do seu justo uso.

Ainda segundo Garcia-Bellido45, os pesos, ao surgirem em conjunto com outros

objectos de prestígio, assumem uma função que não era exclusivamente prática, de

controlo de peso, mas também como objectos de estatuto do santuário. Os pesos

serviriam para pesar o ouro, prata, outros metais, vários géneros alimentares e outras

substâncias. O aparecimento deste novo modo de medir vem acentuar a importância do

comércio.

Os pesos seriam elementos fundamentais para o controlo económico, regulando as

unidades de medida.

Os pesos podiam ser de chumbo, de bronze e de pedra. Os de chumbo eram fundidos a

molde e recebiam alta proporção de estanho. O estanho rebaixa o peso, podendo esta

liga (de chumbo e estanho) ser propositada para enganar o comprador. De notar que o

estanho era escasso e caro. Possuir pesos de bronze era um luxo, uma vez que o chumbo

era mais corrente.

Os pesos de bronze da Península Ibérica são datados do século V ao III a.C., e o sistema

de pesagem é datado da segunda metade do século V a.C46.

Os pesos de Alcácer do Sal têm a forma de um cubo. Na Península Ibérica, os pesos são

habitualmente redondos, perfurados e têm sinais circulares (marcas), perto do rebordo.

Os de cubo, do Cerro del Villar, não têm perfuração, mas têm letras fenícias incisas.

Estas formas cúbicas ou paralelipipédicas são as mais frequentes em todo o mundo

fenício. São datadas dos finais do século VIII, princípios do VII a. C.47

44 Chaix & Méniel 2001 45 Garcia-Bellido 2003 46 Idem 47 Idem

32

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Significado dos pesos?

Que significa a sua presença no santuário? Estaria relacionada com o comércio? Ou

com a balança perante a vida ou a morte? Teria a tarefa de pesar o carácter/natureza

humana do penitente quando este se deslocava ao santuário, ou de pesar a alma do

morto no caminho do além perante o juiz dos mortos? Ou, aquando da sua colocação no

santuário, teria a função de pedir protecção para o comércio, para o comerciante, ou

para o indivíduo não cair em tentação de fraude e de fugir ao justo uso do peso?

No contexto em que eles foram encontrados, os de Alcácer do Sal poderiam

desempenhar um papel fundamentalmente votivo, sem prejuízo de uma utilização

anterior à sua colocação como oferenda, desligada de qualquer ritual ou religião.

3.1.5 – Thymiaterion (vide anexo 4.4)

Segundo Jiménez Ávila (2002), o timiaterio era um objecto usado para queimar incenso

ou outras substâncias odoríficas, normalmente em cerimónias de carácter cultual. Estes

objectos podiam ser de importação, de criação colonial ou imitações locais. A técnica de

fabrico terá sido a da cera perdida em oco.

Ainda segundo este autor, são dois os métodos de fabrico destas peças, podendo ser

fundidas numa só peça ou em peças separadas. Os procedimentos de montagem destas

peças individuais realizavam-se sempre de modo mecânico.

Nas peças fundidas em separado, encaixavam-se os tubos, que são ocos, de forma a não

se desprenderem. Depois era-lhes colocada uma plataforma superior que fechava o

conjunto. O acerto das peças realizava-se através de pregos ou rebites colocados

horizontalmente.

As modalidades de montagem da plataforma são duas, “...(b- 1) la plataforma se sujeta

sobre un casquete cilíndrico que aprisiona la pieza superior y que incorpora las típicas

molduras decorativas. En la segunda (b- 2) de la plataforma brotan, hacia la parte

inferior três pestañas perforadas que se insertan en el cilindro dejado en la pieza

superior que es la que lleva en est caso las decoraciones48”. Segundo Jiménez (2005), os

mais relevantes suportes encontrados na Península Ibérica foram fabricados com as

técnicas b-2, podendo recorrer em parte ao outro sistema também. O timiaterio pode ser

constituído por um suporte com pé e um recipiente para conter as brasas quentes e a

substância aromática. Podia existir ainda uma tampa que permitia a saída do fumo.

48 Jiménez Ávila 2005: 1102

33

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Outra forma de timiaterio apresenta-se sem recipiente. Neste caso, o receptáculo ou

queimador pode ser independente.

O uso do recipiente facilita a utilização de matérias sólidas incandescentes. Este

receptáculo permanece fixo e estável, unido ao suporte, de modo que não há a

necessidade de o tocar, evitando assim possíveis queimaduras49.

Os timiaterios cipriotas foram fabricados em várias peças autónomas, que depois se

encaixam entre si, e não teriam a função de queima-perfumes, mas sim de suporte de

lucernas50.

Os timiaterios encontrados na Península Ibérica enquadram-se numa cronologia que vai

do século VII a.C. ao século VI a.C. Os do século VII a.C. podem ser considerados

como uma produção fenícia, com referências iconográficas no mundo semita. Em finais

do VII a.C., os timiaterios acusam um processo de decadência que se traduz na

diminuição do seu tamanho, seguindo modelos da cerâmica fenício-púnica. No século

VI a.C., receberam as influências gregas51, sendo possível que a sua utilização como

objectos antigos atingisse, em alguns casos, o século II a.C52.

O suporte de Alcácer é oco e de secção circular, com uma decoração em caneluras.

Numa das extremidades, tem um furo que está danificado, e na outra, tem dois furos

paralelos. É provável que estes furos servissem para encaixar um aplique de decoração

ou facilitassem o encaixe de outros componentes da peça.

Quando foi recolhido, este artefacto continha vestígios de madeira no seu interior, os

quais desapareceram no decurso do tratamento de conservação. É uma peça bem

trabalhada e poderia ser semelhante ao timiaterio de Villagarcía ou ao de La Joya: “...se

compone de once piezas de bronce entre base, tubos, cazoletas, fustes y capullos.

Además, en el interior se uso una pieza cilíndrica de madera.”53. São peças

cronologicamente enquadráveis no século VII a.C.

A função principal do timiaterio estaria relacionada com oferendas por intermédio do

fogo, ou talvez, servisse simplesmente para aromatizar o ambiente. Tenha uma ou outra

função, ele está associado ao culto religioso54.

Segundo Jiménez (2002), os timiaterios são um dos elementos que ilustram o processo

de orientalização da Península Ibérica durante o século VII a.C., reflectindo a adopção, 49 Jiménez Ávila 2002 50 Idem 51 Jiménez Ávila 2005 52 Jiménez Ávila 2002 53 Jiménez Ávila 2002: 195 54 Jiménez Ávila 2002

34

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

por parte da sociedade indígena, de práticas religiosas exógenas. Reflecte um claro

exemplo de aculturação, através da adopção de crenças, mais ou menos copiadas,

utilizadas pelos fenícios nas suas colónias.

3.1.6 – Composição e fabrico

Bronze

O uso dos metais foi um passo muito importante dado pelo o Homem para o domínio

dos recursos naturais. Envolve um conjunto de inovações tecnológicas que são

consequência do desenvolvimento de novas capacidades e diferentes modos de pensar55.

O bronze é uma composição metálica composta por dois elementos principais, o cobre56

(com presença não inferior a 70%) e o estanho57.

A proporção mínima de estanho para que a composição passe a ser considerada bronze

deve ser superior a 1%, ainda que o coeficiente óptimo se encontre por volta de 10%. O

estanho provoca a fluidez da mistura, tornando-se os fundidos mais homogéneos

adaptando-se melhor aos moldes para onde irão ser vertidos. A adição de estanho reduz

a absorção de gases, diminuindo o risco de formação de ocos e bolhas que deterioram e

debilitam a fundição. O estanho reduz a tendência do cobre a contrair-se e rachar-se

(gretar) durante a fase de esfriado (arrefecimento)58.

As fundições de bronze são muito mais consistentes e menos porosas que as de cobre,

que foram as mais usuais antes da generalização do uso do estanho. Os objectos do

bronze resultam mais resistentes.

A adição de chumbo59 dá lugar aos bronzes ternários, assim chamados por apresentarem

três elementos básicos (cobre, estanho e chumbo), bastando 2% de chumbo na mistura

para obter uma maior fluidez.

Técnicas utilizadas no trabalho dos metais

As técnicas utilizadas no trabalho dos metais dividem-se em dois processos de

laboração, a directa (a técnica mais antiga e a mais simples) e a indirecta.

55 Informação prestada por Margarida Santos 56 Presença de cobre em Santa Susana (Alcácer Sal), Montemor, Lousal e Caveira (Grândola) Carta mineira de Portugal, Direcção Geral das Minas e Serviços Geológicos, Serviços Geológicos de Portugal, Escala 1:500000, 1960 57 Presença em Monforte 58 Informação prestada por Margarida Santos 59 Presença em Monforte, Campo Maior e Elvas

35

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Na laboração directa, a acção incide directamente sobre o metal através da “placagem”

ou folhagem, que inclui a “martelagem” (processo em que o metal é batido em folha a

frio ou a quente) e a “repuxagem” (o metal é batido em folha de dentro para fora dando

um relevo equivalente ao baixo-relevo)60.

A laboração indirecta é a técnica de fundição que está associada à moldagem. No Egipto

(por volta de 5000 a.C.) e na Mesopotâmia (por volta de 4000 a.C.), surgiram os

primeiros objectos fundidos. A técnica da fundição substitui rapidamente a “placagem”

e a “folhagem”, implicando assim a criação de um modelo.

Inicialmente, a fundição era feita em moldes de

pedra ou de barro cozido, simples e abertos em duas

partes, de onde se obtinha objectos maciços. Com o

tempo, os moldes tornam-se fechados, com apenas

dois orifícios, um para a entrada do metal fundido e

outro para a saída dos gases61.

Segundo Prados Torreira, 1992

O processo de cera perdida é um dos processos

mais antigos de fundição datado dos finais do IIIº

Milénio a.C., que passou a ser o mais usado a partir

do IIº Milénio. Neste processo, há dois métodos,

podendo o modelo ser de cera ou de barro coberto

com cera ou, ainda, modelo de barro ou de gesso,

do qual se faz uma prova que é posteriormente

coberta de cera. A prova ou o modelo original são

envolvidos por um molde, geralmente de barro, e a

cera no interior é derretida e extraída do molde fechado, para ser substituída pelo metal.

Este processo permite a obtenção de um único exemplar62.

Segundo Nicolini (1969), este processo de cera perdida foi a técnica que convinha,

provavelmente, ao fabrico de pequenas peças de bronze, com medidas compreendidas

entre 4 e 12 cm ou 6 a 8 cm, durante a Idade do Ferro.

O molde podia ser de uma só peça (como o de Despeñaperros63). A terra era aplicada

sobre a estatueta de cera, moldada com mais ou menos cuidado. Depois o conjunto era

colocado ao sol para secar, ou submetido a corrente de ar. Aquecia-se depois o molde 60 Informação prestada por Margarida Santos 61 Idem 62 Idem 63 Nicolini 1969

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num forno para cozer parcialmente ou completamente, e a cera escorria pelos buracos

abertos na base64.

Grande parte das estatuetas foram concebidas com a cabeça para baixo, sendo o metal

líquido introduzido pela parte dos pés, onde os jactos de fusão são por vezes visíveis na

peça final. Nestas condições, formam-se nos pés das estatuetas duas pequenas colunas

de bronze.

Segundo Prados Torreira, 1992

A estatueta, depois de moldada,

era novamente trabalhada com a

lima para apagar as

imperfeições. Algumas delas

eram retocadas e aperfeiçoadas

para que a peça ficasse com um

aspecto final melhor e mais

natural.

As estatuetas de pequeno

tamanho, as mais esquemáticas,

são moldadas para indicar os traços da cara ou da roupa. No entanto existem outras, os

nus em particular, que só foram trabalhados com a lima.

As incisões faziam-se recorrendo a um buril com ponta afiada ou, talvez, a um ponteiro,

provavelmente de ferro, mais duro do que o bronze. O trabalho com buril serve para

indicar os limites da indumentária, os traços da cara, os membros e os adornos65.

O punção apresentava uma extremidade cortante de forma circular, perfurado por um

buraco, com um diâmetro de aproximadamente um milímetro. Batido com um golpe de

martelo, o punção deixava no bronze a marca de um pequeno círculo côncavo, mais ou

menos profundo. Este pequeno círculo servia para múltiplas funções, podendo figurar a

íris do olho, os mamilos, os tornozelos, as pérolas do colar, o bordo do manto ou os

elementos de uma fivela de cinturão.

O trabalho com cinzel era utilizado para dar, grosseiramente, a forma da boca. O corte

do cinzel variava de espessura, e as bocas feitas de um só golpe podiam ser mais ou

menos finas. O trabalho com cinzel servia também para separar os dedos da mão e o

dedo grande do pé. Por vezes, o cinzel era utilizado para fazer saltar as pequenas

64 Nicolini 1969 65 Idem

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excrescências do metal devidas às más fundições ou para raspar a superfície. É possível

que este instrumento possa ter sido utilizado para fazer incisões66.

Algumas estatuetas levariam um polimento antes ou depois do trabalho com cinzel ou

com buril. As superfícies granulosas deveriam ser raspadas com a lima ou com

raspador. O acabamento consiste na eliminação das irregularidades da fundição. Esse

acabamento pode consistir no desbaste da superfície com limas e na gravação com

cinzéis ou buris67.

Não é possível afirmar se as peças de Alcácer do Sal tiveram ou não polimento, pois o

grau de oxidação, as patines e por vezes o tratamento podem ter alterado as superfícies.

A oxidação e corrosão do metal são mais rápidas se o terreno for muito húmido, as

rachas na peça ajudam à corrosão interna.

3.2 – Peças de cerâmica

Na área do santuário, foi encontrada uma cabeça de terracota representando o Átis, que

é um pastor frígio, e uma outra estatueta de terracota, com a figura de uma águia que

carrega uma figura humana nas suas garras. A águia é a personificação do deus grego

Zeus que rapta o jovem Ganimedes (de invulgar beleza), levando-o para o Olimpo para

ser seu servo.

3.2.1 - Cabeça com barrete frígio – Átis

Fonte: Wikipédia, l’encyclopédie libre

Átis/Cibele

A versão frígia do mito diz que Zeus origina o nascimento do

hermafrodita Agditis, masturbando-se sobre Cibele, ou derramando o

seu esperma sobre o solo durante o seu sono. Apavorados pela sua força

(de Agditis), os deuses castraram-no. Do sangue de Agditis nasceu uma

amendoeira68. Nana, filha do deus rio Sangrios, colheu o fruto da árvore

e manteve-o contra si, e fica grávida69. Dá nascimento a um rapaz que é

abandonado e criado pelas cabras selvagens. Átis torna-se um jovem de

66 Nicolini 1969 67 Idem 68 Simbolismo da amendoeira - é a primeira árvore de fruto a florir no fim do Inverno, período em que ainda gela pela manhã. É um dos símbolos da virgindade porque o carácter virginal desta árvore resulta do facto de as flores aparecerem muito antes das folhas. Cada ramada cobre-se completamente de branco dando a impressão que a amendoeira, embelezada, ornamentada, se vestiu para casamento. A amendoeira é originária dos planaltos e das montanhas da Ásia Ocidental. 69 Istitvto della Enciclopedia Italiana, 1971

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uma tal beleza que Cibele-Agditis se apaixona. No entanto, ele estava destinado à filha

do rei Pessinos (segundo outra versão, ele terá perdido a virgindade nos braços de uma

ninfa Sagaritis). Quando ele desejou casar, Cibele, furiosa e ciumenta, fustiga de

loucura Átis, que foge para o monte Didime onde se castra e morre. Do sangue de Átis

nasce o pinheiro70, sempre verde.

Esta lenda apresenta numerosas variantes que visam explicar na realidade porquê os

sacerdotes de Cibele, os Galhas, eram eunucos (eles praticavam os rituais de auto-

castração, sanguinária).

Na versão Lídia, Átis é um eunuco da Grande Mãe, filho do rei frígio Kalaos, que

importa da Lídia o culto de Cibele. Zeus, ciumento, envia um javali que mata Átis.

Segundo Heródoto, Átis é filho do rei Cresus, morto por acidente por Adrasto, hóspede

de seu pai durante uma caçada ao javali.

O culto de Átis existiu na Ásia Menor, na Grécia do norte (a partir do século III a.C.)71,

na Macedónia, e em Roma em 204 a.C. As festas eram celebradas no princípio da

Primavera. No equinócio, um pinheiro era abatido (cortado) e transportado para o

santuário de Cibele, embrulhado como um cadáver, simbolizando o Átis morto.

Na mitologia grega, Átis foi o jovem esposo da deusa frígia Cibele.

Cibele

Deusa que teve vários nomes é a própria Terra (filha da Terra e do Céu), a mãe comum

de todos os seres. Depois de nascer, sua mãe expô-la numa floresta onde os animais

selvagens tomaram conta dela.

Cibele foi a grande deusa da Frígia (conhecida igualmente sob o nome de Agdistis), na

zona central da Anatólia. A sede do seu santuário encontrava-se em Pesino, onde era

venerada sob a forma de um ídolo anocónico, a pedra negra72. Na Primavera, eram

celebradas as festas em honra dela e de Átis.

O culto a Cibele inicia a sua expansão, conquista a Lídia, o Mediterrâneo e a Grécia. Aí

identificada como Damia, Demeter ou Réa, a mãe dos deuses, e chega a Roma onde foi

venerada sob o nome de Idaea mater (mãe de Ida).

70 Símbolo de imortalidade e da força vital. Possui folhas fortes e uma resina imperecível. No Oriente, é considerada uma árvore resistente às adversidades do tempo. 71 Istitvto della Enciclopedia Italiana, 1971. 72 Istitvto della Enciclopedia Italiana 1971.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Os frígios avançam pelo Mediterrâneo, levando consigo o culto da grande mãe Cibele,

graças à habilidade dos sacerdotes que souberam tirar partido do prestígio e veneração

que gozava a sagrada Pedra Negra.

Cibele é a grande deusa da fecundidade e está relacionada com um deus da vegetação.

Personifica a natureza selvagem simbolizada pelos leões que a acompanham e é

apresentada como a Grande Mãe, a Mãe dos deuses ou a Grande Deusa. Podia curar as

doenças ou provocar o seu surgimento, e protegia o seu povo durante a guerra.

Fonte: Wikipedia, l'enciclopedia libera.

Em 204 a.C., os romanos, durante a 2ª Guerra Púnica, foram buscar a pedra sagrada ao

local de origem. Foi construído um templo em Roma para acolher a deusa que foi

objecto de culto até ao final da época republicana. Os cidadãos

romanos não tinham o direito de participar no sacerdócio e nos

rituais, podendo no entanto participar na festa à deusa, as Megalesia.

A estátua permanecia no templo e os seus serviços seriam

assegurados pelos sacerdotes (os Galhas). Se bem que as procissões

dos sacerdotes fossem autorizadas, existiram restrições a este culto,

que acabariam por ser suprimidas pelo imperador Cláudio73.

Outra versão diz que Cibele conhece Átis e apaixona-se por ele.

Cibele confia-lhe o cuidado do seu culto com a condição de não

violar o voto de castidade. Mas Átis esquece o juramento e casa-se

com a ninfa Sangarida. Cibele enraivecida castiga-o, matando a

rival. Átis magoado, e num acesso de delírio, mutila-se. Ao tentar

enforcar-se, Cibele compadece-se e transforma-o num pinheiro. O culto de Cibele foi

levado para Creta, e em Roma é introduzido durante a segunda guerra púnica, para onde

foi a grande pedra, a representação da Grande Deusa. A ela sacrificavam porcas, touros

ou cabras pela fertilidade, e o pinheiro era-lhe consagrado.

O culto de Cibele, difundido em Roma a partir de finais do III a.C., recorria à morte do

touro como ritual sacrificial, talvez em substituição da castração de Átis, proibida aos

cidadãos romanos.

Átis

Átis é representado vestido de pastor, com barrete frígio74 e bastão de pastor. Tem o

hábito aderente ao corpo, deixando a barriga a descoberto. Tem umas calcas típicas

73Istitvto della Enciclopedia Italiana 1971.

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persas, fendidas ao alto e, sobre a frente de cada perna, encontram-se ligadas a

intervalos, de maneira a deixar o sexo descoberto.

3.2.2 – Estatueta de Ganimedes

Fonte: Zeus y Ganímedes - Mitología griega_files

Ganimedes era um príncipe troiano, filho de Tros o fundador

de Tróia. Segundo a Ilíada de Homero, ele era o mais belo dos

adolescentes.

Perto de Tróia, cuidava ele do seu rebanho quando Zeus75,

transformado em águia, o rapta, levando-o para o Olimpo,

cidade dos deuses.

Hera, a ciumenta mulher de Zeus, fica contrariada com o facto

de Ganimedes se ter tornado o escanção dos deuses, função

que já pertencia a Hebe, sua filha. Compele Zeus expulsar

Ganimedes do Olimpo. Zeus não querendo enfurecer a deusa, acede à sua vontade, mas

decide imortalizá-lo devido à sua beleza. Em vez de o mandar para Tróia, Zeus coloca-o

no céu sob a forma da constelação do Aquário (o portador de água).

A águia

A águia foi usada como símbolo da força, da grandeza e da majestade.

A águia é a ave de Zeus (Júpiter) nos poemas gregos e latinos. Foi também o símbolo da

alma humana, o símbolo das artes. Nos exércitos, figurou nos estandartes de Ciro, rei

dos Persas e, mais tarde, durante o segundo consulado de Mário, encimou as lanças que

eram insígnias das legiões.

O fabrico das peças de terracota terá sido por molde? Segundo Gijón Gabriel (2004),

terá sido o modo de fabrico mais usual das terracotas, permitindo a produção em série.

O uso do barro como material plástico é muito antigo, a sua utilização nas

representações artísticas remonta ao Neolítico.

A técnica de fabrico para a realização das terracotas terá sido principalmente o modelo

bivalve. Para o conseguir ou se criava um protótipo e sobre ele se trabalhava para 74 O barrete frígio é uma espécie de touca ou carapuça, originariamente utilizada pelos habitantes da Frígia. Barrete usado por troiano Paris para se identificar como não grego. Os poetas romanos utilizavam o epíteto frígio para se referirem aos troianos. Durante o Império Romano era usado pelos antigos escravos que tinham ganho a sua liberdade. 75Na mitologia grega era o Senhor do Olimpo. O deus do céu e da Terra, o deus supremo e pai de diversos deuses.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

reproduzir os objectos, ou a obtenção destes moldes realizava-se através da cópia de um

objecto já existente ou de um molde tipo (técnica designada de sobremolde).

Também se realizaram peças com moldes univalves ou modelagem à mão através da

técnica do beliscão. As terracotas são a manifestação de uma arte eminentemente

popular realizada num material económico, a argila, permitindo que a sua compra e uso

chegasse a amplos sectores sociais, entre os quais se encontram também as classes mais

desfavorecidas da sociedade. O aparecimento, nos santuários, de terracotas também foi

frequente76 já que uma importante parte da produção é constituída por ex-votos, pois

representam tanto o suplicante como as próprias oferendas. As terracotas, devido à sua

versatilidade no uso de certos modelos, são propensas a serem utilizadas em lugares

muito diferentes e por amplos sectores da população. Neste caso, o tipo de peças mais

representativo e que melhor se adapta a esta variedade de usos foi o das figuras com

oferendas a modo de ex-votos. Estas peças adaptam-se muito bem aos distintos

conceitos e crenças que lhe são atribuídos, constituindo um dos símbolos mais ou

menos pessoais.

As terracotas foram utilizadas em diferentes culturas do mundo antigo77, Mesopotâmia,

Egipto, Fenícia e Grécia. Na Grécia, estas peças tiveram um papel destacado, desde

tempos arcaicos e até ao século IV a.C. As diferentes manifestações feitas com este

material foram usadas tanto nas ornamentações, como em figuras do tipo ex-votos e em

peças de tipo escultórico para representar as divindades.

A falta de detalhe das peças também resultava da pouca atenção ou do pouco cuidado

com que os artesãos trabalhavam os moldes e do tempo que dedicavam ao seu

apuramento. Também é possível que esteja relacionada com a procura que poderia

provocar a massificação de alguns tipos dentro das produções, ligada a uma população

pouco exigente, que poderia aceder em massa a sua compra, beneficiando de preços

mais acessíveis.

Também existiria uma certa especialização de algumas oficinas ou em determinadas

zonas que seguiram produções de melhor qualidade78.

76 Gijón Gabriel 2004 77 Idem 78 Idem

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

IV – Interpretação dos artefactos

O estudo das figuras contribuirá para um melhor conhecimento do santuário e dos

rituais levados a cabo nesse recinto sagrado.

O que levaria uma pessoa a colocar no templo uma estatueta com a representação de

Zeus e Ganimedes? Qual é a relação entre este local e o culto?

4.1 – Cronologia e integração no mundo mediterrâneo

No sul da Península Ibérica, a actividade dos comerciantes fenício-púnicos, e o

estabelecimento de suas colónias ao largo da costa, introduziram os seus sistemas e

estruturas sócio-económicas, mas também as suas ideologias, as crenças, divindades,

cultos e arquitectura sagrada79.

A expansão que num primeiro momento era dirigida para assegurar a coesão política e

as transacções comerciais, assegurando a integração dos territórios indígenas nos

circuitos comerciais fenícios do Mediterrâneo, levou, num curto espaço de tempo, à

incorporação do culto a diversos deuses, sendo assimilados às divindades autóctones

através das elites dominantes80.

No que diz respeito às divindades femininas, como a Deusa Mãe

indígena ancestral conhecida desde a época Neolítica, passou a ser

identificada, no período Orientalizante, com a divindade dinástica

fenícia Astarté. Esta deusa, associada ao deus Melqart, teria a seu

cargo o bem-estar, a tutela e a protecção da instituição real, do rei, da

sua família e de todo o povo, actuando em seu favor e benefício81.

Fonte: http://www.infocadiz.com/Monumentos/Astarte.htm

Mas por volta do século IV a.C., emerge um novo conceito de

divindade. Com o surgimento de novas aristocracias, a divindade

Astarté (Senhora dos animais) adapta-se às novas condições de

estrutura e organização sócio-económicas (de cariz agro-pastoril).

Torna-se numa divindade relacionada com os cultos de fecundidade e

da morte, actuando também como protectora de toda a povoação82.

Tanit, divindade trazida pelos púnicos para a Península Ibérica, irá substituir

progressivamente a Astarté fenícia, sincronizando-se com ela. Tanit (Terra Mãe)

79 Moneo 2003 80 Idem 81 Idem 82 Idem

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

aparece associada ao deus púnico Baal-Hammon. Esta divindade masculina personifica

o ciclo natural da vegetação segundo as estações do ano83.

A chegada dos fenícios ao Ocidente originou uma profunda

semitização da religiosidade dos povos hispanos, sobretudo

naqueles que se relacionaram mais rapidamente, tais como os

iberos e turdetanos. Estes povos já tinham nos seus panteões

deuses da fecundidade com várias particularidades e funções.

A existência destes deuses foi um excelente meio para a

introdução de deusas fenícias, como Astarté que também era

uma deusa da fecundidade. Os atributos das divindades

exógenas eram semelhantes em relação às dos povos indígenas

que facilmente aceitaram os principais deuses fenícios e seus

rituais.84

Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/Image:Herakles No santuário de Meniko, datado do período Cipriota-Arcaico I,

foi encontrada uma figura de touro vinculada com a deusa da

fecundidade, para além de figuras de guerreiros e de carros85.

Fonte:commons.wikimedia.org/wiki/Image:Signe_Tanit.png

No santuário de Apolo, por volta do VIII a.C., os devotos ofereciam

grande quantidade de ex-votos de terracota, que representavam

cavalos, cavaleiros, e figuras humanas com os rostos cobertos por

mascaras, assim com as figuras de touros86.

Em Cancho Roano, templo que terá servido, talvez, de sede a um

aristocrata ou príncipe local, foi morada de um culto do tipo daquele

consignado à deusa Mãe ou Senhora dos animais, entre os séculos VII

e finais do V a.C. Entre as peças de bronze, sobressai um ex-voto de

equídeo, que pode relacionar-se com a iconografia da Senhora dos cavalos (Astarté e

Tanit)87.

Em Alcudia, surgiram diferentes versões de uma deusa com os atributos de uma

Senhora dos cavalos. É representada por uma figura feminina alada, estando rodeada de

vegetação e animais, divindade indígena local cujas qualidades e essência a ligam a

83Moneo 2003 84 Blázquez 1990 85 Blázquez 2001: 70 86 Idem 87 Poveda Navarro 1999

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Astarté e Tanit, sugerindo contactos directos com populações fenício-púnicas. Trata-se

de um culto que se terá mantido pelo menos nos séculos VI e V a.C88.

Em Collado de los Jardines, apareceram ex-votos representando homens, mulheres,

cavalos, cavaleiros e suas montadas e outros animais. As estatuetas que representam

homens e mulheres incluem, guerreiros, orantes, ofertantes, adoradores, geralmente nus

e em diversas atitudes. São frequentes as representações de partes do corpo, como

braços, pernas, pés, dentaduras, olhos, falos89, assim como os objectos de uso pessoal.

Em Castellar, a maioria dos ex-votos encontrados tendem para o esquematismo. São

poucos os ex-votos nus, os guerreiros são raros, e só apareceu um cavalo. Surgiram as

representações de membros do corpo90 e oferendas de uso pessoal doméstico, e algumas

peças são de cerâmica.

Em La Luz, os ex-votos são maioritariamente de bronze, sendo poucas as figuras de

cerâmica. Abundam os guerreiros, principalmente a cavalo91, as figuras nuas são pouco

frequentes e só uma é feminina. A representação da parte inferior do corpo a partir da

cintura é uma das características deste santuário. Surgiram também as representações de

cavalos. Foram também recolhidas as representações de braços e mãos92.

Em La Serreta, apareceram mais figuras humanas de barro cozido, principalmente

mulheres com a clássica mitra. Foram também encontradas figuras nuas e a

representação de um pássaro.

Em Alcácer surgiram ex-votos de bronze que representam figuras humanas, animais,

membros do corpo, assim como estatuetas de terracota, que se podem enquadrar nas

crenças religiosas, associadas às divindades orientais e aos cultos de fecundidade ou

fertilidade.

Neste santuário existiria o culto a uma divindade feminina? Seria um santuário de uma

divindade feminina ou do casal divino?

4.2 – Cogitações sobre a função dos ex-votos

As estatuetas são a representação impessoal dos devotos, que se deslocam ao santuário

para fazer os seus votos ou depois de estes terem sido realizados e para deixar o seu

88 Poveda Navarro 1999 89 Moneo 2003 90 Idem 91 Nicolini 1969 92 Moneo 2003

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

testemunho, depositando uma pequena figura de bronze, mais ou menos importante,

mais ou menos bem feita, segundo os seus meios, as suas posses.

Os ex-votos podem ser oferecidos a divindades distintas, segundo a crença de cada um

ou do pedido a efectuar. O seu carácter votivo é evidente93, devido à quantidade de

objectos deste tipo que foram colocados nos santuários. O religioso oferecia à divindade

um objecto adquirido num artesão ou talvez no próprio lugar, com a finalidade de obter

os seus favores ou agradecer uma prece ou um bem conseguido.

Os ex-votos não se depositam ou acomodam, assim, sem nenhuma organização. No acto

da sua entrega, a colocação da estatueta ou depósito no santuário faz-se de forma

intencionada, determinada e seguindo um ritual.

As peças podem ser colocadas como ex-voto oferenda, depositadas ou enterradas

definitivamente. Podiam ser tapadas com barro. As figuras humanas colocavam-se com

a boca para baixo, sugerindo a intenção de não poderem ser exibidas ou contempladas

nunca mais, de modo a não voltarem a ser vistas pelos olhos humanos. Estes ex-votos,

colocados desta forma, poderão ter estado embrulhados num tecido, ou numa ligadura.

Para além das representações humanas (guerreiros, orantes, portadores de oferendas)

existem outras categorias de objectos que também são colocados em lugares de culto,

tais como, os zoomórficos, os membros do corpo (pés, braços, mãos, olhos, seios,

mandíbulas), pregos, fíbulas, cossoiros, etc.

A presença de estatuetas com a representação de guerreiros indicará uma sociedade

guerreira, pronta para a guerra? Ou será uma forma de representar o homem na sua

virilidade? Terá uma função social, a representação de uma elite? Na sociedade o

encontro com a divindade é um privilégio de carácter elitista?

No ritual de oferta, um ex-voto pode ser a representação do próprio, podendo até

ostentar o seu estatuto. Poderá ser interpretada como um ritual de passagem, quando um

jovem se apresenta como guerreiro e como elemento viril.

Os orantes e os portadores de oferendas representam as pessoas na sua nudez espiritual,

o ser humano na sua essência? Estes devotos procuram, através da colocação destes ex-

votos, a protecção da divindade, a cura dos seus males, que a “passagem” pela vida não

seja amarga e agradecem pelas bênções concedidas.

93 Lantier 1930

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

A importância das mãos, sobretudo com as palmas abertas, é uma forma de receber as

bênções concedidas pela divindade e de as transmitir ao devoto. São as mãos que

exprimem a oração dirigida da divindade. Daí talvez a sua exagerada representação94.

A colocação de ex-votos, com a representação de animais domésticos, no santuário

poderá indicar a inquietação sobre a sobrevivência dos mesmos, colocando-os sob a

protecção à divindade. Através destes ex-votos pedem à divindade a fecundidade para

os seus animais, e a continuação dos seus meios de subsistência.

A oferenda de ex-votos anatómicos, como braços, pernas e pés, têm por objectivo

procurar a ajuda divina para a cura das enfermidades. (vide anexos 4.2.2 e 4.2.3)

Os pesos de bronze ou os cossoiros estariam relacionados com o trabalho quotidiano?

Os pesos poderiam ter uma função comercial? A colocação destes no santuário poderia

insinuar a protecção do comércio ou talvez protecção da pessoa perante o juiz da morte.

É provável que as mulheres se deslocassem ao santuário e aí depositassem cossoiros e

agulhas. Os cossoiros, apesar de não serem estudados no âmbito deste trabalho,

surgiram nas escavações do convento em grande quantidade, alguns destes na área do

santuário. Estariam relacionados com o trabalho da mulher, pedindo protecção para a

parte artesanal (fabrico da lã), ou seria a representação da mulher perante a divindade.

Para além das representações humanas, existem outras, estilizadas, que podem ser um

simples alfinete, pregos como aqueles que foram encontrados durante as escavações,

mas que também não fazem parte deste estudo.

A presença de um suporte de timiaterio testemunha as cerimónias rituais em honra da

divindade para que o seu pedido fosse ouvido e aceite?

Os ex-votos são muito semelhantes aos que os peregrinos, hoje, colocam nos santuários

cristãos, em busca da cura ou depois de terem sido curados. Também nestes santuários

cristãos aparecem representações de membros ou outras partes do corpo humano.

Será que os touros colocados no santuário de Bevipo estariam relacionados com a deusa

da fecundidade? Seriam pedidos de fertilidade dirigidos à deusa Astarté ou a Tanit,

como no santuário de Meniko?

A existência de ex-votos de equídeo, poderá relacionar-se com a Senhora dos cavalos

(Astarté e Tanit), como em Cancho Roano ou em Alcudia? Representa os contactos

directos com populações fenício-púnicas?

94Nicolini 1968

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Colocar ou oferecer ex-votos em terracota é uma tradição grega95. Será, com base nesta

lógica, que as duas estatuetas de Bevipo traduzem influência ou tradição grega? No

Olival do Senhor dos Mártires, durante trabalhos de lavoura, apareceram uma mascara

humana e um touro de terracota, como no santuário de Apolo.

Seria interessante saber a que divindade o devoto se dirigia, e se o santuário seria

frequentado por pessoas de todos estratos sociais e de ambos os sexos ou não.

4.3 – Considerandos sobre o Templo (vide anexos 2.9 e 4.1)

Segundo Moneo (1995), os santuários urbanos podem ser classificados em dois grupos,

os dinásticos e os templos urbanos.

Os dinásticos caracterizam-se por uma estrutura não regular, integrada ou relacionada

com uma construção doméstica que tem dimensões notáveis e que é relevante no

povoado. Estes edifícios religiosos situam-se na parte mais alta da povoação. São

constituídos por várias divisões, com pátio de entrada e compartimentos cobertos. O

acesso à zona sacra pode realizar-se através de um pátio, às vezes com vestíbulo ou

pórtico, podendo apresentar-se lajeado. Esta área sagrada é constituída por uma ou duas

salas fechadas. No lado oposto a essas salas pode aparecer um segundo pátio ou um

lugar aberto, por vezes pavimentado. Ao centro do pátio da área sagrada pode existir

uma pedra prismática associada a uma lareira. Estes edifícios sagrados são santuários

integrados nas estruturas domésticas. Estendem-se pela Alta Andaluzia e o Levante

Peninsular. Existem em Carmona, Montemolín, Alhonoz e Coria del Rio, tudo na área

de Sevilha96. A cronologia destes recintos sagrados é ampla, os mais antigos remontam

ao século VII-VI a. C., e perduram até ao século II a.C.

Moneo (1995) considera que os templos urbanos são edifícios individuais com uma

orientação astronómica em relação ao nascimento do Sol. O seu carácter sagrado era

evidenciado através de rituais de fundação. Existiam dois tipos de santuários, o

“semítico” e “clássico” (o tipo “clássico” só existe no Nordeste da Península Ibérica).

Os santuários de tipo “semítico” são áreas a céu aberto que encerram um espaço

(témenos). Localizam-se no interior do povoado em sítios centrais, apresentando uma

planta quadrangular e porta de acesso na parede sul. Nessas áreas a céu aberto, na zona

central encontra-se uma mesa de oferendas. Estes templos “semíticos” são assim

denominados por apresentarem semelhanças com algumas construções sagradas

95 Gijón Gabriel 2004 96 Almagro-Gorbea & Moneo 2000

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

orientais e, sobretudo, do mundo fenício. Alguns destes templos são recintos simples,

não muito grandes, ao ar livre, que contêm no seu centro o santuário da divindade, o

altar dos sacrifícios e duas colunas que eram símbolo da divindade. Este tipo de

santuário surge no Sudeste Peninsular como por exemplo, em La Alcudia de Elche a

partir do século VI a.C., e em lleta dels Banyets de Campello no século IV a.C.

O templo de Montemolín (Belén 2001) é de planta rectangular, de orientação SO-NE,

teria várias dependências e um pátio central, e é considerado um templo semita.

Segundo Jiménez & Ortega (2001), junto às estruturas domésticas existem outros dois

espaços. Estes edifícios encontram-se muito perto, um deles é o espaço religioso, outro

é um armazém. O espaço religioso é uma estrutura simples de planta quadrada. Tem

uma situação marginal em relação ao povoado. A planta do edifício de El Palomar

apresenta semelhanças ao templo de Illeta del Banyets. O armazém, de planta

rectangular, está situado no extremo sul-ocidental. Este edifício enquadra-se nos finais

do século VII até finais do século VI a.C.

Moneo (2003), afirma que é no Período Orientalizante que se documentam os mais

antigos santuários portuários, como os de Coria del Rio e El Caramblo, datados do

século VIII a.C. No entanto, é a partir do século VI a.C. que estes santuários estão

melhor documentados. Caracterizam-se por conter um pórtico ou pátio de entrada, junto

a outros espaços que podem ter telhados ou estar a céu aberto. Através do pátio acede-se

a duas divisões, a cella e o compartimento para as oferendas sagradas. São santuários

que têm relação com zonas portuárias, fluviais ou marítimas, parecem estar vinculados a

actividades de tipo comercial e documentam-se pelas costas da Península Ibérica. É

ainda no século VIII a.C. que surgem os primeiros santuários dinásticos-gentílicos

conhecidos em contexto urbano, como o de Mesa de Setefilla, assim como os santuários

domésticos gentílicos e os de controlo territorial.

Nos séculos IV e III a.C. continuam a existir os santuários urbanos, outros desaparecem,

constroem-se novos santuários de tipo dinástico que se relacionam com os palácios.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Fotografia do armazém, arquivo do IPPAR

Durante as escavações no Convento de Aracaeli, foram encontradas duas bases de

coluna perto do templo, muito

rudes, que talvez fizessem parte

da entrada do templo.

Provavelmente, este templo teria

salas com diversas funções, umas

reservadas ao sacerdote, outras

destinadas aos devotos e ex-

votos. Provavelmente tinha um

pátio com um altar sacrificial.

Foi posto a descoberto um

pequeno tanque, a sul do pátio,

rebocado com uma matéria impermeável, provavelmente para conter líquidos, talvez a

água.

As estruturas do edifício religioso de Bevipo aparentam ter uma planta rectangular.

Foram descobertas salas de planta rectangular, contíguas ao templo, do lado nascente,

que poderiam corresponder a espaços de armazém. Os pavimentos apresentam cor ocre

acastanhada ou alaranjado.

A Norte da calçada, do lado poente, surgiram muros que

poderiam pertencer a um outro santuário, mais pequeno, de

planta quadrada de onde foi exumado um ex-voto de guerreiro.

Fotografia dos pavimentos, arquivo do IPPAR

Em Alcácer do Sal, durante os trabalhos arqueológicos foi

descoberta uma estrutura, interpretada como lareira. É limitada

por dois muretes perpendiculares, situados a um canto de uma

sala, e tem um pavimento esbranquiçado com vestígios de fogo.

Talvez esta estrutura fosse um altar.

Como em La Serreta, o santuário de Bevipo está situado num

extremo do cerro, onde também existem estruturas de um

povoado. Tal como em Medellín97ocupa o alto do monte

destacando-se sobre o território e controlando o rio Sado e a sua

planície. Também apareceram no local fragmentos de cerâmica

pintada do tipo de “Medellín”.

97 Almagro-Gorbea & Moneo 2000

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A maioria dos ex-votos foram encontrados espalhados, devido aos trabalhos de uma

retro-escavadora, entre o muro a Sul e a Calçada a Norte, perto do “santuário romano” e

nenhum se encontrava “in situ”.

Segundo os investigadores, todos os santuários estão colocados à beira das estradas

terrestres e próximos das vias fluviais. O de Bevipo está implantado no alto da colina e

dominando as vias terrestres e fluvial.

O sistema construtivo deste santuário deve ter sido inspirado em outros, talvez nos

templos do Sul da Península Ibérica ou na Turdetania, pois o povoado de Bevipo

integraria, provavelmente, esse território administrativo. Teria, com toda a

probabilidade, um grande poder a nível político-religioso e económico, controlando as

vias marítimo-fluviais e terrestres.

- Rituais

Os rituais desenvolvidos nos santuários ibéricos teriam um carácter diverso, permitindo

diferenciar os destinados a favorecer a fertilidade agrícola e dos animais, a fecundidade

humana e os rituais relacionados com grupos ou sexos98.

O ritmo agro-pastoril é marcado pelas estações, o que levaria a celebrar certos rituais

em que interviria um casal de divindades, mais concretamente um deus99 masculino,

distribuidor de chuva, que personificava a vegetação e os cereais, e uma deusa100 da

fecundidade relacionada com a reprodução de animais e o crescimento da família. A

união destas duas divindades assegurava a renovação da vida humana e animal e de toda

a natureza. Esta dupla foi representada inicialmente pelos deuses fenícios Melqart-

Astarté. A morte e ressurreição de Melqart significavam o ressurgir da Primavera. Com

o seu matrimónio sagrado com Astarté assegurava a renovação anual da vegetação, a

continuidade da vida e a fecundidade. Função semelhante terá tido o par púnico Tanit-

Baal Hammon. A morte do grão é produzida pela foice e o espezinhado dos animais e

seria chorada ritualmente pelos ceifeiros que, condoídos, invocariam a divindade. Um

dos desejos dos agricultores era de propiciar a fecundidade das sementes assegurando o

favor da deusa para o novo ano agrícola101.

98 Moneo 2003 99 Ser superior que tem poder sobre o Homem e ao qual é prestada veneração; pessoa a quem se vota uma dedicação extrema; ou que é objecto de adoração e a que se sacrifica tudo o resto. 100 Divindade feminina; mulher adorada, extremamente bonita. 101 Moneo 2003

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- A cura

O penitente ia ao santuário quando estava doente, pedir auxílio aos deuses ou à

divindade específica do mal ou da sua crença. Depois de curado voltava ao templo para

agradecer o atendimento da prece.

Os penitentes deslocavam-se aos santuários para pedir às divindades a cura para todos

os seus males. Adquiriam um ex-voto de bronze com a representação da parte do corpo

que estava doente ou curada para oferecê-la ao deus. Só a divindade que produziu a

enfermidade a pode curar102.

- A fecundidade

A fertilidade dos campos e a fecundidade dos animais era vital para a subsistência de

uma sociedade assente numa economia agrícola e da criação de gado.

Os artefactos que os penitentes ofereciam às divindades eram na maioria figuras de

bronze de homens e de mulheres, alguns com o sexo exagerado, ou nus oferecendo

frutas nas suas mãos.

A nudez e a representação dos órgãos genitais são uma linguagem universal para pedir

fecundidade, tanto individual para a mulher procriadora (a ideia de fecundidade também

está associada à maternidade), como colectiva para o campo que dá os seus frutos ao

povo que o trabalha, assim como para o gado. A fecundidade sexual protegia o mau-

olhado e afastava a má sorte103.

- A religião

A religião é um elemento fundamental da cultura. Muitas vezes, ela condicionava ou

condiciona a politica, a economia e a sociedade, outras vezes estava subordinada à

sociedade.

Todas as religiões procuram encontrar um sentido para a vida e, por conseguinte, um

significado para a morte. Talvez daí a preocupação de não abandonar os mortos. O

Homem é o único animal que cuida dos seus mortos. Tudo porque o Homem acredita

que a morte não pode ser um ponto final decisivo, daí que tenha nascido o culto dos

antepassados104.

102 Izquierdo & alguns 2004 103 Idem 104 Livro de Antropologia das Religiões

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

O Sagrado é uma realidade misteriosa que não pertence ao nosso mundo material. As

religiões podem evoluir, o sagrado não, é aquilo que sempre foi105.

“O homem religioso é aquele que crê na presença de uma força, o sagrado, e que

ajusta o seu comportamento a essa crença.” G. Van der Leenw

- Religião e sacerdote

Toda a religião necessita de um sistema sacerdotal que tem por missão a manutenção

das actividades religiosas e espirituais dos devotos e crentes.

Os sacerdotes seriam os responsáveis dos actos religiosos, dos sacrifícios e da relação

com os devotos que até ali se deslocavam.

O sacerdote é o elo de ligação entre os crentes e a divindade ou entre o povo e a

divindade. Ele está presente nas alturas mais importantes da vida de um indivíduo, no

nascimento e na morte, nas situações decisivas, na hora do combate e no momento da

paz106. Esta pessoa estaria encarregue de fazer desaparecer ou ocultar as oferendas

acumuladas nas salas de culto. É provável que o sacerdote colocasse os ex-votos em

áreas específicas relacionadas com as divindades.

- Divindade adorada?

Os Deuses:

- Seria Astarté a deusa principal de cidade de Bevipo?

Astarté gozou de grande dignidade entre os turdetanos como assim indicam imagens

que foram descobertas, que seguiam os modelos trazidos do Oriente, mas fabricadas no

Ocidente. Surgia associada a aves e flores de loto, trazendo nas suas mãos uma pomba

ou uma rola e um par de meninos nos braços. Pode estar rodeada de flores, animais,

aves e peixes, o que indica que é a deusa da fecundidade humana, vegetal e animal107.

Astarté era a deusa protectora dos cavalos, a quem se ofereciam ex-votos de cavalos.

Não é de estranhar, portanto, que existissem santuários vinculados a divindades

relacionadas com cavalos, pois este animal abundava na Península Ibérica e era muito

requisitado para a guerra. Esta deusa teria como companheiro uma outra divindade

(Melqart) também acompanhada de cavalos108.

105 Livro de Antropologia das Religiões 106 Ortíz de Zarate 1997 107 Blázquez 1987 108 Idem

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

- Será Tanit a deusa protectora de Bevipo?

Tanit é uma nova divindade, a grande deusa do panteão cartaginês, aparece mencionada

pela primeira vez em Tiro, na primeira metade do VIII a.C109.

Em Cartago, por volta do final do século V inícios IV a.C., sua figura está associada ao

deus Baal Hammon. É uma deusa fecundadora, curativa, maternal, protectora dos

animais, em especial dos cavalos, relacionada com a agricultura, constituindo a espiga

de trigo um dos seus atributos mais característicos; era portadora da riqueza marinha e

estava vinculada ao Além. Em lugares onde exerceu a sua influência, poderia ter sido

considerada como uma deusa da guerra e tutelar da cidade. No Sul e Sudeste da

Península Ibérica, figurou como a divindade dominante, pelo menos desde o século IV

até ao I a.C., momento em que se converteu numa deusa protectora das cidades debaixo

do nome Juno Dea Caelestis, que é a versão romana da Tanit cartaginesa110.

- Melqart

Na Península Ibérica, a figura de Melqart deve ser interpretada, no círculo da monarquia

sacra tartéssica, como divindade dinástica masculina que actuaria em parceria com uma

divindade feminina do tipo da Astarté fenícia.

Sua presença na costa meridional peninsular fica comprovada através das fontes

clássicas que referem a existência de várias ilhas dedicadas a Herakles. Foi considerado

como divindade ctónica111, talvez um rei ancestral divinizado ou o fundador da dinastia

real e da cidade, como em Tiro, onde Melqart ostentara o título de Baal de Tiro ou rei da

cidade. Este senhor era ao mesmo tempo o rei da cidade dos vivos e rei da cidade dos

infernos, sendo este o lugar de morada dos reis mortos que teriam um carácter mais ou

menos divino ou heroícizado, estariam aí dirigidos por Melqart em pessoa112.

Nas sociedades agro-pastoris, Melqart aparece também como divindade de carácter

agrário, sendo interpretado como deus da colheita e da agricultura, ao qual era invocada

a grande festa anual da ressurreição de Melqart. Seu culto encontrava-se ligado aos

cultos de fertilidade cujo objectivo era garantir a renovação da natureza representada no

mito da morte pelo fogo e no seu regresso à vida debaixo uma forma nova. Este rito

109 Moneo 2003 110 Idem 111 Relativo ao globo terrestre; desgnativo dos deuses da mitologia que habitavam as cavidades da Terra 112 Moneo 2003

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

tomava a sua forma no matrimónio sagrado entre o deus, representado através da figura

do rei, e Astarté, sob a forma de uma sacerdotisa ou da própria rainha113.

A introdução do culto a Melqart/Herakles, assimilado a uma divindade local, actuaria

como divindade protectora de numerosas dinastias ibéricas até à chegada dos Bárquidas

no século III a.C114.

- Baal Hammon

O deus púnico, companheiro da deusa Tanit, personificava o ritmo das estações e da

vegetação, assegurava a renovação anual da natureza, a obtenção da fertilidade e a

fecundidade da terra, dos animais e dos homens115. Deus ancestral e tradicional ligado à

casa real e protector pessoal do soberano. Na região de Tiro foi encontrado um pequeno

amuleto de lapislazuli, datado do século VI a.C. com uma dedicatória a esta divindade,

Baal116.

O culto à divindade feminina é o culto à Terra, fonte regeneradora da vida. É ela que dá

os alimentos, nutre todos os seres que a povoam. Das suas entranhas dá vida e faz brotar

a vegetação e o dom do trigo. Recebe os homens depois da morte e, nas suas entranhas,

oculta-se todos os dias o disco do sol que aí descansa e se regenera. A divindade

feminina (mulher) é igual à Terra, é geradora da vida, recebe no seu ventre o ser e

alimenta.

A Terra é representada por Astarté, Tanit e Cibele - aquela que recebeu o corpo de Átis.

A este respeito vale a pena aludir ao texto contido na tabella defixionis encontrada no

poço votivo, no santuário romano datado do I século d.C., em Alcácer do Sal. Aí se

invoca a entidade que recebeu o corpo de Átis, sendo de presumir que se trate da deusa-

mãe.

113Moneo 2003 114 Idem 115 Idem 116 Marín Ceballos 1999

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

V- Catálogo dos ex-votos

5.1 - As figurinhas de bronze - Os Orantes Peça n.º 1 - Orante/Ofertante (desenho no anexo 3.3) Nº de Inventário: 1075 Atitude: 15 D Posição: De pé Descrição de peça: não se mantém de pé. Cabeça: é de formato cónico arredondado no topo. Cara: forma um todo com o pescoço, configurando um cone arredondado no topo. Da cana do nariz arranca uma ligeira insinuação do sobrolho direito. Olhos: o direito tem uma concavidade feita com punção. O olho esquerdo não se vê ou não tem. (fotografia B) Nariz: de formato triangular, proeminente e grosso. É saliente na parte que une à boca, criando um declive recto, destacando-se da cara. (fotografia B) Boca: é demarcada pelo declive do nariz, e por um traço ténue. Pescoço: é grosso, não havendo separação entre a cabeça e o pescoço, formando um todo. Tem dois vincos que marcam a separação entre o pescoço e membros superiores. (fotografia C) Tronco: é grosso e cilíndrico. Braços: tem o esquerdo sobre o peito, ao nível do coração. O direito está flcima e para a frente com a mão ao nível do pescoço. Poderia ter algo na mtalvez uma oferenda. (fotografia D) Órgão sexual: pénis erecto. Tem a separação bem delineada entre os doisatravés de uma linha vertical. Os dois estão bem representados. Pernas: robustas (5,3 mm de afastamento entre elas ao nível dos pés)demarcados os joelhos. Tem a perna esquerda maior que a direita. Pés: são curtos, planos, triangulares e terminando quase em ponta mas arreddedos não estão definidos. Entre as pernas, na parte dorsal, tem dois sulcos graPeso: 82.0 gramas Altura total: 84,44 mm; Largura máxima: 26,96 mm; Tronco: largura:espessura: 1,23 mm; Cabeça: largura (orelha-orelha):12,79 mm; espessunariz):15,42 mm Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de Alcácer doSector L. Arcaria E; X= 37.88; Y= 46.6; Z= 60.95; data: 29/04/1996. Ficha de laboratório: FO 25/96 Observações: de fabrico mais tosco, exibe muitas bolhas. Apresenta vestígioslimado entre as pernas. Tem um estilo diferente em relação a outros, podeartesão.

D

ectido para ão direita,

testículos,

. Não tem

ondada. Os vados.

1,29 mm; ra (cabeça-

Sal.

de ter sido rá ser fabrica

C

B

do por outro

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Peça n.º 2 - Orante ofertante (desenho no anexo 3.3) Nº de Inventário: 1076 Atitude: 15 B Posição: de pé, ligeiramente inclinado para a frente. Cabeça: vestígios de cabelo ou de chapéu. Tem um sulco gravado em redor do topo da cabeça quase formando um chapéu tipo boina ou gorro. (fotografia B) Cara: de formato elíptico. Tem a mesma fisionomia que a dos guerreiros mesmo formato. (fotografia C) Olhos: estão visíveis mas pouco salientes. Olho esquerdo delineado pelo rebaixamento da bochecha e pela arcada do sobrolho, formando uma pequena saliência ovalada. O olho direito também está delineado por uma ténue saliência. (fotografia D) Nariz: forte e grosso, arredondado Boca: é definida por um traço côncavo horizontal. Parece estar um pouco aberta como em sussurro. Orelhas: a direita é definida por um pequeno afundamento ou rasgo de contorno circular ou semi-circular. Não tem a esquerda. Queixo: saliente, bem demarcado. Fazendo a separação da cara e do pescoço estar bem definida. Pescoço: forte e alto Tronco: comprido, de formato paralelepipédico, muito grácil. Braços: o esquerdo tem antebraço arqueado e que acompanha o corpo até à anca, colocando-se ligeiramente para a frente. O braço direito é curto. Tem o braço semi-erguido para a frente, em posição de apresentação ou de oferta. (fotoE) Mãos: a esquerda é definida por um achatamento na extremidade do braço daforma de mão, na qual não são visíveis os dedos. Órgão sexual: testículos bem definidos. Pénis não erecto, mas colocado para desviado para a esquerda. Pernas: ligeiramente afastadas, e rabo bem definido. Pés: os dois pés estão ligeiramente levantados, os calcanhares um pouco erguidose detectam os dedos dos pés. O pé esquerdo é maior que o direito. Peso: 102.5 gramas Altura: 112,94 mm; Largura máxima: 31,11 mm; Cabeça: largura (orelha-o12,03 mm; espessura (cabeça-nariz): 14,73 mm; Tronco: largura: 11,43espessura: 10,61 mm Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de Alcácer do SaSector L; X= 36.7/37.9;Y= 49./50.6;Z= 60.62; data: 16/04/1996. Ficha de laboratório: FO 26/96 Observações: Bom acabamento, de fabrico melhor. Tem algumas bolhas. Poderá ser um idoso? Esta figura parece um idoso pela forma da boca e do qpostura do órgão sexual.

C D

E

antebraço arqueado e o grafia

ndo a

baixo,

s. Não

relha): mm;

l. B

ueixo, assim como pela

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Peça n.º 3 – Orante (desenho no anexo 3.4.1) Nº de Inventário: 1078 Atitude: 3 A Posição: de pé, ligeiramente inclinado para a frente. Cabeça: tem dois sulcos que formam um V aberto na parte de trás do topo da cabeça. Parece ter cabelo que se inicia a partir das sobrancelhas. O cabelo depois seria coberto por um gorro ou boné, atendendo ao desenho formado por um sulco que vai da sobrancelha direita até à esquerda, e que se situa no topo da cabeça. (fotografia B) Cara: de formato ovalado. Olhos: salientes e bem definidos por dois pequenos montículos redondos (tipo aplique). Tem as sobrancelhas salientes e grossas, bem delineadas, no topo da cara, e têm bem definidos os pelos com um entrançado. (fotografia C) Nariz: saliente e de formato triangular. Boca: feita por um ligeiro sulco horizontal, aproveitando a forma da base do nariz. Orelhas: estão bem definidas e bem desenhadas, no entanto a direita está colada à cabeça. Queixo: redondo, dando origem ao pescoço largo. Pescoço: alto e forte, bem definido. Tronco: alto, de formato cilíndrico. Tem um sulco vertical entre o ombro e o braço direito. Braços: levantados e erguidos para cima à altura do pescoço. São braços curum sulco horizontal, que sai das costas para a frente passando por debaixo esquerdo. Tem um outro sulco, horizontal que fica situado no braço direito, saxila para o ombro. As mãos são estilizadas, achatadas e pouco definidas dA mão direita parece ter os dedos fechados, devido a uns pequenodesenhados na palma. O formato da mão esquerda é sub-triangular e a zona é assinalada por um pequeno sulco. (fotografia D) Órgão sexual: pénis erecto, pontiagudo, sem testículos. Tem um sulco circdelimita o arranque do pénis. Apresenta um formato cónico, mais largo na os restantes exemplares. (fotografia E) Pernas: curtas e afastadas. A perna direita é mais perfeita que a esquerda, cpequena e ténue depressão indicando o local da dobra da perna. Na perna enota-se uma saliência lateral à esquerda, acima do nível do joelho, querepresentar alguma anomalia física ou doença. (fotografia E) Pés: levantados e calcanhares erguidos. O pé direito está mais levantado qApresenta formato sub-rectangular e arredondado na ponta, sem vestígios desquerdo é de formato sub-triangular terminando em ponta, sem dedos. Exisseparação entre as pernas e os pés. Peso: 141.6 gramas Altura: 128,63 mm; Largura máxima: 41,30 mm; Altura da cabeça: 20,6(orelha-orelha): 15,74 mm; espessura (cabeça-nariz):17,82 mm; Altura domm; largura do tronco: 14,19 mm; espessura do tronco: 12,83 mm; Pernas: direita: 27,25 mm; altura da perna esquerda: 26,12 mm; afastamento entremm Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de Alcácer dSector L; Z= 36.7/37.9; Y= 51.1/54.9; Z= 61.35; data: 16/04/96. Ficha de laboratório: FO 28/96 Observações: tem algumas bolhas. Vestígios de ter sido limado nas pernas, estas e no tronco. Não é provável que a saliência anómala da perna esquerdaa uma imperfeição de fabrico, atendendo a que os restantes membros e todapresentam bastante uniformes.

E

tos. Tem do braço aindo da efinidas. s sulcos do pulso

ular que base que

om uma squerda poderá

ue o esquee dedos. Ote um sulco

9 mm; larg tronco: 48altura da pe pernas: 14

o Sal

sobretudo e se deva apea a estatuet

B

rdo. pé de

ura ,35 rna ,29

ntre nas

a se

C

D

58

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Peça n.º 4 – Orante (desenho no anexo 3.4.1) Nº de Inventário: 1079 Atitude: 3 A Posição: de pé Cabeça: de formato triangular, alongada para cima e ligeiramente recuada. Cara: de formato triangular, alongada. Olhos: são salientes. O direito formado por uma saliência arredondada, é maior que o esquerdo, este por sua vez é composto por uma saliência pontiaguda. Nariz: é saliente, de formato triangular e grosso. Está torto e virado para a esquerda. Inicia-se na junção das duas sobrancelhas. Orelhas: são salientes, repuxadas para a parte de trás da cabeça. A esquerda está mais evidenciada e saliente que a direita. (fotografia B) Boca: é formada por uma concavidade resultante das saliências do nariz e do queixo. Aparenta estar de boca aberta ou a falar. Queixo: é grosso e saliente. Pescoço: alto Tronco: alto, de secção circular. Tem um só mamilo, o esquerdo, saliente e pequeno. Braços: estão levantados e erguidos para a frente ao nível do pescoço. O braço esquerdo é maior que o direito. Os dois braços terminam por numa fractura. Órgão sexual: está pouco definido. O pénis é curto e inclinado para a esquertestículos. Pernas: estão afastadas e arqueadas ao nível do arranque. Pés: são planos e de forma triangular, sem têm dedos. Existem vestígios de um einserir a peça em algum suporte ou o metal excedentário resultante do fabrico. (foPeso: 50.2 gramas Altura: 111,91 mm; Largura máxiam: 32 mm; Altura da cabeça: 21,62 mm;13,2 mm; espessura (cabeça-nariz): 14,57 mm; Tronco: largura: 8.57 mm; espessProveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de Alcácer do SaSector L; Z= 36.7/ 37.9; Y= 49./50.6; Z= 59.85/59.65; data: 17/04/96. Ficha de laboratório: FO 29/96 Observações: peça de má concepção, tosca. Exibe amolgadelas por toda a estatuepernas sugere um cavaleiro ou uma pessoa idosa. A perna e o braço esquerdos erestaurados.

B

C

da. Não são visíveis os

spigão que serviria para tografia C)

largura (orelha-orelha): ura: 7,33 mm l.

ta. A forma arqueda das stavam partidos e foram

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Peça n.º 5 – Orante (desenho no anexo 3.4.2) Nº de Inventário: 1081 Atitude: 3 A Posição: de pé, ligeiramente inclinado para a frente. Cabeça: ovalada, de forma triangular, alongada para cima e ligeiramente recuada. Tem um ligeiro sulco acima da orelha direita que indicia um possível chapéu? (fotografia B) Cara: oval e de perfil triangular. A cara é demarcada por uma linha que vai de orelha a orelha. Olhos: salientes. O esquerdo é feito por uma pequena saliência arredondada achatada e o direito por uma saliência mais redonda e espetada (tipo aplique). As sobrancelhas são demarcadas pelo traçado ou linha que parte do queixo e vai até à inserção do nariz. Nariz: é triangular, grosso e saliente. Parte da intersecção das sobrancelhas ou da intersecção da face direita com a face esquerda. Boca: é feita por um ténue traço horizontal. Orelhas: são de formato semi-circular e rebatidas para fora e para trás. A esquerda é mais saliente. Queixo: está rebatido e plano. Entre o queixo e a orelha existe um trabalhado, tipo repuxagem e uns ténues recortes que parecem ser barba. Pescoço: alto. Tronco: é alto de secção rectangular. É estreito na cintura mas ao nível do peito é largo. O peito é constituído por dois mamilos salientes, feitos cdois discos achatados. O mamilo direito é maior que o esquerdo. Braços: estão erguidos e ligeiramente inclinados para a frente ao nívelesquerdo termina com uma mão estilizada, arredondada e plana, sem dedos.direito, que não apresenta mão. Órgão sexual: o órgão reprodutor está bem destacado, está erecto. É farqueado para cima. Os testículos estão bem definidos. (fotografia C) Pernas: estão um pouco afastadas e são curtas em relação ao tronco, sendodireita. Pés: são disformes, planos e de formato triangular. O pé esquerdo é maiordos pés. (fotografia D) Peso: 54.7 gramas Altura: 104,66 mm; Largura máxima: 37,04 mm; Altura da cabeça:orelha): 10,67 mm; espessura (cabeça-nariz): 11,82 mm; Tronco: largura ddo tronco: 6,66 mm; Comprimento do pénis: 11,41 mm Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de AlcácerSector L; X= 36.42; Y= 50.7; Z= 60.03; data: 26/06/96. Ficha de laboratório: FO 34/96 Observações: não tem bolhas. Atendendo ao formato da cabeça pode trataum indivíduo calvo ou com gorro.

B C

om apliques. Os mamilos são

médio do pescoço. O braço É mais comprido que o braço

ino, pontiagudo e um pouco

a esquerda mais grossa que a

que o direito. Não têm dedos

17,33 mm; largura (orelha-o tronco: 8,44 mm; espessura

do Sal.

r-se de uma representação de

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Peça n.º 6 – Orante (desenho no anexo 3.4.2) Nº de Inventário: 1201 Atitude: 3 A Posição: de pé Cabeça: tem um sulco que contorna o topo e a parte de trás da cabeça, passando acima das orelhas. Não se percebe se será cabelo ou chapéu que tem no topo da cabeça. (fotografia B) Cara: ovalada. Tem uma pequena linha muito ténue que faz a separação entre a cara e o pescoço. Olhos: olhos salientes. O olho direito é formado por uma saliência arredondada e achatada. Está colocado na face, no entanto o olho esquerdo, também feito por uma saliência arredondada, está desviado para junto do nariz. Tem as duas sobrancelhas muito bem definidas e salientes que estão unidas. Por cima da sobrancelha esquerda surge um sulco que vai unir à orelha esquerda. Nariz: o nariz é saliente e arqueado, partindo da junção das sobrancelhas. Boca: feita por um ligeiro traço e demarcada pela base do nariz. Orelhas: tem as duas orelhas. A esquerda bem saliente, formada por uma pequena lingueta de formato elipsoidal. A direita está colada à sobrancelha, também formada por uma lingueta, mas um pouco deformada pelo sulco que passa acima e que vem do olho. Queixo: arredondado. Tem umas pequenas formações que poderão representar a barba. (fotografia C) Pescoço: alto e estreito. Tronco: alto e cilíndrico. Braços: são curtos. Levantados para a frente, erguidos ao nível do pescoçmais baixo e inclinado para a esquerda. Mãos: de forma achatada e com uns ligeiros entalhes que podem represenÓrgão sexual: pénis curto, ligeiramente levantado, sem os testículos. Pernas: afastadas e curtas. Pés: de formato triangular. Os calcanhares estão levantados ficando qapresentam uma ligeira inclinação para dentro, principalmente o direito. NPeso: 31.3 gramas Altura: 81,12 mm; Largura máxima: 26,18 mm; Cabeça: altura: 11,31orelha): 9,27 mm; espessura da cabeça (cabeça-nariz): 10,20 mm; Troncespessura do tronco: 7,74 mm Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de AlcácSector L; X= 37.89; Y= 44.36; Z= 60.94; data: 29/04/96. Ficha de laboratório: FO 22/96 Observações: não tem bolhas.

B

C

o. O esquerdo está ligeiramente

tar os dedos.

uase nas pontas dos pés. Estes ão se detectam os dedos.

mm; largura da cabeça (orelha-o: largura do tronco: 7,85 mm;

er do Sal.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Peça n.º 7 – Orante (desenho no anexo 3.4.3) Nº de Inventário: 1319 Atitude: 3 A Posição: de pé. Em mau estado de conservação. Cabeça: está mal definida devido ao mau estado de conservação. No entanto nota-se que teria algo de alto na cabeça, talvez um gorro ou cabelo. Tem uma depressão do lado direito da cabeça logo por cima do olho direito, como se usasse uma coroa ou uma bandolete no cabelo e este estivesse todo repuxado para trás. Cara: não está bem definida, devido ao mau estado de conservação da peça. Olhos: são proeminentes, formados por duas saliências redondas. O olho esquerdo é maior mas o olho direito é mais saliente. Nariz: é saliente mas achatado. Pescoço: é alto, grosso e cilíndrico. Tronco: de forma cilíndrica, é alto e grosso. Braços: não estão completos. O braço esquerdo está erguido para cima, e ao nível do pescoço está partido e sem mão. O braço direito está partido logo no arranque, ao nível do ombro. Órgão sexual: o órgão sexual está evidenciado, tendo o pénis erecto, mas econtra-se partido, sensivelmente na zona mediana. Pernas: estão direitas e afastadas. Apresentam-se um pouco disformes devido ao estado de deterioração da peça. Pés: estão ligeiramente erguidos, como se a figura estivesse em pontas dos pés. Não são visíveis os dedos. Peso: 92.9 gramas Altura: 117,86 mm; Largura do braço esquerdo ao arranque dcabeça: 11,61 mm; Espessura da cabeça: 14,95 mm; Largura do pescoço: 12,01 mm; Largura do tronco: 12,45 mm; Espessura do trProveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de AEncontrado durante a abertura da sapata localizada a poente do Santuárecolha - 14/11/96 Ficha de laboratório: FO 19/98

o direito: 36,04 mm; Largura da pescoço: 11,39 mm; Espessura do onco: 12,62 mm lcácer do Sal. rio, por baixo das Arcadas. Data da

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Peça n.º 8 – Orante (desenho no anexo 3.4.3) Nº de Inventário: 1327 Atitude: 3 A Posição: de pé Cabeça: falta uma parte da cabeça no topo, do lado esquerdo. Parece ter tido cabelo, atendendo aos ténues vestígios existentes atrás da orelha direita. (fotografia B) Cara: está bem demarcada. A face direita está danificada. Abrange parte da cabeça e estende-se até à orelha da face esquerda. Tem uma linha abaixo do queixo que delimita o pescoço. Olhos: são duas bolinhas achatadas. O olho esquerdo está melhor conservado que o direito. Nariz: bem destacado, de forma triangular e saliente. Aparenta ter um sinal no lado direito. Orelhas: salientes e pequenas. Boca: é demarcada pelo nariz e por um traço muito ténue horizontal. Tem duas covinhas ao nível da boca, uma de cada lado. Queixo: saliente, arredondado e grosso, demarcado do pescoço. Tem uma linha que vai de um lado ao outro formando a separação entre a cara e o pescoço. Tronco: é cilíndrico. Não tem pernas. Braços: erguidos para cima, ao nível do pescoço. Os braços são curtos.O braço direito não está completo. O esquerdo tem uma mão esquemática, apresentando a palma para a frente. Nesta paaparentam configurar uma mão fechada. (fotografia C) Peso: 32.1 gramas Altura: 59,81 mm Largura: 27,78 mm Largura da cabeça: 10 mm Espessura da cabeça (nariz/parte de trás da cabeça): 12,97 mm Largura do trono: 9,98 mm Espessura do tronco: 9,87 mm Base do tronco ao inicio dos braços: 33,32 mm Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de ASector L; X= 37.48; Y= 47.68; Z= 60.5; data: 30/04/96. Ficha de laboratório: FO 32/96

B C

lma existem pequenos sulcos que

lcácer do Sal.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Peça n.º 9 - Orante feminino (desenho no anexo 3.4) Nº de Inventário: 1080 Atitude: 3 A Posição: de pé Cabeça: de formato globular, convexa para trás e com pequena depressão no topo. Tem um sulco na parte de trás que estabelece a separação entre a cabeça e o pescoço. Tem uns pequenos sulcos (em diagonal e em V) na parte frontal que poderão indicar o cabelo. Cara: mal definida, de formato ovalado. Olhos: são salientes, formados por duas bolas. O olho direito é mais perfeito que o esquerdo, que parece estar colado à orelha esquerda. Orelhas: de concepção muito tosca. A direita é uma saliência de formato sub-rectangular alongado, ficando logo por baixo do olho e colando a este. A orelha esquerda é uma saliência que fica logo por trás do olho e ao qual também está colada. Nariz: é pouco saliente, achatado, ligeiramente largo e medianamente grosso. Tem bem definidas as duas narinas. Boca: é definida por um traço ou sulco em V invertido, ligeiramente aberto. Queixo: é plano, arredondado e a região sob o queixo é curta. Pescoço: pescoço largo, de diâmetro superior ao do tronco. Tronco: de formato cilíndrico ligeiramente aplanado dorso-ventralmente. É fino e com a zona da anca ligeiramente insinuada. Tem dois mamilos de forma redonda descentrados e colocados ao nível dos braços. O mamilo direito é maior que o esquerdo. Braços: estão erguidos para cima à altura da cabeça, com as palmas das mãos estilizadas, achatadas e terminam em forma arredondada. A mão direita é uesquerda e tem definido o polegar. Órgão sexual: não se evidencia a genitália. Pernas: tem a perna esquerda completa. Da direita apenas resta os vestígesquerda é fina, com uma ligeira inclinação para o interior, a partir do pressugerido por uma pequena depressão que no lado oposto denuncia a dobra da pPés: só tem o esquerdo, com o calcanhar erguido. O pé é pequeno, curto e prolongamento da perna, partindo da planta do pé, existe uma protuberândestinada a encaixar numa base que manteria a figura de pé. (fotografia B) Peso: 65.1 gramas Altura: 102,35 mm; Altura da cabeça ao pé: 96,19 mm; Largura: 39,34 mmmm; Largura da cabeça: 11,12 mm; Espessura da cabeça: 13,66 mm; LargLargura do tronco: 8,93 mm; Espessura do tronco: 7,89 mm Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de Alcácer doSector L; X= 37.15; Y= 47.75; Z= 61.06; data: 24/04/96. Ficha de laboratório: FO 31/96 Observações: Ancas mais proeminentes, sugerindo tratar-se de um indivíduo d

B

para a frente. As mãos são m pouco mais larga que a

ios do arranque. A perna umível joelho, o qual está erna. arredondado na ponta. No cia cilíndrica, certamente

; Altura da cabeça: 18,34 ura do pescoço: 9,49 mm;

Sal.

o sexo feminino.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Peça n.º 10 – Orante feminino (desenho no anexo 3.4) Nº de Inventário: 1326 Atitude: 3 A Posição: de pé, provavelmente. Cabeça: troncocónica, com o topo plano e três pontuações em triângulo. Cara: a testa é alta e a cara não está demarcada. (fotografia B) Olhos: salientes, globulares e amendoados, circunscritos por linhas direitas ortogonais. Nariz: grosso, triangular a achatado na ponta. Boca: está aberta, distingodo-se a mandíbula. Queixo: um pouco demarcado pela mandíbula, arredondado e terminando a cara. Pescoço: alto e grosso Tronco: tem apenas o busto com os braços. No peito tem dois mamilos salientes. Não estão muito bem centrados, encontando-se ao nível do arranque dos braços. O direito é maior que o esquerdo, e é formado por um pequeno disco achatae não tão circular. Braços: erguidos para cima ao nível da boca. Temdireita é achatada, denota-se o dedo polegar e tem ne outro ao meio da palma. A mão esquerda também Peso: 65.1 gramas Altura: 53,96 mm; Largura: 54,86 mm; Largu(nariz/parte de trás da cabeça): 15,45 mm; Largumm; Espessura do tronco: 9,59 mm; Base do tronProveniência: Convento de Nossa Senhora de AracSector L; X= 36.7/37.9; Y= 49./50.6; Z= 59.65/59.4Ficha de laboratório: FO 30/96 Observações: pouco cuidado na representação do ol

B

do. O esquerdo, mais pequeno, parece mais descaído

as palmas das mãos viradas para a frente. A mão a palma dois cortes transversais, um ao nível do pulso é achatada e mais estreita. (fotografia C)

ra da cabeça: 11,38 mm; Espessura da cabeça ra do pescoço: 11,74 mm; Largura do trono: 13,01

co ao inicio dos braços: 9,90 mm aeli, Castelo de Alcácer do Sal. 5; data: 17/04/96.

ho. Poderá ser um orante feminino.

C

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

- Os Guerreiros Peça n.º 11 - Guerreiro 1 (desenho no anexo 3.2) N.º de Inventário 1071 Descrição de peça: Atitude: 10 Posição: de pé, e em andamento. Cabeça: de formato ovalado, no topo termina em forma de capacete de soldado, arredondado. Olhos: bem marcados e definidos, de formato amendoado, são duas covas puncionadas junto à cana do nariz. As arcadas estão definidas pelo rebaixamento dos olhos. O olho esquerdo está ligeiramente inclinado (quase em diagonal) e é maior que o direito. Nariz: de formato triangular, bem demarcado, saliente, terminando em ponta arredondada e plano na sua parte inferior. Tem um pontilhado que arranca da sobrancelha esquerda e vai até à ponta do nariz, acompanhando a cana esquerda. O nariz tem um formato que lembra as protecções nasais dos capacetes. Boca: tem um sulco horizontal descentrado, situado logo a seguir à junção do nariz com a face e imediatamente acima da boca. A boca apresenta-se ligeiramente aberta e demarcada por um sulco escavado e concavo. Queixo: é de formato oval e a região sob o queixo é curta. Orelhas: não são evidentes, no entanto, é possível que o olho esquerdo esteja ligado à orelha, devido ao seu tamanho e forma alongada. Pescoço: curto e com dois sulcos horizontais paralelos que provavelmente contornaTronco: alto, de secção circular ao nível da cintura, mas achatado dorso-ventralmeA partir da cintura o tronco alarga em direcção aos braços, originado um peito largas. Nas costas, tem duas linhas que se cruzam ao nível das omoplatas. A linha do centro das costas. Cada linha circunda o braço à altura do peito e regressa às codireito, ou é dupla ao nível do peito ou tem uma outra linha paralela semi-circularsurge um outro sulco vertical, ligeiramente em diagonal, unindo à linha que circundNa parte da frente, tem três linhas ou sulcos marcados ao nível da cintura, que peessas linhas poderão formar um cinto ou cinturão. Tem a região das nádegapronunciada. Braços: Braços idênticos ao nº 1077 e escudo igual. Órgão sexual: pénis erecto com definição dos genitais. Tem um ponto que formado por uma saliência redonda, do lado direito, perto do arranque do pénis. Pernas: são direitas e robustas vislumbram-se os joelhos representados por uma árearredondada. As pernas estão melhor definidas do lado de trás. A perna esquerda está mais adiantada que a direita, levando a pensar que estaria emovimento. Pés: estão bem definidos, assim como os dedos que estão bem demarcados. O pesquerdo é mais perfeito que o direito. O pé esquerdo está levantado em posição dandamento, tem um sulco horizontal, que faz a separação entre os dedos e a palmdo pé. O pé direito está ligeiramente inclinado para dentro quase tocando o esquerd(será que corresponde a alguma malformação ou patologia?). Tem os dedos doincorrecta, como se os dedos dos pés esquerdo estivessem no direito e vice-versa. Asão lisas, mas parecem ter estado num suporte. São toscas pouco tratadas. Na pernahorizontal que faz a separação entre esta e o pé. (fotografia B) Peso: 92.6 gramas Altura total: 115,14 mm; Largura total: 36,37 mm; Altura da cabeça: 27,05 mm14,42 mm; Espessura da cabeça: 14,26 mm; Altura do tronco: 36,01 mm; Espemm; Braços: Braço direito: Comprimento: 21,00 mm; Braço esquerdo e escudoLargura: 16,51 mm; Largura do peito: 15,74 mm; Altura do cinto: 3,73 mm; 11,47 mm; Largura da anca: 14,72 mm; Altura das pernas: 30,25 mm; Largmm; Pés: Pé direito: Comprimento: 15,96 mm; Largura: 7,62 mm; Pé esquerdomm; Largura: 7,75 mm Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de Alcácer do Sal.Sector B; X= 40.5/43.5; Y= 87.5/88.5; Z= 59.95/59.73; data: 27/06/95. Ficha de laboratório: FO 118/95

vam todo o pescoço. nte na região toráxica. desenvolvido e costas

cruzamento incide ao stas. A linha do braço . Ao nível do coração, a o braço esquerdo. rcorrem todo o tronco, s

é

a

m

B

é e a

o, s pés com orientação s plantas dos pés não

esqerda tem um sulco

; Largura da cabeça: ssura do tronco: 9,64 : 21,08 mm; Escudo: Largura da cintura: ura das pernas: 5,86 : Comprimento: 14,28

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Peça n.º 12 - Guerreiro 2 (desenho no anexo 3.2) Nº de Inventário: 1077 Descrição de peça: aparenta estar vestido, não xibindo a genitália e usa cinturão. Atitude: 10 Posição: de pé. Ligeiramente inclinado para a frente. Cabeça: de formato oval, no topo termina em forma de capacete de soldado. (fotografia B) Olhos: bem marcados e definidos, são duas covas puncionadas junto à cana do nariz; as arcadas estão definidas pelo rebaixamento dos olhos. Nariz: de formato triangular, bem demarcado, saliente, terminando em ponta. Boca: apresenta-se aberta e demarcada por um sulco concavo. Queixo: é de formato oval e a região sob o queixo é curta. Pescoço: é curto, quase da largura da cabeça. Tronco: alto, de formato cilíndrico (ou quase), desproporcionado em relação às pernas e aos braços. Tem um sulco horizontal do lado direito, por cima do ombro, que divide o pescoço do tronco. Do lado esquerdo o sulco cruza-se com a linha que vem das costas. Na parte da frente tem duas linhas ou sulcos marcados ao nível da cintura que contornam todo o tronco (a distancia entre as linhas: 4,67 mm), essas linhas desenham o cinto ou cinturão.(fotografia C)Nas costas, tem duas linhas que se cruzam ao nível das omoplatas. A linha do cruzamento incide mais para o braço direito. Cada linha circunda o braço à altura do peito e regressa às costas. Abraço direito, ou é dupla ao nível do peito ou tem uma outra linha(imperfeição do fabrico?) Abaixo do nível do coração, surge um ouhorizontal, um pouco inclinado para a esquerda. Tem a região daspronunciada. Braços: são curtos, arqueados e virados para a frente. O braço esquerdo emescudo redondo com saliência central em forma de cone. O escudo tem uma muito ténue, feita por sulcos em redor do cone, e teria uma decoracompanhava o rebordo do escudo, verificada também pela existência de veoutros sulcos.(fotografia D) O braço direito, à altura do que seria a mãoencaixe ou um semi-círculo (com um furo) onde deveria existir uma armafalcata ou espada de antenas. Órgão sexual: inexistente. Pernas: tem duas pernas afastadas, curtas e direitas. São robustas. Têm dois sulcos que configuram os tornozelos. À perna esquerda falta parte do pé mas tem o calcanhar, que está levantado. A perna direita está completa. O pé é de forma sub-triangular e termina numa ponta arredondada, sem vestígios dos dedos. O calcanhar apresenta-se erguido. Dá a sensação de estar em bicos de pés, ligeiramente levantado. Apresenta traços de lima ou será vestígios traços representando o calçado? Peso: 65,1 gramas Altura: 94,98 mm; Largura do braço ao escudo: 35,39 mm; Altura: da cabeça: 22,96 mm; Largura da cabeça: 12,57 mm; Espessura da cabeç12,68 mm; Largura do pescoço: 9,66 mm; Altura do tronco: 28,91 mmLargura do tronco: na cintura: 11,19 mm; na anca: 16,36 mm; no peito: 13,1mm; Espessura do tronco: na cintura: 10,19 mm; na anca: 10,75 mm; npeito: 9,91 mm; Largura da perna esquerda: 7,09 mm; Espessura da pernesquerda: 7,28 mm Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de Alcácer dSal. Sector L; X= 36.7/37.9;Y= 49:/50.6;Z= 59.65/59.45; data: 17/04/96. Ficha de laboratório: FO 27/96 Observações: Apresenta vestígios de ter sido limado e aplanado ao nível dapernas. A perna direita encontrava-se quebrada e foi restaurada. Tem bolhas Tecnologia: cera perdida.

linha do paralela. tro sulco nádegas

punha um decoração ação que stígios de , tem um , talvez a

B

C

a: ; 0 o a

o

s D

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

- Os zoomórficos

- Os Bovinos Peça n.º 13 - Cabeça de bovino (desenho no anexo 3.5) Nº de Inventário: 1074 Descrição de peça: focinho de secção triangular, pescoço de secção triangular estreita. Orelhas: a direita encontra-se destacada por baixo do corno. A esquerda está colada ao corno. Definição dos cornos: largos e virados para cima. O direito está inteiro e o esquerdo está quebrado a meio. Olhos: o direito é bem saliente e destaca-se da cabeça. O esquerdo está pouco visível devido ao mau estado de conservação. Pescoço: é estreito. Peso: 14.5 gramas Altura: queixo/corno: 33,34 mm; Largura: corno/corno: 29,21 mm; Comprimento: 21,65 mm; Espessura do pescoço: 2,10 mm; Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de Alcácer do Sal. Sector L; X= 36.7/37.9; Y= 51.1/54.9; Z= 61.35; Data: 16/04/96. Ficha de laboratório: FO 24/96 Peça n.º 14 – Bovino (desenho no anexo 3.5.1) Nº de Inventário: 1324 Descrição de peça: está de pé e parado. Cabeça: está bem definida, simples e de face plana. É de perfil triangular, arredondado na área da boca e no topo da cabeça. Orelhas: a direita, bem definida, é mais larga e está colada ao corno direito. A esquerda está partida e seria mais estreita que a direita. Definição dos cornos: estão virados para a frente e encurvados para dentro. As pontas apresentam-se arredondadas. O corno direito está inclinado para dentro enquanto o esquerdo está mais direito e um pouco deslocado paraOlhos: o esquerdo, de forma amendoada, está ligeiramente defdificultada pelo mau estado de conservação da cabeça. O olho dirde conservação ou ao tratamento de restauro realizado. Nariz: não tem. Boca: não tem. Pescoço: está bem demarcado. Garrote bem definido assim coperpendicular ao pescoço, quase fazendo a largura do pescoço. Tronco: é magro, fino e cilíndrico. Membros: os dianteiros estão ao mesmo nível, são direitos, e usão um pouco arredondados. A perna traseira esquerda está mais aCascos: Os cascos das patas dianteiras são planos, largos, arrevestígios dos dois dedos. Os cascos dos membros traseiros sãofrente, terminando quase em ponta. Estão ligeiramente erguidos npontas assentam), também não se vêm os dedos dos pés. Cauda: cauda é comprida, voltada para baixo. Na zona de inseum pequeno troço sub-horizontal. Peso: 32.3 gramas Altura dos cornos às patas dianteiras: 37,51 mm; ComprimAltura da cabeça: 15,68 mm; Largura da cabeça ao nível dos ao nível das orelhas: 16,07 mm; Altura do tronco dorso-ventmm; Altura da cauda: 21,70 mm; Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo dSector L; X= 37.54; Y= 46.62; Z= 60.84; Data: 29/04/96. Ficha de laboratório: FO 21/96

a esquerda. inido por um ténue sulco, a definição é eito não se vê, tmabém devido ao estado

mo a paleta. Tem um entalhe vertical,

m pouco afastados entre si. Os traseiros diantada que a direita.

dondados, assentam no chão e não têm mais triangulares e estreitos que os da ão assentando totalmente no chão, (só as

rção da cauda com os quadris apresenta

ento do focinho à cauda: 54,82 mm; cornos: 15,26 mm; Largura da cabeça re: 6,27 mm; Largura do tronco: 6,42

e Alcácer do Sal.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Peça n. 15 – Bovino (desenho no anexo 3.5.1) Nº de Inventário: 1325 Descrição de peça: está de pé e parado Cabeça: bem definida, de aspecto triangular, arredondada na área da boca. Cabeça ligeiramente levantada, como se estivesse a olhar para a frente. Orelhas: a esquerda está bem definida, de aspecto triangular, pequena e está colada ao corno esquerdo, sob este. A direita está partida na sua extremidade, sendo por isso mais estreita, e está colada ao corno. Na parte de trás do corno e da orelha existe um sulco horizontal que faz a separação entre a orelha e o corno. Definição dos cornos: o esquerdo está partido logo pela base, no contacto com o crânio. O direito está partido na ponta. Ambos os cornos estão erguidos para cima e afastados entre si, com as pontas divergentes. Olhos: o esquerdo, de formato amendoado, saliente, de tipo apldireito é composto por um sulco circular. Nariz: não visível. Boca: não tem. Pescoço: está bem demarcado. Garrote bem definido assim como Tronco: é grosso, comprido e cilíndrico. Membros: os dianteiros estão completos. São direitos e afastapartidas a meio e estariam afastadas entre si. Os membros são calongado. Cascos: os dianteiros são pequenos, ligeiramente arrendondadosarredondadas e ligeiramente erguidas, não têm dedos. Órgão sexual: tem uma prega muito disforme que poderá insinuarCauda: de forma arqueada e inclinada para baixo, terminando emPeso: 44.4 gramas Altura do corno às patas: 40,12 mm; Comprimento do foccabeça: 18,05 mm; Largura da cabeça do corno direito à ortronco dorso-ventre: 10,55 mm; Largura do tronco: 9,91 mm; AProveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo dSector L; X= 36.7/37.9; Y= 49./50.6; Z= 59.45/59.25; Data: 18/04Ficha de laboratório: FO 19/96 Peça n.º 16 – Bovino (desenho no anexo 3.5) Nº de Inventário: 1328 Descrição de peça: está de pé e parado. Mau estado de conservação Cabeça: cabeça de perfil triangular, arredondada na área da boca. A face é simples, não tem olhos, nariz, boca e orelhas. Tem na área frontal uma reentrância de formato alongado que poderia ser um sinal da pelagem do animal. Definição dos cornos: tem o corno direito partido e seria ligeiramente inclinado para dentro. Não tem o corno esquerdo, devido ao mau estado de conservação da peça. Pescoço: é curto com o garrote bem demarcado. Tronco: é robusto, de secção ovalada, com a definição do garrote bem indicado. Membros: os dianteiros são toscos, grossos e curtos. Os membros traseiros são mais magros e o direito perdeu volume, dpeça. A perna esquerda dianteira está mais avançada que a direita.Cascos: ss das patas dianteiras são planos e grossos, e não se desquerda é maior que o direito. O casco esquerdo da pata traseirponta, sem dedos. O casco direito está em mau estado, não se podeÓrgão sexual: o pénis está colado à barriga e partido do laevidenciados (pode significar que se trate de um animal de cobriçã

ique, está quase encostado à orelha. O

a paleta.

dos entre si. As pernas traseiras estão urtos em relação ao tronco que é mais

nas suas plantas. As pontas, também

o órgão genital. ponta.

inho à cauda: 72,63 mm; Altura da elha esquerda: 18,89 mm; Altura do ltura da cauda: 15,87 mm

e Alcácer do Sal. /96.

evido ao mau estado de conservação da etecta nenhum dedo. O casco da pata

a é de forma triangular terminando em ndo verificar a forma.

do esquerdo. Os testículos estão bem o).

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Cauda: tem o arranque da cauda. Peso: 64.9 gramas Altura do corno à pata: 37,88 mm; Comprimento do focinho ao arranque da cauda: 62,84 mm; Largura das patas da frente: 16,46 mm; Altura da cabeça: 20,81 mm; Largura da cabeça: 9,55 mm; Altura do tronco ao nível do dorso-ventre: 14,52 mm; Altura do tronco ao nível do dorso-órgão sexual: 18,33 mm; Largura do tronco: 9,93 mm; Largura do arranque da cauda: 8,93 mm Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de Alcácer do Sal. Sector L; X= 36.3; Y= 60.76; Data: 19/06/96. Ficha de laboratório: FO 33/96 Peça n.º 17 – Bovino (desenho no anexo 3.5.2) Nº de Inventário: 1329 Descrição de peça: está de pé e parado. Mais tosco. Sem bolhas Cabeça: grande em relação ao corpo, com a frente concava e focinho arredondado. Orelhas: são semi-esféricas, grossas e salientes, podendo à primeira vista ser confundidas com olhos. Definição dos cornos: são largos, robustos, abertos para fora e ligeiramente levantados para cima. Olhos: não tem. Nariz: não tem Boca: não tem Pescoço: é curto e forte. Tem o garrote bem destacado, parecendo ter crina. Tronco: é robusto, de secção ovalada e com o garrote bem definido. Membros: são curtos, toscos e grosseiros. Das pernas traseiras apendireita dianteira tem o casco muito estilizado e arredondado. Nas rerespectivos cascos. Órgão sexual: tem a indicação do sexo através de uma prega. Cauda: tem vestígios de arranque de cauda, mas muito ténues. Peso: 45.9 gramas Altura dos cornos aos pés: 37,63 mm; Comprimento do focinhoLargura das patas dianteiras: 19,26 mm; Altura da cabeça: 20,3dos cornos: 28,03 mm; Medida do dorso-ventral do tronco: 14,71Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de ASector L; X= 27.; Y= 55.5/57.5; Z= 59.87; Data: 20/09/96. Ficha de laboratório: FO 111/96

as o arranque se conservou. A perna stantes pernas não se conservaram os

ao arranque da cauda: 52,22 mm; 5 mm; Largura da cabeça ao nível mm; Largura do tronco: 9,58 mm

lcácer do Sal.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

- Os Equídeos Peça n.º 18 – Cavalo (desenho no anexo 3.5.4) Nº de Inventário: 1322 Descrição de peça: está de pé, provávelmente em movimento. A peça não se mantém de pé. Cabeça: de perfil sub-rectangular arredondada na área da boca. Orelhas: estão levantadas para cima e têm formato amendoado. O seu arranque situa-se junto aos olhos. Olhos: são salientes, destacam-se da face, estão afastados e colocados perifericamente na face. O esquerdo é maior e sai para fora da face. O direito é mais pequeno. Ambos estão colados ao arranque das orelhas. Os olhos colocados desta forma são visíveis mesmo de perfil. Nariz: não tem. Boca: tem um ligeiro rasgo horizontal ou traço insinuando a boca. Pescoço: de secção triangular, bem destacado, com a crina evientalhes que poderão ser a representação da crina do cavalo. Tronco: é cilíndrico. Tem a garupa elevada. Membros: são arqueados para a frente e para dentro. As perencostadas ao nível dos cascos. As pernas dianteiras estão muito mcom uma ligeira sobreposição do casco direito sobre o esquerdo. Pcascos. Os cascos são achatados de forma arredondada, sem dedos. Órgão sexual: não tem. Cauda: da garupa arranca a cauda que está partida quase na sua basPeso: 104.2 gramas Altura das orelhas à pata esquerda: 54,46 mm; Altura da caComprimento da cabeça à cauda: 95,38 mm; Largura das pernapernas traseiras: 19,99 mm; Altura da cabeça: 30,37 mm; Larg14,44 mm; Largura do tronco: 9,86 mm; Altura do tronco dorsoProveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo deSector L; X= 36.7; Y= 46.3; Z= 61.38; Data: 22/04/96. Ficha de laboratório: FO 20/96 Peça n.º 19 – Burro (desenho no anexo 3.5.3) Nº de Inventário: 1320 Descrição de peça: está de pé, parado. Cabeça: simples a nível da face, de formato ovalado e terminando numa ponta arredondada. Orelhas: estão levantadas para cima e afastadas entre si. São robustas, de formato triangular e arredondadas nas pontas. A orelha direita está completa. A esquerda está um pouco danificada, sendo por isso mais pequena. Olhos: não tem olhos. Nariz: não tem nariz. Boca: não tem boca. Pescoço: é curto e de secção triangular. A crina está bem definida. Tem uns traços verticais paralelos ao pescoço que podeindicar a crina. Tronco: é comprido e de formato cilíndrico. A barriga está destaquadris apresentam-se robustos. Membros: são curtos em relação ao tronco e estão afastados entarredondadas, não sendo visíveis os cascos. Órgão sexual: está bem visível e inclinado para baixo. Entre as peque pode ser interpretada como o escroto. Cauda: apresenta-se arqueada inclinada para baixo. A cauda é grosPeso: 108.7 gramas

denciada. Tem uns ligeiros traços e

nas traseiras, menos curvadas, estão ais curvadas, inclinadas para a frente atas não definidas a nível de tipos de

e, no entanto conservao troço inicial.

uda às patas traseiras: 49,00 mm; s da frente: 17,28 mm; Largura das ura da cabeça ao nível das orelhas: -ventre: 10,78 mm Alcácer do Sal.

m

c

r

s

ser simplemente riscos de lima ou

ada e ovalada paecendo dilatada. Os

e si. As pernas terminam em pontas

rnas traseiras denota-se uma saliência

a e está partida ao nível mediano.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Altura das orelhas às patas: 48,30 mm; Comprimento da cabeça à cauda: 89,57 mm; Largura das patas da frente: 23,06 mm; Largura das patas de trás: 23,71 mm; Altura da cabeça: 25,8 mm; Largura da cabeça ao nível das orelhas: 15,52 mm; Altura do tronco dorso-ventre: 16,11 mm; Largura do tronco: 12,07 mm Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de Alcácer do Sal. Sector L; X= 36.34; Y= 46.46; Z= 60.9; Data: 29/04/96. Ficha de laboratório: FO 18/96

- Os Canídeos Peça n.º 20 – Cão (desenho no anexo 3.5.5) Nº de Inventário: 1321 Descrição de peça: está de pé, parado, e mantém-se de pé. Sem bolhas. Cabeça: focinho de perfil triangular e arredondado ao nível da boca. Tem um sulco vertical que estabelece a divisão entre a cabeça e o pescoço, no lado esquerdo. Orelhas: estão levantadas para cima e inclinadas ligeiramente para frente. São de formato triangular e estão unidas na base. Olhos: não tem olhos. Nariz: não tem nariz. Boca: não tem boca. Pescoço: de secção triangular. Tronco: é cilíndrico. Pescoço: na zona dorsal do pescoço apresenta um afilamento formandMembros: estão afastados entre si, dirigidos ligeiramente para arredondada, não sendo visíveis os pés. Órgão sexual: verifica-se o órgão sexual pronunciado, saliente e esescroto. Cauda: é grossa, cilíndrica e está partida. Cauda erguida. Existe umque parece ser o ânus. Peso: 42.1 gramas Altura da cabeça às patas dianteiras: 37,60 mm; ComprimentoLargura do tronco: 8,23 mm; Altura do tronco: 9,88 mm; Altura d13,60 mm; Altura da cabeça: 17,58 mm; Largura da cabeça ao níveda cauda: 6,50 mm Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de ASector L; X= 22./23; Y= 51./53; Z= 61.08/61.03; Data: 27/06/97. Ficha de laboratório: FO 1/98

o uma aresta boleada. a frente e terminando em ponta

tá colado à barriga, sendo visível o

a irregularidade por baixo da cauda

do focinho à cauda: 57,78 mm; o tronco incluindo o órgão sexual: l das orelhas: 10,72 mm; Largura

lcácer do Sal.

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- Os ex-votos anatómicos ou membros do corpo Peça n.º 21 - Braço N.º Inventário: 1479 Definição do braço: parece tratar-se do braço esquerdo. É robusto e tem a mão pouco evidenciada, encontrando-se fechada. Denota-se a configuração dos dedos. Tem um corte fundo tranversal, na parte palmar do braço, indicando provavelmente a articulação, ou talvez indicar o mal do devoto. Tem outro sulco transversal na palma da mão que poderá indicar o arranque desta ou o alinhamento dos dedos fechados. Nota-se o polegar por cima do indicador. Os outros dedos não estão muito evidenciados, apesar de se ter a noção da sua existência. Tem duas arestas suaves longitudinais que indicam os lados exteriores do braço. Tem outra aresta longitudinal, entre as duas já referidas, que depois se divide em duas, formando um triângulo que configura a mão. Peso: 14,0 gramas (-2) Altura do braço na parte mais larga (arranque do braço): 10,mm; Largura: 9,85 mm; Largura da mão: 5,41 mm; ComprimeProveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo dAS/CC, Sector E; X= 56.5/59.5; Y= 78.5/79.5; Z= 60.93/60.78; DFicha de laboratório: FO 145/95 Peça n.º 22 – Perna (desenho no anexo 3.1) N.º Inventário: 1437 Definição da perna: trata-se de parte de uma perna, provavelmente esquerda. É de forma cilíndrica. Tem uma saliência na canela que poderá querer indicar a rótula ou provavelmente a doença do devoto. Esta saliência é muito perfeita para ser considerada um defeito de fabrico. O pé é curto, arredondado na ponta e tem o calcanhar erguido levantando o pé. (fotografia B) Peso: 6,5 gramas Altura: 23,38 mm; Largura: 8,05 mm; Espessura: 7,05 mm

BProveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de Alcácer do Sal. Sector B; X= 40.5/43.5; Y= 87.5/88.5; Z= 59.95/59.73; Data: 27/0Ficha de laboratório: FO 118/95 Peça n.º 23 - Pé N.º Inventário: 2062

B

Definição do pé: trata-sse de um pé esquerdo. Tem uma pequena parte da perna. O calcanhar apresenta-se muito bem delineado, mostrando os tendões. A planta do pé está bem marcada com uma pequena concavidade. O calcanhar está ligeiramente erguido. O pé está virado para dentro (mostrando talvez uma deficiência). A inclinação é mais acentuada a partir do meio do pé. Termina em forma arredondada, não sendo detectáveis os 5 dedos. (fotograPeso: 0,8 gramas Altura: 14,77 mm;Largura: 4,85 mm; Espessura: 2,69 mm Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo dSector L; X= 36.7/37.9; Y= 49./50.6; Z= 59.65/59.45; Data: 17/04Ficha de laboratório: FO 30/96

62 mm; Altura na parte da mão: 12,19 nto: 27,87 mm e Alcácer do Sal. ata: 22/03/95.

6/95.

fia B)

e Alcácer do Sal. /96.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

- Os Pesos Peça n.º 24 - Peso pequeno (desenho no anexo 3.1) Nº de Inventário: 1073 Descrição de peça: em forma de cubo, numa das faces junto a um dos vértices tem um pequeno furo. (será bolha no metal?) (fotografia B) Peso: 9.0 gramas Altura: 11,23 mm; Comprimento: 12,43 mm; Largura: 12,44 mm Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de Alcácer do Sal. Sector L; X= 37.; Y= 47./47.3; Z= 60.84; Data: 29/04/96. Ficha de laboratório: FO 23/96

Peça n.º 25 - Peso grande N.º de Inventário: 1478 Descrição de peça: apresenta umde chumbo ou de prata. É um vértices. Peso: 29,5 gramas Altura: 19,28 mm; ComprimentProveniência: Convento de NoAlcácer do Sal. Sector I; X= 31./33,5; Y= 87.5/90Ficha de laboratório: FO 68/96

B

p

s

as palhetes prateadas, que podem ser aralelepípedo ao qual falta um dos

o: 17,38 mm; Largura: 13,36 mm sa Senhora de Aracaeli, Castelo de

.; Z= 58.71/58.56

13,36 mm

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- Timiaterio/Incensário: Peça n.º 26 - Suporte de Timiaterio ou de Incensário (desenho no anexo 3.7) Nº de Inventário: 1072 Descrição de peça: suporte com decoração constituída por caneluras. Objecto bi - troncocónico, com estreitamente máximo próximo de uma das extremidades a qual apresenta o diâmetro máximo. O seu interior é oco e de secção circular. Tem na extremidade (que é plana) mais estreita um padrão mais largo de 7 linhas, formando 7 caneluras. Tem um orifício perto da parte plana, sem uma forma específica, que está danificado, não podendo por isso verificar-se a que propósito serviria (se seria um furo para levar um rebite que servisse para a junção de outro elemento ou se é simplesmente resultante da alteração do próprio metal). (fotografias B e C) Na parte central o objecto apresenta uma decoração composta por bandas de caneluras em conjuntos de duas ou três e que estão intercaladas por segmentos lisos. Tem dois furos adjacentes com disposição longitudinal, na banda composta por três caneluras junto à extremidade com maior diâmetro. Estes furos poderiam ter servido para encaixar um aplique de decoração. A parte mais esvazada inicia-se com uma decoração formada por três caneluras, e termina na parte mais larga com duas. Peso: 109.5 gramas Altura total: 100,66 mm; Altura da totalidade das caneluras da extremidade mais estreita: 14,58 mm; Largura na parte da extremidade mais estreita: 22,91 mm; Largura a meio do objecto: 17,39 mm; Largura no arranque da parte esvazada: 15,63 mm; Largura da extremidade esvazada: 33,31 mm; Espessura da extremidade mais estreita: 5,08 mm; Espessura da parte esvazada: 2,46 mm Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de Alcácer do Sal. Sector N; X= 73.5/74.5; Y= 75.5/84.5; Z= 61.34/61.19; Data 27/01/95 Ficha de laboratório: FO 152/95

B

C

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– As estatuetas de Terracota Peça n.º 27 - Cabeça de Átis ou Ganimedes (desenho no anexo 3.6) Nº de Inventário: 1332 Definição da cabeça: tem na cabeça o barrete tipicamente frígio, com a ponta para a frente. (fotografias B e C) Cabelo: denota-se ligeiramente o cabelo, que será encaracolado. Face: a face destaca-se do barrete. Não se detecta os olhos nem as sobrancelhas. O nariz é um pouco saliente. Tem um ligeiro sulco horizontal que separa o nariz da boca que quase não se nota. O volume das orelhas sob o barrete é sugerido. Peso: 32,1 gramas (- 2) Altura da cabeça do barrete à parte de trás - “nuca”: 46,04 mm; Altura da cabeça do barrete ao início da face: 41,14 mm; Largura da cabeça: 28,09 mm; Espessura da cabeça do nariz à parte de trás: 33,86 mm; Espessura da pasta na parte do barrete: 8,48 mm; Profundidade do oco: 26,74 mm Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de Alcácer do Sal. Sector F; X= 66.5/69.5; Y= 82.5/84.5; Z= de 45 a 60 cm de profundidade Ficha de laboratório: C 54/94 Observações: A peça é feita a molde com duas valvas, que depois são coladas ao nível das orelhas. As duas partes terão sido coladas ainda em fresco e depois foram secas ou cozidas. Pasta: Pasta de cor castanha, com partículas muito finas de mica clara e pequenos grãos muito finos de quartzo. A pasta não é muito compacta e tem uns vacúolos. Apresenta um engobe de cor castanha, mais escura que a pasta, que revestia toda a cabeça e provavelmente toda a peça.

B

C

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Peça n.º 28 – Ganimedes Nº de Inventário: 1333 Rapto de Ganimedes: a águia (personificação de Zeus) prende com as suas garras o jovem Ganimedes ao nível do ombro direito e do antebraço esquerdo. A estatueta está partida ao nível da cabeça da águia e ao nível da cauda e na base das asas. Ganimedes apresenta-se nu usando simplesmente uma capa como protecção e o barrete. O seu braço direito segura a capa. Cabeça: ostenta o barrete frígio que cobre toda a cabeça. (fotografia B) Cabelo: denota-se o cabelo que é encaracolado e não está totalmente oculto sob o barrete. Face: a face é pouco nítida, de forma ligeiramente ovalada. Olhos: não se detectam os olhos; observam-se as sobrancelhas que estão delineadas através de um rebaixamento (que seriam os olhos). Nariz: arranca das sobrancelhas, está achatado, devido talvez à cozedura ou ao contacto com outras peças na altura da sua confecção; denotam-se as narinas. Boca: não se vê. Corpo: tem uma capa atada do lado direito que envolve parte do corpo, protegendo as costas, o braço esquerdo e passando ao nível da cintura do lado esquerdo em direcção ao ombro direito.Tem um sulco vertical que representa a região do esterno. Tem uma pequena depressão na região do umbigo. Braços: o braço direito está flectido e levado ao nível do peito agarrando a sua manta ou capa. O braço esquerdo estará debaixo da capa. Órgão sexual: está visível, pénis pequeno, talvez por ser ainda muito jovem. Pernas: tem a coxa da perna direita e o arranque da coxa da perna esquerda. Tem uma depressão oblíqua mais acentuada que marca a virilha (que poderá indicar que tivesse a flectida). Na perna direita a virilha está ligeiramente demarcada. Definição da águia: da águia não se conservou a cabeça, nem as pontas das asas, nem a totalidade da cauda. São visíveis o seu peito e as suas garras que agarram o jovem.

BCabeça: não tem Corpo da águia: vê-se o peito. Asas da águia: tem as asas parcialmente recolhidas, não estando em posição de voo. Denotam-se as penas, tanto exteriores como interiores das asas. As asas perto das pontas, na parte de trás, tendem a abrir para fora. (Fotografia C) Costas da águia: as costas estão bem demarcadas. A representação da cauda é feita através de dois sulcos verticais e divergentes direccionados para fora, criando assim a separação das asas. Patas da águia: a garra direita, que agarra o ombro do jovem, tem quatro dedos que parecem ser uma mão humana. Na garra esquerda só são visíveis dois dedos. Peso: 125,2 gramas Largura do pescoço da águia: 15,29 mm; Espessura do pescoço da águia: 21,49 mm; Espessura da pasta ao nível do pescoço: 10,85 mm; Altura do pescoço até à cauda da águia: 83,41 mm; Largura das asas da águia: 74,03 mm; Altura do Ganimedes: 84,24 mm; Espessura da pasta, na cauda: 10,87 mm; Espessura da pasta, de Ganimedes: 11,10 mm; Espessura da peça: 31,54 mm; Profundidade da parte oca: 4, 89 mm

C

Constituição da terracota: pasta de cor castanha, compacta. Tem imensos pontos minúsculos ou palhetas de cor preta (grãos), pequenas (minúsculas) pedritas ou pequenos grãos de quartzito ou quartzo. Não apresenta nenhum engobe. Proveniência: Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, Castelo de Alcácer do Sal. Sector E – Corredor; X= 51.5/55.5; Y= 82.5/84.5; Z= 125 a 165 cm de profundidade; 08/1994 Ficha de laboratório: 69/94; 227 (Ippar) Observações: peça feita através de dois moldes em separado, a parte de trás e a parte da frente. As valvas foram unidas ainda com a pasta fresca, sendo depois cozida.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Proveniência: Museu Municipal Pedro Nunes Peça n.º 29 - Orante N.º Inventário: MMPN 4953 Atitude: 3 A Posição: de pé. Cabeça: de formato cilíndrico, direita na parte de trás e com a face saliente. Tem no topo da cabeça uma saliência que se destaca, que pode ser interpretada como cabelo ou um gorro, com um formato arredondado mas sugerindo um triângulo. O topo da saliência é plano e apresenta uma pontuação e vestígios de outras em triângulo. Esta saliência está circundada por um sulco. Cara: a forma da cara está pouco definida. Olhos: estão destacados da cara, arredondados. O esquerdo é de forma redonda e achatada, enquanto o direito é de contorno redondo e saliência apontada. O olho direito está posicionado na cara mais abaixo que o esquerdo e está colado ao lobo da orelha. Nariz: é de formato triangular, pouco saliente e um pouco achatado. Tem dois sulcos verticais, um em cada lado do nariz, que acompanham a cana do nariz. Orelhas: a esquerda está pouco visível, apesar de se vislumbrar uma ténue saliência. A direita é feita por uma saliência semi-circular que arranca ao nível do olho e termina debaixo deste, estando colada ao mesmo. Boca: boca logo a seguir ao nariz (logo a seguir à união do nariz com a face) é feita por um sulco horizontal e curto, que acompanha a largura do nariz. Tem um círculo (tipo amendoado ou ovalado) feito por um pontilhado situado na bochecha, ao nível da boca. Queixo: pouco visível integrando-se logo no pescoço. Pescoço: é alongado. Tronco: alto, cilíndrico e estreito. Tem um sulco circular, horizontal, que contorna o tronco ao nível da anca, estabelecendo a separação entre o tronco e a anca. Braços: curtos, levantados e erguidos para cima ao nível do pescoço (médio). Tem um sulco semi-circular, na parte esquerda, que arranca das costas e termina por debaixo do braço. Tem um sulco horizontal por baixo do braço direito. Mãos: estilizadas, de forma ovalada, com as palmas para a frente. Em cada uma das mãos tem dois sulcos horizontais. Órgão sexual: não erecto, pendente e virado para a direita, sem os testículos. Pernas: estão ligeiramente afastadas e aparenta estar em posição de andar. A perna esquerda está ligeiramente arqueada e é mais curta que a direita. Na perna esquerda tem quatro sulcos horizontais que circundam a perna. Pés: pé direito de forma triangular terminando em ponta e virado para dentro. O pé esquerdo é de forma rectangular e arredondado na ponta. Calcanhares ligeiramente levantados. Em cada perna existe um sulco horizontal que separa ou delimita a perna do pé. Peso: 43.9 gramas Altura total: 89,30 mm; Largura (braço/braço): 32,20 mm; Altura da cabeça: 14,62 mm; Largura da cabeça: 9,24 mm; Espessura da cabeça: 9,71 mm; Altura do pescoço: 9,04 mm; Largura do pescoço: 7,74 mm; Espessura do pescoço: 7,27 mm; Largura do tronco: 7,97 mm; Espessura do tronco: 8,16 mm Acabamento: tem orifícios (bolhas), e denotam-se uns vestígios ou estrias de lima no tronco, na parte das costas e nas pernas. Observações: o tratamento de conservação realixado na peça não facilita a observação de determinados detalhes. A peça apresenta oxidação verde e foi-lhe aplicado um verniz. Patine de cor verde azeitona.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Peça n.º 30 - Orante N.º Inventário: MMPN 4952 Atitude:3 A Posição: de pé. Cabeça: de secção e formato rectangulares, repuxada para cima e achatada no topo. Serviria para encaixar algo, ou é a representação de algo, eventualmente um chapéu? Tem um pequeno sulco horizontal situado acima da orelha esquerda, e um outro acima da orelha direita e que acompanha a cana do nariz. Tem um sulco horizontal, ténue, que circunda toda a cabeça muito perto do topo. Cara: forma alongada e rectangular. Olhos: olhos destacados da face, são compostos por duas grandes bolas que arrancam das orelhas, fazendo parte delas. Nariz: nariz é destacado, grosso, de formato triangular, arredondado. Tem um ligeiro sulco abaixo das narinas na junção do nariz com a cara. Orelhas: estão colocadas muito atrás na cabeça. A direita é saliente, de formato rectangular vertical, destaca-se mais que a esquerda, que é menos saliente e mais arrdondada. Boca: é feita por um ténue traço horizontal. Pescoço: é grosso, tem traços diagonais que saem debaixo da cara, sob as orelhas, convergindo em direcção ao peito, formando um V. Tronco: é cilíndrico, tem dois pequenos sulcos horizontais muito ténues abaixo do arranque do braço direito, outro no início da perna direita e um outro horizontal abaixo do arranque do braço esquerdo. Tem ainda um sulco horizontal nas costas ao nível do arranque dos braços. Braços: braços toscos e achatados, erguidos para céu, ao nível dos olhos. Mãos: são de dimensões exageradas, largas e aplanadas. Têm nas palmas umas incisões em forma de traços que provavelmente representam os dedos. Órgão sexual: tem a parte genital bem definida. Pénis erecto, pontiagudo. Os testículos estão bem evidenciados, o direito é maior que o esquerdo. Tem um sulco horizontal acima do arranque do pénis. Pernas: são muito curtas em relação à altura do tronco. Pouco demarcadas. A direita é significativamente mais volumosa que a esquerda. Pode ser defeito de fabrico ou sugerir uma malformação ou uma outra patologia do devoto. Tem um ténue sulco horizontal que estabelece a união entre a nádega e a perna, do lado direito. Pés: são de formato triangular, arredondados nas pontas. Não são planos, apresentam irregularidades. Tem um pequeno sulco horizontal que indica a ligação da perna com o pé. Tem os calcanhares erguidos (está em pontas). Existe um sulco horizontal na planta do pé esquerdo, provavelmente indicando o calcanhar, e um outro sulco mais ténue no pé direito. Peso: 61.1 gramas Altura: 84,5 mm; Largura: 37,86 mm; Altura da cabeça: 16,00 mm; Largura da cabeça: 11,14 mm; Espessura da cabeça: 10,31 mm; Largura do tronco: 8,72 mm; Espessura do tronco: 9,19 mm Acabamento: patine de cor verde azeitona, brilhante. Tem vestigios de lima por toda a figura, sobretudo na parte de trás da mão direita, na área do peito, nas costas à altura do arranque dos braços e nas pernas. Peça mal concebida, tosca, nos detalhes, mal retocada. Observações: Não se sabe a sua proveniência, talvez do Olival. Tem alguns ocos.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Peça n.º 31 – Zoomórfico Nº de Inventário: Forum

Bovídeo ? Descrição de peça: está de pé e parado. Não tem cabeça e o pescoço está partido muito perto do arranque. Pescoço: tem o arranque do pescoço que é de formato sub-rectangular e de secção triangular, com o garrote um pouco demarcado. Não tem o órgão reprodutor. Tem dois sulcos horizontais perto do arranque do garrote, com uma ligeira depressão entre eles. Tronco: é fino, de secção circular. Tem os quadris destacados de onde arranca a cauda. Membros: As pernas dianteiras são ligeiramente arqueadas e curtas, com a demarcação dos pés (cascos). A perna dianteira direita é mais grossa que a esquerda, é arqueada para dentro e ligeiramente inclinada para frente, o casco está ligeiramente levantado sem dedos. Tem uma depressão que dá origem ao casco. A perna dianteira esquerda é mais delgada, arqueada para dentro e para a frente. O casco virado ligeiramente para dentro, não tem dedos. Tem uma depressão que demarca o arranque do casco. A perna traseira direita está partida no arranque do casco. A perna traseira esquerda está partida muito perto do seu arranque. Cauda: tem o arranque da cauda que é de secção sub-triangular, ligeiramente arredondada. A separação entre a cauda e a perna direita está delimitada por uma depressão semi-circular, que do lado esquerdo não é visível. Peso: 23,2 (-2) gramas Comprimento do pescoço ao arranque da cauda: 46,02 mm; Largura do pescoço: 5,68 mm; Largura das patas da frente: 18,18 mm; Altura do tronco ao nível do dorso-ventre: 8,14 mm; Largura do tronco: 7,70 mm; Largura do arranque da cauda: 5,12 mm Observações: tem bolhas.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Proveniência: Biblioteca Nacional de Lisboa Peça n.º 32 – Orante Nº de Inventário: 1 Atitude: 3 A Posição: de pé, ligeiramente inclinado para a frente. Cabeça: parece ter cabelo que se inicia a partir das orelhas, tipo diadema. Cara: de formato ovalado. Olhos: salientes e bem definidos, formados por dois pequenos montículos redondos (tipo aplique), colocados na face lateral. Tem por cima do olho direito um sulco arredondado que parece indicar a sobrancelha. Nariz: pouco saliente e de formato triangular e achatado. Boca: feita por um ligeiro sulco horizontal. Orelhas: estão bem definidas e bem desenhadas, mas no entanto estão colocadas na parte de trás da cabeça (repuxadas para trás). Queixo: redondo, dando origem ao pescoço. Pescoço: alto e largo, bem definido. Tronco: alto, de formato cilíndrico, mas um pouco achatado. Tem os dois mamilos arredondados e bem destacados, o esquerdo mais pequeno que o direito. Braços: levantados e erguidos para cima à altura da face. São braços compachatadas e mal definidas. A mão direita é mais estreita que a esquerda. Órgão sexual: pénis erecto pontiagudo denotam-se os testículos. ApresentPernas: só tem uma perna, a direita, com uma pequena e ténue depressãoperna, ao nível do joelho (perna um pouco arqueada). Pés: pé levantado e calcanhar erguido, de formato sub-triangular terminbaixo, sem dedos. Peso: 85.0 gramas Altura: 121,53 mm; Largura: 46,54 mm; Altura da cabeça: 18,38 mmmm; Espessura da cabeça: 14,69 mm; Altura do tronco: 31,90 mm; LEspessura do tronco: 8,98 mm; Pernas: Altura da perna direita: 36,20 mmFicha de laboratório: peça que aparenta não ter sido tratada, tem patine e Acabamento: tem algumas bolhas. Vestígios de ter sido espatulado no perna. Observações: precisa de tratamento. Peça n.º 33 - Orante Nº de Inventário: 2 Atitude: 3 A Posição: de pé, em posição de andamento. Cabeça: tem um sulco que circunscreve toda a parte alta da cabeça, taldelimitando a parte do cabelo (formando o cabelo) tipo chapéu. Cara: de formato ovalado. Olhos: salientes e bem definidos por dois pequenos montículos redon(tipo aplique). Não é possível verificar se tem as sobrancelhas uma vez qupeça não levou tratamento de conservação ou restauro. Nariz: saliente e de formato triangular achatado. Boca: representada com um ligeiro sulco horizontal, aproveitando a formabase do nariz, parecendo estar aberta. Orelhas: estão bem definidas e bem desenhadas mas, no entanto, repuxapara o lado e colocadas muito atrás na cabeça. a direita é mais pequena quesquerda. Queixo: redondo, dando origem ao pescoço largo. Pescoço: alto e forte, bem definido, tem um sulco na parte de trás que malimite entre a cabeça e o pescoço. Tronco: alto, de formato cilíndrico e achatado. Tem os mamilos arredondae achatados. O rabo apresenta-se bem delineado. Braços: levantados e erguidos para cima à altura do queixo. São bra

ridos. As mãos são estilizadas,

a um formato cónico. indicando o local da dobra da

ando em ponta inclinada para

; Largura da cabeça: 12,84 argura do tronco: 11,17 mm; ;

verdete. tronco do lado das costas e na

vez

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal curtos. As mãos são estilizadas, achatadas e mal definidas. O formato da mão é sub-triangular. Tem um sulco horizontal no braço esquerdo que poderá indicar a zona da articulação, na parte interior. Órgão sexual: pénis erecto e pontiagudo, com testículos bem delineados. Apresenta um formato cónico. Pernas: curtas e afastadas. A perna direita está ligeiramente mais avançada que a esquerda. Tem um sulco na perna esquerda que poderá indicar o joelho. Na base da perna esquerda existe uma formação que poderá representar alguma anomalia física ou doença. Pés: pés bem delineados, que parecem indicar estar calçados, pois não apresentam dedos e são planos. Peso: 101.7 gramas Altura: 120,55 mm; Largura: 48,62 mm; Altura da cabeça: 19,13 mm; Largura da cabeça: 13,92 mm; Espessura da cabeça: 13,48 mm; Altura do tronco: 42,12 mm; Largura do tronco: 11,56 mm; Espessura do tronco: 8,26 mm; Pernas: altura da perna direita: 26,74 mm; altura da perna esquerda: 26,68 mm; afastamento entre pernas: 6,50 mm Acabamento: tem algumas bolhas. Vestígios de ter sido limado, no tronco e nas pernas, sobretudo entre estas. Peça n.º 34 - Orante Nº de Inventário: 3 Atitude: 3 A Posição: de pé, ligeiramente inclinado para a sua esquerda. Cabeça: tem um sulco, que parece contornar toda a cabeça, que poderá representar um gorro. Não parece ter cabelo. Cara: de formato ovalado. Olhos: salientes e bem definidos por dois pequenos montículos redondos (tipo aplique), bem colocados na cara. As sobrancelhas são formadas pelo declive dos olhos e continuação do nariz. Nariz: saliente e de formato triangular. Boca: feita por um declive que aproveita a forma da base do nariz e o principio do queixo. Aparenta ter barba em forma de pêra ou então o queixo é pontiagudo. Orelhas: estão bem definidas e bem desenhadas, colocadas verticalmente na cabeça, no sítio correcto, no entanto a direita é mais pequena. Queixo: pontiagudo dando origem ao pescoço largo. Pescoço: curto e forte, bem definido. Tronco: alto, de formato cilíndrico. Não tem mamilos. Braços: levantados e erguidos à altura do pescoço. São braços curtos. As mãos são estilizadas, achatadas e mal definidas. A mão esquerda parece que evidencia um dedo através de um pequeno sulco desenhado na palma. O formato das mãos é arredondado. Órgão sexual: pénis pontiagudo, descaído para o lado direito; os testículos estãPernas: curtas e afastadas. Ambas as pernas têm um defeito. Estão inclinadas ser uma enfermidade do devoto (ou será defeito de fabrico?). Pés: com os calcanhares erguidos, o pé direito está mais levantado que o esformato sub-triangular arredondado na ponta, sem vestígios de dedos. O pé etriangular terminando em ponta, com vestígios de dedos. Ambos os pés aprerepresente uma enfermidade do devoto. Peso: 128.00 gramas Altura: 123,00 mm; Largura: 48,06 mm; Altura da cabeça: 21,11 mm; Lmm; Espessura da cabeça: 16,72 mm; Altura do tronco: 41,7 mm; LarguEspessura do tronco: 12,20 mm; Pernas: altura da perna direita: 30,66 mm29,11 mm; afastamento entre pernas: 6,35 mm Acabamento: tem algumas bolhas e pequenas saliências. Tem vestígios de tenas pernas.

o mal definidos. para a direita, o que parece

querdo. O pé direito é de squerdo é de formato sub-sentam deficiência, talvez

argura da cabeça: 16,17 ra do tronco: 12,66 mm; ; altura da perna esquerda:

r sido limado no tronco e

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Peça n.º 35 - Orante Nº de Inventário: 4 Atitude: 3 A Posição: de pé, ligeiramente inclinado para a frente. Cabeça: tem um sulco que circunscrevetodo o topo da cabeça. Parece ser cabelo ou gorro. Cara: de formato ovalado. Olhos: salientes, feitos por dois pequenos montículos redondos (tipo aplique), sendo o direito mais saliente que o esquerdo. As sobrancelhas parecem estar delimitadas por um sulco muito ténue. Nariz: pouco saliente, achatado e de formato triangular. Boca: delineada por um ligeiro sulco horizontal. Orelhas: estão bem definidas; a esquerda apresenta um sulco vertical. Estão esbatidas para trás. Queixo: redondo, dando origem ao pescoço. Pescoço: curto e forte, bem definido. Tronco: alto, de formato cilíndrico. Braços: erguidos para cima à altura da cara. São braços compridos. As mãos são estilizadas, achatadas e mal definidas e arredondadas. Órgão sexual: pénis erecto arredondado, com uma ligeira definição dos testículos. Pernas: curtas e afastadas, ligeiramente arqueadas para dentro. A perna direita tem uma ligeira saliência que poderá indicar alguma deficiência ou patologia do devoto. Pés: com calcanhares erguidos; o pé direito está mais levantado que o esquerdo. O formato dos pés é sub-triangular e arredondado na ponta, sem vestígios de dedos. Peso: 118.4 gramas Altura: 118,99 mm; Largura: 45,82 mm; Altura da cabeça: 22,95 mm; Largura da cabeça: 14.03 mm; Espessura da cabeça: 13,18 mm; Altura do tronco: 33,11 mm; Largura do tronco: 11,01 mm; Espessura do tronco: 10,50 mm; Pernas: altura da perna direita: 32,98 mm; altura da perna esquerda: 33,26 mm; afastamento entre pernas: 11,81 mm Peça n.º 36 - Orante Nº de Inventário: 5 Atitude: 3 A Posição: de pé, ligeiramente inclinado para a frente. Em posição de andar. Cabeça: de formato sub-triangular, parece ter um chapéu ou algo similar (talvez capacete de guerreiro); apreseta um sulco horizontal que circunscreve o topo da cabeça. Cara: de formato ovalado. Olhos: colocados muito perto do nariz, acompanhando a cana, feitos por saliências pequenas e arredondadas. Nariz: saliente e de formato triangular. Boca: feita por um ligeiro sulco horizontal, aproveitando a forma da base do nariz. Orelhas: estão pouco definidas, são verticais, acompanhando a linha da face. Queixo: redondo e ligeiramente pontiagudo, o que poderá representar barba, dando origem ao pescoço largo. (Fotografia B) Pescoço: curto e forte, bem definido. Tronco: curto, de formato cilíndrico. Não tem mamilos. Braços: erguidos para cima à altura do pescoço. São braços curtos. As mãos são estilizadas, achatadas e mal definidas. E o formato das mãos é armais curto. Órgão sexual: pénis erecto arredondado e curto, sem testículos. Pernas: curtas e afastadas, ligeiramente arqueadas para dentro. A perna esdireita. A direita, mais grossa, tem um sulco horizontal na parte de trás qujoelho.

redondado. O braço direito é

querda é mais perfeita que a e poderá indicar a dobra do

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Pés: com os calcanhares erguidos; o pé esquerdo está mais levantado que o direito. Os pés são de formato sub-rectangular, e têm indicação de alguns dedos. Peso: 117.5 gramas Altura: 104,12 mm; Largura: 45,32 mm; Altura da cabeça: 31,53 mm; Largura da cabeça: 16,66 mm; Espessura da cabeça: 18,44 mm; Altura do tronco: 21,17 mm; Largura do tronco: 15,02 mm; Espessura do tronco: 13,30 mm; Pernas: altura da perna direita: 22,46 mm; altura da perna esquerda: 26,52 mm; afastamento entre pernas: 7,50 mm Acabamento: Tem algumas bolhas. Vestígios de ter sido limado no tronco e nas pernas.

B

Peça n.º 37 - Orante Nº de Inventário: 6 Atitude: 3 A Posição: de pé. Cabeça: de formato sub-triangular e pontiaguda no topo, talvez represente um chapéu. Cara: de formato triangular. Olhos: pouco salientes, constituídos pro dois pequenos montículos redondos (tipo aplique), colocados nas concavidades resultantes da moldagem das orelhas. Nariz: saliente e de formato triangular. Boca: não tem Orelhas: estão bem definidas, iniciam-se a partir do nariz e prolongam-se até ao topo da cabeça. Repuxadas para fora formam uma concavidade onde se colocaram os olhos. Queixo: não tem. Pescoço: curto e estreito. Tronco: alto, de formato cilíndrico. Braços: erguidos à altura da face. São braços compridos e estreitos, que terminam em pontas arredondadas que seriam as mãos. Órgão sexual: pénis erecto e pontiagudo, sem testículos. Está mal posiunião entre as pernas. Pernas: curtas e afastadas, encontram-se partidas. Seriam ligeiramente uma plaquinha oval colocada na zona do joelho configurando a rótula. Peso: 28.8 gramas Altura: 79,29 mm; Largura: 26,61 mm; Altura da cabeça: 15,78 mmEspessura da cabeça: 10,07 mm; Altura do tronco: 22,35 mm; Espessura do tronco: 7,67 mm; Pernas: altura da perna direita: 15,113,82 mm; afastamento entre pernas: 4,69 mm Acabamento: vestígios de ter sido limado.

cionado, muito acima da zona de

arqueadas. Existe, em cada perna,

; Largura da cabeça: 12,84 mm; Largura do tronco: 7,80 mm; 9 mm; altura da perna esquerda:

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Peça n.º 38 - Orante Nº de Inventário: 7 Atitude: 5 Posição: de pé. Cabeça: usa chapéu; tem um sulco horizontal na parte de trás da cabeça. Cara: de formato ovalado. Olhos: pouco salientes. As sobrancelhas encontram-se tapadas pelo gorro. Nariz: saliente e de formato triangular. Boca: delineada por um ligeiro sulco horizontal, aproveitando a forma da base do nariz. Orelhas: estão cobertas pelo gorro, mas denota-se o seu formato. Queixo: redondo e curto aparentando ter barba. Pescoço: curto. Braços: vislumbra-se o braço esquerdo por debaixo da capa, a qual envolve toda a parte superior da estatueta. Tronco: está coberto pela capa e o manto que se estende até aos pés. Pés: unidos e planos. Peso: 54.3 gramas Altura: 68,80 mm; Largura: 15,51 mm; Altura da cabeça: 14,65 mm; Largura da cabeça: 12,89 mm; Espessura da cabeça: 14,54 mm; Altura do tronco: 24,31 mm; Largura do tronco: 14,30 mm; Espessura do tronco: 8,51 mm Acabamento: não tem bolhas, vestígios de lima, cor acastanhada, brilhante. Peça n.º 39 - Orante Nº de Inventário: 8 Atitude: 4 A? Posição: de pé. Cabeça: usa gorro pontiagudo; existe um sulco na parte de trás que demarca o gorro. Cara: de formato ovalado e ligeiramente arredondado ao nível do queixo. Olhos: representados por concavidades relacionadas com a modelagem do nariz e a delimitação das sobrancelhas. Nariz: um pouco saliente e de formato triangular. Boca: delineada por uma pequena saliência e um ligeiro sulco horizontal, aproveitando a forma da base do nariz. Orelhas: a esquerda está bem definida, enquanto a direita denota-se por debaixo do gorro. Queixo: redondo, dando origem ao pescoço largo; parece que tem barba. Pescoço: curto. Braços: estão ao nível do peito. O direito mais subido ao nível do coração, o esquerdo logo por debaixo, sem se tocarem. Manto: vai até aos pés, parecendo estar aberto à frente. Por debaixo uspescoço, como se usasse uma camisola de gola alta. Ao nível do peito o Pés: curtos e ligeiramente afastados. Parecem estar descalços mas nãofuro entre as pernas, o que parece indicar que a estatueta estava suspensespecífico. Peso: 139.1 gramas Altura: 80,97 mm; Largura: 24,10 nos braços mm; Altura da cabeça:15,66 mm; Espessura da cabeça: 16,11 mm; Altura do manto: 46,45dos pés: 25,08 mm; Espessura do tronco: 15,94 mm; Pernas: altura doesquerdo: 7,17 mm; afastamento entre pés: 5,96 mm Acabamento:. de cor castanha brilhante.

a outra roupa visível ao nível do manto apresenta-se em V. se detectam os dedos. Tem um a, ou colocada, em algum objecto

31,33 mm; Largura da cabeça: mm; Largura do manto perto pé direito: 7,51 mm; altura do pé

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Peça n.º 40 – Orante (tipo “Baguette”) Nº de Inventário: 9 Atitude: 5 ? Posição: de pé. Cabeça: de formato ovalado, achatada na parte de trás, a cara está pouco definida. Pescoço: curto. Braços: pouco definidos, aparentam estar cruzados ao nível do peito. Pés: pouco definidos. Estatueta que deve usar manto ou túnica. Peso: 20.0 gramas Altura: 64,64 mm; Largura: 12,21 mm; Altura da cabeça: 14,24 mm; Largura da cabeça: 10,23 mm; Espessura da cabeça: 7,71 mm; Largura do tronco: 8,08 mm; Espessura do tronco: 5,84 mm; Pés: altura: 7,75 mm Acabamento: de cor verde (oxidação), patine acastanhada. Peça n.º 41 - Orante Nº de Inventário: 10 Atitude: 4 Posição: de pé. Cabeça: de formato redondo, achatada na parte de trás. A cara está melhor definida, tem olhos, sobrancelhas, nariz e boca. A cabeça apresenta-se coberta por um lenço ou pelo próprio manto. Braços: o esquerdo parece estar estendido ao longo do corpo, enquanto o direito se encontra levantado e colocado ao nível do coração. Pés: estão pouco definidos. Manto: acompanha todo o corpo. Tem uns sulcos verticais que demarcam ligeiramente o braço esquerdo, e existem outros que acompanham o manto, que poderão indicar talvez as pernas. Na parte de trás também existem uns sulcos verticais que podem ser defeito de fabrico. Peso: 9.4 gramas Altura: 75,51 mm; Largura: 10,67 mm; Altura da cabeça: 9,59 mm; Largura da cabeça: 7,72 mm; Espessura da cabeça: 4,64 mm; Largura do tronco: 6,65 mm; Espessura do tronco: 2,66 mm; Pés: altura: 6,51 Acabamento: patine de cor verde.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal Peça n.º 42 - Touro Nº de Inventário: 11 Bovídeo Descrição de peça: está parado e deitado. Cabeça: bem definida e bem trabalhada. É de formato sub-tritangular. Tem um orifício de forma quadrangular no sítio da boca. (Fotografia B) Olhos alongados, bem definidos, com sobrancelhas bem delineadas. Tem na fronte um triangulo de pelo. Os cornos encontram-se partidos restando apenas as bases. As orelhas estão inteiras, bem definidas e arredondadas na ponta. Tem definido o nariz com as narinas. Pescoço: está bem demarcado. Garrote bem definido, assim como a paleta. Tem uma decoração reticulada no contorno do pescoço, até ás espáduas (parecendo ter o pelo penteado). Tronco: é forte, bem constituído, tem uns sulcos verticais que demonstram a sua robustez. O corpo é oco e existe uma abertura rectangular na região ventral,17,64 mm de largura. (Fotografia C) Patas: têm as extremidades partidas. As da frente enaparentam estar parcialmente flectidas. Cauda: comprida, completa, voltada para baixo. Orgão sexual: a genitália está bem evidenciada tratandoPeso: não foi possível pesar a peça, pois o seu peso uutilizada para o efeito. Altura dos cornos às patas dianteiras: 62,46 mm; CAltura da cabeça: 37,47 mm; Largura da cabeça ao nao nível das orelhas: 33,22 mm; Altura do tronco dorsmm; espessura do tronco: 5,78; Altura da cauda: 5728,45 mm; largura ao nível dos testículos: 10,26 mesquerda; 9,28 mm a direita; Espessura das patas traseiObservações: de cor castanha e tem verdete. Não tem bo

CB

Nota: As peças foram medidas com uma cravcom uma balança digital electrónica com a prScale).

cujas dimensões são: 7,46 mm de comprimento;

contram-se inteiramente flectidas, e as de trás

-se de um individuo de sexo masculino. ltrapassava os limites da balança (100 gramas)

omprimento do focinho à cauda: 138,33 mm; ível dos cornos: 27,71 mm; Largura da cabeça o-ventre: 40,66 mm; Largura do tronco: 32,04 ,32 mm; Comprimento do órgão reprodutor: m; Espessura das patas dianteiras: 8,80 mm ras: 8,80 mm, esquerda; 7,26 mm a direita lhas. Tem vestígios de lima.

eira digital de precisão e foram pesadas ecisão de 0,1 gramas (Electronic Pocket

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

VI – Comentários finais e Conclusões Os testemunhos arqueológicos demonstram que Alcácer do Sal, durante a Idade do

Ferro, se tornou um aglomerado populacional de excepcional importância. O Rio Sado

constituiu uma via de penetração privilegiada para os navegadores comerciantes que, a

partir do Mediterrâneo, até aqui se deslocavam para comercializar variados produtos de

diversas origens. Desempenhava provavelmente também um papel fulcral no quadro das

rotas comerciais estabelecidas entre o Norte e o Sul da fachada atlântica peninsular, que

se prolongou pela época romana, pelo menos até aos séculos I/II d.C., altura em que se

verifica um acentuado declínio desta cidade.

Braçal de arqueiro

É de crer que a ocupação deste núcleo urbano durante a Idade do Ferro se tenha

processado de uma forma regular e continuada. Parece assistir-se, sobretudo, à difusão

de aspectos específicos de uma cultura exógena de influência oriental, como sejam: a

tecnologia de construção, a religião, o ritual e a forma de enterramento, os tipos

cerâmicos e as técnicas de olaria e, sobretudo, a circulação de ideias. Apesar deste facto,

é curiosa a quase ausência de elementos escritos, com

excepção dos numismas já referidos e do aparecimento fortuito

de um objecto que tem sido interpretado como braçal de

arqueiro, em que se encontram inscritos alguns caracteres

conotáveis com a chamada “escrita do sudoeste”.

Os povos da Idade do Ferro construíram na colina onde se situa

hoje o Castelo, entre o século VII a.C. e o século II a.C., uma

verdadeira cidade. O povoado ocupa uma posição dominante

sobre o rio Callipus (Sado), erguendo-se num local pouco

afastado do estuário, de fácil acesso à navegação marítima e,

portanto, aos contactos com outros povos. As casas aí

edificadas, idênticas às que nessa altura se encontravam

disseminadas no Mediterrâneo Oriental, utilizavam a mesma

técnica de fabrico: pedra aglutinada com argila.

Ponto de convergência de produtos agrícolas, pecuários e piscícolas, este povoado viria

a desempenhar um papel relevante no desenvolvimento da actividade comercial. A

transacção do sal, referida aliás por autores latinos, e a difusão dos produtos resultantes

da actividade mineira em jazidas de ferro e de cobre, nas regiões de Grândola e de

Montemor-o-Novo, constituíram factores da maior relevância.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Evidenciam-se, nesta fase, contactos permanentes com as gentes do Mediterrâneo

Oriental, Fenícios, Gregos e Cartagineses, hoje arqueologicamente comprovados.

O povoado de Bevipo estava situado na colina com uma cota altimétrica de 62 metros,

dominando o rio Sado e a sua planície. A posição que ocupa esta colina proporciona

uma boa visibilidade sobre a paisagem e o rio, permitindo um grande controlo, sobre

quem chega e quem parte. Na encosta, existiriam provavelmente áreas relacionadas com

o comércio, com a indústria da lã, do sal, dos preparados piscícolas, do azeite, dos

cereais, as oficinas de metalurgia (cobre), os armazéns de apoio ao porto e, mais abaixo,

o próprio porto. A encosta e as margens do rio seriam a “cidade” comercial.

Provavelmente, na Idade do Ferro, o rio Sado alcançaria a zona em que se encontra

actualmente o edifício da Câmara Municicipal, do lado norte. Nos princípios do século

XXI, foi derrubada a antiga abegoaria117para aí se construir um novo espaço municipal.

Durante essas obras, foi posto a descoberto um muro no sentido este-oeste, que era largo

e tinha as pedras aglutinadas com argila. Este muro poderia ser da Idade do Ferro,

atendendo aos materiais arqueológicos recolhidos, atribuíveis a essa época, associados a

terras escuras. Esta estrutura poderia ser um paredão ribeirinho que marginava o Rio.

Lamentavelmente, não foi possível o registo adequado destes testemunhos que foram

rapidamente soterrados.

Ainda no lado norte da Câmara, foram efectuadas escavações118 devido a obras de

remodelação de um edifício habitacional. Durante estes trabalhos, foi posto a descoberto

um muro da Idade do Ferro, que poderá estar em conexão com o da “abegoaria”, tendo a

mesma orientação. As terras também eram escuras e nelas foram exumadas peças

arqueológicas, tais como, cerâmicas cinzentas, duas cabeças de leão de bronze que

poderão ter pertencido a um “tamborete” ou às esquinas de uma cama, e outros objectos

de bronze, todos da Idade do Ferro. Talvez o espaço correspondesse a um armazém

onde as peças ficavam a aguardar o escoamento nos mercados.

Em relação às intervenções no Convento de Nossa Senhora de Aracaeli, na área sacra,

por debaixo do pátio de época romana, apareceu uma estrutura feita à base de cal branca

que poderia pertencer a uma escada. Ainda por debaixo do mesmo pátio, existem

vestígios de cal que tudo indica serem os restos de um pavimento. Esse pavimento

deveria fazer parte do pátio do santuário, que, provavelmente, seria a céu aberto, com

117 Lugar em que se guardavam os gados ou alfaias agrícolas de uma propriedade rústica; conjunto de animais e utensílios de uma propriedade agrícola. 118 Informação pessoal de A. R Carvalho.

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

altar sacrificial e um espaço reservado á água, para as purificações e limpezas das áreas

sacras.

Sob a área do poço votivo romano, surgiu um muro no sentido este-oeste, assente

directamente na rocha, conotável com o templo da 1ª Idade do Ferro. A calçada da

Idade do Ferro ladeava as áreas mais sagradas, a sala da divindade e o pátio, fazendo

parte integrande da mesma. Talvez aí se localizasse a sala reservada aos ex-votos ou

sala de depósitos ou ainda o espaço onde eles eram depositados ritualmente.

As tecnologias introduzidas pelos fenícios terão levado, sem dúvida, a melhorias na vida

da população, levando a uma modificação na organização do território. Os povoados

surgem em sítios estratégicos, no topo das colinas, nos vales, perto das vias de

comunicação, terrestre ou fluvial/marítima, controlando territórios vastos. Todo este

conjunto de mudanças leva ao surgimento de santuários de controlo territorial colocados

em lugares elevados e perto do povoado.

Segundo Belén119, a fundação de santuários e templos por parte dos fenícios estaria

ligada à estratégia comercial encontrando-se todos eles nas rotas mais frequentadas da

região. A sua origem remonta ao auge dos contactos comerciais.

Segundo Ruiz Mata120, os lugares de culto ou espaços religiosos situam-se em lugares

estratégicos perto de rios, promovendo a penetração do culto mais adentro no território,

e usando como meio, provavelmente, as trocas comerciais. Os templos gozavam de um

papel muito importante a nível económico. É exemplo disso, o templo de Melqart em

Gadir que foi usado pelos fenícios para uma melhor penetração nos territórios e para o

estabelecimento e de relações comerciais com esses povos do interior. As edificações de

Carmona e de Montemolín estão situadas em locais de controlo de território e das vias

de comunicação. Estes templos, para além da sua função religiosa, desempanhariam

funções de controlo político e comercial do território em que estavam inseridos.

Provavelmente, o templo de Bevipo teria a mesmas funções que os templos acima

referidos.

É provável que o povoado de Bevipo, estando situado no alto de uma colina, actuasse

como centro político e administrativo e controlasse toda uma vasta área, incluindo o

acesso ao mar e ao interior da região. O seu santuário, colocado no sítio mais alto da

colina, poderia assim, ter o estatuto de santuário de controlo territorial. Talvez, através

119 Belén 2001 120 Ruiz Mata & alguns 1998

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

desta posição estratégica e das trocas comerciais auxiliasse, também, a possibilidade do

culto penetrar adentro da região.

O santuário de Bevipo poderá ter sido inicialmente um santuário urbano dinástico121,

pois está colocado no interior da povoação, na parte mais alta desta, e poderia estar

associado a estruturas domésticas relevantes. O acesso à zona sacra realizar-se-ia

através de um pátio que antecedia a zona sacra, constituída por uma sala fechada, onde

poderá existir um segundo pátio pavimentado, a céu aberto. Existem várias salas

adjacentes ao espaço sagrado que seriam cobertas. As áreas de residência da elite e os

armazéns seriam os edifícios domésticos e que cuja função nada teria a ver com as

actividades religiosas.

A Deusa Mãe foi sem dúvida a divindade mais importante para as populações sujeitas às

adversidades da natureza e desta dependentes. Adorar e prestar culto à Deusa Mãe era

prestar culto à Terra, a qual regenerava a vida. Essa deusa, ao longo dos tempos foi

mudando de nome consoante as civilizações, culturas e povos. No processo de

evolução, a Deusa Mãe indígena é integrada numa divindade dinástica, que vai

evoluindo até se transformar numa divindade protectora de toda a povoação. Essa

divindade era Astarté, deusa fenícia da fecundidade humana, vegetal e animal,

protectora dos cavalos, e também deusa marinha. Estava associada a um deus da

agricultura, Melqart. Mais tarde, Tanit, a deusa cartaginesa vai substituir Astarté. Esta

divindade também é uma deusa da fecundidade, curativa, protectora dos animais,

especialmente dos cavalos. Está relacionada com a agricultura, sendo a espiga de trigo

um dos seus símbolos. Era portadora da riqueza marinha e detinha vínculo com o Além.

Estava, também, associada a um deus da agricultura, Baal Hammon e por vezes

Melqart.

Por fim surge Cibele, deusa frígia, que é a própria Terra, a mãe de todos os seres. Esta

grande deusa da fertilidade está, também, relacionada com um deus da vegetação, Átis.

A Terra é representada pela Deusa Mãe indígena, mais tarde por Astarté, Tanit e Cibele.

Estas divindades estão sempre associadas a um deus da agricultura, pois para que haja

fecundidade há a necessidade de existir um ser feminino e outro masculino.

A divindade que providenciava alimento aos homens, mediante obtenção de uma boa

colheita, e que intervinha na procriação do gado, era também a responsável da saúde

121 Moneo 2003

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

humana, pelo que seriam frequentes certos rituais invocando a cura dos homens e

animais enfermos. Esta qualidade de cura da divindade aparece documentada nos

santuários ibéricos meridionais e do sudoeste, onde é frequente aparição, a partir do

século IV a.C., de ex-votos anatómicos de bronze, que reproduzem diferentes partes do

corpo humano122. Este tipo de ex-voto como oferenda à divindade do santuário estaria

baseado na crença da “magia simpática”, pela qual se buscava obter um determinado

efeito através do desenho ou a representação plástica de determinada parte anatómica

afectada por alguma enfermidade. Estas representações serviriam para substituir a parte

doente, já que a divindade era dadora de saúde mas também da doença, pelo que estas

oferendas serviriam para libertar a parte do corpo que a divindade se havia apoderado

através da dita enfermidade123.

Os ex-votos anatómicos de pernas ou de pés mais grossos poderão ser interpretados

como a representação de uma patologia. A oferenda de ex-votos anatómicos à divindade

em busca de uma cura é um costume difundido no mundo antigo124.

As representações humanas de Alcácer estão todas de pé e têm as pernas ligeiramente

afastadas, talvez por razões técnicas do fabrico. Nicolini afirma que as peças com as

pernas afastadas são de medíocre fabrico e que isso terá acontecido devido à vontade,

ou à sorte, de representar o corpo humano na sua totalidade, talvez porque o artífice não

fosse capaz de unir as pernas de maneira satisfatória. Todas apresentam os pés nus,

porque estão perante a divindade.

Segundo Nicolini (1968), os ex-votos de bronze surgem nos inícos do século VI a.C.

Classificou os gestos e das atitudes dos orantes e ofertantes em dezasseis categorias.

Nos orantes e odoradores existem oito, nos ofertantes ou dedicantes são sete, e duas nas

atitudes intermediárias ou conjugadas.

As peças de Alcácer que correspondem a orantes enquadram-se nas atitudes 3A (os

braços flectidos, afastados e mãos à altura das têmporas, no entanto, ao contrário das

estatuetas estudadas por Nicolini, estas apresentam as pernas afastadas. Os ofertantes

integram-se na atitude 15 B (braço direito estendendo a oferta para a frente, e o braço

esquerdo colado à anca) e na 15 D (braço direito estendendo a oferta para a frente, e o

braço esquerdo clocado sobre o peito). Os guerreiros são integráveis na atitude 10 (os

122 Moneo 2005 123 Idem 124 Idem

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

dois braços, afastados na horizontal, oferecendo as armas – caetra e punhal; a oferta das

armas é geralmente feita por guerreiros nus), um dos guerreiros de Alcácer não está nu.

A atitude 3A125 difundiu-se no mundo mediterrâneo até Cartago (representado no

símbolo de Tanit), desde a Idade do Bronze.

Ainda segundo Nicolini, a atitude 10 é de proveniência indígena.

A nudez dos pés, nos orantes, ofertantes e guerreiros, é um aspecto importante, pois eles

deviam guardar estreito contacto com a terra no momento em que oravam ou

depositavam as suas oferendas.

O sexo exagerado nas figuras humanas masculinas, assim como a presença de ex-votos

zoomórficos, indicam rituais de fecundidade destinados à concessão ou preservação da

fecundidade dos homens, dos solos que eles cultivam, e do gado.

Na época arcaica (séculos VI e V a.C.), a maioria dos ex-votos são ofertantes (atitudes 9

e 11), mais raros são os orantes (atitudes 1, 1A, 2, 3, 3 A, 4, 5). Em época média

(séculos IV e III a.C.) surgem novos gestos que derivam das atitudes arcaicas. E por

fim, em época mais tardia (a partir do século III a.C.), surgem as categorias de atitudes

12, 13 e 13 A.

Nicolini não se refere à cronologia das categorias de atitudes 14, 15 e 16.

Os guerreiros de Lantier (1930) têm as pernas afastadas. Nos de Alcácer do Sal também

estão afastadas, mas apresentam-se proporcionalmente mais curtas em relação ao corpo.

Tal como em Lantier, o braço direito tem um pequeno escudo e o braço esquerdo um

punhal (hoje desaparecido), e existem duas incisões ao nível da cintura.

Nas figuras masculinas foi possível estabelecer três tipos de representações. O primeiro

corresponde às figuras de orantes nus, geralmente itifálicos. O segundo é representado

pelas figuras de ofertantes nus. O terceiro é composto por guerreiros nus ou vestidos e

armados. As figuras femininas só são representadas por orantes.

As três peças de bronze que estão depositadas no museu de Évora126 são semelhantes às

peças de Alcácer do Sal. A peça com o número de inventário 3299, que representa um

ofertante na atitude 15 D, é igual à peça nº 1 de Alcácer do Sal; as peças com os

números 3296 e 3300, que representam orantes nas atitudes 3 A, são provavelmente

peças provenientes de Alcácer do Sal. (vide anexo 4.2)

125 Nicolini 1968 126 Berrocal Rangel 1992

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

As estatuetas de bronze depositadas na Biblioteca Nacional de Lisboa (BNL)127 e que

teriam sido encontradas em Alcácer do Sal, são orantes na atitude 3 A. No entanto, só as

peças números 1, 2, 3 e 4 são semelhantes às de Alcácer; as peças com os números 5 e 6

são diferentes ao nível do formato da cabeça. Provavelmente as peças de 1 a 4 serão as

provenientes do Olival do Senhor dos Mártires como é afirmado por Leite de

Vasconcelos128.

A peça do Museu Nacional de Arqueologia (MNA)129 que foi adquirida em Évora, com

alegadamente proveniente de Terena (Alhandroal), é a representação de um orante,

semelhante aos de Alcácer (também na atitude 3 A).

As peças do santuário de Alcácer são semelhantes às que estão no MNA e em Évora e

parecem ser produzidas pelo mesmo artífice. As existentes na BNL também exibem

características idênticas, exceptuando duas dessas peças cuja proveniência é reputada a

Alcácer, mas que são diferentes na forma, na estética e na aparência global, podendo ser

feitas por outro artífice. Será que existiu outro santuário na Horta de Cima, visto que

existem dois exemplares alegadamente provenientes desse sítio?

O touro de bronze da Herdade de Corte Pereiro (Alcácer do Sal)130 tem algumas

semelhanças com os de Alcácer, inclusivamente ao nível das dimensões. Assinala-se

porém uma diferença: todas as estatuetas de bovinos de Alcácer têm a cauda pendente, e

este outro tem a cauda enrolada, para o lado esquerdo, na horizontal.

Os pesos encontrados em Alcácer do Sal são cúbicos, sem perfuração central e não se

conseguiu identificar neles quaisquer caracteres escritos, embora não seja de descartar a

hipótese de terem existido e posteriormente desaparecido com a deterioração da peça ou

durante o tratamento de restauro. Assemelham-se formalmente aos pesos de Cerro del

Villar dos finais do século VIII, princípios do VII a. C.131

O suporte de timiaterio de Alcácer do Sal, exumado no sector N, situado a sul do

santuário, perto da área do armazém, está bem trabalhado e continha madeira no seu

interior, podendo ser atribuído, tal como o de La Joya132, ao século VII a.C., ou numa

cronologia mais alargada que abrange o século VII e o VI a.C., integrável nas produções

fenícias.

127 Alarcão e Delgado 1969 128Leite de Vasconcelos 1915: 13 129 Leite de Vasconcelos 1920 130 Gomes 1986 131 Garcia-Bellido 2003 132 Jiménez Ávila 2002: 195

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Os Ex-Votos Proto-Históricos do Castelo de Alcácer do Sal

Em relação às estatuetas zoomórficas, estão representadas algumas espécies domésticas

que tinham importância ao nível da alimentação, do trabalho rural, do prestígio e como

animal de companhia.

A colocação de estatuetas representando bovinos deve ser vista à luz da importância

deste animal para o Homem. Através desse ritual pretendia-se certamente obter

protecção divina. Pedia-se à divindade que providenciasse bons pastos e saúde para

estes animais e possivelmente protecção para o proprietário do animal.

Os bois eram usados como força motriz na agricultura para puxar os arados e na

abertura de trilhos. A sua carne era um produto de consumo para as classes mais

afortunadas e para os deuses (através de oferendas). A vaca torna-se importante

sobretudo pela produção de leite e dos seus derivados (manteiga, queijo ou coalhada).

A base de subsistência das comunidades seria dominada pelo gado doméstico, ao nível

da carne constituiria suporte fundamental. Os bovinos ocupavam o papel mais

importante na alimentação, o que levaria que, ao logo do ano, um grupo humano se

dedicasse à pastorícia do gado bovino133.

O templo de Cancho Roano albergou o culto a Astarté e a Tanit entre os séculos VII e

finais do V a.C., verificando-se a presença de um ex-voto de equídeo, o que permite

considerar a possibilidade de ser prestado culto à senhora dos cavalos (Astarté e Tanit).

O cavalo era sem dúvida o animal de uma elite aristocrática, ou guerreira. Com este

animal, o cavaleiro deslocava-se velozmente de terra em terra, podendo ainda caçar

mais facilmente. A aristocracia utilizou o cavalo como símbolo de prestígio, situação

que está ligada à profunda dependência da classe privilegiada em relação a este animal

nas actividades bélicas134. Na realidade, O cavalo foi uma ferramenta importante para a

componente militar. No século V a.C., o cavalo assume o símbolo de prestígio,

certamente também devido ao facto de este ser um animal exigente e dispendioso, que

custava manter não sendo, no entanto, indispensável à vida. Assim, a capacidade de

manter cavalos era a expressão visível de riqueza e posição social. A sumptuosidade e

aura de superioridade do cavalo davam ao cavaleiro, lá do alto, um ar superior.

O burro é um animal importante para a população mais pobre, daí, talvez, o seu

aparecimento no santuário, eventualmente associado a preces de protecção. O devoto

poderia pedir que a sua montada ou animal de carga fosse protegido pela divindade. Na

economia diária os burros e provavelmente as mulas seriam de uma importância

133 Cardoso 1993 134 Quesada Sanz 1998

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comparável aos cavalos. Pedir auxílio divino por estes animais entendia-se

perfeitamente num ambiente doméstico de carácter mais humilde. O burro, cumpre

melhor a maioria das actividades da economia doméstica, pois é menos delicado, mais

dócil, mais resistente.

O cavalo era, sem dúvida, a montada de pessoas com melhores posses por oposição ao

burro que era a montada dos pobres, mas isso não invalida que os seus donos pedissem

protecção para as suas montadas.

O cão é o animal doméstico que acompanha o homem à mais tempo, é o amigo do

homem, companheiro inseparável, aquele que guarda o rebanho e companheiro do

pastor, sendo portanto natural que fosse representado no santuário.

*

No que se refere ao fabrico das peças, segundo Nicolini o processo de cera perdida era a

técnica que convinha à obtenção de pequenas peças de bronze na Idade do Ferro, de

tamanhos compreendidos entre 4 e 12 cm.

No tocante à cronologia das peças, tendo por base a classificação de Nicolini em relação

às atitudes dos ex-votos, os orantes com a atitude 3 A, é a mais difundida pelo mundo

mediterrâneo e uma das mais raras nos séculos VI e V a.C. Assim, é de admitir que

estes se integrem nos séculos V e IV a.C., especialmente considerando que nos séculos

IV e III a.C. surgiram novas modalidades de atitudes derivadas dos arcaicas. Os

ofertantes com as atitudes 15 B e 15 D, assim como os guerreiros na atitude 10

(classificada como indígena), devem ser incluídos na época média ou seja nos séculos

IV e III a.C.

As terracotas foram usadas no mundo antigo e na Grécia. Estas representações tiveram

um papel destacado até ao século IV a.C. As figuras de terracota de Átis e de

Ganimedes estão relacionadas com divindades frígias e gregas, entidades que terão sido

introduzidas no século III a.C., provavelmente, através do comércio grego ou de alguma

família grega ou de ascendência frígia que habitaria neste povoado.

Será que as figuras que estão representadas na estatueta de terracota são Zeus e

Ganimedes? não poderia representar Cibele tentando raptar Átis? Pois sendo, Cibele,

também uma deusa da natureza, podia perfeitamente transformar-se em águia.

Ganimedes e Átis são dois jovens oriundos da mesma região, pastores e usavam o

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barrete frígio. Não serão, eles, a mesma pessoa? Os gregos tinham o hábito de aceitar no

seu panteão deuses oriundos de outras culturas e isso aconteceu com Cibele. Não terão

eles, também, adulterado o simbolismo do rapto e transportá-lo para Zeus, visto que ele

tinha o poder do disfarce.

Na Península Ibérica, os fenícios introduzem o culto de Astarté e de Melqart no século

VII a.C., e os púnicos o culto de Tanit no século IV a.C. Mais tarde surge o culto a

Cibele, talvez no século III a.C., provavelmente, através dos contactos comerciais ou da

instalação de pessoas relacionadas com aquela área geográfica, Frígia ou Grécia.

A povoação de “Bevipo” sofre um processo de aculturação que está demonstrado

através da adopção de crenças religiosas utilizadas pelos fenícios e mais tarde pelos

púnicos.

Através das peças votivas, pode-se concluir que os devotos eram tementes a uma

divindade, à qual dedicavam cerimónias queimando substâncias odoríficas. Dirigiam-se

ao santuário para pedir auxílio a uma divindade, curativa, fecundadora, protectora do ser

humano assim como dos animais. Neste santuário, prestar-se-ia culto à divindade

Astarté (a divindade principal), em época orientalizante e mais tarde a Tanit (a

protectora da cidade), em época púnica, pois estas duas deusas, para além de terem as

características acima referidas, tinham também o epíteto de “senhora dos cavalos”. No

que diz respeito a Tanit, esta deusa está representada em numismas, encontrados em

Alcácer do Sal, através dos símbolos da espiga de trigo e do hipocampo. A estas deusas-

mães estava associada uma divindade masculina - Melqart. Este deus também está

representado nas moedas pré-romanas encontradas nesta cidade. A sua efígie surge

numa das faces e, na outra face, a representação de atuns ou golfinhos, que estão

também relacionados com Melqart. A sua presença nas moedas testemunha que lhe

prestavam culto, sendo esta divindade, sem dúvida, um dos deuses mais importantes do

sul da Península Ibérica.

Admitindo estas cronologias atribuídas às várias peças votivas provenientes do

santuário da Idade do Ferro do Castelo de Alcácer do Sal, é de admitir que este espaço

sagrado se tivesse mantido activo a partir do final do século VII ou início do século VI

a.C., possivelmente até à romanização. Esta continuidade justifica a sobreposição do

santuário romano que vem reaproveitar parte do anterior. Aliás, considerando as

cronologias dos numismas fica estabelecida essa continuidade de utilização do espaço.

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