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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO INSTRUMENTO DE GESTÃO EM ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL: O CASO DA CRIAÇÃO DO CONSELHO GESTOR NA ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DE PRATIGI - BAHIA Maria Angélica de Jesus Souto Orientadora: Profª Drª Laís Mourão Dissertação de Mestrado Brasília-DF: Junho de 2003

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO INSTRUMENTO DE GESTÃO EM ÁREA DE

PROTEÇÃO AMBIENTAL: O CASO DA CRIAÇÃO DO CONSELHO GESTOR NA

ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DE PRATIGI - BAHIA

Maria Angélica de Jesus Souto

Orientadora: Profª Drª Laís Mourão

Dissertação de Mestrado

Brasília-DF: Junho de 2003

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO INSTRUMENTO DE GESTÃO EM ÁREA DE

PROTEÇÃO AMBIENTAL: O CASO DA CRIAÇÃO DO CONSELHO GESTOR NA

ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DE PRATIGI – BAHIA

Maria Angélica de Jesus Souto

Dissertação de Mestrado submetida ao Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade

de Brasília, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do Grau de Mestre em

Desenvolvimento Sustentável, área de concentração Política e Gestão Ambiental, opção

profissionalizante.

Aprovado por:

Laís Mourão, Doutora (CDS/UnB) (Orientadora) Suzi Theodoro, Doutora (CDS/UnB) (Examinador Interno) Maria de Fátima Nunesmaia, Doutora (UEFS-BA) (Examinador Externo)

Brasília-DF, 10 de Junho de 2003

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA – UnB

CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL – CDS

EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO INSTRUMENTO DE GESTÃO EM

ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL: O Caso da Criação do Conselho

Gestor na Área de Proteção Ambiental de Pratigi – Bahia

SOUTO, MARIA ANGELICA DE JESUS

Educação Ambiental como Instrumento de Gestão em Área de Proteção Ambiental: O casoda criação do Conselho Gestor na APA de Pratigi -Bahia 123 p., 297 mm, (UnB-CDS,Mestre, Política e Gestão Ambiental, 2003).

Dissertação de Mestrado – Universidade de Brasília. Centro de Desenvolvimento Sustentável.

1. Educação Ambiental 2. Gestão Participativa

3. Área de Proteção Ambiental 4. Conselho Gestor I

I – UnB – CDS II. Título (série)

É concedida à Universidade de Brasília permissão para reproduzir cópias desta dissertação e

emprestar ou vender tais cópias somente para propósitos acadêmicos e científicos. O autor

reserva outros direitos de publicação e nenhuma parte desta dissertação de mestrado pode ser

reproduzida sem a autorização por escrito do autor.

___________________________

Maria Angélica de Jesus Souto

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AGRADECIMENTOS

A DEUS, nosso mestre maior, exemplo de amor, bondade e caridade, e à espiritualidade, pela

oportunidade de estar aqui fazendo parte deste planeta de encontros e reencontros com a

natureza em todas as suas dimensões.

Aos meus filhos, Paulo, Luana e Vitória, que durante esta trajetória realizaram o curso de

mestrado junto comigo, compartilharam das angústias e expectativas, mas também vibraram por

cada conquista, por cada desafio enfrentado.

À minha orientadora, Profª Laís Mourão, por sua confiança, por sua paciência e incentivo,

dando-me estímulo e coragem para o enfrentamento dos desafios da pesquisa.

A todos os professores do Curso de Mestrado, que compartilharam os seus conhecimentos

contribuindo com o meu crescimento pessoal, profissional e científico, possibilitando

concretizar esta pesquisa.

A todos os meus colegas do curso pelo convívio, pelo aprendizado e pela troca de experiência.

Ao Centro de Recursos Ambientais – CRA, à Universidade Estadual da Bahia – UNEB e à

Universidade de Brasília – UnB, através do Centro de Desenvolvimento Sustentável – CDS, que

imbuídos do espírito de parceria e cientes de que a qualificação profissional é o caminho para

formar competências para lidar com os desafios impostos pela problemática socioambiental no

Estado da Bahia, proporcionou-me esta magnífica oportunidade de realizar o Mestrado.

A Júlia Salomão, amiga e colega do CRA, a quem considero uma co-orientadora pelo incentivo,

pela força, e pela disposição para a troca de idéias sempre muito enriquecedora e oportuna.

A Soraya Honorato, ex-administradora da APA de Pratigi, pela confiança, o apoio e o empenho,

tripé indispensável para que a pesquisa se tornasse possível.

Aos meus colegas do CRA, Hosana, Luciene, Lea e Rachel pelo apoio, paciência e tolerância.

À equipe gestora da APA de Pratigi, Marion Bartolomei – administradora da APA; Ricardo

Nascimento e Marcelo Costa – educadores ambientais; Rogério Cunha e Carla Lessa – técnicos

ambientais e Sérgio Costa – consultor técnico, que estiveram envolvidos comigo nessa trajetória

com empenho, apoio, dedicação e coragem para enfrentar as adversidades encontradas ao longo

dos estuários e dos acessos difíceis da zona rural, para o cumprimento de cada missão

programada.

Aos atores sociais envolvidos no processo de formação do Conselho Gestor da APA de Pratigi,

principalmente aqueles que se fizeram presentes em todas as etapas da pesquisa e que me

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encorajaram a continuar persistindo nessa caminhada, confiantes de que é possível construirmos

uma sociedade planetária melhor, a minha eterna gratidão.

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RESUMO

A intenção desse estudo foi avaliar o papel atribuído à educação ambiental no processo de

formação do Conselho Gestor na APA de Pratigi – BA e, ao mesmo tempo contribuir enquanto

pesquisadora, intervindo no processo ao inserir essa dimensão da educação em todas as etapas

da Pesquisa. Para efeito dos resultados esperados na pesquisa junto aos atores sociais que se

encontram na área de abrangência da APA, o trabalho pautou-se por uma prática

contextualizada de educação ambiental participativa, adotando como estratégia metodológica a

pesquisa-ação, por permitir que o aprendizado estabelecido entre o saber científico e o

conhecimento popular se constitua em formação de competência mobilizadora para a ação e

solução de problemas coletivos de forma participativa. O aprendizado contextualizado do

ambiente natural e construído da APA de Pratigi foi de fundamental importância para a

identificação dos impactos causados pelo manejo inadequado e para o reconhecimento de que

há outras formas e práticas propostas no Plano de Manejo da APA, instrumento de gestão

essencial para o planejamento de ações sustentáveis e compatíveis com os seus objetivos. Com

esta pesquisa foi possível identificar, mobilizar e instrumentalizar os atores sociais para

participar com competência e responsabilidade como membros do Conselho Gestor da APA,

prontos para atuarem como elo de ligação entre a comunidade e as instituições que representam,

na gestão da APA de Pratigi. Por último, pode-se considerar que este trabalho de pesquisa, que

utilizou a prática de Educação Ambiental para preparar os membros do Conselho Gestor da

APA de Pratigi e os demais atores envolvidos no processo, foge das práticas vigentes dos

conselhos criados em gabinetes, tem a possibilidade de se constituir em um ponto de partida

rumo a gestão ambiental participativa. Parte-se do pressuposto que esta é a condição essencial

para a consolidação de uma APA, a qual deve conciliar a conservação de sua área com o uso

produtivo dos seus recursos, de forma sustentável.

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ABSTRACT

The intention of this study was to evaluate role ascribed to the environmental education in the

process of formation of the Administrator Board in the (Environmental Protection Area) APA

of Pratigi–BA, and at the same time to contribute while researcher intervening in the process

when inserting sach dimension of education in all stages of the research.

For effect of the expected results in the research regarding to the social actors which are living

in the enclosing area of the APA, the work was marked by a contextualized practice of

particiative environmental education, adopting the research-action as methodological strategy,

for allowing that the learning established between the scientific knowledge and the folkway

bring forth the creation of mobilizing capacity for the action and solving the collective problems

in a participative way.

The contextualized learning of the natural and built environment of APA of Pratigi was of

fundamental importance for the identification of the impacts caused by the inadequate handling

and for the recognition that there are other forms and practices proposed in the Plan of

management of APA, instrument of administration essential for the planning of sustainable

actions and which are compatible with its objectives.

As a consequence of this research it was possible to identify, to mobilize and instrumentalize the

social actors for participating with competence and responsibility as member of the

Administrator Board of APA, ready for they act as connecting link between the community and

the institutions that they represent, in the administration of APA of Pratigi.

Last, we can consider this research work that use the practice of Environmental Education, to

prepare for preparing the members of the Administrator Board of APA of Pratigi and the other

actors involved in the process, avoid the comossoplaces pactice, in effect, of devising boardsin

cabinets, and thens it has the possibility of constituting a starting point, leading toward a

participative environmental administration. It is assumed that this is an essential condition for the

consolidation of an APA, which should harmonize its conservation with the productive use of its

resources in a sustainable way.

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SUMÁRIO

AGRADECIMENTOS _____________________________________________________IV RESUMO ________________________________________________________________VI ABSTRACT _____________________________________________________________ VII LISTA DE SIGLAS ________________________________________________________ X LISTA DE FIGURAS _____________________________________________________ XII LISTA DE TABELAS ____________________________________________________ XIII

1 - INTRODUÇÃO_______________________________________________________ 1

1.1 - METODOLOGIA ____________________________________________________ 2

1.2 - HIPÓTESE __________________________________________________________ 3

1.3 - OBJETIVO DO TRABALHO __________________________________________ 3

2 - JUSTIFICATIVA _____________________________________________________ 1

3 - DESCRIÇÃO FÍSICA E HISTÓRICO DE FORMAÇÃO DA APA____________ 6

3.1 - PARCERIA DE CO-GESTÃO_________________________________________ 10

4 - EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO INSTRUMENTO EM UM PROCESSO DE GESTÃO PARTICIPATIVA ___________________________________________ 16

4.1 - ENTENDENDO A QUESTÃO AMBIENTAL ____________________________ 16 4.1.1 - A questão ambiental em debate __________________________________________ 17 4.1.2 - Educação, uma nova demanda ambiental __________________________________ 19 4.1.3 - Educação ambiental- institucionalização no Brasil ___________________________ 23 4.1.4 - Educação ambiental, um caminho para a participação ética e cidadã _____________ 27

4.2 - POLÍTICA DE MEIO AMBIENTE PARA UNIDADE DE CONSERVAÇÃO _ 33 4.2.1 - Sistema Nacional de Unidade de Conservação ______________________________ 33 4.2.2 - Legislação ambiental no estado da Bahia __________________________________ 37 4.2.3 - Conselho gestor: um instrumento de gestão participativa em Unidade de

Conservação__ ________________________________________________________ 39

5 - CONTEXTUALIZAÇÃO DO CENÁRIO DA APA DE PRATIGI____________ 44

5.1 - CONTEXTUALIZAÇÃO REGIONAL: CARACTERIZAÇÃO SOCIO-HISTÓRICA E ECONÔMICA__________________________________________ 44

5.2 - ASPECTOS DEMOGRÁFICOS _______________________________________ 58 5.2.2 - Culturas Extrativistas nas Comunidades Estuarinas e Rurais do Pratigi ___________ 66 5.2.3 - Atores sociais presentes na APA do Pratigi_________________________________ 73

6 - FORMAÇÃO DO CONSELHO GESTOR: UMA PRÁTICA PARTICIPATIVA NA APA DE PRATIGI ________________________________________________ 76

6.1 - ETAPA 1: CONHECENDO AS COMUNIDADES ESTUARINAS E RURAIS_ 80 6.1.1 - Inserção do pesquisador________________________________________________ 80 6.1.2 - Mobilização social das comunidades______________________________________ 81 6.1.3 - Mini-oficina de sensibilização local ______________________________________ 81

6.2 - ETAPA 2: CONHECENDO O AMBIENTE DA APA DE PRATIGI _________ 83 6.2.1 - Seminário de Sensibilização para uma Gestão Participativa ____________________ 83 6.2.2 - Oficina para identificação de atores_______________________________________ 84 6.2.3 - Reunião Pública ______________________________________________________ 86

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6.3 - 3ª ETAPA: CONHECENDO PARA PARTICIPAR _______________________ 89 6.3.1 - Curso de Capacitação__________________________________________________ 89 6.3.2 - Oficina para a elaboração do documento-base para o regimento interno __________ 91

7 - CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES_________________________________ 95 REFERÊNCIAS __________________________________________________________ 104

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LISTA DE SIGLAS

APA – Área de Proteção Ambiental

Aprovale – Associação de Produtores Rurais do Vale do Juliana

Ceplac – Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira

Cepram – Conselho Estadual de Meio Ambiente

Coelba – Companhia de Energia Elétrica

Conama – Conselho Nacional de Meio Ambiente

Conder – Companhia de Desenvolvimento Urbano

CRA – Centro de Recursos Ambientais

DLIS – Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável

EBDA – Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola

Embasa – Empresa Baiana de Saneamento

Fazag – Faculdade Zacarias Góes

FBPN – Fundação O Boticário de Proteção à Natureza

Fundipesca – Fundação para o Desenvolvimento de Comunidades Pesqueiras Artesanais

Ibama – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

Ides – Instituto de Desenvolvimento Sustentável Baixo Sul da Bahia

IDH – Índice de Desenvolvimento Humano

IIEB – Instituto Internacional de Educação do Brasil

MMA – Ministério do Meio Ambiente

ONG – Organização Não-Governamental

Oscip – Organização da Sociedade Civil de Interesse Público

Pronea – Programa Nacional de Educaca0 Ambiental

Seara – Sistema Estadual de Administração dos Recursos Ambientais

Sebrae – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas

Sema –Secretaria de Meio Ambiente

Semarh – Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos

Sisnama – Sistema Nacional de Meio Ambiente

SNUC – Sistema Nacional de Unidade de Conservação

Sudepe – Superintendência de Desenvolvimento Urbano

Sudetur – Superintendência de Desenvolvimento Turístico

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Suny – Universidade de Nova York

UCS – Unidade de Conservação

Uneb – Universidade Estadual da Bahia

WWF – Fundo Mundial para Natureza

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LISTA DE FIGURAS

Figura 2. 1 - Vista do canal estuarino em Ituberá ____________________________________ 6 Figura 2. 2 - Orquídea pingo de ouro _____________________________________________ 6 Figura 2. 3 - Vegetação típica de restinga __________________________________________ 6 Figura 2. 4 - Mapa de localização da área de estudo __________________________________ 8 Figura 2. 5 - Mapa de ampliação da APA de Pratigi __________________________________ 9 Figura 5. 1 - Cachoeira da Pancada Grande________________________________________44 Figura 5. 2 - Orquídea encontrada na APA________________________________________ 45 Figura 5. 3 - Ave conhecida como Dançarino ______________________________________ 45 Figura 5. 4 - Beneficiamento artesanal do dendê ____________________________________ 67 Figura 5. 5 - Beneficiamento da piaçava __________________________________________ 68 Figura 5. 6 - Plantação do coco-da-baía __________________________________________ 69 Figura 6. 1 - Fluxograma______________________________________________________ 79 Figura 6. 2 - Educação Ambiental______________________________________________ 81 Figura 6. 3 - Trilha Interpretativa _______________________________________________ 81 Figura 6. 4 - Educação Ambiental_______________________________________________ 81 Figura 6. 5 - Mini-Oficina na Comunidade de Itiúca _________________________________ 82 Figura 6. 8 - Seminário de Sensibilização_________________________________________ 83 Figura 6. 6 - Seminário de Sensibilização _________________________________________ 83 Figura 6. 7 - Oficina de E. A - Comunidade rural ___________________________________ 85 Figura 6. 8 - Reunião Pública __________________________________________________ 86 Figura 6. 9 - Organograma do Conselho Gestor ____________________________________ 88 Figura 6. 10 - Registro do Curso de Educação Ambiental_____________________________ 89 Figura 6. 11 - Trabalho em grupo_______________________________________________ 91 Figura 6. 12 - Aula expositiva _________________________________________________ 91 Figura 6. 13 - Painel do trabalho________________________________________________ 92 Figura 6. 14 - Educadores da APA ______________________________________________ 92

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LISTA DE TABELAS

Tabela 5. 1 - Municípios criados após a década de 50 no Baixo Sul ___________________ 56 Tabela 5. 2 - População, área e densidade demográfica (1996) _________________________ 59 Tabela 5. 3 - Subespaço do Pratigi – 1996 _______________________________________ 60 Tabela 5. 4- Taxa de Crescimento Populacional – 1980/1991/1996____________________ 61

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1 - INTRODUÇÃO

A presente dissertação tem por objetivo discutir a legitimidade e a eficácia sociopolítica dos

conselhos gestores em APAs. Para tanto, foi analisado o processo de formação do Conselho

Gestor da APA Pratigi-BA e enfocada a importância da Educação Ambiental (EA) como

instrumento de mobilização e organização dos grupos sociais envolvidos com as questões

ambientais na unidade de conservação.

A pesquisa consistiu em analisar a concepção de Educação Ambiental adotada ao longo do

processo pelas instituições gestoras da APA, o Centro de Recursos Ambientais – CRA1 e o

Instituto de Desenvolvimento Sustentável – Ides² e o papel atribuído à EA como instrumento de

mobilização e organização dos grupos sociais locais.

A opção pelo tema está diretamente vinculada às atribuições do Centro de Recursos Ambientais e

relacionada com as ações desenvolvidas pela pesquisadora, que atualmente Coordena a área de

Educação Ambiental do órgão, sendo, portanto, um tema de interesse profissional e institucional.

O tema torna-se relevante na medida em que o CRA temcomo responsabilidade o gerenciamento

e o controle ambiental das 26 APAS distribuídas geograficamente nos diversos ecossistemas do

Estado. Desse total, apenas as APAs Itacaré/Serra Grande e Lagoa Encantada possuem um

Conselho Gestor, espaço legalmente previsto para viabilizar a participação dos diversos

segmentos que integram a dinâmica socioambiental de uma APA.

Vale ressaltar que, próximo à conclusão da pesquisa houve uma mudança na esfera

governamental, que em janeiro de 2003 criou a Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Recursos

Hídricos – Semarh, repassando a competência do gerenciamento dessas APAs para a

Superintendência de Unidade de Conservação, autarquia criada para esse fim.

1. CRA – Órgão executor da política ambiental no Estado da Bahia e gestor da APA do Pratigi. 2. Ides – Organização da sociedade civil de interesse público, co-gestor da APA, mediante termo de parceria.

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1.1 - METODOLOGIA

A pesquisa-ação, proposta por Barbier, 1986, é uma metodologia baseada, em grande parte, na

abordagem transversal que requer a teoria da escuta sensível, sem perder o rigor

multirreferencial e existencial.

A metodologia de pesquisa-ação aplicada neste trabalho permitiu à pesquisadora e aos atores

envolvidos perceber que a abordagem participativa nas etapas estabelecidas para a formação do

Conselho Gestor (reuniões preparatórias, seminários de sensibilização, oficinas e cursos de

capacitação) contribuiu para uma nova compreensão acerca dos problemas ambientais

existentes, da forma que estes influenciam a qualidade de vida e do potencial coletivo para

intervir em processos que impliquem mudanças com proposições sustentáveis.

O processo de aprendizado estabelecido entre o saber científico e o conhecimento local, próprio

da pesquisa-ação, possibilita a capacidade de discernimento acerca das necessidades, dos

problemas e das soluções, como também permite relacioná-los com os contextos globais.

Segundo Salomão (2001), a abordagem participativa permite o aumento de poder da

comunidade, uma espécie de empoderamento, através de um trabalho coletivo, que se constitui em

grande parte das iniciativas, objetivos e interesses definidos pelos sujeitos envolvidos no

processo. Permite, ainda, maior competência para participar do processo de tomada de decisões

em relação às políticas públicas relacionadas à conservação ambiental, tornando-se

reconhecidamente importante.

Para alcançar os objetivos propostos, algumas questões foram levantadas, quais sejam:

Como desencadear um processo de formação de Conselho Gestor, que seja capaz de

contribuir efetivamente para a consolidação de uma APA?

Como propiciar a compreensão acerca dos problemas ambientais que interferem

diretamente na qualidade de vida dos atores sociais envolvidos, e como compatibilizar

de forma sustentável o uso dos recursos ambientais com a função de conservação a

que uma APA se destina?

De que forma a Educação Ambiental se constitui em uma estratégia para viabilizar uma

participação consciente, ativa e responsável na gestão de uma APA?

2

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1.2 - HIPÓTESE

A consolidação de uma APA implica na formação de um Conselho Gestor legitimamente

representativo dos atores locais, que possa funcionar como um espaço de interlocução entre o

poder público e a sociedade civil, atuando de forma eficaz no seu processo de gestão, e sendo

capaz de promover ações que visem compatibilizar o uso sustentável dos recursos ambientais

com a função produtiva e sociocultural da APA.

Objeto de estudo

A legitimidade sociopolitica e a eficácia dos conselhos gestores, a partir da importância atribuída

à Educação Ambiental como instrumento de mobilização e organização dos grupos sociais

locais em Áreas de Proteção Ambiental.

1.3 - OBJETIVO DO TRABALHO

• Geral

Analisar o papel atribuído à Educação Ambiental, no processo de implantação

do Conselho Gestor pelas instituições gestoras da APA de Pratigi.

• Específicos

Contribuir para a inserção da dimensão participativa da sociedade civil através de

propostas de educação ambiental no processo de formação do Conselho Gestor;

Analisar a eficácia do Conselho no processo de gestão da APA de Pratigi.

Os objetivos e as questões formuladas nesta pesquisa foram se delineando no decorrer do

trabalho, marcado pela participação de todos os envolvidos, pesquisadora, equipe gestora da

APA, comunidades estuarinas e rurais, ONGs, instituições públicas e privadas, e demais

segmentos que se fizeram presentes nos vários momentos de compartilhamento de

conhecimentos, experiências e vivências. Foram doze meses observando, agindo, interagindo e

participando de todo o processo, que vislumbrava a formação do Conselho Gestor na APA.

3

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Esta dissertação está estruturada em cinco capítulos, a saber: o primeiro capítulo consiste na

justificativa do objeto deste estudo, que tem como foco a criação do conselho gestor,

instrumento de fundamental importância na gestão de uma APA, cuja consolidação só dar-se-á

com o envolvimento e a participação dos atores sociais dos diversos segmentos que devem estar

aptos para lidar com a problemática socioambiental e com habilidades necessárias para propor

soluções e alternativas alicerçadas em bases sustentáveis.

O segundo capítulo refere-se à descrição física e histórica de formação da APA, apresentando os

aspectos relevantes do Bioma Floresta Atlântica, presentes na sua área de abrangência, os

elementos motivadores para a sua criação e o processo de gestão que evoluiu para uma gestão

compartilhada mediante um Termo de Parceria, estabelecido entre o governo e uma

Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – Oscip.

O terceiro capítulo nos remete às premissas teóricas da questão ambiental, tema que passou a

ser incorporado nos debates socioeconômicos não apenas no Brasil, mas em todo o mundo.

Essa visão nos permite uma maior compreensão da educação ambiental e seus pressupostos

nesse contexto, e o entendimento de que esta se constitui em importante instrumento para a

formação da cidadania.

O quarto capítulo refere-se à contextualização da APA do Pratigi, apresentando os diversos

ambientes que a compõem, avaliando a sua importância ecológica, econômica e social, levando

em consideração sua conservação, diversidade biológica, fragilidade, capacidade de suporte, e os

impactos em decorrência da intervenção humana. Esse capítulo permite um melhor

conhecimento sobre a dinâmica da APA e o reconhecimento de que é necessário o

envolvimento de todos para que a sua gestão seja efetivamente participativa.

O quinto capítulo evidencia os passos metodológicos da pesquisa-ação, uma prática participativa

desenvolvida junto aos diversos segmentos que atuam na APA, tendo como eixo principal a

escuta sensível e a pesquisa-ação integral, adotada como uma estratégia de educação ambiental,

pois permite mobilizar a comunidade, criar a capacidade de reflexão, que pode levar a mudanças

da ação e do discurso, ou seja, de uma ação individual para uma prática coletiva, e, sobretudo,

propiciar uma participação cooperativa que pode levar à co-gestão. Esta proposta metodológica

desenvolve-se “in loco” e compreende cinco fases: contratualização, participação, mudança,

discurso e ação.

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Todas as fases se realizam como uma espiral – reflexão – ação – discurso - sendo a sua eficácia

obtida na medida em que haja um maior consenso e este corresponda às capacidades dos

participantes do processo.

Esta prática metodológica desenvolve-se sob uma perspectiva de complementaridade entre

pesquisados e pesquisador, e possibilita mudanças de percepção quanto aos problemas

socioambientais existentes e sobre a necessidade do fortalecimento das ações coletivas para a

busca de soluções sustentáveis.

A inserção de alguns pressupostos da educação ambiental contribuiu para facilitar a compreensão

da complexidade inerente às questões ambientais, mas, também, permite construir um novo

conhecimento a partir de todos os “saberes”, e, sobretudo para estimular a participação cidadã,

requisito essencial no processo de co-gestão em Unidade de Conservação.

Finalmente, alinharam-se, as conclusões e recomendações desta pesquisa, apresentando uma

síntese dos principais pontos abordados durante o trabalho e que se constituem em importante

ferramenta para subsidiar as ações que serão implementadas através de uma gestão compartilhada

com o apoio e a participação efetiva do Conselho Gestor, e dos diversos segmentos que estão

inseridos na APA. O resultado desta pesquisa nos permite afirmar que a inserção da educação

ambiental como estratégia em uma prática participativa favorece expressivos resultados, advindos

de uma participação consciente e responsável dos cidadãos envolvidos. Sob essa ótica, a educação

ambiental deve ser considerada nos planos, programas e projetos, que tenham como horizonte o

desenvolvimento regional ou local em todas as suas dimensões. Esta prática favorece a

construção de novos valores, de uma nova postura, de uma nova ética e sobretudo cria

habilidades e competências que podem contribuir para a transformação e a melhoria da qualidade

de vida dos cidadãos.

A opção por essa prática participativa e educativa nos permite reconhecer que esta dissertação

não apresenta um produto finalizado, na sua essência, mas, sim, um “produto” em constante

processo de lapidação. Assim é considerado o Conselho Gestor da APA de Pratigi, hoje

consciente de que, para resolver os problemas socioambientais não existem soluções mágicas.

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Desse modo, é necessário que as práticas educativas sejam contínuas, sistemáticas e permanentes

com o intuito de fortalecer a participação, promover a mobilização e o exercício da cidadania que

deve estar pautada por valores éticos que priorizem a vida e a solidariedade.

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2 - JUSTIFICATIVA

O Brasil enfrenta, hoje, entre tantos outros, um grande desafio em relação à adoção de diretrizes

capazes de balizar a concepção e a viabilização de estratégias que integrem os objetivos

simultaneamente socioeconômicos, político-institucionais, culturais e ambientais no contexto do

processo de desenvolvimento sustentável.

Segundo Capra (1986), o paradigma racionalista cartesiano produziu uma concepção puramente

mecanicista da natureza, onde ela não tem nenhuma finalidade em si mesma, estando

completamente a mercê da exploração humana.

A concepção cartesiana do universo como sistema mecânico forneceu aos seres humanos uma

espécie de “sanção científica” para que manipulassem e explorassem a natureza, transformando-a

em bens e serviços à disposição da sociedade.

A concepção mecanicista da matéria também foi extrapolada para as plantas e animais, assim

como para o corpo humano, onde todos são tratados como se fossem máquinas, estimulando o

desenvolvimento de uma racionalidade instrumental, utilizando-se o meio ambiente sem

quaisquer critérios para se atingir os fins, conduzindo a um desrespeito, uso indevido e

predatório dos recursos naturais e dos ecossistemas, assim como o desenvolvimento de

tecnologias poluidoras (CAPRA, 1986).

No Estado da Bahia, resgatando um pouco do processo histórico, a institucionalização do

controle ambiental teve início a partir da criação do Conselho Estadual de Proteção Ambiental –

Cepram, em 1973, restrito ao controle da poluição e lançamento de resíduos na Região

Metropolitana de Salvador.

Posteriormente, em 1983, a visão ambiental passa a ser mais abrangente, enfatizando uma

política de uso racional dos recursos naturais com a instituição do Sistema Estadual de

Administração dos Recursos Ambientais – Seara, dentro da política de desenvolvimento integral

do Estado, no qual o Cepram, enquanto conselho assume a função de órgão central, de caráter

consultivo, normativo e deliberativo, e o Centro de Recursos Ambientais - CRA, passa a assumir

a função de órgão executor do sistema, afastando-se do horizonte restrito de controlar a

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poluição industrial, o que não atendia às demandas, nem à filosofia de uma gestão integrada do

meio ambiente.

Esta nova concepção incorporou a dimensão ambiental no processo de planejamento global e

setorial, com ênfase na utilização dos recursos naturais, determinando a integração dos aspectos

ambientais nos processos de ordenamento, tais como: urbanização, industrialização e habitação,

bem como a orientação de um desenvolvimento tecnológico adequado ao ambiente.

A partir de 1989, com a nova Constituição estadual, em seu art.213, é instituído um “sistema de

administração de qualidade ambiental, proteção, controle e desenvolvimento do meio ambiente

e uso adequado dos recursos naturais para organizar, coordenar e integrar as ações da

administração pública e da iniciativa privada, assegurada a participação da coletividade”.

Com esse advento, o Cepram passou a ser denominado de Conselho Estadual de Meio

Ambiente (e não mais Conselho Estadual de Proteção Ambiental) e fixou a representação tripartite e

paritária do poder público, das entidades ambientalistas e demais representações da sociedade

civil, no conjunto de 15 (quinze) membros constituídos através da Lei nº 6.529, de 29 de

dezembro de 1993 como um colegiado, normativo e deliberativo, ficando representado por

05(cinco) membros de cada um dos segmentos (SOUZA, 2003).

Uma nova mudança na política ambiental do Estado da Bahia ocorre com a criação da

Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos – Semarh, em 20 de dezembro de 2002,

através da Lei Estadual nº 8.538, com a finalidade de formular e executar a política estadual de

ordenamento ambiental, de desenvolvimento florestal e de recursos hídricos.

O Decreto Estadual nº 8.419, de 14 de janeiro de 2003, que regulamenta a Semarh, reúne na

mesma Secretaria os órgãos executores do Seara, responsáveis pela agenda marrom (CRA),

agenda verde (Superintendência de Desenvolvimento Florestal e Unidades de Conservação) e a

agenda azul (Superintendência de Recursos Hídricos –SRH).

A sustentabilidade ambiental do estado, que se espera com essa nova estrutura, dependerá

fortemente da ação e interação dos diversos atores governamentais e sociais. A análise dos

modelos de sustentabilidade adotados no passado demonstra a necessidade de permanente

aperfeiçoamento. Há oportunidades abertas e novas perspectivas para integração e

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harmonização das ações e decisões ambientais, diminuindo as incertezas e fortalecendo o

modelo institucional legal (SOUZA, 2003).

Tais mudanças sinalizam para a incorporação de práticas e conceitos que buscam viabilizar uma

nova concepção de desenvolvimento, conforme enunciado por Sachs (2000). Este autor, em sua

caracterização sobre ecodesenvolvimento, identifica o termo como “estilo” de desenvolvimento,

orientado para o atendimento às necessidades básicas e para a promoção da autonomia,

integrando a problemática ambiental por meio de pesquisa científica e do saber popular

tradicional. Num segundo momento, designando a idéia de participação e de intervenção

plurissetorial em contextos específicos, ecodesenvolvimento é referido como diretriz

fundamental de harmonização, ou seja, é a busca da compatibilização das atividades

socioeconômicas produtivas de uma população com a conservação ambiental.

Segundo Vieira (1996), pode-se entender “diretriz fundamental de harmonização” como a forma

de se compatibilizar iniciativas socioeconômicas, concretização da cultura democrático –

participativa, distribuição eqüitativa do “ter” e gestão “ecologicamente prudente” do meio

ambiente, contemplando “princípios da solidariedade” para com as “gerações atuais e futuras” e

a compreensão dos “limites” da natureza.

O Seara, entretanto, já sinalizava para a necessidade de um novo caminho, conforme apontado

posteriormente pelos autores citados, ao buscar promover, dentro da política de

desenvolvimento integral do Estado, a conservação, defesa e melhoria do ambiente em

benefício da qualidade de vida, propondo a “Educação Ambiental nos diferentes graus de

ensino, bem como a participação da comunidade, através de entidades representativas, no

esforço de compatibilizar o desenvolvimento com o ambiente”, como também a implantação e

consolidação da sua função programática de “formulação e implementação de programa de

Educação Ambiental”.

Nesse contexto, a educação ambiental apresenta-se como um instrumento que possibilita a

formação de uma consciência crítica, capaz de despertar no indivíduo e na coletividade o

interesse pelas questões ambientais organizativas dos grupos locais e valorizar os seus saberes

para que possam articular-se com o conhecimento técnico e produzir soluções sustentáveis.

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Para Morin (1998), o conhecimento do mundo torna-se necessidade ao mesmo tempo

intelectual e vital. É o problema universal para todo cidadão: como abrir o acesso às

informações sobre o mundo e como adquirir a possibilidade de as articular e de as organizar. É

necessária uma reforma de pensamento, que comporte o desenvolvimento da contextualização

do conhecimento, mas que pede a complexificação do conhecimento.

Com esse enfoque, a educação ambiental se constitui em um processo de formação e

informação que permite aos cidadãos a compreensão da natureza complexa do meio ambiente e

a sua interdependência com os demais elementos que o compõem; é um processo participativo,

uma vez que seus objetivos se alcançam através da ação integrada de todos os atores envolvidos,

sociedade e poder público, que juntos deverão identificar problemas e buscar alternativas, para

que de fato se estabeleça uma gestão participativa.

Segundo Sorrentino (1991), as problemáticas ambientais, que sempre estiveram presentes na

vida de milhões de pessoas, tomam proporções cada vez mais alarmantes e o imobilismo não

deve estar presente em nenhum momento. Quando se trata da sobrevivência do ser humano,

enquanto não chegam medidas globais que priorizem a questão ambiental, cabe aos órgãos

governamentais de meio ambiente, como parte da sociedade global, oferecer propostas que

venham minimizar os problemas ambientais que ameaçam a própria vida.

Sob esta ótica, e de acordo com a Lei nº 7.799, de 07/02/01, que institui a Política Estadual de

Administração de Recursos Ambientais, a Educação Ambiental é assim entendida: “instrumento

para a formação da cidadania, capaz de despertar no indivíduo sua importância como ser ativo e

consciente, enquanto agente de mudanças, visando o desenvolvimento sustentável do Estado” e

ainda ( a educação ambiental) “deve ser permanente, orientada para a resolução de problemas

concretos, a indução das pessoas à ação e a integração e a articulação com a comunidade”.

Do ponto de vista funcional, nesta pesquisa, partiu-se do princípio de que este conceito é

reducionista, individualista e que, sobretudo prioriza o Estado em detrimento da sociedade.

Enquanto órgão executor da política ambiental do estado, e em consonância com a Lei nº 9.985,

de 18/07/00, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza

(SNUC), coube ao CRA incorporar dentre as suas competências a administração das Áreas de

Proteção Ambiental (APA), categoria que se enquadra no Grupo das Unidades de Uso

Sustentável e caracteriza-se por ser uma Unidade de Conservação de uso direto que implica no

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controle sobre a utilização dos recursos naturais disponíveis, e na compatibilização dos

interesses da ocupação humana com a conservação do ambiente.

Com esse propósito, o Governo do Estado criou a Área de Proteção Ambiental de Pratigi,

localizada na região do Baixo Sul, visando garantir a sua conservação e sustentabilidade, por

constituir-se em uma faixa territorial de grande relevância ambiental, formada de remanescentes

de Mata Atlântica com ricos ecossistemas associados (floresta ombrófila densa, campos de

restinga e manguezais), por meio do Decreto nº 7.272, de 02 de abril de l998.

A consolidação de uma APA requer a adoção de estratégias que possibilitem às comunidades

adquirir novos comportamentos e atitudes frente aos problemas complexos do meio ambiente,

bem como de estímulo para participar ativa e responsavelmente, como cidadãos ao longo de

todo o processo que visa à busca de soluções e alternativas para um novo modelo de

desenvolvimento socialmente mais justo, economicamente viável e ambientalmente sustentável.

Nesse sentido, a criação de Conselho Gestor se constitui em uma das principais estratégias para se

alcançar os objetivos da gestão de uma APA, os quais consistem na conservação da sua

biodiversidade e na promoção do desenvolvimento sustentável, mas, também, deve estabelecer

o espaço adequado para garantir a participação dos diversos segmentos da sociedade,

instituindo-se, desse modo, o processo de co-gestão entre o poder público e a sociedade civil

organizada.

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3 - DESCRIÇÃO FÍSICA E HISTÓRICO DE FORMAÇÃO DA APA

A região do Baixo Sul, do ponto de vista dos recursos naturais, é uma das áreas mais

importantes e complexas do Estado da Bahia, caracterizando-se como uma região tropical

úmida, onde a ação climática representa um elemento fundamental na definição do quadro

natural, configurando a excelência da cobertura vegetal, da rede hidrográfica, do relevo e dos

solos.

A área onde está inserida a APA do Pratigi apresenta uma das mais complexas paisagens do

litoral, com praias, rios, grandes canais estuarinos acompanhados por extensos manguezais e

campos de restinga onde o colorido das bromélias e das orquídeas bordam um grande manto

verde que formam as matas estendidas pelas planícies. A figura 2.1 representa a vista do canal

estuarino em Ituberá bem como as figuras 2.2 e 2.3 , retratam espécies da flora encontradas na

APA.

Figura 2. 1 - Vista do canal estuarino em Ituberá

Figura 2. 2 - Orquídea pingo de ouro

Figura 2. 3 - Vegetação típica de restinga

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A APA do Pratigi abriga, em todos os seus ambientes, florestas tropicais que estão sendo

reconhecidas como uma das áreas mais importantes no nível de repositório da diversidade

biológica.

Esse cenário abriga, além de uma vegetação exuberante, uma fauna diversificada e uma riqueza

imensurável produzida dentro de um ciclo hidrológico complexo e extremamente frágil, que está

representado por córregos, riachos, rios, lagoas e estuários que dão vida e sustentação a muitas

espécies, principalmente a humana.

Contudo, as atividades humanas tradicionais têm causado impactos sobre esse ambiente,

trazendo consequências perceptíveis e danosas, como o raleamento das matas, degradação dos

mananciais hídricos, a redução significativa da fauna silvestre, aceleração dos processos ativos

naturais.

Com a criação da APA ampliaram-se as possibilidades de desenvolvimento socioambiental,

ampliaram-se por intermédio do controle dos processos de degradação ambiental, promovendo

a preservação e a conservação dos ecossistemas, estabelecendo normas e padrões de uso e

ocupação, onde os diversos atores possam realmente implementar os postulados da

sustentabilidade.

A Área de Proteçao Ambiental do Pratigi foi criada através do Decreto Estadual nº 7.272, de 02

de abril de 1998, integrando inicialmente os municípios de Ituberá, Igrapiúna e Nilo Peçanha,

com uma área de 48.746 ha, sendo atribuído ao CRA, dentre as suas competências, estabelecer

plano de manejo, analisar e emitir parecer para licenciamento de empreendimentos, exercer a

supervisão e a fiscalização das atividades a serem realizadas, respeitada a competência municipal.

A APA teve o seu Zoneamento aprovado pela Resolução Cepram nº 2.533, de 24 de novembro

de 2000, tendo a sua poligonal alterada pelo Decreto Estadual nº 8.036, de 20 de setembro de

2001, passando a abranger os municípios de Ibirapitanga e Piraí do Norte, tendo como

justificativa a necessidade de ampliar a proteção das restingas e manguezais, característicos do

ecossistema de Mata Atlântica nesta sub-região, para as áreas de estuário do município de

Igrapiúna até a foz do rio Pinaré, devido ao excelente estado de conservação, decorrente do

isolamento físico, bem como de incluir a Bacia Hidrográfica do Rio Juliana, pelos remanescentes

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de Floresta Ombrófila densa em avançado estágio de regeneração, e pelo exuberante complexo

hidrográfico microrregional, que inclui a Cachoeira da Pancada Grande, importante atrativo

turístico da região. Em decorrência da alteração em sua poligonal, a sua área total corresponde

hoje a 85.686 ha, limitando-se: ao norte pela rodovia BA-001/Cairu, canal de Itiúca e rio dos

Patos; ao sul, pelo canal do Rio Pinaré; a leste, pelo Oceano Atlântico; a oeste, pela BA-001 e pela

Bacia Hidrográfica do Juliana. Logo abaixo, podem-se observar nas figuras 2.4 e 2.5 os mapas do

Estado da Bahia localizando a área de estudo e a ampliação da APA de Pratigi.

F

igura 2. 4 - Mapa de localização da área de estudo

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Figura 2. 5 - Mapa de ampliação da APA de Pratigi

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3.1 - PARCERIA DE CO-GESTÃO

O Centro de Recursos Ambientais, órgão responsável pela gestão da APA de Pratigi, vinha

realizando o seu gerenciamento através de um técnico lotado em seu Escritório Administrativo

no município de Valença, e já contava com o apoio do Instituto de Desenvolvimento

Sustentável do Baixo Sul da Bahia – Ides, até então uma organização não-governamental.

Diante dos problemas ambientais evidenciados na APA (pesca predatória, aterro de manguezais,

destinação inadequada dos resíduos sólidos, retirada de bromélias e orquídeas das florestas e

restingas e desmatamento) e percebendo de que forma a comunidade se relacionava com aquele

ambiente, o Ides resolveu propor ao CRA a criação da sede da APA de Pratigi no município de

Ituberá. Foi feita uma articulação entre as prefeituras pertencentes à APA e uma parceria para a

reforma de um imóvel e o pagamento de uma equipe técnica mínima, para que esta tivesse

condições de acompanhar a realidade da APA, para concomitantemente desempenhar as

funções de fiscalizar e promover ações de educação ambiental.

O Ides foi criado em 23 de agosto de 1997, anteriormente à criação da APA do Pratigi, com o

objetivo de apoiar o desenvolvimento socioeconômico-ambiental da microrregião do Baixo Sul.

Na sua estrutura, o Ides conta com uma presidência executiva e um conselho deliberativo

representado pelos segmentos empresarial, através das Fazendas Reunidas Vale do Juliana Ltda.,

Tecnologia Empresarial S/C Ltda., Agro Industrial Ituberá Ltda. e a Empresa Guaranap`s;

sociedade civil organizada, através da Fundação para o Desenvolvimento de Comunidades

Pesqueiras Artesanais – Fundipesca e Fundação Biobrasil, na qualidade de sócio fundador,

exceto a última empresa citada, e pelos órgãos públicos dos municípios de Ituberá, Igrapiúna,

Ibirapitanga, Camamu e Taperoá. Para coordenar os projetos que desenvolve, forma o seu

corpo técnico na medida em que as parcerias vão-se estabelecendo, para atender às áreas

programáticas em que atua.

De Organização Não-Governamental – ONG, o Ides passou a ser uma instituição de direito

privado, sem fins lucrativos, sendo qualificada, recentemente, pelo Ministério da Justiça, em 26

de junho de 2000, como uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – Oscip, de

acordo com Lei nº 9.790/99, e a sua criação fundamentou-se na necessidade de uma

organização legitimada pela sociedade, representativa, com estrutura técnica e legalmente

constituída, a fim de buscar interlocução com a esfera federal, estadual e municipal.

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Cabe mencionar que o processo de criação do Ides teve como justificativa inicial uma

preocupação com a preservação dos remanescentes de Floresta Atlântica na microrregião.

Porém ao longo de sua consolidação, os programas sociais ganharam significativa expressão,

especialmente os projetos voltados para o protagonismo juvenil. Atualmente, a filosofia do Ides

encontra-se pautada no conceito de Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável – DLIS,

tecnologia que propõe mudanças “profundas” na concepção do crescimento social, econômico

e ambiental da microrregião. Para o Ides, a elevação do Índice de Desenvolvimento Humano

(IDH) da microrregião se constitui em uma missão.

Como Oscip, tem trabalhado sob a perspectiva do aprimoramento da gestão participativa local e

regional, por meio do fortalecimento de práticas associativas e cooperativistas de produção. A

mesma compreende que somente é possível dimensionar a mudança social quando houver

maior oferta e alternativas de trabalho, proporcionando melhoria na renda das famílias em

consonância com o uso racional dos recursos naturais disponíveis nessas comunidades.

As ações desenvolvidas pelo Ides em toda a região do Baixo Sul contribuíram para que o CRA o

identificasse como potencial parceiro para a gestão da APA do Pratigi. Inicialmente essa parceria

deu-se sob forma de articulação regional, por meio de um Termo de Cooperação Técnica entre

as Prefeituras de Igrapiúna, Ituberá e Nilo Peçanha (primeiros municípios a serem abrangidos

pela APA).

Posteriormente a esse Termo de Cooperação Técnica foi celebrado o Termo de Parceria

CRA/Ides (pioneiro no Brasil), possibilitando o repasse de recursos governamentais à Oscip

para administrar a APA do Pratigi sob todos os aspectos legais, ficando somente a cargo do

CRA as ações de fiscalização punitiva e processos de licenciamento ambiental.

Na condição de co-gestor da APA do Pratigi, o Ides elaborou um Plano de Trabalho com o

foco voltado para a proteção da biodiversidade, de forma a assegurar a sustentabilidade do uso

dos recursos naturais com ênfase na qualidade de vida e no exercício da cidadania,

estabelecendo diretrizes entre as quais podem-se destacar:

• A sensibilização e a mobilização dos diversos segmentos da sociedade, que estão

contextualizados na dinâmica que envolve a APA do Pratigi, quanto à necessidade

de mudar a prática inadequada no manejo dos recursos naturais;

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• O estímulo à participação e à organização comunitária na busca de soluções

concretas e viáveis;

• O fortalecimento da parceria entre a APA do Pratigi, as organizações não

governamentais, agências financiadoras, lideranças políticas dos municípios

envolvidos e demais instâncias do governo;

Seu programa de ação é abrangente e insere uma gama de atividades complementares com vistas

à consecução do desenvolvimento local. Dentre as ações propostas destacam-se as seguintes:

• Preservar a diversidade biológica mediante a ampliação da APA do Pratigi, incluindo os

estuários e a sede do município de Igrapiúna, além da Bacia do Rio Juliana; elaboração

do plano de manejo da Bacia do Rio Juliana e formação do seu Comitê Gestor;

• Desenvolver ações que visem à vigilância e à prevenção de agressões ambientais;

• Promover a organização socioprodutiva, estimulando a criação e a estruturação de

associações e cooperativas nas comunidades pesqueiras;

• Desenvolver atividades de educação ambiental, nas escolas estaduais e municipais por

através de oficinas de sensibilização e cursos de capacitação e vivência para educadores;

• Divulgar o Plano de Gestão da APA do Pratigi elaborado em parceria - Sudetur, CRA e

IDES - nas prefeituras e bibliotecas públicas, e disponibilizar as informações do Plano

de Manejo da área protegida para toda a comunidade;

• Captar recursos para os projetos (Capacitação e Vivência dos Conselhos Municipais de

Meio Ambiente dos municípios que integram a APA do Pratigi, Campanha de

Sensibilização nas Comunidades Estuarinas da APA do Pratigi, Cadeia Produtiva do

Artesanato no Baixo Sul);

• Estimular o fortalecimento dos Conselhos Municipais de Meio Ambiente;

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• Promover ações articuladas com as Prefeituras, Promotorias Municipais locais e a

Universidade Federal de Viçosa, visando à melhoria do saneamento básico, mediante a

construção de uma Usina de Reciclagem e Compostagem.

Para desenvolver as ações previstas no Termo de Parceria foi contratada uma equipe composta

por uma bióloga, coordenadora de projetos, um técnico agrícola e dois vigilantes ambientais,

além da administradora da APA, engenheira florestal, mantida através do Termo de Cooperação

Técnica com as Prefeituras.

No entendimento do Ides, para cumprir os principais objetivos de uma Área de Proteção

Ambiental, além da parceria com o CRA, que permitiu aliar equipe técnica e infra-estrutura

adequada (veículo tracionado, barco, motocicleta, etc.) outras parcerias seriam necessárias ao

desenvolvimento de suas atividades.

Nesse sentido, algumas instituições têm contribuído, seja financiando projetos ou mediante

Convênios de Cooperação Técnica, a exemplo do Sebrae, Prefeituras Municipais, Ministério do

Meio Ambiente, Fundo Mundial para a Natureza – WWF, Universidade de Nova York – Suny,

Instituto Internacional de Educação do Brasil – IIEB, Embaixada da Holanda, Fundação O

Boticário de Proteção à Natureza e Secretarias Estaduais, entre outras.

Para as ações de fiscalização da APA, foi estabelecida uma parceria com o Ibama, Polícia Militar

e a Polícia Cívil, permitindo dessa forma a averiguação de denúncias, a apreensão de veículos e

cargas, autuação e até a aplicação de multas, uma vez que a equipe da APA não possui

credenciamento para realizar a fiscalização punitiva, podendo somente agir de forma preventiva

e educativa.

O Ides ressalta que, das cinco áreas em que atua, quatro estão estreitamente ligadas às ações e

parcerias proporcionadas pelo Termo de Parceria, sendo elas: Área de Identificação,

Formação e Desafio de Adolescentes Protagonistas, com a qual, além de manter um

adolescente aprendiz na sede, a APA desenvolve ações com outros adolescentes da região,

fazendo com que estes sejam protagonistas e formadores de opinião, com foco na área

ambiental; Política social, com a qual pretende microrregionalizar a gestão ambiental do Baixo

Sul da Bahia; Cadeias Produtivas da Maricultura e do Palmito de Pupunha, gerando

oportunidade de trabalho e renda através de modelos econômicos sustentáveis; e a própria área

ambiental, a qual, além da gestão da APA do Pratigi, ainda possui um Programa de

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Monitoramento da Bacia Hidrográfica do Juliana, que visa à promoção do desenvolvimento

local integrado e sustentável da região, a partir de ações de educação ambiental e organização

socioprodutiva de produtores rurais da região.

Observa-se que o Termo de Parceria com o Ides proporcionou não apenas a ampliação de

parcerias conjugadas com outras instituições, através de projetos e convênios, mas também

permitiu a integração da área ambiental com outros programas e projetos do próprio Ides.

Para o cumprimento do Plano de Ação elaborado para a APA do Pratigi, as ações previstas

tiveram como foco atividades de Educação Ambiental e Capacitação Específica. No entanto,

outras ações paralelas e complementares a estas também têm sido desenvolvidas, conforme a

seguir:

Educação Ambiental

• Campanha de sensibilização nas comunidades estuarinas (parceiros: Embaixada da

Holanda, Fundação O Boticário de Proteção à Natureza – FBPN);

• Educação Ambiental nas comunidades rurais (parceiros: WWF/IIEB/SUNY e FBPN);

• Trilhas Interpretativas para alunos da rede pública e privada de educação;

• Jornal e Programa de Rádio.

Capacitação Específica

• Artesanato de fibras naturais (parceiros: Sebrae, WWF/IIEB/SUNY);

• Capacitação dos Conselhos Municipais de Meio Ambiente

• Capacitação de Adolescentes para o ajardinamento e Projeto Praia Limpa é Praia Viva

(parceiros: WWF/IIEB/SUNY);

• Capacitação de Adolescentes para o Monitoramento da Bacia do Rio Juliana (Parceiros:

MMA e Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos – SRH);

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• Organização Socioprodutivo nas Comunidades Rurais (Parceiros: WWF/IIEB/SUNY)

Outras Ações

• Sinalização do Centro de Informações Turístico-Ambientais e Recuperação de Área de

Manguezal (parceria: Superintendência de Desenvolvimento Turístico – Sudetur, e

Secretaria de Meio Ambiente- Ituberá);

• Plano de Manejo da área ampliada da APA (parceiros: Projeto Corredores Ecológicos –

PPG7 – MMA e Banco Mundial).

A partir do Termo de Parceria, junho de 2001, pode-se verificar conforme os relatórios

apresentados pelo Ides, o aumento de denúncias de crimes ambientais; a busca de informações

sobre legislação ambiental; a pesquisa científica e escolar; a solicitação de fiscalização ambiental

e orientações referentes a construções e manejo dos recursos florestais e pesqueiros; divulgação

e reconhecimento da APA.

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4 - EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO INSTRUMENTO EM UM

PROCESSO DE GESTÃO PARTICIPATIVA

Neste capítulo, serão apresentados os referenciais teóricos que nortearam o desenvolvimento

deste trabalho, através de uma pesquisa direcionada para temas específicos que possibilitem uma

melhor compreensão sobre a complexidade, a evolução, o papel e as dimensões da educação

ambiental, bem como a gestão participativa, políticas públicas para Unidades de Conservação e

legislação pertinente.

4.1 - ENTENDENDO A QUESTÃO AMBIENTAL

As questões ambientais começaram a emergir como problema na década de 70. Estas podem ser

entendidas como as contradições existentes entre o modelo de desenvolvimento econômico

vigente e a capacidade de suporte dos sistemas naturais e sociais.

Esse modelo assinala para uma crise ambiental, sendo a sua origem atribuída ao sistema cultural

da sociedade industrial, cujo paradigma norteador da estratégia desenvolvimentista, pautada pelo

mercado competitivo como a instância reguladora da sociedade, oferece uma visão de mundo

unidimensional, utilitarista, economicista e de curto prazo da realidade, onde o ser humano

ocidental percebe-se numa relação de exterioridade e domínio da natureza (LAYRARGUES,

1999).

Até a década de 70, a lógica do sistema econômico não atribuía ao meio ambiente a importância

que lhe era devida e não atentava para a sua complexidade. Acreditava-se que havia fontes

inesgotáveis de matéria-prima e energia para alimentar o sistema, e que o processo de produção

converteria todos os insumos em produtos, e não existiriam, portanto, resíduos indesejáveis.

Segundo a lógica econômica clássica desenvolvida pela sociedade ocidental, a natureza é vista

apenas como um meio de produção de riquezas.

Para alguns autores, como por exemplo Sachs, Capra, Morin etc., esses dilemas contemporâneos

são entendidos como sinais da crise da modernidade, ou associados por outros autores à pós-

modernidade. No entanto parece haver um consenso com relação aos principais pontos de

ruptura e renovação da sociedade moderna: os limites do crescimento e a construção de novo

paradigma de produção sustentável; a fragmentação do conhecimento e a emergência da teoria de

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sistemas e o pensamento da complexidade; o questionamento à concentração do poder do

Estado e do mercado, e as reivindicações dos cidadãos por democracia, equidade, justiça,

participação e autonomia.

Esses pontos de ruptura evidenciam um questionamento sobre os paradigmas do conhecimento,

bem como os modelos societários da modernidade, implicando na necessidade de construir outra

racionalidade social, orientada por novos valores e saberes; por modos de produção sustentados

em bases ecológicas e significados culturais; e por novas formas de organização democrática

(LEFF, 1999).

Emergem a busca de novos caminhos, coerentes com as necessidades internas de cada nação e

com o imperioso fortalecimento das relações entre as diferentes nações. A preocupação das

sociedades passa a ser conciliar o desenvolvimento e assegurar a integridade ambiental. O marco

ecológico e ambiental concorre decisivamente para influenciar a criação de políticas públicas.

Para fazer frente a essas questões, estruturas estatais foram sendo criadas para regulamentação e

para a fiscalização das atividades causadoras de danos ao meio ambiente. A questão ambiental,

pela sua complexidade, é entendida pelos neoliberais, até os mais radicais, como atribuição do

Estado, devendo este definir as regras do jogo econômico e assegurar o seu cumprimento.

(BURSZTYN, 1993).

É evidente que ações regulamentadoras e fiscalizadoras não são suficientes para o enfrentamento

dessas questões que implicam mudanças de ordem econômica, política e cultural, que, por sua

vez, não têm ressonância se não houver uma transformação dos modos de ser e ter das pessoas.

Ainda que, como assinala BURSZTYN (1993), essas duas dimensões não possam ser

excludentes, mas, sim, complementares.

4.1.1 - A questão ambiental em debate

Em torno da questão ambiental, uma nova tendência foi assinalada a partir do Relatório

Brundtland (1987), mediante o esforço da Comissão Mundial de Meio Ambiente das Nações

Unidas, que, após analisar os conflitos entre desenvolvimento econômico e proteção ambiental,

promoveu uma série de discussões e mobilização política, introduzindo a temática ambiental nos

debates sobre política econômica, relações internacionais e em outros temas de difícil penetração.

A partir desse Relatório, que deu origem ao livro intitulado Nosso Futuro Comum (1988), surge o

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conceito “Desenvolvimento sustentável” como sendo “aquele que atende às necessidades do

presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem às suas próprias

necessidades” (FERREIRA, 1998).

Segundo Ferreira (1998), na América Latina e Caribe essa tendência de incluir a questão

ambiental como tema para debate se repete. O Programa das Nações Unidas para o

Desenvolvimento (Pnud), em ação conjunta com o Banco Interamericano de Desenvolvimento

(BID) trouxe o debate internacional para a perspectiva regional, apontando as peculiaridades e

dificuldades de compatibilização das políticas ambientais e dos programas de desenvolvimento

em países do Terceiro Mundo. Cita o documento:

O desafio é elaborar uma estratégia de desenvolvimento que leve em

consideração o vínculo entre pobreza e desenvolvimento. Na nossa região... a

pobreza é causa e deterioração ambiental. Os anos 80 representaram para a

região uma “década perdida”, pois em um número considerável de nossos

países a receita se reduziu em níveis de uma, duas ou até três décadas atrás.

Nesse contexto, a recuperação do crescimento e do desenvolvimento é uma

condição necessária que deve ser atendida para fazer frente a problemas

ambientais prementes (Pnud e BID, 1991).

O enfrentamento dessas questões, que se apresenta como um grande desafio, principalmente nos

países da América Latina, requer a adoção de um conjunto de medidas que viabilizem um

processo político de educação, informação e cultura. Um processo que possa colocar em prática

os conhecimentos produzidos, organizados e sistematizados; que contribua para a formação de

pessoas dotadas de comportamento político-crítico, com liberdade para possuir seus meios de

vivências mais igualitários e com perspectivas de alternativas políticas que lhes garantam viver de

forma sustentável (FERREIRA,1998).

No Brasil, o debate ambiental sofre uma mudança acentuada a partir de 1990, já não se dissocia

proteção ambiental de desenvolvimento econômico, a questão em debate tem o foco voltado

para como compatibilizar o desenvolvimento econômico com a conservação ambiental

vislumbrando um cenário de sustentabilidade. Essa mudança pode ser atribuída a três

acontecimentos marcantes: as queimadas na Amazônia, a morte de Chico Mendes (líder

sindicalista) e a realização da Conferência Internacional sobre Desenvolvimento e Meio

Ambiente, que viria a acontecer em 1992. A partir daí consolida-se no País, de forma ostensiva,

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um planejamento voltado para a questão ambiental, mesmo que horizontalmente, desarticulado

entre os vários setores do governo.

4.1.2 - Educação, uma nova demanda ambiental

A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano (Estocolmo, 1972)

contribuiu decisivamente para o surgimento de políticas de gestão ambiental e, em especial,

chamou a atenção para a necessidade de se criar um “Programa Internacional de Educação

Ambiental”. A recomendação nº 96 da Conferência reconhecia o desenvolvimento da Educação

Ambiental como um dos elementos críticos para o combate à crise ambiental.

No âmbito das preocupações das instituições públicas, tanto nacionais como internacionais, a

Organização das Nações Unidas para a Educação e a Cultura (Unesco), em 1975, em colaboração

com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), criou o Programa

Internacional de Educação Ambiental (PIEA), destinado a promover, nos países membros, a

reflexão, a ação e a cooperação internacional.

Vale destacar que o enfoque pedagógico tecnicista, vigente à época, e o conteúdo voltado

especialmente para a área das ciências naturais impediu que o PIEA avançasse em relação à

integração dos aspectos sociais nas questões ambientais e o desenvolvimento de alternativas

pedagógicas que permitissem a compreensão da complexidade do tema.

Dos diversos seminários e oficinas promovidos pela Unesco e o Pnuma, em diversos países, para

tratar sobre o tema merece destaque o Seminário Internacional de Educação Ambiental, realizado

em Belgrado, capital da antiga Iugoslávia (1975), tendo como resultado a “Carta de Belgrado”,

que estabeleceu como meta ambiental “melhorar as relações ecológicas, incluindo as do homem

com a natureza e as dos homens entre si.” E, como meta da Educação Ambiental, “garantir que

a população mundial tenha consciência do meio ambiente e se interesse por ele e por seus

problemas conexos e que conte com os conhecimentos, atitudes, motivação e desejos necessários

para trabalhar individual e coletivamente na busca de soluções dos problemas atuais e para

prevenir os que possam aparecer.”

A Carta de Belgrado (1975) indicava para a necessidade de se repensar o modelo de

desenvolvimento e o conceito de “qualidade de vida”, que não significa, necessariamente,

abundância de recursos materiais, mas a forma como o homem relaciona-se com os recursos à

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sua disposição, devendo este evitar o desperdício, os excessos e a imprevidência, causadores da

pobreza e da miséria social.

A Unesco e o Pnuma ampliam a discussão sobre o tema promovendo a primeira Conferência

Intergovernamental sobre Educação Ambiental, realizada em Tbilisi, na Geórgia, em 1977. Os

pontos enfocados mais importantes foram: os principais problemas ambientais da sociedade

contemporânea; pressupostos da educação para contribuir na resolução dos problemas

ambientais; atividades implementadas em nível nacional e internacional com vistas ao

desenvolvimento da educação ambiental e estratégia de implementação (DIAS, 1992).

Como resultado, a Conferência de Tbilisi (Unesco, 1977) reúne orientações fundamentais a serem

incorporadas ao marco teórico da Educação Ambiental, constituindo-se em um ponto de partida

para muitos países elaborarem seus programas e instituirem políticas públicas de

Após essa Conferência o meio ambiente passou a ser compreendido “não somente como o meio

físico biótico, mas, também, o meio social e cultural, e relaciona os problemas ambientais com os

modelos de desenvolvimento adotados pelo homem.” Enfatiza que a educação ambiental deve

“preparar o indivíduo mediante a compreensão dos principais problemas do mundo

contemporâneo, possibilitando-lhe conhecimentos técnicos e as qualidades necessárias para

desempenhar uma função produtiva com vistas a melhorar a vida e proteger o meio ambiente

considerando os valores éticos.” (Unesco, 1997)

A educação ambiental passa a adotar um enfoque global, interdisciplinar, reconhecendo a

existência de uma profunda interdependência entre o meio natural e o meio artificial. Foram

destacados ainda aspectos importantes no que se refere à função, aos objetivos e aos princípios

norteadores da Educação Ambiental.

A Conferência Internacional sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, realizada no

Rio de Janeiro em 1992, organizada pelas Nações Unidas, representou o ponto alto da

consciência planetária em torno da importância vital de submeter as necessidades do

desenvolvimento aos limites toleráveis pela natureza.

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Com referência à Educação Ambiental, a Declaração do Rio reafirma a Declaração de

Estocolmo, e reconhece que:

A natureza integral e interdependente da Terra, observando o estabelecimento

de acordos internacionais que respeitem os interesses de todos e protejam a

integridade do meio ambiente global e o sistema de desenvolvimento, teve

como objetivo estabelecer uma nova e justa parceria global através da criação

de novos níveis de cooperação entre os Estados e setores importantes da

sociedade.

A Rio-92 reconheceu a necessidade da mútua colaboração entre os países para reequilibrar as

relações do homem com o meio ambiente. Um programa de ações conjuntas com o objetivo de

promover em escala planetária um novo estilo de desenvolvimento foi o compromisso assumido

pelos 179 países, reunidos na Conferência também conhecida como Cúpula da Terra. O

documento produzido, a Agenda 21, que contém princípios e recomendações a serem adotados

para se alcançar o desenvolvimento sustentável, acentua: “[...] as maiores causas da continuada

deterioração do meio ambiente global são os insustentáveis padrões de produção e consumo,

particularmente nos países industrializados”.

A Agenda 21, no seu conteúdo, faz uma crítica ao modelo de desenvolvimento vigente,

considerado injusto socialmente e perdulário do ponto de vista ambiental.

Para fazer frente a esse modelo, a capacitação e a educação ambiental contemplada na Agenda 21

são assinaladas como de fundamental importância para a: "reorientação da educação escolar

básica como condição para o desenvolvimento econômico e social e a conservação do meio

ambiente; ampliação da conscientização pública, que compreende as ações destinadas às

comunidades urbanas e rurais, visando sensibilizá-las sobre os problemas ambientais e de

desenvolvimento, criando canais de participação na busca de soluções urgentes e atribuindo

responsabilidades individual e coletiva em relação ao meio ambiente; e incentivo ao treinamento,

destinado à formação e à capacitação de recursos humanos para atuarem na conservação do meio

ambiente e como agentes do desenvolvimento sustentável”. Para assegurar o pacto estabelecido

na Agenda 21 ficou claro que os governos têm a prerrogativa e a responsabilidade de deslanchar

e facilitar o processo de implementação da Agenda 21 em todas as escalas, estendendo-se essa

convocação a todos os segmentos da sociedade, considerados “atores relevantes” e “parceiros do

desenvolvimento sustentável” .

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O cumprimento da Agenda 21 tem-se manifestado de forma pontual, acentuam-se as diferenças

entre países ricos e pobres, e os países mais desenvolvidos impõem políticas internacionais –

sobretudo financeiras, industriais e comerciais . No Brasil, no âmbito governamental o processo

encontra-se em fase de discussões e debates, apresentação de sugestões e demandas, devendo no

final refletir as contribuições de todos os segmentos governamentais e não-governamentais,

setores empresariais, trabalhistas, políticos e religiosos.

O Ministério da Educação, presente na Rio-92, promoveu um Seminário sobre Educação

Ambiental originando um outro documento, a “Carta Brasileira para a Educação Ambiental” ,

destacando “a necessidade de um compromisso real do poder público federal, estadual e

municipal, no cumprimento da legislação ambiental” (MEC,1992).

Um outro marco importante para a educação ambiental, ainda no âmbito da Rio-92, foi a

realização do Fórum Global, evento paralelo promovido pelas Organizações Não-Governamentais

(ONGs), marcando uma ampla participação da sociedade civil nacional e internacional. Como

resultado foi elaborado o “Tratado de Educação Ambiental para as Sociedades Sustentáveis e

Responsabilidade Global”, contendo os princípios norteadores da Educação Ambiental para o

desenvolvimento sustentável, com ênfase nas ações não formais. Reconhece a “educação como

um processo dinâmico em permanente construção”.

Vinte anos depois de Tbilisi, em 1997 o Brasil realiza a sua primeira Conferência Nacional de

Educação Ambiental, em Brasília, espaço onde se pode refletir sobre as práticas, avaliar

tendências e identificar as perspectivas e estratégias da Educação Ambiental no País. O

documento produzido, a “Declaração de Brasília”, consolida as sugestões de diretrizes políticas

para o tema, tendo sido apresentado na Conferência Internacional sobre Ambiente e Sociedade:

Educação e Conscientização Pública para a Sustentabilidade - Tessalonica, na Grécia, em 1997.

Dentre os pontos abordados, assinala a importância da educação em suas diversas modalidades

como um “meio indispensável para dar a todos homens e mulheres do mundo a capacidade para

conduzir suas próprias vidas, exercitar suas opções pessoais, e a responsabilidade para viver uma

vida sem fronteiras, sejam políticas, geográficas, culturais, religiosas, lingüísticas ou de gênero”.

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Fica evidente, pelas diversas recomendações resultantes dos vários encontros ocorridos ao longo

dessas duas décadas, o reconhecimento da importância do educar para o meio ambiente, a

importância da educação ambiental como processo de mudança que visa criar e desenvolver

novas formas de interação do ser humano com a natureza; não é o suficiente, mas é

imprescindível.

4.1.3 - Educação ambiental- institucionalização no Brasil

A institucionalização da educação ambiental no Brasil tem início a partir da criação da Secretaria

de Meio Ambiente (Sema), em 1973, para atender às exigências internacionais emergentes na área

ambiental.

O processo de educação ambiental desenvolvido pela Sema tem um enfoque interdisciplinar,

voltado para a capacitação de recursos humanos (profissionais dos órgãos estaduais de meio

ambiente e professores universitários), e para a sensibilização da sociedade. Segundo Dias (1999),

as ações de educação ambiental foram extremamente limitadas pelos interesses políticos da

época.

A partir de 1981, a Lei Nº 6.938, que dispõe sobre os fins, mecanismos de formulação e aplicação

da Política Nacional do Meio Ambiente, estabelece no seu décimo princípio: “educação

ambiental a todos os níveis do ensino, inclusive a educação da comunidade, objetivando capacitá-

la para participação ativa na defesa do meio ambiente.” Vale destacar a instituição do Sistema

Nacional de Meio Ambiente (Sisnama) e o Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama),

tendo este uma atuação significativa no estabelecimento de regulamentos e normas da política

ambiental.

No âmbito da política educacional, o então Conselho Federal de Educação (CFE) manifestou-se

através do Parecer 226/87, ressaltando a urgência da “formação de uma consciência pública

voltada para a preservação da qualidade ambiental”, indicando o seu caráter interdisciplinar e

recomendando a criação de Centros de Educação Ambiental no País.

No entanto, só a partir da Constituição Brasileira, de 1988, a educação ambiental passa a ter

maior ênfase e amplitude. É dedicado o Capítulo VI ao Meio Ambiente, em seu Artigo 225,

Inciso VI, destaca a necessidade de “promover a Educação Ambiental em todos os níveis de

ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente”, cabendo essa tarefa ao

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poder público. Ainda no mesmo artigo, referindo-se ao “Meio Ambiente ecologicamente

equilibrado”, amplia essa responsabilidade quando impõe não apenas ao poder público, mas à

“coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e as futuras gerações”. O fato

de a Constituição dedicar um capítulo específico para tratar a questão ambiental reflete a série de

compromissos assumidos pelo Brasil, no âmbito internacional, bem como a pressão dos diversos

segmentos da sociedade civil brasileira, para fazer frente aos problemas ambientais.

A Constituição Federal foi um grande motivador para desencadear no País a inclusão da

Educação Ambiental nas Constituições Estaduais, assim como nas Leis Orgânicas dos

municípios, passando o tema a ser contemplado, a partir daí, nas três instâncias da administração

pública.

Em decorrência da necessidade de uma melhor instrumentalização legal para respaldar as ações

de Educação Ambiental no Brasil, considerando-se o fato de a Educação Ambiental ser um dever

constitucional do Poder Público, e, ainda assim, de esta não estar consolidada como política

pública no País, em 1994 foi criado o “Programa Nacional de Educação Ambiental” (Pronea),

resultado de um esforço conjunto visando à cooperação técnica e institucional na área de

Educação Ambiental, entre os Ministérios da Educação e do Desporto e do Ministério do Meio

Ambiente, com a parceria dos Ministérios da Cultura e da Ciência e Tecnologia.

Os princípios que nortearam o Pronea foram os mesmos estabelecidos, aprofundados e

consolidados na Conferência de Tbilisi, contemplando linhas de ação que acarretam objetivos, e

estratégias apropriadas; subsídios políticos para adequação do programa por outras instâncias da

administração pública; bem como propõe diretrizes para viabilizar ações com a participação da

sociedade civil.

No âmbito educacional, foram criados pelo Mec, em 1996, os Parâmetros Curriculares

Nacionais (PCNs), que consistem na inserção de novos temas no processo de ensino-

aprendizagem, denominados como “Temas de Relevante Interesse Social”, sendo o “Meio

Ambiente” um dos temas que passam a integrar os considerados “Temas Transversais” ao currículo.

A inclusão da variável ambiental nos currículos consiste no entendimento de que a educação

escolar deve estar fundamentalmente voltada para a construção de cidadãos, conscientes de suas

atribuições políticas e sociais, com condições de posicionar-se de forma crítica e responsável nas

diferentes situações sociais. Em termos educacionais essa perspectiva contribui para evidenciar a

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necessidade de um trabalho que esteja em consonância com os princípios da dignidade do ser

humano, da participação, da co-responsabilidade, da solidariedade e da eqüidade.

O grande marco para a história da educação ambiental no Brasil, é atribuída à instituição da

Política Nacional de Educação Ambiental, Lei nº 9.795/99. Resultado de um amplo debate com a

sociedade civil, o documento reflete o entendimento e a compreensão dos princípios e

recomendações obtidos para a educação ambiental ao longo dessas duas décadas.

A Lei nº 9.795/99 apresenta alguns avanços que merecem ser destacados: no art.2º, a educação

ambiental passa a ser reconhecida como um componente permanente da educação nacional,

adquire um espaço privilegiado de ação, inserindo-se no âmbito da educação formal e dos

processos educativos não-formais; no art.3º, ratifica os arts. 205 e 225 da Constituição Federal,

ao estabelecer que o poder público ao definir políticas públicas, deve incorporar a dimensão

ambiental, fortalecer a Educação Ambiental no âmbito escolar e criar mecanismo de participação

para que a sociedade seja um parceiro nos processos de gestão ambiental; quanto à sua execução,

(tratada no art.16), transfere para os Estados e o Distrito Federal a competência de elaborar as

diretrizes a partir de diagnóstico local, cabendo a cada Estado elaborar o seu programa de

educação.

Trata-se de uma lei atual, poiso os princípios da educação ambiental incluíram vários itens como:

incorporaram o enfoque humanista, ampliaram o conceito de meio ambiente, abrangeram as

dimensões socioambientais e culturais, a interdisciplinaridade nos processos pedagógicos, a ética,

a garantia de continuidade e a articulação entre o global e o local. Desta maneira a Educação

Ambiental passa a ser um elemento determinante das políticas públicas, estruturada em princípios

e objetivos claramente definidos, deixando de ser um mero pano de fundo.

Com a regulamentação dessa Lei, através do Dec. nº 4.281/02, no seu artigo 7º fica explícito que

caberá aos órgãos gestores da política, MMA/MEC e aos seus órgãos vinculados, ao elaborar os

seus respectivos orçamentos, consignar recursos para esse fim.

A questão orçamentária para a implementação da política nacional de Educação Ambiental

sempre esteve presente nas preocupações das instituições públicas e Organizações Não-

Governamentais, que atuam na área desenvolvendo programas e projetos ambientais, visto que

esse quesito não era mencionado na Lei.

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Trata-se de uma preocupação pertinente. Ferreira (1998) observa que há no Brasil uma grande

diferença entre a realidade e a retórica traduzida numa legislação ambiental que acompanha a

experiência internacional e possui novos instrumentos extremamente sofisticados. Entretanto, as

condições de real aplicação são ainda extremamente restritas.

No Brasil, há muitos indicativos de leis que, quando são pouco delimitadas, acabam não se

consolidando. Há um distanciamento entre a retórica e a prática.

Ao longo dos últimos 20 anos, foi possível acompanhar a evolução da educação ambiental, que

incorporou ao seu conceito a complexidade das inter-relações sistêmicas da problemática

ambiental, a análise de suas potencialidades socioculturais e ambientais e a necessidade de

construção de novas formas de relação dos homens entre si e com a natureza, formulados a partir

do paradigma da sustentabilidade.

A educação contemporânea apresenta-se como um grande desafio, deve promover mudanças que

contribuam para formação e transformação de educadores e educandos. Nesse processo, é

fundamental o compromisso e a competência do educador, que deverá ser capaz de contribuir

para que o educando possa estar consciente do seu papel na teia da vida, considerando todas as

inter-relações com os outros seres vivos do planeta.

É notório, também, que a educação ambiental cresce definitivamente em importância no cenário

nacional, mas a implementação dessa política ainda se depara com uma série de dificuldades por

conta da degeneração das instituições, da carência de pessoal qualificado, sem contar que ainda há

uma cultura burocrática do Estado, marcada pela ausência de continuidade de políticos e

dirigentes, comprometendo, por sua vez, a implementação das ações de educação ambiental que

devem ser contínuas, permanentes e integradoras.

O momento é de se buscar alternativas, e nesse aspecto a educação, em especial, a educação

ambiental, é um dos caminhos a ser adotado como estratégia para a promoção desse processo de

transição rumo a uma sociedade sustentável, mais harmônica e solidária.

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4.1.4 - Educação ambiental, um caminho para a participação ética e cidadã

Podemos afirmar que a educação ambiental é uma área do conhecimento relativamente nova e,

pela complexidade que permeia a questão ambiental, a sua construção vem-se desenvolvendo na

prática cotidiana dos “educadores ambientais”.

A formulação de um conceito de educação ambiental tem variado ao longo do breve tempo de

vida desta modalidade pedagógica, levando a que a adoção de um ou outro conceito acabe por

atender às diversidades que estão no bojo da temática ambiental, que variam também segundo a

formação e experiência profissional de quem as formula. E essa atitude de estar aberto significa

um profundo respeito às diferenças, à valorização do saber do outro, que é diferente do nosso,

uma rejeição à prepotência e a busca do diálogo. Enfim, princípios que conduzem a um trabalho

interdisciplinar, um dos pilares da educação ambiental. (LEONARDI,1999).

Como bem colocado por Layrargues (2002), atualmente não é mais possível entender a educação

ambiental no singular, como um novo modelo de educação que simplesmente se opõe a uma

educação convencional que não é ambiental, nem tampouco referir-se à educação ambiental de

forma genérica, sem qualificá-la com precisão.

A educação ambiental foi classificada por Sorrentino (2000) em quatro vertentes, levando em

consideração teoria e prática, a saber: conservacionista, educação ao ar livre, gestão ambiental e

economia ecológica. O autor vai mais além ao classificar as diferentes formas de se fazer

educação ambiental em quatro grandes conjuntos de temas e objetivos; São eles:

biológicos: proteger, conservar e preservar espécies, ecossistemas e o planeta como um todo;

espirituais/culturais: promover o autoconhecimento e o conhecimento do universo, segundo

uma nova ética fundamentada em valores como verdade, integridade, diversidade cultural, visão

global e holística;

políticos: buscam desenvolver a democracia, a cidadania, participação popular, diálogo e

autogestão;

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econômicos: defendem a geração de empregos em atividades “ambientais”, não alienantes e não

exploradoras do próximo, bem como a autogestão e participação de grupos e indivíduos nas

decisões políticas;

O autor conclui que a somatória desses quatro conjuntos de temas/objetivos possa convergir

para um grande objetivo geral da educação ambiental: “contribuir para a conservação da

biodiversidade, para a auto-realização indivídual e comunitária e para a autogestão política e

econômica, através de processos educativos e participativos que promovam a melhoria do meio

ambiente e da qualidade de vida” (SORRENTINO, 2000).

Sobre as questões metodológicas que norteiam a educação ambiental, o Seara (1992) chama a

atenção para três aspectos quanto ao enfoque a ser adotado no processo educativo – a sua

amplitude, seu lugar no currículo, e a participação comunitária.

No entendimento do autor, a educação se constitui em um “processo pedagógico que orienta o

indivíduo na expressão de suas potencialidades, conjuga uma série de meios e métodos para

desenvolver no educando sobretudo sua capacidade crítica, seu espírito de iniciativa e seu senso

de responsabilidade”.

Considera, ainda, que esses também são os objetivos assumidos pela Educação Ambiental, com

o propósito de “formar uma cidadania com visão objetiva do funcionamento da sociedade,

motivada para a vida coletiva e consciente de que a qualidade de vida das gerações futuras

depende das escolhas que o cidadão fizer em sua própria vida”.

Ao analisar a amplitude da educação ambiental, o autor faz uma série de reflexões sobre o que

diferencia a educação ambiental da educação geral e as fronteiras que a delimitam e, para ilustrar,

se utiliza de uma expressão colocada por Tanner, de que são as “ligações ecológico-ambientais”

atribuídas a um determinado assunto, que demarcam esses limites.

Um outro aspecto relevante, considerado pelo autor, é quanto à educação ambiental e à

participação comunitária, ao destacar que “a educação não pode ser um processo fechado e

pronto, imposto para a comunidade, mas um processo participativo com a comunidade”.

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E, como tal, essa educação deve ter como base uma perspectiva crítica, contextualizada e

transformadora, propiciando o caráter formativo e não só informativo da Educação, bem como

uma prática voltada para as diferentes realidades de vida, conforme mencionado por SALOMÃO

(2001), ao citar ANDRADE (1993), em sua Dissertação de Mestrado.

O desenvolvimento da educação ambiental, tanto nas modalidades do ensino formal e não-

formal, envolve uma série de abordagens metodológicas diferenciadas, com enfoques apropriados

para cada comunidade. “Uma prática educativa descontextualizada, sem respeito aos princípios

pedagógicos e educacionais, gera resultados inócuos e, muitas vezes, duvidosos em termos

qualitativos”(LOUREIRO, 2003).

A vinculação da educação ambiental tem sido uma constante, tanto em documentos como nas

práticas, voltadas para a formação da cidadania e reformulação de valores éticos e morais,

individuais e coletivos, necessários para a manutenção da vida no planeta.

Cidadania implica a posse de direitos civis, políticos e sociais. Cidadania tem a ver com a

consciência do sujeito de pertencer a uma coletividade e também com a consciência de possuir

uma identidade, que não é só individual mas também coletiva. O direito ao meio ambiente é

novo, na relação dos direitos conquistados pelos cidadãos ao longo da história da humanidade. É

muito recente a idéia generalizada da natureza como um bem a ser preservado, finito, cabendo ao

homem o direito e o dever de preservá-la.

A educação ambiental como formação de cidadania ou como exercício de cidadania tem a ver,

portanto, com uma nova maneira de encarar a relação homem/natureza, com a reintegração do

homem na natureza. “E a cidadania é algo que deve ser vivido como uma necessidade interior e

subjetiva, impulsionada por um sentimento de pertencimento, e não mera formalidade”

(MOURÃO, 1998).

O Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global

ilustra com muita propriedade esses valores que a educação ambiental propõe-se a formar:

A educação ambiental, para uma sustentabilidade eqüitativa, é um processo de

aprendizagem permanente, baseado no respeito a todas as formas de vida. Tal

afirmação resgata valores e ações que contribuem para a transformação humana

e social e para a preservação ecológica. Ela estimula a formação de sociedades

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justas e ecologicamente equilibradas, que conservam entre si relação de

interdependência e diversidade. Isto requer responsabilidade individual e

coletiva em nível local, nacional e planetário.

E mais:

A educação ambiental é individual e coletiva. Tem o propósito de formar

cidadãos com consciência local e planetária, que respeitem a autodeterminação

dos povos e a soberania das nações. Ela deve estimular a solidariedade, a

igualdade e o respeito aos direitos humanos, valendo-se de estratégias

democráticas e interação entre as culturas.

A educação ambiental valoriza as diferentes formas de conhecimento. Este é

diversificado, acumulado e produzido socialmente, não devendo ser patenteado

ou monopolizado. Ela deve promover a cooperação e o diálogo entre

indivíduos e instituições, com a finalidade de criar novos modos de vida,

baseados em atender às necessidades básicas de todos, sem distinções étnicas,

físicas, de gênero, idade, religião, classe ou mentais.

Ficam muito claros a amplitude, a complexidade e o desafio da educação ambiental, que tem

como cerne a cidadania planetária, plena e crítica, exigindo cada vez mais a adequação e

reformulação de práticas e políticas públicas que possibilitem a concretização de um novo

modelo societário e civilizacional pautado na ética ecológica e na justiça social.

LOUREIRO (2000) assinala ser necessário retomar alguns pressupostos básicos norteadores da

prática em educação ambiental, presentes nos principais documentos oficiais nacionais e

internacionais, para que haja um melhor entendimento da relação estabelecida entre Educação

Ambiental, Ética e Cidadania, quais sejam:

• Unidade Ecológica (visão holística e de totalidade): O que se propõe na educação

ambiental é a compreensão de que a totalidade é mais do que as partes somadas, é o

conjunto destas partes em suas relações dinâmicas e dialéticas. É necessário o

entendimento de que a vida, tal como a temos hoje, decorre de interações entre os

elementos vivos e não-vivos do planeta, inexistindo uma natureza neutra e passiva e uma

humanidade independente dos limites naturais.

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• Interdisciplinaridade: O que se propõe na educação ambiental é o respeito mútuo entre as

diferentes experiências de vida e formas de saber e a análise globalizante dos problemas,

através de um conhecimento integrado e interdisciplinar. Seu maior objetivo é

desenvolver no indivíduo um processo de pensamento que o torna capaz de, frente a

novos objetivos de conhecimento, buscar uma nova síntese. O trabalho deve ser

integrado e planejado coletivamente para que o educando/cidadão perceba a

complexidade do ambiente em que vive e seja capaz de agir neste. A sua abordagem deve

utilizar-se da contribuição das várias disciplinas (conteúdo e método) para construir uma

base comum de compreensão e explicação do problema tratado e, desse modo, superar a

compartimentação do ato de conhecer, provocada pela especialização do trabalho

científico. “A construção da interdisciplinaridade deve ser pautada no diálogo, no respeito

às diferenças, e na humildade” (LEONARDI, 1999).

• Participação: O que se propõe na educação ambiental é uma participação com igualdade

no processo, é o respeito pelas experiências acumuladas pelos indivíduos, é a construção

coletiva em busca da cidadania plena e da autopromoção (conhecimento e a valorização

de si mesmo, pois o ser se valoriza na medida em que conquista seus direitos, supera suas

alienações e está ciente de suas responsabilidades sociais, a partir de relações que formem

compromissos para a superação dos problemas existentes). “É através da participação que

sedimentamos as metas de autogestão, democracia, liberdade e convivência” (DEMO,

1998).

• Caráter Permanente: A educação ambiental deve se constituir em um processo contínuo e

permanente, tendo que ocorrer durante todos os momentos e em todos os espaços

sociais e pedagógicos; não deve restringir-se apenas ao período escolar, mas ao longo de

toda a vida de cada indivíduo, de forma a lhe garantir a informação, atualização e

capacitação para lidar com cada situação que se apresente nos diversos espaços sociais em

que vive e atua. Para melhor ilustrar, SALOMÃO (2001) cita HOMEM D`EL REY, para

quem a Educação Ambiental “é um processo de autoconhecimento e autotransformação

do ser humano”.

• Adequação do Processo Educativo à Realidade Cotidiana: A Educação Ambiental deve

propiciar a compreensão dos grandes problemas, a partir do concreto, do imediato, com

vistas a possibilitar a construção de um sentido válido no discurso ambiental

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desenvolvendo um senso de pertencimento ao educando e à comunidade de determinada

localidade e à sociedade. Para entender e valorizar a história do local é necessário

construir a devida identidade comunitária. “É preciso ser um cidadão local para sê-lo no nível

planetário” (LOUREIRO, 2000).

• Sensibilização, Aquisição de Conhecimentos e Habilidades Necessárias na Tomada de

Iniciativas no Ambiente: Para uma melhor compreensão desse pressuposto, o autor o

apresenta de modo esquemático:

1. A sensibilização em um processo de educação ambiental se constitui em uma etapa

primordial, é o momento de despertar a atenção da comunidade para que se mobilize

para o problema, que só o é na medida em que é aceito como tal. Um problema é

construído e definido socialmente.

2. Para poder agir sobre um problema definido é preciso ter conhecimento acerca deste.

3. Contudo, para mudar a realidade confrontada, não basta estar mobilizado e saber a sua

complexidade. É preciso ser capaz de agir, estar devidamente instrumentalizado para isto,

criando habilidades e competências.

4. Porém, mesmo com todos estes passos preenchidos é fundamental que o cidadão tenha

dois outros elementos: condições materiais para agir e o estímulo coletivo necessário, o

que torna evidente a pertinência de todos os outros pressupostos e a relação da

educação com as demais lutas sociais emancipatórias. A mudança envolve a articulação

entre o que podemos fazer como pessoa e o que é de caráter coletivo, espaço onde

atuamos, modificando-o e sendo modificado.

De uma forma geral, os princípios colocados por LOUREIRO (2002) nos sugerem ser

necessário focar as ações educativas para o resgate de alguns valores individuais e coletivos que

podem estar adormecidos, para que seja possível uma ultrapassagem da fase da denúncia, em

direção à fase da ação. É preciso que criemos e recriemos o sentimento de pertinência. O

reconhecimento de que somos seres planetários é que poderá nos mover para ações estratégicas

de sustentabilidade.

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4.2 - POLÍTICA DE MEIO AMBIENTE PARA UNIDADE DE CONSERVAÇÃO

No Brasil, ao final da década de 70, algumas organizações conservacionistas já sinalizavam

interesse pelo estabelecimento de áreas protegidas que permitissem o desenvolvimento de

pesquisas direcionadas às ciências ambientais, em especial à biota, contextualizada à realidade do

País. Concomitantemente, pensava-se em uma estratégia que pudesse compatibilizar a

conservação dos ecossistemas relevantes em domínios da propriedade privada, sem

desapropriação por parte do Estado.

Dessa forma, surge a categoria de manejo Área de Proteção Ambiental – APA, proposta pelo

então dirigente da Secretaria Especial de Meio Ambiente, Dr. Paulo Nogueira Neto, com base

em experiências com objetivos semelhantes, em alguns Parques Naturais da Europa.

Através da Lei Federal nº 6.902, de 27 de abril de 1981, a categoria APA foi criada e assim

definida: “áreas do território nacional de interesse para a proteção ambiental, a fim de assegurar

o bem-estar das populações humanas e conservar ou melhorar as condições ecológicas locais”.

4.2.1 - Sistema Nacional de Unidade de Conservação

A partir da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de

Conservação – Snuc, são estabelecidos “critérios e normas para a criação, implantação e gestão

das unidades de conservação”, regulamentando o art. 225 da Constituição Federal de 1988,

parágrafo 1º, onde cabe ao Poder Público:

I – preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das

espécies e ecossistemas;

II – preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as

entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;

III – definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes, a

serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de

lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua

proteção;

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IV – exigir na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de

significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará

publicidade.

A Lei que institui o SNUC define Unidade de Conservação (art. 2º) como: “... espaço territorial

e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais

relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites

definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de

proteção”.

Para melhor atender os objetivos das Unidades de conservação, que implica na preservação da

integridade do patrimônio natural e da diversidade biológica, estas foram classificadas em duas

categorias, considerando as suas especificidades quanto ao atendimento das necessidades de

determinados grupos sociais e uso sustentável dos recursos naturais. São as Unidades de

Conservação de Uso Integral e de Uso Sustentável.

O foco desse trabalho está voltado para Área de Proteção Ambiental, que integra a categoria de

unidade de conservação de uso sustentável, definida pela lei nº 9.985/00, como “... área

geralmente extensa, com um certo grau de ocupação humana, dotada de atributos abióticos,

bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar

das populações humanas, e tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica,

disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais”.

À primeira vista, esse tipo de unidade de conservação, quanto ao seu processo de gestão parece

ser mais simples, tendo em vista que não passa pelo enfrentamento dos conflitos gerados pela

desapropriação, mas certamente que outros se apresentam já que é uma categoria que estabelece

normas de uso, através de zoneamento, em áreas privadas, e sob este aspecto é imprescindível o

diálogo com os diversos atores envolvidos, que por sua vez possuem diversos interesses.

Sob esse aspecto, o grande desafio é criar mecanismos que favoreçam a integração dos grupos

sociais “ocupantes da área”, no processo de preservação ambiental e na busca de alternativas

sustentáveis, que garantam efetivamente a sobrevivência humana. Evidentemente, esse processo

implica no envolvimento, na participação efetiva e no estabelecimento de parcerias e co-

responsabilidade de todos os segmentos da sociedade.

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O instrumento legal, que prevê o estabelecimento de APAs, define para esta modalidade de

gestão integrada e democrática a formação de Conselhos gestores, considerado como o espaço

público adequado para o fórum em questão.

Segundo o Sistema Nacional de Unidade de Conservação, a APA disporá de um “Conselho

presidido pelo órgão responsável por sua administração e constituído por representantes dos

órgãos públicos, de organizações da sociedade civil e da população residente”.

O Snuc prevê, no caso de Unidades de Conservação de uso sustentável, que o Conselho seja

deliberativo apenas em reservas extrativistas e em reservas de desenvolvimento sustentável, sem

definir as demais.

Contudo, com a regulamentação do Snuc, através do Decreto nº 4.340, de 22 de agosto de 2002,

esperava-se uma definição para as demais categorias, a exemplo de Áreas de Proteção

Ambiental, quanto ao poder que seria dado ao Conselho - Consultivo ou Deliberativo. Observa-

se, no entanto, uma ratificação e não uma definição quanto ao aspecto levantado, conforme

esclarece o Capítulo V dedicado ao Conselho, no art. 17:

“As categorias de Unidade de Conservação poderão ter, conforme a Lei nº 9.985, de 2000,

conselho consultivo ou deliberativo que serão presididos pelo chefe da Unidade de Conservação,

o qual designará os demais conselheiros indicados pelos setores a serem representados”.

Ainda nesse mesmo art., estabelecem-se indicativos quanto à composição do conselho que deve

ter as seguintes representações, quando couber:

• A representação de órgãos públicos - instituições de meio ambiente das três instâncias,

municipal, estadual e federal; e instituições afins (pesquisa científica, educação, defesa

nacional, cultura, turismo, arqueologia, povos indígenas e assentamentos agrícolas);

• A representação da sociedade civil – comunidade científica, e organizações não-

governamentais ambientalistas com atuação comprovada na região onde está inserida a

unidade de conservação, população residente e do entorno, população tradicional,

proprietários de imóveis no interior da unidade, trabalhadores e setores privados

atuantes na região e representantes dos Comitês de Bacia Hidrográfica.

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Sugere, ainda, que a representação dos órgãos públicos e da sociedade civil nos conselhos deve

ser, sempre que possível, paritária, de acordo com as peculiaridades regionais.

As competências do conselho gestor de unidade de conservação são estabelecidas no art. 20,

cabendo ao mesmo:

“I – elaborar o seu regimento interno, no prazo de noventa dias, contados a partir de sua

instalação.

II – acompanhar a elaboração, implementação e revisão do Plano de Manejo das unidades de

conservação, quando couber, garantindo o seu caráter participativo;

III – buscar a integração da unidade de conservação com as demais unidades e espaços

territoriais especialmente protegidos e com o seu entorno;

IV – esforçar-se para compatibilizar os interesses dos diversos segmentos sociais relacionados

com a unidade;

V – avaliar o orçamento da unidade e o relatório financeiro anual elaborado pelo órgão executor

em relação aos objetivos da unidade de conservação;

VI – opinar, no caso de conselho consultivo, ou ratificar, no caso de conselho deliberativo, a

contratação e os dispositivos do termo de parceria com Oscip, na hipótese de gestão

compartilhada da unidade;

VII – acompanhar a gestão por Oscip e recomendar a rescisão do termo de parceria, quando

constatada irregularidade;

VII - manifestar-se sobre obra ou atividade potencialmente causadora de impacto na unidade de

conservação, em sua zona de amortecimento, mosaicos ou corredores ecológicos; e

IX – propor diretrizes e ações para compatibilizar, integrar e otimizar a relação com a população

do entorno ou do interior da unidade, conforme o caso.

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4.2.2 - Legislação ambiental no estado da Bahia

No âmbito da política ambiental do Estado da Bahia, a Lei Nº 7.799, de 07/02/2001, define no

seu art. 27 que “a participação da comunidade na gestão da APA dar-se-á através da criação de

um Conselho Gestor ou do estabelecimento de convênio do órgão gestor da APA com

entidades locais e órgãos colaboradores do Sistema Estadual de Meio Ambiente – Seara, com o

objetivo, dentre outros, de promover ações de vigilância, monitoramento, educação ambiental,

realização de estudos, projetos e orientação à população quanto ao cumprimento do

zoneamento ecológico-econômico”.

A regulamentação dessa mesma Lei, através do Decreto nº 7.967, de 05/06/01, no seu art.69,

não deixa dúvidas quanto à questão, e já define que o Conselho Gestor nas APAs criadas por

ato do Poder Público Estadual será de caráter consultivo, devendo ter como membros

representantes de entidades públicas federais, quando for o caso, estaduais e municipais, dos

órgãos colaboradores e de outros representantes da sociedade civil.

Da mesma forma que a Lei Federal, estabelece que a gestão da APA dar-se-á sob a coordenação

de seu órgão administrador, auxiliado pelo Conselho Gestor, e contará com a atuação dos

demais órgãos identificados no seu Plano de Gestão, de modo que seja descentralizada e

participativa.

O art. 75 do Dec. nº 7.967/2001 sinalizou alguns passos norteadores para a formação desse

“Conselho Gestor”.

“Art. 75 – As instituições interessadas em compor o Conselho Gestor serão convocadas

localmente, e/ou através de jornal de grande circulação”.

§ 1º - A indicação dos representantes da sociedade civil dar-se-á em Assembléia específica de

cada representação, sendo escolhido pelos seus pares um titular e um suplente.

§ 2º - Os dirigentes dos órgãos públicos que têm atuação na área da APA indicarão seus

representantes, sendo um titular e um suplente.

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§ 3º - Os representantes das entidades eleitas referidas no § 1º deste artigo deverão apresentar,

até quinze dias antes da primeira reunião ordinária do Conselho, cópia autenticada do ato de

Registro da entidade, lavrado em Cartório, juntamente com os nomes do titular e suplente.

§ 4º Os membros titulares do Conselho e seus suplentes serão nomeados por Portaria do

Diretor Geral do Centro de Recursos Ambientais – CRA, obedecida a indicação de suas

respectivas entidades.

§ 5º - Os membros do Conselho tomarão posse na primeira reunião do colegiado que se realizar

após as respectivas nomeações.”

Quanto às competências do Conselho Gestor, fica estabelecido que o mesmo deverá:

“I – elaborar seu Regimento Interno em até 90 dias contados a partir da sua posse;

II - acompanhar a implantação do zoneamento ecológico-econômico da APA;

III – acompanhar a elaboração do Plano de Gestão;

IV – promover, juntamente com o órgão administrador da APA, a articulação institucional

necessária à efetivação das ações estabelecidas no zoneamento e no Plano de Gestão;

V – propor e apoiar programas e projetos voltados para o desenvolvimento sustentável da APA;

VI – auxiliar na busca de recursos financeiros que possibilitem um eficiente gerenciamento da

APA.

Parágrafo único – O Regimento Interno do Conselho Gestor deverá estabelecer:

a) o mandato dos membros do Conselho;

b) a periodicidade com que se realizarão as reuniões;

c) os demais aspectos necessários ao seu funcionamento”.

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4.2.3 - Conselho gestor: um instrumento de gestão participativa em Unidade de

Conservação

A modalidade “conselho” utilizada na gestão pública, ou em coletivos organizados da sociedade

civil, não é nova na história. Entre os séculos XII e XV, Portugal já adotava essa modalidade de

“concelho” municipal como forma político-administrativa, em relação às suas colônias.

Ao longo da história, alguns conselhos se tornaram famosos por sua atuação: a comuna de Paris,

sovietes russos, e os operários de Turim. A Comuna tem reconhecido destaque na história das

lutas populares por sua experiência e inovação com relação à autogestão da coisa pública pelos

próprios demandatários, a possibilidade da participação direta da população no processo de

gestão, em projeto político emancipatório (GOHN, 2001).

A mesma autora identifica que no cenário brasileiro do século XX há pelo menos três

modalidades de conselho:

• Criados pelo próprio Poder Executivo, para mediar suas relações com os movimentos

e com as organizações populares; e cita como exemplo os conselhos comunitários

criados para atuar junto à administração municipal ao final dos anos 1970;

• Criados pelos movimentos populares ou setores organizados da sociedade civil para

viabilizar suas relações de negociações com o poder público; que são os conselhos

populares criados entre as décadas de 70 e 80;

• Institucionalizados, criados pelo poder Legislativo com possibilidade de participar da

gestão pública, resultantes das pressões e demandas da sociedade civil, a exemplo dos

conselhos de representantes do município de São Paulo e os conselhos gestores

institucionalizados setoriais.

A figura de conselho gestor surgiu nos anos 90 como a grande novidade nas políticas públicas,

com caráter interinstitucional, para exercer o papel de instrumento mediador na relação

sociedade/Estado. A Constituição de 1988 reconhece-o como instrumento de expressão,

representação e participação da população. Teoricamente, o conselho é dotado de potencial de

transformação política; significa que, na prática, os conselhos devem ser efetivamente

representativos e com poderes para imprimir um novo formato às políticas sociais.

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O conselho gestor se constitui em um novo padrão de relações entre Estado e sociedade,

porque eles viabilizam a participação dos diversos segmentos na formulação e implementação

de políticas públicas. GOHN (2001) observa que o conselho gestor, por um lado, pode ser um

importante instrumento para a constituição de uma gestão democrática e participativa,

caracterizada por novos padrões de interação entre governo e sociedade em torno de políticas

sociais setoriais, e, por outro, pode se constituir em estrutura burocrática formal e/ou simples

elo de transmissão de políticas sociais elaborada por cúpulas, um canal para transferência de

parcos recursos para a comunidade; ou ainda instrumento de acomodação dos conflitos e de

integração dos indivíduos em esquemas definidos previamente. A autora conclui que os

conselhos são espaços com caráter duplo: implicam, de um lado, a ampliação do espaço público

– atuando como agentes de mediação dos conflitos, remando, portanto, contra as tendências das

políticas neoliberais de suprimir os espaços de mediação de conflitos; mas, por outro lado,

dependendo da forma como são compostos, poderão eliminar os efeitos do empowermewnt, do

sentido de pertencer dos indivíduos, e reafirmar antigas práticas herdeiras do fisiologismo.

Observa, ainda, a existência de contradições e contrariedades, com relação aos conselhos, pois

tanto podem alavancar o processo de participação sociopolítica de grupos organizados quanto

opostamente, estagnar o sentimento de pertencer de outros – se monopolizados por indivíduos

que não representem, de fato, as comunidades que os indicaram/elegeram. Os conselhos não

substituem os movimentos de pressão organizada de massas, ainda necessários para que a

própria política pública ganhe agilidade.

Nesse contexto, o Conselho Gestor, como uma das formas de organização e de negociação

Sociedade/Estado, se constitui no espaço adequado para o atendimento das demandas de

interesses coletivos e na mediação de conflitos gerados principalmente por unidades de

conservação de uso sustentável, em especial as APAs.

Os instrumentos legais, que norteiam as unidades de conservação, sejam no âmbito nacional ou

estadual, ao estabelecer que, para a sua gestão, é necessária a formação de conselhos, ainda que

imponha alguns limites legais para algumas categorias (consultivo ou deliberativo), sinalizam um

avanço na compreensão da gestão ambiental e territorial como um processo democrático,

embora não signifique garantia automática para que um processo participativo seja deflagrado,

nem que os objetivos de uma Unidade de Conservação sejam plenamente atingidos.

Historicamente, a idéia de conselhos diz respeito a um espaço de concertação e decisão

democrática, criando uma necessária cultura cidadã e de responsabilidade no que é feito em

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termos de políticas públicas, e como tal deveria ser deliberativo. O fato de o conselho ser

deliberativo em Ucs não significa risco à integridade do patrimônio preservado, mas a garantia

de que todos os envolvidos possam decidir sobre a área, respeitando a Lei maior que rege uma

Unidade de Conservação (LOUREIRO, 2003).

Segundo Loureiro (2003), a depender do modo como o Conselho Gestor é instituído e

regulamentado, da composição definida, da dinâmica de funcionamento, do poder de decisão e

de ingerência no governo, o conselho pode ser mais ou menos representativo do ideário

participativo, e destaca alguns aspectos a serem considerados:

• A formalização de um conselho deve ser precedida por um processo de debate e

mobilização dos atores sociais com a promoção de eventos abertos à participação

popular, em que se definam as bases para o funcionamento.

• É fundamental que o presidente, mesmo nos casos que são definidos em Lei, como,

por exemplo, as Unidades de Conservação, não tenha poderes que inviabilizem a

participação democrática.

• Observar a composição numérica e qualitativa dos conselheiros, de modo que não

ocorram desproporcionalidades entre os setores sociais. As duas propostas clássicas

nesse sentido são: 50% governo e 50% sociedade civil organizada ou 1/3 governo, 1/3

setor empresarial e 1/3 setores sem fins lucrativos da sociedade civil, com critérios de

escolha aceitos e definidos em evento prévio à constituição do conselho.

• Estabelecer processos de discussão temática para estimular a participação no âmbito

dos conselhos, impedindo que este se transforme em uma instância burocrática de

decisões de pautas definidas pelo governo.

• Constituir Câmaras Técnicas para os problemas centrais vivenciados, com prazos para

estudo e formulação de propostas a serem apresentadas e avaliadas pela plenária do

conselho.

• No caso das organizações da sociedade civil, estabelecer mecanismos de escolha a

partir de critérios de seleção e de eleição dos representantes, e não em cima de nomes

predefinidos por questões políticas ou conjunturais.

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• Realizar estudos técnicos-científicos que subsidiem com informações válidas as

discussões nos conselhos. As informações devem ser organizadas de modo simples,

facilitando o acesso e compreensão, para os setores sociais, da cultura e linguagem

científica.

• Criar mecanismos de comunicação permanente com as comunidades, divulgando o

trabalho realizado e envolvendo-as no processo.

Segundo GONH (2001), a implantação de conselho ainda se constitui em alvo de discussões e

debates em razão de algumas lacunas ainda existentes, como por exemplo: ausência de

mecanismos que garantam o cumprimento de seu planejamento; inexistência de instrumentos de

responsabilização dos conselheiros por suas resoluções; indefinições quanto ao papel central do

conselho, dentre outras. Com base em suas pesquisas sobre o tema, a autora sistematizou alguns

pontos que podem ser utilizados como referência na construção de uma proposta de Conselho

Gestor em Unidade de Conservação:

• As competências e atribuições do conselho devem ser bem definidas.

• Deve haver clareza quanto ao significado da participação de cada um dos

representantes no conselho.

• É necessário propiciar informações qualificadas e compreensíveis de forma a assegurar

as bases do diálogo no conselho.

• Promover meios de capacitação que possam integrar e uniformizar o conhecimento

entre os conselheiros, ainda que de forma relativa.

• Compatibilizar as atividades desenvolvidas pelos conselheiros considerando os fatores

disponibilidade de tempo e possibilidade de acesso físico.

• Propiciar os meios necessários de modo a garantir igualdade de condições a todos os

conselheiros para participar e intervir no processo de gestão.

O conhecimento adequado e o estabelecimento de relações mais harmoniosas com o seu

ambiente são condições essenciais para assegurar às futuras gerações um ambiente propício à

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vida humana, e, nesse particular, há que se considerar entre os novos instrumentos, além dos

legais, um em especial: a educação.

Com essa compreensão, é pertinente que estratégias de educação ambiental sejam adotadas no

processo de formação do Conselho Gestor, para que este esteja apto a assumir o papel que lhe

compete, o de interlocutor entre o poder público e a sociedade civil, de fundamental

importância na gestão de uma APA.

A Educação Ambiental pode proporcionar meios pedagógicos e métodos de participação

comunitária, objetivando fortalecer o poder dos atores envolvidos, dando-lhes o instrumental

necessário para o planejamento, o gerenciamento e a implementação de ações identificadas

como alternativas às políticas socioambientais vigentes.

A educação ambiental deve ser considerada como uma atividade-fim, porquanto se destina a

despertar e formar a consciência ecológica para o exercício da cidadania. Não é panacéia para

resolver todos os males; sem dúvida, porém, é um instrumental valioso na geração de atitudes,

hábitos e comportamentos que concorrem para garantir a qualidade do ambiente como

patrimônio da coletividade (MILARE, 2000).

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5 - CONTEXTUALIZAÇÃO DO CENÁRIO DA APA DE PRATIGI

Este capítulo tem como objetivo apresentar o “cenário” onde foi desenvolvido o objeto desse

estudo, tomando como base o Plano de Manejo da APA de Pratigi (1998), e a observação da

pesquisadora na área.

Estão incluídos os seguintes pontos:

1 - aspectos sócio-históricos, econômicos e demográficos;

2 - descrição dos setores de Educação, Saúde, Infra-Estrutura Urbana, Energia e Turismo;

3 - Atividades produtivas ligadas ao extrativismo e à indústria.

5.1 - CONTEXTUALIZAÇÃO REGIONAL: CARACTERIZAÇÃO SOCIO-

HISTÓRICA E ECONÔMICA

A APA de Pratigi apresenta componente ambiental de significativo valor ecológico. A

fragilidade frente à ação antrópica sinalizou para que o zoneamento econômico-ecológico

levasse em consideração seus manguezais e áreas úmidas costeiro-estuarinas, a vegetação de

restingas, as manchas contínuas de Mata Atlântica, bem como o rico manancial hídrico existente

na forma de rios e cachoeiras singulares, conforme ilustra a figura 4.1.

Figura 5. 1 - Cachoeira da Pancada Grande

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Da mesma forma, os aspectos culturais das populações locais – pescadores, pequenos

produtores agrícolas e pequenos produtores artesanais – demonstram um estilo de vida de

consistência delicada e suscetível à descaracterização quando submetidas a padrões culturais

diferenciados de seus modos tradicionais.

Algumas intervenções nesta área têm proporcionado impactos socioambientais significativos em

vista da alteração contínua das formas vigentes de apropriação social e exploração econômica da

natureza, vinculados à pesca predatória e à utilização inadequada dos manguezais que

concorrem para o agravamento das condições de vida da população, a destruição dos modos

tradicionais aludidos, através da crescente exclusão social seguida de êxodo populacional dessas

respectivas áreas ou regiões.

Ainda assim, a área apresenta uma grande extensão de praias, restingas, manguezais, assim como

uma flora e fauna características de regiões litorâneas, que compõem um conjunto de

ecossistemas associados da Mata Atlântica, de importante valor ambiental. As figuras 4.2 e 4.3

representam a exuberância característica da fauna e flora.da região.

Figura 5. 2 - Orquídea encontrada na APA Figura 5. 3 - Ave conhecida como Dançarino

Essas características naturais, ainda relativamente preservadas, de grande beleza cênica,

favorecem o desenvolvimento do turismo e, sobretudo, do turismo ecológico, que guarda

compatibilidade com as exigências para o desenvolvimento sustentável dessa área.

O processo de ocupação e organização do espaço onde está localizada a APA de Pratigi está

intimamente ligado à formação e ao desenvolvimento socioeconômico e espacial do Baixo Sul e

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do conjunto de municípios (Igrapiúna, Ituberá, Nilo Peçanha, Ibirapitanga e Piraí do Norte) nos

quais está contida.

Assim, toda essa faixa litorânea que se estende de Valença a Camamu/Maraú – que compõe o

denominado o Baixo Sul e onde está inserida a APA de Pratigi, começou a ser ocupada

efetivamente a partir da decisão da Coroa portuguesa de implantar na costa brasileira, no século

XVI, o cultivo da cana-de-açúcar para atender à demanda de produtos tropicais no mercado

europeu. Essa ocupação, todavia, ocorreu em uma área já povoada por índios aimorés e

tupiniquins que desempenharam um papel fundamental no processo inicial de ocupação desse

espaço.

Essas populações indígenas, resistindo através de ataques freqüentes aos colonizadores, além de

ter dificultado o processo de criação de vilas e povoados, inviabilizou a expansão em grande

escala do cultivo da cana-de-açúcar e, em conseqüência, a formação de uma economia dinâmica

direcionada para o mercado externo, como a que se desenvolveu no Recôncavo, mais

precisamente, nas proximidades da Baía de Todos os Santos. Com efeito, toda essa área costeira

entre Valença e Camamu/Maraú viria, a partir do século XVI até o final do século passado, a

inserir-se no complexo açucareiro do Recôncavo, como uma área periférica fornecedora de

alimentos, sobretudo de farinha. Por isso, durante muitos anos, ficou conhecida por Recôncavo

Sul.

O diagnóstico socioambiental elaborado para subsidiar o Plano de Manejo da APA de Pratigi

definiu como parâmetro para uma melhor compreensão do processo de formação e ocupação

dessa região e, conseqüentemente, dos municípios que estão inseridos na APA, os seguintes

períodos:

• Período colonial - Século XVI até o final do século XIX

• Período pós-colonial - 1900 até o final da década de 40;

• Período moderno - Década de 50 ao final da década de 70;

• Período recente - A partir da década de 80.

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1 – Período colonial

Nesse primeiro período, o processo de ocupação dessa região ocorreu exclusivamente numa

estreita faixa litorânea caracterizada pela existência de vários cursos d`água, cachoeiras, enseadas,

cordões arenosos, estuários e canais. Nesse espaço foram introduzidos os primeiros cultivos e

os primeiros núcleos de povoamento do Brasil.

Durante o século XVI, essa área permaneceu sem sinais evidentes de colonização, devido

principalmente aos ataques dos aimorés, ao norte, e dos tupiniquins, mais ao sul, dificultando a

introdução da cana-de-açúcar e o processo de urbanização. Mesmo assim, iniciou-se a ocupação

e, em decorrência, as primeiras povoações. Nesse contexto, ocorreu a fundação de alguns

núcleos populacionais como Camamu (1560), Cairu (1535), Santo Antônio de Boipeba (1565),

Vila de Una (1560) e Vila de São Miguel do Taperoguá (1561). Essas pequenas aglomerações,

com exceção de Cairu e Santo Antônio de Boipeba surgiram de aldeias indígenas evangelizadas

pelos jesuítas (ÁREA DE PROTEÇÃO... 1998).

No século XVII, após uma campanha oficial desenvolvida contra os índios aimorés, é reiniciado

o processo de povoamento dessa região. Nessa época, alguns aglomerados rurais fundados no

século XVI foram elevados à categoria de vila, como Cairu (1610), Santo Antônio de Boipeba

(1655), e Nossa Senhora de Macamamu, com o nome de Camamu, em 1653(ÁREA DE

PROTEÇÃO... 1998).

As vilas de Cairu e Boipeba, até o início do século XVIII, desempenharam um papel de

comando dessa região, não só do ponto de vista econômico, como também político-

administrativo. A partir de 1725, essas localidades, ainda fortemente atingidas pelos ataques

freqüentes dos índios aimorés, entraram em processo de decadência, cedendo a Camamu,

gradativamente, a liderança econômica dessa área localizada ao sul da Baía de Todos os Santos.

Na fase de ascensão político-econômica, essas localidades tinham como sustentáculo econômico

a produção de farinha e a extração de madeira (ÁREA DE PROTEÇÃO...1998).

A farinha de mandioca destinava-se não só à subsistência da população local, com o

abastecimento da tropa em Salvador e, clandestinamente, às Capitanias do norte. Fortalecendo

tal situação, ainda no século XVII, foi proibida oficialmente a construção de engenhos e

ampliação do cultivo da cana-de-açúcar, para não desviar do cultivo da mandioca e da produção

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de farinha a mão-de-obra existente. Assim, iniciou-se um longo processo de especialização e de

subordinação desse espaço litorâneo à zona canavieira, sob o comando da cidade do Salvador.

Mais tarde, durante os séculos XVIII, foram fundadas as vilas de Santarém (1758), atual Ituberá;

Valença (1799); o município e a vila de Nova Boipeba (1811) e a vila e o município de Taperoá,

em 1847. Em 1873, o município de Nova Boipeba – que teria sido anexado ao de Taperoá em

1847 – foi restaurado com o nome de Nilo Peçanha.

Segundo Oliveira (1985), as vilas de Cairu e Nova Boipeba já conviviam desde o início do

Século XVIII com a fuga contínua de escravos, com a conseqüente formação de quilombos, e,

novamente, com os ataques dos gueréns – um ramo dos aimorés. Esses fatos, além de

explicarem a decadência dessas localidades, parecem justificar, de alguma forma, a existência de

comunidades predominantemente negras, antigos quilombos, no atual município de Nilo

Peçanha, como Boitaraca e Jatimane.

No século XIX, essa região ainda preservava fortemente algumas características que remontam

ao início do processo de ocupação, como concentração de atividades e núcleos populacionais na

faixa costeira, principalmente na desembocadura dos cursos fluviais. A economia continuava

lenta, comandada fundamentalmente pela farinha de mandioca e a extração de madeiras que

eram destinadas principalmente para o atendimento das demandas não só da Capital, como

também de outras localidades situadas no seu entorno.

Além dessas atividades, a pesca e a piaçava também funcionavam como instrumentos de fixação

da população no litoral. Esta última era praticada quase sempre em reservas nativas, de domínio

público, sem qualquer incentivo ao seu desenvolvimento. Daí a não formação de propriedades

dedicadas exclusivamente ao seu cultivo.

No que diz respeito aos transportes, até o século XIX, todo o processo de comunicação era

realizado por mar e em alguns cursos d`água. Por essas vias, cada aglomeração da região

estabelecia contatos diretos com Salvador, e, de forma inexpressiva, entre si. Por isso, a partir da

segunda metade do século XIX, as localidades portuárias de Valença e Camamu tornaram-se as

mais importantes da região, quando já estava consolidada a decadência econômica de Cairu e

Velha Boipeba.

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Ainda nesse período, Valença começou a despontar no cenário regional e estadual como uma

cidade industrial, com a construção de duas fábricas de tecidos – Todos os Santos e a Nossa

Senhora do Amparo, sendo a primeira delas, sem dúvida, a mais velha do Brasil. A partir de

então expandiu -se, assumindo um papel de destaque na organização do espaço regional.

A não integração dessa região ao modelo agro-exportador gerou uma sociedade com baixo

dinamismo socioeconômico especializada em produtos de subsistência e atividades extrativas.

Esse quadro começou a mudar a partir da introdução e expansão do cacau, especialmente nas

áreas atualmente ocupadas pelos municípios de Camamu e Ituberá.

É nesse contexto que ocorre a formação dos territórios de Igrapiúna, Ituberá e Camamu, onde

está inserida a APA do Pratigi. Ao final de século XIX, esses municípios apresentavam as

seguintes características:

Ituberá: a principal referência era a vila de Santarém, nome primitivo do município. Criada em

1758, juntamente com a freguesia, esta vila no século XIX era ainda muito pequena, mas já

funcionava como área de conexão entre o interior e o litoral, sobretudo Salvador. O ponto

nodal era o porto, a partir do qual se realizava a distribuição de mercadorias para o interior, em

lombo de animais, e para o litoral, através de pequenas embarcações. Do ponto de vista

econômico, a mandioca representava sua principal atividade, já com destaque em nível regional.

Nilo Peçanha: foi o primeiro município da APA do Pratigi a ser instalado. Sua implantação

definitiva ocorreu em 1874, com o nome de Nova Boipeba. Sua sede, com a mesma

denominação, não se destacava em âmbito regional. Com relação às atividades econômicas,

destacavam-se os cultivos da mandioca, da cana-de-açúcar e a exploração de piaçava e dendê.

A importância da cana-de-açúcar na sua formação econômica é ainda hoje evidenciada pela

existência de ruínas de engenhos e da presença de descendentes de negros em seu território.

Igrapiúna: já era também um município nos finais do século XIX. Desmembrado de Camamu,

em 1890, tinha como sustentáculo econômico a produção de arroz e a mandioca.

Posteriormente, é reincorporado ao município de Camamu, de onde se originou.

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2 - Período Pós-Colonial

No segundo período, a expansão do cultivo do cacau e a consolidação da indústria têxtil

contribuíram, para o processo de desenvolvimento socioeconômico e espacial do Baixo Sul,

caracterizado pela diversificação produtiva, crescimento demográfico, formação de

propriedades, aumento do povoamento e a emancipação de novos municípios. Essa etapa, de

acordo com a periodização proposta, começa no início do século XX, e estende-se até a década

de 50.

Nesse período, essa região, que durante o século XIX estruturou-se em função basicamente da

cana-de-açúcar e da mandioca, amplia sua base produtiva e incorpora novos agentes

econômicos e novos espaços, alterando o padrão organizacional preexistente. Tais mudanças,

todavia, não foram capazes de gerar economias externas, nem tampouco de promover um

processo de desenvolvimento econômico mais dinâmico e equilibrado.

Silva, (1969, apud. Área de Proteção...,1998, p. 219), com base em dados estatísticos, comenta

que essa região chega ao século XX com oito municípios (Cairu, Ituberá, Camamu, Maraú, Nilo

Peçanha, Taperoá, Valença e Igrapiúna), 77.191 habitantes e uma densidade demográfica de 9,9

hab/km2 . Além disso, destaca que mais de 50% da população regional, em 1990, concentrava-

se nos municípios de Valença, Camamu e Maraú, que também detinham as mais altas taxas de

densidades demográficas.

A forte concentração populacional em Valença deveu-se ao surto de industrialização iniciado

nos meados do século XIX, enquanto que em Camamu e Maraú esta fase deveu-se a expansão

da cultura cacaueira a partir dos meados do século XIX. O cacau, desde então, passou a atrair

para o Baixo Sul um número significativo de pessoas tanto da região como de outras áreas do

Estado.

Tais mudanças ocorreram em uma fase de decadência socioeconômica no Recôncavo, como

também em todo Estado da Bahia. Essa fase de retração inicia-se com a crise definitiva da cana-

de-açúcar, por volta de 1920, e estende-se até o início da década de 50. Foi nesse período que se

consolidou o deslocamento socioeconômico e político para o Sul do País, com a expansão da

cultura cafeeira e com a entrada significativa de imigrantes estrangeiros, principalmente da Itália.

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O Recôncavo desorganiza sua economia e enfraquece suas relações com os espaços localizados

em sua área de influência, inclusive com os mais distantes, como o Baixo Sul da Bahia. Nessa

região, ocorreu uma redução do transporte marítimo para Salvador, gerando um isolamento

econômico e cultural que dificultou, ainda mais, o processo de formação de uma rede urbana

regional.

É nesse contexto que se desenvolvem as atividades industriais na cidade de Valença, sob o

comando da Cia. Valença Industrial, que resultou da fusão de duas fábricas de tecidos – Todos

os Santos e Nossa Sra. do Amparo, ao final século XIX. Mesmo não tendo atingido o ritmo de

desenvolvimento que se esperava com essa expansão industrial, esta cidade transformou-se na

principal referência da Região, regulando e controlando suas principais atividades econômicas.

As debilidades urbanas dos demais núcleos regionais, decorrentes de fatores históricos e

socioeconômicos, favoreceram tal situação.

De acordo com Santos (1959, apud. Área de Proteção...1998, p.219) “as cidades de Taperoá,

Nilo Peçanha, Camamu, Cairu eram, em torno dos anos 40, pequenos núcleos adormecidos”. O

isolamento dessas cidades, cujo único meio de comunicação com Salvador era por mar,

provocou a formação de verdadeiras ilhas do ponto de vista econômico e cultural, constituindo-

se na principal característica deste período.

Outro elemento importante no processo de desenvolvimento socioespacial do Baixo Sul é a

cacauicultura. Este cultivo que se instalou inicialmente no município de Camamu, ainda no final

do século XIX, expandiu-se na primeira metade desse século em direção aos vales dos rios

próximos ao litoral, como o da Cachoeira Grande, Jequié e Engenho.

Posteriormente, o cacau expande-se em direção às áreas de tabuleiro de Gandu, Itamari, Piraí do

Norte e Wenceslau Guimarães, possibilitando o crescimento rápido dessas aglomerações, até

então pertencentes aos municípios de Ituberá e Nilo Peçanha. Assim, um novo vetor de

expansão socioeconômica instala-se, favorecendo a ocupação dessas áreas mais afastadas do

litoral. Com efeito, surge uma nova configuração regional.

Nessa época, o escoamento da produção do cacau realizava-se através dos portos de Nilo

Peçanha e Ituberá. Este último tornou-se um dos principais portos de exportação do cacau do

Baixo Sul, sem, contudo, atingir o volume de exportação de outras pequenas áreas portuárias da

zona cacaueira, como, por exemplo, Belmonte, Canavieiras e Itacaré.

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Quanto ao aspecto fundiário, constata-se que a expansão do cacau, até a década de 50, não

conduziu essa região ao sistema de monocultura, como na zona cacaueira central; ao contrário,

contribuiu para diversificar ainda mais sua estrutura agrícola já caracterizada pela existência de

vários cultivos, tais como o café, a mandioca, o arroz, o milho, assim como a exploração da

borracha, do dendê e também da piaçava.

Tal fenômeno resultou não só da forma como se desenvolveu o processo de organização da

produção do cacau – baseado em pequenas unidades produtivas, com outras culturas – como

também em decorrência da falta de infra-estrutura, da dificuldade de comunicação com a zona

cacaueira, eixo Ilhéus-Itabuna, e da concorrência com outras culturas comerciais.

Com a construção da BA – 02 (atual BR – 101), nos anos 40, inicia-se um novo processo de

reestruturação regional caracterizado pela aceleração do ritmo de ocupação das áreas de

tabuleiros, via expansão da cultura do cacau, e pela ampliação das relações inter-regionais,

sobretudo com Ilhéus – principal porto de exportação do cacau no Estado.

Segundo o IBGE (1992), entre 1920 e 1940 houve uma redução populacional em praticamente

todos os municípios do Baixo Sul, exceto em Ituberá – onde o cacau achava-se em plena

expansão, nas proximidades de Gandu – e em Valença, devido à presença da indústria têxtil –

sustentáculo do desenvolvimento municipal.

Remetendo-se, mais uma vez, ao conjunto de municípios que contêm a APA do Pratigi, vale

ressaltar nesse período, além da expansão do cacau, os seguintes eventos:

Igrapiúna

Nesse período, mais precisamente em 30 de novembro de 1938, esse município foi extinto,

sendo o seu território anexado ao de Camamu.

Ituberá

Em 1909, a vila de Santarém é elevada à categoria de cidade e, em 1911, segundo o IBGE,

aparece como município na divisão administrativa do Brasil. Em 1943, tem seu nome trocado

para Serinhanhém e, em 1944, passa a chamar-se Ituberá. Algumas cidades pertencentes

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atualmente à região cacaueira, como Gandu, Itamari, Nova Ibiá e Piraí do Norte, faziam parte,

nesse período, desse município.

Ainda segundo o IBGE, no início da década de 50 a cultura do cacau já era considerada sua

principal atividade econômica e, em seguida, a mandioca, a piaçava, a aguardente e a extração de

madeira. Esta última ocorria em grande escala visando especialmente o fabrico de tábuas e

ripões.

A abertura da BA-02, na década de 40, afetou fortemente a dinâmica econômica da cidade de

Ituberá. O transporte de mercadorias que, até essa época, se realizava por via marítima foi

desviado para a rodovia, contribuindo para a intensificação do fluxo migratório, como também

para o processo de decadência do comércio local.

Nilo Peçanha

Recriado com este nome, em 1930, esse município, no começo dos anos 50, tinha como

sustentáculo econômico o cacau e em seguida a mandioca, o arroz, o café e a extração de

piaçava e madeira. Além disso, dispunha de um pequeno campo de pouso e de um porto fluvial

para pequenas embarcações.

De acordo com o recenseamento de 1950, a zona urbana desse município era formada pelo

distrito sede e a vila de Indaiá, pertencente atualmente a Wenceslau Guimarães, com 1.435 e

1.640 habitantes respectivamente.

Em 1957, de acordo com estimativa do IBGE, destacavam-se, do ponto de vista demográfico,

os seguintes aglomerados rurais: Itiúca (470 hab), Barra dos Carvalhos (410 hab.), Jatimane (240

hab.), Rio das Almas (150 hab.), Barreiros (120 hab.), Barroquinha (120 hab.) e Apuarém (105

hab).

Do ponto de vista ambiental, a extração de madeira continuava em expansão. Segundo

informações do IBGE, essa atividade, em 1950, já representava um componente importante na

economia dos municípios onde se insere a APA de Pratigi.

Em síntese, vale considerar que, não obstante a expansão espontânea do cacau ao sul e a

presença da indústria têxtil ao norte, o Baixo Sul vivenciou uma longa fase de estagnação que se

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estendeu do início do século XX até 1950. Essa fase, contudo, foi interrompida ainda no início

dos anos 50, com a abertura de estradas, exploração racional da borracha (Firestone, 1954) e

implantação de uma grande fábrica de madeira em 1951 (Odebrecht), em Ituberá.

3 - Período Moderno

O terceiro período tem início a partir da segunda metade do século XX, quando a região passa a

experimentar várias transformações. Desde então, a expansão da rede rodoviária e a melhoria do

sistema de transporte passaram a desempenhar um papel fundamental no processo de

desenvolvimento regional. Tais acontecimentos, além de promoverem a ampliação das relações

do Baixo Sul com Salvador e com a região cacaueira, facilitaram a inserção da economia regional

nos mercados estadual e nacional.

Além da BA-02, foram implantadas algumas vias intra-regionais que acabaram por incrementar

as relações entre os municípios do Baixo Sul, até então bastante precárias. A primeira delas,

construída em 1945, ligava Valença à BA-02. Em 1956/57, uma outra rodovia é implantada,

ligando Valença a Ituberá, via Taperoá e Nilo Peçanha.

A construção dessas rodovias estimulou o surgimento do transporte rodoviário. Em 1959, uma

linha regular é criada ligando Ituberá/Valença a Salvador. A partir de então surgiram novas

linhas ligando os municípios do Baixo Sul entre si e com algumas cidades e povoados da região

cacaueira.

Essa expansão rodoviária reduziu significativamente o movimento nos principais portos do

Baixo Sul, ou seja, Valença, Ituberá e Camamu. Estes portos passaram, especialmente a partir da

década de 60, a atender basicamente às demandas de seus municípios e/ou da própria região.

Com relação à agricultura, ocorreu, logo nas duas primeiras décadas desse período, a ampliação

de forma racional das culturas do cacau, do dendê e da seringueira, ao tempo em que

declinavam fortemente as culturas tradicionais do café e da cana-de-açúcar. Posteriormente,

deu-se a introdução da pimenta-do-reino e do cravo-da-índia, sobretudo no município de

Ituberá.

Todo esse processo de introdução e expansão de novas culturas, na região, foi possível graças à

participação de alguns atores sociais relevantes como a Ceplac, agências bancárias,

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agroindústrias, empresas de comercialização e exportação de produtos agrícolas, que se foram

multiplicando ao longo do tempo.

Nesse contexto, surgiram ainda novos empreendimentos agroindustriais direcionados para a

produção de borracha e do óleo de dendê. Assim, foram implantadas entre 1950 e 1970 a

Agroindustrial Ituberá, em Ituberá, a Firestone (atual Plantações Michelin da Bahia) e a Culturas

Tropicais – Cultrosa, em Camamu. Todas voltadas para o beneficiamento do látex e para a

produção da borracha, direcionando sua comercialização, principalmente para o Centro-Sul do

País. Entre 1965 e 1970 foram instaladas as empresas Opalma (Taperoá) e Oldesa (Valença),

visando à produção do óleo de dendê.

É importante observar que enquanto crescia o número de empresas agroindustriais na região, a

indústria têxtil em Valença foi perdendo seu significado, principalmente do ponto de vista da

sua participação no valor da produção industrial, como também do ponto de vista do número

de funcionários.

Nesse período, a presença das agroindústrias e da Ceplac na região contribuíram não só para a

introdução e expansão de novas culturas, mas também para a modernização do campo,

sobretudo nas proximidades de Ituberá, Taperoá e Camamu, onde se instalaram algumas

culturas comerciais e grandes empresas agroindustriais. Tudo isso favorecendo a tecnificação do

espaço regional, mediante da incorporação gradativa de máquinas e implementos agrícolas,

insumos materiais e outros componentes.

A expansão e introdução de novas culturas vão possibilitar, a partir de 1960, a emancipação dos

seguintes municípios, conforme demonstrado na tabela 5.1:

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Tabela 5. 1 - Municípios criados após a década de 50 no Baixo Sul

MUNICÍPIOS ANO DE CRIAÇÃO ORIGEM

Igrapiúna 1989 Camamu

Piraí do Norte

1989

Ituberá

Pres. T. Neves 1989

Valença

Teolândia 1962

Taperoá

W. Guimarães 1962

Nilo Peçanha

Fonte: SEI/SEPLANTEC

Essa nova dinâmica socioeconômica e territorial vai repercutir também na situação demográfica

da região. Segundo dados do IBGE, entre 1950 e 1960, o Baixo Sul já apresentou um aumento

populacional superior ao do Estado da Bahia, todavia, entre 1960 e 1970, o crescimento do

Estado superou o do Baixo Sul; mesmo assim, nenhum município registrou crescimento

negativo, como na fase anterior, isto é, entre 1900 e 1950. Tal desempenho está associado ao

crescimento da emigração para o Centro-Sul, com a construção da BR-116, em 1963, e para

Salvador, em decorrência da expansão da indústria petrolífera a partir da primeira metade da

década de 50.

Em que pese tal situação, entre 1960 e 1970, os municípios de Cairu, Camamu, Ituberá, Taperoá

e Valença apresentaram um crescimento populacional provocado pela expansão mais acentuada

da lavoura cacaueira e a introdução e/ou ampliação dos plantios de guaraná, cravo-da-índia,

seringueira e da pimenta-do-reino.

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Durante a década de 70, a cotação favorável desses produtos no mercado externo, aliada à

criação do Sistema Nacional de Crédito Rural e à ampliação das ações da Ceplac, além de terem

contribuído para incentivar o processo de expansão e diversificação agrícola, possibilitaram a

modernização da agricultura regional.

Essa ampliação e modernização na estrutura agrícola do Baixo Sul, em 1970 e 1980, provocaram

transformações significativas no seu padrão de crescimento e distribuição populacional. Nesse

período, o crescimento da população total e rural foi bastante acelerado em praticamente todos

os municípios da região. Em Camamu, Valença e Ituberá cresceu também de forma significativa

a população urbana.

Dos municípios onde está inserida a APA do Pratigi, Ituberá foi o que vivenciou maiores

transformações, entre 1970 e 1980. A instalação da Ceplac, em 1971, na sede desse município,

promoveu uma nova dinâmica na economia municipal por intermédio da difusão de novas

tecnologias na agricultura e assistência técnica aos produtores, proporcionando uma expansão

significativa do cacau e de outros cultivos comerciais.

Em 1980, o município de Ituberá não só apresenta uma economia rural diversificada, como

também uma estrutura urbana dinâmica em relação aos padrões regionais. Segundo estudos

realizados pela Ceplac, a cidade de Ituberá já dispunha, nessa época, de um comércio

constituído de vários estabelecimentos varejistas e alguns atacadistas, que realizava transações

com Salvador e, secundariamente, com Valença.

A demanda gerada pelos novos estabelecimentos rurais e pelas agroindústrias instaladas em seu

território e/ou nas proximidades – em termos de máquinas, implementos agrícolas, saúde,

educação, assistência técnica, lazer, eletrodomésticos, alimentos, entre outros – forçou uma

requalificacão da cidade, fazendo com que esta se fortalecesse tanto do ponto de vista

demográfico quanto do ponto de vista urbano.

4 - Período Recente

A partir de 1980, a crise na lavoura cacaueira e a expansão do turismo em Morro de São Paulo

passaram a produzir novas transformações na região, tanto do ponto de vista econômico quanto

do ponto de vista cultural e socioespacial.

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É nesse período que ocorre, mais uma vez, a emancipação do município de Igrapiúna (1989), a

construção da BA-001 (Nazaré-Valença) e a pavimentação da BA-001, entre Valença e

Camamu. Esta rodovia, implantada pelo Governo do Estado, na década de 90, para incrementar

o turismo regional, vem provocando impactos socioeconômicos, ambientais e espaciais em toda

a região, mais particularmente nas localidades turísticas de Guaimbim (Valença), Morro de São

Paulo (Cairu) e Barra Grande, na área de influência de Camamu. Além disso, reativou as

relações do Baixo Sul com a cidade de Salvador.

Vale ainda mencionar a construção da estrada que dá acesso à praia de Pratigi, em 1998, que

provocou um redirecionamento no fluxo turístico intra-regional.

Todo esse processo de intervenção ocorrido, ao longo do tempo, no espaço regional repercutiu

de forma considerável na dinâmica socioespacial e ambiental dos municípios que contêm a APA

de Pratigi.

5.2 - ASPECTOS DEMOGRÁFICOS

A distribuição da população na APA de Pratigi não ocorre de forma regular. Os dados censitários

revelam que a maior parte de sua população ainda está concentrada numa estreita faixa litorânea

que inclui os manguezais e as pequenas comunidades rurais direcionadas para a pesca e atividades

tradicionais como a piaçava, o coco e o dendê. Abrange, ainda, a maioria das grandes

propriedades agroindustriais e as sedes municipais.

Entre os municípios que compõem APA, a distribuição também se dá de forma irregular, sem

implicar, todavia, grandes disparidades. As informações referentes às densidades demográficas e a

participação da população de cada município na população total da APA confirmam também a

irregularidade dessa distribuição.

De acordo com o IBGE, tabela 1, em 1996, 40,98% da população da APA do Pratigi

concentravam-se em Ituberá; 33%, em Nilo Peçanha, e 26%, em Igrapiúna. Assim, a maior

densidade demográfica foi assinalada Ituberá (59,92 hab/km2) e logo em seguida em Nilo

Peçanha (41,91 hab/km2). Com um menor contingente populacional, Igrapiúna atingiu uma

densidade de (25,69 hab/km2).

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Os dados do IBGE revelam, ainda que em 1996 as densidades demográficas do subespaço e dos

municípios de Ituberá e Nilo Peçanha, isoladamente, suplantaram as densidades do Baixo Sul e

do Estado da Bahia, com 41,61% e 22,11% hab/km2, respectivamente. Ainda assim, cabe

considerar que até mesmo Igrapiúna, com uma densidade demográfica inferior à média do

subespaço, conseguiu atingir uma densidade superior à do Estado, o que vem demonstrar a sua

relevância sociodemográfica no contexto local/regional. Vide tabela 5.2.

Tabela 5. 2 - População, área e densidade demográfica (1996)

5.2.1.1.1.1.1 Municípios

5.2.1.1.1.1.2 População

(habitante

s)

Área

(km2)

Densidade

(hab/km2)

Igrapiúna 13.232 515 25,69

Ituberá 20.671 345 59,92

Nilo Peçanha 16.721 399 41,91

Subespaço da APA 50.624 1.259 45,76

Baixo Sul 248.462 5.971 41,61

Bahia 12.541.745 567. 295,3 22,11

Fonte: IBGE, 1996.

As informações referentes à população residente nas cidades e nos principais povoados da faixa

litorânea, em 1996, reforçam a informação anterior de que a maior parte da população da APA

concentra-se ainda entre o tabuleiro e o litoral (tabela 5.3).

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Tabela 5. 3 - Subespaço do Pratigi – 1996

População residente na planície litorânea em relação ao total do subespaço.

Município/Núcleo

Populacional População %

ITUBERÁ 15.991 31,59

Sede 12.821 25,33

Itajaí 636 1,26

Núcleo Colonial 1.246 2,46

Aglomerados da APA 1.288 2,54

IGRAPIÚNA 7.335 14,49

Sede 1.576 3,11

Comunidades da APA 3.468 6,85

Três Pancadas 2.291 4,53

NILO PEÇANHA 5.846 11,55

Sede 2.455 4,85

Localidades da APA 3.391 6,70

TOTAL 29.172 57,62

SUBESPAÇO DO PRATIGI 50.624 100,00%

Fonte: IBGE – Agência Valença, 1996.

Concentração Demográfica de Ituberá

No município de Ituberá a concentração demográfica chega a ultrapassar o patamar de 75% da

população total, graças, sobretudo, ao distrito sede que absorveu mais de 82% da população

municipal. Essa proporção é bem menor em Igrapiúna e Nilo Peçanha, onde ocorreram os mais

baixos índices de urbanização. Mesmo assim, o índice médio, em nível do subespaço, ficou em

torno de 57,62% da população total. Se fosse considerada a totalidade dos habitantes residentes

nessa área, este índice ultrapassaria o patamar de 60% da população total.

Marcado por um aumento populacional significativo na década 70/80, o conjunto de municípios

que compõem a APA do Pratigi, seguindo a tendência do País e do Estado da Bahia, passou a

vivenciar a partir da década de 80 uma redução no seu ritmo de crescimento demográfico, em

decorrência, sobretudo, do agravamento da crise da lavoura cacaueira – motivada pela queda

acentuada do preço do cacau no mercado internacional e pela presença devastadora da vassoura

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de bruxa³ – da queda de produção da pimenta-do-reino, cravo-da-índia e do guaraná e da

modernização das atividades agroindustriais, com graves repercussões socioeconômicas e

espaciais.

Nesse contexto, a população desse subespaço passou de 34.255 habitantes em 1980 para 45.538

habitantes em 1991, correspondendo a um incremento em torno de 32,94%. Esse aumento

populacional contribuiu para que a taxa média de crescimento anual dessa área atingisse 3,0% ao

ano, superior, inclusive, ao índice apresentado pelo estado (2,09% a.a.) no mesmo período. Entre

1991 e 1996, esse índice caiu para 2,23%, mas, mesmo assim, manteve-se em uma posição

superior à do Estado da Bahia (1,11% a.a.), Região Nordeste (1,06% a.a.) e Brasil (1,38% ao ano).

Tabela 5. 4- Taxa de Crescimento Populacional – 1980/1991/1996

5.2.1.1.1.1.3 Período Brasil Região Bahia Subespaço

1980/1991 1,94 1,83 2,09 3,00

1991/1996 1,38 1,06 1,11 2,23

Fonte:CAR/SEPLANTEC

Internamente, os municípios integrantes desse subespaço apresentaram desempenhos

diferenciados. Entre 1980 e 1991, a criação do município de Igrapiúna e o desmembramento de

Piraí do Norte de Ituberá provocaram mudanças de padrão de crescimento populacional dessa

área. Com efeito, o município de Ituberá teve população reduzida, mas, ainda assim, apresentou

crescimento positivo, com taxa de 0,20% ao ano.

Contrapondo-se à tendência declinante da população no estado da Bahia e no Brasil, o município

de Nilo Peçanha apresentou, entre 1980 e 1991, um crescimento populacional muito significativo

com taxa superior a 4% a.a. Este desempenho, de acordo com a literatura consultada, foi

motivado pela ampliação da estrutura agrícola municipal após a introdução e/ou expansão dos

cultivos da pimenta-do-reino, guaraná e o dendê.

___________________________________________________________________________

3. Espécie de fungo que se alastra facilmente dizimando a lavoura cacaueira.

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No intervalo de 1991 a 1996, os municípios de Igrapiúna e Ituberá experimentaram uma perda

líquida de população e, conseqüentemente, taxas de crescimento inferiores ao patamar de 1% ao

ano. Nilo Peçanha, ao contrário, vivenciou nesse período um crescimento médio anual superior a

6%, em decorrência, provavelmente, da atração da mão-de-obra liberada pela crise da lavoura

cacaueira nos municípios de Gandu e Wenceslau Guimarães. Isso contribuiu para aumentar ainda

mais a concentração de sua população na zona rural, equivalente, em 1996, a 85,31% da

população total.

Esse fluxo migratório procedente de territórios vizinhos para Nilo Peçanha pode ser explicado

pela presença nesse município de uma estrutura agrícola formada por diversos cultivos, como o

dendê, a piaçava, o cacau, o coco-da-baía e o guaraná, além da mandioca e outras culturas de

subsistência. Segundo informações coletadas durante a pesquisa de campo, a maior parte dos

desempregados do cacau que se dirigiram para esse município concentraram-se no povoado de

São Benedito e arredores, nas proximidades da BR-101.

A redução do ritmo de crescimento da população total nesse subespaço, a partir de 1980, está

associada fundamentalmente a uma perda líquida de população nos municípios de Igrapiúna e

Ituberá. Neste último, tal situação tornou-se mais evidente em vista do decréscimo da população

rural da ordem de –2,64% ao ano, entre 1980/91, e – 2,14% ao ano, no período de 1991/96. A

população liberada da zona rural, a princípio, parece não ter sido absorvida pela sede municipal,

haja vista o seu padrão de crescimento urbano, que caiu de 3,19% a. a. entre 1980/91 para 1,66%

a. a. entre 1991/96. Essa redução de população na cidade de Ituberá, todavia, não traduz a

realidade, uma vez que o IBGE considerou a vila de Itajaí – área de expansão urbana desta cidade

-, como localidade rural, durante a realização da contagem da população em 1996.

Informações levantadas junto às autoridades locais sugerem que a população de migrantes rurais

do município de Ituberá, a partir desta década, concentrou-se basicamente na periferia da cidade,

especialmente na vila de Itajaí e adjacências.

Esse êxodo rural foi provocado pela crise da lavoura cacaueira, modernização da agroindústria a

partir dos anos 90, baixa produtividade da unidade familiar e dificuldades de emprego na zona

urbana e rural, assim como pela diminuição da produção e redução da área de alguns cultivos

comerciais por falta de condições favoráveis nos mercados internacionais. A estes fatores devem-

se acrescentar as dificuldades econômicas que vêm afetando o País como um todo, em razão,

principalmente, do avanço do processo de reestruturação produtiva nos dez últimos anos.

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Em Igrapiúna, o aumento do ritmo de crescimento da população urbana, a partir da emancipação

deste município em 1989, provocou um fluxo migratório no sentido rural-urbano que justifica, de

alguma forma, a taxa de crescimento negativo da população rural entre 1991/96, da ordem de

0,12% a. a.

A despeito da diminuição do seu ritmo de crescimento populacional, este subespaço manteve-se

numa situação favorável em relação à região onde está inserido. De modo contrário, a região Sul

não chegou a apresentar nesse período perda absoluta de população nem no meio urbano, nem

tampouco no meio rural.

Educação

Nas comunidades estuarinas pertencentes à APA, observa-se a presença de unidades escolares

de ensino até a 4ª serie, sendo necessário o deslocamento dos alunos que desejem continuar os

estudos para as sedes dos municípios.

Nas sedes municipais o sistema educacional é integrado pelos níveis de ensino fundamental e

médio, e dispõem de um corpo docente, em sua maioria, dotado de uma melhor qualificação.

Dada a difícil situação socioeconômica dos municípios onde está inserida a APA, o serviço de

educação ainda caracteriza-se por apresentar índices significativos de evasão escolar e de

analfabetismo, apesar da descentralização e dos investimentos realizados nos últimos anos,

sobretudo no âmbito municipal.

Na zona rural, a situação não é muito diferente; há poucas escolas com estruturas que variam de

razoáveis a ruins, não comportando, inclusive, o número de crianças, na maioria dos casos. Os

professores, além de escassos e mal preparados, não moram na região e a dificuldade por falta

de transporte prejudica a assiduidade destes às salas de aula.

Saúde

Nas comunidades estuarinas e rurais, o nível dos serviços de saúde revela-se ainda muito

precário. Algumas das localidades dos municípios integrantes da APA do Pratigi dispõem de um

posto médico com atendimento quinzenal, ou contam com atendimento que varia de 1 a 3 vezes

durante a semana, ou ainda, existem localidades que não contam com atendimento médico local.

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Nos casos em que se faz necessário o atendimento emergencial, os pacientes deslocam-se de

carro ou lancha para suas respectivas sedes, que contam, cada uma, com um hospital e quando a

situação requer um atendimento especializado, os doentes são transportados para Salvador.

A incidência dos casos de doenças de notificação obrigatória coloca como desafio à necessidade

de melhoria urgente no sistema de saneamento básico, intensificar de campanhas preventivas de

informação e mobilização da população, melhoria da qualidade dos serviços prestados pela rede

de saúde desses municípios e das condições de vida de populações com níveis de renda

baixíssimos.

Observa-se que na zona rural a população apresenta alguns sinais de desnutrição e as crianças,

além disso, casos de verminose devido aos hábitos alimentares adotados e à falta de saneamento.

Com relação às campanhas de vacinação, em que pesem às dificuldades de transporte, têm

surtido efeito, com a redução de doenças endêmicas. Foram detectados poucos agentes de saúde

locais e as ações preventivas são poucas.

Infra-Estrutura

Na APA do Pratigi, a grande maioria da população não dispõe de uma infra-estrutura adequada

de abastecimento d’água, limpeza urbana e esgotamento sanitário. As comunidades rurais

residentes em Ituberá e Nilo Peçanha são abastecidas através de sistemas convencionais que

incluem os serviços de captação e distribuição. Já em Igrapiúna, os aglomerados são abastecidos

de forma bastante rudimentar, a partir de cisternas e de pequenos poços sem revestimento

interno, sendo comum, nesses lugares, a falta de água durante o verão.

Com relação ao esgotamento sanitário nos aglomerados localizados no interior da APA do

Pratigi, os dejetos são lançados em cursos d’água ou em outros locais, sem qualquer tratamento.

As fossas rudimentares utilizadas pela maioria dos domicílios, além de provocar a contaminação

dos recursos hídricos superficiais, contribuem também para a contaminação das águas

subterrâneas.

A destinação final dos resíduos sólidos é inadequada, nas sedes municipais e em alguns povoados

com características urbanas, como é o caso de Barra dos Carvalhos, São Francisco e Itiúca, em

Nilo Peçanha, e Barra de Serinhaém, em Ituberá. O lixo coletado é transportado e depositado em

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áreas de manguezais e nas margens dos cursos d’água, nas proximidades dessas localidades,

provocando impactos ambientais.

Transportes

O sistema de transporte rodoviário constitui-se no mais importante meio de comunicação,

sendo o principal responsável pelo escoamento da produção (pescado, piaçava e dendê) da APA

do Pratigi, e pela integração local/regional e extra-regional. O eixo rodoviário estratégico é a

BA-001, que liga Bom Despacho às cidades de Valença, Taperoá, Nilo Peçanha, Ituberá,

Igrapiúna e Camamu.

A construção do trecho Nazaré -Valença e a pavimentação dessa estrada entre Valença e

Camamu já na década de 90, além de ter facilitado a comunicação entre as cidades litorâneas do

Baixo Sul, contribuiu também para intensificar as relações desse subespaço de Pratigi com a

Capital do Estado.

Quanto ao transporte marítimo, principal meio de comunicação local/regional até

aproximadamente a década de 60, tem ainda uma importância vital, especialmente para as áreas

estuarinas de Ituberá e Igrapiúna, nos limites da APA.

Ainda assim, a forma como a população articula-se interna e externamente entre as diferentes

localidades que compõem a APA do Pratigi é bem pouco integrada em vista não somente da

localização geográfica e de outros fatores socioeconômicos, mas também em decorrência da

precariedade das vias de acesso e da deficiência do sistema de transporte existente, tanto nas

zonas estuarinas quanto nas rurais. Em períodos de chuva intensa, alguns trechos da estrada

ficam intransitáveis.

Nesse sentido, observa-se um certo isolamento de algumas comunidades de Igrapiúna,

sobretudo as pequenas ilhas, onde o sistema de transporte utilizado é constituído por pequenas

embarcações pertencentes aos moradores locais ou à Prefeitura Municipal. As linhas regulares

atendem a essas localidades, geralmente, não mais que três vezes por semana.

Em Ituberá, a situação não é muito diferente, exceto na praia do Pratigi, onde a construção de

uma estrada ligando este local à BA-001 possibilitou a integração desta praia com a cidade de

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Ituberá e com as demais cidades da região. Vale ressaltar, que essa estrada constitui-se na única

via de acesso pavimentada existente atualmente no interior da APA do Pratigi.

Energia

Os serviços de energia elétrica são satisfatórios basicamente nas sedes municipais e em diversas

localidades de Ituberá e Nilo Peçanha. Todavia, em Igrapiúna o serviço é bastante limitado,

sendo, inclusive, insatisfatório e inexistente em alguns núcleos situados nas áreas rurais.

Relativamente à distribuição do consumo de energia elétrica nos municípios que compõem a

APA do Pratigi, Ituberá detém o maior peso em todas as classes de consumo, o que denota a

sua posição enquanto centro de maior atividade urbano-industrial. Neste município, inclusive, o

maior consumo de energia elétrica industrial é registrado nas seguintes empresas: Agroindustrial

de Ituberá, Fazendas Reunidas Vale do Rio Juliana e Plantações Michelin. Ao lado desses

grandes consumidores, evidencia-se, no âmbito da prestação de serviços públicos, a Embasa.

5.2.2 - Culturas Extrativistas nas Comunidades Estuarinas e Rurais do Pratigi

Pesca

A pesca, praticada de diferentes formas, é desenvolvida amplamente não só no litoral, como

também nos canais, rios e manguezais. Tais condições permitem uma diversificada atividade

pesqueira ensejando tanto a captura de peixes quanto de crustáceos e moluscos. Mesmo não se

constituindo em uma atividade econômica de peso em nível municipal e regional, exerce um

papel de destaque, sobretudo por ocupar um número expressivo de pessoas de baixa renda que

utiliza o pescado como principal meio de sobrevivência.

Essa atividade desenvolve-se principalmente nas comunidades de Barra dos Carvalhos e São

Francisco, em Nilo Peçanha, e em Barra do Serinhaém, no município de Ituberá, onde os

camarões e peixes capturados são os mais representativos e possuem maior valor comercial.

Apesar da importância dessa atividade, observa-se a ocorrência de problemas ligados ao

desrespeito ao período de reprodução (defeso) de espécies como o camarão, guaiamu; a pesca

predatória que utiliza rede com malha fina e até mesmo bombas, ocasionando assim sérios

impactos ambientais, que já se vêm revertendo num agravamento das condições de vida dessas

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populações. Isso tem feito com que muitas pessoas abandonem a pesca e se dediquem à

mariscagem.

Na comunidade de Pescaria, localizada na parte central da APA, a coleta de siri e caranguejo é

bastante significativa. Ela é realizada em qualquer época do ano e envolve praticamente toda a

população a partir de 10 anos de idade. A mulher participa também dessa atividade como

responsável pelo tratamento dos mariscos, que no verão representam o principal meio de

sobrevivência da população nessa comunidade.

Considerando a conjuntura de crise econômica que tem levado as empresas atuantes nesses

municípios da APA Pratigi a um processo de reestruturação produtiva com demissões, tem feito

com que muitos desses desempregados – habitantes destas localidades – voltem a insistir em

sobreviver da pesca, muitas vezes de maneira predatória.

Na zona rural a criação de peixes dá-se de forma extensiva em lagoas e represas. Há um

interesse dos produtores em receber orientação técnica e apoio financeiro para essa atividade.

Dendê

O dendê, introduzido pelos africanos no período colonial, representa a segunda mais importante

atividade extrativa vegetal nos limites da APA. É cultivado em várias localidades, mas concentra-

se na parte sul, nas pequenas ilhas localizadas no município de Igrapiúna. A figura 5.4 representa

o beneficiamento artesanal do dendê na comunidade estuarina de Ponta no município de

Igrapiúna.

Figura 5. 4 - Beneficiamento artesanal do dendê

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O dendê é explorado por mini e pequenos produtores que o transformam em azeite, sendo

comercializado junto a agentes intermediários no cais do porto de Camamu. É uma cultura com

pequena sazonalidade produtiva – uma vez que sua colheita estende-se de janeiro a dezembro –

contribuindo assim para o aproveitamento da mão-de-obra permanente, fato que se reveste de

grande importância social.

Piaçava

A piaçava é a mais importante atividade extrativa vegetal, tanto do ponto de vista da área

ocupada, quanto do valor da produção. Contudo, não tem a mesma expressão social da

atividade pesqueira, que constitui a ocupação principal da grande maioria da população residente

em mais de 60% dos aglomerados populacionais da APA. Embora seja praticada por um

número significativo de pequenos produtores rurais, concentrando-se principalmente na faixa

litorânea consorciada com mandioca, pimenta-do-reino e culturas de subsistência, a maior parte

da produção tem origem nos médios e grandes estabelecimentos situados principalmente entre

Ituberá e Nilo Peçanha, nas proximidades da praia de Pratigi. A figura 5.5 ilustra o

beneficiamento de piaçava na comunidade de Jatimane.

Figura 5. 5 - Beneficiamento da piaçava

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Coco-da-baía

Um outro cultivo importante é o coco-da-baía. Ainda que se destacando em termos de

produção e valor no conjunto de municípios onde está inserida a APA do Pratigi, não tem a

mesma expressão social que os cultivos citados anteriormente, pois se trata de uma atividade de

médio e grande produtor, praticada de maneira extensiva, com baixo rendimento e com

pequena geração de emprego. O espaço de cultivo é a faixa litorânea, contígua à praia, que

embora apresente condições de clima e solo favoráveis, por estar sofrendo um acelerado

processo de valorização imobiliária, tem experimentado uma redução no tamanho da área

ocupada com esta cultura. Seu cultivo vem sendo incentivado para atender ao consumo cada vez

mais crescente, sobretudo na alta estação turística. A figura 5.6 ilustra um cultivo do coco-da-

baía.

Figura 5. 6 - Plantação do coco-da-baía

Na área da APA, no que se refere à produção de alimentos, o cultivo da mandioca é o mais

expressivo e destina-se basicamente à produção de farinha, visando, na sua maior parte, à

subsistência e, secundariamente, à comercialização. Muitas vezes plantada nas áreas com

piaçava, e, depois de colhida é processada nas casas de farinha artesanais e até mesmo

modernizadas – a exemplo de uma existente na comunidade de São Francisco. Com exceção do

coco-da-baía, todos os demais cultivos existentes nos limites da APA são praticados,

majoritariamente, por mini e pequenos produtores, ainda que se pratique em Ituberá e Nilo

Peçanha a extração da piaçava e do dendê em grandes propriedades, não raro em parceria com

pessoas residentes nesses estabelecimentos.

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Além dessas atividades extrativistas, na comunidade de Barroquinha, registra-se a presença de 3

estaleiros que produzem barcos utilizando como matéria-prima a madeira de sucupira, olandi,

jataipeba e a jaqueira. Os barcos são comercializados para Valença, Barra dos Carvalhos, São

Francisco e outras localidades. Esta prática vem ocasionando sérios impactos nas áreas rurais,

através da derrubada de algumas árvores consideradas madeiras-de-lei e de uma importante

planta frutífera como a jaqueira.

O sistema de cultivo na zona rural tem como base a agricultura familiar caracterizando-se pelo

cultivo de subsistência (mandioca, jaca, feijão, milho, fruta-pão, legumes e hortaliças) e as

culturas de cacau, cravo, piaçava, pimenta-do-reino, pupunha e guaraná. Observa-se que a

diversificação é um aspecto bastante positivo, sob a perspectiva da conservação do solo.

Turismo

Num contexto de crise socioeconômica caracterizada pela redução do ritmo de crescimento das

atividades agrícolas, o turismo desponta como uma das mais importantes alternativas de

desenvolvimento para o Baixo Sul da Bahia.

Inserida na Costa do Dendê, onde o turismo já é uma realidade – sobretudo no complexo

Valença/Cairu – com seu fluxo turístico ampliado para Guaibim e a ilha de Tinharé, onde está

localizado o Morro de São Paulo, o subespaço do Pratigi, em virtude dos elementos naturais e

culturais de que dispõe, emerge como um dos mais importantes centros turísticos da região.

Nesse conjunto de municípios, os principais atrativos estão situados nos limites da APA e são

formados basicamente por recursos naturais pouco impactados, como, por exemplo, praias,

baía, restingas, estuários, manguezais, e por um rico acervo histórico-cultural caracterizado pela

existência de capelas, antigos engenhos, artesanato e várias manifestações culturais, como as

festas religiosas, o bumba-meu-boi, dentre outras.

No município de Nilo Peçanha merece destaque nacional e até mesmo internacional a

manifestação folclórica denominada Zambiapunga, que significa festa dos deuses da África,

como também a existência de comunidades compostas por uma só família de negros

remanescentes de quilombos nas localidades de Jatimane e Boitaraca.

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O artesanato no município de Ituberá está voltado para a confecção de produtos utilizando o

coco de dendê, a piaçava e madeira. Em Nilo Peçanha observa-se o aproveitamento da piaçava

para a confecção de cestas e esteiras e a utilização da madeira para a construção de réplicas de

embarcações.

Igrapiúna apresenta tradição em crochê, ponto de cruz e renda de bilro. Nas comunidades

registra-se a produção de artigos de cerâmica, cestas e peneiras de cipó.

Todo esse conjunto de elementos naturais e culturais favorece o desenvolvimento do turismo e

do ecoturismo em suas diferentes modalidades, ou seja, o turismo de aventura (caminhada,

trekking, trilhas, etc.), o turismo rural, o agroturismo, assim como o turismo náutico.

Com grande perspectiva de expansão, o turismo, ainda que inexpressivo do ponto de vista

econômico, emerge como uma das mais importantes alternativas de desenvolvimento socio

econômico da APA e, conseqüentemente, nos municípios onde está inserida.

Nesse sentido, cabe mencionar o Programa Nacional de Municipalização do Turismo, que

começou a ser implementado no subespaço do Pratigi a partir de dezembro de 1998, quando da

formalização da Comissão de Turismo Integrado da Costa do Dendê. Esta Comissão é

composta por representantes das Secretarias de Turismo das Prefeituras de Maraú, Camamu,

Ituberá, Nilo Peçanha, Taperoá, Igrapiúna, Valença, do Sebrae/BA e do Instituto de

Desenvolvimento Sustentável do Baixo Sul - Ides.

A proposta da referida Comissão está voltada para a criação de um turismo diferenciado que

atenda às necessidades da população local na perspectiva de um desenvolvimento mais

equilibrado do ponto de vista socioambiental.

Indústria

As atividades do setor secundário também se fazem presentes e tomam impulso com a

implantação de uma grande madeireira pertencente ao Grupo Odebrecht e com a introdução de

grandes agroindústrias de borracha vinculadas ao setor privado.

A indústria de borracha representada pelas empresas Plantações Michelin S.A, no município de

Igrapiúna, e Ituberá Agroindustrial e Fazendas Reunidas Vale da Juliana, em Ituberá, é

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considerada o mais importante segmento do setor secundário desse subespaço, tanto do ponto

de vista da arrecadação tributária (ICMS) quanto do ponto de vista de empregos gerados para a

população local. As indústrias de borracha sempre exerceram um forte atrativo sobre a força de

trabalho masculina residente na APA, inclusive na sua porção norte, como por exemplo em São

Francisco, no município de Nilo Peçanha.

O processo de reestruturação produtiva do setor em nível mundial foi um dos fatores

determinantes para que tais empresas tivessem que se adequar a essa nova lógica de organização

industrial, aumentando a relação produtividade e competitividade e reduzindo a mão-de-obra

contratada com graves repercussões sociais, cuja maior incidência ocorre no município de

Ituberá. As agrovilas da Michelin vêm sendo desativadas, e nas Fazendas Reunidas Vale da

Juliana a mão-de-obra utilizada é vinculada a uma cooperativa criada por iniciativa do

proprietário desta unidade produtiva.

As indústrias madeireiras sofreram uma redução significativa não só nos municípios onde a

APA se insere, como também em toda região do Baixo Sul. As ações desenvolvidas por

instituições públicas e não-governamentais, em nível regional, foram fundamentais para que isso

ocorresse.

As atividades do setor terciário no subespaço do Pratigi se caracterizam fundamentalmente por

uma forte concentração espacial e com implantação relativamente recente. Mesmo não se

constituindo no sustentáculo da economia local, ainda fortemente atrelada às atividades

agrícolas, o setor terciário, mesmo assim, exerce um papel fundamental no processo de

desenvolvimento local/regional.

O comércio praticado em Ituberá, ainda que considerado de pequeno porte, o coloca numa

posição de destaque no Baixo Sul da Bahia. Para isto dispõe de alguns supermercados de médio

porte, padarias e várias lojas nos ramos de confecções, tecidos, materiais de construção, além de

um mercado municipal bem estruturado, onde ocorrem as feiras semanais.

Quanto aos serviços, ressaltam-se as atividades financeiras, de alojamento, saúde, educação,

alimentação, transporte, e escritórios locais e regionais. Nesse aspecto, merecem destaque a

agência do Banco do Brasil, os escritórios da Comissão Executiva do Plano de Lavoura

Cacaueira- Ceplac, Companhia de Energia Elétrica - Coelba, Instituto de Desenvolvimento

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Sustentável do Baixo Sul – Ides, e Empresa Baiana de Saneamento - Embasa, como também o

Hotel Tropical e o Hospital Regional.

5.2.3 - Atores sociais presentes na APA do Pratigi

A APA do Pratigi é uma categoria de conservação de uso sustentável, e como tal conta com a

incidência de múltiplos interesses por parte dos diversos segmentos presentes na sua área de

abrangência, as organizações governamentais, não governamentais e as comunidades envolvidas.

Dos diversos atores sociais identificados na APA para participar do processo de gestão

participativa, foram convidados: Michelin, Cultrosa, Agroindustrial, Fazenda Reunidas Vale do

Juliana, Tecnova, Guaranaps, Expropalm, Fazenda Camarões, Hotel Paraíso das Águas, Hotel

Tropical, Maricultura Renato Torigoi, Clube de Diretores Lojistas de Ituberá, Banco do

Nordeste, Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola - EBDA, Ceplac, Conder, Sudetur,

Faculdade Zacarias Góes – Fazag, e outras instituições de ensino. As empresas e instituições

mencionadas representam os setores da indústria, comércio, comunicação, pesquisa, turismo etc.

Os cinco municípios que estão inseridos na APA foram igualmente convidados para participar

do processo que se estaria iniciando para a formação do Conselho Gestor, por intermédio das

Secretarias que atuam nas áreas de Educação, Meio Ambiente, Agricultura e Turismo; bem

como as Câmaras de Vereadores.

Da sociedade civil organizada foram também identificados e convidados: Coopervale, Cootrasb,

Cooaibasul, Associação de Apicultores, Sindicato dos Trabalhadores de Nilo Peçanha,

Associação dos Produtores de Tachos de Nilo Peçanha, Associação Boca de Lata, Fundação

Vida Nativa, Bahia Flora, Grupo Folclórico Zambiapunga, Ides, Instituto de Defesa, Estudos e

Integração Ambiental - IDEIA, Associação Comunitária de Barra do Serinhaém, Associação de

Pescadores e Comunidade de São Francisco, Grupo Jovem Esperança da Juventude, Associação

dos Moradores do Rio do Meio, Associação de Produtores Rurais do Vale do Juliana -

Aprovale, Associação de Moradores do Km 25, Associação de Moradores da Prainha II.

As entidades formais da sociedade civil presentes no subespaço de Pratigi estruturam-se,

sobretudo em torno de atividades específicas, a exemplo das associações de pescadores, que

compõem o grupo com maior representatividade entre as categorias com algum nível de

organização.

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Segundo o Sindicato de Trabalhadores Rurais de Ituberá, as associações comunitárias,

cooperativas e colônias de pescadores que atuam na área da APA não têm vínculos com o

movimento sindical e/ou outros movimentos sociais mais representativos.

O processo de criação dessas associações, bem como o movimento flutuante do número de

associados, varia ao sabor do cumprimento-descumprimento das promessas de chegada de

projetos para essas comunidades.

Observa-se nas associações um baixo nível de organização, uma participação induzida,

exercitada de forma precária e voltada basicamente para receber os recursos de algum programa

governamental. Tal afirmação pode ser comprovada pelo largo intervalo entre uma reunião, pela

diferença entre o número de associados fundadores e os atuais, pela motivação geralmente

externa ligada ao usufruto de algum benefício.

No plano individual, as perspectivas de melhora de condição de vida traduzem-se em adesões

crescentes a essas entidades. No plano coletivo, a euforia em face de algum investimento para

desenvolver/melhorar as atividades econômicas mobiliza o imaginário coletivo que justifica

todas as ações, idealizando-as como impulsionadoras do progresso social.

Esse tipo de organização “constitui-se no instrumento ideal através do qual, por um lado, as

comunidades podem ter acesso às políticas públicas acalentando o sonho de melhoria das

condições de vida e, por outro, o Estado cria um canal para comunicar aos beneficiários que

defendem os seus interesses, ao mesmo tempo em que personalizam as ações em proveito dos

grupos políticos locais, regionais e estaduais” (BRITO, 1999).

Portanto, a existência dessas organizações deve-se, sobretudo, ao estímulo de órgãos

governamentais, visando viabilizar projetos de cunho produtivo, no ambiente da APA. Como

exemplo podem ser mencionados os casos da Associação dos Pescadores de Barra dos

Carvalhos, do Contrato e de Barra do Serinhaém, que foram criadas para receber recursos do

Programa de Desenvolvimento da Pesca – fruto do Convênio Sudepe/Ceplac – por intermédio

do BNB, destinados também para a aquisição de novas embarcações.

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Alguns pescadores são filiados às Colônias de Pescadores de Ituberá, Camamu, Taperoá e

Valença, com o intuito de garantirem uma melhor comercialização da produção do pescado e

também para efeito de aposentadoria.

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6 - FORMAÇÃO DO CONSELHO GESTOR: UMA PRÁTICA

PARTICIPATIVA NA APA DE PRATIGI

Esta pesquisa teve a intenção de discutir a legitimidade e a eficácia sociopolítica dos conselhos

gestores em APAs, analisando o processo de formação do Conselho Gestor da APA de Pratigi

– BA e enfocando a importância da Educação Ambiental como instrumento de mobilização e

organização dos grupos sociais envolvidos com as questões ambientais na unidade de

conservação.

A opção metodológica adotada nessa pesquisa realizada junto aos atores envolvidos no

processo, equipe que atua na co-gestão da APA e comunidade, é a pesquisa-ação fundamentada

nos princípios norteadores de Barbier (1986), que apresenta como proposta uma abordagem

transversal e a escuta sensível cuja abrangência permite entender a complexidade e a

multirreferencialidade da realidade em questão a ser trabalhada.

A escuta sensível apóia-se na empatia; isto requer do pesquisador uma atenção toda especial, que

implica saber escutar o outro do seu interior, sentindo o seu universo afetivo, imaginário e

cognitivo. Requer, ainda, uma abertura holística para realmente entrar em uma relação de

totalidade com o outro, tomado em sua existência dinâmica.

A realização desta pesquisa junto aos diversos atores envolvidos no processo de gestão da APA

tomou como referência, além da escuta sensível como eixo metodológico, o método da

pesquisa-ação integral de André Morin, referendada por Barbier (1986), por coadunar com os

mesmos objetivos perseguidos neste trabalho:

A pesquisa-ação visa a uma mudança pela transformação recíproca da ação e do

discurso, isto é, de uma ação individual em uma prática coletiva e instigadora, e

de um discurso espontâneo em um diálogo esclarecido e até mesmo engajado.

Ela exige que haja um contrato aberto, formal (de preferência não-estruturado),

implicando uma participação cooperativa, podendo levar a uma co-gestão.

Essa pesquisa-ação insere-se num modelo de pesquisa aplicada, ou seja, de uma pesquisa que se

desenvolve “in loco” e todas as dimensões que a norteiam fizeram-se presentes no processo de

pesquisa na APA de Pratigi, a saber:

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a) Contrato: é de certa forma uma condição essencial à pesquisa-ação integral. A opção por

ser um contrato aberto permitiu ao pesquisador manter-se ativo, para compreender e

controlar o processo, mantendo a dialogicidade, respeitando os valores e as ideologias. É

durante esta fase que começa a surgir o pesquisador-coletivo, desse modo o pesquisador

não se constitui no único responsável pela pesquisa.

b) Participação: com enfoque para ações cooperativas visando uma melhoria contínua para

se chegar à co-gestão, isto implica que a gestão da APA deve ser compartilhada por todos

os segmentos, através de seus representantes no Conselho Gestor e das ações locais.

c) Mudança: é o que necessariamente visa a pesquisa-ação e, como tal, a pesquisa buscou

promover os meios necessários para possibilitar mudança de atitudes, de práticas e de

valores. E isso implica mudanças de condições, de produtos, de discursos, em função de

um projeto-alvo que exprime um novo momento na vida individual e coletiva,

supostamente melhor do que a ordem anterior (ARDOINO, 1984 apud BARBIER,

1986).

d) Discurso: no processo de pesquisa esse quesito pautou-se no diálogo, no respeito às

diferenças, principalmente ao nível de escolaridade, que revela diferentes experiências de

vida e formas de saber, mas de fundamental importância para favorecer a

interdisciplinaridade, um dos pressupostos básicos da educação ambiental.

e) Ação: o intuito desse projeto de pesquisa-ação teve como perspectiva instrumentalizar os

atores envolvidos de modo que a ação seja concebida e definida coletivamente. A ação

deve funcionar como uma espiral – reflexão – ação – discurso. A eficácia da ação se dará

quanto mais se obtiver o consenso de todos e corresponder às capacidades dos

participantes do processo.

A opção por essa metodologia, a pesquisa-ação, corroborando com o que afirma Salomão (2001),

se constitui em uma estratégia de educação ambiental, pois consiste em criar na comunidade um

processo de autodiagnóstico e autotransformação, possibilitando a conscientização não apenas

acerca dos seus problemas, mas também o conhecimento sobre as causas e as possíveis soluções

para as mudanças que se fizerem necessárias.

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Esta metodologia requer, ainda, uma disponibilidade para, se necessário, modificar as técnicas

adotadas e até mesmo o rumo das estratégias traçadas inicialmente, em função da dinâmica da

pesquisa, bem como em decorrência de novas informações e dos acontecimentos imprevistos.

Desse modo, a improvisação se faz presente nesse método.

A apresentação do projeto de pesquisa à equipe co-gestora da APA foi recebida com muito

entusiasmo, mesmo porque já estava prevista no Plano de Ação da APA de Pratigi a formação

do Conselho Gestor, não estivesse definido ainda de que maneira seria feito, como também não

havia recursos específicos destinados a esse fim.

Porém, como alternativa buscou-se conciliar/remanejar recursos de outros projetos para que

fosse possível viabilizar o processo de formação do Conselho, que pretendia ser diferente,

deveria, até a sua criação, cumprir algumas etapas que consistiam em desenvolver ações de

educação ambiental com o foco voltado para a sensibilização e mobilização da comunidade e a

capacitação dos atores em potencial identificados no decorrer do processo, para participar como

membro do Conselho Gestor.

No Art. 75 da Lei Estadual, as instituições interessadas em compor o Conselho Gestor deveriam

ser convocadas localmente, e/ou através de jornal de grande circulação; os representantes da

sociedade civil, escolhidos entre seus pares em assembléia específica de cada entidade; e os

dirigentes de órgãos públicos, que têm atuação na APA, também devem indicar seus

representantes, sendo um titular e um suplente.

No entanto, devido à importância atribuída a um Conselho Gestor na administração de uma

APA, considerando que suas principais atribuições são promover a articulação entre o poder

público e os diversos setores da sociedade; fortalecer institucionalmente a gestão da APA;

propor e apoiar programas sustentáveis e participar de atividades de educação ambiental que

visa contribuir com o processo de conscientização, mobilização e participação das comunidades

envolvidas, fica evidenciada a complexidade da questão, já que se trata de formar um órgão

colegiado composto por diferentes atores, com níveis de escolaridade, formação, experiências de

vida e profissionais diferentes.

Em conjunto com a equipe gestora da APA, foram definidas as etapas e os procedimentos para

que o processo se formalizsse junto aos atores envolvidos sociais, vide figura 5.1.

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FLUXOGRAMA DO PROCESSO DE FORMAÇÃO DO CONSELHO GESTOR

ETAPA I

MOBILIZAÇÃOSOCIAL

INSERÇÃO DOPESQUISADOR

MINI-OFICINAS DESENSIBILIZAÇÃO

ETAPA II

OFICINA PARAIDENTIFICAÇÃO DE

ATORES

SEMINÁRIO DESENSIBILIZAÇÃO REUNIÃO PÚBLICA

ETAPA III

CAPACITAÇÃO CURSODE EDUCAÇÃO

AMBIENTAL

OFICINA PARACONSTRUÇÃO COLETIVA

(REGIMENTO)

IMPLANTAÇÃO DOCONSELHO

AVALIAÇÃO

Figura 6. 1 - Fluxograma

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6.1 - ETAPA 1: CONHECENDO AS COMUNIDADES ESTUARINAS E RURAIS

6.1.1 - Inserção do pesquisador

A primeira etapa da pesquisa teve início em março de 2002; corresponde ao processo de

inserção da pesquisadora nas comunidades estuarinas e rurais, possibilitando a integração da

pesquisadora com os grupos locais e o conhecimento de cada realidade que integra a APA. “A

partir desse momento, a pesquisadora assume o papel de simples mediadora do processo de

pesquisa, criando as condições que favorecessem uma análise de conjunto do problema em

questão e uma tomada de consciência das condições que causam sua formação, organiza os

temas de discussão e propõe novos desafios em termos de ação. Permite ainda aos atores

envolvidos expressarem a percepção que têm da realidade do objeto de sua luta ou de sua

emancipação” (BARBIER, 1986).

O processo inicial é de fundamental importância. “É o ponto de partida e dele depende o

desenrolar de toda a pesquisa. É o momento onde se estabelece o compromisso entre sujeito-

sujeito, do momento de convivência e do estabelecimento de laços orgânicos com a

comunidade de forma participativa”. (SALOMÃO, 2001 apud LOUREIRO, 1992).

A inserção da pesquisadora em cada uma das comunidades ocorreu por intermédio da equipe da

APA, e a receptividade quanto à proposta de trabalho foi bastante positiva. Essa receptividade e

a predisposição em participar dos eventos locais constantes das etapas da pesquisa foram

atribuídas, de certa forma, à atuação do órgão ambiental que, através da APA do Pratigi, já era

conhecido pela comunidade em decorrência das ações que já vinham sendo desenvolvidas na

região. As figuras 5.2, 5.3 e 5.4 representam as campanhas de sensibilização em Educação

Ambiental nas comunidades estuarinas e rurais.

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Figura 6. 2 - Educação Ambiental Figura 6. 3 - Trilha Interpretativa

Figura 6. 4 - Educação Ambiental

6.1.2 - Mobilização social das comunidades

Foram realizadas visitas em cada uma das comunidades que estão na área de abrangência da

APA, com o objetivo de identificar as associações, cooperativas, sindicatos, lideranças locais, e

demais habitantes, para marcar a data, local e horário de uma mini-oficina de sensibilização, que

seria realizada na própria comunidade e em função da sua disponibilidade, para expor a intenção

da pesquisa e das ações que seriam desenvolvidas a partir daquele momento, e, sobretudo buscar

o apoio da comunidade, que deveria se envolver efetivamente em todo o processo que se

implementaria para a formação do conselho gestor na APA de Pratigi.

6.1.3 - Mini-oficina de sensibilização local

As mini-oficinas de sensibilização local tinham como objetivo convidar a comunidade para

participar do “Seminário de Sensibilização para a Formação do Conselho Gestor”. Para tanto,

foram trabalhadas dinâmicas que possibilitaram a transmissão de informações básicas sobre a

APA do Pratigi, tais como: observar qual a percepção e de que forma a comunidade relacionava-

se com o seu ambiente; construir coletivamente alguns conceitos básicos necessários para o

entendimento da complexidade ecossistêmica natural e social que envolve a dinâmica de uma

APA; promover a reflexão para a importância da participação de cada membro da comunidade

para atingir os objetivos de uma APA e, sobretudo, estimulá-los a participar efetivamente do

processo de formação do conselho gestor.

As mini-oficinas locais duravam cerca de 40 a 50 minutos e os procedimentos metodológicos

adotados estão descritos abaixo e ilustrados nas figuras 6.5, 6.6 e 6.7.

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• exposição dialógica - com o auxílio de um flip-chart na forma de álbum seriado;

Figura 6. 6 - Comunidade de Barroquinhas

Figura 6. 5 - Mini-oficina

• técnica de visualização/ou imagens - com a utilização de fotografias sugestionadas para o

ambiente em equilíbrio/desequilíbrio; natureza preservada/devastada/poluída; os

elementos da natureza, etc. essa técnica possibilitou ao grupo participante fazer uma

reflexão sobre a responsabilidade individual e coletiva, para que se tenha um ambiente

com melhor qualidade, na área de abrangência da APA.

• técnica de simulação – no primeiro momento aleatoriamente são entregues em mãos de

alguns participantes 01 vareta (utilizada em churrasco), para ser quebrada ao meio, o que

ocorre facilmente; posteriormente um conjunto de varetas é distribuído para ser quebrado,

e o mesmo não ocorre. Com essa técnica é possível provocar uma reflexão sobre a

importância da comunidade se fortalecer e se unir para atingir um objetivo comum, e

concluem que “A comunidade junta tem mais força que um indivíduo lutando por um mesmo ideal.”

Figura 6. 5 - Mini-Oficina na Comunidade de Itiúca

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6.2 - ETAPA 2: CONHECENDO O AMBIENTE DA APA DE PRATIGI

6.2.1 - Seminário de Sensibilização para uma Gestão Participativa

A realização do Seminário “Gestão Participativa para a APA de Pratigi – Formação do

Conselho Gestor” teve como objetivo reforçar e aprofundar os temas trabalhados na mini-

oficina, ampliar os conhecimentos dos participantes através da inserção de novos temas, como

também propiciar a discussão e o entendimento sobre todo o processo inerente à gestão da

APA de Pratigi e à formação do Conselho Gestor. As figuras 6.8 e 6.9 registram a participação

dos diversos segmentos no Seminário de Sensibilização realizado em Ituberá.

Figura 6. 8 - Seminário de Sensibilização Figura 6. 6 - Seminário de Sensibilização

O conteúdo programático definido para esse seminário consistiu em abordagens conceituais

sobre: meio ambiente, os elementos que constituem a natureza, a relação do homem com a

natureza, remontando à dinâmica dessa relação; os modelos econômicos, as revoluções, as crises

sociais, econômicas e ambientais, e a necessidade da criação de áreas protegidas; Unidades de

Conservação, Área de Proteção Ambiental, Conselho Gestor, Educação Ambiental, e Gestão

Participativa.

As palestras foram proferidas de forma interativa e didática, possibilitando aos participantes a

oportunidade de contribuir, com sugestões, questionamentos, principalmente a respeito do

conselho.

No total foram realizados três seminários, com uma carga horária de oito horas (manhã e tarde),

sendo um para atender à comunidade estuarina, que se reuniu no município de Ituberá, e dois

para atender à comunidade rural. Ambos foram realizados em duas localidades, km 10 e Rio do

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Braço, escolhidos junto com a comunidade por serem locais de melhor acesso para a realização

do evento.

Para a realização do evento foi necessário viabilizar transporte (lancha, ônibus, veículo

tracionado, lanche, almoço, água etc.) e para isso contou-se com o apoio dos municípios

envolvidos.

Os procedimentos metodológicos adotados visaram contemplar os diversos segmentos das

comunidades estuarinas e rurais. Para atender os objetivos do seminário, algumas dinâmicas

foram aplicadas para retratar a comunidade naquele momento, estimulando-a a responder

“Como está a minha comunidade, hoje? Em relação ao meio ambiente, também?”

Divididos em subgrupos, os participantes trabalharam com papel cartolina, revistas, fotos, pincel

atômico, cola, etc. O painel elaborado pelos subgrupos foi apresentado pelos mesmos e

discutido em plenária. As idéias centrais da dinâmica são o estímulo para o despertar quanto ao

meio ambiente e à análise da apropriação e do autoconhecimento da comunidade sobre aspectos

de sua própria vida. A partir dos resultados que variaram com cada grupo, foi possível se definir

estratégias e conteúdos para as oficinas seguintes.

Nessa etapa já se pode observar um avanço na mudança comportamental dos participantes e a

apropriação de alguns conceitos ambientais básicos e suas derivações. Como também já

começavam a perceber que o caminho da construção coletiva era difícil, porém de fundamental

importância para o processo de formação do conselho. O processo é participativo e, como tal,

as soluções deveriam ser identificadas e construídas pela própria comunidade. Ou seja,

começou-se a ter percepção da dimensão e importância das comunidades, na tomada de decisão

e no processo de gestão de suas vidas.

6.2.2 - Oficina para identificação de atores

Para a identificação dos atores em potencial para representar a comunidade no Conselho Gestor

foram realizadas sete oficinas de Educação Ambiental, sendo quatro em comunidades rurais e

três em comunidades estuarinas, com a carga horária de oito horas. A média de participação em

cada uma das oficinas ficou em torno de 30 pessoas.

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Figura 6. 7 - Oficina de E. A - Comunidade rural

A oficina se constituiu numa estratégia pedagógica onde se buscou resgatar os elementos da

realidade vivenciada (experiência acumulada historicamente e a realidade presente), e, a partir

dela, construir novos conceitos e práticas. As atividades realizadas permitiram conjugar a teoria

e a prática, a reflexão e o fazer. A figura 6.10 apresenta a oficina realizada com a comunidade

rural.

Nesse evento pretendeu-se estimular o processo coletivo e de responsabilidades coletivas. Para

isso foram utilizadas dinâmicas que permitiram ao grupo trabalhar alguns aspectos

comportamentais (olhar e ver, cooperação e competição, o individual e o coletivo, participação e

mobilização).

Tratou-se também de temas específicos ambientais, reforço de conceitos e esclarecimentos

quanto à atuação e às atribuições do conselho e dos conselheiros. Ao final das atividades, o

próprio grupo deveria escolher o seu representante, para participar do Conselho. Nesse

momento, verificava-se a identificação dos participantes com o tema e com a missão proposta.

Como seria natural, constatou-se, embora em poucos casos, algumas lideranças que poderiam

vir a realizar um bom papel no conselho, que se omitiram ou declinaram da indicação do grupo.

Ao final, todas as comunidades indicaram seus representantes.

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6.2.3 - Reunião Pública

A reunião pública teve a intenção de congregar em um mesmo espaço todos os segmentos

envolvidos no processo (instituições públicas, instituições de pesquisa, empresários, sociedade

civil organizada), para discutir sobre as respectivas representações no Conselho, a metodologia

do processo de formação do conselho, e apresentar a experiência do Conselho Gestor da Área

de Proteção Ambiental de Itacaré/ Serra Grande, APA administrada pelo CRA, vide figura 6.11.

Figura 6. 8 - Reunião Pública

No total, foram convidadas cerca de duzentas instituições, incluindo as que estariam

participando da representação do conselho, e as demais, para tomar conhecimento do processo

que vinha sendo implementado para a sua formação. A participação nesse evento não foi

considerada satisfatória, haja vista o número de participantes, em torno de cinqüenta pessoas as

quais, na sua grande maioria, representantes das comunidades. Ou seja, não houve uma

representação expressiva dos demais segmentos públicos e privados. Ainda assim, a

programação foi cumprida, ficando os condutores do processo (equipe gestora da APA)

responsáveis por realizar reuniões por segmentos, visando a sensibilizá-los a participar do

processo, e conseqüentemente indicar seus representantes. Nessa oportunidade, a equipe

gestora da APA apresentou a primeira proposta para a composição do Conselho Gestor,

sugerindo as seguintes representações:

Instituições públicas - Secretaria de Educação (01), de Agricultura (01), Conselhos Municipais

de Meio Ambiente (02), Câmara de Vereadores (01), Instituição de Pesquisa (01), Polícia Militar

(01), Ibama (01), totalizando onze instituições das esferas municipal, estadual e federal.

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Organizações da sociedade civil – Associações de comunidades rurais (03), associações de

comunidades estuarinas (03), setor empresarial (02), ONG ambientalista (01).

Sobre a estrutura e composição do Conselho surgiu um questionamento quanto à sua

presidência, pois, seguindo as orientações do Snuc, esta cabe ao órgão gestor da APA; nesse caso,

seria o CRA. Ocorre que a formação do Conselho Gestor na APA de Pratigi passou a ser

competência da Oscip, mediante um Termo de Parceria, de forma que todo o processo para a sua

formação foi realizado sob a sua coordenação, com o acompanhamento e a intervenção da

técnica do CRA, apenas como pesquisadora do Mestrado em Desenvolvimento Sustentável

(UnB-CDS/Uneb/CRA).

No entanto, a Lei que regulamenta o Snuc estabelece que a Oscip com representação no

conselho de unidade de conservação não pode candidatar-se à gestão compartilhada, e sendo a

Oscip gestora da Unidade, esta deve ser acompanhada pelo Conselho Gestor, que pode,

inclusive, recomendar a rescisão do Termo de Parceria, quando constatada irregularidade. Nesse

caso, não cabe a presidência do Conselho à Oscip. E, como a lei não prevê alternativas para esse

caso, os membros chegaram a um “consenso”: a administradora da APA continua assumindo a

coordenação dos trabalhos até que o representante do órgão ambiental se integre ao processo.

Quanto à composição do Conselho, os participantes já envolvidos no processo consideraram

pertinente a participação de uma representação da área da Saúde, mais uma Câmara de

vereadores, sendo necessário abrir espaço para mais duas representações da sociedade civil

organizada, para que o Conselho permanecesse paritário.

Desse modo, e de acordo com o envolvimento e o esforço dos atores sociais identificados ao

longo do processo com potencial para participar do conselho gestor na APA de Pratigi, obteve-

se como resultado a seguinte estrutura e composição, conforme pode ser verificado a seguir e na

figura 6.12.

Instituições públicas:

Federal: IBAMA;

Estadual: Polícia Militar e, para compor a Câmara Técnica, Sudetur e Conder;

Municipal: Secretarias de Educação, de Turismo, Meio Ambiente, Saúde, Câmaras de Vereadores, e Conselhos de Meio Ambiente

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Instituições de Ensino e Pesquisa: Ceplac, e, para compor a Câmara Técnica, a Faculdade Zacarias Góes – Fazag, e Universidade Estadual da Bahia – Uneb.

Empresas: Fazenda Camarões e a Rádio Litoral FM

Sociedade civil organizada: ONGs – Instituto de Defesa, Estudos e Integração Ambiental – IDEIA, Bahia Flora; Associações Comunitárias de Moradores, Pescadores, Grupo de Jovens.

INTITUIÇÕESPÚBLICAS

FEDERAL

ESTADUAL

MUNICIPAL

Figura 6. 9 - Organ

CONSELHO GESTOR DA APA DO PRATIGI

PRESIDÊNCIA CÂMARATÉCNICA

SUDETURCONDERFAZAGUNEB

ORGANIZAÇÕES DASOCIEDADE CIVIL

ORGANIZADA

IBAMACEPLAC

Polícia Militar

Sec. de Educação - ItuberáSec. de Turismo - ItuberáSec. do Meio Ambiente - IbirapitangaSec. da Saúde - ItuberáCâmara de Vereadores - ItuberáConselho de Meio Ambiente - Nilo PeçanhaConselho de Meio Ambiente - IgrapiúnaConselho de Meio Ambiente - Ituberá

IDEIA - Instituto de Defesa, Estudos eIntegração AmbientalBahia Flora

Associação Comunitária de Barra doSerinhaémAssociação de Pescadores e Comunidade deSão FranciscoGrupo Jovem Esperança da Juventude Barrados Carvalhos

Associação de Moradores do Rio Meio -IbirapitangaAssociação APROVALE - IgrapiúnaAssociação de Moradores do KM 25 - ItuberáAssociação de Moradores da Prainha II -Ituberá

Associação de Maricultores de São Francisco- AMASFRádio Litoral FM

COMUNIDADEESTUARINA

ONG

COMUNIDADERURAL

SETOREMPRESARIAL

ograma do Conselho Gestor

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6.3 - 3ª ETAPA: CONHECENDO PARA PARTICIPAR

6.3.1 - Curso de Capacitação

A Curso de Capacitação para a Formação do Conselho Gestor foi uma das ações previstas nesse

processo por ser considerada um importante instrumento de mudança social, pois permite aos

atores envolvidos uma nova compreensão capaz de provocar mudanças nas estruturas mentais

e, conseqüentemente mudanças nas relações produtivas, nas organizações e nas relações

socioambientais. A figura 6.13 faz o registro do curso de Educação Ambiental.

Figura 6. 10 - Registro do Curso de Educação Ambiental

Segundo Lordello (2001), o que se espera de um processo de capacitação é que o sujeito se

torne capaz de atuar de um determinado modo sobre uma dada realidade, não apenas

conhecendo mais, mas, também, se transformando e transformando a própria realidade.

Dessa forma, realizou-se a etapa da Capacitação do Conselho Gestor, por meio de um curso de

Educação Ambiental com os 22 representantes identificados nas instituições públicas no âmbito

municipal, estadual e federal e nas organizações da sociedade civil, com a carga horária de

quarenta horas. O conteúdo programático foi distribuído em quatro módulos, apresentando os

seguintes temas:

Módulo I

• Globalização e Desenvolvimento Local (DLIS) – Tendências, Conceitos e Estratégias;

• Desenvolvimento Sustentado X Ocupações Urbanas e Rurais;

• APA do Pratigi – Termo de Parceria CRA-Ides, Plano de Manejo, Zoneamento;

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• Conselho Gestor – Estrutura, Papel e Atribuições;

• Educação Ambiental – Conceitos, Objetivos, Princípios e Estratégias;

• Legislação Ambiental.

Módulo II

• Processo de Planejamento I;

• Metodologia de Planejamento Participativo;

• Diagnóstico Ambiental;

• Atividades Econômicas Principais: setor primário, secundário e terciário; Emprego,

Trabalho e Renda.

Módulo III

• Processo de Planejamento II;

• Análise do Diagnóstico – Identificação dos pontos de estrangulamento e das

potencialidades da região;

• Elaboração de Projetos/Programas.

Módulo IV

• Elaboração de Plano de Ação para o Conselho Gestor;

• Definição de Estratégias e Diretrizes;

• Regimento Interno.

Como procedimento metodológico foram adotadas as seguintes técnicas: exposição dialógica;

trabalho em grupo; discussão em plenária; estudos de casos; técnica de simulação; interpretação

e análise de textos; exercícios práticos; audiovisual e, palestras expositivas e interativas.

E, ainda, instrumentos práticos de Planejamento Participativo, utilizando-se a matriz de

planejamento FOFA – Fortalezas, Oportunidades, Fraquezas, Ameaças, direcionada mais à

parte ambiental de cada grupo de comunidades, já que os participantes foram divididos em

subgrupos. Avançou-se também na busca de algumas soluções, mais como um exercício prático

na resolução de problemas.

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As figuras 6.14 e 6.15 demonstram as atividades realizadas durante o curso de capacitação.

Figura 6. 11 - Trabalho em grupo Figura 6. 12 - Aula expositiva

A referida matriz foi escolhida em função da característica do grupo (bastante heterogêneo) e o

tempo disponível (curto). Foram ressaltados durante o evento os aspectos positivos e negativos

da matriz e suas limitações e necessidade de aprofundamento.

Como resultado, foi possível verificar a apropriação e confirmação de alguns conceitos

ambientais e de planejamento e gestão. A participação foi relativamente boa e a responsabilidade

em assumir seu papel como cidadão ambiental integrado passa a ser mais forte, apesar das

diferenças, por vezes muito grandes, de compreensão e integração dos participantes.

O último tema do Módulo IV, referente à construção do Regimento Interno, devido à

importância e ao tempo que seria necessário para a sua elaboração, foi combinado com o grupo

de se realizar uma oficina específica para a sua construção.

6.3.2 - Oficina para a elaboração do documento-base para o regimento interno

De acordo com o Dec. Nº 4.340, art. 20, que regulamenta o Snuc, um Conselho Gestor, ao ser

formado, tem o prazo de 90 dias para elaborar o seu Regimento Interno. Ainda assim, ao final

do Curso de Capacitação, o grupo levantou como demanda a realização dessa oficina, que não

constava do planejamento inicial, embora estivesse incluso como um dos temas no Módulo VI.

O grupo acreditava ser muito importante a construção coletiva deste documento com o apoio

dos facilitadores e condutores do processo, até então, pelo fato de já vir trabalhando uma

metodologia participativa.

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O trabalho foi realizado pelos membros do conselho, que se subdividiram em pequenos grupos

de forma aleatória, com a ajuda de um facilitador, que apresentava e esclarecia as questões que

resultariam na elaboração dos capítulos que comporiam o regimento, como, por exemplo:

definir os objetivos do conselho, finalidade, missão, as possíveis parcerias, composição,

atribuições e competências, etc.

As respostas dos grupos eram apresentadas em tarjetas, que se iam agrupando em forma de

painel, para que todos pudessem visualizar o resultado das discussões nos pequenos grupos para

a partir daí, se iniciar a discussão no grupo maior. Se houvesse convergência nas questões

discutidas nos subgrupos, aprovava-se o capítulo, no caso de divergência iniciava-se uma rodada

de discussão para se buscar um consenso, antes de passar para a fase posterior, que

correspondia à construção de mais um capítulo.

A figura 6.16 mostra o resultado da construção coletiva para subsidiar o documento base para a

elaboração do Regimento interno do Conselho e a figura 6.17 registra a participação dos

educadores ambientais da APA, presentes em todo o processo.

Figura 6. 13 - Painel do trabalho Figura 6. 14 - Educadores da APA

Esta última etapa do processo de capacitação para a formação do conselho gestor, em

atendimento a uma demanda do próprio grupo foi bastante satisfatória e contou com uma carga

horária de oito horas. Contribuiu para reforçar, mais uma vez, alguns conceitos, como também

foi oportuno para o exercício de uma construção coletiva de um documento cujas leis e normas

ficaram bem próximas do seu real. Para os futuros integrantes ficou definido como objetivo e

finalidade do Conselho: “Criar, junto à sociedade, uma conscientização da necessidade da

conservação ambiental”; “Coordenar e acompanhar, junto às comunidades, as ações e trabalhos

de conservação ambiental da APA”; como também a sua missão “Ser um órgão consultivo,

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constituído de forma democrática, com representações dos diversos setores da sociedade,

auxiliando o administrador da APA na elaboração, execução e acompanhamento do Plano de

Gestão da APA”.

Após essa etapa, um segundo evento foi realizado, antes da implantação do conselho

formalmente, em face das mudanças político-institucionais na área de meio ambiente no Estado,

conforme mencionado anteriormente, com a criação da Secretaria de Meio Ambiente,

transferindo a competência da gestão da APA para a Superintendência de Desenvolvimento

Florestal e Unidades de Conservação. A mudança está sendo paulatina, de forma que o

processo não sofra descontinuidade.

Vale ressaltar que, após todo o processo estabelecido para a formação do conselho gestor, essa

foi a primeira reunião, após um intervalo de dois meses (janeiro e fevereiro), sendo possível

observar o conselho já funcionando de fato, cumprindo uma pauta previamente estabelecida –

Apresentação e discussão sobre a nova estrutura político-institucional; o novo contexto em que

a APA está inserida; apresentação dos resultados da pesquisa realizada pela pesquisadora com os

membros do conselho e definições sobre o regimento e a sua atuação.

Cabe mencionar o resultado da pesquisa, que pretendia avaliar os aspectos positivos e negativos

do processo, e a percepção que os atores envolvidos possuíam sobre a proposta de formação do

conselho e após o processo.

Como aspectos positivos, foram consideradas as oficinas realizadas com a comunidade, o

diagnóstico socioambiental da APA, que possibilitou o “conhecimento real da situação da área

onde estão inseridos”; a participação e o comprometimento do grupo; “a partilha de

convivências e vivências”. O grupo considerou como aspecto negativo a ausência de alguns

setores da comunidade e o atraso por parte de alguns participantes nos eventos realizados (o

atraso é atribuído às dificuldades de transporte, principalmente por quem precisa se deslocar das

comunidades mais distantes do local da reunião).

Quanto à segunda questão, a visão que os membros possuíam antes de participarem do

processo eram as seguintes: o conselho atuaria apenas burocraticamente; os recursos naturais

eram inesgotáveis; havia o desconhecimento sobre a responsabilidade e a potencialidade do

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conselho gestor, a importância de uma APA, a legislação ambiental; e, sobretudo, acreditavam

que a APA/CRA era uma “estrutura fechada e inflexível”.

A visão atual, no entanto, reconhece o conselho como um “instrumento poderoso no processo

de desenvolvimento das atividades que vão proporcionar a conscientização da coletividade em

relação à necessidade de se conservar os recursos naturais, utilizando-os de forma sustentável”.

Ao intervir no processo de formação do Conselho Gestor da APA de Pratigi, é importante

mencionar que as ações foram pautadas em alguns requisitos, reconhecidos por diversos

autores, como básicos para uma formação que pretende direcionar as questões socioambientais.

Quais sejam:

• Estimular o indivíduo a reconhecer, analisar e participar na resolução dos problemas

ambientais;

• Estimular uma visão global (abrangente/holística) e crítica das questões ambientais;

• Estimular o enfoque interdisciplinar que resgate e construa saberes;

• Possibilitar um conhecimento interativo pelo intercâmbio/debate de pontos de vista;

• Propiciar um autoconhecimento que contribua para o desenvolvimento de valores

(espirituais e materiais), atitudes, comportamentos e habilidades.

Esses são requisitos necessários e que devem estar presentes em todo o processo, voltados à

recuperação, conservação e melhoria do meio ambiente e da qualidade de vida, da nossa e de

todas as espécies desta e das futuras gerações e, ainda, é imprescindível contar com a vontade

pessoal e coletiva, sobretudo com o comprometimento dos gestores públicos, empresários, e

lideranças locais.

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7 - CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

Com o entendimento de que a Educação Ambiental se constitui em um importante instrumento

de gestão em Unidades de Conservação, e mais, que a legitimidade sociopolítica e a eficácia dos

conselhos gestores estão diretamente relacionadas com a importância atribuída à educação

ambiental no processo de formação do Conselho Gestor, é que será aqui apresentada uma

avaliação sobre o processo experimentado pelos atores sociais que atuaram, ora como

protagonistas, ora como coadjuvantes, mas todos com a sua importância na construção de um

capítulo a mais na história da APA de Pratigi.

O processo de formação do conselho gestor se constituiu em uma prática participativa, por meio

de propostas de educação ambiental, permitindo-se considerar que a pesquisa alcançou os

objetivos propostos, podendo os seus resultados nortear outras experiências que venham a ser

desenvolvidas junto aos diversos atores sociais, que direta ou indiretamente estejam envolvidos

no processo de gestão em uma Área de Proteção Ambiental.

Quanto à eficácia do Conselho no processo de gestão da APA, não se considera, neste momento,

pertinente uma avaliação conclusiva, já que a sua implantação, efetivamente, está ocorrendo

concomitantemente ao final deste trabalho, em função das dificuldades encontradas para o

cumprimento das etapas planejadas no cronograma de atividades, proposto no projeto de

pesquisa. O Conselho deveria estar implantado em julho de 2002 para ser avaliado no período de

agosto a dezembro de 2002.

No entanto, uma avaliação sobre o papel atribuído à educação ambiental no processo de

implantação do Conselho Gestor na APA pode ser considerada satisfatória, na medida em que

suas ações foram pautadas com base em alguns pressupostos norteadores dessa prática educativa,

para que houvesse um melhor entendimento da relação estabelecida entre a Educação Ambiental,

Ética e Cidadania.

Em todo o processo buscou-se sensibilizar os atores sociais presentes na APA, transmitir as

informações necessárias para uniformizar linguagem, ampliar conhecimentos e desenvolver a

capacidade crítica para a identificação de problemas e proposição de alternativas.

Promover meios de capacitação no processo de formação do Conselho Gestor é de fundamental

importância na construção de propostas com essa finalidade, pois permite criar as condições

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necessárias para que todos os envolvidos possam participar e intervir no processo de gestão com

a mesma competência.

Antecedendo à pesquisa, algumas ações de educação ambiental já haviam sido desenvolvidas pela

equipe gestora da APA, junto à comunidade campanhas de sensibilização, oficinas de bonecos,

feitos de garrafa PET, teatro de fantoches, palestras etc. e, de certa maneira, esse foi considerado

um dos fatores que contribuíram para que houvesse uma receptividade com a proposta, por

conta da credibilidade e a empatia que a comunidade demonstrou ter com a equipe executora

dessas ações.

Mesmo assim, o processo contou com algumas dificuldades na sensibilização e mobilização das

comunidades estuarinas e rurais, bem como junto às demais instituições, a saber:

• Nas comunidades esse fato é atribuído à incipiente participação de alguns setores da

comunidade; a prioridade dada em nível individual para satisfazer às necessidades básicas,

em decorrência do próprio processo de exclusão a que estão submetidos;

• A participação pouco significativa das instituições públicas e privadas durante algumas

etapas do processo é atribuída à estratégia adotada para sensibilizar esses segmentos -

insuficiente para mobilizá-los a ponto de provocar uma maior integração e um maior

comprometimento com o processo, contribuindo por sua vez, para que as instituições

priorizassem outros eventos promovidos, inclusive pelo próprio Ides, que atua em outras

áreas além da ambiental.

• Uma outra questão observada é quanto à participação das ONGs e dos setores

empresariais. Esses segmentos foram convidados formalmente, enfatizando a importância

dessas participações no processo que se estaria iniciando. Mas, devido à inexpressiva

mobilização dessas instituições para realizar a escolha de seus representantes, esta foi

realizada pela equipe gestora e pelos atores sociais já envolvidos no processo, utilizando

como critério para escolha as ONGs que demonstraram disposição e interesse em

participar da co-gestão na APA de Pratigi. No entanto, a indicação dos representantes da

sociedade civil de acordo com a Lei Estadual no seu Art.75, § 1º, dar-se-ia em Assembléia

específica de cada representação, sendo escolhidos pelos seus pares um titular e um

suplente. O recomendável para esses casos é estabelecerem-se mecanismos de escolha a

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partir de critérios de seleção e eleição dos representantes e não a partir de nomes

predefinidos por questões políticas ou conjunturais.

• Por tratar-se de uma gestão compartilhada, surgiu o seguinte questionamento: a quem

compete a presidência do Conselho? Ao órgão gestor ou a instituição Co-gestora? De

acordo com o Snuc, o conselho deve ser presidido pelo órgão responsável por sua gestão.

Tratando-se de uma gestão compartilhada a regulamentação do Snuc estabelece que a

Oscip com representação no conselho de unidade de conservação não pode candidatar-se

à gestão compartilhada, e sendo a Oscip gestora da Unidade, esta deve ser acompanhada

pelo Conselho Gestor, que pode, inclusive, recomendar a rescisão do Termo de parceria,

quando constatada irregularidade. Nesse caso, não cabe a presidência do Conselho à

Oscip. Ocorre que o processo de implantação do Conselho Gestor na APA, contou

efetivamente com o Ides – Co-gestor, com o acompanhamento e a intervenção da técnica

do órgão ambiental, como pesquisadora. Essa questão permitiu algumas reflexões sobre a

legitimidade da participação de um representante do órgão gestor na presidência do

Conselho, já que a instituição não participou diretamente das etapas que se

desenvolveram até a sua implantação. Desse modo, a presidência do Conselho coube ao

Coordenador das Áreas de Proteção Ambiental, do órgão gestor, devendo este integrar-se

ao processo, com o apoio da Oscip na coordenação dos trabalhos pertinentes ao

Conselho Gestor da APA. A questão foi discutida com bastante transparência, pautando-

se no que assinala Loureiro (2003) sobre o assunto: “É fundamental que o presidente,

mesmo nos casos em que são definidos em Lei, como, por exemplo, as Unidades de

Conservação, não tenha poderes que inviabilizem a participação democrática”.

• Outras dificuldades: a heterogeneidade dos atores sociais envolvidos para uma adequação

dos recursos didáticos que permitisse uma linguagem acessível a todos; as limitações do

tempo e o custo para viabilizar as ações em função das distâncias e dificuldades nos

acessos para deslocamento; e o cumprimento do cronograma em vista da

incompatibilidade nas agendas da comunidade, ou da equipe do Ides – co-gestora da APA

com suas múltiplas atividades, ou mesmo da pesquisadora, que tinha que conciliar suas

atividades da pesquisa com as profissionais.

• A ampliação da APA do Pratigi: ao ser escolhido o objeto desta pesquisa, a APA possuía

três municípios (Ituberá, Nilo Peçanha e Igrapiúna), posteriormente passaram a integrá-la

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os municípios de Piraí do Norte e Ibirapitanga, ou seja, o Plano de Manejo não

contempla todos os municípios, dificultando, de certa forma, a contextualização dessas

áreas.

• A reestruturação no âmbito governamental que cria a Secretaria de Meio Ambiente e

Recursos Hídricos – Semarh, em 20 de dezembro de 2002, repassando a competência da

criação, implantação e gestão de Áreas de Proteção Ambiental para a Superintendência de

Desenvolvimento Florestal e Unidades de Conservação; ou seja, ao se concluir o

processo de Formação do Conselho Gestor, foi necessário apresentar e discutir com os

membros do Conselho o novo cenário em que a APA do Pratigi se situa

institucionalmente. O impacto não foi maior porque na prática as mudanças foram

graduais.

Os diversos atores sociais presentes na APA, conforme descrito no Capítulo 4, foram convidados

para conhecer e integrar-se ao processo participativo para a formação do Conselho Gestor. No

entanto, os que mais se identificaram com a proposta, demonstrando estar sensibilizados,

mobilizados e comprometidos com as questões socioambientais da APA de Pratigi,

compreendendo membros do conselho e câmara técnica, foram os seguintes:

• Instituições públicas - federal, estadual e municipal (11): Ibama; Polícia Militar

(Membro), Sudetur e Conder (Câmara Técnica); Secretarias de Educação, de Turismo,

Meio Ambiente, Saúde, Câmaras de Vereadores, e Conselhos de Meio Ambiente (03).

• Instituições de Pesquisa e Ensino (03): Ceplac (Membro), Faculdade Zacarias Góes –

Fazag, e Universidade Estadual da Bahia – Uneb (Câmara Técnica).

• Empresas (02): Associação de Maricultores de São Francisco e a Rádio Litoral FM

• Sociedade civil organizada (09): ONGs: Instituto de Defesa, Estudos e Integração

Ambiental – Ideia, Bahia Flora; Associações Comunitárias de Moradores, Pescadores,

Grupo de Jovens.

As razões para que os demais atores não tenham se integrado ao processo podem ser

consideradas as mais diversas:

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• Falta de interesse por ser mais uma atribuição, e sem remuneração;

• Dificuldade de acesso ou de deslocamento até o local do evento; muitas vezes é

necessária uma caminhada de 10 km em estrada de barro até que se possa pegar uma

condução;

• Fraca organização das comunidades, com a presença de lideranças informais impedindo a

participação dessas na representação do Conselho;

• Participação em outros conselhos já existentes nos municípios que compõem a APA.

Vale ressaltar, no entanto, que na medida em que as etapas foram gradativamente vencidas, e os

atores com potencial para participar como representantes no conselho foram sendo identificados

pela própria comunidade, estes progressivamente se engajaram ao processo, sendo possível

perceber um significativo avanço a partir das oficinas de capacitação. Todas as contribuições

eram valorizadas, aproveitadas e discutidas exaustivamente no grupo até que se chegasse a

propostas consensuais.

A participação e a inserção da pesquisadora em todas as etapas do processo possibilitou um

maior conhecimento sobre a dinâmica de funcionamento de uma APA, em especial a de Pratigi,

com suas peculiaridades e complexidade socioambiental, bem como compreender e incorporar as

contribuições dos atores envolvidos, na construção de um processo participativo e educativo.

A pesquisa teve a duração de doze meses, compreendendo o planejamento, a execução e o

acompanhamento sistemático do processo de formação do Conselho Gestor na APA de Pratigi.

A teoria e a prática confirmam que o resultado de um processo de educação ambiental se dá em

longo prazo, e deve ser contínuo e permanente. E ainda, deve propiciar a informação, atualização

e capacitação para que os atores envolvidos estejam aptos para lidar com cada situação que se

apresente nos diversos espaços sociais em que vivem e atuam. Com esse entendimento, o

processo de pesquisa realizou-se em pouco tempo, mas os resultados são indicadores de que esse

é o caminho para se construir uma nova relação com a sociedade em um processo de gestão

compartilhada.

Como pesquisadora e técnica do órgão ambiental até então gestor da APA, foi possível contribuir

com o processo de formação do conselho, inserindo a dimensão participativa, praticando uma

educação crítica, transformadora e contextualizada, oportunizando a cada um dos seus membros

conhecer e se reconhecer dentro do processo que vislumbrava, torná-lo apto a participar de um

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colegiado consciente do seu papel, da sua importância e da sua co-responsabilidade na gestão de

uma Unidade de Conservação, com o entendimento de que a “a sociedade não é o lugar da

harmonia, mas, sobretudo, de conflitos e dos confrontos que ocorrem em suas diferentes esferas,

seja na política, na economia, nas relações sociais, nos valores etc.” (QUINTAS, 2000).

Desse modo, consideramos que o processo de educação ambiental desencadeado não apenas

durante a formação do conselho, mas nas ações que o precederam, contribuiu para

instrumentalizar as comunidades envolvidas para participar de forma mais significativa da gestão

da APA, e os indicadores que refletem isso podem ser atribuídos ao aumento considerável para as

denúncias de crimes ambientais, à busca de informações sobre legislação ambiental, à pesquisa

científica e escolar, à solicitação de fiscalização ambiental e orientações referentes a construções e

manejo dos recursos florestais e pesqueiros.

Para efeito dos resultados até aqui mencionados nesta pesquisa junto aos diversos atores

envolvidos no processo de gestão da APA, vale ressaltar a opção metodológica adotada, a

pesquisa-ação referendada pela pesquisa-ação integral de André Morin, citada por Barbier (1986).

A pesquisa se desenvolveu “ïn loco” e consistiu em três etapas norteadas pelas dimensões que se

inserem no modelo de pesquisa aplicada, quais sejam: contrato, participação, mudança, discurso e

ação.

A dimensão contratual é condição essencial à pesquisa-ação integral. Esta fez-se presente

principalmente na Etapa I da pesquisa, no processo de sensibilização e mobilização dos diversos

segmentos da sociedade civil e instituições públicas. Inicialmente essa dimensão contratual foi

considerada a partir da receptividade e comprometimento dos atores sociais envolvidos com o

processo de formação do Conselho Gestor, quando estes passaram a atuar efetivamente como

pesquisador-coletivo, dividindo as responsabilidades pela pesquisa, com o pesquisador. No

segundo momento, essa dimensão contratual se estabelece formalmente mediante documento

que oficializa a participação dos membros no Conselho, encaminhado por suas respectivas

instituições.

As demais dimensões presentes nesse modelo de pesquisa, (participação, mudança, discurso e

ação) em maior ou menor graus já podiam ser observadas nas Etapas seguintes II e III,

independentemente das diferenças sociais, de ideologia ou escolaridade. Na medida em que o

processo de capacitação promovia os meios necessários para que essas dimensões pudessem ser

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incorporadas na vida individual e coletiva dos atores sociais presentes na APA, principalmente

daqueles que passaram a participar como membro no Conselho Gestor representando um

determinado segmento.

Na aplicação desta metodologia foi possível observar que os pesquisadores e os pesquisados

desempenharam papéis de fundamental importância, na condição de partícipes de um processo

que implicou mudança de atitudes e práticas com vistas a compatibilizar a conservação dos

recursos ambientais com as funções produtivas e socioculturais de uma APA.

Todas as atividades desenvolvidas se constituíram em um processo estratégico com estímulo à

reconstrução coletiva e a reapropriação subjetiva do saber, ou seja, buscou-se fomentar a

capacidade de construção de conceitos, a partir do saber pessoal numa perspectiva de estimular o

pensamento crítico. O processo de aprendizagem coletiva se fez presente em todas as etapas

realizadas, a partir do envolvimento e da troca de informações entre a pesquisadora e

pesquisados, equipe gestora da APA e demais instituições que atuam na região.

Nesse sentido foi possível observar algumas mudanças ocorridas com os membros do Conselho

Gestor ao final do processo desencadeado para a sua formação, tais como:

• De percepção com relação à importância da APA e a necessidade de conservação dos

seus recursos naturais;

• De comportamento e elevação de auto-estima na condição de membro do conselho;

• Fortalecimento das ações comunitárias e a busca de parcerias;

• Demanda por capacitação e orientação técnicas;

• Participação e comprometimento com as questões ambientais;

• Entendimento da APA de Pratigi/CRA como uma oportunidade de envolvimento das

representações sociais na gestão compartilhada.

A partir de toda a experiência vivenciada com esta pesquisa, é oportuno considerar que:

• A Educação Ambiental aliada a uma prática participativa se constitui em um importante

instrumento de gestão em uma Unidade de Conservação. É um dos caminhos a ser

percorrido para a consolidação de uma APA, pois permite criar as competências

necessárias para uma atuação mais efetiva do Conselho Gestor.

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• O Conselho Gestor deve ser capaz de intervir no processo de Gestão da APA, apontando

alternativas políticas, coletivas e propondo práticas que possam promover a

sustentabilidade local e a melhoria da qualidade de vida da população;

• A Educação Ambiental não se encerra com a formação do Conselho Gestor, mas deve se

constituir em uma prática contínua e sistemática, com vistas a propiciar o debate e

aprimoramento de seus membros, para que esses atuem como multiplicadores junto aos

segmentos que representam.

Para o cumprimento dos objetivos deste tipo de Unidade de Conservação, estabelecidos pelo

Snuc, a Semarh/Superintendência de Desenvolvimento Florestal e Unidades de Conservação –

SFC, instituição a quem cabe essa competência, deve:

• Dar continuidade ao processo de articulação, integrando os diversos setores sociais que

atuam na APA (organizações não-governamentais, agências financiadoras, lideranças

políticas dos municípios envolvidos e demais instâncias do governo), fortalecendo as

parcerias, para desenvolver conjuntamente o Plano de Gestão da APA;

• Criar mecanismos que possibilitem agilizar a fiscalização na região;

• Inserir na programação orçamentária os recursos necessários para o funcionamento do

conselho, de forma a garantir igualdade de condições na participação dos seus membros,

até que este seja capaz de se auto-sustentar;

• Dar continuidade ao processo de sensibilização, fortalecer a mobilização e organização

comunitária, para a implementação das mudanças socioambientais necessárias na APA.

Por certo, o fato de ter um conselho implantado nesses moldes, considerando toda a trajetória já

descrita na metodologia, com base na pesquisa-ação, pode ser aqui entendido como o início de

uma caminhada e, sobretudo, de uma conquista de conscientização por parte de alguns setores da

comunidade e das instituições co-responsáveis pela gestão da APA.

Os resultados são aparentemente incipientes frente ao grande desafio que ainda é necessário ser

enfrentado, mas todos temos a consciência que a luta é necessária e a continuidade deste trabalho

na APA é uma das formas de garantia de que uma convivência equilibrada entre os objetivos

ecológico e socioeconômicos poderá ser atingida.

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A riqueza dessa experiência permite assinalar que a educação, além de ser um ato político, é

também um ato de amor, pois, segundo Loureiro (2002), “resulta do compromisso social e do

respeito a si mesmo, ao outro e à vida, movida que é pela paixão de viver e pelo sentimento de

pertencimento ao planeta”.

Finalmente, vale registrar que esta pesquisa promoveu o reconhecimento e a aceitação do outro,

respeitando as diferenças de saberes e de “olhares” nesse processo de convivência educativa,

permitindo a produção de um novo conhecimento sobre a gestão da APA do Pratigi.

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